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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CES - FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
A organização da escola em ciclos na Rede Municipal de Educação
de Niterói/RJ: análise do processo de reconstrução da proposta
pedagógica para o Ensino Fundamental (2005-2007)
Viviane Gualter Peixoto
Niterói/RJ
2008
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VIVIANE GUALTER PEIXOTO
A organização da escola em ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói/RJ:
análise do processo de reconstrução da proposta pedagógica para o Ensino Fundamental
(2005-2007)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em Educação.
ORIENTADOR: Prof. Dr. Waldeck Carneiro
Niterói/RJ
2008
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VIVIANE GUALTER PEIXOTO
A organização da escola em ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói/RJ:
análise do processo de reconstrução da proposta pedagógica para o Ensino Fundamental
(2005-2007)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em Educação.
Aprovada em: _____/_____/_____.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________
Prof. Dr. Waldeck Carneiro da Silva – Orientador
UFF - Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________
Profa. Dra.Iduína Mont’Alverne Chaves
UFF - Universidade Federal Fluminense
______________________________________________
Profa. Dra. Claudia de Oliveira Fernandes
UNIRIO - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
Niterói/RJ
2008
4
AGRADECIMENTOS
Chegar à conclusão do curso de Mestrado me remete a lembranças que jamais podem ser
esquecidas. Lembranças que me fazem vibrar e agradecer todo o dia ao meu Deus, que
diariamente me tem fortalecido com graça, sabedoria e esperança, que se renovam a cada
manhã em meu coração. Obrigada, Deus, pelo Seu imenso amor e pelo Seu poder que se
aperfeiçoa em minha fraqueza. Obrigada, Deus, por mais um sonho conquistado. Obrigada,
Deus, por ter colocado em meus caminhos tantas pessoas especiais.
Sou grata aos meus pais, Wilson e Joana, que abdicaram de muitos de seus desejos para
realizar os meu; por todos os valores que cultivaram em minha vida, por tudo que me
ensinaram e pelo privilégio de ser amada por eles.
Agradeço ao meu irmão Raphael, que, desde o seu nascimento, acalenta minha alma com seu
sorriso que transmite bondade, paz, alegria e sincera torcida por minhas conquistas. Em
especial, por estar sempre ao meu lado.
Sou grata também ao meu noivo Felipe, que projetou comigo a minha inserção nesse curso,
incentivando-me e acreditando sempre na minha vitória. Agradeço por me acolher com
palavras de conforto nos momentos de angústias e, principalmente, pelo sentimento amoroso
que nos une.
alguns anos, me lembro de ter agradecido aos meus mestres da graduação, pelo apoio
crítico e solidário à minha formação intelectual. Naquela época, eu estava concluindo a minha
monografia. Agora, ao fechar um novo ciclo desta formação, reitero este agradecimento,
reconhecendo o incentivo para que eu ingressasse no mestrado. Em especial, às professoras
Lúcia Helena Eletério, Yrlla Ribeiro, Giseli Cruz, Dagmar Canella e aos professores
Alexandre Maia e Renato Dornellas. Obrigada pelo carinho!
Agradeço ao Professor Waldeck Carneiro pela forma generosa com que discutiu comigo o
primeiro esboço deste trabalho e pela forma igualmente generosa pela qual apontou meus
erros e acertos por ocasião de suas orientações. Agradeço ainda pela convivência rica,
marcada por discussões inteligentes e gestos fraternos.
À Professora Célia Linhares e à Professora Claudia Fernandes, agradeço pelos valiosos
comentários feitos durante o exame do projeto desta dissertação.
Também sou grata a minha amiga, Maria das Graças, pela parceria nos trabalhos e pelos
momentos prazerosos que tivemos durante o período do curso.
Agradeço à CAPES e ao Colegiado do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF,
pela concessão da bolsa indispensável à realização deste trabalho.
Enfim, é bom saber que temos amigos em quem podemos confiar. Pessoas que nos apóiam e
nos acolhem com tanto carinho.
Por isso, minha eterna gratidão...
A todos vocês, que no decorrer da caminhada contribuíram com gestos, palavras e orações
para esta grande conquista.
5
Dedico este trabalho a todos que acreditam na luta pela educação pública,
democrática e libertadora. Em especial, a todos os profissionais da Rede
Municipal de Educação de Niterói, que têm buscado superar seus limites e
desafios cotidianos na busca dinâmica de ir e vir, rumo à construção de uma
escola mais democrática.
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Precisamos contribuir para criar a escola que é aventura, que marcha, que não
tem medo do risco, por isso, que recusa o imobilismo. A escola em que se pensa,
em que se atua, em que se cria, em que se fala, em que se ama, se adivinha, a
escola que apaixonadamente diz sim à vida.
Paulo Freire
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PEIXOTO, Viviane Gualter (2008). A organização da escola em ciclos na Rede Municipal de
Educação de Niterói/RJ: análise do processo de reconstrução da proposta pedagógica para o
Ensino Fundamental (2005-2007). Orientador: Prof. Dr. Waldeck Carneiro. Niterói/RJ/ UFF,
30/06/2008. Dissertação (Mestrado em Educação), 252ginas. Campo de Confluência:
Políticas Públicas, Movimentos Instituintes e Educação.
RESUMO
O presente trabalho é resultado da pesquisa empreendida entre os anos de 2005 e 2007 na Rede
Municipal de Educação de Niterói, cuja análise esteve focalizada no processo de reconstrução da
proposta pedagógica em ciclos para o Ensino Fundamental (1º e 2º ciclos). A pesquisa problematiza os
processos vivenciados nas Secretarias de Educação, que articulam a transição paradigmática do
sistema seriado ao sistema “ciclado”, para além das propostas oficiais elaboradas em gabinetes, mas
principalmente por meio da relação que se estabelece com os profissionais da escola. O estudo
valoriza como categorias de análise a participação, a dialogicidade e a coletividade, partindo do
pressuposto de que o desejo de constituir processos democráticos na educação representa um avanço e
contribui para o enriquecimento e o aprofundamento dos novos paradigmas emergentes na sociedade
contemporânea. A grande questão discutida nesta pesquisa está centrada na possibilidade e no desafio
de desenvolver um processo distante da racionalidade linear, visto que, mais do que informar e
divulgar uma “nova proposta redentora”, é fundamental dialogar, mobilizar, fazer acreditar, envolver e
provocar a participação efetiva dos profissionais da educação, criando condições para seu
posicionamento crítico, refletido e fundamentado. Realizada com base em observação participante,
análise documental e entrevistas semi-estruturadas, a pesquisa revela que medidas adotadas com vistas
à implantação de políticas públicas educacionais, descomprometidas com a articulação entre o pensar
e o fazer pedagógico, tendem a não viabilizar modificações nas relações humanas, nas desigualdades
sociais e nas práticas escolares. Porém, têm enorme potencial para produzir resistências nos espaços
escolares, que, por vezes, impulsionam grandes movimentos de luta contra o que se busca
impositivamente implantar. O estudo também mostra uma tendência cristalizada à suspeição ou ao
receio em relação a mudanças, como se nada pudesse ser bom para a escola, o que gera um ambiente
pouco receptivo a mudanças, mesmo quando elas se mostram interessantes e até mesmo necessárias.
Quanto à Rede Municipal de Educação de Niterói, o estudo conclui que esta rede pública começou a
dar alguns passos estruturais e organizacionais para a constituição de relações mais democráticas,
coletivas e dialógicas, tanto no que se refere a sua organização cotidiana com o trabalho em ciclos,
quanto à relação que se estabelece entre as unidades escolares e o órgão central de gestão educacional
do Município.
Palavras-chave: Democratização da Educação; Participação; Dialogicidade; Sistema de Ciclos.
8
RESUME
Le présent travail est le résultat de la recherche ménée entre 2005 et 2007, dans le Réseau Municipal
d’Education de Niterói, dont l’analyse a été tournée vers le processus de reconstruction de la
proposition pédagogique en cycles pour l’enseignement fondamental (1er et 2ème cycles). La
recherche met en question les processus vécus dans les Sécretariats d’Education, qui font la transition
paradigmathique du systhème annuel au systhème de cycles, au-délà des propositions officielles faites
dans les bureaux, mais surtout par le biais des rapports entre les professionnels des écoles. L’étude met
en valeur, comme catégories théoriques, la participation, la dialogicité et la collectivité, tout em
partant de la vision selon laquelle la construction des processus démocratiques en éducation répresente
un avancement et contribue à l’enrichissement et à l’approfondissement de nouveaux paradigmes qui
surgissent dans la société contemporaine. La grande question posée par cette recherche est centrée
dans la possibilité et dans le défi de développer un processus hors de la logique linnéaire, puisque, plus
important que présenter une proposition sauvatrice, il est fondamental de dialoguer, de mobiliser, de
faire croire, de faire participer et de provoquer l’engagement effectif des professionnels de l’éducation,
tout en créant les conditions pour une prise de position critique, réfléchie et bien axée. Faite par le
biais des observations, de l’analyse de documents et des interviews démi-structurées, la recherche
montre que, quand les politiques publiques ne sont pas axées sur la relation entre la pensée et la
pratique pédagogique, elles n’arrivent pas à modifier les rapports humains, les inégalités sociales et les
pratiques scolaires. Cependant, elles peuvent produire des résistances à l’école, qui, parfois, donnent
lieu à de grands mouvements de lutte contre ce que l’on veut arbitrairement mettre en place. L’étude
montre égalément qu’il y a une forte tendance à la suspection vis à vis des changements, même quand
ils peuvent être intéressants ou nécessaires. Sur le Réseau Municipal d’Education de Niterói, le travail
conclut que ce réseau public a en effet commencé à faire quelques pas structurels et organisatifs pour
la mise en place de rapports plus démocratiques, collectifs et dialogiques, soit dans le cadre de son
organisation quotidienne avec le travail en cycles, soit dans le cadre des rapports qui se manifestent
entre les unités scolaires et l’organisme central de gestion de l’éducation municipale.
Mots-Clés: Démocratisation de l’Education; Participation; Dialogicité; Systhème de Cycles.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................................. 13
1. O percurso rumo ao tema de pesquisa........................................................................ 13
2. A problemática da pesquisa: aspectos centrais........................................................... 15
CAPÍTULO I
DEMOCRACIA, PARTICIPAÇÃO, DIALOGICIDADE E PRÁTICAS INSTITUINTES:
DESAFIOS PARA OS PROCESSOS EDUCACIONAIS............................................................
24
1.1 Democracia: uma breve leitura de seu sentido,ou, o sentido da democracia?..........
27
1.2 Democracia na contemporaneidade: qual democracia?............................................
30
1.3 Participação como eixo da democracia: algumas considerações..............................
34
1.4 Por uma participação autônoma e dialógica.............................................................
39
1.5 Práticas instituintes e possibilidades democráticas: caminhos concretos de
mudança..........................................................................................................................
41
CAPÍTULO II
OS CICLOS NO CONTEXTO DAS DISPUTAS PARADIGMÁTICAS NA EDUCAÇÃO
CONTEMPORÂNEA......................................................................................................................
44
2.1 Educar na contemporaneidade..................................................................................
46
2.2 A re-configuração da organização escolar: enfrentando a crise dos paradigmas.....
51
2.3 Ciclos: um possível caminho para organizar a escola na contemporaneidade.........
53
2.3.1 Ciclos: uma interpretação política e educacional transformadora...................
55
2.3.2 Mas, afinal, o que são os ciclos escolares?......................................................
60
2.3.3 Ciclos: novas dimensões do tempo-espaço escolar.........................................
63
2.3.4 Ciclos, uma conquista? Algumas trajetórias da educação brasileira em sua
luta pela democratização...........................................................................................
65
2.3.5 Desvelando diferentes experiências no processo de implantação dos ciclos
no Brasil....................................................................................................................
71
2.4 Política de Ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói: quando tudo
começou..........................................................................................................................
77
2.4.1 Compreendendo a história da Rede Municipal de Educação de Niterói ........
78
2.4.2 Cenários político-pedagógicos da Rede Municipal de Educação de Niterói
até a implantação dos ciclos.....................................................................................
81
2.4.3 A implantação dos ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói
(1999): “Construindo a Escola do Nosso Tempo” ..................................................
83
2.4.4 O rumo da política de Ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói a
partir da nova gestão (2005).....................................................................................
85
10
CAPÍTULO III
O PROCESSO DE RECONSTRUÇÃO DA PROPOSTA PEDAGÓGICA EM CICLOS
NA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI: COMPARTILHANDO
ANÁLISES.......................................................................................................................................
88
3.1 Sobre a arquitetura da pesquisa................................................................................
88
3.2 Apreensão do processo: origem, fundamento, mudanças organizacionais, etapas e
formas de realização.......................................................................................................
92
3.2.1 A origem do processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos.....
93
3.2.2 Processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede
Municipal de Educação de Niterói: fundamentos para sua realização.....................
98
3.2.3 Mudanças organizacionais da Rede Municipal de Educação de Niterói
suscitadas a partir do processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos
102
3.2.4 Etapas do processo...........................................................................................
108
3.2.4.1 Documento Preliminar: o “ponto de partida” do processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos................................................
109
3.2.4.2 A recepção do Documento Preliminar na escola: diferentes expressões
no processo.........................................................................................................
114
3.2.4.3 Experimentação opcional: a articulação da proposta no decorrer do
ano de 2006........................................................................................................
118
3.2.4.4 Convocação: todas as escolas de 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental
experimentam a proposta no ano de 2007..........................................................
120
3.2.5 Formas de realização: táticas e estratégias no processo de reconstrução da
proposta pedagógica em ciclos.................................................................................
121
3.2.5.1 Estratégias instituídas pela FME............................................................
124
3.2.5.2 Práticas instituintes e táticas: possibilidades para a sustentabilidade do
processo democrático..........................................................................................
138
3.2.6 Idas e vindas no processo de (re) escrita da proposta......................................
140
3.2.7 Sobre a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”: produto final?.............
146
CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................................
148
Até que ponto o processo analisado se constitui efetivamente como um movimento
democrático?........................................................................................................................
148
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................................................
152
ANEXOS..........................................................................................................................................
161
Anexo 1 - Gráfico do crescimento da Rede Municipal........................................................
162
Anexo 2 - Participação em espaços destinados à discussão da proposta pedagógica
durante a realização da pesquisa (2006-2007)......................................................................
163
Anexo 3 - Termo de consentimento de entrevista................................................................
164
Anexo 4 - Entrevistas realizadas no decorrer da pesquisa....................................................
168
Anexo 5 - Fontes documentais da pesquisa..........................................................................
195
Anexo 6 - Documento Preliminar enviado para as escolas em outubro de 2005.................
196
Anexo 7 - Relação das coordenações e unidades escolares que enviaram contribuições
para a reescrita da proposta...................................................................................................
222
11
Anexo 8 - Contribuições gerais do Ensino Fundamental (1º e ciclos) para a reescrita
da proposta............................................................................................................................
223
Anexo 9 - Quadro comparativo elaborado pela coordenação de 1º e 2º ciclos com os
principais conceitos contidos no Documento Preliminar................................................................
235
Anexo 10 - Ofício enviado para as Unidades Escolares.......................................................
237
Anexo 11 - Portaria 125/2008 que institui a proposta pedagógica “Escola de cidadania”...
238
Anexo 12 - Portaria 132/2008 que institui as Diretrizes Curriculares e Didáticas que
integram a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”......................................................
245
12
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior
CEC - Conselho Escola-Comunidade
CME - Conselho Municipal de Educação
EAP - Equipe de Articulação Pedagógica
FEUFF - Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense
FME - Fundação Municipal de Educação de Niterói
LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
PNE - Plano Nacional de Educação
PEE - Plano Estadual de Educação
PME - Plano Municipal de Educação
SEPE - Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação
SINEPE/RJ - Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Particular
SINPRO - Sindicato de Professores Particulares de Niterói e São Gonçalo
SME - Secretaria Municipal de Educação
UE - Unidade Escolar
UFF - Universidade Federal Fluminense
UPPES - União dos Professores Públicos no Estado-Sindicato
UMEI - Unidade Municipal de Educação Infantil
UNIRIO - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
13
INTRODUÇÃO
1. O percurso rumo ao tema da pesquisa
A realidade que nos cerca, em função de seus aspectos socialmente injustos e
desumanos, que negam os direitos mais comuns à grande parte de homens e mulheres
brasileiros, aponta para uma urgente necessidade de mudança. Neste sentido, uma pergunta
não deixa de vir à mente: como mudar?
Para respondermos a essa pergunta, temos muitos caminhos a serem apresentados.
Aqui, escolhemos o caminho da formação, da conscientização, enfim, da contribuição que a
educação pode proporcionar. Com origem na classe popular, pude perceber nitidamente, a
partir da realidade vivenciada, a ausência de práticas reflexivas, fato intimamente relacionado
à prevalência de posicionamentos subalternos, aos quais os sujeitos vão aderindo,
incorporando-os durante sua vida. Isso os torna distantes da possibilidade de olhar
criticamente o processo econômico, político e social, atravessado pela desigualdade.
Na tentativa de nos aliarmos ao pensamento de Freire, apontamos algumas
contradições e desafios que circundam o campo educacional, principalmente, o processo a ele
ligado, situando-nos a partir da seguinte compreensão:
Na visão “bancária” da educação, o “saber” é uma doação dos sábios aos que se
julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da
ideologia da opressão a absolutização da ignorância, que constitui o que
chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no
outro. (...) Na concepção bancária que estamos criticando, para qual a educação é o
ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos, não se
verifica nem pode verificar-se esta superação. Pelo contrário, refletindo a sociedade
opressora, sendo dimensão da “cultura do silêncio”, a “educação” “bancária”
mantém e estimula a contradição. (Freire, 2005b, p.67)
Para estabelecermos um corte na nossa abordagem, discutimos a temática da
organização da escola em ciclos, considerando especificamente o processo de reconstrução
da proposta pedagógica para o ensino fundamental em ciclos na Rede Municipal de
Educação de Niterói. Partimos do pressuposto de que os ciclos representam uma
(...) possibilidade para viabilizar o desenvolvimento cognitivo e social, para
tencionar a busca de novas abordagens que não justifiquem uma sociedade desigual
14
e competitiva, mas que viabilizem a solidariedade, a flexibilidade nos tempos de
aprendizagem, a libertação da alienação cotidiana, o direito à escolarização básica
das crianças e jovens de classes populares (Krug, 2001, p. 54).
Nosso desejo é possibilitar a reflexão sobre o processo articulador dessa mudança na
prática educativa, estabelecendo conexões face à necessidade de se criarem canais para que os
educadores assumam posturas dialógicas e participativas, de modo que essa transformação, de
fato, aconteça. No entanto, problematizamos neste estudo a elaboração de propostas
educacionais mediadas pelas Secretarias de Educação.
Em geral, essa temática persegue todos os educadores da escola pública. No meu caso,
a trajetória que me tem impulsionado, num constante movimento progressivo e dialético, se
iniciou em 2001, quando me formei pelo Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho,
localizado em Niterói. Neste mesmo ano, comecei a atuar em uma escola privada, na qual
vivenciei constantes conflitos ideológicos. A escola, que seguia uma concepção de educação
baseada na perspectiva capitalista, direcionava suas atividades por meio da “prática pela
prática”. Percorrendo esse caminho, que indiretamente anulava os valores que defendo e
acredito, procurei refletir sobre minha própria prática, buscando formular questionamentos
cotidianos.
Certa de que continuaria deparando com grandes desafios pela frente, optei por
prosseguir nesta área, ingressando no curso de pedagogia, que concluí em 2005, o que
contribuiu para acentuar minha formação político-pedagógica.
Na qualidade de mestranda da Universidade Federal Fluminense, deparo hoje com
inúmeros questionamentos pertinentes à temática que nos propomos a pesquisar, uma vez que,
pouco a pouco, vem aumentando a reflexão sobre a questão pedagógica e curricular, no
âmbito do Programa de Pós-Graduação que integramos. Porém, considero que as inquietações
que me conduziram a propor uma pesquisa mais minuciosa e sistematizada sobre o processo
de implantação dos ciclos tiveram origem na conclusão do trabalho monográfico
desenvolvido na graduação, assim intitulado: “Projeto político-pedagógico: da razão à ilusão”
(Peixoto, 2005).
Inquieta e repleta de questionamentos, a partir de observações empíricas que fiz durante
a formação acadêmica, pude realizar o trabalho monográfico, porém limitando-o a dois focos
principais, a saber: qual era a racionalidade do projeto político-pedagógico, numa abordagem
de cunho teórico; e o que o impedia de ser implementado numa perspectiva transformadora,
investigando o cotidiano de uma escola especialmente selecionada para esse fim. No entanto,
novos desdobramentos foram sendo suscitados durante o processo de investigação,
15
provocando-me com novas indagações. Desse modo, preparei um projeto de pesquisa a ser
desenvolvido durante o mestrado, com ênfase no mesmo objeto: o projeto político-
pedagógico. Contudo, o foco voltava-se para uma instância mais ampla, pois tinha como
intenção investigar de que forma a Secretaria Municipal de Educação de Niterói (SME)
encaminhava o processo de construção do projeto político-pedagógico realizado na escola. No
entanto, lembrando Konder (1988, p. 37), a realidade é sempre mais rica do que o
conhecimento que se tem dela. Sendo assim, ao me aproximar do campo de investigação, a
Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), pude perceber que essa instância estava
passando por um momento de reflexão quanto a sua própria proposta pedagógica, o que
implicava rever alguns de seus fundamentos e, de forma central, a organização das escolas
municipais em ciclos.
Foi então, nesse momento, que optamos por direcionar a pesquisa para o processo de
reconstrução da proposta pedagógica para o ensino fundamental em ciclos na Rede Municipal
de Educação de Niterói, cujo movimento supunha, principalmente, mudanças nas relações, na
organização do coletivo, na concepção do ato político intrínseco ao ato pedagógico, a partir da
compreensão dos ciclos como uma proposta de inovação para a transformação da cultura
escolar.
2. A problemática da pesquisa: aspectos centrais
A universalização de uma educação de qualidade tem sido ponto marcante, tanto nos
debates e reflexões acadêmicas, quanto na agenda das políticas blicas estaduais e
municipais, que, nos últimos anos, buscam reformular propostas político-pedagógicas que
durante longo tempo foram marcadas por seu caráter excludente para grande parte da
população brasileira.
Nesse contexto, a organização das escolas em ciclos se constitui como uma tendência
alternativa, tornando-se um fértil objeto de investigação e um instigante desafio, tanto para os
sistemas de ensino como para a prática pedagógica nas escolas, que vivenciam o complexo
processo de redefinição das políticas educativas e curriculares, a partir da sua implantação em
escolas públicas estaduais e municipais brasileiras. Para muitos autores, os ciclos representam
a oportunidade de “tornar o sistema educacional mais eficaz, particularmente para os alunos
que, hoje, não saem dele com todos os conhecimentos e competências necessárias”
(Perrenoud, 2004, p. 53). A esse respeito, Pooli e Costa (2004) afirmam:
16
Esse novo modelo político-pedagógico tem como proposta central a reformulação
completa da organização do currículo na escola, desde a organização das turmas, que
passa a ser pela idade dos alunos, até o tempo em que as crianças e os jovens têm para
construir seus conhecimentos, sugerindo uma reformulação dos tempos e do espaço
educativo, o que teoricamente se apresenta como alternativa coerente e fundamentada
para que a escola se constitua como um espaço de possibilidades e de apropriação dos
diferentes saberes pelas camadas populares. (p. 139).
Dentre outros aspectos, algumas análises também abordam a proposta de ciclos
inserida no movimento de redemocratização do ensino e projetam-na como suporte teórico
para mudanças da prática educativa convencional. Nesse sentido, a implantação da proposta
de ciclos em algumas Redes municipais e estaduais de ensino constituiu um exemplo bem
sucedido de inovação institucional.
Todavia, numerosos estudos têm criticado a estratégia adotada pelas diferentes
instâncias de poder do Estado, responsáveis pela articulação dessa nova proposta para as
escolas, “ao criarem expectativas de solução para os problemas educacionais, descartando as
preocupações e os encaminhamentos metodológicos necessários para a efetivação dos novos
processos educativos” (Pooli e Costa, 2004, p.141). Assim, o que hoje se torna mais
preocupante são os dados relativos ao desempenho do sistema, que não correspondem ao
acesso à escola conquistado.
Tais constatações apresentam evidências claras da possibilidade de universalizar o
acesso à Educação Pública através da implantação dos ciclos. Porém, isso não garante que sua
implantação nos níveis estaduais e municipais alcançabons resultados, no que se refere ao
desempenho político-pedagógico da escola, principalmente ao considerarmos o grau de
complexidade política, administrativa e financeira vivenciada, de variadas formas, em cada
sistema de ensino.
Desse modo, importa considerar que o procedimento pelo qual foram encaminhadas as
reformas oficiais que legitimaram os ciclos, em alguns estados e municípios, reduziu a
participação dos profissionais da educação no debate, dificultando o aprofundamento de suas
reflexões sobre as novas formas de atuação no espaço escolar suscitadas pela proposta,
especialmente no que diz respeito às questões curriculares, à avaliação e às diferentes
estratégias de organização do espaço-tempo escolar. O silenciamento dos profissionais
favoreceu, em muitos contextos, a emergência de um discurso com tom fortemente político,
dissociado do cotidiano da escola. Assim, observamos, nas palavras de Jacomini (2004, p.
206), que os ciclos, quando implantados de forma imediatista, apresentam “resultados pouco
17
promissores em termos de aprendizagem, embora relativamente eficientes em termos de
correção de fluxo”.
Nessa lógica pragmática, é possível identificarmos as limitações e contradições
vivenciadas no cenário das escolas públicas brasileiras a partir da implantação dos ciclos, que
parecem estar, por um lado, contribuindo para a melhoria das estatísticas do fracasso escolar;
por outro, não têm dado sinais de avanço no que diz respeito ao problema das desigualdades
educacionais.
Essa temática nos desafia e nos estimula para tecermos algumas reflexões sobre os
processos vivenciados nas Secretarias de Educação, que articulam a transição paradigmática
do sistema seriado ao sistema “ciclado”, para além das propostas oficiais elaboradas em
gabinetes, mas, principalmente, na relação que se estabelece no tempo-espaço da escola.
Para tanto, ressaltamos, neste estudo, a Rede Municipal de Educação de Niterói, que
parece caminhar rumo à construção de uma escola ciclada desde 1999, quando foi
oficialmente implantada a proposta político-pedagógica “Construindo a escola do nosso
tempo”. Esta referida proposta instituiu um novo paradigma, simbolizado pela adoção do
sistema de ciclos. Porém, vale aqui ressaltarmos que a FME
1
, elemento central na política
educacional desse município e expressão de legitimidade e de poder para a tomada de
decisões, parecia entender, no ano de 2005, que a rede municipal “se [propunha] oficialmente
em ciclos, mas (...) acontecia oficiosamente a partir de uma lógica ainda seriada”.
2
Estudos mais recentes (David, 2003; Fernandes, 2005), em seu conjunto, trazem à luz
que o princípio norteador da proposta de ciclos apontava um forte caminho para a
democratização do ensino em Niterói, não em termos da melhoria dos indicadores
educacionais, mas, sobretudo, da aprendizagem dos alunos. Contudo, ao operar a separação
entre aqueles que o pensaram, ou seja, os sujeitos que fizeram a reflexão sobre sua concepção,
e aqueles que o colocariam em funcionamento por meio de suas práticas pedagógicas, abriu-
se um caminho que dissipava a credibilidade e a motivação dos profissionais da educação
para se envolverem no enfrentamento dos desafios que a idéia dos ciclos propunha à Rede
Municipal de Educação de Niterói.
1
A Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME) é a instância central de decisões relativas à organização
da rede escolar do município. Foi criada com base na Lei Municipal 924/91 e no Decreto Municipal
6172/92, visando garantir o aperfeiçoamento da gestão educacional e a autonomia necessária para a efetivação
de atos administrativos ágeis, especialmente no tocante aos processos relativos às unidades municipais de
educação, com atuação, portanto, em diferentes níveis e modalidades (Infantil, Fundamental, Especial e de
Jovens e Adultos).
2
Cf. DOCUMENTO PRELIMINAR: reorganização da proposta pedagógica em ciclos da Rede Municipal de
Educação de Niterói, 2005.
18
Romper com essa configuração significa superar a separação nas relações entre os
sujeitos da FME e os sujeitos das unidades escolares, conduzindo-os à organização coletiva
das práticas pedagógicas comuns à Rede Municipal, no entendimento de que “o pensamento é
parte integrante da realidade e existe uma ligação inseparável entre o agir e o conhecer”
(Semeraro, 2006, p. 17).
Podemos, todavia, destacar que a FME, a partir de 2005, como fruto de discussões que
vinham acontecendo desde 2003 entre os profissionais da Rede para a construção do Plano
Municipal de Educação (PME) e em função de sua nova administração
3
, parecia buscar
possibilidades de aprimoramento e redefinição do conceito dos ciclos e das práticas
pedagógicas decorrentes desse tipo de organização escolar, na tentativa, não apenas de
recuperar sua capacidade de redemocratizar a oferta de ensino fundamental, mas também de
articular processos democráticos nas relações humanas, na gestão, no planejamento educativo,
enfim, alcançar mudanças conceituais e organizacionais necessárias. Em outras palavras,
buscava-se implementar, de fato, os ciclos, na Rede Municipal de Niterói, sem prejudicar a
democratização do acesso à escola municipal nem comprometer a qualidade do trabalho
pedagógico cotidiano e, no limite, da aprendizagem do aluno.
Por isso, ao iniciarmos a nossa pesquisa em 2006, fomos percebendo que o momento
que essa Rede vivenciava propunha a reflexão coletiva e a participação dos sujeitos
envolvidos com o processo pedagógico, tanto os que atuam na FME, quanto os que atuam na
escola, ou seja, os sujeitos que compõem essa Rede, de modo que fosse viabilizada a
construção coletiva da proposta pedagógica de reorganização” do ensino fundamental em
ciclos.
Cabe aqui destacarmos que o movimento iniciado em 2005 na Rede Municipal de
Educação de Niterói era mencionado, por muitos, como proposta de “reorganização” da
Educação Infantil e do Ensino Fundamental (1º e 2º ciclos) em ciclos, pois, entendiam
naquela ocasião que os ciclos tinham sido implantados em 1999, porém não implementados
no decorrer dos anos. Contudo, a FME, ao refletir em relação ao processo que estava em
pleno andamento, percebeu que aquele movimento vivenciado estava não apenas
reorganizando a prática escolar, mas reconstruindo toda a proposta de trabalho em ciclos.
Embora reafirmasse no movimento o desejo de se organizar em ciclos, o processo instalado
em 2005 buscava romper com a gica seriada, que ainda se apresentava, de maneira
subliminar, não obstante a proposta implantada em 1999. Sendo assim, o processo passou a
3
De fevereiro de 2005 a abril de 2008, a Presidência da FME e a Secretaria Municipal de Educação de Niterói
passaram a ser exercidas pelo Professor Waldeck Carneiro da Silva.
19
ser reconhecido como processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos, residindo
exatamente aí o foco desta pesquisa.
Conforme destaca Konder (1988), quando ressalta que na investigação científica da
realidade começamos trabalhando com conceitos que são ainda sínteses muito abstratas, o
acesso que tivemos a alguns dados sobre esse processo nos permitia apontar, apenas muito
sucintamente que, a partir do Documento Preliminar
4
, apresentado em 21 de outubro de 2005,
como proposta para repensar os ciclos, após múltiplos espaços-tempos de discussão realizados
naquele ano, no âmbito da Rede Municipal de Niterói (FME e unidades escolares),
encaminhou-se o processo que assim se definia:
Visa à instalação de um debate acerca da regulamentação da proposta pedagógica
da FME/Niterói, buscando estruturar uma nova concepção dos ciclos na rede
municipal de ensino de Niterói. Indica, pois, diretrizes que buscam redimensionar a
lógica que organiza os recursos, os processos, as relações, o tempo e o espaço da
escola [...], esse foi deflagrado, por determinações do Secretário municipal de
educação, através da superintendência de desenvolvimento do ensino, em abril
deste ano
5
, em atendimento a um reclame da própria rede municipal.
(DOCUMENTO PRELIMINAR, 2005)
Ainda nesse Documento, podíamos ler que o objetivo do movimento instalado na
Rede em 2005 era:
(...) realizar um processo amplo de revisão, ajustes, acréscimos e aperfeiçoamentos,
entendendo que sua implementação se dará de forma progressiva, a partir de
Escolas-pólo, que no ano de 2006 vivenciarão de forma experimental as propostas
aqui contidas e outras a elas incorporadas. Ao serem postas em prática, as propostas
aqui apresentadas passarão por permanente avaliação, fazendo com que este
documento preliminar sofra revisão e ajuste, para que no ano de 2007, passe a
vigorar plenamente para todas as unidades escolares da rede. (DOCUMENTO
PRELIMINAR, 2005)
As idéias postas nos induziram a estabelecer considerações para o desenvolvimento
desta pesquisa, que tem como foco o processo de reconstrução da proposta pedagógica para o
Ensino Fundamental em ciclos, a partir das modificações sugeridas no Documento Preliminar,
que foram sendo discutidas e reformuladas por meio da expressão das escolas, principalmente
daquelas que passaram a experimentar a nova proposta em construção, hoje intitulada “Escola
de Cidadania”. Portanto, configurava-se um movimento de ação-reflexão-ação, no período de
2005 a 2007, cuja construção buscou envolver todos os sujeitos implicados no processo.
5
Refere-se ao mês de abril de 2005.
20
Sendo assim, conduzimos o presente estudo sobre esse processo vivenciado na Rede
Municipal de Educação de Niterói, em torno de três eixos básicos: o processo de construção
do Documento Preliminar em 2005; a implementação da proposta “Escola de Cidadania”, na
primeira etapa experimental, em 2006, nas 14 escolas de Ensino Fundamental que se
colocaram à disposição; e a segunda etapa experimental, em 2007, com todas as 24 escolas de
ensino fundamental de e ciclos (primeiro segmento do ensino fundamental)
experimentando a proposta, já modificada em função das experiências vivenciadas em 2006.
6
Sabemos que a decisão política de desenvolver um processo de reconstrução da
proposta pedagógica em ciclos dessa Rede Municipal esteve respaldada também pela
necessidade de assegurar a possibilidade de participação dos diferentes sujeitos na construção
de políticas públicas de educação. Por isso, supomos que a mudança desejada na relação entre
os sujeitos da Rede apresentava um conjunto de complexidades que precisaram ser re-
significadas para a implementação dos ciclos, através de processos democráticos, dialógicos e
coletivos.
Ao penetrarmos na esfera dos desafios que foram lançados a partir desse processo
pesquisado, que objetivava a superação das incoerências, tensões e contradições na
materialização da proposta de ciclos, que fora apenas oficialmente implantada em 1999 e
também desafiava os sujeitos da Rede para a construção de relações mais democráticas,
buscamos responder às seguintes questões norteadoras da pesquisa: Como se configurou o
processo de reconstrução da proposta pedagógica para o ensino fundamental em ciclos
na Rede Municipal de Niterói, no tocante a seus fundamentos, etapas e formas de
realização? Como os diferentes sujeitos se organizaram para participar desse processo?
Até que ponto esse processo se constituiu efetivamente como um movimento
democrático?
Para responder a esses questionamentos, tentamos atingir os seguintes objetivos:
Objetivos Gerais:
· Aprofundar a nossa reflexão acerca dos processos democráticos e participativos que
desafiam o campo educativo e as relações que nele se constroem;
6
Importa destacar que a proposta pedagógica “Escola de Cidadania” também abrange a educação infantil.
Contudo, no âmbito desta pesquisa, concentraremos nosso foco de análise nas implicações da referida proposta
sobre o ensino fundamental.
21
· Contextualizar a discussão sobre os ciclos frente aos desafios da contemporaneidade e
suas implicações enquanto mudança paradigmática na escola, bem como conhecer o
processo histórico de implantação dos ciclos na Rede Municipal de Educação de
Niterói.
Objetivo Específico:
· Apreender a dinâmica do processo de reconstrução da proposta pedagógica para o
Ensino Fundamental em ciclos na Rede Municipal de Niterói, no tocante: a) aos seus
fundamentos; b) às etapas e às formas de realização; c) à participação dos sujeitos e à
efetividade do caráter coletivo desse processo.
Para empreender essas análises, julgamos ser indispensável desenvolver a pesquisa
com base no método dialético, que “advoga a necessidade de se trabalhar com a
complexidade, com a especificidade e com as diferenciações que os problemas ou ‘objetos
sociais’ apresentam” (Minayo, 2002, p. 25). Além disso, podemos destacar que a dialética:
(...) propõe abarcar o sistema de relações que constrói; o modo de conhecimento
exterior ao sujeito, mas também as representações sociais que traduzem o mundo
dos significados. A dialética pensa a relação da quantidade como uma das
qualidades dos fatos e fenômenos. Busca encontrar, na parte, a compreensão e a
relação com o todo; e a interioridade e a exterioridade como constitutivas dos
fenômenos. (Minayo, 2002, p. 25).
É dessa tensão que tratamos, buscando “apreender suas contradições peculiares, o seu
movimento peculiar, a sua qualidade e as suas transformações bruscas” (Lefebvre apud
Gadotti, 2003, p. 33). Para isso, descrevemos e analisamos o processo a partir das práticas
cotidianas e das estratégias e táticas adotadas na construção de seu conteúdo pretensamente
democrático.
Esta pesquisa foi realizada com base nos seguintes procedimentos metodológicos:
análise documental, observação participante e entrevista semi-estruturada. Convém também
pontuar que, embora tenhamos mencionado três procedimentos metodológicos, que foram
utilizados em triangulação, a pesquisa buscou privilegiar a observação participante, dado o
cunho dinâmico do processo produzido cotidianamente. Além disso, Denzin (apud Ludke e
André, 1986, p. 28) ressalta que a observação participante, por si só, é:
Uma estratégia de campo que combina simultaneamente a análise documental, a
entrevista de respondentes e informantes, a participação e a observação direta e a
introspecção. É uma estratégia que envolve, pois, não a observação direta, mas,
22
todo conjunto de técnicas metodológicas pressupondo um grande envolvimento do
pesquisador na situação estudada.
Definimos, como categorias de análise do estudo, a participação, a dialogicidade e a
coletividade, baseando-nos na crença de que o desejo de constituir processos democráticos na
educação representa um avanço e contribui para o enriquecimento e o aprofundamento dos
novos paradigmas emergentes na sociedade contemporânea.
Não é desprezível considerar o fato de que medidas adotadas com vistas à implantação
de políticas públicas educacionais, descomprometidas com a articulação entre o pensar e o
fazer pedagógico, tendem a não viabilizar modificações nas relações humanas, nas
desigualdades sociais, nas práticas escolares. Porém, têm enorme potencial para produzir
resistências nos espaços escolares, que por vezes impulsionam grandes movimentos de luta
contra o que se institui. Com essa representação cristalizada, é como se nada, nunca, pudesse
ser bom ou relativamente bom, o que gera um ambiente pouco receptivo a inovações, mesmo
que interessantes e necessárias.
A grande questão discutida nesta pesquisa está, pois, focalizada na possibilidade e no
desafio de desenvolver um processo distante da racionalidade linear, visto que, mais do que
informar e divulgar uma “nova proposta redentora”, é fundamental dialogar, mobilizar, fazer
acreditar, envolver, provocar a participação efetiva dos profissionais da educação, criando
condições para seu posicionamento crítico, refletido e fundamentado.
Esses processos podem contribuir, tanto para a articulação de disputas entre os sujeitos
interativos, quanto para a afirmação de uma nova cultura escolar, visando à socialização do
“poder pedagógico” e a efetiva participação dos diferentes sujeitos. Entretanto, considerar que
os sujeitos desenvolvem maneiras diferentes de se apropriar do movimento e de participar
ativamente da discussão, interferindo, portanto, na capacidade de avançar, ou não, na reflexão
sobre a atividade político-pedagógica proposta, foi um dos eixos de análise que tentamos
evidenciar nesta pesquisa.
Assim, nossa pretensão foi analisar em que medida a vontade política, as estratégias
que deram sustentação à dinâmica participativa e as práticas instituintes garantiram uma
sustentabilidade virtuosa do processo pesquisado. Em termos mais concretos, em que medida
a Rede correspondeu aos princípios democráticos na reconstrução “coletiva” da proposta
pedagógica em ciclos.
Esta dissertação foi organizada em três capítulos. No primeiro capítulo, discutimos a
questão da democracia, concentrando nossa reflexão na constituição de espaços participativos
e dialógicos viabilizados nos processos educacionais. Nesse contexto, destacamos que o
23
aprofundamento do conceito de democracia incide sobre a adoção de estratégias políticas que
possibilitam espaços de participação, sobretudo no cotidiano e nos fazeres táticos
representados pelas práticas instituintes.
No segundo capítulo, buscamos fazer uma revisão do debate teórico e histórico sobre
os ciclos, estabelecendo conexões acerca das disputas paradigmáticas enfrentadas no contexto
da escola contemporânea. Além disso, resgatamos o percurso dos ciclos na Rede Municipal de
Educação de Niterói, desde a proposta “Construindo a Escola do Nosso Tempo”, implantada
em 1999.
No terceiro capítulo, problematizamos a experiência vivenciada, ao longo dos anos de
2005 a 2007, na Rede Municipal de Educação de Niterói, buscando apreender as dinâmicas e
os caminhos percorridos pelos diferentes sujeitos que compõem essa Rede Municipal, na
tentativa de estabelecer relações democráticas e espaços de diálogo e de participação na
“Cidade Educadora
7
”. Abordamos ainda a proposta “Escola de Cidadania”, cujo produto é
fruto de discussões, intervenções e experimentações ocorridas no decorrer do processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos.
Finalmente, nas considerações finais, procuramos responder, à luz do arcabouço
teórico e das análises efetuadas, se esse processo instalado na Rede, desde 2005, se constituiu
efetivamente como um movimento de construção democrática.
7
Niterói torna-se membro da Associação Internacional de Cidades Educadoras, em outubro de 2007, por ocasião
da I Conferência Municipal de Educação de Niterói.
24
CAPÍTULO I
DEMOCRACIA, PARTICIPAÇÃO, DIALOGICIDADE E PRÁTICAS
INSTITUINTES: DESAFIOS PARA OS PROCESSOS EDUCACIONAIS
A esperança é de que, distantes da pantomima do poder, os sonhos não tenham
morrido, como na estória da Bela Adormecida, eles dormem, mais profundos que
pesadelos do cotidiano. E um dia acordarão. E o povo possuído pela sua beleza
esquecida, se transformará em guerreiro e se dedicará à única tarefa que vale a
pena, que é a de transformar sonhos em realidade. Essa é a única política que me
fascina.
Rubem Alves
A constituição de um espaço público, coletivo, onde todos possam participar,
problematizar, dialogar e decidir sobre questões políticas vem suscitando, no âmbito das
relações sociais, cada vez mais complexas, um intenso debate em torno da democratização. O
acúmulo teórico de reflexões e experiências inspiradas nessa temática emerge de percursos
repletos de lutas, desafios, avanços, derrotas e esperanças presentes na expansão de
componentes democráticos que continuamente o re-criados e re-significados pelos sujeitos
que persistem na busca de uma democracia plena no território brasileiro.
Convém aqui ressaltarmos que a luta pela maior participação popular na esfera pública
teve sua origem no campo da resistência contra a ditadura militar, a partir dos anos 70 e ao
longo dos anos 80, quando os movimentos sociais
8
se organizaram em torno das
reivindicações urbanas, como educação, saúde, habitação, água, luz, transporte, etc. Para que
não esqueçamos reivindicava-se, nesse contexto, a criação de espaços de participação política,
para que a sociedade civil
9
organizada pudesse canalizar suas demandas e influir nos
8
Segundo Cunha (1991), com o nome movimentos sociais têm sido chamadas as ões reivindicativas de
segmentos de populações urbanas (principalmente) que se caracterizam por reagirem às desigualdades na
distribuição dos recursos públicos.
9
Sobre o conceito de sociedade civil nos referimos a Gramsci, apoiado em Semeraro (2006, pp.102-103):
“Embora as origens do conceito de sociedade civil estejam relacionadas com a tradição política burguesa e
25
processos decisórios de políticas públicas, expressando dessa maneira, a construção de um
“sonho” coletivo. Parafraseando Alves (2002, p.12), “(...) aqueles que partilham sonhos se
dão as mãos e caminham juntos. E, esse é precisamente o início da política”. Segundo
Linhares (2000, p. 83):
(...) a política está referida a polis, ou seja, aos exercícios de poder e controle que
nos envolvem coletivamente, buscando definir quem somos e quem queremos ser,
distinguindo-nos dos outros, a política precisa ser estudada, tanto nas esferas
tradicionais e oficiais, de onde emanam as diretrizes formuladas que se traduzem
em normas e regras de ação e de convivência social, mas também, buscada nas
condutas que tornam aceitáveis e dizíveis aquelas diretrizes e, ainda mais,
investigada no próprio imaginário político e social.
Nesse sentido, o processo de redemocratização da sociedade brasileira vem se
caracterizando, no plano político, não apenas pela consolidação do sistema democrático-
representativo, como também pela implementação de um conjunto de instrumentos legais que,
em grande parte incorporados à Constituição de 1988, possibilitam a viabilização de
mecanismos participativos em gestão pública, garantindo o direito à democracia
participativa
10
, por meio de plebiscitos, referendos de iniciativa popular, conselhos co-
gestores e, por conseguinte, ampliando o conceito de cidadania e participação.
Essa discussão, também faz parte das experiências educacionais, vivenciadas tanto na
escola, quanto na constituição de políticas públicas que, atualmente entendem a importância
de recriar processos que possibilitem a participação e o diálogo entre os sujeitos coletivos.
Assim, com a valorização da dimensão coletiva do ser humano, da sua autonomia e da
sua capacidade como autor de intervir no futuro, promove-se cada vez mais no campo
educacional a afirmação do professor, como profissional que deve assumir-se como agente de
inovação e mudança, e as escolas entendidas como unidades organizacionais de decisão.
Nessa perspectiva, os pontos centrais que aqui abordaremos implicam compreender e
problematizar as questões relativas à democracia, de modo que essa reflexão seja um
instrumental teórico para pensarmos os processos educacionais sob as dimensões
democráticas, participativas e dialógicas, assumidas numa visão dialética da realidade escolar,
mesmo que ainda embrionárias e subjugadas a forças maiores.
liberal, Gramsci elabora um novo significado que o diferencia da tradição jusnaturalista e o conduz além dos
horizontes desenhados por Hegel, por Croce e pelo próprio Marx. Âmbito particular da subjetividade e de suas
múltiplas expressões, a sociedade civil não é apenas o território exclusivo da burguesia reservado para iniciativas
econômicas e a estruturação da sua hegemonia. Gramsci percebe que este espaço pode, também, transformar-se
em uma arena privilegiada onde as classes subalternas organizam as suas associações, articulam as suas
alianças,confrontam os seus projetos ético-políticos e disputam o predomínio hegemônico”.
10
Aprofundaremos esse conceito de democracia participativa mais adiante.
26
Para tanto, destacamos que embora a democracia represente para a sociedade brasileira
uma grande conquista, e tenha expressado nos últimos anos alguns avanços jurídicos e
instituintes nas relações sociais, e aqui destacamos o próprio processo educacional, veio
também acumulando um conjunto de críticas que, com variados níveis e matizes, apontam as
insuficiências inerentes ao seu caráter contraditório e a ineficácia dos projetos que embora
legitimados, continuam “adormecidos”.
Muitos consideram que a democracia encontra-se em crise. Este discurso sustenta-se,
na medida em que a democracia é legitimada e reafirmada nos debates políticos, porém, sem
força efetiva para transformação da realidade que historicamente é massacrada por injustiças
sociais e desrespeito humano. Nesse teor de pensamento, apontam que, embora muitos
governos, instituições, projetos, sujeitos se afirmem democratas, “não significa que acreditem
efetivamente na democracia, mas, sim [pelo fato] que se generalizou o reconhecimento de que
a democracia é uma virtude” (Coutinho, 2005, p.12), promovendo, dessa forma, uma
dicotomia entre teoria e ação; o que se diz e o que se faz.
Entretanto, não podemos desconsiderar nessa discussão, alguns estudos que tem se
dedicado à compreensão de práticas instituintes
11
, que sinalizam mudanças cotidianas que os
sujeitos sustentam no seu fazer diário, mesmo imersos num contexto opressor e manipulador
da democracia. É claro, que essas experiências, não anulam a problemática que enfrentamos.
Vivenciamos um processo cultural atravessado por dois momentos políticos distintos, mas,
ambos preocupantes na tessitura de projetos democratizantes, pois, seus preceitos e seu “jogo”
sufocam a luta democrática.
Do ponto de vista histórico, quando a sociedade brasileira conquistou juridicamente
seus direitos democráticos, encontrava-se (ou ainda se encontra), profundamente nutrida por
valores autoritários que permearam o cenário político brasileiro no período de repressão da
ditadura militar. Já do ponto de vista contemporâneo, “atraídos pela miragem da globalização
capitalista, muitos, inclusive de ‘esquerda’, aderiram ao credo do fim da história, dos projetos
alternativos, da universalização dos direitos, do Estado democrático popular” e, desse modo,
“o que vemos surgir é um mundo sem projetos nem sujeitos, sem critérios nem finalidades,
sem passado nem futuro” (Semeraro, 2006, p.44). Assim reduz-se, “as democracias a uma
processualística vazia, tendendo a uma necrofilia, pela sua baixa intensidade de movimentos,
de participações ativas e, conseqüentemente, de surpresas, como matéria da própria
vitalidade” (Linhares, 2006, p. 4).
11
Aprofundaremos a noção de movimentos e práticas instituintes mais adiante.
27
Sendo assim, interessa-nos aqui debruçarmos a nossa reflexão sobre democracia,
formulando análises fundamentais sobre seu sentido e ampliando a nossa possibilidade de
compreensão dos elementos democráticos inscritos na participação, na dialogicidade e nas
práticas instituintes que atualmente desafiam o campo educacional.
Compreendendo que muitas obras foram e m sido produzidas para discutir os
múltiplos significados dados à democracia e suas implicações teóricas e empíricas, nossa
intenção é de delinear alguns caminhos que nos permitam tecer relações entre essas
formulações teóricas com a pesquisa que efetivamente realizamos no campo educacional.
Através dela, buscamos entender a dimensão política que tem se definido no movimento, na
dinâmica do processo analisado, que se pretende democrático.
Entendemos que mesmo havendo propostas democráticas, comprometidas em
envolver diferentes sujeitos para intervir e construir coletivamente um planejamento
educacional, a compreensão da lógica e do conteúdo que fundamentam a democracia, é
condição indispensável para refletirmos sobre a sua efetividade, nesses espaços abertos à
construção de identidades coletivas e que procuram forjar, nas ações cotidianas, mudanças
capazes de conduzir a uma “pedagogia da autonomia e dialógica” como nos infere as obras de
Paulo Freire.
Para tanto, o ponto de partida para essa abordagem teórica é identificar a tensão
constitutiva entre o discurso e a prática, a representatividade e a participação, a alienação e a
autonomia, o silenciamento e o diálogo... Na esperança que os sonhos não morram.
1.1 Democracia: uma breve leitura de seu sentido, ou, o sentido da democracia?
A democracia se assemelha a uma obra de arte.Tome a Pietà, por exemplo.Ela não
é resultado de cinzéis e martelos, embora cinzéis e martelos tenham sido usados
por Michelangelo para esculpi-la.Mas, antes que cinzéis e martelos fossem usados,
foi necessário que a idéia da Pietà tivesse surgido na cabeça de Michelangelo. Os
cinzéis e martelos foram apenas meios usados pelo artista para realizar sua idéia.
Assim é a democracia: ela é uma obra de arte coletiva. Começa com as idéias do
povo. Votos e eleições são meios para que o pensamento do povo se realize.
Rubem Alves
A democracia é um tema central da teoria política contemporânea, e, nessa arena, várias
correntes de pensamento estão em disputa. Para os liberais, por exemplo, o sentido da
democracia reside na própria noção de participação política expressa no sufrágio universal,
entendido como um valor em si, desprezando-se, portanto, a questão da participação direta
nas relações políticas, sociais, culturais e econômicas.
28
Numa concepção mais progressista, “a democracia é soberania popular, é construção de
uma comunidade participativa, é igualdade” (Coutinho, 1999, p. 64). Num jogo de
conotações, essa segunda concepção expressa, para nós, “o sentido da democracia”, a sua
essência, sua razão. Lembrando das palavras de Alves (2002, p.13) “um povo não nasce do
poder, ele é uma criatura do amor. E o poder tem sentido quando é uma ferramenta para a
realização do amor”. É dessa forma que entendemos o sentido da democracia.
No entanto, vale ressaltar que a segunda concepção decorre da primeira. Coutinho
(1999, p. 64) apresenta em suas palavras essas duas concepções de democracia:
uma concepção liberal de democracia, que a concebe de modo minimalista,
como se democracia fosse apenas o respeito a algumas regras formais que
permitem uma rotatividade das elites no poder através dos processos eleitorais. (...)
E, um outro conceito que incorpora determinadas conquistas liberais, considerando-
as imprescindíveis à democracia (penso nos direitos civis, no direito de expressão,
no direito ao livre pensamento etc.), mas que incorpora também outros direitos
democráticos, como, sobretudo, o direito à participação.
Quanto à concepção liberal de democracia, Coutinho (2005) explica que houve épocas
na história em que o liberalismo posicionava-se francamente contra a democracia, na medida
em que se apresentava como alternativa para democracia. Entretanto, a partir dos anos de
1930, o liberalismo passa a defendê-la reduzindo-a e minimizando-a.
Em Chauí (1993, p. 139), encontramos uma crítica de McPherson sobre o modelo de
democracia instituído na concepção liberal. Em suas palavras:
(...) é um sistema que mantém equilíbrio entre as demandas dos cidadãos e a oferta
do Estado. Cada vez que um Estado é capaz de responder satisfatoriamente as
demandas da cidadania, o regime é democrático. O cidadão define-se, pois, como
consumidor, e o Estado como distribuidor, enquanto a democracia se confunde com
um mecanismo de mercado, cujo motor é a concorrência dos partidos segundo o
modelo da concorrência empresarial.
Coutinho também desenvolve em uma de suas obras, vale dizer, em clássicos, o
conceito de democracia como valor universal. Segundo o autor, o valor da democracia não
pode ser adaptado a diferentes lógicas e estruturas de poder, de acordo com os interesses em
jogo, mas deve expressar-se fielmente ao compromisso político independentemente do
contexto em que está inserida. Em suas palavras, o autor ressalta:
O que tem valor universal não são as formas concretas que a democracia adquire
em determinados contextos históricos formas, essas sempre modificáveis, sempre
passíveis de aprofundamento, mas o que tem valor universal é o processo de
29
democratização que se expressa, essencialmente, numa crescente socialização da
participação política. (Coutinho, 2002, p. 17).
Essa compreensão acerca da democracia amplia o nosso horizonte de reflexão, na
medida em que passamos a compreender a dinâmica do próprio processo de democratização,
que não é linear, nem pontual, mas caracteriza um movimento próprio, quando se propõe a
rever a relação com o poder que se estabelece entre indivíduos e coletivos, garantindo a livre
expressão e a participação de sujeitos diferentes através do diálogo. Por isso, “a democracia
deve ser entendida, não como algo que se esgota em determinada configuração institucional,
mas sim como um processo” (Coutinho, 1999, p. 63). Complementa, afirmando, que a
“democratização é um valor universal, sobretudo porque é um permanente desafio. Nunca
poderemos chegar a ponto de dizer que a democracia está acabada. A democracia é um
processo que devemos conceber em construção”. (Ibdem).
A democracia, que tem assumido novos formatos de acordo com diferentes contextos
históricos, vem se expressando como “uma democracia formal, pelo alto e mutilada de seu
sentido mais profundo. Vale dizer, uma democracia que não se afirma na base da participação
efetiva das massas” (Frigotto, 2005, p.53). Este é, de fato, um problema que vem
desenvolvendo uma série de fragmentos na lógica democrática e resultando no
enfraquecimento dos processos políticos coletivos que foram conquistados arduamente. Dito
de outra maneira, os processos democráticos acolhidos como projetos que se identificam com
interesse da “elite”, sem dúvida, contrapõem-se ao sentido da democracia, que luta pelo
compromisso político com a população excluída em todas as áreas sociais, econômicas e
culturais.
Com a contribuição de Benevides (2005, p.72), nessa discussão “democracia é o
regime político da soberania popular, porém, com respeito integral aos direitos humanos”. E
prossegue a autora:
A fonte de poder está no povo que é, radicalmente (radical no sentido de raízes), o
titular da soberania e que deve exercê-la seja através de seus representantes, seja
através de formas diretas de participação nos processos decisórios. É o regime de
separação de poderes e, essencialmente, é o regime da defesa e da promoção dos
direitos humanos. (p.72)
Sendo assim, “a democracia vai se institucionalizando ao longo de um incessante e
penoso trabalho de defesa da dignidade da pessoa humana” (Benevides, 2005, p.72). Nesse
ângulo de reflexão, podemos dizer que a democracia torna-se meramente formal, se os valores
éticos, políticos e jurídicos mediados pelos princípios constitucionais não obtiverem força de
30
direito. Por isso, a autora entende que a democracia representa uma convivência comunitária
fundada à luz dos direitos humanos, na perspectiva de assegurá-los, com real eficácia a todos
os homens em suas dignidades de pessoas humanas. É preciso a ação de valores, de princípios
postos como fins a serem perseguidos pelos agentes da democracia, pelos governantes e pelos
governados. Ainda esclarece pontuando que “direitos humanos não se restringem aos direitos
civis e às liberdades individuais, mas englobam direitos econômicos sociais, e culturais”
(Benevides, 2005, p.73).
Corroborando essa visão, Demo (1993, p.157) conceitua democracia como “questão
de qualidade em essência, ainda que não exista qualquer possibilidade de entender qualidade
alijada do problema de quantidade. O desafio propriamente dito está, assim, na democracia,
em seu sentido pleno, ou seja: política e produtiva”.
Certamente nossa intenção não é, nem poderia ser esgotar a discussão sobre essa
temática, mas apenas entender seu conceito. Assim, tomamos as palavras de Morin (2005, p.
107), ao desenvolver seu pensamento, esboçando que a democracia:
Fundamenta-se no controle da máquina do poder pelos controlados e, desse modo
reduz a servidão (que determina o poder que não sofre a retroação daqueles que
submete); nesse sentido, a democracia é mais do que um regime político; é a
regeneração continua de uma cadeia complexa e retroativa: os cidadãos produzem a
democracia que produz cidadão.
1.2 Democracia na contemporaneidade: qual democracia?
Tudo que se não é igual ao que a gente viu um segundo. Tudo muda o tempo
todo no mundo. Não adianta fugir, nem mentir pra si mesmo...
Como uma onda” (Lulu Santos)
Introduzir essa discussão com a estrofe de uma canção, fugindo, talvez, aos padrões
formais acadêmicos, significa para nós, reconhecer e afirmar a existência de um mundo que
habitamos em constante movimento, num constante “vir-a-ser”. Assim, como é possível
definir a sociedade atual/contemporânea na perspectiva da democracia?
Falamos de um mundo tão inacabado que não como esgotar suas descobertas, um
mundo que é manifestado pelas subjetividades e que, por isso, se torna tão diverso. Um
mundo em que assistimos e “participamos” de múltiplas formas de mudança que vêm se
expandindo, tanto no campo socioeconômico e político quanto no da cultura, da ciência e da
31
tecnologia. E é justamente essa situação criada pela mudança que nos mergulha em um
processo de crise de concepções e paradigmas, pois, ao “nos instalarmos de maneira segura
em nossas teorias e idéias, estas não têm estrutura para acolher o novo” (Morin, 2000, p. 30).
Seja como imaginemos o mundo atual, o fato é que estamos em outro tempo, ou
melhor, estamos no nosso tempo que é sempre compreendido como atualidade, sempre
contemporâneo. É por tudo isso que nos sentimos estimulados a debater a natureza mutável da
sociedade constituída por sujeitos sócio-históricos, que criam e recriam maneiras de se
relacionar com o mundo em que vivem e com os outros sujeitos.
Nesse sentido, propomos uma discussão sobre a democracia na contemporaneidade,
contudo, sem distanciarmos o nosso olhar do seu conceito e valor anteriormente explorado,
para que não a tratemos de maneira restrita e banalizada.
Segundo Semeraro (2006), a democracia e os conceitos que a acompanham, tais como
igualdade, poder do povo, liberdade, república, cidadania, participação, eleições,
representação, entre outras, assumem interpretações diferenciadas, de acordo com a época e
os grupos no poder.
Semeraro (2006) explica que o significado de democracia para os modernos é bem
diferente de como foi entendido pelos medievais, que ainda não abordavam e
problematizavam algumas noções da relação humana e social como hoje. Entretanto, ainda
divergências profundas entre os pensadores da própria modernidade, assim como há visões de
democracia “que se chocam e se entrecruzam entre si em disputas hegemônicas que evoluem
até os nossos dias (Cf. 2006, p.215), entre partidos, organizações da sociedade civil,
movimentos sociais e culturais.
Nesse sentido, falar de democracia remete-nos, de imediato, à idéia de participação do
povo na tomada de decisões políticas. Contudo, essa fração não decorre exclusivamente de
uma determinação conceitual, mas abrange também padrões democráticos que podem estar
ligados ao jogo ideológico do poder. Muitas vezes, mesmo brandindo-se essa idéia de
democracia, busca-se reduzir a capacidade dos sujeitos de exercerem seus direitos sociais
plenamente, por exemplo, quando se tenta “esvaziar os elementos subversivos imanentes ao
processo de democratização, buscando colocá-los, assim esvaziados, a serviço da conservação
existente” (Coutinho, 2005, p.32). Portanto:
(...) em um sistema que se globaliza rapidamente uniformizando culturas,
embaralhando signos e amalgamando discursos, se faz cada vez mais necessária
uma apurada análise conceitual conectando-a ao contexto histórico e as forças
dominantes que determinam o nosso horizonte de compreensão. Assim, por estar
subjugada à hegemonia neoliberal, a concepção dominante de democracia adquire
32
conotações que tendem a desqualificar as dimensões públicas e sociais. Para
favorecer a centralidade do individuo e do poder econômico, o liberalismo precisa
separar o privado do público, a economia da política, o representante do
representado, a sociedade civil da sociedade política. (Semeraro, 2005.p.214).
Como é possível notarmos, a democracia, se analisada à luz de alguns fatores
condicionados por mudanças paradigmáticas, sofre modificação em seu sentido pleno e está
essencialmente ligada a novas dinâmicas que se constituem de forma conflituosa em diversos
tempo e espaços sociais, abrangendo, nesta direção, a necessidade de se discutir e argumentar
sobre as estruturas de pensamento que se circunscreve em cada época.
Para muitos autores, o momento histórico que estamos vivendo, que tem desencadeado
mudança paradigmática em todos os níveis de compreensão do ser humano e de sua relação
social, é denominado como “pós-modernidade”. Nessa questão, o mundo da certeza, do
progresso, tem sido substituído por uma cultura sustentada pelas incertezas e indeterminações.
Entretanto, essas interpretações são objeto de controvérsia da vida contemporânea.
Compartilhando das análises de Eagleton (1998, p.7) sobre o assunto, temos a seguinte
conceituação:
Pós-modernidade é uma linha de pensamento que questiona as noções clássicas de
verdade, razão, identidade e objetividade, a idéia de progresso ou emancipação
universal, os sistemas únicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos
de explicação. (...) o mundo como contingente, gratuito, diverso, instável,
imprevisível, um conjunto de culturas ou interpretações desunificadas gerando
certo grau de ceticismo em relação às idiossincrasias e a coerência de identidades.
Semeraro (2004, p.40) destaca que “o discurso pós-modernista destitui o sujeito e
dissolve a consciência, considerando-as meras ilusões”. Além disso, “nega a universalidade,
repele a visão de totalidade e a possibilidade de uma ética comum”, substituindo, portanto, a
“verdade pela utilidade”.
Pensando dessa forma, a democracia na contemporaneidade confere valores relativos
ao próprio contexto, atribuindo seu valor à “iniciativa individual, de autonomia inquestionável
do mercado, de uso dos aparelhos do Estado e das instituições públicas para viabilizar
negócios pessoais e garantir a apropriação particular da produção coletiva” (Semeraro, 2005,
p.214).
Através desse processo, pelo qual, incorporamos idéias e representações dominantes,
modo de ver, de sentir, de pensar e de agir da contemporaneidade, estamos tentando buscar
respostas que no fundo, serão formuladas pelo movimento das relações, pela construção
33
dialética da cultura, pelas novas representações de democracia que estão afetas às populações.
Neste ponto de vista, vivemos num mundo que não está separado de nós e, por isso,
participamos do movimento que desconfigura o “velho” no sentido de novas estruturas de
pensamento, de novas formas de relação e de novos arranjos tecnológicos, que rompem com
as categorias tempo e espaço na subversão tecnológica das “nets” e das “notícias”,
estabelecendo assim um novo “estar” e “participar” neste mundo.
A alegação em Harvey (2007) de que vivenciamos uma preponderância do tempo
presente, em detrimento do passado e do futuro vem gerando atitudes imediatistas e
descontínuas. Esta volatilidade, vivenciada intensamente no mundo contemporâneo, nos
encaminha para a dificuldade de planejarmos em longo prazo, de traçarmos metas em direção
ao futuro, tornando-se fundamental a atenção para este fenômeno que permeia o campo
educacional.
Sobre essa questão, Semeraro (2006, p.145) nos alerta para o fato de que:
Para não estagnarmos em um marxismo dogmatizado é necessário promover a sua
‘traducibilidade’ para um tempo como o nosso que se depara com outras feições de
sociedade, com o surgimento de novos atores políticos, com novas formas de luta e
com diferentes sensibilidades trazida pela própria pós-modernidade.
Entretanto, não se deixar envolver espontaneamente por valores pós-modernos que
tentam esvaziar os conteúdos sociais e públicos da democracia é um grande desafio para todos
nós entendermos e discernirmos. Afinal,
(...) se a ficção de princípios metafísicos e a crença em valores sobrenaturais levam
ao elitismo e ao autoritarismo, também nunca haverá liberdade decisão soberana
quando o individuo pensa de tê-las natural e espontaneamente. A sacralização de
vontades particulares, como a realidade vem mostrando, dissolve o tecido social,
incentiva a violência e anula a democracia (destaque nosso). Entregue ao
relativismo e ao imediatismo, a democracia deixa de ser não apenas ato político,
mas também conjunto de “regras do jogo”, tornando-se “jogo de aparências”,
campo de vale-tudo onde se geram simulacros perfeitos para ocultar o império do
individuo e o totalitarismo do mercado. (Semeraro, 2006, p.145)
Sendo assim, consideramos que, a exemplo de diversos temas de trabalho analisados
pelas ciências sociais, democracia é um termo complexo, pois:
(...) complexidade quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos
do todo (como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o
mitológico), e um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre o
objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as
partes entre si (Morin, 2005, p.38).
34
Ao repensarmos a democracia, estamos sujeitos a riscos, e esses não podem impedir
que prossigamos na tarefa coletiva de protagonizar processos sociais, que redefinam nossa
função como sujeitos históricos e parte da construção de novos cenários de organização plena
de oportunidades, mesmo entremeados de lutas e desafios. Portanto:
A percepção da mudança leva à idéia do futuro, já que é o único território do tempo
no qual podem ocorrer as mudanças. O futuro é um território temporal aberto. O
tempo pode ser novo, pois não é somente a extensão do passado. E, dessa maneira,
a história pode ser percebida não somente como algo que ocorre, seja como algo
natural ou produzido por decisões divinas ou misteriosas como o destino, mas como
algo que pode ser produzido pela ação das pessoas, por seus cálculos, suas
decisões, intenções, portanto como algo que não pode ser projetado e,
conseqüentemente, ter sentido. (Quijano, 1988b apud, Quijano, 2005, p.244).
Importa, pois, indagar sobre a tarefa da educação contemporânea que compreende o
futuro como possibilidade do mundo “vir-a-ser”. Vir-a-ser mais justo, mais humano, mais
igualitário. Vir-a-ser composto por sujeitos mais críticos, mais participativos, mais
problematizadores, mais cidadãos, comprometidos com a luta política e com a superação da
contradição afirmada em projetos sociais, que, na “busca pela libertação, se identificam com o
seu contrário” (Freire, 2005, p.35).
1.3 Participação como eixo da democracia: algumas considerações
Nos últimos tempos, temos assistido com freqüência ao discurso da participação, que
tem se afirmado com densidade na rede de poder coletivo que acredita na crise da forma
representativa da democracia. As exigências vêm se tornando mais complexas, e parece clara
a necessidade de interação entre o governo e a sociedade, ou seja, entre representantes e
representados.
Com efeito, o conceito de democracia sofre em sua dinâmica, ao fortalecer a
participação direta. No viés desse processo de re-significação representativa da democracia,
temos presenciado a aproximação da sociedade civil nos espaços de decisões públicas.
Não se pode omitir, no entanto, que a fonte geradora das práticas participativas que hoje
fazem parte juridicamente da política brasileira emergiu da luta contra o regime militar
empreendida por setores da sociedade civil, entre os quais os movimentos sociais, que
desempenharam um papel fundamental na conquista de importantes repercussões
materializadas na constituição de 1988. Conforme lemos no Art. da Constituição: “todo
poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição”. Temos na observação de (Cury; Horta & Fávero, 1999, p.26) que:
35
O grau de participação da sociedade civil na elaboração da Constituição de 1988
traduziu esta concepção ascendente e talvez por isso, ela seja reinventora de novos
direitos sociais, ai compreendido a própria educação. Ela inclui novos direitos a fim
de possibilitar uma situação de maior participação para aqueles que foram
historicamente excluídos do acesso aos bens sociais. Prova disso é a introdução de
direitos coletivos, a proclamação enfática da igualdade através da dura declaração
contra todas as formas de discriminação o acolhimento dos direitos de minorias. E,
se houve ênfase na participação popular, houve concomitantemente a inclusão de
formas de participação política inéditas como instituto da iniciativa, o plebiscito e o
referendo.
