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Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy”
UNIGRANRIO
Terezinha Fatima Martins Franco Brito
Polifonia, (in) formação e (re) conhecimento de discursos críticos e
interpretativos na sociedade contemporânea em uma análise de obra
didática para o Ensino Fundamental II.
Orientadora: Profª. Drª. Jacqueline de Cassia Pinheiro Lima
UNIGRANRIO
Duque de Caxias, RJ
2010
Dissertação apresentada à Universidade do Grande Rio
“Prof. José de Souza Herdy”, Unigranrio,
como parte dos requisitos para obtenção do grau
de mestre em Letras e Ciências Humanas.
Área de concentração:
Discurso, Cultura e Formação Humana.
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Terezinha Fatima Martins Franco Brito
Polifonia, (in) formação e (re) conhecimento de discursos críticos e
interpretativos na sociedade contemporânea em uma análise de obra
didática para o Ensino Fundamental II.
Duque de Caxias
2010
Dissertação apresentada à Universidade do Grande Rio
“Prof. José de Souza Herdy”,Unigranrio, como parte dos
requisitos para obtenção do grau de mestre em Letras e
Ciências Humanas.
Área de concentração:
Discurso, Cultura e Formação Humana
Orientadora:
Professora Doutora Jacqueline de Cassia Pinheiro Lima
Orientadora: Professora Doutora Jacqueline de Cassia
Pinheiro Lima.
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DEDICATÓRIAS:
Ao Senhor Deus, Criador da VIDA e de todos os tempos, Pai Nosso que estais no Céu,
Pai Nosso que estás aqui!
À minha mãe, uma Rosa em minha vida, que me gerou na flor da idade, suportou as
dores de um parto a rceps e me abençoa a todo o momento. Cuidava de meus filhos para eu
poder estudar e lecionar e que ainda cuida de nós a todo instante de nosso dia-a-dia, com o
carinho de mãe, avó e bisavó!
Ao meu pai, que embora jamais o tenha conhecido, no único dia em que me pegou no
colo e eu estava com um mês de vida, ele disse: “Se fosse menino seria jogador de futebol,
mas que é uma menina, será professora!”. “Você faz parte desse caminho que hoje eu sigo
em Paz!”
Ao meu tio Ernani Martins Franco (em memória), que foi meu pai, meu irmão, meu
maior amigo, quem me ensinou a ler e escrever e que me presenteava com livros, histórias em
quadrinhos, revistas, palavras cruzadas... Sempre um Anjo para mim!
À minha tia Nadir Martins Franco (em memória), mais que tia, uma grande amiga,
minha irmã, a minha “Leleguinha”, que um incêndio na empresa em que trabalhava a levou
ainda tão jovem para o Reino de Deus!
Ao meu padrasto, também em lembrança, José de Souza Ramos, que sempre me
chamou de “Senhorita Professora”!
A minha avó e madrinha, Filomena da Conceição Franco, que escolheu o meu
primeiro nome, me criou, me educou, me incentiva até hoje e alegra-se com minhas pequenas
vitórias! É mãe, avó, bisavó e tataravó! Uma bênção!
Aos meus três filhos, Rodrigo, Philippe e Fernanda, jóias preciosas, dádivas de Deus,
grandes presentes da minha vida, em todos os momentos!
À minha neta Eduarda, princesa linda da Vovó Tetê!
A todos os meus alunos e alunas. Eu sempre irei levá-los dentro do meu coração.
não façam muita bagunça porque eu tenho prolapso de válvula mitral.
A toda a minha ascendência da Família Ribeirinha, de Vale de Gouvinhas, Portugal.
AGRADECIMENTOS
Mais uma vez e sempre a Deus. Ele tudo sabe, tudo vê e nos abençoa. Ainda bem! Em
Sua Divina Pedagogia, conduziu-nos por inúmeros percalços: doenças, privações,
provocações, demissões, assaltos, ndromes... Mas também muitas alegrias! estamos nós,
uma turma de primeiro mestrado em uma universidade na Baixada Fluminense, defesa de
dissertação! Ele, Senhor do Tempo e Deus da vida em plenitude, sabe das dificuldades e
dons de cada um de nós.
À minha orientadora, (“a terceira foi aquela a quem Terezinha deu a mão”!)
Professora Doutora Jaqueline de Cássia Pinheiro Lima, que me acolheu nessa dissertação,
quase em trabalho de parto, numa triangulação: a dissertação, a orientadora e a pesquisadora.
Mas, destas, a orientadora está grávida de verdade, em inícios de uma nova e abençoada
gravidez!
Ao Professor Doutor Rogério Casanovas Tílio, que era o primeiro Orientador, mas
passou no Concurso para a UFRJ. Grata pelas preciosas orientações, por apresentar-me
Fairclough, Bronckart e Halliday, pelas excelentes indicações de leituras, companhia no
InPLA, no COLE, no Salínguas, na Unisinos, no Silid... Grata, também pela exigência, pela
(im) paciência com meus blablablás, meus chororôs, meus tins e tens e tais! Ao segundo
orientador, Professor Doutor Airto Ceolin Montagner, que passou no Concurso para a
UFRRJ. Agradeço a calma, a atenção, indicações de leituras, o livro que me emprestou, a
companhia no II Seminário Nacional de Gênero e Práticas Culturais - Culturas, Leituras,
Representações, em 2009, lá em João Pessoa!
A todos os professores doutores e professoras doutoras do Mestrado em Letras e
Ciências Humanas da UNIGRANRIO, pelo pioneirismo, pelos incentivos, pela aprendizagem
de vida. Aos professores participantes da Banca Examinadora e do Exame de Qualificação,
pelas sugestões feitas ao trabalho.
Ao meu companheiro Antonio Fernando, mais que amigo de todas as horas, sempre
presente, acompanhando-me em cada passo dessa caminhada, presente em minha vida, meu
confidente, meu incentivador; se não fosse a crença dele em afirmar, constantemente, que eu
seria capaz, eu nem teria me inscrito no mestrado.
Ao meu ex-marido e sempre amigo Nilson, pai de meus três filhos e avô de minha
neta.
Um brinde aos nove componentes da Primeira Turma de Mestrado em Letras e
Ciências Humanas da UNIGRANRIO”. E quem disse que “noves fora é nada?”. Aliás, nada
de noves fora! Rumo ao doutorado!
RESUMO
MARTINS FRANCO, Terezinha Fatima Brito. Polifonia, (in) formação e (re)
conhecimento de discursos críticos e interpretativos na sociedade contemporânea em
uma análise de obra didática para o Ensino Fundamental II.
A presente dissertação investiga as múltiplas vozes e o discurso presentes em alguns textos e
suas atividades interpretativas, em uma coleção didática de Língua Portuguesa destinada ao
Ensino Fundamental, séries finais. Analisamos a obra enquanto documento, com o intuito de
observar se esse documento atende a alguns aspectos das políticas públicas que veem, entre
outras necessidades da sociedade contemporânea, as obras didáticas como um espaço para
construção de cidadania e valores identitários e, a partir desses dados, verificar se a obra
didática analisada pode contribuir para a formação de cidadãos com desenvolvido pensamento
crítico e conscientes da multidiversidade do mundo. De acordo com alguns aspectos de
documentos oficiais, tais como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n
o
9394/96, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCN) e o Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD), verificamos através de textos e suas atividades
interpretativas, como são apresentados os gêneros discursivos nesse recorte, aqui vistos como
inseridos numa perspectiva de gênero enquanto entidade sociodiscursiva e forma de ação
social e, também, como estão representadas, nessa perspectiva, questões relacionadas ao
mundo em que vivemos e os contextos culturais relacionados aos apelos presentes na
sociedade. Conduzimos esta pesquisa em bases qualitativas, inserida no âmbito da Linguística
Aplicada, através da contextualização proposta pelos textos e suas interpretações elaboradas
pelos autores da obra analisada. Pretendemos direcionar o foco deste trabalho na Análise
Crítica do Discurso (ACD), nas pesquisas de gêneros textuais, em alguns teóricos que
investigam as ideologias e questões socioculturais contemporâneas, numa perspectiva
sociointeracionista de ensino e aprendizagem. Este trabalho analisa uma coleção didática
formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos de número um, que
constam do primeiro capítulo em cada unidade temática, perfazendo um total de dezesseis
textos e respectivas atividades. A escolha destes capítulos e textos de número um se deveu ao
fato desses representarem o primeiro contato, dos leitores projetados, com o tema da unidade
onde aqueles estão inseridos e atenderem a vários tópicos estruturais da obra, entre estes o
gênero textual. Com base no mapeamento de textos e atividades de compreensão e
interpretação na obra didática analisada, elaboramos tabelas que registram a ocorrência de
categorias de análise que utilizamos neste trabalho. Foram identificadas as diversas visões de
mundo ressaltadas nos textos que formam o nosso corpus, evidenciando que a escolha dos
tópicos elaborados pelos autores, confrontados com as teorias, propiciam a formação de um
pensamento crítico da realidade em que estamos inseridos. Porém, alguns tópicos baseados
nos PCN e PNLD, em especial ao que concerne aos gêneros textuais, poderiam ter sido
melhor explorados, uma vez que ainda foram identificados alguns estereótipos, além da
predominância de alguns gêneros textuais sobre outros, importantes socialmente. O estudo da
obra também demonstrou que a multiplicidade de vozes (polifonia) explorada nos textos e
atividades selecionadas, possibilita a percepção das situações heterogêneas e
problematizadoras componentes do meio social em que vivemos.
Palavras-chave: Livro didático; Polifonia; Texto; PCN; PNLD, Identidades.
ABSTRACT
MARTINS FRANCO, Terezinha Fatima Brito. Polyphony, (in) formation, recognition and
knowledge of critical and interpretative discourses in the contemporary society in a
textbook of Portuguese language analyses.
This dissertation investigates the multiple voices and the discourse which are present in some
texts and in its interpretative activities, in a collection of textbooks of Portuguese Language
destined for the final years of the Elementary Education. We analyzed the work as a
document, aiming to observe if it answers to some aspects of the public policy that, among
other needs of contemporary society, see the textbook as a room to the building of citizenship
and of identity values. By observing the data, we aim to verify if the analyzed work may
contribute to the formation of citizens with a developed critical thinking and aware of the
multi-diversity of the world. According to some official documents, as the LBD number
9394/96 (law that rules the National Education), the Brazilian Curricular Parameters of
Portuguese Language (PCN) and the National Program of the Textbooks (PNLD), we verified
through the texts and its interpretative activities how the different genres are presented, as
well as how issues related to the world we live in and the cultural contexts related to the
appeals present in society are represented under this perspective. They are seen here as
inserted in a genre perspective as a social-discursive entity and also as a means of social
action. We drove this research in qualitative basis, inserted in the Applied Linguistic field,
through the contextualization proposed by the texts and its interpretations, which were
prepared by the authors of the analyzed book. We intend to lead our focus to the Critical
Discourse Analysis (CDA), to the research of textual genres and to some theorists who
investigate the contemporary ideologies and socio-cultural issues, in a social interactionist
perspective of teaching and learning. This work analyzes a didactic collection consisted of
four books, and our outline consists of the texts number one”, that are part of the first chapter
in each thematic unit, which make up a total of sixteen texts and its respective activities. The
chapters and texts of number one were chosen due to the fact that they represent the first
contact of the projected readers with the theme of the unity where the chapters and texts are
inserted in, and also due to the fact that they answer to many structural topics of the work
among them, the textual genre. Based on the mapping of the texts and the activities of
interpretation and comprehension in the analyzed work, we prepared tables that register the
occurrence of categories of analyses that we use in this work. Varied worldviews were
identified in the texts that are part of our corpus, showing that the choice of the topics
prepared by the authors, confronted to the theories, provide the formation of a critical thinking
about the society we are inserted in. However, some topics based on PCN and PNLD,
specially the ones concerning to the textual genres, could have been better explored, once that
some stereotypes were identified, as well as the predominance of some textual genres over
others, which are socially important. The study of the textbooks also showed that the
multiplicity of voices (polyphony) explored in the selected texts and activities makes possible
the perception of the heterogeneous and problematizing situations that make part of the social
environment we live in.
Key-words: textbooks; polyphony; text; PCN; PNLD, identities
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................12
1.1 Uns vislumbres da situação-problema............................................................................12
1.2 Os textos e seus múltiplos veículos pedagógicos............................................................17
1.3 Objetivos............................................................................................................................19
1.3.1 Objetivo Geral...............................................................................................................20
1.4 Questões de pesquisa........................................................................................................22
1.5 Organização de estudo.....................................................................................................23
2 ESTRUTURA METODOLÓGICA PARA ESSE ESTUDO..........................................25
2.1 Relevância do estudo........................................................................................................28
2.2 Delimitação do estudo......................................................................................................29
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA....................................................................................31
3.1 Discurso e sociointeracionismo........................................................................................37
3.1.1 Texto...............................................................................................................................44
3.2 Contemporaneidade e educação.....................................................................................47
3.2.1 Parâmetros Curriculares..............................................................................................53
3.3 O livro didático.................................................................................................................56
3.3.1 PNLD 2011 de Língua Portuguesa..............................................................................59
4 METODOLOGIA ................................................................................................................ 61
4.1 Teoria ................................................................................................................................. 62
4.2 Descrição do corpus .......................................................................................................... 64
4.3 Procedimentos de análise ................................................................................................. 66
5. ANÁLISE DE TEXTOS SELECIONADOS E INTERPRETAÇÃO ............................ 72
5.1 Visão de mundo e a polifonia no contexto cultural ....................................................... 73
5.1.1 O mundo visto através de tópicos e configurações tópicas ........................................ 76
5.1.2 A construção identitária na obra didática de Língua Portuguesa...........................103
6 REFLEXÕES CRÍTICAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................... 105
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 108
ANEXOS ............................................................................................................................... 114
Lista de abreviaturas e siglas:
ABRALE - Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos
ABRELIVROS - Associação Brasileira dos Editores de Livros
ACD Análise Crítica do Discurso
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
ECT - Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos
FNDE - Fundo Nacional para o desenvolvimento da Educação
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
INL - Instituto Nacional do Livro
ISD Interacionismo sociodiscursivo
LD Livro Didático
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LDP Livro Didático de Língua Portuguesa
LP Língua Portuguesa
LSF Linguagem Sistêmico-Funcional
MEC - Ministério da Educação
PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais
PL Português - Linguagens
PLIDEF - Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental
PNBE - Programa Nacional Biblioteca da Escola
PNLD - Programa Nacional do Livro Didático
Lista de figuras
Figura 2.5a: O livro didático nas práticas sociais
p. 26
Figura 2.5b - Fairclough (1992): concepção tridimensional de discurso
p. 28
Figura 1 (Texto)
p. 77
Figura 2 (Ilustração)
p. 78
Figura 3 (Texto)
p. 82
Figura 4 (Estudo de texto)
Figura 5 (Texto)
Figura 6 (Texto)
Figura 7 (Compreensão e interpretação)
Figura 8 (Texto)
Figura 9 (Texto)
Figura 10 (Texto)
Figura 11 (Boxe)
p. 83
p. 84
p. 87
p. 88
p. 91
p. 99
p. 99
p, 100
Lista de quadros
Quadro 3.1 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 6º ano
Quadro 3.2 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 7º ano
Quadro 3.3 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 8º ano
Quadro 3.4 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 9º ano
Quadro 4.1 Da análise quanto ao PNLD
Quadro 4.2 Da análise quanto ao PNLD
Quadro 5.1 Categoria de tópicos com base em Tílio (2006)
Quadro 5.1.1a 6º ano e os resultados das análises
Quadro 5.1.1b 7º ano e os resultados das análises
Quadro 5.1.1c 8º ano e os resultados das análises
Quadro 5.1.1d 9º ano e os resultados das análises
Quadro 5.2 Unidades, capítulos e textos do 6º ano
Quadro 5.3 - Unidades, capítulos e textos do 7º ano
Quadro 5.4 - Unidades, capítulos e textos do 8º ano
Quadro 5.5 - Unidades, capítulos e textos do 9º ano
Lista de exemplos
Exemplo 1 trecho de questão
p. 88
Exemplo 2 trecho de questão
p. 91
Exemplo 3 trecho de questão: texto 1
p. 92
Exemplo 4 trecho unidade 2, cap. 1, texto 1
p. 93
Exemplo 5 trecho unidade 4, cap. 1, texto 1
p. 93
Exemplo 6 trecho de questão
p. 93
Exemplo 7 trecho de questão
p. 100
12
1 INTRODUÇÃO
O interdisciplinar, de que tanto se fala, não está em confrontar
disciplinas constituídas das quais, na realidade, nenhum consente
em abandonar-se. Para se fazer interdisciplinaridade, não basta tomar
um “assunto” (um tema) e convocar em torno duas ou três ciências. A
interdisciplinaridade consiste em criar um objeto novo que não
pertença a ninguém. O texto é, creio, eu, um desses objetos.
(BARTHES, 1988, p. 99)
A proposta desta dissertação de mestrado é apresentar uma revisitação aos textos e
atividades interpretativas de uma obra didática de Língua Portuguesa, destinada para o sexto
ao nono ano do Ensino Fundamental, o que despertou a intenção da pesquisadora em
investigar mais detidamente o discurso neste recorte, porque sempre encontrou nos textos
(desde a primeira cartilha
1
) um caminho a ser percorrido a fim de descobrir novas
possibilidades de estudos e questionamentos, sobretudo quanto à compreensão e
interpretação, ou seja, buscava entender a aplicação desses textos à vida.
Considera-se que a pesquisa surgiu da preocupação com a função educativa e,
consequentemente, com os efeitos que poderiam ser extraídos a partir dos textos e as formas
em que esses são trabalhados, especialmente quando integram uma obra didática que chega às
mãos de educadores, alunos, familiares, à sociedade. Portanto, o que a leitura é capaz de
proporcionar à aprendizagem é algo que nos move à colheita de (in)formação.
Por isso, a pesquisa, a abordagem com textos, tornou-se instigante, sobretudo no que
diz respeito àqueles incluídos nas obras didáticas de Língua Portuguesa, doravante LP.
Identificar significados ocultos nas entrelinhas, mensagens contidas no significado das
palavras e o poder dos textos e enunciados em gerar novas realidades, descobrir novas
possibilidades, pode-se dizer, são os interesses que reafirmamos e que nos levaram ao
presente trabalho.
1.1 Uns vislumbres da situação-problema
Pretende-se que se descreva através de textos e atividades relacionadas a eles, com a
inquietude de investigação, o que se pode apreender e depreender em cada leitura e nas
atividades propostas com base nessas leituras. Ou seja, mesmo vistos em sua forma impressa,
1 Impossível não citar essa particularidade que é registro de memória, de história de vida: “A Princesinha do
ABC”, Cartilha de Alfabetização; autoria de Maria Guaraldo; ano de 1964; Editora Vozes Limitada.
13
os textos, ao serem lidos, apresentam, por eles mesmos, possibilidades de inferir como as
pessoas criam novas realidades de significação, relações e conhecimento, fazendo uso de
textos” (DIONÍSIO, 2009). Nesse aspecto educacional houve, a partir de documentos oficiais
tais como a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 20 de
dezembro de 1996, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), os Temas Transversais de
LP e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) que organizam critérios, aqui no caso
de obra didática de LP, para maior articulação dos textos e as atividades propostas com eles,
sendo considerados, entre outros aspectos, espaços de aprendizagem, de construção do
conhecimento, de investigação, de pesquisas que permitem um leque de possibilidades,
embora tenhamos feito um recorte dentro das propostas desses documentos oficiais.
Para este trabalho, destacamos a obra de Língua Portuguesa intitulada Português:
Linguagens”, doravante PL, de autoria de William Roberto Cereja e Thereza Cochar
Magalhães, composta por quatro livros no total, sendo um para cada série do Ensino
Fundamental II (6º ano até o ano). Procura-se investigar se, através das leituras e das
análises dos textos selecionados para a pesquisa, conduz-se, ou não, à constatação de que o
material pedagógico, objeto de pesquisa, possibilita a instrumentação do professor na
formação de cidadãos conscientes de seu papel em um mundo pautado pela multidiversidade,
portadores de um pensamento crítico e autônomo. Serão vistos os vários aspectos
concernentes ao que cada leitura pode apresentar, pois a escolha dos textos que formam o LD
não pode ser vista como aleatória, eles têm um propósito a alcançar, conforme será verificado
no decorrer do trabalho.
Cada texto nos apresenta múltiplas informações, ou seja, pode traduzir uma grande
diversidade de facetas, de apelos ligados às questões da contemporaneidade, como por
exemplo, numa função de representação de identidades, voz a inúmeros atores e setores da
sociedade, daí surgindo oportunidades para o diálogo entre essas vozes.
2
A partir de textos
dispostos numa obra, podem ser examinadas relações de poder que atravessam, como diz
Moita Lopes (2003, p.26), remetendo a Foucault ([1969], 2007), “as relações sociais
cotidianas de forma capilar no nível de micro-poderes do dia-a-dia”. Os textos apresentam,
através da multiplicidade de vozes, a oportunidade em obter-se informações de cultura,
especialmente de mundo. Portanto, a problemática deste trabalho intenciona, por meio da
2 Apelos existentes na sociedade contemporânea sejam eles de origem étnica, de gêneros, identidades, enfim, às
orientações contidas nos documentos oficiais tais como LDB 9394/96, PCN, PNLD e outras obras publicadas
com esse intuito de identificar essas vozes.
14
Análise Crítica do discurso
3
, sem perder de vista as interações sociais (sociointeracionismo),
4
que se perceba nos textos da coleção didática em estudo, aqui vista enquanto documento, as
diversas práticas sociais nas quais se pode chegar ao outro (alteridade).
No dia-a-dia, convivemos, através da linguagem, com diversas estratégias de inclusão
e exclusão do outro. É uma preocupação das questões que envolvem a formação cidadã a
discussão e revisitação de temas específicos com a intenção de repensar essas práticas sociais
e destacar o papel da linguagem (aqui em particular da linguagem textual) na formação,
manutenção e/ou transformação da história, do comportamento e das relações humanas
quanto a, se de fato, existe uma concretização desse reconhecimento das diferenças, das
culturas, das condições de inclusão, do estudo dos gêneros, das identidades no discurso dos
textos apresentados na obra que analisamos.
Analisa-se, deste modo, a obra didática como um instrumento de produção que oferece
ferramentas para o processo de reconhecimento do outro através das ideias estabelecidas e
negociadas com o discurso e até que ponto este é portador de ideologias. “A esse conjunto de
ideias, a essas representações que servem para justificar e explicar a ordem social, as
condições de vida do homem e as relações que ele mantém com outros homens é o que
comumente se chama ideologia”, segundo afirma Fiorin (2007, p.28). Para ele “todo
conhecimento está comprometido com os interesses sociais” (2007, p.29) e, se os textos
utilizados numa obra didática promovem conhecimento, logo se supõe que eles estão
comprometidos com os interesses sociais, no sentido positivo, evidentemente. Queremos ver o
social no discurso desses textos. Pode-se entender que o discurso é o portador da ideologia
que lhe serve de suporte, que o sustenta e promove condições de aplicação à vida social.
Não se discute nesse momento da pesquisa a importância desse material para a
utilização de professores e alunos no espaço de sala de aula. A nossa investigação não
envolve o livro em uso, mas queremos visualizar essas perspectivas através do que está
proposto no material em análise. Há, atualmente, um crescente interesse pelo estudo do LD, e
os estudos sobre o tema se dão sob os mais variados recortes, e podemos dizer que o ponto
nevrálgico é a pesquisa dos processos de formação do pensamento social. Uma obra didática
não substitui, evidentemente, a formação continuada de profissionais especializados que a
3 Análise Crítica do Discurso: (ACD) linha britânica de estudos sobre discurso, que assume papel de descrição
sociológica do trabalho científico por meio da investigação linguística, oferecendo atenção ao processo de
produção e interpretação textual caracterizados por tensões sociais.
4 Sociointeracionismo: em torno deste tema, a partir dos PCN de Língua Portuguesa , pretendemos refletir sobre
possibilidades discursivas quando da produção de documentos (os textos que analisamos) a respeito do que as
atividades interpretativas propõem na obra Português: Linguagens para a interação social.
15
utilizam, isso é um outro assunto que não contemplamos aqui, mas queremos observar sim, se
os interesses comprometidos com a cidadania “falam” por eles mesmos, ou seja, podem ser
identificados nesse instrumento de (re)conhecimento e poder. Em relação ao conhecimento,
podemos verificar em Silva (2009): O conhecimento não é aquilo que põe em xeque o poder:
o conhecimento é parte inerente do poder”. (SILVA, 2009, p.149).
Nas vozes que se apresentam no LD podemos verificar esse conhecimento como parte
que integra variados poderes, entre os quais, os dos autores dos textos, os autores da obra, a
editora, o currículo que determina os conteúdos, os gêneros textuais mais adequados para
determinadas séries... Sobre essa questão do currículo, Silva (2009) também nos orienta que
o currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as
teorias tradicionais nos confinaram. O currículo é o lugar, espaço,
território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória,
viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum
vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto,
discurso, documento. O currículo é documento de identidade.
Essa multiplicidade de mensagens encontradas no LD nos permite ouvir a diversidade
de interesses da e na sociedade e vai orientar para a produção de enunciados interpretativos
que apontam, através de diferentes formas de discurso, para a promoção de modos de pensar
mais críticos. A diversidade de interesses a que nos referimos pode ser entendida quanto, no
caso de textos, às possibilidades de pluri/multi/inter/trans/in/disciplinaridade, embora nosso
enfoque não esclarecer as diferenças entre esses prefixos. Utizamos em nossas abordagens
mais vezes o termo “interdisciplinaridade”, até porque é mais usual empregá-lo nos assuntos
sobre as práticas pedagógicas contemporâneas. Quanto a esse uso, destacamos uma
contribuição oportuna:
A falsa imagem de que está ocorrendo trabalho interdisciplinar no ensino
surge, assim, de idéias equivocadas, como por exemplo, a de que um
professor de um curso, ao dar aulas em outro curso, está estabelecendo uma
relação interdisciplinar. Isto pouco tem a ver com a definição de
interdisciplinaridade como um conceito orgânico, em comum, entre
disciplinas. O que costuma acontecer nestes casos é que o profissional que
aulas numa área que não é a sua mostra-se incapaz de adequar os
conteúdos de seu curso às necessidades da nova área. (COUTO, 1997 , p.03)
A epígrafe que introduz nosso trabalho vem ao encontro dessas palavras da autora e
atendem ao que concordamos em relação ao termo interdisciplinaridade para o que aqui
abordamos. Não adianta apenas dizer que se faz algo e, na prática, o percebermos esse
discurso. Em muitas abordagens pedagógicas se diz a respeito, mas pouco se faz
concretamente. Em resenhas de coleções didáticas, por exemplo, traz-se essa informação, que
16
nem sempre é contemplada nas obras. Destacamos mais um comentário sobre esse assunto
que nos apresenta que
o conceito mais flexível de interdisciplinaridade reflete uma visão mais
aberta a inclusões, onde o desenvolvimento de trabalhos conjuntos implica
admitir uma ótica pluralista e dialógica. Corresponde a reconhecer que a
ordem da ação não está presidida por um método, não é perfeita, mas
pode ser aperfeiçoada pela confrontação de pontos de vista, num diálogo
permanente, que pressupõe a presença de valores por vezes aparentemente
incompatíveis.(COUTO,1997 , p.13)
Muitos poderiam indagar o que poderiam os textos de LP relacionar-se a seus
conteúdos de outras disciplinas, mas se verificarmos que nos textos existe a polifonia a que
nos referimos neste trabalho, não seria difícil verificar pontos em comum. Se tudo é discurso e
com ele construímos nossa realidade e, consequentemente, nossa identidade, é possível
verificar e (re)conhecer, a interdisciplinaridade e sua atuação “como um processo contínuo e
interminável de elaboração do conhecimento, orientado por uma atitude crítica e aberta à
realidade”. (COUTO, 1997 , p.13)
É importante observar como o discurso tem sido construído na identidade nacional e,
se observamos esse discurso sendo analisado num material didático empregado com a
finalidade de promover questionamentos, é preciso verificar se esse documento possibilita
usarmos essa identidade nacional e, também, se usamos a linguagem de forma consciente e
reflexiva, pois segundo Moita Lopes
o discurso como uma construção social é percebido como uma forma de
ação no mundo. Investigar o discurso a partir dessa perspectiva é analisar
como os participantes envolvidos na construção do significado estão agindo
no mundo por meio da linguagem e estão, desse modo, construindo a sua
realidade e a si mesmos. (MOITA LOPES, 2002, p. 31).
