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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO
UNIDADE ACADÊMICA DE HUMANIDADES, CIÊNCIAS E EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO
A CONCEPÇÃO CURRICULAR DO COLÉGIO MARISTA E A
FORMAÇÃO DE ALUNOS PESQUISADORES, COMUNICADORES E
SOLIDÁRIOS
CRICIÚMA, OUTUBRO DE 2009
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1
INGRID ROUSSENQ FORTUNATO MARTINS
A CONCEPÇÃO CURRICULAR DO COLÉGIO MARISTA E A
FORMAÇÃO DE ALUNOS PESQUISADORES, COMUNICADORES E
SOLIDÁRIOS
Dissertação apresentada à Diretoria da UNA de
Humanidades, Ciência e Educação da Universidade do
Extremo Sul Catarinense UNESC, como pré-requisito
para obtenção do título de Mestre em Educação, sob a
orientação da Profª. Drª. Janine Moreira.
CRICIÚMA, OUTUBRO DE 2009
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3
Dedico esta pesquisa a meus filhos, Lucas e Laís,
e aos alunos que me foram confiados, porque é
espelhando-me neles que sou incentivada a
buscar uma educação melhor, um mundo
melhor...
4
AGRADEÇO...
A Deus, que me deu energia e vida para desejar a superação dos meus limites.
À minha mãe, que me mostrou a alegria dos livros.
A meu pai, que me ensinou que tudo poderia ser alcançado.
Ao meu marido Ricardo, com quem pude compartilhar os bons e os maus momentos
vividos durante a realização do Mestrado. Sua paciência e companheirismo foram decisivos
para eu completar minha pesquisa.
Aos meus filhos, Lucas e Laís; e minhas sobrinhas, Izabel, Heloíse e Gabriele, por
serem simplesmente crianças e meu grande incentivo na busca de um mundo melhor.
À minha avó, Ozaide Rabelo Roussenq, por ter sido sempre meu grande exemplo de
vida.
Ao meu avô João Ramos Roussenq (in memoriam), por ter me ajudado a viver.
Ao meu tio Wilson Roussenq (in memoriam), por ter deixado lindas lembranças de
minha infância.
Às minhas amigas e companheiras de trabalho: Rosângela Pereira Cabral e Tânia
Serafim Búrigo, que me animaram e cobriram minhas faltas quando precisei ausentar-me do
Colégio.
Às minhas vizinhas-amigas, Alessandra e Michele, que ouviram meus desabafos não
acadêmicos.
À minha amiga Milena Viana, pelo cuidado e hospedagem em sua casa quando precisei
diante de colóquios e seminários.
À minha amiga sócia Alexsandra Stols da Silva Pelegrim, pela oportunidade que me deu de
ampliar meus horizontes.
Ao Colégio Marista, na pessoa de Jairo Rambo, que permitiu que eu saísse em diversos
momentos para seminários, colóquios e grupos de estudo, mostrando a importância que dá
para a melhoria da Educação na Instituição.
A todos os professores do Colégio Marista, por sua dedicação na construção de um
mundo melhor.
Ao amigo Gláucio Luiz Mota, por todo apoio que me deu durante a realização desse
trabalho.
Ao professor Kleber dos Santos Danielski, pela sua disponibilidade sempre que solicitei
traduções de meus textos.
5
Ao amigo Gláucio Luiz Mota, pelos ricos momentos em que discutimos “nosso ideal”
de educação.
A meus colegas do GEOF (Grupo de Estudos Ofício de Aluno), que me instigaram na
tentativa de entender quem é o nosso aluno e suas necessidades.
À Adalgisa Aparecida de Oliveira Gonçalves e Maria de Lourdes Remenche, que,
mesmo diante de tanto trabalho, oportunizaram-me a riqueza de poder contar com elas nas
leituras de meus artigos.
Aos colegas de Mestrado, que apesar da breve convivência deixaram lembranças
significativas.
À amiga Zélia que, com sua experiência acadêmica, deu-me várias “dicas” para que eu
encontrasse a verdadeira razão de minha pesquisa.
A todos os professores do Mestrado em Educação da UNESC, pelos momentos de
aprendizagem proporcionados.
À minha irmã Inslane e meu cunhado Roberto, por cuidarem de meus filhos como se
fossem seus sempre que precisei viajar.
A meu professor Ilton Benoni da Silva, por me ensinar a fazer perguntas.
Ao professor Antônio Fernando Gouvêa da Silva, pela leitura cuidadosa de meu texto
de qualificação e contribuição na melhoria de minha pesquisa.
À minha orientadora, grande amiga e irmã Janine Moreira, que me incentivou e
promoveu momentos de aprendizagem, desafiando-me a transpor meus próprios limites.
A todos que me auxiliaram, direta ou indiretamente, para que eu pudesse continuar
minha pesquisa: Karin Patrícia Reis, Gustavo de Bona Rafael, Janine Lacerda Moreira,
Rodrigo Ribeiro dos Santos, Cristiani Nunes, Thatiana Quintas Schaucoski, Karine Baptista
Vicente, Janaína Crispim Antônio, Maria Terezinha Martins, Juliana Locks Pacheco,
Alexssandra Canto e Cenira da Silva.
6
Escola é...
o lugar onde se faz amigos,
não se trata só de prédios, salas, quadros,
programas, horários, conceitos...
Escola é, sobretudo, gente,
gente que trabalha, que estuda,
que se alegra, se conhece, se estima.
O diretor é gente,
O coordenador é gente, o professor é gente,
o aluno é gente,
cada funcionário é gente.
E a escola será cada vez melhor
na medida que cada um
se comporte como colega, amigo, irmão.
Nada de “ilha cercada de gente por todos os lados”.
Nada de conviver com pessoas e depois descobrir
que não tem amizade a ninguém,
nada de ser como tijolo que forma a parede,
indiferente, frio, só.
Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar,
é também criar laços de amizade,
é criar ambiente de camaradagem,
é conviver, é se “amarrar nela”!
Ora, é lógico...
numa escola assim vai ser fácil
estudar, trabalhar, crescer,
fazer amigos, educar-se,
ser feliz.
Paulo Freire
7
RESUMO
O objetivo desta pesquisa foi compreender em que medida a proposta curricular efetivada no
Colégio Marista de Criciúma possibilita a formação de alunos pesquisadores, comunicadores
e solidários, à luz das categorias freireanas curiosidade epistemológica/ingênua,
dialogicidade e solidariedade. A investigação deu-se numa abordagem qualitativa, cujos
procedimentos investigativos foram a análise de documentos e a entrevista semiaberta com
professores e gestores. Como base teórica, foi feita a discussão sobre currículo e história
curricular com Sacristán (2000) e Pacheco (2001). Também as categorias curiosidade
epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade de Freire ([1987] 1996) são discutidas
para, em seguida, serem aproximadas ao ideal de aluno proposto por este Colégio. A análise
revelou que a proposta curricular possibilita a formação do ideal de aluno, apresentando, no
entanto, não só similitudes, mas dicotomias entre os discursos documentais e empíricos.
Também revelou a oscilação entre as orientações curriculares de Sacristán e as teorias de
currículo de Pacheco. Destacou ainda que as competências elencadas pelo Colégio - pesquisa,
comunicação e solidariedade distanciam-se das categorias de Freire curiosidade
epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade. A investigação proporcionou uma
reflexão sobre as possibilidades de a escola optar por este autor como orientador na formação
deste aluno idealizado.
Palavras-chave: currículo, comunicação, pesquisa, solidariedade, curiosidade
epistemológica, dialogicidade.
8
ABSTRACT
The objective of this research was to understand to what extent the proposed curriculum in
effect at Colégio Marista from Criciúma, Santa Catarina provides education for students to be
researchers, communicators and solidary in the light of the Freirian categories dialogicity,
naive / epistemological curiosity and solidarity. The investigation has been carried out on a
qualitative approach basis, which investigative procedures were the analysis of documents
and semi-open interviews with teachers and administrators. As for the theoretical basis, a
discussion was carried on curriculum and curriculum history with Sacristán (2000) and
Pacheco (2001). The categories epistemological curiosity, dialogicity and solidarity of Freire
[1987] (1996) are also discussed to be approximated to the ideal of student proposed by this
school. The analysis revealed that the proposed curriculum facilitates the formation of the
ideal of student, presenting, however, not only similarities, but the dichotomy between
documentary and empirical discourses. It also showed the oscillation between the curriculum
guidelines by Sacristán and theories of curriculum by Pacheco. It is also highlighted that the
skills listed by the school - research, communication and solidarity are somewhat far from the
categories of Freire's epistemological curiosity, dialogicity, and solidarity. The research
provided a reflection on the possibilities for the school to choose this author as a counselor in
the education of this intended student.
Keywords: curriculum, communication, research, solidarity, epistemological curiosity,
dialogicity.
9
QUADROS
QUADRO 1 - Teoria técnica...................................................................................................50
QUADRO 2 - Teoria prática....................................................................................................51
QUADRO 3 - Teoria crítica ....................................................................................................51
10
APÊNDICES
APÊNDICE 01 Solicitação de pesquisa............................................................................129
APÊNDICE 02 Termo de consentimento .........................................................................130
APÊNDICE 03 Roteiro da entrevista .............................................................................132
11
ANEXOS
ANEXO 01 - Ofício 003/05..................................................................................................134
ANEXO 02 - Projeto Curricular em Ação............................................................................138
ANEXO 03 - Projeto Político Pedagógico (fragmento) .......................................................148
ANEXO 04 - Matriz de DAPS (fragmento) .........................................................................166
12
SIGLAS
ABEC Associação Brasileira de Educação e Cultura
APC Associação Paranaense de Cultura
CEMEP Centro Marista de Estudos e Pesquisas
CNE Conselho Nacional de Educação
DAPS Desenvolvimento Acadêmico, Pessoal e Social
DERC Diretoria Executiva da Rede de Colégios
GEEF Grupo de Estudos Ensino Fundamental
GEEI Grupo de Estudos Educação Infantil
GENEM Grupo de Estudos Ensino Médio
GEOF Grupo de Estudos Ofício de aluno
GEPLA Grupo de Estudos Planejamento
MEC Ministério da Educação
MEM Missão Educativa Marista
PPP Projeto Político Pedagógico
PUCPR Pontifícia Universidade Católica do Paraná
PUCRS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
SIMA Sistema Marista de Avaliação
UCE União Catarinense de Educação
13
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 14
A origem da inquietação......................................................................................................14
Procedimentos Metodológicos............................................................................................ 30
I. A QUESTÃO CURRICULAR EM DEBATE.................................................................. 34
1.1. O que é currículo? ........................................................................................................ 34
1.2. Desenvolvimento da história curricular ......................................................................38
II. A PROPOSTA LIBERTADORA DE PAULO FREIRE............................................... 56
2.1. Curiosidade Epistemológica/ingênua .......................................................................... 59
2.2. Princípio ontológico da dialogicidade.........................................................................63
2.3. Solidariedade................................................................................................................71
III. O ALUNO PESQUISADOR, COMUNICADOR E SOLIDÁRIO................................. 73
3.1. O que é currículo para o Colégio Marista de Criciúma................................................ 77
3.2. O aluno pesquisador, comunicador e solidário na visão do Colégio Marista de
Criciúma e as categorias freireanas de curiosidade epistemológica/ingênua, dialogicidade e
solidariedade ........................................................................................................................... 93
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................115
REFERÊNCIAS................................................................................................................... 121
REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES.......................................................................... 123
APÊNDICES.........................................................................................................................129
ANEXOS............................................................................................................................... 133
14
INTRODUÇÃO
É por isso que transformar a experiência
educativa em puro treinamento técnico é
amesquinhar o que há de fundamentalmente
humano no exercício educativo: o seu caráter
formador. Se se respeita a natureza do ser
humano, o ensino dos conteúdos não pode
dar-se alheio à formação moral do educando.
Educar é substantivamente formar. (FREIRE
[1996], 2001, p. 37, sic)
A origem da inquietação
Esta pesquisa nasce do desejo de concretização de um sonho educativo. Um sonho
voltado ao aluno que se reconhece como tal e da escola que o acolhe e o ensina. Ela parte do
princípio que a instituição responsável pela educação formal é um ambiente rico de
possibilidades educativas, mas cheio de limitações organizacionais e pedagógicas. As
possibilidades estão contidas na própria convivência estudantil que, pelo fato de estar imbuída
de heterogeneidades, traz oportunidade de aprendizagens também múltiplas.
Trabalho no Colégio Marista doze anos, dentre os quais atuo como Assistente
de Alunos nos três últimos. Nessa condição, pude ouvir falas de professores, alunos e pais que
demonstram concepções diferentes sobre o que é educar. O que a escola deveria ser para um
grupo é distinto do ideal proposto por outro. Na instituição escolar transitam os mais
diferentes olhares sobre o que é educação. Não penso que as intenções educativas de um
grupo sejam melhores ou piores do que de outro, mas não posso deixar de ressaltar que nem
sempre elas são coincidentes, podendo causar estranhamento entre ambas.
Percebo os professores divididos em dois grupos. O primeiro inclui os que veem o
aluno como um “ser alheio a qualquer informação” ou “desejo de aprender”. Esse grupo de
educadores pensa que não mais disciplina, que os alunos não têm mais limites e que a
escola e os pais têm que “tomar alguma atitude para que os meninos acordem”. O segundo vê
os adolescentes como pessoas que estão “além da escola” e procuram ensinar e aprender por
meio de projetos de trabalho e metodologias dialogais. Essa diferença entre os dois grupos
nem sempre é tão evidente, às vezes é bem sutil, mas pode ser observada na forma como o
professor posiciona-se diante do conhecimento e daquilo que o aluno sabe.
15
Dividi também o grupo de pais de acordo com suas falas. Eles estão no bloco dos
“autoritários” ou dos “permissivos”. Os primeiros acham que a escola deve castigar, advertir e
suspender todos os alunos que não cumprem com suas responsabilidades. Em contrapartida,
os permissivos pensam que a escola tem que apenas ensinar de acordo com o desejo do aluno,
tomando muito cuidado para não frustrá-lo. Esse grupo manifesta que o ensino deve estar
ligado ao prazer e que a aprendizagem, além de não ser mecânica, precisa oportunizar
alegria. Considera que tudo na escola tem que ser prazeroso. ainda um terceiro grupo de
pais que questiona tanto sua posição quanto a da escola, buscando um equilíbrio entre o
posicionamento dos dois grupos anteriores.
No setor em que trabalho, denominado Assistência aos Alunos, ouço diferentes
posições do alunado. Eles tanto reclamam pelos professores serem chatos” em suas aulas
dissertadoras, quanto se reconhecem aquém do que é cobrado pela escola. Não vejo, de uma
maneira geral, descaso por parte dessa categoria. Apesar de reclamarem do excesso de
trabalho e limites cobrados pelos professores, eles apresentam desejo de sucesso em sua vida
escolar. São raros os casos de apatia, nos quais precisamos intervir com ajuda profissional.
Não quero, dessa forma, retirar a responsabilidade que os alunos têm com sua formação
escolar, mas demonstrar que nem sempre o que não é alcançado é de responsabilidade apenas
dessa categoria.
Os grupos aqui organizados por mim não são estanques, pois há sempre um
terceiro ou quarto em cada categoria tentando achar o equilíbrio da tensão instaurada no
ambiente escolar. Mas é importante localizá-los dessa forma para que o problema apresentado
possa ser melhor delimitado e também fique mais claro o que permeia minha pesquisa.
Entretanto, a escola não é formada apenas por pais, alunos e professores. O
Colégio Marista de Criciúma, por exemplo, possui uma equipe diretiva, formada por um
Diretor Geral e um Diretor Educacional. Para assessorar os professores, a escola conta com
uma Assessora Psicopedagógica no Ensino Fundamental II e Médio e outra para Educação
Infantil e Ensino Fundamental I. O Ensino Fundamental II e Médio ainda conta com uma
Assistente de Alunos para auxiliar os discentes em sua vida acadêmica e a Educação Infantil
com uma Assistente Psicopedagógica.
Essa equipe diretiva é assessorada pela Diretoria Executiva da Rede de Colégios
(DERC). Portanto, a proposta educativa Marista não pode ser vista apenas em âmbito local,
mas analisada em sua amplitude de Rede. Mesmo que a pesquisa se dê em um desses
colégios, ela reflete concepções que estão contempladas num âmbito maior.
A Rede Marista encontra-se em 78 países e procura manter valores propostos pelo
16
fundador, Marcelino Champagnat, que em 1817, na França, se propunha a “tornar Jesus Cristo
conhecido e amado” por meio da educação escolar. (Missão Educativa Marista, 2008). O site
do Colégio também apresenta sua proposta educativa:
Champagnat ensinou a seus discípulos o respeito e o amor às crianças, a atenção aos
mais pobres e aos mais abandonados. A presença prolongada entre os jovens, a
simplicidade, o espírito de família, o amor ao trabalho, o agir em tudo do jeito de
Maria, são os pontos essenciais de sua concepção educativa.
Progressivamente, L'Hermitage [comunidade onde Marcelino Champagnat construiu
uma casa de formação] tornou-se também o centro de uma rede de escolas primárias,
cada vez mais numerosa e melhor organizada. Em 1836, a Igreja reconheceu a
“Sociedade de Maria” e lhe confiou uma missão na Oceania. Champagnat enviou
três de seus Irmãos com os primeiros Padres Maristas para serem missionários nas
ilhas do Pacífico. Naquela época, ele escreveu ao bispo que lhe solicitava Irmãos:
“Todas as dioceses do mundo estão em nossos planos”. E estavam mesmo! Quando
Champagnat morreu, aos 51 anos, em 6 de junho de 1840, a sua “Família Marista” já
contava com 290 Irmãos, atuando em 48 escolas primárias. (MARCELINO
CHAMPAGNAT, UM EDUCADOR PARA O NOSSO TEMPO, 2009)
O Instituto Marista hoje atende 78 países, por meio de escolas, obras sociais,
editoras, universidades e veículos de comunicação.
No Brasil, a Rede Marista está dividida em três províncias que possuem
autonomia pedagógica e administrativa para atender as demandas regionais e locais. São elas:
Província Marista do Brasil Centro-Norte: composta de 20 (vinte) Escolas de
Educação Básica, 2 (duas) Instituições de Ensino Superior, 37 (trinta e sete) Unidades Sociais,
7 (sete) Projetos Sociais em parceria com outras instituições e 17 (dezessete) Equipamentos
Culturais. Essa Província abrange os seguintes Estados: Pará, Maranhão, Tocantins, Ceará,
Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo,
Rio de Janeiro e Goiás.
Província Marista do Rio Grande do Sul: composta de 1 (uma) Instituição de
Ensino Superior, 21 (vinte e uma) escolas de Educação Básica, 31 (trinta e um) Centros
Sociais e 1 (um) Hospital. Essa Província é composta pelo Estado do Rio Grande do Sul, o
Distrito da Amazônia e possui uma representação no Distrito Federal.
Província Marista Brasil Centro Sul: composta de 24 (vinte e quatro) Unidades
Sociais, 16 (dezesseis) Colégios de Educação Básica, 1 (uma) editora, 1 (uma) Instituição de
Ensino Superior, 3 (três) hospitais e 1 (um) Centro de Comunicação. Abrange os estados do
Paraná, Santa Catarina, São Paulo e possui duas representações no Distrito Federal.
Os Colégios de Santa Catarina faziam parte da Província do Rio Grande do Sul
até 2002, quando foi feita uma reorganização administrativa nas províncias e Criciúma,
juntamente com outros três Colégios, passou a integrar a Província Brasil Centro-Sul.
17
Para consolidação da qualidade educacional sem deixar de lado a unidade e
identidade marista, foram promovidos encontros como meios de organizar e estruturar a nova
província, que se constituía de escolas que tinham caminhadas diferentes. O período inicial
dessa organização exigia, tanto dos colégios como da administração, empenho na participação
dos encontros propostos.
Os representantes dos Colégios, assessorados pelo Centro Marista de Estudos e
Pesquisas (CEMEP) e posteriormente Diretoria Executiva da Rede de Colégios (DERC),
passaram a encontrar-se para discutir sobre o direcionamento dado aos segmentos e a
implantação dos projetos propostos pelos grupos. Foi organizado o Grupo de Estudos para o
Novo Ensino Médio (GENEM), o Grupo de Estudos da Educação Infantil (GEEI), o Grupo de
Estudos Ofício de Aluno (GEOFaluno), o Grupo de Estudos do Ensino Fundamental (GEEF),
o Grupo de Estudos sobre Planejamento (GEPLA) e ainda grupos de especialistas em cada
área do conhecimento para a construção das matrizes curriculares.
Na medida em que os grupos estudavam e montavam as propostas eram enviados
aos colégios documentos e orientações para implantação dos projetos em questão. Um desses
documentos (anexo 02) surgiu no Grupo de Estudos para o Novo Ensino Médio (GENEM) e
propunha o ideal de aluno do Ensino Médio Marista: pesquisador, comunicador e solidário.
Em Criciúma, além de se assumir esse ideal de aluno no Ensino Médio, foi
estendido para o Fundamental também, uma vez que a assessoria local entender que não seria
possível essa formação restringindo-a às séries finais.
Mas o mercado, representado pelos alunos e pais, nem sempre compactuou com o
discurso do colégio, pois enquanto a instituição se propunha a formar alunos pesquisadores,
comunicadores e solidários os pais questionavam sobre a não valorização do vestibular. As
falas dos pais acabavam denunciando o seu ideal de escola. Nos diversos atendimentos feitos
quando questionados, os pais não sabiam associar a autonomia estudantil adquirida por meio
da pesquisa com o vestibular, afirmando que a escola é que deve dar os conteúdos, cabendo
ao aluno apenas estudar para ter boas notas e passar em vestibulares concorridos. Quanto à
comunicação proposta pelo colégio, discorriam ser desnecessária, pois “as crianças de hoje
em dia já falam demais!”
Qualquer proposta que fugisse da educação dissertadora, citada por Paulo Freire,
enfrentava resistência. Na visão da maioria dos pais (pelo menos os que se manifestavam) era
a quantidade de conteúdos que tinha importância, inclusive era considerado bom professor o
que fosse mais prolixo. Além das discussões com os pais, foi necessário ainda intensificar o
estudo com os professores, que se sentiam inseguros em defender a comunicação e a pesquisa
18
como competência estudantil adotada.
O incentivo à reflexão sobre suas práticas é lançado aos professores como algo a
ser pensado e modificado quando necessário. Diferentes práticas metodológicas e concepções
educacionais coexistem, pois são manifestações da própria riqueza escolar. As diferenças são
percebidas como possibilidades educativas, desde que acompanhadas de reflexão e de
respaldo conceitual por meio das Matrizes Curriculares, pois essas representam o documento
oficial que legitima as ações pedagógicas.
O que é um estranhamento entre as reflexões feitas e a necessidade local.
Muitas aulas mantêm a linearidade tão criticada nas discussões, justificada pela necessidade
da demanda que exige uma concepção propedêutica de ensino. O Ensino Fundamental
trabalha para dar conta das propostas do Ensino Médio que precisa preparar para o Vestibular.
Há uma retroalimentação do sistema educacional.
Após a pesquisa foi possível perceber que essa retroalimentação tanto organiza
administrativamente o Colégio quanto impossibilita metodologias mais ousadas por parte dos
professores, que veem suas concepções de educação e homem contradizer-se em sua própria
prática. Eles demonstram sua insatisfação com as metodologias tradicionais com as quais
trabalham, mas salientam que as possibilidades educativas são aproveitadas de acordo com os
objetivos elencados pelo Colégio e sua disciplina.
Para Gouvêa da Silva (2004, p. 19), ser técnico-linear é uma característica da
escola tradicional, que:
[...] pressupõe a separação dos sujeitos a partir de conteúdos alienados e alienantes,
anacrônicos e descontextualizados, cuja pertinência e objetividade se restringem à
retroalimentação do próprio sistema educacional: o ensino nas séries iniciais se
justifica como necessidade para as posteriores, vestibulares etc.
Dentro dessa perspectiva, o ensino não serve para a utilização na vida imediata,
mas para o cumprimento da série seguinte. A vivência cotidiana deixa de ser para se fazer no
amanhã. Os vestibulares são mais importantes do que a vivência imediata do ser humano que
ainda cursa a Educação Básica. A educação, nesse sentido, perde sua utilidade prática ligada à
vida para situar-se na burocracia acadêmica que prioriza a execução dos conteúdos
programáticos.
No intuito de evitar a evasão de alunos enfrentada pelos Colégios Maristas da
Província Brasil Centro-Sul é que foi proposto aquele ideal de aluno baseado em uma visão
diferenciada de ensino. Entretanto, nos convém entender quais são os significados dados pelo
Colégio de Criciúma a esse aluno pesquisador, comunicador e solidário e se apropriação
19
docente desse ideal.
Essa pesquisa se desenvolveu na busca dos significados deste aluno comunicador,
pesquisador e solidário e se propôs a analisar os caminhos e descaminhos trilhados pela
instituição escolar local para que este ideal se concretize.
Apesar do Colégio não se posicionar assumindo Paulo Freire como teórico, em
diversos discursos falados e escritos ele é lembrado. Um exemplo disso é o vídeo da
campanha institucional de 2008 que utiliza a poesia de Paulo Freire, intitulada “Escola é...” ou
a citação no documento encaminhado às escolas em 2005 (Anexo 01), aonde chama os
educadores à criação de um mundo “inédito, mas viável”
1
e o Congresso Nacional Marista,
que iniciou suas atividades no ano de 2008
2
com uma frase de Paulo Freire que chama
atenção dos educadores para que “continuem sonhando sonhos possíveis”.
Não no Projeto Político Pedagógico ou nas Matrizes Curriculares uma
definição pelo autor e nem por outro especificamente, mas em mim enquanto educadora
um desejo de acreditar que a educação dialógica pode tornar a vida em sociedade “mais
humana”. Não apenas em mim, mas em outros que compactuam comigo o desejo de levar os
alunos a conhecerem-se e descobrirem-se não apenas como estudantes, mas como seres
humanos comprometidos com um mundo melhor. Penso que para a conquista de alunos com
tais requisitos são necessárias aulas que os levem ao encontro com o outro e consigo mesmos.
As práticas educativas precisam estar pautadas no diálogo, oportunizando reflexões sobre
aquilo que se é e o que se quer ser. É ir além dos desejos profissionais e econômicos impostos
pela sociedade e buscar um sentido de formação mais amplo. Para essa análise, é necessário
refletir sobre o sentido de formação e libertação em Paulo Freire, pois para o autor não
como formar o outro, mas ajudá-lo a libertar-se, pela educação dialógica.
A construção do Projeto Político Pedagógico no Colégio Marista de Criciúma
deu-se em 1997, mesmo ano em que ingressei na escola. O debate pautado em concepções
progressistas ampliava as possibilidades do trabalho educativo, indo ao encontro de meu ideal
de educação. Os textos de Freire, juntamente com de outros autores, foram estudados e
discutidos nos encontros que reuniam os educadores da instituição local. O início de meu
trabalho docente deu-se, na escola particular, cheio de esperanças e expectativas legitimadas
pelas discussões feitas que apenas ampliavam o que eu acreditava ser o “ideal de educação”.
1
Freire, Paulo. Pedagogia da esperança Um reencontro com a Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro. Paz e
Terra, 1992, p. 11.
2
O Congresso Marista de Educação foi realizado em julho de 2008 na Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS) e iniciou com a frase: “Ai de nós educadores se deixarmos de sonhar sonhos
possíveis” (FREIRE, 1995).
20
Geralmente o início de ano apresenta muitas promessas para o educador. Os desejos de ver se
concretizando os sonhos educativos passam pela semana pedagógica das escolas e é mais
intenso quando se inicia a carreira e o se tem noção das condições reais que aguardam o
dia-a-dia escolar.
Mesmo que, muitas vezes, minha prática contradissesse o que eu acreditava ser o
ideal de educação, nunca deixei de sonhar, de ter esperança, de demonstrar angústia por
apresentar um discurso que não se efetivasse na prática. Refleti diante de minhas próprias
aulas, e penso que esta pesquisa, mesmo distante daquele tempo, ainda tenta responder
questões as quais não consegui nem sugerir na época. Desde lá, mesmo após as mudanças
administrativas e pedagógicas ocorridas no Colégio, penso a educação como esse projeto
inacabado que precisa ser problematizado para ser colocado em prática.
Meu problema de pesquisa não iniciou com o Mestrado, ao contrário, foi a
necessidade de respondê-lo que me impulsionou a continuar na busca das respostas às
perguntas feitas 12 anos. Perguntas referentes não ao fazer do professor que trabalha
comigo hoje, mas daquela professora que eu fui, com meus desejos e minhas possibilidades.
Somente ao iniciar a pesquisa, após o exame de qualificação, quando busquei nos documentos
o referencial teórico que me movia, é que percebi o esvaziamento de meu discurso freireano.
Ao contrário do que eu esperava, não encontrei referência ao autor no Projeto Político
Pedagógico do Colégio. Mesmo assim, permaneci com este referencial, uma vez ter sido real
minha vivência de aproximação com ele no meu caminho nesta escola.
Percebi que Freire poderia não estar claramente definido como referencial nos
documentos escolares, mas ele permeava as discussões pedagógicas que fazíamos e, claro,
alimentava o meu próprio ideal iniciado na faculdade de Pedagogia. É por isso que o
referencial de Paulo Freire nesta pesquisa teve grande importância no sentido de proposição
ao trabalho docente futuro da escola. Não poderia cobrar do Colégio algo que ele mesmo não
se propôs, de seguir um viés freireano.
Nesta pesquisa, as categorias pesquisa, comunicação e solidariedade, tidas como
compondo o ideal de aluno, foram comparadas entre si de acordo com os discursos
documentais e empíricos, ou seja, aquilo que a escola se propõe e pratica, buscando-se os
pontos de semelhança e de diferença entre o discurso e a prática. E por acreditar na
aproximação do ideal de aluno proposto pelo Colégio com Paulo Freire, este trabalho
apresenta uma aproximação do ideal de aluno Marista com o referencial freireano.
Desta forma, a categoria “pesquisa” do ideal de aluno Marista estará sendo
aproximada com a categoria “curiosidade epistemológica/ingênua” de Paulo Freire; a
21
categoria “comunicação”do colégio com a categoria “diálogo” do autor e ambas categorias
“solidariedade” entre si. Assim, acredito que o autor poderá contribuir para as reflexões
iniciadas no Colégio, no sentido de configurar uma proposta para o desenvolvimento das
competências estudantis que o Colégio se propõe: pesquisador, comunicador e solidário,
mais próximas à pedagogia libertadora.
Posso resumir minha vivência na escola em três períodos: em 1997, quando das
discussões e escrita do PPP, baseado em reflexões progressistas em dicotomia com práticas
tradicionais; em 2002, quando da reorganização provincial, o que ocasionou acréscimos no
PPP, mas não sua alteração, trazendo a dificuldade da manutenção de uma identidade de rede
na especificidade local; em 2005, com o estabelecimento do ideal de aluno Marista a partir do
Projeto Curricular em Ação, o que causou uma esperança de mudança.
O desafio proposto pela escola me faz pensar nas ações cotidianas para que este
intento se concretize. Reflito sobre esse ideal quando ouço os professores em suas falas sobre
o aluno que não estuda e nas possibilidades dadas para que este educando deseje aprender.
Não é diferente quando os próprios alunos reclamam que não são ouvidos por nós enquanto
escola e que as aulas são tediosas. Em contrapartida, temos a exigência também dos pais que,
na maioria das vezes, por estarem comprando o serviço, exigem uma escola com mais
conteúdos por considerarem que esta é uma garantia para que seus filhos passem no
vestibular. São esses dizeres e fazeres escolares que nos levam a questionar sobre o currículo
que permeia o Colégio Marista de Criciúma na formação desse aluno pesquisador,
comunicador e solidário.
Parto do princípio de que o currículo precisa ser visto como ferramenta para a
emancipação humana. Os conteúdos escolares não têm sentido se não visarem ao bem
comum, ao acesso coletivo às necessidades básicas. A construção da cidadania pode se dar
também por meio da escola. A instituição escolar possui muitas limitações burocráticas e
pedagógicas, pois lida não apenas com questões educacionais. No caso da escola particular,
acrescente-se uma clientela a ser satisfeita, no entanto, as condições de educação proposta
caminham paralelas às de mercado. Não para limitar a proposta curricular apenas aos
ideais pedagógicos.
Ao mesmo tempo em que me sinto satisfeita por trabalhar em uma instituição que
coloca em pauta discussões sobre a necessidade de ressignificação curricular, oportunizando
para os professores formação continuada
3
, e possibilitando questionamentos sobre o que vem
3
Utilizei o termo formação continuada, pois é assim que o Colégio define os estudos feitos com os professores.
Não discuto a diferença deste termo com a formação permanente elencada por Freire.
22
a ser currículo, avaliação e projetos de trabalho, também me sinto frustrada por não observar
muitos movimentos de mudança. Não penso que o estudo conta de tudo ou a prática é
melhor ou pior que qualquer teoria. A ação e a reflexão estão, ou precisam estar, interligadas,
pois oportunizarão as mudanças pedagógicas necessárias para a efetivação do aprendizado.
Para Gouvêa da Silva (2004), a crença na aparente contradição entre teoria e prática é falsa:
Assim, é ilusório buscar a identidade nos discursos. O que caracterizará um novo
fazer são os elementos transformadores presentes na ação. Devemos, portanto,
procurar caracterizar as referências pedagógicas nas práticas usuais da escola para
melhor compreender suas propostas educacionais, e não no discurso, para então
planejar possíveis formas de intervenção. A reflexão coletiva das contradições entre
o-que-se-diz e o-que-se-faz é a referência inicial tanto para o desvelamento da ética
pressuposta nas ações educativas quanto para fundamentar qualquer mudança na
prática pedagógica. (GOUVÊA DA SILVA, 2004, p. 70)
É a reflexão sobre a ação que dificulta as ideias de alienação e domesticação. É
nessa práxis que o homem toma conhecimento de seu papel no mundo e pode decidir aceitá-lo
ou modificá-lo (FREIRE [1987], 1996). A práxis, para Freire, implica a teoria como um
conjunto de ideias, indissociadas da prática, que possibilita a interpretação de determinado
fenômeno, levando à construção de um novo enunciado, podendo o sujeito dizer sua palavra
sobre o mundo e para o mundo.
É por meio da conscientização que os sujeitos assumem compromisso histórico de
refazerem seu mundo e a si mesmos dentro de suas possibilidades concretas. A ação reflexiva
leva à conscientização que leva a mais reflexão, gerando a construção de um novo mundo
conceitual em que o indivíduo é sujeito e atua sobre o mundo concreto que o rodeia. É por
meio dessa conscientização que esse sujeito torna-se senhor de sua palavra e é esse senhorio
que poderá levá-lo à transformação, tanto do mundo conceitual quanto do concreto, superando
as relações sociais de dominação.
Se um dos objetivos da escola é formar alunos pesquisadores, comunicadores e
solidários é necessário entender o que estes termos significam para as pessoas que ali estão e
de que forma manifesta-se a concepção curricular que garante essa formação.
Neste contexto, nosso problema de pesquisa pode ser formulado operacionalmente
na seguinte pergunta: Em que medida a proposta curricular efetivada no Colégio Marista
possibilita a formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários?
Com o objetivo de desdobrar esta problemática, foi necessário discutirmos sobre
as seguintes questões:
A formação continuada iniciou em 2006 com 10 encontros de duas horas distribuídas no decorrer do ano letivo e
permaneceu em 2007 com a mesma carga horária, sendo reduzida em 2008 para 08 encontros.
23
Como são significados os termos atribuídos ao aluno ideal desta escola:
pesquisador, comunicador e solidário?
Quais as práticas expressas pela escola que possibilitam a formação de alunos
pesquisadores, comunicadores e solidários?
Qual a concepção de currículo expressa nos discursos documentais e orais
apresentados pela escola?
