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KATIA MARIA DE SOUZA
TEORIA E PRÁTICA: A FORMAÇÃO E A PRODUÇÃO
DE ENGENHEIROS E ARQUITETOS NO RIO DE
JANEIRO – 1890-1910.
2ª FACHADA MODIFICADA PARA O PRÉDIO
DO JORNAL DO BRASIL-1908
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Centro de Letras e Artes
Escola de Belas Artes
Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais
Rio de Janeiro
2008
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ii
KATIA MARIA DE SOUZA
TEORIA E PRÁTICA: A FORMAÇÃO E A PRODUÇÃO
DE ENGENHEIROS E ARQUITETOS NO RIO DE
JANEIRO – 1890-1910.
Tese de Doutorado em História e Teoria da
Arte - Estudos da História e Crítica da Arte
Orientadora: Profa. Dra. Sonia Gomes
Pereira
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Centro de Letras e Artes
Escola de Belas Artes
Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais
Rio de Janeiro
2008
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SOUZA, Katia Maria de
TEORIA E PRÁTICA: A formação e a produção de
engenheiros e arquitetos no Rio de Janeiro – 1890-1910.
xiv, 457f.
Tese: Doutorado em História e Teoria da Arte (Estudos da
História e Crítica da Arte)
1. História da arquitetura 2. História da engenharia
3.Ensino de arquitetura 4. Ensino de engenharia 4. 1890-
1910 5. Rio de Janeiro
I. Universidade Federal do Rio de Janeiro
II. Título
iv
Katia Maria de Souza
TEORIA E PRÁTICA:
A formação e a produção de engenheiros e arquitetos no Rio de Janeiro –
1890-1910.
Tese submetida ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em
Artes Visuais da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos
requisitos necessários à obtenção do grau de doutor.
_________________________________________
Profa. Dra. Sonia Gomes Pereira
_________________________________________
Profa. Dra. Maria Lucia Bressan Pinheiro
_________________________________________
Prof. Dr. Roberto Conduru
_________________________________________
Profa. Dra. Ana Cavalcanti
_________________________________________
Prof. Dr. Carlos Terra
Rio de Janeiro
Junho 2008
v
AGRADECIMENTOS
A Sonia Gomes Pereira que com sua orientação precisa me auxiliou a superar
as minhas próprias inseguranças, ressaltando a valor da minha pesquisa e o
meu papel de pesquisadora.
A Luciano Migliacio que me auxiliou no início desta tese e durante a minha
passagem pela Universidade de São Paulo.
A Maria Irene Szmrecsanyi da FAU-USP, que com suas observações
contribuíram no delinear preliminar desta tese.
Aos professores da Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo,
por onde passei no início desta pesquisa.
Aos professores da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, que mais uma vez acreditaram no meu trabalho.
Aos funcionários da FAU-USP e EBA-UFRJ.
Aos funcionários das instituições por onde passei ao longo desta pesquisa,
com especial atenção as bibliotecárias e arquivistas do Setor de Documentos
do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro; as funcionárias da Biblioteca do
Clube de Engenharia; aos funcionários do gabinete da diretoria do setor de
Meio Circulante do Banco Central do Brasil; ao Subtenente Antonio Mattos do
Quartel Central do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro; aos
funcionários do Arquivo Nacional, com especial agradecimento a Luiz Antonio;
todos muitos atenciosos e que me ajudaram a descobrir algumas
preciosidades.
Aos amigos e companheiros do TJERJ pelo interesse e apoio na convivência
diária.
A amiga Ruth Nina V. F. Levy, pelas trocas constantes de idéias e livros, além
de me incentivar durante estes anos, juntamente com a amiga Nancy Rabello a
seguir em frente apesar das diversidades que a vida colocava diante de mim.
A amiga Cristina Areias pelo incentivo e apoio com as leituras em francês.
A amiga Helena Uzeda, pela troca de idéias e cuja pesquisa e tese muito
contribuiu na finalização desta tese.
A minha família especialmente a minha mãe e irmã companheiras sempre
presentes, pelo estímulo na conclusão de mais esta etapa da minha vida.
vi
RESUMO
Teoria e Prática: A formação e a produção de engenheiros e arquitetos no Rio
de Janeiro -1890-1910.
A cidade do Rio de Janeiro na passagem do século XIX para o século XX é o
cenário em que se desenvolve o objeto de estudo desta tese. Considerando as
relações entre espaço urbano, arquitetura e a sociedade brasileira do início da
República o objeto de estudo que busco investigar, é a atuação dos
engenheiros verificando a sua contribuição para consolidação da arquitetura
eclética carioca. A arquitetura eclética, então, será investigada adotando a linha
da historiografia atual que aponta nesta produção aspectos de cunho
modernizante atenta as inovações do próprio período. A princípio os
engenheiros despontam como portadores da modernidade e por conta do seu
conhecimento enciclopédico estariam realizando uma arquitetura de cunho
mais racionalista; enquanto os arquitetos teriam ficado reduzidos a meros
realizadores de fachada. No entanto hoje já é possível perceber que os
arquitetos também estavam atentos as mudanças da época e junto com os
engenheiros formavam um grupo profissional bastante atuante na cidade.
Neste sentido foram abordadas a produção de engenheiros e arquitetos, a sua
formação e as relações que estes mantinham entre si o governo republicano.
Esta relação foi estudada através de documentos e publicações da época,
trabalhos atuais sobre a Escola Politécnica e Escola Nacional de Belas Artes,
que formavam respectivamente os engenheiros e arquitetos abordados neste
trabalho, e principalmente através das edificações projetadas e construídas por
cada grupo profissional.
vii
ABSTRACT
Theory and Practice: the study and the practice of engineers and architects in
Rio de Janeiro – 1890-1910.
The city of Rio de Janeiro in the passing by of the XIX century for the XX
century was the scene where the object of this study was develops. Considering
the connection between urban space, architecture and the brazilan society in
the beginning of the Republic, the object of this study that I intend to investigate,
is the actuation of the engineers to verify its contribution for the consolidation of
the eclectic architecture in Rio de Janeiro. So, the eclectic architecture, will be
investigate adopting the actual historiography that see in the engineer’s
architecture some modernizing aspects. In the early years of the XX century the
engineers turned up as the holder of the modernity and because of their
encyclopedic knowledge they were be realizing one architecture more rationalist
and the architects was be reduced to a façade designer’s. However, today is
possible know that the architects were also attentive of the changing of the
period and with the engineers, they constituted an important professional group
working in the city. So this thesis studies the architecture of architects and
engineers, its back-ground and the relation they had with the republican
government. This relation was studied through out documents and accounts
that appeared in the popular press in the final years of the XIX century and the
begging of the XX century, contemporary articles written specifically about the
Escola Politécnica and Escola Nacional de Belas Artes, where the engineers
and architects of the city of Rio de Janeiro were respectively graduated, and
mainly through out the buildings that they design and build.
viii
Lista de Ilustrações
Capítulo 2
Folha de Rosto
1 - Fonte: HONORATO, César T. (coord.) O Clube de Engenharia nos
momentos decisivos da vida do Brasil. Rio de Janeiro: Venosa Design,
1996, p.170.
2 - Foto Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro.
3 – Foto Torres, 7/09/1904- Arquivo D. Glorinha de Frontin Muniz Freire. Fonte:
DEL BRENNA, Giovanna Rosso. (org.) O Rio de Janeiro de Pereira Passos:
uma cidade em questão II. Rio de Janeiro: Index, 1985, p.226.
Texto
Il. 1- Foto de Augusto Malta extraído do livro O Rio de Janeiro de Pereira
Passos
Il. 2 - Fonte: PUC. Catálogo da Exposição - Uma cidade em questão I –
Grandjean de Montigny. Rio de Janeiro : PUC / FUNART, 1979.
Il. 3 - Fonte: Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro – Iconog.2/6/3.
Il. 4 - Fonte: BARREIROS, Eduardo Canabrava. Atlas da Evolução Urbana do
Rio de Janeiro: 1565-1965. Rio de Janeiro : IHGB, 1965.
Il. 5 - Fonte: TELLES, Pedro Carlos da Silva. História da engenharia no Brasil –
Século XX. Rio de Janeiro : Clavero, 1994, contracapa.
Capítulo 3
Folha de Rosto
1 - Foto – Kátia Maria de Souza
2 - Foto Reprodução Marcos Belandi- Coleção Augusto MaltaArquivo Geral da
cidade do Rio de Janeiro
3 - Foto – Kátia Maria de Souza.
Texto
Il. 6 - Fonte: Cartão Postal da Fundação Riozoo
.
ix
II. 7 - Fonte: PEVSNER, Nikolaus. Panorama da arquitetura ocidental. São
Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 340.
Il. 8 - Fonte: FERREZ, Gilberto. O Rio antigo do fotógrafo Marc Ferrez
paisagens e tipos humanos do Rio de Janeiro, 1865-1918. São Paulo: Ex
Libris,1984,p.143.
Il. 9 - Fonte: REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil.
São Paulo : Perspectiva, 1983, p.137.
Il. 10 - Fonte: Álbum da Avenida Central.
Il. 11 - Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Opera houses. In: The Journal of
Decorative and Propaganda Arts., nº21, Miami, 1995, p.47.
Il. 12 - Fonte: SEGAWA, Hugo. Prelúdio da metrópole – arquitetura e
urbanismo em São Paulo na passagem do século XIX ao XX. São Paulo:
Ateliê Editorial, 2000, p.75.
Il. 13 - Fonte: The Journal of Decorative and Propaganda Arts, Miami, nº 21,
1995, p. 90.
Il. 14 - Fonte: REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil,
São Paulo: Perspectiva, 1983, p.177.
Il. 15 - Escola Polytécnica do Rio de Janeiro. Notas de Aula de Architectura
Civil, Hygiene dos Edifícios e Saneamento das Cidades. Rio de Janeiro:
O.N. Soares, 1916.
Il. 16 - Fonte: DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on
Architecture. Los Angeles : The Getty Research Institute, 2000
Il. 17 - Fonte: Escola Polytécnica do Rio de Janeiro. Notas de Aula de
Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e Saneamento das Cidades. Rio
de Janeiro: O.N. Soares, 1916. Clube de Engenharia Cód. (720.9N899)
Il. 18 - Fonte: DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on
Architecture. Los Angeles : The Getty Research Institute, 2000.
Il. 19 - Fonte: Escola Polytécnica do Rio de Janeiro. Notas de Aula de
Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e Saneamento das Cidades. Rio
de Janeiro: O.N. Soares, 1916. Clube de Engenharia Cód. (720.9N899).
Il. 20 - Fonte: CHIAVARI. Maria Pace. Rio de Janeiro: preservação e
modernidade. Rio de Janeiro: Sextante,1998, p.16.
Il. 21 - . Foto-Katia Maria de Souza.
x
Il. 22 - Fonte:TABET, Sergio Roberto. O Rio de Janeiro em antigos cartões
postais. Rio de Janeiro: Edição do autor, 1985, p. 65.
Il. 23 - Fonte: TABET, Sergio Roberto. O Rio de Janeiro em antigos cartões
postais. Rio de Janeiro: Edição do autor, 1985, p. 65.
Il. 24 - Fonte: SANTOS, Paulo. Quatro séculos de arquitetura. Rio de
Janeiro: IAB, 1891, p.79.
Il. 25 - Fonte: SANTOS, Paulo. Quatro séculos de arquitetura. Rio de
Janeiro: IAB, 1891, p.80.
Il. 26 - Fonte: Arquivo Nacional- Comissão Construtora da Av. Central –
Envelope- 37/656. Foto – Katia Maria de Souza.
Capítulo 4
Folha de Rosto
1 -
Arquivo Nacional. 4T/MAP.49. Foto: Katia Maria de Souza
2 - Fonte: Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro- PO015.06DDEE.
3 - Arquivo Nacional. 4T/MAP.54. Foto: Katia Maria de Souza
4 - Fonte: TOSATTO, Pierluigi. Um palácio na história geológica brasileira.
Brasília: DNPM, 1994, p.s/nº.
5 - Fonte: Arquivo Nacional- 4T/MAP-727-24/5/1933. Foto: Katia Maria de
Souza.
6 - Foto trabalhada por Katia Maria de Souza.
Texto
Il. 27 - Fonte: DURAND, Jean-Nicolas-Louis, Précis of lectures on
architecture. Los Angeles: The Getty Research Institute,2000.
Il. 28 – Acima - Arquivo Nacional. 4T/MAP.49; abaixo – Planta
aerofotogramétrica – Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.
Il. 29 e 30- Arquivo Nacional. 4T/MAP.49. Foto: Katia Maria de Souza.
Il. 31 - Foto Kátia Maria de Souza- Maio/2006.
Il. 32 - Fonte : Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro/ Jorge
Czajkowski, organizador. Rio de Janeiro : Casa da Palavra, 2000, p.357.
xi
Il. 33 - Fonte : Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro/ Jorge
Czajkowski, organizador. Rio de Janeiro : Casa da Palavra, 2000, p.357.
Il. 34 - Foto de Kátia Maria de Souza – Maio de 2006.
Il. 35 - Foto de Kátia Maria de Souza – Maio de 2006.
Il. 36 - Foto Kátia Maria de Souza- Maio/2006.
Il. 37 - Foto- Katia Maria de Souza.
Il. 38 – Desenho de abóbadas sob pendentes, Katia Maria de Souza.
Il.39 - Foto - Katia Maria de Souza, Maio/2006.
Il. 40 - Foto – Katia Maria de Souza.
Ilustração 41 - Foto – Katia Maria de Souza.
Il. 42 - Foto – Katia Maria de Souza.
Il. 43 - Foto – Katia Maria de Souza.
Il. 44- Escaneada - Fonte: : COHEN, Alberto A., FRIDMAN, Sergio A. Rio de
Janeiro Ontem e Hoje. Rio de Janeiro : Amazon, 1998.
Il. 45 - LOYER, François, Le siècle de l’industrie. Paris : Skira, 1983, p.33.
Il. 46 – Em torno de um aniversário, catálogo comemorativo dos 80 anos do
prédio da Caixa de Amortização, p. 2 e 3.
Il. 47 e 48 - Fotografias fornecidas pela equipe do MECIR – Banco Central do
Brasil.
Il. 49 - PEVSNER, Nikolaus, A history of building types, New Jersey :
Princeton University Press, 1997, p. 207 e MECIR – Banco Central do Brasil.
Il. 50 - Foto MECIR.
Il. 51 e 52 - Desenho elaborado a partir da descrição publicada na Revista
Kosmo, nov., 1906. Desenho – Katia Maria de Souza.
Il. 53 - Arquivo Nacional – 4T/MAP.49 - 1898.
Il. 54 - Arquivo Nacional – 4T/MAP.49 - 1898.
Il. 55 - Fotos MECIR.
Il. 56 e 57 - Foto – Katia Maria de Souza.
xii
Il. 58 - Fonte: TOSATTO, Pierluigi. Um palácio que foi dos estados,Cadernos
do Patrimônio Cultural, V. 3, n.3, Jul/Dez, 1992, vista geral, p.18.
Il. 59 - PEVSNER, Nikolaus. Hystory of building types. New Jersey :
Princeton University Press, 1997, p. 49.
Il. 60 - Fotolog.terra.com.br
Il. 61 - DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on Architecture.
Los Angeles : The Getty Research Institute, 2000.
Il. 62 e 63 - TOSATTO, Pierluigi. Um palácio que foi dos estados,Cadernos do
Patrimônio Cultural, V. 3, n.3, Jul/Dez, 1992
Il. 64 - Fotolog.terra.com.br
Il. 65, 66 e 67 - . TOSATTO, Pierluigi. Um palácio na história geológica
brasileira. Brasília: DNPM, 1994, p.s/nº
Il. 68 e 69 - Foto profº Olínio Coelho.
Il. 70 e 71 - Fonte: Arquivo Nacional- 4T/MAP-729.
Il. 72 e 73 - Fonte: Arquivo Nacional- 40/MAP.2.
Il. 74 - Fonte: Arquivo Nacional- 4T/MAP-727-24/5/1933.
Il. 75 - Fonte: Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro/ Jorge
Czajkowski, organizador. Rio de Janeiro : Casa da Palavra, 2000, p.57.
Il. 76 -
Arquivo Nacional – 4T/MAP690.
Il. 77, 78, 79 e 80 - Arquivo Nacional – 4T/MAP.689.
Il. 81 - Foto Katia Maria de Souza-2006.
Il. 82 - Fonte: Inepac- Inepac processo de tombamento nº E-18/001016/2004,
fl.30.
Il. 83 - Fonte: Inepac- Inepac processo de tombamento nº E-18/001016/2004,
fl.34.
Il. 84 - DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on Architecture.
Los Angeles : The Getty Research Institute, 2000.
Il. 85 - PEVSNER, Nikolaus. Hystory of building types. New Jersey :
Princeton University Press, 1997, p. 200.
xiii
Il. 86 - Fonte: PEIXOTO, Gustavo Rocha. Reflexos das luzes na terra do sol:
sobre a teoria da arquitetura no Brasil da Independência: 1808-1831. São
Paulo : ProEditores, 2000, p.118.
Il. 87 - Foto: Katia Maria de Souza.
Il. 88 - Arquivo Nacional – Edifício da Antiga Caixa Econômica planta do 1º
pavimento. 4T/MAP.55.
Il. 89 – Desenho de Katia Maria de Souza.
Il. 90 - Inepac processo de tombamento nº E-18/001016/2004, fl.36.
Il. 91 - Fonte: Arquivo Nacional- Comissão Construtora da Av. Central –
Envelope- 37/656. Foto – Katia Maria de Souza.
Il. 92 - Fonte: GERSON, Brasil. História das ruas do Rio. Rio de Janeiro:
Lacerda Ed., 2000.
Il. 93 - Fonte: Arquivo do Jornal do Brasil.
Il. 94 - Fonte: Foto do projeto da segunda fachada do prédio do Jornal do
Brasil—Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro- PO015.06DDEE.
Il. 95 – Fonte: Foto do projeto da segunda fachada do prédio do Jornal do
Brasil—Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro- PO015.06DDEE.
Il. 96 – Fonte: Foto do projeto da primeira fachada do prédio do Jornal do
Brasil—Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro- PO015.06DDEE.
Il. 97 e 98- Fonte: Fotos do Arquivo do Jornal do Brasil.
Il. 99 – Fonte: Arquivo Nacional- Comissão Construtora da Av. Central –
Envelope- 37/656.
Il. 100 a 105-
Fonte: Arquivo do Jornal do Brasil.
Il. 106 – Fonte: Comissão Construtora da Av. Central – Envelope- 37/656.
Ilustração 107- Planta: Comissão Construtora da Av. Central – Envelope-
37/656. Desenho em Autocad - Ana Moura.
Il. 108 e 109 – Foto : Arquivo do Jornal do Brasil, plantas Arquivo Geral da
Cidade do Rio de Janeiro e Arquivo Nacional.
xiv
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO........................................................................................................... 1
2-CAPÍTULO 1 O PAPEL DAS ELITES (POLÍTICAS E TÉCNICAS) NO PAÍS E AS
TRANSFORMAÇÕES URBANAS.........................................................................
33
2.1 A MUDANÇA ESTRUTURAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA............................... 34
2.1.1 As mudanças nas bases das instituições herdadas da monarquia............. 34
2.1.2 As bases do movimento republicano.............................................................. 35
2.1.3 A crise militar..................................................................................................... 37
2.1.4 A influência inglesa........................................................................................... 41
2.1.5 O Abolicionismo................................................................................................ 43
2.1.6 Do Império a República..................................................................................... 45
2.1.7 As elites políticas do início do século XX....................................................... 47
2.2.- O ESTADO E AS OBRAS PÚBLICAS NO RIO DE JANEIRO DO FINAL DO
SÉCULO XIX INÍCIO DO XX........................................................................................
53
2.2.1 O Rio de Janeiro no contexto da implantação republicana.......................... 53
2.2.2 A reforma do Rio de Janeiro e seus técnicos................................................. 56
2.2.3 As primeiras intervenções na malha urbana.................................................. 60
2.2.4 A reforma do período Pereira Passos............................................................. 66
2.2.5 Os engenheiros no cenário do Rio de Janeiro do início do século XX........ 73
3-CAPÍTULO 2 TEORIA E PRÁTICA, FORMAÇÃO E PRODUÇÃO – A
ARQUITETURA NO SÉCULO XIX..............................................................................
78
3.1 A ARQUITETURA NO SÉCULO XIX/INÍCIO DO XX............................................. 79
3.2 O NEOCLASSICISMO........................................................................................... 82
3.3 O ECLETISMO....................................................................................................... 90
3.4 TRANSFORMAÇÕES ESTRUTURAIS- A ARTE DE CONSTRUIR E A
INDUSTRIALIZAÇÃO...................................................................................................
105
3.5- A FORMAÇÃO DE ARQUITETOS E ENGENHEIROS E A ARQUITETURA DO
FINAL DO SÉCULO XIX – NO BRASIL E A QUESTÃO DA LEGALIZAÇÃO DA
PROFISSÃO................................................................................................................
109
3.5.1 A Legalização Profissional............................................................................... 109
3.5.2 A Formação de Arquitetos e Engenheiros...................................................... 115
4- CAPÍTULO 3 PRÉDIOS PÚBLICOS E INSTITUCIONAIS: OBRAS DE
ENGENHEIROS E ARQUITETOS..............................................................................
142
4.1 O PROJETO PARA EDIFÍCIO PÍBLICO E INSTITUCIONAL............................... 144
4.2 PROJETO DE ENGENHEIROS............................................................................ 147
4.2.1 Quartel Central do Corpo de Bombeiros........................................................ 147
4.2.2 Caixa de Amortização....................................................................................... 168
4.2.3 CPRM- Cia de Pesquisa de Recursos Minerais.............................................. 183
4.3 PROJETO DE ARQUITETOS................................................................................ 195
4.3.1 V Batalhão da Polícia Militar............................................................................ 195
4.3.2 Procuradoria Geral do Estado......................................................................... 207
4.3.3 Antigo Prédio do Jornal do Brasil................................................................... 218
.
5-CAPÍTULO 4 – CONCLUSÃO.................................................................................. 246
6- REFERÊNCIAS........................................................................................................ 251
7- ANEXOS.................................................................................................................. 260
1- INTRODUÇÃO
Arquitetura é construção concebida com uma
determinada intenção plástica, em função de uma
determinada época, de um determinado meio, de um
determinado material, de uma determinada técnica e
de um determinado programa.
Lúcio Costa
No campo da arquitetura o objeto de estudo que busco investigar, é
a atuação dos engenheiros verificando a sua contribuição para consolidação da
arquitetura eclética, no Rio de Janeiro.
A arquitetura eclética será investigada adotando a
linha da historiografia atual que aponta nesta produção aspectos de cunho
modernizante atenta as inovações do próprio período.
O período em que tem vigor e que será, portanto estudado é o
período entre 1890 e a primeira década do século XX, quando foram realizadas
as obras de urbanização na cidade, com a conseqüente construção de edifícios
de caráter eclético funcionando como legitimadores da feição que se quer imprimir
à cidade, inserindo-a no conceito de cidade moderna aos moldes da capital
francesa.
É também neste período que ocorrem grandes transformações
políticas e sociais que levam a ascensão dos profissionais de engenharia. Esta
categoria atuou em diversos ramos da engenharia desde a construção das
estradas de ferro até as questões relativas a zoneamento urbano e arquitetura. É
2
esta arquitetura elaborada e construída por estes profissionais que será estudada,
buscando ressaltar o seu fazer arquitetônico, contextualizando-o com o momento
histórico em que atuam e com as questões inerentes à própria arquitetura do final
do século XIX, início do XX.
Neste aspecto a arquitetura teve papel fundamental, pois acredito na
existência de uma relação entre arquitetura e o seu momento histórico, e esta
crença é que me leva a estudar este relacionamento.
Alia-se a este conceito os preceitos de Vitrúvio, de que arquitetura é
solidez, utilidade e beleza, se quisermos nos ater apenas ao objeto em si, mas
arquitetura é antes de tudo a ação do próprio homem no seu meio, e neste
sentido o pensamento e o momento histórico em que esta se insere são
fundamentais. Neste caso convém me remeter a Lúcio Costa:
... uma construção enquanto satisfaz apenas às exigências técnicas e
funcionais - não é ainda arquitetura; quando se perde em intenções
meramente decorativas - tudo não passa de cenografia; mas quando -
popular ou erudita- aquele que a ideou, para e hesita ante a simples escolha
de um espaçamento de pilar ou a relação entre altura e largura de um vão e
se detém na procura obstinada da justa medida entre cheios e vazios, na
fixação dos volumes e subordinação deles a uma lei e se demora atento ao
jogo de materiais e seu valor expressivo - quando tudo isso se vai pouco a
pouco somando, obedecendo aos mais severos preceitos técnicos e
funcionais, mas também aquela intenção superior que seleciona, coordena
e orienta em determinado sentido toda essa massa confusa e contraditória
de detalhes, transmitindo assim ao conjunto ritmo, expressão, unidade e
clareza- o que confere à obra o seu caráter de permanência, isto sim é
“arquitetura.
1
Hoje, quando analisamos a arquitetura do século XIX, verificamos
que ela já apresentava todas as questões que motivaram o advento do
modernismo no que este tem de racionalidade e funcionalidade. Para a crítica da
1
LEMOS, Carlos. O que é arquitetura. São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 38.
3
época, ou seja, no século XIX, a esperança de uma nova arquitetura estava na
indústria, sem ver, no entanto que esta arquitetura já estava sendo feita, eles não
a enxergavam porque existia uma liberdade na utilização do ornamento. Porém o
emprego das formas inspiradas na Antigüidade Clássica possuía um
questionamento e uma reinterpretarão e principalmente uma adequação as novas
tecnologias introduzidas pela industrialização.
Mesmo usando uma linguagem tradicional o Ecletismo introduziu
uma maneira nova no emprego do ornamento, com mais racionalidade e
coerência, o que está relacionado com a questão da conveniência. Neste período
já se falava muito na conveniência arquitetônica, uma arquitetura conveniente
seria aquela que consegue adequar as partes com o todo unindo programa, forma
e função, buscando uma harmonia, sem desprezar o caráter, este mais ligado ao
simbolismo dos ornamentos, mas que também se insere na percepção do todo.
A individualidade na arquitetura do século XIX consegue obedecer
às características particulares de cada povo, apesar da difusão do estilo Beaux-
Arts. Esta individualidade está ligada ao caráter que por sua vez está relacionado
com o ornamental, sendo ele que imprime a individualidade cultural; que pode ser
percebida nos usos dos materiais locais, e até no emprego dos ornamentos que a
princípio nos parecem todos muito semelhantes, mas que possui um código
particular ligado a cada cultura.
Esta noção do todo, do caráter, da decoração é conseqüência da
construção, respeitando a linha construtiva. A percepção visual tem a sua
importância, e neste ponto a proporção é um dos aspectos a ser obedecido, é ela
que dá ao edifício a sensação de segurança, solidez e beleza que se quer
imprimir.
4
O edifício, então, só pode ser entendido como um todo se
distinguindo a beleza, e o ornamento, o que tem a ver com os sentidos. A beleza
é algo inerente ao edifício: ela não pode ser extraída dele e vista por si mesma.
É esta noção de arquitetura que possui sim uma referência histórica,
que emprega o ornamento dentro do contexto do próprio edifício obedecendo às
suas relações e racionalidades, que se distingui no século XIX. Uma racionalidade
que demonstra exatamente o pensamento da época em que o desenvolvimento
industrial e o surgimento de novos materiais usados na indústria como o ferro e
vidro, provocaram a necessidade de se criar uma nova metodologia de projeto, a
modernidade do ecletismo se encontra ai, nesta adequação as novas tecnologias.
Mantêm o vinculo com o passado, mas consegue reinterpreta-lo e dá aos seus
prédios um caráter moderno, pois este já é pensado segundo a sua
funcionalidade obedecendo às novas técnicas construtivas e se inserindo no
conceito de cidade burguesa do período.
Ao traçar um panorama das questões arquitetônicas também vêm à
tona as questões urbanas, uma vez que a arquitetura não pode ser vista
dissociada de seu entorno; e neste caso uma abordagem do pensamento
urbanístico não pode ser separada das transformações culturais que afetaram a
sociedade desde o início do século XIX. Portanto neste contexto a arquitetura e o
urbanismo também são debatidos e a sua prática moderna apontada,
compreendendo que esta não é fruto apenas de rupturas, mas apresenta uma
ampla gama de propostas de considerável diversidade estética e ideológica.
No Brasil a arquitetura Eclética está ligada ao processo de
modernização das cidades. A modernização promovida nas principais cidades do
5
país impõe-se motivada pelo crescimento populacional, inexistência de uma infra-
estrutura básica de saneamento, urbano e transportes.
Caso emblemático de transformação urbana foi a empreendida no
Rio de Janeiro entre 1902 e 1906, feita por equipe de engenheiros liderados pelo
Engenheiro-Prefeito Francisco Pereira Passos e neste caso específico podemos
ver a força de atuação desta categoria profissional
2
.
A reforma, concebida ainda durante o período Imperial foi
implantada com a República, mas percebe-se que este era um período de
ambigüidades, no Rio de Janeiro, conviviam realidades distintas, a construção de
uma cidade moderna e a presença constante de um passado escravocrata,
marcado por uma sociedade patriarcal.
3
Porém, mesmo com este passado e até algumas resistências, as
reformas foram realizadas, a principal delas foi a obra de abertura da Av. Central
onde foram construídos prédios preferencialmente “de uso comercial, ligando o
novo porto a uma praça composta por prédios públicos de porte monumental”
4
.
Neste momento também foram abertas a Av. Beira Mar, ligando o centro aos
bairros da zona sul, sendo também reguladas e linhadas diversas ruas por toda a
cidade.
Este plano de reforma é representativo dos questionamentos que
abordam a cidade moderna e a arquitetura eclética é usada como um símbolo do
ideal de cidade a ser atingida. No caso brasileiro os exemplos foram retirados de
protótipos parisienses, principalmente nos prédios públicos.
2
PEREIRA, Sonia Gomes. A reforma urbana de Pereira Passos e a construção da identidade
carioca. Tese de Doutorado em comunicação e Cultura, Eco/ UFRJ, 1992.
3
COSTA, Ângela Marques e SCHWARCZ, Lilia Moritz. 1890-1914: no tempo das certezas. São
Paulo: Companhia das Letras, 2000.
4
PEREIRA, Sonia Gomes. Arte no Brasil do século XIX. In: Oliveira, Myriam Andrade Ribeiro de
(org.). História da Arte no Brasil/ Textos de Síntese. Rio de Janeiro: UFRJ, p.70.
6
A renovação urbana das cidades no final do século XIX é um
elemento exemplar da atuação dos engenheiros. Neste sentido os profissionais
de engenharia se destacaram como os detentores do conhecimento necessário
para executar o projeto de urbanização das cidades em desenvolvimento.
Na elaboração desta tese, pensou-se a princípio que os
engenheiros estariam realizando, em arquitetura, algo de realmente novo e
moderno para a época, ou seja, os engenheiros estariam mais ligados às
inovações da técnica, e com isto realizariam uma arquitetura de cunho mais
racionalista; enquanto os arquitetos teriam ficado reduzidos a meros realizadores
de fachada.
Isto se daria porque os engenheiros possuiriam uma familiaridade
maior com as tecnologias de ponta do momento. E que se fazem notar na
construção de pontes e estradas de ferro, assim como na montagem de máquinas
para a produção industrial. Ainda, no campo da engenharia civil é possível
apontar para a construção de represas e redes de abastecimento de água e
esgoto, elementos fundamentais na construção de uma infra-estrutura básica no
momento da renovação das cidades do final do século.
No caso do Rio de Janeiro a participação dos engenheiros já se
fazia notar desde o final do século XIX, acentuando-se com a passagem a
República que possuía um claro plano de governo, que além de controlar o
panorama político-econômico, buscava, tal como as principais cidades do mundo,
adotar projetos urbanísticos que procuravam integrar nas cidades a grande massa
trabalhadora.
Esta massa trabalhadora é formada por um significativo número de
trabalhadores livres, antigos escravos, e a progressiva entrada de emigrantes
7
estrangeiros, que vieram para substituir a mão de obra escrava, mas com a
decadência da cultura do café no vale do Paraíba, criou-se um fluxo migratório,
destes estrangeiros, que refluíram para a cidade em busca de novas
oportunidades de trabalho.
Este aumento no contingente populacional precipitou a necessidade
de uma intervenção mais efetiva na malha urbana, promovendo mudanças que
foram estudadas e mais tarde implantadas pelos engenheiros. As transformações
urbanas inauguraram um novo momento na construção civil, com a criação e
construção de novas ruas, novos bairros e também de novas edificações.
A preocupação com o crescimento desordenado da cidade se
intensificou a partir de 1870, devido ao crescente surto de epidemias na cidade, o
que levou o governo a formar uma Comissão de Melhoramentos responsável
pela elaboração de um plano de melhoramentos.
A preocupação com a questão sanitária e o crescimento da cidade
se faz notar pelo número de livros e artigos publicados tratando deste assunto
como o do eng. Francisco de Paula Bicalho sobre abastecimento de água e o de
Tito Barreto Galvão sobre a remodelação da cidade e a questão sanitária, ambos
de 1901
5
.
Este tipo de publicação se tornou freqüente e muitas das questões
abordadas eram levantadas no Clube de Engenharia, principal instituição da
época. A partir de 1887 o clube passou a publicar muitas da idéias discutidas
pelo grupo de associados, em sua revista. Francisco Saturnino de Brito, publica
através da revista “um artigo sobre esgotamento sanitário em que ressalta a
importância de se divulgar a questão da higiene domiciliar: ... o saneamento
5
REZENDE, Vera F. Evolução da produção urbanística na cidade do Rio de Janeiro, 1900 – 1950
– 1965. In: LEME, Maria Cristina da Silva (Coord.). Urbanismo no Brasil – 1895 – 1965. São
Paulo : FAU/ USP/ FUPAM, 1999, p.48.
8
restabelece o funcionamento normal das cidades, cuja salubridade se aprecia
pela saúde de sues habitantes
6
Inspirado nas cidades e no modelo de civilização européia o novo
governo republicano atou de maneira decisiva na malha urbana para a
implantação de seu projeto de modernidade, estabelecendo uma relação direta
entre a forma e conteúdo, ou seja, entre o aspecto da cidade e o seu índice de
civilidade.
Durante o governo de Rodrigues Alves (1902-1906), foram
implantadas uma série de reformas na cidade do Rio de Janeiro acompanhadas
de regras que tinham por objetivo estabelecer a ordem urbana.
Neste momento começaram a se destacar os profissionais ligados
ao conhecimento científico, em especial os engenheiros que estavam atentos a
introdução das novas tecnologias. Estes profissionais participaram do debate em
torno das reformas urbanas atuando em diversas áreas, desde a introdução da
malha ferroviária, melhoria dos portos, saneamento das cidades e até na
arquitetura.
A atuação destes profissionais nos diversos campos da cidade
contribuiu para a formação de um de corpo arquitetônico, uma vez que eles
também projetaram a construíram prédios importantes na cidade do Rio de
Janeiro, que é representativo da arquitetura praticada na época, uma arquitetura
cheia de referências históricas que caracterizam a cidade moderna na passagem
do século XIX para o XX. É esta arquitetura então que será estudada buscando
apontar nela a modernidade do período em que a contribuição dos profissionais
engenheiros foi fundamental.
6
ibidem,p.48.
9
Portanto uma releitura que inclua e análise a produção arquitetônica
dos engenheiros torna-se importante no contexto da arquitetura eclética carioca.
Produção esta que é significativa, pois se insere no momento em que a
engenharia é apontada como um exemplo do pensamento moderno,
principalmente por seu caráter científico, mas que de um modo geral não se
diferencia da arquitetura praticada pelos arquitetos.
A partir do estudo de uma arquitetura moldada segundo as
referências históricas de seu próprio passado, pode-se então lançar um novo
olhar sobre a arquitetura do final do século XIX e início do XX; um olhar que
venha de encontro à crescente consciência de que é necessário empreender uma
re-leitura da arte desse período.
Neste sentido o livro de Marcelo Puppi Por uma história não
moderna da arquitetura
7
me pareceu fundamental. Esta obra, na verdade, propõe,
sobretudo “uma história não moderna da arquitetura do ecletismo carioca”, que é
o título da conclusão do livro.
O livro de Puppi é um estudo denso que pretende mostrar como a
historiografia da arquitetura brasileira foi construída unicamente a partir de
pressupostos modernistas que desvalorizavam a arquitetura do ecletismo,
necessitando assim de re-leituras.
Em seu livro Puppi reuniu os principais autores que escreveram
sobre ecletismo, destacando a importância de uma leitura crítica destes textos. Os
autores reunidos por ele são: Lucio Costa, Paulo Santos, Yves Bruand, Carlos
Lemos, Mario Barata e Giovanna del Brenna. Mesmo reconhecendo que as obras
7
PUPPI, Marcelo. Por uma história não moderna da arquitetura: questões de historiografia.
Campinas: Pontes: CPHA: IFCH: Unicamp, 1998. (Pandora)
10
desses autores não formam um conjunto historiográfico homogêneo, Puppi decide
reuní-los e “dar um estatuto que eles não tem”, o de historiografia, porque;
Primeiro, evidentemente, porque são as únicas páginas disponíveis sobre o
assunto, constituem leitura obrigatória para o interessado, e bem ou mal
informam o leitor a respeito. Segundo, e principalmente, porque apesar de
quase sempre de caráter genérico e lacônicos, eles passam por estudos
históricos fundamentados e suficientes, tomam o lugar destes e assim
obstaculizam uma produção historiográfica de peso. É preciso assim
retomá-los, em seu conjunto, tanto pelo próprio fato de não constituírem
efetivamente uma história do ecletismo carioca, quanto para verificar-se as
razões pelas quais isto não se realizou.
8
O livro de Puppi é interessante por reunir e discutir os principais
autores, mas ainda destaco o livro organizado por Annateresa Fabris inteiramente
dedicado à questão eclética – Ecletismo na arquitetura brasileira
9
, sua
organizadora, diz na introdução que a idéia de dedicar um livro à questão eclética
surgiu por ocasião do II Congresso Nacional de História da Arte (setembro de
1984), dedicado ao Neoclassicismo e Ecletismo e no qual “várias comunicações
abordaram o segundo tema, demonstrando que a questão eclética, por longo
tempo esquecida pela historiografia artística, voltava a merecer o interesse dos
estudiosos, que sobre ela se debruçavam alheios aos preconceitos oriundos da
ortodoxia da ideologia modernista”.
10
O livro, que “procura fornecer um primeiro mapeamento do
significado e dos alcances do Ecletismo no Brasil”
11
, não reproduz as
8
ibidem, p.12.
9
FABRIS, Anateresa. Ecletismo na arquitetura brasileira. São Paulo: Nobel/Edusp, 1987.
10
ibidem, p.7
11
ibidem, p.7
11
comunicações apresentadas no Congresso e sim textos originais encomendados
a historiadores “que estão pesquisando a problemática no momento”
12
.
É interessante notar as palavras de Fabris ao explicar como se deu
a escolha dos exemplos analisados no livro: os exemplos “foram escolhidos tanto
por seu caráter paradigmático (como no caso do Rio de Janeiro, de São Paulo, de
Minas Gerais) quanto para demonstrar a idéia de ‘disseminação geográfica’,
posto que, em todo o Brasil, o Ecletismo foi sinônimo de modernidade e de
modernização”
13
. Isto soa exatamente ao contrário de toda a “historiografia”
traçada por Puppi e, portanto, do espírito do modernismo.
O ecletismo, colocado por Fabris como uma “questão
eminentemente aberta” e que dá margem a diferentes pontos de vista que
dialogam entre si, é então analisado por diferentes autores para diferentes
cidades ou estados do país
14
. A questão no Rio de Janeiro é analisada por
Giovanna Del Brenna e os principais pontos foram analisados através do estudo
de Marcelo Puppi.
Dentre os autores que estudam a atuação dos engenheiros neste
período um trabalho importante é o de Heliana Angotti Salgueiro, Engenheiro
Aarão Reis: o progresso como missão
15
, que trata da produção do engenheiro
Aarão Reis que projetou a cidade de Belo Horizonte. Analisando a obra de Reis a
autora destaca que o este é imbuído de uma missão civilizadora que possui os
conceitos de progresso, utopia e cientismo. Ele representa o homem do século
XIX, um “politécnico que acredita que a educação, instrução, justiça, dignidade,
ciência, técnica, trabalho, indústria, religião moral, intervenção na cidade, território
12
ibidem, p.7
13
ibidem, p.7
14
O texto que abre o livro é de Luciano Patetta e trata do ecletismo na Europa.
15
SALGUEIRO, Heliana Angotti Salgueiro. Engenheiro Aarão Reis: o progresso como missão.
Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro – Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1997.
12
e natureza, levariam a humanidade a se solidarizar na partilha de todos os
progressos”
16
.
Porém a missão tomada por Aarão Reis revela um idealismo utópico
na medida em que a vontade de racionalizar a sociedade esbarra na distância
entre projeto e as condições de realizá-lo, entre os interesses político-
adminstrativos e os ideais da elite científica que levaram a desmantelamento da
utopia do engenheiro.
Este estudo é fundamental para se compreender a atuação dos
engenheiros neste momento da história da arquitetura no Brasil.
Neste esforço de revisão historiográfica cabe ainda ressaltar os
artigos publicados por Sonia Gomes Pereira que empreende uma análise da
revisão historiográfica sobre a Academia de Belas Artes e delineia o estado da
questão nas principais instâncias que a Academia se oferece para estudo, ou
seja, como estrutura de ensino, como instituição normalizadora do campo
artístico e participante do projeto político de construção do imaginário nacional.
17
E neste caso a questão eclética é apontada ao se abordar não
apenas o ensino de arquitetura na Academia de Belas Artes mas também em
artigos específicos sobre arquitetura
18
ou sobre a arte no século XIX
19
.
Já em relação à arquitetura propriamente dita, até agora pouco
explorada, a abordagem será inserida na questão da necessária revisão da
produção que precede o dito modernismo.
16
ibidem, p. 174.
17
PEREIRA, Sonia Gomes. Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro: revisão
historiográfica e estado da questão. Revista Arte & Ensaios. EBA/UFRJ. n. 8, 2001, p. 72-83.
18
PEREIRA, Sonia Gomes. A questão do ornamento na arquitetura eclética. In: CUNHA, Almir
Paredes(org.). Arquivos da Escola de Belas Artes. Rio de Janeiro, 1999, p.139-150.
19
PEREIRA, Sonia Gomes. Arte no Brasil do século XIX. In: Oliveira, Myriam Andrade Ribeiro de
(org.). História da Arte no Brasil/ Textos de Síntese. Rio de Janeiro: UFRJ.
13
No plano internacional esta releitura remonta a 1977, quando uma
exposição no MOMA, Museum of Modern Art de Nova York, analisou a produção
da Ecole de Beaux-Art que buscou abordar este período tabu que foi o século
XIX. Apontando que a nova modernidade é aquela capaz de aceitar a arquitetura
na diversidade de suas manifestações históricas, ao contrário daqueles para
quem a redescoberta de um passado pouco conhecido, repentinamente, provoca
um ódio ao movimento moderno.
O embasamento teórico desta tese se apóia nos autores que
estudam a arquitetura de caráter historicista. A linha adotada por Peter Collins é a
que mais se aproxima da análise que pretendo fazer. Para Collins os limites da
arquitetura moderna são difíceis de definir assim como o de qualquer outra classe
da história. Já no século XVII os arquitetos do Renascimento se chamavam de
modernos para distinguir-se da Antiguidade. Hoje se entende por arquitetura
moderna a que se produz no nosso século, mesmo que todos os estudiosos
recentes remontem às origens do moderno em épocas anteriores, porém sem
estabelecer exatamente seu começo. Uma autoridade como Nikolaus Pevsner se
limita a buscar as raízes do movimento moderno na obra de Willian Morris. Outros
como Henry-Russel Hitchcock, Siegfried Giedion, Vicente Scully, Hans Sedlmayr
e Leonardo Benévolo as buscam no século XVIII. É verdade que as pesquisas
começam muito antes, o concreto armado que hoje utilizamos foi inventado pelos
romanos, mas somente com as investigações de Cointereau podemos utilizá-lo
com grande abrangência. Também não podemos negar que as trocas radicais
que se produziram em meados do século XVIII alteraram tão profundamente as
teorias posteriores da arquitetura que mudaram por completo os ideais
arquitetônicos vigente até aquele momento.
14
Colins defende a adoção da sua periodização (1750- 1950)
lembrando que os arquitetos atuaram, a partir de 1750, por motivações que até
então não tinham. A fixação dos arquitetos da segunda metade do século XVIII as
alusões históricas, as justificações analógicas, as perspectivas assimétricas, ao
detalhismo brutal, a utilização de tipos orientais e técnicas pictóricas, não
somente os diferenciam da tradição dos séculos anteriores, como os relaciona
intimamente com os arquitetos de hoje, dando unidade ao período de 1750-1950,
que este pode ser considerado como um só período arquitetônico.
20
As trocas que tiveram lugar no aspecto dos edifícios durante estes
dois séculos têm sido analisadas por importantes historiadores, e seus livros são
referências importantes na história da arquitetura. Por isso poderia parecer
pretensioso tecer um caminho para contribuir a uma compreensão total deste
período. No entanto todos os trabalhos deste tipo não podem evitar uma limitação
inerente a ocupar-se de toda a evolução das formas mais do que a troca de ideais
que à construção de determinada forma. Lembra que o arquiteto não define a sua
obra por uma série de racionalizações como um cientista, ou através de uma
intuição livre, como o músico e o pintor, mas sim pensando as formas
intuitivamente e tentando explicá-la racionalmente. Produz-se, assim, um
processo dialético regido pelo que podemos chamar a teoria da arquitetura, que
só pode ser estudada em termos filosóficos.
Segundo o autor a tipo de história necessária é aquela denominada
por César Daly, no século XIX, por “história filosófica da arquitetura”
21
; é uma
história que não pretende fazer uma lista de obras construídas e dos progressos
técnicos e sim uma história que revelasse a evolução sofrida pelo pensamento.
20
COLINS, Peter. Los ideales de la arquitectura moderna; su evolucion (1750-1950).
Barcelona: Gustavo Gili, 1998, p.9.
21
ibidem, p. 10.
15
Este também é propósito de Peter Colins lembrando que seu livro pretende fazer
uma história dos pensamentos sobre arquitetura e não uma história da arquitetura
em si; se interessa mais pelas idéias que pelos edifícios, e sua intenção é dar
uma idéia do que os arquitetos estão tratando de obter desde que começou a
idade moderna. Neste sentido se torna importante considerar as idéias do século
XIX, que tem sido injustamente esquecidas e condenadas.
Nas questões entre modernidade e a permanência da tradição
clássica devo ainda destacar os ensaios de Alan Colquhoun que no campo da
teoria arquitetônica trata o racionalismo como um conceito filosófico. Estudando a
arquitetura moderna e indicando nesta a permanência do classicismo, os textos
de Colquhoun ajudam a compreender os caminhos percorridos pela história da
arquitetura moderna.
