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relação entre organização do tráfico, violência e subjetividade – além de ser uma
história de fato interessante.
“(...) eu disse pra ela: tia a senhora tem certeza que ele veio pra cá? Ela disse: sim, tenho.
Então ele deve estar dentro de uma barraca dessas aí. E foi justamente o cara que eu achei.
Eu entrei nas barraca e disse: olha vamos entrar nas barraca aí que eu vou entrar nessa aqui.
E acabei entrando na barraca e o cara tava jogando maquininha de caça-níquel. Entrei na
barraca, olhei pro cara e pensei: pô, esse cara é estranho, nunca tinha visto esse cara aqui
dentro. Aí eu peguei... Mora onde maluco? Aí ele, Bonsucesso. Qual lugar de Bonsucesso?
Aí ele, pô, moro na rua. Aí eu estranhei, pô, não mora aqui. Aí eu peguei e chamei ele,
falei: chega aí. Levei perto da moça e perguntei: é esse daqui? Aí ela tremeu mais ainda,
ficou mais nervosa, com medo da gente liberar ele e ele fazer uma ruindade com ela. E eu
falei assim: ó, pode falar, pode falar, cheguei falar até com ignorância pra ele. Pode falar
que ele não vai embora, pode falar. Aí ela falou assim: foi ele mesmo. Aí eu falei pra ele
assim: por que você roubou a moça aí? Aí ele: não, não roubei não. Aí ela: você me roubou
sim, aqui na entrada. Aí ele tinha falado pra mim que morava em Bonsucesso, mas sendo
onde que a gente tava tinha uma barraca do outro lado e o dono da barraca do outro lado
chegou perto assim, olhou pra ele assim e falou pra mim assim: pô esse cara aí mora lá em
cima na [dentro da favela]. E eu: quê!? Aí ele: é ele mora lá em cima e eu conheço ele, sei
porque ele traz telefone e essas coisa roubada pra mim. Aí eu falei: que isso rapaz, ele falou
que morava em Bonsucesso. Aí ele: não, ele mora lá em cima. Aí eu peguei e falei assim: é
a primeira vez que ele vem pro lado de cá, não é? Aí ele: é a primeira vez, que eu até
estanhei que ele ta aqui. Aí eu falei: qual é? Você não falou que morava lá em Bonsucesso,
eu falei com o cara aqui e ele falou que te conhece. Aí ele olhou pro cara assim e chegou a
tomar um susto. Aí eu peguei e falei assim: irmão, eu ia só mandar os moleques te dar uma
coça, falei assim pra ele, ia só mandar os moleques te dá um corretivo e ia mandar tu se
adiantar. Mas agora você vai conversar com o patrão. Você vai conversar com o patrão
porque você mora no morro, você é cria do morro, então você ta dando motivo. Certo?
Você ta dando motivo. Aí eu peguei e liguei pros caras lá de cima e perguntei aos moleques
lá da boca lá se eles tinha comprado um telefone e os moleque falou assim: pô, fulano ta
com um telefone aqui maneirão. Aí eu falei assim: pô traz esse telefone aí pra mim ver. Aí
os moleque veio de moto. Eu peguei o telefone e falei: de quem você comprou esse telefone
aqui. E o moleque: comprei desse maluco aí ó, comprei desse maluco aí. Ele falou que tinha
roubado lá pro lado lá de Bonsucesso. Aí eu falei: caramba maluco, todo enrolado. O cara
roubou a moça aqui na entrada da favela e a moça mora lá em cima lá. E os moleque falou
vamo levar ele lá pra cima, os moleque queria levar ele lá pra cima. E eu falei: não, vamos
levar ele pra conversar com o patrão lá do outro lado. (...) A senhora falou assim: meu filho
não solta ele agora não porque se ele sair ele pode me pegar ali. Aí eu falei: senhora, pode ir
tranqüila, pode ficar tranqüila que ele vai resolver outra situação. Aí eu peguei e falei: ó,
você vai conversar com o cara [o dono] lá dentro lá, reza pro cara ta de bom humor pra
poder só te dar uns tapas e te liberar. Falei assim pra ele. Aí ele pegou, entrou pra dentro do
carro, pegou e fomos. Aí chegando no patrão lá, o cara era usado mesmo pelo diabo, era
usado mesmo. Aí ele me chamou e perguntou: qual foi? O que que houve lá dentro? Aí eu
falei, esse cara morador lá de cima, cria do morro e roubando morador lá na entrada da
favela. Aí ele falou, ah, não isso não. Aí ele falou assim: já to um tempão sem matar, esse
eu vou pegar ele. Eu ainda tentei aliviar: falei, pô dá só uma coça nele, é cria do morro,
daqui a pouco a família dele vai ficar procurando ele aí. Aí ele: ta tranqüilo. Aí pegou o
maluco, e eu só ouvindo, e falou assim: por causa de que que tu roubou a moça na entrada
da favela? Aí ele falou: pô é que eu sou viciado, pá. Aí ele: ah, é? Tu roubou ela porque
você é viciado? Queria usar droga? Aí ele: queria pô, eu uso. Aí ele: Então tu vai usar droga
agora. Pegou, foi lá e mandou vim a droga pro cara. Eu até pensei que ele ia liberar o cara.
O cara usou a droga. E ele: e você roubou ela mais porquê? Aí ele: pô, porque eu tava com
fome. Tava com fome? Toma aí comida. Comeu a comida e eu lá pensando né, o cara vai
liberar. Daqui a pouco ele me chamou num canto assim e ó: pode levar, pode levar pra
matar irmão. Pode levar que eu to ligado legal que vai continuar roubando. Pode levar, não
dá mole não. Aí eu peguei e... caraca. Peguei assim e: vou levar mais alguém, valeu? Aí ele,
pode levar. Aí eu: então já é. Chamei só os carniceiros. Falei assim: vamo ali comigo ali.
Peguei e fui. Levei. Era quatro e pouca já da manhã. Nós subimos de carro lá pra dentro de
uma mata lá onde os cara matava e ali desceu. Eu parei o carro mais pra baixo e falei: leva