Que aproximações podem ser feitas entre a proposta curricular do Colégio
Marista de Criciúma e as categorias freireanas dialogicidade, curiosidade ingênua e
epistemológica e solidariedade?
Diante destas questões, temos como objetivos:
1) Geral:
Compreender em que medida a proposta curricular efetivada no Colégio Marista
possibilita a formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários, à luz das
categorias freireanas curiosidade epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade.
2) Específicos:
Definir o que a escola entende por aluno pesquisador, comunicador e
solidário;
Identificar se as práticas do Colégio Marista de Criciúma estão em consonância
com o projeto de formação do aluno proposto pela escola;
Verificar a concepção curricular expressa pela escola e como esta se relaciona
com a formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários;
Relacionar o ideal de aluno do Colégio Marista com a Educação Libertadora de
Paulo Freire, em particular com as categorias de curiosidade epistemológica/ingênua,
dialogicidade e solidariedade.
A seguir, aponto o caminho teórico percorrido, numa apresentação de cada
capítulo desta dissertação. Minha pesquisa desdobra-se em três capítulos, delineados da
seguinte maneira:
No primeiro, discorrerei sobre o pensamento histórico curricular, de acordo com
Pacheco (2001) e Sacristán (2000), que apresentam uma visão crítica em relação ao currículo.
Neste capítulo ainda tentarei localizar o pensamento freireano dentro das orientações
propostas por Sacristán e das teorias elencadas por Pacheco.
A escola não está desvinculada do mundo, portanto, precisa ser vista de acordo
com as mudanças que acontecem ao seu redor e dentro dela mesma. As concepções de
24
currículo também se apresentaram diferentes no decorrer dos anos. O próprio ato de seleção e
organização dos conteúdos curriculares não ocorre como um ato inocente e desinteressado por
parte de quem realiza.
Segundo Pacheco (2001), a função da teoria curricular é descrever, compreender e
explicar os fenômenos curriculares para melhoria da prática. Neste sentido, a teoria
problematiza a própria prática pedagógica. Ela não vive isolada, mas questiona os fazeres
educacionais.
De acordo com Sacristán (2000), a própria teorização curricular torna-se possível
pelas mudanças curriculares que acontecem devido às pressões sociais, econômicas e
históricas dos diversos tipos de sistemas escolares. As escolhas não acontecem por acaso, nem
são neutras, mas políticas, indicando posicionamentos por uma ou outra forma de ensinar.
É por não acreditar na neutralidade educacional que Freire afirma que educar é ato
político, e não como negar que a concepção curricular que acredito irá determinar minhas
aulas, meus objetivos e a atividade ou passividade do aluno. Sacristán (2000) afirma que a
única teoria curricular capaz de dar conta dessa cumplicidade é a teoria crítica, pois ela coloca
em evidência as realidades que condicionam os processos. A prática é real e por isso precisa
ser teorizada para ser vivenciada.
Sacristán (2000, p. 9) afirma que “as condições de desenvolvimento e realidade
curricular não podem ser entendidas senão em conjunto”, apresentando significado cultural. O
ensino é coerente com o contexto que permeia a comunidade escolar, os significados
educativos se dão por meio das práticas e códigos que a traduzem “em processos de
aprendizagem para os alunos”.
A prática escolar que podemos observar num momento histórico tem muito a ver
com os usos, as tradições, as técnicas e as perspectivas dominantes em torno da
realidade do currículo num sistema educativo determinado. Quando os sistemas
escolares estão desenvolvidos e sua estrutura bem-estabilizada, existe uma tendência
a centrar no currículo as possibilidades de reformas qualitativas em educação. Em
primeiro lugar, porque a qualidade do ensino está estreitamente relacionada aos seus
conteúdos e formas, como é natural; em segundo lugar, porque, talvez impotentes ou
descrentes diante da possibilidade de mudanças em profundidade dos sistemas
educativos, descobrimos a importância de mecanismos mais sutis de ação que
configuram a prática. É difícil mudar a estrutura, e é inútil fazê-lo sem alterar
profundamente seus conteúdos e ritos internos. (SACRISTÁN, 2000, p. 9)
As mudanças escolares não são imediatas, muito pelo contrário, algumas podem
levar muito tempo para concretizar-se. Por isso a necessidade de objetivos claros dentro dessa
instituição, pois os parâmetros de planejamento, avaliação e metodologias serão designados
por esses objetivos. Na visão de Sacristán (2000), é a tradição que tem feito que a gestação
25
curricular se em gabinetes e não no chão da escola. Os velhos usos assumiram novos
territórios, impossibilitando a melhoria da qualidade de ensino que está vinculada à mudança
de conteúdos e procedimentos.
Diante do que vem a ser currículo na visão crítica desses autores, no segundo
capítulo serão explanadas as definições das categorias freireanas de curiosidade
epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade descritas nos livros “Educação como
prática da liberdade”, “Pedagogia do oprimido”, “Pedagogia da esperança” e “Pedagogia da
autonomia”. Destacarei neste capítulo a Pedagogia Libertadora de Paulo Freire como
possibilidade dentro da teoria crítica de currículo, segundo Pacheco(2001) e na quarta
orientação de Sacristán(2000).
Freire ([1964] 2008), afirma que todo aquele que se propõe a educar precisa optar
pelo tipo de educação que irá assumir. A opção gira em torno da educação para domesticação
ou para liberdade. Educação para o homem-objeto ou educação para o homem-sujeito”
(FREIRE [1964], 2008, p. 44). Segundo ele, a capacidade criadora do homem desenvolve-
se a partir do processo de libertação para o qual ele nasceu. O poder de decisão do ser humano
é alimentado na medida em que ele o exerce.
Para que se concretize esse processo de libertação, torna-se necessário o diálogo.
Ouso dizer que a escola é o espaço propício a sua realização por comportar em si sujeitos
diferentes e que permanecem dentro dela, no mínimo, quatro horas diárias. Mas o alcance
desse ideal também não é tão simples, pois diálogo é via de mão dupla. O professor pode
oportunizar aulas dialogadas que visem à troca de conhecimentos, sua participação pode ser
por meio da mediação e não imposição. Ensinar a dialogar é essencialmente saber ouvir. Não
podemos ensinar responsabilidades para nossos alunos, se realizamos seus compromissos,
nem libertamos a outro, senão a nós mesmos. “O que importa realmente, ao ajudar-se o
homem é ajudá-lo a ajudar-se. (E aos povos também) É fazê-lo agente de sua própria
recuperação. É repitamos, pô-lo numa postura conscientemente crítica diante de seus
problemas”. (FREIRE [1964], 2008, p. 66).
Para um projeto educacional ser válido é preciso estar revestido de coragem,
trazendo à tona reflexões sobre o nosso tempo que promovam o enfrentamento de nossos
próprios problemas. Como Freire (2008) cita as sociedades de acordo com seus níveis de
consciências
4
, poderíamos pensar se estamos oportunizando na escola a busca da
4
Para Freire (2008), a educação oportuniza que os indivíduos de uma sociedade compreendam qual seu papel.
Esta captação se em vários graus: intransitiva, na qual uma limitação na esfera de apreensão; transitiva
ingênua, em que se interpretam os problemas de forma simplista, e transitiva crítica, em que se busca desprender
dos conceitos para interpretar a realidade.
26
transitividade crítica, sabendo que esta pode ser alcançada por meio de uma educação
dialogal:
A transitividade crítica, por outro lado, a que chegaríamos com uma educação
dialogal e ativa, voltada para a responsabilidade social e política, se caracteriza pela
profundidade na interpretação dos problemas. [...] pela prática do diálogo e não da
polêmica. Pela receptividade ao novo, não apenas porque novo e pela não-recusa ao
velho, só porque velho, mas pela aceitação de ambos, enquanto válidos. Por se
inclinar sempre a argüições. (FREIRE [1964], 2008, p. 69-70).
Para atingir a transitividade crítica é necessária a prática democrática, tanto na
sociedade quanto na escola e, para tanto, o posicionamento dos gestores das aulas torna-se
importante. Não podemos ensinar a democracia se não a vivenciarmos em sua totalidade. Se
as aulas continuam sendo de prática bancária é impossível formarmos alunos que se
posicionem socialmente. A vivência é importante para a consolidação da teoria. Nossos
alunos não serão mais democráticos e, consequentemente, mais solidários, vivendo numa
escola de faz-de-conta. O gosto pelo saber anda de braços dados com a curiosidade, que
levará o aluno a perguntar e a responder suas próprias questões e a de seus semelhantes.
Freire ([1987] 1996) nos propõe uma educação problematizadora e, ao mesmo
tempo, libertadora. Mas para isso a escola precisa assumir seu papel humanizador, cuja lógica
não passa pela educação bancária, que apenas deposita conteúdos e o extrai na hora que o
professor aplica a prova.
Mas o sentido da escuta, do diálogo, segue sentido contrário, pois se coloca no
lugar do outro quando se posiciona ao ouvir. Saber ouvir é uma das competências do
educador que oportuniza a educação democrática. Não há como ensinar a democracia sem
estar atento aos anseios “alheios”.
Na medida em que o professor e a escola aprendem a escutar, paciente e
criticamente, o educando, a fala não será mais para o aluno e sim, com ele (FREIRE [1996],
2001). Nesse sentido, o educador deixa de ser o dono da verdade e passa a considerar outras
possibilidades, pois valoriza o diferente e percebe-o como fundamental para o exercício da
autonomia, tanto docente quanto discente.
Para Freire ([1996] 2001), a escuta é requisito para o diálogo e para a
compreensão do conhecimento que o educando traz para a situação de aprendizagem,
possibilitando ao educador trabalhar a partir da leitura de mundo que o aluno lhe promoveu.
Saber escutar é uma prática que implica a construção do conhecimento crítico-emancipador.
Para tanto, o educador que pratica a escuta acaba por desenvolver também a humildade, a
tolerância e o amor pelos próprios educandos.
27
A humanização, no sentido freireano, é o comprometimento que podemos assumir
contra as diferentes formas de não escuta: econômica, política, social e cognitiva. Na escola,
por exemplo, podemos humanizar ou desumanizar, mas a linha que separa as duas formas de
lidar com o outro é muito tênue. Para Freire (1994a), temos a vocação para a humanização, já
que a marca da natureza humana é “ser mais”, por meio da qual os homens estão em constante
procura.
É por estarmos sendo assim que vimos nos vocacionando para a humanização e que
temos na desumanização, fato concreto na história, a distorção da vocação. Jamais,
porém, outra vocação humana. Nem uma nem outra (humanização, ou
desumanização), são destinos certos, dado dado, sina ou fato. (FREIRE, 1994b, p.
99).
A própria natureza histórica do homem que o faz querer “ser mais” e a educação
sistematizada pode servir de auxílio nesta humanização. É necessário um posicionamento da
escola diante das possibilidades enfrentadas, pois é uma das instituições mais privilegiadas,
sendo que promove a convivência, pacífica ou não, de diferentes culturas, cujos saberes são
heterogêneos e ilimitados. As possibilidades de trabalho num contexto assim são infinitas,
visto que a complexidade escolar oportuniza diferentes conflitos que precisam ser resolvidos
enquanto a própria aprendizagem acontece.
As críticas direcionadas às à educação escolar não se encontram apenas fora desta
instituição, pois é a escola que, muitas vezes, se pergunta sobre a teorização de suas práticas
educativas. Quando essa instituição investe em cursos e os professores participam
questionando sobre o que anda praticando a escola, contradizem os rumores que dizem
respeito ao desinteresse dos educadores a qualquer processo de mudança.
Os próprios educadores, em seu cotidiano, questionam os objetivos educacionais,
seu alcance e o distanciamento entre teoria e prática. Uma educação bancária (FREIRE
[1987], 1996) vista ainda no cotidiano escolar, não se por desconhecimento de outras
concepções ou descrédito de uma proposta dialógica. Resta-nos compreender quais fatores
levam à perpetuação dessa prática e se movimentos de mudança no sentido de
problematizar o que já está posto como verdadeiro.
Distanciando-se do seu mundo vivido, problematizando-o, “descodificando-o”
criticamente, no mesmo movimento da consciência o homem se re-descobre como
sujeito instaurador desse mundo de sua experiência. Testemunhando objetivamente
sua história, mesmo a consciência ingênua acaba por despertar criticamente, para
identificar-se como personagem que se ignorava e é chamada a assumir seu papel.
(FIORI [1987], 1996, p. 15)
28
Para Fiori ([1987] 1996), a consciência do mundo e de si crescem juntas. É
impossível a hominização sem a modificação do olhar que temos de nosso semelhante e de
nós mesmos. o consciência de si sem a consciência de mundo, nem a consciência do
mundo sem nos percebermos nele e as consequências geradas por isso. O importante é que a
escola pode, ou não, contribuir para o processo de conscientização e que este não se dá
individualmente, mas é construído socialmente. A condução dada nas aulas reflete a maneira
como percebemos o homem no mundo e o mundo do homem.
Para compreendermos o currículo escolar é necessário analisarmos os conteúdos
trabalhados, as relações de aprendizagem e o papel assumido pelo educador e o educando
diante do conhecimento e como a instituição escolar apropria-se desse conhecimento para
promover a modificabilidade social. Freire ([1987] 1996) afirma que as relações entre
educador e educando tem a marca dissertadora, pois os papéis são bem distintos, um assume-
se narrador, depositante, enquanto o outro é o depositário, ouvinte. “Nela, o educador aparece
como seu indiscutível agente, como o seu real sujeito, cuja tarefa indeclinável é encher os
educandos dos conteúdos de sua narração” (FREIRE [1987], 1996, p. 57). As palavras desta
narração são vazias, cujo resultado é o “alienado” e o “alienante”. As propostas da escola
geralmente esbarram na dissertação, cuja característica principal é a “sonoridade”.
Em contrapartida, a principal característica da educação libertadora é a de ser
ouvinte, no sentido de ouvir e enxergar o outro. Os alunos são alienados por participarem de
uma educação que não lhes mostra a pobre realidade em que se encontram muitos brasileiros.
O que ouvem são apenas discursos, não são conquistados por meio do diálogo, enfatizando
ainda mais a “alienação”. Ser alienado independe de classe social, depende da consciência que
o sujeito tem de seu papel na sociedade. “Espero que muitos de s estejamos aprendendo
como é difícil fazer história, e como é importante apreender que nós estamos sendo feitos pela
história que fazemos no processo social dentro da história”. (FREIRE; HORTON, 2003, p.
204)
À luz das categorias freireanas, no terceiro capítulo será feita uma explanação do
que o Colégio entende por aluno pesquisador, comunicador e solidário, bem como as
motivações que o levam a desejar este tipo de aluno. Também será analisado o que é currículo
na visão desse Colégio. Para definição desses termos, recorreremos à pesquisa documental e
entrevistas feitas com os professores do Ensino Fundamental II
5
, Assessora e Diretores Geral
e Educacional sobre o que pensam da proposta da escola, a sua participação na elaboração e
5
6º ao 9º ano.
29
as possibilidades de trabalho. É necessário compreender o que a escola entende por
comunicação, pesquisa e solidariedade e quais práticas e reflexões tem utilizado para o
desenvolvimento dessas competências em seus alunos.
De acordo com o ofício n. 03/05 (anexo 01) enviado aos Colégios da Província
Marista Brasil Centro-Sul, o aluno pesquisador é aquele que possui a capacidade de análise
crítica dos problemas do mundo, formulando perguntas e propondo respostas, em um
processo problematizador sempre passível de confirmação, invalidação ou modificação.
Quanto à competência comunicativa, o aluno deve estar apto a expressar ideias e
sentimentos com clareza, consistência e coerência, valendo-se dos recursos e formas
disponíveis de representação, tornados eficazes pela mediação com o outro e com o mundo
em que está inserido.
A solidariedade, de acordo com este documento, é virtude que pode ser
desenvolvida por meio da promoção de princípios éticos que despertem a “indignação ativa
diante de qualquer agressão contra a Terra, a Vida e a Dignidade Humana”. (CEMEP, 2005).
Foi necessário conhecermos as propostas que o Colégio tem para que seus alunos tornem-se
solidários para compreendermos as possibilidades de concretização desta solidariedade, bem
como a pesquisa e a comunicação.
Por Currículo, o Projeto Político Pedagógico (anexo 03) apresenta como uma
produção histórica e social, feito por muitas mãos e tempos diferentes. É conceituado como
formação discursiva que se acumula com diferentes significados e enunciados, sendo
determinado pelas tensões estabelecidas na escola e fora dela.
Após verificar o entendimento de currículo e aluno pesquisador, comunicador e
solidário expressa nos documentos e pelos sujeitos da pesquisa, faremos a aproximação
destes entendimentos com as categorias freireanas de curiosidade epistemológica/ingênua,
dialogicidade e solidariedade.
A seguir, a descrição dos procedimentos metodológicos deste estudo.
Procedimentos metodológicos
Penso que o fato de estar imbuída de um ideal educacional que vise um mundo
mais humano, com oportunidades para todos, utilizando como meio também - e não apenas - a
escola, pode me fazer cair na armadilha de tornar-me pessimista e não perceber as mudanças
que estão acontecendo no Colégio Marista de Criciúma. O contrário também é possível, por
estar tão ligada pela vivência nesta instituição corro o risco de, num otimismo de quem deseja
30
ver esse ideal de aluno concretizando-se, mascarar a realidade pesquisada. Mas seria
impossível procurar minhas respostas se as perguntas que faço se localizam exatamente onde
estou. Na tentativa de distanciamento, cogitei pesquisar outra escola da mesma Província
Administrativa, entretanto, em minha Qualificação, a banca examinadora entendeu que
minhas perguntas poderiam ser respondidas onde nasceram, no chão de minha própria
vivência escolar.
Não posso deixar de salientar sobre o quanto foi difícil o distanciamento para que
a pesquisa pudesse ser realizada. É compreensível, pois, segundo Enguita (1989), a escola
raramente é estudada de fora, pois todos nós somos produtos dela e torna-se quase impossível
uma avaliação objetiva e desapaixonada. O autor compara o investigador que permanece na
escola ao sacerdote que julga a própria igreja ou ao militar que tenta avaliar o exército.
Portanto, o distanciamento deu-se dentro das possibilidades da pesquisa, ao estranhamento do
que antes me era comum e das refutações de hipóteses que anteriormente eram tidas como
corretas ou únicas.
Como dito anteriormente, o Instituto Marista está presente em 78 países e possui
trabalhos voltados à educação básica e universitária e assistência social. No Brasil, esta rede
possui cerca de 500 instituições, entre Colégios, Unidades Sociais, Universidades,
Comunidades Apostólicas, Centros de Evangelização, Hospitais, Veículos de Comunicação,
Equipamentos Culturais e Editoras.
Sua divisão política e administrativa se por meio de Províncias que facilitam a
administração financeira e pedagógica. O Colégio de Criciúma, lócus da pesquisa, junto de
mais quinze outras escolas, compõe a Província Marista Brasil Centro-Sul. As decisões
pedagógicas e administrativas são assessoradas pela DERC (Diretoria Executiva da Rede de
Colégios), que se localiza na PUC-PR.
Em sua administração pedagógica local, o Colégio possui um Diretor Geral, uma
Diretora Educacional, duas Assessoras Psicopedagógicas - responsáveis pela Educação
Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio - uma Assistente Psicopedagógica na Educação
Infantil e uma Assistente de Alunos no Ensino Fundamental II e Médio. As decisões
administrativas e pedagógicas são tomadas no Colégio, mas assessoradas pela DERC.
A presente pesquisa é de abordagem qualitativa, empírica e documental. Os
procedimentos investigativos utilizados foram a análise de documentos e a entrevista
semiaberta.
Para Minayo ([2004] 2008), o campo de pesquisa é apenas um recorte que o
pesquisador faz em termos de espaço, representando uma realidade empírica a ser estudada a
31
partir das concepções teóricas que fundamentam o objeto de investigação. Essa perspectiva
considera o produto final sempre provisório e sempre um dos pontos de vista a respeito do
objeto investigado.
O referencial teórico utilizado nesta pesquisa para análise dos dados foi “O
Currículo” de Sacristán (2000) e “Currículo: teoria e práxis” de Pacheco (2001), que serviram
para análise do currículo que permeia o Colégio Marista de Criciúma.
As categorias de “dialogicidade, “curiosidade ingênua/epistemológica” e
“solidariedade” apresentadas nos livros de Paulo Freire: “Pedagogia da esperança”,
“Pedagogia do oprimido”, “Professora sim, tia não”, “Pedagogia da autonomia”, “Educação
como prática da liberdade” e “Conscientização: teoria e prática da libertação” também foram
estudadas para análise do ideal de aluno proposto pelo Colégio.
Foram pesquisados os seguintes documentos do Colégio: Ofício 03/05 (Anexo
01), Projeto Curricular em Ação (Anexo 02), Projeto Político Pedagógico (Anexo 03) e
Matriz Curricular de DAPS. Após a pesquisa destes documentos percebi que seriam
insuficientes para explicar o ideal de aluno proposto pelo Colégio, sendo necessária a leitura
das Matrizes Curriculares (Biologia, Ciências, Física, Matemática, Química, Filosofia,
Sociologia, Ensino Religioso, Geografia, História, Arte, Educação Física, Línguas
Estrangeiras e Língua Portuguesa) e da Missão Educativa Marista por serem documentos
importantes dentro da proposta pedagógica desta instituição. Dado o grande volume de
páginas destes documentos, anexei apenas os quatro documentos principais determinados
antes da pesquisa, por serem de âmbito geral para todo o colégio.
O segmento escolhido para a pesquisa foi o Ensino Fundamental II (6º ao ano),
por ser o segmento com o qual trabalho e porque foi a partir dele que o problema delineou-se.
Do ao ano, no início da pesquisa havia um total de 12 (doze) professores, sendo que 7
(sete) deles estavam há menos de três anos na Instituição.
O convite à participação da pesquisa foi feito a todos os professores do
Fundamental II oralmente por dois dias consecutivos, quando o grupo se reunia para reuniões.
Quatro atenderam prontamente. Para completar o número de sujeitos da pesquisa, foi
necessário novo convite em particular. Em um dia em que os professores estavam na escola
para aplicação de provas finais, fiz o convite em particular para os primeiros que encontrei. À
medida que eles terminavam de aplicar suas avaliações, se dirigiam para a entrevista,
completando assim a amostra de 10 (dez) professores, previamente estabelecida.
Optei pela entrevista semiaberta pela facilidade na abordagem, já que algumas
questões estão determinadas e possibilidade de acréscimo de outras perguntas que não
32
estivessem no roteiro. Segundo Minayo ([2004] 2008, p. 267) a entrevista semiaberta:
[...] obedece a um roteiro que é apropriado fisicamente e utilizado pelo pesquisador.
Por ter um apoio claro na sequência das questões, a entrevista semi-aberta facilita a
abordagem e assegura, sobretudo, aos investigadores menos experientes, que suas
hipóteses ou seus pressupostos serão cobertos na conversa.
As entrevistas foram realizadas com auxílio de gravador, a maioria em uma sala
anexa à dos professores, algumas em minha própria sala, com duração média de trinta
minutos. Ao transcrever as falas elas foram modificadas de modo a não permitir a
identificação dos entrevistados, respeitando o gênero. Os sujeitos são identificados apenas
pelo gênero para manter o sigilo proposto e explícito no termo de consentimento (Apêndice
02). Também a expressão falada foi corrigida para a fala culta.
Além dos 10 (dez) professores, participaram da entrevista o Diretor Geral, o Ex-
Diretor Geral, a Diretora Educacional e a Assessora Psicopedagógica do Ensino Fundamental
II. Durante o período de entrevista os sujeitos mostraram-se dispostos a responder a todas as
perguntas feitas, inclusive entrando em questões que não haviam sido questionadas. Dois
educadores participantes, ligados à gestão, preferiram escrever suas respostas e entregar
depois. Aceitei, salientando que o objetivo da pesquisa não era a busca de respostas certas ou
erradas, mas uma análise do que é currículo para o colégio e os conceitos atribuídos ao ideal
de aluno proposto na visão dos educadores. Na análise, percebi que algumas das respostas
haviam sido transcritas de alguns documentos pesquisados, portanto, preferi desconsiderar
as entrevistas.
Os dados da entrevista foram comparados com a análise do Projeto Político
Pedagógico, das Matrizes Curriculares, do Pré-Projeto do Novo Ensino Médio e dos
documentos recebidos do CEMEP e DERC, no que se referem à proposta curricular e à
formação do aluno pesquisador, comunicador e solidário, fazendo dessa pesquisa documental
e empírica.
A análise dos dados deu-se por categorias:
A palavra categoria, em geral, se refere a um conceito que abrange elementos ou
aspectos com características comuns ou que se relacionam entre si. Essa palavra está
ligada à ideia de classe ou rie. As categorias são empregadas para se estabelecer
classificações. Nesse sentido, trabalhar com elas significa agrupar elementos, ideias
ou expressões em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso. Esse tipo de
procedimento, de um modo geral, pode ser utilizado em qualquer tipo de análise em
pesquisa qualitativa. (GOMES [1994], 2004, P. 70)
Segundo o autor, as categorias podem ser estabelecidas antes do trabalho de
33
campo seriam as categorias gerais ou após a coleta de dados seriam as categorias
específicas ou concretas, de agrupamento das respostas encontradas. Nesta pesquisa, as
categorias foram estabelecidas previamente ao trabalho de campo e foram as seguintes:
Currículo;
Aluno pesquisador,
Aluno comunicador;
Aluno solidário.
Estas categorias pesquisadas no colégio foram então aproximadas com as
categorias de curiosidade epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade, discutidas a
partir do referencial teórico de Paulo Freire.
Passamos agora para o capítulo 1, que apresentará o que é currículo sob a
perspectiva de Sacristán (2000) e Pacheco (2001) e uma breve história da teoria curricular,
localizando o pensamento freireano dentro dessas duas perspectivas.
34
I. A QUESTÃO CURRICULAR EM DEBATE
O currículo elaborado é uma forma privilegiada para
comunicar teoria pedagógica e prática, conectar
princípios filosóficos, conclusões de pesquisa, etc. com
a prática que se realiza nas aulas; porque apenas através
do plano e realização das tarefas para cumprir com as
exigências curriculares é que determinados princípios
podem ser convertidos em orientadores da prática e da
aprendizagem. (SACRISTÁN, 2000, p. 84)
Seguindo a perspectiva que currículo não é de domínio exclusivo dos professores,
dos gestores, dos alunos e dos especialistas, mas de todos eles, “visto tratar-se de um processo
que implica ao mesmo tempo uma construção ao nível das intenções e uma desconstrução ao
nível da prática”.(PACHECO, 2001, p. 45), reconheço a possibilidade de discussão curricular
tanto na diversidade quanto na convergência de discursos, pois são esses que esclarecem as
opções e tomadas de decisão.
[...] a celebração da homogeneização da diferença e da primazia do local não apaga
as identidades curriculares, necessariamente ligadas a valores que reforçam a
dimensão humana, produzidas em situações de diversos contextos. Este
compromisso de currículo para com a sociedade que o legitima reforça tanto os
aspectos que podem ser organizados através de estruturas destinadas a favorecer
a aprendizagem quanto os aspectos particulares que se prendem com a realidade de
cada sujeito. (PACHECO, 2001, p. 45)
O currículo, portanto, não se forma a partir de um olhar, mas das diversas
perspectivas encontradas no universo escolar. Mesmo havendo um direcionamento
pedagógico o qual o Colégio assume, a instituição abrange diferentes concepções que
compõem o currículo e efetivam-se na prática e retroalimentam os discursos proferidos.
Neste capítulo, primeiramente se buscará, em concordância com Pacheco(2001) e
Sacristán(2000) caracterizar o currículo, discorrendo sobre a história curricular nessa
perspectiva. Em seguida, se buscará localizar o pensamento freireano dentro das orientações
propostas por Sacristán e das teorias elencadas por Pacheco.
1.1. O que é currículo?
Para Moreira (2008), o currículo deixou de ser considerado apenas uma área
meramente técnica, voltada para questões relativas a procedimentos, métodos e técnicas. Ele
35
salienta que se pode falar em uma tradição crítica do currículo, que é guiada por questões
epistemológicas, sociológicas e políticas. O autor complementa que:
Embora questões relativas ao como” do currículo continuem importantes, elas
adquirem sentido dentro de uma perspectiva que as considere em sua relação com
questões que perguntem pelo “por quê” das formas de organização do conhecimento
escolar”. (MOREIRA, 2008, p. 7)
O que numa determinada concepção era considerado apenas uma grade
programática, em outra é entendida como todas as ações que a escola manifesta. Desfocaliza-
se apenas o ato pedagógico para se constituírem todas as ações da prática escolar.
Para Coppete (2003, p. 21):
[...] pode-se dizer que Currículo é fundamento de qualquer sistema de ensino. Ele se
constitui de todo o conhecimento social disponível em nossa época que for
selecionado e organizado, desde que se concretize naquilo que é vivido, sentido e
aprendido pela pessoa que se educa.
Desta forma, o currículo torna-se visível na interação do aluno com seus colegas,
professores, administradores, assim como todos os demais membros da comunidade que estão
envolvidos nas questões escolares. A forma como essas interações acontecem demonstram
qual currículo é garantido pela escola. É importante ressaltar também que a maneira como se
constituem os conteúdos, os horários, as práticas metodológicas também refletem o processo
de constituição curricular. Essa constituição ocorre por meio de uma fusão de conhecimentos
científicos, crenças, expectativas e visões sociais.
[...] o currículo acaba por expressar exatamente, entre outras coisas, a forma como
certas questões são definidas, como “problemas” sociais [...] aquilo que é
considerado currículo num determinado momento, numa determinada sociedade, é o
resultado de um complexo processo no qual considerações epistemológicas puras ou
deliberações sociais racionais e calculadas sobre conhecimento talvez não sejam
nem mesmo as mais centrais e importantes. (SILVA, 1999, p. 9)
A prática educacional não é feita de neutralidades, até o que não é dito está
imbuído de valores que fazem com que seja do jeito que é. O currículo escolar está alicerçado
nas crenças e valores e tem direções que apontam para determinados resultados de acordo
com o contexto histórico no qual se encontra inserido.
Para Grundy (1987, apud SACRISTÁN, 2000, p. 14) “[...] o currículo não é um
conceito, mas uma construção cultural. Isto é, não se trata de um conceito abstrato que tenha
algum tipo de existência fora e previamente à experiência humana. É, antes, um modo de
organizar uma série de práticas educativas”.
36
Desta maneira, não é estranho encontrarmos perspectivas diferentes dentro de uma
mesma instituição, pois a prática escolar é complexa e formada por uma diversidade de
indivíduos que também possuem uma história de vida que não pode ser abandonada a
despeito dos objetivos educacionais. Mas é importante que elas apresentem, pelo menos, certa
coerência e não sejam manifestações divergentes dentro de um mesmo contexto escolar.
Mesmo que os professores utilizem metodologias diferenciadas e tenham experiências
também distintas em toda sua vida escolar, não é coerente que eles pratiquem concepções
contrárias à proposta teórica que a escola defende.
Quando questionamos as práticas escolares não estamos desvinculando-as das
teorias que as legitimam, mas perguntamos se os dizeres escolares estão se concretizando na
prática. Não esquecemos, portanto, que o currículo supõe uma concretização dos fins sociais e
culturais que permeiam a escola, inclusive as conquistas feitas pelos diferentes grupos que a
compõem. À medida que escolhemos um currículo estamos afirmando a concepção de homem
e mundo na qual acreditamos. A proposta curricular delineia as metas que desejamos alcançar
e os meios pelos quais poderemos fazê-lo.
Ao enfocar o tema curricular, se entrecruzam de forma inevitável no discurso as
imagens do que é essencialmente próprio no sistema escolar, se incorporam
tradições, práticas e teorias de outros sistemas, se consideram modelos alternativos
do que deveria ser a educação, a escolarização e o ensino. (SACRISTÁN, 2000, p.
16).
As tradições citadas pelo autor expressam o equilíbrio de interesses e forças que
permeiam o sistema educativo num dado momento histórico. Por isso, o currículo não pode
ser reduzido às questões de conteúdo ou metodologias, como tínhamos anteriormente numa
visão mais tradicional. Ele precisa ser visto como uma opção historicamente configurada que
se consolidou dentro de uma determinada trama cultural, social, política e escolar. Ele
apresenta-se repleto de valores que precisam ser interpretados.
Todas as finalidades que se atribuem e são destinadas implícita ou explicitamente à
instituição escolar, de socialização, de formação, de segregação ou de integração
social, etc, acabam necessariamente tendo um reflexo nos objetivos que orientam
todo o currículo, na seleção de componentes do mesmo, desembocam numa divisão
especialmente ponderada entre diferentes parcelas curriculares e nas próprias
atividades metodológicas às quais lugar. Por isso, o interesse pelos problemas
relacionados com o currículo não é senão uma conseqüência da consciência de que é
por meio dele que se realizam basicamente as funções da escola como instituição.
(SACRISTÁN, 2000, p. 17).
O importante a ser destacado não é a dicotomia entre teoria e prática, pois elas
poderão coexistir, até porque uma rotatividade considerada de professores que podem
37
discutir sobre suas práticas pedagógicas, concordando ou não com o posicionamento da
escola. O que necessita ser questionado é como se dá a construção curricular dentro do espaço
escolar, pois se cabe a um o planejamento e a outro a execução, pode-se questionar a
limitação quanto a autonomia docente.
Não é na dicotomia pedagógica entre planejadores e executores, ou entre processos e
produtos, que se vai superar as dificuldades observadas no ato educativo. Se o
planejar não estiver coerente com a perspectiva que se apresenta para o processo
ensino-aprendizagem, este, como sempre, reverenciará a dinâmica de construção
curricular que o desencadeou, reproduzindo valores, intenções e práticas nele
implícitas. Qualquer proposta concebida de forma centralizada e elitista, reservando
aos educadores o papel de executores de um plano pronto e concluído, por mais
democráticas que sejam suas intenções educacionais teóricas, não conseguirão
atingir seus objetivos práticos, pois não se institui a democracia por mandado, mas
sim pelo próprio exercício democrático. A contradição que substancia tal proposta
condena-a ao fracasso já em sua gestação. (GOUVÊA DA SILVA, 2004, p. 24-25)
Para ser democrático, o currículo escolar necessita ser construído coletivamente
para que todos se empenhem no alcance das metas estabelecidas.
Desde sua formação, a escola utiliza os princípios curriculares, explícitos ou não,
como sustentação para expressar as diferentes concepções de mundo, homem e sociedade. O
que se possui e quer alcançar é dito por meio do currículo e este oportuniza meios de se
atingir as metas propostas. Para compreendermos as intenções escolares precisamos entender
a sociedade que lhe apoia. O currículo escolar funciona de acordo com as necessidades do
contexto social e histórico.
As legislações educacionais do Brasil manifestam as concepções tanto de
currículo como de pedagogia da época em que foram discutidas e aprovadas. A concepção
tradicional e tecnicista de currículo permeava as discussões tanto da Lei 4024/61 quanto da
Reforma 5692/71. Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases em 1996 não foi
diferente, as críticas feitas tanto à concepção de currículo tradicional quanto à tendência
pedagógica tecnicista levaram às reflexões progressistas que acabaram determinando novos
rumos para a educação brasileira. As reflexões feitas para a definição da legislação foram
importantes para as discussões educacionais de uma época e o contrário também aconteceu,
pois sua implantação permitiu que as escolas a estudassem e propusessem possibilidades de
reformulação.
Concordo com Sacristán (2000) quando considera o currículo como múltiplas
práticas que não se reduzem apenas à pedagógica, mas que precisam ser questionadas quanto
a sua diversidade. Tanto a ordem política, administrativa, de produção intelectual e avaliação
são determinantes para a consolidação da proposta curricular, mas também precisam ser
38
coerentes internamente com o que se propõe, pois o currículo se traduz nas atividades
realizadas e adquire seus significados por meio delas.