Nesse processo, todo cidadão passa a adquirir como princípio constitucional, além de
seus direitos humanos fundamentais, o direito de participação, que, sem dúvida, se configura
como a situação ideal de democracia através do envolvimento de todos os indivíduos, livres e
conscientes, na decisão das questões de interesse público. Entretanto, seria ingênuo supor que
essa abertura à participação viesse superar, ou mesmo atenuar em alguma medida, os
problemas enfrentados pela democracia moderna, sem considerá-la inserida em conflitos
ideológicos e processuais.
nos habituamos à indagação acerca de que leis e políticas deverão ser
introduzidas; mas, quanto à indagação sobre os indivíduos capazes de fazer existir
essas leis e políticas, pouco se fez. Quando, para além dos jargões inexpressivos, a
cidadania é objeto de reflexão, a maior parte do tempo acredita-se dever deduzi-la
do conjunto de leis e políticas instituídas por uma pequena elite - pelos governos e
pelos partidos políticos. (Valle, 2006, 544)
Atualizando, portanto, a idéia de participação, e ampliando o espectro de influência do
seu conceito sobre relevância pública para construção da democracia plena no campo
educacional é que buscamos formular algumas análises sobre o tema.
Assim, tomemos inicialmente a definição de Bordenave (2005, p. 26), acerca da
participação:
(...) é uma necessidade humana, e, por conseguinte, constitui um direito das
pessoas; a participação justifica-se por si mesma, não por seus resultados; a
participação é um processo de desenvolvimento da consciência crítica e de
aquisição de poder; a participação leva a apropriação do desenvolvimento pelo
povo; a participação é algo que se aprende e se aperfeiçoa; a participação pode ser
provocada e organizada, sem que isto signifique necessariamente manipulação; a
participação é facilitada com a organização e a criação de fluxos de comunicação;
devem ser respeitadas as diferenças individuais na forma de participar; a
participação pode resolver conflitos ou também gera-los; não se deve “sacralizar” a
participação: ela não é panacéia nem é indispensável em todas as ocasiões.
36
Fundamentando um pouco a nossa reflexão, buscamos apoiar-nos na idéia proposta
por Demo (1993), que entende a participação como conquista. Segundo o autor:
Participação é conquista, para significar que é um processo, no sentido legítimo do
termo: infindável, em constante vir-a-ser, sempre se fazendo. Assim, participação é
em essência autopromoção e existe enquanto conquista processual. Não existe
participação suficiente, nem acabada. Participação que se imagina completa, nisto
começa a regredir. (p.18).
Após introduzir a participação como algo a ser conquistado, Demo (1993, p.18)
procura explicar alguns motivos pelos quais a participação não pode ser entendida como
dádiva, como concessão, como algo preexistente, sendo fundamental o seu processo de
conquista para sua realização plena sem consensos manipulados. Em suas palavras, a
participação:
Não pode ser entendida como dádiva, porque não seria produto de conquista, nem
realizaria o fenômeno fundamental da autopromoção; seria de todos os modos uma
participação tutelada e vigente na medida das boas graças do doador, que delimita o
espaço permitido. Não pode ser entendida como concessão, porque não é fenômeno
residual ou secundário da política social, mas um dos seus eixos fundamentais;
seria apenas um expediente para obnubilar o caráter de conquista, ou de esconder,
no lado dos dominantes, a necessidade de ceder. Não pode ser entendida como algo
preexistente, porque o espaço de participação não cai do céu por descuido, nem é o
passo primeiro. (Cf. 1993, p.18)
Essas considerações, formuladas por Demo (1993), não estão preocupadas em
pormenorizar a participação como um direito a ser garantido, mas, problematizam a
“tendência histórica à dominação” que marcou a sociedade com postura de cima para baixo
organizada hierarquicamente, impossibilitando, portanto, um espaço onde predomine
naturalmente a participação, sem jogo de poder ideológico. Por isso, Demo (1993, p.19)
afirma que se encontrarmos espaço de participação, não foi pelo fato de sua preexistência, e
sim, porque se conquistou.
Corroborando, Negri (2002, p.104) afirma que “(...) o melhor governo é a democracia
e sua efetividade está garantida pela determinação dos sujeitos”. Além disso, Habermas
(1979), um dos principais críticos da redução da democracia feita pelos liberais, coloca uma
questão interessante, quando afirma que a democracia trabalha a favor da autodeterminação, e
neste sentido, a participação política e a autodeterminação coincidem entre si.
Nesse sentido, a idéia da constituição de espaços públicos, que de fato sejam
participativos, passa pelo reconhecimento dos indivíduos, como sujeitos do processo de
37
construção democrática que precisam defender o seu direito de participar convictos dessa
necessidade, caso contrário, “montaríamos a miragem assistencialista, segundo a qual
somente participamos se nos concederem a possibilidade” (Demo,1993, p.19). Essa convicção
o envolve na “participação da criação do conhecimento, de um novo conhecimento,
participação nas necessidades essenciais da comunidade, participação na busca de soluções e,
sobretudo, na transformação da sociedade”. (Faundez, 1993, p.32).
Não é nosso interesse minimizar a responsabilidade do governo na construção de
espaços que promovam a participação, mas, o que está em pauta é que “ainda estamos sob a
égide de uma sociedade classista” (Frigotto, 2005, p.29) e, por isso, não há porque esperarmos
ingenuamente o interesse daqueles que dominam em conceder a participação sem
“predominar a mera preocupação em fazer algumas concessões para o incorrermos em
riscos nas posições privilegiadas vigentes” (Demo,1993, p.23). E, assim, a maneira como
vamos nos relacionando com as estratégias de participação propostas, sem questioná-las, pode
nos conduzir ao estado de “alienação”
12
, sem que nada transformemos.
Por essa e outras razões, “a liberdade é verdadeira quando conquistada. Assim
também a participação” (Demo,1993, p.23). De outro modo, “mesmo o planejamento
participativo pode tornar-se mera legitimação do poder, à medida que reproduz apenas uma
farsa participativa” (Demo, 1993, p.44). Nessa ótica, destaca-se que:
(...) a ideologia mais barata do poder é encobrir-se com a capa da participação. Se
realista formos, partimos daí e não perderemos um minuto sequer em justificativas
vãs, que são nada mais que autodefesas. Quem acredita em participação, estabelece
uma disputa com o poder. Trata-se de reduzir a repressão e não de montar a
quimera de um mundo naturalmente participativo. Assim, para realizar participação
é preciso encarar o poder de frente, partir dele, e, então, abrir os espaços de
participação (...). (Demo, 1993, p. 20).
A problemática mais ampla da participação política pode ser entendida em Chauí
(1993, p.46) como “eficácia da máquina repressiva montada, conservada e acionada pelos
dominantes”. A esse respeito, a autora discorre:
(...) a atitude romântica é vitima de dois esquecimentos: nãoesquece o problema
da alienação e da reprodução da ideologia dominante pelos dominados, como
também esquece de indagar se, sob o discurso “alienado”, submisso à crença nas
virtudes de um poder paternalista, não se esconderia algo que ouvidos românticos
não são capazes de ouvir. (p.46)
12
A alienação como define Gadotti (2004, p.146), é o processo no qual há perda de identidade, individual e
coletiva; falta de autonomia, dependência.
38
Sendo assim, a questão que se situa no conteúdo da participação refere-se aos
interesses que estão vinculados aos discursos que se apresentam como “democráticos”, mas o
que pretendem é “unificar e homogeneizar o social e o político, apagando a existência efetiva
das contradições e das divisões que se exprimem como luta de classes” (Chauí, 1993, p.46).
Por isso, entendemos que o processo democrático, que se quer participativo, precisa
amadurecer em muitos aspectos, dentre os quais destacamos: em primeiro lugar, pelo
reconhecimento de um compromisso que se fortifica na infindável busca pela participação,
em segundo lugar, pela compreensão das “armadilhas” do esvaziamento, no sentido da
participação manifestada em discursos dominantes, e, por último, pela necessidade urgente de
incentivar espaços de formação emancipadora da cultura popular
13
, para que esta possua força
suficiente nos espaços coletivos e, por conseguinte, de transformação social. Sobre esse
último aspecto, tomemos a contribuição de Kuenzer (1990, p. 64):
(...) a participação pura e simples da população, tem tido efeitos limitados pela
distribuição desigual do saber, articulado às condições sociais de alienação que
atingem a população, uma vez que as idéias dominantes são as idéias da classe
dominante, ressalvo os casos de existência de consciência política, conciliação
geralmente ausente particularmente após tão prolongado período de falta de espaço
de participação.
Esta incompatibilidade, no entanto, caracteriza a lógica pela qual na participação “(...)
se enfatiza ou exclusiviza a ação, com sacrifício da reflexão, a palavra se converte em
ativismo. Este, que é ação pela ação, ao minimizar a reflexão, nega também a práxis
verdadeira e impossibilita o diálogo” (Freire, 2005a, p. 90).
Estreitamente ligada à noção de participação, que constituiu o núcleo central do
projeto democratizante, percorrem os mesmos caminhos alguns aspectos que consideramos
fundamentais nessa reflexão, para que possamos re-significar o processo democrático.
Isto nos leva a repensar as nossas práticas pedagógicas e políticas, seja do ponto de
vista da escola, ou do ponto de vista do órgão que a gere. Inevitavelmente, o campo
educacional é afetado com o que está sendo pensado e articulado nesse mundo
contemporâneo, afinal, ele faz parte dele. Para tanto, ao se pretender ultrapassar esses desvios,
seria desejável “(...) instaurar valores e relações sociais que promovam a participação, a
criatividade, à responsabilidade, a construção de um conhecimento democrático que permite
13
Empregamos o termo cultura popular com base em Chauí (1993, p.63): “quando se fala na cultura popular, não
enquanto manifestação dos explorados, mas enquanto cultura dominada tende-se a mostrá-la como inválida,
aniquilada pela cultura de massa e pela indústria cultural, envolvida pelos valores dos dominantes, pauperizada
intelectualmente pelas restrições impostas pela elite, manipulada pela folclorização nacionalista, demagógica e
exploradora, em suma, como impotente face à dominação e arrastada pela potência destrutiva da alienação”.
39
um progresso intelectual de massa e não apenas de reduzidos grupos intelectuais” (Semeraro,
2006, p. 29).
1.4 Por uma participação autônoma e dialógica
Se, o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é falando aos outros, de
cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os portadores da verdade a ser
transmitida aos demais, que aprendemos a escutar, mas é escutando que
aprendemos a falar com eles.
Paulo Freire
Uma das contribuições mais importantes para a construção de uma sociedade
democrática, justa e igualitária busca criar um novo perfil de sujeito, entendendo o modo pelo
qual ele deve ser emancipado para realizar a dinâmica da igualdade de participação no
poder”.
Partindo desse pressuposto, optamos por desenvolver nessa discussão, a articulação
entre os conceitos de autonomia e dialogicidade, apoiando-nos no nosso mestre Paulo Freire e
entendendo que são pontos fundamentais, que sustentam a ação necessária na constituição de
práticas democráticas, participativas.
Segundo Gadotti, a palavra “autonomia” vem do grego e significa capacidade de auto-
determinar-se, de auto-realizar-se, de autos” (si mesmo) e “nomos” (lei). Autonomia
significa autogestão, autogoverno (Gadotti, 2003).
Em Freire, a construção da autonomia passa pela conscientização, o autor propõe que
a conscientização “possibilita a inserção no processo histórico, (...) abre caminho à expressão
das insatisfações sociais” (Freire, 2005a, p.24), pois, dessa forma é possível estimular o
posicionamento autônomo e desejado para a transformação. Entretanto, a conscientização
exige que ultrapassemos a esfera da espontaneidade, que substituamos a consciência ingênua,
pela consciência crítica, e é nessa perspectiva que Freire (2005) sugere a dialogicidade.
Segundo o autor, somente a prática dialógica pode fomentar a problematização. Em
suas palavras, “o que temos de fazer, na verdade, é propor ao povo, através de certas
contradições básicas, sua situação existencial, concreta, presente, como problema que por sua
vez, o desafia e assim, lhe exige resposta, não no nível intelectual, mas no nível da ação”
(Freire, 2005a, p.100).
Problematizar, conforme explica Freire, é exercer uma análise crítica sobre a realidade
problema. E é nesse momento que se deve buscar a firmação do diálogo como prática da
40
liberdade. Refletindo sobre esse aspecto, tomamos emprestada a definição de diálogo
formulada por Freire (2005b, p. 91):
O encontro em que se solidarizam o refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao
mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se a um ato de depositar
idéias de um sujeito no outro, nem tampouco se tornar simples troca de idéias a
serem consumidas pelos permutantes. Não é também discussão guerreira, polêmica,
entre sujeitos que não aspiram a comprometer-se com a pronúncia do mundo, nem
a buscar a verdade, mas a impor a sua.
Sem dúvida, o que Paulo Freire propõe é um diálogo que precisa ser construído com
características que vão além da troca de palavras entre os interlocutores, mas, sobretudo, faz-
se necessário considerar as possibilidades de interação de múltiplas vozes. Potencializar o
processo a partir da “dialogicidade verdadeira, em que os sujeitos dialógicos aprendam a
crescer na diferença, sobretudo, no respeito a ela” (Freire, 2005b, p. 60) é um desafio já posto.
A prática dialógica, no entanto, entendida como encontro dos homens para tarefa
comum, exige amor, humildade e fé, pois nessa relação respeitosa e solidária é que o
diálogo se faz como “uma relação horizontal” (Freire, 2005b, p.94). Na tessitura dessa
relação, Freire (2005) explica que “o amor é um ato de coragem, nunca de medo, o amor é
compromisso com os homens, (...) o ato de amor está em comprometer-se com a causa. A
causa de sua libertação” (p.92). Assim, a auto-suficiência e a descrença do homem em seu
poder de criar e recriar são incompatíveis com o diálogo. Afinal:
Como posso dialogar, se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro,
nunca em mim? Como posso dialogar, se me admito como um homem diferente,
virtuoso por herança, diante dos outros, meros ‘isto’, em que não reconheço outros
eu? Como posso dialogar, se me sinto participante em um gueto de homens puros,
donos da verdade e do saber, para quem todos os que estão fora são ‘essa gente’, ou
são nativos inferiores’? Com posso dialogar se parto de que a pronúncia do mundo
é tarefa de homens seletos se que a presença das massas na história é deterioração
que devo evitar? Como posso dialogar, se me fecho a contribuição dos outros que
jamais reconheço, e até me sinto ofendido com ela? Como osso dialogar se temo a
superação e se, só em pensar nela, sofro e definho? (Freire, 2005, p. 93).
Nos princípios organizativos extraídos da experiência da luta de classes na história, a
democracia e a participação possuem grande importância, contudo, são marcadas e destituídas
pela desumanidade, opressão e marginalização de sujeitos que, mesmo em regime
democrático, sofrem com o abuso do poder daqueles que os calam e negam a sua palavra.
Uma democracia deve ser fundada na solidariedade política da sociedade, como propõe Paulo
Freire. Ele nos ensinou o caminho para a formação da consciência na sua forma política.
Ensinou-nos que “estar no mundo e com o mundo” é não somente aprender a ler a realidade,
41
mas, problematizá-la e nos propormos a modificá-la através do diálogo. Diálogo não é
privilégio de alguns, “é o encontro dos homens para Ser Mais”, (Freire 2005, p. 93), para
construir sua autonomia.
Sem uma apropriação efetiva sobre os conceitos de democracia e sua constituição por
intermédio da participação e diálogo, as inúmeras propostas de “mudança” que assaltam o
campo educacional serão, quase sempre, inadequadas às necessidades do cotidiano e
rejeitadas pelos atores que constroem esse cotidiano. Como conseqüência, serão permeadas
por uma contínua “elocução que sobrevém fora dos lugares onde se fabricam os sistemas
enunciados” (Certeau, 1994, p. 252).
1.5 Práticas instituintes e possibilidades democráticas: caminhos concretos de mudança
Sonho com uma política a ser feita por aqueles que nada desejam ganhar, a não
ser a alegria de contribuir para diminuir o sofrimento do povo.
Rubem Alves
O processo de democratização, instituído no cenário político-social, ainda sob uma
lógica dominante e esvaziada, não pode ser prioridade numa discussão que se alimenta com
sonhos e esperanças. Com isso em mente, buscamos nesse momento sustentar nossa reflexão,
introduzindo a discussão sobre a importância da atuação das práticas instituintes nos fazeres
cotidianos para afirmação da democracia em seu conteúdo qualitativo e nas táticas coletivas
postas em marcha.
Entendemos por práticas instituintes “aquelas que possibilitam aos sujeitos se
assumirem como sujeitos históricos, como sujeitos de saberes e de poderes. Práticas que
podem se enraizar produzindo processos de inovação em permanente construção”. Para
melhor compreendermos:
Pensamos em Benjamin (1993), no sentido das "experiências plenas", que se
traduzem pela tessitura coletiva e pela possibilidade de abertura polifônica. A
experiência instituinte se afirma como partilhada por um grupo, contrapondo-se ao
pontual e fragmentado do sujeito isolado. É aberta e não se afirma como "símbolo",
com um significado unilateral, mas como "alegoria" por seus múltiplos sentidos e
leituras. Este conceito se liga ao sentido de "origem" em Benjamin, pois o
instituinte não se confunde com o "novo", mas é busca do movimento emancipador
que articula passado, presente e futuro. Contrapondo-se ao modismo e a uma
reprodução estática do passado, o instituinte sinaliza a densidade da experiência
humana ao recuperar o sentido de uma memória viva, pulsante, em que olhar para o
42
passado potencializa o presente e ajuda na construção do futuro, pois que é
ancorada em uma memória que é capaz de prometer. (Linhares, 2006)
14
:
Valle (2006, p. 547), parafraseando Castoriadis, assinala que “a sociedade - ou o
social-histórico, como o filósofo costumava denominar - é autocriação. Mas a sociedade não é
criação de um indivíduo ou de um grupo particular, e sim do que o autor chama de ‘coletivo
anônimo’, ou ‘sociedade instituinte’, em oposição à sociedade instituída”. A autora ainda nos
adverte que:
(...) numa democracia o movimento instituinte vai bem mais longe. Não basta -
como tantas vezes querermos acreditar - instaurar as leis, por melhores que sejam,
mais legítimas em termos de sua criação e mais democráticas em termos de seu
conteúdo; é ainda preciso interrogar-se acerca dos cidadãos que efetivamente irão
exercer esses direitos, essa participação. (Cf.2006, p.547)
Apostando nessa capacidade de reinvenção do cotidiano é que escolhemos dialogar
também com Certeau, na tentativa de elaborar uma outra leitura possível que se encontra nas
práticas; mesmo realizadas em espaço instituído e reprodutor das desigualdades e das
hierarquias do saber, as práticas podem buscar a afirmação de novos sentidos sociais.
Em Certeau (1994), podemos notar a importância que assumem as práticas do
“homem ordinário”, pois estes, embora sejam vistos como passivos e apenas receptores,
buscam escapar dos procedimentos hierárquicos, fixos e burocráticos que determinam à
conformação. Ainda com Certau (1994), o homem “inventa o cotidiano” através das “artes de
fazer”, ou seja, através das astúcias sutis, táticas de resistência, promove uma re-significação
da ordem dominante. Como ele escreve em sua obra (1994, p.41):
(...) Se é verdade que por toda a parte se estende e precisa a rede da “vigilância”,
mais urgente ainda é descobrir como é que uma sociedade inteira não se reduz a
ela: que procedimentos populares (também “minúsculos” e cotidianos) jogam com
os mecanismos da disciplina e não se conformam com ela a não ser para alterá-los;
enfim, que “maneiras de fazer” formam a contrapartida, do lado dos consumidores
(ou “dominados”?), dos processos mudos que organizam a ordenação sócio-
política.
Nesse sentido, Certeau nos convida a entender a lógica do cotidiano dos “sujeitos
dominados”, - ou melhor, que de alguma forma sofrem pelo abuso do poder -, reconhecidos
pelo autor como sujeitos de suas ações, que, à sua maneira, reinventam o seu cotidiano,
reelaborando as pressões das quais são alvos e a que, estão expostos diariamente.
14
Extraído do Editorial da revista eletrônica no site: www.uff.br/aleph em outubro de 2007.
43
Nesse processo dialético, a invenção do cotidiano em práticas instituintes olha para o
presente “não pelo que falta, mas pelo que é possível, escovando a história a “contrapelo”,
percebendo no cotidiano, além das relações “automatizadas” outras formas que não esperadas,
criando na contramão da continuidade, descontinuidades, que permitam re-significar a partir
da própria “barbárie” (Canella e Matella, 2006, p. 3).
Conscientes, nem todos os sujeitos se limitam aos instrumentos estratégicos
organizados pela iniciativa instituída para sua atuação política, mas, abarcam também a
multiplicidade de formas táticas prontas a intervir e defender a socialização do poder, a partir
dos princípios da participação que passa a ser potencializada com a sua intervenção cotidiana.
Certeau (1994) formula a reflexão sobre dois conceitos distintos, estratégia e tática,
que organizam a participação dos sujeitos em meio a entraves provocados pelo cotidiano de
um processo em pleno andamento. Em suas palavras:
(...) as estratégias apontam para a resistência que o estabelecimento de um lugar
oferece ao gasto de tempo; as táticas apontam para uma hábil utilização do tempo,
das ocasiões que apresenta e também dos jogos que introduz nas fundações de um
poder. Ainda que os métodos praticados pela arte da guerra cotidiana jamais se
apresentem de forma tão nítida, nem por isso é menos certo que apostas feitas no
lugar ou no tempo distinguem as maneiras de agir. Certeau (1994, p. 102)
Sendo assim, entendemos a partir dessas considerações que as crises políticas
ocorridas dentro do marco democrático não podem colocar em risco os efeitos produzidos
pelos procedimentos táticos acerca da democracia. É importante sublinhar que o
aperfeiçoamento e o aprofundamento democráticos incidem sobre resultados produzidos na
interação das estratégias políticas, mas, sobretudo, no cotidiano e nos fazeres táticos
representados pelas práticas instituintes.
Desse modo, não podemos nos referir a escola numa perspectiva isolada da conquista
pela democratização dos processos educacionais, mas, ao contrário, ainda que negada ao
direito de participar e atuar como protagonista de suas propostas, ganham força com suas
práticas instituintes que reordenam sua função social para além do cumprimento de planos e
propostas que determinam seu trabalho.
44
CAPÍTULO II
OS CICLOS NO CONTEXTO DAS DISPUTAS PARADIGMÁTICAS NA
EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
Organizamos este capítulo de forma interdisciplinar, buscando discutir a educação e,
mais precisamente, a questão da re-configuração da organização escolar, num contínuo
encontro com outras áreas do conhecimento, certos de que esse caminho nos possibilitará
avanços significativos na formulação de nossas reflexões acerca dos desafios contemporâneos
que a sociedade e, conseqüentemente, a educação escolar enfrenta.
Nesse sentido, consideramos que escrever sobre a educação supõe, inevitavelmente,
escrever também sobre o seu entorno, ou seja, o contexto em que ela está sendo pensada e
articulada. Trata-se de situar a educação escolar no momento histórico que estamos vivendo e
compreender a complexidade atual que emerge das mudanças paradigmáticas, em vários
níveis das relações sociais.
Percebemos as múltiplas influências provocadas pela sociedade contemporânea sobre
a educação e suas formas de organização, não na escola, mas nos diferentes espaços sócio-
educativos que contribuem para a formação dos sujeitos, entendendo que estes sujeitos
também constroem conhecimento nos espaços não formais de ensino.
Decorrente disso, a necessidade atual que se apresenta em relação à educação é, em
parte, repensar entre seus membros sua cultura e a lógica que organiza suas relações, seus
recursos, seu currículo, assim como o tempo-espaço, considerando “que as demandas feitas à
instituição [escolar] são excessivas, contraditórias e mutáveis, expressando-se em uma
interminável sucessão de reformas indicativas da desorientação da sociedade e das
autoridades e causadoras da desorientação dos [profissionais da educação]” (Enguita, 2004,
p.09).
No entanto, na discussão que se segue tratamos de articular os rudimentos da
contemporaneidade, apoiando-nos, em parte, em trabalhos que abordam explicitamente
45
conexões freqüentes com relação à complexidade enfrentada no tempo-espaço da escola no
seu sentido histórico, político, social, cultural e pedagógico. Pretendemos, assim, assinalar
dois movimentos de discussão.
Com relação ao primeiro movimento, buscamos situar, ainda que de forma breve, a
educação na contemporaneidade, estendendo esse debate à compreensão do conceito e da
política de ciclos, estruturados a partir de um conjunto de reflexões debatidas no plano de sua
construção histórica e empírica. Deste primeiro movimento de discussão, encaminhamos o
segundo, o qual inicia a construção de nossas análises especificas quanto à mudança
organizacional e seus embates teórico e prático no campo
15
educativo da Rede Municipal de
Educação de Niterói, que tem buscado organizar a escola em ciclos, desde 1999.
Nesta ótica, entendemos que quanto mais compreendermos a aceleração das mudanças
conceituais que tem produzido impactos visíveis às práticas e aos processos alternativos,
inclusive no contexto escolar pela re-configuração do tempo-espaço, facilitaremos o percurso
que implica enfrentar uma crise paradigmática na educação escolar, definida por um novo
projeto pedagógico, que visa à transição da organização da escola sob a gica de um sistema
seriado para a organização da escola sob a lógica de um sistema em ciclos.
Dessa forma, esta discussão apresenta a relevância da organização escolar em ciclos
que, gradativamente, tem sido reconhecida pelos atores do campo educacional. Consideramos
que alguns esclarecimentos sobre o assunto tornam-se necessários para que evitemos a sua
descaracterização através de abordagens aligeiradas. É certo que a reflexão sobre os ciclos
tem sido freqüentemente abordada por diversos fóruns de discussão e detidamente analisada
por inúmeros pesquisadores. Contudo, concordamos com Miranda (2005, p.2), quando
assinala que “ainda não foi suficientemente discutida, uma vez que os estudos publicados
sobre essa questão no Brasil são, em sua quase totalidade, vinculados à justificação e
fundamentação das propostas em curso”. Sendo assim, se torna claro que uma discussão tão
profunda e que tem por base uma mudança estrutural do ensino necessite de um “tempo” e de
novos “espaços” para que de fato venha a se configurar, “aparando” arestas e superando
lacunas afetas aos novos pensamentos e às novas configurações de ensino e educação.
Sob esse panorama geral, interessa-nos destacar que a discussão sobre a possibilidade
de organizar a escola por ciclos busca estruturar-se com o intuito de oferecer subsídios e
tentar dar conta da construção de valores e identidades coletivas como critério básico da
9
Ao se pretender conceituar um campo, consideramos a contribuição de Bourdieu (2004), que o define
resumidamente, como um espaço de relações entre grupos com distintos posicionamentos sociais, espaços de
disputa, conflitos, jogos de poder, onde concorrentes lutam para estabelecer o monopólio sobre a espécie
específica do capital a ele pertinente (o que é valorizado num campo poderá ser depreciado em outro).
46
escola contemporânea, a fim de que construam mecanismos emancipatórios e não se
submetam ao mundo entregue à barbárie. Assim, entendemos que a Política de Ciclos está
intimamente ligada à busca de práticas democráticas no espaço-tempo da escola e, por isso,
não pode desconsiderar a democratização na sua implantação.
Conectar esse movimento e circuito de mudanças na escola com o fluxo de
transformações que convivemos cotidianamente é fundamental para encararmos a idéia de
que, hoje, nos propomos a organizar a escola em ciclos, mas futuramente novos parâmetros e
princípios sociais podem demandar outro modelo de organização da escola como parte de
“um movimento global de redefinição e afirmação de coordenadas políticas como: submissão-
liberdade, exclusão-participação, absolutismo-república, barbárie-civilização” (Arroyo, 1995,
p.35). Resta-nos, portanto, questionarmos: Será que estamos preparados para mudar?
2.1 Educar na contemporaneidade
Educar nada mais é do que humanizar, caminhar para a emancipação, a
autonomia responsável, a subjetividade moral, ética.
Miguel Arroyo
Na medida em que vamos assistindo e refletindo sobre o rumo da escola brasileira dos
últimos anos, não tem como negarmos suas crises, que em alguns aspectos assumem
caminhos de angústias ao exigir, dos membros da escola, o abandono de algumas “certezas” e
práticas dominantes no espaço pedagógico. Entretanto, ao assumir um compromisso
transformador e uma visão dialética da educação, a escola favorece o dinamismo e promove
esperança para a população que espera por uma educação pública, gratuita e de qualidade. Na
interpretação de Morin (2004, p.75), essa situação que a escola vivencia reflete sobre o fato de
que “aquilo que porta o pior perigo traz também as melhores esperanças”. Ainda sobre esse
aspecto, Enguita (2004, p.14) destaca que “a escola se imersa em uma desorientação que
conduz facilmente a uma crise que supõe tanto a impossibilidade de sustentação da dinâmica
prévia, como a manifestação de novas oportunidades”.
No entanto, a escola contemporânea vem convivendo com diversos movimentos
envolvidos no processo de redefinição do seu rumo, da sua lógica, que pouco a pouco tem
sido debatida, de modo que estes processos permitam aos participantes reverem suas posições,
avaliarem suas práticas e transformá-las, lançando na sua complexidade a tarefa de construir
47
coletivamente “um projeto de sociedade sintonizado com aspirações das massas populares”
(Semeraro, 2006, p.57).
Nessa perspectiva, cabe dizer que o que tem desafiado a escola durante alguns anos,
através de uma discussão sobre a sua transformação, é o fato de ela se converter em espaço de
educação problematizadora que, segundo Freire (2005a, p. 83) “parte exatamente do caráter
histórico e da historicidade dos homens. Por isso mesmo é que os reconhece como seres que
estão sendo como seres inacabados, inconclusos, em e com uma realidade que sendo histórica
também é igualmente inacabada”.
Ao assumir um novo movimento de compreensão do mundo, “não mais como uma
realidade estática, mas como uma realidade em transformação, em processo” (Freire, 2005,
p.82), o funcionamento dominante da escola torna-se questionável, flexível, confrontando-se
com sua identidade tradicionalmente construída e, por isso, gerando desconforto entre seus
membros pelas sensações de “crises” e “incertezas”. Como resultado desta dificuldade, a
educação escolar encontra-se no transcurso da experiência que vem sendo desenvolvida ao
longo do processo entre “jogo dos contrários, permanência-mudança”. (Freire, 2005, p. 84). A
respeito Santos (1988, p.2) afirma:
Vive num tempo atônito que ao debruçar-se sobre si próprio descobre que os seus
pés são um cruzamento de sombras, sombras que vêm do passado que ora
pensamos não sermos, ora pensamos não termos ainda deixados de ser, sombras
que vêm do futuro que ora pensamos já sermos, ora pensamos nunca virmos a ser.
(Santos, 1988, p. 20).
Tal fato, como mencionamos anteriormente, reflete, para além da crise educacional.
Os novos paradigmas e o novo pensar da sociedade contemporânea vêm interferindo também
em outras instituições sociais que diretamente estão ligadas à educação. No entanto, a idéia de
“formação” é imprescindivelmente repensada dentro do espaço escolar. Formar para quê?
Formar para o trabalho? Como sustentar essa concepção, se vivemos no tempo da
“empregabilidade”? Sobre essa questão, Gentilli (2005, p.89) explica que:
(...) mais do que pensar a integração dos trabalhadores ao mercado de trabalho, o
desenho das políticas educacionais deveria orientar-se para garantir a transmissão
diferenciada de competências flexíveis que habilitem os indivíduos a lutar nos
exigentes mercados laborais pelos poucos empregos disponíveis. A garantia do
emprego como garantia social (e a sua defesa como requisito para as bases de uma
economia e uma vida política estável) desmanchou-se diante da nova promessa da
empregabilidade como capacidade individual para disputar as limitadas
possibilidades que o mercado oferece.
48
Como podemos notar, novos debates florescem em torno da temática educacional,
operando modificações significativas na sua ão e “passando a exigir o desenvolvimento da
capacidade de educar permanentemente e das habilidades de trabalhar independentemente, de
criar métodos para enfrentar situações não previstas, de contribuir originalmente para resolver
problemas complexos”(Kuenzer, 2005, p.73).
Na perspectiva da formação, “isso significa uma reestruturação do ciclo de vida que
diz respeito à aprendizagem”, como assinala Enguita (2004, p.19). O autor completa,
explicando que:
Rompe-se a velha seqüência na qual, a um período inicial de educação e
aprendizagem, seguia-se um período de vida baseado na plena competência do
trabalhador, do cidadão, do consumidor, etc. As mudanças constantes nas
tecnologias e nas formas de organização (isto é, nos modos de relacionamento com
as coisas e com as pessoas, respectivamente) requerem novas etapas de
aprendizagem, alternadas ou silmutâneas com o trabalho, ao longo de toda a
extensão da vida útil ou entremeando-a em qualquer momento. Essa nova
aprendizagem, atualização, reciclagem, modernização, readaptação, formação
contínua, permanente, recorrente, ou como quer que a chamemos, pode passar pelo
retorno à educação formal, por diversas figuras de formação ocupacional ou pelo
treinamento no terreno da ação, do autoditatismo com manuais, tutoriais,
publicações profissionais ou qualquer outra fórmula. Mas, de qualquer modo,
implica continuar aprendendo ao longo de toda a vida. (p. 19).
Verificamos, a partir dessas mudanças contemporâneas, a desarticulação da escola
como “entidade integradora”, ou seja, “os sistemas educacionais [deixam] de ser considerados
pelos grupos dominantes e pelas massas que lutavam por sua democratização como um
poderoso dispositivo institucional de integração social num sentido amplo” (Petitad, 2004,
apud Gentilli, 2005, p.79). Sobre esse aspecto, Enguita (2004, p.12) nos chama a atenção para
o fato de que o tempo em que estamos convivendo na educação deve ser entendido pelo:
Desmoronamento da crença na associação entre educação e emprego; da sintonia
entre os valores escolares e os valores sociais; da crença na capacidade da escola
para moldar as crianças e os jovens; da tranqüilidade proporcionada pela
aquiescência incondicional das famílias ou da simples idéia de que as autoridades,
as instituições e os agentes do processo educativo sabem o que buscam ou pelo
menos até certo ponto, buscam uma mesma coisa.
No entanto, não podemos ignorar os desafios da educação imersa na sociedade
contemporânea, nem negarmos também a necessidade de mudanças que venham a
proporcionar novo formato ao seu sentido e a sua lógica. Entretanto é essencial que tenhamos
clareza também dos discursos e propostas “mercadológicas e pragmáticas”, para que
possamos dinamizar criticamente e coletivamente estratégias teórico-práticas com
compromisso político e pedagógico, nessa árdua - e ao mesmo tempo brilhante - tarefa de
49
transformação social, a partir da conscientização e da participação autônoma dos diferentes
sujeitos da escola.
Nesse sentido, além das disparidades internas que a escola vivencia na
contemporaneidade, ainda enfrenta como pano de fundo um suposto mercado livre que acaba
por nos aprisionar, construindo necessidades de consumo ao criar um mundo “sedutor”,
“fascinante” que contraditoriamente resulta numa realidade atomizada, excludente e cruel,
convivendo cotidianamente com o desafio de ter que superar as contradições e as demandas
sociais que a colocam no meio dessa trama.
Por isso, devemos considerar sempre a relação entre essas dimensões - escola e
sociedade - para que consigamos nos aproximar de uma leitura atualizada e problematizadora
do entorno educacional e, assim, possibilitarmos a renovação de caminhos e práticas que
dêem conta de superar suas necessidades atuais. Porém, com a preocupação de não confundi-
las com necessidades “emergenciais” e “imediatistas”.
Como nos lembra Semeraro (2004, p.46), “hoje é preciso discernimento muito apurado
para encontrar rumos em uma realidade complexa, plural, fluida, mas também ambígua,
contraditória, embaralhada”. Mais do que a solidariedade, estamos vendo crescer a
competitividade, a individualidade e, por isso, nos detemos a questionar e problematizar: Qual
é a tarefa da educação neste novo contexto político-social? Qual é a tarefa da educação na era
das “nets”, na era de novas configurações que explicam a categoria tempo-espaço? Que
perspectivas podemos apontar para os sujeitos formados na educação contemporânea?
Cabe dizer que os caminhos para responder a essas questões são múltiplos e estão
muito longe de serem homogêneos, entretanto, tomamos como referência algumas
explicações comprometidas com o processo de pensar e construir uma educação
contemporânea sintonizada com a “humanização”, a formação integral do sujeito, do cidadão.
Se em algumas décadas pensávamos na escola como um ambiente social responsável
pela “transmissão” de conhecimentos construídos e sistematizados historicamente, hoje, sua
tarefa comporta outras demandas sociais que fazem parte da nossa realidade contemporânea
expressa nas mudanças na forma de vida, trabalho, convivência que, inevitavelmente, vem
provocando tensões e sendo adicionadas à tarefa inicial da educação escolar - o ensinar -,
requerendo novas orientações no espaço escolar, por meio de uma intensa e conflituosa
revisão em seus “saberes” e “fazeres”.
Entendemos que a escola na contemporaneidade deve traduzir-se em uma educação
emancipadora, que desenvolva nos homens a capacidade de refletir criticamente sobre a
realidade na qual estão inseridos com ambições de transformá-la. Uma escola que possibilite a
50
formação de cidadãos capazes de construir as condições necessárias para modificar as
situações sociais injustas que marcam a realidade brasileira; que como sujeitos co-partícipes,
tornem-se engajados nas questões sociais do país. Uma escola, capaz de reinventar-se como
sistema, sem perder o foco de sua existência que é ensinar, contudo, tomando o
conhecimento, do ponto de vista político, como estratégia de organização social para a
transformação.
Ainda que esta visão de mudanças contemporâneas não esteja amadurecida e
intensificada como ponto crucial para a discussão da re-configuração da organização escolar,
cabe aqui destacar que o grande desafio da escola contemporânea tem sido repensar as novas
formas de organizar o tempo/espaço, dadas as diversas modificações do mundo globalizado.
Nesse sentido, entendemos que uma escola comprometida com a emancipação e a
humanização dos sujeitos não pode limitar-se à ditadura do capitalismo que determina
majoritariamente a fragmentação do indivíduo, a determinação de um “tempo pré-
estabelecido para a assimilação de um determinado conteúdo, a segregação dos alunos de
“espaços” formativos, que, ao serem reprovados ou evadidos pelo “fracasso escolar”,
enfrentam a exclusão em outros espaços sociais.
Sendo assim, uma análise criteriosa para a compreensão dessas mudanças
contemporâneas pelos sujeitos que estão mergulhados neste processo crítico é pertinente,
porque são esses os catalisadores de modificações e de reconstituições que dão novos
formatos à sociedade nos tempos históricos em que estas se localizam. Nesse sentido, “se
cada elemento da organização, especificamente cada elemento humano, cada membro, fecha-
se na função recebida e não está disponível para nenhuma outra, então não haverá
reorganização possível, por mais evidente que seja a necessidade” (Enguita, 2004, p.101).
Nossa questão, de fato, é afirmar que a re-configuração da organização escolar pode e
deve ser articulada contemporaneamente, não como uma pequena contribuição para a
estrutura da escola, mas, sobretudo, como possibilidade de modificar sua lógica, antes
excludente, que nesse novo projeto se quer incluir. E, para tanto, é preciso se pensar
politicamente em torno de questões que na lógica anterior não estavam postas. Sabemos, no
entanto, que analisando a conformação histórica da organização da escola seriada, hoje, ao
tentarmos desconstruí-la, nos vemos imersos em uma tremenda crise paradigmática, que, por
um lado, nos faz resistir ao novo e, por outro, nos provoca a necessidade conhecê-lo.
51
2.2 A re-configuração da organização escolar: enfrentando a crise dos paradigmas
É problema universal de todo cidadão do novo milênio: como ter acesso às
informações sobre o mundo e como ter possibilidade de articulá-las e organizá-
las? Como perceber e conceber o Contexto, o Global (a relação todo/partes), o
Multidimensional, o Complexo?(...) Esta reforma é paradigmática e, não,
programática: é questão fundamental da educação, que se refere à nossa
aptidão para organizar o conhecimento.
Edgar Morin
Para cada tempo histórico existem paradigmas e visões de mundo dominante. Esses,
por sua vez são abordados numa sociedade em defesa de uma identidade ideológica. Não
modos de pensar e educar sem um tipo específico de paradigma. Ao contrário, o
conhecimento legítimo e o tipo de educação são definidos pelos paradigmas emergentes de
uma sociedade.
A prática educativa e pedagógica da escola tem a ver com o momento histórico
específico da sociedade e com as crenças e concepções dominantes em torno do campo
educacional. Ao que vemos, historicamente, a sociedade tem sido marcada pelo ideal de
estabilidade, certeza, imutabilidade e exatidão que vigorou e esteve presente no cenário
educacional, norteando suas propostas, seu tempo-espaço, enfim, sua lógica. Todavia, o ideal
de estabilidade, precisão, segurança e firmeza originados da crença na razão e na ciência estão
sendo questionados, tanto na sociedade quanto na educação.
Dessa maneira, a mudança e a transição paradigmática, que temos mencionando ao
longo de nossa reflexão desenvolvida, nos levam a analisar e problematizar sobre a
educação do homem, sobre a formação do ser humano na sociedade contemporânea,
permeada de novos paradigmas, que reafirmam a inadequação de um saber fragmentado,
absoluto e preciso até então vivenciado por nós.
Nesse sentido, compreender que a discussão sobre a re-configuração da organização
escolar está inserida num panorama de lutas e crises paradigmáticas na escola, mas,
sobretudo, na sociedade contemporânea, que transporta outras estruturas para pensar e estar
no mundo, pensar e estar na escola, é sem dúvida um ponto crucial para todos nós que
estamos imersos nessa crise.
Entende-se paradigma “como uma das versões da teoria platônica das formas ou
idéias, e tem, portanto, um sentimento ontológico, forte, designado àquilo que é real”
(Marcondes, 1995, p.14). Na compreensão de Kuhn (2000. p. 13), paradigmas são realizações
científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e
52
soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência. Para este autor, um
paradigma antes de se tornar dominante convive com o período “pré-paradigmático”,
introduzindo questões e problematizando o modelo de paradigma então hegemônico.
No entanto, podemos dizer que um novo paradigma coloca em xeque as concepções
anteriores, instaurando a “(...) crise de paradigmas que se caracteriza assim devido a uma
mudança conceitual ou uma mudança de visão do mundo, conseqüência de uma insatisfação
com os modelos anteriormente predominantes de explicação” (Marcondes, 1995, p.15).
Há, contudo, uma série de dificuldades que debilitam a sustentação de um novo
paradigma. Marcondes (1995, p.28) nos indica que:
Na medida em que não podemos mais identificar um paradigma dominante em
nosso contexto de pensamento-referência básica para os nossos projetos científicos,
políticos, éticos, pedagógicos e mesmo estéticos é que nos caracterizamos como
vivendo uma crise de paradigmas, e até mesmo uma crise da própria necessidade de
um paradigma hegemônico.
Estamos, pois, num momento em que, como fora antes citado, há uma verdadeira crise
de paradigmas sociais e, por conseqüência, dos paradigmas educacionais, um momento de
urgência de reforma do pensamento. O que importa é ter compreensão de que os momentos de
crise são os mais fecundos, uma vez que neles encontramos uma fermentação significativa de
idéias, pois é na crise em essência que buscamos respostas, alternativas e saídas para uma
determinada conjuntura. Por isso, é necessário entendermos que:
(...) um contexto diverso, mutável, incerto e, como gostam de dizer os teóricos dos
sistemas, turbulento, uma organização não tem outra solução para sobreviver,
prosperar e desenvolver suas funções a não ser comportar-se como um sistema
flexível e aberto. Ou seja, atuar como um sistema aberto e não simplesmente
racional ou natural; ou como um sistema em sentido amplo (como um conjunto de
metarrelações, ou de relações entre as relações)e não como uma simples estrutura
(relações entre elementos) ou um mero agregado (soma de elementos).
Flexibilidade quer dizer capacidade de transformar a si mesmo, de se reorganizar,
se for preciso, para alcançar os fins propostos, inclusive de articular, de outra
maneira, os fins parciais, ou de substituir os fins gerais para sobreviver como
organização. Uma escola faz isso, por exemplo, quando passa do trabalho por
matérias ao trabalho por projetos, do agrupamento rígido ao agrupamento flexível
de seus alunos, do horário fixo e dividido em partes iguais para o horário desigual
e variável ou dos programas únicos as adaptações e flexibilizações curriculares.
(Enguita, 2004, p.101)
Hoje, porém, com a crise de paradigmas e com as mudanças e demandas colocadas à
escola, o projeto de formação do homem precisa ser repensado e re-significado. A luta pela
formação do professor e do aluno precisa ser menos técnica e mais humana e reflexiva,
53
vinculadas ao processo de conhecimento, à análise e à crítica das situações reais, vividas
cotidianamente. Daí a importância de refletirmos sobre a gica de organizar a escola. A
escola contemporânea precisa ter o objetivo de formar pessoas autônomas, que convivam
dialogicamente e que sejam capazes de lidar com o novo e o incerto, com as emoções e
sentimentos próprios e dos outros, que desenvolvam o respeito aos direitos humanos e
utilizem a razão criticamente nas relações interpessoais. Mas, isso é possível na escola
tradicional? Acreditamos que não. Entretanto, mesmo sabendo dessa resposta, as “certezas
com que convivemos na nossa prática profissional nos impedem de abraçarmos o “novo” sem
sofrimentos e resistências.
Isto me faz perguntar: será que as certezas que tínhamos que se revelaram falsas,
são melhores do que a incerteza com a qual navegamos atualmente? Perda ou
libertação? Creio em ambas. Perda porque muita esperança se depositou no que se
perdeu. Libertação porque, livres das amarras de um projeto predeterminado por
pressupostos rígidos, respaldados em uma legitimidade científica, estamos abertos a
novas aventuras (Garcia, 2000, p. 60).
No entanto, isso não significa que “o novo ou aquilo que ainda não se pôs em prática
seja sempre melhor, mas, que a “organização em si é melhor quando é capaz de decidir sobre
a manutenção ou a modificação de sua estrutura, em vez de simplesmente recebê-la e
considerá-la irremovível” (Enguita, 2004, p.101).
A crise paradigmática que vivemos hoje no espaço escolar, marcado pela busca de
uma outra lógica que organize suas práticas cotidianas, reforça, não apenas a idéia de um
espaço de possibilidades, auto-organizativo, não-linear, porém, mais turbulento, complexo,
menos previsível, mais caótico, pluralista, criativo e dinâmico. Entretanto, o nosso grande
ganho nesse processo é a possibilidade de entender a escola, a educação, em constante
construção, num processo de vir-a-ser, portanto, repleta de esperança e necessidade de
aprendizagem.
2.3 Ciclos: um possível caminho para organizar a escola na contemporaneidade
Os ciclos (...) são concebidos e defendidos como “novos espaços-tempos de
formação” que favoreçam presumidamente uma maior igualdade na escola.
Phillipe Perrenoud
Conforme temos problematizado ao longo de nossa discussão, a questão da
organização escolar integra complexas transformações com que nos defrontamos na sociedade
54
contemporânea. Por isso, buscamos intensificar os esforços de compreensão da estrutura
educativa para além dos “muros” da escola, tentando garantir a nossa reflexão na perspectiva
de um processo social dinâmico, e não estático, onde se situam necessidades, tensões, relações
de poder, entre outros aspectos internos e externos ao contexto escolar.
Tomamos este prisma para discutir a organização da escola contemporânea e,
especialmente, a alternativa da escola de se organizar em ciclos, a partir da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96, art. 23), em que se prevê um movimento
transformador que articule novas concepções e estratégias para a cultura da educação escolar,
em especial nas redes públicas. Nesse sentido, fizemos a escolha de discutir os ciclos, como
um possível caminho para organizar a escola no mundo contemporâneo, visto que
representam uma oportunidade de organização política, social e educacional. Afinal,
potencializam os sistemas educacionais, seus membros e os sujeitos que neles são formados
para participarem dos embates ideológicos e hegemônicos que a sociedade capitalista no
contexto da globalização tem imposto, desumanizando o processo de aprendizagem e
minimizando as possibilidades de emancipação.
Esse processo de re-organização da escola, pelo qual várias redes públicas vêm
assumindo a mudança de séries anuais para ciclos, tem suscitado importantes debates,
ressaltando suas potencialidades e fragilidades, contidas e vivenciadas na proposta de ciclos,
cujo objetivo primordial é romper com os movimentos de reprodução da ordem social,
política e educacional hegemônica.
Em seu conjunto, o processo de críticas e contradições nos debates sobre a
implantação dos ciclos no Brasil gerou diferentes interpretações conceituais e alternativas
processuais no campo da experimentação, indo desde a possível transformação ou estagnação
da cultura escolar com os ciclos, até a opção de não adotá-lo, por parte de alguns sistemas
estaduais e municipais. Sem deixar de lado também o aspecto polêmico da questão, entender
essa relação de confronto significa partir do princípio de que “estamos tão acostumados com a
organização seriada que ela passou a fazer parte do nosso imaginário escolar”. (Arroyo, 1999,
p. 144). Ainda destaca que “para o sistema seriado fomos formados e deformados. Trazendo
suas marcas em nossa pele, em nossa cultura profissional. Desconstruir a organização seriada
e sua lógica é desconstruir um pedaço de nós”. ( p.144)
Como conseqüência dessa importação, tendemos a condicionar os paradigmas até
agora utilizados na escola, nos assegurando em práticas que “dominamos”, que acreditamos
ser a mais eficaz, e, por isso, nos posicionamos de maneira resistente às propostas que se
55
“insinuam” no nosso contexto educacional, propondo uma mudança para além da estrutura
física da escola, mas uma mudança em nós, na nossa forma de ver e pensar a escola.
Partindo dessas considerações, os ciclos, embora muitos ainda o neguem, instauram
uma outra concepção, a de “superar o caráter seletivo da escola, (...) torná-la mais flexível
para atender as diferenças dos alunos e (...) fazer desse projeto um trabalho compartilhado”
(Barreto, 2005, p. 665). Trata-se de rever as concepções, os métodos, o currículo, as relações
de poder e, sobretudo, as formas de investigar e intervir na realidade social através de
caminhos teórico-práticos democráticos. Entretanto, a questão fundamental nesse processo diz
respeito à organização do trabalho na escola, a fim de desenvolver mobilizações necessárias
para construir o exercício político da diversidade em suas atividades pedagógicas.
É essencial neste momento destacarmos que não defendemos aprioristicamente a
organização da escola em ciclos como a estratégia correta a ser adotada no processo de
transformação do quadro social tão injusto e perverso, que também se manifesta no contexto
escolar. Afinal, é verdade que em algumas redes, embora organizadas (ou se organizando)
em ciclos, persistem cenários em que alunos são excluídos, pois não conseguem, mesmo sem
o fantasma da reprovação, se apropriar dos conhecimentos básicos. A rigor, o que defendemos
é a possibilidade do aprofundamento da reflexão que os ciclos têm proporcionado. Os
educadores que têm refletido e problematizado essas questões podem encontrar na proposta
de ciclos suporte e fundamento para um movimento de conscientização e de mudança na
cultura escolar, que lute contra a exclusão, a competitividade, a individualidade, e tantos
outros danos imbricados historicamente na nossa sociedade e reafirmados cada vez mais na
contemporaneidade.
2.3.1 Ciclos: uma interpretação política e educacional transformadora
Do ponto de vista político e ideológico, a proposta de ciclos é herdeira de uma
postura progressista, que a escola como um espaço transformador e que para
tal, deve ser igualmente transformado em suas finalidades e em suas práticas, em
seus espaços de gestão e em seus tempos de formação. Para que os estudantes
atuem na vida de forma transformadora, é necessário que o espaço da escola
favoreça a prática transformadora, a começar por ela mesma.
Luiz Carlos de Freitas
Compreendendo que a escola brasileira atravessa um momento de reflexão e
transformação dos seus fundamentos e de sua lógica organizacional, a partir da implantação
dos ciclos em alguns sistemas educacionais, torna-se importante considerar as possibilidades,
56
de âmbito teórico e epistemológico, que sinalizam alternativas inovadoras na atividade
político-pedagógica indispensável à reestruturação das relações políticas, sociais, econômicas
e culturais que definem a sociedade atual.
Esse entendimento, certamente fortalecido no Brasil, principalmente após a
promulgação da Constituição de 1988, que nos apresenta a primazia da discussão e da
formulação de uma proposta de educação igualitária para todos, procura dotar os sistemas
educativos, tendo como base “a humanização, portanto, [numa linha] contrária à perspectiva
homogeneizadora” (Krug, 2002, p. 38), estreitamente vinculada ao período de reformas nos
sistemas públicos de ensino, com os objetivos de melhorar o fluxo escolar e elevar os níveis
de aprendizagem. Corroborando essa concepção, Fernandes (2005, p. 58) afirma que “tal
discussão no Brasil apresenta-se fortemente relacionada às questões de repetência e evasão”.
A escola, que consideramos como um campo estratégico de luta, tem-se articulado em
meio a contradições e resistências, no processo de implementação dos ciclos, mesmo quando
“construído pelas múltiplas iniciativas cujo propósito tem sido o de modificar a organização
da escola, com vistas a assegurar o direito de todos à educação” (Barreto, 2005, p. 663).
Segundo Barreto (2005, p. 659), os ciclos provocam um confronto com os valores
dominantes, na medida em que nos conduzem a uma reflexão quanto a alternativas que sejam
capazes de redefinir a concepção de escola, para além de um espaço que transmite
conhecimentos sistematizados e exerce uma função de caráter seletivo.
Para tanto, numa perspectiva democrática, Krug (2002, p. 45) assinala que nas escolas
caracterizadas por ciclos de formação
16
, o compromisso é possibilitar a todas as crianças e
adolescentes o acesso ao conhecimento formal. Perrenoud (2004, p. 97) também chama a
atenção sobre esse aspecto, apontando que “isso suporia uma vontade real de democratização
do acesso aos saberes básicos”.
Ainda do ponto de vista de Barreto (2005, p. 660), os ciclos “demandam mudanças na
concepção de conhecimento e de aprendizagem, na ocupação do espaço e do tempo escolar,
bem como na própria função da educação escolar, vindo a constituir um caminho potencial
para a democratização do ensino”.
Uma das vertentes de significação da proposta dos ciclos tem sua origem no
pensamento político-social que nos remete à história educacional do Brasil, país que ao longo
de seu percurso histórico esteve predominantemente inserido em um projeto civilizatório
16
Quando cita “ciclos de formação”, a autora esta se referindo à forma como Porto Alegre desenvolveu sua
proposta pedagógica em ciclos.
57
calcado em pressupostos e valores eurocêntricos
17
, apresentados como modelo único para o
progresso do homem enquanto sujeito “culto” e “educado”. Assim, a escola brasileira foi
construída inicialmente com a finalidade de adequar o educando a esses padrões estabelecidos
socialmente na nossa cultura colonizada, exercendo sua tarefa de ensinar pautada nessas
concepções. Isso acabou reforçando a segregação e a discriminação presentes nas relações
sociais, sustentando-se na noção de conhecimento e de cultura de caráter supostamente
universal e, portanto, incapaz de valorizar identidades, linguagens e saberes locais. Nessa
perspectiva, “essa dimensão confirma e legitima as diferenças sociais, transformando em
individual o fracasso e conservando as novas gerações na desigualdade” (Krug, 2002, p. 37),
além de rotular o sujeito portador de outros saberes como subalterno, marginalizado,
naturalizando-se, desse modo, as relações que produziram “ricos” e “pobres”; “cultos” e
“ignorantes”; “dominantes” e “dominados”. Em outras palavras:
A seriação foi quase que exclusivamente a organização de ensino nos sistemas
educacional público e privado. Em consonância com uma estrutura social que opera
conforme o princípio da seletividade e da exclusão, a escola seriada cumpriu a
função reprodutora da estratificação social. Ela reforçou apesar de não se propor a
evasão estruturalmente por meio da reprovação e da evasão, o lugar “reservadoàs
diferentes classes sociais. Salvo raras exceções, os repetentes e evadidos da escola
são os mesmos excluídos socialmente (Jacomini, 2004, p. 403).
No contexto dessa discussão, reconhece-se que historicamente e sistematicamente “a
identificação dos mecanismos educacionais de reprodução social, isto é, a busca de uma
escola resultando de uma consciência alienada pela ideologia dominante” (Cunha, 1991, p.
57), vem se estabelecendo como uma finalidade universal, pondo à margem outros valores e
princípios culturais, que acabam por ser renegados e oprimidos. Como podemos observar,
essa problemática acaba por reforçar as relações sociais responsáveis pela permanência das
classes trabalhadoras em situação subalterna e dominada” (Cunha, 1991, p. 58).
Cabe observar que as dificuldades em relação a esse debate decorrem de uma
construção histórica, pois, embora identifiquemos em seu percurso importantes momentos de
inovação nos sistemas educativos, esses se constituem, ainda hoje, com base em construções
ideológicas que continuam hierarquizando os saberes que norteiam as práticas político-
17
Nessa abordagem eurocêntrica, entendida como construção ideológica articulada a atividades políticas,
pedagógicas, econômicas e sociais, que a tornaram hegemônica, compartilhamos das idéias de Lander (2005, p.
34), que entende o eurocentrismo como: “(...) uma construção que pensa e organiza a totalidade do tempo e do
espaço para toda a humanidade do ponto de vista de sua própria experiência, colocando sua especificidade
histórico-cultural como padrão de referência superior e universal”. E prossegue o autor, afirmando que “(...) uma
forma de organização de ser da sociedade transforma-se mediante este dispositivo colonizador do conhecimento
na forma ‘normal’ do ser humano e da sociedade. As outras formas de ser, as outras formas de organização da
sociedade, as outras formas de conhecimento, são transformadas não só em diferentes, mas em carentes,
arcaicas, primitivas, tradicionais e pré-modernas”.
58
pedagógicas, classificando-os como dominantes ou subalternos, e disciplinando os corpos dos
sujeitos do processo educativo.
18
Assim, buscando teorizar sobre esse novo paradigma - os ciclos -, a escola confronta-
se com a questão da sua identidade, o que revela a complexidade e a grandeza da questão
política, cultural, social e pedagógica implícita nesse debate. Um novo paradigma, no entanto,
apresenta-se diante do desafio de romper com a escola tradicional e introduzir uma dimensão
genuinamente inclusiva no processo de escolarização, o que não se materializa sem
confrontos e resistências, no âmbito da comunidade escolar. Nas palavras de Freitas (2003, p.
36):
Não se trata de uma mera solução pedagógica para um problema de desempenho
escolar do aluno, e sim como um longo e necessário processo de resistência de
professores, alunos e pais à lógica excludente e seletiva da escola. Como processo
de resistência, é algo que deve ser valorizado pelo grau de mobilização que permite
arregimentar (em todas as suas formas). Nesse processo, os ciclos estão mais
instrumentalizados teórica e praticamente.
Nesse contexto, no conjunto de medidas necessárias para promover efetivamente a
reforma na educação, com base numa política educacional inclusiva, a partir dos ciclos,
destaca-se a “ruptura histórica que estabelece com [a escola tradicional], na medida em que
volta sua atenção especificamente para o oprimido como sujeito de sua libertação” (Freire,
2005, p. 4). Tal percurso requer um esforço de máxima significação:
(...) o esforço de mobilização, organização e capacitação das classes populares;
capacitação científica e técnica. Entendendo que esse esforço não se esquece que é
preciso poder, ou seja, é preciso transformar essa organização do poder burguês que
está aí, para que se possa fazer escola de outro jeito. Em uma primeira “definição”
eu a aprendo desse jeito. Há estreita relação entre escola e vida política. (C.f. 2005,
p. 19).
Nessa mesma direção, Krug (2002, p. 53) aponta que:
(...) o desejo de uma escola para todos precisa de nova possibilidade estrutural, de
práticas com trabalhos coletivos, conteúdos organizados a partir da realidade de
cada comunidade e a instituição de ações alertas para a idéia de que a escola é o
lugar de aprender, de construir conhecimentos e de desenvolvimento pessoal e
coletivo.
Somente ultrapassando os limites das estruturas conservadoras da ordem, no plano dos
poderes e dos saberes dominantes, que se afirmam constantemente no pensamento
18
Nos estudos de Azibeiro (s/data), ao se abordar a subalternidade, faz-se referência à produção de
subjetividades que se submetem e se inferiorizam, porque, de tanto que esse discurso é “martelado” e os corpos
são disciplinados para se submeterem a esse regime de verdade, acabam por assumir e assimilar, como próprios,
o discurso e a perspectiva do colonizador ou do opressor. Portanto, os saberes subalternos aqui referidos indicam
a postura que as escolas assumem: transmissão de um saber submisso a uma ordem opressora, mesmo que em
seus discursos sinalizem elementos progressistas.
59
pedagógico, no discurso dos profissionais da educação, ainda aprisionados a uma tradição
histórica seletiva e excludente, propagada por ideologias padronizadoras, é que poderemos
caminhar em uma nova direção ideológica, política, cultural, profundamente estimulada e
protagonizada pela escola de todos, que tanto almejamos e buscamos nesse processo. Trata-se
de questionar não apenas as estruturas e formas de funcionamento desenvolvidas nos sistemas
de ensino, mas de investigar os pressupostos políticos intrínsecos à discussão pedagógica,
buscando compreender os fundamentos e objetivos a que a educação se propõe.
Suscitadas as novas perspectivas que os ciclos propõem para a escola pública, torna-se
indispensável considerar que seus fundamentos estão ligados ànatureza política, social,
econômica, psicológica e pedagógica” (Barreto e Sousa, 2004, p.36). Destacamos, sobre esse
aspecto, as palavras de Barreto e Mitrulis (2001, p. 121):
A organização do ensino em ciclos tem vindo ancorada em projetos políticos que,
em princípio, devam estar mais atentos: a autonomia das unidades escolares para
formular suas propostas educativas de modo contextualizado e de acordo com o
perfil do aluno; a um currículo concebido de forma mais dinâmica e articulado às
práticas sociais e ao mundo de trabalho; a formação continuada de professores; a
um tempo regulamentar de trabalho coletivo na escola e a flexibilização das rotinas
escolares.
É possível perceber, portanto, que, para esta nova concepção se materializar de forma
satisfatória, faz-se necessária uma mudança na própria atividade político-pedagógica da
escola, a partir de um olhar da educação, do ponto de vista histórico e social, como propõe a
concepção dialética da história. E sem se perder de vista que as práticas educacionais, em
especial no contexto escolar, no mais das vezes, se inserem num movimento global de
conservação da ordem social. Diante disso, os ciclos podem contribuir significativamente para
a ruptura desse processo, uma vez que se consolidam como um “projeto transformador das
bases de organização da escola e da sociedade, de médio e longo prazo, que atua como
resistência e fator de conscientização, articulado aos movimentos sociais” (Freitas, 2003, p.
73). Nessa direção, Krug (2002, pp.132-133) ressalta:
As propostas progressistas em educação são marcadas pelas reafirmações da escola
do trabalho com base na concepção dialética de entendimento dos opostos
constituintes na sociedade atual e na pedagogia. Comprometidos com a leitura
crítica do real, trabalham para a transformação desse real, afirmam a possibilidade
de um projeto social inclusivo e conseqüentemente, de uma escola não excludente.
Nesse sentido, é possível considerar que a idéia da organização da escola em ciclos
possibilita a participação de todos os sujeitos envolvidos com a escola, de modo que os
60
mesmos possam opinar, problematizar, discutir e decidir os rumos do processo educativo.
Assinalamos, ainda, que através dos ciclos a escola poderá ser articulada do ponto de vista dos
interesses das classes populares, na medida em que se modifica a concepção de aprendizagem,
conhecimento, avaliação, tempo-espaço, entre outros aspectos que marcam os sujeitos na
escola.
Nesses termos, o sentido que aqui nos interessa para compreendermos melhor a idéia
de organizar as escolas em ciclos pressupõe reconhecer a escola enquanto espaço
democrático, cuja organização está em permanente processo de construção, problematizando
os fatores históricos, políticos, econômicos e sociais que contribuíram, e ainda contribuem,
para a exclusão escolar e social. É preciso, pois, alcançar a abordagem política na discussão
sobre os ciclos, que não “representa uma mera mudança nos detalhes do funcionamento da
escola, mas envolve uma profunda modificação em sua cultura” (Barreto e Sousa, 2004, p.
34). A esse respeito, Freitas (2003, p. 60) ressalta:
Não basta que os ciclos se contraponham à seriação, alterando tempos e espaços. É
fundamental alterar também o poder inserido nesses tempos e espaços, formando
para a autonomia, favorecendo a auto-organização dos estudantes. Isso significa
criar coletivos escolares nos quais os estudantes tenham identidade, voz e voto.
Significa fazer da escola um tempo de vida, e não de preparação para a vida.
Significa permitir que os estudantes construam a vida escolar.
Portanto, compreender o sentido político dos ciclos, o projeto que os constitui como
elemento de transformação social, é elemento indispensável para refletirmos sobre as
possibilidades de construção de uma educação libertadora, que, segundo Freire (2005, p. 37),
“(...) é uma conquista e não uma doação, e por isso, exige [de todos nós] uma permanente
busca”.
2.3.2 Mas, afinal, o que são os ciclos escolares?
Essa pergunta ecoou, e ainda ecoa, particularmente nos dias atuais, quando as escolas
e os profissionais que nela atuam são desafiados a modificar sua prática e reorganizar o
sistema educacional. Portanto, nas condições atuais, destacamos que os ciclos escolares
representam um grande desafio de compreensão da sua gica; de reconstrução das bases da
educação pública; de formação dos profissionais da educação nessa lógica; enfim, de
reelaboracão de caminhos educativos comprometidos com a democratização da educação para
a formação do sujeito autônomo, cidadão.
61
Partindo dessa explicação, os ciclos, em primeiro lugar, pressupõem uma alternativa
de organização da escola e dos sistemas de ensino, com subsídios teórico-práticos para a
transformação da cultura escolar.
Buscando identificar elementos que nos permitam compreender a idéia dos ciclos, de
forma mais concreta, consideramos oportuno apresentar a definição de Barreto (2005, p. 660),
pela qual os ciclos:
(...) compreendem alternativas de organização do ensino sico, que ultrapassam a
duração das séries anuais como referência temporal para o ensino e a
aprendizagem, e estão associados à intenção de assegurar à totalidade dos alunos a
permanência na escola e um ensino de qualidade.
Na contribuição de Perrenoud (2004, p. 22), os ciclos “são a oportunidade para passar,
enfim e de maneira que se pode esperar irreversível, de uma lógica de programa (o que os
professores supostamente ensinam) a uma lógica de objetivos (o que os alunos aprendem e
sabem afinal)”. Numa definição mais ambiciosa, Perrenoud (2004, p.33) define os ciclos
como “quadro integrador e ponto de apoio a uma evolução do oficio do professor, dos
programas e das formações escolares, da avaliação e da luta contra as desigualdades”.
Tomando o significado da palavra ciclo, o dicionário Aurélio nos faz compreendê-lo
como “série de fenômenos que se repetem numa ordem determinada; período, fase”.
Transportando, pois, essa interpretação para a proposta de organização da escola em ciclos é
possível supor um processo de alteração no conceito de tempo-espaço da escola, além dos
critérios que nortearão o movimento dos alunos entre um ciclo e outro. Quando se fala, pois,
da necessidade de um novo estilo de organizar a escola implica também definir seu caráter de
preceito formal. A esse respeito, compartilhamos algumas questões colocadas por Miranda
(2005, p.648):
Se a seqüência dos anos que se sucedem no regime seriado aparece como uma
cronologia estéril e arbitrária, a idéia de ciclos contém um misterioso sentido que
sugere um certo naturalismo teleológico: círculos que se fecham, processos que
naturalmente se completariam, etapas que se cumprem seguindo uma finalidade que
lhes seria inerente. A racionalidade que sustenta a idéia de ciclos não é, portanto,
clara. Ciclos de quê? De aprendizagem, de formação, de desenvolvimento? O que
faz girar o ciclo? Seria com base em um critério antropológico, como etapas
naturais do desenvolvimento humano que se cumprem? Ou seria um critério
psicológico de desenvolvimento, de disposições etárias para a aprendizagem? Ou
seria um princípio ético?
Na complexidade de resposta para essas questões, temos variadas teses que sustentam
os critérios para o ciclo escolar se movimentar, para além das seqüências com durações anuais
conforme foram/são estabelecidas na organização seriada. Essa lógica que desempenhava e,
62
em muitos contextos escolares, ainda desempenha o critério classificatório da avaliação
formativa com utilizam “técnicas e procedimentos paupáveis de avaliação com provas e
trabalhos que conduzem a uma nota (...) e, juízos de valor” (Freitas, 2004, p.20). Desse modo,
com a racionalidade operativa de assegurar o domínio do saber transmitido, consideram que o
espaço pedagógico compartilhado entre os alunos deve ser organizado pela proximidade dos
conhecimentos que essesadquiriram, ou seja, são organizados entre seus “iguais”. Quando
se fala, pois, nos ciclos escolares, novos critérios sustentam a lógica dessa organização.
Tomando as questões em seus contornos mais variados encontramos em Miranda (2005,
p.648) algumas propostas resumidas:
Perrenoud (2004, p. 35) propõe uma “definição mínima”: “Um ciclo de
aprendizagem é um ciclo de estudos no qual não mais reprovação”. Andréa
Krug (2002, p. 17), referindo-se à reforma da Secretaria Municipal de Educação de
Porto Alegre, lembra que os “ciclos de formação” são organizados segundo as
“fases de formação: infância (6 a 8 anos); pré-adolescência (9 a 11 anos) e
adolescência (12 a 14 anos)”. (...) Também Elvira Souza Lima, fundamentada em
Vigotsky e Wallon, retoma a proposta deste último, lembrando que o princípio
organizativo dos ciclos orientava-se: pelas características do desenvolvimento
humano, respeitando cada período de formação sem antecipar formas de atividade e
aquisições e sem forçar o educando a trabalhar com o conhecimento de formas
inadequadas, ou por serem precoces (...) ou por terem sido ultrapassadas no
processo de desenvolvimento do aluno (...). Lima, (2002, p. 13) Miguel Arroyo
(1999, p. 158), em uma visão menos ancorada na psicologia, também situa sua
noção de ciclos nas “temporalidades do desenvolvimento humano”, na
“especificidade de seus tempos ciclos”: “As idades da vida, da formação humana
passam a ser o eixo estruturante do pensar, planejar, intervir e fazer educativos, da
organização das atividades, dos conhecimentos, dos valores, dos tempos e
espaços”. (...) Mais cauteloso, Luiz Carlos de Freitas (2003) afirma “não rejeitar”
essa concepção de ciclo com base nas “fases de desenvolvimento das crianças” mas
busca expandi-la, “adicionando um outro modo de conceber a dinâmica da
formação do aluno e que contrarie tanto a lógica da exclusão como da submissão”
(p. 55). Fundamentando-se no pedagogo russo Pistrak (autor também muito citado
por Krug, 2002), Freitas lembra que, para além do lado psicológico do
desenvolvimento, há também “o lado social da formação”.