As intenções que existem em cada discurso podem permitir que reflitamos mais sobre
a realidade e adotemos um posicionamento crítico diante dela. “Por isso, a cada formação
ideológica corresponde uma formação discursiva, que é um conjunto de temas e de figuras
que materializa uma dada visão de mundo” (FIORIN, 2007, p.32). É ainda importante
verificar se os textos que constituem a indicação de texto de número um e integrantes de
primeiro capítulo, em cada unidade estudada, fazem jus a iniciarem as discussões de uma
unidade que apresenta um tema central a ser contextualizado.
As escolhas dos contextos culturais apresentados pelos livros e as atividades
propostas pelos autores podem permitir, ou não, que determinadas
identidades sejam construídas, ou, pelo menos, manifestadas, em um
determinado momento. (TÍLIO, 2006, p. 19)
17
Esses contextos podem referir-se a diferentes situações relacionadas às questões
culturais amplas, ou seja, os textos podem apresentar contextos étnicos, de gênero, de
sexualidade, de valores sociais, de política, de economia, etc., e que se manifestam através do
discurso e das formações ideológicas e de poder. “Por conseguinte, as formações ideológicas
ganham existência nas formações discursivas”, de acordo Fiorin (2007, p. 32). Nesse
aspecto, o que nos preocupa de sobremaneira quando o assunto é uma obra didática, é se esta
poderá oferecer suporte à formação educacional pretendida para o desenvolvimento cultural
dos educandos.
Também perpassa pela preocupação pedagógica de que a obra projeta discursos de
múltiplas vozes oriundas dos textos que a compõem e que, nesse acervo, consequentemente,
ocorrerá (in) formação e (re) conhecimento quanto aos discursos críticos e interpretativos que
existem na sociedade em geral. Podemos verificar, segundo Tílio (2006) que “o livro didático,
enquanto forma de produção na modalidade escrita, pode ser considerado um documento
pedagógico, pois constitui parte integrante das práticas educacionais”.
Procuramos entender o processo de desenvolvimento das atividades de interpretação
dos textos selecionados na obra em estudo, a fim de verificar se esses textos são utilizados
como meros pretextos ou se promovem realmente uma dinâmica entre saberes, objetos e
práticas de ensino. Portanto, a relevância desse tema de pesquisa, em selecionar textos e
atividades interpretativas, reside no fato de que ao se refletir sobre a dinâmica da ação
polifônica desses elementos contribuir-se para com a importância social dos textos e
gêneros discursivos, visto que a leitura e interpretação são essenciais em situação de trabalho,
minimizando, muitas vezes, a dificuldade de compreensão de enunciados nas mais diferentes
abordagens e contextos transdisciplinares.
1.2 Os textos e seus múltiplos veículos pedagógicos
Além de vermos os textos como portadores de vozes, no sentido da polifonia,
ferramentas ou outra denominação que possa ser apropriada e que os representem na
qualidade de serem múltiplos veículos pedagógicos, pretendemos analisá-los não apenas
como atividades próprias de uma relação do universo escolar, mas, também, no processo de
construção de ações que promovam valores de vida e perspectivas cidadãs de acordo com as
necessidades da sociedade contemporânea, que precisa de conscientização crítica quanto às
situações concretas que dependem de tomada de decisões.
Ainda, é inegável a pluralidade cultural do contexto em que vivemos e que pode ser
observada nos mais variados espaços sociais, inclusive nas escolas e, especialmente, nas salas
18
de aula. Mas, é nos espaços acadêmicos e noutros que possam promover essas discussões, que
vemos uma oportunidade de colocar-se em prática a interdisciplinaridade, há tempos
discutida. Se documentos que discutem isso, falta abri-los, discuti-los e (re) descobrir as
(in) formações importantes a fim de dinamizarmos essas propostas de melhor compreensão da
realidade em que somos inseridos, pois
muito se diz que o Brasil é um país rico em diversidade étnica e cultural
plural em sua identidade: é índio, afro-descendente, imigrante, é urbano,
sertanejo, caiçara, caipira... Contudo, ao longo de nossa história, têm existido
preconceitos, relações de discriminação e exclusão social que impedem
muitos brasileiros de ter uma vivência plena de sua cidadania. (BRASIL,
1998, PCN de Pluralidade Cultural, p.15)
Tanto o documento dos PCN quanto tantas outras obras importantes e que também são
documentos tratam dessas questões. Podemos conferir em Candeau que
as relações entre educação e cultura (s) nos provocam a situar-nos diante das
questões colocadas hoje pelo multiculturalismo no âmbito planetário e de
cada uma das realidades nacionais e locais em que vivemos. As
configurações desta problemática são distintas conforme o contexto em que
nos situemos e suscitam muitas discussões e polêmicas no momento atual.
(CANDEAU, 2008, p. 17)
Um livro que contenha textos que possam favorecer uma leitura dessa realidade que
nos cerca e que ofereçam atividades relacionadas, contextualizadas, que possibilitem que essa
mesma pluralidade, que frequentemente acarreta confrontos e conflitos, possa ser
compreendida, analisada, interpretada irá, sem dúvida, auxiliar no trabalho pedagógico, visto
que vêm se tornando cada vez mais contundentes os desafios a serem enfrentados pelos que
atuam em educação.
No entanto, se essa mesma pluralidade for apreciada através de leituras e atividades
coesas e coerentes, certamente poderá propiciar uma contribuição para o enriquecimento e a
renovação das possibilidades de atuação pedagógica. Antes, porém, de apresentarmos a
metodologia e analisarmos se os textos selecionados para o trabalho podem oportunizar uma
formação voltada para valores de cidadania, conforme um dos aspectos apresentados entre
nossos objetivos, examinaremos o que a obra tem a nos apresentar.
Nesse recorte sobre o qual nos debruçamos, deparamo-nos com essa inquietação
relacionada aos textos e exercícios sobre os mesmos enquanto espaços de pesquisa, ensino e
aprendizagem. Portanto, neste estudo, é pertinente a análise e reflexão sobre algumas questões
no sentido de identificar se existem condições de aprendizagem com esses elementos e como
é possível identificar esse processo de aprendizagem a partir da coleção didática, os textos e
atividades elaborados para serem trabalhados na obra. E, ainda, como essas atividades
19
realizadas com base nos textos, ou a partir deles, contribuem, à luz das exigências da LDB,
dos PCN e PNLD, no processo de ensino e aprendizagem exigidos na contemporaneidade.
Num corpus formado por uma coleção didática com quatro volumes, um para cada
série do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental, e uma seleção total de dezesseis textos
5
,
sendo que, cada texto escolhido é o que representa o primeiro capítulo de cada uma das quatro
unidades, sobre os quais elaboramos quadros para melhor visualização do que explanamos e
que abordaremos mais adiante, pretendemos encontrar também resposta a essa questão.
Partimos do pressuposto de que o LD é fundamental para o processo de ensino-
aprendizagem, pois é um documento que porta vozes (sem hífen, mesmo) importantes de serem
ouvidas e com as quais os educadores fazem eco, esses mesmos educadores se apropriam de
informações e os alunos são introduzidos na e para a aprendizagem com base nessas informações
ou provocações para discursos. Vemos, então, a importância desse documento ser avaliado e
reavaliado. Um importante passo na direção dessa avaliação criteriosa do LD foi, sem dúvida, a
implementação do PNDL, visando coordenar a aquisição gratuita de livros didáticos aos alunos
das escolas públicas brasileiras. Isso é muito importante e sério! Precisamos nos debruçar nesse
exame no sentido de (re) conhecer que material é esse que chega a tantas mãos.
A obra que analisamos se encontra pela quarta vez aprovada pelo PNLD e tem tido
atualizações ao longo desses anos, com objetivos claros de estar cada vez mais em
conformidade com as exigências dos documentos oficiais, pois nada é aleatório. Os volumes
que fazem parte da análise estão editados quanto às novas orientações ortográficas.
Consideramos importante salientar que essa coleção didática é utilizada tanto nas escolas da
rede pública de ensino, através do já citado PNLD, quanto da rede particular; portanto, sua
abrangência é bem ampla. Objetivamos, entre outras possibilidades de pesquisa, verificar se a
obra didática PL corrobora para a contribuição do trabalho docente e o processo de formação
identitária do corpo discente. Ou seja, nossa investigação no documento visa também
“analisar como o discurso do livro didático, através da seleção e apresentação de tópicos e
contextos culturais e das atividades propostas, relaciona-se à construção de identidades sociais
dos alunos” (TÍLIO, 2006, p.20) às quais acrescentamos a dos professores.
1.3 Objetivos
5 Aqui enfatizamos, até utilizando propositamente diversas vezes a palavra “cada”, que nosso destaque são os primeiros
textos que pertencem ao primeiro capítulo de cada unidade apresentada em cada volume da obra e que cada volume possui
quatro unidades com temas específicos para cada uma delas. Queremos, além dessas considerações metodológicas, analisar o
que eles nos dizem (polifonia) e o que se extrai deles na obra didática.
20
Entre nossos objetivos, pretende-se identificar se nos textos destacados na obra
abordagens sobre a construção de formas de pensar críticas, assuntos da contemporaneidade e
educação; verificar se nos estudos interpretativos sobre esses textos, o Livro Didático de
Língua Portuguesa, doravante LDP, dialoga com propostas da LDB, os PCNs com os temas
transversais e o PNLD. Utilizaremos essas abordagens e estudos nos capítulos que são
apresentados e que serão desenvolvidos neste trabalho, que se insere no campo de estudo da
Linguística Aplicada por esta considerar “questões de uso da linguagem do mundo real, ou
seja, tem uma preocupação social”. (TÍLIO, 2006, p.21). São, portanto, objetivos gerais de
pesquisa, conforme explica Richardson (1989, p.23) aqueles que definem "o que se pretende
alcançar com a realização da pesquisa". Os objetivos específicos, por sua vez, aqueles que
"definem aspectos determinados que se pretendem estudar e que contribuem para alcançar o
objetivo geral" (idem). Com vistas a atender essas prerrogativas acreditamos poder alcançar o
objetivo geral deste trabalho. Eis nossos objetivos:
1.3.1 Objetivo Geral
Verificar se a obra didática analisada pode contribuir para a formação
de cidadãos com desenvolvido pensamento crítico e conscientes da multidiversidade
do mundo onde atuam.
1.3.2 Objetivos específicos
Investigar se os textos analisados mantêm a polifonia e adequação
interpretativa para o momento histórico-político-social em que são trabalhados.
Identificar situações de poder que possam estar inseridas nos textos
selecionados para análise, bem como em suas questões de interpretação textual.
Como foi dito, mas é importante frisar, a obra didática com a qual trabalhamos
possui quatro unidades e cada unidade está dividida em três capítulos. Essa proposta de
trabalho considera os primeiros textos de cada primeiro capítulo, tendo em vista serem esses
textos os que significam o primeiro contato que o leitor terá com o tema proposto pela
unidade em que aquele primeiro texto se insere e por serem esses textos utilizados nas
unidades que apresentam mais tópicos propostos pelos autores. Mais adiante mostraremos
quadros onde podem ser constatados, em cada texto de número um, em cada início de um
novo capítulo, os tópicos passíveis de análise.
21
Perfaz-se, portanto, o total de quatro textos por volume. Considerando-se que a obra é
composta por quatro volumes, (6º , 7º, e ano), o total de textos para análise corresponde
a dezesseis textos. Interessa-nos observar se o texto que inicia cada capítulo pode ser
considerado ponto de partida e traz referências presentes sobre algum dos aspectos das
temáticas propostas e se as atividades têm o objetivo de exercitar os conhecimentos prévios
a bagagem do/a leitor/a em relação aos conceitos, conteúdos e principais abordagens do(s)
assunto(s) que se apresenta(m).
Destaca-se a importância de reconhecer se o texto é simples pretexto ou atende às
expectativas inscritas no processo histórico desse provável leitor, imbuído de memória e
cultura de seu meio. Essa indagação é válida para nossa análise por desejarmos verificar se
cada texto contribui para o desenvolvimento de conhecimentos prévios sobre o mundo, ou
seja, às questões exigidas pelo currículo. Para percebermos a relação entre esse currículo e as
construções sociais que estabelecemos ao nos depararmos com a linguagem de um
determinado texto, concordamos com uma perspectiva em que o currículo
pode ser visto como uma prática de significação. O currículo também pode
ser visto como um texto, uma trama de significados, pode ser analisado
como um discurso, pode ser visto como uma prática discursiva. E, como
prática de significação, o currículo, tal como a cultura é, sobretudo, uma
prática produtiva. (SILVA, 1997, p.13)
Objetiva-se contribuir, entre outras possibilidades oriundas do trabalho em pauta, com
aspectos importantes a serem observados em uma obra didática. É essencial que sejam feitas
algumas análises para verificar se a obra oferece temas pertinentes quanto às propostas dos
PCN. O enfoque na “análise do discurso deve ser idealmente um empreendimento
interdisciplinar.” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 276). Essa interdisciplinaridade pode destacar
questões sobre respeito a diferenças, lutas por igualdade, identidades e tantas outras
mencionadas, além do multiculturalismo, por exemplo, que representa um importante
instrumento de luta política, pois ele remete a importantes questionamentos, entre eles o que
se considera como conhecimento oficial. Assim, essa visão de multiculturalismo também nos
lembra que “a igualdade não se obtém simplesmente através da igualdade de acesso ao
currículo hegemônico” (SILVA, 2009, p. 90), sendo preciso mudanças substanciais do
currículo existente. Percebe-se, através desse levantamento de questões, que a obra didática
perpassa por vários outros objetos de estudo.
Ao serem apresentados sob a forma de títulos nessa introdução, a simples menção
desses mesmos títulos faz pensar, levantar hipóteses, sobre as possibilidades de conteúdos
abordados nesses textos que virão a ser lidos e, posteriormente, analisados. Apresentam-se
diversas perspectivas, mas o foco que norteia e é objetivo principal deste trabalho é, portanto,
22
verificar se a obra didática analisada pode contribuir para a formação de cidadãos com
desenvolvido pensamento crítico e conscientes da multidiversidade do mundo onde atuam. E,
nesse bojo se, realmente, através da seleção e apresentação de textos da obra, de tópicos e
contextos culturais propostos nos documentos oficiais, das atividades propostas pelos autores
da obra, contribui para a construção de identidades sociais dos alunos. Insistimos nessa
questão de formação identitária, pois pretendemos ver se esse enfoque pode ser percebido nos
textos e abordagens que os autores da obra utilizam, pois sabemos da importância de
partirmos da realidade social dos alunos e que, muitas vezes, a realidade social apresentada
num LD pode levá-los “a reprimir suas verdadeiras identidades, que podem não lhes parecer
legitimadas pelo livro”. (TÍLIO, 2006, p.19).
1.4 Questões de pesquisa
A presente dissertação visa, portanto, através da análise dos textos e atividades
interpretativas dessa coleção didática em análise, responder às seguintes perguntas de
pesquisa:
1) De que forma os tópicos dos textos selecionados contribuem para uma
formação cidadã?
2) Em que medida as atividades propostas com os textos permitem ao aluno agir
no mundo social, pensando criticamente e expressando diferentes vozes acerca do tópico?
3) Existe variedade de gêneros textuais compatíveis com a realidade social em
que o aluno se insere?
Para que as propostas desse trabalho possam ser alcançadas é importante verificarmos
temas que contribuam para atingirmos respostas aos nossos questionamentos, entre eles:
o discurso e o socioconstrucionismo, a fim de problematizar às expectativas da
contemporaneidade e educação, com formação de valores de vida, pensamento crítico,
atitudes cidadãs;
a interface com a interdisciplinaridade e os textos abordados a fim de observar de
que modo uma obra didática de língua materna dialoga com as demais disciplinas do
currículo, favorecendo esse diálogo interdisciplinar que tanto buscamos;
e, ainda, se os possíveis discursos produzidos pela obra didática dialogam com
alguns documentos oficiais, inúmeras vezes mencionados nessa pesquisa.
Considerando-se que uma obra didática também é um documento e documentos
existem para serem usados a fim de comprovar algo a alguém ou em situações que se façam
23
necessários, este trabalho insere-se no campo de estudo da Lingüística Aplicada e a
interpretação dos dados pretende inspirar-se em teorizações que respaldem acerca de apelos
constantes na sociedade em que vivemos, sejam em relação a questões culturais, identitárias,
de gênero, também de gêneros textuais, memória e aspectos de base sociológica à luz da
Análise Crítica do Discurso (ACD) (FAIRCLOUGH, 2001).
1.5 Organização de estudo
O capítulo 1 trata de nossa introdução que dividimos em alguns tópicos para explicar
alguns passos que tentamos desenvolver neste trabalho. Por termos divido a introdução nesses
tópicos, consideramo-na também na qualidade de capítulo, pois colabora com alguns
conceitos que gostaríamos de esclarecer.
No capítulo 2 apresenta-se a estrutura metodológica para esse estudo, com sua
relevância e delimitação e, no capítulo 3 desenvolve-se a fundamentação teórica deste
trabalho em que esboçamos algumas considerações sobre a teoria bakhtiniana com a oposição
entre a significação e o tema, onde verifica-se que para Bakhtin esses elementos seriam vistos
mais numa perspectiva histórica, social e concreta ao passo que para Halliday, o sentido de
tema abrange mais para a negociação dos signicados onde ele apresenta a oposição Tema e
Rema, sobre o que reportamo-nos a Tílio (2006) e utilizamos essa conceituação.
Também dialogamos com as teorias que se fundamentam na Linguística Aplicada
onde situam-se os estudos de linguagem vistos em sua contextualização o que nos remete às
teorizações acerca de cultura, identidade e contemporaneidade, lugares de onde procuramos
identificar questões de polifonia nos textos e atividades que estudamos, além de buscar
respostas às nossas questões também nos documentos oficiais. Assim, como vemos os textos
e as atividades que se depreendem um uso na sociedade, vemos na Análise Crítica do
Discurso de Fairclough(2001) uma teoria que nos embasamento, pois considera a
linguagem a partir de seu contexto de produção e busca revelar as ideologias veiculadas pelo
uso da linguagem, do discurso.
O capítulo 4 trata de nossa metodologia utilizada para essa pesquisa tendo como base a
obra didática que selecionamos para o trabalho em questão. Reafirma-se que o tão decantado
objeto de análise é a obra PL vista enquanto um documento, ou seja, o livro de acordo com a
proposta dos autores dessa coleção didática. Elaboramos a descrição do corpus, utilizamos
alguns quadros, tabelas, gráficos e exemplos para tentar, com essas ilustrações, elucidar um
pouco do que desejamos desenvolver na análise.
24
Enfim, no capítulo 5 é feita a análise de alguns textos e atividades interpretativas
desse material didático que aqui abordamos. O estudo de cada um dos picos previstos
buscam respostas às nossas questões de pesquisa. Queremos visualizar o que apresentamos no
início desse capítulo introdutório quanto as metafunções às quais fizemos referência, pois elas
podem contribuir para identificarmos melhor um de nossos termos-chave: a polifonia.
O capítulo 6 apresenta as considerações finais dessa dissertação, com uma breve
apresentação de seus principais aspectos, se é que de fato conseguimos apresentá-los, e a
tentativa de trazer alguma contribuição desse trabalho para o desenvolvimento de capacidades
leitoras e interpretativas críticas, indispensáveis à vida e ao exercício pleno da cidadania.
Esperamos, também, levar para as expectativas do mestrado interdisciplinar em Letras e
Ciências Humanas um pouco dessas contribuições das linhas teóricas apontadas no trabalho
que se apresenta aqui.
Além de nossas considerações finais, esta dissertação inclui uma seção de Anexos, que
contém um CD-ROM, com arquivos em PDF, com todos os textos e atividades interpretativas
que foram utilizados para a análise desenvolvida nesta pesquisa. Os PCN de Língua Portuguesa
do e ciclos e o PNLD de Língua Portuguesa 2011 constam dos links que indicamos nas
referências.
25
2 ESTRUTURA METODOLÓGICA PARA ESSE ESTUDO
Optamos por essa forma mais segmentada de apresentação a fim de que ficassem
claros os tópicos que propomos para nossa estrutura metodológica, a importância de
destacar aspectos da obra que lidam com questões de cidania, tendo em vista que essa
abordagem contribui com a efetivação de nosso objetivo geral. Pensamos na abordagem
textual e, comparando-a com as exigências de documentos oficiais, destacamos os pontos
que atendem às causas de diversidade cultural (CUCHE, 1999). Desenvolvemos uma
mostragem que nos apresenta um panorama em relação aos textos, as atividades
relacionadas a eles e, se nos tópicos que apontam, ocorrem ou não interações entre esses
temas e propostas abordados.
Os resultados obtidos, comparando os textos com as atividades, à medida em que,
com elas, se aproximam valores históricos, sociais, culturais, identitários através, também,
do uso dos gêneros discursivos, precisam partir de uma visão interacionista de acordo com
Cuche (1999), onde se reconhecem o caráter dinâmico da cultura com outra efetivando e
oferendo possibilidades de constante (in) formação, (re) conhecimento e (re) invenção, o
que também podemos verificar em Velho (2001) quando nos apresenta.
Com essa intenção, elaboramos um mapeamento de fragmentos dos textos e
atividades onde esses aspectos de gêneros discursivos, cultura, identidade, formação
cidadã, aparecem aplicados a um quadro com tópicos de TÍLIO (2006), sob a ótica da
LA, à luz da ACD, do ISD e da LSF confrontados de acordo com as propostas dos PCN e
PNLD. Nesse sentido, em relação aos documentos oficiais, Batista e Rojo (2005), Rangel
e outros são alguns exemplos que fundamentam essa abordagem. Elaboramos uma figura
na tentativa de representar o que aqui expusemos, de modo que, ao observarmos-la,
percebam-se os elementos que destacamos e o papel que estes exercem na dinâmica do
evento discursivo.
Figura2.5a: O livro didático nas práticas sociais
26
Queremos frisar também, na figura 2.5a, que entendemos “o texto como um evento
comunicativo, com a análise da intencionalidade e, particularmente, da situacionalidade em
que ele acontece, ou seja, um texto é visto de acordo com o contexto em que ele se apresenta.
Deste modo, se temos um texto, mesmo que seja um clássico da literatura infanto-juvenil,
conto maravilhoso, fábula ou qualquer outro representativo de uma época passada, por
exemplo, vemos a partir daquela materialidade até como aquele evento é percebido no
momento atual, pois “vai-se do cotexto ao contexto” (MARCUSCHI, 2008, p. 83).
Um evento discursivo é considerado, portanto, nessa perspectiva, um texto, um
exemplo de prática social e um exemplo de prática discursiva cf. concepção tridimensional
do discurso (FAIRCLOUGH, 1992), segundo a qual não se pode “analisar um texto sem
considerar as práticas discursivas e sociais que envolvem tal texto (TILIO, 2006, p. 82).
Ainda seguindo essa visão de Marcuschi, podemos perceber o texto como algo observável e
que apresenta nele e em seu entorno todos os elementos que dão acesso a diferentes aspectos
que possam ser analisados e que, numa visão interdisciplinar, possam avançar para a
articulação entre as disciplinas.
A
D
C
A
C
D
I
S
D
PolifoniaA
AAAa
Gêneros
Atividades
LDB
Política
s
Pública
s
PCN
PNLD
ECA
27
Sob o olhar da Linguística Aplicada pretendemos observar nos textos, nos gêneros
textuais que esses representam, nas propostas extraídas na obra didática em análise, essa
interdisciplinaridade que problematiza, investiga, promove articulações com o mundo.
Podemos visualizar, portanto, na figura 2.5a, algumas representações do que abordamos e que
apresentam esse olhar da LA em diálogo com a ACD de forma que se envolvem no estudo do
texto, sua intencionalidade (cotexto) e situacionalidade (contexto), onde suas vozes
(polifonia) negociam com as atividades elaboradas pelos autores do livro didático em estudo
nesse trabalho.
As atividades propostas, por sua vez, precisam evidenciar e responder às propostas
das políticas públicas e promover práticas cidadãs num espaço social transdisciplinar,
revelando a análise intertextual como uma forma em que se articulam as análises textuais e
socioculturais em interação. São essas práticas de grande importância dentro de uma obra
didática.
Ao propormos uma análise de elementos textuais com os elementos do contexto de
acordo com a Análise Crítica do Discurso, estabelecemos possibilidades problematizadoras,
que vão confrontar situações de práticas sociais. Um documento, no caso a obra didática, que
não considere esses aspectos, não está de acordo com propostas importantes para a formação
cidadã tão proclamada. Não queremos discursos “ocos”, simplesmente ilustrativos, feitos
apenas para causar boa impressão. Queremos observar como se apresentam essas propostas
nos textos e se atendem a essas perspectivas sociais apontadas.
Na concepção tridimensional do discurso a que nos referimos antes, o discurso é visto
como composto por três elementos básicos: textual, discursivo e social. A figura 2.5b,
apresenta-nos essa concepção tridimensional do discurso, que nos mostra que não se analisa
textos fora dos contextos sociais e discursivos onde eles ocorrem. Para se fazer análise do
discurso verifica-se um texto e as práticas discursivas e sociais que envolvem o texto. A
inscrição do discurso e da atividade das múltiplas vozes passam por temporalidades, situações de
heterogeneidades e diversidade cultural dos indivíduos.
Figura 2.5b - Fairclough (1992): concepção tridimensional de discurso
28
2.1 Relevância do estudo
A realização do estudo também se justifica por dois outros motivos, mutuamente
articulados: um de ordem acadêmica e outro social. Desde que assumimos que os livros
didáticos são documentos, socialmente situados e ideologicamente negociados através do
discurso dos autores em cada obra, procuramos identificar o quanto são necessárias diversas
análises e diferentes estudos teóricos para destacarem-se elementos importantes envolvidos
nos conteúdos dos textos que são (re)apresentados numa coleção didática.
Certamente, essa pesquisa que aqui se desenvolve não dará conta de esgotar todas
essas possibilidades de análise. toda uma grande pesquisa bibliográfica para que sejam
implementadas as propostas que passam a servir para estudos voltados às questões sociais
importantes e que trazem no bojo, também, toda uma discussão que se pretende observar se
são pertinentes à alteridade e situacionalidade, visto que “todo ato discursivo se dirige a
alguém e toda prática discursiva é situada no mundo sócio-histórico-cultural em que ocorre,
isto é, não ocorre em um vácuo social”. (MOITA LOPES, 2003, p. 22). Os textos, as
atividades numa obra didática, não estão ali presentes de forma ilustrativa, ou seja, não estão
num vácuo social.
Quanto a ordem social, pretende-se identificar a prática discursiva que os textos
apresentam fazendo uma análise dessa prática, “focalizando a intertextualidade e a
interdiscursividade das amostras do discurso.” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 282). Os textos
Prática Social
Prática discursiva
Texto
29
selecionados na coleção didática devem fornecer indicadores que demonstrem estar coesos e
coerentes com a temática proposta nas unidades em estudo.
