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POLIANA ROSSI BORGES
ESTRUTURA MORFOFONOLÓGICA DAS
FORMAS FUTURAS NAS
CANTIGAS DE
SANTA MARIA
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Lingüística e Língua Portuguesa da
Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara,
como requisito para obtenção do título de Doutor
em Lingüística e Língua Portuguesa.
Orientador: Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari
ARARAQUARA – SP
2008
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POLIANA ROSSI BORGES
ESTRUTURA MORFOFONOLÓGICA DAS
FORMAS FUTURAS NAS
CANTIGAS DE
SANTA MARIA
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Lingüística e Língua Portuguesa da
Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara,
como requisito para obtenção do título de Doutor
em Lingüística e Língua Portuguesa.
Orientador: Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari
Membros componentes da Banca Examinadora:
_____________________________________________________________
Presidente e Orientador(a): Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari
(UNESP / Campus de Araraquara)
_____________________________________________________________
Membro Titular: Prof. Dr. Ademar Silva
(UFSCAR)
_____________________________________________________________
Membro Titular: Prof. Dr. Seug-Hwa Lee
(UFMG)
_____________________________________________________________
Membro Titular: Profa. Dra. Beatriz Nunes de Oliveira Longo
(UNESP / Campus de Araraquara)
_____________________________________________________________
Membro Titular: Profa. Dra. Cristina Martins Fargetti
(UNESP / Campus de Araraquara)
Local: Faculdade de Ciências e Letras
Universidade Estadual Paulista – UNESP
Campus de Araraquara – SP
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Dedico este trabalho
Às duas pessoas mais importantes da minha vida:
meu pai, Roberto, e minha mãe, Maria Lucia.
E ao meu grande amor, Marcelo.
AGRADECIMENTOS
Ao final dessa etapa tão importante e difícil da minha vida, percebo que só
consegui ultrapassar todos os obstáculos e realizar meus sonhos devido ao apoio de
pessoas realmente importantes para mim. Em especial, gostaria de agradecer:
Primeiramente a DEUS, a Ele devo tudo o que tenho em minha vida e Lhe agradeço
pelas pessoas tão especiais que ele colocou em meu caminho.
A GLADIS MASSINI-CAGLIARI, minha orientadora, a quem agradeço os
ensinamentos, a força, os “puxões de orelhas” e, principalmente, toda a compreensão
nos difíceis momentos que enfrentei durante esses quatro anos de doutorado. Depois de
mais de seis anos trabalhando juntas, ela é hoje para mim muito mais que uma
orientadora, é um modelo de mulher e profissional, que muito eu admiro.
A toda a minha FAMÍLIA, meus pais, Roberto e Maria Lucia, meu irmão Fredy, meus
avós, tios, primos, que sempre me incentivaram e rezaram por mim em todos os
momentos de minha vida.
Aos meus PAIS, meus pilares. Difícil traduzir em palavras o quanto sou grata a eles.
Ao MARCELO SUITER, meu marido, companheiro de muitos anos, que acompanha
meus estudos desde o mestrado, obrigada pela força, pela compreensão e pelo carinho
em todos os nossos momentos juntos.
A minha sogra, SÔNIA, que olha pela minha família.
A ROSANE BERLINK e BEATRIZ LONGO, minhas professoras, pela ajuda e pelos
conselhos no exame de qualificação, que muito auxiliaram no êxito deste trabalho.
Aos meus AMIGOS, em especial TALITA MARINE, pelo carinho, pela amizade e pela
força nos inúmeros momentos de desânimo.
Aos bons AMIGOS que fiz em Florianópolis, em especial FÁBIO e IRIA, obrigada por
todo o apoio e a amizade nos momentos de que mais precisei, obrigada por me adotarem
no período em que estive longe de minha família.
A todos os FUNCIONÁRIOS e PROFESSORES da UNESP, por todo o auxílio,
enquanto fui aluna dessa Universidade.
A TODOS, MEU MUITO OBRIGADA.
Para ser grande sê inteiro
Nada teu exagera ou exclui
Põe quanto és no mínimo que fazes
Assim em cada lago a lua toda brilha
Porque alta vive
(Fernando Pessoa)
Resumo
Esta tese tem por objetivo o estudo da estrutura morfofonológica das formas verbais
futuras do Português Arcaico (PA), no período conhecido por trovadoresco (fins do
século XII até meados do século XIV), determinando se essas formas podem ser
consideradas simples (uma única palavra fonológica) ou compostas ou perifrásticas
(duas palavras fonológicas). Em outras palavras, objetiva-se determinar se, na época em
questão, essas formas eram analíticas (formadas pelo infinitivo do verbo principal +
verbo aver conjugado no presente do indicativo, no futuro do presente, ou pelo
infinitivo do verbo principal + verbo aver/ir, no pretérito imperfeito do indicativo, no
futuro do pretérito) ou sintéticas (cuja estrutura é radical + vogal temática + desinência
modo-temporal + desinência número-pessoal).
O corpus é composto das 420 Cantigas de Santa Maria de Afonso X, tomadas a partir
da edição de Mettmann (1986a, 1988, 1989).
A pesquisa parte do mapeamento e do levantamento quantitativo de todas as formas
futuras presentes no corpus, classificando-as quanto ao tipo (aparentemente sintéticas
ou indubitavelmente analíticas), relacionando os dados mapeados com a ocorrência de
clíticos e o posicionamento do acento. Os resultados obtidos são analisados a partir de
critérios para distinção de formas simples e compostas colhidos em estudos anteriores
(MASSINI-CAGLIARI, 1999, 2006). Foi analisado, também, o grau de
gramaticalização entre o verbo principal e o auxiliar de futuro, a partir dos critérios
estabelecidos por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991).
Os resultados obtidos mostram que os futuros do presente e do pretérito em PA devem
ser considerados formas analíticas, constituídas do infinitivo do verbo principal mais o
verbo aver conjugado no presente do indicativo, para o futuro do presente, ou do
infinitivo do verbo principal seguido do verbo aver/ir, no pretérito imperfeito do
indicativo, para o futuro do pretérito. A possibilidade de se escreverem as partes
constituintes desses verbos separadamente (e até mesmo na ordem invertida, em alguns
casos) e entre elas ser possível intercalar uma preposição ou um pronome clítico, além
do padrão prosódico que apresentam, que preserva o acento primário nas duas bases,
são evidências que indicam que, na época trovadoresca, ancestral do Português Europeu
(PE) e do Português Brasileiro (PB) atuais, as formas verbais futuras eram, ainda,
perifrásticas – e não compostas (por não se verificar uma coesão interna inquebrável
entre seus elementos constituintes) e nem simples (por apresentarem essas formas um
padrão acentual próprio de sintagmas ou compostos, e não de palavras simples ou
derivadas).
Palavras-chave: verbo, futuro, português arcaico, mesóclise, acento, fonologia, Cantigas
de Santa Maria.
Abstract
The objective of this Dissertation is to study the morphophonological structure of the
future verb forms in Archaic Portuguese (AP) spoken during the so-called archaic
period (late 12
th
C until mid 14
th
C), in order to establish whether these forms can be
considered simple forms (a single phonological word) or compound or periphrastic (two
phonological words). In other words, our objective is to determine if at the studied
period these forms were analytical (formed with the infinitive of the main verb + verb
aver in the present, the future indicative, or by the infinitive of the main verb + aver/ir
in the past imperfect) or synthetic (base form + theme vowel + mood-time inflection +
person-number inflection).
The corpus is formed of 420 Cantigas de Santa Maria by Afonso X edited by
Mettmann (1986a, 1988, 1989).
Firstly, all future forms found in the corpus were mapped, quantified and classified as to
their type (apparently synthetic or positively analytic) and these data were related with
the occurrence of clitics and the stress position. The results obtained were analyzed
according to criteria used in former studies (MASSINI-CAGLIARI, 1999, 2006) to
distinguish simple and compound forms. The degree of grammaticalization between the
main verb and the auxiliary of future was also analyzed according with criteria
determined by Bybee, Pagliuca e Perkins (1991).
The results show that the future indicative and conditional tenses in MP must be
regarded as analytical forms, formed with whether the infinitive of the main verb and
verb aver conjugated in the present indicative, in the case of future indicative, or the
infinitive of the main verb and verb aver/ir conjugated in the past imperfect indicative,
in the case of the conditional. The fact that the parts forming these verbs could be
written separately (and even invertedly in some cases), and also that a preposition or a
clitic pronoun could be placed between them, as well as their prosodic pattern,
preserving the primary stress on two bases, are evidences that, in AP, the predecessor of
modern European Portuguese (EP) and Brazilian Portuguese (BP), future verb forms
were still periphrastic, and not compound (for an unbreakable internal cohesion of its
forming elements was not verified) or simple (since these forms present a stress pattern
that is typical of phases or compounds, and not of simple or derivate words).
Key-words: verb, future, Archaic Portuguese , mesoclisis, stress, Phonology, Cantigas
de Santa Maria.
LISTA DE FIGURAS
Figura 2.1 – Miniatura que acompanha o Prólogo, 29
Figura 2.2 – Cantiga XX, fol. 30r – Códice de Toledo, 52
Figura 2.3 – Ilustração: códice dos músicos (E), 55
Figura 2.4 – Cantiga 416 – Códice E, 57
Figura 2.5 – Milagre, Códice MsT.1.I, cantiga 74, 59
Figura 2.6 – Imagem de Maria, Códice MsT.1.I, cantiga 42, 61
Figura 2.7 – Sexto quadro, miniaturas T100, CSM100, 62
LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1. Ocorrências de formas no corpus, 72
Tabela 3.2. Ocorrências de formas futuras sintéticas e analíticas, 74
Tabela 3.3. Ocorrências de pronomes clíticos com formas verbais futuras, 75
Tabela 3.4. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente e do pretérito, 76
Tabela 3.5. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente com pronomes
enclíticos, 86
Tabela 3.6. Tipos de pronomes enclíticos que acompanham o futuro do presente, 88
Tabela 3.7. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do pretérito com pronomes
enclíticos, 90
Tabela 3.8. Tipos de pronomes enclíticos que acompanham o futuro do pretérito, 92
Tabela 3.9. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente com pronomes
mesoclíticos, 93
Tabela 3.10. Tipos de pronomes mesoclíticos que acompanham o futuro do presente, 95
Tabela 3.11. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do pretérito com pronomes
mesoclíticos, 99
Tabela 3.12. Tipos de pronomes mesoclíticos que acompanham o futuro do pretérito,
99
Tabela 3.13. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente com pronomes
proclíticos, 101
Tabela 3.14. Tipos de pronomes proclíticos que acompanham o futuro do presente, 103
Tabela 3.15. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do pretérito com pronomes
proclíticos, 107
Tabela 3.16. Tipos de pronomes proclíticos que acompanham o futuro do pretérito, 108
LISTA DE ABREVIATURAS E SÍMBOLOS
A – analítico
C grupo clítico
CSM – Cantigas de Santa Maria
DM – determinado
DT – determinante
E – Códice dos músicos – El Escorial, Real Monasterio de San Lorenzo, MS B.I.2
ECh – Evite Choque Acentual
encl. – ênclise
F – Códice de Florença. Firenze, Biblioteca Nazionale Centrale, Banco Rari, 20.
FP – futuro do pretérito
FT – futuro do presente
I – frase entonacional
inf. – infinitivo
mesocl. – mesóclise
O – onset; ataque silábico
p/P – pessoa
PA – Português Arcaico
PB – Português do Brasil
PE – Português Europeu
PD – pé defectivo, pé degenerado
pl – plural
procl. – próclise
R – radical
R – rima
s – singular
sstrong/forte
S – sintético
SF – sufixo flexional (= desinência)
SMT – sufixo modo-temporal (= desinência modo-temporal)
SNP – sufixo número-pessoal (= desinência modo-pessoal)
s/p – sem pronome
SQ Sensibilidade quantitativa
T – Códice rico ou Códice das histórias. El Escorial, Real Monasterio de San Lorenzo,
MS T.I.1
T – tema
To – Códice de Toledo. Madrid, Biblioteca Nacional, MS 10.069
U – enunciado
v – verso
VT – vogal temática
x – proeminência
w – weak/fraco
φ − frase fonológica
ω − palavra fonológica
Σ −
σ − sílaba
sílaba leve
sílaba pesada
# limite de constituinte morfológico ou fronteira de palavra
* – sílaba final de rimas ramificadas, portadoras de acento por inerência
. (ponto) – atonicidade; ausência de proeminência.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1.1. Perífrase do futuro e novo sintagma verbal, 10
Quadro 2.1. Distribuição das cantigas de acordo com sua origem, 39
Quadro 3.1. Forma contracta do verbo aver homófona ao verbo ir no pretérito
imperfeito do indicativo, 84
SUMÁRIO
Introdução, 1
1 Diversas abordagens sobre o tempo futuro, 7
1.1 Futuro, do latim ao português: análises históricas, 7
1.2 Análises semânticas, 13
1.2.1 Uso dos tempos futuros em Português, 16
1.3 A estrutura dos tempos futuros, segundo gramáticos e lingüistas, 18
1.4 Análises morfofonológicas, 24
1.5 Considerações finais, 28
2. Corpus, 29
2.1 Português Arcaico, 31
2.2 As Cantigas de Santa Maria, 36
2.3 A vida de Afonso X, 41
2.4 A linguagem escolhida por Afonso X, 44
2.5 Os códices, 49
2.5.1 Códice de Toledo (To), 52
2.5.2 Códice Escorialense (E), 54
2.5.3 Códices ricos (T/F), 58
2.6 A autoria, 63
2.7 A edição de Mettmann, 66
2.8 Considerações finais, 68
3. Formas verbais futuras nas Cantigas de Santa Maria, 70
3.1 Formas analíticas, 76
3.1.1 Formas analíticas do futuro do presente, 77
3.1.2 Formas analíticas do futuro do pretérito, 79
3.2 Pronomes clíticos, 85
3.2.1 Pronomes enclíticos, 85
3.2.2 Pronomes mesoclíticos, 92
3.2.3 Pronomes proclíticos, 101
3.3 Considerações finais, 112
4. Estrutura morfofonológica das formas futuras, 115
4.1 Critérios de distinção entre formas simples e compostas, 116
4.1.2 Critérios de Massini-Cagliari (1999), 116
4.1.2.1 Co-ocorrência em PA de formas sintéticas e analíticas, 117
4.1.2.2 Possibilidade de mesóclise, 120
4.1.2.3 Dois futuros com uma única terminação, 125
4.1.2.4 Padrão acentual, 125
4.2. Critérios de Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), 154
4.2.1 Fusão com o verbo, 154
4.2.1.1 Análise do grau de fusão do futuro do presente em PA, 158
4.2.1.2 Análise do grau de fusão do futuro do pretérito em PA, 176
4.2.2 Dependência, 190
4.2.2.1 Dependência do auxiliar de futuro do presente em PA, 192
4.2.2.2 Dependência do auxiliar de futuro do pretérito em PA, 194
4.2.3 Redução, 195
4.3 Considerações finais, 197
Conclusão, 201
Referências,
209
Apêndice,
218
1
INTRODUÇÃO
O objetivo principal desta tese é o estudo da estrutura morfofonológica das
formas verbais futuras do Português Arcaico (doravante PA), no período conhecido por
trovadoresco (princípio do século XIII até meados do século XIV) – referente à primeira
fase do período arcaico.
1
Através do estudo de processos morfofonológicos
desencadeados pela flexão verbal e pela formação dos tempos futuro do presente e do
pretérito (ou condicional) em PA, pretende-se descrever a estrutura morfofonológica das
formas futuras na língua dos trovadores.
A partir da análise das formas verbais futuras em PA, pretende-se averiguar se,
na época em questão, estas eram analíticas (formadas pelo infinitivo do verbo principal
+ verbo aver, conjugado no presente, ou aver/ir, no pretérito imperfeito, dependendo de
se tratar do futuro do presente ou do pretérito) ou sintéticas (cuja estrutura é radical +
vogal temática + desinência modo-temporal + desinência número-pessoal). Algumas
gramáticas históricas, como a de Nunes (1969), afirmam que para o Português
Brasileiro (de agora em diante, PB) houve uma perfeita junção dos componentes; assim,
como resultado, tem-se atualmente uma forma simples. Advertem, porém, que há ainda
uma certa “consciência” do caráter composto desses verbos, devido à possibilidade de
mesóclise. Já estudos fonológicos mais atuais, como Bisol (1992) e Massini-Cagliari
(1999, 2006), acreditam ser o futuro, tanto em PA como em PB, uma forma composta,
devido à possibilidade de esses verbos terem dois acentos, um na base e outro na
“desinência”.
1
Os historiadores e filólogos são unânimes em situar seu início no século XIII, porque é nesse
momento que a língua portuguesa aparece documentada; já o limite final desse período é uma
questão em aberto (MATTOS E SILVA, 1989, p. 15-19), como apresentaremos na seção 1 desta
tese.
2
Foram os fatos assinalados desde os trabalhos mais tradicionais a respeito das
cantigas medievais galego-portuguesas que apontaram para a relevância do estudo das
formas verbais futuras no PA, fundamental para a construção de um panorama mais
completo dos fenômenos da Fonologia e da Morfologia da língua naquela época e,
portanto, para um melhor conhecimento da história da nossa própria língua.
O que encontramos nas Gramáticas Históricas sobre a flexão verbal e as
mudanças na forma (fonético-fonológica) que os verbos assumem, tanto quanto às
alterações nas desinências modo-temporais quanto às vogais temáticas, por exemplo, é
uma descrição desse fenômeno no período arcaico, sem muitas averiguações quanto à
natureza das mudanças desse período até a formação do PB.
Para se analisar a natureza das mudanças por que passou o tempo futuro em PA,
escolheu-se como fonte para a constituição do corpus do presente trabalho analisar
textos escritos selecionados do material poético remanescente do galego-português
medieval. A consideração de textos poéticos é de grande importância quando se quer
estudar um período passado da língua que não possui registros orais gravados na época,
uma vez que a partir da observação de textos metrificados podem ser levantadas
hipóteses sobre certos aspectos da pronúncia da língua daquela época, sobretudo com
relação à prosódia (nível de descrição que merece relevo quanto ao objeto desta tese, já
que a determinação da quantidade de acentos por palavra é crucial para determinar o
status das formas futuras medievais como simples ou compostas ou, ainda,
perifrásticas).
O corpus é composto das 420 Cantigas de Santa Maria (doravante, CSM) de
Afonso X, tomadas a partir das edições interpretativas e fac-similadas disponíveis ao
3
Grupo de Pesquisa Fonologia do Português Arcaico.
2
Estão disponíveis ao Grupo de
Pesquisa
3
microfilmes de todos os quatro manuscritos em que sobreviveram as cantigas
religiosas em galego-português, fornecidos à orientadora desta pesquisa pelas
Bibliotecas depositárias dos originais, além dos fac-símiles do códice Escorial (E -
códice dos músicos) e Toledo (To).
4
A seção 1 deste trabalho, “Diversas abordagens sobre o tempo futuro”, como o
próprio título diz, trata das variadas abordagens de estudos sobre o tempo futuro em
português. Começamos apresentando uma perspectiva das abordagens diacrônicas sobre
o assunto, desde o latim até o português atual, partindo da formação histórica desse
tempo, passando pelas mudanças por que passou ao longo desse percurso, e pelas
alterações de uso, nas diversas épocas do português. Apresentamos, em seguida,
algumas análises semânticas, resumindo algumas idéias trazidas por trabalhos anteriores
que estudam o valor modal desse tempo e seu uso em PB. São apresentadas a seguir
algumas análises estruturais feitas por lingüistas e gramáticos e abordagens presentes
em manuais de morfologia, que constroem quadros da estrutura morfológica dos tempos
verbais; chegando, finalmente, a análises da estrutura morfofonológica desses tempos,
tanto para o PA (período que é o foco deste trabalho), quanto para o PB e o Português
Europeu (doravante, PE) atuais.
2
Sobre a justificativa para a escolha do corpus e suas principais características, ver seção 2,
nesta tese.
3
O presente trabalho está vinculado ao Grupo de Pesquisa “Fonologia do Português Arcaico”,
registrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq (liderado pela orientadora do presente
trabalho), que tem como objetivo principal a descrição de aspectos fonológicos da Língua
Portuguesa no seu período dito arcaico, em especial o trovadoresco (fins do século XII até
meados do século XIV). Congrega um grupo de estudantes de Graduação e de Pós-Graduação
da Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Câmpus de
Araraquara. Através da descrição de fenômenos segmentais e supra-segmentais do português
medieval, o grupo pretende, a longo prazo, chegar à descrição do componente fonológico da
língua, naquela época, e a hipóteses de mudanças lingüísticas ocorridas, desde as origens do
português até os dias de hoje. A relevância das pesquisas reside, principalmente, na descrição,
ao lado de fenômenos fonológicos segmentais, de fenômenos prosódicos (tais como acento,
ritmo) e outros fenômenos que exigem um tratamento não-segmental (estruturação silábica e
outros processos dela dependentes) de um período passado da língua.
4
Sobre os manuscritos em que sobreviveram as CSM, ver seção 2.5.
4
Em relação à natureza morfofonológica do futuro nas línguas, apresentamos as
idéias de Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), que desenvolveram critérios para se analisar
o grau de fusão entre o verbo principal e seu auxiliar de futuro; e os estudos de Massini-
Cagliari (2006), para o PA, Bisol (1992), para o PB, e Mateus (2002 [1983]), para o PE,
que classificam essas formas futuras como compostas, devido ao seu comportamento
prosódico.
Na seção 2, apresentamos o corpus escolhido para analisar o futuro em PA: as
CSM. Primeiramente, apresentamos a importância de se trabalhar com um corpus
poético quando a análise da prosódia da língua está em foco, já que é possível
depreender, através da estrutura metrificada dos versos, o padrão de silabação das
seqüências, bem como a localização dos acentos e das pausas, e outros fatos fonéticos
de um período da língua do qual não temos mais falantes sobreviventes ou qualquer tipo
de gravação. Como exigência de qualquer estudo histórico, delimitamos, ainda na seção
2, o período focalizado por este trabalho, entre os anos de 1221 e 1284, período de vida
de Afonso X, quando foram compostas as CSM e, para uma melhor compreensão desse
corpus, apresentamos brevemente alguns fatos da vida de seu autor/compilador, Afonso
X, e as diversas especulações sobre a real autoria das cantigas.
Discute-se, também, nessa segunda seção, as razões da escolha da língua galego-
portuguesa pelos trovadores da corte de Afonso X, espaço em que a língua nativa era o
castelhano. São apresentados, ainda, os testemunhos das cantigas que chegaram até nós:
E (códice do Escorial, conhecido como códice dos músicos), T (códice rico da
Biblioteca Escorial), F (códice de Florença) e To (códice de Toledo). Por último,
apresentamos a edição eleita como base para a análise das cantigas religiosas galego-
portuguesas e as razões para esta escolha: a edição interpretativo-crítica de Mettmann
5
(1986a, 1988, 1989), que baseou sua edição no manuscrito mais completo, o códice
Escorial (E) - porém não o mais “rico” (T e F), nem o mais antigo (To).
Na seção 3, foi feito um levantamento quantitativo e qualitativo do
comportamento das formas futuras em PA, a partir do mapeamento das ocorrências de
verbos nesses tempos específicos nas CSM. Analisamos se essas formas aparecem
conjugadas de maneira sintética ou analítica (fundidas ou não com o verbo auxiliar
aver/ir); se são acompanhadas de pronomes clíticos – e, nesse caso, quais clíticos são
esses e em que posição se encontram em relação ao verbo (próclise, ênclise, mesóclise)
-; e as pessoas em que os verbos no futuro estão conjugados. Todas essas averiguações
dão pistas da estrutura morfofonológica das formas futuras em PA, e permitem definir,
finalmente, na seção seguinte, se essas formas devem ser consideradas como sintéticas
ou analíticas.
Na última seção, determinamos a natureza morfofonológica das formas futuras
em PA, com base no levantamento quantitativo efetuado na seção anterior e em critérios
e questões teóricas desenvolvidas por estudos anteriores (apresentados na primeira
seção). Para desenvolvermos essa análise, dividimos a seção em duas partes. Na
primeira, analisamos o futuro em PA a partir dos critérios desenvolvidos por Massini-
Cagliari (1999, 2006): co-ocorrência de formas sintéticas e analíticas, possibilidade de
mesóclise, dois futuros com uma única terminação, padrão acentual das formas. Na
segunda parte da seção 4, foram analisados em relação ao futuro em PA os critérios
desenvolvidos por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991). As idéias desenvolvidas por esses
lingüistas para averiguar o grau de gramaticalização entre o verbo principal e o auxiliar
de futuro se relacionam à fusão, à dependência ou à redução do auxiliar, quando
anexado ao verbo principal. A possibilidade de fusão é o item mais relevante em relação
aos dados apresentados nesta tese, por se mostrar mais produtivo, devido à baixa
6
ocorrência de alomorfes do verbo auxiliar, fenômeno que é a base de análise dos
critérios de dependência e de redução.
Os resultados obtidos mostram que os futuros do presente e do pretérito em PA
devem ser considerados formas analíticas, constituídas do infinitivo do verbo principal
mais o verbo aver conjugado no presente do indicativo, para o futuro do presente, ou do
infinitivo do verbo principal seguido do verbo aver/ir, no pretérito imperfeito do
indicativo, para o futuro do pretérito. A possibilidade de se escreverem as partes
constituintes desses verbos separadamente (e até mesmo na ordem invertida, em alguns
casos) e entre elas ser possível intercalar uma preposição ou um pronome clítico, além
do padrão prosódico que apresentam, que preserva o acento primário nas duas bases,
são evidências que indicam que, na época trovadoresca, ancestral do PE e do PB atuais,
as formas verbais futuras eram, ainda, perifrásticas – e não compostas (por não se
verificar uma coesão interna inquebrável entre seus elementos constituintes) e nem
simples (por apresentarem essas formas um padrão acentual próprio de sintagmas ou
compostos, e não de palavras simples ou derivadas). Tal resultado confirma, mais uma
vez, a relevância do movimento histórico de transformação de formas sintéticas em
analíticas, acontecido no português, desde as suas origens no latim, mostrando que a
força desse movimento talvez seja ainda maior do que o que imaginaram os primeiros
filólogos e gramáticos históricos que a apontaram (cf. seção 1 desta tese), uma vez que
mesmo formas aparentemente sintéticas podem ser, de fato, consideradas analíticas.
7
1. Diversas abordagens sobre o tempo futuro
Muitos gramáticos e lingüistas já desenvolveram estudos sobre o tempo futuro.
As abordagens escolhidas foram as mais diversas: análises diacrônicas desse tempo
verbal, descrevendo sua evolução desde o latim até o português contemporâneo;
análises morfo-semânticas que consideram o futuro como um modo e não como um
tempo verbal; até análises mais recentes sob a perspectiva das novas teorias
morfológicas e fonológicas.
A presente seção tem por objetivo apresentar essas abordagens para melhor se
entender a estrutura morfológica do tempo futuro, sua formação desde o latim e seu uso
no PA e no PB atual, para, finalmente, no final deste trabalho, podermos classificar as
formas futuras como sendo de natureza simples ou perifrástica em PA.
1.1 Futuro, do latim ao português: análises históricas
Segundo Câmara Jr. (1967, p. 29), o latim apresentava a partir do século III a.C.
três formas de futuro: a) futuros arcaicos, como faxo e capso – que se associavam aos
futuros em -so do grego e do osco-umbro e em -syá do sânscrito; b) formas de origem
subjuntiva, como ero e os futuros imperfeitos normais da 3ª e 4ª conjugação – legam e
uenies; c) formas embo da 1ª e 2ª conjugação, como cantabo, de raiz indo-européia -
bhwe.
No início do século XIII, quando o português primeiramente aparece
documentado, percebe-se o abandono definitivo de todas essas formas de futuro, que
não passaram para as línguas românicas. Já se haviam perdido os futuros perfectivo e
8
imperfectivo do latim e começava a se formar uma locução verbal para expressão da
futuridade. Segundo Mattos e Silva (1993, p. 37) “as distinções que marcam o sistema
verbal do PA, em confronto com o atual, decorrem, fundamentalmente, de diferenças no
nível da morfologia”.
A razão do desaparecimento do futuro em -bo no latim vulgar, nas primeira e
segunda conjugações, é explicada por Coutinho (1971, p. 276) pela semelhança de
algumas formas com as do perfeito do indicativo: ambitamavit, amabimus
amavimus; do futuro em –am, nas terceira e quarta conjugações, igualmente pela
semelhança de algumas formas com as do indicativo e subjuntivo presente: leges
legis, legetlegit, legamlegam. Para Coutinho (1971, p. 276), essas semelhanças
deviam “confundir” o povo “inculto”, portanto a necessidade de sua eliminação da
linguagem falada especialmente.
Para preencher as lacunas decorrentes das perdas de certos tempos verbais,
tornou-se necessária a criação de novas formas, o que se deu ainda no latim vulgar ou,
mais provavelmente, no romance. Coutinho (1971, p. 276) lista as seguintes novas
criações: o futuro, o condicional, as formas analíticas do presente e imperfeito da voz
passiva, os tempos compostos. Dentre essas novas formas verbais criadas no romance
estão o futuro do presente, que indica um processo posterior ao momento em que se
fala, e o futuro do pretérito ou condicional.
Sobre esse último tempo, Câmara Jr. (1967, p. 3) nos adverte que, sendo as
formas verbais em -ria uma criação românica e por isso não considerada pela tradição
clássica greco-latina, criou-se um problema de nomenclatura “delicado e controvertido”.
Segundo o autor, a escolha do termo condicional para se referir às formas em -ria
mostra a inclinação pelas características de ummodo de realização do processo verbal,
e, não, do tempo da sua ocorrência” (CÂMARA JR., 1967, p. 4) e que essa escolha
9
decorreu da focalização de um molde frasal de uma correlação em que a frase assertiva
toma o aspecto de uma apódose
5
condicionada por uma prótase condicionante, como no
exemplo dado pelo autor, em (1.1):
(1.1) “Se eu fôsse rico, compraria uma casa.” (CÂMARA JR., 1967, p. 4)
A condição da prótase é apresentada como imaginária, como irreal, e essa
irrealidade é compartilhada pela apódose, que dela é a conseqüência. Segundo o autor, o
esquema condicional com a forma verbal em –ria “exclui, em princípio, a possibilidade
da concretização dos dois processos verbais nela conjugados” (CÂMARA JR., 1967, p.
5).
Câmara Jr. (1967, p. 7) ainda explica que, independentemente do uso sincrônico,
a origem da terminação decorrente de um pretérito – como mostraremos a seguir – e a
associação formal com o futuro românico levaram alguns gramáticos a estabelecer a
denominação perifrástica futuro do passado ou do pretérito.
Todas as gramáticas históricas consultadas abordam de maneira muito
semelhante a evolução do futuro do presente e do futuro do pretérito.
6
Todas são
unânimes em afirmar que o futuro românico não advém do futuro latino; o latim popular
já substituíra o futuro latino e criara um tempo novo, “socorrendo-se para isso de uma
forma perifrástica, constituída pelo infinitivo, junto ao presente e imperfeito do verbo
habeo” (NUNES, 1969 p. 319).
7
Essa substituição do futuro simples, sintético, pelo
perifrástico começou cedo e penetrou inclusive nos textos literários, no início muitas
5
Segundo o Dubois (1973, p.63), designa-se apódose a oração principal que, colocada depois de
uma subordinada condicional (chamada prótase), indica a conseqüência ou a conclusão desta.
6
Gramáticas históricas consultadas: Ali (1971), Coutinho (1971), Bueno (1955), Nunes (1969),
Silva Neto (1952), Williams (1973[1938]). Além destes, foi consultada a análise de Câmara Jr.
(1975).
7
Alguns gramáticos históricos apenas comentam superficialmente a evolução do futuro latino
para o PA, enfocando somente a substituição da forma sintética pela analítica com o verbo
haver: Souza da Silveira (1952, p. 52) e Melo (1957, p. 187).
10
vezes sem a significação clara de futuro. Como nos explica Bueno (1955, p. 161),
abaixo:
Desaparecidas as formas sintéticas do futuro em bo (amabo, debebo)
a língua latina vulgar as substituiu por uma perífrase – amare habeo,
debere habeo – fazendo de ambos os elementos um sintagma verbal
em que amare perdeu sua acentuação própria, graças às alterações
fonéticas do conjunto. O segundo elemento ficou reduzido a ei, ás, á,
emos, eis, an, [...].
O quadro abaixo exemplifica essa substituição por uma perífrase proposta por
Bueno (1955, p.161) e o surgimento de um sintagma verbal em que o radical perdeu sua
acentuação própria.
Futuro do Presente Futuro do pretérito
Cantar + ei – cantaréi Cantar + ia – cantaría
Cantar + ás – cantarás Cantar + ias – cantarías
Cantar + á – cantará Cantar + ia – cantaría
Cantar + emos – cantarémos Cantar + íamos – cantaríamos
Cantar + eis – cantaréis Cantar + íeis – cantaríeis
Cantar + ão – cantarão Cantar + iam – cantaríam
Quadro 1.1. Perífrase do futuro e novo sintagma verbal
Silva Neto (1952, p. 255) acredita que esta perífrase tem o seu ponto de partida
no latim da África, pois é muito freqüente nos textos de teólogos de lá naturais. Daí
teria se expandido pela Itália e pelas províncias ocidentais do Império.
Esse futuro, segundo Bueno (1955, p.161), constituído do presente do indicativo
do verbo haver ou do imperfeito do mesmo verbo e de infinitivo, não tinha uma ordem
fixa; nem sempre a disposição dos elementos teria sido infinitivo + verbo haver,
existindo até ei amar, ás amar, á amar, etc., bem como a intercalação da preposição de,
ei de amar, ás de amar, etc.
11
Mas, ainda segundo esse autor, dois futuros com ordem fixa logo se tornaram
mais comuns. Um era formado de de + infinitivo após as formas do presente do
indicativo do verbo haver, como em hei de ir, enquanto o outro era formado pela
adição, como sufixos ao infinitivo, das formas do presente do indicativo do verbo haver
(menos o elemento hav- da primeira e segunda pessoas do plural); assim temos: -ei, -ás,
, -emos, -ei, -ão.
Williams (1973[1938], p. 212) também se refere ao futuro do pretérito,
chamando-o de condicional. Esse teria se formado como o futuro do indicativo, mas
com o imperfeito do indicativo (menos o elemento hav-) em lugar do presente do
indicativo. As terminações do futuro do pretérito são, portanto, -ia, -ias, -ia, -íamos,
-íeis, -iam.
Sobre as formas do verbo aver, Huber (1986[1933], p. 230-235) aponta que, em
vez das formas plenas avemos, avedes, usam-se as “formas abreviadas (h)emos,
(h)edes”, junto ao infinitivo, na formação do futuro do presente. Comparando o
condicional com o futuro do presente, afirma que as “formas tri ou tetrassilábicas foram
substituídas pelas formas abreviadas di- e trissilábicas”; termina dizendo que todas as
“formas abreviadas perderam o radical av-, tornando-se simples terminações”.
Do ponto de vista formal, houve a aglutinação dos dois vocábulos com uma
redução fonética das formas do verbo haver. O ponto de partida, segundo Câmara Jr.
(1975, p.130), foi o esvaimento da consoante intervocálica /b/; as vogais então em
contato se assimilaram, ditongaram e contraíram: a(b)eo > aio; a(b)e(b)a >ea>ia, etc.
Para Câmara Jr. (1975, p. 130) a combinação do infinitivo com o presente do
verbo haver, em grande parte da România, estabeleceu-se como uma locução volitiva,
focalizando, do presente, a vontade que uma ocorrência se desse; ao mesmo tempo,
estabelecia-se uma locução paralela, do ponto de vista do passado.
12
O falante, que no momento atual declara que quer cantar, que
pretende cantar, que está no propósito de cantar, por exemplo
(cantare habeo), também podia reportar-se a um momento pretérito
em que teve a mesma vontade, a mesma pretensão, o mesmo
propósito. Daí, nas Gálias e na Ibéria uma locução análoga com o
pretérito imperfeito de habere (cantare habebam). (CÂMARA JR.,
1975, p. 130)
Silva Neto (1952, p.255), citando Vossler, procurou explicar esse novo tipo de
futuro por fatores extralingüísticos, sobretudo como resultado de uma mudança operada
na mentalidade dos povos que falavam latim. A cultura clássica permitia aos latinos
uma atitude objetiva em relação ao futuro, mas a derrocada do mundo antigo e o
aparecimento de um período de profundas preocupações religiosas acarretou a perda da
posição objetiva em relação ao futuro, substituindo-a por um sentimento de incerteza,
medo e esperança. “Por isso, em vez de farei (faciam) dir-se-ia devo, quero, posso
fazer” (SILVA NETO, 1952, p. 255).
Segundo Câmara Jr. (1975, p. 128), o latim vulgar, ao contrário do latim
clássico, não propiciava o uso do futuro como um tempo verbal, pois este não é próprio
do uso coloquial de qualquer língua. Para o autor, o emprego de um tempo futuro
depende de condições especiais de comunicação lingüística, que deve ser pautada mais
por um raciocínio objetivo do que por um impulso comunicativo espontâneo; portanto,
o surgimento desse tempo resulta de uma maior elaboração intelectual. No latim vulgar,
o que predominava era o uso do tempo presente com valor semântico de futuro, uma
referência temporal, desde que não houvesse uma motivação modal específica para
levar o falante a outro uso.
Ali (1971, p. 143), como os demais gramáticos históricos, explica toda a nova
formação do futuro na língua portuguesa, mas também preocupa-se em explicar o
porquê da perda de uma sílaba em verbos como trazer, dizer e fazer na formação do
13
futuro. Durante muito tempo acreditou-se que a existência das formas breves trarei,
direi e farei eram devidas à sincopação das formas mais extensas, sem no entanto dar a
razão do desaparecimento da sílaba em tão poucos casos. Ali (1971) explica o fenômeno
referindo os futuros diretamente aos infinitivos dir(e), faz(e) e trar(e), já existentes em
latim vulgar; para jarei, caso não se trate de uma forma analógica, haveria o infinitivo
jar.
1.2 Análises semânticas
Muitos estudos sobre esse tempo verbal voltaram-se para a importância das
oposições modais, já que o futuro expressa sempre um pensamento que parte do
possível para a certeza. Essa análise é comumente feita por lingüistas que estudam os
tempos verbais, como Câmara Jr. (1975), que, na sua gramática histórica sobre o
português, analisa o futuro sob o ponto de vista da modalidade, principalmente quando
esse é expresso por uma perífrase; Corôa (1985), que parte de uma interpretação
semântica do tempo nos verbos em português para mostrar que é possível chegar a uma
interpretação temporal; e Silva (2002), que desenvolveu sua tese sobre o futuro no
português falado sob o ponto de vista da modalidade.
Comrie (1985, p. 43) compara os tempos presente, pretérito e futuro,
primeiramente afirmando que o futuro é apresentado como sendo semelhante
temporalmente ao pretérito, apenas em uma direção temporal oposta; mas também
acrescenta um sentido em que o futuro é claramente diferente do pretérito, a
modalidade:
14
The past subsumes what may already have taken place and, barring
science fiction, is immutable, beyond the control of our present
actions. The future, however, is necessarily more speculative, in that
any prediction we make about the future might be changed by
intervening events, including our own conscious intervention. Thus,
in a very real sense the past is more definite than the future.
Following on from this, one might argue that while the difference
between past and present is indeed one of tense, that between future
on the on hand and past and present on the other should be treated as
a difference of mood rather than one of tense. (COMRIE, 1985, P.
43-44)
Para Bybee e Pagliuca (1987), o morfema de futuro também não é estritamente
temporal, pois pode expressar desejo, intenção, obrigação, necessidade, iminência,
hábito, verdades gerais, comando, pedido, suposição. Os autores defendem a idéia de
que o futuro pode expressar certas modalidades dependendo do significado original da
palavra da qual o futuro se origina (em inglês: will, shall, be going to), como podemos
perceber abaixo:
We would argue that the original sense of these verbs is not lost
entirely, but is rather retained in certain contexts, and hence futures
from different sources will have different shades or flavors of
meaning. Thus a future derived from a verb meaning desire may have
a sense of will or willingness in certain contexts, a future derived
from obligation may give an obligation sense occasionally, and a
future derived from movement may give the sense of being headed
along a certain path, which gives a meaning often labeled,
erroneously we believe, as intention. (BYBEE; PAGLIUCA, 1987, p.
112)
Câmara Jr. (1967, p. 20) ressalta a interferência do modo na categoria de tempo;
segundo ele, as formas temporais assimilam um matiz modal na base das compreensões
complexas que têm, para a mente humana, as noções de tempo, passado e futuro, e
assim acrescenta especificamente sobre o futuro:
15
Em relação ao futuro, o caráter modal ainda é mais nítido e se pode
dizer pacìficamente compreendido e aceito, embora não se tenham
tirado daí tôdas as inferências que o fato comporta. Pode-se mesmo
adiantar que a intromissão da dúvida, da mera potencialidade, da
expectativa, do anelo, da volição com a idéia de futuro é constante na
linguagem espontânea. Sem subintenções subjuntivas, potenciais,
optativas, imperativas, o tempo futuro, para a asserção franca, se
realiza essencialmente pela forma de presente. (CÂMARA JR., 1967,
p. 21)
Porém, Câmara Jr. (1967, p. 27) acredita que essa análise mórfico-semântica não
impede a tendência das formas, criadas por um impulso de expressão modal, a se
fixarem, por fim, com um valor temporal.
Em relação ao PB, Pontes (1973) verificou que o futuro do presente é raríssimo
na fala do português contemporâneo e que todos os exemplos colhidos por ela têm em
comum o traço da dúvida, da irrealidade; por isso, considerou essas formas como
expressão meramente modal, marginal no sistema verbal. Já o futuro do pretérito
ocorreu com maior freqüência em seu corpus; como marca morfológica dessas formas,
a autora segmenta o morfema /-ria/, cuja significação geral “parece ser modal, ligada à
irrealidade, refere-se, mais frequentemente, a uma hipótese, estando relacionado ao
pretérito do subjuntivo” (PONTES, 1973, p. 95).
Câmara Jr. (1967, p. 27), Pontes (1973), Corôa (1985), Comrie (1985), Bybee e
Pagliuca (1987) acreditam que todas as maneiras de expressar futuro são baseadas na
modalidade; o futuro é menos definido, já que não sabemos tanto do futuro como
sabemos do passado, pois é apenas uma possibilidade. Côroa (1985, p. 57) afirma que
“o futuro (...) expressa sempre um pensamento que parte do possível para a certeza:
interpretações antecipadas sobre este movimento fornecem os empregos modais;
interpretações posteriores fornecem os empregos temporais”; já o futuro do pretérito
inscreve o processo em um “vir-a-ser” carregado de incertezas, a realização ou não de
algo não lhe é pertinente.
16
1.2.1 Uso dos tempos futuros em Português
Quando trata do futuro em sua gramática, Ali (1966, p. 64) se preocupa em nos
mostrar as aplicações desse tempo verbal. Começa explicando seu uso literal: “o futuro
exprime fatos inexistentes, mas realizáveis ou posteriormente ao momento atual em que
se fala, ou posteriormente à época de que se fala” (ALI, 1966, p. 164). Temos assim,
respectivamente, o futuro do presente e do pretérito.
Depois do uso literal do futuro, coloca-nos outros empregos desse tempo como
seu uso com valor de imperativo, ora categórico (honrarás pai e mãe), ora
simplesmente sugestivo, isto é, quando procura provocar no outro apenas o sentimento
da necessidade de efetuar a ação (dar-me-ás o dinheiro quando puderes). Para Teyssier
(1987, p. 262), esse emprego do futuro com valor de imperativo seria um dos diversos
empregos modais do futuro. Segundo o autor, empregado com o seu valor temporal,
exprime acontecimento que o locutor situa no futuro; só esse seria o “futuro
propriamente dito” (TEYSSIER, 1987, p. 260).
Outra aplicação do futuro, segundo Ali (1966, p.165), ocorre quando por meio
dele exprimimos a incerteza sobre os fatos próprios do tempo atual; o gramático o
denomina de “futuro problemático” ou “futuro da incerteza” (Neste quarteirão haverá
uns oito prédios desalojados). Acrescenta que o futuro problemático pode ser usado em
frases interrogativas, em que seria uma maneira polida que não obrigaria o interlocutor a
responder (Que casa será esta?).
Ainda segundo o autor, as duas formas do futuro também servem para
caracterizar as asserções condicionais, dependendo o emprego de uma ou outra forma
do sentido da proposição condicionante. Se esta se refere a um fato cuja realização
consideramos possível, empregaremos o futuro do presente; se o fato não se realizou e
17
nem se realizará, usaremos o futuro do pretérito (Se me oferecerem o lugar, aceitarei /
Se me oferecessem o lugar, aceitaria).
Terminando suas explanações sobre o emprego do futuro, Ali (1966, p.165)
critica o uso do termo modo condicional, referindo-se ao futuro do pretérito, devido a
esse emprego em orações condicionais, pois as formas verbais do latim e do grego,
embora diferentes e não especializadas, eram usadas com a mesma função e esse termo
não era aplicado.
Câmara Jr. (1975, p.131) analisa o emprego do futuro do pretérito afirmando que
este tem um uso limitado, já que depende de uma circunstância especial: é preciso que o
falante faça a evocação de um momento pretérito, imagine situações posteriores a este
momento, situando-se no momento em que se fala, como explicado abaixo:
É preciso que o sujeito falante, reportando-se ao passado e
continuando a situar-se no presente, considere, dessa posição por
assim dizer ubíqua, o que ocorreu posteriormente no momento
passado a que assim se reportou. (CÂMARA JR., 1975, p. 131)
Câmara Jr. (1975, p. 132), em relação ao PA, reforça a idéia de as formas futuras
serem de emprego parcial, confinadas à língua escrita e a certas situações orais formais,
assim como acontecia em latim vulgar. O autor acredita que, ao lado da tripartição do
tempo em presente, pretérito e futuro, há outro sistema bipartido de pretérito, de um
lado e, de outro lado, um presente que abarca o futuro. Esse sistema é o das formas
marcadas para o passado em referência ao momento da comunicação, e o presente, sem
“assinalização” própria, expressa presente, futuro ou um tempo indefinido,
respectivamente, como nos seguintes exemplos: parto agora, parto amanhã, parto
sempre de casa às 10 horas (CÂMARA JR., 1972[1970], p. 90). Ainda segundo o
autor, a língua literária joga com a existência dos dois sistemas e tira daí efeitos
estilísticos, para, pelo segundo sistema, apresentar o presente e seu futuro, ou o pretérito
18
e seu futuro, como um segmento temporal único. Dentro do segundo sistema, o futuro
funciona com seu caráter modal, e passa a equivaler a um subjuntivo.
Câmara Jr. (1972[1970], p. 88) afirma que não há como separar o tempo e o
modo. O primeiro se refere ao momento da ocorrência do processo, visto do momento
da comunicação, o segundo a um julgamento implícito do falante a respeito da natureza,
subjetiva ou não, da comunicação que faz. Entretanto o autor acrescenta que é comum
em português um emprego modal dos tempos verbais, e coloca o exemplo do futuro
expressando dúvida, em que não há implicação temporal.
1.3 A estrutura dos tempos futuros, segundo gramáticos e lingüistas
O tema desta seção está diretamente ligado aos objetivos do nosso estudo: o
estabelecimento da natureza simples ou perifrástica das formas verbais de futuro. Nesta
seção, serão apresentados estudos tradicionais e atuais a respeito da estrutura da forma
verbal futura. Adiante, na seção 1.4, serão apresentadas abordagens morfofonológicas
mais recentes a respeito da mesma questão.
As gramáticas normativas da Língua Portuguesa (por exemplo, Cunha e Cintra,
1985, p. 381)
8
e os manuais de morfologia feitos por lingüistas (KEHDI, 2001;
LAROCA, 2001) tratam o futuro de maneira muito semelhante (apesar da distância
teórica entre eles): a partir de uma visão sincrônica, consideram as formas verbais do
8
Cunha e Cintra (1985, p. 382) acrescenta a seguinte observação sobre diacronia, depois da
apresentação dos quadros da conjugação dos tempos futuros: “O FUTURO DO PRESENTE E
O FUTURO DO PRETÉRITO são formados pela aglutinação do INFINITIVO do verbo
principal às formas reduzidas do PRESENTE e do IMPERFEITO do indicativo do auxiliar
haver: amar + hei, amar + hia (por havia), etc.”
19
futuro do presente e do pretérito como palavras simples, flexionadas a partir da fórmula
geral da estrutura do vocábulo verbal português: T (R + VT) + SF (SMT + SNP).
9
mara Jr. (1972 [1970], p. 99) assim apresenta os sufixos modo-temporais do
futuro do presente e do pretérito em sua análise sincrônica do PB:
10
(1.2)
IdFt1: /ra`/ tônico em P 2, 3, 6.
Alomorfia: /rê`/ tônico em P 1, 4, 5.
IdFt2: /ri`a/.
Alomorfia: /ri`e/ em P 5.
Baseados nessa descrição, os manuais de morfologia do português (que
comumente são utilizados em cursos introdutórios de Lingüística) elaboraram quadros
da conjugação de verbos nas três conjugações, a partir dos elementos mórficos que
constituem os tempos do futuro do presente, exemplo (1.3), e do pretérito, exemplo
(1.4):
(1.3) Futuro do presente
1ª conjugação 2ª conjugação 3ª conjugação
R VT SMT SNP R VT SMT SNP R VT SMT SNP
cant a re i vend e re i part i re i
cant a s vend e s part i s
cant a Ø vend e Ø part i Ø
cant a re mos vend e re mos part i re mos
cant a re is vend e re is part i re is
cant a o vend e o part i o
9
A fórmula utilizada por esses dois autores é baseada em Câmara Jr. (1972[1970], p. 94); as
abreviaturas T, R, VT, SF, SMT, SNP significam, respectivamente, “tema”, “radical”, “vogal
temática”, “sufixo flexional”, “sufixo modo-temporal”, “sufixo número-pessoal”.
10
Segundo Câmara Jr. (1972 [1970], p. 99) no futuro do presente do indicativo o morfema /ra`/
é tônico na 2ª, 3ª e 6ª pessoas e sofre alomorfia (/re`/) nas 1ª, 4ª e 5ª pessoas. No futuro do
pretérito do indicativo, a forma é /ri´a/ em todas as pessoas, exceto na 5ª pessoa, em que há
alomorfia (/ri`e/).
20
(1.4) Futuro do pretérito
1ª conjugação 2ª conjugação 3ª conjugação
R VT SMT SNP R VT SMT SNP R VT SMT SNP
cant a ria Ø vend e ria Ø part i ria Ø
cant a ria s vend e ria s part i ria s
cant a ria Ø vend e ria Ø part i ria Ø
cant a ría mos vend e ría mos part i ría mos
cant a ríe is vend e ríe is part i ríe is
cant a ria m vend e ria m part i ria m
Como, do ponto de vista diacrônico, as formas futuras do português têm origem
em uma perífrase, é necessário explicar como as formas perifrásticas teriam se
transformado em simples.
Nas línguas indo-européias, na construção perifrástica, são combinadas uma das
formas nominais do verbo (infinitivo, gerúndio ou particípio), na qual se concentra o
significado do conjunto, com uma forma flexional de outro verbo usado para auxiliar.
Nesse auxiliar está a significação gramatical: as categorias número-pessoais e modo-
temporais. As construções perifrásticas são “dois vocábulos fonológicos e morfológicos
que se associam numa unidade lexical superior” (CÂMARA JR., 1975, p. 164).
Para Câmara Jr. (1975, p. 163) a tendência à aglutinação de certas estruturas, que
na história lingüística faz da expressão perifrástica uma forma flexional, depende de três
fatores:
1. Ascensão em importância da noção gramatical que a perífrase traduz.
As conjugações perifrásticas se dispõem, numa série, a rigor aberta,
em ordem decrescente da intensidade da significação lexical do
auxiliar. Nessa escala, são menos ou mais gramaticalizadas.
Na gramaticalização mais forte, o auxiliar está com a significação
lexical esvaziada e se tornou um mero índice da categoria que se
destina a exprimir. (CÂMARA JR., 1975, p. 164)
21
2. Obsolescência da significação lexical do verbo que entra como auxiliar, isto é,
aquele a que cabe o mecanismo gramatical do conjunto.
3. Possibilidades fonológicas da construção em sua morfofonêmica.
Para o autor, todos esses três fatores enumerados se verificam na perífrase do
futuro e do condicional, com os auxiliares habeo e habebam, respectivamente, e o
infinitivo do verbo principal para construir um novo futuro flexional, nesse caso, uma
forma sintética.
Câmara Jr. (1975, p.164) acredita que essa junção resulta em uma unidade
semântica na composição, que não corresponde necessariamente a uma ordem fixa das
formas constituintes, e também não impede entre elas possível intercalação de locuções
ou vocábulos.
Nunes (1969, p. 320) crê que, no início, logo que o português e as demais
línguas latinas se socorreram de habeo, havia perfeita consciência da composição do
futuro e do condicional, pois houve um tempo em que os dois elementos do futuro
(verbo no infinitivo e habeo) não estavam aglutinados: amarei, amariaamar hei,
amar hia, que coexistiam ao lado de hei amar, havia amar, ou ainda, na linguagem
literária, hei de amar, hia de amar. Mais tarde perdeu-se essa consciência pelo uso
freqüente da forma simples, pois o verbo habeo se “soldou ao infinitivo por forma tão
íntima que os dois vocábulos vieram a formar um só”. Mesmo assim, Nunes afirma que
essa consciência não se perdeu totalmente, mas sobrevive nos casos em que entre essas
formas se coloca um pronome.
Williams (1973[1938], p. 211), semelhantemente a Nunes, acredita que o futuro
e o condicional têm hoje formas contractas, simples, mas que o falante ainda não perdeu
a consciência de sua natureza composta, usando o mesmo argumento usado
22
posteriormente por Nunes, uso de pronomes entre as formas, mas acrescentando a
possibilidade de dois futuros formados por uma única desinência.
Sua natureza simples se revela pela perda do acento do componente
infinitivo nuns poucos verbos do latim vulgar, e.g., salrei (de *salire–
aio), enquanto sua natureza composta se revela pela construção
encontrada nos cancioneiros primitivos de dois futuros formados com
uma só terminação, e.g., direy e non estar
11
[...], e pelo contínuo uso
de pronomes infixos. (WILLIAMS, 1973[1938], p. 211)
Concordando com os demais autores, Coutinho (1971, p. 277) afirma que nunca
se perdeu a consciência da composição do tempo futuro, “tanto assim é que se pode
intercalar nele o pronome oblíquo, o mesmo acontecendo no condicional, e dizer amá-
lo-ei, puni-lo-ei”.
Huber (1986[1933], p. 230) acredita que, tanto para o futuro quanto para o
condicional, é frouxa a ligação entre o verbo principal no infinitivo e seu auxiliar, e a
mesóclise e a possibilidade de se usar uma preposição entre os elementos provam essa
frouxidão.
Já Silva (2002) e Araújo (2005) procuram evidenciar que as formas de futuro
analíticas e sintéticas tendem a se alternar em padrões cíclicos. Eles acreditam que só
esse tipo de análise pode encontrar respostas para a instabilidade desse tempo verbal e o
aparecimento de novas perífrases que expressam futuridade, como o verbo ir +
infinitivo. Silva (2002) não considera que o aparecimento da forma sintética implicava
no desaparecimento da forma perifrástica antecedente, não havendo uma fase
exclusivamente analítica ou sintética, sendo que os dois tipos de futuro podem coexistir
até que o uso de um deles predomine.
11
Nessa estrutura mencionada por Williams (1973[1938], p. 211) só o primeiro verbo recebe a
desinência de futuro (direy), o segundo verbo não a recebe, mas deve-se interpretá-lo como
futuro também. Embora o autor admita essa possibilidade, nenhum caso pôde ser encontrado no
corpus analisado nesta tese.
23
O desenvolvimento do t.vb
12
futuro do latim ao românico revela um
processo cíclico-padrão no qual a forma perifrástica inicial que se
sintetiza é, por sua vez, substituída por uma nova estrutura
perifrástica, repetindo essa seqüência de eventos. (SILVA, 2002, p.
61)
Silva (2002, p. 64) sugere que a colocação do auxiliar atua como um fator
determinante da aglutinação, ou seja, sua colocação antes ou depois do verbo principal
pode resultar em uma forma analítica ou sintética. Se um verbo auxiliar for colocado
antes do verbo principal resultaria em uma forma analítica, se colocado depois do verbo
principal teríamos um forma sintética:
A ordem cantare habeo aparece na formação do futuro românico
sintético. Entretanto, no vernáculo românico, a forma sintética era
ladeada por formas não sintéticas de dois tipos.
No primeiro, a infixação de pronomes é responsável pela disjunção e
reflete a ordem cantare habeo: cantar-lhe-ei, tendo em comum com
o chanterai a sua origem e o significado temporal básico.
Excetuando-se o português, no qual a produção dessa forma está em
declínio, não foi conservada nas outras línguas românicas modernas.
Especula-se como causa para essa não manutenção a rivalidade direta
com a forma sintética como também a rejeição a uma estrutura com
um pronome infixado.
No segundo, a formação disjuntiva, com ou sem a preposição ad ou
de: hei de trabalhar, j´ai à travailler = tenho de trabalhar, reflete
habeo cantare. Manteve a sua modalidade de obrigação original e
sobreviveu em todas as línguas românicas modernas. Tem em comum
com o primeiro tipo a preservação da forma analítica. (SILVA, 2002,
p. 64).
Resumindo, para Silva (2002), um futuro sintético, sincronicamente, segue
paralelamente a uma formação analítica de origem aspectual ou modal; as formas que
expressam temporalidade são sintéticas e as que indicam modalidade são analíticas. À
medida que as formas do futuro se temporalizam, elas tendem a se sintetizar, o que
reforça a inferência de que as formas que primeiramente expressam temporalidade são
sintéticas, como explicado mais detalhadamente abaixo:
12
Para Silva (2002), t.vb é abreviatura para tempo verbal.
24
O processo parece obedecer à seguinte ordem: um alto grau de
temporalidade corresponde a um nível limiar de opacidade nas
colorações modais ou aspectuais e vice-versa. Quando uma forma –
cantabo ou chanterai – atinge esse grau de temporalidade e,
obviamente, um nível limiar de opacidade modal ou aspectual, uma
nova forma de futuro surge – cantare habeo e je vais chanter -, na
qual as noções modais ou aspectuais são mais evidentes. (SILVA,
2002, p. 66)
1.4 Análises morfofonológicas
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) desenvolvem uma análise morfológica das
formas futuras, propondo alguns critérios que definiriam uma forma como sintética ou
analítica, isto é, discutindo o grau de gramaticalização entre o verbo auxiliar e o verbo
principal, se existe ou não fusão entre essas formas na formação do futuro, se apenas
uma dependência entre os elementos ou ainda uma redução do verbo auxiliar de futuro
nas línguas analisadas.
Semelhantemente a Câmara Jr. (1975), esses autores chegaram a alguns critérios
para classificar essas formas em simples ou compostas: a) a ortografia convencional; b)
a intervenção de uma palavra entre as formas; c) alomorfias condicionadas pelo verbo
auxiliar; d) alomorfias condicionadas pelo verbo principal; e) se há mudanças no verbo
principal em relação ao tom, ao acento, ou mudanças em uma vogal ou consoante
13
.
Esses cinco fatores juntos, segundo Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 35),
permitem calcular o grau de fusão entre o verbo auxiliar e o infinitivo do verbo
principal; para tanto, dá-se um valor numérico para as variantes em cada campo, como
explicado abaixo:
13
Nesta seção as idéias desses lingüistas serão apresentadas brevemente; na seção 4 deste
trabalho analisaremos essas questões em relação ao tempo verbal futuro em PA.
25
FUSION:
1. Written bound: N=0; H=1; Y=2
2. Open class intervening: N=1; Y=0
3. Phonological process conditioned by stem: N=0; Y=1
4. Lexical conditioning: N=0; Y=2
5. Conditions stem change: N=0; T or S=1; V or C=2
(BYBEE, PAGLIUCA E PERKINS, 1991, p. 35)
As letras N e Y significam respectivamente non e yes, respectivamente; H, em
relação à escrita da palavra, refere-se à hifenização entre os verbos; T, S, C significam,
respectivamente tom, mudança na vogal ou mudança na consoante. Os valores
numéricos foram escolhidos de maneira a mostrar que uma maior gramaticalização irá
refletir uma nota maior. Abaixo temos a explicação da escolha desses fatores:
Assuming that grams develop from free lexical items, those that can
be and are written bound are more grammaticized than those are not,
with hyphenated and variable representation assigned an intermediate
value. ‘Open class intervening’ refers to the possibility of non-
grammatical elements occurring between the gram and the verb stem.
Such possibilities usually decrease as a gram fuses with the verb,
[…]. Phonological processes in the gram conditioned by the stem will
occur only as the gram starts to become more fused with the stem.
This would be an early indication of fusion. ‘Lexical conditioning’
refers to allomorphy conditioned by the lexical classification of the
verb stem (i.e. conjugation class). Such allomorphy usually arises
only after the affix has been attached to the stem long enough for
phonological processes to lose their productivity and for reanalysis to
occur. Under ‘conditions stem change’, tone or stress changes count
less than consonant or vowel changes, since the former may be
predictable on a phonological basis, while we exclude that possibility
or the latter. (BYBEE; PAGLIUCA; PERKINS, 1991, p. 35-36)
14
Já Massini-Cagliari (2006, p. 96) analisa as formas futuras em PA a partir de seu
comportamento prosódico e acredita que essas formas são compostas: ao infinitivo do
verbo principal, no futuro do presente, foram acrescentadas as formas do verbo aver, no
presente do indicativo, ou do pretérito imperfeito do mesmo verbo, no caso do futuro do
pretérito. Para Massini-Cagliari (2006, p.97), o comportamento prosódico dos
14
Todos esses fatores apontados por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), acrescidos de outros que
ainda serão mostrados neste trabalho, serão analisados em relação ao PA na seção 4 desta tese.
26
compostos é semelhante ao da perífrase (duas palavras prosódicas independentes), tendo
tantos acentos quanto forem as bases; já as formas simples e derivadas comportam-se
como uma palavra fonológica, na medida em que a elas corresponde um acento lexical.
[...] nos tempos Futuro do Presente e do Pretérito do Indicativo, o
acento primário era atribuído primeiramente a cada uma das bases
componentes do composto; posteriormente, o acento mais à direita
receberia o status de principal, dada a Regra Final, que se aplica em
PB nos níveis superiores ao da palavra, fazendo com que, de todos os
acentos concatenados, o último seja o mais forte [...]. (MASSINI-
CAGLIARI, 2006, p. 97)
Com relação às formas futuras em PA, Massini-Cagliari (2006, p. 99) propõe a
mesma solução: como compostas, essas formas possuiriam dois acentos, um para cada
base; no estabelecimento da relação de proeminência entre esses acentos, o segundo tem
precedência, segundo o padrão do PA, que seria: nos compostos, o acento da última
base é o principal. Observe o exemplo retirado da página 97 de Massini-Cagliari
(2006):
15
(1.5) ( x)
(x) (x)
[amar] [ei]
Em relação ao PE, Mateus (2002 [1983], p. 244-245) já havia chegado à mesma
conclusão a que Massini-Cagliari (2006) chegou com relação ao PA, utilizando como
15
No exemplo (1.5), x representa proeminência, ou seja, os acentos em cada nível; em um
primeiro momento, nas palavras compostas, cada base é acentuada, quando feita uma relação de
proeminência entre os acentos, o segundo tem precedência, por regra sem exceções, em PA. Os
parênteses representam os limites de constituinte (no primeiro nível, os limites entre as bases, e,
no segundo, os limites da palavra – composta, no caso).
27
principal argumento a possibilidade de mesóclise nas formas futuras, mas ainda a partir
da possibilidade de acento nas duas bases:
16
Concluímos portanto que as formas do futuro e do condicional
divergem de todas as outras formas verbais pela existência de duas
fronteiras de morfema seguidas que, por um lado, bloqueiam a
actuação da regra (3)
17
, e por outro permitem a inserção de fronteiras
de palavra com a manutenção dos dois acentos primitivos. Esta
proposta pode assim considerar-se um argumento de apoio à hipótese
de que o futuro e o condicional são constituídos com o morfema de
infinitivo. (MATEUS, 2002 [1983], p.244-245)
Bisol (1992, p. 79) chega à mesma conclusão que Mateus (2002 [1983]), mas em
relação ao PB. Para a autora, cada uma das partes que compõem o futuro mantém a sua
autonomia, como o fazem as palavras compostas, recebendo acentos primários
individuais, dos quais somente o último permanece.
1.5 Considerações finais
Como vimos no desenvolver desta seção, existem já alguns estudos
desenvolvidos sobre os tempos futuros, no português, sob diversas abordagens. Todas
elas, com certeza, ajudam-nos a entender a estrutura da forma verbal futura, desde o
latim vulgar, passando pelo PA, até o PB atual.
Diacronicamente não há dúvidas de que as formas verbais do tempo futuro atual
eram, na sua origem, formas perifrásticas, formadas pelo auxiliar aver (conjugado no
presente ou pretérito imperfeito do indicativo) + o infinitivo do verbo principal. Alguns
16
A análise da atribuição do acento às bases, ou seja, a análise da atribuição do acento lexical
em PA, será desenvolvida mais profundamente na seção 4 deste trabalho.
17
Em Mateus (2002[1983], p. 241), Regra (3) refere-se à regra de atribuição de acento às
palavras simples e derivadas.
Regra (3): Acentuar a última vogal do {tema
[vb]
} (MATEUS, 2002[1983], p. 241).
{radical }
28
estudiosos acreditam que houve um momento da língua em que as pessoas tinham
consciência de que essas formas eram compostas por duas palavras, embora, no PB
atual, essa consciência esteja se perdendo.
Através de uma análise mais detalhada, pretendemos, nas seções 3 e 4 desta tese,
finalmente definir o status da formas futuras em PA: se sintéticas ou analíticas, através
da análise das CSM, corpus escolhido como representativo desse período da língua
portuguesa.
29
2.
Corpus
Figura 2.1. Miniatura que acompanha o Prólogo – códice dos músicos, Escorial (E).
Fonte: http://www.pbm.com/~lindahl/cantigas/images/cantiga_2small.jpg
(acesso em 15 julho 2008).
As Cantigas de Santa Maria de Afonso X, a maior coletânea medieval de
poesias em louvor à Virgem Maria e destinadas a serem cantadas, foram escolhidas para
constituição do corpus deste trabalho, pois é da observação de textos poéticos que se
podem levantar questões sobre aspectos da pronúncia da língua daquela época,
sobretudo com relação à prosódia (cf. Massini-Cagliari, 1995, 1999), fenômeno cuja
observação é crucial para a presente pesquisa, uma vez que da determinação da estrutura
prosódica das formas verbais futuras (no que diz respeito sobretudo à quantidade de
acentos) depende a determinação da sua estrutura morfológica. A consideração da rima
e da quantidade de sílabas por verso é imprescindível para o estudo de aspectos
fonológicos de um período da língua do qual não se tem arquivos sonoros.