Boa parte dos argumentos acima revela a intenção de se contrapor à organização
tradicional da escola em séries anuais, fortemente baseada na seletividade e na avaliação
como processo classificatório. Na contramão dessa lógica, a escola em ciclos apresenta-se
com o grande desafio de “(...) regularizar o fluxo dos alunos ao longo da escolarização, a fim
de assegurar que todos possam cumprir os anos de estudo previstos para o ensino obrigatório,
sem interrupções e retenções que inviabilizem a aprendizagem efetiva e uma educação de
qualidade” (Barreto e Sousa, 2004, p. 33). Nesse sentido, eles têm a ver com o propósito de:
(...) superar a fragmentação artificial do processo de aprendizagem ocasionada pela
seriação, a qual tem levado a rupturas na trajetória escolar, uma vez que dá margem
a reprovações anuais. Mas vão além, pois demandam mudanças na concepção de
63
conhecimento e de aprendizagem, na ocupação do espaço e do tempo escolar, bem
como na própria função da educação escolar, vindo a constituir um caminho
potencial para a democratização do ensino. (Barreto e Sousa, 2004, p. 660).
Assim, os ciclos passaram a ser uma estratégia de assegurar a escolaridade, “associados a
propostas de promoção automática, avanços progressivos, progressão continuada” (Barreto e
Sousa, 2004, p. 33). Por isso, faz-se necessário reforçar que a proposta de ciclos se insere
numa concepção progressista de educação, para além das meras modificações realizadas no
âmbito da avaliação escolar, como muitas outras concepções pedagógicas propõem. Portanto,
“a noção de ciclo tem que ser construída simultaneamente na contramão destas duas funções
escolares: exclusão e subordinação” (Freitas, 2004, p.20).
2.3.3 Ciclos: novas dimensões do tempo-espaço escolar
O Tempo é um ótimo professor. Pena que mata seus alunos.
Hector Berlioz
A tentativa de modificar as dimensões do tempo-espaco na escola passa pela reflexão
da organização da escola tradicional, fruto da modernidade, que tem como figura
preponderante à imagem da linearidade. Esta imagem permitiu a escola estabelecer:
(...) um espaço e um tempo de passagem, uma trajetória dividida em anos ou séries,
onde o conteúdo curricular de um ano é pré-requisito para o outro, onde os
conhecimentos são fragmentados em disciplinas, onde o aprender é acumular, onde
o grupo, para realizar um percurso coletivo, precisa ser homogêneo. (Barbosa,
2004, p.66)
Neste sentido, a questão das mudanças possíveis nos tempos e espaços escolares tem
a ver, portanto, com as finalidades educacionais que são atribuídas a tais tempos e espaços”.
(Freitas, 2004, p. 4 ), por isso, “os ciclos propõem alterar os tempos e os espaços da escola de
maneira mais global, procurando ter uma visão crítica das finalidades educacionais da
escola”. (Freitas, 2004, p. 11). Ainda sobre esse aspecto, Freitas (2004, p. 11) destaca que os
ciclos propõem que:
(...) os tempos e espaços da escola sejam colocados a serviço de novas relações de
poder entre o estudante e o professor, com a tarefa de formar para a vida,na
atualidade, propiciando o desenvolvimento de novas relações entre as pessoas e
entre as pessoas e as coisas. (Freitas, 2004, p. 67).
64
Barbosa (2004, p.65), ao interpretar as idéias formuladas por Melluci (1996) acerca da
compreensão da temporalidade, nos apresenta três teses que constituem uma compilação na
abordagem do tempo cíclico, do tempo linear e do tempo que comporta os dois anteriores,
mas com propósitos diferenciados. Em suas palavras:
(...) A alquimia, como um sistema simbólico, sempre pregou a idéia de que a
natureza é cíclica, e em sua visão quadripartite apresenta: os quatro elementos, as
quatro estações, os quatro momentos do dia e, conseqüentemente, as quatro idades
do homem (infância, juventude, maturidade e velhice) estabelecendo a união do
homem, da natureza e do cosmos. Também nas culturas orientais é comum a idéia
da reencarnação ou do retorno repetido, o grande círculo é considerado como
propriedade da vida e caracteriza essa visão. A segunda imagem foi constituída
pelo cristianismo que mantém alguns aspectos do cíclico, mas introduz o linear:
da gênese ao fim do mundo, passando pelo pecado e pela salvação. Para esse autor,
a modernidade - ocidental e cnica - tomou essa idéia de linearidade e, laicizando-
a, transformou-a no ideal do progresso. Uma das características mais comuns na
cultura ocidental é pensar a mudança como uma transição suave, cumulativa,
constante e uniforme. (...) a terceira deriva da primeira, mas não a repete. A
imagem cíclica não deverá ser a circular, mas aquela representada por um
espiral. A espiral contém em si um circulo, o ponto e a linha e, em um único
movimento, sai e torna a si mesma, porém em um plano diferente. Havendo sempre
uma transformação. È o fluir e o manter-se. O modo de como pensamos a
temporalidade do humano produz em nós formas de perceber o mundo e de fazer
opções políticas e pedagógicas.
Por se tratar de um dos temas centrais para a organização da escola em ciclos, a
temporalidade exerce diretamente uma influência na prática educativa. Nessa perspectiva,
Barbosa (2004, p.66) destaca que as propostas de organização da escola por meio de ciclos,
“na imagem espiral, podem ser vistas como a ruptura com um tipo de linearidade e como uma
tentativa - com muita necessidade de aperfeiçoamento - de utilizar um novo paradigma de
temporalidade para a organização do currículo e da aprendizagem, isto é, da vida escolar”. O
ciclo “(...) é um tempo contínuo que se identifica com o tempo de formação do próprio
desenvolvimento humano: infância, puberdade e adolescência” (Dalben, 2000, p. 92 apud
Freitas, 2004.p. 12).
Um outro enfoque fundamental que a proposta de ciclos privilegia para a
transformação da cultura escolar está no esforço de interpretar o espaço educacional como
“um local em interface com a realidade do entorno da escola e regido por princípios
democráticos”(Freitas, 2004. p. 15). Esta visão que busca desconstruir a idéia de que na
escola habitam indivíduos, com o “domínio da verdade” prontos para “moldar” os sujeitos
com valores e conhecimentos que a sociedade exige, nos permite reconhecer transformações
essenciais no espaço escolar que se manifestam simultaneamente na formação dos sujeitos.
Nesta perspectiva:
65
(...) a escola deve ser um espaço de divulgação do que é produzido pela
comunidade escolar. Este espaço democrático, criativo, de organização do
pensamento, de debates e luta, constitui-se num instrumento de formação da
cidadania. (Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre,1995, p. 34 apud,
Freitas, 2004. p. 15).
Converter o espaço escolar num projeto de participação, reflexão, diálogo, e
transformar as relações de poder para se estabelecer um novo espaço político-pedagógico na
escola, significa, mais uma vez, transformar a nossa cultura escolar. Dito de outra maneira,
uma reafirmação de um espaço escolar democrático, que não se coloca como arbitrário e
dominador da verdade, deve introduzir uma outra lógica para a escola. Podemos considerar,
como efeito desta reflexão, que a lógica dos ciclos:
(...) avança na qualificação do espaço escolar como espaço de vida, como espaço de
conhecimentos e valores, como espaço no qual a vida transita em sua complexidade
e intereza, como espaço no qual cada aluno e aluna, com razão e emoção, possa
conhecer e operar com a música, com as ciências, com as artes cênicas, com a
matemática, com a literatura... Onde cada um e todos em relação possam
humanizar-se e singularizar-se, entendendo o mundo e entendendo-se no mundo.
(Moll, 2004, p.105).
Enfim, os tempos e espaços da escola são, portanto, “contraditórios e tensos como
tensa e contraditória é a própria sociedade que a cerca”. (Freitas, 2004, p.25), mas, a
mobilização diferenciada que a proposta dos ciclos nos apresenta pode romper com a
programação linear, o horário fragmentado que estimulam “categorias de fortes implicações
para os sujeitos: adiantamento, atraso, êxito ou fracasso escolar, normalidade e anormalidade,
criando uma rede de conceitos que governam a escolarização e as mentalidades daqueles que
dela participam”. (Sacristán, 2001, p.88).
2.3.4 Ciclos, uma conquista? Algumas trajetórias da educação brasileira em sua luta
pela democratização
Diferente de outras reformas ocorridas na história educacional, os ciclos, desde a sua
origem, se apresentam como forte elemento perturbador da organização escolar tradicional,
sendo impossível abordá-los sem tecermos um amplo movimento de debates sobre as
determinações políticas, econômicas, sociais e pedagógicas que afetam a educação, na sua
forma escolarizada. Por isso, inserir-se no debate sobre a concepção dos ciclos não consiste
numa mera participação na discussão teórica, mas, requer entendê-los e interpretá-los como
um reclame histórico dos profissionais da educação, na busca de projetos, cujos fins fossem
66
adequados às reais necessidades da escola pública brasileira, vinculados a idéias e paradigmas
preconizadores de mudanças sociais.
No Brasil, muito embora os ciclos já estejam sendo enfaticamente discutidos sob
alguns aspectos que caracterizam a realidade atual da escola e da sociedade, não como
negarmos o processo atribuído a várias reformas estabelecidas e ensaiadas ao longo dos anos
sobre essa temática. Nesse sentido, consideramos fundamental abordar, ainda que
resumidamente, alguns períodos marcantes para a educação pública brasileira, que embora
permeadas de limitações e fragilidades em suas propostas e contextos, reuniram muitas
contribuições aos debates sobre a democratização escolar.
Entendemos que esse resgate nos possibilitará problematizar algumas questões, para
que possamos compreender um pouco melhor as tensões e contradições suscitadas hoje, pela
implantação dos ciclos em vários contextos escolares, que o sustenta sob as mais diferentes
denominações, tais como “básico, de alfabetização, de aprendizagem, de progressão
continuada, de formação” (Barreto, 2005, p. 664), entre outras.
Sendo assim, destacamos que embora tenhamos um arcabouço histórico que nos
aponta algumas propostas que se confundem ou até mesmo tiveram a nomenclatura “ciclos”, a
reforma educacional vivenciada atualmente, que propõe a organização da escola em ciclos, se
diferencia na medida em que é sustentada pela ruptura da lógica seriada e do modelo
tradicional de ensino, fundamentado teoricamente o novo projeto pedagógico na agenda
nacional. Portanto, os ciclos propostos na contemporaneidade passaram a ser considerados
como alternativa à organização da escola básica a partir dos anos 1980. Antes, as demais
propostas representaram estratégias de urgência “para deter a acelerada expansão das
reprovações nesse nível de ensino” (Barreto e Mitrulis, 2001, p.104).
Além disso, entender em que base os ciclos se fundamentam no momento atual, com
muitas nuances que já os diferenciam da forma como foram propostos em épocas passadas,
lança novas provocações ao debate. Afinal, a escola pública foi originalmente “organizada
para atender um determinado tipo de aluno, geralmente aquele proveniente das classes média
e alta, e não conseguiu democratizar a aprendizagem assim que as classes populares passaram
a ter acesso a ela” (Jacomini, 2004, p. 404).
Ora, a preocupação, portanto, reside no fato de que a repetência e a evasão sinalizam a
prática de anulação do sujeito da cultura popular frente a uma organização escolar que opera
em sua “principal função a transmissão do conhecimento e a seleção anual dos bem-
sucedidos” (Jacomini, 2004, p. 404 - grifo nosso). Partindo desse mesmo ângulo de reflexão,
Fernandes (2005, p. 79) afirma que:
67
A escola organizada em ciclos, dada as mudanças que exige, torna-se mais do que
outras, uma escola em conflito, inquieta, uma vez que diversos aspectos são postos
em questionamento, a forma de avaliar, a maneira de entender o conhecimento, a
didática utilizada, a organização dos tempos e dos espaços
Sem considerar o conjunto de forças conservadoras que permeiam as relações sociais e
dificultam esse processo, a possibilidade de introduzir novas articulações à escola pública
passou a ser estimulada em função dos aberrantes indicadores de fracasso escolar, sobretudo,
de reprovação e evasão. Com esse direcionamento, podemos destacar que a discussão sobre a
promoção automática foi introduzida na década de 20, como forma de “ampliar o atendimento
escolar aos ingressantes e a proposta de promoção em massa” (Jacomini, 2004, p. 404).
Contudo, as literaturas de referência histórica dos ciclos apontam que essa discussão não teve
repercussão nas práticas escolares, uma vez que apenas definiram e orientaram a
democratização do acesso, sem serem capazes de operar mudanças nos elementos que
estruturavam as práticas cotidianas, mantendo praticamente inalteradas as taxas de matrícula,
evasão e repetência. No que tange a indicadores, compartilhamos da análise de Barreto e
Mitrulis (2001, p. 104):
(...) em meados do século, o Brasil apresentava os índices de retenção mais
elevados em relação a outros países da América Latina: 57,4% na passagem da
para a série do ensino fundamental. estudos realizados pela unesco mostravam, à
época, que 30% de reprovações acarretavam um acréscimo de 43% no orçamento
dos sistemas de ensino.
Assinalamos, ainda, que o caso especifico da crise educacional representava, para o
ideário conservador, prejuízos financeiros à economia e impedimento ao processo de
desenvolvimento do país, por isso, surgiam nesse cenário, algumas propostas cujo objetivo
era de redirecionar o projeto educacional/social, combinando interesses gerais nesse processo.
Algumas questões emanadas desse contexto salientavam a crise social, porém fazendo dela
apenas uma questão pedagógica, reduzindo, portanto, a discussão e a problematização dos
múltiplos condicionamentos do fracasso escolar. Em linhas gerais, tal discurso baseava-se no
seguinte:
A renda estaria mal distribuída porque uns tinham mais acesso à escola do que
outros. Repare em a inversão das coisas leitor: não seriam as diferenças de renda
que explicariam as diferenças de escolaridade. Para os defensores da política
econômica da ditadura (da submissão ao imperialismo ao arrocho salarial), as
diferenças de escolaridade é que determinavam as diferenças de rendimento entre
as pessoas. E não foi fácil desmascarar essa argumentação falsa. No período de
maior repressão policial de nossa história, a ditadura usou e abusou dos meios de
comunicação de massa, principalmente da televisão, para infundir nas massas essa
68
crença no papel milagroso da educação. Para o governo e seus argumentadores,
então, a distribuição da renda mais igualitária viria, automaticamente, com
resultado da mais ampla distribuição de oportunidades educacionais para todos.
(Cunha, 2002, pp. 54 -55).
Com base nesse claro e muito disseminado “ideário desenvolvimentista” (Barreto e
Mitrulis, 2001, p. 105), que buscava convencer os indivíduos de que a mudança social só seria
possível com a mudança educacional, afirmando, no entanto, ser suficiente promover medidas
que impedissem a repetência na pretensa condição de permitir a permanência do aluno nas
escolas públicas, foram instituídas “medidas que apontavam para a promoção automática”
(Barreto e Mitrulis, 2001, p. 105) e que sustentavam o discurso iniciado em décadas passadas.
Mas, dessa vez, com argumentos favoráveis à modificação de algumas concepções no ensino.
Por isso, registram-se, nesse momento histórico, discursos de educadores progressistas que,
visando à democratização do ensino, faziam o enfrentamento de concepções conservadoras
acerca da escola pública. Essas concepções responsabilizavam o educando pelo seu próprio
fracasso, afirmando sua incapacidade de adaptar-se ao sistema. Contudo, a forma como se
pretendia enfrentar esse conservadorismo reduzia-se apenas à estratégia de eliminar a
repetência. Na análise de Gomes (2005, p. 13), “a questão fundamental não é reprovar ou
deixar de reprovar, porém melhorar as condições de aprendizagem de todos, notadamente dos
menos favorecidos”.
Nesse sentido, ao tomarmos as questões educacionais concretas como ponto de partida
para a proposta da promoção automática, tensionando-a a partir de novas práticas de
promoção no processo de escolarização, é possível identificarmos o conjunto de relações que
se articula com interesses econômicos, porém, sem garantir novas práticas educacionais no
que se refere às concepções de currículo, de avaliação, de tempo-espaço, enfim, de aspectos
que se integram na escola tradicional - na escola seriada - para “cumprir a função reprodutora
da estratificação social” (Jacomini, 2004, p. 403).
Cunha (2002, p. 56) salienta sua crítica a essas práticas “desastrosas” que visavam à
erradicação da repetência e da evasão escolar, que se apresentavam com altos índices no
sistema educacional da época. Em suas palavras:
Ao invés de enfrentá-las pela diminuição do número de alunos por sala; do aumento
do número de dias de aula por ano; da qualificação dos professores; da melhoria do
material didático e de sua distribuição gratuita; da adaptação dos métodos didático-
pedagógicos às características socioculturais das crianças, os pedagogos da ditadura
lançaram mão do expediente paternalista, antidemocrático e antipedagógico da
promoção automática.
69
Cunha (2002, p. 56) afirma ainda que “a expansão da rede escolar, das oportunidades
físicas de escolarização, não corresponde na prática, a um aumento das oportunidades
pedagógicas de escolarização”. E, nesse contexto, diríamos que a tentativa de implantar os
ciclos corresponde, ainda hoje, a um processo alternativo de reflexão que busca conciliar uma
política de acesso a uma política de qualidade do ensino para a escola pública e, sobretudo,
para os alunos das classes populares, dado o entendimento de que a “segmentação da política
educacional, tem encaminhando a escola pública a deixar de ser o espaço de convivência e de
formação comum para a cidadania, para se converter na alternativa daqueles que não podem
pagar o ensino privado” (Di Pierro, 2001).
Esta incompatibilidade, no entanto, apesar do conteúdo progressista que tem
caracterizado a democratização da escola pública, reduz a questão política na educação e no
seu processo histórico de enfrentamento das desigualdades.
Quanto aos escritos legais relacionados a esse processo, nas análises de Barreto (2005)
podemos identificar leis que vigoraram na educação do nosso país, reconhecendo os ciclos,
embora sua organização se constituísse pelo regime seriado de ensino. Segundo a autora, a
primeira LDB da Educação Nacional, Lei 4.024/61, prescrevia a organização da educação,
iniciando-se pelo ensino primário (com duração de quatro anos) e, em seguida, o ensino
médio, dividido em dois ciclos, a saber, o ginasial de quatro séries anuais, e o colegial, de três.
“De acordo com o art. 104 desta lei, era permitida a organização de cursos ou escolas com
currículo, métodos e períodos escolares próprios com caráter experimental” (Jacomini, 2004,
p. 406), o que representou grandes mobilizações em alguns estados brasileiros, levando-os a
experimentar práticas diferenciadas, de acordo com as suas especificidades. Destacamos
assim:
O Rio de Janeiro, em 1967, organizou-se o ensino combinando faixa etária e nível
de escolaridade. No estado de São Paulo o ensino primário foi organizado em dois
níveis (1ª e 2ª; e séries) sendo adotada a progressão continuada entre as séries
de cada nível em 1968. Também em 1968, adotou-se em Pernambuco a
organização por níveis. O Sistema de Avanços Progressivos foi adotado em Santa
Catarina, abolindo a reprovação ao longo das quatro primeiras e das quatro últimas
séries, em 1970. Já havia sido adotada, neste estado, com base nos dispositivos
constitucionais de 1967, a obrigatoriedade de oito anos de escolaridade na rede
estadual de ensino (Plano Estadual de Educação de 1969). Também em 1970,
adotou-se o Sistema de Avanços Progressivos em Minas Gerais. (Barreto e
Mitrulis, 1999; Mainardes, 2001; Jacomini, 2002 apud Jacomini, 2004, p. 406)
Nesse processo, Barreto (2005) ainda nos indica que a Lei 5.692/71, mesmo não
substituindo a anterior, reformou o ensino, constituindo-o da seguinte forma: grau (com
70
duração de oito anos, ao abranger nesse grau o até então primário e o ginásio, primeiro ciclo
do antigo ensino médio) e o ensino de grau (com duração de três anos, substituindo o
colegial do antigo ensino médio). Segundo Jacomini (2004, p. 405), essa lei “manteve, de
acordo com o art. 14, parágrafo 4º, a possibilidade de os sistemas de ensino se organizarem de
forma não seriada, em caráter experimental”, o que deu margem a novas experiências acerca
da implantação dos ciclos:
Em 1978, foi implantada no Distrito Federal a proposta de Avanços progressivos, e
no estado do Rio de Janeiro adotou-se o Bloco Único em 1979. Na década de 1980,
foi adotado em alguns estados o Ciclo Básico de Alfabetização: São Paulo em
1984, Minas Gerais em 1985, Paraná e Goiás em 1988. Na década de 1990, ainda
antes da nova LDB, alguns municípios incorporaram os ciclos e a progressão
continuada, sendo que essas experiências se estenderam para os oito anos do ensino
fundamental: São Paulo (1992), Escola Plural em Belo Horizonte (1994) e a Escola
Cidadã em Porto Alegre (1995). (Jacomini 2002, apud Jacomini, 2004, p. 406)
Ao olharmos para esse processo, é possível percebermos que uma das questões
fundamentais para a implantação dos ciclos é a necessidade da clareza teórica sobre essa
maneira de organizar a escola, intimamente relacionada à ação cotidiana que define, a partir
da lógica que os ciclos propõem, práticas educativas comprometidas com a luta contra a
exclusão. Dessa forma, no período em que as escolas se encontram demarcadas pelo esforço
de movimentar-se de uma lógica à outra, torna-se fundamental:
(...) fazer uma clara distinção entre os programas de escolarização em ciclos e o
regime de progressão continuada. Essa distinção baseia-se no argumento de que a
escola em ciclos representa a versão progressista da política de escola, enquanto
que o regime de progressão continuada representa a versão conservadora.
(Mainardes, 2006, p. 13).
Freitas (2003, p. 72) reitera essa leitura, afirmando que “a progressão continuada é
herdeira da concepção conservadora-liberal, e os ciclos de formação estão mais ligados às
propostas transformadoras e progressistas”. Segundo o autor, embora exista uma
aproximação da proposta de ciclos e a proposta de progressão continuada, alguns aspectos
devem ser considerados, para que se notem suas diferenças:
(...) trata-se da diferenciação entre a estratégia de “organizar a escola por ciclos de
formação que se baseiem em experiências socialmente significativas para a idade
do aluno” e de “agrupar séries com o propósito de garantir a progressão continuada
do aluno”. A primeira exige uma proposta global de redefinição de tempo e de
espaço, enquanto a segunda é instrumental - destina-se a viabilizar o fluxo de
alunos e tentar melhorar sua aprendizagem com medidas de apoio (reforço,
recuperação, etc.) (Freitas, 2003, p. 9).
71
Tendo em vista essa compreensão, os ciclos não podem ser entendidos como algo
pronto, acabado, encerrado em si mesmo, como se não houvesse nenhuma relação ou conexão
com a história e com os homens que a produzem. Já que sua proposta é um convite à mudança
cultural, portanto, social e histórica, é prudente que ele seja produzido, construído,
selecionado, recriado e socializado através da escola e das relações que nela se estabelecem.
No entanto, a lógica de organizar a escola em ciclos, por sua importância e sua necessidade,
não pode ser interpretada apenas como imposição, mas, é preciso que o encaremos como uma
conquista, que vem contribuindo para o aumento do contingente da população no processo
educativo escolar. É bem verdade também, que esse entendimento não pode minimizar a
responsabilidade dos órgãos centrais em dinamizar essa política para além dos gabinetes e
consultorias que implantam verticalmente essa proposta, sem a socialização de todos os
sujeitos que participam do processo educativo.
Reconhecendo as múltiplas causas dessas aproximações, associadas ao aspecto da
democratização educacional, a forma de definir o resultado da ação política dos ciclos ocorre
a partir da apreensão do conjunto de relações que estabelece na base educacional, sustentados
no processo de sua implantação e no compromisso com a democratização da escola,
efetivamente pautada no acesso de todos aos saberes universais, numa intensa e constante
busca de uma educação reflexiva e humanizadora.
2.3.5 Desvelando diferentes experiências no processo de implantação dos ciclos no Brasil
Em numerosas experiências, pode-se reconhecer que a implantação dos ciclos no
Brasil não se estende de forma homogênea, mas é norteada mediante operações realizadas em
função da construção de novos procedimentos na ação escolar, de acordo com a
especificidade e necessidade de cada instância que o implementa.
Por meio da atual legislação, que norteia a educação brasileira, existe espaço para
expressão de diferentes expectativas e interesses na construção desse processo, uma vez que a
LDB 9394/96 orienta, no Art 23, que:
A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais,
ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, com base na
idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização,
sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar (Saviani ,
2004, p.170).
72
Dessa forma, como descrito na lei, pode-se dizer que se delinearam diferentes
contextos educacionais, sendo uns expressos pela lógica seriada; outros experimentando os
ciclos com base em experiências de diferentes locais; alguns encaminhando novas
perspectivas políticas para os ciclos e também aqueles que operam através da lógica seriada e
“ciclada” ao mesmo tempo. Essas idéias suscitam reflexões sobre dois aspectos, que devem
ser destacados nessa discussão: em primeiro lugar, a fundamentação político-pedagógica dos
ciclos, comprometidos com a lógica de uma “educação humanizadora” (Freire), que só poderá
ser afirmada através da relação que se estabelece entre sua base teórica e sua práxis cotidiana;
em segundo lugar, a estratégia que introduz a mobilidade pelos ciclos sem reduzi-los à
implantação oficial que se manifesta nas reformas, mas, sobretudo, compreendê-lo como
movimento de “democratização do ensino que instigam a reflexão acerca das dimensões
sociopolíticas da escola” (Giusta, 1999, p. 20).
Dessa maneira, tal reflexão remete a uma demanda urgente que precisa desenvolver
uma análise crítica a respeito desse novo modelo de escola que se espera com os ciclos, e as
bases que se têm materializado na estratégia de implantação de cada experiência, conciliando
os confrontos, contradições e transformação da escola, ou pelo contrário, em sentido restrito,
manter permanente correlação com a lógica seriada.
Por se tratar de uma opção, conforme dispõe a LDB, pode-se destacar que “embora
tenha havido um incremento expressivo das redes de ensino com os ciclos nos anos 1990 e a
sua introdução tenha sido valorizada no plano do discurso pedagógico e da gestão escolar,
essa forma de organização da escola ainda constitui-se minoritária no país” (Barreto, 2005,
p.665). Com efeito, Barreto (2005, p.668) assinala que:
As escolas com ciclos, estaduais ou municipais, particularmente na região sudeste,
tendem a se concentrar nas regiões metropolitanas, as mais populosas, e exatamente
onde se encontram os extremos de pobreza e riqueza. Esse é o caso da Grande São
Paulo, uma das maiores concentrações da Região Metropolitana de Belo Horizonte,
no Estado de Minas Gerais.
É preciso considerar, o obstante a formulação em a nível teórico, que “nos anos
1990, o discurso da política foi recontextualizado de diferentes maneiras, construindo uma
versão aparentemente progressista e outra conservadora” (Mainardes, 2006, p.13), tendo
repercussões singulares em cada rede de ensino que participa desse processo. Por assim dizer,
buscamos conhecer algumas experiências que implantaram os ciclos, de modo que
pudéssemos situar, em nossas reflexões e análises sobre o assunto, a expressão de cada
realidade que ousou modificar suas práticas e concepções pedagógicas. Dentre elas,
73
consideramos a experiência de Porto Alegre e São Paulo. Contudo, é importante destacar que
nossa intenção não é de analisar detidamente o cotidiano dessas experiências, mas, investigar,
sobretudo, como se deu o processo de implantação dos ciclos/progressão continuada nesses
locais, visto que a pesquisa se intensificará no próximo capítulo na análise do processo de
reconstrução da proposta de ciclos no município de Niterói.
A experiência de Porto Alegre
Ao buscarmos indicações teóricas em experiências expressivas dos ciclos no Brasil,
constatamos que as pesquisas sobre os ciclos, realizadas em Porto Alegre, desempenham uma
função primordial para o debate, ao assumir, por meio de suas práticas cotidianas articuladas
ao movimento político do município, o fortalecimento democrático. Como um dos principais
resultados dessa atuação, Porto Alegre tem acentuado nos últimos anos o lugar nas análises
realizadas sobre a discussão dos ciclos. Assim, na busca por conhecer a lógica político-
pedagógica determinante para a adoção dos ciclos, recorrermos a Krug (2002, p.86), quando
afirma:
Em 1989, a Administração Popular passa a governar o município de Porto Alegre.
Uma coligação partidária que se auto define identificada com forças políticas
comprometidas com a necessidade de transformação das condições sociais e
econômicas excludentes impostas pelo capitalismo à maioria da população.
Conforme lemos em Krug (2002), a Administração Popular, representada pelo Partido
dos Trabalhadores (PT), introduz novos interesses na agenda política desse município por
meio de suas concepções adequadas à prática democrática dos trabalhadores. Considerando
que o processo de administração gerido pelo PT contemplou períodos contínuos de gestão.
Assim, permitindo-lhe dar conta do reordenamento da escola pública. Assim, em busca de
alternativas que assegurassem transformação, algumas discussões foram sendo realizadas.
No período de (1989-1992), a Rede Municipal de Porto Alegre procurou promover a
discussão sobre o construtivismo nas escolas, em vista de uma reinvenção coletiva e cotidiana
no seu espaço-tempo. Esta nova dimensão que a Rede Municipal de Porto Alegre assume nas
práticas educativas sofreu uma série de processos, cuja transformação se evidenciou no slogan
“Coragem de mudar em educação”, propagado pela Secretaria de Educação desse município.
Segundo Titton (2004, p.16): “à época, a ênfase na alfabetização e suas implicações
revolucionou os costumes, provocando rupturas não conceituais, mas também nas
dinâmicas institucionais da escola e da própria Secretaria de Educação”. Desse modo, um
74
movimento de mudanças se articulava no processo ensino-aprendizagem com ênfase, “não de
como se deve ensinar e sim como de fato se aprende” (Ibdem).
Outra grande mudança no município de Porto Alegre ocorreu na segunda gestão da
Administração Popular (1993-1996), cuja ampla dimensão das políticas públicas da cidade
originou o projeto Escola Cidadã. Nas análises de Krug (2002), é possível observarmos que
esse projeto visava a desprivatização da instituição escolar, estabelecendo novas formas de se
relacionar com o Estado. Portanto, nesse processo, algumas medidas foram contempladas, tais
como a reestruturação da secretaria municipal de educação (essa deveria articular a dinâmica
dos trabalhos das instituições e das políticas regionais da cidade); a eleição de diretores; a
criação de Conselhos Escolares e a realização do Congresso Constituinte Escolar.
Esse projeto, teve continuidade com a dinâmica de democratização da escola na gestão
posterior (1997-2000), envolvendo diversas práticas de modificação da escola tradicional,
com debates sobre novas concepções de escola e novos processos necessários a uma prática
pedagógica transformadora. Norteado pelos princípios da Gestão democrática, da
convivência, do currículo, do conhecimento e da avaliação, o projeto “Escola Cidadã”
expressou medidas significativas para a formação da identidade escolar e social desse
município, e provocou também conquistas e entraves que continuam em constantes
discussões.
De acordo com Pooli e Costa (2004), esses princípios foram votados no Congresso
Constituinte escolar, envolvendo a participação da comunidade da escola (pais, alunos,
professores e funcionários). Essa foi a fase em que a organização do ensino fundamental em
ciclos de Formação começa a ser implantada na Rede Municipal, pois se entendia a
necessidade de uma nova forma de organizar a escola, de modo que se, pudesse exercer
princípios selecionados para a educação municipal de Porto Alegre.
A experiência de São Paulo
Paralelamente aos movimentos dos fatos ocorridos na Rede municipal de educação em
Porto Alegre, São Paulo também assumiu posições face às ações propostas à educação
organizada em ciclos. Aqui, elas poderão potencializar a discussão, trazendo ao centro do
debate a mesma dinâmica de análise, cujo foco se restringe ao encaminhamento de
implantação dos ciclos em múltiplos direcionamentos que lhes são específicos. Cabe destacar,
ainda, que a análise acima se limitou ao âmbito municipal, contudo, entende-se necessário
75
nesse momento abranger não só o município de São Paulo, mas, também alguns períodos da
rede estadual, visto que possibilitarão nossa compreensão.
Assinala-se, portanto, que São Paulo vivenciou três momentos primordiais,
procurando romper e ultrapassar as formas tradicionais de escola, por meio de novas
concepções e encaminhamentos educacionais orientados e definidos pelos ciclos. Em pauta,
destacam-se o período de implantação do Ciclo Básico de Alfabetização em 1983/84, a
adoção dos ciclos e da progressão, em 1992, e a instituição do regime de progressão
continuada, em 1998. Vale ressaltar que dentre os períodos pontuados acima, dois
representaram uma reforma no âmbito estadual (Ciclo Básico de Alfabetização e o regime de
progressão continuada); e um representou a reforma no âmbito municipal (Adoção dos ciclos
e da progressão). Contudo, o último momento tem sido considerado um retrocesso, sobretudo
para a rede municipal, que já encaminhava anteriormente o sistema de ciclos.
Ao tentar discorrer sobre esses períodos, vemos que o Ciclo Básico de Alfabetização
foi caracterizado em “um projeto político que se propôs alterar as relações excludentes do
Ensino Fundamental, marcado pela reprovação escolar” (Duran, Alves e Filho, 2005, p.84).
Neste sentido, os desafios lançados à escola são diversos, principalmente no que se refere à
articulação da proposta com a prática cotidiana. Embora tenhamos a informação de avanços
e inovações significativas, a partir da lógica propagada acerca da implantação do Ciclo Básico
de Alfabetização, faz-se necessário assinalar, nessa análise, que a iniciativa se designou de
forma autoritária, e foi implementada descartando o debate sobre as necessidades do
cotidiano, sem um processo regular de acompanhamento, para assegurar minimamente uma
organização e um encaminhamento satisfatório da proposta. Nas análises realizadas por
Jacomini, (2004, p.411) entende-se que:
Como os professores não participaram do processo de discussão e elaboração da
proposta do CBA, não puderam iniciar uma reflexão e rever coletivamente suas
concepções sobre o ensino-aprendizagem, escolarização das classes populares e
democratização do ensino, antes de sua adaptação. Houve resistências e
dificuldades em compreender e aceitar as novas propostas de alfabetização
baseadas nos estudos de Emília Ferreiro e na concepção piagentiana de construção
do conhecimento.
Ao refletirmos sobre as reformas ocorridas e, em especial, sobre a reforma que propõe
os ciclos, percebemos que o adensamento dos ciclos, com as devidas atualizações propostas
no município de São Paulo, contemplou aspectos relevantes face ao compromisso
democrático, ao permitir a participação dos atores atuantes no cotidiano escolar, por meio do
processo iniciado no ano de 1992, “ao final do primeiro mandato do PT, e abrangeu todas as
76
escolas municipais” (Barreto e Sousa, 2004, p.39). No entanto, a introdução de novos
dispositivos democráticos, que começaram a ser inseridos nesse processo, pautou-se “nos
princípios de participação, descentralização e autonomia. Desses princípios derivaram-se
diretrizes educacionais”. (Barreto e Sousa, 2004, p.39). Para tanto, a tentativa de influir no
aprimoramento de suas metas buscaram introduzir ações num trabalho cotidiano de
participação de pais, alunos e professores, que puderam atuar nessas transformações. Em
estudo recente, Barreto e Sousa, (2004, p.39) destacam que:
(...) a criação de horários coletivos de trabalho na escola, estimulando-se, por
exemplo, os professores assumirem a jornada de trabalho integral (pela qual
recebem por 40 aulas semanais, sendo 25 com alunos, oito em horário coletivo, três
em tarefas individuais cumpridas na escola e quatro destinadas a atividades
individuais livres, fora da escola); a reorientação da ação supervisora, baseada em
um trabalho articulado entre as instâncias intermediárias do sistema e as escolas,
bem como no estimulo e apoio para o desenvolvimento de projetos pelas unidades
escolares, capazes de responder as suas demandas específicas .
Embora seja fácil a identificação de instrumentos democráticos nessa reforma,
entender o difícil enfrentamento prático para a operação dessa mobilização é uma questão
para além dos dispositivos legais e, portanto, articula-se à especificidade de relação entre
diferentes escolas. Por isso, Jacomini (2004, p.413) afirma que os professores no geral
sentiram-se à parte desse processo e entenderam a proposta como imposição da Secretaria de
Educação.
Na descontinuidade como característica básica em uma instância governamental, cuja
troca de administradores é constante, o ano de 1998 marcou o município de São Paulo por
decisões que violentaram as redes de ensino, ao serem mais uma vez orientadas a obedecer a
novas interferências que nesse momento implantavam a progressão continuada. Lemos em
Barreto e Sousa (2004, p.40) que:
Nesse período, por decreto da administração municipal, altera-se a organização dos
ciclos para acompanhar o agrupamento proposto na rede estadual paulista: eles
passam a ser dois anos apenas, de quatro anos cada, com possibilidade de
reprovação ao final de cada ciclo. Essa organização foi mantida na gestão 2001-
2004, em que o Partido dos trabalhadores retorna ao poder. A opção pelos ciclos de
quatro anos instaura porém a antiga divisão entre primário e ginásio, frustrando o
intento de melhor articulação do projeto educacional da escola completa de oito
anos. Além disso, não tem sido acompanhada de iniciativas e condições de trabalho
que resguardem e sustentem os fundamentos da reorganização do ensino.
As transformações ocorridas ao longo dos anos na Rede Municipal de Educação de
São Paulo, com a vigência de propostas que previam inovar a prática educativa, tendem a
enfrentar dificuldades cada vez maiores, sobretudo, em relação à desconsideração da
77
participação daqueles que atuam diretamente com a atividade político-pedagógica da escola.
O fato inegável emerge na modificação desta insistente dicotomia entre propostas e ações.
Desse modo, observa-se que a partir de diretrizes que direcionam mobilizações à
redemocratização do ensino, além da tentativa de universalizar e equalizar as oportunidades
educacionais, o sistema educacional brasileiro vivencia grandes desafios.
Contudo, Barreto e Mitrulis (2001, p.103) afirmam que:
Independentemente das tônicas de cada momento, o desafio essencial permaneceu,
e, sobre não ser novo, reafirma a urgência de passar da universalização das
oportunidades de acesso ao provimento de condições de permanência do aluno na
escola garantindo-lhe aprendizagem efetiva e educação de qualidade.
Enfim, estes são pontos que devem se tornar propulsores de uma reforma que parte do
ideal coletivo que, em última instância, converte-se à pensar a escola a partir de um olhar
crítico e criativo daqueles que a compõem, afinal, as práticas sociais são processos
desenvolvidos pelo homem e se constituem em formas elaboradas de pensamento que, ao se
transformarem em ação, criam novas realidades e possibilitam a construção de novos
caminhos educacionais.
2.4 Política de Ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói: quando tudo
começou...
Na seção anterior, tentamos explorar a abordagem conceitual dos ciclos, além de
tentarmos resgatar o processo histórico na construção do ideário de ciclos no Brasil.
Com base nessas orientações, foi possível compreendermos aspectos e dimensões que
justificam o movimento de algumas Redes educacionais diante de novos questionamentos que
estimularam a formulação de alternativas teóricas e políticas à educação brasileira. Assim,
este esboço inicial nos serve de ponto de partida para fundamentar as análises e construirmos
reflexões sobre a política de ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói. Por isso,
dedicamos esta seção a uma tentativa de síntese das principais formulações sobre a
organização escolar em ciclos até o inicio de 2005, quando iniciamos a nossa análise.
78
2.4.1 Compreendendo um pouco da história dessa Rede
Segundo alguns registros históricos (FME, Anuário 2006), organizados pela atual
gestão da FME (2005-2007), através da Assessoria de Estudos e Pesquisas Educacionais da
Superintendência de Desenvolvimento Pedagógico, que se debruça sobre a questão do
desenvolvimento da rede municipal de educação, tanto no que se refere aos seus dados
quantitativos, quanto aos processos que caracterizaram a educação de Niterói em seus
diferentes períodos históricos, podemos identificar que, de modo geral, Niterói participa da
elaboração de definições educacionais desde 1914, quando “a primeira escola pública de
Niterói foi criada no governo de Manoel Otávio de Souza Carneiro, no Morro do Atalaia”
(FME, Anuário 2006, p. 4). De acordo com tal restituição histórica, realizada pela FME,
muitos registros sobre a expansão da rede física de alguns períodos não puderam ser
identificados, mas, paralelamente, registram-se algumas realizações expressivas quanto à
expansão do ensino nesse município, a partir da validação nacional dos cursos de colégios
atuantes no município, a saber, Brazil, Salesiano e Bittencourt Silva.
Este documento, portanto, registra mobilizações em função da educação de Niterói,
desde 1914, seguido de três processos de institucionalização gerencial da educação municipal
da cidade: a criação de órgãos de gestão a partir de 1959; a criação da Secretaria Municipal de
Educação, em 1975; e, por último, a criação da Fundação Municipal de Educação de Niterói
(FME), em 1991.
Quanto aos dados quantitativos, indicadores das metas físicas, o Anuário da FME
(2006, p. 1) registra o seguinte:
No período de 1959 a 2006 foram criadas 107 Unidades Escolares em prédios
cedidos, alugados, próprios, improvisados, conveniados ou mesmo construídos
especificamente para atender a educação. Dessas 107 unidades, ao longo das
diferentes administrações municipais e três dos convênios assinados foram
encerrados, estando hoje, portanto, em funcionamento, 92 unidades escolares. (ver
anexo I)
O período de 1959 a 1972 marca uma fase expressiva na expansão da educação desse
município, com “a criação dos primeiros órgãos de acompanhamento e gestão da educação
pública municipal (o Grupo Coordenador de Educação e Cultura, a Divisão de Educação e
Cultura e o Departamento de Educação e Cultura)”, como registra o Anuário da FME (2006,
p. 5). Além disso, tal período representa o momento em que sobressai a iniciativa da criação
de várias unidades escolares.
79
Novo movimento surge a partir de 1975, com a criação da Secretaria Municipal de
Educação de Niterói (SME), pelo Decreto 2.194, de 17 de julho de 1975, sendo o primeiro
Secretário Municipal de Educação o professor Helter Barcellos. A partir daí, a SME
configurou-se como articuladora das demandas educacionais das escolas do município, no que
se refere ao dinamismo das relações políticas e econômicas. Persistia, contudo, o
distanciamento entre as políticas elaboradas e a escola que as executaria, o que não favorecia
a identificação, pelas políticas formuladas, das peculiaridades de cada unidade escolar, com
suas conseqüências para a alocação de recursos nas escolas.
É importante destacar que, apesar da expressiva tarefa exercida pela SME, todo e
qualquer processo referente à atividade financeira e político-pedagógica da escola demandava
um espaço político de negociação na SME, dificultando, de forma muito concreta, a
distribuição de recursos, em função de entraves burocráticos ou fisiológicos. Esta questão,
qual seja, o lugar da SME como integrante do governo municipal, passa por um processo de
discussão, em especial no tocante à legitimidade deste órgão para representar as demandas
administrativas, financeiras e pedagógicas das escolas, com a devida agilidade.
Assim, inicia-se um outro período no município de Niterói, a partir da criação em
1991, da Fundação Municipal de Educação (FME), que não veio para substituir a SME,
porém constituiu-se como uma instância governamental hegemônica no estabelecimento de
metas pedagógicas e na alocação de recursos financeiros, no âmbito da rede municipal de
educação. Sendo assim, cabe destacar que:
(...) um novo período histórico sempre traz conflitos, contradições e dúvidas. assim,
a ousadia da mudança para o aprimoramento e a modernização da ação educacional
fortaleceu a cidade de Niterói, a ponto de “começar o amanhã”, investindo nos
aparentemente simples fazeres do cotidiano. Após intensos debates ocorridos, com
o protagonismo de atores políticos, de profissionais da educação e de instituições da
sociedade civil, foi criada a Fundação Municipal de Educação de Niterói, com base
na lei 924/91 e no decreto 6.172/91, visando garantir o aperfeiçoamento da
gestão educacional e a autonomia necessária para a efetivação de atos
administrativos ágeis, especialmente no tocante aos processos relativos às unidades
municipais de educação. (Um breve olhar sobre os 15 anos da FME, 2007)
Segundo Sarmento (2005, p. 1369), algumas medidas de descentralização podem gerar
uma “simultânea crise: consolidação da escola de massas e deslocamento na esfera da
democratização para o universo da modernização”. Ao analisar o mesmo fenômeno, Martins
(2001, p. 28) contribui, afirmando que esgotado o modelo de intervenção estatal, as críticas à
sua eficiência e eficácia mesclaram-se à defesa de sua (re) organização, o que coloca, no
centro do debate, “a necessidade da descentralização administrativa, política e financeira”.
80
São muitos os desdobramentos que devem ser considerados nesse processo, além das
reflexões do ponto de vista de suas reformulações ideológicas, ajustadas conforme o interesse
de classe. A esse respeito, um dos documentos formulados pela FME aponta:
A revolução científico-pedagógica, que vivenciamos nas décadas de 80 e 90 do
século XX, lançou desafios e novas exigências para o terceiro milênio, indicando a
proposta de adesão aos ideais de igualdade e considerando a democracia como eixo
central do processo de transformação social. Neste contexto, os municípios, por
meio de suas políticas públicas na área social, como a educação, poderiam e
deveriam ser palco de experimentações de alcance universal. As novas relações
entre Estado e sociedade passaram a conferir cidadania a todos os sujeitos sociais,
entendidos como sujeitos de direitos, e a rejeitar as diferentes formas de dominação
e opressão, no plano econômico, político e cultural. Nessa perspectiva, coube aos
governos locais, no seu cotidiano, transformarem-se em “Escola de Cidadãos” (Um
breve olhar sobre os 15 anos da FME, 2007) (grifo nosso).
Assim, a FME participou desse processo de redemocratização, modificando suas
práticas que, neste momento, deveriam ser pensadas juntamente com os sujeitos das escolas,
já que a nova entidade se propunha a transformar as unidades escolares em Escolas de
Cidadãos. Algumas das mudanças iniciadas foram expressas por meio da reformulação do
processo de matrículas, da implantação do processo de eleição direta de diretores escolares, da
política de gestão escolar democrática e da criação dos Conselhos Escola-Comunidade.
É importante lembrar, desde já, que os processos de administração pública anteriores a
esse movimento de descentralização passam a ser discutidos e questionados. Uma das ações
descentralizadas que aqui podemos destacar se refere à efetivação das matrículas, que
aconteciam na Secretaria Municipal de Educação, e que, naquele movimento de mudanças,
passaram a ser realizadas nas próprias Unidades Escolares. A primeira Portaria de Matrículas,
que transferia para as escolas a competência de promover tal processo, foi editada em 1991,
logo após a criação da FME.
Os esforços dessas variáveis para o exercício político dos sujeitos participantes da
educação pública de Niterói indicavam a FME não apenas como um órgão gestor de
atividades burocráticas, mas, sobretudo, um ente que caminharia com as escolas, no que se
refere à gestão política-pedagógica, possibilitando, dessa forma, o encontro de duas instâncias
fundamentais para formação de cidadãos no município.
A nosso juízo, de acordo com o entendimento acima destacado, a grande questão é que
a Educação pública do município de Niterói caminhava para dinamizar o exercício
democrático entre os cidadãos ao fortalecer e estreitar as relações entre órgão central (FME) e
81
unidades escolares. Contudo, que relações essa Rede nos revela em sua história ao conduzir
concretamente suas ações?
A discussão em questão é muito ampla, impossível de ser sintetizada sem prejuízo
nesse estudo, cujo foco tem outra dimensão. Contudo, as propostas educacionais, de cunho
inovador ou não, atravessam uma complexificação da própria relação construída por essas
instâncias. Em vista disso, os compromissos firmados entre esses autores expressam, de um
lado, a construção de estratégias coletivas para a educação pública municipal, ou, por outro
lado, a luta reacionária e desconfiada que criam barreiras na configuração de mudanças.
Retornando aos pontos centrais que aqui abordamos, podemos dizer que sem dúvida a
institucionalização da FME foi um ganho para a educação municipal de Niterói, uma vez que
estreitou o olhar pedagógico da gestão central, possibilitando sua intervenção e busca de
estratégias que pudessem dirimir os problemas enfrentados na Rede. Sendo assim, uma das
primeiras ações registrada com a institucionalização da FME foi a promoção de reflexões
acerca da problemática que o município manifestava, face aos acentuados índices de evasão
escolar revelando desde então alguns cenários político-pedagógicos da Rede Municipal de
Educação.
2.4.2 Cenários político-pedagógicos da Rede Municipal de Educação de Niterói até a
implantação dos ciclos
Baseada na preocupação com o estabelecimento de uma gestão participativa, com a
redução dos altos índices de evasão e repetência, com a concretização de uma direção
democrática nas escolas e com reformas curriculares que acompanhassem as inovações
educacionais pretendidas, a FME, durante o período de 1991 a 1997, buscou medidas que
pudessem dar conta dessas questões mais emergenciais para a educação do município de
Niterói.
Esse período, marcado pela forte influência das idéias de Darcy Ribeiro e sob
orientação de um grupo oriundo da experiência estadual dos Centros Integrados de Educação
Pública (FME, Anuário 2006, p.5), representou várias mudanças pedagógicas para a educação
municipal, além das mudanças políticas e sistêmicas já destacadas anteriormente.
Tratava-se de um período cujo índice de reprovação estava em torno de 38,2% (de
1985 a 1990) e de evasão em torno de 20,68%, no mesmo período. Nesse contexto, foi criado
82
o documento dos Núcleos Integrados de Alfabetização (NIA)
19
, elaborado em 1991, visando
discutir o processo de alfabetização nas séries iniciais do ensino fundamental. O documento
apresentava fundamentos teóricos que pudessem auxiliar a prática pedagógica, principalmente
dos professores alfabetizadores. Na continuidade, em 1992, as reflexões pedagógicas se
expandiram para além das séries iniciais, por meio do Grupo de Trabalho de Currículo e
Avaliação, o qual proporcionou espaço para a participação dos professores. Estes, juntamente
com os representantes da FME, buscaram, nas reflexões proporcionadas, contribuir para as
reformas curriculares que a FME pretendia então encaminhar.
Em 1994, como materialização das reflexões realizadas com aproximadamente 158
professores, o Documento-Proposta de Currículo e Avaliação foi encaminhado, naquele
mesmo ano, às unidades escolares, sendo entregue um exemplar a cada professor e a cada
membro das equipes técnicas.
A Rede Municipal de Niterói vivenciava, nesse período, muitas inquietações,
principalmente em função da Portaria nº 530/94, que assim determinava:
(...) atendendo a proposta de AVALIAÇÃO CONTINUADA e considerando a
legislação de ensino emanada no Conselho de Educação do Estado do Rio de
Janeiro, resolve alterar a sistemática de avaliação do processo de ensino-
aprendizagem a partir de 1995, atingindo as Classes de Alfabetização e o
segmento (...) (FME, Boletim cem por cento, 2006)
20
.
Segundo a proposta da FME (2007, p.41), os alunos não podiam ser reprovados até a
série, de modo a “renovar as práticas da avaliação; utilizar a avaliação enquanto elemento
diagnóstico e a universalizar o atendimento, evitando a reprovação”. No entanto, essa
proposta foi interpretada pela Rede como sistema de promoção automática, gerando muitas
críticas, resistências, distorções e problemas, que repercutem ainda hoje.
Seguindo esse processo, em 1995 foi incorporada, a partir de um Parecer solicitado
pela FME acerca da já citada Portaria 530/94, a proposta de avaliação continuada para o
segmento, que repercutiu nas escolas também como um sistema de promoção automática, que
visava modificações nos índices de aprovação.
A Rede Municipal de Educação de Niterói, portanto, ao mesmo tempo em que
desejava transformar a realidade da educação deste município, limitou-se a reformulações
oficiais, distanciadas da prática pedagógica cotidiana das escolas. Como já afirmamos, a
avaliação continuada, que durante sua implantação foi interpretada como mecanismo para
19
Os participantes desses Núcleos eram profissionais das escolas e da equipe pedagógica da FME.
20
Boletim cem por cento. Assessoria de Estudos e Pesquisas Educacionais. Niterói, Out/2006, vol.1, n.1.
83
evitar a retenção do aluno, não garantiu modificações na organização da escola, promovendo
antes descontentamento dos profissionais que lidam cotidianamente com inúmeros problemas,
dentre eles a crescente massa de alunos que, ao término do segmento do Ensino
Fundamental, não estavam sequer alfabetizados.
Nesta situação, novas propostas começam a ser pensadas, sobretudo, em 1998, com
um novo presidente da FME que propunha novos desafios a serem enfrentados,
principalmente, pelos educadores que convivem com sucessivas interferências pedagógicas às
quais têm que responder, mesmo em meio a múltiplas demandas emergenciais, vivenciadas na
escola.
2.4.3 A implantação dos ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói (1999):
“Construindo a Escola do Nosso Tempo”
A proposta pedagógica “Construindo a Escola do Nosso Tempo” foi apresentada em
1999, sugerindo novos encaminhamentos para a ação pedagógica das escolas do município de
Niterói. Baseada na organização da escola pelo sistema de ciclos, a proposta apresentava, em
forma de documento, orientações e diretrizes que contemplavam uma nova concepção de
escola, colocando em xeque a prática escolar seriada anual e apostando na reinvenção das
escolas do município sob uma lógica ciclada.
Segundo estudos recentes (David, 2003; Fernandes, 2005), a Rede foi “comunicada” a
respeito da adoção de uma nova Proposta Pedagógica, no início do ano letivo de 1999, mesmo
havendo concluído o ano letivo de 1998, em séries anuais. Desenhava-se um esforço
temerário de romper com práticas escolares consideradas tradicionais e ineficazes, porém sem
construir a nova proposta no diálogo com os profissionais que a colocariam em prática. A esse
respeito, ressalta David (2003 p. 75):
(...) mesmo recebendo o título de “Proposta Pedagógica”, não deve ser literalmente
entendida como tal, que não foi dada a oportunidade e a possibilidade de opção
aos professores de adotarem ou não o que estava sendo “proposto”. Desse modo, o
documento ao qual estamos nos referindo, teve, na prática, não apenas a função de
“propor” uma nova reorganização escolar, mas instituiu a reorganização curricular
e uma nova estrutura organizacional para todas as escolas da rede municipal de
educação de Niterói.
Além disso, encontramos, na análise de Fernandes (2005, p. 75), outro elemento de
reflexão:
Os ciclos em Niterói foram elaborados como uma alternativa intermediária entre o
sistema tradicional de escolaridade (série/ aprovação/ reprovação) e o sistema
84
adotado anteriormente para a rede (seriação/ avaliação continuada/ promoção
automática).
Na escola, muitos começaram a se movimentar, reivindicando a volta da seriação
anual, se opondo à avaliação continuada e ao sistema de ciclos. Contudo, esse recuo, para a
FME, era visto como a possibilidade de voltar a lidar com altos e indesejáveis índices de
retenção e de evasão. Sendo assim, o sistema de ciclos escolares é legitimado pela edição de
duas Portarias: a Portaria SME/FME nº 003/98, de 03/11/98, e a Portaria SME/FME
320/98, de 10/12/98, com base na LDB 9394/96 e nos Parâmetros Curriculares Nacionais,
ficando definidos os ciclos como forma de organização da escola municipal de Niterói, de
uma vez e para todas as escolas da rede. A partir desse momento, o ensino fundamental
passou a ser composto por nove anos de escolaridade, da seguinte forma:
As antigas séries de alfabetização, primeira e segunda do ensino fundamental
compunham o primeiro ciclo de ensino, agora denominadas de 1º, e anos de
escolaridade. A terceira e a quarta série, agora e anos de escolaridade,
formavam o segundo ciclo. A quinta e sexta séries, então e anos de
escolaridade, formavam o terceiro ciclo. A sétima e oitava séries, agora e
anos, compunham o quarto ciclo (FME, 1999, p.26).
Quanto ao sistema de avaliação, esse foi concebido com base na proposta de avaliação
continuada, mas permitindo a retenção dos alunos na passagem de um ciclo para outro. Desta
forma, tais alunos retidos eram inseridos em turmas de reorientação da aprendizagem. Sobre
esse assunto, a proposta “Construindo a Escola do Nosso Tempo” nos esclarece da seguinte
forma:
Com o sistema de ciclos fazem-se necessárias alterações no atual sistema de
avaliação,como por exemplo, o fim da impossibilidade de retenção. Alteram-se
também os modelos de acompanhamento e procedimentos e mesmo a periodicidade
dos registros e da atribuição dos resultados, não se entendendo, aqui, registros com
o significado dado aos antigos relatórios (FME, 1999, p. 37).
Enfim, a nova proposta pedagógica almejava uma educação diferenciada através da
modificação de práticas escolares excludentes e pouco satisfatórias para a educação do
município de Niterói. Entretanto, ficou a marca de uma proposta que se estabeleceu sem
envolver um amplo diálogo nas unidades escolares, tornando os ciclos uma espécie de outorga
da FME às escolas da rede municipal. Na pesquisa realizada por David (2003, p.107), temos
na fala de uma das professoras entrevistadas que:
85
(...) foi mais uma proposta que veio de cima para baixo e quando se chegou a
convocar essas pessoas da escola (os supervisores e orientadores) era para dizer ‘a
gente vai mudar e vai ser assim, assim, assado... Alguma sugestão?Mas assim,
perguntavam se tinha alguma sugestão para ser politicamente correto, não para
dizer ‘ah, eu vou incorporar’ ou ‘isso vai estar sendo discutido nas escolas antes da
gente montar uma proposta’. Não! Chegou pronto e encadernado. Eu não me
sinto participante disso!
As transformações ocorridas ao longo desses anos na Rede Municipal de Educação de
Niterói, com a vigência da citada proposta, não foram mais expressivas do que as constantes
dificuldades, cada vez maiores, sobretudo, pela suposta desconsideração quanto à participação
dos sujeitos que atuam diretamente na atividade político-pedagógica da escola.
Embora se reconheça que os ciclos vêm contribuindo para o aumento do contingente
da população no processo educativo escolar, é fundamental problematizar esse acesso e
compreender até que ponto os alunos que participam desse processo m sido beneficiados
com sua efetiva qualidade e sua eficácia para emancipá-los, fortalecendo sua cidadania. Além
disso, compreender que possibilidades e estratégias são necessárias para encaminhar uma
proposta que, de fato, venha proporcionar êxito na escola é fundamental. No entender de
David (2003, p. 218):
(...) para existirem as mudanças efetivas na prática pedagógica não é suficiente
dizer e definir o que deverá ser mudado e como os professores devem agir e, muito
menos, cobrar-lhes que façam diferente do que sempre fizeram. Consideramos
necessário fazer junto com eles e, a partir das práticas já existentes, repensar
constantemente os objetivos e as ações possíveis. Concretamente, uma das opções
seria criar situações para que essas práticas sejam pensadas e repensadas e
oportunizar momentos de reflexão e trabalho coletivo.
2.4.4 O rumo da política de Ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói a partir
da nova gestão (2005)
Ao contrário de uma gestão conservadora e autoritária, se estabelecia naquele
momento o apreço e a busca por uma administração do sistema municipal de educação,
amparada por princípios democráticos, que abria espaço para o diálogo e a participação, de
modo a favorecer mudanças no funcionamento da rede de escolas municipais e garantir o
espaço público para o exercício da cidadania de seus profissionais. A FME fez questão de
destacar, logo no início o valor do trabalho democrático, considerando a defesa desse aspecto
para encaminhar sua gestão. Contudo, a Rede como um todo não estava adaptada às
86
exigências da ordem democrática, sendo necessário provocar mudanças não somente na
estrutura organizacional da escola, mas, sobretudo, na própria estrutura político-institucional
da FME.
No entanto, o foco norteador da gestão atual não se limitava a uma revisão de práticas
anteriores para correções, mas se estabelecia numa tentativa de ir além, reorganizando as
antigas questões e lançando novos desafios político, pedagógico, cultural, organizacional e,
sobretudo, nas relações coletivas para um trabalho em rede. Na concepção da FME, era
necessário naquele momento que as escolas se sentissem partìcipes do trabalho gerido no
órgão central, entendendo que dessa forma seria possível transformar o cotidiano escolar,
as práticas pedagógicas e o sentido da escola para os seus profissionais. Essas são as diretrizes
que alimentaram as ações da FME: “construir espaços permanentes de diálogo, de troca de
idéias e de participação, garantindo que todas as vozes se façam ouvir e que no convívio
saudável se construam os consensos necessários, respeitando-se o dissenso” (FME, 2005).
No contexto dessas orientações gerais sobre a mudança da prática educativa, inscreve-
se diretamente a necessidade de repensar a proposta pedagógica que organiza a escola no
sistema ciclado, de modo que produzam um ordenamento na Rede Educacional, numa lógica
mais democrática e dialógica capaz de levar os profissionais da educação a repensarem,
juntos, uma renovação na cultura escolar que atinja os objetivos de uma educação mais justa e
igualitária.
Passados praticamente seis anos desde a implantação da proposta “Construindo a
Escola do nosso tempo” em 1999, que organizaria a Rede municipal no sistema de ciclos, a
sensação que se tinha na rede era de que esse sistema, - os ciclos - foi se convertendo num
problema para a escola, para os profissionais que nela atuam e, sobretudo, para a efetiva
aprendizagem do aluno, devido ao distanciamento teórico-prático ocasionado entre a política
oficialmente implantada e a dinâmica pedagógica da escola.
A Rede nesse momento revelava a inconsistência de um perfil sistematicamente
organizado, mas, ao contrário, cada escola apontava aspectos particulares e práticas
“instituintes” para exercer sua função político-pedagógica. Como citamos anteriormente, a
Rede municipal de Educação de Niterói, em 1999, foi em sua totalidade inserida na proposta
do trabalho em ciclos, mas, suas relações, práticas e experiências estavam ainda firmadas
numa concepção seriada.
Nessa trajetória de insatisfação da Rede com a implantação dos ciclos, foi possível
reconhecer que indivíduos e coletivos foram tecendo questionamentos e desejando que o
órgão central, a FME, promovesse mudanças. As contradições, os conflitos, as dúvidas e
87
inseguranças suscitadas com a proposta de ciclos foram gradativamente se tornando claras,
convergindo para a necessidade de resgatar, ou melhor, de construir um projeto em comum
para a Rede, o qual fosse elaborado e desenvolvido por todos os sujeitos que a compõem. É
interessante observarmos na fala de alguns profissionais entrevistados nesta pesquisa, que
esse incômodo vivenciado na Rede instigou muitos profissionais a buscarem subsídio teórico
para compreender o trabalho com os ciclos. Por isso, assim como consideramos que o “nosso
aluno” constrói o conhecimento processualmente, os ciclos no município de Niterói se
movimentam, ou melhor, movimentaram a Rede para adquirir novos conhecimentos, uma
nova visão e perspectiva para a educação municipal. Nesse processo, que se movimentava
desde os incômodos e contradições, suscitava também novos desafios a serem encarados e
percorridos no sistema educacional. Por isso, é possível considerarmos que a Rede vivenciou
com os ciclos momentos de:
(...) tensão pelas equipes, além daquelas vividas pelos alunos e por seus
responsáveis, diante de uma rede que se propõe oficialmente em ciclos, mas que
acontece oficiosamente a partir de uma lógica ainda seriada. Tal incoerência cria e
amplia o fosso existente entre o instituído e o instituinte, provocando-nos a
trabalhar para diminuir tanto quanto possível à distância entre eles, mesmo sabendo
tratarem-se de traços comuns à cultura de toda e qualquer instituição. (FME,
Documento Preliminar, 2005, p.3)
Compreendemos que o sistema em ciclos situa contribuição ímpar ao campo
educacional municipal, mas ele não pode ser analisado, estritamente em seus conceitos
teóricos e políticos, pois o vigor e a validade da sua concepção estão fundados no rompimento
de práticas e princípios tradicionais da educação, a começar pela forma de se implantar uma
política.
Na busca de uma leitura atualizada e instigante da Rede Municipal de Educação de
Niterói, nos deparamos, nesta pesquisa, com um cenário repleto de desafios, os quais se
lançam com vitalidade e se apresentaram como tentativa de construir novos caminhos
pedagógicos capazes de atender as demandas especificas da prática educacional deste
município. Para tanto, as nossas discussões e diversas questões sobre a organização da escola
em ciclos expressam o nosso intento de aprofundar e ampliar a compreensão do processo
instalado nessa Rede Educacional, diretamente condicionado pelo período de 2005-2007,
dedicado ao investimento na “reconstrução” da proposta pedagógica em ciclos.
88
CAPÍTULO III
O PROCESSO DE RECONSTRUÇÃO DA PROPOSTA PEDAGÓGICA EM CICLOS
NA REDE MUNICIPAL DE EDUCACÃO DE NITERÓI:
COMPARTILHANDO ANÁLISES
Analisar um processo supõe flexibilizar caminhos. Os processos nunca se dão de
forma estática, nem linear, mas se revelam através de um movimento dinâmico permeado de
idas e vindas. Por isso, nesse capítulo nos propomos a compartilhar a experiência que
vivenciamos ao longo dos anos de 2006 e 2007 na Rede Municipal de Educação de Niterói,
onde buscamos apreender as dinâmicas e os caminhos percorridos pelos diferentes sujeitos
que compõem essa Rede Municipal, na tentativa de estabelecerem relações democráticas e
espaços de diálogo e participação na “Cidade Educadora”.
3.1 Sobre a arquitetura da pesquisa
Nossa pesquisa de campo fundamentou-se no todo qualitativo
21
e nas categorias da
dialética, “que buscou entender o fenômeno educativo em movimento dentro de uma
conjuntura” (Gadotti, 1991, p.11), além de tentarmos apreender suas contradições peculiares,
sua qualidade política e suas transformações. Como forma de norteador da nossa análise,
pautamo-nos nas seguintes “regras práticas”:
21
Conforme a abordagem de Demo (2005, pp.114,116), “a pesquisa qualitativa quer fazer jus a complexidade da
realidade, curvando-se diante dela. (...) em vez de apenas representar sinalizações lineares de realidades de forma
reduzida, busca atingir e reconstruir a arqueologia do fenômeno”.
89
1. Apreender o conjunto de conexões internas da coisa
22
, de seus aspectos; o
desenvolvimento e o movimento.
2. Apreender os aspectos e momentos contraditórios; a coisa como totalidade e
unidade dos contraditórios.
3. Analisar a luta, o conflito interno das contradições, o movimento, a tendência
(o que tende a ser e o que tende a cair no nada).
4. Não esquecer de que tudo está ligado a tudo; e que uma interação
insignificante, negligenciável porque não essencial em determinado momento,
pode tornar-se essencial num outro momento ou sob um outro aspecto.
5. Não esquecer de captar as transições; transições dos aspectos e contradições;
passagens de uns nos outros, transições no devir.
6. Não esquecer de que o processo de aprofundamento do conhecimento – que vai
do fenômeno à essência e da essência menos profunda a mais profunda é
infinito. Jamais estar satisfeito com o obtido.
7. Penetrar, portanto, mais fundo do que a simples coexistência observada;
penetrar sempre mais profundamente na riqueza do conteúdo; apreender
conexões e o movimento.
8. Em certas fases do próprio pensamento, este deverá se transformar, se superar:
modificar ou rejeitar sua forma, remanejar seu conteúdo retomar seus
momentos superados, revê-los, repeti-los, mas apenas aparentemente, com o
objetivo de aprofunda-los mediante um passo atrás rumo as suas etapas
anteriores e, por vezes, até mesmo rumo ao seu ponto de partida etc. (Gadotti,
2003, p.35).
Vale aqui ressaltarmos, que, apesar da nossa pesquisa de campo ter se intensificado
apenas a partir de junho de 2006, quando já tínhamos definido preliminarmente nosso foco e
nossas questões norteadoras – embora tenhamos tido o cuidado de rever e aprimorá-los a cada
redescoberta no campo de pesquisa –, a aproximação que estabelecemos na Fundação
Municipal de Educação durante o ano de 2005, portanto, antes de iniciarmos o curso de
mestrado
23
, teve grande relevância para a articulação de nossas análises acerca do processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos. Ainda na graduação, por intermédio de
atividades da disciplina de Estágio Supervisionado, desenvolvemos algumas reflexões sobre a
prática educativa da Rede Municipal de Educação de Niterói, através dos encontros de
“socialização de fazeres”
24
, que nos possibilitavam interação no diálogo e no debate que ali
se manifestavam.
Então, no ano de 2006, quando iniciamos formalmente o trabalho de campo, não
estávamos entrando em um espaço novo, embora iniciássemos naquele momento uma
pesquisa com novos olhares e novos questionamentos. Nesse sentido, buscamos dedicar parte
22
O autor refere-se ao fenômeno analisado.
23
Ingressamos no curso de mestrado no 1º semestre do ano de 2006.
24
Os encontros de “socialização de fazeres” reunia Orientadores e Supervisores das UEs para troca de
experiências através da apresentação do trabalho que desenvolviam no espaço escolar. Além disso, representava
um movimento de escuta a escola acerca de suas demandas.
90
do nosso tempo, participando e interagindo, sempre que possível, em espaços concebidos para
pensar coletivamente a proposta de ciclos em reconstrução pela FME e pelas Unidades
Escolares.
Logo, começamos a traçar algumas metas que pudessem sistematizar nossas análises.
Isso não significa que nos engessamos nos métodos, mas, mesmo flexibilizando o processo de
análise para apreendermos a complexidade do movimento, e refazendo-o a cada nova
compreensão que tínhamos desse processo, precisávamos de direção. Afinal, como nos
lembra Demo (2005, p.9), “refletir é também avaliar, e avaliar é também planejar, estabelecer
objetivos”.
Por isso, passamos a freqüentar reuniões, encontros, seminários, fóruns, entre outros
espaços abertos à discussão da proposta em reconstrução (ver anexo 2) e direcionar nosso olhar
através da observação participante
25
para os seguintes conceitos-chave: participação,
dialogicidade e coletividade.
