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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
MESTRADO EM DINÂMICAS DO ESPAÇO HABITADO - DEHA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
PAISAGISMO CONTEMPORÂNEO:
Estratégias para o projeto de praças
Claudio Estevão Bergamini
Maceió
2009
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ii
Claudio Estevão Bergamini
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
PAISAGISMO CONTEMPORÂNEO:
Estratégias para o projeto de praças
Dissertação de mestrado apresentada ao Mestrado
em Dinâmicas do Espaço habitado da Universidade
Federal de Alagoas, como requisito para a obtenção do
grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.
Orientador: Prof. Dr. Alexandre Márcio Toledo
Maceió
2009
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecária Responsável: Helena Cristina Pimentel do Vale
B493p Bergamini, Claudio Estevão.
Paisagismo contemporâneo : estratégias para o projeto de praças / Claudio
Estevão Bergamini, 2009.
159 f. : il.
Orientador: Alexandre Márcio Toledo.
Dissertação (mestrado em Arquitetura e Urbanismo : Dinâmicas do Espaço
Habitado) – Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo. Maceió, 2009.
Bibliografia: f. 153-159.
1. Paisagismo contemporâneo. 2. Projetos. 3. Estratégias. 4. Espaço público.
I. Título.
CDU: 711.61
iv
Dedico este trabalho a meus pais:
Sebastião e Olinda, que desde cedo me
incutiram, pelo exemplo, o gosto pela
leitura e a curiosidade para aprender
sempre; e aos meus filhos: Victor, Pedro e
Luna, que me ensinam a cada dia que as
coisas sempre podem ser melhores do que
esperamos.
v
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Gabriela Biana, pela primeira idéia e entusiasmo em fazer o mestrado e pelo
apoio carinhoso e incondicional.
Agradeço ao meu orientador Alexandre Toledo pela paciência de auxiliar a estruturar
intuições e pensamentos dispersos em um discurso coerente.
Agradeço às professoras Maria Angélica e Lúcia Hidaka, pela contribuição com críticas,
comentários, sugestões e visão abalizada do paisagismo.
Agradeço ao arquiteto Fábio Robba e à professora Gianna Barbirato pela leitura atenta e
sugestões para o desenvolvimento da dissertação.
E a todos os professores e colegas com os quais convivemos durante este período e que
ajudaram com comentários e incentivo.
vi
ˆNossa arquitetura devia de ser (sic) imaginosa, meio demente, colorida, violenta, irregular. Arde
nte e forte em certos casos e noutros casos, tranqüila e acolhedora.
Isto é, arquitetura pública no primeiro caso, e particular no segundo˜.
Ariano Suassuna
Palestra em Maceió - 23 Agosto 2006
vii
RESUMO
O paisagismo atualmente se constitui na maior área de experimentações conceituais e
formais que envolvem o campo da arquitetura. Nas últimas décadas do século XX e
início do século XXI, assistiram-se as mais radicais propostas de desenho da paisagem
na criação de ambientes exteriores em todas as escalas. Estas transformações visam à
criação de uma nova natureza, mais próxima do ser humano, mais adequada a sua escala
e ao gosto contemporâneo. A partir da década de 1980, os projetos de paisagismo
passaram a ser mais abrangentes e tomaram maior liberdade no que diz respeito aos
conceitos e estratégias projetuais. O objetivo deste trabalho é discutir os fundamentos
teóricos do paisagismo contemporâneo e o seu rebatimento em estratégias de projeto
recorrentes no trabalho recente dos paisagistas brasileiros. Como metodologia, optou-se
por: (i) uma pesquisa de revisão de literatura de caráter histórico, nesta investiga-se as
influências do paisagismo moderno nas novas concepções contemporâneas no cenário
internacional e no Brasil, verifica-se a influência dos conceitos da arquitetura
contemporânea sobre o paisagismo e abordam-se os aspectos e as disciplinas que atuam
de maneira conjunta na concepção dos projetos de paisagismo contemporâneos, que são:
o aspecto funcional - relacionado ao desenho urbano, o aspecto estético - relacionado à
arte e a arquitetura contemporânea e o aspecto ambiental - relacionado ao conforto
ambiental e à preocupação com o aquecimento global e a sustentabilidade ambiental;
(ii) análise, sob três aspectos (funcional, estético e ambiental) de oito praças - duas
praças em quatro capitais brasileiras: São Paulo e Rio de Janeiro, na região sudeste; e
Recife e Maceió, na região nordeste. Embora haja uma diferença propiciada pela
história e herança cultural de cada região, os projetos contemporâneos apresentam uma
unidade no que diz respeito à criação de ambientes artificiais, com grande influência da
arquitetura, que sejam mais coerentes com o formalismo, a tecnologia, o espírito e a
poesia contemporânea. Este trabalho visa contribuir para a formação de um pensamento
mais claro sobre os fundamentos do paisagismo e para uma prática profissional menos
estereotipada, evitando-se projetos baseados em simples formalismo.
Palavra chave: paisagismo contemporâneo, estratégias de projeto.
viii
ABSTRACT
The landscape today is the greatest area of conceptual and formal trials involving the
field of architecture. In the last decades of the twentieth and early twenty-first century,
attended to the more radical proposals for landscape design in creating outdoor
environments at all scales. These changes aim to create a new nature, closer to humans,
more suitable for scale and contemporary taste. From the 1980s, the landscape design
have become more extensive and took more freedom with regard to the concepts and
strategies for projecting. The aim of this paper is to discuss the theoretical foundations
of contemporary landscape and their effects on design strategies applicants in a recent
study of Brazilian landscape. The methodology was chosen: (i) a research literature
review of historical character, this investigates the influences of the modern landscape
in contemporary new designs in the international arena, and Brazil, there is the
influence of architecture concepts on the contemporary landscape and address the
aspects and disciplines working closely together in the design of contemporary
landscape design, which are the functional aspect - related to urban design, the aesthetic
- relating to art and architecture and contemporary aspect Environment - related to
environmental comfort and concern about global warming and environmental
sustainability, (ii) analysis in three areas (functional, aesthetic and environmental) of
eight squares - two squares in four Brazilian cities: Sao Paulo and Rio de Janeiro, in the
southeast, and Recife and Maceio, in northeastern Brazil. Although there is a difference
provided by the history and heritage of each region, contemporary designs have a unit
with regard to the creation of artificial environments, with great influence of
architecture which are more consistent with the formalism, technology,
entrepreneurship and contemporary poetry. This paper aims to contribute to the
formation of clearer thinking about the fundamentals of landscaping and a professional
practice less stereotyped, avoiding projects based on mere formality.
Keyword: landscaping, contemporary design strategies.
ix
LISTA DE FIGURAS
Fig. 1 - Adaptado Método de Estudo de Caso.................................................................. 6
Fig. 2 - Jardim Noailles - planta baixa - 1924 ................................................................ 13
Fig. 3 - Jardim Noailles - vista ....................................................................................... 13
Fig. 4 - Jardim da Casa Kallenbach - planta baixa - 1922.............................................. 13
Fig. 5 - Jardim da Casa Kallenbach - perspectiva .......................................................... 13
Fig. 6 - Villa Noailles - perspectiva isométrica - 1924................................................... 14
Fig. 7 - Villa Noailles - vista do jardim.......................................................................... 14
Fig. 8 - Vista árvore de concreto .................................................................................... 15
Fig. 9 - Jardins Exposição de Artes Decorativas de Paris - 1925................................... 15
Fig. 10 - Jardim de Água e Luz - perspectiva - 1925 ..................................................... 16
Fig. 11 - Jardim de Água e Luz - vista ........................................................................... 16
Fig. 12 - Jardim Secreto Villa Noailles - 1926............................................................... 16
Fig. 13 - Jardim Secreto Villa Noailles .......................................................................... 16
Fig. 14 - Pavilhão de Barcelona – planta baixa - 1929................................................... 17
Fig. 15 - Pavilhão de Barcelona - vista panorâmica do jardim....................................... 17
Fig. 16 - Casa Farnsworth - planta baixa - 1946 ............................................................ 18
Fig. 17 - Casa Farnsworth.- vista do jardim ................................................................... 18
Fig. 18 - Casa Bentley Wood - planta baixa - 1935 ....................................................... 19
Fig. 19 - Casa Bentley Wood - fachada.......................................................................... 19
Fig. 20 - Casa Bentley Wood - detalhe escultura de Henry Moore................................ 20
Fig. 21 - Casa Bentley Wood - vista do jardim .............................................................. 20
Fig. 22 - Ministério da Educação e Saúde - planta do jardim - 1936-1943.................... 21
Fig. 23 - Ministério da Educação e Saúde - vista do terraço-jardim .............................. 21
Fig. 24 - Ministério da Educação e Saúde - detalhe do jardim....................................... 21
Fig. 25 - Casa Burton Tremaine - planta do jardim - 1948 ............................................ 22
Fig. 26 - Casa Kaufmann – Bear Run – Fallingwater - planta baixa -1936................... 23
Fig. 27 - Casa Kaufmann - vista da cascata.................................................................... 23
Fig. 28 - Casa Kaufmann – Palm Springs - planta baixa - 1946 .................................... 24
Fig. 29 - Casa Kaufmann - vista do jardim .................................................................... 24
Fig. 30 - Jardim Donnell - planta baixa - 1948............................................................... 26
Fig. 31 - Jardim Donnell - vista da piscina..................................................................... 26
Fig. 32 - Jardim Donnell - vista do deck ........................................................................ 26
Fig. 33 - Jardim Donnell - detalhe escultura .................................................................. 26
Fig. 34 - Jardim Goldstone - planta - 1948..................................................................... 28
Fig. 35 - Jardim Goldstone - vista .................................................................................. 28
Fig. 36 - Quadra S.Cristóbal - México - 1967/68........................................................... 29
Fig. 37 - Casa Barragán - México - 1947 ....................................................................... 29
Fig. 38 - Jardins da Sede da IBM - N.Iorque - 1964 ...................................................... 29
Fig. 39 - Califórnia Scenário - Califórnia - 1980-82 ...................................................... 29
Fig. 40 - Casa Rua Santa Cruz – jardim - 1928.............................................................. 31
Fig. 41 - Casa da Rua Santa Cruz - detalhe do jardim ................................................... 31
Fig. 42 - Detalhe do jardim da residência Abraão Huck -1956 - Waldemar Cordeiro... 33
Fig. 43 - Idéia Visível - 1956.......................................................................................... 33
Fig. 44 - Clube Espéria - S.Paulo - 1966........................................................................ 34
Fig. 45 - Clube Espéria - playground............................................................................. 34
Fig. 46 - Jardim Res. Pacaembú - São Paulo - 1956 ...................................................... 35
Fig. 47 - Clube São Paulo - São Paulo ........................................................................... 35
x
Fig. 48 - Praça Roosevelt - S. Paulo - 1967-68 .............................................................. 36
Fig. 49 - Praça da Casa Forte - Recife - PE - planta - 1935 ........................................... 38
Fig. 50 - Praça da Casa Forte - vista do tanque.............................................................. 38
Fig. 51 - Praça da Casa Forte - vista tanque central ....................................................... 38
Fig. 52 - Museu de Arte da Pampulha - Belo Horizonte - MG - planta - 1942.............. 39
Fig. 53 - Museu de Arte da Pampulha - vista da entrada ............................................... 40
Fig. 54 - Museu de Arte da Pampulha - vista espelho d’água........................................ 40
Fig. 55 - Praça Duque de Caxias - Brasília - DF - planta baixa - 1970.......................... 41
Fig. 56 - Praça Duque de Caxias - vista geral ................................................................ 41
Fig. 57 - Praça Duque de Caxias - esculturas................................................................. 41
Fig. 58 - Franklin Court – Filadélfia – 1976 .................................................................. 48
Fig. 59 - Western Plaza - Washington – 1980/84........................................................... 48
Fig. 60 - Diagramas Casa VI – Cornwall, Connecticut, 1975........................................ 50
Fig. 61 - Maquete Casa II - Cornwall,............................................................................ 50
Fig. 62 - Cannaregio Town Square – Veneza - 1978..................................................... 51
Fig. 63 - Cannaregio Town Square – maquete............................................................... 51
Fig. 64 - Il giardino dei passi perduti – Museu Castelvecchio - Verona, Itália, 2003... 51
Fig. 65 - Il giardino dei passi perduti - detalhe do piso................................................. 51
Fig. 66 - Il giardino dei passi perduti - aspecto da topografia....................................... 52
Fig. 67 - Il giardino dei passi perduti - vista geral......................................................... 52
Fig. 68 - Blue Residential Tower, Nova Iorque, Estados Unidos, 2007 ........................ 54
Fig. 69 - Concert Hall and Exhibition Complex. Rouen, França, 1998 - 2001.............. 54
Fig. 70 - Concurso Parc de La Villette – Proposta Zaha Hadid - entorno...................... 59
Fig. 71 - Concurso Parc de La Villette – Proposta Zaha Hadid - implantação .............. 59
Fig. 72 - Concurso Parc de La Villette - Proposta OMA ............................................... 60
Fig. 73 - Concurso Parc de La Villette - Proposta OMA - maquete .............................. 61
Fig. 74 - Concurso Parc de La Villette - Proposta OMA - detalhe da maquete ............. 61
Fig. 75 - Parc de La Villette - Paris - França - Esquema de layers - 1982..................... 63
Fig. 76 - Parc de La Villette – Vista aérea ..................................................................... 64
Fig. 77 - Parc de La Villette - Folies.............................................................................. 64
Fig. 78 - Parc de La Villette - marquise ......................................................................... 64
Fig. 79 - Parc de La VilletteLa promenade cinématique ........................................... 64
Fig. 80 - Parc de La Villette – Jardins de Bambus......................................................... 65
Fig. 81 - Parc de La Villette - Chora L Works............................................................... 65
Fig. 82 - Planta Plaça dels Paisos Catalans, Barcelona, 1983...................................... 70
Fig. 83 - Plaça dels Paisos Catalans - vista geral.......................................................... 70
Fig. 84 - Plaça dels Paisos Catalans, vista noturna....................................................... 70
Fig. 85 - Plaça dels Paisos Catalans, mobiliário........................................................... 70
Fig. 86 - Parc Estácio del Nord, Barcelona, 1987/92 .................................................... 72
Fig. 87 - Parc Estácio del Nord, Cel Caigut.................................................................. 72
Fig. 88 - Parc Estácio del Nord, mobiliário................................................................... 72
Fig. 89 - Parc Estácio del Nord, Spiral of Threes.......................................................... 72
Fig. 90 - Parc del Clot, Barcelona - planta baixa - 1988................................................ 73
Fig. 91 - Parc del Clot - vista geral................................................................................ 73
Fig. 92 - Parc del Clot, passarela ................................................................................... 74
Fig. 93 - Parc del Clot, fonte.......................................................................................... 74
Fig. 94 - Inter-relação estudos de climatologia e morfologia urbana / três aspectos ..... 82
Fig. 95 - Inter-relação aspectos funcionais e estéticos / estudos de morfologia urbana. 83
Fig. 96 - Uso de mapas de figura-fundo......................................................................... 84
Fig. 97 - Uso de layers em projetos paisagísticos .......................................................... 84
xi
Fig. 98 - Utilização dos conceitos de Linch em projetos paisagísticos –....................... 85
Fig. 99 – Percepção e imagem mental............................................................................ 86
Fig. 100 – Efeitos topológicos e efeitos perspectivos .................................................... 86
Fig. 101 - Largo da Carioca, Rio de Janeiro - 1981 ....................................................... 88
Fig. 102 - Peershing Square – Los Angeles ................................................................... 88
Fig. 103- Concurso Goiânia - Praça Cívica.................................................................... 88
Fig. 104- Concurso Goiânia - Praça dos Trabalhadores................................................. 88
Fig. 105 - Spiral Jetty - Robert Smithson..................................................................... 90
Fig. 106 - The Lightining Field - Walter Maria.............................................................. 90
Fig. 107 - Plaza Tower - California – 1991.................................................................... 91
Fig. 108 - Marugame Station Plaza- Japão – 1992........................................................ 91
Fig. 109 - Rio Shopping Center – Geórgia..................................................................... 92
Fig. 110 - Splice Garden – Cambridge – Massachusetts................................................ 92
Fig. 111 - Piazza d’Itália –EUA - 1976.......................................................................... 93
Fig. 112 - Tsukuba Centre Square - Japão - 1983.......................................................... 93
Fig. 113 - Praça Itália - Porto Alegre - 1992 .................................................................. 94
Fig. 114 - Praça de Espanha - Rio de Janeiro - 1998...................................................... 94
Fig. 115 - Jardin Necco - Campus do MIT Cambridge - 1980....................................... 95
Fig. 116 - Praça Turca - Juazeiro - BA - 2005 ............................................................... 95
Fig. 117 - Parque Gringrin – Hakata Bay - Island City - Fukuoka - Japão - 2005......... 96
Fig. 118 - Praça da Sinagoga –....................................................................................... 96
Fig. 119 - Museu Brasileiro de Esculturas - MUBE – São Paulo - Brasil - 1987-1995. 96
Fig. 120 - Praça das águas - Campinas - Brasil -2004.................................................... 96
Fig. 121 - Los Angeles Civic Park - Los Angeles - EUA - 2003 ................................... 97
Fig. 122 - Sala Urbana St. Gallen - St. Gallen Suiça - 2005 .......................................... 97
Fig. 123 - Il giardino dei passi perdutti - Peter Eisenman .............................................. 99
Fig. 124 - Tanner Fontain - Peter Walker....................................................................... 99
Fig. 125 - Corredor Verde Tietê - SP ........................................................................... 101
Fig. 126 - Parque da Gleba E - Rio de Janeiro ............................................................. 101
Fig. 127 - Rio Office Park - Rio de Janeiro.................................................................. 102
Fig. 128 - Condomínio Laguna Maceió ....................................................................... 102
Fig. 129 - Parque da Juventude - São Paulo - 1995...................................................... 102
Fig. 130 - Parque da Juventude - detalhe passarelas .................................................... 102
Fig. 131 - Oosterscheldekering – Holanda - 1994........................................................ 103
Fig. 132 - Arroio Parkway - Passadena - Los Angeles - 2002 ..................................... 103
Fig. 133 - Elementos que conformam o espaço............................................................ 105
Fig. 134 - Kiel Triangle Plaza - EUA - 2002............................................................... 110
Fig. 135 - Jardins Edifício Gifu Kitagata - Japão......................................................... 110
Fig. 136 - Jardines Piccadilly - Manchester - Reino Unido - 2002 ............................. 111
Fig. 137 - Parque Central de Nou Barris - Barcelona - Espanha - 2007 ...................... 111
Fig. 138 - Fira Montjuic 2 - Barcelona - Espanha - 2005 ............................................ 111
Fig. 139 - Plaza Town Hall - Toronto - Canadá - 2005 ............................................... 111
Fig. 140- Jardim Bury Court - Hampshire, Inglaterra.................................................. 112
Fig. 141 - Intervenções na área central de São Paulo................................................... 113
Fig. 142 - Vale do Anhangabaú - S.Paulo - SP - 1988................................................. 114
Fig. 143 - Vale do Anhangabaú - planta baixa............................................................. 115
Fig. 144 - Vale do Anhangabaú - detalhe dos desenhos de piso .................................. 115
Fig. 145 - Vale do Anhanabaú - detalhe escadaria....................................................... 115
Fig. 146 - Vale do Anhangabaú - ruas de pedestres ..................................................... 116
Fig. 147 - Vale do Anhangabaú - enquadramento pela Praça Ramos de Azevedo...... 116
xii
Fig. 148 - Praça do Patriarca - S.Paulo - SP - 1992/2002 ............................................ 118
Fig. 149 - Praça do Patriarca - planta baixa.................................................................. 118
Fig. 150 - Praça do Patriarca - vista do viaduto do Chá............................................... 118
Fig. 151 - Praça do Patriarca – enquadramento............................................................ 119
Fig. 152 - Praça do Patriarca - cobertura...................................................................... 119
Fig. 153 - Praça do Patriarca - detalhe da estátua......................................................... 120
Fig. 154 - Praça do Patriarca - Igreja de Sto. Antônio ................................................. 120
Fig. 155 – Mapa da Zona Sul do Rio de Janeiro .......................................................... 121
Fig. 156 - Praça Antero de Quental - Rio de Janeiro - RJ - 1994/1996........................ 122
Fig. 157 - Praça Antero de Quental - mapa entorno.................................................... 122
Fig. 158 - Praça Antero de Quental - planta................................................................. 122
Fig. 159 - Praça Antero de Quental - playground........................................................ 123
Fig. 160 - Praça Antero de Quental - pergolado........................................................... 123
Fig. 161 - Praça Antero de Quental - mobiliário.......................................................... 124
Fig. 162 - Praça Antero de Quental - iluminação......................................................... 124
Fig. 163 - Praça José de Alencar - Rio de Janeiro - RJ - 1994/1996............................ 126
Fig. 164 - Praça José de Alencar - mapa do entorno.................................................... 126
Fig. 165 - Praça José de Alencar - Planta..................................................................... 126
Fig. 166 - Praça José de Alencar - playground............................................................. 127
Fig. 167 - Praça José de Alencar - painel artístico ....................................................... 127
Fig. 168 - Praça José de Alencar - base de refletor ...................................................... 128
Fig. 169 - Praça José de Alencar - iluminação ............................................................. 128
Fig. 170 – Mapa da Orla e Centro Histórico de Recife................................................ 129
Fig. 171 - Praça de La Coruña - Recife - PE - 1995..................................................... 130
Fig. 172 - Praça de La Coruña - planta baixa............................................................... 130
Fig. 173 - Praça de La Coruña - grupo de esculturas ................................................... 131
Fig. 174 - Praça de La Coruña - detalhe trepadeira...................................................... 131
Fig. 175 - Praça Rio Branco - Recife - PE - 1999/2000 ............................................... 132
Fig. 176 - Praça Rio Branco - planta baixa................................................................... 133
Fig. 177- Praça Rio Branco - Marco Zero.................................................................... 133
Fig. 178 - Praça Rio Branco - esculturas de Brennand................................................. 134
Fig. 179 - Praça Rio Branco - vista noturna ................................................................. 134
Fig. 180 – Mapa de parte da orla de Maceió ................................................................ 135
Fig. 181 - Praça Gogó da Ema - Maceió - AL - 1996-2009......................................... 136
Fig. 182 - Gogó da Ema ............................................................................................... 136
Fig. 183 - Praça Gogó da Ema - monumento ............................................................... 136
Fig. 184 - Praça Gogó da Ema - mapa do entorno ....................................................... 137
Fig. 185 - Praça Gogó da Ema - planta......................................................................... 137
Fig. 186 – Praça Gogó da Ema - playground ............................................................... 137
Fig. 187 - Praça Gogó da Ema - coqueiros................................................................... 137
Fig. 188 - Corredor Cultural Vera Arruda - Maceió - AL – 1999/2000....................... 139
Fig. 189 - Corredor Cultural Vera Arruda - mapa do entorno...................................... 140
Fig. 190 - Corredor Cultural Vera Arruda - planta....................................................... 140
Fig. 191 - Corredor Cultural Vera Arruda - playground .............................................. 141
Fig. 192 - Corredor Cultural Vera Arruda - aparelhos de ginástica ............................. 141
Fig. 193 - Corredor Cultural Vera Arruda - painéis culturais - escritores.................... 142
Fig. 194 - Corredor Cultural Vera Arruda - Totem Beto Normande............................ 142
Fig. 195 - Corredor Cultural Vera Arruda - caramanchão ........................................... 143
Fig. 196 - Corredor Cultural Vera Arruda - pergolado................................................. 143
xiii
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 1
Considerações sobre o paisagismo contemporâneo ..................................................... 1
Fundamentos teóricos e estratégias de projeto ............................................................. 2
Definindo objetivos ...................................................................................................... 3
Referencial Teórico e Procedimentos Metodológicos.................................................. 4
Estrutura da dissertação................................................................................................ 7
CAPÍTULO 1:................................................................................................................. 9
PAISAGISMO CONTEMPORÂNEO - ANTECEDENTES ..................................... 9
1.1 Introdução.......................................................................................................... 10
1.2 Paisagismo moderno.......................................................................................... 10
1.2.1 Os precursores do jardim moderno............................................................... 11
1.2.2 A consolidação do moderno ......................................................................... 17
1.2.3 A escola americana....................................................................................... 24
1.2.4 Paisagistas da transição moderno/contemporâneo ....................................... 28
1.3 Paisagismo moderno no Brasil......................................................................... 30
1.3.1 Mina Warchavchick, primórdios do jardim moderno .................................. 30
1.3.2 Waldemar Cordeiro, moderno ou contemporâneo?...................................... 32
1.3.3 Roberto Coelho Cardozo e a escola americana ............................................ 34
1.3.4 Roberto Burle Marx, a natureza organizada................................................. 37
1.4 Considerações finais do capítulo 1................................................................... 42
CAPÍTULO 2:............................................................................................................... 44
O CONTEMPORÂNEO NA ARQUITETURA E NO PAISAGISMO................... 44
2.1 Introdução.......................................................................................................... 45
2.2 Arquitetura Contemporânea e sua relação com o paisagismo...................... 45
2.2.1 Robert Venturi – A ruptura com o moderno................................................. 46
2.2.2 Peter Eisenman - A invenção do contexto................................................... 49
2.2.3 Bernard Tschumi - Evento, espaço e movimento......................................... 52
2.2.4 O neomoderno - A continuidade do espírito moderno ................................. 54
2.3 Momentos de inflexão no paisagismo .............................................................. 57
2.3.1 O Parc de La Villette: novos paradigmas para o paisagismo....................... 57
2.3.1.1 O projeto de Zaha Hadid ....................................................................... 58
2.3.1.2 O projeto de Rem Koolhaas .................................................................. 60
2.3.1.3 O projeto de Bernard Tschumi .............................................................. 62
2.3.2 Barcelona: a volta da praça como tema de projeto de arquitetura................ 66
2.3.2.1 A Plaça dels Paisos Catalans ............................................................... 69
2.3.2.2 O Parc Estació del Nord ....................................................................... 71
2.3.2.3 O Parc del Clot...................................................................................... 72
2.4 Considerações finais do capítulo 2................................................................... 75
CAPÍTULO 3:............................................................................................................... 77
ASPECTOS FUNCIONAIS, ESTÉTICOS E AMBIENTAIS NA CONCEPÇÃO
DE PROJETOS DE PAISAGISMO........................................................................... 77
3.1 Introdução.......................................................................................................... 78
3.2 Aspectos funcionais ........................................................................................... 79
3.2.1 Desenho urbano............................................................................................ 80
3.2.2 Estudos de Análise do Espaço Urbano......................................................... 82
3.3 Aspectos estéticos............................................................................................... 89
3.3.1 Arte: Land Art e minimalismo...................................................................... 89
3.3.2 Arquitetura: pós-moderno e contemporâneo................................................ 92
xiv
3.3.3 Análise visual e percepção do meio ambiente.............................................. 97
3.4 Aspectos ambientais ........................................................................................ 100
3.4.1 Conforto Ambiental.................................................................................... 103
3.5 Considerações finais do capítulo 3................................................................. 106
CAPÍTULO 4:............................................................................................................. 108
ESTRATÉGIAS DE PROJETO NO PAISAGISMO CONTEMPORÂNEO ...... 108
4.1 Introdução........................................................................................................ 109
4.2 Estratégias do projeto paisagístico contemporâneo..................................... 109
4.3 Duas praças contemporâneas em São Paulo................................................. 113
4.3.1 Vale do Anhangabaú .................................................................................. 114
4.3.2 Praça do Patriarca....................................................................................... 117
4.4 Duas praças contemporâneas no Rio de Janeiro.......................................... 121
4.4.1 Praça Antero de Quental............................................................................. 121
4.4.2 Praça José de Alencar................................................................................. 125
4.5 Duas praças contemporâneas em Recife ....................................................... 128
4.5.1 Praça de La Coruña .................................................................................... 129
4.5.2 Praça Rio Branco (Marco Zero) ................................................................. 132
4.6 Duas praças contemporâneas em Maceió...................................................... 134
4.6.1 Praça Gogó da Ema .................................................................................... 135
4.6.2 Corredor Cultural Vera Arruda................................................................... 138
4.7 Considerações finais do capítulo 4................................................................. 143
CONCLUSÃO............................................................................................................. 145
Antecedentes do Paisagismo Contemporâneo.......................................................... 146
Paisagismo e Arquitetura Contemporânea ............................................................... 147
Aspectos Funcionais, Estéticos e Ambientais .......................................................... 148
Estratégias projetuais em oito praças brasileiras ...................................................... 148
Principais dificuldades.............................................................................................. 149
Sugestões para novas investigações ......................................................................... 150
Considerações finais................................................................................................. 152
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 153
INTRODUÇÃO
Considerações sobre o paisagismo contemporâneo
O paisagismo contemporâneo tem produzido projetos mais abrangentes e
ampliado seu conceito e forma de atuação. Essa ampliação de escopo e contexto torna-
se evidente ao observarmos os projetos recentes de paisagismo. Zein (in KLIASS, 2006)
comenta que Rosa Kliass formou-se na primeira turma da USP, na qual foi incluída a
disciplina de Paisagismo no curso de Arquitetura em 1955, época em que o campo do
paisagismo reduzia-se a jardins particulares e praças públicas. Burle Marx já
evidenciava esta ampliação de temas e a aproximação do paisagismo com o
planejamento urbano.
“A profissão de paisagista assume importância cada vez maior em nossos dias. A evidência
disso é o crescente número de escolas e cursos atuando na área, bem como a efetiva
participação dos profissionais em equipes de projetos no âmbito urbano, municipal e mesmo
regional, nas rodovias, em áreas de preservação, em renovação urbana, preservação de
patrimônio histórico, entre outros” (BURLE MARX in FIASCHI, 1978, p.3).
Segundo Gehl e Gemzoe (2002, p.7) “Por um longo tempo – desde 1930 até
1980 – muito pouco ocorreu no campo do urbanismo e da arquitetura do espaço público.
A rejeição dos modernistas à cidade e aos espaços públicos é uma explicação a esse
fato”.
Observando a explosão que ocorreu no campo do paisagismo de 1980 aos dias
de hoje, o alargamento e a liberdade dos conceitos e estratégias projetuais, tanto em
quantidade como em qualidade de novos projetos, parece ter ocorrido uma profunda
ruptura com a fase imediatamente anterior: o paisagismo moderno.
A recente produção de trabalhos e eventos sobre o paisagismo moderno
(ÁLVARES, 2007, SANDEVILLE JR., 2007, eventos do DOCOMOMO
1
, entre outros)
tem elucidado muito essa questão, desmistificando em parte, inclusive a afirmação
acima de Gehl e Gemzoe (2002), apresentando a contribuição do paisagismo moderno e
1
DOCOMOMO - Documentation and Conservation (of building, sites and neighbourghoods of) Modern Movement -
é uma organização não-governamental, com representação em mais de quarenta países. Foi fundada em 1988, na
cidade de Eindhoven na Holanda. É uma instituição sem fins lucrativos e está sediada atualmente em Paris, na Cité de
l’Architecture et du Patrimoine, e é um organismo assessor do World Heritage Center da UNESCO. Os objetivos do
DOCOMOMO são a documentação e a preservação das criações do Movimento Moderno na arquitetura, urbanismo e
manifestações afins. Em 1992 foi criado o núcleo brasileiro do DOCOMOMO.
2
suas rupturas e continuidades com o paisagismo contemporâneo. Paralelo a isso, as
discussões sobre o conceito e o significado da paisagem, sob uma perspectiva cultural,
com uma visão mais complexa e abrangente da questão, contribui para o surgimento de
estratégias projetuais mais livres de modelos pré-concebidos de imitação da natureza.
Fundamentos teóricos e estratégias de projeto
A busca dos fundamentos do paisagismo contemporâneo não pode limitar-se a
um simples arrolar cronológico de exemplos, trata-se de uma tarefa que certamente
implicará um esforço maior de investigação teórica. A prática do pensamento teórico
não é usual entre os arquitetos brasileiros, que na sua maioria tendem a desconsiderar a
teoria (ZEIN in KLIASS, 2006).
Essa aproximação dos arquitetos com a teoria é mais explícita no trabalho de
arquitetos contemporâneos europeus e americanos, conforme demonstra Moneo (2008,
p.9): “Introduzo no título o termo “inquietação”, pois o modo de abordar o estudo da
arquitetura nos últimos tempos resulta mais em ensaios críticos ditados pela inquietação
do que na elaboração de uma teoria sistemática”. Esta inquietação, presente nas obras
teóricas e construídas de arquitetos contemporâneos é o que move a pesquisa sobre os
fundamentos teóricos do paisagismo contemporâneo.
Por outro lado, existe uma tendência dos teóricos em desconsiderar a intuição,
ou reputá-la como mera inspiração, entretanto como pondera Carlos Eduardo Dias
Comas.
Pode-se sustentar que se trata de intuição educada pela experiência e observação de soluções
pregressas, (...) de intuição preparada por um conhecimento prévio específico que informa a ação
arquitetônica em qualquer circunstância, ainda que o faça de modo subliminar (COMAS apud
ZEIN in KLIASS, 2006, p.10).
Esta situação pode ser ilustrada pelo depoimento do arquiteto Paulo Mendes da
Rocha ao comentar suas obras, na qual, sob uma intenção rigorosamente racional deixa
espaço para a intuição e posteriormente uma checagem dessa intuição com a memória e
sua validação dentro de um enquadramento teórico próprio (PIÑON, 2002).
Segundo Sandeville Jr. (2005):
“A paisagem diz respeito muito de perto ao arquiteto, mas não é fácil nos darmos conta do
significado do termo e do “objeto” designado em sua abrangência e complexidade. Entendida
3
como espaço e sob aspectos culturais, ao arquiteto interessa a materialidade do espaço e seu
significado (SANDEVILLE JR., 2005, p.2).
De toda forma a busca dos fundamentos teóricos do paisagismo e sua relação
com a prática projetual conduziram a uma pesquisa histórica do paisagismo e da sua
relação com a arquitetura.
O entendimento que se faz no presente estudo do termo estratégia refere-se ao
conceito utilizado por Moneo (2008, p.9) “O termo “estratégia” (...), é entendido aqui
como mecanismos, procedimentos, paradigmas e artefatos formais que aparecem com
insistência recorrente na obra dos arquitetos de hoje: entendo que os utilizem para
configurar o construído”.
A identificação das estratégias de projeto utilizadas no paisagismo
contemporâneo permite estabelecer uma relação entre o aporte teórico e a prática de
projeto, com o cuidado de não se tomarem estas estratégias como fórmulas pré-
concebidas e sim como uma maneira de se dar respostas às novas solicitações ao
contexto e modo de vida contemporâneos.
Definindo objetivos
O objetivo geral do presente trabalho é discutir os fundamentos teóricos do
paisagismo contemporâneo e o seu rebatimento em estratégias de projeto recorrentes no
trabalho recente de paisagistas. Não se pretende, entretanto chegar a uma definição
precisa do paisagismo contemporâneo espera-se contribuir para uma abordagem
conceitual que preserve a enorme riqueza e complexidade do paisagismo pensada como
um vasto campo de significados, tensões e contradições.
Como objetivos específicos pretende-se:
1- Contextualizar o paisagismo contemporâneo e suas influências;
2- Identificar contribuições do urbanismo, da arte, da arquitetura contemporânea e das
questões ambientais no paisagismo;
3- Verificar as estratégias projetuais adotadas em praças contemporâneas no Brasil.
4
Referencial Teórico e Procedimentos Metodológicos
A busca dos fundamentos teóricos e a contextualização do paisagismo ensejam
uma pesquisa de revisão de literatura de caráter histórico. Na pesquisa histórica busca-
se o fio condutor dos pressupostos modernos do paisagismo e sua continuidade no
contemporâneo e até que ponto o pensamento teórico da arquitetura contemporânea se
reflete no paisagismo. A construção do referencial teórico no que diz respeito aos
fundamentos teóricos advindos do paisagismo moderno se dá por meio do estudo de
projetos exemplares ou de autoria de renomados arquitetos modernos. Foram
pesquisados principalmente os estudos empreendidos por Álvares (2007), Gehl e
Gemzoe (2002) e Favole (1995) no cenário internacional. No Brasil isto se faz pelo
exame da obra de quatro paisagistas modernos: Mina Warchavchick, Waldemar
Cordeiro, Roberto Coelho Cardoso e Roberto Burle Marx, por meio de estudos de
Sandeville Jr. (1997), Macedo (1999), Robba (2002), Cavalcanti e el-Dahdah (2009) e
Dourado (2009).
A investigação sobre a contribuição da arquitetura contemporânea se faz com a
discussão do conjunto do trabalho de arquitetos importantes na concepção da arquitetura
contemporânea, a partir da ruptura com o pensamento moderno e que realizaram
projetos paisagísticos sob uma nova perspectiva. A referência aos projetos fundantes do
paisagismo contemporâneo que são os do concurso do Parc de La Villete e os projetos
das intervenções de requalificação urbana de Barcelona contribuem para consolidação
dos novos conceitos e estratégias do paisagismo. Discute-se para isso Moneo (2008),
Venturi (1995) e Álvares (2007).
Para se estabelecer uma discussão sobre o paisagismo, e sua interface com o
desenho urbano, a arte, a arquitetura e as questões ambientais faz-se necessário uma
revisão de literatura sobre as disciplinas citadas, que contribuem na formação do
pensamento contemporâneo. Nesta revisão utilizam-se principalmente os estudos de
Macedo (1999), Romero (2001), Del Rio (1990), Kohlsdorf (1996), Linch (1960) e
Cullen (1971).
Por meio do estudo de casos múltiplos de praças contemporâneas em capitais
brasileiras, pretende-se obter um quadro de estratégias de projeto que poderão servir de
5
base de dados para melhor compreensão da atividade de projetar praças com uma visão
mais abrangente e contemporânea do assunto.
“Se tomarmos assim a paisagem urbana como um dado da realidade, procurando compreender
seus elementos componentes, a maneira como se combinam, seus usos e funções, seus
acontecimentos de destaque, sua apropriação e transformação pelos usuários, analisando a
contraposição e a integração de suas partes, poderemos extrair daí conceitos e diretrizes
para possíveis intervenções futuras visando determinados objetivos" (Grifo nosso, ZEIN,
1986, p.68).