Massini-Cagliari e Cagliari (1998, p. 83) exemplificam por que é tão importante
a consideração da poesia em uma análise lingüística das línguas antigas:
30
A tradição da análise poética tem mostrado que a poesia pode revelar
a duração das sílabas, a localização do acento e pausas (cesuras) e um
valor melódico/rítmico de natureza acústica. Com base na observação
desses fatos, desenvolveram-se, dentro dessa tradição de análise
poética, vários “métodos de descrição [...]”.
Para Mattos e Silva (2001, p. 32), a documentação lingüística fornecida pelo
conjunto da lírica medieval galego-portuguesa é riquíssima, pois os dados obtidos a
partir da consideração desses testemunhos são essenciais para o conhecimento do léxico
da época e de outros aspectos da língua:
O fato de serem poemas de estrutura formal em versos rimados os
torna fundamentais, no que concerne a estudos de história da língua,
para o conhecimento de fatos fonéticos desse período, como sejam,
por exemplo, questões referentes aos encontros entre vogais
(hiatos/ditongos), ao timbre vocálico (abertura/fechamento), vogais e
ditongos nasais/orais. A morfologia tanto a nominal como a verbal
também tem nessa documentação uma fonte fundamental. A questão
da sintaxe aí representada deve ser considerada, tendo sempre
presente que o caráter excepcional e variável é essencial na
construção poética.
Muito já foi discutido sobre a relação entre os dados recolhidos dos documentos
medievais e a língua falada indiretamente representada pela língua escrita à qual dá
sustentação. É possível, a partir da escrita produzida pelos compiladores das cantigas
medievais galego-portuguesas, chegar ao português falado na época? Mattos e Silva
(2001, p. 39) acredita que sim, pois não havia um controle gramatical normativo
naquela época, o que faz com que os textos do período arcaico tenham variações
constantes, fato que também é indicador de usos da fala.
[...] sendo a documentação escrita que permanece, e sendo essa uma
representação convencional da fala, desta teremos nos documentos
um reflexo que permite tirar conclusões até certo ponto seguras, no
nível fônico-mórfico, já que, não havendo então uma normatização
ortográfica, a análise da variação da escrita oferece indícios para
alguma percepção da voz. Do mesmo modo, se o que está escrito
procura espelhar a voz e esta nos falta, pelo escrito se pode
depreender, embora não integralmente, a língua no seu uso primeiro,
em qualquer dos níveis em que se pode estruturá-la: fônico, mórfico,
sintático, discursivo. (MATTOS E SILVA, 2001, p. 39)
31
2.1 Português Arcaico
As CSM, escolhidas para compor o corpus desta tese, foram mandadas compilar
por Afonso X (1221-1284), tendo sido produzidas principalmente no período final de
sua vida; encaixam-se, portanto, no período chamado de “arcaico” do desenvolvimento
do português, fase que tem seus limites cronológicos entre os séculos XIII e XV.
Segundo Mattos e Silva (1989, p. 15):
[...] o lugar de produção coincide com os limites históricos em que o
português era usado como língua escrita – e isso não se restringe aos
limites da nação portuguesa, como se sabe – e os informantes são os
produtores (autores, tradutores, copistas) dos documentos que,
elaborados naqueles limites cronológicos, chegaram até o
pesquisador actual.
Em qualquer estudo de caráter histórico, tende-se a uma delimitação das épocas
durante as quais o objeto de estudos, neste caso em particular a língua, apresenta uma
certa coerência, e é essa coerência que Nascimento (1988, p. 123) afirma haver em
relação às CSM:
Para nós, a cantiga religiosa afonsina é um documento histórico-
lingüístico em que podemos registrar um primeiro estágio de repouso
da língua, que legitima identidades sócio-culturais, no mesmo
instante em que se instaura como lugar de constituição da memória,
já que podemos perceber, em seu funcionamento, reflexos do passado
e perspectivas de futuro.
Quando uma língua é dividida em períodos, estes não podem traduzir-se em
datas precisas, pois as mudanças lingüísticas acontecem, embora em ritmos diferentes,
dependendo da época, de maneira extremamente lenta. Por isso, há um consenso entre
os autores em não escolher datas, mas sim escolher períodos de separação longos,
32
temporalmente. Os limites temporais, assim, não aparecem claramente definidos devido
ao caráter paulatino dos processos de mudança lingüística.
A questão da periodização não pode ser tratada sem se levar em conta os
principais aspectos teóricos referentes ao complexo fenômeno da mudança lingüística,
que implica aspectos estruturais e aspectos sociais. Segundo Maia (1999, p. 23), a
discussão a propósito dos critérios – critérios internos e critérios externos – que
suportam as diferentes propostas de periodização não pode separar-se do tratamento
desta questão do condicionamento da mudança lingüística.
A história interna da língua a que se refere a autora seria a descrição da língua
enquanto sistema funcional, fenômenos estruturais que devem ser descritos, a respeito
dos quais o lingüista deve procurar descobrir as motivações “intra-sistemáticas e as
repercussões que essas mudanças internas tiveram na estrutura lingüística” (MAIA,
1999, p. 23). Já a história externa abrange todas as circunstâncias que fazem parte do
contexto sócio-cultural em que vive a língua, transformações sociais de grande impacto
que ocasionam modificações na estrutura lingüística.
Revendo a bibliografia sobre o assunto, verifica-se que, para fazer a
periodização, os autores ora se baseiam em critérios exclusivamente internos
(MESSNER, 2002), ora em critérios preponderantemente externos (SILVA NETO,
1956), ora na combinação desses critérios (VASCONCELOS, 1959).
Em relação ao surgimento da língua portuguesa, é preciso notar que o latim foi
aos poucos se diversificando até o surgimento das chamadas línguas românicas;
Williams (1973[1938], p. 25) assim explica as causas das transformações das línguas
românicas:
33
A diferenciação do latim vulgar de uma região para outra, que
finalmente resultou na sua transformação nas diversas línguas
românicas crê-se ter sido devida às causas seguintes: a) o relativo
isolamento geográfico dos grupos entre si b) o desenvolvimento de
unidades políticas separadas c) a variação cultural e as circunstâncias
educacionais ou o período de romanização e) as diferenças dialetais
na língua dos colonos itálicos f) os substratos lingüísticos originais g)
os superstratos lingüísticos subseqüentes.
Segundo Nunes (1969, p. 3-18), no século XI, separou-se do reino de Leão e
Castela o condado de Portugal, cujo centro era a região de Porto. Esse novo reino
consolidou como língua nacional o seu romanço peculiar, que constituiu a língua
portuguesa. Levada para o sul, à medida que Portugal se expandia, encontrava falares
moçarábicos – “dialetos românicos falados pelos cristãos que ficaram sob o domínio
árabe, desde o século VIII e durante o processo de Reconquista” (MATTOS E SILVA,
2001, p. 19) – e enriquecia e modificava como língua nacional. Bem cedo, o grande
centro lingüístico passou a ser Lisboa, conquistada pelo primeiro rei português, Afonso
Henriques.
Ainda segundo o autor, na segunda metade do século XIII, Portugal firmou seu
território definitivo. A língua portuguesa já apresentava, então, uma língua literária
stricto sensu. Nela se compôs uma rica poesia lírica, associada pela técnica e pela
temática à do sul da França. A língua escrita corrente e a prosa literária foram mais
tardias e substituíram o hábito da redação em latim.
Câmara Jr. (1975, p. 18), baseando-se na língua escrita, divide o português em
período “arcaico”, que vai até o século XV, e em um período posterior que se pode
chamar já de “moderno”. Distinguem-se essas duas fases por traços característicos de
natureza fonológica, gramatical e lexical bem demarcados. Em referência à norma
lingüística, é no século XVI que ela começa a se organizar disciplinariamente, por meio
das primeiras gramáticas (Fernão de Oliveira, João de Barros, Duarte Nunes de Leão).
34
O autor considera ainda um período “clássico”, compreendendo os séculos XVI
e XVII, e outro “pós-clássico”, relativo aos séculos subseqüentes. No português clássico
é sensível uma disciplina sintática calcada no latim literário, enquanto no século XVIII
isso se quebra e a frase escrita se pauta por períodos mais curtos, sintaticamente soltos.
Em relação ao início da história da língua portuguesa, todos os estudiosos são
unânimes em situá-la no início do século XIII, pelo fato de só então se ter verificado a
passagem para a escrita da língua do noroeste hispânico, remontando a essa época o
início da tradição escrita em galego-português. Já em relação ao término da primeira
fase histórica da língua portuguesa, não há consenso entre os filólogos e historiadores,
os limites são variáveis nas tentativas de classificação cronológica da língua portuguesa.
Entre os séculos IX e XII, já havia fenômenos específicos que singularizavam a
área lingüística galego-portuguesa em relação a outros romances hispânicos. Esse
período é considerado por alguns filólogos de proto-histórico. Mas é realmente no final
do século XII e início do século XIII que se situa o início do período arcaico, como
afirma Williams (1973[1938], p. 27), por uma razão explícita: é nesse momento que a
língua portuguesa aparece documentada pela escrita.
Os mais antigos documentos em português aparecem pelo fim do
século XII e marcam o comêço histórico do Português Arcaico.
Durante quatro séculos a língua sofreu muitas modificações. [...] Pelo
fim do século XVI, quase tôdas as características distintivas do
Português Arcaico haviam desaparecido; a língua se tornava, no
essencial, a mesma de hoje em dia.
Como término da primeira fase do português, os autores se baseiam em fatos de
caráter extralingüístico, acontecimentos de caráter histórico, como a morte, em 1354, de
D. Pedro, o último grande representante da poesia trovadoresca, a batalha de
35
Aljubarrota, a crise de 1383-1385, e a vitória do Mestre de Aviz, ou em fatos da história
literária.
De acordo com Matos e Silva (2001, p. 16), marcam o nascimento do PA o
Testamento de Afonso II, datado de 1214, e a Notícia do Torto, escrita entre 1214-1216.
Acredita-se também que as mais antigas cantigas de amigo e de amor do Cancioneiro
Medieval Português datam do início do século XIII, já que a musa inspiradora de
algumas dessas cantigas, Maria Pais Ribeiro, a Ribeirinha, foi amante de Sancho I, rei
português, entre 1185 e 1212.
Tavani (1988, p. 41), por sua vez, propõe recuar a data de produção do texto
poético mais antigo para 1196, baseado em uma cantiga de escárnio de Joam Soares de
Paiva – que é identificada pelo seu primeiro verso: Ora faz ost’o senhor de Navarra
que supostamente teria sido composta na mesma época dos eventos históricos relatados
no poema.
Mattos e Silva (2001, p. 17) enumera os principais aspectos extralingüísticos que
determinam o fim do PA, mas afirma que esses dados devem ser levados em
consideração enquanto não há um estudo essencialmente estrutural da língua:
[...] são acontecimentos extralingüísticos que são tomados como
balizas para marcar o fim do período arcaico, tais como: o surgimento
do livro impresso, em substituição aos manuscritos medievais, nos
fins do século XV e suas conseqüências culturais; o incremento da
expansão imperialista portuguesa no mundo, que se refletiu na
sociedade portuguesa européia pelo contato com novas culturas e
novas línguas, provocando, certamente, reflexos na língua portuguesa
no seu processo de variação e mudança; o delineamento de uma
normativização gramatical, a partir de 1536, com a gramática de
Fernão de Oliveira e de 1540, com a gramática de João de Barros,
aparelho pedagógico que, juntamente com as cartilhas, que se
multiplicaram daí por diante, darão conformação explícita a um
futuro “dialeto” que se tornará a base para o ensino. Desde então será
o português língua da escola ao lado do latim, língua exclusiva da
escola em toda a Idade Média românica.
36
Como será visto adiante, o texto das CSM pode ser considerado um testemunho
legítimo do PA, pois seu compilador, Afonso X, passou a maior parte de sua infância na
Galiza, sendo provavelmente falante nativo de galego-português (MASSINI-
CAGLIARI, 2007a), o que faz com que essa obra seja de grande valor para qualquer
estudo que tenha como foco a língua galego-portuguesa do período trovadoresco, como
é o caso deste trabalho.
2.2 As Cantigas de Santa Maria
As CSM, uma coleção de 420 cantigas religiosas em homenagem à Virgem
Maria, foram elaboradas em galego-português e atribuídas a Dom Afonso X de Castela,
o Sábio, que as teria elaborado com a colaboração de trovadores, músicos, desenhistas e
miniaturistas das mais variadas origens e culturas, que ele acolhia na sua corte. Para
Parkinson (1998, p. 179), elas constituem um monumento literário, musical e artístico
da mais elevada importância. Mettmann (1986b, p. 8) confirma a relevância desse
corpus para o estudo da época medieval:
Por haberse logrado en ellas un perfecto equilibrio entre texto,
melodías y pintura ocupan las Cantigas de Santa Maria un lugar
privilegiado en la literatura medieval, y no cabe duda de que para su
régio ‘autor’, el “fazer sões” y el “pintar” no eran de menor
importancia que el “contar”, “trobar” y “rimar”. Huelga subtrayar
el rango que en la historia de la espiritualidad les corresponde a las
Cantigas como al monumento literario más destacado del culto
mariano en la Península Ibérica, su interés para la historia de la
métrica y, finalmente, su importancia como uma de las fuentes más
ricas del galaico-portugués antiguo.
Para Keller (1987, p. 10), “Alfonso produced an anthology of miraculous
narratives which would surpass any such collection before or during his time. This
collection was the Cantigas de Santa Maria”.
37
Uma interpretação das Cantigas que difere um pouco das anteriores é a de
Castro (2006). O autor acredita que a obra religiosa afonsina é um legítimo
representante da literatura gótica; desta forma, as Cantigas seriam uma espécie de
“catedral gótica literária”:
[...] além de representarem as transformações históricas, guardando
óbvias ligações com o culto mariano, [as CSM] não só dão um vasto
espaço ao diabo como personagem, mas também assemelham-se às
catedrais na representação da diversidade populacional e das crenças
fantásticas, algo demonstrado nas imagens ora esculpidas nas
paredes, ora iluminadas nos vitrais dessas construções sagradas. Em
sua vastidão, o texto apresenta uma enorme variedade de povos
(etnias, religiões, nacionalidades, classes sociais) e os mais
fantásticos acontecimentos. Podemos até pensar que as riquíssimas
iluminuras que acompanham originalmente os textos e as notações
musicais servem-lhe como os vitrais, que trazem um encanto
inigualável às construções religiosas. (CASTRO, 2006, p. 44-45)
Leão (2002, p.1) chama atenção para o ambiente em que esta antologia foi
criada, mostrando a riqueza de trabalhos desenvolvidos por Afonso X:
No mesmo scriptorium também se compilavam leis, ou se
registravam em códigos várias normas consuetudinárias; escreviam-
se tratados de várias ciências; registrava-se a história da Espanha,
bem como uma história geral da humanidade; traduziam-se obras do
hebraico, do árabe ou do grego por via do árabe; compunham-se
obras sobre jogos e lazeres, como o xadrez e os dados; produziam-se
poemas profanos e sacros, cujos textos eram copiados, musicados e
miniaturados em belíssimos manuscritos.
Segundo Leão (2007, p.20), foi nesse contexto de efervescência cultural que
surgiram as CSM, uma coleção de mais de quatro centenas de cantigas, 420 no total,
narrativas ou líricas, das quais 356 narram os milagres da santa (miragres); as demais,
com exceção de uma introdução e dos prólogos, são de louvor a Virgem (loores), estas
distribuídas de dez em dez. Tirando o poema introdutório, todas estão acompanhadas de
melodias. Para Parkinson (1998, p.179), dado que a intenção dessa coletânea foi sempre
a de louvar a Virgem e aumentar a devoção a ela, todas as cantigas são na verdade de
38
louvor, todas exaltam a Mãe de Deus, vista, sobretudo, como nossa indulgente
advogada junto a Jesus Cristo.
Muitos milagres marianos foram recolhidos de igrejas e santuários europeus,
principalmente franceses e ibéricos, e são de fonte confirmada e bem conhecida, mas
muitos relatos são ainda hoje de fonte desconhecida e provavelmente apenas oral
(FILGUEIRA VALVERDE, 1985, p. 49).
Para Leão (2007, p. 26-27), é importante ressaltar que não há apenas uma
narrativa verbal, mas também uma narrativa iconográfica em iluminuras, que se
dispõem numa só página, dividida em seis quadros; e ainda outra narrativa textual,
resumida, sob a forma de seis legendas, cada qual colocada acima de um quadro da
seqüência das iluminuras (apenas nas primeiras 25 cantigas, que receberam
prosificações em castelhano, colocadas abaixo das iluminuras, no manuscrito Escorial
rico). A autora ainda acrescenta que a narrativa verbal se expressa em “sintético poema
cheio de subentendidos”, enquanto a narrativa visual que a acompanha pode extrapolá-
la para preencher eventuais lacunas da narrativa poética.
Segundo Mettmann (1986b, p.12), as cantigas de milagres podem ser divididas
em três grandes grupos, segundo a procedência e o cenário das histórias narradas. No
primeiro grupo teríamos todos os milagres marianos divulgados pelo ocidente cristão;
algumas destas coleções reúnem milagres localizados em determinados santuários,
sobretudo franceses. No segundo grupo estão as cantigas relacionadas com santuários da
própria península. Finalmente, no terceiro grupo, as cantigas relatam acontecimentos
milagrosos sucedidos ao próprio Rei, a membros de sua família ou às pessoas próximas
a ele; algumas cantigas são de caráter autobiográfico. O quadro abaixo, retirado de
Mettmann (1986b, p. 12), apresenta a distribuição das cantigas de acordo com os tipos
39
apresentados acima (cantigas que narram milagres acontecidos em várias partes da
Europa – internacionais, na própria península – nacionais, e ao próprio rei – pessoais).
Cantigas Milagres Internacionais Nacionais Pessoais
1-100 89 75 14 1
101-200 90 46 44 3
201-300 90 36 54 8
301-427 87 19 68 13
Quadro 2.1. Distribuição das cantigas de acordo com sua origem (Mettmann, 1986b, p.12)
Podemos perceber pelo quadro 2.1 a evolução do projeto a partir do conteúdo
dos milagres retratados. Os milagres de tradição européia, os internacionais,
predominam no conjunto das primeiras cem cantigas, mas essa proporção diminui muito
conforme se avança a cada grupo de 100. Já a proporção de narrativas localizadas na
Península Ibérica aumenta. No final, há um aumento considerável de eventos associados
ao Rei Afonso X diretamente, ou a membros de sua família e de sua corte (MASSINI-
CAGLIARI, 2005, p. 66).
Filgueira Valverde (1985, p. 50) também classifica as fontes das Cantigas, mas
de uma maneira um pouco mais pormenorizada que Mettmann, da seguinte forma: a)
marianos latinos sem característica local; b) romances marianos; c) obras gerais de onde
se tomaram temas relativos à aparição da Virgem; d) coleções locais estrangeiras; e)
coleções locais peninsulares; f) milagres familiares ou autobiográficos.
Mettmann (1986b, p. 13) explica que a estrutura dos poemas narrativos é
praticamente invariável: há um estribilho inicial, que se repete depois de cada estrofe e
apresenta o tema; nas primeiras estrofes se dão normalmente indicações mais ou menos
40
concretas sobre o espaço, a época, às vezes a fonte e nomeiam-se as personagens
envolvidas na história.
Já em relação às cantigas de louvor, todos os temas, os epítetos e imagens têm
antecedentes ou paralelos na literatura mariana anterior ou contemporânea, nas quais o
Rei e seus colaboradores se inspiravam sem seguir modelos determinados. Mettmann
(1986b, p.14) acredita que havia clérigos entre os autores, devido à grande familiaridade
com textos litúrgicos. Entre as 61 cantigas de caráter não-narrativo, predominam
aquelas que celebram Maria como auxiliadora, mediadora e procuradora. Segundo Leão
(2007, p. 8), nessas cantigas (de louvor), a presença da figura de Afonso X é freqüente,
sempre retratado em uma postura humilde:
Diferentes no propósito e no valor documental são as cantigas de
loor, que constituem a parte essencialmente lírica da coletânea.
Algumas vezes em discurso direto, mostram sempre o Rei-trovador
diante da Virgem Maria, exaltando-lhe as qualidades ou oferecendo-
lhe a sua devoção, da mesma forma que, nas iluminuras respectivas, a
figura do Monarca é presença constante, na mesma postura humilde.
Para Keller (1987, p. 15), a música deve ser considerada tão importante quanto
os outros aspectos mais comentados pelos estudiosos, as histórias em versos e as
ilustrações. Segundo o autor, sem a música, as Cantigas seriam apenas milagres e hinos
escritos em verso e ilustrados.
Segundo Filgueira Valverde (1985, p. 44), as cantigas estão escritas, como
outras obras afonsinas, a partir de uma idéia de “exemplaridade”. Esta tendência não é
mera inclinação pessoal, era a direção dominante da época, que estabelecia todo um
gênero “exemplar”, tendo assim pretexto para recorrer à narrativa tradicional do Oriente
e da antigüidade clássica, para criar e compor novos relatos e para infiltrar passagens
amenas nas mais elaboradas formas literárias.
41
Así surge el “exemplum”, con su carácter didáctico, de predicación,
dando paso a un triple juego: teológico, moral e imaginativo. El
orador expone su doctrina, saca la conclusión práctica e ilustra, con
una narración o fábula, doctrina y conclusiones. Así había entendido
el ejemplo la retórica clásica, en su utilidad para la comprensión, la
persuasión y el recuerdo, apelando a la vez a la inteligencia, a la
voluntad y a la memoria; así lo utilizó la cristiandad desde los
orígenes mismos de la predicación evangélica. (FILGUEIRA
VALVERDE, 1985, p. 45)
Já Keller (1987, p. 7) chama atenção para outro aspecto das cantigas de Afonso
X: o recreacional. Para o autor, é este aspecto que une todos os outros elementos,
imprime racionalidade aos poemas, chama e prende a atenção, “and imparts to the
remarkable volumes the power and the charm which enabled the king to confront the
widest possible public in all its masses and classes”.
Não se sabe precisar ao certo quando foi escrita cada uma das CSM, mas as
diversas fases de sua elaboração distribuem-se ao longo de alguns anos. É possível
situar as cantigas no tempo com base nas referências históricas que se podem extrair do
próprio texto. A biografia de Afonso X também é um fator crucial na datação dos
poemas da coleção, sendo importante apontar os fatos mais relevantes de sua vida para
poder supor aproximadamente a data de cada um dos manuscritos (MASSINI-
CAGLIARI, 2005, p. 62).
2.3 A vida de Afonso X
É preciso, antes de qualquer análise lingüística sobre este corpus, conhecer um
pouco sobre a biografia do rei Afonso X, pois ela certamente nos fornecerá elementos
necessários à datação dos documentos que iremos analisar e também dados sobre a
linguagem escolhida por ele para compor as CSM.
42
Afonso X era filho de Fernando III, rei de Leão e Castela, e de Beatriz de
Suábia. Sua bisavó, Leonor, esposa de Afonso VIII, fundou o monastério de las Huelgas
em Burgos. Sua bisavó, Berenguela, e os pais de Afonso X encontravam-se envolvidos
em milagres da Virgem Maria, que foram recontados por Afonso nas CSM. A nova
construção da igreja de Santa Maria em Toledo foi iniciada por Fernando III em
aproximadamente 1225 e seu andamento acompanhou o crescimento de Afonso X
(SNOW, 1987, p. 475). Percebe-se que toda a infância de Afonso esteve envolvida em
uma esfera religiosa, em especial relacionada a Maria.
De acordo com Filgueira Valverde (1985, p.11), Afonso X, nascido em Toledo
em 22 de novembro de 1221, falecido em Sevilha em 4 de abril de 1284, tornou-se rei
em 1252. Passou sua infância na Galiza, onde tinha terras seu preceptor García
Fernández de Villaldemiro, casado com uma dama de estirpe galega, Mayor Arias.
Casou-se em 1246 com a princesa Violante ou Yolanda, filha de Jaime I de Aragão,
hábil diplomata que abriu caminho de pactos proveitosos para o reino.
Como rei, foi um político ambicioso e arrojado condutor de campanhas bélicas;
possuía excepcional disposição para o governo de seus estados e o realizava de maneira
muito direta - isso não quer dizer que não tenha enfrentado problemas e cometido erros
no exercício do poder (FILGUEIRA VALVERDE, 1985, p.12). Segundo Leão (2007, p.
18), Afonso X dominava um território muito maior do que o dos reinos de Castela e
Leão; seu domínio:
[...] se estendia da Galiza até Aragão, em toda a faixa Norte, e da
Galiza até o Sul, na faixa litorânea, contando-se ainda numerosas
cunhas encravadas nos territórios muçulmanos, como Badajós,
Sevilha, Córdova, Múrcia e tantos outros burgos que ia tomando aos
mouros nas lutas da Reconquista.
43
Entretanto, Leão (2007, p. 19) afirma que o trono que D. Afonso X ocupou
durante trinta e dois anos (de 1252 a 1284), a partir dos 31, sempre lhe pesou como um
fardo, não tanto pelas lutas contra os mouros, mas pelas dissensões familiares e pelas
intrigas da corte; acrescenta que o que o consolava eram as mulheres – reconheceu doze
filhos – e os estudos, pelos quais recebeu fama e glória e a alcunha de “o Sábio”.
Portanto, sua figura está em evidência principalmente na atividade poética
ibérica do século XIII, por ele a ter encorajado e patrocinado, antes de ser por ele
próprio praticada, como acredita Bertolucci Pizzorusso (2002a, p.37):
[...] a sua corte foi o lugar de encontro de um grande número dos
poetas galego-portugueses mais representativos e de muitos
trovadores provençais, que encontraram em Alfonso X não só o
patrono como também o inteligente e interessado interlocutor para
questões requintadamente literárias e científicas, cujas autorizadas
respostas são por alguns deles versificadas.
Para Filgueira Valverde (1985, p. 19), Afonso X não conseguiu realizar todas as
suas intenções no campo político, como, por exemplo, “el acceso al Sacro Romano
Império”, mas se viu compensado no âmbito cultural, no qual alcança indiscutida
soberania, dominando diversos campos: o jurídico, o histórico, o das ciências naturais, o
das narrativas e louvores religiosos, o das Cantigas, e até o da lírica profana. Snow
(1987, p.475) também acredita que a maior parte dos sonhos políticos de Afonso X não
foi realizada:
We are all familiar with the many ways in which his dreams for
political harmony and even Empire were left unfulfilled, impossibly
shattered, at the hour of his death. Political reverses in his later
years were accompanied by disaffection within his own family circle,
and there can have been little left to cheer him in those final days.
That is, if we omit his personal hopes for salvation through the
person of Mary, the mediatrix between all sinners and their God.
44
Vejamos algumas de suas principais obras, de acordo com Filgueira Valverde
(1985, p. 24-27):
Afonso X dirige e elabora duas obras importantes na historiografia
medieval: Estória de España e Grande e General Estória.
No aspecto jurídico, as suas Partidas ou o Fuero de las Leyes são os
mais importantes códigos da Idade Média, pois disciplinaram e ajudaram
os juristas a conhecer seus direitos e obrigações.
As obras científicas foram realizadas também com a ajuda de humanistas
e de sábios, usando textos traduzidos ou construindo aparatos
astronômicos. São alguns desses textos: Libros del saber de Astronomía,
El libro de las cruces, Lapidario, Setenario.
O Libro del açedrex, dados e tablas trata do lúdico como descanso do
trabalho; é um valioso tratado sobre o tema nessa época.
Afonso X nos lega também uma copiosa obra lírica galego-portuguesa
que abarca todos os gêneros, com 44 cantigas profanas e 420 cantigas
religiosas, mais um fragmento incluindo as de amor.
2.4 A linguagem escolhida por Afonso X
Afonso X, que muito cedo foi coroado rei, teve como língua materna o
castelhano, porém escreveu toda a sua obra poética em galego-português
(RÜBECAMP, 1932, p.280), usando o castelhano apenas para os seus trabalhos em
prosa. Afonso X, portanto, segundo Rübecamp (1932), não escolheu sua língua
materna, mas a língua do noroeste ibérico para trovar. Leão (2002, p. 2) afirma que isto
45
aconteceu devido ao fascínio exercido por uma língua que se afirmava como apta, ou
até ideal, para a poesia:
Aliás, esse fato não era único na Europa Medieval, onde três línguas
vernáculas gozavam da preferência dos poetas: o galego-português no
mundo ibero-românico; o provençal no domínio galo-românico; e o
toscano no âmbito ítalo-românico. O seu prestígio era tão
amplamente reconhecido, que muitos trovadores, no ato de trovar,
deixavam de lado as respectivas línguas maternas e adotavam uma
das três grandes línguas poéticas de então. Foi o que ocorreu com D.
Afonso X. Compôs suas próprias cantigas e dirigiu ou supervisionou
a composição de outras pelos seus colaboradores, utilizando o
galego-português. (LEÃO, 2002, p. 2)
Leão (2002, p.2) acredita que a linguagem nas CSM não pode ser tomada como
um registro da língua oral corrente, já que se trata de um instrumento lingüístico
literário. Ela afirma que linguagem fixada na escrita não deve ser confundida com o
galego-português oral, que como toda e qualquer língua está em constante variação.
Embora essa preocupação de distinção entre a linguagem literária e a oral deva existir, o
galego-português do povo não está de todo ausente nas cantigas e isso é facilmente
percebido nos inúmeros diálogos encontrados nas cantigas, nos quais muitos dados
desta pesquisa se baseiam, e que de tão naturais certamente tentam reproduzir a fala do
povo, aproximando-se desta o quanto possível, em um contexto de narrativa poética. Já
Filgueira Valverde (1985, p. 39) reconhecia um caráter mais popular na linguagem das
CSM:
La lengua de los trovadores no era algo artificial, sino un producto
artístico, sincero, inspirado muy de cerca en el gallego vulgar, que
hoy perdura con muchas características de aquélla, inmediata en las
Cantigas a la lengua hablada […]. (FILGUEIRA VALVERDE,
1985, p. 39)
Outro aspecto sobre a linguagem das cantigas observado por Leão (2002, 2007)
é o fato de a língua mãe do principal trovador (ou para usar um termo de Leão, 2002,
46
p.3, o “mestre daquela corporação de poetas”) ser o castelhano, o que torna inevitável,
segundo a autora, a interferência dessa língua no galego-português. Porém, não
podemos nos esquecer de que Afonso X passou uma grande parte de sua infância na
Galiza, sendo criado por García Fernández de Villaldemiro, tornando-se, assim, muito
provavelmente falante nativo também do galego-português (vejam-se as subseções 2.1 e
2.2, nesta tese).
Para Leão (2002, p. 3), o que distancia as cantigas do padrão oral do galego-
português é a sintaxe “retorcida”, a mudança na ordem normal das palavras dentro dos
sintagmas e a ordem destes dentro da oração. A autora acredita que isso se dá por dois
motivos. Primeiro porque muitas das fontes de Afonso X estavam escritas em latim e
isso transparece na sintaxe das cantigas, uma vez que algumas frases têm uma
construção tão estranha que ela acredita serem cunhadas em moldes latinos. Outro
motivo seria a versificação das cantigas, que é extremamente sofisticada, tanto na
escolha e na combinação dos metros, quanto na construção das estrofes e na disposição
das rimas, distanciando-se muito da simplicidade estrutural das cantigas de amor e
amigo.
Leão (2002, p.3; 2007) também chama a atenção para a riqueza do vocabulário e
do estilo em geral das cantigas. Como elas apresentam uma diversidade muito grande de
temas, e não retratam apenas a vida religiosa, apresentando a vida em toda a sua
complexidade, é evidente que essa temática ampla tenha repercussões na linguagem.
Filgueira Valverde (1985, p. 21) tem a mesma opinião da autora, referindo-se à escolha
reflexiva de cada vocábulo usado por Afonso X, sua busca constante de novos assuntos
e fórmulas rítmicas para expressá-los, e sua preocupação com cada detalhe da narração
poética ou histórica.
47
Os problemas levantados pela abundância de um material narrativo tão rico e
variado, a ser transposto para formas aptas ao canto, foram sem dúvida os mais difíceis
de resolver segundo a pesquisadora (LEÃO, 2002, p.3); são usadas assim estratégias no
nível sintático como hipérbatos
18
e outras figuras de linguagem para conseguir essa
transposição, mas ao mesmo tempo não se utiliza uma ornamentação puramente
decorativa - são raras as figuras de tipo metafórico por exemplo. E é justamente essa
sintaxe que Leão (2002, 2007) analisa, em especial o anacoluto
19
, a topicalização
20
e a
cliticização
21
.
Leão (2002, p.3) diz ainda que o galego-português literário do século XIII
apresentava uma unidade, mas certamente já começava a fragmentar-se na língua oral, e
isso já era percebido na linguagem literária, mas ainda não de forma tão evidente. Uma
prova disso, para a autora, é que a linguagem dos três cancioneiros profanos se
encaminha para o padrão português, enquanto que a linguagem das CSM, no que diz
respeito à fonologia e à morfologia, tende para o padrão galego. Ferreira (1994, p. 66)
acredita que no manuscrito E há a presença de um grande número de formas que
denotam uma forte influência castelhana.
18
Segundo Câmara Jr. (1974[1956], p. 106), hipérbato é uma figura de estilo caracterizada pela
ocorrência de uma ordem inversa que colide com a norma geral da colocação e chega a
prejudicar a clareza. Exemplo: “Mui grandes noit'e dia/devemos dar porende/nos a Santa
Maria/graças, (...)” (refrão da cantiga 57) (LEÃO, 2007, p. 161).
19
Segundo Câmara Jr. (1974[1956], p. 65), anacoluto ou frase quebrada é aquela em que a uma
palavra ou locução, apresentada inicialmente, se segue uma construção oracional em que essa
palavra ou locução não se integra. Exemplo: “Quantos em Santa Maria/esperança an,/bem
se/porrá sa fazenda” (refrão da cantiga 66) (LEÃO, 2007, p. 159).
20
Para Perini (2006, p. 189-190), o tópico sentencial ocorre quando um termo da oração é
marcado, de uma maneira ou de outra, como tópico, o que lhe dá destaque de tema, isto é, é o
termo da frase do qual se afirma (ou se pergunta) alguma coisa. Exemplo: “A Virgen Santa
Maria/todos a loar devemos” (refrão da cantiga. 8) (LEÃO, 2007, p. 158).
21
Leão (2007, p. 154) levanta o problema dos clíticos em posição de ênclise, que difere da
situação atual. Hoje, somente os pronomes pessoais oblíquos se ligam encliticamente ao final
dos verbos. Nas CSM, entretanto, tanto podem ser clíticos alguns pronomes oblíquos, quanto os
artigos definidos e o pronome demonstrativo neutro. Exemplo: “Ali u' todo-los santos non an
poder de põer conselho, pono a Virgem, de que Deus quiso nacer” (refrão da cantiga 313). A
forma todo-los envolve um quantificador e um artigo (LEÃO, 2007, p. 155).
48
Há autores que discordam dessa posição de Leão (2002, 2007), como Gonçalves
(1985, p. 18-19), para quem a linguagem dos cancioneiros e das Cantigas é a mesma, o
galego-português:
Por lírica galego-portuguesa entendemos um grupo de cerca de 1980
textos de assunto profano transmitidos por três cancioneiros, e 420
textos de tema religioso – as chamadas Cantigas de Santa Maria,
com uma tradição manuscrita autônoma -, todos eles escritos numa
língua uniforme com características bastante uniformes, o galego-
português, num período que vai de finais do século XII à segunda
metade do século XIV.
Massini-Cagliari (2005, 2007a) também não concorda completamente com as
afirmações de Leão (2002, 2007) quanto à diferença de linguagem entre as cantigas
profanas e religiosas. A autora fez um estudo comparativo, a partir da análise de alguns
aspectos prosódicos, entre a linguagem da poesia lírica profana (cantigas de amor, de
amigo e de escárnio e maldizer), proveniente de Portugal e Galiza, e das cantigas
religiosas, nas quais o galego-português “é usado como língua de cultura em um país
estrangeiro, Castela, a mando do Rei, para poder melhor louvar à Virgem, na língua
mais apropriada para esta finalidade” (MASSINI-CAGLIARI, 2007a, p. 102).
Em sua tese de livre-docência de 2005 e no artigo de 2007a, Massini-Cagliari
prova que as duas dimensões do PA consideradas são muito próximas, no que diz
respeito aos elementos prosódicos enfocados por ela, como, por exemplo: complexidade
do ataque silábico, travamento silábico, processos de sândi, encontros vocálicos
intravocabulares, acento. As diferenças fonológicas encontradas entre esses dois
discursos não são de tipologia dos fenômenos, mas de freqüência. Ressalva, ainda, que
as CSM têm um nível de formalidade de expressão muito maior do que as cantigas
profanas, “dada a tendência mais latinizante do discurso religioso, que, embora
composto em galego-português, se referia a um universo em que dominava o latim,
língua oficial da Igreja” (MASSINI-CAGLIARI, 2007a, p. 113). E conclui: “Não
49
havendo distinções tipológicas, não há diferença de sistema; em outras palavras, trata-se
de uma e a mesma língua” (MASSINI-CAGLIARI, 2007a, p. 122). Podemos, portanto,
assegurar que a escolha das CSM como corpus deste trabalho é extremamente
pertinente, já que essa obra representa a linguagem dos trovadores galego-portugueses
(muitos deles, inclusive, colaboradores de Afonso X); além disso, como as informações
biográficas dão conta de que Afonso X passou a maior parte da sua infância na Galiza,
muito provavelmente era falante nativo de galego-português.
2.5 Os códices
Os testemunhos que chegaram até nós do cancioneiro mariano são quatro, todos
eles pergaminhos do final do século XIII, repletos de notações musicais. Costumam ser
referidos pelas siglas To, E, T e F, e suas cotas para referências são as seguintes
(PARKINSON, 1998, p. 180):
E: El Escorial, Real Monastério de San Lorenzo, MS B.I.2 (códice dos músicos).
T: El Escorial, Real Monastério de San Lorenzo, MS T.I.1 (códice rico ou
códice das histórias).
F: Firenze, Biblioteca Nazional Centrale, Banco Rari, 20 (códice de Florença).
To: Madrid, Biblioteca Nacional, MS 10.069.
Mettmann (1986b, p.21) e Ferreira (1994, p.59) consideram T e F como um
manuscrito em dois tomos; Mettmann ainda afirma que há uma relação muito estreita
entre E e T/F pelo conteúdo e a ordem numérica das cantigas: “To ofrece el texto más
satisfactorio y corrige errores comunes de E y T/F”. Os manuscritos To e T/F “están
estrechamente emparentados, pero que ni To puede depender de T/F, ni T/F de To”;
50
To y T/F ofrecem por lo general mejores lecturas que E, sobre todo en el aspecto
métrico”.
A coletânea mais antiga (To) contém apenas 100 cantigas, precedidas por uma
cantiga-prólogo – encontrada em todas as coletâneas - que ilustra o projeto de cantar a
Virgem e exaltá-la. Esse texto não se assemelha aos outros dois tipos pelo gênero
(miragres ou loores), pois apresenta o conteúdo do livro e o nome do autor, Dom
Afonso X, que pretende ser o Seu trovador. O texto de encerramento, chamado Pitiçon
(que não está presente apenas na edição mais rica e incompleta) funciona de forma
análoga ao prólogo: contém o pedido, depois de concluído o trabalho, da recompensa
celeste. Esse importante texto, rico em dados autobiográficos, é composto por dez
estrofes de dez versos cada uma, o que representa a soma formalmente perfeita da
primeira coletânea de cem textos do simbolismo mariano do número cinco e dos seus
múltiplos 10, 50 e 100. Aliás, esse é o critério de organização dominante de toda a
coletânea da primeira à última das suas redações e marca também o ritmo da ilustração
miniaturizada da edição mais luxuosa (BERTOLUCCI PIZZORUSSO, 2002b, p. 143).
Mettmann (1986b, p. 21-22), semelhantemente a Filgueira Valverde (1985, p.
47), supõe três etapas na elaboração das Cantigas:
1. Foi projetada uma coleção de cem cantigas, que provavelmente continha
a introdução, o prólogo e a pitiçon, cada décima cantiga era de louvor,
tendo assim 89 de milagres. Este códice chamado de To
0 22
está perdido.
2. Terminada a primeira coleção, decidiu-se duplicar o número de cantigas
e confeccionar um códice ilustrado (T). Para tanto foi necessária uma
reorganização do material de To
0
.
22
A abreviatura To
0
refere-se ao ancestral do qual teria sido copiado o códice de Toledo (To).
51
3. Novamente se quis dobrar o número para chegar a 400 cantigas: o
complemento F do códice T, que ficou incompleto. Ao lado destes dois
preciosos manuscritos, confeccionava-se o códice E, de apresentação
muito mais modesta. Para realizar o projeto eram necessárias 359
cantigas de milagres, mas faltaram algumas. Solucionou-se o problema
repetindo-se nove cantigas.
23
Massini-Cagliari (2005, p. 34) explica os passos da ampliação do projeto inicial,
começando pelo manuscrito T, passando por F, até chegar ao manuscrito E, o mais
completo de todos:
Evidências [...] sugerem fortemente que T provavelmente começou
sua vida como uma coleção fechada de 200 cantigas (o dobro de To).
Em algum ponto posterior no tempo, uma decisão foi tomada no
sentido de expandir a coleção de T: um segundo volume, justamente
F, teria sido preparado, para conter mais 200 cantigas (o que dá o
dobro do volume inicial T) [...]. Porque esta decisão teria sido tomada
já em um momento tardio na vida do monarca, e porque a execução
dos códices de las historias é extremamente complicada e demorada
(dada as dimensões da sua qualidade artística e musical), um novo
projeto foi concebido, mais modesto em termos de iluminuras, em um
único volume, capaz de conter a coleção total de 400 cantigas: E (o
códice dos músicos).
Montoya Martínez (1987, p. 377), buscando evidências no conteúdo das
cantigas, propõe o seguinte desenvolvimento dos manuscritos:
Afonso X decidira compilar 100 cantigas depois de reconquistar
Jerez, no ano de 1264, o que nos leva a crer que já estivesse
trabalhando nelas anteriormente a essa data.
Durante suas viagens por Castela, Murcia e Leão, inicia o segundo
centenário, como se percebe pela geografia dos milagres recolhidos.
23
As correspondências das cantigas que foram repetidas são as seguintes, segundo Mettmann
(1986b, p. 38): 165 = 395, 187 = 394, 192 = 397, 210 = 416, 267 = 373, 289 = 396, 295 = 388,
340 = 412, 349 = 387.
52
O terceiro e quarto centenário se compõem 1) de milagres recolhidos
no norte da Espanha, em Portugal e na França, e de milagres
sucedidos à sua família 2) de milagres que Santa Maria fez em favor
de seus empreendimentos bélicos 3) Afonso X expressa sua devoção
por Santa Maria do Porto.
2.5.1 Códice de Toledo (To)
Figura 2.2. Cantiga XX, fol. 30r – Códice de Toledo.
Fonte: http://www.pbm.com/~lindahl/cantigas/facsimiles/To/bob020small.gif
(acesso em 15 de julho de 2005)
53
O códice To, único manuscrito completo que chegou até nós, agora na
Biblioteca Nacional de Madrid, contém 100 cantigas, as quais narram milagres da
Virgem e também a louvam, mais um prólogo inicial indicando as intenções e as
finalidades do livro, e uma petiçon que encerra com uma súplica que Afonso X faz à
Virgem, com a qual deveria terminar. Foi adicionado um apêndice constituído por cinco
cantigas das Festas de Santa Maria, precedidas de rubrica explicativa, cinco cantigas das
Festas de Jesus, também precedidas de notas explicativas e com indicações marginais
sobre o uso litúrgico, e mais dezesseis cantigas adicionais em apêndice precedidas por
rubrica explicativa, contemplando assim 128 cantigas (METTMANN, 1987, p.355). To
é considerado um pouco anterior aos demais, tendo sido provavelmente terminado em
1275. Os demais, T, F e E, nunca chegaram a ser terminados, estando incompletos;
acredita-se que os trabalhos foram paralisados devido à morte de Afonso X, entre 1280-
84.
Segundo Ferreira (1994, p.72-73), a coleção original de 100 cantigas
representada por To foi finalizada provavelmente entre 1264 e 1276, pois o tema e a
topologia sugerem que os colaboradores de Afonso estavam vivendo no centro ou no
sudeste do reino, o que aponta para os anos de 1259 a 1269. Isso pode indicar que a
compilação data de 1260. Depois dessa afirmação, Ferreira (1994, p. 77-97), a partir de
observações paleográficas e notações musicais, chega à conclusão de que To é na
verdade uma cópia da coletânea original.
We may then conclude that To is a nearly contemporary copy of the
first book of the Cantigas de Santa Maria, oc, of c. 1270, expanded
with three appendices. While representing the first stages of the
Alfonsine collection both for the text and the music of the Cantigas,
To propably dates from the time of the first expansion of the
collection, i. e. between 1270 and 1280 at the latest; it should
therefore be considered its oldest surviving source. (FERREIRA,
1994, p.97)
54
Os argumentos utilizados por Ferreira (1994, p.93-95) para considerar To uma
cópia e não o mais antigo dos códices são os seguintes:
Há um número significativo de erros musicais em To, o que não seria
esperado de um livro produzido por um rei.
Este manuscrito é relativamente pequeno e sem adornos, o que não seria
apropriado para mostrar toda a devoção e religiosidade de Afonso X.
Há algumas notações musicais não compatíveis com aquelas utilizadas
na época em que se supõe que To tenha sido compilado, certamente
teriam sido acrescentadas depois.
To teria sido copiado na mesma ocasião que as demais compilações, pois
o texto do primeiro apêndice foi copiado pelo principal escriba de T, o
que é percebido pela letra dos textos.
To tem 160 folhas de pergaminho, medindo 315 de altura por 217 de largura e
espaço de texto 225mm x 151 mm, além das folhas de guarda; a letra é francesa, típica
de códices do século XII. As letras iniciais são decoradas, mas não iluminadas, a
alternância de tinta preta e vermelha também parece ser de caráter decorativo
(METTMANN, 1986b, p. 25 e MASSINI-CAGLIARI, 2005, p. 68).
2.5.2 Códice Escorialense (E)
O Códice E é o mais vasto: contém Título, Prólogo e 400 cantigas de milagre e
louvor. É neste códice que se baseiam as edições modernas (METTMANN, 1986a,
1988, 1989). A essas 400 cantigas foram acrescentadas doze composições, entre as
quais se encontram as cinco Festas de Santa Maria já presentes em To, ampliadas com
um prólogo e outros textos marianos diversos (METTMANN, 1987, p. 355). Esse
55
manuscrito, além de uma reorganização na montagem das unidades textuais que o
constituem, foi todo revisto, em particular a intitulatio e a petiçon, que continham
indicações numéricas que já não eram pertinentes. Foram acrescentadas também, a cada
dez cantigas, ilustrações de músicos tocando violas de arco, tuba, tímpanos, etc; em
termos de iluminuras, esse projeto é mais modesto que os demais (MASSINI-
CAGLIARI, 2005, p. 65). Esse manuscrito está quase completo, mas incorpora nove
cantigas duplicadas e duas sem notação musical. Ferreira (1994, p. 62) nos dá mais
detalhes sobre a elaboração desse manuscrito:
The fourth manuscript, E, is the most complete source: it contains
413 poetic texts with music for almost all of them. Like T
, it was
transferred in the late sixteenth century from Seville to the Royal
Library of El Escorial, where it has since been. Every tenth cantiga
in this manuscript is preceded by an illumination representing one or
two musicians. The order of the first two hundred songs is, with a few
exceptions, the same as found in T
. The next one hundred pieces
present the same kind of organization, but the last group of hundred
follows only a decadal order.
Figura 2.3. Ilustração: códice dos músicos (E)
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cantigas_de_Santa_Maria
(acesso em 15 julho 2008).
56
E tem seis folhas de papel de guarda, 361 de pergaminho avitelado e restos de
outras três, provavelmente em branco, que foram cortadas ao fim do manuscrito. A
altura de cada folha é de 402 mm e a largura é de 274mm. O texto, escrito em duas
colunas de 40 linhas cada uma, em letra francesa de códices do século XIII, mede 303
por 303mm ou 309 por 198mm (METTMANN, 1986b, p. 27). Segundo Massini-
Cagliari (2005, p. 80), logo após o primeiro fólio, há uma epígrafe de letras góticas
maiúsculas, alternadamente azuis e vermelhas, que traz a inscrição: Prólogo das
cantigas das cinco festas de Sca Maria Primeyra. Abaixo da epígrafe, inicia-se a
transcrição das cantigas de festas, antes do índice que se inicia no fólio 13, e que vai até
o fólio 26; os fólios 27 e 28 estão em branco. A autora ainda acrescenta a seguinte
informação:
A transcrição do refrão inicial e da primeira estrofe das cantigas é
acompanhada da notação musical. As demais estrofes e a indicação
da repetição do refrão vêm a seguir. As letras capitais alternam-se
entre azuis com adornos vermelhos e vermelhas com adornos azuis.
Na parte superior do fólio 29, está a famosa miniatura do Rei Afonso
X, rodeado de seus jograis, poetas e músicos. (MASSINI-
CAGLIARI, 2005, p. 80)
57
Figura 2.4. Cantiga 416 – Códice E.
Fonte: http://www.pbm.com/~lindahl/cantigas/facsimiles/E/014small.html
(acesso em 15 julho 2007).
58
2.5.3 Códices ricos (T/F)
Uma outra e mais luxuosa versão da coletânea conserva-se, embora incompleta
na sua última parte, nos dois preciosos códices T e F. A interrupção dos trabalhos no
códice F e a conclusão precipitada de E podem ser explicadas pela morte do rei em 1284
e por problemas resultantes da coroação de seu filho primogênito Don Sancho, em 1282
(METTMANN, 1987, p. 356).
Segundo Ferreira (1994, p.71-72), o manuscrito T deve ter sido compilado por
volta de 1271, pois a cantiga 169 refere-se à viagem de Afonso X a Murcia; F deve ter
sido copiado depois de 1279, devido às cantigas 257 e 292 que implicam uma data
anterior a 1280; E depois de 1281, devido à cantiga 393, que deve ser datada
anteriormente a 1282.
Considering that the manuscripts T and F constitute together a single
editorial project; that F
is not incomplete but seems to have been
started in adverse circumstances; and E
reflects, in the last one
hundred songs, the same disorganization found in F
– it is reasonable
to propose, tentatively, that T
was copied in the early 1280s; F after
Alfonso`s death in 1284; while E
was probably started before 1284
and finished after this year. (FERREIRA, 1994, p.72)
O Códice T, o primeiro volume da coleção bem cuidada, é conhecido como
“códice rico”, devido ao material utilizado e ao cuidado das anotações musicais, às
letras e à beleza das suas miniaturas. Possui um total de 200 cantigas, a maioria com
música, cada uma ilustrada com seis ou doze miniaturas em uma ou duas páginas
completas que seguem o texto. Muitos acham que esse manuscrito foi danificado e não
inacabado como E e F, pois, segundo Mettmann (1987, p. 355), faltam oito cantigas por
perda de fólios e foram trocados os números 5 e 15.
59
Figura 2.5. Milagre, Códice MsT.1.I, cantiga 74.
http://www.mtholyoke.edu/courses/mtdavis/222/Cantigas/Images/74.jpg
(acesso em 15 de julho de 2008)
60
Segundo Ferreira (1994, p. 60), a maioria das cantigas encontradas em To foram
copiadas em T, mas sua ordem foi drasticamente alterada, para se realizar um novo
princípio de organização: cada quinze cantigas dentro de um grupo de dez tinha que ser
longa o bastante para ocupar duas páginas e ter material narrativo para doze ilustrações
miniaturizadas em duas páginas adicionais ao invés de seis ilustrações como era de
costume.
Nesse códice há, segundo Parkinson (1998, p.87), um número elevado de
cantigas de louvor que insistem na necessidade de louvar a Virgem, com milagres que A
mostrassem participando na vida da família real. Acredita-se que fosse um presente para
o Papa, para reforçar a candidatura de Afonso X a imperador.
O manuscrito F, hoje na Biblioteca Nacional de Florença, tem as mesmas
características externas de T; seu conteúdo representa a segunda parte da coleção, mas
não há notações musicais e o um grande número de miniaturas continua incompleta.
Para Ferreira (1994, p.61), esse códice deve ter agrupado entre 130 a 200 cantigas,
porém, atualmente, contém apenas 104; um dos motivos que levam Ferreira a supor que
muitas cantigas desse códice tenham se perdido é o fato de haver ilustrações
correspondendo a pelo menos mais nove cantigas.
Devido à necessidade de urgência no término desse manuscrito por causa da
iminente morte do rei, Parkinson (1998, p.188) afirma haver uma menor consistência no
nível literário e menor variedade métrica na última centena de cantigas da coleção.
61
Figura 2.6. Imagem de Maria, Códice MsT.1.I, cantiga 42.
http://www.mtholyoke.edu/courses/mtdavis/222/Cantigas/Images/42.jpg
(acesso em 15 de julho de 2008)
T está escrito em 256 folhas de pergaminho avitelado de 485mm de altura por
326mm de largura; há duas colunas de 44 linhas cada uma (METTMANN, 1986b, p.
29). Já F não tem as mesmas dimensões de T; F compõe-se de 131 folhas de
pergaminho que medem 456 por 320mm, mas que deveriam medir mais antes da atual
encadernação, pois percebe-se claramente que foram cortadas, especialmente na parte
62
inferior, onde falta o número, em algarismos romanos, de uma antiga paginação que se
observa ainda no verso de muitas folhas (METTMANN, 1986b, p. 32). Ambos possuem
letra francesa de códices do século VIII e utilizam a mesma área de texto (335mm x
217mm), o que pode servir de argumento de sustentação à hipótese de constituírem um
único manuscrito em dois tomos (MASSINI-CAGLIARI, 2005, p. 71). Massini-Cagliari
(2005, p. 71-72) ainda nos mostra as principais diferenças entre os manuscritos T/F e
E/To:
A diferença de T/F com relação a E/To está [...] na adoção de um
layout muito mais complicado, que vislumbra a presença de
miniaturas como parte integrante de cada cantiga – o que não
acontecia com E/To, em que os textos/músicas das cantigas se
seguem uns aos outros, sem troca de página nem espaços
demarcatórios intermediários.
Segundo Mettmann (1987, p. 356), os dois manuscritos (T/F) foram corrigidos
posteriormente; isso pode ser percebido por raspaduras e palavras escritas à margem dos
textos.
Figura 2.7. Sexto quadro, miniaturas T100, CSM100.
Códice Escorial rico (Biblioteca Real Monasterio de San Lorenzo, El Escorial, MS T.I.1). fólio
145r. Reproduzido de Alvarez (1987, lâmina IX).
(apud MASSINI-CAGLIARI, 2005, p.77)
63
2.6 A autoria
Nas diversas edições que tiveram as Cantigas de Santa Maria e nas referências
internas com relação à autoria, Afonso X sempre é colocado como seu o autor. Mas a
autoria das CSM, com relação à totalidade dos poemas, é questionada atualmente,
embora por muitas vezes confirmada em algumas composições (BERTOLUCCI
PIZZORUSSO, 2002b, p.143; LEÃO, 2007, p. 20; MASSINI-CAGLIARI, 2005, p.61;
METTMANN, 1986b, p. 17; PARKINSON, 1998, p.182). Todos esses autores citados
acreditam que o rei exerceu um papel bastante importante na elaboração das Cantigas:
escolha do tema, orientação da forma de tratá-lo, revisão do texto, etc., e que muitos
colaboradores auxiliaram na fase preparatória na busca das fontes em latim (traduções)
e em língua vulgar, e das fontes orais (são freqüentes as alusões a este respeito), como
afirma Parkinson (1998, p. 183) abaixo:
No contexto do empeño persoal do rei nesta obra, e da importancia
da obra na sua procura persoal de salvación [...] é de supoñer que o
rei tería acompañado de cerca a estruturación da obra. Mais en
realidade resulta estraño que se teña pensado durante bastante
tempo que unha colectión de semellante tamaño fose unicamente do
Rei Sabio (que tería moitas outras ousas en qué se ocupar). A lóxica
indícanos, xa que logo, que non podería o rei ter composto todas as
420 Cantigas e, ó mesmo tempo, que sendo el poeta non poderia non
ter composto ningunha delas.
Castro (2006, p. 44) compara o papel de Afonso X nas Cantigas com a função de
um mestre de obras, um arquiteto medieval que cuidava de uma catedral. Para o
pesquisador, o rei Afonso X era o coordenador que supervisionava o trabalho de vários
artífices para formar uma obra grandiosa que espelharia a imensidão da fé e dos poderes
divinos, assim como o faz uma catedral.
64
É, também, muito evidente uma personalização desta obra oferecida por Afonso
à Virgem Maria pela sua salvação pessoal, fato que Parkinson (1998) a todo momento
reforça em seu trabalho. Lendo as cantigas percebemos que o rei assume para si a
primeira pessoa nos textos líricos e se faz de protagonista de textos narrativos como
sujeito de intervenções milagrosas da Virgem Maria em situações problemáticas, conta
suas doenças, suas dificuldades políticas, seus êxitos e fracassos, até sobre uma traição
da qual teria sido vítima; estende também à sua família e a pessoas da corte próximas a
ele esse mesmo privilégio. Essas referências ao rei vão aumentando ao progredir da
obra.
Filgueira Valverde (1985, p. 28-29) acredita no trabalho direto e intenso do
monarca devido à unidade estilística das Cantigas. Para ele, a tarefa da corte seria a
busca de temas em coleções e histórias e suas traduções, a ajuda ao rei na versificação e
a criação e a adaptação da musicalidade a serviço da poesia.
Montoya Martínez (1987, p. 372) concorda com Filgueira Valverde e, para
corroborar seu ponto de vista, compara a elaboração das CSM com o problema da
inspiração divina da Bíblia, sendo a autoria desta um dos temas mais estudados pelas
igrejas cristãs na época:
Alfonso X, como fácilmente podemos comprobar, pone como
comparación, que podría iluminar tal “contralla fabla”
(‘contradicción’), el ejemplo de su actividad literaria: el proceso de
creación literaria por él ejercitado; proceso que tiene como
protagonista al rey, pero, como en el caso bíblico, tiene unos autores
secundarios que no impiden para nada que la obra, en definitiva, sea
atribuida únicamente a un solo autor: el proprio rey. (MONTOYA
MARTÍNEZ, 1987, p. 373)
Leão (2007, p. 20) acredita ser D. Afonso X um “mestre de obras” no seu
campo, além de autor de numerosas peças literárias e musicais, marcadas pelo selo de
sua cultura e personalidade, o autor incontestável das Cantigas, de pleno direito:
65
Assim, muitas de suas obras Dom Afonso as escreveu ou traduziu
pessoalmente. Algumas outras, porém, ele planejou, supervisionou e
revisou, confiando o grosso da execução a seus colaboradores, numa
espécie de processo medieval de trabalho cooperativo, sob sua
direção. Aliás, esse sistema adotado no scriptorium real coincide com
o que ocorria nas corporações de ofício, onde toda obra se fazia sob a
direção de um “mestre”, cuja responsabilidade e autoridade lhe
garantiam o direito de autoria sobre o trabalho realizado por
“companheiros” e “aprendizes”.
Já Mettmann (1987, p. 360) acredita que uma leitura cuidadosa da coleção
inteira produz ao mesmo tempo uma impressão de homogeneidade e diversidade; afirma
que o valor artístico das cantigas narrativas é muito desigual, devido à variedade de
autores: “Al lado de composiciones donde el encanto de las leyendas es reforzado por
una narración hábil y vivaz y la soltura de los diálogos, (...) hay otras que, como queda
dicho, son productos de serie u obra de un poeta de poco talento” (METTMANN,
1986b, p. 14). Os 420 poemas apresentam mais de 280 combinações métricas distintas,
das quais 170 não aparecem mais que uma única vez. Embora seja impossível que o rei
tenha composto todas as cantigas, ele certamente compôs muitas delas, já que ele
próprio era um poeta.
[...] una lectura cuidadosa y repetida de la colección entera produce
al mismo timpo una impresión de homogeneidad y de diversidad, lo
que a primera vista parece ser una contradicción. Habiendo
adquirido, mediante el trato continuo con el texto, la necessaria
sensibilidad respecto a ciertos fenómenos estilísticos, al ritmo de los
versos y a las combinaciones de rimas, no le cabe a uno duda alguna
de que una gran parte de las Cantigas procede de la misma pluma.
[...]
Por otro lado nos encontramos repetidamente con poemas a los que,
por el cambio de estilo, se les nota en seguida que han sido
compuestos por otro autor. (METTMANN, 1987, p. 360)
Ainda segundo Mettmann (1986b, p.20), um poeta não conhecido, que poderia
ter sido Airas Nunes, teria composto um grande número de cantigas e teria sido também
66
o coordenador da compilação. Parkinson (1998, p. 184) acredita que as evidências tanto
lingüísticas quanto paleográficas são pouco claras, portanto não acha que seja possível
apontar Airas Nunes como o principal colaborador das cantigas.
Filgueira Valverde (1985, p. 31) aponta mais nomes de colaboradores. Sugere a
participação do frei Juan Gil de Zamora, confessor e amigo do rei e preceptor de Dom
Sancho, na teologia e na narrativa; de Bernardo de Brihuega, clérigo da corte,
auxiliando na busca das fontes; e de Airas Nunes, pois “su nombre aparezca escrito en
el espacio que media entre las dos columnas del folio correspondiente a la cantiga 223,
en el códice E”.
Snow (1987, p. 476) aponta também D. Diniz, neto de Afonso X, como provável
participante na elaboração das cantigas. Diniz, quando criança, foi um dos netos
favoritos de Afonso X, tendo seguido o exemplo do avô em tantos aspectos que Snow
acha impossível excluir sua participação, já que tinha vinte e três anos na época da
morte de seu avô e, como se sabe, também tinha uma paixão por poesia.
2.7 A edição de Mettmann
Massini-Cagliari (2007b, p. 29) nos explica que “editar” um texto antigo é
reproduzi-lo com o objetivo de publicá-lo e atingir assim um público mais amplo, já que
os manuscritos originais são de difícil acesso por ficarem em seções reservadas de
bibliotecas importantes e também por seu aspecto físico e gráfico. Nesse sentido, “editar
um texto antigo é interpretá-lo em diversos níveis, desde o seu aspecto material e
gráfico até o significado do seu texto” (MASSINI-CAGLIARI, 2007b, p. 29). Portanto,
foi-nos necessário escolher uma edição das cantigas para podermos estudá-la, e a
67
escolhida para o desenvolvimento deste trabalho foi a edição de Mettmann (1986a,
1988, 1989).
Mettmann (1986a, 1988, 1989) baseou sua edição das CSM na compilação mais
completa, o manuscrito E. Alguns estudiosos dos textos medievais como Parkinson
(1987) e Ferreira (1994) criticaram essa versão, afirmando que Mettmann havia feito
uma edição do códice E, e não das Cantigas como um total. Esses autores acreditam que
deveria ser dado mais crédito às variantes dos outros manuscritos para se chegar a uma
edição completa das Cantigas. Na edição revista publicada em Madrid entre 1986 e
1989, com um maior aparato crítico, Mettmann acrescentou um largo número de
variantes de To e T/F. Mas as críticas continuaram, alegando que não foram suficientes
essas alterações e que a nova edição mantinha a orientação básica da anterior.
Parkinson (1987, p. 21-24) critica três aspectos da edição de Mettmann (1986a,
1988, 1989): a escolha do texto definitivo, o tratamento dado aos refrães e o
estabelecimento da estrutura métrica. Para Parkinson, Mettmann, ao invés de coletar
textos de todos os manuscritos, segue apenas o códice E, apenas buscando os outros
códices quando E está possivelmente errado. Em conseqüência, Mettmann está
realmente produzindo uma edição de E, com notas comparativas, e não uma edição das
Cantigas.
E earns the title of codex princeps for one reason alone: it contains
by far the largest number of cantigas, almost the whole collection.
This makes it the obvious model for the sequencing of the cantigas
but gives its text no priority at all. In fact, there are many reasons for
valuing other manuscripts more highly. F and e
24
are recognized as
de luxe volumes, on which the full resources of the Alfonsine
scriptoria were lavished, while E is by contrast a fairly spartan
version. MS is the best of the musical manuscripts. To is a copy of
the earliest collection, and may thus contain readings unmodified by
the effects of successive copying. (PARKINSON, 1987, p. 22)
24
Nesse trecho, que reproduz fielmente o original do autor citado, provavelmente houve um
erro de revisão, pois os dois manuscritos considerados luxuosos são F e T (e não “e”).
68
Em relação aos refrães, Parkinson (1987, p. 23) nos diz que Mettmann (1986a,
1988, 1989) os trata de maneira muito diferente do texto original. Para indicar repetição
de um refrão, Mettmann acrescenta uma forma truncada, reduzida à primeira linha.
Nenhuma indicação é dada por ele de como os textos originais tratam esse aspecto.
Parkinson (1987, p. 23) explica que em algumas cantigas a ocorrência final do refrão é
em sua forma completa; em outras, o refrão final e alguns intermediários são omitidos
por completo.
Por último, Parkinson (1987, p.24) critica a maneira como Mettmann trata os
problemas estruturais encontrados nas cantigas, já que esta estrutura não é homogênea
na maior parte das vezes, muitos refrães e estrofes têm uma maior complexidade interna
do que a colocada por Mettmann. A principal crítica de Parkinson é que Mettmann nem
discute a questão, não informa o leitor de prováveis diferenças com o texto original.
Apesar dessas críticas, a edição de Mettmann é a única completa e a de mais
fácil acesso aos estudos lingüísticos, não havendo, no momento, alternativas viáveis à
sua substituição. Será adotada, portanto, como corpus de estudo desta pesquisa.
2.8 Considerações finais
A presente seção teve como principais objetivos delimitar o período histórico
focalizado por nosso estudo e mostrar a pertinência e as características do corpus
escolhido. As CSM foram escolhidas para ser o corpus deste trabalho por terem sido
produzidas no final do século XIII, portanto durante o período denominado arcaico,
quando se desenvolveu a língua que posteriormente ficou conhecida como galego-
portuguesa, foco de estudo de nossa análise. Essa escolha se deve também por ser esse
69
um material poético, fato crucial para termos pistas da estrutura prosódica das formas
futuras do PA.