Dentre os historiadores e teóricos da arquitetura que nos últimos
anos vêm reestudando a arquitetura da virada do século XIX/ XX e verificando
que esta já trazia em si a modernidade que tanto marcou o século XX, destaco:
François Loyer, Luciano Patetta e Kenneth Frampton. Ainda são fundamentais
neste trabalho as análises de Antoine Picon.
No que se refere ao Ecletismo, me baseio num texto de Luciano
Patetta publicado no livro Ecletismo na arquitetura brasileira
22
, que aponta tanto
os motivos que levaram a reavaliação da arquitetura eclética na Europa, quanto
faz uma análise desta arquitetura, apontando nela seu caráter moderno. Destaca
que o Ecletismo é algo que se distingue dos revivals apresentando uma linha
contínua “que percorre toda a trajetória da arquitetura burguesa desde os anos do
22
PATETTA, Luciano. Considerações sobre o Ecletismo na Europa. In: FABRIS, Anateresa.
Op.Cit., 1987, p. 10-27.
16
iluminismo”
23
. Discute a busca de uma linguagem própria para o período e a
importância do profissional de arquitetura na construção de um pensamento
racional no ato de projetar e neste aspecto os profissionais da engenharia foram
de fundamental importância, pois eles introduziram esta racionalidade projetual
que também acabou por se seguida pelos arquitetos.
O autor ainda aponta a importância da sociedade burguesa que
amava as novidades e os avanços tecnológicos e que o Ecletismo foi à cultura
arquitetônica própria desta sociedade, que reduzia a produção artística ao nível
da moda e do gosto. “A estas exigências os arquitetos deram a única resposta
possível uma arquitetura sem grandes tensões espirituais, não autônoma, mas
participante e comprometida até ao próprio sacrifício”
24
Nesta linha distingue três
correntes principais : a da composição estilística, baseada na adoção imitativa
coerente e correta de formas do passado; a do historicismo tipológico, voltado, as
escolhas de cunho analógico que deviam orientar o estilo quanto à finalidade a
que a edificação se destinava; e finalmente a dos “pastiches compositivos que,
com uma maior margem de liberdade, “inventava” soluções estilísticas
historicamente inadmissíveis e, às vezes, beirando o mau gosto”.
25
Lembra ainda que a produção industrial influiu também no canteiro
de obras ao introduzir os elementos construtivos metálicos completamente
estranhos às formas e às proporções dos estilos e das ordens arquitetônicas, e
que estas inovações coincidiu com o dualismo existente entre arquitetos e
engenheiros. E neste caso aponta o emprego da linguagem neogótica como a
que melhor se adaptou a estrutura metálica. A coincidência formal das estruturas
metálicas e as modenaturas góticas se davam em dois aspectos: no aspecto
23
ibidem, p.12.
24
ibidem, p.14.
25
ibidem, p. 15.
17
prático era possível montar igrejas inteiras com seus arcos ogivais e vigas em
ferro que exploravam as possibilidades de montagem; e no aspecto relativo a
concepção de projeto era possível eliminar o afastamento entre engenheiros e
arquitetos filtrando o projeto de engenharia através de uma aguda interpretação
dos esquemas construtivos e composições do gótico. Esta assimilação das
formas góticas levou a criação de novas estruturas metálicas que possibilitou a
formação de arquitetura ainda com referências do passado mas já com um
pensamento moderno.
Para compreender esta arquitetura moderna o livro História Crítica
da Arquitetura Moderna
26
é de fundamental importância. Na primeira parte do
livro, Kenneth Frampton traça um perfil sucinto do que chama de “pré–história” do
Movimento Moderno, abordando as transformações culturais, territoriais e
técnicas das quais emergiu a arquitetura moderna. Afirmando que depois do
Iluminismo a arquitetura parece ter se dividido entre a utopia da vanguarda e a
atitude anti-classicista, anti-racional; neste sentido a cultura burguesa oscilou
entre os extremos da utopia das cidades planejadas e industrializadas e a
negação da realidade histórica da produção mecânica.
Aponta a cisão entre a arquitetura e a cidade, que neste momento
de economia consumista em contínua expansão, fez com que a cidade perdesse
sua capacidade de manter sua importância global. A cidade acabou por
desintegrar-se vítima da sua própria expansão e incorporação de novos
elementos como a via expressa, os subúrbios, no caso das cidades americanas, e
dos supermercados.
26
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes,
1997.
18
Portanto, segundo Frampton, o êxito e o fracasso da arquitetura
moderna devem ser avaliados sobre esse pano de fundo. A racionalização dos
tipos e os métodos construtivos foram reduzidos a um denominador comum, a fim
de baratear a produção e otimizar o uso. Mesmo que a intenção fosse boa a
arquitetura moderna adotou um reducionismo ligado aos avanços tecnológicos do
século XX, em que a sua linguagem residia basicamente em componentes
secundários, técnicos, distanciando-se da arquitetura clássica em que estes
elementos ficavam escondidos atrás do corpo do edifício que tinha liberdade de
expressão e deste modo a arquitetura simbolizava o poder da razão através da
racionalidade de seu próprio discurso. Com o funcionalismo a arquitetura ficou
reduzida a expressão da utilidade e dos processos de fabricação.
Esta análise crítica da arquitetura moderna ajuda a compreender
então o modernismo que já se fazia presente nas edificações do século XVIII e
XIX e neste caso contribui na minha análise sobre a arquitetura produzida por
arquitetos e engenheiros na passagem do século XIX/ XX no Rio de Janeiro.
Ainda abordando a modernidade da arquitetura eclética o trabalho
de François Loyer, ajuda na minha análise, pois lembra que o século XIX é
também o “século da história”, seja pela nostalgia ou pela rejeição, não importa, o
que o mantêm nesta condição é justamente esta relação de confronto com o
passado.
Loyer considera que o século XVI foi o fundador do ecletismo, pois
foi neste período que se tomou, pela primeira vez, emprestado o sistema de
formas da antiguidade. Porém foi no século XIX, que se lançou um novo olhar
sobre a história. Mais voltado para uma arqueologia da antiguidade real e não
uma antiguidade idealizada, o passado torna-se um paralelo e não um exemplo.
19
Com isso instaura-se, segundo Loyer, um paradoxo sublime: a história serviu para
fundar a modernidade e é justamente neste aspecto que sua análise se aproxima
deste trabalho.
Já no campo específico da engenharia conto com os estudos de
Antoine Picon que em seu livro Architectes e ingénieurs au siècle dês Lumières
27
,
trata das questões que afligem a arquitetura com o que ele chama, de fim da
teoria clássica, tomando como partida os avanços tecnológicos e o crescimento
da engenharia no campo da arte de construir.
Em sua análise vai ressaltar que o século XVIII representa, para a
arquitetura, um período de transição. Tanto que atualmente as pesquisas
apontam as bases da arquitetura revolucionária no neoclassicismo e no ecletismo.
A interpretação desta evolução se revela, no entanto, inquieta, na medida em que
o antigo e o novo se misturam inexplicavelmente.
A situação é talvez um pouco mais clara no plano da teoria. O
Iluminismo registra o fim da teoria clássica da arquitetura. Entre os arquitetos
revolucionários triunfa a idéia de uma nova concepção de arquitetura que os leva
a rejeitar as regras aplicadas ao ideal de conveniência. No meio das
transformações em curso também desponta a nova divisão do trabalho que se
instaurou entre arquitetos e engenheiros.
No século XVIII os engenheiros se distinguem dos arquitetos, bem
como começam a pensar sobre a produção do espaço, ameaçando os arquitetos
que, então foram buscar os meios para se estruturar. A renovação da teoria da
arquitetura representa, assim, uma tentativa de reconquistar o terreno perdido.
27
PICON, Antoine. Architectes e ingénieurs au siècle dês Lumières. Marseille:
Parenthèses, 1988.
20
A ligação com o fim da teoria clássica e as relações entre arquitetos
e engenheiros constituem um dos vértices deste trabalho. Mais exatamente com a
vontade de confrontar os enunciados teóricos da arquitetura com o discurso das
instâncias técnicas e observar, assim, um certo número de divergências
significativas.
A interpretação destas divergências nos leva à questão das
mutações sócio-econômicas e às suas conseqüências sobre o espaço. A divisão
entre arquitetos e engenheiros se compreende dentro de um contexto de reforço
do poder do Estado sobre a organização, ela está intimamente ligada às trocas
que se fizeram com o progresso tecnológico.
O fim da teoria clássica, de uma arquitetura moldada no passado ou
a partir de referências clássicas e o nascimento de uma nova classe de valores,
os avanços tecnológicos, a busca por uma estética e a pesquisa empreendida por
arquitetos como Boullée e Ledoux, que foram buscar os fundamentos naturais da
arquitetura, provocou uma série de questionamentos.
São estas interrogações que motivaram o autor a desenvolver este
trabalho. O estudo do fim da teoria clássica e a aparição de um discurso técnico
autônomo, permitem com efeito remeter as origens do mal-estar freqüentemente
denunciado por uma arquitetura continuísta e um racionalismo científico e técnico.
A crise da arquitetura moderna reúne em parte esta relação entre o racionalismo
e a esfera do visível. Deste ponto de vista, o classicismo oferece um exemplo
paradoxal de uma relação fecunda entre o debate arquitetônico e as
investigações científicas. Se a arquitetura clássica repousa sobre uma rede de
saber e práticas anteriores a toda colocação da ordem científica, ela é ao mesmo
tempo portadora de interrogações estimulantes para os estudiosos.
21
O interesse de Claude Perrault, médico e membro da Academia de
Ciências, pela teoria da arquitetura, as ordens clássicas e suas ligações com os
fenômenos da percepção não está isolado. Mais que uma metáfora do domínio do
homem sobre o mundo, a arquitetura constitui um campo de experimentação, um
modelo de confrontação entre as teorias já formalizadas e as determinações mais
fluidas, ligadas à estética e ao gosto. Se esta complexidade que se anuncia no
século XVIII, com a aparição de duplos antagonistas: sensação e cálculo, solidez
e construção, tradição e inovação; a tarefa que se oferece então é aproximar
temas que divergem entre si; nos quais se incluem os engenheiros e suas novas
posições e os arquitetos que questionam o seu próprio fazer, pode-se dizer que a
união de ciência e arte, portanto de inscreve no programa da Revolução. Sobre
este ângulo a tentativa dos Iluministas e seu fracasso nos interessa.
Interessam também as ligações entre teoria, sensibilidade estética e
o prazer de olhar, um prazer que em grande parte não excluí as invenções das
novas combinações, nem as tentativas de racionalização. Sobre este ângulo a
teoria clássica se revela plena de interesse. O detalhe das ordens, o capitel e
suas molduras que figuram nas páginas de todos os tratados, constituem os
elementos da verdadeira aprendizagem da percepção. Os arquitetos não hesitam
e pesquisar soluções inéditas e nem mesmo a simplificar suas ordenações a fim
de facilitar a sua execução na obra. A teoria clássica propõe um modelo
susceptível de adaptações. No século XVIII esta flexibilidade desaparece pouco a
pouco; o fenômeno corresponde também à transformação em profundidade da
sensibilidade que torna possível o reducionismo do detalhe da arquitetura ao
ornamento.
22
Foi neste embate entre tradição e inovação que a figura do
profissional da engenharia se destacou, ganhando prestígio na sociedade e
atuando com mais intensidade na cidade, contribuindo de forma decisiva para os
questionamentos sobre o desenvolvimento de uma arquitetura mais atenta as
modernidades do período.
Será então, baseado nestes teóricos que este trabalho discutirá a
atuação de arquitetos e engenheiros no Rio de Janeiro do final do século XIX e
início do XX, levando em conta tanto a atuação profissional quanto os
questionamentos provocados por tal atuação e como eles também estavam
afinados com o desenvolvimento de uma arquitetura moderna.
É objetivo dessa tese contribuir para o movimento de revisão da
produção arquitetônica do período que precede o modernismo. Esta produção
tendeu a ser, por muito tempo, analisada segundo critérios próprios não de sua
época, mas de uma época posterior, o que a deixava em posição desfavorável.
Ao resgatar os valores nacionais, voltando-se para a produção colonial, os
autores modernistas tenderam a desmerecer em bloco a produção de filiação
estrangeira que dominou, sobretudo, a segunda metade do século XIX e o início
do XX.
Busco então verificar com precisão o conteúdo racionalista do
método de concepção arquitetônico do período para avaliar em seguida em que
medida a “modernidade” do passado (ou seja, o racionalismo e o gosto pelo
progresso material da arquitetura) está presente na arquitetura eclética carioca.
Ressaltando que no Rio de Janeiro, os engenheiros foram elementos importantes
para a construção da paisagem arquitetônica que se imprimiu na cidade, esta
influência se dava tanto no âmbito da formação, com o intercâmbio entre mestres
23
e alunos das duas principais escolas da cidade em que o corpo de engenheiros
era marcadamente atuante; quanto no âmbito tecnicista, científico, difundido pelos
laudos e pareceres dados pelos membros do Clube de Engenharia, e que
tratavam tanto da construção das estradas de ferro e saneamento urbano quanto
sobre planejamento urbano e “estética” dos edifícios.
A escolha que se faz pelos engenheiros neste estudo o faz
buscando solucionar as questões tocantes às leis da teoria da arquitetura, prática
do projeto, urbanismo e seus profissionais, comparando a produção de arquitetos
e engenheiros.
Além disso, o trabalho visa colocar em evidência os arquitetos e
engenheiros atuantes na cidade do Rio de Janeiro nas primeiras décadas do
século XX, profissionais estes que, por sua importância, são, de certo modo,
representativos de toda a classe naquele momento. Considerando que a
escassez de pesquisas a cerca da formação e produção destes profissionais no
período representa uma lacuna prejudicial à melhor compreensão desta produção
arquitetônica, acredito na importância de estimular novas pesquisas a este
respeito.
Para levantamento de dados necessários ao desenvolvimento deste
trabalho foram utilizadas basicamente fontes primárias encontradas nos arquivos
públicos da cidade do Rio de Janeiro, tais como o Arquivo da Cidade, onde estão
arquivados todos os projetos de obras na cidade desde 1830, o Arquivo do Clube
de Engenharia, onde se encontram documentos relativos à atuação desta
instituição nas obras de reformas da cidade, além do cadastro de engenheiros,
pareceres dados por membros do clube sobre diversas questões relativas a
engenharia e a cidade, o Arquivo Nacional, onde estão documentos, fotos e
24
materiais diversos relativos à história da cidade e do Brasil; e os documentos da
Antiga Escola Politécnica do Rio e Janeiro; o arquivo do engenheiro Francisco
Pereira Passos, que se encontra no Museu da República e os arquivos da Escola
de Belas Artes.
Periódicos de época tem se mostrado extremamente importantes
pois abordam as questões relativas as transformações ocorridas na cidade, fato
este bastante documentado pela imprensa do período. A revista Architectura no
Brasil
28
, apesar de ser uma publicação que começou em 1921, ou seja, após o
recorte tratado nesta tese, revelou-se ferramenta imprescindível, pois seus
artigos, escritos na maior parte por arquitetos, revelam as idéias, crenças,
opiniões e lutas desses profissionais, assim como incluem o registro dos
principais acontecimentos no meio, como a fundação das entidades de classe,
informações sobre os profissionais e escritórios atuantes, a publicação de
projetos, concursos e prêmios. Periódicos como a Revista Renascença e
Kosmos, também estão na base deste trabalho já que relatam e comentam as
principais intervenções realizadas na cidade e o debate que se travou em torno
delas.
Estes levantamentos em fontes primárias contribuiriam para
compreender melhor os prédios selecionados e tomados como exemplo para a
discussão da questão do fazer arquitetônico de arquitetos e engenheiros. No
entanto, foram as edificações em si, a maior parte delas ainda existentes que
constituem na verdade o verdadeiro documento de época, mesmo que algumas
delas tenha sofrido alterações ao longo destes quase 100 anos, considerando
que a maior parte foi construída na primeira década do século XX, elas mantêm o
28
ARCHITECTURA NO BRASIL – Engenharia/Construção: Revista ilustrada de assuntos técnicos e
artísticos. Rio de Janeiro: M. Moura Brasil do Amaral, 1921-1926.
25
corpo, a estrutura, e até alguns materiais originais, que ajudam a compreender a
composição como um todo e neste caso são marcos representativos da atuação
de arquitetos e engenheiros no início do século XX.
Sendo assim o corpo principal deste trabalho foi dividido em 3
capítulos; os dois primeiros abordam temas pertinentes a compreensão do
terceiro capítulo que trata do objeto em si, as obras dos arquitetos e engenheiros,
e são melhor detalhados a seguir.
O primeiro capítulo busca apresentar um panorama da época e
mostrar a importância das elites políticas e técnicas, na modernização do Brasil
no início do século XX. Para isso foram abordadas, num primeiro momento, as
questões relativas às mudanças sofridas pelo país na passagem do Império para
a República.
Período em que o Brasil passou por alterações significativas em sua
estrutura política, econômica e social, atingindo as cidades mais importantes da
nação, sobretudo o Rio de Janeiro, que era a capital tanto do Império como da
República e que, por isso, vivenciou toda espécie de acordos políticos e revoltas
urbanas.
Não se pode esquecer que o país neste período passava por um
processo de modificação intenso e que devido às alterações na relação de
trabalho, sobretudo após a Abolição dos escravos e ao declínio da cultura do café
no Vale do Paraíba, as cidades passaram por um processo de crescimento
populacional, que levou à desestruturação da malha urbana.
Foi nesta época também que se desenvolveu o ideal de progresso e
civilização, já há muito tempo difundido da Europa. Baseados nos novos
mecanismos de análise das sociedades e em novas filosofias e teorias, o
26
progresso se tornou um objetivo a ser alcançado por todos os países, que
pretendiam se estabelecer frente ao desenvolvimento industrial e ao capitalismo
emergente.
O Brasil também se lança nesta busca e tomando a Europa como
modelo promoveu alterações importantes no cenário urbano das suas principais
cidades, em que atuaram tanto os membros das elites políticas que ascenderam
ao poder, sobretudo a elite paulista, e as elites técnicas, como engenheiros e
médicos, que respaldaram, através do seu conhecimento científico, muito
valorizado neste momento, o projeto de construção de um país mais afinado com
as inovações do mundo moderno.
Sendo assim foi abordado o papel que esses técnicos tiveram na
formação da nova capital da República, o Rio de Janeiro, que no início do século
XX passou por mudanças significativas em sua estrutura urbana, muito
impulsionado pela idéia de cidade moderna do início do século passado, a qual o
governo republicano queria ver implantada para acabar de vez que o passado
colonial que para eles representava atraso e subdesenvolvimento.
Foi, então, destacada a reforma urbana da cidade e ressaltado o
nome dos principais técnicos. Não só os nomes ligados diretamente às obras e
comissões, mas também os que contribuíram através de seus projetos e
pareceres, para o debate que se instaurou naquele momento, sendo
intensamente divulgado pela imprensa da época, contribuindo assim para a
formação do pensamento moderno do início do século XX, ajudando a implantar
as reformas desejadas pelas elites.
O segundo capítulo tem por objetivo apresentar um panorama da
arquitetura do século XIX e início do século XX, verificando os conflitos sofridos
27
por ela com a formação de uma nova sociedade após a Revolução Industrial.
Sendo assim, o capítulo sobre arquitetura do século XIX/XX, aborda as questões
pertinentes ao Neoclassicismo compreendendo-o, tal como Peter Collins e
Luciano Patetta como um subitem de um grande bloco histórico que é o
Ecletismo. Neste sentido serão tratados os aspectos deste Ecletismo no Brasil,
para que seja possível, então, verificar como se deu a sua atuação na arquitetura
carioca.
Para a compreensão desde momento na história da arquitetura, foram
usadas as interpretações de historiadores e teóricos da arquitetura, que nos
últimos anos vêm reestudando a arquitetura da virada do século XIX/ XX e
verificando que esta já trazia em si a modernidade que tanto marcou o século XX.
Dentre estes destaco: François Loyer, Luciano Patetta, Antoine Picon e Kenneth
Frampton, aliado ao método aplicado por Giulio Carlo Argan, que aborda a
produção artística a partir da obra de arte contextualizando-a com o seu momento
histórico.
Também são abordadas as questões relativas à introdução de novas
técnicas construtivas e os avanços implementados com os materiais
industrializados e a tecnologia do uso do ferro na construção fato este que
permitiu novas relações espaciais, com vencimento de grandes vãos, além de
caráter decorativo próprio das estruturas em ferro, que foram intensamente
utilizadas neste período e que corroboraram na constituição da arquitetura de
tipos, principalmente nas construções neogóticas.
Mais adiante verifico a questão do ensino de arquitetura e engenharia
no Brasil, mais especificamente no Rio de Janeiro, sem esquecer da city moderna
do início de século XX. Neste sentido foram destacados os principais exemplos de
28
arquitetura eclética carioca e seus autores, mostrando que também engenheiros
atuaram neste campo.
Também foram de fundamental importância os textos de Antoine
Picon tanto no seu livro Architectes e ingénieurs au siècle dês Lumières, já citado
anteriormente, quanto a introdução escrita por ele na nova reedição do livro de
Jean-Nicolas-Louis Durand, Précis of the lectures on Architecture
29
, uma edição
em inglês de 2000.
Na introdução da reedição do livro de Durand, Picon esmiúça o
texto de Durand apontando neste os conceitos que nortearam a método por ele
empregado e suas referências ressaltando a sua importância na construção de
toda uma teoria arquitetônica que terminou influenciando os arquitetos de finais
de século XIX e início do XX.
O terceiro e último capítulo analisa os prédios projetados por
engenheiros e arquitetos no Rio de Janeiro na passagem do século XIX para o
século XX e assim verificar como cada profissional tratava a arquitetura.
O critério de escolha das edificações levou em consideração o
recorte temporal desta tese, que trata de construções entre 1890 e 1910, a
formação dos profissionais, ou seja profissionais que estudaram na Politécnica ou
na Escola Nacional de Belas Artes e a função da edificação, na sua maioria
prédios de grandes instituições públicas ou privadas. Foi dada preferência a
prédios existentes, no entanto, para não repetir um mesmo projetista, optou-se
por uma edificação que, mesmo já não existindo, tivesse relevância no cenário do
Rio de Janeiro do período estudado e que fosse possível levantar material, caso
29
DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on Architecture. Los Angeles: The Getty
Research Institute, 2000.
29
específico do antigo prédio do Jornal do Brasil, situado na antiga Av. Central,
atual Av. Rio Branco.
Para a análise das edificações, será adotado o método de
fichamento em que são listados: a localização do edifício; a situação atual deste,
se é existente ou não; a data de construção; o(os) projetista(as); a formação
do(os) projetista(as); um histórico do prédio; a tipologia e por fim a descrição e
análise arquitetônica. Neste último item, descrevo cada prédio, mas, sempre que
possível, já fazendo uma interpretação dos elementos descritos, o que constitui a
análise em si.
Neste momento, então, abordo as questões teóricas e históricas que
tratam da arquitetura eclética, apoiando-me em: Nikolaus Pevsner, Peter Collins,
François Loyer, Luciano Patetta, Antoine Picon, entre outros, sempre que for
pertinente.
Os ensaios de Alan Colquhoun reunidos no livro Modernidade e
Tradição Clássica
30
foram fundamentais para o entendimento do papel da história
na arquitetura dos séculos XVIII, XIX e XX, lançando luz a permanência da
tradição clássica na arquitetura até os dias de hoje.
Deste modo, procuro compreender a arquitetura eclética, a meu ver
tão rica e importante na constituição de uma arquitetura moderna. Modernismo
este que só foi possível alcançar por profissionais, que se formaram sob a égide
do ecletismo, por eles próprios desqualificado sem, no entanto, compreender que
foi o conhecimento desta arquitetura, que os ajudou a entender a arquitetura
como um todo, fato que se perdeu quando os arquitetos passaram a ignorar as
construções de cunho historicista e os princípios que as norteavam. Perdeu-se,
30
COLQUHOUN, Alan. Modernidade e tradição clássica. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.
30
então, o conhecimento da arquitetura como um elemento indissociável da sua
estrutura e de como os componentes que a constituem se inter-relacionam na
composição, criando formas, linguagem e até modelos. Modelos estes que
refletem o seu momento histórico e principalmente se comunicam com seu
principal usuário, o homem, pois é este que irá legitimar a arquitetura, na medida
em que usufrui daquele espaço e se identifica com ele.
Como coloca Alan Colquhoun, “a arquitetura é uma forma de
conhecimento por meio da experiência”
31
e foi justamente a união do
conhecimento dos estilos do passado com a prática arquitetônica que marcou a
produção dos séculos XVIII e XIX, mesmo sujeitando estes estilos a distorções
ideológicas, esta arquitetura promoveu relações que conduziram ao seu próprio
questionamento e busca por uma nova arquitetura, mas fundamentalmente era
atenta e sua própria época e avanços sociais e tecnológicos.
A arquitetura do século XIX/XX foi buscar na história da arquitetura
as referências para a sua composição e assim dar conta das diferentes
solicitações da sociedade do período, em que uma arquitetura de cunho
historicista era plena de reconhecimento.
Os princípios e parâmetros de projeto do século XIX destacam
soluções próprias, modelos, a cada situação a ser enfrentada, como já foi
apontado no livro de Nikolaus Pevsner Hystory of building types
32
, associado às
necessidades crescentes da sociedade do final do século XIX, que se
manifestaram no programa de necessidades de cada projeto como coloca Picon:
31
ibidem, p.35.
32
PEVSNER, Nikolaus. Hystory of building types. New Jersey : Princeton University Press,
1997.
31
As ambigüidades do projeto são... de uma disciplina arquitetônica
confrontada a uma programação cada vez mais exigente, e geralmente a
uma vontade de antecipação que traduz uma evolução em profundidade da
racionalidade técnica. Esta se articulava antes sobre objetos realizados,
dotados de um estatuto de modelos, suportes por conseqüência do saber
técnico. A solidez clássica procedia assim de regras de estabilidade
constatadas e confirmadas de edifício para edifício.
33
Sendo assim a adoção de modelos e padrões atendia perfeitamente
ao racionalismo técnico que então preponderava e até de certa forma ajudou a
consolidar uma linguagem já de amplo conhecimento e domínio tanto de
engenheiros como de arquitetos.
Deste modo, torna-se necessário verificar como estes
profissionais tratam os edifícios, buscando investigar na obra o método
adotado, apontando o seu caráter moderno, pensando o moderno pela linha que o
aproxima do racionalismo. Tal como observa Alan Colquhoun, lembrando que “a
definição de “racional” em arquitetura não permanece constante ao longo da
história. Não estamos lidando com um conceito simples e estático mas com um
conceito que tem variado segundo a constelação de idéias dominante em cada
fase histórica.”
34
Apontar o racional no trabalho destes arquitetos e engenheiros
contextualizando-o com o seu momento histórico é o que norteia este trabalho.
Será então abordado o fazer arquitetônico de engenheiros e arquitetos, tanto na
distribuição dos espaços em planta, confrontando-o com o programa de
necessidades de cada edificação, quanto às soluções adotadas na concepção e
tratamento da volumetria do edifício.
Para se definir a volumetria, é necessário se ter um embasamento
quanto à solução estrutural e das instalações em geral, buscando verificar no
33
PICON, Antoine. Op. cit, 1988, p.275
34
COLQUHOUN, Alan. Racionalismo: um conceito filosófico na arquitetura, In: Revista Gávea,
nº9, Rio de Janeiro:PUC, ago, 1991, p.91.
32
conjunto das definições os aspectos em relação aos seguintes fatores: conforto
ambiental (insolação, aeração, luminosidade); tecnologia da construção (sistema
construtivos, resistência e durabilidade dos materiais); e aspectos econômicos,
relação entre os materiais e seus custos.
No tratamento dado à fachada, será apontada a sua relação direta
com a questão do caráter, que está relacionado com o ornamento, mas não o
ornamento em si, mas um ornamento que tem uma significação, uma
conveniência. Esta conveniência irá conduzir para uma distribuição mais
ordenada dos elementos clássicos, que neste caso passa a ser um fator
importante na elaboração do projeto.
Sendo assim torna-se importante estabelecer um contraponto com a
arquitetura feita por arquitetos do mesmo período, e verificar se a produção de
ambos profissionais, engenheiros e arquitetos, apresentam semelhanças.
Fechando o trabalho a conclusão à cerca da produção arquitetônica
dos profissionais da construção civil no Rio de Janeiro é apresentada, esperando
elucidar algumas questões e contribuir neste resgate do Ecletismo.
Nas últimas páginas estão os anexos, que são de modo geral sempre
relacionados no decorrer do trabalho e que tem a função de esclarecer os pontos
abordados ao longo da tese, principalmente os anexos, III e V, relação de
professores atuantes nas duas escolas estudadas, a ENBA e a Politécnica, e o
livro Notas de Aula de Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e Saneamento das
Cidades, respectivamente.
2- CAPÍTULO 1 – O PAPEL DAS ELITES (POLÍTICAS E TÉCNICAS) NO PAÍS E
AS TRANSFORMAÇÕES URBANAS
1 – Grupo de Engenheiros projetistas.
2 - Prefeito Pereira Passos na inauguração do
Coreto do Campo de São Cristóvão – 1906.
3 - Presidente Rodrigues Alves sobe no mirante da Casa
Hasenclever, para apreciar o eixo da Avenida Central.
34
2.1 A MUDANÇA ESTRUTURAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA
2.1.1 As mudanças nas bases das instituições herdadas da monarquia.
Para se compreender o Brasil da passagem do século XIX para o XX, a
sua busca por progresso e inserção no mundo moderno traçado pelo capitalismo
emergente, torna-se necessário apurar as fases, as forças sociais, a ideologia e
as instituições políticas que marcaram este período.
Ao nos remetermos ao período imperial verificamos que a constituição
social brasileira era formada pelo tríplice: Coroa, escravidão, grande proprietário;
mas a dinâmica destes elementos não pode ser considerada apenas pelos conflitos
e alianças geradas entre eles, outras forças contribuíram nesta articulação. O
término do tráfico negreiro, a introdução de imigrantes, a expansão do café, o
desenvolvimento de uma burguesia mercantil, o crescimento industrial entre outros
fatores, começaram a formar outras forças sociais.
Isso indica uma “relativa diferenciação estrutural e a presença de
extratos sociais que não se resumem às categorias sociais fundamentais da
estrutura social, isto é, aos senhores de escravos”.
35
Sendo assim, o que se
percebe, principalmente no final do século XIX é que a sociedade brasileira
dinamizou-se.
As alterações na sociedade brasileira também se relacionam com as
crises políticas que antecederam a República. “A emergência do Partido
35
CARDOSO, Fernando Henrique. O Sistema Oligárquico nos primeiros anos da República, In:
Boris, Fausto (Org.) História Geral da Civilização Brasileira, O Brasil republicano, estrutura de
poder e economia(1889-1930), Vol. 1, 6ª edição, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997, p.17
35
Republicano em São Paulo e a força do movimento abolicionista são exemplos
disso”
36
. Outro fator que desequilibrou as instituições políticas imperiais foi a crise
militar.
Deste modo, pode-se dizer que, mesmo tendo o povo assistido
“bestializado”
37
à parada militar da proclamação da República e esta tendo sido
articulada dentro do exército, por oficiais jovens, a revolta foi de fato vitoriosa e
promoveu a reorganização da ordem política brasileira. Ou seja, a República não
foi apenas uma revolta militar e nem se tratou apenas da passagem de instituições
monárquicas para republicanas, mas houve de fato uma mudança nas bases e
nas forças sociais.
Para se compreender estas mudanças e a importância dos grupos ou
forças sociais que promoveram tais alterações, é importante conhecer como cada
um deles, deste modo, relato a seguir as principais forças atuantes no processo de
passagem do Império para a República.
2.1.2 As bases do movimento republicano.
A organização política imperial atendia aos círculos dominantes da
monarquia, em especial as antigas elites do interior do Rio de Janeiro. Esta
posição deixava a novas forças regionais emergentes, tais como, os militares e o
setor manufatureiro e mercantil insatisfeitas, especialmente em São Paulo, uma
vez que, a expansão da cultura do café na região fazia com que o estado de São
36
ibidem, p. 25.
37
Expressão cunhada por Aristides Lobo em carta ao Diário Popular de São Paulo em 18/11/1889.
36
Paulo pagasse impostos cada vez mais altos justamente pelo aumento da
produção.
Com o declínio da produção cafeeira no Rio de Janeiro a partir de 1880,
São Paulo passa a liderar a economia nacional. Os fazendeiros paulistas viam o
seu poder econômico e a sua carga tributária aumentarem, no entanto o seu poder
político continuava reduzido. A insatisfação da elite paulista com o governo
imperial cresce na mesma proporção que os seus ganhos econômicos não
concordando com as vantagens, cargos e favores concedidos às províncias
decadentes, segundo estes, em particular o Rio de Janeiro.
O sistema de acesso aos cargos públicos também desagradava a uma
nova elite constituída por profissionais formados nas escolas brasileiras que
difundiam o pensamento europeu. Porém, apesar de uma formação voltada para
as questões políticas e jurídicas, o ensino superior brasileiro ainda formava uma
elite intelectual distanciada dos reais interesses da nação e muito voltada a galgar
um posto na hierarquia imperial.
A posição do imperador em sempre atuar de modo a favorecer o partido
Conservador em detrimento das intenções do partido Liberal contribuiu para que
uma facção mais radical do partido Liberal lançasse o Manifesto Republicano, fato
este acompanhado pelos republicanos paulistas, que se organizaram como um
partido, contando, então, com o apoio da elite rural do estado.
Este grupo via na República a oportunidade de uma redistribuição do
poder, mais favorável aos seus interesses, em que a província desfrutaria da sua
própria receita e seria governada por representantes eleitos por ela.
37
Outra base do movimento republicano se desenvolve na área urbana de
cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, formada por: bacharéis, estudantes de
direito, engenharia e medicina, além de empresários, especialmente os ligados a
produção industrial, que começavam a surgir neste período, todos se ressentindo
das restrições impostas aos negócios, à indústria e a mobilidade social impetrada
por uma ordem política conservadora.
São estes dois grupos: o grupo paulista, que possuía influência sobre a
elite agro-exportadora e grupo urbano, basicamente formado por ideólogos
cariocas, que impulsionaram o movimento republicano. Porém se o ímpeto
republicano parte do Rio de Janeiro, foi em São Paulo, que se formou depois de
proclamada a República, a base do poder, pois os republicanos paulistas
possuíam uma estrutura sócio–econômica mais consolidada e que possibilitou a
instauração do novo governo.
2.1.3 A crise militar
A crise militar foi outro aspecto deste momento de transição. As bases
militares já não compartilhavam dos mesmos objetivos da monarquia e as
mudanças sofridas pela sociedade brasileira em finais do século XIX também se
refletem na estrutura do exército que passa de uma “organização aristocrática,
não educada e não profissionalizada”
38
, a uma instituição organizada e ciente de
sua força e importância. O exército herdado do período de D. João VI era formado
por aristocratas e fidalgos, que ingressavam no exército como oficiais e atingiam
38
os mais altos postos em pouco tempo e com pouca idade. Este critério
permaneceu por boa parte do período imperial.
No entanto esse processo não agradava à massa do corpo de oficiais,
que não conseguia galgar cargos maiores, por melhor que fosse o seu
desempenho, dentro da corporação. Esta insatisfação começou a gerar uma
comoção, que visou reformular a estrutura.
A transformação social dentro do exército se dá em torno de 1850, com
a saída dos oficiais portugueses e a expansão do sistema de educação militar
dividido entre a engenharia, o estado–maior e a artilharia. Mesmo persistindo o
princípio do favoritismo, oficiais menos influentes passaram, então, a atingir postos
mais altos e foram estas pessoas que contribuíram para a mudança de
pensamento no seio da instituição.
A criação da Academia Militar remonta a 1810 e até 1874 ela foi a única
escola de engenharia no Brasil. O crescente número de oficiais estudando na
Academia levou à formação de um contingente com consciência política. Este fato
ocorreu no mesmo período, em que a aristocracia começou a se afastar das bases
militares, indo buscar em outros ramos da sociedade os favores que já não
obtinham no exército.
Os herdeiros de grandes famílias passaram a optar por desenvolver
carreira nas escolas de Direito que lhes possibilitava o envolvimento em atividades
políticas, mais propícias à rápida ascensão, muito, devido à influência que
exerciam junto ao Imperador. “Apesar de algumas exceções,..., geralmente a
38
SCHULZ, John. O exército e o Império, In: HOLANDA, Sérgio Buarque de (Org), Brasil
monárquico: declínio e queda do império. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995- História geral
39
baixa remuneração, as pobres condições de vida e a lentidão das promoções
tendiam a desencorajar”
39
os mais abastados à fazer parte do quadro militar.
Nos anos finais da monarquia era cada vez maior o número de
membros da sociedade civil inscritos na Academia Militar. Neste momento já era
possível notar a divisão entre os militares e a elite. A profissionalização dos
militares e o surgimento de outras carreiras mais voltadas para as questões do
Estado levaram ao gradual afastamento dos militares dos cargos políticos. Ao
mesmo tempo, a instituição militar passou por uma série de reformas, que
conduzia a uma progressão dentro do exército, exigindo uma maior dedicação de
seus oficiais e soldados.
Por volta de 1860 o ingresso na Academia Militar já se tornara uma
etapa importante na vida dos candidatos, que se dedicavam amplamente aos
estudos para admissão. As reformas introduziram disciplinas como a gramática, o
francês e a geografia, e para os que pretendiam ser engenheiros, gramática latina.
Estas novas exigências afastaram um pouco os mais pobres da academia, pois
estes não podiam pagar cursos preparatórios. Porém, em 1858, o governo fundou
duas escolas preparatórias gratuitas, uma no Rio de Janeiro e outra em Porto
Alegre; e já no final do Império criou o Colégio Militar, uma escola de nível
secundário com um extenso programa, o que facilitou o acesso a Academia
Militar. Sendo assim, tanto o Colégio como a Academia Militar se notabilizaram
pelo nível do seu ensino, destacando-se inclusive entre as faculdades civis.
da civilização brasileira, t.2,v.4, p.235.
39
ibidem, p. 239.
40
A participação de militares na política é algo que remonta ao início do
Império e a filiação em um partido ou outro poderia influir na carreira militar. O jogo
entre liberais e conservadores na política imperial influiu na atuação militar na
guerra do Paraguai, levando ao afastamento de Caxias, o mais político dos
militares, da frente de batalha.
As mudanças na condução da guerra, a despeito da vitória, geraram
uma insatisfação no corpo militar, que saiu deste evento com um sentimento de
unidade corporativo bastante arraigado, além de um novo “sentido de sua
importância e uma amargura para com os civis”.
40
O então, Tenente – coronel Floriano Peixoto organizou em 1871 o
Instituto Militar para defender os interesses da classe. Esta busca em se organizar
já demonstrava a insatisfação do exército com as elites, que não davam
importância ao descontentamento militar e nem tinham noção do que tal
descontentamento poderia gerar em relação à continuidade do governo imperial.
A morte de velhos generais como Caxias e Osório deixou vagos cargos
assumidos por homens mais jovens e menos comprometidos com a monarquia. A
indiferença com que eram tratados pelo governo, os baixos salários, as lentas
promoções, contribuiu para predispor o exército à ação política, levando o corpo
de oficiais a discordar das elites a “respeito da política sócio – econômica a ser
seguida”.
41
Toda esta insatisfação, a instabilidade do governo imperial, as
diferenças ideológicas, como o abolicionismo e o antinepotismo, levaram ao
40
ibidem, p. 252.
41
ibidem, p. 253.
41
gradual afastamento do corpo militar da elite imperial, contribuindo sobremaneira
para a sua atuação na proclamação da República.
2.1.4 A influência inglesa
Durante quase todo o século XIX, os interesses britânicos no Brasil
giravam, na sua maioria, em torno da escravatura, do comércio e dos
investimentos. A influência britânica também se dava no modelo político adotado
por figuras ilustres no cenário nacional, sobretudo os liberais.
A relação entre os dois países pode ser, numa visão mais ampla,
dividida em duas fases: a primeira, até aproximadamente 1860, está relacionada
às questões da escravatura e do comércio; a segunda, posterior a esta data, diz
respeito ao “desenvolvimento de oportunidades para investimentos industriais,
estradas de ferro e serviços urbanos”.
42
A Inglaterra teve papel importante na questão do tráfico de escravos,
colocando como condição para o reconhecimento da independência brasileira a
extinção do comércio de escravos, que de certo modo contribuiu para o
decréscimo da popularidade de D. Pedro I junto aos senhores de terras.
A lei proibindo o tráfico de escravos foi promulgada, mesmo com a
abdicação de Pedro I, mas não surtiu efeito, uma vez que o lucro deste comércio
era muito alto e não inibia a sua prática mesmo na ilegalidade.
A Inglaterra usou de todos os recursos possíveis para acabar com o
tráfico, lançando mão de leis, que permitiam a marinha inglesa tratar os navios
42
brasileiros e portugueses, ligados a este comércio, como piratas e até a penetrar
em portos e rios brasileiros para capturar tais embarcações. Deste modo, a partir
de 1850, o tráfico negreiro começou a declinar consideravelmente até a sua total
extinção.
Na verdade a atuação dos ingleses nos negócios brasileiros era
herança de um acordo firmado com Portugal no início de século XVIII
43
e mantido
durante o século XIX, especialmente após a abertura dos portos brasileiros em
1808, fazendo com que a Inglaterra fosse a maior beneficiária predominando no
cenário da importação brasileira.
O domínio sobre o comércio no Brasil pelos britânicos não se dava
apenas nas importações, mas também nas exportações, uma vez que grande
parte das exportações brasileiras de açúcar e café era feita por firmas britânicas.
A influência inglesa era notória no que diz respeito aos transportes
marítimos, constituindo de certa forma um monopólio. Estudos demonstram que,
em certos anos do século XIX, os britânicos respondiam por metade dos vapores
chegados ao Rio de Janeiro, entre as embarcações procedentes de todos os
portos estrangeiros
44
.
Esta presença inglesa também se deu nas questões referentes às
próprias condições portuárias brasileira. Em meados do século XIX, quando o
governo passou a investir nos melhoramentos públicos, que incluía a melhoria dos
portos, nota-se a presença inglesa na figura dos engenheiros contratados para
42
GRAHAM, Richard. Brasil – Inglaterra, In: HOLANDA, Sérgio Buarque de (Org.),Op. Cit., p. 141.
43
Segundo Richard Graham:“a significação relevante dos produtos britânicos entre as importações
brasileirasremonta ao menos aos tratados de Methuen, entre Portugal e a Grã-Bretanha, em 1702-
1703”. ibidem, p.145.
44
ibidem, p. 147.
43
desenvolver tais projetos. Atuação esta que se repetiu nas principais capitais do
país.
Ainda ligado ao comércio de exportação, estão os investimentos na
área de transportes, principalmente a construção de estradas de ferro, em que se
percebe a distribuição destes caminhos em torno da cultura do café, de modo a
facilitar o escoamento da produção.
O envolvimento britânico na construção de ferrovias ia desde o
fornecimento de material e mão de obra até o emprego de capital para a execução
dos serviços, algumas das vezes em associação com empreendedores brasileiros
como é o exemplo do Barão de Mauá.
Este interesse pelos transportes, principalmente das estradas de ferro,
deve muito ao comércio de exportação, mas também visava suprir as
necessidades de se criar ligações entre os novos povoamentos, propiciando o
desenvolvimento de centros importantes, que passaram então a exigir melhorias
urbanas. Surge neste momento outro segmento com forte atuação britânica: os
melhoramentos urbanos.
2.1.5 O Abolicionismo
O movimento abolicionista começou sua arrancada na última década do
século XIX e não obteve apoio da elite rural, uma vez que a causa atingia os
fundamentos da centenária estrutura rural dominada pelos grandes latifundiários.
Sendo assim, desenvolveu-se no meio urbano entre intelectuais, ideólogos e
44
estudantes formados segundo o pensamento europeu difundido nas escolas da
corte.
No final da década de oitenta, o abolicionismo despontava como um
movimento crescente e eminentemente urbano. A elite escravocrata tentou resistir
ao avanço do movimento nas regiões agrárias decadentes como o norte do país e
mesmo no Rio de Janeiro, que apesar do declínio da cultura do café no Vale do
Paraíba, uniu-se aos paulistas, estes sim, em franca expansão cafeeira, na
tentativa de conter o movimento. Porém o crescente avanço das forças militantes
abolicionistas, que alcançaram as fazendas do interior paulista, fez com que os
fazendeiros recuassem mudando de tática e abraçando a causa, com receio da
revolta que uma reação mais forte poderia provocar. Estes fazendeiros, então,
passaram a investir no trabalho livre imigrante uma vez que naquele momento
possuíam condições para isso. Esta posição paulista deixou seus aliados, cariocas
e mineiros sem força para combater o avanço do movimento.
A desarticulação da elite agrária, marcada por um contexto de
convulsão social, além da simpatia do trono pela causa, tornou a Abolição
possível. A Abolição na verdade marca o fim do Império, fato este percebido até
mesmo pelos políticos da época, como teria dito o Barão de Cotegipe advertindo a
Princesa Izabel: “Redime uma raça, mas perde o trono”.
45
45
OLIVEIRA, Francisco. A emergência do modo de produção de mercadorias: uma interpretação
teórica da economia da República velha no Brasil In: FAUSTO, Boris(Org.), O Brasil
republicano, estrutura de poder e economia(1889-1930), Vol. 1, 6ª edição, Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1997, História Geral da Civilização Brasileira, v.8, p. 395.
45
2.1.6 Do Império a República
As mudanças políticas, do período de governo de D. Pedro II revelam
que apesar do “sutil parlamentarismo coroado”
46
, o monarca tinha mais poder do
que corresponderia um poder moderador, o que gerou no Brasil uma zona de
incerteza entre o poder moderador e o executivo.
Esta posição do imperador criou, na verdade, um sistema em que
funcionava muito mais a força de interesses políticos - administrativos do que a
distribuição do poder através de eleições justas. O que ocorria na verdade era um
patriarcalismo tradicional, em que o preenchimento de cargos públicos era
determinado pela existência de padrinhos.
O sistema econômico imperial consistia na exportação e no controle do
câmbio, de modo a garantir a atividade exportadora e financiar o gasto público,
uma vez que o principal imposto utilizado para cobrir as despesas do governo
vinha das importações. Sendo assim, qualquer oscilação do mercado internacional
influía na cotação da moeda nacional, aumentando o imposto sobre produtos
importados, o que afetava as populações assalariadas urbanas.
Por outro lado, o setor de produção de bens primários (agricultura)
permanecia com seu “status quo”, devido à abundante oferta de terra e mão–de–
obra, tirando proveito ainda da valorização da moeda. Percebe-se, neste caso, a
intensa relação entre o poder constituído e as forças políticas advindas dos
senhores de terra.
46
CARDOSO, Fernando Henrique. Op. Cit., p.26
46
Logo após a proclamação da República, a economia nacional
continuou a favorecer os agricultores que passaram a arcar com os custos de uma
mão–de-obra assalariada, sendo estes beneficiados por empréstimos consentidos
pelo governo. Em seguida, impulsionado pela ideologia progressiva do positivismo
e do “democratismo modernizante, (o governo republicano) lançou-se numa
diretriz industrialista”
47
, que beneficiou um novo grupo, os investidores na
economia urbana, especialmente no Rio de Janeiro. Pois mesmo com a crise do
café fluminense, o Rio de Janeiro permaneceu como um centro financeiro
importante, uma vez que era a sede dos bancos estrangeiros e da única Bolsa de
Valores do país, “constituía-se também num importante pólo comercial,
envolvendo transações ligadas ao comércio de exportação e importação, ao
comércio local e inter-regional.”