Nesse caso, a ampla compreensão do projeto como desenho/desígnio, isto é, a
intenção e uma investigação sobre o pensamento do arquiteto complementam o estudo
de caso das oito praças escolhidas em quatro capitais brasileiras. As capitais escolhidas
foram São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Maceió.
São Paulo, por ter iniciado em 1988 um processo de requalificação na área
central da cidade no qual o pensamento contemporâneo de introduzir qualidade de vida
e respeito ao pedestre no espaço público resultou em uma série de replicações na própria
cidade e em outras capitais. Selecionaram-se a Praça do Patriarca e o Vale do
Anhangabaú, na área central da cidade.
Rio de Janeiro, pelo fato de ter seguido a tendência mundial de investir na
melhoria dos espaços públicos, que iniciou com os projetos de recuperação ambiental
em Jacarepaguá, seguidos dos projetos Rio Cidade (1995-1996) e Favela-Bairro, que
também tiveram grande repercussão no cenário nacional e motivaram outras cidades na
melhoria da qualidade de seus espaços. Selecionaram-se duas praças de bairros
residenciais da Zona Sul: a Praça Antero de Quental, no bairro do Leblon e a Praça José
de Alencar, no bairro do Catete.
Recife, por participar do projeto de requalificação da orla em 1995 e
posteriormente ter sido palco de um projeto de recuperação do patrimônio arquitetônico
via melhoria do espaço público em 1999, de características semelhantes às de
Barcelona. As praças escolhidas foram a Praça de La Coruña, na praia de Boa Viagem e
a Praça Rio Branco, no Bairro do Recife.
Finalmente Maceió, que sofreu a intervenção de projetos de extensão nacional
como os de reestruturação da orla marítima em 1995, e projetos voltados ao
financiamento de recuperação do patrimônio cultural em 1999. Selecionaram-se as
6
praças Gogó da Ema, no bairro da Ponta Verde e o Corredor Cultural Vera Arruda, no
bairro Stella Maris.
Escolheram-se duas praças de cada cidade, quando possível participantes de
um mesmo programa de requalificação e no marco temporal sugerido por Macedo
(1999) nos estudos do Quapá - Quadro do Paisagismo no Brasil, que considera como
linha projetual contemporânea os projetos realizados a partir de 1980. As praças foram
visitadas e fotografadas durante a pesquisa.
Empregou-se a metodologia de análise, servindo como base os aspectos
funcionais - relacionados ao desenho urbano; estéticos - relacionados à arte e arquitetura
contemporâneas; e ambientais - relacionados às questões de recuperação de áreas
degradadas e a sustentabilidade ambiental, por meio dos quais foi conduzido o estudo
de casos múltiplos das praças escolhidas conforme esquema abaixo (fig.1).
Fig. 1 - Adaptado Método de Estudo de Caso
(YIN, 2001, p.73)
As análises das praças de Maceió complementam-se com entrevistas com as
autoras dos projetos. Busca-se nas estratégias recorrentes nos projetos do paisagismo
não meramente um vocabulário formal, mas sim entender como essas estratégias
respondem às novas demandas da sociedade contemporânea, compondo um quadro
Seleciona os
casos
Conduz o
primeiro estudo
de caso
Elabora um
relatório de
caso individual
Chega à
conclusões de
casos cruzados
Projeta o
protocolo de
coleta de
dados
Conduz o
segundo estudo
de caso
Conduz estudo
de caso
remanescente
Elabora um
relatório de
caso individual
Elabora um
relatório de
caso individual
Modifica a
teoria se
necessário
Definição e planejamento Preparação coleta e análise
Escreve um
relatório de
casos cruzados
Desenvolve
a teoria
Análise e conclusão
7
coerente e consistente nos projetos recentes, destacando-se com certa identidade como
intervenções contemporâneas.
Estrutura da dissertação
No primeiro capítulo apresenta-se uma reflexão sobre o paisagismo
contemporâneo iniciando-se pelo antecedente imediato: o paisagismo moderno. Alguns
autores como Gehl e Gemzoe (2002) e Favole (1995), negam a existência de um
paisagismo moderno, especialmente por analisarem praças e espaços públicos,
entretanto Álvares (2007) demonstra a influência de um pensamento moderno no
paisagismo, expresso em projetos de jardins. Por meio do estudo de jardins
emblemáticos ou de autoria de expoentes da arquitetura moderna, busca-se identificar a
influência do pensamento moderno no paisagismo. Apresentam-se os trabalhos de
Waldemar Cordeiro, Roberto Coelho Cardoso e Roberto Burle Marx, como expoentes
do moderno no paisagismo brasileiro.
No capítulo dois discute-se a relação do paisagismo com a arquitetura
contemporânea, passando pela investigação da gênese da arquitetura contemporânea,
como forma de compreender a influência do pensamento filosófico e artístico
contemporâneo sobre a prática projetual do paisagismo. No estudo da obra arquitetônica
de arquitetos contemporâneos expressa-se uma nova abordagem e linguagem no projeto
de paisagismo. Em seguida, identificam-se os momentos de inflexão do paisagismo,
quando surge a visão contemporânea da concepção de projetos paisagísticos,
destacando-se três projetos finalistas do concurso para o Parc de la Villete: o projeto de
Zaha Hadid, o projeto de Rem Koolhass e o projeto vencedor de Bernard Tschumi; e
três projetos integrantes das intervenções de requalificação urbana de Barcelona: o
projeto de Helio Piñon e Albert Viaplana, o projeto de Andreu Arriola e Carmen Fiol e
o projeto de Daniel Freixes e Vincence Miranda.
No capítulo três discutem-se os aspectos funcionais, estéticos e ambientais na
concepção dos projetos de paisagismo. Estes aspectos relacionam-se com as disciplinas:
desenho urbano, relacionada ao aspecto funcional; arte e arquitetura contemporâneas,
relacionadas ao aspecto estético; e a questão ambiental, relacionada aos projetos de
recuperação de áreas degradadas e sustentabilidade ambiental. Tornou-se necessário
então a discussão de alguns aspectos dessas disciplinas afins com o paisagismo. No que
8
tange a questão da concepção de projetos os paisagistas passam a utilizar critérios e o
instrumental teórico próprios destas disciplinas.
No quarto capítulo discutem-se as estratégias projetuais do paisagismo
contemporâneo, exemplificando com projetos; e analisam-se projetos de intervenções
em programas de requalificação em quatro capitais brasileiras. A Praça do Patriarca e o
Vale do Anhangabau em São Paulo, participantes das intervenções na área central; a
Praça Antero de Quental e a Praça José de Alencar no Rio de Janeiro, integrantes do
programa Rio-Cidade; a Praça de La Coruña e a Praça Rio Branco em Recife parte do
programa de revitalização da orla e da área central da cidade, respectivamente; e a Praça
Gogó da Ema e Corredor Cultural Vera Arruda, de diferentes programas de
requalificação de Maceió. Utilizam-se como critério de análise os aspectos descritos no
capítulo três.
9
CAPÍTULO 1:
PAISAGISMO CONTEMPORÂNEO - ANTECEDENTES
ˆEncontrar beleza na forma,
em lugar de fazê−la depender da ornamentação,
é uma busca permanente da humanidade˜.
Chiristopher Tunnard
10
1.1 Introdução
Observando as obras e projetos recentes de praças e parques no Brasil e no
exterior e comparando-as com a imagem mental que temos de uma praça percebemos
um contraste acentuado. O uso das cores, formas poderosas e às vezes agressivas,
materiais industrializados, o caráter artístico presente na geometria e na iluminação
causam uma sensação de estranhamento frente à imagem tradicional da praça ainda tão
presente nas pequenas cidades do interior do Brasil.
Esta primeira impressão induz a pensar que houve uma ruptura profunda e
extensa na concepção dos projetos de paisagismo. Isto leva a considerar que o estudo da
história do paisagismo não trará as respostas a essa mudança radical de conceitos de
projeto, como se a mudança fosse de alguma forma externa ao campo do paisagismo.
Entretanto, um estudo mais acurado dos antecedentes do paisagismo contemporâneo
mostra que essa ruptura não foi tão intensa quanto parece a princípio.
Discute-se neste capítulo a contribuição do modernismo para o paisagismo, as
idéias e os conceitos principais em duas abordagens: (i) uma de caráter geral, desde os
precursores, passando pela consolidação das idéias fundamentais, destacando-se a
escola americana e apresentando o trabalho de paisagistas cujas características estão
entre o moderno e o contemporâneo; e (ii) uma abordagem sobre o paisagismo moderno
no Brasil.
1.2 Paisagismo moderno
Gehl e Gemzoe (2002) e Favole (1995) entre outros acreditam que não existiu
um paisagismo moderno, contudo alguns críticos contemporâneos consideram indícios
de um paisagismo moderno apenas nas obras de Luis Barragán
2
e Roberto Burle Marx
3
.
2
Luis Ramiro Barragán Morfin (Guadalajara, México, 1902 – Cidade do México, México, 1988). Foi um dos
arquitetos mexicanos mais importantes do século XX. Barragán atuou com uma arquitetura única, distinta, que
remete tanto a ideologia do Movimento Modernista Europeu, como ao regionalismo tradicional mexicano. Essa
mescla concebida cria uma arquitetura singular, de beleza e emoção; o estranhamento, a reflexão e a contemplação
perpassa todo conjunto da obra do arquiteto. (Obs. As biografias de arquitetos foram pesquisadas nos sites
Educatorium, Wikipédia, entre outros, em livros constantes das referencias bibliográficas e organizadas de forma
padronizada)
3
Roberto Burle Marx (São Paulo, Brasil, 1909 — Rio de Janeiro, Brasil, 1994). Foi um dos maiores paisagistas do
nosso século, distinguido e premiado internacionalmente. Artista de múltiplas artes foi também, desenhista, pintor,
11
O movimento moderno, mais preocupado com questões de outra natureza e urgência é
substancialmente indiferente ao tema da praça. Os motivos desse desinteresse são múltiplos e
convergentes: a escolha de potencializar bairros compostos por blocos isolados de plano
aberto, que rompiam com a tradicional continuidade de fachadas; a escolha de potencializar a
implantação das residências na periferia urbana, situando as funções públicas no centro
histórico e nas praças tradicionais (FAVOLE, 1995, p.10).
A argumentação desses autores é em parte pertinente, haja visto que o tema da
praça como projeto de arquitetura foi praticamente inexistente na produção de arquitetos
modernos, sendo que a única praça projetada por Le Corbusier
4
, um dos mais notáveis
arquiteto moderno, foi para o complexo do Capitólio de Chandigarh (1951), que
apresenta semelhanças formais com as praças cívicas de Brasília projetadas por Oscar
Niemeyer
5
. Entretanto estudos mais recentes como os de Álvares (2007) e Sandeville Jr.
(1997), apresentam uma análise histórica detalhada da contribuição do paisagismo
moderno, desde o movimento precursor do moderno que foi o arts & crafts
6
.
A busca de uma linguagem mais condizente com a arquitetura é mais evidente
no projeto de jardins residenciais, desta forma busca-se identificar os traços
característicos do paisagismo moderno em obras emblemáticas de jardins e na obra de
renomados arquitetos modernos.
1.2.1 Os precursores do jardim moderno
No princípio, a idéia de se constituir uma linguagem moderna surgiu da necessidade de
se projetar um jardim que dialogasse com a arquitetura, não se poderia projetar uma
casa moderna e manter o jardim com as características ecléticas.
tapeceiro, ceramista, escultor, pesquisador, cantor e criador de jóias, sensibilidades que conferiram características
específicas a toda a sua obra. De 1928 a 1929 estudou pintura na Alemanha, tendo sido freqüentador assíduo do
Jardim Botânico de Berlim, onde descobriu, em suas estufas, a flora brasileira, passando a dedicar-se ao paisagismo,
paralelamente à pintura e ao desenho.
4
Charles-Edouard Jeanneret-Gris, mais conhecido pelo pseudónimo de Le Corbusier, (La Chaux-de-Fonds, Suiça,
1887 — Roquebrune-Cap-Martin, França, 1965). Arquiteto, urbanista e pintor francês de origem suíça. É considerado
juntamente com Frank Lloyd Wright, Alvar Aalto, Mies van der Rohe e Oscar Niemeyer, um dos mais importantes
arquitetos do século XX.
5
Oscar Ribeiro de Almeida de Niemeyer Soares Filho (Rio de Janeiro, Brasil, 1907). Arquiteto brasileiro,
considerado um dos nomes mais influentes na Arquitetura Moderna internacional. Foi pioneiro na exploração das
possibilidades construtivas e plásticas do concreto armado. Seus trabalhos mais conhecidos são os edifícios públicos
que desenhou para a cidade de Brasília.
6
Arts & crafts (do inglês artes e ofícios). Foi um movimento estético surgido na Inglaterra, na segunda metade do
século XIX. Durou relativamente pouco tempo, mas influenciou o movimento francês da art nouveau e é considerado
por diversos historiadores como uma das raízes do modernismo no design gráfico, desenho industrial e arquitetura.
De acordo com Tomás Maldonado, o arts & crafts foi uma importante influência para o surgimento posterior da
Bauhaus.
12
“O Jardim é uma criação artificial com uma finalidade específica; é um ambiente da casa no
exterior. Como obra do homem, deve levar o selo indelével de sua arte e destreza.” Edwin
Lutyens
7
(ALVARES, 2007, p.33).
Os pressupostos de uma nova linguagem partiram da oposição ao jardim eclético
e principalmente ao chamado “jardim paisagístico”, que é o jardim inglês, considerado
pelos arquitetos modernos uma tentativa de imitar e melhorar a natureza.
Desta forma, as principais características do jardim arts & crafts e moderno foi
seu aspecto arquitetônico, um jardim construído, obedecendo aos eixos da arquitetura,
buscando interação com a arquitetura, utilizando a topiaria
8
como recurso de reforçar a
aparência arquitetônica do jardim.
Dentro deste espírito, André Vera publicou um livro intitulado Les Jardins, onde
apresenta suas idéias: “Nosso jardim não será, tampouco uma acumulação de vegetais
encantadores, como no jardim paisagista. Pensamos que a razão deve ordená-lo.”
(ÁLVARES, 2007, p.96). André e Paul Vera
9
produzem jardins rigorosamente
geométricos, composições com raízes clássicas, entretanto o tratamento geométrico de
todos os elementos e a total ausência de ornamentos remete aos jardins do Movimento
Moderno.
André e Paul Vera projetaram em 1924 o Jardim Noailles em Paris (fig. 2 e 3),
segundo os pressupostos do arts & crafts quanto à questão dos eixos da arquitetura,
porém apresentando uma inovação no uso de parterres
10
assimétricos e diagonais,
lembrando um vitral ou estilhaços de vidro e ainda utilizando uma parede de espelhos
que reflete o jardim. Este projeto é notável também pela sua vinculação às artes
plásticas, o jardim passa a ter um caráter mais livre e artístico, afastando-se da tentativa
de imitação da natureza.
7
Sir Edwin Landseer Lutyens, (Londres, Inglaterra, 1869 – Londres, Inglaterra, 1944). Um dos grandes arquitetos
ingleses do século XX. Reconhecido pela criatividade adaptando os estilos tradicionais de arquitetura aos requisitos
de sua época. Projetou várias mansões inglesas e jardins segundo as idéias do movimento arts & crafts.
8
Arte de aparar árvores ou arbustos para criar formas decorativas.
9
André e Paul Vera (arquiteto – 1881-1971 e gravador -1882-1957 respectivamente). Paisagistas franceses. André
Vera é autor dos livros Le Noveau Jardin (1912) e Les Jardins (1919).
10
Parterre do francês par terre – sobre o solo – maciço ornamental ou quadra de jardim arranjada com flores e
plantas de diferentes tamanhos e espécies.
13
Fig. 2 - Jardim Noailles - planta baixa - 1924
André e Paul Vera
Fonte: Álvares, 2007, p.99
Fig. 3 - Jardim Noailles - vista
Fonte: Álvares, 2007, p.99
Walter Gropius
11
projeta também nessa época um jardim com esta característica,
com forte influência do cubismo e do expressionismo, correntes artísticas em voga na
Europa na época, que é o jardim da Casa Kallenbach em Berlim, 1922 (fig. 4 e 5).
Fig. 4 - Jardim da Casa Kallenbach - planta baixa -
1922
Walter Gropius
Fonte: Álvares, 2007, p.20
Fig. 5 - Jardim da Casa Kallenbach - perspectiva
Fonte: Álvares, 2007, p.113
Desenha uma composição baseada nos eixos da arquitetura e ainda utilizando
formas da planta baixa criando figuras quebradas e surpreendentes, utiliza também a
água como elemento da composição refletindo a arquitetura como se fará muitos anos
depois nos palácios de Brasília. As cores e as formas reforçam a expressão de um jardim
abstrato, contrastando com a visão tradicional do jardim natural.
Robert Mallet-Stevens
12
produz um dos exemplos mais notáveis do paisagismo
moderno com os jardins da Villa Noailles em Hyerres, 1924 (fig. 6 e 7).
11
Walter Gropius (Berlim, Alemanha, 1883 — Boston, Estados Unidos, 1969). Arquiteto alemão, considerado um
dos principais nomes da arquitetura do século XX, tendo sido fundador da Bauhaus, escola que foi um marco no
design, arquitetura e arte moderna e diretor do curso de arquitetura da Universidade de Harvard. Gropius iniciou sua
carreira na Alemanha, seu país natal, mas com a ascensão do nazismo na década de 1930, emigrou para os Estados
Unidos da América e lá desenvolveu a maior parte de sua obra.
14
Sobre o muro frontal da Villa abrem-se grandes vãos que se debruçam sobre
fragmentos da paisagem previamente escolhidos, capturam a paisagem através das
janelas. A paisagem passa a fazer parte do jardim como se fosse um quadro na parede.
No jardim, sobre um gramado algumas árvores estão distribuídas aleatoriamente, mas
entre as janelas, o arquiteto utiliza pequenas árvores podadas como esferas, sobre uma
base circular escalonada, acentuando o caráter arquitetônico do jardim.
Fig. 6 - Villa Noailles - perspectiva isométrica -
1924
Robert Mallet-Stevens
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.106
Fig. 7 - Villa Noailles - vista do jardim
Disponível em: www.stylepark.com
A Villa Noailles é um dos raros exemplos de arquitetura moderna na época;
Mallet-Stevens entendia a arquitetura como um trabalho de arte total, e a paisagem
como elemento essencial na composição de toda obra de arte.
O diálogo do interior com o exterior está presente na arquitetura, na integração
da casa com o jardim e no paisagismo na integração do jardim com a paisagem.
Mallet-Stevens apresenta durante a Exposição de Artes Decorativa de Paris, em
1925, as polêmicas árvores de concreto, (fig. 8 e 9) que alimentam a discussão sobre o
natural e o artificial no paisagismo e que suscitaram uma série de projetos de árvores e
flores artificiais como elementos utilizados em jardins que não tiveram prosseguimento.
12
Robert Mallet-Stevens (1886-1945). Arquiteto belga, designer e escritor, estudou na Escola Especial de
Arquitetura, em Paris, de 1903 a 1906. Participou da Exposição de Artes Decorativas de Paris 1925, para o qual
projetou o Pavilhão da Embaixada Francesa que lhe trouxe notoriedade. Seus projetos mais famosos são a Villa
Noailles e o bloco de apartamentos na Rua Mallet-Stevens em Paris.
15
Entretanto, a imagem das árvores de Mallet-Stevens continua a ser emblemática na
história do paisagismo do século XX.
Fig. 8 - Vista árvore de concreto
Fonte: Álvares, 2007, p.116
Fig. 9 - Jardins Exposição de Artes Decorativas de Paris - 1925
Fonte: Álvares, 2007, p.109
Ainda na Exposição de Artes Decorativas de Paris em 1925, Gabriel
Guévrékian
13
projetou o Jardim de Água e Luz, em que apresenta novos conceitos na
concepção de jardins (fig.10 e 11).
As paredes de fundo eram pequenas pirâmides empilhadas, os canteiros
triangulares com flores vermelhas, azuis e amarelas, um globo de espelhos e cristais,
com iluminação em seu interior, uma fonte de cristal que jorrava água para os tanques
triangulares em diferentes níveis, tudo enfatizando a tridimensionalidade e o
movimento.
Considerado como jardim cubista, é inegável a influência do pintor cubista
Roberto Delaunay, amigo do paisagista e participante na execução da obra. Ultrapassa,
entretanto a simples aplicação de uma estética cubista, utilizando o volume e uma
13
Gabriel Guévrékian (Istambul 1892 ou 1900 - 1970). Arquiteto formado em Viena em 1919. Trabalhou em Viena
com Oscar Strand e Joseph Hoffman até 1922. Saiu de lá para Paris, onde trabalhou para o arquiteto francês Henri
Sauvage inicialmente e depois com Robert Mallet-Stevens até 1924. Entre outros, ele também trabalhou com Le
Corbusier, Andre Lurcat e Sigfried Gideon. Os jardins modernos de Guévrékian representaram uma mudança a partir
da relação entre o jardim e a natureza para uma relação entre o jardim e a saúde humana. O jardim se tornou uma
extensão da casa, uma forma arquitetônica. Presidiu o CIAM (Congresso Internacional de Arquitetura Moderna) a
partir de 1928 até 1932, indicado por Le Corbusier. O governo do recém-formado Irã, convidou-o para retornar à sua
terra natal. Ele atuou como secretário-geral e projetou muitos edifícios governamentais e públicos.
No entanto, o seu trabalho mais interessante ocorreu em seu início de carreira, em Paris, onde houve uma explosão de
arte e arquitetura durante o pós-guerra. Guevrekian é mais conhecido por suas contribuições à arquitetura
paisagística.
16
conjunção de elementos naturais, artificiais e a iluminação para criar um ambiente
totalmente novo como conceito de jardim.
Fig. 10 - Jardim de Água e Luz - perspectiva - 1925
Gabriel Guévrékian
Fonte: Álvares, 2007, p.21
Fig. 11 - Jardim de Água e Luz - vista
Fonte: Álvares, 2007, p.21
Em 1926 Guévrékian é contratado para projetar o Jardim Secreto da Villa
Noailles em Hyerres, projeto de Mallet-Stevens com quem trabalhou anteriormente
(1922-1924), e que se tornaria célebre por sua proposta arrojada (fig. 12 e 13).
Fig. 12 - Jardim Secreto Villa Noailles - 1926
Disponível em: www.commoms.wikipedia.org
Fig. 13 - Jardim Secreto Villa Noailles
Disponível em: www.commoms.wikipedia.org
Em uma área triangular do terreno cria uma composição geométrica, utilizando
canteiros alternados pelo piso revestido por pastilhas de vidro, além de um espelho
d’água e uma escultura que gira sobre a base. Novamente utiliza as cores, a
tridimensionalidade e o movimento para construir um jardim arquitetônico de grande
beleza plástica.
17
Surpreendentemente, Guévrékian criou apenas três jardins de interesse,
considerados jardins cubistas, nenhum deles sobreviveu ao tempo. Em 1990 foi
restaurado o Jardim Secreto, juntamente com a arquitetura e os jardins da Villa Noailles.
Estas experiências de vanguarda, prenunciando uma estética anti-naturalista,
cores e movimento não tiveram prosseguimento na concepção dos jardins modernos,
talvez por não corresponderem aos ideais modernos então nascentes de “Superfícies
lisas, arestas vivas, curvas limpas, materiais polidos, ângulos retos; claridade, ordem
(ROBERT MALLET-STEVENS in ÁLVARES, 2007, p.101).
1.2.2 A consolidação do moderno
Ludwig Mies van der Rohe
14
, no auge de sua popularidade como arquiteto, é
convidado para projetar o que seria um dos ícones da arquitetura moderna mundial, o
Pavilhão Alemão para a Exposição de Barcelona em1929 (fig.14 e 15).
Nesse projeto ele expressa todo o seu pensamento projetual de busca da verdade
e desmaterialização da arquitetura, além de utilizar de forma inovadora materiais
tradicionais, como o
mármore, e novos materiais industrializados, como o aço e o vidro.
Fig. 14 - Pavilhão de Barcelona – planta baixa -
1929
Mies van der Rohe
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.283
Fig. 15 - Pavilhão de Barcelona - vista panorâmica do
jardim
Disponível em: www.flickr.com.br
Embora a palavra “jardim” nunca apareça em seus desenhos, deve-se levar em
conta sua linguagem depurada e reduzida ao essencial. A integração dos espaços
14
Ludwig Mies van der Rohe, nascido Maria Ludwig Michael Mies (Aachen, Alemanha, 1886 - Chicago, Estados
Unidos, 1969). Arquiteto alemão, naturalizado americano, considerado um dos principais nomes da arquitetura do
século XX, sendo geralmente colocado no mesmo nível de Le Corbusier ou de Frank Lloyd Wright. Foi professor da
Bauhaus e um dos formadores do que ficou conhecido por International style, onde deixou a marca de uma
arquitectura que prima pela clareza e aparente simplicidade. Os edifícios da sua maturidade criativa fazem uso de
materiais representativos da era industrial, como o aço e o vidro, definindo espaços austeros mas que transmitem uma
determinada concepção de elegância e cosmopolitismo. Sua concepção dos espaços arquitetônicos envolvia uma
profunda depuração da forma, voltada sempre às necessidades impostas pelo lugar, segundo o preceito do
minimalismo, Less is more.
18
internos e externos num jogo de paredes descontínuas delimita o espaço onde o tanque
com a escultura de mulher, a parede de mármore verde e as árvores entrevistas por sobre
o muro evocam um jardim artificial com uma natureza inexistente, que se repetiria em
outras obras do arquiteto.
Na Casa Farnsworth (1946) outra obra de referência da arquitetura moderna,
chegou ao limite extremo de desmaterialização da arquitetura, no qual o jardim é a
transição entre a casa e a paisagem (fig.16 e 17).
Fig. 16 - Casa Farnsworth - planta baixa - 1946
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.246
Fig. 17 - Casa Farnsworth.- vista do jardim
Disponível em:
www.ideiasdespedacadas.wordpress.com
Wright havia iniciado uma relação da casa com a paisagerm por mimesis, Neutra a continuou
por contraste e Mies a concluiu por transparência, com o que conseguiu uma nova leitura da
paisagem natural através das paredes artificiais de vidro da casa Farnsworth (ÁLVARES,
2007, p.245).
Christopher Tunnard
15
abriu novos caminhos para formalização do jardim
moderno, não somente com suas obras, mas também com a publicação do livro Gardens
in Modern Landscap. Um manifesto pró jardim moderno, em que estabelece três
princípios: 1- o funcional – uma abordagem global baseada no conceito de que o uso
determina a forma; 2- a empatia – baseada na atitude japonesa de um diálogo do jardim
15
Christopher Tunnard (Victória, Canadá, 1910 – British Columbia, 1979). Paisagista canadense, autor de Gardens in
the Modern Landscape (1938). Tunnard emigrou para os Estados Unidos em 1939, onde desempenhou importante
atividade docente em Harvard, influenciando a nova geração de arquitetos paisagistas americanos: Dan Kiley, Garret
Eckbo, James Rose e Lawrence Halprin, entre outros. Nesta época passou a dedicar-se ao planejamento do território.
19
com a natureza, expressa simbolicamente pelo uso de composições assimétricas e
elementos irregulares; e 3- o artístico – baseado nos princípios da arte moderna.
Constrói em parceria com Serge Chermayeff um dos jardins mais significativos
do paisagismo moderno que é o jardim da casa do arquiteto Serge Chermayeff em
Bentley Wood, Halland, 1935 (fig.18 e 19). Utiliza o recurso do enquadramento,
presente no jardim da Villa Noailles, através de uma esquadria de madeira que tem
também a função de proteger o jardim dos ventos (os cinco quadros de baixo são
fechados com vidro). Esta esquadria faz também uma referência à fachada da casa,
estabelecendo uma relação entre a casa, o jardim e a paisagem.
Assim como a arquitetura se abre para o exterior, através das amplas esquadrias
de madeira e vidro, o jardim se abre para uma paisagem previamente preparada
(algumas árvores foram cortadas e o gramado plantado) e enquadrada de uma maneira
quase pictórica.
Fig. 18 - Casa Bentley Wood - planta baixa - 1935
Christopher Tunnard
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.104
Fig. 19 - Casa Bentley Wood - fachada
Fonte: Álvares, 2007, p.155
Neste projeto, tanto a arquitetura como o jardim conseguem a integração entre
interior e exterior, utilizando o moderno uso da proporção, sem adornos, para criar um
conjunto equilibrado de espaços dinâmicos. A escultura de Henry Moore
16
(fig.19)
16
Henry Spencer Moore (Castleford, Yorkshire, Inglaterra, 1898 — Perry Green, Hertfordshire, Inglaterra, 1986).
Escultor e desenhista britânico que desenvolveu uma obra tridimensional predominantemente figurativa, com breves
incursões pela abstração. Foi influenciado sobretudo pela arte mexicana pré-colombiana, assim como pela arte
20
observando a paisagem e o uso de mobiliário de interior no jardim (fig.21)
complementam a característica de se “viver ao ar livre” do jardim moderno. “Encontrar
beleza na forma, em vez de fazê-la depender da ornamentação, é uma busca permanente
da humanidade”, escreveu o paisagista inglês Christopher Tunnard (BRADLEY-HOLE,
2009, p.32).
Fig. 20 - Casa Bentley Wood - detalhe escultura de
Henry Moore
Fonte: Álvares, 2007, p.155
Fig. 21 - Casa Bentley Wood - vista do jardim
Fonte: Álvares, 2007, p.155
Nesta mesma época (1936-1943), Roberto Burle Marx projeta os jardins do
Ministério da Educação e Saúde, primeiro prédio modernista de porte construído no
Brasil (fig.22 e 24).
Após alguns anos projetando praças em Recife, este é um dos primeiros projetos
de Burle Marx no qual a liberdade do traçado, o uso das cores, das formas ondulantes e
da vegetação nativa aparecem em sua plenitude. Nesse projeto, contrariando os
princípios iniciais do paisagismo moderno de estabelecer uma relação de continuidade
com a arquitetura, Burle Marx apresenta um forte contraste entre as linhas e as cores
sóbrias da arquitetura com a exuberância do paisagismo. Bruno Zevi manifesta sua
preocupação com estas novas liberdades do paisagismo no comentário abaixo:
Alguns desenhos de jardins e de parques parecem tomados de empréstimo a Arp ou Miró: uma
decoração “orgânica”, que insiste nas curvas livres, que abranda a geometria dos traçados
reguladores e a dureza dos perfis arquitetônicos. Uma forma de compensação psicológica,
particularmente evidente no famoso Ministério da Educação (...). A intervenção de Burle Marx
aí se desdobra em dois sentidos: colocando uma luxuriante vegetação junto a um ângulo ou a
uma parede nua do edifício, ou quebrando a regularidade retangular de um terraço com um
desenho ondulado multicolorido. (...) O resultado costuma ser excelente, sempre interessante e
genial, mas deixa alguma perplexidade, justamente por se basear num processo “corretivo” da
arquitetura (ZEVI apud DOURADO, 2009, p.170).
arcaica e renascentista, pelo Surrealismo e pelo Construtivismo. A essa cultura visual vasta e multiforme do artista
soma-se uma sensível capacidade de análise da natureza.
21
Segundo Dourado (2009, p.145) Burle Marx utilizava nos projetos as cores das
florações das espécies aplicadas ao desenho, como essas florações se dão em épocas
diversas há sempre certa discrepância entre o projeto e as fotos.
Burle Marx utilizou também neste projeto uma técnica de diluição da arquitetura
na paisagem, ao promover a continuidade do desenho do terraço-jardim com o desenho
dos jardins ao nível do solo, cria a ilusão, de quem vê pela janela da lâmina, de que o
volume do auditório não existe (fig.23).
Fig. 22 - Ministério da Educação e Saúde - planta do jardim - 1936-1943
Burle Marx
Fonte: Cavalcanti, 2009, p.48
Fig. 23 - Ministério da Educação e Saúde - vista do
terraço-jardim
Disponível em: www.mateussz.blogspot.com
Fig. 24 - Ministério da Educação e Saúde - detalhe
do jardim
Fonte: Cavalcanti, 2009, p.205
Esta atitude projetual é também identificável nos jardins da casa Burton
Tremaine em Santa Bárbara, Califórnia, 1948, projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer,
22
onde “A planta do conjunto pintada por Burle Marx mostra a perfeita empatia entre o
jardim e a casa, (...) a ponto de o edifício – apenas definido por pilares e linhas de
envidraçamento – desaparecer como em um jogo visual.” (ÁLVARES, 2007, p.176).
Fig. 25 - Casa Burton Tremaine - planta do jardim - 1948
Fonte: Álvares, 2007, p.24
Desta forma as estratégias iniciais do paisagismo moderno que seriam de
emolduramento, ou ainda resultantes de eixos e formas da arquitetura são aqui
subvertidas, no momento em que alguns projetos como no apresentado acima, a relação
entre a arquitetura e o paisagismo é de diálogo, sem hierarquia, e em outros projetos de
Burle Marx, o paisagismo praticamente ignora a arquitetura.
Frank Lloyd Wright
17
projeta alguns jardins cuja principal característica é o
mimetismo entre a arquitetura e a natureza, a busca da continuidade e unicidade entre a
arquitetura e a paisagem. Essa característica aparece mais claramente em sua obra prima
de arquitetura que é a Casa Kaufmann mais conhecida como Fallingwater (Casa da
cascata), Bear Run, Pensilvânia, 1936 (fig. 26 e 27).
...Fallingwater representa seu ideal de uma habitação integrada com a natureza. (...) Neste
edifício, mais do que em qualquer outro, Wright quebrou a caixa formal dos edifícios
tradicionais, separando os planos verticais e horizontais. Planos de concreto em balanço são
realizados em conjunto com muros de pedra bruta de diferentes espessuras. Por ser tão
completamente fundido com a paisagem e o terreno sobre o qual é construído, Fallingwater
não pode nunca ser completamente capturado em uma única fotografia.(CONSTANTINO,
1999, p.67).
17
Frank Lloyd Wright (Richland Center, Estados Unidos, 1867 — Phoenix, Estados Unidos. 1959). Arquiteto,
escritor e educador americano de ascendência galesa. Um dos conceitos centrais em sua obra é o de que o projeto
deve ser individual, de acordo com sua localização e finalidade. No início de sua carreira, trabalhou com Louis
Sullivan, um dos pioneiros em arranha-céus da Escola de Chicago. Foi a figura chave da arquitetura orgânica,
exemplificada pela casa da cascata, um desdobramento da arquitetura moderna que se contrapunha ao International
style europeu. Wright escreveu vinte livros, muitos artigos, era um palestrante popular nos Estados Unidos e Europa e
grandemente reconhecido ainda em vida.
23
Fig. 26 - Casa Kaufmann – Bear Run –
Fallingwater - planta baixa -1936
Frank Lloyd Wright
Fonte: adaptado de www.hughpearman.com
Fig. 27 - Casa Kaufmann - vista da cascata
Fonte: Constatino, 1999, capa
Richard Neutra
18
iniciou sua produção de projetos residenciais em Los Angeles,
tipologia de projetos que ocuparão quase toda sua carreira. Juntamente com os projetos
das residências elaborava os jardins de uma maneira muito pessoal, definindo com sua
obra o chamado estilo californiano.
Apesar de sua colaboração com Frank Lloyd Wright, a visão de Neutra era
bastante diferente: enquanto Wright buscava o mimetismo, Neutra jogava com o
contraste de sua arquitetura de aço, alumínio, vidro e um jardim luxuriante.
Neutra produz uma arquitetura “embalada” no paisagismo, seus projetos não
procuram reproduzir a natureza, pelo contrário, exagerava na construção do cenário
“natural” para produzir maior contraste com os materiais industrializados utilizados, e o
perfil reto da arquitetura, buscando um equilíbrio complexo.
Ao mesmo tempo o arquiteto utiliza uma técnica japonesa chamada shakkei
termo que poderíamos traduzir como “tomar emprestado um fundo ou um cenário”,
18
Richard Joseph Neutra (Viena, Áustria, 1982, Wuppertal, Alemanha, 1970). Cursou arquitetura na Universidade
Técnica de Viena, onde foi aluno de Adolf Loos, com quem trabalhou antes mesmo de se formar. Após se formar,
Neutra trabalhou em alguns escritórios europeus e, em 1921, foi contratado pelo inventivo arquiteto Erich
Mendelsohn. Em 1923, casou-se e viajou para os Estados Unidos contagiado pela arquitetura de Frank Lloyd Wright
com quem trabalha por algum tempo. Em Los Angeles, trabalhou com Rudolph Schindler em vários projetos, e
depois iniciou seus trabalhos individuais.
24
onde ele leva o seu jardim até certo ponto, escondendo o entorno imediato e
emoldurando a paisagem de fundo. Uma evolução da Villa Noailles de Mallet-Stevens e
de Bentley Wood de Tunnard, que também utilizavam o recurso do enquadramento da
paisagem circundante.
Em uma de suas obras, referência da arquitetura habitacional moderna, a Casa
Kauffman em Palm Springs na Califórnia, 1946 (fig.28 e 29), Neutra implanta um oásis
no deserto da Califórnia. As montanhas onduladas da paisagem são capturadas e
colocadas em contraste com sua arquitetura de formas puras e retas; a oposição da
paisagem agreste com o brilho do alumínio, do aço e dos vidros valorizando ambos e o
jardim minuciosamente definido no projeto revelam o conceito peculiar dos jardins de
Neutra.
Fig. 28 - Casa Kaufmann – Palm Springs - planta
baixa - 1946
Richard Neutra
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.218
Fig. 29 - Casa Kaufmann - vista do jardim
Fonte: Lamprecht, 2004, capa
1.2.3 A escola americana
Nos Estados Unidos a profissão de paisagista já era consolidada no princípio do
século XX, entretanto o academicismo imperava nas escolas de arquitetura. Com a
vinda de arquitetos europeus modernos como Walter Gropius e paisagistas como
Cristopher Tunnard e Richard Neutra, um movimento de reação contra o academicismo
e a busca de uma linguagem moderna se inicia.
25
Thomas Church
19
foi um dos mais importantes paisagista americano, professor e
autor de livros sobre paisagismo, em sua teoria estabelecia três elementos que
influenciavam nas formas de um jardim: 1- as necessidades e exigências do cliente, 2-
as características dos materiais e das espécies vegetais utilizadas e 3- a expressão
artística na concepção do espaço, semelhante ao que professava Tunnard em seu livro
Gardens in Modern Landscape, as semelhanças também se estendem às obras
realizadas.