Para Esteban (2004), é necessário reconhecer a heterogeneidade escolar, não
apenas incorporando positivamente a diferença ao processo pedagógico, mas procurar ancorar
as práticas em padrões menos hegemônicos:
[...] a educação que oferece um único horizonte de possibilidades a todos nos afasta
do outro com quem partilhamos o tempo escolar. O percurso único, o resultado
homogêneo e o processo linear despotencializam os exercícios escolares, que, em
lugar de promover exercícios de ser, se tornam exercícios para treinamento de
habilidades e aquisição de fragmentos descontextualizados de conhecimentos,
negando as diferenças que nos constituem e fazendo da experiência infantil e juvenil
momentos de negação, por serem mera preparação para algo que virá... (ESTEBAN,
2004, p. 160).
Quando a escola propõe objetivos que serão alcançados apenas quando os alunos
saírem dela acaba limitando as possibilidades de conquistas estudantis enquanto ali
permanecerem. O tempo escolar é rico para a busca do sentido de inclusão, pois contém em si
heterogeneidade suficiente para as mais ricas discussões. São as diferenças no ambiente
educativo que o torna tão propício à construção de significados.
Nesse sentido, as práticas educativas tanto podem promover a inclusão por meio
de metodologias e posicionamentos que valorizem os diferentes conhecimentos como podem
continuar trabalhando os conteúdos propostos pela matriz curricular no sentido vertical, sem
considerar as possibilidades estudantis e docentes.
O estudo do currículo acaba servindo de centro a outros estudos pedagógicos, pois
tudo o que acontece na escola relaciona-se com a organização e o desenvolvimento curricular.
Tanto a seleção dos professores quanto a matriz curricular e as metodologias utilizadas
refletem a concepção que a escola tem sobre a formação de homem/sociedade.
Passarei agora a um breve olhar histórico sobre o currículo tendo Pacheco (2001)
e Sacristán (2000) como principais autores.
1.2. Desenvolvimento da história curricular
Neste item é feito apenas um recorte da história que envolve o tema curricular.
Reconheço as limitações do texto, visto a gama de autores e livros escritos sobre o assunto.
Mas quando partimos o fazemos de algum lugar, preferi, então, ler e reler autores com quem
mais me identificava quanto ao entendimento de currículo.
Mesmo antes de existir uma teoria que se denominasse currículo já havia um
39
movimento no sentido de organizar o que se ensinava e o como se fazia. O texto de
Comenius, intitulado Didactica Magna, escrito em 1627, é um exemplo de interesse
consciente à questão do ensino, o qual postulava um método pedagógico que fosse eficiente,
econômico, sem fadiga, baseado em conteúdos cotidianos oportunizados a todos.
Pacheco (2001) faz uma análise histórica do campo curricular e apresenta-o como
alvo de atenção desde que surgiram os primeiros escritos sobre a educação, mas como campo
especializado surge a partir do momento em que a sociedade industrial do séc. XIX pressiona
a escolarização a cumprir finalidades mais explícitas. O termo currículo entra no vocabulário
educacional a partir do momento que a escolarização se torna uma atividade “[...] organizada,
em função de interesses sociais, culturais, econômicos e políticos”.(PACHECO, 2001, p. 22)
O autor cita Zais (1981)
6
e Hameyer (1991)
7
, que afirmam que o campo curricular
tem sua origem no movimento herbertiano (Johnn Friedrich Herbert), que dava maior atenção
à seleção e organização dos conteúdos de ensino.
Silva (1999) escreve que os estudos sobre currículo, no sentido de como o vemos
hoje, só começaram a ser utilizados recentemente, sob influência da literatura norteamericana.
E foi nos Estados Unidos que o currículo começou a ser estudado como um campo
profissional especializado. Para o autor, a consolidação desses estudos deu-se dentre as
seguintes condições:
A formação de uma burocracia estatal encarregada dos negócios ligados à educação;
o estabelecimento da educação como um objeto próprio de estudo científico; a
extensão da educação escolarizada em níveis cada vez mais altos e segmentos cada
vez maiores da população; as preocupações com a manutenção de uma identidade
nacional, como resultado das sucessivas ondas de imigração; o processo de
crescente industrialização e urbanização. (SILVA, 1999, p. 22)
Diante desta realidade, Bobbitt escreve The Curriculum, em 1918 um marco no
estabelecimento dos estudos sobre currículo. As forças econômicas, políticas e culturais do
contexto estadunidense da época exigiam uma atenção especial aos objetivos e os modelos a
serem dados à educação das massas. Para Bobbitt, as respostas às questões educacionais
deveriam ser dadas à luz da economia e respaldadas na eficiência. A escola deveria funcionar
como uma fábrica, tanto em sua organização administrativa quanto pedagógica. O autor
defendia que o ponto de partida do sistema educacional deveria ser a precisão de objetivos, os
6
ZAIS, Robert(1981). Conceptions of curriculum and the curriculum field. In H. Giroux, A. Penna e W.
Pinar(eds), Curriculum y instruction. Alternatives in education. Berkeley: MaCutchan Publishing Corporation,
pp. 31-49.
7
HAMEYER, U. (1991). The domain of curriculum studies. Curriculum theory. In Arieh Lewy (ed), op.cit., pp
19-27
40
quais estariam centrados nas habilidades necessárias à ocupação profissional a ser exercida na
idade adulta.
Bobbitt (apud SILVA, 1999, p. 24) afirma que [...] a educação, tal como a usina
de fabricação de aço, é um processo de moldagem” [...] Nesta perspectiva, não é difícil
entendermos as práticas metodológicas no início do séc. XX, cujos pressupostos eram a
formação de mão-de-obra qualificada. O que ditava a educação era a vida ocupacional adulta
e o trabalho fabril a ser realizado. Por esta razão, os especialistas em currículo tinham como
tarefa pesquisar e definir as habilidades necessárias para cada função. Após, ficava mais fácil
a definição dos conteúdos e das metodologias utilizadas para concretização daquela
aprendizagem. Era o especialista em currículo que definia também os instrumentos de
medição das habilidades aprendidas.
De acordo com este modelo, Bobbitt propõe a utilização do modelo
organizacional empresarial taylorista, pois seria esse modelo que garantiria o padrão de
eficiência dentro da escola, da mesma maneira que na fábrica:
O gestor pensa, planeja e decide; o operário executa com competência puramente
técnica que lhe é atribuída, de acordo com os moldes de qualidade também
estabelecidos externamente ao processo e de forma prévia a essa operação. A
profissionalidade do operário e do professor na transferência metafórica consiste
numa prática “normalizada” que deve desembocar, antes de mais nada, na
consecução dos objetivos propostos, definidos logicamente com precisão. A norma
de qualidade é de responsabilidade do manager, não do técnico que executa, o que,
na gestão do currículo, significa emitir regulações para o comportamento
pedagógico por parte de quem administra, que disporá de algum aparato vigilante
para garantir seu cumprimento. (SACRISTÁN, 2000, p. 45)
Tanto o operário quanto o professor deveriam alcançar os objetivos propostos
definidos com precisão pelo manager ou gestor. A visão tradicional de Currículo traz um
enfoque conteudista, cuja definição é do gestor e o cumprimento é do professor. Todo
empenho da escola está centrado na aplicação dos conteúdos que devem ser trabalhados
durante o ano. Para tanto, a precisão nos objetivos educacionais é fundamental, pois serão eles
que servirão na avaliação dos conhecimentos fundamentais adquiridos pelo aluno.
Pacheco (2001) acrescenta que em 1895 ocorre a fundação da National Society
for the Study of Education, onde debate-se as formas organizacionais curriculares, atingindo
no século XIX foros de cidadania epistemológica, sendo reconhecido como uma nova área de
conhecimento educativo no qual tem Dewey
8
, Bobitt e Tyler como principais precursores.
8
The absolute curriculum, 1900; The curriculum in elementary education, 1901; The child and the curriculum,
1902. (PACHECO, 2001, p. 22)
41
Em 1923, W. Charters publica o livro Curriculum construction, em 1924, Bobitt
lança How to make a curriculum? (PACHECO, 2001)
Nesta perspectiva, Tyler publica com Virgel Herrick, Toward improved
curriculum theory, onde salienta a necessidade de uma teoria curricular porque “o
desenvolvimento do currículo sem uma teoria tem fatais resultados e uma teoria do currículo
sem o desenvolvimento nega o fim último da teoria”.(PACHECO, 2001, p. 22-23)
Silva (1999, p. 25) analisando texto de Tyler, afirma que a organização e o
desenvolvimento do currículo precisava responder:
[...]1. que objetivos educacionais deve a escola procurar atingir?; 2. que experiências
educacionais podem ser oferecidas que tenham probabilidade de alcançar esses
propósitos?; 3. como organizar eficientemente essas experiências educacionais?; 4.
como podemos ter certeza de que esses objetivos estão sendo alcançados? As quatro
perguntas de Tyler correspondem à divisão tradicional da atividade educacional:
currículo (1), ensino e instrução (2 e 3) e avaliação (4).
Na análise de Silva (1999), para Tyler, a questão curricular era técnica e por isto
centrou sua atenção nos objetivos educacionais. Ele ampliou o sentido de Currículo que
Bobbit havia iniciado em 1918 e o concebeu como uma extensão da fábrica, na qual se podia
descrever objetivos específicos e medir com precisão o seu alcance. Tanto as aulas quanto as
avaliações e planejamentos eram pautados na concepção fabril porque era esta que servia de
modelo para a escola da época. A concepção de homem, mundo e sociedade estavam
fundamentadas nas necessidades da sociedade capitalista que estava se instaurando e, para
tanto, era imprescindível uma concepção de currículo que atendesse a essas necessidades.
Uma educação voltada à fábrica deveria aproveitar ao máximo o tempo e fazer
com que a produção fosse a maior possível. Os horários eram esquadrinhados de tal forma
que não houvesse tempo ocioso. A própria disposição dos alunos em sala de aula deveria ser
propícia a evitar distrações.
Pacheco (2001) afirma que depois desse período inicial muitas obras foram
escritas enfatizando que o “currículo enquanto instrumento de escolarização, que existe em
função de um sistema educativo, é também de natureza prática” (p. 23). A questão curricular
toma proporção de campo disciplinar especializado.
Pacheco (2001) utiliza os contributos teóricos estudados por Gonçalves
9
, Hameyer
(1991)
10
e Gimeno (1988)
11
para analisar as teorias curriculares propostas por Kemmis
9
Pacheco (2001) cita Gonçalves na pág. 33, mas o referido autor não consta das referências.
10
HAMEYER, U. (1991). The domain of curriculum studies. Curriculum teory. In Arieh Lewy(ed), op. cit.,
pp.19-27.
42
(1988)
12
técnica, prática e crítica. Mesmo sendo proposta por Kemmis, Pacheco apropria-se
dessa categorização e as conceitua. Retomarei esta categorização mais adiante, ainda neste
item.
Para Sacristán (2000, p. 37), as teorias curriculares desempenham várias funções:
[...] são modelos que selecionam temas e perspectivas; costumam influir nos
formatos que o currículo adota antes de ser consumido e interpretado pelos
professores, tendo assim, um valor formativo profissional para eles; determinam o
sentido da profissionalidade do professorado ao ressaltar certas funções; finalmente,
oferecem uma cobertura de racionalidade às práticas escolares.
Nesse sentido, essas teorias se convertem em expressões da mediação entre o
pensamento e a ação em educação. A impressão de que os professores colaboram para que os
alunos consumam o currículo não reflete a verdadeira complexidade da realidade, pois o
professorado é o primeiro destinatário do currículo.
Lundgren (apud SACRISTÁN, 2000) afirma que é impossível compreender as
teorias curriculares fora do contexto do qual procedem, pois elas se constituem para resolução
dos problemas que as definiram.
As teorias sobre o currículo se convertem em referenciais ordenadores das
concepções sobre a realidade que abrangem e passam a ser formas, ainda que
indiretas, de abordar os problemas práticos da educação. É importante reparar em
que as teorizações sobre o currículo implicam delimitações do que é seu próprio
objeto, muito diferentes entre si. Se toda teorização é uma forma de esclarecer os
limites de uma realidade, neste caso, tal função é muito decisiva, embora ainda falte
um consenso elementar sobre qual é o campo a que se alude quando se fala de
currículo. (SACRISTÁN, 2000, p. 38)
O autor faz uma aproximação, citando alguns autores que propõem concepções
curriculares, como Eisner (1974)
13
, Reid (1980, 1981)
14
, Schiro (1978)
15
, McNeil (1981)
16
,
11
GIMENO, José (1988). El curriculum: uma reflexión sobre la práctica. Madrid. Morata. Esta obra é a mesma
que utilizo reportando-me, todavia, ao último nome do autor, Sacristán (2000).
12
KEMMIS, Stephen (1988). El curriculum: más allá de la teoria de la reproducción. Madrid: Morata.
13
Propõe concepções curriculares centradas no desenvolvimento cognitivo, no currículo como auto-realização,
como tecnologia, como instrumento de reconstrução social e como expressão do racionalismo acadêmico.
(SACRISTÁN, 2000)
14
“[…] distingue cinco orientações fundamentais: a centrada na gestão racional ou perspectiva sistemática, que
se ocupa em desenvolver metodologias para cumprir com as tarefas que implica realizar um currículo sob formas
autodenominadas como racionais, científicas e lógicas; uma segunda orientação, denominada radical crítica, que
descobre os interesses e objetivos ocultos das práticas curriculares em busca de mudança social; a orientação
existencial que tem uma raiz psicológica centrada nas experiências que os indivíduos obtêm do currículo; outra
que denomina popular mais que acadêmica ou reacionária, para a qual o passado é bom, sendo conveniente sua
reprodução; e, finalmente, se destaca a perspectiva deliberativa, que acredita na contribuição pessoal dos
indivíduos para o processo de mudança como sujeitos morais que são, trabalhando dentro das condições nas
quais atuam”.(SACRISTÁN, 2000, 38-39)
15
Diferencia as ideologias curriculares: a acadêmica, da eficiência social e a centrada na criança e no
reconstrucionismo social. (SACRISTÁN, 2000)
43
Tanner e Tanner (1980)
17
e a partir delas faz um esboço de quatro grandes orientações básicas
para o desenvolvimento de seu trabalho.
A primeira é que constitui o currículo como soma das exigências acadêmicas,
caracterizada pela valorização dos conteúdos distribuídos nas disciplinas. Seu surgimento está
ligado à tradição medieval que distribuía o saber acadêmico em trivium (gramática, lógica e
retórica) e quadrivium (aritmética, geometria, astronomia e música).
É uma concepção que recolhe toda a tradição acadêmica em educação, que valoriza
os saberes distribuídos em disciplinas especializadas - ou, quando muito, em áreas
nas quais se justapõem componentes disciplinares como expressão da cultura
elaborada, transformando-as em instrumento para o progresso pela escala do sistema
escolar, agora numa sociedade complexa que reclama uma maior preparação nos
indivíduos. (SACRISTÁN, 2000, p. 39)
O currículo nesta perspectiva é visto como lista de conteúdos e está relacionado
com a própria organização do sistema escolar, que concede títulos e validações específicas de
cultura básica. Para o autor, o controle curricular torna-se mais simples, por meio da lista de
conteúdos. Expressando-se nestes termos, é mais fácil de controlar e regular do que em
qualquer outro enfoque que contenha considerações psicopedagógicas (SACRISTÁN, 2000).
A potencialização desse enfoque se pela pressão acadêmica, as necessidades
administrativas e a organização do professorado. As aulas são fragmentadas, cujas matérias
possuem tempos diferentes determinados pelo programa. “Práticas econômicas, de produção e
distribuição de meios, criam dinâmicas com uma forte incidência na prática pedagógica” [...]
(SACRISTÁN, 2000, p. 24).
A segunda grande orientação citada refere-se ao currículo como base de
experiências, aonde o método deixa de ser o meio para algum fim e torna-se “parte de um
sentido ampliado do conteúdo” (SACRISTÁN, 2000, p. 41).
As considerações nesta orientação não se limitam mais a conteúdos divididos em
disciplinas estanques, e passam a atender a outras necessidades não acadêmicas, tais como
físicas, emocionais e intelectuais. O importante do currículo passa a ser a experiência e a
recriação da cultura em termos de vivência.
O movimento “progressivo” americano e o movimento da “Escola Nova” européia
romperam neste século o monopolitismo do currículo, centrado até então mais nas
matérias, dando lugar as acepções muito diversificadas, próprias da ruptura,
pluralismo e concepções diferentes das finalidades educativas dentro de uma
sociedade democrática. (SACRISTÁN, 2000, p. 41)
16
Distingue os enfoques humanístico, reconstrucionista social, teológico e acadêmico. (SACRISTÁN, 2000)
17
Revisam a panorâmica de posições e enfoques conflitivos sobre o campo curricular.
44
O autor afirma que historicamente essa versão do currículo é mais moderna
porque se forjou como movimento de reação ao academicismo. A educação aparece para
atender o desenvolvimento integral do cidadão e, nessa perspectiva, não é possível o trabalho
apenas por conteúdos programáticos.
O currículo é visto como um conjunto de experiências planejadas que os alunos
têm sob a orientação da escola, parte de uma perspectiva pedagógica e humanista, de
atendimento às necessidades e individualidades dos alunos. Neste sentido, englobam-se as
intenções, as metodologias ou atividades elaboradas com fins pedagógicos.
Phillips (apud SACRISTÁN, 2000) afirma que a concepção de currículo como
experiência, partindo do valor das atividades, provocou um forte impacto na tradição
pedagógica e causou uma confusão e dispersão de significados num panorama que funcionava
em consenso por meio do academicismo, por ser um critério mais seguro.
Dentro desta ótica mais psicológica, promovedora de um novo humanismo, apoiado
não nas essências da cultura, mas nas necessidades do desenvolvimento pessoal dos
indivíduos, não faltam novos “místicos” e ofertas contraculturais, inclusive
expressões de um novo romantismo pedagógico que nega tudo o que não seja
oferecer atividades gratificantes por si mesmas e atender a uma pretensa dinâmica de
desenvolvimento pessoal, sendo que este é entendido como um processo de
autodesenvolvimento numa sociedade que aniquila as possibilidades dos indivíduos
e à margem de conteúdos culturais. (SACRISTÁN, 2000, p. 42)
A escola nessa visão aparece como agência socializadora e educadora total, cujas
finalidades vão além da introdução aos saberes acadêmicos, abrangendo um projeto global de
educação. Essa orientação apoia a tradição moderna em educação que ressalta a importância
dos processos psicológicos do aluno, valorizando mais os processos educativos que o produto
final.
A atenção aos processos educativos e não apenas aos conteúdos é o novo princípio
que apóia a concepção de currículo como a experiência do aluno nas instituições
escolares. o é apenas uma forma de entender o currículo, com uma ponderação
diferente de suas finalidades e componentes, mas toda uma teorização sobre o
mesmo e sobre os métodos de desenvolvimento. (SACRISTÁN, 2000, p. 42)
São as necessidades do aluno, tanto do ponto de vista de seu desenvolvimento
quanto de sua relação com a sociedade, que movimentam os projetos educativos.
A terceira orientação está associada ao legado tecnológico e eficienticista no
currículo, o qual se interessa pelos temas curriculares mais por conveniência administrativa
que por intelectualidade. Apresenta-se como um campo profissional da administração antes de
ser um campo preocupado com a psicologia ou filosofia.
45
Por isso surgem modelos de organizar e gestionar este componente do aparelho
escolar com esquemas próprios da burocracia moderna para racionalizar todo o
conjunto. O governo do currículo assimilou modelos de “gestão científica” que, se
tornando independente do quadro e do momento do qual surgem, se convertem em
esquemas autônomos que propõem um tipo de racionalidade em abstrato, acepção
que chega, inclusive, a equiparar-se a algo que é científico. Tais esquemas de gestão
de currículo ganharam autonomia como modelos teóricos para explicá-lo: a metáfora
se torna independente do referencial e gera por si mesma um marco de compreensão
de uma realidade distinta; o modelo metafórico passa a ser o modelo substantivo,
quando se esquecem sua origem e suas raízes. (SACRISTÁN, 2000, p. 45)
O currículo é visto pela profissionalização, em que os gestores planejam e os
professores executam. O êxito do trabalho depende da estimulação dada aos professores para
que desempenhem bem sua função de dar aulas e cumprir com o planejamento feito. Para o
autor, o que o taylorismo foi para a produção industrial em série, a gestão científica é para a
burocracia educacional nesta perspectiva. A eficácia, o controle, a economia na adequação de
meios a fins são os elementos-chave para o sucesso nesta orientação.
uma contradição produzida, nos sistemas educativos gestionados dessa forma,
quando surgem discursos sobre a autonomia do professor e sua independência profissional,
pois não como este educador usufruir de sua independência se não puder escolher sobre o
que irá trabalhar com os alunos.
Segundo Sacristán (2000), misturaram-se a essa teorização curricular proposições
mais psicopedagógicas, às vezes, com esquemas de racionalidade técnica, que veem nas
experiências e conteúdos curriculares a serem aprendidos pelo aluno um meio de conseguir
determinados objetivos da forma mais eficaz e científica possível. Para o autor, em outras
ocasiões, esses esquemas se justificam de forma autônoma em si mesmos, como uma técnica
própria da elaboração do currículo. A experiência escolar em sua globalidade perde seu valor
pelo enfoque eficienticista que o define pelo referencial escrito de meio-fins e que almeja
padronizar os produtos curriculares e educativos, reduzindo a simples habilidades as
competências do professor.
Dessa maneira, o currículo torna-se objeto gestionável e suas dimensões histórica,
cultural e social são perdidas de vista. A teoria curricular serve apenas para manter o controle
e não para resolver os problemas educativos que surgem no dia-a-dia escolar. Os
conhecimentos válidos, dentro dessa orientação, são as soluções dadas pelos gestores a
problemas deparados por eles.
Posição que necessariamente teve sucesso entre nós num ambiente político não-
democrático, com uma administração fortemente centralizadora e intervencionista,
onde os únicos espaços possíveis para a intervenção eram os de discutir a eficácia no
cumprimento da diretriz, antes de questionar o conteúdo e os fins do projeto; tudo
isso auxiliado pelo desarmamento intelectual no professorado (SACRISTÁN, 2000,
46
p. 46)
A perspectiva de Tyler é o exemplo mais marcante desta orientação, foi ela que
estabeleceu as bases do discurso dominante nos estudos curriculares e nos gestores da
educação. Neste viés, o currículo é composto pelas experiências de aprendizagem planejadas
e dirigidas pela escola para o alcance dos objetivos educativos.
Para Tyler (apud SACRISTÁN, 2000, p. 46):
O desenvolvimento do currículo é uma tarefa prática, não um problema teórico, cuja
pretensão é elaborar um sistema para conseguir uma finalidade educativa e não-
dirigida para obter a explicação de um fenômeno existencial. O sistema deve ser
elaborado para que opere de forma efetiva numa sociedade onde existem numerosas
demandas e com seres humanos que têm intenções, preferências...
Este currículo, portanto, define os fins, preescreve os resultados que a escola deve
priorizar. Não se preocupa com a razão pela qual os conteúdos são escolhidos, mas que
precisam ser trabalhados enquanto estiverem no programa.
A quarta e última grande orientação definida por Sacristán (2000) é a que
determina o currículo como configurador da prática. Nesta, a priorização da autonomia
profissional. O objetivo principal é fazer com que o professorado assuma-se enquanto
educador para a problematização da prática. A teoria curricular, neste sentido, contribui para
melhoria da compreensão dos fenômenos que se produzem na prática.
Segundo Sacristán (2000, p. 48), esta teoria curricular não é:
Uma teorização que busca o ascético objetivismo, que deve descobrir os valores,
as condutas e as atividades que nela se mesclam; tampouco pode ser neutra, porque,
esperando-se um guia para a prática, terá que dizer como esta deve ser e iluminar os
condicionamentos que a obscurecem, para que cumpra com uma série de finalidades.
É a condição para que este campo de teorização não seja puro discurso legitimador
de interesses que não se discute.
A prática controladora do professor não permite aos alunos o desenvolvimento da
autonomia discente. É via de mão dupla, a autonomia é desenvolvida se alicerçada por
momento de reflexão sobre a prática, por meio do diálogo.
O questionamento da falta de autonomia afeta todos aqueles que participam nas
práticas curriculares, especialmente os professores e os alunos. É pouco crível que
os professores possam contribuir para estabelecer metodologias criadoras que
emancipem os alunos quando estes estão sob um tipo de prática altamente
controladora. É preciso partir de um isomorfismo, necessário entre condições de
desenvolvimento dos alunos nas situações escolares, em certa medida, pelos
professores. (SACRISTÁN, 2000, p. 48)
47
Sacristán (2000) cita que o currículo pode contribuir para o interesse
emancipatório e nesse sentido deve ser entendido como uma práxis. Ainda que esse autor não
tenha citado Freire, percebo similitudes com a práxis freireana.
Práxis, na visão de Freire ([1996] 2001), é a estreita relação que se estabelece
entre a teoria e a prática educativa, entendendo todo ato do educador como educativo. Nesse
ínterim, a práxis pode ser compreendida como a relação que se estabelece entre o modo de
interpretar a realidade e a vida e a consequente prática que decorre desta compreensão,
levando a uma ação transformadora.
Neste sentido, a práxis opõe-se à ideia de domesticação e alienação, gerando um
processo consciente que conduza a uma ação e, a partir dela, um novo discurso para
modificabilidade da realidade observada.
A conscientização precede a ação, levando à construção de um novo mundo. A
práxis implica um conjunto de ideias capazes de interpretar um dado fenômeno ou momento
histórico que, num segundo momento, constrói um novo enunciado em que o sujeito
posiciona-se para agir sobre essa mesma realidade, modificando-a.
A preocupação pela prática curricular, nesta orientação, -se pelas contribuições
críticas sobre a educação, da análise do currículo como objeto social e da prática criada ao
redor deste. Para Sacristán (2000, p. 47), vários fatores contribuíram para que essa orientação
se constituísse:
[...] um certo declive no predomínio do paradigma positivista e suas conseqüências
na concepção da técnica, o enfraquecimento da projeção exclusivista da psicologia
sobre a teoria e a prática escolar, o ressurgimento do pensamento crítico em
educação conduzido por paradigmas mais comprometidos com a emancipação do
homem em relação aos condicionamentos sociais, a experiência acumulada nas
políticas e programas de mudança curricular, a maior conscientização do
professorado sobre o seu papel ativo e histórico [...]
Os problemas levantados pela realidade educativa e o currículo são de ordem
prática, porque a educação está ligada à práxis. Para Carr e Kemmis (apud SACRISTÁN,
2000, p. 47):
A pesquisa educativa não pode ser definida quanto aos objetivos apropriados às
atividades que se ocupam em resolver problemas teóricos, senão as que têm que
operar dentro do campo de referência dos fins práticos aos quais obedecem as
atividades educativas (...) Mais ainda, visto que a educação é uma empresa prática,
tais problemas serão sempre problemas práticos, quer dizer, ao contrário dos
teóricos, não ficam resolvidos com a descoberta de um novo saber, mas unicamente
com a adoção de uma linha de ação.
A teoria do currículo, nesta perspectiva, considera teoria e prática indissociáveis
48
para melhoria da prática educativa. Ela não é indiferente às complexas determinações de que é
objeto a prática pedagógica, nem ao papel que desempenha nas mudanças escolares e sociais.
As teorizações sobre a questão curricular se diferenciam pelo tipo de
posicionamento, pois eles se traduzirão em sistemas educativos distintos de acordo com a
posição teórica que a escola acredita. A superação da prática pedagógica existente implica
tomar partido por um quadro curricular que sirva de instrumento emancipatório para
estabelecer as bases de uma ação autônoma. Neste ínterim, a teoria ancora a prática, ela que
condições de análises das metodologias utilizadas, dos posicionamentos assumidos pelo
educador e escola.
Concordo com o autor quando ele salienta sobre a impossibilidade de o docente
poder oportunizar escolhas ao educando que ele também não possui. O diálogo, a abertura a
novas propostas educativas se consolidam se a instituição à qual pertencem esses professores
oportunizarem momentos de reflexão em que não se imponha nada. Ao contrário, momentos
de ouvidoria docente. A possibilidade de desenvolvimento da autonomia nos alunos estará
imbricada ao próprio desenvolvimento docente desta competência. Neste sentido, a educação
como uma práxis é possibilitadora de emancipação humana, pois se apoia no princípio da
dialogicidade e interdependência entre teoria e prática.
O currículo nessa orientação instrumentaliza a teoria e a prática dos professores,
fazendo-os desempenhar um papel ativo, os quais intervêm na renovação pedagógica,
tornando-se interrogadores reflexivos em sua prática.
Perante a variedade de propostas relacionadas às teorias curriculares é que
Kemmis (1988, apud PACHECO, 2001) formula as teorias técnica, prática e crítica, nas
quais mostra as diferentes perspectivas de entender o currículo e seu processo de
desenvolvimento. Retomo, então, a categorização efetuada por Pacheco.
Ouso localizar a teoria crítica de currículo citada por Kemmis (1988, apud
PACHECO, 2001) ao lado da quarta grande orientação citada por Sacristán (2000), intitulada
o currículo como configurador da prática. Esse viés, como citado anteriormente, pauta-se na
interdependência entre teoria e prática, dando valor significativo às duas ações, que para
essa concepção a prática é alimentada pelos discursos que se dizem dela. A teoria embasa a
prática pedagógica, mas é na prática que se produzem os problemas relativos à teorização.
Para Pacheco (2005), na teoria crítica o currículo deixa de ser resultado dos
especialistas ou dos professores em sua individualidade, como é na teoria prática e cnica, e
passa a ser uma busca conjunta dos educadores seguindo um viés crítico. Historicamente, ela
apresenta-se como projeto interdisciplinar, partindo do marxismo, como teoria de mudança
49
social, cuja base é a reflexividade e o interesse emancipatório dos agentes.
Nesse sentido, a teoria crítica oportuniza à realidade curricular um olhar sobre o
que estava oculto nas práticas, pois possibilita a visão reflexiva para as diversas relações que
existem quando se pensa nos conteúdos e naquilo que se faz no contexto das organizações
escolares.
As linhas de acção dos actores curriculares são delineadas por forças mais vastas que
controlam os contextos social, econômico e político, aceitando-se assim, o
argumento gramsciniano de que as lutas e conflitos culturais não são superficiais,
mas reais e cruciais na batalha da hegemonia. (PACHECO, 2005, p. 92)
A teoria crítica consiste em olhar a possibilidade de transformação da prática em
sua base por meio da orientação para emancipação e o comportamento crítico. Ela oportuniza
aos educadores olharem-se e optarem por qual perspectiva analisar a educação e a escola
como meio de emancipação ou alienação. Mostra aos atores escolares que a escola não é feita
apenas de interesses acadêmicos, mas também ocupa espaço político e econômico.
Estar do lado crítico do currículo é olhar de um modo transformador para as práticas
curriculares, sabendo-se da impossibilidade de uma mudança total e da existência de
muitos obstáculos, valorizando-se o lado marginal das escolas, cada vez mais
submetidas a uma lógica de curricularização nacional, supranacional e transnacional
em busca de padrões de qualidade, eficiência e eficácia. (PACHECO, 2005, p. 99)
O conhecimento escolar constitui-se por verdades estabelecidas social e
historicamente e a institucionalização da cultura letrada que possui posição política e
econômica, reportando-as às opções da escola na definição de conteúdos e métodos.
O currículo, na perspectiva crítica, não se limita ao interesse burocrático, como na
teoria técnica, pois de acordo com Pacheco (2001) o viés técnico estabelece uma hierarquia,
em que a teoria é que determina a prática. O currículo, na teoria técnica, define-se como
produto, resultado, organização disciplinar. Seu conceito mais corrente está ligado a um plano
de aprendizagem centrado nos conteúdos a serem ensinados e nos objetivos previamente
formulados. Pacheco (2001, p. 37) classifica algumas concepções curriculares dentro da teoria
técnica:
50
Fonte: PACHECO (2001, p. 37)
Pensar o currículo dentro da teoria cnica, segundo Kemmis (1987, apud
PACHECO, 2001), é enxergá-lo sob um discurso científico, uma organização burocrática e
uma ação tecnicista. A prática é determinada pela teoria e não é possível fugir dessa
hierarquia.
Segundo Pacheco (2001), a ação tecnicista e a organização burocrática estão
respaldadas pela ciência que legitima essas características. O autor não maiores
explicações do porquê anunciar a ciência com caráter cientificista, apenas acrescenta que a
relação teoria e prática é hierarquizada, aonde a primeira determina a segunda. Analisando a
teoria técnica neste viés, uma desconsideração pela ciência em seu caráter
problematizador. Ela define o conhecimento de forma estanque, não modificável e distribuído
em disciplinas diferentes.
O currículo, na teoria técnica, é um plano de ação pedagógica que abrange a
definição de educação pretendida, especificação das atividades de ensino, o que acaba
implicando os conteúdos escolhidos e a forma avaliativa aplicada aos alunos.
Além de contrapor-se à Técnica, a Teoria Crítica também não compactua com a
Teoria Prática, porque nesta a legitimidade se naquilo que é pragmático. Segundo Pacheco
(2001), na Teoria Prática a resolução dos problemas é realizada pela aplicação dos métodos de
forma deliberativa.
Mais do que um produto ou resultado pretendido, o currículo, para a Teoria
Prática, deve proporcionar um princípio de procedimento para o professor, dado que se
entende como algo em construção ou inacabado ou como uma ferramenta (PACHECO, 2001).
Teoria Técnica
Legitimidade normativa
Racionalidade técnica
Ideologia burocrática
Interesse técnico
Discurso científico
Organização burocrática
Ação tecnicista
Teoria → prática
Concepções de Currículo
Currículo como produto ou conteúdos organizados
em disciplinas;
Currículo como autorrealização dos alunos;
Currículo como meio tecnológico ou plano para
aprendizagem.
51
Fonte: PACHECO (2001, p. 40)
Kemmis (1987, apud PACHECO, 2001, p. 38) define a teoria prática “por um
discurso humanista, uma organização liberal e uma prática racional”. Nesse sentido, o
currículo não é definido apenas pelos especialistas curriculares e professores, mas também
pelas condições reais da prática pedagógica, pois se destaca como processo e não como
produto. “Enquanto processo, define-se como uma proposta que pode ser interpretada pelos
professores de diferentes modos e aplicada em contextos diferentes. Neste sentido, o currículo
é uma prática constantemente em deliberação e em negociação”. (PACHECO, 2001, p. 39).
Pacheco (2001, p. 39) ainda apresenta currículo na teoria prática como texto:
Assim, o currículo é um texto produzido para resolver o problema da apresentação
com estes quatro sentidos: dos materiais escritos (manuais, livros de texto...) para os
alunos; das intenções e orientações programáticas para os professores; da interacção
didáctica que existe ao nível de sala de aula e que é um texto verbal e não escrito; da
interacção escolar da qual resultam textos não verbais e não escritos.
A Teoria Crítica de Currículo define-se pelo seu interesse emancipatório, sendo
resultado dos interesses de todos que participam das atividades escolares. O que a difere da
Teoria Prática é o conceito de práxis, constituído pela ação e reflexão.
Fonte: PACHECO (2001, p. 40)
Teoria Prática
Legitimidade processual
Racionalidade prática
Ideologia pragmática
Interesse prático
Discurso humanista
Organização liberal
Ação racional
Teoria prática
Concepções de Currículo
Currículo como texto;
Currículo como projeto;
Currículo como hipótese de trabalho.
Teoria Crítica
Legitimidade discursiva
Racionalidade comunicativa
Ideologia crítica
Interesse emancipatório
Discurso dialético
Organização participativa,
democrática e comunitária
Ação
emancipatória
Teoria prática
Concepções de Currículo
Currículo como práxis;
Currículo como ação argumentativa.
