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Amor e Criatividade: Ações Estéticas e Diversidade
Na Construção do Futuro
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
P
ONTIFÍCIA
U
NIVERSIDADE
C
ATÓLICA DE
S
ÃO
P
AULO
– PUC/SP
Heloisa Helena da Fonseca Carneiro Leão
São Paulo
2009
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P
ONTIFÍCIA
U
NIVERSIDADE
C
ATÓLICA DE
S
ÃO
P
AULO
– PUC/SP
Heloisa Helena da Fonseca Carneiro Leão
Amor e Criatividade: Ações Estéticas e Diversidade
Na Construção do Futuro
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título
de Doutora em Ciências sociais, sob a
orientação do Prof. Dr. Edgard de Assis
Carvalho.
São Paulo
2009
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Banca Examinadora
4
Agradecimentos
Ao Prof. Dr. Edgard de Assis Carvalho um
grande orientador e principalmente amigo
Ao CNPq que me possibilitou iniciar e
concluir um sonho
Ao Prof. Dr. Jorge Albuquerque Vieira
por seus conselhos e amizade
À minha filha Patricia e aos meus filhos
Às minhas amigas: Guti, Erica e Monica que
me ajudaram e enriqueceram esta tese
5
Dedicatória
Ao meu marido que me ensinou a amar com um amor incondicional.
Aos meus filhos, noras e netos que procuro dedicar e ensinar a força do
amor.
Aos meus amigos, alunos e colegas que me permitem praticar o amor.
Aos meus pais e avós
(in memorium)
por terem me apresentado ao amor,
à música, à poesia, às artes e à natureza.
À Frans Krajcberg por seu amor incondicional à natureza e a todo artista
vivo ou morto que dedica sua arte à vida.
Ao Amor por ele mesmo por estar vivo e em processo.
6
SUMÁRIO
Resumo.......................................................................................................1
Abstract.......................................................................................................2
Resumé.......................................................................................................3
1.Introdução................................................................................................5
2. Síntese dos Capítulos................................................................................7
3. Capítulo I - A Criatividade no universo e nos seres vivos............................10
3.1. A criatividade em um sistema aberto na construção do futuro.................19
3.2. A criatividade em busca do admirável do ideal supremo
Summum bonum
29
3.2.1. Estética e criatividade........................................................................29
3.2.2. Mudança de hábito: Um percurso valido para as Ações Estéticas..........33
3.2.3. A criatividade do Ágape Amor Criativo................................................42
3.3. A criatividade no
homo
Sapiens sapiens Demens
....................................45
3.4. Amor criativo Ação na construção do futuro...........................................48
4. Capítulo II – A criatividade na arte e na vida.............................................61
4.1. A criatividade na arte: arte como ação e política de libertação.................65
4.2. A criatividade: O corpo como memória da vida.......................................71
4.3. A criatividade: A arte na defesa da natureza..........................................77
5. Capítulo III – Criatividade e sentidos da vida............................................90
5.1 Explicação de alguns tópicos..................................................................93
5.1.2. A criatividade por meio da educação estética do homem......................93
5.1.3. Transdisciplinaridade – Complexidade – Classificação das Ciências
Arquitetura Filosófica de Peirce....................................................................95
5.1.4. A criatividade por meio da sensibilidade: na sala de aula....................104
5.1.5. A Criatividade por meio da sensibilidade: na participação em
exposições...............................................................................................109
7
5.1.6. A criatividade por meio da sensibilidade e exemplos do cinema..........122
6. Capítulo IV – Criatividade na Vida e nos Exemplos das Ações Estéticas.....131
6.1. Inconclusão para o Futuro..................................................................139
7. Bibliografia...........................................................................................155
8. Glossário..............................................................................................162
9. Anexo 1- .............................................................................................170
10. Anexo 2 - Reportagens........................................................................188
8
Amor e Criatividade: Ações Estéticas e Diversidade
Na Construção do Futuro
Resumo
Este trabalho reflete a preocupação atual sobre o homem, suas invenções e seu
ambiente. A destruição da natureza e o futuro do planeta estão em jogo. No
entanto, as novas descobertas tecnológicas têm a possibilidade de aproximar
homem e natureza uma vez que utilizadas de forma racional e, ao mesmo tempo
sensível. As ações do homem moderno são conseqüências da ciência tradicional
que coloca a razão como o caminho único da verdade. Hoje, percebemos que as
verdades absolutas não existem. Em conseqüência disso, pela ausência dessas
verdades, o ser humano se sente desamparado. À medida que procuramos
entender questões como a diversidade, as mutações e as novas tecnologias, o
mundo se torna mais complexo para nós. Para resolver isso, o ser humano precisa
olhar a seu redor e procurar por novas soluções. O embate entre o homem e o
objeto de forma consistente é fundamental para a criação de um futuro
diversificado. A busca por um mundo diferente é defendido por Ilya Prigogine,
Charles Sanders Peirce e Edgar Morin. Prigogine afirma que o futuro não é algo
estabelecido
a priori
e, sim, em constante construção. Enfatiza que outro futuro é
possível, basta agir para modificá-lo. Em sua “Carta às Futuras gerações, ele
convoca os jovens a agir por um amanhã diferente. Por estar presente em todas
as manifestações do ser humano, a arte é fundamental para o resgate da
sensibilidade que se perdeu na tirania da razão. Ao longo da existência da
humanidade, homem e arte sempre foram parceiros e isso não pode ser
esquecido. Apresentamos três artistas que ampliaram o fazer artístico. Lygia Clark
propõe ao homem contemporâneo a redescoberta do corpo por meio de sua
memória sensorial, Frans Krajcberg faz de seu percurso de vida um alerta contra a
destruição da natureza. Joseph Beuys investe na ação dos indivíduos, pois
considera todos os indivíduos artistas. Pensadores, artistas mostram as
possibilidades do “Reencantamento do Mundo” por meio da criatividade e do amor
como construtores do futuro. Além, deles, pessoas de sensibilidade apurada se
dedicam a modificar o amanhã, por meio de ações estéticas.
Palavras-Chave: Amor, Criatividade, Construção, Ação Estética
9
Abstract
Love and Creativity: Aesthetics Actions and Diversity in the construction
of the Future
This work reflects the present concerns of the humankind, their inventions and
their habitat. The destruction of the nature and the future of our planet are in
deep jeopardy, however the new technologic discoveries has the possibility to
approach man to the nature, of course, if applied rationally, at the same time
sensible. The actions of the modern man are consequences of the traditional
science, which places the reason as the sole and only way to the truth. Today, we
noticed that the absolute truth does not exist. In consequence, by the absence of
the truth, the human been, feels abandoned. As long as we try to understand
questions such as diversity, the mutation and new technologies, the world
becomes more complex to us. To resolve this paradox, the man needs to look
deeply around the world and try to find new solutions. The confrontation between
man and object on a consistent way is fundamental to build a diverse future. The
search for a different world is founded in Ilya Prigogine, Charles Sanders Peirce
and Edgar Morin sources of in exhaustive reflection. Prigogine affirms future is not
something established in advance, yet in constant construction, he emphasizes
that future is possible, if we act properly to change. In his letter, "the future
generations", he convoked youngsters to act for a different tomorrow. The art is
present in all human being manifestations, it is crucial to redeem the sensibility
that has been lost in the tyranny of the reason. Since the beginning of humanity,
man and art always been partners, this cannot be forgotten or ignored. We
presented 3 artists that amplified the artistic savoir-faire. Lygia Clark proposed to
the contemporary man the re-discovery of the body by the sensorial memory,
Frans Krajcberg, directed his life to alert against nature destruction, Joseph Beuys
invests in the individuals actions, as he considers that all individuals are artists.
Thinkers, artists have shown the possibilities of the "re-enchantment of the world"
utilizing the creativity and love as "future constructors". Not only them, but also
people with refined sensibility are dedicating themselves to modify the future,
using esthetics actions.
Keywords:
Love, Creativity, Construction,
Aesthetics Actions.
10
Resumé
Amour et Creativité: Les Actions Esthétiques et la Divercité dans la
Constructions de L’Avenir
Cet thèse reflete la preocupation actuelle sur l’homme, ses inventions et son
ambiance. La destruction de la nature et l’avenir du planète sont en jeu. Par
contre, les nouvelles inventions techniques montrent la possibilite d’approcher
l’homme et la nature si celles-là sont utilisées de façons rationnel et au même
temps sensible. Les actions de l’homme moderne sont les conséquences de la
science traditionnel, laquelle élégit la raison comme un chemin unique de la verité.
Aujourd’hui, nous voyons que les verités absolues n’existent pas et par
conséquence l’être humain est devennu deprotégée. Au fur et a mesure que nous
cherchons entendre des questions comme la diversité, les mutations et les
nouvelles technologies, plus le monde est devenu complexe. Pour resouldre cella
l’homme a besoin de regarder autour de soi et de chercher des solutions
nouvelles. Le choc entre l’homme et l’objet, d’une façon consistante, est
fondamental pour la création d’un avenir diversifié. Le desir d’un monde different
est défendu par Ilya Prigogine, Charles Sanders Peirce et Edgar Morin. Celui-là
afirme que le future n’est pas donné
a priori
, au contraire, c’est une construction
permanente. Il emphatize qui un autre future est possible et on doit agir pour le
modifier. Dans la “Lettre aux Futures Générations”, il incite les jeunes a agir pour
changer l’avenir. L’art est une présence constante dans l’histoire de la humanité et
maintenat nous aide a resgater la sensibilité perdue à cause de la tiranie de la
raison. Nous êvoquons trois artists qui ont amplié les frontières du faire l’arte,
Lygia Clark, Frans Krajcberg et Joseph Beuys. Ceux-ci avec l’association des
penseurs dessus et des actions esthétiques ont la possibilité de “Reenchanter le
Monde” par la creativité, l’amour et le désir de transformer l’avenir.
Mots-Clés
:
Amour, Creativité, Construction, Action Esthétique.
11
O que é uma tese?
É refletir sobre a vida ou
seguir passo a passo
o percurso acadêmico?
Eu sempre me pergunto
sobre a vida e se é possível
organizá-la
a priori?
Onde ficam os imprevistos que nos
levam a deriva?
Se o mergulho na vida
exige saltos aleatórios
Como uma tese pode ser
construída linearmente?
Como pode ser edificada a
margem da vida?
Uma tese é
um caminho múltiplo
que precisa antes de tudo
estar em diálogo
com a vida
O que adianta uma tese
mofando nas prateleiras
a espera de um intelectual
alienado?
Uma tese deveria ser
antes de tudo
Leve como
um romance
Melódica como os sons da natureza
ou uma sonata
Bela como o por de sol
ou uma tela
Sonora como a poesia
Sólida como a escultura
Saborosa como o chocolate
Deveria transparecer a carícia da mão amada e amiga
Uma tese antes de tudo deveria
refletir sobre o amor a amizade
a tolerância à vida
Em uma tese não poderia estar presente
qualquer tipo de pedantismo
Deveria estar impregnada de amor à vida
Enfim!!! Uma tese deveria possuir
a atração da lua para os amantes
o brilho infinito das estrelas
que guiam os viajantes
em noites escuras
12
1. Introdução:
A tese que apresentamos é composta de duas partes: texto e deos. O texto é a
parte teórica do processo e os vídeos são as experiências como pesquisadora e
professora. A tese escrita tem o desejo de transformar o percurso acadêmico em
um passeio de descobertas de ações e sentidos. Os vídeos mostram pesquisas
artísticas realizadas sobre o tema e seus desdobramentos em sala de aula. O foco
é direcionado à criação, à poesia, ao amor como incentivos às ações estéticas.
Encontram-se no deo alguns exemplos de e-mail que investem na defesa do
planeta e no amor ao próximo. A principal intenção é apontar para a necessidade
de uma nova postura do homem frente aos problemas da atualidade. Esses
problemas revelam a predominância de atitudes, por parte dos indivíduos, na
procura incessante pela ascensão social em detrimento do amor ao próximo. O
que nos conforta são as atitudes magnânimas de pensadores, artistas e indivíduos
que procuram nadar contra uma corrente institucionalizada. A arte a ciência a
ação e a própria vida são as armas que possuímos para reverter um caminho
traçado por nossos antepassados.
Nossa visão tem caráter transdisciplinar
1
entende o pensamento complexo como o
entrelaçamento das diversidades e foca o homem e a vida por meio de uma
constelação de possibilidades. Uma tese que enfoca a criatividade precisa do
suporte de pensadores otimistas e visionários, que vejam o homem e a natureza
1
Transdisciplinaridade: tem várias definições nos dias atuais. Neste trabalho usaremos a definição do prof.
Dr. Ubiratan D’Ambrosio: A disciplinaridade, resultado do reducionismo cartesiano, desenvolveu métodos e
objetos de estudo específicos. A multidisciplinaridade, antecipada no discurso de Fontenelle na Académie
des Sciences de Paris, no final do século XVII, que é a reunião de conhecimentos obtidos no quadro das
disciplinas, logo se mostrou insuficiente para tratar problemas mais complexos. No curso do século XIX a
interdisciplinaridade começa a se mostrar importante no ataque a fenômenos complexos e na própria
formulação de novas visões da realidade. Mas igualmente, a crítica gerada pela própria interdisciplinaridade
desde o início do século XX, estimulado pela mecânica quântica e por desenvolvimentos da biologia e por
uma visão mais abrangente e universal da história do conhecimento, mostrou a necessidade de um novo
enfoque ao conhecimento. A transdisciplinaridade é uma resposta a essa necessidade. O método de pesquisa
transdisciplinar é holística, abordando todo o ciclo do conhecimento, desde sua geração, organização
intelectual e social, e difusão, comparativamente nas várias culturas do passado e do presente. A
transdisciplinaridade se utiliza de todos os instrumentos materiais e intelectuais disponíveis.
http://www.cfh.ufsc.br/~aped/ubiratan_d.htm
13
como um único bloco. A base teórica encontra em Edgar Morin, Ilya Prigogine,
Charles Sanders Peirce e outros pensadores subsídios importantes no que diz
respeito à unidade do homem, à ética e à estética. Peirce, por ser o mais antigo
dos teóricos não foi entendido, quando criou sua filosofia, pois o ambiente da
época não estava propício a perceber a importância de seus pensamentos e
colocações. No entanto, Prigogine e Morin encontram, no momento presente, solo
fértil para desenvolverem o tema.
Lembramos que na mesma época de Peirce o discurso do Cacique Seattle
2
(1855),
procurou chamar a atenção sobre a transitoriedade da vida. O Cacique diante da
ameaça da perda das terras dos índios Suquamish
3
para o governo americano
escreve uma carta
4
de amor a terra e a natureza, na qual apontava, naquela
época, a necessidade de integrar homem/natureza. As palavras do Cacique Seattle
naquele instante, assim como as de Peirce, foram palavras ao vento. Talvez hoje
elas fossem entendidas, assim como as dos outros pensadores já o são.
É possível constatar que o novo ambiente e clima estão prósperos para “corações
sensíveis” escutarem assimilarem e agirem na direção de um futuro mais justo.
Além dos pensadores citados, a pesquisa encontra contribuições valiosas nos
trabalhos de vários artistas, entre eles, Lygia Clark sobre a redescoberta do corpo,
Frans Krajcberg com ações sobre a natureza e Joseph Beuys na divulgação da arte
como ação ou ação como arte. A investigação tem encontrado pessoas
diferenciadas que compõem a comunidade de interessados em melhorar a vida do
2
A carta do Cacique Seattle pode ser lida na integra em Perry 2006
3
Cacique Seattle. Francis Pierce, presidente dos Estados Unidos, propôs em 1854(5) comprar as terras dos
índios Suquamish. O Cacique Seattle, chefe da tribo, sabedor de suas limitações frente ao governo resolve
aceitar o pedido, no entanto, faz um belíssimo discurso em que mostra a transitoriedade da vida, uma
transitoriedade que faz parte da continuidade, uma vez que está repleta de memórias, de hábitos e de
mudanças de hábitos. As mudanças de hábitos e as ações indígenas levam sempre em consideração o respeito
a natureza.
O discurso mais tarde foi transformado em carta por Perry (2006) e é um apelo em defesa da mãe natureza.
4
Na realidade o Cacique não escreveu uma carta, ele proferiu um discurso no dia de entregar as terras ao
governo, mais tarde esse discurso foi transformado em carta por Ted Perry.
14
próximo. Aos indivíduos, que movidos pelo amor atuam na existência,
denominamos suas interferências de “ações estéticas”
5
.
Sabemos que escolher três teóricos do porte dos citados aqui é uma tarefa que
impõe recortes, uma vez que conhecê-los, em profundidade, é impossível em um
trabalho. Nosso argumento se prende a alguns pontos de convergências
existentes entre os pensadores e não tem a intenção de desenvolver um estudo
profundo sobre eles. A pesquisa desenvolve e apresenta a criatividade e o amor
como possibilidades de iluminar o trajeto escuro de ações, do passado e do
presente, baseadas simplesmente na razão. Acreditamos que, no momento em
que o lado sensível do humano dialogar efetivamente com o racional, o caminho
do futuro seoutro. Ressaltamos que não é o caso de colocar o lado sensível
como predominante, porque, assim, estaríamos cometendo o mesmo erro
daqueles que colocaram a razão. Defendemos o diálogo efetivo entre razão e
sensibilidade para chegar à unidade e não a outra divisão. Afirmamos que não
podemos saber
a priori
o resultado de tal assertiva, pois é impossível, em um
caminho de incertezas, prever antecipadamente seus resultados. Estamos
somente jogando sementes e desejando que ocorram mudanças significativas no
amanhã. O trabalho divide-se em cinco partes: Introdução, 1º. capítulo: A
Criatividade no Universo e nos Seres Vivos – Visão Otimista do Futuro. 2º.
Capítulo: A criatividade na Arte e sentido da Vida. 3º. Criatividade na Vida, no
Cinema e na sala de aula. 4º. Capítulo: Criatividade na Vida e nas Ações e
Inconclusão para o Futuro.
2. Síntese dos Capítulos:
2.1. Introdução
5
Ações estéticas esse termo é um neologismo foi criado por nós para explicar ações que transbordam de
sentimento e amor ao próximo, ao ambiente, à natureza e à vida.
15
2.2. capítulo I: A Criatividade no Universo e nos Seres Vivos Visão Otimista do
Futuro. Esse capítulo apresenta como a ciência e alguns pensadores defendem a
criatividade por ser uma característica de um mundo não determinado
a priori
. A
criatividade é fruto da liberdade que existe em um mundo a ser construído e se o
futuro não é dado, sempre a possibilidade de modificá-lo. Entre os diversos
pensadores destacamos: Ilya Prigogine, Edgar Morin e Charles Sanders Peirce, por
possuírem uma visão otimista do homem e da vida. Esses pensadores, cada um
na sua particularidade, entendem que a vida em um sistema pré-definido é irreal,
pois a natureza é incerta. Acreditam na ação como força de mudanças. Defendem
o amor como totalidade do homem e da vida. Entendem que a estética e a ética
constroem o futuro.
2.3. Capítulo II: A criatividade na Arte e na Vida – Esse capítulo aborda as ações
e reflexões de artistas preocupados com o homem e sua relação com natureza.
Entre os artistas atuantes nessa linha apresentamos: Lygia Clark, Joseph Beuys e
Frans Krajcberg. O trabalho dos artistas elencados se posiciona como ação e, da
mesma forma que os pensadores constroem o futuro. Estamos em uma
encruzilhada em que a criatividade e o amor serão a dominância do futuro.
2.4. Capítulo III. Criatividade na Vida, no Cinema e na sala de aula Esse
capítulo aponta para a pertinência do cinema como divulgador de sensações e de
exemplos de conduta. Entre os vários filmes que abordam esse tema destacamos:
A Corrente do Bem, A Última Grande Lição e Escola da Vida.
A lista de filmes é enorme e pode ser consultada no anexo. Entre eles têm alguns
que foram tirados da realidade e outros que são fruto da ficção. Estamos
conscientes que uma história real, um livro etc., quando vai para as mãos de um
diretor ganha luz própria. Real ou não esse detalhe não é o importante, o que vale
16
para nosso trabalho são os exemplos abordados. Lembramos que a busca pela
verdade
67
encontra diversas visões no seu percurso. Por isso mesmo é inatingível.
Além dos filmes, o capítulo aborda também alguns trabalhos e manifestações de
alunos. Como professora universitária divulgo aos meus alunos “A Carta as
Futuras Gerações” de Prigogine e a “Carta do Cacique Seattle”. Desenvolvo com
eles trabalhos artísticos no sentido de ação com o intuito de melhorar a relação
homem/homem e homem/ambiente.
2.5. Capítulo IV: Criatividade na Vida e nos Exemplos das Ações. Sementes de
Amor Visando o Futuro e Inconclusão para o Futuro. Esse capítulo aborda os
exemplos de ações estéticas e éticas de pessoas empenhadas em modificar o
futuro. Termina com uma conclusão que não conclui inconclusiva, em virtude da
impossibilidade de se determinar resultados
a priori
. O nosso trabalho é no
caminho da distribuição de sementes utópicas e agathópicas.
2.6. Bibliografia
2.7. Glossário
2.8. Anexo 1
2.9. Anexo 2 - Reportagens
6
Sobre a verdade encontramos em um mito africano a explicação da possível consistência da verdade de uma
determinada verdade:
Uma lenda africana sobre a criação do mundo diz que Olofi, o senhor que criou tudo: o bem e o mal; o
bonito e o feio; o claro e o escuro; o grande e o pequeno; o cheio e o vazio; o alto e o baixo; criou, também, a
verdade e a mentira. A verdade era forte, marcante, bela, luminosa e a mentira era fraca, feia, opaca. Ao
perceber a fragilidade da mentira, o senhor deu-lhe uma foice, para que ela pudesse se defender.
A mentira sentia inveja da verdade e, por isso queria eliminá-la. Certa ocasião quando a mentira defrontou-se
com a verdade, desacatou-a. Elas brigaram e a mentira empunhando sua foice degolou a verdade, de um
golpe, esta, ao se sentir sem cabeça começou a procurá-la tateando a sua volta. De repente, ela apalpou um
crânio e supondo ser o seu agarrou-o e arrancando-o de onde estava colocou-o sobre o seu pescoço. Mas,
acontece que aquela não era a sua cabeça e sim a da mentira. Desde então, a verdade anda por enganando
a todas as pessoas.
7
Infelizmente, não tenho a referência sobre essa lenda. Quando recebi alguns livros de presente, de uma
pessoa falecida, veio um com a dedicatória da lenda.
17
3. Capítulo I:
A Criatividade no Universo e nos Seres Vivos:
As artes levam-nos à dimensão estética da existência e – conforme o adágio que diz que a natureza
imita a obra de arte – elas nos ensinam a ver o mundo esteticamente. (...) Trata-se, enfim, de
demonstrar que, em toda grande obra, de literatura, de cinema, de poesia, de pintura, de escultura, há
um pensamento profundo sobre a condição humana.
Morin. 2000:45
A questão real é que a arte é forma de conhecimento e todo conhecimento é função vital, todo
conhecimento garante vida e complexidade. [...] Da mesma forma, a boa ciência envolve a
qualidade do ato criativo científico. O belo modelo. A equação elegante. O experimento sofisticado.
Vieira. 2002:52
A Ciência é, e continua a ser, uma aventura. A Verdade da ciência não está unicamente na
capitalização das verdades adquiridas, na verificação das teorias conhecidas. Está no caráter
aberto da aventura que permite, melhor dizendo, que hoje exige a contestação das suas próprias
estruturas de pensamento. Bronovski dizia que o conceito da ciência não é nem absoluto nem
eterno.
Edgar Morin
Pretendo que a poesia tenha a virtude de, em meio ao sofrimento e o desamparo,
acender uma luz qualquer, uma luz que não nos é dada, que não desce dos céus,
mas que nasce das mãos e do espírito dos homens.
Ferreira Gullar
O homem só ensina bem o que para ele tem poesia.
Rabíndranáth Thákhur
Importante para desenvolver um paradigma efetivo para a PAZ é o
movimento de abandono das hierarquias
8
lineares.
Amit Goswami
Estamos num universo predeterminado, somos, como escreveu Popper, espectadores
de um filme já feito, do qual ignoramos o fim. Ou, como dizia Paul Valéry, estamos
num universo em construção, onde o futuro ainda não existe e onde participamos na
criação do futuro?.
Prigogine 1991:226
O saber científico, extraído dos sonhos de uma revelação inspirada, quer dizer, sobrenatural, pode
descobrir-se hoje simultaneamente como “escuta poética” e processo natural nela, processo aberto
de produção e invenção, num mundo aberto, produtivo e inventivo. Chegou o tempo de novas
alianças, desde sempre firmadas, durante muito tempo ignoradas, entre a história dos homens, de
suas sociedades, de seus saberes, e a aventura exploradora da natureza.
Prigogine 1991:226
8
Se pudéssemos isolar um único conceito histórico que tenha impulsionado o ser humano e a sociedade para
tanta violência e guerra, ele seria o de hierarquia. (Goswami.2007:260 )
18
A tese caminha na direção de levantar possibilidades na construção de um mundo
melhor, por meio das ações estéticas. Nesse percurso os teóricos escolhidos
possuem em comum, além de suas idéias avançadas e a ênfase na ação e na
criatividade, visões otimistas sobre o futuro. Faço minhas, com pequenas
mudanças, as palavras de Prigogine na “Carta às Futuras Gerações”: Escrevo este
trabalho na mais completa humildade. Meu trabalho é no domínio da arte. Não me
qualquer qualificação especial para falar sobre o futuro da humanidade. As
decisões humanas dependem das ações do presente e das expectativas para o
futuro. A perspectiva sob a qual vejo o problema da transição da cultura da guerra
para uma cultura de paz, embora, tenha se obscurecido nos últimos anos, não
eliminou minha fé no ser humano. Continuo otimista e acredito na ação do
homem para modificar o futuro.
Antes de adentramos nos temas: criatividade, arte e ação estética é necessário
desenvolver poucas palavras sobre estética. A estética desde a Grécia Antiga até
os dias de hoje sempre esteve presente na relação do homem com a sociedade, a
cultura e a natureza. No entanto, como ciência surge somente por volta de 1750
com Alexander Gottlieb Baumgarten. A partir dessa data, os filósofos cada vez
mais amplificam os limites da estética. No final do séc. XIX Charles Sanders Peirce
amplia a abrangência da estética ao
propor que esta assuma o direcionamento da
vida, por meio da busca de um ideal admirável –
Summum Bonum
.
9
Vários filósofos, ao longo do tempo, explicaram a estética de diferentes formas,
mas o importante para este trabalho é o entendimento das mudanças que
ocorreram no c. XX. O ponto fundamental é refletir sobre a criação estética,
não como a ciência do belo ou como um procedimento de arte, mas como um
instrumento que permita um olhar abrangente do sistema vida. O olhar estético é
que permite o alargamento e o entrelaçamento dos sub-sistemas que estão
conectados ao sistema maior que é o universo. O diálogo entre todos os sub-
sistemas agrega informação nova e permite novas descobertas. Como disse
9
Summum bonum - ideal admirável é, segundo Peirce, o ideal estético da vida humana.
19
Marcel Proust
10
: “Uma verdadeira viagem de descobrimento não é encontrar
novas terras, mas ter um olhar novo.” (Proust
apud
Morin. 2000:107) A estética
em Peirce e em outros pensadores do séc. XX é fundamental para o
desenvolvimento dessa pesquisa.
O importante é esclarecer que a criatividade defendida por Prigogine, Morin e
Peirce está apoiada na ética. Prigogine aponta para a criatividade como
descoberta, construção e novos direcionamentos. Na semiótica, de Peirce, a ética
não se separa nem da estética e nem da lógica o que configura a totalidade. Morin
defende a emergência da antropoética, que, segundo ele, seria um manifesto para
a conduta ética assumir o destino humano. Os três teóricos defendem, em suma,
uma nova postura do homem por intermédio da comunicação sistêmica e da inter-
relação entre os subsistemas. Quando utilizamos a palavra estética, como criadora
de um novo processo evolutivo, estamos incluindo a ética e a lógica. Em Peirce a
estética representa o sentimento, a ética a ação e a lógica o pensamento. O
sentir, o agir e o pensar não se separam e constituem a soma do individuo a
unidade.
A intenção desse capítulo é refletir sobre a criatividade pelo caráter de descoberta.
A união da arte e da ciência são os pilares de novas atitudes na busca de um
futuro diferente. Não podemos esquecer que tanto a arte quanto a ciência
possuem a liberdade em dialogar com a vida e produzir diferenças, sendo o grau
de liberdade da primeira o diferencial no caminho do novo. Enfatizamos que tanto
a arte quanto a ciência contêm no seu âmago a preocupação com a realidade e
com a projeção do futuro.
A emergência da criatividade por ser fruto de um sistema aberto, aponta às visões
multidisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar. A ação dos artistas e suas
10
Marcel Proust. 1871 - 1922 intelectual francês, escritor de romances, de ensaios e crítico literário. É
conhecido pela obra "Em busca do tempo perdido" (À la recherche du temps perdu).
Publicada entre 1913 e 1927, em oito volumes: No Caminho de Swann, À Sombra das Raparigas em Flor, O
Caminho de Guermantes (1 e 2), Sodoma e Gomorra, A Prisioneira, A Fugitiva e O Tempo Redescoberto
.
20
reflexões ampliam as possibilidades de quebrar hábitos adquiridos e apontar para
mudanças substanciais na relação homem/vida. A ocorrência dessas
transformações é fruto do rompimento de ações e hábitos enraizados. Ao longo
do trabalho apresentaremos reflexões de pensadores e artistas sobre arte, ciência
e indivíduos. A meta é refletir sobre a probabilidade de o amor emergir como
gerenciador de diversidades e atitudes. A importância da criação surge como
elemento diferencial em um mundo complexo e unificado por ações estéticas.
Para Jorge Albuquerque Vieira
11
a arte tem a função de elaborar complexidade,
pois possui vínculo e compromisso com a realidade, diferentemente do que tem
sido dito. Assevera: “A questão real é que arte é forma de conhecimento e todo
conhecimento é função vital, todo conhecimento garante vida e complexidade”.
(2002:52)
Vieira defende sua assertiva com base em Hans Vaihinger e na teoria do
conhecimento
12
. Realça que a emergência do conhecimento possui várias formas
diferentes de conhecer o mundo. Neste trabalho utilizamos o Ficcionalismo de
Vaihinger, por ser pertinente no que se refere ao aspecto das criações artísticas.
Vaihinger defende que é possível formular pensamentos corretos, sobre o mundo
e sobre a realidade, mesmo partindo de representações falsas.
O conhecimento se forma no esforço da adaptação do indivíduo ao meio e é,
conseqüentemente, - em seu momento inicial uma forma criada pela espécie para sua
conservação. Este tipo de pragmatismo’ não aspira a restabelecer a situação concreta
do pensar como também reconhece o que Wilhelm Wundt chamou a heterogênese dos
fins’ e que Vaihinger qualifica de ‘proliferações dos meios com relação aos fins’, vinculando-
se a elas, como motivo central, a tese das ficções conscientes. A heterogênese admite que,
tendendo todo meio a tornar-se independente de seu fim, o conhecimento chega,
finalmente, a constituir-se numa finalidade independente, a pretender descobrir por si e
em si a realidade. Esta pretensão é, não obstante, injustificada quando levada a suas
ultimas conseqüências; o que o conhecimento faz é apenas, respondendo à sua finalidade
biológica, criar ficções para a compreensão e domínio das situações problemáticas.
(Vaihinger apud Vita. 1965:94)
11
Jorge Albuquerque Vieira. Engenheiro de telecomunicações, Astrofísica, Mestre em Física de Reatores
pela COPPE/UFRJ e Dr. Em Comunicação pela PUCSP.
12
A teoria do conhecimento defende: o Dogmatismo, o Criticismo, o Relativismo, o Perspectivismo, o
Pragmatismo, o Ficcionalismo e o Cepticismo.
21
Vieira vai ao encontro de Vaihinger e esclarece que a necessidade de permanecer
do ser humano é que o obriga a se adaptar ao meio e a construir ficções
conscientes. Pode-se afirmar que, quando acontece uma descoberta, a qual, num
primeiro momento, é entendida como relacionada aos objetos ideais (fora da
realidade), com o passar do tempo, essa descoberta, mostra-se real, o que
comprova o Ficcionalismo. Essa explicação é importante para mostrar que a
criação existe de início só na imaginação e, muitas vezes, necessita de tempo para
se concretizar. Um exemplo nos é dado por Leonardo da Vinci, pois diversas
descobertas atuais vêm dos estudos feitos, por ele, no Renascimento. Fazer ficção
é deixar a mente aberta para criar e ser impedido de concretizar seus devaneios
por falta de tecnologia apropriada, mas o passar do tempo mostra a pertinência
da ficção elaborada.
Mais um exemplo do ficcionalismo é encontrado em Ray Kurzweil cientista e um
dos maiores nomes na criação de novas tecnologias. As suas invenções são
diversificadas e investem em um futuro que presenciará a convergência do
homem com a máquina. Kurzweil por seu desempenho ganhou a maior medalha
que o governo dos Estados Unidos oferece a um homem da ciência. Aposta que
em 2045 “o homem fundido com a máquina irá multiplicar em bilhões de vezes a
sua inteligência, comparado ao que somos hoje.” A possibilidade do homem em
fazer backup do que não sabe vai ao encontro da ficção científica e encontra
exemplos em filmes como: Matrix, Minha Noiva é uma Extraterrestre e muitos
outros.
Kurzweil, atualmente, está afastado das criações e dedica-se a escrever e a dar
conferências sobre suas idéias repletas de ficções para o futuro. A capacidade de
criar ficções continua mais forte do que nunca, mas concretizá-las no tempo
presente está difícil, ou melhor, quase impossível. Kurzweil explica os motivos de
sua decisão:
Eu vi que o tempo não era bom para eu continuar estabelecido como inventor. Prevendo o
que será feito, eu posso ‘inventar’ as tecnologias do futuro. Hoje eu ainda não posso
inventar esses mecanismos, mas ao menos eu posso fala e escrever sobre eles.
22
O documentário Transcendent Man
13
, do cineasta Barry Ptolemy, apresenta ao
grande público as idéias desse grande cientista e o elogio de Stevie Wonder à
suas invenções: “Ray tem um dom, que foi dado a ele para o bem da
humanidade”. Wonder se refere à máquina leitora de Kurzweil, um computador,
que tem o poder de ler para os cegos. No youtube pode ser visto o Trailer do
documentário. No anexo a reportagem do Estado de São Paulo sobre o cientista
que projeta: seres humanos imortais, robôs com alma e cérebros descarregados
na internet.
O ser humano tem a necessidade de internalizar informações do mundo e de
aprender com elas para sobreviver, para tanto complexifica algumas alucinações.
O ser vivo recolhe diferenças do mundo elabora uma organização de alguma
maneira coerente com a realidade, faz ficção. O homem e a ciência fazem ficção
consciente e a arte, por sua liberdade, faz ficção coerente (realidade) e fantasiosa
(possibilidades). Depois de certo estágio de complexidade evolutiva, é possível
fazer ficções de forma mais livre e planejada. Essa liberdade diz respeito à arte.
Vieira acredita que o conhecimento artístico, por sua liberdade, antecede ao
científico, fazendo da arte uma fonte, sem a qual a ciência não poderia viver.
Ao explicar as ficções elaboradas e a permanência, Vieira defende o conceito de
Umwelt
do biólogo Jakob Von Uexküll (1864 1944) que é a maneira como as
espécies interagem com o ambiente. Uexküll defende a unidade do processo da
vida como sistêmico. Um sistema coerente que dialoga sujeito e objeto. O
pensador não defendia nem o objetivismo e nem o subjetivismo; sua defesa se
dirige ao encontro da interação de ambos.
Entendia o processo vital como um sistema coerente em que sujeito e objeto se definem
como elementos inter-relacionados em um todo maior. (...) A definição de objeto por
Uexküll antecipa a definição de sistema aberto’. (...) Cada processo de observação implica
interações entre o observador e o sistema observado. (...) Nenhuma afirmação definitiva
pode ser feita sobre eles, nem mesmo se existem ou não. Portanto, é impossível examinar
13
http://www.youtube.com/watch?v=ntY01qoIdus
23
objetos isolados de seu ambiente. (...) Desenvolveu seu conceito da Umwelt especifica da
espécie’ o segmento ambiental de um organismo, que é definido por suas capacidades
especificas da espécie tanto receptoras quanto efetoras (definidas por Uexküll como
‘percepção’ e ‘operação’). (Uexküll. 2004:20-22)
Vieira enfatiza que o diálogo entre sujeito e objeto gera crise e, esta, criação.
Criar é conseqüência de uma crise, “o ato de criação visa, entre outras coisas mais
específicas, a permanência do vivo”. (2006:58).
Ao falar de crise e criação, Vieira assinala para a possibilidade de haver um padrão
no ato criador. Cita o conceito de
Evolon
de Mende,
Evolon
seria um passo
evolutivo
14
, a passagem de um nível de estabilidade a outro.
Uma seqüência de evolons constitui uma escada evolutiva, pela transição repetitiva de um
estado estacionário ao próximo. Atingir o estacionário, na verdade o metaestável, é uma
imposição da permanência. As órbitas históricas que descrevem a evolução do sistema
tendem à regiões de estabilidade em seu espaço de estados histórico: os extremos do
evolon são regidos por atratores. A idéia de evolon, por conter as crises típicas das
estruturas dissipativas de Prigogine (a rota do caos para a organização) e as crises típicas
de processos de caos determinista (a rota da organização para o caos) contém
fenomenologicamente a fusão de idéias ainda não bem conciliadas. (Mende apud
Vieira.2006:60)
Na mesma direção de Vieira, Amit Goswami
15
afirma que o desenvolvimento
humano é gerido pela natureza, educação e criatividade. Cita Freud e diz que a
natureza é regida por instintos inconscientes: Libido
16
. A educação está ligada ao
ambiente que por sua vez possui uma parte inconsciente. A criatividade defendida
por ele diz respeito ao impulso que tem origem no inconsciente coletivo. “A
criatividade é a gestação de algo novo em um contexto inteiramente novo. O
caráter de novo do contexto é o elemento fundamental.” (Goswami. 2007:265).
14
Passo evolutivo diz respeito a patamares, a mudanças de nível e não a evolução no sentido de progresso.
Muitas vezes, o progresso torna-se um retrocesso.
15
Amit Goswami. físico, doutorado em física nuclear, nasceu na Índia, filho de um guru hinduísta.
Pesquisador e professor titular de fisica teórica da Universidade de Oregon, nos EUA, por 32 anos a partir de
1968. Pesquisa a cosmologia quântica e aplicações da mecânica quântica ao problema da relação mente-
corpo. Procura a convergencia entre as tradições místicas e a científica, busca unificar a espiritualidade e
física quântica.
16
Embora, inicialmente, Freud definisse libido inteiramente em termos do impulso sexual, em trabalhos
posteriores ele parece usar a palavra para indicar toda a “força vital”. Uso a palavra libido neste sentido
freudiano mais geral. (Goswami.2007:341)
24
Argumenta que a diferença entre o homem e o computador é que o primeiro tem
a natureza de criar novos contextos enquanto que o segundo trabalha em
contextos preestabelecidos. O ser humano tem a capacidade de criar ao saltar
para fora do sistema:
A criatividade é, fundamentalmente, um modo não local de cognição. (...) A descoberta
simultânea da mesma idéia científica
17
por indivíduos o conectados localmente, em
diferentes tempos e lugares, fornece prova impressionante da não-localidade dos atos
criativos. (Goswami. 2007:265-266)
Goswami explica que existem:
três estágios distintos no processo criativo. O primeiro é o estágio de preparação, de
coleta de informações. O segundo é o grande estágio do processo criativo - a
germinação e comunicação da idéia criativa. O terceiro e final estágio é o da
manifestação, no qual uma forma é dada à idéia criativa. (2007:266)
Assevera que a criatividade não é fruto de um diálogo ordenado entre as partes e
que o ato criativo “é fruto do encontro do
self
clássico
18
e das modalidades
quânticas”. (Goswami.2007:266)
A criatividade, portanto, é o encontro hierárquico entrelaçado entre as modalidades
clássica e quântica do self: informação e comunicação, transpiração e inspiração. O ego
tem de agir mas sob orientação de um aspecto do self que não conhece. Em especial,
ele tem de resistir ao desejo de reduzir o processo criativo a uma hierarquia simples de
programas aprendidos. Essa redução na causa da eficiência é uma tendência natural,
mas infeliz, do ego. (Goswami.2007:268-269)
Goswami lembra os versos de Rabindranath Tagore:
A melodia procura agrilhoar-se no ritmo,
Enquanto o ritmo flui de volta para a melodia.
A idéia procura seu corpo na forma,
E a forma sua liberdade na idéia.
O infinito procura o toque do finito,
E o finito a sua libertação do infinito.
Que drama é esse entre criação e destruição –
Essa oscilação infindável entre idéia e forma?
A servidão luta para obter a liberdade,
E a liberdade procura repouso na servidão.
17
Este fenômeno não se restringe ao reino da ciência. Semelhanças no trabalho criativo de artistas, poetas e
músicos que vivem em diferentes épocas e lugares são tão notáveis que sugerem também correlação não local.
(Goswami.2007:266)
18
Self clássico – termo usado neste livro para denotar a modalidade condicionada do self, o ego.
Self quântico – A modalidade do sujeito primário do self, além do ego, na qual reside a autentica liberdade, a
criatividade e a não-localidade da experiência humana. (Goswami. 2007:332)
25
A criatividade por permitir novos caminhos representa a ruptura de idéias pré-
concebidas e aponta para a visão sistêmica. O sistema criativo é aberto e não
delimitado, pois se remete a totalidade e não as partes isoladamente. O processo
criativo rompe com as visões lineares e condicionadas e possibilita a trama
complexa. Stephen Nachmanovitch vem ao nosso encontro e explica bem a
natureza da criatividade:
Nenhum tipo de organização linear pode fazer justiça a esse tema; por sua própria
natureza. (...) Olhar para o processo criativo é como olhar dentro de um cristal: Quando
fixamos os olhos numa face, vemos todas as outras refletidas. (...) Os pré-requisitos da
criação, são a alegria, o amor, a concentração, a prática, a técnica, o uso do poder dos
limites, o uso do poder dos erros, o risco, a entrega, a paciência, a coragem e a confiança.
(...) A criatividade é a harmonia de tensões opostas.
(Nachmanovitch.1993:23)
O olhar a totalidade em diálogo com as partes em uma visão sistêmica, em que
todas as partes de um sistema dialogam entre si, faz emergir o mistério da vida.
Acaba com a tranqüilidade de ações conhecidas para obrigar a atitudes novas. A
criação surge do embate entre a transitoriedade e a eternidade da vida. É
necessário abandonar as crenças estabelecidas e partir na direção de novas
crenças.
Improvisar é aceitar, a cada respiração, a transitoriedade e a eternidade. Sabemos o que
poderá acontecer no dia seguinte ou no minuto seguinte, mas não sabemos o que vai
acontecer. Na medida em que nos sentimos seguros do que vai acontecer, trancamos as
possibilidades futuras, nos isolamos e nos defendemos contra surpresas essenciais.
Entregar-se significa cultivar uma atitude de não saber, nutrir-se do mistério contido em
cada momento, que é certamente surpreendente, e sempre novo.
(Nachmanovitch.1993:30)
Para entendermos como a criatividade é fundamental nas ões para o futuro é
importante sabermos a diferença de sua ação em um sistema aberto e em um
sistema fechado. O sistema fechado, por ser determinista, não permite a
emergência da criatividade, por outro lado, o sistema aberto, por ser
indeterminado, possui uma dinâmica que permite a emergência de visões novas e
atitudes novas. O pensamento complexo
19
é fruto de um sistema aberto, pois
permite as visões inter, multi e transdisciplinares.
19
A complexidade é fruto de um sistema complexo e possui uma parábola que pode ser lida no final do texto,
no anexo – Parábola da Complexidade.
26
3.2 A Criatividade em um Sistema Aberto na Construção do Futuro
A noção de sistema aberto encontra em Ilya Prigogine
20
as bases necessárias para
sua compreensão. Prigogine escreveu, com Isabelle Stengers, “A Nova Aliança”,
1984, no qual levanta o problema da flecha do tempo. Defende a criatividade na
construção do futuro e explica a nova visão de ciência. A mudança que ocorreu na
ciência clássica é fundamental para se entender o pensamento de Prigogine.
A fim de tornar acessível as explicações de Prigogine desenvolvemos a tabela
abaixo com as diferenças existentes entre os dois tipos de universos: Universo
simples, clássico sistema em equilíbrio que representa a ciência tradicional e o
Universo complexo sistema longe-do-equilíbrio que representa a ciência
contemporânea:
UNIVERSO SIMPLES – CLÁSSICO
Pessimismo;
Determinismo (passado e futuro
equivalentes);
Reversível;
Contínuo – linear – Estável e sem
rupturas e grandes flutuações;
Verdades;
Universo Estável;
UNIVERSO COMPLEXO – PRIGOGINE
Otimismo;
Indeterminismo (futuro em Construção);
Irreversível;
Descontínuo – Acontecimentos – Bifurcações;
Flutuações (quando são grandes as Estruturas
Dissipativas) – Múltiplo – Instável e com rupturas;
Possibilidades;
20
Ilya Prigogine - Rússia 1917 - Bruxelas 2003. Ganhou o Premio Nobel de Química em 1977 pelos seus
estudos em termodinâmica de processos irreversíveis e a formulação da teoria das estruturas dissipativas.
Prof. Dr. da Universidade Livre de Bruxelas. Foi co-fundador do atual Centro Para Sistemas Quânticos
Complexos.
27
Sistema em equilíbrio – sem
flutuações que interfiram na
trajetória – simétrico no tempo;
Ordem Matéria inerte;
Universo geométrico intemporal,
sem história, sem liberdade e
criatividade;
Antropocêntrico (homem se- parado
da natureza);
Mundo autômato.
Universo Instável;
Sistema longe do equilíbrio – com flutuações que
modificam a trajetória – assimétrico no tempo;
Entropia – A Entropia (do grego εντροπία) é uma
grandeza termodinâmica associada ao grau de
desordem de um sistema ma-croscópico;
Universo orientado no tempo – fluxo do tempo;
História – Narrativo;
Matéria dinâmica;
Cosmocentrismo – união do homem e da
natureza;
Liberdade e criatividade;
Mundo dinâmico.
As pesquisas de Prigogine explicam que essa nova racionalidade é fruto da noção
de sistemas abertos e da física do não-equilíbrio. Para explicar essa mudança é
necessário compreender que, um sistema quando está perto do equilíbrio,
embora, sofra flutuações e seu equilíbrio fique momentaneamente abalado, ele
consegue voltar a sua posição estável anterior. Um sistema estável é semelhante
ao pêndulo que ao sofrer um abalo sempre volta a sua antiga posição. A seguir
exemplos de sistemas - um baseado no pêndulo e um de crescimento linear:
x
n+1
= rx
n crescimento linear
21
21
http://www.fsc.ufsc.br/.../fig-pendulo-modos.html
28
Para se entender como atuam os sistemas
22
é importante saber que eles estão
conectados internamente e externamente. O todo sistêmico é o responsável pela
reestruturação do sistema por possuir determinados elementos e regras.
Na organização sistêmica, “os sistemas conectam-se internamente e na realidade,
regidos pelos chamados
Parâmetros Sistêmicos
: Permanência, Ambiente,
Autonomia, Composição, Conectividade, Estrutura, Integralidade, Funcionalidade e
Organização”
23
. No momento em que ocorre uma flutuação todas essas etapas do
processo atuam para a auto-organização do sistema. O processo de reorganização
do sistema é o responsável pelo surgimento do novo ou, se não ocorrer uma auto-
organização, por sua morte. Pode-se concluir que o elemento ativo na organização
sistêmica diz respeito a permanência. Como define Vieira: “Todas as coisas
tendem a permanecer”. (Vieira.2000:5)
É importante lembrar que a termodinâmica clássica é a responsável pelas
explicações das estruturas em equilíbrio, que operam em sistemas isolados e em
um determinado espaço de tempo relativamente longo e compreendido por sua
estrutura de equilíbrio. Entretanto, no momento em que o sistema deixa de ser
isolado e, torna-se aberto, ele começa a trocar matéria e energia com o ambiente
e passa a ser compreendido por suas estruturas dissipativas. As estruturas
dissipativas não possuem a ordenação defendida por Ludwig Boltzmann
24
na
22
um agregado (m) de coisas (qualquer que seja sua natureza) será um sistema S quando por definição df
existir um conjunto de relações R entre os elementos do agregado de tal forma que venham a partilhar
propriedades P.
(m) S = df [ R (m) ] P - Definição de Uyemov
A vantagem dessa definição é que nos permite uma leitura direta da noção de sistema a partir de um de seus
parâmetros mais simples, a idéia de composição, como expressa pela notação (m), o agregado que formará o
sistema, além de explicitar a emergência do todo, a partir de P.
23
VIEIRA, Jorge de Albuquerque. Sistemas e significação. In: FELTES, Heloisa Pedroso de Moraes.
“Produção de sentido estudos transdisciplinares”. (Caxias do Sul: Educs, 2003. pp. 342)
24
Boltzmann, (1844-1906) Físico austríaco, estabeleceu as bases da física clássica estatística, e relacionou a
teoria cinética à termodinâmica. A física teórica sofreu mudanças importantes nos anos 1860-1870, após o
estabelecimento da Segunda Lei da Termodinâmica, efetuado por Clausius e Kelvin; da teoria cinética dos
gases por Clausius e Maxwell e da teoria do eletromagnetismo por Maxwell. Botzmann estendeu a teoria
cinética, desenvolvendo a lei de equipartição da energia das partículas pelos graus de liberdade, e calculando
29
termodinâmica clássica, ao contrário, estão ligadas a uma ordem por meio da
flutuação.
Acontece que as estruturas dissipativas são o resultado da amplificação das
flutuações ou flutuações gigantes “que resultam de uma instabilidade do ramo
termodinâmico”. (Prigogine.1976:95) A estrutura dissipativa é fruto da
amplificação da flutuação, sendo, portanto, a ligação entre a função e a estrutura.
Em comparação a ordenação de Boltzmann, na qual as flutuações têm seu papel
reduzido à uma simples ligação, as flutuações nas estruturas dissipativa são
essenciais, porque permitem o surgimento da ordem e do novo.
A diferença da visão tradicional para a contemporânea encontra nas estruturas
dissipativas o foco de mudanças. As estruturas dissipativas nascem:
de um desvio do equilíbrio. (...) O caminho evolutivo singular compassado por uma
sucessão de bifurcações. (...) Pode-se afirmar que sua atividade é produto da sua
historia e contém, portanto, a distinção entre passado e futuro. O Anel fica, assim,
fechado, (esquema) e o mundo microscópio é, por sua vez, capaz de nos fornecer o
ponto de partida de que tínhamos necessidade para toda e qualquer e qualquer
observação. Resumamos esse esquema circular: (1991:214)
A nova ciência está aberta a um futuro histórico:
É o das estruturas dissipativas que constituem a chance das singularidades aleatórias.
Esse esquema não traduz, pois, uma verdade de ordem lógica ou epistemológica, mas a
da nossa condição de seres macroscópicos num mundo mantido longe-do-eqüilíbrio.
(1991:214)
O ponto mais importante é que, longe do equilíbrio, não existe nenhuma garantia que o
sistema voltaria ao seu estado inicial quando perturbado. Ao contrário, o sistema,
começa a explorar novas estruturas, novos tipos de organizações espaço-temporais, que
denomino de estruturas dissipativas. (...) Muitas vezes descrevo esse comportamento
dizendo que a matéria perto do equilíbrio é cega; cada molécula pode enxergar tão
somente suas vizinhas. Longe do equilíbrio, porém, temos correlações de longo alcance
que são essenciais à construção de novas estruturas. A vida seria impossível sem esses
processos em estados de não-equilíbrio. (Prigogine 2001:70)
quantas partículas possuem uma determinada energia, originando a chamada distribuição de Maxwell-
Boltzmann. (http://www.fem.unicamp.br/~em313/paginas/person/boltz.htm)
30
Alguns exemplos de sistemas longe do equilíbrio – Caóticos:
x
n+1
= rx
n
(1-x
n
) crescimento não-linear
As imagens acima mostram os comportamentos dos sistemas não lineares,
caóticos e imprevisíveis. O mundo em que vivemos é regido por probabilidades e
não por certezas. Verifica-se que as afirmações de Prigogine são importantes
para o entendimento do mundo regido pela indeterminação: “Escolhas,
possibilidades, incertezas são simultaneamente, uma propriedade do universo e
da existência humana”. (Prigogine
apud
Carvalho 2001:12)
Se concordarmos com Trin Xuan Thuan que o caos se incumbe de liberar a matéria de
inércia, e o acaso e a indeterminação impregnam, galáxias e estrelas, é possível até supor
um reencantamento da natureza, da vida, do amor e da própria temporalidade. Aqui reside
a transição com a qual a ciência vem defrontando, ao assumir a probabilidade e a
irreversibilidade como pontos de partida nevrálgicos para uma visão mais otimista da
natureza e dos seres humanos, e a arte como a metáfora mais convincente a esse tipo de
cosmovisão. (Carvalho 2001:11-12)
31
A frase acima retrata o ponto primordial do trabalho: “a arte como a metáfora
mais convincente a esse tipo de cosmovisão”. As artes e as ciências juntas para
encontrar uma visão mais otimista, global e agir com amor na consolidação do
diálogo entre homem/homem/ e homem/natureza.
Prigogine afirma a pertinência da criatividade tanto na ciência como nas artes.
Afiança que elas não estão separadas, uma vez que a ciência não pode estar
separada do homem. Enfatiza que a criatividade científica não se limita a grupos
isolados, mas está na vida. “Vemos mais claramente como a criatividade humana
prolonga a da natureza.” (2001:17) Portanto, é possível falar de criatividade no
homem e na vida.
Ao defender a criatividade como fonte de mudanças, Prigogine aponta para a
liberdade e a responsabilidade do homem frente ao futuro. Esclarece que a
emergência da criatividade é fruto da complexidade e dos sistemas abertos. Em
suas pesquisas, constatou que o sistema vida não é fechado e não está em
equilíbrio, como se pensava no passado, ao contrário, é aberto e está longe-do-
equilíbrio. É um sistema instável em conseqüência, de sua abertura ao ambiente
e por sofrer perturbações do sistema como um todo. Prigogine argumenta sobre
a importância do fluxo do tempo, de um tempo que o é reversível e, sim,
irreversível. Ao explicar que não existe uma equivalência entre passado e futuro
aponta um novo caminho. Essa nova direção não é linear e possibilita a
emergência da criatividade como um elemento construtivo do futuro. Chama
atenção para o acontecimento, àquilo que chega sem ser esperado, o
contingente, o acaso, o imprevisível. E afirma a impossibilidade de se incluir a
criatividade em um mundo já determinado.
É possível que a construção do futuro, regida pela criatividade e pela ação
estética, seja uma alternativa evolutiva para o século XXI. A nossa tese é que o
conceito de criação estética se ampliou, com o passar dos tempos, sofreu
32
mutações e chega ao momento presente com a probabilidade de modificar o
caminho evolutivo.
Para enfocar a necessidade da criatividade na visão otimista de Ilya Prigogine, as
reflexões de Edgard de Assis Carvalho
25
, explicam o sentimento de amor pelo
universo de Prigogine. Carvalho cita William Blake
26
em
Agrúrias da Inocência
:
“Para ver o mundo num grão de areia e todo o firmamento numa simples flor
silvestre, pegue o infinito na palma de suas mãos.” Certamente esse verso de
Blake consegue antecipar a visão de universo em Prigogine. Carvalho lembra que
“Ilya Prigogine nos transmite exatamente uma visão de totalidade que, exige
novas alianças entre o homem e a natureza, entre a ciência e a filosofia”.
(Carvalho 2001:12)
Em virtude dos questionamentos sobre o comportamento de sistemas longe-do-
equilíbrio, perguntaram a Prigogine sobre a finalidade de seu trabalho. O Prêmio
Nobel respondeu “que suas pesquisas pretendiam apenas demonstrar um universo
em construção contínua, crivado de explosões de novidades e criatividade”.
(Prigogine
apud
Carvalho 2001:11)
É importante ressaltar que a arte possui exatamente a função de direcionar, no
presente, o percurso de um dos caminhos possíveis para o futuro. Mostrar a ação
do invisível é a meta do artista, pois ele consegue visualizar na situação caótica da
realidade possibilidades de percursos. Como afirmou Prigogine é impossível incluir
a criatividade em um mundo já determinado.
25
Prof. Dr. Edgard de Assis Carvalho. Prof. Dr. do Departamento de Antropologia, Pós-Graduação e
Graduação da PUC-SP, onde coordena um curso sobre Edgar Morin. Tem vários livros publicados é um dos
grandes defensores do Pensamento Complexo no Brasil. Coordena o Complexus, grupo de Estudos do
Departamento de Ciências Sociais na PUCSP.
26
William Blake Primeiro dos grandes poetas Românticos ingleses, como também pintor, impressor, e um
dos maiores gravadores da história inglesa.
33
Pode-se ver nas frases de Willian Blake, abaixo, a necessidade de haver uma
abertura humana para o invisível, a visão de criatividade como fator construtivo.
“Existem coisas conhecidas e coisas desconhecidas. Entre elas existem portas. (...)
O que hoje está provado, ontem era apenas um sonho. (...) Se as portas da
percepção fossem abertas tudo pareceria ao homem como realmente é infinito.”