Nas próximas seções deste trabalho será feita a análise do corpus escolhido em
relação às formas futuras usadas pelos trovadores, para avaliarmos se essas construções
formadas pelo verbo auxiliar aver + o infinitivo do verbo principal já haviam se
aglutinado em PA ou se eram ainda formas perifrásticas
70
3. Formas verbais futuras nas CSM
Para se analisar a estrutura morfofonológica das formas verbais futuras em PA, é
necessário fazer uma análise do comportamento desses verbos nas cantigas religiosas de
Afonso X (corpus escolhido para este trabalho, como já justificado na seção anterior),
isto é, analisar se essas formas aparecem conjugadas de maneira sintética ou analítica
(fundidas ou não com um verbo auxiliar, como veremos no item 3.1); se são
acompanhadas de clíticos
24
, que clíticos são esses e em que posição se encontram em
relação ao verbo (próclise, ênclise, mesóclise); e as pessoas em que os verbos no futuro
estão conjugados. Todas essas averiguações, como justificaremos ao longo desta seção,
poderão nos dar pistas da estrutura morfofonológica da forma futura em PA e,
conseqüentemente, poderemos classificar, finalmente, essas formas como sintéticas ou
analíticas.
Em cada uma das 420 cantigas de nosso corpus, buscamos verbos conjugados no
futuro. Quando os encontramos, primeiramente os dividimos em dois grupos: os que
estavam conjugados no futuro do presente e no futuro do pretérito. Posteriormente
classificamos essas formas como sintéticas ou analíticas, verificando se o verbo aver
(ou aver/ir, no caso do futuro do pretérito) estava unido ao verbo principal no infinitivo
ou separado e, nesse último caso, se o verbo auxiliar e o principal estavam ou não
ligados por preposição.
Em um segundo momento, analisamos se essas formas futuras estavam
acompanhadas de pronomes clíticos; verificou-se também quais pronomes eram mais
24
Segundo Rosa (2000, p. 110-111), o clítico a) tem uma posição fixa em relação a um outro
elemento da oração (que nos dá as formas proclíticas e as enclíticas); b) tem posição
relativamente fixa em relação a outros clíticos (ex. o objeto indireto antecedo o direto: lha, mo,
etc.); c) em geral se apresenta sem acento. Basílio (2008, p. 16) acrescenta que os clíticos são
unidades que se agregam a uma palavra fonologicamente sem fazer parte dela do ponto de vista
morfológico, e têm esse nome porque não apresentam acentuação própria, são átonos.
71
recorrentes, se de 1ª, 2ª ou 3ª pessoas do singular ou do plural, e em que posição se
encontravam: antes do verbo (próclise), depois do verbo (ênclise) ou se o clítico
aparecia no meio da forma verbal conjugada (mesóclise). Para as conclusões deste
trabalho, o estudo da mesóclise é fundamental, pois essa possibilidade de colocação
pronominal nos indica que podemos ter nessa estrutura duas palavras, portanto uma
forma perifrástica. Já o pronome colocado antes ou depois do verbo (próclise e ênclise)
pode nos indicar que as formas já estão contractas (isto é, contraídas, amalgamadas em
uma só palavra), sendo assim sintéticas.
Por último, fizemos um levantamento das pessoas gramaticais em que os verbos
estavam conjugados. Esse fator pode ser relevante devido à quantidade de sílabas da
forma conjugada e a posição do acento: as marcas de 1ª, 2ª e 3ª pessoas do singular e a
3ª do plural do futuro do presente são monossílabas e tônicas, já as de 1ª, 2ª pessoas do
plural (-emos, -edes) são dissílabas e paroxítonas. No futuro do pretérito, as marcas de
1ª, 2ª e 3ª pessoas do singular e a 3ª do plural são dissílabas e paroxítonas
(respectivamente, -ia, -ias, -ia e –iam), já as de 1ª, 2ª pessoas do plural são trissílabas e
proparoxítonas (-íamos, -íades). Essa análise da quantidade de sílabas e a posição do
acento pode ter influência, como mostraremos no item 3.2.1 desta seção, na colocação
do pronome.
Foram analisadas nesta tese as 420 CSM conforme a edição de Mettmann
(1986a, 1988, 1989). No corpus foi possível encontrar uma quantidade considerável de
formas futuras, como exposto na tabela 3.1. No total foram encontradas 1023 formas de
futuro, das quais 954 eram formas do futuro do presente e 249 do futuro do pretérito.
72
Tabela 3.1. Ocorrências de formas futuras no corpus.
Formas futuras Quantidade de ocorrências
Futuro de presente 954 (79,3%)
Futuro do pretérito 249 (20,7%)
Total 1203 (100%)
Depois desse primeiro levantamento, separamos os verbos conjugados no futuro
em formas sintéticas do futuro do presente, formas sintéticas do futuro do pretérito,
formas analíticas do futuro do presente – exemplos (3.1) e (3.2) – e formas analíticas do
futuro do pretérito – exemplos (3.3) e (3.4). Em nossa análise, foram consideradas como
formas sintéticas aquelas em que o infinitivo do verbo principal estava unido às formas
do verbo aver conjugado no presente do indicativo, quando relacionado ao futuro do
presente (farás), e no pretérito imperfeito do indicativo, quando relacionado ao futuro
do pretérito (poderias). Ao contrário das anteriores, os dados em que essas formas
verbais estavam separadas foram considerados como analíticos, isto é, teríamos mais de
uma palavra ou vocábulo como em á de salvar.
(3.1)
Virgen, de Deus amada:
do que o mund' á de salvar [...]
(CSM 1, v. 17-18)
(3.2)
E diz: «Varões, chamemos ora de bon coraçon
a Virgen Santa Maria de Vila-Sirga, e non
se faça end' om' afora, e peçamos-lle perdon,
ca a ssa vertude santa no-nos á de falecer. (CSM 313, v. 46-49)
(3.3)
Sen muito mal que fazia,
cada noyt' en drudaria
a hua sa druda ya
con ela ter
seu gasallado;
pero ant' «Ave Maria»
sempr' ya dizer
de mui bon grado. (CSM 11, v. 18-25)
73
(3.4)
Dest' avo un miragre en França a un frances,
que non avia no reino duc nen conde nen marques
que fosse de mayor guisa, e tal astragueza pres
que quanto por ben fazia en mal xe ll' ya tornar. (CSM 281, v. 5-8)
Nos dois primeiros exemplos, o verbo aver está conjugado no presente do
indicativo antecedendo o verbo principal, que está no infinitivo, e ligado a ele por uma
preposição. Essas formas são consideradas em nosso trabalho como analíticas, pois o
verbo auxiliar aver está separado (graficamente, prosodicamente e através da presença
da preposição) do verbo principal.
Câmara Jr. (1972[1970], p. 53) já afirmava que é a presença do acento que
assinala a existência de um vocábulo. Como o acento tem tanto uma função distintiva
quanto delimitativa, dessa maneira o vocábulo fonológico fica bem delimitado no PB.
Para Bisol (2001, p. 233), “dos constituintes mais baixos da hierarquia
prosódica, é a palavra fonológica que faz uso substancial de noções não-fonológicas”,
pois há uma interação entre os componentes fonológico e morfológico da gramática.
Além disso, a autora observa que “a palavra fonológica ou prosódica tem um só
elemento proeminente, do que se conclui que a palavra fonológica ou prosódica não
pode ter mais do que um acento primário”. As formas verbais futuras analisadas neste
trabalho são consideradas analíticas quando têm dois acentos primários, um em cada
forma verbal, um acento no verbo auxiliar e outro no verbo principal no infinitivo.
Nos exemplos (3.3) e (3.4), os verbos auxiliar e principal também estão
separados, mas, em relação ao futuro do pretérito, o verbo aver/ir, conjugado no
pretérito imperfeito do indicativo, não vem separado do principal por meio de uma
preposição. Como veremos no item 3.1.2 deste mesmo capítulo, a ordem dos
componentes de formas verbais desse tipo não é rígida; foram encontrados casos em que
74
o auxiliar é colocado depois do verbo principal (situação não encontrada em relação ao
futuro do presente), ainda que igualmente sem preposição.
Como demonstrado na tabela 3.2, das 1203 formas futuras encontradas, 1170
eram sintéticas e apenas 33 analíticas. No futuro do presente, foram encontradas 24
formas analíticas frente a 930 sintéticas; no futuro do pretérito, nove formas analíticas
frente a 240 sintéticas. O futuro do presente na sua forma analítica era sempre auxiliado
pelo verbo aver, como exemplificado em (3.1) e (3.2) e no futuro do pretérito pelo
verbos aver ou ir
25
, como nos exemplos (3.3) e (3.4).
Tabela 3.2. Ocorrências de formas futuras sintéticas e analíticas.
Tempos futuros Formas sintéticas
(percentual, em
relação ao total no
tempo específico)
Formas analíticas
(percentual, em
relação ao total no
tempo específico)
Total
Futuro do presente 930 (97,5%) 24 (2,5%) 954 (100%)
Futuro do pretérito 240 (96,4%) 9 (3,6%) 249 (100%)
Formas futuras 1170 (97,3%) 33 (2,7%) 1203 (100%)
Como explicado na introdução desta seção, achou-se necessário também fazer
um levantamento quantitativo dos pronomes clíticos junto às formas futuras. O objetivo
desse estudo é saber qual posição do pronome em relação aos verbos era mais recorrente
em PA: próclise, ênclise ou mesóclise. Esse levantamento é importante, pois a posição
de mesóclise nos permite, ao contrário do que ocorre quando há ênclise ou próclise
(quando não há indicações claras para a classificação da forma futura como sintética ou
analítica), classificar as formas futuras como analíticas. No caso de classificação da
forma como analítica, teríamos duas palavras, um infinitivo e um verbo auxiliar
conjugado, com um pronome ao meio delas; enquanto que a ênclise e a próclise não nos
25
Não é ponto pacífico entre os gramáticos e lingüistas se o verbo encontrado como auxiliar do
futuro do pretérito era o verbo aver ou ir. Esse assunto será novamente discutido no item 3.1.2
desta seção.
75
dão pistas seguras da classificação da forma futura em PA, quando poderíamos ter
apenas uma palavra, um verbo conjugado no futuro, e o pronome seria colocado antes
ou depois do verbo, ou duas palavras, com o pronome ocorrendo antes ou depois da
locução verbal.
A tabela 3.3 mostra que foram encontradas 494 formas de futuro acompanhadas
de pronomes clíticos, sendo 360 ocorrências de próclises, como exemplificado em (3.5),
em que o pronome oblíquo vos antecede o verbo direy, 94 casos de mesóclises, exemplo
(3.6), em que há inserção do pronome che no verbo pidirei, e 40 de ênclises, exemplo
(3.7), em que o pronome lle é enclítico ao verbo fazer.
Tabela 3.3. Ocorrências de pronomes clíticos com formas verbais futuras.
Tempos futuros Próclise Mesóclise Ênclise Total
Futuro do
presente
290 (72,3%) 76 (19%) 35 (8,7%) 401 (100%)
Futuro do
pretérito
70 (75,3%) 18 (19,3%) 5 (5,4%) 93 (100%)
Total 360 (72,9%) 94 (19%) 40 (8,1%) 494 (100%)
(3.5)
Dest' un miragre fremoso, ond' averedes sabor,
vos direy, que fez a Virgen, |Madre de Nostro Sennor, (CSM 42, v. 7-8)
(3.6)
Esto por don cho peço, | e ar pidir-ch-ei al:
Sennor Santa Maria, | pois que começad' ey
de pedir-che merçee, | non me departirey;
(CSM 401, v. 81-83)
(3.7)
U alguen a Jhesu Cristo por seus pecados negar,
se ben fiar en ssa Madre, fará-ll' ela perdõar.
(CSM 281, v. 3-4, refrão)
Foi feito também um levantamento das pessoas nas quais os futuros do presente
e do pretérito eram mais conjugados, pois, para o desenvolvimento da nossa análise, a
76
quantidade de sílabas de uma forma verbal nos faz levantar hipóteses sobre a colocação
pronominal. Por exemplo, um verbo conjugado na 1ª pessoa do plural (cantaremos), em
nosso corpus nunca vem acompanhado de pronome enclítico (ver item 3.2.1), pois
teríamos assim uma palavra proparoxítona, forma evitada e considerada esdrúxula em
PA. Massini-Cagliari (1999, p. 169), analisando as cantigas medievais portuguesas
profanas, em um levantamento quantitativo, constatou que a maioria das palavras de seu
corpus era paroxítona, “o que confirma a hipótese do troqueu moraico como pé básico
único do PA, já que a pauta paroxítona é o padrão trocaico canônico”. A mesma autora,
na página 175 de seu livro, afirma não ter encontrado palavras proparoxítonas nas
cantigas de amigo, sejam as palavras verbos ou não verbos. Uma análise detalhada
desses dados será desenvolvida no item 3.2 desta seção.
Como a tabela 3.4 comprova, no corpus considerado, há uma predominância da
conjugação na 1ª pessoa do singular no futuro do presente e da 3ª pessoa do singular no
futuro do pretérito. Apenas no futuro do presente encontramos verbos conjugados na 1ª
e na 2ª pessoas do plural. Na 3ª pessoa do plural, os futuros do presente e do pretérito
são pouco usados no corpus, contando apenas 70 ocorrências. É baixa também a
quantidade de ocorrências na 2ª pessoa do singular: 86 casos.
Tabela 3.4. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente e do pretérito.
Pessoas da conjugação
dos verbos
Futuro do presente Futuro do pretérito Subtotal
1ª pessoa do singular 438 (36,4%) 26 (2,2%) 464 (38,6%)
2ª pessoa do singular 83 (6,9%) 3 (0,3%) 86 (7,2%)
3ª pessoa do singular 331 (27,5%) 200 (16,6%) 531 (44,1%)
1ª pessoa do plural 27 (2,2%) - 27 (2,2%)
2ª pessoa do plural 25 (2,1%) - 25 (2,1%)
3ª pessoa do plural 50 (4,1%) 20 (1,7%) 70 (5,8%)
Total 954 (79,2%) 249 (20,8%) 1203 (100%)
77
3.1 Formas analíticas
Como já apresentado no início desta seção, foram consideradas formas analíticas
aquelas em que o verbo aver encontra-se separado do verbo principal no infinitivo, em
relação ao futuro do presente, e dos verbos aver/ir para o futuro do pretérito. Como
veremos a seguir, no futuro do presente sempre há uma preposição ligando as duas
palavras; já, no futuro do pretérito, em nenhum contexto foi encontrada uma preposição
ligando os dois verbos, mesmo eles estando graficamente separados (o que pode sugerir
uma “separação” também no plano prosódico) como em ya dizer.
3.1.1 Formas analíticas do futuro do presente
Em PA, as chamadas “formas sintéticas” do futuro do presente e do pretérito já
haviam se consolidado, visto que, das 1203 formas futuras encontradas, apenas 33 são
formas analíticas; entre elas, 24 estão no futuro do presente e nove, no futuro do
pretérito (cf. Tabela 3.2).
Dessas 24 formas do futuro do presente, todas têm como auxiliar o verbo aver no
presente, nunca no futuro, ligadas ao infinitivo pela preposição de, como no exemplo
(3.8); há apenas uma ocorrência em todo o corpus com a preposição a, exemplo (3.9).
(3.8)
Non é gran cousa se sabe | bon joyzo dar
a Madre do que o mundo | tod' á de joigar. (CSM 26, refrão, v. 4-5)
78
(3.9)
E disse: «Pagão,
sse queres guarir,
do demo de chão
t' ás a departir
26
e do falsso, vão, (CSM 192, v.98-102)
Há, em nossos dados, várias ocorrências do verbo aver conjugado no futuro,
enquanto verbo principal, mas nunca como auxiliar de outro verbo, como demonstrado
nos exemplos (3.10), e (3.11), casos em que o verbo aver está conjugado na 3ª e 2ª
pessoas do singular do futuro do indicativo, respectivamente, como verbo principal, sem
um auxiliar. Como auxiliar, todas as ocorrências deste verbo estão no presente, como no
exemplo (3.12).
(3.10)
Todos responderon logo: | «Preit' outr' y non averá
que o todo non tomemos, | mas tornaremos dacá;
daquelo que gaannarmos | cada u y dará
o que vir que é guisado (CSM 35, v. 105-108)
(3.11)
[...] ond' á mester
que a leixes e te vaas comigo a como quer,
se non, daqui adeante averás coyta mortal.» (CSM 42, v. 68-70)
(3.12)
Gran poder á de mandar
o mar e todo-los ventos
(CSM 33, v. 3-4)
Em 16 das 24 ocorrências encontradas do futuro do presente analítico, o verbo
auxiliar encontra-se conjugado na 3ª pessoa do singular, como no exemplo (3.13), cinco
na 2ª pessoa do singular, exemplo (3.14), e apenas três na 1ª pessoa também do singular,
26
Este único exemplo encontrado em nosso corpus parece tratar-se de um caso de dissimilação,
para evitar a forma “de departir”. A forma com a preposição “a” é a lição registrada nos dois
manuscritos em que esta cantiga específica sobreviveu: E192 e T192.
79
exemplo (3.15). Não foi encontrada qualquer forma analítica com verbos flexionados no
plural.
(3.13)
Desto deron todos gran loor
a Santa Maria, que sabor
á de valer sempr' ao pecador (CSM 109, v.50-52)
(3.14)
Mas ante farás esto que te digo,
se sabor ás de seer meu amigo: (CSM 26, v. 41-42)
(3.15)
E ele lle respondia: | «Mia Madr', o que vos quiserdes
ei eu de fazer sen falla, | pois vos en sabor ouverdes; (CSM 45, v.71-72)
Gramáticos históricos como Williams (1973[1938], p. 211) afirmavam que não
havia, no início, uma posição fixa para os elementos dessa forma analítica e que o
auxiliar aver poderia ser colocado antes ou depois do verbo no infinitivo. Mas a ordem
verbo aver + infinitivo logo foi se tornando mais comum. Nenhum gramático, ao fazer
esta afirmação, precisa exatamente em que período da língua se poderia inverter a
ordem dos termos. A partir dos dados analisados nesta pesquisa, podemos afirmar que,
em relação ao futuro do presente, já em PA a ordem era bastante fixa: auxiliar aver +
infinitivo, nunca o contrário e nunca sem preposição, como os gramáticos históricos
dizem ser comum na época.
27
Não há qualquer caso no corpus aqui considerado de
inversão entre o verbo auxiliar e o principal para o futuro do presente, a ordem é sempre
a mesma: verbo auxiliar aver conjugado no presente do indicativo ligado ao verbo
principal no infinitivo por intermédio de uma preposição.
27
Para maiores reflexões sobre as afirmações dos gramáticos históricos em relação à posição
dos dois verbos indicadores de futuro em PA, ver seção 1.1.
80
3.1.2 Formas analíticas do futuro do pretérito
Em relação ao futuro do pretérito, foram encontradas as duas posições, verbo
auxiliar antes do principal (ya perder), como exemplificado em (3.16), no qual o verbo
aver (ou ir) está conjugado no pretérito imperfeito e vem antes de um verbo no
infinitivo; ou verbo auxiliar depois do infinitivo, e nunca ligados por preposição,
embora a presença do verbo auxiliar depois do verbo no infinitivo tenha ocorrido apenas
três vezes - exemplos (3.17) e (3.18).
(3.16)
E ao gran son que a madeira fez
veron as gentes logo dessa vez,
e viron o demo mais negro ca pez
fogir da ygreja u ss' ya perder. (CSM 74, v.45-48)
(3.17)
fez seu amigo chamar,
que llo contar ya. (CSM, 94, v.115)
(3.18)
Mais aquel dia que sayr | avia sabad’ era,
e foi missa oyr enton, | ca tal costum’ ouvera
(CSM 237, v. 34-35)
Como já foi mostrado na seção 1, o aparecimento do h no verbo aver é
determinação gráfica recente; nos dados, não há qualquer ocorrência do verbo aver com
h.
28
Em relação ao futuro do presente, esse fato não resulta em nenhum problema,
porém, para o futuro do pretérito, isso pode ocasionar dificuldades de interpretação já
28
Segundo Massini-Cagliari (1998, p. 165), a letra H, em PA, assume três funções diferentes: a)
pode ser colocada após uma consoante para modificar o seu ponto de articulação (exemplos:
chus, manselinha); b) pode funcionar como letra muda (exemplo: he – verbo seer, 3ª pessoa do
singular, Presente do Indicativo; no corpus considerado, a letra H com esta função ainda não
havia se estendido à representação do verbo aver); c) pode ainda representar o som /i/, quando
precedendo uma vogal, em ditongos crescentes (mha) e o som /¯/ quando precedido e seguido
de vogal (gaahades).
81
que o verbo aver sem h, nas formas contraídas do pretérito imperfeito do indicativo, é
homógrafo e homófono ao verbo ir no mesmo tempo-modo.
Esta dificuldade de determinação do auxiliar (se aver ou ir) que se combina com
o infinitivo para formar o futuro do pretérito (ver discussão deste assunto nesta mesma
seção, adiante) acarreta uma outra dificuldade de análise: a distinção entre formas do
futuro do pretérito e locuções verbais constituídas do verbo ir conjugado no pretérito
imperfeito do indicativo, complementado por um infinitivo. Há contextos, como o do
exemplo (3.19), em que é difícil de saber se temos nesta locução verbal a expressão de
um tempo do pretérito imperfeito ou do futuro do pretérito.
(3.19)
E con taces a yan fillar,
mas per ren non lla podian tirar
nen con baesta que yan armar; (CSM 126, v.15-17)
Entretanto há momentos em que o sentido geral do texto no qual essa forma
verbal está inserida determina qual o tempo verbal, como no exemplo (3.20), em que
percebemos claramente o uso do pretérito imperfeito, pois o contexto nos indica que é
uma ação rotineira do clérigo no passado, que sempre ia dizer louvores a Santa Maria.
Portanto, o contexto analisado para podermos definir que tempo verbal temos nesses
trechos é o semântico: é o sentido da frase que nos leva a classificar uma forma verbal
como conjugada no pretérito imperfeito ou no futuro do pretérito.
(3.20)
Dest' un mui maravilloso
miragre vos contarey,
que fez, e mui piadoso,
a Madre do alto Rei
por un crerigo, que foran a furt' ereges prender
porque de Santa Maria sempr' ya loor dizer.
(CSM 156, v.6-11)
82
Um fato interessante de se apontar em relação a essa dúvida entre futuro do
pretérito e pretérito imperfeito é a disposição dos verbos no enunciado (ordem). No
exemplo (3.19), auxiliar e infinitivo aparecem contíguos; já no exemplo (3.20) não há
contigüidade. Em todos os dados de nosso corpus em que consideramos a locução como
forma do futuro do pretérito os verbos estavam contíguos (com exceção dos casos de
mesóclise de pronomes clíticos). A contigüidade do auxiliar com o infinitivo pode ser
uma evidência a favor da classificação dessa forma como futuro do pretérito, em
oposição a casos de pretérito imperfeito + infinitivo. De fato, neste trabalho, só foram
considerados como dados quantificáveis (isto é, como formas do futuro do pretérito) os
verbos em que era perfeitamente possível pelo contexto, por uma análise semântica,
classificar essas formas como futuras; em caso contrário, os dados não eram
computados em nosso levantamento quantitativo.
A maior parte dos gramáticos históricos e estudiosos do período arcaico da
Língua Portuguesa, como Câmara Jr. (1975), Coutinho (1971), Elia (1979), Huber
(1986[1933]), Nunes (1969), Said Ali (1966), Silva Neto (1952) e Williams
(1973[1938]), afirma que o verbo auxiliar na composição do futuro do pretérito ou
condicional era o verbo aver conjugado no pretérito imperfeito do indicativo.
Silva Neto (1952) e Coutinho (1971) acrescentam que o verbo habere do latim
passou por grandes alterações pelo seu uso constante como auxiliar, tanto proclítico
quanto enclítico. Coutinho (1971, p.277) ainda acrescenta a seguinte informação sobre a
modificação por que passou esse verbo no condicional:
Na composição, as formas do imperfeito de habere muito se
modificaram. Por dissimulação, habebam, habebas, etc. reduziram-se
a *abem, *abéas, etc. cujo grupo átono ab- caiu do mesmo modo que
no futuro. Ficou destarte o imperfeito reduzido a -*éam, -*éas, -*éat,
-*éamus, -*éatis, -*éant, que se transformaram em -ia, -ias, -ia,
-íamos, -íeis, -íam.
83
Said Ali (1966, p. 76) desenvolve a conjugação do verbo aver no pretérito
imperfeito e, logo após a forma hia
29
(primeira pessoa do singular desse tempo), o autor
coloca entre parênteses a informação de que essa forma é a contração de havia.
Williams (1973[1938], p. 212) afirma que o condicional formou-se como o
futuro do presente do indicativo, mas usando como auxiliar o imperfeito do indicativo
do verbo haver menos o elemento hav-. Nunes (1969, p. 208) explica mais
detalhadamente essa redução do verbo aver:
Devido certamente ao seu freqüente emprego como auxiliar, o que o
tornava proclítico, sofreu este verbo grande contracção, que sem
dúvida ascende à língua vulgar, não só no presente como no
imperfeito do indicativo, ficando em ambos os tempos reduzido
apenas à vogal tónica e desinências que se lhe seguiam, só na
primeira pessoa do presente do indicativo se salvou a mais a semi-
vogal, por ter sido atraída pela tónica.
Desta maneira, a forma da 3ª pessoa do singular do verbo aver no pretérito
imperfeito do indicativo, avia, contraída e usada como auxiliar, torna-se ia, homófona à
forma da 3ª pessoa do singular do verbo ir no pretérito imperfeito do indicativo,
também ia.
Dada a homofonia entre as formas contraídas do verbo aver no pretérito
imperfeito do indicativo com as formas do verbo ir nesse mesmo tempo, é, portanto,
difícil de afirmar com toda a certeza que o auxiliar utilizado em todos os exemplos
retirados das cantigas em relação à forma analítica seja realmente o verbo aver. Pode-se
interpretar que o auxiliar é o verbo ir, conjugado no pretérito imperfeito do indicativo.
Cagliari (1999, p. 64) é um dos poucos autores que afirmam que a terminação ia pode
ser uma forma do verbo aver ou do verbo ir.
29
Said Ali (1966, p. 76) representa a forma contraída do pretérito imperfeito com h. Como
vimos na p. 80 desta seção e também na seção 1 deste trabalho, a letra h, na representação
ortográfica do verbo aver, é recente, e em nossos dados não foi encontrado nenhum caso com
essa ortografia.
84
O quadro abaixo mostra essa coincidência entre os verbos:
Forma contracta do verbo aver Verbo ir
ia ia
ias ias
ia ia
íamos iamos
íades iades
ían ian
Quadro 3.1. Forma contracta do verbo aver homófona ao verbo ir no pretérito
imperfeito do indicativo
30
Embora todos os gramáticos históricos apontem o auxiliar aver como origem da
forma do futuro do pretérito, os filólogos que trabalham com edições de textos não
costumam listar as formas contractas do verbo aver entre as ocorrências que mapeiam
nos corpora com que trabalham: por exemplo, Maia (1997), Mattos e Silva (1989) e
Cintra (1984), que trabalham com textos notariais, e Ramos (1985), que analisam
cantigas medievais profanas de amigo e de amor, não registram essas formas, embora
seus corpora contemplem formas de futuro do pretérito (onde essas formas contraídas
do verbo aver apareceriam). Também o Dicionário de Verbos Portugueses do século 13
organizado por Xavier, Vicente e Crispim (1999) não lista formas contraídas do verbo
aver.
Na época do PA, por não poderem ser encontradas as formas contraídas de aver
no pretérito imperfeito isoladamente e por estas coincidirem com as formas do verbo ir,
pode-se hipotetizar que talvez já não houvesse mais consciência da origem histórica do
auxiliar (aver), confundido sincronicamente com ir. Talvez, naquela época, enunciados
30
Fonte de conjugação desses verbos: Câmara Jr. (1975), Coutinho (1971), Elia (1979), Huber
(1986[1933]), Nunes (1969), Said Ali (1966), Silva Neto (1952), Williams (1973[1938]).
85
como os do exemplo (3.18) (apresentado anteriormente), em que o auxiliar aver aparece
desenvolvido, fossem já sentidos como arcaicos.
3.2 Pronomes clíticos
Foi feito também um levantamento no corpus dos pronomes oblíquos átonos
encontrados junto às formas verbais futuras (cf. Tabela 3.3). Em um total de 494
ocorrências de formas futuras combinadas com pronomes oblíquos átonos, encontramos
uma grande quantidade de pronomes proclíticos – 360 ocorrências, o que corresponde a
72,9% dos casos; uma quantidade considerável de mesóclises – 94 ocorrências, 19%
dos casos; e uma quantidade menor de pronomes enclíticos – 40 ocorrências, apenas
8,1% dos casos de pronomes clíticos acompanhando verbos no futuro.
3.2.1 Pronomes enclíticos
Leão (2007, p. 154) chama atenção do leitor para o problema dos clíticos em
posição de ênclise, em PA, que é diferente da situação atual no português, tanto do
Brasil como de Portugal. Atualmente, só os pronomes oblíquos átonos podem ser
enclíticos a verbos e, em PB, especialmente na língua culta escrita, em registro bastante
formal. Já em PA, segundo Leão (2007, p. 154):
Nas Cantigas de Santa Maria, entretanto, tanto podiam ser enclíticos
alguns pronomes oblíquos (principalmente os da 3ª pessoa -o, -lo,
-no), quanto os artigos definidos e o pronome demonstrativo neutro.
O fato é de certo modo explicável, pois são formas homófonas, com
um étimo comum (<illum, illam), sujeitas aos mesmos processos
fonológicos, tanto intra- quanto extra-vocabulares. Quanto ao suporte
fonético-fonológico da forma enclítica, no galego-português, tanto
podia ser um verbo, quanto um pronome substantivo, quanto um
quantificador, quanto um advérbio de negação.
86
Houve grande mudança no uso da ênclise, ao longo da evolução do português.
Como observa Leão (2007, p. 157), reduziram-se as classes de palavras que podem
servir de apoio ao pronome enclítico, como também se reduziram os tipos de palavras
enclíticas. Para os objetivos deste trabalho, foram levadas em consideração só as formas
verbais futuras com pronomes oblíquos átonos enclíticos, não só de 3ª pessoa (-o, -lo, -
no), mas também os pronomes clíticos átonos de 1ª e 2ª pessoas do singular e do plural
(me, te, nos, vos).
Foram encontrados poucos casos de ênclise de pronome clítico a formas verbais
futuras em nosso corpus: em 494 ocorrências de pronomes clíticos junto a verbos no
futuro, há apenas 40 ocorrências de enclíticos, sendo 35 com o futuro do presente e
cinco com o futuro do pretérito, como demonstrado nas tabelas 3.5 (abaixo) e 3.7
(adiante).
Tabela 3.5. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente com pronomes
enclíticos.
Pessoas da conjugação dos verbos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular 25 (71,4%)
2ª pessoa do singular 1 (2,9%)
3ª pessoa do singular 9 (25,7%)
1ª pessoa do plural -
2ª pessoa do plural -
3ª pessoa do plural -
Total 35 (100%)
A ênclise ocorreu principalmente com verbos no futuro do presente conjugados
na primeira pessoa do singular, um total de 25 ocorrências, como exemplificado em
(3.21), em que o pronome oblíquo o está enclítico ao verbo farey; foram encontradas
nove ocorrências com a 3ª pessoa do singular, exemplo (3.22), no qual o pronome de 3ª
pessoa do singular lle vem posposto ao verbo aver, e apenas uma na segunda pessoa do
87
singular, exemplo (3.23), no qual o pronome me está colocado depois do verbo fazer,
conjugado na 2ª pessoa do singular.
(3.21)
Ela respos-lle; “Farey-o | se meu conssello fillardes.” (CSM 128, v.17)
(3.22)
Quen fiar en ela de coraçon,
averrá-lle com' a un ifançon (CSM 44, v. 5-6)
(3.23)
[...] dá-me meu fillo morto
ou viv' ou qual quer que seja; | se non, farás-me gran torto,
e direi que mui mal erra | queno teu ben atende.»
(CSM 6, v. 63-65)
Não foi encontrado qualquer pronome enclítico com formas futuras no plural.
Isso se deve à pauta prosódica das formas de 1ª e 2ª pessoas do plural. Essas formas são
paroxítonas. O acréscimo de um pronome enclítico geraria formas proparoxítonas, um
padrão prosódico extremamente marginal em PA. Segundo Massini-Cagliari (2005, p.
149), as proparoxítonas são um padrão acentual ainda mais excepcional em PA do que
no PB e PE atuais. Michaëlis de Vasconcelos (1912-1913, p. 58-59) afirma que nas
evoluções por que passou o latim vulgar e o romanço de Portugal, manifesta-se
claramente a tendência de transformar proparoxítonas em paroxítonas; para a autora, a
tendência oposta é unicamente “própria de semi-letrados que gostam de disparates como
erúdito, e que impuseram erros como rúbrica, púdico e outros semelhantes”.
A época dos esdrúxulos principia com o Renascimento. Eles
constituem a parte principal das palavras cultas, poéticas e eruditas
reintroduzidas do século XV em diante [...] êsses elementos faltam
quási por completo na linguagem arcaica. (MICHAËLIS DE
VASCONCELOS, 1912-1913, p.59)
Como mostrado na tabela 3.4, a quantidade de ocorrências de futuro com verbos
conjugados na 1ª pessoa é bem superior às demais (36,4%), seguido pelas formas
88
conjugadas na 3ª pessoa do singular (27,3%). Essas formas juntas somam 63, 8% das
formas do futuro do presente. Era de se esperar, portanto, que grande parte dos
pronomes enclíticos estivesse acompanhando verbos conjugados nas 1ª e 3ª pessoas. É
importante relembrarmos também a forma recorrente nas cantigas de nosso corpus:
direi-vos já que o rei está contando os milagres da Santa Maria aos seus leitores.
Como se pode verificar na tabela 3.6, o pronome enclítico mais recorrente no
futuro do presente foi o pronome de segunda pessoa do plural vos (treze ocorrências,
exemplo (3.24)), seguido do pronome objeto direto o, a, com suas variantes lo, la.
Foram mapeadas doze ocorrências, em um total de 39 pronomes enclíticos com o futuro
do presente, como exemplificado em (3.25). Os pronomes de 1ª pessoa do singular (me),
2ª pessoa do singular (te) e 3ª pessoa do singular (lle) tiveram, respectivamente, três,
cinco e seis ocorrências cada (ver exemplos (3.26), (3.27) (3.28)).
Tabela 3.6. Tipos de pronomes enclíticos que acompanham o futuro do presente.
Pronomes pessoais oblíquos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular - me 3 (7,7%)
2ª pessoa do singular – te 5 (12,8%)
3ª pessoa do singular – o 12 (30,8%)
3ª pessoa do singular – lle 6 (15,4%)
1ª pessoa do plural – nos -
2ª pessoa do plural – vos 13 (33,3%)
3ª pessoa do plural – os – lles -
Total 39 (100%)
(3.24)
[...] mas en dormindo a Madre de Deus direi-vos que lle fez: (CSM 5, v. 127)
(3.25)
por quanto na ta hermida | mandei o fogo põer;
mais por emenda daquesto | farey-a nova fazer, (CSM 316, v. 41-42)
89
(3.26)
[...] e fo comerás por fazfeiro,
ou te farey de fame fir;
e se t' aqueste pan non refeiro,
terrei-me por d'outr' ome peyor.» (CSM 15, v. 54-57)
(3.27)
Enton vo voz de ceo, que lle disse: “Tol
tas mãos dela, se non, farey-te perecer.” (CSM 5, v. 114-115)
(3.28)
direi-ll' eu de com' a Virgen quis no meno mostrar.
(CSM 53, v.13)
O total de dados da tabela 3.6 é superior à quantidade encontrada de verbos no
futuro com pronomes enclíticos, pois, em quatro ocorrências do verbo flexionado no
futuro do presente, encontramos dois pronomes junto de um mesmo verbo, como
comprova o exemplo (3.29): junto ao verbo direi, foram colocados os pronomes vos de
2ª pessoa do plural e o de 3ª pessoa do singular, como junto de s o pronome o
transforma-se em lo e a palavra antecedente perde o s, temos a forma vo-lo.
(3.29)
E o por que esto fiz,
direi-vo-lo aginna: (CSM 28, v. 122-123)
O percentual de casos desse tipo é baixo (11,4%), pois a forma resultante da
adição de dois pronomes a um verbo é um vocábulo fonológico proparoxítono, o que,
como explanado anteriormente nesta seção nas páginas 87, não é uma forma comum em
PA.
Como já ressaltado anteriormente, não há casos de ênclise com verbos
conjugados nas 1ª e 2ª pessoas do plural devido ao resultado de uma palavra
proparoxítona, algo pouco comum em PA, mas não impossível. No exemplo (3.29), o
acréscimo de dois pronomes oblíquos átonos após um verbo flexionado na 1ª pessoa do
singular, portanto oxítono, tornou essa forma proparoxítona.
90
Entretanto, é impossível encontrar dois pronomes enclíticos a uma forma verbal
futura conjugada no plural em PA, pois a sílaba tônica seria anterior à antepenúltima
sílaba. Esse fato não acontece no corpus considerado.
Sobre esses dados é interessante também assinalar que, embora poucos sejam os
exemplos de verbos flexionados na segunda pessoa do plural, foram encontrados
diversos exemplos com o pronome oblíquo vos junto às formas futuras, como nos
exemplos apresentados anteriormente em (3.24) e (3.29).
A partir da tabela 3.7, pode-se perceber que, com o futuro do pretérito, foram
encontradas apenas cinco ocorrências com o pronome enclítico, duas delas com o verbo
flexionado na primeira pessoa do singular, como exemplificado em (3.30), e três delas
na terceira pessoa do singular, exemplo (3.31). Como também ocorreu com o futuro do
presente, houve somente ocorrências de ênclise com verbos no singular.
Tabela 3.7. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do pretérito com pronomes
enclíticos.
Pessoas da conjugação dos verbos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular 2 (40%)
2ª pessoa do singular -
3ª pessoa do singular 3 (60%)
1ª pessoa do plural -
2ª pessoa do plural -
3ª pessoa do plural -
Total 5 (100%)
(3.30)
Poderia-vos de dur
dizer as grandes dõas (CSM 28, v.131-132)
(3.31)
e Deus tiraria
nos desta balança?”
(CSM 9, v. 161-162)
Esses resultados encontrados em relação tanto ao futuro do presente quanto ao
futuro do pretérito podem ter como explicação a estrutura da sílaba final dessas formas.
91
Apenas as formas verbais que terminam em sílabas abertas podem receber clíticos (1ª e
2ª pessoas do singular). As demais formas terminam em sílabas travadas. Sílabas
travadas têm duas ou mais posições associadas à rima: ou o núcleo é ramificado e temos
ditongos ou vogais longas; ou o núcleo é seguido de consoantes (SILVA, 2001, p.
216).
31
A única exceção é um caso de ênclise com o futuro do presente conjugado na 2ª
pessoa do singular, que termina em sílaba travada por um s. Massini-Cagliari (2005, p.
199), analisando as cantigas profanas e religiosas do PA (portanto, do mesmo período
que o abordado nesta tese e com um corpus ainda mais abrangente), afirma que as
sílabas travadas são pesadas em PA, com exceção das travadas em –s, quando esta
consoante tem status de desinência, o que ocorre com o verbo conjugado na 2ª pessoa
do singular:
[...] mesmo em se considerando a posição final da palavra a
sensibilidade do PA à quantidade é relativa, no sentido em que sílabas
finais travadas por consoantes que correspondem a marcas desinenciais
(de número plural, nos nomes, por exemplo, ou de número e pessoa,
nos verbos) nunca atraem o acento.
Portanto, há restrições para ênclise quando a forma verbal termina por uma
sílaba travada ou por duas sílabas átonas. Em outras palavras, a ênclise só pode ocorrer
em PA quando houver a possibilidade de formação de um pé com no máximo três
sílabas, o que já é considerado bastante marginal pela fonologia do PA, incluindo a
última sílaba da forma verbal e os possíveis clíticos.
31
Ainda segundo Câmara Jr. (1972[1970], p. 43-44): “Se chamarmos simbolicamente V o
centro da sílaba e C um elemento marginal, teremos os tipos silábicos: V (sílaba simples), CV
(sílaba complexa crescente), VC (sílaba complexa crescente-decrescente). Conforme a ausência
ou a presença de travamento silábico (isto é, V e CV, de um lado, e, de outro, VC e CVC),
temos a sílaba aberta, ou melhor, livre, e a sílaba fechada, ou melhor, travada”.
92
A tabela 3.8 mostra-nos os pronomes encontrados junto aos verbos no futuro do
pretérito: há duas ocorrências com o pronome na segunda pessoa do plural (vos), como
pode ser visto no exemplo (3.32), uma com a primeira pessoa do singular (me), exemplo
(3.33), uma com a primeira pessoa do plural (nos) e uma com a terceira pessoa do
singular (lle), exemplos (3.34) e (3.35), respectivamente.
Tabela 3.8. Tipos de pronomes enclíticos que acompanham o futuro do pretérito.
Pronomes pessoais oblíquos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular - me 1 (20%)
2ª pessoa do singular – te -
3ª pessoa do singular – o -
3ª pessoa do singular – lle 1 (20%)
1ª pessoa do plural – nos 1 (20%)
2ª pessoa do plural – vos 2 (40%)
3ª pessoa do plural – os – lles -
Total 5 (100%)
(3.32)
Contaria-vos de dur
as mui grandes tormentas (CSM 115, v.174-175)
(3.33)
foss´ a mi que quer mostrar,
faria-me logo sou (CSM 46, v. 55-56)
(3.34)
e Deus tiraria
nos desta balança?”
(CSM 9, v. 161-162)
(3.35)
(...) disse que mui ben fezera
e que mui ben s'acharia de quanto ali vera,
demais faria-ll' ajuda mui çed' en gran coita fera;
(CSM 75, v.143-145)
93
3.2.2 Pronomes mesoclíticos
Como mostra a tabela 3.3 (p. 75), a quantidade de casos de mesóclise com
verbos no futuro do presente encontrada em nosso corpus é bem superior à de casos de
ênclise. De acordo com a tabela 3.9 (abaixo), a maior parte dos casos de mesóclise
apareceu com verbos conjugados na 1ª pessoa do singular (fato semelhante ocorreu com
os pronomes enclíticos, como se observou na tabela 3.5): 37 ocorrências de um total de
76 casos (48,7%). Com verbos conjugados na 3ª pessoa do singular ocorreram vinte e
nove casos e houve apenas quatro ocorrências com a 2ª pessoa do singular. Como visto
no item 3.2.1, não houve qualquer caso de ênclise com verbos conjugados no plural,
porém, em relação à mesóclise, encontramos quatro ocorrências com o verbo flexionado
na 3ª pessoa do plural e duas na 1ª pessoa do plural.
A ausência de mesóclise na 2ª pessoa do plural parece ser apenas coincidência,
derivada das limitações discursivas do corpus escolhido. Em nosso trabalho, foram
encontrados apenas 25 casos (2,1%) de formas flexionadas na 2ª pessoa do plural e
junto dessas formas só foram encontrados pronomes proclíticos como veremos no item
3.2.3. Como a quantidade de casos de verbos flexionados na 2ª pessoa do singular é
muito baixa, pode ser uma lacuna de nosso corpus não termos encontrado casos de
mesóclise com essas formas.
Tabela 3.9. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente com pronomes
mesoclíticos.
Pessoas da conjugação dos verbos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular 37 (48,7%)
2ª pessoa do singular 4 (5,3%)
3ª pessoa do singular 29 (38,1%)
1ª pessoa do plural 2 (2,6%)
2ª pessoa do plural -
3ª pessoa do plural 4 (5,3%)
Total 76 (100%)
94
Nos exemplos abaixo podemos perceber melhor como se comporta a mesóclise
com os verbos no futuro do presente. Em (3.36) há um exemplo de mesóclise com a 1ª
pessoa do singular, caso mais recorrente, de acordo com a tabela 3.9; em (3.37) pode-se
observar um exemplo com a 3ª pessoa do singular e em (3.38) com a 2ª pessoa do
singular. Em (3.39) e (3.40) há exemplos com a 1ª e 3ª pessoas do plural,
respectivamente.
(3.36)
Dade-mia qual quer que seja, sequer viva, sequer morta,
e conortar-m-ei con ela come quen se mal conorta.» (CSM 354, v. 35-36)
(3.37)
Quen crever na Virgen santa,
ena coita valer-ll-á. (CSM 107, refrão, v.4-5)
(3.38)
e aver-m-ás sempre por servidor.
Quen fiar na Madre do Salvador... (CSM 44, v. 28-29)
(3.39)
E por aquest' un miragre | vos direi, de que sabor
averedes poy-l’ oirdes, | que fez en Rocamador
a Virgen Santa Maria, | Madre de Nostro Sennor;
ora oyd' o miragre, | e nos contar-vo-lo-emos. (CSM 8, v. 7-10)
(3.40)
E con tod’ esto servi-la-an
Quantos me creveren loarán...
e de seu prazer non sayrán
Quantos me creveren loarán...
e mais d’ outra ren a amarán,
e serán per y de mui bon sen;
(CSM 120, v.11-16)
95
Verificou-se também, em relação à mesóclise, quais os pronomes oblíquos mais
utilizados com verbos conjugados no futuro do presente, como retratado na tabela 3.10.
Tabela 3.10. Tipos de pronomes mesoclíticos que acompanham o futuro do presente.
Pronomes pessoais oblíquos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular - me 9 (10,7%)
2ª pessoa do singular – te 22 (26,2%)
3ª pessoa do singular – o 14 (16,6%)
3ª pessoa do singular – lle 23 (27,4%)
3ª pessoa do singular – se 2 (2,4%)
1ª pessoa do plural – nos 1 (1,2%)
2ª pessoa do plural – vos 12 (14,3%)
3ª pessoa do plural – os -
3ª pessoa do plural – lles 1 (1,2%)
Total 84 (100%)
Em relação à mesóclise, o clítico mais recorrente foi o objeto indireto de 3ª
pessoa do singular, lle, como exemplificado em (3.41) e (3.42). Quando o pronome lle é
mesoclítico, há elisão da vogal e diante da vogal que inicia o verbo aver, como no
exemplo (3.41), em que o verbo aver conjugado na 1ª pessoa do singular se inicia assim
também por e. Foram encontradas ainda, nessa posição, catorze ocorrências do pronome
objeto direto o, a, com suas variantes lo, la, como pode ver visto no exemplo (3.43). Há,
também, duas ocorrências do também pronome de 3ª pessoa se, exemplo (3.44), fato
não verificado em relação à ênclise.
(3.41)
Dar-ll-ei con mia lança,
e o seu partamos,
logo sem perfia
todos per iguança.” (CSM 9, v. 93-96)
96
(3.42)
Diss' o bispo: «Venna logo, | ca de veer-l' ei soydade.» (CSM 67, v.79)
(3.43)
Quen na Virgen santa muito fiará,
se o vir en coita, acorre-lo-á. (CSM 186, refrão, v. 3-4)
(3.44)
diss' a Virgen: «Eu ir-m-ia,
e todos yr-ss-an;
mais o que ti eu dad' avia
nono levarán,
pois to dey por offerenda.» (CSM 66, v.65-69)
O segundo pronome mais usado em mesóclise foi o de 2ª pessoa do singular
te/che. Percebemos, pela análise do corpus, que em PA ainda não havia consenso sobre
a grafia desse pronome; encontramos as duas formas em posição mesoclítica: te
(exemplo (3.45)) e che (exemplo (3.46)).
(3.45)
E disse-ll' enton: «Mesquo, macar mal me dostaste,
muit' ei eu de ti gran doo de que ta lingua tallaste;
mais sãar-t-ei ora dela, porque en mi confiaste,
(CSM 174, v.32-34)
(3.46)
Santa Maria: «vai, e dar-ch-ey quito
E teu fillo do usureiro maldito”, (CSM 62, v. 36-37)
Foram localizadas nove ocorrências do pronome na 1ª pessoa do singular me.
Em todos os casos houve a elisão da vogal e, já que o verbo aver se inicia por vogal,
exemplo (3.47), fato que também ocorre com verbos no futuro do pretérito, exemplo
(3.48). Mas há uma cantiga em que não ocorre elisão da vogal do pronome; neste caso a
vogal utilizada não é e e sim i, como vem exemplificado em (3.49). Massini-Cagliari
(2005, p. 251) levanta a hipótese de que o pronome mi seria tônico, em PA; daí decorre
97
o fato de esse pronome nunca se submeter à elisão; o único processo de sândi a que se
submete é a ditongação (processo que não apaga a vogal do pronome).
(3.47)
que o faça esforçar;
porend' eu d' aqui ir-m-ei(CSM 88, v.45-46)
(3.48)
e prazer-m-ia
se te prazia (CSM 100, v.28-29)
(3.49)
Porend' un miragre vos direi fremoso
que fezo a Madre do Rey grorioso,
e de o oyr seer-vos-á saboroso,
e prazer-mi-á en.
(CSM 79, v.7-10)
Em relação ao plural, encontramos doze ocorrências do pronome de 2ª pessoa
vos, exemplo (3.50); apenas um exemplo com o pronome de 1ª pessoa nos – exemplo
(3.51), e um com o pronome de 3ª pessoa lles – exemplo (3.52). Não houve ocorrências
de pronomes objetos diretos na 3ª pessoa do plural, fato já observado com relação à
ocorrência de ênclise.
(3.50)
E mostrar-vos-ei tal cousa, | qual viuda nen oyda
nunca foi.” [...] (CSM 128, v.42-43)
(3.51)
Ca como quer que ben crean en Deus os de Portogal,
eu ei tan gran esperança na Virgen espirtal
que, se ll' algo prometemos, sacar-nos-á deste mal;
(CSM 271, v. 26-28)
(3.52)
Ena loar, ca u Nostro Sennor
eno juyzo mais yrado for,
perdõa-lles-á polo seu amor,
e estes taes non se perderán. (CSM 240, v. 49-52)
98
A quantidade de pronomes é superior à de verbos conjugados no futuro do
presente devido aos exemplos de uso concomitante de mais de um pronome clítico a um
mesmo verbo, como exemplificado em (3.53).
(3.53)
El lle respos, com' en jogo: «Pois vos praz, dizer-vo-l-ei:
outra dona mui fremosa amo muit' e amarei
mais d' outra cousa do mundo e por seu sempr' andarei.» (CSM 84, v.41-43)
É interessante notar que a mesóclise com dois pronomes só é possível quando o
segundo clítico não aumenta a quantidade de sílabas; no exemplo (3.53), há elisão da
vogal o do pronome lo diante de ei e, por isso, apenas uma sílaba acaba por ser
interposta ao verbo, apesar de haver dois pronomes.
Foram encontrados poucos casos de mesóclise com o futuro do pretérito: apenas
dezoito ocorrências no total, como se vê na tabela 3.11. Dessas, treze aparecem com
verbos flexionados na 3ª pessoa do singular e cinco, com a 1ª pessoa do singular, como
exemplificado em (3.54) e (3.55), respectivamente. Não há casos de mesóclise no futuro
do pretérito com verbos flexionados no plural.
(3.54)
fez sas orações
que lle dissesse seu nome, e dar-ll-ia dões.
(CSM 85, v.29-30)
(3.55)
Mortos de cima do muro. | e diss` el rei: “Nulla prol
non ei de mais conbatermos, | e ter-m-ia por fol
sse contra Maria fosse, [...]
(CSM 185, v. 85-87)
A quantidade de verbos flexionados no plural com o futuro do pretérito é
bastante baixa, 20 casos (1,7%, tabela 3.4); a quantidade de casos de mesóclise com
verbos flexionados no futuro do pretérito também é baixa, 18 casos (19,3%, tabela 3.5).
99
Percebemos, assim, que a ausência de formas de futuro do pretérito flexionados no
plural com pronomes mesoclíticos pode ser devida a uma limitação do corpus, não
podendo ser interpretada como suficiente para determinar restrições devidas à estrutura
prosódica da forma verbal ou sua estrutura silábica.
Tabela 3.11. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do pretérito com pronomes
mesoclíticos.
Pessoas da conjugação dos verbos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular 5 (27,8%)
2ª pessoa do singular
3ª pessoa do singular 13 (72,2%)
1ª pessoa do plural -
2ª pessoa do plural -
3ª pessoa do plural -
Total 18 (100%)
Em relação aos clíticos mais encontrados com verbos no futuro do pretérito, foi
elaborada a tabela 3.12. A partir dela, pode-se verificar que os pronomes mais
encontrados foram os de 1ª pessoa do singular me (seis ocorrências), e de 3ª pessoa do
singular (lle) (cinco ocorrências), como exemplificado em (3.56) e (3.57),
respectivamente.
Tabela 3.12. Tipos de pronomes mesoclíticos que acompanham o futuro do pretérito.
Pronomes pessoais oblíquos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular - me 6 (27,3%)
2ª pessoa do singular – te 4 (18,2%)
3ª pessoa do singular – o 3 (13,6%)
3ª pessoa do singular – lle 5 (22,8%)
3ª pessoa do singular – se 2 (9,1%)
1ª pessoa do plural – nos -
2ª pessoa do plural – vos -
3ª pessoa do plural – os 1 (4,5%)
3ª pessoa do plural - lles 1 (4,5%)
Total 22 (100%)
100
(3.56)
diss' a Virgen: «Eu ir-m-ia,
e todos yr-ss-an;
mais o que ti eu dad' avia
nono levarán,
pois to dey por offerenda.» (CSM 66, v.65-69)
(3.57)
e vivesse por sempr’ un ome enssinado
de scriver, ficar-ll-ia a mayor partida. (CSM 110, v.16-17)
No singular, há quatro ocorrências com o pronome de 2ª pessoa che, três do
pronome de 3ª pessoa o, a, e duas do também pronome de 3ª pessoa se - exemplos
(3.58), (3.59) e (3.60), respectivamente. No plural, aparece apenas uma ocorrência de
cada um dos pronomes de 3ª pessoa os e lles, exemplos (3.61) e (3.62). No único
exemplo em que encontramos o pronome os, ele aparece contraído com o pronome che.
(3.58)
Logo comig’, ai irmãa, | e amostrar-che-ei logar
u podemos quinze dias | ou tres domaas estar
viçosos cab’ hũa fonte | que eu ei; des i caçar
me veeredes andando, | e prazer-vos-á muit’ en.” (CSM 314, v. 19-22)
(3.59)
[...] “Amigos meus,
por piadade,
ant’ a Magestade
vos me parade,
e roga-la-ya.
(CSM 255, v.83-87)
(3.60)
e torceu-xe-lle’ a boca en tal maneira
que quen quer que o visse espantar-s-ia. (CSM 61, v.22-23)
(3.61)
Respos el: «Non quer' eu creer
en eles; mas fillar-chos-ya,
(CSM 25, v. 38-39)
101
(3.62)
E conssellou-lles que fossen mouras e crischãidade
leixassen, e fossen fora daquela catividade,
e lles faria grand' algo e dar-lles-ya herdade,
e que con mouros mui ricos a ambas casa-las faria. (CSM 325, v. 29-32)
3.2.3 Pronomes proclíticos
A quantidade de clíticos posicionados antes de verbos flexionados no futuro do
presente e do pretérito é muito superior aos casos de ênclise e mesóclise, cf. tabela 3.3.
A tabela 3.13 (abaixo) mostra os casos de próclise com verbos no futuro do presente,
distribuídos por pessoa.
Tabela 3.13. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do presente com pronomes
proclíticos.
Pessoas da conjugação dos verbos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular 185 (63,8%)
2ª pessoa do singular 10 (3,4%)
3ª pessoa do singular 74 (25,5%)
1ª pessoa do plural 6 (2,1%)
2ª pessoa do plural 4 (1,4%)
3ª pessoa do plural 11 (3,8%)
Total 290 (100%)
Conforme os dados da tabela 3.13 (acima), pode-se perceber que a posição de
próclise parece ser favorecida já naquela época. Em relação ao futuro, todas as pessoas
aceitam pronomes proclíticos. Desses 290 casos de pronomes proclíticos em relação a
verbos no futuro do presente, 185 estão junto a um verbo conjugado na 1ª pessoa do
singular, como exemplificado em (3.63). A quantidade é bastante elevada devido a uma
fórmula recorrente nas cantigas: logo na primeira estrofe, o trovador, em 1ª pessoa,
anuncia ao interlocutor o que vai ser narrado. Devido a essa estrutura fixa, a quantidade
de pronomes oblíquos de 2ª pessoa do plural também é alta (tabela 3.14, adiante). A
102
partir dessa forma, o poeta refere-se ao interlocutor utilizando-se do pronome vos, esse
uso vem exemplificado em (3.64), (3.65) e (3.66).
(3.63)
Diss' o irmão do Conde: «Eu o vingarey
de ti, que o matar foste por nos cofonder.” (CSM 5, v. 100-101)
(3.64)
Desto vos direi un miragre fremoso,
que mostrou a Madre do Rei grorioso
contra un ric-ome fol e sobervioso,
e contar-vos-ei end' a gran maravilla.
(CSM 19, v.5-8)
(3.65)
E dest' un miragre fremoso vos direi (CSM 73, v.5)
(3.66)
Dest’ un maravilloso
miragre mui fremoso
vos direi [...] (CSM, 182, v.5-7)
A quantidade de pronomes proclíticos junto a verbos na 3ª pessoa do singular
também é alta, 74 ocorrências (25,5% dos casos) - exemplo em (3.67). Já, em relação à
2ª pessoa do singular, há apenas dez ocorrências, como no exemplo em (3.68).
(3.67)
Esto fez Santa Maria, a Sennor que nos manten,
pola ssa gran piadade, e sempre nos manterrá. (CSM 124, v.47-48)
(3.68)
E disse: «Pagão,
sse queres guarir,
do demo de chão
t' ás a departir
e do falsso, vão, (CSM 192, v.98-102)
103
Em relação a verbos flexionados no plural do futuro do presente, há apenas 21
ocorrências no total, seis com o verbo conjugado na 1ª pessoa, quatro na 2ª e onze na 3ª
pessoa, como exemplificado em (3.69), (3.70) e (3.71), respectivamente.
(3.69)
may-lo monge tesoureiro | foi-lla da mão toller,
dizend': «Encantador sodes, | e non vo-la leixaremos. (CSM 8, v. 24-25)
(3.70)
Grand' alegria vos será;
ca o veeredes alá
en Galilea, u está
segund' vos el dit' avia.» (CSM 425, v. 45-48)
(3.71)
e quen cree ben esto, o demo nen sas artes
nunca lle terrán dano, se en elo atura. (CSM 149, v. 50-51)
Como já foi dito anteriormente, o pronome clítico mais utilizado junto às formas
do futuro do presente é o pronome de 2ª pessoa do plural, como mostra a tabela 3.14. A
maneira de iniciar as cantigas como se o próprio Rei Afonso X estivesse a nos contar os
fatos resulta em uma grande freqüência de clíticos vos, como registrado nos exemplos
(3.72) e (3.73).
Tabela 3.14. Tipos de pronomes proclíticos que acompanham o futuro do presente.
Pronomes pessoais oblíquos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular - me 25 (8,2%)
2ª pessoa do singular – te 41 (13,4%)
3ª pessoa do singular – o 46 (15,1%)
3ª pessoa do singular – lle 13 (4,3%)
3ª pessoa do singular – se 9 (2,9%)
1ª pessoa do plural – nos 18 (6%)
2ª pessoa do plural – vos 147 (48,2%)
3ª pessoa do plural – os 1 (0,3%)
3ª pessoa do plural - lles 5 (1,6%)
Total 305 (100%)
104
(3.72)
Dest' un miragre preçado
vos será per mi mostrado (CSM 111, v.11-12)
(3.73)
E dest’ un miragre, de que fiz cobras e son,
vos direi mui grande, que mostrou en Aragon (CSM 64, v.6-7)
Há ainda 41 ocorrências dos pronomes de 2ª pessoa do singular che/te. Como
visto em relação à mesóclise, as duas formas coexistem nas Cantigas para o pronome de
2ª pessoa do singular, como se verifica nos exemplos (3.74) e (3.75), retirados da
mesma cantiga.
(3.74)
che darei onrradamente | mia filla, e tu seerás
como en logar de fillo; | e se morrer erdarás
mui grand’ algo que eu tenno, | que gaanney sen tricharia. (CSM 125, v.74-76)
(3.75)
E eu farei ao bispo | que venna por ti log’ acá,
e di-ll’ esto que che dixe, | e el ben te consellará
como non percas ta alma; | e senon, Deus se vingará
de ti por quanto quisische | do demo ssa compania.” (CSM 125, 98-101)
Foi também encontrada uma ocorrência com o pronome ti com a função sintática
de objeto indireto, como pode ser verificado em (3.76). Esse foi o único caso de nosso
corpus com o pronome ti proclítico a um verbo.
(3.76)
E demais esta cera ti darei
en sa figura, e sempr' andarei
pregõando teu nome e direi
como dos Santos tu es la mellor.» (CSM 44, v. 30-34)
O pronome de 1ª pessoa do singular tem 25 ocorrências no total (exemplo
(3.77)). Em apenas uma dessas ocorrências ocorre o pronome mi, não acompanhado de
105
preposição, como mostrado em (3.78); o mesmo fato que ocorreu com relação à
mesóclise (ver p. 96). Tanto para mesóclise quanto para a próclise, o pronome mi foi
encontrado apenas uma vez para cada tipo de colocação pronominal.
(3.77)
«Tod' esto», diss' ela, «creo de chão;
mais como me poderei levantar?» (CSM 105, v.112-113)
(3.78)
Poren nunca mi averá
32
erg’ a quen m’ ela dará;
e vos, quitade-vos ja
d’ irdes contra seu mandado,
mais levade-m’ acolá
u ést’ o que seerá
meu marid’ e meu amado.” (CSM 137, v.96-102)
Em relação à 3ª pessoa do singular, há 46 ocorrências com os pronomes o, a e
suas variantes lo, la, como no exemplo (3.79); treze ocorrências com o pronome lle,
sempre grafado com dois l, exemplo (3.80); nove ocorrências com o pronome reflexivo
se, grafado ora com apenas um s, ora com dois s, como nos exemplos (3.81) e (3.82),
respectivamente.
(3.79)
a Santa Maria a pedide des aqui,
que é poderosa e vo-la poderá dar. (CSM 16, v. 42-43)
(3.80)
O que pola Virgen leixa o de que gran sabor á,
sempr[e] aqui lle demostra o ben que pois lle fará. (CSM 124, v.3-4, refrão)
32
A ditongação entre mi e averá, no exemplo (3.78), comprova a cliticização prosódica do
pronome à forma verbal.
106
(3.81)
Quantos en Santa Maria
esperança an,
ben se porrá sa fazenda. (CSM 66, v.4-6, refrão)
(3.82)
que mio cobres, sequer ali
u a ta missa sse dirá. (CSM 92, v.26-27)
Além das 147 ocorrências do pronome de 2ª pessoa do plural, encontramos
também 18 ocorrências do pronome de 1ª pessoa do plural nos, como no exemplo
(3.83); cinco ocorrências com o pronome de 3ª pessoa do plural lles, e apenas uma com
o pronome também de 3ª pessoa do plural os, as – exemplos (3.84) e (3.85),
respectivamente.
(3.83)
Poren cabo del está,
u sempre por nos rogará,
Santa Maria. U por nos lle rogará
e del perdon nos gãará
Santa Maria. (CSM 160, 14-19)
(3.84)
Nen lles nuzirá se beveren poçon,
e guarrán de todo mal e de lijon
aos enfermos.” (CSM 426, v. 30-32)
(3.85)
A moller respos: «Aquesto de grado farei,
e que a ajades quant' eu poder punnarei;
mas de vossas dõas me dad', e eu llas darei,
e quiçay per esto a poderei enganar.»
(CSM 64, v.61-64)
Já em relação a verbos conjugados no futuro do pretérito, assim como aconteceu
com os casos de ênclise e mesóclise, houve maior recorrência de pronomes junto a
verbos flexionados na 3ª pessoa do singular (exemplo (3.86)) – 62 dos 69 casos de
107
próclise junto a verbos no futuro do pretérito, como mostra a tabela 3.15. Há ainda
cinco ocorrências com o verbo conjugado na 1ª pessoa do singular e apenas duas com o
verbo na 3ª pessoa do plural - exemplos (3.87) e (3.88), respectivamente.
Tabela 3.15. Pessoas da conjugação dos verbos no futuro do pretérito com pronomes
proclíticos.
Pessoas da conjugação dos verbos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular 5 (7,2%)
2ª pessoa do singular -
3ª pessoa do singular 62 (89,9%)
1ª pessoa do plural -
2ª pessoa do plural -
3ª pessoa do plural 2 (2,9%)
Total 69 (100%)
(3.86)
en ha torre o meteu en muy gran prijon,
jurando muyto que o faria y morrer. (CSM 5, v. 37-38)
(3.87)
Os que m’ oen cada dia
e que m' oyrán,
de grado lles contaria (CSM 66, v.7-9)
(3.88)
E demais que lle darian
ha menynna donzela
das mais ricas que sabian
ena terra e mais bela,
porque ambos vivirian
sen coita e sen mazela
e sen toda tricharia. (CSM 132, v.61-66)
A tabela 3.16 mostra o levantamento dos tipos de pronomes que acompanham as
formas do futuro do pretérito. A maior recorrência foi de pronomes da 3ª pessoa do
singular (46 entre as 71 ocorrências de pronomes proclíticos ao futuro do pretérito).
108
Tabela 3.16. Tipos de pronomes proclíticos que acompanham o futuro do pretérito.
Pronomes pessoais oblíquos Quantidade de ocorrências
1ª pessoa do singular - me 6 (8,6%)
2ª pessoa do singular – te 3 (4,2%)
3ª pessoa do singular – o 16 (22,5%)
3ª pessoa do singular – lle 20 (28,2%)
3ª pessoa do singular – se 10 (14,1%)
1ª pessoa do plural – nos 4 (5,6%)
2ª pessoa do plural – vos 4 (5,6%)
3ª pessoa do plural – os 4 (5,6%)
3ª pessoa do plural - lles 4 (5,6%)
Total 71 (100%)
Das ocorrências de pronomes de 3ª pessoa, apenas quatro eram do plural com o
pronome lles, como no exemplo (3.89) e duas com os pronomes os, as (exemplo (3.90)).
No singular, encontramos vinte ocorrências de lle (exemplo (3.91)), dezesseis do
pronome o, a, (exemplo (3.92)) e dez casos do pronome reflexivo se (exemplos (3.93) e
(3.94)).
(3.89)
que per ali lles faria
a alma toller
do frad' errado,
dizendo-lles [...]
(CSM 11, v. 63-68)
(3.90)
e deron poren loores | aa Sennor mui conprida,
a que quen quer as daria | que sse migo co[n]ssellas[s]e. (CSM 343, v. 52-53)
(3.91)
a un judeu foi sen lezer
provar se ll' alg' enprestaria. (CSM 25, v. 20-21)
(3.92)
ca o que terra e mar
fez per seu mui gran poder,
esto ben o faria(CSM 108, v.26-28)
109
(3.93)
nen que per nulla maneira
est´ alva vestir provasse,
ca Deus del se vingaria. (CSM 2, v. 53-55)
(3.94)
ca o demo, de mal cho, | en tal guisa a encendeu
que diss’ enton a seu padre | que logo sse casaria (CSM 104, v.60-61)
Foram encontrados, ainda: três casos com o pronome che, como no exemplo
(3.95); quatro casos com o pronome de 1ª pessoa do plural nos, exemplo (3.96); e
também quatro casos com o pronome de 2ª pessoa do plural vos, exemplo (3.97).