52
Para Grundy (1987)
18
, o currículo precisa ser entendido como uma práxis e seguir
os seguintes princípios:
. precisa ser uma prática, sustentada pela reflexão enquanto práxis, ou seja, por
meio da ação e a reflexão. O currículo não pode apresentar-se apenas como conjunto de
planos a serem desenvolvidos, mas constituído de um processo ativo, onde planejar, agir e
avaliar apresentam-se de forma integrada;
. a formação curricular se no mundo real e não na perspectiva idealizada de
aluno ou escola;
. não coexiste com relações autoritárias de professor e aluno, sobrevive na
dialogicidade educativa;
. a práxis oportuniza o entendimento que o conhecimento se constrói histórica e
socialmente, fazendo com que tanto alunos quanto professores tornem-se participantes ativos
na construção de seu próprio conhecimento.
. a práxis oportuniza o ato de construir currículo como ato político, a partir do
momento em que ela traz sentido ao fazer educativo, oportunizando que professores e alunos
questionem sobre o que está sendo ensinado, para quem e o porquê da escolha de alguns
conteúdos em detrimento de outros.
Para Freire[1969] 2006, a práxis caracteriza-se por seu interesse emancipatório,
que busca na educação seu sentido primeiro: a humanização do homem numa ação consciente
para transformação do mundo.
Qualquer que seja, contudo, o nível em que se a ação do homem sobre o mundo,
esta ação subentende uma teoria. Tal é o que ocorre também com as formas mágicas
da ação.
Sendo assim, impõe-se que tenhamos uma clara e lúcida compreensão de nossa
ação, que envolve uma teoria, quer o saibamos ou não. Impõe-se que, em lugar da
simples “doxa” em torno da ação que desenvolvemos, alcancemos o “logos” de
nossa ação. Isso é tarefa especifica da reflexão filosófica. Cabe a esta reflexão
incindir sobre a ação e desvelá-la em seus objetivos, em seus meios, em sua
eficiência.
Ao fazê-lo, o que antes talvez não se apresentasse a nós como teoria de nossa ação,
se nos revela como tal. E, se a teoria e a prática são algo indicotomizável, a reflexão
sobre ação ressalta a teoria, sem a qual a ação (ou a prática) não é verdadeira.
(FREIRE [1969] 2006)
Por ser caracterizada pela práxis e seu interesse emancipatório, bem como por
enquadrar-se em muitas ideias marxistas e fenomenológicas (PACHECO, 2001), faço uma
aproximação da Proposta Libertadora de Paulo Freire com a Teoria Crítica de currículo. A
18
GRUNDY, Shirley. Curriculum: produto or práxis? London: The Falmer Press.Citada por Sacristán (2000, p.
48) e Pacheco (2001, p. 41).
53
práxis, de acordo com Freire ([1996] 2001), implica a teoria como um conjunto de ideias
capazes de interpretar os fenômenos ou momentos históricos, levando o sujeito a ter
consciência de seu lugar no mundo.
Por outro lado, o homem, que não pode ser compreendido fora de suas relações com
o mundo, de vez que é um “ser-em-situação”, é também, um ser do trabalho e da
transformação do mundo. O homem é um ser da “práxis”; da ação e reflexão.
Nestas relações com o mundo, através de sua ação sobre ele, o homem se encontra
marcado pelos resultados de sua própria ação.
Atuando, transforma; transformando, cria uma realidade que, por sua vez,
“envolvendo-o”, condiciona sua forma de atuar.
Não, por isto mesmo, possibilidade de dicotomizar o homem do mundo, pois que
não existe um sem o outro. (FREIRE[1969], 2006)
O conhecimento do lugar que o homem ocupa no mundo dá-se pelo fato do pensar
certo que, na visão freireana, acontece pelo ato dialógico.
Pensar certo implica a existência de sujeitos que pensam mediatizados por objeto ou
objetos sobre que incide o próprio pensar dos sujeitos. Pensar certo não é que-fazer
de quem se isola, de quem se “aconchega” a si mesmo na solidão, mas um ato
comunicante. Não por isso mesmo pensar sem entendimento o entendimento, do
ponto de vista do pensar certo, não é transferido mas co-participado. (FREIRE
[1996], 2001, p. 41)
O autor considera o homem como um ser de relações, desafiado cotidianamente
pela natureza, transformando-a com seu trabalho. Para Freire ([1996] 2001), a tarefa do
professor que pensa certo não é depositar, transferir ou doar ao outro, agindo como se os
alunos fossem os pacientes do seu pensar, mas portar-se como desafiador de quem se
comunica.
O pensar certo sabe, por exemplo, que não é a partir dele como um dado dado, que
se conforma com a prática docente crítica, mas sabe também que sem ele não se
funde aquela. A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o
movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer. O saber que a
prática docente espontânea ou quase espontânea, “desarmada”, indiscutivelmente
produz é um saber ingênuo, um saber de experiência feito, a que falta a rigorosidade
metódica que caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito. (FREIRE [1996],
2001, p. 42-43)
Neste sentido, não é a formação acadêmica que leva o professor a pensar certo ou
não, mas sua atitude diante do conhecimento e como oportuniza a construção deste com seus
alunos. O currículo construído pela práxis ressignifica dia a dia a prática por meio da
teorização e a teoria nada mais é do que a problematização do próprio processo educativo. É
pensando em sua prática que o professorado, em conjunto, busca soluções para a superação
das práticas que constituem o dia-a-dia escolar.
54
O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo
concreto que quase se confunda com a prática. O seu “distanciamento”
epistemológico da prática enquanto objeto de análise, deve dela aproximá-lo” ao
máximo. Quanto melhor faça esta operação tanto mais inteligência ganha da prática
em análise e maior comunicabilidade exerce em torno da superação da ingenuidade
pela rigorosidade. Por outro lado, quanto mais me assumo como estou sendo e
percebo a ou as razões de ser de porque estou sendo assim, mais me torno capaz de
mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade epistemológica. Não é
possível a assunção que o sujeito faz de si numa certa forma de estar sendo sem a
disponibilidade de mudar. Para mudar e de cujo processo se faz necessariamente
sujeito também. (FREIRE [1996], 2001, p. 44)
Pela sua condição ontológica de ser mais, quando o homem reconhece-se em suas
condições de humanização, torna-se sujeito e consegue colocar-se em favor dos oprimidos,
criticando e criando, refletindo e decidindo, dessa forma, transformando a realidade que o
cerca. É uma ação não individualizada, mas em comunidade com seus pares, que também se
assumiram enquanto sujeitos.
Todo ato de pensar exige um sujeito que pensa, um objeto pensado, que mediatiza o
primeiro sujeito do segundo, e a comunicação entre ambos, que se dá através de
signos lingüísticos. O mundo humano é desta forma, um mundo de comunicação.
(FREIRE [1977], 2001, p. 66)
As aulas ministradas, os recursos utilizados dizem muito sobre a concepção de
mundo e homem que o educador tem. O professor que considera os diferentes olhares não se
contenta em descrever o que pensa sobre determinado assunto. Ao contrário, ele medeia as
relações, discute posicionamentos, oportuniza enfrentamentos entre o senso comum e o saber
científico e promove a aquisição de saberes. As metodologias que utiliza poderão ou não
oportunizar a mediação e o debate entre iguais. Serão os processos metodológicos que
poderão determinar ou não o outro do processo educativo. O outro no sentido do saber ou
não-saber. Se a diversidade intelectual for considerada, a chance de exclusão educativa será
menor. Não defendo que qualquer conhecimento seja válido, mas que possam ser levados ao
diálogo, potencializados e reconstruídos, se necessário. O professor tem papel fundamental
nesse processo, o de articulador entre as necessidades educativas e os objetivos propostos em
seus planejamentos. A maneira como são conduzidos esses processos também transmitem a
concepção de currículo que tem tanto o educador quanto a instituição a que este pertence.
Para Freire ([1987] 1996) a educação bancária, ainda muito difundida nas escolas, mantém e
estimula a contradição educacional, pois nela:
a) o educador é o que educa; os educandos, os que são educados;
b) o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem;
c) o educador é o que pensa; os educandos, os pensados;
d) o educador é o que diz a palavra; os educandos, os que escutam docilmente;
55
e) o educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados;
f) o educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os que seguem a
prescrição;
g) o educador é o que atua; os educandos, os que tem a ilusão de que atuam, na
atuação do educador;
h) o educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos nesta
escolha, se acomodam a ele;
i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que
opte antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às
determinações daquele;
j) o educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos meros objetos.
(FREIRE [1987], 1996, p. 59)
Num outro viés, o de libertação destes educandos, é oportuno pensar nas
determinações feitas por Paulo Freire no sentido contrário. O educando seria aquele que
participa das decisões de conteúdos, pensa, fala e discute suas opções, reconhecendo-se
sujeito do processo educativo. No processo de diálogo não há quem saiba mais ou menos, mas
sim pessoas com diferentes olhares e possibilidades educativas e com diferentes níveis de
consciência sobre as coisas.
A educação é ato humano e como tal pode ser vista por meio do diálogo, pois
só o homem pensa, atua e descreve sobre a realidade vista, podendo contestá-la ou não.
Esse pensar, atuar e agir não é ato solitário, ao contrário, realiza-se com a co-
participação de outros homens na construção de uma nova realidade. A educação torna-se
encontro de sujeitos que buscam a significação dos significados. (FREIRE [1977], 2001).
No próximo capítulo me dedicarei a aprofundar as bases da concepção libertadora
de Paulo Freire, em especial sua noção de dialogicidade, curiosidade ingênua/epistemológica
e solidariedade.
56
II. A PROPOSTA LIBERTADORA DE PAULO FREIRE
Nenhuma pedagogia realmente libertadora
pode ficar distante dos oprimidos, quer dizer,
pode fazer deles seres desditados, objetos de
um “tratamento” humanitarista, para tentar,
através de exemplos retirados de entre os
opressores, modelos para sua “promoção”.
Os oprimidos hão de ser o exemplo para si
mesmos, na luta por sua redenção. (FREIRE
[1987] 1996, p. 41)
O presente capítulo explanará a proposta libertadora de Paulo Freire, elencando as
categorias de dialogicidade, curiosidade ingênua/epistemológica e solidariedade com o
objetivo de compará-las com as competências atribuídas ao ideal de aluno do Colégio Marista
de Criciúma, quais sejam, pesquisador, comunicador e solidário.
Para Freire não existe a educação, mas educações, ou seja, formas diferentes de os
seres humanos modificarem-se do que são para o que querem ser. Para o autor, elas podem se
resumir em duas: “bancária” ou “libertadora”.
A bancária, pautada na repetição, estímulo-resposta, torna as pessoas alienadas,
dominadas e oprimidas. A libertadora, ao contrário, oportuniza a conscientização, a
liberdade e a própria hominização.
Para a primeira perspectiva, o conhecimento é resultado do ato de “depositar
conteúdos em ‘consciências ocas’. Quanto mais ativo seja aquele que deposita e mais
passivos e dóceis sejam aqueles que recebem os depósitos, mais conhecimento haverá”
(FREIRE[1969] 2006).
Os docentes praticam uma ou outra educação, não são neutros:
[...] venho aprendendo também quão importante se faz tomar o óbvio como objeto
de nossa reflexão crítica e, adentrando-nos nele, descobrir que ele não é, às vezes,
tão óbvio quanto parece. [...] Daí a ênfase que dou [...] não propriamente à análise de
métodos e técnicas em si mesmos, mas ao caráter político da educação, de que
decorre a impossibilidade de sua neutralidade. (FREIRE [1968], 1978, p. 147-148)
Não como educar na neutralidade. A educação, seja feita de uma forma ou de
outra, estará levando os “educados” a algum lugar. Esse lugar pode ser o que está prescrito
57
nos planos ou não, mas passa pelo fazer político daquele que educa. É o que também afirma
Sacristán (2000):
Falar de neutralidade da educação é expressar uma vontade de mistificação. Com
efeito, o educador tem suas próprias ações, e as mais perigosas para uma educação
da liberdade são aquelas que se transmitem sob a cobertura da autoridade
pedagógica sem reconhecerem-se como opções. Além disso, todo sistema de
educação procede de opções, e imagens, de uma concepção do mundo, de
determinados modelos de pensamento e de ação que se procura tornar aceitos como
melhores que outros. Quando um tal sistema esconde o aspecto convencional, pode-
se dizer, arbitrário, dos esquemas que tem como tarefa fazer assimilar, está
ocultando uma prática que contribui, no fundo (as investigações o demonstram),
para favorecer os possuidores desta cultura que é a do poder [...] (FREIRE [1979],
1980, p. 77-78)
Nas relações entre professor e aluno que se mostram narrativas a determinação
explícita ou velada sobre quem é o que aprende e quem ensina. O professor explica a
realidade como se ela fosse estática, fragmentada e não passível de mudanças. O ato de
depósito para Freire é o que caracteriza a educação bancária.
Na concepção bancária da educação, o conhecimento é um dom concedido por
aqueles que se consideram como seus possuidores àqueles que eles consideram que
nada sabem. Projetar uma ignorância absoluta sobre os outros é característica de
uma ideologia de opressão. É uma negação da educação e do conhecimento como
processo de procura. O professor apresenta-se a seus alunos como seu “contrário”
necessário: considerando que a ignorância deles é absoluta, justifica sua própria
existência. Os alunos, alienados como o escravo na dialética hegeliana, aceitam a
ignorância como justificativa para a existência do professor, mas diferentemente do
escravo, jamais descobrem que eles educam o professor. (FREIRE [1979], 1980, p.
79)
A educação bancária reforça as contradições por meio de práticas opressoras, não
oportunizando o diálogo e a troca de saberes. Ao contrário, a educação libertadora traz ao
homem a consciência de sua real situação e proporciona a oportunidade de modificabilidade.
Ao contrário, a educação libertadora pauta-se no diálogo como problematizador
do próprio conhecimento em sua “indiscutível reação com a realidade concreta na qual se gera
e sobre a qual incide, para melhor compreendê-la, explicá-la, transformá-la.”(FREIRE [1969
2006, p. 52)
Nessa perspectiva, os sujeitos não constroem seus conhecimentos sozinhos, mas
em comunhão uns com os outros, pois a coparticipação dos homens no ato de pensar é
estabelecida pelo ato dialógico. A educação libertadora oportuniza a tomada de consciência
que se opera no homem enquanto agem.
Este aprofundamento da tomada de consciência, que se faz através da
58
conscientização, não é, e jamais poderia ser, um esforço de caráter intelectualista,
nem tampouco individualista.
Não se chega à conscientização por via psicologista, idealista ou subjetivista, como
tampouco se chega a ela pelo objetivismo [...].
Assim como a tomada de consciência não se dá nos homens isolados, mas enquanto
travam entre si e o mundo relações de transformação, assim também somente
pode a conscientização instaurar-se. (FREIRE [1969] 2006).
Freire não coloca a conscientização como poder mágico a ser utilizado para
resolução de todos os problemas, pois sendo vista assim também se constitui como mito. Em
vez disso, ela serve como dimensão de base para a ão reflexiva, por meio da práxis: “[...]
não será demasiado repetirmos, a conscientização, que não pode dar-se a não ser na práxis
concreta, nunca numa práxis que se reduzisse à mera atividade da consciência, jamais é
neutra. Como neutra, jamais pode ser a educação.”(FREIRE [1969] 2006).
O diálogo, dessa maneira apresenta-se importante, porque não dicotomiza a aula
em momentos distintos, atribuindo a um o que sabe e a muitos os que aprendem. É necessário
um esforço por parte do educador que se propõe ao diálogo, porque precisam apropriar-se da
educação em seu sentido amplo e não apenas como memorização de conteúdos.
2.1. Curiosidade ingênua/epistemológica
A prática docente crítica, implicante do
pensar certo, envolve o movimento dinâmico,
dialético, entre o fazer e o pensar sobre o
fazer. O saber que a prática docente
espontânea ou quase espontânea,
‘desarmada’, indiscutivelmente produz é um
saber ingênuo, um saber de experiência feito, a
que falta a rigorosidade metódica que
caracteriza a curiosidade epistemológica do
sujeito (FREIRE, [1996] 2001, p. 43).
A curiosidade é vista por Paulo Freire como necessidade ontológica que
caracteriza o processo de criação e recriação da existência humana, dado seu inacabamento.
Mas apenas quando ultrapassa os limites peculiares do domínio vital que ela torna-se
produtora de conhecimento: “[...] é enquanto epistemologicamente curiosos que conhecemos,
no sentido de que produzimos conhecimento e não apenas mecanicamente o armazenamos na
memória. (FREIRE, 1994a, p. 148)
Para o autor, foi esta capacidade de olhar curiosamente o mundo que tornou os
seres humanos capazes de agir sobre a realidade para transformá-la, transformando
59
igualmente a qualidade da própria curiosidade, de ingênua à epistemológica. Freire ([1964]
2008) afirma que a educação oportuniza e sentido aos seres humanos verem-se de acordo
com sua verdadeira vocação.
O conhecimento não é o ato por meio do qual os sujeitos são transformados em
objeto, recebendo de forma dócil e passiva os conteúdos que outro lhe ou impõe. Pelo
contrário, exige presença curiosa do sujeito em face do mundo, exigindo sua ação
transformadora sobre a realidade. Implica em invenção e reinvenção.(FREIRE [1969], 2006).
Freire discorre sobre a consciência intransitiva, transitiva ingênua e transitiva
crítica e descreve que para a superação de uma para a outra é imprescindível relações
educativas dialogais. Para isso, a educação pauta-se na reflexão radical sobre a necessidade
ontológica do homem de ser mais, e para isso o sujeito necessita se situar no mundo, sendo
necessária a curiosidade na busca de saber mais para sua própria transformação.
Esse saber não se nutre no sectarismo, no posicionamento fechado pelo
antidiálogo. Ao contrário, é alimentado pela radicalização, que é crítica e criadora:
É que a sectarização é sempre castradora, pelo fanatismo de que se nutre. A
radicalização, pelo contrário, é sempre criadora, pela criticidade que a alimenta.
Enquanto a sectarização é mítica, por isso alienante, a radicalização é crítica, por
isto libertadora. Libertadora porque implicando o enraizamento que os homens
fazem na opção que fizeram, os engaja cada vez mais no esforço de transformação
da realidade concreta, objetiva. (FREIRE [1987] 1996, p. 25).
Segundo o autor, a radicalização amplia os horizontes dos sujeitos por apresentar
a eles sua própria libertação, pois não se deixa prender em círculos de segurança, nos quais
aprisione também a realidade e dessa forma impeça a transformação da realidade. Para
Freire([1987] 1996) o homem radical:
Não teme enfrentar, não teme ouvir, não teme desvelamento com ele, de que resulta
o crescente saber de ambos. Não se sente dono do tempo, nem dono dos homens,
nem libertador dos oprimidos. Com eles se compromete, dentro do tempo, para com
eles lutar. (FREIRE [1987] 1996, p. 27)
É o posicionamento radical alicerçado no diálogo que oportuniza ao homem a
superação de uma consciência à outra, da instransitiva para a transitiva ingênua e
posteriormente à crítica.
Por intransitividade de consciência, o autor define a condição do ser humano que
está imerso em sua realidade e que ainda não tem a capacidade de objetivá-la. É o grau de
consciência característico de sociedades fechadas, cujos sujeitos não ultrapassam o horizonte
biológico.
60
Uma comunidade preponderantemente “intransitivada” em sua consciência, como o
era a sociedade “fechada” brasileira, se caracteriza pela quase centralização dos
interesses do homem em torno da formas mais vegetativas de vida. Quase que
exclusivamente pela extensão do raio de captação a essas formas de vida. Suas
preocupações se cingem mais no que há nele de vital, biologicamente falando. Falta-
lhe teor de vida em plano mais histórico. [...] Esta forma de consciência representa
um quase incompromisso entre o homem e sua existência. (FREIRE [1964], 2008, p.
67)
Mas, potencialmente dotada de força de transcendência, a consciência humana
continua aberta, podendo superar gradativamente a intransitividade e ampliar seu campo de
percepção. Na medida em que o homem amplia o seu poder de captação e respostas às
questões que partem de seu contorno e aumenta o seu poder de dialogação, o que era
intransitivo deixa de ser e torna-se transitivo, pois seus interesses abrangem mais do que
apenas a questão vital.
Ao contrário da intransitiva, a consciência transitiva ingênua percebe a
contradição social, mas ainda se move nos limites do conformismo, adotando explicações
fabulosas para os fenômenos. Não se arrisca na investigação das causas verdadeiras, portanto,
não tem capacidade de pensar autonomamente, buscando a modificabilidade social. Por ser
uma consciência dependente, responsabiliza os outros e as instituições por sua situação.
Isso significa que a consciência transitiva não é imediatamente, nem
necessariamente, crítica. No primeiro momento do transito ela ainda é ingênua,
caracterizando-se pela interpretação simplificadora dos problemas e por imaginar
que o passado foi melhor do que o presente, além de subestimar a si mesma. A
consciência transitiva ingênua tende ao gregarismo e à massificação. Pelo fato de
satisfazer-se com explicações fabulosas e conduzir-se pela emoção, ela tem
dificuldades para o diálogo, para a argumentação racional e, com freqüência,
mostra-se irracionalmente sectária e fanatisma. (KRONBAUER, 2008, p. 98)
Por meio do diálogo, a consciência pode elevar-se à condição de consciência
crítica, que se caracteriza pela profundidade com que interpreta os problemas e pelo
engajamento sociopolítico. É a prática do diálogo que leva à reflexão, à curiosidade e é por
meio dele que se recebe o novo, “não apenas porque novo e pela não-recusa ao velho,
porque velho, mas pela aceitação de ambos, enquanto válidos. Por se inclinar sempre a
argüições”.(FREIRE [1964], 2008, p. 70).
Para Freire, a posição transitivamente crítica:
[...] implica num retorno à matriz verdadeira da democracia. Daí ser transitividade
crítica característica dos autênticos regimes democráticos e corresponder a formas
de vida altamente permeáveis, interrogadoras, inquietas e dialogais, em oposição a
formas de vida “mudas”, quietas e discursivas [...] (FREIRE [1964], 2008, p. 70)
61
A prática democrática torna-se necessária dentro e fora da escola para que se
atinja esse tipo de consciência e para que o que é apenas ato curioso, próprio da condição
ontológica do homem, torne-se curiosidade epistemológica. A superação dos indivíduos se
concretiza pela própria superação educativa, pois uma educação que se diz neutra, como o faz
o bancarismo, não problematiza o homem diante do mundo porque não possui esse
compromisso.
Mas, a curiosidade epistemológica a que, tomando distância do objeto, dele se
“aproxima” com ímpeto e o gosto de desvelá-lo. E essa curiosidade fundamental
ainda não basta. É preciso que, servindo-nos dela, que nos “aproxima” do texto para
seu exame, a ele nos demos também ou a ele nos entreguemos. Para isso, é
necessário que evitemos igualmente outros medos que o cientificismo nos inoculou.
O medo, por exemplo, de nossos sentimentos, de nossas emoções, de nossos desejos,
o medo de que ponham a perder nossa cientificidade. O que eu sei, sei com meu
corpo inteiro: com minha mente crítica mas também com meus sentimentos, com
minhas intuições, com minhas emoções. O que eu não posso é parar satisfeito ao
nível dos sentimentos, das emoções, das intuições. Devo submeter os objetos de
minhas intuições a um tratamento sério, rigoroso mas nunca desprezá-los. (FREIRE
[1987] 1997, p. 42-43)
No entender de Freire, a curiosidade epistemológica é aquela que, ao viabilizar a
tomada de distância do objeto, transcendendo seus limites de cotidianeidade, pode produzir
conhecimento.
É que o processo de aprender, em que historicamente descobrimos que era possível
ensinar como tarefa não apenas embutida no aprender, mas perfilada em si, com
relação a aprender, é um processo que pode deflagrar no aprendiz uma curiosidade
crescente, que pode torná-lo mais e mais criador. O que quero dizer é o seguinte:
quanto mais criticamente se exerça a capacidade de aprender tanto mais se constrói e
desenvolve o que venho chamando “curiosidade epistemológica”, sem a qual não
alcançamos o conhecimento cabal do objeto. (FREIRE [1997] 2001, p. 27)
Nesse sentido, a curiosidade epistemológica não é qualquer curiosidade, mas é a
que está aliada ao difícil, mas prazeroso, ato de estudar. Ela é própria da consciência crítica,
desenvolvendo-se num processo de conscientização. Para promoção de uma curiosidade à
outra, ingênua à epistemológica, é preciso rigorosidade metódica, representando um desafio
aos educadores, pois no dia-a-dia de sala de aula, é necessário fomentar o desejo de aprender.
Ao teorizar uma proposta de educação voltada à problematização, Freire ([1987]
1996) destaca que a libertação não consiste em uma doação às camadas dominantes, mas
concretiza-se como resultado da construção da consciência. De acordo com o autor, a
educação bancária pauta-se na narração alienada e alienante sob a perspectiva de educar para
submissão, ou crença de uma realidade estática. No bancarismo, trabalha-se com a perspectiva
de um sujeito acabado, concluso e a educação legitima um currículo pautado na verticalidade.
62
A educação, neste sentido (SARTORI, 2008, p. 152): “[...] inibe o poder de criar próprio dos
educandos, camuflando qualquer possibilidade de refletir acerca das contradições e dos
conflitos emergentes do cotidiano em que se insere a escola, o aluno”.
O bancarismo subordina educador e educando, reprimindo a curiosidade e
desestimulando a capacidade de desafiar-se, tornando o educando sujeito passivo e
impossibilitando-o de atingir a curiosidade epistemológica que:
[...] não é qualquer curiosidade, mas é a que está ligada ao difícil, mas prazeroso, ato
de estudar. É a própria consciência crítica e se desenvolve no processo de
conscientização. A promoção da curiosidade ingênua à curiosidade epistemológica
requer o desenvolvimento da rigorosidade metódica e representa um desafio à
formação de educadores/as. (FREITAS, 2008, p. 118)
Para a superação da curiosidade ingênua faz-se necessária uma educação
problematizadora, pois está fundada na crença da humanização dos educadores e dos
educandos. Em razão disso, a função do educador que problematiza os conteúdos ensinados é
a de possibilitar aos educandos condições para que ocorra a superação do conhecimento de
um nível a outro.
Quanto mais se problematizam os educandos, como seres no mundo e com o mundo,
tanto mais se sentirão desafiados. Tão mais desafiados, quanto mais obrigados a
responder ao desafio. Desafiados, compreendem o desafio na própria ação de captá-
lo. Mas, precisamente porque captam o desafio como um problema em suas
conexões com os outros, num plano de totalidade e não como algo petrificado, a
compreensão resultante tende a tornar-se crescentemente crítica, por isso, cada vez
mais desalienada. (FREIRE [1987], 1996, p.70)
Freire ([1964] 2008) afirma que o educador precisa optar a educação pretendida.
Esta opção pode ser para a alienação ou libertação de si e dos educandos. Sua capacidade
criadora e criativa desenvolve-se por meio das problematizações as quais está submetido e
submete os educandos. Submissão não de autoridade, mas de parceria, de troca de saberes e
perspectivas. Para o autor, o poder de decisão do ser humano é desenvolvido na medida em
que ele o exerce.
2.2. Princípio ontológico da dialogicidade
Ditamos idéias. Não trocamos idéias.
Discursamos aulas. Não debatemos ou
discutimos temas. Trabalhamos sobre o
educando. Não trabalhamos com ele.
Impomos-lhe uma ordem a que ele não adere,
mas se acomoda. Não lhe propiciamos meios
63
para o pensar autêntico, porque recebendo as
fórmulas que lhe damos, simplesmente as
guarda. Não as incorpora porque a
incorporação é o resultado de busca de algo
que exige, de quem tenta, o esforço de
recriação e de procura. Exige reinvenção.
(FREIRE [1964], 2008, p. 104-105)
Para Freire ([1987] 1996), as relações entre educador e educando na prática
bancária são determinadas por sua característica narrativa/dissertativa, apresentando um
caráter como “algo quase morto” e tendendo à “petrificação”.
A realidade não é estática e, por não possuir esta característica, não como
explorá-la de forma compartimentada sem experenciar diferentes perspectivas, tanto de
educandos quanto de educadores. Freire ([1987] 1996) propõe uma educação voltada à
dialogicidade, definindo-a essência da educação como prática da libertação, descrita na ação e
reflexão dos homens sobre o mundo, para juntos transformá-lo. A relação professor x aluno,
citada pelo autor como bancária, dá-se pelo fato de os educadores tratarem os educandos
como recipientes vazios que precisam ser cheios pelos conteúdos escolares.
Conteúdos que são retalhos da realidade desconectados da totalidade em que se
engendram e em cuja visão ganhariam significação. A palavra, nestas dissertações,
se esvazia da dimensão concreta que devia ter ou se transforma em palavra oca, em
verbosidade alienada e alienante. Daí que seja mais som que significação e, assim,
melhor seria não dizê-la. (FREIRE [1987], 1996, p. 57)
Os conteúdos dentro dessa realidade tornam-se ocos por não apresentarem
significados que os legitimem, eles existem apenas para preencher um quadro de conteúdos
que terão que ser trabalhados para que o ano letivo possa ser convincente. Nesta
perspectiva, há um que ensina e muitos que apenas aprendem.
A certificação de que os conteúdos foram aprendidos se dá por meio dos
extratos denominados “avaliação”, que provarão o que o aluno aprendeu ou deixou de
aprender.
Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os
educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis
a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se
oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los.
Margem para serem colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam. No
fundo, porém, os grandes arquivados são os homens nesta (na melhor das hipóteses)
equivocada concepção “bancária” da educação. Arquivados, porque fora da busca,
fora da práxis, os homens não podem ser. Educador e educandos se arquivam na
medida em que, nesta distorcida visão de educação, não criatividade, não
transformação, não saber. existe saber na invenção, na reinvenção, na busca
64
inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e
com os outros. Busca esperançosa também. (FREIRE [1987], 1996, p. 58).
Na negação das trocas de conhecimento professor/aluno, aluno/aluno a escola
acaba não oportunizando o exercício do diálogo, e deixando de formar agentes
comunicadores. A sala de aula perde a oportunidade de trabalhar com a riqueza das
contradições pelo fato de ficar apenas nas certezas, comunicadas verticalmente, não
promovendo uma relação horizontal entre professores e alunos.
Para Freire ([1987] 1996), a educação bancária contribui para a
“domesticação” pelo fato de não discutir, nem problematizar, e apenas legitimar as
verdades estabelecidas. A falta de diálogo apenas incentiva os educandos a acreditarem
que existe uma única perspectiva válida para cada conteúdo aprendido.
Para o professor que acredita numa concepção bancária é impossível utilizar o
diálogo, que este é “[...] uma relação horizontal de A com B [...] Nutre-se do amor, da
humildade, da esperança, da fé, da confiança” (FREIRE [1964], 2008, p. 115).
É por essa razão que o autor afirma que só o diálogo consegue comunicar algo,
pois é por meio dele que se instala uma relação de simpatia que permite tanto o educando
quanto o educador a educarem-se mutuamente.
“O diálogo é, portanto, o indispensável caminho”, diz Jaspers, “não somente nas
questões vitais para nossa ordenação política, mas em todos os sentidos do nosso
ser. Somente pela virtude da crença, contudo, tem o diálogo estímulo e significação:
pela crença no homem e nas suas possibilidades, pela crença de que somente chego
a ser eu mesmo quando os demais cheguem a ser eles mesmos”. (FREIRE [1964],
2008, p. 116)
Para Freire ([1987] 1996), a dialogicidade é a essência da educação como prática
da liberdade, valor máximo da educação problematizadora. Diálogo implica pronunciar a
palavra, e esta traz consigo as dimensões mutuamente implicadas de ação e reflexão. “Não
palavra verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira seja transformar o
mundo” (FREIRE [1987], 1996, p. 77). Porque a vocação ontológica do homem é “ser mais”,
“existir, humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo pronunciado, por sua
vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar”
(FREIRE [1987], 1996, p. 78). Assim, todos podem dizer a palavra, porque é condição da
existência humana, e não privilégio de alguns. “Precisamente por isto, ninguém pode dizer a
palavra verdadeira sozinho, ou dizê-la para os outros, num ato de prescrição, com o qual
rouba a palavra aos demais” (FREIRE [1987], 1996, p. 78). Desta forma, “o diálogo é este
65
encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo [...]”, e pelo diálogo, os
homens ganham significado enquanto homens, sendo-lhe uma exigência existencial. (FREIRE
[1987], 1996, p. 78).
Freire parte da concepção fenomenológica de intencionalidade da consciência
para demonstrar que o mundo não está dentro do homem, ele é externo a ele, a consciência se
relaciona com o mundo, pois é sempre consciência de algo, que está fora dela mesma,
portanto, a consciência transcende ao homem. De outro lado, o inacabamento do homem o
situa sempre como um ser em construção. Homem e mundo são inacabados e, numa
perspectiva materialista histórica, dialeticamente implicados, uma vez que o homem constrói
o mundo no exato movimento de se construir e vice-versa. O homem, inacabado, é construtor
da história e com o mundo externo a ele se relaciona com o mundo. É sua vocação ontológica
o ser mais, no sentido de humanizar-se, situar-se no mundo e superar-se.
Mas ele não faz isso isoladamente, e sim, em comunhão com outros homens, que
têm a mesma condição dele. Por isso o diálogo é o encontro dos homens mediatizados pelo
mundo. Nesse sentido, impedir o diálogo é desumanizar o homem. A educação
problematizadora é aquela pautada na dialogicidade, na comunhão dos homens para entender
e modificar o mundo, necessariamente dependente da palavra de todos os envolvidos no
processo educativo, onde a polaridade educador e educando lugar ao educador-educando e
ao educando-educador. Ao contrário da “educação bancária”, em que não diálogo, pois
um entendimento de que a palavra pode ser pronunciada por quem tem algo a dizer”,
neste caso, o educador, que “deposita” no educando a palavra verdadeira. A conscientização
implica, então, a perene leitura e ação sobre o mundo, atingindo-se formas críticas de
enxergá-lo e de se posicionar, alcançada em situação de diálogo.
Freire diz, no entanto, no livro que escreveu no início da ditadura militar
(Educação com prática da liberdade), que o Brasil tem uma história antidemocrática, ou seja,
desde os tempos coloniais, passando pela República e chegando ao Golpe Militar, o Brasil
não viveu experiências hegemônicas de democracia, e sim, num contexto de uma cultura do
silêncio, avessa, portanto, ao diálogo. Como veremos adiante, o Brasil estaria em um estado
de transitividade ingênua, isto significando que já teria ultrapassado a intransitividade, mas
ainda não teria chegado à transitividade crítica. Por isso, é necessário promover experiências
de diálogo, para que as pessoas possam se vivenciar nele, e assim possam enxergar o mundo
de outra forma e a si mesmas com outras possibilidades.
Para encontrar a essência do diálogo, segundo Freire ([1987] 1996, p. 7), é
necessário entendermos seus elementos constitutivos, e nessa busca o autor revela duas
66
dimensões: a ação e a reflexão que são indissociáveis “Não palavra verdadeira que não
seja práxis”.
Para que seja verdadeira, a palavra precisa ser autêntica e estar colocada com a
ação, o que significa ter significado primeiro para quem a diz. De outra forma é mero
“verbalismo”. Ela compromete-se com a transformação do que é dito porque foi
transformada, também denunciando a alienação. Por outro lado, a ação sem a palavra
torna-se ativismo e impossibilita o diálogo porque não é produzida na práxis. Para Freire
([1987] 1996), tanto o ativismo quanto o verbalismo legitimam sua matriz, baseada na ação
e palavração por elas mesmas, sem compromisso entre ambas.
Existir humanamente para Freire ([1987] 1996, p. 78) é pronunciar o mundo, ver-
se nele e ser dele participante como sujeito de transformação. “O mundo pronunciado, por sua
vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar”.
Dizer a sua palavra, expressar por meio do diálogo seu texto é direito de todos.
Por isso, como apontado, a palavra não é dita sozinha, mas com os outros. Para o autor,
dizer a sua palavra não é roubar de outros, mas dizer com os outros aquilo que precisa ser
dito. O diálogo não se limita a eu-tu, mas é comunhão entre nós-eles e com o mundo, que
precisa ser modificado.
Para que haja diálogo, é necessário que não exista relação de dominação entre os
que dialogam, pois, se assim for, o que existe não é diálogo e, sim, palavração.