Observa-se, atualmente, que a obra de arte contemporânea provoca uma troca e
um jogo entre o que é visível e o que é invisível, sendo, por isso, os sentidos tão
importantes nesse processo. Para enfatizar o real e o irreal ou o tangível e o
intangível o poema:
A Atuação do Invisível no Visível
de Lao-Tsé
27
é pertinente na
função criativa.
Trinta raios convergentes no centro
Tem uma roda,
Mas somente os vácuos entre os raios
É que facultam seu movimento.
O oleiro faz um vaso, manipulando a argila,
Mas é o oco do vaso que lhe dá utilidade.
Paredes são massas com portas e janelas,
Mas somente o vácuo entre as massas
Lhes dá utilidade
Assim são as coisas físicas,
Que parecem ser o principal,
Mas o seu valor está no metafísico.
Prigogine argumenta sobre o direito de escolhas que o homem possui e mostra
que a ciência clássica ao criar as leis deterministas e reversíveis, não respeitou o
fluxo do tempo e não permitiu a emergência das escolhas. “O materialismo
clássico, que assimila o universo a uma máquina, pede um relojoeiro! Ao passo
que um universo que se auto-organiza é um universo no qual você tem direito de
escolher!”. (2002:74)
27
Lao-Tsé Filósofo e alquimista chinês. É possivel que tenha vivido aproximadamente no Século Século IV
a.C ou no VII a.C. A ele é atribuída a autoria de uma das obras fundamentais do Taoísmo: o Tao Te Ching. A
influência deste livro é tão disseminada que tornou-se na atualidade um dos livros mais traduzidos em todo o
mundo.
Lao–Tsé explica que: “O invisível age pelo visível. (...) A aparente passividade da alma se manifesta pela
atividade do corpo. (...) A essência se revela em todas as existências. Quando o Todo, que é, age pelo Nada,
que não é então Algo começa a existir. Os fatos não criam valores, mas o valor produz os fatos.” (Lao-Tse
1989:46)
34
A complexidade é a possibilidade de mudança de rumo. É entender que um
sistema simples é regido pela escassez de liberdade (leis deterministas e
reversíveis). Os sistemas complexos comportam aberturas e liberdades (leis
indeterministas e irreversíveis). Acontece que muitos sistemas aparentemente
simples estão impregnados de complexidade.
Na complexidade do universo é importante observar o papel da entropia
28
(desordem). No momento em que o sistema se desorganiza emerge a criatividade.
Surge, então, o elemento narrativo do sistema que está vinculado à flecha do
tempo. Esse elemento é fundamental por possuir, ao mesmo tempo, unidade e
diversidade.
Prigogine diz que tanto Einstein quanto Borges
29
foram ambivalentes ao negar o
tempo
30
. E afirma: “O tempo e a realidade estão irredutivelmente ligados. Negar o
tempo pode parecer um consolo ou aparecer como o triunfo da razão humana, é
sempre uma negação da realidade.” (1996:197)
Prigogine adverte que o mundo regido pelo tempo, pela história é uma narrativa
que nos remete a Sherazade e as “Mil e uma noites”. Enfatizando a complexidade
e a irreversibilidade afirma:
O universo não faz lembrar agora aqueles contos árabes em que cada história se encaixa
em outras histórias? A história da matéria encaixa-se na história cosmológica, a história da
vida na história da matéria. E por fim, nossas próprias vidas estão mergulhadas na história
da sociedade. (1996:192)
28
“A noção de entropia é uma etapa essencial. Permite sair da geometria intemporal clássica e introduzir um
elemento narrativo na concepção que temos do mundo. A entropia exprime a flecha do tempo, estreitamente
ligada a dois outros aspectos que são a importância das flutuações e a imprevisibilidade ligada as duas
ações.”
29
Jorge Luis Borges. Argentina 1899 - Suiça 1986 escritor, poeta, tradutor, crítico e ensaísta
internacinalmente conhecido por seus contos e histórias curtas.
30
Prigogine questiona Borges sobre o tempo em
:
“Uma nova refutação do tempo” “E, no entanto, no
entanto... negar a sucessão do tempo, negar o eu, negar o universo astronômico são desesperos aparentes e
consolos secretos.... O tempo é a substância de que sou feito. O tempo é um rio que me arrebata, mas eu sou
o rio; é um tigre que me destroça, mas eu sou o tigre; é um fogo que me consome, mas eu sou o fogo. O
mundo desgraçadamente, é real; e eu, desgraçadamente, sou Borges.” (Borges apud Prigogine.1996:197)
35
A possibilidade de mudança é resultado da criatividade e responsável pela visão
otimista de Prigogine. “Estas novas estruturas estão ligadas a bifurcações que,
introduzindo um elemento histórico na descrição, permitem que o sistema passe
espontaneamente de um estado não organizado para um estado organizado.”
(1998:233)
A repetição dos acontecimentos na visão clássica impede a ação criativa. “O
universo é uma realização num universo das coisas possíveis. (...) Essa visão de um
universo evolutivo, assimétrico no tempo, reintroduz um elemento narrativo, uma
história.” (1998:235-136)
A ação da arte pode conseguir o retorno da união homem/natureza. Como
conseqüência dessa união, o homem percebe a complexidade
31
do futuro. A
31
Complexidade: é a escola filosófica que o mundo como um todo indissociável e propõe uma abordagem
multidisciplinar e multireferencial para a construção do conhecimento.
Edgar Morin: A Complexidade é um tecido de constituintes heterogêneos inseparavelmente associados:
coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. A complexidade é efetivamente o tecido de acontecimentos, ações,
interações, retroações, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo fenomenal. Mas então a
complexidade, apresenta-se com os traços inquietantes da confusão, do inextricável, da desordem, da
ambigüidade, da incerteza... Daí a necessidade, para o conhecimento, de pôr em ordem nos fenômenos ao
rejeitar a desordem, de afastar o incerto, isto é, de selecionar os elementos de ordem e de certeza, de retirar a
ambigüidade, de clarificar, de distinguir, de hierarquizar... (Morin.2001:20).
Parábola da Complexidade:
A questão da complexidade está na moda, mas no sentido em que vou utilizá-la, ela é antiga. Lichtenberg,
que vivia no século XVIII, já a tinha colocado na forma de uma parábola, num texto que o põe em cena como
químico sonhando (Lichtenberg era a um tempo químico, escritor, físico, crítico literário, etc.).
Lichtenberg-químico sonha que um Ser sobrenatural, ao qual ele não nome, mas que é evidentemente
Deus criador, confia-lhe uma bola mineral. Pede-lhe para analisá-la e lhe designa um laboratório bem
equipado. Lichtenberg pensa que esta é a oportunidade de sua vida: - ele vai descobrir um corpo
desconhecido, com propriedades surpreendentes. Começa a trabalhar... A bola está com um pouco de poeira e
ele a sopra; ela está úmida, ele a enxuga; testa suas propriedades em relação à eletricidade friccionando-a.
Nada de particular, não é âmbar. Depois ele a analisa quimicamente e não encontra nada interessante, nada
senão compostos conhecidos... Decepção. O Ser sobrenatural reaparece e pergunta: "analisou?", e
Lichtenberg, perplexo, atônito, lhe a lista dos constituintes. - "Você sabe o que analisou, mortal? Esta bola
é o globo terrestre" um sonho; devemos imaginar uma terra sem âmago ardente, evidentemente). E o Ser
sobrenatural descreve para o químico como, desde as primeiras operações, desde que se "apropriou" da bola
soprando-a, enxugando-a com seu lenço, ele suprimiu tudo o que na terra tem de interessante, de singular. Os
oceanos foram "soprados", os Andes são essa poeira que esainda agarrada em seu lenço, etc... O primeiro
gesto de Lichtenberg, que ele acreditava ser neutro, insignificante, que fez sem pensar, e que era realmente o
gesto de apropriação, reduziu a terra a um composto mineral qualquer. No final do sonho, Lichtenberg, ainda
químico, mas jurando tomar todas as precauções possíveis e imagináveis, pede uma nova chance. O Ser
sobrenatural lhe concede a nova chance e lhe diz: "Analise quimicamente o que encontrar nesse saco".
Lichtenberg abre o saco e cai de joelhos para pedir perdão, enquanto químico, por sua arrogância. Dentro do
saco um livro, e ele sabe que podeanalisá-lo sem que, evidentemente, a análise química lhe permita
dizer o que quer que seja de interessante.
36
complexidade potencializa a força do momento presente em construir o amanhã,
uma vez que produz diversidades e bifurcações. As bifurcações são frutos da
liberdade de criar caminhos e a complexidade é o caminho otimista e
intermediário entre as visões deterministas, céticas de um passado pessimista. A
criatividade negada no mundo determinista torna-se o centro refletor no mundo
indeterminado. Prigogine assevera que a noção de complementaridade entre a
repetição e a criatividade construirá o futuro.
A união da razão com a sensibilidade enfatiza o diálogo entre os pensamentos
objetivo e poético e potencializa a reflexão humana e a expansão da mente. A
pesquisa defende a ação de artistas e de indivíduos do mundo como propositores
e executores de ações estéticas. Os artistas, por meio das Performances,
Instalações perceptivas etc., contribuem para o aumento da sensibilidade e o
desenvolvimento da relação homem/natureza pelo viés da complexidade
32
.
Prigogine em sua visão otimista sabe que não é fácil se chegar a um futuro feliz.
Sabe das dificuldades em direcionar positivamente o uso das novas tecnologias,
uma vez que interesses comerciais estão em jogo. No entanto, deve-se ter
esperança e olhar o futuro de forma doce e não amarga. Para Prigogine, o futuro
é uma construção e sempre há a possibilidade de se reverter o caminho
destrutivo. Sonha e investe no reencantamento do mundo por acreditar nos
jovens. Com esse espírito otimista, Prigogine escreve uma Carta às Futuras
Gerações
33
com o intuito de alertar a juventude sobre o amanhã e a instigá-los a
uma tomada de decisões coerente e construtiva:
O sonho de Lichtenberg é a própria parábola da complexidade: a maneira pela qual abordamos aquilo com
que lidamos é pertinente relativamente ao problema que nos é colocado por aquilo com que lidamos?"
(p.151, 152) Procurei essa referencia e não encontrei.
PRIGOGINE, I. & STENGERS, I., 1991.: Quinto dia: Da complexidade (Outras Histórias para a ciência), In:
A Nova Aliança. - Brasília: Universidade de Brasília.
32
Complexidade está ligada a multiplicidade de comportamentos, a sistemas cujo futuro não se pode prever.
(Prigogine. 2003:49)
33
A carta na integra encontrasse no anexo deste trabalho.
37
“Cabe às futuras gerações construir uma nova coerência que incorpore tanto os valores humanos
quanto a ciência, algo que ponha fim às profecias quanto ao ''fim da ciência'', ''fim da história'' ou
até quanto ao advento da pós-humanidade”
34
.
Na mesma direção de Prigogine, Charles Sanders Peirce investe na criatividade. A
potencialidade da criação está contida na capacidade de visualizar o novo e de ir
além do visível. Essa procura exercida incessantemente pela criatividade em
procurar outros rumos é explicada por Peirce que assevera se tratar da busca por
um ideal admirável. Esse ideal é o
Summum Bonum
e é fruto da estética.
3.2. A Criatividade em Busca do Admirável do Ideal Supremo -
Summum
Bonum:
3.2.1. Estética e Criatividade:
Charles Sanders Peirce
35
,
filósofo e lógico americano, uma dimensão diferente
à estética. A estética em Peirce
não é uma filosofia do belo, mas uma forma de
direcionar a vida para se alcançar o admirável. No final do séc. XIX,
Peirce
propõe
uma estrutura filosófica, uma visão científica da filosofia, na qual a estética tem o
papel de direcionar a vida. A importância de Peirce, para este trabalho, não diz
respeito somente a sua estética diferenciada, mas, igualmente, por sua visão
sistêmica. A abrangência da estética, em Peirce, adquire contornos
epistemológicos e aponta na direção da transdisciplinaridade. A estética como um
ideal a ser seguido traz consigo toda a complexidade do homem e da natureza,
conseguindo, assim, sintetizar no ideal último, o múltiplo.
A pesquisa de Peirce não se limita, somente, ao pensamento racional vai além, ao
procurar outras “razõespara explicar sua filosofia científica. O filósofo afirma que
o pensamento racional não é completo, pois esquece o lado sensível e, não atinge
34
Abbagnano, Nicola. Diccionario de filosofia. Ed. Fondo de Cultura. México. P. 27.
35
Charles Sanders Peirce 1839-1914, Considerado por muitos historiadores da Filosofia como o maior e
mais original pensador americano, deixou contribuições em múltiplas áreas do conhecimento: gica,
semiótica, astronomia, geodésia, matemática, teoria e história da ciência, econometria e psicologia.
Ressaltamos: A semiótica, Agapismo, Arquitetura das Ciências e o Pragmaticismo.
38
a totalidade da unidade humana. Afirma que o pensamento racional,
isoladamente, não es apto a responder por todos os problemas existenciais.
Peirce assevera a estética como responsável pela busca de um ideal admirável,
sendo esse ideal admirável o fim último da ação
36
. O ideal admirável diz respeito
ao crescimento e à corporificação da razão criativa do mundo. A estética, a ética e
a lógica ou semiótica por serem ciências normativas fornecem subsídios à
metafísica e assim, respondem pelos ideais que orientam os sentimentos, as ações
e os pensamentos.
No seu percurso Peirce estuda a lógica de todas as ciências e chega a conclusão
que não existe pensamento sem signo. A partir dessa constatação, pesquisa todos
os tipos possíveis de signos e de raciocínios. É nesse panorama peirceano que
surge a estética, uma das disciplinas filosóficas e científicas, com a função de
procurar e “atingir” o admirável. Esse admirável é o fim último da ação, com o
propósito de fazer crescer e dar corpo a razão criativa do mundo.
A intenção de Peirce
é mostrar que a filosofia tem como meta descobrir o
“verdadeiro” e direcionar para as categorias mais universais do ser humano. No
diagrama das ciências encontra-se a fenomenologia que é responsável por
caracterizar os fenômenos, que não podem ser abandonados pela razão. O
pensamento racional, não pode excluir os fenômenos, ao contrário, deve observá-
los e dialogar com eles. O diálogo entre os elementos do sistema aponta para a
relação interdisciplinar que é uma dinâmica processual. No momento em que o
todo dialoga com as partes, não perda das partes, ao contrário, surgem novas
possibilidades de relações e criações. Esse sistema é um processo evolutivo
in
futuro.
36
A idéia de criar o termo: “Ações Estéticas” como a ação que tem origem na estética e no amor vem de
Peirce, da noção de ideal admirável - Summum Bonum, fim último da ação. Estética diz respeito à beleza que
essas ações contem. E a beleza por sua vez é fruto do amor. Em resumo, Ações estéticas são ações repletas de
amor e beleza.
39
Como a filosofia de Peirce
tem uma visão científica, a criação estética, goza de
liberdade, possuindo o papel de direcionar a existência. Peirce chega, ao final de
sua pesquisa, a conclusão de que a lógica sozinha não consegue resolver todos os
problemas da vida, por ser incompleta. Argumenta que a lógica precisa da ética e
que por sua vez, a ética precisa da estética. Essas ciências que são normativas têm
a função de analisar “os ideais” “os valores” e “as normas” da existência. A estética
procura responder: “Que ideais orientam os sentimentos”. A ética “Que ideais
orientam as condutas”. E a lógica “Que ideais orientam os pensamentos”. Um dos
exemplos pertinentes a esse ideal pode ser visto no anexo, na reportagem
“Aposentada amplia farmácia comunitária no quintal de casa”. Transcrevo o diálogo
entre a enfermeira e a aposentada: - “Que graça a senhora vai receber no céu”.
Não faço pensando no céu, mas nos que estão aqui na Terra”. responde ela.
Peirce
profetiza que as ciências normativas (estética, ética e lógica) são a chave
do seu pragmatismo. E que seu pragmatismo não poderia ter um caráter estático,
ao contrário, deveria ser dinâmico. Define o bom estético como: “À luz das
categorias, devo dizer que o objeto, para ser esteticamente bom, deve ter uma
multiplicidade de partes relacionadas umas as outras de um modo tal que confere
uma qualidade imediata, simples e positiva à sua totalidade”. (Peirce
apud
Santaella. 1994: 136)
A visão de Peirce sobre a estética agrega um caráter transdisciplinar e
multidisciplinar a ciência, porque, no momento em que a multiplicidade das partes
consegue a qualidade imediata do todo, a transformação do múltiplo aponta para
o admirável (único), havendo um processo dinâmico de transversalidade. Nesse
raciocínio, o ideal estético tem uma função evolutiva. Lucia Santaella
37
esclarece
que o ideal estético tem: “seu significado pleno apenas num futuro distante
sempre concretamente adiado. Um futuro idealmente pensável, mas
materialmente inatingível”. (Santaella. 1994:137)
37
Profa. Dra Lucia Santaella. Livre docente em Ciências da Comunicação pela ECA-USP. Professora
titular na PUC-SP, coordenadora da pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital e
Presidente da Charles S. Peirce Society, USA.
40
Podemos perceber a existência do princípio de incerteza no ideal estético. Esse
estado não pode ser nem imposto e nem determinado com antecedência e vai ao
encontro de Prigogine e Morin, quando esses explicam a emergência da
criatividade como fruto da incerteza e da irreversibilidade na construção do futuro.
Encontramos em Peirce, além de sua estética como detonadora de novas idéias, o
conceito de hábito ligado a necessidade da mudança de hábito. A mudança de
hábito é responsável por novos caminhos e é fundamental para a procura
sistemática de um ideal admirável.
3.2.2. Mudança de Hábito: Um Percurso Válido Para as Ações Estéticas?
Ao ressaltarmos a necessidade de novas ações por parte dos indivíduos, vamos ao
encontro da noção de Hábito e mudança de hábito de Peirce.
Peirce desenvolveu uma classificação das ciências a fim de mostrar a dependência
existente entre elas. Essa visão de totalidade é fundamental, pois a classificação
mencionada com as devidas correlações promove a emergência da visão sistêmica
e complexa. Ao apontar a interdependência das ciências e ao descartar análises
isoladas, Peirce comprova a impossibilidade de se analisar uma delas sem que se
mostre a relação com as demais. Da mesma forma em que quebra a crença da
dualidade
38
entre mente e matéria, ao propor a continuidade entre elas.
38
O Dualismo, na Filosofia, é um termo que se aplica ao contrário de Monismo. René Descartes propos o
dualismo das substâncias (que seriam uma entre duas coisas: res cogitans ou res extensa). Para ele o espírito e
o corpo seriam nitidamente distintos. Espírito e matéria constituiriam dois mundos irredutíveis, assim não
seriam nunca uma substância só, mas sempre duas substâncias distintas. Espírito seria do mundo do
pensamento, da liberdade e da atividade; e matéria seria do mundo da extensão, do determinismo e da
passividade.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mente
Peirce, ao contrário, é um monista na medida em que ele não separa Mente e Matéria, Ódio e Amor, uma vez
que tudo evolui porque os Signos evoluem. Mátéria é Mente cristalizada.
Para o monista Peirce não separação - Dualismo - mas uma íntima relação pela evolução, o que está
implícito nas relações de primeridade/segundidade/terceridade. Essa relação entre mente e matéria é um
continuum. No texto “A Lei da Mente de 1892, Peirce postula a continuidade entre o mundo físico e mental.
41
Na direção da visão total investimos na mudança de hábito, a fim de conseguirmos
que as ações estéticas modifiquem a face do futuro. Ressaltamos que esse
conceito é gerido por uma ambigüidade, pois o mesmo hábito que é necessário
para a conservação da vida pode ser contrário a ela. Isso significa que, muitas
vezes o hábito se solidifica de tal forma que leva a cegueira e impede, assim,
novos questionamentos e conseqüentemente o surgimento de novos hábitos. Em
Peirce, hábito e mudança de hábito fazem parte da sobrevivência, da adaptação e
das mudanças dos seres da natureza. A crença, um sentimento de “certeza”, nos
leva ao hábito e a dúvida, um sentimento de incerteza, nos leva a
questionamentos que, como conseqüência, provocará uma mudança de hábito.
Nosso trabalho investe, exatamente, no inter/jogo hábito/mudança de hábito.
Enfatizamos e explicamos: que “o sentimento de crença é uma indicação mais ou
menos certa de que se estabeleceu em nossa natureza algum hábito que irá
determinar nossas ações. A dúvida nunca produz tal efeito” (CP 5.370-371). “... a
crença não nos faz agir de imediato, mas nos coloca em condições de nos
comportarmos de certo modo quando surgir a ocasião. A dúvida não produz
sequer minimamente tal efeito, mas estimula-nos a investigar até que ela seja
destruída” CP 5.373. “A essência de uma crença é o estabelecimento de um
hábito; e crenças diferentes são distinguidas pelos diferentes modos de ação a que
dão origem” CP 5.398.
As dúvidas e as crenças nos moldam, mas elas têm características diferentes. As
crenças nos dão calma, bem estar, sendo um convite a tranqüilidade. Como
conseqüência de uma crença aparece um hábito, e esse seresponsável por um
modo de agir e um condicionamento para uma determinada ação em outras
situações semelhantes. Reenfatizamos “O sentimento de crença é uma indicação
mais ou menos segura de que se está estabelecendo na nossa natureza um bito
que determinará as nossas ações. As dúvidas, por outro lado, nos agitam nos
Argumenta que a matéria é uma forma especial de mente, com hábitos enrijecidos no tempo, mas que, no
entanto, mantém um elemento de diversificação e vida.
42
desconfortam e, assim, nos levam a buscar soluções adequadas para terminarmos
com esse desconforto e novamente voltarmos à tranqüilidade de uma nova crença
(um hábito). A dúvida não é um hábito adquirido e nem uma ação de conduta
futura, ao contrário, é a responsável pela procura da aquisição de um novo
hábito”. (Peirce.1998: 64)
A crença gera um bito, e no momento em que fizermos uma determinada
escolha de algo, deixamos de escolher outras possibilidades contidas nesse mesmo
algo. Ao mesmo tempo em que as crenças nos levam a adquirir hábitos de
conduta elas não têm um caráter definitivo e estão sujeitas às dúvidas. Peirce
declara: “O objetivo do raciocínio é descobrir, a partir da consideração daquilo que
já conhecemos algo que ainda não conhecemos”. (Peirce.1998:61)
A busca por novos hábitos é a finalidade do signo, uma vez que, por ser dinâmico,
tende a mudança de hábito para conseguir seu crescimento, sua evolução.
“A doutrina da Lei, da continuidade no pensamento e no cosmos é o sinequismo.
(...) Toda ação pressupõe fins e os fins são o modo de ser do pensamento porque
estes são gerais. (...) Um hábito é um alvo ou ideal que se solidifica”. Peirce
propõe que o crescimento do saber passa pelo desenvolvimento do signo.
(Santaella.2000:96;99) Seguindo a finalidade sígnica, que é a mudança de hábito,
citamos Santaella que explica o crescimento dos signos no mundo como resultado
de uma tendência das coisas vivas e não vivas em adquirir hábitos.
(...) propensão de todas as coisas vivas, e mesmo das não vivas, para adquirir hábitos,
não é apenas uma lei entre outras, mas a lei governando todas as leis. São as leis gerais
que tornam os fenômenos regulares e inteligíveis, sendo, por isso mesmo, os fenômenos
mais completamente reais do universo. (...) O Summum Bonnum da espécie humana. À
medida que a evolução progride, a inteligência humana vai desempenhando um papel cada
vez maior no crescimento da razoabilidade por meio de sua característica mais peculiar e
inalienável, o autocontrole. (...) Para Peirce, a investigação científica é algo que vale a
pena porque ela é o meio privilegiado de conversar com a natureza em todas as suas
formas macroscópica e microscópica, inorgânica, biológica e humana – em todas as
multiplicidades de suas aparições. (Santaella apud Bacha 2003: 123)
43
A continuidade entre mente e matéria e o conceito de hábito como sendo uma lei
geral estão na base de Peirce:
De 1884 em diante, conceito antropomórfico de hábito da natureza tornou-se o conceito
central do sinequismo peirceano. (...) No contexto metafísico do sinequismo, mente é
sinônimo de continuidade, é a tendência do universo para aquisição de hábitos. No
contexto lógico da semiótica, mente é sinônimo de semiose. Mente, portanto, é
continuidade e semiose. (Santaella. 2002:100;103)
A relação contínua entre mente – matéria se evidencia na colocação de Dib
(2008:63) ao citar definições de Peirce (CP 6.25) nos estudos feitos com base em
Ivo Ibri
39
(1992: 58) e Maria de Lourdes Bacha
40
(2002:294/5/6), ambos,
pesquisadores e comentadores de Peirce:
A relação entre mente e matéria, de foco peirceano, diferente do cartesianismo,
possibilita-lhe afirmar: “A única teoria inteligível do universo é aquela do idealismo
objetivo em que matéria é mente exaurida, hábitos inveterados se tornando leis
físicas”. E “A matéria é mente quase morta, constituída fundamentalmente por
hábitos arraigados”. Ibri e Bacha afirmam: “a chave da relação entre mente e
matéria esna admissão de que, se o universo material é provido de hábitos de
conduta na forma de leis naturais, há que o conceber como uma forma de mente”.
O argumento acima é central para se entender a doutrina que Peirce “denomina
Idealismo Objetivo, concebendo um universo cujo pano de fundo é eidético
41
”.
(Ibri.1992:58)
Nossa trajetória parte das idéias de Peirce de hábito e de mudança de hábito para
inferir um novo mundo. Utilizamo-nos da frase abaixo, que faz parte da 7ª palestra
39
Prof. Dr. Ivo Assad Ibri. Professor do Departamento de Filosofia da PUCSP. Pesquisador de Peirce e
coordenador do Centro de Estudos do Pragmatismo da PUCSP.
40
Profa. Dra. Maria de Lourdes Bacha. Pós doutora em Comunicação e Semiótica da PUCSP. Professora
da Pós-Graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
41
Eidético 1. Segundo Edmund Husserl é relativo à essência das coisas e não à sua existência ou função
(Novo dicionário Aurélio – Dicionário eletrônico 2004).
Eidético 2 . Termo introduzido na filosofia contemporânea por Husserl a partir de “Investigações gicas”
(1900-01) para indicar tudo o que se refere às essências, que são objeto de investigação fenomenológica.
(Abbagnano.2000:308)
44
de Cambridge Conferences
42
, na qual Peirce explica sua concepção de Hábito: “A
ocorrência repetida de uma idéia geral e a experiência de sua utilidade resultam
na formação ou fortalecimento da concepção de Hábito”.
Nessa frase está explicita a necessidade de haver a repetição de uma idéia e nessa
idéia conter uma utilidade para que o hábito seja implantado. Como defender e
mostrar as ações estéticas isoladas de forma que incorporem a utilidade
necessária para se transformar em hábito? Nesse sentido, precisamos do auxílio da
criatividade, da arte, do amor para indicar o sensível como necessário e útil.
Precisamos mostrar que o pensamento racional dá conta da metade do homem
43
e
que a outra metade precisa ser gerida pela sensibilidade. Acreditamos que a
divulgação permanente de ações movidas pelo sentimento seja fundamental para
a absorção de novos hábitos ligados ao sentimento.
Defendemos as ações estéticas
44
como armas
45
para promoverem as mudanças
necessárias e possibilitarem um futuro diferenciado. Enfatizamos o perigo da
existência de hábitos enraizados que impeçam a criação do novo. Lembramos que
as ações do homem moderno, por estarem impregnadas de crenças oriundas do
império da razão, são responsáveis pelo declínio do pensamento sensível. Esse
declínio é o responsável por uma sociedade mais individualista, egoísta e menos
altruísta. No entanto, acreditamos no homem e na sua capacidade criativa.
Nossa preocupação com o futuro ocorre em virtude de alguns hábitos muito
consolidados. Acreditamos que as ações estéticas, por estarem repleta de
sentimento, mostrem a saída dessa condição de caos egóico em que vivemos. O
42
Em Cambridge Conferences, Charles Sanders Peirce proferiu uma serie de oito palestras em fevereiro e
março de 1898. Essas palestras foram publicadas no 7º volume, livro III, capítulo dos seus “Collected
Papers”.
43
Edgar Morin defende o homo sapiens como sendo: 100% sapiens e 100% demens.
44
Defendemos que todas as ões que transmitam a preocupação com o outro, com a vida e o coletivo são
ações estéticas.
45
Utilizamos a palavra armas não com o sentido bélico, mas com o sentido de determinação de ação, a fim de
conseguir mudanças significativas no homem. O que mais interessa ao nosso trabalho é a ênfase na mudança
do período guerra para o de paz.
45
que nos anima é saber que a possibilidade de mudança pela propagação de
idéias.
As explicações sobre a forma como os hábitos se consolidam vem ao nosso
encontro no que diz respeito a sementes a serem germinadas. Se entendermos
que um determinado hábito é falível, seremos acometidos pela dúvida e
procuraremos modificá-lo. O problema maior é a expectativa de resultados, mas
na lei da mente de Peirce encontramos a saída desejada. Peirce ao defender a lei
da mente espreocupado e atento às diretrizes da conduta dessa mente e das
idéias que fazem parte do todo:
A análise lógica aplicada a fenômenos mentais mostra que apenas uma lei da mente,
a saber, que as idéias tendem a se propagar continuamente e afetar outras que estão
para elas numa relação peculiar de afetibilidade. Nessa propagação, elas perdem
intensidade e, especialmente, o poder afetante, mas ganham generalidade e vinculam-se
com outras idéias. (Peirce apud Ibri.2005:189)
Precisamos colocar os indivíduos frente a atos de sentimento, de amor e
compreensão, acreditando na possibilidade de que os nossos atos irão se
multiplicar por afetabilidade como ocorre com as idéias.
Um exemplo poético da necessidade do sentimento para gerenciar o homem é a
explicação que o professor aos seus alunos no filme “Sociedade dos Poetas
Mortos”: A poesia se escreve, não por ser bonita e sim porque somos membros da
raça humana e a raça humana está impregnada de paixão. A medicina, o direito e
a engenharia são ocupações nobres e necessárias a vida, mas, a arte, a poesia, a
beleza, o romance e o amor, são a essência e por isso, nos manténs vivos.
A citação do filme tem o intuito de chamar a atenção para o lado sensível, no
entanto, a nossa intenção não é enfatizar o lado sensível em detrimento do
racional. Nós procuramos a unidade entre eles um diálogo consistente. Não
queremos cair na armadilha do dualismo valorizando um lado e esquecendo o
outro.
46
A busca por um amanhã menos egoísta e mais altruísta encontra refugio nos
conceitos de amor Agápico, hábito e mudança de hábito. Peirce, ao mostrar que
as dúvidas quando se instalam em nossas mentes são responsáveis por mudanças
de hábitos, faz com que acreditemos que as ações estéticas possam operar
mudanças de hábitos significativas na relação homem/homem e homem/natureza.
Defendemos as ações repletas de sensibilidade para agirem como sementes de
reflexão para possíveis mudanças. Vemos, hoje, a forma como o mundo funciona
e, por não aceitarmos o descaso com o pensamento sensível, questionamos:
Como poderíamos colaborar para reverter às ações que condenamos? Como
poderíamos contribuir para o aperfeiçoamento de um novo mundo? Encontramos
em Peirce e na sua busca pelo ideal supremo, o
Summum Bonum
respostas
otimistas para um mundo pessimista e cruel. Defendemos a arte e uma
aproximação significativa do homem com a sensibilidade. Reafirmamos que a
experiência da ação estética caminha analogamente à ação da Razão.
Lauro da Silveira
46
aponta para a pertinência do encontro da estética e da razão
como sendo:
A grande síntese do poder do espírito e de suas exigências, registrando a plenitude do
aspecto estético (...) e do aspecto ético, inclusive o prazer de seu próprio lugar entre as
outras coisas a experiência intelectual prenuncia o papel da ciência e seu destino no
seio da realidade.
Se a Razão o se esgota em nenhuma de suas realizações, ela é ação e, como tal, é
afirmativa e deve manifestar-se:
A criação do universo, (...) constitui-se no trabalho e na realização total da humanidade.
(...) A Razão se apresenta como pleroma
47
do universo e ideal a ser buscado pelos homens
(...). A Razão se apresenta ao sujeito como possibilidade espontânea e insuperável de
perfeição. (...) A Razão, assim compreendida, apresenta-se como ideal, não para uma
mera contemplação passiva, mas como significado último da totalidade da conduta e de
cada ato que a constitui. (2007:131-132)
Essa é a Razão de que fala Peirce no
Evolutionary Love
, uma razão sensível, que
não desconsidera o sentimento.
46
Prof. Dr. Lauro Frederico Barbosa da Silveira. Dr. em Filosofia (epistemologia e estética) pela PUCSP.
Prof. no programa de Pós-Graduação em Filosofia da UNESP Marília.
47
Pleroma. Tudo que completa
47
Peirce ao defender a função última da razão, coloca-a impregnada de uma
totalidade diferente da razão iluminista. A Razão em Peirce é o fim último por
conter a ética e a estética. Silveira reafirma:
Peirce não somente explica a função última da Razão no universo como também constitui
um quase poema do destino do Homem na totalidade do Real. Como propõe o
Pragmatismo de Peirce, o pensamento é ação criadora e em verdadeiro hino à
reconciliação universal. A ciência é profundamente ética e finalmente poética. (...) ela exige
todas as matizes das sensações, inclusive o prazer de seu próprio lugar entre as outras
coisas. (...) Se a razão não se esgota em nenhuma de suas realizações, ela é ação e, como
tal, é afirmativa e deve manifestar-se: A criação do universo, (...) que prossegue hoje e
nunca terminará é o próprio desenvolvimento da razão. Ultrapassando os limites da
individualidade, a razão constitui-se no trabalho e na realização total da humanidade e,
conseqüentemente, de cada indivíduo. (Peirce apud Silveira 2007:130)
Se insistirmos em mudanças de hábitos em prol do matizar o mundo com novas
cores, através das ações estéticas, é porque entendemos que os hábitos do
homem contemporâneo estão impregnados de individualismo impedindo o
altruísmo. A famosa frase de Descartes: “Penso, logo existo”, colocou o homem
em uma encruzilhada: É possível ser pensante e ser sensível? O estado de
racionalismo exacerbado fez com que o ser colocasse a sensibilidade em segundo
plano e conseqüentemente perdesse a amplitude da poesia da vida. O uso
exagerado da razão cega o indivíduo e impede que ele contemple o outro e a vida
na sua plenitude. Além do mais, o agravamento da influência do poder e das
realizações individuais contribuiu para o sentimento de vazio do homem. Um
mundo onde vencer, vencer e vencer é o que define o ser, provoca nesse ser
angustia e desencantamento.
Peirce nos mostra como as crenças, responsáveis pelos nossos hábitos, agem para
que possamos movimentar o pensamento e a vida, ao questioná-las. Entretanto,
esse suposto estado de tranqüilidade promovido pelas crenças, se não for
questionado pode nos alienar e nos transformar em autômatos. Peirce ao
defender a transitoriedade das verdades defende uma vigilância constante sobre
nossos pensamentos e atos para conseguir crescer. Inferimos, portanto que as
dúvidas têm uma função primordial, isto é, nos ajudam a sair do condicionamento
das crenças e dos hábitos instalados e, assim, propiciar o crescimento dos signos.
48
Peirce aponta para a necessária atenção à emergência do erro, pois somos
humanos e falíveis. Nessa direção se vale da doutrina do Falibilismo
48
. O
falibilismo, segundo Peirce, explica que um determinado conhecimento não é
definitivo. Peirce, ao defender a falibilidade do ser, aponta para a necessidade dos
questionamentos e para a benéfica ação das dúvidas. A relação conflituosa entre
crença/dúvida é que promove novos caminhos e ações. Acreditamos que as ações
estéticas possam representar a concretização do sonho
49
de Peirce em
transformar o evangelho da ganância em evangelho do amor
50
/
51
.
Como foi dito no início desse capítulo a criatividade é a mola mestre para um
futuro diferenciado. Nessa direção procuramos encontrar em Peirce, Morin e
Prigogine os recursos necessários para a base deste trabalho:
O estado de coisas admirável o pode ser determinado aprioristicamente, pois, se assim
fosse, haveria nele algo de impositivo e opressivo que lhe esvaziaria, imediatamente, o
caráter de admirável. Nem poderia ser, muito menos, fruto de uma imposição externa, de
qualquer tipo que seja, por mais disfarçada que seja. Trata-se, pois, de uma meta ou ideal
que descobrimos porque nos sentimos atraídos por ele como tal, e nele ficamos imantados.
Sendo uma adoção deliberada, ela expressão à nossa liberdade no seu mais alto grau.
(...) Não nada mais profundamente enraizado no espírito humano do que os hábitos de
sentir. (...) os hábitos de sentimento só se modificam através do sofrimento ou da
exposição constante do sentimento a objetos ou situações capazes de produzir sua
regeneração. (Santaella.2005:128;129;131)
Ao ampliar e dar nova vida a estética, de mostrar como os hábitos nos confortam e
ao mesmo tempo escravizam, Peirce investe na possibilidade de um amor criativo e
evolutivo. Abaixo a oração proferida pelo filósofo em 1863:
48
Falibilismo é a doutrina filosófica segundo a qual não podemos ter a certeza absoluta de qualquer (ou
apenas algumas) forma(s) de conhecimento. Contudo, o falibilista não incide nem no cepticismo radical
(segundo o qual nenhuma forma de conhecimento é válida) nem no relativismo radical (segundo o qual
qualquer forma de conhecimento é valida). Para o falibilista existem formas de conhecimento mais válidas,
legítimas e frutíferas que outras, mesmo que não tenhamos certeza absoluta delas.
49
O uso da palavra Sonho é de nossa responsabilidade e representa a síntese que fizemos do texto
Evolutionary Love.
50
No texto Evolutionary Love encontramos o confronto feito por Peirce de dois tipos de princípios de
conduta aparentemente antagônicos para os quais ele denominou evangelho da ganância e evangelho do
amor.
51
As nossas reflexões, sobre o possível desejo de Peirce na transformação do Evangelho da ganância em
Amor, encontram ecos nas afirmações de Ilya Prigogine que defende na “Carta as Futuras Gerações” a
transição da cultura da guerra para uma cultura de paz.
49
Quando nossa era chegar ao termo, e o ceticismo e o materialismo tiverem alcançado o
ápice de sua perfeição, então teremos mais fé do que jamais antes tivemos. Pois o Homem
conhecerá a sabedoria e a compaixão de Deus, não apenas em cada evento de sua própria
vida, mas também da vida do gorila, do leão, do peixe, do pólipo, da árvore, do cristal, da
partícula de poeira, do átomo. Ele percebeque cada uma dessas entidades tem uma vida
interior particular, amada por Deus, e à qual Deus concedeu uma natureza de perfeição
sem fim. Ele constará a loucura de acreditar que a natureza foi criada para seu uso próprio.
Mas, próximo está o momento em que não haverá mais a poesia, pois aquilo que é
poeticamente divinizado será cientificamente conhecido. É verdade que o progresso da
ciência pode fenecer, mas sua essência terá sido apreendida. (Peirce apud Bacha.
2002:135)
3. 2. 3. A Criatividade do Ágape - Amor Criativo
52
Peirce na sua pesquisa cientifica vai além e defende a possibilidade da evolução
ocorrer por meio do amor, Ágape amor criativo. Na citação de Peirce é possível
perceber a abrangência da estética e a base para o que chamamos de ações
estéticas:
Numa passagem muito clara Peirce dizia que a estética ‘lida com o ideal em si mesmo, cuja
mera materialização cativa e absorve a atenção da prática [ou ética] e da lógica(CP 5.5551)
(...) Em outra passagem, ainda, Peirce diz que a estética ‘considera aquelas coisas cujos fins
são os de encarnar qualidades de sentimento’ [CP5.129]. Avançando nessa mesma idéia, o que
deixou claro é que coisas que têm por finalidade corporificar qualidades de sentimento,
dar ocasião para que qualidades de sentimento se atualizem no mundo. (...) O ideal estético é
nutrido pelo cultivo de hábitos de sentimento. Sendo as obras de arte aquelas coisas que
encarnam qualidades de sentimento, os hábitos de sentimento podem ser cultivados através
da exposição de nossa sensibilidade às obras de arte. (Peirce apud Santaella.2005:129-130)
Peirce nos abre caminhos para o entendimento da arte e das ações estéticas tanto
pelos seus escritos nas Ciências Normativas como no Amor Evolucionário. Filósofo,
lógico e metafísico desenvolveu trabalhos relevantes em diversas áreas do
conhecimento. Pensador sistemático e sistêmico, rigoroso e apaixonado pelo
processo da vida e do conhecimento, conforme podemos observar no
Philosophy
and the Conduct
of Life
53
. Peirce opõe-se à tendência dos filósofos, desde os
clássicos gregos, em misturar filosofia com prática. Defende que a verdadeira
52
1- Nessa parte do trabalho tivemos a ajuda fundamental das contribuições e reflexões da Dra. Maria
Augusta Dib - defendeu tese sobre Agathopia na PUCSP - e das discussões do grupo de estudos: Leituras
básicas de Peirce da PUCSP.
2- Quem tiver interesse de estudar esse o tema “Agathotopia” em Peirce sugerimos a tese de Dib, Maria
Augusta. “A Agathotopia” de Charles Sanders Peirce.
3- O esquema da Agathotopia pode ser visto no anexo.
53
MS 437, publicado no CP 1.616-48, em parte, e RL 105-22.
50
investigação científica não deve ser conduzida por questões de utilidade. O
propósito da filosofia não deveria ser com o intuito de melhorar a vida de seus
adeptos. Na primeira Conferência de Cambridge no ano de 1898, Peirce expôs
suas crenças a respeito de assuntos de importância vital ao progresso gradual do
conhecimento. Sustenta que a razão é um pobre substituto para o sentimento e o
instinto.
O embate sobre as questões de cunho utilitarista adentrando o universo das
ciências e da filosofia parece ter sido um dos fios condutores da reflexão
peirceana. Peirce, 1904
54
, cunha o termo pragmaticismo para sua doutrina, a
intenção era protegê-la das doutrinas ligadas as práticas e denominada de
pragmatismo. Nesta diferenciação explícita ficou a crença peirceana nas
possibilidades evolutivas para o cosmos e tudo ao que ele diz respeito. Tudo que
existe faz parte do universo evolutivo e não só ao que diz respeito ao homem.
No
Evolutionary Love
55
no ano de 1893, Peirce esclarece sua crença evolucionária,
e ao mesmo tempo explora o desenvolvimento evolutivo tanto do próprio conceito
de evolução quanto do conceito de amor. Para ele a condição necessária para que
as correlações entre os elementos do universo aconteçam, cresçam e evoluam
está no amor ágape. Em Peirce o Agapismo é a doutrina segundo a qual uma
lei do amor evolutivo operando no universo, e em virtude da qual a evolução
cósmica tenderia a incrementar o amor fraterno entre os homens
56
.
Peirce, evolucionista, não se esqueceu da interpretação primeira do nascimento,
da relação da vida e da filosofia com o amor Eros. No entanto, um salto e
passa a discorrer sobre a possibilidade da evolução por intermédio do amor Ágape
o amor criativo. Pondera, também sobre a possibilidade de evolução do próprio
54
What Pragmatism is. 1904. The Monist 15 – abril 1905:161-81.
55
The Monist 3 janeiro 1893: 176-200. CP 6.287-317. EP vol. 1. Utilizamos a tradução para o português
feita por Basílio João Sá Ramalho Antônio, na Dissertação de Mestrado defendida no ano de 2006 na
PUC/SP – O Todo e as Partes: Subsídios para a Leitura do Ensaio Amor Evolucionário de C. S. Peirce.
56
Abbagnano, Nicola. Diccionario de filosofia. Ed. Fondo de Cultura. México. P. 27.
51
conceito evolução nos seus três modelos: 1. por acaso,
ticasma
; 2. por
necessidade,
anancasma
; 3. por amor,
agapasma
.
Nos seus estudos sobre o assunto, Peirce se utilizou de uma pesquisa exploratória
das etapas da história da humanidade marcadas pelas descobertas científicas,
pelas escolas filosóficas e pelos episódios da história. Levou em consideração os
personagens históricos enquanto individualidades pessoais, segundo épocas e
grupos de pessoas representativas destas diversas etapas. Analisa as teorias
evolutivas surgidas na sua época: Lamarck e Darwin e desenvolve uma teoria na
qual as duas são complementares. Reflete sobre a mentalidade social econômica
de sua época para a qual o nome de Evangelho da Ganância. E em contra
partida dá o nome de Evangelho do Amor a mentalidade cristã segundo São João
Evangelista.
Nos três tipos de evolução por Peirce analisados: 1. pela variação fortuita, 2. pela
necessidade mecânica, e 3. pelo amor criativo, este último ele considerou o mais
importante, por ser o tipo de evolução que o sinequismo busca, conforme sua
citação “Amor, embrião que reconhece a amabilidade no ódio, acolhe-o
gradualmente à vida, e torna-o amável”.
Segundo Silveira (2000:118), Peirce denominou Sinequismo à concepção do real
como um
continnum
em constante crescimento, o que vai ao encontro da
efetivação de sua Semiótica e Pragmaticismo. Esses conceitos supõem a
representação da realidade que os constitui como conduta racional num universo
fenomênico em busca do Bem como seu fim último. Essa prática deve assumir
uma natureza ela mesma evolutiva e inteligível.
Importante salientar que, se Peirce não se mostrou favorável às ações individuais
mesmo que heróicas na história dos povos, das ciências, das religiões. Acreditava
que somente no
continnum
em constante crescimento e mediante as correlações
semióticas é que a vida, o crescimento e a evolução se dariam. No entanto, Peirce
52
defendia que tais correlações poderiam ocorrer por simpatia e, ou por
afectabilidade. Defendemos que pensamentos, ações individuais e sentimentos de
pequenos e de grandes grupos poderiam ser considerados, no que denominamos
“ações estéticas”. Acreditamos que essas possam fazer parte da lei operativa do
amor evolutivo que atua no cosmos, enquanto se incrementa nos homens e
contribui na evolução em busca do Bem ou do
Summum Bonum.
Nosso percurso encontro subsídios valiosos em Edgar Morin que defende a
valorização do
homo demens
na formação do
homo sapiens sapiens.
3. 3. A Criatividade no
Homo Sapiens Sapiens Demens
Edgar Morin
57
, após pesquisar por longo tempo a relação do homem com a
existência e a natureza, propõe a necessidade da emergência do pensamento
complexo
58
. O pensamento complexo é sistêmico e responsável por uma reforma
ativa do pensamento, com o intuito de ligar o que foi separado: o homem e a
natureza; o racional e o sensível. O que estava ligado no passado se separou e a
visão de todo deu lugar às partes desconectadas. Morin propõe a mudança na
forma de pensar em resposta ao homem oriundo do período iluminista, defensor
do predomínio do pensamento racional sobre o sensível. Alerta para o fato de que
a racionalidade excessiva provoca a fragmentação e a divisão do homem,
argumenta que a atitude de valorizar unicamente a razão não condiz com a
história do homem. Porque se o homem é
homo sapiens
é, também,
demens.
No
entanto, Morin afirma que o jogo entre ligar e separar é uma constante no
processo evolutivo:
Um mundo pode advir pela separação e pode existir na relação entre o que é
separado. (...) Desde a agitação térmica inicial, uma dialógica indissociável acontece entre
aquilo que separa, dispersa, aniquila e o que religa, associa, integra. (...) Num minúsculo
57
Edgar Morin 1921 Pesquisador emérito do CNRS nasceu em Paris, em 1921. Formado em História,
Geografia e Direito, migrou para a Filosofia, a Sociologia e a Epistemologia, depois de ter participado da
Resistência ao nazismo, na França ocupada, durante a Segunda Guerra Mundial. Autor de mais de trinta
livros, tornou-se um dos pensadores mais importantes do século XX. (Morin.2005)
58
Pensamento complexo - um pensamento que busca distinguir (mas não separar), ao mesmo tempo em que
busca reunir. (Morin. 2003:71)
53
planeta perdido, feito de um agregado de detritos de uma estrela desaparecida, fadada
aparentemente às convulsões, tormentas, erupções terremotos, a vida surgiu como uma
vitória inusitada das virtudes da religação. Um turbilhão interligando macromoléculas,
gerando a sua própria diversidade ao integrá-lo à sua unidade, teria criado a partir de si
mesmo uma organização de complexidade superior: uma auto-eco-organização, de onde
emergiram todas as qualidades e propriedades da vida.” (Morin.2005:31-32)
Ao propor a quebra das fronteiras entre as disciplinas, Morin incentiva um olhar
extra disciplinar com o intuito de reformular o pensamento e fazer dialogar arte e
ciência. Defende o amor como uma totalidade por aglutinar loucura e sabedoria.
Nessa direção mostra que a evolução do homem é regida pelo ambiente e que o
Homo
é formado pelo
sapiens
e pelo
demens
.
Esclarece que o ser humano é definido pela espécie em parceria com o ambiente.
E explica as conseqüências operadas nos ancestrais do homem quando esses
mudaram da floresta para a savana. Morin mostra que as sociedades que viviam
nas florestas, como, por exemplo, os chimpanzés, tinham mais segurança e por
isso não havia uma centralização rígida de poder. As lideranças eram regidas por
qualidades
hedônicas
baseadas no exibicionismo. Por outro lado, as sociedades
das savanas, dos babuínos, possuíam o poder centralizado de forma hierárquica e
regido por qualidades
“agônicas
”, em que o poder era representado pela
agressividade.
Os ancestrais do homem, nesse percurso evolutivo, para a hominização tiveram a
substituição da selva, que lhes dava segurança e alimentação tranqüila, pela
savana que era desafiadora e obrigava-os a uma atitude mais agressiva. A savana,
por suas características, impôs as “aptidões bípedes, bímanas e cerebrais”. Esse
novo ambiente forneceu a esses ancestrais do homem os elementos para uma
adaptação alimentar, uma vez que eles deixaram de ser vegetarianos para se
tornar carnívoros e foram obrigados a desenvolver agilidades, habilidades e
técnicas para conseguir alguma caça e sobreviver.
54
Morin, a partir do percurso evolutivo, defende a tese do aumento de
complexidade, no cérebro do
Homo sapiens,
como responsável pela sua evolução:
“A passagem da hominização à humanidade, corresponde a novo salto qualitativo,
que é o da hipercomplexidade” (1976: 122). No entanto, aponta para as idéias
errôneas do passado, que faziam do homem o senhor e o criador de tudo. Mostra
que não é o homem o responsável pela criação, as mudanças operadas eram
fruto, também, da ação do ambiente sobre o homem. Portanto, uma relação
recursiva entre homem e ambiente:
No ponto onde se via o Homo sapiens desprender-se da natureza com um salto
majestoso e produzir, com sua bela inteligência, a cnica, a linguagem, a sociedade, a
cultura, vê-se, pelo contrário, a natureza, a sociedade, a inteligência, a técnica, a
linguagem e a cultura co-produzirem o Homo sapiens no decurso de um processo que
durou alguns milhões de anos. (Morin.1973: 53)
Critica a prepotência do homem em se intitular racional, mostrando que o fato de
se valorizar somente o lado
sapiens
é uma idéia pouco racional. O
Homo
deveria
ser entendido como 100%
sapiens
e 100%
demens
59
:
(...) podemos assumir, mas com plena consciência, o destino antropológico do homo
sapiens-demens, que implica nunca cessar de fazer dialogar em nós mesmos sabedoria e
loucura, ousadia e prudência, economia e gasto, temperança e consumação,
desprendimento e apego. (...)
A sabedoria deve saber que contém em si uma contradição; é inteiramente loucura viver
muito sabiamente. Devemos reconhecer que na loucura, que é o amor, a sabedoria
do amor. No amor da sabedoria, ou da filosofia, falta amor. O importante na vida é o
amor. Com todos os perigos que ele contém”. (Morin.2002:10-11, 66)
A intenção de Morin é enfatizar que pela visão sistêmica ocorre o diálogo da
diversidade. Assim, o amor, que é a junção da loucura com a sabedoria, engloba o
todo do sistema homem. Ser, somente, racional é não olhar o
demens
que existe
no
homo,
o que implica na perda da visão de totalidade e transforma o racional em
irracional.
Os três teóricos apresentados neste ensaio pesquisaram as conseqüências de uma
visão estreita. O homem e o ambiente precisam dialogar e travar uma diretriz para
59
Morin utiliza o percentual de 100% no sentido de eliminar o dualismo. Se dissesse 50% sapiens e 50%
demens implicaria admitir a separação e não a unidade.
55
o futuro. Ao defendermos a criação estética vamos ao encontro dessa totalidade e
desse diálogo entre homem/natureza. Enfatizamos a possibilidade de a criação
estética ser uma alternativa para se vislumbrar a totalidade do sistema vida e,
permitir que a diversidade ocorra.
Na busca da reconciliação entre homem/homem e homem/natureza, Morin
defende a necessidade da emergência da antropoética. A antropoética é o
resultado do pensamento complexo e uma atitude ética necessária para a
construção do futuro:
(...) assumir a condição humana. (...) A antropoética contém o caráter trinitário do circuito
indivíduo/espécie/sociedade e assim nos faz assumir o destino humano nas suas
antinomias e na sua plenitude. (...) A antropoética liga a ética do universal e a ética do
singular. (Morin.2005:159-160).
Morin manifesta o desejo de ver a reforma ética em um sentido lato:
A reforma o pode ser solitária. (...) A reforma ética pode realizar-se numa
polireforma da humanidade. As reformas devem ser concebidas em circuito recursivo, cada
uma sendo produzida
produtora
A regeneração ética depende de uma regeneração geral, que depende da regeneração
ética. (Morin.2005:176-177)
Na defesa da visão sistêmica, Morin cita Pascal: “(...) considero impossível
conhecer as partes sem conhecer o todo, assim como conhecer o todo sem
conhecer, particularmente, as partes...” (Pascal
apud
Morin.2000:25). É
conveniente enfatizar que o sistema aqui não se resume a uma mera soma de
suas partes. O sistema, por ser aberto, pode ser mais ou menos do que a soma de
suas partes constitutivas.
3. 4. Amor Criatividade Ação na Construção do futuro
Os teóricos apresentados neste trabalho possuem em comum a defesa da ação
ética e estética na construção do futuro e cronologicamente podemos afirmar a
56
atualidade do pensamento de Peirce. Em relação a Prigogine e Morin entendemos
que esses pensadores avançaram e deram corpo as idéias peirceanas.
A criatividade, nesta pesquisa, tem a função de ser o ponto de união entre os
teóricos e artistas. A possibilidade de criar tem como ponto de partida a liberdade
que, segundo Morin, vem da loucura do
homo demens
e é gerenciada pelo amor.
A criatividade é defendida por Peirce na interligação entre a estética, a ética e a
lógica, essa união possibilita que novas idéias apareçam. O pensamento estético
por ser gerenciado pela curiosidade e pelo olhar primeiro permite a emergência de
múltiplas descobertas. As descobertas, para Prigogine, são fruto da liberdade
existente em um mundo não determinista. Em: “A criatividade da Natureza e a
Criatividade Humana”, Prigogine adverte: a criatividade é inerente a vida. “Nada
impede de pensar que a criatividade do homem prolongue a da natureza.”
(2003:23) Exemplifica obras e artistas e afirma que os artistas como os cientistas
estão preocupados com os mistérios da vida. Ao visitar a exposição “O Homem
que Anda” fez uma analogia da escultura de Rodin de 1877, mesmo nome da
exposição, com o avanço da vida. A vida encontra-se sempre em movimento.
Explica:
A existência é antecipação, avanço em direção ao futuro criatividade, da qual os
escultores aqui expostos exprimem a vitalidade. Qual seria a fonte dessa criatividade?
Valéry dizia: o inesperado é minha essência, a angústia meu verdadeiro ofício, ninguém
exprimiu ou pode exprimir a estranheza do existir. Por que assim e não de outra forma?
A questão parece absurda, mas colocá-la testemunha alguma outra coisa. Einstein
também entendia que o inesperado residia na base da atividade científica. (...) Magritte
também enfatiza o mistério da natureza humana, insistindo, entretanto, sobre o fato de
que é necessário explicá-la pela obra de arte e não tentar apenas decifrá-la ou analisá-la.
Qualquer tentativa de intelectualizar o segredo da criação leva-o à destruição. (2003:21)
No que diz respeito à arte, como fonte inesgotável para um novo mundo,
encontramos a mesma tendência entre os pensadores. Prigogine na Carta às
Futuras Gerações, ao discorrer sobre seu otimismo explica: “Um sinal de
esperança é o de que o interesse pela natureza e o desejo de participar da vida
cultural jamais foi maior do que hoje. (2001:20) A visão da vida como um sistema
agrega a diversidade e valoriza as manifestações artísticas.
