Goiabada. Nome horrível que Dona Gertrudes resolveu mudar. Consultou a filha, a filha pediu
um dia para pensar, pensou e sugeriu dois a escolher: Florzinha e Violeta. Dona Gertrudes
recusou, passou em revista outros e afinal se decidiu por Dorotéia Cabral. Daí a celebridade.
Toda gente fez questão de conhecer Dorotéia Cabral. E Dona Gertrudes explicava: - Os animais
não são nossos irmãos inferiores? Pois então, ué! Devem ter nome de gente! Por isso o genro
se animou um dia a observar: Se a cachorrinha tem direito a nome de gente tem direito a
apelido. Dorotéia Cabral é muito comprido: fica sendo Tetéia. Dona Gertrudes não discordou.
Fez porém uma restrição: - Não há dúvida. Tetéia está bem. Mas só na intimidade.
Enquanto crescia o amor de Dona Esmeralda (que não tinha filhos) pela Tetéia grandes
sucessos modificavam a vida do país. E Jataí-Vila (cidade, cabeça de comarca, mas sempre
Jataí-Vila para distinguir de Jataí-Estação onde passavam os trilhos da Boigiana) foi teatro de
muitos e variados acontecimentos. Com seus quatro mil e setecentos vizinhos há muitos anos
vivia empenhada em furiosa luta política: de um lado os partidários de Zéquinha Silva desde
cinco lustros chefe do situacionismo, de outro os do Major Mourão (alentejano de nascimento) e
seu braço direito Nicolau Foz. Aqueles eram os perrepistas. Estes os oposicionistas. Luta local
só. Os antiperrepistas também pertenciam incondicionalmente ao P. R. P. Mas ao P. R. P.
estadual, ao governo. Nunca ao de Zequinha Silva. A ambição deles era constituir um dia com
sua gente o P. R. P de Jataí-Vila. Obedeciam â orientação de um deputado que em Jataí-
Estação era situacionista, em Jataí-Vila oposicionista. E tecia seus pauzinhos na Capital junto
aos chefões para derrubar o tiranete de Jatai-Vila que a oposição não se cansava de apontar
como indigno dos nossos foros de civilização e cultura.
A coisa porém continuava no mesmo pé sem dar esperanças de modificação próxima. Até que
veio o movimento revolucionário de outubro de 1930. Então principiou uma emulação
desesperada. Todas as provas iniludíveis de dedicação à causa da legalidade (o que eqüivalia
dizer à causa sagrada do Brasil unido) foram dadas pelos dois partidos. Zéquinha Silva
telegrafava solidariedade aos Presidentes da República e do Estado, o Major Mourão
imediatamente fazia o mesmo. Fazia mais: estendia essa solidariedade inabalável ao Ministro
da Guerra ao Ministro da Marinha, ao Presidente da C. D do P. R. P., ao Secretário da Justiça e
ao Chefe de Policia do Estado. E quando Zéquinha resolveu organizar um batalhão patriótico a
oposição anunciou a formação de dois: infantaria e cavalaria. Porém Zéquinha Silva contava
com maior número de elementos. Trinta e dois sujeitos pegados à força pelo Subdelegado
Tolentino foram convenientemente calçados e seguiram logo sob o comando do cabo do
destacamento. Este levava uma carta do diretório para o Secretário da Justiça pedindo que os
voluntários de Jataí-Vila fossem aproveitados na faxina dos quartéis da Capital "para sossego
de suas respeitáveis famílias. cujo patriotismo honra sobremaneira as nossas gloriosas
tradições bandeirantes". Passados uns dias a Viúva Mané Bindão (inventora e fabricante única
de um doce chamado "beija-me-devagar") recebeu carta do filho dizendo que a coisa em Itararé
estava bem preta. A Viúva Mané Bindão foi na casa do Zéquinha e amaldiçoou a família Silva
até a última geração. A oposição pulou nas ruas de contentamento Pulou um dia só entretanto:
o governo mandou perguntar para o Major Mourão se os homens dele seguiam ou como era. O
major respondeu que estavam de partida. Foi uma vergonha. O Afonso Henriques. filho do
major, afundou no mato com dois primos. Antônio Vicente de Camargo Júnior, um dos chefes
oposicionistas. declarou que não criara filho para carne de canhão. E assim todos. Até que
Nicolau teve uma idéia. Três léguas para o norte em São Benedito do Alecrim, nas divisas de
Minas, havia dois batalhões em pé de guerra: um paulista aquartelado no Grupo Escolar
Marechal Deodoro, outro mineiro no Grupo Escolar Marechal Floriano. Os dois prédios ficavam
na mesma rua. Mas seus ocupantes trocavam gentilezas. Cada batalhão só esperava a hora de
aderir ao adversário. Pois então: era comunicar para o governo que o pessoal oposicionista de
Jataí-Vila iria reforçar a tropa de São Benedito do Alecrim. E estava tudo arranjado.
Não estava. O governo mandou ordem para os homens partirem sem demora para a Capital. Aí
seria resolvido o destino deles. Que remédio? O Major Mourão recrutou três matadores
profissionais, dois ladrões de cavalos, um preto maluco que pensava que era relógio e vivia no
Largo da Matriz movendo os braços que nem ponteiros, um surdo-mudo de nascença e um tal
Chico Rosa mais conhecido por Chico Perna-de-Pau. Os matadores e os ladrões custaram cem