Esta é a razão por que não é possível o diálogo entre os que querem a pronúncia do
mundo e os que não a querem; entre os que negam aos demais o direito de dizer a
palavra e os que se acham negados deste direito. É preciso primeiro que, os que
assim se encontram negados no direito primordial de dizer a palavra, reconquistem
esse direito, proibindo que este assalto desumanizante continue”. (FREIRE [1987]
1996, p. 79)
Para Freire ([1987] 1996), é dizendo sua palavra que os homens humanizam-se e é
o diálogo que proporciona esse caminho, tornando-se exigência existencial. Portanto, dialogar
não se constitui no ato de trocar ideias ou depositar no outro aquilo que eu penso ser verdade,
mas ao contrário, é ato de busca solidária, consistente e que se compromete com o mundo.
A conquista por meio do diálogo, elencada pelo autor, é encontro de criação, feito
pelos homens e para eles. É o diálogo que permite ao homem olhar o mundo e sua existência
como processo e realidade inacabada e que se modifica constantemente. A possibilidade
dialógica permite repensar a vida em sociedade, oportunizando o direito de assumirmos nossa
posição diante do que vemos.
67
O compromisso do ato dialógico é encharcado de amor, que, para Freire,
materializa-se no sentido de compromisso com o outro, que acontece cheio de solidariedade,
no viés da doação de si e humildade, que não significa submissão, mas possibilidade de ouvir
o que o outro tem a dizer. Tendo amor, não relação de dominação, pois esse sentimento
compactua apenas com a libertação da opressão.
Somente com a supressão da situação opressora é possível restaurar o amor que nela
estava proibido.
Se não amo, o mundo, se não amo a vida, se não amo os homens, não me é possível
o diálogo.
Não há, por outro lado, diálogo, se não humildade. A pronúncia do mundo, com
que os homens o recriam permanentemente, não pode ser um ato arrogante.
O diálogo, como encontro de homens para a tarefa comum de saber agir, se rompe,
se seus pólos (ou um deles) perdem a humildade. (FREIRE [1987] 1996, p. 80)
Não há, para o autor, sábios ou ignorantes absolutos, mas homens, que
mediatizados pelo mundo, transformam e são transformados uns com os outros. Para que
ocorra esse processo é necessária humildade de reconhecer que o outro é um ser de doação,
pois todos dizem algo do lugar em que estão.
Além do amor e da humildade, Freire cita que para que haja diálogo é preciso ter
nos homens, pois se não se possibilidade de mudança nos homens e no mundo não
diálogo, pois pressupondo que não haverá modificabilidade não se intensifica o ouvir e o dizer
a sua palavra.
O homem dialógico tem nos homens antes de encontrar-se frente a frente com
eles. Esta, contudo, não é uma ingênua fé. O homem dialógico, que é crítico, sabe
que, se o poder de fazer, de criar, de transformar, é um poder dos homens, sabe
também que podem eles, em situação concreta, alienados, ter este poder prejudicado.
Esta possibilidade, porém, em lugar de matar no homem dialógico a sua nos
homens, aparece a ele, pelo contrário, como um desafio, ao qual tem de responder.
Está convencido de que este poder de fazer e transformar, mesmo que negado em
situações concretas, tende a renascer. Pode renascer. Pode constituir-se. Não
gratuitamente, mas na e pela luta por sua libertação. Com a instalação do trabalho
não mais escravo, mas livre, que dá a alegria de viver. (FREIRE [1987] 1996, p. 81)
Para o autor, se não houver fé nos homens, o diálogo é uma farsa, pois se
transforma em “manipulação adocicadamente paternalista”. (FREIRE [1987] 1996, p. 81)
Fundado no amor, humildade e nos homens, o diálogo inspira confiança e faz-
se numa relação horizontal. Essa confiança implica o testemunho que o sujeito aos outros
sobre suas reais intenções e só pode existir se a palavra coincide com os atos daquele que quer
se comunicar.
Além do amor, da humildade e fé, o diálogo é também composto de esperança,
68
pois esta reside na própria imperfeição dos homens, “levando-os a eterna busca”.
O desespero é uma espécie de silêncio, de recusa do mundo, de fuga. No entanto a
desumanização que resulta da “ordem” injusta não deveria ser uma razão de perda
da esperança, mas, ao contrário, uma razão de desejar ainda mais, e de procurar sem
descanso, restaurar a humanidade esmagada pela injustiça. (FREIRE [1987] 1996, p.
82)
A esperança que o autor destaca não é inerte e não produz encontros estéreis,
mas uma esperança que luta para a emancipação humana.
A esperança é, para o autor, necessidade ontológica e imperativo excepcional e
histórico. A desesperança, ao contrário, é a esperança que perdeu a razão de ser. O que
Freire propõe é que o educador cuide da esperança para que não vire desesperança, que
ela é geradora de uma realidade distinta. A esperança precisa estar vinculada à criticidade,
pois é a crítica que não permite uma esperança ingênua.
Freire ([1987] 1996) acrescenta como essência ao verdadeiro diálogo a
criticidade que reconhece nas singularidades humanas a riqueza de saberes e a
“inquebrantável solidariedade”. Esse pensar crítico entende a realidade como processo e
opõe-se ao pensar ingênuo que se acomoda diante do tempo histórico como se fosse
estático.
Somente o diálogo, que implica um pensar crítico, é capaz também de gerá-lo.
Sem ele não comunicação e sem esta não verdadeira educação. A que
operando superação da contradição educador-educandos, se instaura como situação
gnosiológica, em que os sujeitos incidem seu ato cognoscente sobre o objeto
cognoscível que os metiatiza. (FREIRE [1987], 1996, p. 83)
Para que haja diálogo é necessária rigorosidade metodológica também. O
educador não inicia o diálogo ao se encontrar com o educando dentro ou fora de sala de
aula. O conteúdo do diálogo nasce bem antes desse encontro e é fruto da reflexão do
educador que o propõe. Sob uma proposta dialógica, a organização se dá para promoção do
diálogo e não pela necessidade de saber sobre o que se irá dissertar.
Na educação bancária, o dissertador programa antes para poder explicar “tudo”
sem esquecer de nenhum tópico. Não há perguntas a serem respondidas no ato pedagógico,
pois o educador já as respondeu antes mesmo de iniciar sua aula. Para o educador bancário,
o conteúdo programático da educação é uma doação sua a outros.
Nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão de mundo, ou tentar impô-la a
69
ele, mas dialogar com ele sobre a sua e a nossa. Temos de estar convencidos de que
a sua visão do mundo, que se manifesta nas várias formas de sua ação, reflete a sua
situação no mundo, em que se constitui. A ação educativa e política não pode
prescindir do conhecimento crítico dessa situação, sob pena de se fazer bancária”
ou de pregar no deserto. (FREIRE [1987] 1996, p. 87)
É por meio da realidade mediatizadora que o educador escolhe os conteúdos
sobre os quais irá dialogar. É por meio do diálogo que os saberes podem ser
democratizados. Em seu discurso sobre a alfabetização popular, Freire traça linhas que
podem ser utilizadas em todas as escolas. Seu olhar condições de ampliação das
capacidades não apenas relacionadas à cultura, mas à própria experiência humana,
vivenciada sob diferentes perspectivas.
A educação bancária legitima a contradição social, pois é determinista em seus
preceitos. Ela é ato de depósito e transferência promovendo a cultura do silêncio. Em
contrapartida, a educação dialógica dá espaço a trocas de saberes e liberta o indivíduo para
que ele encontre seu lugar no mundo.
O diálogo enfatizado por Freire encontra-se num viés crítico, pois propõe a
problematização do dado, fechado, dito verdadeiro. A problematização nasce do diálogo,
na escuta, uma vez que se entende o ser humano como aquele que precisa ser ouvido e
considerado.
Não é fácil promover o diálogo num lugar de caráter discursivo como a escola.
A educação “bancária”, em cuja prática se a inconciliação educador-educandos,
rechaça este companheirismo. E é lógico que sejam assim. No momento em que o
educador “bancário” vivesse a superação da contradição não seria “bancário”. Já
não faria depósitos. Já não tentaria domesticar. não preescreveria. Saber com os
educandos, enquanto estes soubessem com ele, seria sua tarefa. não estaria a
serviço da desumanização. A serviço da opressão, mas a serviço da libertação.
(FREIRE [1987], 1996, p. 62)
O bancarismo não se dá por culpa do professor, mas promovido pelo modelo escolar.
O educador não pode imprimir modelos educacionais distanciados da concepção na qual a
escola acredita. Nem todos os aspectos da educação bancária são explícitos, alguns
apresentam aparência de neutralidade, pois é próprio da educação bancária parecer assim.
O antidiálogo, por exemplo, pode não ser discursivo, mas acontecer na prática, passando
uma impressão de que os homens apenas estão no mundo como espectadores descartando
seu caráter histórico e a historicidade dos homens. O diálogo é o contrário disto:
Por isto mesmo é que os reconhece como seres que estão sendo, como seres
70
inacabados, inconclusos, em e com uma realidade que, sendo histórica também, é
igualmente inacabada. Na verdade, diferentemente dos outros animais, que são
apenas inacabados, mas não são históricos, os homens se sabem inacabados. Têm a
consciência de sua inconclusão. se encontram as raízes da educação mesma,
como manifestação exclusivamente humana. Isto é, na inconclusão dos homens e na
consciência que dela têm. Daí que seja a educação um quefazer permanente.
Permanente, na razão da inconclusão dos homens e do devir da realidade. (FREIRE
[1987], 1996, p. 72-73)
Vista desta maneira, a educação se refaz na práxis e sua duração se dá no “jogo
dos contrários permanência-mudança” (FREIRE [1987], 1996). Ela opõe-se à ideia de
permanência porque reforça a mudança por meio do diálogo.
A práxis contraria a domesticação e alienação e gera um processo de atuação
consciente que conduz a um discurso sobre a realidade para modificá-la. A conscientização
gera ações que levam à construção de outro mundo conceitual em que o homem torna-se
sujeito e passa a atuar no mundo em que está inserido. A práxis caracteriza-se como um
conjunto de ideias capazes de interpretar um momento histórico ou um dado fenômeno,
que, posteriormente, torna-se outro enunciado, em que o indivíduo profere sua palavra
sobre o que vê e passa a agir para transformação dessa mesma realidade e essa ação
potencializa um novo pensar. A partir do instante em que alguém se conscientiza de seu
lugar no mundo, sua transformação torna-se possível.
Neste ínterim, o ato educativo torna o educando dono de sua palavra, pois é
ação de libertação de consciência, que posteriormente torna-se libertação social, gerada por
um pensamento dinâmico presente numa sociedade também em devir permanente.
2.3. Solidariedade
Se, na verdade, o sonho que nos anima é
democrático e solidário, não é falando aos
outros, de cima para baixo, sobretudo, como
se fôssemos os portadores da verdade a ser
transmitida aos demais, que aprendemos a
‘escutar’, mas é ‘escutando’ que aprendemos a
‘falar com eles’. Somente quem escuta
paciente e criticamente o outro, fala ‘com ele’,
mesmo que, em certas condições, precise de
falar a ele. (FREIRE [1996] 2001, p. 127-128)
Para Freire ([1987] 1996), ser solidário não é praticar o assistencialismo, mas uma
atitude radical diante das diferenças sociais. A solidariedade baseada somente na prática
71
assistencialista transforma a pessoa em objeto passivo, sem possibilidade de participar do
processo de sua própria (re) construção.
Opúnhamos a estas soluções assistencialistas, ao mesmo tempo em que não
aceitávamos as demais, porque guardavam em si um dupla contradição. Em
primeiro lugar, contradiziam a vocação natural da pessoa - a de ser sujeito e não
objeto, e o assistencialismo faz de quem recebe a assistência um objeto passivo, sem
possibilidade de participar do processo de sua própria recuperação. Em segundo
lugar, contradiziam o processo de “democratização fundamental” em que estávamos
situados.(FREIRE [1964] 2008, p. 65)
Para o autor, o perigo desse assistencialismo está na violência de seu antidiálogo,
que impõe ao homem mutismo e passividade, não lhe oferecendo oportunidade de possuir
consciência crítica. Ao contrário, a solidariedade implica, todavia, descobrir-se, por vezes,
como opressor:
Descobrir-se na posição de opressor, mesmo que sofra por este fato, não é ainda
solidarizar-se com os oprimidos. Solidarizar-se com estes é algo mais que prestar
assistência à trinta ou a cem, mantendo-os atados, contudo, à mesma posição de
dependência. Solidarizar-se não é ter a consciência de que explora e “racionalizar”
sua culpa paternalisticamente. A solidariedade, exigindo de quem se solidariza que
“assuma” a situação de com quem se solidarizou, é uma atitude radical. (FREIRE
[1987] 1996, p. 36)
Para Freire ([1987] 1996) formas diferentes de solidariedade que são
condicionadas pelo contexto sócio-histórico. No caso da estrutura econômica que se formou
sob o domínio do trabalho escravo, as disposições mentais e de relações humanas
desenvolvidas resultaram em formas de solidariedade privadas. As condições culturais não
foram favoráveis para desenvolver uma solidariedade relacionada com uma cultura do
público, política. Ao contrário, a solidariedade foi desenvolvida com submissões e mutismos,
ajustamentos e acomodações hierarquizadas, onde o rico doa algo material ao pobre.
A solidariedade política e social é resultado de um processo educativo de
desenvolvimento de disposições e exercício prático de participação, de diálogo com
responsabilidade e que combina com uma sociedade radicalmente democrática pautada numa
educação libertadora, que contribui e amplia a vivência de solidariedade, ao mesmo tempo em
que torna o ambiente propício para o processo educativo democrático e solidário. Esse tipo de
solidariedade não hierarquiza valores sociais ou políticos, mas promove a doação recíproca,
pois todos têm algo a oferecer.
A verdadeira solidariedade consiste em estar com os oprimidos lutando na
transformação da realidade objetiva. Ela é identificada no opressor quando seu gesto deixa de
ser individual e passa a ser ato coletivo.
72
Quando, para ele, os oprimidos deixam de ser uma designação abstrata e passam a
ser os homens concretos, injustiçados e roubados. Roubados na sua palavra, por isso
no seu trabalho comprado, que significa a sua pessoa vendida. na plenitude deste
ato de amar, na sua existencialização, na sua práxis, se constitui a solidariedade
verdadeira. Dizer que os homens são pessoas e, como pessoas são livres, e nada
concretamente fazer para que esta afirmação se objetive, é uma farsa. (FREIRE
[1987] 1996, p. 36)
Ser solidário, nessa perspectiva, é estar com outros na busca da mudança social. É
perceber-se opressor ou oprimido e, em conjunto, modificar essa realidade, visto que não
pode ser modificada se não reconhecida. O homem se solidariza porque possui uma vocação
para humanização. Assim, quando percebe que seu semelhante está numa condição de
negação ontológica de “ser mais” necessita fazer algo para modificar essa situação.
O reconhecimento de sua condição necessita estar acompanhado da ação para que
se concretize a realidade imaginária.
Por isso, inserção crítica e ação já são a mesma coisa. Por isto também é que o mero
reconhecimento de uma realidade que não leve a esta inserção crítica (ação já) não
conduz a nenhuma transformação da realidade objetiva, precisamente porque não é
reconhecimento verdadeiro. (FREIRE [1987] 1996, p. 38)
A solidariedade é demonstrada por atitudes não pontuais, apenas de ajuda
econômica. Embora essas atitudes também sejam importantes, elas não provocam a
modificação social. Ela pode ser demonstrada pela luta na humanização do mundo, utilizando
a esperança como mola propulsora no potencial dos seres humanos em modificar a si mesmos
e a sociedade em que estão.
No próximo capítulo apresentarei a noção de currículo e o ideal de aluno do
Colégio Marista de Criciúma, contrapondo com a visão de currículo enunciada por Sacristán
(2000) e Pacheco (2001) e as categorias freireanas descritas no presente capítulo.
73
III. O ALUNO PESQUISADOR, COMUNICADOR E SOLIDÁRIO
Precisamos aprender a compreender a
significação de um silêncio, ou de um sorriso
ou de uma retirada da aula. O tom menos
cortês com que foi feita uma pergunta. Afinal,
o espaço pedagógico é um texto para ser
constantemente “lido”, interpretado,
“escrito” e “reescrito”. Neste sentido, quanto
mais solidariedade exista entre o educador e
os educandos no “trato” desse espaço, tanto
mais possibilidades de aprendizagem
democrática se abrem na escola. (FREIRE
[1996] 2001, p. 109)
O presente capítulo trata da pesquisa documental e empírica, dos dizeres da escola
sobre seus ideais de aluno e currículo e como se consolidam na visão dos professores e equipe
diretiva do Colégio Marista de Criciúma.
Concordo com Saul (1998) quando afirma que a tradição educacional brasileira é
presidida pela lógica do controle técnico, cuja preocupação está em torno dos objetivos,
métodos e técnicas de ensino e avaliação. A autora salienta que a construção e a reformulação
do currículo acaba ficando a critério das secretarias estaduais e municipais de educação,
chegando à escola em forma de pacotes educacionais a serem utilizados, não considerando,
muitas vezes, a realidade local. Em termos de escola particular não é diferente, as
determinações também são dadas pelas legislações educacionais. Cabe uma reflexão sobre a
organização tanto da parte comum dos conteúdos quanto diversificada, garantida por lei (Art.
26, Lei 9394/96), e como esta chega aos professores.
Neste sentido, a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) permite a
escolha de alguns conteúdos a serem trabalhados, bem como as metodologias utilizadas para
que se alcancem os objetivos propostos por ela, que são:
I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno
domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia,
das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;
III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição
de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;
IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e
de tolerância recíproca em que se assenta a vida social. (Art. 32, Lei 9394/96).
74
A legislação respalda e liberdade para a construção de projetos curriculares,
por meio dos quais serão explícitas as concepções educativas nas quais a escola está pautada,
por meio dos artigos 12, 13 e 14 da Lei 9394/96
19
. De acordo com a lei vigente, os docentes
terão a incumbência de participar da proposta pedagógica da escola de maneira democrática,
zelando sempre pela aprendizagem dos alunos. O papel do professor é importante, tanto no
processo de inserção dos conteúdos da base diversificada quanto no estabelecimento das
práticas pedagógicas que serão utilizadas para trabalhar os conteúdos da base comum e da
diversificada. Educar é um ato político, para tanto, é necessário que o professor não apenas
domine os conteúdos de sua disciplina, mas entenda o porquê dos conteúdos estarem
distribuídos da maneira que estão e a melhor forma de trabalhá-los para que o conhecimento
se efetive.
A aprendizagem, neste sentido, poderá ser meramente mecânica ou ocupar seu
papel político de conscientização. Para Freire ([1987] 1996), o ato educativo deve ser prática
de liberdade, pois abrange não apenas as questões metodológicas, mas a própria atitude
docente diante do saber, que nunca é neutra. Mas para que isso aconteça é necessário que o
professor também se entenda como politizado, desprovido de verdades fechadas e sensível às
necessidades que se apresentam no dia-a-dia escolar. “A educação como prática da liberdade,
ao contrário daquela que é prática da dominação, implica a negação do homem abstrato,
isolado, solto, desligado do mundo, assim como também a negação do mundo como uma
realidade ausente dos homens”. (FREIRE [1987], 1996, p. 70)
Para o autor, todo ato educacional deve permitir a politização. O conhecimento
19
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema
de ensino, terão a incumbência de:
I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;
II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros;
III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas;
IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente;
V - prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento;
VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola;
VII - informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução
de sua proposta pedagógica.
Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:
I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
III - zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV - estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento;
V - ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados
ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;
VI - colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.
Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica,
de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;
II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
75
não é tratado por ele mesmo, mas como ato político que permitirá o alcance da consciência do
mundo por meio do entrecruzamento de saberes. Esses saberes tanto são manifestos pelos
alunos quanto pelos professores, por meio do diálogo que “[...] fenomeniza e historiciza a
essencial intersubjetividade humana; ele é racional e, nele, ninguém tem iniciativa absoluta.”
(FREIRE [1987], 1996, p. 16).
Freire ([1987] 1996) enfatiza que aqueles que dialogam admiram um mesmo
mundo, tanto se afastam dele como com ele coincidem. O diálogo não pode ser produto
histórico e sim a própria historicização do homem, que leva à consciência de quem ele é.
Dialogar não é falar qualquer coisa, mas falar algo, transmitir sentimentos, anseios e
necessidades. O professor que se propõe ao diálogo não fala sozinho, buscando a sua resposta,
ao contrário, ele ouve e problematiza para que o próprio aluno procure as possibilidades de
perguntas e respostas necessárias.
O fato de haverem entrecruzamentos de saberes, ou não, será possibilitado pela
teoria curricular que permeia a escola em questão, pois para alguns professores o único saber
válido é o seu, para outros, os discursos estudantis encontram-se encharcados de
conhecimentos legítimos. A distribuição de conteúdos da base comum está determinada,
mas é necessário discutir quais são as concepções de currículo apresentadas na escolha dos
conteúdos tanto da base diversificada quanto dos estabelecidos da comum. Não quero, por
meio disso, afirmar que a concepção curricular alicerça-se apenas na lista de conteúdos
trabalhados ou na prática docente. Apenas saliento que a maneira como esta escolha se dá e as
práticas educativas vivenciadas legitimam o currículo que sustenta a instituição escolar.
Além do professorado, é importante salientar a forma como a escola, de uma
maneira geral, valoriza o discurso democrático. Discurso aqui entendido como práxis, que se
determina pela reflexão baseada na prática, gerando a modificabilidade dessa mesma prática
por meio de um processo de retroalimentação, onde as reflexões são geradas dentro do próprio
contexto escolar. O caminho pelo qual chegam as determinações educativas, sejam
metodologias ou conteúdos a serem aplicados, expressam a proposta curricular da escola em
questão. Se as opções são feitas de maneira democrática refletem um posicionamento mais
aberto, mas se ocorrem de maneira verticalizada podem refletir uma visão autoritária,
interferindo, desta forma, na prática educativa. A maneira como são estabelecidos os
conteúdos e as determinações pedagógicas também refletem a visão curricular da escola.
Os fazeres da direção, da assessoria e de outros setores constroem a concepção
curricular da instituição escolar, pois as práticas educativas são mais amplas do que apenas as
metodologias utilizadas em sala de aula. Os encaminhamentos dados pelos gestores escolares
76
oportunizarão ou não um currículo voltado à práxis. A liberdade que os professores têm de
expressar suas necessidades educativas refletirá na liberdade que eles darão a seus alunos. A
valorização dada aos profissionais da educação também legitimará este currículo, pois os
professores são os profissionais que passam mais tempo com os alunos e conhecem melhor
suas necessidades, tanto acadêmicas quanto sociais e emocionais. Dar voz e vez a esse
educador implica fazê-lo co-partícipe do ideal de educação na instituição em que ele está.
3.1. O que é o currículo para o Colégio Marista de Criciúma
Como dito anteriormente, o currículo apresenta-se não apenas na matriz
curricular, ou nas práticas pedagógicas dos professores, ele também é manifesto por outras
atitudes, explícitas ou não, de todos os que compõem a comunidade escolar. Docentes,
direção, assessoria e discentes tanto produzem currículo como são produzidos por ele. A
valorização que a escola dá a alguns aspectos em detrimento de outros também delimita o que
é mais valorizado nessa instituição, demonstrando assim um ou outro tipo de concepção
curricular. O currículo não é mera lista de conteúdos. A lista é consequência de um
posicionamento pedagógico, epistemológico, filosófico. Por meio da proposta curricular
pode-se perceber qual a visão de mundo que determinada instituição promove.
Para Sacristán (2000, p. 34):
O currículo é selecionado dentro de um campo social, se realiza dentro de um campo
escolar e adota uma determinada estrutura condicionada por esquemas que são a
expressão de uma cultura que podemos chamar psicopedagógica, mesmo que suas
raízes remontem muito além do pedagógico. Por trás de todo currículo existe hoje,
de forma mais ou menos explícita e imediata, uma filosofia curricular ou uma
orientação teórica que é, por sua vez, síntese de uma série de posições filosóficas,
epistemológicas, científicas, pedagógicas e de valores sociais. [...] é fonte de códigos
curriculares que se traduzem em diretrizes para a prática e que acabam se refletindo
nela.
Para o autor, além de estar atrelado a múltiplas orientações teóricas, o currículo
está organizado em função de um projeto cultural para a escola, isto é, o currículo escolar é,
antes de mais nada, uma seleção de conteúdos culturais, organizados de forma específica para
aquela instituição. Ele ainda explica que as determinações curriculares vão muito além das
pedagógicas, que é um projeto cultural que se realiza dentro de determinadas condições
institucionais, políticas e administrativas. Dessa maneira:
As condições o modelam e são fonte por si mesmas de um currículo paralelo ou
oculto. O currículo na prática não tem valor a não ser em função das condições reais
77
nas quais se desenvolve, enquanto se modela em práticas concretas de tipo muito
diverso. Tais condições não são irrelevantes, mas artífices da modelagem real da
possibilidade que um currículo tem. Sem notar essa concretização particular, pouco
valor pode ter qualquer proposta ideal. (SACRISTÁN, 2000, p. 35)
Nesse sentido, o que os documentos dizem sobre a educação na escola são parte
do currículo, mas não o constituem totalmente, pois as metodologias aplicadas nas aulas, os
objetivos propostos para cada segmento e as condições de trabalho do professorado também
fazem parte da orientação curricular que a escola contempla. A forma como chegam aos
professores as determinações escolares também expressa uma concepção curricular na qual a
instituição se posiciona. O projeto cultural que origina todo o currículo está culturalmente
condicionado a uma estrutura mais ampla, de ideias e valores que justificam as escolhas feitas
pela instituição escolar. Este projeto precisa ser percebido como produtor e produto das
relações culturais existentes, pois são códigos que se traduzem em direcionamentos da prática
e acabam se refletindo nela.
A análise que fiz sobre a concepção curricular do Colégio Marista de Criciúma
revela apenas um viés, expresso nos ditos documentais e empíricos, por meio do professorado
e dos gestores locais. Diferentes reflexões seriam possíveis caso os sujeitos pesquisados
fossem os alunos ou outros colaboradores da instituição. Os dados são apresentados
primeiramente sobre o que diz a pesquisa documental e depois sobre o que diz a pesquisa
empírica, sendo feita posteriormente uma reflexão baseada nos autores citados anteriormente.
O mesmo critério é utilizado ao analisar as categorias elencadas quanto ao ideal de aluno do
Colégio Marista pesquisador, comunicador e solidário, sendo destacadas separadamente,
no próximo item deste capítulo.
Segundo o Projeto Político Pedagógico do Colégio Marista, o currículo é muito
mais do que apenas as matrizes curriculares, pois é uma produção histórica e social, elaborado
por muitas mãos em tempos diferentes. “É uma formação discursiva que se acumula em
diferentes camadas sedimentares que apresentam enunciados e significados diversos”
(PPP, 2008, p. 49).
Neste documento, o currículo é apresentado como território contestado por ser um
espaço aonde se constitui tensões, seja pelas diferenças ideológicas ou pela luta de classes.
Ele é também um espaço aonde se manifestam diferentes significados sobre o que seja ensinar
e aprender. Desta maneira, o currículo de uma escola ou instituição, segundo o documento,
acaba por apresentar sua identidade, pois é ele que reorganiza e reestrutura os sujeitos sociais
e a relação pedagógica. É por meio da concepção que a escola tem do que vem a ser currículo
que se determina quais conhecimentos são válidos ou não. O documento ainda destaca a
78
importância da reflexão e a avaliação em torno da organização curricular porque o currículo é
uma construção permanente e inacabada e a escola é um espaço de desenvolvimento de
capacidades individuais e coletivas, de (re) construção de saberes, de normas, de atitudes e de
valores.
Na perspectiva do Projeto Político Pedagógico do Colégio Marista de Criciúma, é
necessário haver uma autonomia curricular que permita a construção de respostas educativas
inovadoras aos indícios do tempo futuro. O currículo educa para o ‘governo do eu’ na e para a
coletividade: as identidades individuais se assentam sobre bases e princípios da coletividade e
essas identidades apresentam um conflito numa outra instância dialética, ou seja, a identidade
pública da esfera da cidadania se confunde com a identidade privada da esfera do consumo.
Destaca também a necessidade do profissional docente possuir um conjunto de
comportamentos, conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que constituem a
especificidade de ser professor e atribui à escola o compromisso de constituir-se na base da
interação e da partilha, buscando incessantemente a emancipação curricular.
Nota-se que, de um lado, o currículo se traduz numa organização e estruturação dos
conteúdos a serem ensinados e das experiências de aprendizagem, para se atingir
determinados fins. Mas há que se considerar também um outro lado, os seus efeitos:
pelo/no currículo forjam-se os modos de ser sujeito, os papéis sociais assumidos por
professores e alunos. A escrita curricular a produção de currículos é, portanto,
importante ferramenta de luta cultural pelos significados. Ou seja, nas linhas da
escrita curricular que praticamos circulam os significados em que acreditamos e os
posicionamentos políticos quanto à educação, ao ensinar e ao aprender, ao ser aluno
e professor, por exemplo. (PPP, 2008, p. 51)
De acordo com o Projeto Político Pedagógico do Colégio Marista, a Matriz
Curricular é apenas parte do currículo, onde são expressos os indicadores e objetivos
necessários para cada área do conhecimento.
[...] a Matriz Curricular é a sistematização de um determinado recorte do currículo a
contribuir para o processo de planejamento de ensino dos professores. Nela,
explicitam-se intenções e decisões políticas que interferem na escolha dos conteúdos
escolares, bem como na associação destes às operações cognitivas (objetivos,
indicadores). (PPP, 2008, p. 51)
É importante ressaltar que o PPP define a Matriz Curricular como documento que
vai além das questões organizacionais, superando a visão de lista de conteúdos e
procedimentos metodológicos e que está contida no currículo e não o constitui isoladamente.
[As Matrizes Curriculares] querem problematizar os currículos praticados, as
concepções sobre as quais se assentam os campos disciplinares e as tendências
metodológicas, bem como os objetos de ensino e aprendizagem e os instrumentos de
79
avaliação que podem emergir dessa problematização. As Matrizes exigem discussão,
reflexão, escolhas, articulações, enfim, estudo e planejamento. Elas se constituem
em um instrumento a mais para a ação docente, em um referencial a mais para que o
professor possa planejar sua prática pedagógica. Por isso, ela não pode,
simplesmente, ser transferida para o planejamento/plano de ensino. (PPP, 2008, p.
48-49)
Cabe esclarecer que as matrizes foram concebidas por meio da discussão entre os
profissionais dos dezesseis Colégios que compõem a Província Brasil Centro-Sul e
implantadas em cada Colégio com assessoria da DERC. No Colégio Marista de Criciúma, os
professores tiveram a oportunidade de compartilhar o objeto de estudo de cada matriz com os
outros docentes. A Matriz Curricular constitui-se um referencial organizacional e teórico para
que o professor possa planejar sua prática pedagógica. Este documento apresenta uma
teorização inicial
20
, que contempla o objetivo da área e dos conteúdos a serem trabalhados.
Elas são divididas por área de conhecimento: Ciências da Natureza - Biologia, Ciências,
Física, Matemática e Química; Ciências Humanas - Ensino Religioso, Filosofia, Geografia,
História e Sociologia; Linguagem - Arte, Educação Física, Línguas Estrangeiras e Língua
Portuguesa.
O período de elaboração de cada matriz não foi coincidente, por ter havido a
necessidade de reunir um ou mais profissionais de cada unidade. O estudo e as discussões
foram realizados em Curitiba, coordenados pelo CEMEP (Centro Marista de Estudos e
Pesquisas)
21
e DERC (Diretoria Executiva da Rede de Colégios). Para cada matriz curricular
elaborada foram necessários, em média, quatro encontros. O professor responsável de cada
unidade apresentava para os professores locais o que havia sido discutido e reelaborava os
conteúdos/objetivos propostos para cada segmento em sua área de conhecimento. Em 2008,
apenas três dos dez entrevistados haviam participado das discussões das Matrizes. Os outros
não participaram desse processo por terem entrado no Colégio após o término de sua
elaboração.
Não é possível apresentar a pesquisa documental baseada apenas no que a escola
define ser o Currículo. Muito do que não é dito explicitamente pode ser percebido nos
discursos implícitos, nas concepções elencadas de homem, mundo, sociedade. A visão de
educação, avaliação, planejamento define o que o Colégio entende por currículo e norteia o
processo pedagógico. Um dos discursos que pode ser considerado implícito é a maneira como
o Colégio estruturou suas Matrizes Curriculares mantendo uma unificação de rede, mas sem
20
No texto são apresentadas as intenções do ensino do componente curricular, o objeto de conhecimento de cada
disciplina, o convívio curricular da disciplina com outras áreas do conhecimento, os eixos estruturadores e
blocos temáticos dependendo da área de conhecimento.
21
Substituído em 2007 pela DERC (Diretoria Executiva da Rede de Colégios).
80
descartar as possibilidades locais. As discussões foram lançadas a todos os Colégios,
buscando uma aproximação com a localidade. Ao conversar com os professores, como
discorrerei posteriormente, é possível perceber um certo desconforto quanto aos excessos de
conteúdos desses documentos. Mas a condução de produção da escrita e escolha foi
oportunizada aos dezesseis Colégios numa determinada época, o que não garante que haja
proximidade com a visão dos professores que estão lecionando atualmente.
Outra consideração é quanto à percepção da necessidade da construção de uma
matriz curricular cujo objeto de conhecimento seja o aluno e suas relações, considerando o
aluno em sua interdimensionalidade. A Matriz Curricular de DAPS - Desenvolvimento
Acadêmico, Pessoal e Social
22
- foi estudada pelos professores e é de responsabilidade de
todos os docentes. Ela visa:
[...] promover o desenvolvimento acadêmico, pessoal e social do aluno Marista,
dando suporte às práticas escolares, visando oferecer condições para que o aluno
amplie/aprofunde seu ofício e a ação de conviver em sociedade. (MATRIZ
CURRICULAR DAPS, 2008, p. 2)
Esta matriz foi escrita com o objetivo de auxiliar o aluno em suas necessidades
educativas, buscando sanar problemas observados pelos educadores da Província Brasil
Centro-Sul, e mostra a importância que a instituição dá às questões que transcendem o
estritamente acadêmico. Alguns Colégios da Província Brasil Centro-Sul possuem a disciplina
de DAPS, mas o Colégio Marista de Criciúma não a possui, pois essa determinação passa pela
estrutura de cada unidade.
A valorização à interdimensionalidade dos indivíduos é legitimada pelo Projeto
Político Pedagógico (2008, p. 60) que afirma que o Colégio tem por finalidade:
Buscar a formação de bons cristãos e honrados cidadãos, visando o desenvolvimento
integral do homem. Pela formação de uma consciência crítica e criativa, o aluno tem
ampliadas as suas possibilidades de melhor se adaptar ao meio, interpretando e
enfrentando a realidade com autodeterminação e discernimento e assim, ir
preparando sua competência profissional. A formação integral do indivíduo advém
de uma harmonização entre os valores cristãos e os conhecimentos científicos
22
A escrita da Matriz Curricular de DAPS foi feita pelo GEOF Grupo de Estudos Ofício de Aluno composto
por um representante de cada unidade. Tive oportunidade de participar dos encontros realizados nessa discussão
por um período de dois anos. Este grupo instituiu como uma das metas a implantação do DAPS para resolução
de problemas acadêmicos e não acadêmicos e seria ministrada de acordo com a necessidade da turma. Nas
escolas que não possuem um professor titular (responsável pela turma ou ano que ministra essa disciplina), todos
os professores responsabilizam-se na aplicação dessa Matriz, de acordo com as necessidades percebidas em cada
turma.