48
Estas forças de interesses político-econômicos constituem as bases do
governo da Primeira República, direcionando as suas benesses ora ao grupo
agro-exportador, ora ao grupo industrial urbano.
No governo de Prudente de Moraes, Campos Sales e Rodrigues Alves
estabeleceram-se relações, em que se sobressai a produção agro–exportadora.
Baseada neste segmento da economia espalha-se pelo país uma corrente
modernizadora apoiada no cientismo pragmático. A racionalidade empresária dos
agricultores aburguesados representa o grupo mais atuante junto ao poder.
47
ibidem, p.36
48
LEOPOLDI, Maria Antonieta p. Crescimento industrial, políticas governamentais e organização
da burguesia: O Rio de Janeiro de 1844 a 1914. Revista do Rio de Janeiro, Vol. 1, nº3, maio/ago,
Niterói, 1986, p. 56.
47
No caso do Rio de Janeiro uma burguesia industrial e urbana buscou
ajustar-se numa economia agro-exportadora e em condições diferentes da de São
Paulo, em que indústrias se formaram com capitais vindos diretamente da
cafeicultura, pleitearam proteção tarifária junto ao Governo. Ainda como formas de
proteção criaram associações de classe e de penetração no Congresso buscando
garantir a sua sobrevivência. Formando assim, uma elite econômica que também
articulava interesse junto ao Governo
49
.
Sendo assim, verifica-se que as relações estabelecidas pelo governo
mantêm o sistema de oligarquias, sendo ora cientistas, voltadas para as
expansões industriais e urbanas, ora tradicionais, mais afinadas com a tradição
agrária, mas ambas profundamente elitistas.
As Forças Armadas se dividiam entre os que apoiavam o governo, mas
sem grande representatividade, e os que buscavam uma atuação maior. Esta
articulação entre as novas forças regionais emergentes, militares, burguesia
agrária e urbana, com o poder constituído caracterizou a Primeira República.
2.1.7 As elites políticas do início do século XX e a ideologia de progresso.
O fim do império e início da República é marcado como o período em
que se articularam idéias em geral importadas da Europa. Muitas destas idéias
foram mal absorvidas, como ressalta José Murilo de Carvalho, resultando em
grande confusão ideológica
50
.
49
ibidem, p. 65.
50
CARVALHO, José Murilo de Os Bestializados – O Rio de Janeiro e a República que não foi.
São Paulo: Cia da Letras, 1999, p. 42.
48
Apesar das mudanças nas bases das instituições que conduziram à
República, ou seja, os questionamentos dos militares, a mudança na força de
trabalho, as alterações na economia e o florescimento de uma burguesia agrária e
urbana, no campo das idéias, estas mudanças não foram suficientes para se
estabelecer uma ordem social em que todas as camadas da sociedade fossem
melhor representadas.
O avanço dos valores burgueses fez com que os ideais republicanos,
de igualdade e liberdade fossem abandonados para se manter uma ordem social e
política já estabelecida. O liberalismo que regulamentava as leis sobre a
propriedade rural, sociedades anônimas, abolição e trabalho livre, liberdade de
pensamento, profissões e garantia de propriedade são alguns dos direitos que já
existiam e permaneceram inalterados pós República. Deste modo, a constituição
de 1891 pouca novidade acrescentou aos direitos civis e políticos, segundo
Carvalho: “As inovações republicanas referentes à franquia eleitoral resumiram-se
em eliminar a exigência de renda mantendo a de alfabetização.
51
” Sendo assim,
grande parte da população permaneceu sem representação junto ao Governo.
A cidadania plena e o direito ao voto eram exercidos pelos
alfabetizados, assim estabelecia-se uma diferenciação da sociedade pelo saber. A
exclusão dos analfabetos retirava da participação política a grande maioria da
população, delegando o poder às classes já dominantes ou estabelecidas da
sociedade civil. Desta forma, a República pouco contribuiu para a expansão dos
direitos civis e políticos, consolidando um poder já estabelecido pelos setores
dominantes, tanto rurais quanto urbanos.
49
Apesar das diversas manifestações políticas surgidas no início da
República, tais como o positivismo, o anarquismo e até mesmo o socialismo
democrático, todas buscando uma expansão dos direitos políticos, despertando na
população uma redefinição de seus direitos e deveres, terminaram se frustrando,
uma vez que as razões ideológicas e as próprias condições sociais do país não
contribuíram para o desenvolvimento de tais ideais. Era necessário se estabelecer
a ordem e retirar o país da crise econômica em que se encontrava.
A elite civil republicana manteve o conceito liberal de cidadania e criou
obstáculos para que outras forças se manifestassem, garantindo, assim, a ordem
que se pretendia para o estabelecimento e a consolidação da República.
Era preciso estabelecer um comando, que controlasse a crise
econômica por que passava o país. A fraca industrialização, apesar dos grandes
investimentos e até certa expansão, as importações de produtos manufaturados e
os empréstimos assumidos para se manter a indústria agro-exportadora levaram o
país a uma crise que se baseava na especulação cambial, o que proporcionou
lucros elevados aos especuladores e banqueiros estrangeiros, contribuindo cada
vez mais para a condição precária em que já se encontrava a tradicional elite
brasileira.
A atuação de Floriano Peixoto, que, mesmo tendo obtido sucesso nas
batalhas anti–republicanas e do apoio que tinha nos círculos militares, era vista,
sobretudo entre as elites tradicionais e alguns grupos republicanos, como
prenúncio de um ditador. Os seguidores de Floriano, auto-denominados
jacobinos, foram um dos grupos mais ruidosos e turbulentos do início da
51
Ibide, p.42.
50
República: eram essencialmente urbanos e atuavam sobretudo no Rio de Janeiro.
Os jacobinos formavam a base de sustentação do governo Floriano e promoviam
movimentos contra qualquer idéia que comprometesse a República.
Os Jacobinos perdem sua força com a eleição de Prudente de Moraes
para a presidência da república em 1894, que conduziu a burguesia paulista ao
poder, iniciando a consolidação de sua hegemonia, face às demais frações
oligárquicas e às correntes civis e militares que disputavam o controle do Estado
republicano.
A política empreendida por Prudente de Moraes, que favorecia o núcleo
exportador e a consolidação de um governo politicamente estável, não era
compatível com o espaço político concedido às organizações jacobinas. Era
preciso, então, estabelecer a ordem e controlar as manifestações urbanas na
capital.
O estopim para a forte atuação do governo na capital foi o incidente
ocorrido nas comemorações da vitória da Guerra de Canudos. A morte do Ministro
da Guerra, provocada por uma luta corporal no palanque, após a tentativa de
assassinato do presidente da República por um soldado ligado aos jacobinos, foi o
pretexto que o governo usou para proclamar estado de sítio na capital,
desmantelando as hostes jacobinas. Neste momento, membros das elites
tradicionais emergentes se uniram e formaram a base que dominou a República
no início do século XX.
Este grupo formado por fazendeiros paulistas obteve com Prudente de
Moraes a força necessária para a transferência do poder a outro civil paulista,
51
Campos Sales, que consolidou o restabelecimento dos interesses da elite agro–
exportadora.
Foi esta elite que propiciou a construção de uma República mais
afinada com as inovações do período e que possuía a clara intenção de construir
um país moderno.
Para estabelecer a ordem econômica do país, Campos Sales foi buscar
empréstimo em Londres, junto ao Lorde Rothschild; em troca deu numerosas
garantias e, após a sua posse como presidente da República, implementou um
conjunto de medidas para deflacionar a economia e aumentar a arrecadação.
Assim, o presidente pretendia reverter a imagem do país, recuperando
a confiança dos banqueiros e estabelecendo uma política com os principais
presidentes de estado (atuais governadores de estado), inaugurando a “política
dos governadores” e atenuando as oposições. Mantiveram-se, assim, os grupos
de poder oligárquico dos estados, que em troca tinham a garantia de que somente
candidatos ao congresso aprovados pelos governadores de seus respectivos
estados tomariam posse. Deste modo, o governo garantiu o apoio do congresso,
conseguindo implantar a sua política econômica que equilibrou o orçamento do
país, mas levou à recessão e à falência alguns setores do comércio e indústria,
causando estagnação econômica, desemprego e insatisfação popular,
principalmente no Rio de Janeiro.
Mesmo assim, a burguesia paulista conseguiu fazer o seu sucessor e
em 15 de novembro de 1902 Rodrigues Alves assume o governo. Grande
fazendeiro de café, presidente do estado de São Paulo desde 1900, a sua eleição
assegurou “a permanência da chefia do governo republicano, pela terceira vez
52
mãos de um representante da grande burguesia cafeeira paulista”
52
. Com o
orçamento em dia, Rodrigues Alves implantou uma política que buscava contornar
a situação econômica recessiva com um programa de obras públicas, que
envolveram o saneamento e a urbanização da Capital Federal. Uma vez assumido
o controle das reformas, o novo governo republicano adotou um estilo de
administração autoritário, que garantiu a realização das obras associados a
empresas da construção civil. Estes empreendimentos trouxeram dinamismo à
cidade do Rio de Janeiro.
A República aos poucos se firmava e com ela o desejo de
modernidade, desejo este que permeou o século XIX e se intensificou na
passagem para o século XX, quando se realizaram empreendimentos, grande
parte com capital estrangeiro, de infra-estrutura urbana, tais como: iluminação,
primeiro a gás e depois elétrico; abastecimento de água e esgoto; transportes
regulares de bondes; construções de ferrovias e modernização dos portos.
A adaptação à nova realidade econômica começou exatamente pela
modernização da principal infra-estrutura, o porto, provocando mudanças
importantes. Essa abertura para o exterior facilitou a aceitação de modelos
urbanos europeus, estabelecendo uma relação direta entre o nível econômico a
ser alcançado e o aspecto da cidade que se quer “moderna”.
A busca da modernidade materializou-se na reforma do Rio de Janeiro,
transformando-o no modelo a ser seguido pelas demais cidades brasileiras, que
52
BENCHIMOL, Jaime Larry. Pereira Passos: um Haussmann tropical. Rio de Janeiro:
Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes, Biblioteca Carioca, 1990, p.120.
53
também procuravam acompanhar o processo de modernização das cidades do
século XX.
2.2 O ESTADO E AS OBRAS PÚBLICAS NO RIO DE JANEIRO DO FINAL DO
SÉCULO XIX INÍCIO DO XX.
2.2.1 O Rio de Janeiro no contexto da implantação republicana
Nos primeiros anos da república as elites políticas produziram um
modelo ambíguo de capital na medida em que os interesses da cidade eram
articulados entre os poderes constituídos, tanto no âmbito federal como municipal,
ou seja, a cidade-capital viu a sua administração ser manipulada de acordo com
os interesses do governo republicano. Num primeiro momento, esta estrutura era
constantemente influenciada por forças políticas locais, que atuavam nas decisões
da prefeitura.
O conflito entre os grupos dirigentes abriu espaço para formação de
movimentos político-sociais urbanos em que se destaca o “jacobinismo carioca
que testou os limites políticos do novo regime e deu margem a conspirações
políticas tão amplas como desarticuladas
53
”, como já foi ressaltado.
A desmontagem deste panorama político da capital foi uma tarefa a
qual Campos Sales se lançou sem sucesso e só foi conseguido no governo de
Rodrigues Alves, que empreendeu uma ação direta, com um intenso programa de
reformas, tocado por um corpo de engenheiros, conduzido pelo engenheiro
54
Pereira Passos, nomeado prefeito da capital da república. “Estava finalmente
aberto o caminho para se substituir a politicagem local por uma cidade - símbolo
da ordem e da modernidade nacional republicana”
54
.
A reforma de Pereira Passos pretendia resolver a questão da
adequação da forma ao capitalismo, superando as contradições da cidade colonial
– escravista. As palavras de ordem eram “modernizar”, “embelezar”, “sanear”.
Com apoio das camadas mais prósperas da sociedade, procurava-se, antes de
tudo, garantir o ingresso do Brasil no mundo moderno e estabilizar o regime que
neste modelo se identificava.
Foram estas camadas sociais que atuaram na cidade do Rio de Janeiro
e por mais que as relações da República fossem travadas pelas elites estaduais
era no Rio que elas eram firmadas, formando uma malha de conspiração, revolta e
politicagem. Deste modo a elite carioca vivenciou as mudanças políticas, que a
fizeram se adaptar para assim manter a sua posição na hierarquia social.
Na verdade, as mudanças não chegaram a alterar o controle exercido
por esta elite e a sua expressão sócio – cultural, pelo contrário, o grupo continuou
a promover e defender seus interesses, preservando a sua continuidade
aristocrática.
Por ser capital da República e principal porta de entrada do país, a
cidade teve sua vida social e política extremamente envolvida e afetada pelos
53
FREIRE, Américo. República, cidade e capital: o poder federal e as forças políticas do Rio de
Janeiro, in:FERREIRA, Marieta de Moraes (Org.) Rio de Janeiro: uma cidade na história. Rio de
Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2000, p.28
54
ibidem, p. 29.
55
interesses do governo federal, foi o espaço do exercício do poder e o símbolo da
construção nacional do Estado republicano. Como centro político da nação, a
cidade foi usada como representação da atuação do poder constituído,
estabelecendo um diálogo com as forças políticas da própria cidade, que, apesar
de fragmentárias buscavam sempre eixos de articulação que possibilitassem uma
melhor atuação junto ao poder.
O governo federal impedia manifestações políticas contrárias à sua
atuação na cidade, limitando manifestações hostis e mantendo na hierarquia
política somente aqueles que atendessem aos seus interesses. Como bem
destaca Sarmento:
O Rio de Janeiro da Primeira República, atrofiado pela presença da cunha
intervencionista do poder federal, experimentou uma certa alienação em
relação ao jogo do poder, vendo-o controlado por um restrito grupo que se
interessava em manter, propositadamente, a população distante da plena
cidadania política para melhor exercer seu controle. Sobre uma base restrita de
cidadãos, e com poucas fichas em jogo na mesa da política urbana, era mais
fácil exercer o controle sobre as redes de clientela e, consequentemente, sobre
toda a estrutura política da cidade.
55
A cidade do Rio de Janeiro foi o cenário para o desenvolvimento de
uma elite, que demonstrava tanto a sua relação com o poder como a sua
identificação com a cultura européia, usada neste momento como o modelo a ser
seguido, o que se verifica na própria reforma da cidade no início do século XX
empreendida por um filho de cafeicultor que havia estudado em Paris, portanto,
bastante influenciado pelo pensamento europeu.
56
2.2.2 A reforma do Rio de Janeiro e seus técnicos
Tendo a sociedade européia como modelo de civilização a ser
alcançado, a implantação do projeto de modernidade da Primeira República usou
a cidade como índice de civilidade. A preocupação com o embelezamento
representava a incorporação e a adequação ao modelo civilizatório europeu. A
cidade funcionava como a vitrine de um modo de vida que se queria ver
inaugurado, enfim, um termômetro de civilidade.
A Reforma de Pereira Passos (1902/1906) foi acompanhada da
elaboração de várias posturas municipais, que visavam regular desde o comércio
nos quiosques (Il.1), até a forma como a população deveria apresentar-se na
Grande Avenida. Aproximar-se da estética européia era assegurar uma vida
civilizada nos moldes europeus.
Il. 1 – Quiosque típico existente
na cidade do Rio de Janeiro no
início do século XX.
55
SARMENTO, Carlos Eduardo B. A arquitetura do impossível – a estruturação do Partido
Autonomista do Distrito Federal e o debate autonomista nos anos 1930. In: FERREIRA, Marieta de
Moraes Op. Cit., p. 35-36.
57
Neste sentido, lançou-se mão de um conhecimento que abrangia a
norma e a ciência, ou seja, a regra, a lei e o conhecimento científico como o
sustentáculo para a ação que visavam empreender.
A emergência de olhares científicos sobre os problemas sociais
colocava a cidade como local privilegiado para observação e experimentação de
práticas que visavam disciplinar a sociedade.
Desta forma, começaram a se destacar os profissionais que estariam
sintonizados com a discussão sobre a modernização do país, os médicos e os
engenheiros, cujo campo de atuação era o da organização do trabalho e das
novas tecnologias, reafirmando o domínio da técnica, o que legitimava a
intervenção do Estado.
O Rio de Janeiro, no início da República, era uma cidade fragmentada,
marcada por disputas sociais. Um caso exemplar foi a Revolta da Vacina em
1904, que, articulada entre políticos do congresso contra o sistema autoritário do
governo, após a aprovação de uma lei obrigando toda a população a vacinar-se
contra varíola, chegou às ruas, muito também insuflada pelos jornais da época,
levando a luta e o tiroteio pelas ruas do centro da cidade.
56
A revolta acabou sendo dominada e revelou-se tão fragmentária quanto
a própria cidade, marcada pela fragmentação social de uma população alienada
do sistema político e facilmente manipulada pelos setores mais esclarecidos e
articulados da cidade. Sendo assim, estabelecidos e manobrados os interesses
entre os grupos dominantes, o governo implantou a ordem e lançou mão de seus
56
Sobre a Revolta a Vacina ver, CARVALHO, José Murilo de. Op. Cit, p.91.
58
técnicos com a firme intenção de modernização, mas também de controle, em que
se destacam o engenheiro Pereira Passos e o médico Osvaldo Cruz.
Pereira Passos representava a força da engenharia e do conhecimento
científico que se destacavam naquela época. A engenharia era vista como
instrumento de progresso, não só por sua intervenção em diversos setores do
mundo do trabalho, mas também porque o desprezo pelo trabalho manual, tão
arraigado na sociedade, estava desaparecendo. A relação que se fazia das
profissões técnicas com o trabalho manual vinha da mentalidade colonial
escravista, que via o comércio e a indústria como trabalhos inferiores. Essa
situação começou a mudar a partir da segunda metade do século XIX, com a
vinda dos ingleses.
As estradas de ferro empregavam o maior número de profissionais da
engenharia, mas, com o advento da República, houve uma ampliação do mercado
de trabalho, decorrente sobretudo do aumento das oportunidades de emprego no
Estado, tanto em nível federal como municipal.
O estado empregou os engenheiros para a construção de grandes
obras empreendidas no início do século XX. Os grandes vultos da engenharia
eram chamados para resolver problemas, em diversas cidades do país, tanto na
questão urbanística, como abertura de ruas e definição de novos partidos urbanos,
quanto em questões de saneamento e abastecimento de água.
A formação “enciclopédica” desses engenheiros permitiu que eles
abordassem e resolvessem problemas em vários campos da engenharia:
ferrovias, portos, grandes obras na cidade e indústrias. No Rio de Janeiro, tal
formação se dava na Escola Politécnica, uma escola de engenharia, nascida a
59
partir a fundação da Academia Militar, que passou por diversas mudanças até a
separação do ensino de engenharia civil do curso militar. As alterações sofridas
pela Academia Militar até a criação da Escola Politécnica e a formação dos
engenheiros, serão melhor detalhadas no capítulo seguinte.
No entanto, se pode adiantar que, apesar de a Politécnica manter
vários cursos: civil, geógrafo, industrial, e mecânico, a especialização se dava na
prática, no exercício profissional e de forma autodidata.
A visão enciclopédica, acompanhada da filosofia positivista, fazia com
que os engenheiros se vissem como portadores da racionalidade e da técnica.
Com o desenvolvimento tecnológico, os engenheiros passaram a atuar nas áreas
em que se processava a modernização.
Essas inovações permitiram, a estes profissionais, não só alargar o
campo de atuação da engenharia, mas também a obter reconhecimento social
similar ao desfrutado pelos médicos e advogados. Apresentando-se como
portadores do progresso, os engenheiros ampliaram seu próprio mercado de
trabalho, ao mesmo tempo em que começaram a ocupar maior espaço dentro do
Estado.
A ampliação desses campos de atuação, principalmente aqueles
relacionados à modernidade permitiu à engenharia dar visibilidade à sua vocação
de elite dirigente. Com a ampliação do mercado e o reconhecimento social, a
engenharia foi cada vez mais usada pelo corpo governamental, como o agente do
progresso, a portadora da técnica e da modernidade.
A crescente valorização da ciência com sua lógica e racionalidade
sobre as questões sociais, favoreceu a implementação de novas práticas em que
60
se destacam os conhecimentos adquiridos pelos engenheiros, principalmente no
que se refere às ordenações urbanas.
Os engenheiros colocavam-se, assim, como portadores de uma
racionalidade objetiva, sendo capazes, portanto, devido à sua formação, de
colocar ordem em todos os setores e, a partir do seu cientificismo gerar novos
valores na sociedade.
2.2.3 As primeiras intervenções na malha urbana
Durante o século XIX a cidade do Rio de Janeiro sofreu algumas
alterações na sua estrutura urbana, devido ao crescimento cidade, que a princípio
se expandia em direção à zona norte. Inúmeros projetos de modificação e
abertura de ruas, aterramento de mangues e desmonte de morros também foram
apresentados à Câmara Municipal, além dos projetos urbanos elaborados por
Grandjean de Montigny, durante a sua estada no Brasil.
Montigny propôs vários projetos urbanísticos para o Rio de Janeiro, em
geral complementos dos projetos de palácios e prédios públicos encomendados
pelo governo imperial. Desenhou praças e grandes avenidas que permitiam
amplas perspectivas, propôs também arborização das ruas, projetou vários
chafarizes (Il.2) para resolver o problema de abastecimento de água da cidade e
estipulou o recuo progressivo e obrigatório de prédios de modo promover o
alargamento sistemático das ruas. Segundo Robert Coustet:
61
O saldo da obra de Grandjean de Montigny urbanista pode parecer, afinal de
contas, modesto. Entretanto seus projetos foram bastante conhecidos e sua
influência enorme. Foi o primeiro a conscientizar o carioca da necessidade de
se planejar o crescimento da cidade....Face às tradições portuguesas de
construções espontâneas, Grandjean propôs o exemplo de um urbanismo
fundado na regularidade, na simetria. Em meio à trama de ruelas estreitas,
muitas vezes sinuosas, sonhou aplicar uma política de amplas avenidas, à
maneira francesa. Graças a ele, pela primeira vez, os brasileiros tomaram
consciência de uma concepção clássica do urbanismo.
57
Il. 2 – À esquerda,
chafariz projetado
para o Largo de
Benfica, na zona
norte da cidade; ao
lado chafariz
projetado para Rua
São Clemente em
Botafogo, zona sul
da cidade.
57
COUSTET, Robert. Grandjean de Montigny, urbanista. In: Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro. Departamento de Artes. Uma cidade em questão I : Grandjean de Montigny e o Rio
de Janeiro. Rio de Janeiro : PUC/Funarte/ Fundação Roberto Marinho, 1979.
62
A partir de 1870 a preocupação com o crescimento desordenado da
cidade intensifica levando o governo a formar uma Comissão de Melhoramentos
responsável pela elaboração um plano de melhoramentos para a cidade.
É importante ressaltar que a elaboração do plano demonstra a
preocupação com o crescimento da cidade e a questão da ordenação e
saneamento básico, não apenas por parte do governo, mas sobretudo dos
técnicos envolvidos ou não na confecção de tal plano, uma vez que o estudo
elaborado pela Comissão foi alvo de “severas críticas , técnicas e econômicas por
parte do Engenheiro Luiz Raphael Vieira Souto”
58
, o que demonstra o interesse
de técnicos sobretudo engenheiros nas questões relativas a cidade. Estes
profissionais elaboravam propostas, que eram apresentadas à população através
dos meios de comunicação da época, jornais e revistas.
Entre estas propostas havia a do engº André Rebouças, bastante
semelhante às soluções apontadas pela Comissão de Melhoramento, que previa
a abertura de duas grandes avenidas, uma a beira – mar, até Botafogo, e outra
que, em direção a zona norte, iria da praia dos Mineiros até o bairro do Andaraí.
Outro projeto foi apresentado pelo engº Antônio de Paula Freitas denominado
Saneamento da cidade do Rio de Janeiro, publicado em 1883: sugeria o
prolongamento do Canal do Mangue até o mar e a construção de duas largas e
retas ruas paralelas no centro da cidade, uma no alinhamento das atuais ruas da
Assembléia e Carioca e outra na atual Av. Mal. Floriano, além do prolongamento
58
TELLES, Pedro Carlos da Silva. História da engenharia no Brasil – Séculos XVI a XIX. Rio de
Janeiro: Clavero, 1994, p. 148.
63
da rua do Lavradio até a bairro da Saúde
59
. Interessante observar que estes
projetos(Il.3), apesar das sutis diferenças, apontam para o mesmo sentido e sob a
mesma orientação técnica dos elaborados pela Comissão de Melhoramentos.
A preocupação com a questão sanitária e o crescimento da cidade se
fazem notar pelo número de livros e artigos publicados tratando deste assunto,
como o do engº Francisco de Paula Bicalho sobre abastecimento de água e o de
Tito Barreto Galvão sobre a remodelação da cidade e questão sanitária, ambos
de 1901
60
.
Este tipo de publicação tornou-se freqüente e muitas das questões
abordadas eram levantadas no Clube de Engenharia, principal instituição da
época. Fundado em 21/12/1880, o clube congregava, além da grande maioria dos
engenheiros formados pela Politécnica, arquitetos, industriais, comerciantes,
empresários e sobretudo proprietários de firmas de construção civil. A partir de
1887, o clube passou a publicar muitas das idéias discutidas pelo grupo de
associados em sua revista. Francisco Saturnino de Brito publica através da revista
“um artigo sobre esgotamento sanitário em que ressalta a importância de se
divulgar a questão da higiene domiciliar: ... o saneamento restabelece o
funcionamento normal das cidades, cuja salubridade se aprecia pela saúde de
seus habitantes
61
Cabe ressaltar, ainda, a importância do Clube de Engenharia neste
momento de intenso debate sobre a evolução das cidades brasileiras.
59
ibidem, p.48.
60
REZENDE, Vera F. Evolução da produção urbanística na cidade do Rio de Janeiro, 1900 – 1950
– 1965. In: LEME, Maria Cristina da Silva(Coord.). Urbanismo no Brasil – 1895 – 1965. São
Paulo: FAU/ USP/ FUPAM, 1999, p.48.
61
ibidem, p.48.
64
Participavam do clube os engenheiros mais atuantes do período, que interviram
nas principais cidades do país, sobretudo em questões referente ao saneamento
urbano e ao abastecimento de água. O clube terminou se transformando no
principal responsável pela manutenção do debate sobre saneamento e
urbanização do Rio de Janeiro, principalmente através da publicação de artigos
em sua revista. Sendo assim, torna-se praticamente um órgão de consultoria,
uma vez que constantemente formava comissões para estudar os projetos de
melhoramentos
62
dando pareceres sobre a viabilidade destes.
Il. 3 – Mapa da cidade do Rio de Janeiro em 1891.
Legenda: Área concedida ao Engº Luís Rafael Vieira Souto em 1879 para aterro.
Proposta do Engº Antônio de Paula Freitas em 1883 para prolongamento do canal do
Mangue até o mar.
Proposta de Paula Freitas para abertura de avenida larga na atual Mal. Floriano.
Proposta de Paula Fritas para abertura de avenida larga no alinhamento das atuais ruas
da Assembléia e Carioca.
Proposta de Paula Freitas para prolongamento da rua do Lavradio até a Saúde
62
PEREIRA, Sonia Gomes. A reforma urbana de Pereira Passos e a construção da identidade
carioca. Rio de Janeiro: UFRJ/ECO – Tese de doutorado em Comunicação e Cultura, 1992, p.140.
65
Antes da execução da principal reforma da cidade do Rio de Janeiro
durante o governo do prefeito Pereira Passos, algumas obras foram comandadas
pelo próprio governo federal; a principal delas foi o melhoramento do porto. Em
1900, foram aprovados os planos e orçamentos para as obras do porto; no ano
seguinte, é autorizado o arrasamento do morro do Senado no centro da cidade,
cujo aterro foi utilizado no porto. As obras de desmonte do morro ficaram a cargo
da Empresa Industrial de Melhoramentos do Brasil dirigida pelos engenheiros
Paulo de Frontin e Carlos Sampaio. Posteriormente na administração Pereira
Passos foram construídas na esplanada a Av. Mem de Sá e a Pça. da Cruz
Vermelha.
Na verdade as obras do porto já haviam sido objeto de interesse de
alguns grupos especulativos desde 1870, quando começaram a surgir os
primeiros estudos sobre a malha urbana, impulsionados pelos problemas de
saneamento urbano e das epidemias. O próprio engenheiro Luiz Rapahel Vieira
Souto, que fez críticas ao projeto elaborado pela Comissão de Melhoramentos,
obteve uma concessão, em 1879. Juntamente com Francisco José Gonçalves
Agra Filho e Filadelfo de Souza Castro, Vieira Souto deveria aterrar a área
compreendida entre as praias dos Lázaros e Formosa incorporando as ilhas dos
Melões e Moças (Il.3), também tinham que construir um cais, abrir ruas nas áreas
criadas entre outras intervenções. Em troca, ganhariam a propriedade das terras
conquistadas ao mar e poderiam explorar linhas de carris, bem como construir
armazéns na área do cais.
O que se percebe é que, neste período, foram autorizadas várias
concessões, que se mostraram altamente lucrativas. Porém o não cumprimento
66
dos serviços no prazo estabelecido levou ao cancelamento de tais concessões
através de um decreto de 1906
63
. No entanto, foram os membros deste grupo,
que já atuavam na cidade, que por fim participaram das principais comissões
responsáveis pelas reformas empreendidas no Rio de Janeiro.
Paulo de Frontin, dono da Empresa Industrial de Melhoramentos do
Brasil, que havia ganho a concessão para obras do porto, foi nomeado por
Rodrigues Alves, em janeiro de 1903, chefe da Comissão Construtora da Avenida
Central; no mesmo mês foi eleito presidente do Clube de Engenharia. A Comissão
de Obras do Porto foi chefiada por Francisco Bicalho: as obras empreendidas
usaram como base o projeto da empresa de Paulo de Frontin, com algumas
modificações; a Vieira Souto foi entregue a supervisão técnica das obras; a
execução dos serviços coube à firma britânica C.H.Walker & Cia., ligada
diretamente a empresa que havia comprado a concessão das obras do porto da
Cia de Melhoramentos, que naquele momento passava por dificuldades
financeiras
64
, ou seja, é notável a forte atuação deste grupo de engenheiros tão
importantes na história da engenharia no Brasil, especialmente no Rio de Janeiro.
2.2.4 A reforma do período Pereira Passos
As obras do Porto do Rio de Janeiro foram comandadas diretamente
pelo governo federal, que também concluiu a abertura do Canal do Mangue, o
63
Para se conhecer com mais detalhes este momento da história urbana do Rio de Janeiro e
participação destes investidores, ver: BENCHIMOL, Jaime Larry, Pereira Passos: um
Haussmann
Tropical. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes,
Biblioteca Carioca, 1990, p.204-234.
64
ibidem, p.204.
67
arrasamento do morro do Senado e a abertura da Avenida Central.
Complementam estas obras o plano de melhoramentos da prefeitura de Pereira
Passos, denominado “Embelezamento e Saneamento da Cidade”.
Este plano nada mais é do que a reformulação do antigo Plano de
Melhoramentos, elaborado pela Comissão de Melhoramentos, em 1875, e da qual
o próprio Pereira Passos fazia parte. O plano de remodelação da cidade foi
apresentado ao Diretor de Obras e Viação, engenheiro Carlos Augusto
Nascimento Silva em 1903, pelo chefe da Comissão da Carta Cadastral,
engenheiro Alfredo Américo de Souza Rangel. Constava na descrição do plano:
...dar maior facilidade de comunicação entre os diferentes bairros da cidade,
permitir o estabelecimento de traçado mais vantajoso às grandes linhas de
canalizações (águas e esgotos), impedir a valorização de prédios
antiquados... das ruas estreitas do centro, facilitar o enxugo do subsolo pela
arborização – impraticável nas ruas estreitas - ...e despertar o gosto
arquitetônico, pois oferecendo as ruas largas e bem situadas uma renda
compensadora dos prédios, os proprietários animar-se-ão a construí-los em
melhores condições.
65
A Reforma de Pereira Passos tomou como base as intervenções
realizadas pelo prefeito Haussmann, entre 1853- 1870, em Paris que transformou
a capital francesa em uma metrópole moderna. Pereira Passos acompanhou de
perto este momento, pois se encontrava em Paris, onde foi complementar seus
estudos. Travou conhecimento com os engenheiros da École de Ponts et
Chaussés, e “tornou-se assíduo freqüentador de seus cursos, dedicando-se ao
65
TELLES, Pedro Carlos da Silva apud, SILVA, Maurício Jooppert, in: PARDAL, Paulo Jo.
Memórias da Escola Politécnica. Rio de Janeiro: Biblioteca reprográfica Xerox, 1984, p.143.
68
estudo de arquitetura, hidráulica, construção de portos, canais e estradas de ferro,
direito administrativo e economia política.”
66
Sendo assim, o plano previa a abertura de alguns grandes eixos de
circulação da cidade, como a Avenida Beira – Mar (Il.4), que desafogaria o
trânsito entre o centro, Botafogo e Catete, ajudando a impulsionar a ocupação da
orla marítima, e a avenida Mem de Sá, que parte do Largo da Lapa, passa sob os
Arcos da Carioca e termina na rua Frei Caneca(Il. 4), ligando o centro a Tijuca.
Fizeram ainda parte do plano as obras nas avenidas Salvador de Sá e
Estácio de Sá, que junto dão continuidade às duas radiais na Rua Frei Caneca.
Avenida Mal. Floriano, que é resultado do prolongamento da Rua Larga de São
Joaquim e Estreita de São Joaquim, alargamento da Rua Visconde de Inhaúma
até o Largo de Stª Rita, daí ligando-se com a Mal. Floriano, além de alargar as
ruas da Assembléia, Carioca, Treze de Maio, Hospício (atual Buenos Aires), Sete
de Setembro, Evaristo da Veiga, bem como a canalização de alguns rios, como o
Berquó e o Carioca. Todas estas alterações foram apresentadas ao Clube de
Engenharia, que aprovou integralmente o projeto.
A obra mais importante foi, sem dúvida a abertura da Avenida Central,
uma reta de aproximadamente 2 km de comprimento e 33 de largura, que faz a
comunicação entre o porto e a Avenida Beira Mar: foi uma operação significativa,
pois cortava a parte mais valiosa do centro urbano da cidade. A avenida foi
concluída em pouco mais de vinte meses, devido ao pulso forte com que as obras
foram conduzidas por Paulo de Frontin e Pereira Passos, que possuía poderes
quase ditatoriais.
66
BENCHIMOL, Jaime Larry. Op.Cit., p.192.
69
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Il. 4 – Mapa do Centro de Rio de Janeiro em 1910. Em amarelo estão assinaladas as principais ruas e
avenidas abertas durante o governo Pereira Passos. A área tracejada a esquerda, cortada pela Av.
Men de Sá corresponde a ruas que ainda seriam abertas na esplanada formada depois do desmonte
do Morro do Senado; e a esquerda junto a Av. Rodrigues Alves, estão as ruas que seriam abertas
durante as obras de urbanização do porto. A inclusão de cores para demarcação e nomeação das
ruas foram feitas
p
or Katia Maria de Souza.
70
Para a abertura da Avenida Central, foram demolidos 585 prédios,
sendo o terreno posteriormente nivelado e loteado, foram também realizadas
todas as obras de infra-estrutura, água, esgoto, gás e luz, além de arborização.
Houve necessidade de se cortar partes do Morro do Castelo e de São Bento para
deixar o eixo da avenida o mais reto possível.
Esta obra de urbanização foi precedida de um concurso para fachadas
de edifícios, em que a arquitetura eclética se afirma como o estilo que daria
suporte ao aspecto que se queria imprimir a cidade, funcionando de maneira
cenografia e obedecendo a uma tipologia de acordo com a função de cada prédio.
Interessante observar que os edifícios da avenida foram divididos entre
as principais instituições e grupos financeiros, que encontram nesse momento a
oportunidade de aplicar seus recursos, num período em que a economia exigia
manobras especiais de reorganização do mercado internacional, face ao impasse
econômico da cultura do café. As principais empresas da construção civil
participaram deste empreendimento, revelando a presença destes no mercado
imobiliário, que passava por um processo de consolidação.
Na avenida, foram construídos, além de prédios públicos importantes
como o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional, o Supremo Tribunal Federal, a
Escola Nacional de Belas Artes, hotéis de luxo, como o Hotel Avenida (Il.5),
cinemas, confeitarias, jornais e instituições de destaque como o Clube de
Engenharia, o Clube Militar e o Clube Naval.
A arquitetura de cunho historicista do final do século XIX e início do XX,
então, tal como em Paris e Londres, respondia perfeitamente aos objetivos de
71
criação de um cenário de modernidade, adequado para a afirmação da burguesia
em ascensão.
Il. 5 – Hotel Avenida, um
dos pontos mais
tradicionais e
movimentados da cidade
do Rio de Janeiro, que
abrigava o hotel, a Galeria
Cruzeiro e a estação dos
bondes da Ligth. Existiu
até 1957 quando foi
demolido para construção
do atual Edifício Avenida
Central.
Cabe ainda destacar, entre as obras empreendidas por Pereira Passos,
a abertura do túnel do Leme – Túnel Novo e o início da construção da Avenida
Atlântica.
Interessante observar a importância que os engenheiros tiveram na
construção da malha urbana do Rio de Janeiro, não apenas com seus projetos e
obras, mas sobretudo no envolvimento que tiveram com o poder constituído,
chegando inclusive, alguns deles, a assumir o cargo de prefeito da cidade, como
aconteceu com Pereira Passos, Paulo de Frontin e Carlos Sampaio, personagens
com participação ativa nas questões urbanas desde o início do século XX.
Frontin assumiu a prefeitura em 1919 e durante apenas os seis meses
em que se manteve no posto realizou obras importantes como a construção da
72
Avenida Rio Comprido, Avenida Delfim Moreira, Avenida Niemeyer e abertura do
túnel João Ricardo, que liga o Cais do Porto à Praça da República. Paulo de
Frontin continuou atuando na cidade através da empresa Industrial de
Melhoramentos do Brasil, que existiu até 1933, ano de sua morte
67
.
O engenheiro Carlos César de Oliveira Sampaio administrou a cidade
entre 1920 e 1922, realizou, entre outras obras, o desmonte do Morro do Castelo,
uma grande obra de engenharia que contou com a participação dos engenheiros
Paulo de Frontin e Gastão Bahiana, além do arquiteto Adolpho Morales de los
Rios, como responsáveis pela comissão que deveria estudar a urbanização da
área resultante do desmonte.
A intenção do prefeito era comemorar o Centenário da Independência
do Brasil, que culminou com a realização da Exposição Internacional de 1922.
Sendo assim, Carlos Sampaio decide preparar a cidade para receber
personalidades e turistas; para isso tornou-se necessário definir um sítio para a
construção dos pavilhões que participariam da exposição. Empreende, então, o
desmonte do Morro do Castelo, com a justificativa de melhorar as condições de
aeração e higiene, eliminando do centro áreas habitacionais que haviam
sobrevivido à reforma de Pereira Passos. Na verdade, a intenção de derrubar o
morro era um projeto antigo de Carlos Sampaio que neste momento conseguiu
concluir com sucesso.
Os debates sobre o crescimento da cidade se prolongam nas primeiras
décadas do século XX, e a atuação de engenheiros é intensa, surgindo num
momento em que o urbanismo, enquanto disciplina autônoma se estabelece,
TP
67
ibidem, p, 232.
73
contando também com a participação dos arquitetos que buscam, neste momento
da história se orientar e se posicionar frente às mudanças ocorridas com as
cidades e sobretudo com a arquitetura. Engenheiros e arquitetos passaram então
a divulgar seus princípios e estabelecer um “novo conhecimento que se faz
necessário ao bom planejamento da cidade”
68
2.2.5 Os engenheiros no cenário do Rio de Janeiro do início do século XX.
Ao longo da primeira década do século XX, as cidades brasileiras
passaram por um processo intenso de modificações, muitas destas relacionadas
com o próprio desenvolvimento do país e as novas relações que se
estabeleceram já em finais do século XIX, entre o governo e as instituições do
sistema produtivo moderno, em que se destaca a formação de uma burguesia
ligada aos problemas urbanos.
A ascensão de uma nova classe ao poder, a manifestação de
interesses econômicos emergentes, as inovações técnicas são expressão da
formação da cidade capitalista, que buscou, através das reformas urbanas,
instaurar um novo processo de desenvolvimento das cidades.
Neste momento, a construção de um país moderno está bastante
ligado a um ideal de progresso, que se fundamenta a partir das bases teóricas
que tratavam das questões relativas à formação de uma sociedade talhada para o
binômio Progresso = Civilização.
68
REZENDE, Vera F. Op. Cit., p., 63
74
As correntes de pensamento vigentes na Europa tiveram papel
fundamental na construção de um conceito de progresso. A Ideologia do
Progresso, com a valorização do novo e o ideal de civilização; o elogio da ciência
e da técnica do discurso positivista; as noções de origem e cultura dentro do
pensamento evolucionista – refletindo-se em vários aspectos culturais e sociais,
determinando sistemas classificatórios e de ordenação, inclusive na própria
disposição física dos espaços – foram conceitos que não ficaram restritos ao
âmbito europeu, mas espelharam-se, atingindo-nos em cheio.
Vendo a sociedade européia como modelo de civilização a ser
alcançado, estas teorias ajudaram a apontar os elementos que geravam o atraso
da sociedade brasileira, ao mesmo tempo em que serviram de base para a
construção do ideal de cidade.
Era necessário definitivamente acabar com passado colonial e inserir o
Brasil na modernidade do período. Sendo assim as cidades brasileiras, vinculadas
ao comércio exportador, principalmente as portuárias, foram palco de profundas
transformações sócio - econômicas, provocadas tanto pelo novo regime político, a
República, quanto pelas mudanças na estrutura produtiva e da divisão do
trabalho, o que ocasionou o crescimento populacional dos principais centros
urbanos, que não tinham estrutura para arcar com todas estas mudanças.
Resultado disto foram cidades com graves problemas sanitários e
habitacionais, onde se proliferava rapidamente todo tipo de doenças epidêmicas.
Assim, as principais cidades brasileiras do período foram objeto de reformas que
buscavam melhorar tanto as condições sanitárias como estéticas dentro do
75
conceito de cidade moderna do início de culo, em que se destacam as grandes
avenidas.
A reforma do Rio de Janeiro foi reflexo deste processo, que por ser
capital da República era o espaço, onde todos os tipos de forças políticas
exerciam pressão, expressando-se, inclusive, na própria estrutura administrativa
municipal. Caso mais notável foi a nomeação de Pereira Passos para o cargo de
prefeito com amplos poderes, durante o governo de Rodrigues Alves.
Neste momento, destaca-se a atuação dos engenheiros no processo
de renovação urbana. Os engenheiros que desempenharam papel importante nas
modificações da cidade neste período, já haviam mostrado interesse nos
melhoramentos urbanos antes mesmo da grande reforma de Pereira Passos,
alguns até possuíam concessões para aterrar, lotear e canalizar rios, como já foi
comentado.
Interessante observar como estes profissionais conseguiram se inserir
nos meandros do poder e estabelecer relações com o mesmo. O que se percebe
é que se estabeleceu uma relação de troca de interesses, na medida em que o
poder lançou mão do conhecimento técnico dos engenheiros, tidos neste
momento, como os homens da ciência, atentos às inovações técnicas do período,
muito devido ao seu conhecimento enciclopédico, para respaldar um projeto de
modernização. Os engenheiros, então aproveitaram para se estabelecer como um
profissional importante frente à sociedade burguesa e com isso galgar e em
alguns casos manter um status social e econômico na sociedade capitalista do
início do século XX.
76
Importante lembrar que antes da República a profissão de engenheiro
não possuía o mesmo status que o advogado e o médico tinham frente à
sociedade brasileira. Profissão eminentemente técnica, a engenharia encontrou
pouco espaço para uma atuação mais autônoma numa sociedade cuja
economia, durante o período imperial, era predominantemente agroexportadora
e fundada no trabalho escravo. Na maioria das vezes os engenheiros civis eram
absorvidos pela burocracia imperial, “como o principal, senão o único
empregador, como ressalta Edmundo Campos Coelho em seu livro “As
profissões Imperiais” e acrescenta:
A alternativa para os mais ambiciosos era construir uma carreira empresarial,
escolha que numa sociedade agrária e pré-industrial via de regra levava
apenas à frustração. Sem recursos próprios, dependentes de favores do
governo e às voltas com a crônica escassez de capitais e de sócios para os
empreendimentos, poucos foram os que obtiveram algum sucesso. A grande
maioria era absorvida pela burocracia imperial, que geralmente os
encaminhava para o setor ferroviário.
69
Portanto é perfeitamente compreensível que os engenheiros
aproveitassem o momento em que a profissão estava ganhando espaço,
justamente pelo seu conhecimento técnico, após a proclamação da República,
para se estabelecer como uma categoria de classe importante na formação da
sociedade moderna do século XX e com isso ascender socialmente. Neste
sentido foram buscar maior reconhecimento profissional implementando leis sobre
o exercício da profissão, nesta luta aliam-se a eles os arquitetos que também
começaram a se ver ameaçados pela crescente atuação de mestres- de – obra e
69
COELHO, Edmundo Campos. As profissões Imperiais, medicina, engenharia e advocacia no
Rio de Janeiro 1822-1930. Rio de Janeiro: Record, 1999, p.198.
77
empreiteiros. Estas questões, no entanto, serão melhor abordadas no capítulo
seguinte juntamente com uma análise da arquitetura deste período.
3- CAPÍTULO 2 – TEORIA E PRÁTICA, FORMAÇÃO E PRODUÇÃO – A
ARQUITETURA NO SÉCULO XIX.
1- Ilha Fiscal – Rio de Janeiro
3- Fórum de Niterói – RJ
2 - Antigo Prédio do
Jóquei Clube na Av.
Central.
79
3.1 A ARQUITETURA NO SÉCULO XIX/INÍCIO DO XX
O século XIX apresenta-se como um período de grande
efervescência, que precisava lidar com uma nova escala de fenômenos. A
industrialização detonou transformações que foram desde o setor bélico até a
urbanização.
As mudanças tecnológicas instauraram uma nova infra-estrutura
levando a exploração da capacidade produtiva do homem deste período,
contribuindo para uma mudança da consciência e consequentemente “produzindo
novas categorias de conhecimento e a um modo historicista de pensamento,
reflexivo o bastante para questionar a sua própria identidade
70
, reflexo da nova
formação cultural estabelecida pela transformação social vivida deste o final do
século XVII.