Inicialmente Church projetava jardins com vocabulário eclético, aos poucos
passou a se interessar pela linguagem moderna, utilizando traçados lineares e
ortogonais. Em 1937 em viagem aos Estados Unidos conhece os arquitetos Le
Corbusier e Alvar Aalto
20
.
A obra de Alvar Aalto com sua característica orgânica e curvas onduladas
tiveram grande influência na sua concepção formal. A utilização de curvas e retas
resultando em um efeito dramático de movimento passa a ser a expressão do trabalho
maduro de Church.
No jardim Donnell, Somona, Califórnia, 1948 (fig.30 e 31), um de seus jardins
mais famosos, vê-se a ilustração de suas idéias: a concepção de um ambiente artificial
aplicado sobre o terreno. O deck de madeira solto sobre o terreno, a presença de rochas
ali colocadas, e as pequenas árvores que perfuram o deck evocam o contraste do natural
sobre o artificial. A conjunção de retas e curvas, do orgânico com o racional, o
equilíbrio entre o geométrico e o irregular conforme preconizava Tunnard aparece neste
projeto de forma engenhosa. O requinte dos detalhes, a forma amebóide e a escultura da
piscina e o uso do mobiliário (fig.32 e 33) complementam a idéia de que o interior da
residência foi trazido para o exterior e colocado no terreno como um tapete.
A ampliação definitiva do jardim como um ambiente da casa, que deve ser
planejada, projetada, mobiliada e decorada como qualquer outra, como uma resposta ao
19
Thomas Doliver Church (Boston, 1902-1978). Arquiteto paisagista titulado por Bekerley e Harvard, realizou
aproximadamente 2.000 jardins. Autor de Garden are for the people: How to plan for Outdoor Living (1955). Foi um
dos mais importantes paisagistas modernos, criador do genuíno jardim americano.
20
Hugo Alvar Henrik Aalto (Kuortane, Finlândia, 1898 -1976). Arquiteto finlandês cuja obra é considerada exemplar
da vertente orgânica da arquitetura moderna da primeira metade do século XX, foi um dos primeiros e mais influentes
arquitetos do movimento moderno escandinavo. No campo do design, tornaram-se célebres os projetos de cadeiras
baseados na exploração das possibilidades de corte e tratamento industrial da madeira. Além disso, pode-se citar os
cristais que desenhou, como o conhecido Vaso Savoy.
26
“viver ao ar livre” da vida moderna, a partir da obra de Church torna-se uma constante,
embora já estivesse de forma incipiente no jardim de Bentley Wood, de Tunnard.
Fig. 30 - Jardim Donnell - planta baixa - 1948
Thomas Church
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.235
Fig. 31 - Jardim Donnell - vista da piscina
Disponível em:
www.landscapeandurbanism.blogspot.com
Fig. 32 - Jardim Donnell - vista do deck
Disponível em: www.nucleoap.blogspot.com
Fig. 33 - Jardim Donnell - detalhe escultura
Disponível em:
www.landscapeandurbanism.blogspot.com
Sobre Thomas Church, “Peter Walker e Melanie Simo consideram que na
história do jardim moderno somente Christopher Tunnard, na Inglaterra e Roberto Burle
Marx, no Brasil, promoveram rupturas comparáveis” (BARRA, 2006, p.79).
27
Bruno Zevi
21
, em Saber ver a Arquitetura conceituava arquitetura como sendo o
espaço interior, considerando, entretanto que o espaço exterior das edificações faz parte
do espaço interior da cidade. Dessa forma o exterior é também espaço interior. Muitos
anos se passaram para que a prática arquitetônica produzisse espaços coerentes com esta
afirmação.
Garrett Ekbo
22
, avança na concepção do paisagismo como construção artificial
em projetos em que o jardim já adquire maior autonomia em relação à casa. Em 1950
publica seu livro Landscape for living, em que apresenta suas idéias de negação do
pensamento tradicional sobre jardins como lugar de recreação vegetado e contra o
debate sobre o formal e o informal e a sua compreensão do jardim como espaço de
interação entre as pessoas e o lugar.
Em 1956 publica um novo livro: The art of Home Landscaping, no qual, de
forma semelhante ao de Thomas Church expressa suas idéias de como projetar jardins.
Estabelece quatro premissas para o desenho de jardins: 1- a forma da casa e do terreno,
2- os problemas técnicos relacionados à implantação da casa no terreno, 3- a função e o
uso que desejam os moradores, 4- as propriedades físicas dos materiais utilizados.
Também entendia que os jardins deveriam ter três qualidades: ritmo, equilíbrio e
ênfase.(ALVARES, 2007)
Nos projetos do paisagismo moderno existe sempre uma relação de
complementação ou extensão em relação à arquitetura, exceto em alguns projetos de
Burle Marx. Nos projetos de Eckbo estas relações vão se diluindo, assim como a relação
com os elementos naturais que vão se tornando progressivamente raros. A geometria do
traçado dos jardins busca a desmaterialização dos limites regulares da casa por meio da
profusão de formas, como numa colagem.
No Jardim Goldstone, Beverly Hills, Califórnia, 1948 (fig.34 e 35), a
composição já não tem nenhuma relação com a arquitetura da casa, o uso dos materiais
21
Bruno Zevi (Roma, 1918 – Roma, 2000). Arquiteto italiano bastante importante no contexto da teorização e
introdução da historiografia da Arquitetura moderna. Exilou-se nos Estados Unidos e lá recebeu fortes influências da
arquitetura orgânica e principalmente de Frank Lloyd Wright. Foi autor de diversos livros célebres sobre a
arquitetura, incluindo Saper vedere l’architettura,1948 .
22
Garrett Eckbo (1910 – 2000). Arquiteto paisagista norte-americano notável por seu livro Landscape for Living.
Influenciado por Gropius, ele previsivelmente rejeitou os estilos históricos de desenho de jardins e partiu para criação
de um estilo moderno. A partir de 1945, projetou vários jardins com plantas exóticas, sendo por isso associado à
Escola Californiana. Mais tarde, passou a fazer projetos para fábricas, campus, e espaços urbanos na Califórnia.
28
e dos poucos elementos vegetais é no sentido de dar à composição a cor e a textura
desejadas. A inspiração nas artes plásticas e na obra de Kandisnsky
23
e Moholy-Nagy
24
é evidente.
Fig. 34 - Jardim Goldstone - planta - 1948
Garrett Eckbo
Fonte: adaptado de Álvares, 2007, p.243
Fig. 35 - Jardim Goldstone - vista
Fonte: Álvares, 2007, p.244
1.2.4 Paisagistas da transição moderno/contemporâneo
A obra de Luis Barragán e Isamo Noguchi
25
assim como a de Burle Marx,
(coincidentemente nenhum dos três tem formação em arquitetura paisagística) embora
entendida usualmente como sendo paisagismo moderno destoa um pouco da dos demais
arquitetos apresentados até agora.
Os jardins de Barragán inspirados na obra do pintor de Chirico
26
, jardins árabes,
jardins tradicionais japoneses e outras influências, apresentam uma poética muito
pessoal e de difícil classificação. Alguns projetos apresentam a influência minimalista
dos pátios jardins de Mies van der Rohe; entretanto, o colorido violento, texturas, luzes
23
Wassili Kandinsky (Russia, 1866 – França, 1944). Pintor russo, introdutor da abstração no campo das artes visuais,
lecionou na escola Bauhaus.
24
Lázló Moholy-Nagy (1895-1946). Designer, fotógrafo, pintor e professor de design pioneiro, lecionou na escola
Bauhaus. Foi muito influenciado pelo Construtivismo Russo e um defensor da integração entre tecnologia e indústria
no design e nas artes.
25
Isamu Noguchi - Los Angeles, Estados Unidos, 1904 – New York – Estados Unidos, 1988). Proeminente artista e
paisagista de origem japonesa, conhecido por suas esculturas e obras públicas, Noguchi também desenhou luminárias
e mobiliário, tendo colaborado com a empresa Herman Miller em 1948. Seus trabalhos estão ao redor do mundo e no
Museu Noguchi em Nova Iorque.
26
Giorgio de Chirico (Vólos, Grécia, 1888 — Roma, Itália, 1978) também conhecido como Népo, foi um pintor
italiano. Fez parte do movimento chamado Pintura metafísica, considerado um precursor do Surrealismo.
29
e sombras conforme a tradição da arquitetura popular mexicana, não condiz com o
ideário modernista de sobriedade de linhas e cores (fig.36 e 37).
Fig. 36 - Quadra S.Cristóbal - México - 1967/68
Luis Barragán
Disponível em: www.thequietman.org
Fig. 37 - Casa Barragán - México - 1947
Disponível em:
www.moooonriver.spaces.live.com
Quanto a Isamo Noguchi, assim como Burle Marx, utilizava o jardim como um
meio de expressão artística como escultor que era. Seus jardins apresentam de forma
personalista uma interpretação de jardins japoneses utilizando elementos naturais e
artificiais de forma contrastante e artística (fig.38 e 39), dificilmente identificável com
os jardins propriamente modernistas apresentados anteriormente.
Fig. 38 - Jardins da Sede da IBM - N.Iorque - 1964
Isamu Noguchi
Fonte: Barra, 2006, p.102
Fig. 39 - Califórnia Scenário - Califórnia - 1980-82
Fonte: Barra, 2006, p.103
30
1.3 Paisagismo moderno no Brasil
Durante o período colonial algumas intervenções paisagísticas ocorreram na
cidade do Rio de Janeiro, mas é com a chegada ao Brasil de Glaziou
27
em 1858, que a
prática do paisagismo torna-se mais consistente. Glaziou projeta várias praças e parques
e cria o equivalente ao atual “departamento de parques e jardins”, sendo sua maior
contribuição a formação, na prática de desenhistas e profissionais de obra que após seu
retorno à França, disseminaram este conhecimento construindo e reformando praças e
parques nas principais cidades brasileiras no início do século XX. Segundo Sandeville
Junior (1997), até o final da década de 1920, o paisagismo no Brasil mantinha-se
atrelado aos modelos franceses e ingleses.
Assim como na Europa, a preocupação de criar um jardim que atendesse às
inovações formais da arquitetura moderna conduziu o nascente paisagismo moderno
para o tema do jardim residencial. Os primeiros traços de um jardim moderno aparecem
nos jardins de Mina Klabin Warchavchik para as casas modernistas de seu marido
Gregori Warchavchik
28
, arquiteto ucraniano, pioneiro do modernismo no Brasil.
1.3.1 Mina Warchavchick, primórdios do jardim moderno
As casas de Warchavchick foram projetadas conforme o ideário moderno da
época: a liberação da edificação do terreno, integração dos espaços interiores e
exteriores, ausência de ornamentação, entre outros. Warchavchik atuava com o controle
total sobre a obra, algo semelhante ao conceito de Mallet-Stevens de obra de arte total,
onde fazia a arquitetura, os interiores e o paisagismo, chegando a desenhar os móveis
para a edificação. Desta forma surgiram os jardins projetados por sua esposa Mina
Warchavchik que buscavam uma linguagem mais despojada e coerente com a
arquitetura.
27
Auguste François Marie Glaziou (1833-1906) Engenheiro civil francês, integrante da equipe de Alphand durante as
reformas de Paris comandadas pelo barão Haussmann. Foi convidado pelo imperador D.Pedro II para remodelar o
Rio de Janeiro e reflorestar o maciço da Tijuca, viveu no Rio de Janeiro de 1858 a 1897.
28
Gregori Ilich Warchavchik (Odessa 1896 — São Paulo, 1972). Foi um dos principais nomes da primeira geração de
arquitetos modernistas do Brasil. Chegou ao Brasil em 1923. Naturalizado brasileiro, entre 1927 e 1928, projetou e
construiu para si aquela que foi considerada a primeira residência moderna do país.
31
Apesar de Mina Warchavchick sempre ser citada como pioneira, sua obra atinge até o
momento um interesse muito circunscrito e pouco avaliado, o que aliás será difícil de ser
superado devido à carência do material hoje disponível, já que seus jardins são conhecidos
apenas por uma via extremamente indireta à partir de fotos que visam mostrar a arquitetura
modernista que se inicia com esse poucos exemplos solitários na cidade.
(SANDEVILLE JR., 1997, p.106).
A parte as dificuldades citadas, é possível observar nas fotos o uso de vegetação
nativa brasileira. É notável o uso de cactus (fig.40 e 41), espécie que nessa época havia
se tornado quase um símbolo de brasilidade na pintura moderna, presente na obra de
Tarsila do Amaral
29
e Anita Malfati
30
(DOURADO, 2009, p.44-45). Observa-se
também uma composição mais livre, diferente da profusão de elementos que
caracterizava o jardim eclético da época. Deve-se observar que Mina Warchavchik não
era arquiteta, nem artista, não tendo restado nenhuma planta ou croquis dos jardins que
registrasse intenções ou composições nos jardins que eram executados sob sua
supervisão. Não existe também nenhuma evidência de que estes trabalhos tenham tido
influência em jardins posteriores.
Fig. 40 - Casa Rua Santa Cruz – jardim - 1928
Mina Warchavchik
Fonte: Sandeville Jr., 1997, p.108
Fig. 41 - Casa da Rua Santa Cruz - detalhe do
jardim
Fonte: Sandeville Jr., 1997, p.108
29
Tarsila do Amaral (1986-1973). Pintora modernista, nasceu em 1º de setembro de 1886 no município de Capivari,
interior do Estado de São Paulo. Em 1922 regressa (da Europa) ao Brasil e se integra com os intelectuais do grupo
modernista. Faz parte do “grupo dos cinco” juntamente com Anita Malfatti, Oswald de Andrade, Mário de Andrade e
Menotti del Picchia. É autora das pinturas: “pau-brasil”, “Abaporu”, e “Operários”. Faleceu em São Paulo no dia 17
de janeiro de 1973.
30
Anita Malfati (1889-1964). Pintora modernista, nasceu em São Paulo. A pintura de Anita Malfatti foi o estopim da
vanguarda do modernismo brasileiro. Já em 1917, cinco anos antes da Semana de Arte Moderna, uma mostra com 53
de seus mais arrojados trabalhos chocaram a provinciana e acadêmica São Paulo. A artista pintou obras como "O
homem amarelo","A Boba" e "Mulher de Cabelos Verdes".
32
Embora os jardins de Mina Warchavchik sejam considerados um marco no
paisagismo moderno, passaram-se quase vinte anos para que a nova linguagem
modernista se tornasse visível nos projetos.
No levantamento realizado pelo Quapá
31
para o livro Praças Brasileiras, as
praças ecléticas ainda imperaram por muito tempo, sendo projetadas, fora do eixo Rio -
São Paulo, até nos anos 1990. No Rio de Janeiro, pela presença do paisagista Roberto
Burle Marx, o uso da linguagem moderna se deu mais cedo, a maioria das praças
modernas apresentadas na pesquisas data dos anos 1940 a 1960, embora ainda perdurem
até os anos 1990; em São Paulo essas datas se adiantam para os anos 1960 e 1970.
De qualquer forma, segundo Ana Belluzo, “em São Paulo só por volta dos anos
1950 alarga-se o espaço, antes preenchido pelo arquiteto e pelo jardineiro, dando lugar à
figura do profissional paisagista. Contavam-se nos dedos: eram Roberto Coelho
Cardozo e Cordeiro“. (SANDEVILLE JR., 1997, p.127).
1.3.2 Waldemar Cordeiro, moderno ou contemporâneo?
Waldemar Cordeiro
32
inicia sua carreira de paisagista em 1950 ao projetar os
jardins de uma obra de Vilanova Artigas. A partir de 1953 estuda botânica e mantém
um prolífico escritório de paisagismo de 1950 a 1973 quando falece prematuramente
aos 48 anos de idade.
Segundo Sandeville Jr. (1997, p. 131): “Há um constante questionamento em
Cordeiro de todo tipo de naturalismo. Entendia que essa idéia não correspondia à
natureza de artefatos do homem contemporâneo”.
A concepção mais ampla da paisagem, e o entendimento de que a paisagem
ultrapassa os limites do naturalismo, conduzem Cordeiro ao campo do planejamento
urbano. Na década de 1960 passa a atuar em projetos de planejamento urbano com
31
Quapá - Quadro do Paisagismo no Brasil (Grupo de estudos em paisagismo da FAU/USP).
32
Waldemar Cordeiro (Roma – Itália 1925 – São Paulo – Brasil 1973). Pintor, escultor, paisagista, designer e crítico
de arte. Transfere-se para São Paulo em 1946. Em 1949 integra a Mostra do Figurativo ao Abstracionismo, exposição
inaugural do MAM – SP. Participa da I Bienal Internacional de SP, em 1951. Compõe o Grupo Ruptura, juntamente
com Geraldo de Barros e outros. Lidera o Movimento Concreto em São Paulo. Expõe em Paris, em 1969, no X Salon
Grands et Jeunes d'Aujourd'hui e no Salon Comparaisons. Intruduz a computer art no Brasil, em 1970.
33
Anhaia Melo e posteriormente com Jorge Willheim
33
, antecipando uma tendência de
aproximação do paisagismo com o desenho urbano que aconteceria décadas depois.
Cordeiro, assim como Burle Marx, trabalham a transposição da atividade de artista
plástico para o projeto de jardins, com a diferença que os trabalhos de Burle Marx eram
uma construção com a natureza, já Cordeiro descobre uma natureza recriada por meio
de sua construção (SANDEVILLE JR, 1997). Os dois paisagistas trabalham com apoio
em sua atividade artística, sendo que o ambiente cultural e as múltiplas atividades de
Cordeiro remetem mais à vanguarda e às pesquisas formais do concretismo e da arte
pop nas quais trabalha tendo também como suporte os jardins (fig.42 e 43)
Para ele, uma atitude naturalista quanto à paisagem conduz à omissão e à neutralidade,
porquanto considera que a paisagem passou a ser um produto da cultura, um fato da
comunicação, que se apresenta através de sinais naturais e artificiais, símbolos e signos.
(SANDEVILLE JR., 1997, p.135)
Fig. 42 - Detalhe do jardim da residência Abraão
Huck -1956 - Waldemar Cordeiro
Fonte: Sandeville Jr., 1997, p.140.
Fig. 43 - Idéia Visível - 1956
Disponível em: www.austin360.com
Segundo Sandeville Jr. duas fases marcaram o trabalho de Waldemar Cordeiro,
num primeiro momento no qual os jardins são uma transposição do trabalho do artista
plástico para o plano do jardim. O conceito de um projeto onde a vegetação participa
como elemento de composição com tratamento escultórico, a idéia de fragmentação e
totalidade, o rigor geométrico e a concepção de projeto em arranjos espaciais abstratos,
nos quais o jardim como imagem da natureza é negada, está sempre presente na obra
33
Jorge Wilheim (Triestre, Itália, 1928), arquiteto e urbanista, formado pela Faculdade de Arquitetura Mackenzie,
São Paulo, em 1952. Foi secretário de planejamento da cidade de São Paulo na década de 1970. Entre suas obras
estão: o Parque Anhembi, o Hospital Albert Einstein, o SESI – Vila Leolpoldina; entre os projetos urbanos: a
revitalização do Centro Histórico e as reurbanizações do Pátio do Colégio e do Vale do Anhangabaú.
34
precursora de Cordeiro. Segundo o paisagista “O número de materiais e espécies
vegetais é o estritamente necessário a articular a estrutura plástica” (Acrópole nº. 237,
1958 apud SANDEVILLE JR., 1997, p. 138-140).
Uma das características desses jardins é a fragmentação da composição geral, como são
fragmentos esses espaços livres do lote. Cada setor é entendido de modo temático, com uma
plástica autônoma. Ao contrário de Burle Marx, o artista parece abandonar a idéia de
totalidade, favorecendo a “ruptura” entre as unidades dentro de sua linguagem.
(SANDEVILLE JR., 1997, p.141)
Num segundo momento, já na década de 1960, passa a se preocupar mais com a
noção de conjunto do jardim, utilizando mais a integração com o plano vertical,
utilizando painéis cinéticos abstratos coloridos, por meio de um jogo de sombras e de
luz estabelece mudanças visuais com o deslocamento do espectador.
No Clube Espéria (fig. 44 e 45), segundo Sandeville Jr., Cordeiro realiza a mais
completa transposição de seus conceitos de paisagismo, desenvolve uma construção
abstrata em que abandona a representação naturalista.
Waldemar Cordeiro estabelece uma relação nítida na década de 50 entre questão da linguagem
artística e do paisagismo. O faz porém, por um caminho diverso de Burle Marx. Este constrói
com a natureza, Cordeiro descobre uma natureza recriada através de sua construção.
(SANDEVILLE JR., 1997, p.143)
Fig. 44 - Clube Espéria - S.Paulo - 1966
Waldemar Cordeiro
Fonte: Macedo, 1999, p.97
Fig. 45 - Clube Espéria - playground
Fonte: Macedo, 1999, p.97
1.3.3 Roberto Coelho Cardozo e a escola americana
Roberto Coelho Cardozo
34
, vem para o Brasil por indicação de Garrett Eckbo
para trabalhar no escritório de Burle Marx em 1952. Em 1954 estabelece seu escritório
próprio em São Paulo. Seu trabalho profissional e atividade acadêmica (lecionou na
34
Roberto Coelho Cardoso (1923 - ). Arquiteto paisagista americado, filho de pais portugueses, estudou arquitetura
paisagística na Universidade da Califórnia, tendo trabalhado no escritório de Garrett Eckbo.
35
FAU/USP) influenciaram algumas gerações de arquitetos paisagistas, tendo se mudado
para Inglaterra em 1969.
Trouxe a mudança nos referencias de projeto, com a abordagem da escola
californiana, que difere muito dos pressupostos artísticos de Cordeiro e Burle Marx.
Além de estruturar a questão metodológica de projeto, em que exigia maior elaboração,
precisão e rigor na concepção dos espaços e no uso da vegetação. A escola californiana
dava ênfase especial à produção de espaços destinados à recreação, os projetos eram
concebidos arquitetonicamente quase como salas de estar ao ar livre, não somente nos
jardins particulares, mas também no projeto de praças.
Esses espaços eram caracterizados formalmente pela existência de grandes pisos
ou decks, pérgulas, jardineiras e piscinas (no caso das residências) e em geral
delimitados por grandes panos de vegetação.
Cardoso sintetiza suas idéias em alguns pontos de projeto: (i)respeito ao usuário;
(ii) os acessos e percursos dos espaços criados devem sempre tirar o maior partido das
emoções e sensações usuais; (iii) o respeito às condições de visibilidade dos espaços a
serem projetados; (iv) o uso da vegetação como elemento construtivo de ambientes e
espaços semelhantes àqueles criados pela arquitetura; (v) a orientação do espaço a ser
projetado em relação ao percurso solar, que se constitui em um critério fundamental
para designar zonas de uso.
Fig. 46 - Jardim Res. Pacaembú - São Paulo - 1956
Roberto Coelho Cardoso
Fonte: adaptado Sandeville Jr., 1997, p. 149
Fig. 47 - Clube São Paulo - São Paulo
Fonte: Robba, 2002, p.126
No Jardim da Residência do Pacaembú, projeto de Vilanova Artigas (fig.46), é
bastante visível a influência de Eckbo no traçado dos ângulos e curvas, buscando diluir
os limites retangulares do lote.
36
Segundo Benedito Abbud, “(...) o Cardoso praticamente trabalhava com aspectos
sutis, com formas que se sobrepõem a outras formas, com tons de verdes, com plantas
caducas e não caducas, enfim, com uma riqueza muito grande e muito sutil, menos
explícita que as cores do Burle Marx.” (SANDEVILLE JR., 1997, p.150).
Embora enfatizasse o zoneamento funcional e o uso da vegetação como
elemento arquitetônico, seus projetos revelam grande sensibilidade e conhecimento
específico das características das espécies utilizadas.
Fig. 48 - Praça Roosevelt - S. Paulo - 1967-68
Roberto Coelho Cardoso
Fonte: adaptado de Sandeville Jr., 1997, p. 153
Na década de 1960, seus projetos tendem a ser cada vez mais construídos, a
vegetação diminui, cada vez mais subordinada aos elementos arquitetônicos, sendo que
na Praça Roosevelt (fig.48) ela desaparece.
Segundo Alex (2008, p.160), a Praça Roosevelt foi a primeira praça moderna
planejada em São Paulo, como estratégia de revitalização da área central, como se fazia
nos Estados Unidos, por meio da construção de megaestruturas arquitetônicas.
37
O programa da praça era bastante complexo, incluindo dois pavimentos de
garagens, área para supermercado, escola e pequenos serviços que antes estavam nas
calçadas do entorno, que resultaram no projeto de grandes volumes arquitetônicos
construídos, polígonos angulados, sem relação explícita com funções ou com o entorno.
1.3.4 Roberto Burle Marx, a natureza organizada
Roberto Burle Marx é considerado um dos maiores paisagistas do século XX.
Produziu uma obra vasta e diversificada que tem inspirado paisagistas de todo mundo,
obra esta, entretanto que requer maiores estudos, conforme comentário abaixo.
A obra do brasileiro Roberto Burle Marx é uma das poucas que tem sido entendidas pela
crítica contemporânea como indício da existência de um jardim moderno; mas as leituras de
seus jardins tem partido sempre de uma interpretação tendenciosa. Tem-se querido ver nos
jardins de Burle Marx unicamente uma recriação de um paisagismo exótico e colorista, sem
nenhuma outra pretensão adicional (ÁLVARES, 2007, p.169).
Alguns críticos tendem a exagerar a influência de Jean Arp, como se os jardins
de Burle Marx fossem a transposição da obra deste artista (ou de Matisse e Miró);
entretanto outros paisagistas de renome como Luis Barragán e Isamu Noguchi buscaram
inspiração na obra de artistas contemporâneos, e assim como Burle Marx produziram
uma obra que ultrapassa as influências na formulação de uma linguagem própria.
Macedo (2003) identifica três etapas na construção do paisagismo moderno
brasileiro: Etapa 01- Primórdios (1937-1950) nesta época o destaque principal é a obra
dos jardins da Pampulha de Burle Marx; Etapa 02 - Período de expansão (1950-1960),
onde destaca a obra do paisagista Roberto Coelho Cardoso e de Waldemar Cordeiro; e
Etapa 03- Consolidação (1960-1989) onde destaca a obra dos paisagistas do DEPAVE –
Departamento de Parques e Áreas Verdes da Prefeitura Municipal de São Paulo, o
trabalho da Fundação de Parques e Jardins do Rio de Janeiro e do Instituto de
Planejamento de Curitiba.
Os projetos de paisagismo de Burle Marx passaram por várias fases, nas quais
ele foi construindo uma obra que não cabe em uma rígida classificação. Alguns críticos
em obras mais recentes tem classificado o trabalho de Burle Marx como sendo de
paisagismo contemporâneo, e pode-se observar que em suas obras iniciais embora já
houvesse o indício da modernidade, o traçado ainda era clássico.
38
No Jardim da Casa Forte, Recife/PE, 1935, considerado por Robba (2002), como
um trabalho de transição entre o eclético e o moderno, Burle Marx projetou em um
traçado clássico e simétrico um jardim com espécies brasileiras e exóticas, exaltando o
caráter tropical, sem a pretensão de reprodução da natureza. Utilizou tanques de forma
didática (fig.49), sendo que o da esquerda abrigava plantas exóticas à flora brasileira, o
tanque central (circular) com espécies amazônicas e o da direita dedicado à flora
americana. A temática dos tanques com plantas aquáticas tornou-se uma constante nos
projetos de Burle Marx, que diferentemente de outros paisagistas que tiram partido
somente do caráter plástico dos espelhos ou da água em movimento em fontes e
cascatas, desenvolve o projeto sempre com a presença de espécies aquáticas. Entretanto,
como observa Tabacow na citação abaixo, este não é ainda o momento de ruptura no
trabalho de Burle Marx.
Os jardins de Casa Forte no Recife, ainda refletem forte influência da geometria francesa, com
eixos longitudinais, formas rígidas e distribuição simétrica de vegetação. Portanto é
equivocado atribuir o rompimento a essa época. O que houve de novo no Recife está
relacionado com a escolha da vegetação. Esta não deve ser considerada nativa, porque se
origina de outro bioma, a tão distante Amazônia, na geografia e na fisionomia (TABACOW in
CAVALCANTI, 2009).
Fig. 49 - Praça da Casa Forte - Recife - PE - planta - 1935
Burle Marx
Fonte: Robba, 2002, p.91
Fig. 50 - Praça da Casa Forte - vista do tanque
Foto: Claudio Bergamini, 2008
Fig. 51 - Praça da Casa Forte - vista tanque central
Foto: Claudio Bergamini, 2008
39
O marco inicial da construção do paisagismo moderno no Brasil foi o jardim do
Ministério da Educação e Saúde, construído em 1938, apenas três anos após o projeto
da Praça da Casa Forte, apresentado anteriormente (ver fig. 22 a 24, p.20). Segundo
Dourado (2009) no período de 1930 a 1950 Burle Marx dedica-se a construir uma
sintaxe plástica que aplicará em sua obra, por meio de pesquisas fundamentadas na cor e
na forma. Segundo Fleming:
(...) Remoendo sobre as diferenças entre os cactos espinhados, as folhas grandes e brilhantes e
a delicadeza das plantas que floriam do lado de fora, começou a se dar conta de que era
essencial elaborar um vocabulário personalizado, caso quisesse levar a jardinagem a sério
(FLEMING in DOURADO, 2009, p.57).
Entre os anos de 1942 e 1945 Burle Marx teve oportunidade, nos projetos de
Belo Horizonte de explorar o uso de cores nos jardins. Neste contexto elabora o projeto
dos jardins do Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte/MG, 1942 (fig.52 a 54), a
feliz conjunção entre as curvas da arquitetura de Niemeyer e do paisagismo de Burle
Marx cria um cenário de exuberância e leveza, o colorido dos jardins valoriza por
contraste a arquitetura branca, sendo uma obra bastante representativa do ideal moderno
de união da arquitetura e paisagem.
Segundo Dourado este projeto apresenta um grande avanço no potencial criativo
da abordagem cromática, de todos os trabalhos propostos para a arquitetura de
Niemeyer configura-se como o mais luxuriante. Estes trabalhos utilizando cores
demoraram certo tempo a serem absorvidos pelo ideário moderno, cujo espírito
racionalista implicava em certa prevenção com a cor, que jamais deveria turvar a
compreensão do desenho, quando muito deveria enfatizá-lo (DOURADO, 2009).
Fig. 52 - Museu de Arte da Pampulha - Belo Horizonte - MG - planta - 1942
Burle Marx
Fonte: Robba, 2002, p.105
40
Fig. 53 - Museu de Arte da Pampulha - vista da
entrada
Fonte: Dourado, 2009, p.127
Fig. 54 - Museu de Arte da Pampulha - vista espelho
d’água
Fonte: Robba, 2002, p.115
Segundo Dourado (2009) durante as décadas de 1940 e 1950, duas posições
marcavam a discussão da arquitetura moderna: (i) a primeira de continuidade da
vanguarda histórica, que resultou no internacional style; (ii) a outra corrente que
indicava uma postura de revisão de alguns aspectos do moderno, constituída
principalmente pela corrente organicista, expressa especialmente nos trabalhos dos
arquitetos Alvar Aalto e Oscar Niemeyer. O paisagismo de Burle Marx antecipou estas
questões utilizando formas curvas e assimétricas de maneira intensiva desde o
emblemático projeto para o Ministério de Educação e Saúde.
As pesquisas quanto à forma e à cor na obra de Burle Marx prosseguem na
década de 1960 e 1970, com especial destaque nos projetos do Parque Del Este
(Caracas, 1956), nos jardins dos palácios de Brasília (entre 1961 e 1976) e no Parque do
Flamengo (Rio de Janeiro, 1961). Nestes projetos pôs em prática um vocabulário
plástico que ia de formas orgânicas a geométricas, conjugando formas regulares e
irregulares de forma harmônica e sempre acompanhada de pesquisas sobre as espécies
vegetais e seus ecossistemas.
Em 1970 realiza um de seus projetos mais singulares em Brasília, a Praça Duque
de Caxias, 1970 (fig.55) que faz limite com o Ministério do Exercito, obra de Niemeyer.
Neste projeto, a linguagem formal de grande expressividade se apresenta com
características inéditas que se remetem ao vocabulário contemporâneo. Formas
retilíneas quebradas combinadas com curvas já não tão sinuosas, em uma grande
esplanada de forma triangular com um grande tanque no centro, do qual emergem
grandes peças de concreto com aparência de cristais que atraem a atenção pelo caráter
41
artificial (fig. 57). Não existe um traçado unificador, a composição é formada por
fragmentos de diversos materiais em colisão. As cores também passam a ser menos
contrastantes tanto nos pisos, quanto na vegetação. Ainda que se reconheça um
vocabulário autoral, a obra aponta para uma inflexão no caráter formal, antenada nas
novas tendências em formação em que a fragmentação e colisão fundamentam a
composição.
Fig. 55 - Praça Duque de Caxias - Brasília - DF - planta baixa - 1970
Burle Marx
Fonte: Robba, 2002, p.120
Fig. 56 - Praça Duque de Caxias - vista geral
Fonte: Robba, 2002, p.121
Fig. 57 - Praça Duque de Caxias - esculturas
Fonte: Robba, 2002, p.95
42
1.4 Considerações finais do capítulo 1
A busca de uma linguagem coerente com a arquitetura moderna, com a negação
do “jardim paisagístico” que procurava imitar a natureza, presente ainda nas raízes do
arts & crafts se prolonga por todo século XX, passando pelos jardins de inspiração
cubista, pelos precursores do moderno como Mallet-Stevens, pelo purismo de Mies van
der Rohe até os jardins artificiais de inspiração na arte abstrata de Garrett Eckbo. Este
afastamento da tentativa de cópia da natureza e a busca de uma expressão própria do
jardim e da paisagem como criação é uma das características primordiais desse período.
Algumas experiências na formatação do jardim, como o uso dos espelhos no
jardim dos irmãos Vera e os jardins de Guévrékian não tiveram continuidade na época,
especialmente o uso de cor, movimento, luz elétrica e materiais estranhos ao jardim não
se adequavam à linguagem purista do modernismo. São jardins inspiradores, mas só
vieram a ser resgatados, e alguns, reconstruídos no final do século XX.
Uma linha condutora do pensamento moderno em paisagismo mais coesa parece
ser a que passa pelos trabalhos de Mallet-Stevens, Ludwig Mies van der Rohe, Frank
Lloyd Wright, Richard Neutra e principalmente Christopher Tunnard, que com seu livro
estabeleceu as premissas do paisagismo moderno, anos depois corroboradas por Thomas
Church e Garrett Eckbo em seus livros e obras.
A escola americana de paisagismo se constitui em uma experiência de
modernismo avançado, suas bases estão no paisagismo moderno, entretanto avançam
para linguagens de transição, aproximando-se do contemporâneo.
Segundo Barra (2006), Peter Walker e Melanie Simo consideram Isamu
Noguchi, Luís Barragán e Roberto Burle Marx os mais provocativos paisagistas
contemporâneos. Realizaram obras extensas e autorais, não deixando seguidores, mas
sendo fonte de inspiração para gerações de paisagistas. Como observado por Oliveira
(2008) a obra de Burle Marx é um exemplo, na qual os três princípios básicos
estabelecidos por Tunnard (ver p.18) são alcançados com maestria, no entanto, a obra
desses três paisagistas não se resumem aos princípios modernos e também não são
somente a aplicação de princípios artísticos na concepção de jardins, criaram modelos
espaciais próprios que ultrapassam as fronteiras do moderno sendo que sua influência é
bastante presente na obra dos arquitetos paisagistas contemporâneos.
43
No caso do paisagismo moderno no Brasil é notável a presença de um grande
número de projeto de praças. A experiência do paisagismo moderno que se inicia em
jardins da mesma forma que na Europa e nos Estados Unidos, conforme se observa no
exemplo de Mina Warchavchick, a partir de Waldemar Cordeiro vai se ampliando para
as praças. Roberto Burle Marx com sua atividade prolífica de cinqüenta anos de
atividade em projetos paisagísticos, introduz e consolida o paisagismo como prática
profissional no Brasil. É notável a diferença formal e conceitual entre o paisagismo
moderno europeu e as experiências empreendidas por Burle Marx, no que diz respeito
às curvas. Uma das questões básicas do pensamento moderno europeu era a negação dos
“jardins paisagísticos” curvilíneos, o que não ocorreu no Brasil, onde a discordância
maior em relação aos antecedentes se dava pela negação das geometrias rígidas e eixos
do jardim eclético. Através de sua obra e experiência Burle Marx influenciou várias
gerações de paisagistas brasileiros e apontou os caminhos que viriam a seguir.
44
CAPÍTULO 2:
O CONTEMPORÂNEO NA ARQUITETURA E NO
PAISAGISMO
O número de materiais e espécies vegetais é
o estritamente necessário a articular a estrutura plástica˜
Waldemar Cordeiro − 1958
O parque tradicional é uma réplica da natureza
equipada com um mínimo de instalações requeridas para distração do público:
(nosso)programa apresenta um denso bosque de instrumentos sociais,
equipado com um mínimo de elementos naturais.
Rem Koolhaas − 1982
45
2.1 Introdução
Neste capítulo discute-se a contribuição dos pressupostos teóricos da arquitetura
contemporânea sobre o paisagismo, por meio da investigação das investigações teóricas
de arquitetos e suas experiências em obras de paisagismo, seguida do estudo de projetos
de dois momentos de inflexão no paisagismo contemporâneo.
Sobre a contribuição do pensamento contemporâneo na arquitetura examina-se o
momento de ruptura com o moderno, por meio das idéias de Robert Venturi. Em
seguida apresentam-se as idéias expressas em ensaios críticos de Peter Eisenman e sua
experiência em projetos de arquitetura e paisagismo. Conclui-se esta abordagem com a
apresentação das idéias e obras de Bernard Tschumi, que tendo vencido o concurso do
Parc de La Villette é o responsável pela primeira obra de paisagismo de grande porte,
em que são materializados os novos paradigmas contemporâneos.
São apresentados três projetos finalistas do Concurso do Parc de La Villette, que
são os de Zaha Hadid, do escritório OMA de Rem Koolhass e o de Bernard Tschumi, na
busca dos traços do pensamento contemporâneo na concepção de projetos de paisgismo,
da mesma forma são estudados três projetos integrantes do programa de requalificação
urbana da cidade de Barcelona, na Espanha, que são os projetos da Plaça dels Paisos
Catalans, o Parc Estácio del Nord e o Parc del Clot, ilustrando-se com este conjunto o
momento de inflexão do paisagismo moderno para o contemporâneo.