Além da Matriz Curricular de DAPS, o grupo elaborou um conjunto de textos acerca dos aspectos fundamentais
que circundam o ofício de aluno na contemporaneidade, elaborando linhas de ação a fim de favorecer a reflexão
e a prática docente e discente. Os textos foram compilados num livro que será lançado em 2009. O referido
material não pode ser utilizado em minha pesquisa por estar em fase de análise no período desta investigação.
81
alcançados.
A integralidade é reforçada quando caracteriza o estilo educativo marista e o
aproxima de uma visão cristã:
O estilo educativo baseia-se em uma visão integral, que se propõe conscientemente
a comunicar valores. Ao partilharmos essa visão com outros educadores,
principalmente os cristãos, empregamos uma abordagem pedagógica própria,
desenvolvida inicialmente por Marcelino Champagnat e pelos primeiros maristas,
que era inovadora em muitos aspectos. (PPP, 2008, p. 60, grifo meu)
Esse documento ainda salienta a educação de valores e o desenvolvimento pessoal
de cada educando oportunizado pelo Colégio, responsabilizando os educadores à atenção às
suas necessidades. Define também que além da profissionalidade, o grupo de educadores deve
estabelecer um relacionamento baseado no amor, visando à criação de um clima favorável à
aprendizagem, à educação de valores e ao desenvolvimento pessoal do educando.
As metas para o Ensino Fundamental contemplam aspectos cognitivos, afetivos e
psicomotores do aluno, bem como seu relacionamento no meio social em que vive:
Desenvolver no educando o domínio cognitivo, afetivo e psicomotor;
Desenvolver a inteligência operatória concreta, que leve o educando ao contato
com a realidade física circundante, a fim de capacitá-lo nas suas estruturas
funcionais;
Desenvolver o processo de socialização para possibilitar ao educando uma
positiva integração com o grupo;
Orientar para que adquira algumas técnicas de trabalho, baseadas especialmente
em atividades de observação, em sondagem de aptidões, em pesquisa e expressão;
Integrar o educando ao meio em que vive;
Desenvolver o senso dos valores humanos e cristãos que facilitem sua
participação na comunidade social e eclesial e o seu compromisso como cidadão e
cristão;
Propiciar atividades de aprendizagem e experiências que promovam no educando
o desenvolvimento de suas potencialidades, permitindo sua auto-realização. (PPP,
2008, p. 40)
A valorização do aluno em sua integralidade é citada nos documentos, revelando
as limitações encontradas pela escola no alcance desse estudante, como também a decisão
institucional de enfrentar essas limitações.
Na pesquisa empírica os professores citam o currículo como lista de conteúdos,
tentam diferenciá-lo das matrizes de sua disciplina, mas comumentemente citam a sobrecarga
de conteúdos como empecilho na concretização do ideal do Colégio. De acordo com a
Entrevistada A, currículo é a bússola para o trabalho docente e é a partir dele que se consegue
determinar aquilo que se objetiva do ensino, e que devem ser objetivos utilizáveis fora do
âmbito escolar. uma preocupação por parte dessa profissional no que concerne aos
82
conteúdos apresentados na matriz curricular, pois ela os considera densos, não dando espaço
para o trabalho com questões regionais. Afirma que o Colégio liberdade para acrescentar,
mas que não é possível fazer acréscimos por falta de tempo para execução.
A Entrevistada B concorda com essa visão quando afirma que o currículo é a lista
de conteúdos a ser trabalhada no decorrer do ano letivo, mas salienta que as metodologias
utilizadas são planejadas de acordo com a característica da turma. Ela afirma que é importante
ter um currículo como garantia de unificação nacional. Salienta que as matrizes apresentam
muitos conteúdos e que a única possibilidade de se trabalhar todos os objetivos propostos é
aumentar os dias letivos do ano.
Currículo é a bússola para o trabalho do professor, pois qualquer profissional precisa
ter um plano para cumprir. O currículo apresenta-se como os conteúdos mínimos
que o professor tem de passar para o aluno. Mas nós o ficamos presos apenas
àquilo que o currículo exige, pois a proposta que nos é dada precisa ser adaptada
para cada turma. Mas acho muito importante a determinação dos conteúdos a serem
dados, se não fosse assim, cada professor ou escola daria o que quisesse. Aonde
iríamos parar? (Entrevistada B)
Na análise dessa educadora, o currículo é a lista de conteúdos a serem trabalhados,
no entanto, não o vê negativamente, pois para ela sua determinação é importante para que haja
unificação em relação aos conteúdos dados.
A Entrevistada C diz que o currículo é “a proposta de trabalho do professor
perante a realidade do aluno”. A mesma professora cita a Matriz Curricular ao ser questionada
sobre a relação desta com o Currículo do Colégio: “Há dezesseis Colégios em nossa Província
que procuram contemplar a Matriz, mas eu sinto liberdade de adaptar os conteúdos de acordo
com nossa realidade local”.
Ela ainda explica o currículo como proposta de sua disciplina específica e que a
Matriz Curricular auxilia dando suporte teórico para o trabalho docente no Colégio Marista.
Para ela, há possibilidade de mudança dos conteúdos apresentados, desde que de forma
coerente com a realidade do grupo com o qual trabalha. Quando esses educadores manifestam
a possibilidade de trabalho com os conteúdos determinados, tanto para acréscimos quanto
para retiradas, manifestam também a flexibilidade oferecida pelo Colégio na consecução
desses.
De acordo com o Entrevistado G, o currículo é “[...] o conjunto de matérias a
serem trabalhadas nas disciplinas, mas que não se restringem ao material didático, pois esses
servem para aprofundar as aprendizagens necessárias ao dia-a-dia do aluno”.
Os educadores maristas de Criciúma, em sua maioria, percebem o currículo como
83
grade de conteúdos necessária para a prática docente. Talvez seja por isso que enfatizem tanto
a matriz curricular de sua disciplina em suas entrevistas. Fazem menção a esse documento de
forma positiva quando questionados sobre o currículo, alegando sua necessidade na
organização pedagógica. Em contrapartida, a citam negativamente quando atribuem a ela a
limitação na formação do ideal de aluno proposto pela escola, pelo fato de apresentar-se densa
demais. A Entrevistada D enfatiza a necessidade de associar a matriz curricular ao currículo,
demonstrando que relação entre ambos, mas que o currículo é mais amplo que apenas os
documentos:
[...] falando em currículo é impossível não falar de nossas matrizes curriculares, pois
serão elas que nortearão o trabalho docente. É claro que as matrizes não dão conta
do currículo, pois meu fazer pedagógico está muito além do documento, ele depende
de minhas concepções de homem, mundo, sociedade. Um exemplo, eu sendo
professor e utilizando a mesma matriz que outro da mesma área demonstrarei em
meu planejamento minhas crenças, qual meu aporte teórico. Se me aproximar de um
enfoque mais apriorista vou utilizar metodologias, avaliações que deem conta dessa
concepção. Mas se acreditar num trabalho que valorize a mediação, minha aula não
será a mesma.
O Entrevistado L cita que o currículo “é o caminho a ser seguido” e as matrizes
servem para dar o embasamento teórico: “O currículo é mais fundamentado e mais objetivo,
são os conteúdos. As matrizes nos apresentam os objetivos e o porquê daqueles conteúdos
serem trabalhados naquele segmento. (Entrevistado L)”.
O Entrevistado M apresenta a necessidade de uma definição curricular clara:
O currículo está ligado a outros elementos: planejamentos, avaliação, planos de
aula. Ele é o norte. No momento em que o currículo está bem definido, há foco para
que a aprendizagem seja facilitada. A relação entre currículo e matriz curricular se
dá pela possibilidade de criação de focos.
De acordo com o Entrevistado N, o Currículo o é limitado à lista de conteúdos,
mas é caracterizado pela comunidade escolar: “Currículo é tudo o que envolve a comunidade
escolar, não somente os conteúdos trabalhados, a avaliação, planejamento e a própria gestão
da aula. É a abrangência de um todo. A escola como um todo”.
Mesmo que vários educadores do Colégio tenham citado que o currículo escolar
não seja apenas os conteúdos ou objetivos propostos, percebe-se ser bastante significativa a
referência que fazem à matriz de sua disciplina e aos objetivos contidos nela. Isso é
apresentado de maneira mais enfática quando questionados sobre a possibilidade de formação
de um aluno com as competências comunicação, pesquisa e solidariedade. Mesmo que o
Colégio não limite, em seus documentos, o currículo à grade curricular ou instrumento de
84
controle, ele aparece entre os educadores com essa característica, pois o associam aos
conteúdos propostos e à necessidade de cumprimento das exigências docentes.
No mesmo sentido em que não considerei na pesquisa documental apenas o que o
Colégio define ser Currículo, avaliei necessário enfatizar alguns aspectos citados pelos
professores nem sempre encontrados como resposta ao questionamento sobre currículo, mas
que também definem seu posicionamento em relação à proposta curricular. Destaquei três
aspectos que se encontram interligados.
O primeiro deles é a necessidade docente em realizar seu trabalho dentro do tempo
previsto. A maioria dos professores definiu que os objetivos propostos nas matrizes são
adequados, mas que o tempo escolar interfere na qualidade de ensino, ou seja, haveria
necessidade de um tempo maior para dar conta de tantos indicadores. Eles citam que as
matrizes dão embasamento teórico para seu trabalho, mas que as limitações são encontradas
pela falta de adequação desse tempo escolar.
O segundo aspecto está ligado diretamente ao primeiro, que são as cobranças
referentes à qualidade de ensino, manifestadas pelas aprovações nos vestibulares, boa
classificação no ENEM
23
e melhoria no SIMA
24
, que consiste em uma avaliação institucional
realizada anualmente, com alunos dos e anos do Ensino Fundamental e Série do
Ensino Médio, portanto, as turmas finalizantes de um nível educacional.
Esta avaliação é citada com frequência e os professores referem-se a ela como se
fosse um fim em si mesma. Ou seja, não discorrem muito sobre o processo, mas sobre a
necessidade de conseguirem atingir os indicadores propostos nesta avaliação. Não é possível
dizer se o que ocorre é a falta de tempo mesmo ou a necessidade de negociação quanto aos
indicadores exigidos pelo SIMA e os objetivos a serem alcançados nas disciplinas. É
importante salientar este aspecto, pois foi bastante significativo, sendo citado por todos cujas
disciplinas são avaliadas. Mesmo que o objetivo dessa avaliação não seja o trabalho do
23
Exame Nacional do Ensino Médio.
24
De acordo com o Projeto Político Pedagógico do Colégio Marista (2008, p. 52-53), o SIMA:
“[...] é a expressão de uma conduta gerencial pró-ativa e representa uma imprescindível ferramenta, para que a
escola se conheça numa perspectiva de qualidade educacional, sustentada por uma gestão eficiente e
compromissada com a Missão Educativa Marista. Alinhado com os mais conhecidos programas de avaliação em
larga escala, o SIMA é um projeto que tem como objetivo central fornecer elementos para decisões políticas e
gerenciais, por meio de resultados de desempenho dos alunos e monitoramento das práticas educativas
realizadas, que dele se utilizam.
O SIMA incorpora modalidades avançadas de tecnologia educacional, de avaliação, de procedimentos
estatísticos e de computação, de modo a facultar, dentre outras ações, a avaliação de desempenho dos alunos,
possibilitando comparações verticais e horizontais entre unidades, segmento de séries, disciplinas e turmas; a
avaliação e a reorganização de práticas curriculares, com a finalidade de manter ou elevar o padrão de qualidade
da escola avaliada; e ainda, definir e redefinir medidas gerenciais visando à alta qualidade da sua proposta
educativa.”
85
professor, ela submete-o a um crivo, ao que me parece, do próprio educador responsável.
O terceiro e último aspecto é o fato de alguns professores apontarem em suas
respostas falta de consideração de regionalidade das matrizes. Mesmo tendo sido escrita por
muitas mãos, por pessoas que se encontram em cidades diferentes, não há garantias de que os
profissionais que a pensaram tenham permanecido na escola. Portanto, determinado professor
que tenha chegado ao Colégio após o término das discussões e escrita pode não compreender
a razão de alguns objetivos estarem em determinado segmento e não em outro.
É o caso da Entrevistada A, professora, que foi contratada no ano de 2006:
Apesar das matrizes terem sido construídas por professores representantes dos
dezesseis colégios, ainda sinto que não é possível perceber a regionalidade dentro
dela. A matriz apresenta, mas não predomina a localidade. Tenta unificar os
objetivos, mas como fazer isso se nossa realidade é bem diferente de São Paulo,
Curitiba e Brasília?
conteúdos que não estão contidos na Matriz e dizem para nós o tempo todo que
flexibilidade e que temos liberdade de acrescentá-la. Mas como fazer isso tendo
que “dar conta” de um mínimo que é amplo? Como não trabalhar com o mínimo que
a matriz apresenta se será cobrado de nossos alunos no SIMA?
O SIMA avalia não apenas os alunos, mas as unidades, os segmentos, as
disciplinas e a turmas e sua finalidade é manter ou elevar o padrão da escola avaliada. O que
precisa ser questionado é o porquê dessa avaliação estar controlando o fazer educativo desses
professores. O trabalho pedagógico necessita ser consolidado por meio da avaliação, mas a
manifestação dos professores quanto ao SIMA demonstra dificuldade em perceberem essa
avaliação como ferramenta de trabalho em Rede. Quando se manifestam dizendo que
trabalham para “dar conta” do SIMA, estão dizendo que são reféns dessa avaliação, pois
trilham um caminho contrário é a avaliação que determina o tempo para que as
aprendizagens sejam consolidadas.
“Todo mundo queria ter mais aulas para desenvolver o conteúdo com mais
tranquilidade, fazer mais trabalhos, mas não tem o que fazer, temos que trabalhar dentro da
realidade que cada uma tem”. (Entrevistada B)
Mesmo os professores que possuem mais aulas durante a semana afirmam serem
insuficientes para uma discussão mais aprofundada:
Tenho noção de minha responsabilidade e isso me incomoda bastante, pois não
tenho uma concepção conteudista, mas o tempo para discussões mais profundas não
é o suficiente. Sei que não é a quantidade de capítulos trabalhados que farão meus
alunos saberem mais ou menos. Portanto, procuro utilizar notícias trazidas por eles
ou por mim para associar aos conteúdos trabalhados. O presente deles é importante,
não podemos viver no passado nem no futuro. Mas a falta de tempo é que faz com
que eu nem sempre faça o que acredito ser certo. (Entrevistado N)
86
O tempo diferenciado para cada disciplina também foi citado. Segundo a
Entrevistada F, pode-se perceber uma hierarquia entre as disciplinas, como se uma tivesse
mais valor que as outras, já que a quantidade de aulas é distinta:
Como não pensar em hierarquia entre disciplinas? Quantas aulas de Língua
Portuguesa, Matemática, Ciências e História são dadas? O número é o mesmo? O
que é mais importante nessa proposta? um desmerecimento por algumas
disciplinas. Mudamos por fora, mas nossos velhos usos continuam os mesmos.
(Entrevistada F)
Seguindo essa mesma lógica, a Entrevistada D salienta a necessidade de um
trabalho mais voltado às exigências educativas do aluno. De acordo com ela, o professor
também precisa de formação para compreender o educando em suas fases de
desenvolvimento:
Os professores têm um tempo anual para se reunir em busca da sua formação e os
estudos oferecidos pelo Colégio são escolhidos de acordo com a necessidade do
grupo. Por exemplo, a Educação Infantil estudou sobre a concepção de infância, já o
Fundamental II e Médio sobre o adolescente/jovem e suas necessidades na
sociedade atual. Não para dar aulas nos dias de hoje desconsiderando quem é o
nosso estudante.
A Entrevistada L considera a problematização, proposta pela Assessoria
Psicopedagógica como procedimento metodológico, inviável, pelo fato de não possuir tempo
suficiente para sua efetivação. Ela destaca o atropelo das aulas para aplicação da avaliação
posterior:
Como posso propor uma problematização se trabalho apenas uma vez por semana
com a turma? Acredito nessa metodologia, sou da área de Ciências. Problematizar é
antes de tudo, dar espaço ao diálogo. Como vou dialogar sabendo que não disporei
de tempo para o resto? Acabo “dando” as aulas... Meu desejo? Era aproveitar melhor
meu tempo de laboratório... Poder explorar sem pressa de aplicar uma avaliação.
Mas não é assim...
Alguns dos professores entrevistados não se veem com autonomia de decidir
sobre quais conteúdos trabalhar com suas turmas. Nas entrevistas, citaram que podem
trabalhar na ordem que quiserem, desde que respeitem os conteúdos do ano. Os acréscimos
acontecem esporadicamente, pelo excesso de conteúdos que têm que ser trabalhados. “Não
tenho liberdade de trazer conteúdos do Ensino Médio para o Fundamental. Aliviaria um
pouco, pois no Médio os alunos têm que ler uma quantidade de livros que é impossível dar
conta”.(Entrevistada A)
Contrariando essa visão, a Entrevistada F, não enquadrada na categoria de
87
professor, explica as possibilidades de transferência de objetivos de um segmento para o
outro:
As possibilidades de mudanças de um objetivo proposto num segmento para outro
depende muito do diálogo entre os professores e das possibilidades, já que há trocas
impossíveis de serem feitas. Não podemos retirar do Ensino Fundamental um
objetivo que seja essencial para este segmento. (Entrevistada F)
A Entrevistada B no ano de 2008 era professora titular de uma série e teve
oportunidade de escolher, por meio do diálogo, o que seria estudado:
Em nosso projeto de titulância
25
pra abrir espaço para os alunos escolherem os
conteúdos, pois não temos obrigatoriedade de conteúdos. Fazemos uma sondagem
com eles no início do ano para saber quais são suas necessidades. A partir daí
montamos as atividades a serem desenvolvidas com os educandos, acompanhados
pela assessoria. (Entrevistada B)
Um dos entrevistados, contrariando a visão dos demais em relação ao tempo de
trabalho e aos conteúdos da matriz, disse que o sentia dificuldade e trabalhava de acordo
com as possibilidades do grupo. É interessante salientar que as disciplinas ministradas por ele
não são avaliadas diretamente pelo SIMA.
Acho que a falta de tempo, que a maioria dos professores reclama, não é um
problema tão simples assim. Ele se dá por causa de problemas também estruturais. A
carga horária a que o professor tem que se submeter para poder ganhar um pouco
mais não lhe permite utilizar as ferramentas (matriz, planejamentos) de forma
correta. Então, ele não tem tempo de planejar, executa e depois precisa entregar um
planejamento. É dicotômico. Esses documentos servem para ajudar na administração
do tempo e atividade docente, mas o caminho torna-se inverso pelas condições de
trabalho. E não digo isso aqui no Marista, é geral a sobrecarga do professor.
(Entrevistado M)
Ele ainda salienta a importância da Matriz Curricular em suas disciplinas,
apontando-a como instrumento de organização pedagógica, destacando ainda a
responsabilidade docente no destaque dos conteúdos mais importantes em cada disciplina:
Entendo matriz curricular como ferramenta e o professor especialista é que mais
enfoque a alguns conteúdos em detrimento de outros. Ela apresenta objetivos claros
e eu que leciono é que possuo competência para gastar mais tempo com alguns
conteúdos e outros não. Tudo na vida precisa de organização. Não vejo a matriz
como ato burocrático. Eles estão ali para me ajudar a organizar meu trabalho
25
No ano de 2007 e 2008 o Colégio possuía um trabalho com os alunos do e do Ensino Fundamental e
série do Ensino Médio, nomeado “titulância”. Um professor responsável pelo ano/série acompanhava os
trabalhos, recebendo duas aulas semanais para o desenvolvimento desse trabalho no contraturno escolar. Esse
projeto foi suspenso em Criciúma no ano de 2009 por questões administrativas.
Uma das propostas do Grupo de Estudos Ofício de Aluno era que esse mesmo professor pudesse trabalhar a
disciplina de DAPS, citada anteriormente.
88
pedagógico. (Entrevistado M)
Entendo a prática educacional como ato político, manifesto tanto de forma
explícita como implícita. A consideração do currículo como alicerçado nos valores expressos,
tanto nos discursos documentais quanto empíricos, possibilitou-me compreender a
complexidade desses discursos e a necessidade de reflexões não tão simplistas. O encontro de
diferentes perspectivas numa mesma instituição escolar delineia sua própria concepção
curricular. Essa complexidade pode levar a novas reflexões sobre a própria prática a que se
propõe o Colégio. Do ponto de vista teórico são possíveis aproximações e distanciamentos
dentro de uma mesma orientação (SACRISTÁN, 2000) ou teoria de currículo (PACHECO,
2001), já que os próprios discursos institucionais são contraditórios.
A pesquisa documental descortina duas possibilidades curriculares. A primeira
voltada à quarta orientação de Sacristán (2000), identificada por currículo como configurador
da prática e à teoria crítica de currículo de Pacheco (2001). Pode-se fazer uma aproximação
com estas perspectivas quanto ao enfoque da autonomia docente. Os documentos enfatizam a
autonomia em relação à prática do professorado, sendo manifestada inclusive na construção
das matrizes curriculares. Estas perspectivas também se destacam na análise do processo de
construção das matrizes. Elas foram escritas por grupos de professores de cada área do
conhecimento. Esses educadores, quando se reuniam para discuti-las, não estavam alheios à
realidade local, que eram os próprios professores das unidades que compunham os grupos.
Após as discussões teóricas elaboravam os principais objetivos a serem elencados em cada
disciplina, levando as propostas para serem analisadas por seus pares nos colégios.
O destaque às relações estudantis e à proposição do componente curricular DAPS
também se aproxima destas perspectivas. A Província assumiu um posicionamento de
enfrentamento de um problema observado, que era o fato das relações do estudante com seu
ofício e, a partir desta observação, propôs ões que o sanassem, dentre elas a escrita da
matriz curricular que nortearia o processo de formação do aluno proposto pela Instituição.
Esta iniciativa auxilia a compreensão dos fenômenos que produzem a prática e a sua
superação.
Outra possibilidade curricular é determinada pela análise do Projeto Político
Pedagógico, que segue a perspectiva de auxiliar na autonomia discente e destaca a
necessidade de compreender o indivíduo em sua interdimensionalidade. Tanto o discurso
deste documento quanto da Matriz de DAPS associa-se ao Currículo como base de
experiências (SACRISTÁN, 2000) pelo fato de a escola, nesta segunda orientação do autor,
assumir-se responsável pelo ensino acadêmico, mas estendendo às necessidades pessoais e
89
sociais dos indivíduos.
O PPP do Colégio apresenta a importância da reflexão e a avaliação em torno da
organização curricular porque considera o currículo uma construção permanente e inacabada e
define a instituição escolar como um espaço de desenvolvimento de capacidades individuais e
coletivas, de (re) construção de saberes, de normas, de atitudes e de valores. De acordo com o
documento, necessidade dos educadores possuírem um conjunto de comportamentos,
conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que constituem a especificidade de ser
professor e atribui à escola o compromisso de constituir-se na base da interação e da partilha,
buscando incessantemente a emancipação curricular, por meio de reflexões sobre o fazer
pedagógico.
Os resultados da pesquisa empírica, na qual os professores respondem sobre o que
é currículo, aproximam-se da orientação definida como currículo como soma das exigências
acadêmicas, a primeira orientação de Sacristán (2000) e da teoria técnica de Pacheco (2001),
pois sua principal característica é o enfoque à lista de conteúdos. Esta concepção valoriza os
saberes distribuídos em disciplinas específicas ou áreas. Como citado anteriormente, a
potencialização desse enfoque curricular ocorre pela pressão acadêmica, as necessidades
administrativas e a organização do professorado. As aulas apresentam-se fragmentadas e as
disciplinas possuem tempos distintos determinados pelo programa.
Essa concepção é visível quando o professorado manifesta-se refém de aulas,
divididas em tempos diferentes, como se uma disciplina tivesse maior valor que outra.
Sacristán (2000) explica que essa orientação se concretiza na lista de conteúdos, e ao se
expressar nestes termos é mais fácil de regular e controlar do que de outra forma que contenha
considerações mais psicopedagógicas. É por isso que do ponto de vista administrativo as
regulações curriculares se apoiam muito mais nos conteúdos do que em outras considerações.
Para Pacheco (2001), na teoria técnica o conhecimento é visto de forma estanque,
não flexível e distribuído em disciplinas específicas e o currículo é um plano de ação
pedagógica que abrange a definição de educação pretendida, especificação das atividades de
ensino, o que acaba implicando os conteúdos escolhidos e a forma avaliativa aplicada aos
alunos.
O enfoque dado pelos professores, de uma maneira geral, é quanto ao tempo
limitado de trabalho efetivo com os conteúdos propostos. Para eles, a proposta de
problematização da escola, manifestada nas matrizes, não pode ser real porque o tempo é
curto, não abrindo espaço para o diálogo. Essa visão de que quando se problematiza não se dá
aula precisa ser repensada, pois a problematização serve para compreender as formas de
90
raciocínio dos alunos. ouvindo-os pode-se saber quais conteúdos podem ser trabalhados e
as metodologias utilizadas. Não significa que o professor deixa de trabalhar também os
saberes científicos. A problematização acontece na mediação do conhecimento. A partir dela
pode-se ampliar a visão dos alunos e por ela é possível saber o que eles entendem em
relação aos conteúdos trabalhados. Mas para que os professores possam assim pensar, é
necessário que a estrutura pedagógica escolar também tenha esta certeza, para não cobrar do
professor uma certa eficiência dentro da visão tradicional de “dar aula”, como conteúdo
transmitido.
uma dicotomia entre a concepção expressa nos documentos e na pesquisa
empírica, já que o estabelecimento do currículo como configurador da prática, de acordo com
a quarta orientação de Sacristán (2000) e a teoria crítica de currículo de Pacheco (2001),
torna-se quase que impossível quando se determina a construção de objetivos únicos para
Colégios que não estão na mesma localidade, possuem culturas e histórias diferentes. Para a
ampliação dessa possibilidade seria necessário, antes de tudo, uma autonomia e escuta
docente, permitindo a reconfiguração dos indicadores e objetivos a serem trabalhados.
Sacristán (2000), como citado anteriormente, afirma:
O questionamento da falta de autonomia afeta todos aqueles que participam nas
práticas curriculares, especialmente os professores e os alunos. É pouco crível que
os professores possam contribuir para estabelecer metodologias criadoras que
emancipem os alunos quando estes estão sob um tipo de prática altamente
controladora. É preciso partir de um isomorfismo, necessário entre condições de
desenvolvimento dos alunos nas situações escolares, em certa medida, pelos
professores. (SACRISTÁN, 2000, p. 48)
Não afirmo que o Colégio Marista de Criciúma seja uma instituição “altamente
controladora”, mas que a pesquisa empírica apresenta indícios de que os professores não se
veem com a mesma autonomia proposta nos documentos. A liberdade que os professores têm
de determinar o que é mais ou menos importante oportuniza também o protagonismo
estudantil. Perceber os conteúdos essenciais a partir de uma lista pode flexibilizar a ação
educativa.
Para a gerência de uma Rede são necessárias ações homogêneas, a utilização de
mecanismos para análise da qualidade, mas para que sejam legitimados necessidade de
passar pela incorporação local. O trabalho de discussão e reflexão sobre o currículo praticado
é bastante importante porque respalda ao educador a defender o porquê de uma prática em
detrimento de outra.
possibilidades e limitações que precisam tornar-se claras, mas que
91
acontecem quando escuta pedagógica. Essa escuta consolida-se em ouvir o que os
professores têm a dizer e quais propostas são dadas por eles. É preciso também deixar claro
quais opções metodológicas são compatíveis com a proposta pedagógica da Rede e a
necessidade da sociedade local. A partir das duas perspectivas pode ser consolidada uma outra
que conta de suprir a necessidade educacional, construída coletivamente a partir do olhar
dos diferentes atores escolares.
De acordo com as entrevistas, o que falta é tempo hábil para a consolidação dos
objetivos propostos, não permitindo espaço para que outros objetivos, considerados
importantes pelo professor, possam ser acrescentados. O tempo escolar não é curto, mas
torna-se insuficiente para contemplar tudo o que o Colégio pretende trabalhar. Saliento
também a necessidade, destacada pelos educadores, deste trabalho ser bem avaliado por meio
do SIMA, dos índices de aprovação no vestibular e ENEM.
Desta forma, uma reflexão a ser feita, embasada na própria proposta do Colégio
ao considerar a educação em sua integralidade e à autonomia docente, é em relação às
avaliações que regulam o processo pedagógico. A avaliação em seu sentido formativo
colabora para emancipação discente e docente e não se apresenta como fim em si mesma. O
peso avaliativo não deve servir para definição do bom e do mau professor, mas para análise
dos próprios processos de apropriação do conhecimento, se estes estão se efetivando ou não.
O que determina o sucesso numa avaliação institucional não é apenas o trabalho do ano em
que ela foi realizada, mas todo o tempo de formação deste aluno.
Contemplar a avaliação como exigência administrativa ou pensar que ela conduz o
trabalho pedagógico margem para associarmos o currículo ao legado tecnológico e
eficienticista, que é a terceira orientação de Sacristán (2000). De acordo com essa orientação,
o currículo cumpre mais uma conveniência administrativa que intelectual. Mesmo que os
objetivos do SIMA contemplem a qualidade educativa em todos os colégios é necessário que
esta avaliação seja vista como instrumento diagnóstico para possível reconfiguração da
prática. Os professores não têm observado dessa maneira, caracterizando a aplicação da
avaliação como configuradora do tempo escolar. Nesta perspectiva, pode-se associar à teoria
técnica de currículo elencada por Pacheco (2001), que apresenta seu conceito mais corrente
centrado nos conteúdos a serem ensinados e nos objetivos previamente formulados.
A maneira como o SIMA for utilizado também oportuniza possibilidades e
limitações. Se ele apresentar-se como instrumento docente e gerencial, reavaliando práticas
pedagógicas e administrativas, pode-se considerá-lo formativo. Mas se ele apresenta-se
92
apenas como termômetro pedagógico não cumpre sua função, pois o Colégio também possui
intenções administrativas que nem sempre são coerentes com a proposta educacional a que se
propõe. Na análise avaliativa deve ser considerado todo o contexto em que ela foi realizada. A
ação docente pode ser melindrada quando a unidade, a disciplina e o segmento são
classificados com outros Colégios.
Percebo, em meu cotidiano na escola, que mesmo apresentando melhoria no
desempenho no decorrer das avaliações, os professores sentem o peso que essa avaliação traz
quando se deparam com seus resultados. No primeiro ano não havia como comparar a unidade
com ela mesma, mas os resultados de 2009 poderiam ter sido apresentados fazendo-se apenas
esta comparação. Não necessidade de apresentar aos professores a classificação por
unidade educacional, pois essa forma de fazê-lo provoca decepção e desculpas. Mesmo
dizendo aos professores que o resultado não é responsabilidade deles, mas de todo o
Colégio, eles sentem-se responsáveis diretos pelos resultados e isso me parece normal numa
concepção docente responsável.
Faz-se necessária também uma análise sobre as próprias condições de trabalho do
educador que tem expressado a insatisfação com seu próprio fazer docente. Perceber suas
perspectivas, suas metas, sabendo qual seu ideal de educação e se este condiz com a proposta
efetiva do Colégio, que se mostraram comprometidos com sua ação docente. Mesmo que
algumas questões tenham sido elencadas com os professores, como o fato do SIMA não
avaliar o trabalho docente em sua individualidade ou a adequação dos conteúdos às
necessidades da série, precisam ser reforçadas, pois o ensino ainda apresenta-se propedêutico,
contrariando a proposta de um ensino com significado.
3.2. O aluno pesquisador, comunicador e solidário na visão do Colégio Marista e as
categorias freireanas de curiosidade epistemológica/ingênua, dialogicidad, e solidariedade.
Os termos pesquisador, comunicador e solidário surgiram a partir do Grupo de
Estudos Novo Ensino Médio
26
e foram ampliados como ideal de aluno também para o Ensino
26
Grupo de Estudos Novo Ensino Médio que foi criado em 2001 por uma necessidade administrativa nacional da
Rede Marista, pois naquele momento o Ensino Médio indicava sinais de crise evidenciada na evasão de alunos.
O grupo era composto por profissionais da Província Marista Brasil Centro-Sul, da Província do Rio Grande do
Sul e do Brasil Centro-Norte e tinha como objetivo “refletir sobre o Ensino Médio e elaborar propostas que
possibilitassem a ressignificação de sua identidade no contexto da educação básica à luz do documento Missão
Educativa Marista” (Projeto Curricular em Ação Ensino Médio). Foram 19 encontros entre os anos de 2001 e
2005, quando o pré-projeto foi lançado nos Colégios.
93
Fundamental, pois o grupo entendia que não seria possível constituir essas competências
estudantis nessa perspectiva apenas no Ensino Médio.
O Projeto Curricular em Ação foi apresentado para os colégios pelos
representantes que participavam das discussões do grupo, e como proposta inicial para as
unidades seria o estudo sobre “Aprendizagem Significativa
27
para fortalecer o embasamento
teórico dos professores a respeito das aprendizagens dos alunos não se constituírem de forma
mecânica, sem atribuição de significado. Além de ser citado no Projeto Curricular em Ação
(Anexo 02), o ideal de aluno marista pesquisador,comunicador e solidário é mencionado
especificamente num ofício endereçado aos Colégios em 2005 (Anexo 01), no Projeto Político
Pedagógico do Colégio Marista (Anexo 03) de Criciúma e nas matrizes Curriculares de
Biologia, Ciências, Física, Arte e DAPS.
Apesar de não serem enfatizadas essas competências como ideal de aluno, nas
outras matrizes curriculares (Matemática, Química, Ensino Religioso, Filosofia, Geografia,
História, Sociologia, Educação Física, Línguas Estrangeiras e Língua Portuguesa) pode-se
percebê-las pela análise dos eixos estruturantes que salientam a investigação e a linguagem
como essenciais no processo de aquisição dos conhecimentos e percebem a solidariedade
como condição para transformação social. De acordo com a Matriz de Biologia, por exemplo,
esses eixos revelam a identidade do componente curricular e sistematizam os conteúdos,
apontando estratégias e orientando as avaliações, visando proporcionar maior visibilidade à
disciplina.
Como um dos objetivos de minha investigação foi identificar os significados
atribuídos pelo Colégio quanto às categorias propostas para seu ideal de aluno, tanto nos
documentos quanto nos discursos dos educadores, iniciei a pesquisa documental pelo PPP e o
Projeto Curricular em Ação, sendo necessário posteriormente me reportar à leitura das
Matrizes Curriculares. Ao não encontrar as definições diretas em todas as matrizes optei por
anexar no trabalho final apenas a Matriz Curricular de DAPS porque seu objeto de estudo é o
aluno e suas relações.
Lembrando, o componente curricular Desenvolvimento Acadêmico, Pessoal e
Social é uma disciplina elaborada especialmente para aproximar o aluno do mundo concreto,
situá-lo no contexto social, muito próxima, portanto, ao ideal de aluno marista. No colégio de
Criciúma, que optou por não oferecê-la como uma disciplina, seus conteúdos acabaram sendo
de responsabilidade de todos os professores. No decorrer desse texto procurarei elencar o que
27
Os estudos feitos foram baseados em MOREIRA, Marco Antônio; MASINI, Elcie F. Salzano sobre
aprendizagem significativa, de acordo com David Ausubel.
94
significam essas categorias de acordo com os documentos e pesquisa empírica nesta
sequência, fazendo posteriormente uma reflexão sobre as aproximações e distanciamentos
possíveis com as categorias freireanas de curiosidade ingênua/epistemológica, dialogicidade
e solidariedade.
