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[...] a Convenção entende “criança” estritamente no sentido de “menor” e não põe
absolutamente em questão o conceito de “menoridade jurídica”. Em certo sentido, portanto,
emprega “direitos da criança” na mesma linha da Convenção de Genebra de 1924 e da
Declaração da ONU de 1959: seu preâmbulo e numerosos artigos definem claramente os
direitos da criança como direitos a “uma proteção especial”, e esses direitos são reafirmados
com muita força. Contudo, por outro lado, somam-se a esses direitos à proteção outros tipos
de direitos, os quais só têm sentido caso exercidos pelos seus beneficiários: direitos à
liberdade de opinião (art.12), à liberdade de expressão (art.13), à liberdade de pensamento, de
consciência e de religião (art. 14), à liberdade de associação (art.15); em suma, direitos que
pressupõem a capacidade jurídica, quer dizer, a responsabilidade. (THÉRY, 2007, p. 139-
140).
Para Arantes (2009), as dificuldades de implementação dos novos direitos de crianças
e adolescentes ganham maior evidência, no Brasil, quando se trata de matéria objeto de
disputa entre grupos religiosos e minoritários. É o caso do direito à liberdade de orientação
sexual e ao uso de preservativos para a prevenção da gravidez e de doenças sexualmente
transmissíveis, além do direito ao aborto, nos casos permitidos por lei. Chama a atenção para
a novidade da Proteção Integral a que têm direito crianças e adolescentes, endossando o
posicionamento de Souza (2008) sobre a existência de uma tensão, e não de uma contradição,
entre os direitos de proteção e autonomia:
O que se destaca neste debate é o fato de não mais se restringir ao mero reconhecimento do
direito à proteção e ao acesso não discriminatório de crianças e adolescentes aos serviços e
bens culturais, reivindicações que se tornaram o apanágio dos movimentos sociais. O grande
desafio do momento atual é equacionar a tensão que se instala entre conceder maior
autonomia à infância e à adolescência, direito de voz e de participação política, com vistas ao
alcance daquilo que definimos como meta para atingirmos a excelência humana, portanto a
felicidade, e o risco que esta prática possa favorecer uma certa omissão dos adultos e das
instituições em construir junto com as crianças e os adolescentes metas que garantam a
proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes em um contexto de definições claras em
relação ao bem humano e à felicidade humana. Se, por um lado, estamos convencidos de que
os princípios tradicionais de proteção e direitos da criança e do adolescente precisam ser
revistos, por outro, é igualmente verdadeiro que eles não podem ser de modo algum
descartados, mas sim retomados dentro de um novo contexto [...]. (Souza, 2008, p. 12-13
apud Arantes, 2009).
Dinechin (2006) considera que a CDC apresenta uma visão ocidental de criança. Para
ele, essa criança ocidental, idealizada nos trabalhos preparatórios da CDC acabou se
convertendo no modelo de criança internacional por meio do Direito Internacional – as
crianças e adolescentes se beneficiam de regras comuns, independentemente do respeito a sua
cultura, de suas crenças e como as leis nacionais os entendem.
Para o autor, de maneira geral, o impacto social provocado pela CDC no âmbito da
proteção da infância nas sociedades ocidentais desenvolvidas não tem provocado maior
autonomia de crianças e adolescentes, uma vez que a ideia de maior proteção à infância tem
se traduzido em maior controle dos seus movimentos. “Los derechos del niño moderno
aumentan a medida que su libertad para ir y venir disminuye”(DINECHIN, 2006, p. 19).
Para Dinechin, a CDC vai além do âmbito da infância, ela se converte em um dos
pilares da própria democracia. O autor chama atenção para o que estabeleceu o Diretor
Executivo do UNICEF, James P. Grant: “la democracia es buena para los niños”