57
Em Morin é a união do
homo sapiens
com o
demens
que acarreta a emergência
da criatividade. Morin defende o trabalho artístico e afirma:
As artes levam-nos à dimensão estética da existência e conforme o adágio que diz que a
natureza imita a obra de arte elas nos ensinam a ver o mundo esteticamente. (...) Trata-se,
enfim, de demonstrar que, em toda grande obra, de literatura, de cinema, de poesia, de
pintura, de escultura, há um pensamento profundo sobre a condição humana. (2000:45)
Os três teóricos investem na ação e nas mudanças. São otimistas e acreditam no
futuro. Peirce defende o evangelho do amor em detrimento ao evangelho da
ganância e aponta para o
summum bonum
, um ideal estético, admirável e
evolutivo. Prigogine acredita que o período de paz possa emergir sobre o da
guerra e fala no “Reencantamento do Mundo”. Morin ao defender a pertinência do
homo demens
investe na integração do homem, por meio de uma reforma
completa do homem, da ética e do pensamento:
Uma reforma do próprio ser humano, a sociedade-mundo será vítima de tudo o que até
agora ensangüentou e deu um caráter cruel à historia da humanidade, dos impérios, das
nações. Como ocorreria tal reforma que pressupõe uma reforma radical dos sistemas de
educação, uma grande corrente de compreensão e de compaixão no mundo, um novo
evangelho, novas mentalidades? (...) De um lado, o progresso científico-técnico oferece
possibilidades de emancipação, até então desconhecidas, em relação às limitações
biológicas da doença e da morte. Por outro lado, a morte coletiva por armas nucleares,
químicas, biológicas, por degradação ecológica traz sua sombra sobre a humanidade: a
idade de ouro e a idade do horror apresentam-se ao mesmo tempo para o nosso futuro.
(2003:19-20)
Morin, mesmo ciente de todos os problemas
que mostrou acima, tem esperança no
futuro e acredita que possa surgir algo inesperado. Explica:
A superação da situação exigiria uma metamorfose totalmente inconcebível. No entanto,
essa constatação desesperante comporta um princípio de esperança; sabemos que as
grandes mutações o invisíveis. (...) Além disso, a metamorfose não é impossível, mas
improvável. Aqui surge um segundo principio de esperança: freqüentemente, o improvável
surge na historia humana. (...) É possível, portanto, manter a esperança na desesperança.
(...) Acrescentamos a isso o apelo à vontade face à grandeza do desafio. Embora quase
ninguém tenha ainda consciência, jamais existiu causa tão grande, tão nobre, tão
necessária quanto a causa pela humanidade para poder, ao mesmo tempo e
inseparavelmente sobreviver, viver e humanizar-se. (2003:20)
58
Prigogine explica que “a historia é uma sucessão de bifurcações
60
. (...) Toda
bifurcação tem beneficiários e vítimas.” (2001:17). Ao defender a ação e a
construção do futuro explica:
O crescimento populacional transfere a iniciativa do indivíduo para a coletividade. (...)
Minha mensagem as futuras gerações, portanto, é de que os dados não foram lançados e
que o caminho a ser percorrido depois das bifurcações ainda não foi escolhido. Estamos
em um período de flutuação no qual as ações individuais continuam a ser essenciais. Uma
carta as gerações futuras é sempre e necessariamente escrita de uma posição de
incerteza, de uma extrapolação arriscada do passado. No entanto, continuo otimista.
(2001:18-20)
Os pensadores tem a mesma postura no que diz respeito a impossibilidade de se
prever
a priori
os resultados de determinadas ações. A convergência é fruto do
entendimento da indeterminação da vida. Eles vão de encontro às noções de um
mundo determinado aprioristicamente. Morin afirma que “as grandes mutações
são invisíveis e logicamente impossíveis, antes de aparecerem. (...) Elas aparecem
quando os meios de que dispõe um sistema tornaram-se incapazes de resolver
seus problemas.” (2003:20).
Morin defende escola c/arte e os trabalhos artísticos:
As artes levam-nos à dimensão estética da existência e conforme o adágio que diz que a
natureza imita a obra de arte elas nos ensinam a ver o mundo esteticamente. (...) Trata-
se, enfim, de demonstrar que, em toda grande obra, de literatura, de cinema, de poesia, de
pintura, de escultura, um pensamento profundo sobre a condição humana.
(Morin.2000:45)
Nosso trabalho investe nas ações estéticas e se utiliza do cinema como divulgador
de boas ações. Acreditamos que as ações em prol do bem da sociedade estão
sendo feitas a fim de melhorar o amanhã. Defendemos a importância de se
investir na mudança de hábitos destrutivos e de agir para transformar os hábitos
aliados ao individualismo em hábitos de amor a si, ao próximo e ao planeta.
Felizmente, é possível ver, atualmente, um cuidado acentuado com o meio-
ambiente e a vida.
60
As bifurcações aparecem em pontos especiais nos quais a trajetória seguida por um sistema se subdivide
em “ramos”. Todos os ramos são possíveis, mas um deles será seguido. No geral não se apenas uma
bifurcação. Elas tendem a surgir em sucessão. (Prigogine.2001:16)
59
Observamos em diversos meios de comunicação a dedicação crescente de pessoas
quer individualmente, quer em grupo no respeito pela natureza. Vemos políticos,
empresários, intelectuais e artistas preocupados com o futuro dos filhos e netos
por causa do tratamento negligente que foi dispensado ao meio-ambiente. O
aquecimento global e algumas catástrofes naturais estão servindo de alerta para
as novas ações. O que desejamos não é uma relação de medo com a natureza e,
sim, uma convivência fraterna, uma vez que somos parte integrante dessa
natureza.
A preocupação com o futuro, com a natureza e com a falta de amor entre os
indivíduos é tão grande, que o 20ª Fórum Nacional
61
terminou falando do amor.
Evento organizado pelo economista João Paulo dos Reis Velloso teve como tema:
Brasil - "Um novo mundo nos trópicos": 200 anos de independência econômica e
20 anos de fórum nacional (sob o signo da incerteza). O evento aconteceu na
sede do BNDES, no Rio de Janeiro, e o tema de encerramento foi "O Amor em
Tempos de Desamor":
Apresentação: Maria Adelaide Amaral, escritora: "Grandes Amores Universais"
Conferência: Amor Romântico (à la Século 21):
- Maria Clara Bingemer, professora da PUC - Rio: "A Bossa Nova e o Amor"
- Renato Mezan, Filósofo: "Amor Romântico e Filosofia"
- Danilo Marcondes, filósofo: "Amor e Amizade"
- Gilberto de Mello Kujawski, filósofo: "Amor à Pátria"
Exposição final: Miriam Nunes, professora de Letras da UFRJ: "Amor em Escala
Universal"
Se um Fórum Nacional organizado por um economista - disciplina esta
denominada por Peirce como representante do evangelho da ganância - termina
61
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u404993.shtml
http://www.macaenews.com.br/ver_not.php?id=31535&ed=Cultura&cat=Not%C3%ADcias
60
seus trabalhos enobrecendo o amor, é o vislumbre de novos tempos. Acreditamos
que podemos ter esperanças em que as ações estéticas promoverão mudanças de
hábito e matizarão o mundo com novas cores.
Imaginar um mundo em que gestos ou pensamentos de amor fazem parte da
rotina do indivíduo mais parece um sonho, mas acreditamos que este sonho possa
se realizar. À medida que esse novo hábito for incorporado e se propagar pela
vida, teremos um caminho diferenciado. Sonhar, imaginar, projetar o período de
guerra cedendo lugar ao de paz, é possível ao mudarmos hábitos tão profundos.
Devemos jogar sementes e trabalhar para que essa nova visão floresça.
Estaremos, também, cuidando de nosso imenso jardim
62
.
Ressaltamos e acreditamos que a fusão da sensibilidade com a razão e os
desdobramentos desta fusão são fundamentais para que ocorra uma mudança de
hábito. As reflexões de Peirce sobre o bito e o amor Agápico, como base
construtiva, nos ajudam profundamente e otimistamente a projetar uma nova
direção para a realidade. Surge, portanto, a função do artista como propositor de
sensações diversas, atuando com ardor para que se opere essa mudança.
Ressaltamos que a ação estética é um instrumento capaz de possibilitar
transformações de vidas.
Vivemos em um sistema aberto, complexo, que permite por meio de uma
consciência sensível, emergir hábitos guiados pela poesia da vida. As obras de
arte, as reflexões e as ações estéticas investem na mudança de hábito.
Prigogine na “Carta às Futuras Gerações
63
faz um apelo aos jovens para agirem
na construção do futuro e transformarem o período de guerra em paz.
62 'Precisamos cultivar nosso jardim' é a última frase do livro 'Cândido o Otimista' de François-Marie Arouet
(1694-1778), mais conhecido pelo pseudônimo Voltaire. O que significa? Cultivar, em francês, tem o
significado agrário de "cultivo", mas ainda o sentido figurativo de 'tornar-se culto', participar do mundo
cultural a sua volta. "Cultivar" em um sentido de educação, razão, tolerância, etc."
http://pontedeluz.blogspot.com/2007/03/luz-do-iluminismo-no-meu-jardim.html
63
Carvalho. 2001 ou pode ser consultada no site http://hps.infolink.com.br/peco/p000130a.htm.
61
Reafirmamos aqui sua importância, para indicar a ação estética como arma
pacífica em prol de matizar o mundo com novas cores. Peirce, Prigogine e Morin
defendem a liberdade de agir e mostram a responsabilidade inerente a essa
liberdade.
Sobre o amor os três teóricos estão de acordo. Morin adverte que o amor está
submetido ao:
segundo princípio da termodinâmica, que se define como um princípio de degradação e
desintegração, combatendo-a pela regeneração. (...) cita Heráclito: ‘Morrer de vida, viver
de morte’. Nossas moléculas se degradam e morrem, sendo substituídas por outras.
Vivemos utilizando o processo de nossa decomposição para nos rejuvenescer. (...)
Acontece o mesmo com o amor, que vive renascendo incessantemente. (...) O amor
implica a regeneração permanente do amor nascente. (2002:24)
Na defesa do amor como uma visão geral, Morin define:
O amor faz parte da poesia da vida. A poesia faz parte do amor da vida.
Amor e poesia engendram-se mutuamente e podem identificar-se um com o outro.
Se o amor expressa o ápice supremo da sabedoria e da loucura, é preciso assumir o
amor.
O sentido do amor e da poesia é o sentido da qualidade suprema da vida. Amor e poesia,
quando concebidos como fins e meios do viver, o plenitude de sentido ao viver por
viver”. (2002:9 -10)
Ao concluirmos esse capítulo, enfatizamos que um diálogo pertinente entre os
segmentos da vida estão embasados na visão multi, inter e transdisciplinar.
Entender o diálogo entre os diversos segmentos da vida encontra em Jorge Vieira a
explicação de como a teoria de sistemas, segundo Uyemov, elucida as relações
entre as diferentes disciplinas:
(m) S =
df
[R(m)] P
(m)
multidisciplinar
S
sistema
= df [R
relações comuns entre elas
interdisciplinar
(m)] P
propriedades partilhadas
Transdisciplinar
Quando se aplica a definição de Uyemov é possível se compreender em P a
emergência da transdisciplinaridade, algo novo que é fruto das relações no
sistema. A preocupação em dialogar saberes foi o responsável pelo surgimento da
Carta da Transdisciplinaridade, 1994, no I Congresso Mundial de
62
Transdisciplinaridade. Essa carta defende o crescimento do conhecimento pelo
diálogo das diversas disciplinas que são responsáveis pela vida. O Prof. Dr.
Ubiratan D’Ambrósio, um dos teóricos da carta da transdisciplinaridade, define a
vida como uma tríade:
O fenômeno da vida é inclusivo e complexo, está em permanente transformação e
sujeito a uma dinâmica da qual sabemos muito pouco. Identifico três elementos
fundamentais para que a vida se realize, que represento no que chamo de triângulo da
vida (subentende-se “individuo” e “outrocomo da mesma espécie, e “natureza” como a
totalidade planetária e cósmica): os três componentes, o individuo, o outro e a natureza,
são mutuamente essenciais. Vida significa a resolução desse triangulo indissolúvel.
Nenhum componente tem qualquer significado sem os demais.
(http://www.sociologia.org.br/tex/educacaoparaapaz.htm)
D’Ambrósio faz um alerta ao palestrar no II Congresso Mundial de
Transdisciplinaridade. Explica que o uso indiscriminado da palavra
transdisciplinaridade poderá comprometer a sua eficácia. Faz uma analogia das
disciplinas com gaiolas, explicando que cada gaiola seria uma disciplina e que as
diversas gaiolas corresponderiam a multidisciplinaridade. A interdisciplinaridade
seria o diálogo entre as gaiolas e o resultado do diálogo entre elas seria a
transdisciplinaridade. O grande risco é da transdisciplinaridade, por sua
banalização, se tornar um grande viveiro, ao invés de abrir suas portas.
Avisa que o momento presente da sociedade é de transição e da busca por novos
paradigmas. Cita Boaventura de Sousa Santos: “construir, na verdade, uma utopia
tão pragmática quanto o próprio senso comum, não é uma tarefa fácil, nem uma
tarefa que alguma vez possa concluir-se. É este reconhecimento, à partida, da
infinitude que faz desta tarefa uma tarefa verdadeiramente digna dos humanos.”
64
O amor é uma tarefa inerente e digna aos humanos, por isso, defendemos que
esse sentimento ocupe posição de destaque para gerar, alimentar e semear os
futuros comportamentos. Insistimos nas ações para mudar hábitos tão
solidificados, por entendermos a dificuldade de mudanças em hábitos ligados ao
64
http://vello.sites.uol.com.br/responsabilidade.htm#_edn12
63
sentimento. Como Peirce definiu “o ideal estético é nutrido pelo cultivo de hábitos
de sentimentos”.
Não nada mais profundamente enraizado no espírito humano do que os hábitos de
sentir. Enquanto que o pensamento e a ação podem se modificar através de argumentos
lógicos ou da força do bom-senso, os hábitos de sentimento se modificam através do
sofrimento ou da exposição constante do sentimento a objetos ou situações capazes de
produzir sua regeneração. (...) As obras de arte não são apenas ambíguas encarnações de
qualidades de sentimento, mas são formas de sabedoria, de um tipo que fala à
sensibilidade, ao mesmo tempo em que convida a razão a se integrar ludicamente ao sentir.
(Santaella.2005:131)
Ressaltamos o poder transformador da arte “por afetabilidade”, o que fica
evidenciado nas palavras de Santaella: "A arte regenera os hábitos”
65
. Palavras
essas que nos permitem acreditar que uma mudança de Hábito é possível.
A unificação do homem, pelo diálogo entre razão e sentimento, é defendida pelos
três teóricos. Prigogine concorda e cita Richard Tarnas: “Porque a paixão mais
profunda da mente ocidental tem sido a de reunir a base do ser.” Vai mais longe e
afirma que vivemos um período de reunificação e da busca pela unidade.
(2001:97)
É possível que essa nova postura impulsionada pelas ações estéticas e por
preocupações constantes com o todo da vida, sejam movidas pela atração de um
ideal admirável. Esse ideal é admirável por encarnar qualidades de sentimentos.
Estamos confiantes, pois vislumbramos e sentimos ventos favoráveis a
incorporação do amor nas atitudes. Acreditamos que a procura pelo admirável
concretize o desejo dos três pensadores. Pensamento, ação e sentimento se
completam e direcionam as ações do homem para novas atitudes frente ao
mundo. Estamos cientes que o ideal em Peirce, Prigogine e Morin não pode ser
programado e nem definido
a priori,
estamos somente jogando sementes. O
65
Citação feita em classe no dia 10/10/2005 na disciplina: Semiótica Peirceana, da área de concentração
Signos e Significação nas Mídias, da linha de pesquisa: Epistemologia da Comunicação e Semióticas das
Mediações, no Departamento de Comunicação e Semiótica da PUCSP.
64
resultado só o tempo dirá. Como disse Machado de Assis: “Cada qual sabe amar a
seu modo; o modo pouco importa; o essencial é que saiba amar”. Nelson
Rodrigues diz que “se o amor acaba é porque não era amor”. Ou como afirmou
Santo Agostinho: “A medida do amor é amar sem medida”. Ou Madre Teresa de
Calcutá
66
: "Não é o quanto fazemos, mas quanto amor colocamos naquilo que
fazemos. Não é o quanto damos, mas quanto amor colocamos em dar."
Temos convicção que a mesma criatividade, que faz parte do homem e da
natureza e se apresenta como um dom seja fruto da sensibilidade. Acreditamos
que da mesma forma que se possa desenvolver e educar para aflorar a
sensibilidade, se possa também educar para o amor. O amor é um dom, inerente
ao homem e pode ser cultivado. Cabe a todos nós desenvolver estratégias que
consigam despertar esse sentimento vivo em potencialidade, mas, que muitas
vezes encontra-se em estado latente. Depositamos nas ações estéticas a
esperança do estímulo e do afloramento desse sentimento.
Na busca pela divulgação e estímulo da sensibilidade nos utilizamos dos artistas,
uma vez que esses conseguem perceber com antecedência o que ocorrerá no
futuro. Como explicou Baudelaire
67
no poema “Os Faróis”
68
: “Os artistas que
interpretam a linguagem misteriosa da natureza e traduzem as inquietudes
humanas são os “phares”
69
que iluminam a rota dos homens dando-lhes a
intuição de uma dignidade que está fora da sua condição mortal.”
(Baudelaire.1969: 432)
66
Madre Teresa de Calcutá. Nasceu em
1910 e morreu em 1997. Foi uma missionária católica albanesa,
nascida na República da Macedônia e naturalizada indiana, beatificada pela Igreja Católica. Algumas frases de
Madre Teresa que enriquecem a tese:
O senhor não daria banho a um leproso nem por um milhão de dólares?
Eu também não. por amor se pode dar banho a um leproso”. “O que eu faço, é uma gota no meio de um
oceano. Mas sem ela, o oceano será menor”. “A falta de amor é a maior de todas as pobrezas”. “Não
devemos permitir que alguém saia da nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz”.
www.pensador.info/.../Madre_Teresa_de_Calcuta
67
Charles Baudelaire. Nasceu em 1821 e morreu em 1867. Foi poeta e teórico de arte francês. É
considerado um dos precursores do Simbolismo. Sua obra teórica influenciou profundamente as artes
plásticas do século XIX.
68
Veja a poesia completa no anexo.
69
Significa “Faróis”. Baudelaire se preocupa com a ação dos artistas e propõe que eles tirem a eternidade do
presente, para tanto explica: “A modernidade é o transitório, o fugidio, o contingente e a metade da arte, da
qual a outra metade é o eterno e o imutável.” (1997:25)
65
O capítulo II aborda alguns artistas que acreditamos serem “phares”, pois deram
novos caminhos a arte. Marcel Duchamp inicia um período de reflexão e após
suas idéias a arte o foi mais a mesma. Não incluímos Duchamp nos artistas
elencados pelo trabalho, mas o poderíamos deixar de tecer algumas linhas
sobre suas idéias que serviram para iluminar os outros artistas. Escolhemos como
exemplos: Lygia Clark, Joseph Beuys e Frans Krajcberg, embora estejamos
cientes que a lista de artistas que investem em um mundo melhor seja enorme,
mas por ser inviável escrever sobre a totalidade de artistas, fizemos um recorte.
Todo recorte está fadado a fazer algumas ou muitas injustiças.
Os artistas escolhidos concretizam os pensamentos dos filósofos apresentados no
capítulo I. Investir em um futuro diferente pode ser o caminho dos artistas, que
da mesma forma que os cientistas, entendem o mistério da vida.
Enfatizamos a necessidade da prática do pensamento sensível, ao construir e
participar de um futuro diferenciado. O nosso trabalho por investir no diálogo com
a vida e na transdisciplinaridade utiliza-se de diversos exemplos do cotidiano como
se fosse uma viagem pela diversidade do homem. Um exemplo apaixonante,
repleto de esperanças é o tema da Escola de Samba Portela
70
:
A Portela foi buscar símbolos históricos do amor em livros, lendas e no cinema
para a disputa do Carnaval de 2009 no Rio de Janeiro. A idéia era mostrar a
importância desse sentimento para o ser humano no decorrer da história. A escola
quis mostrar diversos "tipos" de amor, como entre namorados, familiares e
amigos. A comissão de frente, por exemplo, representava a relação de coragem e
lealdade existente entre o rei Arthur e os cavaleiros da Távora Redonda.
Depois, o carro abre-alas trazia a tradicional águia que é símbolo da escola, porém
na cor dourada, acoplada a figuras que remetem ao filme "O Feitiço de Áquila",
estrelado por Michelle Pfeiffer, sobre um casal de amantes que é alvo de uma
maldição para nunca mais se encontrar.
Também foram representados os amores de "Tristão e Isolda", matriz das
narrativas do amor romântico, e Romeu e Julieta.
No segundo carro, a Portela mostrou a história do palácio indiano do Taj Mahal,
construído em Agra pelo imperador mongol Shah Jahan, em memória de sua
esposa favorita, Mumtaz Mahal, que morreu em 1631 ao dar à luz seu 14º filho.
70
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u504649.shtml
66
Depois, a escola levou à avenida um carro sobre os africanos que vieram para o
Brasil, deixando naquele continente os seus entes queridos. Na alegoria Vozes do
Brasil, a Portela lembrou o amor dos brasileiros pela pátria.
Em um dos carros, a agremiação fez uma crítica à família moderna, que tem
dificuldades de comunicação, apesar de os novos aparatos tecnológicos, como
internet e celular, terem o potencial de melhorar essa interação. Uma das alas se
chamava Plugado no iPhone, em referência ao celular inteligente da Apple.
Bonecos de costas uns para os outros demonstravam essa distância entre os
familiares.
Samba Enredo da Portela: "E por Falar em Amor, Onde Anda Você?
71
"
Brilha Portela! Das trevas renasce o amor
Doze cavaleiros se uniram
Um rei a lealdade conquistou
Lendas do povo europeu
Feitiços, mistérios, magia
A lua vem beijar o astro-rei
A noite se encontra com o dia
Lágrimas, nos olhos do Imperador
Na Índia, o palácio da saudade
Mãe África negra! O amor cruza o mar!
Liberdade!
Meu coração guerreiro
É raça, é filho desse chão
Meu canto tem raiz, é brasileiro
É natureza e miscigenação
Cenas de cinema, lindos temas de amor
A união da família, momentos que o vento levou
O homem tem que usar a consciência,
As maravilhas da Ciência
Para viver em harmonia
Vem recordar... Ranchos, blocos e cordões
Os mascarados nos salões
As fantasias do Municipal
Embarque nesse bonde é Carnaval!
São vinte e uma estrelas que brilham no meu olhar
Se eu for falar da Portela não vou terminar
Lá vem minha águia no céu da paixão!
O azul que faz pulsar meu coração!
Oh! Majestade do samba
Meu orgulho maior é a tua bandeira
Chegou minha Portela! Meu eterno amor
A luz de Oswaldo Cruz e Madureira
71
Compositores: Ciraninho, Wanderley Monteiro, Diogo Nogueira, Luiz Carlos Máximo e Júnior Escafura.
67
Ao finalizar este capítulo argumentamos por meio das reflexões de Antoine de
Saint-Exupéry
72
que vão ao encontro das nossas preocupações:
O futuro não é um lugar onde estamos indo, mas um lugar que estamos criando. O
caminho para ele não é encontrado, mas construído e o ato de fazê-lo muda tanto o
realizador quando o destino.
72
Antoine de Saint-Exupéry http://www.pensador.info/autor/Antoine_de_Saint-Exupery/
68
4. Capítulo II –
A Criatividade na Arte e na Vida
A vida do artista não poderia deixar de ser cheia de conflitos, porque duas forças estão em guerra
dentro dele – por um lado, o anseio natural do homem por felicidade, satisfação e segurança, e
por outro lado uma paixão cruel pela criação, capaz de ir tão longe a ponto de anular qualquer
desejo pessoal. (...) Quase não há exceções à regra de que uma pessoa deve pagar caro pelo
divino dom do fogo criativo.
Carl Jung
"A arte é cúmplice do amor. Tire o amor, e não existe mais arte."
Remy de Gourmont
Improvisar é aceitar, a cada respiração, a transitoriedade e a eternidade. Sabemos o que poderá
acontecer no dia seguinte ou no minuto seguinte, mas não sabemos o que vai acontecer. Na
medida em que nos sentimos seguros do que vai acontecer, trancamos as possibilidades futuras,
nos isolamos e nos defendemos contra surpresas essenciais. Entregar-se significa cultivar uma
atitude de não saber, nutrir-se do mistério contido em cada momento, que é certamente
surpreendente, e sempre novo.
Stephen Nachmanovitch
A complexidade reclama uma verdadeira reforma do pensamento. (...) Mas esta nova abordagem e
compreensão do mundo, de um mundo que se <autoproduz>, dá também um novo sentido à
ação: é fazer apostas, o que significa que com a complexidade ganhamos a liberdade.
Morin (1998:239)
O modo complexo de pensar não é útil apenas para os problemas organizacionais, sociais e
políticos. O pensamento que enfrenta a incerteza pode ensinar as estratégias para o nosso mundo
incerto. O pensamento que reúne, ensina uma ética da aliança ou da solidariedade. O pensamento
da complexidade possui, igualmente, seus prolongamentos existenciais, postulando a compreensão
entre os humanos.
Morin (2003:77)
E depois temos aquele movimento artístico de um só homem, Marcel Duchamp – para mim, um
movimento verdadeiramente moderno porque subentende que cada artista pode fazer o que pensa
que deve fazer – um movimento para cada pessoa e aberto a todos.
Willem de Kooning
Chega sempre um tempo onde é preciso escolher entre a Contemplação e a ação
.
Albert Camus
Minha arte é política de libertação.
Beuys
Assim como o ser humano não existe, mas tem que surgir primeiro, a arte também tem que surgir,
pois ainda não existe.
Beuys
Se é arte ou não, é assunto para outros. Não me interessa se as pessoas gostam ou não do que faço...
O meu trabalho é a única maneira de me expressar.
Krajcberg
69
Esse capítulo é dedicado aos artistas que comungam com os pensadores a visão
de preservar e construir o futuro. A escolha tem como base o fato dos artistas
convergirem à noção de arte com a vida. A estética para eles vai ao encontro dos
pensadores elencados, no que diz respeito à ão. Ressaltamos que a idéia de
ação é um dos focos principais do trabalho.
Os artistas criam objetos artísticos que têm o poder de fazer o receptor sentir,
fruir e se extasiar quando defrontado com ele. A ação de usufruir a obra de arte é
uma ação natural, ocorre sem esforço e desperta sensações instintivas e
profundas. Quando o objeto artístico se apresenta ao receptor, inunda seu corpo e
o mantém vivo. Mesmo a obra de arte mais estranha provoca reações de vida. O
estar vivo é reagir é movimento. Discorrer sobre os efeitos profundos da arte,
explicar de forma segura, o poder do objeto artístico ao estimular o homem, é
uma tarefa árdua, complexa e fadada a erros se houver a intenção de encontrar
uma definição precisa. A ambigüidade é a chave do objeto artístico.
As ações estéticas, no mesmo sentido que a arte, inquietam o interior mais
profundo dos homens e servem de sementes de informação para futuros atos. É
bem provável que o ato de amor seja regido por sentimentos estéticos, uma vez
que está impregnado de qualidade de sentimento. Kandinsky afirma que “toda
arte é filha do seu tempo” e o artista retrata esse tempo. O artista ao mostrar de
forma sensível o momento em que vive enfatiza, com seu trabalho, o mistério da
vida. Por outro lado, a ação estética, por ser um ato de amor, é a concretização
da sensibilidade e do sentimento de agir em determinados momentos. Esse fluxo
no tempo alimenta a corrente sígnica com qualidade de sentimento.
O artista ao criar está preocupado em propor visões e abrir os olhos do público
aos sentidos, a sensibilidade. O mesmo acontece quando uma pessoa pratica uma
ação estética. Como as duas ações jogam com os sentimentos a convergência
entre elas. A criação artística e a ação estética constroem o indivíduo e ajudam-no
nas suas limitações frente à vida.
70
Peirce ao afirmar que a estética, juntamente com a ética e a lógica são
responsáveis pela busca de um ideal admirável, abre caminho para ações
estéticas, movidas pelo amor, para construir o amanhã. O amor espresente nos
outros pensadores e passa a ser um elemento primordial para o retorno à
sensibilidade perdida em virtude do domínio da razão. Esse sentimento vai além e
surge como elemento de unificação, por agregar a diversidade e agir para a
aquisição de novos hábitos de ação.
Os artistas, como um todo, têm se preocupado com o futuro da humanidade e
muitas obras enfocam a situação do homem pós Iluminismo. No cinema, várias
óticas da vida têm sido exploradas, mas é possível visualizar que essa diversidade
e suas repercussões apontam para uma visão sistêmica. O amor seria, portanto, o
elemento aglutinante das variadas facetas da vida. A relação da criatividade e do
amor humanitário com a vida pode ser vista nos artistas e roteiristas que dedicam
sua vida a lançar reflexões sobre a existência e o momento presente.
Um ponto de partida para se entender a arte atual como ação foi dada por Marcel
Duchamp. Em, 1917, Duchamp afirma estar mais “interessado nas idéias do que no
produto final” e sua irreverência fica explícita ao transportar um mictório público e
colocá-lo em uma galeria de arte, como se fosse uma escultura. A esse objeto dá o
nome de “Fonte” e assina R. Mutt. Esse trabalho foi recusado o que permitiu o
surgimento dos
ready-made
(arte como idéia), nome dado por Duchamp ao objeto
que “questiona deliberadamente e irreverentemente seu próprio
status
como arte.”
(Smith.1991:182)
Em meados dos anos 60 surge a arte conceitual
73
que representa a concretização
das idéias de Duchamp.
73
A arte conceitual é uma tentativa de revisão da noção de obra de arte arraigada na cultura ocidental. A arte
deixa de ser primordialmente visual, feita para ser olhada, e passa a ser considerada como idéia e
pensamento. Muitos trabalhos que usam a fotografia, xerox, filmes ou vídeo como documento de ações e
processos, geralmente em recusa à noção tradicional de objeto de arte, são designados como arte conceitual.
Além da crítica ao formalismo, artistas conceituais atacam ferozmente as instituições, o sistema de seleção de
obras e o mercado de arte. George Maciunas (1931 - 1978), um dos fundadores do Fluxus, redige em 1963
71
Duchamp foi um gênio visionário e, a arte, depois de suas ações, não foi mais a
mesma. O artista amplia os limites artísticos ao defender a arte como
manifestação do artista e fora do circuito acadêmico.
Duchamp deu a entender que a arte podia existir fora dos veículos convencionais e
manuais da pintura e da escultura, e para além das considerações de gosto; seu ponto de
vista era que a arte relacionava-se mais com as intenções do artista do que com qualquer
coisa que ele fizesse com as próprias mãos ou sentisse a respeito de beleza.
(Smith.1991:182)
Willem de Kooning, ao definir o trabalho de Duchamp, afirma que esse estava
correto em se interessar mais com idéias do que com o produto final. Afirma que
Duchamp conseguiu abrir as fronteiras do fazer artístico. E é essa abertura que irá
propiciar mais tarde a ênfase dada pelos artistas à recepção da obra de arte. É a
mudança da platéia passiva em ativa, de simples contemplação para a
participação e interação. A grande contribuição da arte conceitual é sem dúvida:
O sentimento de libertação que ela gerou como efeito secundário. (...) uma geração de
artistas nova e estilisticamente diferente surgiu gradualmente: esses artistas estão
desenvolvendo e aperfeiçoando novos métodos para dar forma às suas idéias em termos
visuais extravagantemente complexos e coloridos, sem perder a seqüencia do pensamento.
(Smith.1991:192)
Após a abertura do fazer artístico por Duchamp, vários artistas contribuíram para
ampliar a trajetória da arte, entre eles, os artistas escolhidos para este trabalho:
Lygia Clark, Joseph Beuys e Frans Kracjberg.
um manifesto em que diz: "Livrem o mundo da doença burguesa, da cultura 'intelectual', profissional e
comercializada. Livrem o mundo da arte morta, da imitação, da arte artificial, da arte abstrata... Promovam
uma arte viva, uma antiarte, uma realidade não artística, para ser compreendida por todos [...]". A
contundente crítica ao materialismo da sociedade de consumo, elemento constitutivo das performances e
ações do artista alemão Joseph Beuys (1912 - 1986), pode ser compreendida a arte conceitual é uma tentativa
de revisão da noção de obra de arte arraigada na cultura ocidental. A arte deixa de ser primordialmente
visual, feita para ser olhada, e passa a ser considerada como idéia e pensamento. Muitos trabalhos que usam a
fotografia, xerox, filmes ou vídeo como documento de ações e processos, geralmente em recusa à noção
tradicional de objeto de arte, são designados como arte conceitual. Além da crítica ao formalismo, artistas
conceituais atacam ferozmente as instituições, o sistema de seleção de obras e o mercado de arte. George
Maciunas (1931 - 1978), um dos fundadores do Fluxus, redige em 1963 um manifesto em que diz: "Livrem o
mundo da doença burguesa, da cultura 'intelectual', profissional e comercializada. Livrem o mundo da arte
morta, da imitação, da arte artificial, da arte abstrata... Promovam uma arte viva, uma antiarte, uma realidade
não artística, para ser compreendida por todos [...]". A contundente crítica ao materialismo da sociedade de
consumo, elemento constitutivo das performances e ações do artista alemão Joseph Beuys (1912 - 1986),
pode ser compreendida como arte conceitual.
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbet
e=3187
72
Fonte
www.students.sbc.edu/.../Marcel%20Duchamp.jpg
4. 1. A Criatividade na Arte - Arte como Ação e Política de Libertação
Na visão de arte como ação e política de libertação encontramos o artista Joseph
Beuys
74
que fez de sua trajetória artística uma forma de incutir a ação nos
indivíduos. Algumas frases marcantes de Beuys:
"Todo mundo é um artista."
"Libertar as pessoas é o objetivo da arte, portanto, a arte para mim é a ciência da liberdade."
"Tornai os segredos produtivos."
Beuys Explica o que entende por criatividade:
[...] a criatividade não é monopólio das artes. [...] Quando eu digo que toda a gente é
artista eu quero dizer que cada um pode concentrar a sua vida nessa perspectiva: pode
cultivar a artisticidade
75
tanto na pintura como na música, na técnica, na cura de doenças,
74
Joseph Beuys. Nasceu em 12 de janeiro de 1921 e morreu em 23 de janeiro de 1986. Beuys foi um dos
pioneiros do movimento ambientalista alemão e teve participação ativa na política. Ele fundou várias
organizações políticas, como o Partido Alemão dos Estudantes, em 1967 (alemão: Deutsche Studentenpartei
DSP), e a Organização para a Democracia Direta, em 1970. Em 1979, ele se tornou um dos membros
fundadores do Partido Verde Alemão. Mesmo tendo até arriscado uma candidatura em uma eleição pelos
verdes, Beuys expressou no fim da vida desgosto pela política partidária e havia se afastado das atividades do
PV.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Joseph_Beuys
75
A artisticidade de Beuys é o quotidiano, acessível a toda a gente, processo contínuo, obra aberta para todos
os imaginários que na participação, no debate e na ação solidária vão criando mudança de vida. O artista é o
73
na economia ou em qualquer outro domínio [...]. O nosso conceito de arte deve ser
universal, terá que ter uma natureza interdisciplinar com um conceito novo de arte e
ciência. (1979 - entrevista a Franz Hak. BEUYS, 2005)
Joseph Beuys, na Documenta de Kassel - 1979, fez uma apresentação com o
nome de
7000 Carvalhos.
Para conseguir que carvalhos fossem plantados na
cidade, o artista espalhou sete mil pedras e determinou que para cada pedra
retirada pela Prefeitura fosse plantado em seu lugar um carvalho. Abaixo algumas
fotos.
sujeito capaz de evocar o significado, apenas grosseiramente enunciado por aquele simples expediente com
que toda a gente pode provocar a arte nos outros, ou seja, viver criativamente a vida "desocultando" o que
está apenas escondido. Com materiais e instalações simples, Beuys pretende provocar interpretações
simbólicas e culturais singulares, reações de todos os que são capazes de construir a visão artística do que
apenas foi enunciado. O "artista" fazedor apaga-se para enaltecer o artista decifrador, que ocupa agora o lugar
na divina criação daquilo que foi apenas a modesta aparência ou sombra da realidade que é a vida quotidiana.
Trata-se da inversão do mito da caverna de Platão. Antigamente o artista era o personagem que, através do
"ícone sublime", fazia aparecer a divindade no público considerado como incapaz de comparticipar da beleza
dos deuses, própria aos divinos artistas. Agora, trata-se de uma demissão do papel divino do fazedor de arte,
para que caiba aos outros o papel de criadores autônomos. Mas não se pretende apenas essa reviravolta do
sujeito objeto. Trata-se agora da possibilidade de toda a gente poder participar neste duplo jogo de produzir e
usufruir da arte, transpondo este passo que separa o artista do não artista.
http://www.ipv.pt/millenium/Millenium25/25_24.htm
74
A ação de Beuys em Eichen
Stadtverwaldung statt Verwaltung 1979
tinha
como finalidade o incentivo ao reflorestamento urbano. Acreditava e depositava
suas esperanças na proliferação dessa ação e pretendia que essa idéia se
espalhasse por outras cidades.
A atitude de Beuys duplicou o número de árvores de Kassel. Essa "escultura
social", era composta por cinco tipos de carvalho e mais de 36 outras espécies de
árvores. Além de criar o verde, Beuys provocou grandes polêmicas e resistências
entre os moradores da cidade. Afinal, isso acarretou menos vagas para estacionar,
mais folhas para varrer e mais motivos para acidentes de carro. Algumas árvores
recém-plantadas chegaram até a ser destroçadas.
75
Hoje, uma ação como
7000 Carvalhos
não seria uma provocação tão grande. O
grau de institucionalização das intervenções artísticas é tal que atualmente existe
até uma associação para cuidar somente do futuro da escultura social de Beuys.
Alertamos para o perigo de associações tornarem-se soberanas das obras de
artes, pois deve-se ficar atento e não permitir que esse grau de institucionalização
modique a intenção do artista. Muitas vezes fala-se em nome da arte e do artista,
mas se age de forma contrária. Não se pode esquecer que a liberdade é o motor
da arte e do artista.
Em relação às atitudes efetivas de Beuys lembramos que ele foi um dos
fundadores do Partido Verde Alemão. Essa iniciativa foi precursora do sugimento
de diversos partidos políticos voltados para o ambiente e, atualmente, em vários
países a bandeira verde é hasteada. A nossa intenção não é defender e nem fazer
propaganda de partido político, esta tese é apartidária, mostramos a arte como
ação e política de libertação, como foi defendida por Beuys.
Um exemplo magnífico da arte como ação, ou melhor, da ação como arte,
encontramos no violista Joshua Bell
76
que, em sua passagem pelo Brasil, dedicou
76
Reportagem sobre a visita de Joshua Bell ao Brasil. O Estado De São Paulo
24 de Junho de 2009. João Luiz Sampaio
''Adotem a música!''
O violinista Joshua Bell conversa, e toca de improviso, com jovens de Heliópolis
Os jovens da Sinfônica de Heliópolis mal acabaram de fazer soar os acordes finais da Abertura Hebrides de
Mendelssohn e um Joshua Bell de olhos arregalados curvou-se para cumprimentar o spalla do grupo. "Vocês
tocam de maneira entrosada, olham uns para os outros, m energia, excitação. toquei com as maiores
orquestras do mundo e, acreditem, essa energia não é fácil de ver, não. Eu adoro Mendelssohn, é um dos
meus compositores favoritos. Talvez um dia, quando vocês estudarem o concerto para violino dele, a gente
possa tocá-lo juntos, que tal?" O riso maroto surgiu primeiro no rosto do maestro Roberto Tibiriçá e logo se
espalhou pela orquestra, formada por jovens de 18 a 24 anos. Rapidamente, eles começam a tirar as partituras
das mochilas. "Agora?", perguntou Bell, já sacando da mala seu Stradivarius.
Bell é hoje uma das maiores estrelas do violino internacional, com quase 30 anos de carreira (ele não gosta de
revelar a idade, mas vai fazer 41 anos em 2009) e mais de 35 gravações reconhecidas por prêmios como o
Grammy. Está na cidade desde domingo, quando tocou com a Orquestra Sinfônica Brasileira na Sala São
Paulo. Segunda e terça, fez recitais com o pianista Frederic Chiu no Teatro Alfa, parte da temporada do
Mozarteum Brasileiro. Esteve em Heliópolis na manhã de ontem por conta de uma parceria da entidade com
o Instituto Baccarelli, antigo trabalho de formação musical realizado na favela, a maior da cidade, do qual a
Sinfônica de Heliópolis é o chamariz mais atraente.
Bell chegou pouco antes da 11 horas e foi recebido pelos alunos da classe infantil de violino do instituto.
Tocaram para ele Brilha, Brilha, Estrelinha, mas acoplando à melodia tradicional americana ritmos
brasileiros que fizeram o violinista ensaiar uns passinhos. "Sempre que vou encontrar crianças eles tocam
para mim essa peça, mas nunca tinha ouvido assim, com esse ritmo." Depois da tradução, risinhos. "Vocês
76
sua arte a vida. Joshua foi visitar Heliópolis e, para incentivar os meninos tocou
com eles. A atitude de joshua representa a importância da ação para o artista.
querem ver meu violino?" A professora contou a história do instrumento, de 1713, que foi roubado duas
vezes e vale US$ 5 milhões. E Bell tocou uma peça de Bach para os rostos atentos dos meninos e meninas de
7 a 11 anos. Do que gostaram mais, aliás? Dele ou do violino? Mayara, de 10 anos, pensa um pouco, põe o
dedinho no queixo. "Dele... mas o violino é legal também. Achei bonito, deu até vontade de chorar." Israel,
de 12 anos, quatro estudando violino, diz que não sabia que ele ia tocar. "Achei que ele ia ouvir. A
gente estava até com um pouco de medo."
De volta à sala de ensaios da sinfônica, o primeiro movimento do concerto de Mendelssohn vai chegando ao
fim. Bell inicia a cadência, parte dedicada ao solo do instrumento, hesita um pouco. "Acho que esqueci. E
olha que essa cadência fui eu que escrevi", diz ele, sorrindo, enquanto toca. O maestro Tibiriçá vai
conduzindo os músicos até a parte final do movimento, da qual emerge o solo do fagote, sozinho sobre a
orquestra. Bell relaxa, vira-se. Mas não é este o solo de fagote que abre o segundo movimento? Não, eles não
pretendem deixar Bell escapar assim tão fácil. Ele ri, empunha uma vez mais o violino. As cordas da
orquestra introduzem o tema. "Mais doce, mais doce", pede Bell. É atendido. E o segundo movimento do
concerto segue seu curso.
Bell diz que não gosta de dar master classes. Prefere conversar com os estudantes, trocar experiências. E que
troca pode haver entre um jovem nascido no bucólico interior de Indiana, nos Estados Unidos, onde iniciou
seus estudos aos 4 anos, e jovens carentes que enfrentam os desafios diários de uma metrópole como São
Paulo? Um estudante pergunta a ele: "Ao se deparar com uma situação complicada, uma enorme dificuldade,
você pensou em abandonar o violino?" Quem começa a responder é o pianista Frederic Chiu, também
presente no bate-papo. "Quando comecei minha carreira, fui morar em Paris. Não tinha dinheiro, ficava em
um quarto sem banheiro, sem nada, sem piano. Como eu ia estudar? Eu parava as pessoas nas ruas e
perguntava se tinham piano em casa, se me deixariam ensaiar nele. Tenho amigos chineses que foram
proibidos de tocar pelo governo, não podiam ter piano, então desenhavam em um papel as teclas para poder
estudar. Com isso, você se transforma. No meu caso, comecei a ver a música também dentro de mim, com a
cabeça, pensava nas peças já que não podia tocá-las. Isso fez de mim um músico muito melhor. A dificuldade
pode ser professora." Bell pede a palavra, vai direto ao ponto. "Eu sei que muitos de vocês passaram ou
passam por enormes dificuldades. Mas aprendam a usar isso na música de vocês. Música é sofrimento, é
conflito, mas é também a trajetória da superação em direção à alegria, à beleza. O sofrimento pelo qual vocês
passam deve ser colocado na música de vocês. É isso que fará de vocês artistas e pessoas únicas. E, nunca,
nunca, abandonem a música. Adotem a música. Tenham ela perto de vocês. Sempre. Para mim é claro que
não existe vida sem música e tenho certeza de que com vocês é igual."
Mendelssohn, Concerto para Violino, terceiro movimento. Bell olha para os violinos da orquestra enquanto
seu solo emerge da malha sonora por eles produzida. Sorri, muito. "Pianíssimo, pianíssimo", pede e logo vira
o rosto na direção dos violoncelos. Não diz nada, mas eles reagem. "A gente não esperava poder tocar com
ele. Estávamos ensaiando essa peça porque vamos interpretá-la na semana que vem. Mas foi incrível. Ele
pega o violino e, de repente, do nada, sai fazendo música junto com a gente", diz a estudante Carolina de
Moraes, de 26 anos. "Nunca estive tão perto de um Stradivarius assim", acrescenta Jessé Siqueira, de 21
anos, desde os 13 estudando violino. "Mas eu fiquei meio nervoso, trocando as notas, queria ficar prestando
atenção no som maravilhoso do instrumento dele."
Mais tarde, durante a conversa com os músicos, Bell fala de tudo um pouco. Adora videogame, seria
psicólogo se não fosse músico, se bem que também tem fascinação por matemática e computação. Além,
claro, de adorar comer e beber. "Ontem estivemos em um... como fala? Rodízio. Uau." A conversa, no
entanto, logo volta para a música. Na pauta, Mendelssohn. "Vejam o que acabamos de fazer. Este concerto
pode ser a coisa mais entediante e chata do mundo, mas pode também ser algo fascinante. O que faz a
diferença é o prazer de fazer música, é o diálogo entre vocês, como percebi enquanto tocávamos. Não percam
essa energia, de jeito nenhum. É ela que fará de vocês grandes músicos. É preciso ter prazer quando tocamos.
Foi o que senti agora. E tenho certeza de que muitos de vocês serão grandes artistas e espero reencontrá-los
mundo afora em boas orquestras." Ele empunha o violino mais uma vez. Toca, como despedida, Yankee
Doodle. Os músicos querem mais, porém, saíram de com um extra. Na semana que vem, quando
receberem o violinista Erik Schumann, com quem se apresentam, e ouvirem a pergunta: "Vocês já tocaram
essa peça antes?", poderão responder: "Já, com Joshua Bell." Precisa mesmo de mais?
77
Transformar os problemas da vida dificil dos meninos em momentos de alegria e
esperança para o futuro. Depois de tocar com os pequenos disse:
Eu sei que muitos de vocês já passaram ou passam por enormes dificuldades. Mas
aprendam a usar isso na música de vocês. Música é sofrimento, é conflito, mas é também
a trajetória da superação em direção à alegria, à beleza. O sofrimento pelo qual vocês
passam deve ser colocado na música de vocês. É isso que fará de vocês artistas e pessoas
únicas. E, nunca, nunca, abandonem a música. Adotem a música. Tenham ela perto de
vocês. Sempre. Para mim é claro que não existe vida sem música e tenho certeza de que
com vocês é igual." "O que faz a diferença é o prazer de fazer música".
Muitos artistas, de cinema, estão engajados em deixar um mundo melhor, por
meio de ações estéticas. para ilustrar Angelina Jolie depois que fez o filme
“Amor Sem Fronteirasiniciou ações em prol dos mais necessitados. Poderíamos
citar inúmeros artistas, mas escolhemos Paul Newman que criou uma industria de
alimentos em que todo o lucro é revertido para a caridade. Além disso, auxiliou
crianças doentes e dependentes químicos. Depois da morte de Newman foi feita
uma homenagem ao trabalho desempenhado por ele em vida. No anexo tem uma
reportagem sobre o artista.
78
4. 2. A Criatividade: O Corpo como Memória da Vida:
O Corpo como memória da vida encontra em Lygia Clark
77
seu maior expoente.
Lygia faz de sua pesquisa artística um caminho para entender o homem e traçar
possibilidades para conhecê-lo. O homem moderno, na sua trajetória evolutiva,
concentrou na visão, sua importante porta de percepção. A audição foi a segunda
porta e as outras entradas de percepções foram relegadas a planos inferiores.
Lygia percebeu a importância dos sentidos para complementar o ser. Por que
não resgatar as sensações adormecidas? Se o homem é composto pela união do
homo sapiens e demens,
segundo Morin,
por que esquecer sua porção
demens
e
se concentrar somente no
sapiens
? Lygia traz para o artista a responsabilidade de
mostrar os caminhos alternativos, para equilibrar e unir esse corpo dividido e
nostálgico.
Desde 1976, Lygia propõe que o ser humano solte sua sensibilidade e viva o
instante. Para libertar o indivíduo de suas amarras, propõe: “O viver o presente, a
arte sem arte”. (Milliet.1992:100). Vai além ao dizer que “O homem moderno deve
descartar-se desse excesso de racionalismo que está no coração do pensamento
contemporâneo” (Milliet.1992:102). O trabalho vanguardista de Lygia representa o
olhar do indivíduo para si mesmo, pela redescoberta de sensações perdidas. Lygia
ao enxergar o corpo na sua totalidade faz dialogar o interior e o exterior e
antecipa a preocupação atual do homem que, ao mesmo tempo em que modifica
o ambiente, é recursivamente modificado por ele. O corpo por ser único aponta
para a inexistência de uma parte interior e outra exterior, pois uma completa a
outra e cria uma totalidade.
“Na Fase sensorial do meu trabalho, que denominei
Nostalgia do Corpo,
o objeto
ainda era um meio indispensável entre a sensação e o participante. O homem
77
Lygia Clark. Nasceu em 23 de outubro de 1920 (minas Gerais) e morreu em 25 de abril de 1988 (rio de
Janeiro).
79
encontra seu próprio corpo através de sensações táteis realizadas em objetos
exteriores a si”. (Milliet.1992:119)
O caminho escolhido por Lygia na “Estruturação do
Self
parte da obra para a
poética.
“A poética clarkiana supera a obra e elege o corpo como espaço experimental para uma
expressão não codificada, ‘não necessidade de objeto: é o ato que engendra a poesia’.
“(...) na realidade arte e vida sempre estão imbricados: de vivências, extrai pensamentos
aplicados no fazer artístico; da prática da arte, deriva reflexões revertidas para a vida.” (...) A
atuação de Clark no campo da arte ou fora dele não é regida por dogmas, é antes fundada
em motivações pessoais profundas articuladas às circunstâncias externas em contínuas e
múltiplas adaptações.”
“A importância de Lygia Clark no panorama cultural brasileiro não se prende exclusivamente
ao estético, mas, sobretudo à determinação de atravessar os territórios minados da arte e da
terapia. Seu legado é a ousadia de querer mudar a si, mudar a linguagem e ‘mudar o
mundo’: sua obra é o trajeto”. (Milliet.1992:177-179)
Lygia Clark chama atenção para a necessidade de ampliar as artes na direção da
exploração de todos os sentidos, não só do visual. Essa procura por novas
significações do eu é um caminho para uma poética do corpo. Lygia afirmou que
não era uma artista e sim uma propositora e, em 1968, escreveu o seguinte
manifesto sobre o artista, o fazer arte e a participação do público:
Somos os propositores: somos o molde; a vocês cabe o sopro, no interior desse molde: o
sentido de nossa existência.
Somos os propositores: nossa proposição é o diálogo. Sós, não existimos; estamos a vosso
dispor.
Somos os propositores: enterramos a obra de arte como tal e solicitamos a vocês para que o
pensamento viva pela ação.
Somos os propositores: não lhe propomos nem o passado nem o futuro, mas o agora. (Lygia
apud Milliet.1992: 156)
Nesse manifesto é possível entender como a obra de arte provoca a ão e cria o
indivíduo. É quase como uma ação divina. Como se fosse um sopro de vida. É a
experimentação sensorial que transforma o corpo. Lygia expande as fronteiras do
fazer artístico, ao interagir com as diversas linguagens, o público e o pensar o
corpo. Exemplo dos objetos relacionais:
80
Lygia promove nos anos 70/80 uma nova relação entre o artista e o espectador
que é, antes de tudo, o responsável pelo resultado da proposta do artista. A
artista apresenta uma nova postura de ação, que vai ao encontro do desejo dos
artistas que, nessa época, começavam a se preocupar com o objeto artístico, pela
ótica da recepção.
Os “Objetos Relacionais” de Lygia foram utilizados como terapia nas experiências
de Lula Wanderley
78
. Guy Brett
79
t ao ler o livro de Wanderley “O Dragão pousou
78
Lula Wanderley nasceu em Recife, Pernambuco. Alem de artista gráfico formou-se em medicina na UFP.
Migrou para o Rio de Janeiro em 1976, onde se ligou a Nise da Silveira, trabalhando na Casa das Palmeiras e
81
no Espaço” define-o: “Talvez a melhor maneira de caracterizar este livro seja dizer
que ele é sobre vidas humanas, que este é o modo mais verdadeiro de unir as
experiências dos que sofrem, dos artistas e dos terapeutas.” (Wanderley.2002)
Na última pagina do livro encontramos seguinte:
“E assim a Vida lentamente ocupa o lugar
do que há muito tempo
se chamava Arte”, que ocupa o lugar
do que antes
se chamava “Loucura”.
Brett explica a pertinência do trabalho terapêutico de Wanderley apoiado nos
objetos de Lygia. Mostra sua alegria pelo reconhecimento internacional, mesmo
que tardio, da competência de Lygia como artista e propositora. Enaltece o livro,
por ele construir “uma nova e surpreendente conexão entre arte e o tratamento
da loucura. (Wanderley. 2002:7) Sobre Wanderley elogia seu trabalho pioneiro
para os distúrbios mentais graves, nos quais se utiliza de diferentes terapias:
Incluindo procedimentos médicos, mas a preocupação central da clinica de Wanderley
tem sido a utilização dos Objetos Relacionais de Lygia como parte do processo
terapêutico. Wanderley nunca fala de obtenção de uma “cura” através do método de
Lygia, mas de trazer um “melhor contato afetivo com a realidade”, ou um “desbloqueio
de nossa relação com o mundo. (Wanderley.2002:8-9)
As pesquisas de Lygia representam a visão de ação que defendemos nesta tese. A
arte sai da esfera das artes como representação de uma imagem real, para se
manifestar e atuar na vida. A possibilidade de se tratar a loucura pelos objetos de
Lygia é gratificante. Wanderley teve seu percurso profissional divido entre a
psiquiatria e a arte. Após se formar foi para o Rio de Janeiro e trabalhou com a
Dra. Nise da Silveira
80
, quem o aconselhou a continuar na medicina e usar a
no Museu de Imagens do Inconsciente. Colaborou com Lygia Clark na transposição do Objeto Relacional
para uma proposta psicoterápica, desenvolvendo um trabalho junto a esquizofrênicos em hospitais
psiquiátricos.
79
Guy Brett. escreve sobre arte desde a década de 1960. Seus artigos, ensaios e livros têm revelado, no
contexto da crítica internacional, uma posição singular voltada para a produção mais experimental, à revelia
de todos os formalismos, e caracterizada por um repertório de conceitos que se baseiam na convivência com
os artistas e suas obras.
http://www.contracapa.com.br/Guy_Brett_Brasil_experimental.htm
80
Nise da Silveira nasceu em Maceió, 15 de fevereiro de 1906 e morreu no Rio de Janeiro, 30 de
outubro de 1999. Foi uma renomada médica psiquiatra brasileira, aluna de Carl Jung. Dedicou sua
vida à psiquiatria e manifestou-se radicalmente contrária às formas agressivas de tratamento de sua época,
82
sensibilidade como instrumento de trabalho. Teve contato com os objetos
relacionais de Lygia e mostra a possibilidade da convergência entre a arte e a
psicanálise. O que enfatiza a potencialidade da ação do artista.
Wanderley, em uma entrevista
81
a Maíra Novoa, explica seu trabalho como
coordenador do Espaço Aberto ao Tempo IMAS Nise da Silveira no Engenho de
Dentro.
Para tomar a sensibilidade como instrumento de trabalho, o meu mecanismo subjetivo
de captar a realidade é estético. Embora eu uma resposta a isso na passagem da
estética para a ética, meu mecanismo subjetivo é estético. O que eu fiz foi entrar nesses
ambientes de psiquiatria e me deixar impressionar pelos clientes em uma época em que
deixar-se impressionar era proibido, deveria cultivar um olhar de neutralidade.
(...) Quando eu falo em juntar arte e clínica não é colocar os clientes para pintar,
desenhar, fazer música... é tomar a arte como um acontecimento clínico.
(...) Os Objetos Relacionais eu comecei a usá-los logo que fui para a enfermaria. Por ser
uma coisa mais visível, eu me interessei pela vivência de corpo dos clientes. Isso foi logo
cedo e me fez chegar até a Lygia Clark que tinha uma arte voltada para o corpo.
Comecei a experimentar quase que por acaso em pessoas com vivências esquizofrênicas.
Antes de vir para comecei a fazer algumas experiências que foram muito
encorajadoras e contei para o Jurandir Freire que estava trabalhando aqui no Nise da
Silveira dando supervisão em um dos hospitais. No hospital Gustavo Riedel havia um
caso de uma mulher extremamente grave, que não comia, pesava uns 32Kg e não
tinha forças para nada. O hospital clínico de apoio dizia que era uma Neoplasia. Jurandir,
acreditando ser um sofrimento psíquico, disse para tentarmos uma aproximação com ela
com três ou quatro terapias diferentes ao mesmo tempo. Alguém fazia as experiências
medicamentosas, eu fazia essas experiências com o corpo e outro fazia experiências com
tais como o confinamento em hospitais psiquiátricos, eletrochoque, insulinoterapia e lobotomia. Por sua
discordância com os métodos adotados nas enfermarias, recusando-se a aplicar eletrochoques em pacientes,
Nise da Silveira é transferida para o trabalho com terapia ocupacional, atividade então menosprezada pelos
médicos. Assim em 1946 funda nesta instituição a "Seção de Terapêutica Ocupacional".