(3.95)
adormeceu, e a Virgen lle disse: Sal acá fora
deste logar e trei migo, ca eu te porrei na via.»
(CSM 325, v. 46-47)
(3.96)
e faz con el a guerlanda e é ssa ajudador,
que assi nos desfaria ben com' a agua o sal.» (CSM 121, v. 47-48)
(3.97)
“Ide fazer
Com’ eu a donzela aja | log’ esta noit’ en meu poder;
Senon, en ha redoma | todos vos ensserraria.” (CSM 125, v.29-31)
Também em relação à próclise, a quantidade de pronomes é maior do que o
número de verbos flexionados no futuro do presente e do pretérito, pois há casos de co-
ocorrência de pronomes, como se pode observar nos exemplos (3.98) e (3.99).
(3.98)
Diss’: Amig’, assi farey
que cras con vosco m’ irei
e atanto buscarey
aquel que foi esposado
110
vosco, que o acharey,
e logo vo-lle darey
por aver a Deus pagado.” (CSM 135, v.64-70)
(3.99)
ca sabian
que llo non leixaria. (CSM 115, v.303-304)
Dos 494 casos de uso de clíticos encontrados em nosso corpus, 360 são de
pronomes proclíticos, o que equivale a 72,9% dos casos. Por ser a quantidade bastante
elevada, resolveu-se também analisar se o contexto frasal de alguma forma influenciava
a colocação do pronome antes do verbo. Do total de 360 casos de próclise, em 29 (8%)
deles havia alguma palavra negativa antes do verbo (como non, nunc, nen), como no
exemplo (3.100). Não houve qualquer caso de ênclise ou de mesóclise em que houvesse
uma palavra negativa antes do verbo.
(3.100)
e achar nona podia, | e cuidava que per ren
per el já non ss’ acharia, | nen per outro sabedor. (CSM 202, v. 14-15)
Foi feito também um controle do uso da palavra que, tanto como pronome
relativo quanto como conjunção, e, em todos os casos em que essa palavra aparecia
antes de um verbo acompanhado de pronome, a colocação escolhida era a proclítica. Há
50 casos de próclise com a presença de que (exemplo (3.101)), o que equivale a 13,89%
dos casos de próclise. Esses dados mostram haver algum tipo de condicionamento para
a próclise, como o uso de palavras negativas, conjunções ou pronomes relativos.
(3.101)
E disse: «Ja mais non me partirei
daquesta porta, ca de certo sey
que me dará a Madre do bon Rei
mia filla viva; senon, de prumaz (CSM 122, v.50-54)
111
Em relação à próclise, foi feito também um levantamento dos casos em que os
clíticos não estavam adjacentes ao verbo, como no exemplo (3.102). Há em nosso
corpus 32 casos de próclise em que o pronome oblíquo está separado do verbo por outra
palavra, como um advérbio – exemplo (3.102) –, um pronome pessoal do caso reto –
exemplo (3.103) – ou uma conjunção – exemplo (3.104). Esse valor equivale a 8,9% de
um total de 360 casos de próclise – ver tabela 3.3.
(3.102)
poren mercee te peço que me perdões, ca sey
que se me tu perdõares, que me non será sannoso (CSM 219, v. 48-49)
(3.103)
Desto ela un miragre mostrou, que vos eu direi,
a que fix bon son e cobras, porque me dele paguei; (CSM 188, v.7-8)
(3.104)
aqueste Santa Maria ouv' en si, por que prender
vo Deus en ela carne, con que nos pois julgará. (CSM 418, v. 10-11)
Esses dados levantados comprovam a independência prosódica do clítico em
relação à forma verbal, o que pode ser um indício a favor de considerar analíticas
mesmo as formas aqui rotuladas como sintéticas, isto é, formas verbais futuras
prosodicamente equivalentes a palavras compostas ou perífrases, já que há a
possibilidade de inserção de material fônico/sintático entre as bases, ao passo que a
cliticização padrão se dá preferencialmente com formas sintéticas, posicionando o
clítico antes ou depois do núcleo (prosódico, no caso). A possibilidade de interpretar as
formas aqui rotuladas como sintéticas como expressões analíticas será discutida na
seção 4 desta tese.
112
3.3 Considerações finais
Nesta análise, verificou-se que em PA o verbo aver, auxiliar do tempo futuro,
está unido ao verbo principal, formando com este um único vocábulo, em 97,3% dos
casos, e separado deste gráfica e prosodicamente, em 2,7% dos casos. Em uma primeira
análise superficial, esses dados podem nos levar a crer que, em PA, as formas sintéticas
já haviam se consolidado.
Nas formas analíticas do futuro do presente, o verbo aver, conjugado no
presente do indicativo, está sempre separado do verbo no infinitivo por meio de uma
preposição, o que não ocorre em nenhum dado com o futuro do pretérito. E, apenas
nesse último tempo, o verbo aver/ir, conjugado no pretérito imperfeito do indicativo,
não tem ordem fixa em relação ao verbo principal, ora aparecendo primeiro o auxiliar,
ora primeiro o verbo principal no infinitivo.
No futuro do presente, o verbo está conjugado predominantemente na 1ª pessoa
do singular, enquanto que no futuro do pretérito predomina a 3ª pessoa do singular. Só
no futuro do presente encontramos verbos conjugados nas 1ª e 2ª pessoas do plural, não
havendo qualquer caso como esse no futuro do pretérito. Uma provável explicação para
esse fato é que as formas de 1ª e 2ª pessoas do plural do futuro do pretérito
(cantaríamos e cantaríades) são proparoxítonas, formas extremamente marginais em
PA, como já provaram Michaëlis de Vasconcelos (1912-1913), Teyssier (1987) e
Massini-Cagliari (2005).
Em relação à colocação pronominal, há preferência pela próclise em PA: 72,9%
dos casos, contra 19% de casos de mesóclise e 8,1% de ênclises.
113
Nos poucos casos de ênclise, o verbo está sempre conjugado no singular, seja no
futuro do presente ou do pretérito. Isso se deve a dois fatores: só formas verbais que
terminam em sílabas abertas aceitam pronomes enclíticos, o que não é o caso das
formas de plural do futuro; evita-se também, como aconteceria com a colocação de
pronomes enclíticos, a formação de palavras prosódicas proparoxítonas, palavras
esdrúxulas em PA. É importante ressaltar que palavras proparoxítonas em PA são
formas marginais, mas não impossíveis, já que há no corpus verbos oxítonos
acompanhados de dois pronomes oblíquos enclíticos, o que resulta em uma forma
superficial proparoxítona.
A quantidade de casos de mesóclises é superior à de ocorrência de ênclises.
Diferentemente dos casos de ênclise, encontramos mesóclise com verbos flexionados
também no plural, exceto com a 2ª pessoa; esse último fato se deve certamente a uma
limitação do corpus, no qual não há muitos verbos conjugados na 2ª pessoa do plural.
Finalmente, a quantidade de pronomes proclíticos no corpus é muito superior à de
ênclises e mesóclises. No futuro do presente, todas as pessoas verbais aceitam próclise,
o que não ocorreu nem em relação à ênclise, nem em relação à mesóclise, o que nos
prova que essa posição já era favorecida em PA. Verificou-se também que, em PA, o
contexto frasal favorece a próclise, como em casos em que há uma palavra atrativa
como advérbios, pronomes relativos ou conjunções.
Apesar do predomínio de formas (aparentemente) sintéticas no corpus e da
elevada quantidade de próclises sugerirem que estamos diante de uma forma sintética,
verificou-se que em 8,9% dos casos de próclise o pronome não está adjacente ao verbo,
mas separado desse por meio de um advérbio, conjunção, entre outras palavras. Esse
fato mostra uma independência prosódica do pronome em relação à forma verbal, o que
ainda nos permite pensar em formas futuras analíticas. A quantidade relativamente
114
elevada de mesóclises também nos dá pistas de que em PA talvez existia uma
conscientização de que a forma futura tradicionalmente rotulada como sintética é
possivelmente composta ou mesmo perifrástica, em ambos os casos analítica, pela
possibilidade de colocação de um ou mais pronomes entre o infinitivo e o verbo aver
conjugado.
115
4. Estrutura morfofonológica das formas futuras
Esta seção tem como objetivo abordar a questão da determinação da estrutura
das formas do futuro do presente e do pretérito no PA como simples (sintéticas) ou
compostas ou perifrásticas (analíticas). A questão que se pretende responder é a
seguinte: teríamos na formação desses tempos em PA a estrutura que Câmara Jr. (1972
[1970], p. 94) reconhece para esses tempos verbais no PB, ou seja, R + VT + SMT +
SNP (cf. seção 1.3, p. 19), considerando as formas rei, rá(s), , re(mos), re(dês), rá(n) /
ria ria(s), ria, ria(mos), ria(dês), ria(n), como desinências modo-temporais (seguidas
das desinências número-pessoais), ou as formas ei, ás, á, emos, edes, án / ia, ias, ia,
íamos, íades, ian corresponderiam o verbo aver ou ir flexionados, respectivamente, no
presente do indicativo e no pretérito imperfeito do indicativo adicionado ao infinitivo do
verbo principal, portanto uma palavra composta ou uma forma perifrástica?
Há estudos sobre o PB atual que analisam formas analíticas do futuro, mas
centram especial atenção na expressão do tempo verbal futuro pela forma perifrástica ir
+ infinitivo, como Longo (1992), Silva (2006) e Oliveira (2006). Esses trabalhos tratam
como formas simples “aquela formada por um verbo + morfema gramatical” (SILVA,
2006, p. 16). Longo (1992) verifica se as interpretações das perífrases em que o verbo
ocorre equivalem semanticamente às das “formas simples” de futuro que lhes
correspondem. Silva (2006) analisa a substituição da “forma simples” pela perifrástica e
as possíveis causas extralingüísticas que ocasionaram essa substituição. Gibbon (2000)
tem como objetivo de sua dissertação mostrar como a forma perifrástica ir + infinitivo e
o futuro do presente expressam futuro e o desuso desse último. Tafner (2004) analisa,
também, formas com gerúndio que podem indicar futuro como estar + verbo principal
116
no gerúndio (“estarei andando”) e ir + estar + verbo principal no gerúndio (“vou estar
andando”).
4.1 Critérios de distinção entre formas simples e compostas
Vários lingüistas já abordaram o tempo futuro em diversas línguas, analisando
sua estrutura (como já apresentado na primeira seção desta tese e no início desta seção).
Entretanto poucos tiveram a preocupação de analisar a natureza morfofonológica do
tempo verbal futuro, verificando se essas formas seriam simples – correspondendo a
apenas uma única palavra fonológica – ou compostas ou perifrásticas – constituindo
duas palavras fonológicas.
Dois trabalhos em especial tiveram como foco a análise da estrutura
morfofonológica de verbos no tempo futuro, em PA e em inglês, respectivamente:
Massini-Cagliari (1999, 2006) e Bybee, Pagliuca e Perkins (1991). É a partir dos
critérios desenvolvidos por esses lingüistas que faremos nossa análise das formas
futuras encontradas nas CSM.
4.1.2 Critérios de Massini-Cagliari (1999)
Estudos anteriores sobre a atribuição de acento em PB analisam formas como
cantarei, cantaria, atribuindo a elas um status de palavras compostas, como Bisol
(2002), Massini-Cagliari (1999) e Cagliari (1999, 2002). Mateus (2002[1983]) e Mateus
e d’Andrade (2000) chegam à mesma conclusão em relação a essas formas em PE.
Cagliari (2002, p. 63), analisando a estrutura morfológica dos verbos em PB, diz que
“os verbos no futuro e no condicional são formados do infinitivo do verbo de
117
significação principal mais o presente do indicativo dos verbos haver (futuro) ou do
verbo ir (condicional)”.
Trabalhos recentes sobre o acento nas formas verbais futuras do PA determinam
que essas seriam compostas e não simples, como, por exemplo, Massini-Cagliari (1999,
p. 181). Os argumentos utilizados pela autora para considerar tais formas como
compostas, mostrando que há independência das partes que compõem as formas do
futuro, são os transcritos abaixo:
1. Co-ocorrência em PA de formas como viverey e ei a viver.
2. Possibilidade de mesóclise.
3. Dois futuros formados com uma só terminação como direy e non estar
argumento baseado em dados coletados em Williams (1973[1938]).
4. Padrão acentual das formas de 3ª pessoa do singular (oxítonas):
Um outro argumento provém dos próprios padrões acentuais dessas
formas, todas oxítonas. Ora, se não se tratasse de um composto, a
forma da 3ª pessoa do singular deveria ser paroxítona, pois termina
em vogal aberta. Entretanto, isto não ocorre, porque esta forma é
composta do infinitivo do verbo principal mais o verbo auer na 3ª
pessoa do singular do presente do indicativo, que é monossílabo,
sobre o qual é erguido em pé degenerado
32
. (MASSINI-CAGLIARI,
1999, p. 181)
O exemplo (4.1), retirado de Massini-Cagliari (1999, p. 181), mostra como a
autora acredita que se comportam todas as formas do futuro do presente, quanto à
localização do acento:
33
32
Um pé “degenerado” corresponde a um pé defectivo, construído com apenas uma sílaba leve
(cf. Massini-Cagliari, 1999, p. 87-89).
33
No exemplo (4.1), os parênteses indicam limite de constituinte prosódico. Cada x corresponde
a um acento, no nível lexical; o x na linha mais alta, corresponde à proeminência do constituinte
prosódico superior. Os demais símbolos, , e #, correspondem, respectivamente, a “sílaba
leve”, “sílaba pesada” e “limite de constituinte morfológico” ou “fronteira de palavra” (no caso,
limite entre as bases constituintes de um composto).
118
(4.1)
( x) RF (regra final)
(x) (x)
Partira = par tir # a
__ __
Retomaremos os argumentos usados por Massini-Cagliari (1999, p. 181 e 2006),
apresentados acima, para analisarmos como as formas verbais futuras mapeadas em
nosso corpus, as CSM, se comportam em termos de sua estruturação fonológica e
morfológica.
4.1.2.1 Co-ocorrência em PA de formas sintéticas e analíticas
Os exemplos abaixo, retirados das CSM, comprovam que, em PA, há alternância
de formas analíticas e sintéticas: os mesmos verbos são, em algumas cantigas,
conjugados separadamente, como duas palavras distintas; em outras, há uma junção
entre as formas, o que resulta (pelo menos aparentemente, devido à grafia escolhida) em
uma única palavra.
Como pode ser verificado nos exemplos (4.2) e (4.3), os mesmos verbos ora
estão na forma sintética, ora na forma analítica; no primeiro o verbo salvar vem
precedido do verbo auxiliar aver conjugado da 3ª pessoa do singular do presente do
indicativo e separado por uma preposição; no segundo, os mesmos verbos se fundem
em uma única palavra gráfica, o que resulta na forma salvará. Em (4.4), o verbo falecer
vem escrito separadamente do verbo aver, este conjugado na 3ª pessoa do singular; em
(4.5), o verbo falecer se une ao verbo aver, agora conjugado na 3ª pessoa do plural.
119
(4.2)
Virgen, de Deus amada:
do que o mund' á de salvar (CSM 1, v. 17-18)
(4.3)
e a dona do fogo remãeceu
salva per aquela que nos salvará. (CSM 186, v.77-78)
(4.4)
mas des oi mais a Santa Maria, que é luz,
quero servir, que me nunca á de falecer. (CSM 5, v. 177-178)
(4.5)
“Madre de Deus, beitos son os que en ti fyuza an,
ca na ta gran mercee nunca falecerán (CSM 5, v. 134-135)
Em (4.6) e (4.7), temos fatos semelhantes, mas agora referentes ao futuro do
pretérito: ambos têm o verbo aver ou ir conjugado na 3ª pessoa do singular, mas, no
primeiro exemplo, existe uma separação na escrita entre o auxiliar, este posposto ao
principal, e o verbo contar; enquanto no segundo, os termos vêm graficamente unidos,
como uma única palavra – contaria. Em (4.8) e (4.9), também para o futuro do pretérito,
há uma diferença em relação à colocação do auxiliar, no primeiro, o auxiliar, conjugado
na 3ª pessoa do plural, é colocado antes do verbo principal matar; já, no segundo, há
uma união entre o infinitivo e o verbo auxiliar, nesse exemplo conjugado na 3ª pessoa
do singular – mataria.
(4.6)
fez seu amigo chamar,
que llo contar ya. (CSM 94, v.115)
(4.7)
con quanto ben nos visti,
queno contaria? (CSM 40, v. 40-41)
120
(4.8)
E avo dessa vez
aos que combatian
que Deus por ssa Madre fez
que dali u ferian
os colbes, yan matar
daquel Soldan barvudo
as gentes, e arredar
do muro ja movudo. (CSM 28, v. 78-85)
(4.9)
que log’ enton con sas mãos | ant’ eles sse mataria. (CSM 125, v.66)
A partir dos exemplos acima (semelhantes aos apresentados na seção 3.1 deste
trabalho), percebemos que em PA existe uma co-ocorrência de usos gráficos distintos,
isto é, em alguns contextos os verbos principal e seu auxiliar aver ou aver/ir se
escreviam juntos, sem espaço interveniente, e, em outros contextos, eram escritos
separadamente. Esse primeiro argumento de Massini-Cagliari (1999, 2006) favorece a
interpretação dos futuros do PA como formas compostas ou perifrásticas, uma vez que
há a possibilidade de interpretar as suas partes constituintes como duas palavras
distintas, gráfica e prosodicamente.
4.1.2.2 Possibilidade de mesóclise
Para Mateus e Andrade (2000, p. 115), em relação a outras formas verbais, as
terceiras pessoas do singular e do plural do futuro do presente no PE atual se
comportam de maneira peculiar, já que elas têm o final tônico. Mas o futuro, segundo
eles, é um tempo peculiar não só em relação ao acento.
Segundo Mateus e Andrade (2000, p. 115), deve-se notar, em primeiro lugar,
que todas as formas de futuro no PE atual têm um // depois da vogal temática. Em
segundo lugar, no caso da colocação de clíticos, estes devem aparecer dentro da forma
121
verbal, assim teríamos falar-te-ei e não * falarei-te. Como os clíticos aparecem depois
do //, os autores concluem que este não pertence à marca de futuro, já que não
encontramos fala-te-rei. Isso os leva a considerar que o futuro é composto da forma
infinitiva, e é a esta forma que as marcas de tempo e pessoa são acrescidas. Mateus e
Andrade (2000, p. 115) ainda acrescentam outro argumento:
Yet another reason resides in the fact that when the form is
pronounced without enclisis, the theme vowel, /a/, as unstressed, is
raised, falarei [f
å
l
å
r
å
j]; if there is enclisis, the theme vowel behaves
as if it were stressed, that is, without raising, falar-te-ei [f
å
lart
Èå
j], or
[f
å
lartj
å
j].
Os autores explicam, logo depois, que estas marcas de tempo e pessoa são na
verdade o presente do indicativo do verbo haver e o imperfeito do mesmo verbo (eles
consideram o verbo haver como auxiliar para o futuro do pretérito) para o condicional,
já que, historicamente, o futuro deriva da construção perifrástica do tipo hei (de) falar.
Portanto “so even if this periphrastic form is historically grounded, it is on purely
synchronic facts that we assume it” (MATEUS; ANDRADE, 2000, p. 115).
Ainda segundo Mateus e Andrade (2000, p. 81), as formas do verbo haver
funcionam como marcadores de tempo e constituem uma única palavra com o verbo
principal. Porém, os autores advertem que, enquanto palavras (no nível morfológico), as
formas futuras devem ser vistas como compostas. Algumas formas do verbo haver são
completamente integradas ao verbo principal, como hei, hás; outras perdem o material
segmental que precede a vogal tônica, como havemos, 1ª pessoa do plural do presente
do indicativo, e todas as pessoas do pretérito imperfeito do indicativo. Os autores
concluem que a estrutura interna desses dois tempos envolve uma fronteira de palavra
pela possibilidade de mesóclise, ou seja, a inserção de formas clíticas de pronomes
122
pessoais dentro do verbo, à esquerda da vogal acentuada do morfema temporal, ainda
preservada em PE moderno, mas perdida para outras línguas românicas.
Os autores ainda ressalvam que os clíticos diferem radicalmente dos “sufixos
normais”, pois eles nunca influenciam a colocação do acento: “clitics are immune to
stress and may be said to be invisible to stress processes” (MATEUS; ANDRADE,
2000, p. 116). Eles ainda fazem um comentário sobre as posições tônicas que são
anteriores à antepenúltima sílaba: a colocação do clítico é pós-acentual e os clíticos são
inertes ao acento.
Vigário (2001, p. 55), mesmo acreditando que existem boas razões para analisar
as unidades com clíticos internos como construções perifrásticas, difere na sua análise,
em alguns aspectos, de Mateus e Andrade (2000). A autora acredita que:
[…] only the constructions with internal clitics are obtained via the
insertion of an infinitive verb form and a(n auxiliary-like) affix, while
the future and conditional verb forms without internal clitics are
inserted lexically inflected at the moment of phonological
instantiation. (VIGÁRIO, 2001, p. 55)
Para a autora as construções mesoclíticas se comportam como palavras
prosódicas compostas; o clítico interno seria, na verdade, enclítico ao primeiro verbo,
incorporando-se à palavra prosódica anterior:
The data presented in this section provide clear support for the
prosodization of mesoclitic constructions as compound prosodic
words. As to the internal clitic, it patterns like other postverbal
pronominal clitics, being incorporated into the preceding prosodic
word. (VIGÁRIO, 2001, p. 261)
Abaixo temos o exemplo dado por Vigário (2001, p. 262):
123
(4.10)
Sendo o uso das formas de futuro em PA semelhante à ocorrência dessas formas
no PE atual, a partir das idéias tanto de Mateus e Andrade (2000) como de Vigário
(2001), pode-se considerar que esses verbos constituem compostos ou perífrases, uma
vez que existe a possibilidade de mesóclise. Além disso, sendo a estrutura infinitivo +
auxiliar das formas do futuro no PA a mesma encontrada no PE, a partir dos critérios de
Vigário (2001), os pronomes mesoclíticos do PA poderiam ser igualmente considerados
como adjungidos encliticamente ao infinitivo.
Com relação ao português medieval, alguns gramáticos históricos, como Nunes
(1969), Coutinho (1971) e Williams (1973[1938]) (como já exposto na seção 1, deste
trabalho), já apontavam que a consciência da composição das formas futuras não havia
se perdido completamente no período medieval da língua. O principal argumento desses
gramáticos era exatamente a possibilidade de mesóclise com verbos flexionados no
futuro do presente e do pretérito.
Vigário (2001, p. 166) afirma que, atualmente, alguns falantes do PE não fazem
uso da mesóclise e sim da ênclise com verbos flexionados no futuro do presente e do
condicional. Segundo a autora, isso acontece pois eles interpretam a formação de futuro
como idêntica à formação dos tempos simples; para esses falantes, a construção
analítica já se perdeu. Isso também se dá em PB, já que a mesóclise é cada vez mais rara
dir-te emos
ω
w
ω
s
ω
max
124
na fala e na escrita. No entanto, há que se considerar que também as formas de futuro do
presente e do pretérito simples são cada vez mais raras no PB, especialmente na fala,
sendo substituídas por perífrases do tipo vou fazer / ia fazer (como apontam Gibbon,
2000, Tafner, 2004, e Silva, 2006). Fenômenos como os citados por Vigário (ênclise
com verbos futuros) são mais próprios da escrita em PB do que da fala. Por outro lado,
há que considerar, também, que formas compostas têm coesão interna, isto é, não
podem sofrer interpolação de material lingüístico entre suas partes (cf. Laroca, 2001, p.
22), ao passo que perífrases são permeáveis à inclusão de material lingüístico
interveniente (ex: Vou certamente fazer isto amanhã.). Desta forma, o argumento de
Vigário indica que as formas de futuro não são mais sentidas pelos falantes de PE como
perifrásticas; não pode, entretanto, ser utilizado como evidência de perda de consciência
de composição, já que também nestas não há a possibilidade de interveniência de outras
palavras entre as suas partes constitutivas.
De acordo com os dados encontrados nas Cantigas e quantificados na seção
3.2.2 deste trabalho, o número de casos de mesóclise encontrados no corpus é relevante:
de 230 ocorrências de verbos acompanhados de pronomes clíticos, 53 deles eram
mesoclíticos, o que equivale a 23% dos casos, como exemplificado abaixo em (4.11) e
(4.12). Se a possibilidade de mesóclise for considerada, a exemplo de Mateus e
d’Andrade (2000) para o PE, como índice de composição, esse fato ajuda a comprovar
que em PA ainda havia uma consciência de que a forma de futuro era perifrástica, já que
havia a possibilidade de mesóclise (apenas nesses tempos).
(4.11)
[...] entrou na cidade de Roma, u er’o cortes
Emperador, que a chamou e disso-lle: “Vês?
Guari-m' est' irmão gaff', e dar-ch-ei grand' aver.” (CSM 5, v. 162-164)
125
(4.12)
e dizendo: «Pois que ei congeyto,
vingar-m-ei daquele malfeitor.» (CSM 15, v. 92-93)
4.1.2.3 Dois futuros com uma única terminação
Williams (1973[1938], p. 211) afirma que, no português medieval, era possível
encontrar dois verbos no futuro com uma única terminação, e nos dá como exemplo a
expressão direy e non estar, em que os dois verbos indicariam futuro, mas só o primeiro
verbo teria a terminação. Esse exemplo mostra uma independência entre o verbo no
infinitivo e seu auxiliar aver, levando-nos a crer que realmente temos duas palavras
nesse período da língua.
Entretanto, não foram encontrados em nosso corpus dois futuros com uma só
terminação, como registrado por Williams (1973[1938]) e recuperado por Massini-
Cagliari (1999).
4.1.2.4 Padrão acentual
Para Câmara Jr. (1972[1970], p. 53), acento é “uma força expiratória, ou
intensidade de emissão, da vogal de uma sílaba em contraste com as demais vogais
silábicas”. A sua presença assinala a existência de um vocábulo. Silva (2001, p. 77)
retoma essa definição fonética de acento, dizendo que “uma sílaba tônica ou acentuada é
produzida com um pulso torácico reforçado”; portanto, na produção de uma sílaba
acentuada, temos um jato de ar mais forte, em relação às sílabas não acentuadas ou
átonas.
126
Câmara Jr. (1972[1970], p. 54) acrescenta a informação de que em português o
acento é também distintivo, pois pode, dependendo de sua posição, distinguir palavras,
como em jaca e jacá, cáqui e caqui. De acordo com a proposta de Câmara Jr., o acento
é analisado como um delimitador de vocábulos fonológicos, tendo assim valor
demarcativo, além do valor distintivo.
Para Collischonn (2001, p. 132), o acento pode ser considerado um fonema, do
ponto de vista estruturalista, pois distingue palavras (falara / falará, falaram / falarão),
mas é um fonema de tipo especial, porque ele não aparece colocado linearmente entre
os segmentos, mas se superpõe a eles. Ele se acrescenta a segmentos e, por isso, é
chamado de supra-segmento.
Segundo Massini-Cagliari e Cagliari (2001, p. 113), as línguas apresentam três
tipos básicos de acento: acento primário (é o acento mais forte de uma palavra), acento
secundário (é o acento relativamente menos forte que o acento primário de uma
palavra), acento frasal (é o acento mais forte de uma seqüência de palavras). Os autores
exemplificam esses tipos de acento da seguinte maneira:
A palavra cafezi
nho, dita isoladamente, recebe o acento primário na
penúltima sílaba (zi) e pode ter um acento secundário na primeira
sílaba (ca). Já na frase Vou tomar um cafezinho, a sílaba zi, que já era
acentuada no nível da palavra, recebe o acento frasal.
No modelo gerativo clássico de Chomsky e Halle (1968, p. 16), o acento é
considerado uma propriedade da vogal, ou seja, o acento seria equivalente a qualquer
propriedade vocálica, portanto um traço distintivo como os demais, sendo atribuído por
uma regra, pois, na estrutura profunda, as vogais não são acentuadas. Dentro dessa
perspectiva teórica, na qual o tratamento oferecido aos dados continua linear, “o acento
só poderia ser tratado como um traço distintivo que pode ser atribuído por meio de
regras apenas a vogais num nível lexical” (MASSINI-CAGLIARI, 1992, p. 74).
127
Na proposta de Chomsky e Halle (1968), a regra do acento primário obedece a
ciclos, isto é, tem de ser reaplicada toda vez em que há o acréscimo de um morfema
derivativo; em cada nova derivação, o acento primário é atribuído e os acentos
atribuídos em ciclos anteriores ficam reduzidos de um grau, como em pédra e pedréiro.
Sob a perspectiva teórica da fonologia gerativa, o primeiro trabalho a respeito da
acentuação do português foi o de Mateus (1982[1975]), que formulou regras de
atribuição de acento, com base exclusivamente fonológica, em que o acento não-
excepcional era atribuído por regra default às formas paroxítonas; nesse seu primeiro
trabalho, que desconsidera condicionamentos de ordem morfofonológica à localização
do acento principal de palavra, os padrões oxítono e proparoxítono são considerados
excepcionais, e atribuídos por regras especiais, desencadeadas por marcas lexicais de
excepcionalidade. Reformulando suas primeiras idéias, Mateus (2002[1983], p. 241)
pretende demonstrar que a acentuação em português depende da constituição
morfológica da palavra, e que a regra geral que determina a aplicação do acento deve
levar em conta a relação entre o radical ou tema e os morfemas que lhe seguem, sendo
também sensível ao tipo de fronteiras que conjugam os elementos constituintes, e
apresenta a seguinte regra e sua formalização na Fonologia Gerativa:
(4.13)
Acentuar a última vogal do {TEMA
[Vb]
} ou {RADICAL}
(4.14)
V [+ac] / [_] (C
1
) ] {TEMA
[Vb]
} ou {RADICAL}
Em relação ao futuro e o condicional, Mateus (2002[1983], p. 246), como já
apresentado na seção 1 deste trabalho, afirma que seus morfemas são diferentes de
outras formas verbais. Isso quer dizer que, quando no interior da estrutura morfológica
128
não existe nenhuma fronteira de palavra, mas existem duas fronteiras de morfemas
seguidas, perdura o acento que se encontra à direita dessas duas fronteiras
(bat e +r+ +á+s); se as fronteiras de palavra se mantiverem, mantêm-se igualmente os
dois acentos (bat é+r+# te#+á+s). Portanto, a existência de duas fronteiras de
morfemas seguidas, por um lado bloqueiam a atuação da regra apresentada em (4.14) e,
por outro, permitem a inserção de fronteiras de palavra com manutenção de dois acentos
primitivos.
Os modelos fonológicos mais recentes, os não-lineares, têm definido acento
como uma relação de proeminência entre sílabas: “as mais proeminentes são tônicas ou
acentuadas e as menos proeminentes, as átonas” (MASSINI-CAGLIARI, 1992, p. 9). O
acento, segundo a Fonologia Métrica, é uma propriedade da sílaba e tem caráter
relacional, não é um traço, mas uma proeminência que nasce da relação entre os
elementos prosódicos: sílaba, pé, e palavra fonológica (HERNANDORENA, 2001, p.
79).
A fonologia Métrica, que se iniciou com Liberman e Prince (1977), é uma das
opções que se oferecem para a descrição do acento do português. A Fonologia Métrica
não trata o acento como uma propriedade do segmento, mas da sílaba. Massini-Cagliari
(1992, p. 81) explica que, na Fonologia Métrica, o acento, como as demais
manifestações supra-segmentais, localiza-se em um nível superior ao dos segmentos.
Sendo assim, o acento não pode ser localizado apenas no núcleo ou na rima, tendo que
ser atribuído no nível da palavra, às sílabas, através da distribuição dos rótulos “s”
(strong/forte) e “w” (weak/fraco). Veja os exemplos dados por Massini-Cagliari (1992,
p. 81):
129
(4.15)
σ
s
σ
w
σ
s
O R O R O R
m á g i c a
w
σ
w
σ
s
O R O R
c a f é
130
Segundo Collischonn (2001, p. 135), retomando trabalhos anteriores de Bisol
(1992), a regularidade do acento em PB atual segue o seguinte padrão:
a) o acento somente pode cair sobre uma das três últimas sílabas da palavra;
b) a posição do acento na penúltima sílaba é a preferida, quando a palavra for
terminada em vogal;
c) a posição do acento sobre a última sílaba é a preferida quando a palavra for
terminada em consoante;
d) quando a penúltima sílaba for pesada
34
, o acento nunca cairá sobre a
antepenúltima sílaba.
Collischonn (2001, p. 136) acrescenta, ainda, dois outros fatores que precisam
ser levados em conta: a interferência dos sufixos na posição do acento e a não
interferência do morfema de plural nos nomes e dos morfemas de número/pessoa nos
verbos. Segundo a autora, quando um sufixo derivacional se acrescenta a uma palavra,
normalmente a palavra nova tem o acento em uma sílaba diferente daquela que recebia
o acento na palavra primitiva, como em facafacada, árvorearvoredo. Porém, não
há mudança de acento quando ocorrer prefixação ou quando houver formação de
palavra composta, como em so
losubsolo, inteligentesuperinteligente, caras-
pinta
das.
Em relação à colocação do acento nas palavras derivadas por sufixos, Cagliari
(1999, p. 58-59) diferencia os sufixos átonos (-in, -ia, -ulo, -vel, -bil, -ic, -il), em menor
34
Segundo Collischonn (2001, p. 128), as sílabas pesadas são aquelas que têm rima ramificada
(sílabas terminadas em consoante ou formadas por ditongo ou por vogal longa); essas sílabas
têm, em muitas línguas, a propriedade de atrair o acento.
Hayes (1995) propôs um modelo de grade em que o peso silábico é incorporado aos próprios
constituintes, chamados de pés. Há, segundo o autor, três tipos de sistemas de acento: i) os
sistemas insensíveis ao peso silábico, com constituintes binários de cabeça à esquerda, ii) os
sistemas sensíveis ao peso, com constituintes binários de cabeça à esquerda e iii) os sistemas
com constituintes binários de cabeça à direita. “A cada um desses sistemas corresponde um tipo
de pé: o troqueu silábico, o troqueu mórico e o iambo (nomes emprestados da métrica clássica)”
(COLLISCHONN, 2001, p. 130).
131
quantidade na língua, dos sufixos tônicos. Estes carregam o acento principal das
palavras (lata, latinha, lataria), enquanto aqueles não podem nunca receber o acento,
que, dado esse caráter inacentuável do sufixo, acaba por cair na última sílaba do radical
(técnica, fonólogo).
Com relação aos verbos, de acordo com Collischonn (2001, p. 137), o morfema
de número-pessoa modifica a posição do acento em alguns casos (amaamamos), e em
outros não (fala
vafalávamos).
Segundo Bisol (1992, p. 69) a regra do acento no PB é a mesma para verbos e
não-verbos, no entanto, sua aplicação é diferente. Nos nomes, a regra aplica-se à palavra
derivacional, a partir do radical mais a vogal temática, ciclicamente, isto é, quando se
acrescenta um sufixo, a regra do acento volta a se aplicar. Já nos verbos, aplica-se sobre
a palavra pronta, ou seja, a palavra lexical, de uma só vez.
Bisol (1992, p. 69) parte do pressuposto de que o português estrutura as sílabas
em pés métricos binários de cabeça à esquerda, assim representados (* .)
35
, e estabelece
a seguinte regra de atribuição do acento:
35
Liberman e Prince (1977) propõem a “grade métrica”, a qual contém linhas ou níveis em que
as vogais são numeradas como forma de representação do jogo de proeminências entre sílabas.
Para Hernandorena (2001, p. 78), o que a grade métrica faz é organizar hierarquicamente, em
colunas, as relações entre os elementos e expressar a força relativa desses elementos: quanto
mais extensa for a coluna, maior será sua força.
Halle e Vergnaud (1987) utilizam-se do modelo de grade e o enriquecem com a informação
sobre a estrutura dos constituintes (pés), cujos limites são indicados pelos parênteses. No
exemplo abaixo, retirado de Collischonn (2001, p. 126), a grade métrica pode ser entendida
como uma seqüência de espaços, um para cada sílaba. Na linha 0, indica-se cada espaço por um
asterisco, formando-se os constituintes; na linha 1 apenas os cabeças de constituintes, ou seja, os
elementos mais fortes recebem um asterisco e os fracos, um ponto; na linha 2, apenas o cabeça
de toda seqüência recebe um asterisco.
( * ) linha 2
(* . * . ) linha 1
( * * ) (* * ) linha 0
bor bo le ta
132
(4.16)
Regra do Acento Primário
Domínio: a palavra
i. Atribua um asterisco (*) à sílaba pesada final, i.é, sílaba de rima
ramificada.
ii. Nos demais casos, forme um constituinte binário (não-
iterativamente) com proeminência à esquerda, de tipo (* .), junto
à borda direita da palavra.
Collischonn (2001, p. 144) interpreta a regra de Bisol (1992, p. 69) de maneira
bastante esclarecedora:
Quanto ao peso silábico, a regra do acento é sensível à sílaba pesada
final. Deste modo, o acento é atribuído às oxítonas terminadas em
consoante ou ditongo, como pomar, troféu, coronel, por meio de (i).
Quanto ao pé, a regra determina que o acento irá cair sobre a segunda
sílaba, a contar da borda direita da palavra, desde que a primeira não
seja pesada. Deste modo, o acento é atribuído às paroxítonas como
casa, parede e borboleta, por meio de (ii).
Em relação à extrametricidade
36
, isto é, o que permite que um elemento não seja
visto pela regra do acento, resultando em um recuo do acento uma sílaba à direita da sua
posição esperada, Bisol (1992, p. 78) estipula que, nos verbos, a inacentuabilidade é
atribuída no decorrer da derivação por meio da seguinte regra:
(4.17)
A extrametricidade em verbos
Marque como extramétrica:
i. A sílaba final da primeira e da segunda pessoa
ii. Nos demais casos, marque a consoante com status de flexão.
36
Uma noção importante introduzida por Liberman e Prince (1977) é a de extrametricidade, que
é um recurso para explicar por que em determinadas línguas o acento não cai nas margens do
constituinte. Usam-se colchetes angulados como diacrítico para marcar como extramétrico um
determinado elemento que passa a se tornar invisível para a regra do acento.
133
Bisol (1992, p. 78) acredita que nas formas verbais de futuro encontramos um
caso de pé defectivo (PD), também chamado pé degenerado
37
, que gera um choque
acentual em contato com a proeminência principal, devido à origem locucional dessas
formas, como se verifica em (4.18) - exemplos extraídos de Bisol (1992, p. 79).
(4.18)
SQ
38
SQ Por Evite Choque Acentual (ECh)
(*) (*) (*)(*) (*)
a. Infinitivo + ei: /falar/ /ei/ falarei falarei
SQ PD ECh
(*) (*) (*)(*) (*)
/falar/ /a<S>/ falarás falará
SQ PD ECh
(*) (*) (*)(*) (*)
/falar/ /a/ falará falará
SQ FCP ECh
(*) (* .) (*)(* .) (*)
/falar/ /emo<S>/ falaremo<S> falarémos
37
Muitas vezes, quando uma seqüência de sílabas é segmentada em pés, algumas ficam
sobrando; no entanto, há a possibilidade, em algumas línguas específicas, de construir sobre
essas sílabas “sobrantes” um pé, ao qual se dá o nome de “degenerado”, que possibilita que elas
participem do jogo de proeminências que gerará o acento. Hayes (1995, p. 86) estabelece quais
sílabas podem constituir pés degenerados: “a single light syllables in systems that respect
syllable weight (iambics and moraic trochees), and single syllabes in the quantity – insensitive
systemes (syllabic troches)”. Segundo Massini-Cagliari (1999, p. 87): “em relação aos troqueus
silábicos, insensíveis à quantidade, isto acontece, principalmente, quando a seqüência contém
um número ímpar de sílabas, em uma construção iterativa dos pés, ou quando se trata de um
monossílabo. Em relação aos troqueus moraicos e iambos, este problema surge quando ficam
sobrando sílabas leves à direita, quando a escolha das língua é construir os pés da esquerda para
direita iterativamente, ou à esquerda, quando os pés são construídos da direita para a esquerda.
Também os monossílabos constituídos de sílabas leves constituem problema.” Quando a língua
opta por construir pés sobre as sílabas que sobraram são obtidos pés que correspondem ao
tamanho mínimo que um pé pode ter.
38
Sensibilidade quantitativa (SQ): esta regra atribui um asterisco à sílaba final de rimas
ramificadas, portadoras de acento por inerência.
134
SQ SQ ECh
(*) (*) (*)(*) (*)
/falar/ /ei<S>/ falarei<S> falareis
SQ PD ECh
(*) (*) (*)(*) (*)
/falar/ /a<N>/ falara<N> falarão
SQ SQ ECh
(*) (*) (*)(*.) (*)
b. Infinitivo + ia: /falar/ /ia/ falaria falaria
Este exemplo mostra o que Hogg e McCully (1987, p. 132-137) chamam de
reversão iâmbica, isto é, uma colisão acentual, como no exemplo da palavra cafezinho,
extraído de Costa (2006, p. 49), em que há um choque entre as sílabas (que recebe
originariamente o acento secundário) e zi. Para desfazer a colisão, aplica-se a regra
Mova x (abaixo), gerando o padrão acentual càfezínho.
39
(4.19)
Regra de Mova x
40
Mova apenas uma marca da grade por vez ao longo de sua fileira.
Quando a operação Mova x tem a finalidade de resolver uma colisão acentual, o
movimento deve acontecer ao longo da fileira em que a colisão ocorre.
(MASSINI-CAGLIARI, 1999, p. 92)
Cagliari (1999, p. 42) observa uma outra estratégia eurrítmica que consiste em
aplicar uma Regra de Apagamento de Acento, em que se apaga o acento mais à
esquerda da colisão. Para o autor, há uma tendência rítmica geral que mantém o mais
possível o acento que estiver mais à direita, afetando os acentos que ficam à esquerda
39
Note-se, no entanto, que, nesse exemplo, por ter recebido o acento primário anteriormente, a
sílaba é realizada com um timbre aberto na vogal média, mesmo acontecendo a reversão
iâmbica. Isso prova que se trata de um processo pós-lexical, já que o desmanche da colisão
acentual não “apaga” o acento principal atribuído no nível lexical.
40
A regra de Mova x, em (4.19), formulada por Massini-Cagliari (1999), retoma as regras de
mesma ação formuladas anteriormente por Prince (1983) e Hayes (1995).
135
(cárro nóvocarro nóvo). É exatamente isso que observamos com o futuro nos
exemplos dados por Bisol transcritos acima, devido ao choque acentual, apenas o mais à
direita permaneceu, aquele que recai sobre o verbo haver.
Para Bisol (1992, p. 79), a combinação do infinitivo do verbo que se quer
conjugar com formas do presente ou do pretérito imperfeito do verbo haver, futuro e
condicional, respectivamente, tem ainda reflexos na sincronia:
O acento primário [...] oferece mais um argumento em favor desta
colocação. Cada uma das duas partes que compõem o futuro mantém
a sua autonomia, tal qual o fazem as palavras compostas, recebendo
acentos primários individuais, dos quais somente o último permanece
por efeito de Apague*, sob a condição de choque acentual de grau 1,
i.é, seqüência de dois acentos, que o português tende a rejeitar.
Estudos do acento em PA, como os de Massini-Cagliari (1995, 1999) e Costa
(2006), mostram, a partir da análise das cantigas profanas e religiosas, que o conjunto
dos valores dos parâmetros do acento em PA e em PB não se diferencia: nesses dois
períodos o pé básico é o troqueu moraico, o que é confirmado pela maior recorrência de
palavras paroxítonas; os pés são constituídos não-iterativamente, já que não é necessária
a construção de mais do que um único pé para que a proeminência principal seja
localizada no nível da palavra; a direcionalidade da construção dos pés se dá da direita
para esquerda e tanto o PA quanto o PB são sensíveis ao peso silábico, na construção
dos pés.
Para a sua análise do acento em PA, Massini-Cagliari (1995, 1999, 2005) adotou
a estratégia de focalizar as palavras que aparecem no fim de cada verso, já que essas
palavras carregam o acento principal; portanto deve-se olhar para a estrutura métrica do
poema, pois ela fornece a garantia da localização da sílaba tônica, através da observação
da quantidade de sílabas poéticas por verso e da maneira como o trovador compõe a sua
cantiga (contando ou não as átonas finais).
136
A partir dessa estratégia, a autora separou as palavras encontradas no seu corpus
em duas categorias: por um lado os não-verbos e, por outro, os verbos, para ver se a
extrametricidade atua de maneira diferente em verbos e não-verbos.
A autora também confirmou que o troqueu moraico é o pé básico único do PA, a
partir da constatação que a maior parte das palavras da língua é paroxítona, a pauta do
padrão trocaico canônico. Não foram encontradas palavras proparoxítonas.
Em relação ao peso da sílaba, a autora confirma que o PA é sensível à
quantidade silábica na construção dos pés, isto é, qualquer sílaba longa (ou pesada)
posicionada na penúltima ou última posição silábica da palavra atrai o acento principal,
comprovando que os pés são constituídos não-iterativamente - o que pode ser visto nos
exemplos abaixo, retirados de Massini-Cagliari (1999, p. 169):
(4.20)
a. sagrádo vs. sagraçón
__
b. uírgo vs. uirgéu
__ __ __
Com relação à construção de pés degenerados, a autora afirma que eles podem
ocorrer quando nenhum pé canônico puder ser construído (que é o caso dos
monossílabos leves); portanto, trata-se de uma proibição fraca em relação à sua
construção.
A autora afirma, ainda, que os paroxítonos terminados em vogal aberta, seguida
ou não do morfema de número plural –s, são o tipo canônico dos não-verbos em PA. A
autora também ressalta que as escolhas paramétricas da língua quanto ao ritmo
explicam, além do padrão canônico das palavras em PA, todos os outros padrões
encontrados, como “oxítonas terminadas em consoante, em nasal ou em ditongo
137
decrescente, além de paroxítonas terminadas em hiato” ou ditongo crescente
(MASSINI-CAGLIARI, 1999, p. 171), como comprovam os exemplos abaixo de
Massini-Cagliari (1999, p. 171):
(4.21)
(x .) (x) (x .) (x .)
lu me for te coy ta do so y da de
__ __
(x) (x) (x) (x)
pra zer pas tor por tu gal mor tal
__ __ __ __ __ __ __
(x) (x) (x) (x .)
en ton co ra çon san deu do o
__ __ __ __ __
(x) (x)
ue rã o bõ a<s>
__ __
Em relação às palavras que terminam com fricativa /S/, Massini-Cagliari (1999,
p. 172) mostra que há palavras nas quais esse /S/ faz parte do radical, tornando a sílaba
final pesada e atraindo, portanto, o acento, como, por exemplo, em solaz, frances, juyz.
Já nas palavras que terminam em /S/, mas em que, no entanto, essa consoante é a
desinência de plural, a última sílaba não é pesada e, portanto, não é acentuada, visto que
o –s de plural não pertence ao radical e é ligado à palavra, no nível lexical, em um
momento posterior à atribuição do acento - como em amigas, coitadas, namoradas,
delgadas, ledas. O exemplo (4.22) descreve a interação entre a atribuição do acento e a
flexão de número aos nomes substantivos, em PA:
138
(4.22)
[amig] [a] [s] forma de base
amiga afixação da marca de classe
(x .) construção dos pés
+s pluralização (MASSINI-CAGLIARI, 1999, p. 173)
Em relação aos não-verbos, um dos maiores problemas encontrados pela autora
foi explicar a estrutura de palavras como assy, aqui, aly, ala, aca, que recebem o acento
na última sílaba, mesmo esta não sendo aparentemente pesada. Ela explica que essas
palavras são compostas da preposição a mais as formas monossilábicas dos advérbios: a
+ ssy, a + qui, etc. Sendo a palavra composta, o componente mais à direita recebe o
acento principal (MASSINI-CAGLIARI, 1999, p. 174).
Finalizando a parte referente aos não-verbos, a autora trata do plural das palavras
oxítonas terminadas em sílaba travada, como em amór > amóres, em que há a inclusão
de uma vogal epentética final. Pode-se perceber que o acento não muda de posição
(continua na sílaba mo). Sendo assim, pode-se concluir que a sílaba constituída na
formação do plural (res) conta com uma vogal adjungida em momento posterior ao da
formação da estrutura métrica da forma do singular.
Já em relação aos verbos, Massini-Cagliari (1999, p. 175-176) diz também não
ter encontrado proparoxítonos entre as formas verbais do corpus. Para descrever a
estrutura métrica de todas as formas verbais encontradas em todos os tempos e modos,
foi necessário estabelecer a seguinte regra de extrametricidade:
(4.23)
Extrametricidade nos verbos:
Marcar como extramétrica a coda final que porte elemento com status de flexão,
ou seja, {N, S}.
139
Com esta regra e todas as escolhas paramétricas vistas anteriormente, quase
todas as formas verbais do PA foram explicadas, como podemos observar em alguns
exemplos retirados de Massini-Cagliari (1999, p. 176):
(4.24)
(x .) (x .) (x)
di go fazemo<s> demanda<m>
___
A autora encontrou problemas para explicar, a partir dessa regra, as formas da
primeira pessoa do singular do pretérito perfeito, nas 2ª e 3ª conjugações, e do futuro do
presente e do pretérito.
As formas do pretérito perfeito do indicativo (defendi, dormi, perdi) fogem ao
padrão da acentuação das demais formas verbais, pois a última sílaba atrai o acento,
apesar de ser uma sílaba aberta. A explicação dada por Massini-Cagliari (1999, p. 176-
179) é que a vogal temática e a vogal do morfema número-pessoal se fundem por serem
da mesma natureza ([+alta]), o que torna a última vogal longa, fazendo com que a sílaba
fique pesada, atraindo o acento. O inconveniente dessa solução, colocado pela própria
autora, é admitir que, no PA, existem vogais longas, considerando que as distinções
entre vogais longas e breves foram perdidas na passagem do latim clássico ao latim
vulgar. A conclusão a que a autora chega a este respeito é a de que, de fato, as
distinções entre vogais longas e breves realmente se perderam na passagem do latim
clássico ao latim vulgar e não existem mais, em PA, na forma de base das palavras,
“mas não há nada que impeça que uma tal distinção seja criada, no processo de flexão
das formas verbais. Assim, de modo geral, distinções quantitativas entre vogais não
existem no PA, aparecendo unicamente no caso específico da formação das formas do
140
Pretérito Perfeito”, não tendo, assim, um caráter fonêmico-distintivo (MASSINI-
CAGLIARI, 1999, p. 180-181).
Em relação às formas do futuro do presente, foco de nossa análise, a autora diz
que se trata de palavras formadas do infinitivo do verbo principal seguido da forma
conjugada do verbo aver no presente do indicativo, sendo, portanto, formas compostas
e, como tais, o acento recai sobre o componente mais à direita (ex. uiuerey /vive’rei/ -
uiuer + ey). Se não se tratasse de um composto, a forma da terceira pessoa do singular
deveria ser paroxítona, pois termina em vogal aberta.
Costa (2006), analisando as CSM, concluiu que os parâmetros que regem a
atribuição do acento no PA, nas cantigas religiosas, são exatamente iguais aos que
Massini-Cagliari (1995, 1999) encontrou para o corpus de cantigas profanas.
Em relação ao futuro em PA, os dois trabalhos chegam à mesma conclusão:
como a flexão em PA nunca atrai o acento, algumas formas do futuro do presente e do
pretérito não se encaixam nas regras padrão (default) de acento, mas, considerando
essas formas como compostas e não simples, é possível explicá-las. Portanto, em PA,
essas formas de futuro também eram compostas pelo infinitivo do verbo principal mais
o verbo aver conjugado no presente para o futuro do presente, e os verbos aver ou ir
conjugados no pretérito imperfeito do indicativo para formação do futuro do pretérito.
Como a definição da estrutura morfofonológica das formas futuras do PA passa
necessariamente pela avaliação da natureza dessas formas como sintéticas – o que
corresponderia a uma única palavra fonológica – ou analíticas – correspondendo assim a
duas palavras fonológicas, é preciso discutir aqui a definição de palavra em sua
dimensão fonológica (prosódica).
Em relação ao português, Basílio (2004, p. 79) mostra a extrema preocupação de
Câmara Jr., em seus estudos, em colocar a lingüística descritiva a serviço do
141
conhecimento da língua portuguesa e, por este motivo, de se empenhar em definir
palavra, já que toda descrição da língua portuguesa até então levava em conta a
existência do vocábulo, mas não se tinha cogitado, nas abordagens tradicionais, explicar
e definir em que ele consiste. Câmara Jr. (1969, p. 86) critica a postura do
estruturalismo em não considerar o vocábulo como “entidade natural lingüística” e
avaliá-lo como “imposto à nossa consciência pelas formalidades do ensino e da língua”.
O que assinala a existência de um vocábulo em português, para Câmara Jr.
(1972[1970], p. 53), é a presença de um acento, “a maior força expiratória, ou
intensidade de emissão, da vogal de uma sílaba em contraste com as demais vogais
silábicas”. Segundo o autor, no registro formal da pronúncia padrão do PB, há a rigor
uma pauta acentual para cada palavra, o que faz com que o vocábulo fonológico fique
bem delimitado nessa língua.
Para Câmara Jr. (1972[1970], p. 53), as sílabas pretônicas, aquelas anteriores ao
acento, são “menos débeis” do que as postônicas, as localizadas depois do acento; para
exemplificar, o autor representa o acento pelo número 3 e forma o seguinte esquema:
(4.25) ... (1) + 3 + (0) + (0) + (0)
41
Câmara Jr. (1972[1970], p. 53) acrescenta ainda que, em uma seqüência de
vocábulos sem pausa, “as sílabas tônicas que precedem o último vocábulo baixam a
uma intensidade 2”, como nos seus exemplos a seguir:
41
As reticências no exemplo de Câmara Jr. (1972[1970], p. 53) indicam um número indefinido
de sílabas pretônicas, os parênteses indicam opcionalidade. Os graus 1 e 0 representam,
respectivamente, sílabas pretônicas e postônicas.
142
(4.26)
/abilidadi/ - hábil idade
20 1 3 0
/abilidadi/ - habilidade
1 1 1 3 0
A partir desse exemplo, percebe-se que, a partir da tonicidade 2 ou 3
contrastando com a tonicidade 1 ou 0, é possível depreender um vocábulo fonológico:
as sílabas átonas não atribuem à seqüência status de palavra fonológica, portanto são os
acentos 2 e 3 as marcas nítidas do vocábulo fonológico. Em suma, na língua portuguesa,
o vocábulo fonológico é definido pela pauta prosódica, determinada pelo acento tônico.
Para Basílio (2004, p. 79), Câmara Jr. é quem introduz uma distinção entre duas
unidades diferentes sob o mesmo nome: vocábulo fonológico, que corresponde a uma
“divisão espontânea na cadeia de emissão vocal” (CÂMARA JR., 1969, p. 34), e
vocábulo formal ou mórfico, que acontece quando um segmento fônico se individualiza
em função de um significado específico.
Embora relacionadas, essas entidades podem não coincidir; por isso Câmara Jr.
(1972[1970], p. 59-60) estabelece também uma necessária delimitação do vocábulo para
dar conta de problemas relacionados a afixos, desinências, clíticos e partículas átonas
(artigo, preposição e partícula que), propondo uma divisão tripla
42
: 1) formas livres, que
constituem uma seqüência que pode aparecer isolada; 2) formas presas, que sempre
aparecem ligadas a outras (como afixos e desinências); 3) formas dependentes, que não
podem funcionar isoladamente e são suscetíveis de se colocar entre elas outras formas
livres (artigos) ou podem mudar de posição em relação à forma livre a que estão ligadas
(clíticos).
42
Câmara Jr. (1972[1970], p. 59) se baseia nas idéias apresentadas por Bloomfield (1933, apud
Câmara Jr., 1972[1970]) de que as unidades formais de uma língua seriam de duas espécies:
formas livres e formas presas.
143
O primeiro exemplo em português dado por Câmara Jr. (1972[1970], p. 59-60)
da falta de coincidência absoluta entre vocábulo fonológico e vocábulo formal envolve
as que ele chamou de formas dependentes. Um vocábulo formal ou forma dependente
pode fazer parte de um vocábulo fonológico, ao qual se liga devido ao acento que
domina várias sílabas átonas. Os pronomes átonos, por exemplo, unem-se a verbos, pois
não têm acento próprio, formando com estes uma única palavra fonológica (fala-se).
Vigário (2001, p. 23) reforça as idéias de Câmara Jr. (1972[1970]) expostas
acima de que a palavra fonológica tem um único acento primário: “word primary stress
is one of the most intuitive diagnostics for the prosodic word domain. In fact, it is
generally accepted that the prosodic word must bear one and only one primary stress”.
Câmara Jr. (1972[1970], p. 60-61) também analisa os problemas referentes à
composição de palavras: no vocábulo composto por justaposição, dois vocábulos
fonológicos passam a constituir um só vocábulo formal. O autor ainda diferencia as
locuções (vocábulos formais associados intimamente na sentença) de um composto por
justaposição: para aquelas é possível suprimir um dos elementos sem maior prejuízo de
sentido (“Apanhei uma chuva” pode ser inferida a partir de “Apanhei uma grande
chuva”), o que para esta é impossível (“Apanhei chuva” não decorre de “Apanhei um
guarda-chuva”). Câmara Jr. (1972[1970], p. 61-62) ainda acrescenta:
Do ponto de vista da doutrina gramatical, a locução vai além do que
se considera justaposição, porque a justaposição está no plano
fonológico pôsto em relação com o plano mórfico. Em outros têrmos,
a locução é o uso como unicidade formal superior de dois vocábulos
mórficos. Há assim locução pela associação de uma forma livre com
uma forma dependente (fala-se ou se fala, (livro) de Pedro etc), em
que não há dois vocábulos fonológicos em justaposição, mas um só
vocábulo fonológico.
O que se opõe à justaposição é a aglutinação, em que só se tem um
vocábulo fonológico unitário. O que se opõe à locução é o vocábulo
formal unitário, em que figuram uma ou mais formas prêsas.
144
Sendo assim, têm a mesma pauta acentual guarda-chuva e grande chuva; o que
caracteriza os compostos por justaposição, então, seria a rigidez léxica que esses
acabam adquirindo. Portanto, os compostos no PB, como mostrou Câmara Jr.
(1972[1970], p. 61-62), equivaleriam prosodicamente a duas palavras fonológicas.
Massini-Cagliari (2006, p. 97), a partir dessas idéias de Câmara Jr. quanto à
função delimitativa do acento, conclui que o comportamento prosódico dos compostos é
semelhante ao da perífrase, por portarem tantos acentos quanto forem as bases,
enquanto que as formas simples e derivadas comportam-se como uma única palavra
fonológica, já que a elas corresponde um único acento lexical, como podemos verificar
nos exemplos dados pela autora:
(4.27)
a. duas palavras: b. composta: c. derivadas:
gránde chúva guárda-chúva chuvísco; chuvisquéiro
(dois acentos) (dois acentos) (um acento)
(MASSINI-CAGLIARI, 2006, p. 97)
Vigário (2001, p. 228) discorda das idéias apresentadas anteriormente nesta tese
de Câmara Jr. (1972[1970]) e Massini-Cagliari (2006), que consideram que compostos e
sintagmas nominais comportam-se da mesma maneira em termos prosódicos. A autora
considera que os compostos têm dois acentos, mas que se comportam prosodicamente
de forma diferente de sintagmas nominais, como transcrito abaixo:
we investigate […] combinations of words (e.g. word compounds) that
exhibit more than a single word stress, but whose phonological
behavior will be shown to be distinct from the behavior of words
regularly combined within syntactic phrases. (VIGÁRIO, 2001, p. 228)
Como nosso objetivo é trabalhar com a definição de palavra para entender a
natureza morfofonológica das formas de futuro em PA, é impossível não passar pela
definição de palavra prosódica de Nespor e Vogel (1986). Segundo Mateus (2001, p.
145
66), deve-se a elas uma obra de referência incontornável e integrada nos modelos
gerativos mais recentes que propõe hipóteses gerais para o estudo das unidades
entoacionais das línguas.
Esse estudo abre caminho para análises em que a fonologia é estudada em
interface com outros componentes da gramática. Para as autoras, a fala é organizada
hierarquicamente em constituintes
43
prosódicos que se constroem a partir de outros
componentes da gramática. Nespor e Vogel (1986) identificam os seguintes
constituintes prosódicos que se relacionam hierarquicamente entre si e definem a
organização de uma língua:
(4.28)
43
Segundo Bisol (2001, p. 229), constituinte é uma unidade lingüística complexa formada por
dois ou mais elementos, que estabelecem entre si uma relação “dominante/dominado”,
precisamente uma relação de forte/fraco ou vice-versa. Todo constituinte pressupõe um cabeça e
um ou mais dominados. O constituinte prosódico, que conta com informações fonológicas ou
não-fonológicas para sua definição de domínio, “não apresenta compromissos de isomorfia com
os constituintes de outras áreas da gramática” (BISOL, 2001, p. 229).
U enunciado
I (I) frase entonacional
φ
(φ) frase fonológica
)
C (C) grupo clítico
ω
(
ω) palavra fonológica
Σ
(Σ)
σ (σ) sílaba
146
Verifica-se, na proposta de Nespor e Vogel (1986), que a menor unidade da
hierarquia prosódica é a sílaba; esta se agrupa para formar pés, que, por sua vez, vão
constituir a palavra fonológica, que pode se combinar com um clítico para formar o
constituinte superior na hierarquia e, assim, sucessivamente, até chegar ao enunciado.
Segundo Nespor e Vogel (1986, p. 7), os princípios que regulam a hierarquia
prosódica são os seguintes:
a) cada unidade da hierarquia prosódica é composta de uma ou mais unidades
da categoria imediatamente mais baixa;
b) cada unidade está exaustivamente contida na unidade imediatamente
superior de que faz parte;
c) os constituintes são estruturas n-árias;
d) a relação de proeminência relativa, que se estabelece entre nós irmãos, é tal
que a um só nó se atribui o valor forte (s) e a todos os demais o valor fraco
(w).
Obedecendo a esses critérios, Nespor e Vogel (1986, p. 7) propõem a seguinte
regra de formação dos constituintes prosódicos: incorpore em X
p
todos os X
p-1
incluídos
em uma cadeia delimitada pelo domínio de X
p
.
44
Para analisar a estrutura morfofonológica das formas futuras em PA, e
chegarmos a uma conclusão sobre sua natureza morfofonológica, o domínio da palavra
fonológica é o que mais nos interessa neste momento, pois, a partir de uma melhor
compreensão desse domínio, poderemos refletir sobre a natureza sintética ou analítica
desse tempo verbal.
44
Nessa regra, X
p
é um constituinte (pé, palavra fonológica, grupo clítico, etc.) e X
p-1
é o
constituinte imediatamente inferior na hierarquia.
147
Para Nespor e Vogel (1986, p. 109), dos constituintes mais baixos da hierarquia
prosódica, a palavra fonológica faz uso substancial de noções não-fonológicas. Nesse
nível aparece uma interação entre os componentes fonológicos e morfológicos da
gramática.
A palavra fonológica ou prosódica é a categoria que domina o pé; portanto,
todos os pés de uma seqüência devem agrupar-se em uma palavra fonológica e nenhuma
outra categoria pode agrupar-se dessa maneira. Todo pé está incluído de forma
exaustiva em uma palavra fonológica, e nunca poderão as sílabas de um mesmo pé
pertencer a palavras fonológicas diferentes. Além disso, Nespor e Vogel (1986, p. 109)
observam que a palavra fonológica ou prosódica, sendo um constituinte n-ário, tem um
só elemento proeminente; isso quer dizer que a palavra fonológica não pode ter mais do
que um acento primário.
Quanto ao domínio da palavra fonológica, existem duas possibilidades, segundo
as autoras: uma delas considera que a palavra fonológica é igual ao elemento terminal
de uma árvore sintática; a outra a considera menor que esse elemento final da árvore.
Para o primeiro caso, são dados como exemplos o grego e o latim, que são línguas que
mantêm isomorfia entre palavra fonológica e morfológica - isto quer dizer que, nessas
línguas, um composto constitui uma só palavra fonológica. Palavras fonológicas
menores do que o elemento terminal de uma árvore são encontradas em línguas como o
sânscrito, o turco e o italiano. Nas duas primeiras línguas, cada raiz de um composto
forma uma palavra independente, os afixos juntando-se à última raiz. No italiano,
prefixos acabados em vogais já constituem uma palavra fonológica, no entanto prefixos
acabados em consoantes se juntam a uma raiz para constituir com ela uma única palavra
fonológica.
148
Bisol (2004, p. 64) coloca o português entre as línguas do segundo grupo, em
que a isomorfia nem sempre se mantém. A autora apresenta dados do português que
mostram o mesmo prefixo se comportando “ora como palavra independente, ora não, o
que depende do grau de coerência
45
” (BISOL, 2004, p. 64). Os prefixos pré e pós são
utilizados como exemplos para comprovar esse comportamento da língua portuguesa.
Em palavras como prefixo (prE+ fixo) e posfácio (p
O
s + fácio), os prefixos sofrem
neutralização, comportando-se como sílaba pretônica da palavra, isto é, juntam-se à
palavra seguinte, formando uma única palavra fonológica. Já em exemplos como pré-
estréia (pr
E
+ estréia) e pós-lexical (p
O
s + lexical), o prefixo se mostra autônomo, como
se fosse membro de um composto, pois prefixo e raiz formam duas palavras
fonológicas.
Schwindt (2000, p. 100) também argumenta a favor de considerar alguns
prefixos (que ele chama de composicionais) como constituindo palavras fonológicas
independentes da base, exatamente como propõe Bisol (2004). Seu argumento, baseado
em Nespor e Vogel (1986), é a existência de dois acentos concatenados em alguns
derivados por prefixação (Pós-Graduação, contra-reforma e autodidata, por exemplo) e
a possibilidade de poderem se estabelecer como formas livres. Neste sentido, a
prefixação se aproximaria do processo de composição, por preservar a estrutura
prosódica das bases, ou seja, por manter ambos os acentos das bases, estabelecendo uma
relação de proeminência entre eles (sendo que, neste caso, a regra default do PB é
sempre considerar o último acento como o mais proeminente). É exatamente isto o que
acontece na formação das formas futuras em PA: essas formas verbais recebem dois
acentos, um na base, outro no verbo auxiliar; este último, o acento mais à direita, é o
proeminente.
45
Coerência, no texto de Bisol (2004, p. 64) refere-se à coesão interna entre prefixo e base, ou
seja, o grau de ligação entre essas partes.
149
Alguns autores trabalharam com a definição de compostos nas línguas; outra
análise importante para esta tese, para podermos analisar se as formas futuras em PA
são ou não palavras compostas.