Ainda é importante observar se esses textos elencados e os trabalhos desenvolvidos
com os mesmos, na obra em análise, persistem em certos estereótipos ou buscam revelar
vozes críticas, visto ser importante que a prática intertextual seja recorrente nos
procedimentos de análise, bem como a atenta observação dos fatores socioculturais e
históricos, para destacar a consciência da riqueza desses assuntos. Também para Bentes
(2001) “um texto sempre será constituído de uma multiplicidade de significações, tudo
dependendo de diversos fatores, entre eles, a intenção de quem produz e, da parte do leitor ou
destinatário, a disponibilidade de aceitar aquilo que é dito” (BENTES, 2001, p. 273).
Nas aulas de Língua Portuguesa, tanto quanto nas demais disciplinas da Matriz
Curricular, pois a ngua portuguesa perpassa por essas, a partir dos ideais interdisciplinares,
buscam-se, entre outros objetivos referentes à disciplina, promover reflexões sobre valores de
vida em sociedade. Podem-se dinamizar inúmeras possibilidades de debates, argumentações e
reflexões sobre o papel do discurso crítico e suas acepções exercidas no meio em que
vivemos; bem como as identidades que se (re)constróem através dos discursos proclamados,
com o devido cuidado em não torná-los panfletários.
Além disso, é fundamental despertar hábitos de leitura e reconsiderar a importância
da leitura de textos que garantam a formação identitária do indivíduo como agente de
transformações sociais e de novos textos que garantam sua identidade cultural, porém essas e
outras inegáveis contribuições não se esgotam numa pesquisa e isso é bom, pois justifica a
necessidade de que tais possibilidades tenham espaço de discussões posteriores.
2.2 Delimitação do estudo
Arriscamos alguns pequenos passos na perspectiva da Linguística Sistêmico-Funcional
porque é uma teoria de base sociossemiótica que, segundo Tílio (2006) considera a
linguagem em contextos situacionais (imediatos) e culturais (abrangentes). É, portanto,
importante para esta pesquisa, que tem entre seus objetivos estudar os contextos construídos
nos textos e atividades interpretativas de uma obra didática, tanto esses contextos mais
imediatos, com observação de presença ou não de polifonia, os gêneros discursivos
trabalhados em situações sociais, ou não; quanto aos contextos culturais mais abrangentes que
possam inserir o aluno no mundo, em seu contexto cultural e identitário (cf. CANDEAU
2008, TRINDADE & SANTOS 2002, MOITA LOPES 2002, HALL 2006, SILVA 2009 e
outros).
30
Elaboramos uma ilustração (cf. p. 26) que esperamos que possa contribuir para o
entendimento do que se traz à discussão e que pretende destacar o que propomos nesta
dissertação. E, considerando o nosso foco ser o discurso, especialmente em sua abordagem
crítica, o trabalho começa discutindo no capítulo 2 , que é a nossa fundamentação teórica, o
discurso e o socioconstrucionismo (cf. BRONCKART, 2003), com as passagens pelo texto e
por questões de poder (cf. FOUCAULT [1979] 2008) que possam estar veiculadas neles; as
questões inquietantes acerca da contemporaneidade e educação regida pelos documentos
oficiais (LDB/96, PCN, PNLD) que também representam poderes, uma vez que trazem
determinações a serem seguidas e de que modo o livro didático nos fala sobre isso. O capítulo
é encerrado com uma mostragem sobre o PNLD 2011.
31
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Tropeçavas nos astros desastrada
Quase não tínhamos livros em casa
E a cidade não tinha livraria
Mas os livros que em nossa vida entraram
São como a radiação de um corpo negro
Apontando pra a expansão do Universo
Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
(E, sem dúvida, sobretudo o verso)
É o que pode lançar mundos no mundo.
(Caetano Veloso)
Há aqui um compromisso com a investigação quanto a aspectos que possam ser
visualizados num LD. Nosso recorte se insere onde, numa seleção de textos e tópicos de
atividades interpretativas, embasados nesses textos, se pretende verificar a polifonia que
dialogue com temas relevantes e, efetivamente, pautados em assuntos significativos à
formação de valores essenciais para a vida em sociedade.
Aqui, ainda que se trate de uma análise do LD enquanto documento, cabe tecermos
considerações sobre o que podemos esperar de uma sociedade com uma formação cidadã
responsável, com valores identitários bem pontuados, com perspectivas de interação crítica
entre os indivíduos. Nesse sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, os Parâmetros
Curriculares Nacionais e o Programa Nacional do Livro Didático vêm sendo uma preciosa
contribuição e, pautado por estes instrumentos institucionais, o presente trabalho pretende
levar adiante o debate encontrado nos textos e atividades propostos numa obra didática. Para
respaldar o exposto, é importante analisarmos sobre o quanto se torna importante um texto e
os trabalhos que são desenvolvidos com ele, aqui no caso os trabalhos propostos na obra
didática em análise, a partir do momento em que cada um desses textos vai ser utilizado e
exposto à compreensão de outras pessoas que os leem, de acordo com o que nos informa o
fragmento:
Todo enunciado da réplica sucinta (monovocal) do diálogo cotidiano ao
grande romance ou tratado científico tem, por assim dizer, um princípio
absoluto e um fim absoluto: antes do seu início, os enunciados de outros;
depois do seu término, os enunciados responsivos de outros (ou ao menos
uma compreensão ativamente responsiva silenciosa do outro ou, por último,
uma ação responsiva baseada nessa compreensão). (BAKHTIN, [1979]
2003, p.275)
É claro que uma obra didática supõe critérios para sua organização que remetem à
cautela, a respaldos e estratégias cognitivas que levem a pressuposições adequadas a fim de
que possa ser legitimada. Podemos, assim, evocar o pensamento de Kock para enfatizar a
importância de uma análise fundamentada, a partir da necessidade de estudos para uma
32
organização responsável e órgãos que analisem uma obra didática: “para que duas ou mais
pessoas possam compreender-se mutuamente, faz-se preciso que seus contextos
sociocognitivos sejam, pelo menos, parcialmente semelhantes” (KOCK, 2008, p. 06). Ainda,
para destacar a necessidade de uma compreensão de interação social, podemos ler em
Bronckart:
É, portanto, a adesão a uma psicologia interacionista-social que nos leva a
abordar o estudo da linguagem em suas dimensões discursivas e/ou textuais.
De um lado, os textos e/ou discursos são as únicas manifestações
empiricamente observáveis das ações de linguagem humanas (a língua é
apenas um construto; as frases e os morfemas são apenas “recortes
abstratos”) e, de outro lado, é no nível dessas unidades globais que se
manifestam, de forma mais nítida, as relações de interdependência entre as
produções de linguagem e seu contexto acional e social (BRONCKART,
[1997], 2003, p.14)
Segundo Jouve (2002, p. 23) “autor e leitor não têm espaço comum de referência.
Portanto, é fundamentando-se na estrutura do texto, isto é, no jogo de suas relações internas,
que o leitor vai reconstruir o contexto necessário à compreensão da obra”. Essa importância é
significativa, pois, a cada novo leitor, vão sendo incorporados novos conceitos, de acordo com
as experiências de um novo momento histórico e de diferentes processos de interação. De
acordo com Jouve, “enquanto no discurso oral a palavra morre logo após ser pronunciada, o
texto, ao contrário, resiste ao tempo e faz que, ainda hoje, se possa escutar Homero ou
Platão”. Por isso, o estudo de textos selecionados numa obra didática trazem essa polifonia
que pode permitir aos leitores verem além do projeto inicial de cada autor, especialmente se o
texto integra uma unidade que promova essa reflexão. Jouve também afirma que “o texto
alarga o horizonte do leitor abrindo-lhe um universo novo”.
Segundo Kleiman (2008, p. 65), “mediante a leitura, estabelece-se uma relação entre
leitor e autor que tem sido definida como de responsabilidade mútua, pois ambos têm a zelar
para que os pontos de contato sejam mantidos, apesar das divergências possíveis em opiniões
e objetivos”. Se consideramos a urgência da formação de cidadania responsável, de formação
identitária do indivíduo, se desejamos colocar em pauta questões e expectativas da
contemporaneidade e se pretendemos leitores críticos em nossa sociedade o nosso discurso
não pode cair no vácuo. É através de algum material didático que poderemos promover essas
construções cidadãs, identitárias, contemporâneas e de criticidade.
Assim, desejamos destacar que a leitura precisa ocupar um espaço privilegiado no
ensino de língua materna, estrangeira, nas ciências, na arte, na história, enfim, na
interdisciplinaridade. Numa abordagem de Orlandi (2008, p. 62), “estamos propondo nessa
reflexão pensar a produção do efeito-leitor a partir da materialidade mesma do texto em sua
33
relação com a discursividade e os diferentes gestos de interpretação que se dão”. Ao que
Marcuschi (2008, p. 51) complementa “que o ensino de língua deva dar-se através de textos é
hoje um consenso tanto entre linguistas teóricos como aplicados”. Com a publicação dos
PCN, no final da década de 90, a discussão dessas questões sobre a importância de textos e
gêneros textuais tornou-se fundamental, especialmente tendo por base o contexto político,
cultural, social, étnico, ético, crítico, interativo.
Não podemos desconsiderar as orientações em Freitag (1989) que afirma que
a vertente populista do livro didático, defendendo um livro para as classes
oprimidas, que considere suas condições materiais de vida, sua linguagem e
sua “cultura de pobreza”(Lewis), não está prestando nenhum serviço à
criança carente. Sua marginalização e condição de classe não serão
superadas com esse procedimento, mas sim consolidadas.
Portanto, quando aqui dissemos sobre o conhecimento de mundo do aluno para o qual
reclamamos que as propostas do LD estejam voltadas não significa engessá-lo em condições
de subestima, muito pelo contrário. As oportunidades de conhecimento, de acesso aos livros,
à cultura, à formação crítica e identitária devem ser iguais para todos.
Nos aportes de Foucault (1969) sobre as formações discursivas, na contribuição de
Wittgenstein (1961) sobre linguagem como um produto de interação social e do uso, no jogo
das relações entre os usuários de uma língua natural, seguimos aqui em busca de
fundamentações teóricas que possam permitir o diálogo para enfrentar as lacunas que separam
textos de contextos e atividades que contribuam para que o texto possa ser lido,
compreendido, interpretado, analisado e que possa propor efetivamente o que os teóricos
chamam de interacionismo-sociodiscursivo, doravante ISD.
O ISD, em linhas gerais, postula que haja interação no intuito de se comunicar, por
meio de atividades que são desenvolvidas com base em textos e que, através desses textos e
atividades possam ser concretizadas as implicações sociais de diferentes gêneros, formadoras
de atitudes cidadãs. Para o trabalho proposto, foram escolhidos os textos que iniciam cada
capítulo, em cada unidade temática e, a partir deles, o confronto com os PCN, do Ministério
da Educação e Cultura, doravante MEC, e o Programa Nacional do Livro Didático, PNLD.
Os contextos socioculturais foram investigados para “identificar a visão de mundo
representada em cada livro (metafunção ideacional)” (TILIO, 2006, p.67), como uma forma
de orientações para o convívio social, cidadão, crítico e, portanto, questionador das formas de
poder e opressão. Lembramos a valiosa contribuição de Silva (2009) que nos diz que é
Preciso reconhecer que a chamada “virada linguística”pode nos ter levado a
negligenciar certos mecanismos de dominação e poder que tinham sido
detalhadamente analisados pela teoria crítica. Embora seja evidente que
somos cada vez mais governados por mecanismos sutis de poder tais como
os analisados por Foucault, é também evidente que continuamos sendo
34
sempre governados, de forma talvez menos sutil, por relações e estruturas de
poder baseadas na propriedade de recursos econômicos e culturais. (SILVA,
2009, p.145).
É importante observar que tais sutilezas não dominem a educação com a imposição
dessas estruturas de poder baseadas na propriedade de recursos econômicos e culturais”, pois
é mister que haja transparência, especialmente quando existem propostas sérias de levar às
classes menos favorecidas o LD que, muitas vezes, é o único livro que lhes chega às mãos.
Com base em pesquisas que têm sido feitas e nos estudos de grupos que se reúnem para as
avaliações das obras didáticas, os livros didáticos são submetidos por profissionais que atuam
nessas avaliações do MEC, a partir de critérios muito bem estruturados por esses grupos de
pesquisadores. Sendo assim, que os resultados daqui por diante, se não forem pelo LD ideal,
que seja ao menos pelo mais próximo do que se espera desse recurso pedagógico.
Numa obra didática de LP, que é o nosso enfoque, uma coleção de textos que
apresenta-nos a importância de serem trabalhados com critérios definidos quanto às propostas
dos documentos oficiais. Para isso, que as vozes dos textos precisam ser ouvidas. A partir do
imaginário, da leitura atenta, o texto deve oferecer ao leitor o direito de voz. E, através desse
diálogo se o (re) conhecimento, o ensino e aprendizagem, a (in)formação cidadã. Podemos
ler no texto de Bakhtin essa polifonia, quando ele nos fala que
é também unicamente à imaginação do leitor que o escritor se dirige, quando
usa essas formas. O que ele procura, não é relatar um fato qualquer ou um
produto do seu pensamento, mas comunicar suas impressões, despertar na
alma do leitor imagens e representações vívidas. Ele não se dirige à razão,
mas à imaginação. (BAKHTIN, 2006, p.187)
Podemos perceber que em cada texto podem existir muitas vozes e diferentes
discursos. Um livro didático, aqui em pauta o livro de Língua Portuguesa, Português:
Linguagens, apresenta-nos os textos em unidades temáticas e trabalha o sentido da leitura nas
atidades interpretativas. É importante verificar até que ponto, através de cada texto, se
possibilita uma troca entre o que o leitor contempla na obra e o que experimenta em sua vida,
permitindo-lhe participar do diálogo com o material escrito e estabelecer uma relação de
interação entre esse e o que existe no contexto da realidade.
Para muitas famílias o livro didático é a única fonte de leitura a que elas têm acesso e,
a partir daí, se a obra oferece textos instigantes, essa é uma oportunidade de proporcionar-se
uma “experiência única com o texto literário” (ZILBERMAN, 1990, p. 18), que pode levar o
leitor a buscar outras fontes de leitura, adquirir novas vivências e a refletir sobre o seu
cotidiano. É importante verificar se existe uma coerência entre os interesses de uma sociedade
que se “reconfigura”, os assuntos motivadores típicos da identidade dos usuários, expectativas
criadas para os leitores alvo, os PCN, o PNLD e o que os textos da obra didática se propõem
35
nesse diálogo. Ler textos é também uma relação de alteridade, de negociação de significados,
de sentidos entre o que se encontra na obra, o que o leitor pode apreender, os autores (re)
organizam e a sociedade transforma ou é transformada. Essa concepção é destacada
principalmente nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p.53)
“A leitura é um processo pelo qual o leitor realiza um trabalho ativo de
construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu
conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a
língua”.
Freitag (1993) ressalva que professores e alunos acabam tornando-se escravos do livro
didático ao invés de o utilizarem para o desenvolvimento da autonomia, do senso crítico e de
contraideologia tornando-o principal roteiro, ou exclusivo, do processo de ensino e
aprendizagem. Faz-se necessário dizer que um texto é “toda unidade de produção de
linguagem situada, acabada e auto-suficiente do ponto de vista da ação ou da comunicação”
(BRONCKART, 1999, p.75).
De acordo com a análise Crítica do Discurso, segundo Fairclough (2001) verifica-se
que esse enfoque tem muito a contribuir para a investigação sobre o cunho social de uma obra
didática, sobretudo quando se faz a investigação integrada em projetos interdisciplinares. Os
autores de cada texto, inserido numa coleção didática, e, nesse caso, destacam-se os
selecionados para compor uma obra, de acordo com os critérios dos autores da mesma - não
podem prever o indivíduo que terá o produto em suas mãos. Há um leitor projetado na história
e um efetivamente real que o receberá e terá em relação a ele uma interpretação. Nesse
momento, a interdisciplinaridade torna-se elemento indispensável para a percepção e
entendimento de um texto, pois o leitor poderá escolher e organizar as informações contidas e
com elas representar novas propostas para o conteúdo apresentado.
Ainda ao darmos ênfase a este contexto, podemos observar a pertinência desses
estudos sobre o LD porque o que mais importa para a bagagem cultural do aluno é o que
poderá vir a ser promovido, com as leituras de textos e propostas de trabalho, para a formação
de valores de vida e não apenas ler textos e fazer exercícios de interpretação, mecanicamente,
e que não tratam a cultura seriamente, ou seja, de forma a levar os alunos a pensar
criticamente” (TÍLIO, 2006, p.125). E, ao buscarmos eco a essas palavras, a fim de enfatizar o
que abordamos, ainda podemos observar que essa linha de raciocínio nos levaria a entender
que, parafraseando Coracini, se daria, então, na escola, instituição a quem é atribuída a
função de preparar o cidadão para a vida, a função de legitimar o livro didático, mas, ainda
seguindo a linha de pensamento da autora, a escola não o faz sozinha: ao mesmo tempo que
constrói o imaginário discursivo da sociedade a seu respeito, também seus valores,
36
interesses e necessidades de toda ordem sendo construídos e modificados por essa mesma
sociedade. (CORACINI, 1999, p. 33).
Promover esse diálogo com os autores, com os textos, com as atividades previstas nos
ajuda no desenho que pretendemos esboçar em nossa análise. Temos o LD, os textos
selecionados, as atividades sobre esses textos, trabalhamos com a perspectiva desse objeto ser
um documento, mas não descartamos que esse documento possui significados que podem ser
negociados de acordo com as diferentes propostas elaboradas com ele. E, ainda, ele será
utilizado por alguém, para alguém, com propósitos, com propostas, com interesses
institucionais, com variados motivos para ser usado.
O LD não existe no vácuo; um documento não existe pelo simples fato de existir, há,
portanto, significados para que ele exista. De acordo com o que nos diz Bronckart (2003)
vemos a ratificação das considerações anteriores e podemos articular nosso pensamento no
sentido de que
convém sublinhar aqui que, sendo produtos da interação social (do uso),
assim como os textos nos quais se organizam, os signos continuam
perpetuamente sob a dependência desse uso e, portanto, os significados que
veiculam não podem ser considerados estáveis senão momentaneamente, em
um determinado estado sincrônico (artificialmente). Convém assinalar ainda
que, desde que é através desses textos e desses signos com significações
sempre moventes que se constroem os mundos representados definidores do
contexto das atividades humanas, esses mundos, por sua vez, também se
transformam permanentemente. (BRONCKART, 2003, p.35).
Nesse ponto parece-nos verificar uma consonância nos pontos de vista entre as
colocações de Bronckart e Bakhtin, pois este tem a nos orientar no sentido de que
O valor novo do signo, relativamente a um “tema” sempre novo, é a única
realidade para o locutor-ouvinte. a dialética pode resolver a contradição
aparente entre a unicidade e a pluralidade da significação. O objetivismo
abstrato favorece arbitrariamente a unicidade, a fim de poder “prender a
palavra em um dicionário”. O signo é, por natureza, vivo e móvel,
plurivalente; a classe dominante tem interesse em torná-lo monovalente.
(BAKHTIN, 2006, p.8).
Nosso trabalho não pretende esse alcance de análise que prevê escolhas ou o uso.
existem órgãos e profissionais competentes para essas abordagens, tal qual vemos em Rojo &
Batista (2003), que enumeram, percentuais de livros didáticos de língua portuguesa, que são
analisados sob os critérios de avaliação do PNLD quanto a capacidade de leitura, como
tratamento de gênero, propriedades estilísticas, e uma série de outros critérios e itens
avaliativos, apresentando que muitos desses textos não são trabalhados efetivamente nos
tópicos propostos nas diversas obras, que não veem a questão das variedades linguísticas e
estudo de textos de gêneros orais, entre outros. A abordagem de estrutura da maioria dos
37
livros didáticos, especialmente de língua portuguesa, também é fortemente criticada pela
autora, assim como o descaso com a reflexão linguística nas diversas atividades propostas
desde a interpretação e compreensão, que interessa-nos particularmente também neste
trabalho, até a produção textual, segundo a autora destaca.
Podemos observar, portanto, nos textos selecionados, uma grande
diversidade temática (100%), que, no entanto, fica empobrecida por uma
menor diversidade na abordagem das atividades de leitura dos textos (69%),
que, muitas vezes, reduz ao enfoque ao que julga que pode ser compreendido
pelo leitor representado criança ou pré-adolescente -, gerando uma leitura
plana das temáticas abordadas. Os textos apresentam-se também em gêneros
bastante diversificados (97%), embora nem sempre as características desses
gêneros sejam exploradas nas atividades de leitura e produção de textos.
(ROJO & BATISTA, 2003, p. 84).
As considerações elaboradas por esses autores confirmam o que vem sendo observado
nas atividades propostas com os textos no LD, embora haja iniciativas mais dinâmicas
quanto aos trabalhos com textos, especialmente nos volumes de e ano que apresentam
temáticas que enfocam melhor as perspectivas das práticas discursivas sociais.
3.1 Discurso e socioconstrucionismo
O discurso inscrito através dos textos de uma obra didática é de certa maneira parte
integrante de uma discussão ideológica em grande escala: ele responde a alguma coisa, refuta,
confirma, antecipa as respostas e objeções potenciais, procura apoio, ouve as diferentes vozes
que podem ser percebidas nas leituras dos textos, forma imagens, etc. Estes pressupostos nos
fazem entender o estudo do texto na amplitude da análise do discurso, onde as formações
ideológicas são determinantes para o entendimento das práticas discursivas.
A leitura centrada em textos que permitem um diálogo com os mesmos encontra no
discurso do livro didático um elenco de possibilidades que podem promover respostas ativas
dos alunos e uma possível interpretação aplicável à vida. Hall (2006) vai dizer que as
sociedades modernas o têm um centro regulador que reja os sujeitos de forma unificada; o
que é um conjunto disperso de referentes que transpassando os sujeitos torna-os usuários
de rias identidades. O autor ainda nos traz a pertinente reflexão sobre as palavras, os
significados e a identidade:
As palavras são multimoduladas. Elas sempre carregam ecos de outros
significados que elas colocam em movimento, apesar de nossos
melhores esforços para cerrar o significado (...). O significado é
inerentemente instável: ele procura o fechamento (a identidade), mas
ele é constantemente perturbado (pela diferença). Ele está
constantemente escapulindo de nós. Existem sempre significados
38
suplementares sobre os quais não temos qualquer controle. (HALL,
2006, p.41)
Considerando, também, a flexibilidade das identidades, Santos (2000, p.135) apresenta
que “as identidades culturais não são regidas nem, muito menos, imutáveis. São resultados
sempre transitórios e fugazes de processos de identificação. É importante que a reflexão
sobre a importância dos textos numa obra didática leve em conta o sujeito aluno, que de mero
objeto passivo, vai passar a agente autônomo de seu aprender.
Para Bakhtin ([1929]2006, p.126) tudo que envolve a língua está diretamente
relacionado ao social, ou seja, a língua é por natureza um fato social, e isso envolve tanto o
pensar lingüístico como a materialização do pensar por meio da enunciação e da criticidade
que a partir desta possa existir. Embora Bronckart apresente fundamentações em Volshinov,
não descartamos que as ideias atribuídas ao Círculo Bakhtiniano, com base no princípio da
dialogicidade de que geram-se inúmeros gêneros nas ações sociais e, se os textos são
pertencentes a determinados gêneros, é possível dizer que através das atividades promovidas
com eles podem ser observadas formas discursivas cada vez mais complexas capazes de
verbalizarem as vozes que existem nesses mesmos textos, apresentando-nos que as práticas
sociais podem ser repensadas através de discursos de textos pelo que conservam e acumulam,
ou não, de herança cultural e pela reelaboração de valores sociais que transmitem.
Pressupomos que no desenvolvimento deste estudo, a compreensão de que os textos se
apresentam no que é formulado e historicizado em sua essência, mas que também funcionam,
ao mesmo tempo, como possibilidades de transformação, de mudança. Dessa forma, nossa
pesquisa se circunscreve na perspectiva teórica do Círculo de estudos Bakhtinianos,
considerando-se também o conceito de gênero e princípios dialógicos dos discursos da
alteridade. Ao compararmos teorias e nas perspectivas que apontam podem vislumbrar-se o
diálogo com outros aportes teóricos que serão observados na medida em que se fizerem
necessários, especialmente no interior das análises.
Um documento não reclama para si a polifonia. Esta precisa ser oportunizada através
das propostas que permitam a observação dessas vozes. De conteúdo produzido pelos autores
dos textos às abordagens apresentadas pelos autores da obra didática e pautados na
conceituação bakhtiniana de que cada gênero se caracteriza pelo objeto do discurso, pelo
querer-dizer do locutor e pelas suas formas de interpretação nossa análise pretende identificar
as possíveis marcas dessa polifonia e os prováveis sentidos produzidos nas atividades de
interpretação recortadas para a análise.
39
Considerando-se que o ISD defende que as interações assinalam um papel
preponderante para a aquisição da linguagem, queremos observar até que ponto ocorre essa
abordagem interativa que traduz as vozes que se encontram nas entrelinhas dos textos e que
contemplam as ideias dos autores daquilo que se pretende fazer ouvir. De acordo com
Bronckart (2006, p. 55), “é na própria construção do social que se situam as organizações
sociais”.
De acordo com Bakhtin (1997, p.123) “a verdadeira substância da língua é constituída
pelo fenômeno da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A
interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua”. Nesse aspecto, Foucault
([1969]2007, p. 123) diz que a análise do discurso “não toma o lugar de uma análise lógica
das proposições, de uma análise gramatical das frases, de uma análise psicológica ou
contextual das formulações.” O que podemos perceber, ao destacarmos essa perspectiva
foucaultiana de discurso é que os textos podem constituir sujeitos nas relações de poder, ou
seja, esses sujeitos não seriam exatamente pessoas, mas situações de interações que possam
ser promovidas através das vozes desses textos e que são apontadas nas perspectivas de que
podem articular-se e se unirem ou podem manter suas especificidades.
Os novos parâmetros que têm regido o ensino-aprendizagem de língua portuguesa
podem ser comparados ao que Foucault ([1969]2007, p. 133) chama de Práticas
discursivas”[grifo nosso] que, parafraseando o que ele informa, focalizam um conjunto de
regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que podem definir,
em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística,
as condições de exercício da função enunciativa, para qual cada texto, em seu contexto, pode
contribuir de maneira significativa. Que discurso se apresenta nas práticas discursivas dos
livros didáticos e do repertório da educação para a questão da heterogeneidade, da
diversidade, das diferenças étnicas, estéticas, dialéticas, culturais, políticas, de gênero,
gêneros do discurso entre tantas outras questões? Destacamos, então, para esses
questionamentos, o que Marcuschi nos apresenta quando afirma que
sem situacionalidade e inserção cultural, não como interpretar o texto.
Parafraseando Kant, diria, numa expressão um tanto desajeitada, que a
língua sem contexto é vazia e o contexto sem a língua é cego. Mas isso nos
coloca diante de uma situação curiosa, pois em certo sentido todos os textos
são virtuais enquanto não se inserirem em algum contexto interpretativo.
que essa virtualidade diz respeito a um de seus aspectos, ou seja, sua
compreensão efetiva. Esta se numa determinada situação, que todo
sentido é sentido situado. (MARCUSCHI, 2008, p. 87)
Abordar sobre livros didáticos torna-se relevante, com base nesse estudo, pois na
prática não se leva em consideração toda a complexidade desse objeto cultural. Portanto, uma
40
das considerações iniciais em destaque é a própria definição de Cultura e culturas e a
importância da obra didática nesse contexto. Pode-se observar na afirmação de Cuche:
O encontro das culturas não se produz somente entre sociedades globais,
mas também entre grupos sociais pertencentes a uma mesma sociedade
complexa. Como estes grupos o hierarquizados entre si, percebe-se que as
hierarquias sociais determinam as hierarquias culturais, o que não significa
que a cultura do grupo dominante determine o caráter das culturas dos
grupos socialmente dominados. As culturas das classes populares não são
desprovidas de autonomia nem de capacidade de resistência. (CUCHE,
2002, p. 14).