No lugar das tradicionais tarefas de limpeza e manutenção que os pacientes exerciam sob o título de terapia
ocupacional, ela cria ateliês de pintura e modelagem com a intenção de possibilitar aos doentes reatar seus
vínculos com a realidade através da expressão simbólica e da criatividade, revolucionando a Psiquiatria então
praticada no país. Em 1952, ela funda o Museu de Imagens do Inconsciente, no Rio de Janeiro, um centro de
estudo e pesquisa destinado à preservação dos trabalhos produzidos nos estúdios de modelagem e pintura que
criou na instituição, valorizando-os como documentos que abrem novas possibilidades para uma
compreensão mais profunda do universo interior do esquizofrênico.
Poucos anos depois da fundação do museu, em 1956, Nise desenvolve outro projeto também revolucionário
para sua época: cria a Casa das Palmeiras, uma clínica voltada à reabilitação de antigos pacientes de
instituições psiquiátricas. Neste local podem diariamente expressar sua criatividade, sendo tratados como
pacientes externos numa etapa intermediária entre a rotina hospitalar e sua reintegração à vida em sociedade.
Foi uma pioneira na pesquisa das relações emocionais entre pacientes e animais, que costumava chamar de
co-terapeutas. Percebeu esta possibilidade de tratamento ao observar como um paciente a quem delegara os
cuidados de uma cadela abandonada no hospital melhorou tendo a responsabilidade de tratar deste animal
como um ponto de referência afetiva estável em sua vida.
81
http://rubedo.psc.br/08outrub/entlula.html
83
linguagem e comunicação. Conseguimos resgatar essa mulher de uma forma belíssima.
Resgatar essa mulher para a vida porque ela poderia morrer com aquela anorexia com
idéias puramente delirante. Lembro alguma coisa da história: ela bateu nos filhos e disse
palavras contra Deus pela vida miserável que estava vivendo; teve a idéia de que Deus a
castigou tampando toda a sua víscera e por isso o poderia comer. Jurandir chegou
para mim e disse: “é o momento de você experimentar isso”. Eu tinha uma experiência
muito pequena, estava cheio de vidas e levei uma bronca dele porque era grave o
estado da cliente e eu não tinha que ficar pensando. Se eu já tinha algumas experiências
boas com os Objetos Relacionais, por que não?
(...) Eu trouxe os Objetos da Lygia como instrumento para a transformação da
enfermaria. São objetos de específica sensorialidade tátil, que não trazem uma
linguagem visual que lhe dêem significado fora da relação que estabelece com o corpo.
Eles ganham significação na relação que estabelece com o corpo através de uma
linguagem específica do corpo e, se você estabelece essa relação, você subjetiva, você
sai de sua posição psicótica. Porque você significado aos objetos, você significado
ao seu corpo e à sua própria vida. Essa é, em síntese, a experiência da Estruturação do
Self. E foi muito bom, porque aprendi também através dessas experiências a fazer
leituras não só da experiência, mas da vivência dos clientes, o modo deles vivenciarem o
tempo e o espaço, os objetos. Através desse tipo de leitura fui ajudando a criar o espaço
Aberto ao Tempo.
(...) Eu ofereço um objeto, fenomenologicamente desconstruído para que você aproprie-
se dele e o reconstrua, reconstruindo seu próprio corpo. Cabe ao cliente fazer isso ou
não e a mim seguir qual é a construção que ele faz com aquele objeto e se ela é válida
para ele ou não. Não é como uma psicoterapia que tenha um tempo próprio, onde eu
digo alguma coisa e espero que o sujeito responda para colher outra. É uma relação que
ele estabelece com o objeto, da qual eu sou apenas um mediador.
(...) Não existe um objeto, existe um conjunto de objetos que envolvem o corpo. Cada um
tem uma sensorialidade diferente, cada um causa estímulos no corpo de maneiras
distintas, mas um complementa o outro. Isso que os caracteriza e por isso não é um
objeto qualquer. Essa unidade que eles formam tem uma relação particular com o corpo. É
sempre uma película, por onde corre uma matéria pura dentro. Existe aquela
sensorialidade do objeto que vai para além do seu corpo, para um interior imaginário do
seu corpo. Muito difícil falar sobre isso, mas toda a experiência do Espaço Aberto ao
Tempo foi muito forte. Eu não tenho dúvidas de sua utilidade.
84
http://rubedo.psc.br/08outrub/entlula.html
Enfatizamos que entender a arte somente como a criação do belo é minimizar sua
potencialidade, assim como a do artista. A função maior do artista é despertar
sensações é criar momentos de reflexão pelos sentidos em relação a si e a vida.
Reafirmo aqui a importância da reflexão de Augusto Boal sobre a função da arte:
“Sinto sincero respeito por todos que dedicam suas vidas à arte (...). Mas prefiro
àqueles que dedicam sua Arte à Vida”
4. 3. A Criatividade: A Arte na Defesa da Natureza
Como exemplo de arte na defesa da natureza, escolhemos o artista Frans
Krajcberg
82
por sua dedicação ao ambiente. Krajcberg, polonês naturalizado
brasileiro, sentiu na carne as dores e a destruição da guerra e, acreditou que
encontraria paz além das fronteiras da terra mãe. Triste esperança!!! Ao ver as
queimadas no Brasil percebeu que o homem não vive na paz, ao contrário,
sempre arranja um motivo para destruir. A partir dessa experiência dedicou sua
arte e vida na defesa da natureza que, segundo ele, agoniza como os homens
vencidos pelas mãos dos próprios homens.
82
Frans Krajcberg. Nasceu em 12 de abril de 1921 na Polônia. Pintor, escultor, gravador e fotógrafo,
naturalizou-se brasileiro. Fugiu da guerra e Chegou ao Brasil em 1948. Participou da primeira Bienal de São
Paulo, em 1951. Em 1964, executou as suas primeiras esculturas com troncos de árvores mortas.
85
Afirmou diversas vezes que sua intenção vai além da arte, pois deseja contribuir
na manutenção da complexidade da vida e da natureza. Em seu trabalho usa os
resíduos dos campos devastados pelo homem, que, segundo ele, mais parecem
campos de batalha. As esculturas de Krajcberg são monumentos feitos de
troncos, galhos e detritos de queimadas e desmatamentos. Seu trabalho é
manipular resíduos da destruição e do caos e transformá-los em objetos
artísticos.
86
Krajcberg dá vários depoimentos sobre suas andanças pela destruição do homem.
“Vou para a floresta e me sinto tão queimado quanto à arvores.” (Sant’Anna.
2007)
O Brasil cuja maior riqueza é a natureza, está próximo de se tornar um país de caatinga e
cerrados, com exceção de alguns parques e monumentos ecológicos. Estamos próximos do
completo esgotamento dos nossos recursos naturais. Precisamos urgentemente distinguir o
uso do abuso, a exploração da esfoliação, a conservação da devastação. Só assim os
recursos naturais poderão continuar sendo usados pelo homem. (2008:14-15)
Existe hoje uma consciência mundial em favor do meio ambiente. Graças a ela, reforça-se a
idéia de que a sobrevivência da humanidade depende diretamente da sobrevivência do
planeta. Essa dependência não é de ordem física. Ela é também uma fonte de inspiração
espiritual, que nos permite antever um tempo infinito e dar mais sentido a vida. (2008: 60-
61)
Artista engajado com o futuro da vida argumenta sobre o seu trabalho: "Se é arte
ou não, é assunto para outros. Não me interessa se as pessoas gostam ou não do
que faço... O meu trabalho é a única maneira de me expressar. Se começo a
gritar na rua, me botam num hospital de doidos". (Frans Krajcberg)
Além de seus trabalhos artísticos que mostram os desatinos da raça humana,
Krajcberg atua como defensor do verde e, em particular, da floresta amazônica. O
artista em parceria com Pierre Restany
83
e Sepp Baendereck
84
são os responsáveis
pelo “Manifesto do Rio Negro”, que foi assinado em 1978. No Manifesto são
disseminadas as bases conceituais para uma consciência ambiental diferenciada,
denominada de naturalismo. “A idéia é que a arte, assim como a visão ambiental
83
Pierre Restany. Escritor e crítico de arte contemporânea nasceu, em 1930 na França e morreu em maio de
2003.
http://www.infopedia.pt/$pierre-restany. Restany propõe: "... A arte de vanguarda não é mais uma arte de
revolta, mas uma arte de participação popular. Como assegurar as condições dessa participação? Voltando à
realidade direta, a do nosso presente. Arte de comunicação de massa, arte da Segunda Revolução Industrial é
uma arte popular por necessidade histórica.
http://worldartnow.blogspot.com/2007/06/pierre-restany.html
84
Sepp Baendereck. Pintor, desenhista, gravador, ilustrador, fotógrafo, ilustrador, teórico de arte, professor,
publicitário. Nasceu em 1944/1945 em Zagreb (Iugoslávia, atual Croácia) naturalizado brasileiro, morre em
1988 em São Paulo. Em 1978 Realiza expedições ecológicas com Franz Krajcberg e Pierre Restany pelos
rios Amazonas, Tapajós, Solimões, Jutaí e Negro. Dessa experiência resulta o Manifesto do Rio Negro -
Naturalismo Integral, firmado pelo trio, com texto do crítico francês Pierre Restany.
http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://img.mercadolivre.com.br/jm/img%3Fs%3DMLB%26f%3
D87228303_1216.jpg%26v%3DE&imgrefurl=http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-87228303-sepp-
baendereck-paisagem-magnifica-gravura-serigrafia-pa-_JM&usg=__k2XhyORU8t2-
tee8A5vRIT6riwA=&h=280&w=280&sz=11&hl=pt-
BR&start=1&um=1&tbnid=Axg7j2oCe1woyM:&tbnh=114&tbnw=114&prev=/images%3Fq%3Dsepp%2Bb
aendereck%26hl%3Dpt-BR%26lr%3Dlang_pt%26sa%3DN%26um%3D1
87
do ser humano, seja destituída da busca pelo poder, em qualquer âmbito que isso
possa ser encontrado (social, político, religioso), para encontrar uma nova
sensibilidade aguçada, livre de julgamentos e diretamente ligada à limpeza e
prontidão da percepção.”
85
Restany, Krajcberg, Baendereck e os pensadores, aqui elencados, comungam a
preocupação com o futuro. E na mesma direção acreditam que é necessário agir
para melhorar o amanhã. Ao final do manifesto defendido por eles, Restany
escreve:
O naturalismo integral é uma resposta. E justamente por sua virtude de integracionista, de
generalização e extremismo da estrutura da percepção, ou seja, da planetarização da
consciência, hoje ela se apresenta como uma opção aberta - um fio diretor dentro do caos
da arte atual. Autocrítica, desmaterialização, tentação idealista, percursos subterrâneos
simbolistas e ocultistas: essa aparente confusão se organizará talvez um dia, a partir da
noção do naturalismo - expressão da consciência planetária.
Esta reestruturação perceptiva refere-se á uma real mudança e a desmaterialização do
objeto de arte, sua interpretação idealista, a volta ao sentido oculto das coisas e sua
simbologia constituem um conjunto de fenômenos que se inscrevem como um preâmbulo
operacional à nossa Segunda Renascença - etapa necessária para uma mutação
antropológica final.
Hoje, vivemos dois sentidos da natureza: aquele ancestral, do "concedido" planetário, e
aquele moderno, do "adquirido" industrial e urbano. Pode-se optar por um ou outro, negar
um em proveito do outro; o importante é que esses dois sentidos da natureza sejam vividos
e assumidos na integridade de sua estrutura antológica, dentro da perspectiva de uma
universalização da consciência perceptiva - o Eu abraçando o mundo, fazendo dele um uno,
dentro de um acordo e uma harmonia da emoção assumida como a única realidade da
linguagem humana.
O naturalismo como disciplina de pensamento e da consciência perceptiva é um programa
ambicioso e exigente que ultrapassa de longe as balbuciantes perspectivas ecológicas de
hoje. Trata-se de lutar muito mais contra a poluição subjetiva do que contra a poluição
objetiva - a poluição dos sentidos e do cérebro contra a queda do ar e da água.
Um contexto tão excepcional como o do Amazonas suscita a idéia de um retorno à
natureza original. A natureza original deve ser exaltada como uma higiene da percepção e
um oxigênio mental: um naturalismo integral, gigantesco catalisador e acelerador das
nossas faculdades de sentir, pensar e agir.
Na Oca em 2008 foi apresentada ao público a exposição: Frans Krajcberg: Natura
16 de outubro a 14 de dezembro - na qual a ação dos artistas e de Restany foi
mostrada por fotos, filmes e esculturas. A emoção que a exposição provocava na
85
http://www.mam.org.br/2008/portugues/exposicaoDetalhes.aspx?id=73
88
platéia não pode ser descrita por palavras. O cheiro das queimadas dava pra ser
sentido. Eu nunca fiquei tão emocionada em uma exposição como nessa,
realmente indescritível. Krajcberg consegue mostrar o grito da natureza e nos leva
a gritar por ela.
A exposição de Krajcberg é a concretização das idéias defendidas pelos
pensadores aqui tratados. No convite do MAM as palavras abaixo vão ao encontro
da tese.
O homem deve abrir sua sensibilidade para o papel soberano da natureza como estrutura
que abrange a tudo, inclusive ao domínio humano, a partir do que se torna livre para
interagir tanto com o meio ambiente quanto com as demais pessoas de forma direta e
afetiva. A estrutura social e as preocupações cotidianas com questões materiais e
“científicas”, ou seja, o realismo (como é conceituado no Manifesto) deixam de ser
necessárias para que as pessoas possam experimentar uma nova consciência ambiental,
que não é somente uma preocupação com a produção de poluentes e a auto-
sustentabilidade, mas sim uma nova maneira de interagir com o mundo e com o outro.
http://feaznar.multiply.com/calendar/item/10572
Na exposição da Oca no Ibirapuera Frans Krajcberg deu uma entrevista à Sílvia
Czapski
86
. Falou de suas inquietações em relação ao planeta e disse que as
preocupações estéticas estão ausentes de sua obra e do âmbito de sua reflexão, e
que seu trabalho artístico como manifestação do horror da humanidade ante a
destruição da natureza.
Quando perguntado por Czapski: O que seria o ideal, que o senhor sonha para
suas obras? Respondeu: “Não faço nada se não for ecológico, não faço nada se
não se discutir sobre a saúde do planeta".
Czapski: A educação ambiental está em moda. Como acha que se deve trabalhar
para alertar as pessoas, especialmente as crianças?
86
Sílvia Czapski é jornalista e entrevistou Krajcberg para a Revista 18. A reportagem completa pode ser
consultada em: http://revista18.uol.com.br/visualizar.asp?id=1639
Krajcberg recebeu a reportagem da Revista 18 na Oca, e caminhou entre suas esculturas e fotografias com a
jornalista Sílvia Czapski e a artista plástica Sara Rosenberg, enquanto contava suas memórias e falava, em
frases curtas, muitas vezes truncadas, mas sempre muito emocionado, sobre sua visão de mundo e suas
idéias.
89
Krajcberg: Eu estou vendo a juventude muito sensibilizada. Minha exposição
sempre está cheia. Isso é muito positivo. Precisamos dar mais consciência.
Czapski: O que o senhor mostraria de sua obra a uma criança que vem da escola?
Krajcberg: Não é mostrar a obra, mas a natureza, que é riquíssima. A criança
costuma ver e respeitar. Isso se chama educar. Não tem no mundo outro país
com tanta riqueza como nas florestas da Amazônia. Precisa destruir? Expulsar os
habitantes? Não. O país poderia facilitar para que brasileiros conheçam o Brasil.
São muito raros os que conhecem. Os políticos, nem a região deles, eles
conhecem. E fazem as leis mais absurdas do mundo. E nós somos passivos. O
mundo, o planeta precisa da Amazônia. Precisamos de oxigênio.
Essa pequena parte da reportagem com Krajcberg mostra a grandiosidade desse
artista. Krajcberg é exemplo de amor incondicional à natureza e é motivo de
orgulho para todos nós humanos. Os brasileiros, principalmente, deveriam
agradecer o privilégio em ter o grande artista polonês como filho do Brasil. A
nossa pátria está sendo defendida por ele que não é um simples filho por
nascimento, mas um filho muito mais importante, por escolha de amor. O
privilégio em tê-lo como arauto na defesa de nossa pátria nos obriga a agir na
divulgação e amplificação de atitudes estéticas tão maravilhosas. Nós temos a
obrigação moral de ajudar e continuar seu trabalho. O amor é
contagiante, assim como, as ações estéticas.
Na mesma direção da exposição de Krajcberg, o mesmo espaço expositivo Oca,
apresentou a exposição Intempéries Fim do Tempo 87. Na qual os artistas
contemporâneos mostram, também, suas reflexões em favor do futuro. O
87
A exposição reúne obras de 29 artistas, de 16 nacionalidades distintas, apresentadas em vídeos e
fotografias. Com coordenação de Marcello Dantas, curadoria internacional de Alfons Hug e nacional de
Alberto Saraiva, a exposição está estruturada a partir de 4 elementos - fogo, água, ar e terra - que dividem os
7 mil metros quadrados nas 4 plantas da OCA. De 07/03 até 12/04.
http://minhanoticia.ig.com.br/editoria/Cultura_Diversao/2009/03/08/aberta+a+exposicao+intemperies++o+fi
m+do+tempo+4588904.html
90
coordenador Marcello Dantas ao dar uma entrevista, a Bianca Ramoneda, do
programa Starte na Globo News, explica que o planeta não vai desaparecer por
causa das loucuras humanas, pois sempre existiu, a raça humana é que corre o
risco de perecer.
A temática do evento pretende mostrar a arte que expressa o distanciamento dos
homens diante das transformações climáticas que assolam o mundo. Artistas dos cinco
continentes expressam o estranhamento do homem diante das transformações climáticas
Fogo, água, ar e terra. Os quatro elementos da natureza dividem os 1.700 metros
quadrados da OCA e são o leitmotiv para esta exposição sobre o tempo, as mudanças
climáticas e a interdependência entre natureza e atividade humana. Reunindo obras de
28 artistas de 16 nacionalidades, apresentadas em grandes projeções de vídeos e
fotografias, a mostra procura, mais do que uma abordagem científica, dar um tratamento
artístico ao tempo e à paisagem.
Como categoria estável e atemporal, o tempo perdeu sua poesia e estética ao se
transformar em clima, uma entidade anônima e amedrontadora que a qualquer momento
é capaz de deflagrar uma catástrofe. As mudanças climáticas causadas pelo homem ou
pela natureza sempre vêm acompanhadas de mudanças culturais e de atitude. O corpo e
os sentidos são expostos a novas experiências. As mudanças climáticas fizeram do tempo
intempérie.
Do Equador até o lo Sul, os artistas da mostra encontraram intempéries. O nigeriano
George Osodi pesquisou as condições apocalípticas na produção de petróleo no delta da
Nigéria. Os alemães Michael Sailstorfer e Jürgen Heinert incendiaram uma cabana a
que sobrasse apenas a estufa incandescente. O holandês Guido van der Werve mostra
como um navio quebra-gelo persegue um andarilho solitário no congelado Golfo da
Finlândia, enquanto o brasileiro Thiago Rocha Pitta é testemunha de um naufrágio.
Assim, a arte que expressa o estranhamento do homem diante das transformações
climáticas que assolam o mundo, pode contribuir para a preservação do tempo e da
paisagem.
Com curadoria internacional de Alfons Hug, diretor do Goethe-Institut Rio de Janeiro, e
curadoria nacional de Alberto Saraiva, a exposição é realizada pelo Goethe-Institut, Oi
Futuro (Rio de Janeiro) e a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente de São
Paulo e é organizada em colaboração com a Bienal do Fim do Mundo, que acontecerá
nos meses de abril e maio de 2009 em Ushuaia e em El Calafate
(Argentina) e na
Antártida.
91
Abaixo algumas imagens da exposição:
92
Mais uma instalação importante e emocionante da Exposição Intempéries foi a
Escultura de gelo de Marcello Dantas
88
. A idéia era de ver em quanto tempo a
escultura iria desaparecer. O derretimento de escultura de gelo levou uma
multidão de receptores à Oca.
Mais de 2.800 pessoas compareceram ao prédio da Oca, no Parque do Ibirapuera, neste
domingo (8), para ver o derretimento de uma escultura. Feita com 8,7 toneladas de gelo,
a obra Degelo, do artista multimídia Marcello Dantas, foi o centro das atenções dos
visitantes. Montada na sexta-feira à noite, como parte da mostra Intempéries - O Fim do
Tempo, a torre de 9 metros de altura durou apenas 56 horas.
Mais imagens da exposição Intempéries podem ser vistas no site do Instituto
Göethe.
89
88
Marcello Dantas é conhecido por ter criado a ambientação do Museu da Língua Portuguesa e da mostra
Bossa na Oca, queria fazer o público entender os efeitos do aquecimento global. "Como a mostra discute as
mudanças climáticas, achei que seria uma boa idéia mostrar o impacto da elevação de temperatura", afirma.
O derretimento da escultura lavou o piso da Oca com mais de 8.000 litros de água. "Em nenhum outro museu
eu poderia contar com um sistema de escoamento tão bom", diz Dantas, que conhece cada milímetro do
espaço devido à curadoria da exposição sobre Bossa Nova.
A partir desta quarta-feira (11), no lugar da escultura derretida, Dantas deve instalar um televisor e um
aparelho de DVD, que vão ficar exibindo um filme sobre o derretimento. Assim, quem for à exposição
Intempéries - O Fim do Tempo, que vai até 12 de abril, poderá ter uma idéia do que perdeu...
http://vejasaopaulo.abril.com.br/red/blogs/redacao/2009/03/derretimento-de-escultura-de-gelo-leva.html
89
Imagens da exposição podem ser vistas no site:
http://megmamede.blogspot.com/2009/03/intemperies-o-fim-do-tempo.html
93
Na mesma direção de Marcello Dantas a Secretaria da Cultura montou uma
instalação no Parque do Trianon, a fim de conscientizar a população para agirem
contra o aquecimento global.
A Instalação
90
, com barras de gelo, chama a atenção de quem passa pela Av.
Paulista:
Iniciativa tenta conscientizar população para o aquecimento global.
Biblioteca temática do meio ambiente será inaugurada neste sábado (30).
Instalação de gelo idealizada pela Secretaria da Cultura para a conscientização da população sobre
o aquecimento global, no Parque do Trianon, promove a inauguração da biblioteca temática do
Meio Ambiente Raul Bopp, neste sábado (30) no Parque da Aclimação (Foto: Denis Freire de
Almeida/G1)
90
- 29/05/09 - 10h15 - Atualizado em 29/05/09 - 10h22 O Globo on line
94
Escultura feita com barras de gelo chama a atenção dos pedestres na Av. Paulista, em frente ao Museu de
Arte de São Paulo (MASP), na manhã desta sexta-feira (29), e divulga a inauguração da biblioteca temática
do meio ambiente no Parque da Aclimação (Foto: Denis Freire de Almeida/G1)
A ação, com amor para melhorar o mundo, feita por artistas e pessoas sensíveis
nos permite mostrar outros exemplos de arte engajada com a vida. O artista
Frances Jean Paul Ganem transformou um lixão em jardim - LandScape Art,
vertente que cria novas paisagens utilizando a jardinagem. Além desses exemplos,
queremos frisar que os animais, ditos irracionais, também praticam ações repletas
de amor – ver anexo.
O
s
exemplos a seguir podem ser classificado
s
na “contramão” deste trabalho
,
embora, possamos fazer algumas considerações sobre. O artista multimídia, Cildo
Meireles, em 1970, ao participar da ‘Semana da Inconfidência’ em Belo Horizonte,
apresentou a seguinte obra: “Tiradentes: totem-monumento ao preso político”, na
qual dez galinhas amarradas a uma estaca foram queimadas vivas. A reação do
público foi de indignação e Cildo argumentou que a dor maior era o que ocorria na
sociedade e que ninguém fazia nada. O ato de Cildo contra a repressão militar
representou a indignação de todos nós que passamos por uma ditadura. No
entanto, acreditamos que a forma escolhida foi totalmente equivocada. Existem
maneiras e maneiras de se mostrar uma revolta. Cildo, em uma entrevista
recente, confessou que não se perdoa por ter feito essa crueldade com as
galinhas e que até hoje escuta os seus gritos. O artista pediu perdão ao público e,
principalmente, as galinhas.
A pesquisadora Maria Amélia Bulhões explica a obra de Cildo: Um de seus
primeiros e mais polêmicos trabalhos foi “Tiradentes: Totem Homenagem ao
Preso Político”. Ele instalou em uma praça blica, em Belo Horizonte, um poste
de madeira onde amarrou 10 galinhas vivas e ao qual ateou fogo. A morte dos
animais, seus ruídos desesperados e o fogo ardendo eram imagens de uma
violência total para dizer ao público estarrecido da violência de sua sociedade. A
dor pela morte dos animais colocava-os frente a uma dor maior, pelas mortes
95
terríveis a que foram submetidos muitos homens em diferentes momentos da
história brasileira. Se muitas pessoas reagiam encolerizadas contra a morte dos
animais, com duras críticas ao seu trabalho, porque então se submetiam calados
às agressões que estavam sendo cometidas, quotidianamente, contra inúmeros
setores da população? De certa forma, Cildo colocava o espectador frente a frente
com a denegação permanente da violência que a sociedade brasileira realiza, no
ocultamento de seu passado.
A mesma atitude equivocada de Ciro foi repetida por um artista da Costa-Rica.
Guillermo Habacuc Vargas
9192
, 2007, pegou um cachorro na rua levou-o para uma
galeria de arte, deixou-o amarrado e sem comida até sua morte. Intitulou seu
“trabalho” de "instalação perecível".
Defendemos a liberdade total do artista, mas dentro de certos limites humanos.
Ao tomarmos conhecimento do trabalho de Vargas, levamos o tema à sala de
aula. O nosso argumento em defesa do artista, em face à repercussão negativa de
seus trabalhos, foi que vemos diariamente situações semelhantes de miséria e de
abandono de muitas pessoas que vagueiam pelas ruas e não nos manifestamos.
Acreditamos que a atitude desumana de Vargas tenha tido como finalidade
acordar-nos para as injustiças e para darmos o real valor à função da vida. Se foi
essa a intenção, o artista é vitorioso, pois conseguiu levar o público à reflexão. O
estranhamento na arte defendido por muitos teóricos, para quebrar o
automatismo da recepção, ficou explícito no trabalho de Vargas. No entanto, a
forma utilizada por ele é cruel. Hoje temos ao nosso dispor várias tecnologias que
permitem simular situações para tocar o público. Acreditamos que uma
instalação perceptiva, um vídeo e outros recursos que simulassem a inanição e o
sofrimento do cão conseguissem de forma virtual algum impacto sem precisar
realmente torturar o pobre animal
93
. Não concordamos com o sofrimento de
91
Anexo, carta de Ferreira Gullar que reflete sobre essa “obra”.
92
No site: http://www.diegomiguelartes.blogspot.com/ há uma comparação entre essa obra com as ações
estéticas de pessoas que lutam pelos animais.
93
1 - http://www.casthalia.com.br/periscope/mariaameliabulhoes/identidadeumamemoriaaserenfrentada.htm
96
qualquer ser vivo para se conseguir afetar outros. Para nós os fins não justificam
os meios e o artista tem a obrigação de impedir o sofrimento e, não se utilizar
dele.
Cildo e Vargas agiram na corrente de Duchamp e de alguns teóricos, mas de
forma, para nós, irresponsável e desumana. Abaixo a imagem do pobre cachorro
que transformou com seu sofrimento, um artista desconhecido em astro. Não
temos imagens do sacrifício das galinhas de Cildo.
Da mesma forma que os artistas nos ajudam a perceber e a desenvolver o
sentimento, a sétima arte torna essa tarefa mais simples, pois tem a capacidade
de iluminar nossas visões. O cinema joga com as possibilidades da concretização
do sonho e da realidade.
2 - Cildo Meireles. Nasceu no Rio de Janeiro em 1948 é artista Multimídia de reconhecimento internacional.
Inicia seus estudos em arte em 1963, na Fundação Cultural do Distrito Federal, em Brasília, orientado pelo
ceramista e pintor peruano Barrenechea (1921). Começa a realizar desenhos inspirados em máscaras e
esculturas africanas. Em 1967, transfere-se para o Rio de Janeiro, onde estuda por dois meses na Escola
Nacional de Belas Artes - ENBA. Nesse período, cria a série Espaços Virtuais: Cantos, com 44 projetos, em
que explora questões de espaço, desenvolvidas ainda nos trabalhos Volumes Virtuais e Ocupações (ambos de
1968-69). É um dos fundadores da Unidade Experimental do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro -
MAM/RJ, em 1969, na qual leciona até 1970. O caráter político de suas obras revela-se em trabalhos como
Tiradentes - Totem-monumento ao Preso Político (1970), Inserções em Circuitos Ideológicos: Projeto Coca-
cola (1970) e Quem Matou Herzog? (1970). No ano seguinte, viaja para Nova York, onde trabalha no projeto
Eureka/Blindhotland, no LP Sal sem Carne (gravado em 1975) e na série Inserções em Circuitos
Antropológicos. Após seu retorno ao Brasil, em 1973, passa a criar cenários e figurinos para teatro e cinema
e, em 1975, torna-se um dos diretores da revista de arte Malasartes. Desenvolve ries de trabalhos
inspirados em papel moeda, como Zero Cruzeiro e Zero Centavo (ambos de 1974-1978) ou Zero Dollar
(1978-1994). Em algumas obras, explora questões acerca de unidades de medida do espaço ou do tempo,
como em Pão de Metros (1983) ou Fontes (1992). www.itaucultural.org.br/.../index.cfm?...
97
5. Capítulo III
Criatividade e Sentidos da Vida
Cinema – Sala de Aula – Ações Estéticas.
Uma Proposta Para a Missão do Artista
Estamos aqui reunidos
para lutar pela nossa terra
nosso espaço
A nossa luta não é com armas
nem com palavras de ordem
A nossa luta é com amor
As nossas palavras
não se perderão ao vento
ecoarão em reflexões e ações
As palavras sem ação podem ser
bonitas, mas são incompletas
Precisamos agir!!!
Se os outros não entenderem nossos
trabalhos
Não importa!!!
O importante é agirmos!!!
Somos como as gotas d’água que buscam
o oceano para não morrer.
Se o nosso trabalho não for reconhecido
Não importa!!!
Continuaremos mesmo assim a lutar
por ele.
O artista tem o dom de sofrer pelo amor
a arte que é o amor a vida
De lutar por seu espaço com amor
De dedicar sua vida ao amor
O artista tem como meta
deixar o mundo com mais amor
Se ele não conseguir
Não importa!!!
O importante é viver mergulhado
nos seus sonhos e transbordar de amor sua vida
para melhorar a humanidade!!!
98
“Há dois modos de bloquear o caminho do conhecimento: presumir a impossibilidade de se
conhecer a verdade ou assumir que a verdade já é conhecida”.
C. S. Peirce
“Concluo por achar sagrada a desordem de meu espírito.”
Rimbaud
Monte Castelo
Legião Urbana – Composição: Renato Russo (recortes do Apóstolo Paulo e de Camões).
Ainda que eu falasse a língua dos homens
E falasse a língua dos anjos,
Sem amor eu nada seria.
É só o amor, é só o amor
Que conhece o que é verdade
O amor é bom, não quer o mal
Não sente inveja ou se envaidece.
Amor é fogo que arde sem se ver
É ferida que dói e não se sente
É um contentamento descontente
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer
É solitário andar por entre a gente
É um não contentar-se de contente
É cuidar que se ganha em se perder.
É um estar-se preso por vontade
É servir a quem vence, o vencedor;
É um ter com quem nos mata a lealdade.
Tão contrário a si é o mesmo amor.
Estou acordado e todos dormem todos dormem todos dormem
Agora vejo em parte
Mas então veremos face a face.
É só o amor, é só o amor
Que conhece o que é verdade.
http://www.youtube.com/watch?v=AkqLU7aMU7M
Outra música de Renato Russo - “Como Nossos Pais”:
É preciso amar as pessoas
Como se não houvesse amanhã
Por que se você parar
Prá pensar
Na verdade não há...
http://letras.terra.com.br/legiao-urbana/22488/
99
Esse capítulo aborda a sensibilidade da vida, enfatiza o poder transformador da
visão transdisciplinar na educação e do cinema ao propalar ações e sentimentos. A
finalidade maior é mostrar que é possível conscientizar os indivíduos a exercerem
atitudes éticas para com o próximo e que essas atitudes contém no seu bojo a
estética, por estarem repletas de beleza. Além do cinema, divulgamos a
pertinência de trabalhar o tema na sala de aula e angariar, assim, adeptos na luta
por um futuro mais consistente. Ao nos mobilizarmos em busca de um mundo
melhor precisamos ter em mente a reunião da razão/emoção e da ação/reflexão.
Ressaltamos que não temos respostas e nem soluções predeterminadas. Nosso
percurso é permeado pela utopia
94
, pois não queremos um caminho pré-resolvido
ou definido
a priori
. Investimos em um caminho dinâmico que se recrie a cada
passo dado. Não queremos que a nossa utopia, se é possível dizer nossa, se
transforme em função utópica, pois na história temos muitos exemplos de
aplicações “utópicas” de forma tirânica. Não queremos ver engessada a utopia
inicial, nem que ela adquire força de imposição. Investimos em um ideal
inatingível em virtude de sua liberdade.
Na direção desse ideal escolhemos um percurso no qual convergem as artes, as
ações, a educação e o cinema. Ao colocarmos nossos filhos e alunos frente a
situações de amor à vida conseguimos inseri-los no caminho da defesa da própria
vida. Devemos propor estranhamentos de atitudes e não acomodações. Viver é
agir, é batalhar, é lutar para mudar as atitudes conformadas. Não se pode aceitar
um comportamento passivo e alienado. Acreditamos na posição privilegiada da
sensibilidade para promover mudanças, como os exemplos dos pensadores e
94
Utopia Thomas More (Morus) deu esse nome a uma espécie de romance filosófico, no qual relatava as
condições de vida numa ilha desconhecida denominada Utopia, nela teriam sido abolidas as propriedades
privadas e as intolerâncias religiosas. Depois disso, esse termo passou a designar não qualquer tentativa
análoga, mas também qualquer ideal político, social ou religioso de realização difícil ou impossível. (...)
Representa a correção ou integração ideal de uma situação política, social ou religiosa existente. Como
muitas vezes aconteceu, essa correção pode ficar no estágio de simples aspiração ou sonho genérico. (...) Mas
também pode tornar-se força de transformação da realidade, assumindo corpo e consistências suficientes para
transforma-se em autêntica vontade inovadora e encontrar os meios da inovação. (Abbagnano. 2000:987)
100
artistas aqui mostrados. Asseveramos, novamente, que não estamos diminuindo a
força da razão, mas procurando criar um diálogo permanente entre sentimento e
razão. Utilizamos a conjunção
e
que é aditiva e aceita possibilidades e não a
ou
que é uma alternativa limitada de escolhas.
5. 1. Explicação de Alguns Tópicos:
5.1.2. A Criatividade Por Meio da Educação Estética do Homem
A nossa abordagem do desenvolvimento da sensibilidade pela educação encontra
vários defensores. Não poderíamos deixar de escrever algumas palavras sobre o
filósofo Friedrich Von Schiller
95
, que em 1795 propôs a necessidade da educação
estética do homem.
A base da filosofia de Schiller é a estética como um caminho convergente entre os
sentidos e a razão. A visão cosmológica do homem em Schiller tem origem na
Grécia, no mundo helênico.
Schiller aposta na arte como base da educação do
homem, uma vez que o próprio homem é uma obra de arte. Ser estético é
conseguir a junção do individual e do coletivo:
É realizar em si e no coletivo a própria natureza do homem que é o apetite pela liberdade,
onde reside a justeza e o divino do caráter humano. (...) A liberdade é um ideal a ser
conquistado pela razão e fruído. (...) A liberdade é anterior ao homem e está impressa no
mundo como força promotora do aperfeiçoamento da máquina do universo que tem em
seus desígnios o acaso. (...) Na possibilidade de sua humanidade plena, o homem está por
princípio determinado pelo desequilíbrio natural entre esses impulsos
96
e, embora sendo o
domínio da razão a sua maior conquista, está ainda sujeito à prevalência do sensível
porque a condição humana é a da contradição.
(Silva.2005:156 )
Para o entendimento de Schiller o homem deve ser lido como uma obra de arte porque é
nesta que está manifesta a totalidade de todo o saber livre, fazendo vibrar no contingente
logicamente produzido, a universalidade da transcendência. (...) A qualidade estética no
homem é aquele bem novo que lhe permite a auto-determinação, porque lhe restitui a
95
Friedrich Von Schiller 1759 1805 Alemanha. Poeta, dramaturgo, filósofo e historiador, foi um dos
grandes homens de letras da Alemanha do século XVIII. Uma de suas mais famosas poesias Ode à Alegria,
inspirou Ludwig van Beethoven a escrever, em 1823, o quarto movimento de sua nona sinfonia.
96
São potencias coexistentes na mente (impulso sensível e impulso formal) e separadas pelo próprio ato
humano de se estar inteligentemente no mundo. É pulsão natural no sujeito e somente nele existe. São as duas
possibilidades para abarcar p fenômeno, a sensibilidade e a forma racional. A eles Schiller agrega uma
terceira instância; o impulso lúdico, com intermediação estética. (Silva.2005:162)
101
liberdade de fazer de si instrumento em evolução constante. (...) O homem físico deve
tender ao moral, passando pelo estético. (2005:154-155)
O caminho estético como a junção do racional e do sensível é o gerenciador do
equilíbrio. As ações racionais e sensíveis devem configurar o homem livre, por
isso a necessidade da arte a da poesia fazerem parte do cotidiano dos homens.
Os indivíduos, que tem o hábito de trabalhar a sensibilidade, desenvolvem a
capacidade de contagiar suas ações com sentimentos.
Se a arte está contaminando toda a ação humana, ela pode ser um princípio ético a todo
procedimento, agregando no mundo da diversidade e de fragmentos, um princípio e um
fim de beleza totalizadora. Nada mais adequado a todas as épocas, pois todas as épocas e
todos os povos, ainda que na dureza da vida primitiva, desenvolveram sistemas de
representações artísticas. (Silva.2005:160)
Na mesma direção de Schiller, os pensadores que pregam o pensamento
complexo sabem da importância da estética, no seu sentido amplo, em construir o
amanhã. Acreditamos que suas colocações enfatizem a educação estética do
homem.
Na prática é possível observar várias ações que mostram a pertinência da
educação sensível. Os bons exemplos têm a capacidade de instigar o próximo a
agir de forma semelhante. É importante lembrar que a educação estética do
homem, defendida por Schiller, pode vir a ser um ato freqüente de conduta. Além
dos artistas citados no capítulo dois, o cinema tem investido em filmes que propõe
atos éticos e estéticos como defendido nesta tese. Citamos a força da poesia de
Schiller “Ode a Alegria”
97
que em 1823 foi musicada e é conhecida como a
Sinfonia de Ludwig van Beethoven.
Na direção de uma educação sensível, encontramos o filósofo e escritor espanhol
José Antonio Marina
98
que, não troca as aulas nos colégios pela universidade.
Argumenta que estamos perdendo a capacidade de amar e defende a inserção do
97
O poema e letra da 9ª. Sinfonia encontra-se no anexo.
98
José Antonio Marina, espanhol, catedrático, filósofo e ensaísta, elaborou uma teoria da inteligência que
começa na neurologia e acaba na ética. É autor de numerosos livros nos quais estuda os sentimentos, a
linguagem, e as criações humanas.
102
afeto no campo da sexualidade. Marina explica que a revolução sexual dos anos 60
teve um lado positivo e um negativo. O positivo foi o de terminar com a repressão
sexual e o negativo foi de ter excluído da liberdade sexual a afetividade. Afirma:
Durante muitos séculos, em todo o âmbito da cultura ocidental, houve uma sobrecarga de
moralidade na sexualidade. E a primeira revolução sexual tentou eliminar todos os
significados repressivos e excessivamente moralizantes que tinham sido relacionados com
o sexo. Mas, ao tentar purificar ou tornar as relações sexuais mais naturais, acabou
excluindo a afetividade, que era uma parte muito positiva da sexualidade
99
.
Marina na direção dos filósofos apresentados fala em criatividade e se preocupa em
transmitir a seus alunos que são crianças e adolescentes conceitos éticos. Adverte
que:
Normas morais são mecanismos para permitir a dignidade da convivência, e servem não
para evitar choques ou para resolver conflitos, mas também para ampliar as possibilidades
de felicidade de toda a sociedade. Há escravidão onde não há moral
100
.
Se filósofos, pensadores, poetas e artistas defendem a estética como um
complemento fundamental do homem. Por que as escolas não investem
maciçamente na educação sensível de seus alunos?
5. 1. 3. Transdisciplinaridade Complexidade e Classificação das
Ciências – Arquitetura Filosófica de Peirce
Entendemos que é premente a religação dos saberes e que a visão da totalidade
da vida implica em diversidade, e essa por sua vez nos leva à complexidade. A
transdisciplinaridade integra o homem na sua totalidade como ser humano, como
parte da natureza e como ser racional e cultural. A preocupação em investir na
compreensão da trama da vida não é uma inquietação dos filósofos e cientistas da
atualidade, vem da antiguidade com Xenófanes
101
. O poeta e filósofo pré-socrático
99
Reportagem “Estamos perdendo a capacidade de amar” do Jornal O Globo de 19 de julho de 2008 pag. 4
do caderno Ela.
100
Ibdem Reportagem “Estamos perdendo a capacidade de amar” do Jornal O Globo de 19 de julho de 2008
pag. 4 do caderno Ela.
101
Xenófanes (cerca de 570 a.C. - 460 a.C.) filósofo grego pré-socrático.
103
foi considerado por Karl Popper como o fundador da tradição científica e em 500
a.c, escreveu:
Os deuses não nos revelam tudo desde o início,
Mas no curso do tempo, buscando,
Podemos aprender algo
E conhecer um pouco melhor de tudo.
Quanto à verdade, nenhum homem a conhece
E, mesmo se por acaso pudesse anunciá-la,
Ele próprio não poderia ter certeza
Pois tudo é apenas
Uma teia de suposições entrelaçadas.
102
Ou trama de adivinhações
Entender a vida como uma “teia de suposições entrelaçadas” é o foco da
transdisciplinaridade e dos pensadores escolhidos por nós. Reiteramos que quando
investimos na sensibilidade procuramos a unidade e, em momento algum,
abandonamos a racionalidade. Nossa preocupação é com o todo e espautada
na complementabilidade entre o homo
sapiens sapiens e o demens
, que segundo
Morin é 100% um e 100% outro.
Com os mesmos propósitos dos teóricos da complexidade, voltamos no tempo e
encontramos Peirce que, já no século XIX, questionava:
102
A afirmação acima de Xenófanes representa seu entendimento sobre o pensamento dos homens.
“Xenófanes entendeu de modo profundo que as opinões humanas das coisas são criações humanas, incluindo
o que consideramos ser nosso conhecimento. Aprendendo cada vez mais e mudando nossas idéias à luz do
que aprendemos, podemos nos aproximar cada vez mais da verdade, mas nossas idéias permanecem sempre
nossas, e sempre um elemento de conjectura envolvido. Xenófanes era mordaz, sarcástico até, a respeito
dos deuses:
‘Os etíopes dizem que seus deuses m nariz chato e são negros, enquanto os trácios, dizem que os seus têm
olhos azuis e cabelo ruivo. Ora, se os bois, os cavalos ou os leões tivessem mãos e pudessem desenhar, e
pudessem esculpir como os homens, então os cavalos desenhariam seus deuses como cavalos, e os bois como
bois, e cada um moldaria corpos de deuses à semelhança, cada genero, do seu próprio.’
Essa tradução de Xenófanes e a colocada acima foram feitas por Karl Popper, filósofo do século XX. A idéia
de que todo o nosso, assim chamado, conhecimento científico é na verdade conjectura, em príncipio sempre
substituível por algo que pode estar mais perto da verdade, é central na filosofia de Popper. Ele considerava
Xenófanes a primeira pessoa a ter expressado essa noção. (Magee.1999:16-17)
Xenófanes ensinara que, embora possamos sempre aprender mais do que sabemos, nunca podemos ter
certeza de haver alcançado qualquer verdade final. (Magee.1999:42)
Xenófanes dizia que o ser absoluto, essência de todas as coisas, era o Um. E de acordo com Teofrasto, uma
das fórmulas contidas nos ensinamentos de Xenófanes era: “Tudo é o Um e o Um é Deus”. O conceito Deus,
criado por Xenófanes, como sendo um ser mais alto: com uma identidade abstrata, não possuindo nenhum
atributo conhecido pelos homens, e tão pouco sendo semelhante a estes - nem quanto à figura, nem quanto ao
espírito. http://pt.wikipedia.org/wiki/Xen%C3%B3fanes
104
Por que o homem, um ser no qual o impulso natural está primeiro na sensação,
depois na razão, depois na imaginação, então no desejo, então na ação, teve de
parar na razão, como ele tem feito há 2.500 anos? Isso é inatural e não pode durar.
O homem deve continuar para usar todos esses poderes e energias que lhe foram
dadas, a fim de que ele possa imprimir a natureza com seu próprio intelecto,
conversar com a natureza e não meramente ouvi-la. (apud Vieira. 2008:102)
Ao procurar respostas ao seu questionamento, Peirce investe no estudo e no
mapeamento das ciências. E inicia-o ao criar uma definição sobre ciência:
(...) nossa noção de ciência é uma noção de ciência como coisa viva e não mera
definição abstrata. Não nos esqueçamos de que a ciência é uma busca realizada
por homens vivos e sua característica mais marcante é que quando ela é genuína
está permanentemente em um estado de metabolismo e crescimento. (...) A
maior parte das classificações das ciências têm sido classificações de
conhecimentos estabelecidos e sistematizados o que não é senão a exsudação
da ciência viva. (...) Encarar a ciência de tal ponto de vista classificatório é
promover o caos no seio da ciência moderna. (...) Observemos a ciência a
ciência de hoje – como coisa viva. (Peirce.1983:139 -140)
Peirce parte da idéia de ciência viva em direção a existência de uma lógica
inerente a todas as ciências. Ao encontrar a lógica pesquisada cria uma estrutura
em que as ciências dialogam, em virtude da inter-relação existente. A semiótica
estudo dos signos entende que todo pensamento é feito por meio de signos. E
se o pensamento é guiado por signos, o fundamento do signo, não será outra
coisa que outro signo. Esse dinamismo cria uma cadeia sígnica evolutiva, na qual
os signos crescem e se multiplicam constantemente.
O passo de Peirce vem ao encontro dos teóricos da complexidade que lutam pela
religação dos saberes. A classificação das ciências de Peirce teve como base as
necessidades de sua época, mas, por possuir uma estrutura aberta permite
desdobramentos e atualizações como fruto de uma ciência viva dinâmica e em
processo. Pode-se fazer um paralelo entre o pensamento de Peirce e a defesa da
transdisciplinaridade dos filósofos atuais que investem no homem total livre da
fragmentação.
Jorge Albuquerque Vieira chama atenção para esse fato:
Junto com a busca dos novos paradigmas, vem sendo conclamada com muita ênfase a
urgência da inter, multi e transdisciplinaridade. Não são poucos os cientistas que tem
105
atualmente chamado atenção para a necessidade da inter e transdisciplinaridade, pois sem
elas, a ciência está destinada a estagnar. (...) Como enfrentar a impossibilidade do diálogo
entre as disciplinas cientificas provocado pela babel da fragmentação do saber? (...) o
escritor Walker Percy propôs enfaticamente que a monumental obra C. S. Peirce pode
funcionar como antídoto contra as separações entre as ciências, pois nessa obra são
encontradas as vias mais sofisticadas e complexas para se pensar e realizar uma inter-
multi-transdisciplinaridade que vai muito além das meras cartas de intenções a que essa
questão costuma ficar restrita. Na mesma linha da proposta de Percy, pode-se acrescentar
que a cartografia transdisciplinar de Peirce está suportada por uma filosofia da ciência,
esta sintonizada com uma filosofia da natureza, ambas capazes de dar conta dos desafios
apresentados pelo avanço tecnocientífico contemporâneo. (...) Newton da Costa afirmou
que “uma das coisas a se fazer para entendermos bem o espírito que norteia a ciência é
procurar uma classificação razoável das numerosas disciplinas cientificas”. (2008: 102-103)
Vieira explica a importância da classificação de Peirce: “(...) está no fato dela estar
suportada por uma filosofia científica capaz de fornecer para as ciências os
princípios ontológicos e epistemológicos fundados em uma lógica concebida como
semiótica, esta por sua vez, alicerçada na fenomenologia”. (2008:103)
Abaixo o diagrama da arquitetura filosófica de Peirce
1.1. Ciências da Descoberta
1.1.1 Matemática
1.1.2. Filosofia : Absorve da matemática e dá Substancia às ciências
1.1.2.1 Fenomenologia (Quase ciência, porque não trabalha sobre nenhum pressuposto;
quer saber como se dá a apreensão dos fenômenos e está na base da filosofia);
1.1.2.2 Ciências Normativas: valores e ideais guia finalidade última do sentimento, da
ação, e do pensamento humano
` 1.1.2.2.1. Estética
1.1.2.2.2. Ética
1.1.2.2.3. Lógica ou Semiótica
1.1.2.2.3.1. Gramática Especulativa
como se articula o raciocínio humano
1.1.2.2.3.2. Lógica Crítica propriamente dita
2.3.2.1 Abdução
2.3.2.2 Indução
2.3.2.3
Dedução
1.1.2.3.3.3. Retórica Especulativa ou Metodêutica
1.1.2.3. Metafísica
106
1.1.3. Ciências Especiais
Físicas dominadas pela ação externa: física, química geologia
Biologia fica entre as físicas e as psíquicas.
Psíquicas dominadas pela ação interna: psicologia, sociologia, lingüística
Acreditamos no estudo da Classificação das Ciências, da Transdisciplinaridade, do
Pensamento Complexo como o caminho possível ao exercício das ações estéticas.
As ações estéticas podem representar a concretização da união de todas as
possibilidades humanas. Estudar por meio de fragmentos é conhecer de forma
incompleta, pois acarreta a perda da visão de totalidade. Interpretar o mundo por
meio de disciplinas separadas não decifra a complexidade humana. Carvalho
completa: “não contribui para a construção da democracia cognitiva.”
(Carvalho.2009:2)
A transdisciplinaridade torna-se um caminho de reflexão e discussão sobre a vida
e o homem. Carvalho enfatiza:
É um domínio cognitivo que se localiza além das disciplinas e visa construir meta
pontos de vista sobre o homem, a terra, a vida, a natureza, o cosmo. (...) A
transdisciplinaridade exige conhecimento amplo da área-tronco do pesquisador,
prolonga-se, porém, para além dela, a fim de construir um conhecimento
complexo da cultura, mesmo sabendo que decifrará um pequeno grão de areia
dessa extensa rede de conversações, cujo acesso jamais será inteiramente
apreendido. (2009:2)
Defendemos que o problema da especialização nas ciências e o determinismo
sejam os responsáveis pela falta de criatividade. Prigogine observa que não
criação em um mundo determinado
a priori
e que a vida é um sistema aberto
longe do equilíbrio, o que impossibilita certezas. Morin explica:
Até metade do século XIX a maior parte das ciências tinha a redução como método de
conhecimento (do conhecimento de um todo para o conhecimento das partes que o
compõem), e o determinismo como conceito principal, ou seja, a ocultação do acaso, do
novo, das invenções, e a aplicação da lógica mecânica da maquina artificial aos
problemas vivos, humanos e sociais.
107
A especialização abstrai, isto é, retira um objeto do seu contexto e da sua totalidade,
rejeitando suas ligações e intercomunicações com o seu ambiente, o insere no
compartimento da disciplina, cujas fronteiras destroem arbitrariamente a sistematicidade
(a relação de uma parte com o todo) e a multidimensionalidade dos fenômenos.
(...) O modo complexo de pensar não é útil apenas para os problemas organizacionais,
sociais e políticos. O pensamento que enfrenta a incerteza pode ensinar estratégias para
o nosso mundo incerto. O pensamento que reúne, ensina uma ética da aliança ou da
solidariedade. O pensamento da complexidade possui, igualmente, seus prolongamentos
existências, postulando a compreensão entre os humanos. (2003:69;77)
A abrangência da transdisciplinaridade nos permite esperar por atitudes
diferenciadas e a sala de aula pode agir no incentivo de novas ações
103
e
exemplos. O projeto é levar aos alunos a preocupação constante com o futuro da
vida. É desenvolver a observação e a preservação do ambiente, com o intuito de
preservamos, no limite, a nós mesmos.
A procura pelo todo da vida encontra eco nas explicações de Morin sobre a
finalidade da tríade “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” são pertinentes ao
nosso desafio:
Nossas finalidades não nos são impostas, no sentido que, nas nossas sociedades
individualistas, a ética não se impõe imperativamente nem universalmente a cada cidadão;
cada um terá de escolher por si mesmo os seus valores e ideais, isto é, praticar a auto-
ética. (...)
Sabemos que nossas finalidades não vão inevitavelmente triunfar, e que a marcha da
historia não é moral. Devemos visualizar seu insucesso possível e a mesmo provável.
Justamente porque a incerteza sobre o real é fundamental, é que somos conduzidos a lutar
por nossas finalidades. A ecologia da ação o nos convida à inação, mas ao desafio que
reconhece seus riscos, e à estratégia que permite modificar a ação empreendida.
(Morin.1998: 67-69)
Não é possível esquecer que fazemos parte de um todo. Lembramos a
contribuição do ecólogo americano Edward O. Wilson
104
, ao propor a “hipótese da
103
"O ensino deve favorecer a arte de agir" - Edgar Morin
http://www.escoladosaber.xpg.com.br/AnotePensar.htm
104
Edward O. Wilson nasceu nos Estados Unidos em 1929. biólogo, Etnólogo Fundador da Teoria da
Sociobiologia, é reconhecido mundialmente por seus estudos sobre insetos - principalmente formigas - que
auxiliam o entendimento dos conceitos ecológicos e genéticos da evolução dos animais e do homem. Afirma
que "Se o Homo sapiens sapiens está caminhando para ter o mesmo fim dos dinossauros, a responsabilidade
é toda nossa".
108
biofilia”
105
. Wilson defende a existência de uma ligação emocional entre os seres
humanos e os outros organismos vivos, a natureza como um todo. Acredita que
essa ligação é inata e está nos nossos genes. Defende a Consiliência
106
unidade do
conhecimento
Mais um teórico engajado Fritjof Capra
107
defende a alfabetização ecológica. Esses
pensadores vão ao encontro dos filósofos elencados no trabalho e nos ajudam a
refletir sobre o problema atual que, se for abandonado a si mesmo, será ampliado
no futuro. A educação dos nossos jovens e crianças precisa ser direcionada para
integrá-los no universo. Repetimos aqui as reflexões de Marina que não troca as
aulas nos colégios pela universidade, pois acredita que estejamos perdendo a
capacidade de amar. Marina defende a inserção do afeto no campo da
sexualidade.
O questionamento de Morin é fundamental: Quem vai ensinar nossos educadores?
E em Carvalho que investe nos quatro pilares da educação para o século XXI da
UNESCO. Os pilares da educação defendidos são: conhecer, fazer, viver junto e
ser, essa empreitada não será fácil, pois o ensino é complexo e deve transpor os
muros da escola e se manifestar no mundo.
Carvalho, ao apontar a abrangência da educação em uma visão multicultural, cita
o poeta frances Yves Bonnefoy
108
por sua resposta a seguinte questão: Por que a
105
“Biofilia” Este termo foi popularizado por E. O. Wilson, num livro com o mesmo nome publicado pela
Harvard University Press 1984. A biofilia é o amor (philia) à natureza (bio). Vem do grego bios, vida e
philia, amor, afeição — significa literalmente “amor pela vida”. http://pt.wikipedia.org/wiki/Biofilia
106
Consiliência. É um termo que não se encontra nos dicionários, mas, no século passado, Consiliência era
um termo popular que significava a unidade de conhecimento, a ligação entre os saberes. Edward Wilson, um
biólogo de Harvard, recuperou esta idéia, e hoje em dia luta contra a fragmentação da ciência. Htpp//
nautilus.fis.uc.pt/cec/arquivo/.../1998/19981010_Consiliencia.pdf
107
Fritjof Capra Nasceu na Áustria em 1939. Doutor em Física pela Universidade de Viena. Defende os
progressos da ciência, da filosofia de forma consciente e ecológica.
108
Yves Bonnefoy nasceu no dia 24 de junho de 1923, no interior da França. Estudou matemática e filosofia,
tendo obtido o “baccaloréat” em 1941. Na Sorbonne, prosseguirá os estudos de matemática superior, história
das ciências e filosofia.
Na adolescência lia poesias. Leu Paul Valéry, Rimbaud e Mallarmé, mas particularmente Charles
Baudelaire, sobre o qual fará o mestrado.
109
poesia deveria voltar a ser ensinada nas escolas? “Sua resposta foi direta e
incisiva. Para ele, a poesia propicia a prática da liberdade para com as palavras e
a vivência da responsabilidade para com os destinos comuns da nossa Terra-
Pátria”. (2008:63)
Ao afirmar a pertinência da poesia, da literatura das artes como um todo,
Carvalho investe no efeito duradouro das emoções provocadas pelo contato com
as artes. Defende a necessidade de se aproximar das experiências artísticas, a fim
de que elas abram:
Janelas para o mundo acionam níveis de realidade não percebidos pela linguagem fria e
distante de conceitos, teorias e métodos.