70
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes,
1997, p.3
Assim, como nos demais níveis de conhecimentos, a arquitetura do
século XIX se fundamenta em duas bases; a do conhecimento científico e a do
pensamento iluminista da época, que levou ao surgimento das disciplinas
humanistas, como a sociologia, a estética, a história e a arqueologia. Todo este
conhecimento refletiu na arquitetura, que vinha de um rebuscamento, de um
excesso decorativo, principalmente nos interiores rococós, e que neste momento,
de grande instabilidade, foi buscar através do conhecimento um estilo autêntico;
deste modo a reavaliação da Antigüidade foi fundamental na construção desta
nova arquitetura.
80
A princípio, acreditou-se que o Neoclassicismo seria o estilo que
responderia às necessidades de uma arquitetura mais verdadeira, a motivação
não era a simples cópia dos prédios da Antigüidade clássica, mas obedecer aos
princípios em que a obra destes se baseava.
O aprofundamento da pesquisa arqueológica levou ao conhecimento
de outras culturas com estilos diferentes, gerando uma certa controvérsia quanto
ao estilo autêntico a ser seguido. A partir daí cada projetista foi buscar uma
referência própria, chegando, inclusive, a se apropriar de um ou outro elemento
de estilos diferentes, levando assim ao Ecletismo.
O Ecletismo, segundo Luciano Patetta, usou de maneira mais
simplificada, estilizada, alguns elementos do passado, chegando a sutis
complexidades e algumas reduções modernas, na convicção de que fosse
possível escolher os melhores elementos da Antigüidade sem adotar a totalidade
do sistema de origem
71
.
Assim a arquitetura do século XIX fez uso dos estilos e alguns deles
foram associados a certas funções, tornando o Ecletismo o estilo próprio do
século XIX. Foi a cultura arquitetônica de uma classe burguesa que dava primazia
ao conforto, amava o progresso (no que este melhorasse suas condições de vida)
e as novidades, mas tratava a produção arquitetônica ao nível do gosto. O
Ecletismo pode não ter tido a intenção de ser uma arquitetura com grandes
preocupações filosóficas, mas produziu uma arquitetura participante e
comprometida com o seu momento histórico
72
.
71
PATETTA, Luciano. Considerações sobre o ecletismo na Europa. In FABRIS, Annateresa (org.).
Ecletismo na arquitetura brasileira. São Paulo: Nobel/Edusp, 1987, p.9-27.
72
ibidem, p. 13.
81
Ainda, segundo Patetta, o Ecletismo abrangeu mais de 150 anos, com
variadas manifestações e direções contraditórias, demonstrando uma inquietude
intelectual. Esse período fragmentário, no entanto, era condizente com o
conhecimento alcançado, levando à aceitação e ao aprofundamento desta
fragmentariedade, na medida em que novas culturas eram descobertas e seus
elementos construtivos eram incorporados ao vocabulário arquitetônico
tradicional, criando, assim uma linguagem particular para o século XIX.
A questão de um “estilo” ou uma linguagem própria para o século XIX
foi, durante este período, um dos temas principais de discussão entre os teóricos.
Hermann Muthesius, alemão, nascido em 1861, estudou arquitetura, história da
arte e filosofia, defendendo durante toda a sua carreira uma renovação cultural;
foi um dos pensadores que, durante o último quartel do século XIX, inflou a
discussão sobre este tema, tal como César Daly, que em seu tradicional jornal,
Revue Generale de L’Architecture et des Travaux Publics, abordou temas
relativos a arquitetura do século XIX.
É interessante observar, nos textos de Muthesius, constante
questionamento entorno da busca por um novo estilo, um estilo do século XIX/
XX, e que este deveria estar ligado às criações modernas que verdadeiramente
estabeleceram novas necessidades, não tendo relação nenhuma com as
formalidades da antiga arquitetura, e estas criações são: as estações ferroviárias,
os prédios das exposições, os grandes halls, as largas pontes, navios a vapor,
vagões de trem, bicicletas etc. São nestes exemplos que, segundo ele, estão
82
encarnadas as verdadeiras idéias modernas e os novos princípios de design; um
design sem decorativismos, preocupado estritamente com a função
73
.
Buscando entender melhor como as novas tecnologias e os novos
usos solicitados pela sociedade do final do século XIX início do XX atuaram na
arquitetura do período, tanto na Europa quanto no Brasil, discuto a seguir o
Neoclassicismo e o Ecletismo, muito embora ambos estejam inter-relacionados.
3.2 O NEOCLASSICISMO
O Neoclassicismo tem sua origem em meados do século XVIII e se dá
no mesmo período da Revolução Industrial. Este momento histórico traz uma
série de questionamentos, tanto no que se refere ao homem e a sua relação com
os novos conceitos e conhecimentos da era industrial e do capitalismo crescente,
quanto na esfera da arte e da arquitetura, que passou a buscar um novo estilo
condizente com o momento. Impulsionado pelo espírito iluminista da época, o
Neoclassicismo surgiu como o exemplo de linguagem à ser aplicada a arquitetura,
o modelo mais apropriado para o momento, uma vez que ele trabalha com
exemplos da arquitetura greco-romana, obedecendo ou buscando obedecer à
racionalidade das formas da Antigüidade clássica. A difusão do Neoclassicismo
por toda a Europa intensifica-se a partir da publicação de livros e manuais de
73
MUTHESIUS, Hermann. Style-architecture and building-art: transformations of architecture
in the nineteenth century and its present condition. Santa Monica : The Getty Center for
History of Art and the
Humanities, 1994, reedição do livro escrito em 1902, em que Muthesius trabalha com temas que
ele defendeu por toda a sua carreira, em busca de uma renovação cultural. O livro é importante
porque reserva especial atenção a arquitetura anterior à Primeira Guerra Mundial. Ele estudou
arquitetura, escreveu outros livros sobre o tema, inclusive um sobre a arquitetura italiana,
resultado de uma viagem de estudo. Em 1896 foi trabalhar como adido cultural na embaixada da
Alemanha na Inglaterra, onde teve oportunidade de conhecer a arquitetura inglesa sobre a qual
escreveu alguns livros. Quando voltou para a Alemanha trabalhou no Ministério do Comércio, mas
nunca deixou de escrever, morrendo em 1927.
83
arquitetura clássica, livros estes feitos com extrema acuidade arqueológica.
Sendo assim, a Antigüidade deixava de ser um mito e passava a ser um período
histórico devidamente estudado e dissecado com precisão científica; portanto,
uma referência exata tal como desejava a sociedade do período
74
.
A Inglaterra foi um dos centros culturais importantes para a difusão do
Neoclassicismo e muito se deve à influência de Palladio, levada por Inigo Jones já
em 1613, ano em que foi nomeado, pelo rei da Inglaterra, arquiteto responsável
pelas construções reais, retornando logo depois à Itália “desta vez para estudar
seriamente as construções italianas”
75
. De Palladio e da arquitetura romana,
Jones absorveu o espírito construtivo, trabalhando a edificação como um todo de
maneira organizada e segundo regras racionais
76
. Esta influência italiana
favoreceu a absorção dos conceitos clássicos, sem, no entanto, afastar-se
totalmente do gótico, que sempre esteve presente na arquitetura inglesa, o que de
certa forma contribuiu para a mistura ou a convivência dos dois modelos num
mesmo momento.
Outro centro importante foi a França, que, com a instituição da
Academie Royale d’architecture em 1671, passou a orientar a produção
arquitetônica francesa. A Academia administrava uma competição anual para
selecionar um pensionista real na Académie de France à Rome, premiação esta
instituída regularmente a partir de 1720.
77
As academias foram extintas em 1793
e uma escola de arquitetura só foi regulamentada em 1819 com a criação da
École des Beaux-Arts. A seção de arquitetura da Ecole des Beaux Arts descende
74
BENEVOLO, Leonardo. História da arquitetura moderna. São Paulo: Perspectiva, 1992, p.62
75
PEVSNER, Nikolaus. Panorama da arquitetura ocidental. São Paulo: Martins Fontes, 1994,
p.294
76
ibidem, p.294.
77
EGBERT, Donald Drew. The Beaux- Art tradition in French architecture. New Jersey :
Princeton University Press, 1980, p. xxi.
84
da linha conduzida pela Academie Royale d’architecture, a sua orientação,
portanto, permaneceu praticamente a mesma da época em que Nicolas-François
Bondel (1617-1686) foi diretor da Academia.
Um outro fator que contribuiu para o fortalecimento da cultura clássica
foi a circulação dos desenhos de ruínas gregas fazendo com que após a
Revolução Francesa a orientação da Academia se voltasse cada vez mais para o
revivalismo da arquitetura grega estabelecendo o Neoclassicismo como o símbolo
do poder constituído, uma vez que este se identifica com a tradição, que poderia
ser criada ideologicamente quando fosse necessário
78
. Como ainda não se tinha
um conhecimento exato do que seria a verdadeira referência clássica, pensá-la
enquanto algo idealizado era por fim o caminho mais fácil. A identificação com o
poder, do ideal clássico, termina por se espalhar por toda a Europa e nas
Américas.
Entretanto, toda a efervescência cultural do período não se restringe ao
Neoclassicismo. Sabemos que, desde o século XVIII, outras manifestações
artísticas já conviviam como o próprio gótico, que nunca deixou de ser produzido
na Inglaterra, assim como construções de gosto romântico/pitoresco
principalmente nos Países - Baixos. Acredito que o Neoclassicismo tenha se
mostrado com mais força, devido a sua relação direta com as instituições
governamentais, mas ele é apenas uma das tendências arquitetônicas que
estavam em desenvolvimento no período.
No Brasil não foi diferente: também aqui podemos notar esta ascensão
do Neoclassicismo, apesar de outros exemplos já virem se manifestando. A
arquitetura brasileira começa a sofrer alterações a partir da incorporação dos
78
FRANÇA, José-Augusto. História da arte ocidental 1780-1980. Lisboa : Livros Horizontes,
1987, p.13.
85
novos movimentos europeus como o próprio Neoclassicismo. A Abertura dos
Portos às Nações Amigas contribuiu para aquisição destes novos valores e
modismos e, antes mesmo da chegada da Missão Francesa, em 1816, alguns
elementos, que demonstravam um gosto neoclássico, vinham sendo aplicados em
algumas edificações. Ainda que de forma modesta, este gosto neoclássico
aparece em exemplos como a montagem do portão neoclássico (Il.06) em 1812,
trazido pelo inglês John Joshnstn (que é cópia do pórtico de entrada da Syon
House projetada por Robert Adam
79
- Il. 7), na residência real de São Cristóvão.
Il. 06 – Portão da Quinta da Boa
Vista.
Il. 07 – Portão da Syon House-
Robert Adam – 1773.
79
Robert Adam é conhecido como o pai do neoclassicismo na Grã-Bretanha. PEVSNER,
Nicolaus, Panorama da arquitetura ocidental. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p.338
86
Este mesmo arquiteto, ou construtor inglês, não se sabe ao certo, teria
executado na referida residência um pavilhão neogótico, e nesse caso, então, não
apenas o Neoclassicismo, mas na verdade, uma prática eclética já vinha se
manisfestando, na medida em que se lançava mão de um “estilo” diferente do que
do que estava marcado na construção. Este tipo de prática eclética vem sendo
reestudada atualmente, levando a uma reflexão do Ecletismo como um todo
80
.
É possível, então, afirmar que a influência neoclássica, no Brasil, se
processou em dois níveis: pelo contato direto dos centros litorâneos com as
capitais européias, através dos viajantes e pessoas que vinham conhecer a
América, e pela Missão Francesa, que institucionalizou o gosto neoclássico e,
neste caso, influenciou não apenas as construções oficiais, mas também as
pequenas edificações que procuravam adequar-se aos novos modismos.
Após a vinda a Missão, o gosto neoclássico foi oficializado como o
“estilo” do Império, uma vez que os artistas que formavam a Missão passaram a
trabalhar para o governo, criando um sistema de dependência com o mesmo, que
acompanhou por muito tempo a produção artística brasileira. Estes artistas, de
clara formação clássica, vindos da Beaux-Arts francesa, refletiram no Brasil uma
tendência comum a todo o ocidente entre o final do século XVIII e início do XIX.
Com a inauguração da Academia de Belas Artes, em novembro de
1826, cujo prédio (Il.8), projetado por Grandjean de Montigny, é exemplo da
linguagem clássica aplicada às edificações, o ensino da arquitetura foi instituído e
direcionado para uma formação neoclássica. Seguindo a orientação do mestre
Grandjean, que lecionou na Academia até 1850, seus discípulos realizaram, no
Rio de Janeiro, obras de notável apuro formal e construtivo, como por exemplo, o
80
Dentre os historiadores que reestudam o Ecletismo, destaco: PATETTA, Luciano.
L’architecture dell ecletismo: fonti, teorie e modelli – 1750/1900. Milão : Mazotta, 1975
87
Palácio Itamarati, projeto de José Maria Jacinto Rabello, construído em
1851/1856, entre outros projetos executados pelos arquitetos formados na
Academia, para atender a encomendas oficiais, como o Palácio Imperial de
Petrópolis(Il.9), projeto de Joaquim Cândido Guilhobel; a Casa da Princesa Isabel
(atual Palácio Guanabara), projeto de José Maria Jacinto Rabelo, na verdade uma
adaptação feita em 1895 de uma casa existente; e o Hospício Pedro II, projeto de
José Maria Jacinto Rabelo e Joaquim Cândido Guilhobel construído em
1842/1852 entre outros
81
.
Esta arquitetura influenciada pelo ensino acadêmico se caracterizava
pela clareza construtiva e simplicidade formal. Os recursos formais constituíam-se
de alguns elementos construtivos, como cornijas e platibandas que eram
revestidos com ornamentos. As linhas básicas das construções eram marcadas
por pilastras, sobre as quais se assentavam arquitraves e platibandas, onde se
dispunham elementos decorativos, como objetos de louça, tipo compoteiras, ou
figuras representando mitos e divindades. É nesta clareza construtiva e
simplicidade formal que reside o racionalismo apontado por Picon na doutrina de
Blondel e que está diretamente ligado a Grandjean de Montigny.
Il 08 -Fachada da Academia
Imperial de Belas Artes
81
SANTOS, Paulo F. Quatro séculos de arquitetura. Rio de Janeiro: IAB, 1981, p.59 e 60.
88
Nos corpos centrais, que geralmente avançam em relação ao restante
da construção, erguiam-se escadarias, colunatas e frontões de pedra aparente,
chegando inclusive a receber a denominação de templete (pequeno templo de
inspiração grega) dórico, jônico ou coríntio, conforme o capitel empregado nas
colunas. Nestes pórticos os arquitetos, davam um tratamento mais elaborado
demonstrando todo o seu conhecimento dos ensinamentos acadêmicos
objetivando marcar as obras em termo de “estilo”.
Il. 09 – Palácio Imperial de
Petrópolis.
A planta das edificações se desenvolvia, na maioria das vezes, a partir
de quadrados e retângulos. As paredes, de pedra ou de tijolo, eram revestidas e
pintadas em cores suaves, onde se destacavam janelas e portas emolduradas por
pedras aparelhadas e arrematadas em arco pleno, em cujas bandeiras
dispunham-se rosáceas.
Porém, o maior avanço da arquitetura deste período, foi a
reorganização dos espaços internos. O desenvolvimento dos núcleos urbanos,
principalmente no Rio de Janeiro, implicou na alteração dos usos e costumes da
cidade, alteração esta que refletiu na forma de habitar e nos mecanismos de
relacionamento da vida familiar com a nova sociedade que estava se formando. A
austeridade e até de certa forma a rusticidade dos interiores coloniais começaram
89
a ser substituídos por ambientes mais decorados, com paredes revestidas com
papéis de parede importados da Europa.
Nas residências das famílias abastadas, desenvolvia-se intensa vida
social, assim, as salas destinadas às recepções recebiam tratamento especial,
com pinturas originais nos forros, paredes e portas; ao mesmo tempo, novos
objetos e mobiliário de gosto refinado foram incorporados à vida desta nova
sociedade, que procurava cada vez mais adequar-se a um modo de vida com
características européias.
Dentro desta realidade, a arquitetura e os arquitetos contribuíram para
a modificação formal, não apenas dos ambientes, mas também da paisagem
urbana. As construções passaram a receber um acabamento melhor com o
emprego de novas técnicas construtivas, como o uso de uma base estrutural,
revestimentos em pedra e argamassa e a incorporação de materiais importados:
Traziam-se da Europa vidros, ferragens, mármores, luminárias, calhas e até
mesmo telha e madeira para portas, janelas e estruturas de telhado
82
.
Portanto, este refinamento que se desenvolveu no decorrer do século
XIX, atingiu não só as residências das famílias abastadas e as construções
oficiais, mas também as casas mais populares. Os pequenos e médios
construtores absorveram estes novos padrões decorativos, que foram
empregados para atender às exigências dos proprietários, não obedecendo aos
cânones da Academia, porém contribuíram para dar à cidade uma feição
neoclássica e reafirmar o neoclássico como estilo oficial do Império.
No entanto, atualmente percebemos que este “Neoclassicismo” não era
totalmente puro, ele já apresentava manifestações e interpretações que estão
82
REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo : Perspectiva, 1983, p.120.
90
muito mais próximas de uma prática eclética e que, a partir de meados do século
XIX, tornou-se mais evidente na arquitetura carioca.
3.3 O ECLETISMO
A arquitetura produzida no século XIX é reflexo das intensas
transformações sofridas pela sociedade ocidental e já se mostravam desde o final
do século XVIII o que, para os arquitetos, segundo François Loyer
83
, corresponde
a uma crise ideológica profunda. É sob esta crise que começaram a se formar
novas estruturas arquitetônicas, que, apesar de sua aparente diversidade e talvez
por causa dela mesma, acabou por constituir o que chamamos de Ecletismo.
O Ecletismo, numa definição mais simples, surge como uma releitura
de todos os estilos existentes na história da arquitetura. Obviamente, toda a
produção neoclássica foi de fundamental importância, estando até ela mesma
incorporada ao Ecletismo, se o considerarmos um grande bloco histórico, como
sugere Luciano Patetta; mas a arquitetura já vinha questionando o seu papel e as
próprias regras tidas como verdades, como as proporções vitruvianas e “o modo
como elas foram recebidas e apuradas pela teoria clássica”
84
.
Neste momento, cabe, então, fazer referência a esta revisão das regras
vitruvianas que foram tratadas por Jacques-François Blondel em seu Curso de
Arquitetura e posteriormente abordadas por Jean-Nicolas-Louis Durand. Blondel e
Durand são aqui apontados por terem sido professores das escolas de arquitetura
e engenharia respectivamente, na França, e demonstraram preocupação com a
“expressão formal apropriada e com uma fisionomia diferenciada para ajustar o
83
LOYER, François. Le siècle de l’industrie. Paris : Skira, 1983 p.111
84
FRAMPTON,Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p.5
91
caráter social variável de diferentes tipos de construção”
85
e, como mais adiante
abordo, a questão da formação de arquitetos e engenheiros no Rio de Janeiro,
acredito ser pertinente revisar a posição teórica de ambos.
Jacques-François Blondel nasceu em Rouen no ano de 1705. Fundou
uma Escola de Artes em 1740, nela montou um curso de arquitetura e a partir de
1770 começou a publicar suas notas de aulas, que após a sua morte em 1774,
continuaram a ser publicadas por seu discípulo Pierre Patte. Com sua escola e a
publicação de seus escritos, Blondel se tornou, “o mestre da chamada geração
“visionária” de arquitetos, que incluía Étienne-Louis Boullée, Jacques Gondoin,
Pierre Patte, Marie-Joseph Peyre, Jean-Baptiste Rondelet e, provavelmente o
mais visionário de todos, Claude-Nicolas Ledoux.”
86
Blondel estabelece um método de ensino mais elaborado que o da
Academia, é antes de tudo um professor, preocupado com a elaboração do saber
e com a sua difusão, mais voltado a teoria do que a prática profissional. Blondel
foi conservador no gosto e racional em seu método, e é este método, pontuado
por um gosto clássico, porém muito mais afeito ao historicismo, que destaco nos
parágrafos seguintes.
Para Blondel, o arquiteto deve “passar do cálculo ao desenho, deste à
perspectiva, retornar à ornamentação da paisagem, mas também se transformar
em viajante, visitar tudo e tudo ver, desde os monumentos mais célebres até os
ateliês onde se fabrica as marchetarias e os vidros destinados a ornamentar os
apartamentos”
87
. Ressaltando, que da teoria das ordens às questões de
85
ibidem, p.5.
86
ibidem, p.6.
87
PICON, Antoine. Architectes e ingénieurs au siècle dês Lumières. Marseille: Parenthèses, 1988,
p.54. Apud BLONDEL, Francois, Cours d’architecture, p.3 – Tradução de Cristina Areias.
92
construção, a cultura arquitetural constitui um verdadeiro universo com o qual é
conveniente ir-se familiarizando pacientemente.
Quer se trate da decoração ou da distribuição das construções, Blondel
tenta recensear e organizar os conhecimentos arquitetônicos de seu tempo em
função de imperativos em que relaciona: divisões e classificações em arquitetura
e arte; decoração, proporção e ordem; distribuição interna e externa; conveniência
e caráter.
Retomando o mito das origens, Blondel se servirá dele para distinguir a
arquitetura civil, militar e naval. Como em Condillac ou Rousseau, a
origem é antes de tudo explicativa, conceito que encontramos junto aos
engenheiros, que os utilizam a fim de elaborar uma divisão das ciências
em função de suas filiações recíprocas.
Define a proporção como a “parte mais interessante da arquitetura”, que
“determina as dimensões, as grandezas, alturas e profundidades dos
planos e fachadas de uma construção”; “é por causa dela que um edifício
adquire uma relação íntima entre o todo e as partes, e que cada membro
se encontra em seu lugar”. A proporção se aprende segundo Blondel, que
retoma aqui fielmente a lição clássica, “com a ajuda dos matemáticos e
com o estudo da arquitetura antiga”.
O Curso privilegia o sistema de Vignola, cujas medidas com base em
relações bastante simples se deduzem facilmente umas das outras.
....é, com efeito, a simplicidade que os arquitetos procuram a fim de
facilitar a boa execução das ordens de arquitetura pelos operários.
Renunciando ao caráter ideal da proporção, a teoria perde com efeito uma
de suas justificativas essenciais. O que não se encontra ameaçado a
termo, é mesmo a possibilidade de uma coerência formal fundamentada
sobre o sistema de medidas e de correspondências entre as partes e o
todo, que a idade clássica havia progressivamente procurado refinar.
Mais que as proporções ideais, é esta coerência que, no entanto,
preocupa Blondel.
88
Este conhecimento tão valorizado por Blondel apenas reflete o seu
próprio momento histórico, em que a difusão e valorização da cultura clássica
surgem como parâmetro para a sociedade da época. A partir daí toda a
metodologia de ensino foi baseada num conceito ou ideal clássico.
Em seu curso Blondel destaca a importância do conhecimento e
retomando a teoria clássica se preocupa antes de tudo com as regularidades que
88
PICON, Aontoine, Em direção a uma arquitetura clássica”Jacquues-François Blondel e o curso de
arquiteura, in
Architectes e ingénieurs au siècle dês Lumières. Marseille: Parenthèses, 1988,
p.56 e 57
93
sozinhas podem se erigir em saber. Sendo assim, para ele a genialidade não se
aprende, e suas “felizes licenças” são objeto de reflexão mais que de ensino.
Desta forma o talento e o gosto residem antes de tudo no domínio da
profissão de arquiteto; o gênio pode em contrapartida alterar as regras e às vezes
mesmo, corrompê-las. Saber e imaginação, regras e invenções se confrontam no
seio do desenrolar do projeto. Para Blondel a unidade e a simplicidade são as
principais qualidades de um projeto.
A simetria deve ser considerada como uma das principais belezas da
arquitetura”, mas trata-se também de fazer “piramidar” os edifícios por
meio dos avant-corps, dos frontões e do conjunto dos telhados habilmente
dispostos e, mais geralmente, de promover uma composição
hierarquizada, se deslocando claramente a partir de seus elementos de
centralidade. Animado por um desejo de racionalização, o Curso se opõe,
por outro lado, a tudo que vem entravar os movimentos do conjunto da
construção e o livre jogo das partes. Blondel critica as sobreposições e as
penetrações, como os frontões que invadem os entablamentos do andar
superior ou estes consoles interrompendo as arquivoltas Não mais estes
perfis atormentados, estes membros truncados, de Palladio ou de
Borromini. Convém evitar igualmente toda decoração supérflua. Blondel
sublinha também a inconveniência de sobrepor as ordens, a diferença de
módulo de um nível ao outro criando inúmeras dificuldades. A construção
ideal, comportará na medida do possível um embasamento regular, os
áticos são os mais freqüentemente proscritos, sua utilização se
acompanhando aí ainda de problemas dimensionais praticamente
insolúveis. A arquitetura deve ser simples e legível como um discurso
formal, que não se relaxa.
89
Deste modo, Blondel começou a estabelecer novas definições no fazer
arquitetônico, distinguindo claramente cada função de uma nova tríade(ordem,
distribuição e conveniência). Sua preocupação em criar novos parâmetros fez
com que levantasse questões tal como a distribuição, o que o torna uma figura
decisiva na história da arquitetura, chegando mesmo a escrever que foi a partir
dele que “a arquitetura se tornou humana, isto é prática
90
”. Sobre a distribuição,
Blondel faz distinção entre distribuição externa e distribuição interna. A
89
ibidem, p.63 e 64
90
PICON, Op. Cit.,apud Blondel,p.54
94
distribuição exterior diz respeito à disposição da construção principal, aos átrios e
às áreas em comum, assim como ao desenho dos jardins. A salubridade e uma
boa exposição permitem determinar o posicionamento da habitação. Em torno
dela, cozinhas, estábulos, átrios devem ser organizados como uma composição
progressiva, tão escalonada como os planos em uma fachada. Depois destas
considerações gerais, Blondel se volta para a arte dos jardins.
Se Blondel ainda se permitia algumas liberdades na distribuição
externa, na interna, ao contrário, ele estabelece um sistema bem mais rígido. Os
alinhamentos constituem a principal beleza de um apartamento e o trabalho do
arquiteto consiste em determiná-los logo de início. Para ele é preciso observar aí,
“uma gradação relativa ao destino e ao uso de cada peça.
91
”, a partir dos
vestíbulos sobriamente ornados, até aos salões, onde todos os recursos das artes
são colocados a disposição. Encontra-se em matéria de distribuição interna todos
os grandes princípios da decoração transportados para o ordenamento das
peças.
Pelo espírito de conveniência relativo à distribuição, nós entendemos os
diferentes graus de magnificência que devemos tentar espalhar no interior
dos apartamentos, segundo a dignidade do proprietário que deverá habitá-
la, tanto quanto a atenção que o arquiteto deve ter com relação a tornar as
principais peças mais ou menos espaçosas, com formas variadas, bem
perspectivadas, claras e destacadas, segundo o uso de cada uma.”
Por simetria, entendemos a regularidade respectiva dos corpos colocados
em oposição, uns diante dos outros; a necessidade de colocar as
chaminés e os panos cegos no meio da profundidade e da largura das
peças. A simetria consiste ainda na relação que devem ter as diferentes
peças de um apartamento, entre elas.”
Por proporção, devemos entender o quanto é essencial dar às diferentes
peças de uma construção, as alturas relativas a seus diferentes diâmetros
e a seu uso particular, assim como estabelecer uma relação direta entre
sua profundidade e sua largura.
92
.
91
Ibidem, p.76
92
ibidem, p.81-83
95
Segundo Picon, a analogia que se faz entre a decoração e a
distribuição pode ainda prosseguir, uma vez que ao caráter escalonado da
fachada corresponde a gradação dos alinhamentos. Ao classificar os edifícios em
função do número de seus andares, é possível distinguir igualmente os corpos
das construções simples, duplas ou semi-duplas, na medida em que encontramos
aí, um só plano sobre a largura, um plano principal acompanhado de um outro de
menor importância ou dois planos principais.
Para Picon, neste momento, vemos iniciar uma tentativa de resolução
do conflito entre exterior e interior, por sua redução a um problema de geometria,
consistindo em combinar toda uma série de horizontais e de verticais.
Diferente de Ledoux, Blondel quer evitar os efeitos paradoxais que podem
se introduzir entre o plano e a elevação. Trata-se a seus olhos, mais de
conciliar que de opor o volume a suas diferentes projeções. As janelas
serão aumentadas, se jogará com as alturas da peças ou com a ordem
externa, mas jamais um cilindro deixará a impressão de um quadrado sob
o solo.
Privilegiando os alinhamentos, as peças simétricas, retomando estas
galerias que o século XVII gostava de colocar nas alas dos hotéis
particulares, as distribuições apresentadas por Blondel em seu Curso, são
finalmente, bastante convencionais.
Enumerando em contrapartida as diferentes peças que compõem os
apartamentos: vestíbulos, banheiros, quartos e galerias, dando a este
propósito inúmeras precisões quanto a seu uso e às comodidades que se
lhes pode trazer, o Curso de arquitetura marca em definitivo uma transição
entre a idade clássica e a descoberta do íntimo doméstico. Em matéria de
distribuição, encontramos assim em Blondel, esta preocupação com a
unidade e com a coerência, esta obsessão com a continuidade dos
efeitos, que se exprimiam já no domínio da decoração.”
93
As questões levantadas por Blondel já apontam pra a substituição das
regras vitruvianas e a noção de conveniência começa então a aparecer.
Conveniência e caráter estão intimamente ligadas e estas por sua vez descendem
da distribuição, que em si está relacionada ao conceito de ordem. Portanto, há
93
ibidem, p.83.
96
uma unidade e coerência na arquitetura que se traduzem em termos de princípio.
Com relação à geometria, estes princípios se organizam, segundo um dispositivo,
que é preciso deixar claro. Princípios e prática de projeto estão na verdade
intimamente ligados; a conveniência dita, por exemplo, ao arquiteto, cada uma de
suas decisões.
Segundo Picon, Blondel é, sem dúvida, o teórico por excelência da
conveniência, dando uma importância nova a este termo há muito subordinado às
regras do bem-estar
94
. Sob sua pena, a conveniência funciona sob vários planos.
Ela diz respeito, logo de início, ao projeto em sua definição espacial.
O espírito de conveniência ensina a escolha das localizações, a exatidão
das proporções e a comodidade dos arranjos; ele faz distinguir os
materiais próprios no local em que se constrói; guia em sua arrumação e
em seu trabalho; coloca sempre à vista o objetivo de sua empreitada:...e
em uma palavra, é através da conveniência que uma construção pode ter
toda sua perfeição e que podemos encontrar aí uma agradável
correspondência das partes com o todo
95
.
Ainda segundo Picon, a conveniência não se restringe à definição
espacial, uma vez que ela também abraça o domínio do bem-estar, definida como
“a perspectiva que se deve guardar em cada gênero de edifício relativamente à
dignidade das pessoas para as quais o construímos
96
”. Se o bem-estar se dirige
mais particularmente aos edifícios sacros, aos locais públicos e aos palácios
reais, a conveniência vem generalizar esta “perspectiva” relativa à dignidade do
cliente. Princípio de coerência do projeto, ela diz respeito, finalmente, ao conjunto
94
ibidem, p.86.
95
ibidem, p.86 e 87
96
ibidem, p.86
97
de problemas que encontramos no curso de sua elaboração, assim como à
procura de uma perfeita adequação entre a arquitetura e sua demanda
97
.
A conveniência representa assim um “espírito”, um conceito.
Acompanhando o arquiteto até aos detalhes de sua trajetória, ela vem garantir a
unidade do produto final. Esta unidade diz respeito em particular à relação entre
o exterior dos edifícios e seu destino interior: é preciso sublinhar a este propósito,
a dupla natureza da conveniência, que se estende das questões de ordem à
economia e às despesas. A conveniência se situa, assim, no ponto exato em que
vêm se encontrar o belo e o útil, a decoração e a distribuição. Enfim, ela acaba
por se tornar o conceito que melhor abarca a problemática, que envolve a arte de
projetar e esta talvez seja a maior contribuição que os teóricos e arquitetos dos
séculos XVIII e XIX deram para a arquitetura, na medida em que cada vez mais
todos os elementos constituintes do projeto são pensados em conjunto, tendo
como fio condutor a conveniência.
Por fim, a noção de caráter promove o fechamento do termo
conveniência. Surgida em final do século XVII, a noção de caráter também é
tratada por Blondel em seu Curso. A princípio, o caráter arquitetural reside nas
cinco ordens da arquitetura, das quais o “gênero” estabelecido após a
Renascença ganha novo relevo. O toscano marca uma solidez um pouco rústica,
o dórico é robusto e masculino, o jônico mais feminino, o coríntio rico, elegante e
leve, enquanto que o compósito evoca a idéia de uma graça quase adolescente.
O caráter das ordens se transmite em seguida ao edifício como um todo, pelo
97
“A conveniência deve ser vista como a parte que deve preceder toda operação na arte de
construir. Ela indica o bem-estar que devemos observar em todas as espécies de edifícios,
suas grandezas, suas formas, suas ordens, suas riquezas e suas simplicidades. É ela que
assina as alegorias, os atributos convenientes a cada gênero de construção; é ela que
nomeia, que determina a escolha dos materiais, seu emprego, a qualidade das matérias;
enfim, é pelo espírito da conveniência que, sob princípios constantes, conseguimos dar
98
intermédio de suas “expressões”, através do desenho dos entalhes, das portas,
das cruzetas e das balaustradas. A oposição entre o liso e o rebuscado, o jogo
de diferentes ornamentos na decoração, os efeitos piramidais devem contribuir
para transformar a arquitetura em um poema alternativamente eloqüente ou
reservado
98
.
A noção de caráter aparece enunciada pelo texto do Curso de Blondel
e nas instruções que deixa aos arquitetos: “O espírito de conveniência,
fundamento do gosto pela arte, obriga o arquiteto à escolha das características de
uma de suas ordens para designar a espécie, a importância e o uso do edifício
que ele quer decorar
99
.” Todo o problema, então, consiste em estabelecer regras
de correspondência entre a ordem e o uso.
Blondel, por fim, promove uma valorização do clássico, mas engendra
novos mecanismos de composição, que determinaram uma nova maneira de
pensar a arquitetura. O mais significativo em toda esta revisão clássica é
justamente verificar, através do estudo das regras vitruvianas uma racionalidade
na concepção do projeto e trazer a tona a reflexão do ato de projetar, a partir das
novas relações promovidas entre arquiteto, arquitetura, ciência e sociedade.
Sendo assim, esta revisão das regras vitruvianas tem, como seu maior
exemplo, a substituição dos atributos de Vitruvio - utilitas, firmitas e venustas
(utilidade, solidez e beleza)- por ordenance, distribution e bienséance (ordem,
distribuição e conveniência)- elaborada pelo abade Cordemoy
100
. Esta nova tríade
se preocupa com a proporção correta e a distribuição de cada elemento clássico,
respectivamente ordem e distribuição, já a conveniência introduzia a adequação
formas diversas a construções erguidas para o mesmo fim, de acordo com a colocação, a
dignidade ou a opulência dos proprietários.” Ibid. p.86 apub. BLONDEL, Discours, p.5
98
PICON, Op. Cit. p.59
99
ibidem, p.60
99
da herança clássica, antecipando assim a noção de caráter, que tanto orientou a
produção arquitetônica do século XIX.
Portanto, percebemos que a principal discussão da arquitetura do
século XIX é a questão da conveniência, ou melhor, de uma distribuição mais
ordenada dos elementos clássicos, em que não se pode deixar de considerar o
ornamento, que neste caso passa a ser um elemento importante na elaboração
do projeto. Sendo assim, é possível estabelecer um percurso que tem por fim
atingir a conveniência. Seria ele: ornamentocaráter
significaçãoconveniência. Vemos, então, que toda a discussão acaba, por fim,
na questão do estilo, mais propriamente do ornamento e o seu uso apropriado,
para produzir uma arquitetura clara, demonstrando o seu significado, na
configuração da cidade. É sob esta cadeia de relações, de certa forma até
conflitantes, que se desenvolve o Ecletismo, que abrange, não só os ecléticos
propriamente ditos, mas também os racionalistas ou estruturalistas e as demais
tendências arquitetônicas que se manifestam durante o século XIX
101
.
As questões relativas à ordem, distribuição e conveniência também
podem ser percebidas nos manuais de arquitetura tão difundidos neste período,
que buscam muito mais educar o gosto e principalmente promover o
conhecimento, do que propriamente querer imprimir um conceito de cópia de um
modelo ideal. Neste sentido, tem papel fundamental Jean-Nicolas-Louis-Durand,
professor de arquitetura da Escola Politécnica, que, com seu “Précis des leçons
données à l’école Plytechnique” (1802-1809), estabeleceu um método, mas acima
de tudo promoveu o conceito de conveniência e economia. Para ele, por
conveniência entende-se a perfeita distribuição das partes e economia seria
100
FRANPTON, Kenneth. Op. Cit. p.5
100
obedecer às formas simples e geométricas, que resultariam um processo
construtivo mais rápido, simples e, portanto, econômico; ou seja, esta sintetização
normativa de Durand valoriza a racionalidade, que sabemos ser uma das
correntes da arquitetura do século XIX, que evoluiu no decorrer do mesmo,
principalmente com a distinção entre arquitetura e engenharia, arquitetos e
engenheiros.
A idéia corrente na época era que, com o crescimento da sociedade
capitalista, a arquitetura teria ficado em segundo plano, uma vez que a
engenharia conseguia responder mais imediatamente ao pensamento científico
do período. Assim, com a ascensão da engenharia, os arquitetos teriam ficado
praticamente esquecidos, vendo-se como meros ilustradores
102
da arquitetura do
poder.
Os engenheiros se distinguem dos arquitetos, já em meados do século
XVIII, interessando-se também sobre a produção do espaço. Apoiando-se numa
rede de instituições novas, tais como o novo sistema de governo e os
investimentos urbanos, eles foram codificando seu saber e sua prática. Os
engenheiros elaboraram um sistema que foi pouco a pouco ameaçando os
arquitetos em suas certezas e prerrogativas
103
.
Os engenheiros buscavam prioritariamente a colaboração dos
cientistas, em lugar da antiguidade, e admiravam a eficácia inglesa. Cálculo e
economia passaram a ser as palavras de ordem dos engenheiros, com isso eles
estabeleceram novas relações e se colocaram ao lado do Estado ou a serviço dos
bancos e empreendimentos privados, lidando com questões de rentabilidade.
101
LOYER, Op.Cit., p.65-104
102
PICON, Antoine. Op.Cit., p.291
101
Resta, então, conciliar arquitetura e futuro, arquitetura e progresso,
tarefa à qual os arquitetos logo se atrelaram. Os anos 1800 marcam, em
definitivo, uma ruptura, em relação à teoria clássica, apagaram-se
progressivamente as regras de correspondência tradicional entre arquitetura e
hierarquia social, as racionalidades agem mais sobre o processo que sobre os
objetos. É uma racionalidade por excelência da sociedade capitalista nascente, a
ciência tornou-se ela mesma um processo de interrogação da natureza. A
arquitetura então se viu num momento de crise, questionando a sua produção.
Porém, dentro deste momento de crise, a arquitetura passa a se
posicionar e mostrar que ela não estava tão alienada quanto se acreditava; ela
buscava, na verdade, se sustentar dentro da crise e da diversidade do próprio
século XIX. Sem perceber que as mudanças já estavam em curso e se refletem,
seja no emprego dos materiais tradicionais como a pedra, usada de forma
racional, destacando a sua função e verdade construtiva; seja na preocupação em
criar um método objetivo de projetar, em que a linguagem fosse decorrência dos
processos construtivos.
Mesmo que lançasse mão de um repertório tradicional de forma a
atender aos seus pressupostos teóricos, procurava dentro destes a sua verdade
construtiva, criando assim uma arquitetura que reflete o próprio século XIX em
que tradição e inovação se mesclam.
Como já foi relatado na introdução desta tese, no Brasil a arquitetura
eclética passou a dominar o cenário das principais cidades e está ligado a
modernização e ao crescimento urbano.
103
ibidem, p.93
102
Neste momento a reforma urbana do Rio de Janeiro durante o governo
Pereira Passos é exemplo do empenho da República em implantar os seus ideais
de modernidade, já ressaltado no capítulo anterior.
Il.10 - Avenida Central em obras-
Vista em direção ao Norte.
Este plano de reforma é representativo dos questionamentos, que
abordam a cidade moderna e a arquitetura eclética é usada como um símbolo do
ideal de cidade a ser atingida; no caso brasileiro, os exemplos foram retirados de
protótipos parisienses, principalmente nos prédios públicos.
A presença desta arquitetura se dissemina pelo país, como ressalta
Annateresa Fabris no livro Ecletismo na Arquitetura Brasileira. A disseminação do
Ecletismo pelo país também está associado ao surto econômico que atingiu
algumas regiões. São Paulo desponta como a nova força econômica nacional,
com o crescimento da economia cafeeira, formando uma elite que se identificava
com o progresso tecnológico e aberta aos investimentos industriais. A cidade
também passou por transformações significativas. Vencer as depressões
geográficas era o grande objetivo da época: “ o eixo do vale do Anhangabaú e
Várzea do Carmo eram obsessões”
104
. A construção do Viaduto do Chá em
104
SEGAWA, Hugo. Prelúdio da metrópole – arquitetura e urbanismo em São Paulo na
passagem do século XIX ao XX. São Paulo : Ateliê Editorial, 2000, p.15.
103
1892(Il.11) marca a ruptura da cidade fechada num triângulo
105
, abrindo-se para
novos espaços. Nas décadas seguintes novos viadutos foram incorporados,
vencendo e também ocupando estes vales.
Il. 11- Viaduto do Chá,
com o Teatro Municipal
a direita e o Teatro São
José a esquerda.
Mantendo-se ainda entorno da região do Viaduto do Chá e o Vale do
Anhangabaú, apenas pra citar um dos exemplos das várias transformações que a
cidade de São Paulo sofreu neste período e como a arquitetura eclética
fundamenta estas transformações, verifica-se que o projeto de urbanização do
vale é emblemático destas questões: expansão urbana, construção de marcos
importantes, como o Teatro Municipal, e uma arquitetura intimamente ligada aos
anseios da burguesia capitalista(Il.12).
105
A cidade de São Paulo esteve por muito tempo restrita a um espaço demarcado pelo
Convento de São Francisco, do Carmo e do Mosteiro de São Bento, que formava a figura de
104
Il. 12 – Perspectiva do Vale do Anhangabaú, segundo a proposta de Projeto Freire-Guilhem.
Na região norte do país, a exploração da borracha promoveu o
desenvolvimento de cidades como Belém e Manaus e a construção de prédios
marcantes, como o Teatro Amazonas em Manaus e o Mercado Municipal em
Belém – este um exemplo de arquitetura do ferro, em Belém. No nordeste do
Brasil, o desenvolvimento da cultura do açúcar e do algodão levou à expansão de
cidades como Recife e Fortaleza. No sul, encontram-se exemplos de arquitetura
eclética, tanto na capital, Porto Alegre, quanto em cidades como Pelotas e Rio
Grande, ligadas ao crescimento da atividade portuária e cujos exemplos ainda
estão presentes. Pelotas, então, apresenta uma quantidade significativa de
prédios ecléticos, chegando, inclusive, a impressionar o visitante desavisado e
interessado neste tipo de arquitetura.
um triângulo.
105
3.4 TRANSFORMAÇÕES ESTRUTURAIS – A ARTE DE CONSTRUIR E A
INDUSTRIALIZAÇÃO.
A contribuição da industrialização e a evolução das técnicas
construtivas, na busca de uma nova arquitetura, estão diretamente ligadas à
racionalização do ato de projetar, ao projeto em si, que passa a ser pensado a
partir dos elementos industrializados. A introdução da estrutura metálica, o
principal fenômeno tecnológico do período, determina uma orientação, que
conduziu a uma racionalização ao projetar.
Todo este progresso tecnológico contribui de certa forma para a crise
da arquitetura do século XIX, criando uma expectativa em relação a esta. A
liberdade na utilização do ornamento, de certa forma, impediu que se enxergasse
que uma nova arquitetura estava sendo desenvolvida. Como as mudanças foram
grandes e muito rápidas, não foi possível para a sociedade da época perceber tal
mudança.
A tecnologia, de certa forma, acentuou o caráter retrógrado do
Ecletismo, criando um preconceito que perdurou pelo século XX. Não havia uma
consciência de que o olhar para o passado não era um olhar passivo. Ele possuía
um questionamento e uma reinterpretação. Porém, como se acreditava que a
revolução arquitetônica seria estilística, a mudança não foi percebida, mas ela já
estava ocorrendo, foi uma reforma muito mais conceitual do que de “estilo”
propriamente.
No Ecletismo, a maneira de usar a linguagem é nova e moderna, pois
emprega os elementos de forma mais racional e coerente, mesmo usando um
código conhecido e tradicional, mas foi este conhecimento que permitiu o uso dos
106
novos materiais saídos da indústria, uma vez que se dominavam totalmente as
regras compositivas e construtivas compreendendo a função de cada elemento
arquitetônico.
O crescimento industrial levou à criação da indústria de pré-fabricados,
contribuindo, assim, para o barateamento da construção, que deve muito ao
desenvolvimento tecnológico do ferro e de materiais sintéticos como o
aglomerado. Com o passar dos anos, este fenômeno vai crescendo, atingindo
todos os níveis da arquitetura, desde a construção até o ornamento. Este tipo de
material, como gradis de ferro, vidros, madeira prensada, entre outros, a princípio,
atendia ao gosto burguês pelo ornamento, mas em pouco tempo ele começou a
atingir as demais classes sociais, que passaram também a adquirir tais materiais
importados inclusive casas pré-fabricadas, devidamente acompanhadas do seu
manual de instrução por um preço bem acessível.
As novas condições de transportes, tanto da navegação quanto o
ferroviário, possibilitaram uma maior comunicação entre os grandes centros
industriais e as cidades em crescimento. Este fato propiciou o aparecimento de
um fenômeno novo na arquitetura: a importação de edifícios pré-fabricados,
produzidos industrialmente nos países europeus.
No Brasil, como nos demais países, a importação compreendia desde
as estruturas e vedações até as coberturas, escadas e peças de acabamento,
que eram montadas, conforme as instruções e desenhos que as acompanhavam.
Um dos exemplos deste tipo de construção é o Teatro José de Alencar, em
Fortaleza – Ceará, cuja montagem foi feita acompanhando o manual(Il.13).
107
Il. 13 – Fachada interna do Teatro José de
Alencar – Fortaleza / Ceará. Produzido
por Walter MacFarlane and Company,
Sracen Foundry of Glasgow, 1910.
Também eram importados edifícios em madeira, neste caso na sua
maioria pequenas residências com aspectos de chalés ou estações ferroviárias,
que foram muito empregadas ao longo das estradas de ferro que faziam a ligação
entre as capitais e as pequenas cidades do interior, algumas ainda existem, tanto
no interior de São Paulo como no Rio de Janeiro. Porém, o chalé foi o tipo mais
difundido, principalmente por ser uma solução que pretendia adotar
características das construções européias. A reinterpretação deste modelo não
fazia tanto uso da madeira, como nos exemplares importados, a madeira era
empregada apenas nos pisos, forros, portas e janelas e principalmente nos
arremates dos telhados, formando os lambrequins, que contornavam as empenas
dos mesmos(Il.14).
Ilustração 14 – Típico chalé com lambrequins.