Villalva (2004, p. 341) critica as definições tradicionais de composição que
definem esse processo sob o conceito de “idéia única e autônoma”. Essa definição de
base semântica acaba por resultar em uma confusão entre composição e lexicalização, o
que gera hesitação na classificação de muitas estruturas como compostos ou estruturas
sintáticas. Critica ainda o equívoco gerado entre análise morfológica e convenção
ortográfica, que “toma a inexistência de espaços em branco, ou a presença de hífen,
como critérios de identificação de compostos” (VILLALVA, 2004, p. 407).
Em alternativa às definições que contesta, Villalva (2004, p. 343) propõe a
seguinte definição para “compostos”:
[...] proponho que os compostos sejam identificados como unidades
morfológicas constituídas por um número mínimo de duas
variáveis lexicais, nomeadamente radicais ou palavras.
Consequentemente, a composição procede à concatenação de, pelo
menos, duas variáveis (cf. 2a), por oposição aos processos de
afixação que consistem na concatenação de uma constante e uma
variável (cf. 2b):
46
2. a. composição
[[x] [y]]
b. afixação
[a [x]] (prefixação)
[[x] a] (sufixação)
Para Villalva (2004, p. 346), os compostos morfológicos são estruturas
resultantes de um processo de concatenação de radicais simples ou complexos,
46
Villalva (2004, p. 120) faz uma distinção formal entre radicais, temas e palavras, por um lado,
e afixos, por outro. Ela acredita que os primeiros são “unidades lexicais às quais não está
associada qualquer estrutura de subcategorização morfológica, enquanto que aos afixos está
obrigatoriamente associado esse tipo de informação, que legitima (ou impede) a sua presença
numa dada estrutura. Assim os radicais, temas e palavras são caracterizáveis como variáveis
lexicais, enquanto que os afixos são caracterizáveis como constantes lexicais” (VILLALVA,
2004, p. 120).
150
“autonomamente existentes na língua”. Essa afirmação, que contraria a identificação
dos constituintes dos compostos como afixos e sufixos, “assenta na constatação de que
estas unidades se podem combinar livremente entre si, ocorrendo, em alguns casos, quer
como primeiro, quer como o último constituinte da estrutura composta” (VILLALVA,
2004, p. 348). Pode-se concluir, pois, que “a composição morfológica é um processo
que opera exclusivamente sobre radicais” (VILLALVA, 2004, p. 352). Desta forma, a
exemplo do que ocorre na formação dos tempos futuros no PA, os compostos sintáticos,
operando sobre bases, mantêm sua independência mórfica e prosódica, o que acaba por
acarretar a presença de dois acentos concatenados.
Lee (1995) também analisa os compostos afirmando que há compostos lexicais,
isto é, que são formados no léxico e são sintaticamente opacos por comportarem-se
como uma unidade em relação a processos morfossintáticos, e compostos pós-lexicais,
que são formados na sintaxe, após o léxico. Ele propõe que o léxico do PB seja
considerado como tendo dois níveis ordenados. Abaixo, porém, está representada uma
de suas primeiras propostas de organização do léxico do PB, na qual ainda admitia três
níveis.
(4.29)
MORFOLOGIA FONOLOGIA
Nível 1 (α)
Derivação
Composição I
Flexão Irregular
Regra 1
Regra 2
Regra 3
Nível 2 (β)
Formação Produtiva
Flexão Irregular
.
.
Nível (ω)
Pós-Lexical
151
O nível 1 (α) compreende todos os processos derivacionais, a flexão irregular e a
composição que admite derivação sufixal. No segundo nível (β) ocorrem a flexão
regular do verbo e do não-verbo (número) e a formação produtiva do português:
diminutivo (-inho, -zinho), advérbio (-mente) e grau (-íssimo). O nível ω, nível da
palavra prosódica, caracteriza-se por ser a saída do léxico e a entrada da sintaxe. Nesse
nível, as regras não têm aplicação cíclica e não afetam as operações morfológicas. No
decorrer de seu trabalho, Lee (1995) inclui este nível no componente pós-lexical.
Lee (1995), portanto, admite a possibilidade de formação de compostos pós-
lexicais no PB, cujo status prosódico corresponde exatamente ao status de uma
seqüência de duas palavras (ou seja, não difere prosodicamente de qualquer outro
sintagma nominal da língua). Essa questão pode ser relacionada com a formação do
futuro no PA, uma vez que a possibilidade de inserção de material lingüístico entre as
bases (mesóclise) e a manutenção dos acentos originais de cada base podem indicar uma
formação pós-lexical, uma vez que o comportamento de cada uma das partes mantém
sua independência no nível sintático.
Zec (2008), analisando algumas variedades de línguas sérvias, mostra que as
línguas se baseiam em critérios prosódicos para a identificação da palavra prosódica e
identifica que a cabeça da palavra prosódica é associada a dois tipos de proeminência:
acento e tom. Desta forma, a cabeça da palavra prosódica é marcada em termos de uma
maior duração (atualização fonética do acento) e por uma saliência tonal. A cada cabeça
corresponde uma palavra prosódica. Sendo que no PA e no PB os compostos se
comportam da mesma maneira que uma seqüência de duas palavras prosódicas,
correspondem a uma seqüência de duas unidades prosódicas, cada uma com sua
respectiva cabeça.
152
Vigário (2001, p. 276) tem uma visão um pouco diferente dos demais em relação
aos compostos em PE; para ela, estes seriam uma palavra prosódica composta e não
duas palavras prosódicas. De qualquer maneira, Vigário (2001, 276) acredita que os
compostos têm mais de um acento primário e que estes, colocados em contato, seguem
a regra de proeminência apresentada abaixo, em que, no jogo entre as proeminências, a
final é a saliência principal.
(4.30)
Compound prosodic word prominence (EP)
The head of a compound prosodic word is its rightmost prosodic word.
Assim como Villalva (2004) e Vigário (2001), Almeida (1999), quando trata dos
compostos, refere-se somente à formação de substantivos e adjetivos. Ela afirma que o
output da formação de compostos é sempre um nome; nesse sentido, o futuro (no PA ou
no PB) não poderia ser considerado composto, do seu ponto de vista, uma vez que sua
categoria morfológica é a de verbo.
Em termos de ordem, Almeida (1999) afirma que os compostos em PB
apresentam a mesma que os sintagmas nominais, isto é, apresentam preferencialmente a
ordem núcleo-adjunto (ou determinado-determinante). Entretanto, Sandmann (1989)
afirma que o inventário de formação de compostos em PB é de dois tipos: tipo DM-DT
e tipo DT-DM
47
; ele concorda que a seqüência mais freqüente dos constituintes de
palavras compostas em português seja DM-DT, da mesma forma como acredita
Almeida (1999), mas diz que hoje o tipo DT-DM é plenamente produtivo. Afirma ainda
que a seqüência DT-DM pode remeter à influência de modelos estrangeiros, bem como,
47
Para Sandmann (1989), DT seria o determinante, o elemento subordinado, adjunto da
estrutura vocabular, enquanto DM seria o determinado, o elemento subordinante, núcleo da
estrutura vocabular.
153
possivelmente, ao modelo da prefixação (prefixação: miniposto; composição:
motosserra).
48
Nesse sentido, as formas futuras em PA apresentam a ordem semelhante à
preferencialmente apresentada pelos compostos do PB, uma vez que possuem a
estrutura núcleo-auxiliar: falar (núcleo) + ei (auxiliar); falar (núcleo) + ia (auxiliar).
Almeida (1999, p. 20) ainda afirma que uma característica dos compostos é o
fato de eles não poderem se separar, não ser possível colocar entre os termos qualquer
outra classe de palavras. Laroca (2001, p. 23-24) também usa esse critério para definir
palavra, acrescentando o critério de permutação. Segundo essa autora, um indicativo
morfológico de que dois elementos se combinam para formar uma palavra é a
impossibilidade de inserir uma outra forma entre eles. Deve haver entre os termos uma
coesão interna sólida de tal forma que não se pode inserir nada entre eles, tampouco
inverter sua ordem. Esse último caso diz respeito ao principio da permutação, isto é, a
mobilidade, ou a possibilidade de uma palavra trocar de posição com outra na mesma
frase.
Esses dois fatos abordados anteriormente, inseparabilidade das partes ou
permutação e impossibilidade de se colocar uma palavra entre eles, são possíveis com o
futuro do presente e do pretérito em PA. Isso nos faz concluir que estamos diante de
duas palavras que têm certa autonomia.
48
Em Sandmann (1991, p. 66-67), o autor afirma que na ordem DM-DT, os compostos são
formados segundo o modelo vernáculo, enquanto que na ordem DT-DM, os compostos são
formados a partir do modelo não-vernáculo ou clássico, pois têm a mesma seqüência dos
compostos gregos (psicologia), latinos (agricultura), ingleses (buldog) e alemães (handarbeit
mão-de-obra).
154
4.2. Critérios de Bybee, Pagliuca e Perkins (1991)
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) desenvolveram um método para avaliar o grau
de gramaticalização das formas verbais, isto é, uma maneira de avaliar se essas formas
já estão fundidas uma a outra, formando uma única palavra, perdendo a estrutura de
auxiliar + verbo principal, e, dessa forma, o status de duas palavras prosódicas,
transformando-se em apenas uma; ou se os verbos envolvidos na construção específica
são formas independentes, não havendo assim gramaticalização.
Analisando dados de diversas línguas, inclusive do inglês, os autores chegaram à
conclusão de que há três possibilidades de caracterizar a gramaticalização que sofreu o
tempo futuro de uma língua. Uma das possibilidades é uma fusão total entre o verbo
principal e o auxiliar de futuro
49
(fusion); o auxiliar pode perder sua autonomia e se
tornar dependente (dependence), ou o material fonológico do verbo auxiliar pode se
reduzir (shortness). Essas três possibilidades serão apresentadas e exemplificadas nas
subseções seguintes.
4.2.1 Fusão com o verbo
Segundo Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), a classificação do auxiliar como um
afixo ou não depende, entre outras avaliações, das convenções ortográficas empregadas
pelo falante ou de como as gramáticas normativas abordam esse fato, isto é, de o
auxiliar poder ser classificado como um afixo (escrito junto ao radical do verbo, como
49
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) usam o termo gram para denominar o elemento gramatical,
podendo ser um verbo auxiliar ou até um sufixo, que se une ao verbo principal na formação do
futuro das línguas. Em nosso texto, em que primeiramente apresentaremos as idéias desses
autores e, posteriormente, faremos uma análise, a partir desses fatores, do auxiliar haver em PA,
usaremos a expressão verbo auxiliar para nos referirmos ao gram, já que, no caso em particular
desta tese, é um verbo auxiliar que indica que a forma verbal está conjugada no futuro.
155
uma única palavra) ou como um morfema livre (escrito separadamente do verbo
principal). Entretanto, as convenções ortográficas só parcialmente refletem o fenômeno
da afixação, que é diacronicamente gradual e complexo, envolvendo diferentes fatores.
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 34-35) desenvolveram uma maneira de
medir o grau de fusão entre o auxiliar e o radical do verbo principal, levando em
consideração os seguintes fatores:
1. Ortografia: notam-se as convenções ortográficas, indicando S para sim,
quando os elementos são escritos como uma única palavra, N para
quando isso não acontece, H para uso do hífen e V quando as formas
variam, em alguns contextos são escritas em conjunto e em outros
separadamente.
50
Assumindo que o auxiliar de futuro nasce de itens lexicais livres, aqueles que
podem e são escritos juntos são mais gramaticalizados do que aqueles que não o são,
porém quando aparecem hifenizados ou há representação variável, têm um valor
intermediário.
2. Interpolação de uma palavra: indica-se S se alguma palavra pode ser
colocada entre o verbo auxiliar e o verbo principal, N se não for possível.
Interveniência de uma palavra refere-se à possibilidade de elementos não
gramaticais ocorrerem entre o auxiliar e o radical do verbo. Essa possibilidade diminui
se o auxiliar de futuro se funde com o verbo.
50
As abreviaturas, originalmente utilizadas pelos autores em inglês, foram traduzidas para o
português.
156
3. Processos fonológicos condicionados pelo radical do verbo principal: é
colocado S se o radical causa alomorfia
51
de natureza fonológica no
auxiliar, N é colocado se isso não ocorre.
Processos fonológicos no auxiliar condicionados pelo radical irão ocorrer apenas
se este começar a se tornar mais fundido com o radical.
4. Processos fonológicos condicionados pela categoria lexical: S é colocado
se a conjugação do verbo condiciona alomorfia no auxiliar; N é colocado
se isso não ocorre.
O condicionamento no léxico refere-se à alomorfia condicionada pela
classificação lexical do radical do verbo (isto é, da classe de conjugação). Essa
alomorfia geralmente ocorre só depois que o afixo se liga ao radical tempo suficiente
para processos fonológicos perderem sua produtividade e para uma reanálise
52
ocorrer.
5. Alterações no radical: se o auxiliar causa uma alteração no radical do
verbo, assim se deve analisar: T se a mudança for tonal, A para uma
mudança no acento, V para mudança na vogal ou C por uma alteração na
consoante.
Em relação às mudanças no radical, alterações tonais e acentuais contam menos
que alterações na consoante ou na vogal, já que aquelas podem ser previstas em uma
base fonológica, enquanto essa possibilidade está excluída em relação a estas.
51
Segundo Clark e Yallop (1995, p. 115), “if a morpheme has two or more shapes, the different
forms are sometimes referred to as allomorphs”.
52
Langacker (1977, p. 58) apresenta a seguinte definição para reanálise: “I will define
‘reanalysis’ as a change in the structure of an expression or class of expressions that does not
involve any immediate or intrinsic modification of its surface modification. Reanalysis may lead
to changes at the surface level […], but these surface changes can be viewed as the natural and
expected result of functionally prior modifications in rules and underlying representations.”
157
Segundo os autores, esses cinco fatores juntos permitem calcular a fusão com o
verbo, pois são dados valores numéricos para as variáveis de cada campo. Esses valores
foram escolhidos de tal forma que um maior grau de gramaticalização irá refletir em
uma nota maior, como explicado abaixo:
FUSION:
1. Written bound: N=0; H or S=1; Y=2
2. Open class intervening: N=1; Y=0
3. Phonological process conditioned by stem: N=0; Y=1
4. Lexical conditioning: N=0; Y=2
5. Conditions stem change: N=0; T or S=1; V or C=2
(BYBEE; PAGLIUCA; PERKINS, 1991, p. 35)
Para ilustrar como essa escala funciona, reproduziremos a seguir a análise que
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 36) fizeram em relação à marca morfológica de
pretérito (-ed) – exemplo (4.31) – e futuro (will) do inglês – exemplo (4.32):
(4.31)
Pretérito:
1. O auxiliar do pretérito é escrito junto ao radical (nota 2);
2. Isso acaba proibindo que outras classes de palavras sejam colocadas entre o
auxiliar e radical do verbo (nota 1);
3. O auxiliar é afetado por um processo fonológico condicionado pelo radical,
isto é, há um desvozeamento após uma consoante surda (helped [hєlpt]) (nota 1);
4. Há alomorfes condicionados pelo léxico, pois os autores consideram
mudanças no radical de verbos irregulares como sendo condicionadas
lexicalmente (nota 2);
5. Isso condiciona mudanças no radical de alguns verbos, com em kept (nota 2).
Nota final da fusão: 8
(4.32)
Futuro com will:
1. Will não é escrito junto do verbo (nota 0);
2. Outras classes de palavras podem ser colocadas entre will e o verbo, em
particular advérbios de modo (I’ll gladly help.) (nota 0)
3. Não há processos fonológicos condicionados pelo radical do verbo (nota 0);
4. Não há condicionamento lexical – will não varia de acordo com o verbo
principal empregado (nota 0);
5. Will não condiciona nenhuma mudança no radical do verbo principal (nota 0).
Nota final da fusão: 0
158
4.2.1.1 Análise do grau de fusão do futuro do presente em PA
A partir do modelo desenvolvido por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991),
observaremos como se comporta o futuro do presente em PA em relação aos critérios
apresentados em 4.2.1, para chegarmos a uma nota em relação à fusão do verbo auxiliar
aver com o verbo principal no infinitivo nesse período da língua. Abaixo, cada um dos
critérios desenvolvidos por esses lingüistas serão analisados em relação ao futuro do
presente em PA:
1. Ortografia:
Como já apresentado na tabela 3.2 da seção anterior deste trabalho, em nosso
corpus foram encontradas 1203 formas futuras, das quais 954 estavam conjugadas no
futuro do presente. Desses 954 casos, 930 estavam escritos juntos, como uma única
palavra, o verbo auxiliar aver e o verbo principal no infinitivo. Em apenas 24 dessas
formas futuras seus constituintes estavam escritos separadamente, o que corresponde a
2,5% dos casos. Embora seja uma pequena porcentagem dos casos, existe em PA a
possibilidade de separação do auxiliar com o verbo principal na escrita.
Como em relação a esse critério, Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) colocam a
possibilidade de se escreverem os termos às vezes juntos, às vezes separados
(“sometimes”); atribuiu-se, portanto, a nota 1 nesse item. Abaixo, em (4.33), há um
exemplo do auxiliar e do verbo principal escritos separadamente; em (4.34) exemplos
dos verbos escritos juntos, como uma única palavra (aduzer, partir, ver, acrescidos do
verbo aver conjugado na 1ª pessoa do singular, nos dois primeiros casos, e na 3ª, no
terceiro verbo).
159
(4.33)
Desto deron todos gran loor
a Santa Maria, que sabor
á de valer sempr' ao pecador (CSM 109, v.50-52)
(4.34)
Que comesse, e dizendo: «Cada dia t' adurey
desta raçon que me deren e tigo a partirey;
e poren te rog', amigo, que cómias, ca mui ben sei
que sse desto non comeres, outro non cho verrá dar.» (CSM 353, v. 56-59)
2. Interveniência de uma palavra
Há em PA, entre o verbo principal e o auxiliar, a possibilidade de intercalação de
um pronome oblíquo. Em relação ao futuro do presente, foram encontrados 76 casos de
mesóclise, o que equivale a 19% dos casos de colocação pronominal em nosso corpus
(ver tabela 3.3, seção 3, p. 75).
Para esse critério, portanto, a nota atribuída foi 0, pois existe a possibilidade de
colocar-se uma palavra entre o auxiliar e o verbo principal. Além de pronomes oblíquos,
no futuro do presente, quando o verbo auxiliar era colocado antes do principal, existia
também a colocação de uma preposição entre os termos, mais comumente a preposição
de, como já exemplificado em (4.33), mas também existe a possibilidade de colocar-se a
preposição a, exemplo (4.35). Em (4.36), vemos um exemplo de mesóclise, em que um
pronome oblíquo foi colocado entre o verbo principal e o auxiliar de futuro.
(4.35)
E disse: «Pagão,
sse queres guarir,
do demo de chão
t' ás a departir
e do falsso, vão,
(CSM 192, v.98-102)
160
(4.36)
[...] entrou na cidade de Roma, u er’o cortes
Emperador, que a chamou e disso-lle: “Vês?
Guari-m' est' irmão gaff', e dar-ch-ei grand' aver.” (CSM 5, v. 163-164)
3. Processos fonológicos condicionados pelo radical
Segundo encontrado em nosso corpus, e também registrado no dicionário de
Xavier, Vicente e Crispim (1999, p. 168-169) e no glossário de Mettmann (1972, p. 34-
35), a conjugação do verbo aver no presente do indicativo em PA é a seguinte:
(4.37)
Eu ei
Tu ás
Ele á
Nós avemos
Vós avedes
Eles án
Entretanto, quando flexionado como auxiliar do futuro do presente, as formas
são ei, ás, á, emos, edes, án. Ocorre, portanto, uma diminuição das formas avemos para
emos e avedes para edes. Abaixo, em (4.38) e (4.39) temos exemplos do verbo aver
conjugado no presente do indicativo, sem nenhum tipo de redução, nas 1ª e 2ª pessoas
do plural respectivamente:
(4.38)
Porque teu ben connocemos | e entendes ta loucura,
eu farei que o meu Fillo | te cambiará a natura
que já mais esto non faças, | ca desto poder avemos. (CSM 336, v. 52-54)
(4.39)
E diss' el: «farey-o pois end' avedes sabor;
mas torn' a alma no corpo, e compra ssa profisson.» (CSM 14, v. 43-44)
161
Os exemplos (4.40) e (4.41) nos mostram o verbo aver em PA escrito junto ao
verbo principal no infinitivo para indicar o futuro do presente. Ocorre, nesse contexto,
uma redução do verbo aver quando empregado como auxiliar. No primeiro exemplo, o
verbo está conjugado na 1ª pessoa do plural e, no segundo, na 2ª pessoa do plural:
(4.40)
Póla Virgen beita, | de como vos diremos. (CSM 315, v. 15)
(4.41)
Poren quer' eu dela un miragr' onrrado
dizer, se m' oyrdes; e poi-lo contado
ouver, saberedes que faz mui guisado
o que faz serviço a esta piadosa. (CSM 319, v. 9-12)
Como se observa através dos exemplos, ocorre uma mudança no auxiliar aver
quanto este é parte de uma expressão de futuro do presente, qualquer que seja o verbo
principal que o acompanhe. Em todas as ocorrências em que as formas se escrevem
juntas nas 1ª e 2ª pessoas do plural, ocorre uma redução do auxiliar, portanto a nota
nesse quesito é 1.
4. Processos fonológicos condicionados pela categoria lexical
Para entendermos esse quesito de Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 35),
colocaremos abaixo exemplos no português e no italiano de mudanças no auxiliar ou em
morfemas específicos ocasionadas pela categoria lexical do verbo, isto é, pela sua
conjugação.
Em português contemporâneo, o pretérito imperfeito do indicativo sofre uma
variação na desinência modo-temporal, dependendo da conjugação do verbo: se este for
de primeira conjugação, as desinências são va/ve (cantáva
mos, cantáveis), se de
162
segunda ou terceira conjugação, as desinências são ia/ie (2ª conjugação: vendíamos,
vendíeis; 3ª conjugação: partíamos, partíeis).
Este critério de Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) pode ser estendido também a
outros níveis gramaticais, além da Fonologia. No italiano, segundo Chiuchiú,
Minciarelli e Silvestrini (1985), para a formação do tempo passato prossimo, o
equivalente ao pretérito perfeito do indicativo em português, usa-se, para os verbos
intransitivos, o auxiliar essere (ser/estar) – exemplo (4.42) –, já, para os verbos
intransitivos, o auxiliar é o verbo havere, como observamos no exemplo (4.43):
(4.42) Sono arrivata a Roma in aprile. (Cheguei a Roma em abril)
(4.43) Ho comprato uma màcchina. (Comprei um carro)
Esse tipo de alomorfia condicionada pela categoria lexical do verbo, que ocorre
quando o auxiliar ou o afixo já está ligado ao radical por um tempo suficiente para que
esses processos fonológicos percam sua produtividade e uma reanálise ocorra, não se dá
em relação ao verbo aver e o verbo principal na indicação de futuro do presente no PA;
portanto, a nota nesse quesito é 0.
5. Mudanças no radical
O acréscimo do auxiliar aver ao radical de verbos no infinitivo para formação do
futuro do presente pode resultar em mudanças no radical de alguns verbos. No corpus
considerado nesta tese, foram encontradas mudanças no radical dos verbos aduzer (que
significa “trazer”, “conduzir”), avĩir, dizer, fazer (e seu derivado desfazer), falir, guarir
163
(“curar”, “sarar”), jazer, mãer (“pernoitar”), põer, querer (e seu derivado conquerer -
“conquistar”), teer, valer, veer
53
, vĩir.
Todos esses verbos passam por algum tipo de redução; alguns verbos sofrem a
queda de uma vogal, como em falirfalrrá, ou até de uma sílaba, como o que ocorre
com o verbo fazer (fazer – *fazereifarei). Abaixo há exemplos desses verbos
conjugados no futuro do presente: em (4.44), há um exemplo com o verbo aduzir
conjugado na 1ª pessoa do singular; em (4.45), os verbos mãer e dizer estão conjugados
na 2ª pessoa do singular; em (4.46) e (4.47), o verbo fazer e seu derivado desfazer
conjugados na 1ª e 3ª pessoas do singular, respectivamente; em (4.48), o verbo falir na
3ª pessoa do singular; em (4.49), o verbo guarir na 3ª pessoa do singular; em (4.50), o
verbo jazer na 2ª pessoa do singular; em (4.51) e (4.52), o verbo querer e seu derivado
conquerer, conjugados na 1ª pessoa do singular e 3ª pessoa do singular respectivamente;
o verbo valer – exemplo (4.53) – conjugado na 3ª pessoa do singular; em (4.54), (4.55),
os verbos põer, vĩir, na 1ª pessoa do singular; em (4.56) e (4.57), verbos veer e avĩir, na
3ª pessoa do singular; e, em (4.58), o verbo teer, conjugado na 1ª pessoa do singular:
(4.44)
E un d' Aguadalffaja[ra] assi
disse: «Sennor, eu adurey aquen
Ena gran coita sempr' acorrer ven
a Virgen a quen fia en seu ben. (CSM 142, v.27-30)
(4.45)
as portas do mõesteiro | sarradas; mas entrarás
per elas ousadamente | e na eygreja marrás
e dirás est’ aos frades | todos e ao prior.” (CSM 245, v. 85-88)
53
Em algumas cantigas, o verbo veer sofria alteração no radical, perdendo uma vogal e
aparecendo uma geminada, em outras, seu radical se mantinha, só ocorrendo a fusão com o
verbo aver: veerei.
164
(4.46)
[...] E tan toste entraron, com' apres' ei,
ena eigreja, e viron estar aquele sen lei
cegu' e atal com' ha pedra. Diz hu deles: «¿Que farei? (CSM 329, v. 55-57)
(4.47)
Toller deve mal e aduzer ben
o leite que criou o que non ten
en seu poder e nos fez de non ren
e desfará quando lle semellar. (CSM 404, v. 5-8)
(4.48)
Que aos que o serviren | nunca lles falrrá niente
do gran ben do paraíso, |ca a eles pertece. (CSM 288, v. 43-44)
(4.49)
e assi no dia quinto | serán todas acabadas,
e desta enfermidade | guarrá log’ a pastora.” (CSM 321, v. 57-58)
(4.50)
dizendo: “Sen ti mui soa | fico, e tu sen mi soo;
e ou mais jarás so terra | ben como jaz teu avoo, (CSM 331, v. 30-31)
(4.51)
querrei-me leixar de trobar des i
por outra dona, (CSM B, v. 23-25)
(4.52)
E porend' a eigreja sua quita é ja,
que nunca Mafomete poder y averá;
ca a conquereu ela e demais conquerrá
Espanna e Marrocos, e Ceta e Arcilla. (CSM 169, v.63-66)
(4.53)
Porend’ un miragre desta razon
vos direi, que xe valrrá um sermon, (CSM 404, v. 10-11)
(4.54)
muit' end' el; mas disse-ll' ela: «Eu vos porrei en carreira
(CSM 43, v. 8)
165
(4.55)
E ar diss’ outra vegada: | “De boa mente verrei
Quand’ esto oyu sa madre, | disse como vos direi:
“Meu fillo, con quen falades?” | Diss’ el: Nono negarei:
falo con Santa Maria, | que me fezo resorgir (CSM 269, v. 36-39)
(4.56)
E disse-lle: “Vai, non temas, | ca per ren non te verá
null' ome que mal te faça, (CSM 176, v.25-26)
(4.57)
Quen fiar en ela de coraçon,
averrá-lle com' a un ifançon (CSM 44, v. 5-6)
(4.58)
Que me livrou de sas mãos u era en poder seu;
e porend', enquant' eu viva, sempre no coraçon meu
a terrei pera servi-la, e nunca me será greu
de ren que por ela faça, ca mui ben enpregad' é.» (CSM 311, v. 55-58)
Um fato interessante de se apontar é que esses verbos nunca aceitam a
mesóclise; não há nenhum dado, nenhum exemplo no corpus em que tenha sido
encontrado um pronome oblíquo entre o auxiliar e o verbo principal quando um dos
verbos acima é utilizado.
Para Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 35), mudanças em vogais e consoantes
no radical dos verbos contam mais, pois essas mudanças não podem ser previstas em
uma base fonológica.
Entretanto, Huber (1986[1933], p. 231) assim explica os fenômenos por que
passaram os verbos apresentados acima:
1. As formas terrei a par de terei e terei, verrei a par de vinrei, marrei,
porrei a par de põerei, para teer, viir, mãer, põer < *tener-ei, *venir –
ei, *maner –ei, *poner-ei, apresentam síncope da vogal intertónica e
assimilação de nr>rr. 2. Por sua vez, as formas querrei, guarrei, ferrei,
morrei a par de morrerei, salrrei, valrrei a par de valerei, para querrer,
guarircurar’, ferir, morrer, sair, valer, apresentam síncope da vogal
166
medial. A par de salrrei encontra-se também o futuro formado por
analogia sairei; [...] 3. farei, direi, adurei, jarei a par de jazerei são
decerto formações analógicas: farei provavelmente pelo modelo de
darei, estarei; é possível que as outras só se tenham formado por
analogia com farei. Para prazer (‘agradar’) o futuro é só prazerei.
Essas observações de Huber (1986[1933], p. 231) mostram que esses verbos,
aparentemente irregulares, do ponto de vista morfológico, sofrem processos fonológicos
regulares da língua, não condicionados morfologicamente, que os fazem ter a aparência
superficial de “irregulares”. Partindo das idéias de Huber e avaliando os dados
encontrados no corpus, constatamos uma similaridade entre os verbos que sofriam
alterações no radical e chegamos à conclusão de que ocorreu, nesses dados, um
processo denominado haplologia, logo passível de ser explicado em uma base
fonológica.
Nos dicionários de lingüística de Dubois (1973) e de Crystal (1985), aparecem
as seguintes definições para o fenômeno de haplologia:
É um caso particular de síncope por dissimilação que consiste em
supressão de uma sílaba quando na mesma palavra aparecem
contíguas duas sílabas iniciadas pela mesma consoante. Ex:
tragicômico por trágico-cômico, idolatria por ídolo-latria, bondoso
por bondadoso, morfonologia por morfofonologia. (DUBOIS, 1973,
p. 321)
A term used in phonology, in both synchronic and diachronic
contexts, to refer to the omission of some of the sounds occurring in a
sequence of similar articulations. […] Some psychologists also use
the term to refer to a tongue-slip an omission of this kind has taken
place, e.g., running jump becoming rump. (CRYSTAL, 1985, p. 144)
Segundo Leal (2006, p. 44), a haplologia é um tipo de redução em que há
apagamento total de uma sílaba se esta estiver adjacente a outra e seus segmentos forem
iguais ou semelhantes; as consoantes só podem diferir, no máximo, no traço
167
[sonoridade]. A haplologia é um processo fonológico de sândi
54
, que pode ser externo,
ocorrendo em níveis maiores do que o nível das palavras, ou interno, ocorrendo no
interior de palavras, sendo esse último o percebido na flexão de futuro dos verbos
apresentados acima.
Leal (2006, p. 13) diferencia ainda a elisão silábica da haplologia: aquela ocorre
quando as sílabas do contexto que sofre a queda apresentam consoantes diferentes, esta
ocorre quando o contexto for idêntico ou semelhante, variando apenas na sonoridade.
A maior parte dos estudos desenvolvidos sobre haplologia no PB refere-se ao
sândi externo, isto é, entre palavras. Leal (2006) estuda a queda de sílaba em limite de
palavra, observando em quais contextos esse processo fonológico pode ocorrer e em
quais nunca ocorre. Alkmim e Gomes (1982) analisam essa supressão de segmentos em
limite de palavras e discutem quais são as restrições com relação ao contexto segmental
no qual a haplologia ocorre. Bisol (2000) discute alguns aspectos da fonologia,
inclusive a haplologia entre palavras, como argumentos a favor da idéia de ser o PB
uma língua de ritmo misto com forte componente de ritmo silábico, ressaltando o papel
do troqueu silábico no sistema da língua. Tenani (2002, 2003), em seus trabalhos,
discute as implicações da haplologia entre palavras para a prosódia da língua,
relacionando, assim, esse processo segmental à constituição prosódica dos enunciados.
Pavezi (2005, 2006a, 2006b) também discute a haplologia entre fronteiras acima da
palavra fonológica.
Para Bisol (2000, p. 409), a haplologia compreende duas partes: síncope da
vogal seguida de geminação de duas consoantes, que podem fundir-se ou não. A autora
54
Segundo Câmara Jr. (1974[1956], p. 214), sândi é o nome que se dá às variações
morfofonêmicas de condicionamento fonológico em caso de juntura, ou, como afirma Trask
(2004, p. 206), uma “modificação de pronúncia numa fronteira gramatical”. Câmara Jr.
(1974[1956], p. 214) ainda diferencia sândi interno, aquele que ocorre dentro de um vocábulo,
de sândi externo, que ocorre no limite entre vocábulos, dentro da frase, que as línguas modernas
não registram na grafia.
168
apresenta dados do PB que confirmam a presença das duas referidas regras, pois o
português dispõe de frases com síncope da vogal e reforço da sílaba precedente, assim
como dispõe do resultado final da haplologia com as sílabas ajustadas a uma só palavra,
sem o referido esforço, como podemos observar em seus exemplos abaixo:
(4.59)
O macaco comeu todas as bananas
( ma.kak ko.mew > ma.ka.ko.mew )
O pato tomava água no açude
( pat. to.ma.va > patomava) (BISOL, 2000, p. 409)
Desta forma, Bisol (2000, p. 409) explica o exemplo acima para entender o
ritmo acentual do PB:
De um lado temos a síncope da vogal, apontando para o ritmo
acentual ao reforçar com o acréscimo de um segmento a sílaba
precedente, portadora de um dos acentos secundários da frase; de
outro a haplologia completa, apontando para o ritmo silábico ao
reorganizar as sílabas em um conjunto de unidades de duração similar
nas posições que precedem o acento final. A presença na fala dos
resultados das duas facetas do processo é, a nosso ver, um indicativo
do caráter misto do ritmo de nossa língua.
Diferentemente dos trabalhos apresentados, Barbosa e Costa (2006)
desenvolveram um estudo do fenômeno da haplologia desencadeado pelos sufixos
-s/ção e –mento, na formação de substantivos deverbais no PB do século XX. Esse
estudo, analisando a haplologia no interior da palavra, apresenta alguns casos, na junção
dos morfemas -s/ção ou –mento à base de verbos, em que podem ocorrer alterações
fonológicas na base, como, por exemplo, do verbo optar, que, ao unir-se ao sufixo –ção,
dá origem ao substantivo opção, havendo uma alteração na base, pois ocorre o
apagamento da última sílaba do tema (/ta/).
169
A partir dessas reflexões sobre a bibliografia relacionada à haplologia, é possível
analisar os dados do corpus, os verbos que sofreram alteração em seu radical quando é
acrescido o verbo auxiliar aver na formação do futuro em PA. Esses verbos foram
separados em grupos pela semelhança na mudança sofrida pelo seu radical.
Analisaremos primeiramente os verbos aduzer, dizer, fazer (seu derivado
desfazer) e jazer. Esses verbos têm em comum o fato de perderem uma sílaba inteira
quando há o acréscimo do auxiliar. Ao acréscimo desse verbo auxiliar aver ao infinitivo
do verbo principal, primeiramente ocorre uma ressilabação
55
entre os fonemas, isto é, a
coda da segunda sílaba passa a onset da terceira, o que resulta em uma sílaba CV. Como
conseqüência, resultam duas sílabas seguidas com consoantes na posição de ataque que
têm traços semelhantes: a da primeira sílaba, cujos traços definidores do ponto de
articulação são [+ coronal]
56
e [- distribuída]
57
e, a da segunda sílaba, os traços são
[+coronal] e [+distribuída]; neste caso, a primeira sílaba inteira cai. Em (4.60) temos a
representação desse processo e, em (4.61), a regra que rege a sua aplicação:
55
Câmara Jr. (1972[1970], p. 50-51) refere-se a esse fenômeno de ressilabação como ‘ligação’
(fr. liaison) entre uma sílaba final travada de um vocábulo e a vogal inicial de um outro
vocábulo, que a ele se segue sem pausa. Nesse caso “a consoante posvocálica se liga à vogal
imediatamente seguinte e a sílaba final, que era travada, fica uma sílaba livre, ao mesmo tempo
que a sílaba seguinte ganha uma consoante prevocálica ou crescente (mar alto fica /ma-ral-to/,
falas hoje fica /fa-la-zo-z’i/)”.
56
Um som é [+coronal] quando é produzido com o levantamento da lâmina da língua a um
ponto superior à posição neutra. Um som é [-coronal] quando a lâmina da língua permanece na
posição neutra (SILVA, 2001, p.194). Têm o traço [+coronal]: dentais, alveolares, palato-
alveolares, palatais (HERNANDORENA, 2001, p. 22).
57
Segundo Halle e Clements (1983, p. 6), “distributed sounds are produced with a constriction
that extends for a considerable distance along the midsaggital axis of the oral tract;
nondistributed sounds are produced with a constriction that extends for only a short distance in
this direction”.
170
(4.60)
σ σ σ σ σ σ
σ σ
(4.61)
Regra: σ σ
O R
N
d i
OR
N C
z e r
R
N
+ á
ressilabação
O
RO R O R
NN N
dizerá
[+coronal]
[-distribuída]
haplologia
[+coronal]
O R
[+ coronal]
Ø
O
[+ coronal]
OROR
NN
d i r á
171
No segundo grupo, estão inseridos os verbos guarir, querer (e seu derivado
conquerer), põer, veer, teer, avĩir, vĩir. O primeiro fenômeno que ocorre após a união
do auxiliar ao infinitivo desses verbos é novamente a ressilabação: a coda da última
sílaba do infinitivo passa a onset da sílaba inicial do auxiliar. Isso resulta em duas
sílabas com consoantes idênticas, portanto com os mesmos traços [+coronal,
+distribuída]. Esse contexto é o ideal para a haplologia, que resulta no apagamento da
vogal intermediária, caindo apenas o núcleo da sílaba, e na formação da geminada,
como podemos observar no exemplo (4.62) abaixo:
(4.62)
O R
N
qu e
[k]
OR
N C
e
R
N
+ á
ressilabação
ORO RO
R
NN N
qu e e á
x x x x
[+coronal]
[+distribuída]
haplologia
(apagamento
do e e
formação da
geminada)
σ σ σ σ σ σ
RRRR
[+coronal]
[+distribuída]
172
O fato notado nesse contexto explicita um dos princípios mais importantes para
a análise fonológica a partir do advento do modelo auto-segmental: o Princípio do
Contorno Obrigatório – PCO (Obligatory Contour Principle – OCP), formulado por
Leben (1973 apud Hernandorena, 2001). Segundo o PCO, seqüências adjacentes de
unidades idênticas são proibidas nas representações fonológicas, isto é, o PCO proíbe
uma seqüência idêntica de auto-segmentos. Se tal seqüência ocorre na forma de base ou
na derivação, então ela será reduzida a uma unidade no processo derivacional (SILVA,
2001, p. 208). O PCO pode proibir não só segmentos idênticos, mas também traços ou
nós adjacentes idênticos em um dado tier (camada), bem como regras que possam criar
violações a esse princípio (HERNANDORENA, 2001, p. 65). A árvore abaixo
exemplifica melhor o que foi apresentado anteriormente – exemplo (4.63); logo após
foram colocadas as regras que explicam esse fenômeno – exemplo (4.64).
58
58
Na árvore, as abreviações utilizadas significam: son – sonoro, quando há “presença de uma
excitação periódica das cordas vocais”; cons – consonantal, presença de “obstrução no tubo
vocal” (JAKOBSON, 1967, p. 124-125); cont – contínuo, são os sons em cuja constrição
primária o trato vocal não está estreitando a ponto de bloquear a passagem do fluxo de ar; nos
σ σ
O R O R
N C N
qu e á
x x
R
173
(4.63)
(4.64) Regras:
1. Apagamento da vogal:
V Ø σ σ
O R O R
N
___
sons não-contínuos o fluxo de ar pela boca é efetivamente bloqueado; ant – anterior, são sons
produzidos com uma primária obstrução na frente da região palato-alveolar, quando não há essa
obstrução, temos os sons não-anteriores (HALLE; CLEMENTS, 1983, p. 6).
e a
x x x
R R
OC OC
[cons] [son]
[+cont] [+cont]
[cor] [cor]
[+ant] [+dist] [+ant] [+dist]
apagamento
do e
[son] [cons]
R
174
2. Formação de geminada:
x x x x
O terceiro grupo de verbos que sofrem algum tipo de alteração no radical
engloba falir, mãer e valer. Nesses verbos, semelhantemente ao que ocorre com os
demais grupos, há primeiramente uma ressilabação, desencadeada pela adjunção do
auxiliar. Posteriormente, há a queda da vogal da última sílaba do radical do verbo
principal. Nesse contexto, em início de sílaba, depois de a coda da primeira sílaba ser
preenchida pela líquida, a exemplo do que ocorre no PB atual (em que aparece a
variante fricativa e não o tepe), a rótica do PA é atualizada foneticamente como vibrante
múltipla – exemplo (4.65):
(4.65)
σ σ σ σ σ σ
O R
N
v a
OR
N C
l e r
R
N
+ á
ressilabação
ORO ROR
NN N
valerá
[+coronal]
[+distribuída]
haplologia
[+coronal]
[+distribuída]
queda do
núcleo
175
A partir de toda a análise desenvolvida acima, podemos perceber que as
alterações sofridas pelos radicais de alguns verbos considerados irregulares são
possíveis de serem explicadas pela fonologia da língua da época, especificamente pelo
processo de haplologia. Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) acreditam que mudanças em
vogais e consoantes no radical do verbo principal têm um peso maior, pois mostram que
houve maior gramaticalização, devido ao fato de não poderem ser previstas em uma
base fonológica. Entretanto, devido à haplologia, essas alterações são regulares e
plausíveis de serem previstas em uma base apenas fonológica.
A única observação que podemos fazer sobre o radical de todos os verbos no
infinitivo quando acrescentado o auxiliar é em relação ao acento. Essas bases continuam
com seu acento primário, entretanto, devido ao jogo de proeminências que gera o acento
frasal, a regra do PA é sempre colocar o último acento como o mais forte, por isso o
acento do auxiliar é mais forte do que o da base. Como não há uma alteração acentual
no radical, a nota nesse quesito também é zero.
Recuperando as notas resultantes da análise dos cinco critérios desenvolvidos
por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), temos o seguinte resultado para o futuro do
presente em PA:
σ σ
O R O R
N C N
v a l r á
176
1. Ortografia, nota 1;
2. Interveniência de uma palavra, nota 0;
3. Processos fonológicos condicionados pelo radical, nota 1;
4. Processos fonológicos condicionados pela categoria lexical, nota 0;
5. Mudanças no radical, nota 0.
A nota final que indica o grau de gramaticalização é 2, uma nota bastante baixa,
que indica um baixo grau de gramaticalização do futuro do presente em PA. Logo, a
partir desses critérios, essa forma verbal pode ser classificada como analítica em PA,
isto é, como formada por duas palavras para indicar o futuro do presente: ao verbo
principal no infinitivo acrescenta-se o verbo aver conjugado no presente do indicativo.
4.2.1.2 Análise do grau de fusão do futuro do pretérito em PA
Partindo desse mesmo modelo, observamos também como se comporta o futuro
do pretérito em PA em relação aos critérios apresentados em 4.2.1, para chegarmos a
uma nota em relação à fusão do verbo auxiliar aver/ir, agora conjugado no pretérito
imperfeito do indicativo, com o verbo principal no infinitivo.
Como abordado na subseção 3.1.2 deste trabalho, não é possível definir qual o
auxiliar na formação do futuro do pretérito em PA, se o verbo aver conjugado no
pretérito imperfeito do indicativo, ou o verbo ir, conjugado no mesmo tempo. Sendo
assim os dados serão analisados levando em conta os dois auxiliares. Essa distinção só
será necessária em relação ao terceiro critério desses lingüistas, os demais serão
analisados independentemente de qual verbo auxiliar foi o escolhido.
177
1. Ortografia:
Na tabela 3.2 da seção 3 deste trabalho, apresentamos que, em nosso corpus,
encontramos 1203 formas futuras; dessas, 249 estavam conjugadas no futuro do
pretérito. Dos 249 casos encontrados, 240 das formas verbais estavam escritas juntas,
como uma única palavra. Em apenas 9 dessas formas futuras, os verbos estavam escritos
separadamente, o que corresponde a 3,6% dos casos. Assim como visto em relação ao
futuro do presente, embora seja uma pequena porcentagem dos casos, existe, em PA, a
possibilidade de separação dos constituintes que expressam o futuro do pretérito.
A esse critério, da mesma maneira como aconteceu com o futuro do presente,
atribuiu-se a nota 1, por ser possível encontrarmos as formas escritas também
separadamente. Abaixo, em (4.66), há um exemplo do auxiliar aver precedendo o verbo
principal e escrito separadamente; em (4.67), um exemplo do auxiliar colocado depois
do principal, mas ainda escrito separadamente; em (4.68), um exemplo dos dois verbos
escritos juntos, como uma única palavra.
(4.66)
Dest' avo un miragre en França a un frances,
que non avia no reino duc nen conde nen marques
que fosse de mayor guisa, e tal astragueza pres
que quanto por ben fazia en mal xe ll' ya tornar. (CSM 281, v. 5-8)
(4.67)
fez seu amigo chamar,
que llo contar ya. (CSM 94, v.115)
(4.68)
nen que per nulla maneira
est´ alva vestir provasse,
ca Deus del se vingaria. (CSM 2, v. 53-55)
178
2. Interveniência de uma palavra
Há em PA a possibilidade, como já apresentado em relação ao futuro do
presente, de intercalação de um pronome oblíquo entre o verbo principal e o auxiliar.
Em relação ao futuro do pretérito, 18 casos de mesóclise foram encontrados, o que
equivale a 19,3% dos casos de colocação pronominal em nosso corpus (ver tabela 3.3,
seção 3, p. 75). Para esse tempo verbal, não existe a possibilidade de colocar-se uma
preposição entre os termos, como ocorre com o futuro do presente.
Para esse critério, a nota atribuída também foi 0. Abaixo temos dois exemplos de
casos de mesóclise para o futuro do pretérito: em (4.69), o verbo dar; e, em (4.70), o
verbo vender, ambos conjugados na 3ª pessoa do singular.
(4.69)
E conssellou-lles que fossen mouras e crischãidade
leixassen, e fossen fora daquela catividade,
e lles faria grand' algo e dar-lles-ya herdade,
e que con mouros mui ricos a ambas casa-las faria. (CSM 325, v. 29-32)
(4.70)
Diss’ un deles: Eu o trago, | que con mia moller casse,
mais pero vender-mio-ya | a quen mio mui ben comprasse (CSM 369, v. 90-91)
3. Processos fonológicos condicionados pelo radical
Para se analisar o futuro do pretérito em relação a esse critério, será necessário
analisar separadamente os possíveis auxiliares para esse tempo: os verbos aver e ir.
Pelos dados encontrados no corpus (quando o verbo aver se encontra em formas
simples, não perifrásticas), e também conforme o registrado no dicionário de Xavier,
Vicente e Crispim (1999, p. 168-169) e no glossário de Mettmann (1972, p. 34-35), a
conjugação do verbo aver no pretérito imperfeito do indicativo em PA é:
179
(4.71)
Eu avia
Tu avias
Ele avia
Nós aviamos
Vós aviedes
Eles avian
Entretanto, quando flexionado como auxiliar do futuro do pretérito, as formas
são ia, ias, ia, ian.
59
Ocorre, portanto, uma diminuição das formas avia para ia, avias
para ias, avian para ian. Em nosso corpus não foram encontrados verbos flexionados
nas 1ª e 2ª pessoas do plural no futuro do pretérito, como pôde ser constatado na tabela
3.4 da seção 3 desta tese. Há apenas um exemplo, apresentado em (4.72), em que essa
redução não ocorre e que nos dá pistas de que, em PA, o auxiliar seria mesmo o verbo
aver:
(4.72)
Mais aquel dia que sayr | avia sabad’ era,
e foi missa oyr enton, | ca tal costum’ ouvera (CSM 237, v. 34-35)
Como se observa através dos exemplos (4.66), (4.67), (4.68), (4.69) e (4.70),
ocorre uma mudança no auxiliar quando este é o verbo aver, provocada pelo verbo
principal, qualquer que seja este. Em todas as ocorrências em que as formas se escrevem
juntas e em todas em que se escrevem separadas, com exceção do caso exemplificado
em (4.72), ocorre uma redução do auxiliar; portanto, a nota nesse quesito é 1.
Entretanto, se considerarmos que o auxiliar do pretérito imperfeito é o verbo ir, a
nota nesse quesito é 0, pois ele não sofre nenhum tipo de redução ou alteração, quando
59
Como em nosso corpus não foram encontrados exemplos de verbos no futuro do pretérito
conjugados nas 1ª e 2ª pessoas do plural, foram colocadas apenas as terminações mapeadas no
corpus.
180
conjugado como auxiliar. Abaixo, temos a conjugação do verbo ir no pretérito
imperfeito do indicativo de acordo com os dados do corpus considerado, que
corroboram as informações coletadas no glossário de Mettmann (1972, p. 163):
(4.73)
Eu ia
Tu ias
Ele ia
Nós íamos
Vós iades
Eles ian
4. Processos fonológicos condicionados pela categoria lexical
Esse tipo de alomorfia condicionada pela categoria lexical do verbo principal,
que já foi explicada em relação ao futuro do presente, também não se dá em relação aos
verbos aver ou ir e o verbo principal na indicação de futuro do pretérito. Qualquer que
seja o verbo principal, a conjugação do auxiliar é sempre a mesma, variando só nas
desinências número-pessoais; portanto, a nota nesse quesito é 0.
5. Mudanças no radical
O acréscimo dos auxiliares aver ou ir ao radical de verbos no infinitivo para
formação do futuro do pretérito também acarreta mudanças no radical de alguns verbos.
Em nosso corpus, foram encontradas mudanças no radical dos seguintes verbos (que
também sofreram alteração no futuro do presente): avĩĩr, dizer, fazer (e seu derivado
desfazer), falir, guarir, jazer, põer, querer, ter, valer, vĩir. E, só para esse tempo, foram
encontradas alterações nos radicais dos verbos convĩir e sair.
Nos exemplos abaixo, percebemos que as alterações sofridas nesses verbos são
bastante semelhantes às ocorridas em relação ao futuro do presente: em alguns há queda
de apenas uma vogal, em outros de uma sílaba inteira. Em (4.74), há um exemplo do
181
verbo dizer, conjugado na 1ª pessoa do singular; em (4.75), os verbos fazer e põer,
conjugados na 3ª pessoa do plural; em (4.76), o verbo desfazer conjugado na 3ª pessoa
do singular; em (4.77), (4.78) e (4.79), os verbos falir, guarir e jazer aparecem
conjugados na 3ª pessoa do singular; em (4.80) e (4.81), os verbos querer e sair são
conjugados na 1ª pessoa do singular; em (4.82), (4.83), (4.84) e (4.85), os verbos teer,
avĩir, convĩir, e vĩir, respectivamente, conjugados todos na 3ª pessoa do singular.
(4.74)
Sobr' esto, se m' oissedes, diria
dun joyzo que deu Santa Maria (CSM 26, v. 13-14)
(4.75)
Un falcon lle dessen feito, que mui de grado farian,
e que ena sa ygreja ant' o seu altar porriam; (CSM 366, v. 55-56)
(4.76)
e faz con el a guerlanda e é ssa ajudador,
que assi nos desfaria ben com' a agua o sal.» (CSM 121, v. 47-48)
(4.77)
con ousadia
que nos desvia
da bõa via
que levaria
nos u devia,
u nos daria
sempr' alegria
que non falrria
nen menguaria,
mas creçeria
e poiaria
e compriria
e 'nçimaria
a nos. (CSM 421, v. 19-32)
(4.78)
A moller, a que pesava de que quer que el mandasse,
diss' ao crerigo toste que daquesto se calasse,
ca seu marido guarria, e que folga-lo leixasse,
entre tanto sa fazenda averia ordinnada. (CSM 75, v. 43-46)
182
(4.79)
Tu es alva per que visto
foi o sol, que éste Cristo,
que o mund' ouve conquisto
e sacado du jazia
e jaria,
e de que non sairya; (CSM 340, v. 42-47)
(4.80)
E macar eu estas duas non ey
com' eu querria, pero provarei
a mostrar ende un pouco que sei, (CSM B, v. 9-11)
(4.81)
Enton vo-ss' aos frades e disso: «Sennores meus,
aqui u ora orava vo a Madre de Deus
e disso que eu salrria cras do mundo; e os seus (CSM 274, v. 64-66)
(4.82)
Desta quisa quarto dias | passar que non bevera
cousa que de bever fosse, | e tan gran coita soffrera,
que tod’ ome que o visse | terria que já morrera; (CSM 393, v. 25-27)
(4.83)
Enton fillaron-s' a correr,
e a gente pos eles ya,
todos con coita de saber
o que daquel preit' averria. (CSM 25, v. 153-156)
(4.84)
«Quaes cantarán
a missa que converria,
ou quaes dirán
toda a outra leenda?
(CSM 66, v.26-29)
(4.85)
E disse: «Se quisessedes gracir
est' a Deus e a ssa Madre servir
e de vossos pecados vos partir,
a chuvia logo verria. (CSM 143, v.29-32)
183
Como também constatado em relação ao futuro do presente, os verbos
apresentados acima em nenhum contexto aceitam a possibilidade de se colocar um
pronome oblíquo entre as formas verbais; nenhum caso de mesóclise foi encontrado
com esses verbos.
A explicação da alteração sofrida pelo radical dos verbos conjugados no futuro
do pretérito é muito semelhante à desenvolvida anteriormente em relação ao futuro do
presente. O processo de haplologia será novamente usado para se entenderem as
mudanças no radical de alguns verbos em PA.
Como feito para o futuro do presente, os verbos foram separados em três grupos
pela semelhança entre as alterações sofridas por seus radicais.
Primeiro analisaremos os verbos dizer, fazer (e seu derivado desfazer) e jazer.
Igualmente ao que ocorre com o futuro do presente, ao acréscimo do verbo auxiliar aver
ao infinitivo do verbo principal, ocorre uma ressilabação, isto é, a coda da segunda
sílaba passa a onset da terceira, resultando em uma sílaba CV. Conseqüentemente,
resultam duas sílabas seguidas com consoantes na posição de ataque que têm traços
semelhantes; a primeira sílaba tem uma consoante [+coronal] e [-distribuída], e a
segunda, uma com traço [+coronal] e [+distribuída]; neste contexto, a primeira sílaba
cai. Em (4.86), temos a representação desse processo e, em (4.87), a regra que rege a
sua aplicação:
184
(4.86)
σ σ σ σ σ σ σ σ
σ σ σ
(4.87)
Regra: σ σ
O R
[+ coronal]
Ø
O
[+ coronal]
O R
N
d i
OR
N C
z e r
R R
N C
+ i a
ressilabação
ORO RORR
NN NN
dizeria
[+coronal]
[-distribuída]
haplologia
[+coronal]
ORORR
NNN
d i r i a
185
Estão inseridos no segundo grupo os verbos avĩir, convĩir, guarir, põer, querer,
teer, vĩir. O primeiro fenômeno que ocorre é novamente a ressilabação. Como resultado,
temos duas sílabas com consoantes idênticas, com os mesmos traços [+coronal,
-distribuída]. Esse é o contexto ideal para a haplologia, que resulta no apagamento da
vogal intermediária, caindo apenas o núcleo da sílaba, e na formação da geminada,
como vemos no exemplo (4.88) abaixo:
(4.88)
Notamos também na formação do futuro do pretérito em PA a ação do Princípio
do Contorno Obrigatório – PCO. Como já colocado, esse princípio proíbe uma
seqüência de auto-segmentos idênticos em um mesmo plano auto-segmental,
indiferentemente se ela ocorre na forma de base ou na derivação, sendo sempre reduzida
a uma unidade no processo derivacional. A árvore no exemplo (4.89) explica melhor o
efeito da ação desse princípio; logo após foram colocadas as regras que explicam esse
fenômeno – exemplo (4.90).
σ σ σ
O R O R R
N C N N
qu e i a
x x
R
186
(4.89)
e a
x x x
R R
OC OC
[cons] [son]
[+cont] [+cont]
[cor] [cor]
[+ant] [+dist] [+ant] [+dist]
apagamento
do e
[son] [cons]
R
x x
R
[son] OC [cons]
[cor]
[+ant] [+dist]
187
(4.90) Regras:
1. Apagamento da vogal:
V Ø σ σ
O R O R
N
___
2. Formação de geminada:
x x x x
No último grupo estão os verbos falir, valer e sair. Na alteração que sofrem
esses verbos, há primeiramente a ressilabação. Em um segundo momento, há a queda da
vogal da última sílaba do radical do verbo principal, aquela que se junta ao auxiliar de
formação do futuro. Nesse contexto, em início de sílaba, depois da coda da primeira
sílaba ser preenchida pela líquida, a rótica do PA é atualizada foneticamente como
vibrante múltipla – exemplo (4.91):
188
(4.91)
σ σ σ σ σ σ σ σ
Diferentemente do que acreditavam Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) – que
postulam que mudanças em vogais e consoantes no radical têm mais valor, pois
mostram que houve maior gramaticalização e não podem ser explicadas em uma base
fonológica –, as alterações sofridas pelos radicais dos verbos apresentados acima são
possíveis de serem explicadas pela ocorrência de haplologia, portanto uma explicação
fonológica.
O R
N
v a
OR
N C
l e r
R R
N N
+ i a
ressilabação
ORO RORR
NN NN
vale
ria
[+coronal]
[+distribuída]
haplologia
[+coronal]
[+distribuída]
queda do
núcleo
σ σ σ
O R O R R
N C N N
v a l r i a
189
O único fato observado em relação ao radical de todos os verbos no infinitivo,
idêntica a que ocorre com o futuro do presente, quando acrescentado o auxiliar é em
relação ao acento. No jogo de proeminências, o segundo acento acaba prevalecendo (ver
item 4.1.4 desta seção). Como não ocorre uma alteração acentual, a esse quesito foi
atribuída uma nota 0.
Primeiramente, em relação ao auxiliar aver, recuperando as notas resultantes da
análise dos cinco critérios desenvolvidos por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), temos o
seguinte resultado para o futuro do pretérito em PA:
1. Ortografia, nota 1;
2. Interveniência de uma palavra, nota 0;
3. Processos fonológicos condicionados pelo radical, nota 1;
4. Processos fonológicos condicionados pela categoria lexical, nota 0;
5. Mudanças no radical, nota 0.
Para o futuro do pretérito em PA, se o auxiliar for o verbo aver, a nota resultante
é 2. Se o verbo ir for o auxiliar, teríamos as seguintes notas:
1. Ortografia, nota 1;
2. Interveniência de uma palavra, nota 0;
3. Processos fonológicos condicionados pelo radical, nota 0;
4. Processos fonológicos condicionados pela categoria lexical, nota 0;
5. Mudanças no radical, nota 0.
190
Para o verbo ir, a nota seria ainda menor, um. Qualquer que seja realmente o
auxiliar utilizado em PA para formação do futuro do pretérito, a nota resultante é
extremamente baixa. Conclui-se, então, a partir desses critérios, que também para o
futuro do pretérito o grau de gramaticalização é baixo; há, portanto, duas palavras para
indicar o futuro do pretérito em PA, uma forma analítica de expressão de um tempo
verbal.
4.2.2 Dependência
Os fatores de dependência desenvolvidos por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991,
p. 37) são mantidos separados dos de fusão porque há casos em que o auxiliar sofre
mudanças na forma durante o processo de gramaticalização, o que reduz sua autonomia,
sem resultar em fusão com o verbo. Os autores acreditam que a falta de fusão se dá
geralmente pela posição do auxiliar. Essa escala é chamada dependência por medir a
que ponto este está perdendo sua autonomia independentemente se se funde ou não com
o verbo. Para essa avaliação, os autores consideraram os seguintes critérios:
1. Número de alomorfes que não são puramente condicionados
foneticamente: colocar 0, 1, 2, 3 ou > 3.
Como o gram se torna mais dependente devido aos elementos que o circundam,
ele desenvolve alomorfia, especialmente devido aos processos fonológicos, alguns dos
quais são condicionados por outros morfemas gramaticais. Desse modo, o número de
alomorfes e a presença de condicionamento fonológico e morfológico dão indicativos
de maior dependência.
191
2. Condição fonológica para alomorfes: a resposta é S ou N.
O condicionamento fonológico pode ser controlado pelo radical do verbo,
indicando fusão com ele; entretanto, como esse condicionamento não é necessariamente
induzido pelo verbo, o condicionamento fonológico foi incluído em dependência.
3. Condição morfológica para alomorfia: isso se refere à alomorfia
condicionada por outros morfemas gramaticais; aqui a resposta também
é S ou N.
4. Redução suprasegmental: é notado se o gram tem (S) ou não (N) acento
ou tom não-neutro; se o acento se alterna, é colocado A.
Como os itens lexicais são geralmente acentuados e morfemas gramaticais
geralmente não o são, os autores consideraram a falta de acento para indicar maior
gramaticalização. Para línguas tonais, os autores assumiram que a comparação seria a
perda do tom alto ou não-neutro.
Os valores numéricos são os seguintes:
DEPENDENCE:
1. Other allomorphs: 0 = 0; 1 or 2 = 2; 3 = 3; >3 = 4
2. Phonological conditioning: N = 0; Y = 1
3. Morphological conditioning: N = 0; Y = 2
4. Stress: N = 2; A= 1; Y = 0
(BYBEE; PAGLIUCA; PERKINS, 1991, p. 37)
Essa escala vai de 0 a 9 e, novamente, a obtenção de um valor maior indica um
maior grau de gramaticalização.
Para ilustrar essa escala, Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 38) analisaram
novamente o pretérito (-ed) e o futuro (will) do inglês:
192
(4.92) Pretérito:
1. Eles consideraram que o pretérito tem mais de três alomorfes pelo [d]
e também [id], como também diversas mudanças internas ao radical de
vogais e consoantes (nota 4);
2. A alternância [id]/ [d] é fonologicamente condicionada (nota 1);
3. Não há nenhum alomorfe condicionado por outro morfema gramatical
(nota 0);
4. O gram nunca é acentuado (nota 2).
Nota total de dependência: 7
(4.93) Futuro:
1. Os autores consideraram a versão reduzida de will e também sua forma
contraída com not como alomorfes, então ele tem dois alomorfes (nota
2);
2. Eles acreditam que esses alomorfes não são foneticamente
condicionados (nota 0);
3. O alomorfe em won’t é morfologicamente condicionado (nota 2);
4. Will não é normalmente acentuado (nota 2).
Nota total de dependência: 6
Na escala de dependência, o pretérito e o futuro com will têm notas similares, o
que demonstra que, pelo menos em alguns casos, fusão e dependência são medidas
distintas.
4.2.2.1 Dependência do auxiliar de futuro do presente em PA
Analisaremos a seguir o grau de dependência do verbo aver conjugado no
presente do indicativo e o verbo principal em PA para expressão do futuro do presente,
a partir dos critérios apresentados acima:
1. Com relação à flexão do verbo aver no tempo presente como auxiliar, esse
verbo não tem alomorfes. Esse verbo, como todos em português, tem suas
flexões de pessoa, as desinências número-pessoais, mas não há variações
193
nessas desinências dependendo do verbo principal ou do contexto em que as
formas estão inseridas. Sendo assim, a nota nesse requisito é zero.
2. Se não há alomorfes, estes não são foneticamente motivados, tendo assim
também uma nota zero.
3. Não há qualquer alomorfe condicionado por outro morfema gramatical,
nunca há alomorfia, em qualquer contexto; qualquer que seja o verbo
principal, as formas do verbo aver são sempre ei, ás, á, emos, edes, án, para
1ª, 2ª, 3ª pessoas do singular e do plural, respectivamente. Portanto, a nota
nesse requisito também é zero.
4. O verbo aver é sempre acentuado. O auxiliar, em todas as suas desinências
número-pessoais, sempre recebe o acento tônico. O verbo principal no
infinitivo, logo uma palavra oxítona, quando escrito junto ao verbo auxiliar,
perde o seu caráter de acento primário, que passa a secundário, mas mantém-
se na sílaba original; o acento principal passa a recair sobre o verbo auxiliar.
Nesse último item, a nota também é zero.
A nota resultante nesses quesitos de dependência é zero. Segundo os autores,
uma maior nota indica maior gramaticalização; portanto, no que se refere à
dependência, o grau de gramaticalização, ou seja, de interdependência das formas
constituintes do futuro do pretérito em PA, é muito baixo.
194
4.2.2.2 Dependência do auxiliar de futuro do pretérito em PA
Apresentaremos também qual o grau de dependência entre os verbos aver ou ir
em relação ao verbo principal na formação do futuro do pretérito em PA:
1. Independentemente de qual o verbo auxiliar na formação do futuro do
pretérito, os verbos aver e ir não têm alomorfes. Esses verbos têm apenas
suas desinências número-pessoais, e não há variações nessas desinências
dependendo do verbo principal ou do contexto em que as formas estão
inseridas. Assim, a nota nesse quesito é zero.
2. Se não há alomorfes, estes não são foneticamente motivados, tendo assim
também uma nota zero.
3. Seja para o verbo aver ou para o verbo ir, nunca há alomorfia, em nenhum
contexto, ou qualquer que seja o verbo principal. Portanto, a nota nesse
quesito também é zero.
4. Os verbos aver e ir sempre são acentuados. O auxiliar, qualquer dos dois que
seja ele, em todas as suas desinências número-pessoais, sempre recebe o
acento tônico. O verbo principal que é oxítono por estar no infinitivo;
quando juntado do verbo auxiliar, perde o seu acento primário, que assume
um caráter de acento secundário (mas que incide sobre a sílaba originalmente
acentuada); o acento principal passa a recair sobre o verbo auxiliar. Nesse
item, a nota também é zero.
195
O resultado nesse critério de dependência é o mesmo para o futuro do presente e
do pretérito, o que nos leva a concluir que o grau de gramaticalização é muito baixo
entre os verbos auxiliares e o infinitivo do verbo principal em PA, em relação ao grau
de dependência.
4.2.3 Redução
Essa escala mede a extensão da redução segmental do auxiliar, começando com
um valor 10 e subtraindo pontos para cada segmento deste, como representado abaixo:
SHORTNESS:
C = -1
V = -2
V: = -3
(BYBEE, PAGLIUCA E PERKINS, 1991, p. 38)
A escala resultante mostra um número maior para uma forma mais reduzida, e
um número menor para uma forma menos reduzida. Essa representação foi a escolhida
para que todas as escalas tivessem uma mesma direção: um número maior demonstraria
um maior grau de gramaticalização.
Essa escala de redução inclui uma outra variável. A compilação desses autores
exige que se faça o registro do mais longo alomorfe como básico na maioria dos casos;
entretanto, é fornecido para a existência de um alomorfe reduzido um que aparenta ser o
mesmo que o alomorfe básico, mas com alguns segmentos ou traços ausentes. Eles
ainda adicionam 2 pontos se um alomorfe reduzido ocorre. Essa escala varia
aproximadamente de 0 a 10, porém valores maiores e menores são possíveis.
