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era escrava, aqui no Marajó, marajoara, por parte de mãe! Do Maguary, município
de Soure. Os avós dela tinham fazenda pra lá. Aí, minha mãe, veio pra cá já com a
minha avó, com a mãe dela que tinha sangue de negro. E lá o patrão português se
engraçou e tudo mais e fez a minha mãe. A minha mãe era uma mulata branca.
Professora também, formou-se em professora. E meu pai era de Abaeté, da família
Paes. Minha mãe era da família Cardoso Pena. E meu pai era de Abaeté, era
salesiano e faltava um ano pra ele se formar de padre. Veio a Guerra, a segunda
guerra. Então naquele tempo fazia o recenseamento e o que estivesse enquadrado
naquele perfil tinha que ir pra linha de frente. Como meu pai estudava no colégio
Santo Antonio, faltava um ano pra ele se ordenar padre, certo? De repente a
professora passa assim, o padre (risos) viu a professora morena, aí se encantou.
Isso já aqui em Belém, ela morava em Icoaraci. Quando ele foi pra força pública
do Estado do Pará, ele veio servir aqui em icoaraci. E aí, em Icoaraci, minha vó
morava ali na terceira rua, quase próximo da delegacia, um terrenão grande que
era dos Penas. Naquele tempo: “esse lugar é meu, cercava e pronto”. Era grande,
bonita--- eu cheguei a conhecer. Já nas ruínas. E de repente se casou.
Da parte do meu pai eu tenho sangue de português que o meu bisavô era
português. O meu bisavô era português, o pai dele era português, o meu pai tinha
sangue de português e casou com uma bisneta de escravo. E meu pai era
descendente de italiano com português. Em Abaeté a família Reis e família Paes;
ai então eu estou com sangue de negro, sangue de português e sangue italiano nas
veias. Eu acho muito importante isso: a gente sabe a origem da gente. E como se
diz a árvore biológica (genealógica) da pessoa. Aí nasceu minha irmã que é
falecida, aí nasceu outra irmã que morreu pequenininha, nasceu outra, eu vim
depois, já veio mais um irmão. E aí nós ficamos quatro filhos. E desses quatros
filhos, tem aí os descendentes da minha irmã, os descendentes do meu irmão que
está no Rio. A outra irmã vive comigo aqui que ela é solteira e é deficiente, assim
deficiente que ela num aprendeu ler num aprendeu a escrever, coisas da memória;
não é louca, ela é uma pessoa que não se lembra das coisas, se mandar ela guardar
um objeto... o dela, ela guarda e se lembra , mas manda ela guardar uma coisa,
hoje e amanhã ela não sabe. A mãe professora e ela não aprender a ler de jeito
nenhum. A vida dela é comer, beber, dormir e ver televisão. Beber no sentido de
água, suco, essas coisas. Agora somos três irmãos vivos, um no Rio, que é meu
irmão Pedrinho, ela Terezinha e eu. A vida minha com a minha esposa que
também é descendente de escravos. Bisavó dela era escrava, mãe dela já era daqui
de Icoaraci. Você sabe a escravatura, ela trouxe pontos em vários pontos. Os
portugueses, mais foram os portugueses porque os italianos vieram pra cá e
imigraram pra trabalhar depois dos negros, Mas tinha italianos, turcos. Abaeté era
italiano, turco e português, as primeiras gerações né: gomba bra mi, baça bra mim,
entendeu : O turco é assim: passa na bonde, tira medida aqui no Ver-o-Peso,
tinham muitos que vendiam roupa. O camarada vinha olhar, o cara: ah vem cá,
vem cá, vem cá, compa ropa, tira medida aqui. Tu passou na bonde tira medida
tua. Essa camisa dá pa ti. Botava no cara, olhava aqui pra frente, puxava aqui pra
trás, olhava pra trás ,olhava aqui pra frente, não ficava justo. Quando chegava a
casa que ia vestir... então era. Esse pessoal em Abaeté era português, italiano e
turco. As primeiras gerações, o primeiro pessoal, os primeiros habitantes, essa
coisa toda.
A Zula nasceu aqui numa ilha aqui defronte de Arapiranga, linda por sinal o lugar
é Flexeira, é paralelo ao Cotijuba. Arapiranga fica pra cá e Cotijuba fica assim
(demonstrando com as mãos em paralelo). É coisa de trinta minutos pra atravessar
de um pra outro de barco. Nós se encontramos em Icoaraci, logo em meus
primeiros passos, quando eu comecei a trabalhar. Eu comecei a trabalhar...meu pai
era carpinteiro naval e funcionário público. Fiscal da prefeitura em Abaeté, fiscal
do estado e coletor né. Naquele tempo ele saía pra o interior pra fiscalizar o