De acordo com o Projeto Político Pedagógico (PPP) do Colégio Marista os
objetivos do Colégio são:
estabelecer a relação teórico-prática na área educacional, analisando todos os
aspectos que podem aprimorar o ensino e a formação integral do ser humano;
promover a educação integral e harmônica da criança, do adolescente e do
jovem;
formar os educandos para a liberdade e para a responsabilidade;
orientar os educandos para internalizar, consciente e responsavelmente, uma
escala de valores humanos e cristãos;
cooperar para formar o homem que seja livre, consciente, crítico, comunitário e
solidário, membro da comunidade social e eclesial, comprometido na promoção das
pessoas;
preparar o educando pesquisador, solidário e comunicador para o exercício
consciente da cidadania;
estimular a criatividade do educando;
proporcionar o desenvolvimento da capacidade sensório-motora e das
habilidades;
criar ambiente de onde o educando possa receber, experimentar e aprofundar
os valores evangélicos. (PPP, p. 11, grifo meu)
Este documento não especifica as características de um aluno pesquisador,
comunicador e solidário, apenas cita essa formação dentre os objetivos do Colégio. A missão
do Colégio Marista de Criciúma “é tornar-se um centro irradiador de uma nova sociedade, em
que o homem, comprometido com a verdade, justiça e paz contribua na construção da
fraternidade e do bem estar social”.(PPP, 2008, p. 11)
A explicação das categorias pesquisa, comunicação e solidariedade encontram-se
no ofício endereçado aos Colégios em 2005 (Anexo 01), que se propõe formar o aluno para:
(1) A pesquisa: o aluno deve ser capaz de analisar criticamente os problemas do
mundo, formulando perguntas e propondo respostas, em um processo
problematizador sempre passível de confirmação, inovação e modificação [...]
(2) A comunicação: o aluno deve estar apto a expressar ideias e sentimentos com
clareza, consistência e coerência, valendo-se dos recursos e formas disponíveis de
representação, tornados eficazes na interação comunicativa com o outro e com o
mundo [...]
(3) A solidariedade: educar o aluno na e pela solidariedade, assumida como “a
virtude cristã dos nossos tempos e como imperativo moral para toda a humanidade,
no quadro da atual interdependência global e das penetrantes estruturas do
pecado
28
”. (CEMEP, 2005)
28
Missão Educativa Marista: um projeto para nosso tempo. Comissão Internacional de Educação Marista (1995-
1998). 2.ed. São Paulo: SIMAR, 2000, p. 61.
95
O documento ainda destaca o desafio dos Colégios no sentido de articular o
currículo com os objetivos pedagógicos e as situações didáticas, visando à formação do aluno
pesquisador, comunicador e solidário. Refere-se também à necessidade de adequação à
realidade contemporânea no desenvolvimento de capacidades para o enfrentamento e a
resolução dos problemas planetários.
Descreverei a demarcação da categoria pesquisa nos documentos e posteriormente
os dados da pesquisa empírica bem como sua aproximação com a curiosidade epistemológica
de Freire. O ofício 03/05 (Anexo 01) encaminhado aos colégios evidencia a relação direta
entre a escola, o educador e a pesquisa:
A ação educativa da escola deve incentivar a pesquisa, a pergunta, a curiosidade, a
ação de buscar o conhecimento e de gerar informações tanto por parte dos alunos
quanto dos professores, favorecendo a construção da autonomia responsável. O
professor vive a pesquisa em sua própria vida e a incentiva em seus alunos,
construindo assim um esquema dialético de avaliação e interpretação. Para tanto, é
preciso ser capaz de elaboração própria do conhecimento para que possa promover
uma intervenção social responsável e eficaz, o que implica renovação constante.
(CEMEP, 2005)
Nessa perspectiva de formação de um aluno pesquisador é necessário um professor
também com essa característica. O Projeto Curricular em Ação propõe também que o docente
seja colocado em situações em que se reconheça enquanto sujeito, para que, dessa forma,
possa transformar o seu fazer pedagógico sob a constituição de uma nova concepção de
educação. Este projeto visava ainda:
5.2. Constituir-se em instrumento de qualificação e formação de professores
mediadores, oferecendo momentos de participação em debates, visando à construção
das concepções de educação e currículo e que sejam capazes de ensinar para a
autonomia na autonomia, desenvolvendo o espírito de pesquisa, investigação,
comunicação e solidariedade. (PROJETO CURRICULAR EM AÇÃO, 2005)
A ressignificação curricular é citada, de modo a alcançar o ideal de aluno proposto
sem desfocalizar seu processo formativo na transmissão dos conhecimentos escolares. De
acordo com o projeto, é necessária a superação do ensino propedêutico para um outro voltado
mais às aprendizagens com significado. A lógica burocrática de ensino, da transmissão de
conteúdos à mediação necessita ser alcançada por meio da proposta deste projeto.
O Projeto foi lançado em 2005, mas não se ouviu falar muito dele após este
período. As matrizes curriculares que estavam em fase de discussão foram concluídas e as
demais também elaboradas. Dentre um total de quinze matrizes escritas na Província Marista
Brasil Centro-Sul, a investigação é apresentada como eixo em sete, demonstrando uma
96
valorização ao ato da pesquisa. Cada uma delas é apresentada de acordo com a área do
conhecimento, mas lhe é atribuída importância para a transformação social.
As Matrizes Curriculares de Biologia, Ciências, Química e Física destacam a
necessidade do eixo investigação científica para que seja produzido e cultivado o espírito
investigativo. Salientam ainda que este eixo abre possibilidades de desenvolvimento de novos
conceitos e novas interpretações dos temas vivenciados, superando a contemplação dos
fenômenos observados.
A Matriz Curricular de Filosofia compreende a investigação como a capacidade de
não se contentar com o dado pronto, mas que oportuniza disposição para questionar as
práticas e os valores socialmente aceitos e para buscar novas formas de compreensão e
apreensão do mundo. O documento ainda define que a inquietação proposta pela Filosofia
deve estar associada à criticidade e propõe-se ainda a promover embates que favoreçam
construções teórico-práticas sobre os problemas que afetam a vida dos homens. Contrariando
a visão utilitarista da escola, essa definição atribui a esta disciplina o auxílio na organização
dos processos de formação que visem ensinar e aprender, a ter raciocínio lógico, a saber
pesquisar, a fazer sínteses e elaborações teóricas e outras competências que sejam necessárias
para o educando.
A investigação também é destacada na Matriz Curricular de Sociologia como eixo.
Nesse documento ela é apresentada como investigação sociológica e destacada sua
importância na produção de conhecimento científico e na análise dos fenômenos sociais em
suas várias esferas, atribuindo sua colaboração para a ampliação da interpretação da realidade.
Destaca que a diversidade dos temas estudados pela disciplina deve ser relevante na vida dos
alunos e que estes devem ser estimulados à construção de um olhar científico que permita
compreender seu contexto histórico e refletir sobre as implicações sociais.
A prática investigativa dentro dessa matriz é considerada um exercício de
cidadania, que será ela que oportunizará a possibilidade de traduzir os conhecimentos da
Sociologia, compreendendo suas especificidades metodológicas e construindo significados a
partir dos dados analisados, interpretados para, posteriormente, transformar positivamente a
realidade social. A disciplina de sociologia caracteriza-se como um saber essencial ao aluno
pesquisador, pois poderá atribuir-lhe aspectos importantes à cidadania, evitando a mera
repetição de conteúdos e a ideia de uma sociedade pronta e acabada, mas entendendo-a
enquanto processo contínuo de construção e reconstrução.
Além das matrizes citadas, a Matriz de DAPS oportuniza algumas reflexões na
97
formação do aluno pesquisador, comunicador e solidário. Esta matriz é de responsabilidade
de todos os professores e tem como eixos estruturantes as dimensões acadêmica, pessoal e
social, na tentativa de ver o educando em sua integralidade:
O DAPS explora as interações da pessoa com o meio em que vive e se relaciona.
Engloba os núcleos dos saberes que emanam da pessoa como objeto de estudo e
voltam para ela como objeto do conhecimento. Nessa retroalimentação reside a
complexidade da disciplina que, ao mesmo tempo envolve devido às suas
características essenciais, possibilita a complementaridade entre as diversas áreas. O
processo de ensino e aprendizagem favorecido no DAPS envolve questões ligadas à
organização escolar, às vivências, interações pessoais e habilidades sociais que
fundamentam o “aprender a ser” e o “aprender a conviver”, ou seja, tudo o que diz
respeito ao aluno como sujeito em sua integralidade. Dessa forma, todo o universo
do aluno pode ser traduzido como conteúdo, fonte inesgotável para a motivação e
desencadeamento de ações. (MATRIZ CURRICULAR DE DAPS, 2008, p. 3, sic)
Para o alcance dessas características, o documento faz menção às competências
e habilidades desenvolvidas por essa disciplina, elencando três competências das cinco
citadas no ENEM:
III. Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações representados
de diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situações problema.
IV. Relacionar informações, representadas em diferentes formas, e conhecimentos
disponíveis em situações concretas, para construir argumentação consistente.
V. Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para intervenção solidária
na realidade, respeitando os valores humanos e considerando a diversidade
sociocultural. (MATRIZ CURRICULAR DAPS, 2008, p. 24)
As competências escolhidas para a Matriz Curricular de DAPS associam-se com
as três características do aluno Marista quando relacionam a coleta de informações para
argumentação consistente e intervenção social. Para uma argumentação consistente é
necessário pesquisa e boa comunicação e a intervenção social pode ser realizada por meio da
solidariedade. Esta Matriz ainda destaca três habilidades do ENEM e elenca quais devem ser
desenvolvidas em cada eixo estruturante:
ACADÊMICA
a. Desenvolver hábitos de estudo “cultivando a memória, capacidade de síntese,
os critérios para reflexão, o juízo crítico, hábitos de trabalho intelectual, assim
como as habilidades que lhe permitam assumir o trabalho com expressão e
criatividade”, buscando a autonomia para ser pesquisador, comunicador,
empreendedor e solidário.
PESSOAL
a. Aprender a cultivar a auto-estima, a persistência, a resiliência, desenvolvendo
autonomia e responsabilidade na tomada de decisões.
SOCIAL
a. Analisar as relações humanas, observar e modificar maneiras de
relacionamento pessoal e interpessoal, desenvolvendo o protagonismo, a
solidariedade e a comunicação.
98
b. Aplicar as regras de convivência em seu cotidiano, reconhecendo a diferença
como elemento natural no mundo, ampliando os vínculos sócio-afetivos em prol
de um exercício consciente da civilidade, da solidariedade, da mediação e da
resolução de conflitos. (MATRIZ CURRICULAR DE DAPS, 2008, p. 25)
O eixo dimensão acadêmica é voltado aos interesses do aluno enquanto ator
e agente do processo educativo. Determina as funções e tarefas que dizem respeito ao
educando. Assim, esse eixo apresenta um conjunto de habilidades que visa à mobilização
dos saberes e sua aplicabilidade, proporcionando a produção e a integração dos
conhecimentos que vão construir e corroborar a competência acadêmica.
A dimensão pessoal, como eixo da Matriz Curricular de DAPS, percebe o
educando além de seu contexto escolar, sendo marcado por suas características e
particularidades individuais, marcadas pelas formas de perceber e significar o mundo e de
sua interação com ele.
É, em diferentes contextos como, por exemplo, o familiar, sociocultural e escolar
que o aluno constrói sua identidade e autonomia na busca do
autoconhecimento, da auto-observação, da auto-estima, da ampliação de
perspectivas pessoais e da compreensão da relação com o outro. Diante dessas
necessidades, o trabalho com esse eixo contribui para o desenvolvimento da
consciência dos próprios sentimentos e do dos outros, da automotivação, da
compreensão das próprias potencialidades e dificuldades, da sensibilidade,
discernimento, senso estético, responsabilidade e espiritualidade. (MATRIZ
CURRICULAR DE DAPS, 2008, p. 10)
A dimensão social é o último eixo da Matriz Curricular de DAPS e visa ao
desenvolvimento de habilidades necessárias para que o educando relacione-se positivamente
com seus pares. Cita a competência social como responsável por condutas e procedimentos
no enfrentamento de diversas situações que a vida impõe.
A categoria pesquisa liga-se à dimensão acadêmica, pois é uma das habilidades a
que este eixo se propõe, mas não se desvincula dos outros dois eixos, pelo fato de estar ligada
diretamente às individualidades do sujeito e da interdependência de outras pessoas para
realizá-la.
Foi possível perceber pelas entrevistas que esse ideal de aluno é conhecido não
como característica Marista, mas como necessidade educacional dos dias atuais. Os
professores definem a necessidade de criação de espaços de pesquisa e comunicação para que
a sociedade seja transformada. Percebem os conteúdos tratados em sua disciplina como
instrumentos para que a solidariedade aconteça entre os povos. A maioria dos entrevistados
não demonstrou conhecimento da proposta como ideal de aluno marista, mas concorda que é
99
necessário o desenvolvimento dessas competências para que o aluno possua autonomia
estudantil.
De acordo com as Entrevistadas A e D, o aluno pesquisador é aquele que vai em
busca do conhecimento e não espera conteúdos prontos. Para essas educadoras, o ensino de
conteúdos deve promover a curiosidade nos alunos para que estes queiram aprender mais.
O ensino dos conteúdos deve apenas atiçar os conhecimentos, despertar a
curiosidade para que ele aprofunde os conteúdos que a escola tem trabalhado. Não
basta assimilar conteúdos prontos. A sala de aula é apenas o meio para incitação de
maior desejo de conhecer. (Entrevistada A)
A Entrevistada B acrescenta que o aluno pesquisador:
[...] é aquele que, deparando-se com um tema, sabe onde buscar, sabe redigir sobre
aquele assunto sem estar precisando que o professor esgote as possibilidades. Ele
resolve situações-problema. Eu dou aula para o nono ano e Ensino Médio e percebo
o crescimento de nossos alunos. Trabalho em outras escolas e o enfoque que posso
dar aqui no incentivo à pesquisa e a problematização faz a diferença quando eles
chegam na terceira série do Ensino Médio. (Entrevistada B)
Para essa educadora, para que seja considerado pesquisador, o aluno deve possuir
protagonismo em suas atividades de estudo, resolvendo situações complexas por meio de
diferentes caminhos, não ficando limitado a apenas uma solução para os problemas propostos.
Nesse sentido, o aluno precisa mostrar-se desejoso de apropriar-se dos conhecimentos, não se
limitando às aulas ou apenas aos conteúdos propostos nos livros adotados pelo Colégio.
A Entrevistada D concorda: “Um aluno que tenha vontade de sair em busca de se
aprofundar, que ele seja instigado para pesquisar, para ter autonomia, e o contrário também
deve ocorrer: precisa possuir autonomia para saber pesquisar”. Ela ainda ressalta que a
autonomia de pesquisar é um dos requisitos básicos para a contratação dos professores no
Colégio Marista, pois para ensinar alguém a pesquisar é necessário, antes, vivenciar a
pesquisa.
A Entrevistada F salienta o papel do professor no processo de pesquisa:
O aluno pesquisador é aquele que consegue elaborar seus conhecimentos por meio
da pesquisa orientada. São os professores que têm a responsabilidade de ensinar a
pesquisar. Ele não pode ser visto como alguém dono do saber, mas que possui
competência para ensinar a investigar porque também é um investigador.
De acordo com essa educadora, a pesquisa é mediada por professores-
pesquisadores, que se apresentam também como aprendizes. Para ela, o professor, quando
representa ser o “dono da verdade”, inibe a aprendizagem. Não considera o educador como
100
aquele que “guiará” alguém que não sabe aonde vai, mas ao contrário, oferece diferentes
possibilidades de busca, fazendo do aluno co-autor do conhecimento estudado.
A coragem de expor sua opinião e o compromisso social da pesquisa também
foram citados:
Aquele que expõe e defende sua opinião, toma posição em variados assuntos, é um
aprendiz independente, busca o algo mais, sem esperar pelo professor. Ainda assim,
tem consciência de seu papel em classe bem como na sociedade, auxiliando os que
têm dificuldade e buscando ajuda quando precisa. (Entrevistado G)
No entender do Entrevistado L, o pesquisador tem que saber fazer a pesquisa, mas
isso não significa apenas catalogar ou repassar para o papel o que leu, analisando ou
sintetizando. Ele deve compreender para poder escrever o que entendeu. A análise precisa ter
diferentes fontes, não apenas uma, para que ele possa fazer o comparativo entre elas.
Segundo o Entrevistado M, as categorias estudantis elencadas são indissociáveis e
são subordinadas ao conceito de autonomia:
Essas três características estão ligadas ao conceito de autonomia. Os estudantes que
pesquisam, comunicam-se e que de alguma forma transcendem essa dinâmica sendo
solidários. A dinâmica de autonomia acontece com uma série de trabalhos e
situações que o professor pode proporcionar.
O estudante não é aqui no Colégio e eu posso cultivar a dinâmica de pesquisa
nele e mantê-lo pesquisador em outros locais. A pesquisa deve estar atrelada à vida
social desse indivíduo. Minha aula parte do pressuposto que a pesquisa e a
individualidade são elementos fundamentais, mas estão ligados ao conceito de
liberdade, por isso é importante que os alunos também compreendam o que significa
liberdade.
A maioria dos educadores entrevistados salientou a necessidade da pesquisa no
dia-a-dia escolar, sendo vista como oportunidade de ampliação dos conhecimentos tratados
em sala de aula. A responsabilidade docente também foi elencada como condição para o
alcance do aluno pesquisador. Os educadores do Colégio visualizam a necessidade de não
apenas oportunizar a pesquisa, mas vivenciá-la no seu dia-a-dia docente. O que pude
perceber, no decorrer das entrevistas, foi um certo desconforto em relação aos objetivos
propostos. Quando questionados sobre suas práticas para o alcance do aluno pesquisador,
bem como comunicador e solidário, os professores argumentaram a falta de tempo para
trabalhar tantos objetivos e voltaram a citar as avaliações.
A Entrevistada A considera a escola, de uma maneira geral, retrógrada e cuja
exigência ainda pauta-se em conteúdos prontos em vez de objetivar um ensino que realmente
tenha significado para os educandos.
O Entrevistado N, como citado anteriormente, quando questionado sobre sua
101
contribuição para o alcance do aluno pesquisador, salientou sua responsabilidade docente:
Tenho noção de minha responsabilidade e isso me incomoda bastante, pois não
tenho uma concepção conteudista, mas o tempo para discussões mais profundas não
é o suficiente. Sei que não é a quantidade de capítulos trabalhados que farão meus
alunos saberem mais ou menos. Portanto, procuro utilizar notícias trazidas por eles
ou por mim para associar aos conteúdos trabalhados. O presente deles é importante,
não podemos viver no passado nem no futuro. Mas a falta de tempo é que faz com
que eu nem sempre faça o que acredito ser certo.
Para o Entrevistado N, muitas de suas aulas assumem caráter bancário por não
poder abrir muito espaço ao diálogo. Quanto à pesquisa, ele manifesta fazê-la de modo
problematizador, incitando seus alunos a estudarem os textos destacando suas principais
dúvidas e pesquisando em outras fontes que não sejam seus livros textos. Este entrevistado
explica que a orientação da Assessoria do Colégio é que trabalhe com problematizações
durante as aulas, mas que ele nem sempre consegue fazê-lo, por falta de tempo.
De acordo com Freire, a curiosidade é necessidade ontológica, mas que pode
ultrapassar os limites do domínio vital para tornar-se produtora de conhecimentos. Segundo o
autor, para superação de uma curiosidade a outra, da ingênua para a epistemológica, é
necessário uma ação problematizadora que possibilite aos educandos uma visão crítica do
mundo que os cerca. Práticas pontuais feitas por professores que problematizam os conteúdos
abordados, escolhidos por eles ou não, mesmo que não seja o ideal se comparando com uma
proposta de problematização que concretamente esteja presente no dia-a-dia escolar, podem
auxiliar os alunos a vislumbrar outras possibilidades de ver o mundo. A visão única sobre os
fatos, praticada pelo bancarismo, não abre possibilidades de pensar criticamente sobre eles,
pois limita o pensar discente. Como citado anteriormente, a problematização em sala de aula
não é muito praticada pelos professores do Colégio.
Para que possa produzir conhecimento, na visão de Freire ([1996] 2001), a
curiosidade precisa ultrapassar os limites peculiares do domínio vital. É a capacidade de olhar
o mundo de forma curiosa que tornou os seres humanos capazes de atuarem no mundo que os
cerca. Mas a curiosidade, mesmo sendo inerente ao ser humano, para se tornar epistemológica
precisa ser trabalhada de forma problematizadora. Essa curiosidade pode ser vista nos
documentos do Colégio Marista de Criciúma quando incentiva a pesquisa e se utiliza da
investigação como eixo na proposta de trabalho, mas quanto à pesquisa empírica pode-se
perceber que os professores não se mostram satisfeitos com sua prática, elencando a falta de
tempo para formar com vistas à argumentação.
A curiosidade epistemológica elencada por Freire aproxima-se da pesquisa
102
destacada nos documentos quando se compromete com a transformação da sociedade atual.
Mas se distancia quando os entrevistados afirmam estar submetidos ao que podemos
identificar como bancarismo, pois esse modelo subordina tanto educador quanto educando,
reprimindo a curiosidade e desestimulando a capacidade de desafiar-se. Para que os alunos
superem a curiosidade ingênua é necessária uma educação problematizadora, fundada na
crença da humanização, no sentido da vocação ontológica do ser mais, dos atores escolares.
De acordo com Freire ([1996] 2001), para que seja possível uma prática docente
crítica faz-se necessário o pensar certo, o qual consiste num movimento de reflexão sobre a
própria prática pedagógica. É por meio da rigorosidade metódica do professor, ao planejar
suas aulas, que a curiosidade epistemológica pode ser alcançada, pois o que a prática
espontânea produz é um saber ingênuo, acrítico. O autor determina que foi a capacidade de
perceber o mundo curiosamente que tornou os homens capazes de transformá-lo e afirma que
a educação torna possível ao homem perceber sua vocação ontológica de ser mais e auxiliar
seus pares para que também o sejam.
Os professores do Colégio Marista de Criciúma, ao contrário do que dizem os
documentos, manifestam não conseguir praticar a pesquisa com a tranquilidade necessária e
afirmam que uma investigação bem feita precisa ser realizada em sala de aula onde eles
poderão dar as orientações necessárias aos alunos que necessitem. Expressam - o que
podemos interpretar - que os encaminhamentos metodológicos ainda tem caráter bancário
pelo tempo limitado de trabalho junto aos educandos.
Pensar a pesquisa como determinam os documentos do Colégio é possível se este
tempo, tão reclamado pelos professores, pudesse ser ampliado ou alguns objetivos reduzidos.
Ou seja, a proposta pedagógica da pesquisa parece esbarrar no aspecto concreto de avaliação
do conteúdo que deve ser ministrado, não permitindo tempo para se alcançar todos os
indicadores propostos nas matrizes. A proposta das matrizes curriculares proporciona uma
visão de pesquisa que leve o aluno junto com o professor a responsabilizar-se pelo próprio
processo de aprendizagem, mas seria interessante uma discussão com os próprios docentes
sobre a impossibilidade dessa formação manifestada na pesquisa empírica. O fato de haver
uma proposta que abre essa possibilidade já é um começo, o que precisa ser discutido entre os
educadores é a real razão que impossibilita a prática. A proposta dialógica de Freire seria
bastante viável para o Colégio, no sentido de buscar junto com os professores soluções para
os problemas encontrados quanto à integração da pesquisa no fazer pedagógico.
É possível perceber um distanciamento da proposta freireana no que concerne à
pesquisa, quando não associação desta categoria à conscientização. Para Freire ([1996]
103
2001), o ato curioso deixa de ser ingênuo e passa a ser epistemológico pela rigorosidade
metódica, desenvolvida pelo ato consciente dos homens de se fazerem sujeitos também. Os
documentos citam a necessidade da investigação para que os alunos se apropriem do
conhecimento e percebam o mundo que os cerca de forma crítica. Faz-se necessário
considerar que essa crítica não é a mesma citada pelo autor, quando evidencia o homem em
sua condição ontológica de ser mais, tornando-se sujeito, colocando-se a favor dos oprimidos,
transformando a realidade que o cerca com outros homens que também se fizeram sujeitos por
seu posicionamento radical.
O posicionamento radical, segundo Freire ([1987] 1996), alicerçado no diálogo,
oportuniza ao homem a superação de uma consciência à outra, da instransitiva para a
transitiva ingênua e posteriormente à crítica, porque é alimentado pela radicalização que é
crítica e criadora. Posicionamento este que contraria o sectarismo, fechado por seu
antidiálogo. Como citado anteriormente:
É que a sectarização é sempre castradora, pelo fanatismo de que se nutre. A
radicalização, pelo contrário, é sempre criadora, pela criticidade que a alimenta.
Enquanto a sectarização é mítica, por isso alienante, a radicalização é crítica, por
isto libertadora. Libertadora porque implicando o enraizamento que os homens
fazem na opção que fizeram, os engaja cada vez mais no esforço de transformação
da realidade concreta, objetiva. (FREIRE [1987] 1996, p. 25)
Os professores do Colégio Marista, junto com sua assessoria e direção, podem
optar pela radicalização, que amplia os horizontes dos sujeitos por apresentar a eles sua
própria libertação, ou a sectarização, que aprisiona e prende em círculos de segurança,
impedindo-os, assim, de transformarem a realidade e suas próprias práticas, como propõem os
documentos. É necessário enfrentamentos, apropriação da teoria que rege a proposta e opções
metodológicas que sejam coerentes com o discurso teórico.
Quanto ao aluno comunicador, seguirei o mesmo viés. Na análise documental
verificando suas possibilidades por meio do Projeto Curricular em Ação, do PPP, das
matrizes, especificamente a de DAPS. Posteriormente a apresentação dos dados empíricos,
farei uma aproximação com a categoria freireana de dialogicidade.
Relembrando a citação feita anteriormente contida no ofício 03/05 quanto a
formação do aluno para comunicação:
[...] o aluno deve estar apto a expressar ideias e sentimentos com clareza,
consistência e coerência, valendo-se dos recursos e formas disponíveis de
representação, tornados eficazes na interação comunicativa com o outro e com o
mundo [...] (CEMEP, 2005)
104
De acordo com o Projeto Curricular em Ação, a educação deve promover a
participação e a criatividade no processo de aprendizagem, contribuindo para que o aluno
construa autoconfiança na relação com seus colegas para que conquiste a competência de
trabalhar em grupo e a se comunicar com o outro, assumindo suas responsabilidades: “Estar
com o outro, sensibilizar-se com as diferenças, mobilizar conhecimentos que gerem atitudes
solidárias, interferindo socialmente, são ações que demonstram a identidade do aluno do
Ensino Médio Marista”.(PROJETO CURRICULAR EM AÇÃO, 2005)
Este documento ainda salienta que a apropriação da cultura só é possível por meio
da leitura e escrita e que é função da escola oportunizar as linguagens diferentes próprias de
cada área do conhecimento para que os educandos se utilizem delas para comunicar-se bem
no mundo em que vivem.
2.9. O Ensino Médio, ao longo dos anos, tem priorizado e legitimado, como
possibilidade de expressão e representação do mundo, o domínio exclusivo da
linguagem escrita, academicizada, negando a multiplicidade e variedade de
linguagens que produzem e explicam os significados e sentidos do mundo. Esse
aspecto, de certa forma, tem impedido que as culturas juvenis seus
conhecimentos, seus saberes, suas formas de representação, seu universo cultural,
sua visão de mundo entrem na escola e façam parte do processo ensino-
aprendizagem. (PROJETO CURRICULAR EM AÇÃO, 2005)
Dentre os objetivos específicos do Projeto, encontra-se:
5.5. Ampliar as possibilidades de leitura, interpretação, análise e representação do
mundo, por meio do reconhecimento das múltiplas linguagens (artística, visual,
musical, gestual, corporal, entre outras), visando ao desenvolvimento das diversas
formas de expressão, comunicação e produção de ideias. (PROJETO
CURRICULAR EM AÇÃO, 2005)
A Matriz de DAPS apresenta a comunicação como característica do aluno marista
e contextualiza que essa matriz auxilia na formação desse ideal, buscando respostas aos
desafios impostos pelas demandas atuais, alicerçados nas exigências da educação para o c.
XXI: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver:
[...] Com relação ao aprender a fazer, exigência essencial à estética, à formação
profissional, ao exercício do próprio ofício e ao preparo para o mundo de trabalho
que permeiam a Educação Básica, destacou-se a ênfase no hábito de estudo, na
pesquisa e na comunicação/aplicação dos conhecimentos significativos. O
investimento na assertividade como meio de organização e cooperação, motivando o
empreendedorismo e a transformação do conhecimento.(MATRIZ CURRICULAR
DE DAPS, 2008, p. 9)
O PPP do Colégio Marista de Criciúma não conceitua as categorias em sua
escrita, apenas cita-as em seus objetivos. Como dito anteriormente, as matrizes curriculares
105
que especificam esse ideal de aluno são as de Biologia, Ciências, Física e Arte, mas outras
utilizam o eixo linguagem com o objetivo de promover o domínio da comunicação em cada
área do conhecimento. O eixo linguagem é apresentado em nove das quinze matrizes
curriculares.
A Matriz Curricular de Biologia atribui à linguagem o predomínio da função
informativa, clareza, precisão e um vocabulário técnico-científico e destaca que quando o
aluno compreende a origem dessa linguagem, avalia como ela é, a usa para representar as
verdades provisórias da ciência. Refere-se também à importância de relacionar o significado
de um conceito a uma rede constituída por outros conceitos que determina o seu significado
biológico, ou seja, suas origens a qual estão inter-relacionados no tempo e espaço.
Explica que um conceito nunca está isolado, pois dialoga com vários outros e, por
isso, a análise de sua origem, bem como de suas características terminológicas, precisam ser
estudadas na sua inter-relação. Este eixo, segundo a matriz, também possibilita, ao abordar a
estrutura e origem dessa linguagem, que o sujeito possa analisar, compreender, ampliar,
registrar e desenvolver sua criticidade em relação aos fenômenos científicos, biológicos ou de
senso comum, ampliando seu conhecimento sobre o mundo.
De acordo com as matrizes de Biologia e Física, entre as ciências, essas
disciplinas possuem a particularidade de exigir diferentes linguagens para sua compreensão -
oral, escrita, visual e, em alguns casos, a linguagem matemática. Dessa maneira, exigindo que
a linguagem apresentada pela disciplina de Biologia abranja os modelos teóricos elaborados
pelo homem que buscam representar os recursos naturais.
A Matriz Curricular de Ciências afirma que o eixo busca promover o domínio da
linguagem empregada pela ciência para significar e mediar seus saberes. Caracteriza a
linguagem como um corpo de conceitos que a área usa para ver e produzir objetos do
conhecimento, abrindo possibilidades e facilitando a compreensão das ciências.
O eixo linguagem é apresentado na Matriz Curricular de Química como
responsável pela mediação e significação dos conteúdos, pois compreende a capacidade
humana de articulação de significados coletivos em sistemas arbitrários de representação, de
certa forma compartilhados e que variam de acordo com as necessidades temporais, sociais e
locais. Para este documento, a linguagem possibilita a discussão articulada, a formulação de
problemas, o encontro de soluções e a expressão de novos conhecimentos, fornecendo
espaços para qualificação por meio da crítica. Reafirma a diferença da linguagem científica
concordando com as matrizes de Biologia e Física.
Diferente do destacado nas matrizes anteriores, a linguagem nas matrizes de
106
Sociologia e Filosofia é descrita como superação da simples representação de ideias ou
objetos ou como instrumento de comunicação, ao contrário, propõe uma concepção mais
ampla, ligada às várias possibilidades de compreensão e significação dos signos disponíveis
na sociedade. Estes dois documentos consideram todo ato de linguagem um processo de
produção e interpretação, construídos pelos sujeitos e que precisa ser reconhecido pertencente
a um jogo interacional, com intencionalidades explícitas e veladas. Trata-se de um processo
de invenção daquilo que a própria linguagem narra.
De acordo com a Entrevistada A, a comunicação é:
O meio pelo qual podemos expressar os sentimentos, angústias. No caso dos alunos
não é diferente. Quando ele se expressa torna-se dono daquilo que disse, mostra a
valorização que para o mundo que o cerca. Por isso é tão importante procurar
formar alguém que saiba se comunicar: assim ele poderá expressar tudo de forma
clara e objetiva, não apenas os conteúdos da escola. Não me refiro a ser um aluno
que domine apenas conteúdos conceituais ou factuais, mas que saiba viver e
expressar-se vivo pela linguagem.
Segundo a Entrevistada B, saber comunicar-se é compreender os noticiários
referentes à ciência porque se apropriou da linguagem científica e consegue fazer relações
com o que estudou por meio de suas pesquisas ou os conteúdos em sala de aula. Ela afirma
que essa capacidade auxilia o educando na intervenção no meio em que vive. A Entrevistada
D concorda e afirma que as características propostas para o aluno estão relacionadas umas
com as outras quando afirma que:
O aluno pesquisa, mas essa investigação tem que servir para algo. Penso que para
mudar a sociedade em que ele está e a apropriação das linguagens auxilia nessa
transformação. Não adianta estudar ciência e não saber o que fazer com ela. O
aporte teórico dado pelo Colégio deve servir para o futuro do aluno. Eu instigo meu
aluno a ter autonomia na pesquisa e espero que ele saiba que seu uso não é aqui
em sala de aula. Fazemos a Multimostra aonde o aluno precisa demonstrar-se apto
para apresentar seus trabalhos. Além de desenvolver a pesquisa, sempre
acompanhado pelos colegas e professor, precisa defender sua proposta de trabalho. É
claro que cada aluno o fará dentro de suas possibilidades. Mas por isso a
importância de conhecermos nossos alunos, assim poderemos perceber os
avanços. É uma oportunidade de percebermos também até que ponto eles
solidarizam-se uns com os outros.
A Entrevistada F também salientou a questão da comunicação como mobilidade
social, referindo-se a ela como necessária para que as pessoas unam-se para melhorar seu
meio social.
O Entrevistado L concorda com o fato do comunicador não ser apenas aquele
que faz a pesquisa, mas sabe expressá-la das mais diversas maneiras, o apenas de forma
oral, mas gestos (teatro) e mídias diversificadas. De acordo com o Entrevistado N, o
107
comunicador domina o conhecimento e sabe transmiti-lo, tendo domínio da oratória,
expressando-se de forma limpa, nítida.
O Entrevistado E define o aluno comunicador como aquele que se comunica
bastante com o outro, tem bastante diálogo com as outras pessoas. Ao ser questionado sobre
essa comunicação reforçou a ideia da fala, ou seja, a comunicação por este entrevistado é vista
como conversa entre pares ou mesmo entre professores e alunos. Além de definir o aluno
comunicador dessa mesma forma, o Entrevistado G acrescentou que este educando busca seus
direitos sem esperar pelo professor.
A pesquisa, tanto documental quanto empírica, apresenta a comunicação como
competência de expressar-se bem nas diferentes áreas do conhecimento. Tanto nos eixos de
linguagem apresentado nas matrizes quanto à definição do Projeto Curricular em Ação, ou os
entendimentos apresentados pelos professores apresentou-se bastante coerente. O que o
Colégio propõe como competência é visto pelos professores também dessa maneira. O que
é um distanciamento dessa categoria com a dialogicidade no sentido freireano, pois, para
Freire ([1987] 1996), dialogar não é apenas expressar ideias de maneira clara, mas é ouvir e
dar o direito ao outro de dizer sua palavra. Pronunciar o mundo, percebendo-se nele e
sentindo-se participante dele é existir humanamente, segundo o autor. Mesmo que este
diálogo apresente-se como proposta, ele necessita efetivar-se na prática, por meio das ações
educativas. Ele manifesta-se nas relações estabelecidas entre educador e educando no que
concerne à relação de conteúdos, como também ao tempo de aprendizagem de cada grupo, e é
composto de amor, humildade, fé nos homens, esperança, criticidade e rigorosidade metódica.
Ser dialógico é mais que desenvolver a competência comunicativa, é tornar o outro visível,
em suas ideias e expressões. Educar para o diálogo, no sentido freireano, não se limita a
ensinar a expressão de ideias fragmentadas nas áreas do conhecimento, mas oportunizar que o
outro seja mais para que encontre o sentido de sua humanização.