Novamente, Bybee, Pagliuca e Perkins (1991, p. 39) testaram sua escala com o
pretérito em -ed e o futuro com will do inglês, e obtiveram o resultado exposto abaixo.
196
(4.94) Pretérito:
O alomorfe mais longo é [id], que consiste de uma vogal (nota –2) e uma consoante
(nota –1); 10 menos 3 sobram 7. Esse gram também tem um alomorfe reduzido [d],
portanto são adicionados 2 pontos, resultando em uma nota total de redução 9.
(4.95) Will:
O mais longo alomorfe é [wIl], que consiste de uma consoante (–1), uma vogal (–2) e
outra consoante (–1), 10 menos 4 sobram 6. Como há também um alomorfe reduzido,
adicionam-se 2, resultando em uma nota de redução 8.
Testamos também o futuro do presente do PA em relação a essa escala; o
resultado desse teste segue abaixo, em (4.96). Essa escala mostra um número maior para
uma forma menor, isto é, quanto maior a nota resultante, maior redução a forma sofreu
e, conseqüentemente, maior é chance de ter se gramaticalizado.
(4.96)
Futuro do presente em PA:
Os alomorfes mais longos são –emos e -edes, que são iguais na sua estrutura no que se
refere ao número de vogais e consoantes. Consistem em duas vogais (-4) e duas
consoantes (-2), 6 menos 10 sobram 4. Como há alomorfes reduzidos são adicionados
dois pontos, resultando em uma nota de redução 6.
O grande problema em se utilizar esse quesito redução na análise do futuro do
presente em PA é considerar as desinências como alomorfes. É bastante complicado
chamarmos as formas avemos, emos de alomorfes, pois a primeira forma nunca é usada
como auxiliar.
Em relação ao futuro do pretérito, essa escala é ainda mais problemática. Se
considerarmos como verbo auxiliar o verbo aver, ele tem suas desinências número-
pessoais que não podem ser consideradas como alomorfes. Há, em todo o corpus, um
único exemplo, colocado em (4.72), em que o verbo aver, como auxiliar, não tem
redução. Mas um único exemplo é muito pouco para fazermos qualquer tipo de
197
afirmação. Se o verbo auxiliar for o verbo ir, ainda mais difícil fica essa análise, pois
este não tem nenhum alomorfe, apenas desinências número-pessoais.
Portanto, trabalhamos focando principalmente os critérios de fusão e
dependência desenvolvidos por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), os quais se
mostraram mais produtivos na análise em PA do futuro do presente e do pretérito.
4.3 Considerações finais
Esta seção teve por objetivo analisar as formas futuras em PA para poder se
chegar a uma conclusão a respeito da natureza morfofonológica dessas estruturas:
seriam elas formas analíticas de expressão de futuro, isto é, seriam duas palavras com
essa função; ou formas sintéticas, verbos já fundidos em um único vocábulo?
Para desenvolver essa análise, esta seção foi dividida em duas partes. Em um
primeiro momento as formas futuras nas CSM no PA foram analisadas a partir dos
argumentos arrolados por Massini-Cagliari (1999): co-ocorrência de formas sintéticas e
analíticas, possibilidade de mesóclise, dois futuros com uma única terminação, padrão
acentual das formas.
O primeiro argumento de Massini-Cagliari (1999, 2006) se mostrou bastante
produtivo em PA também para as CSM, pois foi encontrado, no corpus, o verbo auxiliar
escrito junto ao verbo principal no infinitivo e também separado, tanto para o futuro do
presente quanto para o futuro do pretérito.
Existe também, em nosso corpus, a possibilidade de mesóclise, isto é, a
possibilidade de se colocar um pronome oblíquo entre o verbo auxiliar e o principal para
os futuros do presente e do pretérito. Esses pronomes sempre aparecem depois do
infinitivo do verbo principal e antes do auxiliar conjugado no presente do indicativo ou
198
no pretérito imperfeito do indicativo. Como apresentado na seção 3.2.2 deste trabalho,
os casos de mesóclise correspondem a 23% dos casos de colocação pronominal do
corpus, um número bastante expressivo em PA.
O terceiro argumento de Massini-Caligari (1999), a partir de um dado registrado
por Williams (1973[1938]), não nos foi relevante, pois não foi encontrado nenhum
exemplo de dois futuros coordenados a partir de uma única terminação.
Em relação ao padrão acentual das formas futuras, verificou-se que há um
choque acentual entre essas formas devido à sua origem locucional, uma vez que cada
uma das partes que compõem o futuro mantém sua autonomia, como acontece com as
palavras compostas, recebendo acento primário individual; desses acentos recebidos, no
jogo de proeminências entre eles, o último acento sempre é mais proeminente no PA,
pela regra default. A flexão verbal em PA, como estudado por Massini-Cagliari (1999) e
Costa (2006), nunca atrai o acento; portanto, só é possível explicar a posição do acento
nas formas futuras do PA considerando essas formas verbais como compostas; em caso
contrário, teríamos que admitir que o acento pode, em casos excepcionais, recair sobre a
flexão do verbo (apenas quando conjugado no futuro).
Foi feita ainda, ao longo desta seção, uma discussão sobre a definição de palavra
fonológica, com o objetivo de mostrar que estamos diante de duas palavras fonológicas,
quando analisamos as formas de futuro em PA. O que nos faz perceber que essas formas
têm autonomia, além de seus acentos primários, é a possibilidade de elas se separarem e
a possibilidade de se colocar um clítico ou preposição entre as partes; portanto, os
verbos conjugados nos futuros do presente e do pretérito não podem ser considerados
uma única palavra fonológica, mas duas.
Três dos quatro argumentos utilizados por Massini-Cagliari (1999, 2006) são
também válidos para o nosso corpus, as CSM. Mesmo não tendo encontrado dois
199
verbos coordenados a partir de uma única terminação, é possível interpretar as formas
futuras do PA como analíticas, a partir dos outros argumentos, principalmente
adicionando a esses dados os resultados das análises efetuadas a partir das idéias de
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), que foram apresentados na segunda parte desta seção.
As idéias desenvolvidas por esses lingüistas para averiguar o grau de
gramaticalização entre o verbo principal e o auxiliar de futuro se relacionavam à fusão,
à dependência ou à redução do auxiliar, quando anexado ao verbo principal. A
possibilidade de fusão foi o item mais trabalhado em relação aos dados por se mostrar
mais produtivo, devido à baixa ocorrência de alomorfes do verbo auxiliar, que é a base
de análise dos critérios de dependência e de redução.
Na análise da fusão entre os verbos, Bybee, Pagliuca e Perkins (1991)
apresentam os seguintes critérios: ortografia, interveniência de uma palavra, processos
fonológicos condicionados pelo radical, processos fonológicos condicionados pela
categoria lexical e mudanças no radical. O primeiro critério coincide com o primeiro
argumento de Massini-Cagliari (1999, 2006); como anteriormente apresentado, existe
em PA a possibilidade de se escreverem as formas juntas ou separadas, tanto para o
futuro do presente quanto para o futuro do pretérito.
Também coincidente com o argumento de Massini-Cagliari (1999, 2006), o
segundo critério nos mostra que é possível se colocar uma palavra entre o verbo
principal e o auxiliar. Para o futuro do presente é possível colocar tanto um pronome
oblíquo quanto uma preposição; para o futuro do pretérito só é possível colocar um
pronome. Esses dois primeiros critérios mostram a independência que existe entre o
verbo principal e seu auxiliar.
Se considerarmos como auxiliar de futuro em PA o verbo aver conjugado no
presente do indicativo para indicar o futuro do presente e no imperfeito do indicativo
200
para o futuro do pretérito, então o auxiliar sofre uma redução do seu radical – terceiro
critério elaborado pelos autores – o que aponta para uma maior fusão entre os termos.
Já, se o verbo ir for considerado o auxiliar para o futuro do pretérito, não há nenhum
tipo de redução ou alteração na sua forma.
Em relação ao quarto critério – processos fonológicos condicionados pela
categoria lexical – o auxiliar de futuro não sofre nenhum tipo de alteração que dependa
da categoria de verbo principal que a ele se une.
Finalmente, em relação ao último critério, alterações no radical, essas podem
ocorrer em alguns verbos, mas esses dados são facilmente explicados em uma base
fonológica, pelo mecanismo da haplologia.
A partir da análise desenvolvida nesta seção, percebemos que só um critério de
Bybee, Pagliuca e Perkins (1991) aponta para a fusão entre os termos, o relacionado a
alterações fonéticas no auxiliar. Portanto, a nota de fusão entre os termos é muito baixa,
tanto para o futuro do presente quanto para o futuro do pretérito. São poucas as
alterações nas formas que entram em contato na expressão de futuro, e essas alterações
são ainda menores quando se considera como auxiliar o verbo ir para o futuro do
pretérito.
A conclusão a que se chega com a análise de nossos dados a partir dos critérios
estabelecidos por Massini-Cagliari (1999, 2006) e Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), é
que as formas na expressão de futuro em PA são analíticas, isto é, são duas palavras
usadas para se exprimir o futuro: o verbo principal no infinitivo mais o verbo aver
conjugado no presente do indicativo para indicar o futuro do presente e o verbo
principal no infinitivo mais o verbo aver (ou o verbo ir) conjugados no pretérito
imperfeito do indicativo para indicar o futuro do pretérito ou condicional.
201
CONCLUSÃO
Com o objetivo de entender a natureza morfofonológica das formas dos tempos
futuros do presente e do pretérito (ou condicional) em PA, desenvolvemos este trabalho,
que mostrou, através de uma análise da estrutura morfológica e prosódica das palavras
envolvidas, que, na formação dos tempos futuros na época medieval do português,
existem duas palavras fonológicas: o verbo principal no infinitivo + o verbo aver
conjugado no presente do indicativo, para o futuro do presente, ou aver/ir, no pretérito
imperfeito do indicativo, para o futuro do pretérito.
Começamos por apresentar, na seção 1, alguns estudos que analisaram questões
referentes a esses tempos desde o latim até o PB e o PE atuais. Como vimos no
desenvolver da seção 1 deste trabalho, há diversos estudos desenvolvidos sobre o tempo
futuro, no português, a partir de abordagens bastante variadas: análises históricas,
semânticas, morfológicas e morfofonológicas. Todas elas, com certeza, ajudam-nos a
entender a estrutura das formas verbais futuras, desde o latim vulgar, passando pelo PA,
até o PB atual.
Do ponto de vista diacrônico, não há dúvidas de que as formas verbais do tempo
futuro atual eram, na sua origem, formas perifrásticas, formadas pelo auxiliar aver
(conjugado no presente ou pretérito imperfeito do indicativo) + o infinitivo do verbo
principal, como apresentam todas as gramáticas históricas. Alguns estudiosos acreditam
que houve um momento da língua em que as pessoas tinham consciência de que essas
formas eram compostas por duas palavras, embora, no PB atual, essa consciência esteja
se perdendo.
Análises morfofonológicas dessas formas futuras anteriormente desenvolvidas
apontam para uma natureza composta desses tempos verbais, como os estudos de
202
Massini-Cagliari (2006), para o PA, Bisol (1992), para o PB, e Mateus (2002 [1983]),
para o PE, tomando por base uma análise prosódica que sugere que há dois acentos
nessas formas, um no radical do verbo principal e outro no verbo auxiliar aver,
conjugado no presente do indicativo, para o futuro do presente, ou no pretérito
imperfeito do indicativo, para o futuro do pretérito.
Como era nosso objetivo estudar essas formas futuras no PA, escolhemos, para
constituir nosso corpus, as CSM, mandadas reunir por Afonso X, rei de Castela, por
terem sido produzidas no último quartel do século XIII, no período final da vida do
monarca, portanto durante o período histórico denominado arcaico (séculos XIII-XV),
quando se desenvolveu a língua que posteriormente ficou conhecida como galego-
portuguesa. Essa escolha se deve também por ser esse um material poético, fato crucial
para termos pistas da estrutura prosódica das formas futuras do PA, período do qual
(dadas as limitações tecnológicas da época) não sobreviveram gravações - o que foi
necessário, para analisarmos o padrão acentual desse tempo verbal nesse período da
língua portuguesa.
Na análise quantitativa dos dados colhidos a partir da consideração das CSM,
apresentada na seção 3 desta tese, verificou-se que em PA o verbo aver, auxiliar do
tempo futuro, apresenta-se superficialmente unido no nível gráfico ao verbo principal
em 97,3% dos casos e, separado deste graficamente, em 2,7% dos casos, predominando,
portanto, as formas em que temos graficamente um único vocábulo. No entanto, com
relação ao futuro do presente, o verbo aver, conjugado no presente do indicativo, está
sempre separado do verbo no infinitivo por meio de uma preposição, o que não ocorre
em nenhum dado com o futuro do pretérito. E, relativamente a este último tempo, o
verbo auxiliar, conjugado no pretérito imperfeito do indicativo, não tem ordem fixa em
relação ao verbo principal, aparecendo antes do verbo principal ou depois deste.
203
No futuro do presente, o verbo aparece predominantemente conjugado na 1ª
pessoa do singular, enquanto que no futuro do pretérito predomina a 3ª pessoa do
singular. Só no futuro do presente encontramos verbos conjugados nas 1ª e 2ª pessoas
do plural, não havendo qualquer caso como esses no futuro do pretérito. Uma provável
explicação para esse fato é que as formas de 1ª e 2ª pessoas do plural do futuro do
pretérito (cantaríamos e cantaríades) são proparoxítonas, formas extremamente
marginais em PA, como já argumentaram Michaëlis de Vasconcelos (1912-1913),
Teyssier (1987) e Massini-Cagliari (2005).
Em relação à colocação pronominal, 72,9% dos casos mapeados no corpus eram
de próclise, 19% dos casos correspondiam a mesóclises e 8,1% constituíam casos de
ênclise. Nos poucos casos de ênclise, o verbo está sempre conjugado no singular, seja
no futuro do presente ou do pretérito. Isso se deve a dois fatores: só formas verbais que
terminam em sílabas abertas aceitam pronomes enclíticos, o que não é o caso das
formas de plural do futuro; evita-se também, com a não-colocação de pronomes
enclíticos, a formação de palavras proparoxítonas, vocábulos esdrúxulos em PA.
A quantidade de pronomes proclíticos encontrada no corpus é muito superior
aos casos de ênclises e mesóclises. No futuro do presente, todas as pessoas verbais
aceitam próclise, o que não ocorreu nem em relação à ênclise, nem em relação à
mesóclise; tal observação prova que essa posição, para a colocação de pronomes átonos,
já era favorecida em PA. Verificou-se também que, em PA, o contexto frasal favorece a
próclise, nos casos em que há uma palavra atrativa, como advérbios, pronomes relativos
ou conjunções.
Apesar de o predomínio de formas sintéticas no corpus e a grande quantidade de
próclises sugerirem que as formas verbais de futuro eram sintéticas naquela época,
verificou-se que, em 8,9% dos casos de próclise, o pronome não está adjacente ao
204
verbo, mas separado deste por meio de um advérbio ou conjunção, entre outras classes
de palavras. Esse fato mostra uma independência prosódica do pronome em relação à
forma verbal, o que ainda nos permite considerar a possibilidade de as formas futuras
serem analíticas. A quantidade relativamente alta de mesóclises também nos mostra
que, em PA, existia uma consciência de que a forma futura, tradicionalmente rotulada
como sintética, é possivelmente composta ou perifrástica, em ambos os casos analítica,
pela possibilidade de colocação de um ou mais pronomes entre o infinitivo e o verbo
auxiliar.
Para podermos melhor compreender a estrutura das formas futuras em PA,
desenvolvemos, na seção 4 desta tese, um estudo baseado nos critérios formulados por
Massini-Cagliari (1999, 2006) e Bybee, Pagliuca e Perkins (1991).
Dos critérios arrolados por Massini-Cagliari (1999, 2006) – co-ocorrência de
formas sintéticas e analíticas, possibilidade de mesóclise, a coordenação de dois verbos
no futuro a partir de uma única terminação, padrão acentual das formas –, só um deles
não nos foi produtivo, pois, no corpus considerado por esta tese, não foram encontradas
formas futuras coordenadas com uma única terminação. A análise de todos os outros
critérios apontou para a consideração das formas verbais de futuro em PA como tendo
uma natureza analítica, devido aos seguintes fatores:
Em relação ao primeiro argumento de Massini-Cagliari (1999, 2006), foi
encontrado, no corpus, o verbo auxiliar escrito junto ao verbo principal no
infinitivo e também separado, tanto para o futuro do presente quanto para o
futuro do pretérito. O comportamento gráfico desses verbos não é, pois,
categoricamente favorável à consideração de que essas formas já estivessem
sintetizadas;
205
Existe também, no corpus analisado nesta tese, a possibilidade de mesóclise
(19% dos casos de colocação pronominal). Esses pronomes sempre aparecem
depois do infinitivo do verbo principal e antes do auxiliar conjugado no presente
do indicativo ou no pretérito imperfeito do indicativo. Este fato aponta para uma
maior independência entre as partes formativas dos tempos futuros na época
medieval;
Em relação ao padrão acentual das formas futuras, verificou-se que cada uma
das partes que compõem o futuro mantém sua autonomia, como acontece com as
palavras compostas, recebendo acento primário individual; desses acentos
recebidos, no jogo de proeminências estabelecido entre eles em níveis superiores
ao da palavra, o último acento sempre é mais proeminente em PA, pela regra
default. As marcas de flexão verbal em PA, como estudado anteriormente por
Massini-Cagliari (1999) e Costa (2006), nunca atraem o acento; portanto, só é
possível explicar a posição do acento nas formas futuras do PA considerando
essas formas verbais como compostas (ou perifrásticas); caso contrário, teríamos
que admitir que o acento pode, em casos excepcionais, recair sobre a flexão do
verbo (apenas quando conjugado no futuro).
Apresentamos, ainda na seção 4, uma análise da estruturação prosódica das
formas verbais futuras no PA, em termos de palavras fonológicas. O que nos faz
perceber que essas formas têm autonomia, além da manutenção dos acentos primários
de cada uma das suas partes constitutivas, é a possibilidade de elas se separarem e a
possibilidade de se colocar um clítico ou uma preposição entre as partes; portanto, os
verbos conjugados nos futuros do presente e do pretérito não podem ser considerados
uma única palavra fonológica, mas sim duas.
206
Apesar de a análise dos critérios considerados por Massini-Cagliari (1999, 2006)
já mostrar uma independência entre as palavras que compõem o futuro em PA, para
aprofundarmos a discussão da questão do ponto de vista da possível gramaticalização –
e, portanto, do caráter sintético – dessas formas verbais foram tomados também os
critérios estabelecidos por Bybee, Pagliuca e Perkins (1991), que avaliam o grau de
fusão entre um verbo e seu auxiliar de futuro em algumas línguas, para analisar o futuro
em PA a partir dos dados encontrados no corpus considerado por esta tese, as CSM.
Para a análise do grau de fusão entre os verbos principal e auxiliar, Bybee,
Pagliuca e Perkins (1991) apresentam os seguintes critérios: ortografia, possibilidade de
interpolação de outra palavra entre as partes constituintes do tempo verbal em questão,
processos fonológicos condicionados pelo radical, processos fonológicos condicionados
pela categoria lexical e mudanças no radical.
Os dois primeiros critérios são os mesmos já analisados a partir de Massini-
Cagliari (1999, 2006); como já apresentado anteriormente, esses critérios reafirmam a
idéia de que as formas medievais de futuro são compostas ou perifrásticas, pela
possibilidades de se escrever o verbo principal e seu auxiliar separadamente (e até
mesmo com a ordem invertida) e de mesóclise.
Em relação aos processos fonológicos condicionados pelo radical, constatou-se
que o verbo aver sofre redução no auxiliar quando conjugado no presente do indicativo
para atuar como auxiliar o futuro do presente nas 1ª e 2ª pessoas do plural. Para o futuro
do pretérito, se considerarmos como auxiliar o verbo aver conjugado no pretérito
imperfeito do indicativo, este também sofre redução, mas agora em todas as pessoas.
Tanto para o futuro do presente quanto para o futuro do pretérito, o verbo aver perde o
segmento av-. Se considerarmos como auxiliar do futuro do pretérito o verbo ir, então
não há qualquer tipo de redução ou alteração. Esse é o único critério de Bybee, Pagliuca
207
e Perkins (1991) que poderia avaliar o futuro em PA como uma forma sintética; mas, na
concepção dos próprios autores, um único critério não é suficiente para a definição de
uma conclusão quanto ao caráter gramaticalizado de uma forma.
O auxiliar de futuro não sofre nenhum tipo de alteração que dependa da
categoria de verbo principal que a ele se une; portanto, em relação ao quarto critério –
processos fonológicos condicionados pela categoria lexical –, não há um alto grau de
fusão dos verbos na formação do futuro.
Em relação ao último critério, alterações no radical, verificou-se que essas
podem ocorrer em alguns verbos específicos; no entanto, esses dados podem ser, de
outro ponto de vista, facilmente explicados em uma base exclusivamente fonológica,
pelo mecanismo da haplologia, isto é, um tipo de redução em que há apagamento total
de uma sílaba se esta estiver adjacente a outra cujos segmentos em posição de ataque
silábico forem iguais ou semelhantes (as consoantes só podem diferir, no máximo, no
traço [sonoridade]).
Ao final, conclui-se que apenas um dos critérios de Bybee, Pagliuca e Perkins
(1991) aponta para a fusão entre os elementos constitutivos das formas futuras
medievais; todos os outros mostram que o grau de gramaticalização entre os verbos que
entram na formação do futuro em PA é muito baixo.
A partir da análise desenvolvida nesta tese, conclui-se que os futuros do presente
e do pretérito em PA constituem formas compostas do verbo principal no infinitivo + o
auxiliar aver, conjugado no presente do indicativo para indicar o futuro do presente, ou
o auxiliar aver/ir, conjugado no pretérito imperfeito do indicativo para indicar o futuro
do pretérito. São, portanto, tanto no caso de composição como no caso de perífrase,
formas analíticas, uma vez que duas palavras fonológicas entram na formação desses
tempos, mantendo, cada uma delas, seu acento primário (no jogo de proeminências
208
entre elas, em níveis superiores, em PA, passa a prevalecer o acento mais à direita, de
acordo com a regra default de acentuação de frases fonológicas). A independência
dessas formas pode ser comprovada, também, pelas possibilidades de mesóclise e de
colocação de uma preposição entre as formas, fatos que favorecem a consideração das
formas futuras do PA como perifrásticas (e não como compostas), uma vez que a coesão
interna entre os elementos constituintes dos tempos futuros do presente e do pretérito,
na época medieval, podia ser quebrada.
209
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218
Apêndice
Seguem abaixo as formas futuras contextualizadas mapeadas nas Cantigas de
Santa Maria. Ao final de cada exemplo há o número da cantiga e os versos em que se
encontram. As abreviaturas utilizadas nas fichas de análises abaixo são as seguintes: FT
- futuro do presente; FP – futuro do pretérito; p – pessoa; s – singular; pl – plural; S –
sintético; A – analítico; inf. – infinitivo; s/p – sem pronome; encl.- ênclise; procl. –
próclise; mesocl. – mesóclise.
á-o d'aver e de razon assaz,
per que entenda e sábia dizer (CSM B, v. 5-6)
á-o d'aver: FT, 3ps, Aaver+de+inf; encl.
E macar eu estas duas non ey
com' eu querria, pero provarei
a mostrar ende un pouco que sei, (CSM B, v. 9-11)
querria: FP; 1ps; S; s/p.
provarei: FT; 1ps; S; s/p.
ca per ele tenno que poderei
mostrar do que quero alga ren. (...) (CSM B, v. 13-14)
poderei : FT; 1ps; S; s/p.
e ar/querrei-me leixar de trobar des i/ por outra dona, (CSM B, v. 23-25)
querrei: FT; 1ps; S; encl.
que non poderei en seu ben falir / de o aver (CSM B, v. 35-36)
poderei: FT; 1ps; S; s/p.
e queno souber / por ela mais de grado trobará.
(CSM B, v. 43-44)
trobará: FT; 3ps; S; s/p.
Virgen, de Deus amada:
do que o mund' á de salvar (CSM 1, v. 17-18)
á de salvar: FT, 3ps, Aaver+de+inf; s/p.
(...) nen que per nulla maneira
est´ alva vestir provasse,
ca Deus del se vingaria.
(CSM 2, v. 53-55)
vingaria: FP; 3ps; S; procl.
(...) en ha torre o meteu en muy gran prijon,
jurando muyto que o faria y morrer. (CSM 5, v. 37-38)
faria: FP; 3ps; S; procl.
«Par Deus», diss' el Conde, «aqueste rogo farei volonter, (CSM 5, v. 78)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
219
Pois desta guisa pres mort' o meno, como vos dit' ei,
a santa dona, que o sentiu morto, diss': «Ai, que farei(CSM 5, v. 96-97)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
Diss' o irmão do Conde: «Eu o vingarey
de ti, que o matar foste por nos cofonder.” (CSM 5, v. 100-101)
vingarey: FT; 1ps; S; procl.
Enton vo voz de ceo, que lle disse: “Tol
tas mãos dela, se non, farey-te perecer.” (CSM 5, v. 114-115)
farey: FT; 1ps; S; encl.
mas en dormindo a Madre de Deus direi-vos que lle fez: (
CSM 5, v. 127)
direi: FT; 1ps; S; encl.
“Madre de Deus, beitos son os que en ti fyuza an,
ca na ta gran mercee nunca falecerán
(CSM 5, v. 134-135)
falecerán: FT; 3ppl; S; s/p.
entrou na cidade de Roma, u er’o cortes
Emperador, que a chamou e disso-lle: “Vês?
Guari-m' est' irmão gaff', e dar-ch-ei grand' aver.” (CSM 5, v. 163-164)
dar-ch-ei: FT; 1ps; S; mesocl.
A dona diss' ao Emperador: «Voss' irmão guarrá;
mas ante que eu en el faça ren, seus pecados dirá
ant' o Apostolig' e ante vos, como os feitos á.» (CSM 5, v. 166-168)
guarrá: FT; 3ps; S; s/p.
dirá: FT; 3ps; S; s/p.
E pois foi feito, o Emperador diss': «Ai Deus, que será?
Nunca mayor trayçon desta om' oyrá.» (
CSM 5, v. 169-170)
será: FT; 3ps; S; s/p.
oyrá: FT; 3ps; S; s/p.
mas des oi mais a Santa Maria, que é luz,
quero servir, que me nunca á de falecer. (CSM 5, v. 177-178)
á de falecer: FT, 3ps, Aaver+de+inf; s/p.
ante lle disse que fosse fis
que ao segre non ficaria nunca, par San Denis,
nen ar vestiria pano de seda nen pena de gris,
mas ha cela faria d´obra de Paris, (
CSM 5, 181-184)
ficaria: FP; 3ps; S; s/p.
vestiria: FP; 3ps; S; s/p.
faria: FP; 3ps; S; s/p.
dizend': «Eu dar-ll-ei que jante, | e demais que merende.» (CSM 6, v. 30)
dar-ll-ei: FT; 1ps; S; mesocl.
220
dá-me meu fillo morto
ou viv' ou qual quer que seja; | se non, farás-me gran torto,
e direi que mui mal erra | queno teu ben atende.» (CSM 6, v. 63-65)
farás: FT; 2ps; S; encl.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Porende vos contarey
un miragre que achei (CSM 7, v. 9-10)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
E por aquest' un miragre | vos direi, de que sabor
averedes poy-l’ oirdes, | que fez en Rocamador
a Virgen Santa Maria, | Madre de Nostro Sennor;
ora oyd' o miragre, | e nos contar-vo-lo-emos. (CSM 8, v. 7-10)
direi: FT; 1ps; S; procl.
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
contaremos: FT; 1ppl; S; mesocl.
may-lo monge tesoureiro | foi-lla da mão toller,
dizend': «Encantador sodes, | e non vo-la leixaremos. (CSM 8, v. 24-25)
leixaremos: FT; 1ppl; S; procl.
mas o monge lla cuidou
fillar, mas disse-ll' a gente: | «Esto vos non sofreremos.» (CSM 8, v. 39-40)
sofreremos: FT; 1ppl; S; s/p.
“que gran demorança
Aqui u estamos
bõa non seria
sen aver pitança.” (CSM 9, v. 49-52)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Esto non loamos;
ca mal ch'estaria
que, per obridança,
se a que amamos
monja non avia
da Virgen senbrança.” (
CSM 9, v. 58-63)
estaria: FP; 3ps; S; procl.
Diss´el: «Ben mercamos;
e quen poderia
a esta osmança
põer? (...) (
CSM 9, v.69-72)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
Dar-ll-ei con mia lança,
e o seu partamos,
logo sem perfia
todos per iguança.” (CSM 9, v. 93-96)
221
darei: FT; 1ps; S; mesocl.
e ben vos mostramos
que Deus prenderia
de vos gran vingança. (CSM 9, v.105-107)
prenderia: FP; 3ps; S; s/p.
“Como quer que seja,
bõa será esta, | asse Deus m'ajude,
en Costantinoble | na nossa eigreja; (CSM 9, v. 110-112)
será: FT; 3ps; S; s/p.
bravequia
e gran malestança
serán, non erramos.» (CSM 9, v. 114-116)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
Mas, como penssamos,
tanto lle valrria
com` ha garvança. (CSM 9, v. 149-151)
valrria: FP; 3ps; S; procl.
e Deus tiraria
nos desta balança?” (CSM 9, v. 161-162)
tiraria: FP; 3ps; S; encl.
Poren direi todavia
com´ em ha abadia
un tesoureiro avia, (...) (CSM 11, v. 9-11)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Sen muito mal que fazia,
cada noyt' en drudaria
a hua sa druda ya
con ela ter
seu gasallado;
pero ant' «Ave Maria»
sempr' ya dizer
de mui bon grado. (CSM 11, v. 18-25)
ya dizer: FP, 3ps, A ir+inf; s/p.
E pois chegou, lles movía
ssa razon con preitesia
que per ali lles faria
a alma toller
do frad' errado,
dizendo-lles
(CSM 11, v. 63-68)
faria: FP, 3ps, S; procl.
222
E porend' un gran miragre vos direi desta razón, (CSM 13, v.5)
direi: FT; 1ps; S; procl.
«Non sabes la profecia que diss' o bon rei Davi,
que o ome con mazela de peccado ante mi
non verrá, nen de mia casa nunca será conpannon?» (CSM 14, v. 27-29)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E diss' el: «farey-o pois end' avedes sabor;
mas torn' a alma no corpo, e compra ssa profisson.» (CSM 14, v. 43-44)
farey: FT; 1ps; S; encl.
Basil[l]o diz: «Será est' enquanto
tu connoceres teu Criador.» (CSM 15, v. 38-39)
será: FT; 3ps; S; s/p.
e fo comerás por fazfeiro,
ou te farey de fame fir;
e se t' aqueste pan non refeiro,
terrei-me por d'outr' ome peyor.» (CSM 15, v. 54-57)
comerás: FT; 2ps; S; s/p.
farey: FT; 1ps; S; procl.
terrei: FT; 1ps; S; encl.
e dizendo: «Pois que ei congeyto,
vingar-m-ei daquele malfeitor.» (CSM 15, v. 92-93)
vingarei: FT; 1ps; S; mesocl.
San Basillo, com' escrit' achey,
u a gente estav' assada
foi-lles dizer como vos direi:
(CSM 15, v. 132-134)
direi: FT; 1ps; S; procl.
diss' el, «poren quero santa vida
fazer vosqu', e non vos seja greu,
e receber vossa ley comprida,
e serey dela preegador.» (CSM 15, v. 171-174)
serey: FT; 1ps; S; s/p.
Quen dona fremosa e bõa quiser amar,
am' a Groriosa e non poderá errar. (
CSM 16, v. 3-4, refrão)
poderá: FT; 3ps; S; s/p.
E pola aver fazia o que vos direi: (CSM 16, v. 15)
direi: FT; 1ps; S; procl.
a Santa Maria a pedide des aqui,
que é poderosa e vo-la poderá dar. (CSM 16, v. 42-43)
poderá: FT; 3ps; S; procl.
223
Desto vos direi un miragre fremoso,
que mostrou a Madre do Rei grorioso
contra un ric-ome fol e sobervioso,
e contar-vos-ei end' a gran maravilla. (CSM 19, v.5-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
contarei: FT; 1ps; S; mesocl.
e dest' un miragre vos direi eu
que ela fez grande nos dias meus. (CSM 22, v.7-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Desto direi un miragre que fez en Bretanna
Santa Maria por ha dona mui sen sanna, (CSM 23, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
e diss' «Ai, Santa Maria, ta mercee seja
que me saques daquesta vergonna tan sobeja;
se non, nunca vestirei ja mais lãa nen lo.» (CSM 23, v. 26-28)
vestirei: FT; 1ps; S; s/p.
a un judeu foi sen lezer
provar se ll' alg' enprestaria. (CSM 25, v. 20-21)
emprestaria: FP; 3ps; S; procl.
«Amig', aquesto que tu queres
farei eu mui de coraçon
sobre bon pennor, se mio deres » (CSM 25, v. 24-26)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
Disse-ll' o crischão: «Poder
d'esso fazer non averia,
(CSM 25, v. 27-28)
averia: FP; 3ps; S; s/p.
O judeu lle respos assi:
«Sen pennor non será ja feito
que o per ren leves de mi.» (CSM 25, v. 32-35)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Diz o crischão: «Fas un preito:
ir-t-ei por fiador meter
Jeso-Crist' e Santa Maria.»
(CSM 25, 35-37)
irei: FT; 1ps; S; mesocl.
Respos el: «Non quer' eu creer
en eles; mas fillar-chos-ya, (CSM 25, v. 38-39)
fillarya: FP; 3ps; S; mesocl.
224
poren, senner,
fillar-chos quer' e dar-ch-ei quanto
quiseres, (CSM 25, v. 43-45)
darei: FT; 1ps; S; mesocl.
se eu pagar non llo podia
per mi, mas vos ide põer
a paga u mia eu porria. (CSM 25, v. 64-66)
porria: FP; 1ps; S; s/p.
Enton fillaron-s' a correr,
e a gente pos eles ya,
todos con coita de saber
o que daquel preit' averria. (CSM 25, v. 153-156)
averria: FP; 3ps; S; s/p.
Non é gran cousa se sabe | bon joyzo dar
a Madre do que o mundo | tod' á de joigar. (CSM 26, v. 4-5, refrão)
á de jogar: FT; 3ps; Aaver+de+infinitivo; s/d.
Sobr' esto, se m' oissedes, diria
dun joyzo que deu Santa Maria (CSM 26, v. 13-14)
diria: FP; 1ps; S; s/p.
Mas ante farás esto que te digo,
se sabor ás de seer meu amigo: (CSM 26, v. 41-42)
farás: FT; 2ps; S; s/p
ás de seer: FT; 2ps; Aaver+de+infinitivo; s/d.
«Daqueste preito non ajades pavor,
ca eu vos serei y tal ajudador
per que a os judeus ajan de perder.»
(CSM 27, v. 41-43)
serei: FT; 1ps; S; procl.
que faria en matar
o poboo myudo
(CSM 28, v.27-28)
faria: FP; 3ps; S; s/p.
yan matar
daquel Soldan barvudo
(CSM 28, v. 81-82)
yan matar: FP; 3ppl; Air+infinitivo; s/d.
E o por que esto fiz,
direi-vo-lo aginna: (CSM 28, v. 122-123)
direi: FT; 1ps; S; encl.
Poderia-vos de dur
dizer as grandes doas (CSM 28, v.131-132)
poderia: FP; 1ps; S; encl.
225
«Santa Maria,
dar-t-ei o que trag', en don, (CSM 31, v. 30-31)
darei: FT; 1ps; S; mesocl.
«Irey cras a mercado;
mas este novelo non
yrá nas offereçudas
bestias qu' en offereçon (CSM 31, v. 43-46)
irei: FT; 1ps; S; s/p.
yrá: FT; 3ps; S; s/p.
A Madre de quen
o mundo fez,
seria de bon sen. (CSM 32, v. 5-7, refrão)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Dest' un gran miragre vos contarei ora, (CSM 32, v. 9)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
te quites; e se non, d' oj' a trinta dias
morte prenderias
e alá yrias (CSM 32, v. 42-44)
prenderias: FP; 2ps; S; s/p.
yrias: FP; 2ps; S; s/p.
Gran poder á de mandar
o mar e todo-los ventos (CSM 33, v. 3-4, refrão)
á de mandar: FT; 3ps; Aaver+de+infinitivo; s/d.
que quen per ela fiar,
valer-ll-an seus cousimentos.» (CSM 33, v. 3-4, refrão)
v. 68-69)
valeran: FT; 1ppl; S; mesocl.
Poren direi un miragre, que foi gran verdade,
(CSM 34, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Desta razon un miragre direi fremoso, que fez
A Virgen Santa Maria, (...) (CSM 35, v. 10-11)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
E poren mal non nos faças, | se non, logo morrerás
e con quantos tigo trages | ao inferno yrás
e de quant' acabar cuidas | ren en non acabarás,
ca a nav' estas relicas | queren de ti deffender.» (CSM 35, v. 75-78)
morrerás: FT; 2ps; S; s/p.
yrás: FT; 2ps; S; s/p.
acabarás: FT; 2ps; S; s/p.
226
E maestre Bernal disse: «Un preito vosco farey:
dar-vos-ey a meyadade, | e leixad' o al jazer.» (CSM 35, v. 102-103)
farey: FT; 1ps; S; procl.
darey: FT; 1ps; S; mesocl.
Todos responderon logo: | «Preit' outr' y non averá
que o todo non tomemos, | mas tornaremos dacá;
daquelo que gaannarmos | cada u y dará
o que vir que é guisado (CSM 35, v. 105-108)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
dará: FT; 3ps; S; s/p.
«Pois Deus quer
que a ssa Madre do nosso | demos, quis do que tever
dará y de bõa mente, | e ide-o receber.» (CSM 35, v. 126-128)
dará: FT; 3ps; S; s/p.
«Ay, Virgen, tu que es escudo
sempre dos coitados, queras que acorrudo
seja per ti; se non, serei oi mais tudo
por dos mais nojosos. (CSM 37, v. 26-29)
serei: FT; 1ps; S; s/p.
con quanto ben nos visti,
queno contaria? (CSM 40, v. 40-41)
contaria: FP; 3ps; S; s/p.
Loada será mentr' o mundo for
a Virgen, Madre de Nostro Sennor, (CSM 41, v. 24-25)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Dest' un miragre fremoso, ond' averedes sabor,
vos direy, que fez a Virgen, |Madre de Nostro Sennor,
(CSM 42, v. 7-8)
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
direy: FT; 1ps; S; procl.
poren daqui adeante serei eu dos servos teus,
(CSM 42, v. 34)
serei: FT; 1ps; S; s/p.
ond' á mester
que a leixes e te vaas comigo a como quer,
se non, daqui adeante averás coyta mortal.»
(CSM 42, v. 68-70)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
Mas se tu meu amor queres, | daqui te levantarás, (CSM 42, v. 78)
levantarás: FT; 2ps; S; procl.
muit' end' el; mas disse-ll' ela: «Eu vos porrei en carreira (CSM 43, v. 8)
porrei: FT; 1ps; S; procl.
227
Com' ajamos algun fillo, ca se non, eu morreria.
Poren dou-vos por conssello que log' a Santa Maria
de Salas ambos vaamos, ca quen se en ela fia,
o que pedir dar-ll-á logo, aquest' é cousa certeira.» (CSM 43, v. 10-13)
morreria: FP; 1ps; S; s/p.
dará: FT; 1ps; S; mesocl.
que el' a Santa Maria o daria, (...) (CSM 43, v. 42)
daria: FP; 3ps; S; procl.
Quen fiar na Madre do Salvador
non perderá ren de quanto seu for. (CSM 44, v. 3-4, refrão)
poderá: FT; 3ps; S; s/p.
Quen fiar en ela de coraçon,
averrá-lle com' a un ifançon (CSM 44, v. 5-6)
averrá: FT; 3ps; S; encl.
e aver-m-ás sempre por servidor.
Quen fiar na Madre do Salvador... (CSM 44, v. 28-29)
averás: FT; 2ps; S; mesocl.
E demais esta cera ti darei
en sa figura, e sempr' andarei
pregõando teu nome e direi
como dos Santos tu es la mellor.» (CSM 44, v. 30-34)
darei: FT; 1ps; S; procl.
andarei: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
e per que mui ben vivessen | lles daria conprimento,
e que por Santa Maria | servir seria y frade.
(CSM 45, v.33-34)
daria: FP; 3ps; S; procl.
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Os diabos ar disseron: | «Esto per ren non faremos,
(CSM 45, v.56)
faremos: FT; 1ppl; S; s/p.
E un dos angeos disse: | «O que vos dig' entendede:
eu sobirei ao ceo, | e vos aqui mi atendede, (CSM 45, v.61-62)
sobirei: FT; 1ps; S; s/p.
E ele lle respondia: | «Mia Madr', o que vos quiserdes
ei eu de fazer sen falla, | pois vos en sabor ouverdes; (CSM 45, v.71-72)
ei de fazer: FT; 1ps; Aaver+de+infinitivo; s/p.
foss´ a mi que quer mostrar,
faria-me logo sou (CSM 46, v. 55-56)
faria: FP; 3ps; S; encl.
228
(...) possamos ir sen vergonna
ant' el e que non vaamos u yrán os soberviosos. (CSM 48, v.8-9)
yrán: FT; 3ppl; S; s/p.
E dultar non deve, por quanto vos direi,
porque, se non foss' esto, non viramos Rei
que corpos e almas nos julgass', eu o sei,
como Jeso-Cristo nos verrá joigar. (CSM 50, v.5-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
verrá: FT; 3ps; S; procl.
nen door nen coyta; pois quen sse doerá
del, nen piadade averá nen pesar?
(CSM 50, v.17-18)
doerá: FT; 3ps; S; procl.
averá: FT; 3ps; S; s/p.
direi-ll' eu de com' a Virgen quis no meno mostrar. (CSM 53, v.13)
direi: FT; 1ps; S; encl.
Dest’ un miragre me vo emente
que vos direi ora, ay, bõa gente, (CSM 54, v.10-11)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E quando morreres, sei ben certão
que irás u é Santa Catela.» (CSM 54, v.67-68)
irás: FT; 2ps; S; s/p.
Desto direi un miragre que quis mostrar en Espanna (CSM 55, v.5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Quen catar e reolver
estes salmos, achará
“Magnificat” y jazer,
(CSM 56, v.35-37)
achará: FT; 3ps; S; s/p.
porque sabemos
que será ascuitado
(CSM 57, v.13-14)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E dest' un miragre vos contarei
(CSM 58, v.5)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
“Des oge mais non te partas de mi
nen de meu Fillo, e sen non, aqui
te tornarei, u non averá al.» (CSM 58, v.56-58)
tornarei: FT; 1ps; S; procl.
averá: FT; 3ps; S; s/p.
229
Mais, se Deus quiser, esto non será,
nen fora daqui non me veerá
já mais null’ ome; (CSM 58, v.70-72)
será: FT; 3ps; S; s/p.
veerá: FT; 3ps; S; s/p.
Nen mentre viva nunca amador
averei, nen non quer' eu outr' amor (CSM 58, v.75-76)
averei: FT; 1ps; S; s/p.
Quena Virgen ben servir
nunca poderá falir. (CSM 59, v.3-4, refrão)
poderá: FT; 1ps; S; s/p.
E daquesto un grand feito
dun miragre vos direi (CSM 59, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Fol é o que cuida que non poderia
faze-lo que quisesse Santa Maria. (CSM 61, v.3-4, refrão)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
Dest' un miragre vos direi que avo (CSM 61, v.5)
direi: FT;1ps; S; procl.
de seer a çapata tan ben guardada
que ja podre non foss', esto non seria(CSM 61, v.17-18)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
e torceu-xe-lle’ a boca en tal maneira
que quen quer que o visse espantar-s-ia. (CSM 61, v.22-23)
espantaria: FP; 3ps; S; mesocl.
Santa Maria: «vai, e dar-ch-ey quito
E teu fillo do usureiro maldito”, (CSM 62, v. 36-37)
darey: FT; 1ps; S; mesocl.
E dest’ un miragre, de que fiz cobras e son,
vos direi mui grande, que mostrou en Aragon (CSM 64, v.6-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
mais ena ygreja mannãa seremos y,
e enton vos direi a quen vos cuid' a leixar.» (CSM 64, v.28-29)
seremos: FT; 1ppl; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; procl.
A moller respos: «Aquesto de grado farei,
e que a ajades quant' eu poder punnarei;
mas de vossas dõas me dad', e eu llas darei,
e quiçay per esto a poderei enganar.» (CSM 64, v.61-64)
230
farei: FT; 1ps; S; s/p.
punnarei: FT; 1ps; S; s/p.
darei: FT; 1ps; S; procl.
poderei: FT; 1ps; S; procl.
Diss' o cavaleir': «Esto farei de bon talan.» (CSM 64, v. 66)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
“Dona, desto me praz, / e sobr' esto nunca averemos senon paz, (CSM 64, v.91-92)
averemos: FT; 1ppl; S; s/p.
A creer devemos que todo pecado
Deus pola sa Madr' averá perdõado.
(CSM 65, v.3-4, refrão)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
Porend' un miragre vos direi mui grande / que Santa Maria fez; (CSM 65, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Poren direi com' un clerig' aldeão, (CSM 65, v.10)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Que lle diss, se livre seer queria,
que lle déss' algo, se non nono seria. (CSM 65, v.50-51)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
vay Alexandria, e se o fezeres,
dar-ch-á y consello un fol trosquiado.» (CSM 65, v.72-73)
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
Em este feito non me deron consello,
como mio dará o que é fol provado?» (CSM 65, v.82-83)
dará: FT; 3ps; S; s/p.
e se en este meogo / morreres, morrerás de Deus perdõado.»
(CSM 65, v.97-98)
morrerás: FT; 2ps; S; s/p.
Pero se aquest’ é fol, pela ventura,
aguarda-lo-ei tena noit' escura;
ca se el non é ben louco de natura,
algur irá long' albergar apartado.» (CSM 65, v. 115-118)
aguardarei: FT; 1ps; S; s/p.
irá: FT; 3ps; S; s/p.
disse-lle chorand': «Eu vos farei ajuda, (CSM 65, v.142)
farei: FT; 1ps; S; procl.
chama-o ante mi, e serás soltado.» (CSM 65, v.173)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
231
e disse: «Sol de m' ir non será pensado, (CSM 65, v.188)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Aynda vos direi mais de mia fazenda:
d' oj' a quinze dias serei sen contenda / no Parayso, (CSM 65, v.225-227)
direi: FT; 1ps; S; procl.
serei: FT; 1ps; S; s/p.
Quantos en Santa Maria
esperança an,
ben se porrá sa fazenda. (CSM 66, v.4-6, refrão)
porrá: FT; 3ps; S; procl.
Os que m’ oen cada dia
e que m' oyrán,
de grado lles contaria (CSM 66, v.7-9)
oyrán: FT; 3ppl; S; procl.
contaria: FP; 1ps; S; procl.
Ante Deus e todavia
por nos rogarán (CSM 66, v.19-20)
rogarán: FT; 3ppl; S; procl.
«Quaes cantarán
a missa que converria,
ou quaes dirán
toda a outra leenda? (CSM 66, v.26-29)
cantarán: FT; 3ppl; S; s/p.
converria: FP; 3ps; S; s/p.
dirán: FT; 3ppl; S; s/p.
E dizede, quen seria / vosso capelan?”
(CSM 66, v.31-32)
seria: FP; 1ps; S; s/p.
t' om': «Aquesta missa di-a,
e responderán
esta santa crerizia,
que ben saberán
responder-ti sen emenda.»
(CSM 66, v.41-45)
responderán: FT; 3ppl; S; s/p.
saberán: FT; 3ppl; S; s/p.
e taes llas dan
que ome non poderia (CSM 66, v.50-51)
poderia: FP; 1ps; S; s/p.
diss' a Virgen: «Eu ir-m-ia,
e todos yr-ss-an;
mais o que ti eu dad' avia
nono levarán,
232
pois to dey por offerenda.» (CSM 66, v.65-69)
iria: FP; 1ps; S; mesocl.
yran: FT; 3ppl; S; mesocl.
levarán: FT; 3ppl; S; s/p.
e o serviço dos pobres | vos farei de bõa mente, (CSM 67, v.28)
farei: FT; 1ps; S; procl.
como vos contarei ora; | e por Deus, ben m' ascuitade: (CSM 67, v.64)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
Diss' o bispo: «Venna logo, | ca de veer-l' ei soydade.» (CSM 67, v.79)
veerei: FT; 1ps; S; mesocl.
e eu vos mostrarei ora | com' est' om' en que fiades
é demo sen nulla dulta, (...)
(CSM 67, v.88-89)
mostrarei: FT; 1ps; S; procl.
E dest' un miragre direi
fremoso, que escrit’ achei (CSM 68, v. 4-5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
mas já outra vez
nono farei, pois vos despraz.» (CSM 68, v.46-47)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
de quant’ al fez Nostro Sennor
nen que fazer poderia. (CSM 70, v.7-8)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
e fiiz / quena visse ben seria. (CSM 70, v.27-28)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
A ar diz que AVEREMOS
e que tod' ACABAREMOS
aquelo que nos queremos
(CSM 70, v.25-27)
averemos: FT; 1ppl; S; s/p.
acabaremos: FT; 1ppl; S; s/p.
Disse Santa Maria: «Esto farei de grado,
(CSM 71, v.40)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
um rezar ordinnado
che mostrarei que faças ca ja que en sabemos. (CSM 71, v.43-44)
mostrarei: FT; 1ps; S; procl.
e di ben a terceira,
de quant' ante dizias, e mais t' end' amaremos(CSM 71, v.57-58)
amaremos: FT; 1ppl; S; s/p.
233
Te dou que o acharás
pelas costas tod' atras
partid', e ll' o cor verás (CSM 72, v.47-49)
acharás: FT; 2ps; S; procl.
verás: FT; 2ps; S; procl.
E dest' un miragre fremoso vos direi (CSM 73, v.5)
direi: FT; 1ps; S; procl.
e espessa tan muito que niun tintor
vermello non poderia fazer mellor, (CSM 73, v.36-37)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
non ousarey ant' o abad' apareçer,
nen u for o convento ousarei entrar.» (CSM 73, v.47-48)
ousarey: FT; 1ps; S; s/p.
ousarei: FT; 1ps; S; s/p.
E ao gran son que a madeira fez
veron as gentes logo dessa vez,
e viron o demo mais negro ca pez
fogir da ygreja u ss' ya perder. (CSM 74, v.45-48)
ya perder: FP; 3ps; Air+infinitivo; procl.
E desta razon vos direi un miragre mui fremoso, (CSM 75, v.8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
ca de quant' aqui nos derdes vos dará Deus por un çento, (CSM 75, v.40)
dará: FT; 3ps; S; procl.
A moller, a que pesava de que quer que el mandasse,
diss' ao crerigo toste que daquesto se calasse,
ca seu marido guarria, e que folga-lo leixasse,
entre tanto sa fazenda averia ordinnada. (CSM 75, v. 43-46)
guarria: FP; 3ps; S; s/p.
averia: FP; 3ps; S; s/p.
que é onrrad’ e mui rico,
que non leixarei agora pola vella que no bico (CSM 75, v. 59-60)
leixarei: FT; 1ps; S; s/p.
e disse-ll': «Aquel moogo non verrá, per quant' entendo, (CSM 75, v.65)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
segund’ eu entend’ e creo,
será vos de Jesu-Cristo a sa alma demandada.» (CSM 75, v.75-76)
será: FT; 3ps; S; encl.
Respos-lle Santa Maria: «Mui çedo serás comigo;
(CSM 75, v.115)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
234
aquel rico de mal siso,
por que sa alma agora será do demo levada.» (CSM 75, v. 120-121)
será: FT; 3ps; S; s/p.
disse que mui ben fezera
e que mui ben s'acharia de quanto ali vera,
demais faria-ll' ajuda mui çed' en gran coita fera; (CSM 75, v.143-145)
acharia: FP; 3ps; S; procl.
faria: FP; 3ps; S; encl.
E a alm' assi dizia: «Que será de min, cativa? (CSM 75, v.158)
será: FT; 3ps; S; s/p.
dizend': «Este terrei eu trões que vir (CSM 76, v.29)
terrei: FT; 1ps; S; s/p.
Será agora per min. (CSM 77, v. 30)
será: FT; 3ps; S; s/p.
“Esta missa, a como quer que seja,
oyrei eu toda, por que Deus de peleja (CSM 78, v.51-52)
oyrei: FT; 1ps; S; s/p.
poren farei ora per todas tas ygrejas
contar este feito e com’ es poderosa.” (CSM 78, v.87-88)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
Porend' un miragre vos direi fremoso
que fezo a Madre do Rey grorioso,
e de o oyr seer-vos-á saboroso,
e prazer-mi-á en. (CSM 79, v.7-10)
direi: FT; 1ps; S; procl.
seerá: FT; 3ps; S; mesocl.
prazerá: FT; 3ps; S; mesocl.
d’ oj’ a trinta dias
seerás comig' entr' estas conpannias (CSM 79, v.27-28)
seerás: FT; 2ps; S; s/p.
Santos. E poren seja de nos reogado
que eno juyzo, u verrá irado,
(CSM 79, v.52-53)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
que con estes garfios que eu trag’ aqui
o desfarei, pero que trage frocaz.» (CSM 82, v.28-29)
desfarei: FT; 1ps; S; procl.
O que en Santa Maria crever ben de coraçon
nunca reçeberá dano nen gran mal nen ocajon. (CSM 84, v.4-5, refrão)
reçeberá: FT; 3ps; S; s/p.
235
porende mete-lo quix,
porque sei, se o oyrdes, que vos valrrá un sermon. (CSM 84, v. 8-9)
valrrá: FT; 3ps; S; procl.
e do mal que dest' avo, vos contarei a razon. (CSM 84, v. 14)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
El lle respos, com' en jogo: «Pois vos praz, dizer-vo-l-ei:
outra dona mui fremosa amo muit' e amarei
mais d' outra cousa do mundo e por seu sempr' andarei(CSM 84, v.41-43)
dizerei: FT; 1ps; S; mesocl.
amarei: FT; 1ps; S; s/p.
andarei: FT; 1ps; S; s/p.
Onde direi un miragre que en Englaterra
Demonstrou Santa Maria (...) (CSM 85, v.7-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
fez sas orações
que lle dissesse seu nome, e dar-ll-ia dões. (CSM 85, v.29-30)
daria: Fp; 3ps; S; mesocl.
“Estes son meus e de meu Fillo, Deus Jeu-Cristo,
con que serás se creveres en el e leytões (CSM 85, v. 63-64)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
Os seus onrrou e onrrará
sempre Santa Maria. (CSM 87, v.39-40)
onrrará: FT; 3ps; S; s/p.
Quen servir a Madre do gran Rey,
ben sei
que será de mal guardado,
com' ora vos contarey. (CSM 88, v.4-7, refrão)
será: FT; 3ps; S; s/p.
contarey: FT; 1ps; S; procl.
E sobr' esto vos direi (CSM 88, v.30)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Vos non podedes durar,
segundo vos mostrarei: (CSM 88, v.37-38)
mostrarei: FT; 1ps; S; procl.
que o façca esforçar;
porend' eu d' aqui ir-m-ei
(CSM 88, v.45-46)
irei: FT; 1ps; S; mesocl.
236
E diss': «Eu que farei (CSM 88, v.86)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
e fillou-ss’ a chorar
e disse: «Leixa-lo-ei(CSM 88, v. 93-94)
leixarei: FT; 1ps; S; mesocl.
E un miragre disto
direi que fez a groriosa
Madre de Jhesu Cristo, (CSM 89, v.6-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
da Virgen que non ouvo par
de bondade, nen averá. (CSM 92, v. 16-17)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
dizendo: «Sennor, que será (CSM 92, v.22)
será: FT; 3ps; S; s/p.
que mio cobres, sequer ali
u a ta missa sse dirá. (CSM 92, v.26-27)
dirá: FT; 3ps; S; procl.
que aos seus non faleceu
nunca ja nen falecerá. (CSM 92, v.31-32)
falecerá: FT; 3ps; S; s/p.
E disse-ll’ enton: “Logo cras
mannãa mia missa dirás
con devoçon, e cobrarás
teu lum', e que te durará (CSM 92, v.34-37)
dirás: FT; 2ps; S; s/p.
cobrarás: FT; 2ps; S; s/p.
durará: FT; 3ps; S; procl.
que ch’ esto faz por meu amor
e aynda che mais fará
(CSM 92, v.41-42)
fará: FT; 3ps; S; procl.
e seu lum’ ali o cobrou;
ca non mentiu nen mentirá
(CSM 92, v.46-47)
mentirá: FT; 3ps; S; s/p.
fez seu amigo chamar,
que llo contar ya. (CSM 94, v.115)
contar ya: FP; 3ps; Air+inf.; s/p.
Desto direy un miragre que ha vegada
demonstrou a Santa Virgen benaventurada (CSM 95, v.6-7)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
237
Dest' un miragre vos darei recado,
que a Virgen fez fremos’ e preçado; (CSM 96, v.11-12)
darei: FT; 1ps; S; procl.
(...) per mi vos mostrado
será, por que ajades dele sabor. (CSM 96, v. 13-14)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Dest' un miragre vos contarey (CSM 97, v.7)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
e est' avia nome Mateu,
a ben leu
pode-l-an en cas del Rei connocer. (CSM 97, v.25-26)
poderán: FT; 3ppl; S; mesocl.
Desto direy un miragre | que contar o (CSM 98, v.5)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
fazer folia
mais que non deveria. (CSM 100, v.12-13)
deveria: FP; 3ps; S; s/p.
e a querria
por ti dar e daria. (CSM 100, v.21-22)
querria: FP; 3ps; S; procl.
daria: FP; 3ps; S; s/p.
e prazer-m-ia
se te prazia (CSM 100, v.28-29)
prazeria: FP; 1ps; S; mesocl.
Desto contarei de grado
un gran miragre provado (CSM 102, v.7-8)
contarei: FT; 1ps; S; s/p.
Vos guiarei, se quiserdes
ir migo e mi algo derdes;
(CSM 102, v.22-23)
guiarei: FT; 1ps; S; procl.
Quena Virgen ben servirá
a Parayso irá.
(CSM 103, v.4-5, refrão)
servirá: FT; 3ps; S; s/p.
irá: FT; 3ps; S; s/p.
E pois lavou mui ben sas mãos, diss': «Ai, Virgen, que será (CSM 103, v.16)
será: FT; 3ps; S; s/p.
238
Se verei do Parayso, o que ch' eu muito pidi,
algun pouco de seu viço ante que saya daqui,
e que sábia do que ben obra que galardon averá(CSM 103, v.18-20)
verei: FT; 1ps; S; s/p.
averá: FT; 3ps; S; s/p.
e diz: «Eu daqui ir-me quero, ca oy mais comer querrá (CSM 103, v.32)
querrá: FT; 3ps; S; s/p.
(...) e disse: «Ai, Santa Maria, val!
Non é est' o meu mõesteiro, pois de mi que se fará (CSM 103, v.35-36)
fará: FT; 3ps; S; procl.
Diss' el: «Busco meu abade, que agor' aqui leixey,
e o prior e os frades, de que mi agora quitey
quando fui a aquela orta; u seen quen mio dirá(CSM 103, v.42-44)
dirá: FT; 3ps; S; s/p.
(...) mais des que souberon ben
de como fora este feyto, disseron: «Quen oyrá (CSM 103, v.47-48)
oyrá: FT; 3ps; S; s/p.
E por aquesto a loemos; mais quena non loará (CSM 103, v.52)
loará: FT; 3ps; S; s/p.
pois quanto nos lle pedimos nos dá seu Fill', a la ffe,
por ela, e aqui nos mostra o que nos depois dará». (CSM 103, v.55-56)
dará: FT; 3ps; S; procl.
E daquest’ un grand miragre | vos direi, (...) (CSM 104, v. 8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
log' a ela seu amigo| e já mais nunca partir
dela se ja poderia, | e de con ela viver. (CSM 104, v.38-39)
poderia: FP; 3ps; S; procl.
ond’ aquesta moller era, | poer com’ end’ eu apres’ ey,
avo en mui gran cousa | que vos ora contarey;
(CSM 104, v.43-44)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
e disse: «Non ás por que t' espantar;
mais se me creveres, irás mui cedo
u verás meu Fill' e min faz a faz.
(CSM 105, v.17-19)
irás: FT; 2ps; S; s/p.
verás: FT; 2ps; S; s/p.
Esto será sse ta virgidade
quiseres toda ta vida guardar (CSM 105, v.21-22)
será: FT; 3ps; S; s/p.
239
Diss' a moça: «Sennor de piadade,
eu o farei, pois vos en prazer jaz.» (CSM 105, v. 25-26)
farei: FT; 1ps; S; procl.
que quantos enfermos fores beijar
serán tan sãos com' ha magãa (CSM 105, v.108-109)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
«Tod' esto», diss' ela, «creo de chão;
mais como me poderei levantar?» (CSM 105, v.112-113)
poderei: FT; 1ps; S; procl.
Desta razon vos direi
un miragre que achei
escrito, e mui ben sei
que farei
del cantiga saborosa. (CSM 106, v.5-9)
direi: FT; 1ps; S; procl.
farei: FT; 1ps; S; s/p.
E contarei sen mentir
como de prijon sair
fez dous presos (...) (CSM 106, v. 11-13)
contarei: FT; 1ps; S; s/p.
«Se eu sayr de prijon,
cen cravos darei en don
a Seixon (CSM 106, v.30-32)
darei: FT; 1ps; S; s/p.
«Per quant' eu a vos oý,
mil cravos levarei y
se mi a mi
(CSM 106, v.48-50)
levarei: FT; 1ps; S; s/p.
Quen crever na Virgen santa,
ena coita valer-ll-á.
(CSM 107, v.4-5, refrão)
valerá: FT; 3ps; S; mesocl.
Dest’ un miragr’ , en verdade,
fez en Segovi’ a cidade
a Madre de piedade,
qual este cantar dirá
(CSM 107, v.6-9)
dirá: FT; 3ps; S; s/p.
E sse ficar viv’ e sãa,
logo me fare[i] crischãa
ante que seja mannãa
cras, u al non averá. (CSM 107, v.31-34)
farei: FT; 1ps; S; procl.
240
averá: FT; 3ps; S; s/p.
e logo a espenaron,
dizendo: “Alá yrá!” (CSM 107, v. 38-39)
yrá: FT; 3ps; S; s/p.
(…) e foi-sse sa carreira
dizendo: “Senpre será (CSM 107, v.48-49)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Madre de Deus preciosa,
que me foi tan piadosa;
e quena non servirá?
(CSM 107, v.52-54)
servirá: FT; 3ps; S; s/p.
e tal miragr’ oyredes
que vos maravillaredes,
e tod’ om’ assi fará.” (CSM 107, v.62-64)
oyredes: FT; 2ppl; S; s/p.
maravillaredes: FT; 2ppl; S; procl.
fará: FT; 3ps; S; s/p.
e foi sempre ben creente
da que por nos rogará (CSM 107, v.68-69)
rogará: FT; 3ps; S; procl.
A seu Fillo grorioso
que nos seja piadoso
eno dia temeroso
quando julgar-nos verrá. (CSM 107, v.71-74)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
ca o que terra e mar
fez per seu mui gran poder,
esto ben o faria(CSM 108, v.26-28)
faria: FP; 3ps; S; procl.
ca o que foi ensserrar
en ssi quantas cousas son,
como ss' enserraria(CSM 108, v.34-36)
enserraria: FP; 3ps; S; procl.
«Madre do que nos salvar
vo, este diz de ti
o que non deveria. (CSM 108, v.42-44)
deveria: FP; 3ps; S; s/p.
que o que te rogarey
queras agora' mostrar (CSM 108, v.49-50)
rogarey: FT; 1ps; S; procl.
241
Dest' un miragre quero contar
que fez a Virgen que non á par
nen averá mentr' o mundo durar, (CSM 109, v.10-12)
averá: FT; 3ps; S; s/pl.
Querelando-sse, com' apres' ei,
os demões da Madre do Rey
dos Ceos en como vos eu direi:
«Esta nos fará dest' ome partir.» (CSM 109, v.30-33)
direi: FT; 1ps; S; procl.
fará: FT; 3ps; S; procl.
Desto deron todos gran loor
a Santa Maria, que sabor
á de valer sempr' ao pecador (CSM 109, v.50-52)
á de valer: FT; 3ps; Aaver+de+inf.; s/p.
Ca tantos son os bes de Santa Maria,
que lingua dizer todos nonos poderia, (CSM 110, v.9-10)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
e vivesse por sempr’ un ome enssinado
de scriver, ficar-ll-ia a mayor partida. (CSM 110, v.16-17)
ficaria: FP; 3ps; S; mesocl.
Dest' un miragre preçado
vos será per mi mostrado (CSM 111, v.11-12)
será: FT; 3ps; S; procl.
Desto direi un miragre | mui grande que contar oý (CSM 113, v.7)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
e todos loaron
a Virgen por est' e loarán ja maes.( CSM 114, v.53-54)
loarán: FT; 3ppl; S; s/p.
ca soubesse
que a Deus pesaria.
(CSM 115, v.83-84)
pesaria: FP; 3ps; S; s/p.
“Demais, festa será cras
dessa Pascoa santa; (CSM 115, v.86-87)
será: FT; 3ps; S; s/p.
diz: “O que será feito,
eu endeito
o daqui que seu seja,
(CSM 115, v.102-104)
será: FT; 3ps; S; s/p.
242
e diss’: “Ao quinzo
en meu so
o levarei sen falla, (CSM 115, v.124-126)
levarei: FT; 1ps; S; procl.
Ca d’ atanto soon fis
que te porrá conssello (CSM 115, v. 141-142)
porrá: FT; 3ps; S; procl.
e conssello te dará
bõo, se Deus [me] parca. (CSM 115, v.167-168)
dará: FT; 3ps; S; procl.
Contaria-vos de dur
as mui grandes tormentas (CSM 115, v.174-175)
contaria: FP; 1ps; S; encl.
E acha-lo-ás, ben sey,
ena Negra Montanna;
mais atanto te direi
que non leves conpanna, (CSM 115, v.207-210)
acharás: FT; 2ps; S; mesocl.
direi: FT; 1ps; S; procl.
que direi eu, se lle praz,
missa pela luz chãa
e comungar-t-ei en paz,
e a ta alma sãa
e certãa
será de Parayso, (CSM 115, v.264-266)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
comungarei: FT; 1ps; S; mesocl.
será: FT; 3ps; S; s/p.
ca sabian
que llo non leixaria. (CSM 115, v.303-304)
leixaria: FP; 3ps; S; procl.
as cadeas trouxeron
assi como vos direi, (CSM 116, v.52-53)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Dest' un miragre direi que oý,
que fez a Virgen, per com' aprendi, (CSM 118, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Ollos, dizendo: «Sennor, que farey?
Pois est' é morto, nunca vivirey
con meu marido; mas a ti yrei
que a teu Fillo rogues que dos seus (CSM 118, v.20-23)
farey: FT; 1ps; S; s/p.