2.2 Arquitetura Contemporânea e sua relação com o
paisagismo
O capítulo 1 mostrou que as experiências de se formatar uma nova linguagem
moderna se deram no âmbito dos jardins residenciais, alguns dos quais foram resgatados
e divulgados no final do século XX. Os jardins representavam a tentativa de uma
resposta coerente com os novos pressupostos da arquitetura moderna. Esta relação que é
bastante evidente no paisagismo moderno, também se apresenta na relação entre a
arquitetura e o paisagismo contemporâneo, ensejando uma investigação sobre a gênese
da arquitetura contemporânea.
46
2.2.1 Robert Venturi – A ruptura com o moderno
Para Moneo (2008), o marco da ruptura com o pensamento moderno se deu com
a publicação do livro de Robert Venturi
35
, Complexity and Contradiction in
Architecture (1966). Segundo Vincent Scully, influente crítico da área na época, tratava-
se do “escrito mais importante sobre o modo de fazer arquitetura desde Por uma
arquitetura de Le Corbusier, publicado em 1923” (MONEO, 2008, p.51).
O desgaste sofrido pelo modernismo pela sua absorção como “vocabulário
inevitável”, por empreendedores e instituições, e sua repetição infinita, em contextos
nem sempre adequados, trouxeram grandes descontentamentos, expressos pela primeira
vez de forma articulada no livro-manifesto de Venturi.
Os arquitetos não podem mais se deixar intimidar pela linguagem puritanamente moralista da
arquitetura moderna ortodoxa. Prefiro os elementos híbridos aos puros, os que aceitam
compromisso ao “limpos”, os distorcidos aos “óbvios”, os ambíguos aos “articulados”, os
deturpados que ao mesmo tempo são impessoais aos tediosos que ao mesmo tempo são
“interessantes”, os convencionais aos “projetados”, os que buscam acordo aos “excludentes”,
os redundantes aos simples, os que nos falam do passado aos que são inovadores, os
inconsistentes e equívocos aos diretos e claros. Defendo a vitalidade confusa ante a
necessidade óbvia. Manifesto-me em prol do non sequitur e proclamo a dualidade.
Sou a favor da riqueza de significados ante a clareza de significado: das funções inexplícitas
ante as explícitas. Prefiro “ambos e ao mesmo tempo” a “um e outro”, o branco e o preto, e
algumas vezes o cinza, em lugar do branco ou do preto. Uma arquitetura válida conhece
muitos níveis de significado e diversos focos: seu espaço e seus elementos se lêem e
funcionam de diversas formas ao mesmo tempo.
Porém uma arquitetura de complexidade e contradição tem uma especial obrigação para como
o todo: sua verdade deve estar na totalidade ou nas suas implicações. A arquitetura deve
incorporar a difícil unidade da inclusão, mais do que assumir a fácil unidade do exclusivo.
Mais não é menos (VENTURI, 1995, p.1 e 2).
O centro da crítica de Venturi era quanto à indiferença do modernismo a tradição
disciplinar arquitetônica e a sua relação com o contexto; argumentava que a vida
contemporânea não admitia projetos simplificados, que os projetos deveriam ser
multifuncionais e que a arquitetura deveria transmitir significado.
35
Robert Charles Venturi (Filadélfia, Estados Unidos, 1925) Arquiteto norte-americano vencedor do Prêmio Pritzker
de 1991. Formou-se em Princeton em 1947. Trabalhou com Eero Saarinen e Louis Kahn antes de formar sua própria
firma. Lecionou na University of Pennsylvania, onde conheceu sua esposa Denise Scott Brown, que se tornou
parceira da firma em 1967. Venturi foi um crítico ferrenho da arquitetura moderna, publicando seu manifesto
Complexity and Contradiction in Architecture em 1966, e mais tarde, em 1972 o livro Learning from Las Vegas
tidos como bases das transformações que ocorreriam na arquitetura nas décadas de 1970 e 1980.
47
Na mesma época, na Itália, Aldo Rossi
36
publica o livro L’architettura della
città (1966), também uma crítica ao modernismo, especialmente em seus aspectos
urbanísticos; no livro, Rossi aborda os aspectos tipológicos, estruturais e históricos na
formação da cidade. (MONEO, 2008)
A reavaliação do papel da história, o retorno do uso de ornamentação, de cores
contrastantes, como forma de crítica ao modernismo foram as estratégias da nova forma
de se fazer arquitetura do movimento que ficou conhecido genericamente como “pós-
moderno”.
Robert Venturi, Aldo Rossi, Charles Moore
37
, Michael Graves
38
, Philip
Johnson
39
e Ricardo Bofill
40
foram os principais nomes da arquitetura pós-moderna que
teve seu auge nos anos 1970 e 1980. A arquitetura pós-moderna no sentido estilístico do
36
Aldo Rossi (Milão, Itália, 1931 – 1997). Arquiteto e teórico italiano, formado pela Escola Politécnica de Milão, em
1959. Seus principais livros foram: L’architettura della città e Autobiografia Scientifica. O termo genius loci não foi
inventado por Aldo Rossi, embora ele o cite no seu livro a propósito das construções romanas. Os Romanos
entendiam que um edifício só deveria ser construído se o lugar a ele destinado estivesse sob a protecção do genius
loci, uma divindade ou o espírito do lugar. Em 1990 foi ganhador do Prêmio Pritzker pelo conjunto de sua obra.
37
Charles Willard Moore (Michigan, Estados Unidos, 1925 – Texas, Estados Unidos, 1993). Arquiteto americano,
professor, escritor. O design de Moore era muito peculiar, incluía combinações de cores contrastantes, grafismo,
colisões de estilos, a reuso de soluções histórico-esotéricas e a utilização de materiais não tradicionais como plástico,
alumínio, telhas de platina e letreiros de néon; como resultado, seu trabalho provoca excitação, exige atenção e, por
vezes, se aproxima do kitsch. Seu projeto mais típico é a Piazza d’Italia, Nova Orleans, 1975-78 Essas características
fizeram de Moore um dos primeiros inovadores pós-modernos, juntamente com Robert Venturi e outros.
38
Michael Graves (Indianápolis, Estados Unidos, 1934). Formado em Cincinnati, teve uma curta temporada
trabalhando no escritório do designer e arquiteto George Nelson, para logo ir para Roma, por ter recebido o Prix de
Rome, onde passou dois anos estudando pintura e desenho e entrando em contato com os grandes clássicos teóricos e
críticos de arquitetura que influenciaram grandemente sua carreira. Michael Graves utilizava cores com uma
preocupação peculiar, por exemplo, a terracota, que representa a terra, geralmente é visto perto da base das suas
estruturas, o azul utilizado como uma metáfora para o céu, é muitas vezes escolhida para o teto. Michael Graves era
obcecado com a comunicação do significado de cada elemento do seu trabalho, suas cores suaves reforçam esta
preocupação de simbolismo.
39
Philip Cortelyou Johnson (Ohio, Estados Unidos, 1906 Connecticut, Estados Unidos, 2005). Estudou artes e
filosofia na Universidade de Harvard (1923-30) e foi o primeiro diretor do Departamento de Arquitetura do Museu de
Arte Moderna (MOMA) em 1930-36. Voltou a Harvard para estudar arquitetura com Gropius e Breuer (1942-6) e fez
parcerias com Richard Foster e John Burges. Construiu a Casa de Vidro em New Canaan influenciado pela Casa em
Plano (1945) de Mies van der Rohe. Com a Sinagoga Kneses Tifereth Israel em Port Chester, New York (1954-6)
ampliou o espectro de seu ecletismo. Cria controvérsia ao usar elementos barrocos na estrutura de arranha-céu.
Durante sua trajetória foi representante do Estilo Internacional, Pós-Modernismo, e até Deconstrutivismo, levando
críticos a dizerem que é um seguidor das tendências, e não um arquiteto com estilo próprio. Ganhou o Prêmio
Pritzker (1978) e medalha de ouro do American Institute of Architects (1978).
40
Ricardo Bofill Levi (Barcelona Espanha, 1939). Estudou na Escola Técnica Superior de Arquitectura de Barcelona,
de onde foi expulso, em 1957, por suas actividades políticas, em seguida, viajou para a Suíça e continuou os seus
estudos na Universidade de Genebra. Em 1963 criou o Taller de Arquitectura, um estúdio que conta com sociólogos,
além de arquitectos e engenheiros. Bofill é um dos máximos representantes do estilo pós-moderno da arquitectura
contemporânea. Em seus desenhos mantém as linhas claras do estilo moderno, mas abandona as formas frias que
caracterizam outras tendências modernas. Consegue-o incorporando nos seus edifícios elementos clássicos, como
colunas ou arcos, que ao público leigo dão a sensação de familiares e entendíveis. Boffil é autor de uma extensa obra
teórica, e entre os muitos livros que escreveu destacam-se Espacio y vida, La ciudad del arquitecto e El dibujo de la
ciudad.
48
termo foi esvaziada pela repetição sem critério do uso de frontões e outros elementos,
profusão de materiais e cores, etc., o que distorceu seu intento inicial de crítica aos
princípios modernistas e a transformou em um padrão comercial.
Nas praças projetadas para Filadélfia e Washington, Robert Venturi utiliza
partido semelhante: o desenho de piso com a planta da cidade como um desenho
abstrato utilizando duas cores; entretanto carregado de significado e reconhecível como
um espaço distinto pelos moradores.
Em Franklin Court, Filadélfia, a história do presidente é recuperada no perfil da
casa em meio a um jardim (fig.58); na Western Plaza, um micro Capitólio colocado na
perspectiva do Capitólio real é o único elemento vertical, num jogo gráfico de praças
quase bidimensionais (fig.59).
Fig. 58 - Franklin Court – Filadélfia – 1976
Robert Venturi
Fonte: Favole, 1995, p. 114
Fig. 59 - Western Plaza - Washington – 1980/84
Fonte: Favole, 1995, p.115
Os arquitetos pós-modernos procuraram resgatar os estilos do passado recente,
mas como fazê-lo em uma sociedade multicultural, a não ser por meio da colagem. Uma
estratégia de justaposição de fragmentos veio substituir a idéia forçada de harmonia e
unidade da arquitetura moderna. Conceitos como: colisão – colagem de fragmentos do
passado e de utopias, e fragmentação – condição da cidade pós-moderna, apontam
novos caminhos para a arquitetura e o urbanismo.
49
2.2.2 Peter Eisenman - A invenção do contexto
A obra peculiar de Peter Eisenman
41
expressa seu desejo de fazer com que a
teoria preceda a prática. Após concluir seu mestrado na Universidade de Columbia, vai
para Cambridge, na Inglaterra, completar sua formação onde, por influência de Colin
Rowe
42
estuda a arquitetura moderna. Segundo MONEO (2008), é possivelmente lá,
que Eisenman percebe que a arquitetura moderna não se realizou em sua plenitude, em
seus trabalhos iniciais procura recuperar os ideais da modernidade. Acredita que os
arquitetos modernistas se desviaram do objetivo de uma arquitetura pura ao se
vincularem ao funcionalismo. Para ele a arquitetura deveria ser livre de tudo, sem
contaminação nenhuma – nem do lugar, nem da função, nem dos sistemas construtivos.
Eisenman coloca-se, portanto, numa posição oposta à de Venturi, que reivindicando a
condição comunicativa da arquitetura, sugeria que esta poderia ser capaz de recuperar a
expressão de valores culturais latentes dentro de determinado grupo social. Eisenman não quer
nem ouvir falar do simbólico (MONEO, 2008, p.139).
Nesta busca de uma linguagem autônoma para a arquitetura, durante dez anos
Eisenman realiza uma pesquisa nos projetos de casas que são numeradas de I a XI,
algumas delas não construídas, vê-se nitidamente a herança formal da arquitetura
moderna, entretanto, sem nenhuma relação com os conceitos modernos (fig.60 e 61). Ao
longo desse trabalho, Eisenman elabora uma linguagem em que a sobreposição, o
deslocamento, as simetrias e anti-simetrias, os recortes, a distinção entre os espaços
cheios e vazios, etc. se misturam e se transformam em mecanismos formais, uma nova
linguagem particular com a qual o arquiteto se distingue.
Há, portanto, neste primeiro Eisenman uma resistência ao figurativismo que convém
sublinhar: a geometria como alternativa à figura, à imagem. Uma geometria na qual os
componentes abstratos da retícula – o ponto, a linha e o plano – são utilizados como elementos
notacionais mínimos que permitem o surgimento de categorias citadas que, diga-se de
41
Peter Eisenman (Newark, Estados Unidos, 1932). Arquiteto e teórico da arquitetura norte-americano.Formado em
Cornel, com mestrado na Universidade de Colúmbia e doutorado em Cambridge, Inglaterra. A partir de 1967, começa
a fazer diversas pesquisas nos projetos das casas I a XI, experimentando assim diferentes metodologias compositivas,
das quais a principal, é a trama ou espécie de grade cartesiana, que até hoje utiliza para compor volumetria e dividir
seus espaços. Para Eisenman, espaço, função e mobiliário devem ser estruturados a partir de um sistema mental
coordenado. Tornou-se um dos precursores da arquitetura desconstrutivista na década de 1980. O filósofo Jacques
Derrida influenciou imensamente a arquitetura de Eisenman, com quem fez parceria em alguns trabalhos.
42
Colin Rowe (Rotherham, Inglaterra, 1920 – Virgínia, Estados Unidos, 1999). Historiador de arquitetura, crítico,
teórico e professor inglês, naturalizado americano. Conhecido como o mais influente intelectual no mundo da
arquitetura e do urbanismo na segunda metade do século XX e particularmente no campo do planejamento de
cidades, revitalização de cidades e desenho urbano.
50
passagem, logo se transformam em mecanismos de projeto, adquirindo, dessa forma, uma
condição instrumental e operativa (MONEO, 2008, p.141).
Fig. 60 - Diagramas Casa VI – Cornwall,
Connecticut, 1975
Peter Eisenman
Disponível em: www.diagramas-pe.blogspot.com
Fig. 61 - Maquete Casa II - Cornwall,
Disponível em: www.extratos.blogspot.com
O projeto de intervenção em Cannaregio, em Veneza, 1978 (fig.62 e 63)
representa um ponto de inflexão na obra de Eisenman, como o próprio arquiteto
comenta.
O projeto de habitação do Cannaregio em Veneza foi o primeiro a empregar o que pode ser
chamado de um texto externo, pois foi o primeiro de uma série de seis projetos nos quais
considerei o lugar como “exterioridade” [...] Isso era condizente com a minha atitude
psicológica naquela época, quando tentava transferir meu centro psicológico do pensamento ao
sentimento, da cabeça ao corpo e à terra (EISENMAN apud MONEO, 2008, p.178).
Neste projeto Eisenman descobre o potencial do valor do lugar e do solo, coisa
que até então, segundo seus princípios, não deveriam intervir na arquitetura. O arquiteto
que ignora o contexto vê-se forçado, neste projeto a inventá-lo. Utilizando a malha
universal que Le Corbusier utilizara em seu projeto para o hospital, e uma segunda
malha, girada, resultante da união das duas pontes do entorno, Eisenman projeta, nas
intersecções das malhas, estruturas semelhantes às das casas conceituais, utilizando sua
linguagem peculiar. Desta forma, ao invés de utilizar o contexto como referência,
Eisenman passa a inventar as condições aonde o projeto irá se implantar. A utilização de
malhas de referência será a partir dessa experiência, uma constante no seu trabalho,
estendendo-se inclusive ao plano vertical das fachadas.
51
Fig. 62 - Cannaregio Town Square – Veneza - 1978
Disponível em: www.archinfo.it
Fig. 63 - Cannaregio Town Square – maquete
Disponível em: www.archinfo.it
No jardim do museu de Castelvecchio, uma instalação construída em Verona em
2003 (fig.64), Eisenman aplica os conceitos desenvolvidos em suas indagações teóricas
e em suas experiências construtivas na busca de uma lógica interna à arquitetura. O
museu foi reconstruído após a Segunda Guerra Mundial pelo arquiteto Carlo Scarpa.
Eisenman desenha o jardim inspirado por, e reagindo ao desenho de Scarpa. Eisenman
inventa uma espécie de escavação que descobre os eixos da estrutura interna do Museu,
os eixos de Scarpa, interseccionados pelos eixos de Eisenman, sugerem uma estrutura
pré-existente.
Fig. 64 -
Il giardino dei passi perduti – Museu
Castelvecchio - Verona, Itália, 2003
Peter Eisenman
Fonte: www.landliving.com
Fig. 65 - Il giardino dei passi perduti - detalhe do
piso
Disponível em: www.architectook.net
Eisenman utiliza o mesmo material que Scarpa utilizara na restauração: cimento
lixado com juntas de pedra branca e elementos pintados de vermelho, que adentram o
52
Museu (fig.65). Cria uma paisagem artificial, na qual inclui a topografia (fig.66 e 67),
citando suas obras anteriores, numa obra típica do arquiteto, reinventando um lugar de
memória entre a ficção e a realidade.
Fig. 66 - Il giardino dei passi perduti - aspecto da
topografia
Disponível em: www.flickr.com
Fig. 67 - Il giardino dei passi perduti - vista geral
Disponível em: www.flickr.com
2.2.3 Bernard Tschumi - Evento, espaço e movimento
Bernard Tschumi
43
lecionou e escreveu artigos e livros nos quais desenvolve
seu pensamento peculiar sobre a arquitetura contemporânea, durante treze anos. Em
Architecture and disjunction” (1975-1991), desenvolve o conceito de disjunção –
discrepância entre uso, forma e valores sociais na arquitetura contemporânea, e
considera este elemento como uma situação altamente “arquitetural”. No ano de 1975
organizou a exposição "A Space, a Thousand Words", em Nova Iorque.
De 1977 a 1981, publicou Manhattan Transcripts, propondo um novo conceito de
"Notação Arquitetônica".
43
Bernard Tschumi (Lausanne, Suiça, 1944) Arquiteto, escritor e professor, normalmente associado ao
descontrutivismo. Trabalha e vive em Nova Iorque e Paris. Estudou em Paris e em Zurich na ETH (Instituto Federal
de Tecnologia) onde obteve graduação em Arquitetura em 1969. Lecionou em Universidades de Londres e Nova
Iorque.
53
Segundo Tschumi “Arquitetura não é simplesmente a respeito de espaço e
forma, mas também sobre eventos, ação e o que acontece no espaço” (TSCHUMI apud
RENNÓ, 2006). Defende a idéia de que a arquitetura contemporânea deveria “projetar
as condições” ao invés de “condicionar o projeto”. Esta confrontação entre espaço e uso
e a disjunção entre os dois termos significa que a arquitetura é constantemente instável,
mesmo porque na sociedade contemporânea, marcada pelo dinamismo, os próprios
programas são instáveis.
Em 1983, Bernard Tschumi abre seu atelier em Paris, após vencer o Concurso
para o Parc de La Villette, no qual pode materializar alguns de seus conceitos
formulados anteriormente. Tschumi participou da exposição de 1988, no Museu de Arte
Moderna (MoMA) de Nova Iorque, Desconstrutivist Architecture, organizada por
Philip Johnson e Mark Wigley
44
, juntamente com Peter Eisenman, Frank O. Gehry
45
,
Daniel Libeskind
46
, Rem Koolhaas
47
, Zaha Hadid
48
e Coop Himmelb(l)au
49
. O
44
Mark Antony Wigley (Nova Zelândia - ). Arquiteto, decano da Graduate School of Architecture, Planning and
Preservation na Universidade de Columbia em Nova Iorque.Em 2005, juntamente com Rem Koolhaas e Ole Bouman,
fundou o Volume Magazine (revista de arquitetura).
45
Frank Owen Gehry, nascido Ephraim Owen Goldberg (Toronto, Canadá, 1929). Arquiteto canadense, naturalizado
americano, formou-se na University of Southern California em arquitetura, estudou planejamento urbano em
Harvard. Gehry é conhecido como um dos principais expoentes do desconstrutivismo, pelo seu design arrojado na
arquitetura, repleto de estruturas curvas, geralmente em metal. Sua obra mais famosa é o Museu Guggenheim Bilbao,
em Bilbao, Espanha, todo feito revestido de titânio. Ganhador do Pritzker Prize em 1989, atualmente vive em Los
Angeles.
46
Daniel Libeskind (Lódź, Polónia, 1946). Arquiteto polonês, naturalizado americano. Estudou música em Israel e
Nova Iorque antes de se formar em Arquitetura pela Cooper Union for the Advancement of Science and Art em Nova
Iorque. É conhecido por introduzir um novo discurso crítico em arquitetura e por sua abordagem multidisciplinar.
Considerado um dos expoentes do desconstrutivismo, dentre suas obras reverenciais estão: O Museu Judaico de
Berlim e de Copenhague. Atualmente trabalha no projeto da Torre da Liberdade para a Zona Zero de Nova Iorque.
47
Rem Koolhaas (Rotterdam,1944).Passou parte da infância na Indonésia (1950-6) e Amsterdã (1958-62) e trabalhou
como jornalista (1968-72), antes de estudar na Architectural Association em Londres. Ganhou experiência prática na
Universidade Cornell com o pós-modernista Oswald Mathias Ungers (1972-73). Formou o OMA – Office for
Metropolitan Architecture em 1975. Em 1980 Koolhaas abriu escritório em Rotterdam usando Londres como base
para seus trabalhos. Admite que sua estética foi influenciada pelas pinturas de Dali e o Surrealismo sendo
considerado um Desconstrutivista É autor de “Delirious New York” (1978), “S,M,L,XL” (1995), entre outros. Desde
1990 leciona na Universidade Harvard no curso de Design. Recebeu o Prêmio Pritzker em 2000.
48
Zaha Hadid (Bagdad, 1950). Arquiteta iraquiana identificada com a corrente desconstrutivista da arquitetura.
Formou-se em Matemática na Universidade Americana de Beirute. Após se formar, passou a estudar na Architectural
Association de Londres. Depois de se graduar em arquitetura tornou-se membro do Office for Metropolitan
Architecture (OMA), trabalhando com seu antigo professor, o arquiteto Rem Koolhaas. Em 1979, passou a
estabelecer prática profissional própria em Londres. Em 2004, Hadid se tornou a primeira mulher a receber o Prêmio
Pritzker de Arquitetura, pelo conjunto de sua obra.
49
Coop Himmelb(l)au (1968). É uma cooperativa de arquitetos fundada inicalmente em Viena, Áustria, e atualmente
com escritórios em Los Angeles, Estados Unidos e Guadalajara, México.O nome da firma Himmelblau traduzido do
alemão quer dizer Céu azul, foi fundada por Wolf Prix, Helmut Swiczinsky e Michael Holzer e ganhou fama ao
lado
de Peter Eisenman, Zaha Hadid, Frank Gehry com a exposição "Deconstructivist Architecture" no Museu de Arte
Moderna de Nova Iorque.
54
desconstrutivismo, assim como o pós-modernismo situa-se em oposição à racionalidade
ordenada do modernismo, assume uma postura de confrontação com a arquitetura e a
história arquitetônica, rejeitando também o uso do ornamento, trabalha a geometria
aplicada aos aspectos funcionais, estruturais e espaciais das construções, aprofundando
idéias postuladas por Eisenman e Tschumi.
Fig. 68 - Blue Residential Tower, Nova Iorque,
Estados Unidos, 2007
Bernard Tschumi
Disponível em: www.dezeen.com
Fig. 69 - Concert Hall and Exhibition Complex.
Rouen, França, 1998 - 2001
Bernard Tschumi
Disponível em: www.iamjoa.xanga.com
2.2.4 O neomoderno - A continuidade do espírito moderno
Distante da discussão sobre a contemporaneidade que se travava no contexto
mundial, no Brasil a arquitetura contemporânea realiza um percurso de continuidade
com o período anterior recente que é a arquitetura moderna. Nesta evolução alguns
fatores foram apontados por diversos pesquisadores, com enfoques diferentes, mas que
apresentam similaridades. Bastos (2003) aponta como idéia dominante no pensamento
nacional: O entendimento de uma arquitetura contemporânea brasileira que se coloca
em continuidade e não como ruptura com a arquitetura moderna, valorizando coerência
construtiva, adequação climática, adequada relação entre custo e benefício. (2003,
p.255).
Bastos (2003) distingue seis traços característicos da Arquitetura Brasileira
Contemporânea: (i) coerência construtiva; (ii) adequação física e climática; (iii)
preeminência da realidade existente, do contexto; (iv) inserção cuidadosa do edifício no
55
meio urbano ou natural; (v) qualificação dos espaços internos e externos; e (vi)
referências à arquitetura popular e tradicional.
Destas características colocam-se em relevo as que parecem de importância
crucial e que se replicam também de certa forma, no paisagismo contemporâneo.
Os itens (iii) e (iv) citados por Bastos (2003) implicam numa mudança radical de
atitude frente ao projeto. No modernismo o foco do projeto era o edifício isolado, e na
corrente modernista do internacional style, isso foi radicalizado a ponto do edifício
poder estar em qualquer contexto urbano ou país. Esta descontextualização total
provocou muitas críticas, entretanto na arquitetura brasileira, gradativamente o
agenciamento começou a tornar-se importante, como um movimento de afastamento do
objeto do projeto e uma ampliação da escala, uma visão mais geral. Sintomaticamente,
os projetos passaram a ser mais completos, o paisagismo passou a ser incorporado ao
projeto arquitetônico.
Esse movimento de ampliação também ocorre com o paisagismo, originalmente
relacionado apenas ao desenho de jardins e praças, considerando apenas os aspectos
estéticos e cênicos, ao longo do tempo foi abarcando escalas e propostas maiores,
incorporando as variáveis sócio-econômicas mais próprias do campo do desenho
urbano.
O interesse crescente na recuperação da nova vida nos espaços públicos é certamente uma
idéia instigante. Em uma sociedade na qual cada vez mais a vida diária acontece na esfera
privada (...) existem sinais claros que a cidade e os espaços urbanos receberam um novo e
influente papel como espaço e fórum públicos (GEHL
e GEMZOE, 2002, p.20).
Um segundo paralelo entre a arquitetura e o paisagismo contemporâneos é
quanto à adequação física e climática. Nas décadas de 1980 e 1990, a crise energética e
as preocupações mundiais com a saúde do planeta, a agenda 21 e movimentos
ecológicos se refletiram na arquitetura e também no paisagismo.
“Se a arquitetura do século XIX fosse definida pela construção em metal – o Palácio de Cristal
e assim por diante – e a do século XX, pelo despojamento modernista na decoração e a
superfície limpa, Então a arquitetura do século XXI deveria ser sobre humanismo, sobre a
percepção de que estamos construindo em um mundo frágil. Sustentabilidade não tem a ver só
com energia, mas com toda a história, a cidade” (Renzo Piano in Folha de São Paulo, 2008).
Outro traço característico do paisagismo contemporâneo é o tratamento dos
espaços exteriores como arquitetura da paisagem, o que no paralelo traçado entre
arquitetura e paisagismo contemporâneos está sugerido na qualificação dos espaços
56
internos e externos. Tanto na arquitetura quanto no paisagismo contemporâneos,
paralelo ao movimento de afastamento e ampliação da escala, houve um movimento de
aproximação no projeto, que foi detectado por Bastos (2003), mas que também é
bastante evidente nos projetos recentes de paisagismo que apresentam um detalhamento
precioso.
Este processo de continuidade do moderno também se verifica na Europa, e mais
especificamente na Espanha, onde a obra teórica e a prática profissional do arquiteto
Hélio Piñon apresenta uma aproximação com a arquitetura contemporânea brasileira.
Coincidentemente ele organiza um livro sobre a obra do arquiteto Paulo Mendes da
Rocha, em que expõe seu pensamento sobre a arquitetura exemplificando com as obras
do arquiteto paulista. Mahfuz (2003) apresentando a Praça da Sinagoga projeto de Hélio
Piñon para cidade de Onda, Espanha (2001) identifica através da análise do projeto,
alguns critérios:
Do estudo deste projeto podem-se tirar as seguintes conclusões: 1. O projeto de espaços
abertos é também arquitetura, e sendo assim pode ser resolvido com os mesmos recursos
projetuais aplicados a projetos de edificação ou desenho urbano; 2. Não obstante o uso de
vegetação, qualquer espaço aberto (jardim, praça, largo, parque, etc.) é artifício, produção
cultural. Portanto, não faz sentido tentar imitar a natureza; o elemento natural deve ser tratado
de modo a enfatizar o caráter artificial desse espaço. Plantas, pisos, bancos e luminárias são
igualmente materiais de que dispõe o arquiteto; 3. Se é artifício e, mais especificamente,
arquitetura, todo espaço aberto deve ser ordenado de modo claro e inteligível, permitindo que
seus usuários se envolvam com ele não só com o corpo, mas também com o intelecto
(MAHFUZ, 2003, p.1).
Esta corrente de pensamento da arquitetura de continuidade do moderno retoma
os ideais modernos de se construir um arcabouço teórico em que a arquitetura é
explicada pela realidade da obra e não como algumas correntes contemporâneas que
buscam analisar a obra arquitetônica com base em conceitos filosóficos, biológicos,
psicológicos, etc.. Assim sendo a importância da forma é retomada, a definição formal
volta a ser a preocupação central do projeto.
...enquanto na arquitetura tradicional todos os subsistemas convergem e se confundem com a
estrutura formal, a sua independência na arquitetura moderna permite o abandono da imitação
como procedimento fundamental, possibilitando o uso de esquemas ordenadores de qualquer
origem, até da própria história da arquitetura (MAHFUZ, 2006, p.23).
Esta relação do projeto pensado de modo autônomo, segundo estratégias
próprias da arquitetura, se transpõe em certa medida para os projetos de paisagismo,
conforme se verificará ao longo do estudo.
57
2.3 Momentos de inflexão no paisagismo
Não se pode falar propriamente de uma ruptura, mas sim de uma inflexão no
campo teórico do paisagismo, já que muitos dos conceitos desenvolvidos pelo
paisagismo contemporâneo já estavam presentes nas experiências dos jardins modernos.
A compreensão da paisagem como artifício e a inspiração nas artes plásticas,
elementos presentes na criação dos jardins modernos, somam-se aos novos conceitos da
arquitetura contemporânea formando a base de uma nova concepção de paisagismo.
Neste momento de inflexão, dois fatos ocorridos na Europa, temporalmente
próximos (Concurso para o Parc de la Villette – 1982 e intervenções de renovação
urbana em Barcelona – 1970/80) contribuíram para levantar a discussão e divulgar os
projetos que representam uma nova maneira de se pensar o projeto de paisagismo, com
uma ênfase especial para o espaço público.
2.3.1 O Parc de La Villette: novos paradigmas para o paisagismo
O primeiro concurso para o Parc de la Villette foi realizado em 1976, no qual
foram atribuídos vários prêmios e menções, no entanto não houve claramente um
ganhador. Segundo Álvares (2007), a maioria dos projetos apresentava soluções
pseudo-paisagísticas ou pseudo-organicistas, apenas uns poucos se atreviam a refletir
sobre a crise do modernismo.
La Villette, situado a noroeste da cidade é uma região de antigos matadouros e
mercados de carne, estava ocupado por antigos galpões napoleônicos e edifícios
industriais, dentre os quais se destacam a Grande Halle, estrutura típica do século XIX
em ferro e vidro e a Salle dês Ventes, estrutura de concreto que mais tarde seria
convertida em Cidade das Ciências.
Em 1982, resolveu-se convocar um segundo concurso, sob o lema de “Um
parque urbano para o século XXI”, no qual o paisagista brasileiro Roberto Burle Marx
foi convidado para presidir um júri internacional formado por, entre outros: Vittorio
Gregotti
50
, Renzo Piano
51
e Arata Isozaki
52
. Em dezembro do mesmo ano, a comissão
50
Vittorio Gregotti (Novara, Itália, 1927). Arquiteto italiano, formado em 1952 pela Escola de Arquitetura do
Instituto Politécnico de Milão, responsável por vários projetos importantes como o do Estádio Olímpico de
Barcelona, o Centro Cultural de Belém em Lisboa e o Teatro Arcimboldi de Milão.
58
de jurados escolheu nove primeiros prêmios ex aequo, e convidou seus autores a
desenvolverem seus projetos. Em 25 de março de 1983, finalmente foi escolhido
Bernard Tschumi como mestre de obras do parque.
O concurso levantou uma grande discussão sobre o paisagismo, e ao contrário do
concurso anterior apresentou diversas contribuições para uma reflexão séria sobre a
nova condição do paisagismo na cidade contemporânea, suas novas formas e novos
métodos. A participação dos maiores escritórios de arquitetura colaborou para o
surgimento de propostas de alto nível de complexidade resultando em inúmeros
caminhos que mais tarde foram desenvolvidos em propostas para outras intervenções
paisagísticas.
Segundo Álvares (2007), três projetos se diferenciavam radicalmente dos
demais, e assumiam a condição de palimpsesto
53
: o projeto de Zaha Hadid, o projeto do
grupo OMA
54
liderado pelo arquiteto Rem Koolhaas e o projeto vencedor de Bernard
Tschumi. Os três partiam de alusões às vanguardas pictóricas e arquitetônicas do século
XX, os três tentavam experimentar novas maneiras de se entender o projeto de
arquitetura como uma obra aberta e pode-se observar em todos eles uma relação com a
cidade e o desenho urbano.
2.3.1.1 O projeto de Zaha Hadid
O projeto de Zaha Hadid apresentava uma clara inspiração na obra do pintor
Wassily Kandinsky. “O parque de Hadid era uma paisagem de linhas tensionadas, a
ponto de iniciar um movimento – uma implantação formal ou conceitual -, a ponto de
serem lançadas, como flechas de um arco pintado pelo mestre russo.” (ÁLVARES,
2007, p.408).
51
Renzo Piano (Gênova, Itália, 1937). Arquiteto italiano, formado em 1964 pela Escola de Arquitetura do Instituto
Politécnico de Milão. Adquiriu experiência internacional ao trabalhar com Louis Kahn, partidário da arquitetura high-
tech, entre suas obras mais conhecidas destaca-se o Centro Georges Pompidou, em Paris, em parceria com Richard
Rogers e o Aeroporto Internacional de Kansai, no Japão.
52
Arata Isozaki (Kyushu, Japão, 1931). Arquiteto formado pela Universidade de Tóquio em 1954, tendo sido aluno
de Kenzo Tange. A partir de finais da década de 1980 evolui para uma posição que evidencia a sua reação aos
princípios do Movimento Moderno. Nos seus edifícios podem encontrar-se referências tão díspares como o
Neoclassicismo ou a Arte Nova.
53
Palimpsesto – colagem historicista.
54
Grupo OMA – Office for Metropolitan Architecture formado em 1975 pelo arquiteto Rem Koolhaas, do qual Zaha
Hadid participou antes de partir para carreira solo.
59
A inspiração de Hadid, entretanto, quando se observa a planta do entorno (fig.
70 e 71) vem do traçado da cidade, em toda sua riqueza e desordem. A arquiteta
“decompõe o caos da cidade (...) para reconstruí-lo de novo e articulá-lo como um ballet
arquitetônico cujos elementos evoluíam sobre o espaço segundo as pautas pictóricas de
Kandinsky”. (ÁLVARES, 2007, p.408). O projeto de Hadid era estruturado em faixas
que abrigavam atividades diversas e que se aproximavam da estratégia utilizada pelo
grupo OMA, ainda que com uma formalização diferenciada.
Fig. 70 - Concurso Parc de La Villette – Proposta
Zaha Hadid - entorno
Fonte: Álvares, 2007, p. 409
Fig. 71 - Concurso Parc de La Villette – Proposta
Zaha Hadid - implantação
Fonte: adaptado Álvares, 2007, p. 409
Hadid propôs uma série de jardins elevados que deslizavam sobre esteiras
mecânicas, e foram projetados para mover-se em órbitas aleatórias ou controladas e
mudar com as estações do ano - uma galáxia virtual de quiosques, áreas de piquenique,
restaurantes e jardins. Assim o movimento dos jardins se torna uma espécie de
caligrafia sobre o terreno. Uma experiência possível neste parque no modo de ver um
corte arquitetônico, como uma fatia vertical através da paisagem, gerando encontros
imprevistos e infinitas justaposições no espaço. Natureza nesse sentido se tornou uma
60
construção artificial e mecanizada, e a paisagem, ao invés de uma pitoresca paysage, um
laboratório de experimentações.
2.3.1.2 O projeto de Rem Koolhaas
O projeto de Koolhaas apresenta semelhanças e diferenças conceituais com o
projeto de Tschumi. O uso de sistemas de tramas sobrepostos como estratégia de projeto
que parece remeter ao desconstrutivismo; entretanto com resultados formais e
conceituais diferentes dos obtidos por Tschumi.
O parque tradicional é uma réplica da natureza equipado com um mínimo de instalações
requeridas para distração do público: aqui, o programa apresenta um denso bosque de
instrumentos sociais, equipado com um mínimo de elementos naturais. OMA/Koolhas apud
(ÁLVARES, 2007, p.425).
O projeto de Koolhaas estabelecia cinco níveis de intervenção, que sobrepostos
comporiam o parque: as faixas, a trama de pontos (confetis), as vias de acesso e
circulações, o nível final e o nível de conexões e elaborações (fig.72).
1- Faixas
2- Tramas
3- Vias e
circulações
4- Nível final
5- Conexões e
elaborações
6- Superposição
Fig. 72 - Concurso Parc de La Villette - Proposta OMA
Fonte: Álvares, 2007, p.425
As faixas eram os elementos principais do sistema e funcionavam como os
pavimentos de um arranha-céu, proposta conceitual desenvolvida por Koolhaas em
Delirious New York (1978). As faixas ocupam a superfície total do parque e podem
acolher todos os acontecimentos programáticos possíveis: jardins temáticos, zonas de
61
jogos, esportes ou espetáculos. Assim como no piso dos arranha-céus, cada faixa admite
um programa diferente e autônomo.
Koolhaas trabalha os elementos vegetais de forma ativa, criando cortinas que
separam as faixas de maneiras diversas, em função do tipo de atividades: arbustos
cortados e fileiras de árvores. Estas cortinas vegetais criam um efeito de profundidade,
todos os elementos vegetais se modelam geometricamente, configurando um jardim
extremamente construído.