O ato dialógico, para Freire[1969] 2006, não está à mercê do tempo e dos
conteúdos a serem trabalhados, pois ele problematiza os conhecimentos, sejam eles de ordem
técnica ou não. O papel do educador é “o de proporcionar, através da relação dialógica
educador-educando, educando-educador, a organização de um pensamento correto em
ambos.”(FREIRE[1969] 2006, p. 53)
Esse diálogo, ao contrário da linguagem destacada nas Matrizes, encontra-se na
realidade mediatizadora em que o educador escolhe os conteúdos com os quais vai dialogar.
Conteúdos esses sempre democratizados, pois parte do próprio olhar do educador sobre as
necessidades dos educandos. Dessa forma, o ato dialógico não se dá sozinho e é por meio dele
108
que os homens humanizam-se e têm oportunidade de olhar o mundo e sua existência como
processo. O diálogo implica eu formar a minha ideia em comunhão com os outros, em uma
incompletude própria do ser humano, que é um vir-a-ser.
Discorrerei agora sobre a categoria solidariedade segundo os documentos, a
pesquisa empírica e a visão freireana.
No Projeto Curricular em Ação (2005) pode-se perceber a solidariedade no
objetivo geral do projeto que é:
Formação humana e científica do jovem, com ênfase no aprofundamento, na
ampliação dos estudos e nas competências e virtudes que possibilitem a inserção
ética na sociedade: capacidade de trabalho em equipe, comunicar-se por meio de
múltiplas linguagens, dar sentido ao mundo em transformação, considerando as
condições de posicionamento diante das novas formas de organização de trabalho, o
desenvolvimento de competências cognitivas, sociais, políticas, psicológicas e
culturais, o cultivo do estilo Marista que contempla o zelo pela aprendizagem, a
acolhida solidária, o esforço cooperativo e a simplicidade, para favorecer a
reconstrução sistêmica e crítica do conhecimento e a vivência da justiça e da
solidariedade.
O documento atribui à proposta para o ensino como constituição de uma nova
racionalidade e uma nova dimensão relacional pautada em valores e em princípios éticos, por
meio do exercício da solidariedade, do cuidado com os outros, bem como com o ambiente, e
salienta a necessidade de respeito às diferenças de cada sujeito no alcance da promoção da
espiritualidade cristã marista. Propõe-se ainda a desenvolver sujeitos co-responsáveis e co-
partícipes dos processos de gestão escolar, que atuem na sociedade contribuindo com o
desenvolvimento dos contextos pessoais e socioculturais nos quais estão inseridos. Este
documento não maiores explicações sobre esta categoria, mas ela é encontrada no PPP
entre os deveres do professor: “[...] desenvolver junto aos alunos uma formação integral,
promovendo a solidariedade, respeitando a orientação católica do Colégio [...]”. (PROJETO
POLÍTICO PEDAGÓGICO, 2008, p. 91)
O Projeto Político Pedagógico também não especifica o que significa ser solidário
na visão do Colégio Marista de Criciúma, apenas coloca-o ao lado dos valores cristãos e
católicos, bem como a questão ética.
A Matriz do DAPS (2008, p. 7) propõe que o convívio entre as disciplinas
contribui para dar significado e sentido aos processos de formação do aluno Marista, abrindo
possibilidades para o aprofundamento e ampliação de seu ofício, “[...] colaborando, dessa
forma, para a formação de um sujeito mais aberto, flexível, solidário, crítico e que enfrenta os
problemas que as demandas atuais impõem”.
Na Matriz de Biologia a solidariedade é explicada como justificativa para a
109
conquista da melhoria de vida por meio da pesquisa científica. Cita ainda uma competência
elencada no ENEM que se refere ao reconhecimento dos conhecimentos desenvolvidos para
elaboração de propostas de intervenção solidária na realidade aliados ao respeito dos valores
humanos, considerando a diversidade de cada cultura. Na perspectiva deste documento a
formação de um aluno solidário se dá por meio da interpretação dos fenômenos relacionados à
vida, sua diversidade e manifestações nas diferentes leituras científicas, capacitando esse
sujeito na intervenção do processo tecnológico, social e na preservação do meio ambiente.
A Matriz de Química descreve como intenção dessa disciplina o desenvolvimento
de valores de solidariedade e compromisso social dos educandos, incentivando o
posicionamento de respeito a princípios estéticos, políticos e éticos. A competência do ENEM
citada na Matriz de Biologia é ressaltada nesse documento, bem como na de DAPS, Física,
Filosofia, Geografia, História, Educação Física, Língua Estrangeira e Língua Portuguesa: “[...]
Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaboração de propostas de
intervenção solidária na realidade, respeitando os valores humanos e considerando a
diversidade sociocultural [...]”
29
Segundo a matriz que norteia o trabalho de Química, vários dos objetos dessa área
são de fácil contextualização, mas é importante promover o trabalho com temas sociais que
evidenciem e propiciem condições para o desenvolvimento de atitudes de solidariedade e de
tomada de decisões em situações diversas. Para isso, determinam que os temas devem ser
contextualizados e a interdisciplinariedade considerada como fundamental na estruturação das
dinâmicas e ações didáticas.
De acordo com a Matriz Curricular de Filosofia o projeto humanitário é assumido
pela instituição e objetiva formar para a autonomia intelectual, social e organizativa,
expressando o comprometimento junto à cultura escolar. A garantia de aprimoramento dos
processos de leitura de mundo e a formulação de propostas de intervenção na sociedade são
metas perseguidas, objetivando a formação de sujeitos solidários e sociáveis que exerçam sua
alteridade sem perder de vista o outro.
Na Matriz Curricular de Educação Física, o eixo Interação Sócio-Afetiva propõe-
se a dar oportunidade ao aluno de aprender a ser cidadão do mundo em que vive,
considerando o coletivo sem sobrepujar o individual, descreve que a ganância não deve
superar a solidariedade, nem a indiferença esmagar a compaixão. A disciplina, por meio do
documento, compromete-se em favorecer o desenvolvimento de uma prática regular,
contribuindo para atitudes mais solidárias e um posicionamento mais crítico, responsável e
29
www.inep.gov.br
110
construtivo nas diferentes situações sociais. Cita o diálogo como forma de mediar os conflitos
e tomar decisões coletivas.
A solidariedade proposta nos documentos bem como a definição da pesquisa
empírica apresenta uma visão cristã e a pesquisa empírica segue esse viés complementando a
necessidade de ações que objetivem a transformação social. Para a Entrevistada A:
O aluno solidário é o aluno que vem para escola, mas pensa na sua vida em
sociedade. Os dias atuais nos apresentam valores distorcidos, apresentando conflitos
sociais e problemas econômicos exatamente porque as pessoas preocupam-se
consigo mesmas. O solidário utiliza seus conhecimentos para o bem comum,
percebe a ciência como instrumento de transformação social.
Para a Entrevistada B, ser solidário é conseguir ver as necessidades do colega ao
lado, perceber suas dificuldades acadêmicas e auxiliá-lo. É o aluno que, ao ver uma
reportagem, sensibiliza-se com a dor de outros seres humanos e dos animais:
Esse aluno não fica rindo ou fazendo piadinha dos problemas os quais passam outras
pessoas, mas consegue refletir sobre as soluções para os problemas observados. Para
nós que trabalhamos com adolescentes é um desafio muito grande, pois nossa
sociedade é bastante individualista, e uma formação solidária não é alcançada
sozinha, pois nossos alunos m outras relações sociais. Ele não ficará solidário de
um dia pro outro. Minha proposta enquanto professora é auxiliar o aluno a ter
condições de trabalhar numa empresa tendo ações solidárias. Eu que trabalho há
anos aqui me sinto gratificada ao perceber que conseguimos atingir esse ideal com
alguns alunos...
De acordo com a Entrevistada C, a solidariedade é manifesta quando os
indivíduos agem em função do outro, de suas necessidades. A Entrevistada D, acrescenta:
A solidariedade não deve ser conquistada apenas nas aulas de Ensino Religioso.
Todas as disciplinas devem desenvolver essa competência. Temos no Colégio a
Pastoral Juvenil Marista que promove reflexões com os jovens sobre sua função
social.
Ser solidário não é só doar algo aos outros, isso todo mundo faz. Procuramos
trabalhar a consciência planetária, a importância de si e do outro e destacamos para
cada segmento conteúdos que sejam adequados para idade e que garantam no final
da formação marista esses alunos solidários.
A Entrevistada F concorda:
O solidário é aquele que consegue elaborar o conhecimento crítico, saindo da escola
com responsabilidade social, sendo protagonista, relacionando-se inter e
intrapessoalmente. Esse indivíduo faz com que seu meio possua um convívio mais
humano.
A Entrevistada E explica que ser solidário é ajudar o outro, seja no âmbito escolar
ou não. Ela destaca que o exercício da solidariedade acontece na escola, quando os alunos se
111
ajudam mutuamente, auxiliando os colegas em suas atividades. A coragem de posicionar-se
diante do mundo também foi salientada por outro sujeito:
Aquele que expõe e defende sua opinião, toma posição em variados assuntos, é um
aprendiz independente, busca o algo mais, sem esperar pelo professor. Ainda assim,
tem consciência de seu papel em classe bem como na sociedade, auxiliando os que
têm dificuldade e buscando ajuda quando precisa. (Entrevistado G)
Um dos entrevistados, que trabalhou numa obra social, destacou a dificuldade que
possuem os alunos dos colégios particulares de colocar-se no lugar dos outros:
Quando eu trabalhava na obra social eu percebia que os alunos tinham carência
econômica e emocional. No caso dos alunos de nosso Colégio, que possuem uma
vida econômica melhor, percebo a dificuldade que eles têm de colocarem-se no
lugar do outro, fazendo assim com que tenham dificuldade de serem solidários. Nem
sempre conseguem ver os problemas sociais, mesmo os que se apresentam bem
próximo deles. (Entrevistado L)
O Entrevistado M destaca que a proposta de perfil solidário é característica
marista, pelo fato de ser uma escola de perspectiva cristã. Para o Entrevistado N, ser solidário
está além de propor doações ou ser caridoso:
Ser solidário é mais do que participar de campanhas de doação de agasalhos ou
alimentação, pois dessa forma desempenho um papel paternalista. Solidarizar-se é
ter vivência, pois esse conceito está imbrincado com a fraternidade e ser fraterno é
ajudar a melhorar a sociedade atual. É a pessoa participativa, imbuída de propósitos
e não desviar-se deles porque a campanha acabou, mas fazer de sua vida uma
campanha constante. É participar de movimentos sociais. (Entrevistado N)
De acordo com Freire ([1987] 1996), solidarizar-se é estar com os oprimidos, e
considerá-los não como designação abstrata, mas em sua concretude, buscando junto com os
oprimidos a sua libertação. A compreensão da dimensão da necessidade social é que
possibilita aos sujeitos a transformação da realidade objetiva.
De acordo com a pesquisa, tanto documental como empírica, pode-se perceber
que os educadores manifestaram a necessidade da solidariedade enquanto condição humana
de perceber no outro a sua própria humanidade. Nesse sentido, distancia-se da afirmação
freireana a qual determina que ser solidário é afirmar a condição ontológica do homem em ser
mais. É participar da superação do sentido de desumanização presente no contexto sócio-
histórico.
Não foram citadas ações que enfatizam o ato de estar com os oprimidos na busca
da mudança de sua situação de opressão, sendo que esta é uma das características da
solidariedade freireana. O autor reconhece que não é apenas falar aos oprimidos ou
112
reconhecer-se opressor, mas estar junto deles na construção de metas para modificabilidade
social. Apenas o reconhecimento do outro enquanto ser social que necessita de emancipação
não oportuniza que ela aconteça efetivamente.
Nesta perspectiva, ser solidário é estar junto do outro para modificabilidade
social, buscando ações conjuntas que façam refletir tanto opressores quanto oprimidos. Não é
apenas perceber o que o outro não tem e sensibilizar-se com isso, mas auxiliá-lo na busca de
sua própria humanização. Não apenas no sentido de propor melhoria social, mas
comprometer-se para obtê-la, percebendo-se oprimidos ou opressores e trabalhando para que
haja superação dessa contradição. Mas a percepção não é suficiente, pois, para Freire
([1987] 1996), para que haja a superação é necessária uma ação transformadora que incida
sobre a situação opressora e instaure outra, possibilitando a busca do ser mais.
A pesquisa empírica apresenta semelhança à proposta freireana quando se opõe à
prática de assistencialismo. Freire ([1987] 1996) afirma que a prática assistencialista
transforma os sujeitos em objeto passivo e o que pode auxiliar na mudança social é a
participação ativa dos oprimidos e opressores, descobrindo-se nessa condição por meio do
diálogo. Como citado anteriormente:
Descobrir-se na posição de opressor, mesmo que sofra por este fato, não é ainda
solidarizar-se com os oprimidos. Solidarizar-se com estes é algo mais que prestar
assistência à trinta ou a cem, mantendo-os atados, contudo, à mesma posição de
dependência. Solidarizar-se não é ter a consciência de que explora e “racionalizar”
sua culpa paternalisticamente. A solidariedade, exigindo de quem se solidariza que
“assuma” a situação de com quem se solidarizou, é uma atitude radical. (FREIRE
[1987] 1996, p. 36)
Esta atitude radical, alicerçada no diálogo, oportuniza aos sujeitos a superação de
uma consciência à outra, da instransitiva para a transitiva ingênua e posteriormente à crítica.
Segundo as entrevistas, os alunos podem ter ações solidárias a partir de sua formação e estas
determinarão a construção de um mundo melhor. Não afirmam a necessidade desses alunos
perceberem-se opressores, apenas consideram a dificuldade que têm de enxergarem os
oprimidos. Ou seja, na condição em que se encontram, é necessário um trabalho de
conscientização de todos os atores escolares, incluindo as famílias, que este aluno convive
muito tempo na escola, mas não é formado apenas por ela.
Pensar no currículo proposto para o Colégio Marista na formação de alunos
pesquisadores, comunicadores e solidários é refletir sobre questões que se estendem além do
cunho pedagógico. É lançar-se a questionamento sobre quem são os profissionais que atuam
com este aluno e como a família legitima essa formação. É ampliar o olhar para a necessidade
113
local, percebendo quais expectativas são colocadas diante da escola e ainda refletir sobre as
possibilidades e limitações diante da proposta.
Durante a pesquisa procurei distanciar-me ao máximo, para poder perceber em que
medida a formação desse aluno é possível e reflito que, diante do exposto anteriormente,
contradição entre os discursos documentais e empíricos. Em alguns momentos eles se
assemelham e em outros se distanciam. É um movimento esperado considerando a
complexidade educativa. A formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários é
possível segundo a pesquisa, mas necessita de ajustes para sua consolidação. Os documentos
apresentam-na de uma maneira geral sem especificá-la, mas é possível perceber sua inserção
nas matrizes curriculares de acordo com cada área do conhecimento. Unificar o escrito e o
dito/vivido é imprescindível para se chegar a este ideal.
A práxis é definida por esta reflexão constante sobre o que se pretende e o que se
faz. É por meio dela que se vai, além disso, buscar uma reorganização do que se tem feito. Por
ser um ser de relações, o homem também é um ser do trabalho e da transformação do mundo.
E são nas reflexões que ele faz sobre sua ação que se percebe marcado por sua própria ação.
Tanto o Colégio, em seus documentos escritos, quanto os educadores que são marcados por
suas concepções e práticas, nem sempre coincidentes, formam um conjunto que atua, criando
uma realidade, que pode ser problematizada ou não, dependendo das escolhas feitas. As
opções relacionadas à prática educativa, problematizadas por meio da práxis, descortinarão a
proposta de aluno que o Colégio anuncia, nem sempre percebidas num primeiro olhar,
fazendo-se necessária uma observação mais meticulosa.
Em relação à aproximação feita entre as categorias freireanas e esse ideal de aluno,
a pesquisa revelou que nem sempre é possível e, lembro, o próprio Colégio não se propôs a
isto. As categorias freireanas não podem ser vistas separadamente. O ato dialógico leva à
curiosidade epistemológica e também à solidariedade, que é por meio do diálogo que os
sujeitos encontram-se e libertam-se, mediatizados pelo mundo. Descrever as categorias de
Freire como possibilidade curricular seria explicar pesquisa, comunicação e solidariedade de
outra forma, diferentes do expresso pelo colégio.
Demarcar estas diferenças teve o intuito de iniciar uma reflexão para a
possibilidade de uma re-orientação neste sentido, caso venha a ser a escolha do colégio. Para
tanto, foram feitas tanto aproximações como distanciamentos em relação ao
documental/vivido e as categorias freireanas, com a certeza de que qualquer reorientação em
direção ao viés freireano implica não apenas modificações conceituais do ideal de aluno
estabelecido, mas também de algumas mudanças estruturais, no sentido de deixarem de ser
114
obstáculos para esta mudança. Repito, tudo isso se vier a ser a decisão do colégio em re-
orientar seu ideal de aluno para a concepção libertadora.
115
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho questionou em que medida a proposta curricular efetivada no
Colégio Marista possibilita a formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários.
Para essa análise foi feita pesquisa documental e empírica, por meio de entrevista com
professores e equipe gestora do Colégio Marista de Criciúma. Para a análise curricular realizei
uma aproximação teórica com Sacristán (2000) e Pacheco (2001) e quanto às competências
estudantis propostas como perfil do aluno Marista utilizei as categorias freireanas de
curiosidade epistemológica, dialogicidade e solidariedade.
A análise da proposta curricular para efetivação desse ideal de aluno é feita de
acordo com o Projeto Curricular em Ação, o Projeto Político Pedagógico, o ofício 03/05 e a
Matriz Curricular de DAPS e os sujeitos citados anteriormente, reconhecendo, todavia, que
havia outras possibilidades de análise.
Os documentos analisados apresentam uma visão crítica de currículo e estão
embasados teoricamente de forma a propiciar a formação do aluno ideal do Colégio Marista.
Os eixos das matrizes propõem investigação e o desenvolvimento da linguagem de acordo
com as disciplinas específicas. A valorização à investigação e à linguagem (aqui aproximado
com comunicação) como meio de apropriação dos conhecimentos possibilita o
desenvolvimento da necessidade da pergunta como prática metodológica. A solidariedade nas
matrizes passa pela questão social, pois identifica a pesquisa científica atrelada ao contexto
sociocultural e tem como função a melhoria da vida em sociedade.
De acordo com os documentos pesquisados é possível perceber as possibilidades
de formação do aluno ideal do Colégio Marista de Criciúma. Entretanto, não esta
legitimidade nos discursos empíricos, pois este ideal é compreendido pelos educadores como
difícil de ser alcançado em sua prática educativa. Para os profissionais desta escola as
possibilidades para formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários limitam-se
ao tempo de trabalho escolar, destacando a dificuldade de trabalho diante da cobrança
avaliativa a qual o Colégio está submetido.
Grande parte dos professores não conhece as competências de pesquisa,
comunicação e solidariedade como ideal Marista, mas concorda que elas sejam necessárias à
vida estudantil nos dias atuais. Eles explicam essas características como necessárias para a
contemporaneidade, que se manifesta alicerçada em valores econômicos e competitivos.
116
É importante salientar que, para formar alunos para a prática da pesquisa,
comunicação e solidariedade é necessário, antes de tudo, que os discursos teóricos e práticos
estejam afinados, ou seja, o educador que trabalha no Colégio Marista de Criciúma precisa
conhecer o que dizem os documentos e assumi-los como ideal. Os professores mostraram-se
solícitos às propostas feitas pela assessoria, mas alegam dificuldades na concretização das
várias propostas em sua prática pedagógica.
Não é possível desvincular o currículo proposto por este colégio da formação de
seu aluno. Os documentos são importantes e são eles que legitimam a ação docente, seu
conhecimento e apropriação é um trabalho feito no decorrer de todo o período em que este
profissional se encontra na instituição. Ações de parceria, diálogo constante, escuta
pedagógica ampliam a visão dos gestores na configuração da prática que se efetiva dentro e
fora de sala de aula. A riqueza de material teórico para a consulta docente é destaque para o
trabalho no Colégio Marista de Criciúma. Os professores manifestam o desejo de
concretização das propostas contidas nas matrizes curriculares e encontraram mecanismos de
superação de suas dificuldades. Os documentos não explicam as categorias elencadas ao aluno
ideal, mas pode-se perceber que consenso nas matrizes para sua efetivação por meio dos
eixos e objetivos.
Encontrar possibilidades dentro das limitações reais de uma instituição evidencia
a necessidade que os docentes possuem de ver o projeto dar certo. Afinal, esperar as
condições ideais para a concretização do que se considera ser o melhor é adiar para um futuro
incerto o que precisa ser feito. Isso pode ser percebido nas entrevistas feitas quando os
professores identificavam suas falhas identificamdo-se muitas vezes “conteudistas”, e
demonstrando um desejo de modificar sua prática.
Não concordo com o discurso o qual afirma que o professor é o responsável por
tudo e por isso encontra soluções, mas também não é possível encontrar ambientes reais com
condições ideais de trabalho. As possibilidades e limitações deste Colégio não são únicas,
mas são singulares. Trabalhar com um grupo que pode discutir e encontrar as soluções dentro
da própria unidade é um privilégio. É claro que ainda existem limitações por indicadores
inalcançáveis, objetivos que podem não ser os ideais para os alunos de Criciúma, mas outras
soluções podem ser determinadas a partir do momento que problematizadas e discutidas.
O desenvolvimento de uma matriz curricular voltada às necessidades do aluno
também é um dos destaques, que ao se dar luz ao problema também é considerar as razões
de sua existência. Apesar do Colégio não possuir a disciplina, seus objetivos são assumidos
por todos os docentes que se abrem à proposta pedagógica do Colégio Marista de Criciúma. A
117
Matriz Curricular de DAPS é suporte para o trabalho dos professores e também auxilia na
aquisição das competências estudantis propostas, pois se baseia no desenvolvimento do
sujeito aprendente e das necessidades acadêmicas, pessoais e sociais desse sujeito.
Ao analisar o processo de escrita das matrizes, a proposição do componente
curricular DAPS e a reflexão do professorado assumindo-se corresponsável pela formação do
aluno pesquisador, comunicador e solidário é possível aproximar-se da quarta orientação de
Sacristán (2000), identificada por currículo como configurador da prática, e à teoria crítica
de currículo de Pacheco (2001). Nestas duas classificações a priorização da autonomia
profissional do professor como agente problematizador da prática.
Essa perspectiva contribui para a melhoria da compreensão dos fenômenos que
produzem na prática e a superação da prática pedagógica implica optar por um quadro
curricular que sirva de instrumento emancipatório para o estabelecimento da autonomia
discente. Essa emancipação não possui as mesmas características das destacadas na
perspectiva freireana, mas não se opõe a ela.
A visão curricular expressa no Projeto Político Pedagógico segue a perspectiva de
auxiliar na autonomia docente e complementa destacando a necessidade de compreender o
indivíduo em sua interdimensionalidade. Este documento, aliado ao discurso proposto na
Matriz Curricular de DAPS, pode ser associado ao Currículo como base de experiências
(SACRISTÁN, 2000) pelo fato de a escola, nesta orientação, caracterizar-se por agência
socializadora e educadora total, incorporando finalidades além das acadêmicas.
Há uma tensão expressa nos discursos dos educadores que pode ser aproximada da
orientação definida como currículo como soma das exigências acadêmicas (SACRISTÁN,
2000) e da teoria técnica (PACHECO, 2001), quando expressam que o currículo se define
como lista de conteúdos ou das manifestações docentes que explicam o tempo disciplinar
dividido hierarquicamente. Tanto na primeira orientação de Sacristán (2000) quanto na teoria
de Pacheco (2001) a valorização dos saberes distribuídos em disciplinas específicas ou
áreas. Como citado anteriormente, a potencialização desse enfoque curricular ocorre pela
pressão acadêmica, as necessidades administrativas e a organização do professorado. As aulas
apresentam-se fragmentadas e as disciplinas possuem tempos distintos determinados pelo
programa.
As aproximações feitas das categorias pesquisa, comunicação e solidariedade
com curiosidade epistemológica, dialogicidade e solidariedade de Paulo Freire nem sempre
são possíveis. Em alguns momentos percebo similitudes e em outros, distanciamento.
Relembro que o Colégio em si não se compromete com o autor, isentando, portanto, seu
118
compromisso de aproximar-se das categorias elencadas. Percebo aproximação com o autor na
proposta de construção das matrizes, o incentivo que aos estudos em grupo entrecolégios.
Essas atitudes abrem espaço ao diálogo, proporcionando condições para os professores
organizarem ações educativas que visem à melhoria de seu trabalho pedagógico.
Em contrapartida, se opõe à visão de educação do autor quando não consegue
oportunizar aulas menos dissertadoras, praticando uma educação bancária. O fato de havere
discursos tão aproximados entre os docentes é algo a ser pensado, sua manifestação referente
a um maior tempo de trabalho junto ao aluno chama a atenção. Questionam sobre as
diferenças entre a carga horária das disciplinas e não fogem de sua responsabilidade diante da
avaliação institucional realizada anualmente.
Pode-se perceber, pelos dados levantados na pesquisa documental e empírica, que
distanciamento entre a categoria pesquisa e a curiosidade epistemológica, que para
superar a curiosidade ingênua são necessárias aulas dialogais que levem ao desejo de
conhecer. Como os professores manifestam-se efetuando práticas dissertativas torna-se
inviável essa aproximação. A pesquisa incentivada pelos professores está relacionada ao saber
científico, não se relacionando diretamente à transformação social. Em contrapartida, os
documentos enfatizam a investigação proposta pelo Colégio à modificabilidade social, se
aproximando da curiosidade epistemológica, por remeter a um compromisso com a
transformação social.
A comunicação apresentada como competência para o aluno marista é expressa
como capacidade de expressar-se bem nas diferentes áreas do conhecimento. Dessa forma,
distancia-se da dialogicidade, pois na perspectiva de Freire o diálogo não é apenas a
expressão de ideias com clareza, mas a competência de ouvir e dar ao outro seu direito de
dizer sua palavra. O autor destaca o direito dos sujeitos pronunciarem o mundo, percebendo-
se nele e sentindo-se participante dele. Ser dialógico é mais que desenvolver a competência
comunicativa, é tornar o outro visível, em suas ideias e expressões. E a categoria
comunicação não se apresenta no sentido de educar para o diálogo, limita-se a desenvolver
nos educandos a expressão do conhecimento científico destacado em cada área do
conhecimento.
O próprio ato dialógico não é usual entre os professores e isso é destacado por
eles pela falta de tempo de trabalho com os discentes. O professor conversa, mas não dialoga,
pois o diálogo leva tempo para ser construído e necessita de sistematização. As práticas
docentes, de acordo com as entrevistas, são dissertadoras, mesmo quando problematizam os
conteúdos propostos.
119
A categoria solidariedade proposta por Freire determina que ser solidário é
afirmar a condição ontológica do homem em ser mais, distanciando-se da solidariedade
elencada pelo Colégio. Nos discursos da instituição a solidariedade é citada enquanto
condição humana de dar ao outro o que se possui, não apenas no sentido material. Mas apenas
essa caracterização não determina a semelhança com o autor, que ele salienta que ser
solidário é estar junto do outro para modificabilidade social, buscando ações conjuntas que
façam refletir tanto opressores quanto oprimidos. É ter compromisso com o outro, auxiliando-
o em sua própria humanização.
Mesmo que a proposta vise à emancipação estudantil, não a caracteriza como
necessidade ontológica do homem em ser mais. Freire se opõe à prática do assistencialismo e
afirma que essa prática torna os homens como objetos passivos, impossibilitando-os de
perceberem-se transformadores de seu entorno. Neste sentido, a pesquisa demonstrou
semelhança entre as duas propostas, que os professores salientam que práticas pontuais de
doações não são caracterizadas por eles como solidariedade.
Como dito anteriormente, é possível encontrarmos diferentes perspectivas
curriculares dentro de uma mesma instituição, que a prática escolar é complexa e formada
por uma diversidade de indivíduos que possuem necessidades que não podem ser
abandonadas a despeito dos objetivos educacionais. Entretanto, são necessárias reflexões
constantes sobre a prática escolar e a coerência existente entre os discursos anunciados.
Educadores que inseridos numa instituição conseguem olhar criticamente para ela,
demonstrando suas limitações e possibilidades, caminham para a superação de suas práticas
narrativas.
A conscientização não acontece abruptamente de forma milagrosa, mas por
reflexões, críticas e autocríticas, de análise da prática e busca coletiva. Ela se dá a partir da
problematização das contradições vivenciadas diariamente dentro da escola, sendo
pedagógicas ou não. É o espaço para o diálogo que oportunizará a coerência educacional de
discurso e prática.
A ingenuidade de dicotomizar prática e teoria se dilui a partir do momento em que
se percebe que elas estão indissociadas. Teorizar sobre educação é em si mesmo olhar e
conceber de outra maneira as próprias ações educativas que se encontram na escola,
manifestadas por todos os envolvidos. Ainda mais, é a prática que alimenta e subsidia a
abertura de novas formas de refletir sobre ela. A prática não é apenas o lugar da aplicação da
teoria, é muito mais ampla, a de auxiliar na compreensão dos fenômenos educativos.
A organização do trabalho pedagógico, a formação do educador, o
120
estabelecimento democrático de tomada de decisões entre os profissionais da educação
possibilitam um avanço nas questões que angustiam os professores. Problematizar a prática,
enfatizar os discursos documentais pode ser um caminho a percorrer com os profissionais do
Colégio Marista de Criciúma. A questão escolar primordial no que concerne à aprendizagem é
assegurar-lhe sentido, portanto, é preciso promover práticas educativas que garantam a
apropriação do conhecimento que possa ser utilizado para o alcance do ideal proposto.
O aluno aprende para a vida, para o hoje, e não para ser alguém algum dia. A
simples discussão do que deve conter o currículo não é suficiente para mudarmos as práticas
educacionais vigentes, mas a forma de refletirmos sobre isso expressará quem somos e o que
consideramos ser verdadeiro, mesmo que seja por um tempo. Não espaços para a exclusão
do diálogo, pois é por meio dele que a escola manifestará seus problemas e possibilidades.
Uma prática curricular que preze a vida, as diferentes realidades e busque dar espaço a todos
abrirá horizontes para seus educandos por meio do diálogo, das indagações e do prazer de
aprender.
A pergunta que me impulsionou a realizar a pesquisa foi respondida, mas
desencadeou outras indagações referentes ao trabalho educativo no Colégio Marista de
Criciúma. Elas referem-se ao olhar do educando sobre si mesmo e sobre a educação que
recebem. Pergunto-me se eles se identificam como pesquisadores, comunicadores e
solidários e o que isso significa para eles. Outro questionamento é o que se refere aos
impedimentos para a consolidação de uma prática dialógica nas disciplinas que se submetem à
avaliação institucional e as sugestões dadas pelos educadores para a superação dessa
realidade.
Perguntar e buscar respostas, mesmo que sejam momentâneas faz parte do fazer
educativo. E é nesse viés que o educador comprometido com o outro se constitui, percebendo-
se inacabado e construtor de sua história. Entretanto, ele não se faz isoladamente, mas em
comunhão com outros educadores que se encontram na mesma condição. Juntos, buscam
humanizar e humanizar-se por meio do diálogo, repensando a vida em sociedade e praticando
sua vocação ontológica de ser mais.
121
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128
APÊNDICES
129
130
UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO
TERMO DE CONSENTIMENTO
Sob o título “A Concepção Curricular do Colégio Marista e a formação de alunos
pesquisadores, comunicadores e solidários, este estudo, que culminará na elaboração de
uma dissertação de Mestrado, pretende compreender a concepção curricular do Colégio
Marista de Criciúma na formação de alunos pesquisadores, comunicadores e solidários, e
sua relação com a proposta freireana de educação libertadora.
Os dados e resultados individuais da pesquisa estarão sob sigilo ético, não sendo
mencionados os nomes dos participantes em nenhuma expressão oral ou trabalho escrito que
venha a ser publicado, a não ser que o(a) autor(a) do depoimento manifeste expressamente seu
desejo de ser identificado(a). As entrevistas serão gravadas e transcritas.
As pesquisadoras responsáveis pela pesquisa são a Professora orientadora Dr.ª Janine
Moreira, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Extremo Sul
Catarinense UNESC e a mestranda Ingrid Roussenq Fortunato Martins, do referido
Programa de Pós-Graduação. Ambas se comprometem a esclarecer qualquer dúvida ou
necessidade de informações que o/a participante venha a ter no momento da pesquisa ou
posteriormente, através dos telefones 3431- 2584 e 3437- 9122.
Após ter sido devidamente informado/a de todos os aspectos da pesquisa e ter
esclarecido todas as minhas dúvidas, eu _________________________________________
cedo os direitos de minha participação e depoimentos para a pesquisa acima descrita, para que
sejam usados integralmente ou em partes, sem restrições de prazo e citações, a partir da
presente data.
________________________
Assinatura do entrevistado
Criciúma, __/__/____.
131
ROTEIRO DA ENTREVISTA
O que os professores, assessores e diretores entendem por aluno pesquisador,
comunicador e solidário;
A expressão das práticas educativas enunciadas pela escola na formação de seus
alunos, que a diferenciam de outra instituição escolar;
A relação que os professores, assessores e direção fazem de sua prática pedagógica e
os estudos propostos pela escola;
O conceito dado pela comunidade educativa (professores, assessores e diretores)
sobre currículo e sua relação com as matrizes curriculares;
A percepção que o professor tem de sua atuação na formação do ideal de aluno
proposto pelo Colégio Marista de Criciúma.
132
ANEXOS
133
ANEXO 01
OFÍCIO 03/2005
134
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O desafio, na parte da responsabilidade que nos cabe como escola, é articular o
currículo com objetivos pedagógicos e situações didáticas que respondam a essa
situação de crise. Nesse sentido, o CEMEP, por meio dos colégios maristas, assume
como projeto, a partir de 2005, formar o aluno para:
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O’Sullivan, Edmund. Aprendizagem Transformadora Uma visão educacional para o século XXI. Biblioteca
Freiriana; v. 9. São Paulo: Cortez Editora; Instituto Paulo Freire, 2004, p. 18.
31
Comentário a partir das idéias de John Dewey no livro "Democracia e Educação" (São Paulo: Nacional,
1979).
32
Missão Educativa Marista: um projeto para nosso tempo. CIME (1995-1998). ed. São Paulo: SIMAR,
2000, p. 61.
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como combinar o cotidiano com o surpreendente, a imanência opaca dos dias com a transcendência radiosa do
espírito, a vida na plena liberdade com a morte simbolizada como um unir-se com os ancestrais, a felicidade
discreta nesse mundo com a grande promessa na eternidade. E, ao final, teremos descoberto mil razões para
viver mais e melhor, todos juntos, como uma grande família, na mesma Aldeia Comum, generosa e bela, o
planeta Terra.
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Estamos enviando uma reflexão do CEMEP (inicialmente, apenas uma página!)
sobre as metas 2005 para a formação do aluno marista: Pesquisa, Comunicação e
Solidariedade, cf. texto anexo. Esse texto busca refletir o intuito dos nossos Colégios em
formar-preparar um aluno para a pesquisa, a comunicação e a solidariedade o que
exigirá reciprocamente um professor com tais competências.
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33
Freire, Paulo. Pedagogia da Esperança Um reencontro com a Pedagogia do oprimido. Rio de janeiro: Paz e
Terra, 1992, p. 11.
34
Boff, Leonardo. Casamento entre os céus e a terra. Salamandra, Rio de Janeiro, 2001, p. 9.
136
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maneira resoluta e manifesta, (...), mediante
NOVOS caminhos de educação, de
evangelização e de solidariedade (Chamados a
escolher a Vida, n
o.
31).”
137
ANEXO 02
PROJETO CURRICULAR EM AÇÃO
138
139
140
141
142
143
144
145
146
147
ANEXO 03
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DO COLÉGIO MARISTA DE CRICIÚMA
(FRAGMENTO)
148
149
150
151
152
153
154
155
156
157
158
159
160
161
162
163
164
165
ANEXO 04
MATRIZ CURRICULAR DE DAPS (FRAGMENTO)
166
167
168
169
170
171
172
173
174
175
176
177
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