108
O chalé foi, então, uma das primeiras manifestações ecléticas na
arquitetura brasileira, uma vez que as variações deste, realizadas aqui, incluíam:
paredes de tijolos aparentes, equipamentos de ferro fundido, como colunas,
grades e alpendres e, em alguns casos, elementos decorativos de inspiração
greco-romana.
Verifica-se que a arquitetura produzida no Brasil, a partir da segunda
metade do século XIX, já alcançava um bom nível em termos técnicos. Os
profissionais deste período conseguiram reinterpretar os diversos “estilos”
arquitetônicos surgidos com os revivals europeus. Mesmo dependendo, na
maioria das vezes de materiais importados, dominavam as técnicas de
construção, sendo capazes de atender às exigências estruturais e de acabamento
imposta por esta nova arquitetura.
A evolução das técnicas construtivas se faz notar pelo rigor e
preciosismo com que eram executadas as novas edificações, com o emprego de
tijolos revestidos com massa, segundo motivos decorativos. Nos interiores, o uso
de papel de parede, o surgimento do revestimento em azulejos, em geral com
barras decorativas coloridas nas áreas molhadas (cozinha e banheiro). O piso de
madeira passa a ser mais trabalhado, surgindo o parquet, piso mais fino com
desenhos em madeira de várias cores; os ladrilhos hidráulicos empregados nas
cozinhas e banheiros e o revestimento dos saguões e jardins de inverno com
mosaicos coloridos, formando desenhos ornamentais – estes detalhes
demonstram com que refinamento, neste momento, eram tratadas as diversas
áreas das residências ou prédios públicos.
109
As estruturas das coberturas também passaram por transformações
significativas, com o emprego de novos tipos de telhas; cúpulas, torrões, rufos,
calhas, condutores e peças de arremate em geral, todos feitos de metal
revelando, assim, o aperfeiçoamento dos recursos disponíveis, tanto dos
equipamentos quanto da mão-de-obra.
A arquitetura da segunda metade do século XIX destaca-se pelo
aperfeiçoamento técnico dos edifícios e pela crescente incorporação dos
benefícios da sociedade industrial. No aspecto formal, o Ecletismo foi a linguagem
utilizada para atender aos anseios desta nova sociedade, criando uma nova
composição arquitetônica, que não se distanciava muito do ensino acadêmico.
3.5 A FORMAÇÃO DE ARQUITETOS E ENGENHEIROS E A ARQUITETURA DO
FINAL DO SÉCULO XIX NO BRASIL E A QUESTÃO DA LEGALIZAÇÃO
PROFISSIONAL
3.5.1 A Legalização Profissional
O exercício profissional da engenharia, arquitetura e agrimensura no
Brasil foi completamente livre desde o período colonial até o Império. Atuavam na
profissão tanto os engenheiros diplomados nas capitais européias ou nas antigas
aulas de fortificação existentes no Brasil, quanto os formados pelo conhecimento
prático da profissão, sem qualquer formação acadêmica. O exercício da
engenharia era tido como um trabalho comum de artífice, como ressalta Morales
de los Rios Filho, tomando como testemunho texto escrito por Tácito de Almeida:
Qualquer indivíduo, sem título científico, podia dedicar-se à construção de
edifícios e pontes, a medições de terras, a quaisquer trabalhos de
arquitetura ou agrimensura. Exercer a engenharia era exercer um ofício
110
comum de artífice, como o dos marceneiros e alfaiates.
106
Foi com a fundação da Academia Militar, depois transformada
em Escola Militar, Escola Central e em Escola Politécnica
107
, que se criou a
necessidade de habilitação profissional. O mesmo ocorreu em virtude da
instalação da Academia Imperial de Belas Artes, e mais tarde, no início do século
XX, com uma grande atuação dos professores da Academia
108
, que também
passaram a questionar quais os profissionais que realmente poderiam exercer a
função de arquitetos. Na verdade, a questão da regulamentação profissional e a
formação destes profissionais estavam intimamente relacionadas.
No Rio de Janeiro, os efeitos do ensino institucional sobre profissão
surgiram já na primeira metade do século XIX. O Decreto Imperial de 1° de
Dezembro de 1836, que estabelecia as Posturas do Município da Corte, criava o
Cargo de Inspetor Geral de Obras Públicas: este deveria ser nomeado pelo
governo e escolhido dentre os oficiais do Corpo de Engenheiros. Em 1861, ao ser
organizada, pelo decreto nº 2728, a Secretaria de Agricultura, Comércio e Obras
Públicas, é prevista a existência de um Corpo de Engenheiros Civis. Criado
definitivamente no ano seguinte, o decreto nº 2922 exige, para exercício dos
cargos que menciona, o diploma de engenheiro civil.
106
MORALES DE LOS RIOS FILHO, Adolfo. Legislação do exercício da engenharia,
Arquitetura e Agrimensor
, Rio de Janeiro : 1947, p. 07
107
Denominada Academia Real Militar em 1810, Academia Imperial Militar em 1822, Academia
Militar e de Marinha em 1832, Academia Militar da Corte em 1833, Escola Militar em 1839,
Escola Central em 1858 e Escola Politécnica em 1874, PARDAL, Paulo. Memórias da Escola
Politécnica, Rio de Janeiro: UFRJ e Xerox do Brasil, 1994.
108
Sobre as questões pertinentes a formação e direito ao exercício da profissão de arquiteto
durante o período imperial ver: UZEDA, Helena. O ensino artístico de arquitetura no
contexto da Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro: 1816-1889. Dissertação
de Mestrado, EBA-UFRJ, 2000.
111
Porém, a necessidade se regulamentar o exercício da profissão só
ficou mais definido com o Decreto 3.198 de 18 de Dezembro de 1863, que
estabeleceu os requisitos necessários para os habilitados ao cargo de agrimensor
nas medições das terras públicas e particulares. A este decreto, foram acrescidos
outros, que buscavam regular o exercício profissional. São estes, em ordem
cronológica:
O decreto nº 4.696, de 1871, aprovando o novo regulamento do
Corpo de Engenheiros Civis, revigora a exigência do diploma de engenheiro civil,
exige, para exercício dos cargos, certo número de anos de prática profissional e
determina a prévia reforma ou demissão de postos de engenheiros militares, que
desejassem entrar para o Corpo.
09 /10/ 1880 – Decreto Nº 3.001 – Estabelece requisitos que
devem satisfazer os engenheiros civis, geógrafos, agrimensores e os bacharéis
formados em matemática, nacionais e estrangeiros, para poderem assumir
empregos ou participar de comissões de nomeação do Governo.
01/07/1881 – Decreto Nº 8.159 – Que faz um adendo ao decreto
3.001 de 9/10/1881, aceitando-se como carta de habilitação científica os membros
efetivos do Instituto dos Engenheiros Civis de Londres.
Nos estatutos da Politécnica, aprovados pelo decreto nº 5.600, de
1874, são pela primeira vez definidos e valorizados o grau de “doutor”, a “carta”
de bacharel, o “diploma” (de engenheiro civil, engenheiro geógrafo, engenheiro de
minas e engenheiro industrial) e o título de “habilitação” concedido a quem
terminasse o curso geral
109
.
109
MORALES DE LOS RIOS FILHO, Adolfo. Op. Cit. P.7
112
Com a vinda de engenheiros estrangeiros ao Brasil a fim de realizar
obras ferroviárias, começaram as controvérsias sobre a validade dos respectivos
diplomas ou títulos profissionais em face das exigências até então feitas pelos
decretos e atos oficiais. Com o novo regulamento da Escola de Minas de Ouro
Preto – decreto nº 9.448 de 1885 – aparece a exigência de habilitação para
“exercer a profissão de Agrimensor de terras públicas”.
De 1884 a 1886, o Instituto Politécnico Brasileiro cogita, pela iniciativa
do arquiteto Luiz Schreiner, de obter do Governo Imperial a regulamentação das
profissões de engenheiro e de arquiteto. Presidido pelo Conde D’Eu e tendo,
entre seus membros, homens como Paulo de Frontin, Carlos Sampaio, Luiz
Rafael Vieira Souto, Manuel Pereira Reis, Honório Bicalho, Francisco Bicalho,
Alfredo de Paula Freitas, Benjamin Constant Botelho de Magalhães, Viriato Belfort
Duarte, Getúlio das Neves, Licinio Barcelos, Ramos de Queiroz, Saldanha Gama,
Barão de Tefé, Calheiros da Graça, Pereira Horta, Barbosa de Oliveira, Pedro
Betim, Índio do Brasil, Ferreira Pena, José Carlos de Carvalho, Rocha Miranda, E.
G. Moreira Maia e Luís Schreiner – o Instituto aprova, em sua sessão de 6 de
outubro de 1886, a minuta da representação a ser dirigida ao Governo sobre o
assunto.
A 23 do mesmo mês era enviado ao Ministério da Agricultura,
Comércio e Obras Públicas o seguinte ofício:
O Instituto Politécnico Brasileiro ocupou várias das suas sessões com a
discussão de um assunto, que merecerá sem dúvida a atenção do
Governo Imperial, em vista do alcance prático que oferece. Desde longos
anos se tem reconhecido a necessidade de adotarem-se medidas
restritivas para o exercício da engenharia e da arquitetura no Brasil,
análogos às que existem para a advocacia e da medicina, fixadas nos
decretos nº 5.618 de 2/05/1874 (art.43) e nº 8.024 de 12/03/1881 (Cap. V).
O decreto legislativo nº 3.001 de 9/10/1880 e várias decisões posteriores
constituem alguns passos para aquele fim, porém se estas disposições
estabelecem os requisitos, que devem satisfazer os engenheiros civis e
113
geógrafos, os agrimensores e os bacharéis formados em matemáticas,
nacionais ou estrangeiros, para poderem exercer emprego ou comissões
de nomeação do Governo, nada adiantam quanto ao campo do exercício
especial de cada uma das profissões, nem quanto à extensão desse
exercício perante as câmaras municipais; entretanto, do mesmo modo que
nenhum indivíduo pode praticar a advocacia ou a medicina nas cidades
importantes do Império, sem mostrar-se graduado em alguma das
faculdades, ou possuir a necessária habilitação, parecer de equidade, que
análoga disposição se deve exigir quanto à prática da engenharia.
Não é propósito do Instituto excluir as habilitações obtidas em outros
países, desde que forem julgados equivalentes às conferidas no Brasil; o
citado no Decreto nº 3.001 salva, e bem judiciosamente define esta
circunstância; não é igualmente seu intuito extinguir a classe dos
construtores ou mestres de obras, pois que se um tal concurso a
engenharia não pode prescindir absolutamente; mas o Instituto julga, que
torna-se desde já oportuna uma medida, que dê ao engenheiro o prestígio
e a força moral indispensáveis garantindo-o por meio de disposições
legais, que impeçam a concorrência, em terreno igual, de indivíduos sem a
mínima habilitação técnica.
Não é somente o efeito desfavorável, que resulta de semelhante
concorrência injustificada, o prejuízo, com que luta a engenharia brasileira;
é antes a dupla circunstância do quanto o engenheiro vem a sofrer com as
críticas, que freqüentemente levantam as construções civis, confiadas aos
mestres de obra, e ver-se coibido de praticar e adquirir, por conseguinte
mais proficiência, gosto e tirocínio na arte de construir, e principalmente na
arquitetura.
Nesta dá-se ainda um outro fato, que reclama também uma providência do
Governo Imperial: é a notável disparidade dos respectivos cursos na
Escola de Politécnica e na Academia das Belas Artes, junta à
circunstância de que naquela o curso não é completo com a precisa
instrumentação prática, e nesta subsiste a ausência radical e a mais
completa de conhecimentos científicos, atualmente indispensáveis ao
engenheiro-arquiteto, em conseqüência da diversidade de elementos, que
a arte moderna aplica as construções.
Em vista pois, destas razões, vem o Instituto Politécnico Brasileiro,
confiado na solicitude em que o Governo Imperial tem-se dignado atender
a todas as medidas, destinadas a melhorar a instrução científica e prática
do país, depositar nas mãos de V. Ex.a. Esta representação acompanhada
do parecer, que sobre semelhante assunto discutiu a aprovou o mesmo
Instituto, e cujas conclusões foram as seguintes:
1º - Convém providenciar para que somente possam exercer no Brasil os
cargos de arquiteto e engenheiro os indivíduos, nacionais ou estrangeiros,
que se mostrarem legalmente habilitados, segundo disposições
semelhantes às que existem para o exercício da advocacia e da medicina.
2º - Convém providenciar para que se dê na Escola Politécnica maior
desenvolvimento à parte artística do curso de arquitetura, a fim de se criar
neste estabelecimento um título especial de arquiteto, independente do de
engenheiro civil, conservando-se na Academia das Belas Artes o curso,
que já existe, para formar tão somente artistas desenhistas.
3º - Convém providenciar para que nas capitais e principais cidades do
Império, todas as construções e reconstruções de casas sejam
previamente autorizadas pelas respectivas Câmaras Municipais sobre
planos e projetos com as dimensões do edifício e de todo o terreno, em
que se tem de edificar, organizadas por arquitetos legalmente habilitados.
OBSERVAÇÔES: Os direitos adquiridos até a presente data pelos
indivíduos que tenham o título de engenheiro civil conferido na Escola
Politécnica, ou outros cursos legais, incluindo nesse número os de
nomeação de professor da cadeira de arquitetura da Academia de Belas
114
Artes, e as habilitações conferidas pela mesma Academia para o exercício
da arquitetura no Brasil serão respeitados.”
110
Pelo decreto nº 9.827, são reguladas as condições de habilitação para
o exercício da profissão de agrimensor. São criados o grau de “doutor em
ciências” e o “anel distintivo” de engenheiro, pelo decreto nº 1.073 de 1890.
Em 1911, o Conselho Superior de Ensino regulamenta o registro
administrativo de títulos conferidos por institutos particulares, frisando que se
deveria seguir a lei orgânica de ensino.
Nesta época, então, o Governo Federal já demonstrava interesse na
regulamentação das carreiras de engenheiro e de arquiteto. A constituição de
1891 legou aos Estados a faculdade de legislar a respeito do ensino que, em
conseqüência disso, passariam também a controlar as profissões técnicas dentro
dos respectivos territórios, porém, nada se fez para regular a atuação profissional.
Os Estados fundavam escolas, concediam diplomas, mas não amparavam os
profissionais, nem protegiam os respectivos títulos científicos. O mesmo ocorria
na vida prática. O município, a cidade ou o particular preferia o leigo, chamado
vulgarmente de “prático”, ao profissional formado.
Durante as primeiras décadas do século XX, muitas foram as tentativas
de se regulamentar a profissão, estados como São Paulo, Pernambuco e
posteriormente o Rio de Janeiro, elaboraram projetos de lei. Em 1928, discutiu-se
no Clube de Engenharia
111
a questão da denominação profissional a partir das
suas funções, sendo assim, aquele profissional que apenas construísse seria
chamado de Engenheiro, aquele que apenas projetasse seria chamado de
110
MORALES DE LOS RIOS FILHO, op. Cit. P. 9-11.
111
O Clube de Engenharia, criado em 24/12/1880, tinha por objetivo congregar os profissionais da
engenharia, defender os interesses da classe e promover congressos, estudos e debates dos grandes
problemas nacionais. Foi reconhecido pelo decreto nº8253 de 10-9-1881 do Imperador D. Pedro II. Entre
115
Arquiteto, e o profissional que projetasse e construísse ganharia a denominação
de Engenheiro-Arquiteto
112
. Percebe-se, neste caso, como o exercício da
profissão ainda era indefinido dentro do próprio grupo de profissionais e, sem
dúvida, a questão da formação é fator primordial neste quesito.
Novos decretos foram, durante os anos seguintes, estudados e
discutidos e o Clube de Engenharia tem papel significativo neste momento: foram
estudadas e pesquisadas as regulamentações profissionais nas principais capitais
do mundo, relacionando as escolas de cada país que concediam os diplomas,
mas somente após muita luta, em 1933, é finalmente regulamentada a profissão
de engenheiro, arquiteto e agrimensor em escala nacional.
3.5.2 A Formação de Arquitetos e Engenheiros
A Escola Politécnica passou por constantes alterações em seus
estatutos, de modo a manter atualizadas as questões colocadas pelos próprios
profissionais. A relação entre os profissionais atuantes no mercado e o ensino foi
muito estreita e estes conferiam a Escola uma função importante neste momento,
pois, além de trabalharem por uma regulamentação da profissão, também
atuavam de modo a fazer com que a Escola formasse profissionais mais
preparados e com funções bem definidas. Umas das primeiras mudanças foi a
separação do curso de formação em engenharia civil e militar.
seus presidentes figuraram os principais nomes da engenharia no Brasil, entre eles:Gabriel Osório de
Almeida, André G.Paulo de Frontin e Jose Mattoso Sampaio Corrêa.
112
Parecer sobre Projeto de Revisão da Regulamentação das Construções- 25/07/1928 – Códice- DO –
073.
116
A mudança mais significativa neste âmbito foi à passagem de Escola
Militar para Escola Central em 1858. Com o desmembramento dos cursos
destinados aos alunos militares e aos alunos civis, a engenharia civil passava a
ser um curso complementar de dois anos. Em 1863, outra reforma alargou o
curso para seis anos. Mas a história do ensino de engenharia no Brasil está
relacionada à ocupação do território brasileiro.
A formação do engenheiro remonta a 1699 com a criação da Aula de
Fortificação, fato este intimamente ligado a questões de dominação do território
no Brasil Colônia, e que marca os primórdios do ensino da engenharia no Brasil.
Vários cursos se seguiram até a criação em 1792 da Real Academia de Artilharia,
Fortificação e Desenho. Posteriormente seus alunos e professores foram
transferidos para a Academia Real Militar, em 1810
113
, e dela descende
diretamente a Escola Politécnica do Rio de Janeiro.
A Academia Real Militar era um estabelecimento militar, mas
destinava-se ao ensino das ciências exatas e da engenharia em geral, formando
não só oficiais de engenharia e de artilharia, como também engenheiros
geógrafos e topógrafos. Depois da independência, seu nome foi mudado para
Academia Imperial Militar e, em 1823, permitiu o ingresso de alunos civis. A
Academia sofreu várias reformas, mas o ensino de engenharia ainda não
satisfazia às necessidades nacionais, sendo assim, um decreto de 1858
desvincula o ensino militar, que passou a ser administrado pela Escola de
Aplicação do Exército e a Academia Imperial Militar passou a denominar-se
113
Até pouco tempo considerava-se que a Academia Real Militar, de 1810 era a origem da
Escola Politécnica do Rio de Janeiro, porém uma pesquisa do Prof. Paulo Pardal encontrou
documentos no Arquivo Nacional que provam que os alunos e professores da Real Academia de
Artilharia, Fortificação e Desenho, criada em 1792, foram transferidos para a Academia Real
Militar após a criação desta, portanto uma é apenas extensão da outra. Para maiores
117
Escola Central
114
, destinada ao ensino das Matemáticas e Ciências Físicas e
Naturais e também das doutrinas da engenharia Civil. Em 1874
115
esta é
transformada na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, promovendo mudanças
importantes na formação dos engenheiros não militares no Brasil. O curso
destinado somente a alunos civis era distribuído conforme o organograma a
seguir:
Curso Geral
2 Anos
Cursos Especiais
Especialização
Profissional
Ciências Físicas e
Naturais – 3 anos
- Bacharel
Ciências Físicas e
Matemáticas* –
3anos- Bacharel
Engenheiro Civil
3 anos
Bacharel
Engenheiro de
Minas
3 anos
Engenheiro de
Artes e
Manufaturas – 3
* Neste curso, a Escola concedia o título de Engenheiro Geógrafo a quem concluísse
as matérias do 2º ano.
esclarecimentos ver: TELLES, Pedro Carlos da Silva. História da Engenharia no Brasil –
Século XVI a XIX. Rio de Janeiro:Clavero, 1994, p.87.
114
Segundo Pedro Telles o nome Escola Central foi influenciado pela École Centrale des Arts e
Manufactures, criada em Paris em 1828, com um curso de três anos para formar engenheiros
civis e dirigentes industriais, Ibid. p.106.
115
25/04/1874 – Decreto nº5600 – Dá Estatutos a Escola Politécnica em substituição a Escola Central.
118
A Escola Politécnica passou, então, a ministrar um Curso Geral, com
duração de dois anos, e os seguintes Cursos Especiais, com duração de três
anos: Curso de Ciências Físicas e Naturais; Curso de Ciências Físicas e
Matemáticas, que concedia diploma de Engenheiros Geógrafos após o segundo
ano; Curso de Engenheiros Civis, Curso de Engenheiro de Minas e Curso de
Artes e Manufaturas.
No Curso Geral, eram ministradas as disciplinas de Álgebra,
Geometria, Trigonometria, além de Desenho Geométrico, Química e Noções de
Mineralogia, Botânica e Zoologia. Para o Curso de Engenharia Civil, a ênfase era
nas disciplinas técnicas, como Resistências dos Materiais, Estradas de Ferro,
Pontes e Viadutos, mas também eram ministradas aulas sobre Arquitetura Civil,
Desenho e Representação Gráfica. Após a criação destes cursos, muitas outras
reformas se seguiram até criação da Escola de Engenharia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro em 1965.
A pesar da ênfase do ensino se voltar para as disciplinas técnicas nos
primeiros anos da Escola após a sua criação, os engenheiros que atuaram na
passagem do século XIX para o XX tiveram uma formação mais ampla, e, com
relação ao ensino de Arquitetura Civil, muito mais abrangente, pois, além das
aulas de desenho de arquitetura, também eram dadas noções de História da Arte,
Arquitetura e Estética, como pode ser constatado na publicação intitulada “Notas
de Aula de Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e Saneamento das
Cidades
116
, (Il.15) dividido em duas grandes partes: Arquitetura Civil e Higiene
dos Edifícios e Saneamento das Cidades, que por suas vez são suddividos por
temas. Na primeira parte, sobre Arquitetura Civil, os assuntos são apresentados
116
Escola Polytécnica do Rio de Janeiro. Notas de Aula de Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e
Saneamento das Cidades. Rio de Janeiro: O.N. Soares, 1916. Clube de Engenharia Cód. (720.9N899)
119
em lições- Primeira Lição: Arquitetura- Definição e DivisãoOrigens; Segunda
Lição: Estilo –Ordens e Estilos – Princípios Gerais de Estética; Terceira e Quarta
Lições apresentam vários itens: Molduras Simples e Ornamentadas – Relevos
baixo, médio e alto- Aplicações das Molduras- Exemplos e Crítica; Muros- Muros
isolados e combinados- Aparelhos, paramentos, perfis – Caráter e Decoração –
Panos de madeira e de metal – Aplicações; Colunas, Pilares e Pilastras – Módulo
– Bases, Fustes e Capitéis – Traçado, disposições, efeitos – Cariátides e
Telamones – Entablamentos – Aplicações; Portas e Janelas, Interiores e
Exteriores- Pórticos – Arcadas – Frontões – Alpendres- Galerias- Balcões-
Vidraças, venezianas, vitrais- Ornamentação – Aplicações; Escadas Retas e
Curvas – Rampas- Ornamentações – Aplicações; Embasamentos – Balaustradas
– Vigamentos e Madeiramento – Assoalhos e Forros; Fachadas – Vestíbulos e
Pátios; Telhados-Retilíneos e Curvelíneos- Ornamentações- Ventilação- Calhas e
Condutores – Goteiras – Gárgulas; Abobadas – Nomenclatura – Ornamentação
externa e interna – Acessórios – Cúpulas – Flexas- Principais Exemplos de
abóbadas e Cúpulas – Exame de sua aplicabilidade.
Após as lições apresenta um capítulo sobre História da Arquitetura
desde o Neolítico até o Renascimento, e um outro capítulo que chama de-
Decadência do Renascimento – Causas- Estilo Luiz XIV e Luiz XVI – Arquitetura
do Século XIX – Tempos Modernos- tecendo grandes comentários sobre a
arquitetura de cidades como Paris e Nova York.
Termina a parte sobre arquitetura civil com um subcapítulo que chama:
Estilos de Fantasia – Chalé Suíço- Isba Russo – Estilo Persa Antigo e Moderno –
Estilo Chinês – Estilo Japonês. Na Segunda parte do livro trata da higiene dos
edifícios e saneamento das cidades. Apesar de se mostrar abrangente o livro trata
120
de questões importantes na formação de arquitetos e neste caso dos
engenheiros.
Il. 15 – Página de rosto do livro.
Notas de Aula de Arquitetura Civil e
Higiene dos Edifícios e
Saneamento das Cidades.
Ainda tratando das questões pertinentes à arquitetura, este “pequeno”
livro chamado “Notas de Aula de Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e
Saneamento das Cidades” traz em seu texto conceitos da teoria da arquitetura,
inclusive as noções de conveniência e caráter estão ali presentes.
A Arquitetura a seguirmos os nossos léxicos seria definida pela arte de
construir os edifícios e se consultarmos o Dicionário da Academia
Francesa lá encontraremos que é a arte de construir, dispor ou ornar os
edifícios e segundo escritores ingleses o belo na construção.
121
Tais definições eliminam o artista ou o separam do construtor admitindo a
possibilidade de haver construção sem beleza, cabendo ao arquiteto a
simples função de decorar ornando os edifícios.
Charles Blanc
117
, na sua Gramática das artes do desenho, defini
Arquitetura como a arte de construir segundo princípios do belo e assim
vemos que não há separação entre o construtor e o artista e que o
Arquiteto é o conjunto dos dois fazendo nascer o edifício sob o triplo
aspecto de conveniência, solidez e beleza correspondestes as três partes
de um projeto planta, corte, elevação.
O belo que não deve ser confundido com o útil e o agradável, na
arquitetura é a expressão do caráter, das proporções da ardem e da
harmonia e quando este conjunto nos admira e abala a alma, recordando
os espetáculos os mais imponentes do universo então o Belo atingiu ao
Sublime.
É porem necessário ver que o Sublime não é o superlativo do Belo.
.....O Sublime admite as idéias de horror, de caos, de desordem, de
harmonia, de proporção e de calma, o Belo pode ser sublime, mas nem
sempre o sublime é belo, como vimos acima.
118
Interessante, ao observar esta compilação de notas de aula, é que ela
procura fornecer aos alunos um conhecimento mais humanista, ao mesmo tempo
em que fornece elementos para a concepção do projeto, discorrendo sobre os
temas pertinentes ao projeto em si, tal como no item sobre Fachadas-Vestíbulos e
Pateos, páginas 97 a 117(ver Anexo V). Neste item, enquanto aborda a questão
da conveniência, solidez e expressão, fornece esquemas (pg.100 e 109) e formas
para os mais variados prédios de acordo com o uso. O autor chega inclusive a
dizer que:
É muito difficil estabelecer regras para compôr fachadas. Conselhos
apenas podem ser dados, pois o que deve predominar é o sentimento
117
Charles Blanc (França 1813 – Idem, 1882). Crítico de arte francês, convocado para a
direção das belas-artes quando da revolução de 1848. Um dos críticos mais prolíficos do
século XIX, dirigiu a monumental Histoire des peintres de toutes les écoles, em 14
volumes. Especialista em Rembrandt, fundou e foi redator-chefe da Gazette des beaux-
arts, publicação que ocupou lugar central entre os periódicos consagrados à critica e à
história de arte na segunda metade do século XIX. Blanc foi nomeado para a Académie
des beaux-arts em 1869, para a Académie francesa em 1876, e lecionou estética e
história da arte no Collège de France a partir de 1878. Uma de suas principais obras -
Grammaire des arts du dessin - foi uma importante referência teórica para os pintores
brasileiros da 1ª República.
Fonte:www.dezenovevinte.net/text_artistas/text_cavalheiro_1952.htm.
118
ibidem,p. 6 e7.
122
artístico do projetante, junto ao estudo do passado e contemplação dos
monumentos existentes, tidos como bons.
119
No entanto, apresenta num único texto método e teoria que por fim
conduz a uma reflexão, ajudando a formar um pensamento crítico. Mas o método
está ali e neste sentido, mesmo que de maneira mais simplificada, este livro se
aproxima na metodologia aplicada por Durand no seu “Précis des leçons
d’architecture données à l’École Polytechnique” (1802-1809) e no Recueil et
parallèle dês édifices de touts genres, anciens et modernes (1801). O Recueil at
parallèle... é praticamente um álbum com pranchas em que estão dispostos os
programas arquitetônicos e sua evolução histórica e é nele que a questão do tipo
ou da tipologia está mais explícita, uma vez que a justaposição de plantas,
secções e elevações na mesma escala torna fácil a apreensão dos tipos e de
onde eles derivam. Porém, é no Précis de leçons... que ele estabelece uma
metodologia básica de um curso de arquitetura para futuros engenheiros.
No livro de Durand, encontramos os princípios que ligam o fazer
arquitetônico a uma lógica que, segundo Picon, descende da cultura iluminista,
porém o que me interessa aqui é perceber como, num pequeno e abrangente livro
publicado no Brasil na primeira década do século XX, é possível perceber os
conceitos apontados por Durand. Os dois livros são diferentes na forma como
apresentam os seus conceitos. O de Durand é praticamente um manual; na
introdução, ele discorre sobre a natureza da arquitetura, seus objetivos,
propósitos, significado e princípios gerais. Coloca que para ele :
119
Ibidem, p.104.
123
Arquitetura é uma arte única e o seu objetivo é a composição e execução
de prédios, públicos ou privados.
Seu propósito, na composição e execução de tais prédios, é satisfazer um
grande número de nossas necessidades, e nos colocar numa posição em
possamos satisfazer as outras.
O significado empregado para o seu fim é a conveniência e economia.
Conveniência inclui solidez, salubridade e comodidade.
Economia compreende simetria, regularidade e simplicidade.
Solidez consiste na seleção e uso dos materiais, e no número e disposição
dos suportes.
Salubridade depende da situação, orientação, na elevação do solo das
paredes, das aberturas destas e da cobertura.
Comodidade vem da relação entre a forma do edifício, da sua magnitude,
e número de partes que o compõem por um lado, e o seu propósito, por
outro.
A mais simétrica, regular e simples das formas, tal como o círculo, o
quadrado, e um paralelogramo esbelto e alongado, são as formas mais
suscetíveis a economia, desde que eles compreende uma área com um
perímetro menor do outras formas; e estas firmas conseqüentemente
devem ser preferidas.
Decoração não é atribuição do arquiteto, embora o que é chamado por
decoração é a arte de aplicar pintura, escultura e relevos nos prédios. Este
tipo de decoração não é mais do que um acessório.
As ordens, como objetos de imitação, não tem nada a contribuir, pois não
estas não são percebidas como naturais ou da natureza.
Ordem e distribuição devem ser as únicas preocupações dos arquitetos, e
apenas isso, mesmo que seu único fim seja o dar prazer ou ser prazeroso.
Caráter, efeito, variedade- num mundo em que todo tipo de beleza é
encontrada nos edifícios ou aquelas que o homem procura para aplicar na
decoração arquitetônica- naturalmente emerge de qualquer disposição ou
distribuição que atenda a conveniência e a economia.
Mas, antes de assentar qualquer edifício, antes de elaborar sua
composição ou as partes que o constituem, estas partes deve primeiro ser
conhecidas. E eles de todo modo, são combinações de outras partes que
podem se chamadas de elementos da edificação tais como, paredes,
aberturas, estrutura, piso, abóbada, cobertura e etc. Ou seja, antes de
qualquer coisa estes elementos devem ser conhecidos.
120
Ou seja, para Durand, o que há de belo numa edificação vem da
própria construção, da perfeita distribuição das partes que a compõem, o trabalho
de Durand não é focado na decoração, ele considera que a preocupação
exclusivamente com a beleza é uma futilidade e acrescenta:
120
DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on Architecture. Los Angeles : The Getty
Research Institute, 2000, p.87-88. Tradução Kátia Maria de Souza.
124
Onde quer que consultemos a razão ou examinemos os monumentos, é
evidente que o prazer não pode nunca ser o propósito da arquitetura e nem
a decoração arquitetônica pode ser o seu objetivo.
121
Durand se afasta do idealismo no sentido de uma busca pela beleza,
pureza ou decência da natureza para se aproximar de um sentido mais racional. A
única coisa que ele conserva dos arquitetos, chamados por Antoine Picon de
“revolucionários”
122
, é o imperativo da utilidade e, neste sentido, ele é bem
objetivo mantendo-se no eixo do cientificismo.
Sendo assim, para Durand, a utilidade aplicada à arquitetura encontra
expressão em dois caminhos: em fazer prédios adequados ao seu uso e em
minimizar os esforços físicos e financeiros requeridos para a sua conclusão.
Conveniência e economia são os termos que ele usa para designar estes dois
aspectos da utilidade.
O termo conveniência aparece em tratados de arquitetura anteriores a
Durand, mas ele estabelece um novo conceito para o termo, aproximando-se de
Perrault, Durand subdivide o termo em solidez, salubridade e comodidade,
mantendo uma linha próxima da ciência, que naquele momento ganhava cada vez
espaço. Já a economia está relacionada com os princípios de regularidade,
simetria e simplicidade, “quanto mais simétrico, regular e simples um prédio for,
ele custará menos” dizia Durand.
Sendo assim, no Précis, Durand elabora um método baseado numa
análise precisa tal como a matemática. A primeira parte do livro é, na verdade, um
121
Ibidem, p.31
122
Antoine Picon classifica os arquitetos do final do século XVIII e início do XIX de “Revolucionários” pois
foram eles que começaram estabelecer novas relações para a arquitetura do Iluminismo. Para maiores
detalhes ver PICON, Antoine, From “Poetry of Art” to method: the theory of Jean-Nicolas-Luis Durand, In:
DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on Architecture. Los Angeles : The Getty
Research Institute, 2000, p.1-68.
125
catálogo de elementos estilizados. Mais uma vez, o propósito não é listar todos os
elementos válidos em todas as suas variações, mas, sim, definir um repertório
que possa dar combinações suficientes para responder às necessidades do
homem na sociedade. Fazendo uma comparação com a lingüística, o que importa
não é o tamanho do vocabulário, mas a riqueza da sintaxe.
Como vocabulário entenda-se as partes da edificação: portões,
vestíbulos, caixa de escadas, salas e pátios a sintaxe é a reunião destes
elementos, e a manipulação destes elementos representa o primeiro estágio no
estudo da composição. Neste momento em que ele estabelece seus conceitos, a
malha quadrada, o atual papel milimetrado, foi introduzida, possibilitando a
standartização, a princípio dos elementos e mais tarde ajuda a implantar o
conceito de alinhamento e eixo.
Ao introduzir a malha, Durand estabelece um tipo de composição
analítica na medida em que simultaneamente manipula a composição e a
decomposição, sublinhando hipóteses. O domínio de uma composição, cada vez
mais analítica, permite então, não só desenrolar o emaranhado de operações
necessárias num projeto, mas também tem o propósito de arrumar os problemas
numa seqüência que evite confusão. Ao subordinar a elevação à planta-baixa,
Durand estabelece a autonomia de cada um relativo ao outro, mesmo parecendo
um contra-senso, o que se quer dizer é que a planta deixa de ser o principal
elemento gráfico usado no projeto, e a elevação passa a ter a mesma
importância.
Interessante observar que todo o método desenvolvido por Durand
para a Escola Politécnica de Paris, foi contemporâneo dos questionamentos por
que passava a arquitetura, entre os séculos XVIII e XIX, em que as referências
126
clássicas e o historicismo conduziram a uma a variedade de composições. No
entanto, o seu método auxiliou a compreender e a projetar dentro deste
emaranhado de referências. Mesmo evitando o ecletismo nascente o método
compositivo de Durand permite uma redefinição da morfologia dos elementos, e
as técnicas compositivas apresentadas no Précis podem ser aplicadas as
ordenações góticas, mouriscas ou chinesas. Portanto, segundo Picon, o método
desenvolvido por Durand acabou repercutindo na Escola de Belas Artes e
acrescenta:
Entre as técnicas de composição apresentadas no Précis e aquelas que
mais tarde fizeram a fama do sistema Beaux Arts, há uma afinidade que
de modo algum está confinada a primazia da planta-baixa, ou a
importância em definir eixos primários e secundários do projeto: esta
também reside na desconexão da planta da elevação, e da forma
arquitetônica da construção. Na França do século XIX este domínio do
projeto era dividido por arquitetos e engenheiros. Isto permitiu a cada um
exercer a sua própria competência dentro de limites claramente definidos,
e ocasiões de conflito foram consequentemente reduzidas. Ao contrário de
repetidas afirmações, tais como a de César Daly, o conflito entre
engenheiros e arquitetos do século XIX foi mais um mito do que uma
realidade. A composição, como foi apresentada pelo professor de
arquitetura da Escola Politécnica, não era apenas um método de projeto
mas também foi o portador de novas formas de negociação entre os
profissionais da arquitetura e da estrutura.
123
É certo que colocar em dúvida os questionamentos de César Daly e a
sua luta na redefinição da arquitetura e do papel do arquiteto no século XIX, uma
vez que ele foi personagem da época, é de certa forma ousado. No entanto,
confrontando a produção arquitetônica do período e os seus projetistas, é
possível apontar muito mais interação e unidade do que diferenças.
123
PICON, Antoine. Introdução In : DURAND, Jean-Nicolas-Louis. Précis of the lectures on
Architecture. Los Angeles : The Getty Research Institute, 2000, p. 44.
127
Este é, na verdade, o pensamento que norteia esta tese e que aqui
encontra respaldo na observação de Antoine Picon: o de que arquitetos e
engenheiros do século XIX tinham muito mais afinidades do que diferenças e que
estes não só se complementavam, mas inclusive dividiam o mesmo fazer. Penso
que, mais que delimitar uma área de atuação, a grande disputa no campo
profissional era reconhecer os profissionais realmente habilitados e capacitados a
exercer a profissão. Neste sentido, a questão da legalização da profissão e da
exigência de um profissional reconhecido na condução de uma obra era a grande
luta no momento. Portanto investigar como estas afinidades ocorreram,
especialmente no Rio de Janeiro, me conduziram para a questão da formação, e
perceber que os engenheiros tinham contato com questões relativas à teoria da
arquitetura, foi fundamental para respaldar a linha investigativa que se comprova
não apenas nos edifícios construídos mas também com o texto por eles
estudados na Politécnica, tal como o Notas de Aula.
Esta pequena compilação chamada Notas Aula de Architectura Civil,
Hygiene dos Edifícios e Saneamento das Cidades- de acordo com o programa do
5º ano de Engenharia Civil da Escola Politécnica do Rio de Janeiro não chega
exatamente a estabelecer um método, mas o conceito que norteia o livro de
Durand.
Com um texto mais corrido, o autor foi apresentando os conceitos que
norteiam o fazer arquitetônico. Na introdução, define o que é arquitetura, para
logo depois discorrer sobre os períodos históricos, como já foi relatado
anteriormente. Porém, mesmo quando fala sobre cada período introduz definições
arquitetônicas. A seguir fala sobre cada elemento arquitetônico, tal como o Précis,
128
e até as ilustrações apresentadas se assemelham as pranchas do livro de Durand
(Il.16 e 17/ 18 e 19).
Il. 16 – Prancha do Précis of the lectures on Architecture, com modelos de escadas
Il. 17 – Exemplos de Escadas do livro Notas de Aula de Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e
Saneamento das Cidades.
129
Nas pranchas de Durand os desenhos são simplesmente
apresentados, pois os comentários estão num texto a parte e ele apenas faz
referencia as pranchas sem relacionar no texto os exemplos mostrados nas
pranchas, mesmo que no texto eles estejam referendados é necessário que o
leitor tenha conhecimento prévio para por fazer as relações. Já no livro da
Politécnica do Rio de Janeiro, as ilustrações complementam o texto, e cada
desenho é numerado e citado no texto, como nos exemplos de escadas em que
também são fornecidas as fórmulas para calcular os degraus e as rampas, ver
páginas 75 a 87 do Anexo V.
Il. 18 – Prancha do Précis of lectures on Architecture, com detalhes das modenaturas.
130
Il. 19– Exemplos de modenaturas do livro
Notas de Aula de Architectura Civil,
Hygiene dos Edifícios e Saneamento das
Cidades.
Mesmo que o livro carioca tenha menos desenhos e que estes não
sejam apresentados em forma de pranchas, obedecendo uma certa rigidez, não
invalida a sua utilização como um manual orientador para o projetista, e ele ainda
fornece ao leitor conceitos sobre história e teoria da arquitetura. Em seu texto o
autor, que não foi possível identificar, mas atribuo ao professor de arquitetura, faz
comentários particulares, atribuindo juízo de valor e cita exemplos
contemporâneos a publicação, como no item que trata dos panos de vedação de
uma edificação, sobre os panos em ferro diz:
131
Os pannos de ferro são feitos obedecendo à mesma disposição dos de madeira,
sendo, igualmente, os vazios preenchidos por tijolos ou cimento armado. A América
do Norte, principlamente nas cidades de New York, S. Francisco e Chicago, os
pannos metallicos são muito usados, permittindo a construção de edifícios de 30
andares que, por occasião dos grandes vendavaes, oscillam.
Os projectos desses arranhas céu são difficieis, principalmente sob o ponto de vista
esthetico, pois para uma desmesurada altura, temos a contrapor uma largura
pequena, aggravada pela successão de janellas dos múltiplos andares, que dão a
esses edifícios o aspecto de pombaes.
124
Tomando como base a relação de professores que ministravam aulas
no curso de engenharia na Politécnica (ver Anexo III) no período de 1890 a 1916,
data da publicação do Notas de Aula, é possível supor que o autor do livro tenha
sido ao engenheiro Francisco Manoel das Chagas Doria, formado ela Escola
Politécnica do Rio de Janeiro, tornou-se lente substituto em agosto de 1898,
lecionando na cadeira de Geometria Descritiva Aplicada (3ª cadeira do 1º ano) e
Arquitetura, Higiene e Saneamento (1ª cadeira do 3º ano). Foi efetivado por
concurso em dezembro de 1898 e em outubro do mesmo ano foi nomeado
Catedrático de Geometria Descritiva Aplicada, em 1901 passa para a cadeira de
Arquitetura, aposentou-se em 1934. Exerceu ainda o cargo de consultor técnico
do Ministério da Viação durante o governo de Rodrigues Alves, também foi diretor
da Estrada de Ferro Oeste de Minas
125
. Foram ainda professores de Arquitetura
Civil os engenheiros: Engº André Pinto Rebouças e Engº Viriato Belfort Duarte.
Segundo Maria Inez Turrazi, André Rebouças foi titular da cadeira de
Arquitetura Civil, Resistência dos Materiais de Construção e Tecnologia das
Profissões Elementares, a partir de 1880, e o enfoque da disciplina no caso das
construções civis:
124
Escola Polytécnica do Rio de Janeiro. Notas de Aula de Architectura Civil, Hygiene dos Edifícios e
Saneamento das Cidades. Rio de Janeiro: O.N. Soares, 1916, p. 48. Ver Anexo V.
125
MILLER, Célia Peitl. O Doutorado em matemática no Brasil: um estudo de histórico
documentado(1842-1937). Dissertação de mestrado, Universidade Estadual Paulista, Instituto de
Gociências e Ciências Exatas, Rio Claro, 2003, p.408 e 409.
132
era uma combinação de referências clássicas, através de estudo da
“gênese e evolução dos estilos arquitetônicos”, com as mais modernas
preocupações do urbanismo, da arquitetura industrial e da recente
“engenharia sanitária: a higiene das habitações, a utilização de resíduos
pela agricultura, os banhos públicos.
126
O que confirma que esta combinação entre teoria clássica e
conhecimento de técnicas construtivas era uma orientação fornecida no curso de
engenharia civil da Escola Politécnica do Rio de Janeiro entre as décadas de 80 e
90 do século XIX, período em que se formaram os profissionais que terão seus
prédios analisados no próximo capítulo, e perdurou pelas primeiras décadas do
século XX. Muito provavelmente o livro Notas de Aula, agrupou os temas
abordados na disciplina atualizando-o sempre que possível.
Sem dúvida os professores e alunos da Politécnica do Rio de Janeiro
tiveram contato com outras publicações além do livro de Durand. Silva Telles
ressalta que a biblioteca da Escola Politécnica possuía exemplares de: Vitrúvio-
Dell’Architettura(em italiano), René Descartes- La Géometrie, Bernard Forrest de
Bélidor- Architecture Hydraulique, ou l’Art de Conduire, d’Élever et de Ménager lês
Eaux, Adrien Marie Legendre- Essai sur la Théorie des Nombres, Gaspar Monge-
Géométrie Descriptive, entre outros.
127
No entanto, o livro de Durand é, até hoje,
apontado pelos historiadores da arquitetura, como o manual mais difundido entre
os profissionais da construção civil do século XIX.
Porém, mais importante do que perceber a correspondência entre as
duas publicações, é notar que o ensino de engenharia tanto no Brasil, e mais
especificamente no Rio de Janeiro, quanto na França, fornecia um conhecimento
126
TURRAZI, Maria Inez. As artes do ofício- fotografia e memória da engenharia no século XIX. Tese de
Doutorado: Fau/USP, 1997, p.170.
127
SILVA TELLES, Pedro Carlos da. Op. Cit. Vol.1, p. 473.
133
amplo do fazer arquitetônico. E que este fazer poderia ser exercido por
engenheiros e por arquitetos, o que de fato aconteceu.
No que se refere à formação do arquiteto, é possível notar que, neste
momento, se manteve a orientação clássica, baseada no ensino ministrado nas
grandes escolas de arte da Europa, principalmente na École des Beaux-Arts.
Durante a direção de Felix Emílio Taunay(1834-1851), a Academia
passou por uma reorganização que a aproximou mais do ensino francês; criou a
Pinacoteca e instituiu prêmios para os alunos, inclusive o prêmio de viagem, que
garantia ao vencedor a estadia por três anos na Europa, financiado pelo governo.
Em 1854, com a posse de Araújo Porto Alegre, a Academia passou por
outra reformulação, principalmente no que se refere ao ensino, que deixava de
ser centralizado, para distribuir-se em várias disciplinas, fornecendo ao estudante
um número maior de conhecimento. No curso de arquitetura os alunos deveriam
freqüentar as disciplinas de:
…desenho geométrico e industrial; desenho de ornatos; e arquitetura civil,
tendo como suporte os cursos específicos à arquitetura que faziam parte de
Ciências Acessórias. Estes consistiam em matemáticas aplicadas- incluindo
aritmética, geometria descritiva, trigonometria-; história das artes, estética e
arqueologia, e perspectiva e teoria das sombras. A importância da
introdução dos cursos científicos na estrutura curricular do ensino artístico
assume importância inegável e mostra a antecipação modernizadora de
Porto-Alegre, ao procurar trazer o exercício extremamente idealizado dos
artistas acadêmicos para uma nova realidade de produção, mesmo num
Brasil ainda agrário e escravocrata.
128
Cabe ainda lembrar que Porto-Alegre, após um período como professor
de pintura histórica na Academia de Belas Artes, assumiu o cargo de professor
128
UZEDA, Helena Cunha. O ensino de arquitetura na Academia de Belas Artes: 1826-1889.
In: 185 anos de Escola de Belas Artes. Rio de Janeiro: UFRJ, 2001/2002, p.52.
134
substituto de desenho em 1848
129
, na Escola Militar que deu origem a Escola
Politécnica.