243
vivirey: FT; 1ps; S; s/p.
yrei: FT; 1ps; S; s/p.
Miragres mostre por ti, ca sei ben
que o fará, desto non dulto ren; (CSM 118, v.25-26)
fará: FT; 3ps; S; procl.
Desto direi un miragre, onde gran façanna
fillaredes, que a Virgen fezo en Espanna (CSM 119, v.6-7)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
fillaredes: FT; 2ppl; S; s/p.
Ca sabe que mais dun dia non será ta vida;
poren faz que, pois ta alma for de ti partida (CSM 119, v.61-62)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Quantos me creveren loarán
a Virgen que nos manten. (CSM 120, v.2-3, refrão)
loarán: FT; 3ppl; S; s/p.
Ca sen ela Deus non averán
Quantos me creveren loarán...
nenas sas fazendas ben farán
Quantos me creveren loarán...
neno ben de Deus connocerán; (CSM 120, v.4-8)
averán: FT; 3ppl; S; s/p.
farán: FT; 3ppl; S; s/p.
connocerán: FT; 3ppl; S; s/p.
E con tod’ esto servi-la-an
Quantos me creveren loarán...
e de seu prazer non sayrán
Quantos me creveren loarán...
e mais d’ outra ren a amarán,
e serán per y de mui bon sen; (CSM 120, v.11-16)
serviran: FT; 3ppl; S; mesocl.
sayrán: FT; 3ppl; S; s/p.
amarán: FT; 3ppl; S; procl.
Ca en ela sempre acharán
Quantos me creveren loarán... (CSM 120, v.18-19)
acharán: FT; 3ppl; S; s/p.
per que atan pagados serán
que nunca desejarán al ren. (CSM 120, v.22-23)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
desejarán: FT; 3ppl; S; s/p.
contra un seu cavaleiro que tal promessa lle fez
que lle guerlanda faria de rosas toda, non d' al. (CSM 121, v.7-8)
244
faria: FP; 3ps; S; procl.
e faz con el a guerlanda e é ssa ajudador,
que assi nos desfaria ben com' a agua o sal.» (CSM 121, v. 47-48)
desfaria: FP; 3ps; S; procl.
Desto direi un miragre que vi
que en Toled' a Virgen fez ali (CSM 122, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Dos mortos fosses por pecados meus,
poren deitar-t-ey ant' os pees seus
da ssa omagen da Madre de Deus.»
(CSM 122, v.40-42)
deitarey: FT; 1ps; S; mesocl.
E disse: «Ja mais non me partirei
daquesta porta, ca de certo sey
que me dará a Madre do bon Rei
mia filla viva; senon, de prumaz (CSM 122, v.50-54)
partirei: FT; 1ps; S; procl.
dará: FT; 3ps; S; procl.
Tragerei doo ou dun anadiu.» (CSM 122, v.55)
tragarei: FT; 1ps; S; s/p.
Darei do meu.» E ben assi o fez; (CSM 122, v.65)
darei: FT; 1ps; S; s/p.
De Santa Maria sinal qual xe quer
valrrá muit' a quen en ela ben crever. (CSM 123, v.3-4, refrão)
valrrá: FT; 3ps; S; s/p.
Ca que quer que seja daquesta Sennor
valrrá muit' a quen de mal coitado for,
e valer-ll-á contra o demo mayor
ali u sobr' ele gran poder ouver. (CSM 123, v.5-8)
valrrá: FT; 3ps; S; s/p.
valerá: FT; 3ps; S; mesocl.
Sempre terrá sigo algu[u]n sinal
de Santa Maria, a que nunca fal
(CSM 123, v.45-46)
terrá: FT; 3ps; S; s/p.
e vos muitas graças lle dade poren,
ca salvo será sempr' o con que tever.» (CSM 123, v.52-53)
será: FT; 3ps; S; s/p.
O que pola Virgen leixa o de que gran sabor á,
sempr[e] aqui lle demostra o ben que pois lle fará. (CSM 124, v.3-4, refrão)
fará: FT; 3ps; S; procl.
245
E dest' un mui gran miragre vos contarei, (CSM 124, v.5)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
e mostrou Santa Maria, Madre de Nostro Sennor,
or un ome. E quen esto oyr, sabor averá (CSM 124, v.12-13)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
Enton os que o matavan disseron: «E que será (CSM 124, v.28)
será: FT; 3ps; S; s/p.
(...)diss': «Amigo, sempr' eu quix
servir a Santa Maria, a que nunca falirá (CSM 124, v.37-38)
falirá: FT; 3ps; S; s/p.
Esto fez Santa Maria, a Sennor que nos manten,
pola ssa gran piadade, e sempre nos manterrá.
(CSM 124, v.47-48)
manterrá: FT; 3ps; S; procl.
E desta razon vos direi | un miragre fremos’ assaz, (CSM 125, v.8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
“Ide fazer
Com’ eu a donzela aja | log’ esta noit’ en meu poder;
Senon, en ha redoma | todos vos ensserraria.” (CSM 125, v.29-31)
ensserraria: FP; 1ps; S; procl.
ca o demo, de mal cho, | en tal guisa a encendeu
que diss’ enton a seu padre | que logo sse casaria (CSM 125, v.60-61)
casaria: FP; 3ps; S; procl.
que log’ enton con sas mãos | ant’ eles sse mataria. (CSM 125, v.66)
mataria: FP; 3ps; S; procl.
che darei onrradamente | mia filla, e tu seerás
como en logar de fillo; | e se morrer erdarás
mui grand’ algo que eu tenno, | que gaanney sen tricharia.
(CSM 125, v.74-76)
darei: FT; 1ps; S; procl.
seerás: FT; 2ps; S; s/p.
erdarás: FT; 2ps; S; s/p.
Os esposoyros juntados | foron logo, com’ apres’ ey,
e outro dia mannãa | casaron; mais, que vos direy?
(CSM 125, v.78-79)
direy: FT; 1ps; S; procl.
Esto son será dest’ ano, | per boa fe, nen deste mes;
mais lexa esta loucura | e torna-t’ a crerezia. (CSM 125, v.95-96)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E eu farei ao bispo | que venna por ti log’ aça,
e di-ll’ esto que che dixe, | e el ben te consellará
246
como non percas ta alma; | e senon, Deus se vingará
de ti por quanto quisische | do demo ssa compania.” (CSM 125, 98-101)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
consellará: FT; 3ps; S; procl.
vingará: FT; 3ps; S; procl.
A donzela disse logo: | “Sennor, o que vos aprouguer
farei mui de boa mente; | mais este, de que sôo moller,
com’ o leixarei?” (diss’ ela). (...) (CSM 125, v. 108-110)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
leixarei: FT; 1ps; S; procl.
E con taces a yan fillar,
mas per ren non lla podian tirar
nen con baesta que yan armar; (CSM 126, v.15-17)
yan fillar: FP; 3ppl; Air+inf.; procl.
yan armar: FP; 3ppl; Air+inf.; s/p.
E desto mui gran miragre vos direi que ha vez
a Virgen Santa Maria na eigreja do Poe fez (CSM 127, v.7-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
El disse que o fezera; pois conssellaron assi
que o pe tallar mandasse e poderia entrar. (CSM 127, v.39-40)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
E sonnou que a omagen lle diss'. «Aquesto farás:
filla o pee de teu fillo, e non esperes a cras,
mais pon-llo u x' ant' estava, e ta mão tragerás
sobr' ele eno meu nome, e eu farey-o sãar.» (CSM 127, v.52-55)
farás: FT; 2ps; S; s/p.
tragerás: FT; 2ps; S; s/p.
De tal razon un miragre | vos direi maravilloso, (CSM 128, v.7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Ela respos-lle; “Farey-o | se meu conssello fillardes.”
(CSM 128, v.17)
farey: FT; 1ps; S; encl.
e se vos esto fezerdes,
de mel será e de cera | vossa casa avondada.”
(CSM 128, v.24-25)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E mostrar-vos-ei tal cousa, | qual viuda nen oyda
nunca foi.” (...) (CSM 128, v.42-43)
mostrarei: FT; 1ps; S; mesocl.
E poren seu entendedor serei
enquant' eu viva, e loarei
e de muitos bées que faz direi
247
e miragres grandes, ond' ei sabor. (CSM 130, v.34-37)
serei: FT; 1ps; S; s/p.
loarei: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
E dest' un miragre, de que gran sabor
averedes, direi que fez a Sennor, (CSM 131, v.6-7)
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Porque en meu Fillo fias, o gran Rey,
non quix que morresses, e ar guardar-t-ei
enquant' aqui fores, e pois sacar-t-ey
daqui, e desto non ajas que temer.» (CSM 131, v.61-64)
guardarei: FT; 1ps; S; mesocl.
sacarey: FT; 1ps; S; mesocl.
Quen leixar Santa Maria
por outra, fará folia. (CSM 132, v.3-4, refrão)
fará: FT; 3ps; S; s/p.
fará loucura provada,
que mayor non poderia. (CSM 132, v.10-11)
fará: FT; 3ps; S; s/p.
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
ca de chão lle disseron
que faria gran seu dano
se el moller non prendia. (CSM 132, v.57-59)
faria: FP; 3ps; S; s/p.
E demais que lle darian
ha menynna donzela
das mais ricas que sabian
ena terra e mais bela,
porque ambos vivirian
sen coita e sen mazela
e sen toda tricharia.
(CSM 132, v.61-66)
darian: FP; 3ppl; S; procl.
vivirian: FP; 3ppl; S; s/p.
por servir a que senlleyra
foi e será en nobreza,
que os seus amigos guia, (CSM 132, v.153-155)
será: FT; 3ps; S; s/p.
A Virgen en que é toda santidade
poder á de toller tod' enfermidade. (CSM 134, v.4-5, refrão)
á de toller: FT; 3ps; Aaver+de+inf.; s/p.
248
Diss’: Amig’, assi farey
que cras con vosco m’ irei
e atanto buscarey
aquel que foi esposado
vosco, que o acharey,
e logo vo-lle darey
por aver a Deus pagado.” (CSM 135, v.64-70)
farey: FT; 1ps; S; s/p.
irei: FT; 1ps; S; procl.
buscarey: FT; 1ps; S; s/p.
acharey: FT; 1ps; S; procl.
darey: FT; 1ps; S; procl.
Poren nunca mi averá
erg’ a quen m’ ela dará;
e vos, quitade-vos ja
d’ irdes contra seu mandado,
mais levade-m’ acolá
u ést’ o que seerá
meu marid’ e meu amado.” (CSM 135, v.96-102)
averá: FT; 3ps; S; procl.
dará: FT; 3ps; S; procl.
seerá: FT; 1ps; S; s/p.
e quant’ ha col
do seu non filles, ca sol
por tanto serás rastrado.” (CSM 135, v.166-118)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
Desto direi un miragre que a Groriosa
fez grand' en terra de Pulla come poderosa (CSM 136, v.7-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
E dest' un mui gran miragre direi que avo
a un cavaleiro que era seu, non allo,
(CSM 137, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Quen a Santa Maria de coraçon
rogar, oir-ll-á ela ssa oraçon. (CSM 138, v.5-6, refrão)
oirá: FT; 3ps; S; mesocl.
se ll' algo pedir assi ou demandar,
dar-llo-á, que sol non lle dirá de non. (CSM 138, v.9-10)
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
dirá: FT; 3ps; S; procl.
e disse: «Se queres, logo veerán
teus ollos tan ben come outra sazon (CSM 138, v.44-45)
veerán: FT; 3ppl; S; s/p.
249
Viron, e ta dinidade averás,
e quanto perdiste todo cobrarás
Diss' el: «Sennor, ante mi tu mostrarás
o que mais teu Fillo, se el mi perdon, (CSM 138, v.47-50)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
cobrarás: FT; 2ps; S; s/p.
mostrarás: FT; 2ps; S; s/p.
Quand' esto diss', a omagen de Cristo
respos ao menynno: «Paparás
cras mig' en Ceo; e pois que me visto
ouveres, senpre pois migo seerás (CSM 139, v.50-53)
paparás: FT; 2ps; S; s/p.
seerás: FT; 2ps; S; s/p.
Quen muit’ onrrar o nome da Sennor conprida,
dar-ll-á en este mundo e no outro vida.
(CSM 141, v.4-5, refrão)
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
Dar-ll-á en este mundo vida e saude
e depois Parayso, assi Deus m’ ajude,
u verá el e ela e ssa gran vertude
e ssa onrra, que nunca mais será falida. (CSM 141, v.6-9)
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
verá: FT; 3ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
e seria são
e ssa vellece lle seria conssomida. (CSM 141, v.38-39)
seria: FP; 3ps; S; procl.
Com' ha vez acorreu ant' el Rey
Don Affonsso, com' ora vos direi,
(CSM 142, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Mas el Rey deu vozes: «Quen será, quen (CSM 142, v.23)
será: FT; 3ps; S; s/p.
disse: «Sennor, eu adurey aquen
(CSM 142, v.28)
adurey: FT; 1ps; S; s/p.
mas el Rei disse: «Non averá mal;
ca non querrá a Madr' esperital
que nos guarda e nos en poder ten.» (CSM 142, v.46-48)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
querrá: FT; 3ps; S; s/p.
Quen alga cousa quiser pedir
a Deus por Santa Maria,
se de seus pecados se repentir,
250
ave-lo-á todavia. (CSM 143, v.3-6, refrão)
averá: FT; 3ps; S; mesocl.
E disse: «Se quisessedes gracir
est' a Deus e a ssa Madre servir
e de vossos pecados vos partir,
a chuvia logo verria. (CSM 143, v.29-32)
verria: FP; 3ps; S; s/p.
e sei que nos oyr
querrá a Virgen que Deus foi parir, (CSM 143, v.36-37)
querrá: FT; 3ps; S; s/p.
Averemos chuvia que nos conprir
e per que poderemos ben guarir
e daquesta mui gran coita sair,
dest' eu fiador serya(CSM 143, v.34-37)
averemos: FT; 1ppl; S; s/p.
poderemos: FT; 1ppl; S; s/p.
serya: FP; 1ps; S; s/p.
O que pola Virgen de grado seus dões
der, dar-vo-ll-á ela grandes galardões. (CSM 145, v.3-4, refrão)
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
dizendo: “Maa gent’ y á
de teus emigos sandeus,
ben sei que ren non te guarrá
de mort’. (CSM 146, v.48-51)
guarrá: FT; 3ps; S; procl.
“Ca”, diss’ el, “sey
que a Santa Virgen de prez
me guarrá, sol dulta non ei.”
E un desses romeus lo fez.
Mas da madre, que vos direi? (CSM 146, v.73-77)
guarrá: FT; 3ps; S; procl.
direi: FT; 1ps; S; procl.
foi log’ alá, seendo fis
que Deus dar-ll-ia como quer
ser fillo sen maravedis
(CSM 146, v.83-85)
daria: FP; 3ps; S; mesocl.
Ora verey o que farás
ou se deste meu mal te dol,
ca bem sei que poder end’ ás
de o fazer. E muit’ é fol
o que non cree que darás
ben aos teus e que ssa prol
251
non queres; (CSM 146, v.99-104)
verey: FT; 1ps; S; s/p.
farás: FT; 2ps; S; s/p.
ás de o fazer: FT; 2ps; Aaver+de+inf.; procl.
darás: FT; 2ps; S; s/p.
E daquest' un miragre mostrarei en tal guisa
que dos outros da Virgen será mui grand' enquisa, (CSM 148, v.5-6)
mostrarei: FT; 1ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
e quen cree ben esto, o demo nen sas artes
nunca lle terrán dano, se en elo atura.
(CSM 149, v. 50-51)
terrán: FT; 3ppl; S; procl.
esto quer Deus que seja polo ome mesquynno,
que terria por crua cousa comer mino (CSM 149, v.59-60)
terria: FP; 3ps; S; s/p.
Dest’ un fremoso miragre | vos direy que fez a Virgen, | Madre de Deus groriosa, (CSM
151, v.5)
direy: FT; 1ps; S; procl.
U a viu o cavaleyro, foi con medo [e]spantado
e preguntou-lle quen era. Diss' ela: «Dar-ch-ei recado:
eu sõo Santa Maria, (…) (CSM 152, v.26-28)
darei: FT; 1ps; S; mesocl.
es na alma, poren cheiras com' este manjar astroso,
per que yrás a inferno, que é cho d' amargores.» (CSM 152, v.33-34)
yrás: FT; 2ps; S; s/p.
Como ha moller de Gasconna,
que desdennava a romaria de Santa Maria de Rocamador,
disse que, sse a alá non levass' ha sela
en que siia, que nunca yria alá. (CSM 153, introdução)
yria: FP; 3ps; S; s/p.
Quen quer que ten en desden
a Santa Maria,
gran mal lle verrá poren.
(CSM 153, v. 4-6, refrão)
verrá: FT; 3ps; S; procl.
Disse-ll' ela: «Vay e ven,
ai, louca, sandia,
ca eu non m' irei daquen, (CSM 153, v.27-29)
irei: FT; 1ps; S; procl.
252
dizendo: «tal será quen
fillar ousadia
contra quen lle non conven.» (CSM 153, v.43-45)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Como un tafur tirou con ha saeta contra
o ceo con sanna porque perdera, e cuidava que fi[ri]-
ria a Deus ou [a] Santa Maria (CSM 154, v.1-3)
firiria: FP; 3ps; S; s/p.
E pois armou a baesta, | disse: “Daquesta vegada
ou a Deus ou a as Madre | darei mui gran saetada.” (CSM 154, v.21-22)
darei: FT; 1ps; S; s/p.
El deu-lle por pedença | que a Ultramar romeu
Fosse, e el respondeu-lle: | “Esto vos non farei eu.”
(CSM 155, v.22-23)
farei: FT; 1ps; S; procl.
Dest' un mui maravilloso
miragre vos contarey,
que fez, e mui piadoso,
a Madre do alto Rei
por un crerigo, que foran a furt' ereges prender
porque de Santa Maria sempr' ya loor dizer. (CSM 156, v.6-11)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
Quen bõa dona querrá
loar, lo' a que par non á,
Santa Maria. (CSM 160, v.2-4)
querrá: FT; 3ps; S; s/p.
E par nunca ll' achará,
pois que Madre de Deus foi ja,
Santa Maria. (CSM 160, v.5-7)
achará: FT; 3ps; S; procl.
Pois Madre de Deus foi ja,
e Virgen foi e seerá
Santa Maria. (CSM 160, v.8-10)
seerá: FT; 3ps; S; s/p.
E Virgen foi e será;
porende cabo del está
Santa Maria. (CSM 160, 11-13)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Poren cabo del está,
u sempre por nos rogará,
Santa Maria. (CSM 160, 14-16)
rogará: FT; 3ps; S; procl.
253
U por nos lle rogará
e del perdon nos gãará
Santa Maria. (CSM 160, 17-19)
rogará: FT; 3ps; S; procl.
gãará: FT; 3ps; S; procl.
E perdon nos gãará
e ao demo vencerá
Santa Maria. (CSM 160, 20-22)
gãará: FT; 3ps; S; procl.
vencerá: FT; 3ps; S; s/p.
E o demo vencerá
e nos consigo levará
Santa Maria. (CSM 160, v.23-25)
vencerá: FT; 3ps; S; s/p.
levará: FT; 3ps; S; procl.
E daquesto vos contarey
ora un mui gran miragre que fez (CSM 162, v.12-13)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
e el foi-ss’ aa eigreja, | cuidando y guarecer,
creendo en toda guisa | que non seria britada. (CSM 164, v.18-19)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Este seus omes tragia con crischãos toda vez
por saber mais sa fazend', e un deles saber-lle fez
que, sse fillasse Tortosa, gãaria y gran prez,
demais quen lla defendesse non avia tal nen qual. (CSM 165, v.15-18)
gãaria: FP; 3ps; S; s/p.
(...) e pois esto sey,
guerra per nulla maneira con ela non fillarey,
e daqui me torno logo, e fas tange-lo tabal.» (CSM 165, v.66-68)
fillarey: FT; 1ps; S; s/p.
Con esta enfermidade atan grande que avia
prometeu que, se guarisse, a Salas logo irya
e ha livra de cera cad' ano ll' ofereria; (CSM 166, v.10-12)
irya: FP; 3ps; S; s/p.
ofereria: FP; 3ps; S; procl.
Quen quer que na Virgen fia e a roga de femença,
valer-ll-á, pero que seja d' outra lee en creença. (CSM 167, v.3-4, refrão)
vallerá: FT; 3ps; S; mesocl.
Ca eu levarei meu fillo a Salas desta vegada
con ssa omagen de cera, que ja lle tenno conprada,
e velarei na eigreja da mui benaventurada
254
Santa Maria, e tenno que de mia coita se sença.» (CSM 167, v.20-23)
levarei: FT; 1ps; S; s/p.
velarei: FT; 1ps; S; s/p.
diss' aa Virgen: «Se non mente
ta lee, dá-me meu fillo, e farey tig' avença.» (CSM 167, v.27-28)
farey: FT; 1ps; S; s/p.
Seu fillo, Deus e om’ e Rey,
Poder lle deu, qual vos direy, (CSM 168, v.7-8)
direy: FT; 1ps; S; procl.
E pois viu que non resurgiu,
en un eirado o sobiu
e contra Salas comediu
que o yria alt’ erger. (CSM 168, v.42-45)
yria: FP; 3ps; S; procl.
E daquest' un miragre direi grande, que vi
des que mi Deus deu Murça, e oý outrossi (CSM 169, v.8-9)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
mas diss' el: «Non farei,
ca os que Mariame desama, mal os trilla. (CSM 169, v.50-51)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
E porend' a eigreja sua quita é ja,
que nunca Mafomete poder y averá;
ca a conquereu ela e demais conquerrá
Espanna e Marrocos, e Ceta e Arcilla. (CSM 169, v.63-66)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
conquerrá: FT; 3ps; S; s/p.
De mi vos digo que a loarei
mentre for vivo, e sempre direi
ben dos seus bes (...) (CSM 170, v. 24-26)
loarei: FT; 1ps; S; procl.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
e poren querrei retraer
ontr’ os teus mui groriosos
miragres
(CSM 171, v.66-68)
querrei: FT; 1ps; S; s/p.
A Madre de Jesu-Cristo | que ceos, terras e mares
Fez, poder á d’ as tormentas | toller en todos logares. (CSM 172, v.3-4)
á de toller: FT; 3ps; Aaver+de+inf.; s/p.
E disse-ll' enton: «Mesquo, macar mal me dostaste,
muit' ei eu de ti gran doo de que ta lingua tallaste;
255
mais sãar-t-ei ora dela, porque en mi confiaste, (CSM 174, v.32-34)
sãarei: FT; 1ps; S; mesocl.
E porque te repentiste, sãar-t-ei ora de chão.» (CSM 174, v.37)
sãarei: FT; 1ps; S; mesocl.
Desto direi un miragre | de gran maravill’ estranna
que mostrou Santa Maria | por un Romeu d’ Alemanna (CSM 175, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
E dest’ un mui gran miragre | direi que oý dizer (CSM 176, v.5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
prometeu log[o] assi
que sse o Santa Maria | de Salas tirasse d’ i,
que seria seu romeiro | e dar-ll-ia mui grãados (CSM 176, v.11-13)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
daria: FP; 3ps; S; mesocl.
Dões e a ssa omagen | faria, com’ aprix eu,
de cera que y levasse, | e seria sempre seu
servo. (CSM 176, v.15-17)
faria: FP; 3ps; S; s/p.
seria: FP; 3ps; S; s/p.
E disse-lle: “Vai, non temas, | ca per ren non te verá
null' ome que mal te faça, (CSM 176, v.25-26)
verá: FT; 3ps; S; procl.
e faagando-o muito, dizendo: «Este don teu
seja daquesta muleta, e dar-te-ll-ei org' e palla.» (CSM 178, v.13-14)
darei: FT; 1ps; S; mesocl.
Esta Sennor de mesura
fisica sobre natura
mostrou e quis aver cura
da moller, direi qual, (CSM 179, v.10-13)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
De como é Donzela, Ysaýa
en sas profecias o foi mostrar,
u disse que virgen conceberia
(CSM 180, v.34-36)
conceberia: FP; 3ps; S; s/p.
Como foi Pobre, queno osmaria,
a que seu Fillo Deus ya deitar
no preseve,
(CSM 180, v.41-43)
osmaria: FP; 3ps; S; procl.
ya deitar: FP; 3ps; Air+inf.; s/p.
256
Por Reynna tod' ome a terria
que a visse a seu Fillo levar
daqueste mund', (CSM 180, v.48-50)
terria: FP; 3ps; S; procl.
Outra Dona seer non poderia
atal com' esta, (CSM 180, v.55-56)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
Deus en ela carne d' ome verria,
e como serva se foi omildar
u lle disse: «Farei quant' el mandar.» (CSM 180, v.64-66)
verria: FP; 3ps; S; s/p.
farei: FT; 1ps; S; s/p.
Dest’ un maravilloso
miragre mui fremoso
vos direi
(CSM 182, v.5-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Desto direi un miragre que fezo en Faaron
a Virgen Santa Maria (CSM 183, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
En aquel castel' avia omagen, com' apres' ei
da Virgen mui groriosa, feita como vos direi
de pedra ben fegurada, (CSM 183, v.10-12)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E de tal razon com' esta un miragre mui fremoso
vos direi que fez a Virgen, Madre do Rei Poderoso, (CSM 184, v.7-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
e disse-lle: “Desta vez
vos darei eu o castelo | de Chincoya en poder.”
(CSM 185, v.17-18)
darei: FT; 1ps; S; procl.
Respos-ll’ ele: | “Se eu vosso poder ei,
Mia fala cono alcaide | pêra un dia porrei;
e estando ena fala, | ben ali o prenderei,
e desta maneira tenno | que o podedes aver.” (CSM 185, v.20-23)
porrei: FT; 1ps; S; s/p.
prenderei: FT; 1ps; S; procl.
E diss’ el rei de Grãada: | “Eu por mi, u a [l] non á,
Quero alá yr contigo | e verei o que será;
mais se me tu desto mentes, | log’ y al non averá,
che mandarei a cabeça | d’ antr’ os teus ombros toller.” (CSM 185, v.25-28)
verei: FT; 1ps; S; s/p.
será: FT; 1ps; S; s/p.
257
averá: FT; 1ps; S; s/p.
mandarei: FT; 1ps; S; procl.
“De mais, non levades arma | e ydes assi en cós,
e com` os mouros son falssoso, | quiça travarán de vos; (CSM 185, v. 45-46)
travarán: FT; 3ppl; S; s/p.
Que estava na ciada. | E disse-ll` esta razon:
que lle dissess` a verdade | do castelo e, se non,
escabeça-lo faria. (CSM 185, v. 55-57)
faria: FP; 3ps; S; s/p.
Mortos de cima do muro. | e diss` el rei: “Nulla prol
non ei de mais conbatermos, | e ter-m-ia por fol
sse contra Maria fosse, (CSM 185, v. 85-87)
ei de conbatermos: FT; 1ps; Aaver+de+inf.; s/p.??
teria: FP; 1ps; S; mesocl.
Quen na Virgen santa muito fiará,
se o vir en coita, acorre-lo-á. (CSM 186, v.3-4, refrão)
fiará: FT; 3ps; S; s/p.
acorrerá: FT; 3ps; S; mesocl.
per que lle buscou morte descomal,
como vos per mi ora dito será. (CSM 186, v.17-18)
será: FT; 3ps; S; s/p.
ter un mour' en seu leito cabo si,
ben tenno que muito ch' ende pesará(CSM 186, v.27-28)
pesará: FT; 3ps; S; procl.
mais la madre lle disse: «Non faças, non;
mais aa jostiça mostra ta razon,
e veerás que dereito che dará(CSM 186, v.36-38)
veerás: FT; 2ps; S; s/p.
dará: FT; 3ps; S; procl.
disseron: «Que será
Quen na Virgen santa muito fiará...
Daquesta moller que tan gran torto fez, (CSM 186, v.43-45)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E por aquesto no fogo arderá, (CSM 186, v.48)
arderá: FT; 3ps; S; s/p.
e poren tenno que quen en ti crever
que nunca en ta mercee falirá
(CSM 186, v.57-58)
falirá: FT; 3ps; S; s/p.
258
e a dona do fogo remãeceu
salva per aquela que nos salvará. (CSM 186, v.77-78)
salvará: FT; 3ps; S; procl.
e miragre bel
fez aquela que muitos outros fará. (CSM 186, v.82-83)
fará: FT; 3ps; S; s/p.
E dest’, amigos, un miragre direi
que fez a Virgen, Madre do alto Rei, (CSM 187, v.4-5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
que nos acorrer queira en est[e] ano tan greu,
ca muito mais ca esto por ela nos faria.” (CSM 187, v.46-47)
faria: FP; 3ps; S; procl.
Desto ela un miragre mostrou, que vos eu direi,
a que fix bon son e cobras, porque me dele paguei; (CSM 188, v.7-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
dizendo: «Béeita sejas, Madre de Nostro Sennor,
que a ta gran lealdade non á nen averá par.» (CSM 188, v.39-40)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
A ssi vir ha bescha come dragon toda feita, de que foi muit'espantado;
pero non fugiu ant' ela, ca med' ouve se fogisse que seria acalçado; (CSM 189, v.11-12)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Muito faremos mal sen
se o temermos de ren, (CSM 190, v.7-8)
faremos: FT; 1ppl; S; s/p.
O que de Santa Maria | as mercee ben gaanna,
de tod’ o ocajon o guarda, | já non será tan estranna. (CSM 191, v.3-4, refrão)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E desto contado
vos será per mi
miragr' e mostrado
quant' end' aprendi,
fremos' aficado,
e ben ascuitado
será, per meu grado,
e dev' a seer, (CSM 192, v.7-14)
será: FT; 3ps; S; procl.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E disse: «Pagão,
sse queres guarir,
do demo de chão
259
t' ás a departir
e do falsso, vão, (CSM 192, v.98-102)
ás a departir: FT; 2ps; Aaver+a+inf.; procl.
«Mais mannãa crara
querrei receber (CSM 192, v.121-122)
querrei: FT; 1ps; S; s/p.
E daquest' un gran miragre vos direi e verdadeiro,
que fezo Santa Maria, Madre do Rei josticeiro, (CSM 193, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
poren por servir a ela seerei en esta guerra.»
(CSM 193, v.53)
seerei: FT; 1ps; S; s/p.
Quena festa e o dia
da mui Groriosa
quiser guardar todavia,
seer-ll-á piadosa. (CSM 195, v.3-6)
seerá: FT; 3ps; S; mesocl.
E desto contado
per mi mui de grado
será e mostrado
que a que nos guia, (CSM 195, v.7-10)
será: FT; 3ps; S; s/p.
que el lle daria
per que menguadosa
nunca fosse nen mesqa, (CSM 195, v. 42-44)
daria: FP; 3ps; S; procl.
dizend': «Ai, coitosa,
nunca mais serei chamada
virgen omildosa.» (CSM 195, v.59-61)
serei: FT; 1ps; S; s/p.
E di log' a essa
que é abadessa,
que nunca condessa
sigo colleria
que mais proveitosa
lle seja, ca, mia promessa,
non é revoltosa.» (CSM 195, v.95-101)
colleria: FP; 3ps; S; s/p.
O convent' estando
a el asperando
muit' e preguntando
quando chegaria; (CSM 195, v.11-114)
260
chegaria: FP; 3ps; S; s/p.
Vida e deserta;
de que será certa
quando vir aberta-
mente que nascia (CSM 195, v.143-146)
será: FT; 3ps; S; s/p.
e poren vos direi ora | o que ll’ avo un dia, (CSM 196, v.14)
direi: FT; 1ps; S; procl.
mui mayor poder sa Madr[e] á en os ressucitar;
e porend' un gran miragre vos direi de razon tal.
(CSM 197, v.9-10)
direi: FT; 1ps; S; procl.
mais eu, porque ele seja perdõado, sen falir
yrei alá de bon grado e farey este jornal. (CSM 197, v.34-35)
yrei: FT; 1ps; S; s/p.
farey: FT; 1ps; S; s/p.
e poi-lo oyren, creo que por mui maravilloso
o terrán, e que metudo dev' a seer ontr' os preçados. (CSM 198, v.8-9)
terrán: FT; 3ppl; S; procl.
Poren direi un miragre que fez por un peliteiro (CSM 199, v.12)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Santa Maria loei
e loo e loarei. (CSM 200, v.2-3)
loarei: FT; 1ps; S; s/p.
a mi á ela mostrados
mais bes, que contarei.
(CSM 200, v.6-7)
contarei: FT; 1ps; S; s/p.
por que sabiades
que poren a servirey. (CSM 200, v.16-17)
servirey: FT; 1ps; S; procl.
deu-lles o que merecian,
assi como provarei.
(CSM 200, v.21-22)
provarei: FT; 1ps; S; s/p.
por que sas grandes nobrezas
quantas mais poder direi. (CSM 200, v.26-27)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
por que sabiades, varões,
que por ela morrerei. (CSM 200, v.36-37)
morrerei: FT; 1ps; S; s/p.
261
Muit’ é mais a piadade de Santa Maria
que quantos pecados ome fazer poderia. (CSM 201, v. 3-4, refrão)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
Mais se te ben partires | deste mal que fezeste,
perdõar-cha-á meu Fillo, | ca eu t’ ajudaria.” (CSM 201, v. 62-63)
perdõará: FT; 3ps; S; mesocl.
e achar nona podia, | e cuidava que per ren
per el já non ss’ acharia, | nen per outro sabedor. (CSM 202, v. 14-15)
acharia: FP; 3ps; S; procl.
Quen polo amor de Santa | Maria do seu fazer
algun ben, dar-vo-ll-á ela | que dé, se o non tever. (CSM 203, v. 3-4, refrão)
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
ca vos direi un miragre | que quis pouque’ i á mostrar
a hũa sua amiga | que era santa moller. (CSM 203, v. 7-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
dizian que poderia | daquela guarir assy
como poderia morto | de sso terra resorgir. (CSM 204, v. 16-17)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
Quen souber Santa Maria | ben de coraçon amar,
pero o tent' o diabo, | nunca o fará errar, (CSM 206, v. 3-4, refrão)
fará: FT; 3ps; S; procl.
e porque me deste beijo | ora tan muito paguei,
a mia mão por aquesto | cona outra cortarei." (CSM 206, v. 26-27)
cortarei: FT; 1ps; S; s/p.
Se ome fezer de grado pola Virgen algun ben,
demostrar-ll' averá ela sinaes que lle praz en. (CSM 207, v. 4-5, refrão)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
Desto vos direi miragre, ond' averedes sabor,
que mostrou Santa Maria con merce' e con amor (CSM 207, v. 6-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
«Abellas, comed' aquesto, ca eu o vinno bevi;
e se vos obrar sabedes, verei que faredes y.» (CSM 208, v. 31-32)
verei: FT; 1ps; S; s/p.
faredes: FT; 2ppl; S; s/p.
(...) «Verei que obra feit' an
na ostia as abellas.» E enton com' atrevudo (CSM 208, 37-38)
verei: FT; 1ps; S; s/p.
262
Mas en este torto per ren non jarei
que non cont' o ben que del recebud' ei (CSM 209, v. 7-8)
jarei: FT; 1ps; S; s/p.
Poren vos direi o que passou per mi,
jazend' en Bitoira enfermo assi (CSM 209, v. 17-18)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Muito foi noss' amigo | u diss': "Ave Maria"
aa Virgen be~eita, | e que Deus prenderia
en ela nossa carne | con que pois britaria
o inferno antigo. (CSM 210, v. 5-8)
prenderia: FP; 3ps; S; s/p.
britaria: FP; 3ps; S; s/p.
que Deus ome seria | pola grand' omildade
que ouv' a Virgen sigo.
(CSM 210, v. 12-13)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Tod’ aquel que ploa Virgen | quiser do seu ben fazer,
cousa que lle faça mingua | grande non á de perder. (CSM 212, v. 4-5)
á de perder: FT; 3ps; A; s/p.
ca non acharia ome | que llo podess’ entender. (CSM 212, v.49)
acharia: FP; 3ps; S; s/p.
e de como foi o feito contar-vos-ei a maneira: (CSM 213, v. 9)
contarei: FT; 1ps; S; mesocl.
que en romeria fosse a Teren', e piadade
averia de la Virgen mui conprida de bondade, (CSM 213, v. 38-39)
averia: FP; 3ps; S; s/p.
Cousa, que o guardaria de non prender mal a torto,
e que, tend' el verdade, non fosse preso nen morto;
(CSM 213, v. 41-42)
guardaria: FP; 3ps; S; procl.
E daquest' un gran miragre vos direi, que na fronteira
mostrou y Santa Maria, a Sennor mui verdadeira (CSM 215, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Que lle disso: «Pois meu sodes, mui grand' algo vos darei;
e vossa moller tragede a un mont', e falarey
con ela e poren rico sen mesura vos farey(CSM 216, v. 15-17)
darei: FT; 1ps; S; procl.
falarey: FT; 1ps; S; s/p.
farey: FT; 1ps; S; procl.
Ela yndo per carreyra, viu eigreja cabo ssy
estar de Santa Maria e disso: «Quer' eu aly
263
folgar ora ha peça, e andaremos des y.» (CSM 216, v. 30-32)
andaremos: FT; 1ppl; S; s/p.
«Vai, demo cho de mal,
cuidasch' a meter a dano a mia serventa leal;
mas de quanto tu cuidaste eu cho tornarei en al,
ca te tollo que non possas ja mais fazer-lle pesar.» (CSM 216, v. 45-48)
tornarei: FT; 1ps; S; procl.
E de tal razon miragre vos direi mui saboroso: (CSM 219, v. 9)
direi: FT; 1ps; S; procl.
poren mercee te peço que me perdões, ca sey
que se me tu perdõares, que me non será sannoso (CSM 219, v. 48-49)
será: FT; 1ps; S; procl.
E eu aqueste miragre farei põer entr' os teus
miragres, porque ben creo que é mui maravilloso.» (CSM 219, v. 53-54)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
E quena non loará
A que todo mal
Tolle e todo ben nos dá? (CSM 220, v. 2-4, refrão)
loará: FT; 3ps; S; procl.
(...) ca de loor conprida
éste e senpre será. (CSM 220, v. 7-8)
será: FT; 3ps; S; s/p.
e Deus em nos por ela | mostra miragres quantos
por outra non mostrará. (CSM 220, v. 17-18)
mostrará: FT; 3ps; S; s/p.
E porend' un gran miragre direi, que avo quando
era moço peque[ni]nno o mui bon Rei Don Fernando,
(CSM 221, v. 10-11)
direi: FT; 1ps; S;s/p.
Quen ouver na Groriosa | fiança com fe conplida
Non lle nozirá poçõya, | e dar-ll-á por sempre vida. (CSM 222, v. 4-5)
nozirá: FT; 3ps; S; procl.
dará: FT; 3ps; S; mesocl.
e demais pêra as almas | seer-vos-á proveitoso;
e per mi, quant’ ei apreso, | non será cousa falida. (CSM 222, v. 13-14)
seerá: FT; 3ps; S; mescocl.
será: FT; 3ps; S; s/p.
Porend' un miragre seu vos direi, pois m'ascuitades,
da Virgen a que deu Deus poder sobr' enfermidades
de as toller; e sei ben que, se y mentes parades,
264
veredes que á poder sobre toda creatura. (CSM 224, v. 10-13)
direi: FT; 1ps; S; procl.
veredes: FT; 2ppl; S;s/p.
Ca u pariu sa moller, naceu-ll' enton hũa filla
que ben terredes que foi muit' estranna maravilla (CSM 224, v. 30-31)
terredes: FT; 2ppl; S;s/p.
E daquest' un gran miragre vos será per mi contado, (CSM 225, v. 6)
será: FT; 3ps; S; procl.
Ontr' os outros que oystes, e tenn' eu que atal éste
o que vos contarei ora que avo a un preste
que dizia senpre missa da Madre do Rei celeste; (CSM 225, v. 11-13)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
E dest' un miragre per quant' aprendi
vos contarei ora grande, que oý (CSM 226, v. 6-7)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
Poren a loemos senpr', amigos meus,
ca esta nos ceos nos fará entrar. (CSM 226, v. 68-69)
fará: FT; 3ps; S; procl.
Dereit' é de loores dar
a aquela que sempre dá
seu ben que nunca falirá; (CSM 230, v. 4-6)
falirá: FT; 3ps; S; s/p.
E disse: «Se me creveres
e meu mandado fezeres
e as pedras alçar queres,
porrei t' end' eu ena via.
(CSM 231, v. 50-53)
porrei: FT; 1ps; S; encl.
Esto é que filles çedo
tres menos mui sen medo,
e farei-lles alçar quedo
as pedras sen gemetria.»
(CSM 231, v. 55-58)
farei: FT; 1ps; S; encl.
Aa Virgen groriosa de Vila-Sirga, ca sey
que sse eu aquesto faço, que meu açor acharei(CSM 232, v.31-32)
acharei: FT; 1ps; S; s/p.
Desto direi un miragre | que mostrou Santa Maria (CSM 233, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Dizendo-lle “Morreredes.” | Mas el nonos asperava,
(CSM 223, v. 15)
morreredes: FT; 2ppl; S; s/p.
265
E ali Santa Maria | o anparou, que non erra,
en com’ agor’ oyredes, | se esteverdes calados. (CSM 233, v. 22-23)
oyredes: FT; 2ppl; S; s/p.
destes que me matar queren | par Deus, muitos de pesares
te farán os malcreentes | que andan desasperados.” (CSM 233, v. 32-33)
farán: FT; 3ppl; S; procl.
E daquest' un gran miragre vos direi desta razon, (CSM 235, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Mas eu o desfarei todo o que eles van ordir,
que aquelo que desejan nunca o possan conprir;
ca meu Fillo Jhesu-Christo sabor á de sse servir,
e d'oi mais mui ben te guarda de gran pecado mortal.» (CSM 235, v. 30-33)
desfarei: FT; 1ps; S; procl.
á de sse servir: FT; 3ps; A; procl.
os outros pera o demo foron e, sse Deus quiser,
assi yrá tod' aquele que atal feito fezer, (CSM 235, v. 76-77)
yrá: FT; 3ps; S; s/p.
Como ha moller perigoou no mar, e tragia un fillo pequeno nos braços;
e feze-a Santa Maria per cima das aguas andar de pe,
assi como yria per un mui bon chão. (CSM 236, v. 1-3)
yria: FP; 3ps; S; s/p.
Se ben ena Virgen fiar
o peccador sabudo,
querrá-o na morte guardar
que non seja perdudo. (CSM 237, v. 5-8)
querrá: FT; 3ps; S; encl.
Outro costum’ esta moller | vos direi que avia: (CSM 237, v. 24)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Mais aquel dia que sayr | avia sabad’ era,
e foi missa oyr enton, | ca tal costum’ ouvera
(CSM 237, v. 34-35)
sayr avia: FP; 3ps; A; s/p.
Contra ela, o traedor, | e diz: “Se non fezeres
ora quant’ eu quiser, aqui | o corp’ e quant’ ouveres
perdud’ ás.” E ela respos: | “podes quanto quiseres
fazer, mas ant’ eu morrerei, | vilão, falsso, rudo.” (CSM 237, v. 49-52)
morrerei: FT; 1ps; S; s/p.
“Non sejas quixosa,
Ca serás salva porque é | já o demo batudo.” (CSM 237, v. 86-87)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
266
[E] pois disse-lle: “Sey aqui, | non temas nemigalla,
E pornán que daqui a cras | mãefestes ta falla
Quanta ás feita contra Deus, | e crey ben que te valla
Meu Fill’, e viverás con el, | pero te vay sannudo. (CSM 237, v. 94-97)
pornán: FT; 3ppl; S; s/p.
viverás: FT; 2ps; S; s/p.
E vês, un cavaleiro ven | per aquel[e] recoste,
Que teu mandado levará | a Santaren muit toste;
E do concello sayrá | contra ti muit grand’ oste,
E muy long’ este feyto teu | se [e]rá retraudo.” (CSM 237, v. 94-97)
levará: FT; 3ps; S; s/p.
sayrá: FT; 3ps; S; s/p.
se[e]rá: FT; 3ps; S; s/p.
E desto vos direy ora | ũa vengança que fez
Jhesu-Christo en Guimarães (CSM 238, v. 10-11)
direy: FT; 1ps; S; procl.
O que te fez de niente | e pois á t’ a desfazer,
e eno dia do joyzo | estarás a sseu poder, (CSM 238, v.40-41)
estarás: FT; 2ps; S; s/p.
E da Virgen groriosa | te nenbra, e ben farás,
e filla ta pedença | por aquesto que dit’ ás.” (CSM 238, v. 45-46)
farás: FT; 2ps; S; s/p.
Do corpo e no inferno | a foy logo sobolir;
ca assi yr deveria | quen quer que foss’ escarnir (CSM 238, v. 65-66)
deveria: FP; 3ps; S; s/p.
Os peccadores todos loarán
Santa Maria, ca dereit' y na
(CSM 240, v. 2-3)
loarán: FP; 3ppl; S; s/p.
Ena loar, e senpr' eu loarei
os seus feitos, ca outro ben non ei;
e por aquesto dereito farei,
e os cuitados dereito farán. (CSM 240, v. 9-12)
loarei: FT; 1ps; S; s/p.
farei: FT; 1ps; S; s/p.
farán: FT; 3ppl; S; s/p.
Ena loar, e dereito será;
ca muito ben nos fez senpr' e fará,
e se non foss' ela, foramos ja
todos con Abiron e con Datan.
(CSM 240, v. 29-32)
será: FT; 3ps; S; s/p.
fará: FT; 3ps; S; s/p.
267
Ena loar, e farán gran razon;
ca ela ped' a seu Fillo perdon
quand' eles erran, e outro padron
nunca ouveron neno averán. (CSM 240, v. 34-37)
farán: FT; 3ppl; S; s/p.
averán: FT; 3ppl; S; procl.
Ena loar, e quen esto fezer
fará dereito, pois senpr' ela quer (CSM 240, v. 39-40)
fará: FT; 3ps; S; s/p.
Ena loar, ca Deus non lle fez par;
e poren devemos a confiar
dela, que por nos Deus verrá rogar
ali u todos muito temerán. (CSM 240, v. 44-47)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
temerán: FT; 3ppl; S; s/p.
Ena loar, ca u Nostro Sennor
eno juyzo mais yrado for,
perdõa-lles-á polo seu amor,
e estes taes non se perderán. (CSM 240, v. 49-52)
perdõará: FT; 3ps; S; mesocl.
perderán: FT; 3ppl; S; procl.
direi-vos un miragre | en que ei gran creença, (CSM 241, v. 10)
direi: FT; 1ps; S; encl.
Contar non poderia | do dôo que fezeron
A sogr’ e a menynna | e quantos y severon; (CSM 241, v. 54-55)
poderia: FP; 1ps; S; s/p.
Porende dá-mio vivo | que eu possa ave-lo
pera o teu serviço, | se non, morta seria.” (CSM 241, v. 71-72)
seria: FP; 1ps; S; s/p.
«Ir quer' eu aa taverna ante do vinno bever,
e en aquesto ben tenno que os vencerei de sen.»
(CSM 244, v. 27-28)
vencerei: FT; 1ps; S; procl.
E sobr’ aquest’ un miragre | mui fremoso vos direi
que fez en riba de Limia | a Madre do alto Rey, (CSM 245, v. 10-11)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Muytas vezes açoutado, | como contaron a min,
foy, dizian: “Vilão, | oge sseerá ta fin
se nos non dás quant’ ouveres.” | E jurou par San Martin
o alcayde que de cuyta | o faria soffredor. (CSM 245, v. 40-43)
sseerá: FT; 3ps; S; s/p.
faria: FP; 3ps; S; procl.
268
Dizede que nos daredes, | se non, a vossa moller
e os fillos prenderemos.” Ele diss’ enton: Senner,
mil soldos de leoneses | vos darei per quat’ ouver,
ca mais non sõoatrevudo | de dar, par Nostro Sennor. (CSM 245, v. 50-53)
prenderemos: PT; 1ppl; S; s/p.
darei: FT; 1ps; S; procl.
Eles esto non quiseron | e fórono açoutar,
se poderian aynda | del mais deiros levar; (CSM 245, v. 55-56)
poderian: FP; 3ppl; S; s/p.
Entra no rio e passa | a alen, e acharás
as portas do mõesteiro | sarradas; mas entrarás
per elas ousadamente | e na eygreja marrás
e dirás est’ aos frades | todos e ao prior.” (CSM 245, v. 85-88)
acharás: FT; 2ps; S; s/p.
entrarás: FT; 2ps; S; s/p.
marrás: FT; 2ps; S; s/p.
dirás: FT; 2ps; S; s/p.
(...) disse-ll’ ela enton: “Vês,
de me fazeres serviço | averás ma[i]s meu amor.” (CSM 245, v. 97-98)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
Desto direi un miragre, | segundo que aprendi,
que aveo en Alcaçar, e creo que foi assi, (CSM 246, v. 7-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
(...) mas en ora dũu dia
guariu-a Santa Maria, | como vos será contado. (CSM 247, v. 8-9)
será: FT; 3ps; S; procl.
e se te praz seu serviço, dá-lle lume con que veja,
e dês oi mais penssa dela, ca de mi sol un bocado
Non averá.” E tan toste | revolveu-sse muit’ aga
pera ir-sse da eigreja; (...) (CSM 247, v. 28-32)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
E de tan gran piadade un miragre direi en
que mostrou grand' en Laredo a Sennor que pod' e val
(CSM 248, v. 8-9)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
E de tal razon com' esta un miragre vos direi
que en Castroxeriz fezo a Madre do alto Rey, (CSM 249, v. 6-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
O Papa, que sant’ ome, | era, respos-lles: “Cras
mandarei cantar missa, | e tu a levarás”, (CSM 251, v. 85-86)
mandarei: FT; 1ps; S; s/p.
levarás: FT; 2ps; S; procl.
269
E sobr’ aquest’ un miragre | pequenn’ e bõo d’ oyr
direi que Santa Maria | fez fremoso, sen mentir; (CSM 252, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Poren dela un miragre direy, e vos m'ascuitade: (CSM 253, v. 14)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
e porend' ontr' estes outros miragres será contado,
porque sei que o terredes por bõo e por fremoso. (CSM 254, v. 7-8)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Dest’ un miragre vos direi ora
que a Virgen quis mui grand’ amostrar,
(CSM 255, v. 8-9)
direi: FT; 1ps; S; procl.
(...) “Amigos meus,
por piadade,
ant’ a Magestade
vos me parade,
e roga-la-ya. (CSM 255, v.83-87)
rogarya: FP; 1ps; S; mesocl.
(...) e con cantos
ela foi tantos
levada, quantos
muit de dur diria. (CSM 255, v. 138-141)
diria: FP; 3ps; S; s/p.
Quen na Virgen groriosa esperança mui grand' á,
macar seja muit' enfermo, ela mui ben o guarrá. (CSM 256, v. 3-4)
guarrá: FT; 3ps; S; procl.
ca m'estava eu deante e todo vi e oý,
que fezo Santa Maria, que muitos fez e fará. (CSM 256, v. 7-8)
fará: FT; 3ps; S; s/p.
(...) ca pero de Monpisler
bõos fisicos y eran, dizian: «Non viverá
(CSM 256, v. 17-18)
viverá: FT; 3ps; S; s/p.
e avia tan gran fever, que quena viya enton
dizia: «Seguramente, desta non escapará(CSM 256, v. 22-23)
escapará: FT; 3ps; S; s/p.
fez trager ha omagen, mui ben feita de metal,
de Santa Mari' e disse: «Esta cabo mi será. (CSM 256, v. 27-28)
será: FT; 3ps; S; s/p.
270
Ca pois eu a sa fegura vir, atal creença ei
que de todos estes maes que atan toste guarrei;
porend' a mi a chegade e logo lle beijarei
as sas mãos e os pees, ca mui gran prol me terrá(CSM 256, v. 30-33)
guarrei: FT; 1ps; S; s/p.
beijarei: FT; 1ps; S; procl.
terrá: FT; 3ps; S; procl.
Poren será de mal siso o que a non loará. (CSM 256, v. 38)
será: FT; 3ps; S; s/p.
loará: FT; 3ps; S; procl.
Desto direi un miragre grand' a maravilla,
que al Rey Don Affonsso avo. En Sevilla
foi guardar relicas da Madre de Deus e Filla
e de santos; e direi com', e Deus y m' ajude. (CSM 257, v. 5-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
[E] de tal razon com' esta un miragre vos direi
que mostrou Santa Maria en Proença, com' achei
escrito ontr' outros muitos, e assi [o] contarei
que, se o ben ascuitardes, fará-vos muit' alegrar. (CSM 258, v. 5-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
contarei: FT; 1ps; S; procl.
fará: FT; 3ps; S; encl.
Se fillou, e depois esto ar direi-vo-lo que fez:
foi-ss' aa rua chorando e loand' a do bon prez, (CSM 258, v. 45-46)
direi: FT; 1ps; S; encl.
«Amigos, id' ambos a mi
a mia eigreja d' Arraz, e ali
vos direi como vos mando guarir.» (CSM 259, v. 17-19)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E diss': «Amigos, vossa entençon
partid', e ambos mui de coraçon
amade-mi e vos muit', e al non
façades, ca vos non ei de falir(CSM 259, v. 26-29)
ei de falir: FT; 1ps; A; procl.
Foron-s' ambos dali en grand' amor
e sãavan as gentes da door,
como lles foi mandado da Sennor
que nunca mentiu nen á de mentir. (CSM 259, v. 36-39)
á de mentir: FT; 3ps; A; s/p.
Quen Jesu-Crist’ e ssa Madre veer
quiser, em ssa vida á de guardar
271
como punne de lles fazer prazer
e sse guarde de lles fazer pesar. (CSM 261, v. 3-6, refrão)
á de guardar: FT; 3ps; A; s/p.
Pero falou como pode | e disse: “Alá yrei
u me mandades que vaa; | mas pois y for, que farei?” (CSM 263, v. 28-29)
yrei: FT; 1ps; S; s/p.
farei: FT; 1ps; S; s/p.
Quen tan toste gran saude | no corpo receberás.
Onde faz-ti levar logo |sol que vires a luz craz;
mas a missa que te digo | da Madre de Deus farás
dizer, e verá-lo corpo | daquel que dela nasceu,
(CSM 263, v. 99-36)
receberás: FT; 2ps; S; s/p.
farás: FT; 2ps; S; s/p.
verás: FT; 2ps; S;s/p.
E logo serás guarido | e ar cobrarás teu sen.” (CSM, 263, v. 38)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
cobrarás: FT; 2ps; S; s/p.
E ela, por vertude que del á, nos defende
e defende a ssi misma quand' algun torto prende;
ond' aqueste miragre que vos direi porende
fez en Costantinopla, u gran torto prendia. (CSM 264, v. 11-14)
direi: FT; 1ps; S; procl.
«A ti e nos deffende destes que non creveron
nen creen no teu Fillo, ca mester nos seria(CSM 264, v. 48-49)
seria: FP; 3ps; S; procl.
Un miragre desto que escrit' achei
en un livr' antigo vos ora direi
que a Virgen Madre fez do alto Rei, (CSM 265, v. 5-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
De Deus nosso Padre que en ceo ssé.
Que eno emperio pouca gent' é
sabede, e mal bastido, a la ffe,
está; por que vos toste de suggeçon
Senpr' a Virgen santa dá bon gualardon...
Poderedes sair ora, se vos praz.» (CSM 265, v. 90-95)
poderedes: FT; 2ppl; S; s/p.
Fez, ca destas leteras soon ben fis
que ele as escriviu,par San Denis;
mais farei-vo-ll' eu o que mal fazer quis,
que el de ssi veja mui maa vijon.» (CSM 265, v. 100-103)
farei: FT; 1ps; S; encl.
272
Pois un seu miragre vos direi de grado (CSM 267, v. 8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Porque amava muito Santa Maria
de coraçon, disse ca en romaria
a Rocamador de bõa ment' irya
tanto que o el podess' aver guisado. (CSM 267, v. 25-28)
irya: FP; 3ps; S; s/p.
Sennor, por merece non me desanpares
por algu tempo t' eu fazer pesares,
e se mi ora daquestas ondas tirares,
servir-t-ei eu sempr' e farei teu mandado.
(CSM 267, v. 65-68)
servirei: FT; 1ps; S; mesocl.
farei: FT; 1ps; S; s/p.
(...) e quando
os oyu esta dona, | fez o que nos vos diremos: (CSM 268, v. 22-23)
diremos: FT; 1ps; S; procl.
(...) E ar, com’ en responder,
diz: “Sennor, de boa mente | o farei eu, sen mentir.” (CSM 269, v. 33-34)
farei: FT; 1ps; S; procl.
E ar diss’ outra vegada: | “De boa mente verrei
Quand’ esto oyu sa madre, | disse como vos direi:
“Meu fillo, con quen falades?” | Diss’ el: Nono negarei:
falo con Santa Maria, | que me fezo resorgir (CSM 269, v. 36-39)
verrei: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; procl.
negarei: FT; 1ps; S; procl.
Ar disse-m’ outra vegada, | que se eu pesseverar
en seu serviço quisesse, | que me faria levar (CSM 269, v. 46-47)
faria: FP; 3ps; S; procl.
e Daniel propheta, que dita de pastor
era, disse que Cristus averia onçon.
(CSM 270, v. 31-32)
averia: FP; 3ps; S; s/p.
falou e de seu Fillo prophetizou assy,
dizendo que profeta verria, e des y
quen en aquel non creess' yrya a perdiçon. (CSM 270, v. 40-42)
yrya: FP; 3ps; S; s/p.
Desto direi un miragre que fez aquesta Sennor
grand' e mui maravilloso eno rio d'Azamor,
(CSM 270, v. 6-7)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
273
Ca como quer que ben crean en Deus os de Portogal,
eu ei tan gran esperança na Virgen espirtal
que, se ll' algo prometemos, sacar-nos-á deste mal; (CSM 270, v. 26-28)
sacará: FT; 3ps; S; mesocl.
Serviç' a Santa Maria muito será de bon sen,
ca nas cuitas deste mundo acorre-lo-á mui ben
e ena ora da morte nono leixará per ren;
e poren servi-la deve tod' om' e toda moller. (CSM 270, v. 51-54)
será: FT; 3ps; S; s/p.
acorrerá: FT; 3ps; S; mesocl.
leixará: FT; 3ps; S; procl.
E de tal razon miragre vos contarei que oý
mui grande, que fez a Virgen en Roma, com' aprendi, (CSM 272, v. 10-11)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
Que éste da groriosa Virgen e Madre de Deus,
enton serás perdõada, cuid' eu, dos pecados teus.» (CSM 272, v. 35-36)
serás: FT; 2ps; S; s/p.
e a moller depois senpre a serviu, e poren sei
que lle foi gualardõado u nunca verá pesar. (CSM 272, v. 62-63)
verá: FT; 3ps; S; s/p.
Desta razon un miragre direy apost' e fremoso,
que fezo Santa Maria, e d' oyr mui saboroso; (CSM 273, v. 5-6)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
E pero ora non tenno pera dar y offerenda,
coserei aquestes panos daquest' altar sen contenda, (CSM 273, v. 25-26)
coserei: FT; 1ps; S; s/p.
e estando-a fazendo, o demo en coraçon
lle meteu que sse saysse da orden, ca ben seria.
(CSM 274, v. 11-12)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
pequena. E diss' o frade: «Seeria muy mellor
esta garnacha se fosse conprida como devia.» (CSM 274, v. 26-27)
seeria: FP; 3ps; S; s/p.
por acabar; mais aga te torna logo daqui
ao mõesteyr', e se mia conprisses, gracir-cho-ya(CSM 274, v. 31-32)
gracirya: FP; 1ps; S; mesocl.
e disso-lle: «Sennor, Madre daquel que pod' e que val,
se mi aquesto perdõasses, yr-m-ia logo sen al
ao mõesteyr' e esta garnacha acabaria(CSM 274, v. 35-37)
yria: FP; 1ps; S; mesocl.
acabaria: FP; 3ps; S; s/p.
274
Enton diss' a Groriosa: «Meu Fillo perdõará
a ti quanto tu cuydasche, pois que t' end' achas mal ja;
e torna-t' a tua orden, ca mui cedo ch' averá
mester de t' alá tornares, ca eu teu mal non querria. (CSM 274, v.39-42)
querria: FP; 1ps; S; s/p.
perdõará: FT; 3ps; S; s/p.
averá: FT; 3ps; S; procl.
Aynda de ta fazenda mays te desenganarey:
deste dia a un ano serás morto, eu o sey;
e a esto para mentes, ca eu ant' a ti verrey
que moiras; e no meu Fillo, que te fez, sempre confia.» (CSM 274, v. 44-47)
desenganarey: FT; 1ps; S; procl.
serás: FT; 2ps; S; s/p.
verrey: FT; 1ps; S; s/p.
e contou-lles quanto vira; e cada un escriviu
o dia en que dissera a Virgen que morreria.
(CSM 274, v. 51-52)
morreria: FP; 3ps; S; s/p.
e mui ben ontre seus frades tod' aquel tenpo passou,
e cada u parou mentes ena Virgen se verria. (CSM 274, v. 56-57)
verria: FP; 3ps; S; procl.
e pareceu ao frade e disso-ll': Amigo, ben
acabasch' a mia garnacha, mas mui ben t' acharás en,
ca sairás cras do mundo, e prend' en grand' alegria.» (CSM 274, 60-62)
acharás: FT; 2ps; S; procl.]
sairás: FT; 2ps; S; s/p.
Enton vo-ss' aos frades e disso: «Sennores meus,
aqui u ora orava vo a Madre de Deus
e disso que eu salrria cras do mundo; e os seus
(CSM 274, v. 64-66)
salrria: FP; 1ps; S; s/p.
E disse logo como vos eu direy: (CSM 275, v. 35)
direy: FT; 1ps; S; procl.
Quena Virgen por sennor
tever, de todo mal guarrá.
(CSM 276, v. 3-4, refrão)
guarrá: FT; 3ps; S; s/p.
Ond' un miragre que fez
vos direi, saboroso, (CSM 276, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
poren de todos sen al
senpre é mui loada
e será. (CSM 276, v. 73-75)
será: FT; 3ps; S; s/p.
275
Os outros oito disseron que da carne comerian
quanta mais dela podes[s]en e que a non leixarian, (CSM 277, v. 25-26)
comerian: FP; 3ppl; S; s/p.
leixarian: FP; 3ppl; S; procl.
De jajar en tal terra e andand' en cavalgada;
poren que quer comeremos que non leixaremos nada.» (CSM 277, v. 30-31)
comeremos: FT; 1ppl; S; s/p.
leixaremos: FT; 1ppl; S; s/p.
U alguen a Jhesu Cristo por seus pecados negar,
se ben fiar en ssa Madre, fará-ll' ela perdõar. (CSM 281, v. 3-4, refrão)
fará: FT; 3ps; S; encl.
Dest' avo un miragre en França a un frances,
que non avia no reino duc nen conde nen marques
que fosse de mayor guisa, e tal astragueza pres
que quanto por ben fazia en mal xe ll' ya tornar.
(CSM 281, v. 5-8)
ya tornar: FP; 3ps; A; procl.
Poys que sse viu en pobreza, diss' un dia entre ssi:
«Mesqo desanparado, que será agora de my?
A requeza que avia, non sey por que mia perdi;
mais se a cobrar non posso, yr-m-ei algur esterrar.» (CSM 281, v. 15-18)
será: FT; 3ps; S; s/p.
yrei: FT; 1ps; S; mesocl.
E se tu assi fezeres, todo cho eu cobrarey
Diss' el: «Di-me que che faça, e logo cho eu farey
Diss' o demo: «Por vassalo meu t'outorga, e dar-ch-ei
mui mais ca o que perdische.» E el foy-llo outorgar (CSM 281, v. 25-28)
cobrarey: FT; 1ps; S; procl.
farey: FT; 1ps; S; procl.
darei: FT; 1ps; S; mesocl.
Pois que lle beijou a mão, diss' o demo: «Un amor
me farás, pois meu vassalo es: nega Nostro Sennor
e nega todos seus santos.» (CSM 281, v. 30-32)
farás: FT; 2ps; S; procl.
Despos esto disso: «Santa Maria renegarás
Diss' enton o cavaleiro: «Este poder nono ás
que me faças que a negue, nen tanto non me darás
que negue tan bõa dona; ante m' iria matar.» (CSM 281, v. 35-38)
renegarás: FT; 2ps; S; s/p.
darás: FT; 2ps; S; procl.
iria: FP; 3ps; S; procl.
Diss' o demo: «Pois negaste Deus, non mi á ren que fazer
de ssa Madre non negares, mais dou-che mui grand' aver;
276
demais negasch' os seus santos, mais al mi ás de prometer
que non entres en eigreja.» E jurou d' i non entrar. (CSM 281, v. 40-44)
ás de prometer: FT; 2ps; A; procl.
E daquest' un seu miragre mui fremoso contarey
que mostrou grand' en Segovi' a, com' eu en verdad' achey, (CSM 282, v. 11-12)
contarey: FT; 1ps; S; s/p.
E por esto vos contarey
un gran miragre que achey (CSM 283, v. 13-14)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
en ssa eigreja e mostrar
aas gentes que «gran folia
será,» diss' el, «creed' a mi, (CSM 283, v. 25-27)
será: FT; 3ps; S; s/p.
e juro-vos eu sen mentir
que por est' escomungaria
quantos alá fossen daqui. (CSM 283, v. 33-35)
escomungaria: FP; 1ps; S; s/p.
E se per ventura aven
que en esta festa que ven
d' Agosto per vosso mal sen
fordes y per neha ren,
escomungar-vos-ei poren.» (CSM 283, v. 37-41)
escomungarei: FT; 1ps; S; mesocl.
Quen ben fiar na Virgen de todo coraçon,
guarda-lo-á do demo e de sa tentaçon. (CSM 284, v. 3-4, refrão)
guardará: FT; 3ps; S; mesocl.
E daquest' un miragre mui fremoso direi
(CSM 284, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
que non era dia
que ll' el muitas vegadas sa coita non dizia
e lle prometia
que sse con el sse fosse, con ela casaria. (CSM 285, v. 28-31)
casaria: FP; 3ps; S; s/p.
E demais que grand' herdade lle daria e aver
e a terria senpr' onrrada, rica e viçosa,
e que nunca del pesar receberia, mais prazer.
E tanto lle diss' aquesto, que ela saborosa
foi e d' alegria
lle jurou en sas mãos que con ele s' irya
e que leixaria
log' aquel mõesteiro, u al non averia. (CSM 285, v. 33-40)
277
daria: FP; 3ps; S; procl.
terria: FP; 3ps; S; procl.
receberia: FP; 3ps; S; s/p.
irya: FP; 3ps; S; procl.
leixaria: FP; 3ps; S; s/p.
averia: FP; 3ps; S; s/p.