O que mais se discute, entre inúmeros teóricos que apresentam obras sobre livros
didáticos, se escuta, se e se repete é: cada aluno é um sujeito com suas particularidades de
aprendizagem; deve-se colocar o aluno em situações de aprendizagem onde ele possa ser
agente de transformação do seu aprendizado; a língua é um fato social que se manifesta
diferentemente em cada contexto, seja ele social, regional, político, econômico, de um grupo
para outro grupo, etc. Como se pode ler em Orlandi:
Uma das tarefas da Análise do Discurso é trabalhar a política da língua
(sujeita a equívoco) na textualidade ou, em outra perspectiva, aprender a
textualização do político, das políticas da língua que aí se constituem. E esse
jogo nos / sobre os (e não dos) sentidos é a marca dessa textualização. Logo,
é a materialização do político no dizer (e, por ele, temos a materialização da
ideologia, presença do equívoco na relação da língua com a história). É
dessa forma que podemos concluir que a leitura atesta os modos da
materialização do político. Ler é fazer um gesto de interpretação
configurando esse gesto na política da significação. Leituras diferentes não
são gratuitas nem brotam naturalmente. Elas atestam modos de subjetivação
distintos dos sujeitos pela sua relação com a materialidade da linguagem, ou
melhor, com o corpo do texto, que guarda em si os vestígios da simbolização
de relações de poder, na passagem do discurso a texto, em seus espaços
abertos de significação. (ORLANDI, 2008, p.66):
Todas essas práticas discursivas têm contribuído para reflexões importantes, e
felizmente, para práticas linguístico-crítico-discursivas no ensino da língua. Um exemplo
dessas práticas é o uso do texto como suporte fundamental para o ensino da leitura e da
escrita. A partir do exposto cabe-nos uma indagação sobre como se pode alicerçar uma prática
pedagógica multicultural em que não sejam reproduzidos padrões, estereótipos e nem as
situações de exclusão. Nesse caso, cabe-nos um olhar para os PCNs sobre Pluralidade
Cultural, p.121:
A temática da Pluralidade Cultural diz respeito ao conhecimento e à
valorização de características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais
que convivem no território nacional, às desigualdades socioeconômicas e à
crítica às relações sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a
41
sociedade brasileira, oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o
Brasil como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal.
Se iniciamos este capítulo sugerindo que o discurso inscrito através dos textos de uma
obra didática é de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica consideramos
importante visualizarmos de onde parte a nossa análise. Para isso, é necessário que façamos
inicialmente esse levantamento dos textos que foram selecionados para essa análise e
pensemos sobre o que encontraremos adiante, mais precisamente no capítulo 4 dessa
dissertação. Temos para a análise, portanto, nos volumes destinados do sexto ano ao nono
ano, a proposta que pode ser visualizada nos quadros a seguir:
Quadro 3.1 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 6º ano:
No volume destinado aos sétimos anos, pode-se verificar o seguinte quadro, onde
identificamos as unidades, títulos das unidades, a temática do capítulo e os textos:
Quadro 3.2 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 7º ano:
42
Quadro 3.3 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 8º ano:
E, ainda quanto ao que foi examinado no livro destinado aos estudos do 9º ano:
43
Quadro 3.4 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 9º ano
Com essa mostragem de nosso recorte para o trabalho que apresentamos, reafirmam
Na análise colocamos em evidência o LD avaliado em suas propostas nas questões de
interpretação, pois se trata de um documento utilizado em diferentes contextos institucionais,
educacionais, espaços de construções de cidadania, convívio, interações sociais, porque
interessa, especialmente com as leituras apresentadas, que o aluno possa tornar-se autor de sua
discursividade.
Ainda segundo o que nos apresenta Marcuschi quanto a leitura e compreensão de
textos como trabalho social e não atividade individual, podemos refletir sobre a seguinte
consideração:
Compreender bem um texto não é uma atividade natural nem uma herança
genética; nem uma ação individual isolada do meio e da sociedade em que se
vive. Compreender exige habilidade, interação e trabalho. Na realidade,
sempre que ouvimos alguém ou lemos um texto, entendemos algo, mas nem
sempre essa compreensão é bem sucedida. Compreender não é uma ação
apenas linguística ou cognitiva. É muito mais uma forma de inserção no
mundo e um modo de agir sobre o mundo na relação com o outro dentro de
uma cultura e uma sociedade. (MARCUSCHI, 2008, p.291)
Se tivermos uma obra didática que seleciona textos que oportunizam essas reflexões,
ou seja, que apresentam textos que revelam uma preocupação com o social, com as
diferenças, com os anseios e expectativas de uma sociedade plural, podemos constatar, com
base nas análises, que a compreensão poderá ser bem sucedida para a atuação desse leitor no
44
mundo e as suas relações com o outro. Em função disso, concordamos cam Coracini quanto
ao fato de a obra didática possui um leitor projetado no contexto escolar.
É nesse contexto que se insere o uso do livro didático pelo professor que,
autorizado pela instituição escolar (já que é portador de um diploma
legalmente reconhecido), legitima o material comercializado, considerando-
o a base para seu trabalho em sala de aula. Assim, o livro didático funciona
como portador de verdades que devem ser assimiladas tanto por professores
quanto por alunos. (CORACINI, 1999, PP. 33 e 34).
3.1.1 Texto
“O texto é uma máquina preguiçosa, esperando que o leitor faça a sua parte”
(Eco, U, 1999, p.55).
Com esse estudo sobre textos de uma obra didática e atividades relacionadas a eles
propusemo-nos à identificação da polifonia, onde esse discurso oculto, pode revelar-nos
valores culturais, questões identitárias, características do socioconstrucionismo, marcas de
gêneros discursivos... Ou seja, o que desejamos dizer é que os autores constróem essa
máquina para que, segundo Eco, o leitor faça a sua parte, ou seja, faz essa máquina funcionar.
Com os discursos encontrados nos textos da obra os autores fizeram-na funcionar de acordo
com a perspectiva deles. Mas, nada impede que as atividades possam ser discutidas e se
possam chegar a respostas diferentes das oferecidas pelos autores no livro do professor. Eis o
que analisamos e o que pretendemos identificar na obra selecionada: possiilidades de dar
visibilidade á voz dos professorese alunos. De acordo com a análise crítica do discurso,
também devemos (re)considerar o texto em seu contexto e na questão de que ele é dirigido a
alguém, ou seja, supõe a existência de um interlocutor para quem esse texto se destina.
De acordo com estudos do Círculo bakhtiniano, a ngua tem a propriedade de ser
dialógica, mesmo que essas relações dialógicas não se circunscrevam ao diálogo face a face.
Pode ser dar exatamente ao contrário, pois existe uma informação interna da palavra, que é
perpassada sempre pela palavra do outro. Isso significa dizer que qualquer pessoa, ao falar,
leva em conta a fala de outra pessoa, que está presente na sua. Ou seja, nossas posições de
sujeitos sociais, são pontos de vista acerca da realidade, são centros de valor de informações
de mundo que nós temos.
Segundo a teoria bakhtiniana o dialogismo revela-se na bivocalidade, na polifonia do
discurso. O contexto sociocultural em que esse discurso se constitui pode permitir que esse
texto dialogue com a realidade social, onde pretendemos visualizar através de que meios isso
45
ocorre, ou seja, até que ponto o texto, trabalhado pelos autores, oportuniza a criticidade, a
visão de mundo e contribuições sociais. Segundo indagações de Soares, “será a leitura um ato
solitário, que afasta o mundo e do mundo? o leitor e o texto?” ela própria responde que não , mas
afirma que
“a leitura é vista com desconfiança, em certas culturas, às vezes utilizadas
como instrumento de opressão; perspectiva unilateral, porque os valores
atribuídos à leitura expressam a visão, numa sociedade de classes, dos
grupos que mantêm a posse e o controle dos modos de produção” (SOARES,
1995, p. 20).
O trabalho aqui apresentado não esgota as inúmeras possibilidades que estudos sobre
os textos e atividades interpretativas possam dinamizar. muito ainda para ser discutido,
especialmente quanto às contribuições desses estudos, com base em textos, que possam
contribuir para os estudos das ciências humanas, visto que aqui há diversos viéses
imbricados. E que ainda Soares prossegue afirmando que “o texto não preexiste à sua leitura, e
leitura não é aceitação passiva, mas é construção ativa; é no processo de interação desencadeado pela
leitura que o texto se constitui” (SOARES, 1995, p.26). Se aqui colocamos a importância do texto,
onde poderemos encontrar um acervo que nos apresente esse conteúdo social o rico e pronto para
ser explorado? Como um importante recurso que auxilia o trabalho do educador, o livro didático
mostra-se, portanto, um material de utilidade inegável, “mas o desaparecimento do papel do livro
didático como fonte de informação tem efeitos mais profundos do que se pode imaginar à primeira
vista”. (PERINI, 1995, p.82).
Não basta o acesso ao documento em si, mas o que o documento permite realizar
através dele. Portanto, não nos basta munir educadores desses instrumentos didáticos e
pressupor-se que o trabalho esteja parcialmente pronto. O LD enquanto documento precisa
dar condições de acesso a saberes que permitam, a quem dele se aproprie, o desenvolvimento
da criticidade, das perspectivas cidadãs. Como afirma Orlandi “não se petrifiquem essas
leituras previstas, a fim de que possa acontecer a descoberta, a leitura nova, tanto quanto
possível” (ORLANDI, 2006, p. 45)
Ao pretendermos analisar o discurso encontrado nos textos e atividades de uma obra
didática, precisamos definir o que se entende por esse discurso nesse contexto social amplo
no qual nos inserimos e no qual os textos circulam . Nossa utilização para a análise de
discurso neste trabalho baseia-se Fairclough (1992), onde podemos ler que “O discurso é um
modo de agir, uma forma pela qual as pessoas agem em relação ao mundo e principalmente
em relação às outras pessoas” (FAIRCLOUGH, 1992, p. 63, apud TÍLIO, 2006, p.56). Ainda
segundo Fairclough (1992, p. 64), “existe uma relação dialética entre o discurso e a estrutura
46
social, havendo portanto uma relação entre prática social e estrutura social, em que a segunda
é tanto uma condição para a primeira quanto um efeito dela”.
Vimos que para Fairclough uma preocupação em verificar a forma como esse
discurso alcança a sociedade em geral, as práticas e eventos sociais em que nos inserimos.
Para nossa análise interessa, então, observar em que pontos os textos e as atividades
selecionadas articulam-se nas práticas sociais, “negociando significados e construindo o
mundo, ao mesmo tempo em que também são construídos por eles”.(TÍLIO, 2006, p.58).
Vemos aqui também a importância da linguagem desses textos, e embora não
venhamos a nos aprofundar, neste trabalho, num estudo mais detalhado sobre essa questão,
gostaríamos de registrar importância da Linguística Sistêmico-Funcional (LSF) de Michael
Halliday, como um enquadre teórico muito eficaz para o prosseguimento desses estudos
tendo em vista que a LSF preocupa-se com a explicação e interpretação dos usos concretos
que se faz da linguagem dentro dos contextos de situação e de cultura, até porque pontua suas
propostas nos alicerces de uma visão do mundo social como um mundo complexo e por isso
explora a relação dinâmica entre os significados e as formas pelas quais esses significados
são realizados e nos contextos que os ativam.
A dinâmica que os textos podem nos oferecer, junto com os tópicos previstos nas
atividades com esses textos, pode ativar “um recurso para que se possa engajar, com a
linguagem, na ação para se intervir nos processos sociais e semióticos” (MATTHIESSEN,
2009, p. 12) e, ao mesmo tempo, “a construção de sentido nas interações sociais.”. (Bakhtin,
1929 [2002]). Portanto, o que sepretende é que nas discussões em torno dos textos, seja na
leitura com base no que o LD apresenta, nas atividades interpretativas previstas com base
nesses textos, discussão de obras extraclasse, seja na realização de pesquisas e seminários,
seja nas interações sociais em geral, que os textos possam oferecer a legítima expressão de
cidadania construída em/por seus leitores, de suas aspirações, de suas realidades pessoais.
Com base no exposto, ainda podemos confirmar que “o discurso não apenas reflete ou
representa as entidades e relações sociais, ele as constrói ou „constitui‟; diferentes discursos
constituem práticas sociais de formas diversas, posicionando os indivíduos de maneiras
diferentes como sujeitos sociais” (FAIRCLOUGH, 1992, p. 3-4).
Em síntese, “examinar o discurso desta perspectiva [sócio-construcionista] implica
analisar como os participantes envolvidos na construção do significado agem no mundo
através da linguagem e, portanto, como se constroem e como constroem sua realidade social”
(MOITA LOPES, 1996, p. 2).
Ao entendermos os textos como representantes discursivos de uma prática social,
também podemos verificar nesses textos relações de poder, que segundo Foucault (1979
47
[2001, p. 12]), nos informa que essas mesmas relações de poder não necessariamente
reprimem, mas que possibilitam também produzir discurso, pois
cada sociedade tem seu regime de verdade, sua “política geral” de
verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar
como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem
distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se
sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são
valorizados para a obtenção da verdade; o estatuto daqueles que têm o
encargo de dizer o que funciona como verdadeiro.
Considerando-se que o poder seja uma forma de prática social e discursiva, retomamos
as palavras de Umberto Eco que compara os textos a máquinas que funcionam à medida em
que as colocamos para funcionar e, ainda, podemos fundamentar-nos em Fairclough (1992, p.
65) que nos orienta no sentido de que as práticas discursivas “contribuem tanto para a
reprodução da sociedade como ela é quanto para a sua transformação”. E em Tílio podemos
encontrar que
“se todos os participantes do discurso têm o poder de agir na
construção do mundo social e das identidades sociais, o fato de algum
participante estar posicionado inferiormente na escala de poder não
tira necessariamente o seu direito à voz”. (TÍLIO, 2006, p.63)
Esses textos que recortamos para a análise e que vemos também numa perspectiva da
Análise Crítica do Discurso (ACD) podem ser analisados como uma forma que busca
estabelecer um elo entre esses textos e os contextos sociointeracionais nos quais eles oferecem
as possibilidades de mostrar mudanças sociais contínuas, mesmo que tais mudanças afetem
apenas contextos micros e locais (...). Por isso mesmo, a Análise Crítica do Discurso deve ser
entendida como interdisciplinar e interdiscursiva, estabelecendo um diálogo entre a
Lingüística e a Semiótica (...). Mais do que interdisciplinar, Fairclough (2001) advoga que a
Análise Crítica do Discurso assume um caráter transdisciplinar, em que ela não apenas se
utiliza de conhecimentos de outras áreas, mas também produz conhecimento a partir desta
interdisciplinaridade. A importância de tal interdisciplinaridade explica-se pelo espaço
ocupado pela linguagem na vida social contemporânea.
3.2 Contemporaneidade e educação
Ao esboçarmos os comentários em relação à contemporaneidade e educação torna-se
necessário frisar sobre as mais recentes determinações oficiais acerca desses assuntos, vistos
em conjunto. Uma dessas determinações que destacamos é o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), que foi criado em 13 de julho de 1990 e instituiu-se como Lei Federal n.º
48
8.069 (obedecendo ao artigo 227 da Constituição Federal), cujo pressuposto básico afirma que
as crianças e os adolescentes devem ser vistos como pessoas em desenvolvimento, sujeitos de
direitos e destinatários de proteção integral, como podemos verificar:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).
Não é tão simples atender às necessidades básicas dessa faixa de desenvolvimento
humano a qual nos referimos e às suas particularidades quanto a material didático adequado
ao seu desenvolvimento intelectual, por exemplo. São muitas considerações que precisam ser
examinadas, pois são instâncias muito amplas que conceberam as determinações às quais
autores, editoras, educadores devem estar atentos, em minúcias. A concepção sustentadora do
Art. 227 é a Doutrina da Proteção Integral defendida pela ONU com base na Declaração
Universal dos Direitos da Criança. Esta doutrina afirma o valor intrínseco da criança e do
adolescente enquanto ser humano; a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa
em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da juventude, como portadoras da
continuidade dos valores de seu povo e da sua própria espécie, (re) conhecer a importância do
saber sobre sua realidade, além do reconhecimento de sua vulnerabilidade, o que os torna
merecedores de contar com a proteção integral por parte da família, da escola, da sociedade
como um todo, percebendo-se integrados a esse todo.
O que se propõe é uma educação que passa pelos documentos oficiais, passa pelos
livros e outros veículos pedagógicos, para a formação do indivíduo, mas vai além deles. Na
percepção do professor Anísio Teixeira:
Não se trata, somente, de difundir conhecimentos. O livro também os
difunde. Não se trata, somente, de conservar a experiência humana. O livro
também a conserva. Não se trata, somente, de preparar práticos ou
profissionais, de ofícios ou artes. A aprendizagem direta os prepara, ou, em
último caso, escolas muito mais singelas do que as universidades. Trata-se
de manter uma atmosfera de saber pelo saber para se preparar o homem que
o serve e o desenvolve. Trata-se de conservar o saber vivo e não morto, nos
livros ou no empirismo das práticas não intelectualizadas.Trata-se de
formular intelectualmente a experiência humana, sempre renovada, para que
a mesma se torne consciente e progressiva [TEIXEIRA, 1998, p. 35].
O Estatuto ainda, em linhas gerais, visa à garantia dos direitos e deveres de cidadania a
crianças e adolescentes e determinando como responsáveis por essa garantia os setores que
compõem a sociedade, sejam estes a família, a escola, instituições em geral, o Estado.
49
muito a ser estudado sobre o Estatuto, mas quanto ao que se refere à educação destacamos que
as escolas e seus educadores devem conhecer essa legislação e assegurar seu cumprimento.
Dessa forma, os educadores precisam ser orientados quanto a trabalhar para que os
pressupostos do ECA sejam cumpridos, proporcionando o pleno desenvolvimento da
cidadania de crianças e adolescentes. Portanto, consideramos importante destacar os tópicos
referentes ao Capítulo IV do Estatuto que orientam no sentido “Do Direito à Educação, à
Cultura, ao Esporte e ao Lazer”, do qual, para enfatizarmos sobre aspectos importantes que
não devem ser negligenciados numa obra didática, muito menos na educação em geral e, para
isso, apresentamos o que nos determinam os artigos a seguir:
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - direito de ser respeitado por seus educadores;
III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias
escolares superiores;
IV - direito de organização e participação em entidades estudantis;
V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.
Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo
pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.
Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:
I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não
tiveram acesso na idade própria;
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de
idade;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação
artística, segundo a capacidade de cada um;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente
trabalhador;
VII - atendimento no ensino fundamental, através de programas
suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde.
§ 1.º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2.º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua
oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.
Entre todos os capítulos e artigos verifica-se a preocupação de oferecer às crianças e
adolescentes o melhor possível em termos de garantia de atendimentos específicos e amparo,
apresentando ainda um destaque nesse sentido no que se referem os Artigos 57, 58 e 59 onde
podemos ler que:
Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiências e novas
propostas relativas a calendário, seriação, currículo, metodologia, didática e
avaliação, com vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos do
ensino fundamental obrigatório.
50
Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais,
artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do
adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes
de cultura.
Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da União, estimularão e
facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais,
esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.
Essas orientações e leis não surgiram num vácuo social. Elas existem para atender às
políticas públicas direcionadas ao desenvolvimento infantil e juvenil amplamente saudável.
Num contexto histórico, a década de 1960 foi mundialmente marcada pelo surgimento de
inúmeros movimentos sociais em defesa dos direitos da criança e do adolescente. O fato se
observa desde o final da Segunda Guerra Mundial, onde crianças e adolescentes passaram a
ser alvo de grande preocupação por passarem a ocupar uma posição de destaque no cenário da
violência, pois foi quando houve maior necessidade de mão-de-obra feminina na rotina de
trabalho fora do lar e que, em muitos casos, deixou as crianças em situação de abandono, as
quais, mais tarde, adolescentes, constituíram-se como gangues marcadas por atitudes que
expressavam revolta, indignação e violência contra a sociedade. Essa é uma das causas entre
tantas que não nos cabe citar aqui, apenas queremos destacar possíveis motivos para que a
educação, e as formas que se oferecem para implementá-la, seja a mais efetiva possível
quanto às causas sociais onde ela pode oferecer suporte.
Para as ciências humanas, as ciências sociais e ciências jurídicas, esse processo caótico
resultou na necessidade de repensar a forma de (re) conhecer e compreender as reais
necessidades da infância e adolescência, que passaram a ser alvo de pesquisas e reflexões
teóricas, pois, nessas fases e suas manifestações típicas, toda uma importância de
acompanhamento e atendimentos que passaram a ocupar um espaço definido no cotidiano, nas
instituições, na mídia e na sociedade em geral. Certamente uma obra didática não deve ficar
alheia a tudo isso, considerando-se ser um recurso no qual existe correlação com a relidade na
qual estamos inseridos.
Todas as instituições, pessoas e recursos pedagógicos, dentre eles o LD, realizam sua
função no sentido de (in) formar, educar, desenvolver o educando como ser cidadão. Não
materiais didáticos ou métodos capazes de educar sozinhos. Com base nesta realidade
contemporânea, buscamos a educação que sabe ouvir todas essas vozes e visa, junto a todos
os recursos, uma formação que precisa promover o desenvolvimento social, igualitário e justo.
Há, sem dúvida, inúmeros conceitos e definições que buscam elucidar o que é a educação,
especialmente nessa contemporaneidade repleta de desafios, onde não apenas vozes, mas
luzes, precisam vislumbrar possibilidades que melhor instrumentalizem os agentes de
transformação social. Esse assunto é um tema que, para Sacristán (2003, pp.15 e 16),
51
configura o “mundo da educação”, um “quebra-cabeça pedagógico” e um “amálgama
complexo de materiais muito diversos”.
Os contextos sociais também compartilham, na Escola Sistêmico-Funcional de
Sydney, representada por Halliday e Hasan estudos de grande contribuição para os aportes
teóricos, para os quais destacamos os contextos sociais. Por situarmos a ação de linguagem
analisada por meio de textos, também consideramos importante acrescentar a este arcabouço o
Interacionismo Sociodiscursivo , da chamada escola suíça, representada por autores como
Jean-Paul Bronckart, Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz.
O modelo sociointeracionista se torna muito produtivo na contemporaneidade porque
para essa teoria os fatores de textualidade estão intimamente relacionados à discursividade.
Em termos gerais, essa perspectiva, entende o processo de produção textual como uma
atividade humana interacional (discursiva) e intencional (BAKHTIN, 1929). Um dos teóricos
igualmente preocupado com as formas de interação é Van Dijk, que, em sua proposta por um
modelo estratégico de compreensão textual, orienta-nos que:
A análise estratégica depende não somente das características textuais, como
também das características do usuário da língua, tais como seus objetivos ou
conhecimento de mundo. Isso pode significar que o leitor de um texto tentará
reconstruir não somente o significado intencionado do texto - como
sinalizado de diversas formas pelo autor, no texto e contexto - como também
um significado que diga mais respeito aos seus interesses e objetivos (van
Dijk, 2000, p. 23).
Pretende-se que esse arcabouço teórico possa dialogar com as propostas das políticas
públicas, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), o PNLD e os textos trabalhados
sob a ótica dos autores da obra e pensamos inicialmente na Lei de Diretrizes e Bases para a
Educação Nacional (LDB) que foi promulgada, em 1996, e que apresenta diversos desafios
que não podem ser negligenciados.
Destacamos que nosso enfoque conta com a importância da inter e
transdisciplinaridade, visto que os PCN apresentam uma abordagem que notadamente
apresenta uma perspectiva social da linguagem muito importante de ser observada,
considerando-se que
além da memorização mecânica de regras gramaticais ou das características
de determinado movimento literário, o aluno deve ter meios para ampliar e
articular conhecimentos e competências que possam ser mobilizadas nas
inúmeras situações de uso da língua com que se depara, na família, entre
amigos, na escola, no mundo do trabalho. (BRASIL, 2002, p.55)
Podemos verificar, então, que os PCN revelam o quanto é necessária a formação
cidadã que, além do conhecimento conteudista, também se possibilite aplicar à vida
conhecimentos sobre questões sociais e problemas cotidianos do educando, especialmente
52
quanto a sua identidade, como também podemos observar no documento quanto ao que diz
que:
Nas Ciências Humanas, a problemática da identidade, por exemplo, é objeto
de estudo da Psicologia, da Sociologia, da Filosofia e da História. A
identidade estará presente na afirmação e na auto-estima do jovem estudante,
no estudo antropológico das organizações familiares, das culturas
alimentares, musicais ou religiosas, nas questões de identidade nacional
diante da globalização cultural. Seu tratamento articulado, resultante de um
entendimento entre professores de uma mesma escola, poderia promover um
recíproco reforço no trabalho dessas e de outras disciplinas da área. A
identidade cultural em associação com o conceito de estética pode articular
ainda as disciplinas da área de Linguagens e Códigos. Por sua vizinhança e
caráter complementar, artes ou jogos, literatura ou teatro, dança ou esporte,
figura ou cena, música ou gesto podem ser apreendidos como integrantes de
um todo expressivo, não como mero mosaico de formas de representação.
(BRASIL, 2002, p.21-22)
O exposto assinala apenas exemplos encontrados no documento citado, mas destaca
o quanto se torna essencial a articulação entre as diferentes disciplinas da matriz curricular.
Isto significa que é fundamental a interação e contextualização do conhecimento para que os
objetivos de educação sejam mais plenamente alcançados.
A Lei 9394 de 1996 é um marco para a educação em nosso país porque a partir dela o
Ensino Fundamental passa a ser obrigatório e gratuito, com progressiva extensão dessa
obrigatoriedade e gratuidade até o Ensino Médio. Com base na lei surgiram políticas públicas,
tais como os PCN e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), “uma iniciativa do
Ministério de Educação e Cultura (MEC), (...) [cujos] objetivos básicos são a aquisição e a
distribuição, universal e gratuita, de livros didáticos para os alunos das escolas públicas do
ensino fundamental brasileiro” (BATISTA, 2003, p.25).
Por causa desses documentos, o livro didático passou a ser observado com mais rigor
quanto a aspectos sociais estritamente importantes para a tão falada formação cidadã”, que
parecia uma proposta inalcançável, típica de falares de reuniões e que ilustravam
planejamentos, mas não saiam do papel. Haja vista o fraco desempenho de muitas escolas
recentemente divulgado pela mídia, os efeitos de uma nova proposta oferecida pelos PCN e
pelo PNLD ainda não foram efetivamente evidenciados.
Se pretendermos verificar se essas exigências dos contextos culturais e das interações
discursivas da realidade que vivenciamos na contemporaneidade são atendidas, é importante destacar
que contemporaneidade é essa, uma vez que vivemos num contexto “marcado pela afirmação da
diversidade e flexibilidade das formas de organização escolar, originadas pela necessidade de atender
aos diferentes interesses e expectativas gerados por fatores de ordem cultural, social e regional”
(BATISTA, 2003, p.49).
53
Retomamos a inquietação quanto a reconhecer nessas falas a consonância com o que é
proposto na obra em análise, com seus textos e a polifonia dos mesmos, pois de acordo com o que
Rojo (2003, p.98) destaca, embora os procedimentos de avaliação do PNLD tenham contribuído para a
melhoria de qualidade em alguns aspectos do material didático distribuído em nossas escolas, o LD
ainda está a exigir um enorme montante de esforços, para o incremento de sua condução didático-
metodológica nos campos específicos do ensino de língua materna.
É importante ressaltar que, no presente estudo, consideramos o LD enquanto documento
(SILVA, 2000), com textos pertencentes a determinados gêneros e inerentemente dialógicos (talvez
polifônicos), numa perspectiva sócio-histório-político-cultural, do ponto de vista da Análise Crítica do
Discurso (ACD) e que se organiza considerando-se exigências de documentos oficiais baseados nas
necessidades estabelecidas pelas Políticas Públicas, mais especificamente o PNLD.