Quando se aprende um poema de cor, quando se um romance ou se guarda a
imagem de uma pintura, eles permanecem para sempre em nossa mente, como fiéis
companheiros que nos convidam a encarar a desregulação do mundo de modo menos
pessimista, a perceber a realidade de forma menos linear, a descrer nos ditames da
razão, a usufruir das delicias do imaginário, a adentrar nos labirintos da sabedoria.
(2008:64)
Enfatizamos a noção de transversalidade
109
do conhecimento por meio da
afirmação de Goswami: “Importante para desenvolver um paradigma efetivo para
a PAZ é o movimento de abandono das hierarquias lineares”. (2007:206)
O nosso trabalho defende o amor, a diversidade, a liberdade e incentiva ações
estéticas a fim de abrir janelas para o mundo, no entanto, uma reportagem sobre
o “incentivo” à leitura na Venezuela
110
é um exemplo contundente sobre o fechar
Em Paris, descobre os poetas e os pintores surrealistas, chegando a freqüentar o grupo de André Breton. A
originalidade de Bonnefoy se afirma e ele será um daqueles inovadores que irão imprimir novos rumos à
poesia francesa.
O sucesso da produção poética de Yves Bonnefoy se deve à sua extraordinária clarividência, às suas
admiráveis faculdades de intuição e ao profundo senso poético que preside a sua vida e à sua produção
artística e intelectual, à aguda visão arquitetural e de conjunto, que talvez tenha as suas raízes nos estudos
matemáticos e filosóficos a que se dedicou desde a juventude. Assim, Yves Bonnefoy, como diz Jean
Starobinski, “conhece por experiência o atrativo do pensamento abstrato, a alegria que a mente pode
experimentar em construir o edifício dos conceitos e das relações puras e converge o pensamento conceitual e
critico. A convivência entre o pensamento conceptual científico e a “narrativa em sonho” é o que torna difícil
separar, na sua produção, o que é poesia do que é ensaio. Assim, por um impulso interno que deságua na
escrita, Yves Bonnefoy oscila entre o conceito e o devaneio na produção do texto.
http://www.culturapara.art.br/opoema/yvesbonnefoy/yvesbonnefoy_db.htm
109
Ver glossário
110
O estado de São Paulo Domingo, 12 de Julho de 2009 | Versão Impressa
110
as aberturas para o mundo. As autoridades desse país limitam as leituras às que
possam contribuir para a manutenção de uma revolução à la Chaves. Se o intuito
desta pesquisa é a ênfase na possibilidade da criação de novos paradigmas, como
aceitar o engessamento do pensamento. A reportagem completa encontra-se no
Chávez limita compras de ''livros de direita''
Presidente faz ‘revolução da leitura’, mas nem clássicos chegam ao país.
pelo menos três livrarias no aeroporto de Caracas, mas se estiver em busca de um escritor consagrado da
literatura latino-americana para passar o tempo antes do embarque, o visitante sairá frustrado de qualquer
uma delas. O colombiano Gabriel García Márquez? "Não." O mexicano Carlos Fuentes ou o argentino Julio
Cortázar? "Também não." O peruano Mário Vargas Llosa? "Nem pensar, tenho esses aqui", diz a
vendedora, desconcertada, apontando para uma estante quase vazia que começa com "Culinária para
Crianças" e termina numa série de análises sobre o socialismo do presidente Hugo Chávez.
No centro da capital venezuelana ou em bairros de classe média a situação é a mesma. "As autoridades não
estão liberando dólares para importar livros, papel ou tinta. E não adianta dizer que o problema é a crise, pois
sabemos que uma questão ideológica por trás disso: para esse governo, literatura? desengajada? não é
prioridade", diz Andrés Boersner, dono da tradicional livraria Noctua.
Também estão em falta muitos clássicos, livros universitários e técnicos. "Hoje, de 50 títulos que me pedem,
não tenho 45", conta Boersner. "Fiquei deprimido ao entrar numa livraria em Barcelona e ver todas as
novidades literárias que não chegam mais na Venezuela."
O curioso é que a situação chegou a esse ponto apenas três meses depois de Chávez ter anunciado seu "Plano
Revolucionário da Leitura", cujo objetivo é "estimular a leitura para ampliar a consciência". Mas é claro que
não é qualquer leitura. Apenas a que "desenvolva uma ética socialista" e "desmonte o imaginário capitalista
para dar novo contexto à história".
As bibliotecas públicas receberam caixas e caixas de obras "revolucionárias": coletâneas de discursos de
Chávez, livros escritos por ministros, Cartas de Marx para Engels, o diário de Che Guevara na Bolívia e
biografias de Simón Bolívar. Estão sendo organizados em bairros pobres os "Esquadrões Revolucionários de
Leitura", cujo objetivo é "refletir e contribuir para a construção do socialismo do século 21".
E apesar de as editoras privadas não conseguirem importar papel, tinta e peças para seu maquinário, editoras
ligadas ao governo distribuem milhares de livros a preços que não passam de US$ 2. Mais uma vez, não são
quaisquer livros. sim, alguns clássicos como Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, mas a
maior parte é o que as autoridades definem como "livros de esquerda".
IDEAIS SOCIALISTAS
"Recuperamos obras que estavam esquecidas, pois antes só havia espaço para a literatura de direita", disse ao
Estado Miguel Márquez, presidente da editora Los Perros y las Ranas, ligada ao governo. Ela foi criada em
2006, ao receber uma doação de Cuba, e distribuiu 50 milhões de livros. "São livros que contribuem para
humanizar nossa sociedade, ou seja, para acabar com a valorização do dinheiro, típica do capitalismo, e
impulsionar o socialismo."
Enquanto isso, as obras "não revolucionárias" são cada vez mais raras. "Tradicionalmente, mais de 80% dos
livros lidos na Venezuela são importados de países como México e Espanha, mas agora eles chegam a conta-
gotas", diz Yolanda de Fernández, da Câmara Venezuelana do Livro. Ela explica que, desde 2008, o governo
passou a exigir um "certificado de não produção ou produção insuficiente" para a importação de livros. Ou
seja, hoje a rede que quiser comprar qualquer título precisa esperar a emissão de um documento que diga que
ele não é publicado na Venezuela.
Se o processo já era complicado nos últimos meses, com a queda do petróleo pressionando as reservas de
Chávez, tornou-se ainda mais lento. "Mesmo com o certificado, os dólares para importar livros simplesmente
não são liberados", diz Yolanda. Como o limite para as compras externas é cada vez menor, as distribuidoras
preferem, quando podem, comprar best sellers (como o brasileiro Paulo Coelho) , o que reduz ainda mais a
variedade de títulos em circulação no país.
O resultado desse processo é o que a oposição vem chamando de "a revolução cultural do presidente
Chávez".
"As autoridades deste governo não conseguem entender, afinal, para que serve um livro de poesia ou um
Dostoievski", diz Boersner. "Eles só sabem que não devem acrescentar muito à sua revolução."
111
rodapé, no entanto, retiramos uma afirmação que mostra o horror do pensamento
dirigido e fechado às reflexões: “As autoridades deste governo não conseguem
entender, afinal, para que serve um livro de poesia ou um Dostoievski", diz
Boersner. "Eles sabem que não devem acrescentar muito à sua revolução." É
de conhecimento de todos nós a forma como os ditadores agem contra as artes e
os intelectuais. As primeiras atitudes dos tiranos são a censura, a proibição da
venda e circulação de livros e de obras de arte. Com o intuito de nos defendermos
dos inúmeros “Salvadores da Pátria”, aconselhamos alguns filmes que servem de
alerta contra a repressão e a proibição do livre pensar: “Fahrenheit 451”,
“Equilibrium”, “Arquitetura da Destruição”, “1984”, “Admirável Mundo Novo”.
5. 1. 4. A Criatividade Por Meio da Sensibilidade: na Sala de Aula
Como conseqüência da pesquisa teórica, a necessidade de aplicar na sala de
aula a idéia de ação e de multiplicidade de visões. O início do trabalho com meus
alunos é pautado pela necessidade humana da relação fraterna entre professor e
aluno. O uso da sensibilidade na sala de aula passa pela conscientização da vida e
do imperativo da ação na construção do futuro. Para ocorrer à conscientização é
importante haver a abertura do olhar. Para tanto, utilizamos teóricos como Viktor
Chklovski
111
e Marshall McLuhan
112
entre outros, que se preocupam em resgatar a
curiosidade inerente as crianças. A noção de procedimento em Chklovski é
fundamental para a aplicação da arte como ação, da mesma forma que as
definições de Mcluhan sobre os meios, artistas e sensibilidade.
111
Viktor Borisovich Shklovsky (Chklovski) nasceu em São Petersburgo em 24 de janeiro de 1893 –
Moscou Russia e morreu em 6 de Dezembro 1984. foi um crítico literário e cenógrafo russo, escritor famoso
por seu conceito de estranhamento na arte, escrito em 1917.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Viktor_Chklovski
112
Herbert Marshall McLuhan, filósofo e educador. Nasceu em Edmonton, Toronto Canadá em 21 de
julho de 1911 e morreu em 31 de dezembro de 1980. Reconhecido pelo pionerismo no estudo das tecnologias
e seus impactos na construção da sociedade humana em suas diferentes fases.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Os_meios_de_comunica%C3%A7%C3%A3o_como_extens%C3%B5es_do_ho
mem
112
No texto “A Arte como Procedimento”, 1917, Chklovski mostra como o artista deve
agir para evitar o automatismo presente na recepção. A vida agitada transforma
os indivíduos em robôs, daí a necessidade da ação do artista para despertar o
público. Para conseguir mudar a recepção, o artista deve investir no
estranhamento e, assim, conseguir uma percepção demorada. A percepção
demorada é fruto de algo novo de algo estranho e repleto de linguagem poética.
Chklovski defende dois tipos de linguagens, a prosaica e a poética. A primeira é
ligada ao objetivo e as certezas, enquanto que a segunda caminha na direção do
devaneio e da liberdade de produzir o novo. A linguagem poética tem como alvo
criar uma percepção particular do objeto é o processo da individualização, do
olhar primeiro e de descobertas, enquanto que, a linguagem prosaica é
automatizada. Essa ultima tem como processo não investir na visão e, sim, no que
já é conhecido e reconhecido. A linguagem prosaica se contenta com a mesmice e
a economia da reflexão. A linguagem poética, ao contrário, remete as descobertas
a percepções diferenciadas e quebra o automatismo gerado pela correria do
cotidiano. A linguagem poética investe no ato de refletir e não se limita à
economia de pensamento.
Os indivíduos, em virtude da velocidade da vida, perdem o olhar crítico e olham
para os objetos e para a vida de forma alienada, superficial e automatizada.
Chklovski aponta para o uso da linguagem poética e da ação do artista para
motivar o público:
A finalidade da arte é dar uma sensação do objecto como visão e não como
reconhecimento; o processo da arte é o processo de singularização dos objectos é o
processo que consiste em obscurecer a forma, em aumentar a dificuldade e a duração da
percepção. O acto de percepção em arte é um fim em si e deve ser prolongado; a arte é
um meio de sentir o devir do objecto, aquilo que já se ‘tornou’ não interessa à arte. (...) Os
objectos várias vezes percepcionados começam a ser percepcionados por um
reconhecimento: o objecto encontra-se diante de nós, nós sabemo-lo mas não o vemos.
(...) O processo de singularização em L. Tolstoi consiste no facto de ele não chamar o
objecto pelo nome, mas em o descrever como se o visse pela primeira vez. (ibid., p.81-
82).
113
A intenção do teórico é despertar o olhar primeiro é investir na obrigação do
artista em transformar o público.
Na mesma direção de Chklovski encontramos McLuhan, no livro “Os Meios de
Comunicação como Extensões do Homem”, 1964. A definição dos meios segundo
o numero de uso dos sentidos é fundadora. McLuhan mostra que, em virtude da
invenção da imprensa de Gutemberg
113
, o conhecimento se difundiu, mas, em
contra a partida, a comunicação ficou reduzida ao visual, à escrita, que tem a
característica linear. Antes dessa invenção, o conhecimento era transmitido pela
audição, que é circular. Abaixo uma explicação:
McLuhan propõe que, até o surgimento da televisão, vivíamos na "galáxia de Gutemberg"
onde todo o conhecimento era visto apenas em sua dimensão visual. Sua idéia é simples:
antigamente, o conhecimento era transmitido oralmente, por lendas, histórias e tradições.
Quando Gutemberg inventou a imprensa, permitiu que o conhecimento fosse mais
difundido. Mas, por outro lado, reduziu a comunicação a um único aspecto, o escrito.
"Antes da imprensa, o jovem aprendia ouvindo, observando, fazendo. A aprendizagem
tinha lugar fora da aula", explica o autor.
A evolução tecnológica deixa, aqui, de ser mera coadjuvante na vida social: o que é dito é
condicionado pela maneira como se diz. O próprio meio passou a ser a principal atração, a
informação. Muitas das páginas que estão na internet, por exemplo, poderiam ser livros ou
revistas, mas, segundo McLuhan, tornam-se interessantes justamente por que estão em
um novo meio de comunicação.
Isso não significa, é claro, ser passivo diante da mídia. "A tarefa educativa não é fornecer,
unicamente, os instrumentos básicos da percepção, mas também desenvolver a
capacidade de julgamento e discriminação através da experiência social corrente", diz o
autor.
Uma das mais curiosas idéias de McLuhan é a de que "os meios de comunicação são
extensões do homem". Assim como se usa uma pinça para aumentar a precisão das os
e uma chave de fenda para girar um parafuso, os meios de comunicação seriam, na
verdade, extensões dos sentidos do homem. Os óculos, por exemplo, são extensões do
olho, a roupa é uma extensão da pele, a roda do carro é uma extensão do . Com a
internet, não deixa de ser curioso se falar em "relações virtuais", como se as máquinas
fossem realmente capazes de sentir e pensar pelos seus operadores.
113
João Gutenberg (1390-1468), foi um inventor alemão que se tornou famoso pela sua contribuição para a
tecnologia da impressão e tipografia.
Tradicionalmente afirma-se que teria inventado os tipos móveis - que não foram mais, no entanto, que uma
melhoria dos blocos de impressão então em uso na Europa. A sua contribuição foi a da introdução de tipos
(caracteres) individuais de metal e o desenvolvimento de tintas à base de óleo para melhor usá-los.
Aperfeiçou ainda uma prensa gráfica, inspirada nas prensas utilizadas para espremer as uvas no fabrico do
vinho. http://pt.wikipedia.org/wiki/Johannes_Gutenberg
114
Muito antes de alguém falar em "aspectos lúdicos da educação", McLuhan dizia que o
estudo deveria ser uma atividade divertida. A escola, para ele, ainda não tinha percebido
essa realidade óbvia. E completa: ilusório supor que existe qualquer diferença básica
entre entretenimento e educação. Sempre foi verdade que tudo o que agrada ensina mais
eficazmente".
(http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/m.html)
Ao defender a força das novas tecnologias por congregarem vários sentidos,
Mcluhan aponta para o fato de que essas tecnologias mexem com todas as
percepções humanas, não de forma específica ao novo meio descoberto, mas de
um modo geral: “Qualquer extensão – seja da pele, da mão ou do afeta todo
o complexo psíquico e social. (1964:18) Acredita na capacidade do artista em
entender as mudanças perceptivas, advindas dos efeitos das tecnologias sobre os
indivíduos. Afirma que deposita no artista a esperança em ver resolvidos os
problemas de desequilíbrio provocados pelo aparecimento de um novo meio: “O
artista pode corrigir as relações entre os sentidos antes que o golpe da nova
tecnologia adormeça os procedimentos conscientes”. (1964:86)
McLuhan cita Wyndhan Lewis: “O artista essempre empenhado em escrever a
minuciosa história do futuro, porque ele é a única pessoa consciente da natureza
presente!” (Lewis
apud
McLuhan.1964:85). Essa citação de Lewis sobre a função
do artista vai ao encontro do que Baudelaire escreveu em “Sobre a Modernidade”
.
Para Baudelaire, a modernidade, o ser moderno está ligado ao transitório, ao
efêmero, cabendo ao artista retirar do momento caótico do presente o que se
tornará antiguidade com o passar do tempo.
O nosso trabalho em sala de aula, ao chamar atenção para a visão total dos
sentidos, defende a relevância da visão transdisciplinar explicada anteriormente.
Realçamos que somos feitos de razão, emoção e que é preciso soltar as amarras
da massificação e cultivar atitudes éticas em relação a si mesmos, aos outros e ao
planeta. Desenvolvemos o gosto pela ação criativa por meio de textos, livros,
músicas, filmes e poesias que falem dos homens, da vida e do amor. E
principalmente apresentamos aos alunos os pensadores e artistas aqui tratados.
115
Não podemos esquecer, como foi exposto anteriormente, que Schiller defende a
arte como instrumento de educação por reunir o sensível e o racional. As palavras
de Ana Mae nos ajudam a entender:
Queremos chamar atenção para a interculturalidade, a interdisciplinaridade e a integração
das artes e dos meios como modos de produção e significação desafiadores de limites,
fronteiras e territórios que reclamam uma visão rearticuladora do mundo e de nós
mesmos. (...) Na escola, as artes não devem ter seu espaço específico como disciplinas no
currículo, mas também lhes cabe transitar por todo o currículo, enriquecendo a
aprendizagem de outros conhecimentos, as disciplinas e as atividades dos estudantes.
Estamos falando do que oficialmente se designou transversalidade curricular. (...) Arte
como disciplina transversal, atravessando todo o currículo, aproxima-se do que Herbert
Read queria dizer em seu livro “educação através da arte”. Ele falava de arte como um
elemento humano agregador que, interpenetrando outras disciplinas, facilita a
aprendizagem pela qualidade cognitiva dos gestos, do som, do movimento e da imagem.
(2008:25)
A intenção do professor é formar uma visão diferenciada para a criação ou a
recepção de uma obra de arte, a fim de instigar à elaboração de juízos. O mundo
atual é múltiplo e requer novos olhares. Ensinar requer antes de qualquer coisa
fazer com que os alunos pensem por eles próprios. Encontramos no cinema uma
ferramenta muito importante para nos ajudar a propiciar reflexões. Estamos
convencidos que o caminho por meio de poesias, filmes, artistas e pensadores
ocupam lugar de destaque na compreensão da vida.
Em relação à pertinência do cinema na formação dos indivíduos, um livro veio em
nossa direção – “O Clube do Filme” que retrata o relacionamento de um pai com o
filho problemático que não quer estudar. O livro versa sobre uma proposta: Diante
da desorientação e da infelicidade do filho-problema, o pai faz uma oferta fora dos
padrões o garoto poderia sair da escola ficar sem trabalhar e sem pagar
aluguel desde que assistisse semanalmente a três filmes escolhidos pelo pai.
Semana a semana, lado a lado, pai e filho viam e discutiam o melhor e,
ocasionalmente, o pior do cinema. O resultado pode ser visto na reportagem que
se encontra no anexo.
114
114
Reportagem: “O Pai que trocou a escola do filho por filmes” O Globo - 24/05/2009 05:00:07
116
5. 1. 5. A Criatividade Por Meio da Sensibilidade: na Participação em
Exposições
No interesse da divulgação das ações estéticas pedimos aos alunos, como trabalho
artístico de conclusão do semestre, obras que sejam pertinentes: à “Carta do
Cacique Seattle”, à “Carta às Futuras Gerações”, aos trabalhos de Krajcberg, à
Lygia e aos filmes que investem em levar atitudes para preservar a existência.
A preocupação com o planeta e a vida é um grande foco de discussão dos artistas.
Apresentamos aos alunos a exposição Intempéries
115
, na Oca de São Paulo, 2009,
que serve como modelo de indiferença e inação aos problemas atuais. A exposição
aborda o aquecimento global e a inércia dos homens frente aos perigos futuros.
Na Faculdade Paulista de Arte de SP, investimos na arte como ação. Montamos
com meus alunos algumas exposições com o intuito de difundir, aos outros alunos
da faculdade, a necessidade de se respeitar à natureza e os outros seres vivos.
Confesso que as respostas dos alunos têm sido excelentes, muito além das
expectativas, o que nos incita a continuar nosso trabalho. No dia 6 de maio de
2009 na exposição “Visão Aberta”, fizemos um discurso de abertura convocando
todos à ação
116
.
115
A arte que expressa o estranhamento do homem diante das transformações climáticas que assolam o
mundo é palco de Intempéries O Fim do Tempo. A mostra reúne obras de 29 artistas, de 16 nacionalidades
distintas, apresentadas em grandes projeções de vídeos e fotografias. Com coordenação de Marcello Dantas,
curadoria internacional de Alfons Hug e nacional de Alberto Saraiva, a exposição está estruturada a partir dos
quatro elementos - fogo, água, ar e terra - que dividem os 7 mil metros quadrados da mostra nos quatro
andares da Oca. A estréia foi dia 7 de março, na Oca, no Parque do Ibirapuera.
116
Agradeço a Faculdade Paulista de Arte e aos alunos que participam comigo dessa pesquisa.
Vocês encontrarão nessa exposição trabalhos relacionados a certa tradição artística, mas verão, também,
trabalhos que investem na preocupação com a vida e o futuro. Acho que é muita pretensão de minha parte
falar em futuro, no entanto, acredito que as grandes transformações não sejam feitas por guerras, terrorismos
ou ações violentas, mas por pequenas atitudes de amor.
Sempre li e ouvi que o grande diferencial da arte está em não ter uma utilidade especifica.
Peço desculpas aos grandes estudiosos, pois acho que o grande objetivo da arte é, exatamente, investir na
nossa maior necessidade que é a vida. E o que é a vida, senão o espelho da sensibilidade? Hoje, por
coincidência no jornal, havia uma noticia sobre o livro que Augusto Boal, morto semana passada, deixou
para ser publicado. No inicio do livro “A estética do Oprimido” Boal faz uma síntese de suas concepções
sobre a arte. Ao ler fiquei emocionada, pois suas idéias vêm ao meu encontro. Assim sendo, faço minhas as
palavras de Boal:
117
A exposição apresentou certo número de trabalhos na direção da arte mais
tradicional e outros impregnados da preocupação com a vida. Os trabalhos foram
diversificados. Abaixo alguns exemplos:
Trabalho do aluno Boni Feitosa: “Bifurcação”
Escultura/Instalação criada com base na “Carta as Futuras Gerações” de Ilya
Prigogine foi feita de folhas secas e, além do trabalho criativo, houve a
preocupação de criar um todo harmônico, no qual as imagens projetadas por um
pequeno DVD digital, completavam as diversas possibilidades de percursos. É um
trabalho de multiplicidades e descobertas.
“ Sinto sincero respeito por todos que dedicam suas vidas à arte (...). Mas prefiro àqueles que dedicam sua
Arte à Vida”
Essa reflexão é que passo aos meus alunos e espero de coração, que eles dediquem sua arte à vida por meio
de sementes de amor.
118
Trabalho do aluno Raphael Vasquez: “Paletó”
Material: Um paletó usado velho com mais de 7 bolsos, os quais continham vários recados.
1- Bolso de fora do paletó: Pedaço de papel escrito à mão: “Andei, li, amei, chorei, morri de
rir, morri de medo. Fui alguém e decidi deixar um pouco de mim aqui.”
2- Bolso interior: Pequeno globo terrestre preso a uma corrente para se pendurar ao pescoço
com os seguintes dizeres: “É uma jóia”
3- Bolso interior: Foto de um casal apaixonado com os dizeres: “Ame, assim o paraíso se faz
real”
4- Bolso interior: Foto de um garoto descabelado com os dizeres: “Às vezes, permita que o
vento penteie os seus cabelos.”
5- Bolso Interior: Relógio de pulso quebrado e com um bilhete amarrado: Não se baseie
tanto por isto.
6- Bolso Interior: Diversos papéis pequenos e em cada um, uma palavra que juntos
formavam a frase: “O tempo passa muito rápido”.
7- Bolso exterior: Impressão de um mapa qualquer que não revela exatamente o local e nele
uma frase em destaque: “A bússola está em seu coração”.
História que acompanhava a obra - Paletó:
“Este paletó pertenceu a um homem e foi encontrado em uma praça no centro da
cidade – pode ser qualquer cidade de qualquer estado ou país – no estado em que
está, isto é, gasto pelo tempo e com esses recados nos bolsos. Os recados
119
indicam a maneira que seu dono viveu e pensava sobre o mundo, o tempo, o
amor e servem para nos inspirar a pensar na vida.”
Dizeres ao lado do paletó: “Fique à vontade e vasculhe os bolsos à procura de
algo que lhe possa interessar a refletir.”
117
Trabalho do aluno Ricardo Moreira.
Obras feitas com lixo – Reciclagem artística
“Não quero luxo, não quero lixo, e que se lixem aqueles que acham que o
lixo é apenas lixo.”
117
O Trabalho de Rafael me recordou a poesia “Ilusões da Vida” de Francisco Otaviano.
117
Quem passou pela vida em brancas nuvens
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu:
Foi espectro de Homem, não foi Homem,
Só passou pela vida, não viveu.
120
Os trabalhos de Ricardo podem ser vistos no site
: http://ricksarte.blogspot.com/
Trabalhos do Aluno Vinicius Jovino:
1. Arlequim: No Gozo de Prová-lo, Na dor de perdê-lo
2. Colombina e Arlequim: O Dom de encontrar a delícia na intenção da
carícia, e nunca na caricia, buscando o amor no incenso de um sonho:
Os trabalhos plásticos surgiram a partir da leitura do livro: “As Máscaras”, de
Menotti Del Picchia, que conta a história de um triângulo amoroso vivenciado
pelos personagens Pierrot, Colombina e Arlequim:
1º. Arlequim: No Gozo de Prová-lo, Na dor de perdê-lo:
Arlequim, ironicamente místico:
No meu lábio, no ardor desse beijo, que é todo um romance de amor!
Seduzido pela angustia da saudade:
No temor de pedi-lo e na gloria de tê-lo...
No gozo de prová-lo e na dor de perdê-lo...
No contato desfeito e no rumor já mudo...
No prazer que passou... Nesse nada que é tudo:
O passado!... a lembrança... a saudade... o desejo... (Picchia.1937:28-29)
O primeiro trabalho retrata os sentimentos de Arlequim. O “tipo” de amor que é
idealizado por esse personagem é carnal. Arlequim ama através da carne, aprecia
o toque, o calor do corpo, é quem toma o beijo da Colombina e sofre por não tê-lo
outra vez.
2º. Pierrot e Colombina: O Dom de encontrar a delícia na intenção da
carícia, e nunca na caricia, buscando o amor no incenso de um sonho:
PIERROT, num fio de voz:
Ai de mim que, tristonho, trazia
à tua vida a oferta do meu sonho...
Pouca coisa, porém... Uma alma ardente e inquieta arrastando na terra um coração de poeta!
Na velha Ásia, a Jesus, em Belém, um Rei Mago, não tendo ouro, partiu através de Cartago,
atravessando a Síria, o Mar Morto infinito, a ruiva e adusta Líbia, o mundo e fulvo Egito,
as várzeas de Giséh, o Hebron fragoso e imenso,
só para lhe ofertar uns grânulos de incenso.
Também vim, sonhador, pela vida, tristonho,
trazer-te o meu amor no incenso do meu sonho. (Picchia.1937:68)
121
Arlequim, escarninho:
Esse amor tão sutil que teus nervos reclamam só se aplica aos Pierrots?
Pierrot:
Não! A todos os que amam!
Aos que têm esse dom de encontrar a delicia na intenção da caricia e nunca na caricia...
(Picchia.1937:35-36)
O Segundo trabalho retrata Pierrot, que ama através do sonho. O trabalho é um
quebra-cabeça, onde podem ser montados dois retratos, um do Pierrot e outro da
Colombina. Apesar de poder montá-los, as duas imagens jamais podem aparecer
ao mesmo tempo. A única maneira dos dois amantes se encontrarem é na
abstração, é no sonho de Pierrot. O trabalho é composto pelas figuras dos
amantes que se encontrarão, por meio da participação do receptor. Abaixo o
processo do trabalho:
Arlequim Pierrot e Colombina
122
Trabalho da aluna Elis Regina:
Três frases durante 03 semestres de trabalhos foram sugeridas pela Professora Heloisa Leão na
Faculdade Paulista de Artes, para serem refletidas, trabalhadas e respondidas:
O que você deixaria de belo para a humanidade?
Ações que podem melhorar o mundo?
Pensar na natureza como parte do mundo?
Resposta a todas elas: Ação e atitude. E pensar no belo como atitudes construtivas, ações que
enchem o coração de amor e que não tem preço.
Há necessidade urgente de introduzir um novo paradigma de desenvolvimento que
Possua estratégias mundiais para a conservação da natureza. Este novo paradigma é a
Sustentabilidade e que tem como objetivo, levar os indivíduos a pensar e agir, para preparar o
mundo frente aos desafios do novo século, pois a pobreza, o subconsumo, a exclusão social, o
desemprego, a chuva ácida, o efeito estufa, a destruição da camada de ozônio, o uso inadequado
dos recursos naturais renováveis e não renováveis, devem ser tratados como problemas
planetários e estão no cerne da nova concepção de sustentabilidade.
Sabemos que as dificuldades são muitas, mas a esperança e a confiança nos seres
humanos o ainda maiores, por isso devemos aprender com aqueles que nos deixaram
ensinamentos valiosos, como por exemplo a “Carta do Cacique Seattle” ao presidente dos EUA
(Franklin Peirce) em 1854(5):
“Ensinai a vossos filhos, aquilo que ensinamos aos nossos: que a Terra é nossa mãe. Dizei a eles,
que a respeitem, pois tudo que acontecer a Terra, acontecerá aos filhos da Terra. (...) Ao menos
sabemos isso: a Terra não é do homem; o homem é que pertence à Terra. Todas as coisas são
dependentes”.
No dia 05 de junho último (2009) comemorou-se o Dia do Meio Ambiente, e a ONU reforçou a
importância da participação de todos no combate às mudanças climáticas. Essa preocupação cabe
a cada um de nós. Quando falamos de conscientização do ser humano em salvar o planeta, não
podemos deixar de citar: O artista plástico Frans Krajcberg; a
Carta
do Cacique de
Seattle”,
1854,
ao presidente dos EUA, Franklin Peirce e a “Carta às Futura Gerações” de Ilya Prigogine.
“Grandes realizações não são feitas por impulso, mas por uma soma de pequenas realizações."
[Vincent Van Gogh]
A CMMAD (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO) criou a definição
de Desenvolvimento Sustentável:
123
“Desenvolvimento Sustentável é aquele que atende as necessidades do presente sem
comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades”.
Elis Construiu um livro com árvores em extinção que poderá ser visto no DVD que
acompanha a tese. Elis e Vinicius plantaram algumas mudas de árvores na Praça
Capitão Antônio do Santos - Bairro Itaquera – SP. Uma vez por semana, Elis passa
para ver as plantas que cresceram bastante. Com o seu gesto ela tem tido
alegrias e tristezas. As alegrias são o fruto do exemplo dado, porque outras
pessoas começaram a plantar e as tristezas remetem aos estragos feitos, por
vândalos, nas plantas que crescem. A experiência é gratificante mesmo com os
dissabores.
ÁRVORES EM EXTINÇÃO
DECLARAÇÃO DO AMBIENTE
Ipê Rosa, plantado em novembro/08, pelos alunos Elis e Vinicius da FPA em uma praça
Trabalho das Alunas Elis Regina e Iramildes Carvalho:
Trabalho que distribuiu mudas de “Amor Perfeito” e de árvores de grande porte:
Uma tela em branco!
Uma caneta grande!
Uma muda de árvore!!!
80 pacotes da semente de amor prefeito são 500
Um compromisso com a mãe natureza!
Questões colocadas. O por que da tela? Pois quem assinasse sobre a tela sempre se lembraria que
deixou sua marca, isto é uma pincelada para ajudar e embelezar o ambiente. O ato de plantar é
124
seguido da ação de cuidar
118
da pequena muda, até esta se transformar em uma robusta e
centenária árvore. Além disso, atos como esses estarão compartilhando de nossa corrente de
ação e atitude em favor do nosso Planeta Azul.
Trabalho de Renato e Cleiton
Trabalho Lucia Chiba e Thatiana Sanchez
Pensamos em fazer uma obra que estivesse ligada aos dois temas sugeridos pela
professora Heloísa C. Leão: meio ambiente e como deixar o mundo belo.
Para tanto, utilizamos materiais recicláveis que descartamos todos os dias, principalmente
o plástico. Desta forma, chamamos atenção para a importância da reciclagem para o meio
ambiente. Reciclar é aplicar um produto da forma como ele foi concebido inicialmente, porém
tratando-o de uma maneira tal que ele assuma uma configuração diferente e passe a ter uma nova
função, um novo uso, um novo objetivo.
118
A idéia de cuidar vem da frase do livro “O Pequeno Príncipe”, que defende a responsabilidade: “você é
responsável por tudo aquilo que cativas.” Essa frase foi discutida durante o curso, mas o interesse dos alunos
agregou o amor a natureza.
125
Para o nosso trabalho, criamos borboletas e flores com este material. As borboletas,
simbolizando a metamorfose do lixo em algo belo, parecem sair leves e delicadas por entre os
plásticos engarrafados. As flores também fazem parte desta transformação.
Isso nos mostra que o belo depende da forma com a qual olhamos o mundo. Podemos ver
um monte de plásticos e imaginar que é um monte de lixo, mas com um olhar mais sensível,
podemos imaginar algo belo, na forma de uma obra de arte.
O problema de lixo no Planeta é muito grave, um dos piores já enfrentados pelo homem. O
lixo é gerado excessivamente a cada dia, e a cada dia se reduz o espaço para armazená-lo. A
melhor maneira de se tratar o lixo é através da sua reciclagem, ou seja, seu reaproveitamento e
eventual transformação em outro objeto. Grande parte do material que consideramos como lixo
pode ser tratado desta maneira. E se assim o fizermos, estaremos reduzindo o impacto ambiental
e aumentando a qualidade de vida no Planeta, que economizaremos tanto matérias-primas que
seriam necessárias para algum produto, como o espaço que ele ocuparia no lixo, sem necessidade.
Assim, tanto a arte quanto o meio ambiente, agradecem.
O nome da obra é “A beleza do lixo” as criadoras foram Lucia Chiba e Thatiana Sanchez.
Alguns trabalhos finais que não estavam na exposição:
Trabalhos dos alunos Brenda Cueba, Luciano Crepaldi, Rosangela B.
Ballesteros, Vivian Moretti e Telma D. N. Nomura: Calendário do Tempo
126
É um álbum com fotos do passado em comparação com os dias atuais. As imagens compravam a
poluição e os detritos jogados nos rios. Exemplos: 1º. O Rio Tietê coberto com espumas de
produtos indevidamente foram jogados.
2º. Amazônia no tempo.
3º. Antártica no tempo enfatizando o degelo.
Trabalho dos alunos: Thalita, Rafael Vasquez e Vinicius Jovino - Sobre a
preservação da natureza e o trabalho de Frans Krajcberg
A Luz alimenta a Natureza que esbanja vida e cor
A natureza clama por atenção dos homens, não quer mais ser devastada, corrompida, poluída e o
dever da consciência cabe a nós humanos. Os olhos do homem moderno vêem a natureza
apenas como combustível para a sua máquina veloz que nos distancia da nossa própria essência,
que transforma todo o ambiente num amontoado de ferro e cimento e se ergue para o céu com
toda a fúria.
O homem não poderia criar sem matéria, sem ferramentas, e é na natureza que ele recolhe todo
material que usa. Suas mãos e seu cérebro se aperfeiçoaram proporcionalmente aos desafios que
encontrava na natureza e, hoje tendo a superado, constrói um novo ambiente a seu estilo.
O homem agora não se recorda de onde veio e não volta os olhos para admirar, nem sequer
para cuidar daquela que foi uma vez tudo o que lhe cercava e lhe dava o que precisava.
A natureza era abundante, mas hoje, a cada hora, mais e mais áreas são devastadas em nosso
país.
Se pudermos voltar-nos para a beleza que transborda das árvores, flores, rios, bosques que ainda
existem e admirá-la como se admira uma obra de arte poderíamos traçar um caminho mais
seguro, nesse breve passar pela vida.
Uma bexiga presa a uma arvore não dura muito tempo cheia. O calor do sol, o vento, o atrito com
os galhos provocam o seu fim, pois a faz estourar e nessa velocidade a beleza da vida se vai.
O artista plástico Frans Krajcberg utiliza a matéria das queimadas, da devastação em suas
esculturas, revelando a bruteza de nossos atos. Isso nos inspirou a olhar a natureza como um bem
maior, por isso a enfeitamos com cor e luz tentando indicar que dali brota vida, mas que assim
como é a bexiga, tal vida é frágil e precisa do nosso cuidado.
127
As bexigas brancas significam a natureza pedindo PAZ
Trabalho dos Alunos: Maíra Lacerda, Andre Destro Xavier, Diocir J. A.
Junior – Livro Ilustrado
Livro de figurinhas auto-adesivas com referência as mazelas do planeta.
Esse trabalho tem o foco nas queimadas, no aquecimento global e na fome.
128
Trabalhos do Aluno Diego Miguel na Exposição “Ser Humano”
O início do projeto “Quinta Cultural” foi no dia 4 de setembro de 2008 com a Exposição “Ser
Humano”. É um projeto ligado a um movimento artístico itinerante composto por diversas
manifestações artísticas: artes plásticas, vídeos, filmes, músicas etc. Todas as obras da exposição
se interligam por meio de suas diferentes visões do Ser Humano, constituindo, assim, um ambiente
acolhedor e atraente.
Na Exposição “Ser Humano” Diego apresentou alguns trabalhos, entre eles a série de esculturas
(Re)ciclos I e II e a obra “Flutuação” baseada na “Carta às Futuras Gerações” de Ilya Prigogine
(1917 – 2003)
129
As obras em sua maioria foram feitas com materiais encontrados no lixo, bastardos, e em cores
fortes, a fim de provocar reflexões. Todas as ações refletem no presente e no futuro. Tudo que é
feito gera energia que mais tarde refletirá na história da humanidade.
As ações individuais fazem parte do coletivo e as ações do coletivo também atuam no individual.
Somos todos ligados pela mesma matéria e respiramos o mesmo ar.
Mais informações sobre Diego podem ser vistas no blog:
www.diegomiguelartes.blogspot.com
Trabalho Carolina Gutierres: Instalação Corpo e Alma
5. 1. 6. A Criatividade Por Meio da Sensibilidade e Exemplos do Cinema
O cinema, como outras manifestações artísticas, investe na capitação de emoções.
Desde o primórdio do cinema a sala escura, a introspecção, o jogo de luz e
sombra, a música e a narrativa provocam no espectador o encontro da realidade e
do sonho.
Morin ao falar sobre estética explica que tudo que diz respeito a esse tema tem o
poder de nos tocar a alma. Caminha na direção de Schiller que entende o estético
como a junção do individual no coletivo. Morin explica a abrangência da estética:
Tudo que remete à estética penetra em nossas almas, em nossas mentes, em nossas
vidas. (...)
Os filmes e as séries de televisão nos falam, sem parar, dos problemas da vida que são os
amores, ambições, ciúmes, traições, doenças, encontros, acasos. São “evasões” que nos
130
fazem mergulhar em nossas almas e em nossas existências. (...) O atroz em nossas vidas
é transfigurado num filme e nos dá a volúpia ou o deslumbramento no horror. O
impossível é realizado, mais no imaginário, ou seja, sem perigo. Encontramos no cinema,
ao mesmo tempo, evasão e hiper-realidade. Revela, do seu jeito, que, como dizia Franz
Liszt, “as artes são o meio mais seguro de se esconder do mundo, mas também o meio
mais seguro de unir-se a ele”. (2005:135)
Carvalho elucida que o cinema consegue dialogar saberes racionais e imaginários
e compara o cinema a uma:
Caverna simbólica na qual o homem se mostra como verdadeiramente é, despojado das
amarras das instituições e do caráter prosaico do cotidiano, o imaginário cinematográfico
fornece pistas para o entendimento da cultura contemporânea. (...) Como se operasse
com mecanismos do pensamento selvagem, o cinema aproxima-se, sem medos, da
intuição sensível, aberta, que sempre excede a dureza do conceito.
(...) O cinema é obra aberta, inacabada, presta-se a múltiplas interpretações, uma
hermenêutica do sentido, uma pluralidade instável e indeterminada que, a todo tempo,
cria brechas e dissipações, que propiciam ao sujeito-vidente encarar de frente os
paradoxos do tempo presente, para tentar, na medida do possível, regenerar sua própria
existência, direcionando-a para a busca de novos níveis de significação, sejam eles
individuais, sociais e planetário.
(...) Com o cinema, assumimos de vez que nossa dimensão existencial é simultaneamente
rubricada pelo tempo e pelos espaços reais e imaginários, locais e universais. São essas as
dimensões multidimensionais da criatividade que se encontram presentes não apenas em
cineastas e atores, mas em escritores, poetas e em poucos homens de ciência.
(2008:133,134,140)
Defendemos o cinema como ferramenta importante e auxiliar do professor na sala
de aula. As reflexões de Morin nos ajudam e reforçam nossa empreitada: “O
cinema opera uma espécie de ressurreição da visão primitiva do mundo, permite,
tolera e inscreve o fantástico no real”. (
apud
Carvalho. 2008:133) Vai além e
defende o cinema na educação, pela capacidade que possui de trazer sentido a
vida. Carvalho elogia Morin, quando esse enfatiza “que o cinema desvenda
estruturas da participação e estruturas da inteligência e cita: ‘O cinema, com sua
linguagem de imagens, e de imagens, converteu-se em pedagogia’.”
(2008:141)
Carvalho questiona como a pedagogia do cinema pode contribuir para a criação
de nova cidadania e responde: “Um bom caminho seria incluir uma programação
sistemática de filmes sintonizada a currículos regulares, cujo objetivo seria
estimular a criatividade, religar saberes e promover a transversalidade do
conhecimento”. (Carvalho, 2008:142)
131
Para destacar a ação do cinema como empreendedora de mudanças de hábitos.
Apresentamos três filmes que investem no amor, na ação e na relação com o
próximo. Mudar o tratamento entre as pessoas de agônico em hedônico é o que
pretendemos mostrar. Nesses filmes, é possível constatar as visões dos
pensadores elencados sobre o pensamento complexo, a transdisciplinaridade e o
amor como meta.
Ao escolhermos os filmes que enfatizem a sala de aula e o amor nos deparamos
com alguns que são baseados em fatos reais. O filme extraído da realidade não
deve ser entendido como uma narrativa fiel ao fato acontecido. A liberdade do
diretor e do roteirista possibilita vôos de imaginação quando reescrevem uma
história. Carvalho explica que o diretor:
Ao transpor para o cinema romances, fatos históricos-políticos, experiências extraterrenas,
biografias, os roteiros nem sempre cumprem fielmente o conteúdo de realidade de uma
obra, das vidas que nela transitam, dos fatos concretos que pretendem relatar. Omitem e
adicionam fatos, transmutam situações reais, invertem e esgarçam temporalidades,
superpõem planos existenciais, ordenam restos culturais sem se importar com a
linearidade da história e com a irreversibilidade do tempo. (...) O cinema quebra o quadro
espaço-temporal do cinematógrafo, capta objetos e situações inimagináveis, polemiza o
dispositivo tecnocientífico, projeta cenários futuristas, cria utopias sociais que nenhum
cientista é capaz de prever. Fábrica de sonhos incumbe-se de objetivar na grande angular
uma mitologia de duplos. Fabricar um comércio de signos mediadores das relações entre
indivíduo, sociedade e cosmo. (2008:134-135)
Os filmes escolhidos, entre muitos, têm em comum a sala de aula. É a conjugação
perfeita cinema e professor. Os educadores retratados pelo cinema e escolhido
por nós praticam a religação dos saberes e promovem a transversalidade que é
defendida por Carvalho.
O primeiro filme selecionado é “A Ultima Grande Lição” mostra um professor
acometido de uma doença terminal que paralisa seus órgãos ao pouco. O prof.
Morrie ao invés de esperar tranquilamente o dia de sua morte, ainda encontra
tempo para ministrar a última lição. Esse filme vem ao encontro do nosso
trabalho, pois mostra que é possível construir um futuro diferente. No qual a
amizade e o amor são os responsáveis por uma nova visão de mundo.
132
No filme “A Ultima Grande Lição”, dirigido por Mick Jackson, os conselhos do prof.
Morrie a seus alunos são fundamentais para uma mudança de hábito. Esse filme
foi baseado em uma historia real e Mick, aluno que recebeu as lições, quis ampliar
os ensinamentos do professor, transformando-os em livro e depois em filme.
Na narrativa, Mick vê, pela TV, seu professor doente, resolve procurá-lo e a partir
desse momento receberá todas as terças-feiras lições valiosas de vida. O
professor Morrie mesmo acometido de uma doença incurável utiliza seu tempo
final para deixar ensinamentos sobre a vida e o amor ao próximo. Frases do
professor Morrie importantes que são ditas sobre amor e vida:
Quando você aprende a morrer, você aprende a viver.
Nós precisamos amar uns aos outros, ou morremos. É muito simples.
A coisa mais importante na vida é aprender como dar amor, e como deixá-lo entrar.
Às vezes você não consegue acreditar no que vê, precisa acreditar no que sente. E se você quer
que outras pessoas confiem em você, você deve sentir que pode confiar nelas - mesmo que você
esteja no escuro. Mesmo que você esteja caindo.
“A Ultima Grande Lição” é um filme tocante e gratificante, pois investe na ação
mesmo frente à morte. A partir desse filme coloquei meus alunos frente à
seguinte questão: Se vocês soubessem que iriam morrer, em pouco tempo, o que
Título no Brasil: A Última Grande Lição
Título Original: Tuesdays with Morrie
País de origem: EUA
Gênero: Drama Duração: 89 min
Ano de Lançamento:1999
Diretor: Mick Jackson
Atores:
Jack Lemmon,
Hank Azaria,
Wendy Moniz,
133
vocês deixariam para embelezar o mundo? Embelezar no sentido de uma ou
diversas ações estéticas em relação a vida como um todo. Esse tema é um entre
outros temas que indico para o trabalho de conclusão da disciplina.
O segundo filme selecionado é “A Corrente do Bem” porque investe no poder
multiplicador das ações estéticas. O estudante Trevor tem a brilhante idéia de
criar uma pirâmide composta por boas ações. A idéia de colocar o amor em
movimento é gratificante. Esse filme, como o anterior, ajuda na construção de um
novo futuro.
No filme “A Corrente do Bem”, dirigido por Mimi Leder, um garotinho - Trevor
Mckinney, motivado pelo professor de Estudos Sociais Eugene Simonet, propõe
uma corrente de amor entre as pessoas. Esse garoto acredita ser possível mudar
o mundo a partir da ação voluntária de cada um. Para tanto cria uma corrente, na
qual defende três ações estéticas por cada favor recebido. Essa corrente
multiplica as ações estéticas, a fim de modificar o mundo. Abaixo, uma imagem
da pirâmide de ações e de seu poder multiplicador.
O terceiro filme é “Escola da Vida” apresenta uma nova escola que vai ao
encontro do pensamento complexo. O professor Sr. D e o prof. Matt são dois
Filme: A Corrente do Bem
Título Original: Pay It
Forward
Gênero: Drama
Origem/Ano: EUA/2000
Duração: 122 min
Direção: Mimi Leder
Atores:
Kevin Spacey - Eugene Simonet
Helen Hunt - Arlene McKinney
Haley J.Osment - Trevor
McKinney
134
lados distintos do ensino. O primeiro insere o aluno no aprendizado da vida e o
outro faz um recorte disciplinar. Esse filme, como os outros dois, é pertinente a
tese. Encontramos aqui a preocupação com a totalidade do individuo e com a
distribuição do amor pelas ações.
O filme “Escola da Vida” dirigido por Willian Dear, conta a historia de dois
professores em uma instituição de ensino. A classificação do filme é aventura, o
que discordamos, é uma historia tragicômica que leva o publico a reflexão. A
importância do filme é mostrar um novo caminho para o ensino. A narrativa
retrata dois posicionamentos distintos, o prof. Matt representa a escola linear e
agônica, enquanto que, o Sr. D. a escola complexa e hedônica. Sr. D. muda as
relações entre professor/aluno; aluno/aluno; aluno/consigo mesmo e todos com a
vida. A metodologia dinâmica desse professor faz do dia a dia, das necessidades
vitais e imediatas o foco do curso. Investe na valorização do aluno ao quebrar o
espírito de competição. Os ensinamentos desse professor têm correspondência
com os pensadores citados ao investir na ação com o próximo e no diálogo com a
vida.
A ação, na sala de aula, de amor ao próximo e de ações éticas pode ser vista em
alguns filmes
119
. Acreditamos que o cinema tenha a capacidade de mostrar atos
119
“Ao Mestre com Carinho”, “O Sorriso de MonaLisa”, “Sociedade dos Poetas Mortos”, “Coast Carter Um
Treino para a Vida”, “Mr. Holland”, Os Cavaleiros do Bronx”, “Música do coração”, “O Clube do
Imperador”, “Um Diretor Contra Todos”, “Vem Dançar”, “Escritores da liberdade”, “A Primavera de Uma
Filme: Escola da Vida
Título no Brasil: Escola da Vida
Título Original: School of Life
Duração: 122min
País de Origem: Canadá / EUA
Gênero: Aventura
Ano de
Lançamento: 2005
Direção: William Dear
Atores:
Ryan Reynolds
David Paymer
John Astin
135
de amor e de divulgar ações para serem seguidas. As histórias dos filmes têm
características reais e fictícias, mas isso não tem importância, pois a realidade ou
a ficção o elementos primordiais na ação e na mudança de hábito. Nessa
direção as palavras acima nos ajudam: “As artes são o meio mais seguro de se
esconder do mundo, mas também o meio mais seguro de unir-se a ele”. (Liszt
apud
Morin. 2005:135)
O cinema ao falar de amor tenta reunir esse homem dividido entre a
predominância da razão em detrimento da sensibilidade. No filme “Uma Mente
Brilhante” o personagem principal é John Nash matemático que vai contra as
idéias defendidas por Adam Smith. Inversamente a este Nash defende a visão de
grupo contra a predominância da visão individual.
Smith atesta que os melhores resultados surgem quando cada um no grupo olha
pelos seus próprios interesses e Nash defende que o melhor resultado surge
quando todos os elementos do grupo olham pelos seus próprios interesses e,
também pelos do grupo. As idéias de Nash quebram com a frase popular “Cada
um por si e Deus por todos”, melhor seria se fosse dita assim: Cada um por si na
luta pelo bem do grupo. “Um por todos, todos por um”.
Nash em 1994, como resultado de seu trabalho com a teoria dos jogos, recebeu o
Prémio Nobel de Ciências Economicas juntamente com Reinhard Selten
e John
Harsanyi. Transcrevemos aqui o que foi dito por Nash, no filme, ao receber o
premio:
Sempre acreditei em números, nas equações e na lógica. Mas após uma vida de
demanda, pergunto... o que é, na verdade, lógico? Quem decide o que é racional?
A minha busca conduziu-me do físico... ao metafísico... ao delírio... e ao regresso.
E fiz a mais importante descoberta da minha carreira. A mais importante
Solteirona”, “Mentes Perigosas”, “Perfume de Mulher” não é um filme em sala de aula, mas mostra a ética
entre alunos/professores. “Encontrando Forrester” é como o filme anterior, retrata relação prof./aluno.
136
descoberta da minha vida. É apenas nas misteriosas equações do Amor...
que alguma lógica ou razão podem ser encontradas
120
.
A declaração de amor de Nash pode ter sido verdadeira ou fictícia, como nos
manifestamos anteriormente, o fato de ser real ou inventada não é o importante.
O admirável é a presença desse sentimento em todos os desdobramentos da vida,
e na relação do homem consigo mesmo com os outros e com seu entorno.
Na mesma direção encontramos as poesias musicadas de Renato Russo: “Monte
Castelo”
121
; “Quando o sol bater na Janela do se Quarto e Pais e Filhos. Russo
mostra seu otimismo com o futuro ao pregar o amor em toda sua plenitude e
associado à ação:
Ainda que eu falasse a língua dos homens.
E falasse a língua dos anjos
Sem amor eu nada seria.
É só o amor, é só o amor
que conhece o que é verdade”.
Quando o sol bater na janela do teu quarto
Por que esperar se podemos começar tudo de novo
Agora mesmo
A humanidade é desumana
Mas ainda temos chance
O Sol nasce pra todos
Só não sabe quem não quer.
É preciso amar as pessoas como se
Não houvesse amanhã.
Porque se você parar para pensar,
Na verdade não há.
Russo quando fala que o amor é a verdade, não quer dizer que esta é a certeza de
alguma coisa. A verdade surge como um sentimento de totalidade, pois o amor é a
única totalidade, portanto, a verdade. Enfatizamos que conseguiremos atingir a
verdade, a totalidade por meio do amor.
120
http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/cinema/dossier/mentebrilhante/momentos.htm
121
A letra da musica de Renato Russo tem recortes do Apóstolo Paulo e de Camões.
137
Mais um exemplo esclarecedor sobre o amor está no filme “Amor nos tempos do
Cólera”: Florentino Ariza, poeta, em carta a sua amada Fermina Daza escreve:
Pense no amor como um estado de graça, não em um meio para se chegar a um
fim. De alpha a omega um fim em si mesmo.
O cinema está repleto de citações que enfocam o amor, infelizmente, o maior
número de citações diz respeito à violência e à busca por ganhar riquezas e se
sair vencedor. A corrida para granjear notoriedade é uma constante nos filmes
americanos em detrimento de filmes que ajudem a refletir sobre a vida e o
próximo. O importante é observar que mesmo em Hollywood muitos diretores
estão preocupados em difundir as relações de sentimento. O cinema quando
encarna a preocupação com o outro se torna uma fonte inesgotável de
propaganda de ações e de sentimentos.
138
6. Capítulo IV
Criatividade na Vida e nos Exemplos das Ações Estéticas – Sementes de
Amor Visando o Futuro - Inconclusão para o Futuro
“O artista tem a capacidade de lidar com as possibilidades do real e
se a natureza permitiu o nascimento de artistas é porque a natureza é artística”.
Jorge Vieira
“A permanência passa pela afetividade. Uma realidade bela estética apaixonante a atitude.
Conhecer bem é saber amar, o amor é profundo.”
Jorge Vieira
Antoine de Saint-Exupéry
“Cada um é responsável por todos. Cada um é o único responsável. Cada um é o único
responsável por todos”.
“É o espírito que conduz o mundo e não a inteligência”.
“A grandeza de uma profissão é talvez, antes de tudo, unir os homens: não há senão um
verdadeiro luxo e esse é o das relações humanas”.
“Ser homem é ser responsável.
É sentir que colocando sua pedra se colabora na construção do mundo.”
“Os olhos são cegos. É preciso ver com o coração...”
"O futuro não é um lugar onde estamos indo, mas um lugar que estamos criando. O caminho para
ele não é encontrado, mas construído e o ato de fazê-lo muda tanto o realizador quando o
destino."
"Se queremos um mundo de paz e de justiça temos que pôr decididamente a inteligência a serviço
do amor."
"A inteligência apenas vale ao serviço do amor."
"É apenas com o coração que se pode ver direito; o essencial é invisível aos olhos."
“O significado das coisas não está nas coisas em si, mas sim em nossa atitude com relação a elas."
“A verdadeira solidariedade começa onde não se espera nada em troca."
139
Esse capítulo segue a linha dos outros três e pesquisa a criatividade e o amor nas
ações estéticas do cidadão comum, que segundo Beuys é artista. Acreditamos que
as mudanças operadas no homem contemporâneo, suas descobertas e avanços
tecnológicos possibilitem transformações radicais nas relações homem/homem;
homem/vida. A internet vem ao nosso encontro para difundir as ações estéticas e
nos alertar contra a falta de ação por parte dos indivíduos.
A criatividade foi apresentada, neste trabalho, por vários pensadores e artistas.
Podemos observar no nosso entorno a emergência de uma preocupação
generalizada com o futuro. Os meios de comunicação oferecem múltiplos
exemplos de ações de indivíduos possuidores da antropoética de Morin, da
criatividade em construir o futuro de Prigogine e da busca de um ideal admirável
de Peirce. Da arte como ação de Beuys. Do artista como propositor de Lygia e a
defesa da vida e da natureza de Krajcberg.
A nossa intenção é mostrar que atitudes generosas podem fazer parte do nosso
cotidiano. Para embasar o nosso trabalho, tiramos exemplos em reportagens de
jornais e em diversas dias. Constatamos, infelizmente, que a porcentagem de
atitudes hedônicas é bem menor que as atitudes agônicas. Isso porque, nossa
vida é pautada pelas competições, pelas relações de poder, pela valoração
econômica e social etc. O cenário atual é predominantemente predador e imbuído
da idéia de que os fortes sobreviverão. No entanto, não podemos perder a
esperança, pois a busca por um futuro diferenciado passa pela educação da
sensibilidade. As atitudes estéticas são o vislumbrar de novos tempos. Os
exemplos das ações estéticas, no anexo, também podem ser vistos em muitos
filmes, como no apresentado acima - “A Corrente do Bem”.
Nos capítulos anteriores apresentamos os anseios e medos de artistas e
pensadores. Continuamos com esses anseios e oferecemos no anexo da tese
reportagens de ações estéticas gratificantes.