Mai la Virgen groriosa, Reynna esperital,
fezo que a el essa noite enganou agoiro,
e foi-sse ssa via,
maldizendo quen nunca por moller creeria. (CSM 285, v. 53-56)
creeria: FP; 3ps; S; s/p.
mas ela lle jurava que mui mal se sentia,
pero todavia,
quando ves[s]' a noite, que pera el ir-ss-ya. (CSM 285, v. 65-67)
irya: FP; 3ps; S; mesocl.
arou-sse-ll' en cruz ena porta e disse: «Non seja
que tan gran folia
faças contra meu Fillo nen tan grand' ousadia,
ca eu non seria
tuda de rogar-lle por ti, nen m'oyrya(CSM 285, v. 72-76)
seria: FP; 1ps; S; s/p.
oyrya: FP; 3ps; S; procl.
E ela vivia
a mais viçosa dona que viver poderia, (CSM 285, v. 91-92)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
Por est' eu terria
por ben que te tornasses pera a ta mongia,
e eu guisaria
logo con Deus, meu Fillo, que te perdõaria(CSM 285, v. 109-112)
terria: FP; 1ps; S; s/p.
guisaria: FP; 1ps; S; s/p.
perdõaria: FP; 3ps; S; procl.
E mui fremoso miragre vos direi desta razon
que mostrou Santa Maria, que nunca faz se ben non, (CSM 286, v. 10-11)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E daquest’ un gran miragre | vos direi, se vos prouguer, (CSM 287, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; procl.
que a guareceu de morte, | com’ oyredes per mi;
e de como foi aquesto, | non vos en negarei ren.
(CSM 287, v. 17-18)
oyredes: FT; 2ppl; S; s/p.
negarei: FT; 1ps; S; procl.
278
E dest’ un mui gran miragre | vos contarei mui fremoso, (CSM, 288, v. 6)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
Que aos que o serviren | nunca lles falrrá niente
do gran ben do paraíso, |ca a eles pertece. (CSM 288, v. 43-44)
falrrá: FT; 3ps; S; procl.
Desto direi un miragre | grande que cabo Madride (CSM 289, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Maldito seja quen non loará
a que en si todas bondades á. (CSM 290, v. 2-3, refrão)
loará: FT; 3ps; S; s/p.
Maldito seja o que non loar
a que de bondades non ouve par
nen averá mentr' o mundo durar,
[ca] Deus non fez outra tal, nen fará.
(CSM 290, v. 4-7)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
fará: FT; 3ps; S; s/p.
e que naceu Deus, om' e Salvador,
ea pois gualardõado lle será. (CSM 290, v. 11-12)
será: FT; 3ps; S; procl.
de quant' a bondad' e a prez conven,
e esto ja mais non lle falirá. (CSM 290, v. 16-17)
falirá: FT; 3ps; S; procl.
ea, pois [que] deste mundo se partir,
ant' o seu Fillo o presentará. (CSM 290, v. 21-22)
presentará: FT; 3ps; S; procl.
aver seu amor enquanto poder,
ea por aquest' o de Deus averá.
(CSM 290, v. 26-27)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
Beito seja o que gran prazer
á de loar tal Sennor, que aver
nos fez amor de Deus e connocer
ela que por nos todos rogará. (CSM 290, v. 29-32)
á de loar: FT; 3ps; A; s/p.
rogará: FT; 3ps; S; s/p.
Cantand' e en muitas guisas dev' om' a Virgen loar,
ca u ouver mayor coita, valer-ll-á se chamar. (CSM 291, v. 4-3, refrão)
valerá: FT; 3ps; S; mesocl.
279
Ca loada de tod' ome devia sempr' a seer,
e assi connoceria ja quanto do seu poder, (CSM 291, v. 5-6)
connoceria: FP; 3ps; S; s/p.
te pego que tu mi acorras, e enquan' eu vivo for
nunca me de teu serviço, Sennor, querrei alongar.» (CSM 291, v. 37-38)
querrei: FT; 1ps; S; s/p.
e filló-o pelo braço e diz: «Quero-t' eu en paz
põer desta prijon fora, pois que por meu ás d' andar(CSM 291, v. 47-48)
ás d’ andar: FT; 2ps; A; s/p.
E de tal razon com' esta vos direi com' ha vez
a Virgen Santa Maria un mui gran miragre fez (CSM 292, v. 6-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Assi que en este mundo fez-ll' acabar o que quis
e morrer onrradamente e morrendo seer fis
que a Parais' yria, ben u éste San Denis,
u veeria seu Fillo e a ela outro tal. (CSM 292, v. 21-24)
yria: FP; 3ps; S; s/p.
veeria: FP; 3ps; S; s/p.
que tod' ome que o veja ben dirá, per bõa ffe,
que o ten por mui mais nobre ca sse fosse de cristal. (CSM 292, v. 63-64)
dirá: FT; 3ps; S; s/p.
e maravilla mui grande vos en direi
que mostrou en este feito o que naceu por Nadal. (CSM 292, v. 68-69)
direi: FT; 1ps; S; procl.
ouve grand' a maravilla, e diss' :«Ai, Nostro Sennor,
quen m' adubaria este anel? Soubess' ora qual
(CSM 292, v. 93-34)
adubaria: FP; 3ps; S; procl.
Seria que o fezesse.» Maestre Jorge diss': «Eu,
ca eu fix aquesta obra toda e est' anel seu
del Rei.» E o tesoureiro logo o anel lle deu,
(CSM 292, v. 96-98)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Disse «non faz», o maestre, «mas direi, e non vos pes,
que esta noit' ei sonnado vel duas vezes ou tres.» (CSM 292, v. 101-102)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
dela; e poren ll' avo o que vos ora direy,
onde vos rog', ai, amigos, que o queirades oyr. (CSM 295, v. 29-30)
direy: FT; 1ps; S; procl.
280
E elas assi fezeron; e a Virgen en vijon
lles diss': «O que me rogades farey-o, se el Rei vir.» (CSM 295, v. 39-40)
farey: FT; 1ps; S; encl.
chorando muit' e dizendo: «A ti, Sennor, que es luz,
beijarei pees e mãos, ca ta vertude m' aduz (CSM 295, v. 49-50)
beijarei: FT; 1ps; S; s/p.
«Non,» diss' ela, «mais as vossas mãos vos beijarei eu
por quanta onrra fazedes a mi sempr' e ao meu
Fillo, que é Deus e ome; e poren no reino seu
vos meterei pois morrerdes, esto será sen mentir.» (CSM 295, v. 52-55)
beijarei: FT: 1ps; S; procl.
meterei: FT: 1ps; S; procl.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E dest' un gran miragre ora vos contarey
que en Conturbe[l] fezo, per com' escri' achey,
por un monge, sant' ome; e sõo cert' e sey
que senpre fará est' a quena servir souber.
(CSM 296, v. 10-13)
contarey: FT; 1ps; S; procl.
fará: FT; 3ps; S; s/p.
e disse-ll': « O que pedes praz-me, per bõa fe;
e eu dizer-cho quero ca meu Fill', u el ssé,
ten por ben que cho diga, e direi-cho, senner. (CSM 297, v. 2-28)
direi: FT; 1ps; S; encl.
Se ben queres servir-me, primeiro amar-m-ás
muit' ena voontade, outrossi onrrar-m-ás,
e sobre tod' aquesto sempre me loarás,
pois me fillou por madre Deus, seend' eu moller.
(CSM 296, v. 30-33)
amarás: FT; 2ps; S; mesocl.
onrrarás: FT; 2ps; S; mesocl.
loarás: FT; 2ps; S; procl.
Sempr' en aqueste mundo bõa vida fará,
e quen servir a ela, seu Fillo servirá,
e pois que del for fora, Parayso verá;
demais valrrá-lle senpre u a mester ouver.
(CSM 297, v. 40-43)
fará: FT; 3ps; S; s/p.
servirá: FT; 3ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
valrrá: FT; 3ps; S; encl.
Dest' un fremoso miragre vos rog' ora que ouçades,
e des que o entenderdes fará-vos que ben creades
en Deus e en[a] ssa Madre, per que seu amor ajades, (CSM 297, v. 5-7)
fará: FT; 3ps; S; encl.
281
E des oy mais sa fazenda nunca irá adeante,
ante tornará a redr', e sempre será malandante;
e a Virgen groriosa on querrá que ss' [el] avante
daquesto que el [á] dito, pois que en ela descree.» (CSM 297, v. 45-48)
irá: FT; 3ps; S; s/p.
tornará: FT; 3ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
queerrá: FT; 3ps; S; s/p.
E porend’ ora un miragre direi
que en Seixon fez a Madre do gran Rei;
quant’ end’ aprendi ren non vos negarei,
e de o oyr averedes sabor.
(CSM 298, v. 9-12)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
negarei: FT; 1ps; S; procl.
averedes: FT; 2pps; S; s/p.
Soon de gran coita que mi o demo dá
qual nunca loller ouve nen averá;
ai, Madre de Deus, Sennor, tolle-mio já,
e seerei sempre tua servidor.” (CSM 298, v. 59-62)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
seerei: FT; 1ps; S; s/p.
Dest’ un miragre mostrar-vos querria,
E de mio oyrdes vos rogaria
De boa ment, e per el vos faria
Saber servir a comprida de ben. (CSM 299, v. 5-8)
querria: FP; 1ps; S; s/p.
rogaria: FP; 1ps; S; procl.
faria: FP; 1ps; S; procl.
e em loa-la gran sabor prendia;
e direi-vos que ll’ avo poren. (CSM 299, v. 12-13)
direi: FT; 1ps; S; encl.
(...) mais vai ta via
al Rei e dá-lla, ca me prazeria
se lla désses, e faria bom sen.” (CSm 299, v. 26-28)
prazeria: FP; 3ps; S; procl.
faria: FP; 3ps; S; s/p.
“E como fillaste tal ousadia
De non dar o que te mandad’ avia
que désses al Rei, e gracir-cho-ya?
Mas dá-lla; se non, mal te verrá en.” (CSM 299, v. 40-43)
gracirya: FP; 3ps; S; mesocl.
verrá: FT; 3ps; S; procl.
282
Tal omagen, mas al Rei converria.
E por aquesto vos conssellaria
que lla dessedes, ca el saberia
onrra-la muit’; e vos buscad’ alguen (CSM 299, v. 50-53)
converria: FP; 3ps; S; s/p.
conssellaria: FP; 3ps; S; procl.
saberia: FP; 3ps; S; s/p.
e ela filla e criada,
e onrrada
e amada
a fez tanto, que sen par
é preçada
e loada
e será quant' el durar. (CSM 300, v. 9-15)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E dest' un mui gran miragre | vos direi que me juraron
omees de bõa vida | e por verdade mostraron (CSM 301, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Desto direi un miragre que conteu no mõesteiro
de Burgos, e se m' oirdes, direi-vo-lo tod' enteiro,
que mostrou Santa Maria por toller med' e fazfeiro
da moça que avia tod' esto sen dovidança. (CSM 303, v. 5-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; encl.
«Aquesto que me tu rogas farei eu de bõa mente,
tanto que oi mais teu feito non[o] metas en balança.» (CSM 303, v. 37-38)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
E poren dizer-vos quero, se me mui ben ascuitardes,
un mui fremoso miragre; e se y mentes parardes,
gran prol de vossa fazenda vos terrá, se vos guardardes
de fazer per que perçades d' aver de Deus galardões. (CSM 305, v. 5-8)
terrá: FT; 3ps; S; procl.
E diss' el: «Vee-la quero, e meterei y femença
se é carta de soltura ou se é de petições.»
(CSM 305, v. 47-48)
meterei: FT; 1ps; S; s/p.
El enton leeu a carta, e ante que lla tornasse
disse-lle que lle daria sobr' ela quanto pesasse,
e que esto lle faria, e d'al non sse traballasse
per ren, ca el non amava truães nen arlotões. (CSM 305, v. 45-47)
daria: FP; 3ps; S; procl.
faria: FP; 3ps; S; procl.
283
Quand' o canbiador viu esto, pediu por Santa Maria ,
mercee que sse leixasse do peso, e lle daria
quant' ela do seu quisesse, per que sempre viviria
ben e avondadamente. E molleres e barões, (CSM 305, v. 70-73)
daria: FP; 3ps; S; procl.
viviria: FP; 3ps; S; s/p.
Esta omagen beita | dês enton assi está
con ssa cinta abaixada, | e sempr’ assi estará;
e Deus miragres por ela | mostrou pois e mostrará,
por nos fazer de sa Madre | a verdade connocer. (CSM 306, v. 50-53)
estará: FT; 3ps; S; s/p.
mostrará: FT; 3ps; S; s/p.
Dest’ un fremoso miragre | vos direi que foi verdade (CSM 309, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; procl.
e porend’ un ome bõo | lles disse que sse tevessen
de faze-la ata quando | de Deus tal sinal ouvessen
do logar u a farian | a ssa Madr’, und’ el é Padre. (CSM 309, v. 26-28)
farian: FP; 3ppl; S; procl.
que lle disso: «Deus o santo
de ti nacerá agynna.» (CSM 310, v. 18-19)
nacerá: FT; 3ps; S; s/p
«Mal empregasti teu tenpo na Virgen, com' aprendi,
demais perdisti grand' algo que lle desti; mais a mi
nunca averrá aquesto, ca o meu na arca é.» (CSM 311, v. 46-48)
averrá: FT; 3ps; S; s/p.
Que me livrou de sas mãos u era en poder seu;
e porend', enquant' eu viva, sempre no coraçon meu
a terrei pera servi-la, e nunca me será greu
de ren que por ela faça, ca mui ben enpregad' é.» (CSM 311, v. 55-58)
terrei: FT; 1ps; S; procl.
será: FT; 3ps; S; procl.
e cuidand' en sa amiga | en como a averia,
o sen a perder ouvera | e caer en gran loucura. (CSM 312, v. 42-43)
averia: FP; 3ps; S; procl.
E poren dizer-vos quero dela un miragr', e sei
que loaredes seu nome; aynda vos mais direi:
connoceredes de certo que sabença do gran Rei,
seu Fillo, de pran á ela por tal miragre fazer. (CSM 313, v. 11-14)
loaredes: FT; 2ppl; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; procl.
connoceredes: FT; 2ppl; S; s/p.
284
e santos muitos e santas, outorgando que romeus
de grado seus seerian se lles quisesse valer. (CSM 313, v. 33-34)
seerian: FP; 3ppl; S; s/p.
E diz: «Varões, chamemos ora de bon coraçon
a Virgen Santa Maria de Vila-Sirga, e non
se faça end' om' afora, e peçamos-lle perdon,
ca a ssa vertude santa no-nos á de falecer. (CSM 313, v. 46-49)
á de falecer: FT; 3ps; S; procl.
Quen souber Santa Maria | loar, será de bon sem. (CSM 314, v. 3, refrão)
será: FT; 3ps; S; s/p.
e de como foi o feito | todo vo-lo contarei,
pero prazer-m-ia muito | se m’ oyssedes mui ben. (CSM 314, v. 6-7)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
prazeria: FP; 3ps; S; mesocl.
Logo comig’, ai irmãa, | e amostrar-che-ei logar
u podemos quinze dias | ou tres domaas estar
viçosos cab’ hũa fonte | que eu ei; des i caçar
me veeredes andando, | e prazer-vos-á muit’ en.” (CSM 314, v. 19-22)
amostrarei: FT; 1ps; S; mesocl.
veeredes: FT; 2ppl; S; procl.
prazerá: FT; 3ps; S; mesocl.
E daquesto avo | miragre mui fremoso (...)
que vos contarei ora, | se me for ascuitado. (CSM 315, v. 5-8)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
Póla Virgen beita, | de como vos diremos. (CSM 315, v. 15)
diremos: FT; 1ppl; S; procl.
de Tocha o levasse, | e esto per concello,
ca Deus y mostraria | miragre sinaado.
(CSM 315, v. 42-43)
mostraria: FP; 3ps; S; s/p.
Desto direi un miragre | que conteu en Portugal,
(CSM 316, v. 5)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
por quanto na ta hermida | mandei o fogo põer;
mais por emenda daquesto | farey-a nova fazer, (CSM 316, v. 41-42)
farey: FT; 1ps; S; encl.
mais por ti direi de grado | quanto ben dizer poder,
e des aqui adeante | quero ja por ti trobar.” (CSM 316, v. 57-58)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
285
Mal ss’ á en d’ achar
quen quiser desonrrar Santa Maria (CSM 317, v. 3-4, refrão)
á de achar: FT; 3ps; A; procl.
e chamando: “Val,
Madre de Deus, ca mester nos seria.” (CSM 317, v. 57-58)
seria: FT; 3ps; S; procl.
E com’ era atrevudo e sandeu,
quis acabar aquelo que prometeu,
e o pe ergueu
e ena porta gran couce dar ya. (CSM 317, v. 50-53)
dar ya: FP; 3ps; S; s/p.
Mais avo-ll’ en como vos eu direi:
(CSM 317, v. 55)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Quen a Deus e a ssa Madre escarn[n]o fazer quiser,
muito será gran dereito se ll' ende pois mal ver. (CSM 318, v. 3-4, refrão)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E desto, se m' ascuitardes, vos direi, per com' oý,
un miragre mui fremoso, e creo que foi assi; (CSM 318, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
e bõa paravl' avia, mas dentro no coraçon
en com' era de mal cho vos direi, se vos prouguer. (CSM 318, v. 17-18)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Quen quer mui ben pod' a Virgen groriosa
de door guarir, non será tan coitosa. (CSM 319, v. 2-3, refrão)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Poren quer' eu dela un miragr' onrrado
dizer, se m' oyrdes; e poi-lo contado
ouver, saberedes que faz mui guisado
o que faz serviço a esta piadosa. (CSM 319, v. 9-12)
saberedes: FT; 2ppl; S; s/p.
Por ela, ca outro fillo non avian.
Des i prometeron que a levarian
a Terena, ca ja per al non sabian
(CSM 319, v. 39-41)
levarian: FP; 3ppl; S; procl.
(...) poren, se ela m’ajude,
vos direi un seu miragre | que fez en hũa minynna. (CSM 321, v. 7-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Ant’ el Rey, e yrei logo | vosco, se Deus me defenda
de mal, e de vossa filla | lle contarei a fazenda;
286
e des que llo ouver dito | ben sei logo sen contenda
que el Rei por as mercee | vos acorrerá agynna.” (CSM 321, 35-38)
yrei: FT; 1ps; S; s/p.
contarei: FT; 1ps; S; procl.
acorrerá: FT; 3ps; S; procl.
Ca dizedes que vertude | ei, dizedes necidade;
Mais fazed’ agora tanto | eu direi, e vos calade,
E levarey a minynna | ant’ a bela Magestade (CSM 321, v. 45-47)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
levarey: FT; 1ps; S; s/p.
e assi no dia quinto | serán todas acabadas,
e desta enfermidade | guarrá log’ a pastora.” (CSM 321, v. 57-58)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
guarrá: FT; 3ps; S; s/p.
E de tal razon com' esta vos direi, se m' ascuitades,
un gran miragre que fezo esta Sennor muit' onrrada. (CSM 322, v. 12-13)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E porend' un gran miragre direi, se Deus me defenda,
que fez esta que ja outros á feitos muitas vegadas. (CSM 323, v. 7-8)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Daquest' un mui gran miragre vos direi, sen ren mentir,
mui fremos' e muit' aposto, e saboroso d'oyr, (CSM 324, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E de tal razon com' esta direi mui maravilloso
miragre que fez a Virgen, e d'oyr mui saboroso;
e quen parar y ben mentes terrá-o por piadoso
e averá mais fiança eno seu ben todavia.
(CSM 325, v. 9-12)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
terrá: FT; 3ps; S; encl.
averá: FT; 3ps; S; s/p.
(...) e d'oyr a maravilla
que avo deste feito muito m'ende prazeria. (CSM 325 ,v. 21-22)
prazeria: FP; 1ps; S; procl.
E conssellou-lles que fossen mouras e crischãidade
leixassen, e fossen fora daquela catividade,
e lles faria grand' algo e dar-lles-ya herdade,
e que con mouros mui ricos a ambas casa-las faria. (CSM 325, v. 29-32)
faria: FP; 3ps; S; procl.
darya: FP; 3ps; S; mesocl.
faria: FP; 3ps; S; procl.
287
E se fazer non quisesse[n] esto, logo nas cadas
ambas mete-las faria e dar-lles tan grandes pas
que lles non ficassen sãos coiros nen nervos nen vas,
e demais, sobre tod' esto, escabeça-las faria. (CSM 325, v. 34-37)
faria: FP: 3ps; S; s/p.
faria: FP: 3ps; S; s/p.
adormeceu, e a Virgen lle disse: Sal acá fora
deste logar e trei migo, ca eu te porrei na via.» (CSM 325, v. 46-47)
porrei: FT; 1ps; S; procl.
Enton a moller lles disse: «Eu sõo pobr' e mesqynna,
e se m'alg' a dar avedes por Deus, dade-mio aga,
e yr-m-ei pera Tudia, a cas da Santa Rea (CSM 325, v. 74-76)
yrei: FT; 1ps; S; mesocl.
Ca a Sennor que o atan ben dá
non á ome razon de lle furtar
nen de roubar-ll’ o seu nen llo fillar,
ca servindo a ben ave-lo-á. (CSM 326, v. 5-8)
averá: FT; 3ps; S; mesocl.
E daquesta razon vos contarei
un gran miragre que fez hũa vez (CSM 326, v. 10-11)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
E quen a verdade saber quiser,
saberá que as poseron aly (CSM 326, v. 25-26)
saberá: FT; 3ps; S; s/p.
Onde, se m'oyr quiserdes, daquesto vos contarei
un miragre mui fremoso que fez a Madre do Rey
Jhesu-Crist' en Odimira, como vos ora direi,
u ela fez ende muitos outros en aquel logar. (CSM 327, v. 6-9)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
direi: FT; 1ps; S; procl.
(...) ca de todo deleitosa
tant' é, que de dur seria en un gran dia contado. (CSM 328, v. 17-18)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
el Rey Don Affonso, quando sa frota ouv' enviada
que Çalé britaron toda, gran vila e muit' onrrada,
e o aver que gãaron, de dur seria osmado. (CSM 328, v. 31-33)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Esto fez a Virgen santa, a Sennor dereitoreira,
de cujo nome o mundo será cho per meu grado. (CSM 328, v. 87-88)
será: FT; 3ps; S; s/p.
288
O levaren.» E tan toste entraron, com' apres' ei,
ena eigreja, e viron estar aquele sen lei
cegu' e atal com' ha pedra. Diz hu deles: «¿Que farei? (CSM 329, v. 55-57)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
A qual diss' «Ave Maria»
Gabriel e que seria (CSM 330, v. 7-8)
seria: FT; 3ps; S; s/p.
dizendo: “Sen ti mui soa | fico, e tu sen mi soo;
e ou mais jarás so terra | ben como jaz teu avoo, (CSM 331, v. 30-31)
jarás:FT; 2ps; S; s/p.
Ond' un mui maravil[loso] miragre vos contarei
que avo en Carriço, per com' en verdad' achei, (CSM 332, v. 6-7)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
Ao convent' u durmia, e disse: «Por esto vin,
por vos mostrar gran miragre que ora conteu a min;
e sei que poi-lo oyrdes, diredes, par San Martin,
que d'outro mayor daqueste nunca oystes falar.» (CSM 332, v. 56-59)
diredes: FT; 2ppl; S; s/p.
E poren vos direi ora | un miragre que á feito
en Terena esta Virgen, | Madre do Fillo beito, (CSM 333, v. 10-11)
direi: FT; 1ps; S; procl
foss’ e diss’: “Ai, Virgen Madre, | se algũa vez servida
fuste de mi algun tenpo, | val, ca mester me seria.” (CSM 333, v. 32-33)
seria: FP; 3ps; S; procl.
E desto fez en Terena, ond' averedes sabor,
un miragr' a Virgen santa, Madre de Nostro Sennor,
(CSM 334, v. 5-6)
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
E diss[e] a o mancebo: «Se ora podess[es] yr
ao agro a teu amo, punnarei en cho gracir,
(CSM 334, v. 25-26)
punnarei: FT; 1ps; S; s/p.
E dar-ll-ás aqueste vo, e fas como te direi:
non bevas [en] nemigalla, e ven-t' e eu te darei
algo, se esto fezeres, e demais gracir-cho-ei,
e a mi e a teu amo farás ora gran prazer.»
(CSM 334, v. 30-33)
darás: FT; 2ps; S; mesocl.
direi: FT; 1ps; S; procl.
darei: FT; 1ps; S; procl.
gracirei: FT; 1ps; S; mesocl.
farás: FT; 2ps; S; s/p.
289
Com' andamos lazerados con est' ano tan minguado.»
Respondeu-ll' o ome bõo: «Esto faria de grado; (CSM 335, v. 35-36)
faria: FP; 1ps; S; s/p.
E yrei catar as arcas se me ficou y farynna.» (CSM 335, v. 45)
yrei: FT; 1ps; S; s/p.
e as arcas de fara chas, e tan avondada
que avondar poderia a todo-los da cidade. (CSM 335, v. 72-73)
poderia: FP; 3ps; S; s/p.
a Virgen mui groriosa, | de que gran merce’ espero;
e se ben nos ascuitardes, | de grado vo-lo diremos.
(CSM 336, v. 13-14)
diremos: FT; 1ppl; S; procl.
lle disse: “Sennor, mercee, | ca en ti a acharemos (CSM 336, v. 34)
acharemos: FT; 1ppl; S; procl.
mais est’ erro per natura | ben des Adan é-xe nosso,
de que non seremos sãos, | se per vos non guarecemos.” (CSM 336, v. 48-49)
seremos: FT; 1ppl; S; s/p.
“Porque teu ben connocemos | e entendes ta loucura,
eu farei que o meu Fillo | te cambia a natura
que já mais esto non faças, | ca desto poder avemos.” (CSM 336, v. 52-54)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
cambiará: FT; 3ps; S; procl.
E daquest’ un gran miragre | direi, conde devoçon
averedes poi-l’ oyrdes, que conteu a ũu baron (CSM 337, v.5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
E colleu tal antollança | polo fazer entender,
que con todos contendia; | e macar ll’ yan dizer
que se ben se soltaria, | non llo queria creer,
ant’ ya travar en muitos, | e dos panos lles tirar,
(CSM 337, v. 10-13)
soltaria: FP; 3ps; S; procl.
Desto direy un miragre | que fezo a Virgen santa,
(CSM 338, v. 5)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
Na eigeja da Madre do gran Rei,
que fez muitos miragres, com' eu sei,
por que a loo sempr' e loarei
enquant' en aqueste mundo viver. (CSM 339, v. 70-73)
loarei: FT; 1ps; S; s/p.
290
Virgen Madre groriosa,
de Deus filla e esposa,
santa, nobre, preciosa,
quen te loar saberia
ou podia? (CSM 340, v. 2-6)
saberia: FP; 3ps; S; s/p.
Quen diria,
nen quen osmar poderia
teu ben e ta gran mesura? (CSM 340, v. 36-38)
poderia: FT; 3ps; S; s/p.
Tu es alva per que visto
foi o sol, que éste Cristo,
que o mund' ouve conquisto
e sacado du jazia
e jaria,
e de que non sairya; (CSM 340, v. 42-47)
jaria: FP; 3ps; S; s/p.
sairya: FP; 3ps; S; s/p.
E querria
t' eu ver con el, ca seria
quito de maa ventura (CSM 340, v. 66-68)
querria: FP; 1ps; S; s/p.
seria: FP; 1ps; S; s/p.
Desto direi un miragre | que en terra de Gasconna
fez a Virgen groriosa, (...) (CSM 341, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
e sequer en un gran fogo | en meo daquela praça
me meterei, ca non sõo | daquelas que esto fazen.”
(CSM 341, v. 37-38)
meterei: FT; 1ps; S; procl.
Diss’ ela: “De mui bon grado | farei o que me mandades,
en tal que maa sospeita | per ren de mi nona jades.”
(CSM 341, v. 45-46)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
(...) Ca agora tal peccado
feziste, que gran dereito | faria quen te matasse.
(CSM 343, v. 27-28)
faria: FP; 3ps; S; s/p.
e deron poren loores | aa Sennor mui conprida,
a que quen quer as daria | que sse migo co[n]ssellas[s]e. (CSM 343, v. 52-53)
daria: FP; 3ps; S; procl.
E dest' un mui gran miragre direi, e ben m'ascuitade,
que ela fez en Tudia; e meted' y ben femenga. (CSM 344, v. 8-9)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
291
E desta gran maravilla | ũu chanto mui doorido
vos direi que end’ avo, sol que me seja oydo, (CSM 345, v. 6-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
e que per seu corpo fosse | ll’acorrer; se non, pagado
per outr’ ome non seria. | E el Rei foi aprender (CSM 345, v. 38-39)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Onde desta razon grande | miragre contar vos quero
que fezo Santa Maria, | a Madre do gran Deus vero
que no dia do joizo | verrá mui brav’ e mui fero
e juygará o mundo | tod’ en mui pequena ora. (CSM 346, v. 5-8)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
juygará: FT; 3ps; S; s/p.
Desto direi ũu miragre | que en Tudia avo,
e porrey-o con os outros, | ond’ un gran livro é cho,
(CSM 347, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
porrey: FT; 1ps; S; encl.
(…) mas tu que es verdadeira,
Se tu queres, dá-mio vivo, | ca fazer-o poderias.” (CSM 347, v. 37-38)
poderias: FP; 2ps; S; s/p.
Desto direi un miragre que avo en Espanna,
que mostrou Santa Maria, a piadosa sen sanna, (CSM 348, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Ela lle disse: «Teu rogo de meu Fill' é ja cabudo;
onde por mingua que ajas non dés ren, mais atrevudo
sei ben, ca mui gran tesouro te darei que ascondudo
jaz sso terra, que meteron y mui peyores ca mouros.»
(CSM 348, v. 25-28)
darei: FT; 1ps; S; procl.
Onde daquest' un miragre vos direi, se m'ascuita[r]des,
mui fremos' a maravilla; e se y mentes para[r]des,
sa mercee averedes dela, e se [a] guardardes,
do inferno seeredes quitos e de ssa tormenta. (CSM 349, v. 10-13)
direi: FT; 1ps; S; procl.
averedes: FT; 2ppl; S; s/p.
seeredes: FT; 2ppl; S; s/p.
Un rey consigo tragia ha omagen fremosa
daquesta Virgen beita, Madre de Deus groriosa,
que a quantos la viyan era atan graciosa
que achar non poderian tal ontre mil e setenta. (CSM 349, v. 15-18)
poderian: FT; 3ppl; S; s/p.
292
E desta razon miragre [mui] fremoso vos direi,
que mostrou Santa Maria, com' eu en verdad' achei, (CSM 351, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Entonce disseron todos: «Se nos a Virgen non val,
con coita deste bon vo nos poderemos perder.» (CSM 351, v. 32-33)
poderemos: FT; 1ppl; S; procl.
Dest’ un remoso miragre | vos direi, se m’ascuitardes,
que fezo Snata Maria; e se y mentes parardes,
por mui grande o terredes | quant’ en ele mais cuidardes,
e veredes com’ a Virgen | á poder sobre natura. (CSM 352, v. 5-8)
direi: FT; 1ps; S; procl.
terredes: FT; 2ps; S; procl.
veredes: Ft; 2ppl; S; s/p.
ena Virgen groriosa | e creendo sen dultança
que seu açor lle daria | viv’ e são sen laidura.
(CSM 352, v. 42-43)
daria: FP; 3ps; S; procl.
e meteu outras tan boas | e atan ben cooradas,
que per ren non poderian | taes pintar de pintura. (CSM 352, v. 52-53)
poderian: FP; 3ppl; S; s/p.
Como un meninno que criava un abade en sa castra tragia
de comer ao menin[n]o que tiin[n]a a omagen
enos seus braços, e disso-ll' a omagen que comeria con ele mui çedo. (CSM 353, v. 1-3)
comeria: FP; 3ps; S; s/p.
Quen a omagen da Virgen e de seu Fillo onrrar,
deles será muit' onrrado no seu ben, que non á par. (CSM 353, v. 4-5)
será: FT; 3ps; S; s/p.
E de tal razon com' esta vos direi, se vos prouguer,
miragre que fez a Virgen, que sempre nosso ben quer,
(CSM 353, v. 6-7)
direi: FT; 1ps; S; procl.
Que comesse, e dizendo: «Cada dia t' adurey
desta raçon que me deren e tigo a partirey;
e poren te rog', amigo, que cómias, ca mui ben sei
que sse desto non comeres, outro non cho verrá dar.» (CSM 353, v. 56-59)
adurey: FT; 1ps; S; procl.
partirey: FT; 1ps; S; procl.
verrá: FT; 3ps; S; procl.
lle diss' un dia: «Contigo non comerei outra vez,
se cras mig' e con meu Padre non quiseres yr jantar.»
(CSM 353, v. 63-64)
comerei: FT; 1ps; S; s/p.
293
ao meno: «Meu fillo, se tu non comes assaz,
eu te darei ben que cómias, ca te vejo magr' andar.» (CSM 353, v. 68-69)
darei: FT; 1ps; S; procl.
Enton lle diss' o abade: «Pois que tu est' oyd' ás,
e creo certãamente que con eles jantarás,
rogo-t' eu que vaa tigo comer de tan bon manjar.» (CSM 353, v. 87-89)
jantarás: FT; 2ps; S; s/p.
e disse-lles: «Ai, amigos, cras m[e] irei eu, par Deus,
esto sei certãamente; e porend' a Don Mateus,
vosso monge, por abade escolled' en meu logar.» (CSM 353, v. 92-94)
irei: FT; 1ps; S; procl.
Desto direi un miragre grande que fez a Reynna,
Madre de Deus Jhesu-Cristo, a u rey que muito tia
(CSM 354, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Dade-mia qual quer que seja, sequer viva, sequer morta,
e conortar-m-ei con ela come quen se mal conorta.» (CSM 354, v. 35-36)
conortarei: FT; 1ps; S; mesocl.
O que Santa Maria | serviço fezer de grado,
na mui gran coita que aia | seer-ll-á galardõado. (CSM 355, v. 3-4, refrão)
seerá: FT; 3ps; S; mesocl.
E porend’ un seu miragre | vos direi de boa mente (CSM 355, v. 10)
direi: FT; 1ps; S; procl.
E diss’ el: E non iredes | comigo, se Deus me valla,
ca non querria con vossos | parentes aver baralla; (CSM 355, v. 30-31)
iredes: FT; 2ppl; S; s/p.
querria: FP; 1ps; S; s/p.
Ca, se mi a Virgen Maria | guardar, que é meu espello,
nunca me casarei vusco, | non vo-lo digo en trebello,
(CSM 355, v. 65-66)
casarei: FT; 1ps; S; procl.
Desto direi un miragre | que no Port’ aconteçeu,
(CSM 356, v. 6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Desto fezo eno Porto que de seu nom' é chamado
gran miragr' a Groriosa, que será per min contado, (CSM 358, v. 5-6)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Enton diss' a maestr' Ali un ome de sa conpanna:
«Eu vos mostrarei un canto da medida tamanna
que, se muitos end' ouverdes, a lavor será creçuda (CSM 358, v. 16-18)
mostrarei: FT; 1ps; S; procl.
será: FT; 3ps; S; s/p.
294
(...) e disse: “Non temas ren,
ca eu te porrei en salvo, | e esto verás tu ben, (CSM 359, v. 32-33)
porrei: FT; 1ps; S; procl.
verás: FT; 2ps; S; s/p.
Demais que dirá Deus Padre a seu Fill' o dia forte
do juyzo, quando ll' ele mostrar a cruz u pres morte
e as chagas eno corpo que pres pera dar conorte
a nos: «Nunca piedade foi nen será ja tamanna.» (CSM 360, v. 14-17)
dirá: FT; 3ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E dest' un mui gran miragre, meus amigos, vos direy
que avo na cidade de Burgos, e mui ben sey (CSM 361, v. 5-6)
direy: FT; 1ps; S; procl.
dizendo: «Se alá chego, ben ei fiuza en Deus
e na sa Madre beyta que veerei destes meus
ollos, que por meus pecados muit á sse foron serrar.» (CSM 362, v. 40-42)
veerei: FT; 1ps; S; s/p.
Desto direi un miragre | que eno gran Port’ avo (CSM 364, v. 6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
E verá aqueste monje que anda en gran loucura
en cuidar que non é nada a alma, ca da altura
deçeu meu Fill' e pres morte por ela fort' e mui dura; (CSM 365, v. 36-38)
verá: FT; 3ps; S; s/p.
Un falcon lle dessen feito, que mui de grado farian,
e que ena sa ygreja ant' o seu altar porriam; (CSM 366, v. 55-56)
farian: FP; 3ppl; S; s/p.
porriam: FP; 3ppl; S; s/p.
E ind' el Rei per mar, tanto ll'incharon
as pernas ambas e se lle pararon
assi vermellas que todos cuidaron
que daquel mal mui tarde sãaria. (CSM 367, v. 41-44)
sãaria: FP; 3ps; S; s/p.
De tal razon com' esta un miragre mui grande
direi, que fez a Virgen, a que queyra que ande (CSM 368, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Que fomos end' abade; e dar-t-emos consello
per que ben guarir possas, ca non é por trebello (CSM 368, v. 20-21)
daremos: FT; 1ppl; S; mesocl.
295
Guiará ta fazenda, per que sejas guarida.»
E ela foi-ss' a Silos; e pois que fez sa ida, (CSM 368, v. 25-26)
guiará: FT; 3ps; S; s/p.
(...)e pois que y chegares,
log' averás consello, desto non dovidamos.» (CSM 368, v. 32-33)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
A Caliz atan toste que for a madurgada,
aa See que éste de Santa Cruz chamada,
en que meu Fillo posto foy, ond' eu fuy prennada,
e averás saude, ca nos por ti rogamos.» (CSM 368, v. 40-43)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
E de tal razon com’ esta | vos direy un gran miragre, | sol que me ben ascoitedes,
(CSM 369, v. 9)
direy: FT; 1ps; S; procl.
Ela avendo gran coyta | e fazendo mui gran doo, | vo a ela as filla
Dizendo: “Madre, comede | e avede algun conorto; | ca seria maravilla,
(CSM 369, v. 83-84)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Diss’ un deles: Eu o trago, | que con mia moller casse,
mais pero vender-mio-ya | a quen mio mui ben comprasse.” (CSM 369, v. 90-91)
venderya: FP; 3ps; S; mesocl.
Outro dia o alcayde | vo irad’ e sannudo | a ssa casa por prende-la,
se ll’ a sortella non désse, | pois lle dava seus din[n]e[i][ros], que morreria por ela.
Enton chorand’ a mesquinna | rogou que a ascoitasse,
dizendo que lla daria, | sol que ll’ o seu entregas[s]e. (CSM 369, v. 108-111)
morreria: FP; 3ps; S; s/p.
daria: FP; 3ps; S; procl.
E de a servir sol non nos enfademos,
outrossi temer e loar, ca sabemos
que nos gãará dos erros que fazemos
perdon pera sempr' e vid' e alegria.
(CSM 370, v. 9-12)
gãará: FT; 3ps; S; procl.
Esta nos quis dar Deus por noss' a vogada
quando fez dela Madr' e Filla juntada;
e poren deve seer de nos loada,
e atal Sennor, quen-na non loaria (CSM 370, v. 14-17)
loaria: FP; 3ps; S; procl.
Pero direi un daqueles que pouco temp' á que fez
mui grande e mui fremoso esta Reynna de prez (CSM 371, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
296
E dest’ un gram miragre | direy, se vos prouguer,
que a Virgen b[e]yta | fez por hũa moller
na ygreja do Porto; |e quem mi oyr quiser
direi-lle com’ avo, | se mio ben ascoitar. (CSM 372, v. 5-6)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; encl.
Desto direy un miragre grande que me foi mostrado
que fezo Santa Maria, de que Deus quis seer nado,
en Xerez, na sa capela do alcaçar, que gãado
foi de mouros per sa graça que nunca será falida (CSM 374, v. 7-10)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E disse que lla daria. E pois foi en sa pousada
Don Manuel, el Rey logo non quis mais fazer tardada, (CSM 376, v. 52-26)
daria: FP; 3ps; S; procl.
E porend' ha vegada ha obra mui fremosa
pintava da Santa Virgen, Madre de Deus groriosa;
e el Rey, cuj' om' el era, por amor da preçiosa
Sennor, que el muit' amava, prometeu que lle daria (CSM 377, v. 11-14)
daria: FP; 3ps; S; procl.
Mais depois que a verdade deste feyt' ouve sabuda,
mandou logo que a carta non lle fosse detuda
e que lle déss'outra toste, se non, pa connosçuda
lle faria que peytasse, en que al non averia. (CSM 377, v. 26-29)
faria: FP; 3ps; S; procl.
averia: FP; 3ps; S; s/p.
Sobr' esto muitas vegadas mandou el Rey que lla dessen
e que per nulla maneyra de dar non lla detevessen,
e se non, que a sa ira averian, se fezessen
contra esto; mais aqueles alongavan cada dia. (CSM 377, v. 36-39)
averian: FP; 3ppl; S; s/p.
Onde daquest' en Sevilla fez ela miragr' atal
qual vos ora contar quero; e des que oyrdes qual
foi, por grande o terredes, ca ela que pod' e val
mostrou y sa gran vertude, ca sempre fez o mellor. (CSM 378, v. 22-25)
terredes: FT; 2ppl; S; procl.
E disse: «Se vos fezerdes o que vos quero dizer,
esta menyn' ao Porto yde logo prometer
da Virgen Santa Maria, e sse sãar, offreçer
lla yde, e mantenente perderá esta door.
(CSM 378, v. 42-45)
perderá: FT; 3ps; S; s/p.
297
Que logo que offrecerdes, que a menyna guarrá
E eles lle prometeron que a levassen alá
con sas offertas mui grandes; (CSM 378, v. 52-54)
guarrá: FT; 3ps; S; s/p.
Ar en dar-lle loor
avemos gran razon,
ca Deus a fez mellor
de quantas cousas son;
que sen par,
sen dultar,
ést'. E quem diria
en trobar
nen cantar
quant' i converria?
Sen calar...
Poren non quedarei
de sempre lle pedir
merçee, e rogar-ll-ey
que se de mi servir
quer e dar
me logar
u quant' eu querria
eixalçar
e poiar
seus feitos Maria.
Sen calar... (CSM 380, v. 41-62)
diria: FP; 3ps; S; s/p.
converria: FP; 3ps; S; s/p.
quedarei: FT; 1ps; S; s/p.
rogarey: FT; 1ps; S; mesocl.
querria: FP; 1ps; S; s/p.
Desto direi un miragre que no Porto conteçeu
que é de Santa Maria, dum menino que morreu, (CSM 381, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Sa madre, pois viu que morto era, a gran voz deu
dizend': «Ay, Santa Maria, dá-m' aqueste fillo meu;
se non, leva-me con ele, ca mais non viverei eu
eno mundo.» E con coyta foi logo esmoreçer.
(CSM 381, v. 25-28)
viverei: FT; 1ps; S; s/p.
“Se queredes que vos herde, | de grado vos herdarey
ali u o fazer possa, | ca per ren non fillarey
cousa que eu dada aja; | mais tal logar buscarey
per que sejades herdado | mui bem e vos dé bon don.” (CSM 382, v. 21-24)
herdarey: FT; 1ps; S; procl.
fillarey: FT; 1ps; S; s/p.
298
buscarey: FT; 1ps; S; s/p.
A [a] Virgen gloriosa, | y toda mesura jaz,
que ela na voontade | al Rey meta, se lle praz,
que dé aos monges canbio | por Alvaç[a]; e assaz
averei se me der esto, | e será bon gualardon. (CSM 382, v. 46-49)
averei: FT; 1ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E se m’aquesta merçee | Santa Maria fezer
do gran Port’, eu lle prometo | que lle darey como quer
dez livras de boa çera, | e fille-as quem quiser;
demais irei a ssa casa | e levarey meu bordon.”
(CSM 382, v. 56-59)
darey: FT; 1ps; S; procl.
irei: FT; 1ps; S; s/p.
levarey: FT; 1ps; S; s/p.
E pois aquest' ouve feyto, foy-sse logo sa carreyra
e levou si o sa filla por que non fosse senlleyra,
ca achar non poderia pera ssi tal companneira.
E passou per muitas terras, e atal foi sa ventura (CSM 383, v. 21-24)
poderia: FT; 3ps; S; s/p.
Desto direi un miragre, segundo me foi contado,
que avo a un monge bõo e ben ordin[n]ado (CSM 384, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Apareçeu ao frade que o guardav', en dormindo,
e viu que ao leyto se chegava passo yndo,
e dizia-lle: «Non temas, ca te farey ir sobindo
mig' ora a parayso, u veerás os mayores. (CSM 384, v. 40-43)
farey: FT; 1ps; S; procl.
veerás: FT; 2ps; S; s/p.
Ca por quanto tu pintavas meu nome de tres pinturas,
leva[r]-t-ey suso ao çeo, u verás as aposturas,
e eno Livro da Vida escrit' ontr' as escrituras
serás ontr' os que non morren, nen an coitas nen doores.» (CSM 384, v. 45-48)
levarey: FT; 1ps; S; mesocl.
verás: FT; 2ps; S; s/p.
serás: FT; 2ps; S; s/p.
e aquel monge lles disse: «Sennores, por cousimento
o que vi vos direy todo, se m' en fordes oydores.» (CSM 384, v. 57-58)
direy: FT; 1ps; S; procl.
Desto direi un miragre | que avo en Sevilla,
ena çidade mui nobre |que fez Deus por maravilla, (CSM 386, v. 5-6)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
299
Prol sua nunca fezeron | omes como nos faremos
en fazer vosso mandado, | e demais que seeremos
vosqu’ en assessegamento, | por que pois non temeremos
enquisas de mascarade, | que contra todos reganna.” (CSM 386, v. 25-28)
faremos: FT; 1ppl; S; procl.
seeremos: FT; 1ppl; S; s/p.
temeremos: FT; 1ppl; S; s/p.
Enquant’ as cartas faziam | desto, foron convidados
todos del Rey que comes[s]sen | con el, e que avondados
serian de quant’ ouvessen | mester; (...) (CSM 386, v. 35-37)
serian: FP; 3ppl; S; s/p.
E respos-lles el Rey logo: | “Asperad’ e veeredes
que fará Santa Maria, | u jaz merçee quamanna (CSM 386, v. 47-48)
veeredes: FT; 2ppl; S; s/p.
fará: FT; 3ps; S; s/p.
A que pera parayso | irmos nos mostra camin[n]os,
poder á de sãar vellos | e mancebos e menin[n]os. (CSM 389, v. 3-4, refrão)
á de sãar: FT; 3ps; A; s/p.
Poder á de sãar vello | se é tal que o mereçe,
E outro tal o mançebo | se faz boa mançebeçe, (CSM 389, v. 5-6)
á de sãar: FT; 3ps; A; s/p.
Con ela lá offreçessen; | ca non tiinnam dinneyros
que partir de ssi podessem, | nen ovellas nen carneiros
dos seus dar non y queiram, | ca os santos son arteiros;
mais dar-ll-ia dous capões | ou ben leu dous ansarin[n]os. (CSM 389, v. 30-33)
dar-ll-ia: FP; 3ps; S; mesocl.
Desto direy un miragre que eno gran Porto fez,
que é seu desta Reynna gloriosa de gran prez, (CSM 391, v. 5-6)
direy: FT; 1ps; S; s/p.
Desta quisa quarto dias | passar que non bevera
cousa que de bever fosse, | e tan gran coita soffrera,
que tod’ ome que o visse | terria que já morrera; (CSM 393, v. 25-27)
terria: FP; 3ps; S; s/p.
Ca o dia da gran Ça, | pois ouv’ os pees lavados
a seus discipulos, disse| que per ele muy guardados
seriam, ca pastor era | bõo e que seus gãados (CSM 398, v. 3-5)
seriam: FP; 3ppl; S; s/p.
E enquanto a lavravam, | demostrou y mui fremosos
miragres Santa Maria, | e d’oir mui saborosos,
pêra os que as merçee | d’ave-la son desejos[os];
mais un deles ontr’os outros | vos será per min contado. (CSM 398, v. 18-21)
300
será: FT; 3ps; S; procl.
Quen usar na de Deus Madre falar e amiga,
non lle falirám razões muy bõas que diga. (CSM 398, v. 5-6, refrão)
falirám: FT; 3ppl; S; procl.
Porend' un miragre dela direi muy fremoso
que mostro[u] na vila d'Elvas, e maravilloso, (CSM 399, v. 12-13)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
Ond' avo que un dia, seend' enserrada
en sa casa, foi cuidando muit' a malfadada
como matass' o menino; ca desenbargada
seria se o colgasse sequer da viga. (CSM 399, v. 22-25)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
(...) E logo na testa
lle foi põer a agulla, e diss': Oge festa
será pera mi ta morte.» Mais a que abriga (CSM 399, v. 33-35)
será: FT; 3ps; S; s/p.
Os maos feitos, [Deus] dar-t-ia porende maa morte,
e levaria o demo ta alma en sorte;
mais contra todas tas coitas darei gran conorte;
poren maa voontade de ti derrayga. (CSM 399, v. 42-45)
daria: FP; 3ps; S; mesocl.
levaria: FP; 3ps; S; s/p.
darei: FT; 1ps; S; s/p.
E poren fill' a teu fillo nos braços privado
e vay log' aa ygreja dizer teu pecado,
e tan toste nas tas coitas porrei eu recado;
(CSM 399, v. 47-49)
porrei: FT; 1ps; S; s/p.
Ca pero o don mui pouc' é,
segund' a mia pobreza,
non catará est', a la ffe,
a Sennor da franqueza;
ca por un don, esto sey ja,
que ll'eu dé, çento me dará
dos seus mui nobres dões,
e a mia mingua comprirá
conos seus gualardões.
(CSM 400, v. 20-28)
catará: FT; 3ps; S; s/p.
dará: FT; 3ps; S; procl.
comprirá: FT; 3ps; S; s/p.
Esto por don cho peço, | e ar pidir-ch-ei al:
Sennor Santa Maria, | pois que começad' ey
de pedir-che merçee, | non me departirey; (CSM 401, v. 81-83)
301
pidirei: FT; 1ps; S; mesocl.
ey de pedir: FT; 1ps; S; encl.
departirey: FT; 1ps; S; procl.
nen meu aver enpregue | tam mal com' enpreguey
en algu~us logares, | segundo que eu sey,
perdend' el e meu tenpo | e aos que o dey;
mas des oi mais me guarda, | e guardado serey. (CSM 401, v. 88-91)
serey: FT; 1ps; S; s/p.
Tantas son as merçees, | Sennor, que en ti à,
que porende te rogo | que rogues o que dá
seu ben aos que ama, | ca sey ca o fará
se o tu por ben vires, | que me dê o que ja
lle pedi muitas vezes; | que quando for alá
no parayso, veja | a ti sempr' e acá
mi acorra en mias coitas | por ti, e averá
me bon galardon dado; | e sempre fia
en ti quen souber esto | e mais te servirá
por quanto me feziste | de ben, e t' amará (CSM 401, v. 92-101)
fará: FT; 3ps; S; procl.
averá: FT; 3ps; S; s/p.
fiará: FT; 3ps; S; s/p.
servirá: FT; 3ps; S; procl.
amará: FT; 3ps; S; procl.
Aver non poderia
lagrimas que chorasse
quantas chorar querria,
se m’ante non nenbrasse
como Santa Maria (CSM 403, v. 2-6)
poderia: FP; 1ps; S; s/p.
querria: FP; 1ps; S; s/p.
Toller deve mal e aduzer bem
o leite que criou o que non ten
en seu poder e nos fez de non ren
e desfará quando lle semellar. (CSM 404, v. 5-8)
desfará: FT; 3ps; S; s/p.
Porend’ un miragre desta razon
vos direi, que xe valrrá um sermon, (CSM 404, v. 10-11)
direi: FT; 1ps; S; procl.
valrrá: FT; 3ps; S; procl.
Entr’ as molleres beita es tu;
Ca tal como ti, u acharán, u?
(CSM 404, v. 35-36)
acharán: FT; 3ppl; S; s/p.
302
Dest’ un miragre vos contarei que vi
escrit' en livro e dizia assi
com' oyredes adeante per mi,
que foi a Virgen fazer (CSM 407, v. 6-9)
contarei: FT; 1ps; S; procl.
oyredes: FT; 2ppl; S: s/p.
E crei ora esto que ti dig’ eu:
fas que te leven tost’ ant’ o altar meu;
e pois y fores, saud’ o corpo teu
logo poderá aver.” (CSM 407, v. 51-54)
poderá: FT; 3ps; S; s/p.
Respos el: “Esto farei logo de pran.” (CSM 407, v. 56)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
Ca lle falssou os costados | a saeta que de forte
baesta fora tirada; e colleu tal desconorte,
que ben cuidou prender morte,
que al y non averia. (CSM 408, v. 20-23)
averia: FP; 3ps; S; s/p.
Seja por nos loada,
e dereito faremos,
pois seu ben atendemos
e d’ aver o temos
por cousa mui guisada,
ca é noss’ avogada;
e de certo sabemos
que de Deus averemos
perdon e guannaremos
as merce’ acabada
per ela
(CSM 409, v. 6-16)
faremos: FT; 1ppl; S; s/p.
averemos: FT; 1ppl; S; s/p.
guannaremos: FT; 1ppl; S; s/p.
e demais deanteiros
en fazer sinaadas
cousas e mui preçadas
por ela, que contadas
sejan, que verdadeiros
lles son e prazenteiros, ca serán perdoados
porende seus pecados,
e guardados d’errança. (CSM 409, v. 71-79)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
E porque eu gran sabor ey
de a servir, servi-la-ey,
e quanto poder punnarey
303
d’os seus miragres descobrir. (CSM 410, v. 4-7)
servirey: FT; 1ps; S; mesocl.
punnarey: FT; 1ps; S; s/p.
Pero direi ant’ en bon son
das sas çinque festas, que son
mui nobres, e direi razon
que praza a quena oyr. (CSM 410, v. 9-12)
direi: FT; 1ps; S; s/p.
direi: FT; 1ps; S; s/p.
A mostra a saudaçion
d' Ave que Gabriel enton
lle disse que fillo baron,
Deus e om’, iria parir. (CSM 410, v. 24-27)
iria: FP; 3ps; S; s/p.
E daquesta naçença | falou muit' Ysaýa,
e prophetando disse | que arvor sayria
ben de rayz de Jesse, | e que tal fror faria
que do Sant' Espirito | de Deus fosse morada. (CSM 411, v. 5-8)
sayria: FP; 3ps; S; s/p.
faria: FP; 3ps; S; s/p.
Mas pero de seu padre, | que Joachin chamado
foi, e sa madre Anna, | direi-vos seu estado: (CSM 411, v. 15-16)
direi: FT; 1ps; S; encl.
E disse-lle: "Non temas, | Anna, ca Deus oyda
a ta oraçon ouve; | e poren sen falida
de teu marido filla | averás, que comprida
será de todos bes | mais d'outra e preçada."
(CSM 411, v. 55-58)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
"Com' irei a mia terra | u reçebi quebranto
grand' entre meus vezinnos, | que eu, palo Deus santo,
quisera que a testa | me foss' ante tallada? (CSM 411, v. 66-68)
irei: FT; 1ps; S; s/p.
Ca à porta do templo | disseron-mi os porteiros,
pois non avia fillos | como meus conpanneiros,
non entraria dentro, | nen aves nen cordeiros
nen ren de mia offerta | non seria fillada. (CSM 411, v. 70-73)
entraria: FP; 3ps; S; s/p.
seria: FP; 3ps; S; s/p.
E por esta vergonna | e por este de~osto
fogi a esta terra, | e ei ja assi posto
que nunca alá torne; | e eno mes d'agosto
304
averá ben seis meses | que fiz aqui estada (CSM 411, v. 75-78)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
O angeo lle disse: | "Eu soon mandadeiro
a ti de Deus do çeo | por te fazer certeiro
que de ta moller Anna | averás tal erdeiro
per que toda a terra | será enlumada. (CSM 411, v. 85-88)
averás: FT; 2ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
E se esto que digo | tes por maravilla,
certãaamente cree | que te dará Deus filla,
que o que perdeu Eva | per ssa gran pecadilla
cobrar-ss-á per aquesta, | que será avogada (CSM 411, v. 90-93)
dará: FT; 3ps; S; procl.
cobrará: FT; 3ps; S; mesocl.
será: FT; 3ps; S: s/p.
Cousa, e non passedes | de Deus seu mandamento,
e id' a vossa casa | logo sen tardamento;
ca se o non fezerdes, | quiçay por escarmento
vos dará Deus tal morte | que será mui sõada." (CSM 411, v. 110-13)
dará: FT; 3ps; S; procl.
será: FT; 3ps; S; s/p.
que lles respos chorando: | "Pois que vos praz, varões,
farei vosso consello; | mais, por Deus, compannões,
guardade-mi os gãados | en aquesta mallada." (CSM 411, v. 116-118)
farei: FT; 1ps; S; s/p.
E pois lles esto disse, | meteu-ss' aa carreira
por s'ir pera sa casa | veer sa compan[n]eyra,
que o be~eyto angeo | fezera [ja] certeira
que Joachin verria | pela porta dourada, (CSM 411, v. 120-123)
verria: FP; 3ps; S; s/p.
E que a el saysse | reçebe-lo, aginna;
ca Deus enas sas coitas | porria meezinna
e lle daria filla | dele tal que Reynna
seria deste mundo | e dos çeos chamada.
porria: FP; 3ps; S; s/p.
daria: FP; 3ps; S; procl.
seria: FP; 3ps; S; s/p.
Tod' aqueste mund' a loar deveria
a virgĩidade de Santa Maria. (CSM 413, v. 3-4)
deveria: FP; 3ps; S; s/p.
Ond' ela foi prenne. Mas como x'ant' era
ficou virgen, que foi maravilla fera;
305
ca tant' ouve door com[o] ant' ouvera
que ouvesse fillo. Queno cuidaria (CSM 413, v. 10-13)
cuidaria: FP; 3ps; procl.
E porend’, amigos, mentes parade
e veredes obra muit’ ordin[n]ada
de como Deus buscou carne sagrada (CSM 414, v. 18-20)
veredes: FT; 2ppl; S; s/p.
E u lle disse: “Beeyto será
aquel fruito que de ti naçerá”, (CSM 415, v. 30-31)
será: FT; 3ps; S; s/p.
naçerá: FT; 3ps; S; s/p.
aqueste Santa Maria ouv' en si, por que prender
vo Deus en ela carne, con que nos pois julgará. (CSM 418, v. 10-11)
julgará: FT; 3ps; S; procl.
O terceyro de consello ést', e con mui gran razon
o ouve Santa Maria; porque quantas ora son
molleres nen foron ante non ouveron beycion
de Deus com' aquesta ouve, nen outra non averá. (CSM 418, v. 18-21)
averá: FT; 3ps; S; s/p.
O quarto é fortaleza; e aquesta ouv' en ssi
tan grande, per que o demo perdeu seu poder dali
u Deus en ela pres carne e foi ome, ca des i
foi britad' e mal apreso, e ja mais non cobrará. (CSM 418, v. 23-26)
cobrará: FT; 3ps; S; s/p.
O quinto don é çiente, que ouve grand' e bon sen
a Virgen Santa Maria, que a fez responder ben
quando ll' o angeo disse que do que todo mantem
seria Madr', e diss' ela: Por serva m[e] achará(CSM 418, v. 28-31)
seria: FP; 3ps; S; s/p.
achará: FT; 3ps; S; procl.
O sesto don piadade é que ouv' e á de pran
a quantos nas grandes coitas a chamam e chamarán;
e poren Santa Maria os peccadores la an
ante Deus por avogada, e por sempr' assi será. (CSM 418, v. 33-36)
chamarán: FT; 3ps; S; s/p.
será: FT; 3ps; S; s/p.
O septimo destes dões é aver de Deus temor;
aquest' ouv a Groriosa, pero sempre con amor;
e por aquesto foi ela Madre de Nostro Sennor
Jhesu-Christo, Deus e ome, que por sempre regnará.
(CSM 418, v. 38-41)
regnará: FT; 3ps; S; s/p.
306
E un ramo de palma lle deu log' en sinal
que dend' a tercer dia, non averia al,
que verria por ela o Rey espirital,
seu Fillo Jhesu-Christo, que en ela encarnou. (CSM 419, v. 30-33)
averia: FP; 3ps; S; s/p.
verria: FP; 3ps; S; s/p.
Disso-ll' a Santa Virgen: «Sennor, e qual nom' ás?»
O angeo respos-lle: «Esto non saberás,
ca meu nom' é mui grande; mas çedo veerás
os apostolos tigo, que Deus vir mandou (CSM 419, v. 35-38)
saberás: FT; 2ps; S; s/p.
veerás: FT; 2ps; S; s/p.
E pois juntados sodes, esto vos rogarei
que vigiedes migo; ca eu de certo sei
que cras en aquel dia deste mundo m'irei,
ca un angeo santo comig' esto falou.» (CSM 419, v. 70-73)
rogarei: FT; 1ps; S; procl.
irei: FT; 1ps; S; procl.
Eles, quand' est' oyron, choraron log' assaz;
pois disseron: “Faremos, Sennor, o que vos praz.” (CSM 419, v. 75-76)
faremos: FT; 1ppl; S; s/p.
Mais a ora da sesta, direi-vo-lo que fez
Deus, que foi Padr' e Fillo desta Virgen de prez: (CSM 419, v. 85-86)
direi: FT; 1ps; S; encl.
E disso a San Pedro: «Direi-ch' o que farás:
pois mia Madr' é finada, non esperes a cras, (CSM 419, v. 90-91)
direi: FT; 1ps; S; encl.
farás: FT; 2ps; S; s/p.
Enton disse San Pedro: «Tenno que será prol
d'irmos provar aquesto que nos diz este fol;
(CSM 419, v. 140-141)
será: FT; 3ps; S; s/p.
San Pedr[o], e os outros todos a ha voz
en terra se deitaron, pedindo per Ayoz
perdon a Santo Thomas; e diss' el: «Ha noz
non daria por esto, pois con verdad' estou.»
(CSM 419, v. 150-153)
daria: FP; 3ps; S; s/p.
con ousadia
que nos desvia
da bõa via
que levaria
nos u devia,
u nos daria
307
sempr' alegria
que non falrria
nen menguaria,
mas creçeria
e poiaria
e compriria
e 'nçimaria
a nos. (CSM 421, v. 19-32)
levaria: FP; 3ps; S; s/p.
daria: FP; 3ps; S; procl.
falrria: FP; 3ps; S; s/p.
menguaria: FP; 3ps; S; s/p.
creçeria: FP; 3ps; S; s/p.
poiaria: FP; 3ps; S; s/p.
compriria: FP; 3ps; S; s/p.
encimaria: FP; 3ps; S; s/p.
U verrá na carne | que quis fillar de ty, Madre,
joyga-lo mundo | cono poder de seu Padre. (CSM 422, v. 4-5)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
E u el a todos | pareçerá mui sannudo,
enton faz-ll’ enmente | de como foi conçebudo. (CSM 422, v. 7-8)
parecerá: FT; 3ps; S; s/p.
U verás dos santos as compannas espantadas,
mostra-ll’ as tas tetas | santas que ouv’el mamadas. (CSM 422, v. 13-14)
verás: FT; 2ps; S; s/p.
U ao juyzio | todos, per com’ é escrito,
verrán, di-lli como | con el fugisti a Egito. (CSM 422, v. 16-17)
verrán: FT; 3ppl; S; s/p.
U leixarán todos | os viços e as requezas,
di-lle que sofriste | con el[e] muitas pobrezas.
(CSM 422, v. 19-20)
leixarán: FT; 3ppl; S; s/p.
U queimará fogo | serras [e] vales e montes,
di com’ en Egipto | non achast’ aguas nen fontes. (CSM 422, v. 22-23)
queimarás: FT; 2ps; S; s/p.
U verás os angeos | estar ant’ ele tremendo,
di-lle quantas vezes |o tu andast’ ascondendo. (CSM 422, v. 25-26)
verás: FT; 2ps; S; s/p.
U dirán as tronpas: | “Mortos, levade-vos logo”,
di-ll’ u o perdiste | que ta coita non foy jogo.
(CSM 28-29)
dirán: FT; 3ppl; S; s/p.
308
U será o ayre | de fog’ e de suffr’ aceso,
di-ll’ a mui gran coita | que ouviste pois foi preso (CSM 422, v. 31-32)
será: FT; 2ps; S; s/p.
U verrá do çeo | sôo mui fort’ e rogido,
di-ll’ o que soffriste | u d’açoutes foi ferido. (CSM 422, v. 34-35)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
U terrán escrito | na frontes quanto fezeron,
di-ll’ o que soffriste | quand’ o ena cruz poseron. (CSM 422, v. 37-38)
terrán: FT; 3ppl; S; s/p.
E du o mar grande | perderá as semellança,
di-ll’ o que soffriste | u lle deron cona lança. (CSM422, v. 46-47)
perderá: FT; 3ps; S; s/p.
E u a terra fez, mostrou ben qual
poder avia; mas quen comidir,
por mais terrá u por nos remiir
andou en ela e sogreu gran mal. (CSM 423, v. 21-24)
terrá: FT; 3ps; S; s/p.
Diss' Erodes: «Creed' a mi,
ca bon conssello vos darei:
id', e pois tornardes des i,
ar y-lo-ei eu connoçer.» (CSM 424, v. 38-41)
darei: FT; 1ps; S; procl.
yrei: FT; 1ps; S; mesocl.
Grand' alegria vos será;
ca o veeredes alá
en Galilea, u está
segund' vos el dit' avia.»
(CSM 425, v. 45-48)
será: FT; 3ps; S; procl.
veeredes: FT; 2ppl; S; procl.
Mas ante les disse: “Ide preegar
o meu Evangeo per cada logar,
e quantos creveren e se batiçar
quiseren de grado, logo serán meus. (CSM 426, v. 20-23)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
Os que non creveren, perdudos serán;
mai-los outros diabres deitarán
dos omes e lenguages falarán
mais que aqueles que albergan romeus, (CSM 426, v. 25-28)
serán: FT; 3ppl; S; s/p.
deitarán: FT; 3ps; S; s/p.
falarán: FT; 3ps; S; s/p.
309
Nen lles nuzirá se beveren poçon,
e guarrán de todo mal e de lijon
aos enfermos.” (CSM 426, v. 30-32)
nuzirá: FT; 3ps; S; procl.
guarrán: FT; 3ps; S; s/p.
Ena maneira que o veedes dacá
subir ao ceo, ben assi verrá
joyga-lo mund’ e os mortos fará
ressurgir, que non creen os fariseus.” (CSM 426, v. 40-43)
verrá: FT; 3ps; S; s/p.
fará: FT; 3ps; S; s/p.
Muitas vezes lles fora prometer
Deus que per seu Espirito saber
lles faria todas [las] cousas entender
mellor que nunca sage en todo o mund' aprendeu. (CSM 427, v. 18-21)
faria: FP; 3ps; S; procl.
E porend' os dicipolos meter
se foran de su~u e atender
en hu~a casa por aquel don reçeber;
e estand' ali, direi-vos eu o que lles conteçeu: (CSM 427, v. 23-26)
direi: FT; 1ps; S; encl.
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