Nesse movimento de busca de informações necessárias à pesquisa, conversávamos
informalmente com profissionais da FME, com profissionais da escola, tentando entender
como eles compreendiam e se posicionavam diante do processo de reconstrução da proposta.
A partir dessas interações, obtivemos algumas impressões e informações preliminares que nos
possibilitavam mais indagações e mais curiosidades em conhecer e entender o processo que
estava em pleno andamento. Eram espaços sempre muito intensos, e nos revelavam tanto as
potencialidades como as fragilidades do processo em vigor, impulsionando-nos a fazer
conexões de cada aspecto que o constituía. As pessoas, os documentos, as falas, a história, os
posicionamentos, enfim, não descartamos nada que pudesse nos revelar o fenômeno.
Ao prosseguirmos nesse percurso de interpretações do processo que também
estávamos experimentando, outro passo que demos, e que julgamos ter sido fundamental para
a pesquisa, foi a aproximação que tivemos com a escola. Precisávamos entender como os
diferentes sujeitos da Rede Municipal de Educação estavam se organizando para participar do
processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos, e isso seria possível
25
Segundo Ludke e André (1986, p.25), para que a observação se torne um instrumento válido e fidedigno de
investigação científica, precisa ser antes de tudo controlada e sistemática. Isso implica a existência de um
planejamento cuidadoso do trabalho e uma preparação rigorosa do observador. Consideram também que o
“observador como participante” é um papel em que a identidade do pesquisador e os objetivos do estudo são
revelados ao grupo pesquisado desde o início. Nessa posição, o pesquisador pode ter acesso a uma gama variada
de informações, amesmo confidenciais, pedindo a cooperação do grupo. Contudo, “terá em geral que aceitar o
controle do grupo sobre o que será ou não tornado público pela pesquisa” (p.29).
91
vivenciando esse processo a partir do cotidiano da escola. Olhar para esse processo a partir de
outro ângulo, sem dúvida, era muito importante.
Para tanto, nos aproximamos de quatro escolas, que aqui serão identificadas como
escolas A, B, C e D, de acordo com o seguinte critério: escolas A e B, que participaram como
escolas-pólo
26
da implementação de forma experimental em 2006 e puderam intervir, com
base nessa experiência, na reformulação da proposta para 2007; escolas C e D, que, por
opção, não participaram da implementação de forma experimental em 2006, mas vivenciaram
a experimentação, juntamente com todas as demais escolas de 1º e 2º ciclos
27
da Rede
Municipal em 2007. Além disso, a escolha dessas escolas levou em conta a facilidade do
acesso para o pesquisador e a disponibilidade demonstrada pelos seus profissionais para a
participação da pesquisa.
Mesmo assim, esse não foi um movimento fácil. Alguns profissionais mostraram-se
resistentes e desconfiados com a nossa presença na escola. Contudo, aos poucos nossa
integração com as escolas possibilitou algumas participações em reuniões, debates e
formações que conduziam à discussão sobre a proposta em reconstrução dentro do seu
espaço-tempo.
Embora não tenhamos descartado nada que se revelava no movimento, é necessário
aqui ressaltarmos que nossa intenção não foi de analisar o trabalho que a escola desenvolvia
com o sistema de ciclos, mesmo esse trabalho tendo sobressaído nessa relação que fomos
construindo pouco a pouco com a realidade escolar. Nosso foco de análise era entender como
ela estava se organizando (ou não), para participar desse processo instalado na Rede, pois, por
se tratar de um processo com tamanha riqueza de características e situações, delimitamos a
investigação optando por focalizar o estudo na questão da democratização do processo.
A etapa seguinte foi à realização de entrevistas (ver anexo 3) e gravações de reuniões
coletivas no nosso campo de pesquisa, que é a Rede Municipal de Educação de Niterói. A
entrevista, conforme Ludke e André (1986) nos orientam, apresenta uma vantagem sobre
outras técnicas, pois permite a capacitação imediata e corrente da informação desejada,
praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos. Assim, essa
técnica possibilitou a nossa percepção quanto à leitura dos sujeitos em relação ao processo
analisado.
26
“escolas-pólo”: expressão utilizada recorrentemente entre os profissionais da rede ao fazerem referência a
escolas que aderiram à proposta contida no Documento Preliminar (FME, 2005).
27
Lembramos que a Educação Infantil estava participando desse movimento, mas a nossa análise limitou-se ao
1º e 2º ciclo do Ensino Fundamental.
92
Inicialmente tínhamos a intenção de entrevistar mais de um sujeito na escola, mas, por
optarmos em analisar quatro escolas, ou seja, diferentes realidades, redirecionamos as
entrevistas para um profissional de cada escola pesquisada. Não estabelecemos critério de
escolha das pessoas que foram entrevistadas na escola, elas aconteceram aleatoriamente. Na
escola A, entrevistamos a diretora, e nas escolas B, C e D, entrevistamos as pedagogas. Na
FME, entrevistamos a diretora de Políticas Pedagógicas, a coordenadora de e ciclos e
também uma das coordenadoras da Equipe de Referência.
Nesse percurso de investigação, contamos também com os dados revelados em
documentos produzidos (ver anexo 4), tanto na escola como na FME, dentre os quais
destacamos: o Documento Preliminar (ver anexo 5), a proposta em construção “Escola de
cidadania”, relatórios das Equipes de Referência, relatórios dos Delegados, as contribuições
enviadas pelas escolas (ver anexo 7), o material produzido pela Consultoria em 2006, a Portaria
que institui a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania” e as Diretrizes Curriculares e
Didáticas que integram a proposta, publicadas em 2008 (ver anexo 10 e 11) , entre outros.
Vale ressaltar que é no contexto da Rede - FME e escolas - que percorremos todo
trajeto de nossa análise. Não foi nem na FME nem nas escolas como instâncias isoladas e
fragmentadas que buscávamos entender o processo, mas na relação que ambas estabeleciam.
Desse modo, essas técnicas nos ajudaram a compreender o processo; contudo, é importante
lembrar que organizamos todos os dados coletados durante a nossa pesquisa, articulando-os
em triangulação
28
e analisando os aspectos mais relevantes à luz das contribuições teóricas
que nos ajudaram a tecer nossas reflexões.
3.2 Apreensão do processo: origem, fundamento, mudanças organizacionais, etapas e
formas de realização
Na presente seção, apresentamos as informações obtidas durante o trabalho de campo
através das observações, dos documentos analisados e das entrevistas que realizamos. Os
dados aqui reunidos serão apresentados com caráter descritivo e analítico, que o nosso
objetivo consistiu em problematizar alguns aspectos revelados a partir da realidade estudada.
28
Pautamo-nos, ainda, na abordagem de Ludke e André (1986), que consideram a triangulação a checagem de
um dado obtido através de diferentes informantes, em situações variadas e em momentos diferentes.
93
3.2.1 A origem do processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos
Um processo começa, geralmente, com articulação de movimentos anteriores. Não se
trata de um fato pontual, mas, ao envolver sujeitos sócio-históricos, é motivado pela dinâmica
dialética de fazer e refazer, acertar e errar, construir e reconstruir, enfim, mantém grandes
relações com o que é causado, mantido e transformado historicamente. Por isso, ao
realizarmos uma pesquisa corremos sérios riscos de considerarmos uma realidade como dada,
se não nos propusermos analisar sua construção histórica.
É a partir dessa consideração que queremos iniciar nossa reflexão. Para nós, foi
consideravelmente relevante entender os movimentos vivenciados na Rede Municipal de
Educação de Niterói que deram origem ao processo instalado em 2005, cujo objetivo tem sido
reconstruir a proposta pedagógica em ciclos.
Por isso, ao investigarmos esses movimentos, fomos percebendo gradativamente o
quanto foram importantes para o processo atual. Nesse sentido, situamos em nossa reflexão
essas conexões, que nos estimulam a compreender o processo em sua totalidade, e não apenas
pelos fatos pontuais. Assim, mais do que falar levianamente sobre a proposta de ciclos
“Construindo a Escola do Nosso Tempo”, implantada em 1999, aqui nos propomos apontá-la
como parte desse processo atual, pois, mesmo com suas tensões e incoerências
29
, possibilitou
olhares amadurecidos sobre os ciclos entre os diferentes sujeitos da Rede, que, através de
críticas e denúncias, promoveram movimentos e deram origem ao processo atualmente
experimentado.
Dessa forma, é cabível considerarmos que em atendimento a um reclame da própria
Rede Municipal” (FME, 2005, p.2 - destaque nosso), instalava-se em 2005, na Rede
Municipal de Educação de Niterói, um processo que visava reconstruir coletivamente a
proposta pedagógica em ciclos. Corroborando essa proposição, temos registrado que “a
situação paradoxal que [a Rede vivenciava], diante do sistema de escolaridade em ciclos,
muito [vinha] sendo denunciada pelos sujeitos das escolas, à espera de encaminhamentos
reorganizativos do órgão central” (FME, 2005, p.2).
29
Sobre esse assunto temos como referência os trabalhos de: a) DAVID, Leila Nívea B. K. A experiência do
sistema de ciclos na rede municipal de educação de Niterói: da proposta oficial às práticas concretas. Niterói.
Dissertação. Universidade Federal Fluminense, UFF, 2003; b) FERNANDES, Cláudia de Oliveira; FRANCO,
Creso. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Departamento de Educação. A escolaridade em
ciclos: práticas que conformam a escola dentro de uma nova lógica - a transição para a escola do século XXI.
2003. 362 p.Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Educação,
2003.
94
Ao entendermos que a origem desse processo se deu a partir de algumas necessidades
que eram intensas na proposta de ciclos implantada em 1999, buscamos avançar, tentando
compreender que movimentos foram esses que permitiram revelar a situação da Rede
Municipal de Educação, quanto a essa proposta citada. Através da entrevista realizada com a
professora Glória Anselmo foi possível obter alguns esclarecimentos. A professora Glória
Anselmo atua na Rede Municipal de Educação de Niterói desde 2002, inicialmente como
supervisora da Escola Municipal Diógenes Ribeiro de Mendonça, passando pela coordenação
de e ciclos na FME em 2005 e 2006 e, em 2007, assumindo a Diretoria de Políticas
Pedagógicas
30
na FME. Em sua trajetória dinâmica nessa Rede, pontua que:
Quando entrei na Rede em 2002, encontrei um grupo de profissionais muito
inquietos e descontentes com a política de ciclos. Para começar, as pessoas não
sabiam direito o que eram ciclos, elas tinham uma leitura muito controvertida e
confundiam ciclos com construtivismo. Eu também não sabia o que eram ciclos.
Então, eu perguntei na escola de onde tinha surgido essa proposta e me
apresentaram a proposta “Construindo a Escola do nosso Tempo”, que tinha sido
implantada em 1999. Nessa mesma época, eu estava fazendo mestrado, e como uma
boa mestranda, comecei a pesquisar sobre o assunto e indagar a FME sempre que
era possível nas reuniões de Orientadores e Supervisores. Mas, nunca obtive uma
resposta que me satisfizesse. Nesse momento então, passei a engrossar a fileira
das pessoas que questionavam a FME por ter adotado uma forma de organização
da qual as pessoas não sabiam nem teórica e nem praticamente definir. (destaque
nosso)
Segundo a professora Glória Anselmo, a Rede questionava muito a FME quanto à
adoção do sistema de ciclos, contudo, não se tinha um retorno à sua insatisfação. Relata,
contudo, que a gestão da professora Maria Felisberta Trindade
31
(2003-2004), foi
imprescindível para o processo que vivenciam atualmente. Segundo ela, o trabalho realizado
durante os anos de (2003-2004) possibilitou uma mudança gradual na relação da FME com as
escolas, na medida em que se abria um processo de escuta às escolas. Nesse período, que a
FME buscava estabelecer novas relações com as escolas da Rede a partir do diálogo, alguns
registros foram produzidos e muito deles denunciavam a proposta de ciclos implantada em
1999, requerendo, por parte da FME o encaminhamento de mudanças.
Contudo, esse movimento não acontecia isoladamente das outras demandas da Rede.
Conscientes de que não havia apenas a necessidade de repensar os ciclos, mas, sobretudo, de
30
Cabe à Diretoria de Políticas Pedagógicas a promoção de formação continuada de professores e equipes
técnico-pedagógicas, bem como assessorar o processo de gestão e funcionamento pedagógico da Rede,
promovendo as intervenções necessárias. Igualmente é de sua responsabilidade a formulação de diretrizes que
visem à implementação da proposta político-pedagógica da FME.
31
A professora Maria Felisberta B. Trindade presidia a Fundação Municipal de Educação de Niterói nos anos de
2003-2004.
95
discutir o sistema de ensino de Niterói, o Conselho Municipal de Educação
32
elaborou um
documento, chamado de “Carta Regimento”
33
, que visava orientar o cotidiano escolar através
de normas gerais de organização de um sistema educacional. Segundo lemos nas palavras da
professora Maria Felisberta, no texto de apresentação da Carta Regimento:
(...) o seu valor, porém, não está apenas no fato de proporcionar a orientação
regimental necessária à rede municipal, seu significado especial está por ter sido
um documento elaborado por meio do processo participativo das profissionais da
educação, numa demonstração inexeqüível de como a construção democrática é
possível no cotidiano do espaço/tempo escolar. (grifo nosso)
Nesse período, em consonância com a Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que
estabeleceu o Plano Nacional de Educação (PNE), e prevê que os estados e municípios
devem construir seu Plano Municipal de Educação (PME)
34
, o Prefeito Godofredo Pinto,
35
do
Partido dos Trabalhadores (PT), publicou, em 24 de julho de 2003, o Decreto Municipal
9.038, que determinava sua elaboração. Portanto, a partir da publicação do referido Decreto,
a Secretaria Municipal de Educação (SME) e a Fundação Municipal de Educação (FME)
32
Segundo o Art. da Lei 2272, de 16 de dezembro de 2005, o Conselho Municipal de Educação de Niterói
tem o objetivo de estimular e propor a formulação de políticas para a educação municipal, de acordo com os
princípios inscritos na Constituição Federal, na Constituição do Estado, na Lei Orgânica do Município, na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional e na legislação municipal em vigor. Ainda na Lei nº2272, encontramos
no Art. que “o Conselho Municipal de Educação [é] composto pelo Secretário Municipal de Educação e por
outros (14) membros, e seus respectivos suplentes, nomeados pelo Prefeito de Niterói entre pessoas de
comprovado saber e experiência em matéria de educação, com mandato de dois anos, observados os seguintes
critérios: I um (01) representante da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF); II
três (03) representantes de Professores, sendo um (01) representante do Sindicato Estadual dos Profissionais da
Educação (SEPE); um (01) representante da União dos Professores Públicos no Estado-Sindicato (UPPES); um
(01) representante do Sindicato de Professores Particulares de Niterói e São Gonçalo (SINPRO); III três (03)
representantes do Conselho Escola Comunidade (CEC), sendo um (01) do segmento de pais da educação
infantil, um (01) do segmento de pais do ensino fundamental e um (01) do segmento de alunos da EJA, todos
eleitos no Fórum dos CECs; IV um (01) representante da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro;
V um (01) representante do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Particular (SINEPE/RJ); VI quatro
(04) membros de livre nomeação do Prefeito, de reconhecido saber na área de educação; VII – um (01)
representante da Comissão de Educação e Cultura da Câmara Municipal de Niterói.
33
Esta Carta Regimento foi aprovada em Sessão Plenária do Conselho Municipal de Educação de Niterói, em
16/12/02, através da Deliberação CME 006/02, publicada em 02/04/03, e registrada no Cartório de 5º Ofício
Títulos e Documentos.
34
A cidade de Niterói conquista seu Plano Municipal de Educação em 2007, como fruto de discussões realizadas
desde 2003. A 1ª Conferência Municipal de Educação de Niterói (I Confemen) foi iniciada de 19 a 21 de outubro
de 2007 na Unilassale, e terminou 24/10, após nova plenária realizada em 22/11 no mesmo local. “Tivemos 400
delegados participantes de diferentes entidades da sociedade civil niteroiense. O evento definiu os rumos da
educação na cidade para os próximos dez anos e, a partir dele, creio que Niterói construirá a tradição de realizar
periodicamente conferências educacionais, até mesmo para acompanhar o cumprimento das metas fixadas neste
Plano Municipal de Educação”, revelou o Secretário de Educação de Niterói e Presidente do Conselho Municipal
de Educação de Niterói, Waldeck Carneiro. Sobre esse assunto temos como referência o trabalho de MERLIM,
Viviane. O Conceito de cidadania na definição de Políticas Públicas Educacionais: debates e impasses no
processo de elaboração do Plano Municipal de Educação de Niterói/RJ. Niterói. Dissertação. Universidade
Federal Fluminense, UFF, 2008.
35
O Prefeito Godofredo Pinto assumiu a prefeitura em 2002. Em 2004, Godofredo ganhou o direito de
permanecer à frente da administração municipal, ao ser eleito, com a aprovação de 80% dos niteroienses.
96
estabeleceram duas frentes de trabalho para que pudessem encaminhar a elaboração do PME
juntamente com os representantes do CME e da sociedade civil.
Essas frentes de trabalho foram designadas da seguinte forma: um grupo esteve
comprometido em discutir na Rede Municipal de Educação de Niterói (portanto, com os
sujeitos ligados diretamente à prática educativa do município), o tipo de escola que almejava
construir, problematizando nessas discussões diversos assuntos referentes à educação escolar.
Destacamos aqui, em especial a questão da organização da escola no sistema de ciclos, que
se referia a uma problemática da Rede Municipal. Já o outro grupo desempenhou a função de
discutir com a sociedade civil as Políticas Públicas do município e as metas da Cidade
Educadora, para organização de conferências que levassem à elaboração do Plano Municipal
de Educação.
A discussão sistemática na Rede, tarefa constitutiva de uma das frentes de trabalho
para a elaboração do PME, iniciou-se em maio de 2003 com o foco de discussão voltado para
a Educação de Jovens e Adultos, estendendo-se posteriormente a discussão para a Educação
Infantil e o Ensino Fundamental.
Na busca de estabelecer uma Política para o Ensino Fundamental
36
a partir de
propostas que eram suscitadas pela Rede no decorrer desse processo de discussões, foi
realizado no Colégio Salesiano de Niterói e na E. M. Paulo Freire, em maio de 2004, o “I
Encontro de Ensino Fundamental: uma reflexão coletiva”, contando com a participação de
aproximadamente 500 profissionais da rede, pais e alunos.
Na tentativa de resgatarmos o processo que desencadeou esse I Encontro, temos
registrado no Documento da FME (2005b, p.7) a seguinte trajetória:
1) Em 18 de setembro de 2003 ocorreu, no auditório da OAB-Niterói o
Encontro Preparatório para o I Encontro de Ensino Fundamental. Estavam
presentes cerca de 150 profissionais das escolas. Este encontro tinha por
objetivo a apresentação de uma proposta de trabalho no sentido de deflagrar
um movimento para repensar coletivamente a escola em sua função
educativa, como formadora de sujeitos e de ensino através da sistematização
dos conhecimentos, com vistas à Conferência Municipal de Educação e ao
Plano Municipal de Educação, assegurando a participação de toda a
comunidade escolar. Foram propostos cinco eixos para serem discutidos a
partir de perguntas norteadoras, a saber: CICLO, AVALIAÇÃO,
CURRÍCULO, ALFABETIZAÇÃO, EDUCAÇÃO ESPECIAL na
perspectiva da inclusão, GESTÃO DEMOCRÁTICA.
2) Apresentada a proposta, houve algumas manifestações e foi criada uma
comissão, legitimada pelos sujeitos presentes para juntamente com a FME,
organizar o encontro. Além disso, foi incluída para discussão a temática
Valorização do Magistério.
36
É importante aqui esclarecermos que a Educação Infantil e a Educação de Jovens e Adultos também foram
contempladas nesse movimento, mas, neste trabalho nos deteremos no Ensino Fundamental.
97
3) Em 6 de novembro de 2003 ocorreu a encontro preparatório para o I
Encontro de Ensino Fundamental. Nesse encontro, foi colocado para os
sujeitos presentes o desejo da FME por uma proposta construída no coletivo.
Também foi votado e legitimado pelo grupo o aumento do número de
representantes das escolas na Comissão organizadora do Encontro.
4) Foram encaminhados às escolas vários textos sobre ciclos para que pudesse
ser discutido através da mediação dos representantes escolhidos pela própria
escola.
5) Em 2004, foram organizados pequenos grupos (35 participantes 1 de cada
escola que oferecia o Ensino Fundamental), com o objetivo de discutir as
diferentes temáticas. Nesse sentido, foi solicitado às escolas que
encaminhassem um representante de sua escola, escolhido no seu coletivo,
para discutir as temáticas de currículo, ciclo, alfabetização, educação
inclusiva, gestão democrática e valorização do magistério.
Sendo assim, como mencionamos anteriormente, esses movimentos que aconteceram
no decorrer dos anos de 2003-2004 contribuíram para que a FME, através da escuta e do
diálogo que buscava estabelecer com as escolas, pudesse perceber as fragilidade e
incoerências vivenciadas com a proposta de ciclos, principalmente na distância encontrada em
seu caráter politicamente instituído e sua forma instituinte de se expressar. Com isso,
entenderam a necessidade de “rever o instituído para a partir dele instituir outra coisa”
(Gadotti, 1996, p.34).
Outro movimento expressivo no início do ano de 2004 partiu da vontade política da
Direção da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (FEUFF) e da
Secretaria Municipal de Educação de Niterói/ Fundação Municipal de Educação Pública de
Niterói (SME/FME), que se empenharam em formar um grupo de professores para discutir e
implementar o Programa de Cooperação Pedagógica. Nesse sentido, a primeira ação do
referido programa foi o curso de Formação Continuada em “Práticas Pedagógicas no Sistema
de Ciclos” para os profissionais da Rede Municipal de Educação de Niterói.
Então, dando continuidade aos procedimentos de escuta e diálogo na Rede, é possível
pontuarmos que a partir da nova gestão de 2005, quando o professor Waldeck Carneiro
assume a presidência da FME, se instalou de vez o processo dialógico na Rede, por
conseguinte, o processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos, expressos através
dos “13 pontos” que foram estabelecidos como metas, logo no início de sua gestão.
Portanto, regatando e sintetizando alguns documentos que apontavam para esses
anseios, que deram origem ao processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos,
destacamos:
98
· os registros avaliativos das inúmeras atividades de formação continuada,
realizadas com os profissionais da Rede nos últimos anos;
· os subsídios para o Plano Municipal de Educação de Niterói, a partir
dos Encontros de Educação Infantil, de Ensino Fundamental e de
Educação de Jovens e Adultos, cuja dinâmica levou em conta a
representação dos diferentes segmentos que compõem a comunidade
escolar;
· a Carta de Princípios da Educação de Jovens e Adultos da Rede
Pública Municipal de Niterói – 2004;
· o documento intitulado Os 13 pontos”, contendo o discurso pronunciado
pelo Prof. Waldeck Carneiro da Silva, por ocasião de sua posse como
Secretário Municipal de Educação de Niterói, realizada em 03/02/05, cujo
quarto ponto aborda a necessidade de intensificar e aprofundar ações
sobre o sistema de ciclos na Rede Municipal;
· o relatório da Formação Continuada da Rede, realizada em 23/02/05,
que teve o documento “Os 13 pontos” como eixo de sua discussão;
· o Plano Pluri-Anual da FME para o quadriênio 2006-2009;
· os registros do Encontro para Reflexões Estratégicas, realizado nos
dias 11 e 12 de março de 2005, com a equipe dirigente da FME;
· o Plano de Ações Estratégicas da FME para o quadriênio 2005-2008,
sobretudo no que tange à meta quatro;
· as demandas observadas nos termos das visitas de acompanhamento às
escolas por representantes das coordenações que compõem as Diretorias
de Políticas Pedagógicas e de Gestão Escolar, da Superintendência de
Desenvolvimento Pedagógico.
De acordo com esses dados, observamos que o processo de reconstrução da proposta
pedagógica em ciclos não surgiu do “nada” sem razões e conexões com a realidade que a
Rede vivenciava, mas, ao contrário, veio atender um “reclame” da própria Rede, expresso nos
movimentos de discussão e elaboração da política educacional do município.
3.2.2 Processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de
Educação de Niterói: fundamentos para sua realização
Certamente, a construção coletiva e cotidiana de respostas às lacunas que a Rede
Municipal de Educação vinha apresentando para os sujeitos dessa Rede era um dos maiores
desafios a serem enfrentados, visto que culturalmente o despreparo próprio no trato
acadêmico e a fragmentação do saber forçado por fatores administrativos, segregando os que
99
pensam a educação e os que a executam, foram “deformando” os profissionais e distanciando-
os de um ambiente coletivo e compartilhado nos processos educativos.
Por isso, entender que fundamentos norteiam a prática político-pedagógica
democrática almejada nessa Rede educativa torna-se fundamental para não analisarmos esse
processo baseado simplesmente em arranjos contraditórios. Sendo assim, partimos do
seguinte questionamento: por que razão dirigentes políticos decidem partilhar uma parte do
seu poder com os demais profissionais da educação, quando na realidade não são obrigados a
fazê-lo?
Em Niterói, a democracia participativa é o projeto político estabelecido pela equipe
municipal, começando por objetivos de ordem de gestão que busca uma modernização
administrativa, além dos princípios políticos e sociais do Partido dos Trabalhadores (PT) que
norteiam a administração municipal. Na Rede Municipal de Educação, as experiências
seguem um percurso de discussões que foram provendo a vontade política dos eleitos e,
também, respondendo a reivindicação do movimento social dos profissionais que integram
essa Rede.
Os responsáveis políticos definem a democracia participativa como uma outra forma
de fazer política, caracterizada por uma partilha do poder entre os diferentes sujeitos que
fazem parte do processo educacional da cidade. Nesse sentido, a participação no processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos é uma resposta à crise local da representação e
atuação na construção de políticas públicas municipais.
Como vimos, o processo de reconstrução da proposta em ciclos surgiu a partir de um
cenário que marcava a educação municipal de Niterói, dando forma a seu sentido democrático
através do fortalecimento à escuta e ao diálogo estabelecidos entre duas instâncias FME e
Unidades Escolares –, que historicamente foram construídas em relações fragmentadas e
distantes. Além disso, ao desenvolverem experiências de participação conjunta no âmbito das
decisões do sistema de ensino municipal, alargaram um caminho formativo, suscitando novas
perspectivas acerca do planejamento educacional.
Conforme lemos no Editorial do Informativo
37
da Rede, a FME imprime o seguinte
posicionamento acerca do planejamento de propostas educacionais:
(...) não será contratando ‘a peso de ouro’ consultorias externas, importando
acriticamente modelos e projetos ou elaborando tecnocraticamente, na clausura dos
gabinetes refrigerados, uma proposta feita apenas por colegas que hoje estão
37
Informativo da Rede Municipal de Educação de Niterói. Ano 55, nº14. Fevereiro/março, 2006.
100
dirigindo a Fundação e a Secretaria Municipal de Educação de Niterói. Teremos
que usar o melhor da nossa energia, imaginação e inteligência para sem abrir mão
do diálogo com agentes externos, do estudo de experiências vividas em outros
contextos e de uma certa direção e intencionalidade políticas, construir uma nova
proposta baseada no protagonismo de todos os segmentos que integram a nossa
comunidade escolar, especialmente dos profissionais que pensam e fazem no chão
da escola, a Rede Municipal de Educação de Niterói.
Embora a perspectiva de um planejamento participativo na educação já esteja há muito
sendo tratada e discutida, a verdade é que temos nos esforçado para participarmos dessa
“poderosa força dominadora que quase sempre é entregue a tecnoburocratas” (Calazans, 1990,
p.32). O planejamento conforme descreve o MST (1995, apud, Padilha, 2002, p.30) “é um
processo de tomada de decisões sobre a ação. Processo que num planejamento coletivo (que é
a nossa meta) envolve busca de informações, elaboração de propostas, encontros de discussão,
reuniões de decisão, avaliação permanente (...)”. Avançando nessa discussão, tomamos a
definição do planejamento participativo:
Se constitui num processo analítico, num contínuo propósito coletivo, numa
deliberada e amplamente discutida construção do futuro da comunidade, na qual
participe o maior número de membros de todas as categorias que a constituem.
Significa, portanto, mais do que uma atividade técnica, um processo político
vinculado à decisão da maioria, tomada pela maioria, em benefício da maioria.
(Cornely, 1977, apud, Padilha, 2002, p.35).
Decorrem daí os fundamentos implícitos nas decisões administrativas e pedagógicas
da Rede Municipal de Educação de Niterói, que passam a defender movimentos que permitam
o planejamento participativo, portanto, um processo democrático para a elaboração de planos
educacionais
38
. Nessa direção, defendem os fundamentos da dialogicidade, coletividade e
participação, para a realização de um processo democrático. Conforme lemos na proposta em
construção “Escola de Cidadania”
39
:
(...) diálogo, porque, através dele, como afirma Freire (1996:122-123), podemos
refletir sobre nossa realidade, tal como a fazemos e re-fazemos, e, também, nos
transformar em seres criticamente comunicativos. No seu dizer, “através do
38
Conforme temos na definição de Sobrinho (1994, apud, Padilha, 2002, p. 36), “o plano é um documento que
registra o que se pensa fazer, como fazer, quando fazer, com que fazer. Para que exista o Plano é necessário que
um grupo tenha antes se reunido e, com base nos dados e informações disponíveis, tenha definido os objetivos a
serem alcançados, tenha confrontado os objetivos com os recursos humanos e financeiros disponíveis, tenha
definido o período de realização das ações, enfim, tenha organizado o conjunto de ações e recursos. O plano
evita o improviso, o imediatismo, a ausência de perspectivas, pois, ele antecipa, ele prevê. O plano passa a ser
um referencial, um norte para as ações educacionais do município. Com o plano é possível então acompanhar o
seu desempenho, avaliar se os resultados alcançados foram ou não os esperados, onde houve desvios, quais os
problemas enfrentados. Planejamento e plano estão estritamente relacionados, mas não são sinônimos. O
primeiro representa o processo e o segundo é um registro do processo”.
39
A proposta em construção foi intitulada “Escola de Cidadania”.
101
diálogo, refletindo juntos sobre o que sabemos e não sabemos, podemos, a seguir,
atuar criticamente para transformar a realidade”.
(...) coletividade, porque entendemos que os processos decisórios centralizados
precisam ser suplantados pelas decisões nascidas da articulação dos interesses e das
concepções divergentes que marcam o coletivo escolar. Trata-se de investir em um
planejamento que traz em si mesmo um processo formativo, em que todos
aprendem a colaborar e não só a cooperar. Ambos os termos (colaborar e cooperar)
incluem o significado de ação conjunta. Entretanto, enquanto cooperação, porque
deriva do verbo latim operare, enseja um trabalho de ajuda, com possibilidade de
relação desigual ou hierarquizada, a colaboração, derivada do verbo laborare,
pressupõe trabalho conjunto manifesto, sobretudo através de uma relação de
mutualidade, onde não prevalece tanto a hierarquia, mas a prática compartilhada,
tanto no seu pensar quanto no seu implementar (Boavida e Ponte, 2002)
(...) participação, como condição para a consolidação do clima democrático. (FME,
2007, p.32 – grifo nosso).
Não basta reunir o coletivo e exercitar o diálogo, se quem decide é a equipe dirigente
desse processo. A dialogicidade e a coletividade estão na base no planejamento participativo,
que representa, em última instância, a forma de planejar centrada na democratização do
processo decisório. Um planejamento do tipo participativo se desenvolve com o envolvimento
dos diversos segmentos que compõem o coletivo escolar na tomada de decisão.
Sobre essa experiência que a Rede Municipal de Educação se propõe a vivenciar a
partir dos fundamentos implícitos para a realização do processo de reconstrução da proposta
pedagógica em ciclos, temos uma relevante contribuição de Gandin (2004, p.55):
Estamos num mundo que anuncia claramente um século XXI com poder distribuído
entre as pessoas e os pequenos grupos e não mais concentrado na mão de alguns,
sejam pessoas governos ou instituições. Estamos passando de uma época, em que
se reconhecia uma cosmovisão pronta e determinada, para um outro tempo em que
é preciso construir cada momento uma visão de mundo; mais ainda, firma-se a
convicção de que não só os poderosos ou os técnicos que têm capacidade de
descobrir caminhos; todos temos esta sabedoria e este direito não pode ser
subtraído das pessoas. Cada vez mais vem o tempo em que governar é coordenar o
processo de definição conjunta de rumos sociais e, conjuntamente, administrar os
meios para seguir a caminhada nos rumos estabelecidos.
O reconhecimento dos desafios colocados por esses fundamentos impõe inflexões
sobre o processo democrático na construção da proposta pedagógica; sobre as relações entre
FME e as Unidades Escolares e a problemática da constituição de espaços públicos
participativos e sua dinâmica de funcionamento. Na verdade, a imensa complexidade desse
processo implica rever a noção de projeto político
40
, no nível teórico, e, em conseqüência,
40
Utilizamos o termo projeto político num sentido próximo da visão gramsciana, para designar os conjuntos de
crenças, interesses, concepções de mundo, representações do que deve ser a vida em sociedade, que orientam a
ação política dos diferentes sujeitos.
102
investir, no nível empírico, nas relações de poder entre sujeitos que ocupam lugares
diferentes, mas participam de um projeto em comum: a educação municipal.
3.2.3 Mudanças organizacionais da Rede Municipal de Educação de Niterói suscitadas a
partir do processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos
Conforme temos abordado, a participação consciente de todos os indivíduos que fazem
parte do processo educativo na elaboração de projetos e planos se configura como a situação
ideal de democracia em políticas públicas educacionais. No entanto, construir espaços e
trabalhar relações que viabilizem a tomada de decisões de “todos” sobre os interesses públicos
é sem dúvida um desafio para os órgãos responsáveis por essas mediações. É preciso, em
primeiro lugar, um espaço específico que assegure, tenha força e legitimidade para
implementar uma política que é formulada a partir de uma construção coletiva. Contudo, sem
trabalhar nas relações que ali serão estabelecidas, se tornam inócuos todas as iniciativas com
vistas à implantação deste espaço. Afinal, conforme nos aponta Kaufmam ( apud Lück (2000,
p.15), “a chave do êxito na educação reside nas pessoas”.
Por isso, identificados os fundamentos e princípios norteadores do processo de
reconstrução da proposta pedagógica da Rede Municipal de Educação, é possível
considerarmos algumas modificações organizacionais que buscaram reestruturar as relações
de diferentes sujeitos da Rede. Ao propor um trabalho democrático, a FME entendeu que
necessitava modificar algumas estruturas que contribuíram durante longos anos para um
convívio de relações autoritárias, fragmentadas, portanto, nocivas às relações democráticas.
Na verdade, essa é a condição essencial para a estruturação de subjetividades autônomas e
coletivas, pois processos autoritários e fragmentados não conseguem servir de base para
resultados democráticos. Recorrendo a Lück (2000, p.29), temos a seguinte observação:
À simples observação do processo educativo, tal como se verifica atualmente entre
nós, nota-se o seu fracionamento. O mesmo parece constituir-se de uma
justaposição de atividades, experiências, unidades, conteúdos, disciplinas, matérias,
áreas de estudo que se unem, mas não se somam e não se integram. Nele, cada área,
cada disciplina, cada professor, cada especialista em educação assume uma parte do
todo (a que considera tipicamente sua) e passa a atuar preocupando-se
essencialmente com a mesma, despreocupando-se das demais. A falta de integração
do processo educativo tem uma multiplicidade de aspectos e ângulos. Ela é tanto
interna quanto externa, tanto de concepção quanto de ação.
Em vista dessas questões expostas, preconiza-se, a partir de 2005, algumas
modificações organizacionais para a Rede Municipal de Educação, no sentido de viabilizar
103
relações mais integradas e articuladas num processo que se pretende participativo, dialógico e
democrático. Conforme temos considerado, a própria ruptura com o sistema seriado indica
novas formas de relações na escola. Por isso, se uma Rede pretende se organizar em ciclos,
certamente repensar sua estrutura organizacional é um dos passos primordiais nesse processo.
Afinal, como contribuir na formação de sujeitos democráticos se o processo educacional não é
democrático?
Dessa forma, nos propomos a entender essas modificações que foram geradas pela
própria reconstrução da proposta de ciclos com referência à construção de um trabalho
coletivo. Entretanto, vale lembrarmos que nossa intenção nesse trabalho não é de descrever e
analisar a proposta de ciclos que tem sido reconstruída na Rede, mas, limitamo-nos a
compreender que tipo de relações se estabeleceram entre os sujeitos desde a proposta
preliminar de 2005.
Aqui, faremos menção em nossa análise à proposta de 2007, pois, embora seja uma
proposta ainda aberta e sujeita a alterações, foi considerada a primeira versão final,
possibilitando, dessa forma, considerações e leituras em uma versão mais completa. Contudo,
vale esclarecer, que essas proposições para mudanças organizacionais foram sugeridas desde
2005. Os ajustes estruturais sugeridos pela FME, a partir da nova proposta em construção,
requeriam algumas modificações necessárias para a constituição de relações estabelecidas na
escola e na FME, no âmbito do trabalho em ciclos (ver anexo 8), e, mais precisamente, em
nossa análise, para o desenvolvimento do trabalho coletivo contemplado no processo.
No Art. 9º, da proposta ainda em construção lemos que “cada ciclo deverá ser
confiado a uma equipe denominada Equipe de Referência, constituída por profissionais
habilitados da Unidade de Educação que desenvolvem diferentes atividades naquele ciclo”
(FME, 2007 – grifo nosso).
Fizemos questão de destacar “Equipe de Referência” uma vez que o entendimento de
como ela funciona na escola é sobremaneira importante. A Equipe de Referência do ciclo
41
é
composta pelo grupo de professores que atuam diretamente com os alunos de um determinado
ciclo
42
sendo articulada pelo Orientador e/ou Supervisor Educacional. Além disso, poderá
41
Exerce funções diferentes da Equipe de Referência da FME.
42
Art. 1º - A Rede Municipal de Educação de Niterói é composta por Unidades de Educação Infantil, de Ensino
Fundamental e de Educação de Jovens e Adultos e Idosos, pedagogicamente organizadas em Ciclos. § - Para
fins desta Portaria, entende-se por Ciclo um conjunto de Períodos Letivos que organiza a prática pedagógica,
estendendo-se por no mínimo um ano civil. § - Entende-se por Período Letivo o período de 200 dias para
Educação Infantil e Ensino Fundamental e de 100 dias para Educação de Jovens e Adultos, com programação
escolar e freqüência apurada com efetiva orientação do professor. § - Pedagogicamente, entende-se por Ciclo
a forma de organização temporal escolar baseada nas características biológicas e culturais do desenvolvimento
104
contar com professores que não são responsáveis por um agrupamento
43
específico, atuando,
portanto, nos reagrupamentos
44
, assim como o professor de Arte, de Educação Física,
professor de Sala de Recurso e professores de Apoio ao aluno com Necessidades
Educacionais Especiais.
Como podemos notar, novas dinâmicas de trabalho são viabilizadas a partir da
composição da Equipe de Referência da escola. Os profissionais da educação que
anteriormente atuavam de forma fragmentada, cada um com sua “turma”, agora se vêem
diante de uma nova realidade que exige a interação, o diálogo e o planejamento coletivo
constantemente. Isso não significa a ausência de um grupo de referência para a prática
direcionada do professor, entretanto, não o isola, mas, busca promover mediações entre os
diferentes profissionais de ensino, além de possibilitar diversos olhares ao educando. Na
entrevista que fizemos com a professora Leda, que atua na Rede desde 1994, atualmente
como coordenadora de e ciclos
45
na FME, podemos destacar a seguinte repercussão
dessa mudança estrutural:
Hoje, você tem uma fala dos professores que estão vivenciando o processo desde
2006, o fato de que não é possível um trabalho individual nessa proposta.
Entendendo isso eles hoje brigam por mais tempo de reunião pedagógica e acho de
fato que um projeto futuro é repensar sim esse tempo. Quando se trata de um
trabalho sério, engajado, 2h não para nada e também não adianta eu planejar
sozinha em casa, é um trabalho coletivo, requer planejar junto com. Então nós
humano, com trabalho em períodos alongados, em que a idade e os interesses em comuns dos alunos são os
principais articuladores do processo de ensino e de aprendizagem.
43
Art. - Cada Ciclo é constituído por Grupos de Referência, a partir dos quais se organiza o trabalho
pedagógico. § - Entende-se por Grupo de Referência o grupo de alunos organizado em função de suas idades,
que será constituído no início de cada período letivo, mediante processo de Agrupamento. § - Considera-se
Agrupamento o processo inicial de organização dos alunos nos Grupos de Referência, baseado no critério etário
para Educação Infantil e Ensino Fundamental e no critério cognitivo e sócio-afetivo para Educação de Jovens e
Adultos. (FME, 2007).
44
O reagrupamento é a forma de reorganizar os alunos considerando seus interesses, desempenhos e objetivos a
serem alcançados. O reagrupamento permite movimentar os alunos ao longo dos ciclos, conforme a necessidade
e os projetos desenvolvidos pela escola. Conforme lemos no Art. - Além do agrupamento inicial, os alunos
serão reagrupados para realizarem atividades que favoreçam o seu desenvolvimento cognitivo, cultural, social e
afetivo. § - Considera-se Reagrupamento o processo de deslocamento temporário dos alunos de seus Grupos
de Referência para outros, planejados e formados a partir de potencialidades, necessidades e interesses,
observando os aspectos cognitivos, lingüísticos, psicológicos, sociais e afetivos, sem prejuízo do nculo com o
Grupo de Referência, que será preservado e retomado ao longo do processo.
45
A Coordenação de 1º e 2º Ciclos, a partir de 2005, busca acompanhar o desenvolvimento das ações
pedagógicas nas escolas, seus processos e resultados. Pretende garantir a discussão teórica e prática de questões
que hoje identificamos urgentes e prioritárias, como o processo de ensino e aprendizagem da leitura e da
escrita. Procura dialogar com a Equipe de Articulação Pedagógica acerca das práticas cotidianas, elaborando, em
parceria, ações que possam auxiliar no enfrentamento das questões pedagógicas. Visa ainda construir espaços de
estudo e reflexão com os professores através de discussões, cursos e oficinas, durante o planejamento semanal ou
em espaços alternativos.
105
percebemos esse movimento na escola, que mais do que um discurso, se na
prática o esforço para se encontrar esse tempo. “Ah, vamos ver se minha aula
coincide com a sua para sentarmos juntas nesse horário”.
Outra mudança significativa nesse processo é especificada no Art. 14, apontando que
“em cada Unidade de Educação deverá ser instituída uma Equipe de Articulação Pedagógica
(EAP) constituída pelos seguintes profissionais: Diretor Geral, Diretor Adjunto, Orientador
Educacional e/ou Supervisor Educacional, Secretário Escolar e Coordenador de Turno”
(FME, 2007 – grifo nosso).
Nesta perspectiva, a Equipe de Articulação Pedagógica (EAP) é um grupo responsável
pela organização e gestão da Unidade de Educação com função de promover condições para a
realização do trabalho pedagógico e proporcionar o planejamento coletivo e integrado, de
modo que todos os professores da escola estejam comprometidos com o processo ensino-
aprendizagem dos alunos. Essa mudança afirma que todos os profissionais da escola atuam e
influenciam no trabalho pedagógico, tornando-se essencial a articulação dessas funções.
Assim, é importante lembrar que cada profissional prima pela especificidade do seu trabalho,
contudo, essa prática deixa de ser desarticulada com os demais “setores” da escola.
Ainda sobre essa equipe, é possível considerarmos que, ao ser nomeada de Articulação
Pedagógica, rompe também com a fragmentação vivenciada durante longos períodos na
escola onde os “técnicos” eram os únicos responsáveis na elaboração de propostas para a
prática pedagógica, possibilitando que todos sejam sujeitos dessa ação. Portanto, é designada
para essa Equipe a função de articular o processo e não determiná-lo. Ainda lemos em
Vasconcellos (2006, p.160) que:
A equipe de coordenação escolar tem por função articular todo o trabalho em torno
da proposta da escola e não ser elemento de fiscalização, de controle formal e
burocrático. Seria interessante refletir sobre a diferença entre acompanhar (que é
uma necessidade) e fiscalizar (que é colocar-se fora e acima do processo). A equipe
deve funcionar como o coração, onde a riqueza não vem dele próprio, vem do
sangue, do pulmão, do fígado; a equipe “anima” e media o processo.
Consideramos que o depoimento da Supervisora Jaqueline Pereira da Escola (D)
ilustra bem a repercussão dessa mudança na prática. Segundo sua fala, um dos grandes
desafios que essa proposta traz para a escola é:
(...) o supervisor tentar aprender junto com o professor. Porque essa proposta foi
construída e aprendida no cotidiano. Então é na porta da sala de aula, na hora da
merenda, na saída, enfim, foram nesses espaços que íamos mantendo um diálogo de
algo que eu não sabia na sua totalidade, mas, estava aprendendo junto com os
106
professores que estavam experimentando a proposta na sala de aula. Então, estar
preparada para aprender com, é um grande desafio. (destaque nosso).
Assim como a escola precisou passar por determinadas mudanças estruturais e
organizacionais, desde o agrupamento de alunos, até as novas dinâmicas para a relação e
integração de diferentes profissionais da escola, a FME, órgão central da Rede Municipal de
Educação, também precisou rever sua organização. Recorrendo a fala da professora Leda
Marina:
(...) Se, queremos que as escolas se mobilizem para o coletivo, nós procuramos
fazer o mesmo movimento aqui na FME, pois, também estávamos muito
fragmentados, muito segmentados em nossos grupos e reconhecemos a necessidade
de repensar as nossas relações internas.
(...) O primeiro movimento que aconteceu para isso foi na nossa própria
coordenação. Tinha diversos tipos de coordenação que trabalhavam com os
mesmos professores, mas, que tinham focos distintos e mal dialogavam. Então
quando foi proposto de se tornar uma mesma coordenação é algo bem difícil no
que se refere às relações. Imagina, se antes nem se falavam, agora ter que trabalhar
juntos! Esse foi o primeiro passo interno, o outro passo foi o agrupamento das
pessoas nas Equipes de Referência da FME, internamente isso também foi difícil,
hoje, percebemos que esse foi um dos passos mais acertados que demos. Antes as
pessoas trabalhavam aqui dentro, não sabiam o que o outro fazia, e mais do que
fazer, não compartilhavam das mesmas concepções. Por isso, para nós tem sido
uma aprendizagem do que significa de fato trabalhar juntos. Hoje o entrosamento
dessas equipes tem se consolidado de tal forma que as pessoas não se vêem mais
participantes de um grupo isolado.
A Equipe de Referência da FME é composta por pessoas de diferentes coordenações
que têm como função articular a ligação das escolas com a FME. Essas Equipes atuam
principalmente como parte de estratégia da solidificação para o trabalho conjunto entre a Sede
e as escolas através dos acompanhamentos semanais, tanto no que se refere ao
desenvolvimento do trabalho pedagógico, quanto ao administrativo. Ao promover a
integração de diferentes coordenações essa equipe passa a obter uma visão integral da escola.
A coordenação de informática, Educação Especial, e ciclo, entre outras, não acompanha
mais a escola apenas com o seu olhar específico, mas tem a possibilidade de ver o trabalho da
escola como um todo, pois cada Equipe de Referência é composta por um profissional de cada
coordenação.
Nesse sentido, podemos considerar que as mudanças estruturais e organizacionais
sugeridas a partir do processo de reconstrução da proposta de ciclos na Rede Municipal de
Educação de Niterói buscam romper com a tradição que convivemos: a divisão de trabalho e
distribuição de papéis fragmentados dentro do espaço escolar. Sobre esse assunto, Lück
(2000, p.11) destaca que:
107
As unidades de estrutura social de uma instituição se constituem em papéis sociais.
Um papel social corresponde a um padrão esperado de determinada posição em um
contexto social. O papel é a expressão da posição que corresponde à localização do
sistema. A divisão do trabalho corresponde ao agrupamento de funções, seguindo
determinados critérios, de forma a permitir que a carga total de trabalho seja
desempenhada satisfatoriamente pelas pessoas disponíveis para o seu desempenho.
Por uma influência da tecnologia industrial, também em educação, foi adotado o
critério de divisão de trabalho por especialização de funções.
No cerne deste estudo seria, pois, ingênuo pensarmos que, de uma Rede ligada a uma
cultura dual - ao definir duas instâncias (FME e unidades escolares), dissociadas de um
projeto político-pedagógico comum, sob dinâmica constituinte historicamente estruturada em
bases hierárquicas - surgissem “do nada” ações democratizantes. No entanto, foi possível
entendermos as possibilidades suscitadas a partir da tentativa de mudanças dessa realidade
como eixo primordial para a condução de um processo que buscou se desenvolver
democraticamente. No depoimento da Jaqueline Pereira, supervisora da escola (D)
entendemos que:
(...) o grande ganho dessa proposta foi ter fortalecido mesmo que com algumas
arestas, a relação FME e ESCOLAS. Nunca estivemos tão próximos. Isso não quer
dizer que estamos concordando com tudo, mas, estamos juntos mesmo que para
discordarmos, discutirmos. Não ficamos separados nesse processo, nessa proposta.
Não podemos esquecer, portanto, que o compromisso político, que garante a prática do
diálogo como mecanismo de socialização dos diferentes saberes, reside em se estabelecer
“uma nova relação de poder que, com a participação de todos, se manifestará através da
criação de um saber coletivo” (Faundez, 1993, p. 74). Ademais, colabora no aprofundamento
da relação de diálogos que, articulada com a ação, redefine o lugar que cada sujeito ocupa nas
discussões. A esse respeito, Certeau (1994, p. 201) destaca:
Um lugar é a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuem elementos nas
relações de coexistência. se acha, portanto, excluída a possibilidade para duas
coisas, de ocuparem o mesmo lugar. impera a lei do ‘próprio’: os elementos
considerados se acham uns ao lado dos outros, cada um situado num lugar ‘próprio’
e distinto que define. Um lugar é, portanto uma configuração instantânea de
posições. Implica uma indicação de estabilidade.
Desse modo, torna-se importante destacar que embora o exercício da participação seja
expansivo e se revele por meio de estratégias democráticas, compreender como o movimento
recriou a responsabilidade de engajamento político entre os sujeitos, que falam de lugares
108
diferentes, sem cair na demagogia, foram elementos fundamentais para a consolidação de um
processo, de fato, democrático.
Além disso, não podemos nos distanciar da teoria dialógica de Paulo Freire, que nos
incita a refletir acerca da importância da organização como dimensão fundamental da
educação transformadora. Em seu posicionamento, o ilustre pensador, discorre da seguinte
forma:
Enquanto, na teoria da ão antidialógica, a manipulação, que serve à conquista, se
impõe como condição indispensável ao ato dominador, na teoria dialógica da ação,
vamos encontrar, como seu oposto antagônico, a organização das massas populares.
A organização não apenas está diretamente ligada à sua unidade, mas é um
desdobramento natural desta unidade das massas populares. (Freire, 2005b, p.203)
Objetivamente, a organização, embora banalizada em muitos processos educativos,
pode transformar a relação do grupo para atuar no processo. Por isso, devemos atentar para o
fato de que essas mudanças organizacionais sugeridas e promovidas na Rede Municipal de
Educação de Niterói não ocorreram dissociadas do desejo de democratização do processo
instalado. Ao contrário, essa forma de organização influência o sistema, na medida em que
busca unir os sujeitos para que esse coletivo se organize para o exercício da transformação.
Segundo a Professora Leda Marina, na FME, o “trabalho é de muito investimento na
escola, entendendo que a escola deve estar fortalecida, independentemente da continuidade
partidária, da continuidade de governo, mas, é o projeto de escola pública que deve ser
fortalecido”.
Nessa direção, o processo instaurado tem cotidianamente proposto mudanças
necessárias na relação entre os sujeitos que compõem a Rede Municipal de Educação de
Niterói. No entanto, somente a conscientização e a apropriação dessas novas dinâmicas serão
capazes de promover transformações que gerem impacto na luta política pela qualidade da
educação nesse município.
3.2.4 Etapas do processo
Até este momento da nossa análise, tentamos descrever ainda que brevemente o
movimento vivenciado na Rede antes e durante o ano de 2005, cuja dinâmica provocou a
origem do processo que nos propomos a investigar nesta pesquisa. Além disso, buscamos
descrever os princípios em que esse processo se fundamenta e algumas mudanças que a Rede
precisou sofrer em sua organização para encaminhá-los. Dessa definição geral, adentramos
109
diretamente no processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos desejando
apreendê-lo a partir dos caminhos percorridos.
Assim, nesta seção, buscamos entender o processo a partir de suas etapas. Vale aqui
ressaltarmos que não se trata de etapas pontuais e fragmentadas, mas, de um percurso
processual que aqui tentaremos restituir em etapas. Para tanto, demarcamos os seguintes
marcos do processo: outubro de 2005 encaminhamento do Documento Preliminar para leitura
e estudo nas escolas, que deveriam optar pela adesão à experimentação da Proposta no ano de
2006; o percurso da experimentação opcional das escolas-pólo
46
em 2006; convocação para
todas as Unidades Escolares da Rede com vistas à experimentação da proposta em 2007.
3.2.4.1 Documento Preliminar: o “ponto de partida” do processo de reconstrução da
proposta pedagógica em ciclos
Logo que iniciamos nossa pesquisa na Rede Municipal de Educação de Niterói, em
junho de 2006, ouvíamos falar durante alguns encontros de que vínhamos participando que
circulava nas escolas do município, desde outubro de 2005, um Documento Preliminar.
Segundo as informações que nos eram passadas, esse Documento buscava estruturar uma
nova configuração dos ciclos na rede, apresentando, diretrizes que se diferenciavam da
proposta “Construindo a Escola do nosso Tempo”, implantada em 1999. Nesse momento,
muitos sujeitos que participavam dos encontros se mostravam desconfiados, não acreditavam
na possibilidade de mudança, afirmando em seus discursos que a FME tinha meramente a
pretensão de substituir uma “proposta” pela outra e para isso, inventaram um processo,
pretensamente participativo.
A partir dessas manifestações e inquietações que presenciávamos nos encontros, nossa
impressão inicial era exatamente essa. Embora achássemos que a iniciativa da FME em (re)
estruturar o sistema de ciclos na Rede fosse necessária, tínhamos a sensação de que essa
medida não estava provocando mudanças na prática político-pedagógica das escolas, pois não
percebíamos credibilidade dos profissionais da Rede que vivenciam cotidianamente esse
desafio no espaço escolar.
46
“Escolas-pólo”: expressão utilizada recorrentemente entre os profissionais da rede ao fazerem referência a
escolas que aderiram à proposta contida no Documento Preliminar (FME, 2005).
110
Contudo, naquela altura, ainda era prematuro fazer afirmação conclusivas sobre o
processo. Assim, dedicamos nossa análise à leitura do Documento Preliminar, que, para nossa
surpresa, nos indicava outros caminhos para compreensão desse processo. Não estamos
querendo defender que tudo que estava escrito no Documento de fato aconteceu, isso só foi se
revelando no decorrer do processo. Mas, estarmos atentos ao que era proposto em sua escrita
foi fundamental para não interpretarmos a realidade apenas pelos discursos
47
.
Sendo assim, no Documento, encontramos elementos que mencionavam o objetivo de
lançar o debate acerca da reorganização
48
da Proposta Pedagógica em ciclos, no âmbito da
Rede Municipal de Educação de Niterói. Para além de uma proposta que substituiria a que foi
implantada em 1999, tivemos clareza, na leitura do Documento Preliminar, que se buscava
instalar um processo no qual todos os profissionais da Rede fossem convocados a estudar,
experimentar e propor modificações na organização dos ciclos, apostando-se, enfaticamente
num processo participativo e dialógico:
(...) Portanto, encaminhamos às escolas este Documento Preliminar para estudo,
crítica, avaliação e proposições. Que a necessidade de compreendermos a lógica de
ensinar e aprender por meio dos ciclos impulsione e vivifique entre nós o debate a
seu respeito, levando-nos a conceber e formular políticas de ação para a sua
concretização. Nessa direção, cremos que caminhamos para superar, tanto quanto
possível, as incoerências, contradições e tensões atualmente estabelecidas, dando
lugar a outras que, natural e historicamente, hão de sobrevir. (FME, 2005, p.3
grifo nosso).
Nesse sentido, é importante considerarmos que esse Documento Preliminar não
caracterizava “uma convicção autoritária de se ter uma verdade a impor a verdade
indiscutível” (Freire, 1921, p. 45). De acordo com a leitura acima, compreendemos que vinha
atender uma necessidade da Rede Municipal de Educação de Niterói, propondo um
movimento de reflexões sobre a organização da escola em ciclos que necessitava
urgentemente ser repensada. E assim, revela-se com um caráter de “ponta de partida”, um
norteador para um processo, que estava apenas iniciando.
Para nós, que buscávamos compreender esse processo de reconstrução da proposta em
ciclos, ficava claro na leitura do Documento Preliminar que seu conteúdo representava (ou,
pelo menos, deveria representar) objeto de estudo, crítica e proposições de todos os
47
Segundo Pêcheux (2002, p.44), a análise do discurso consiste em “multiplicar as relações entre o que é dito
aqui (em tal lugar), e dito assim e não de outro jeito, com o que é dito em outro lugar e de outro modo, a fim de
se colocar em posição de ‘entender’ a presença de não-ditos no interior do que é dito”.
48
Inicialmente a FME considerou o processo como “reorganizativo” da proposta de ciclos implantada em 1999,
contudo, no decorrer do movimento, esse processo foi sendo reconhecido como estratégia de “reconstruir” a
proposta de ciclos, uma vez que propunham romper radicalmente com a prática seriada ainda presente na
proposta “Construindo a Escola do Nosso Tempo”.
111
profissionais que compõem a Rede. Enfim, o desafio estava lançado. Quanto à forma como
esse processo foi desencadeado, analisaremos em outro momento desta dissertação. No
entendimento de Demo (2006, p.39), a habilidade humana de constituir-se sujeito
relativamente autônomo, participar ativamente na democracia, efetivar cidadania individual e
coletiva,
(...) não é algo dado que vem pronto, como vem pronto, pelo menos como ponto de
partida o equipamento corporal e mental ao nascermos (mas mesmo tais
equipamentos podem crescer e desenvolver-se).Todos nascemos equipados com
cérebro, mas, uma coisa é levar a vida ao talante das circunstâncias, como massa de
manobra, outra coisa é tomar o destino em suas mãos e procurar construí-lo até
onde possível (p.39 – destaque nosso).
Isso não significa que o Documento não apresentava nenhum direcionamento para o
trabalho da escola. Apresentava sim. Mas, de fato era uma “proposta”, pois, estava aberta a
discussão e interferência dos sujeitos. Freire (1991, p. 45) assinalava que, “(...) se nada
temos a propor, ou se simplesmente nos recusamos a fazê-lo, não temos nada o que fazer
verdadeiramente na prática educativa”. Sendo assim, esse Documento Preliminar deveria ser
considerado como um norteador para a relação de ação-reflexão-ação, aberto à discussão de
novas propostas.
A FME posicionava-se em relação a esse processo, considerando no Documento que
“nenhum trabalho, como o que propõe a Equipe Gestora da FME, de cunho realmente
participativo, se encerra nele mesmo” (FME, 2005, p.3), mas com abertura a mudanças e
proposições. De acordo com a leitura do Documento:
(...) instituir o sistema de ciclos não é suficiente para transformar a realidade do
processo de ensinar e aprender, pois qualquer que seja a mudança almejada,será
possível a partir do esforço e do comprometimento daqueles que protagonizam as
cenas pedagógicas do cotidiano escolar. Desta forma, reconhecemos e defendemos
que toda mudança proposta se efetivará quando, principalmente, os
professores forem agentes da sua concepção e implementação, bem como alvo
de cuidadosas políticas de formação e atuação. (FME, 2005, p.3 – grifo nosso).
Portanto, esse Documento não surgiu do nada. Como foi possível notar, é fruto de um
processo que buscava responder a demandas da Rede Municipal de Educação de Niterói, a
partir das incoerências e tensões vivenciadas com a implantação de ciclos em 1999.
Entretanto, buscou lançar, como “ponto de partida”, diretrizes e estratégias a serem estudadas,
refletidas, problematizadas e experimentadas ao longo do processo intitulado “reconstrução da
112
proposta pedagógica em ciclos”. Além disso, acrescentou e reafirmou desafios para que essa
reconstrução ocorresse de forma democrática.
Portanto, embora o Documento Preliminar provocasse em sua leitura um chamado
para a participação dos diferentes sujeitos da Rede e pontuasse alguns elementos-chave, como
ponto de partida da reconstrução coletiva da proposta de ciclos, isso poderia se efetivar a
partir da tomada de decisão de cada sujeito, visto que “participação é conquista” (Demo,
2005, p. 12).
Entretanto, diante da realidade, que pressupõe os fenômenos complexos, “não é fácil
separar causas e motivações isoladas e exclusivas. Não podem ser reproduzidos em
laboratório e submetidos a controle. As re-construções são sempre parciais, dependendo de
documentos, observações, sensibilidades e perspectivas” (Da Matta, 1991, apud, Martins,
2004, p.291).
Sem desejarmos afirmar ou confirmar essas informações, mas, principalmente
questioná-las “no balanço dialético entre desconstruir e reconstruir conhecimento” (Demo,
2006, p.18), buscamos por intermédio do diálogo e observação participante compreender e
problematizar o que estava posto na escrita do Documento Preliminar.
Esses questionamentos partiram através de algumas observações e conversas
informais. Assim, percebíamos o incômodo de muitos sujeitos da Rede que estavam
inconformados com esse Documento Preliminar. Algumas pessoas consideravam uma
implantação “de cima para baixo” pelo fato de apresentar diretrizes e propostas. Outros que
estavam chegando à Rede nesse período
49
, influenciados, fortaleciam estes discursos.
Por isso, as considerações aqui apresentadas partem, em larga medida, do fato de nos
situarmos acerca do processo de construção da “proposta preliminar”, voltada, sobretudo, à
estratégia que a FME adotou para promover reflexões e proposições dos sujeitos que exerciam
suas funções na sede. Antes de qualquer coisa, é preciso esclarecer que esses sujeitos não
eram “técnicos” que vieram de fora para pensar e produzir uma proposta para a Rede
Municipal de Educação. Eram profissionais da própria escola, concursados da Rede, portanto,
que conheciam a realidade educacional desse município e principalmente os conflitos
vivenciados no espaço escolar.
Sobre o processo de elaboração da proposta preliminar, a professora Leda Marina
esclareceu como acontecia a dinâmica na FME, no período de maio a outubro de 2005, para a
discussão do processo que seria implementado na rede no ano seguinte.
49
Muitos profissionais que prestaram o concurso no ano de 2003 foram chamados nesse período.
113
Em 2005, quando o prof. Waldeck assume a gestão da FME, eu fui convidada a
assumir a coordenação. O ponto norteador para se iniciar o nosso trabalho aqui na
FME foi pensar: o que é que pretendemos dessa gestão? E ai, uma das coisas que
mais nos chamava atenção era o fato de ouvirmos da equipe pedagógica, dos
professores, diretores, orientadores, a necessidade de se pensar a lógica de ciclos
que era muito conflituosa para todos. Tínhamos a clareza que a nossa discussão
ainda era muito baseada no modelo seriado. Então as metas começam a ser
pautadas em busca de estratégias para avançarmos nessa discussão. Assim, o prof.
Waldeck, o prof. Armando e nós, coordenadoras, ao ouvirmos a escola, percebemos
que o caminho era de fazer uma revisão, e mais do que uma revisão, uma
reconstrução na proposta de ciclos que tinha sido implantada em 1999. E a nossa
questão foi: como que iremos fazer isso? Começamos a elaborar um esboço desse
trabalho, montando os GTs internos. Um para pensar a Educação Infantil, outro,
para pensar a Educação de Jovens e Adultos, outro, para pensar o Ensino
Fundamental, todos esses níveis seriam pensados com considerações a suas
especificidades na lógica de ciclos. Enfim, começamos a estudar, a pesquisar
caminhos que pudessem romper com alguns aspectos da proposta de 1999 que
embora estivessem propondo os ciclos, reafirmavam uma lógica seriada.
(Professora da Rede)
Na fala da professora Marta Nidia, supervisora da Rede desde 2000, atualmente
coordenadora da Educação Infantil e, também de uma das Equipes de Referência:
(...) com a nova gestão, começamos uma discussão interna que na minha opinião
foi um momento riquíssimo. Eu atuava na escola como supervisora também aqui na
coordenação da FME. Então eu participava dos encontros mensais que eram
realizados aqui na Sede, e brigava muito nesses encontros, discutia muito, mas, eu
acho que nem todos entenderam desta maneira, e acho até que muitos se
perguntavam o que eu estou fazendo aqui. Eu vinha “afoita” para essas reuniões,
porque via como um momento único acho que estávamos vivendo um momento
único que nós fomos chamados a começar a construção de uma proposta. Era um
movimento formado inicialmente por duas comissões que organizavam essa
proposta e as questões iam para esses encontros mensais, onde todos nós tínhamos
a oportunidade de opinar de refletir e colaborar.
Como é possível notar, não se tratava, portanto, de uma discussão sobre técnicas e
novos modelos importados para ser experimentados nas escolas, mas sobre a possibilidade de
se pensar coletivamente uma escola “possível” para a Rede Municipal de Educação de
Niterói, a partir das contribuições teóricas sobre os ciclos.
Nessa perspectiva, vale aqui esclarecer que, embora tenhamos apontado esse
Documento como “ponto de partida”, desejamos afirmar que ele é fruto de um movimento de
discussões que vinham acontecendo nos períodos de maio a outubro de 2005. Portanto, é um
Documento que representa a sistematização dessas discussões preliminares, para norteá-las na
trama do cotidiano.
114
3.2.4.2 A recepção do Documento Preliminar na escola: diferentes expressões no
processo
A chegada do Documento Preliminar nas escolas, em outubro de 2005, introduz o
movimento de reflexão e estudo da proposta no seu cotidiano para estruturar os ciclos na
Rede, porém, também intensifica as disputas nos espaços em que transitam os mais diversos
atores, cada qual defendendo seus interesses.
Na visão de algumas escolas, a FME, que se constitui como instância deliberativa e
legitimadora do poder político, propunha através do Documento uma “ação participativa”
mascarada, por isso, essas desprezaram a proposta, mantendo em seu cotidiano a prática
educativa que vinham desenvolvendo. Para outras, embora reconhecessem e considerassem
a FME como instância propícia a defender questões de interesse dominante decidiram se
envolver e estudar o Documento, fortalecendo e sustentando suas decisões na mudança que
tanto desejavam, e também por acreditar, ainda que minimamente, na possibilidade de
trabalhar com ciclos. Também houve escolas que não viam a FME dessa forma, mas, por
razões próprias preferiam não aderir à proposta.
Nesse sentido, a proposta foi ampliando o espectro de influência e de resistências,
através de diferentes expressões que se revelavam nesse período. Essas diferenças levaram-
nos a focalizar a análise em quatro realidades escolares. Duas Unidades que a partir da leitura
do Documento decidiram experimentar a proposta em 2006; e duas Unidades que preferiram
não aderir.
Portanto, aqui buscaremos descrever a dinâmica que cada escola utilizou para se
posicionar diante do Documento Preliminar que indicava dois caminhos possíveis: aderir ou
não à proposta no ano de 2006, em caráter de experimentação.
Iniciemos falando da escola (A). A escola (A), antes de ser inaugurada em 2005,
desenvolvia o trabalho pedagógico em atendimento à comunidade do local onde hoje é
situada, funcionando como “anexo” de uma outra escola da região. Nesse sentido, em 2005,
tem a possibilidade de construir uma identidade própria através da autonomia de seu trabalho,
que passa a ser gerido por um novo grupo de profissionais, a maioria oriunda do concurso
realizado em 2003, que foram chamados naquele período. Também recebe um prédio novo
com excelente infra-estrutura.
Essa escola, que nascia junto com o processo de reconstrução da proposta de ciclos na
Rede, não apresentou subterfúgios para encarar o desafio proposto; pelo contrário, precisava
115
de direcionamentos para sua prática pedagógica, conforme podemos perceber através da fala
da diretora dessa escola:
Em outubro de 2005, a proposta preliminar chegou em nossa escola para que
pudéssemos estudá-la. Não participamos do momento em que os ciclos tinham sido
implantados em 1999, então para nós, aquela proposta que chegava na escola era a
única que conhecíamos e poderíamos ter, ou, não como norteadora de nossas
práticas. Então dedicamo-nos ao máximo para estudá-la e refletir em suas propostas
no período de outubro até dezembro. Nesse período, tivemos que quebrar muitos
tabus. A maioria dos professores que tínhamos, vieram de escola particular e
estavam acostumados apenas com a seriação, apresentando muitas resistências aos
ciclos, embora ainda não o conhecêssemos. Por isso, lemos, estudamos, mas, fomos
percebendo que o nosso grupo é muito de ação. Nós achamos que se ficássemos
apenas lendo e estudando iríamos sempre achar algo que nos gerassem dúvidas e
medos, que é natural em todo processo de mudança. Assim, decidimos abraçar essa
proposta e acolher todos que viessem para nos ajudar, conforme propunha o
Documento. (Diretora da escola A)
Temos também como dado de nossa análise a escola (B). Essa escola que foi
inaugurada em 2004 começou a desenvolver seu trabalho partindo da tentativa de uma
organização ciclada. Conforme nos relata Josélia Alves, uma das supervisoras que compõe a
EAP dessa UE, o ano de 2004 foi um ano de dedicação para estudo dos princípios e
fundamentos que a escola iria adotar em sua prática pedagógica, pautando-se sempre na
proposta de ciclos já implantada na Rede Municipal de Educação desde 1999. Nesse sentido,
complementa:
(...) como estávamos ensaiando já o trabalho com o sistema de ciclos desde o início,
ao chegar a proposta de 2005 sugerindo uma reestruturação, nós discutimos com o
grupo e fizemos uma votação onde a maioria votou a favor da adesão como
experimentação em 2006, embora, tivesse também um grupo expressivo que não
concordou e ainda hoje não concorda em trabalhar com os ciclos. (Supervisora da
escola B)
Sobre esse assunto, encontramos em Morin (2005, p.108) importante contribuição:
A democracia supõe e nutre a diversidade dos interesses, assim como a diversidade
de idéias. O respeito à diversidade significa que a democracia não pode ser
identificada com a ditadura da maioria sobre as minorias; deve comportar o direito
das minorias e dos contestadores à existência e à expressão. (...) Mas, a vitalidade e
a produtividade dos conflitos podem se expandir em obediência às regras
democráticas que regulam os antagonismos, substituindo as lutas físicas pelas lutas
de idéias e que determinam, por meio de debates e eleições, o vencedor provisório
das idéias em conflito.