140
Entre as reportagens há a de um pedreiro que reuniu livros e criou uma biblioteca
em sua casa: “A casa do pedreiro virou biblioteca”. O Sr. Carlos Leite, por amar os
livros, arranjou uma forma de compensar seus problemas, tornando-se coletor de
livros que seriam descartados. Leite movido pela curiosidade da leitura e pelas
dificuldades, ao longo da vida, de ver realizado os seus sonhos cria uma biblioteca
comunitária. Atualmente possui mais de 10.000 livros que enriquecem sua
biblioteca. Acreditamos que atitude como essa é de uma beleza o grande, que
pode ser chamada de ação estética por estar impregnada de amor a vida e ao
próximo.
Outra reportagem é sobre uma senhora coletora de remédios: “Aposentada
amplia farmácia comunitária no quintal de casa”. Na mesma direção da
reportagem da biblioteca, essa, também, é fruto do trabalho de amor aos seus
semelhantes. No anexo as reportagens nos emocionam e nos animam a tirar das
atitudes mostradas, lições de vida e exemplos a serem seguidos, para
trabalharmos em prol de outro futuro. Quando entendermos que todos nós somos
responsáveis pelo amanhã, agiremos de forma diferente.
Inúmeros vídeos são disseminados, na internet, com o intuito de alertar as
pessoas a terem novas visões e atitudes em prol da vida. No DVD anexo à tese é
possível encontrar vários exemplos. Abaixo alguns sites e textos que correm na
internet a fim de levar reflexão aos internautas. Depositamos muitas esperanças e
acreditamos que essa nova tecnologia possa aproximar e sensibilizar as pessoas.
Como afirmamos anteriormente a tecnologia é neutra, o uso dela pelos humanos
é que nos preocupa.
Sites:
http://www.youtube.com/watch?v=NNGDj9IeAuI&feature=channel
http://www.youtube.com/watch?v=aJUdLhsWVg4&feature=response_watch
http://www.youtube.com/watch?v=N0ykm1v9xbU
141
Um dos e-mails vem do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (não temos certeza da veracidade do remetente, mas parece de fundo
cientifico) e serve para reflexão: Oceano de Plástico
The Independent, Greenpeace e Mindfully
Ver essas coisas sempre servem para que nós repensemos nossos valores e
principalmente o nosso papel frente ao meio ambiente, ou o ambiente em que
vivemos.
Antes de Reciclar, reduza!
Um Oceano de plástico
Durabilidade, estabilidade e resistência a desintegração. As propriedades que fazem do
plástico um dos produtos com maiores aplicações e utilidades ao consumidor final,
também o tornam um dos maiores vilões ambientais. São produzidos anualmente cerca de
100 milhões de toneladas de plástico e cerca de 10% deste total acabam nos oceanos,
sendo que 80% desta fração vem de terra firme.
No oceano pacífico uma enorme camada flutuante de plástico, que é considerada a
maior concentração de lixo do mundo, com cerca de 1000 km de extensão, vai da costa da
Califórnia, atravessa o Havaí e chega a meio caminho do Japão e atinge uma profundidade
de mais ou menos 10 metros . Acredita-se que haja neste vórtex de lixo cerca de 100
milhões de toneladas de plásticos de todos os tipos.
Pedaços de redes, garrafas, tampas, bolas , bonecas, patos de borracha, nis, isqueiros,
sacolas plásticas, caiaques, malas e todo exemplar possível de ser feito com plástico.
Segundo seus descobridores, a mancha de lixo, ou sopa plástica tem quase duas vezes o
tamanho dos Estados Unidos.
O oceanógrafo Curtis Ebbesmeyer, que pesquisa esta mancha 15 anos compara este
vórtex a uma entidade viva, um grande animal se movimentando livremente pelo pacifico.
E quando passa perto do continente, você tem praias cobertas de lixo plástico de ponta a
ponta.
A bolha plástica atualmente está em duas grandes áreas ligadas por uma parte estreita.
Referem-se a elas como bolha oriental e bolha ocidental. Um marinheiro que navegou pela
área no final dos anos 90 disse que ficou atordoado com a visão do oceano de lixo plástico
a sua frente. 'Como foi possível fazermos isso?' - 'Naveguei por mais de uma semana sobre
todo esse lixo'.
Pesquisadores alertam para o fato de que toda peça plástica que foi manufaturada desde
que descobrimos este material, e que não foram recicladas, ainda estão em algum lugar. E
ainda o problema das partículas decompostas deste plástico. Segundo dados de Curtis
Ebbesmeyer, em algumas áreas do oceano pacifico podem se encontrar uma concentração
de polímeros de até seis vezes mais do que o fitoplâncton, base da cadeia alimentar
marinha
142
Segundo PNUMA, o programa das nações unidas para o meio ambiente, este plástico é
responsável pela morte de mais de um milhão de aves marinha todos os anos. Sem contar
toda a outra fauna que vive nesta área, como tartarugas marinhas, tubarões, e centenas
de espécies de peixes.
E para piorar essa sopa plástica pode funcionar como uma esponja, que concentraria todo
tipo de poluentes persistentes, ou seja, qualquer animal que se alimentar nestas regiões
estará ingerindo altos índices de venenos, que podem ser introduzidos, através da pesca,
na cadeia alimentar humana, fechando-se o ciclo, na mais pura verdade de que o que
fazemos à terra retorna à nós, seres humanos.
E-mail: sobre a necessidade de se educar a sensibilidade para a vida
Essa pergunta foi a vencedora em um congresso sobre vida sustentável.
"Todo mundo 'pensando' em deixar um planeta melhor para nossos filhos... Quando é que
'pensarão' em deixar filhos melhores para o nosso planeta?"
Passe adiante!
Precisamos começar JÁ!
143
Uma criança que aprende o respeito e a honra dentro de casa e recebe o exemplo vindo de seus
pais, torna-se um adulto comprometido em todos os aspectos da vida, inclusive em respeitar o
planeta aonde vive...
E-mail: para educar a sensibilidade adormecida e sem etiqueta de valor.
O e-mail abaixo tem o deo no Youtube. Chama atenção para a indiferença das
pessoas quando não são informadas do valor existente em algum produto, que
aqui no caso é um violinista. A sensibilidade do violinista
Joshua Bell, que levou
sua arte aos freqüentadores do metrô de NY. Joshua é o mesmo que foi citado no
capítulo 2 – (pag.80), por ter tocado com os meninos de Heliópolis.
E-mail:
QUANDO O LUXO VEM SEM ETIQUETA . . .Ninguém dá valor
Como a massa anônima é contaminada pelas aparências!!
Não sabe sequer consumir e apreciar cultura.
Quando o luxo vem sem etiqueta...
O cara desce na estação do metrô de NY vestindo jeans, camiseta e boné,
encosta-se próximo à entrada, tira o violino da caixa e começa a tocar com
entusiasmo para a multidão que passa por ali, bem na hora do rush matinal.
Durante os 45 minutos que tocou, foi praticamente ignorado pelos
passantes, ninguém sabia, mas o músico era Joshua Bell, um dos maiores
violinistas do mundo, executando peças musicais consagradas num
instrumento raríssimo, um Stradivarius de 1713, estimado em mais de 3
milhões de dólares.
Alguns dias antes Bell havia tocado no Symphony Hall de Boston, onde os
melhores lugares custam a bagatela de 1000 dólares.
A experiência, gravada em vídeo, mostra homens e mulheres de andar
ligeiro, copo de café na mão, celular no ouvido, crachá balançando no
pescoço, indiferentes ao som do violino. A iniciativa realizada pelo
jornal The Washington Post era a de lançar um debate sobre valor, contexto
e arte.
A conclusão: estamos acostumados a dar valor às coisas quando estão num
contexto.
Bell era uma obra de arte sem moldura. Um artefato de luxo sem etiqueta de
grife.
O vídeo da apresentação no metrô está no YouTube:
http://www.youtube.com/watch?v=hnOPu0_YWhw
E-mail: que mostra o direcionamento errôneo do criar.
144
O professor precisa investir na relação entre o olhar, o sentir e o criar de criança.
Deve deixar o aluno criar livremente e não dar receitas para o ato da criação. A
cada momento o olhar muda em relação ao sentir. Uma rosa em um momento
pode espelhar a beleza da vida e ser maravilhosa e em outra espelhar os
espinhos. O modelo serve para dar um start, não para servir de copia. Posso olhar
a rosa e ver somente o vermelho, o orvalho etc. A cópia despedaça a criação.
Exemplo do que um professor de arte NÃO deve fazer!!!
Era uma vez um menininho bastante pequeno
Que contrastava com a escola bastante grande.
Uma manhã, a professora disse: Hoje nós iremos fazer um desenho. "Que bom!"- pensou o
menininho. Ele gostava de desenhar leões, tigres, galinhas, vacas, trens e barcos.
Pegou a sua caixa de lápis de cor e começou a desenhar.
A professora então disse: Esperem, ainda não é hora de começar!
Ela esperou até que todos estivessem prontos.
Agora, disse a professora, nós iremos desenhar flores.
E o menininho começou a desenhar bonitas flores.
Com seus lápis rosa, laranja e azul. A professora disse: Esperem! Vou mostrar como fazer. E a flor
era vermelha com caule verde. Assim, disse a professora, agora vocês podem começar.
O menininho olhou para a flor da professora E depois olhou para sua flor.
Gostou mais da sua flor, mas não podia dizer isso.
Virou o papel e desenhou uma flor igual a da
professora.
Era vermelha com caule verde.
Num outro dia, quando o menininho estava em
aula ao ar livre,
A professora disse:
Hoje iremos fazer alguma coisa com o barro.
"Que bom"!!!, pensou o menininho.
Ele gostava de trabalhar com barro.
Podia fazer com ele todos os tipos de coisas:
elefantes,
Camundongos, carros e caminhões.
Começou a juntar e amassar a sua bola de barro.
Então, a professora disse:
Esperem, não é hora de começar!
Ela esperou até que todos estivessem prontos.
Agora, disse ela, nós iremos fazer um prato.
Ele gostava de fazer pratos de todas as formas e
tamanhos.
A professora disse: - Esperem! Vou mostrar como
se faz.
Assim, agora vocês podem começar.
E o prato era um prato fundo.
O menininho olhou para o prato da professora e
depois par a seu próprio prato.
145
Gostou mais do seu,
mas não poderia dizer isso.
Amassou seu barro numa grande bola novamente
e fez um prato fundo,
Igual ao da professora.
E muito cedo o menininho aprendeu a esperar e a
olhar e fazer as coisas
Exatamente como a professora.
E muito cedo ele não fazia coisas por si próprio.
Então aconteceu que o menininho
teve que mudar de escola.
Era uma escola ainda maior que a primeira.
Um dia a professora disse: Hoje vamos fazer um desenho.
"Que bom!"- pensou o menininho, Esperando que a professora dissesse o que fazer.
Ela não disse, apenas andava pela sala. Então veio até o menininho e disse: Você não quer
desenhar? Sim, e o que nós vamos fazer? Eu não sei até que você o faça. Como eu posso fazê-lo?
Da maneira que você gostar! E de que cor?
Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas cores, como eu posso saber o que cada
um gosta de desenhar?
Eu não sei...
Então o menininho começou a desenhar uma flor vermelha Com caule verde...
E-mail que mostra a nossa preocupação em relação à ação – Ações Estéticas –
Faça a diferença
Muitas vezes são as próprias crianças que educam os mais velhos.
Um senhor IDOSO passeava na praia e viu um menino que pegava estrelas do mar e as atirava
suavemente de volta à água.
O velho perguntou ao menino:
- O que você esta fazendo?
- O sol está subindo e a maré baixando. Se eu não devolver estas estrelas ao mar elas irão morrer,
respondeu o garoto.
- Mas, meu jovem - disse o homem - há quilômetros de praias cobertos de estrelas do mar. Você
não vai conseguir fazer nenhuma diferença atirando uma ou outra ao mar!
O menino curvou-se, pegou mais uma estrela e atirou-a, carinhosamente, de volta ao oceano, e
disse:
-
FIZ A DIFERENÇA PARA ESSA AÍ!
Todos sabemos que não podemos salvar o mundo, salvar nossa empresa, resolver todos os
problemas de nossos clientes.
Todos sabemos que não podemos assumir responsabilidade por tudo.
Mas, com certeza, podemos fazer a diferença para alguém, para algum cliente, para um
companheiro ou companheira e para que nosso ambiente de trabalho seja melhor e mais
produtivo, para um filho, uma esposa, um amigo, e para que alguém seja mais feliz!
146
Temos que fazer a diferença nem que seja para apenas uma estrela do mar!
Fazer a diferença significa:
Se comprometer mais; Ajudar mais; Participar mais; Agir mais.
Os e-mails mostrados acima são a prova que podemos agir que podemos mudar
hábitos enraizados. Este trabalho poderia conter inúmeros e-mails construtivos.
Escolhemos alguns entre a quantidade enorme de bobagens que circulam na
internet. No entanto, esses poucos selecionados, mostram a importância da
tecnologia como auxiliar na construção do futuro. O importante é a vontade de
cada um de nós.
6. 1. Inconclusão para o Futuro
A intenção primeira desta tese era continuar a dissertação de mestrado “O Corpo
Tecnológico como Suporte Artístico no Caminho do Pós-humano”
122
, que aborda a
relação arte/ciência e artistas/ficção científica como responsável por diversas
descobertas científicas de interesse global.
À medida que a pesquisa se desenvolvia o foco da ação dos artistas mudava.
Achamos que seria oportuno investir na sensibilidade, para sedimentarmos o
terreno atual, visando às futuras decisões sobre o uso das tecnologias, da defesa
da vida e do planeta. Ao desviarmos o percurso, em nenhum momento,
abandonamos as idéias da dissertação de mestrado, na qual o artista é visto como
visionário e pioneiro de descobertas. A essência do trabalho continua voltada para
a ação do artista como vanguarda de proposições, ações e pensamentos. A
relação arte/ciência, ou melhor, sensibilidade/descobertas tem como meta
despertar sentimentos latentes que aguardam pequenos impulsos para emergir.
122
Dissertação de mestrado defendida na PUCSP
147
No decurso da tese surgiram as ações estéticas
123
, uma possível realidade movida
por desejos utópicos, a serem trabalhadas e ampliadas em prol de um mundo
melhor. Os exemplos de ações estéticas, mesmo em menor número frente às
violências tão comuns, não podem ser descartados pela dimensão, porque embora
sejam pequenas em quantidade são enormes na qualidade. As mudanças quando
ocorrem são motivadas por idéias utópicas, que se apresentam tímidas e com o
tempo se desenvolvem. Como disse Madre Teresa de Calcutá:
Por vezes
sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água no mar. Mas o
mar seria menor se lhe faltasse uma gota.”
Defendemos a união da arte e da ciência. Acreditamos no lado positivo das
grandes descobertas científicas, assim como os pensadores elencados. Confiamos
na arte como instrumento de ajuda à emergência de grandes idéias e de grandes
ações. O que nos atormenta não é a descoberta em si, pois as tecnologias não são
nem boas e nem ruins, mas o uso que se faz delas é que mostra o problema.
Estamos convictos de que é por meio das novas descobertas tecnológicas que a
fome no mundo, a mortalidade infantil e a violência, entre tantos outros males,
cheguem ao fim. Mas ao mesmo tempo compreendemos que falta sensibilidade
econômica e política aos nossos dirigentes para que essas descobertas sejam
direcionadas para um caminho diferente do atual. Em virtude do medo que nos
assola preferimos dirigir nossa ação na direção dos exemplos e da educação, com
ênfase no sentir, para que no futuro as atitudes dos cidadãos e as grandes
decisões sociais e políticas sejam tomadas por indivíduos voltados para o bem
comum.
Cornelius Castoriadis
124
é uma ajuda importante sobre possíveis caminhos da
sociedade. Relembra a experiência traumática de Hiroshima para questionar o uso
123
As ações de um modo geral são entendidas como éticas. Nesse trabalho o termo “ações estéticas” foi
cunhado com o intuito de enfatizar a ação por meio do amor ao próximo, a espécie e ao planeta. O nome
estética, no lugar de ética, reflete a beleza de que essas ações estão impregnadas. Resumindo: ão estética
representa difundir amor e beleza no mundo, por meio de ações.
124
Cornelius Castoriadis. Turco de nascimento (1922) viveu na França desde 1945 e foi considerado um
dos maiores nomes da filosofia francesa do sec. XX. Morreu na França em 1997.
148
da tecnologia e as desculpas que foram dadas por essa tragédia: “Não queríamos
isso! Não conhecíamos as suas conseqüências!”. Castoriadis questiona essas
respostas:
Então por que vocês continuam a fazer agora coisas, cujas conseqüências nem vocês nem
ninguém pode prever, e que são profundamentes análogas a outras, cujos resultados
horríveis já conhecemos?” (1992:82)
E para exemplificar a falta de rumo, utiliza-se da historia de “Alice no País das
Maravilhas”:
“__ Por favor _ disse Alice ao Gato de Cheshire _, você pode me dizer que caminho eu deveria
pegar daqui pra frente?
___ Isso depende muito do lugar aonde você quer ir __ disse o Gato.
___ Pouco me importa __ disse Alice.
___ Então, também pouco importa saber que caminho você pega __ disse o Gato.
___ ...desde que eu chegue a algum lugar __ acrescentou Alice, a título de explicação.
___ Oh, é certo que você chegará __ disse o Gato __, que você precisa caminhar muito
tempo.” (1992:82)
Castoriadis argumenta:
Se não se sabe aonde se quer ir, como e por que escolher um caminho de preferência a
outro? Quem, dentre os protagonistas da tecnociência contemporânea, sabe realmente
aonde quer ir, não do ponto de vista do “puro saber”, mas quanto ao tipo de sociedade
que desejaria e às vias que conduzem a ela? (1992:82)
A escolha de caminhos é uma tarefa árdua e, por isso, reafirmamos que
trabalhamos com idéias utópicas e não com certezas. É impossível se saber
a
priori,
e nem queremos, os resultados de nosso trabalho como artista, pesquisador
e educador. Os pensadores e artistas descritos aqui, também, pregam a incerteza
nas ações criativas. Os devaneios são fruto da liberdade de agir sem a certeza das
respostas absolutas.
Nesse sentido, Michel Serres
125
afirma que sem utopia não evolução e
responde a uma pergunta sobre a utopia da globalização do conhecimento:
Não há progresso sem utopia. A maioria das grandes descobertas ou a maioria dos
progressos locais que fazemos vem, sem dúvida, do sonho de alguém que nos precedeu,
como uma espécie de utopia. Acontece que, na tradição filosófica, todos os grandes
125
Michel Serres esteve no Brasil em 1999 e foi entrevistado no programa Roda-Viva da TV Cultura. A
referência é o site da FAPESP, no qual a encontra-se a integra da reportagem.
http://www.rodaviva.fapesp.br/materia_busca/386/michel%20serres/entrevistados/michel_serres_1999.htm)
149
filósofos globalizaram o saber. (...) A
Enciclopédia
, no sentido do Iluminismo, no século
XVIII, foi também uma tentativa de globalização do saber. Então, faço parte, embora seja
utópico, de tal tradição e acredito que não se pode fazer filosofia sem ter uma sólida
formação enciclopédica. Um filósofo deve empreender esses trabalhos um pouco heróicos
e tentar, não se consegue isso todo dia, é claro..., mas tentar, em sua vida, trazer algo
como uma idéia global do saber. Sim, acredito nisso, embora seja utópico. (Serres. Roda-
Viva. 1999)
Enfatizamos que as tecnologias provocam visões diferentes na sua relação com a
vida. A invenção da fotografia no inicio trouxe aos artistas o medo de perder suas
funções, mas, ao contrário, possibilitou que captassem detalhes que o olho perdia,
portanto, expandiu a visão. Michel Serres
126
afirma que tudo que se perde com as
mudanças se ganha de forma diferente, daí ser um otimista convicto:
Eu tinha um professor... era um homem admirável e que descrevia a maneira pela qual o
homem se levantou. Ele estava de quatro e levantou. E ele nos mostrava, ficando de
quatro, que as duas mãos é que sustentavam o corpo. E quando o corpo se levantou, dizia
ele, as mãos perderam a função de sustentar. Perderam a função de sustentar, mas
adquiriram a função de pegar, portanto, a o apareceu. Mas, antes, quando estávamos
de quatro, a boca tinha a função de pegar, que as mãos estavam ocupadas. Portanto a
boca perdeu a função de pegar, não é? Mas ganhou a função de falar. E, desde que esse
professor me explicou tal fenômeno, tornei-me um homem otimista, porque ouço todo
mundo dizer: "Perdemos o humanismo, perdemos os valores, perdemos a memória. Os
jovens não têm mais memória, não têm mais imaginação por causa das imagens.
Não têm
possibilidade de fazer cálculos, porque existe a calculadora". Mas é melhor assim, não é?
Porque é justamente quando se perde a função que percebem que
perder a sustentação
não é nada, que os pés dão conta. Mas ganhar as os nos tornou uma espécie que
pode ser pianista ou então cirurgião, prestidigitador. As mãos são um órgão extraordinário,
portanto, se ganha muito mais do que se perde. Perder isso ou aquilo implica ganhar
coisas extraordinárias, porque, de certa forma, até o cérebro perdeu algumas coisas e está
livre para inventar. E, como historiador de ciências, posso testemunhar isso. É porque no
Renascimento perdeu-se a memória da erudição que inventaram as ciências
experimentais, porque, ao invés de copiar as ciências em livros, olhava-se apenas a
realidade das coisas. Sou otimista por causa disso. (Serres. Roda Viva 1999)
126
Michel Serres nasceu em 1930, na França. A trajetória intelectual e acadêmica de Serres é
multidisciplinar. O filósofo tem sólida formação em ciências exatas: matemática e física é também
historiador da ciência e epistemólogo. Escreveu sobre os contatos entre as ciências exatas - ciências duras, as
ciências humanas, sobre literatura, estética, antropologia e as relações do homem com a natureza. Além de
tratar dos desafios da educação no mundo de hoje, preocupa-se com questões éticas suscitadas a partir da
bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki. Ele é um intelectual comprometido com o uso do saber e da
comunicação na construção da paz.
150
Outra vertente otimista vem de Antoine de Saint-Exupéry
127
que aponta as
reflexões que surgem aos homens no contato com as tecnologias. As invenções
aparecem no início como um simples diferencial prático, mas com o tempo
adquirem uma potencialidade de análise e reflexão sobre a vida. As máquinas têm
a capacidade de transformar nosso olhar em relação a nós mesmos e ao mundo:
O uso de um instrumento sábio não faz de você um técnico seco. Sempre me pareceu que
as pessoas que se horrorizam muito com nossos progressos técnicos confundem o fim
com o meio. (...) Sem dúvida, o avião é uma quina mas que instrumento de análise!
Esse instrumento nos permitiu descobrir a verdadeira fisionomia da terra. (...) Se às vezes
julgamos que a máquina domina o homem é talvez porque ainda não temos perspectiva
bastante para julgar os efeitos de transformações tão rápidas como essas que sofremos.
(1979:37)
Se Saint-Exupéry está correto, em acreditar na possibilidade das máquinas
ajudarem ao homem a se reconhecer, podemos ter esperança que no futuro as
descobertas científicas permitam uma mudança nos comportamentos e no
afloramento da sensibilidade. O nosso intuito é investir na prática constante da
sensibilidade e do amor. Encontramos em Serres a possível resposta para nossas
aflições, ao responder a seguinte pergunta: Será que a violência pode ser
suprimida? Serres responde:
Minha resposta é, infelizmente: provavelmente não. É provável que a violência nunca
possa ser erradicada, mas o que temos à nossa disposição é negociar sempre a violência a
fim de dirigi-la, canalizá-la e transformá-la. (...) alguns se dirigem a política, outros a
religião. O que é cultura? A cultura é a negociação de nossa violência essencial. (...) A
127
Antoine de Saint-Exupéry
nasceu em Lyon, França, em 29 de junho de 1900, numa família
aristocrática. Primeiro livro, “Correio do sul” (1929). Segundo romance, “Vôo noturno (1931), no qual
exaltou os primeiros pilotos comerciais, que enfrentavam a morte no cumprimento do dever. Registrou suas
próprias aventuras em “Terra dos homens” (1939). Na Segunda Guerra Mundial Saint-Exupéry serviu na
aviação aliada e quando a França ficou em poder dos nazistas fugiu para os Estados Unidos, onde escreveu
“Carta a um refém” (1943). A obra mais famosa é “O pequeno príncipe”(1943), na qual retrata um encontro
com um principe vindo de outro planeta. O livro a Cidadela foi publicado depois da sua morte (1948), Em
1943, voltou à força rea no norte da África e morreu em missão, em 31 de julho de 1944. rumores que
deixou uma carta: “Eu não me preocupo se eu morrer na guerra (...) Mas se eu voltar vivo desse 'trabalho'
ingrato, mas necessário, haverá apenas uma questão para mim: O que dizer da humanidade? O que dizer para
a humanidade?"
http://www.mayrink.g12.br/pp/exupery.htm
151
cultura é o que nos salva da violência e nós, homens, inventamos a cultura para não nos
matarmos uns aos outros. (Serres. Roda Viva. 1999)
Serres vai além e, no livro “Luzes”, postula três leis para que o mundo tenha
menos males. A partir do mandamento cristão “Não Matarás”, Serres amplia a
abrangência deste nos três postulados:
A primeira: Não te entregarás à violência, não só contra este ou aquele indivíduo, estranho
ou próximo, mas também contra a espécie humana global. A segunda: Não te entregarás
à violência, não mais somente contra o que jaz ou vive na tua vizinhança, mas em relação
ao planeta Terra inteiro. E, a terceira: Não te entregarás, enfim, a nenhuma violência em
espírito, pois, desde que ingressa na ciência, o espírito supera a consciência ou a intenção
e se torna o principal multiplicador de violência.
Quase nunca observada até aqui, esta ultima lei concerne aos cientistas, aos técnicos, aos
inventores e inovadores, aos escritores e filósofos.
(...) Antes de organizar o bem de outrem, o que muitas vezes significa fazer-lhes violência,
ou seja, mal, a obrigação mínima exige que se evite cuidadosamente fazer-lhe esse mal.
A obrigação máxima consistiria, antes, em amar, não a pessoa mais próxima, como
todos os conjuntos globais, indivíduos, coletivos, seres vivos e inertes: para tanto, é
preciso mais do que uma moral. (Serres.1999:263-264)
A ação do cientista é bem explicada por Serres. E na busca de minimizar as
mazelas da vida depositamos nas ações estéticas o caminho. A ação na arte e na
ciência podem em conjunto propiciar a difusão do amor coletivo. Saint-Exupéry ao
defender novas visões pelas tecnologias nos anima. Ao vermos a reportagem:
Robô - Mais emoção, na qual o humanóide Kobian
128
foi criado para expressar as
emoções humanas como: tristeza, repulsa e surpresa, nos permite acreditar que é
possível que o contato dos humanos com máquinas sentimentais possam
desenvolver uma maior afetibilidade. Enfatizamos que nós humanos, nem todos,
em busca de um “progresso” nos tornamos máquinas também, embora, tenhamos
criado essas ferramentas como se nos olhássemos no espelho. Ao sabermos que o
nosso contato com nossos inventos têm uma função recursiva, nós modificamos a
sociedade por meio de novas descobertas e, essas nos transformam.
128
www.roboticsblog.org
152
Repulsa Tristeza
Surpresa
O que defendemos é a possibilidade da correção de nossos defeitos em relação à
falta de amor, a partir de máquinas emocionais. Quem sabe o contato dos
humanos com robôs sentimentais ajude o homem a se conhecer como ser
sensível!? Outro exemplo vem do filme Inteligência Artificial
129
.
David (Haley Joel Osment) é um robô meca-filho que é cópia fiel de uma criança
humana. Esse robô é programado para servir como filho e amar incondicionalmente a
mãe. O pequeno robô, ao ser ativado para amar, passa a sonhar - como Pinóquio - em se
tornar humano para ganhar o amor de sua mãe. O filme passa em um tempo futuro,
em que o efeito estufa derreteu a calota polar, matou bilhões de pessoas e afundou
cidades costeiras como Nova Iorque e Amsterdã. A população está divida entre orgas - os
orgânicos, e os mecas - os mecânicos, os orgas estão proibidos de procriar. A grande
questão, inicialmente destacada pelo cientista, é a capacidade de um meca amar um orga,
mas no decorrer do filme essa posição se inverte e trás outra questão: Será um humano
capaz de amar um meca?
129
http://www.adorocinema.com/filmes/ai/ai.asp
153
Esse filme nos permite esperar que os humanos possam aprender a amar como
as máquinas.
Além da possibilidade das máquinas mostrarem atitudes de amor, chamamos a
atenção para as atitudes de amor ao próximo vindo dos animais. No anexo do
trabalho é possível encontrar várias reportagens de ações estéticas feitas pelos
seres ditos “irracionais”. No entanto, uma em particular, nos chamou atenção por
se tratar de uma cadela que leva seu carinho aos animais abandonados.
Em 2003, a polícia de Warwckshire, Inglaterra, abriu um galpão de um jardim e encontrou
ali um cão choroso e encolhido. Ele havia sido trancado e abandonado no galpão. Estava
sujo, desnutrido e claramente maltratado.
Num ato de bondade, a polícia levou o cão para um abrigo próximo, o Nuneaton
Warwickshire Wildlife Sanctuary, dirigido por um homem chamado Geoff Grewcock. Lugar
este conhecido como um paraíso para animais abandonados, órfãos ou com outra
qualquer necessidade. Geoff e a equipe do Santuário trabalharam com dois objetivos:
restaurar a completa saúde do animal, e ganhar sua confiança. Levou várias semanas,
mas finalmente os dois objetivos foram alcançados.
Deram a ela o nome de Jasmine, e começaram a pensar em encontrar para ela um lar
adotivo. Mas Jasmine tinha outras idéias. Ninguém se lembra como começou, mas ela
passou a dar as boas vindas a todos os animais que chegavam ao Santuário. Não
importava se era um cachorrinho, um filhote de raposa, um coelho ou qualquer outro
animal perdido ou ferido. Jasmine se esgueirava para dentro da caixa ou gaiola e os
recebia com uma lambida de boas vindas.
Geoff conta um dos primeiros incidentes: "Nós tínhamos dois cachorrinhos que foram
abandonados numa linha de trem próxima. Um era um mestiço de Lakeland Terrier e o
outro um mestiço de Jack Russel Doberman.
Eles eram bem pequenos quando chegaram ao centro e Jasmine aproximou-se e
abocanhou um pelo cangote e colocou-o em uma almofada. “Aí ela trouxe o outro e
aconchegou-se a eles, acarinhando- os”.
"Mas ela é assim com todos os nossos animais, até com os coelhos. Ela os acalma e
desestressa e isto os ajudam, não a ficarem mais próximos a ela, mas também a se
adaptarem ao novo ambiente"
"Ela fez o mesmo com filhotes de raposa e de texugos: ela lambe os coelhos e os porcos
da Guiné e ainda deixa os pássaros empoleirarem- se em seu nariz"
Jasmine, a tímida, maltratada, pária abandonada, tornou-se a mãe substituta dos animais
do Santuário, um papel para o qual ela nasceu.
154
A lista de jovens animais dos quais ela cuidou inclui cinco filhotes de raposa, quatro
filhotes de texugo, quinze galinhas, oito porcos da Guiné, dois cachorrinhos e quinze
coelhos.
E um cervo montês. O pequeno Bramble, com 11 semanas de idade, foi encontrado semi-
consciente em um campo. Na chegada ao Santuário, Jasmine aconchegou-se a ele para
mantê-lo aquecido e assumiu inteiramente o papel de mãe substituta. Jasmine cumula
Bramble de afeição e não deixa que nada lhe falte. "Eles são inseparáveis", diz Geoff.
"Bramble anda entre suas pernas e eles ficam se beijando...Eles passeiam juntos pelo
Santuário. É um prazer vê-los":
Jasmine continuará cuidando de Bramble aque ele possa voltar a viver na floresta e quando isto
acontecer, Jasmine não estará sozinha. Ela estará muito ocupada distribuindo amor e carinho ao
próximo órfão ou a próxima vitima de abusos e maus tratos.
UM VERDADEIRO EXEMPLO DE AMOR INCONDICIONAL! VOCÊ CONHECE MUITOS SERES CAPAZES
DISSO???... JASMINE ESTÁ AÍ PARA ENSINAR...
http://muitoalmdospassarinhos.blogspot.com/
Mais um exemplo de cena tocante com animais aconteceu na Ásia:
Um cachorro foi visto no meio de uma avenida com muito trânsito cuidando de seu amigo que foi
atropelado por um carro. Usando a pata,
155
cachorro tentava acordar o amigo que estava morto.
Apesar do tráfego pesado, o cachorro não abandonava o amigo.
O cachorro tentava empurrar seu amigo para fora da avenida. E quando alguma pessoa tentava
ajudar, ele rosnava e afugentava os que se aproximavam dele.
As pessoas ficaram impressionadas como um cachorro vira-lata podia ser tão leal!
Acreditamos que o amor entre esses dois cães passaria completamente
despercebido aos olhos do público se o mundo respirasse um clima consistente de
amor e compreensão. Como vivemos um momento de individualismo exacerbado
o fato teve uma conotação enorme. Em virtude da aceitação calorosa da cena
mostrada é que acreditamos que exemplos como esses toquem cada vez mais os
corações carentes. Essa constatação de receptividade é que nos anima a acreditar
que as ações estéticas possam ser efetivas para um futuro diferenciado.
As reportagens acima, para muitos, no que diz respeito à academia, seriam
totalmente inúteis e fora dos padrões. No entanto, a nossa idéia é ligar a tese à
vida em uma visão transdisciplinar. Utilizamos as reflexões do escritor Martin
Page
130
que investe, por meio de seu personagem Antoine, na necessidade da
academia se voltar para a curiosidade e as paixões humanas. Antoine sua
130
Martin Page - nasceu em 1975, escritor frances, que estudou antropologia, mas não se formou por não
concordar com as divisões do curso em disciplinas. Escreveu “Como me Tornei Estúpido”, no qual faz uma
critica aos valores do mundo atual e as instituições de ensino que impõe aos alunos disciplinas que são
fragmentadas.
Resenha do livro feita pelo Instituto Hypnos: “Porque no acúmulo de sabedoria, acumula-se tristeza, e quem
aumenta a ciência, aumenta a dor” (Eclesiastes, 1,18). É esse o mote que Antoine, um erudito cujos
conhecimentos sempre interminados, que vagam da biologia à metafísica, passando por seus sólidos
conhecimentos de… aramaico, arroga para sua nova empreitada: tornar-se estúpido.
Martin Page constrói um personagem memorável. Antoine é um curioso, que tem uma relação visceral com o
conhecimento, para além da vida acadêmica regular. (...) O personagem é crítico, ácido e odeia o mundo das
burocracias, obrigações desprazerosas e da ignorância contumaz. Entretanto, descobre-se, por isso mesmo,
doente. Sofre da patologia daqueles que pensam demais e que, como diz o sábio livro da Sabedoria, têm sua
dor de viver aumentada em proporção direta à sua lucidez. O autor mostra a decisão de Antoine diante desse
quadro irreparável: abdicar de sua consciência e inteligência e tornar-se retumbantemente estúpido.
http://www.institutohypnos.org.br/v4/index.php/2009/06/como-me-tornei-estupido-martin-page/
156
versão do que uma tese não deveria ser afirmar verdades e conter respostas
absolutas. Para tanto, critica e ironiza Rodolphe seu colega e contumaz
contraditor:
Rodolphe dava um curso de filosofia intitulado “Kant ou o reino do pensamento absoluto”.
Típico produto do sistema educacional, Rodolphe podia obter o grau de mestre dentro de
dois anos, passar a professor dentro de 7 anos e morrer completamente esquecido uns
sessenta anos depois, deixando uma obra que influenciagerações e gerações de
traças. (2005:33)
Antoine é o típico representante do pensamento complexo, pois prega a incerteza
e a preocupação com o todo da vida. Representa a dúvida:
O ser humano era tão vasto e tão rico que não poderia haver maior vaidade neste mundo
que estar demasiado seguro de si mesmo. (...) Acreditava razoavelmente em si mesmo,
esforçava-se por não acreditar demasiadamente, por não concordar facilmente com o que
ele próprio pensava, pois sabia como as palavras do nosso espírito gostam de nos prestar
serviço e nos reconfortar logrando-nos. (2005: 13-14)
Rodolphe, ao contrário, é a escarnação das certezas e das verdades:
Afirmava, como bom filósofo que era, que produzia atos e pensamentos puros pela simples
operação da sua vontade todo-poderosa e do seu perfeito livre-arbítrio. Antoine zombava
dele, relembrando-lhe as contingências e os múltiplos determinismos que pesam sobre os
seres humanos. (2005:33)
Antoine torna-se um crítico severo das diretrizes educacionais vigentes, em
virtude, das experiências que teve no percurso acadêmico. Como aluno, Antoine
assiste às aulas que o interessam como ser e não as ligadas a um programa
oficial. Fica totalmente aborrecido com provas que pedem respostas como sim ou
não, por achar que é uma enorme limitação das questões complexas. E questiona:
Ser curioso, querer compreender a natureza e os homens, descobrir as artes deveria ser a
tendência de todo e qualquer espírito. Mas, se assim fosse, com a atual organização do
trabalho, o mundo deixaria de girar, simplesmente porque aquilo demanda tempo e
desenvolve o espírito crítico. Ninguém trabalharia. (...) Não é possível viver
demasiadamente consciente, demasiadamente pensante. Aliás, observemos a natureza:
tudo o que vive muito e contente não é inteligente. As tartarugas vivem séculos, a água é
imortal, e Milton Friedman
131
está sempre vivo. (...) A organização social das formigas, por
131
Milton Friedman nasceu em Nova York, no dia 31 de julho de 1912, sendo originário de uma família
muito pobre, cujos pais emigraram da Rússia. Defensor dos princípios do liberalismo permaneceu na
Universidade de Chicago de 1946 a 1977. A partir de 1977 desenvolveu seu trabalho na Hoover Institution e
157
exemplo, é muito mais bem-sucedida do que jamais será a nossa e nenhuma formiga tem
cátedra na Sorbonne. (...) Estou convencido de que a inteligência é uma virtude
compartilhada pelo conjunto da população, sem distinção social: igual porcentagem de
pessoas inteligentes entre profs. e outras profissões
132
(...) Encontrar alguém inteligente e
sensato não é função do diploma; não teste de Q.I. para revelar o que se poderia
chamar bom senso. (2005:58-64)
As críticas defendidas por Antoine nos ajudam na procura por possíveis caminhos
em direção ao futuro. A atualidade dos pensadores, artistas e indivíduos que se
entregam às ões estéticas, nesta tese apresentados, nos permite acreditar em
um novo futuro. Uma vez que presenciamos gestos, ações e pensamentos de
amor que se derramam pela vida. Sonhar, imaginar, projetar: o período de guerra
cedendo lugar ao de paz, a lógica da ganância cedendo lugar à lógica da partilha é
a nossa utopia. E incentivar a conquista de uma consciência em que cada parte
faz parte de um só todo em uma relação de interdependente responsabilidade.
A fusão da sensibilidade com a razão e os desdobramentos desta fusão estão na
base das reflexões de Peirce sobre a realidade do Ágape - Agapismo, o terceiro
modo de evolução, na doutrina peirceana. O termo significa Amor e em Peirce
origina a lei do amor evolucionário. As reflexões de Ilya Prigogine sobre a
liberdade e criatividade na construção do futuro, apontam na direção do amor
como base construtiva de um futuro diferenciado. Também nessa direção pode
surgir a função do artista como propositor de sensações diversas, atuando no
retorno da unidade do homem. A pesquisa enfatiza a ação estética como um
instrumento capaz de possibilitar transformações de vidas.
Vivemos em um sistema aberto, complexo, que permite a emergência da
criatividade, e esta é fruto da nossa liberdade de agir. Assim, podemos esperar
que o homem em contato constante com a poesia da vida, quer seja em obras de
arte ou em ações estéticas, possa interferir na condução do caminho evolutivo. Na
“Carta às Futuras Gerações”, Prigogine defende a ação dos jovens e a esperança,
foi agraciado com o Prêmio Nobel em 1976, por suas realizações nos campos de análise de consumo, história
e teoria monetária e por sua demonstração da complexidade da política de estabilização.
www.cofecon.org.br/index.php?Itemid
132
Explicação feita na Tese para completar o raciocínio da frase.
158
a visão otimista e a possibilidade do Reencantamento do mundo. Peirce e
Prigogine defendem a liberdade de agir e mostram a responsabilidade inerente a
essa liberdade.
A liberdade de criar abre caminho para a construção de um novo futuro. Lygia ao
dizer que não era artista, e sim, propositora mostra uma nova postura do artista
frente ao público. Krajcberg dedica sua vida a exibir os abusos do homem. Esses
artistas, como outros, criam um novo objeto artístico, pois esse deixa de ser o
resultado final – a obra – e passa a ser o próprio ato. A ação como poesia.
Visualizar a beleza na vida é uma das características de muitos artistas. Auguste
Rodin
133
pratica a biofilia, ao explicar à Paul Gsell porque gosta de colocar suas
esculturas nos jardins. “Geralmente as estátuas são colocadas num jardim para
embelezá-los. Estátuas devem ser colocadas para serem embelezadas pelo
jardim. A natureza é sempre a mestra soberana e a perfeição infinita.”
(Rodin.1990:10)
É possível que as obras de arte, as ações estéticas e a preocupação com o todo da
vida sejam movidas pela atração de um ideal admirável como Peirce afirmou, uma
vez que elas encarnam qualidades de sentimentos. Peirce em conjunto com os
artistas e pensadores citados, nos fazem acreditar que sentimento, ação e
pensamento se completam. Claude Lévi-Strauss
134
terminou o livro “Olhar Escutar
Ler” glorificando as artes:
O único meio de a obra de arte perpetuar-se é dar origem a outras obras de arte, que,
para seus contemporâneos, parecerão mais vivas do que aquelas que as precederam
imediatamente.
Vistas na escala dos milênios, as paixões humanas se confundem. O tempo não acrescenta
nem subtrai coisa alguma aos amores e aos ódios sentidos pelos homens, nem aos seus
compromissos, suas lutas e suas esperanças: ontem e hoje, são sempre os mesmos.
Suprimir ao acaso dez ou vinte culos de história não afetaria de modo sensível nosso
133
Auguste Rodin escultor frances nasceu em Paris em 1840 e morreu 1917.
134
Claude Lévi-Strauss. Nasceu em Bruxelas em 1908, antropólogo, professor e filósofo francês. É
considerado o fundador da Antropologia Estruturalista. Residiu no Brasil entre 1935 1939, como membro
da missão universitária francesa que colaborou na criação da USP.
159
conhecimento da natureza humana. A única perda insubstituível seria a das obras de arte
que tais séculos teriam visto nascer. Pois os homens não diferem, e nem existem, senão
por suas obras. (1997:139)
Enfatizamos que é o sentimento de amor que nutre e contribui para a evolução
do cosmos, da natureza e das pessoas. Ao gerenciar as ações, o amor, aponta
para a possibilidade de ocorrer a tão esperada transição da cultura da guerra para
a cultura da Paz, defendida por Prigogine. A única certeza que temos, neste
trabalho, é o incentivo para as ações estéticas. O resultado dessas ações fica na
esfera da incerteza no amanhã. As possíveis respostas dos acertos e dos erros da
nossa pretensa utopia só o tempo responderá. Esperamos que nossa Utopia e
Agathopia possam crescer indefinidamente como todo ideal inatingível.
Acreditamos nas afirmações de Peirce de que a grande lei do universo, a lei da
mente e da aquisição de hábitos, possa difundir idéias e afetar outras que se
encontrem em relação.
As afirmações de Vieira sobre a tendência das coisas vivas em permanecer, não
podem ser esquecidas. O ser vivo para permanecer precisa se adaptar ao meio e
mudar conforme as necessidades, senão fenecerá. A exigência de adaptações e
mudanças talvez consiga um milagre não conseguido até a presente data. Quem
sabe que em nome da sobrevivência o ser humano adquira bitos de amor ao
próximo e a vida? O recurso de amor como salvação de um e de outro vai ao
encontro do filme “Uma mente brilhante” quando Nash discorda da afirmação de
Adam Smith
135
. E, no filme “Perfume de Mulher”, no qual Tereza Mendonça
136
explica a relação aberta e não paranóica entre pai e filho, que substitui a
rivalidade pela solidariedade. Essa relação como a de Nash mostra que o agir em
prol de todos é uma forma de agir para si mesmo:
Em “Perfume de Mulher”, estabelece-se uma relação pai-filho entre os personagens
principais, em que a salvação de um está diretamente ligada à salvação do outro, e cada
135
Ver pag. 140
136
Dra. Teresa Mendonça é psicanalista, doutora em Ciências Sociais e fundadora do Instituto da
Complexidade
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um salva-se a si mesmo, no momento mesmo em que pensa estar salvando o outro.
(2007:206)
Não podemos deixar de ressaltar o otimismo dos pensadores e artistas desta tese.
Beuys acredita na possibilidade de qualquer pessoa ser artista por meio da ação.
Lygia transforma o artista em propositor de sensações e Krajcberg mostra toda a
força da ação em prol da sobrevivência da natureza. Prigogine na “Carta às
Futuras Gerações” se confessa otimista e acredita no amanhã por meio dos
jovens. Peirce defende a existência do amor até mesmo no mal e Morin afirma
suas esperanças:
Sabemos que as grandes mutações são invisíveis e logicamente impossíveis, antes de
aparecerem. Sabemos também que elas aparecem quando os meios de que dispõe um
sistema tornam-se incapazes de resolver seus problemas. (...) Além disso, a
metamorfose não é impossível, mas improvável. Aqui surge um segundo princípio de
esperança: freqüentemente, o improvável surge na história humana. (...) É possível,
portanto, manter a esperança na desesperança. Acrescentemos a isso o apelo à vontade
face à grandeza do desafio. Embora quase ninguém tenha ainda consciência, jamais
existiu causa tão grande, tão nobre, tão necessária quanto a causa pela humanidade
para poder, ao mesmo tempo e inseparavelmente sobreviver, viver e humanizar-se.
(2003:20)
Terminamos com as esperanças de Carvalho, de Vinicius de Moraes, de Madre
Teresa de Calcutá e lançando os dados:
A educação do futuro pode vir a ser algo prazeroso, complexo, sintonizado na
incessante recriação de novas formas de entendimento para o sistema-mundo, fundadas
na co-responsabilidade, na esperança planetária, na eco-alfabetização, assim como na
aposta de que as futuras gerações serão as continuadoras de um longo processo
civilizatório cujo fim permanecerá sempre indeterminado. (2008:68)
“É, meu amigo, só resta uma certeza
é preciso acabar com essa tristeza
é preciso inventar de novo o amor”.
137
137
Vinicius de Moraes escreveu a letra da música “Carta ao Tom” em 1974, para relembrar o período dos
dois na criação musical. A letra fala de um Rio de Janeiro feliz que existe na memória, mas não na realidade.
Os amigos e parceiros sabiam que era importante defender o amor. Vinicius introduziu o amor repleto de
esperanças na musica brasileira. O amor que por si só vale a pena. Tom, naquela época, já mostrava sua
preocupação com a natureza. A letra completa pode ser consultada no anexo.
161
“Sei que o meu trabalho é uma gota no oceano, mas sem ele, o oceano seria
menor”
138
'Alea jacta est '
139
138
Frase de Madre Teresa de Calcutá.
139
'Alea jacta est' "Os dados estão lançados" - "A sorte está lançada" - foi a frase em latim supostamente
proferida por Júlio César ao tomar a decisão de cruzar com suas legiões o rio Rubicão, que delimitava a
divisa entre a Gália Cisalpina (Gália ao sul dos Alpes, que hoje corresponde ao território do norte da
Península Itálica) e o território da Itália. http://pt.wikipedia.org/wiki/Alea_jacta_est
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8. GLOSSÁRIO
As definições encontradas neste glossário foram obtidas dos autores identificados entre os
parênteses ou pelos autores da tese.
Ações Estéticas. Ações que transbordam de sentimento e amor ao próximo ao ambiente e a
natureza e por isso estão repletas de beleza. Esse termo foi criado para tese é um neologismo.
Agapismo Termo empregado por Peirce para designar a “a lei do amor evolutivo”, em virtude
da qual a evolução cósmica tenderia a um incremento do amor fraterno entre os homens.
(Abbagnano.2000:22)
Agatologia Nome raramente usado para a doutrina do bem como parte da ética.
(Abbagnano.2000:22)
Agathopia - Termo introduzindo no universo da Economia pelo economista James Edward Meade,
em 1989, no seu artigo
Agathopia: The Economics of Partnership: A tract for the Times Addressed
to All Capitalist and Socialist Who SeeK to make the Best of Both Worlds
- Hume Paper Número 16-
publicado pela Aberdeen University Press for the David Hume Institute, significa um bom lugar.
Pensado originariamente como uma ilha experimental de um novo regime sócio-político-
econômico, aos moldes da
Utopia
de Thomas More, porém com uma diferença significativa, os
agathotopianos (
Agathotopians
) não são perfeitos e não buscam uma sociedade perfeita, como na
ilha
Utopia
, mas são imperfeitos, em uma sociedade imperfeita, e, portanto necessitam encontrar
um modelo sócio-econômico político possível de ser concretizado e suficiente à correção e
aperfeiçoamento de suas imperfeições, de forma a lhe construir um Bom Lugar para viverem em
uma comunidade de parcerias consideradas as características específicas de cada parte.
Posteriormente este modelo arquitetado para a ilha chamada Agathotopia, adentrou o universo da
economia política como um original modelo de economia onde se procura juntar o que de
melhor do modelo capitalista com o que há de melhor do modelo socialista.
Ambos pensadores criativos cunharam termos para suas respectivas ciências e que se tornaram de
importância central em suas próprias doutrinas. Originários de duas próximas idéias concebidas por
duas mentes individuais separadas, no espaço-tempo histórico, será a correlação entre os dois
conceitos Agapismo e Agathotopia, a condição que permitirá a transposição do termo concebido
por Meade na sua doutrina econômica do século XX, para a doutrina filosófica do século XIX de
Peirce. O termo de um para aquele que acreditou no outro.
Agathón
= Bem
Tópos
= Lugar
A
Agathotopia
de Meade aparece no universo da economia política do culo XX como um modelo
de um Bom Lugar para se viver construído a partir das parcerias efetivadas entre as instituições.
Um Bom Lugar para se viver, arquitetado ao longo da história da humanidade por Utopias
diversas, e não alcançado exatamente porque buscavam o perfeito tão somente idealizado. Utopias
são construções imaginárias e não possíveis de serem testadas na experiência concreta da vida
cotidiana.
A tese de que é possível uma transposição do termo
Agathotopia
ao sistema de Peirce sustenta-se
exatamente na diferença entre os conceitos Utopia e Agathotopia, e na diferença da conotação
deste último em Meade, e em Peirce. A doutrina peirceana, original e única, o se reduz a uma
ficção filosófica ou literária, nem tampouco a uma idealização de um bom lugar para se viver, ou
um sistema político econômico para um Estado de Bem Estar Social, ou ainda um modelo para
uma conduta de vida para a felicidade, mesmo que se colocada à prova como o modelo do
economista Meade.
O foco realista do filósofo do culo XIX nos seus princípios universais do mundo fenomenológico
(doutrina das categorias), epistemológico e ontológico, conferiu-lhe uma prioridade que não esteve
colocado em modelos éticos de conduta de sociedades particulares para a conquista de um bem
170
geral, mas exatamente em uma lei operativa de conduta ética universal com reflexos individuais,
que geral e particular fazem parte de um mesmo todo naturalmente.
Com as categorias da fenomenologia primeiridade, segundidade e terceiridade; fundamento das
demais e muitas tríades da filosofia lógica-semiótica metafísica de Charles Sanders Peirce, ele
rompe com todo o tipo de dicotomia até então imperante na filosofia, o que foi possível porque ele
observou uma mesma lei operando na mente universal e nas mentes individuais (CP 7.46), em
continuum
movimento evolucionário, A lei do Amor Agápico Evolucionário Criativo.
Não nos sendo possível reproduzir todo o percurso por s identificado ao longo da pesquisa de
muitos textos dos estudiosos do filósofo Peirce, e dos seus próprios aos quais tivemos acesso, e
que escreveu mais do que podemos lê-lo na totalidade, mas que sua escritura quase que em cada
parte fala do seu todo, selecionamos em dois capítulos centrais aqueles pontuais que nos
conduziram ao centro do seu labirinto com nossos mapas nas os, como que brincando de
“seguir o mestre”. Iniciado no seu Agapismo e por ele conduzido ao que se nos apresentou como o
que estamos defendendo como sua Agathotopia, passando pelo seu Pragmaticismo e seu sistema
realista sinequista evolucionário. (DIB. 2008:4-5)
Esquema da
Agathotopia
(DIB. 2008)
Agônico – Relativo ou próprio da agonia. (http://www.portoeditora.pt/dol/default.asp?
param=08010100)
171
Ambiente Trata-se de um sistema que envolve um determinado sistema. Para que sejam
efetivados os mecanismos de produção de sistemas pela termodinâmica universal, é necessário
que os sistemas sejam abertos, ou seja, troquem matéria, energia e informação com outros; o
mais imediato desses costuma ser o seu ambiente. É através dessa interação que um sistema é
gerenciado pela evolução universal. (Vieira, 2000:6)
Auto-organização 1 – Está embebida do conceito de semiose, que é a ação do signo.
Auto-organização 2 – Organização espontânea da matéria. (Rosnay, 1997:409)
BEAUDELAIRE, Charles - Nasceu em 1821 e morreu em 1867. Poeta e teórico de arte francês. É
considerado um dos precursores do Simbolismo. Sua obra teórica influenciou profundamente as
artes plásticas do século XIX. A importante definição de Modernidade no livro “Sobre a
modernidade” é fundamentamental, pois para Baudelaire o verdadeiro artista procura sempre a
modernidade. E para conseguir ser moderno ele precisa captar, no momento presente, os traços
diferentes e transitórios, que apontam para o eterno. Trata-se, para ele, (o artista) de tirar da
moda o que esta pode conter de poético no histórico, de extrair o eterno do transitório. (...) A
modernidade é o transitório, o efêmero, o contingente, é a metade da arte, sendo a outra metade
o eterno e o imutável”. (Baudelaire, 1996: 24 - 25)
Biofilia – é o amor (philia) à natureza (bio).
Caos – Comportamento imprevisível de certos sistemas que, no entanto, são regidos por leis
deterministas. (Rosnay. 1997:410)
Caos Determinista – É um fenômeno que se apresenta nas evoluções temporais deterministas: a
condição inicial determina o que vai se produzir em seguida, e essa previsibilidade a priori não
exclui uma imprevisibilidade real, resultante do fato de a condição inicial não ser jamais conhecida
com absoluta certeza. (Ruelle.2001:40)
Ciência Cognitiva Estudo do funcionamento mental (humano ou não) que toma como modelo
o computador. A Ciência Cognitiva é essencialmente interdisciplinar, reunindo, na tentativa de
fazer uma ciência da mente, disciplinas como a Psicologia, a Lingüística, a Ciência da Computação,
as ciências do Cérebro e a Filosofia. (Teixeira, 1998:166)
CLARK, Lygia. Nasceu em 1920 em Belo Horizonte, Minas Gerais. Mudou-se para o Rio de Janeiro
e participou do Grupo Frente, liderado por Ivan Serpa e formado por Hélio Oiticica, Lygia Pape,
Aluísio Carvão, Décio Vieira, Franz Weissmann e Abraham Palatnik, entre outros, foi, também, uma
das fundadoras do Grupo Neoconcreto. Lygia Clark morreu em 1988 no Rio de Janeiro.
(http://www.itaucultural.org.br/AplicExternas/Enciclopedia/artes visuais/index)
Co-evolução Evolução conjunta de sistemas biológicos, técnicos ou sociais associados entre si e
influenciando-se mutuamente. (Rosnay, 1997:411)
Complexidade Quando podemos observar um crescendo na dificuldade de definir com rigor
lógico os parâmetros sistêmicos. (Vieira. 2000: 8)
Complexidade 2 - é um tecido de constituintes heterogêneos inseparavelmente associados:
coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. A complexidade é efetivamente o tecido de
acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem o nosso
mundo fenomenal. Mas então a complexidade, apresenta-se com os traços inquietantes da
confusão, do inextricável, da desordem, da ambigüidade, da incerteza... Daí a necessidade, para o
conhecimento, de pôr em ordem nos fenômenos ao rejeitar a desordem, de afastar o incerto, isto
é, de selecionar os elementos de ordem e de certeza, de retirar a ambigüidade, de clarificar, de
distinguir, de hierarquizar... (Morin.2001:20).
172
Consiliência Edward O. Wilson recupera um termo que não existe nos dicionários para
explicar a união dos conhecimentos. Afiança que o propósito da mente foi e será sempre a
tentativa de ligação das ciências com a humanidade. “A fragmentação constante do conhecimento
e o caos resultante na filosofia não são reflexos do mundo real, mas artefatos da erudição. (...) A
Consiliência é a chave para a unificação.” (1999:7)
Continuum 1 – Em obediência ao princípio, ou máxima de continuidade, segundo o qual devemos
imaginar as coisas contínuas na medida em que o possamos, realce-se que devemos supor uma
continuidade entre caracteres da mente e da matéria, tal que a matéria nada seria senão mente
que teve seus hábitos cristalizados, fazendo-a agir com um alto e peculiar grau de regularidade
mecânica ou rotina. (Peirce
apud
Ibri, 1992:62)
Continuum 2Diz respeito a continuidade. O que, então, vem a ser continuidade? Peirce (apud
Ibri, 1992:62) Todos nós temos alguma idéia de continuidade. Continuidade é fluidez, a fusão de
partes em partes”. Antevê-se que continuidade se refere à generalidade e não a pluralidade de
individuais, numa provisória interpretação do que possa ser fusão de partes, identificando-a com
um sistema de relações e afeita, assim, à terceiridade. (Ibri, 1992:62)
Egóico – Que se refere ao ego.