3.2.1 Parâmetros Curriculares Nacionais
Com esses diálogos pretendemos ainda esboçar algumas particularidades dos PCN de
Língua Portuguesa, pois entendemos a natureza desse diálogo como uma proposta que se
baseia na ACD e coerente com o socioconstrucionismo, pois o discurso crítico se constitui e
também é constituído nas relações sociais. Os PCN apresentam isso de forma clara, mas o que
pretendemos verificar é se essa clareza é percebida nos documentos que se baseiam neste
documento oficial, pois se espraiam nas relações sociais. (BRONCKART 1999;
FAIRCLOUGH, 1992; MOITA LOPES, 2002).
Para atender necessidades de políticas publicas e outras medidas pedagógicas
importantes para a melhoria do ensino e aprendizagem foi essencial a implementação de uma
reforma curricular em nosso país, prescrita pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) e,
entre medidas adotadas, aparecem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), em 1996,
que passaram a balizar a avaliação do livro escolar comprado pelo governo no PNLD
(SOUZA, 2005).
Com orientações bastante detalhadas quanto a aspectos de cidadania, cultura, valores
sociais entre outros, esses manuais, específicos por disciplinas e graus, além dos temas
transversais de pluralidade cultural, sexualidade, etnia, inclusão, diversidade, enfim, temas
considerados ainda polêmicos nas escolas, assegurou-se com os PCN não somente a ausência
de erros grosseiros, conceituais, em textos e atividades e preconceitos em grande escala, como
também a difusão de uma reforma e a aglutinação do currículo nacional, visto o quanto tem
sido abordado e a centralidade desse manual na escola, para ser estudado, debatido e seguido.
54
Os Parâmetros Curriculares de Língua Portuguesa, e ciclos, como m
especificados e que se referem do sexto ao nono ano do ensino fundamental, ou ainda, séries
finais do ensino fundamental, trazem contribuições muito importantes sobre os textos:
Vale considerar que a inclusão da heterogeneidade textual não pode ficar
refém de uma prática estrangulada na homogeneidade de tratamento
didático, que submete a um mesmo roteiro cristalizado de abordagem uma
notícia, um artigo de divulgação científica e um poema. A diversidade não
deve contemplar apenas a seleção dos textos; deve contemplar, também, a
diversidade que acompanha a recepção a que os diversos textos são
submetidos nas práticas sociais de leitura. (BRASIL, 1998, p. 26).
Enfatizando nossa proposta com os textos e atividades de compreensão e interpretação textual
trabalhados pelos autores da obra com as possibilidades que podem ser obtidas a partir desses tópicos
para o estudo interdisciplinar, destacamos mais uma passagem significativa extraída dos PCN de LP:
Ambiente, Saúde, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo) demanda
participação efetiva e responsável dos cidadãos, tanto na capacidade de
análise crítica e reflexão sobre os valores e concepções veiculados quanto
nas possibilidades de participação e de transformação das questões
envolvidas.
Por tratarem de questões sociais contemporâneas, que tocam profundamente
o exercício de cidadania, os temas transversais oferecem inúmeras
possibilidades para o uso vivo da palavra, permitindo muitas articulações
com a área de Língua Portuguesa, como:
. a possibilidade de poder expressar-se autenticamente sobre questões
efetivas;
. a diversidade dos pontos de vista e as formas de enunciá-los;
. a convivência com outras posições ideológicas, permitindo o exercício
democrático;
. os domínios lexicais articulados às diversas temáticas.
Os temas transversais abrem a possibilidade de um trabalho integrado de
várias áreas.
Não é o caso de, como muitas vezes ocorre em projetos interdisciplinares,
atribuir à Língua Portuguesa o valor meramente instrumental de ler,
produzir, revisar e corrigir textos, enquanto outras áreas se ocupam do
tratamento dos conteúdos. Adotar tal concepção é postular a neutralidade da
linguagem, o que é incompatível com os princípios que norteiam
estes parâmetros. (BRASIL, p.40).
No que se refere ao nosso estudo, vemos as práticas de linguagem associadas aos
textos e o que com eles se trabalha com o sentido de evidenciar valores e atitudes que podem
ser construídos a partir dessas práticas. No documento dos PCN de LP, podemos conferir,
como nos mostra o fragmento extraído da p. 64:
VALORES E ATITUDES SUBJACENTES ÀS PRÁTICAS DE
LINGUAGEM
. Valorização das variedades lingüísticas que caracterizam a comunidade dos
falantes da Língua Portuguesa nas diferentes regiões do país.
55
. Valorização das diferentes opiniões e informações veiculadas nos textos .
orais ou escritos . como possibilidades diferenciadas de compreensão do
mundo.
. Posicionamento crítico diante de textos, de modo a reconhecer a pertinência
dos argumentos utilizados, posições ideológicas subjacentes e possíveis
conteúdos discriminatórios neles veiculados.
. Interesse, iniciativa e autonomia para ler textos diversos adequados à
condição atual do aluno.
. Atitude receptiva diante de leituras desafiadoras e disponibilidade para a
ampliação do repertório a partir de experiências com material diversificado e
recomendações de terceiros.
. Interesse pela leitura e escrita como fontes de informação, aprendizagem,
lazer e arte.
. Interesse pela literatura, considerando-a forma de expressão da cultura de
um povo.
. Interesse por trocar impressões e informações com outros leitores,
posicionando-se a respeito dos textos lidos, fornecendo indicações de leitura
e considerando os novos dados recebidos.
. Interesse por freqüentar os espaços mediadores de leitura: bibliotecas,
livrarias, distribuidoras, editoras, bancas de revistas, lançamentos,
exposições, palestras, debates, depoimentos de autores ., sabendo orientar-se
dentro da especificidade desses espaços e sendo capaz de localizar um texto
desejado.
. Reconhecimento da necessidade de dominar os saberes envolvidos nas
práticas sociais mediadas pela linguagem como ferramenta para a
continuidade de aprendizagem fora da escola.
. Reconhecimento de que o domínio dos usos sociais da linguagem oral e
escrita pode possibilitar a participação política e cidadã do sujeito, bem
como transformar as condições dessa participação, conferindo-lhe melhor
qualidade.
. Reconhecimento de que o domínio da linguagem oral e escrita pode
oferecer ao sujeito melhores possibilidades de acesso ao trabalho.
. Reconhecimento da necessidade e importância da língua escrita
no processo de planejamento prévio de textos orais.
. Preocupação com a qualidade das produções escritas próprias, tanto no que
se refere aos aspectos formais . discursivos, textuais, gramaticais,
convencionais . quanto à apresentação estética.
. Valorização da linguagem escrita como instrumento que possibilita o
distanciamento do sujeito em relação a idéias e conhecimentos expressos,
permitindo formas de reflexão mais aprofundadas. (BRASIL, pp.64 e 65).
Vimos, portanto, que o livro didático, os recursos didáticos em geral, não existem sem
bases. Ao contrário. Esses documentos e materiais são essenciais ao ensino e aprendizagem.
Essas exigências sociais de legitimação encontram-se representadas principalmente, na nova
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB) e nas novas Diretrizes para o Ensino
Fundamental emanadas do Conselho Nacional de Educação (CNE). Da mesma forma, essas
demandas são contempladas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/1998) propostos
pelo MEC para funcionarem como elemento catalisador de ações, na busca de uma melhoria
na qualidade da Educação Brasileira, o que podemos comprovar em Batista (2003, p.42).
56
Pode-se dizer que, na década de 90, houve uma maior ebulição que favoreceu a
chamada “mudança de paradigma” e que vem refletindo, atualmente, uma nova configuração
do próprio ensino da Língua Portuguesa na qualidade de disciplina. Nessa nova configuração,
novos objetos de ensino e aprendizagem foram reivindicados, entre eles, o investimento na
melhoria de qualidade do LD.
3.3 O livro didático
O livro, isto é, o ato de fala impresso, constitui igualmente um elemento da
comunicação verbal. Ele é objeto de discussões ativas sob a forma de
diálogo e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para ser
estudado a fundo, comentado e criticado no quadro do discurso interior, sem
contar as reações impressas, institucionalizadas, que se encontram nas
diferentes esferas da comunicação verbal (críticas, resenhas, que exercem
influência sobre os trabalhos posteriores, etc.). Além disso, o ato de fala sob
a forma de livro é sempre orientado em função das intervenções anteriores
na mesma esfera de atividade, tanto as do próprio autor como as de outros
autores: ele decorre portanto da situação particular de um problema
científico ou de um estilo de produção literária. Assim, o discurso escrito é
de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica em grande
escala: ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e
objeções potenciais, procura apoio, etc (BAKHTIN, 2006, p.126).
As questões referentes ao livro didático se inserem em um contexto mais amplo, que
perpassa o sistema educacional e envolve uma variedade de outras estruturas. Isto porque uma
obra didática para ser realizada depende de muitas vozes, como pudemos observar quanto a
documentos oficiais e, também com elas, o que os autores e editoras propõem segundo esses
documentos e público alvo. Se a interlocução com as instituições que utilizarão o documento
ocorre dentro de critérios definidos por aqueles documentos oficiais e por atendimento ao
currículo, geralmente são adotadas obras de indiscutíveis condições de dialogar com o que se
pede para contribuir com a formação cidadã do aluno.
Caso o diálogo de adoção de um LD ocorra apenas por causa de coleções
conhecidas pela mídia, esta apresenta editores e autores que têm prestígio suficiente para
obter respaldo nas instituições. De forma que se torna cada vez mais necessário que haja todo
um reconhecimento das vozes que perpassam por um LD, assim como a Associação Brasileira
de Editores de Livros (Abrelivros); a Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos
(Abrale), a Câmara Brasileira do Livro (CBL) e o Sindicato Nacional de Editores de Livros
(SNEL), entre outros, além, é claro, dos documentos oficiais nos quais um LD deve respaldar-
se.
Referir-se ao LD é geralmente polêmico, mas que, inegavelmente, é um assunto que
faz parte do universo dos professores, educadores em geral. Há tempos que o LD se destaca
57
em ser uns dos instrumentos mais utilizados no campo educacional e sua visibilidade tem sido
maior, especialmente, a partir do momento em que esse material passou a ser submetido a
avaliações de profissionais pesquisadores e capacitados, de acordo com propostas de
documentos oficiais. muita informação social, cultural e de gêneros do discurso, entre
outras possibilidades, a serem exploradas, (re) conhecidas dentro de uma obra didática. Mas,
outra questão preocupante é como operacionalizar o atendimento a inúmeras especificidades
propostas para serem contempladas no LD, visto o fato de que esse material deve atender a
normas oficiais, ao universo multicultural.
Certamente o LD, enquanto documento, permite uma abordagem criativa por parte de
quem venha a usá-lo. As coleções aprovadas pelo Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD) têm buscado essas possibilidades, sobretudo quanto ao uso de gêneros do discurso
que, se empregados com função social, indicam condições de atendimento à demanda
cultural. Mas, ainda “engatinha-se nesse terreno e os gêneros estampam as unidades quase
que com a finalidade apenas ilustrativa, para deixar marcas que de que estão ali, mas que na
verdade não são explorados em suas possibilidades sociais. Fica, então, o gênero pelo gênero
e não como (re) conhecimento da importância de cada um para o emprego nas situações reais
de necessidade no espaço social.
O que temos visto é um investimento na qualidade, mas que ainda urge de “retoques”
essenciais para que os livros didáticos, quando produzidos em editoras compromissadas com
os documentos oficiais e valores de cidadania, possam ser recursos fundamentais para a
dinâmica do ensino e aprendizagem, obedecendo a padrões de qualidade. Segundo
Carmagnani, uma análise crítica do livro didático não poderia deixar de considerar sua
inserção no contexto geral do sistema educacional, o mercado o qual serve e, por fim, seus
usuários, professores e alunos (CARMAGNANI, 1999, p. 127).
Embora seja considerada, entre outras possibilidades, um documento, uma obra
didática não é estática, ensimesmada, fechada, engessada. Documentos não são assim.
Prestam-se a diversas possibilidades sociais. Por isso, vemos o LD enquanto objeto que
possui sua emancipação no cenário educacional, haja vista toda uma proposta nos PCN e no
PNLD, para citar dois, em outros exemplos, o que torna o objetivo suscetível a diferentes
explorações de análise.
O LD é um participante do universo escolar, pois é elaborado de forma a vir a ser um
auxiliar para atendendimento às necessidades de (re) conhecimento e (in) formações
educacionais importantes para a contribuição da criticidade e exercício de valores e práticas
cidadãs. Os conteúdos, entre eles os textos, em relação à realidade em que se insere, deve
permitir a formação de posicionamentos importantes na construção da sociedade.
58
É importante também frisar que o LD contribui com aspectos que envolvem as
relações entre o que é proposto pelos autores e a cultura, através das atividades elaboradas
com as leituras e dentro da escola, com o que será realizado com tais propostas. Portanto, um
LD tem um discurso e, com base nesse pressuposto, podemos entender o LD como um espaço
onde podem ocorrer reflexões de práticas sociais: as formações identitárias, o dia-a-dia,
valores de vida em sociedade, o (re)conhecimento da diversidade e diferenças culturais, as
crenças, a indignaçãso diante de injustiças, as relações de poder e ideologias, as possibilidades
de transformação. Como nos apresenta Fairclough (2001):
O discurso contribui para construir todas as dimensões da estrutura
social que, direta ou indiretamente, o moldam e o restringem; as
próprias normas e convenções, como também relações, identidades e
instituiçoes que lhe são subjacentes. O discurso e uma pratica, não
apenas de representação do mundo, mas de significação do mundo,
constituindo e construindo o mundo em significados.
(FAIRCLOUGH, p. 91)
O LD pode ser visto ainda como um recurso contra o apagamento de tantos outros
discursos sociais. Atraves de estudos de textos podem ser inseridas questões importantes de
serem discutidas, tais como as questões de preconceitos sociais, as questões de gêneros
sociais, aspectos da realidade que muitas vezes se perdem porque ou os profissionais de
educação consideram esses temas irrelevantes ou porque as instituições não autorizam esse
tipo de discussão nas escolas, porque julgam que esses assuntos não levam a nada, pois o que
interessa para muitos são os alunos de boca fechada cumprindo tarefas.
Segundo a historiadora Circe Bittencourt, o livro didático é um objeto dos mais usados
instrumentos de trabalho integrantes da „tradição escolar‟ e de “múltiplas facetas”: ora é visto
como um produto cultural, ora “trata-se de um objeto cultural de difícil definição”, ora como
uma mercadoria ligada ao mercado editorial e, como tal, sujeito à lógica do sistema
capitalista; outras vezes é visto como suporte de conhecimentos e de métodos das várias
disciplinas curriculares e, sobretudo, como veículo de valores, ideológicos ou culturais.
A cada nova avaliação dos programas elaborados com a finalidade de avaliar e
contribuir, deste modo, para a melhoria do livro didático, vemos que essa produção está em
processo de mudanças que, esperamos, contribuam para atender ao que pedem os documentos
oficiais e às vozes da sociedade que busca por justiça e reconhecimento. Segundo lemos em
“um dos mais importantes pesquisadores de livros didáticos, o historidor francês Alain
Choppin, tem afirmado que os manuais estão, na atualidade, convertendo-se em uma
ferramenta „polifônica‟” (BITTENCOURT, 2009, p. 307)
59
3.3.1 PNLD 2011 de Língua Portuguesa
Embora os LDP sejam oficialmente avaliados pelo PNLD, por equipes altamente
qualificadas para a tarefa e segundo critérios blicos e oficiais, com fundamentação teórica
pertinentes, embasamentos didático-pedagógicos e técnicas de análise bastante precisas apesar
de fortemente embasadas por todo esse aparato, a análise oficial do PNLD não só não invalida
como sugere e necessita de outras para que cada vez mais possam atingir os objetivos de
qualidade para um LD: pesquisas sobre os assuntos relacionados ao material didático e, e
especialmente, a análise das equipes docentes de cada unidade educacional.
Nessa trajetória do PNLD, que na verdade não é tão recente considerando-se que
mais de duas décadas, criado em 1985 e inserido numa política educacional do país
redemocratizado” (CASSIANO, 2007, p. 5), existe toda uma preocupação com a qualidade do
LD , esse suporte privilegiado para se recuperar conhecimentos, através de leituras,
atividades, conceitos e técnicas considerados essenciais para o ensino e aprendizagem de
alunos, para contribuir criticamente para uma sociedade que pretende ser justa, igualitária,
cidadã, mais humana.
Com vistas a isso, todo um investimento e envolvimento em pesquisas de
especialistas nessa área do PNLD, de verbas que fomentam pesquisas, de pesquisadores que
também enveredam nessa área no sentido de (re) apresentar o LD como um dos recursos que
mais auxiliam ao trabalho docente e que, segundo nos afirma Choppin (2004) , durante muito
tempo as investigações históricas sobre o livro escolar foram negligenciadas, inclusive pelo
status secundário do manual no ramo dos livros. Entretanto, esse autor ainda observa que
uns 20 anos esse tipo de pesquisa teve avanços significativos, sendo o livro didático
considerado como dispositivo de memória na educação. Por essa razão, tem sido mais
enfatizado o interesse quanto às pesquisas nessa área, onde o LD passou a ser um importante
objeto de estudos.
De acordo com o PNLD, as atividades de compreensão e interpretação do texto têm
como objetivo final a formação do leitor (inclusive a do leitor literário) e o desenvolvimento
da capacidade crítica. Neste trabalho, através das propostas elaboradas pelos autores no
recorte que fizemos vimos alguns aspectos que são relativos a esse enfoque no material
selecionado.
Ainda de acordo com o que podemos ler no documento elaborado pelo PNLD de LP
de 2011, o conjunto de textos que um LDP oferece para o ensino-aprendizagem de Língua
Portuguesa deve justificar-se pela qualidade da experiência de leitura que possa propiciar ao
60
aluno, contribuindo para a sua formação como leitor proficiente, inclusive como leitor
literário. Segundo o documento, uma coletânea deve, portanto:
estar isenta tanto de fragmentos sem unidade de sentido quanto de
pseudotextos, redigidos com propósitos exclusivamente didáticos;
ser representativa da heterogeneidade própria da cultura da escrita
inclusive no que diz respeito a autoria, a registros, estilos e variedades
(sociais e regionais) linguísticas do Português , de forma a permitir ao
aluno a percepção de semelhanças e diferenças entre tipos de textos e
gêneros diversos, pertencentes a esferas socialmente mais significativas de
uso da linguagem;
ser adequada do ponto de vista da extensão, da temática e da
complexidade linguística ao nível de escolarização em jogo;
incluir, de forma significativa e equilibrada, em relação aos demais
textos da tradição literária de língua portuguesa (especialmente os da
literatura brasileira); e
incentivar professores e alunos a buscarem textos e informações fora
dos • limites do próprio livro didático.
61
4 METODOLOGIA
Este ponto estrutura-se a partir de alguns eixos categoriais para a nossa análise, dando
conta de algumas mostragens que elaboramos em tabelas configuradoras de um perfil síntese
dos textos da obra didática. Por haver muitos pontos comuns na análise, fizemos os passos
desse percurso apenas utilizando alguns dos textos recortados, pois, se utilizássemos todos, o
trabalho ficaria deveras repetitivo.
A nossa investigação buscou tentar dar conta da pluralidade de vozes que pudessem
ser vistas nos textos e nas atividades, que, elaboradas pelos autores da obra, possibilitam ou
não a ação e estar em ação no mundo social e considerar que isso envolve questões relativas
a poder, ideologia, história e subjetividade (Moita Lopes, 1994, p. 331). A análise dessa
coleção didática para o ensino de LP proposta nesta dissertação de mestrado, mais uma vez
frisamos que
enquadra-se na modalidade de pesquisa qualitativa chamada de
análise documental (Lüdke & André, 1986). Conceituo o livro
didático como documento de fonte primária, pois se trata de material
impresso (documento) que analiso tal como concebido por seus
autores (fonte primária). Os livros didáticos são tratados aqui como
documentos, inseridos em um contexto sócio-histórico, e, assim como
qualquer documento, detêm um conteúdo passível de análise. (TÍLIO,
2006).
O discurso destes documentos que os livros didáticos de Língua Portuguesa
representam, com os textos e atividades de compreensão e interpretação são enfocados em
nosso trabalho com a perspectiva de seu papel social no contexto pedagógico, o que faz com
que esta pesquisa se caracterize por adotar uma perspectiva sociodiscursiva.
Esta dissertação apresenta uma análise textual, na medida em que observam-se
aspectos textuais e discursivos nos textos aqui previstos nos livros didáticos, e é uma pesquisa
social, pois o problema que enfoca caracteriza-se por ser de ordem social e a análise é feita
com base em uma teoria social de discurso que é a ADC . Adotamos uma postura crítica
prévia em relação aos aspectos ideológicos nos discursos, o que concorre para a ênfase de
perceber nos textos os fatos linguísticos que apontam às ideologias em sua produção e
levantamos hipóteses acerca de seu efeito nos receptores dos textos investigados. Para tanto,
lemos sobre as categorias de teorias da linguagem (por exemplo, em HALLIDAY apud
TÍLIO; MATTHIESSEN; FAIRCLOUGH, 2003; e van DIJK) para a identificação de
categorias linguísticas de análise e sua relação com o social e a cultura.
Sustentando o argumento de que a noção de “criticismo” nas Ciências Sociais e nas
Humanidades resulta de construções históricas do termo, percebemos na leitura de Fiorin
62
esses mecanismos ideológicos na esteira de décadas. Pretendemos evitar, na análise, uma
supervalorização dos dados que destacamos a fim de não corrermos riscos de,
consequentemente, interpretá-los à luz de nossos próprios juízos de valor. Queremos com isso
emitir possibilidades de estudos e questionamentos e não engessar opiniões radicais.
Segundo Fairclough (1992, p. 67), “o discurso enquanto prática ideológica
constitui, naturaliza, sustenta e modifica significados do mundo a partir de suas
diferentes posições dentro de relações de poder”. É com esse enfoque que pretendemos
observar os recortes de textos que utilizamos nesta pesquisa, além de verificarmos as
condições de discurso que promovam interação no meio social. Para essas possibilidades,
contribuem de maneira significativa as contribuições da ACD e do ISD.
4.1 Teoria
Entre outros procedimentos, pretendemos verificar no material que nos propusemos a
analisar se o título está de acordo com as perguntas de pesquisa, se as perguntas estão de
acordo com os objetivos, se os objetivos estão de acordo com a justificativa e por último se a
conclusão é compatível com todos os itens anteriores” (BARROS, 2002, pp. 10 e 11).
O objetivo dessa análise documental é identificar no LD, documento primário,
informações que sirvam de subsídio para responder alguma questão de pesquisa. Por
representarem uma fonte natural de informação, documentos “não são apenas uma fonte de
informação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem informações
sobre esse mesmo contexto” (Lüdke & André, 1986, p. 39, In TÍLIO, 2006).
O interesse nesse universo textual, com base nos teóricos que elencamos para
contribuição na pesquisa, objetiva também compreender a negociação de significados entre o
discurso dos textos e as propostas dos autores. A coleta de dados feita com esses textos e as
atividades propostas a partir deles ajudam na observação das relações sociais estabelecidas
por esses contextos em que os textos se inserem e são inseridos, pois é nessa troca de
informações entre esses universos que presenciamos a interação e o agir dessas vozes.
A análise documental deve ser adotada quando a linguagem utilizada
nos documentos constitui-se elemento fundamental para a
investigação. O livro didático, enquanto forma de produção na
modalidade escrita, pode ser considerado um documento pedagógico,
pois constitui parte integrante das práticas educacionais. Além disso,
ele está inserido em um contexto maior a contemporaneidade que
também é considerada na análise. (TÍLIO, 2006, p.130)
O material em análise, embora ainda não em mãos dos usuários projetados, supõe
esses usuários e já dialoga com eles em relação às propostas que se apresentam, pois tratam-se
63
de temas importantes para a contemporaneidade, onde esses usuários projetados tem seu lugar
e seu direito de voz, pois, reportando-nos Tílio (2006) concordamos em que a relevância da
análise documental também se explica na medida em que a construção de identidades dos
alunos e a abordagem de questões socioculturais em livros didáticos são viabilizadas através
da linguagem. Este trabalho se preocupa com a análise do LD enquanto documento idealizado
por seus autores, mas tendo em vista a função pedagógica e os usuários previstos (projetados)
para o uso desse documento; são os textos selecionados na coletânea com o texto dos autores,
apresentados nas atividades de compreensão e interpretação textual, inseridos no contexto
contemporâneo , o objeto de estudo desta pesquisa.
Para desenvolver uma análise documental, Lüdke & And (1986) sugerem a
metodologia de análise de conteúdo, “uma categoria de procedimentos explícitos de análise
textual para fins de pesquisa social” (Bauer, 2002, p. 191). A análise de conteúdo “é uma
técnica para produzir inferências de um texto focal para seu contexto social de maneira
objetivada” (Bauer, 2002, p. 191, In: Tílio 2006), em que um texto é estudado tendo em vista
sua inserção em um contexto social mais amplo. Segundo Bakhtin,
o objeto verdadeiro da pesquisa deve ser justamente a interação dinâmica
dessas duas dimensões, o discurso a transmitir e aquele que serve para
transmiti-lo. Na verdade, eles têm uma existência real, se formam e
vivem através dessa interrelação, e não de maneira isolada. O discurso citado
e o contexto de transmissão o somente os termos de uma interrelação
dinâmica. Essa dinâmica, por sua vez, reflete a dinâmica da interrelação
social dos indivíduos na comunicação ideológica verbal. (Trata-se,
naturalmente, de tendências essenciais e constantes dessa comunicação)
(BAKHTIN, 2006, pp.151-152).
Materiais textuais são trabalhados de forma sistemática, tentando evitar que a análise
seja confundida com uma interpretação subjetiva aleatória. Maneira objetivada refere-se aos
procedimentos sistemáticos, metodicamente explícitos e replicáveis: não sugere uma leitura
válida singular dos textos. Pelo contrário, a codificação singular de um texto o transforma, a
fim de criar nova informação desse texto.
O material selecionado nos textos e nas atividades que acessamos são os discursos,
identidades, a polifonia, os gêneros discursivos e as representações discursivas que podem ser
categorizadas com base nos dados desse material. Uma outra abordagem metodológica que
viabiliza a análise documental é a análise de discurso (Gill, 2002), o nome genérico utilizado
para uma forma de análise de textos que rejeita a neutralidade da linguagem e atribui ao
discurso centralidade na construção da vida social.
Reportando-nos a Tílio, que adapta Burr (1995), Gill (2002, p. 245) enumera quatro
características chave que norteiam uma análise de discurso: 1. A postura crítica com respeito
64
ao conhecimento dado, aceito sem discussão e um ceticismo com respeito à visão de que
nossas observações do mundo nos revelam, sem problemas, sua natureza autêntica. 2. O
reconhecimento de que as maneiras como nós normalmente compreendemos o mundo são
histórica e culturalmente específicas e relativas. 3. A convicção de que o conhecimento é
socialmente construído, isto é, que nossas maneiras atuais de compreender o mundo são
determinadas não pela natureza do mundo em si mesmo, mas pelos processos sociais. 4. O
compromisso de explorar as maneiras como os conhecimentos a construção social de
pessoas, fenômenos ou problemas estão ligados à ações / práticas. A análise documental
aqui conduzida utiliza o aporte teórico-metodológico da análise crítica do discurso, além das
conceituações discutidas em nossa fundamentação teórica e com os nomes de autores que
destacamos para nos dar suporte a essa fundamentação (cf. capítulo 3).
Reportando-nos a Resende (2009, p.12), uma característica fundamental dessas
abordagens críticas nos estudos da linguagem é a interdisciplinaridade. A autora ainda sugere
que pesquisas discursivas críticas estejam baseadas na identificação de problemas sociais que
possam ser investigados por meio da análise situada em textos. A forma de operacionalização
da análise encontra-se detalhada nos procedimentos de análise (cf. seção 4.3).