A trama de pontos representa os diferentes tipos de pequenas arquiteturas:
quiosques, pontos de venda, postos de bebidas, etc., cada um deles identificado com
uma cor e distribuídos segundo uma freqüência diferente. As vias de acesso e circulação
são formalizadas em dois grandes elementos: o mail e a promenade
55
.
O mail é uma faixa de 25 metros de largura que atravessa o parque de norte a
sul, cruzando o canal; não é só um passeio, mas um sistema de conexão com a cidade. A
promenade liga o resto dos elementos do parque, sua forma geométrica é à base de
fragmentos de esplanadas conectadas entre si e ao mail. O nível final é composto por
elementos de grande escala, alguns já existentes (o Museu, a Geoda, a Grande Halle, a
Cidade da Música, a Rotonda e os Pavilhões) e outros novos como a pirâmide estufa e a
colina artificial.
Fig. 73 - Concurso Parc de La Villette - Proposta
OMA - maquete
Disponível em: www.gsd.harvard.edu
Fig. 74 - Concurso Parc de La Villette - Proposta
OMA - detalhe da maquete
Disponível em: www.oma.eu
As conexões incluem a linha de metrô e a nova linha de teleférico que cruza o
parque, e as elaborações espaciais do interior do parque como o anfiteatro e os jardins
astronômicos constituem o último nível de projeto do OMA. A superposição de todos os
55
Mail e promenade – tradução aproximada caminho expresso e passeio.
62
níveis configura a estratégia final do projeto, coincidente em alguns pontos com a
estratégia do projeto vencedor do concurso (fig.73 e 74), o projeto de Bernard Tschumi.
2.3.1.3 O projeto de Bernard Tschumi
No projeto do Parc de La Villette (fig.76), Bernard Tschumi teve oportunidade
de trabalhar vários conceitos teóricos que vinha desenvolvendo, como a concepção de
que a experiência arquitetônica depende da interação de três níveis: o evento, o espaço e
o movimento. O conceito de evento, como espaço de sobreposição de programas e
acontecimentos, e a idéia de movimento são fortemente explorados.
Transparece também no projeto uma grande influência das idéias e obras de
Peter Eisenman, como por exemplo, a descontextualização do parque por meio do uso
de uma trama geométrica e até mesmo as folies
56
, que em seu formato remetem-se ao
construtivismo russo, mas também à estética das casas conceituais de Eisenman, a
semelhança formal é, sobretudo, em relação ao projeto do Cannaregio Town Square
(fig. 62 e 63).
Segundo Álvares (2007), Tschumi propõe no processo de composição do
parque, três operações: a primeira é a desconstrução do programa estabelecido,
mediante definição de usos e áreas, para posteriormente reconstruí-lo em
acontecimentos diversos; a segunda é a criação de objetos que abriguem estes
acontecimentos, as folies (fig.77), que ativam e marcam o território e a terceira consiste
em sugerir o movimento, por meio das circulações, mediante o uso de linhas curvas.
Com base nessas operações se criam os três sistemas autônomos, que superpostos
configuram o parque.
A estratégia principal do projeto (fig.75) está na sobreposição destes três layers
conceituais: superfícies (água e vegetação), linhas (vias e circulações) e pontos (as
folies). A estrutura organizadora do parque, representada pela grelha abstrata das folies,
pode simular a idéia central de se criar uma estrutura sem centro ou hierarquia, uma
estrutura que iria negar uma relação entre o programa e a arquitetura, conforme
depoimento de Tschumi:
56
Nos jardins do século XVIII se referiam às pequenas construções: pavilhões, templos ou quiosques presentes nos
jardins, Tschumi utiliza a mesma denominação estruturas de aço pintadas de vermelho que demarcam a trama
conceitual e que abrigam múltiplas atividades ou às vezes, nenhuma, aparecendo na paisagem como elemento
escultórico.
63
“Nós tínhamos que projetar um parque: a rede de pontos era antinatural. Nós tínhamos que
preencher um certo número de funções: a rede de pontos era antifuncional. Nós tínhamos que
ser realistas: a rede de pontos era abstrata. Nós tínhamos que respeitar o conceito local: a rede
de pontos era anticontextual. Nós tínhamos que ser sensíveis aos limites do local: a rede de
pontos era infinita. Nós tínhamos que ter conhecimentos prévios de paisagismo: a rede de
pontos não tinha origem, se abria em uma infinita recessão dentro de imagens e sinais.”
Três tramas formais:
Linhas – um continuum
de corredores lineares e
curvos que ao se
sobrepor e cruzar criam
pontos de tensão formal.
Pontos – convertidos em
folies de cor vermelha,
forma cúbica,
expressividade
neoconstrutivista e
diferentes usos possíveis.
Superfícies – uma série
de plataformas verdes e
volumes de diversos usos
culturais e lúdicos.
As sobreposições,
interrelações e conflitos
criados ao coincidir estas
três lógicas – linhas,
pontos e superfícies –
que geram a forma
global do parque.
Fig. 75 - Parc de La Villette - Paris - França - Esquema de layers - 1982
Bernard Tschumi
Fonte : www.deconstrublog.blogspot.com
Montaner (2001) aponta uma influência dos teóricos do desenho urbano sobre
configuração do parque:
Outro elemento importante que está na base do projeto é a interpretação de Kevin Lynch sobre
A imagem da cidade, com seu estabelecimento de cinco referencias geométricas básicas na
percepção que os habitantes têm da cidade: sendas, bordas, bairros, nós e marcos. No entanto,
o fato de que um parque popular deva ser a recriação das tensões e frustrações próprias da
metrópole e não um espaço alternativo ao artificial, um lugar orgânico de alegria e repouso,
suscita sérias dúvidas. Isto nos obriga a formular a questão de como deve ser um parque ao
final do século XX (MONTANER, 2001, p.238).
64
O parque foi concebido como uma construção artificial, em vez da tradicional
paisagem pitoresca, Tschumi apresenta um laboratório de experiências, uma obra aberta
a alterações e contribuições sem, entretanto desfazer seu conceito inicial, como se
verificou no desenvolvimento da obra.
No layer de linhas, Tschumi desenvolve um caminho que ele chama de la
promenade cinématique (fig.79), em uma referência aos seus trabalhos sobre arquitetura
e cinema, num traçado sinuoso e livre que corta as circulações principais, e onde estão
os jardins temáticos, cujos projetos foram delegados a arquitetos, paisagistas e artistas
convidados.
Fig. 76 - Parc de La Villette – Vista aérea
Disponível em: www.landliving.com
Fig. 77 - Parc de La Villette - Folies
Disponível em: www.users.compaqnet.be
Fig. 78 - Parc de La Villette - marquise
Disponível em: www.educatorium.com.br
Fig. 79 - Parc de La VilletteLa promenade
cinématique
Fonte: Álvares, 2007, p.418
65
Nestes jardins, novas experiências foram realizadas dando suporte e
complemento ao parque, com destaque para os jardins de bambus de Alexandre
Chemetoff
57
(fig.80), e um pequeno jardim não construído de Peter Eisenman e Jacques
Derrida denominado Chora L Works (fig.81). Agora que o parque está completo, com
suas múltiplas leituras é possível avaliar melhor o intento do arquiteto ao construir uma
nova paisagem para o século XXI.
Fig. 80 - Parc de La Villette – Jardins de Bambus
Alexandre Chemetoff
Disponível em: www. archiguide.free.fr
Fig. 81 - Parc de La Villette - Chora L Works
Peter Eisenman e Jacques Derrida
Disponível em: www.prabhsharanbir.blogspot.com
O concurso do Parc de La Villette estabeleceu novos paradigmas no paisagismo
contemporâneo. No paisagismo moderno a utilização de molduras como forma de
dominar e artificializar a paisagem são comparáveis a utilização de malhas ou grelhas
estruturantes da composição, já não como forma de dominar a natureza, mas
constatando que se está projetando uma outra paisagem, uma paisagem de arquitetura.
Nesta outra paisagem a natureza entra como um dos elementos da composição e
paradoxalmente contribui para enfatizar o caráter artificial do espaço.
A relação do espaço projetado com a cidade, o tratamento arquitetônico que se
estende para o entorno e a composição inspirada no espaço urbano demonstram também
uma aproximação maior do paisagismo com o desenho urbano. As circulações passam a
ter um caráter rigorosamente funcional e mais atento à inserção do paisagismo no
contexto da cidade.
57
Alexandre Chemetoff (França, 1950). Arquiteto, urbanista e paisagista.
66
A partir de então, muitas idéias prospectadas pelos participantes do concurso,
não só as executadas pelo projeto vencedor, passaram a ser utilizadas na concepção de
novos projetos, reinterpretadas ou mesmo repetidas como elementos
descontextualizados. O tratamento da paisagem como arquitetura se tornou corrente, o
uso de alguns elementos específicos como marquises e passarelas metálicas, estruturas
como grandes esculturas, que evoluíram para o tratamento do solo como suporte para
arte, com inspiração na land art, serão os elementos recorrentes no paisagismo
contemporâneo das décadas seguintes.
Porém a lição definitiva deste momento é a de que era possível inventar uma
nova paisagem, mais próxima formalmente da arquitetura e da vida contemporânea, sem
por isso estar espelhando “as tensões e frustrações de metrópole” (MONTANER, 2001),
mas sim, apoiando-se em concepções da arquitetura moderna e contemporânea criar
uma poética específica do paisagismo.
2.3.2 Barcelona: a volta da praça como tema de projeto de
arquitetura
Na mesma época do concurso do Parc de La Villette (década de 1980)
desenvolve-se em Barcelona um processo de requalificação dos espaços públicos que
iria influenciar o paisagismo de forma decisiva. Segundo Solá-Morales (1991), o
processo se inicia a partir da ação política das primeiras gestões democráticas na
Espanha, a partir de 1978, e este contexto de participação da sociedade foi muito
importante para o sucesso dos empreendimentos.
Na década de 1990, quando a primeira fase do projeto já se encontra construída,
Barcelona passa a exportar certo “estilo municipal” de se fazer espaço público e apesar
da aparente estranheza inicial, passou a ser “lugar comum enquanto desenho urbano
habitualmente aceito”. (Grifo nosso, SOLÁ-MORALES, 1991, p.131). Embora o autor
esteja se referindo às praças inicialmente restauradas e construídas, utiliza o termo
desenho urbano.
Solá-Morales (1991) identifica três características que trazem unidade à
experiência de Barcelona e da Catalunha. Em primeiro lugar, a localização dos projetos
em áreas consolidadas, onde o projeto do espaço público é uma intervenção à
67
posteriori. Em segundo lugar, os espaços públicos são tratados como arquitetura, isto é,
são projetos executados com a lógica dos projetos de arquitetura e design de pequena
escala, não sendo feitos com uma metodologia ou um repertório diferente do da
arquitetura.
Haver confiado uma ação política à disciplina arquitetônica e a seus instrumentos específicos
é, sem dúvida, um caso excepcional, na situação cultural de nosso mundo tardo industrial, no
qual todos os indícios apontam para a hegeliana morte da arquitetura ante a eficácia mais
potente de outras racionalidades, de outras tecnologias e outros mass media (SOLÁ-
MORALES, 1991
, p.132).
Em terceiro lugar, a experiência de Barcelona tem uma “impostação ideológica
precisa” (SOLÁ-MORALES, 1991, p.132), isto é, advinda de um governo socialista,
após anos de ditadura, a tônica das intervenções foi recuperar o espaço público para a
população: a praça, a rua, o jardim.
Essa recuperação do papel de coordenador de intervenções urbanísticas por parte
do arquiteto no contexto das transformações em Barcelona é bastante notável no atual
contexto da arquitetura e é também sintomático como as intervenções são ora nomeadas
como paisagismo, ora como urbanismo e às vezes como arquitetura. Faz-se notar
também o contexto em que se desenvolveram as propostas.
Da arquitetura barcelonesa destes últimos anos – pública, privada – falou-se que era
astutamente eclética, entre a herança da tradição moderna e certa capacidade de
prolongamento dos modelos do passado. Sem haver sido literalmente pós-moderna, no sentido
estilístico que concedemos a este termo, pode ter sido uma arquitetura sem preconceitos com
respeito a estar adstrita a uma linguagem única ou à emissão de uma mensagem programática
com pretensões à universalidade (SOLÁ-MORALES, 1991, p.132).
Pode-se creditar a essa situação a ampla liberdade formal que tiveram os
arquitetos ao propor os projetos, que pela sua quantidade e qualidade tiveram ampla
repercussão na Europa. Observa-se pelas datas dos projetos dos novos espaços urbanos
europeus a influência do vocabulário formal e conceitual da experiência barcelonesa,
que também pelo fato de apresentarem grande visibilidade e uma resposta imediata do
público com forte conteúdo político, foram exemplos facilmente adotados.
Essa visão contemporânea do paisagismo, que surge simultaneamente em
diversas intervenções (La Villete e outros), mas com maior massa crítica em Barcelona,
apresentam alguns aspectos presentes na obra de alguns paisagistas do modernismo e
nas considerações teóricas sobre a arquitetura contemporânea (pós-modernismo,
fragmentação, desconstrutivismo, etc.).
68
Entretanto um aspecto bastante importante apontado por Solá-Morales (1991) é
o fato de que as experiências propostas pelos arquitetos para o espaço público, não
tiveram uma base conceitual comum a todos os projetos e formulada anteriormente, mas
sim o contrário.
Seu evidente realismo, sua deliberada autolimitação não só se refletem no fato de não ter se
produzido depois de um completo debate teórico, como também porque, em todo caso, a
armação conceitual que explica essa experiência é, sobretudo, o resultado de uma prática
concreta, de um trabalho de reflexão caso a caso, a partir dos projetos e das situações
particulares e não o revés (SOLÁ-MORALES, 1991, p.132).
Para desempenhar a tarefa de requalificar os espaços públicos, a prefeitura
nomeou um dos arquitetos mais importantes na época: Oriol Bohigas
58
, diretor da
escola de arquitetura. Bohigas desenvolveu uma política que enfatizava mais as
intervenções pontuais que projetos urbanos mais gerais e complexos, por uma questão
prática, de que os projetos mostram à população uma visão de progresso imediato.
Na proposição de Bohigas, cada quarteirão deveria possuir sua própria “sala de
estar” e cada distrito seu parque, evidenciando a interlocução entre o espaço urbano e o
novo regime democrático que pressupõe espaços onde as pessoas possam se reunir.
Como tratamento de “sala de estar”, fica evidente a atenção dos arquitetos ao detalhe
dos pisos, dos bancos, da iluminação. A busca de espaços mais confortáveis em todos os
sentidos, e não apenas a criação do idílico cenário vegetado. Fora da área central da
cidade, foram criados outros espaços públicos sob o lema de “dar um rosto a quem não
tem”, contemplando as extensas áreas de expansão da cidade, carentes de identidade,
nas quais os arquitetos tiveram ampla liberdade de experimentação.
Outra premissa do projeto foi “Levar os museus às ruas”, que previa a
implantação de uma obra de arte (normalmente esculturas) de um artista de prestígio
internacional para cada praça. Isto suscitou a cooperação entre artistas e arquitetos em
quase todas as intervenções. Segundo Gehl e Gemzoe (2002) “Os arquitetos de
58
José Oriol Bohigas Guardiola (Barcelona, 1925) Formou-se pela Escola Técnica Superior de Barcelona, em 1951.
Fez parceria com Josep Martorell (1951) logo incluindo Davia Mackay e formando o MBM (Martorell Bohigas
Mackay), escritório responsável pela adequação de Barcelona para as Olimpíadas de 1992. Fundador do Grupo R
criticava a estagnação cultural da década de 1940 e o regionalismo que resultaram na arquitetura vanguardista da
década de 1930. Professor na Escola de Arquitetura de Barcelona (1971) e diretor em 1977 aliava a tendência
moderna e o funcionalismo à tradição histórica. Recebeu dentre diversos prêmios, medalhas de ouro em Barcelona
(1986) e Madrid (1990), Universidade de Darmstadt (1992) e pela construção da Academia de Arquitetura em Paris
(1988).
69
Barcelona foram no mínimo pioneiros por elevar o espaço público ao nível de um
campo arquitetônico independente, depois que essa disciplina desapareceu sob a
influência do modernismo” (GEHL e GEMZOE, 2002, p.29).
Diferente do Parc de La Villete, que foi uma intervenção em grande escala, as
intervenções em Barcelona, embora fizessem parte de um plano geral, em sua maioria
eram na escala da praça, e em áreas consolidadas: áreas degradadas ou obsoletas.
2.3.2.1 A Plaça dels Paisos Catalans
A Plaça dels Paisos Catalans (Barcelona, 1983), projeto dos arquitetos Helio
Piñon
59
e Albert Viaplana
60
é uma obra paradigmática, construída no que era um grande
estacionamento em frente a uma estação ferroviária, demonstra a ruptura com os
preconceitos em relação ao desenho de espaços públicos.
A praça está sobre um entroncamento de linhas subterrâneas e na superfície é
circundada por vias de tráfego intenso (fig.82 e 83). A condição agressiva em que está
localizada e a impossibilidade de ser arborizada obrigou os arquitetos a uma solução
radical, que causou muita polêmica. A praça é uma composição abstrata, com o espírito
formal do modernismo, utilizando elementos esculturais de forma poética.
Estrutura-se através da grande cobertura ondulada que divide a praça em duas
áreas, uma segunda cobertura, mais elevada, como um dossel ou a copa de uma árvore
frondosa faz um contraponto com o entorno de edifícios mais elevados, e parece
representar um portal de entrada para cidade, sem entretanto, fazer qualquer concessão
ao estilo beaux-arts de grandeza convencional. O piso de granito e o mobiliário: bancos,
fontes e iluminação incomuns, mas de design preciso se apresentam como uma nova
forma de se construir o espaço público da praça, mas também e principalmente uma
nova forma de vê-lo.
59
Hélio Piñon (Onda, Castellón, Espanha, 1942), arquiteto formado em 1966 e doutor em Arquitetura (1976) pela
Escola Técnica Superior de Arquitetura de Barcelona. No início dos anos setenta, inicou sua atividade docente nessa
escola, onde, desde 1980, ocupa a cátedra de Projetos e atualmente, dirige o Laboratório de Arquitetura.
60
Albert Viaplana (Barcelona, 1933), arquiteto, formado pela Escola de Arquitetura de Barcelona em 1966. É
professor da Universidade de Arquitetura de Barcelona e desde 1974 tem um escritório com Helio Piñon. Entre suas
obras podemos destacar: Plaza dels Paisos Catalans (1983), Parc del Besos (Sant Adriá del Besos, 1984), Centre d Art
Santa Monica (1986), Plaza Barange (Granollers, 1987), Hotel Hilton (1990), Edificis d habitatges de la Vila
Olimpica (1992), Biblioteca Popular en Sant Feliu de Llobregat (1993), Centre de Cultura Comtemporanea (1993),
Moll d Espanya, Port Vell (1995), Rambla de Mar (1994) e Maremágnum (1995).
70
Fig. 82 - Planta Plaça dels Paisos Catalans,
Barcelona, 1983
Piñon e Viaplana
Fonte: adaptado de Gehl e Gemzoe, 2002, p. 178
Fig. 83 - Plaça dels Paisos Catalans - vista geral
Fonte: Gehl e Gemzoe, 2002, p. 179
Embora a praça contenha uma grande dose de ineditismo e ter suscitado
polêmica, especialmente por apresentar um caráter extremamente arquitetônico, é
possível os traços da estética do modernismo. A praça é uma construção de arquitetura,
ordenada de forma clara e inteligível, resolvida com os mesmos recursos projetuais
aplicados aos projetos de edificações ou desenho urbano. Os elementos apresentam
formas puras, despidas de enfeites, e as cores e texturas são as dos próprios materiais,
granito, aço, aplicadas a um design de mobiliário que valoriza a forma (fig.85), mas não
mais preocupado com o binômio forma-função do ideário moderno.
Fig. 84 - Plaça dels Paisos Catalans, vista noturna
Fonte: Gehl e Gemzoe, 2002, p. 181
Fig. 85 - Plaça dels Paisos Catalans, mobiliário
Fonte: Gehl e Gemzoe, 2002, p. 180
Muitos elementos apresentados na praça foram reinterpretados ou repetidos
como a formar um vocabulário da praça contemporânea: a concepção não usual das
fontes, a cobertura metálica inspirada na pérgula, mas com uma aparência mais
71
contemporânea, as esferas metálicas utilizadas como balizadores impedindo acesso de
automóveis e especialmente as luminárias criadas especialmente para este projeto
(fig.84).
Há também a citação do paisagismo moderno, por meio de uma parede com uma
abertura que emoldura a paisagem urbana na entrada da praça, como a demonstrar o
apreço dos arquitetos aos mestres modernos (fig.83).
2.3.2.2 O Parc Estació del Nord
Como parte das premissas de Bohigas de “levar o museu às ruas”, a prefeitura de
Barcelona convidou vários artistas de renome internacional para colaborar no projeto de
praças. O Parc Estácio del Nord é resultado da colaboração entre os paisagistas Andreu
Arriola e Carmen Fiol
61
e a escultora americana Beverly Pepper
62
, que desenvolve
trabalhos no conceito de land art. Não se trata mais da utilização de uma linguagem da
arte na concepção formal dos jardins, mas de um trabalho em que o conceito
paisagístico e artístico da praça são desenvolvidos simultaneamente.
O parque chamado pelos autores de “Sombra e Sol” (fig.86), configura-se como
uma praça de transbordo da estação de metrô adjacente a ele, e faz uma referência às
estações do ano, materializada nas duas áreas principais: o Cel Caigut (céu de inverno),
uma escultura de grandes proporções revestida de cacos de azulejos (fig.87), numa
homenagem à Gaudí, é a área de sol, para utilização preferencial no inverno e a Spiral
of Threes (espiral de árvores), no outro extremo da praça (fig.87), uma área sombreada
de estar para uso preferencial no verão.
O projeto apresenta uma evidente unidade, presente em todos os detalhes,
inclusive os bancos e a iluminação foram projetados pela artista Beverly Pepper
(fig.88).
61
Andreu Arriola e Carmen Fiol (nasceram ambos em Barcelona, 1956), arquitetos, formados pela Escola Técnica
Superior de Arquitetura de Barcelona. Lideraram de 1981 a 1988 o departamento de Desenho Urbano de Barcelona.
Entre 1989 a 1993, Andreu Arriola foi diretor associado do Instituto de Desenvolvimento e Jogos Olímpicos –
Barcelona 1992. Em 1987 começaram a trabalhar juntos em Barcelona e ganharam várias competições nacionais e
internacionais.
62
Beverl Pepper (1922) é uma escultora moderna e pintora abstrata, nasceu em Beverly Stoll em 1922 na cidade de
Nova Iorque e teve sua educação no Pratt Institute (desde 1940) and the Art Students League of New York. Estudou
em Paris (a partir de 1949) com Fernand Léger e André Lhote e a partir de 1951 morou em, e próximo, à Roma. Ela é
conhecida por suas figuras-totens, esculturas metálicas, trabalhos espelhados e construções ambientais e por sua série
“Amphisculture” (1947-76).
72
Fig. 86 - Parc Estácio del Nord, Barcelona, 1987/92
Andreu Arriola e Carmen Fiol
Disponível em: www.beverlypepper.org
Fig. 87 - Parc Estácio del Nord, Cel Caigut
Disponível em: www.beverlypepper.org
A praça é um refúgio em movimentada área urbana próxima à estação de metrô,
questões de conforto ambiental estão presentes na proteção da praça em relação ao
entorno urbano ruidoso, através de taludes incorporados às esculturas de Pepper
(fig.86), ou na área sombreada em espiral que convida à introspecção e repouso da
Spiral of Threes, nessa conjunção perfeita entre arte, funcionalidade e qualidade
ambiental experimentada neste projeto.
Fig. 88 - Parc Estácio del Nord, mobiliário
Disponível em: www.beverlypepper.org
Fig. 89 - Parc Estácio del Nord, Spiral of Threes
Disponível em: www.beverlypepper.org
2.3.2.3 O Parc del Clot
No Parc del Clot, projeto de Daniel Freixes
63
e Vincence Miranda, recuperou-se
um antigo espaço industrial para converte-lo em um jardim arquitetônico de sistemas
63
Daniel Freixes (Barcelona, 1946) Arquiteto , especializado na reabilitação de espaços arquitetônicos. Seus
trabalhos incluem o Parc del Clot, a Faculdade de Ciências da Comunicação da Universidade Ramon Llull, o
coquetel-Zsa Zsa em Barcelona, Palamos Museu de Pesca, o parque temático Felifonte em Taranto (Itália), uma
conjunto de habitação plurifamiliar em Barcelona (em colaboração com Virgínia Figueras) e outra em Reus (em
colaboração com Josep Llobet). Trabalhou também em projectos para a remodelação do Tibidabo Amusement Park
Barcelona (em colaboração com a Bosch Eulália), o Museu da Música de Barcelona (em colaboração com Rafael
Moneo e Andreu Arriola), o Museu Mines of Transportation arqueológico, o Museu Rural de avaliação da vida de
73
geométricos em colisão. O parque apresenta uma interessante conjunção de parque e
praça recreativa, sendo que os aspectos de preservação de um pequeno bosque e das
ruínas de uma antiga estação ferroviária tornam o parque peculiar (fig.90 e 91).
O caráter da preservação das ruínas é apenas sinalizador, como em outros
projetos contemporâneos, não se trata de preservação nos moldes de “patrimônio
histórico”, assim como a preservação do pequeno bosque não foi com o rigor purista de
botânicos, no parque admitiu-se o plantio de espécies exóticas de forma mais
intencional e geométrica.
No aproveitamento das ruínas, vê-se dupla utilidade, o conjunto de arcos que
emoldura a paisagem vista do interior do parque, ao mesmo tempo, funciona como
limite de proteção em relação ao entorno urbano. O traçado dos caminhos: duas
diagonais que cruzam a praça, representa bem o espírito do contemporâneo, de
objetividade e rapidez (fig.92). Os pórticos que acompanham a passarela principal
imprimem a sensação de velocidade ao trajeto.
Fig. 90 - Parc del Clot, Barcelona - planta baixa -
1988
Freixes e Miranda
Fonte: adaptado de Gehl e Gemzoe, 2002, p. 186
Fig. 91 - Parc del Clot - vista geral
Disponível em:
www.geocities.com
Espluga de Francolí o Museum of Prehistoric Park Teverga (Astúrias) e do novo Conservatório de Música do Liceu
de Barcelona.
74
O bosque é mantido, mas as árvores novas representam a natureza disciplinada:
duas fileiras de ciprestes rigidamente dispostas; curiosamente essa geometria não
transmite idéia de estática, mas de um jogo dinâmico ao se chocar com a assimetria das
passarelas e das formas livres do bosque. A água como elemento lúdico e de proteção
acústica, em cascatas, fontes, espelhos d’água é também outra característica que
expressa movimento. O elemento lúdico presente nas colunas de ferro fundido que
sustentam uma arcada de tijolos (fig.93), remetem à obra instigante de Gaudí.
A chaminé, resquício da antiga fábrica, forma um conjunto com as arcadas
também de tijolo, que remetem ao passado, entretanto, as passarelas e as torres de vidro
que compõem o sistema de iluminação da praça dão o toque do contraste e da
fragmentação, que remete ao contemporâneo, a síntese da liberdade formal e da alegria
que os novos espaços urbanos projetados têm suscitado.
Fig. 92 - Parc del Clot, passarela
Disponível em:
www.geocities.com
Fig. 93 - Parc del Clot, fonte
Disponível em:
www.geocities.com
Neste parque/praça o caráter contemporâneo estabelecido no La Villette se
suaviza pela menor escala, mas nele estão contidos todos os elementos de velocidade,
colisão e colagem presentes no anterior, compondo a nova poética contemporânea do
paisagismo, contemplando os aspectos funcionais, especialmente nas circulações, o
aspecto artístico nas obras de arte incorporadas à arquitetura e na preservação do
histórico e o aspecto ambiental no uso da vegetação existente e a nova, fugindo um
pouco do modelo praça seca, ou excessivamente construído, sem entretanto, deixar de
atender à necessidade contemporânea dos amplos espaços multifuncionais.
75
2.4 Considerações finais do capítulo 2
Assim como o pensamento moderno em paisagismo surgiu como uma resposta
coerente aos pressupostos da arquitetura moderna, os conceitos contemporâneos de
paisagismo surgem também em decorrência de um movimento que se esboça também
na arquitetura. É bastante evidente que o modernismo como movimento cultural era
bastante coeso e abrangente, envolvendo as artes (música, pintura, literatura e
escultura), a arquitetura e a filosofia, o que não é tão visível na arquitetura
contemporânea, que se apresenta de forma fragmentária e cuja expressão não é tão
facilmente distinguível em todas as artes em que se manifesta.
Muitas das experiências empreendidas no paisagismo moderno, nos jardins
residenciais, serviram de base para o que se iria fazer no espaço público a partir da
década de 1980, no paisagismo contemporâneo, configurando-se mais como
continuidade, ou a retomada de experiências iniciadas no paisagismo moderno. Este
aspecto de ruptura e continuidade é bastante presente na história do paisagismo, alguns
aspectos do paisagismo eclético, como a rígida geometria foram reinterpretados pelo
moderno, assim como algumas concepções de um paisagismo baseado em conceitos das
artes plásticas serão reinterpretados pelo contemporâneo.
No paisagismo moderno, a estratégia de dominar o natural, através de
emolduramento e da construção de marcos que representavam o domínio do construído
sobre a natureza, evolui no contemporâneo com a utilização das malhas conceituais
sobre o terreno. Como comenta Eisenman, já não é a tentativa de dominar a natureza,
pois que a tecnologia já a esmagou, mas de estabelecer uma paisagem de arquitetura,
onde os elementos naturais e construídos têm o mesmo valor num jogo compositivo de
invenção de uma outra paisagem.
O paisagismo moderno institui o uso do jardim, os jardins deixam de ser
preferencialmente destinados à contemplação e passeio e passam a ser utilizados, como
enfatiza Thomas Church em Gardens are for the people, influenciado pelas novas
doutrinas sobre saúde e vida ao ar livre. Nesse sentido, a introdução de áreas de lazer e
esportes e a criação do playground são as influências mais evidentes da escola
americana na formalização das praças modernas.
76
No paisagismo contemporâneo, com a negação dos princípios modernos,
especialmente do dístico “forma e função” por Robert Venturi em seu manifesto, a
funcionalidade se apresenta na forma de espaços múltiplos, embora as circulações e a
ligação com a cidade tenha tornado os projetos mais rigorosamente funcionais. A
recuperação do paisagismo como indutor de um desenvolvimento urbano, aproxima o
paisagismo contemporâneo do desenho urbano, especialmente em intervenções de
requalificação de áreas urbanas.
A conjunção de arquitetura e arte como princípio da Bahaus e da arquitetura
moderna se apresenta também nos primórdios do paisagismo moderno com os famosos
jardins cubistas da década de 1920, aparecendo novamente na década de 1960 com a
obra de paisagistas como: Roberto Burle Marx, Luis Barragán e Isamu Noguchi, em
toda sua plenitude artística de formas e cores.
No paisagismo contemporâneo a arte não é mais uma citação ou um apêndice,
ou uma linguagem utilizada no trabalho paisagístico, os conceitos da arte são
subjacentes à origem do projeto. Observa-se também, como caso do Parc de La Villette,
que conceitos teóricos do campo da arquitetura e da filosofia se incorporam a concepção
do projeto.
Observa-se no paisagismo moderno pelo afastamento do jardim paisagístico,
uma crescente artificialização do jardim, fato que parecia levar o paisagismo a se tornar
uma obra essencialmente construída. Entretanto, a contribuição principalmente de
paisagistas americanos e a atuação de Roberto Burle Marx, na preservação de espécies
ameaçadas e no uso de vegetação autóctone, promove o equilíbrio entre elementos
vegetais e construídos.
No paisagismo contemporâneo, a questão ecológica torna-se crucial, a partir da
década de 1980, com a crise dos combustíveis e as preocupações com o aquecimento
global, o paisagismo acompanhando o momento histórico, assim como a arquitetura
também o faz, passa a incorporar na gênese do projeto as preocupações com a
sustentabilidade do planeta. O caráter ambiental no paisagismo se amplia com a
utilização de materiais recicláveis.
77
CAPÍTULO 3:
ASPECTOS FUNCIONAIS, ESTÉTICOS E AMBIENTAIS
NA CONCEPÇÃO DE PROJETOS DE PAISAGISMO
Os Fractais constituem uma maneira de geometrizar o caos da natureza,
de iluminar a desordem, mensurando−a,
representando−a e domesticando−a.
(MONTANER, 2008)
78
3.1 Introdução
Neste capítulo apresentam-se os três aspectos importantes na concepção de
projetos no paisagismo contemporâneo, aspectos estes que se interrelacionam e que
estão presentes em maior ou menor grau nas estratégias projetuais.
Alguns autores que se dedicam ao estudo do paisagismo, como Robba (2002),
Macedo (1999) e Romero (2001) - têm uma opinião coincidente de que a análise da
qualidade de um projeto de paisagismo passa pelo atendimento a três requisitos: o
ambiental, o funcional e o estético.
A cada paisagem, a cada lugar, então, atribuem-se três tipos de qualidade: 1. ambiental - que
mede as possibilidades de vida e sobrevida de todos os seres vivos e das comunidades na
paisagem existente, 2. funcional – que avalia o grau de eficiência do lugar no tocante ao
funcionamento da sociedade humana, 3. estética – que apresenta valores com características
puramente sociais, atribuída pelas comunidades humanas a algum lugar em um momento no
tempo ( MACEDO,1999, p.13).
Esses três aspectos permeiam os projetos de paisagismo desde a busca da
linguagem moderna de desenho de jardins privados, até os projetos contemporâneos que
apresentam uma outra visão de construção da paisagem.
A questão funcional e estética esteve sempre presente no paisagismo, como
demonstram os três princípios contidos nas premissas de Tunnard (1938): (i) o
funcional – uma abordagem global, baseada no conceito de que o uso determina a
forma; (ii) a empatia – baseada na atitude japonesa de um diálogo do jardim com a
natureza, expressa simbolicamente pelo uso de composições assimétricas e elementos
irregulares e (iii) o artístico – baseado nos princípios da arte moderna. Observa-se que a
empatia sugerida por Tunnard trata também do aspecto estético ou artístico,
preocupação mais diretamente ligada à formalização do projeto.
De forma similar, Church (1955) aborda as mesmas questões ao estabelecer os
três elementos que influenciam a forma do jardim: (i) as necessidades e exigências do
cliente; (ii) as características dos materiais e das espécies vegetais utilizadas e (iii) a
expressão artística da concepção. Os itens (i) e (ii) referem-se aos aspectos funcionais
do projeto, embora falem sobre as espécies vegetais, nos projetos de Church elas se
apresentam mais como elementos da composição, do que pelo seu caráter ecológico.
79
Observando-se as experiências empreendidas nos jardins modernos da década de
1960 e as intervenções paisagísticas que determinaram a inflexão entre o moderno e o
contemporâneo (Concurso de La Villette e Intervenções em Barcelona), parecia que o
paisagismo iria tornar-se uma construção artificial cada vez mais distante do mundo
natural e, portanto afastado do caráter ecológico e ambiental proporcionado pelo uso da
vegetação.
Entretanto, como reflexo da conjuntura mundial, com a crise dos combustíveis
fósseis e as preocupações com o aquecimento global, um novo interesse pela utilização
de elementos naturais na concepção dos projetos paisagísticos gera então a retomada do
terceiro aspecto norteador do paisagismo que é o aspecto ambiental. Evidentemente esta
preocupação já existia desde os primórdios do moderno, mas não da forma explícita e
com a urgência que se apresenta na sociedade contemporânea. Esta tendência surge
com mais evidência na década de 1990, inspirando-se nos movimentos ecológicos e nos
conceitos de sustentabilidade ambiental.
Estes três aspectos vão se relacionar com quatro disciplinas que ajudam a
compor o quadro do paisagismo contemporâneo que são o desenho urbano, a arte e
arquitetura contemporâneas e a revitalização de áreas degradadas. As teorias e os
conceitos próprios destas áreas são utilizados na concepção de projetos no paisagismo
contemporâneo, por esta razão, apresentam-se os fundamentos teóricos e instrumentos
de análise que aplicados ao paisagismo tem apresentado seus projetos mais
emblemáticos.
3.2 Aspectos funcionais
O aspecto funcional foi um dos fundamentos da arquitetura moderna e se refletiu
no paisagismo. Já não se tratava de conceber espaços somente para o passeio e a
contemplação, os jardins e praças passam a ter maior ocupação e utilização. Desde os
princípios estabelecidos por Tunnard e Church, a funcionalidade tem sido um dos
parâmetros norteadores do projeto de paisagismo. Nos jardins modernos, principalmente
os da escola americana, se realiza especialmente na formulação das áreas de lazer com
piscinas, churrasqueiras etc., o que se manifesta nas praças por meio das quadras de
esportes e playgrounds. De maneira geral o aspecto da funcionalidade no moderno, está
80
mais presente no interior do jardim ou da praça, o interesse do traçado está mais no
interior do lote que no contexto urbano.
No paisagismo contemporâneo, a questão da funcionalidade se amplia, e está
mais presente na interação com o contexto da cidade. Inicialmente, na oposição entre o
moderno e o contemporâneo, uma das questões principais, apontada por Venturi (1995),
era a da forma e função. Esse atrelamento da forma à função é desprezado pelo espírito
contemporâneo, embora os traçados dos caminhos passem a ser mais rigorosamente
funcionais com relação ao tecido urbano. Essa visão ampliada do paisagismo
contemporâneo aliada ao descontentamento da visão modernista de planejamento gerou
uma grande aproximação dos paisagistas aos problemas da cidade e a parceria que se
mostra mais integrada nas ações do desenho urbano.
A relação dos aspectos funcionais do projeto paisagístico é ampliada para o
contexto urbano no contemporâneo, os paisagistas passam a se apropriar de conceitos e
métodos próprios do desenho urbano, como observa Montaner (2001) ao comentar o
projeto do Parc de La Villette:
Outro elemento importante que está na base do projeto é a interpretação de Kevin Lynch sobre
A imagem da cidade, com seu estabelecimento de cinco referencias geométricas básicas na
percepção que os habitantes têm da cidade: sendas, bordas, bairros, nós e marcos. No entanto,
o fato de que um parque popular deva ser a recriação das tensões e frustrações próprias da
metrópole e não um espaço alternativo ao artificial, um lugar orgânico de alegria e repouso,
suscita sérias dúvidas. Isto nos obriga a formular a questão de como deve ser um parque ao
final do século XX (MONTANER, 2001, p.238).