116
Em contraponto, temos na fala da Silvia Tedesco, outra supervisora da escola (B)
50
, a
seguinte colocação:
Na minha opinião, pelo que entendi dessa proposta, os anos de 2006 e 2007 as
escolas foram convidadas a tornar prático aquilo que estava proposto no
Documento. A nossa escola resolveu na sua maioria aceitar o convite, amesmo
porque nosso pensamento era de que, se essa proposta iria vir para a escola de
qualquer jeito, seria melhor que viesse logo, pois assim estaríamos com um ano
antes de experiência em relação às outras escolas que não acataram, não aceitaram,
mas, esperaram se tornar obrigatória.
Como se pode notar, as escolas que aderiram à Proposta em 2006 tiveram expressões e
formas diferenciadas nesse processo de decisão. Uma porque entendia a necessidade de
experimentar e aprender, fazendo junto com o grupo que, apesar de desconhecer o trabalho
com o sistema de ciclos, demonstrou disponibilidade para aprender; e a outra, porque já vinha
tentando trabalhar com os ciclos e preferiu ganhar esse período de experiência já que em 2007
seria compulsória a experimentação da Proposta.
Quanto às escolas que decidiram não aderir à proposta em 2006, temos a escola (C)
que também é uma escola nova, inaugurada em 2004, portanto, com um grupo de
profissionais novos na Rede, inclusive a supervisão. Por essa razão, o ano de 2005
representava para escola um ano de estruturação. Segundo a supervisora Virgínia:
Nossa escola teve conhecimento da proposta conforme todas as escolas da rede, e
não fez a sua opção de adesão em 2006. Nós vínhamos participando de alguns
encontros na Sede que apontavam caminhos para uma necessidade de reorganizar
os ciclos nessa Rede. Então, em forma de Documento, a escola foi convidada a
participar de um processo de experimentação. Entendíamos naquele momento, que
precisávamos compreender que mudança era essa, não só a mudança que era
proposta, mas a própria concepção do ciclo que não sabíamos. Como essa escola
começou seu trabalho em 2004, a partir de sua inauguração com todos os
professores originários do concurso de 2003 não nos sentíamos seguros para nos
desafiarmos com essa proposta. Achávamos que era muito recente ainda nosso
processo de formação, para estarmos participando de uma renovação de alguma
coisa que não tínhamos vivenciado nem no primeiro momento. Por isso, se
tínhamos a alternativa de participar, no ano seguinte, em 2007, então, queríamos
ganhar aquele tempo sim. Mas, não ficamos parados em 2006. Nos preocupamos
em estudar, ler a proposta e também buscamos autores que falavam especificamente
do trabalho com ciclos.
a escola (D) não é uma escola recente. Pelo contrário, é uma escola que já atende a
comunidade onde está localizada desde 1988, portanto, desenvolvendo 20 anos o trabalho
50
Nessa escola tivemos a oportunidade de ouvir duas supervisoras.
117
pedagógico. Além disso, é uma escola cujo grupo é composto por profissionais que têm uma
história na Rede e, por isso, vivenciaram muitas mudanças e rupturas constantes no seu
trabalho pedagógico, o que possibilita a resistência e, até mesmo, o desanimo de muitos.
Jaqueline, a supervisora de e ciclos que entrevistamos, atua na escola desde 1989, como
professora e, desde 1991, como supervisora. Consideramos relevante mencionar o seu relato:
Considero que em 2006, não nós dessa escola, mas a maioria das escolas da
Rede ainda não se sentiam preparadas para tal proposta. Poderia de dizer que não
nos sentíamos parte daquela proposta que estava começando a ser discutida. E,
como nós sabemos, existe uma série de dificuldades que a escola precisa atravessar
para que a proposta de ciclos aconteça de fato no cotidiano. Mas, no fundo, nós não
havíamos entendido a proposta e nem o chamado que a FME estava fazendo
naquela ocasião. Como a proposta estava ainda sendo costurada, afinal, ela não era
um produto, nós nos sentimos despreparados para fazer um teste. Então, nós
preferimos acompanhar aquele momento, não como uma escola experimental, mas,
acompanhar o processo de discussão, de leitura. A nossa escola, ao contrário do que
muitos pensam, não se fechou a proposta, mas, em 2006 participou indiretamente
pelo caminho da discussão, do entendimento, dos questionamentos, das colocações.
Dedicamos bastante as nossas reuniões de planejamento para isso.
É importante destacarmos que o entrosamento do grupo em cada escola varia também
de sua estrutura. As escolas (A e C) atendem em sua comunidade a Educação Infantil e 1º e 2º
ciclos, a escola (B e D) atende também o e ciclos. Esse dado para nossa análise é
fundamental, pois pudemos perceber que embora todas essas escolas apresentassem
expressões diferenciadas quanto ao processo, tinham também semelhanças quanto algumas
peculiaridades.
Tanto a escola (A), que aderiu a proposta em 2006, quanto à escola (C), que preferiu
aguardar para adesão em 2007, possuíam um grupo que caminhava junto. Aderindo ou não
era um posicionamento de toda a escola, pois, sua estrutura quantitativa possibilitava o
diálogo entre a maioria. nas escolas (B) e (D), percebemos um trabalho mais dificultado
devido o seu quantitativo. Contudo, isso não significa que não conseguiram caminhar, mas,
esse dado não pode ser ignorado, pois cada uma buscou realizar seu trabalho dentro de suas
possibilidades.
De um modo geral, o que observamos foi que o processo em si de participação e
proposições não foi entendido palas escolas logo no início. As escolas em geral, tentaram se
adaptar com uma realidade que estava sendo proposta, detendo suas preocupações muito
focadas no seu cotidiano e buscando qual seria a melhor forma de gerir um “novo processo”
de mudança sem que viesse interferir tanto na sua prática. Contudo, desconhecendo e/ou
desconfiando da necessidade de participação e discussão para uma reconstrução coletiva.
118
Além disso, nas escolas em que o diálogo e a participação dos diferentes sujeitos nas
decisões fazia parte das rotinas, percebemos mais predisposição para aderir ao convite da
FME. Já nas escolas em que o papel desempenhado por alguém que exerce uma liderança na
escola foi identificado como limitador do envolvimento de todos em processos decisórios
dificultou quando apenas se utilizou do “lugar” que ocupa para legitimar as próprias escolhas.
3.2.4.3 Experimentação opcional: a articulação da proposta no decorrer do ano de 2006
A reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria/prática
sem a qual a teoria pode ir virando blábláblá e a prática, ativismo.
Paulo Freire
Conforme o Documento Preliminar vinha apresentando em sua escrita, as escolas da
Rede municipal de Educação de Niterói são convidadas a experimentar as novas propostas
nele apresentadas durante o ano de 2006, como oportunidade de vivenciar outra forma de
organizar sua prática, com base na lógica de ciclos. Além disso, propunha que as escolas
pudessem através dessas vivencias, intensificar seus tempos de estudo e de reflexões sobre os
ciclos, de modo que pudessem oferecer críticas e sugestões à proposta preliminar.
Nesse contexto, é importante assinalar que nem todas as escolas optaram por
experimentar a nova proposta. Das então 49 unidades escolares, 23 optaram pela
experimentação
51
após assumirem sua opção através da Carta Compromisso
52
. Visualizando
esse quantitativo no gráfico temos a seguinte disposição:
51
Essa relação de escolas inclui todos os níveis, não se limitando ao Ensino Fundamental que é o que temos
centrado a nossa pesquisa.
52
A carta compromisso foi assinada por 23 escolas que aderiram à proposta contida no Documento Preliminar
(FME, 2005), assumindo-se como “escolas-pólo”(expressão utilizada recorrentemente entre os profissionais da
rede ao fazerem referência a tais escolas).
NÃO
53%
SIM
47%
119
É importante observarmos que essa representação significativa de escolas que
estiveram abertas à atividade reflexiva da proposta a partir da experimentação em 2006,
intensificou o processo, na medida em que abriu novas possibilidades de invenção e criação
através da prática. Portanto, trata-se de um movimento que parte da escuta atenta da realidade
e ousa apostar em algumas projeções.
Até mesmo as escolas que não optaram pela experimentação da proposta em 2006,
também se viram enredadas num processo de reflexão sobre os ciclos, que as colocavam em
condições de intervir com proposições sobre a construção da proposta.
Essa possibilidade aberta às escolas sugeriu uma prática tomada pela curiosidade.
Conforme nos lembra Freire (2005a, p.41):
As pessoas então fazem de seus discursos um panorama que é possível fazer. Não se
limitam apenas àquilo que deve ser feito. As pessoas descobrem com a prática as suas
possibilidades. Mesmo dentro dos limites analisados, as pessoas organizam esforços
para viabilizar o que está sendo difícil de ser feito. Penso que esse processo
amadurece politicamente os intelectuais e os grupos populares. Penso que nesse
processo as pessoas não se limitam a discutir sobre conteúdos, mas as pessoas
discutem sobre as dimensões e os momentos da prática. (Freire, 2005, p.41).
Nesse sentido, o ano de 2006 foi dedicado ao dinamismo da aprendizagem, tanto da
escola como da FME que estavam imersos a um processo de fazer e refazer cotidianamente.
Foi um ano que as relações puderam se estreitar, pois o diálogo da prática era fundamental.
Muitas reuniões, encontros, seminários contribuíram para essas reflexões. Entretanto, era
possível percebermos que essas mediações não determinavam uma “prática modelo”, mas, ao
contrário, o coletivo da escola era fortalecido na busca diária da avaliação do caminho que
iam descobrindo dentro da proposta, assim, contribuindo no aperfeiçoamento do processo.
Não podemos negligenciar também, as dificuldades enfrentadas nesse processo.
Embora seja muito bonita a abertura de interação e criação nesse processo, suas contradições
peculiares foram surgindo na caminhada. Desafios cotidianos, estruturais, administrativos,
todos esses aspectos tornam-se abordagem de debates e inquietações na escola. Esse aspecto
vem carregado de queixa da escola, especialmente dos professores que afirmam não se
sentirem preparados para exercer sua atividade profissional conforme as novas exigências do
trabalho com ciclos, além de denunciarem a incompatibilidade da infra-estrutura que algumas
escolas do município apresentam com a demanda de recursos humanos e materiais que essa
proposta exige.
120
Cabe observarmos ainda que “algumas escolas não participaram das discussões e
produções que ocorreram nos últimos anos, assumindo um silenciamento quanto às propostas
que foram e estão sendo construídas para e sobre a educação em ciclos no município”
(Consultoria, 2006, p.28).
3.2.4.4 Convocação: todas as escolas de e ciclos do Ensino Fundamental
experimentam a proposta no ano de 2007
Logo quando iniciamos a pesquisa, uma das críticas que mais ouvíamos entre os
profissionais que participavam das discussões versava sobre uma afirmação contida no
Documento Preliminar, a saber:
(...) ao serem postas em prática, as propostas aqui apresentadas passarão por
permanente avaliação, fazendo com que este Documento Preliminar sofra revisão e
ajuste, para que, no ano de 2007, passe a vigorar plenamente para todas as
Unidades Escolares da Rede (FME, 2005, p.3).
De acordo com as resistências e críticas formuladas a esse respeito, fomos percebendo
o quanto essa questão incomodava e contribuía para alimentar um ceticismo em relação ao
processo instalado em 2005. Mesmo para algumas escolas que aderiram por opção à proposta
em 2006, esse aspecto era problemático. Algumas, como apontamos anteriormente, fizeram A
adesão sem acreditar enfaticamente na possibilidade democrática, mas, pelo medo de se
verem obrigadas a implementar a proposta sem participar da sua construção. Esse fator por si
só já dificultou o processo, pois:
A ação sem desejo torna-se linear. Fazer de conta que se tem o desejo, se, de fato,
não se tem, é um desastre para a própria ação. Uma vez que sem o desejo não se
investe na construção dos resultados que se espera, fazer de conta que se tem um
desejo é um modo de não se entregar à ação. Não importa a razão pela qual não se
está entregue àquele ato ou situação específica. Importa ter ciência de que sem a
entrega não é possível construção bem-sucedida. A ausência do desejo, na
construção de resultados, manifesta-se sob um modo apático de conduzir os atos do
cotidiano. Não “garra”, vai-se mais ou menos. E, então, a vida, as práticas, os
resultados, tudo se torna linear e comum. Não ocorre vibração, alegria e por isso,
também não ocorrem resultados significativos, alegres e felizes. (Luckesi, 1998,
p.152).
Contudo, o próprio processo foi apontando a necessidade de um tempo maior para a
construção da proposta, ampliando assim o movimento de experimentação. Nesse sentido, o
ano de 2007 representou para o processo em andamento um ano ainda aberto a proposições
121
das escolas, mas com a obrigatoriedade da experimentação, de modo a suscitar a intervenção
de todas.
Entendemos que, na medida em que as pessoas que se organizam, encontram motivos
para agir de determinada maneira, definem para si mesmas o que querem fazer e o que podem
fazer, entre diversas possibilidades de ação, não se restringindo ao que lhes é determinado.
Certamente, a expressão desse movimento variou, pois, cada escola atuou de forma
diferente. Umas, fazendo por fazer; outras, buscando melhores caminhos para a ação e
compartilhando suas experiências; outras, ainda, exercendo sua função, porém, fechadas ao
diálogo. Enfim, assim como os anos de 2005 e 2006, o ano de 2007 também foi um ano para
reflexões críticas sobre a prática e para confrontar o que estava sendo proposto com aquilo
que estava sendo vivenciado no cotidiano. Além disso, no ano de 2007, avançou-se na
avaliação e na busca de novos caminhos direcionados a partir da experiência que a Rede teve
em 2006, bem como na apuração de suas fragilidades.
3.2.5 Formas de realização: o instituído e o instituinte no processo de reconstrução da
proposta pedagógica em ciclos
Conforme pudemos apreender, alguns movimentos de debates e discussões deram
origem ao processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos a partir do
encaminhamento do Documento Preliminar. Entretanto, esses movimentos foram iniciais,
necessitando, portanto, de estratégias que pudessem encaminhar o processo instalado em
2005.
Desse modo, dedicamos esta seção à descrição e à análise das táticas e espaços que
foram instituídos pela FME para dinamizar a participação e o diálogo no processo de
reconstrução da proposta, assim como, as estratégias e as práticas instituintes desencadeadas
nesse movimento. Dessa forma, buscamos desvelar quais foram as condições criadas pelos
gestores e pelas próprias escolas para propiciar a participação dos sujeitos nas diferentes
etapas vivenciadas nesse processo.
Instituir espaços e estratégias para a realização de um processo participativo e
democrático sem dúvida exige esforço, dedicação e convicção política para esse trabalho. As
principais ferramentas relacionadas ao processo devem proporcionar a dialogicidade, o
protagonismo coletivo e a participação máxima de todos os indivíduos envolvidos no
movimento. Contudo, de que forma realizá-lo?
122
Vivenciamos, no decorrer da pesquisa, algumas estratégias participativas direcionadas
pela FME. Elas se desenvolveram por meio de plenárias, seminários, painéis, encontros,
cursos e outras ações de formação, reuniões e conversas, que tiveram como objetivo assegurar
diversificados fóruns de debate, de reflexão e de formulação de propostas educacionais, com a
presença de diferentes sujeitos da comunidade escolar. Esse processo, também desenvolvido
nas unidades escolares, visava possibilitar o diálogo e a participação na construção de
princípios e de diretrizes, fundamentos da proposta pedagógica da Rede Municipal de
Educação de Niterói.
Tais estratégias tiveram como alvo envolver os dirigentes, pedagogos e professores,
tanto das unidades escolares como da FME, além dos pais e familiares dos alunos, que foram
convidados a participar desse processo. Entretanto, vale ressaltar que os processos
participativos desenvolvidos pela FME incorporam atores diferentes em cada uma das suas
etapas.
Procuramos, ao longo do nosso estudo, participar dessas estratégias, sempre que era
possível. Por isso, nos propomos aqui a descrevê-las, tendo como base as observações que
fizemos quando dessas vivências. Para tanto, partimos da seguinte consideração:
Quando se fala na participação em seu aspecto prático de processo participativo,
muitas pessoas pensam em grandes plenários, onde através de votações se alcancem
decisões. algo de louvável nisto. Contudo, isto é precário porque não parte de
uma visão teórica lúcida nem gesta uma prática transformadora. Em geral, destrói a
possível participação. Muitas vezes, este tipo de prática “participativa” é o modo
com que algumas autoridades conseguem enganar grupos que desejam a
participação: eles mesmos, as autoridades, limitam o campo e a forma de
participação, preservam para si o poder e aceitam que algumas decisões devam ser
tomadas por todos, desde que fiquem claros os limites e que as autoridades
continuem decidindo sobre o que o povo deve decidir. Mesmo quando se tratar de
uma tentativa honesta de criar participação, este modo de agir leva a becos sem
saída, a intermináveis discussões, à valorização do pronunciamento de alguns em
detrimento do pensamento coletivo, ao distanciamento entre grupos rivais e ao
reforço do corporativismo. (Gandin, 2002, p.120).
Desse modo, Gandin (2002) pontua a necessidade que os sujeitos, participantes de um
processo coletivo, têm, no que tange à atuação em três momentos interligados, porém
distintos, do processo de participação: o individual; o de subgrupos; o de plenário. A esse
respeito, o autor enfatiza:
· não pode haver processo participativo se não acontecer o pronunciamento
reiterado de cada pessoa, por si, não como parte do grupo; o
posicionamento pessoal cria consciência, permite encaminhar questões e
incorporar conhecimentos necessários;
123
· as decisões sobre o rumo, o esclarecimento e o julgamento sobre a prática
real do grupo num determinado momento, o estabelecimento de caminhos
concretos acontecerão nos pequenos grupos; será que todos e cada um
poderão, a partir de saberes e opções diversas, construir o coletivo;
· o plenário é importante, não como lugar de decisão, mas como espaço para
que cada pequeno grupo apresente sua contribuição, a fim de que novas
sessões de pequenos grupos ou novas avaliações pessoais possam valer-se
de toda a grande riqueza que aparecer. (Gandin, 2002, p.122).
Para uma análise esclarecedora, consideramos que a FME, ao propor um processo de
participação, com ênfase na dialogicidade e na coletividade, contava com a ativa atuação,
tanto da Equipe de Referência da FME como da Equipe de Articulação Pedagógica das
escolas, que teriam a função de possibilitar os dois primeiros momentos mencionados por
Gandin (2002). Era de extrema importância que os sujeitos, ao serem chamados a participar
de espaços “maiores”, tivessem o seu posicionamento pessoal e coletivo para intervir e
contribuir com posicionamentos, críticas e sugestões. Contudo, o que notamos, ao longo desse
trabalho, foi o esvaziamento dos espaços devido ao desconhecimento e ao despreparo
manifestados pelos profissionais que chegavam para discutir e debater. Assim, entendemos
que os espaços e as estratégias oferecidas pela FME poderiam ter sido potencializados, se
houvesse uma freqüente articulação das variadas formas de realização desse processo.
Entretanto, essa observação não desconsidera os posicionamentos acalorados e engajados na
discussão, que muito contribuíram nesse processo. Além disso, na proposição de Freire (2005,
p.107), “ninguém é autônomo primeiro para depois decidir. A autonomia vai se constituindo
na experiência de várias, inúmeras decisões que vão sendo tomadas”. Assim, notamos que as
pessoas foram aprendendo, através desse processo, a participar.
No que se refere à coerência entre as estratégias e os objetivos adiantados nos
discursos feitos pela FME acerca do desejo de um processo democrático, constatamos certa
adequação entre o que se diz e o que se faz. A multiplicidade e a abertura permanente dos
espaços participativos respondem à vontade de incluir o máximo de sujeitos no debate
público, estimulando uma participação livre e aberta.
Entretanto, será que as novas estratégias democráticas permitem dar acesso à
participação, ao diálogo e à decisão aos diferentes sujeitos da educação? A análise das
principais ferramentas Seminários, Encontros, Formações, Acompanhamentos, Conversas
com a Comunidade indica que as experiências têm uma dimensão inclusiva, ao estimular a
participação e a atuação dos diversos atores da Educação Pública Municipal. Porém, sua
efetividade depende da atuação consciente dos sujeitos. Nesse sentido, pudemos perceber que
124
essas estratégias oscilavam entre a simples presença de alguns profissionais e a influência
direta de outros na intervenção e nas decisões que movimentaram o processo.
Poucas foram as atitudes dos educadores que poderiam ser classificadas como
indiferentes. Esses poderiam até não concordar ou sustentar o processo em consensos, mas
defendiam suas opiniões e reivindicavam suas angústias, na medida em que reclamavam da
falta de infra-estrutura e da falta de discussão sobre a política, frente às dificuldades que
enfrentavam no contexto escolar.
De modo geral, podemos considerar que houve oportunidades de discussão e espaços
para participação e atuação dos diferentes sujeitos no processo de formulação e reconstrução
da política de ciclos no município de Niterói.
3.2.5.1 Estratégias instituídas pela FME
Os Seminários
É certo que temos de estudar, mas porque não estudar antes de mais nada , a
própria prática? Por que não tornar a nossa prática objeto de estudo?
Celso Vasconcellos
Os seminários
53
foram realizados no decorrer do ano de 2006, tendo como objetivo
proporcionar espaço-tempo para a socialização do trabalho que as “escolas-pólo” estavam
desenvolvendo, a partir da proposta de ciclos esboçada no Documento Preliminar (2005).
Todas as escolas e profissionais foram convidados a participar, interagindo com sugestões e
proposições. É importante destacarmos que os seminários foram organizados pela FME em
parceria com os pedagogos das escolas, que participaram de alguns encontros na sede com o
intuito de prepará-los.
O primeiro seminário, cujo tema era “Ciclos: experiências da Rede Municipal de
Niterói” foi realizado em julho de 2006, no auditório das Faculdades Integradas Maria
Thereza. O evento compreendeu uma mostra de trabalhos das escolas, comunicações orais e
debates protagonizados por oito “escolas-pólo”. O segundo, com o tema “Ciclos: refletindo
sobre novas experiências”, foi realizado em dezembro de 2006, no auditório da Unilassalle,
53
Cabe aqui esclarecer que estamos nos referindo apenas aos seminários voltados para a discussão da proposta
de reorganização dos ciclos. Afinal, desde 2005, foram inúmeros, e tematicamente variados, os seminários,
colóquios e outros eventos realizados pela FME.
125
sob o formato de mesas-redondas, seguidas de debate, com a participação de quatro escolas
expositoras. Cada um desses seminários contou com a presença de aproximadamente 300
profissionais da rede municipal.
Essa estratégia, instituída pela FME, revelava-se como uma modificação da relação da
FME com as escolas. Historicamente, a FME, como órgão central, era quem ministrava as
palestras, no intuito de formar as escolas. Com essa estratégia, aquela lógica sofre uma
inversão, possibilitando-se a vivência de novas formas de gestão dos processos educacionais,
na medida em que se revela a importância de a escola compartilhar e trocar suas experiências
e construir novos conhecimentos sobre o fenômeno estudado e problematizado nas práticas
escolares. Numa avaliação dos seminários, a professora Leda Marina relata:
Nós, enquanto uma gestão que se pensa mais dialógica, mais em contato com as
pessoas, eu acho que conseguimos avançar muito. Eu vejo assim, (...) hoje, as
pessoas se colocam de outra maneira, valorizando muito mais a troca, não está
focado mais na Equipe que está aqui na FME, gerindo. Nós, da FME fazemos a
mediação do trabalho, mas não é mais em formato de palestras em que damos
várias orientações (Coordenadora de 1º e 2º ciclos da FME)
Então, ao analisarmos essa estratégia instituída pela FME durante o processo, foi
possível apreender duas interpretações. A primeira nos mostra a possibilidade aberta à escola
para socializar sua prática, problematizando avanços e recuos no cotidiano frente à proposta
em reconstrução, ou seja, possibilita a abertura de novos olhares para o cotidiano e viabiliza
meios para que os sujeitos da escola se tornem protagonistas da proposta. A outra refere-se à
maneira pela qual a escola se posicionou frente a esse chamado. Com a incumbência de
socializar a sua prática, algumas escolas que participaram do seminário o utilizaram aquele
espaço para, de fato, refletir sobre a proposta em construção. Mas, preocupadas em mostrar o
seu trabalho, fizeram uma exposição “edulcorada”, demonstrando uma versão da escola
diferente das tensões enfrentadas no cotidiano.
A partir dessas interpretações, é possível considerarmos que, ao mesmo tempo em que
essa estratégia avança a partir da possibilidade de troca que a escola conquista nesse processo,
não é suficiente:
(...) ter a prática como objeto não pode significar uma feira de relatos de
experiências, sem confronto das práticas entre si e com o referencial da escola, sem
sistematização. Fazer do trabalho coletivo um espaço de práxis não é, portanto,
tarefa simples. (Vasconcellos, 2006, p.163)
Convém ressaltarmos, também, que a questão da cultura instalada nessa Rede está
inteiramente contemplada nesse modelo, o que suscita de antemão que nesse processo a Rede
126
vem construindo aos poucos novas formas de relação. Parece que, em vez de
questionamentos, a Rede se acostumou às explicações e compreensões que conduzem a meras
adaptações. Então, ao acompanharmos a repercussão dessa experiência das escolas no
seminário, notamos um movimento que permitia a reversão dessa tendência, na medida em
que puderam se auto-avaliar, questionando a sua própria experiência, e confrontar o que
estavam expondo, com o que, de fato, acontecia. Na avaliação da professora Marta Nidia:
As pessoas se preocuparam muito, as próprias escolas. Ao ver aquilo que não
correspondia com a realidade tiveram que fazer um exercício muito sério de
entender o que estava distanciando o discurso da prática. A meu ver, foi um
pequeno passo, mas, para aquela escola perceber isso, pode ter sido uma revolução.
Dentro daquilo que eles estão caminhando eu acho que é um exercício cotidiano.
(Coordenadora da Equipe de Referência da FME)
Enfim, uma das tônicas desse processo vivenciado através dos seminários foi perceber
que a escola sai de um lugar de receptora, para atuar como formadora e problematizadora da
sua prática, no espaço aberto para a participação e a dialogicidade. Além disso, sair do seu
espaço isolado e se perceber no coletivo foi um ganho para as escolas que participaram do
seminário. Assim, não podemos deixar de mencionar a importante atuação das escolas nos
seminários, compreendendo que sua interlocução marcou uma política de defesa das relações
democráticas; abriu novos caminhos para a construção de sua autonomia e (re) significou as
experiências que separavam a FME das unidades escolares. Entretanto, reconhecer essa
estratégia como um passo inicial, ainda em construção, é fundamental para não
desconsiderarmos as fragilidades que ainda subsistem.
Encontros
Ao iniciar o processo de reconstrução da proposta em ciclos na Rede Municipal de
Educação de Niterói, a FME buscou investir intensamente em Encontros, que eram realizados
em diversos espaços. Esses Encontros contribuíram para a formação conjunta da Rede em
relação ao processo instalado em 2005, possibilitando sempre o debate com questionamentos
e sugestões acerca do movimento.
Compreendendo a importância de informar e manter os profissionais sempre
contextualizados sobre o processo que vivenciavam, muitos Encontros realizados no início de
2006 e 2007 tiveram o objetivo de acolher e integrar Supervisores e Orientadores que
prestaram o concurso em 2003 e estavam sendo convocados naquele período.
127
Além disso, conforme relata a professora Leda Marina, 2006 foi um ano de muito
investimento na formação e construção do coletivo de Pedagogos e Diretores das unidades
escolares, visto que esses sujeitos seriam responsáveis pela articulação desse processo nas
escolas junto com as Equipes de Referência da FME.
Nesse sentido, ao participarmos de alguns desses Encontros de Pedagogos e Diretores
das unidades escolares realizados pela FME, pudemos pontuar as seguintes considerações
sobre esse movimento, que destacamos a partir da nossa observação:
· Proporcionou a organização dos sujeitos para participar dos momentos de reflexão
e debate sobre a escola;
· Viabilizou a participação em uma instância de decisão sobre os rumos da escola e
os parâmetros de uma política pública;
· No caso da relação entre a FME e as unidades escolares, propiciou uma percepção
de que todos têm direito e responsabilidade de opinar e decidir sobre melhores
caminhos para a Educação Municipal, promovendo, assim, um comprometimento
conjunto.
Entretanto, também foi possível notar que:
· As atuações e participações mais ativas partiam na maioria das vezes dos mesmos
sujeitos;
· Percebíamos pessoas que se apoiavam no discurso de outros;
· Mesmo havendo Encontros voltados para a contextualização dos profissionais na
história da Rede, a falta de envolvimento de algumas pessoas nesses espaços de
participação, em alguns casos, devia-se ao desconhecimento do momento que a
Rede vivenciava;
· As insuficiências do estudo sobre a proposta no espaço escolar comprometiam a
participação dos sujeitos na FME.
A partir da avaliação realizada no final do ano de 2006, algumas medidas foram
tomadas para o ano de 2007, de modo que a FME pudesse viabilizar a maior participação
possível dos professores nesses Encontros, visto que até então sua participação e intervenção
no processo tinham se dado a partir das articulações e mediações realizadas nas escolas
pela EAP e pelas Equipes de Referência da FME. As constantes mediações realizadas por
128
essas equipes citadas tinham a função de discutir, estudar, problematizar, acompanhar e
mediar espaços de diálogo sobre a proposta em construção, no espaço-tempo da escola, com
os professores, tanto das escolas que aderiram à proposta em 2006, quanto das escolas que
aderiram em 2007.
Segundo a FME, em 2006 ainda não havia tido nenhuma iniciativa para reunir
professores, na Sede, para discussão exclusiva da proposta
54
, pois se considerou necessário
priorizar inicialmente a formação dos sujeitos articuladores da escola. Além disso, havia
dificuldades administrativas para promover constantemente encontros com todos esses
profissionais fora da escola.
Nesse sentido, percebemos grandes fragilidades no processo quanto à participação
desses profissionais, pois, sua interação e participação autônoma e ativa dependeram, em boa
parte, das articulações que eram desenvolvidas nas escolas. Assim, ao serem convocados em
maio de 2007 para participarem do “Encontro de Professores: a proposta pedagógica em
discussão” algumas dificuldades foram notáveis para uma participação autônoma, crítica e
conscientizada de seu direito de opinar e de decidir os rumos do processo.
A dinâmica do Encontro aconteceu da seguinte forma: foram direcionados dois dias
para o Encontro: um seria reservado para a discussão e a problematização do conteúdo teórico
de fundamentação da proposta “Escola de Cidadania”, ainda em construção; e o outro para
sugestões e proposições acerca da minuta da proposta. Nesses dois dias, dividiu-se a atividade
em dois turnos: um grupo trabalhou pela manhã e outro grupo trabalhou à tarde. Assim, as
mediações realizadas nesses Encontros promoveram, no primeiro dia, a divisão de grupos de
professores para que, em conjunto, discutissem uma parte da fundamentação da proposta e,
em seguida, socializarem a discussão na plenária. Quanto ao segundo dia do Encontro, foi
reservado para que os professores, no decorrer da leitura da minuta, pudessem propor
sugestões de mudanças e alterações. Para tanto, o objetivo do Encontro, conforme relatou a
FME, era:
(...) levar em consideração todas as vozes, discussões, embates e confrontos de
idéias. Tudo isso é parte de uma política pública que se quer verdadeiramente
democrática. Reunir e proporcionar o encontro de professores para um olhar mais
minucioso sobre a proposta é parte do movimento de trazer para o bojo do debate
todos os atores que, não estão envolvidos, mas que experimentam os
desdobramentos do que é institucionalizado no di-a-dia de seus fazeres. Enfim, este
é um momento de (re) elaboração para que sejamos co-partipes do pensar e
formular a proposta pedagógica da Rede Municipal de Educação de Niterói.
54
Nesse percurso, ocorreram formações, cursos, enfim, movimentos que envolveram os professores na Sede. No
que se refere à reconstrução da proposta pedagógica em ciclos, o primeiro Encontro aconteceu em maio de 2007.
129
Contudo, no decorrer do Encontro, foi possível percebermos que:
· Muitos professores desconheciam a proposta e o processo;
· Muitos tiveram acesso apenas à minuta e já estavam trabalhando nesse formato na
escola; contudo, desconheciam a discussão teórica e contextualizada da proposta;
· Muitos não se reconheciam no processo de discussão, afirmando em seus discursos
que apenas estavam realizando o que estava posto;
· A participação em muitos momentos restringiu-se a apontamentos sobre correção
ortográfica da proposta, sem apresentar aprofundamento crítico sobre seu conteúdo.
Nesses Encontros, muitas interferências foram suscitadas, apontando a angústia desses
profissionais quanto ao seu trabalho cotidiano e às dificuldades que enfrentariam, a partir das
mudanças suscitadas na proposta. Demonstrava-se, dessa maneira, a necessidade de espaços
onde os professores pudessem ser ouvidos pela FME. Embora a constituição das Equipes de
Referência tenha tentado dar conta dessa questão, muitos profissionais ainda não as
reconhecem como Equipe de ligação da FME com as escolas, mas as vêem como
fiscalizadora de seu trabalho, criando, dessa maneira, resistência e barreiras para uma relação
mais coletiva.
Por isso, notamos que a falta de discussão dos professores no próprio espaço-tempo da
escola foi um dos fatores que esvaziou a participação desses profissionais, apontando, assim,
para a necessidade de intensificar os espaços de discussão na escola, além de suscitar a
necessidade de se contar com instrumentos que permitam aprimorar a capacidade dos
dirigentes e dos técnicos destas instituições para produzir uma nova cultura de gestão
educacional e as competências a ela correlatas. Por outro lado, é possível considerarmos,
também, que a abertura desses espaços fomentou e estimulou a participação mais ativa desses
profissionais nas escolas, pois, ao constatarem o seu desconhecimento acerca do processo,
muitos voltavam para a escola, cheios de questionamentos e inquietações.
Frente a essas dificuldades enfrentadas pela FME para “promover” a participação dos
professores, algumas reuniões internas foram realizadas na FME, buscando-se direcionar
novos encaminhamentos para que os professores estivessem, de fato, envolvidos no processo.
Afinal, a participação e a contribuição dos mesmos são de extrema importância, uma vez que
são esses profissionais que fazem uso diário da política construída. Recorrendo a Freire
(2005b), entendemos que:
130
(...) quem tem o que dizer deve assumir o dever de motivar, de desafiar quem
escuta, no sentido de que, quem escuta diga, fale, responda. É intolerável o direito
que se a si mesmo o educador autoritário de comportar-se com o proprietário da
verdade de que se apossa e do tempo para discorrer sobre ela. Para ele, quem escuta
sequer tem tempo próprio, pois o tempo de quem escuta é o seu, o tempo de sua
fala. Sua fala, por isso mesmo, se dá num espaço silenciado e não num espaço com
ou em silêncio. Ao contrário, o espaço do educador democrático, que aprende a
falar escutando, é cortado pelo silêncio intermitente de quem, falando, cala para
escutar a quem, silencioso, e não silenciado, fala. A importância do silêncio no
espaço da comunicação é fundamental. De um lado, me proporciona que, ao
escutar, como sujeito e não como objeto, a fala comunicante de alguém, procure
entrar no movimento interno do seu pensamento, virando linguagem; de outro,
torna possível a quem fala, realmente comprometido com comunicar e não com
fazer puros comunicados, escutar a indagação, a dúvida, a criação de quem escutou.
(Freire, 2005b, p.117- destaque do autor).
Para tanto, encaminhou-se um novo movimento a partir do semestre de 2007, onde
as Equipes de Referência da FME e as coordenações foram até as escolas para uma reunião
especifica com os professores, cujo objetivo era garantir a contextualização do processo,
esclarecer o movimento iniciado em 2005, do qual todos deveriam estar participando, e
motivar a atuação desses profissionais. Entendemos que “ninguém é sujeito da autonomia de
ninguém” (Freire, 2005, p.107), mas sabemos que a motivação e a mediação para que os
sujeitos interajam em um processo é fundamental.
A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. Não
ocorre em data marcada. É nesse sentido que uma pedagogia da autonomia tem de
estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale
dizer, em experiências respeitosas da liberdade. (Freire, 2005, p.107)
Esse processo, chamado de “Encontro com as Escolas”, mas também apelidado de
“Corrida às Escolas”, pelo intenso movimento de trabalho que suscitou, percorreu todas as
unidades escolares em todos seus turnos de funcionamento, envolvendo pessoalmente o
próprio Secretário de Educação e seus colaboradores mais diretos no debate. Quanto a esses
movimentos, tivemos a oportunidades de participar de dois Encontros. Um, na escola (A), que
foi enriquecido com muitas proposições dos professores e mediado com bastante diálogo.
Outro, na escola (B), que, embora tenha aderido à proposta em 2006, revelou que seus
professores demonstravam desconhecer muitos aspectos, tanto do processo quanto da
proposta. O encontro, então, tornou-se um encontro mais expositivo do que dialógico.
Dessa forma, percebemos que se, por um lado, crescem os movimentos organizados que
reivindicam participação e pressionam os governos para assegurar seus direitos e condições
de intervir e decidir na política educacional, por outro, notamos que a formação desses
profissionais não condiz com ações democráticas e intervenções dialógicas e participativas.
131
Como raramente efetivos canais de debate, reflexão e participação, os profissionais da
educação enfrentam fortes barreiras para se apropriarem do conjunto de informações e
decisões públicas, quando esta possibilidade concretamente se coloca.
Assim, é possível afirmar que houve, a partir dos Encontros, espaço direto para a
participação de diferentes sujeitos, mas a forma como esses indivíduos, tanto os
representantes da FME, quanto os que atuam nas unidades escolares, fizeram uso dele não
garantiu uma participação política com contribuições e intervenções concretas para a
proposta. Essa, sem dúvida, sofreu várias modificações a partir das experiências que as
escolas tiveram e foram relatando. Entretanto, poderíamos dizer que o grande ganho desse
processo revelou-se pela promoção de novas experiências, ainda que tímidas e imaturas, mas
que apontaram para o desejo democrático e participativo na construção de políticas públicas
municipais.
Sendo assim, podemos considerar que esses Encontros trouxeram frutos para esse
processo, na medida em que nesses espaços houve um intenso investimento para mobilizar a
participação. Entretanto, de acordo com os Encontros de que participamos na FME, ter
“disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para abertura à fala do outro, ao
gesto do outro, às diferenças do outro” (Freire, 2005, p.119) é um exercício que necessita
ainda de muito aperfeiçoamento.
Contudo, em alguns pontos foi possível notar um grande esforço para que os sujeitos
tentassem romper com uma fala autoritária, mas, sem dúvida, isso será conquistado com
muita prática e com a possibilidade de se refletir sobre ela. Sobre esse aspecto, Freire (2005,
p.116) assinala:
Nesse caso falar a, que, na perspectiva democrática é um possível momento do
falar com, nem sequer é ensaiado. A desconsideração total pela formação integral
do ser humano, a redução a puro treino fortalecem a maneira autoritária de falar de
cima para baixo a que falta, por isso mesmo, a intenção de sua democratização no
falar com.
Portanto, percebemos que os Encontros realizados avançaram rumo à abertura do
diálogo entre os sujeitos que compõem a Rede Municipal de Educação de Niterói, o que pode
ser sustentando pela fala de uma supervisora da Rede:
Eu acho que o grande ganho dessa proposta foi ter fortalecido mesmo que com
algumas arestas, a relação FME e ESCOLAS. Nunca estivemos tão próximos. Isso
não quer dizer que estamos concordando com tudo, mas estamos juntos para
discordarmos, discutirmos. o ficamos separados. (Jaqueline, Supervisora
educacional da Escola D).
132
Formação Continuada
Os movimentos de formação continuada, que também são um diferencial da nova
proposta, acontecem não em grandes eventos, mas em discussão muito próxima ao cotidiano.
Em 2006, essas formações, que aconteceram também nos Encontros mencionados, foram
realizadas através das reuniões, por pólo, de Diretores e de Pedagogos, além de acontecerem
semanalmente nas escolas, com vistas ao estudo e à reflexão da proposta em construção. Foi
nessa relação que as escolas começaram a estudar sobre os ciclos e a buscar subsídios
teóricos, a partir da prática que vivenciavam.
É interessante pontuar que, além das escolas estarem vivenciando esse movimento de
reflexão e de descoberta de caminhos, a partir do próprio trabalho que estavam realizando, a
FME, representada pela sua equipe, experimentava a mesma dinâmica. Na verdade, todos se
viram diante do desafio de entender o trabalho em ciclos.
Além disso, a partir da constituição das Equipes de Referência da escola, formada por
profissionais de diferentes coordenações, a formação continuada na escola procurava atender
a demanda de cada contexto. Assim, quando se notava a necessidade de trabalhar a questão,
por exemplo, da Educação Especial, a Equipe de Referência da FME mediava estudos na
escola e, assim, ia acontecendo com as outras áreas também. Ou seja, ao perceberem uma
necessidade através do acompanhamento que faziam na escola, ou por solicitação da própria
escola, a Equipe de Referência da FME auxiliava a escola na mediação de estudos,
procurando abordá-los sempre na perspectiva da proposta em construção.
Em 2007, essas formações se intensificam na escola, devido à avaliação do processo
realizada no final de 2006. Então, ao articular as observações feitas pelos Delegados, o
acompanhamento feito pelas Equipes e os relatórios produzidos nos Encontros e Seminários
realizados no decorrer de 2006, a FME entendeu que necessitava fortalecer alguns temas na
escola para que o trabalho com os ciclos fosse viabilizado. Assim, todas as Equipes de
Referência da FME mediaram, nas escolas que acompanhavam, as formações sobre três
temáticas fundamentais para o trabalho em ciclos, a saber: mediação pedagógica, avaliação e
currículo.
É importante pontuarmos em nossa discussão que “a dialogicidade não nega a validade
de momentos explicativos, narrativos” (Freire, 2005a, p.86), pois, costumamos ouvir com
freqüência algumas distorções sobre esse assunto.
133
Essa dinâmica de formação, no entanto, trouxe fortes questionamentos para a própria
Equipe de Referência da FME, que não concordava com essa medida. Ao participarmos de
uma reunião na FME com uma Equipe de Referência, ouvíamos algumas falas do tipo:
“Minha formação não tem nada a ver com esse tema, não me sinto à vontade para falar sobre
isso na escola”. Enfim, percebíamos um incômodo nas pessoas, ao se verem num processo
que mobilizava, em primeira instância, a pesquisa conjunta na FME. As Equipes de
Referência também se viram em processo de formação e isso, a nosso ver, foi muito
interessante. Sob essa exigência, a Rede resgata a importância de se reconhecer em
permanente formação: Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou
anunciar a novidade.” (Freire, 2005a, p.29). Além disso, é preciso salientar que, “embora
diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e
forma ao ser formado”. (Freire, 2005a, p.23). Seguimos, ainda, na caminhada com Freire
(2005, p.324):
(...) é um processo que pode deflagrar no aprendiz uma curiosidade crescente, que
pode torná-lo mais e mais criador. O que quero dizer é o seguinte: “quanto mais
criticamente se exerça a capacidade de aprender tanto mais se constrói e desenvolve
o que venho chamando curiosidade epistemlógica”, sem a qual não alcançamos o
conhecimento cabal do objeto.
Um outro aspecto a ser considerado nessa abordagem é que a formação ministrada na
escola era para ter um caráter de aproximação, quanto à relação teoria e prática, ou seja, para
fazer com que as pessoas estabelecessem conexões entre a discussão sobre currículo,
avaliação, mediação pedagógica, na lógica dos ciclos, e os desafios da prática cotidiana.
Segundo Freire (2005a, p.39):
Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fundamental é
o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando a prática de hoje ou de ontem que
se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à
reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que se confunda com a prática.
Sendo assim, é preciso considerar que a formação continuada, inaugurada nesse
processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos da Rede, permitiu que o grupo
responsável pela mediação do saber estivesse mais atento à realidade escolar, reconhecendo-
se como participante desse desafio, de modo que houvesse parceria entre equipes e
professores na tomada de consciência e na elaboração de meios possíveis para a proposta em
134
construção. E tudo isso sem desvalorizar a estratégia de formação utilizada em 1999, que era
limitada:
(...) colocava todos no Clube Português, ou todos no Canto do Rio, e as pessoas
iam, ouviam aquela fala profissional maravilhosa e voltava para escola e não
conseguiam fazer daquela fala a sua prática. Até concordavam e aplaudiam. As
pessoas falam de Euvira de Souza Lima com respeito, mas, não colocavam em
prática coisas relacionadas com aquilo que elas concordavam. Então não faz uma
conexão e fica em grandes informações que não tem a ver com o cotidiano da
escola, com a especificidade de cada Unidade de Ensino. (Coordenadora de Equipe
de Referência da FME)
Podemos dizer que a estratégia de formação continuada instituída pela FME nesse
processo despertou a reflexão crítica e coletiva sobre a prática da sala de aula, bem como para
replanejar suas ações. É claro que nesse caminho houve medidas que esvaziaram esses
espaços, tornando-o apenas uma rotina burocrática pela forma como a Equipe se organizou
para mediá-lo ou como a escola se organizou para participar. Mas sua inauguração despertou
uma nova prática entre esses sujeitos.
Conversa com a comunidade
Conforme já mencionado, a FME, a partir da avaliação realizada no semestre de
2006, percebeu a importância de dialogar com todas as escolas e também conversar
diretamente com os pais e responsáveis, a fim de propor um espaço de formação para esses
indivíduos. Por isso, a partir de outubro de 2007, realizou um trabalho intitulado “Caravana
Pedagógica”. As caravanas buscaram reunir em uma escola-pólo a comunidade escolar das
unidades escolares referentes ao pólo.
Para mediar esse diálogo, a FME contou com a Equipe gestora da Sede, incluindo
pessoalmente o Secretário de Educação e seus colaboradores mais diretos, que se dividiu para
este fim. Convém esclarecer que o intuito da caravana pedagógica era dialogar, dirimir
dúvidas e envolver pais e responsáveis na reconstrução da proposta pedagógica, afirmando-os
também como sujeitos do processo. Certamente, reunir a comunidade para um diálogo é
louvável para uma política democrática, contudo, a forma como essa ação foi realizada
suscitou algumas críticas. Tivemos a oportunidade de participar, em duas oportunidades,
desse trabalho e pudemos obter várias impressões em relação a essa iniciativa.
Um aspecto notável refere-se à estreita relação quanto ao tempo da política e ao tempo
da demanda de atividades que a escola exerce cotidianamente. Esses se esbarram,
135
enfraquecendo e dificultando o envolvimento de todos os sujeitos nessa importante tarefa de
fazer a política educacional junto com a comunidade. Um outro aspecto relevante é que esse
movimento nos permitiu entender que a forma como cada escola se relaciona com a
comunidade foi expressamente realçada nesses encontros.
Quando soubemos que a FME iria até as escolas, através de seus gestores, para
dialogar com a comunidade, consideramos uma ação fundamental para que esse processo
fosse plenamente democrático. Afinal, a comunidade precisa estar envolvida e ser formada
num processo de mudança do qual ela também faz parte. Entretanto, ao chegarmos a uma das
escolas onde aconteceria o diálogo, pudemos perceber algumas fragilidades:
· A escola não teve tempo hábil para convidar a comunidade para estar presente,
por isso, o encontro contou com apenas 12 pais ou responsáveis;
· Apenas a diretora da escola e mais dois funcionários participaram do diálogo
com a comunidade, mediada pelo Secretário de Educação e por uma das
coordenadoras da Sede;
· Quanto à escola vizinha que foi convidada a participar dessa conversa, não
teve nenhum representante da comunidade, apenas a presença da diretora.
Apesar dessas questões, foi possível notar também que:
· O encontro proporcionou o diálogo entre os presentes, a partir do
esclarecimento feito acerca do processo iniciado em 2005;
· Despertou em muitos sujeitos o interesse e a vontade de compreender a
proposta de ciclos;
· Desenvolveu a satisfação pela valorização pessoal diante da possibilidade de
participarem de atividades das quais tradicionalmente foram excluídos.
Esses apontamentos foram feitos a partir da nossa observação em uma escola que
participou logo no início dessa iniciativa. Assim, os outros encontros puderam ser
modificados a partir da avaliação do primeiro, além de terem tido a oportunidade de se
prepararem por mais tempo para se envolverem nessa dinâmica de diálogo. Então, ao
participarmos do segundo encontro (dessa vez com a participação de duas escolas que
participavam da nossa pesquisa: a escola A e a escola C), novas considerações foram feitas
por nós.
136
No dia anterior à realização desse “diálogo” com a comunidade, estivemos presente na
escola (A). A diretora demonstrou suas expectativas para o trabalho que seria realizado no dia
seguinte. Havia feito reunião com os pais, na tentativa de envolvê-los e conscientizá-los sobre
a importância da participação dos mesmos nesses espaços, além de contar com a participação
máxima de todos os profissionais da escola. a escola (C), que também contava com a
participação expressiva da comunidade, tinha outras expectativas em relação ao encontro que
seria realizado, pois, teria também nesse encontro a inauguração da quadra, além da
propagação de outras atividades que estavam sendo desenvolvidas.
Nesse sentido, um encontro que seria direcionado ao diálogo sobre o processo de
reconstrução da proposta em ciclos da Rede Municipal de Educação de Niterói acabou tendo
um outro formato, que hierarquizava as falas e pronunciamentos da escola. Isso foi possível
notar pela forma como a escola (C), que agregou as demais em seu espaço para esse diálogo,
se organizou para a atividade.
Inicialmente, o encontro foi direcionado para a inauguração da quadra, prolongando-se
com discursos e todo ritual necessário para esse fim. Em seguida, a escola apresentou parte do
trabalho desenvolvido nos últimos meses, que culminou com a confecção de um jornal
informativo para, enfim, se dedicar ao “diálogo” com os pais ou responsáveis, mediado pela
FME. Para tanto, formalizou o momento através da mesa que organizou, para que fosse
ocupada pelas diretoras e pelos gestores da FME. Assim, o encontro que deveria ser
direcionado pelo diálogo, tornou-se uma “palestra”.
Diferentemente do primeiro encontro de que participamos, que teve apenas 12 sujeitos
da comunidade, esse contou com aproximadamente 80 pessoas, que pouco interagiram. Vale
aqui esclarecermos que esse não foi um direcionamento da FME nem da escola (A), mas da
escola que acolheu o evento, pois, na tentativa de proporcionar um encontro formalizado,
descaracterizou o momento, comprometendo a participação e o diálogo entre os sujeitos.
Assim, identificamos que as escolas se organizaram de maneiras diferentes para
participar e integrar a comunidade nos espaços propostos pela gestão aqui analisada. Umas,
compreendem sua função nesse processo; outras, no entanto, consideram que essa é uma
responsabilidade exclusiva do órgão central. Notamos esse dado a partir de algumas reuniões
de que participamos, tanto nas escolas como na FME, quando era questionado: por que essa
iniciativa de a FME ir até as escolas não foi tomada antes?
Entendemos que, em se tratando de um processo, foi necessário o amadurecimento,
tanto da escola quanto da FME, para que isso pudesse acontecer. Assim, se a própria escola e
137
também os sujeitos da FME estavam passando por um processo de aprendizagem, não haveria
possibilidades de, logo no início do processo, a FME esclarecer a comunidade, posto que o
próprio órgão ainda tinha muitas dúvidas. A escola, que tem a função de estabelecer um
constante diálogo com a comunidade, poderia, sim, estreitar esse diálogo, mas elas também
estão aprendendo a trabalhar democraticamente.
Quando a escola questiona se é importante marcar uma reunião para que a FME
explique a proposta para os pais, inconscientemente ela está se eximindo de uma
responsabilidade, que é coletiva, e descaracterizando o próprio processo que se deseja
democrático. Afinal, a proposta não é da FME, mas da Rede. Juntos, e na diferença, órgão
central e escolas poderiam trabalhar coletivamente para defender uma educação pública de
qualidade. O frágil comprometimento nesse processo revela que a própria escola não acredita
ou não compreende o que está acontecendo, chegando a produzir “pérolas”, tais como “vocês
[FME] precisam dizer à comunidade, afinal, a idéia não é nossa!”. Quando falamos na falta de
comprometimento, não nos referimos ao fato de se comprometer com o governo ou a com
gestão, mas significa se comprometer com idéias que estão tendo a oportunidade de ser
formuladas coletivamente.
Assim, algumas escolas se eximiram disso, outras se mobilizaram para chamar os
pais, ainda que minimamente, para situá-los acerca do processo que vivenciavam. No
cotidiano, nas reuniões com a família, afirmavam: “Niterói está vivendo um momento de
construção e implementação da proposta de ciclos, e isso significa mudanças para dentro da
escola”. Sobre esse aspecto, Freire (2005, p.93-94) sinaliza a importância de:
(...) convencer a liberdade de que construindo consigo mesma, em si mesma,
com materiais que, embora vindo de fora de si, reelaborados por ela, a sua
autonomia. É ela, a autonomia, penosamente construindo-se, que a liberdade ou
preenchendo o “espaço” antes “habitadopor sua dependência. Sua autonomia que
se funda na responsabilidade vai sendo assumida. (grifo do autor)
Em algumas escolas, os pais são muito resistentes; então, dialogar com a comunidade
não é fazê-la “engolir” a sua posição individual, mas fortalecer o coletivo da escola, que tem
autoridade pedagógica para apontar um caminho diferente para a escola. Nós, como
educadores, temos a função de educar também esta comunidade, o desmerecendo o
conhecimento que ela traz, e fazer com que ela problematize o conhecimento construído pelos
alunos, seus filhos, na escola: “Não por isso mesmo pensar sem entendimento e o
entendimento, do ponto de vista do pensar certo, não é transferido, mas co-participado”
(Freire, 2005, p.37). Assim, uma proposta que se quer democrática precisa entender que a
138
democracia não pode se impor à comunidade nem se sobrepor ao que a comunidade conhece,
mas, sobretudo, ser objeto de construção coletiva, no diálogo. Na concepção de Freire (2005,
p.81):
Se, de um lado, não posso me adaptar ou me “converter” ao saber ingênuo dos
grupos populares, de outro, não posso, se realmente progressista, impor-lhes
arrogantemente o meu saber como verdadeiro. O diálogo em que se vai desafiando
o grupo popular a pensar sua história social como a experiência igualmente social
de seus membros vai revelando a necessidade de superar certos saberes que,
desnudados, vão mostrando sua incompetência” para explicar os fatos. (destaque
do autor)
Então, fomos percebendo durante o nosso estudo que esse processo de conversa,
diálogo com a comunidade deveria estar acontecendo desde 2006, através da escola. Em
algumas localidades, essa construção independente do diálogo com a comunidade aconteceu,
possibilitando uma interação mais ativa da comunidade na ação pedagógica da escola, através
de questionamentos e provocações feita às escolas, no acompanhamento do educando nesse
processo. Mas essa não foi a realidade de todas as escolas da Rede.
3.2.5.2 Práticas instituintes e táticas: possibilidades para a sustentabilidade do processo
democrático
Um processo de construção coletiva conta com diferentes veis de responsabilização
pessoal e com uma diversidade de opiniões e opções quanto ao fazer organizacional, que são
expressas sob a forma de contradições e resistências, no percurso dos processos educacionais.
Conforme destaca Martins (2006, p.47):
(...) a democracia não é algo que vem de cima para baixo, ou que está contida num
determinado lugar formal investido de poder e /ou autoridade, mas sim que é criada
nas relações sociais, nos (des) encontros e nos desejos de pais, funcionários,
professores e alunos que lutam para a efetivação de normas comuns. E esta
democracia realiza-se assumindo outras escalas e confronta-se, por exemplo, com a
burocracia de Estado, com as secretarias municipais e/ou estaduais de educação
que sua dinâmica constituinte tem múltiplas vias.
Logo, a democracia pode realizar-se e tem se realizado, quando diversos movimentos
sociais irrompem, desfazem equilíbrios e continuidades, quando expressam sua radicalidade
inventiva, ao negarem ou proporem outras formas de convívio social. Esta convivência
contraditória é em si mesma a própria mediação entre o modelo reprodutivista e o modelo
democrático. Afinal, a “dialética é contraditória, não poderia ser a educação uma ou a
139
outra dessas coisas. Nem apenas reprodutora nem apenas desmascaradora da ideologia
dominante” (Freire, 2005, p.98). Assim, emerge como equilíbrio dinâmico e como tal deve
ser compreendido para que venha a engendrar, seja a partir das estratégias instituídas ou das
táticas e práticas instituintes da escola, uma organização coletiva capaz de promover a
democracia e expandir o potencial emancipador. Além disso, conforme nos aponta o relatório
escrito pela Consultoria, “as ações instituintes não se fazem apenas como reação à proposta da
FME, uma vez que no fazer cotidiano os sujeitos deparam-se com o eventual, com o insólito,
criando ações que vão desconstruindo as regras instituídas e gerando novos percursos”
(Consultoria, 2006, p.29).
Nesse sentido, entendemos que as escolas estão desenvolvendo suas práticas
organizacionais, entre as estratégias instituídas e suas práticas instituintes. Assim, não se
configuram de forma homogênea, havendo variação conforme suas singularidades, conforme
a subjetividade dos sujeitos, conforme a cultura de cada unidade escolar.
Assim, embora as dimensões política e institucional da participação estejam
“asseguradas” em estratégias garantidas do ponto de vista normativo, foi necessário abrirmos
espaços à análise sobre os conteúdos concretos de realização da participação organizada e
mediada pela própria unidade escolar. A nosso ver, estes elementos indicam que nas unidades
escolares a democracia está em construção como desafio aos valores da própria organização.
Portanto, é um aprendizado coletivo, não regulado, mas dinâmico, com efeito multiplicador,
lento e gradual, de práticas democráticas descobertas e criadas cotidianamente pela atuação de
diferentes sujeitos.
Assim, entendemos que cada escola atuou nesse processo de uma maneira diferente.
Mas, cada uma construindo sua identidade coletiva, que, uma vez fortalecida, poderá dar
sustentabilidade ao processo democrático, independentemente do governo e da gestão que
dirija a Rede Municipal de Educação de Niterói. A esse respeito, trazemos a contribuição de
Valle (2006):
A subjetividade democrática é aquela que é capaz de questionamento de si, de
oposição interna, de abertura ao novo. Nela, o constante movimento instituinte faz-
se acompanhar da crítica e da reflexão, a criação faz-se explícita e deliberada. Mas
não é apenas do ponto de vista da razão, do lógos, que a subjetividade democrática
se distingue de tudo o que o humano apresentou até então. Essa subjetividade
também se traduz em um tipo de investimento afetivo muito singular. (...) trata-se,
como afirmado, de um mecanismo essencial na auto-instituição de todo humano,
que consiste na capacidade de a criança paulatinamente deixar de investir
afetivamente apenas nos objetos de prazer mais imediatos, mais sensoriais e
próximos - portanto, objetos privados - para investir em "objetos" imateriais (que
não nos fornecem qualquer experiência dos sentidos, mas que são socialmente
instituídos, que existem na e pela sociedade), encontrando prazer. Essa
140
passagem aos objetos de investimento social é a marca que a sociedade põe aos
sujeitos. assim como uma cadeia de objetos de investimento, e o deslocamento
daqueles que são mais privados àqueles que são mais públicos é também condição
de socialização indispensável para que os sujeitos efetivamente invistam em objetos
tais como a democracia, a igualdade, o autoquestionamento... Na maior parte do
tempo, esses objetos não são tangíveis; aceitar continuar investindo neles não é
apenas uma decisão racional, mas envolve um modo de ser muito específico: este
mesmo que é próprio das subjetividades reflexivas e deliberantes em uma
democracia. (Valle, 2006, p. 542)
3.2.6 Idas e vindas no processo de (re) escrita da proposta
“Simplesmente não posso pensar pelos outros nem para os outros, nem sem os
outros”.
Paulo Freire
Freqüentemente, convivemos com o insucesso e com a dicotomização das propostas
que são implantadas nas Redes Públicas de Ensino. Essas experiências, sedimentadas pelo
distanciamento dos profissionais da escola na elaboração das propostas, impedem a
constituição do dinamismo da práxis, para o qual é necessário que o professor articule a
reflexão com a prática, de modo a re-significar o seu trabalho. Nessa lógica, apenas alguns
programas rigidamente definidos são reconhecidos como legítimos e apenas algumas vozes
são ouvidas, o que inevitavelmente provoca o distanciamento das propostas oficiais do
cotidiano pedagógico.
Na contramão dessas práticas tecnoburocráticas
55
, que “invadem” a escola como
“portadoras da verdade salvadora, com sua tarefa irrecusável de não propô-la, mas impô-la
(Freire, 2005, p.82), temos observado que algumas Secretarias de Educação buscam medidas
para democratizar os processos educativos, na esperança de construírem experiências mais
coletivas, mais eficazes e mais comprometidas com a reflexão sobre os desafios da realidade
injusta, excludente e perversa com que convivemos.
Neste estudo, temos tentado apresentar a experiência da Rede Municipal de Educação
de Niterói, num movimento que reconhece a necessidade de gerir os seus processos
educacionais numa perspectiva dialógica e participativa.
55
Sobre esse conceito, apoiamo-nos em Gadotti, que desenvolve a seguinte idéia: “a tecnoburocracia não apenas
controla os aparelhos do estado e a organização e apropria-se da mais-valia através de altos ordenados, como
impõe novas crenças e valores: sobrevaloriza o planejamento (controle) e o conhecimento técnico-
organizacional, a hierarquia, a ordem, as estruturas, a eficácia, a impessoalidade, a precisão etc. O poder no
Brasil está formado por técnicos, não habituados ao exercício do diálogo e da participação, ao debate livre e à
crítica” (Gadotti, 2003, p.163).
141
Por isso, as considerações que faremos a seguir situam-se na caminhada dos
educadores dessa Rede, que estão se empenhando para reconstruir a proposta pedagógica
coletivamente, a partir de possibilidades desenvolvidas e experimentadas no cotidiano de cada
escola. Gostaríamos, no entanto, de esclarecer que esse caminho percorrido pelas escolas não
tem o caráter prescritivo de “modelos” e receitas” a serem seguidas, mas está aberto à
atividade reflexiva, para que se esbocem na prática contribuições e sugestões para o trabalho
em ciclos.
Assim, o processo instalado na Rede impõe-se como elemento provocador da escola,
de modo que seus representantes não se posicionem como receptores da proposta, mas que
sejam capazes de produzi-la do ponto de vista dialético, visando à transformação da realidade.
“Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente ‘lido’, interpretado, ‘escrito’
e ‘reescrito’” (Freire, 2005a, p.97).
Para tanto, esse processo analisado, que inclui a produção escrita da proposta, tem
como uma de suas metas possibilitar a interação da teoria com a prática na escola, numa
perspectiva de que os educadores se reconheçam na proposta, exercendo sua capacidade de
reflexão e elaboração de propostas aprofundadas na dimensão político-pedagógica. Além
disso, é fundamental que os educadores tenham uma postura “dialógica, aberta, curiosa e não
apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve. O que importa é que eles se assumam
epistemologicamente curiosos” (Freire, 2005a, p.86, destaque do autor).
Não podemos perder de vista que a constituição de um processo democrático, tanto no
que se refere as suas possibilidades de participação e dialogicidade entre os sujeitos nas
decisões, quanto no que se refere à produção escrita da proposta, demanda certas condições:
encontros para o diálogo, socialização das práticas, espaço coletivo para tomada de decisão,
entre outras. Assim, uma questão que levantamos foi: de que forma as escolas participaram da
produção escrita da proposta?
Em primeiro lugar, consideramos importante destacar que a produção de escrita da
proposta “Escola de Cidadania” não ocorreu dissociada de outros movimentos vivenciados
nesse processo, mas é parte das ações e reflexões geridas no decorrer dos anos de 2005 a
2007. Conforme apontamos neste trabalho, o Documento Preliminar, fruto das discussões
do ano de 2005, foi enviado para que as escolas estivessem estudando, problematizando e
experimentando a “proposta norteadora” durante o ano de 2006. A partir dessa vivência, o
referido documento seria (re)escrito.
142
Assim, a partir da experimentação de algumas escolas-pólo em 2006 e, também, das
reflexões e estudos que as demais escolas fizeram, foram enviadas por oficio à FME suas
contribuições, críticas, enfim, seus posicionamentos. Nesse contexto, ao acompanharmos esse
processo, encontramos freqüentemente, entre os educadores, uma tendência que rompia com a
concepção tradicional. Foi possível notarmos que, ao buscarem realizar um trabalho mais
significativo e transformador, mesmo dentro de uma estrutura ainda burocrática,
desenvolviam as considerações para a escrita da proposta, não numa lógica linear, mas, de
fato, processual: o educador, enfim, tem uma idéia, registra, experimenta quando possível,
logo constrói novas idéias, e assim sucessivamente. Nessa visão, encontramos uma expressão
concreta do trabalho processual, que privilegia a relação teoria/prática articulada numa
proposta pedagógica.
É claro que esse posicionamento não repercutiu na totalidade das escolas, até porque
nem todas entenderam o desafio do processo. Mas, assumido o desafio, os educadores dessa
Rede, tanto os que atuam na escola, quanto os que atuam na FME, se lançaram numa longa
jornada de elaboração, acréscimos e reformulações.
Embora não seja possível definir, a priori, todos os detalhes das contribuições que as
escolas fizeram nesse processo, entendemos que o fato de esboçarmos as proposições como
um todo, numa concepção geral, pode ajudar bastante, por nos possibilitar uma referência de
conjunto das escolas que atuaram nesse processo (ver anexo 7). Em linhas gerais, podemos
identificar que, das então 37 Unidades de Ensino Fundamental, que desenvolvem o trabalho
com o 1º e 2º ciclos, 26 enviaram suas contribuições em meados de 2006 (ver anexo 6).
Visualizando no gráfico abaixo, temos o seguinte percentual de escolas que participaram
desse movimento de (re) escrita da proposta:
SIM
70,3%
NÃO
29,7%
143
Dentre as escolas que enviaram por ofício suas contribuições, destacamos que:
· Algumas contribuições apontaram criticamente posicionamentos sobre a
fundamentação da proposta e propunham sugestões para modificação e acréscimos
das diretrizes, com base na experimentação;
· Algumas críticas se apresentaram sem fundamentos e sem sugestões;
· Algumas modificações se limitaram à parte ortográfica do Documento;
· Algumas críticas reivindicavam a volta da seriação.
Essa dinâmica, no entanto, avança com a exigência de sistematização das proposições
feitas. Além disso, aquelas propostas surgidas como síntese das contribuições realizadas por
diferentes sujeitos, portanto, por diferentes olhares, necessitavam ser confrontadas, de modo
que houvesse uma reformulação ou até mesmo uma substituição do conteúdo da proposta
preliminar. De acordo com a professora Leda, isso se constrói da seguinte forma:
As escolas que mandaram suas contribuições daquilo que não concordavam,
daquilo que concordava, mas tinha que melhorar, enfim, o semestre de 2006
também foi dedicado a discussão novamente nos GTS para refazermos a versão da
proposta que iria para a escola em 2007 a partir dessas contribuições e discussões.
No final de 2006, temos uma nova versão da proposta e mandamos para a escola
para que novamente pudessem experimentar discutir e enviar até julho de 2007 suas
novas contribuições, que nesse momento estão sendo discutidos aqui internamente
para quem sabe uma “proposta final”. Nesse movimento de conversarmos sobre as
contribuições, fomos percebendo aquilo que se repetia por muitas escolas, também
alguns aspectos, eixos que o estão mais em discussão, como por exemplo se a
rede vai se organizar em série ou em ciclos. Estamos numa lógica que tenta romper
com a gica seriada, e isso precisa ser entendido. Então o que ajuda nessa ruptura?
(Coordenadora do 1º e 2º ciclos da FME)
Conforme podemos perceber através do depoimento acima, esse processo não buscava
empreender uma nova proposta. que se compreender também que não estava aberta a
discussão acerca da opção da Rede em se organizar em séries ou ciclos. A organização em
ciclos era posta e entendida como algo que “desejamos para o aluno da nossa Rede, que é
romper com essa fragmentação, competição, com essa gica que eu tenho um tempo
determinado para aprender um conhecimento que alguém disse que eu deveria aprender”
(Coordenadora de e 2º ciclos da FME). O que se discutia era como fazer isso, de modo que
a escola viesse a romper com a lógica seriada. Corroborando essa concepção, damos voz à
Professora Glória:
144
Essa proposta pedagógica, - isso nós sempre temos tido o cuidado de dizer -, ela
não é nova. Ela busca complementar a iniciativa que foi adotada de 98 para 99, que
naquele momento, por razões que desconheço, não foi dialogada. Então essa
proposta que temos buscado reconstruir, ela vem dar respostas a uma série de
reclames da própria rede. Então considero que o avanço desse processo é de
estarmos caminhando para a construção de uma outra escola possível. Não é a
escola “redentora” que vai solucionar os problemas educacionais de Niterói, mas,
outra possibilidade de escola que leva em conta uma escuta mais sensível aos
profissionais da rede, aos alunos e aos seus familiares. (Diretora de Políticas
Pedagógicas da FME)
Nesse sentido, é possível pontuarmos que a circulação da proposta nesse movimento
de pensar e repensar, fazer e refazer, ir e vir demonstrou a relevância de se colocar em
evidência práticas de sucesso, práticas questionadoras, práticas reacionárias, práticas estáticas,
enfim, práticas que puderam perceber a necessidade de se despertar para novas iniciativas e,
em especial, perceber que é possível mudar a prática(Vasconcellos, 2006, p.162). Com
base nisso, a relação passa a ser construída, levando em conta que a prática pedagógica “se
funda na convicção de que sei algo e de que ignoro algo a que se junta à certeza de que posso
saber melhor o que já sei e conhecer o que ainda não sei” (Freire, 2005a, p.135).
Além da escola, é importante reconhecer que esse processo se desdobra como objeto
de reconhecimento em si, enredando também as coordenações de Articulação Pedagógica,
Educação Infantil, e Ciclos, e Ciclos, Educação de Jovens e Adultos e Educação
Especial, as Equipes de Referências da FME e os Delegados que representavam as escolas no
acompanhamento do processo de implementação da proposta. Esses sujeitos também
enviaram sugestões e críticas para o aperfeiçoamento da proposta, tendo em vista a
apropriação do conhecimento sobre os ciclos a partir desse processo. Dentre os documentos
que possibilitaram a intervenção desses sujeitos na proposta em construção, destacamos:
· As demandas observadas através dos termos de visita de acompanhamento às
escolas pelas equipes de Referência da FME;
· O Relatório da Equipe de Delegados das escolas;
· O Relatório dos Seminários de Avaliação realizados pelas escolas que
implementaram a proposta em 2006;
· O Relatório-síntese das sugestões oferecidas pelas escolas, enviadas em
setembro de 2006.