4.2 Descrição do corpus
Escolhemos a coleção didática Português: Linguagens, de autoria de William Roberto
Cereja e Thereza Cochar Magalhães, destinada às séries finais do Ensino Fundamental como
corpus que compõe essa pesquisa. Dentro dessa coleção, selecionamos os textos de número
um, sempre dos capítulos de número um, também, e as atividades de interpretação de texto
relacionadas a esses textos que recortamos. O motivo da escolha pelos textos de número um
deveu-se ao fato desses textos serem o primeiro contato do aluno com o título do capítulo nos
quais esses textos se inserem. Vemos esses títulos de capítulos como Tema, pois seguimos as
orientações de Tílio (2006) ao lidar com essa nomenclatura (cf. 4.3) nesta pesquisa.
Outro motivo de nossa escolha deveu-se ao fato da coleção em análise ter sido
aprovada pela quarta vez pelo PNLD e é a edição mais recente oferecida pelos autores e
editora. A edição define o público alvo, ou seja, alunos de ano ao ano do EF, bem como
possui local e data de publicação. São analisados dezessseis textos com a suas atividades
interpretativas. A escolha dessa faixa escolar, público alvo, justifica-se por alguns aspectos:
Primeiramente, espera-se que o aluno ingressante nesse segmento tenha
cumprido satisfatoriamente uma primeira e decisiva etapa de seu processo de
letramento e alfabetização, tendo, inclusive, se apropriado de algumas
práticas mais complexas e menos cotidianas (relacionadas a esferas públicas
65
de uso da linguagem), seja de leitura e escrita, seja de compreensão e
produção de textos orais. Essas práticas apresentam padrões linguísticos e
textuais que, por sua vez, demandam novos tipos de reflexão sobre o
funcionamento e as propriedades da linguagem em uso, assim como a
sistematização dos conhecimentos lingüísticos correlatos mais relevantes.
(BRASIL/ MEC, 2010, p. 21).
Destacamos que nessa faixa etária, entre os dez anos e quinze anos, aproximadamente,
é onde geralmente observa-se um comportamento mais inquiridor por parte dos alunos acerca
da realidade em que vivemos. É quando eles se percebem mais preocupados com as
transformações que acontecem no corpo e comportamento deles mesmos, pois é a fase da
pré-adolescência e inícios da adolescência onde se observa que
a trajetória desse aluno em direção à autonomia relativa nos estudos e ao
pleno exercício da cidadania pode ser considerada, por um lado, mais
delineada; e, por outro, ainda não satisfatoriamente consolidada. O que
deverá implicar, no processo de ensino-aprendizagem escolar desses anos,
um maior peso relativo para esses eixos de formação. (BRASIL/ MEC,
2010, p. 21).
É, sem dúvida, uma fase complexa, para eles, para os familiares que lidam mais
diretamente com eles, para os professores que dividem com eles um espaço de construção
cidadã, para os educadores em geral, para pesquisadores... Mais acentuadamente nessa fase,
esses alunos são expostos a um cotidiano mais conturbado, embora nosso trabalho não tenha
se aprofundado nessas particularidades sociais, comportamentais e psicológicas, mas é
importante para caracterizarmos a fase em que, certamente, a maioria do público alvo da
coleção em pauta se encontra, com bombardeios de informações que lhes chegam e eles ficam
sem saber como filtrá-las.
Finalmente, o destino do aluno, ao final desse período de escolarização
obrigatória, é bastante diversificado. E, muitas vezes, implica a interrupção
temporária ou mesmo definitiva de sua educação escolar, motivo pelo qual o
EF deve garantir a seus egressos um domínio da escrita e da oralidade
suficiente para as demandas básicas do mundo do trabalho e do pleno
exercício da cidadania, inclusive no que diz respeito à fruição da literatura
em língua portuguesa. Tais circunstâncias atribuem a esses anos do EF uma
responsabilidade ainda maior, no que diz respeito ao processo de formação
tanto do leitor e do produtor proficiente e crítico de textos quanto do locutor
capaz de uso adequado e eficiente da linguagem oral em situações privadas
ou públicas. (BRASIL/ MEC, 2010, p. 21).
Essa coleção também vem sendo anos amplamente indicada nas escolas tanto das
redes particulares quanto públicas de ensino, sendo inclusive chamada por alguns professores
como coleção de grife. Os livros selecionados apresentam uma diversidade de temas (cf. 2.1,
quadros 2.1, 2.2, 2.3 e 2.4) que representam o que se analisou no volume do PL destinado
66
aos anos aqui estudados), voltando a lembrar de que lugar referimo-nos ao citar a palavra
tema neste trabalho .
Verificamos que é preocupação tanto da editora quanto dos autores da obra a
adequação aos PCNs, pois um livro que não se adeque aos PCNs é considerado fora dos
padrões educacionais vigentes reconhecidos pelo MEC (TÍLIO, 2006, p. 13). Ainda é
importante salientar que o primeiro texto, correspondente ao livro de 6º ano e que faz parte do
capítulo de número um foi aquele no qual nos detivemos com as maiores pormenorizações de
análise, embora os demais textos também tenham sido vistos com o mesmo empenho, mas se
alongariam demais nossos comentários de análise aqui neste trabalho, tornando-os, inclusive,
repetitivos, caso nos detivéssemos a examinar pormenorizadamente cada um. Por isso,
optamos por elaborar quadros onde elencamos os tópicos com base em Tílio (2006), como
pode ser conferido no item 3.3 de nossos procedimentos de análise, alguns tópicos dos PCN
de Língua Portuguesa e outros tópicos referentes a textos que retiramos do documento do
PNLD, como pode ser conferido nos quadros: Quadro 4.1.1a, Quadro 4.1.1b, Quadro 4.1.1c
e Quadro 4.1.1d (6º, 7º, e anos, respectivamente, e os resultados das análises de acordo
com o tema dos capítulos, tópicos e documentos oficiais).
4.3 Procedimentos de análise
Para conduzir a análise documental aqui proposta, adaptamos os tópicos encontrados
em Tilio (2006) que versa sobre conceitos de Tema e Rema, alguns aspectos dos PCN (cf
anexo 2) de LP que consideramos mais representativos para o estudo de textos e atividades
interpretativas. Também utilizamos alguns itens do PNLD (cf. anexo 3) que consideramos
mais gerais para atendimento a nossa proposta de pesquisa e metologias voltadas à análise de
livros didáticos e a partir de alguns pressupostos teóricos da Lingüística Sistêmico-Funcional,
onde podemos ler que é importante,
através das metafunções ideacional, interpessoal e textual, identificar
como os livros didáticos representam o mundo (metafunção
ideacional) e abrem espaço para a construção de identidades, dão voz
aos participantes do processo de ensino e aprendizagem (metafunção
interpessoal) e organizam seu material (metafunção textual). A visão
de mundo e o espaço para a construção de identidades foram
observados nos livros didáticos através das experiências de mundo
que são apresentadas como representações da realidade. O estudo dos
tópicos abordados pelos livros foi feito visando caracterizar o mundo
que o livro pretende coconstruir com os alunos (metafunção
ideacional). (TILIO, 2006, p. 138)
67
Os tópicos foram levantados a partir da análise dos textos um (os que abrem os
capítulos nas unidades temáticas), de todos os capítulos de mero um nos volumes de sexto
ao nono ano e com base nas atividades de compreensão e interpretação desses textos. Os
contextos socioculturais foram analisados com intuito de verificar se, com as abordagem de
gêneros textuais utilizadas, os itens relacionados aos PCN e PNLD contribuem para “ auxiliar
na identificação dos mundos representados nos livros” (TILIO, 2006. p. 138).
Nossa utilização do que Tílio apresenta sobre considerar as categorizações de Tema e
Rema é porque concordamos com o que ele diz em sua tese:
Por se tratar de uma categorização preocupada com o significado da
mensagem, e não apenas com sua estrutura sintática, as mesmas
categorias de Tema e Rema podem ser utilizadas para estudar a
estruturação de livros didáticos. Embora o Tema seja o elemento que
ocupa a posição inicial em uma oração, adaptei este conceito para a
análise de livros didáticos, pois não analiso as orações presentes nos
livros. Ao invés de trabalhar com Tema e Rema das orações, trabalhei
com Temas e Remas das lições, unidades e do livro com um todo.
(TÍLIO, 2006, p.138)
Na organização do estudo, parafrasendo Tilio (idem), chamamos de Tema o que se
põe em destaque, ou seja, os títulos e subtítulos, o material que se encontra nas aberturas de
unidades (para nós todas correspondentes às unidades de número um), capítulos e tulos de
textos com fontes maiores, cores destacadas, as lições e atividades interpretativas e de Rema
tudo o que aparece ao redor deste(s) elementos(s) ou deixados mais para o final das unidades.
Portanto, o que nos interessa para o momento é o Tema, que nos apresenta esse corpo social
que o LD nos traz em forma de textos e atividades,
do ponto de vista do conteúdo, dos temas que se encontram atualizados
num dado momento do tempo; e, em segundo lugar, do ponto de vista dos
tipos e formas de discurso através dos quais estes temas tomam forma, são
comentados, se realizam, são experimentados, são pensados, etc
(BAKHTIN, 2006, p. 46)
Elaboramos, para a análise com utilização do quadro X, um código para os itens do
PNLD identificados como AIII8, AIV10, AIV11, AIV12 e AD24, (cf. quadro 3.1), que
explicamos a seguir:
AIII8 “A”, referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. guia PNLD,
p.48) que trata da análise avaliativa quanto ao aspecto “III, que apresenta tópicos sobre a
coletânea de textos usados para a leitura nos LD. E, finalmente o tópico 8 que apresenta as
seguintes questões:
8. A coletânea é representativa do que a cultura escrita oferece para o adolescente na faixa
escolar do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental?
a) Os gêneros selecionados pertencem a esferas socialmente relevantes?
68
b) A coletânea inclui textos multimodais?
c) A produção cultural específica para os adolescentes (quadrinhos, almanaques, suplementos
de jornais) está representada?
d) Os textos literários selecionados são de autores representativos do cânone?
e) textos literários que se referem a diferentes épocas e regiões (aí incluídas traduções de
boa qualidade)?
Aqui, comprovamos com o fragmento extraído do documento do PNLD, exatamente
de onde surgiu o nosso quadro, e em que nos baseamos para um dos tópicos da análise:
Quadro 4.1 Da análise quanto ao PNLD
AIII9 “A”, referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf.doc. guia do PNLD,
p.48) que trata da análise avaliativa quanto ao aspecto “III” , que apresenta tópicos sobre a
coletânea de textos usados para a leitura nos LD. E, finalmente o tópico 9 que nos apresenta
os enuniados com os seguintes itens:
69
Quadro 4.2 Da análise quanto ao PNLD
Conforme as páginas aparecem indicadas e os podem ser conferidas nos documentos
a que nos referimos (cf. referências) Daqui por diante apresentaremos apenas as questões a
que nos referimos e não mais os quadros. Em sequência às explicações dos procedimentos de
análise, apresentamos os demais tópicos, ainda com base no PNLD:
AIV10 Onde “A” é referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. Guia
do PNLD, p.49), sendo “IV” o tópico que trata especificamente sobre o tema “Leitura” onde
encontramos a questão 10 com os seguintes questionamentos:
10. As atividades de leitura colaboram efetivamente para a formação geral do leitor?
a) Definem objetivos plausíveis para a leitura proposta?
b) Resgatam o contexto de produção (esfera, suporte, função social, contexto histórico)?
c) Propõem apreciações estéticas, éticas, políticas, ideológicas?
d) Discutem questões relativas a diversidade sociocultural brasileira?
e) Situam as práticas de leitura em seu universo de uso social?
f) Respeitam as convenções e os modos de ler constitutivos de diferentes gêneros praticados
em diferentes esferas de letramento?
g) Incentivam os alunos a buscarem textos e informações fora dos limites do LD?
h) Tratam a leitura como processo de interlocução, promovendo o diálogo leitortexto autor?
AIV11 - Onde “A” é referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. Guia
PNLD, p. 49), sendo “IV” o tópico que trata especificamente sobre o tema “Leitura” onde
encontramos a questão 11 com as seguintes perguntas:
70
11. As atividades de leitura colaboram efetivamente para a formação do leitor literário?
a) Situam o autor e sua obra em relação à produção cultural e aos cânones literários?
b) Situam o fragmento selecionado em relação à obra de que faz parte?
c) Estimulam o aluno a conhecer a obra de que o texto faz parte ou outras
obras a ele relacionadas?
d) Levam o aluno a considerar a materialidade do texto na apreensão de efeitos de sentido?
e) Aproximam adequadamente o aluno do padrão linguístico do texto (vocabulário e recursos
sintáticos pouco usuais, variedades linguísticas etc.)?
de Livros Didáticos PNLD 201
AIV12- Onde “A” é referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. Guia
PNLD, p. 49), sendo “IV” o tópico que trata especificamente sobre o tema “Leitura” onde
encontramos a questão 12 com as questões:
12. As atividades de leitura colaboram efetivamente para o desenvolvimento da
proficiência do aluno?
a) Trabalham as diferentes estratégias cognitivas envolvidas no processo de leitura
(ativação de conhecimentos prévios, formulação e verificação de hipóteses)?
b) Desenvolvem capacidades de leitura para além da localização de informações?
c) Exploram aspectos discursivos [interdiscursividade, intertextualidade, marcas
enunciativas, efeitos de sentido, pressupostos e subentendidos, polifonia (vozes,
marcas da presença do discurso alheio), argumentatividade, etc.]?
d) Exploram os recursos linguístico-textuais específicos dos diferentes gêneros para
a produção de sentido (recursos de conexão, coesão verbal e nominal, recursos
sintáticos)?
e) Exploram a compreensão das relações que se estabelecem entre texto verbal e
imagem em textos multissemióticos?
D24 Onde “D” (cf. doc. Guia PNLD , p. 53) diz respeito à legislação e observância
aos princípios éticos necessários à construção da cidadania e o item 24, que
destacamos, envolve as seguintes questões em relação a esse assunto:
D. RESPEITO À LEGISLAÇÃO E OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS ÉTICOS
NECESSÁRIOS À CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA
24. A obra em análise:
71
a) obedece aos dispositivos legais pertinentes (Constituição Federal, Estatuto da Criança e do
Adolescente e outros)?
b) cumpre a exigência legal de não disseminar:
(i) preconceitos e estereótipos?
(ii) proselitismo político ou religioso?
(iii) publicidade (a não ser quando se trata de estudar textos dessa esfera)?
c) propõe a discussão de textos e imagens que apresentem atitudes preconceituosas ou
estereótipos?
d) contribui para a percepção das relações entre conhecimento e suas funções na sociedade e
na vida prática?
e) representa a diversidade étnica, regional, linguística e cultural e de gênero (masculino e
feminino) em textos e imagens?
Obs.: Utilizando-nos desses itens, fizemos a análise dos textos que selecionamos e
obtivemos um quadro mostragem onde cada tópico referente a itens presentes nesses textos
foi assinalado com um “X” para demarcar que verificamos totalmente ou parcialmente aquele
aspecto analisado; ou, caso o tópico não tenha sido identificado por nós, deixamos a célula
referente àquele item, sem qualquer marcação. Livros
72
5 ANÁLISE DE TEXTOS SELECIONADOS E INTERPRETAÇÃO NOS VOLUMES
DIDÁTICOS
De modo geral, considera-se que um texto é polifônico, quando nele se
fazem ouvir várias vozes distintas, podendo tratar-se de várias vozes de
mesmo estatuto (diferentes vozes sociais ou diferentes vozes de
personagens) ou de combinação de vozes de estatuto diferente (voz do autor,
voz de um personagem, voz social, etc.). Portanto, podem existir múltiplas
formas de combinações polifônicas. Além disso, considerando a diferença
entre os modos de expressão direta e indireta, podemos distinguir uma
polifonia explícita (analisada principalmente por Ducrot, 1984) e uma
polifonia implícita (analisada particularmente por Bakhtin, 1984), sendo que,
em numerosos textos, a polifonia implícita e a explícita podem,
evidentemente coexistir. (BRONCKART, 2003, p. 329)
O livro didático de língua portuguesa apresenta-se, como documento interdisciplinar
que representa, no sentido de ser permeado por diversos outros discursos, não apenas vozes
relacionadas ao ambiente escolar, mas e sobretudo, discursos de mundo, provenientes também
da realidade sócio-histórico- cultural da sociedade vista como um todo. Aqui é o momento de
verificarmos até que ponto isso que dissemos pode ser confirmado na obra em análise,
sobretudo considerando-se que a mesma visa atender a uma série de exigências que contam
dos documentos oficiais.
O povo brasileiro com sua etnia, a convivência desse povo e seu relacionamento com a
globalização, a pluralidade cultural, as identidades que se constroem no cotidiano e nas
práticas sociais dessa interação, o papel social dos gêneros textuais que se apresentam no
interior da obra, até onde delimitamos seu estudo, são de crucial importância para essa
análise, de acordo com nossa proposta ao selecionarmos esse objeto de estudos.
Nesse recorte analisamos, não exaustivamente, alguns textos, devidamente
recortados, com base nas propostas da teoria de linguagem de base sistêmico-funcional e uma
visão socioconstrucionista do discurso e sociointeracionista do ensino e aprendizagem, que
embasa os princípios dos Parâmetros Curriculares Nacionais de língua portuguesa (PCN de
LP), também as atividades interpretativas relacionadas a esses textos e os resultados
encontrados nesse estudo, que serão agora discutidos.
A análise desenvolvida buscou responder às seguintes questões de pesquisa:
1) De que forma os tópicos dos textos selecionados contribuem para uma formação cidadã?
2) Em que medida as atividades propostas com os textos permitem ao aluno agir no mundo
social, pensando criticamente e expressando diferentes vozes acerca do tópico?
3) Existe variedade de gêneros textuais compatíveis com a realidade social em que o aluno se
insere?
73
Para que as propostas desse trabalho possam ser alcançadas é importante verificarmos
temas que contribuam para atingirmos respostas aos nossos questionamentos, entre eles:
o discurso e o socioconstrucionismo, a fim de problematizar às expectativas da
contemporaneidade e educação, com formação de valores de vida, pensamento crítico,
atitudes cidadãs;
a interface com a interdisciplinaridade e os textos abordados a fim de observar de
que modo uma obra didática de língua materna dialoga com as demais disciplinas do
currículo, favorecendo esse diálogo interdisciplinar que tanto buscamos;
e, ainda, se os possíveis discursos produzidos pela obra didática dialogam com
alguns documentos oficiais, inúmeras vezes mencionados nessa pesquisa.
5.1 Visão de mundo e a polifonia no contexto cultural
Pelo que pudemos analisar, a visão de mundo (re) apresentada numa obra didática
pode exercer alguma influência na construção de identidades dos alunos que utilizam o
material”. Mas, voltamos a enfatizar aqui, que vemos esse material didático enquanto
documento,portanto esses efeitos não fazem parte da análise e, sim, o que depreendemos a
partir do documento que temos em mãos e as possibilidades apresentadas pelos autores da
obra.
A análise dos livros das quatro séries finais do ensino fundamental levou-nos a seguir
a sequência que foi elaborada pelos autores da obra com a identificação e classificação dos
tópicos presentes até a parte que delimitamos, que foram distribuídos em dezesseis partes, de
acordo com a quantidade total de textos que selecionamos. A função social desses textos, a
representação de mundo criada a partir deles e da forma em que eles foram “dissecados”pelos
autores nas questões de estudo do texto, no recorte de compreensão e interpretação, foi onde
nos atemos para esse trabalho.
Deste modo, através do estudo das categorias de tópicos presentes em cada volume
analisado foi feita a caracterização das especificidades retratadas em cada série, ou seja, as
abordagens textuais previstas, os gêneros mais presentes nesses textos e as questões
problematizadoras da realidade social que eles trabalham, a fim de que cheguem aos
educadores e alunos as propostas, tanto dos autores, quanto dos documentos oficiais aos quais
a obra deve atender.
De acordo com Tílio (2006), destacamos os mesmos tópicos utilizados por ele em sua
tese de doutorado e também ressalvamos que esse tópicos podem aparecer misturados. Não
significa que, pelo fato de termos elencado esse tópicos com uma marca de oposição ( o
74
símbolo de versus), que eles apareçam separadamente. Ao contrário, eles podem aparecer
numa mesma perspectiva textual. Vejamos os tópicos nomeados como a seguir:
Quadro 5.1 Categoria de tópicos Tílio (2006)
tópicos includentes X excludentes;
tópicos tradicionais X tópicos pós-modernos,
que aqui utilizo, de acordo com leituras e
preferência pessoal, o termo
contemporaneidade.
tópicos globalizados X tópicos localizados;
tópicos contextualizados X tópicos
descontextualizados;
tópicos multiculturais X tópicos
etnocentristas;
tópicos conscientizadores X tópicos
alienantes;
tópicos estereotipadores X tópicos
legitimadores de identidades
tópicos legitimadores de identidades através
da difusão de identidades X tópicos que
permitem a construção de identidades de
projeto.
Aqui, esclarecemos um pouco mais sobre essa abordagem dos tópicos que citamos
anteriormente, ainda com base em Tílio (2006), e referimo-nos a alguns exemplos
encontrados na obra em análise:
tópicos tradicionais, são os tópicos com assuntos atemporais (ex.: relacionamentos),
e tópicos pós-modernos, que tratam de assuntos da contemporaneidade (ex.: ternura) cf.
Toada de Ternura;
tópicos globalizados, preocupados com a integração de diferentes contextos globais (ex:
Carta ao Pleitosceno, que aborda sobre experiências científicas), e tópicos localizados,
preocupados apenas com questões setoriais que parecem não atingir o âmbito da globalização
(ex. comprar ou não comprar presentes para o dia das mães) cf. 8º ano. Unidade 3:
Consumo Capítulo: Ser ou ter? Eis a questão. Texto: Ser filho é padecer no purgatório.
Em meio a esses esclarecimentos sobre tópicos tradicionais, globalizados, localizados
e os demais que são lidos aqui, queremos apresentar, especialmente quanto a esses tópicos
globalizados, o que podemos ler em Santos (2002) que, para haver um processo de
globalização necessariamente tem que haver um de localização. Em suas palavras, a produção
de tópicos globalizados
“é o conjunto de trocas desiguais pelo qual um determinado produto,
condição, entidade ou identidade local estende a sua influência para além das
75
fronteiras nacionais, desenvolvendo uma capacidade de designar como local
outro produto, condição, entidade ou identidade”. (SANTOS, 2002, p 63)
tópicos descontextualizados, tratados de forma genérica, como se válidos para
qualquer situação (ex.: uma festa, como se todas as festas, em todos os lugares e de qualquer
tipo, fossem festejadas da mesma forma), e tópicos contextualizados, inseridos em contextos
culturais ou situacionais (ex: a noite de São Silvestre no país onde vive a menina dos fósforos)
cf. anexos.
tópicos etnocentristas, que induzem à idéia de que determinadas culturas sejam
superiores às demais (ex.ainda em “a menina dos fósforos” por apresentar conto maravilhoso
de origem europeia:), e tópicos multiculturais, que reconhecem a pluralidade cultural e suas
diferenças inerentes (ex.: diferenças culturais) cf. o diálogo da patroa (branca) com a
empregada (negra) sobre desfilar na escola de samba;
tópicos estereotipadores, que, na tentativa de reconhecer a diversidade, atribuem
identidades essencialistas a determinados grupos (ex.: alguns estereótipos relacionados a
cidades), e tópicos diferenciadores, que tratam de diferenças que coexistem, sem se
preocupar com a atribuição de identidades uniformes (ex.as diferentes profissões:) cf. o
texto “A vocação de Geraldinho”;
tópicos conscientizadores, com o intuito de educar o aluno e o cidadão, muitas
vezes com foco nos temas transversais apontados pelos PCNs (ex.consumismo:), e tópicos
alienantes, sem qualquer preocupação com a preparação do aluno para o mundo (não
identificados na análise).
tópicos legitimadores de identidades através da difusão de identidades socialmente
aceitas (ex.o texto dos pais numa cerimônia de casamento:), e tópicos que permitem a
construção de identidades de projeto, através da resistência e sugestão de alternativas às
identidades legitimadoras (ex.: histórias de vida e experiências pessoais) cf. “os meninos
morenos”, de Ziraldo.
As categorias descritas podem aparecer interrelacionadas, ou seja, num mesmo texto
podemos vê-las em conjunto e não necessariamente onde aparece uma não aparece a outra
que lhe serviu de par no quadro que apresentamos (cf. quadro 7.1, 7.2, 7.3 e 7.4) .
Pelo que pudemos analisar, a visão de mundo (re) apresentada numa obra didática
pode exercer alguma influência na construção de identidades dos alunos que utilizam o
material. Mas, voltamos a enfatizar aqui, que vemos esse material didático enquanto
documento, portanto esses efeitos não fazem parte da análise e, sim, o que depreendemos a
partir do documento que temos em mãos e as possibilidades apresentadas pelos autores da
obra.
76
A análise dos livros das quatro séries finais do ensino fundamental levou-nos a seguir
a sequência que foi elaborada pelos autores da obra com a identificação e classificação dos
tópicos presentes até a parte que delimitamos, distribuídas em dezesseis textos, de acordo com
os critérios de serem aqueles que são os textos de número um, conforma explicamos. A
função social desses textos, a representação de mundo criada a partir deles e da forma em que
eles foram “dissecados” pelos autores nas questões de estudo do texto, no recorte de
compreensão e interpretação, foi onde nos atemos para esse trabalho.
Deste modo, através do estudo das categorias de tópicos presentes em cada volume
analisado foi feita a caracterização das especificidades retratadas em cada série, ou seja, as
abordagens textuais previstas, os gêneros mais presentes nesses textos e as questões
problematizadoras da realidade social que eles trabalham, a fim de que cheguem aos
educadores e alunos as propostas, tanto dos autores, quanto dos documentos oficiais aos quais
a obra deve atender.
5.1.1 O mundo visto através de tópicos e configurações tópicas
Com base nas categorias de tópicos e nas configurações tópicas que apresentam, cada
livro pode ser caracterizado, o que permite uma visão geral da natureza dos tópicos presentes
nestes livros e, conseqüentemente, a percepção do mundo que está sendo criado por cada um.
Por isso vemos que no livro de ano os gêneros mais enfatizados, nas leituras dos
textos da unidades temáticas, são: conto maravilhoso, história em quadrinhos, página de
diário, relato. No livro de 7º ano podemos verificar que os gêneros mais abordados nos textos
são: mito, narrativa de aventura. Em relação ao 8º ano vemos presentes os gêneros textuais:
crônica, poesia; e, finalmente, no livro indicado para o ano, os gêneros elencados, nos
textos de nosso recorte, são: conto, crônica, poema
No entanto, cada um destes gêneros é mais evidente dentro da seção de texto e
interpretação de texto, mas não acontece da mesma forma considerando-se toda a obra. E,
mesmo dentro da seção de interpretação textual, nem sempre o gênero é nomeado, fazendo
com o que o aluno precise intuir qual o gênero do texto lido. O mesmo acontece com as
questões de tópicos que citamos, que nem sempre estão contextualizadas dentro da sessão em
análise. Para que visualizemos sobre o que falamos, torna-se importante examinar o que nos
apresenta, na unidade 1, capítulo 1, o texto 1, do livro destinado ao 6º ano:
77
Figura 1 (Texto)
Logo na primeira leitura do capítulo um texto distante da realidade do aluno de
ano, por mais que saibamos que se trata de um clássico da literatura infanto-juvenil, que é de
nero pertencente aos contos maravilhosos, mas com uma visão europeizada, considerando-
se os elementos distantes de nossa realidade, especialmente no início do ano escolar, quando
aqui no Brasil estamos em pleno verão e por estarmos próximos do carnaval, quando é
quando ocorre o início do nosso calendário escolar.