Evolução Teoria metafísica do desenvolvimento progressivo do universo em sua totalidade, que
é uma hipótese admitida e pressuposta por muitas doutrinas filosóficas modernas e
contemporâneas. (Abbagnamo, 2000:393)
Feedback – Realimentação. (Ferreira, 1975:618) Ver também recursivo.
Ficcionalismo Da escola de Vaihinger mostra que muito do conhecimento humano é construído
de maneira puramente ficcional e além do mais de maneira consciente. “Hans Vaihinger, declara
que o seu objetivo é responder à pergunta de como podemos formular pensamentos corretos
sobre a realidade à base de representações conscientemente falsas”. (Vita, 1965: 94)
Hedônica – Relativo ao hedonismo.
(http://www.portoeditora.pt/dol/default.asp?param=08010100)
Hedonismo - Sistema moral que considera o prazer como o supremo bem que a vontade deve
atingir. (http://www.portoeditora.pt/dol/default.asp?param=08010100)
Heterogênese ou Heterogonia dos Fins definição de W. Wundt, da observação não muito
original de que os fins que a historia realiza não são os mesmos que os indivíduos ou as
comunidades se propõem, mas resultam da combinação, da correlação e do conflito das vontades
humanas entre si e com as condições objetivas. (Abbagnamo, 2000:498)
Hierarquia dos níveis Organização de sistemas complexos por encaixamento sucessivo de
blocos de construção (átomos, células, sociedades) que acabam formando níveis hierárquicos
sobrepostos. (Rosnay, 1997:413)
Interface 1 Em seu sentido mais simples, a palavra se refere a softwares que dão forma à
interação entre usuário e computador. A interface atua como uma espécie de tradutor, mediando
entre as duas partes, tornando uma sensível para a outra. (Johnson, 2001:17)
Interface 2 Meio que conecta dois meios diferentes, mediação (signo). O
Umwelt
é uma
interface e é responsável pela tradução intersemiótica do sistema indivíduo com o sistema externo.
(Vieira, 2002: apontamentos de aula)
173
Frans Krajcberg 12 de abril de 1921 - é pintor, escultor, gravador e fotógrafo, nasceu na
Polônia e se naturalizou brasileiro. Fugiu da guerra e Chegou ao Brasil em 1948. Participou da
primeira Bienal de São Paulo, em 1951. Em 1964, executou as suas primeiras esculturas com
troncos de árvores mortas, tendo realizado diversas viagens à Amazônia e ao Pantanal
Matogrossense, para fotografar e documentar os desmatamentos. O material destruído pelas
queimadas passou a ser recolhido pelo artista e transformado em obras, como raízes e troncos
calcinados. É um dos maiores defensores da natureza e sempre questiona o próprio trabalho: "Se é
arte ou não, é assunto para outros. Não me interessa se as pessoas gostam ou não do que faço...
O meu trabalho é a única maneira de me expressar. Se começo a gritar na rua, me botam num
hospital de doidos". (Frans Krajcberg)
Macroorganismo Organismo vivo composto por um grande numero de agentes individuais
(seres vivos e máquinas) (Rosnay, 1997:414)
Macroscópio todo e ferramenta de observação do infinitamente complexo. Graças ao seu
poder de simulação, o computador tornou-se um macroscópio. (Rosnay, 1997:414)
Objetivismo - filosofia criada por Ayn Rand pode ser resumida e quatro palavras:
1 - A realidade existe independentemente da observação do homem, de seus sentimentos,
desejos, esperanças ou medos.
2 - A razão é o único meio do homem para perceber a realidade, sua única fonte de
conhecimento, seu único guia de ação e seu meio básico de sobrevivência.
3 - O homem, cada homem, é um fim em si mesmo e não um meio para o fim de outros homens.
Deve existir em função de seus próprios propósitos, o se sacrificando por outros nem
sacrificando outros por ele.
4 - A liberdade, num sistema político onde os homens se tratam como negociantes livres, em
trocas voluntárias, com mútuo benefício e nunca como vítimas e executores, senhores e escravos.
http://br.geocities.com/objetivismobr/resumo.htm
Organização Esse termo vem do grego
organon,
que significa instrumento e remete à
funcionalidade ou papel que cabe à uma parte no todo. A organização fala das relações que
definem o sistema como um todo e refere-se à Coerência sistêmica.
(Vieira, 2000: 8)
Paradigma Modo de pensamento que faz referência a princípios fundamentais compartilhados
por uma comunidade. A mudança de paradigma resulta da emergência de novos modos de
pensamento e de referência. (Rosnay, 1997:415)
Permanência Vem da pergunta ontológica e cosmológica: o que são as coisas e por que são no
tempo? E pode ser expressa com a ajuda de um enunciado na forma de um princípio:
“Todas as coisas tendem a permanecer.” (Vieira, 2000: 5)
Pragmatismo 1 Pragmatismo Metodológico não pretende definir a verdade ou realidade, mas
apenas um procedimento para determinar o significado. O princípio dessa regra metodológica é
que a função do pensamento é produzir hábitos de ação, crenças. A regra proposta por Peirce era,
portanto,sugerida pela exigência de achar um procedimento experimental ou científico para fixar
as crenças. (Abbagnamo, 2000:784)
174
Pragmatismo 2 – A essência do Pragmatismo reside na harmônica correspondência entre
fenômeno e conceito, de tal modo que os erros desta correspondência, configurando uma pseudo-
harmonia, serão corrigidos pelo transcurso da experiência no tempo, para o qual se tensiona o
esse in futuro
que caracteriza o continuum da significação.
(...) A relação entre teoria e experimento, exige que se resgate, sempre que
teoria não é mera
salvação das aparências, mas a representação de um objeto real.
Por conseguinte, da teoria que
engendra as conseqüências experienciáveis ao objeto real representado que se faz ato para uma
consciência experienciadora,
o veio comum da relação entre o geral e o particular.
(Ibri,
1992:106,110)
Pragmatismo 3 (...) uma concepção, isto é, o teor racional de uma palavra ou de outra
expressão, reside exclusivamente em suas influências concebíveis sobre a conduta de vida: assim,
desde que obviamente nada, que pudesse resultar do experimento, possa exercer qualquer
influência direta sobre a conduta, se se puder definir precisamente todos os fenômenos
experimentais concebíveis que a firmação ou negação de um conceito poderia implicar, ter-se-á,
então, uma completa definição do conceito, e nele não absolutamente mais nada. (Peirce
apud
Ibri, 1992:106)
Pragmatismo 4 Na filosofia de Hans Vaihinger, ele afirma o caráter fictício de todo
conhecimento e o caráter biológico da preferência por um conhecimento eo por outro.
(Abbagnamo, 2000:785)
Recursivo 1 - Propriedade do que pode ser repetido. (Ferreira. 2004:1714)
Representação – Relação triádica entre o signo, o objeto e o interpretante, isso pelo simples fato
que tanto o objeto quanto o interpretante são partes constitutivas do signo ou do processo de
representação. O signo pode ser definido na relação com o objeto e o interpretante. (Santaella,
2000:61-62)
Semiose – Ação do signo, quando sistemas sígnicos evoluem no tempo.
(Vieira, 2002: apontamentos de aula)
Signo Um signo, ou
representâmen,
é aquilo que, sob certo aspecto ou modo, representa algo
para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria, na mente dessa pessoa, um signo equivalente, ou
talvez um signo mais desenvolvido. Ao signo assim criado denomino
interpretante
do primeiro
signo. O signo representa alguma coisa, seu
objeto
.
(Peirce, 1999: 46)
Simbiose Associação entre espécies vivas que se realiza em benefício mútuo dos parceiros. Por
extensão: associação entre espécies vivas e sistemas ou organizações macrobiológicas, incluindo
máquinas. (Rosnay, 1997:416)
Sistema ou seja, um agregado (m) de coisas (qualquer que seja sua natureza) seum sistema
S quando por definição df existir um conjunto de relações R entre os elementos do agregado de
tal forma que venham a partilhar propriedades P.
(m) S = df [ R (m) ] P
A vantagem dessa definição é que nos permite uma leitura direta da noção de sistema a partir de
um de seus parâmetros mais simples, a idéia de
composição
, como expressa pela notação (m), o
agregado que formará o sistema, além de explicitar a emergência do todo, a partir de P. (Vieira,
2000: 4)
Sistema complexo Um sistema complexo caracteriza-se pelo número dos elementos que o
constituem, pela natureza das interações entre esses elementos e pela diversidade das ligações
175
que unem esses elementos entre si. Exemplos de sistemas complexos: a célula, uma cidade, um
ecossistema. (Rosnay, 1997:416)
Sistêmica Nova abordagem que permite organizar o conhecimento com o objetivo de conseguir
uma eficácia maior da ação. A sistêmica relaciona-se com o estudo dos sistemas e da respectiva
evolução no tempo. (Rosnay, 1997:416)
Subjetivismo - Sistema filosófico que só admite a realidade do sujeito pensante. / Propensão
para o que é subjetivo; tendência a considerar e avaliar as coisas de um ponto de vista meramente
pessoal; individualismo. http://www.hostdime.com.br/dicionario/subjetivismo.html
Summum Bonum
ideal admirável da vida. Santaella explica Peirce: O ideal deve ser evolutivo,
estando seu significado pleno apenas num futuro distante sempre concretamente adiado. Um
futuro idealmente pensável, mas materialmente inatingível, porque aproximável
assintoticamente. O pragmatismo havia descoberto que, no processo de evolução, aquilo que
existe vai, mais e mais, dando corpo a certas classes de ideais que, no curso do desenvolvimento,
se mostram razoáveis. Esse ideal foi caracterizado como o crescimento contínuo da corporificação
da potencialidade da idéia.
Para haver o crescimento da potencialidade da idéia, sua corporificação deve se dar o apenas
através de símbolos, mas também através de ações, hábitos e mudanças de hábitos. Ora, na
potencialidade há possibilidade, na corporificação há existência e, na idéia há continuidade. Os três
juntos compõem o que Peirce passou a considerar como o
summum bonum
estético. (...) O ideal
estético é nutrido pelo cultivo de hábitos de sentimento. Sendo as obras de arte aquelas coisas que
encarnam qualidades de sentimento, os hábitos de sentimento podem ser cultivados através da
exposição de nossa sensibilidade às obras de arte. (...) As obras de arte não são apenas ambíguas
encarnações de qualidades de sentimento, mas são formas de sabedoria, de um tipo que fala à
sensibilidade, ao mesmo tempo em que convida a razão a se integrar ludicamente ao sentir.
(2005:126;130;131)
Transdisciplinaridade: tem várias definições nos dias atuais. Neste trabalho usaremos a
definição do prof. Dr. Ubiratan D’Ambrosio: A disciplinaridade, resultado do reducionismo
cartesiano, desenvolveu métodos e objetos de estudo específicos. A multidisciplinaridade,
antecipada no discurso de Fontenelle na Académie des Sciences de Paris, no final do século XVII,
que é a reunião de conhecimentos obtidos no quadro das disciplinas, logo se mostrou insuficiente
para tratar problemas mais complexos. No curso do século XIX a interdisciplinaridade começa a se
mostrar importante no ataque a fenômenos complexos e na própria formulação de novas visões da
realidade. Mas igualmente, a crítica gerada pela própria interdisciplinaridade desde o início do
século XX, estimulado pela mecânica quântica e por desenvolvimentos da biologia e por uma visão
mais abrangente e universal da história do conhecimento, mostrou a necessidade de um novo
enfoque ao conhecimento. A transdisciplinaridade é uma resposta a essa necessidade. O método
de pesquisa transdisciplinar é holística, abordando todo o ciclo do conhecimento, desde sua
geração, organização intelectual e social, e difusão, comparativamente nas várias culturas do
passado e do presente. A transdisciplinaridade se utiliza de todos os instrumentos materiais e
intelectuais disponíveis. http://www.cfh.ufsc.br/~aped/ubiratan_d.htm
Transversalidade: A transversalidade diz respeito à possibilidade de se instituir, na prática
educativa, uma analogia entre aprender conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender
sobre a realidade) e as questões da vida real (aprender na realidade e da realidade). A escola vista
por esse enfoque, deve possuir uma visão mais ampla, acabando com a fragmentação do
conhecimento, pois somente assim se apossará de uma cultura interdisciplinar. A transversalidade
e a interdisciplinaridade são modos de trabalhar o conhecimento que buscam reintegração de
procedimentos acadêmicos, que ficaram isolados uns dos outros pelo método disciplinar.
Necessário se torna uma visão mais adequada e abrangente da realidade, que muitas vezes se nos
apresenta de maneira fragmentada. Através dessa ênfase poderemos intervir na realidade para
transformá-la.
176
Quando nos referimos aos temas transversais nos os colocamos como um eixo unificador da ação
educativa, em torno do qual organizam-se as disciplinas.
http://www.educador.brasilescola.com/trabalho-docente/o-principio-da-interdisciplinaridade-
transversalidade.htm
Umwelt
- O Mundo em volta ou o Universo particular de uma espécie. A Interface que o sistema
cognitivo tem com o real. (Vieira, 2002: apontamentos de aula)
Utopia 1 - termo cunhado por Thomas More no livro Utopia que é uma espécie de romance
filosófico. Utopia é o nome de uma ilha onde não propriedade privada e nem intolerância
religiosa. Com o tempo esse termo “passou a designar não só qualquer tentativa análoga, (...) mas
também qualquer ideal político, social ou religioso de realização difícil ou impossível.
(Abbagnano.2000:987)
Utopia 2 – Projeto irrealizável: quimera; fantasia. (Ferreira. 2004:2028)
177
ANEXO 1
178
ANEXO 1
OS FARÓIS - Charles Baudelaire
Rubens, rio do olvido, jardim da preguiça,
Divã de carne tenra onde amar é proibido,
Mas onde a vida flui e eternamente viça,
Como o ar no céu e o mar dentro do mar contido;
Da Vinci, espelho tão sombrio quão profundo,
Onde anjos cândidos, sorrindo com carinho
Submersos em mistério, irradiam-se ao fundo
Dos gelos e pinhais que lhes selam o ninho;
Rembrandt, triste hospital repleto de lamentos,
Por um só crucifixo imenso decorado,
Onde a oração é um pranto em meio aos excrementos,
E por um sol de inverno súbito cruzado;
Miguel Ângelo, espaço ambíguo em que vagueiam
Cristo e Hércules, e onde se erguem dos ossários
Fantasmas colossais que à tíbia luz se arqueiam
E cujos dedos hirtos rasgam seus sudários;
Impudências de fauno, iras de boxeador,
Tu que de graça aureolaste os desgraçados,
Coração orgulhoso, homem fraco e sem cor,
Puget, imperador soturno dos forçados;
Watteau, um carnaval de corações ilustres,
Quais borboletas a pulsar por entre os lírios,
Cenários leves inflamados pelos lustres
Que à insânia incitam este baile de delírios;
Goya, lúgubre sonho de obscuras vertigens,
De fetos cuja carne cresta os sabás,
De velhas ao espelho e seminuas virgens,
Que a meia ajustam e seduzem Satanás;
Delacroix, lago onde anjos maus banham-se em sangue,
Na orla de um bosque cujas cores não se apagam
E onde entranhas fanfarras, sob um céu exangue,
Como um sopro de Weber entre os ramos vagam;
Essas blasfêmias e lamentos indistintos,
Esses Te Deum, essas desgraças, esses ais
São como um eco a percorrerem mil labirintos,
E um ópio sacrossanto aos corações mortais!
É um grito expresso por milhões de sentinelas,
179
Uma ordem dada por milhões de porta-vozes;
É um farol a clarear milhões de cidadelas,
Um caçador a uivar entre animais ferozes!
Sem dúvida, Senhor, jamais o homem vos dera
Testemunho melhor de sua dignidade
Do que esse atroz soluço que erra de era em era
E vem morrer aos pés de vossa eternidade!
http://br.geocities.com/edterranova/baudelapoe06.htm
Parábola da Complexidade
A questão da complexidade está na moda, mas no sentido em que vou utilizá-la, ela é
antiga. Lichtenberg, que vivia no século XVIII, a tinha colocado na forma de uma
parábola, num texto que o põe em cena como químico sonhando (Lichtenberg era a um
tempo químico, escritor, físico, crítico literário, etc.) . Lichtenberg-químico sonha que
um Ser sobrenatural, ao qual ele não nome mas que é evidentemente Deus criador,
lhe confia uma bola mineral. Pede-lhe para analisá-la e lhe designa um laboratório bem
equipado. Lichtenberg pensa que esta é a oportunidade de sua vida: ele vai descobrir um
corpo desconhecido, com propriedades surpreendentes. Começa a trabalhar... A bola está
com um pouco de poeira e ele a sopra; ela está úmida, ele a enxuga; testa suas
propriedades em relação à eletricidade friccionando-a. Nada de particular, não é âmbar.
Depois ele a analisa quimicamente e não encontra nada interessante, nada senão
compostos conhecidos... Decepção. O Ser sobrenatural reaparece e pergunta:
"analisou?", e Lichtenberg, perplexo, atônito, lhe dá a lista dos constituintes. "Você sabe o
que analisou, mortal? Esta bola é o globo terrestre" (é um sonho; devemos imaginar uma
terra sem âmago ardente, evidentemente). E o Ser sobrenatural descreve para o químico
como, desde as primeiras operações, desde que se "apropriou" da bola soprando-a,
enxugando-a com seu lenço, ele suprimiu tudo o que na terra tem de interessante, de
singular. Os oceanos foram "soprados", os Andes são essa poeira que está ainda agarrada
em seu lenço, etc... O primeiro gesto de Lichtenberg, que ele acreditava ser neutro,
insignificante, que fez sem pensar, e que era realmente o gesto de apropriação, reduziu a
terra a um composto mineral qualquer. No final do sonho, Lichtenberg, ainda químico,
mas jurando tomar todas as precauções possíveis e imagináveis, pede uma nova chance.
O Ser sobrenatural lhe concede a nova chance e lhe diz: "Analise quimicamente o que
encontrar nesse saco". Lichtenberg abre o saco e cai de joelhos para pedir perdão,
enquanto químico, por sua arrogância. Dentro do saco há um livro, e ele sabe que poderá
analisá-lo sem que, evidentemente, a análise química lhe permita dizer o que quer que
seja de interessante.
O sonho de Lichtenberg é a própria parábola da complexidade: a maneira pela
qual abordamos aquilo com que lidamos é pertinente relativamente ao problema que nos
é colocado por aquilo com que lidamos?" (p.151, 152)
PRIGOGINE, I. & STENGERS, I., 1991.: Quinto dia: Da complexidade (Outras Histórias
para a ciência), In:
A Nova Aliança
. - Brasília: Universidade de Brasília.
__._,_.___
180
Carta às Futuras Gerações
Ilya Prigogine
IIya Prigogine é cientista de origem russa, nascido em Moscou, em 1917. Vive na
Bélgica desde os 12 anos. Em 1977, recebeu o Prêmio Nobel de Química. É autor de O
Fim das certezas (Ed. Unesp e A Nova Aliança (Ed. UnB), entre outros.
Escrevo esta carta na mais completa humildade. Meu trabalho é no domínio da ciência.
Não me da qualquer qualificação especial para falar sobre o futuro da humanidade. As
moléculas obedecem a ''leis". As decisões humanas dependem das lembranças do
passado e das expectativas para o futuro. A perspectiva sob a qual vejo o problema da
transição da cultura da guerra para uma cultura de paz - para usar a expressão de
Federico Mayor - se obscureceu nos últimos anos, mas continuo otimista.
De qualquer forma, como poderia um homem da minha geração - nasci em 1917- não ser
otimista? Não vimos o fim de monstros como Hitler e Stalin? Não testemunhamos a
miraculosa vitória das democracias na Segunda Guerra Mundial? No final da guerra, todos
nós acreditávamos que a História recomeçaria do zero, e os acontecimentos justificaram
esse otimismo.
Os marcos da era incluem a fundação da Organização das Nações Unidas e da Unesco, a
proclamação dos direitos do homem e a descolonização. Em termos mais gerais, houve o
reconhecimento das culturas não européias, do qual derivou uma queda do eurocentrismo
e da suposta desigualdade entre os povos "civilizados e os ''não-civilizados". Houve
também uma redução na distância entre as classes sociais, pelo menos nos países
ocidentais.
Esse progresso foi conquistado sob a ameaça da Guerra Fria. No momento da queda do
Muro de Berlim, começamos a acreditar que enfim seria realizada a transição da cultura
da guerra para a cultura da paz. No entanto a década que se seguiu não tomou esse
rumo. Testemunhamos a persistência, e até mesmo a ampliação, dos conflitos locais,
quer sejam na África, quer nos Bálcãs. Isso pode ser considerado, ainda, como um
resultado da sobrevivência do passado no presente. No entanto, além da ameaça nuclear
sempre presente, novas sombras apareceram: o progresso tecnológico agora torna
possível guerras travadas premindo botões, semelhantes de alguma forma a um jogo
eletrônico.
Sou uma das pessoas que ajudaram a formular as políticas científicas da União Européia.
A ciência une os povos. Criou uma linguagem universal. Multas outras disciplinas, como a
economia e a ecologia, também requerem cooperação internacional. Fico, por isso, ainda
mais atônito quando percebo que os governos estão tentando criar um exército europeu
como expressão da unidade da Europa. Um exército contra quem? Onde está o inimigo?
Por que esse crescimento constante nos orçamentos militares, quer na Europa, quer nos
Estados Unidos? Cabe às futuras gerações tomar uma posição sobre isso. Na nossa era, e
isso será cada vez mais verdade no futuro, as coisas estão mudando a uma velocidade
jamais vista. Vou usar um exemplo científico.
181
Quarenta anos atrás, o número de cientistas interessados na física de estado sólido e na
tecnologia da informação não passava de umas poucas centenas. Era uma "flutuação",
quando comparado às ciências como um todo. Hoje, essas disciplinas se tornaram tão
importantes que têm conseqüências decisivas para a história da humanidade.
Crescimento exponencial foi registrado no número de pesquisadores envolvidos nesse
setor da ciência. E um fenômeno de proporção sem precedentes, que deixou muito para
trás o crescimento do budismo e do cristianismo.
Em minha mensagem às futuras gerações, gostaria de propor argumentos com o objetivo
de lutar contra os sentimentos de resignação ou impotência. As recentes ciências da
complexidade negam o determinismo; insistem na criatividade em todos os níveis da
natureza. O futuro não é dado.
O grande historiador francês Fernand Braudel escreveu: ''Eventos são poeira". Isso é
verdade? O que é um evento? Uma analogia com''bifurcações", estudadas na física do não
equilíbrio, surge imediatamente. Essas bifurcações aparecem em pontos especiais nos
quais a trajetória seguida por um sistema se subdivide em ramos". Todos os ramos são
possíveis, mas um deles será seguido. No geral não se vê apenas uma bifurcação. Elas
tendem a surgir em sucessão. Isso significa que até mesmo nas ciências fundamentais
um elemento temporal, narrativo, e isso constitui o "fim da certeza", o título do meu
último livro. O mundo está em construção e todos podemos participar dela.
Metáforas úteis Como escreveu Immanuel Wallerstein: ''É possível - possível, mas não
certo - criar ou construir um mundo mais humano e igualitário, melhor ancorado no
racionalismo material". Flutuações do nível microscópico decidem que ramo emergirá em
cada ponto de bifurcação, e portanto que evento acontecerá. O apelo às ciências da
complexidade não significa que estejamos sugerindo que as ciências humanas sejam
"reduzidas" à física. Nossa empreitada não é de redução, mas de reconciliação. Conceitos
introduzidos das ciências da complexidade podem servir como metáforas muito mais úteis
do que o tradicional apelo a metáforas newtonianas.
As ciências da complexidade, assim, conduzem a uma metáfora que pode ser aplicada à
sociedade: um evento é a aparição de uma nova estrutura social depois de uma
bifurcação; flutuações São o resultado de ações individuais.
Todo evento tem uma ''microestrutura''. Tomemos um exemplo histórico a Revolução
Russa de 1917. 0 fim do regime czarista poderia ter tomado diferentes formas, e o ramo
seguido resultou de diversos fatores, tais como a falta de previsão do czar, a
impopularidade de sua mulher, a debilidade de Kerensky, a violência de Lênin. Foi essa
microestrutura, essa flutuação, que determinou o desfecho da crise e, assim, os eventos
que a ela se seguiram.
Desse ponto de vista, a história é uma sucessão de bifurcações. Um exemplo fascinante
de como isso transcorre é a transição da era paleolítica para a neolítica, que aconteceu
praticamente no mesmo período em todo o mundo (esse fato é ainda mais surpreendente
dada a longa duração da era paleolítica). A transição parece ter sido uma bifurcação
ligada a uma exploração mais sistemática dos recursos minerais e vegetais. Muitos ramos
emergiram dessa bifurcação: o período neolítico chinês, com sua visão cósmica, por
182
exemplo, o neolítico egípcio, com sua confiança nos deuses, ou o ansioso período
neolítico do mundo pré-colombiano.
Toda bifurcação tem beneficiários e vítimas. A transição para a era neolítica trouxe a
ascensão de sociedades hierárquicas. A divisão do trabalho implicou em desigualdade. A
escravidão foi estabelecida e continuou a existir até o século 19. Ainda que o faraó tivesse
uma pirâmide como tumba, seu povo era enterrado em valas comuns.
O século 19, da mesma forma que o 20, apresentou uma série de bifurcações. A cada vez
que novos materiais eram descobertos - carvão, petróleo ou novas formas de energia
utilizável-, a sociedade se transformava. Será que não se poderia dizer que, tomadas
como um todo, essas bifurcações conduziram a uma maior participação da população na
cultura' e que de por diante as desigualdades entre as classes sociais nascidas na era
neolítica começaram a diminuir?
Homem e natureza No geral, bifurcações são a um tempo um sinal de instabilidade
e um sinal de vitalidade em uma dada sociedade. Elas expressam também o desejo por
uma sociedade mais justa. Mesmo fora das ciências sociais, o Ocidente preserva um
espetáculo surpreendente de bifurcações sucessivas. A música e a arte, por exemplo,
mudam a cada 50 anos. O homem continuamente explora novas possibilidades, concebe
utopias que podem conduzi-lo a uma relação mais harmoniosa entre homem e homem e
homem e natureza. E esses são temas que ressurgem constantemente nas pesquisas de
opinião sobre o caráter do século 21.
A que ponto chegamos? Estou convencido de que estamos nos aproximando de uma
bifurcação conectada ao progresso da tecnologia da informação e a tudo que a ela se
associa como a multimídia, robótica e inteligência artificial. Essa é a "sociedade de rede",
com seus sonhos de aldeia global.
Mas qual será o resultado dessa bifurcação? Em qual de seus ramos nos encontraremos?
A palavra "globalização" cobre uma grande variedade de situações diferentes? E possível
que os imperadores romanos estivessem sonhando com globalização, uma cultura
única dominando o mundo. A preservação do pluralismo cultural e o respeito pelo outro
exigirá toda a atenção das gerações futuras. Mas há outros riscos no horizonte.
Cerca de 12 mil espécies de formigas são conhecidas hoje. Suas colônias variam de
algumas centenas a muitos milhões de indivíduos. E interessante notar que o
comportamento das formigas depende do tamanho da colônia. Em colônias pequenas, a
formiga se comporta de forma individualista, procurando comida e a levando de volta ao
ninho. Quando a colônia é grande, porém, a situação muda e a coordenação de
atividades se toma essencial. Estruturas coletivas surgem espontaneamente, então, como
resultado de reações autocatalíticas entre formigas que produzem trocas de informação
medidas quimicamente.
Não é coincidência que nas grandes colônias de formigas ou térmites os insetos
individuais se tomem cegos. O crescimento populacional transfere a iniciativa do indivíduo
para a coletividade.
Por analogia, podemos nos perguntar qual será o efeito da sociedade da informação
sobre nossa criatividade individual. vantagens óbvias nesse tipo de sociedade - basta
183
pensar na medicina ou na economia. Mas existe informação e desinformação. Como
diferenciá-las? Claramente, isso requer cada vez mais conhecimento e um senso crítico
desenvolvido. O verdadeiro precisa ser distinguido do falso,o possível do impossível. O
desenvolvimento da informação significa que estamos legando uma tarefa pesada às
futuras gerações. Não devemos permitir que surjam novas divisões resultando da
''sociedade de redes" baseada na tecnologia da informação. Mas é preciso igualmente
examinar questões mais fundamentais.
Em sentido geral será que a bifurcação reduzirá a distância entre os países ricos e os
pobres? A globalização será caracterizada pela paz e democracia ou por violência, aberta
ou disfarçada? Cabe às futuras gerações criar as flutuações que determinarão o rumo do
evento correspondente à chegada da sociedade da informação.
Minha mensagem às futuras gerações, portanto, é de que os dados não foram lançados e
que o caminho a ser percorrido depois das bifurcação ainda não foi escolhido. Estamos
em um período de flutuação no qual as ações individuais continuam a ser essenciais.
Quanto mais a ciência avança, mais nos espantamos com ela. Fomos da idéia geocêntrica
de um sistema solar para a heliocêntrica, e de lá para a idéia das galáxias e, por fim, para
a dos múltiplos universos. Todos ouviram falar do Big Bang. Para a ciência, não existe
um evento único, e isso conduziu à idéia de que múltiplos universos podem existir. Por
outro lado, o homem é até agora a única criatura viva consciente do espantoso universo
que o criou e que ele, por sua vez, pode alterar. A condição humana consiste em
aprender a lidar com essa ambiguidade. Minha esperança é de que as gerações futuras
aprendam a conviver com o espanto e com a ambiguidade.
A cada ano, nossos químicos produzem milhares de novas substâncias, muitas das quais
derivadas de produtos naturais - um exemplo da criatividade humana no seio da
criatividade natural como um todo. Esse espanto nos leva a respeitar os outros. Ninguém
é dono da verdade absoluta, se é que essa expressão significa alguma coisa. Acredito que
Richard Tarnes esteja certo:
''A paixão mais profunda da alma ocidental é redescobrir a unidade com as raízes de seu
ser''
.
Essa paixão leva à afirmação prometéica do poder da razão, mas a razão pode também
conduzir à alienação, a uma negação daquilo que valor e significado ávida. Cabe às
futuras gerações construir uma nova coerência que incorpore tanto os valores humanos
quanto a ciência, algo que ponha fim às profecias quanto ao ''fim da ciência'', ''fim da
história" ou quanto ao advento da ''pós-humanidade''.
Estamos apenas no começo da ciência, e muito distantes do tempo em que se acreditava
possível descrever todo o universo em termos de algumas poucas leis fundamentais.
Encontramos o complexo e o irreversível no domínio microscópico (tal como associado às
partículas elementares), no domínio macroscópico que nos cerca e no domínio da
astrofísica. Cabe às futuras gerações construir uma nova ciência que incorpore todos
esses aspectos, porque, por enquanto, a ciência continua em sua infância.
Da mesma forma, o fim da história poderia ser o fim das bifurcações e a realização das
visões de pesadelo de Orwell ou Huxley quanto a uma sociedade atemporal que perdeu
184
sua memória. Cabe às futuras gerações manterem-se vigilantes para garantir que isso
jamais aconteça. Um sinal de esperança é o de que o interesse pela natureza e o desejo
de participar da vida cultural jamais foi maior do que hoje. Não precisamos de nenhum
tipo de pós-humanidade. Cabe ao homem tal qual é hoje, com seus problemas, dores e
alegrias, garantir que sobreviva no futuro. A tarefa é encontrar a estreita via entre a
globalização e a preservação do pluralismo cultural, entre a violência e a política, e entre
a cultura da guerra e a da razão. São responsabilidades pesadas.
Uma carta às gerações futuras é sempre e necessariamente escrita de uma posição de
incerteza, de uma extrapolação arriscada do passado. No entanto, continuo otimista. O
papel dos pilotos britânicos foi crucial para decidir o desfecho da Segunda Guerra
Mundial. Foi, para repetir uma palavra que usei com freqüência nesse texto, uma
''flutuação". Confio em que flutuações como essa surgirão sempre, para que possamos
navegar seguros entre os perigos que hoje percebemos. É com essa nota de otimismo
que eu gostaria de encerrar minha mensagem.
Cabe às futuras gerações construir uma nova coerência que incorpore tanto os valores
humanos quanto a ciência, algo que ponha fim às profecias quanto ao ''fim da ciência'',
''fim da história'' ou até quanto ao advento da pós-humanidade
IIya Prigogine é cientista de origem russa, nascido em Moscou, em 1917. Vive na
Bélgica desde os 12 anos. Em 1977, recebeu o Prêmio Nobel de Química. É autor de O
Fim das certezas (Ed. Unesp e A Nova Aliança (Ed. UnB), entre outros. artigo de Ilya
Prigogine, para o Caderno Mais!, da FSP, de 30/01/2000
A Carta do Chefe Indígena Seattle (1854)
Resposta do cacique Seattle ao Presidente Americano F. Pierce, que tentava comprar as
suas terras. Um exemplo sublime de consciência Holística e Ecológica. Uma denúncia à
ganância do homem branco, cioso de seu intelecto. Um grito contra a injustiça dos que
pensam ter o direito sobre a terra, excluindo seus semelhantes e outros seres vivos. Um
apelo ao humanismo
:
"O ar é precioso para o homem vermelho, pois todas as coisas compartilham o mesmo
sopro: o animal, a árvore, o homem, todos compartilham o mesmo sopro. Parece que o
homem branco não sente o ar que respira. Como um homem agonizante há vários dias, é
insensível ao [seu próprio] mau cheiro. (...)
"Portanto, vamos meditar sobre sua oferta de comprar nossa terra. Se nós a decidirmos
aceitar, imporei uma condição:
O homem branco deve tratar os animais desta terra como
seus irmãos
.
"O que é o homem sem os animais? Se os animais se fossem, o homem morreria de uma
grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, breve acontece com o
homem. Há uma lição em tudo. Tudo está ligado.
185
"Vocês devem ensinar às suas crianças que o solo a seus pés é a cinza de nossos avós.
Para que respeitem a terra, digam a seus filhos que ela foi enriquecida com a vida de
nosso povo.
Ensinem às suas crianças o que ensinamos às nossas: que a terra é nossa
mãe
.
Tudo o que acontecer à Terra, acontecerá também aos filhos da terra. Se os
homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos.
"Disto nós sabemos: a terra não pertence ao homem; o homem é que pertence à terra.
Disto sabemos: todas as coisas então ligadas como o sangue que une uma família.
uma ligação em tudo.
"O que ocorre com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não teceu a teia da
vida: ele é simplesmente um de seus fios. Tudo o que fizermos ao tecido, fará o homem a
si mesmo.
"Mesmo o homem branco, cujo Deus caminha e fala como ele de amigo para amigo, não
pode estar isento do destino comum. É possível que sejamos irmãos, apesar de tudo.
Veremos. De uma coisa estamos certos (e o homem branco poderá vir a descobrir um
dia): Deus é um Só, qualquer que seja o nome que lhe dêem. Vocês podem pensar que
O
possuem, como desejam possuir nossa terra; mas não é possível. Ele é o Deus do homem
e sua compaixão é igual para o homem branco e para o homem vermelho. A terra lhe é
preciosa e feri-la é desprezar o seu Criador. Os homens brancos também passarão; talvez
mais cedo do que todas as outras tribos. Contaminem suas camas, e uma noite serão
sufocados pelos próprios dejetos.
"Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão intensamente, iluminados pela força do
Deus que os trouxe a esta terra e por alguma razão especial lhes deu o domínio sobre a
terra e sobre o homem vermelho.
Esse destino é um mistério para nós, pois não
compreendemos que todos os búfalos sejam exterminados, os cavalos bravios sejam
todos domados, os recantos secretos das florestas densa impregnados do cheiro de
muitos homens, e a visão dos morros obstruídas por fios que falam. Onde está o
arvoredo? Desapareceu. Onde está a água? Desapareceu. É o final da vida e o inicio da
sobrevivência.
"Como é que se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra? Essa Idéia nos parece
um pouco estranha. Se não possuímos o frescor do ar e o brilho da água, como é possível
comprá-los.
"Cada pedaço de terra é sagrado para meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro,
cada punhado de areia das praias, a penumbra na floresta densa, cada clareira e inseto a
zumbir são sagrados na memória e experiência do meu povo. A seiva que percorre o
corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho...
"Essa água brilhante que escorre nos riachos e rios não é apenas água, mas o sangue de
nossos antepassados.
Se lhes vendermos a terra, vocês devem lembrar-se de que ela é
sagrada
, e devem ensinar às suas crianças que ela é sagrada e que cada reflexo nas
águas límpidas dos lagos fala de acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O
murmúrio das águas é a voz dos meus ancestrais.
"
Os rios são nossos irmãos, saciam nossa sede. Os rios carregam nossas canoas e
alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem lembrar e
186
ensinar para seus filhos que os rios são nossos irmãos e seus também. E, portanto, vocês
devem, dar aos rios a bondade que dedicariam a qualquer irmão.
"Sabemos que o homem branco não compreende nossos costumes. Uma porção de terra,
para ele, tem o mesmo significado que qualquer outra, pois é um forasteiro que vem à
noite e extrai da terra tudo que necessita. A terra, para ele, não é sua irmã, mas sua
inimiga e, quando ele a conquista, extraindo dela o que deseja, prossegue seu caminho.
Deixa para traz os túmulos de seus antepassados e não se incomoda. Rapta da terra
aquilo que seria de seus filhos e não se importa... Seu apetite devorará a terra, deixando
somente um deserto.
"Eu não sei...
nossos costumes são diferentes dos seus
. A visão de suas cidades fere os
olhos do homem vermelho. Talvez porque o homem vermelho seja um selvagem e não
compreenda.
"Não um lugar quieto nas cidades do homem branco. Nenhum lugar onde se possa
ouvir o desabrochar de folhas na primavera ou o bater de asas de um inseto. Mas talvez
seja porque eu sou um selvagem e não compreendo. O ruído parece somente insultar os
ouvidos. E o que resta de um homem, se não pode ouvir o choro solitário de uma ave ou
o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, à noite? Eu sou um homem vermelho e não
compreendo. O índio prefere o suave murmuro do vento encrespando a face do lago, e o
próprio vento, limpo por uma chuva diurna ou perfumado pelos pinheiros. "
fonte: " EDUCAÇÃO AMBIENTAL - Princípios e Práticas " Genebaldo Freire Dias - Editora
GAIA 1993
Carta ao Tom 74
Rua Nascimento Silva 107
você ensinando pra Elizete
as canções de “Canção do Amor Demais”
lembra que tempo feliz, ai, que saudade
Ipanema era só felicidade,
era como se o amor doesse em paz
Nossa famosa garota nem sabia
a que ponto a cidade turvaria
esse Rio de amor que se perdeu
Mesmo a tristeza da gente era mais bela e, além disso, se via da janela
um cantinho de céu e o Redentor
É, meu amigo, só resta uma certeza
é preciso acabar com essa tristeza
é preciso inventar de novo o amor
A brincadeira de Tom Jobim à letra de Vinicius
Rua Nascimento Silva 107
Eu saio correndo do pivete
Tentando alcançar o elevador
Minha janela não passa de um quadrado
a gente só vê cimento armado
onde antes se via o Redentor
É meu amigo só resta uma certeza
É preciso acabar com a natureza
É melhor lotear o nosso amor
187
Frans KRAJCBERG
http://www.krajcberg.vertical.fr/
"Meus trabalhos
são meu manifesto.
O fogo é a morte, o
abismo. Ele me
acompanha desde
sempre. A
destruição tem
formas. Eu procuro
imagens para meu
grito de revolta."
O MANIFESTO DO RIO NEGRO
Amazônia constitui hoje, sobre o nosso planeta, o "último reservatório", refúgio da
natureza integral.
Que tipo de arte, qual sistema de linguagem pode suscitar uma tal ambiência - excepcional
sob todos os pontos de vista, exorbitante em relação ao senso comum? Um naturalismo do
tipo essencialista e fundamental, que se opõe ao realismo e à própria continuidade da
tradição realista, do espirito realista, além da sucessão de seus estilos e de suas formas. O
espirito do realismo em toda a historia da arte não é o espirito da pura constatação, o
testemunho da disponibilidade afetiva. O espirito do realismo é a metáfora; o realismo é,
na verdade, a metáfora do poder: poder religioso, poder do dinheiro na época da
188
Renascença, em seguida poder politico, realismo burguês, realismo socialista, poder da
sociedade de consumo com a pop-art.
O naturalismo não é metafórico. Não traduz nenhuma vontade de poder, mas sim um outro
estado de sensibilidade, uma maior abertura de consciência. A tendência à objetividade do
"constatado" traduz uma disciplina da percepção, uma plena disponibilidade para a
mensagem direta e espontânea dos dados imediatos da consciência. Como no jornalismo,
mas sendo este transferido ao domínio da sensibilidade pura, "o naturalismo é a
informação sensível sobre a natureza". Praticar esta disponibilidade ante o natural
concedido é admitir a modéstia da percepção humana e suas próprias limitações, em
relação a um todo que é um fim em si. Essa disciplina na conscientização de seus próprios
limites é a qualidade primeira do bom repórter: é assim que ele pode transmitir aquilo que
vê - "desnaturando" o menos possível os fatos.
O naturalismo assim concebido implica não somente maior disciplina da percepção, mas
também maior na abertura humana. No final das contas a natureza é, e ela nos ultrapassa
dentro da percepção de sua própria duração. Porém, no espaço-tempo da vida de um
homem, a natureza é a medida de sua consciência e de sua sensibilidade.
O naturalismo integral é alérgico a todo tipo de poder ou de metáfora de poder. O único
poder que ele reconhece é o, poder purificador e catártico da imaginação a serviço da
sensibilidade, e jamais o poder abusivo da sociedade.
Este naturalismo é de ordem individual. A opção naturalista oposta à opção realista é fruto
de uma escolha que engaja a totalidade da consciência individual. Essa opção não é
somente critica, ela não se limite a exprimir o medo do homem frente ao perigo que corre a
natureza pelo excesso de civilização industrial e a consciência planetária. Ela traduz o
advento de um estado global da percepção, a passagem individual para a consciência
planetária. Nos vivemos uma época de balanço dobrado. Ao final do século se junta o final
do milênio, com todas as transferências de tabus e da paranóia coletiva que esta
concorrência temporal implica - a começar pela transferência do medo do ano 1000 sobre o
medo do ano 2000, o átomo no lugar da peste.
Vivemos, assim, uma época de balanço. Balanço do nosso passado aberto sobre nosso
futuro. Nosso Primeiro Milênio deve anunciar o Segundo. Nossa civilização judaico-cristã
deve preparar sua Segunda Renascença. A volta do idealismo em pleno século XX
supermaterialista, a volta de interesse pela historia das religiões e a tradição do ocultismo,
a procura cada vez maior por novas iconografias simbolistas: todos esses sintomas são
conseqüência de um processo de desmaterialização do objeto, iniciado em 1966, e que é o
fenômeno maior da historia da arte contemporânea no Ocidente.
Apôs séculos de "tirania do objeto" e seu clímax na apoteose da aventura do objeto como
linguagem sintética da sociedade de consumo - a arte duvida de sua justificação material,
ela se desmaterializa, se conceitua. Os andamentos conceituais da arte contemporânea
têm sentido se examinados através dessa ótica autocrítica. A arte é ela mesma colocada
numa posição critica. Ela se questiona sobre sua imanência, sua necessidade, sua função.
O naturalismo integral é uma resposta. E justamente por sua virtude de integracionista, de
generalização e extremismo da estrutura da percepção, ou seja, da planetarização da
189
consciência, hoje ela se apresenta como uma opção aberta - um fio diretor dentro do caos
da arte atual. Autocrítica, desmaterialização, tentação idealista, percursos subterrâneos
simbolistas e ocultistas: essa aparente confusão se organizará talvez um dia, a partir da
noção do naturalismo - expressão da consciência planetária.
Esta reestruturação perceptiva refere-se á uma real mudança e a desmaterialização do
objeto de arte, sua interpretação idealista, a volta ao sentido oculto das coisas e sua
simbologia constituem um conjunto de fenômenos que se inscrevem como um preâmbulo
operacional à nossa Segunda Renascença - etapa necessária para uma mutação
antropológica final.
Hoje, vivemos dois sentidos da natureza: aquele ancestral, do "concedido" planetário, e
aquele moderno, do "adquirido" industrial e urbano. Pode-se optar por um ou outro, negar
um em proveito do outro; o importante é que esses dois sentidos da natureza sejam vividos
e assumidos na integridade de sua estrutura antológica, dentro da perspectiva de uma
universalização da consciência perceptiva - o Eu abraçando o mundo, fazendo dele um
uno, dentro de um acordo e uma harmonia da emoção assumida como a única realidade da
linguagem humana.
O naturalismo como disciplina de pensamento e da consciência perceptiva é um programa
ambicioso e exigente que ultrapassa de longe as balbuciantes perspectivas ecológicas de
hoje. Trata-se de lutar muito mais contra a poluição subjetiva do que contra a poluição
objetiva - a poluição dos sentidos e do cérebro contra a queda do ar e da água.
Um contexto tão excepcional como o do Amazonas suscita a idéia de um retorno à
natureza original. A natureza original deve ser exaltada como uma higiene da percepção e
um oxigênio mental: um naturalismo integral, gigantesco catalisador e acelerador das
nossas faculdades de sentir, pensar e agir.
Pierre Restany
Alto Rio Negro, quinta-feira, 3 de agosto de 1978.
Na presença de Sepp Baendereck e Frans Krajcberg.
http://www.krajcberg.vertical.fr/fkmanifesteportugues.html
Ode à Alegria
Letra de Friedrich von Schiller
Ode à Alegria de Friedrich Von Schiller, tradução do original, tal como se canta na Nona
Sinfonia de Ludwig Van Beethoven.
Oh amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais prazeroso
E mais alegre!
190
Alegre, formosa centelha divina,
Filha do Elíseo,
Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste!
Tua magia volta a unir
O que o costume rigorosamente dividiu.
Todos os homens se irmanam
Ali onde teu doce vôo se detém.
Quem já conseguiu o maior tesouro
De ser o amigo de um amigo,
Quem já conquistou uma mulher amável
Rejubile-se conosco!
Sim, mesmo se alguém conquistar apenas uma alma,
Uma única em todo o mundo.
Mas aquele que falhou nisso
Que fique chorando sozinho!
Alegria bebem todos os seres
No seio da Natureza:
Todos os bons, todos os maus,
Seguem seu rastro de rosas.
Ela nos deu beijos e vinho e
Um amigo leal até a morte;
Deu força para a vida aos mais humildes
E ao querubim que se ergue diante de Deus!
Alegremente, como seus sóis corram
Através do esplêndido espaço celeste
Se expressem, irmãos, em seus caminhos,
Alegremente como o herói diante da vitória.
Alegre, formosa centelha divina,
Filha do Elíseo,
Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste!
Abracem-se milhões!
Enviem este beijo para todo o mundo!
Irmãos, além do céu estrelado
Mora um Pai Amado.
Milhões se deprimem diante Dele?
Mundo, você percebe seu Criador?
Procure-o mais acima do céu estrelado!
Sobre as estrelas onde Ele mora.
http://www.starnews2001.com.br/odeschiller.html
Projeto transforma lixão em estufa de flores
191
O cultivo de flores está mudando a vida de vinte famílias que viviam de catar lixo em um
aterro em Guarulhos, na Grande São Paulo.
Desde agosto do ano passado, eles estão produzindo gérberas, crisântemos e amareles
para melhorar sua qualidade de vida e transformar o antigo lugar de trabalho.
Por meio do projeto Do Lixo às Flores, eles aprenderam técnicas de cultivo de plantas e
montaram no lixão uma estufa de flores.
Hoje todos têm carteira assinada, recebem R$300 por mês, mais cesta básica, vale
transporte e vale alimentação para trabalhar na estufa. Já produziram 32 mil flores.
"É uma obra 100% social. O projeto está mudando totalmente o aterro e o pensamento
dos participantes", diz Leandro Vieira D'Ambrosio, encarregado do projeto da estufa. Ele
conta que só o fato de não ter mais que conviver com os urubus devolve um pouco da
dignidade das famílias.
A idéia de transformar lixão e aterro sanitário em jardim foi do carnavalesco Joãosinho
Trinta, inspirado no profeta Gentileza - que pregava a gentileza e distribuía flores no Rio
de Janeiro dizendo: "Meus filhos, não usem problemas, usem gentileza".
Trinta, juntamente com a empresa coletora de lixo Quitauna, a empresa de consultoria e
treinamento Flortec e com apoio da Prefeitura de Guarulhos, pretende ampliar a iniciativa
para beneficiar mais pessoas.
"Por enquanto, nós não estamos fazendo compostagem para utilizar o lixo orgânico como
adubo, mas será um próximo passo", explica D'Ambrosio.
http://www2.uol.com.br/aprendiz/n_noticias/fazendo_diferenca/id300401.htm
A Arte das Flores
19/12/2007 ÀS 19:29
http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/redacao/20071219_lst_assuntos.shtml
A arte das flores
A arte pode ser criada usando diversas ferramentas. Um artista francês usa a pá e o
ancinho para compor as suas obras. Jean Paul Ganem faz o que se denomina de
LandScape Art, uma vertente que cria novas paisagens utilizando a jardinagem. Em
outras palavras, ele desenha, esquematiza e planta diversas espécies para que o conjunto
crie imagens e cores específicas.
A importância desse trabalho, porém, não está no fato de se usar a vegetação para criar
imagens, mas pelo caráter sustentável que alguns dos projetos de Ganem têm. Em
Montreal, no Canadá, o artista fez parcerias com Ongs e moradores da região para fazer
um jardim onde ficava um lixão. Eles tiraram o entulho, descontaminaram a terra,
192
aprenderam a cuidar do jardim e plantaram as espécies. Infelizmente, devido à liberação
de gás metano pelo lixo soterrado, o solo cedeu e as plantas tiveram que ser removidas.
Para não perder as mudas, porém, elas foram distribuídas entre as escolas da região.
O artista também fez projetos para aeroportos do mundo, como o de Paris (imagem
abaixo). Segundo ele, os passageiros de aviões sempre olham para a janela na
decolagem e no pouso, por causa da angústia de que algum acidente possa acontecer.
Para tentar melhorar a viagem, Ganem redesenhou as áreas onde havia grama no
aeroporto e projetou algumas mudas de flores. Os passageiros, em vez de se
preocuparem com possíveis acidentes, contemplariam um jardim desenhado e com
bonitas cores.
Ganem se inspirou no que os artistas das décadas de 1960 e 1970 faziam, quando surgiu
o movimento “land art”. A natureza, para eles, era mais do que um simples ambiente,
mas fazia parte da obra. O objetivo era que a sociedade, que começava a usufruir dos
avanços tecnológicos, percebesse que a natureza também é algo a ser admirado.
Nas imagens abaixo, Ganem plantou girassóis para pintar o desenho de um sol.
O artista está com projetos para mudar lixões e paisagens aqui do Brasil. O único
empecilho é encontrar um patrocinador para financiar toda a reformulação da área. A
primeira cidade poderá ser São Paulo.
http://planetasustentavel.abril.uol.com.br/blog/redacao/20071219_lst_assuntos.shtml
193
Domingo, 17 de Maio de 2009
"Enterros..." - "Burial..." INSTRUÇÃO
"Enterro": instante de passagem
Este vídeo documenta o primeiro enterro realizado na calçada em frente ao SESC e Casa
das Rosas - Avenida Paulista São Paulo.
Como o primeiro exercício de documentação desta ação, não possui caráter de exposição,
sendo apenas um entre os muitos registros que se encontram em fase de pós-produção.
PROJETO
Participação em obra de arte por instrução de artista.
Pessoas que estão em diferentes lugares, realizam uma ação por instrução e com
isso, participam do evento :
Enterro de obra de arte na Av. Paulista - São Paulo, Brasil.
A ação aconteceu no momento único em que a Avenida estava tendo suas calçadas
reconstruídas e o seu chão - terra, estava exposto ( 2007-2008).
Localização dos enterros realizados : em frente ao Instituto Itaú Cultural, Casa das Rosas,
SESC AV. Paulista, Metrô Brigadeiro e MASP ( Museu de Arte de São Paulo).
Obra enterrada: instalação cerâmica "Flores", exposta publicamente em 2003.
As fotografias-registros destes eventos-enterros na Av. Paulista, estão sendo enviadas pela
internet e as pessoas "enterram" agora as imagens, produzindo um novo evento vinculado ao
anterior.
A ação do participante será
realizar e documentar o "enterro" da imagem,
que documenta o evento-anterior, marcando os lugares e datas da ação.
Instrução ao Participante
1- Imprimir a imagem (registro) aqui enviada em tamanho qualquer, importa que se
possa reconhecê-la na documentação do evento.
2- escolher um espaço para produzir a ação.
3- fotografar (ou filmar) a ação de "enterrar" a imagem.
4- Reenviar as fotos do momento-evento produzido, com anotações da data, local,
...observações.
? "Enterrar" ? é de livre interpretação
Cada local, cada vivência requer uma estratégia. Você decide o formato ....
Para a continuidade do trabalho, fica a documentação visual, do deslocamento do objeto -
arte (agora inacessível) para sua imagem.
Deslocamento este, que também ocorre no ato de "enterrar", marcando o momento
da mudança, da passagem para outra configuração, outra dimensão.
194
"Enterros" na Avenida Paulista - "Burial" on Av. Paulista - São Paulo, Brasil. 2007-2008
http://www.rebecalenizestumm.com/
195
ANEXO 2
Reportagens
196
Filme Inteligência Artificial
A.I. - Inteligência Artificial
Num futuro onde as calotas polares
derreteram, uma nova forma de
inteligência artificial auxilia a humanidade
em sua saga sobre o planeta Terra. É
neste contexto que um garoto irá passar
por uma jornada emocional inesquecível.
Dirigido por Steven Spielberg (Jurassic
Park) e com Jude Law, William Hurt e
Haley Joel Osment no elenco. Recebeu 2
indicações ao Oscar.
Sinopse
Na metade do século XXI, o efeito estufa derreteu uma grande parte das colatas polares da Terra,
fazendo com que boa parte das cidades litorâneas do planeta fiquem parcialmente submersas.
Para controlar este desastre ambiental a humanidade conta com o auxílio de uma nova forma de
computador independente, com inteligência artificial, conhecido como A.I. É neste contexto que
vive o garoto David Swinton (Haley Joel Osment), que irá passar por uma jornada emocional
inesquecível.
Ficha Técnica
Título Original: Artificial Inteligence: A.I.
Gênero: Ficção Científica
Tempo de Duração: 146 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2001
Site Oficial: www.aimovie.com
Estúdio: DreamWorks SKG / Warner Bros. / Stanley Kubrick Productions
Distribuição: DreamWorks Distribution L.L.C. / Warner Bros.
Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Steven Spielberg, baseado em conto de Brian Aldriss
Produção: Bonnie Curtis
Música: John Williams
Direção de Fotografia: Janusz Kaminski
Desenho de Produção: Rick Carter
Direção de Arte: Tom Valentine
Figurino: Bob Ringwood
Edição: Michael Kahn
Efeitos Especiais: Industrial Light & Magic
O termo inteligência artificial foi cunhado em 1956 pelo pesquisador americano John McCarthy
durante o primeiro evento dedicado ao assunto, a Conferência de Dartmouth, nos EUA. Em 1985,
o americano Marvin Minsky publicou o livro "The Society of Mind", que relaciona a inteligência
artificial ao desenvolvimento de uma criança. Mas os avanços se revelaram mais lentos que o
teorizado nos livros.
197
- A.I. Inteligência Artificial foi á distribuído nos Estados Unidos pela Warner Bros. e no restante do
planeta pela DreamWorks.
http://www.adorocinema.com/filmes/ai/ai05.jpg
O filme é baseado no conto Supertoys Last All Day Long (escrito por Brian Aldiss)
e se passará no meio do século XXI, quando o efeito estufa derreteu boa parte
das calotas polares e, conseqüentemente, as águas cobriram boa parte das
cidades costeiras ao redor de todo o planeta. Para lidar com este desastre
ambiental, a humanidade conta com o fundamental auxílio de um novo tipo de
computador, cuja inteligência artificial o torna independente e consciente de sua
própria existência. A história segue a o relacionamento entre um garoto e o tal
computador dotado de I.A. (a "inteligência artificial" do título).
http://www.cinepop.com.br/filmes/inteligenciaartificial.htm
Aqui, lemos o depoimento de quem assistiu ao filme e ressalta não o futurismo do filme
ou os efeitos da tecnologia, mas o amor:
“Este filme é o amor incondicional posto a prova! Você observar o menino querendo ser
gente para ser amado! E ele perdendo tudo a sua volta pelo simples fato de querer amor!
E ele não consegue! Ele não conheceu a verdadeira tranqüilidade e alegria! Como aquele
filme é triste. Principalmente a cena em que ele fita os olhos da Fada Madrinha esperando
ser transformado em um menino de verdade. E a parte em que ele é posto junto a mãe
ressuscitada por apenas um dia!?”
140
140
http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://3.bp.blogspot.com/_fiGDXx05rpU/SaLRcbf1egI/
AAAAAAAABn8/a7hUb0trx0w/s400/david.jpg&imgrefurl=http://ciniro.blogspot.com/&usg=___t8FB
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6gbv%3D2%26hl%3Dpt-BR
198
Paul Newman era mais do que um grande ator
SEG, 29/09/08
POR PAULO MOREIRA LEITE |
Passei o fim de semana lembrando velhos filhos de Paul Newman. Ouvi entrevistas e vi análises. Poucos anos
antes de morrer, ele contou que trabalhava cada vez menos, descansava cada vez mais. Já não conseguia
fazer muita coisa, disse. Perguntaram se estava cansado de tudo. Ele deu uma resposta para guardar: “Não
dá para se aposentar da vida.”
Eu acho que a lição de vida Paul Newman é muito mais do que uma ótima aula de interpretação, disponível
em filmes inesquecíveis como “Gata em Teto de Zinco Quente”, “Ausência de Malícia” e “Butch Cassidy e
Sundance Kid”, para ficar em três exemplos.
Ele era um grande ator — mas vamos lembrar que Hollywood teve outros grandes atores. Também era
considerado um ator bonito — vamos lembrar, de novo, que não era o único em sua geração.
Eu acho que Paul Newman usava seus filmes para demonstrar que a vida era mais importante que o cinema.
Defendia seu trabalho como parte de sua integridade. Se a industria do cinema procura transformar atores e
atrizes em operários embrutecidos numa fábrica de futilidades milionárias, ele tinha uma postura de
resistência.
Fazia questão de escolher papéis e só fez um filme que era uma operação caça níquel descarada, um certo
“Inferno na Torre” — catástrofe na época dos filmes-catástrofe.
Falando sobre seu método para aceitar uma oferta de trabalho e rejeitar outra, contou que no início da
carreira procurava personagens que pudessem lhe ensinar alguma coisa. E que, mais tarde, acontecia o
inverso: procurava personagens aos quais pudesse transmitir algum complemento.
Na verdade, eram dois caminhos para chegar ao mesmo lugar: entender a condição humana, contribuir para
aperfeiçoá-la. Encarnou bêbados, derrotados e desajustados, representou frustrações profundas e lutas
difíceis, dando rosto e voz para dramas e tragédias de nosso tempo. Seus melhores filmes não tinham um
final feliz. Retratavam impasses, dúvidas, pontos de interrogação em velhas convicções da sociedade
contemporânea. Alguns atores representam personagens. Newman era capaz de se expressar através deles.
199
Como ensinou aquele filósofo, nada do que era humano lhe era estranho. E é dessa forma que se entende
sua generosidade, que o levou a montar uma fábrica de alimentos orgânicos que não deixava uma única nota
de 1 dólar — e a gastar 250 milhões de dólares em ações de solidariedade sem fazer disso um projeto de
auto-marketing.
Paul Newman não teve uma carreira construiu uma obra — ele próprio, o personagem mais difícil na vida de
cada ser humano. Encontrou um lugar e soube defendê-lo. Deixou de ser um ator para tornar-se uma
referência da cultura e uma consciência da sociedade americana de seu tempo.
Paulo Moreira Leite http://colunas.epoca.globo.com/paulomoreiraleite/2008/09/29/o-ator-que-era-
mais-do-que-um-grande-ator/
REPORTAGENS
O Pai que trocou a escola do filho por filmes
(OGlobo - 24/05/2009 05:00:07)
Escritor canadense conta como passou a se relacionar melhor com jovem ao organizar sessões
de cinema.
Eduardo Fradkin
Oex-crítico de cinema e escritor canadense David Gilmour (homônimo do guitarrista do Pink Floyd)
estava prestes a fazer um livro sobre como superar decepções amorosas com mulheres e já tinha
até uma editora para lançá-lo, quando seu filho Jesse abriu-lhe os olhos.
200
- Ele me disse: "Ninguém vai ler isso. Não é para o público feminino, e os homens não compram
livros desse tipo. Por que você não escreve sobre os três anos que passamos vendo filmes?" -
relata Gilmour, em entrevista por telefone.
O pai seguiu o conselho, e o resultado é "O clube do filme", sucesso mundial que será lançado no
Brasil amanhã pela editora Intrínseca. A obra narra uma história real: Jesse, aos 16 anos, estava
sem rumo na vida, reprovado em várias matérias na escola. David, então, fez-lhe uma proposta
singular. O garoto poderia deixar a escola e não precisaria arranjar trabalho. Poderia dormir até
tarde e fazer o que quisesse, mas teria que assistir a três filmes com David por semana e debatê-
los.
- Ele realmente odiava a escola. Eu acredito muito na educação, sou professor universitário em
Toronto. Mas Jesse era um caso especial. Algo na personalidade dele fazia com que lhe fosse
penoso ficar horas sentado na sala de aula. Era algo fisicamente doloroso. Isso se tornou um
problema entre nós, porque eu queria que ele terminasse a escola, então ficava cobrando os
deveres dele. Nossa relação se tornou uma briga constante. Percebi que, no fim das contas, eu
não poderia forçar um moleque de 1,93 metro a fazer o que era necessário para concluir o ensino
médio. Tudo o que eu conseguiria era destruir nossa relação e levá-lo a sair de casa. Em seis
meses, é o que teria acontecido. Eu o teria perdido - alega David.
O escritor ressalta que aparentemente nada havia de errado na personalidade do filho:
- Ele não tinha problemas comportamentais ou intelectuais. Era sociável, falante. Apenas odiava a
escola.
Garoto-problema se tornou roteirista e estuda atuação
Hoje, Jesse está com 23 anos. O que anda fazendo?
- Para a surpresa de todos, ele acaba de escrever e estrelar seu primeiro curta-metragem, de dez
minutos, e também escreveu o roteiro de um longa que será filmado em algum momento durante o
ano. Um famoso produtor canadense o leu e gostou do texto. Foi uma surpresa para mim e a mãe
dele, pois não esperávamos que ele se interessasse por atuar ou escrever roteiros. Há mais ou
menos um ano, ele decidiu que era o que queria fazer.
No fim do livro, Jesse resolve voltar para a escola e faz um curso intensivo de três meses para
prestar um teste de admissão. Ele passa. David diz o que aconteceu depois disso:
- Ele entrou na Universidade de Toronto e ficou um ano estudando lá. Mostrou a todos que podia
ser um universitário, mas disse que descobriu o que queria fazer, que era escrever um roteiro, e
abandonaria a universidade para realizar aquilo. Foi para a Tailândia e três meses depois
apareceu com o roteiro. Outra surpresa é que Jesse se revelou um bom ator. A mãe dele é atriz e
o preparou para o curta de dez minutos. Ela me disse que ele tem um dom natural para atuar. Ele
vai fazer isso no próprio filme. Está começando a tomar aulas de atuação.
Todavia, David não atribui ao cinema a ligação afetiva construída com o filho.
- Nós não nos aproximamos por causa dos filmes. Nós já nos adorávamos. A escola era o
problema. No momento em que eu disse para ele que não precisava mais ir à escola, ficou tudo
bem. Jesse precisava de duas coisas. Precisava de tempo para se tornar quem ele seria. Tinha
16 anos. Nessa idade, nenhum garoto sabe o que quer. Também precisava de uma figura
exemplar para a vida no mundo adulto. Se eu não servisse de modelo, ele o encontraria no seu
grupo de amigos, e isso poderia ser uma encrenca. A tendência dos jovens é escolher como
modelo o garoto com a personalidade mais forte, que pode vir a ser um delinquente ou um
traficante. Eu acredito que adolescentes precisam de seus pais muito mais do que admitem -
afirma David.
201
Todos os filmes vistos por Jesse dos 16 aos 19 anos foram escolhidos por David, com base em
dois critérios: ele os tinha adorado em algum momento da vida, e deviam ser de todos os gêneros.
Para que o filho não se tornasse esnobe, ele lhe mostrava com o mesmo entusiasmo "Cidadão
Kane" ou "Instinto selvagem". As reações, às vezes, o surpreenderam.
- Mostrei "Os reis do iê iê iê" achando que ele ia adorar, mas ele detestou. Mostrei "Ran", de Akira
Kurosawa, pensando que o entediaria, e ele adorou. Acho que é porque há algo nesse filme que
sugere a solidão da natureza humana, algo que todos sentimos. Até ver esse filme, Jesse devia
achar que era a única pessoa que tinha esse sentimento de estar só no mundo. Ele tinha estudado
"Rei Lear" na escola e tinha odiado a peça de Shakespeare. O filme é a mesma história adaptada
ao Japão do século XVI. Outro filme que me surpreendeu foi "Amores expressos". Na época, achei
que era porque tinha uma chinesa bonita nele, e Jesse tinha acabado de perder uma namorada
chinesa e estava de coração partido. Mas hoje vejo que o motivo era outro. Esse é o tipo de filme
que inspira jovens cineastas, porque parece que qualquer um poderia fazê-lo - arrisca o autor.
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O Estado de São Paulo – Metropole - Sexta-Feira, 19 de Junho de 2009 | Versão
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No ônibus, peça de boas maneiras
Apresentação em veículos da EMTU ?incomoda? e faz usuário rever hábitos
Fernanda Aranda, SÃO PAULO
O nome da dupla não é dos dez mais sofisticados, mas é a parceria entre Escovão e Touquinha que
tem levado aulas de etiqueta para dentro dos ônibus de São Paulo. De segunda a sexta-feira, os
atores avançam pela catraca e começam a "incomodar" os passageiros de todas as formas possíveis.
Falam alto, escutam música no último volume, jogam papel no chão, não dão lugar para idosos e
esquecem até das grávidas. Em minutos, viram "espelho" de alguns usuários que ocupam papel de
plateia."É a tentativa de disseminar gentileza entre os pontos de parada", resume Escovão,
identidade assumida por Aliu Coelho, de 31 anos, ator há nove anos.
Todo dia, durante no mínimo seis viagens dentro dos veículos da Empresa Metropolitana de
Transporte Urbano (Emtu), a dupla parte sempre ou do Terminal Jabaquara, na zona sul, ou de São
Mateus, na zona leste, para espalhar o manual do "passageiro ideal". "Você não vale nada, mas eu
gosto de você", hit da novela Caminho das Índias, é a trilha que inicia o espetáculo. "Temos o
intervalo de quatro pontos em média para representar as situações do cotidiano dos ônibus e passar
uma mensagem", conta César Augustos Finhana, de 28 anos, o Touquinha, uma espécie de office-
boy mal educado que consegue, em menos de 2 m² no corredor do coletivo, infringir todas as regras
de respeito ao próximo, com um toque de bom humor.
A iniciativa é da EMTU, começou de forma experimental em março, mas ganhou o público. Antes,
o teatro a bordo dos ônibus só acontecia de segunda a quarta-feira. Agora, foi expandido para todos
os dias úteis. O trajeto é variado, sempre com destino às cidades da Grande São Paulo, como São
Bernardo do Campo e Ferraz. As peças de boas maneiras são oferecidas por uma dupla de atores da
companhia de Fernando Lyra.
202
A reportagem acompanhou uma dessas viagens teatrais e registrou as reações. Assim que Escovão
e Touquinha passavam a disparar peraltices, os olhos constrangidos tentavam disfarçar que
cometem os mesmos pecados da dupla. Desligavam o som alto, tiravam a mochila das costas para
facilitar a passagem dentro do ônibus, jogavam lixo no lixo e até olhavam para ver se alguém da
terceira idade não precisava sentar. "Esse aí é bem mal-educado, mas eu convivo com piores",
afirmava Cecília Kottke, de 68 anos, que pega ônibus todos os dias para ir ao curso de literatura.
"Adorei essa história de teatro educativo", vibrava.
O teatro nos ônibus já tem próximas missões. Vai abordar dicas de segurança e reciclagem. Os
roteiristas são os próprios motoristas, que, com ajuda de Lyra, levam as demandas para definir os
temas. Uma das principais virtudes do espetáculo, contam os atores, é que os espectadores podem
até estar acostumados com os pecados apresentados, mas muitos assistem a uma peça pela primeira
vez. "Isso é o maior barato", dizem Escovão e Touquinha.
http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090619/not_imp389731,0.php
Domingo, 13 de Julho de 2008 | Golobo on line Versão Impressa
Para fazer de Cubatão um pomar, mudas em pet
O pescador Josuel de Abreu recolheu garrafas plásticas e terra, investiu R$ 200 e montou
um viveiro com diversas espécies de árvores frutíferas
Rejane Lima
O pescador Josuel Ferraz de Abreu, de 33 anos, há 12 morador da Vila dos Pescadores, em
Cubatão, na Baixada Santista, montou entre as palafitas um canteiro com mais de 2 mil
mudas de árvores frutíferas, todas plantadas em garrafas pet, recolhidas do estuário.
Feito com telhas e tijolos, o viveiro de 18 metros tem camadas de cascalho e terra,
recolhida do outro lado do rio. Foi construído grudado à parede do barraco vizinho, que
ganhou calhas para que a chuva não alague o plantio.
Pintor afastado por acidente de trabalho, Abreu investiu cerca de R$ 200 em seu projeto. A
idéia veio há nove meses, durante uma visita à escola de seu filho Jefferson, de 8 anos.
''Percebi que lá tinha muito espaço vazio e nenhuma árvore. Conversei com a diretora e ela
falou que não plantava porque não tinha mudas. Pretendo mudar isso, quero doar mudas
para as escolas e toda a cidade'', diz. Migrante nordestino, Abreu vivia em um sítio no
interior de Pernambuco. ''Lá eu plantava muito, mas essa terra aqui é boa demais, eu pego
do aterro do antigo lixão de Santos. O bom de plantar na garrafa pet é que você transporta
junto, leva para onde quiser. É fácil de manusear.''
As centenas de garrafas retiradas do estuário e doadas por vizinhos acumulam-se na casa
do pescador e já causaram algumas brigas. ''Primeiro eu não gostei, porque fazia sujeira em
casa, mas agora que está dando certo. Aprovei e quero que ele faça uma horta para eu
203
plantar alface, coentro e rabanete'', afirma a mulher de Abreu, a dona de casa Luciana.
Por enquanto, o canteiro tem apenas árvores frutíferas e chuchu. São mudas de laranja,
acerola, mexerica, carambola, abacate, jabuticaba, jaca, maracujá, pinha, goiaba, manga,
tamarindo, cambuci e pinha. Abreu está esperando as plantas atingirem um metro de altura
para replantá-las por toda Cubatão. ''Quero mudar a cara da cidade, que só tem uma
avenida com árvores frutíferas'', planeja.
''Em um ano quero ter 10 mil mudas. Em cada metro quadrado de pet dá para plantar cem
árvores'', contabiliza. Ele comprou os tambores para o novo canteiro, que pretende erguer
onde havia alguns barracos, destruídos num incêndio.
Assim como a família de Abreu, cerca de 9.800 pessoas moram na Vila dos Pescadores,
área invadida à margem da rodovia Anchieta, do Rio Casqueiro - e da sociedade. No local,
paga-se um taxa simbólica pela eletricidade (não há relógios individuais). Há rede de água
encanada.
Já o esgoto é despejado sem nenhum tratamento no mangue. O forte cheiro ruim contrasta
com a delicadeza das futuras árvores de Abreu.
03/07/2008 - 07h37 O Globo
Aposentado constrói muro de garrafas pet
Mais de 3,6 mil unidades foram utilizadas na construção.
Ele diz que está feliz por contribuir com a preservação do meio ambiente.
Do G1, em São Paulo, com informações da TV Gazeta de Vitória
Aposentado constrói muro de garrafas pet (Foto: Reprodução/TV Gazeta de Vitória)
Um morador do município de Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, construiu um muro usando
como material apenas garrafas pet. Com criatividade, o aposentado Luiz Carlos Temporim tenta
despertar a consciência ambiental de outras pessoas.
“A minha intenção era tirar o plástico do lixo. Depois, eu notei que dava certo, que não entra animal
nenhum no terreno”, afirma Temporim, que usou mais de 3,6 mil garrafas para construir o muro.
204
O aposentado levou cerca de um ano para erguer a estrutura e chegou a dedicar uma hora por dia ao
trabalho. Com o esforço, ele conseguiu chamar a atenção também dos vizinhos.
Ele disse que está feliz por contribuir com a preservação do meio ambiente. “A gente vê nos rios uma
quantidade imensa de garrafas. Se a gente não cuidar do meio ambiente, ninguém sabe como será nosso
futuro”, afirma.
O ESTADO DE SÃO PAULO
Quarta-feira, 5 de Outubro de 2005
Caderno – Metrópole pág. C10
http://txt.estado.com.br/editorias/2005/10/05/cid028.html
A casa do pedreiro virou biblioteca
Morador de São Gonçalo, no Rio, bateu de porta em porta para receber livros
Henry Chu
Los Angeles Times
SÃO GONÇALO - Carlos Leite mal consegue ler, mas os livros mudaram vida. Dois anos
atrás, ele fazia uma construção para uma pessoa que ia se desfazer de seis volumes de uma
enciclopédia. Leite pediu para ficar com eles. Assim, nasceu um sonho.
Ele decidiu bater de porta em porta na cidade da Baixada Fluminense, pedindo livros
indesejados às pessoas. Nenhuma contribuição era pequena demais . Amigos foram
convencidos a ajudá-lo. A biblioteca, que abriu as portas em março de 2004, tem 10 mil
volumes de todo tipo.
Para Leite, porém, os livros são um mistério. De família pobre, ele abandonou a escola no
terceiro ano e hoje, aos 51, é analfabeto funcional. Mas sabe a importância dos livros.
"Pode ser tarde para mim, um pedreiro, mas não para outros."
Assim floresceu a paixão que tem consumido seu tempo livre e transformou sua casa numa
biblioteca pública, gratuita e aberta à vizinhança pobre neste subúrbio do Rio. Quem visita
a casa de Leite encontra garotos fazendo lição no que era seu quarto. Adultos folheiam
títulos no que era a sala. Um festival de brochuras e livros sobre quase todo assunto
imaginável, alguns em estado lamentável, cobre todo espaço disponível das paredes.
O espaço para os livros é tão precioso que Leite e a companheira, Maria da Penha, se
mudaram para um quartinho nos fundos. "Este é o único espaço que temos para dormir. Os
livros nos chutaram para fora. Se não tomarmos cuidado, vão nos chutar para fora deste
quartinho também".
Um grande cartaz pintado à mão no telhado da casa anuncia: Biblioteca Comunitária, Rua
18. O que Maria da Penha e Leite fizeram é notável quando se considera o desafio que é
criar o hábito da ler num país com um dos níveis mais baixos de leitura do mundo. O
americano e o inglês médios lêem 5 livros por ano. Na França, 7. No Brasil,
menos de 2.
205
Os brasileiros são prejudicados pela falta de acesso. Autoridades dizem que quase 1 mil
dos 5.500 municípios do País não têm biblioteca pública. Um estudo de 2001 estima que
16% da população tem 75% de todos os livros no Brasil. Além disso, o analfabetismo
continua alto, com 16 milhões de brasileiros com mais de 15 anos incapazes de ler ou
escrever.
O governo brasileiro lançou uma série de iniciativas para melhorar a situação, inclusive
com redução de impostos e campanha para criar bibliotecas. Mas Leite e Maria da Penha
não quiseram esperar.
O GLOBO 15 de outubro de 2008 – O País pag. 13
Ministro da Cultura visita biblioteca que poeta criou na palafita onde vive.
206
O Globo – O País – 16/09/2007
O Estado de São Paulo – Metrópole – 12/10/2007
Crianças que querem fazer a diferença
Elas pensam em política e solidariedade
Marici Capitelli e Fernanda Aranda, SÃO PAULO
207
Eles são diferentes. Ou melhor, fazem a diferença na comunidade em que vivem. São crianças
que, como as demais, gostam de brincar e fantasiar. Só que, além disso, também fazem por
vontade própria ações para transformar a sociedade. Costumam surpreender os pais com suas
preocupações sociais.
“Estou convencendo as minhas amigas que precisamos pintar as paredes da escola que estão sujas
e horríveis. Dá vergonha de estudar lá.” Quem está mobilizando a turma para a limpeza de uma
escola estadual no centro é Nathália Rodrigues Abreu. A idade da organizadora: 7 anos. Um dos
seus assuntos favoritos é política. “Gostaria de conversar com o José Serra para investir mais em
educação.” O presidente Lula não escapa: “Ele diz que governa para pobres. Mas quantas crianças
estão nas ruas?
Já às terças nem adianta convidar Gregório Camacho Marin, de 12 anos, para a pelada de futebol.
O dia está reservado para o trabalho voluntário que o garoto realiza há dois anos na creche Miguel
Franchini Neto, Zona Sul. “Eu venho aqui e me divirto tanto! Brinco com eles e o meu maior
prêmio é ver tantos sorrisos estampados ao mesmo tempo.” Gregório estuda no colégio particular
Magno e foi lá que foi convidado a destinar uma parte da sua semana para fazer o bem.
Enquanto a maioria das crianças passa horas na frente da TV ou do computador, Gabriela Moura,
de 9 anos, faz algo bem diferente: é militante dos direitos dos animais. Ela recolhe assinaturas
para que a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheça os direitos dos bichos, freqüenta
feiras de adoção de cães e gatos e cuida da bicharada que resgata da rua. Na escola, onde cursa a
3ª série, ainda causa polêmica. Em discussões sobre rodeios, faz questão de mostrar aos amigos
que não é justo divertir-se às custas do sofrimento dos animais.
208
O estado de São Paulo A14 08/09/2007
Mostra canadense abre as portas da percepção
Inside, no Paço das Artes, usa eletrônica para ativar sentidos
Antonio Gonçalves Filho
É a primeira parceria do Paço das Artes com o grupo canadense Molior, de Montreal, e
já vem na contramão da recente mania de transformar exposições em espetáculos. A
mostra Inside, aberta hoje ao público, reúne oito artistas pesquisadores de mídias
209
eletrônicas que assinam seis instalações nada espetaculares. Ao contrário. Há até uma
delas, Data, que opera com nanotecnologia e microscópios eletrônicos em busca do
infinitesimal. Numa sociedade em que imagens eletrônicas servem à indústria de
entretenimento ou ao controle policial de seus cidadãos, a exposição propõe um olhar
interiorizado, distante da superficialidade de telões eletrônicos em espaços públicos. Ou,
como diz a curadora canadense Sylvie Parent, tudo o que esses oito artistas querem é
provocar a participação interativa do público preservando seu espaço íntimo.
De fato, todas as seis instalações pedem um ''interator'' disposto a uma experiência de
autoconsciência, a começar pela instalação criada por Alexandre Castonguay, Digitale, em
que uma antiga máquina fotográfica, adaptada para registrar imagens em vídeo (exibidas
numa tela tátil), leva o espectador a um estado de estupefação diante de sua silhueta em
preto-e-branco, que desaparece gradualmente diante de seus olhos. Funciona mais ou
menos como um ''fade-out'' da memória, apagando os vestígios dessa imagem como num
cérebro que morre .
Após esse choque, o espectador estará apto a ver a instalação Perversely Interactive
System, da dupla formada por Lynn Hughes e Simon Laroche. Nela, entra-se em contato
com um ser virtual graças a um dispositivo de biofeedback. Uma interface sensível ao
toque mede a resistência elétrica da pele do espectador que, dependendo de seu nível de
estresse, estará ou não habilitado a integarir com o ''outro'' virtual - uma mulher que se
aproxima ou se afasta da superfície da tela atraída pela descontração do operador. Lynn
Hughes é ligada à área de humanas (literatura, filosofia), o que explica essa referência às
questões filosóficas da ficção de Philip K. Dick e sua associação com o designer interativo
Simon Laroche, colaborador habitual de diretores teatrais e cineastas do Canadá.
O ''interator'' pode, ainda, transformar-se numa torre móvel de captação e transmissão de
imagens na mostra Inside. Basta entrar na instalação Habitgram, de uma artista conhecida
apenas como ''beewoo'' (com minúscula, como o poeta e.e. cummings). Concebido como
um casaco que traz embutidas minicâmeras de vídeo, o Habitgram leva o espectador a um
delírio labiríntico ao se ver cercado por projeções do ambiente real em que está imerso,
tentando redefinir o que vê à frente.
''As obras da exposição usam meios que afirmam o espaço interior como um espaço
inviolável, mas elas não se referem apenas à espacialidade'', observa a curadora,
destacando a experiência temporal desse processo de interiorização, particularmente em
instalações como RedTV, de Bradd Todd. Nela, um sinal de transmissão televisiva, mal
captado pelos sentidos, dá origem a um programa de imagens evasivas. Figuras se movem
e desaparecem nessa fantasmagoria produzida por um desvio de percepção. Ele é produto
do confronto entre o tempo real de projeção e os rastros deixados pelo desenho
computadorizado. Proustiano até a medula.
Se a instalação de Brad Todd conduz a um jogo de memória baseado em combinações
telemáticas, o professor de Artes Visuais da Universidade de Quebec, Jean Dubois, propõe,
com sua instalação interativa Tact, que o espectador entre em contato com um personagem
virtual anônimo por meio do toque. O efeito lembra muito o do menino que, no filme
Persona, de Bergman, tenta alcançar a imagem projetada da mãe, com a diferença que,
aqui, o espectador tem total controle sobre o personagem, pagando por isso o preço de ver
210
sua imagem refletida num espelho circular. Detalhe: ele registra todas as nuances do seu
comportamento.
Finalmente, em Data, da dupla Gisèle Trudel e Stéphane Claude, imagens obtidas por meio
de microscópios eletrônicos levam o espectador a explorar a matéria, a exemplo dos
clássicos de ficção. Como contraponto da exposição, o mesmo Paço abre hoje a mostra
Oidaradio, em que artistas visuais criam obras para serem ouvidas.
Serviço
Inside. Oidaradio. 14 h/18 h (fecha aos sábados e domingos). Grátis. Até 30/5Paço das Artes.
Cidade Universitária. Av. da Universidade, 1. tel. 3814-4832 3.ª a 6.ª, 11h30/19 h (sáb., dom. e
feriados, 12h30 às 17h30). Grátis. Até 20/7.
FERREIRA GULLAR FSP 20-04-08
O cachorro como obra de arte
A arte de vanguarda, que nasceu contra a institucionalização, é refém da instituição
Em 2007, um costarriquenho, que se diz artista e se chama Guillermo
Habacuc Vargas, pegou na rua um cão vira-lata, amarrou-o numa corda e o prendeu à
parede de uma galeria de arte, onde o animal ficou definhando até morrer de fome.
Tratava-
se, segundo ele, de uma "instalação perecível", uma obra de vanguarda. Pois bem, para o
espanto das pessoas que já se tinham revoltado com a crueldade de Habacuc, a Bienal de
Arte Centro-Americana de Honduras acaba de convidá-lo para dela participar com a
referida
"obra" e concorrer a um dos prêmios do certame.
Será tudo isso verdade ou apenas uma "pegadinha"? Custa crer que o dono de uma galeria
de arte permita que um exibicionista pirado amarre ali um pobre cão e o deixe morrer de
inanição. Como se deu a coisa? O animal urinava e cagava preso à parede, ganindo
desesperado? As pessoas iam assistir a esse espetáculo de sadismo e ninguém se revoltou
nem nenhuma sociedade protetora dos animais protestou? A possibilidade de ter o cão
morrido sem que ninguém tenha sabido está fora de questão, uma vez que o objetivo desse
tipo de "autor" é precisamente chamar a atenção sobre si, já que nenhum outro propósito
pode ser considerado. Mais surpresa causa ainda a notícia de que a Bienal de Honduras o
tenha convidado a repetir, nela, aquele mesmo espetáculo de crueldade e sadismo.
Não obstante, essa informação está em vários sites, e surgiu até um movimento de protesto
-um abaixo-assinado- para impedir que a Bienal mantenha o convite. Se o que Habacuc
queria era escandalizar e ganhar notoriedade, conseguiu, ainda que a notoriedade própria
aos torturadores e carrascos.
Não obstante, apesar da repercussão que o cerca, esse fato não é tão novo assim. Sem a
mesma dose de cocô e urina nem a mesma animalidade, outras "obras" e atitudes ocorridas
antes são reveladoras do impasse a que chegaram a arte dita de vanguarda e as instituições
que a exibem, particularmente as Bienais. Uns poucos anos atrás, um gaiato enviou para a
Bienal de São Paulo, como sua obra, a seguinte proposta: abrir uma segunda porta na
211
exposição por onde as pessoas entrariam sem pagar. Não podia ser aceita, pois implicaria
sério prejuízo ao certame, mas também não poderia ser rejeitada, porque, sendo a Bienal
"de vanguarda", tal rejeição comprometeria sua imagem.
Em face disso, adotou-se a seguinte solução: improvisar, nos fundos do prédio, uma
portinha meio secreta, garantida por um guarda que a manteria aberta por apenas uma hora
e só permitiria a entrada de dez visitantes, no máximo. E assim as coisas se acomodaram,
salvando-se a audácia do artista e o caráter vanguardista da instituição. Pode ser que me
engane, mas a impressão que tenho é de uma luta farsesca entre falsos inimigos que
necessitam um do outro para existir: sem o espaço institucional (galeria, museu, Bienal),
não
existe a vanguarda e, sem a vanguarda, não existem tais instituições. E a gente se pergunta:
mas a vanguarda não nasceu contra a arte institucionalizada? Pois é...
Voltemos ao cachorro. O tal Habacuc pegou o cachorro na rua e o levou para a galeria de
arte a fim de fazer dele uma "instalação perecível", ou seja, uma obra de arte. Se o tivesse
levado para um galpão qualquer e o deixasse lá morrendo de fome, ele não passaria de um
pobre vira-lata vítima de um maluco. Mas, como o Habacuc é artista -ou se diz-, levou-o
para uma galeria de arte e aí o pobre cão, de cão virou instalação, por obra e graça do
espaço em que o puseram para morrer. Esse é um dado que os críticos de arte (também de
vanguarda) teimam em ignorar, ou seja, que, nessa concepção estética, é o espaço
institucional que faz a obra: por exemplo, um urinol igualzinho ao de Duchamp, se estiver
no
Pompidou, é arte; se estiver no banheiro de um boteco, é urinol mesmo, pode-se mijar nele
à vontade.
É, portanto, diferente da Mona Lisa, que depois de roubada do Louvre, em 1911, e levada
para um quarto de hotel na Itália, continuou a obra-prima que sempre foi. É que a chamada
arte conceitual dispensa o fazer artístico e afirma que será arte tudo o que se disser que é
arte, mas desde que o ponham numa galeria ou numa Bienal.
Ou seja, a essência da arte de vanguarda, que nasceu contra a institucionalização da arte, é
contraditoriamente, a instituição; não está nas obras e, sim, no espaço institucionalizado
em
que ela é posta. Talvez por isso, a próxima Bienal de São Paulo não terá obras de arte:
exibirá apenas o espaço institucional vazio, que as dispensa.
O Estado de São Paulo
Silêncio feito de denúncia e indignação
Reisewitz usa a fotografia para apontar a barbárie e o descaso com a natureza
Maria Hirszman
Paradoxais, as fotografias de Caio Reisewitz aliam forças antagônicas para tratar de questões do
mundo das artes e do mundo dos homens. Ao mesmo tempo que são profundamente silenciosas,
negam a velocidade e a potência significativa do fragrante, elas destilam uma profunda indignação
contra a barbárie econômica e o descaso em relação ao nosso patrimônio natural. Atemporais, elas
denunciam, por meio do título e das imagens registradas, o local preciso em que se deu aquele
encontro entre o olhar do fotógrafo e a natureza - preservada ou devastada -, num jogo de
interessante e instável equilíbrio. Como define o artista, estas ''não são fotografias de
oportunidade''.
212
Não há diferença no tratamento da cena. Seja na bucólica e irreal Goiânia Golf Club ou na trágica
imagem aérea da represa de Guarapiranga, temos diante dos olhos imagens de grande requinte
técnico. Feitas com câmaras de grande formato e negativos de chapa, essas fotografias são
resultado de um grande esforço compositivo. E, no entanto, primam por uma grande neutralidade.
''Procuro deixar o objeto falar por si só, sem inventar perspectivas malucas'', afirma o artista,
acrescentando que essa busca de neutralidade, de atemporalidade, a exploração de uma luz e de
um enquadramento cuidadosamente ''neutro'' acaba adquirindo muitas vezes um caráter
provocativo. ''Tem gente que se irrita porque não vê minha ação'', conta. Outros buscam pistas de
um processo de trucagem com o computador, que não existe.
A qualidade impecável da imagem, o caráter muitas vezes sublime das composições, o respeito aos
cânones do gênero da paisagem contribuem para esse estranhamento, para essa sensação de
irrealidade provocada pelas imagens, expressões simultâneas da cena cotidiana do século 21 e da
tradição da representação idílica da natureza, típica da pintura romântica do século 18 e19. ''Sou
um artista que trabalha com fotografia'', explica Reisewitz, enfatizando dessa forma a importância
da tradição pictórica, em especial do gênero paisagístico, em sua produção. Um exemplo bastante
interessante desse embate entre a escola européia, mais melancólica, e a realidade brasileira, é a
tela Mata Reduzida a Carvão, pintada por Felix Émile Taunay em 1830, na qual vemos o avançar
da destruição da mata virgem, a ação civilizatória e economicamente predatória.
Reisewitz propõe quase que uma releitura desse confronto, isolando de maneira mais radical os
elementos em jogo. O fato de não haver pessoas nas cenas de Reisewitz é algo bastante
significativo. A ausência dos personagens dessa história só faz reforçar a melancolia e o efeito de
distanciamento, que ao mesmo tempo atenua e consolida a denúncia. Afinal, se o autor da
destruição não está lá, não podemos transferir ao outro a culpa pelo estado de coisas, só nos
restando questionar a nós mesmos. Trata-se, assim, de imagens que falam de gente sem mostrar
gente, composições que eliminam os ruídos a ponto de excluir qualquer luz mais intensa ou
qualquer referente mais explícito dando forma a um vazio eloqüente.
Serviço
Caio Reisewitz. Galeria Brito Cimino. Rua Gomes de Carvalho, 842, Vila Olímpia, telefone 3842-
0635. Terça a sexta, das 10 horas às 19 horas; sábado, das 11 horas às 17 horas. Até 31/5.
Abertura prevista para hoje, às 19 horas
Os colecionadores que estão pensando em comprar uma obra do jovem artista plástico Caio
Resewitiz, é melhor se apressarem. A estrela do rapaz sobe a grande velocidade. Sua agenda para
os próximos dias e meses é a seguinte: amanhã, ele abre a individual Você Não Está Sozinho, na
Galeria Brito em São Paulo; na quinta, abre a mostra Alegoria Barroca na Arte Contemporânea, no
CCBB do Rio. Em seguida parte para a Bienal de Veneza, que será aberta em junho, com seis
importantes trabalhos da série Utopias Ameaçadas que vão dividir o pavilhão brasileiro no Centro
dos Giardini com as obras do grupo Chelpa Ferro. Depois, Milão, Frankfurt, Recife e Buenos Aires
no Museu de Belas Artes. Ou seja...
Jornal O Estado de São Paulo - 22/5, Caderno 2 – Coluna Persona (Cesar Giobbi).
Biografia
Caio Christian Reisewitz (São Paulo SP 1967). Fotógrafo. Forma-se em comunicação visual na Faap
em 1989. No início dos anos 90 vai para Alemanha, onde freqüenta a Escola Superior de Artes de
Darmstadt. Entre 1992 e 1997, estuda artes plásticas pela Universidade de Mainz, Alemanha,
especializando-se em fotografia. Realiza, em 2001, Workshop na Oficina Cultural Oswald de
Andrade.
213
Informações detalhadas sobre a vida e obra do artista estão publicadas em diferentes sites.
Atualmente, Caio expõe seus trabalhos na 51ª Bienal de Veneza.- Pavilhão do Brasil.
Veja detalhes clicando no link.
http://www.goethe.de/br/rio/prpbienalveneza.htm
Works 2003
Minas cria rede de escolas sobre meio ambiente
Unesco e Conselho Mundial das Águas apóiam projeto que começa com 30 unidades
em locais estratégicos
João Domingos, BRASÍLIA
O Estado de Minas dará início amanhã a um projeto que pretende instalar 30 escolas de
educação ambiental, num primeiro momento, e 55 até o fim deste ano. “Queremos que as
escolas sejam freqüentadas por pessoas de todas as idades”, explica o subsecretário
estadual de Ciência e Tecnologia, Otávio Elízio.
Cada uma das escolas ambientais terá capacidade para atender até 300 alunos, que terão
ensino à distância e também na presença do professor, sempre um técnico selecionado de
algum órgão que trabalhe com o meio ambiente.
A idéia recebeu o apoio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco) e do Conselho Mundial de Águas, que está lançando a campanha “Água
para a paz e para a vida”, com o objetivo de resolver conflitos entre países que disputam as
mesmas fontes aqüíferas.
Há um mês, cerca de 400 cientistas que participaram da segunda parte do relatório do
214
Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), em
Bruxelas, concluíram que mais de 1 bilhão de pessoas poderão sofrer com a falta de água
em um futuro próximo e que as populações mais pobres do mundo serão as mais afetadas
pelo aquecimento global.
BACIAS HIDROGRÁFICAS
A Rede Mineira de Educação Ambiental prevê a criação de centros de educação em meio
ambiente nas localidades próximas às diferentes bacias hidrográficas de Minas. A
princípio, pretende oferecer aos alunos de qualquer idade noções de preservação do meio
ambiente como fator de melhoria das condições sociais. Em seguida, de acordo com
Otávio Elízio, com a experiência que tiverem adquirido, os alunos poderão trabalhar em
projetos produtivos que se sustentem a longo prazo e sem que o meio ambiente seja
degradado.
Na primeira fase de implantação do projeto de escolas ambientais, o governo de Minas
pretende usar também a rede de universidades federais, estaduais e particulares, além de
autarquias como a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG), a
Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e a Companhia de Saneamento do Estado
(Copasa), informa Elízio.
Segundo os idealizadores do programa, esses prédios públicos e privados têm condições de
oferecer a infra-estrutura para as escolas, pois boa parte das aulas será feita por
videoconferência.
NO CURRÍCULO ESCOLAR
Como o tema ambiental hoje ganhou grande importância no Brasil e no mundo, a Câmara
dos Deputados poderá votar projeto de lei que tornará obrigatória em todo o País a
educação ambiental. De acordo com o vice-presidente da Câmara, Narcio Rodrigues
(PSDB-MG), a Mesa Diretora da Casa já decidiu encomendar estudos sobre a mudança.
Assim, é provável que dentro de dois ou três anos os alunos do ensino básico e
fundamental já venham a estudar matérias sobre meio ambiente.
A Câmara pretende, ela mesma, ter maior participação no tema ambiental. No mês
passado, Rodrigues foi enviado a Moscou e a Paris para encontros com Mikhail
Gorbachev, ex-presidente da extinta União Soviética (URSS), que hoje preside a Green
Cross, uma entidade voltada para temas de meio ambiente, e com Bertrand Charrier,
dirigente do Conselho Mundial de Águas.
Rodrigues, que é ligado politicamente ao governador de Minas, Aécio Neves (PSDB),
aproveitou para falar do projeto de criação das escolas ambientais, além de recolher, com
os dois dirigentes, experiências implantadas em outros países que possam ser utilizadas no
Brasil.
“O mundo todo tem grande interesse no Brasil e na América Latina por causa,
principalmente, da Amazônia e da grande quantidade de água que há por aqui”, diz o
215
deputado.
Segundo ele, numa dessas reuniões, um dirigente lhe disse que a Unesco tem trabalhado
em uma estratégia especial para a América Latina, visto que na região está 26% da água
potável do globo, mas apenas 6% da população mundial.
O Estado de São Paulo – Caderno 2 - 07/06/2007
Pensar com os sentidos e sentir com a mente
Esse é o tema genérico da 52.ª Bienal de Veneza, que a partir desta semana vai
apresentar a arte do presente
Camila Molina
Pense com os Sentidos, Sinta com a Mente. Sob esse tema genérico, com o subtítulo A
Arte do Presente, a 52ª Bienal Internacional de Arte de Veneza, a mostra mais tradicional
do mundo, começa hoje a ser inaugurada - até sábado para os convidados e no domingo
para o grande público (nesse dia, pela manhã, ocorrerá a cerimônia de entrega do Leão de
Ouro para o fotógrafo africano Malick Sidibé). 'Acho muito conveniente falar do presente,
tão vertiginoso no âmbito cultural', diz o artista carioca Waltercio Caldas, que participa da
exposição como um dos artistas convidados pelo curador-geral da 52ª Bienal de Veneza, o
americano Robert Storr. 'Ele quis enfatizar uma arte feita para um momento essencial, não
a feita para o futuro nem para o passado. É uma curadoria que me interessa porque faço
uma diferença entre arte e cultura: arte produz um tempo, a cultura sofre o tempo', continua
o artista, um dos principais nomes da arte contemporânea brasileira.
A 52ª Bienal de Veneza conserva seu modelo tradicional: é formada por uma mostra
central, com curadoria de Robert Storr, que ocupa o Pavilhão Itália e o Arsenale, e pelas
representações nacionais nos Giardini - 77 países fizeram suas próprias escolhas de
representantes, inclusive o Brasil, pela Fundação Bienal de São Paulo. No Pavilhão Brasil
estarão as obras do carioca José Damasceno e da dupla de gaúchos que vive em Paris
Angela Detanico e Rafael Lain, selecionados por Jacopo Crivelli Visconti, da Fundação
Bienal de São Paulo, instituição que desde 1983 faz a curadoria da representação brasileira
em Veneza.
Ainda dentro do projeto curatorial de Storr estão a inclusão do Pavilhão Turquia e a
realização da mostra sobre arte contemporânea africana Check List Luanda Pop, com obras
da Coleção Sindika Dokolo, de Luanda, Angola, selecionadas por curadores convidados.
Robert Storr, que entre 1990 e 2002 foi responsável pelo departamento de pinturas e
esculturas do Museu de Arte Moderna de Nova York ( MoMA), é o primeiro americano a
assinar a curadoria da Bienal de Veneza, que na sua edição anterior, teve pela primeira vez,
também, uma novidade: uma curadoria assinada por duas mulheres, as espanholas Maria
de Corral e Rosa Martinez.
Há mais de 15 dias Waltercio Caldas chegou à cidade italiana para preparar a obra Half
Mirror Sharp (Meio Espelho Sustenido), seu trabalho inédito para a 52ª Bienal de Veneza,
instalado no Pavilhão Itália. O 'ambiente' - e não instalação - de Waltercio é formado por
216
cinco esculturas 'relacionadas como uma seqüência de partitura musical', como diz o
artista. Segundo Waltercio, os intervalos entre os elementos da obra - feitos com vidros,
aço inox, fios de lã, pedras e adesivos, nas cores vermelho, abóbora, bege, preto, verde e
azul -, suas distâncias que, na verdade, se transformam em 'intervalos óticos' nessa 'música
para os olhos', também são considerados materiais. O trabalho se faz da relação entre todos
- como numa composição musical de notas e intervalos para o espectador 'sentir-se
envolvido'.
Para Waltercio Caldas, que participou também da 47ª Bienal de Veneza, em 1997, 'a
principal função do artista é melhorar a qualidade do desconhecido', o que está implícito no
tema desta edição da mostra: unir o pensamento e o sentimento ('não a sentimentalidade').
Para o paulista Iran do Espírito Santo, também entre os artistas convidados de Storr para o
evento, mesmo 'com todos os problemas da instituição e com a crise das bienais, a Bienal
de Veneza é certamente a que tem maior público e que provoca mais debate', isso
possibilitado pela extensa duração da mostra, que vai até 21 de novembro. Iran exibe em
uma sala do Pavilhão Itália um desenho e uma pintura de grandes dimensões, feitas sobre
as paredes, e quatro esculturas de granito, que 'representam sucessivamente uma cerca de
alambrado, um muro e vidros quebrados'. 'A relação do meu trabalho com a idéia da
mostra creio ser bastante clara. Apesar de meu trabalho ter uma verve bastante racional, a
origem dele sempre se dá de maneira intuitiva e sensível', afirma o artista. 'Outra questão é
a de que esta bienal é bastante 'visual', o que retoma, a meu ver, a razão de ser da arte.'
HOMENAGEM
'Com um punhado de exceções, todos os artistas incluídos estão vivos e ativos. Diferentes
em origem e em pontos de vista temporais, são eles que conjugam o presente da arte um
para o outro - e para nós', escreve Robert Storr em texto de apresentação. Mas o curador
criou uma seção especial como homenagem a artistas que tiveram morte prematura e
inesperada, embora tenham deixado uma obra viva na atualidade, e dentro desse sentido o
brasileiro Leonilson (1957-1993) foi selecionado para ser representado ao lado do cubano-
americano Felix Gonzalez-Torres, do alemão Martin Kippenberger e do francês Philipe
Thomas. 'A nossa escolha ficou com trabalhos que, de alguma forma, aludiam ao auto-
retrato. O curador acabou por optar por quatro obras em que o texto e a figura estão
evidentes', conta Ricardo Resende, que faz parte do Projeto Leonilson, com sede em São
Paulo.
Ao mesmo tempo, na mesma 52ª Bienal de Veneza em que participam nomes de destaque
do cenário mundial, como Louise Bourgeois, Daniel Buren, León Ferrari, Jenny Holzer,
Ilya e Emilia Kabakov, Sol LeWitt (1928-2007), Bruce Nauman, Sigmar Polke e Gerhard
Richter, ainda conta com os brasileiros Elaine Tedesco, Paula Trope e os meninos do
Grupo do Morrinho, do Rio.
06 de junho de 2007 - 17:48
Bienal de Veneza apresenta sua arte do presente
Começa nesta quinta-feira, para convidados, com o tema genérico Pense com os Sentidos,
Sinta com a Mente, a 52.ª edição da mostra mais tradicional do mundo
217
Camila Molina
Divulgação
Escultura
Viagem à Lua
, de José Damasceno
Veja também
¤ Galeria de fotos
SÃO PAULO - Pense com os Sentidos, Sinta com a Mente. Sob esse tema genérico, com o subtítulo
A Arte do Presente, a 52.ª Bienal Internacional de Arte de Veneza, a mostra mais tradicional do
mundo, começa nesta quinta-feira, 7, a ser inaugurada - até sábado para os convidados e no
domingo para o grande público (nesse dia, pela manhã, ocorrerá a cerimônia de entrega do Leão
de Ouro para o fotógrafo africano Malick Sidibé). “Acho muito conveniente falar do presente, tão
vertiginoso no âmbito cultural”, diz o artista carioca Waltercio Caldas, que participa da exposição
como um dos artistas convidados pelo curador-geral da 52.ª Bienal de Veneza, o americano Robert
Storr. “Ele quis enfatizar uma arte feita para um momento essencial, não a feita para o futuro nem
para o passado. É uma curadoria que me interessa porque faço uma diferença entre arte e cultura:
arte produz um tempo, a cultura sofre o tempo”, continua o artista, um dos principais nomes da
arte contemporânea brasileira.
A 52.ª Bienal de Veneza conserva seu modelo tradicional: é formada por uma mostra central, com
curadoria de Robert Storr, que ocupa o Pavilhão Itália e o Arsenale, e pelas representações
nacionais nos Giardini - 77 países fizeram suas próprias escolhas de representantes, inclusive o
Brasil, pela Fundação Bienal de São Paulo. No Pavilhão Brasil estarão as obras do carioca José
Damasceno e da dupla de gaúchos que vive em Paris Angela Detanico e Rafael Lain, selecionados
por Jacopo Crivelli Visconti, da Fundação Bienal de São Paulo, instituição que desde 1983 faz a
curadoria da representação brasileira em Veneza.
Ainda dentro do projeto curatorial de Storr estão a inclusão do Pavilhão Turquia e a realização da
mostra sobre arte contemporânea africana Check List Luanda Pop, com obras da Coleção Sindika
Dokolo, de Luanda, Angola, selecionadas por curadores convidados. Robert Storr, que entre 1990 e
2002 foi responsável pelo departamento de pinturas e esculturas do Museu de Arte Moderna de
Nova York (MoMA), é o primeiro americano a assinar a curadoria da Bienal de Veneza, que na sua
edição anterior, teve pela primeira vez, também, uma novidade: uma curadoria assinada por duas
mulheres, as espanholas Maria de Corral e Rosa Martinez.
Há mais de 15 dias Waltercio Caldas chegou à cidade italiana para preparar a obra Half Mirror
Sharp (Meio Espelho Sustenido), seu trabalho inédito para a 52.ª Bienal de Veneza, instalado no
Pavilhão Itália. O “ambiente” - e não instalação - de Waltercio é formado por cinco esculturas
“relacionadas como uma seqüência de partitura musical”, como diz o artista. Segundo Waltercio,
os intervalos entre os elementos da obra - feitos com vidros, aço inox, fios de lã, pedras e
218
adesivos, nas cores vermelho, abóbora, bege, preto, verde e azul -, suas distâncias que, na
verdade, se transformam em “intervalos óticos” nessa “música para os olhos”, também são
considerados materiais. O trabalho se faz da relação entre todos - como numa composição musical
de notas e intervalos para o espectador “sentir-se envolvido”.
Para Waltercio Caldas, que participou também da 47.ª Bienal de Veneza, em 1997, “a principal
função do artista é melhorar a qualidade do desconhecido”, o que está implícito no tema desta
edição da mostra: unir o pensamento e o sentimento (“não a sentimentalidade”).
Para o paulista Iran do Espírito Santo, também entre os artistas convidados de Storr para o
evento, mesmo “com todos os problemas da instituição e com a crise das bienais, a Bienal de
Veneza é certamente a que tem maior público e que provoca mais debate”, isso possibilitado pela
extensa duração da mostra, que vai até 21 de novembro. Iran exibe em uma sala do Pavilhão
Itália um desenho e uma pintura de grandes dimensões, feitas sobre as paredes, e quatro
esculturas de granito, que “representam sucessivamente uma cerca de alambrado, um muro e
vidros quebrados”. “A relação do meu trabalho com a idéia da mostra creio ser bastante clara.
Apesar de meu trabalho ter uma verve bastante racional, a origem dele sempre se dá de maneira
intuitiva e sensível”, afirma o artista. “Outra questão é a de que esta bienal é bastante ‘visual’, o
que retoma, a meu ver, a razão de ser da arte.”
Homenagem
“Com um punhado de exceções, todos os artistas incluídos estão vivos e ativos. Diferentes em
origem e em pontos de vista temporais, são eles que conjugam o presente da arte um para o
outro - e para nós”, escreve Robert Storr em texto de apresentação. Mas o curador criou uma
seção especial como homenagem a artistas que tiveram morte prematura e inesperada, embora
tenham deixado uma obra viva na atualidade, e dentro desse sentido o brasileiro Leonilson (1957-
1993) foi selecionado para ser representado ao lado do cubano-americano Felix Gonzalez-Torres,
do alemão Martin Kippenberger e do francês Philipe Thomas. “A nossa escolha ficou com trabalhos
que, de alguma forma, aludiam ao auto-retrato. O curador acabou por optar por quatro obras em
que o texto e a figura estão evidentes”, conta Ricardo Resende, que faz parte do Projeto
Leonilson, com sede em São Paulo.
Ao mesmo tempo, na mesma 52.ª Bienal de Veneza em que participam nomes de destaque do
cenário mundial, como Louise Bourgeois, Daniel Buren, León Ferrari, Jenny Holzer, Ilya e Emilia
Kabakov, Sol LeWitt (1928-2007), Bruce Nauman, Sigmar Polke e Gerhard Richter, ainda conta
com os brasileiros Elaine Tedesco, Paula Trope e os meninos do Grupo do Morrinho, do Rio.
Por enquanto, dois brasileiros na 12.ª Documenta
Lista de Kassel ainda não foi anunciada, mas já se sabe que Ricardo Basbaum e Iole de Freitas
estão nela
Para as artes visuais, 2007 é um ano privilegiado, quando as duas maiores e mais importantes
mostras de arte do mundo ocorrem quase ao mesmo tempo. Além da 52ª Bienal Internacional de
Veneza, a ser inaugurada para o público já no domingo, a 12ª Documenta de Kassel, na
Alemanha, tem na próxima sexta-feira, dia 15, sua festa de abertura, e, no sábado, a inauguração
para os visitantes em geral. A Documenta, iniciada em 1955, ocorre apenas a cada cinco anos, daí
a feliz coincidência.
No ano passado foi anunciado que o brasileiro Ricardo Basbaum tinha sido convidado a participar
desta edição da Documenta, cujo diretor artístico é alemão Roger M. Buergel. Além dele, também
estará a escultora mineira Iole de Freitas, convidada em março. A lista oficial dos artistas será
apenas revelada pouco antes da abertura da exposição - como nas edições de 1997 e 2002.
219
Também já foram anunciados como participantes o polonês Artur Zmijewski, a inglesa Imogen
Stidworthy e, curiosamente, o famoso chef de cozinha espanhol Ferran Adriá.
A Documenta 12, que ficará em cartaz até 23 de setembro, tem três leitmotifs, ou questões
complexas que norteiam a sua concepção curatorial: A modernidade é nossa antiguidade? ; O que
é vida nua? ; e O que pode ser feito? Já em dezembro de 2005 Buergel explicou cada uma das
perguntas - segundo ele, faz-se uma mostra para descobrir algo - em texto publicado no site oficial
da Documenta. 'Os artistas se educam para trabalhar forma e tema; o público se educa para
experimentar coisas esteticamente. Como mediar o conteúdo particular ou formal das obras sem
sacrificar sua particularidade é um dos grandes desafios de uma exposição como a Documenta.
Hoje, a educação parece oferecer uma alternativa viável ao demônio (didatismo, academia) e o
profundo mar azul (fetichismo da mercadoria)', sugere o curador. Como indica, essa pode ser uma
mostra com inovações, entre elas, o projeto Documenta 12 Magazines, trabalho colaborativo entre
publicações impressas e eletrônicas sobre arte contemporânea de todo o mundo, inclusive
brasileiras.
A participação de Ricardo Basbaum, artista, mas também crítico e curador, foi anunciada há
tempos porque seu trabalho é feito em colaboração com o público. Foi o primeiro projeto iniciado
pela Documenta e todo ele foi desenvolvido usando como ferramenta a internet.
Objetos produzidos com funcionários de empresas alemãs circularam pelas casas de pessoas que
se interessaram em participar da obra - uma relação intensa de público e privado. Os
objetos/ferramentas foram colocados em pontos de Kassel e também enviados para São Paulo, Rio
e Buenos Aires. As experiências foram documentadas pelos participantes e apresentadas no site
www.nbp.pro.br, onde o material é acessível ao público em geral. Agora, na mostra, tudo será
mostrado em uma instalação criada por Basbaum.
quarta-feira, 18 de julho de 2007, 17:14 | O Estado de São Paulo Online
Fotógrafo quer registrar nus no gelo contra o aquecimento
Spencer Tunick, famoso por reunir milhares de pessoas sem roupa, fará sessão em gelo
suíço
220
Reuters
Tunick espera reunir centenas de pessoas sem roupa alguma em uma calota de gelo na
Suíça
MADRI - O fotógrafo nova-iorquino Spencer Tunick, famoso por imortalizar com sua
lente milhares de pessoas nuas em diferentes cidade do planeta, agora quer chegar às
geleiras suíças, onde retratará voluntários para um protesto contra o aquecimento global,
informou nesta quarta-feira, 18, o jornal El Pais.
A sessão de fotos, claro, contará com "modelos" nus. A organização Greenpeace já iniciou
as buscas pelas pessoas dispostas a tirar a roupa. A campanha pretende simbolizar a
vulnerabilidade do gelo e a fragilidade do corpo humano.
Um porta-voz afirmou que o grupo está otimista e espera recrutar centenas de pessoas.
Segundo a reportagem do jornal espanhol, ainda não foi decidido o local exato de onde
serão feitas as fotos. Contudo, a data é certa: 18 e 19 de agosto.
Em seu comunicado, o Greenpeace destaca que as fotografias com geleiras é um claro
alerta às mudanças que o planeta está sofrendo e que, "caso o aquecimento continue no
ritmo atual, antes de 2080 a maioria das calotas de gelo serão substituídos por campos de
cascalho".
221
Spencer Tunick é famoso por exibições públicas de nu. Sua última sessão de fotos foi
realizada na Cidade do México, em uma das maiores praças do planeta, que contou com a
participação de 20 mil pessoas e teve custo de aproximadamente 85 mil euros.
O globo 11/05/2007 - 10h22 - Atualizado em 11/05/2007 - 11h03
Bulldog francês adota filhote de tigre-de-bengala órfão no Japão
A cadela cuida do tigre como se ele fosse seu filho.
Funcionários do zoológico dizem que eles passam o dia juntos.
Reuters
Este Bulldog francês ficou sensibilizado com a situação de um filhote de tigre-de-bengala
que foi rejeitado pela mãe. Segundo os funcionários do zoológico de Shirotori, no sul do
Japão, o cachorro está cuidando do tigre como se ele fosse seu filho (Foto: Yuriko
Nakao/Reuters)
Reuters
O solidário cão francês não apenas alimenta o tigre, mas também o limpa e brinca com ele
durante todo o dia (Foto: Yuriko Nakao/Reuters)
222
Reuters
'Mãe e filho' também comem juntos (Foto: Yuriko Nakao/Reuters)
13/05/2007 - 11h34 - Atualizado em 13/05/2007 - 11h35
Gata adota sete pintinhos órfãos na Jordânia
Galinha morreu faz um mês.
Pintinhos e filhotes da gata vivem em harmonia.
Reuters
Na hora de mamar, a mãe gata, chamada de Nimra, encontra canto para dar calor aos sete
pintinhos, que ficaram órfãos há um mês, na Jordânia (Foto: Ali Jarekji/Reuters)
Reuters
Homem segura a mãe-gata e um dos sete pintinhos (Foto: Ali Jarekji/Reuters)
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