O projeto de recuperação ou implantação das praças passa a considerar outras
variáveis, como o tráfego, acessibilidade, a interligação de praças em corredores verdes,
entre outras, tornando a questão mais complexa e exigindo equipes maiores e
multidisciplinares; por outro lado as equipes de planejamento urbano também passaram
a solicitar profissionais do paisagismo para compor seus quadros.
3.2.1 Desenho urbano
O desenho urbano se estrutura a partir da década de 1970 e se consolida em 1980
com a proliferação de cursos de pós-graduação específicos na Grã-Bretanha. Surge
também da constatação da falência dos modelos formalistas do movimento moderno. A
visão determinista e a pretensão científica do planejamento urbano dos anos 1960 e
81
1970 aliada aos modelos funcionalistas do movimento moderno resultou em um
tratamento da cidade como um sistema racionalista, apoiado por outras disciplinas como
a economia, a sociologia e a geografia, afastando-se da realidade e da escala vivencial
do cotidiano da população, totalmente ignorada nos planos.
“... no Planejamento Urbano as propostas físico-espaciais são formuladas a partir de diretrizes
ou planos sócio-econômicos e institucionais... o espaço urbano é prefigurado através de outros
campos disciplinares, quando não é totalmente omitido” (KOHLSDORF, 1985, p.41).
O distanciamento do planejamento urbano da questão da conformação da cidade
e mais especificamente do espaço do cotidiano da população se torna cada vez mais
evidente. “Foi para responder à necessidade de complementar esse gap que se impôs o
desenho urbano, com suas novas categorias de análise e atuação sobre o urbano” (DEL
RIO, 1990, p.47). A Inglaterra foi o primeiro país a agir de forma institucional para
atender a esta demanda. Segundo Del Rio (1990), em 1970, o Real Instituto Britânico de
Arquitetura (RIBA), já admitia a necessidade de formar profissionais nessa área e, em
1980 já existiam nove cursos de pós-graduação em desenho urbano implantados. A
preocupação inicial era oferecer um treinamento voltado para prática, o entendimento
então era de que seria necessária uma disciplina de design.
... os inscritos, se planejadores, teriam que receber formação em temas de natureza físico-
espaciais, de “design” e estética; se arquitetos, teriam que passar a compreender e saber atuar
sobre todo o entorno de sua área e o contexto urbano como um todo (DEL RIO, 1990, p.47).
É interessante observar a relação entre o paisagismo, o urbanismo e a arquitetura
presente na definição de desenho urbano formulada por B. Goodey, um dos arquitetos
fundadores do desenho urbano na Inglaterra.
“Como Planejamento, o termo Desenho Urbano está aberto a uma série de interpretações. Nós
o entendemos, de uma maneira geral, como significando o projeto e gerenciamento do meio
ambiente tridimensional, maior que a edificação individual. Consideramos que seu campo de
interesse localizou-se na interface entre a arquitetura paisagística e o planejamento urbano,
inspirando-se na tradição de projeto da arquitetura e da arquitetura paisagística, e na tradição
do gerenciamento ambiental e de ciências sociais do Planejamento Contemporâneo” (in B.
GOODEY, 1983:13 apud DEL RIO, 1990, p.47).
Nesta visão ampliada da inserção do paisagismo no contexto urbano, os
paisagistas passam a utilizar com freqüência os mapas de figura-fundo e mapas de
layers sobrepostos para definir seus projetos.
82
3.2.2 Estudos de Análise do Espaço Urbano
Os estudos de análise do espaço urbano desenvolvidas por Romero (2001) dizem
respeito tanto aos aspectos ambientais quanto funcionais, da mesma forma o
instrumental desenvolvido por Lynch (1960), Cullen (1971) e Kohlsdorf (1996) para
leitura da forma da cidade se prestam a uma análise da praça sob seus aspectos
funcionais, estéticos e simbólicos.
Desta forma pode-se verificar uma interessante interrelação das teorias sobre os
estudos da climatologia e os de morfologia urbana com os aspectos básicos para
qualificação do projeto de paisagismo (fig.92), sendo que o aspecto funcional está
presente em ambos os casos.
Fig. 94 - Inter-relação estudos de climatologia e morfologia urbana / três aspectos
A análise dos aspectos funcionais de uma praça passa obrigatoriamente pela
questão da morfologia do espaço público, área em que o desenho urbano empreendeu
esforços para compreensão do espaço, desenvolvendo diversas teorias e propostas
metodológicas sobre o assunto. Nenhuma destas propostas é completa e suficiente para
abordar tão complexa questão que é o espaço urbano, entretanto, todas se
complementam neste campo no qual atuam várias disciplinas (DEL RIO, 1990, p.67).
Ambiental
Funcional
Estético e simbólico
Estudos da
climatologia
Estudos da
Morfologia urbana
83
Os estudos da morfologia são comumente divididos em três linhas de pesquisa:
1- trata do espaço físico, do desenho da cidade: 2- trata da percepção do espaço e a 3-
trata da imagem e da memória do espaço (KOHLSDORF, 1996).
As linhas 1 e 2 podem ser utilizadas na análise dos aspectos funcionais e as
linhas 2 e 3 apresentam características para uma análise de aspectos estéticos e
simbólicos, apresentando um caso de sobreposição semelhante ao do desenho urbano e
da climatologia vistos anteriormente, neste caso o estudo da percepção contempla tanto
aspectos funcionais, quanto estéticos.
Fig. 95 - Inter-relação aspectos funcionais e estéticos / estudos de morfologia urbana
A linha de investigação que trata da imagem e memória do espaço, por lidar com
aspectos muito subjetivos e ter em sua pesquisa um caráter predominantemente
descritivo, não tem sido suficientemente contemplada em trabalhos conhecidos. Como
constata Kohlsdorf (1996), “por isso, os instrumentos para investigação da imagem
mental dos lugares são, muitas vezes, descartados como pouco úteis para fins de projeto
ou planejamento urbanos” (1996, p.117).
Nos estudos de morfologia urbana que tratam do espaço físico, um dos métodos
clássicos da análise de morfologia urbana é o mapa de figura-fundo.
Para precisão científica NOLLI utilizou-se da técnica de projeção vertical desenhada como
figura-fundo, que veio a se revelar de grande valia na identificação de relações entre domínios
público, semipúblico dos grandes edifícios e privado, assim como outras relações
morfológicas importantes como distâncias e acessibilidade, ou relação entre cheios e vazios
(GRAVES, 1979 apud DEL RIO, 1990, p.74).
Espaço físico
Perce
ão do es
p
a
ç
o
Imagem e memória
Aspectos
funcionais
Aspectos estéticos e
simbólicos
84
Gehl e Gemzoe (2002) utilizam-se deste método ao ilustrar e comentar as praças
e espaços urbanos (fig.98). Em uma perspectiva de investigação sobre o projeto de
praças é um instrumento que facilita a leitura do entorno e da inserção da praça na
malha urbana.
Fig. 96 - Uso de mapas de figura-fundo
Praça Charles Hernu
Fonte: Gehl e Gemzoe
, 2002, p. 166
Fig. 97 - Uso de layers em projetos paisagísticos
Projeto para o Concurso Novo Parque Tancredo
Neves - ES - 3º lugar - Keila Costa
Fonte: Portal Vitruvius, 2007 (notícia 16/01/2007)
Dos estudos sobre morfologia do espaço urbano no desenvolvimento da linha de
percepção do espaço, a pesquisa mais influente foi a empreendida por Kevin Lynch.
Lynch (1960) utiliza como base conceitual os aspectos de imageabilidade, identidade e
legibilidade para, através de uma pesquisa na qual constavam questionários e entrevistas
para identificar as imagens coletivas das cidades e as suas partes mais significantes.
Cruzando as informações em mapas identificaram-se elementos que se destacavam em
seu papel para a imageabilidade, identidade e legibilidade. Esses elementos possuem um
alto grau de aplicabilidade para o Desenho urbano, são eles:
1. Percursos ou sendas – Os caminhos pelos quais o observador se movimenta,
constituindo-se um dos elementos principais, ao longo dos quais os outros elementos
estão arranjados.
85
2. Limites ou bordas – Elementos lineares que geralmente demarcam o limite de uma
área ou zona conhecida pelo observador.
3. Setores ou bairros – Áreas da cidade onde o observador identifica “de dentro” como
possuindo certa identidade, ou “de fora” se realmente puderem ser vistas de longe.
4. Nós – Locais estratégicos onde o observador pode entrar e que possuem forte função
como ponto focal, destacando-se da estrutura, locais de concentração de atividade ou
convergência física do tecido urbano.
5. Marcos – Referenciais externos que se destacam na paisagem, podem estar distantes e
constituem uma referência constante ao usuário, ou podem estar mais integrados a um
conjunto, destacando-se por sua forte imageabilidade.
Fig. 98 - Utilização dos conceitos de Linch em projetos paisagísticos –
Concurso Público Nacional de Valorização da Paisagem Urbana de Santa Tereza - RS - 3º lugar -
Humberto Hickel
Fonte: Portal Vitruvius, 2004 (notícia 14/08/2004)
Kohlsdorf (1996) apresenta uma interessante relação entre o nível da percepção
e da imagem mental.
86
Fig. 99 – Percepção e imagem mental
Fonte: KOHLSDORF, 1996, p.64
Apoiada nas teorias de Cullen e Lynch entre outros, elabora um trabalho que
nomeou Análise de desempenho topoceptivo na percepção, que contém vários
elementos para análise funcional e estético/simbólica das praças.
Fig. 100 – Efeitos topológicos e efeitos perspectivos
Fonte: KOHLSDORF, 1996, p.102
Efeitos Topológicos
Efeitos Perspectivos
Representação Projetiva
Representação Euclidiana
Nível da percepção
Nível da imagem mental
87
Utilizando as categorias formuladas por Romero (2001) – entorno, fronteira e
base – pode-se ter uma visão mais abrangente do desenho urbano, iniciando pelo
entorno, como o contexto urbano, a fronteira, considerando a envoltória do espaço da
praça e a base em que se dão as relações internas da praça.
No estudo do entorno, incluem-se os elementos que dizem respeito à
implantação da praça no contexto urbano, a análise dos mapas de figura-fundo, análise
dos fluxos de pedestres e automóveis, acessibilidade
64
e conectividade
65
.
No estudo da fronteira está presente a questão da envolvente da praça, o
fechamento, a presença e caracterização dos edifícios vizinhos, em que os efeitos
topológicos e perspectivos identificados por Kohlsdorf (1996) auxiliam na compreensão
dos aspectos funcionais.
E no estudo da base as questões do zoneamento, configuração do sítio, traçado,
vegetação, pavimentos e mobiliário urbano utilizado na composição do espaço são
considerados sob seu aspecto funcional.
Os cinco elementos identificados por Kevin Lynch: percursos, limites, setores,
nós e marcos, são elementos que facilmente se identificam na linguagem de projetos de
paisagismo contemporâneo.
Este instrumental teórico tem sido utilizado nos projetos de paisagismo desde o
Parc de La Villete, e com freqüência especialmente em projetos de médio e grande
porte, que apresentam certo grau de complexidade e estão em áreas urbanas.
O projeto de reestruturação do Largo da Carioca (Rio de Janeiro, 1981), após as
intervenções de construção do metrô, apresenta-se como um exemplo de paisagismo
vinculado ao desenho urbano, as soluções plásticas e o desenho obedeceu a critérios que
se relacionam com todo o entorno do centro da cidade (fig.101).
A Praça Peershing (Los Angeles, 1991), é também exemplo de intervenção
urbana de recuperação de uma praça degradada, a área havia se tornado um grande
estacionamento, sob a perspectiva do desenho urbano (fig.102).
64
Possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para a utilização com segurança e autonomia de
edificações, espaço, mobiliário, equipamento urbano e elementos.
65
Capacidade de um dispositivo de se conectar com outros dispositivos e transferir informação.
88
Fig. 101 - Largo da Carioca, Rio de Janeiro - 1981
Burle Marx
Fonte: Macedo, 1999, p.72
Fig. 102 - Peershing Square – Los Angeles
Hanna Ollin e Ricardo Legorreta - 1991
Fonte: Robba, 2002, p.42
Os concursos para projetos de requalificação urbana das capitais brasileiras,
como por exemplo, o de Goiânia (fig.103 e 104), o Rio-Cidade e outros, apresentam-se
ora como projetos de urbanismo, ora como de paisagismo, revelando uma intensa
confluência de propósitos que tem ocorrido entre o paisagismo e o desenho urbano.
Fig. 103- Concurso Goiânia - Praça Cívica
1º Lugar Alexandre Brasil e equipe
Fonte: Portal Vitruvius
Fig. 104- Concurso Goiânia - Praça dos
Trabalhadores
1º lugar - Alexandre Brasil e equipe
Fonte: Portal Vitruvius
89
3.3 Aspectos estéticos
A evolução do paisagismo em parceria com a arte passa por conceitos
semelhantes. A arte passou por uma crescente abstração e desvinculação com o
figurativo, e teve dessa maneira que se reinventar como forma de expressão. No
paisagismo de modo similar, durante o período moderno, utilizava-se do formalismo da
arte abstrata na concepção da paisagem, entretanto ainda com resquícios de
figurativismo. Esta concepção artística do paisagismo evolui cada vez mais para a
abstração no contemporâneo, e passa a participar do projeto desde a sua concepção e
não mais como um conceito aplicado ao desenho.
A busca de novas linguagens na arquitetura contemporânea também contribui
muito na formalização do paisagismo contemporâneo, numa conjunção de arte e
arquitetura contemporânea para se construir uma nova paisagem, totalmente artificial
como conceito e fortemente ligada à arquitetura, de forma tão poderosa que nos parece
muito mais conveniente a designação arquitetura da paisagem, mais específico e
verdadeiro que a denominação de paisagismo, ampla e aberta a inúmeras interpretações.
3.3.1 Arte: Land Art e minimalismo
Debray (1993) faz uma abordagem da paisagem sob o viés cultural, e nele
apresenta a idéia dessa inter-relação entre a arte e a natureza que contempla as duas
formas de construção da paisagem empreendidas por Burle Marx e Waldemar Cordeiro.
O midiólogo toma nota de que “natureza” e “arte” são categorias abstratas que, na realidade,
não existem independentemente uma da outra. Uma certa arte engendrou nossa natureza. E
uma certa natureza engendrou nossa arte (DEBRAY, 1993, p.190).
A arte moderna do início do século XX desenvolveu diversas tendências que
afetaram diretamente a prática e o pensamento da arquitetura. Nos anos de 1950 e 1960,
os movimentos artísticos do expressionismo abstrato, a Op Art, a Pop Art, e o
minimalismo, influenciam fortemente o trabalho de muitos arquitetos e paisagistas na
produção de formas.
Nas décadas seguintes 1960 e 1970, a land art e a arte conceitual trouxeram uma
visão mais contemporânea a respeito da própria arte. A excessiva valorização da
visualidade trouxe questionamentos sobre a linguagem da arte e uma análise mais crítica
90
da prática visual, independente de movimentos ou estilos. O que se vê agora é uma
multiplicidade de linguagens, contraditórias e independentes, convivendo em paralelo,
porque a arte contemporânea não é o lugar da afirmação de verdades absolutas.
(...) a predominância dos conceitos paisagísticos em projetos, que apresentam o novo dentro
do campo da arquitetura, devem-se, em parte (...) à contribuição de uma série de outros
profissionais de áreas afins, atuando na paisagem por disciplinas como a pintura, a escultura e
a arquitetura e a arte do meio-ambiente. Portanto pode-se afirmar que atualmente a paisagem
projetada é plural, é um produto de numerosas fontes e disciplinas (FRANCO, 1997, p. 32).
Assim como na arquitetura a busca do mais novo, e do espanto são substituídas
por obras que propõem o estranhamento ou o questionamento da linguagem e sua
leitura, tornou-se necessário para a contemporaneidade insinuar uma crítica da imagem.
A arte passou a ocupar o espaço da invenção e da crítica de si mesma, para questionar o
próprio visível, alterar a percepção, propor um enigma e não mais uma visão pronta do
mundo.
A Land Art (arte da Terra), ou Earthworks (trabalhos em / sobre a paisagem)
surge no final dos anos 60, liderados por um grupo de artistas que integram um
movimento cultural mais vasto que preconiza o "regresso à natureza", têm a intenção de
ultrapassar as limitações do espaço tradicional das galerias, recusando o sentido
comercial e mercantilista que a produção artística assumia nesta década. O conceito
estabeleceu-se numa exposição organizada na Dwan Gallery, de Nova York em 1968, e
na exposição Earth Art, promovida pela Universidade de Cornell, em 1969. Os artistas
escolheram entrar eles mesmos na paisagem. Eles não representavam a paisagem, eles
fundiam-se com ela; a sua arte não era simplesmente sobre a natureza, mas dentro dela.
Fig. 105 - Spiral Jetty - Robert Smithson
Disponível em:
http://peregrinacultural.wordpress.com/2008/11/18/
Fig. 106 - The Lightining Field - Walter Maria.
Disponível em:
http://whoisioz.blogspot.com/2007_03_11_archive.html
91
Dentre as obras de land art que foram efetivamente realizadas, a mais conhecida
talvez seja a Spiral Jetty (fig.14), de Robert Smithson (1970), construída no Grande
Lago Salgado, e The lightining Field (fig.15) de Walter de Maria nos Estados Unidos.
Muitos paisagistas da década de 1980 tiveram como fonte de inspiração as obras
polêmicas destes artistas, utilizando os elementos naturais (terra, pedra, vegetação) em
composições absolutamente artificiais em seus projetos (fig.107 e 108).
Fig. 107 - Plaza Tower - California – 1991
Peter Walker
Disponível em
http://bacancy.com.ne.kr/html/peter.html
Fig. 108 - Marugame Station Plaza- Japão – 1992
Peter Walker
Disponível em
http://bacancy.com.ne.kr/html/peter.html
O movimento do Land Art resulta de uma ampliação extrema do campo da arte
onde o planeta é o suporte. Inversamente, no minimalismo a redução de elementos e às
vezes até da área dos projetos são a origem de experiências empreendidas inicialmente
por Martha Schwartz e Peter Walker que Favole (1995) denomina Jardins Artificiais.
Peter Walker e Martha Schwartz se destacam por um trabalho em que utilizam o
grafismo de forma acentuada nas superfícies pavimentadas em composições modulares
que constituem um traçado regulador, pelo qual os elementos naturais
descontextualizados como objetos partidos, com distribuição geométrica evocam uma
paisagem irreal e completamente artificial.
O trabalho de Martha Schwartz evolui para uma condição ainda mais artificial
em pequenos espaços, que Barra (2006) classifica como micropaisagismo. Ela própria
se considera uma híbrida, meio paisagista, meio artista plástica, com inspiração na Land
Art. Sua primeira proposta nesse sentido foi o Bagel Garden, em que dispõe rosquinhas
em um jardim vitoriano fronteiro à sua casa em Boston, fotografou e enviou para a
revista Landscape Architecture, que resolveu transformá-lo em matéria de capa. Isto
92
gerou muita polêmica e muitas críticas, mas estava posta uma nova maneira de se
interpretar um jardim.
Os projetos que se seguiram também despertaram polêmicas como o
Estacionamento da Disney, em que utiliza as técnicas já experimentadas por Peter
Walker em grafismos; o paisagismo do Rio Shopping Center na Geórgia (fig. 109), em
que utiliza trezentas e cinqüenta rãs de cimento pintadas de dourado, num projeto em
que a ousadia e a criatividade estão aliadas ao baixo custo. Uma de suas obras mais
instigantes é o Splice Garden, projetado para o Instituto Whitehead de pesquisas
microbiológicas de Cambridge. Schwartz propõe um quebra cabeças em que divide o
espaço ao meio e implanta um jardim artificial com características de jardim japonês de
um lado e francês de outro, utilizando materiais sintéticos, mas que pela composição
leva as pessoas a “lerem” o espaço como um jardim (Fig.110).
Fig. 109 - Rio Shopping Center – Geórgia
Martha Schwartz
Fonte: Barra, 2006, p. 39
Fig. 110 - Splice Garden – Cambridge – Massachusetts
Martha Schwartz
Fonte: Barra, 2006, p. 45
3.3.2 Arquitetura: pós-moderno e contemporâneo
As primeiras experiências do paisagismo com inspiração na arquitetura, no
período imediatamente após o moderno, surgiram na criação de cenários. Os primeiros
projetos criados nesse campo foram realizados por arquitetos de tendência pós-moderna,
no sentido estilístico do termo. A Piazza d’Itália (fig.111), projeto de Charles Moore de
1976, talvez seja o exemplo mais radical, no sentido do exagero. O projeto utiliza todo
93
tipo de referência e de elementos e materiais com a intenção de representar uma
“italianidade”, mas que se aproxima muito do “kitsch” e do caricatural.
Entretanto, o excesso dos elementos acrescenta no projeto uma marca forte e livre, em que
todos os diferentes códigos aparecem, competindo uns ao lado dos outros, criando muitas
vezes desarmonia pelo exagero. (...) O maior valor em termos ambientais consiste no
estabelecimento de uma memória, um resgate do clássico, como um elemento essencial para a
criação de nova paisagem que se anuncia (VIEIRA, 2007, p.200,201).
Outro exemplo da tendência pós-moderna como obra referencial é a Tsukuba
Centre Square (fig.112), obra do arquiteto Arata Isozaki, de 1983; porém neste projeto a
referência ao passado é bem mais sutil e equilibrada, apresentando menor número de
elementos e cores.
Fig. 111 - Piazza d’Itália –EUA - 1976
Charles Moore
Fonte: Favole, 2006, p. 79
Fig. 112 - Tsukuba Centre Square - Japão - 1983
Arata Isozaki
Fonte: Favole, 2006, p. 73
A tendência pós-moderna no paisagismo teve difusão inclusive no Brasil,
durante certo período. Isso se verifica nos projetos da Praça Itália (fig.113), projeto do
arquiteto Carlos Maximiliano Fayet
66
, em Porto Alegre (l992) e nas intervenções do
programa Rio Cidade, mais especificamente na Praça de Espanha (fig.114), no bairro de
Ipanema, Rio de Janeiro (1998), projeto do arquiteto Paulo Casé
67
e Luiz Acioli.
66
Carlos Maximiliano Fayet (1930 - 2007). Arquiteto, nasceu em Domingos Martins – RS - Brasil, graduou-se em
Artes no Instituto de Belas Artes, e em Arquitetura e, posteriormente, em Urbanismo, na Faculdade de Arquitetura da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi professor titular desta Universidade e trabalhou durante na Prefeitura
de Porto Alegre. Em projetos de edificações teve grande destaque com obras como o Palácio da Justiça de Porto
Alegre, o Auditório Araújo Viana , a Refinaria Alberto Pasqualini e a Praça Itália.
67
Paulo Casé (1931). Arquiteto, nascido no Rio de Janeiro, em 1931. Destacam-se trabalhos desenvolvidos como os
dos hotéis Hilton e Meridien (atualmente Iberostar) e o prédio Rio Metropolitan, no Rio de Janeiro e o Hotel Porto do
94
Fig. 113 - Praça Itália - Porto Alegre - 1992
Carlos Maximiliano Fayet
Fonte: Robba, 2002, p.195
Fig. 114 - Praça de Espanha - Rio de
Janeiro - 1998
Paulo Case e Luiz Acioli
Fonte: Soter, 1996, p.71
Na evolução dessa tendência de inspiração na arquitetura, o paisagismo passou a
incorporar a linguagem do desconstrutivismo, com uma forte influência das idéias de
Peter Eisenman, como se apresenta nos trabalhos de Peter Walker. Na figura 115, vê-se
o uso das tramas giradas e superpostas criando um jogo sobre o gramado da
Universidade de Cambridge. A exemplo da arquitetura, o paisagismo passa também a se
utilizar de conceitos da filosofia e da ciência.
No jardim Necco, Peter Walker aplica sobre o gramado da Universidade de
Cambridge duas tramas superpostas, uma linha formada por tiras de chocolate da
fábrica Necco, e uma outra trama formada por pneus de automóvel pintados de branco,
criando um espaço de tensão e dinamismo gerado apenas pela imposição das tramas. A
inspiração nas pesquisas sobre arquitetura de Peter Eisenman é evidente.
No projeto premiado na VI Bienal de Arquitetura e Urbanismo - Lisboa´08, a
Praça Turca (Juazeiro/BA, 2005) dos arquitetos Naia Alban Suarez e Moacyr Peres
Gramacho, um interessante traçado irregular e sem hierarquias estabelece formas
estilhaçadas para os pisos, canteiros e bancos remetendo a conceitos da física como os
fractalis
68
. Essa pequena praça no interior do Estado da Bahia, embora seja
sol em Guarapari. Na área de urbanismo, desenvolveu os projetos do Rio-Cidade dos bairros de Ipanema e Bangu, e
da Cidade das Crianças, construída no bairro de Santa Cruz.
68
Um fractal é um objeto geométrico que pode ser dividido em partes, cada uma das quais semelhante ao objeto
original. Diz-se que os fractais têm infinitos detalhes, são geralmente auto-similares e independem de escala. Em
95
inegavelmente uma proposição contemporânea antenada com as tendências globais, não
aparenta discrepância com o contexto local, aparece como o novo, mas não dissociada
da cultura nordestina, a cobertura trançada, de material reciclável remete aos trabalhos
do artesanato local (fig.116).
Fig. 115 - Jardin Necco - Campus do MIT
Cambridge - 1980
Peter Walker e Martha Schwartz
Fonte: Bradley-Hole, 2009, p.38
Fig. 116 - Praça Turca - Juazeiro - BA - 2005
Naia Alban e Moacyr Gramacho
Fonte: Portal Vitruvius, 2008 (notícia em
27/06/2008)
No Parque Gringrin do arquiteto Toyo Ito, uma obra que se desenvolve em todas
as direções, para cima e para baixo (no subsolo), dentro e fora, e sem nenhuma
hierarquia, sem um começo ou um fim aparentes, remete aos conceitos de rizoma
69
da
filosofia de Deleuze (fig.117)
Além das contribuições do desconstrutivismo e dos conceitos citados, o
paisagismo também se apropria da tendência arquitetônica de continuidade do moderno.
Isso se observa em projetos rigorosamente racionais, com utilização do vocabulário
moderno, mas de uma conceituação mais intelectualizada em que o resultado é uma
obra de profunda ordenação formal e mental, como nos exemplos da Praça da Sinagoga
(Onda, Espanha, 2001), do arquiteto Hélio Piñon (fig.118), no Museu de Escultura (São
Paulo, 1987-1995), do arquiteto Paulo Mendes da Rocha (fig.119) e na Praça das Águas
(Campinas, São Paulo, 2004), do escritório Dal Pian Arquitetos (fig.120).
muitos casos um fractal pode ser gerado por um padrão repetido, tipicamente um processo recorrente ou iterativo.O
termo foi criado em 1975 por Benoît Mandelbrot, matemático francês nascido na Polónia, que descobriu a geometria
fractal na década de 1970 do século XX, a partir do adjetivo latino fractus, do verbo frangere, que significa quebrar.
69
Rizoma é um conceito chave para pensar o mundo contemporâneo, desenvolvido por Gilles Deleuze e Félix
Guatarri, um rizoma não tem nem princípio nem fim, e tampouco memória. Pode romper-se ou interromper-se em
qualquer ponto e sempre recomeça em uma outra conexão. É um processo, uma estratégia de distribuição orgânica,
sem hierarquias, sua essência é temporal. No rizoma, o grau de caos aumenta e qualquer referência geométrica se
dilui.
96
Fig. 117 - Parque Gringrin – Hakata Bay - Island City -
Fukuoka - Japão - 2005
Toyo Ito & Associates Architects
Fonte: http://arquict.wordpress/2008/03/25
Fig. 118 - Praça da Sinagoga –
Helio Piñon
Fonte: Maffuz, InfoIAB-RS, 2003
Fig. 119 - Museu Brasileiro de Esculturas -
MUBE – São Paulo - Brasil - 1987-1995
Paulo M. Rocha e Roberto Burle Marx
Fonte:
Fig. 120 - Praça das águas - Campinas - Brasil -2004
Dal Pian Arquitetos
Fonte: Vidiella, 2008, p.439
Tendências mais radicais que se apropriam de conceitos da arquitetura se
expressam através da exacerbação da tecnologia. O projeto de Márcio Kogan para o
concurso do Los Angeles Civic Park (2003), em que sob um deck de madeira
equipamentos de esporte, cultura e lazer emergem do subsolo por meio elevadores
hidráulicos, criando uma outra paisagem e novas opções de lazer é um exemplo
97
(fig.121). A solução remete ao projeto de Zaha Hadid para o concurso do Parc de La
Villette, no que diz respeito ao aspecto tecnológico.
Uma outra tendência no paisagismo contemporâneo é o uso de materiais,
mobiliário e iluminação de interiores no espaço externo, que aparece de forma explícita
no projeto para Sala Urbana de St. Gallen (Suíça, 2005), projeto do arquiteto Carlos
Martinez (fig.122). O arquiteto recobre com uma espécie de tapete sintético, uma área
de pedestres no distrito financeiro da cidade, recobrindo bancos e mesas que faz com
que eles pareçam brotar do chão. A qualidade do material e da iluminação faz com que
as relações interior/exterior se invertam, dando a impressão que as fachadas dos
edifícios são as paredes internas de um grande salão.
Fig. 121 - Los Angeles Civic Park - Los Angeles - EUA - 2003
Márcio Kogan - Arquiteto
Disponível em www.piniweb.com.br/.../parque-multitematico
Fig. 122 - Sala Urbana St. Gallen - St.
Gallen Suiça - 2005
Carlos Martinez Arquiteto
Fonte: Vidiella, 2008, p.367
3.3.3 Análise visual e percepção do meio ambiente
No campo teórico, os aspectos estéticos e simbólicos, por sua natureza subjetiva,
são os de maior complexidade, que se reflete sobre a forma de análise e a maneira de se
transpor esses dados para o projeto.
Essas questões se reportam a duas correntes principais que permeiam o desenho
urbano, a arquitetura e o paisagismo, que são a “análise visual” e a “percepção do meio
ambiente” (DEL RIO, 1990, p.86). Na linha da análise visual, a obra de Cullen (1961) é
98
a mais consistente, embora seja criticada por sua exagerada preocupação com os
aspectos visuais do ambiente, em detrimento de outras abordagens igualmente
importantes.
Para ele, uma edificação isolada é uma obra de arquitetura, mas um grupo delas já conforma
uma outra arte, diferente de arquitetura, uma arte de relacionamento (CULLEN, 1961). O
objetivo é a exploração do drama e dos efeitos emocionais, sentidos a partir de nossa
experiência visual dos conjuntos edificados, algo que a solução meramente “científica” é
incapaz. (DEL RIO, 1990, p.87)
Cullen (1961) apresenta três formas pelas quais o ambiente pode gerar respostas
emocionais: ótica, lugar e conteúdo.
1- Ótica – considera as reações a partir de nossas experiências simplesmente
visuais e estéticas dos caminhos, conjuntos, espaços, edificações, etc..
2- Lugar – possui um sentido topológico e diz respeito a nossa posição em
relação a um conjunto de elementos que conformam a envolvente. Envolvem a noção de
aqui – lá, dentro – fora, sensações de pertencimento e de proteção.
3- Conteúdo – refere-se a um conjunto de significados percebidos na experiência
com o espaço por meio da cor, textura, escala etc. Cullen (1961) define como temáticas
a serem analisadas: intimidade, multiplicidade de usos, escala, confusão, complexidade,
etc..
Na linha de “percepção do ambiente”, que se desenvolveu a partir de conceitos e
métodos da psicologia e mais especificamente da teoria da Gestalt
70
, destaca-se a obra
de Kevin Lynch, um dos autores que mais influenciou o campo do desenho urbano.
Lynch (1960) preocupa-se com a questão do usuário, “qual seria o significado da cidade
para seus usuários, identificando suas qualidades e elementos estruturadores”. (DEL
RIO, 1990, p.93).
Neste contexto situa sua teoria baseando-se em três qualidades urbanas como
conceitos de referência: (i) legibilidade, (ii) identidade, estrutura e significado e (iii)
imageabilidade.
70
Teoria da psicologia que considera os fenômenos psicológicos como um conjunto autônomo, indivisível e
articulado na sua configuração, organização e lei interna. Funda-se na idéia de que o todo é mais do que a simples
soma de suas partes.
99
(i) – Legibilidade – facilidade com que as partes e o todo podem ser reconhecidas e
organizadas de forma coerente, não encarando o termo de forma simplista, aponta a
riqueza de detalhes e significado como característica importante na legibilidade, mas
deve-se evitar a confusão visual.
(ii) - Identidade, estrutura e significado – O ambiente deve conter os três componentes:
- Identidade – o que o diferencia de outro, personalização e individualidade.
- Estrutura – as partes e o todo devem ter uma relação precisa e coerente.
- Significado – o observador deve ser capaz de captar o significado do ambiente, seja ele
prático ou emocional.
(iii) – Imageabilidade - qualidade do objeto de evocar uma forte imagem em qualquer
observador. Pode-se compará-la a pregnância – capacidade de uma imagem ser forte o
suficiente para se impor na percepção e na memória do observador.
Embora ao criar estas categorias e instrumentos de análise Lynch (1960) tivesse
em vista sua utilização em abordagens que envolviam os usuários, elas podem ser de
grande valia para análise dos aspectos estéticos e simbólicos na interface com o projeto.
Como se tratam de aspectos mais subjetivos e que na maioria das vezes são
anteriores ao projeto, especialmente no que diz respeito ao aspecto simbólico das
praças, estas categorias se reportam mais a análise de praças construídas. Na prática o
caráter simbólico das praças contemporâneas passa a ser uma invenção, como se pode
observar na instalação de Eisenman e na obra do paisagista Peter Walker.
Fig. 123 - Il giardino dei passi perdutti - Peter
Eisenman
Fonte:www.flickr.com
Fig. 124 - Tanner Fontain - Peter Walker
Fonte:
100
3.4 Aspectos ambientais
A questão dos aspectos ambientais presentes no paisagismo contemporâneo
relaciona-se a uma demanda mundial que atingiu todos os campos de conhecimento e
que diz respeito à ecologia e à sustentabilidade do planeta.
A formação dos conceitos do paisagismo contemporâneo fundamentou-se no estabelecimento
de uma nova linguagem paisagística, em que os jardins refletissem a arte e a cultura
contemporânea, passando pelos movimentos Moderno e Pós Moderno e gradativamente
incorporando preceitos ambientalistas e, sobretudo o da recomposição ecológica (VIEIRA,
2007, p.89).
Paisagistas do período modernista, entre os quais se destaca Roberto Burle Marx
já traziam em seus projetos conceitos que objetivavam melhorar a qualidade ambiental.
Roberto Coelho Cardoso estabelecia entre os princípios de projeto a orientação solar e o
mapa de sombras na implantação do projeto de paisagismo.
Dados como topografia, direção dos ventos, qualidades visuais do entorno, patrimônio, massas
vegetais e recomposição vegetal autóctone, qualidade das águas, insolação, caracterização da
vida animal residente, em conjunto com dados sócio-econômicos e culturais passaram a
constituir os elementos fundamentais para a elaboração do projeto (VIEIRA, 2007, p.196).
Mc. Harg (1969) apresenta as idéias fundadoras do planejamento paisagístico e
segundo depoimento de Vieira (2007, p.199) foi a base metodológica para as
intervenções do projeto “Política do Verde para a Cidade de São Paulo”. A preocupação
com o meio ambiente inicialmente restrita a grupos ecológicos e paisagistas, na década
de 1970 e 1980 institucionaliza-se. A crise dos combustíveis fósseis que provoca uma
guinada mundial para a questão do uso de energias renováveis e mais tarde as
preocupações com o aquecimento global forçam os governos a tomarem atitudes e
instituírem órgãos e políticas de atenção ao meio ambiente.
A participação e o interesse dos cidadãos e das equipes de planejamento urbano
sobre a questão crescem na medida em que a viabilidade do desenvolvimento se torna
mais atrelada à questão da sustentabilidade. A instituição no Brasil da Política Nacional
do Meio Ambiente, em 1973, nas instâncias federal, estadual e municipal, resultado do
protocolo assinado na Conferência de Estocolmo em 1972, e a recente obrigatoriedade
de se explicitar, nos Planos Diretores Participativos, as ações e mecanismos visando à
proteção ambiental, obrigou as empresas a procurarem os profissionais do paisagismo.
101
A resolução 001 de 1986 do Conselho Nacional de Meio Ambiente –
CONAMA, tornando obrigatória a realização dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA)
e os Relatórios de Impacto no Meio Ambiente (RIMA), para empreendimentos de
grande porte, instituiu um novo patamar ao planejamento da paisagem e revelou uma
nova face do paisagismo.
“O planejamento paisagístico só poderá ser realizado por uma equipe multi e interdisciplinar
envolvida com a paisagem a planejar. (...) Caberá ao arquiteto paisagista, integrante dessa
equipe, a importante tarefa de síntese dos inventários e diagnósticos realizados, intervindo em
seguida, no limite de uma delicada faixa que se estabeleceu entre a criatividade pura e as reais
necessidades da comunidade” (MELLO FILHO in CHACEL, 2004, p.22).
Grandes projetos foram realizados neste sentido pelos diversos governos e pela
iniciativa privada, revelando a qualidade do trabalho de preservação e recuperação de
áreas degradadas, dos quais se destacam o Corredor Verde do Tietê em São Paulo (fig.
125) e os diversos projetos realizados por Fernando Chacel na Barra da Tijuca, no Rio
de Janeiro (fig.126 e 127)
É notável nestes projetos, que não se trata de recomposição da natureza, como
Chacel (2004) explicita, é uma criação artificial utilizando as espécies de forma a
facilitar o repovoamento da flora e da fauna característicos do local, em que se
acrescenta o caráter ordenador e estético do espaço.
Fig. 125 - Corredor Verde Tietê - SP
Maria E.Vieira
Fonte: Vieira, 2007, p.229
Fig. 126 - Parque da Gleba E - Rio de Janeiro
Fernando Chacel
Fonte: Chacel, 2004, p.64
Muitas vezes esses critérios de recuperação ambiental são aplicados em projetos
não só de áreas degradadas, mas também como complemento de projetos de restauração
de patrimônio histórico, e dada a obrigatoriedade das RIMAs, em inúmeros projetos de
empreendimentos turísticos, como no recente projeto de Benedito Abbud para um
condomínio residencial em Maceió (fig. 128).