Apesar de ser um texto de conto “maravilhoso”, começar o ano escolar com um texto
onde elementos que remetem ao último dia do ano, com aspectos descontextualizados em
relação à realidade brasileira, pode contribuir para um certo afastamento do aluno para a
proposta de “gosto pela leitura” considerando ser essa uma das exigências dos PCN, que não
podemos esquecer que são levadas em questão. Nesse fragmento de texto abaixo também
vemos estereótipos, pois frisa uma menina loura ( cabelos cor de ouro), vemos sobre o que é
servido numa casa à ceia de final de ano, que é um ganso assado ( que não é tão típico de
nosso cardápio) e, reforçando o que dissemos, a data remete ao último dia do ano, que
depreendemos por causa de citar-se que “era dia de São Silvestre”, como pode ser
comprovado no fragmento de texto a seguir:
O exemplo contribui para enfatizarmos que, logo nesse primeiro texto, do livro de
sexto ano, quando os alunos ingressam na segunda fase do ensino fundamental, apresenta o
distanciamento de nossa relidade local e, ao mesmo tempo, não aproxima de uma realidade
78
global, visto que não são todos os países que tem neve! Isso é o que se observa na superfície
do texto.
Porém, se considerarmos as vozes que se encontram na leitura textual mais atenta, ele
nos aproxima de realidade que precisa ser denunciada, em todas as mídias possíveis: a
exploração do trabalho infantil, os maus-tratos, mesmo no seio da família, que são abordados
no texto e são vozes que precisam de muitos ecos no que se refere à denúncias nesse sentido
e que, a nosso ver, caracterizam aspectos, entre outros, que são polifônicos nesse texto.
Vejamos que, na figura a seguir, uma cena não típica de nossa realidade, mas se
observarmos a imagem e o que ela expressa do sofrimento da menina da história poderemos
compreender o que se pretende passar através da imagem e da leitura do texto.
Figura 2 (Ilustração)
De nada adianta elaborarmos apenas críticas que remeteam a uma inadequação da
presença do texto na obra, assim como também de nada adianta uma configuração tópica até
estar perfeitamente encadeada, se considerarmos apenas a questão de apresentar um clássico
para os alunos, apenas pelo fato de apresentar, para constar que foi apresentado, se o mundo
construído e refletido pelo livro didático apresentar significados (aqueles que concordamos
que precisam ser negociados) algumas vezes incompatíveis com o universo em que o aluno
79
vive e conhece. Daí insistirmos no quanto é imprescindível que o trabalho que se faz com os
textos precisa de uma condução e, aqui em nosso trabalho, vemos a condução que é proposta
pelos autores da obra. “A compreensão amadurece apenas na resposta” (BAKHTIN, 1997, p.
90).
Considerando-se o contexto pedagógico, a forma como esse texto será trabalhado é
também uma maneira de comprovar que texto, além de ser discurso, é veículo pedagógico.
Para que haja construção de conhecimento, é preciso que sejam consideradas situações reais,
em que o aprendiz compartilhe os contextos comunicativos e socioculturais em que sua
aprendizagem está inserida.
Quadro 5.2 Unidades, capítulos e textos do 6º ano
A
N
O
Unidade 1: No mundo da fantasia Capítulo 1: Era uma vez
Texto: A menina dos fósforos
Tópicos
Um país qualquer; neve; inverno; muito frio, noite escura;
miséria; fome; exploração do trabalho infantil; morte.
Configuração
tópica
Situação social de miséria; problemas de moradia; abandono e
maus-tratos; exploração da mão-de-obra infantil; criança em
perigo; injustiça social; morte como solução?
Unidade 2: Crianças Capítulo 1: Quando eu crescer
Texto: A vocação do Geraldinho
Tópicos
Inteligência; esperteza; preocupação com o futuro; diferenças;
profissões; vocação; teste vocacional.
Configuração
tópica
Dúvidas e inseguranças em relação ao futuro profissional.
Unidade 3: Descobrindo quem sou eu Capítulo: Um mundo chamado
infância
Texto: Os meninos morenos
Tópicos
Ascendência e descendência; lembranças da infância;
aconchego e segurança; momentos marcantes de vida;
observação da lua.
Configuração
tópica
Etnia; continentes; diferenças; patriarcalismo; miscigenação.
Unidade 4: Verde, adoro ver-te Capítulo 1: Preservação animal
Texto: Da utilidade dos animais
Tópicos
Diversidade da fauna; mensagens ecológicas; curiosidades
sobre os animais; direito dos animais à vida X utilidades dos
animais; contradições; ironia.
Configuração
tópica
Meio ambiente; comportamento dos seres humanos em
relação às demais espécies de vida; ironização.
Vimos que no volume destinado aos sextos anos tópicos importantes para o
universo dos alunos situados nesta etapa de conhecimentos, embora o primeiro texto, um
conto maravilhoso, distancia a participação do aluno daquela realidade retratada, não pelo
gênero escolhido ou por representar um país qualquer onde neva no último dia do ano, mas
pela questão social abordada. As questões sociais ligadas ao abandono, sofrimento, maus-
80
tratos, exploração do trabalho e morte infantil não acontecem apenas em contos maravilhosos
que apresentam crianças em perigo, num país distante e frio, onde cai neve numa noite escura
e onde as pessoas em suas casas saboreiam ganso assado recheado de maçãs e ameixas. A
questão final do conto maravilhoso fica mal resolvida na exploração das atividades propostas,
pois passa a ideia de que somente a morte seria a “solução” para a vida daquela menina
“vendedeira de fósforos”. Aqui vemos uma problematização que pode interferir na construção
de mundos e de crenças, pois o final do conto apresenta o reencontro da menina com a avó já
falecida.
Essas questões envolvem a importância da discussão relevante sobre assuntos
polêmicos e até de esfera psiquica, mas necessários à formação de pessoa humana. Segundo
nos aponta Bakhtin e é importante para a vida social refletir a esse respeito:
os próprios problemas do psiquismo permanecem insolúveis. Eles não
serão resolvidos enquanto não se resolva o problema da ideologia.
Estas duas questões estão indissoluvelmente ligadas. As histórias da
psicologia e das ciências ligadas à ideologia (a lógica, a teoria do
conhecimento, a estética, as ciências humanas,
etc...) são as de uma luta incessante, de uma delimitação recíproca de
fronteiras e de uma mútua absorção (BAKHTIN, 2006, p.54).
Essa construção tópica no conto “A menina dos fósforos”, para fazer mais sentido em
sua perspectiva enunciativa, representaria melhor o seu gênero, nas condições de aspecto
social se apresentasse, com mais ênfase em suas atividades de exploração de compreensão e
interpretação textual, as possibilidades de comparação da história à nossa realidade cultural,
onde distanciamento e frieza em relação às causas e conseqüências do abandono e
exploração da infância, apesar de tantas leis, determinações e orientações. Segundo Bakhtin,
“se perdermos de vista os elementos da situação, estaremos tão pouco aptos a compreender a
enunciação como se perdêssemos suas palavras mais importantes” (BAKHTIN, 2006, p.132).
Na unidade dois, percebe-se uma preocupação em representar, através de uma história
em quadrinhos, as diferenças entre as personagens, crianças da turma do Pererê, envolvidas na
trama: o coelho Geraldinho, o saci Pererê, o jabuti Moacir, a onça Galileu, o macaco Alan, o
indiozinho Tininim. São essas personagens que aparecem na história “A vocação de
Geraldinho”, que convivem e dialogam, mesmo com suas diferenças de espécie.
A história atrai a curiosidade do leitor por ser uma HQ e colorida, por ter personagens
diferentes (pessoa, ser lendário e animais) e todos têm nome, atrai também por ser de autoria
de Ziraldo e por tantos outros aspectos, mas o coelho Moacir, no texto, para treinar sua
vocação que, num teste vocacional ele supõe que seja a medicina, machuca os colegas. Essa
perspectiva de que machucar alguém não é a melhor forma para “treinar” a vocação para a
81
medicina, ou qualquer outra profissão, não é abordada pelas atividades previstas com o texto.
Segundo Tílio,
a visão de mundo de um livro didático pode influenciar diretamente a
construção de identidades dos alunos que utilizam o material. É através do
mundo retratado pelo livro que o aluno se reconhece, ou não, como parte
integrante desse mundo e vê-se capaz de agir, ou não, nele e sobre ele
(TÍLIO, 2006, p. 141).
muitas considerações que podem ser empregadas para as atividades de leitura e
interpretação textual. Entendemos que apenas as aulas de Língua Portuguesa e uma obra
didática não dão conta de uma série de particularidades importantes à formação do aluno,
como um todo, para atuar na sociedade com valores e práticas cidadãs. Por isso insistimos que
a interdisciplinaridade contribui para essa perspectiva
dos estudos sobre o conhecimento científico, a literatura, a religião, a
moral, etc. [e] estão estreitamente ligadas aos problemas de
filosofia da linguagem. Um produto ideológico faz parte de uma
realidade (natural ou social) como todo corpo físico, instrumento de
produção ou produto de consumo; mas, ao contrário destes, ele
também reflete e refrata uma outra realidade, que lhe é exterior. Tudo
que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de
si mesmo (BAKHTIN, 2006, p. 29).
No texto da unidade três, um relato pessoal, conta-nos a história da infância do autor
que se confunde com a formação do povo brasileiro, pois o autor narra que ao chegar à nossa
terra o homem branco encontrou meninos com a carinha igual à de todos os meninos que
viviam nas florestas úmidas da América ou das altas montanhas dos Andes, conforme
podemos ler no fragmento representado pela figura que se segue:
Esse texto nos traz vozes importantes relacionadas às questões de miscigenação e
desigualdades, o que propicia, sem dúvida, amplos debates. Por isso aqui destacamos que
há um debate sobre a constitucionalidade das políticas focalizadas e se estas
entram em conflito com as políticas universais. Não contradição entre
políticas de alcance universal e políticas focalizadas: políticas universais são
e serão sempre indispensáveis. Tratar igualmente desiguais pode, no entanto,
agravar a desigualdade, em vez de reduzi-la. As políticas universais podem e
devem ser complementadas por programas que atendam a públicos
específicos, a fim de superar desvantagens e discriminações de natureza
82
regional, racial, de gênero, de faixa etária, de nível de escolaridade ou outras
situações especiais de vulnerabilidade (PNUD Brasil, 2005, p.118).
O texto “Os meninos morenos” traz contribuições e possibilidades importantes para
abordar questões de etnia, da pobreza, desemprego questões que se imbricam de tal forma
que permitem esse confronto, combinando tanto ações de cidadania quanto da participação
das políticas públicas que existem em prol dessas causas sociais. Na história o pai do menino
estava desempregado e eles precisaram mudar-se para outra cidade porque o avô do menino
conseguira um emprego para o genro. Ele relata como transcorreu essa viagem:
Figura 3 (Texto)
Muitos problemas paralelos são apresentados: uma viagem feita numa noite escura,
com relâmpagos e chuva, a família em caravana, com mudança, uma criança pequena
protegida pela capa do avô, montados a cavalo. É uma cena típica de muitos retirantes que
buscam melhores condições de vida nesse país. Vejamos as propostas elaboradas pelos
autores para o trabalho com o texto:
Figura 4 (Estudo de Texto)
83
As demais questões do estudo do texto remetem à outras lembranças da infância do
autor, curiosidades que tinha a respeito da cor da lua, a conversa do escritor, adulto, com
um astronauta sobre a verdadeira cor da lua e, ainda, a importância de conhecer o passado
para conhecer-se melhor no presente. Portanto, os autores perdem uma oportunidade
necessária de dinamizar questões que apontem para um debate mais amplo acerca das
questões sociais que envolvem vulnerabilidade.
E, completando as análises textuais dos textos dos sextos anos, temos a unidade quatro
com o texto “Da utilidade dos animais” em que uma professora se contradiz várias vezes ao
afirmar que devemos amar e proteger os animais, mas destaca todas as vezes o quanto eles são
úteis para a alimentação e que se pode aproveitar o pelo, o couro e os ossos para roupas,
acessórios, utensílios e decoração, em geral. Os alunos, no texto percebem a contradição e
ironizam o fato. É sem dúvida um texto interdisciplinar e faz-nos refletir, enquanto pessoas
humanas, estudantes, educadores, pesquisadores, profissionais de diferentes ramos do quanto
nosso discurso, em muitas situações, é contraditório. Vejamos o que nos apresenta o texto:
Figura 5 (Texto)
84
Pelos textos elencados no livro de ano, tópicos e configurações tópicas, podemos
notar que o conhecimento de mundo apresentado pelos autores aos alunos é um mundo
contemporâneo, mas que em alguns aspectos foge às questões essenciais de serem discutidas
nessa contemporaneidade, pois apresenta enfoques mais superficiais, mais planos nas
abordagens interpretativas que poderiam avançar mais nas causas de discussões sociais. No
exemplo do texto em que a professora orienta uma prática de amor aos animais e age no
sentido de que eles são importantes pelo que podemos usufruir deles, apresenta-nos uma
denúncia, uma crítica que poderia ser melhor explorada, nessa ironia, nas atividades sobre o
texto.
Em outras palavras, a ironia será considerada como estratégia de linguagem
que, participando da constituição do discurso como fato histórico e social,
mobiliza diferentes vozes, instaura a polifonia, ainda que essa polifonia não
signifique, necessariamente, a democratização dos valores veiculados ou
criados. (BRAIT, 2008, p. 16).
Reportando-nos a Tílio (2006), um discurso, que ainda tem sido repetido e se
transformado em lugar-comum na produção de livros didáticos, é o de que o livro iniciante
(e, no caso do volume em questão, estamos nos referindo ao livro que inicia a segunda fase do
ensino fundamental) não pode tratar de tópicos maduros, pois o aluno ainda não possui
competência linguística para se expressar, mas isso não justifica subestimar a capacidade
85
crítica dos alunos dessa série. A capacidade cognitiva do aluno de 6º ano permite a
discussão de tópicos mais maduros e pertinentes.
O que seriam esses temas mais maduros? Além dos gêneros textuais mais variados e
socialmente construídos e trabalhados os temas que afligem o professor, o aluno, os pais de
alunos, orientadores pedagógicos, as instituições, o pesquisador, os autores de livros
didáticos, as editoras, e por que não colocar aqui os detratores dos livros didáticos que o
utilizam para fundamentar críticas contra o sistema, são os que envolvem preconceitos em
geral, assuntos ligados à política, etnia, probreza, injustiças sociais, violência e, especialmente
os temas ligados à sexualidade.
Muitos temas aparecem em novelas, nos jornais, na mídia em geral e até nas casas dos
alunos, mas são considerados proibidos de serem comentados numa obra didática ou por
quem trabalha com ela. Existem passeatas de orgulho gay, apenas para citar um exemplo, nas
quais os próprios pais levam os filhos. Esse assunto e tantos outros são assuntos que
inegavelmente fazem parte da contemporaneidade, mas que ainda são tabus no universo
educacional. Mas, não estamos preparando nossos alunos para uma sociedade plural?
Sexualidade, violência, exploração, injustiças, questões de preconceitos sociais de vários
níveis e tantos outros temas polêmicos muitas vezes ficam de fora dos livros didáticos.
O discurso do LD tem a sua principal vantagem exatamente devido a uma escolha
criteriosa de textos. Estes devem ser atraentes ao seu público-alvo, que possibilite a vontade
de interagir, de criar novas possibilidades de ação. E esse poder somente é atingido quando o
aluno realmente se retratado e se identifica com os textos do seu material didático. Ali, no
texto, nas propostas de interpretação ele precisa se reconhecer, com todos os seus problemas,
com as suas qualidades, com o seu modo de ser, com a sua vivência, com o seu cotidiano.
Podemos ler em Albuquerque Junior (2009) o quanto se constrói, (re)constrói ou se
destrói com discursos, ou falta deles e que podemos reportar a essa nossa discussão que
também perpassa nos documentos oficiais e que deveriam ser problematizados em obras
didáticas, por exemplo.
[...]Angústia e pessimismo acompanham e acentuam a produção de sujeitos
que se refugiam, cada vez mais, no que seria o seu próprio interior. O
individualismo nascente resvala para o narcisismo e o egocentrismo, e as
impressões subjetivas se tornam o refúgio contra o mundo exterior, o mundo
do objeto, da matéria, da mercadoria. Diante de uma sociedade que requer
cada vez mais a disciplina, que investe na identificação e controle dos
corpos, se devaneia sobre corpos sem controle, sobre seres sem identidade,
seres que, como Frankenstein, vagam pelas ruas, pelas florestas, pelos mares,
em busca dos confins da civilização: nômades, fugitivos acossados pelo
julgamento e pelo controle de todos que fazem a
sociedade.(ALBUQUERQUE JR., 2009, p. 98).
86
Até mesmo por (pré) julgarem que determinados assuntos não devem ser tratados nas
escolas e em textos que servem de veículos pedagógicos, as editoras, autores, instituições de
ensino, direções, pais de alunos e tantos mais que sejam, consideram que abordagens de
temática sexual, para citar um exemplo, no LD deve ser cuidadosa, o que sem dúvida
concordamos. Mas, não se podem ignorar assuntos que fazem parte da contemporaneidade, ou
sempre fizeram parte de tantas outras épocas, mas que ficam apagados nas obras didáticas e
em muitos discursos, em geral.
Entre outros aspectos, que não nos cabe abordar nesse trabalho, pois nossa proposta
são os textos e atividades interpretativas, mas sem esquecer a polifonia, nos exemplos dos
textos apresentados até aqui como fragmentos de análise, não vemos ainda a preocupação
com temas transversais e questões claras sobre interdisciplinaridade. Vemos, por exemplo,
que o texto um, da unidade um, primeiro capítulo, em seu papel de documento, liga-se a
contexto específico de países onde há neve em dia de São Silvestre.
Para a realidade do aluno também pode tornar-se chocante o fato de a menina dos
fósforos sair na última noite do ano para trabalhar, enquanto o pai da menina fica em casa e se
ela não vender os fósforos ela será espancada. Ainda, no final da história, a menina morre
congelada com o frio, para o qual ela não tem agasalho nem calçados adequados. Porém, se
nas abordagens de atividades interpretativas da obra houver uma ligação com o fato de que na
realidade crianças sendo exploradas, sim, em todas as partes do mundo, e que muitas
passam fome e frio, mesmo no Brasil, onde não é tão comum haver neve, especialmente em
dia de São Silvestre, último dia do ano, poderá haver, neste caso, uma relação entre esses
contextos. Afinal, falta de calor humano também falta em qualquer parte do mundo. Vejamos
o final do texto:
Figura 6 (Texto)
87
Constata-se, então, nesse documento textual que os tópicos não podem ser
considerados como localizados, nem tampouco globalizados. O mundo construído nesse
primeiro texto não se refere a um país específico, mas podemos dizer que se trata de um
conto maravilhoso e essa é uma das características desse gênero textual. As únicas referências
geográficas que percebemos são neve, frio, ganso como prato típico de final de ano e noite de
São Silvestre.
Embora as questões tenham sido baseadas em um conto maravilhoso, este que foi
selecionado, para um exame em mais detalhes, não é tão (re)conhecido nos clássicos da
literatura infanto-juvenil. Pelo menos nesse primeiro momento de atividades interpretativas,
que é o que analisamos, não se promove o confronto do texto com outros textos, apenas é
sugerido que se trabalhe com outros textos que, supostamente, pelo ponto de vista da
questão, deveriam ser conhecidos os textos mais famosos dos clássicos maravilhosos.
88
A partir dessa problematização, vejamos como são abordadas as questões de
compreensão e interpretação textual:
Figura 7 (Compreensão e Interpretação)
Percebemos no boxe, (caixa de texto) ao lado das questões de interpretação, que há
preocupação dos autores em informar sobre nossos clássicos nacionais. Contudo, deixa como
sugestão, a critério dos leitores, educadores e/ou alunos, a busca por esses textos. Se essa
busca será feita ou não, é uma outra história. Continuemos na verificação das questões de
interpretação propostas com o texto em análise:
Exemplo 1 (trecho de questões)
89
Verificamos nas questões 5, 6 e 7 uma tentativa de adentrar nas questões de injustiça
social, embora de forma bem superficial. É público e notório que o tempo previsto para as
aulas, mesmo de LP, que possuem na matriz curricular mais horas aulas que muitas outras
disciplinas, não contempla espaço/tempo para esses aprofundamentos de análise com as
turmas, até considerando-se o programa curricular da disciplina que deve envolver outros
conhecimentos importantes para a bagagem de conhecimentos do aluno. a
interdisciplinaridade poderia ser contemplada, nas demais disciplinas, em conjunto com a LP,
no sentido de todas contemplarem assuntos desse e outros teores significativos para a a
construção identitária dos alunos.
As relações de alteridade precisam ser abordadas com mais profundidade, com a
possibilidade de promoção dos mais diversificados debates. Enfim, precisa ser dinamizada
como uma questão prioritária que, certamente, não podemos negar que seja. Para interagirmos
e sermos todos construtores de uma sociedade mais justa, são necessários amplos
entendimentos dessas questões e propiciarmos a fomentação do exercício desse entendimento,
se consideramo-nos, de fato, educadores.
Prosseguimos nossa análise considerando os demais textos com o olhar nesses
aspectos abordados, de acordo com os exemplos dos textos do ano e de acordo com as
propostas temáticas em cada texto inserido nos demais capítulos e volumes estudados, isto é,
os livros de 7º, 8º e 9º ano.
90
Quadro 5.3 Unidades, capítulos e textos do 7º ano
Nos tópicos trabalhados no sétimo ano uma abordagem maior em relação a
histórias que envolvem aventura, o desconhecido, as inquietações e o medo, retratando assim
a heroicização como pano de fundo para os textos que analisamos, embora aqui a figura do
herói não seja aquela romantizada, mas heróis que enfrentam realidades sem maiores
“poderes” de divindades. Verificamos que há tópicos recorrentes, tais como : amizade,
infância, aventura e heroísmo. Há aspectos contraditórios, como o medo, a covardia, a
agressão, a repugnância que expressam o multifacetamento das pessoas e da sociedade que
julga, isola e silencia.
Estamos diante de abortos da orientação social, incapazes de viver,
comparáveis a romances sem heróis ou a representações sem espectadores.
São privados de toda lógica ou unicidade. É extremamente difícil perceber
nesses farrapos ideológicos leis sociológicas (BAKHTIN, 2006, p.122).
A
N
O
Unidade 1: Heróis Capítulo 1: O herói e a conquista do impossível
Texto: As asas de Ícaro
Tópicos
Prisão no labirinto; fantasia, sonho, criatividade, invento;
trabalho; liberdade; juventude X maturidade; empolgação,
impaciência, euforia; medo; morte
Configuração
tópica
Mitos gregos; heróis; sonho de voar; limites.
Unidade 2: Viagem pela palavra Capítulo 1: A palavra no reino da
ternura
Texto: Toada de ternura
Tópicos
Amizade; companheirismo; reino; dia; noite; construção do
amanhã; sono; canção; estrela; ternura; infância
Configuração
tópica
Companheirismo; viagem; infância; mundo
Unidade 3: Eu e os outros Capítulo 1: A descoberta do outro
Texto: A doida
Tópicos
A doida; meninos curiosos; amizade; história de vida:
mocidade, casamento, abandono, isolamento; pedradas;
agressão; xingamentos e pragas; provocações; invasão; medo;
repugnância; solidariedade; maturidade.
Configuração
tópica
Loucura; desconhecimento; pré-julgamento; repúdio; culpa;
isolamento; guerrilha; desrespeito ao diferente e pessoa idosa;
heroicidade; alteridade; piedade; solidariedade; maturidade
Unidade 4: Medo, terror e aventura Capítulo 1: Aventura no mar
Texto: A ilha do tesouro
Tópicos
Velho marinheiro com baú; hospedagem; segredo; planos de
fuga; amizade; ameaça e morte; tesouro; cobrança;
honestidade X cobiça; covardia e heroísmo
Configuração
tópica
Aventura; medo; pirataria; fuga; heroísmo
91
Conforme podemos verificar no texto da unidade 3, “A doida”:
Figura 8 (Texto)
Pelo texto, podemos verificar que a voz da senhora abandonada não foi ouvida pelo
menino. Mas, através dessa palavra curta, ininteligível, podem ser ouvidas muitas outras
vozes que um estudo das relações de grupos sociais, no caso do texto, o abandono do idoso,
apresenta-nos não apenas a situação imediata do texto em si, mas de um contexto social mais
amplo. Os autores apresentam, entre outras, as seguintes questões de trabalho com o texto, de
acordo com o que podemos verificar no exemplo:
Exemplo 2 (trecho de questões)
92
Nos textos podemos notar também, que muitas vezes a sociedade tem noção do
abandono e da fragilização de muitos, mas não reage, não faz nada para minimizar aquela
situação. “A atitude blasé, analisada por Simmel em contexto metropolitano, com uma certa
indiferença e distanciamento em relação à multiplicidade de estímulos e situações é também
uma resposta possível às descontinuidades e fragmentação da sociedade moderna” (VELHO,
2003, p. 98). É importante que as obras didáticas não estejam alheias às vozes textuais.
Quadro 5.4 Unidades, capítulos e textos do 8º ano
A
N
O
Unidade 1: Humor: entre o riso e a crítica Capítulo 1: O povo, suas cores,
suas dores
Texto: Povo
Tópicos
Diálogo entre patroa e empregada; relações de poder e
preconceito; argumentos para convencer e obter o que
pretende; mesquinhez
Configuração
tópica
Diferenças sociais e étnicas; preconceito; interesses
mesquinhos
Unidade 2: Adolescer Capítulo 1: Corpo em (r) evolução
Texto: Eu, escultor de mim
Tópicos
Transformações na adolescência; curiosidades; orientações;
Configuração
tópica
Mudanças físicas e psicológicas; construção identitária;
individualidade
Unidade 3: Consumo Capítulo: Ser ou ter? Eis a questão
Texto: Ser filho é padecer no purgatório
Tópicos
Abordagem de comerciante a cliente; argumentações para
convencer a comprar presentes; chantagem emocional
Configuração
tópica
Relacionamento comercial e clientela; mercadoria e lucro
Unidade 4: Ser diferente Capítulo 1: O que faz a diferença
Texto: Socorro, sou fofo
Tópicos
Autoestima X autocrítica; imagem construída pela sociedade;
autoaceitação
Configuração
tópica
Corporeidade
Ao observarmos os tópicos e as configurações tópicas referentes ao sétimo ano
podemos notar que avanços significativos nas abordagens textuais. As atividades
propostas, em geral também permitem mais voz aos alunos, como podemos verificar nos
exemplos:
Exemplo 3 (questão texto 1)
93
Exemplo 4 (unidade 2, cáp. 1, texto 1)
Exemplo 5 ( unidade 4, cáp. 1, texto 1)
Além desses exemplos recortados também aparecem junto aos textos e atividades
interpretativas que selecionamos alguns “boxes”. Os boxes, pequenos textos que aparecem
ladeando os textos principais ou as atividades propostas com os mesmos, algumas vezes
sugerem a voz dos alunos acerca do que apresentam,
não chegam a constituir uma seção, mas têm uma grande importância na
concepção da obra. São textos paralelos, que “dialogamcom o texto-base.
Seu papel é essencialmente, ampliar o assunto tratado e estabelecer relações
entre ele e a realidade do aluno. Assim, chamam a atenção para certas
curiosidades relacionadas ao assunto do texto estudado e certas obras da
literatura, do cinema, da música, etc. (CEREJA & MAGALHÃES, 2009).
