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Os estudos realizados ao longo dos anos já destacavam a existência, ao lado da
competência narrativa, de uma competência descritiva. Estudiosos de lingüística textual tais
como Hamon (1981), Charaudeau (1992), Adam (2005) etc enfatizam que o modo descritivo não
é apenas um complementar dos demais modos, podendo mesmo estar presente de forma
onipresente em determinados gêneros textuais. Como destaca Adam (2005:95-97), nota-se a
presença desse modo, por exemplo, em listas de compras, receitas, etc.
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Hamon (1981:98)
propõe: “mais do que a descrição, é melhor falar de descritivo e considerando mais uma vez esse
descritivo como uma << dominante >> constituída por certos tipos particulares de textos”
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Ainda segundo Hamon (1981:40), todo e qualquer ouvinte ou leitor de um texto pode
reconhecer de forma intuitiva a presença de uma unidade descritiva dentro de uma macroestrutura
textual, através de características específicas deste modo de organização discursivo ou por
reconhecer certas modificações mais profundas do processo comunicativo de um texto. O modo
descritivo leva o leitor a uma visão diferente do mundo, criando nele certas posturas de
destinador e de destinatário do texto; o mesmo leva o texto a um outro fluxo textual, a um novo
horizonte convocando uma nova imagem do emissor da mensagem e, ao mesmo tempo, criando
um novo estatuto de leitor, exigindo deste uma forma diferente e específica de competência para
que haja uma leitura efetiva do texto.
Para Hamon (1981:42/43), a competência descritiva de um texto é definida em termos
paradigmáticos, lexicais e enciclopédicos. Em termos paradigmáticos observa-se que a memória
impõe a repetição de termos lexicais de um mesmo conjunto de vocábulos relativos a um mesmo
tema através da declinação de um paradigma. Como exemplo disto, é visto o vocábulo “casa”
cujo o uso permite a inserção de outros vocábulos no mesmo contexto descritivo: muros, janelas,
escadas, portas etc, ou seja, objetos que fazem parte de uma casa. Em termos lexicais nota-se a
persistência de um mesmo significado através da pluralidade de lexemas diferentes que
constituem o esquema descritivo de uma casa, conforme já visto. Em termos enciclopédicos,
percebe-se que a memória a longo prazo do leitor é solicitada, já que - para compreender o texto
– o leitor/ouvinte precisa recorrer a todo o seu arcabouço vocabular,ou seja, à sua enciclopédia
pessoal de conhecimento. Por outro lado, uma estrutura narrativa vai requerer do seu leitor uma
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Não há consenso quanto à classificação desses tipos de texto, pois, segundo Werlich de Longrage, o gênero
‘receita’, por exemplo, pode ser considerado um tipo de texto especificamente procedural. (Pág.95). Sendo situado,
deste modo, entre dois modos de organização do discurso : o narrativo e o descritivo.
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“Plutôt que de description, il faudrait donc mieux parler de descriptif, et considérer encore une fois ce descriptif
comme une <<dominante>> construite par certains types particuliers de textes”.