Após a proclamação da República, novas transformações pedagógicas
foram introduzida e, como bem pontua Helena Uzeda, em sua tese:
“remoinhavam-se outras questões cruciais, como o caráter da própria profissão de
arquiteto, cujas atribuições estavam sendo atropeladas pela capacitação técnica
dos engenheiros, e pelas novas demandas arquitetônicas do período, cujos
materiais, programas e estéticas colocavam em questão a própria concepção de
“moderno.”
130
A Academia sofre apenas reformas na sua estrutura de ensino, mas
não muda a sua orientação e a sua referência estética, que apesar de ser uma
das preocupações de Porto Alegre, ainda não foi possível viabilizar. No entanto,
foi esta referência estética que serviu de base e permitiu a assimilação do
ecletismo, que já dominava a produção arquitetônica nos principais centros
europeus, como Paris e Londres, e que no Brasil encontrou solo fértil para o seu
desenvolvimento.
Também é de conhecimento, entre os pesquisadores sobre temas
relativos a engenharia e arquitetura do século XIX, no Rio de Janeiro, que havia
um intercâmbio entre os professores da Escola Nacional de Belas Artes e da
Escola Politécnica
131
, em que, engenheiros ministravam aulas técnicas na ENBA
e os arquitetos ensinavam arquitetura na Politécnica, fato esse comprovado em
129
Ibidem, p.50.
130
UZEDA, Helena. Modernidades acadêmicas. O ensino de arquitetura na Escola
Nacional de Belas Artes: 1890-1930. Tese de Doutorado em História e Teoria da Arte,
Estudos de História e Crítica da Arte. EBA-UFRJ, 2006, Cap.1, p.14, Em sua Tese Helena
Uzeda aborda as questões relativas as transformações sofridas pela Escola Nacional de Belas
Artes especificamente no curso de arquitetura que passou por mudanças significativas, em que
eram questionadas inclusive a sua própria existência, uma vez que os profissionais de
engenharia já começavam a atuar no mercado da construção civil.
135
publicações como o Almanaque Laemmert, que traz uma relação do Corpo
Docente da Escola de Belas Artes e da Escola Politécnica, desde 1895, bem
como pela tese da Helena Uzeda. Esta, então, discrimina as disciplinas
ministradas pelos engenheiros na ENBA demonstrando, também, que eles
exerceriam um papel significativo nas questões relativas à qualidade ao ensino da
escola, opinavam a cerca dos pré-requisitos necessários para o ingresso na
escola ou em determinada disciplina
132
.
Este intercâmbio promoveu a difusão de um conhecimento, em que as
questões pertinentes à teoria da arquitetura também eram abordadas tanto
quanto as das novas tecnologias de construção. O que se verifica é que este
conhecimento não ficava restrito a uma única classe profissional, engenheiro ou
arquiteto, e que ambos tinham pleno domínio tanto do projeto e da perfeita
adequação dos elementos decorativos no corpo da edificação, quanto das
técnicas construtivas. No que se refere ao domínio de uma linguagem de linhas
clássicas ou historicistas, é perfeitamente possível verificar nos próprios prédios
projetados por estes profissionais, demonstrando, assim, que o estudo da teoria
clássica era ministrada tanto na Academia quanto na Politécnica e que o contato
com esta teoria forneceu aos arquitetos e engenheiros um bom conhecimento da
arquitetura do passado.
Um exemplo do conhecimento adquirido pelos engenheiros à época
pode ser observado no edifício em que funcionou a Ministério da Agricultura,
depois Ministério da Viação, projeto organizado em 1871 pelo engenheiro
Francisco Pereira Passos, um prédio com inspiração renascentista, com linhas
sóbrias, mas que demonstra o domínio das ordenações clássicas(Il.20).
131
Ver no Anexo III a relação de professores engenheiros e arquitetos que ministraram aulas
na Politécnica e na ENBA.
136
Il.20- Prédio do
Ministério da
Agricultura em
primeiro plano.
O domínio da teoria clássica e a influência do esquema Beaux Arts no
ensino de arquitetura, contribuiu para a difusão dos “neos” nas construções da
época, ou seja do último quartel do século XIX, fez com estes fossem aceitos
sem grandes conflitos pela sociedade, como o neopersa, o neobarroco, o
neorenascentista e o neogótico. É importante também ressaltar influência de
arquitetos e engenheiros estrangeiros, que de certa forma influenciou os artistas
brasileiros, sobretudo os engenheiros que neste período tomam conhecimento da
obra de Viollet–le-Duc, e o seu clássico, “Entretiens sur Le architecture”, como
destaca Morales de los Rios Filho
133
ao falar de Luiz Raphael Vieira Souto e o seu
vasto conhecimento sobre as principais obras sobre arquitetura do século XIX,
revelando que Vieira Souto conhecia “a grande obra de Viollet-le-Duc”
134
.
Também o engenheiro Adolfo José Del Vecchio expressa todo o aprendizado
132
UZEDA, Helena. Op. Cit. P.26
133
MORALES DE LOS RIOS FILHO, Adolfo. Dois notáveis engenheiros – Pereira Passos e
Vieira Souto. Rio de Janeiro: A Noite, 1951.
134
Op. Cit. P. 46.
137
obtido a partir dos livros de Viollet Le Duc
135
sobre arte gótica ao projetar o
edifício da Ilha Fiscal(Il.21).
Il.21 – Palácio da Ilha Fiscal
Portanto, neste aspecto, o ensino acadêmico, e neste caso se inclui o
ensino da Escola Politécnica, favoreceu a adoção destes modelos, não se opondo
a nenhum deles, como ocorreu na Beaux-Arts francesa, que rejeitou o neogótico e
só considerava as inovações arquitetônicas na medida em que estas fossem uma
extensão da tradição clássica
136
.
No Brasil, verificamos que os “estilos” neomedivais foram melhor
aceitos, talvez devido à colonização portuguesa, que valorizava uma arquitetura
que tivesse mais afinidade com a arquitetura da época do Rei D. Manuel(1495-
1521), simbolizando uma resistência ao classicismo imposto pelas metrópoles
135
Viollet Le Duc foi o profissional que no século XIX viu na arquitetura do período gótico, uma
racionalidade construtiva e uma liberdade na utilização do ferro que permitia sistemas
estruturais mais leves ao mesmo tempo que vencia grandes vãos. Em seu livro Entretiens sur
le architecture interpreta a estrutura da catedral gótica como um ser orgânico levando-o a
descrever um sistema de abóbadas como uma estrutura de painéis sustentados por costelas,
issto permitia fazer uma associação com as estruturas de painéis de vidro sustentados por
esqueleto metálico. Toda esta inovação proposta por Viollet Le Duc não foi bem aceita pela
Beaux-Arts francesa e sua passagem pela escola foi das mais conturbadas. Ver: CHAFFE,
Richard, Op.Cit.
136
CHAFEE, Richard. Op. Cit. p. 100
138
européias
137
. Assim, o neomanuelino, com sua nítida feição gótica, foi utilizado no
Brasil, sem grandes conflitos com os demais “estilos” de origem clássica.
Exemplos desta arquitetura ainda podem ser observados no prédio do Real
Gabinete Português de Leitura, construído entre 1880-1887, em que a escolha do
estilo neomanuelino foi uma imposição da diretoria do Gabinete
138
.
O Real Gabinete Português de Leitura não foi o único exemplo
neomanuelino; existia no Largo da Mãe do Bispo, atual Cinelândia, a Escola São
José, com sua fachada “manuelina”(Il.22) e mais adiante, na Rua 13 de Maio, o
prédio da Imprensa Nacional(Il.23).
Il. 22 - Escola São José, depois
Conselho Municipal.
Il. 23 – Imprensa Nacional.
137
DEL BRENNA, Giovana Rosso. Ecletismo no Rio de Janeiro(Séc. XIX/XX). In FABRIS,
Annateresa (Org.) Ecletismo na arquitetura brasileira. São Paulo : Nobel/Edusp, 1987 p.44.
138
Para maiores informações sobre a construção do Gabinete Português de Leitura, ver : DEL
BRENNA, Giovana Rosso, Op. Cit. , p.,29-67.
139
A adoção do neogótico ajuda a compreender alguns aspectos do
pensamento eclético na passagem do século XX, pois, além da intenção
simbólica de architecture parlante
139
, tão comum nos prédios ecléticos, nota-se
também que estavam sendo levados em consideração os elementos de ordem
estética, mas também a funcionalidade. Uma vez que o Ecletismo promovia a
assimilação das inovações tecnológicas com os padrões de uma arquitetura
voltada para os estilos do passado.
O maior exemplo de arquitetura eclética foi realizado durante a
abertura da Avenida Central, e neste caso, verifica-se que o ensino ministrado
nas principais escolas da cidade não se distanciava muito da prática arquitetônica
do período. Alguns dos projetos executados para a Avenida Central eram de
autoria de professores da Escola Nacional de Belas Artes e neles foram
colocados em prática todos os preceitos ensinados por eles como exemplo da
verdadeira arte de projetar.
Percebe-se nestes arquitetos a facilidade com que manejavam e
combinavam com grande habilidade os “estilos”, associando-os a algumas
inovações nos sistemas construtivos. Como exemplos podemos citar Adolfo
Morales de Los Rios, professor da Academia e autor de vários projetos, entre eles
a da própria Escola Nacional de Belas Artes(Il.24) de inspiração renascentista,
baseado no Louvre, e o Café Mourisco(Il.25) que faz referência à arquitetura
arábico-persa. Outro exemplo é o prédio do Jornal do Brasil (Il.26), um edifício
eclético, marcado por elementos decorativos em ferro, projeto de Ludovico Berna,
também professor da Escola.
139
DEL BRENNA, Giovana Rosso, Op. Cit. p. 47.
140
Sendo assim, percebe-se que, o ecletismo conseguiu se desenvolver
com facilidade, pois em ambas as escolas, responsáveis pela formação
profissional, os novos conceitos foram obsorvidos e incorporados ao receituário
escolar.
Il. 24 – Escola Nacional de Belas Artes, atual Museu Nacional de Belas Artes.
Il. 25 – Café Mourisco. .
Il. 26 – 1ª Fachada projetada para o
prédio do Jornal do Brasil – Autor
Ludovico Berna, 1906.
141
Todo o questionamento da arquitetura do século XIX, ou seja, do
Ecletismo, considerando-o como um grande bloco histórico que parte do
Neoclassicismo, tem suas raízes no confronto entre ciência e arte, entre
racionalismo e decorativismo, como se cada um destes parâmetros não
pudessem conviver harmonicamente.
“A técnica é uma atividade racional em vista de um certo fim”.
140
Colocando o racionalismo, a ordem e a ciência como um fim a ser atingido, muitos
técnicos do período se deixaram conduzir por este pensamento e se viram
perdidos em busca de “estilo” para o século XIX.
E neste momento os engenheiros se destacam justamente pela
racionalização da produção por meio do cálculo e do planejamento. O que Picon
chama de o “fim da teoria clássica” provêm da incapacidade desta em encarnar
esta racionalização. Deste ponto de vista, o neoclassicismo contribuiu
inegavelmente para o início da solução, ao se acomodar as determinações
técnicas até se transformar em auxiliar eficaz da organização.
Neste sentido os estudos sobre a teoria clássica e a formação das
escolas de arquitetura e engenharia ajudam a compreender como normatização
do ensino e a importância do projeto que deve destacar uma lógica da utilidade e
da economia, foram fundamentais na constituição de uma arquitetura atenda as
necessidades da sociedade da época.
Os prédios construídos neste momento são representativos das forças
que contribuíram na constituição de uma arquitetura do final do século XIX e início
do XX, em que teoria e prática se complementam efetivamente e serão
analisados no capítulo seguinte.
140
PICON, Antoine. Op. Cit. P. 298
4-CAPÍTULO 3 PRÉDIOS PÚBLICOS E INSTITUCIONAIS: OBRAS DE
ENGENHEIROS E ARQUITETOS.
1 - Planta-Baixa e 1ª Fachada para o Quartel do Corpo
de Bombeiros, Data 1894.
3 - Planta de Fachada Obras da nova Caixa de
Amortização – Setembro de 1898
2 - 2ª Fachada do Projeto
Prédio do Jornal do Brasil.
4 - Desenho da Fachada do Prédio do CPRM – Desenho do
Engenheiro Walter Schmied.
5 - Elevação da Fachada acrescida.
6 - Fachada do Prédio da Procuradoria Geral do Estado.
143
Este capítulo pretende analisar os prédios projetados por
engenheiros e arquitetos no Rio de Janeiro na passagem do século XIX para o
século XX e assim verificar como cada profissional tratava a arquitetura.
Como descrito na introdução, para analisar cada edificação foi
adotado o método de fichamento das mesmas destacando localização, data de
construção, o projetista e sua formação, histórico do prédio, tipologia e uma
descrição com análise.
Neste momento me apoio nos autores citados ao longo desta tese,
para tratar as questões em torno da arquitetura eclética, com destaque maior
neste capítulo para as relações apontadas por Nikolaus Pevsner e Jean-
Nicolaus-Louis Durand. O primeiro, com seu livro A History of Building Types, me
auxiliou na percepção da tipologia empregada na arquitetura a partir do século
XVIII e, o segundo por ser o próprio manual arquitetônico do século XIX
apresenta os modelos e seus padrões que nortearam a produção da época.
Deste modo analiso as edificações me baseando no conceito de que a
arquitetura do século XIX conseguiu absorver o seu momento histórico, criando
formas que se identificavam com a sociedade daquele momento, sociedade esta
que solicitava novos usos para a cidade, como ressalta Nikolaus Pevsner na
introdução do seu livro A History of Building Types, ao transpor a visão que o
arquiteto norte americano Henry Van Brunt tinha em 1886, e que representa bem
a sociedade e a arquitetura daquele período:
The architect, in the course of his career, is called upon to erect buildings
for every conceivable purpose, most of them adapted to requirements
which have never before arisen in history…Railway buildings of all sorts;
144
churches with parlors, kitchens and society rooms; hotels on a scale never
before dreamt; public libraries the service of which is fundamentally
different from any of their predecessors; office and mercantile structures,
such as no pre-existing conditions of professional and commercial life has
ever required; school houses and college buildings, whose necessary
equipment removes them far from the venerable examples of Oxford and
Cambridge; skating-rinks, theatres, exhibition buildings, music halls,
apartment houses, and all the other structures which must be
accommodated to the complicated conditions of modern society…
Out of(the)…eminently practical considerations of planning must grow
elevations, of which the essential character, if they are
honestly composed,
can have no precedent in architectural history.
142
Nas edificações analisadas abordo o fazer arquitetônico de arquitetos
e engenheiros através de suas obras, destacando a partir da função destinada a
cada prédio, o partido adotado, o processo construtivo, as soluções espaciais, a
volumetria e os ornamentos sempre presentes na arquitetura eclética.
Lembrando que os prédios selecionados são de um modo geral edificações
públicas ou institucionais e neste caso obedecem a determinados processos
projetuais que destaco a seguir.
4.1 O PROJETO PARA EDIFÍCIO PÚBLICO E INSTITUCIONAL
O projeto para edifício blico irá, de um modo geral, atender a
parâmetros que levam em conta a questão dos acessos e a distribuição dos
142
PEVSNER, Nikolaus. Hystory of building types. New Jersey : Princeton University Press,
1997, p. 9
“O arquiteto no curso de sua carreira é chamado a construir prédios para os mais diversos
propósitos, muitos destes adaptando soluções que nunca antes haviam sido
colocadas...Estações de trem de toda sorte; igrejas com salões; cozinhas e salas de vistas;
hotéis numa escala nunca antes sonhada; bibliotecas públicas com serviços os quais são
fundamentalmente diferentes dos seus predecessores; escritórios e estruturas mercantis que
nenhuma outra condição profissional havia requerido; escolas e colégios, cujos equipamentos
são inspirados nos exemplos veneráveis de Oxford e Cambridge; pistas de patinação, teatros,
pavilhões de exposição, salas de música, prédios de apartamentos, e demais estruturas que
devem acomodar as complicadas condições da sociedade moderna...Sem contar as
eminentemente condições práticas do planejamento que deve produzir elevações de seu
caráter essencial, se estes forem honestamente compostos, pode não ter precedentes na
história da arquitetura.” Tradução Kátia Maria de Souza.
145
espaços específicos de atendimento ao público e as áreas reservadas aos
servidores, bem como a questão, para usar uma linguagem típica do século XIX,
do caráter que se liga diretamente ao: ornamentocaráter
significaçãoconveniência; acaba por fim na questão do “estilo”, mais
propriamente do ornamento e o seu uso apropriado, para produzir uma
arquitetura clara, demonstrando o seu significado, na configuração da cidade,
marcando tanto o espaço urbano quanto a obra em si. O prédio tem como
objetivo se destacar e demonstrar sua função, neste sentido o seu aspecto
enquanto um monumento é um dos fatores que perpassam a criação
arquitetônica.
“A função de edifício público é denunciada pela monumentalidade e
nobreza das linhas clássicas”
143
. Este tipo de edifício, então, cuja finalidade
solicita uma imagem de estabilidade e solidez, será projetado sempre adotando
uma linguagem classicizante.
Esta linguagem classicizante foi adotada durante o século XIX e início
do XX com uma clara menção aos monumentos greco-romanos, no entanto, ao
consideráramos o conceito de clássico no sentido da forma em si, dos elementos
distribuídos e pensados mais racionalmente, veremos que os parâmetros,
apontados anteriormente, para concepção do projeto de edifício público no
século XIX/XX inclui também a questão do ornamento. Porém estas mesmas
configurações cabem perfeitamente nas concepções arquitetônicas atuais,
comprovando assim que o ato de projetar apresenta uma linha condutora única,
ou seja, um programa de necessidades, um terreno em que se deve conciderar
as implicações para a implantação do edifício e uma folha em branco, atualmente
143
CARVALHO, Maria Cristina Wolff. A arquitetura de Ramos de Azevedo.Tese de Doutorado.
FAU/USP, São Paulo, 1996, p.137.
146
uma tela de computador em branco. Talvez hoje não estejamos tão preocupados
com o ornamento mais conveniente a determinado edifício público, mas não
deixamos de pensar no caráter, na medida em que pensamos num partido a ser
adotado, numa feição que queremos imprimir a construção, passamos então a
adotar uma maneira diferente de aplicar o ornamento “como aponta Peter
Collins, um outro tipo de ornato- não como algo aplicado às superfícies, mas
como um fator sico da composição arquitetônica”
144
. A questão do ornamento
na arquitetura moderna e contemporânea, então, como bem colocou Sonia
Gomes Pereira, “não deixou de existir, apenas uniu-se imperceptivelmente à
estrutura. Desta forma não foi a escultura que desapareceu na arquitetura
moderna, mas ao contrário foi a arquitetura moderna que se converteu numa
escultura abstrata.”
145
É exatamente esta relação que vivenciamos atualmente ao
projetarmos edifícios públicos principalmente, mas também prédios institucionais
e até mesmo residenciais. Fato que se comprova nos prédios projetados para
Fóruns no Estado do Rio de Janeiro, experiência que vivencio diariamente
146
. A
questão do monumento, não obrigatoriamente “monumental”, que deve se
implantar destacando e marcando o espaço urbano, e a feição, ou seja, o caráter
que se quer dar, também são fatores preponderantes na definição do projeto.
144
PEREIRA, Sonia Gomes. A questão da ornamentação na arquitetura eclética. In: CUNHA,
Almir Paredes(org.) Arquivos da Escola de Belas Artes. Rio de Janeiro : EBA/ UFRJ, 1999,
p.147.
145
ibidem, p.148.
146
Atualmente trabalho na Divisão de Projetos de Obra do Departamento de Engenharia do
Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro, atuando como arquiteta, e juntamente com os
demais arquitetos da divisão discutimos e elaboramos projetos tanto para novas edificações
como reforma de prédios existentes. No momento trabalho no projeto de restauração do prédio
do Fórum da Comarca de Niterói, uma vez que um novo prédio para o Fórum de Niterói já es
em construção.
147
Será, então, a partir desta vivência deste conhecimento do ato de
projetar, de pensar e entender o edifício como um objeto que possui uma função
e um significado, que busco adotar ao analisar e compreender a arquitetura
produzida por engenheiros e arquitetos cariocas entre a última década do século
XIX e a primeira do século XX. Leio os edifícios aliando meu conhecimento de
historiadora ao de arquiteta projetista, tentado compreender as relações que se
estabeleceram naquele momento em que a arquitetura passava por
transformações significativas estruturais, que compreendem desde aspectos
técnicos, aspectos sociais e até profissionais uma vez que os profissionais da
construção civil viviam um momento de indefinição das suas funções, com uma
inter-relação bastante intensa como é possível verificar nos prédios a serem
analisados a seguir.
4.2 PROJETO DE ENGENHEIROS
4.2.1 Quartel Central do Corpo de Bombeiros
Localização: Pç. da República, 45 - Centro – RJ.
Situação: Existente.
Data : 1898-1903
Projetista : Eng. Gal. Francisco Marcelino de Souza Aguiar
Formação : Natural da Bahia, formado engenheiro pela Escola Militar do Rio de
Janeiro em 1876. Ingressou para o Clube de Engenharia em 2/04/1900. Apesar
da formação militar, foi um engenheiro de destacada atuação no início do século
XX, autor do projeto do Palácio Monroe, projetado inicialmente para ser o
148
Pavilhão do Brasil na Exposição Internacional de Saint Louis em 1904 e
posteriormente montado no Rio de Janeiro em 1906, sendo demolido em 1973.
Histórico:
A história do prédio do Quartel Central do Corpo de Bombeiros está
ligado a própria história da instituição, segundo levantamento que consta no
processo de tombamento do prédio junto ao INEPAC(Instituto Estadual do
Patrimônio Cultural)
147
. Antes da criação do Corpo de Bombeiros, os incêndios
que ocorriam na cidade do Rio de Janeiro eram debelados de maneira
improvisada e com auxílio da população.
A corporação foi criada por decreto de D. Pedro II em 2/07/1856, um
ano depois o “Corpo Provisório de Bombeiros da Corte” se encontrava
instalado no Campo da Aclamação. Em 1860 foi aprovado o regulamento
definitivo da Corporação, que passaria a dispor de cinco seções de incêndio,
sendo as duas primeiras, de caráter permanente, localizadas em Posto na
Central de Obras Públicas, e as três restantes qualificadas de auxiliares,
pertencentes ao Arsenal de Guerra, ao Arsenal de Marinha e à Casa de
Correção, porém, todas sob comando do Diretor Geral do Corpo de Bombeiros.
A hierarquia militar foi adotada na corporação pelo decreto 7766 de 1880,
assegurando o direito de uso das insígnias relativas aos postos e graduações.
O terreno em que hoje se ergue o atual prédio da corporação foi
adquirido por Vítor José de Freitas Reis e Alfredo Bernardo da Cunha em
18/11/1891, que o entregou a União em 8/2/1892, por haver rescindido o
contrato para construção de um teatro Lírico no local. Além do terreno foram
147
INEPAC- Histórico da Propriedade, Inventário dos Bens Imóveis de Interesse Histórico e
Artístico do Estado do Rio de Janeiro, 1978.
149
adquiridos mais 21 imóveis para a construção do Quartel do Corpo de
Bombeiros. Porém segundo relatório de 1897 escrito pelo Comandante da
Corporação, apesar da estação Central do Corpo de Bombeiros está situada em
um ponto estratégico da cidade, o edifíco não correspondia às necessidades e
ao desenvolvimento da instituição e acrescenta:
Construído para fim diferente e mais tarde consertado e apropriado para
quartel com acréscimos e modificações do momento, apresenta ele hoje
um triste aspecto...de velho pardieiro, onde com dificuldade se acredita
esteja aquartelado o Corpo de Bombeiros da Capital Federal
148
.
No mesmo ano foi nomeado Comandante do Corpo de Bombeiros o
Coronel Engenheiro Francisco Marcelino de Souza Aguiar, que ao tomar posse,
endossou e renovou os protestos de seu antecessor, e praticamente descreve o
que por fim acabou projetando para o novo prédio da Corporação:
Um quartel de Bombeiros, além das condições gerais de higiene, disciplina
e comodidade...deve dispor de um pátio bastante espaçoso, onde se
possa fazer experiências com bombas a vapor, armar mangueiras...fazer
exercícios de escadas...ter armazéns espaçosos...cocheiras próximas, de
modo a facilitar a trela pida dos animais ao sinal de
alarma...oficinas...depósito, uma torre de 22 metros de altura para secar
mangueiras, estação telegráfica e telefônica central, para o serviço de
avisos de incêndio...salão para ginásio...
149
Acrescentava que o edifício do Campo da Aclamação estava longe de
satisfazer as exigências necessárias e propunha “iniciar a construção de um
quartel...obedecendo a um plano previamente concebido”
150
.
148
ibidem, p. s/nº
149
ibidem, p. s/nº
150
ibidem, p.s/nº
150
Em 1898 foram solicitadas verbas para a reconstrução do quartel, que
começaram a ser liberadas em1901, dois anos depois(1903) o Coronel Souza
Aguiar afastou-se da Corporação para presidir a Comissão de Representantes
do Brasil na Exposição Internacional de Saint Louis, para a qual projetou o
conhecido Palácio Monroe. O Comando do Corpo de Bombeiros passou então
ao Major e depois Tenente Coronel de Engenheiros Feliciano Benjamim de
Souza Aguiar, irmão do antecessor, que prosseguiu com a obra de reconstrução
do quartel, segundo projeto de Francisco Marcelino.
O Palácio Acastelado da Praça da República foi inaugurado em
23/05/1908, com uma área de 7.466,94 de construção. No tio central, em
que se localizavam as baias, erguia-se uma torre de exercícios e de secagem
com 27 metros de altura de base quadrada com 6 metros de face. A estrutura
interna do prédio, em ferro, teria vindo da Alemanha, por intermédio da firma
Herm Stoltz, segundo informação da família de Souza Aguiar.
151
Tipologia :
Exemplar típico da fase do ecletismo arquitetônico, reunindo frontões
interrompidos, colunas jônicas, lambrequins, ornatos dentados, mãos-
francesas, torreões ao estilo dos palácios franceses do Loire, com cúpula
em bronze, etc. Até mesmo sua estrutura metálica interna, reflexo de uma
nascente era industrial, apresenta ligações com o estilo, como rosáceas,
carrancas e o símbolo da corporação (uma tocha entrelaçada por dois
machados), que se alternam por toda a extensão do alpendre que circunda
o pátio, segue portanto a arquitetura oficial dos prédios públicos da
época.
152
151
ibidem, p. s/nº
152
ibidem, p. s/nº
151
Tal composição que por seus torreões, rosáceas e cúpulas terminadas
com flechas se assemelham aos estilos medievais, comumente empregados em
prédios militares conferindo a edificação algo de austeridade e fortaleza.
No que se refere à planta esta remete a soluções, apontadas por
Durand em seu Précis, adotadas em prédios construídos para abrigar o corpo
militar. Durand cita que tais edificações se inspiravam nos prédios construídos
pelos romanos, mais especificamente nas ruínas de um “acampamento”
153
militar
em Pompéia. O prédio se distribuía em uma grande quadra, com um jardim ou
praça das armas que era circundado por uma galeria coberta. Esta galeria dava
acesso aos quartos ocupados pelos soldados e simultaneamente servia como
um caminho para outras partes do “acampamento”, para além do portão então
existia uma espécie de teatro.
A partir desta solução outras edificações militares foram construídas e
a distribuição dos alojamentos e demais serviços necessários seguiram o mesmo
modelo, de planta que se estende por uma quadra com um pátio interno que na
maioria das vezes funciona também como espaço para exercícios e
treinamentos, tal como no modelo apresentado por Durand no Précis (Il.27).
153
Na tradução do livro Précis des leçons d’architecture données à l’École Plytechinique, para o
inglês aparece a palavra camp at Pompeii” para designar tal edificação, como se trata de uma
edificação para abrigar soldados, a palavra mais próxima e que melhor se aplica ao texto é
“acampamento”. DURAND, Jean-Nicolas-Louis, Précis of lectures on architecture. Los
Angeles: The Getty Research Institute,2000, p.168.
152
Il. 27 – Prancha 20 , Parte III, Principais Tipos de Prédios.
153
Descrição e Análise Arquitetônica:
Prédio projetado com fim específico de atender às necessidades de
um quartel do Corpo de Bombeiros, compreende, portanto alojamentos de
praças e oficiais, depósitos de material, oficinas, pátio de manobras e
estacionamento de veículos, torre de exercícios e de secagem de mangueiras,
além de parte administrativas.
A planta principal apresenta simetria típica das construções clássicas,
em forma retangular constituído de um grande pátio interno, que tem por objetivo
servir de exercícios as atividades típicas da corporação. A fachada principal
encontra-se destacada do restante da construção, é formada por um grande
torreão de onde saem os dois corpos laterais. Dentro da corporação especula-se
que a implantação do corpo central do prédio que é formado pelo pátio central e
os alojamentos no pavimento superior, planta em U, deveria ter sido locado com
o vão do U voltado para o corpo principal da fachada, em cujo pavimento
superior estão os gabinetes dos oficiais, e assim, estes teriam uma ampla visão
do interior do pátio, o que não ocorre atualmente. Neste caso, a hipótese é bem
plausível, tal implantação levou ao fechamento do vão em U por uma nova
edificação, que atualmente constitui a fachada voltada para a rua do Senado. Um
elemento que realmente contribui para balizar esta hipótese são as plantas por
mim encontradas no Arquivo Nacional
154
.
Estas plantas, datadas de 1898, mostram um projeto para o Quartel do
Corpo de Bombeiros exatamente no local onde hoje ele está implantado. É
154
Arquivo Nacional – Plantas dos edifícios destinados à Estação Central do Corpo de
Bombeiros, Capital Federal-1894-1898 – 4T/MAP.49.
154
justamente na implantação que o projeto e o prédio existente se assemelham
(Il.28 e 29). Composição em U com corpo principal voltado para a Praça da
República, pátio interno, alojamentos distribuídos lateralmente com área
reservada a alojamentos para os soldados de plantão, logo acima do
estacionamento dos carros e outro alojamento no segundo pavimento. O
tratamento plástico apresentado na planta de elevação de fachada (Il.30) dos
alojamentos é bastante semelhante ao existente (Il.31) que remete aos chalés
com lambrequins encimando a cornija.
a fachada apresentada para o corpo principal obedece a uma
solução mais clássica, marcada por um pórtico central, ladeado por corpo lateral
simétrico, formado por um módulo de um pavimento e outro de dois pavimentos,
ambos terminados por entablamento, em que se destaca cornija bem
demarcada. No segundo pavimento, ao centro, duas portas-balcão se abrem
para uma pequena sacada. Todas as janelas são em verga reta, encimada por
sobreverga em forma de moldura. O pórtico central de inspiração clássica é
composto por portão em arco pleno ladeado por colunas dóricas, em que se
apóia frontão triangular com tímpano decorado com as armas da república.
Portanto, uma composição mais simples comparada com a que foi efetivamente
construída.
O prédio existente possui, no corpo voltado para a Praça da República,
“quatro pavimentos, de alvenaria de pedra associada à estrutura metálica
interna. Este tipo de solução estrutural é, segundo pensamento corrente na
época, reflexo do conflito entre a Era Industrial e a busca do passado através dos
“Neos”, a solução ideal e conciliatória era obtida pelo emprego de estruturas de
ferro no interior dos edifícios, enquanto, no exterior destes, eram usados
155
fartamente envoltórios de alvenaria, considerados mais vantajosos, do ponto de
vista construtivo (mão de obra mais acessível) e do estético (sentido historicista
dos prédios). Este último, porém, se achava comprometido igualmente pela
produção em série- moldados em estuque, prontos para aplicar, como cimalhas,
tímpanos de frontões, modilhões, balaustradas, além de lambrequins de
estamparia a metro, substituindo os tradicionais de madeira trabalhada.
Comprovam este novo misto sistema construtivo, no caso específico do prédio
em questão, faturas relativas à aquisição de materiais de construção durante os
anos de 1905, 1906, 1907, existentes em pastas do Arquivo Nacional”
155
.
155
Inventário de Bens Imóveis de Interesse Histórico e Artístico do Estado do Rio de Janeiro,
Quartel do Comando Geral do Corpo de Bombeiros, INEPAC.
Il. 28- Quartel /central do Corpo de Bombeiros. – Acima - Planta-baixa 1º Pavimento- A indicação da
Praça da República está marcada à esquerda da imagem. A disposição das Edificações é
semelhante à atual, com algumas diferenças em relação a volumetria.
Data 1898. Abaixo– Marcação, a partir de uma planta aerofotogramétrica, da implantação atual do
Quartel Central do Corpo de Bombeiro, a seta indica o corpo principal voltado para a Praça da
República, atrás deste o módulo de alojamentos com pátio interno, a direita serviços e oficinas, a
hachura em azul representa uma área acrescida. Percebe-se nas duas imagens a mesma
implantação. Marcação no aerofotogramétrica de Katia Maria de Souza.
156
Il. 29- Quartel /central do Corpo de Bombeiros. – Planta-baixa 2º Pavimento- A indicação da Praça da
República está marcada à esquerda da imagem. No segundo pavimento foram dispostos os
alojamentos. Data 1898.
157
Il. 30-Planta de Elevação dos Alojamentos, em que é possível identificar o acabamento em
lambrequim no telhado. Data 1898.
Il. 31- Foto dos alojamentos, detalhe dos lambrequins existentes de estamparia de metro em
chapa metálica.
158
A fachada principal, voltada para a Praça da República(Il.32)
apresenta torre central ladeada por pilastras, ornamentadas por dois pares de
colunas com volutas, no térreo e segundo andares, encimadas por entablamento;
no terceiro andar, dois pares de colunas com volutas menores, arrematadas por
frontão curvo interrompido por uma pequena sacada, composta por porta-janela
em arco pleno, ladeada por colunas, resguardada por guarda-corpos de
balaústres e encimada por frontão reto. Entre as pilastras do térreo, uma porta de
acesso em arco abatido segue uma pequena escadaria. Acima do térreo, uma
porta-janela reta com balaústres encimada por frontão reto com brasão, seguida
por duas janelas reatas no segundo pavimento. Acima da platibanda, uma janela
em arco abatido correspondente ao terceiro pavimento. O conjunto de frontão
interrompido e sacada descrito anteriormente, está ladeado por duas janelas
retas e encimado por um conjunto de três janelas em arco pleno. Segue-se uma
platibanda guarnecida de óculos e uma terminação piramidal. Nas laterais da
torre localizam-se dois panos de fachadas iguais, contando cada um com uma
grande porta em arco abatido, para trânsito de veículos. Acima, uma seqüência
de três janelas em arco pleno, com guarda-corpos de balaústres, no segundo
andar e, no terceiro, outra seqüência de três janelas retas com frontão reto na do
centro e alteado nas demais. Segue-se a platibanda coroada por balaustrada:
todo esse conjunto encontrando-se recuado.
159
Os corpos laterais são simétricos, apresentando nos ângulos torres
cilíndricas terminadas por pináculos. São seguidas, nas laterais, por corpos retos
constituídos de porão alto, onde localizam-se três aberturas para iluminação e
ventilação. No térreo contam-se três janelas em arco abatido, três em arco pleno
no segundo e três retas, a central com frontão reto e as demais com frontão
alteado, no terceiro pavimento. Acima, a platibanda coroada por balaustrada.
No pátio interno (Il.33, 34 e 35) o conjunto que compõe os alojamentos
apresenta solução formal mais simples, apoiado em estrutura metálica, possui
vão livre no rreo e alojamentos no mezanino e no pavimento superior. Sob
cada conjunto de alojamentos, ficam estacionados os carros de socorro e,
sempre que acionado o alarme, os oficiais descem por um tubo de ferro, que liga
o mezanino, área reservada aos alojamentos, ao pavimento em que está
estacionado o veículo. As salas do segundo pavimento também eram utilizadas
como alojamentos; atualmente, com o projeto de restauração do prédio, irão
Il. 32:Fachada Principal –
160
atender a um novo uso; compõem ainda este pavimento uma grande varanda
que funciona como circulação entre as salas.
Il. 33 - Pátio interno -
Il. 34 Pátio Interno, visto a partir do
acesso pela Praça da República.
Destaque para a torre para secar
mangueiras.
161
Interessante neste conjunto é justamente a solução adotada na sua
construção, uma estrutura metálica com pilares, vigas e escadas em ferro, os
painéis de vedação alternam fechamento em lambri de madeira e uma estrutura
em estuque que forma um painel de pouca espessura e se encaixa perfeitamente
no vão do perfil metálico entre cada painel. Do mesmo modo as esquadrias
foram colocadas nos vãos a elas destinado, de modo que o caixão, ou caixonete
desta abraça o painel e lhe acabamento. Percebe-se em todo este conjunto
soluções típicas de peças pré-fabricadas e trazidas prontas pra o canteiro de
obras, sendo então montadas no local.
O prédio, que faz o fechamento da planta em U dos alojamentos
(Il.36), possui um tratamento de fachada que apresenta harmonia com todo o
complexo, mas não tem a mesma suntuosidade da fachada principal, no entanto
repete o repertório formal com uma decoração aplicada à fachada, emoldurando
Il. 35 Pátio Interno visto da torre. Destaque para a torre da fachada voltada para a Praça
da República em obras na época.
162
cada conjunto de três portas-balcão, composto de cimalha, frontão central em
arco e cartelas que descem até o piso entre cada porta-balcão, criando assim um
pórtico para cada conjunto. Ao centro uma sacada se destaca do plano, com
porta–balcão em arco, ladeada por colunas e encimada por cornija simples. No
entablamento mais uma vez foi empregada ornamentação aplicada ao friso que
intercala rosácea e fita imitando um lambrequim. Abaixo da cornija dentículos
remetem às soluções formais militares que se referem às construções medievais.
Coroando o prédio frontão alteado em arco em que se insere um relógio rodeado
pelos símbolos vegetais da bandeira do Estado; o frontão é encimado por
corruchéu em forma de tocha.
Outra construção significativa neste complexo é o prédio das antigas
oficinas, prédio este todo em estrutura metálica, que está sendo restaurado. Nele
é possível perceber o emprego deste tipo de material e solução estrutural que
fornece uma leveza a edificação. Com exceção dos painéis de vedação,
atualmente inexistentes em toda a construção, pilares, vigas escadas e piso o
em ferro e é possível identificar as soluções adotadas principalmente no segundo
pavimento em volta do vazio da escada, ponto mais crítico em qualquer
estrutura; quatro no total, que ligam o rreo, o pavimento superior e a cobertura.
Il. 36
163
No vão necessário a passagem da escada abre-se uma rede de vigas em torno
do vazio que lembram a estrutura de um guarda-chuva(Il.37) ou as vigas em
nervuras que sustentam as abobadas em ogivas das igrejas góticas(Il.38). Esta
solução remete as proposições de teóricos da arquitetura do século XIX, tais
como Viollet-le-Duc que apontavam nas soluções estruturais góticas as
inovações para a arquitetura oitocentista.
Il. 38- Abóbada sobre pendentes
Il. 37- Estrutura de vidas metálicas para abertura de vão na laje em estuque. Solução
adotando o mesmo conceito para abertura de vão na laje.
164
A planta deste prédio é um octógono recortado no centro, formando
dois módulos que se ligam no pavimento superior por uma passarela (Il.39). No
térreo ainda se destaca a ponte rolante que se distribui pelos dois módulos.
Junto aos pilares que possuem uma base em cantaria corre a calha de águas
pluviais. Na cobertura em terraço, apenas a chegada da escada possui um
telhado e um fechamento em painel metálico (Il.40).
Ainda compõem todo o conjunto do Quartel Central do Corpo de
Bombeiros outras edificações, que perfazem um total de 7.466,94 m²; em todas é
possível identificar alterações que conjugam soluções estruturais entre ferro e
cantaria e/ou alvenaria, mas também é fácil perceber que estas foram aquisições
posteriores a obra de 1908, que foram adaptadas e incorporadas ao complexo.
Il. 39 – Blocos das Oficinas, atualmente em reforma.
165
Il. 40 – Chegada da escada na cobertura,
fechamento em chapa metálica.
Il. 41 – Laje e estuque com viga metálica nos alojamentos.
166
Il. 42 – Painel de fechamento no 2º pavimento.
167
Il. 43- Detalhe do painel.
168
4.2.2 Caixa de Amortização
Localização: Situa-se na Avenida Rio Branco — antiga Avenida Central, 28-36.
Situação: Existente
Data : 1905
Projetista : Engº. Gabriel Diniz Junqueira Guimarães.
Formação: Nasceu em 1866 no Rio de Janeiro, formado engenheiro civil pela
Escola Politécnica do Rio de Janeiro em 1891. Filiou-se ao Clube de Engenharia
em 01/08/1903.
Histórico:
A pedra fundamental foi lançada, com grande solenidade, a 30 de
março de 1905 ficando pronto em abril do ano seguinte (Il.44).
O projeto e detalhes do edifício obedecem às proporções clássicas e
foram confeccionados pelo escritório técnico da Comissão Construtora da
Avenida Central, tendo o engenheiro Gabriel Junqueira como responsável.
Gabriel foi auxiliado pelo arquiteto desenhista Américo de Castro, sob as ordens
de Paulo de Frontin, chefe da comissão e de José Valentim Dumham, chefe de
sessão, estando a direção desde o início a o final a cargo do engenheiro
Henrique Couto Fernandes, que foi auxiliado na montagem de todo o vigamento
metálico por Illilyo Coelho. Esse vigamento foi fornecido pela usina Braine-le-
Conte
156
.
156
FERNANDES, José Luís. Em torno de um aniversário. Brasília: Banco Central do Brasil,
1986, p.13-15
169
Tipologia :
A composição geral da fachada remete ao Renascimento. O prédio
apresenta na sua estrutura o uso do ferro que serve de sustentação a uma
cúpula de vidro, demonstrando a perfeita assimilação de elementos modernos,
no que se refere aos materiais, na arquitetura do início do século XX.
Obedece à típica solução adotada nos grandes bancos construídos na
Europa, em que a presença de um grande hall central, sob o qual repousa um
domo, é característica fundamental e remete aos primórdios das casas
bancárias, que funcionavam a princípio como um grande mercado, vem daí a
inclusão de uma área para negociações e pregões(Il.45).
O emprego de linguagem formal que remete ao Renascimento
também é um padrão muito utilizado em projetos para bancos e esta diretamente
relacionado à construção das primeiras casas ou mercados de trocas
construídos na Itália durante o Renascimento
157
.
157
PEVSNER, Nikolus.
,
A history of building types, New Jersey : Princeton University Press,
1997, p. 207.
Il.44
170
Descrição e Análise Arquitetônica:
Prédio em esquina, situado no rond-point de 60 metros de diâmetro,
entre a Avenida Rio Branco e a Rua Visconde de Inhaúma, dividido em três
andares e três fachadas, além da fachada posterior. Todas apresentam o
pavimento térreo em cantaria com janelas em arco pleno e porta em verga reta.
A fachada principal e as laterais têm dois pavimentos superiores
ligeiramente recuados, abrindo-se para uma varanda cercada pela colunata,
formada por trinta e quatro colunas coríntias, que abrange estes dois andares.
No segundo pavimento aparecem portas-janela em verga reta e sobreverga em
Il. 45- Consols Office- 1797- Perspectiva aquarelada – John Soane.
171
frontão triangular, e duas portas de verga reta e sobreverga em arco pleno. No
terceiro pavimento, janelas em verga reta e sobreverga em frontão recortado
envolto por guirlandas e modilhão central.. Entre os vãos do segundo e terceiro
pavimentos, pilastras coríntias adossadas fazem correspondência com as
colunas. O entablamento apresenta platibanda em balaustrada interrompida por
frontões triangulares com as Armas da República nos tímpanos.
Fachada principal esquina da Avenida Rio Branco com a Rua Visconde de
Inhaúma (Il.46).
A fachada, arredondada, acompanhando o desenho da rua,
apresenta, no rreo, uma porta central ladeada por duas janelas em cada lado.
Nos andares superiores a disposição das aberturas é a mesma: uma porta
central com duas portas-janela de cada lado no segundo andar, e janelas, no
terceiro. Apresenta sobre a sacada em balaustrada da varanda, seis colunas
coríntias, que sustentam o entablamento, no qual, aparecia a inscrição “Caixa de
Amortização” atualmente aparece “Banco Central”. A fachada é coroada por
um frontão triangular.
Fachada lateral direita, voltada para a Avenida Rio Branco
No térreo a porta central é ladeada por cinco janelas em cada um de
seus lados, seguindo-se, nos andares superiores, a mesma disposição dos vãos
de abertura. O entablamento dessa fachada é sustentado por dezessete colunas,
sendo que, na direção da porta a varanda avança no sentido da rua e é
172
encimada por um frontão triangular.
Fachada lateral esquerda, voltada para a Rua Visconde de Inhaúma
Apresenta sete janelas no primeiro pavimento, sete portas-janela no
segundo e sete janelas no terceiro, contidas na colunata de onze colunas desta
fachada, que sustentam o entablamento, onde lê-se a inscrição “1906”.
Fachada posterior, voltada para a Rua Alcântara Machado antiga Rua de
Santa Rita
Ficando no alinhamento da rua, esta fachada apresenta seis janelas
no primeiro andar, cinco portas-janela no segundo e cinco janelas no terceiro.
Il. 46 – A Fachada principal é a fachada curva à esquerda e a lateral é fachada maior.
173
Interior
O saguão de entrada da praça circular é revestido de estuque e
seguido da rotunda central, com 19 m de diâmetro abrangendo os três
pavimentos(Il.47).
Il. 47 – Praça Circular - rotunda.
174
Em frente à entrada, comunicando-se com a rotunda por três portas,
há o vestíbulo da escada, que é em cantaria e composta dentro da ordem dórica,
por onde se chega à varanda que circula a rotunda na altura do segundo
pavimento. Para chegar-se ao terceiro pavimento utiliza-se uma escada de ferro
(Il.48) construída pela fundição Americana, que também forneceu as grades das
janelas do térreo
158
.
Todos os preceitos difundidos em projetos para bancos foram aqui
empregados (Il.49), nos quais se encontram o uso de materiais nobres, com
peças de acabamento dourado, remetendo ao ouro. O que também se observa
no prédio da Caixa de Amortização no qual na área da rotunda central foram
criados painéis de mosaico de vidro dourado, que segundo relato da época da
construção, tinham o objetivo de refletir a luz para as salas vizinhas. No piso um
mosaico em pastilhas (Il.50) apresenta tabeira com desenho que remete a
representação de uma banda grega, ao centro um medalhão circular em que se
destaca o desenho em fita ondulada.
158
FERNANDES, José Luís. Op. Cit. P. 13-15
Il. 48 – Escada interna
em ferro. Foto MECIR
175
Il. 50 – Praça Central, tabeira com banda grega e medalhão central.
Il. 49 – Praça Central do Coal Exchange- Londres, 1846-49- e Praça Central da Caixa de
Amortização.
176
Na impossibilidade de se obter a planta-baixa da edificação por
questões de segurança, uma vez que o prédio hoje abriga departamentos
importantes do Banco Central do Brasil, reproduzo a seguir uma descrição do
interior da edificação publicada na Revista Kosmos em novembro de 1906,
quando da inauguração do prédio. Pela descrição é possível reconstituir, mesmo
que esquematicamente, a planta (Il.51 e 52) e partir dela verificar que o prédio
obedece a uma tipologia típica de bancos e bolsa de mercadorias, uma grande
praça central com áreas de serviços distribuídas em torno desta.