No texto 1 da unidade 3, “Ser filho é padecer no purgatório”, os autores utilizam um
texto de Coelho Neto, no boxe junto às atividades de estudo do texto, para dialogar e
estabelecer comparações com o texto principal, como se pode verificar:
Exemplo 6 (Trecho de questão)
94
Ainda quanto ao texto 1 “Socorro, sou fofo”, capítulo 1 da unidade 4, pode-se
verificar que este apresenta um importante exemplo para ser problematizado quanto a uma
temática necessária de se discutir nas escolas. As questões sobre obesidade e excessiva
magreza, que podem levar a sérias doenças, tais como, apenas para citar exemplos, problemas
cardíacos no primeiro caso e de anorexia e bulimia, no segundo, são relevantes e não podem
ser negligenciados para abordagens interdisciplinares. O que deve ser ensinado e
problematizado? No texto sobre conhecimento, poder e cultura no campo do currículo Soares
(2008) faz um questionamento:
Que critérios podem ser mobilizados para afirmar que alguns saberes valem
a pena ser ensinados em detrimentos de outros, após a formulação das
críticas pós-modernas e pós-estruturalistas? Entre esses critérios, ainda
teriam sentido aqueles que incidem em questões de objetividade,
subjetividade e verdade? Em que medida não podemos pensar em discursos
recontextualizados e hibridizados sobre essas questões produzidos no âmbito
da epistemologia social escolar? , (SOARES, 2008, p.231)
Temos, com o exemplo desse texto, uma contribuição interdisciplinar importantíssima.
Sem dúvida, esse documento, o texto, pode ser trabalhado, além da aula de LP. Ele pode ser
algo que instiga a pesquisas sobre obesidade e anorexia em Educação Física, Ciências,
questões de estatísticas matemáticas e tantas outras possibilidades que professores engajados
com uma educação inclusiva podem, em conjunto, articular.
O importante ao lermos um texto não é fazê-lo de forma mecânica, mas dinâmica no
sentido de buscar significados para o material que lemos. Problematizar, inquirir, arguir,
debater sobre o conteúdo nos leva a descobertas importantes para a formação identitária. As
reflexões permitem a construção de conhecimentos. Segundo Fairclough, “não existe análise
objetiva de textos, pois não é possível descrever simplesmente „o que está lá‟ sem a
participação da subjetividade do analista” (FAIRCLOUGH, 2003, p.14).
Com base no exposto e para não nos estendermos muito na subjetividade de nossa
análise, destacamos os tópicos referentes ao volume do nono ano que fazem parte desse nosso
recorte de estudos e, com o quadro a seguir, apresentamos os textos desse material:
95
Quadro 5.5 Unidades, capítulos e textos do 9º ano
A
N
O
Unidade 1: Valores Capítulo 1: A dança das gerações
Texto: Pais
Tópicos
Igreja; casamento; pais; cerimônia tradicional de casamento;
frustrações paternas.
Configuração
tópica
Ritual cerimonioso de casamento católico tradicional X
gerações contestadoras às formalidades do casamento
tradicional
Unidade 2: Amor Capítulo 1: Amor além das fronteiras
Texto: Tentação
Tópicos
Diferença e discriminação (ser ruivo X ser moreno); tédio;
desalento; objeto de estimação; paixão; sentimento de posse
Configuração
tópica
Diferenças e semelhanças étnicas; solidão; possessividade.
Unidade 3: Juventude Capítulo 1: A permanente descoberta
Texto: Ser jovem
Tópicos
Definições sobre juventude; juventude e possibilidades
sociais e emocionais.
Configuração
tópica
Reflexões e experiências estéticas sobre a juventude.
Unidade 4: Nosso tempo Capítulo 1: De volta para o presente
Texto: Carta do Pleistoceno
Tópicos
Clonagem; Projeto Genoma; DNA; Pleistoceno (época do
período Quaternário, há 3 milhões de anos); extinção animal;
caça;
Configuração
pica
Curiosidade científica; Clonagem; Pesquisas científicas.
Em termos de escopo os textos presentes no volume de nono ano representam
categorias de interesse investigativo para a série a qual se destina. São assuntos que fazem
parte das práticas da vida social contemporânea, quando muitos valores são questionados,
como por exemplo a própria cerimônia oficial dos casamentos tradicionais. Apenas esse tema
da unidade 1 já possibilitaria uma ampla investigação, que não nos cabe nesse trabalho, mas a
simples referência a essas problematizações acionam instâncias discursivas, passíveis de
estudos mais amplos e aprofundados.
O amor entre os diferentes no texto que inicia a unidade 2 é também outro aspecto
problematizador para análises minuciosas em relação aos elementos linguísticos no texto, pois
a “materialização discursiva de problemas sociais presentes em textos, além de apontarem
esses problemas, revelam suas vozes”( RESENDE, 2009, p. 13). Assim também pode ser
contatado no texto da unidade 3 que assinala um dos grandes desejos da humanidade em
manter-se com a vitalidade, a saúde, a beleza, a desenvoltura e tantas e ampls possibilidades
que o “ser jovem”pode oferecer em termos de descobertas e criatividade. Sem deixar de frisar
o quanto as pesquisas científicas investigam para a continuidade da vida através de
96
experiências que envolvem clonagem, entre tantas outras formas de preservação, de cura, de
minimização de dores, mas que despertam outras discussões também muito mais amplas
porque envolvem questões religiosas, éticas e tantas outras mais, como nos aponta o texto da
unidade 4. Portanto, a abordagem de discurso que desenvolvemos neste trabalho
é aquela que vem sendo desenvolvida por Fairclough, que se baseia na
relação entre linguagem e sociedade: textos, como instanciações discursivas,
são resultantes da estruturação social da linguagem (nas ordens do discurso),
mas o também potencialmente transformadores dessa estruturação
(RESENDE, 2009, p.39).
Os textos que marcam esses tópicos levantados para essa análise despertam a
sensibilização às causas sociais, despertam vozes que podem colaborar para a “conduta
organizada para atingir finalidades específicas” (VELHO, 2003, p. 100). Desta forma, os
textos lidos numa obra didática junto com as propostas que são elaboradas para trabalhá-los
passam a ser fonte de memória, que tem um significado fundamental nesse processo de
construção de identidade cidadã. Isto porque os textos envolvem “valores, preconceitos,
emoções” (Idem, p. 101). Se os autores de obras didáticas dinamizam projetos que estimulem
à essa memória textual, “o projeto e a memória associam-se e articulam-se ao dar significado
à vida e às ões dos indivíduos, em outros termos, à própria identidade” (VELHO, 2003, p.
101). Portanto, para ilustrarmos o exposto, podemos visualizar, em seguida, os quadros onde
esquematizamos essas análises, de acordo com as categorias dos tópicos em Tílio (2006),
alguns tópicos dos PCN e de um breve recorte em análises do PNLD, conforme
identificamos em nossa metodologia de pesquisa (cf. capítulo 3, item 3.3 procedimentos de
análise):
97
Quadro 5.1.1a ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e
documentos oficiais:
TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 6º ANO
Categorias
Itens observados
TEXTOS
TÓPICOS, SEGUNDO TÍLIO (2006)
A menina
dos fósforos
A vocação
do
Geraldinho
Os meninos
morenos
Da utilidade
dos animais
Includentes
x
x
x
Excludentes
x
x
Tradicionais
x
x
Contemporâneos
x
x
x
Globalizados
x
x
x
Localizados
x
x
x
Descontextualizados
Contextualizados
x
x
x
x
Etnocentristas
x
Multiculturais
x
x
Estereotipadores
x
Diferenciadores
x
x
x
Conscientizadores
x
x
x
Alienantes
x
Legitimadores de
identidades
x
x
Permitem a
construção de
identidades de
projetos
x
x
P C N
Quanto a aspectos da
apresentação da área
de LP nos PCN (cf.
anexo 2 pp. 17 a 21)
x
x
Discurso e suas
condições de
produção, gênero e
texto/ A seleção de
textos. (cf. anexo 2
pp. 22 a 26)
x
x
Conteúdos de Língua
Portuguesa e temas
transversais (cf. anexo
2)
x
x
x
Condições de
interdisciplinaridade
(cf. anexo 2)
x
x
x
PNLD
AIII8
x
x
x
x
AIV10
x
x
x
x
AIV11
x
x
x
x
AIV12
x
x
x
x
D24
x
x
x
x
98
Quadro 5.1.1b ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e
documentos oficiais:
TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 7º ANO
Categorias
Itens observados
TEXTOS
TÓPICOS, SEGUNDO TÍLIO (2006)
As asas de
Ícaro
Toada de
Ternura
A doida
A ilha do
tesouro
Includentes
x
Excludentes
x
x
x
Tradicionais
x
x
Contemporâneos
x
x
x
Globalizados
x
x
x
x
Localizados
x
x
x
Descontextualizados
Contextualizados
x
x
x
Etnocentristas
x
Multiculturais
Estereotipadores
x
x
Diferenciadores
x
Conscientizadores
x
x
x
x
Alienantes
Legitimadores de
identidades
x
Permitem a
construção de
identidades de
projetos
x
x
x
P C N
Quanto a aspectos da
apresentação da área
de LP nos PCN (cf.
pp. 17 a 21)
x
x
x
Discurso e suas
condições de
produção, gênero e
texto/ A seleção de
textos. (cf. pp. 22 a
26)
x
x
x
Conteúdos de Língua
Portuguesa e temas
transversais (cf.doc.
PCN)
x
x
x
x
Condições de
interdisciplinaridade
(cf. doc. PCN)
x
x
x
x
PNLD
AIII8
x
x
x
x
AIV10
x
x
x
x
AIV11
x
x
x
x
AIV12
x
x
x
x
D24
x
x
x
x
99
Ainda com a intenção de, com o clássico sobre heróis, levar em conta o nível de
interesse dos alunos, o texto sobre Ícaro nos apresenta o herói que busca vencer desafios.
Mas, nem sempre a vitória é obtida, de modo que o sonho de Ícaro em voar até o Sol não se
concretiza. Há aqui um preparo para a realidade onde nem sempre o que sonhamos é possível
de ser realizado. A abordagem feita na incursão pelo texto pode apresentar várias outras
comparações com o herói e a liberdade obtida com a capacidade de voar. Com base em Ícaro,
outros heróis podem ser lembrados com o que podem realizar através das condições que o ato
de voar lhes permitem. Essa interação pode ser estabelecida nas questões sociais porque
podem dialogar com vários outras possibilidades. O dialogismo “tem na polifonia sua forma
suprema” (BEZERRA, 2008, p. 193); isso representa que podemos estabelecer essas inserções
com outros heróis (personagens), pois cada personagem passa a ser dono de sua voz: “o autor
não fala sobre, mas com a personagem” (BAKHTIN, 2002, p.71).
Podemos confirmar o exposto através do que nos apresenta o fragmento de texto
abaixo, onde percebemos a voz do filho que percebe o perigo e clama pela ajuda paterna, que
não está ali presente para ajudá-lo. Quantos filhos vivem essa mesma situação diante do
perigo? Quantos alunos precisam de ajuda e encontram nos textos as suas próprias vozes?
“Cada enunciado do herói contém uma outra voz, que soa ao lado da palavra do autor”
(BAKHTIN, 2002, p. 5).
Figura 9 (Texto)
O pai previne o filho sobre o perigo, mas este, inebriado pela perspectiva da conquista
do Sol e de usufruir da liberdade, se afasta do pai e esquece seus conselhos. Uma forma de
orientar os alunos quanto a ouvir os conselhos e ensinamentos de pessoas mais velhas e
responsáveis, conscientes das situações de perigo é apresentada pelo texto, que mostra,
também, a dor do pai com a perda do filho.
Figura 10 (Texto)
100
Pelas questões de estudo do texto, através da compreensão e interpretação, verifica-se
que os autores supõem um diálogo dessa história com outra história ligada a essa e que
envolve o labirinto e o Minotauro (monstro que tinha a cabeça de touro e o corpo de homem).
Se o aluno não conhece essa história anterior sobre o labirinto do Minotauro, as respostas aos
itens a, b e c da atividade “um” ficam comprometidas com o conhecimento dessa outra parte
da história, que um (re) conhecimento interdisciplinar poderia ter promovido.
Exemplo 7 (trecho de questão)
Quando os autores promovem a comparação do sonho de Ícaro em voar com salto do
homem na superfície da Lua eles estão apresentando um exemplo claro de polifonia. Vejamos
o boxe:
Figura 11 (boxe)
Outro exemplo de polifonia aparece no boxe onde compara a construção da asa feita
por Dédalo e o pioneirismo de Leonardo da Vinci como inventor da asa-delta.
A partir dessas interações sociais que podem ser promovidas através dos textos,
podemos verificar que essas possibilidades de compreensão e interpretação são apenas um
breve levantamento das propostas que os autores apresentam. “Trata-se evidentemente de um
levantamento não exaustivo” (SOBRAL, 2008, P. 125).
101
Quadro 5.1.1c ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, picos e
documentos oficiais:
TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 8º ANO
Categorias
Itens observados
TEXTOS
TÓPICOS, SEGUNDO TÍLIO (2006)
Povo
Eu, escultor
de mim
Ser filho é
padecer no
purgatório
Socorro, sou
fofo
Includentes
x
x
Excludentes
x
x
Tradicionais
Contemporâneos
x
x
x
x
Globalizados
x
x
Localizados
x
x
Descontextualizados
Contextualizados
x
x
x
x
Etnocentristas
x
x
Multiculturais
x
x
x
x
Estereotipadores
x
x
Diferenciadores
x
x
x
Conscientizadores
x
x
x
Alienantes
Legitimadores de
identidades
x
x
Permitem a
construção de
identidades de
projetos
x
x
x
P C N
Quanto a aspectos da
apresentação da área
de LP nos PCN (cf.
anexo 2 pp. 17 a 21)
x
x
x
x
Discurso e suas
condições de
produção, gênero e
texto/ A seleção de
textos. (cf. anexo 2
pp. 22 a 26)
x
x
x
x
Conteúdos de Língua
Portuguesa e temas
transversais (cf. anexo
2)
x
x
x
x
Condições de
interdisciplinaridade
(cf. anexo 2)
x
x
x
x
PNLD
AIII8
x
x
x
x
AIV10
x
x
x
x
AIV11
x
x
x
x
AIV12
x
x
x
x
D24
x
x
x
x
102
Quadro 5.1.1d ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e
documentos oficiais:
TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 9º ANO
Categorias
Itens observados
TEXTOS
TÓPICOS, SEGUNDO TÍLIO (2006)
Pais
Tentação
Ser jovem
Carta de
Pleistoceno
Includentes
x
x
x
Excludentes
x
x
x
Tradicionais
x
x
x
Contemporâneos
x
x
x
x
Globalizados
x
x
Localizados
x
x
x
x
Descontextualizados
x
Contextualizados
x
x
x
Etnocentristas
x
Multiculturais
x
x
x
Estereotipadores
x
x
x
Diferenciadores
x
x
x
Conscientizadores
x
x
x
Alienantes
Legitimadores de
identidades
x
x
x
Permitem a
construção de
identidades de
projetos
x
x
x
P C N
Quanto a aspectos da
apresentação da área
de LP nos PCN (cf.
anexo 2 pp. 17 a 21)
x
x
x
x
Discurso e suas
condições de
produção, gênero e
texto/ A seleção de
textos. (cf. anexo 2
pp. 22 a 26)
x
x
x
x
Conteúdos de Língua
Portuguesa e temas
transversais (cf. anexo
2)
x
x
x
x
Condições de
interdisciplinaridade
(cf. anexo 2)
x
x
x
x
PNLD
AIII8
x
x
x
x
AIV10
x
x
x
x
AIV11
x
x
x
x
AIV12
x
x
x
x
D24
x
x
x
x
103
5.1.2 A construção identitária na obra didática de Língua Portuguesa
A partir dos resultados da análise da representação que os livros didáticos
fazem do mundo e do espaço dado ao aluno para que manifeste sua voz, é
possível discutir como estes livros didáticos contribuem para a construção de
identidades dos alunos. A representação do mundo e a inserção do aluno
neste mundo é o primeiro fator determinante de quais identidades serão
construídas por estes alunos, que podem se reconhecer ou não como parte
deste mundo, se têm lugar ou não neste mundo. Além disso, precisam de voz
para construir suas identidades, caso contrário o oprimidos pelas
identidades legitimadoras impostas pelos livros.(TÍLIO, 2006, p. 196)
Como contexto, constatamos a situação contemporânea, com suas crises das mais
variadas naturezas, sejam elas provocadas pelo desemprego, pela miséria, atribuídas à
distribuição de renda, à falta de moradia, às condições precárias de saneamento básico e que
provocam doenças, ao salário mínimo irrisório, à falta de respeito pela identidade do outro,
incompatibilidades no seio familiar, exploração de crianças e jovens (além de uso indevido de
mão-de-obra para o trabalho, também as questões de exploraçào sexual), os heróis
buscados e não mais encontrados, os choques culturais e as vozes dos excluídos, dos
marginalizados, desesperança e, consequentemente a essas e outras causas, a violência se
alastra, a criminalidade não é combatida e povo permanece revoltado, denunciando inúmeras
injustiças que também não têm fim. São nessas interações sociais conflituosas que se
constróem as identidades e onde estas querem ser ouvidas em seus apelos, em meio a tanto
descaso e caos. muitas vozes abafadas. Segundo Rouanet(1993), “é a forma
contemporânea assumida pelo mal-estar na civilização” (ROUANET, 1993, p.96). E ainda
podemos relembrar Freud, citado por Rouanet, em que lemos que “a voz da inteligência é
baixa, mas não descansa enquanto não for ouvida” (ROUANET, 1993, p. 101).
Através do que se escreve nos textos, as marcas de tantas vozes ficam impressas.
Encontramos nos textos respaldo para que levantemos essas situações e permitamos que haja
as vozes críticas que possam elaborar o seu discurso com base em reflexões apontadas nos
enunciados das atividades de compreensão e interpretação textuais? Essa passagem da voz do
autor para o diálogo com os leitores, mesmo numa perspectiva de leitores projetados, “tem na
polifonia sua forma suprema, equivale à libertação do indivíduo, que de escravo mudo da
consciência do autor se torna sujeito de sua própria consciência” (BEZERRA, 2008, 193).
Podemos verificar na polifonia dos textos o que é, segundo Bakhtin (apud
BRANDÃO, 1995, p. 53),
um enunciado vivo, significativamente surgido em um momento histórico e
em um meio social determinados, que não pode deixar de tocar em milhares
104
de fios dialógicos vivos, tecidos pela consciência socioideológica em torno
do objeto de tal enunciado e de participar ativamente do diálogo social.
Através do exposto, vemos que há “maleabilidade de um texto (falado ou escrito), sua
potencialidade de leitura múltipla e intertextualidade, questionando assim as interpretações
inívocas e unidimensionais oferecidas pelos textos didáticos” (FREITAG, , p. 82), mas que
aqui pudemos constatar que esforço no sentido em que o discurso do livro didático, com
seus textos e atividades nos tópicos selecionados, através do material que recortamos para a
análise, nos apresenta possibilidades de relacionar-se com a construção de identidades sociais
dos alunos, “em que novas formas de exercício de cidadania e solidariedade tenham espaço”
(FREITAG, 2006, p. 177).
105
6 REFLEXÕES CRÍTICAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS
O livro didático de língua portuguesa analisado não apaga as possibilidades de
interação com as questões sociais citadas, embora não problematizadas em seu merecimento e
profundidade, pois não era nossa intenção, aqui neste trabalho. Através da polifonia e das
atividades interpretativas propostas pelos autores podemos observar que no documento
reflexões sobre cultura, diversidade, diferenças, identidades e, a totalidade dos textos, como
pode ser observado ao visualizarem-se as tabelas elaboradas, atende aos aspectos que
recortamos nos PCN e PNLD, que nos ajudam a dialogar com esse recorte que elaboramos.
Portanto, podemos concluir que a polifonia é bastante explorada ao longo dos textos que
selecionamos, mas pelo eixo temático, não necessariamente pelo estudo de gêneros enquanto
função social, embora estes estejam presentes, não são análises de gêneros que possam
identificar a importância deles em suas funcções sociais.
Refletimos quanto a importância do LD, que segue orientações desses documentos
oficiais citados além do recorte teórico que elaboramos e observamos que o LD procura
conciliar, aqui nesse estudo, o papel dos textos com suas propostas de interpretação, ou seja,
a leitura e análise de textos. Porém, queremos salientar que todo um esforço de produção
textual, de autores, de editora, de leis, parâmetros, recomendações, programas, projetos se não
obtiverem ressonância no espaço onde devem ser aplicadas essas propostas, torna-se
impossível perceber-se o eco do que se espera em termos de perspectivas cidadãs. Pois, se o
corpo docente e todo a assessoria pedagógica de uma instituição privilegiar apenas enormes
listas de exercícios visando apenas aspectos gramaticais, propostas de produção textual para
serem feitas em casa com finalidade de serem corrigidas para verificar ortografia, não se
estará satisfazendo às necessidades desse perfil de aluno que pressupomos agente de
transformação social, com pensamento crítico e sabendo expressar suas ideias num mundo
onde ele exerce a sua autonomia, a sua cidadania e inscreve a sua história como herói de si
mesmo.
O presente trabalho investigou o discurso de textos do livro didático Português-
Linguagem para o ensino de Língua Portuguesa do ao ano do EF, visando discutir como
estes textos, contidos no recorte para este trabalho, representam o mundo e permitem um
diálogo, através de propostas nas atividades interpretativas elaboradas pelos autores da obra,
de forma a representarem os contextos culturais, os tópicos que destacamos para análise,
algumas propostas dos PCN e PNLD e, em que medida esses tópicos contribuem para a
construção de identidades sociais e possiblitam dar voz aos alunos como contrutores de sua
aprendizagem, isto tendo em vista aulas dialógicas, onde não apenas a enunciação do
106
professor e/ou do autor do livro didático são consideradas, respeitadas e tidas como verdades.
Como tornar alunos construtores de sua aprendizagem se muitos docentes e instituições ditam
que o aluno precisa estar de boca fechada, pois o contrário é falta de disciplina? Qualquer
esforço de elaboração de diretrizes, novos documentos oficiais, parâmetros, programas e
variedade de gêneros textuais, sobretudo os que visam a oralidade, caem por terra diante de tal
disparate.
Foram analisados quatro livros didáticos da coleção Português: Linguagem destinada
aos alunos de dez a quatorze anos. Constatamos que os livros das séries iniciais da segunda
fase do EF (6º e anos) representam um mundo mais fantasioso, até mesmo quanto aos
gêneros estudados; e os volumes das séries de ano e ano apresentam mais situações do
mundo real.
Apesar da pesquisa restrita ao documento, vimos que há nas propostas da coletânea
analisada o interesse em que, nas atividades pedagógicas, possam se debater textos,
compartilhar e negociar a polifonia em seus sentidos mais amplos e, deste modo, a obra
exerce seu papel de colaborar para que o aluno assuma sua identidade social de cidadão
crítico e autônomo, que possa vencer suas próprias dificuldades.
Esperamos que esta pesquisa traga resultados que contribuam, de alguma forma, para
a prática pedagógica de professores que utilizam livros didáticos, levando-os a refletir sobre
estas breves questões aqui levantadas. Gostaríamos, também, que pudessem ser obtidas
algumas contribuições para um (re)conhecimento linguístico-discursivo do livro didático
enquanto um documento textual de grande importância no discurso interdisciplinar,
especialmente com temas que atendem aos interesses das letras e ciências humanas, que são
as propostas de nosso mestrado interdisciplinar.
Para que tenhamos hoje condições de verificar se a educação como um todo está em
condições de estimular o efetivo exercício da cidadania não basta verificar se uma obra
didática propicia essa condição. toda uma complexidade de elementos que dialogam para
essa construção cidadã. O LD é um dos suportes que pode configurar-se para promover
alguns enfoques que contribuam para a aprendizagem transformadora. São necessárias muitas
condições que permitam avaliar se o aluno está capacitado a agir no mundo social. Se ele é
apoiado pela família, pelos educadores, pelo estímulo à criatividade e autonomia, pela
instituição, pela sociedade e toda organização de outras instituições e sujeitos que atuam nas
mais variadas esferas da sociedade, a aprendizagem significativa e transformadora poderá
estar ao seu alcance.
Acreditamos que nossa perguntas de pesquisa tenham sido respondidas aqui, pois
quando indagamos de que forma os tópicos dos textos selecionados contribuem para uma
107
formação cidadã? A classificação dos tópicos apresentada e comentada através das tabelas
que foram elaboradas e as citações, especialmente referentes aos PCN e temas tranversais,
colaboram para o que pretendemos responder.
Assim como quando indagamos em que medida as atividades propostas com os textos
permitem ao aluno agir no mundo social, pensando criticamente e expressando diferentes
vozes acerca do tópico, também acreditamos que as propostas apresentadas nas atividades do
LD contribuem para esse conhecimento que, através do trabalho que dependerá de como serão
tratadas pedagogicamente nos universos entre escola, família e sociedade, e com os tipos de
conhecimento sistêmico e de mundo que são desenvolvidos para contribuir para a formação
cidadã, junto com a operacionalização das propostas dos PCN poderão ser efetivadas.
E, finalmente, quanto a questão de se existência de variedade de gêneros textuais
compatíveis com a realidade social em que o aluno se insere podemos responder que,
parcialmente, sim, embora esse ttratamento de variedade de gêneros ainda dependa de maior
exploração em sua contribuição social. Pois, como dissemos anteriormente, não basta o
gênero pelo gênero, para servir de verniz, para constar no elenco da obra, para dizer que está
e foi usado numa ou noutra proposta de atividade interpretativa ou de produção textual.
Como nos apresenta Resende:
Textos como elementos de eventos sociais têm efeitos causais ou seja,
acarretam mudanças em nosso conhecimento (aprendemos coisas por meio
deles). Em suma, textos têm efeitos causais sobre as pessoas (crenças,
atitudes), as ações, as relações sociais e o mundo material. Esses efeitos são
mediados pela construção de significado (RESENDE, 2009, p.23)
A partir dos resultados aqui obtidos, espera-se despertar em professores e
pesquisadores o interesse em dar continuidade ao desenvolvimento de pesquisas nesta área de
análise de obras didáticas e estudos de textos e atividades com base nestes, pois esse terreno
tem muitas possibilidades de investigação que nem sempre são observadas em sua totalidade
em relação a sua importância e que, certamente, não se esgotam em uma pesquisa.
A abordagem discursiva que desenvolvemos neste trabalho, a ACD, “provê meios
meios para investigar os modos como a linguagem figura na vida social(RESENDE, 2009,
p.48). Através de objetivos éticos e políticos, concordamos que “a partir de uma análise
minuciosa de elementos linguísticos nos textos” (IDEM) que possam ser acrescentados cada
vez mais ao interesse investigativo acadêmico o aspecto discursivo, pois “a condição principal
para que um programa interdisciplinar possa se desenvolver é um interesse compartilhado por
problemas no mundo e o desejo de contribuir para sua solução” (BLOMMAERT, 2005, p. 19,
In: RESENDE, 2009, p. 48). É o que pretendemos com o presente trabalho.
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tucionaliza-os-programas-do-livro-do-mec&catid=318. Decreto institucionaliza os Programas
do Livro do MEC. Acessado aos 02 de agosto de 2010.
http://www.scribd.com/full/36974003?access_key=key-3cc387obntpy8sx4ezd. Tese de
Doutorado. COUTO, Rita Maria de Souza. Sobre Designers e Interdisplinaridade. Acessado
aos 10 de setembro de 2010.
Obra analisada: CEREJA, William Roberto & MAGALHÃES, Thereza Cochar.
Português: Linguagens. Vols. do ao ano do Ensino Fundamental II. (5ª edição
reformulada). São Paulo: Atual Editora, 2009.
114
ANEXOS
Devido a se tratarem de vários arquivos em PDF, que são todos os textos e atividades que
foram trabalhados nesta dissertação de mestrado, informamos que tais anexos constam de um
CD, devidamente identificado e anexado ao presente trabalho.
Obs.: Para título de exemplificação acerca dos arquivos mencionados acima, eis o primeiro
texto e atividades interpretativas, do capítulo um, do livro destinado ao sexto ano e que
também consta do CD-ROM:
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117
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