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desvinculado assim né. Mas, antigamente a eleição era através da irmandade do rei da rainha e
o terno acompanhava eles, o terno, o grupo, né tinha obrigação de acompanhar eles.
(...) Hoje o que eu vejo é assim é geralmente pela pessoa mais velha, um dos preceitos
é a pessoa mais velha, por exemplo, lá na companhia de Cunha que tinha rei, e na outra
companhia também de Cunha do bairro da Cachueira, do Marechal, tanto lá na Vársea do
Gouveia, como no bairro da Cachueira, dois bairros que são de Cunha, o rei era o mais velho.
Do bairro da Cachueira morreu então o filho ficou no lugar do pai, dos grupos que ainda
preservam essa tradição, de ter o casal real ou pelo menos um rei ou uma rainha, o que eu vejo
é assim é o mais velho e quando o pai morre o filho é convidado a ocupar o lugar do pai, então
lá era o seu Sebastião Rodrigues, se eu não me engano, ai ele morreu e agora é o filho dele
que está segurando a bandeira.
(...) Tem que ter conhecimento também né.
Tem que ter é. Hoje a influência do rei no mando do Moçambique assim não é tão é...
não influencia tanto, mas antigamente era o rei que passava as ordem pro mestre pra ele ir
conduzindo o grupo, entendeu, as vezes quando tinha uma coisa demais, sei lá, o mestre
consultava o rei, acho que era por isso que era o mais velho. Porque na companhia do
Marechal, por exemplo, de vez em quando ele parava, o Marechal era o mestre mais velho, o
mestre que morreu mais idoso de Moçambique, morreu com quase cem anos, e era nossa, um
dos maiores mestres de Moçambique. Então ele, por exemplo, na companhia do Marechal, de
vez em quando ele parava, ele terminava uma parte assim e conversava, não sei o que, com o
rei e depois voltava de novo. Acho que sei lá, que parte que eu faço agora, ou se notou alguma
coisa diferente, não sei, porque pelo fato dele ta segurando a bandeira também ele tem
condição de ficar observando tudo que ta rolando e o mestre ta naquela tensão de comandar
então muita coisa passa desapercebido pra ele”.
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Nesse sentido, sendo a bandeira um objeto sagrado, não seria qualquer pessoa
que estaria apta a carregá-la:
“Exatamente por isso que tem esse preceito que era o mais velho, antigamente que era
o mais velho, hoje você não observa mais isso, que eu falei pra você. Mas, antigamente era a
pessoa mais idosa, porque coisa que você vai viver ela já viveu entendeu, ele tem mais
experiência, ele é mais sábio, idade é sabedoria, então quanto mais velho mais sábio é. Isso
tem haver com a tradição africana ficou no inconsciente do pessoal, do brasileiro, mas tem a ver
com a tradição africana, que a velhice vem acompanhada da sabedoria, e o jovem é a fortaleza
né, o vigor, tem que andar os dois juntos, um tem que andar com o outro, porque sem a força
física..., mas sem sabedoria, não adianta nada né. Igual um elefante você amarra o elefante, o
elefante é um bichão né, você amarra ele no cantinho ele fica ali parado, ele não sabe a força
que ele tem, entendeu, é a mesma coisa, não tem consciência né. Então eu noto assim que
esse fato deles escolher o mais velho tem haver com a tradição africana, quase que
inconsciente que eles tem isso, que tem haver com o lado africano, mas o preceito é..., era que
a pessoa mais velha que era o rei.
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Depoimento de Mestre Silvio Antonio de Oliveira, coletado 19/03/2005.