A porta da praça circular dá acesso ao saguão revestido de estuque lustre,
em seguida a rotunda central de 19 metros de diâmetro, que serve de sala
de espera a seção dos juros de apólices situada a direita e dando para a
Av. Central e para a seção de troco de papel-moeda, que se acha a
esquerda com frente para a rua Visconde de Inhaúma e travessa Stª Rita.
A rotunda, abrangendo os três pavimentos é revestida no pavimento térreo
de painéis de mosaico de vidro dourado, cujo efeito é refletir luz as salas
vizinhas.
A sala da direita destinada aos juros das apólices mede 400 metros
quadrados de área, com uma casa forte de 55 de área, munidas de
portas do fabricante Chubb. Nela é que foram feitas divisões para o serviço
de corretoria, tesouraria e vestiário com aparelhos sanitários.
A sala da esquerda, com 350 m² de área é destinada ao serviço de papel-
moeda, possuindo também duas casas fortes com porta dos fabricantes
Remington & Sherman; tem 53 m² de área, além de vestuário e gabinete
sanitário.
Defrontando a entrada, acha-se a rotunda, comunicada por três portas
adiante o vestíbulo de escada, toda de cantaria, obedecendo em todos os
seus ornatos e molduras a ordem dórica. Por baixo da escadaria fica o
corredor, dando acesso ao pavilhão do forno de incineração e a casa para
corpo da guarda.
A escadaria é de granito, com dois lances curvos rematados em um
reto, terminando na varanda que circunda a rotunda no nível do segundo
pavimento, varanda circular, com 1,80m de largura, dando entrada à
direita, para a seção de contabilidade; com 315m² de área, e à esquerda
para transferência de apólices, com 150m² de área, dando frente para o
vestíbulo do Inspetor a direita para a sala do chefe da contabilidade.
Duas portas, ainda, à varanda, dão acesso ao grande vestíbulo do qual,
em seguimento, vem o salão da inspetoria, espaçoso, com 18 metros por
8,50, e o gabinete do Ministro, com dependências.
Os salões da contabilidade, transferência de apólices e gabinete do
inspetor estão providos de vestiários com parelhos sanitários.
Uma escada de ferro franqueia a subida do terceiro pavimento, onde, do
lado da Avenida, está situada uma sala de 440 m² provida de vestiários e
aparelhos, destinados aos sorteios; do lado da Travessa de Stª Rita, fica o
arquivo, com 425 m² de área e portas fichet.”
159
159
Revista Kosmos, Rio de Janeiro, nov/
177
Il. 51- Planta esquemática do 1º pavimento do prédio da Caixa de
Amortização quando da inauguração.
178
As soluções apresentadas no projeto da Caixa de Amortização
demonstram o conhecimento e domínio por parte do corpo de engenheiros
responsáveis dos elementos que compõem o fazer arquitetônico. É certo que
todos eles foram alunos da Escola Politécnica e tiveram a formação
Il. 52- Planta esquemática do 2º pavimento do prédio da Caixa de
Amortização quando da inauguração.
179
enciclopédica que tanto caracterizou os engenheiros do período. Porém o
conhecimento da arquitetura, destes profissionais não passava apenas pelos
manuais compositivos tão difundidos na época, mas também tinham
conhecimento de história da arte e da arquitetura, dando inclusive opiniões sobre
o tema conforme lhes fossem solicitado. Fato este que se comprova tanto nas
atas de reunião
160
do Clube de Engenharia, como no livro, encontrado no Clube
de Engenharia, “Notas de Aula de Arquitetura Civil” que discorre sobre temas
como estética, história da arte e da arquitetura, modelos de plantas, fachadas e
decoração termina abordando as questões de saneamento, como foi relatado
no capítulo II desta tese, quanto abordo a questão da formação de engenheiros e
arquitetos no Rio de Janeiro entre final do século XIX e início do XX.
Ainda é bastante interessante quando analisamos as plantas de
detalhes construtivos, encontrados no Arquivo Nacional, datados de 1898, e
verificarmos que o prédio foi concebido para possuir uma estrutura metálica,
porém as colunas que suportam esta estrutura foram inspiradas na ordem
clássica (Il.53 e 54), mesmo sendo em ferro. Verifica-se assim que a questão da
linguagem era algo bastante presente e estas deveriam acompanhar o padrão
adotado, promovendo uma identificação com todo o conjunto, optou-se então por
fazer as colunas em ferro, mas com uma linguagem condizente ao restante da
edificação, ao invés de encobri-la com uma camada de estuque, como era típico
da época.
No entanto o prédio que foi construído não apresenta esta estrutura,
apenas possui alguns elementos metálicos tais como a escada, o guarda corpo
da varanda sob a rotunda no segundo pavimento e as mãos francesas que
160
Ver anexa transcrição da ata de reunião do Clube de Engenharia no período de 1896 a
1910.
180
sustentam a varanda (Il.55). Sendo assim o projeto encontrado no Arquivo
Nacional, muito provavelmente deve ter sido um primeiro estudo para a Caixa de
Amortização, contribui para esta hipótese não apenas os títulos das pranchas
mas também a configuração das estruturas metálicas que pelo detalhe
apresentado representam o balanço do piso do segundo pavimento envolta da
área da rotunda.
Obra da nova
caixa de
amortização
Ilustração 53 Projeto com
dimensionamento das vigas
metálicas e secção dos
pilares em ferro sobre base
em mármore.
Disposição das vigas em
volta da rotunda
181
Il. 54 – Continuação da prancha da ilustração anterior.
182
As imagens a seguir (Il.56 e 57) são ilustrativas de como o ferro, já
bastante usado pela construção cível da época, era coberto por argamassa
moldada imitando colunas gregas, de forma imprimir a edificação uma solidez
que as construções em pedra, aparentemente forneceriam. A estação da
Estrada de Ferro no município de Mendes no interior do Estado do Rio de
Janeiro, construção que emprega o ferro recoberto por argamassa, é um
exemplo típico de como o mesmo era revestido por uma massa de cimento, areia
Il. 55 – 1ª- Escada
2ª- Corrimão da Escada
3ª - Guarda-Corpo da varanda sob a rotunda
4ª - Mãos-Francesas que sustentam a varanda sob a rotunda.
183
e água, de tal forma que era possível então “esculpir” a base, o fuste e o capitel
de uma coluna.
4.2.3 CPRM - Cia de Pesquisa de Recursos Mimerais
Localização: Av. Pasteur,404 - Urca – RJ
Situação: Existente
Data : 1908
Projetista: Enghº. Antônio de Paula Freitas(1843-1906) e Enghº Jose Mattoso
Sampaio Correia (1875-1942)
Formação: Antônio de Paula Freitas Formado pela Escola Central
posteriormente denominada Escola Politécnica. Jose Mattoso Sampaio Correia
Formado pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro em 1898.
Il. 56-Perfil metálico- recoberto por
estuque, parte danificada-
Estação da Mendes – RJ-
Il. 57- Perfil metálico- recoberto por
estuque, coluna inteira- Estação
da Mendes – RJ –
184
Histórico:
Prédio foi mandado construir em 1880 pelo Ministro do Império, Barão
Homem de Mello. O projeto foi entregue ao engenheiro Antônio de Paula Freitas
e destinava-se à administração da primeira universidade brasileira, que teria o
nome de Pedro II. A pedra fundamental foi lançada em 12 de fevereiro de 1881.
Apesar do grande interesse pelo empreendimento, a falta de recursos
financeiros paralizou as obras e o projeto da universidade foi abandonado. Em
1884 existiam apenas as fundações e cerca de 40 a 50 centímetros de paredes
levantadas; a obra só foi retomada após a proclamação da República em 1889. A
princípio funcionaria ali a Escola Superior de Guerra, mas novamente
dificuldades financeiras fizeram com que a obra caminhasse muito lentamente só
chegando ao fim em 1908 sob orientação do engenheiro José Mattoso Sampaio
Correia, diretor da Inspetoria Geral de Obras Públicas, quando a esplanada da
Praia Vermelha foi escolhida para sediar a Exposição Nacional em comemoração
ao centenário da Abertura dos Portos.
O projeto sofreu alterações, porém Sampaio Correia procurou
respeitar ao máximo os planos de Paula Freitas, “embora reconhecesse que a
harmonia severa das linhas do projeto deste não se manifestariam tão
completas, no projeto modificado”
161
. A modificação mais significativa foi a da
escadaria frontal, também foram alterados os corpos laterais que anteriormente
teriam três pavimentos e foram construídos com dois, e não foram executados a
biblioteca e o anfiteatro previstos no projeto de Paula Freitas.
161
TOSATTO, Pierluigi. Um palácio na história geológica brasileira. Brasília: DNPM, 1994.
185
Tipologia:
O prédio corresponde as composições típicas de uma edificação
pública, que segundo Pevsner
162
se inspiravam nos palácios renascentistas, que
a partir do crescimento das cidades e da formação de burguesia, passaram a ser
adaptados com o objetivo de ali abrigar a instituições então criadas. Pevsner
destaca ainda que a necessidade de se criar um prédio para a administração
pública, algo correspondente ao “bouleterion”
163
grego, toma força quando as
cidades do norte da Itália alcançaram a independência. Aponta o Palazzo del
Broletto em Como, como um dos mais antigos prédios de governo, apresentando
uma planta simples formada por um andar térreo com arcadas e uma grande
sala no pavimento superior. O pavimento térreo servia como extensão do
mercado em frente e a grande sala superior tinha dupla função podendo abrigar
hora o conselho da cidade e hora a corte de justiça. Sendo assim os prédios
162
PEVSNER, Nikolaus. Op. Cit., p. 27
163
Prédio construído entre os séculos VI e V a. C. funcionava como o conselho da câmara.
Il. 58
186
construídos para o governo, palácios de justiça ou algo ligado a administração
pública, durante o revivalismo dos séculos XVIII e XIX, buscavam no
Renascimento as referências para a composição dos seus edifícios (Il.59).
Neste sentido o prédio do CPRM obedece a tais referências com sua
fachada austera inspirada no Renascimento(Il.60).
Assim como as Town e City Halls descritas por Durand em seu
Précis(Il.61), em que o prédio deve ter um hall principal, uma sala para
assembléias públicas e o que ele chama de “pórticos” distribuídos de tal forma
que possibilitassem fácil acesso a qualquer parte do prédio; o edifício do atual
CPRM, obedece as mesmas soluções, em que se destacam a distribuição das
salas destinadas às áreas administrativas para a então Exposição comemorativa
de abertura aos portos em 1908, e salas maiores que funcionaram como
espaços de exposição dos estados, dispostas nos corpos laterais ao corpo
principal entorno de pequenos pátios centrais. Tal composição sem dúvida
acabou contribuindo para o futuro aproveitamento da edificação.
Il. 59- New Government Offices- 1898-1912 – Londres -Por J.M. Brydon. Classificado por
Pevsner como Neorenascentista.
187
Il. 60- Corpo Principal – CPRM
Il. 61- Prancha 7 do Précis des
leçons d’architecture données
à l’École Polytechinique, em
que Durand exemplifica a
questão da distribuição das
salas e dos acessos,
destacando a necessidade do
fácil acesso.
188
Descrição e Análise Arquitetônica:
O prédio adota a linguagem neoclássica, com elementos de
características greco-romanas, composto, segundo projeto de Sampaio Correia,
por três pavimentos no corpo central e dois pavimentos nos corpos recuados
laterais, que no projeto de Paula Freitas também teriam três pavimentos.
Edifício em construção misto de alvenaria irregular de blocos de rocha,
argamassa e tijolos; possui algumas estruturas de concreto armado. A cobertura
era em telha francesa, atualmente somente o corpo recuado à direita preserva as
telhas originais, os demais telhados são em telha de amianto.
A fachada do corpo central tem 78 metros de extensão e se divide em
cinco partes com planos alternados, sendo o eixo central marcado por um pórtico
que se apóia sobre terraço, nas partes externas abrem-se três vãos em cada
pavimento, quatro vãos nas duas intermediárias e cinco na parte central. Os
vãos das fachadas são realçados por guarnições em cantaria, sendo que no
embassamento as janelas são retangulares, no segundo pavimento janelas
arrematadas em arco e no terceiro pavimento janelas arrematadas por frontão
triangular, o que demonstra uma inspiração de cunho renascentista.
Todo o embassamento é de cantaria. A fachada frontal apresenta
grandes superfícies de cantaria trabalhada em granito. O acesso principal se faz
por duas amplas escadas em curva que abrem-se, na calçada, com uma largura
útil de 6,50 metros, e no terraço, com 5,00 metros. Cada escada é lançada nos
primeiros degraus por dois pedestais em que se apóiam leões modelados em
cimento.
189
O pórtico central se destaca da edificação e apresenta composição de
inspiração clássica em que se erguem quatro grandes colunas encimadas por
capitel de ordem compósita, trabalhadas em granito, com fuste reto, base anelar
e plinto quadrado. Seguindo a composição clássica, as colunas são encimadas
por entablamento composto por arquitrave, em todo o perímetro do prédio, com
três faixas escalonadas e cornija reta arrematada por uma fileira de dentículos.
Termina o pórtico um frontão triangular em que se destaca no tímpano o brazão
das armas da República, que se presume ser sua primeira reprodução em
cantaria de granito. Acima do frontão termina o prédio uma platibanda que
acompanha todo o pemetro do mesmo em seus diferentes planos.
Observando as plantas que se seguem (Il.62) é claro perceber todo o
conceito da distribuição dos espaços do edifício obedece a uma lógica
perfeitamente simétrica. Não fosse pela sua volumetria, ele estaria bem próximo
dos parâmetros de uma construção neoclássica, porém é esta mesma disposição
que o aproxima das construções neo-renascentista com influência inglesa que
deriva de Palladio e neste caso adquire característica mameiristas. Portanto
dentre os Neos da arquitetura do século XIX, no meu entendimento, a
classificação mais apropriada é considerá-lo um prédio Neo-Maneirista,
justamente pela desconstrução do clássico. A sua planta, principalmente se nos
atermos a do terceiro pavimento(Il.63), obedece aos preceitos clássico de
composição, mas que se quebra com a inclusão dos corpos laterais alocados
ao fundo do corpo principal, criando então uma planta em U. A inclusão de um
pórtico monumental, uma escadaria semi-circular com dois tramos na fachada,
as envasaduras emolduradas em cantarias alternando verga em arco pleno no
segundo pavimento e verga reta no terceiro, todos aplicados sobre fundo branco,
190
aproxima o conjunto do maneirismo, pois busca exatamente esta dissolução do
clássico, inserindo elementos que quebram o ritmo clássico.
Ainda no que se refere a planta, a distribuição dos corpos laterais que
se espalham pelo terreno(Il.64) prefiguram as composições palladianas, estas
construções são apontadas por Pevsner, como os palácios(pallazzi) e as
vilas(ville) que foram os modelos adotados quando as construções residenciais
e públicas começaram a predominar nas cidades a partir do século XVIII
164
.
As soluções construtivas ainda se mantêm no padrão tradicional de
estrutura altoportante em que os esforços são distribuídos de maneira regular
sobre cada parede, tornando uma estrutura rígida apoiada sobre si mesma. Os
grandes vãos e direito alto o alcançados com um dimensionamento maior
desta estrutura altoportante, criando paredes grossas.
É um tipo de estrutura amplamente conhecida pelos profissionais da
época, e segundo levantamento realizado na década de 70 do século XX, num
trabalho de sondagem executado pela CPRM- Companhia de Pesquisa de
Recursos Minerais, verificou-se que os baldrames(Il.65) possuem larguras que
“chegam a 3,45 metros de base e que se elevam, de forma escalonada, a alturas
de cerca de 3 metros”
165
. Ainda segundo este estudo estes alicerces remontam
aos três primeiros anos da obra, entre 1881 a 1883.
164
Em seu livro “Panorama da arquitetura ocidental”, Pevsner já ressalta este aspecto nas
construções do século XVIII, reforçando a questão no livro “A history of building types”.
PEVSNER, Nikolaus. Op.cit, p. 27 e PEVSNER, Nikolaus. Panorama da arquitetura
ocidental. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p.204.
165
TOSATTO, Pierluigi. Um palácio na história geológica brasileira. Brasília: DNPM, 1994,
p.s/nº.
191
Il. 62- Planta- baixa do
primeiro e segundo
pavimentos do Palácio
dos Estados-
Modificada pelo Engh°
Sampaio Correia
192
Muito provavelmente a solução estrutural adotada se deveu ao fato de
que, como este é um prédio mais austero e cuja fundação estava construída
quando da definição do projeto, os engenheiros responsáveis preferiram manter
um padrão construtivo mais fácil de ser administrado, justamente pelo
conhecimento prévio que já se tinha dele.
As inovações ficam por conta dos elementos em ferro existente no
prédio como a escadaria (Il.66) e a estrutura que sustenta a cobertura da
clarabóia(Il.67). O guarda-corpo da escadaria também merece destaque, pois
apresenta um belo desenho de folhagens sinuosamente articuladas que remetem
ao art-nouveau, padrão semelhante, em estuque, se repete em meia parede ao
longo da escada.
Il. 63-Planta- baixa do terceiro pavimento
do Palácio dos Estados- Modificada pela
Engh° Sampaio Correia
193
Il. 64- Foto área do início do
século em que é possível ver a
distribuição do prédio do CPRM,
construído para abrigar o
pavilhão dos estados para a
exposição de 1908.
Il. 65- Levantamento realizado pelo CPRM - Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, na
década de 70 do século XX.
194
Il. 67 -Estrutura do Vitral do Domo. TOSATTO, Pierluigi.
Um palácio na história geológica brasileira. Brasília:
DNPM, 1994, p.s/nº
Il. 66 -Escadaria no interior do edifício.
TOSATTO, Pierluigi. Um palácio na história
geológica brasileira. Brasília: DNPM, 1994,
p.s/nº
195
4.3 PROJETO DE ARQUITETOS
4.3.1 V Batalhão da Polícia Militar
Localização: Pça Coronel Assunção S/N - Saúde.
Situação: Existente.
Data: 1908-1914
Projetista: Arquiteto Heitor de Mello.
Formação: Nascido no Rio de Janeiro em 12/09/1875, formou-se arquiteto pela
Escola Nacional de Belas Artes e dela tornou-se professor da Cadeira de
composição de Arquitetura, seu desenho e ornamentos em 1912. Durante as
duas primeiras décadas do século XX, seu escritório de arquitetura foi um dos
mais atuantes na cidade do Rio de Janeiro sendo responsável não apenas por
projetos importantes como o prédio do Jockey Club na antiga Av. Central, como
também por construções significativas da época como o prédio do Clube de
Engenharia, projeto de Raphael Rebecchi.
Histórico:
Projetado para abrigar o quartel da Polícia do bairro da Saúde, seu
projeto data de 1906, e consta da lista de obras assinadas por Heitor de Mello
166
.
A construção ocorreu entre 1908 e 1914. Em 1924 a planta foi levantada pelo
enghº Ed Sá, pois se pensava na ampliação do quartel com a aquisição dos
lotes adjacentes a este. Em 1932 foi então elaborado o projeto de ampliação que
fechou a antiga planta em U em um quadrilátero.
166
TERRA, Alcione. Heitor de Mello: trajetória e contribuição profissional na cidade do
Rio de Janeiro no período da Primeira República. Rio de Janeiro: Dissertação de Mestrado,
Fau/ UFRJ, 2004, p. 116.
196
Tipologia:
Assim como o prédio do Quartel Central do Corpo de Bombeiros,
descrito anteriormente, o edifício do V Batalhão da Polícia Militar também
obedece a mesma tipologia com sua planta distribuída em quadra que se fecha
em si, entorno de um pátio central. A reforma sofrida na segunda década do
século XX que aumentou a área construída do prédio, manteve a mesma
disposição garantindo assim uma ocupação que na verdade se mostra
perfeitamente adequada ao uso do prédio.
O estilo empregado está ligado aos modelos de prédios medievais que
remetem aos castelos, fortalezas e por associação as construções militares.
Descrição e Análise Arquitetônica:
Fachada principal
Prédio de dois pavimentos, onde o ângulo chanfrado na esquina
corresponde ao corpo central com feições acasteladas em que se destaca torre
central projetada sobre telhado com mansarda. No primeiro pavimento, porta
principal de acesso a veículos, em arco abatido com moldura em estuque
arrematada ao centro por cartela, uma janela de cada lado obedece à mesma
composição. No segundo pavimento, destacam-se os torreões, um em cada
extremidade encimados por tambor e corruchéu em seta.
As fachadas laterais ao corpo central são marcadas por cornija entre o
primeiro e o segundo pavimento, dividindo-se cada uma delas em três seções
por planos ressaltados nas extremidades. O térreo possui janela arco pleno
197
dividida em tramo de quadro ao longo das fachadas laterais e o segundo
pavimento dois pares de porta-janela com balaustrada, se distribuem nas
extremidades e entre elas distribui-se 14 janelas em arco abatido. Arrematando
os dois pavimentos, cimalha com dentículos.
Interior
Em forma de quadrilátero, o prédio apresenta amplo pátio interno, em
torno do qual se distribuem as alas. À entrada da porta principal, dois salões se
abrem de cada lado, ambos com escada que dá acesso ao segundo andar.
Il. 68- V Batalhão da Polícia Militar- Fachada
Principal
Il. 69- V Batalhão da Polícia Militar Fachada
Lateral.
198
O prédio do Batalhão da Polícia Militar foi construído inicialmente
com planta em U, como demonstra a ilustração 70, complementa o prédio
serviços anexos, mas que não fazem parte do corpo principal. Com a reforma de
1932 foi acrescido uma nova ala que fechou o conjunto em um quadrilátero
mantendo-se o pátio interno (Il.72 e 73). Descontando-se este acréscimo, o
prédio mantém a sua feição de pequeno palacete acastelado, inspirado nos
estilos medievais, que se faz notar mais claramente nas torres circulares
adossadas a fachada principal terminadas em setas e pelo tratamento dado ao
revestimento externo que alterna, no segundo pavimento tijolos à vista com
painéis estucados em argamassa com pintura branca( Il.68).
Neste prédio, como os demais estudados, é clara a adoção de um
estilo que possui uma identidade com o tipo de instituição que irá abrigar. Assim
como o prédio do Quartel Central do Corpo de Bombeiros, a inspiração nos
castelos medievais era tida como a mais adequada ao um prédio militar, o que
remete à questão de uma certa ordem, rigidez, hierarquia que caracteriza as
corporações.
O mesmo padrão, que um pouco menos medieval e mais
historicista na medida em que faz uso de um grande número de elementos
decorativos, foi adotado por Heitor de Melo do prédio da Polícia Central (Il.76).
Muito provavelmente neste prédio ele optou por seguir uma linha mais elaborada
sem marcar uma referência direta, como no prédio do Batalhão, pois ele tinha
como fim abrigar os serviços administrativos da polícia da então Capital da
República e portanto este deveria ganhar um aspecto mais de palácio do que de
Castelo.
199
No entanto, em ambos os prédios, o arquiteto tirou partido da
implantação em lote de esquina, colocando o corpo principal neste ângulo,
criando um acesso diagonal que tanto conduz ao pátio interno existente em
ambas as edificações com também é por este portão que se distribui os acessos
às demais dependências. A partir deste acesso, chega-se a um avarandado que
percorre todo o perímetro das edificações em torno do pátio interno. Apesar das
diferenças formais, os dois prédios apresentam a mesma distribuição dos
espaços em planta, condicionada inclusive pela adoção do pátio interno.
Infelizmente as plantas originais do Quartel da Saúde não foram
encontradas, mas o levantamento realizado na época da construção do
acréscimo (Il.72 e 73) ajudou a estabelecer as comparações entre as duas
edificações. Pelo padrão construtivo apresentado elas foram construídas em
estrutura alto-portante e o arquiteto Heitor de Mello teve atuação significativa na
elaboração das plantas estruturais, o que se comprova a partir das plantas de
detalhes dos alicerces, do prédio da Polícia Central, existentes no Arquivo
Nacional assinadas pelo arquiteto (Il.77 e 78).
Heitor de Mello atuou como projetista e construtor nos dois prédios
num período, em que é sabido, a atuação deste profissional foi intensa. Os
prédios são contemporâneos e apresentam solução em planta bastante
semelhante, portanto é bem possível que a mesma solução estrutural tenha sido
adotada por Heitor de Mello no prédio do Quartel da Saúde.
Porém o mais importante na comparação entre os dois edifícios é
perceber o conhecimento e o domínio que este arquiteto possuía tanto dos
aspectos técnicos que envolvem uma edificação como dos aspectos plásticos,
formais que envolvem o fazer arquitetônico.
200
ÁREA A SER
ACRESCIDA
Il. 70- Planta de levantamento do Quartel da Saúde datada de 02/1924.
201
Il. 71 – Legenda da planta de levantamento.
Il. 72 – Planta
do Quartel da
Polícia da
Saúde – 1º
Pavtº, acrescida
com os lotes
nº234/235.
202
Il. 73 – Planta do Quartel da Polícia da Saúde – 2º Pavtº, acrescida com os lotes
nº234/235.
203
Il. 74 – Elevação da Fachada acrescida..
Il. 75 – Fachada do prédio da Polícia
Central..
204
Il. 76- Planta-baixa 1º pavimento prédio da Polícia Central.
205
Il. 77 – Planta de detalhes dos baldrames.
Il. 78 – Planta de detalhes dos baldrames. Arquivo Nacional – 4T/MAP.689
206
Fazer este dominado por arquitetos formados na antiga Escola
Nacional de Belas Artes, num período de intensas modificações sociais e
econômicas na cidade do Rio de Janeiro em que a arquitetura era usada para
legitimar toda uma modificação urbana pela qual a cidade estava passando. O
conhecimento, tanto da linguagem arquitetônica característica do início do século
XX, quanto das técnicas pelos profissionais da construção civil foi fundamental
para estabelecer em curto tempo toda uma nova espacialidade para a cidade.
As ilustrações 53 e 54 mostram desenhos de detalhes construtivos assinados por
Heitor de Mello e que tratam desde aspectos técnicos/estruturais até definição de
paginação de piso.
Heitor de Mello foi um dos nossos maiores exemplos deste
profissional, que pode ser chamado, tal como os engenheiros da época, de
“arquiteto enciclopédico” uma vez que atuava em diversos ramos da construção
civil, assim como os engenheiros.
Il. 79 – Planta de detalhe da cúpula - Arquivo Nacional .
207
4.3.2 Procuradoria Geral do Estado
Localização: Rua da Relação,49 - Centro.
Situação: Existente.
Data: 1884-1887 e reformado entre 1909-1910
Projetista: Arquiteto Francisco Joaquim Bittencourt da Silva(1831-1911).
Formação: Considerado o maior discípulo de Grandjean de Montigny,
Bittencourt da Silva formou-se arquiteto pela Academia Imperial de Belas Artes.
Lecionou Arquitetura Civil de 1858 a 1888 na Academia. Associou-se ao Clube
de Engenharia em 15/05/1884. Foi o fundador da Sociedade Propagadora das
Belas Artes e do Liceu de Artes e Ofícios, que tinha por objetivo formar mão-de-
obra especializada nos ofícios ligados a tradição artesanal.
Il. 80 – Planta de paginação do piso. Arquivo Nacional .
208
Dentre seus projetos destacam-se: o Instituto Benjamim Constant, em Botafogo;
A reconstrução do Colégio Pedro II, no Centro; O Educandário de Santa Tereza,
em Botafogo; a Escola Amaro Cavalcanti, no Largo do Machado.
Histórico:
O prédio, situado à rua D. Manoel, entre a Rua Jacob do Bandolim e
Travessa Trajano de Carvalho, teve sua pedra fundamental lançada a 28 de
março de 1884. Construído em terreno da Coroa, cedido pelo Imperador D.
Pedro II, em 1883, a fim de que fosse construída a nova sede da Caixa
Econômica e Monte Socorro da Corte, fundada em 12 de janeiro de 1861. Esta
instituição tinha como missão conceder empréstimos e incentivar a poupança
Il. 81- Prédio da Procuradoria Geral do Estado – Foto Katia Maria de Souza-2006.
209
popular, o que atraiu nobres e principalmente escravos, que ávidos por
comprarem suas cartas de alforria, nela depositavam seus recursos
167
.
A Caixa Econômica funcionou nesse prédio até 1940. entre 1940 e 1960,
ali funcionou o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, para as
Varas de Acidentes de Trabalho, de Registro Civil e Casamentos,
chamados “Pretórios”.
Em 1960, passou a ser ocupado pela antiga Procuradoria Geral do Estado
da Guanabara. Com a fusão do Estado da Guanabara e do antigo Estado
do Rio de Janeiro, formou-se a atual Procuradoria Geral do Estado do Rio
de Janeiro, sendo sua sede transferida para o referido prédio, em 1979.
168
O projeto do edifício é de autoria do arquiteto Francisco Joaquim
Bittencourt da Silva, professor de arquitetura e desenho e um dos discípulos de
Grandjean de Montigny. Foi edificado entre 1884 e 1887. No projeto original
apresentava um corpo central em dois pavimentos e duas alas laterais com
apenas um pavimento(Il.82), compreendia ainda um pátio interno.
167
INEPAC – Processo de Tombamento nº e.18/00.10.16/2004, 03 de agosto de 2004, p.6.
168
INEPAC – Processo de Tombamento nº e.18/00.10.16/2004, 03 de agosto de 2004, p.7.
Il. 82 – Foto do prédio da
Caixa Econômica e Monte
Socorro, 1904 – Arquivo
Geral da Cidade do Rio de
Janeiro-
210
Durante os anos a edificação sofreu várias alterações, sendo a
primeira delas, entre 1905 e 1908, baseadas em um segundo projeto do próprio
Bittencourt da Silva, que acrescentou mais um pavimento nos corpos
laterais(Il.83). Em 1913, foram feitas as instalações elétricas e colocado um
elevador. Com a saída da Caixa Econômica em 1940, o prédio sofreu reformas
pra adaptação de uso pelo judiciário. Entre 1974 e 1979 foram realizadas
modificações internas para instalação da Procuradoria Geral do Estado do Rio de
Janeiro, e segundo o processo de tombamento do Inepac, muito provavelmente,
o pé direito duplo do primeiro e segundo pavimentos foram subdivididos, a
escada e a estrutura de ferro localizadas nas varandas do pátio interno e a bela
escada de madeira localizada no hall, teriam sido demolidos. Particularmente
concordo com este parecer do Inepac, pois analisando as cópias do projeto de
reforma deste período, é possível perceber que havia uma indicação de
demolição destes elementos e construção de outros. Infelizmente, por se tratar
de cópia heliográfica as convenções de Demolir- Amarelo, Construir- Vermelho e
Existente- Preto, empregadas nos projetos de arquitetura, não aparecem. Em
1980, o prédio sofreu mais uma significativa intervenção, ganhando um quinto
pavimento e uma edificação com quatro pavimentos foi erguida em seu pátio
interno para abrigar um auditório e várias salas.
Il. 83 – Foto do prédio
da Caixa Econômica e
Monte Socorro, 1942 –
Arquivo Geral da
Cidade do Rio de
Janeiro-
211
Tipologia:
Prédio eclético, que se aproxima das composições neoclássicas,
possui dois pavimentos divididos por cimalha. Com embasamento em cantaria
no tipo rusticação que se estende pelo corpo central da edificação até o segundo
pavimento, sendo delimitado por quatro pilastras que o divide em três seções,
cada uma contendo uma porta-janela com balcão, verga e sobreverga reta,
sendo a central encimada por frontão reto; ladeando o corpo central, duas
seções arrematadas por par de pilastras, seis portas-janela com balcão, em
verga e sobreverga retas. Finalizando o conjunto, platibanda com seções em
balaustrada, arrematada por quatro pináculos e um frontão central decorado
169
.
A composição obedece a uma solução típica a construções voltadas
aos serviços e atendimentos ao público. Importante lembrar que o prédio
inicialmente foi projetado para funcionar como uma casa bancária, mais voltada a
guardar as economias da população, neste sentido se aproxima tanto na questão
do estilo como na tipologia dos modelos de casas bancárias, porém seguindo
uma composição mais simples, diferente dos grandes prédios bancários que
apresentavam uma praça sob uma grande rotunda, tal como descrito
anteriormente quando da análise o prédio da Caixa de Amortização.
No atual prédio da Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro a
solução empregada por Bittencourt da Silva se assemelha aos modelos
apresentados por Durand, para este tipo de construção(Il.84) e com fachada
semelhante as composições neoclássicas empregadas nas primeiras casa
bancárias tal como o primeiro projeto para o Banco de Londres(Il.85).
169
PEREIRA, Sonia Gomes. Ecletismo Carioca – Inventário de arquitetura eclética carioca
de 1808 a 1910.
212
Il. 84- Prancha 14 do Précis des leçons d’architecture données à l’École Polytechinique, em que Durand
exemplifica a planata típica para prédios com vistas a funcionar como bolsa de valores e alfândega
Il. 85- Primeiro projeto par o
Banco de Londres.
213
Considerando que Bittecourt da Silva foi um arquiteto formado dentro
da mais clara concepção neoclássica, o projeto para uma casa bancária voltada
a salvaguardar as economias da população menos abastada, não poderia fugir a
regra, partido clássico e obedecendo aos preceitos da época.
Assemelha-se inclusive com o projeto de seu professor Grandjean de
Montigny para o prédio da Praça do Comércio do Rio de Janeiro(Il.86), que
segue uma composição inspirada na Antiguidade, como ressalta Gustavo Rocha-
Peixoto:
...Na composição interna há também uma evidente vontade ordenadora. É
naturalmente na Antiguidade que o arquiteto vai buscar a linguagem a ser
emprestada ao projeto, e o faz observando os edifícios romanos
destinados ao mesmo uso proposto para o projeto – as basílicas tribunícias
romanas.
Em Roma, a basílica era um edifício de uso múltiplo, destinado a funcionar
como mercado, banco, bolsa de valores, tribunal, praça coberta e parte
integrante de cada um dos complexos urbanísticos centrais do tipo fórum.
...Em seu programa arquitetônico, além das naves, achavam-se presentes
uma ou duas tribunas, por vezes situadas em êxedras semicirculares nos
lados menores do retângulo (como nas de Augusta Raurica ou Aspendos)
ou em pequenos nichos (como em Cosa) ou em plataformas ligeiramente
elevadas no interior da nave central (pompéia), opção adotada por
Grandjean.
170
170
PEIXOTO, Gustavo Rocha. Reflexos das luzes na terra do sol: sobre a teoria da
arquitetura no Brasil da Independência: 1808-1831. São Paulo : ProEditores, 2000, p.117
Il. 86- Planta-baixa da
primeira Praça do
Comércio do Rio de
Janeiro – 1820.
Grandjean de Montigny.
214
De fato a planta da basílica romana atende aos diversos usos dos
novos prédios públicos do culo XIX, ela é sempre referência para os
programas de necessidades destas edificações, que por serem voltados a
administração de serviços públicos devem possuir grandes halls e salas voltadas
para circulações dimensionadas para atender um número considerável de
pessoas. Durand sita a planta basilical quando descreve os modelos
apresentados no Precis, para Bourses e Courthouses.
Courthouses Among the ancients, those buildings in which justice was
administered were called basilicas; they consisted of a single vast hall, divided in
varius ways by rows of columns,…
Bouses - These buildings, also known as exchanges, are places where merchants,
brokers, and bankers assemble to trade in money and public bonds. Among the
ancients their purpose was served by the basilicas, which combined all their
functions and united all that had to do with commerce and with
men of business.
171
Descrição e Análise Arquitetônica:
Prédio de dois pavimentos divididos por cimalha. No térreo, em
cantaria no tipo rusticação, se destaca o corpo central separado dos laterais por
pilastras adossadas, e três portas em arco pleno, sendo a principal ladeada por
um pórtico toscano constituído por colunas soltas e uma arquitrave no mesmo
estilo(Il.87). Nos corpos laterais simétricos encontram-se três janelas também em
arco pleno com grades em ferro e respiradouros na parte inferior. No segundo
171
Casas de Justiça Entre os antigos aqueles prédios nos quais a justiça era administrada
eram chamados de basílicas, eles se consistiam de um único e vasto hall, dividido em vários
caminhos por corredores e colunas.... Bolsa de Valores Estes prédios, também conhecidos
como casa de câmbio, são lugares onde comerciantes, corretores e banqueiros se reúnem
para negociar dinheiro e títulos públicos. Entre o antigos este propósito era atendido pela
basílica, que combinava todas as suas funções e unia tudo que tinha que ser feito entre o
comércio e os homens de negócios. DURAND, op. Cit, p. 157 e 162.
215
pavimento, o corpo central, também em rusticação, é delimitado por quatro
pilastras de ordenação coríntia, em três seções, cada uma contendo uma porta-
janela com balcão, verga e sobreverga reta apoiadas por mísulas, sendo a
central encimada por frontão triangular, também apoiado por mísula, nas
extremidades do guarda-corpo foi colocada uma estatua de cada lado; ladeando
o corpo central, duas seções arrematadas por par de pilastras, seis portas-janela
com balcão, em verga e sobreverga retas, o conjunto forma um caixonete em
torno das portas e apenas este é em cantaria sendo o restante da fachada
revestida em massa e pintada. Acima janelas com duas folhas em vidro fazem
parte dos acréscimos sofridos pela edificação que lhe acrescentaram mais dois
pavimentos com a subdivisão do direito original. Finalizando o conjunto,
platibanda com seções em balaustrada, arrematada por quatro pináculos e um
frontão central decorado.
Nas fachadas laterais se repete a mesma composição, portas e
janelas em arco pleno com grades em ferro no rreo. No segundo pavimento,
dividido por cimalha, janelas em verga e sobreverga retas, encimadas por
pequenas aberturas, marcando um ritmo constante em que se repetem as
envazaduras numa secessão de cheios e vazios. Finalizando o segundo
pavimento, entablamento e platibanda com seções em balaustrada.
Il. 87- Pórtico Central-
Procuradoria Geral do
Estado
216
O prédio apresenta uma fachada clássica na concepção e na
aplicação dos ornamentos, obedece a uma ordem característica do
neoclassicismo, com certa simplicidade volumétrica, porém mesmo dentro desta
simplicidade apresenta elementos que demonstram que mesmo as edificações
mais próximas do neoclassicismo o na verdade eclética, sendo ele próprio, o
neoclássico, um eclético. No caso do edifício da Procuradoria Geral do Estado do
Rio de Janeiro, este ecletismo se apresenta no emprego de duas ordens
arquitetônicas sobrepostas, a toscana no primeiro pavimento e coríntia no
segundo, assim como no uso de portas e janelas em arco pleno no primeiro e
verga reta no segundo, que neste caso dá a composição características
renascentistas.
No interior, atualmente bastante descaracterizado, mas que a partir
das plantas por mim encontradas no Arquivo Nacional e que se referem às
adaptações feitas no prédio para instalação do Pretório, órgão ligado à Justiça, é
possível perceber que a edificação possui um partido arquitetônico comum a
prédios públicos, um hall central e escadaria na entrada e alas simetricamente
dispostas.
Esta forma de composição com corpo central nobre valorizado e duas
asas laterais mais ou menos longas, desenvolvendo-se com ritmação
binária simples, tornou-se canônica na arquitetura brasileira ....Grandjean a
utilizou na Academia de Belas Artes, seus alunos a usaram na Santa
Casa, no hospício dos Alienados Pedro II, no antigo Pretório(hoje,
reformado em sua volumetria original, abriga a Procuradoria Geral do
Estado, na rua d. Manoel).
172
No caso do prédio da procuradoria a escada se localizava à direita do
hall(Il.88), como comprovam as plantas existentes no Arquivo Nacional, e foi a
172
PEIXOTO, Gustavo Rocha. Op.cit., p.121.
217
partir dela que elaborei como seria a planta original do primeiro pavimento(Il.89),
uma vez que o prédio foi bastante adulterado ao longo dos anos.
Il. 88 – Detalhe da planta
existente no Arquivo
Nacional, em que é
possível identificar a
localização da escada
original.
Il. 89 – Planta-baixa
1º pavimento,
reconstituída a partir
da planta atual e da
planta existente no
Arquivo Nacional.
218
Quanto ao sistema construtivo, apresenta paredes auto-portantes,
constituídas de cantaria. Estas paredes se distribuem em todo o perímetro do
prédio e no módulo central, o que cria unidade entre planta-baixa e fachada, uma
vez que esta reflete a solução adotada em planta, ou seja um módulo central e
dois laterais. Solução típica de um racionalismo arquitetônico que tem raízes na
cultura clássica, da qual o ecletismo absorveu bastantes fundamentos.
4.3.3 Antigo Prédio do Jornal do Brasil
Localização: Av. Central - Centro.
Situação: Demolido.
Data: 1906
Projetista: Projeto de Arquitetura Original-Arquiteto João Ludovico Maria Berna.
Il.90 – Planta-
baixa atual do1º
pavimento.
219
Projeto Estrutural – Engenheiro João Felipe Pereira.
Formação: Arquiteto João Ludovico Berna- Italiano naturalizado brasileiro em
1887, mesmo ano em que obteve o prêmio de Viagem à Europa da Academia
Imperial de Belas Artes. Em 1897 assume a cadeira de arquitetura da Escola
Nacional de Belas Artes.
173
Engenheiro João Felipe Pereira Brasileiro, natural do Ceará nascido em 23 de
março de 1861, formou-se em 1888 pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro.
Foi admitido no Clube de Engenharia em 19 de setembro de 1896 e faleceu em
15 de maio de 1950.
173
UZEDA, Helena da Cunha. O ensino de arquitetura da Academia de Belas Artes: 1826-
1889. in 185 anos de Escola de Belas Artes, org. Pereira, Sonia Gomes. EBA/ UFRJ, Rio de
Janeiro, 2001/2002.
Il. 91 Fachada projetada
para o prédio do Jornal do Brasil
– Autor Ludovico Berna, 1906.
220
Histórico:
A pedra fundamental, do novo prédio do Jornal do Brasil, foi lançada em
14/10/1904, e no ano seguinte teve início a construção do prédio.
A história da construção e posterior demolição do prédio do Jornal do
Brasil, por volta da década de 70 do culo XX, está atrelada à própria história
do jornal.
O jornal foi fundado em 9 de abril de 1891, a sede ficava na rua
Gonçalves Dias, 56 no centro do Rio de Janeiro, era um pequeno sobrado com
três janelas e uma sacada
174
. Foi um jornal fundado por monarquistas, mas que
primava pela isenção e neutralidade. Alguns meses depois Joaquim Nabuco
assume a chefia da redação e a partir daí começaram a surgir os problemas com
os governantes. Os problemas com as posições políticas permaneceram mesmo
após o afastamento de Nabuco e sob o comando de um novo proprietário
também monarquista. Em abril de 1893, um novo grupo, ligado a Rui Barbosa,
comprou o jornal”
175
; a passagem de Rui Barbosa pelo jornal provocou diversos
conflitos com o governo republicano que terminaram com o fechamento do jornal
por um ano. Ele volta a circular em 1894 sob o comando dos irmãos Candido e
Fernando Mendes de Almeida, com proposta de ser uma publicação voltada para
as reivindicações cotidianas da população.
Com a abertura da Av. Central, atual Av. Rio Branco, marco fundamental
das transformações urbanas ocorridas no Rio de Janeiro do início do século XX,
o Jornal do Brasil também constrói nesta grande avenida a sua nova sede. As
obras começaram em 1905, mas o jornal passou a funcionar no local em
174
Jornal do Brasil, domingo, 16 de Abril de 2006, Caderno Especial, p.5
175
ibidem, para maiores esclarecimentos sobre a passagem de Rui Barbosa pelo jornal ver a
reprodução da reportagem nos anexos.
221
12/01/1910. A obra durou 5 anos, pois mesmo com uma boa vendagem a
construção da nova sede e a compra de novas máquinas trouxeram dificuldades
financeiras à empresa.
O prédio, projeto de Ludovico Berna, “era na primeira década do
século o mais alto da América Latina (Il.92) e o primeiro a ser construído com
estrutura metálica. Naquele tempo, era considerado um modelo de prédio para
jornal, sendo comum visitas de turmas da Escola Politécnica, principalmente
trazidas pelo profº João Felipe”
176
. O professor João Felipe referido na matéria
do jornal, era professor da Escola Politécnica e foi o autor do projeto estrutural do
prédio do Jornal do Brasil, conforme indicam as plantas encontradas no Arquivo
Nacional
177
, as únicas plantas existentes do prédio.
O prédio era composto por dois módulos, um frontal à grande avenida
com um total de 11 pavimentos e um módulo adjacente que se estendia para os
fundos do terreno com cinco pavimentos. No módulo frontal funcionavam então a
administração, a redação e demais serviços administrativos, aos fundos ficavam
as oficinas.
Segundo dados levantados nos arquivos do próprio jornal, a
administração ocupava dois pavimentos e os demais pavimentos eram alugados.
Com o crescimento do jornal, que se tornou uma referência jornalística para o
antigo Estado da Guanabara, e conseqüente expansão dos serviços, o prédio da
Av. Rio Branco, não tinha condições de abrigar o crescimento do jornal, e em
1965 a direção começou a procurar um novo terreno para construção de um
prédio moderno, chegando então ao nº 500 da Av. Brasil.
176
Jornal do Brasil, Rio de Janeiro 1988. Jornal do Brasil – Um jovem de 80 anos.
177
Arquivo Nacional - Comissão Construtora da Avenida Central – Envelope 37/656
222
Com a construção da nova sede, projeto do escritório de arquitetura
de Henrique Mindlin, o prédio da Av. Rio Branco foi demolido, cedendo aos
apelos das novas tecnologias e no caso específico da construção civil, a
especulação imobiliária, como demonstra a foto do prédio do JB na Av. Rio
Branco já cercado por prédios mais modernos em 1970 em que também é
possível observar a construção de anexos nas laterais da antiga torre(Il.93).
Atualmente já não existem nenhum dos prédios retratados nesta foto, estes
também substituídos por prédios modernos com seus panos de vidro na fachada.
Tipologia :
Prédio de linguagem eclética se destaca pela composição escalonada na
fachada, em que os últimos pavimentos foram compostos como um torreão. No
projeto original apresentava uma cúpula arrematando o prédio, que teria cinco
pavimentos, e que finalmente foi construído com um pavimento a mais no corpo
principal e mais cinco pavimentos que sobem de forma escalonada sendo
finalizado por uma cúpula semelhante ao projeto original.
Concebido como um prédio comercial segue a mesma orientação dos
primeiros edifícios voltados a uma empresa específica, como os primeiros
“arranha-céus” construídos na Europa e nos Estados Unidos. Nestes prédios
eram então empregadas as novas tecnologias adotadas na construção civil, o
uso do aço e o emprego de elevadores elétricos, o que se ajustava ao
desenvolvimento econômico da cidade moderna da passagem do século XIX
para o XX.
223
O prédio do Jornal do Brasil é um dos exemplares nacionais deste
momento, projetado inicial com cinco pavimentos, acabou sendo construído com
11 pavimentos sobre uma estrutura metálica.
