30
magia. Esse encontro foi relatado por Villa-Lobos de maneira levemente
irreverente:
Encontrei Segóvia em 1923 ou 24, não me lembro bem, na casa de
Olga Moraes Sarmento Nobre. Havia uma princesada lá. Vi um moço
de vasta cabeleira, rodeado de mulheres. Achei-o besta, pretensioso,
apesar de simpático. (SANTOS, 1975, p. 11)
Evento organizado para apresentar o violonista à sociedade francesa,
Segóvia também relatou a ocasião com o mesmo ar de deboche, no que se
refere ao violonista Villa-Lobos:
Quando terminei minha apresentação, Villa-Lobos aproximou-se e
disse-me em tom confidencial: “Também toco violão” - “Maravilhoso!”
respondi. “Você é, então, capaz de compor diretamente para o
instrumento”. Estendendo as mãos, ele pediu-me o violão. Sentou-se
(...). Olhou severamente para os dedos (...). E quando menos se
esperava, desferiu um acorde com tal força, que deixei escapar um
grito, pensando que o violão tinha se despedaçado. Ele deu uma
gargalhada e com uma alegria infantil disse-me: “Espere, espere...”
(...). Após várias tentativas para começar a tocar, ele acabou por
desistir. (...) Apesar da sua incapacidade para continuar, os poucos
compassos que tocou foram suficientes para revelar, primeiro, que
aquele mau intérprete era um grande músico, pois os acordes que
conseguiu produzir encerravam fascinantes dissonâncias, os
fragmentos melódicos possuíam originalidade, os ritmos eram novos
e incisivos e até a dedilhação era engenhosa; segundo, que ele era
um verdadeiro amante do violão. No calor desse sentimento, nasceu
entre nós uma sólida amizade. Hoje o mundo da música reconhece
que a contribuição desse gênio para o repertório violonístico
constituiu uma benção tanto para o instrumento como para mim.
(SANTOS, 1975, p. 12)
Com dedicatória para Segóvia, Villa-Lobos compôs os 12 Estudos
para violão solo. Nesta obra, aproveitando-se do ganho sonoro causado pela
utilização de cordas de nylon, usou procedimentos técnicos que ressaltavam
esta nova característica acústica, unindo a utilidade dos estudos técnicos com
a estética de música de concerto, a sonoridade moderna não conservadora
com imagens do violão popular acompanhador.
Alguns desses procedimentos composicionais já haviam sido testados
na Suíte, como descrito anteriormente. Movimentos paralelos, harmônicos,
preocupação timbrística demonstrada através de digitações específicas,
exploração da ampliação acústica do instrumento, utilizando fórmulas em que
as cordas soltas ficam em evidência; todos estes recursos são encontrados nos