102
“A ECOGÊNESE, então deve ser entendida como uma ação antrópica e parte integrante de
uma paisagem cultural que utiliza, para recuperação dos seus componentes bióticos,
associações e indivíduos próprios que compunham os ecossistemas originais” (CHACEL,
2004, p.23).
Fig. 127 - Rio Office Park - Rio de Janeiro
Fernando Chacel
Fonte: Chacel, 2001, p.117
Fig. 128 - Condomínio Laguna Maceió
Benedito Abbud
Fonte: arquivo CIPESA Engenharia
Como exemplo de projeto de recuperação de área degradada, sem enveredar pela
preservação de patrimônio histórico, e nem para uma intervenção baseada
exclusivamente em conceitos ecológicos, o projeto para o Parque da Juventude (São
Paulo, 1995) da arquiteta paisagista Rosa Kliass. O projeto apresenta o aspecto de
preservação de uma ruína e uma extensa área verde na área central da cidade, entretanto
trata-se de um grande parque de esporte, lazer e contemplação. Pelo seu caráter de
contemplação dos aspectos de preservação histórica e ambiental, assemelha-se ao Parc
del Clot de Barcelona.
Fig. 129 - Parque da Juventude - São Paulo - 1995
Rosa Kliass
Fonte:Vidiella, 2008, p.105
Fig. 130 - Parque da Juventude - detalhe passarelas
Fonte: Vidiella, 2008, p.107
Um dos escritórios mais importantes e reconhecidos internacionalmente em
atuação na área do paisagismo e do urbanismo, na questão principalmente da
sustentabilidade ambiental e no uso de materiais recicláveis, é o West 8, liderado pelo
103
arquiteto Adrian Geuze. No projeto do Oostescheldekering Flood Barrier (Holanda,
1994) as faixas em preto e branco das conchas de mexilhão são tanto peças artísticas da
terra, quanto paisagem (fig.131), e revelam a preocupação ambiental no uso de um
material reciclável. No Arroio Parkway apresenta soluções provocativas e polêmicas
como suas “palmeiras no céu” (fig.132).
Fig. 131 - Oosterscheldekering – Holanda - 1994
West 8
Disponível em: www.west8.nl
Fig. 132 - Arroio Parkway - Passadena - Los
Angeles - 2002
West 8
Fonte: Catálogo da 6ª Bienal Internacional de
Arquitetura - São Paulo, p.259
3.4.1 Conforto Ambiental
A literatura sobre conforto ambiental é bastante extensa quando se trata de
diretrizes para implantação de novas cidades, novas praças, novos edifícios, quando se
tem liberdade para escolha de melhor orientação solar, aproveitamento dos ventos
dominantes, implantação na malha viária, etc.. Entretanto, sobre áreas consolidadas é
bastante reduzida. No caso de projetos de praças em áreas consolidadas das cidades,
como é o caso do estudo e mesmo nas praças novas, o contexto no qual ela vai se
implantar já está posto.
A partir da década de 1970 estudos de diversos pesquisadores estabeleceram
teorias e abordagens sobre o clima urbano, umas mais, outras menos preocupadas em
elaborar subsídios à prática projetual.
De uma maneira geral podem-se observar estudos que estão mais preocupados
com a cidade de forma mais ampla, estudos mais próximos do urbanismo dos anos 1960
e 1970 que são os de Monteiro (1976), Oke (1982), Bitan (1988) e Katzschner (1997).
104
Outros estudos abordam os princípios bioclimáticos, e podem ser considerados como os
mais próximos da escala local do espaço público e do edifício, como os de Higueras
(2006), Oliveira (1988) e Romero (2000 e 2001).
Oliveira (1988) focou seus estudos na forma urbana, definida por ele como o
produto das relações estabelecidas pelo homem entre: a morfologia da massa edificada,
a morfologia dos espaços exteriores de permanência e circulação e a morfologia do solo
/ paisagem.
Estabeleceu sete características da forma urbana, as quais analisa e sugere
diretrizes para o desenho urbano, são elas: rugosidade e porosidade; densidade de
construção; tamanho da estrutura urbana (em altura e extensão horizontal); a ocupação
do solo; a orientação; a permeabilidade superficial do solo urbano; e propriedades
termodinâmicas dos materiais constituintes da estrutura urbana.
Romero (2000; 2001) mostra a preocupação da bioclimatologia e a atividade do
projeto. Percebe-se a preocupação de que os trabalhos produzidos pelo meio acadêmico
resultem em informações e diretrizes de fácil entendimento, que possam auxiliar os
profissionais na prática do projeto.
Em “Princípios bioclimáticos para o desenho urbano” (ROMERO, 2000) elabora
algumas recomendações gerais sobre a radiação, ventilação e vegetação, para projetos
de intervenções urbanas, apresenta os princípios bioclimáticos para regiões tropicais de
clima quente-úmido a partir de quatro critérios básicos: diminuir a temperatura,
incrementar o movimento do ar, evitar a absorção de umidade e proteger das chuvas e
promover seu escoamento rápido.
Romero (2001) traça um amplo panorama, onde situa a questão histórica,
arquitetônica, urbanística e ambiental do espaço público (a praça na maioria das vezes),
com foco na formulação de diretrizes ambientais para intervenções urbanísticas. Propõe
um modelo de análise do espaço público considerando três categorias básicas: o entorno
(espaço urbano mais imediato); a base (espaço sobre o qual se assenta o espaço
público); e a fronteira (espaço que forma o limite ou marco).
105
Fig. 133 - Elementos que conformam o espaço
Fonte: adaptado de ROMERO, 2001, p.155
A ferramenta elaborada por Romero (2001) – Fichamento bioclimático – foi
produzida para análise bioclimática de espaços públicos, entretanto pode ser também
utilizada para análise dos aspectos funcionais e auxiliar como metodologia para
identificação de diretrizes para projeto. A análise se faz a partir da base, que representa
a praça em si, em seguida a fronteira, que é a envoltura espacial da praça e por fim o
entorno que se reporta mais à inserção da praça na malha urbana.
106
3.5 Considerações finais do capítulo 3
Em uma ampliação de escala o paisagismo passou a ter maior interface com o
desenho urbano, intensificou sua forma de atuação com a contribuição da arte
contemporânea e passou a atuar mais fortemente na recriação de áreas degradadas.
No aspecto funcional, a aproximação com o desenho urbano e a arquitetura
torna-se evidente e revela que esforços conjuntos estão sendo empreendidos para
melhor compreensão do fenômeno urbano, no qual o paisagismo está inserido como o
grande promotor da melhoria de qualidade de vida nas cidades. Embora o instrumental
teórico não esteja tão próximo da atividade do projeto, como observado por alguns
autores (KOHLSDORF ,1996 e DEL RIO, 1990), é necessário que esta integração seja
promovida pelos trabalhos mais voltados para a realidade concreta da prática projetual.
Os estudos de análise do espaço público tem contribuído para elaboração de projetos de
paisagismo e mais especificamente os projetos de requalificação de áreas centrais. É
possível ver nesses projetos a utilização de vários instrumentos próprios do campo do
desenho urbano gerando leituras mais complexas que auxiliam a concepção de projetos
mais integrados ao contexto urbano.
Sobre os aspectos estéticos observa-se que a arte e a arquitetura contemporânea
são as principais fontes de inspiração na concepção dos projetos de paisagismo. Esta
questão que já despontava no período moderno, torna-se mais acentuada e adquire
maior liberdade pela percepção de que se trata de projetar uma nova paisagem e dotá-la
de um sentido específico. A dificuldade de se produzir ferramentas para estas análises é
análoga a dificuldade que perpassa as atividades multidisciplinares, certos olhares e
ferramentas produzidas para um fim específico podem colaborar de maneira diferente
da que foi originalmente formulada. A organização do pensamento em estruturas e
tipologias neste caso costuma não ser a forma mais adequada, os estudos passam a ser
mais particularizados e por esta razão parecem não ser eficazes.
No aspecto ambiental, a preocupação com a incorporação do discurso teórico na
prática projetual do espaço público, no qual se inclui a praça, foram mais bem
desenvolvidas, tendo sido produzidas ferramentas que podem ser facilmente utilizadas
pelos projetistas. A arquitetura e o paisagismo contemporâneos devem estreitar a cada
dia esta parceria com a climatologia, os estudos do microclima urbano devem subsidiar
107
a produção de projetos mais ecologicamente corretos e a busca da sustentabilidade. A
análise das praças neste contexto deverá proporcionar uma melhor compreensão de seu
papel no contexto urbano, não só localmente, nas condições de conforto geradas no
interior da praça, mas também em seu reflexo no entorno edificado.
A sobreposição destes três aspectos nas diversas correntes teóricas representa
um outro tipo de organização, o da inter-relação que é uma das características principais
do contemporâneo, o que leva a uma leitura cruzada dos vários aspectos que conferem
qualidade ao espaço público edificado.
108
CAPÍTULO 4:
ESTRATÉGIAS DE PROJETO NO PAISAGISMO
CONTEMPORÂNEO
(...)
devia de ser imaginosa, meio demente, colorida, violenta, irregular.
Ariano Suassuna
109
4.1 Introdução
Este capítulo inicia-se com a discussão das estratégias de projeto correntes no
paisagismo contemporâneo. O termo “estratégia” é aqui entendido como mecanismos,
procedimentos, paradigmas e artefatos formais que aparecem com insistência recorrente
na obra dos arquitetos de hoje conforme Moneo (2007) e será utilizado ao longo da
discussão das estratégias utilizadas no paisagismo contemporâneo e na análise das
praças contemporâneas das quatro capitais brasileiras escolhidas para este estudo: São
Paulo e Rio de Janeiro, na região sudeste e Recife e Maceió, na região nordeste.
Os projetos de São Paulo aqui apresentados: Largo do Anhangabaú (1988) e
Praça do Patriarca (1992/2002) representam as primeiras intervenções de requalificação
urbana no contexto nacional, apresentam por isso, um caráter próprio da época e
também sofreram influências do contexto global, por sua conexão mais intensa com as
transformações ocorridas em outras capitais mundiais. Os projetos do Rio de Janeiro:
Praça Antero de Quental (1994/1996) e Praça José de Alencar (1994/1996), da mesma
forma que em São Paulo e pelos mesmos motivos apresentam influência do que ocorreu
especificamente em Barcelona, apresentando um formalismo mais próximo da
arquitetura pós-moderna. Por fazerem parte do mesmo programa de requalificação
urbana, o Rio-Cidade, foram projetadas e construídas simultanteamente.
Os projetos de Recife e Maceió apresentam um grau maior de homogeneidade
que pode-se reputar ao traço cultural nordestino e curiosamente foram construídas nas
mesmas datas. A Praça de La Coruña (Recife, 1995) e a Praça Gogó da Ema (Maceió,
1995), como parte de um programa nacional de requalificação da orla marítima; a Praça
Rio Branco (Recife, 1999/2000) e o Corredor Cultural Vera Arruda (1999/2000),
integrantes de programas diferentes, o de Recife, um programa de revitalização da área
central da cidade e o de Maceió, uma praça com elementos que enfatizam a cultura
local.
4.2 Estratégias do projeto paisagístico contemporâneo
Uma preocupação de muitos projetistas e teóricos, que têm buscado em seus
estudos recomendações gerais que possam auxiliar na tomada de decisões de projeto, é a
de que essas recomendações resultem em mera cópia de soluções plásticas. Nesse
110
sentido, o estudo de Marta Romero é bastante enfático sobre a possibilidade de
elaboração de diretrizes e ao mesmo tempo preservar a liberdade de soluções
inovadoras.
“A forma exterior dos espaços públicos é uma expressão da sociedade, o que faz inviável e
indesejável seguir modelos preestabelecidos. A independência de outras soluções anteriores
como modelos a serem imitados permitirá chegar a soluções que serão o reflexo de uma
arquitetura situada em nosso tempo, empregando materiais e tecnologias simples, tradicionais
ou avançadas.”(ROMERO, 2001)
O objetivo da apresentação desses projetos, que apontam os princípios de uma
nova maneira de se enfrentar o projeto dos espaços públicos, não é tomá-los como
modelo e sim entender o pensamento que está por trás destas soluções específicas de
resolução de projeto.
As estratégias projetuais utilizadas por paisagistas notáveis como Peter Walker,
Martha Schartz e EDAW
71
(EUA), Arriola & Fiol Arquitectes (Espanha), Toyo Ito
(Japão), Janet Rosenberg & Associates (Canadá), diferem das que se vêem nos projetos
dos paisagistas brasileiros, especialmente por se reportarem com mais freqüência à
arquitetura e mais especificamente à corrente dos desconstrutivistas.
Fig. 134 - Kiel Triangle Plaza - EUA - 2002
PWP Landscape Architecture
Fonte: Vidiella, 2008, p.98
Fig. 135 - Jardins Edifício Gifu Kitagata - Japão
Martha Schwartz
Fonte: Bradley-Hole, 2009, p.60
71
EDAW - Sigla da empresa de arquitetos paisagistas que evoluíram a partir de uma parceria formada por Eckbo,
Francis Dean, Don Austin, e Edward A. Williams, que estabeleceu escritórios em todo o mundo, realizando trabalho
de pequenos jardins à enormes propostas para a conservação de grandes áreas de paisagem natural. Entre os trabalhos
realizados podem ser citados o redesenho do centro de Washington, DC (desde 1976), Eurodisney, Marne-la-Vallée,
França (anos 1990) e Eco City, Tóquio, Japão (1992-1994). A atual diretoria é formada por Joe Brown, Jason Prior e
Danaway Mire.
111
Nos projetos de Peter Walker e Martha Schwartz (Fig.134 e 135), a utilização de
várias tramas geométricas, o uso da cor, o cuidado com a iluminação e o uso da
vegetação como elemento de composição, associados à abordagem tecnológica
produzem sempre grande impacto e acrescentam poesia aos espaços públicos
contemporâneos.
Fig. 136 - Jardines Piccadilly - Manchester - Reino
Unido - 2002
EDAW - Fonte: Vidiella, 2008, p.109
Fig. 137 - Parque Central de Nou Barris -
Barcelona - Espanha - 2007
Arriola & Fiol - Fonte: Vidiella, 2008, p.139
As praças projetadas pelos escritórios: EDAW e Arriola & Fiol (Fig.136 e 137)
têm certa proximidade pelo seu traçado em diagonais e curvas inesperadas que
conformam um espaço em que a velocidade parece ser a tônica, no entanto, sempre
acrescentam elementos lúdicos, como a fonte no Jardim Piccadilly e as luminárias do
Parque Nou Barris.
Fig. 138 - Fira Montjuic 2 - Barcelona - Espanha
- 2005
Toyo Ito & Architects Associates
Fonte: Vidiella, 2008, p.357
Fig. 139 - Plaza Town Hall - Toronto - Canadá - 2005
Janet Rosenberg & Associates
Fonte: Vidiella, 2008, p.374
112
As obras de arquitetura e paisagismo de Toyo Ito apresentam muitas vezes um
caráter tecnológico e um grande domínio de megaestruturas, no exemplo da figura 138,
no entanto, em uma faixa entre a edificação e a rua, com poucos elementos consegue
um magnífico efeito, criando arcos por meio de jorro d’água. A praça canadense de
Janet Rosenberg se aproxima mais dos conceitos americanos de Peter Walker com seus
grafismos e malhas superpostas e acabamentos e mobiliários de interiores (fig.139)
Essas estratégias são bastante visíveis em recomendações para projetos
contemporâneos que se assemelham a uma receita passo a passo, conforme Bradley-
Hole (2007) que propõe uma gramática e uma narrativa em que destaca os conceitos
chave da concepção de jardins: a proporção, a quadrícula, o marco, os limites, o ritmo e
a repetição, assim como a sua progressiva imposição, camada por camada, sobre o
cenário, conformando uma hierarquia de desenho (BRADLEY-HOLE, 2007, p.48).
Fig. 140- Jardim Bury Court - Hampshire, Inglaterra
Christopher Bradley-Hole
Fonte: BRADLEY-HOLE, 2007, p.48 e 49
Observam-se as referências explícitas aos layers do Parc de la Villete e às
malhas estruturantes de Peter Eisenman nesta proposição de abordagem contemporânea
de jardins. A presença de elementos comuns, mais do que um simples modismos ou
uma repetição formal, às vezes freqüente também na arquitetura, releva, entretanto
características de uma linguagem contemporânea que se consolida. As estratégias
contemporâneas passam pelos três aspectos apresentados no capítulo anterior e
assumem na concepção do desenho uma forma comum nos aspectos a seguir:
(i) A presença de um desenho unificador, na forma de grelhas ou layers estruturando o
desenho geral, é uma característica freqüente em projetos das mais diversas escalas e
procedências.
(ii) A linguagem artificial com que é tratada o elemento vegetal, e o cuidadoso
detalhamento dos pisos e equipamentos como arquitetura de interior revela também os
traços do contemporâneo.
113
(iii) A utilização de conceitos da arte abstrata contemporânea nos desenhos de pisos e
objetos de arte, o tratamento da topografia como forma de expressão artística sem se
referenciar obrigatoriamente na topografia natural também está frequentemente presente
na estruturação do desenho contemporâneo do paisagismo.
4.3 Duas praças contemporâneas em São Paulo
As duas praças paulistas apresentadas a seguir: Praça do Patriarca e Vale do
Anhangabaú fazem parte de um processo de revitalização da área central da cidade de
São Paulo, iniciada de l988, que incluiu vários projetos visando uma ampla reforma
conforme figura 126.
As intervenções guardam uma semelhança no aspecto estético: a utilização de
poucos elementos e a criação de espaços sóbrios e de fácil inteligibilidade - herança da
arquitetura neomoderna paulista. Na Praça do Patriarca é bastante notável a tendência
minimalista, já no projeto do Vale do Anhangabaú o uso mais extenso de arborização e
vegetação revela a influência de Burle Marx e dos modernistas americanos.
Fig. 141 - Intervenções na área central de São Paulo
Fonte: Revista PROJETO DESIGN, n
º138, 1991, p.66
114
4.3.1 Vale do Anhangabaú
Ficha técnica
Vale do Anhangabaú Data: 1988
Centro - São Paulo – SP Característica: desenho urbano
Arquitetos: Jamil José Kfouri, Jorge Wilheim e Rosa Grena Kliass
Colaboradores:
Atividade: Praça de circulação de pedestre, de eventos, comércio e contemplação
Na década de 1980 realizou-se um concurso público, parte de uma série de ações
de reordenamento da área central de São Paulo, vencido pela equipe de Jorge Wilheim,
Jamil Kfouri e Rosa Kliass. Neste projeto, o tráfego de veículos da Avenida Prestes
Maia, passa sob uma laje que configura uma grande praça com aproximadamente
60.000 m², que constitui a grande ligação para pedestres entre os dois lados do centro da
cidade (ROBBA, 2002).
Fig. 142 - Vale do Anhangabaú - S.Paulo - SP - 1988
Jamil José Kfouri, Jorgue Wilheim e Rosa Grena Kliass Fonte: Robba, 2002, p.134
115
Neste novo espaço, criado especificamente para conexão, eliminando o hiato
existente pela depressão do terreno e pela avenida de grandes proporções, os arquitetos
tiveram liberdade para propor um misto entre praça, esplanada e parque, que pelas suas
dimensões e localização abriga as mais diversas manifestações (comícios, concertos,
festas e comemorações públicas).
Fig. 143 - Vale do Anhangabaú - planta baixa
Fonte: adaptado Revista Projeto Design, nº160, 1993, p.34/35.
Fig. 144 - Vale do Anhangabaú - detalhe dos
desenhos de piso
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 145 - Vale do Anhanabaú - detalhe escadaria
Foto: Claudio Bergamini - 2008
116
Fig. 146 - Vale do Anhangabaú - ruas de pedestres
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 147 - Vale do Anhangabaú - enquadramento
pela Praça Ramos de Azevedo
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Sob o aspecto funcional, a solução de conexão de duas áreas da cidade por meio
de uma grande laje, revela-se um recurso surpreendente pela sua dimensão e apresenta
uma notável solução de continuidade por meio do tratamento do piso, arborização e
mobiliário urbano com o calçadão da Avenida São João e das ruas adjacentes. A
conexão com a Praça Ramos de Azevedo revela um curioso contraste entre a profusão
de elementos do jardim eclético e a ordenação mais simplificada do jardim
contemporâneo, embora este ainda seja um exemplo não tão radical do uso de
vegetação.
Os grandes espaços multifuncionais que tornam a praça palco de tantas
atividades diversificadas estão distribuídos ao longo de toda a praça, próximo ao
viaduto do Chá apresenta-se em uma série de três arquibancadas irregulares, como se
fossem topografias artificiais que remetem ao projeto da Praça Lovejoy do arquiteto
americano Lawrence Halprin
72
; no eixo da Avenida São João, um terraço elevado que
faz as vezes de palco, se debruça sobre uma depressão onde os degraus irregulares
utilizam o mesmo recurso de uma estranha topografia (fig.145), constituindo um local
72
Lawrence Halprin (Nova Iorque - EUA - 1916). Arquiteto paisagista, professor, formou-se em agronomia na
Universidade Cornell. Em 1935 cursa a Escola de Design de Harvard que tem como prof. Walter Gropius, Marcel
Breuer e Christopher Tunnard. Trabalha com Thomas Dolliver antes de abrir seu próprio escritório em 1949.
117
para shows e sob o qual estão bilheterias, finalmente em frente aos correios um amplo
espaço aberto tendo como fundo o prédio de arquitetura eclética se presta a eventos
populares.
No aspecto estético uma grande curva ondulante estrutura o desenho da praça no
sentido longitudinal (fig.142), contrastando com desenhos geométricos retilíneos
descontínuos e as formas geométricas quebradas dos tanques d’água, em que se percebe
a herança formal de Burle Marx e da escola americana modernista, entretanto
apresentam o choque de formas, a assimetria e ausência de hierarquia do desenho
contemporâneo. O detalhamento preciso dos pisos, da drenagem demonstra o
tratamento do espaço como projeto arquitetônico, traço que se apresenta no paisagismo
contemporâneo.
No aspecto ambiental, o uso da vegetação ainda é um misto, entre o caráter
contemporâneo de utilização do vegetal como elemento escultórico e compositivo nas
áreas de maior circulação e o tratamento de jardim à maneira de Burle Marx, nas áreas
próximas aos edifícios. A conexão com a Praça Ramos de Azevedo, com sua linguagem
peculiar e a ligação através de um extenso gramado com um portal de palmeiras
imperiais se apresenta como um emolduramento recíproco, isto é, do Vale em relação à
praça e da praça em relação ao Vale e confere ao conjunto uma atmosfera amena de um
oásis no centro da cidade (fig.147).
A síntese das preocupações: funcionais, de proporcionar amplos espaços para
múltiplos usos (circulação, eventos, etc.); estéticos, de se apresentar um desenho mais
coerente com o estágio atual das artes; e ambientais, de se prover esta área da cidade de
qualidade ambiental, sem partir para a mimese com a natureza, conforma esta grande
praça como um espaço contemporâneo nas suas intenções e forma.
4.3.2 Praça do Patriarca
Ficha técnica
Praça do Patriarca Data: 1992 - 2002
Centro - São Paulo – SP Característica: desenho urbano
Arquiteto: Paulo Mendes da Rocha
Colaboradores:
Eduardo Colonelli, Kátia Pestana, Giancarlo Latorraca e Marcelo Laurino
Atividade: Praça de circulação de pedestres
118
A Praça do Patriarca tem grande relevância simbólica para a cidade de São
Paulo. Foi construída com a demolição de um quarteirão para fazer a conexão do centro
velho e o novo, dando acesso ao Viaduto do Chá pelas ruas Direita e São Bento.
Em 1992, encontrava-se tomada por pontos de ônibus urbanos, quando a
Associação Viva o Centro, organização que luta pela recuperação da área central de São
Paulo, encomendou um projeto de requalificação da área.
O projeto, sob aparente simplicidade apresenta uma intervenção precisa com
poucos elementos: o piso, com um arabesco de pedra portuguesa, reconstituído com
base em fotografias, e o segundo elemento que é o pórtico com estrutura e cobertura
metálica.
Fig. 148 - Praça do Patriarca - S.Paulo - SP - 1992/2002
Paulo Mendes da Rocha - Fonte: Revista Projeto Design, nº273, 2002, p.38
Fig. 149 - Praça do Patriarca - planta baixa
Paulo Mendes da Rocha
Fonte: Revista Projeto Design, nº273, 2002, p.37
Fig. 150 - Praça do Patriarca - vista do viaduto do
Chá
Foto: Claudio Bergamini - 2008
119
Fig. 151 - Praça do Patriarca – enquadramento
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 152 - Praça do Patriarca - cobertura
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Quanto ao aspecto funcional, relacionado ao contexto urbano, a estratégia do
arquiteto foi a de reconstituir a conexão inicial do projeto da praça, como elemento de
ligação entre o centro antigo e o novo. Esta reconexão se realiza por meio de estratégias
formais de representação de continuidade e de limite. A continuidade do espaço se
obtém por meio do piso em mosaico português que se estende das ruas Direita e São
Bento, passa pela praça prossegue pelo viaduto do Chá e, da ausência de elementos que
obstruam a visão geral do espaço. A conexão se acentua pela construção do pórtico que
emoldura o viaduto e a paisagem do centro novo. O emolduramento, a exemplo dos
existentes nos primórdios do jardim moderno (Villa Noailles – Robert Mallet Stevens)
traz para dentro da praça a paisagem do centro novo, e dá a referência visual de
delimitação e transparência da praça (fig.151).
No aspecto estético é notável o caráter arquitetônico do projeto. A praça é um
projeto de arquitetura, segundo os princípios do neomoderno, um espaço claro,
ordenado e inteligível. Uma praça quase minimalista, mas de grande força expressiva e
poética, aliada à precisão cerebral, como observado por Serapião (2002).
No movimento das peças, é reveladora a jogada que transformou em importante elemento de
projeto a escultura de José Bonifácio, o Patriarca da Independência. Ela foi criada em 1972,
por Alfredo Ceschiatti (1918-1989), (...). Mendes da Rocha recolocou-a em ponto estratégico
da praça, na extremidade próxima às ruas Direita e São Bento, alinhada com o eixo do viaduto
do Chá e enquadrada em uma das laterais do pórtico metálico. Xeque-mate (SERAPIÃO,
2002).
120
Fig. 153 - Praça do Patriarca - detalhe da estátua
Fonte: Revista PROJETO DESIGN, nº 273, p.40
Fig. 154 - Praça do Patriarca - Igreja de Sto. Antônio
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Observa-se o cuidado do arquiteto com a questão simbólica: o desenho do piso
configura o espaço interno da praça, simulando canteiros artificiais, o desenho central
mais elaborado é uma referência da cobertura da entrada da galeria que existia
inicialmente, os desenhos laterais, não são decorativos, mas indicadores simbólicos da
memória da praça. Embora o projeto tenha sido questionado por interferir na
visualização da Igreja de Santo Antonio, vê-se pelo desenho do piso centralizado no
eixo desta, e pelo desenho da implantação em que é o único edifício detalhado em
planta, a importância que o arquiteto dispensou à Igreja (fig.154).
No aspecto ambiental, recuperou-se uma área degradada pela poluição visual,
atmosférica e sonora gerada pela parada de ônibus, com a criação de um amplo espaço
para pedestres. A geração de uma grande sombra pela cobertura metálica é realizada de
forma leve e poética: a casca flutua sobre a escadaria que conduz ao subsolo. Duas
árvores de porte médio pontuam a praça como elementos de composição e também de
contraste essencial para que a praça não se tornasse excessivamente árida e artificial.
Na síntese entre as preocupações funcionais, estéticas e ambientais, prevalece o
aspecto de fluidez espacial e de beleza tecnológica, revelando o ideal de beleza
contemporânea perseguido pelo arquiteto.
121
A beleza é algo que se atribui, e faz muito bem no tempo histórico: beleza do que pode ser
arabescado, que se vê em Veneza em corrimões e guarda-corpos lindíssimos. São de uma
época. Em que ainda não se tinha coragem de atribuir beleza ao próprio engenho de caráter
técnico-científico. Agora vive-se numa época em que se pode atribuir (Paulo Mendes da
Rocha em PIÑON, 2002, p.32).
4.4 Duas praças contemporâneas no Rio de Janeiro
As duas praças cariocas apresentadas a seguir: Praça Antero de Quental e Praça
José de Alencar fazem parte de um projeto de renovação urbana da cidade do Rio de
Janeiro, denominado Rio Cidade, inspirado nas intervenções realizadas com sucesso em
Barcelona. O programa baseava-se em intervenções pontuais, indutoras da
requalificação de áreas escolhidas da cidade.
Fig. 155 – Mapa da Zona Sul do Rio de Janeiro
Fonte: Adaptado de Mapa das artes
Os dois projetos apresentam semelhanças no paisagismo, herança da arquitetura
carioca moderna, mais exuberante e afeita às curvas e profusão de elementos que a dos
exemplos paulistas e, também a forte influência de Burle Marx na linguagem mais
colorida e descontraída dos projetos. Observa-se também certa influência da arquitetura
pós-moderna, no sentido estilístico do termo, de forma mais explícita na proposta de
requalificação para o bairro de Ipanema, e em menor grau nos outros bairros.
4.4.1 Praça Antero de Quental
Ficha técnica
Praça Antero de Quental Data: 1994 - 1996
Bairro do Leblon - Rio de Janeiro – SP Característica: Praça de bairro
122
Arquitetos: Luiz Eduardo Índio da Costa - Arquiteto
Projetos técnicos:
Fernando Magalhães Chacel - Paisagista
Luiz Augusto de Siqueira Índio da Costa - Designer
Atividade: Praça de recreação e lazer
Entre as intervenções do projeto Rio-Cidade, a do Bairro do Leblon, cuja meta
era “reconhecer e enfatizar o desenvolvimento das atividades de lazer”. (PROJETO
DESIGN, nº224, 1998, p.102), e mais especificamente, a da Praça Antero de Quental
foi um dos projetos de maior sucesso, tendo recebido o prêmio da Industrie Fórum
Design (IFD) de Hannover, Alemanha, na categoria design público.
Fig. 156 - Praça Antero de Quental - Rio de Janeiro - RJ - 1994/1996
Índio da Costa Arquitetos Ltda. - Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 157 - Praça Antero de Quental - mapa entorno
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 158 - Praça Antero de Quental - planta
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
123
Como resultante de um concurso público de intervenção urbana no bairro do
Leblon, o projeto da praça estava inserido no plano de reestruturação do bairro que
contemplou a Avenida Ataulfo de Paiva, a Rua Afrânio de Melo Franco e a Praça
Antero de Quental com as principais melhorias.
A estratégia de desenho urbano se materializa na extensão do tratamento de piso,
mobiliário e iluminação presentes na praça, pelas ruas principais do bairro. A integração
da praça ao contexto urbano se faz também por meio de uma ciclovia que atravessa o
bairro e a praça.
O traçado da praça, entretanto ainda assume um aspecto tradicional, com um
vazio central destinado a atividades múltiplas, uma área destinada a playground
rebaixada e cercada de canteiros e arborização, uma área de jogos para idosos (fig.158 e
159), e uma grande área destinada a uma loja de venda de plantas ornamentais que
domina a frente da praça para a Avenida Ataulfo de Paiva e faz a segurança do local,
funcionando 24 horas por dia.
A acessibilidade promovida nessa intervenção é notável, suaves rampas
facilitam a travessia de idosos, crianças e deficientes. O mobiliário (fig.160) e a
iluminação mais requintados apresentam semelhança com os utilizados em interiores,
convidando ao uso da praça em horário noturno (fig.161).
Fig. 159 - Praça Antero de Quental - playground
Foto: Claudio Bergamini- 2008
Fig. 160 - Praça Antero de Quental - pergolado
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Na questão estética e no design do mobiliário reside o ponto mais forte da
característica contemporânea da praça. A utilização de mosaico português e o desenho
com formas curvas remetem inevitavelmente a lembrança da obra de Burle Marx, mas o
desenho das faixas de travessia de pedestres e os globos de concreto pintados com
124
pintura metálica remetem imediatamente à Placa dels Paisos Catalans de Piñon.
Referências à parte, o design do mobiliário, que foi premiado, especialmente o design
dos abrigos de ônibus e postes de iluminação confere uma unidade espacial e atmosfera
contemporânea ao ambiente da praça e adjacências.
Fig. 161 - Praça Antero de Quental - mobiliário
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 162 - Praça Antero de Quental - iluminação
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Tratando-se de uma reforma de uma praça de bairro existente, a arborização já
existia, foram acrescentadas as árvores que fazem a ambientação específica do
playground, protegendo a área da insolação excessiva e do ruído. O mesmo se aplica à
área destinada aos idosos, com o cuidado de evitar copas muito densas e fechadas para
manter a visibilidade e domínio visual do espaço. As floreiras plantadas nas bordas da
praça contribuem para o isolamento do ruído e da poeira das avenidas e trouxeram a
alegria de suas cores ao local.
Todos esses acréscimos contribuíram muito para a melhoria do conforto
ambiental da praça, mas o fator principal foi a implantação da loja de plantas, que se
constitui em uma estratégia que foi muito replicada na cidade do Rio de Janeiro. Essas
lojas funcionam vinte e quatro horas por dia, fazendo a segurança do local, juntamente
com o policiamento e um projeto de iluminação adequado, permitiram o uso noturno
das praças, o que representa um acréscimo, na qualidade de vida nas grandes cidades.
125
Na conjunção dos aspectos funcionais, estéticos e ambientais, constata-se que a
resolução geral se deu por meio do design, contemplando os três aspectos e reforçando a
unidade visual do projeto, o que ensejou a premiação citada no início deste item.
4.4.2 Praça José de Alencar
Ficha técnica
Praça José de Alencar Data: 1994 - 1996
Bairro do Catete - Rio de Janeiro – RJ Característica: Praça de bairro
Arquiteto: PAA Planejamento Arquitetônico e Ambiental Ltda.
Jorge Mário Jaurégui - Arquiteto
Colaboradores:
José Humberto Bertarelli, Renata Griner, Florência Chapuis, Janete de Oliveira Trolles,
Marcos Carrión e Alexandre Costa - Arquitetos
Projetos técnicos:
Pedro Luiz A.L. de Andrade - Engenheiro agrônomo/paisagista
Artur Apelbaum - Luminotécnica
Bitis Aflalo - Designer
Instituto de Tecnologia do cidadão - Engenharia de trânsito
Atividade: Praça de recreação, lazer
Na intervenção realizada no Bairro do Catete, do qual faz parte a Praça José de
Alencar, o ponto de partida foi “reconhecer e valorizar a importância histórica do
bairro”. Nesse sentido a equipe de projetistas liderada pelo arquiteto Jorge Mário
Jaurégui realizou uma série de melhorias recuperando calçadas, introduzindo um novo
mobiliário urbano específico para o bairro, iluminando edifícios e monumentos. A Praça
José de Alencar é uma homenagem ao escritor, José Martiniano de Alencar um dos
expoentes do romantismo, fica na confluência das Ruas do Catete, Marques de
Abrantes, Barão do Flamengo, Conde de Baependí e Senador Vergueiro.
Na sua inserção ao contexto urbano, recuperou-se o traçado original em rótula
existente no início do século, inserindo a praça no eixo da Rua do Catete. Dessa forma a
praça passou a se constituir em um marco visual no bairro. Por questões de trânsito de
automóveis, é dividida em três partes, uma primeira com a escultura do escritor José de
Alencar de autoria de Bernardelli
73
ocupa um pedestal elevado no centro da rótula
73
José Maria Oscar Rodolfo Bernardelli (Guadalajara - México, 1852 - Rio de Janeiro - Brasil, 1931) foi um escultor
e professor. No Brasil se formou e lançou suas obras. Naturalizou-se brasileiro em 1874. Deixou seu país natal em
1866, passando pelo Chile e Argentina e fixando moradia no Rio Grande do Sul. Mudou-se para o Rio de Janeiro,
onde frequentou entre 1870 e 1876 aulas de escultura e de desenho de modelo vivo.Viveu alguns anos na Europa,
estudando em Roma. De volta ao Brasil, passou a atuar como professor de escultura estatuária na Academia Imperial
de Belas Artes e como diretor na recém-criada Escola Nacional de Belas Artes, que chefiou por 25 anos.
126
(fig.162), uma segunda parte ao lado de uma Igreja Metodista, onde existe um
"playground" e por final uma "ilhota", onde se localizam postes de iluminação pública.
A faixa destinada aos veículos que contorna a rótula é de paralelepípedos, o que induz a
diminuição da velocidade e ao mesmo tempo incorpora o espaço da rua ao do pedestre,
fazendo a união das ilhas e esquinas que constituem a praça. As faixas de pedestre que
passam pela rótula em direção ao bairro de Botafogo pelo seu suave declive acentuam
essa idéia de continuidade da praça.
Fig. 163 - Praça José de Alencar - Rio de Janeiro - RJ - 1994/1996
PAA Planejamento Arquitetônico e Ambiental Ltda.
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 164 - Praça José de Alencar - mapa do entorno
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 165 - Praça José de Alencar - Planta
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
O tratamento de piso e o mobiliário urbano também se encarregam de promover
uma integração entre as outras praças do bairro, que também receberam restauração. No
127
Largo do Machado foi restaurado o projeto inicial de Burle Marx, a Praça São Salvador
foi recuperada e alguns terrenos remanescentes das obras do metrô, receberam
tratamento e equipamentos de pequenas praças, são unificados por uma linguagem
comum.
No aspecto estético, o painel artístico representando animais recortados em
chapas metálicas pintadas, que faz fundo à área do playground remete aos grafitis
(fig.165 e 166), o próprio playground, uma estrutura metálica que sustenta uma
plataforma de madeira de onde se estendem os brinquedos, é também uma escultura.
O desenho dos pisos é rigidamente geométrico, um macro grafismo. Na rótula, a
área de calçada é de granilite rosa, sobre uma plataforma elevada de granilite cinza se
ergue um pedestal de granito com desenho elaborado onde está assentada a escultura do
escritor. A faixa de rolagem de paralelepípedos é interrompida pelas faixas de pedestre e
pequenas faixas de granito claro desenhadas em sentido radial que reforçam o sentido
monumental.
Na praça em si, uma malha de granito rosa disciplina o piso de granilite cinza,
onde formas livres delimitam os canteiros, o playground e a loja de plantas. Esta mesma
linguagem e materiais se estendem pelas outras três esquinas que compõem a praça e
pelas ruas adjacentes em direção ao Largo do Machado. Na base das árvores uma grade
metálica protege a árvore e auxilia na drenagem, detalhe que se repete nas calçadas do
bairro promovendo uma linguagem uniforme.
Fig. 166 - Praça José de Alencar - playground
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 167 - Praça José de Alencar - painel artístico
Foto: Claudio Bergamini - 2008
A iluminação da praça apresenta algumas peculiaridades, ao redor da estátua de
José de Alencar, na rótula, seis postes inclinados iluminam a figura de forma profusa, o
128
que promove grande visibilidade sem ofuscamento para pedestres e veículos. Na ilha
que se encontra em frente à rótula, sobre uma base circular revestida de mármore bege
um poste inclinado (fig.167) aponta um refletor para o rosto da figura, como um
holofote. Afora este exagero evidente, a iluminação do restante da praça é bastante
equilibrada, com destaque para a iluminação do painel artístico, em que o refletor está
dentro de um globo de metal pintado de vermelho que parece flutuar em frente ao
painel.
Fig. 168 - Praça José de Alencar - base de refletor
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 169 - Praça José de Alencar - iluminação
Foto: Claudio Bergamini - 2008
No aspecto ambiental, a farta vegetação e a loja de plantas introduzidas pelo
projeto tornaram este cruzamento de vias que era bastante poeirento e desértico em um
agradável espaço de convívio e lazer. A área do playground é bastante arborizada e o
piso é de pissara, constituindo-se em uma contribuição à drenagem das águas de chuva,
já que os pisos de concreto são impermeáveis.
Na conjunção dos aspectos funcionais, estéticos e ambientais, destaca-se o
cuidado com a escala do pedestre. Por ser o cruzamento mais complexo e movimentado
do bairro, os arquitetos se preocuparam não só com a questão da acessibilidade, mas
também em criar um ambiente “amigável” priorizando o pedestre. Próximo às faixas de
pedestres guarda-corpos com floreiras incorporadas sinalizam de forma poética o apreço
à população do bairro.
4.5 Duas praças contemporâneas em Recife
As praças recifenses aqui apresentadas: Praça de La Coruña e Praça Rio Branco
reportam-se também às intervenções urbanas realizadas em Barcelona.
129
Fig. 170 – Mapa da Orla e Centro Histórico de Recife
Fonte: adaptado de Mapa Turístico – Prefeitura
A Praça de La Coruña faz parte de um projeto de requalificação da orla marítima
empreendido em várias capitais brasileiras por iniciativa da União, pois se tratam de
terrenos de marinha, também foram objeto de estudo em projetos denominados Planos
Estratégicos, produzidos sob a consultoria de urbanistas espanhóis visando
especialmente à recuperação econômica da cidade através do turismo. O outro projeto, a
Praça Rio Branco foi realizado através do programa de recuperação de áreas degradadas
na área central de Recife, que tomou o nome de Recife Antigo e recuperou diversos
edifícios históricos, passando a ser o foco da boêmia na cidade.
4.5.1 Praça de La Coruña
Ficha técnica
Praça de La Coruña Data: 1995
Recife - PE Característica: Praça de bairro
Arquitetos: Brena Lúcia de Aguiar Remígio e Maria Inês de Oliveira Mendonça
Atividade: Praça de lazer e contemplação
A Praça La Corunã, faz parte de um conjunto de praças lineares distribuídas ao
longo da praia de Boa Viagem, que funciona como sala de estar para a população do
bairro. Sob o ponto de vista funcional, procurou-se uma integração através da
linguagem utilizada em toda a orla, no que diz respeito aos desenhos e materiais de piso,
mobiliário urbano e obras de arte.
130
Fig. 171 - Praça de La Coruña - Recife - PE - 1995
Brena Lúcia de Aguiar Remígio e Maria Inês de Oliveira Mendonça
Foto: Claudio Bergamini, 2008
Fig. 172 - Praça de La Coruña - planta baixa
Fonte: Robba, 2002, p.271
A acessibilidade da praça está bem resolvida, com rampas bem sinalizadas nas
travessias das vias; a integração formal que se obtém pela extensão do tratamento dos
pisos tanto em relação às ruas internas do bairro, quanto ao acesso à praia é notável.
No que diz respeito ao aspecto estético, buscou-se através da utilização de obras
de arte de artistas pernambucanos dar uma conotação regional, as carrancas remetem ao
artesanato nordestino. Um grupo de esculturas é colocado nas extremidades da praça,
devido à sua escala parecem estar recepcionando as pessoas (fig.170). A formalização
dos canteiros obedece ainda a uma rígida simetria, resquícios da influência eclética nas
praças, entretanto a disposição aleatória dos coqueiros, dentro e fora de canteiros
apresenta um aspecto bastante contemporâneo.
131
Fig. 173 - Praça de La Coruña - grupo de esculturas
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 174 - Praça de La Coruña - detalhe
trepadeira
Foto: Claudio Bergamini - 2008
No piso se utilizam dois materiais distintos: tijolos de barro vermelho e mosaico
português fazendo desenhos em preto e branco formando tapetes nas áreas de
pergolados.
As cores: vermelho, preto e branco do piso repetem-se nas esculturas e nos
pergolados dotando o espaço de unidade e clareza visual ao mesmo tempo em que
provoca um agradável contraste com o verde dos gramados.
No aspecto ambiental, as praças apresentam-se bastante arborizadas, com
árvores de pequeno e médio porte que não obstruem a visibilidade da praia, e o uso de
pergolados cobertos por trepadeiras.
Há certo equilíbrio entre as áreas pavimentadas e os canteiros, auxiliando a
drenagem superficial da praça. As áreas pergoladas, cobertas por buganvilles de várias
cores proporcionam uma agradável sombra nas áreas onde se concentra o mobiliário
urbano - mesinhas e bancos (fig.172).
Na conjunção dos aspectos funcionais, estéticos e ambientais a praça apresenta
um grande equilíbrio entre o design com caráter marcadamente regional e a resolução
cuidadosa de uma praça que se repete com pequenas modificações por toda a orla.
132
4.5.2 Praça Rio Branco (Marco Zero)
Ficha técnica
Praça Rio Branco (Marco Zero) Data: 1999 - 2000
Recife - PE Característica: desenho urbano
Arquitetos: Reginaldo L. Esteves e Fernando Borba
Projetos técnicos:
P.P. Paisagismo - Paisagismo
Cícero Dias - Artista plástico
Francisco Brennand - Artista plástico
Atividade: Praça de eventos
A importância histórica evidente do local, marco zero, além de convergência do
sistema viário projetado no início do século e proximidade com a área de intervenção do
programa Recife Antigo, resgatou um importante espaço cívico existente na cidade
desde o século XVI - o grande arraial da Igreja do Corpo Santo, demolida no início do
século XX.
Fig. 175 - Praça Rio Branco - Recife - PE - 1999/2000
Reginaldo L.Esteves e Fernando Borba - Foto: Claudio Bergamini - 2008
A praça localiza-se no eixo das avenidas, constituindo um marco visual e um
portal para o Recife Antigo, razão pela qual é também denominada de Praça do Marco
Zero, inclusive abriga o totem indicativo deste evento (Fig.175).
O traçado da praça avança sobre a avenida que margeia o mar, constituindo-se
em um redutor de velocidade e enfatizando a visibilidade das avenidas e do mar.
133
O projeto previa a construção de uma praça de esculturas nos arrecifes em frente
à praça que abrigam esculturas, totens de grandes dimensões do artista plástico
Francisco Brennand, um pórtico monumental, ancoradouro e apoio de serviços, que terá
acesso através de barcos que saem da praça.
Esta parte do projeto encontra-se em fase de conclusão e ensejará a continuidade
espacial que caracteriza as intervenções contemporâneas de paisagismo.
Fig. 176 - Praça Rio Branco - planta baixa
Fonte: Robba, 2002, p.272
Fig. 177- Praça Rio Branco - Marco Zero
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Sob o aspecto estético, a participação dos artistas contemporâneos de Recife foi
fundamental para o espírito do projeto.
O grande painel circular do piso da praça de autoria do artista plástico Cícero
Dias em concreto pigmentado, pode ser entendido como um grande jardim dando um
caráter festivo e ao mesmo tempo repleto de simbologia. É constituído de círculos e
anéis coloridos, e contêm o sol e a lua em bronze, os pontos cardeais e os nomes dos
nove planetas solares.
Nas bordas laterais um piso ondulante pintado de azul relembra a praia e as
palmeiras imperiais geometricamente dispostas acentuam o caráter artificial da
composição.
As esculturas de Brennand em frente à praia apresentam um caráter monumental
e misteriosamente medieval, mas ao mesmo tempo acrescentam uma qualidade regional
ao conjunto (fig.176).
134
Fig. 178 - Praça Rio Branco - esculturas de
Brennand
Foto: Claudio Bergamini - 2008
Fig. 179 - Praça Rio Branco - vista noturna
Foto: Claudio Bergamini - 2008
No aspecto ambiental, por se tratar de uma praça de eventos, cuja premissa de
projeto é a visibilidade de um grande espaço vazio, a vegetação só aparece de maneira
sinalizada pelas palmeiras imperiais nos dois extremos da praça, com uma função mais
formal de realçar o portal, do que produzir sombra.
A iluminação permite a freqüência noturna (fig.177), o que, dado as
características da praça, sem áreas consideráveis de sombreamento, é de grande
importância.
Na resolução dos aspectos funcionais, estéticos e ambientais, os arquitetos
privilegiaram o uso da arte como forma de enfatizar a identidade pernambucana, na
produção de um espaço de grande importância, afetivo e simbólico para população de
Recife.
4.6 Duas praças contemporâneas em Maceió
As praças de Maceió aqui apresentadas: Praça Gogó da Ema e Corredor Cultural
Vera Arruda, reportam-se a diferentes programas de requalificação.
O projeto da Praça Gogó da Ema refere-se a uma iniciativa da União de
requalificação da orla marítima ocorrido emrias capitais brasileiras, e consta também
de um conjunto de estratégias visando a recuperação econômica da cidade por meio do
incremento ao turismo.
135
Já o segundo projeto, do Corredor Cultural Vera Arruda foi realizado com o
financiamento do Banco do Brasil em um programa de apoio e incentivo à cultura.
Fig. 180 – Mapa de parte da orla de Maceió
Fonte: Adaptado de Editel
4.6.1 Praça Gogó da Ema
Ficha técnica
Praça Gogó da Ema Data: 1996 reformada em 2002
Bairro Ponta Verde - Maceió - AL Característica: Praça de bairro
Arquiteto: Rosa Elena Tenório Nogueira
Colaboradores:
Tatiane Macedo - Paisagismo
Eurídice Lobo Rocha Leão - Monumento Gogó da Ema
Atividade: Praça de lazer, recreação, alimentação
Por iniciativa da Prefeitura de Maceió, como estratégia de incentivar o turismo,
foi realizado em 1996 um programa de melhoria na orla marítima de Maceió, que
incluía dois projetos principais: o da Praça Multieventos e o da Praça Gogó da Ema.
136
Fig. 181 - Praça Gogó da Ema - Maceió - AL - 1996-2009
Rosa Elena Tenório Nogueira - Foto: Claudio Bergamini - 2009
A Praça Gogó da Ema recebeu esta denominação em homenagem a um dos
símbolos de Maceió durante as primeiras décadas do século XX, um coqueiro cujo
formato diferente – lembrava o pescoço de uma ema – foi motivo de músicas e poemas
(fig.179). Em 1955 tombou durante uma tempestade, mas permanece ainda na memória
do povo e foi homenageado com o monumento e a praça. A intervenção de 1996
introduziu o monumento (fig.180) de autoria da arquiteta Eurídice Leão, mantendo o
piso de mosaico português e instalando uma banca de revistas.
Fig. 182 - Gogó da Ema
Fonte: Arquivo Museu da Imagem e do Som -
Maceió
Fig. 183 - Praça Gogó da Ema - monumento
Foto: Claudio Bergamini - 2009
137
Fig. 184 - Praça Gogó da Ema - mapa do entorno
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 185 - Praça Gogó da Ema - planta
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
Na intervenção de 2009, manteve-se o monumento e foi introduzido um novo
desenho e novos usos. Há maior integração ao contexto urbano na medida em que os
canteiros já não têm um formato que delimita todas as bordas da praça, os canteiros são
pulverizados, gerando maior permeabilidade. Um playground (fig.183) também foi
implantado em apoio à área de alimentação, otimizando o uso da praça especialmente
nos fins de semana, quando a avenida é fechada, tornando a orla da Ponta Verde uma
ampla área de lazer.
Fig. 186 – Praça Gogó da Ema - playground
Foto: Claudio Bergamini - 2009
Fig. 187 - Praça Gogó da Ema - coqueiros
Foto: Claudio Bergamini - 2009
138
O monumento ao Gogó da Ema é uma obra bastante contemporânea, fugindo do
figurativismo, no dizer da autora se impõe pela ausência, além de ser uma obra
interativa, as pessoas circulam por entre as peças e tiram fotos. O desenho do piso é
abstrato e contemporâneo, sem eixos ou hierarquia, formando amplas manchas de cores.
Sob o aspecto ambiental, o piso em mosaico português foi substituído por blocos
intertravados, como é o piso de toda a orla de Maceió, recomendado por suas
características de permeabilidade e facilidade de manutenção.
A vegetação: árvores e coqueiros foram preservados e introduziu-se um tapete
gramado que ressalta a beleza arquitetural dos coqueiros (Fig.184). As árvores
sombreiam o playground e a parte dos fundos da praça de forma a assegurar a ampla
visibilidade do mar.
Na conjunção dos aspectos funcionais, estéticos e ambientais, há de se ressaltar
que a reforma da praça foi devido à necessidade de se abrir espaços para uma atividade
que ali se instalava (área de lanches) e que utilizava os próprios canteiros como apoio.
Entretanto a solução, atendendo a todos os critérios citados, obteve um equilíbrio
notável entre funcionalidade e estética, sem prejuízo para a qualidade ambiental.
Conseguiu-se uma solução contemporânea preservando, entretanto o caráter local e
regional.
4.6.2 Corredor Cultural Vera Arruda
Ficha técnica
Corredor Cultural Vera Arruda Data: 1999/2000
Bairro Stella Maris - Maceió - AL Característica: Galeria de arte
Arquiteto: Tatiane Maria Duarte Macedo e Rosa Elena
Projetos técnicos:
Mirna Porto - curadoria de arte
Atividade: Praça de lazer, recreação, eventos
O projeto do Corredor Cultural Vera Arruda, foi uma iniciativa da Prefeitura de
Maceió para utilização de uma linha específica de financiamento do Banco do Brasil
para projetos culturais. A área é resultante do Loteamento Stella Maris que previu uma
ampla faixa que cruza o bairro de mesmo nome e foi destinada a área verde.
139
Fig. 188 - Corredor Cultural Vera Arruda - Maceió - AL – 1999/2000
Tatiane Macedo e Rosa Elena - Fonte: Arquivo das autoras
Em 1994 a Prefeitura contratou a arquiteta paisagista Tatiane Macedo para
realizar o projeto, a pedido da Associação de Moradores e Amigos do Stella Maris,
preocupados com o estado de abandono em que se encontrava a área, por falta de
recursos o projeto não foi executado. No ano de 1999, surgindo esta oportunidade de
financiamento, a Prefeitura retomou o projeto, que com as devidas modificações e
adaptações foi finalmente viabilizado. O projeto foi realizado e executado rapidamente,
para poder ser inaugurado ainda pela gestão política então no poder, e nesta pressa,
esqueceu-se de instalar os pontos de água para rega dos canteiros e das inúmeras árvores
que foram plantadas no local, conforme depoimento da arquiteta Tatiane Macedo.
Infelizmente a gestão seguinte não priorizou a correção do equívoco, o que dá a praça o
aspecto desértico e o ensejo de algumas críticas quanto ao desempenho ambiental.
140
Fig. 189 - Corredor Cultural Vera Arruda - mapa do entorno
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 190 - Corredor Cultural Vera Arruda - planta
Fonte: Claudio Bergamini, 2009
A principal característica dessa obra é a presença de um grande número de obras
de arte e painéis didáticos sobre personalidades alagoanas.
Uma das exigências do Banco do Brasil para o financiamento da obra foi a
questão cultural, o patrocínio não poderia ser simplesmente de uma praça ou
equipamento comunitário, tinha que estar vinculado à cultura.
A prefeitura contratou então a arquiteta Mirna Porto para a curadoria das obras.
Inicialmente seriam sete áreas temáticas, ocupadas por trabalhos de artistas alagoanos já
falecidos, relativas aos sete espaços entre as quadras, delimitadas pelos cul-de-sacs.
Posteriormente o projeto se ampliou e diversificou, sendo as sete áreas ocupadas mais
livremente e por um maior número de artistas alagoanos.
141
Sob aspectos funcionais, a necessidade de espaço livre para contemplar esses
painéis fez com que a área pavimentada fosse ampliada, o que torna o espaço adequado
para diversas manifestações e usos.
É notável o surgimento de um espaço único, amplo, de ligação das quadras
internas com o mar. Trata-se da única área verde de grandes proporções próxima à praia
existente na cidade.
Fig. 191 - Corredor Cultural Vera Arruda -
playground
Foto: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 192 - Corredor Cultural Vera Arruda - aparelhos
de ginástica
Foto: Claudio Bergamini, 2009
Numa cidade litorânea como Maceió, existe uma tendência a se priorizar como
área de lazer a própria praia, deixando as praças e parques em segundo plano, este foi o
primeiro caso de um amplo espaço de lazer que embora ligado à orla, não faz parte do
projeto orla.
A integração bairros/praia é reforçada pela presença de uma ciclovia que vem
dos bairros mais populares e atravessa a praça em direção à orla.
A área pavimentada é bastante ampla, com especial atenção a acessibilidade, o
piso de concreto permite ao cadeirante circular por toda praça sem passar pelas áreas em
que o piso é de bloco intertravado.
As áreas para atividades solicitadas no primeiro projeto, especificada pelos
moradores foi atendida, constando de: playground (fig.188), área para aparelhos de
ginástica (fig.189), área para eventos, área de pergolados para contemplação (fig.192) e
uma área para lazer infantil (bebês).
142
Fig. 193 - Corredor Cultural Vera Arruda - painéis culturais -
escritores
Foto: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 194 - Corredor Cultural Vera Arruda
- Totem Beto Normande
Foto: Claudio Bergamini, 2009
No aspecto estético, a obrigatoriedade de se apresentar o aspecto cultural ditada
pelo órgão financiador da obra foi uma excelente oportunidade de se criar uma praça
que é uma verdadeira galeria de arte a céu aberto. Painéis que apresentam a imagem e
biografia de personalidades homenageadas: escritores, músicos, cientistas, políticos,
etc., foram gravados em placas de aço inox apoiados em alvenarias que acompanham as
curvas do traçado da praça (fig. 190). Artistas contemporâneos foram convidados a
participar com esculturas distribuídas ao longo da praça reforçando o caráter artístico e
cultural da praça (fig.191).
Os pisos de concreto, intertravado vermelho e gramados formam um desenho
abstrato sem qualquer traçado regulador ou malha, geram elementos amebóides que às
vezes recordam os desenhos de Burle Marx, mas com um tratamento mais fragmentado.
Os círculos gerados pelos cul-de-sacs se ajustam as curvas da ciclovia promovendo um
traçado sinuoso que domina a composição e ameniza o caráter quebrado do desenho de
piso.
Na questão ambiental, o projeto previa uma arborização intensa, promovendo
sombra de grandes árvores pelo trajeto de travessia do parque, infelizmente pelas
questões citadas anteriormente, isso não foi atendido. As trepadeiras dos pergolados e
143
caramanchões (fig.192 e 193) conseguiram sobreviver e amenizam um pouco a falta das
grandes árvores previstas. Atualmente algumas árvores de médio porte que
sobreviveram à falta d’água inicial, contribuem para criação de um microclima mais
agradável na extremidade oeste da praça.
Fig. 195 - Corredor Cultural Vera Arruda -
caramanchão
Foto: Claudio Bergamini, 2009
Fig. 196 - Corredor Cultural Vera Arruda -
pergolado
Foto: Claudio Bergamini, 2009
Nas áreas pavimentadas procurou-se utilizar o concreto em conjunto com o piso
intertravado que por sua permeabilidade auxiliam a drenagem da praça. As áreas
gramadas e arbustivas do projeto original foram preservadas por meio da rega
providenciada pelos próprios moradores.
No atendimento aos aspectos funcionais, estéticos e ambientais, a estratégia da
praça, forçada pelas imposições do patrocinador resultou em uma proposta peculiar na
criação de uma praça única no Estado e talvez na região nordeste pelo seu caráter
artístico e cultural. Foi visto durante o estudo das praças contemporâneas que a presença
de obras de arte em intervenções paisagísticas é uma estratégia corriqueira, entretanto
no Brasil isto não é usual, o que, no caso do Corredor Cultural Vera Arruda torna-se
uma experiência notável pela quantidade e qualidade de obras de arte.
4.7 Considerações finais do capítulo 4
As oito praças analisadas apresentam características semelhantes quanto ao
tratamento conceitual de projeto de paisagismo e diferenças quanto aos aspectos
regionais, culturais e históricos de cada cidade.
São Paulo e Rio de Janeiro sendo as capitais mais próximas das influências
globais apresentam praças com referências americanas e européias respectivamente. As
144
praças de São Paulo aproximam-se mais das praças americanas, com os traços de maior
ordenação e limpeza de elementos, própria da escola americana moderna e o rigor
racionalista mais próprio da arquitetura paulista. As praças do Rio de Janeiro, até por
fazerem parte de um projeto com nítidas raízes na experiência de Barcelona, apresentam
ambientes mais coloridos e descontraídos.
As praças de Recife e Maceió, capitais nordestinas, de referências históricas e
identidade cultural similar, apresentam uma linguagem mais próxima da cultura
popular. As praças de Recife têm na sua concepção a estrutura do paisagismo
contemporâneo, entretanto apresentam uma forte presença da arte e da cultura
pernambucana. O mesmo acontecendo com as praças de Maceió, que além deste recurso
de uso de obras de artistas alagoanos, utiliza a vegetação tropical, especialmente o
coqueiro, que apesar de não ser espécie brasileira, apresenta-se como um forte elemento
simbólico.
145
CONCLUSÃO
O paisagismo contemporâneo constitui-se no maior campo de experimentações
conceituais e formais que envolvem o campo da arquitetura. Nas últimas décadas do
século XX e início do século XXI, assistiram-se as mais radicais propostas de desenho
da paisagem na criação de ambientes exteriores em todas as escalas. Estas
transformações visam à criação de uma nova natureza, mais próxima do ser humano,
mais adequada a sua escala e ao gosto contemporâneo.
O objetivo da pesquisa de identificar os fundamentos teóricos do paisagismo
contemporâneo, não pretendendo constituir-se em uma teoria, mas da mesma maneira
que Moneo (2008), de expressar a inquietação teórica que as obras recentes suscitam;
revelou alguns detalhes interessantes e até surpreendentes. A influência do paisagismo e
da arquitetura moderna na ruptura em relação ao período anterior (ecletismo), no que
diz respeito especialmente à forma, substituiu a imitação por uma idéia autônoma de
forma. Idéia que se esboça nos primeiros jardins modernos e vai se consolidando até
estar plenamente definida no paisagismo contemporâneo, revela um traço de
continuidade que leva inclusive alguns autores como Bradley-Hole (2007) a considerar
o paisagismo que se faz hoje ainda como moderno.
Por outro lado, nos estudos de Peter Walker, paisagistas considerados modernos
como Burle Marx e Barragán são citados como contemporâneos, demonstrando que o
que a princípio parece ser uma grande ruptura, na verdade se apresenta como
continuidade.
No que diz respeito às estratégias projetuais, embora muitas vezes sejam
confundidas com um receituário ou um modismo, sob uma aparente generalização,
revelam-se adequadas a realidades distintas produzindo projetos marcadamente
regionalistas, entretanto com o caráter contemporâneo global, como se observa na Praça
Turca de Naia Alban em Juazeiro/BA.
O estudo das praças revelou também que as estratégias de projeto variam
regionalmente, constituindo quase uma identidade com a cidade em que se situam,
apesar dessa “filiação” ao moderno de poderem ser isoladas e abstraídas, são pensadas
de forma autônoma segundo estratégias particulares, não se tornando fórmulas fáceis ou
146
estereótipos como ocorre às vezes com a arquitetura, e ocorreu com o internacional
style.
Na busca da contextualização do paisagismo contemporâneo e suas influências,
depara-se com a relação interessante entre os aspectos que aparecem de maneira
insistente nas concepções paisagísticas: funcional, estético e ambiental e as disciplinas
que têm contribuído para ampliação do escopo e diversificação formal do paisagismo: o
desenho urbano, a arte e arquitetura contemporâneas e as intervenções de recuperação
de áreas degradadas.
Estas relações não têm a pretensão de ser definidoras de uma leitura do
paisagismo, entretanto mostraram-se bastante adequadas à análise dos projetos
contemporâneos enquanto desenho/desígnio. Podem ser apresentadas também como
categorias de intervenção na apresentação de projetos paisagísticos, normalmente a
classificação de apresentação de projetos tende a ser mais extensa e a apresentar
sobreposições como, por exemplo: paisagem com água, presente em diversos livros de
paisagismo.
As estratégias projetuais de praças contemporâneas na análise de oito praças em
capitais brasileiras revelaram a grande influência destas com o período moderno, ou
seja, a escola americana e a obra de Burle Marx. Demonstra também o percurso de
continuidade da arquitetura moderna no Brasil e sua influência no paisagismo. Também
é notável que dos três paisagistas mais ativos no Brasil: Rosa Grena Kliass, Fernando
Chacel e Benedito Abbud, dois foram alunos de Roberto Coelho Cardoso e dois
estagiaram com Burle Marx.
Antecedentes do Paisagismo Contemporâneo
Por meio da pesquisa pode-se constatar que diferentemente do que se imaginava
a princípio, a abordagem contemporânea deve muito às experiências empreendidas
pelos arquitetos modernos, que na concepção de jardins mais condizentes com a
arquitetura realizaram os primeiros ensaios de criação de ambientes mais artificiais,
estabelecendo uma relação atualizada entre a natureza em seu contexto amplo e a
natureza humana.
147
As experiências empreendidas no jardim moderno, além de um ensaio ao que se
proporia para os espaços públicos, especialmente na revitalização de praças e parques
públicos, consolidaram uma visão do projeto paisagístico como arquitetura da
paisagem, isto é, a compreensão de que o projeto se atém aos mesmos mecanismos que
se considera na concepção do espaço na arquitetura.
Pode-se perceber também que a trajetória do paisagismo moderno no Brasil
apresentava duas figuras principais, os paisagistas Roberto Coelho Cardoso e Roberto
Burle Marx que influenciaram gerações de novos paisagistas, apontando caminhos
diversos entre si, cuja influência perdura até os dias de hoje e que apresentam uma
linguagem até mesmo regional - Cardoso em São Paulo e Burle Marx no Rio de Janeiro.
Paisagismo e Arquitetura Contemporânea
Verifica-se que a relação entre o paisagismo e a arquitetura torna-se mais
explícita a partir do modernismo e paulatinamente mais próxima dos conceitos da
arquitetura e da arte contemporâneas, demonstrando que o paisagismo sempre será
fundamentalmente um espaço, e que ainda que se utilize de materiais diferentes, sempre
estará estreitamente ligado à arquitetura.
A ruptura com o moderno na arquitetura, e a busca de novos caminhos que
passaram pelo pós-moderno, desconstrutivismo e continuidade do moderno, entre
outros, produziram conceitos e instrumentos que apropriados pelo paisagismo tornaram
os espaços externos mais condizentes com a arquitetura e o modo de vida
contemporâneos.
A busca empreendida pela arquitetura de pressupostos teóricos que sustentassem
a prática projetual, após o abandono do arcabouço produzido pelo modernismo, em
outras disciplinas como a filosofia, a arte e a psicologia, por parte de alguns arquitetos
(Eisenman, Tschumi e outros) e a sua negação por outros arquitetos que orientam suas
investigações teóricas no próprio campo da arquitetura (Moneo, Pinõn e outros) reflete-
se também no paisagismo.
Ainda que tenha havido um percurso de continuidade de algumas experiências
do paisagismo moderno, a partir da década de 1980, principalmente com os projetos do
Parc de La Villette e as intervenções de requalificação urbana de Barcelona, houve um
148
redirecionamento nos conceitos e na prática dos projetos de paisagismo, indicando
novos paradigmas e provocando uma demanda por projetos de espaços públicos inédita.
Aspectos Funcionais, Estéticos e Ambientais
Esses aspectos sempre estiveram envolvidos de forma intrínseca na percepção e
análise de projetos e curiosamente se relacionam com as disciplinas que nos últimos
anos se conectam com a questão do paisagismo de maneira tão complexa que em
algumas intervenções torna-se difícil distinguir de que tipo de intervenção se trata.
A busca dos pressupostos teóricos presentes no paisagismo contemporâneo
revela alguns aspectos que requerem especial atenção na concepção do paisagismo.
Iniciada pelos paisagistas modernos na tentativa de compor um quadro do paisagismo
de então, os aspectos funcionais e estéticos são recorrentes no estabelecimento dos
princípios norteadores do projeto. Mais tarde surge a preocupação ambiental, esboçada
pelos paisagistas americanos e posteriormente incorporada de maneira mais explícita a
partir da década de 1980 com as preocupações com o aquecimento global e a
sustentabilidade ambiental do planeta.
Estes três aspectos passam a se relacionar com as disciplinas do desenho urbano,
da arte e arquitetura contemporânea e conforto ambiental, respectivamente, aparecendo
nos projetos contemporâneos de maneira explícita ou implícita na forma de memoriais
justificativos em que se buscam argumentos teóricos próprios dessas disciplinas.
Os estudos produzidos por essas disciplinas procuram produzir recomendações
para projetos de arquitetura e de intervenções no espaço público, recomendações que
passam a ser incorporadas nos projetos e que se apresentam sob a forma de estratégias
recorrentes. Por este motivo orientou-se a discussão para estes aspectos como forma de
se apresentar os fundamentos teóricos que sustentam as estratégias utilizadas pelos
paisagistas na concepção de projetos contemporâneos.
Estratégias projetuais em oito praças brasileiras
Por meio do estudo de oito praças em capitais brasileiras, procurou-se evidenciar
as estratégias de projeto. As estratégias projetuais contemporâneas apresentam uma
quantidade e diversidade de estruturas formais que são utilizadas algumas vezes como
149
fórmulas em manuais de paisagismo contemporâneo; entretanto o intuito desse estudo é
reconhecê-las como estratégias que se reportam a um entendimento da paisagem como
objeto de projeto, e como tal sujeita a leituras comuns na concepção de projeto.
Observa-se a aproximação maior dos conceitos de arquitetura (especialmente
desconstrutivista), de um formalismo mais artificial nos projetos europeus e norte-
americanos, diferentemente dos projetos de paisagistas brasileiros, formados dentro do
espírito da arquitetura moderna, os quais se apresentam com uma linguagem mais
ordenada e de estética neomoderna com forte influência de Roberto Burle Marx no uso
da vegetação.
Entretanto, embora haja uma diferença propiciada pela história e herança
cultural de cada região, os projetos contemporâneos estudados apresentam uma unidade
no que diz respeito à criação de ambientes artificiais, com grande influência da
arquitetura, que sejam mais coerentes com o formalismo, a tecnologia, o espírito e a
poesia contemporânea.
Principais dificuldades
A primeira grande dificuldade do trabalho foi a referente a conceitos e
delimitações do próprio campo do paisagismo. A existência de inúmeros trabalhos que
discutem a paisagem e a natureza sob enfoques muito diversos (da geografia, do
urbanismo, da ecologia, da percepção, de viés cultural e político, etc.). Essa dificuldade
também, apresenta-se inclusive na própria denominação dos projetos, o que levou a
considerar como praça o Vale do Anhangabaú e o Corredor Cultural Vera Arruda, por
suas características funcionais e morfológicas e não pela sua denominação. Na
apresentação de projetos de paisagismo contemporâneo muitas vezes os projetos são
apresentados como intervenções urbanas, mesmo quando se trata de uma praça.
No estudo do paisagismo moderno no Brasil, a principal dificuldade encontrada
foi o fato de que existe muito pouco registro dos projetos, especialmente a carência de
plantas e memoriais justificativos. A obra de Mirna Warchavchick só é apresentada em
fotos que mostram muito pouco da intenção da autora nos jardins, restam apenas
suposições e a constatação do uso de espécies brasileiras de forma inclusive bastante
simbólica.
150
Sobre Waldemar Cordeiro e Roberto Coelho Cardoso apesar de se apresentarem
obras mais recentes, também existem poucos registros. No caso de Cordeiro, entretanto
existem vários depoimentos sobre a sua arte e sobre seus jardins que despertam
curiosidade e apontam uma visão muito contemporânea, mas os registros de fotos e
plantas são escassos.
No caso de Cardoso, mesmo no projeto de uma importante praça de São Paulo, a
Praça Roosevelt, as informações não estão disponíveis, e sua obra construída parece
menor que sua importância como teórico e professor. Somente a obra de Burle Marx
pode ser melhor estudada por meio de plantas, mapas, fotografias e visitas às obras, que
em grande parte ainda se encontram preservadas, inclusive algumas praças de Recife
foram recentemente restauradas (Praça da Casa Forte e Praça Euclides da Cunha, as
mais emblemáticas).
No caso das oito praças escolhidas, a dificuldade também permaneceu, as
plantas e mapas precisaram ser desenhados por meio de informações colhidas no local.
Embora grande parte das praças (as do Rio Cidade e das intervenções de São Paulo)
tenha sido publicada em livros e revistas, os desenhos e memoriais não constam desses
trabalhos, o que dificultou sobremaneira a pesquisa, pois se considera o projeto como
elemento principal do estudo, no qual o desenho, o desígnio, a intenção do projetista
aparece de forma mais explícita.
Sugestões para novas investigações
Durante a pesquisa observou-se a urgente necessidade de se empreender maior
quantidade de trabalhos de pesquisa sobre o paisagismo moderno e contemporâneo,
como maneira de se suprir a lacuna deixada pelas revistas especializadas em arquitetura.
As poucas revistas nacionais dedicadas à arquitetura no decorrer dos últimos
cinco anos diminuíram drasticamente a publicação de projetos de paisagismo.
Os registros de projetos de paisagismo do período moderno se resumem a obra
de Burle Marx. Enquanto existe uma facilidade em se pesquisar a obra de paisagistas
europeus e americanos através de fotos, projetos e memoriais, na pesquisa sobre o
paisagismo moderno brasileiro que é mais recente, cronologicamente falando, a situação
151
torna-se mais complexa. Grande parte dos jardins e praças projetados nesse período
foram modificados ou destruídos.
A pesquisa sobre o paisagismo contemporâneo apresenta as mesmas
dificuldades. Apesar de terem sido empreendidos importantes programas de
requalificação urbana e projetos de caráter nacional como o programa de requalificação
da orla marítma, os registros ainda são escassos. Projetos como o de requalificação da
área central do Rio de Janeiro, que tornou rua de pedestre várias vias no centro, com
dinimuição de faixas de vias mais largas, e outras que se tornaram vias locais, ainda não
foram divulgados em revistas especializadas.
A obra de importantes paisagistas brasileiros contemporâneos como Rosa Kliass,
Fernando Chacel, entre outros tem sido registrada em livros individualmente, e às vezes
são contemplados em livros produzidos fora do Brasil, em que a tônica é a publicação
de uma grande quantidade de projetos de vários autores. As obras individuais
obviamente cobrem uma parte da lacuna bibliográfica sobre o paisagismo, entretanto
cria a falsa visão de que poucos projetistas se ocuparam com o paisagismo no Brasil no
período moderno e contemporâneo.
Embora esta dissertação não seja especificamente sobre a obra do paisagista
Roberto Burle Marx, estudou-se uma grande quantidade de projetos nos quais se
percebe várias fases e a evolução de um desenho, inicialmente dentro de conceitos ainda
ecléticos, posteriormente e de forma abrupta em desenhos de jardins biomórficos, que se
desenvolvem com curvas e cores cada vez mais elaboradas, em seguida um traçado mais
geometrizado utilizando retas e curvas e nas obras finais traçados mais fragmentados de
expressão mais contemporânea. Contudo, os estudos da obra do paisagista abordam
frequentemente o caráter artístico ou ecológico, às vezes de forma simplista, atribuindo
aos jardins a transposição de formas de artistas como Jean Arp, Matisse ou Miró,
exagerando essa influência, sem prestar atenção à tridimensionalidade da obra de Burle
Marx e o caráter personalizado que o artista aplica ao trabalho, ainda que inspirado em
outros artistas.
A questão do estudo do traçado e do projeto como “desenho” poderia revelar
fases distintas e os distintos interesses do paisagista na concepção dos projetos. É
possível vislumbrar estes interesses até pela biografia e pelos depoimentos de Burle
152
Marx, um estudo evidenciando as intenções contidas nos projetos, suas estratégias e
seus pressupostos poderiam apresentar a obra do paisagista sob uma nova perspectiva e
evidenciar sua contemporaneidade.
Considerações finais
Quando nos defrontamos com os ambientes de novos espaços urbanos
projetados com a linguagem contemporânea, percebemos que as perspectivas de criação
desses espaços ainda podem abrigar muitas inovações. A possibilidade de uso noturno
de espaços públicos, superada a questão da segurança, pode incentivar a produção de
espaços completamente diferentes por meio da iluminação artificial, pode-se levar esta
atitude ao extremo de se criar espaços virtuais em locais que têm utilização diversa
durante o dia por meio da tecnologia. O uso das novas tecnologias e novos materiais e o
avanço do design de interiores sobre o espaço público parece ser uma tendência
consolidada.
Ainda há espaço para muita experimentação, entretanto o caminho iniciado pelos
modernistas de concepção do espaço cada vez mais como arquitetura e a liberdade de
criação de um espaço exterior autônomo, sem referência ou cópia da natureza parece ser
um caminho sem retorno. A concepção desse espaço como artifício, vai estar sempre
ligada à natureza e o paisagismo sempre será a construção de uma paisagem para o
Homem.
153
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