Il. 92 – Acima, vista lateral em que se vê o torreão e ao
fundo os andares reservados as oficinas; e a direita foto
após a inauguração, período em que o prédio era o ais alto
da Avenida Central.
224
Il. 93 – Foto do prédio do Jornal do Brasil anos
70 do século XX.
Acréscimos
construídos nas
laterais
225
Descrição e Análise Arquitetônica:
Prédio inicialmente projetado com 5 pavimentos no módulo frontal
arrematado por cúpula em estrutura metálica, e 4 pavimentos no módulo que se
estende para os fundos do terreno; sofre alteração de projeto em que o corpo
correspondente à fachada frontal passou a ter 5 pavimentos colados nas divisas
do terreno e mais 5 pavimentos afastados simetricamente das laterais, criando
uma composição em forma de torreão, sendo este então arrematado por cúpula
metálica(Il.94).
No corte da frontaria representado junto à planta de fachada, é
possível perceber que esta foi tratada como um elemento independente do
restante da edificação. Obedece a uma lógica compositiva própria em termos de
distribuição dos volumes. Este aspecto realmente comprova que o projeto de
fachada foi pensado plasticamente com o objetivo de atender às exigências
formais do período. No entanto ao se analisar com mais cuidado o corte, verifica-
se que o tratamento dado à fachada apresenta harmonia com o restante da
edificação. No desenho é possível perceber que a cantaria e/ou alvenaria da
fachada foi dimensionada para receber a estrutura metálica com a qual o prédio
foi construído(Il.95), o que também se comprova com a análise do corte
longitudinal ao prédio(Il.96).
226
Il. 95 Detalhe do corte da fachada em que foram ressaltadas as vigas metálicas e os
apoios as mesmas. Destaque demarcado por Katia Maria de Souza.
Il. 94 Fachada e corte da mesma, acrescida
em 6 pavimentos.
227
Neste corte também é possível verificar que mesmo a fachada sendo
tratada plasticamente como um elemento formal com características particulares,
ela não se distancia da obra arquitetônica, uma vez que seus elementos
compositivos se integram com o corpo do prédio, seja pelas soluções de
engenharia como pelos ornamentos em si, já que estes se repetem no interior do
prédio integrando-o com o exterior.
O que desejo esclarecer aqui é que apesar da fachada ter sido
elaborada independente do corpo do prédio, ela era pensada para se integrar ao
restante da edificação, seja pelo uso de ornamentos que se repetem no interior e
exterior, seja pela solução estrutural que era adotada. Outro fator que se deve
considerar é que toda e qualquer abertura de vãos na fachada interfere no
Il. 96 Corte longitudinal do projeto com 5 pavimentos, em que foram destacados os
apoios das vigas e a fundação. Destaque demarcado por Katia Maria de Souza.
228
interior de uma edificação, de modo que mesmo sendo esta pensada separada
do corpo do prédio ela irá determinar a distribuição dos espaços internos, ou seja
interior e exterior por mais que se queira nunca estão dissociados e sempre irão
interferir no outro, alguns com boas soluções outros nem tanto, pois está é por
fim a atribuição da arquitetura, pelo menos da boa arquitetura.
Sendo assim, toda uma história da arquitetura que acusava os
arquitetos formados pelas academias de meros “fachadistas” não se sustenta,
quando analisamos mais detalhadamente o projeto do prédio do Jornal do Brasil
e as fotos deste, demonstrando que o projeto buscou integrar interior e exterior.
A fachada realmente foi pensada obedecendo ao vocabulário formal eclético,
porém dentro da própria composição também foi pensada a integração desta
com o restante do edifico, não apenas com o emprego dos ornamentos que se
apresentam interna e externamente, mas principalmente na união entre
alvenaria/cantaria com a estrutura metálica. É possível perceber que a cantaria
foi dimensionada com um rebaixo no qual se encaixa a viga metálica,
procedimento este comumente usado na construção de pontes. Sobre as vigas
metálicas foram engastadas vigas, também em ferro, com secção menor, em que
os panos de laje foram então apoiados. Esta solução permitiu o
dimensionamento de lajes mais esbeltas, que eram revestidas com paginação de
diferentes tipos de ladrilho hidráulico(Il.97).
No interior do prédio há uma nítida diferenciação nos tratamentos
plásticos e de revestimentos, dados aos espaços de trabalho. Como o prédio é
formado por dois blocos, no corpo da frente a decoração e os materiais utilizados
eram mais elaborados e até a estrutura metálica recebia um acabamento plástico
de modo a camufla-la; no módulo que se estende para os fundos do terreno, não
229
num tipo de decoração, as treliças e perfis metálicos que constituem a
estrutura ficaram totalmente a vista, o que confere ao ambiente o aspecto de
fábrica e/ou oficina que ele realmente é, pois ficavam as máquinas e demais
equipamentos necessários para a feitura do jornal(Il.98).
Il. 97 Diferentes tipos de ladrilho hidráulico utilizados no prédio do Jornal do Brasil. Acima à
direita piso das áreas administrativas, abaixo piso das oficinas, no centro ao lado piso e tabeira
andar superior e último à esquerda tabeira das áreas administrativas.
Il. 98- Foto
da Oficina.
230
Uma característica bastante interessante do prédio, que é possível
perceber na planta de corte longitudinal (Il.96) e transversal (Il.99), comprovado
também pelas fotos, é a existência de iluminação zenital através de uma
clarabóia, para isso todos os pisos foram vazados de forma que a iluminação
atingisse o térreo. Esta solução se deu tanto na área nobre da edificação quanto
nos espaços reservados aos trabalhos mais sujos e pesados.
O hall de entrada é extremamente refinado e mesmo com a estrutura
metálica aparente esta recebe um tratamento plástico mais elaborado em que os
pilares e colunas de sustentação são terminados por capitéis compósitos e
jônicos respectivamente, a trama formada pelas vigas de apoio do piso superior
Il. 99 Corte A-B e C-D, transversais a edificação. Destaque para a estrutura metálica de
apoio a clarabóia. Setas indicativas feitas por Katia Maria de Souza.
Iluminação Zenital
Estrutura Metálica
231
também recebe acabamento de frisos longitudinais na face inferior da viga e no
encontro com a laje tal como uma sanca, o que lhe fornece maior sobriedade e
refinamento(Il.100). A caixa dos elevadores, toda em ferro, também recebe
aplicação de elementos decorativos com formas sinuosas derivadas da natureza,
numa clara inspiração Art Nouveau(Il.101). No entanto, ainda no primeiro
pavimento prevalece uma decoração mais sóbria em que se destacam os
ornamentos inspirados na arquitetura clássica tal como colunas com caneluras,
capitéis, frisos, guirlandas e festões (Il.102).
Il. 100- Recepção
do Jornal do
Brasil. Observar
trama das vigas e
abertura para
passagem da
iluminação natural.
232
Il. 101 – Hall dos elevadores. Destaque para a estrutura das caixas dos elevadores.
233
A partir da análise das fotos é possível notar que este tratamento
decorativo foi mantido nos demais pavimentos, sendo que nos pavimentos
Il. 102 – Vestíbulo visto a partir da recepção. Destaque para os ornamentos tais como
guirlandas e festões que envolvem as colunas.
234
superiores ainda se destaca o guarda-corpo em torno do vão existente na laje,
que na representação em desenho seria uma simples balaustrada composta por
chapa redonda e corrimão simples, mas que foi empregada na área das
oficinas. No trecho do prédio reservado aos serviços administrativos, o guarda-
corpo é robusto, alternando uma balaustrada decorada por feixes de folhagens
entrelaçadas e prisma que recebeu tratamento tal como um pedestal,
arrematando todo o conjunto, peitoril em mármore branco (Il.103).
Na abertura para passagem da iluminação zenital, percebe-se que a
viga metálica transpassa o vão, modulação esta que se repete até o último
pavimento, sendo que neste a viga recebeu um tratamento decorativo constituído
por sulcos verticais, que se estendem às demais vigas do teto em torno da
clarabóia; acima delas um friso faz a vez de platibanda, ricamente decorada com
guirlanda e arabescos simetricamente dispostos separados por mascarões, ao
centro de cada friso foi inserida uma cartela, em cujo centro encontrava-se
representado símbolos marítimos, todo o friso foi arrematado por moldura em
feixe lictório. Por sobre este friso, repousa a clarabóia guarnecida de vitral, tendo
ao centro decoração em figuras geométricas e nas laterais festões e flores.
Interessante observar que os ornamentos mascaram a estrutura
metálica, e neste sentido adota um procedimento bastante comum na época,
uma vez que era hábito esconder a estrutura em ferro e conferir ao conjunto uma
certa nobreza clássica. E em particular, a partir da análise do ornamento aplicado
no centro da cartela e da insígnia colocada no centro do vitral localizado no hall
do andar, CN(Il.104). Conclui-se que esta decoração mais elaborada e luxuosa
foi executada pela Companhia de Comércio e Navegação que ocupou alguns
235
andares do prédio até o ano de 1937/38, como consta na própria história do
jornal
178
.
Apesar de todo este luxo no pavimento ocupado pela Cia de Comércio
e Navegação, as estruturas de ferro aparente nos pavimentos pertencentes ao
jornal, também receberam um tratamento decorativo, embora menos luxuoso,
eles ressaltavam a leveza dos ornamentos em ferro, como se pode notar no
pavimento térreo, de acesso ao prédio, em que colunas mais esbeltas são
envolvidas por fitas metálicas (Il.102). Porém são nas áreas menos nobres que
podemos perceber o emprego das estruturas em ferro sem nenhum tipo de
tratamento para disfarçá-las e notar que elas eram feitas dentro da linguagem
empregada na época, colunas com caneluras com detalhe transversal em
moldura que a dividia em duas partes dando a parte inferior à impressão de uma
base (Il.105).
178
Jornal do Brasil, op.cit., p.
236
Il. 103 – Pavimento superior.
Il. 104 – Detalhe da cartela.
237
As plantas, por mim encontradas entre a documentação da Comissão
Construtora da Av. Central (Il.106), são com a modificação do projeto, porém,
a partir da análise delas, da planta de corte e da fachada, juntamente com as
fotos existentes, é possível concluir claramente que o corpo frontal, voltado para
a Av. Central, atual Rio Branco, estava bem demarcado do restante do prédio
destinado à tipografia do jornal.
Mais uma vez o que ressalta na análise da planta é a sua confecção;
que pensou o espaço para o fim ao qual ele foi projetado. Sem dúvida alguma, a
solução de se criar uma iluminação zenital demonstra a preocupação com a
iluminação num terreno estreito e aproveitado em sua extensão máxima. Além
de conferir às instalações destinadas às oficinas o caráter de uma indústria, em
que as áreas de produção são grandes vãos por onde se distribuem as diversas
Il. 105 – Hall de acesso de serviço.
Destaque para as colunas em ferro com
caneluras.
238
etapas desta. No caso do JB, as áreas de produção foram distribuídas
verticalmente, mas todas ficaram integradas a partir do momento em que as lajes
foram vazadas criando praticamente um pátio interno.
Il. 106- Planta-baixa ou térreo, e pavimentos, desenhados da direita para a esquerda. No ou
térreo o acesso ao prédio está centralizado ladeado por áreas destinadas a lojas. Uma escada à direita
conduz ao segundo pavimento, ao fundo ficam as oficinas. No segundo pavimento duas escadas
conduzem aos demais andares. Ao centro está demarcado o vazio destinado à iluminação natural.
239
A fachada marcada por forte linguagem eclética foi dividida em seis
tramos verticais separados por cimalhas. Embasamento em bossagem, com sete
portas em verga reta sendo três portas ao centro em grade de ferro trabalhada
com motivos florais, nas laterais dispostas simetricamente uma porta, mais
estreita, com bandeira em grade de ferro e folha tipo de enrolar e uma porta
também com bandeira em grade de ferro e folhas de madeira almofadada. Neste
tipo de disposição dos acessos, principalmente por se tratar de lote estreito e
geminado, percebe-se que foi dado ao acesso principal, ao centro, um destaque
maior que se mantêm no restante da fachada, dividindo-a também em um
módulo central e dois laterais, o que possibilitou distribuir os acessos às áreas
das oficinas pelas laterais.
Nos tramos superiores a modulação em três portas/janelas ao centro
foi mantida assim como a separação da modulação por elementos decorativos
que remetem a rusticação adotada no embasamento.
No entanto, é importante ressaltar que os ornamentos apresentados
no projeto dão destaque aos elementos em ferro presentes na fachada, tais
como nas grades das sacadas, estatuária com luminárias, os pináculos em lança
colocados nas arestas do peitoril em torno da torre e a própria esfera, na qual se
gravaria o nome do jornal, que arremata o torreão. Neste sentido é cabível
colocar que o projeto da fachada ressaltava, mesmo fazendo uso da linguagem
eclética, o material empregado na estrutura do prédio, o que confere uma
harmonia entre interior/ exterior, ou seja, a fachada não foi pensada dissociada
do restante da edificação e da função que esta teria, um jornal, que necessita de
espaços administrativos e de oficinas.
240
Infelizmente o prédio construído não obedeceu fielmente o projeto,
alguns elementos foram suprimidos e o conjunto formado pelo torreão e cúpula
sofreu alterações. Tenho conhecimento de dois projetos de fachada, um
apresentado no Álbum da Avenida Central e outro arquivado no Arquivo da
Cidade do Rio de Janeiro, com data de 12 de Julho de 1907, sendo que este
último está mais próximo do foi efetivamente construído e é dele que falo no
parágrafo anterior.
Ainda há um desenho com uma modificação para o coroamento dos
primeiros 5 pavimentos (Il.107) e o que foi efetivamente construído. Para melhor
compreensão destas alterações veja no final do texto as duas versões de
fachada, a modificação no coroamento e a fachada construída.
No prédio construído, o módulo do torreão ganhou uma cúpula de
forma bulbosa encimada por esfera, tal como uma lanterna, no qual se assentava
a esfera com o nome do jornal, solução esta muito semelhante ao primeiro
projeto. Do segundo então permaneceu o escalonamento dos cinco últimos
pavimentos, no projeto são seis, dando forma de torreão e entre as janelas em
verga reta encimadas por bandeira em arco pleno, o relógio representado em
projeto foi substituído por um óculo(Il.108).
O pavimento suprimido no módulo do torreão foi acrescentado no
corpo principal do prédio, que, em projeto, seria térreo e mais quatro e passou a
ser térreo e mais cinco. Ainda diferem o tratamento dado ao módulo central, que
em projeto somente o segundo e terceiro pavimentos eram ladeados por
alvenaria de bossagem semelhante a cunhais e no terceiro e quarto pavimentos
por coluna com capitel coríntio. Na construção, então, todo o módulo central foi
ladeado por alvenaria de bossagem. Separando os seis pavimentos que se
241
estendem até as laterais do terreno do módulo escalonado do torreão, uma
cornija sobre a qual foi aplicado no centro um tímido frontão interrompido com
volutas.
Il. 107 Desenho modificando o coroamento
dos 5 primeiros pavimentos abaixo da torre.
242
O que se depreende das alterações executadas durante a construção
é que a unidade e leveza apresentada em projeto se perderam, resultando num
conjunto mais pesado, em que as expressões de uma arquitetura que buscava
unir a linguagem historicista do ecletismo à fluidez do ferro não tiveram sucesso.
Porém as razões que levaram ao abandono de tais soluções não
invalidam a concepção do projeto e demonstra que este apresentava uma
coerência, que infelizmente talvez por razões financeiras, devemos lembrar que
a instituição sofreu alguns reveses durante a construção do prédio
179
, foi
decidido lançar mão de uma ornamentação com menos elementos metálicos,
reconhecidamente mais dispendiosos, uma vez que necessitavam de uma mão
de obra especializada, não muito diferente da realidade atual.
179
Eternamente moderno, 1901-1915 – O jornal atravessa o novo século, Jornal do Brasil,
domingo, 16 de abril de 2006, p.5,
243
Il. 108 – De cima para baixo: 1ª Fachada apresentada à Comissão Construtora da
Av. Central. No centro segunda fachada apresentada já com alteração no número
de pavimento e finalmente a fachada efetivamente construída.
244
Coroamento da 2ª fachada
Coroamento modificado da 2ª fachada
Coroamento construído
Ilustração 109 De cima
para baixo: Coroamento
da 2ª fachada, ao centro
modificação da fachada e
do coroamento e o
coroamento construído.
245
Estudando e levantando a história de cada um destes prédios, vendo
os projetos, visitando cada prédio, sentindo o espaço, os materiais empregados,
percebendo como cada um deles nasce do chão e marca o seu entorno, com
exceção do prédio do Jornal do Brasil, é claro notar as semelhanças no
tratamento formal e estrutural destas edificações.
Todos os prédios apresentam de um modo geral uma tendência
acadêmica, na medida em que obedece aos parâmetros da linguagem
arquitetônica estabelecida, mas ao enfatizar os processos construtivos, mesmo
lançando o do repertório tradicional de forma a atender aos pressupostos
teóricos, é possível notar que eles buscaram e implantaram a sua verdade
construtiva. O que remete a uma tradição racionalista, que se iniciou com base
no desenvolvimento da ciência e que ficou mais claramente marcada na
formação da engenharia e que aqui também se apresenta na arquitetura.
Neste sentido, a atuação dos engenheiros foi importante, pois
motivou os arquitetos a buscarem se estabelecer neste novo cenário, aliando a
sua sensibilidade estética e o prazer de olhar, um prazer que em grande parte
não excluí as invenções das novas combinações, nem as tentativas de
racionalização, que se manifestam nos prédios estudados, constituindo eles
próprios o verdadeiro documento desta interação entre arquitetos e engenheiros.
5- CATÍTULO 4- CONCLUSÃO
A arquitetura do final do século XIX e início do XX reflete as
transformações sofridas nas cidades e na sociedade do século XIX. Com o
surgimento de uma nova classe social disposta a investir na cidade foi feita uma
associação entre estes e os novos governos que assumem o controle do estado,
instaurando novas formas de gestão pública oposta aos regimes conservadores
anteriores. O resultado desta mudança, segundo Leonardo Benevolo
180
, é a
cidade industrial pós-liberal, cujo principal modelo é a reconstrução de Paris de
Haussmann, que se baseia num acordo entre a iniciativa privada e a instituição
pública(o poder constituído), reconhecendo o domínio de cada um.
Toda esta estrutura precisava de uma cobertura cultural que é dada,
então, pelos profissionais da construção civil, os engenheiros e os arquitetos.
Inicialmente, acreditava-se que aos engenheiros foi reservado o poder da
ciência e do conhecimento das novas tecnologias, enquanto aos arquitetos era
delegado uma liberdade plástica e formal permitida pelos novos caminhos da
história, acreditando-se que eles não acompanhavam as novas técnicas.
Por muito tempo, até meados do século XX esta foi uma verdade
sedimentada, porém agora podemos questioná-la. A arquitetura e os arquitetos
estavam atentos às mudanças e influíram na construção e principalmente na
180
Leonardo Benévolo discute as questões relacionadas entre cidade, arquitetura e arquiteto,
após a Revolução Industrial numa perspectiva de entender o desenvolvimento da cidade e da
arquitetura modernas. BENEVOLO, Leonardo. A cidade e o arquiteto. São Paulo :
Perspectiva, 1991.
247
passagem para a arquitetura moderna. Interessante observar que, apesar da
sua aparente alienação, eles contribuíram de forma decisiva na construção da
cidade moderna do século XIX, com sua arquitetura de referências historicistas.
No Brasil não foi diferente, principalmente no caso do Rio de Janeiro,
que, por ser capital da República, deveria apresentar uma feição mais
condizente com o novo regime e com a modernidade do período. As vantagens
e desvantagens da reforma Pereira Passos já foram devidamente estudadas e
levantadas pela historiografia recente, ressaltando em alguns casos o papel da
arquitetura eclética na consolidação desta reforma.
A arquitetura eclética fornecia as bases necessárias à leitura mais
rápida e apurada da edificação, uma vez que faz uso de um repertório histórico
de fácil decodificação pelo usuário, permitindo uma compreensão imediata do
edifício, que, por sua vez, provoca uma determinância espacial e uma relação
com o seu entorno, seja pelo uso de grandes avenidas privilegiando as
perspectivas, seja com as grandes praças que permitem a fruição do espaço
urbano em si, como dos monumentos à sua volta.
Esta sensibilidade aliou as novas relações construtivas ao
conhecimento da teoria clássica e sobre este ângulo a teoria clássica se revela
plena de interesse. O detalhe das ordens, o capitel e suas molduras, que figuram
nas páginas de todos os tratados, constituem os elementos da verdadeira
aprendizagem da percepção. Os arquitetos não hesitaram em pesquisar
soluções inéditas e nem mesmo simplificar suas ordenações, a fim de facilitar a
sua execução na obra. A teoria clássica propõe um modelo susceptível de
adaptações e é ela que conduzirá ao novo.
248
Deste modo, trabalhei com duas hipóteses alternativas:
1- A primeira hipótese se baseia na interpretação tradicional de que
os engenheiros já fariam uma arquitetura moderna, baseada nos conceitos de
uma racionalidade que segue mais para o sentido de uma lógica construtiva do
que o racionalismo arquitetural de Labrouste ou Viollet-le-Duc. Porém,
confrontando a produção de arquitetos e engenheiros, verificam-se pontos que, a
princípio, não se enquadram neste pensamento, pois os projetos apresentam
muito mais semelhanças que diferenças. E neste caso construí uma segunda
hipótese, 2- que aponta para o fato de que tanto arquitetos como engenheiros
estavam atentos às inovações da época, manifestando isto nos seguintes
aspectos: uso de estruturas em ferro; distribuição dos espaços de forma racional
privilegiando as circulações e a criação de prumadas de serviços; adoção de
soluções de aeração com abertura de vãos e orientação que favoreçam a
circulação dos ventos; o uso do ornamento dentro de um pensamento em que se
busca um harmonia com o prédio e o aspecto que se pretende dar a ele,
conseguindo assim, adequar as partes com o todo, unindo programa, forma e
função.
Cabe ainda ressaltar, no âmbito das hipóteses, a questão da
formação destes profissionais que se dava em escolas distintas, mas que na
verdade se complementavam, na medida em que compartilhavam seus
conhecimentos dentro de cada escola através do intercâmbio entre os
professores da Escola Politécnica e da Escola Nacional de Belas Artes.
249
Este intercâmbio, no meu entendimento, auxiliou a suprir as
deficiências de ambas as escolas, que, durante o último quartel do século XIX e
nas primeiras décadas do século XX, sofreram reformas em seus programas de
ensino, buscando implantar um ensino mais consistente.
Sendo assim, a primeira hipótese - que se baseia na interpretação
tradicional de que os engenheiros já fariam uma arquitetura moderna, apoiados
nos conceitos de uma racionalidade, que seguem mais para o sentido de uma
lógica construtiva do que o racionalismo arquitetural de Labrouste ou Viollet-le-
Duc não é de todo verdade, pois o conhecimento destes profissionais vai além
de um racionalismo construtivo. E no caso da arquitetura eclética, eles também
conheciam os elementos compositivos, ou seja os ornamentos e sua aplicação
tanto nas edificações mais nobres como nas de caráter mais industrial, como
armazéns e fábricas ou até mesmo nas chamadas obras de arte, as pontes e
viadutos.
Na verdade, como já apontava a segunda hipótese, tanto arquitetos
como engenheiros estavam atentos às inovações da época, conheciam as
soluções de projeto na distribuição dos espaços, o emprego dos novos materiais
construtivos assim como dominavam a linguagem arquitetônica vigente e os
elementos compositivos.
É exatamente este conhecimento dos diversos elementos que
constituem o fazer arquitetônico que é possível perceber nos prédios estudados,
sendo este ou aquele projetado por engenheiro ou arquiteto, o tratamento dado à
edificação ira sempre obedecer aos parâmetros construtivos utilizados na época,
a linguagem adequada a cada tipo de edificação, demarcando exatamente o fim
a que se destina, numa clara relação com a questão da conveniência, que
250
orientou a produção arquitetônica do século XIX. As plantas tanto obedecem à
sua tipologia, quanto também mostram o conhecimento que estes profissionais
tinham na distribuição dos usos aos quais os espaços estavam destinados. Nos
prédios colados nas laterais do terreno, houve preocupação com a iluminação e
ventilação como acontece com prédio do Jornal do Brasil.
As soluções estruturais empregadas me parecem mais relacionadas
à própria tipologia do prédio do que a um desconhecimento de novas soluções,
como se pode perceber comparando-se o prédio do CPRM com o prédio da
Procuradoria do Estado, e a mesma linguagem e mesma solução estrutural,
talvez se deva pelo fato também de serem, com relação ao projeto, os mais
antigos do grupo (ver tabela no Anexo VI).
No entanto é notável verificar que um arquiteto tinha pleno
conhecimento das soluções estruturais, chegando inclusive a detalhar as vigas
baldrames, como o fez Heitor de Mello no prédio da Polícia Central e Ludovico
Berna ao já representar no corte da fachada do Jornal do Brasil o recorte de
apoio à estrutura metálica na cantaria.
Do mesmo modo, é interessante perceber que os engenheiros
sabiam ordenar os diversos elementos ornamentais para dar a edificação o
caráter pretendido. A sobriedade impressa ao prédio da Caixa de Amortização,
as características de castelo medieval dado ao corpo principal do Quartel Central
do Corpo de Bombeiros, linguagem esta também utilizada por Heitor de Melo do
Quartel do 5º Batalhão da Saúde, portanto ambos profissionais perfeitamente
atentos e integrados às questões formais e construtivas da época (ver tabela no
Anexo VI).
251
O que se conclui é que tanto o arquiteto quanto o engenheiro, apesar
de passarem por escolas distintas, possuíam embassamento suficiente para
atuar nas diversas áreas da construção civil, indo desde o projeto até a
construção, sem hesitar ao usar uma e outra solução formal ou estrutural de
acordo com a função à qual o prédio era destinado, deixando claro o
conhecimento que ambos possuíam das questões relativas a arquitetura do
século XIX início do XX.
A conseqüência disto foi a formação de um grupo de profissionais
que se complementavam na formação, mas que se igualavam na produção,
como se pode ver ao analisarmos os exemplos de arquitetura elaboradas por
arquitetos e engenheiros nesta passagem do século XIX para o XX.
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Revista da Semana. Rio de Janeiro: C. Malheiro Dias, 1904-1906.
Revista Kosmos. Rio de Janeiro, nov., 1906.
Revista Renascença. Rio de Janeiro.
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Arquivo Nacional:
Polícia Central – Croquis – 1º e 2º Pavtº - Escala – 1:200 – Ref. 4T/MAP.689.
259
Planta 1º Pavtº. – Escala - 1:100 – Ref. 4T/ MAP.690.
Detalhe da Cúpula – Escala – 1:20 – Ref. 4T/MAP.692.
Plantas dos Edifícios destinados a Estação Central do Corpo de Bombeiros,
Capital Federal – 1894 – 4T/MAP.49.
Obras da nova Caixa de Amortização – 4T/MAP – Set. 1898 – 4T/MAP.54.
Polícia Militar do Distrito Federal – Quartel da Saúde do 5º Batalhão – Elevação da
Fachada – 4T/MAP.727, 728, 729, 730 e 731.
Comissão Construtora da Avenida Central: - Jornal do Brasil – Envelope 37/656.
Clube de Engenharia:
Atas de Reunião do Clube de Engenharia – 1896-1903.
Revista do Clube de Engenharia – 1887-1920
Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro:
Relação de Engenheiros e Agrimensores que teem títulos registrados na
Directoria das Obras Públicas - (Documento nº 78-5-15)
260
ANEXO I
RELAÇÃO DE ENGENHEIROS FORMADOS PELA ESCOLA POLITÉCNICA
DO RIO DE JANEIRO QUE EXERCERAM CARGOS PÚBLICOS E/OU
FUNÇÕES NA POLÍTICA ESTADUAL E/OU FEDERAL.
Christiano Benedicto Ottoni (1811-1896) – Cursou a Escola Militar e
diplomou-se engenheiro em 1837. Foi Deputado e Senador no Império e na
República.
Henrique Pedro Carlos de Beaurepaire-Rohan (1812-1894) – Diplomou-
se engenheiro pela antiga Escola Militar. Foi presidente das Províncias do Pará
e da Paraíba, Ministro da Guerra e Ministro do Supremo Tribunal Militar.
Francisco Pereira Passos (1836-1913) – Cursou a Escola Central e
diplomou-se engenheiro em 1856. Foi Prefeito do Rio de Janeiro de 1903 a
1906.
Jerônymo Rodrigues de Moraes Jardim (1838-1916) – Cursou a Escola
Central e diplomou-se engenheiro em 1858. Foi ministro da Viação e Obras
Públicas em 1898.
André Gustavo Paulo de Frontin (1860-1933) – Cursou a Escola
Politécnica e diplomou-se engenheiro em 1879. Foi Prefeito do Rio de Janeiro
em 1919, foi ainda Deputado Federal e Senador.
Francisco Paes Leme de Monlevade (1860-1945) - Cursou a Escola
Politécnica diplomou-se engenheiro em 1882. Foi Secretário de Viação e Obras
Públicas de São Paulo.
Carlos César de Oliveira Sampaio (1861-1930) – Cursou a Escola
Politécnica diplomou-se engenheiro em 1880. Foi Prefeito do Rio de Janeiro
em 1920.
Jose Mattoso Sampaio Corrêa (1875-1942) – Cursou a Escola
Politécnica e diplomou-se engenheiro em 1898. Foi Deputado Federal em
1818, Senador de 1921 a 1927, fez parte da Assembléia Constituinte de 1934.
Miguel Calmon du Pin e Almeida (1879-1935) – Cursou a Escola
Politécnica e diplomou-se engenheiro em 1900. Foi Secretário e Agricultura e
Viação da Bahia, Ministro da Viação (1906-1909), Ministro da Agricultura
(1922-1926), Deputado Federal e Senador.
FONTE - TELLES, Pedro Carlos da Silva. História da engenharia no Brasil – Século XIX.
Rio de Janeiro : Clavero, 1994.
____________. História da engenharia no Brasil – Século XX. Rio de Janeiro: Clavero,
1994.
261
ANEXO II
DECRETO DA CRIAÇÃO DA ESCOLA POLITÉCNICA EM 1874
262
ESTATUTOS DE ESCOLA POLITÉCNICA PUBLICADO EM 1895
263
264
265
266
267
268
FONTE: PARDAL, Paulo. Memórias da Escola Politécnica, Rio de Janeiro: UFRJ e
Xerox do Brasil, 1994.
269
ANEXO III
Quadros com relação de disciplinas e professores da Escola Nacional de
Belas Artes e da Escola Politécnica, separado por ano. Nestes quadros foram
relacionadas apenas as disciplinas complementares na formação de cada uma
das categorias profissionais; ou seja no Curso de Arquitetura da Escola Nacional
de Belas Artes foram destacadas as disciplinas relativas às ciências exatas tais
como Cálculo, Geometria,Técnicas e Matérias de Construção que na sua maioria
eram ministradas por engenheiros. No Curso de Engenharia Civil da Escola
Politécnica foram listadas as disciplinas relativas representações gráficas,
desenho e teoria.
1890
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Desenho
Geométrico
Engº Paulo Cirne Maia Desenho
Organográfico- (1º
Ano Curso Geral)
Rodolpho Amoedo
Arquitetura Civil – (1º
ano Curso Engª Civil)
Engº André Pinto
Rebouças
Trabalhos Gráficos –
(2º Ano Curso de
Engª Civil)
Engº Paulo Cirne
Maia
270
1891
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Desenho
Geométrico
Vago Desenho
Organográfico- (1º
Ano Curso Geral)
João Maximiano
Mafra
Desenho de
Ornato
Vago Arquitetura Civil – (1º
ano Curso Engª Civil)
Engº Viriato
Belfort Duarte
Arquitetura Vago Trabalhos Gráficos –
(2º Ano Curso de
Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
1892
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Desenho Linear Engº Arqº Henrique
Bahiana
Desenho
Organográfico- (1º
Ano Curso Geral)
João Maximiano
Mafra
Stereotomia Engº Sante Bucciarelli Arquitetura Civil – (1º
ano Curso Engª Civil)
Engº Viriato
Belfort Duarte
Cálculo e
Mecânica
Engº João Eduardo
Barbosa
Trabalhos Gráficos –
(2º Ano Curso de
Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
271
1895
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Desenho de
Arquitetura
Vago Desenho
Organográfico- (1º
Ano Curso Geral)
João Maximiano
Mafra
Stereotomia Vago Arquitetura Civil – (1º
ano Curso Engª Civil)
Engº Viriato
Belfort Duarte
Geometria
Descritiva
Engº Carlo Cianconi Trabalhos Gráficos –
(2º Ano Curso de
Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
1896
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Desenho
Geométrico,
Plantas, etc.
Engº Arqº Henrique
Bahiana
Desenho
Organográfico- (1º
Ano Curso Geral)
João Maximiano
Mafra
Ciências Naturais,
Física e Química
Marcio Filaphiano Nery Arquitetura Civil – (1º
ano Curso Engª Civil)
Engº Viriato
Belfort Duarte
Geometria
Descritiva
Vago Trabalhos Gráficos –
(2º Ano Curso de
Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
272
1898
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Ciências Naturais,
Física e Química
Cincinato Américo
Lopes
Desenho de Aguadas
e sua aplicação às
sombras- (1º Ano
Curso Geral)
Engº Jorge
Valdetaro de
Lossio Seibltz
Geometria
Descritiva
Engº Carlo Cianconi Desenho de
Arquitetura – (3º ano
Curso Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
Stereotomia Engº Arqº Adolfo
Morales de Los Rios
1905
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Materiais de
Construção
Engº José Pereira da
Graça Couto
Desenho de Aguadas
e sua aplicação às
sombras, Trabalhos
Gráficos e Geometria
Descritiva- (1º Ano
Curso Geral)
Alcino José
Chavantes
Cálculo e
Mecânica
Engº João Eduardo
Barbosa
Desenho e Projeto de
Arquitetura,
construções
Hidráulicas e
Saneamento das
Cidades – (1º ano
Curso Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
Desenho
Geométrico e
Plantas
Engº Carlos Cianconi Arquitetura, Higiene
dos Edifícios e
Saneamento das
Cidades
Francisco Manoel
das Chagas Doria
273
1906 - 1909
ESCOLA NACIONAL DE BELAS
ARTES
ESCOLA POLITÉCNICA
DISCIPLINA
PROFESSOR DISCIPLINA PROFESSOR
Materiais de
Construção,
Tecnologia das
Profissões e
Stereotomia
Engº José Pereira da
Graça Couto
Desenho de Aguadas
e sua aplicação às
sombras, Trabalhos
Gráficos e Geometria
Descritiva- (1º Ano
Curso Geral)
Alcino José
Chavantes
Cálculo e
Mecânica
Engº João Eduardo
Barbosa
Desenho e Projeto de
Arquitetura,
construções
Hidráulicas e
Saneamento das
Cidades – (1º ano
Curso Engª Civil)
Engº Alfredo Paula
Freitas
Desenho
Geométrico e
Plantas
Engº Carlos Cianconi Arquitetura, Higiene
dos Edifícios e
Saneamento das
Cidades
Francisco Manoel
das Chagas Doria
Geometria
Descritiva
Engº Arqº Gastão
Bahiana
A partir de 1905 o Engº Ernesto da Cunha Araújo Viana consta no quadro
de docentes da Escola Nacional de Belas Artes como Professor de História
e Teoria da Arquitetura e Legislação.
O Engenheiro José Pereira da Graça Couto, professor da disciplina
Materiais de Construção na ENBA, também era responsável pela disciplina
Desenho e Projeto de Máquinas do 1º ano do curso de Engenharia de
Minas da Escola Polytécnica.
Em 1910 o Engº Carlos Cianconi assume a cadeira de Cálculo e Mecânica
na Escola de Belas Artes.
Os dados referentes aos anos entre 1898 e 1905 ainda não foram
totalmente levantados e comparados.
FONTE: Almanaque Laemmert. Rio de Janeiro, 1895 – 1905.
UZEDA, Helena. O ensino artístico de arquitetura no contexto da Academia Imperial de
Belas Artes do Rio de Janeiro: 1816-1889. Dissertação de Mestrado, EBA-UFRJ, 2000.
___________Modernidades acadêmicas. O ensino de arquitetura na Escola Nacional de
Belas Artes: 1890-1930. Tese de Doutorado em História e Teoria da Arte, Estudos de
História e Crítica da Arte. EBA-UFRJ, 2006.
274
ANEXO IV
Compilação de textos anotados nas Atas de Reunião do Conselho Diretor do
Clube de Engenharia
- Ata da 3ª Reunião Ordinária do Conselho Diretor de 15/10/1896
Presidência: Dr. Oliveira Bulhões
Presentes: Oliveira Bulhões, Pedro Gordilho, Osório de Almeida, Castro
Barbosa, Paulo de Frontin, Carvalho de Souza, H. Kingston, Smith de
Vasconcelos, Floresta de Miranda, Ed. P. Gomide, Raja Gabaglia, Lemos Bastos,
Uchoa Cavalcanti, Cordeiro da Graça, Aarão Reis, Daniel Henmger, Jose Américo,
Conrado Niemyer e Eduardo Limoeiro.
Página 16 – Pede a palavra o diretor Cordeiro da Graça propondo que o Clube de
Engenharia nomeie uma comissão que estude os trabalhos de calçamento à
asfalto que se esta fazendo na Arsenal de Marinha e que vai se fazer na ruas
General Câmara e Theophilo Ottoni.
O diretor Osório de Almeida é contra pois acha que não convêm ao Clube
este estudo já que não solicitado um parecer prévio.
Porém o diretor Aarão Reis é de opinião que o conselho deve nomear tal
comissão, mas solicitando previamente autorização dos poderes competentes
para acompanhar os trabalhos e que o Clube nomeie uma comissão que estude
os ensaios de calçamento a asfalto que estão sendo feito atualmente no Rio de
Janeiro.
Castro Barbosa propõe que a comissão também dê seu parecer sobre o
calçamento atual de paralelepípedos, atestando a influência que sobre a sua
determinação exercem os trilhos das linhas de ferro carril.
Sendo assim o diretor Osório de Almeida propõe que seja nomeada
comissão que estude os diversos sistemas de calçamento adotado e por adotar no
Rio de Janeiro. Sendo aprovada sem prejuízo das anteriores.
- Ata da 8ª Reunião Ordinária do Conselho Diretor em 02/08/1897.
Presidente: Oliveira Bulhões
Presentes: Oliveira Bulhões, Castro Barbosa, Aarão Reis, Osório de Almeida,
Jose Américo dos Santos, Frederico Liberachi, Aquino e Castro, Smith
Vasconcelos, Carvalho de Souza, Pedro Gordilho, Willian Newlands, Daniel
Hemmiger, Conrado Niemeyer, Carlos Niemyer, Raja Gabaglia, Ed. Gomide e
Eduardo Limoeiro.
Página 23 – Nesta reunião Jose Américo dos Santos lê o parecer que elaborou
sobre a consulta feita ao Clube pela Empresa de Melhoramentos do Brasil sobre
os aterros dos pântanos das praias Formosa e dos Lázaros.
275
- Ata da Reunião Extraordinária do Conselho Diretor em 06/08/1897
Presidente: Oliveira Bulhões
Presentes: Oliveira Bulhões, Floresta de Miranda Daniel Heminger, Jose Américo
dos Santos, Frederico Liberachi, Osório de Almeida, Raja Gabaglia, Aquino e
Castro, Henrique Kingston, João Felippe, Conrado Niemeyer, Carvalho de Souza,
Castro Barbosa, Aarão Reis, Newton Burlamaqui, Graça Bastos e Eduardo
Limoeiro.
Página – 24 – O presidente lembra que esta reunião foi convocada especialmente
para a discussão do parecer do diretor Jose Américo dos Santos sobre a consulta
feita ao Clube pela Empresa de Melhoramentos do Brasil. Discussão adiada para
o dia 10 do mês corrente.
Ata da Reunião Ordinária de 15/02/1898
Oferta do consocio Dr. Miguel Ricardo de Galvão de um quadro com o projeto por
ele feito da fachada principal da Alfândega desta capital e de uma fotografia das
obras da dita Alfândega dirigida pelo mesmo engenheiro.
Ata de Reunião de 01/04/1898
Página 81 – Castro Barbosa apresenta moção parabenizando a direção das obras
públicas pelo trabalhos de aformosamento que vem realizando. Após algumas
observações feitas é aprovada a seguinte moção:
“ O Conselho Diretor do Club de Engenharia regosija-se com a população
desta capital pelo esforços que a actual direção das obras municipaes está
revelando para proseguir no plano de aformosamento da cidade, pelo alargamento
e retificação das ruas e praças, arborização, etc; e faz votos para em factos reaes
e positivos, graças a boa vontade do proprietários”.
Ata de 23 /04/ 1898
O Sr. Presidente Oliveira Bulhões lembra o grave problema de abastecimento de
água da cidade e põe ao conselho que se realizem uma série de conferências p/
que se explamen o assunto colaborando para a solução do problema. Fica
aprovada a criação das conferências públicas devendo-se convidar as autoridades
interessadas no assunto.
Ata de 02/06/1902
Presidente: Horacio Antunes ( 1° secretário)
O Sr. Pedro Luiz apresenta proposta para que o Clube de Engenharia se dirija ao
Congresso Nacional pedindo a decretação de uma lei regulando a desapropriação
por utilidade pública ou obras Federias e do Distrito Federal. Depois de algumas
observações feitas pelos Srs. Ozório de Almeida, Pedro Betim, Loureiro de
276
Andrade, Castro Barbosa e Manuel Maria de Carvalho é apresentada a aprovada
a seguinte proposta:
“ Proponho em addictamento a proposta do Dr° Pedro Luiz, que a Directoria
do Club estude um projecto de lei de desapropriação e o submetta ao Conselho
Diretor a fim de ser levado ao Congresso Nacional.
Ass. Ozório de Almeida”
Na mesma seção Sampaio Correa l^a primeira parte de su trabalho sobre a
consulta feita pela “ Ligth and Power Company.”
Ata do dia 11/08/1902
Discutem sobre a demissão de dois membros do Clube, do Ministério da Viação e
Obras Públicas. Redigem uma moção e exigem que o governo torne público os
motivos das demissões.
Ata do dia 10/09/1902
Presidente : Sr. Dr. Chrockatt de Sá
Página 51 – “ O Sr. Dr. Presidente declara que a presente sessão foi convocada
para o fim especial de tormar-se conhecimento do pedido feito, por intermédio do
Dr. Luiz C. do Amaral Gama, pela Camara Municipal de Santos, no sentido de
incumbir-se o Conselho Director do estudo das propostas que foram apresentadas
aquela Camara para illuminação electrica da cidade de Santos.”
“ O Conselho resolve pela affirmativa”.
Ata do dia 16/09/1902
Página 55 – “ Sr, Dr. Cezar de Campos comunica ao Conselho que elaborou um
trabalho sobre o Poro do Rio de Janeiro. Deseja lê-lo, “ mais a hora está
adeantada e elle reserva-se para outra sessão.”
O trabalho foi lido em Sessão Extraordinária do dia 23/09/1902.
Ata do dia 16/10/1902
Presidente: Chrockatt de Sá
Página 62 – “ Ofício do Sr. Joaquim Ribeiro Paiva, Presidente da Câmara
Municipal da cidade do Rio Novo, pedindo o parecer do Club sobre a questão de
illuminação da mesma cidade, apresentado esclarecimentos, informações e a
planta da cidade do Rio Novo para illuminação do mesmo parecer.”
Foi nomeado o Sr. Dr. Eugenio Sisserandot para elaborar parecer sobre a
consulta da Câmara Municipal do Rio Novo.
Página 65 – Na mesma sessão foi comunicado a reintegração dos funcionários
demitidos do Ministério da Viação..
277
Ata do dia 03/11/1902
Presidentes : Chrockatt de Sá e Daniel Hemminger ( 2° Vice- Presidente)
Página 70 – “ Ofício do Sr. A. Jansen Tavares, secretário do Centro das Classes
Operárias
Imagem 1- Ata de
Reunião do Clube de
Engenharia do dia
2/05/1898.
278
Documentos Existentes no Clube de Engenharia
Códice – DO-118 – 17/08/1887
Assunto: Parecer sobre aterros e os problemas das enchentes.
Códice –DO- 132 – 19/08/1899
Assunto: Parecer sobre os melhoramentos da cidade do Rio de Janeiro para
“tornar esta capital uma cidade das mais aprazíveis do mundo”.
Códice – DO – 159 – 16/04/1903
Assunto: Parecer sobre a abertura da Av. Central e Beira Mar.
279
ANEXO V
REPRODUÇÃO DO LIVRO NOTAS DE AULAS DE ARCHITECTURA CIVIL E SANEAMANTO DAS CIDADES *
*
A reprodução contempla apenas a primeira parte do livro, que trata de questões relativas à História e Teoria da Arte e da Arquitetura
que são os pontos principais desta tese. Na última página está reproduzida somente a página de rosto da segunda parte do livro que
trata da Higiene e Saneamento das Cidades.
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Prédios de Engenheiros
Quartel Central do
Corpo de Bombeiros
Caixa de Amortização
CPRM – Cia de Pesquisa e
Recursos Minerais
V Batalhão da Polícia Militar
Procuradoria
Geral do Estado
Jornal do Brasil
FUNÇÃO Instituição Militar
Instituição Financeira Instituição Administração Pública Instituição Militar antiga Sede da Caixa
Econômica
(Instituição Financeira)
(Instituição Privada)
PLANTA
FACHADA
TÉCNICA Alvenaria com estrutura
metálica sobre
embassamento em
alvenaria de pedra.
Alvenaria com estrutura
metálica sobre
embassamento em alvenaria
de pedra.
Alvenaria sobre embassamento
em alvenaria de pedra.
Alvenaria sobre
embassamento em alvenaria
de pedra.
Alvenaria sobre
embassamento em
alvenaria de pedra.
Alvenaria com estrutura
metálica sobre estrutura
Independente tipo
sapatas isoladas.
ESTILO Eclético
Neo-medieval
Eclético
Neo-renascentistas
Eclético
Neo-renascentistas
Eclético
Neo-medieval
Eclético
Neo-Clássico
Eclético
AUTOR Eng. Gal. Francisco
Marcelino de Souza
Aguiar
Engº. Gabriel Diniz Junqueira
Guimarães
Enghº. Antônio de Paula Freitas
e Enghº Jose Mattoso Sampaio
Correia.
Arquiteto Heitor de
Melo
Arquiteto Francisco
Joaquim Bittencourt da
Silva
Arquiteto João Ludovico
Berna e
Engenheiro João Felipe
Pereira
Berna – Italiano ,
naturalizado barasileiro,
formado pela Academia
de Belas Artes, ganhou
prêmio e viagem em
1887.
ANO DE CONCLUSÃO
DO CURSO
1876 na Escola Militar
do Rio de Janeiro
1891 na Escola Politécnica Paula Freitas na Escola Central e
Sampaio Correia- 1898 na
Escola Politécnica
Antes de 1912 na Escola
Nacional de Belas Artes
Antes de 1858 na
Academia Imperial de
Belas Artes
João Felipe - 1888 na
Escola Politécnica
ANEXO VI
TABELA COMPARATIVA DAS EDIFICAÇÕES
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo