do praticante), esse primeiro modelo de sistema já exige, para seu correto
funcionamento, uma intensa atividade criadora, não só para escolher as imagens
visuais a serem memorizadas como para qualificá-las com as cores específicas que
caracterizam as construções simbólica de cada mente em particular. Relembrando
a citação sobre os paralelos entre pintura e poesia sugeridos por Simônides, fica
mais fácil apreender o sistema dos locais antigo como um método de criação
interior que combina desenho/pintura e poesia na sua concepção, e a enunciação
falada na sua expressão. À sua maneira, tal método já exige a disposição dos
conteúdos históricos do artista para elaboração das imagens a serem associadas aos
textos, mesmo que sua expressão final não se dê pelas formas, senão pelos sons.
Paralelamente à sistematização da arte da memória, Platão surge como o
primeiro grande pensador a inserir efetivamente a arte da memória na teoria geral
do conhecimento. A mnemônica platônica é a arte de cultivar a memória em
consonância com a sua teoria do conhecimento inato, problematizando o ato de
recordar para além de modelos técnic os de fixação interior e reprodução de
imagens e textos tratados até então. Na República
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, Platão define sua teoria da
reminiscência, sugerida no exercício maiêutico do diálogo Ménon, detalhada em
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Da mesma forma como se utiliza das alegorias do mito da caverna para ilustrar a relação entre o mundo
sensível e o mundo inteligível, Platão , no mesmo livro, conta a história do mito de Er para tratar da função da
memória e do esquecimento. Em breves palavras, o pastor Er morre, e é levado ao Hades, onde encontra
diversos heróis, amigos, artistas e parentes queridos que lá contemplam o conhecimento absoluto. Porém, Er
lá descobre que o sentido da morte é oferecer aos homens a oportunidade de renascer e, assim, se purificar em
seu retorno e na nova vida dos erros da existência anterior. Portanto, é perguntado aos mortos como gostariam
de voltar à Terra. Muitos dizem que gostariam de voltar como reis, nobres, ricos comerciantes. Outros, pedem
sabedoria e uma vida mais modesta, e partem todos de regresso ao mundo dos vivos navegando pelo rio Lethé
(esquecimento). Na viagem de volta, aqueles que foram mais gananciosos sentem muita sede, e bebem
descontroladamente a água do rio. Não sabem que essa água tem o dom de promover o esquecimento de todas
as formas belas, do conhecimento e da verdade que experimentaram no Hades, por isso voltam ainda mais
ignorantes à Terra do que quando partiram. Ao contrário, aqueles que escolheram uma vida de moderação,
não sentem tanta sede, bebem menos da água do esquecimento e retornam mais sábios à vida, reduzindo o
ciclo de morte e renascimento e antecipando seu aprendizado da verdade. Eis, em tons claríssimos, a
perspectiva do filósofo sobre as relações entre prazer do corpo e conhecimento.