A sistematização dessas intervenções deu origem a um novo formato da proposta
pedagógica, que permaneceu em fase de construção no decorrer do ano de 2007. Portanto,
145
importa ressaltar que a nova versão proposta, submetida às escolas, ainda como texto
preliminar, em fevereiro de 2007, incorpora as contribuições produzidas pela Rede, a partir
das reflexões teórico-práticas realizadas nos múltiplos espaços e tempos de encontros,
seminários, discussões e debates; e, principalmente, a partir da reflexão realizada no cotidiano
das próprias escolas.
Assim, em 2007, as contribuições enviadas tinham sido sistematizadas e as escolas
receberam uma nova versão da proposta, esta com as modificações e acréscimos sugeridos.
Entretanto, ainda se tratava de uma proposta em construção, portanto, aberta a novas
proposições (ver anexo 9).
Quando abordamos essa dinâmica de idas e vindas no processo de (re) escrita da
proposta, é possível verificarmos, a partir das nossas observações e também das informações
que foram obtidas ao longo da pesquisa, que essa relação dialética vivenciada na escola e no
diálogo das unidades escolares com o órgão central nos permite uma leitura de que esse
processo de fato conferiu um novo caráter ao processo educacional. Desde a reorganização
que as escolas estavam sofrendo com o movimento coletivo de pensar a sua prática numa
lógica de ciclos, em paralelo ao movimento de dialogar sobre essa prática e propor
contribuições para uma proposta escrita, acompanhamos um processo favorável à
democratização das relações. Além disso, ele promove uma pertinente discussão em que se
tenta romper com alguns “mitos” relacionados ao processo de mudança de uma proposta
pedagógica. Até então, as propostas chegavam como “pacotes fechados” e “receitas prontas”,
a serem adaptadas em cada contexto escolar.
Não podemos, no entanto, ignorar as fragilidades experimentadas frente a essa nova
realidade que a Rede começava a vivenciar. Sobre este ponto, temos o relato de uma das
supervisoras da escola que pesquisamos:
Bom, que foi uma proposta coletiva nós não podemos negar. Houve a intenção e
uma organização para que essa proposta fosse discutida e construída no conjunto. O
que às vezes os professores se ressentem muito é que quando vem a proposta para
analisarmos e mandarmos nossas contribuições, nossas impressões para a FME, nós
não recebemos de volta isso na proposta. E quando falo isso, não é com a intenção
de que a nossa escola seja o centro do mundo, e que as nossas idéias devam
prevalecer. Não é isso. Mas, acho que toda vez que se manda uma proposta para as
escolas discutirem, deveria vir alguém falar como foi feita a organização das idéias
que foram enviadas pelas escolas, até chegarem à estrutura de escrita final. Ao
contrário, o que fica parecendo é que ninguém deu valor ao que nós escrevemos.
Em minha opinião poderiam mandar por escrito quantas escolas enviaram as
contribuições. Quais foram os critérios que contariam. Se foi o da maioria. Se for,
está correto, pois a democracia tem que trabalhar com a maioria. Pode ser que as
contribuições da nossa escola tenha sido sempre a minoria. Tudo bem. Mas o que
nós queremos seria um processo que desse mais reconhecimento ao trabalho. Sem
146
isso toda vez que vier algo para discutirmos, vamos nos esbarrar sempre com a
mesma fala: “Ah, mas novamente isso! Nós enviamos o que queremos e nos
mandam escrever novamente sem proporem modificações.” Então um desânimo
com isso. A falha a meu ver é essa falta de retorno, que poderia ser enviada por
ofício, enfim... É necessário dizer de forma transparente que critérios foram
utilizados para a sugestão se tornar parte do documento. E isso trabalho, mas, se
é para discutirmos tem que ter trabalho. Não estou dizendo com isso que a FME
não teve trabalho, pelo contrário, percebemos ao longo desse processo muita
dedicação e investimento. O que necessita caminhar é como organizar melhor essa
democracia que estamos vivenciando. (Supervisora da Escola B)
Consideramos que as características gerais das experiências que relatamos servem
apenas como indicadores iniciais, dentre outros que poderíamos citar; principalmente a
respeito de como estas experiências têm sido geridas na Rede Municipal de Educação de
Niterói. Com essa análise realizada, entendemos que a opção pelo processo democrático:
(...) pressupõe um movimento de idas e vindas; de erros e acertos. Que bom que é
assim! Que bom que s podemos errar e refazer, podemos pensar melhor sobre as
coisas, (re) elaborar o trabalho, discutir coletivamente, abrir os processos a outros
olhares, porque temos clareza que nosso olhar é sempre parcial, sempre provisório
e quanto mais pessoas participando, sugerindo , mais as relações e os processos se
intensificam. ( Diretora de Políticas Pedagógicas)
Pelas reflexões precedentes, podemos parafrasear Freire (2005b, p.67): “só existe
saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens
fazem no mundo, com o mundo e com os outros. Busca esperançosa também”.
3.2.7 Sobre a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”: produto final?
A proposta pedagógica “Escola de Cidadania” passa a ser oficializada no ano de 2008,
através da Portaria FME nº 125/2008 (ver anexo 10), partindo das seguintes considerações:
a) o disposto na legislação, notadamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei nº. 9.394/96, e nos diplomas legais em vigor no Município de
Niterói; b) a necessidade permanente de aprimorar, reorganizar e qualificar a Rede
Municipal de Educação de Niterói, com vistas ao sucesso escolar dos alunos e ao
aperfeiçoamento das condições de trabalho e de formação dos profissionais da
educação; c) o amplo e aprofundado diálogo construído com a Rede Municipal de
Educação de Niterói sobre a construção da Proposta Pedagógica “Escola de
Cidadania”, notadamente no último triênio.
Evidentemente essa proposta não tem como sustentar-se e solidificar-se na prática
cotidiana das escolas da Rede Municipal de Educação, sem que haja uma constante atividade
que envolva a práxis. O importante é que os sujeitos entendam que o fato de ser uma proposta
147
instituída não é suficiente, pois ela precisa ganhar força na dinâmica instituinte de cada
escola, num esforço de compreensão de uma proposta em permanente construção. Refletindo
sobre essa questão, mais uma vez trazemos Freire (2005b, p.110):
A raiz mais profunda da politicidade da educação se acha na educabilidade do ser
humano, que se funda na sua natureza inacabada e da qual se tornou consciente.
Inacabado e consciente de seu inacabamento, histórico, necessariamente o ser
humano se faria um ser ético, um ser de opção, de decisão.
A legitimidade política da proposta reconstruída não pode se tornar um impedimento
para a continuidade da reflexão participativa e para fazer os encaminhamentos que ressaltam
os interesses coletivos. Por isso, a conscientização da Rede Municipal de Educação frente ao
desafio de sustentar a democratização do processo, sem conceber essa proposta pedagógica
como mera burocratização do processo e produto final, é fundamental. Afinal, uma proposta
como se pretende a “Escola de Cidadania”, construída no diálogo, deve se debruçar sobre a
construção de uma escola cidadã a partir da compreensão de que a transformação da escola
“não se sem conflitos. Ela se lentamente. Com pequenas ações, mas continuadas”
(Gadotti, 2003, p.56).
148
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Até que ponto esse processo se constitui efetivamente como um movimento democrático?
A pesquisa do processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede
Municipal de Educação de Niterói, empreendida no decorrer dos anos de 2005 a 2007, nos
permitiu perceber que a democratização dos processos educacionais na “Cidade Educadora”
passou a ser reforçada a partir da iniciativa do governo, quando da criação de canais de
participação e diálogo para os sujeitos que constituem essa Rede Municipal, na tarefa coletiva
de reconstrução da proposta de ciclos.
Este trabalho pretendeu analisar essa experiência, buscando analisar os principais
fatores e fundamentos responsáveis pela iniciativa deste modelo participativo. Demos
destaque não somente à dimensão da ação e da vontade política, como também à consolidação
desse processo na relação entre unidades escolares e FME.
Observamos que os espaços para participação e diálogo nesse processo estão influindo
na estruturação das representações coletivas desses sujeitos, pois, ao serem inseridos na
discussão da proposta em construção, intensificaram o tempo-espaço da escola para reflexões
e estudos sobre os ciclos, possibilitando um posicionamento mais fundamentado e autônomo
acerca do assunto.
O processo indica grande avanço, quando verificamos consensualmente que seu
movimento se deu de forma participativa e dialógica. Além disso, indica que a criação das
estratégias instituídas e organizadas pela FME foram favoráveis ao estreitamento da relação
com as unidades escolares. Em outras palavras, esse processo rejeitou o caráter hierárquico e
antidialógico historicamente construído nessa Rede Municipal de Educação.
Nesse sentido, consideramos que a Rede Municipal de Educação de Niterói buscou
estabelecer uma dinâmica dialógica e participativa nesse processo, que se constitui
efetivamente como um movimento democrático. Entretanto, num nível que ainda não
desabrochou. É uma caminhada que está apenas no início e ainda precisa solidificar-se.
Mais do que um processo burocrático de implantar a política educacional, entendemos
que a gestão da FME buscou colaborar para romper com o trabalho formalista e autoritário, a
149
fim de fazer desse processo um caminho desafiador e provocativo para construir relações
democráticas na Rede Municipal de Educação. Entretanto, para que esse processo se
desenvolvesse, observamos três aspectos que precisaram ser assumidos pelos sujeitos nele
implicados.
O primeiro esteve ligado ao desafio de a FME resgatar a sua credibilidade junto às
unidades escolares. Por uma série de distorções históricas, essas duas instâncias (FME e
unidades escolares) que compõem a Rede Municipal de Educação estabeleciam relações
fragmentadas, delimitando um espaço para pensar a educação do município e outro, para
executar as propostas elaboradas, fato que acabou marcando a memória dos educadores e
cristalizando a desconfiança para com propostas de mudança. O segundo, desencadeado pelo
primeiro, configurou-se pelo enorme esforço da escola de se lançar ao processo,
compreendendo-o como prática contraditória, tendo lucidez de perceber suas fragilidades,
mas também suas potencialidades. O terceiro, articulado aos demais, expressou o esforço da
FME em mobilizar as escolas para se organizarem na luta comum pelo projeto de uma
educação pública, mais democrática e humanizadora, que, nesse momento, encontra respaldo
na lógica dos ciclos.
A partir desses desdobramentos, compreendemos que foi um processo complexo e
variado, cujos resultados oscilaram entre o avanço, a continuidade e a contradição. Muitas
escolas não acreditaram no processo e, por isso, se fecharam à proposta e mantiveram sua
prática na mesma gica anterior. Outras se fecharam no início, demonstrando sua resistência
e insatisfação, mas, no decorrer das reuniões e encontros de que participavam, decidiram se
arriscar e construir novas experiências com o processo. Algumas escolas assumiram seu
posicionamento crítico desde o início, estudando sobre os ciclos e entendendo sua lógica para
além dos interesses de edulcorar os indicadores educacionais, especialmente de aprovação.
Além disso, a partir da participação e do diálogo que estabeleceram com a FME e as demais
unidades de escolares, essas escolas foram construindo sua autonomia nas decisões e nas
mediações que eram realizadas no seu espaço-tempo.
Percebemos, nas quatro escolas em que fizemos a pesquisa, que a adesão à proposta,
em 2006, ou a convocação para experimentá-la, em 2007, foram capazes de produzir
movimentos significativos em suas rotinas de trabalho, tanto no que se refere à proposta de
ciclos, quanto no que se refere à organização do coletivo, internamente às escolas e entre as
próprias escolas.
Durante o processo, várias opiniões conflitantes emergiram entre os sujeitos da Rede.
Notamos que algumas pessoas sempre faziam uma apreciação em relação ao processo
150
instalado em 2005, demonstrando que realmente era um momento diferenciado
experimentado pela Rede. Em contrapartida, muitos também o repudiavam, demonstrando
descrédito em relação à iniciativa. Entretanto, a maioria da Rede demonstrou disposição para
se organizar coletivamente, ainda que nem todos estivessem unidos sob a mesma orientação.
Há nisso tudo uma série de questões que pudemos considerar. Uma delas é que não
incorporação pura e simples de um modelo instituído na escola; o que compreendemos é que a
escola desenvolve uma nova racionalidade para seu trabalho, a partir de suas práticas
instituintes repletas de significados táticos de mobilização. Assim, constroem maneiras
diferentes de participar, dialogar, se organizar e desenvolver o trabalho com a proposta
construída. Outra questão relevante: mesmo se apresentando de maneira diferente, o processo
suscitou na escola o fortalecimento do trabalho coletivo e a importância de participarem
juntas na discussão e na defesa de um projeto de escola transformador.
Nos espaços destinados à discussão sobre o assunto, foi possível percebermos, através
da participação e do posicionamento de alguns sujeitos, que muitos haviam compreendido
que o processo não estava apresentando uma proposta “redentora”, mas se empenhando para
mobilizar a reflexão e participação da escola na tessitura coletiva de uma proposta em
construção. Foi um processo de organização democrática no cotidiano, portanto, lento, num
movimento que deve ser continuado.
De um modo geral, encontramos nesse processo: subsídios organizacionais para a
realização do trabalho coletivo; uma gestão militante, aberta ao diálogo e que procura através
da participação dos diferentes sujeitos ultrapassar os modelos burocráticos; o dinamismo da
relação teoria e prática; múltiplas mediações para a reflexão sobre a proposta; a socialização
dos saberes e fazeres; o compartilhamento e a troca de experiências, enfim, o desejo de
democratizar os processos educacionais e permitir que a escola assuma um posicionamento
crítico e problematizador, capaz de se posicionar a favor da humanização da escola pública,
independentemente do projeto do governo, qualquer que ele seja.
Evidenciamos ser essa uma experiência que tem provocado a inclusão dos diferentes
sujeitos nos processos decisórios da educação municipal, criando sociabilidades através de
encontros e da convivência entre os sujeitos que participam, dialogam e se organizam
coletivamente.
As principais estratégias para isso foram estimuladas pelos encontros, reuniões,
seminários, formações e acompanhamentos da FME nas escolas. Nesse sentido, podemos
concluir que a experiência da Rede Municipal de Educação de Niterói, vivenciada durante o
processo de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos, mostra um caminho possível para
151
o estabelecimento da democratização dos processos educacionais, pois, oferece instrumentos
de participação, diálogo, trabalho coletivo, divisão do poder, mobilização para a reflexão
crítica e construção de autonomia. Essa iniciativa efetiva movimentos democráticos que
permitem a construção de uma gestão pública mais atenta ao cotidiano escolar.
que se atentar, entretanto, para as dificuldades e limites dessa experiência, na
medida em que a formação e a concepção dos sujeitos ainda são fortemente ancoradas em
uma realidade pautada por relações antidialógicas, hierárquicas, autoritárias, individuais,
reproduzindo situações de exclusão, acomodação e desigualdade. Por isso, algumas
fragilidades foram atenuadas no processo que precisou estar aberto à crítica e a reavaliações.
Enfim, os resultados desse processo só poderão ser constatados em longo prazo.
Portanto, esperamos e torcemos para que as escolas organizadas e comprometidas com o
projeto democrático de educação pública tenham força e esperança para uma luta que
permanece, não acaba, mas se insere em um novo “ciclo” de desafios. Embora tenha havido
recentemente (04/04/08) uma surpreendente mudança na gestão da FME, desejamos, no
futuro, analisar a Rede Municipal de Educação de Niterói numa perspectiva contínua de
solidificação e aprimoramento do processo democrático que vivenciamos ao longo desta
pesquisa.
Por ora, podemos concluir, no caminho de novos questionamentos, que a prática
pedagógica, vista como um processo ininterrupto de descobertas, inovações e mudanças,
estará sempre inacabada e, assim, em permanente construção.
152
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161
ANEXOS
162
Anexo 1 - Gráfico do crescimento da Rede Municipal
163
Anexo 2 - Participação em espaços destinados à discussão da proposta pedagógica
durante a realização da pesquisa (2006-2007)
Ações
Junho/2006
1º. Seminário Interno do FSDE “Diálogos sobre currículos para uma escola em
ciclos” – Universidade Salgado de Oliveira.
Junho/2006
Encontro. Encontro com diretores e pedagogos para o estudo da proposta de ciclos
Julho/2006
Participação na reunião da comissão de delegados.
Julho/2006
I Seminário das Unidades Escolares “Ciclos: experiências da rede municipal de
educação de Niterói” – Faculdades Integradas Maria Thereza (8 às 17h).
Agosto/2006
Jornada de Formação Interna sobre Currículo Faculdades Integradas Maria
Thereza.
Outubro/2006 Encontros com Pedagogos das escolas
Balanço anual e projeções para 2007
Dezembro/2006
II Seminário das Ues/UMEIs da Rede Municipal de Educação de Niterói “Ciclos:
refletindo sobre novas experiências” – Unilasalle (13 às 17h).
Março/2007 Reunião interna de Equipes de Referência
Abril/Maio/2007
Encontro: Encontro com diretores e pedagogos para o estudo da proposta de ciclos
Maio/junho /2007
Encontro: Encontro com professores para o estudo da proposta de ciclos
Maio/Agosto/2007
Fórum de Diretores: Encontros mensais, alterando-se em pólos e gerais
Agosto/setembro/outubro
2007
Cursos na escola: currículo, mediação pedagógica e avaliação.
Setembro/ Outubro/2007
Corrida nas Escolas: Reunião com os professores nas escolas para a discussão da
proposta pedagógica
Outubro/novembro/2007
Caravana na Comunidade: Encontro com pais e responsáveis para discussão da
proposta pedagógica
164
Anexo 3 - Termo de consentimento de entrevista
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação
da Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo
de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de
Niterói, a entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter
público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação da
Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói, a
entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
165
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação
da Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo
de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de
Niterói, a entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter
público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação da
Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói, a
entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
166
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação
da Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo
de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de
Niterói, a entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter
público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação da
Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói, a
entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
167
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação
da Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo
de reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de
Niterói a entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter
público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
Eu, ________________________________________________________________,
autorizo a professora Viviane Gualter Peixoto, mestranda da Faculdade de Educação da
Universidade Federal Fluminense (UFF), utilizar em sua pesquisa sobre o processo de
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos na Rede Municipal de Educação de Niterói, a
entrevista por mim concedida tornando as informações prestadas de caráter público.
Niterói, ______de____________ de ________.
______________________________________
Assinatura da entrevistada
168
Anexo 4 - Entrevistas realizadas no decorrer da pesquisa
Entrevista com a Prof. Glória Anselmo
56
Realizada em setembro de 2007
Comente um pouco sobre o seu percurso de atuação na Rede Municipal de Educação de
Niterói.
Entrei na Rede em 2002, como Supervisora Pedagógica da E.M. Diógenes e atuei nessa escola
até 2005, quando fui convidada para trabalhar aqui na Sede como Coordenadora do e
ciclo. Fiquei nessa condição durante dois anos e, agora em 2007 o prof. Waldeck me
convidou para assumir a Diretoria de Políticas Pedagógicas.
A partir dessa trajetória que você tem na rede, desde sua atuação no cotidiano escolar,
até como gestora, qual sua leitura quanto à política de ciclos nessa Rede?
Entrei na escola em 2002 e encontrei um grupo de profissionais muito inquieto e descontente
com a Política de ciclos. Para começar, as pessoas não sabiam muito bem o que eram os
ciclos. Elas tinham uma leitura muito controvertida dos ciclos e confundiam ciclos com o
construtivismo. que eu também não sabia o que eram os ciclos. Conhecia a discussão
proposta pela LDB, pois era professora do curso Normal, vel Médio e dava aula de
Estrutura, então eu estava sempre pegando a LDB, mas, não tinha clareza da estrutura
organizacional do sistema de ciclos. Ao perguntar na escola que eu atuava na época, de onde
tinha surgido a proposta de ciclos, me apresentaram a proposta implantada em 1999,
“Construindo a Escola do Nosso Tempo”.
Nessa mesma época, eu estava fazendo mestrado e como toda boa mestranda eu fui pesquisar
os Referências que norteavam aquela proposta. Para minha surpresa, eu não encontrei nenhum
autor dentro daquela proposta, que tocasse nos ciclos. Então, comecei a indagar isso nas
reuniões integradas de Supervisores e Orientadores e em todos os momentos que podia estar
em contato com pessoas da Sede. Sempre fazia essa pergunta, mas, nunca encontrei uma
resposta que me satisfizesse, passando assim a engrossar a fileira de pessoas que
questionavam a FME por ter adotado uma forma de organização que as pessoas não sabiam,
nem teórica e nem praticamente definir.
Nesse período de questionamentos, começaram a surgir nomes como Euvira de Souza Lima,
Celso Vasconcellos, que demonstravam que a Rede tinha um aporte teórico apresentado em
forma de palestras, mas que não se sustentara nesse mesmo aporte para escrever a proposta
que foi implantada em 1999. Quando analisamos essa proposta, fica nítida a fragilidade
teórica tanto no que se refere ao arcabouço conceitual, quanto nas abordagens metodológicas,
pois qual é o caminho que o Documento faz?
Ele faz uma discussão muito pontual tratando os objetivos, os fins, traz para o centro do
debate os processos de evasão e repetência que eram questionados em todo país, mas, o como
fazer os ciclos, ou seja, as orientações administrativas e metodológicas não foram
contempladas. O que a proposta trazia eram grandes quadros com conteúdos por ano de
escolaridade dizendo como deveriam ser ministrados, assim como tratam os livros didáticos.
56
Diretora de Políticas Pedagógicas da FME (2007).
169
Esses fatores ficaram como diz a profª. Fátima da E.M.Santos Dumont “como um monte de
macaquinhos pulando no meu soton”, porque considero muito complicado, você dizer a
alguém que é preciso fazer alguma coisa, mas, não dizer minimamente que estratégia seguir
para encontrar esse caminho. Assim, fui percebendo que a Rede questionava muito a FME.
Primeiro eu achei que era implicância, mas, a partir das participações em reuniões e nos
encontros de formações, fui percebendo que esse era um questionamento da Rede.
Então os anos de 2002 e 2003 foram de muita pesquisa para tentar entender o que eram os
ciclos, de tentar recuperar alguns referenciais teóricos. Bom, com a assunção da prof.
Felisberta na Secretaria, nós fomos percebendo uma mudança de postura na relação FME e
escolas. Em 2004, tivemos um ano muito confuso, mas que podíamos ver um movimento
de discussão, de escuta as escolas. Na verdade, esse movimento se inicia em 2003. É um
período que nos possibilita perceber uma abertura de escuta aos reclames da Rede. Tivemos o
Encontro de EJA, de E.I, de E.F. que produziram Documentos que subsidiaram a Construção
do PME. Esses encontros foram muito importantes porque eles abriram o processo dialógico
que eu não consegui identificar em 2002. Em 2002 era assim, por exemplo: “A FME decidiu
que a escola tem que fazer isso...”, era uma coisa muito volátil. De 2003 para já fomos
percebendo uma mudança gradual, que quando o prof. Waldeck assume em 2005, esse
processo de mudança se instala de vez, pois apresentou logo no inicio do governo aquela
proposta dos “13 pontos” e é uma dinâmica que eu percebo que ele vem perseguindo em
parceria sempre conosco de estar trilhando esses pontos que foram levantados como meta para
o decorrer desses quatro anos de gestão.
Acho que nós temos tido uma caminhada muito árida, muito trabalhosa, porque a primeira
necessidade que nós tínhamos era de recuperar a confiança da Rede nesse órgão central.
Ainda hoje nós padecemos com essa falta de credibilidade. Precisamos cotidianamente
estabelecer vínculos com a escola. Dar explicações virou algo muito comum para nós porque
somos muito questionados. Às vezes com sabedoria, serenidade, elegância, mas, às vezes
também com questionamentos ríspidos, doloridos e até diria a você que em alguns momentos
esses questionamentos são ofensivos.
Qual é o eixo que tem norteado essa proposta que está sendo reconstruída?
Essa proposta pedagógica, - isso nós sempre temos tido o cuidado de dizer -, ela não é nova.
Ela busca complementar a iniciativa que foi adotada de 98 para 99, que naquele momento, por
razões que desconheço, não foi dialogada. Então essa proposta que temos buscado reconstruir,
ela vem dar respostas a uma série de reclames da própria rede. Então considero que o avanço
desse processo é de estarmos caminhando para a construção de uma outra escola possível.
Não é a escola “redentora” que vai solucionar os problemas educacionais de Niterói, mas,
outra possibilidade de escola que leva em conta uma escuta mais sensível aos profissionais da
rede, aos alunos e aos seus familiares. O diálogo hoje é mais aberto.
É claro que nós temos uma série de limitações para o trabalho coletivo, pois o trabalho da
lógica do sistema impõe algumas restrições. Não para cada escola se auto-gerir e depois,
como diz o Waldeck “nos juntarmos como uma Rede de escolas federadas”, mas, essa
proposta tem um eixo central que é a construção de uma escola mais democrática. Uma escola
que acolha a todos, independente da classe social que pertençam, da cor, da origem, da opção
sexual, enfim, estamos tentando encaminhar a construção de uma escola pública que seja para
todos. Considerando que a escola pública historicamente demarcou o seu caráter seletivo, que
a série também demarca, eu acho que o eixo central é a tentativa de uma escola mais
democrática, de uma gestão mais democrática, de processos mais democráticos, de relações
170
escolares e humanas mais justas e igualitárias. Enfim, estamos em busca de um processo de
humanização da escola pública.
Em linhas gerais, qual é a sua avaliação sobre esse processo instalado desde 2005?
Vejo que nós fizemos uma longa caminhada, com muitos avanços e muitos recuos
importantes. Tivemos momentos que foram necessário parar e, parar mesmo, para dar a
possibilidade de reflexão, de distanciamento. Acho que falhamos algumas vezes. Algumas por
omissão, outras por excesso, enfim, como todo processo houve nesse percurso uma dinâmica
contínua de ir e vir no sentido de que nenhuma mudança se numa perspectiva linear,
estática e imóvel. Toda mudança pressupõe um movimento de idas e vindas; de erros e
acertos. Que bom que é assim! Que bom que nós podemos errar e refazer, podemos pensar
melhor sobre as coisas, (re) elaborar o trabalho, discutir coletivamente, abrir os processos a
outros olhares, porque temos clareza que nosso olhar é sempre parcial, sempre provisório e
quanto mais pessoas participando, sugerindo , mais as relações e os processos se intensificam.
Um aspecto que considero muito bacana nesse processo, é que a escola está começando a
perceber a importância da participação dela, e por outro lado ganhando autonomia também
para se auto-gerir dentro do que é possível. Então, acho que esse é o grande ganho desse
processo. Nós trabalhamos para que a escola assuma o seu papel na sociedade, que é um papel
hoje ainda um tanto ofuscado, mas que não deixa de ser importante nesse contexto social.
Ontem mesmo fui a uma escola com a Adriana e uma professora disse assim: “Eu não gostei
de vocês terem enviado essa proposta só no final do ano e com tão pouco tempo. Se é para eu
contribuir, eu quero realmente dar minha contribuição.” E ai, que bom ouvir isso! Saber que
alguém se importa com o trabalho, saber que alguém tem outro olhar, outras contribuições. É
nessa educação que eu acredito.
171
Entrevista com a Prof. Leda Marina
57
Realizada em setembro de 2007
Comente um pouco sobre sua leitura quanto ao processo de implantação dos ciclos desde
1999 até o momento de 2005, quando a proposta começou a ser reconstruída.
Na verdade, em 1999 eu ainda estava na escola, como professora da E. M. Vera Lucia
Machado. Eu entrei na Rede em 1994 e, naquele momento percebia que na Rede havia uma
discussão muito focada em torno da avaliação. Ao tentar repensar um pouco sobre isso, tudo
parecia muito confuso para mim, pois, eu estava naquele momento buscando me encontrar
como professora.
Em 1999, quando chegamos à escola, encontramos uma proposta nova, com o trabalho
pensado numa lógica de ciclos. Foi um momento muito confuso, que gerou resistência em
muitas pessoas e que apontava apenas uma mudança na própria nomenclatura. Então,
começaram a haver alguns encontros para pensar os ciclos, naquela ocasião foram
desenvolvidos “mega” eventos, que a meu ver não nos ajudavam a pensar a prática na sala de
aula, tinha aquela “coisa grandona”, mas que não era possível conectar com o cotidiano. Eu
participei de alguns encontros, muito poucos, antes da implantação da proposta “Construindo
a Escola do Nosso Tempo” nesse mesmo ano, porém, as discussões eram bem pontuais para
apontar o que era série, o que era o ciclo. Vínhamos num movimento de discussão muito
superficial, mas, eu não posso negar que nesse momento eu participei dessas discussões,
embora não muito complexa e aprofundada como fazemos hoje.
Em 2000, eu vim trabalhar na FME, trabalhava pela manhã na escola e a tarde compondo a
equipe da coordenação de e ciclos vendo, portanto, esse processo de um outro olhar.
Continuaram os eventos, mas a participação dos professores era muito restrita, pois não
tínhamos como estruturar a escola para a ausência deles.
Em 2005, quando o prof.Waldeck assume a gestão da FME, eu assumo a coordenação,
começamos a pensar o que é que pretendíamos dessa gestão. E ai, uma das coisas que
ouvíamos por toda equipe pedagógica, os professores, diretores, orientadores, era a
necessidade de se pensar essa gica de ciclos que era muito conflituosa para todos, pois a
nossa discussão ainda era muito influenciada pelo modelo seriado. Então, as metas começam
a ser pautadas para buscar estratégias de modo que pudéssemos avançar nessa discussão.
Assim, o Waldeck, Armando e nós, coordenadores, ao ouvirmos a escola, percebemos que o
caminho era de fazer uma revisão, e mais do que uma revisão, uma reconstrução dessa
proposta. Mas como fizemos isso? Começamos a elaborar um esboço internamente montando
os GTS internos. Um para pensar a e E.I., outro para pensar a EJA, outro para pensar o E.F.,
enfim, começamos a estudar, a pesquisar caminhos que pudessem romper com alguns
aspectos da proposta de 1999 que apresentavam a lógica seriada e encaminhar novas
possibilidades para implementação, de fato, da lógica de ciclos nessa Rede.
No final de 2005, nós temos um Documento mais ou menos possível e enviamos para escola,
na expectativa delas lerem, refletirem e enviarem contribuições. Só que esse não é um
caminho muito fácil, não é tão simples para o cotidiano da escola, pois, falta tempo, falta
mediação, falta espaço, articulação. Então, nesse momento, nós começamos a investir muito
nos Supervisores e Orientadores das escolas (os Pedagogos). Os anos de 2005 e 2006 o
investimento foi todo voltado para isso. Muitos encontros, muitos debates, muitas formações,
estudos sobre currículo, avaliação, mediação tudo para os Pedagogos da escola.
Em 2006, remontamos esse “Documento Preliminar” enviado em 2005. A proposta foi
remontada por base aos acompanhamentos que começam a acontecer na escola. São
57
Coordenadora do 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental da FME.
172
acompanhamentos que deixam de ser por grupos de coordenação, passando a ser por uma
Equipe de Referência, ou seja, equipes que teriam um olhar mais coletivo. Se queremos que
as escolas se mobilizem para o coletivo, nós procuramos fazer o mesmo movimento aqui na
FME, pois, nós também estávamos muito fragmentados, muito segmentado em nossos grupos,
reconhecendo a necessidade de repensar as nossas relações internas na FME.
Então, os movimentos de Formação continuada, que também são um diferencial da nova
proposta acontecem não com grandes eventos, mas, em discussão muito próxima ao cotidiano.
Reuniões por pólo de diretores, de Pedagogos. No ano de 2006 basicamente fizemos isso, e
mais, ajudando a mediar, essa leitura e essa discussão na escola. As escolas que mandam suas
contribuições daquilo que não concordavam, daquilo que concordava, mas tinha que
melhorar, enfim, o 2º semestre de 2006 também foi dedicado a discussão novamente nos GTS
para refazermos a versão da proposta que iria para a escola em 2007 a partir dessas
contribuições e discussões. No final de 2006, temos uma nova versão da proposta e
mandamos para a escola para que novamente pudessem experimentar, discutir e enviar até
julho de 2007 suas novas contribuições, que nesse momento estão sendo discutidos aqui
internamente para quem sabe uma “proposta final”.
Nesse movimento de conversarmos sobre as contribuições, fomos percebendo aquilo que se
repete por muitas escolas, também alguns aspectos, eixos que não estão mais em discussão,
como por exemplo se a rede vai se organizar em série ou em ciclos. Estamos numa lógica que
tenta romper com a lógica seriada, e isso precisa ser entendido, então o que ajuda nessa
ruptura?
Então, basicamente nisso que você perguntou sobre a minha leitura entre uma proposta e
outra, posso dizer que o diferencial é exatamente o processo de escrita dessa proposta que está
sendo muito mais lento, numa tentativa de participação maior, com os professores,
pedagogos, diretores. Mas, eu também não sei se caso nós não tivéssemos passado por aquele
processo em 1999, com pessoas vindo de fora, se hoje nós teríamos esse amadurecimento de
fazer a coisa mais no miúdo. Além disso, o fato dos ciclos em 1999 serem implantados na
expectativa de dar conta com a questão da avaliação continuada que por muitos foi
interpretada como “promoção automática”. Então, eu acho que agora é que nós temos a noção
da gica de ciclos e sabemos o que desejamos para o aluno da nossa rede que é romper com
essa fragmentação, competição, com essa lógica que eu tenho um tempo determinado para
aprender um conhecimento que alguém disse que eu deveria aprender.
De que forma vose sente inserida nesse movimento? Comente um pouco sobre sua
atuação no processo.
Desde antes de eu ter assumido a coordenação de referência, mas na própria coordenação de
e ciclos, eu tinha clareza do objetivo do trabalho desta gestão que era implementar
uma lógica diferente da lógica seriada que hoje chamamos de ciclos, mas que daqui algum
tempo podemos vir chamar de outra coisa. Por isso, eu acho que a minha inserção nas
discussões com orientadores, supervisores, com os pedagogos aconteceu. Eu fui muito as
escolas, na verdade ainda vou muito as escolas, principalmente no inicio do processo nós
conversamos muito com as pessoas, tentando pensar junto: “bom se vimos que isso não da
certo, o que podemos estar pensando e propondo numa outra perspectiva?”.
Por isso, a palavra fundamental desse processo todo é a conversa, o diálogo. Nem sempre isso
é fácil, ao contrário, é difícil, algumas pessoas resistem e nós temos que ir com uma nova
estratégia, questionando: “bom você resiste a isso, mas aquilo que fazíamos dava certo? Se na
série não dava certo, você está dizendo que o ciclo é ruim, então me uma outra proposta.
Vamos pensar juntos um outro caminho”.
173
Isso é muito difícil, porque nós somos formados numa lógica de que alguém nos diz o que
deve ser feito, qual o caminho certo, e você acredita naquilo, e quando você está trabalhando
numa perspectiva de que nós ainda não sabemos qual é o caminho certo, mas, que para a
descoberta desse caminho é preciso estar junto, pensar, conversar, para chegar num acordo,
isso é muito difícil. Ontem uma professora perguntou: “Me diz o que eu faço com os meus
alunos?” Hipoteticamente eu não tenho uma fórmula pronta para te responder, mas podemos
sentar, você me diz o que você está fazendo e eu posso te dizer o que eu também faço, quem
sabe juntas nós chegamos a um acordo. É preciso experimentar, vivenciar, repensar e
avaliar, será que é esse o caminho, mas é muito difícil isso, porque as pessoas não foram
formadas nessa lógica. Por isso, nós conversamos muito, temos realizado muitos cursos,
investido na formação continuada. Eu acho que esta formação continuada precisa ter alguns
aspectos específicos que precisamos estar tocando, o processo de leitura e escrita que na
coordenação organizamos alguns cursos que tem sempre a ver com a proposta em andamento.
Proposta em ciclos, então é o processo de formação pontual juntamente com a formação
coletiva do dia-a-dia escolar que é sempre mais uma vertente de trabalho e é nesse trabalho
que acreditamos para escola.
Qual a sua avaliação quanto ao processo já encaminhado?
Na verdade, iremos dar conta de responder isso quando sairmos um pouco deste processo,
pois, estamos ainda muito envolvidos, mas de qualquer maneira podemos dizer que é possível
notarmos focos de resistência dentro de algumas escolas. Umas umas são maiores, outras se
abrem mais e também temos as diferenças dentro da própria escola, com alguns profissionais
que se fecham para o processo e outros que são mais abertos ao diálogo. Isso faz parte. Vo
nunca vai ter uma rede toda pensando da mesma forma. Esses movimentos que nós fizemos,
ao mesmo tempo que são difíceis e dolorosos, ou seja, que é sofrido, eles vão nos dando esse
contra ponto. Até porque nós não sabemos tudo. Nós imaginamos que estamos
implementando uma lógica que seja melhor, mas será que de fato é melhor? Talvez existam
outros caminhos melhores que ainda não conhecemos. Assim, o desafio não é vencer o
foco de resistência, mas transformar aquela resistência em algo produtivo.
Em relação às escolas, eu percebo o seguinte: mais do que um grupo de pessoas terem se
interessado em ler essa proposta, e vivenciar junto conosco essa experiência com interesse, -
pelo menos da sua grande maioria de entender a proposta e investir nela- , nós avançamos
bastante as discussões nessas escolas.Mas, por exemplo, em escolas que a diretora achou
interessantíssimo a proposta e de alguma forma tentou convencer os professores de que
valeria experimentá-la em 2006, essa escola pouco caminhou, pois, o grupo de professores
não acreditava naquilo. A escola que você tinha uma supervisora que acreditava, alguns
professores também, mas, a diretora era bastante conservadora com atitudes bastante
autoritária também tivemos dificuldade de caminhar . Então, o que percebemos, pelo menos é
o que eu avalio das escolas que mais conseguiram caminhar em relação a essa perspectiva de
ciclos, com todas dificuldades, com todos os desafios, foram aquelas que tinham na equipe
pedagógica e no grupo de professores, pessoas que diziam: “Não, é preciso modificar, estou
aberta ao diálogo, vamos conversar...”, essas escolas parecem ter caminhado mais.
Nós, enquanto uma gestão que se pensa mais dialógica, mais em contato com as pessoas, eu
acho que conseguimos avançar muito. Eu vejo assim, as reuniões com orientadores,
supervisores, elas tinham um perfil com a gestão anterior. Hoje, as pessoas se colocam de
outra maneira, valorizando muito mais a troca. Não estão focados somente na Equipe que está
aqui na FME, gerindo. Nós, da FME fazemos a mediação do trabalho, mas não é mais em
formato de palestras em que damos várias orientações. Ontem mesmo estava numa escola e
mais do que dizer “olha gente vou contar para vocês como se a proposta de ciclos”, não,
174
nós mediamos de outra forma: “o que vocês estão entendendo? o que esta sendo possível
fazer e o que ainda se tem de dúvida?”. No inicio foi aquele silêncio, até que uma professora
tomou coragem e iniciou a conversa, que é difícil às vezes, uma conversa tensa. Em alguns
momentos se forma grupo de pessoas mais resistentes. Às vezes são lançadas perguntas do
tipo “reprova ou não reprova?” e nós já entendemos que não sou eu nem você, nem alguém
que pode dar essa resposta. Isso precisa ser amadurecido entre as pessoas que lidam
diretamente com essa realidade. Em alguns casos uma necessidade diferenciada de outros.
Então a troca com grupos que estão dispostos a construírem juntos é bem enriquecida, mas, os
grupos que querem lançar perguntas para obter respostas prontas e que sejam rígidas, o
diálogo é muito prejudicado, pois, não avançamos. Esse grupo precisa amadurecer, pois ele
ainda não entendeu que é preciso mudar toda a lógica. Mudar a lógica para um processo
democratizado. É necessário repensar a relação com a diretora, com os meus alunos, com a
FME, enfim, exige mudanças profundas de relações e não simplesmente uma forma de
trabalhar na escola. Então fazer com que as pessoas entendam isso, esta sendo muito rico.
Então, essa lógica de participação está em construção. Mas, quanto à forma de
participar, como você diria que se expressa a participação desses profissionais mais
atuantes, é uma participação consciente, engajada politicamente?
Considero que sim. Essas escolas já têm clareza que a sua participação é fundamental nesse
processo, então ela entendeu que participar do processo significa compartilhar de coisas
boas e coisas difíceis. Você se responsabiliza em conjunto por aquele processo, então se
algumas coisas você combina e não cumpre você também é responsável por aquilo. Você
pode cobrar ao outro aquilo que você também, e ai, eu percebo que essas escolas
entendendo isso, assumem um compromisso, que talvez numa outra perspectiva, - na
seriação-, não assumissem. Por exemplo: “ Se o aluno quer aprender, tudo bem; se não quer o
problema é dele, a minha tarefa é apenas cumprir meu horário ministrando minhas aulas”,
mas, as escolas engajadas verdadeiramente no processo compreenderam que é muito mais
do que isso. Tanto que as reuniões de planejamento são muito mais densas, as pessoas brigam,
as pessoas estão lá juntas porque querem discutir as coisas, querem definir juntos. As
reuniões de pólo estão ficando cada vez mais coesas, estão se fortalecendo. Isso é ótimo,
porque tudo que nós queremos é que terminada essa gestão as escolas estejam de tal ponto
fortalecidas que muito pouco possa ser mudado. Explicando melhor eu diria que a partir da
compreensão das escolas, não haveria mais chance de voltar série, pois as escolas
entenderam que o nosso compromisso com a escola publica é outro. Nosso trabalho é de
muito investimento na escola, entendendo que a escola esta fortalecida, independente da
continuidade partidária, da continuidade de governo é o projeto de escola pública que está
fortalecido. Historicamente tem tido uma descontinuidade muito grande no que se refere ao
trabalho educacional, não em Niterói, mas, nacionalmente. Esse é um dos motivos pelo
qual os professores ficam muito desconfiados e temerosos “Ah, nós estamos investindo nisso,
daqui a pouco chega uma outra pessoa e muda tudo”.
A idéia do ciclo e a idéia dessa gestão mais democrática, mais dialogada é uma idéia de
trabalhar e decidir coletivamente quais são os caminhos para aquela escola, para aquele
determinado grupo. Isso fortalece a tal ponto que as inserções exteriores, vão influenciar sim,
mas, elas não vão determinar o seu trabalho. Então acho que assim, o PROCESSO que nós
estamos vivendo é o mais bonito de tudo. Porque quando terminar e tiver conseguido
fortalecer pelo menos algumas das escolas dentro dessa perspectiva, vamos ter conseguido
atingir os nossos objetivos. Não é o ciclo, mas o processo. Não tem sido fácil não, mas, eu
acho que temos investido muito para que isso aconteça.
175
Para finalizar, em sua opinião, até que ponto esse processo se constitui efetivamente
como um movimento coletivo?
Falar de coletivo é algo tão difícil, pois, foi como eu disse, somos formados, não na
escola, mas a nossa vivência ao longo de nossas vidas é uma vivencia bastante individual,
fragmentada, cada um tomando conta da sua vida. Então falar de coletividade na sociedade
em que vivemos é sempre muito difícil. Eu acho que a Rede esta, diria “engatinhando”. Falta
muito para poder dizer: “olha esse trabalho da rede como um todo, é um trabalho
absolutamente coletivo”, mas, eu acho que mais do que iniciar, estamos fazendo um esforço
de viver isso junto. Então é isso que faz a diferença. Nós saímos dessa lógica em passos
pequenos. O primeiro movimento que aconteceu para isso foi na nossa própria coordenação.
Tinham diversos tipos de coordenação que trabalhavam com os mesmos professores, mas, que
tinham focos distintos e mal dialogavam. Então quando em 2005 virar uma mesma
coordenação é algo bem difícil no que se refere às relações. Imagina, se antes as pessoas
nem se falavam agora ter que trabalhar juntos! Esse foi o primeiro passo interno. O outro
passo foi o agrupamento das pessoas nas ER. Internamente isso também foi difícil, hoje,
percebemos que esse foi um dos passos mais acertados que demos. As pessoas trabalhavam
aqui dentro, não sabiam o que o outro fazia, e mais do que fazer, não compartilhavam das
mesmas concepções, então tivemos que aprender a trabalhar junto. Hoje o entrosamento
dessas equipes se consolidou de tal forma que as pessoas não se vêem mais participantes de
um único grupo.
Então pensando nisso, conseguimos caminhar com o trabalho coletivo, mas que ainda é
pouco, sem dúvida. E, a escola a mesma coisa, ela também vai se mostrando dessa mesma
forma. Hoje, você tem uma fala dos professores que estão vivenciando o processo desde de
2006, o fato de que não é possível um trabalho individual nessa proposta. Entendendo isso
eles hoje brigam por mais tempo de reunião pedagógica e acho de fato que um projeto futuro
é repensar sim esse tempo. Quando se trata de um trabalho sério, engajado, 2h não para
nada e também não adianta eu planejar sozinha em casa, é um trabalho coletivo, requer
planejar junto com. Então nós percebemos esse movimento na escola, que mais do que um
discurso, se na prática o esforço para se encontrar esse tempo. “Ah, vamos ver se minha
aula coincide com a sua para sentarmos juntas nesse horário”.
Mesmo assim, eu acho que pensando no que quer dizer coletivo, e de tudo que a nossa
formação enquanto pessoa, a nossa formação escolar trabalha numa outra perspectiva, temos
muito que avançar. Mas, acho que estamos no caminho, eu acho que é esse mesmo o caminho
que precisamos trilhar. Devagar, se reconhecendo nesse processo.
176
Entrevista com a Prof.Marta Nidia
58
Realizada em outubro de 2007
Qual a sua leitura sobre a política de ciclos em Niterói, desde sua implantação em 1999
até o momento da reconstrução iniciado em 2005?
Eu entrei na escola da Rede no ano 2000, então no momento em que tinha acabado de ser
lançada a proposta anterior, “Construindo a Escola do Nosso Tempo”. Portanto, não participei
muito nessa implantação. Eu atuava na Educação Infantil e tinha uma leitura dessa proposta
muito formada através das minhas colegas. Houve mudanças de nomenclaturas de outras
coisas, mas que não alteraram tanto na Educação Infantil. A partir daí ficamos muito a mercê
das opiniões das pessoas que, eram opiniões assim: “a gente não discutiu, isso foi uma
proposta de gabinete, não tivemos informações, não houve diálogo”, enfim, o tempo passou...
Encontrando com pessoas do Ensino Fundamental, perguntamos sua opinião; o que eles
achavam da proposta e, como eles se relacionavam com ela. Eu que estava entrando naquele
momento na Rede, já tinha um olhar que me direcionava para a proposta de ciclos, não que eu
tivesse a idéia de ciclos antes de ser inventada, mas, encontrava desafios no meio do
caminho da nossa prática, que nos faziam pensar em algo novo. Eu não sou a favor de uma
escola tradicional, então, estou sempre tentando enxergar coisas que possibilitem a construção
de uma escola melhor, com uma leitura não tradicional. Então eu ficava interessada, achando
que seria algo legal trabalhar com os ciclos. Eu sempre fazia discurso que Niterói estava com
a proposta de ciclos e quando encontrava com os colegas do Ensino Fundamental eles
falavam de séries e falando de suas práticas totalmente seriada.
Houve outras tantas falas que me permitia perceber a escola um pouco distante desta proposta
implantada em 1999 e vimos que ela acabou caindo em esquecimento por um tempo. Não se
falou muito mais dela, inclusive eu ouvia assim em algumas reuniões: "nós não temos
nenhuma proposta" e eu ia de encontro: “como assim não temos uma proposta, se quando eu
entrei foi apresentado uma proposta?”. A verdade, a meu ver, é que as pessoas tentavam não
ver mais os ciclos como uma proposta. E ai, aconteceu algumas coisas interessantes. Depois
de um tempo você vai juntando as coisas.
na FME, como coordenadora da Educação Infantil, pude ter acesso a alguns documentos
criados na fase anterior a 1999, onde eu vi o nome de colegas meus da Rede que haviam me
dito que esta proposta foi criada em gabinete, mas, o interessante é que o nome das pessoas
estavam lá, representados como presença de alguém que ajudou a construir esses documentos
antes da proposta ser implantada. Eu entendo que isso fez parte do processo, mas não sei
como foram os fatos. Eu tenho impressão que aconteceram vários movimentos de
informações e discussão e, depois um grupo sentou em gabinete e fez a síntese disso. Mas, a
rede não reconhece essa síntese como construída e protagonizada por ela.
De uma forma geral, eu posso dizer que tivemos algumas formações sobre a proposta de
ciclos, que foram formações do nível macro, grandes formações que colocava todos no
Clube Português, ou todos no Canto do Rio, e as pessoas iam, ouviam aquela fala profissional
maravilhosa e voltava para escola e não conseguiam fazer daquela fala a sua prática. Até
concordavam e aplaudiam. As pessoas falam de Euvira de Souza Lima com respeito, mas, não
colocavam em prática coisas relacionadas com aquilo que elas concordavam. Então não faz
uma conexão e fica em grandes informações que não tem a ver com o cotidiano da escola,
com a especificidade de cada Unidade de Ensino. Essas foram coisas que nós observamos no
decorrer da proposta, e o que foi acontecendo?
58
Coordenadora da Equipe de Referência da FME.
177
Esta proposta foi “des-plantada” e nós seguimos a vida. Não seguimos a vida nessa proposta.
As escolas continuaram seriadas, ora falando de ciclos, ora falando de série, parte falando de
ciclos e parte falando de série, mas a maioria com o trabalho seriado, embora eu não possa
falar pela totalidade das escolas.
Quando passamos pelo processo de discussão em 2004 para o PME, a Rede tinha tido
muitas queixas e eu particularmente acho essa rede muito “lamurienta”. Não que nós não
devamos fazer reivindicações, - fazer reivindicações é uma coisa, fazer lamúria é outra-. Eu
sempre ia a encontros com professores e supervisores da rede e, algumas vezes as pessoas
traziam algumas práticas muito legais como se fossem totalmente inovadoras e como se não
tivesse nada a ver com a proposta de ciclos. Lembro-me de uma reunião com uma professora
que eu gostei muito. Uma professora que também é da rede e ela começou a falar da prática
dela e colocando coisas que ela gostaria de fazer. Eu dizia: “não estou entendendo, pois, tudo
que você gosta de fazer é da proposta de ciclo, e você está dizendo que não concorda com
isso”. Defendemos as coisas que compõem a proposta de ciclos. Essas atitudes era uma forma
de bater com aquela proposta, aliás, da forma como foi implantada e pela descontinuidade no
processo de formação, pois, a meu ver houve uma descontinuidade na política. Era como se
instalar de ciclos na rede fosse um momento distante, pontual. “Conversamos até aqui e chega
de conversar, agora é ciclo”. Foram feitas algumas formações, mas o movimento de
acompanhar este processo, para provocar e orientar isso não aconteceu. Resultado: repudiava-
se aquela proposta e eu acho que o motivo foi esse, o distanciamento que ela tinha da escola.
“Por que me deram uma coisa e me abandonaram nela, não ficaram junto comigo?”, assim, a
rede queria mais, mas para dizer o que queria a maneira era anunciando uma negação: “não
queremos dessa forma, queremos assim, assim e assim”.
Em 2005, com a nova gestão e em função dos documentos produzidos nesse momento a
partir da leitura das discussões que tinham sido realizadas, foi iniciado um movimento para
reconstruir a proposta de ciclos. Para mim este momento foi riquíssimo, eu particularmente
brigava muito nos encontros, discutia muito. Mas, eu acho que nem todos entenderam desta
maneira e, acho até que muitos se perguntaram: “o que eu estou fazendo aqui?”. Eu vinha
“afoita” para essas reuniões, porque via como um momento único, afinal, nós educadores
fomos chamados a começar a “construção” de uma proposta. Para isso, havia duas comissões
organizando essa proposta e as questões iam para esses encontros, onde todos nós tínhamos a
oportunidade de opinar, de refletir e colaborar.
Assim como a rede num todo nem sempre entende esse chamado, eu acho que essa equipe de
superintendência também não entendeu esse chamado. Acho que algumas pessoas entenderam
e deram conta da seriedade do momento, mas, a totalidade considero que não. Até porque
um estranhamento nisso: “eu estou aqui tantos anos, passaram tantos governos e gestões, a
política muda, nunca fiz isso, agora, estou sendo chamado, para quê? Para construir o quê? Eu
desconfio do convite que me fazem, até porque essa proposta de ciclos é uma coisa que eu
não me sinto a vontade”. Assim, as pessoas param, estacionam na desconfiança.
Outras encararam de outra maneira. Se for para melhorar escola estamos dentro. Eu achei
esse momento de maior importância, entrava e saia das reuniões com muitos pensamentos e
acho que foi um momento muito legal. Foram das reuniões e discussões que a proposta
preliminar foi escrita. Eu enquanto coordenadora passei a acompanhar esse processo muito de
dentro da escola, compondo a Equipe de Referência.
Na sua opinião, de que forma a escola recepcionou essa proposta preliminar?
A minha consideração, é que na rede têm profissionais exóticos, pessoas muito críticas,
questionadoras e foram instaladas numa proposta extremamente democrática, tão democrática
que assustava. Assim como ter chamado aqui dentro da Sede para discussão de uma proposta
178
de ciclos, gerou desconfiança, também na escola ter chamado para uma gestão realmente
democrática também assustou. Desequilibrou, gerou desconfiança. Até mesmo o grupo mais
novo de professores recém convocados já tinham uma desconfiança fortalecida pelos
discursos do grupo mais antigo da Rede. Então as pessoas começavam a chorar por
sentimentos das fases anteriores sem tê-las vivido. Você chorar uma mágoa que você ainda
nem tem?! Em minha opinião, é um grupo de certa forma envelhecido. E ai assim mitos não
aproveitaram esse momento. Também tem as que parecem que aproveitaram, mergulharam,
questionaram, discutindo com a desconfiança que é natural e comum, mas, ainda assim
discutiram, colaboraram, mandaram suas contribuições.
Essas contribuições que vieram para a Sede, um grupo de pessoas organizaram o material e o
retornou para escola. E ai algumas escolas mais uma vez mergulham nessa discussão.
Mergulham até para dizer não entendi, ou não gostei. Algumas dizem que viram por alto.
Algumas estudaram para intervir.
A partir da experimentação em 2006, qual é a sua leitura acerca do trabalho que a
escola foi desenvolvendo nesse processo?
Em 2006 a gente começa com o processo de implementação e tudo vai acontecendo aos
poucos. Eu fui numa das escolas que participou da apresentação do seminário em 2006 e pude
perceber que a escola não estava andando muito com a forma de como se apresentou. Então,
ouvi de uma pedagoga, a mesma que apresentou o seminário, que ela estava equivocada, pois,
o que ela estava apresentando não condizia com a prática da escola. Ela estava se dando conta
que estava caminhando sozinha, ela estava caminhando na discussão e não a escola. Então
temos que entender que na escola existe uma complexidade, pois muitos pedagogos têm
dificuldade de entender a proposta de ciclos, outros não têm dificuldade de entender, mas, por
formação são contra, alguns não compreendem bem, mas, estão abertos a fazer e entender e,
outros que entendem abraçam, mas “malham” todo dia na escola para conseguir caminhar
com a proposta. Por outro lado, você tem a escola que esta se organizando,
independentemente do pedagogo porque ele esta num processo mais lento do que a escola.
Então você tem diversas realidades e quando você vai para esses seminários, isso fica claro.
As pessoas se preocuparam muito, as próprias escolas. Ao ver aquilo que não correspondia
com a realidade tiveram que fazer um exercício muito sério de entender o que estava
distanciando o discurso da prática. A meu ver, foi um pequeno passo, mas, para aquela escola
perceber isso, pode ter sido uma revolução. Dentro daquilo que eles estão caminhando eu
acho que é um exercício cotidiano.
Para as Equipes de Referências que acompanham várias escolas, entender isso exige muita
sensibilidade e um olhar crítico. As realidades das escolas são muito diferentes. Às vezes você
veio de uma escola onde ela estava avançando e você apenas atravessa a rua e vai para uma
outra escola da mesma comunidade com profissionais que trabalham nas duas e que, uma
esta caminhando e a outra deu um passinho pequeno achando que esta avançando bastante. E
ai, você deve ter uma ação muito respeitosa a essa escola e dizer: você deu um passinho
pequenininho e agora, vamos tentar outro, incentivar e estabilizar essa escola é um desafio.
Mas sem desmontar, sem perder o que foi construído. É um desafio porque o que vale para
uma, nem sempre vale para outra. Assim, a gente acerta e erra todo dia, a gente sai de uma
escola com uma conversa e tem ganhos, e vai para outra escola com uma conversa muito
perto e tem perdas. A equipe de referência caminha com uma determinada ação numa escola e
às vezes na mesma escola, em um outro turno não consegue. Então tem que rever. Numa
escola ela tem uma parceria franca com a direção e numa outra escola à parceria que a Equipe
tentou estabelecer desde o inicio não conseguiu por desconfiança da escola. costurando a
relação com jogo de cintura porque é um grupo de escolas diferentes. Então a gente vem
179
fazendo esse exercício de entender e não perder aquilo que a escola caminhou e não nos
conformar, mas, provocar essa escola, problematizar o tempo todo.
Então é uma situação delicada, mas não é impossível, temos que buscar uma escola e dizer:
minha intenção não é derrubar o que vocês estão tocando, venho com muito respeito ao que
vocês estão fazendo, mas é meu papel problematizar e questionar com vocês algumas
questões, e trazer para perto da proposta o que vocês estão realizando. Não desmerecer o
caminho da escola, mas trazer para a lógica de ciclos, então, nossa atuação acaba
desestruturando um pouco o que esta acontecendo. Afinal, o que se esta propondo é uma
reestruturação.
Nesse caminhar você tem a construção das Equipes de Referências que se deu no ano de 2006
e, que eu particularmente não conheço nenhuma rede que tem este formato. Acho que estamos
inaugurando uma forma de se relacionar com a escola, não tem receita. A gente sabia fazer?
Não. A gente foi pensando e criando no caminhar, então acho que a gente pegou alguns
procedimentos e algumas relações em 2006 que foram avaliadas para a organização de 2007 e
acho que a gente tem outras questões para avaliar para 2008, questões que precisamos
aprimorar. E essa própria Equipe de Referencia, que são pessoas de diferentes formações e
diferentes formas de trabalhar que compõem uma mesma equipe e de certa forma "deu conta"
de um grupo de escolas que não estavam acostumas a pensar nesse tipo de propostas.
Algumas se sentiram atropeladas, ameaçadas, algumas se fecharam, outras se abriram, a
gente tem escola que passamos um semestre inteiro tentando conquistar a confiança da Equipe
de pedagogos da escola e, seis meses depois a própria Equipe de Articulação te pergunta:
quando é que você vai começar a trabalhar? E, você não fez mais porque essa Equipe não
permitiu. Você está o tempo todo buscando brechas, mas querendo ser muito respeitoso, não
vamos fazer nesse momento, porque agora que este pedagogo esta dialogando com a gente, se
colocando a disposição, tentando amarrar a idéia e chega uma hora e perguntam: “o que vocês
vieram fazer aqui que até agora não começaram?”. A gente estava construindo esta relação
pensando em resultados, em médio prazo, estávamos estabelecendo laços.
Hoje, você tem equipes que fazem parte da escola, equipes boas, respeitadas e queridas que
são chamadas para curtir as coisas boas e chamadas para enfrentar os problemas juntos.
Equipes em que a diretora antes de tomar alguma decisão, chama para ser ouvida e sentam
para planejar juntos com a escola. “Estou precisando de ajuda nisso e naquilo”. Assim como
você tem escolas, que a Equipe de Referência entra como um elemento estranho. Muitas
pessoas não falam às coisas que realmente estão pensando quando a Equipe de Referência
esta na escola. Isso tudo é processo da proposta, o novo recebendo, escrevendo e
reescrevendo as diretrizes.
Tudo isso fez parte do movimento de reconstrução. Foi um processo que se desenvolve
efetivamente no calor da panela. Mas, quando você vai para escola ainda escuta que isso esta
sendo feito a rebelia da escola, as falas são: eu não tenho participação nisso e tudo que esta
transitando aqui”. Ou seja, sua contribuição por documento, por fala em reunião, pela sua fala
com a Equipe de Referencia ou pela interpretação da equipe de referencia no cotidiano da
escola, nada disso conta?! Essas pessoas se sentem ainda não envolvida no processo, como se
estivesse engolindo a seco a proposta.
É fundamental lembrar que, por mais democrático que seja o processo ele não é infinito, ele
tem tempo para acabar, então eu não posso esperar que em dois anos depois você tenha um
desejo de começar a participar, de se envolver. O processo está em andamento, está
acontecendo enquanto você não se envolve, está acontecendo. Além disso, a escola não é
isolada, ela faz parte de uma rede. Então às vezes a escola manda uma proposta e diz assim:
“mas a nossa proposta não entrou”, mas é porque a proposta não é soberana, são sessenta e
quatro escolas, então você tem que ter uma leitura de sessenta e quatro.
180
Você tem que ter um limite legal, a possibilidade administrativa, financeira e a coerência
pedagógica com a proposta, porque as pessoas fazem proposições que distorcem a proposta de
ciclos. Você não pode vir com questão que vai arrebentar com a lógica que está sendo
proposta. A gente esta pensando em uma proposta de ciclos, estamos elaborando em conjunto
com a rede a proposta em ciclos e não uma proposta de séries inovadoras. Isso é uma outra
coisa.
Até que ponto você considera este processo, como um processo de democracia, de
coletividade, de participação?
Primeiro eu acho que a gente parte de um primeiro problema que é a democracia. Eu acho é
muito recente na escola. Quem nasceu um pouco depois da Ditadura, nasceu na nossa euforia
democrática, que ainda não é uma democracia, porque não é nos extremos que nós fazemos
democracia, mas sim no equilíbrio de forças. Além disso, nós não tínhamos a prática de
participar, nós votamos, criamos estrutura para o país de democratização, que são os
diferentes conselhos, as diferentes experiências participativas, as diferentes experiências de
gestão acontecidas no país, que nos levam a uma organização propriamente democrática.
Mas nós, individualmente não vivemos isso. Nós temos relações familiares autoritárias, temos
pais autoritários, filhos autoritários, colegas autoritários. Nós não sabemos levar uma relação
democrática. Quando você, em qualquer instância se propõem em sentar e dialogar, alguém
acha que não é bem assim, tem uma outra coisa que não vai ser aquilo ali, ou seja, não leva fé
no diálogo, ou, tenta impor um ritmo próprio ao diálogo sem respeitar. Às vezes utilizam para
dizer que todas as estratégias de organização que você trata com diálogo são autoritárias,
porque a gente acha que democracia não tem regra. Então eu acho que as nossas maiores
experiências com a democracia tem sido difícil, pois existe uma ausência de respeito pela
regra, e democracia possui regras claras. E ai, nesse sentido que eu acho que a gente tem uma
organização nesse processo bastante democrática, mas de um nível de pensamento
democrático que ainda é mais difícil para a gente de organizar, de lidar, e que é um processo
que tem que ir se organizando no cotidiano.
Em 2005 a gestão podia dar todos os fatos do processo, será que podia? Não sei? Nós
tínhamos deslumbrado não o fim do túnel, mas o médio túnel. Então a gente precisava ir
reconstruindo isso. Então, assim uma construção que se dá na medida em que sente o calor do
movimento ele é por principio democrático, mas ele pode não ser, pois pode ser uma
manipulação. Na minha avaliação, esse movimento tem sido democrático, mas, assim um
democrático que a gente não esta acostumado a lidar. Então você tem dezenas de pessoas da
rede, de profissionais da rede que não reconhecem este processo, que não se integram nesse
processo, por quê? Uns porque não confiam que a sua opinião vai valer, mas muita gente,
porque acham que democracia é me ouvir. Democracia não é te ouvir. Para muitos,
democrático é a escola dizer a gente tem que ser assim. Mas, democrático não é a escola dizer
a gente tem que ser assim, mas, aguardar isso ser processado, o conjunto da rede se
manifestar.
Pensar sozinho? Não. É pensar com., mas não dá para negar que a FME organiza esse
processo para gerir a Rede de escolas. Algumas escolas querem compor democraticamente,
isoladas. Elas têm dificuldade de reconhecer que elas compõem uma rede. Então na visão de
muitos, toda ação que vai da FME para escola ela é autoritária. Tudo bem, temos que
considerar isso por outros momentos vividos, que descreve a descontinuidade, de
autoritarismo, de abandono. Sem citar nomes, eu não estava aqui, eu não vi como foi à
complexidade da escola. A gente teve período de tutela, a gente teve período (indicativo de
uma relação democrática que não foi democrática), a gente teve momentos de maior respeito e
consideração e a gente teve momento de abandono. A escola gritava que precisava de ajuda,
181
mas não sabia nem a quem procurar.
A própria estrutura da FME proporcionava isso. Vivíamos com diretorias divididas, diferentes
coordenações. Éramos fragmentados e pensávamos de forma fragmentada: “eu tenho uma
escola de educação infantil então, vou à escola para discutir o problema com a educação
infantil”, mas não havia diálogo, pois, o problema daquela escola estava ligado a outras
coordenações, ou seja, estava ligado a um todo. Então formar uma Equipe que possa pensar
no todo, realmente significa um salto qualitativo dessa estrutura que nos enlouquece, mas, que
é fundamental nessa proposta, que é a Equipe de Referencia. Essa Equipe esta junta, lutando
com diferentes olhares.
Não tem como nós não estarmos um pouco ligado em cada escola. Tem muito poucas escolas
que eu me sinto uma estranha. É claro, não me sinto íntima porque não estou lá, mas tem
poucas escolas que eu não tenho nenhuma informação. Isso é de extrema importância para a
reconfiguração da rede e dessa relação de democracia. Aqui ou na escola a gente não tem
mais vidro, não tem mais quintal, o que é meu daqui a pouco é teu e depois é nosso.
Não mais para você trancar o portão e dizer que daqui para dentro o problema é nosso,
como havia em alguns momentos. Embora você tenha escolas insistindo bravamente em
manter o portão fechado dizendo que o problema não é nosso. Mas, como você tem uma
Equipe que está indo cotidianamente, e não está indo para vigiar, mas sim para participar e
ajudar, então ela é uma cúmplice, mas uma cúmplice que está no meio da caminhada. Então
ela olha a perspectiva da escola, mas, também tem que olhar a perspectiva da FME como
gestora e como alguém que circula em vários espaços. Colabora com você quando percebe e
olha.
Eu acho que tudo isso, este conjunto de coisas que o processo traz, vem garantindo que seja
um processo democrático. Mas eu acho que se a gente fizesse a mesma coisa daqui a quarenta
anos, quero eu acreditar que daqui a quarenta anos, a gente olhe para trás e vejamos essa
gestão como autoritária, porque desejo que possamos ter adquirido uma prática
democrática. Mais que uma prática, uma lógica democrática, uma filosofia democrática, onde
realmente a gente respeite. Onde havendo um chamado para uma reunião na FME para
discutir sobre a proposta, a gente não venha pensando que não iremos conseguir sobrepor a
nossa opinião e nem assustados, com que falar. Mas que possamos dizer, dialogar, questionar,
posicionar. “Olha só estou querendo entender, não entendi nada.”
Entender que o momento é de dialogo mesmo. Eu acho que autoridade política a gente não
tem, historicamente a gente não tem, o Brasil tem muito poucos momentos de democracia
para a gente dizer que sabe da política de ciclos. Acho que tem muitas pessoas querendo fazer
democracia no seu cotidiano, mas eu digo isso, pois é um processo muito similar que a gente
esta vivendo na perspectiva democrática.
Mas se assim como naquele momento foi difícil e vem sendo dificil, manter essa lógica na
escola, fazer com que este processo todo de elaboração dessa proposta como um processo
democrático, porque qual o conceito que cada um de nós traz de democracia, é o encontro de
todos esses cursores, então você tem diferentes leituras sobre isso, e eu acho que este processo
tem sido o mais democrático possível.
182
Entrevista com a a diretora Greice
Realizada em setembro de 2007
Escola A
Entendendo que a E. M. _____ tem participado do processo instalado na Rede desde
2005, cujo foco tem se voltado para a reconstrução da proposta pedagógica em ciclos,
gostaria de saber qual foi o critério utilizado pela escola para adesão da proposta em
forma de experimentação no ano de 2006?
Em outubro de 2005, a proposta preliminar chegou a nossa escola para que pudéssemos
estudá-la. Não participamos do momento em que os ciclos tinham sido implantados em 1999,
então para nós, aquela proposta que chegava à escola era a única que conhecíamos e
poderíamos ter, ou, não como norteadora de nossas práticas. Então dedicamo-nos ao máximo
para estudá-la e refletir em suas propostas no período de outubro até dezembro. Nesse
período, tivemos que quebrar muitos tabus. A maioria dos professores que tínhamos, vieram
de escola particular e estavam acostumados apenas com a seriação, apresentando muitas
resistências aos ciclos, embora ainda não o conhecêssemos. Por isso, lemos, estudamos, mas,
fomos percebendo que o nosso grupo é muito de ação. Nós achamos que se ficássemos apenas
lendo e estudando iríamos sempre achar algo que nos gerassem dúvidas e medos, que é
natural em todo processo de mudança. Assim, decidimos abraçar essa proposta e acolher
todos que viessem para nos ajudar, conforme propunha o Documento.
Como esse processo tem se repercutido entre o grupo aqui na escola?
Fomos lendo, estudando e fazendo que essa proposta pudesse acontecer aqui na escola. É
claro que quando se meche na prática do professor, algumas resistências surgem, algumas
barreiras, mas sendo um processo que te a possibilidade de reflexão, um processo lento,
acho que temos caminhado com essa proposta. Eu particularmente, acho essa proposta muito
interessante, em termos do que almejamos socialmente, mas quanto à mudança na prática é
um processo que leva tempo. Então na escola nem sempre acontece da forma de como está o
papel. Nós tentamos. Acho também queo foi essa a proposta da FME, mas, tivemos
bastante flexibilidade para trabalhar. O objetivo é que todas as escolas trabalhem com a
proposta, mas cada uma no seu tempo. Pelo menos é o que tenho percebido.
Nós aqui nos entusiasmamos muito com o trabalho que começamos a realizar com a proposta,
pois estávamos tendo a possibilidade de ver alguns resultados positivos. Professoras que
vinham falar do rendimento dos alunos com o reagrupamento. Isso tudo nos estimulou a
prosseguir. Em 2006, quando fomos participar do Seminário que a FME realizou para as
escolas-pólo trocarem suas experiências, tudo que nós falamos foi bem verdade. Algumas
pessoas de outras escolas criticaram achando que estávamos falando além do que estávamos
vivendo, mas, não. A escola se entregou no processo e as coisas começaram a dar certo aqui
dentro. Posso dizer que foi com muita “ralação”, muitas críticas também porque muitas coisas
da proposta precisaram ser revisadas e ainda precisam. Até por conta disso preferimos não
participar do Seminário. Preferimos não nos expor tato, mas, continuar fazendo aqui nosso
trabalho.
183
Como você avaliaria esse processo de reconstrução da proposta? Proporcionou
participação e coletividade?
Eu achei que tem funcionado para aquelas escolas que se disponibilizaram a meter a cara para
aprender um novo trabalho com a proposta e também criticar as questões incompatíveis. Acho
também que deveria ter um trabalho mais efetivo com os professores na FME. Não que eles
não se insiram na proposta dentro da escola, mas na FME seria diferente para não verem
como uma proposta imposta. O encontro realizado com eles deveria ter continuidade. É
necessária uma atenção mais precisa para eles.
Que foi uma proposta mais democrática, sem dúvida. Não foi implantada de uma hora para
outra, ouve escuta a escola e seus profissionais; houve muitos encontros para diálogo, enfim,
há um compartilhar dessa proposta em grupo.
184
Entrevista com as Supervisoras Josélia e Silvia
Realizada em outubro de 2007
Escola B
Entendendo que a E. M. _____ tem participado do processo instalado na Rede desde
2005, cujo foco tem se voltado para a reconstrução da proposta pedagógica em ciclos,
gostaria de saber qual foi o critério utilizado pela escola para adesão da proposta em
forma de experimentação no ano de 2006?
Josélia:
Bom, em 2004 quando iniciamos o trabalho nessa escola, começamos o trabalho
pedagógico com a proposta de ciclos da Fundação, que era uma proposta diferente da que
temos hoje. Antes de trabalhar no Paulo Freire eu vinha atuando nessa Rede Municipal,
mas, em outra escola. Nela as professoras diziam que a proposta implantada em 1999 não
havia sido discutida na base com os profissionais da escola, então era assim, a proposta é
ciclos, mas, todos pensavam e trabalhavam na lógica seriada. O que considerava mais
conflituoso na época era o fato de estar trabalhando em série e não poder reprovar o aluno no
final. Isso dava uma angústia, pois éramos obrigados a passar o aluno com defasagem de
conteúdo.
Em 2004 fizemos várias reuniões entre os meses de janeiro a março e decidimos iniciar
trabalhando com a proposta de ciclos para o (1º e ciclos, ou seja, na época, do ao ano
de escolaridade). Tínhamos um ideal de escola em nossas discussões e nos baseávamos na
teoria de Paulo Freire, Vigotsky, Emília Ferreiro, enfim, autores progressistas. Esses autores
que norteavam os nossos planejamentos. Quando iniciamos em março o trabalho com os
nossos alunos, enfrentamos grandes desafios, pois, recebemos na matrícula muitas crianças de
outras escolas e lugares com uma defasagem assustadora. Crianças de 12,13 anos que não
sabiam ler e escrever. Isso tudo foi um choque para todos nós, então foi preciso parar e
refletirmos sobre aquela realidade.
Além disso, os nossos professores eram novos na Rede, eram profissionais que tinham sido
chamados do concurso de 2003. Pessoas competentes, mas, nem sempre experientes,
principalmente em relação a proposta do trabalho em ciclos. Com isso, podemos dizer que
embora tenhamos feito a opção de trabalhar na lógica de ciclos, estamos até hoje tateando
para na prática efetivarmos de fato, esse nosso ideal de escola. Entendemos a relevância da
concepção dos ciclos, contudo, na prática temos diversas questões que emperram esse
trabalho.
Então, como estávamos ensaiando o trabalho com o sistema de ciclos desde o início, ao
chegar a proposta de 2005 sugerindo uma reestruturação, nós discutimos com o grupo e
fizemos uma votação onde a maioria votou a favor da adesão como experimentação em 2006,
embora, tivesse também um grupo expressivo que não concordou e ainda hoje não concorda
em trabalhar com os ciclos.
Silvia:
Na minha opinião, pelo que entendi dessa proposta, os anos de 2006 e 2007 as escolas foram
convidadas a tornar prático aquilo que estava proposto no Documento. A E.M. _______
resolveu na sua maioria aceitar o convite, até mesmo porque nosso pensamento era de que, se
essa proposta iria vir para a escola de qualquer jeito, seria melhor que viesse logo, pois assim
estaríamos com um ano antes de experiência em relação às outras escolas que não acataram,
não aceitaram, mas, esperaram se tornar obrigatória.
185
Já que a escolha da escola foi aderir à proposta com caráter de experimentação em 2006,
de que forma a escola se organizou internamente para participar do processo de
reconstrução e reescrita da proposta de ciclos? Qual foi a dinâmica de participação da
escola?
Josélia:
Nós participamos muito das reuniões realizadas pela FME. Levávamos o que estávamos
experimentando na escola. O que dava certo, o que necessitava ser repensado. Dentro da
escola nós também fizemos muitas reuniões com os professores, reorganizando sempre o que
estávamos experimentando. Mas, é um trabalho muito difícil. A escola _______ é grande,
então quando falta uma pessoa da equipe desanda todo nosso trabalho.
Se formos analisar o Documento Preliminar que foi enviado para a escola em 2005, ele
se apresenta como norteador de práticas dialógicas e democráticas. Na percepção de
vocês houve espaço para isso? Como a escola se relacionou com a FME, com as Equipes
de Referência nesse processo?
Josélia:
Consideramos que esse foi um trabalho bastante empenhado em agregar a escola nas
discussões. As Equipes de Referência da FME estava sempre pronta para esclarecer,
questionar, dialogar com a escola no calor do dia-a-dia. Foi uma Equipe muito interativa e
fazia questão de participar das nossas reuniões de planejamento. Faziam rodízio, mas, sempre
tínhamos uma pessoa dessa Equipe para nos orientar e ajudar em nosso trabalho.
Contribuíram desde as questões administrativas até as especificidades pedagógicas do
cotidiano. Não foi um trabalho unilateral, mas, pelo contrário tivemos o suporte e temos
aprendido a trabalhar junto com essa Equipe, com a FME. Mas volto a dizer não é fácil, pois
as demandas da prática diária nos desafiam muito.
Vocês consideram que essa é uma percepção do grupo da Escola. O coletivo da escola
concebe esse processo numa dinâmica participativa?
Silvia:
Bom, nós estamos falando de uma escola muito grande, então temos um universo de pessoas
heterogêneas. Tem aqueles profissionais que lidam com o trabalho com mais disposição,
inquietude para discutir, questionar, mesmo que não concordem, ou mesmo concordando em
parte, se disponibilizam para aprender, construir. Existem aqueles que se fecham com uma
crítica, sem essa possibilidade, na verdade sem saber e defender o que de fato desejam.
Estamos numa escola com pessoas cheia das opiniões, e que bom que é assim. Não é um
trabalho unilateral que só a equipe gestora traz a proposta e as pessoas têm que acatar. Se
fosse assim, essa escola nem se chamaria ________.
Josélia:
O professor tem que ter sua autoria, só que na sua formação ele faz o que?! Antigamente eram
os planejamentos que vinham das Secretarias. De algum tempo para são os livros didáticos
186
que virou o planejamento do professor e não pode ser assim. O planejamento tem que ser de
acordo com a turma. Por isso tem que ser com a participação de todos que lidam diretamente
com essas turmas.
Silvia:
Ai que ta. Se tratando de e ciclo eu vejo que depende muito da equipe que se forma. A
cada ano acho que isso se difere, pois se nós conseguimos pessoas envolvidas em unidade de
planejamento, eu nem diria da ação propriamente, mas, o planejar, o trabalho coletivo se torna
mais viável. Entretanto, nem sempre isso acontece. As pessoas que se isolam em sua prática
dificultam os mecanismos para se trabalhar numa dinâmica participativa. E na escola lidamos
com essa heterogeneidade. Temos posturas bem radicais, outras do “laissefair”, outras
fragmentadas, então nosso trabalho enquanto pedagoga é de estar alfinetando a todo tempo.
Josélia:
Acho assim, o ciclo ainda é um bebê. As séries estão a quanto tempo no nosso sistema
educacional? A verdade é que o ciclo começou ontem, pois, pode até ter dez anos, mas, para a
educação dez anos é muito pouco.
Silvia:
É temos professores que entraram em 2004 com posturas bastante tradicionais. No inicio
tivemos até alguns embates em relação a isso, mas com reuniões e algumas reflexões que
foram realizadas, percebemos que alguns professores se renderam logo no final de 2004 e
hoje trabalham numa outra perspectiva. É um trabalho de construção, formação. Eu mesma
me sinto assim. Ao ter tido a oportunidade de debater, refletir, conhecer junto a outras pessoas
me sinto uma outra pessoa pensando a educação e os ciclos. Por isso o diálogo é muito
importante.
Então volto a dizer. Acho que o bom funcionamento de uma proposta, de uma prática depende
muito da equipe que se forma. Se você encontra a resistência de conversar em um, o grupo
fica prejudicado. E aqui percebemos muito isso. As pessoas se fecham à proposta, sem querer
discutir, pois se esbarram com as fragilidades da proposta. Nem sempre tudo que está escrito
não condiz com a nossa realidade. Por exemplo, em relação ao quantitativo de alunos, existe
uma série de questionamentos dos professores e nós ficamos até sem argumentos para isso.
Como uma proposta quer se efetivar, se no aspecto da organização, que é o mais simples, se
contradiz.
Entendendo que a proposta estava aberta a discussão e alterações, como a escola
percebeu e tencionou essas reivindicações que iam aparecendo com a experimentação?
Vocês enviaram sugestões de mudanças?
Josélia:
Enviamos, mas ainda não tivemos retorno.
Silvia:
Esse é um aspecto que acho importante considerar. Eu vejo um pouco do cansaço dos
professores em relação a esse movimento. Essa proposta por ser democrática, exige muita
187
discussão, muito questionamento, muita aprendizagem. As coisas aqui na escola são muito
abertas ao grupo e exercer a democracia é cansativo. As pessoas estão sempre discordando,
conversando, debatendo afinal, isso faz parte de um processo democrático e é desejável.
Então eu percebo que alguns professores adotam uma postura do tipo: “Ah! Vamos ter que
discutir novamente isso”. Ao contrário, outros não aceitam que nada seja decidido sem que
tenha passado pelo coletivo. Esse exercício realmente não é nada fácil. Por isso, ter um
retorno daquilo que foi discutido é fundamental.
Josélia:
Pois é. Sabemos que a proposta está quase sendo regulamentada, para que nenhum prefeito ao
vir possa tirar. Isso acontece até para termos mais segurança em relação à continuidade de um
árduo trabalho que temos tido na discussão dessa proposta.
Em contraponto a legislação, nós temos a questão da gestão. Nós temos uma proposta
pronta, discutida pelas escolas, mas, a gestão ainda continua a antiga. Gestão que digo, é toda
a parte de documentação, registros. Tudo isso é uma incoerência. Tudo bem que nós tivemos
bastante tempo para discutir a proposta, mas, nas escolas, nós estávamos discutindo
pedagogicamente. E o administrativo dessa proposta? Então os professores perguntam: “fazer
relatórios para quê, se ainda tem o boletim?”. É claro reconhecemos que tem um grupo
trabalhando para isso, mas, demora demais. Aliás, eu acho que não caminhou junto com o
pedagógico.
Para finalizar, na opinião de vocês, até que ponto esse processo se constitui efetivamente
como um movimento coletivo?
Josélia:
Bom, que foi uma proposta coletiva nós não podemos negar. Houve a intenção e uma
organização para que essa proposta fosse discutida. O que às vezes os professores se
ressentem muito é que quando vem a proposta para analisarmos e mandarmos nossas
contribuições, nossas impressões para a FME, nós não recebemos de volta isso na proposta. E
quando falo isso, não é com a intenção de que a E.M._____ seja o centro do mundo, e que as
nossas idéias devam prevalecer. Não é isso. Mas, acho que toda vez que se manda uma
proposta para as escolas discutirem, deveria vir alguém falar como foi feitas a organização das
idéias que foram enviadas pelas escolas, até chegarem à estrutura de escrita final. Ao
contrário, o que fica parecendo é que ninguém deu valor ao que nós escrevemos.
Em minha opinião deveria poderiam mandar por escrito quantas escolas enviaram as
contribuições. Quais foram os critérios que contaria. Se foi a da maioria. Se foi, está correto,
pois a democracia tem que trabalhar com a maioria. Pode ser que as contribuições da Paulo
Freire tenha sido sempre a minoria. Tudo bem. Mas o que nós queremos seria um processo
que desse mais reconhecimento ao trabalho. Sem isso toda vez que vier algo para discutirmos,
vamos nos esbarrar sempre com a mesma fala: “Ah, mas novamente isso! Nós enviamos o
que queremos e nos mandam escrever novamente sem proporem modificações.” Então um
desânimo com isso. A falha a meu ver é essa falta de retorno, que poderia ser enviada por
ofício, enfim... É necessário dizer de forma transparente que critérios foram utilizados para a
sugestão se tornar parte do documento. E isso trabalho, mas, se é para discutirmos tem que
ter trabalho. Não estou dizendo com isso que a FME não teve trabalho, pelo contrário,
percebemos ao longo desse processo muita dedicação e investimento. O que necessita
caminhar é como organizar melhor essa democracia que estamos vivenciando.
188
Entrevista com a Supervisora Virgínia
Realizada em novembro de 2007
Escola C
Entendendo o processo instalado na Rede Municipal de Educação de Niterói desde 2005,
cujo foco tem sido voltado para a reconstrução da proposta pedagógica em ciclos,
gostaria de saber como a E. M. _____ ficou sabendo desse processo e de que forma a
escola recebeu o Documento Preliminar em 2005 que convidava para experimentação?
Nossa escola teve conhecimento da proposta conforme todas as escolas da rede, e não fez a
sua opção de adesão em 2006. Nós nhamos participando de alguns encontros na Sede que
apontavam caminhos para uma necessidade de reorganizar os ciclos nessa Rede. Então, em
forma de Documento, a escola foi convidada a participar de um processo de experimentação.
Entendíamos naquele momento, que precisávamos compreender que mudança era essa, não só
a mudança que era proposta, mas a própria concepção do ciclo que não sabíamos. Como essa
escola começou seu trabalho em 2004, a partir de sua inauguração com todos os professores
originários do concurso de 2003 não nos sentíamos seguros para nos desafiarmos com essa
proposta. Achávamos que era muito recente ainda nosso processo de formação, para estarmos
participando de uma renovação de alguma coisa que não tínhamos vivenciado nem no
primeiro momento. Por isso, se nhamos a alternativa de participar, no ano seguinte, em
2007, então, queríamos ganhar aquele tempo sim. Mas, não ficamos parados em 2006. Nos
preocupamos em estudar, ler a proposta e também buscamos autores que falavam
especificamente do trabalho com ciclos.
Mesmo não aderindo à proposta em 2006, que movimentos internos a E.M. ______ fez
em relação ao processo de reconstrução da proposta?
Em 2006, nos preocupamos em estudar. Estudamos e lemos obras de muitos autores que
falavam sobre ciclos. Isso nos permitiu até para entender o perfil da nossa escola. Aqui nós
gostamos de estudar e entender muito aquilo que nos propomos a fazer. Não gostamos de
aventuras, ou ir porque “fulano” ou “cicrano” está indo. Por isso, em 2006 nos dedicamos
muito na leitura da proposta, aliás, do Documento Preliminar, e na leitura sobre a organização
da escola em ciclos. Mandamos também nossas contribuições para a FME. Mesmo sem
praticarmos esse trabalho, podíamos contribuir, pois, estávamos lendo bastante sobre o
assunto. Mas os ciclos ainda não é o retrato do dia a dia, do cotidiano da escola, não adianta
você ler os teóricos e não olhar para dinâmica da escola. É preciso, sim, compreender,
algumas subsídios que a teoria nos apresenta, não no sentido de que vai estar nos dando a
informação certa, mas pelo menos o caminho para pensarmos e pesquisarmos, sempre com
questionamentos para ampliar nosso conhecimento sobre tal assunto.Mesmo enquanto
supervisora, não era eu que ia trazer a idéia e o caminho “correto” de ciclo, com certeza não.
Mas eu podia mediar isso. Eu precisava compreender bem para poder mediar. E assim
fizemos no ano de 2006, todo tempo que tínhamos no nosso calendário uma vez por mês no
horário dos planejamentos de quarta feira, usávamos para nossa formação. Líamos a proposta
da FME, enfim, e a nossa escola , tem uma( ... ) assim uma coisa que (.... ) algo que era assim
vamos dizer(...)o nosso perfil. Nós gostamos do trabalho que inclui e buscávamos sempre o
melhor num processo de inclusão de alunos. Então sem dúvida este, foi um ponto de ponto de
partida para nossas discussões sobre o trabalho com os ciclos, pois encontramos subsídios
disso nessa proposta.Vimos no trabalho com ciclos a sensibilização que trazia para o
189
professor trabalhar com as diferenças que se apresentam. O professor ele precisa ver essa
diferenças; precisa enxergar essas diferenças.
Vocês perceberam mudanças na relação da escola com a FME nesse processo? Quais?
Considero que houve bastante mudança. Mudanças até que sentimos dificuldades de lidar com
elas, talvez porque ainda não nos acostumamos. Acho que uma mudança que repercutiu muito
aqui na escola foi à formação da Equipe de Referência. Num primeiro momento nós tínhamos
alguém da educação especial, que vinha a nossa escola, observava os alunos conosco,
avaliava e dava alguns caminhos para o trabalho. Essa era a prática da FME. Agora não é
mais assim. Existe uma Equipe formada que vem a escola, mas para discutir possibilidades
conosco. È bem diferente porque são pessoas de várias áreas, com outro perfil, com outra
proposição. Eu não sei ainda se esse é o melhor caminho, mas, talvez porque ainda não
estamos “fera” nessa proposta. O que eu sei é que nós ainda sentimos falta da forma como
trabalhávamos.De vez em quando recorremos a própria FME, ainda precisamos reconhecer
bem o papel dessa nova equipe ,não sei assim como que elas estão avançando , na
estruturação das equipes e na sua lista de funções, então isso é uma questão que eu acho que
as escolas vão se adaptando aos poucos .
Em sua opinião, como a FME está mediando esse processo?
No meu caso, particularmente, tudo é novo. Tudo é uma mudança, pois eu entrei para a escola
em 2005. Então, não a proposta era nova, mas, a Rede também era. Um dos trabalhos da
equipe técnica é a responsabilidade no processo de formação continuada. Eu precisa buscar
minha própria formação e compreender que rede é essa que eu estava inserida. Embora eu
tenha muitos anos de prática como supervisora do em outra rede, essa, tem características
totalmente diferente. A forma de trabalhar, as propostas, as pessoas. Enfim, eu estava
iniciando uma prática como supervisora completamente diferente.
Em ralação ao ano de 2007, como foi para a escola experimentar essa proposta em
construção?
Bom, como disse antes, no ano de 2006, nós recebemos o Documento Preliminar , lemos ,
buscamos compreende-lo dentro das nossas limitações aquilo que estava posto, e no ano de
2007 nós recebemos uma proposta mais estruturada da FME. Era uma proposta que trazia
as modificações sugeridas e construídas no decorrer do ano de 2006. Como um dos
diferenciais da versão anterior, essa proposta apresentava uma portaria de matrícula em que
nós deveríamos matricular os alunos por idade e não mais por série de acordo com o
conhecimento obtido nas anteriores. Confesso isso... Nossa! Virou nossa cabeça. Nosso
cérebro ficou de cabeça para baixo. Como é que nós íamos compreender aquilo de repente?
Sim, de repente, pois por mais que estivéssemos estudando a proposta em 2006 e estudando a
teoria dos ciclos, fazer isso na prática é realmente um grande desafio que enfrentamos.
Reestruturar toda a escola agora por idade, por faixa etária?! Obviamente, matematicamente
aquilo era possível, e assim nós fizemos. Fechamos os olhos, e deixamos os desafios do
cotidiano para depois. Bom, a primeira coisa que nós percebemos logo no início após
estruturarmos e organizarmos as turmas da escola por idade foi que a diversidade tinha
aumentado ainda mais. Afinal, tínhamos alunos de faixas etárias iguais, mas, com histórias
190
diferentes, ritmos diferentes, conhecimentos diferentes, enfim, eram muitas diferenças a
serem administradas. Agora não eram alunos que vinham de fora, e que a gente avaliava e
colocávamos num grupo que achávamos pertinentes a sua aprendizagem. Mas alunos da nossa
própria escola completamente misturados, em relação a suas aprendizagens. Quanto a essa
questão, que era apenas uma frente a tantas outras que iríamos enfrentar, procuramos sentar
com os professores, fazer algumas adequações de modo que eles pudessem conduzir seu
trabalho. Eles ficaram muito angustiados. Enfrentamos muitas resistências, insatisfações,
enfim, mas, a maioria do grupo da escola procurou fazer o melhor. Dedicando-se ainda mais
para a leitura da proposta.
De que forma a escola avalia a proposta pedagógica em ciclos que está sendo
reconstruída na Rede?
Ao chegarmos ao final de 2007, ano desafiador para todos nós que nos deparamos a essa
proposta conseguimos fazer algumas avaliações tanto positivas quanto negativas em ralação
ao nosso trabalho como em ralação a proposta.É óbvio que hoje temos outra visão, nós ao
iniciarmos em 2007 já numa lógica de escola organizada em ciclos, éramos muito
inexperiente, agora, ainda temos muito que avançar, mas, conseguimos também amadurecer
nesse processo. Para o próximo ano, talvez iremos iniciar o trabalho com mais tranqüilidade e
também com novos desafios. Vamos envolver os professores no processo de formação das
turmas, e procurar ouvindo-o para que seu trabalho comece mais tranqüilo. Quanto ao ciclo, à
estruturação pedagógica da escola, veio avançando e possivelmente agora para 2008
teremos novas propostas de modificação. Algumas arestas que nós queremos aparar e
melhorar. Quanto a questão pedagógica, a grande diferença nesse ano foi o trabalho com
proposição de reagrupamento. Enfim, nós acreditamos na proposta dos ciclos, mas, temos
muitos desafios pela frente. Acho que a forma de como essa proposta da Rede está sendo
mediada, permitindo que a escola se posicione e fale sobre suas angústias e preocupações têm
ajudado muito pra nos encorajar nessa caminhada que é muito desafiadora.
Especificamente em relação ao processo de reconstrução iniciado em 2005. Como vocês
reconhecem este tipo de política?
Em minha opinião é papel do órgão central, da FME, organizar o trabalho da escola. Esse
órgão existe para atender as demandas educacionais dali da sua região, da sua competência.
Então, ele precisa de escuta. Saber qual é a demanda social antes de organizar seu trabalho é
fundamental. Mas, isso precisa ser feito a todo tempo. Isso vai e volta. O órgão central tem
que se organizar ouvindo as suas unidades escolares. Mas este trabalho, a questão da atuação
das políticas educacionais, elas tem uma tradição, vamos dizer assim, de onde nascem as
idéias. Agora, se as idéias estão sendo discutidas, ótimo. E é o que vejo nessa política, ela vai
e volta, corrigi, rever, esta aberto a diálogo. O difícil é aquela que cai no colo Olha dá conta
e se vira”, é difícil ...é difícil para aqueles que estão na ponta do processo e executam a
informação. Tem que haver diálogo, troca. A infra-estrutura que é uma riqueza em Niterói. Eu
tenho experiência nesta escola, mas não sei se estou generalizando algo que eu não vi. A
riqueza de recursos que a escola dispõe, a forma que a alimentação que é ingerida na escola, a
forma como a escola tem sua verba própria para administrar a manutenção, para compra de
material pedagógico.
Então Niterói tem uma marca de diferença, tem uma diferença sim. Eu acho que como a
proposta vem tendo esse tempo para ser discutida de várias formas: disponibilizada por e-
191
mail, espaço para formações continuadas, discussão dela por um tempo longo, isso é muito
bom. Porque não basta mandar um documento falando: “olha, tem dois dias pra discutir com
a sua escola”. Não é assim o tempo da escola. O tempo da escola é muito imprensado.
192
Entrevista com a Supervisora Jaqueline
Realizada em novembro de 2007
Escola D
Entendendo que a Rede tem passado por um movimento de reflexão para a
reconstrução da proposta pedagógica em ciclos, e uma das etapas desse processo
iniciado em 2005, foi o convite para as escolas aderirem em 2006, como forma de
experimentação, gostaria de compreender qual é a leitura da escola nesse percurso? E
qual foi o critério que a escola utilizou para optar em não aderir à proposta em 2006?
Considero que em 2006, não nós da escola ______, mas a maioria das escolas da Rede
ainda não se sentiam preparadas para tal proposta. Poderia de dizer que não nos sentíamos
parte daquela proposta que estava começando a ser discutida. E, como nós sabemos, existe
uma série de dificuldades que a escola precisa atravessar para que a proposta de ciclos
aconteça de fato no cotidiano. Mas, no fundo, nós não havíamos entendido a proposta e nem o
chamado que a FME estava fazendo naquela ocasião. Como a proposta estava ainda sendo
costurada, afinal, ela não era um produto, nós nos sentimos despreparados para fazer um teste.
Então, nós preferimos acompanhar aquele momento, não como uma escola experimental, mas,
acompanhar o processo de discussão, de leitura. A nossa escola, ao contrário do que muitos
pensam, não se fechou a proposta, mas, em 2006 participou indiretamente pelo caminho da
discussão, do entendimento, dos questionamentos, das colocações e realizamos. Dedicamos
bastante as nossas reuniões de planejamento para isso.
De que forma os profissionais da escola se posicionaram na discussão, na
experimentação em 2007, frente a esse processo que a Rede vivencia?
Eu acho que toda proposta nova cria resistência e atritos, vamos dizer assim. A escola tem
sempre um estigma de que tudo que vem da Fundação é ruim, mais uma novidade que vai
desestabilizar a prática do cotidiano. Mas, devo dizer que acompanho essa Rede a muitos
anos. Desde 1989 como professora e desde 1991 como Supervisora pedagógica. Então tive
a oportunidade de acompanhar muitas propostas que realmente viam como pacotes fechados
da Fundação. A própria proposta de 99, teve uma colocação fiscalizada. Então acho que por
toda a discussão que nós participamos, pelo menos por parte da ETP nós podemos perceber
esse processo de forma diferente. A elaboração dessa proposta tem sido feita muito na base do
diálogo. Não que esse diálogo não tenha atrito, discordância, discussão e resistência. É natural
que tenhamos resistência sim, pois, passamos por tantas descontinuidades no contexto escolar,
que toda mudança assusta.
No inicio as pessoas resistiram muito. As pessoas não, porque não posso me ausentar disso.
Ouvíamos muito: “Não vamos fazer. Não vai dar certo. Não vamos conseguir isso, é muito
complicado.”. E elas tinham razão, é mesmo. Mas, apesar dessa resistência, o professor de
e ciclo tem uma abertura para tentar, ouvir. Não quero dizer com isso, que são pessoas
passivas e aceitam tudo. Não. Mas, se disponibilizam para ouvir, pensar, rever seus conceitos.
São corajosos. Por isso, depois de estarmos estudando a proposta em 2006, no ano de 2007
fomos tentando entender, não porque a FME determinou, mas, que ganhos meu aluno, a
escola teria a partir da proposta e ao levarmos em conta essas questões fomos debatendo sobre
isso. Porém, senti que a nossa escola, mesmo não sendo uma escola experimental em 2006,
apresentou muitas dificuldades em abraçar essa proposta como um todo. Esse ano é que
conseguimos construir no cotidiano do segundo turno, alguns passos para essa proposta.
Posso dizer que o mérito de encarar o desafio está com o professor que compraram a idéia,
193
que se arriscaram e puderam ver também os saldos positivos. Eles encontraram na prática,
uma nova forma de humanizar o tempo-espaço da escola. Isso foi acontecendo com muitos
embates, dificuldades, fomos caminhando no movimento de fazer e refazer na trama do
cotidiano.
Posso dizer que mesmo com tantas barreiras e dificuldades, estamos vivenciando um processo
muito interessante. A relação das pessoas aqui na escola mudou bastante. Estamos tendo
efeitos muito positivos e construtivos. Às vezes achamos que a nossa escola esta fragmentada
porque esse processo tem sido muito mais intenso para o e ciclo. A EJA e e ciclo
tem uma outra lógica que ainda precisa ser muito discutida por nós. Tem suas questões
específicas. Na verdade, tudo está em processo, em amadurecimento para todos nós.
Quanto à relação da escola com a FME nesse processo?
Nós enquanto professores, e, estou falando da escola pública, vivemos sempre inseridos em
processos descontínuos na escola. Isso dificulta muito, pois às vezes estamos engajados em
uma proposta, estudando, dedicando nosso tempo, tentando nos adaptarmos e logo se muda de
governo, e se muda de proposta. Então, esse conflito que é real na nossa história ocasiona
inevitavelmente o descrédito das pessoas que compõem o Órgão que gere a Rede. Então,
como conseqüência disso, temos a resistência a FME e, logo as Equipes de Referências que a
representa. Não é uma resistência as pessoas, mas pelo que elas representam para a escola
nessa angústia coletiva acerca de mudanças que convivemos. Nós não conseguimos construir
uma história contínua na escola, mas estamos sempre passando por rupturas de propostas. Isso
é muito ruim, causa muita descredibilidade. Agora, não podemos deixar de considerar, que a
presença das Equipes de Referência na escola contribui muito para o nosso trabalho nessa
nova proposta. Eles sem dúvida estiveram disponíveis para tirar as nossas dúvidas, e o mais
legal, compartilhar algumas conosco. Sentimos muito apoio dessa Equipe para
desenvolvermos esse trabalho. Não nos sentimos e abandonados na caminhada. É claro,
tivemos momentos que foi preciso caminhar sozinhos. Afinal, na minha opinião cada escola
teve que descobrir sua identidade dentro da proposta, e a Equipe não se apresentou como
aquela que fiscaliza cobra, e exige que sigamos o padrão, mas, ao contrário, estiveram aqui
nos apoiando. Aprendendo junto conosco. Isso foi muito bom, diferente do que já tínhamos
vivenciado na Rede. Era uma equipe que se formava junto com a gente, pois via a coisa no
papel, mas via também no nosso cotidiano Eu acho que o grande ganho dessa proposta foi ter
fortalecido mesmo que com algumas arestas, a relação FME e ESCOLAS. Nunca estivemos
tão próximos. Isso não quer dizer que estamos concordando com tudo, mas estamos juntos
para discordarmos, discutirmos. Não ficamos separados.
Em relação ao coletivo da escola nesse processo?
Esse eu considero o ponto principal, pois, se você não tiver o coletivo fortalecido, essa
proposta não caminha. Ela exige estar trabalhando junto, acreditando, mesmo para que se
chegue ao final e diga: “eu não disse que não ia dar certo!”. Então vou responder muito pelo
grupo que atuo na escola que é com o grupo de e ciclo. Eu acho que o coletivo, que não
são todos, está muito disposto a tentar, principalmente o turno da tarde que tem quase um
ano de experiência, então vêem o que deu certo, o que precisa mudar, enfim. Esse coletivo
está disposto a tentar, a se arriscar.
194
Nesse processo de experimentação desse grupo, como foram articuladas as proposições
que o grupo foi fazendo a partir dessa prática?
Todas as vezes que fomos convidadas a participar na FME estivemos presente. Enviamos
nossas contribuições para a escrita, atuamos nos Gts, enfim, mantínhamos sempre espaço para
discutirmos a nossa prática a luz da proposta.
Quanto ao retorno da contribuição enviada?
A Equipe de Referência sempre nos dava alguma posição acerca das nossas proposições, e ao
mesmo tempo as observações que ela tinha do nosso cotidiano aproximou muito os nossos
olhares quanto às contribuições que foram enviadas para a escrita da proposta.
Além disso, eu considero que esse movimento do qual os professores se interessaram em
escrever, observar, propor, foi muito interessante. Não foi um fazer por fazer porque é
obrigação. Por isso, devo dizer novamente que em minha opinião o grande ganho dessa
proposta foi esse caminho que abriu para o professor pensar uma proposta a partir da sua
própria prática. Esse tempo de escuta e mediação foi sem dúvida um ganho para as relações
na Rede.
O que você considera como maior desafio do trabalho coletivo nesse processo?
Em primeiro lugar, eu acho que é conseguirmos manter esse coletivo ativo. É natural na
escola, algumas mudanças de professores, turno, enfim. Então, manter esse coletivo
fortalecido, trabalhando junto, é um grande desafio.
Um outro aspecto é passar essa proposta para os pais. É possibilitar uma relação de conversa
de modo que eles entendam esse trabalho.
E o outro, acho que é o supervisor tentar aprender junto com o professor. Porque essa
proposta foi construída e aprendida no cotidiano. Então é na porta da sala de aula, na hora da
merenda, na saída, enfim, foram nesses espaços que íamos mantendo um diálogo de algo que
eu não sabia na sua totalidade, mas, estava aprendendo junto com ela. Então estar preparada
para aprender com, é um grande desafio.
O planejamento não aconteceu nas quartas-feiras. As ações eram planejadas também de
uma hora para outra. Sempre sofriam alterações. Construir esse conhecimento dentro do
espaço-tempo do cotidiano é difícil. Requer atenção nas relações, flexibilidade no planejar,
sem dúvida uma outra lógica de escola. Realmente você tem que abrir mão de todas as
convicções rígidas. É preciso manter o diálogo constante, pois não é mais o seu papel
“traduzir” a proposta aos professores, mas sentar e dizer: “isso eu não sei, vamos pesquisar”.
Essa participação foi fundamental.
195
Anexo 5 - Fontes Documentais da Pesquisa
1. Lei 2272, de 16 de dezembro de 2005, dispõe sobre as atribuições, a composição e o
funcionamento do Conselho Municipal de Educação de Niterói.
2. Lei 531, de 18 de Janeiro de 1985, Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais de
Niterói.
3. Decreto nº 9820/2006, institui o Sistema Municipal de Ensino de Niterói.
4. Documentos referentes ao histórico da Rede Municipal de Educação de Niterói, produzidos
no Setor de Assessoria de Estudos e Pesquisa da FME, 2006.
5. Mapeamento Estatístico da Secretaria de Educação de 2006.
6. Documento preliminar para a proposta pedagógica de reorganização do ensino fundamental
na rede municipal de educação de Niterói, 2005.
7. Proposta Pedagógica “Construindo a Escola do nosso tempo”, implantada em 1999.
8. Relatório da Consultoria, produzido em 2006 a partir do acompanhamento das escolas-pólo
que estavam experimentando a proposta sugerida no Documento Preliminar/2005.
9. Proposta pedagógica “Escola de cidadania”, já com as proposições enviadas em 2006.
10. Relatório da Reunião dos Delegados das escolas sobre a discussão da implantação de
ciclos, realizado em 06/02/06.
11. Relatório final dos mediadores do Seminário Interno sobre Currículo, realizado em junho
de 2006.
12. Proposições para ação integrada das coordenações em 2006 elaboradas, em 21/11/05,
pelas coordenações: técnico-pedagógica, educação infantil, ciclos 1º e 2º, ciclos 3º e 4º, EJA e
educação e saúde.
13.Ofício-circular FME 008/07 de 09 de julho de 2007, encaminhado pelo Secretário de
Educação para as Diretoras das Unidades de educação da Rede Municipal de Educação de
Niterói abolindo a possibilidade de ilimitadas reconduções ao cargo de Diretor.
14. Portaria, FME 125/2008 de 26/03/2008 que institui a proposta pedagógica “Escola de
cidadania” na Rede Municipal de Educação de Niterói.
15. Portaria, FME 132/2008 de 01/04/2008 que institui as Diretrizes Curriculares e
Didáticas para a Educação Infantil, para o Ensino Fundamental e para a Educação de Jovens,
Adultos e idosos que integram a proposta “Escola de cidadania”.
196
Anexo 6 - Documento Preliminar enviado para as escolas em outubro de 2005
DOCUMENTO PRELIMINAR
Algumas palavras iniciais
Este é um Documento Preliminar, que visa a instalação de um debate acerca da
regulamentação da Proposta Pedagógica da FME, buscando estruturar uma nova configuração
dos ciclos na rede municipal de ensino de Niterói. Indica, pois, diretrizes que buscam
redimensionar a lógica que organiza os recursos, os processos, as relações, o tempo e o espaço
da escola.
O processo interno de reflexão e de proposição para a ação, materializados no presente
Documento Preliminar, foi deflagrado, por determinação do Secretário Municipal de
Educação, através da Superintendência de Desenvolvimento de Ensino, em abril deste ano,
em atendimento a um reclame da própria Rede Municipal. Nesse sentido, foram criados dois
grupos de trabalhos, a saber, um com o foco voltado para a Educação Infantil e outro para o
Ensino Fundamental. Esses grupos tinham como eixo de trabalho a organização do sistema
educacional de Niterói, compreendendo que a Educação Infantil e o Ensino Fundamental,
como etapas da Educação Básica, devem ser entendidos de forma integrada, formando um
movimento único na construção de um processo de Educação da Infância. Nesse movimento,
a Educação de Jovens e Adultos, em termos formais, foi entendida em suas complexidades e
especificidades como uma modalidade do Ensino Fundamental.
Vários fatores contribuíram para que enfrentássemos o necessário movimento de pensar
preliminarmente possibilidades de redimensionamento da dinâmica organizativa da escola em
ciclos, justificando a formalização desta proposta.
No espectro desses fatores encontram-se muitos anseios, alguns deles expressos em
documentos, dentre os quais destacamos:
· os registros avaliativos das inúmeras atividades de formação continuada realizadas com
os profissionais da Rede nos últimos anos;
197
· os subsídios para o Plano Municipal de Educação de Niterói a partir dos Encontros de
Educação Infantil, Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos, cuja dinâmica
levou em conta a representação dos diferentes segmentos que compõem a comunidade
escolar;
· a Carta de princípios da Educação de Jovens e Adultos da Rede Pública Municipal de
Niterói – 2004;
· o documento intitulado “Os 13 pontos”, contendo o discurso pronunciado do Prof.
Waldeck Carneiro da Silva, por ocasião de sua posse como Secretário Municipal de
Educação de Niterói, realizada em 03/02/05, cujo quarto ponto aborda a necessidade de
intensificar e aprofundar ações sobre o sistema de ciclos na Rede Municipal;
· o relatório da Formação Continuada da Rede, realizada em 23/02/05, que teve o
documento “Os 13 pontos” como eixo de sua discussão;
· o Plano Pluri-Anual da FME para o quadriênio 2006-2009;
· os registros do Encontro para Reflexões Estratégicas, realizado nos dias 11 e 12 de
março de 2005 com a equipe dirigente da FME;
· o Plano de Ações Estratégicas da FME para o quadriênio 2005-2008, sobretudo, no que
tange à meta quatro;
· as demandas observadas nos termos das visitas de acompanhamento às escolas por
representantes das coordenações que compõem as Diretorias Políticas Pedagógicas e de
Gestão Escolar, da Superintendência de Ensino.
O balanço dos achados de alguns desses registros ênfase, de um lado, ao esforço
empreendido no interior de cada escola, por suas equipes docente, técnico-pedagógica e
dirigente, no sentido de adequar, sempre que possível, as formas organizativas para favorecer
que cada educando vivencie situações fecundas de aprendizagem; de outro, à tensão vivida
por essas mesmas equipes, além daquelas vividas pelos alunos e por seus responsáveis, diante
de uma rede que se propõe oficialmente em ciclos, mas que acontece oficiosamente a partir de
uma lógica ainda seriada. Tal incoerência cria e amplia o fosso existente entre o instituído e o
198
instituinte, provocando-nos a trabalhar para diminuir tanto quanto possível a distância entre
eles, mesmo sabendo tratarem-se de traços comuns à cultura de toda e qualquer instituição.
É importante esclarecer que a situação paradoxal que vivemos, diante do sistema de
escolaridade em ciclos, há muito vem sendo denunciada pelos sujeitos das escolas, à espera de
encaminhamentos reorganizativos do órgão central. Em decorrência disso e considerando que
são passados seis anos desde que o sistema de ciclos foi implantado, formalizamos esta
proposta, cujo conteúdo deve ser assumido como objeto de estudo de todos os profissionais
que compõem nossa Rede de Ensino.
Nosso desejo e nossa defesa são de que os indicativos de uma reorganização estrutural
que ora se anunciam resultem também e, sobretudo, do envolvimento coletivo daqueles que
vivem o dia-a-dia das escolas. Acreditamos que instituir o sistema de ciclos não é suficiente
para transformar a realidade do processo de ensinar e aprender, pois qualquer que seja a
mudança almejada, será possível a partir do esforço e do comprometimento daqueles que
protagonizam as cenas pedagógicas do cotidiano escolar. Desta forma, reconhecemos e
defendemos que toda mudança proposta se efetivará quando, principalmente, os
professores forem agentes da sua concepção e implementação, bem como alvo de cuidadosas
políticas de formação e atuação.
Portanto, encaminhamos às escolas este Documento Preliminar para estudo, crítica,
avaliação e proposições. Que a necessidade de compreendermos a lógica de ensinar e
aprender por meio dos ciclos impulsione e vivifique entre nós o debate a seu respeito,
levando-nos a conceber e formular políticas de ação para a sua concretização. Nessa direção,
cremos que caminhamos para superar, tanto quanto possível, as incoerências, contradições e
tensões atualmente estabelecidas, dando lugar a outras que, natural e historicamente, hão de
sobrevir.
Sendo assim, ao submeter tal Documento Preliminar às Unidades Escolares, temos o
propósito de realizar um processo amplo de revisão, ajustes, acréscimos e aperfeiçoamentos,
entendendo que sua implementação se dará de forma progressiva, a partir de Escolas-Pólo,
que no ano de 2006 vivenciarão de forma experimental as propostas aqui contidas e outras a
elas incorporadas. Ao serem postas em prática, as propostas aqui apresentadas passarão por
permanente avaliação, fazendo com que este Documento Preliminar sofra revisão e ajuste,
para que, no ano de 2007, passe a vigorar plenamente para todas as Unidades Escolares da
199
Rede. A definição das Escolas-Pólo será feita a partir do diálogo entre as Unidades Escolares
e a FME, após amplo debate e assinatura de Carta de Compromisso.
Temos clareza das limitações e da necessidade de ajustes deste Documento Preliminar,
entretanto consideramos que nenhum trabalho, como o que propõe a Equipe Gestora da FME,
de cunho realmente participativo, se encerre nele mesmo. É necessário ouvir as diversas vozes
e produzir as convergências possíveis diante de cada questão levantada. Mais ainda, há que se
ter a convicção de que é no confronto das idéias que se provocam as mudanças necessárias ao
aperfeiçoamento democrático.
Provocando desafios - Análise do contexto
Educar as novas gerações representa um ideal a ser alcançado por nós – escola e
sociedade. Vemo-nos, no cenário conturbado deste início de século, diante de vários
problemas no campo educacional. Apesar de não poderem ser tratados como fatos isolados e
independentes uns dos outros, alguns desses problemas possuem caráter paralisante.
Promovem, de diferentes maneiras, o descrédito da escola pública e o desgaste da profissão
docente. Tais constatações exigem um constante repensar de posturas e práticas, procurando
evidenciar o real compromisso com a garantia do direito à educação de todos as crianças.
Uma das questões a ser considerada quando falamos em educação é a da desigualdade
social. Suas marcas estão presentes nas ações e intenções daqueles que, quanto mais têm, mais
procuram garantir e preservar privilégios, desconsiderando uma significativa maioria que
padece de privações. As pesquisas revelam que quatro quintos da população estão à margem
do direito, ainda que convidados, diariamente, pela mídia a consumir. São cidadãos que
participam da produção das riquezas nacionais, através de diferentes atividades humanas, mas
são impedidos, socialmente, de desfrutar do resultado do que é produzido pela sociedade
global.
O agravamento desse cenário se sustenta por meio dos processos de discriminação e
marginalização de um número significativo de crianças, adolescentes, jovens e adultos, a
quem, constantemente, vemos negado o direito de acesso, permanência na escola e, mais
ainda, o direito de conhecer, de alcançar os bens materiais e culturais historicamente
produzidos. A todos os cidadãos deve ser garantido o direito ao conhecimento de forma a
200
poderem exercer a cidadania, com vistas à possível transformação da sociedade. Mas, como
concretizar essa utopia?
Em pleno século XXI, a realidade mostra ainda altos índices de analfabetismo,
repetência e evasão escolar, provocados pelo abismo político-econômico presente no país.
Esse é, como nos diz Carlos Drummond de Andrade: um tempo partido/ tempo de homens
partidos”. Quais seriam as possíveis causas de tantos problemas? Como contribuir para que a
população tenha garantido o seu direito à educação? De que formas podemos, como
instituição pública, contribuir para enfrentar e superar tais obstáculos?
Quando se reflete sobre a importância do papel de educadores/formadores e do
compromisso nele implícito, surgem novas construções e o questionamento de práticas até
então estabelecidas. Na posição de sujeitos instigadores de mudanças, se assim nos
entendemos, faz-se necessário o rompimento com paradigmas conservadores, para passarmos
a considerar as questões que se apresentam nas escolas e em suas salas de aula, como
elementos de reflexão e redimensionamento do trabalho realizado. Escolhas surgem então.
Reconhecer as responsabilidades que nos cabem frente a tais desafios é um começo
interessante. Olhar para nós mesmos e para os nossos pares da comunidade escolar, buscando
compreender as ações que movem esses coletivos, atentar para a complexidade sempre
presente ao cotidiano da escola, faz-se também fundamental para a ampliação do nosso
olhar/sentir. Reconhecermo-nos como seres em permanente processo de formação, talvez seja
uma das maneiras de ousarmos, em busca do rompimento com formas já estabelecidas,
percebendo-nos assim como produtores do novo, de práticas desafiadoras que ambicionem
um pouco mais do que conquistamos. Cabe, então, perguntar: quais são as concepções
pedagógicas que norteiam nossa ação educativa? Como nossos alunos, professores, bem como
toda a comunidade escolar podem ser sensibilizados para a luta histórica a ser vencida pelo
direito de todos à escolarização?
É preciso, como afirma Freire, continuar a sonhar sonhos impossíveis. Tal escolha nos
leva a perceber que nossos saberes e certezas são provisórios, portanto, sujeitos a
questionamentos e revisões. Devemos reconhecer, ainda, que as práticas baseadas nos
modelos históricos fundados em concepções que contemplavam a memorização, bem como a
repetição isolada e estéril de conteúdos escolares, não ajudam a ensinar e a pensar. Ao
contrário, elas dificultam, ou mesmo inviabilizam, as condições para que os alunos se
201
tornem sujeitos autônomos e produtores de conhecimentos. Tais práticas ignoram os
diferentes aspectos cognitivos, afetivos, práticos, culturais, políticos e estéticos integrantes
da vida daqueles que freqüentam a escola.
Diante das questões aqui pontuadas que, reconhecemos, estão longe de abarcar toda a
problemática que nos envolve, como gestores de uma política oficial, propomos o desafio de
ao olhar o cotidiano das escolas desta rede de ensino, em um esforço de instigar um
movimento de reflexão sobre as práticas pedagógicas cotidianas, sobre as relações sociais nos
diferentes espaços e fazeres, buscar caminhos que avancem rumo a outros horizontes mais
favoráveis ao processo formativo que protagonizamos. Consideramos tais movimentos como
parte de um processo em permanente construção, marcado por muitas possibilidades e limites.
Por fim, ressignificar o trabalho educativo, repensar a organização do tempo-espaço da
escola, propor atividades que contribuam para a formação plena de crianças, jovens e adultos
é o que pretendemos. Está posto o desafio.
Séries e Ciclos
O século XX foi marcado por inúmeras mudanças. Uma delas é a consolidação de um
modelo escolar cujo objetivo é que todos os alunos estejam sujeitos aos mesmos
conhecimentos, com expectativa de resultados semelhantes, num período comum a todos.
A seriação surge a partir da necessidade de preparar rapidamente uma massa de
trabalhadores que atendesse às exigências capitalistas. Dessa forma, “o conhecimento foi
partido em disciplinas, distribuído por anos e os anos foram subdivididos em partes menores
que servem para controlar uma certa velocidade de aprendizagem do conhecimento” (Freitas,
2003: 27). A partir de tal perspectiva, todos os alunos deveriam dominar certa quantidade de
conhecimento, num determinado tempo.
Neste contexto, a forma escolar predominante é pautada na exposição oral em
detrimento de outras estratégias de ensino, baseando-se na transmissão cultural, concebendo o
aluno como um ser passivo, conferindo um caráter dogmático aos conteúdos e atribuindo a
centralidade do processo educativo ora ao professor, ora ao próprio método.
Com a finalidade de mensurar o domínio do conhecimento, instauraram-se processos de
verificação pontuais (provas, testes etc). O sistema de avaliação, tal como foi entendido,
202
passou a ser desenvolvido a fim de estimular os alunos, considerando que, nesse momento,
não se aprende o que é de interesse de cada um individualmente, mas aquilo que atenda às
necessidades da sociedade capitalista.
O fim do século XX traz consigo o desafio de ruptura com uma lógica que se caracteriza
muito mais pela exclusão do que pela aparente inclusão a que se propôs. Desconstruir idéias,
que durante séculos foram se consolidando como naturais e favorecedoras de uma
organização necessária ao aprendizado, é uma tarefa árdua, à qual diferentes autores vêm se
dedicando e alguns sistemas de ensino têm se proposto.
Assim, os ciclos parecem se constituir enquanto estratégia alternativa de organização do
tempo e do espaço escolar. O conceito de ciclos é amplo e alguns autores partem de pelo
menos dois princípios: o desenvolvimento humano (ARROYO, 1999; LIMA, 1998) e o
desenvolvimento cognitivo (PERRENOUD, 2003), ainda que um esteja marcadamente
implicado no outro, já que os processos de aprendizagem envolvem, além de conceitos,
valores, sentimentos, atitudes etc. Esses aspectos se constituem em processo permanente do
desenvolvimento humano.
Surge, pois, um questionamento sobre o modelo que adotaremos como norteador do
trabalho a ser implementado: Ciclos de Formação ou Ciclos de Aprendizagem?
Gostaríamos de caracterizar os ciclos de formação e os ciclos de aprendizagem,
entendendo-os como uma nova forma de organizar as práticas educativas, possibilitando uma
distinção que não significa oposição; ao contrário, sinaliza a necessidade de aproximação dos
dois conceitos.
Os ciclos de formação se distinguiriam por considerar as fases do desenvolvimento
humano, uma vez que “ensinar uma criança de sete anos e outra de dez anos a ler vai exigir da
escola situações educativas diferenciadas, pois essas duas crianças têm percepções e mesmo
potencialidades de desenvolvimento diferenciadas” (Krug: 2001: 25). Tal idéia pressupõe uma
nova maneira de organização do tempo escolar, assim, os agrupamentos são realizados de
acordo com as fases de formação dos alunos: infância (6 a 8 anos), pré-adolescência (9 a 11
anos) e adolescência (12 a 14 anos).
No sistema de ciclos de formação, em lugar de séries anuais, trabalha-se com períodos
alongados em que a idade e os interesses em comum dos alunos são os principais
203
articuladores do processo de ensino-aprendizagem. experiências em que o currículo é
organizado a partir de complexos temáticos, definidos por uma pesquisa sócio-antropológica
realizada anualmente na comunidade em que cada escola está inserida. Dessa forma, os
complexos temáticos se propõem a romper com os conteúdos pré-estabelecidos, o
característicos do modelo escolar seriado, tendo em vista que todos deveriam aprender tudo
no mesmo ritmo, independentemente das marcas regionais, culturais, sociais que cada
indivíduo traz consigo. Essa proposta de ciclos prevê que a avaliação seja diagnóstica,
processual, investigativa, coletiva e cotidiana.
Os ciclos de aprendizagem, diferentemente dos ciclos de formação, não consideram a
idade como um fator determinante, mas sim a construção de novos espaços-tempos de
organização da escola voltados especificamente para os níveis diferenciados de aprendizagem
em que se encontram os alunos. Nesse sentido, busca-se favorecer contextos de aprendizagem
para todos que se encontram em percursos diferenciados de formação. Uma pedagogia
diferenciada requer uma avaliação diferenciada, a fim de propor situações que, de fato, sejam
desafiadoras para todos os alunos.
O trabalho na perspectiva de ciclos exige uma avaliação formativa, onde “não se espera
até o final do percurso para fazer balanços formativos e opções estratégicas(Perrenoud,
2004: 42). O desenvolvimento das ações em equipe é fundamental, uma vez que juntos os
professores podem antecipar e identificar problemas, construindo estratégias didáticas a fim
de superar as dificuldades encontradas. Nesse sentido, é essencial confiar os alunos a um
único professor durante toda a permanência no ciclo e ainda, trabalhar com uma equipe que
tenha bem definidos os objetivos do ciclo, a fim de assegurar o desenvolvimento de diferentes
competências.
A filiação teórico-metodológica a apenas uma dessas concepções de ciclos representaria
em si mesma o desvio de suas orientações, dadas as condições concretas de implementação.
Se de um certo ponto de vista acadêmico pode parecer um hibridismo, ou um ecletismo,
entendemos que o recorte da realidade (necessário para o exame científico do problema) e a
filiação a apenas uma possibilidade de sua análise, pode representar um estreitamento de
nossas ações, entendendo que o ser humano necessita ser compreendido em sua
complexidade. As condições reais de aplicação de um ou outro modelo, poderiam provocar o
abandono de alguns de seus preceitos, pelo menos no momento em que nos encontramos.
204
Nossa tentativa, então, é a de identificar e incorporar as marcas de cada uma dessas
propostas de organização escolar, não desconsiderando o contexto histórico e social em que
estão inseridas, sabendo que uma predominância de elementos que se sustentam na
concepção de Ciclos de Aprendizagem e que a eles se somam muitos que apontam na direção
das idéias que fundamentam os Ciclos de Formação.
Se, em um dado momento histórico a organização do ensino em séries pretendeu
acolher as necessidades de uma determinada sociedade, hoje, nos parece imprescindível
avaliar as melhores estratégias para atender as demandas que se impõem à sociedade em que
estamos inseridos, mesmo que para isso tenhamos que construir, de forma dialógica,
participativa e processual, um novo modelo de organização escolar.
205
PREFEITURA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
Minuta de Projeto de Resolução
Do Ensino Fundamental e sua organização em Ciclos
Art. 1 ° - O ensino fundamental regular, no Sistema Municipal de Ensino de Niterói, terá nove
anos de escolaridade, sendo organizado em 4 (quatro) ciclos.
I- O ciclo terá duração de três anos e atenderá alunos de 6, 7, 8 ou 9 anos de
idade;
II- O 2º ciclo terá duração de dois anos e atenderá alunos de 9, 10, 11 ou 12 anos de
idade;
III- O ciclo terá duração de dois anos e atenderá alunos de 11, 12, 13 ou 14 anos
de idade;
IV- O ciclo terá duração de dois anos e atenderá alunos a partir de 13 anos, com
limite de idade determinado em função de critérios pedagógicos estabelecidos pela Equipe de
Referência do ciclo, não podendo atender a alunos que ultrapassem os 16 anos de idade.
Art. - A Educação de Jovens e Adultos, que atenderá alunos com no mínimo 15 anos de
idade, terá dez períodos de escolaridade, organizados em 4 (quatro) ciclos:
I- O 1º ciclo terá duração de dois anos;
II- O 2º ciclo terá duração de um ano;
III- O 3º ciclo terá duração de um ano;
IV- O 4º ciclo terá duração de um ano.
Art. - Cada ciclo será composto por Grupos de Referência a serem organizados,
observando-se o quantitativo máximo de alunos, conforme o que se segue.
I – No primeiro ciclo, ..... alunos;
II – No segundo ciclo, ..... alunos;
III – No terceiro e no quarto ciclos, ...... alunos.
Parágrafo único - Grupo de Referência é o grupo de alunos organizados em função de suas
idades, que constituir-se-á no início de cada ano letivo e a partir do qual se organizará o
trabalho pedagógico do ciclo.
Art. - A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em cada Grupo de
Referência obedecerá a seguinte composição:
I- 1º ciclo: ........ alunos e 2 alunos com deficiência, totalizando ....... alunos;
II- 2º ciclo: ....... alunos e 2 alunos com deficiência, totalizando ...... alunos;
III- 3º e 4º ciclos: ....... alunos e 2 alunos com deficiência, totalizando ...... alunos.
206
Art. - Considera-se Agrupamento o processo inicial de organização dos alunos nos Grupos
de Referência, devendo ser realizado conforme o previsto no Art. e no Art. da presente
Resolução.
Art. - Considera-se Reagrupamento o processo de deslocamento temporário dos alunos de
seus Grupos de Referência para outros, formados a partir de potencialidades, necessidades e
afinidades sócio-cognitivas, sem prejuízo do vínculo com o Grupo de Referência, que será
preservado e retomado ao longo do processo.
I- O Reagrupamento poderá ocorrer entre todos os Grupos de Referência do ciclo,
independentemente da idade, na periodicidade a ser proposta pela Equipe de Referência do
ciclo, de acordo com os objetivos a serem alcançados, podendo ser diário, semanal ou
mensal.
Art. 7º – Os Reagrupamentos deverão ser realizados:
I- a partir da avaliação contínua do trabalho pedagógico desenvolvido, da
regularidade dos encaminhamentos e dos resultados alcançados e organizado sempre no
mesmo turno;
II- a partir do planejamento de propostas de atividades diversificadas, estratégias
metodológicas a serem adotadas, do tempo de duração e materiais necessários, levando em
conta a diversidade de conhecimentos e ritmos dos alunos envolvidos.
Parágrafo Único - Preferencialmente, não haverá dentro do ciclo a formação de Grupos de
Referência em turnos diferentes, salvo em caso de necessidades de espaço, ou outros, a serem
avaliados pela equipe da FME.
Das Equipes
Art. - Cada ciclo deverá ser confiado a uma equipe denominada Equipe de Referência,
constituída por profissionais habilitados da escola que desenvolvem diferentes atividades
naquele ciclo.
§ - A Equipe de Referência será composta por Professores dos Grupos de Referência,
Orientador e/ou Supervisor Educacional.
a) Os professores que farão parte da Equipe de Referência poderão atuar em
diferentes espaços e atividades, inclusive as específicas de Promoção de Leitura no Contexto
Escolar e de Informática Educativa, de acordo com o Projeto Pedagógico definido pela escola
e pela própria Equipe de Referência de cada ciclo.
b) As Unidades Escolares que tiverem até doze Grupos de Referência por turno
contarão com mais dois docentes para compor suas Equipes de Referência, com a finalidade
de viabilizar atividades diversas nos momentos de Reagrupamento.
c) As unidades escolares que atenderem mais de doze Grupos de Referência por
turno terão mais um docente a cada seis novos Grupos de Referência para compor suas
Equipes de Referência com a finalidade de viabilizar atividades diversas nos momentos de
Reagrupamento.
207
d) Além dos professores que constituem a Equipe de Referência, a escola também
poderá contar com um Professor de Sala de Recursos e Professores de Apoio ao aluno com
NEE, de acordo com as necessidades apontadas, após o exame da FME.
§ - O Orientador Educacional, o Supervisor Educacional e o Professor poderão compor
mais de uma Equipe de Referência, de acordo com a necessidade de cada Unidade Escolar, a
disponibilidade de profissionais e as atividades a serem desenvolvidas.
§ - O acompanhamento permanente do trabalho pedagógico desenvolvido em cada ciclo é
também de responsabilidade do diretor da Unidade Escolar a quem caberá responder
sistematicamente pelas ações, juntamente com a Equipe de Referência.
§ - A Equipe de Referência terá como incumbência o acompanhamento das turmas nos
aspectos gerais, na realização dos Agrupamentos e Reagrupamentos, nos processos
avaliativos, na construção de critérios para organização das diferentes dinâmicas pedagógicas,
na produção de atividades diversificadas e diferenciadas que atendam a todas as situações
cotidianas, e em todos os outros momentos que disserem respeito à garantia de qualidade de
ensino a ser oferecido.
§ - É responsabilidade da Equipe de Referência a implementação do processo de ensinar e
aprender de modo adequado aos alunos, articulando ações voltadas para o acompanhamento
da aprendizagem e avaliação, tanto coletiva, quanto individualmente.
§ 6º - Todos os Grupos de Referência serão de responsabilidade da Equipe de Referência, mas
cada Grupo de Referência contará com a atuação específica de um Professor de Referência.
a) O Professor de Referência é um docente que compõe a Equipe de Referência do
Ciclo que acompanha de forma específica o trabalho realizado com um determinado Grupo de
Referência.
b) A definição prévia do papel desse professor não invalida ou desqualifica a
atuação dos demais Professores de Referência do ciclo diante das demandas de aprendizagem
e desenvolvimento apresentadas pelos alunos, sendo de responsabilidade de todos os
profissionais envolvidos o planejamento e o desenvolvimento das ações pedagógicas.
§ 7 º - Os profissionais da Unidades Escolares terão acesso à Formação Continuada para que
possam atuar nos espaços de Sala de Leitura e Sala de Informática, a partir da inserção de um
Professor Formador, que será incumbido de construir instrumentos pedagógicos para que os
professores possam conceber a tecnologia, bem como a leitura, como agente mediador da
relação do sujeito com o conhecimento no processo ensino-aprendizagem
§ 8º - A inserção do Professor Formador na Unidade Escolar será definida a partir das
necessidades levantadas em diálogo com as equipes das coordenações de Promoção de
Leitura no Contexto Escolar e de Informática Educativa da Diretoria de Políticas
Educacionais da Superintendência de Desenvolvimento do Ensino.
Art. - Os professores de primeiro ciclo do Ensino Fundamental Regular realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo três anos letivos consecutivos.
Art. 10 - Os professores de segundo ciclo do Ensino Fundamental Regular realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo dois anos letivos consecutivos.
208
Art. 11 - Os professores de terceiro ciclo do Ensino Fundamental regular realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo dois anos letivos consecutivos.
Art. 12 - Os professores de quarto ciclo do Ensino Fundamental regular realizarão seu
trabalho, no mesmo Grupo de Referência, por no mínimo dois anos letivos consecutivos.
Art. 13 - Os professores de primeiro ciclo da Educação de Jovens e Adultos realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo dois anos letivos consecutivos.
Art. 14 - Os professores de segundo ciclo da Educação de Jovens e Adultos realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo um ano letivo.
Art. 15 - Os professores de terceiro ciclo da Educação de Jovens e Adultos realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo um ano letivo.
Art. 16 - Os professores de quarto ciclo da Educação de Jovens e Adultos realizarão seu
trabalho, nos mesmos Grupos de Referência, por no mínimo um ano letivo.
Art. 17 - A substituição de Professor de seu Grupo de Referência no decorrer do ciclo
poderá ser realizada mediante decisão da Equipe de Referência do Ciclo, devidamente
justificada e documentada.
Art. 18 - Integrarão a Equipe Técnico-pedagógica - ETP - os seguintes profissionais: Diretor
Geral, Diretor Adjunto, Orientador Educacional, Supervisor Educacional, Secretário Escolar e
Coordenador de Turno.
Parágrafo Único - A essa Equipe caberá a organização e a gestão escolar, provendo as
condições para a realização do trabalho pedagógico, articulando o coletivo escolar em torno
da definição de objetivos sócio-políticos e educativos, bem como das formas organizativas do
processo de ensino pelo professor e de desenvolvimento de aprendizagem pelos alunos.
Art. 19 - Compete aos Orientadores e Supervisores Educacionais a condução do trabalho
pedagógico, responsabilizando-se pelo estudo, organização e acompanhamento sistemático da
prática educativa, intencional, que se realiza na escola, sob a responsabilidade do diretor.
§ 1º - Os Orientadores e Supervisores Educacionais terão, no mínimo, duas vertentes de
atuação: uma focada na elaboração e implementação do Projeto Pedagógico da Unidade
Escolar e outra na articulação da Equipe de Referência do Ciclo.
§ 2º - Os Orientadores e Supervisores Educacionais serão os gestores da Equipe de Referência
do Ciclo, podendo atuar em mais de um ciclo, com a responsabilidade de coordenar as
seguintes ações:
a) organização do tempo e do espaço escolar;
b) definição de Agrupamento e Reagrupamento de alunos;
c) organização dos Grupos de Referência;
d) definição de estratégias de atendimento às necessidades de aprendizagem dos
alunos e de avaliação do processo;
e) dinamização do horário de planejamento;
f) formação continuada para o desenvolvimento pessoal e profissional dos
209
integrantes da Equipe de Referência do ciclo;
g) acompanhamento da vida escolar dos alunos.
§ - Dentro da carga horária semanal do Orientador e do Supervisor Educacional, prevista
pela legislação em vigor, deverá haverá coincidência de quatro horas para planejamento e
avaliação da dinâmica organizacional da escola.
Art. 20 - Ao Secretário Escolar competirá subsidiar a Equipe de Referência do ciclo, cuidando
dos registros dos Agrupamentos e Reagrupamentos, observando o fluxo de mobilidade dos
alunos, a partir das indicações da própria Equipe de Referência e da Equipe Técnico-
pedagógica.
Art. 21 - Cabe ao Coordenador de Turno assessorar a Direção na consecução de atividades que
garantam a movimentação de alunos, professores e funcionários, no sentido de assegurar o
funcionamento cotidiano da escola.
Do Projeto Pedagógico
Art. 22 O Projeto Pedagógico da Unidade Escolar consiste na expressão de concepções,
finalidades, intenções, metas, objetivos e formas de mediação e de organização da escola, para
consolidação do seu trabalho educativo.
§ - No processo de elaboração do Projeto Pedagógico, deve-se priorizar a participação do
coletivo escolar, garantindo a representatividade dos diferentes segmentos que o integram.
§ - Integram os segmentos representativos da Unidade Escolar o Conselho Escola-
Comunidade, a Equipe Técnico-pedagógica, a Equipe de Referência dos Ciclos, Funcionários,
Alunos e Responsáveis pelos alunos.
§ - O Projeto Pedagógico da Unidade Escolas deve ser elaborado para um período pluri-
anual, em consonância com a Proposta Pedagógica da FME.
§ - Para cada ano letivo, a escola deve organizar um Plano de Ação, contendo as metas,
políticas e estratégias de sua implementação, de acordo com o que apontar o Projeto
Pedagógico da Unidade Escolar.
Do Currículo
Art. 23 Ao organizarem seus currículos, as Unidades Escolares deverão orientar-se pelos
seguintes princípios:
I- O princípio da participação coletiva na elaboração do Projeto Pedagógico,
consolidando a democratização das relações com a comunidade local, regional e planetária;
II- Os princípios da autonomia, dos Direitos e Deveres da Cidadania, bem como da
ordem democrática;
III- O princípio da criticidade, reconhecendo a identidade pessoal dos atores
envolvidos nos processos e relações exercidos na Unidade Escolar;
210
IV- Os princípio estéticos da sensibilidade, da criatividade, da diversidade étnico-
racial, sexual, religiosa, cultural e artística, bem como de sua visão de mundo;
V- O princípio da heterogeneidade que caracteriza a construção do conhecimento,
levando em conta os aspectos sócio-afetivos, culturais, cognitivos, ideológicos e políticos
envolvidos na construção de situações de ensino e aprendizagem.
VI- O princípio de articulação entre o ensino, como processo intencional de
formação dos sujeitos, e a saúde, a sexualidade, a vida familiar e social, o meio ambiente, o
trabalho, a ciência e a tecnologia, a cultura, as linguagens
VII O princípio da ética como base das relações interpessoais, institucionais e
sociais que se manifestam na escola e na sociedade como um todo.
§ 1º - O Currículo Escolar de primeiro e segundo ciclos serão organizados a partir dos
seguintes componentes curriculares:
I- Língua Portuguesa
II- Matemática
III- Ciências Naturais
IV- Geografia
V- História
VI- Educação Artística
VII- Educação Física
Art. 24 - O Currículo Escolar de terceiro e quarto ciclos serão organizados a partir dos
seguintes componentes curriculares:
I- Língua Portuguesa
II- Matemática
III- Ciências Naturais
IV- Geografia
V- História
VI- Educação Artística
VII- Educação Física
VIII- Língua Estrangeira
§ 1 º - Tais componentes serão agrupados por áreas de conhecimento, na forma que se segue:
a) Linguagens - Língua Portuguesa, Educação Artística, Educação sica e
Línguas Estrangeiras;
b) Ciências Humanas - Geografia e História;
c) Ciências da Natureza – Matemática e Ciências Naturais.
§ - Os conteúdos a serem trabalhados em todos os ciclos no Ensino Fundamental devem
versar sobre as seguintes temáticas:
a. diferentes linguagens
b. comunicação
c. oralidade
d. leitura
e. interpretação e produção textual em suas diferentes modalidades (gêneros e
211
tipos)
f. grupos humanos, espaço/território
g. tempo e espaço
h. diversidade cultural
i. meio ambiente, ser humano e saúde
j. fenômenos químicos e físicos
k. sistema de numeração, raciocínio lógico, aritmética, geometria, álgebra
§ 3 º - Os componentes curriculares serão trabalhados de forma integrada e poderão se
articular a partir de Temas Geradores, Complexos Temáticos, Projetos Didáticos, ou outra
forma de organização.
Da avaliação
Art. 25 - A avaliação é processo permanente a ser implementado no curso do desenvolvimento
das atividades educacionais empreendidas pela escola em seus diversos momentos para
subsidiar as ações de ensino-aprendizagem, considerando a necessidade de utilização de
procedimentos e instrumentos diversificados que favoreçam a interpretação qualitativa do
percurso e evolução de cada aluno.
Parágrafo único - A condução do processo avaliativo é de responsabilidade da Equipe de
Referência do Ciclo, que deverá estar sempre atenta às necessidades individuais e coletivas
dos grupos, articulando ações preventivas e corretivas dos fluxos de aprendizagem, a fim de
minimizar/interromper situações de fracasso ou inadaptações.
Art. 26 - O Registro da Avaliação será organizado de duas formas:
I – Ao longo do processo, através de:
· anotações pessoais;
· montagem de portifólios;
· testes e provas;
· trabalhos em grupo;
· pesquisas;
· seminários;
· fichas de avaliação e auto-avaliação do aluno;
· fichário que acompanhe o aluno;
· diários reflexivos do trabalho docente ou qualquer outro instrumento
cumulativo de informações que subsidiem a elaboração do relatório anual.
II - Anualmente, em forma de relatório, em que devem aparecer:
a) Os objetivos alcançados naquele ano letivo, com observações acerca do
processo em que se deu a construção desses objetivos;
b) Os objetivos não alcançados naquele ano letivo, com observações acerca do
processo em que se deu a construção desses objetivos;
212
c) Os procedimentos adotados pelo Professor de Referência e pela Equipe de
Referência do Ciclo para superação dos entraves observados no decorrer do processo;
d) Os procedimentos a serem adotados para a superação dos entraves observados.
§ - Tais instrumentos servirão também de base para a emissão de documentos oficiais, em
caso de transferência do aluno para outro sistema de ensino, no decorrer do ciclo ou do
período letivo.
§ 2º - O relatório, com as devidas observações, será retomado no início ou a qualquer
momento do ano letivo seguinte, com vistas à elaboração de planejamento de ação e
estratégias para superação dos entraves, mantendo-se permanentemente atualizados e
disponíveis os seus respectivos registros.
Art 27 - O Conselho de Avaliação do Ciclo é uma instância de reflexão e deliberação,
composto por representantes de alunos, responsáveis, funcionários e pela Equipe de
Referência de cada ciclo, e tem por finalidade levantar dados significativos sobre o processo
de ensino-aprendizagem com vistas à reorientação do trabalho pedagógico.
§ - Os dados revelados no decorrer do processo avaliativo de cada Grupo de Referência
constituir-se-ão em objeto de análise e pronunciamento do Conselho de Avaliação do Ciclo, a
reunir-se em 3 (três) sessões ao longo do ano letivo.
§ - No que se refere à Educação de Jovens e Adultos, o Conselho de Avaliação do Ciclo
também reunir-se- á em 3(três) sessões ao longo do ano letivo.
§ - A partir do que deliberar o Conselho de Avaliação do Ciclo, os alunos poderão ser
reagrupados, temporariamente, objetivando um atendimento mais específico, centrado na
superação das dificuldades encontradas ao longo do percurso ou para o desenvolvimento de
propostas de trabalho que demandem tal proposição.
§ - Caberá ao Conselho de Avaliação do Ciclo a indicação de desenvolvimento de
atividades pedagógicas diferenciadas para atender os alunos que, ao longo do ciclo, se
distanciarem do percurso de aprendizagem de sua turma de referência.
§ 5 º - As atividades pedagógicas diferenciadas poderão ser desenvolvidas no próprio Grupo
de Referência, no Reagrupamento, ou sob forma de um projeto, considerando dispositivos de
aprendizagem voltados para as necessidades específicas desses alunos.
Da Educação Especial
Art 28 - A Educação Especial se na perspectiva da Inclusão, considerando a legislação
vigente sobre a questão.
§ - O aluno que integra o foco da Educação Especial é aquele que possui Necessidades
Educacionais Especiais (N.E.E.), permanentes ou temporárias, em decorrência de deficiências
físicas, sensoriais ou mentais, síndromes ou altas habilidades;
§ 2 - O aluno com N.E.E. poderá ser assim identificado a partir da declaração da família, no
ato de matrícula, e/ou da observação da Equipe de Referência do Ciclo, seguida da avaliação
213
da Equipe de Educação Especial (E.E.E) da FME, requerendo sempre confirmação clínica da
especificidade apontada.
§ - Enquanto ocorre a investigação clínica, a E.E.E. orientará as Equipes de Referência das
escolas sobre a organização de situações de aprendizagem necessárias ao avanço escolar do
aluno.
§ - A falta de diagnóstico clínico definitivo não representará fator de impedimento para a
definição de encaminhamentos pedagógicos.
Art 29 - O aluno com N.E.E. terá, sempre que observada a necessidade pela E.E.E.,
atendimento na Sala de Recursos.
§ 1º - O atendimento ao aluno com N.E.E. na Sala de Recursos será desenvolvido na Unidade
Escolar, em espaço adequado, a partir de atividades que promovam e garantam a
aprendizagem, bem como a inclusão desse aluno no ambiente escolar como um todo.
§ 2 º - O professor com atuação na Sala de Recursos integrará a Equipe de Referência, mas
não será Professor de Referência de nenhum Grupo de Referência, nem participará como
responsável pelas atividades promovidas nos Reagrupamentos a serem realizados, podendo
deles participar acompanhando os alunos com N.E.E..
Art 30 Se na organização do Grupo de Referência o número de alunos exceder o máximo
definido pelo Art. desta Resolução, a Equipe de Referência passa a contar com um
Professor de Apoio aos alunos com N.E.E., que a estes passará a atender de forma específica,
desde que apontadas as necessidades pela E.E.E..
Parágrafo único Em caso especiais, definidos pela E.E.E. da FME, a Equipe de Referência
será acrescida de um Professor de Apoio aos alunos com N.E.E., mesmo que não ocorra a
situação prevista no caput deste artigo.
Art 31 - Com relação ao aluno com N.E.E., devem ser observadas, de forma prioritária,
quando nos processos de Reagrupamento, as características emocionais específicas desse
aluno, bem como o vínculo estabelecido com seu Professor de Referência.
Das Disposições Gerais
Art 32 - O calendário escolar será elaborado pela FME para cada ano letivo, sendo permitido
às Unidades Escolares efetuarem as adequações necessárias ao seu projeto pedagógico, desde
que considerem os pontos que se seguem:
I- Obrigatoriedade do cumprimento dos 200 dias letivos e das 800 horas, no que se
refere ao ensino regular e 100 dias letivos e das 400 horas, no que se refere á E.J.A.;
II- Distribuição dos 200 dias letivos em 3 períodos de, aproximadamente, 66 e/ou
67 dias, observando que, em relação a E.J.A., a distribuição dos 100 dias letivos ocorrerá em 3
períodos de aproximadamente 50 dias;
III- Início do ano letivo e período de recesso estabelecidos;
IV- Dia letivo computado somente para programação escolar com freqüência
exigível do aluno e efetiva orientação do professor;
214
V- Apresentação das adequações para aprovação prévia da FME.
Art 33 - O Ensino Fundamental é presencial e de freqüência obrigatória, sendo exigido, por
lei, o alcance mínimo de 75% de presença a cada ano letivo, cabendo à Unidade Escolar
controlar a freqüência de cada aluno, observando o que se segue:
I- A ausência consecutiva do aluno por 10 (dez) dias, sem justificativa, implica
notificação ao responsável;
II- Em relação à E.J.A., a ausência consecutiva do aluno por 10(dez) dias, sem
justificativa, implica a notificação através de aerograma para o endereço do mesmo,
solicitando o seu comparecimento para esclarecimento;
III- A reincidência das faltas quando ultrapassarem o percentual de 12,5% dos dias
letivos, com apuração a cada 50 dias, obriga notificação ao Conselho Tutelar;
IV- Após a realização de cada Conselho de Avaliação do Ciclo, a Unidade Escolar
deverá dar ciência ao aluno e ao responsável por sua freqüência;
V- Em qualquer uma das ocorrências anteriormente mencionadas, as notificações
deverão ser feitas expressamente por escrito, mantendo-se em arquivo documento
comprobatório;
VI- No caso de doenças que impeçam os alunos de locomoção até a Unidade
Escolar, ou infecto-contagiosas, ou gravidez de risco, atestados pelos Postos de Saúde do
Município, o aluno terá direito a material de estudo ou atendimento domiciliar, devendo ser
registrado no controle de freqüência justificativa para as faltas lançadas;
VII- O aluno que não atingir 75% de freqüência no final de um ano letivo deverá
ser avaliado pela Equipe de Referência do Ciclo e reagrupado mediante processo de
reclassificação, de acordo com o que apontar o parecer avaliativo;
VIII- No caso da E.J.A., o aluno que não atingir 75% de freqüência no final de um
semestre deverá ser avaliado pela Equipe de Referência do ciclo e reagrupado mediante
processo de reclassificação, de acordo com o que apontar o parecer avaliativo;
IX- Será considerado transferido o aluno que solicitar documento de
transferência para outro estabelecimento de ensino;
X- Será considerado infreqüente o aluno que obtiver 15 faltas consecutivas;
XI- Será considerado evadido o aluno com algum registro de frequência que
abandonar as atividades escolares e não mais retornar até que seja findo o ano letivo;
XII- Será considerado desistente o aluno que não obtiver nenhuma freqüência ao
longo do ano letivo;
XIII- As situações de evasão e de desistência poderão ser caracterizadas após
o encerramento total das atividades do ano escolar em curso.
Parágrafo Único - O registro de freqüência será organizado, levando-se em consideração o
agrupamento inicial do aluno, ainda que ele integre grupos diferenciados durante o ciclo.
Art. 34 - O horário de funcionamento do Ensino Fundamental nas Unidades Escolares da
Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói obedecerá a indicação que se segue:
I - 1º e 2º ciclos:
a) Turno da manhã: 7h30 às 12h
b) Turno da tarde: 13h às 17h30
c) Turno da noite: 18h às 22h
II - 3º e 4º ciclos:
a) Turno da manhã: 7h10 às 12h
215
b) Turno da tarde: 13h às 17h50
c) Turno da noite: 18h às 22h
§ - Haverá 20 minutos de intervalo para merenda/recreio de cada Grupo de Referência de
todos os ciclos do Ensino Fundamental Regular, ficando o estabelecimento desse horário a
critério da Direção da Unidade Escolar.
§ 2º – Na Educação de Jovens e Adultos, fica reservado o horário das 18h às 18h20 à merenda
dos alunos, iniciando-se as aulas às 18h20, exceto às quartas-feiras, quando as mesmas têm
início às 20h.
Art. 35 Às quartas-feiras, em função do horário de planejamento, os alunos do Ensino
Fundamental Regular serão dispensados das aulas regulares, após o recreio, obedecendo a
indicação que se segue:
I - 1º e 2º ciclos:
a) Turno da manhã: 9h30
b) Turno da tarde: 15h
II - 3º e 4º ciclos:
a) Turno da manhã: 10h10
b) Turno da tarde: 16h
Art. 36 - O horário de planejamento, aqui entendido como espaço de Reuniões Pedagógicas e
de Formação Continuada, deve ser assumido como um processo contínuo de elaboração e
execução do Projeto Pedagógico da Unidade Escolar, abordando diretamente a especificidade
da sala de aula e do ciclo, o que inclui a necessidade de investimentos em tempo de estudo,
reflexão, análise da realidade e projeções de finalidades e de ações.
§ - A dinamização das Reuniões Pedagógicas e de Formação Continuada, sob a
responsabilidade do Supervisor e do Orientador Educacional, deve considerar a especificidade
do trabalho da Equipe de Referência do Ciclo,
Art. 37 - O horário semanal de planejamento terá duração de 2 (duas) horas e ocorrerá,
obrigatoriamente, às quartas-feiras, obedecendo a indicação que se segue:
I- 1º e 2º ciclos:
a) Turno da manhã: 9h30 às 11h30
b) Turno da tarde: 15h às 17h
c) Turno da noite: 18h às 20h
II - 3º e 4º ciclos:
a) Turno da manhã: 10h10 às 12h10
b) Turno da tarde: 16h às 18h
c) Turno da noite: 18h às 20h
§ - As horas reservadas ao planejamento destinam-se a todos os integrantes da Equipe de
Referência do Ciclo, incluindo-se a Equipe Técnico-pedagógica e a Direção, e são de
freqüência obrigatória, inclusive para os professores do e do ciclos que não atuam em
sala de aula no dia, devendo a ausência ser computada como falta ao serviço, naquele horário,
216
ficando vedada a utilização desse horário para fins de natureza incompatível com o trabalho
pedagógico.
§ 2º - O Professor com duas matrículas, lotado em regime de 40 horas, ou em regime especial
de trabalho com exercício no mesmo estabelecimento, ou em outro, deverá participar das
reuniões pedagógicas dos horários de todos os turnos de sua atuação.
Da Matrícula
Art. 38 - O ingresso de aluno no Ensino Fundamental ocorrerá por meio de:
I- matrícula inicial;
II- matrícula renovada;
III- matrícula por transferência.
Art. 39 As matrículas inicial e renovada, ocorrerão de acordo com o calendário definido
pela FME, por processo de classificação ou reclassificação, desde que existam vagas nas
unidades escolares, considerando o que dispõe a legislação vigente.
Art. 40 - A matrícula por meio de transferência ocorrerá através da adequação da vida escolar
do aluno no ciclo e no grupo de referência, em conformidade com a proposta pedagógica da
FME e com o projeto pedagógico da Unidade Escolar, após análise do que certificar o seu
histórico.
Art. 41 - A inserção de alunos novos em ciclo que não corresponda às idades indicadas poderá
ser realizada por meio de processo de classificação ou reclassificação a partir da avaliação da
Equipe de Referência do Ciclo referendada pela FME, seguindo critérios que levem em conta
o seu desenvolvimento cognitivo e sócio-afetivo.
Art. 42 - A classificação de aluno no Ensino Fundamental, quando não houver comprovação
de escolaridade, será feita mediante avaliação da Equipe Técnico-pedagógica de cada
unidade escolar, que definirá sua inserção no ciclo/grupo adequados, priorizando a idade em
que se encontra o aluno.
§ 1º- O parecer avaliativo e a ficha de classificação devem constar obrigatoriamente na pasta
do aluno, arquivada na secretaria da Unidade Escolar.
§ 2º- O processo de classificação deverá ocorrer durante os primeiros trinta dias cursados pelo
aluno.
Art. 43 - O processo de reclassificação será feito mediante avaliação da Equipe Técnico-
pedagógica da escola, que definirá a inserção do aluno no ciclo e no grupo de referência
adequado.
§ - O parecer avaliativo e a ficha de reclassificação devem constar obrigatoriamente na
pasta do aluno, arquivada na secretaria da Unidade Escolar.
§ - O processo de reclassificação ocorrerá ao longo do período definido pela legislação
vigente.
217
§ 3º - Para o aluno que não alcançou o percentual mínimo de 75% de freqüência no ano letivo
anterior, a reclassificação deverá ser processada durante os primeiros trinta dias cursados pelo
aluno.
§ 4º - Os alunos poderão ser encaminhados para Grupos de Referência de Educação de Jovens
e Adultos, quando ultrapassarem idade de 15 anos, desde que feita avaliação pela Equipe de
Referência do Ciclo, referendada pela FME, seguindo critérios que levem em conta o seu
desenvolvimento cognitivo e sócio-afetivo, após esclarecimentos aos responsáveis.
Disposições transitórias
Art. 44 - Os professores deverão acompanhar seus alunos até que estes concluam o ciclo.
Art. 45 - A partir de 2006, o CEMOA não receberá novos alunos para atendimento, dando-se
continuidade apenas ao trabalho com os alunos já atendidos até o final do ano de 2006.
Art. 46 - Todos os dispositivos desta Resolução serão aplicados em caráter experimental, no
ano letivo de 2006, apenas às Unidades Escolares que firmarem Carta de Compromisso, com
a FME até a data de ......de........de............. , para se constituírem como Escola-Pólo.
Art. 48 - Esta resolução entrará plenamente em vigor para a totalidade da Rede no ano letivo
de 2007, revogando-se todas as disposições em contrário.
218
ANEXO
59
CARTA DE PRINCÍPIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE NITERÓI - 2004
4CONCEPÇÕES DE EJA
A EJA expressa e é expressão da sociedade de classes. Na sociedade capitalista,
organizada sobre as bases da apropriação privada da produção, a Educação também assume
um caráter dual: escolas diferenciadas para classes antagônicas. Parafraseando Gramsci, uma
educação que forma os dirigentes e outra que (con) forma os dirigidos.
A Educação de Jovens e Adultos tem como principal característica ser uma modalidade
de ensino destinada aos trabalhadores, isso porque são eles que, durante o tempo dedicado à
escolarização – infância e adolescência - tiveram esse direito negado por determinantes sócio-
econômico-culturais. Esses determinantes não alcançam os filhos das classes dominantes,
como, por exemplo, a necessidade de trabalhar ainda na infância, a falta de escolas públicas, o
preconceito contra a mulher, etc. Embora os dois últimos não sejam tão fortes, em outras
épocas eram motivos sérios para afastar os estudantes da escolarização.
No caso da Educação Brasileira, podemos afirmar que o fenômeno da universalização
da escola básica é recente, além, é claro, de profundamente marcado pelo distanciamento
entre qualidade e quantidade de ensino.
Tal desenho da educação pública brasileira gerou, dentre outras coisas, uma educação,
na maioria das vezes, desconectada dos interesses, necessidades e aspirações da classe
trabalhadora.
Dessa forma, a EJA é muito mais do que reparar compensar e resgata o tempo perdido,
o que torna urgente pensar a construção de um currículo específico. Diferentemente das
crianças, jovens e adultos, chegam à escola, por um lado, com uma auto-estima muito
castigada, mas, por outro, com experiências de vida tão ricas, com conhecimentos diversos e
interessantes, que não podem ser desconsiderados no processo educativo nem desconhecidos
pela escola. São elementos fundamentais no processo de construção do conhecimento de
todos, educadores e alunos.
59
Anexo do Documento Preliminar.
219
Se em décadas anteriores, não havia escola para todos, hoje, com a ampliação do
número de vagas, constatam-se altos índices de evasão e terminalidades forjadas.
Como a obrigatoriedade do Estado restringe-se à faixa etária de 7 a 14 anos, a EJA é
uma modalidade de ensino que carece, legal e praticamente, da assunção do Estado. Alguns
governos sejam municipais, estaduais e federal em maior ou menor escala, tentam
implementar a EJA com interesses diversos, que vão desde a função
reparadora/compensatória até a de elevação estatística de escolaridade de sua população.
É necessário combater essa política e os interesses que a sustentam, construindo
políticas públicas para a EJA de forma a que, realmente, contemplem objetivos voltados para
os trabalhadores.
A Educação de Jovens e Adultos da classe trabalhadora – que ingressa ou retorna para a
escola com expectativas diversas, próprias de cada faixa etária e com necessidades
diferenciadas, inclusive de tempo e espaço pode ser definida como modalidade de ensino
destinada à fração da classe trabalhadora que não teve acesso ao Ensino Fundamental, ou não
teve nele sua permanência garantida na idade prevista legalmente e socialmente estipulada.
Entendemos que esses trabalhadores tiveram seus direitos negados. É imperioso que, no
momento em que eles retornam à escola, seja criado um espaço no qual eles se sintam
sujeitos, autores de suas histórias, cidadãos de direitos.
Não é possível pensar uma educação para jovens e adultos trabalhadores como uma
transposição da educação de crianças e adolescentes. Não cabe mais a visão de um adulto
infantilizado porque não domina a escrita ou uma série de conteúdos que a escola institui
como fundamentais.
Dessa forma, a certificação apenas para a satisfação do mercado não pode ser o
horizonte da EJA.
A Educação de Jovens e Adultos precisa, assim como a educação em geral, ter a
perspectiva da formação humana integral.
4MEDIDAS POSSÍVEIS
· Criar fóruns permanentes de discussão sobre a EJA.
· Assegurar Formações Continuadas organizadas pelas escolas e pela FME, voltadas
para a especificidade da EJA, respeitando o horário de trabalho em questão.
· Garantir a permanência dos encontros EJA EM FOCO ao longo do ano letivo.
· Propiciar um horário de planejamento semanal, nas escolas, mais adequado às
220
condições da EJA de cada escola, realizando, em tempo integral, estudo e
planejamento coletivo com participação dos discentes e das coordenações da FME.
· Organizar fóruns semestrais, discutindo e refletindo a EJA no município,
fortalecendo políticas públicas para a área.
· Criar turmas diurnas de EJA, de acordo com a necessidade da comunidade, a fim de
contemplar, além dos trabalhadores noturnos, os alunos adolescentes que são
periodicamente encaminhados para a EJA.
· Ampliar a oferta de EJA e garantir a manutenção desses alunos na própria Rede para
os próximos ciclos.
· Implementar uma política de valorização salarial dos professores, inclusive,
garantindo adicional de periculosidade e difícil acesso.
· Elaborar indicativos pedagógicos que contribuam para que, ao estabelecer o Projeto
Político Pedagógico de cada escola, seja contemplada a Educação de Jovens e
Adultos.
· Investir na formação do profissional da EJA para que, cada vez mais, haja a
transformação de metodologias e concepções pedagógicas adequadas a esta
modalidade de ensino.
· Viabilizar, a cada dois anos, como política pública do município, pesquisas de perfil
sócio-cultural e necessidades educacionais da comunidade, a fim de adequar a oferta
de EJA.
· Criar um Grupo de Trabalho que discuta e delibere sobre questões como: currículo,
organização do tempo da EJA e avaliação, além da organização legal burocrática.
Em um prazo de seis meses, esse grupo, formado por representantes de cada escola,
Coordenação de EJA, Coordenação de Orientação, Coordenação de Supervisão e
representantes dos alunos, deve apresentar nos fóruns de EJA suas propostas, para
aprovação e posterior encaminhamento às vias legais.
· Garantir corpo docente e de funcionários, entendido como professor regente,
professor de sala de leitura (sem sobreposição de funções), sala de recursos, de
informática, coordenador de turno, professor de reorientação, supervisor, orientador,
agente administrativo, auxiliar de serviços gerais, merendeira.
· Garantir a ludoteca “Ejinha”, como política pública de atendimento aos filhos dos
envolvidos na EJA, em cada unidade escolar, com garantia de profissional
específico para a função.
· Garantir a abertura e a permanência de turmas, em todos os semestres/ciclos, a partir
221
de 12 alunos.
· Promover mensalmente atividades esportivas e culturais, dentro e fora do espaço
escolar, garantindo o incentivo e a infra-estrutura necessária (inclusive financeira)
para a sua realização.
· Garantir a participação efetiva das coordenações da FME na EJA, garantindo que
haja reuniões específicas, respeitando o horário de trabalho.
· Ampliar o acervo literário da EJA, levando em conta as sugestões dos professores
envolvidos nesse processo. Incluir no acervo jornais, revistas semanais e outros,
para que os alunos possam, semanalmente, ter contanto com esses materiais.
· Garantir o funcionamento da biblioteca “Cora Coralina” nos três turnos e aos
sábados pela manhã.
· Garantir mobiliário e materiais adequados para a EJA, inclusive para a sala de
informática com montagem de laboratório.
· Criar parcerias com órgãos e outras secretarias que desdobrem discussões e palestras
nas escolas sobre temas variados.
· Garantir para o aluno da EJA transporte público em qualquer horário.
Grupo relator: Carla Mendes E.M. Helena Antipoff, Célia Claudia E.M. Helena
Antipoff, Elisa Diniz E.M. Eulália de Bragança, Luciane Nardino E.M. Helena Antipoff,
Marta Maia – E.M. Paulo Freire, Renata Gonçalves – E.M. Ayrton Senna. Esta carta é
resultado de um trabalho coletivo. O grupo relator foi responsável pela sistematização das
contribuições dos participantes do curso.
222
Anexo 7 - Relação das coordenações e unidades escolares que enviaram contribuições
para a reescrita da proposta
Unidades Escolares de Ensino Fundamental Envio
Sim Não
1. E. M. Alberto Francisco Torres
X
2. E. M. Ayrton Senna
X
3. E. M. Maestro Heitor Villa-Lobos
X
4. E. M. Nossa Senhora da Penha
X
5. E. M. Paulo de Almeida Campos
X
6. E. M. Santos Dumont
X
7. E. M. Adelino Magalhães
X
8. E. M. Altivo César
X
9. E. M. Governador Roberto Silveira
X
10. E. M. Infante Dom Henrique
X
11. E. M. João Brazil
X
12. E. M. Mestra Fininha
X
13. E. M. Tiradentes
X
14. E. M. Eulália da Silveira Bragança
X
15. E. M. Francisco Portugal Neves
X
16. E. M. Helena Antipoff
X
17. E. M. Maralegre
X
18. E. M. Marcos Waldemar
X
19. E. M. Maria Ângela Moreira Pinto
X
20. E. M. Professora Lúcia Maria Silveira da Rocha
X
21. E. M. Várzea das Moças
X
22. E. M. Bolívia Gaètho
X
23. E. M. Diógenes Ribeiro de Mendonça
X
24. E. M. Honorina de Carvalho
X
25. E. M. Horácio Pacheco
X
26. E. M. Levi Carneiro
X
27. E.M. Lucia Maria
X
28. E. M. Padre Leonel Franca
X
29. E. M. Sitio do Ipê
X
30. E. M. Vera Lúcia Machado
X
31. E. M. Antônio Coutinho
X
32. E. M. Djalma Coutinho
X
33. E. M. Ernani Moreira Franco
X
34. E. M. José de Anchieta
X
35. E. M. Paulo Freire
X
36. E. M. Rachide da Glória Salim Sacker
X
37. E. M. Sebastiana Gonçalves Pinho
X
Coordenações da FME
Coordenação de Articulação Pedagógica
Coordenação da Educação Infantil
Coordenação de 1º e 2º Ciclos
Coordenação de 3º e 4º Ciclos
Coordenação de Educação de Jovens e Adultos
Coordenação de Educação Especial
223
Anexo 8 - Contribuições gerais do Ensino Fundamental (1º e ciclos) enviadas para a
reescrita da Proposta Pedagógica em ciclos
SUPERINTENDÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO DE ENSINO
ENSINO FUNDAMENTAL
Art. 1º
Coordenações
EAP
Como proceder com matrícula inicial de alunos com idade avançada, sem ter
vivenciado experiências formais de aprendizagem no contexto escolar?
1º e 2º Ciclos
Acrescentar um parágrafo: Casos não previstos deverão ser analisados pela
ER da FME, juntamente com as ERs das escolas.
ERs
UEs
1º ciclo em dois anos (X)
2º ciclo em 3 anos (X)
Não retirar a nomenclatura “Ano de Escolaridade” para melhor organização da
escola e da própria gestão escolar (X)
Delegados
Art. 2º
Coordenações
ERs
UEs
Sem mudanças significativas (X)
Merece maior investimento na Proposta (X)
Permanece o critério da semestralidade (X)
Delegados
Art. 3º
Coordenações
EAP
1º e 2º ciclos: 20 a 25
3º e 4º ciclos: 25 a 30
Parágrafo único: Definir GR para EJA.
1º e 2º Ciclos
Definir número de alunos.
EJA
Cada Ciclo será composto por Grupos de Referência a serem organizados,
observando-se o quantitativo máximo de alunos, conforme o que se segue:
I – No primeiro Ciclo 25 alunos;
II – No segundo Ciclo 25 alunos;
III – No terceiro e no quarto Ciclos 30 alunos.
Parágrafo Único
Grupo de Referência é o grupo de alunos organizados em
função da aprendizagem e ou interesse, que constituir-se-
á no início de cada
período letivo e a partir do qual se organizará o trabalho pedagógico do Ciclo.
ERs
Estabelecer a modulação.
1º e 2º ciclos – entre 20 e 25 alunos.
3º e 4º ciclos – entre 25 e 30 alunos.
Parágrafo Único -
Ao se referir que os Grupos de Referência se constituirão “no
início de cada ano letivo”, talvez seja imp
ortante salientar a importância de que
o Grupo de Referência não mude, dentro do ciclo, na sua constituição no início
de cada ano.
UEs
OBS.: Incorpora o
artigo 4 (sobre
quantitativo de
NEE)
Todos os ciclos com 25 alunos ou 22 alunos com NEE (X)
Todos os ciclos com 10 alunos + 2 NEE (X)
Todos os ciclos com 15 alunos (X)
1º ciclo com 20 alunos (XXXXX)
1º ciclo com 20 + 2 NEE (X)
1º ciclo com 16 + 2 NEE (XX)
1° ciclo com 22 alunos (X)
224
1º ciclo com 25 alunos (XX)
2º ciclo com 25 alunos (XXXXXX)
2º ciclo com 25 alunos = 2 NEE (X)
2º ciclo com 25 alunos ou 23 com NEE (X)
2º ciclo com 21 alunos + 2 NEE (X)
2º ciclo com 30 alunos (X)
1º e 2º ciclos com 20 alunos (XXXX)
1º e 2º ciclos com 22 alunos ou 20 com NEE (X)
1º e 2º ciclos com 16 alunos + 2 com NEE (X)
3º e 4º ciclos com 21 alunos + 2 com NEE (X)
3º e 4º ciclos com 25 alunos (XX)
3° e 4 ciclos com 30 alunos (X)
3º e 4º ciclos com 35 alunos (X)
3º ciclo com 30 alunos ou 28 com NEE (X)
3º e 4º ciclos com 30 alunos + 2 NEE (X)
1 (um) aluno NEE por ciclo (X)
Respeitar a Carta Regimento (X)
Que o quantitativo estabelecido leve em conta as proporções obtidas a partir
da relação espaço/aluno e por professor (XX)
Parágrafo único:
Não utilizar a idade como única forma de organização dos agrupamentos (X)
Não agrupar por idade (X)
Definir forma de agrupar aluno com idade avançada e sem escolarização
(Projeto de Aceleração / um professor para agrupamento que extrapole a
idade/ciclo) (X)
Rever a inclusão de aluno não alfabetizado no 2º ciclo, mesmo que já possua a
idade indicada. Utilizar não somente o critério de idade, mas também um
mínimo de conhecimento (X)
Definir o período de passagem de idades dos alunos (março/abril) para serem
inseridos nos ciclos.
Definir agrupamento na EJA (X)
Delegados
Art. 4º
Coordenações
1º e 2º Ciclos
Definir número de alunos nas turmas com NEEs.
ERs
UEs
Para cada GR em que houver 2 alunos NEE, a modulação diminui em 2 alunos
(X)
Considerar o tipo de deficiência e circunstâncias omissas (X)
Delegados
Art. 5º
Coordenações
EJA
O Agrupamento para EJA levará em consideração o vel de conhecimento
cognitivo do aluno. Os alunos antigos”, deverão ser agrupados primeiramente,
por interesse na hora da matrícula, posto que a escola já tem conhecimento
prévio sobre os mesmos. Quanto aos alunos “novos” serão agrupados de
acordo com a escolaridade que virá comprovada através de sua
documentação.
ERs
UEs
Delegados
Art. 6º
Coordenações
EAP
Juntar o Inciso I com os do art. 7º.
1º e 2º Ciclos
Acrescentar a possibilidade de reagrupamentos inter-ciclos.
ERs
Acrescentar: O reagrupamento poderá ocorrer entre todos os GRs do ciclo e
entre ciclos.
225
Reagrupamento também entre ciclos, dependendo da necessidade apontada
pela Equipe de Referência.
UEs
Reagrupamento também entre ciclos (XXX)
Reagrupamento entre turnos (X)
Reagrupamento no contra turno (X)
Mais clareza nos objetivos e critérios para os reagrupamentos (XXX)
Equipe de Referência precisa pensar na formação de reagrupamentos a partir
de potencialidades, necessidades e afinidades sócio-cognitivas (X)
Agrupar e reagrupar ao final do ano letivo e novamente reagrupar após o
Conselho de Avaliação do Ciclo para melhor organização do registro de
freqüência do aluno (X)
Independente dos reagrup
amentos e além deles, incluir recuperação paralela
(X)
Reduzir a carga horária dos reagrupamentos (X)
Delegados
Art. 7º
Coordenações
ERs
Indica-
se a realização dos Reagrupamentos "organizados sempre no mesmo
turno". Porém, a possibilidade de reagrupamento em outro turno aumenta a
chance de se trabalhar com projetos diferenciados, de acordo com cada grup
o
específico, esticando o tempo de estudo e trabalho para os alunos.
UEs
Reforço escolar no contra turno (X)
Garantir infra-estrutura adequada (espaço) para os reagupamentos (X)
Levar em conta a diversidade de conhecimentos e ritmos dos alunos
envolvidos (X)
Excluir este artigo (X)
Delegados
Art. 8º
Coordenações
EAP
Rever quantitativo de professores a mais por turno.
Retirar o professor formador.
Repensar a idéia de professor acompanhar GR durante o ciclo.
1º e 2º Ciclos
§ 1º
Trocar poderão atuar por
atuarão em diferentes espaços e atividades,
inclusive de promoção de leitura e de informática educativa.
Redefinir o número de professor por GR.
Sugestão:
De 1 a 5 GRs: além dos professores dos grupos, mais um professor.
De 6 a 10 GRs: além dos professores dos grupos, mais dois professores.
De 11 a 15 GRs: além dos professores dos grupos, mais três professores.
e) Definir o papel do professor de sala de recursos e de professor de apoio.
§ 7º e 8º
Retirar. Redefinir a inserção do professor formador.
3º e 4º Ciclos
É preciso deixar claro na redação que não existirá mais a figura do prof. de
sala de leitura e informática. Sugerimos que esta mudança se dê em 2 etapas:
1
o
) consulta a esses profissionais para que façam a opção em compor a ER do
ciclo como professor articulador (“a mais”) ou professor regente; 2
o
) após a
opção, as UEs devem solicitar suprimento para as eventuais faltas de
professor articulador para compor suas Equipes de Referência.
§ 6º
No caso dos 3
o
e 4
o
ciclos, cada Grupo de Refer
ência poderá contar com pelo
menos dois Professores de Referência.
§ 7º
A figura do Professor Formador deve ser extinta. A formação dos docentes
deve se dar de forma continuada e em serviço.
226
§ 8º
Revisar este parágrafo, pois a Coordenação de Promoção de
Leitura no
Contexto Escolar não existe mais.
EJA
§ 1º
b) As unidades ecolares que tiverem até 08 Grupos de Referência por turno
contarão com os dois docentes (Sala de Leitura e Informática) para compor
suas Equipes de Referência, com a finalidade de viab
ilizar atividades diversas
nos momentos de reagrupamento;
c)
As Unidades Escolares que atenderem mais de 08 Grupos de
Referência por turno, terão mais (01) um docente a cada 04 novos
Grupos de Referência, para compor sua Equipe com a finalidade de
viabilizar atividades diversas nos momentos de Reagrupamento.
ERs
§ 1º
a) Suprimir as palavras “específicas” e “no contexto escolar”
§ 7º
Especificar a atuação do professor formador.
Fortalecer a idéia de Equipe de Referência.
Necessidade de denominar o professor a mais.
Definir o quantitativo de docentes “a mais” em função do número de alunos e
não do número de grupos de referência por turno.
Modificar a escrita "contarão com mais dois docentes para compor suas
Equipes de Referênia", pois margem à interpre
tação de que as escolas
ganharão mais dois professores, o que é falso, pois conta-
se com os
profissionais de sala de leitura e informática, que as escolas têm e que
passarão a "viabilizar atividades diversas nos momentos de Reagrupamento".
Talvez seja i
mportante estes professores terem uma denominação específica,
pois cada escola, cada Equipe de Referência tem se referido a eles de formas
diferentes, o que tem trazido confusão, inclusive chamando-
os de "professor
formador", que teria funções diferentes. "professor reagrupador";
A distribuição destes profissionais pode ser mais justa. Da maneira em que
está, uma escola que tenha poucas Grupos de Referência (8 por exemplo)
receberá 2 docentes, o mesmo que uma escola com até 15 Grupos de
Referência. Talvez
fazer uma distribuição a cada 4 grupos de referência seja a
solução, ou fazer a distribuição por uma composição por número de Grupos de
Referência e número de alunos nos mesmos.
O profissional da sala de informática foi uma conquista importante da rede de
ensino de Niterói. A o existência deste profissional na escola será um
retrocesso. outras soluções, como a reorientação do trabalho realizado,
com a participação mais efetiva junto aos professores(as) das turmas. Se este
profissional ficar responsáve
l, junto com as equipes de referência, pelos
reagrupamentos neste espaço ou em outros -
, a sala de informática poderá
não mais ser usada, pois é muito complicado não ter uma pessoa responsável
pelos computadores: ligar antes dos alunos chegarem, desligar
quando saírem,
"limpar" os computadores, retirar vírus, conferir as configurações… São
atividades necessárias se queremos que os computadores funcionem e que
são impossíveis de serem realizadas junto com turmas. Outra solução possível
é a contratação de técnicos para tal trabalho.
Creio que o melhor seria que a figura do "professor formador" não exista mais,
mas que seja dada continuidade à formação continuada em serviço, seja
ela feita por quem for: (ex)professor da sala de informática, leitura, recursos
,
apoio,
equipe de referência da escola…
UEs
Incluir professor especializado para acompanhar os alunos com NEEs (X)
Definir situação dos professores em regime de 40 horas (X)
Permanência dos professores de Sala de Leitura e Informática Educativa
227
(XXXXXX)
Assegurar profissionais na Sala de Leitura
e no Laboratório de Informática para
organização, manutenção e apoio ao trabalho dos professores (XX)
Reduzir a carga-
horária do professor em sala para favorecer o planejamento
dos reagrupamentos (X)
2 docentes a mais a cada 6 novos GRs (X)
2 docentes a mais até 8 GRs por turno (X)
1 docente a mais a cada 4 novos GRs por turno (XX)
1 docente volante a cada 6 novos GRs (X)
2 docentes a mais para até 12 GRs e + 1 a cada 6 novos GRs (X)
3 docentes até 12 GRs por turno (X)
Assegurar professores extras para atuarem em reforço no contra turno (X)
Assegurar professor específico para a alfabetização (XX)
Garantir 2 professores integradores, por turno, para cobrir faltas e licenças (X)
Manter o professor formador (XXX)
Professor formador para desenvolver trabalho de
leitura e informática e
promoção cultural. (X)
Explicar outras possibilidades de atuação do professor formador (X)
Incluir professor de Sala de Recursos e professor de apoio ao aluno com NEEs
na ER do ciclo (X)
Aumentar o de OE/SE, de modo que cada UE
conte com esse profissional
em tempo integral (X)
Professor a mais como articulador da ER (X)
Garantir um OE e ou um SE em cada ciclo (X)
Aumentar a carga horária do professor (X)
Definir claramente a composição da ER de cada ciclo (X)
Esclarecer o papel do professor de referência (X)
Repensar a idéia de ER devido a fragmentação. Rever a concepção, dando
ênfase ao trabalho coletivo e dialógico (X)
Adequar a carga horária do professor de Arte e de Educação Física no tocante
ao 1º e 2º ciclos (X)
Delegados
Art. 9º
Coordenações
ERs
UEs
OBS: Extensivo até
o artigo 16.
O professor deverá acompanhar seus alunos até o final do ciclo (X)
Suprimir a exigência do professor ter que acompanhar os alunos no decorrer
do ciclo. Deixar esta decisão por conta da ER do ciclo (XXX)
Utilizar a palavra preferencialmente (X)
Delegados
Art. 10
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 11
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 12
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
228
Art. 13
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 14
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 15
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 16
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 17
Coordenações
ERs
UEs
Suprimir este artigo (X)
Delegados
Art. 18
Coordenações
ERs
UEs
Ampliar o conceito de ETP ou mudar a denominação (X)
Rever este artigo no tocante a responsabilidade da ETP de prover as
condições para a realização do trabalho pedagógico (X)
Considerar a inclusão do Professor-Orientador, haja vista a quantidade de
atribuições destinadas ao Supervisor e Orientador Educacionais, a
especificidade da função, os diferentes papéis e o atendimento às
individualidades que a proposta de ciclos pressupõe (X)
Delegados
Art. 19
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 20
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 21
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 22
Coordenações
EAP
Trabalhar com a nomenclatura PPP.
ERs
Por
que a retirada do “político” do PPP (Projeto Político Pedagógico), que
229
passa a se chamar, na proposta, Projeto Pedagógico?
UEs
Discussão coletiva do PPP organizada pela FME (X)
Apresentação da Proposta pluri-anual, pelo órgão gestor, com metas (X)
Delegados
Art. 23
Coordenações
EAP
Rever a organização do artigo em relação ao art. 24.
Retirar a ênfase nas disciplinas e explorar as áreas de conhecimento.
1º e 2º Ciclos
Encerrar ao fim do VII princípio.
ERs
Outro inciso: "O princípio da interdisciplinaridade, buscando-
se a construção de
uma visão complexa do mundo através da união dos diversos conhecimentos
disponíveis"
Não há necessidade de separar os componentes curriculares do Currículo
Escolar dos 1
o
e 2
o
ciclos dos 3
o
e 4
o
ciclos, pois sã
o os mesmos, com
exceção da Língua Estrangeira nos 3
o
e 4
o
ciclos.
UEs
Incluir dois princípios: um sobre a provisoriedade do conhecimento e outro
sobre a concepção de conhecimento globalizado (X)
Substituir a palavra planetária por globalizada (X)
Substituir a palavra ordem por organização (X)
Princípio 4° (rever a escrita)
: “Os princípios estéticos da sensibilidade, da
criatividade, da diversidade etnico-
racial, sexual, religiosa, cultural e artística,
associando e ampliando sua visão de mundo.” (X)
Incluir um princípio que aborde a questão da formação humana através da
constução de valores (X)
Incluir o princípio da formação intelectual e moral para o exercício da liderança
e/ou do controle social de quem lidera. Fomentando a criação de espaços
democráticos de auto-regulação e construção da autonomia dos educandos (X)
A democratização das relações não pode ser um princípio só de currículo (X)
Rever a organização dos artigos e parágrafos dessa parte (XXX)
Eliminar trechos que citam os componentes curriculares e enfatizar as áreas de
conhecimento (XX)
Destacar que as temática
s elencadas devem servir de eixos para
desdobramentos de outros conhecimentos (X)
Definir conteúdos e competências por ano de escolaridade (XX)
Estabelecer conteúdos fixos (X)
Definir objetivos para cada ciclo (X)
Organizar cronograma de objetivos a sere
m alcançados em cada ano de
escolaridade (X)
Indicar se os objetivos de cada ciclo serão definidos pela FME ou pela UE (X)
Rever a carga-horária das disciplinas (XX)
Delegados
Art. 24
Coordenações
1º e 2º Ciclos
Abordar a organização do currículo
da EI e do EF a partir dos diferentes
componentes curriculares (aqueles definidos por área de conhecimento?).
Ressaltar que a ngua estrangeira é componente curricular apenas do e
ciclos. Acrescentar que os componentes curriculares serão trabalha
dos de
forma integrada e poderão se articular a partir de projetos, temas geradores,
complexos temáticos e outras formas de organização que potencializem a
articulação do trabalho das diferentes áreas do conhecimento.
ERs
As áreas de conhecimento conforme se dividem separam os componentes
curriculares Geografia e História das Ciências Naturais e Matemática; no
entanto, as Ciências Naturais têm mais conexões com os dois primeiros do que
com Matemática. Trata-se em ciências
Naturais, hoje em dia nas escolas, mais
sobre questões humanas (saúde, corpo humano, localização do ser humano no
mundo, etc.) do que questõs ligadas à matemática.
230
Pode-
se ter apenas duas áreas: "Linguagens" e "Ciências Humanas e da
Natureza", o que carac
teriza mais a interdisciplinaridade que se almeja,
trabalhando-se as temáticas 2
o
) dentro destas duas áreas utilizando-
se as
formas apontadas no § 3
o
.
UEs
Delegados
Art. 25
Coordenações
ERs
UEs
Permanência da retenção ao final de cada ciclo (XXXX)
Clareza de critérios para promoção e retenção (X)
Definição de instrumentos avaliativos pelo GR (X)
Garantir retenção para o aluno que não atingir 75% de freqüência (X)
Explicar se haverá ou não retenção (X)
Assegurar aos alunos com distorção série/idade a possibilidade de retenção,
tendo em vista alcançar os objetivos da etapa de aprendizagem (X)
Delegados
Art. 26
Coordenações
3º e 4º Ciclos
A organização do processo de avaliação fica sob a responsabilidade da ER do
ciclo.
§ 1º
São alternativas a serem usadas no processo de avaliação:
ERs
Não deveríamos fugir das "anualidades", visto os ciclos terem 2 ou 3 anos?
Não seria melhor,
por exemplo, um relatório por Grupo de Referência ao fim de
cada ciclo do mesmo?
Deve a FME fazer a padronização deste relatório, igual para todas as escolas?
UEs
Registro através de conceito trimestral e sem adoção de relatórios parciais e
finais (X)
O registro avaliativo poderá ser feito a partir de relatórios individuais e demais
instrumentos, e conceitos que poderão ser indicados por letras”, sendo que
atribuídos como indicador de permanência ou avanço ao final de cada ciclo (X)
Formalizar docum
entos que registrem o processo de escolarização do aluno,
explicitando como ita transitar na Rede e fora dela (equivalência) (X)
Facultar a transferência de alunos de seu grupo de referência inicial, dentro do
mesmo ciclo, sem que seja necessário reclassificá-lo (X)
Substituir testes e provas por exercícios avaliativos (X)
Definir quem será o responsável pela elaboração do relatório anual (X)
Incluir modelo de relatório (X)
Criar uma ficha, uma pasta ou um relatório de avaliação do aluno a ser
preenchido semestralmente e que acompanhe o aluno durante todo o ciclo (X)
Amarrar mais a questão dos registros (X)
Relatório trimestral, com liberação do horário de meio turno durante a semana
anterior ao Conselho de Avaliação, para favorecer a sua elaboração. (X)
Definir como será o registro avaliativo no 3º e 4º ciclos (X)
Delegados
Art. 27
Coordenações
EAP
Rever CAC na EJA
EJA
§ 2º
No que se refere à Educação de Jovens e Adultos, o Conselho de Avaliação do
Ciclo também, reunir-se-á em (02) duas sessões ao longo do período letivo.
ERs
Onde se lê "de sua turma", lê-se "de seu grupo de referência".
UEs
O Conselho de Avaliação do Ciclo deve ser precedido de um espaçode
avaliação do trabalho pela ER (Pré-CAC) (X)
231
Delegados
Art. 28
Coordenações
1º e 2º Ciclos
§ 1º
Acrescentar que as dificuldades de aprendizagem, que não se caracterizam
por deficiência serão trabalhadas nos GRs e nos reagrupamentos.
§ 3º
Trocar a palavra aprendizagem por ensino / avanço escolar por aprendizagem.
Educação Especial
§ 2º
Acrescentar: junto com ETP da FME.
§ 4º
Acrescentar: sendo necessário o parecer da ER e da EEE.
ERs
§ 1º
Acrescentar: As dificuldades de aprendizagem, que não se caracterizem com
NEE serão trabalhadas nos GRs e nos reagrupamentos.
§ 2º
Acrescentar: “...seguida da avaliação da Equipe de Educação Especial e ETP
da FME...”
UEs
A ER fará uma avaliação considerando as NEEs dos alunos, para inseri-
los nos
GRs (X)
Garantir a assistência efetiva da Coordenação de Educação Especial no
processo de avaliação e fornecimento de parecer (XXX)
Acompanhamento efetivo da Coordenação de Educação Especial às ERs dos
ciclos, na escola (X)
§ 4º
Após avaliação será determinado o tipo de apoio necessário às crianças com
NEEs (X)
Parceria com a saúde para fono, Assistente Social, Psicólogo, dentista e
pediatra (XX)
Delegados
Art. 29
Coordenações
1º e 2º Ciclos
§ 2º
Acrescentar que a participação do professor de sala de recursos precisa
acontecer desde o momento de planejamento da ação.
Educação Especial
Acrescentar no caput do artigo: podendo este ser temporário ou definitivo.
§ 2º
Acrescentar: O professor de apoio e o ..., devendo deles participar dos
reagrupamentos acompanhando os alunos NEE.
ERs
Acrescentar no caput do artigo: podendo este ser temporário ou definitivo.
§ 2º
Acrescentar: O professor de apoio.
UEs
Especificar funções e organização da Sala de Recursos (X)
Delegados
Art. 30
Coordenações
1º e 2º Ciclos
É importante ressaltar que de acordo com a concepção da Equipe de
Educação Especial, o professor de apoio não é exatamente para o aluno, ma
s
para favorecer a sua inserção no grupo, isto é, o professor de apoio do grupo
de alunos em que nele está inserido crianças com NEEs.
Educação Especial
“Se na organização do GR o número de alunos exceder o máximo definido pelo
art. 4º desta Resolução, o GR passa a contar com um professor de apoio,
para
a turma que possui NEE, garantindo a inclusão
, que a estes passará a
atender de forma específica, desde que apontadas as necessidades pela EEE.
ERs
232
UEs
Delegados
Art. 31
Coordenações
1º e 2º Ciclos
Trocar a redação, tendo em vista que os aspectos emocionais de todos os
alunos devem ser considerados e não só das crianças com NEEs.
Considerando as características emocionais dos alunos,
bem como o vínculo
estabelecido com o seu professor de referência, a inclusão do aluno NEE nos
reagrupamentos obedecerá critérios construídos pela ER do Ciclo.
Educação Especial
Os alunos com NEE deverão participar dos reagrupamentos, sendo
respeitadas su
as características, devendo estes casos serem orientados pela
Coordenação de Educação Especial.
ERs
UEs
Delegados
Art. 32
Coordenações
EAP
Trabalhar com a designação período em lugar de ano letivo.
Rever a distribuição de dias para a EJA.
EJA
II
Em relação à EJA, a distribuição dos 100 dias letivos ocorrerá em (02)
dois períodos de 50 dias.
ERs
UEs
Autonomia da UE na construção do calendário, respeitando a legislação (XX)
Rever distribuição de dias letivos (XXXX)
Delegados
Art. 33
Coordenações
ERs
UEs
Inciso III - Notificação de faltas ao Conselho Tutelar, ao responsável e ao CEC,
sob os cuidados da secretaria.
Inciso VI
Definir como se dará o acompanhamento domiciliar e quem deverá
fazê-lo (X)
Retirar atendimento domiciliar (X)
Inciso XI – A situação de infreqüente já está contemplada em evadido (XX)
Delegados
Art. 34
Coordenações
ETP
Juntar todos os horários de funcionamento em um artigo.
ERs
UEs
Horário integral para o Ensino Fundamental com opções e infra-estrutura (XX)
Turmas diurnas de EJA (X)
Delegados
Art. 35
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 36
Coordenações
ERs
UEs
Otimizar as reuniões de quarta-feira (X)
Delegados
Art. 37
Coordenações
EAP
Acertar horário de planejamento.
233
ERs
UEs
Ampliar o horário de planejamento semanal para favo
recer a elaboração do
relatório (X)
Confirmar ou acertar o horário de término do planejamento (X)
Formação continuada fora do horário de planejamento (XXX)
Instituir tempo específico, fora do planejamento, para escrita do registro de
desempenho do aluno (X)
Delegados
Art. 38
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 39
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 40
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 41
Coordenações
3º e 4º ciclos
Quaisquer casos que não estejam pr
evistos deverão ser resolvidos com a ETP,
direção e FME.
EJA
A inserção de alunos novos em Ciclos na EJA poderá ser realizada por meio
de processo de classificação ou reclassificação a partir da avaliação da E.R. do
Ciclo referendada pela FME seguindo crit
érios que levem em conta o seu
desenvolvimento cognitivo e sócio- afetivo.
ERs
Pode-
se ter alunos nos ciclos que não tenham a idade apontada para tais?
Seriam apenas alunos novos? E os alunos que hoje estão com defasagem
idde/série, não podem? Têm que ir para o ciclo correspondente, mesmo
"seguindo critérios que levem em conta o se
r desenvolvimento cognitivo e
sócio-afetivo"?
UEs
Delegados
Art. 42
Coordenações
EJA
A classificação de aluno na EJA quando não houver comprovação de
escolaridade, será feita mediante avaliação de Equipe técnico-
pedagógico de
cada unidade escolar, que definirá sua inserção no Ciclo / grupo adequados.
ERs
UEs
Delegados
Art. 43
Coordenações
ERs
UEs
Seguir o que está no histórico do aluno, evitando reclassificações (X)
Acabar com reclassificação para alunos que não alcançaram o percentual
mínimo de freqüência (X)
Delegados
234
Art. 44
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 45
Coordenações
ERs
UEs
Delegados
Art. 46
Coordenações
ERs
UEs
OEs/SEs
Delegados
Art. 47
Coordenações
EAP
Artigo inexistente.
ERs
UEs
Delegados
Art. 48
Coordenações
ERs
UEs
Implantação gradual começando pelos ciclos iniciais (XX)
OEs/SEs
Delegados
OBS.
Coordenações
1º e 2º Ciclos
Será ne
cessário criar mais um título (Dos espaços e suas funções) para
esclarecer a quem compete cuidar dos acervos literários e tecnológicos? Ou
isto pode ser acrescentado em Equipes?
Como dar conta do trabalho de informática nas escolas em que a sala
atende a metade da turma? Precisamos orientar.
Podemos garantir neste doc a inserção do trabalho de parceria das ERs da
FME?
ERs
UEs
Esclarecimento para a comunidade escolar sobre a proposta de ciclos (X)
Explicar o que é ciclo e sua função (X)
Plebiscito nas escolas com a participação da comunidade para aprovar a
Proposta (X)
Acolhimento por parte da FME das sugestões enviadas pelas UEs (X)
Formação de professores (pela FME e pela UE) (XXXX)
Incluir artigo sobre formação continuada do professor (X)
Esclarecimento dos critérios que definem difícil acesso (X)
Pouco tempo de debate da proposta – insuficiente (XX)
Gestão escolar mais atenta às necessidades da UE (X)
Programa de Gestão Escolar (Informatizado) precisa de adequação à Proposta
(X)
Instituir Coordenação de Alfabetização, na FME (X)
Revisão da tabela salarial de acordo com a proposta do SEPE (X)
Valorização do profissional para além da questão salarial (X)
Delegados
235
Anexo 9 - Quadro comparativo elaborado pela coordenação de e ciclos com os
principais conceitos contidos no Documento Preliminar
Como a escola hoje é organizada Proposta em discussão
Agrupamentos
de alunos
Em geral, os alunos são agrupados em turmas, no
início de cada ano. O principal critério para a divisão
das turmas é o conhecimento que cada um possui.
Nem sempre o professor acompanha a turma ao
longo do ciclo.
Os alunos seriam organizados em grupos de
referência, a cada ciclo. O critério para a construção
dos grupos seria a idade dos alunos, tentando garantir
assim, os interesses pertinentes a cada faixa etária. O
grupo permaneceria com o mesmo professor ao longo
de todo o ciclo.
Reorientação da Aprendizagem: alunos retidos ao
final do ciclo são reorganizados em novas turmas (só
de alunos retidos) ou atendidos em mini-grupos,
permanecendo mais um ano no mesmo ciclo. Nem
sempre ao final de um ano o aluno consegue alcançar
os objetivos daquele ciclo. Muitas vezes é retido
mais uma vez.
Estratégias de apoio aos alunos de 1º e 2º ciclos
CEMOA: alunos retidos e/ou com distorção idade-
série são atendidos no CEMOA. Deixam de estar em
seu grupo comunitário de referência e na maioria das
vezes permanece no grupo por três anos, já que seus
conhecimentos não correspondem a sua escolaridade
oficial.
Exemplo: alunos de 14 anos, muitas vezes
finalizam a primeira etapa do Ens. Fundamental aos
16 ou 17 anos de idade, pois mesmo chegando
matriculado no 5º ano precisa resgatar
conhecimentos muito iniciais.
Reagrupamentos: estratégia que permite (mas não é
obrigatória) reorganizar os alunos desde o início de
cada ciclo. O objetivo não é especificamente atender
aqueles que têm dificuldade, mas possibilitar o
entrosamento dos alunos a partir das suas
possibilidade e interesses, inclusive permitindo a
troca de saberes entre eles.
Exemplo 1: reunir num reagrupamento alunos que
tem bastante domínio de um conceito com a aqueles
que têm dificuldade em compreender aquele
conceito, a fim de desenvolvermos a possibilidade de
monitoramento.
Exemplo 2: construir um reagrupamento com base
nos interesses de determinada área, ou seja, alunos
que possuem fortes habilidades para artes,
matemática, ciências etc, podem estar agrupados para
desenvolver um projeto com um determinado
professor que também tenha interesse por aquele
tema.
A estratégia do reagupamento não tem período, nem
quantidade de alunos fixa. Pode acontecer, de acordo
com o objetivo para cada grupo. Os grupos poderão
ter alunos com idades diferentes, já que aqui o
critério é outro.
Os grupos formados para os reagupamentos serão
divididos entre os próprios professores e com os
professores destinados para essa tarefa.
Equipe
Pedagógica
A Equipe Técnico Pedagógica de cada escola é
composta por Orientadores e Supervisores
Educacionais. Estes são responsáveis por
acompanhar o trabalho de cada professor, por realizar
os conselhos de Classe etc
A Equipe passa a ser composta não pela ETP, mas
também por professores do mesmo ciclo, sendo
denominada de Equipe de Referência do Ciclo. Mais
do que uma mudança burocrática, a nova constituição
visa compartilhar com todos a responsabilidade e as
possibilidades de ação.
236
Como a escola hoje é organizada Proposta em discussão
Sala de Informática
Assim como o professor de leitura o professor de
informática tem sido o maior, senão único,
interlocutor com a tecnologia. Tentando aproximar-
se do trabalho cotidiano busca desenvolver propostas
que considerem o conteúdo que está sendo
trabalhado em sala de aula. Pontualmente, também
desenvolve projetos.
O conhecimento da tecnologia nos dias atuais é
fundamental para qualquer indivíduo, assim todos os
professores precisam se apropriar da informática,
enquanto possibilidade de acesso a múltiplas
linguagens. Em parceria com um interlocutor mais
experiente, todos os professores precisam
acompanhar seus alunos no que se refere ao
aprendizado desta nova linguagem.
Sala de Leitura
O acervo de livros em geral é utilizado com maior
periodicidade pelo professor de sala de leitura, que se
tornou o principal interlocutor do processo de
formação de leitores. É ele que, geralmente,
desenvolve projetos, acompanha a realização do
concurso de poesia etc.
Mais do que um professor, todos os demais precisam
se tornar um modelo de leitor para seus alunos. Para
isso é essencial que conheçam o acervo, vão com os
alunos à sala de leitura, leiam com e para os seus
alunos, isto é, se tornem os reais mediadores de
leitura. É preciso encarar a formação leitora e
escritora como prioridade e isso não pode ser tarefa
de um único professor.
Avaliação e Registros
Apesar de já realizarmos avaliações que não se
restrinjam os exames pontuais, em geral, são poucos
os registros guardados pelo professor, ao longo do
ciclo, que possibilite dizer com segurança quais são
os conhecimentos de domínio de cada aluno, seu
avanço real e as dificuldades de caráter pedagógico.
São poucos também os registros do próprio professor
sobre as estratégias e intervenções realizadas ao
longo do processo de ensino e aprendizagem.
Numa proposta de ciclos, é essencial desenvolver
formas de avaliação e registro que permitam
acompanhar e avaliar o desenvolvimento conceitual,
procedimental e atitudinal dos alunos. Muitos são as
formas de fazer tais registros, desde as avaliações
pessoais do professor até as provas e testes, além de
fichários que acompanhe o aluno ao longo do ciclo,
portifólios etc. O imprescindível é que tais registros
sejam feitos de forma organizada e sistemática a fim
de permitir a reflexão sobre as estratégias utilizadas
pelo professor e o desenvolvimento do aluno.
Espaço de avaliação dos alunos
Conselho de Classe: momento em que os professores
se reúnem com a ETP a fim de detectar as
dificuldades de aprendizagem e relacionamento dos
alunos. O foco é a turma, os objetivos alcançados, os
conteúdos trabalhados etc. Acontece bimestralmente,
constituindo-se em quatro encontros anuais.
Conselho de Avaliação de Ciclo: instância de
reflexão e deliberação, isto é, momento em que a
equipe de Referência do Ciclo, além de
representantes de alunos e responsáveis se reúne para
detectar quais os limites encontrados ao decorrer do
período para o trabalho daquele ciclo e elaborar
estratégias específicas e sistematizadas para o
trabalho no próximo período letivo. Aconteceria
trimestralmente, constituindo-se em três encontros
anuais.
237
Anexo 10 - Ofício enviado para as Unidades Escolares
Superintendência de Desenvolvimento de Ensino
Ofício Circular FSDE nº 006/2007
Niterói, 02 de fevereiro de 2007.
Senhor(a) Diretor(a), professores(as), pedagogos(as) e funcionário(as) da Rede
Municipal de Educação,
O presente documento, que hoje encaminhamos a toda Rede Municipal de
Educação, é o resultado do trabalho realizado de forma coletiva, nos anos de 2005 e 2006. É
uma primeira versão do texto final da Proposta Pedagógica da Secretaria Municipal de
Educação e da Fundação Municipal de Educação.
É um documento que ainda precisa ser revisto e aperfeiçoado, por isso solicitamos
que, até o dia 27 de abril, sejam encaminhadas à FME as propostas de emendas, seja de
caráter supressivo, substitutivo ou aditivo, produzidas a partir do debate em sua Unidade.
Temos certeza de que a reflexão teórico-prática desenvolvida pelos profissionais
de sua escola contribuirá em muito para o necessário aperfeiçoamento do processo de
construção coletiva desta proposta.
Certo de sua atenção e desejando que o ano letivo de 2007 seja repleto de
conquistas.
Firmo,
Cordialmente,
ARMANDO DE CASTRO CERQUEIRA AROSA
SUBSECRETARIA DE PROJETOS ESPECIAIS
SUPERINTENDÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO DE ENSINO
238
Anexo 11 - PORTARIA 125/2008
FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
ATO DO PRESIDENTE
O PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI, no uso de suas atribuições legais e considerando:
a) o disposto na legislação, notadamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96, e
nos diplomas legais em vigor no Município de Niterói;
b) a necessidade permanente de aprimorar, reorganizar e qualificar a Rede Municipal de Educação de Niterói,
com vistas ao sucesso escolar dos alunos e ao aperfeiçoamento das condições de trabalho e de formação dos
profissionais da educação;
c) o amplo e aprofundado diálogo construído com a Rede
Municipal de Educação de Niterói sobre a construção da
Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”, notadamente no último triênio,
R E S O L V E :
Capítulo I
Da Organização
Art. 1º: Fica instituída a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”, que se regerá pela presente Portaria e por
outros documentos e dispositivos legais que a complementam, com o objetivo de fundamentar o trabalho
pedagógico cotidiano realizado pelas unidades de ensino fundamental e de educação infantil da Rede Municipal
de
Educação de Niterói.
§ 1º: A Rede Municipal de Educação de Niterói é composta por Unidades de Ensino Fundamental e/ou de
Educação
Infantil, sob a forma de Escolas Municipais e de Unidades Municipais de Educação Infantil, com atuação
inclusive em ambiente hospitalar; por Telecentros, entendidos como unidades do Programa de Educação e
Inclusão Digital; por Bibliotecas Populares Municipais e por Creches Comunitárias vinculadas ao Programa
Criança na Creche.
§ 2º: As Unidades Municipais de Educação Infantil e as
Escolas Municipais atuam na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e na Educação de Jovens, Adultos e
Idosos, conforme o caso, sendo pedagogicamente organizadas em Ciclos.
§ 3º: Entende-se por Ciclo o conjunto de Períodos Letivos que organiza a prática pedagógica, estendendo-se
por, no mínimo, um ano civil.
§ 4º: Entende-se por Período Letivo o total de 200 dias de atividades pedagógicas, com programação escolar
desenvolvida e freqüência dos alunos apurada sob a responsabilidade direta de um Professor.
§ 5º: Do ponto de vista pedagógico, Ciclo é a forma de organização do currículo, do espaço e do tempo escolar,
baseada nas características biológicas e sócio-culturais do desenvolvimento humano, engendrando a realização
de um trabalho pedagógico em que a idade, os interesses comuns e os aspectos cognitivo e sócio-afetivo dos
alunos são os eixos articuladores do processo de construção de valores, de conhecimentos e de práticas sociais.
Art. 2º: A Educação Básica, no âmbito da Rede Municipal de Niterói, será organizada da seguinte forma:
I - Educação Infantil, para atendimento de alunos de 4 meses a 5 anos e 11 meses de idade, organizada em um
único Ciclo, denominado Ciclo Infantil, com duração de 6 Períodos Letivos, sendo oferecida nos regimes de
horário integral ou parcial.
II - Ensino Fundamental, para atendimento de alunos de 6 a 14 anos de idade, organizado em 4 Ciclos,
perfazendo um total de 9 Períodos Letivos, sendo oferecido em regime de horário integral ou parcial.
III - Educação de Jovens, Adultos e Idosos, para atendimento de alunos com, no nimo, 15 anos de idade,
organizada em 4 Ciclos, perfazendo um total de 5 Períodos Letivos, sendo oferecida em regime de horário
parcial.
Parágrafo Único: Do ponto de vista epistemológico e pedagógico, a Educação da Infância, no âmbito da
Rede Municipal de Educação de Niterói, compreenderá as etapas de Educação Infantil e do e ciclos do
Ensino Fundamental, abrangendo alunos de 0 a 12 anos de idade.
Art. 3º: Os alunos de cada Ciclo serão organizados em Grupos de Referência, a partir dos quais se desenvolverá
o trabalho pedagógico.
§ 1º: Entende-se por Grupo de Referência o conjunto de alunos organizado no início de cada Período Letivo,
mediante processo de Agrupamento.
§ 2º: Entende-se por Agrupamento o processo inicial de organização dos alunos nos Grupos de Referência.
§ 3º: Na Educação Infantil, o critério para Agrupamento será exclusivamente etário, agrupando-se os alunos com
idades contíguas.
§i4º: No Ensino Fundamental, o critério para Agrupamento será predominantemente etário, agrupando-se os
alunos com idades contíguas, também podendo ser considerados os critérios cognitivo e sócio-afetivo, mediante
parecer emitido pela Equipe de Articulação Pedagógica e pela Equipe de
Referência do Ciclo.
§ 5º: Na Educação de Jovens, Adultos e Idosos, o critério para Agrupamento será cognitivo e sócioafetivo.
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§ 6º: Poderão ser formados Grupos de Referência, constituídos apenas por alunos surdos, cursando o e o
Ciclos do Ensino Fundamental, agrupados segundo os critérios estabelecidos para este nível, observada a
modulação máxima de 15 alunos por Grupo de Referência.
§ 7º: Os alunos surdos ou deficientes auditivos de e Ciclos serão incluídos em Grupos de Referência
compostos por alunos ouvintes e contarão com a presença de um Agente de Educação Bilíngüe proficiente em
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), observada a modulação de até 10 alunos surdos ou deficientes auditivos
por Grupo de Referência.
Art. : O Ciclo Infantil, com duração de 6 Períodos Letivos, será composto por Grupos de Referência
organizados, com base no quantitativo máximo de alunos por Grupo, em função do espaço da sala de aula e das
demais dependências da Unidade Escolar, conforme o que se segue:
I - Grupos de Referência com até 12 alunos de 4 meses até 11 meses;
II - Grupos de Referência com até 12 alunos de 1 ano até 1 ano e 11 meses;
III - Grupos de Referência com até 16 alunos de 2 anos até 2 anos e 11 meses;
IV - Grupos de Referência com até 20 alunos de 3 anos até 3 anos e 11 meses;
V - Grupos de Referência com até 20 alunos de 4 anos até 4 anos e 11 meses;
VI - Grupos de Referência com até 20 alunos de 5 anos até 5 anos e 11 meses.
Parágrafo Único: Em situações excepcionais e transitórias, a modulação acima poderá ser ultrapassada, com a
expressa anuência da Fundação Municipal de Educação de Niterói, ouvida a Direção da
Unidade Escolar.
Art. 5º: Os Ciclos do Ensino Fundamental serão organizados como se segue:
I - o 1º Ciclo terá duração de três Períodos Letivos e atenderá alunos de 6, 7, 8 ou 9 anos de idade;
II - o 2º Ciclo terá duração de dois Períodos Letivos e atenderá alunos de 9, 10, 11 ou 12 anos de idade;
III - o 3º Ciclo terá duração de dois Períodos Letivos e atenderá alunos de 11, 12, 13 ou 14 anos de idade;
IV - o Ciclo terá duração de dois Períodos Letivos e atenderá alunos a partir de 13 anos de idade, com limite
estimado em 16 anos, observados os critérios pedagógicos estabelecidos pela Equipe de Referência do Ciclo.
Art. 6º: Os alunos do Ensino Fundamental serão organizados em Grupos de Referência, observando-se o
quantitativo máximo de alunos por Grupo, em função do espaço da sala de aula e das demais dependências da
Unidade Escolar, conforme o que se segue:
a) os Grupos de Referência do 1º Ciclo terão até 25 alunos;
b) os Grupos de Referência do 2º Ciclo terão até 28 alunos;
c) os Grupos de Referência do 3º Ciclo terão até 32 alunos;
d) os Grupos de Referência do 4º Ciclo terão até 35 alunos.
Parágrafo Único: Em situações excepcionais e transitórias, quando estiver sob risco o direito constitucional à
educação e o atendimento no âmbito do Ensino Fundamental, etapa obrigatória da Educação Básica, a
modulação acima poderá ser ultrapassada, com a expressa anuência da Fundação Municipal de Educação de
Niterói (FME), ouvida a Direção da Unidade Escolar.
Art. 7º: Os Ciclos da Educação de Jovens, Adultos e Idosos serão organizados como se segue:
I - o 1º Ciclo terá duração de dois Períodos Letivos;
II - o 2º Ciclo terá duração de um Período Letivo;
III - o 3º Ciclo terá duração de um Período Letivo;
IV - o 4º Ciclo terá duração de um Período Letivo.
Art. 8º: Os alunos da Educação de Jovens, Adultos e Idosos serão organizados em Grupos de Referência,
observando-se o quantitativo máximo de alunos por Grupo, em função do espaço da sala de aula, conforme o
que se segue:
a) os Grupos de Referência do 1º Ciclo terão até 25 alunos;
b) os Grupos de Referência do 2º Ciclo terão até 28 alunos;
c) os Grupos de Referência do 3º Ciclo terão até 32 alunos;
d) os Grupos de Referência do 4º Ciclo terão até 35 alunos.
Parágrafo Único: Em situações excepcionais e transitórias, a modulação acima poderá ser ultrapassada, com a
expressa anuência da Fundação Municipal de
Educação de Niterói, ouvida a Direção da Unidade Escolar.
Art. 9º: A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais (NEE) em cada Grupo de
Referência obedecerá à seguinte composição:
I - na Educação Infantil:
a) Grupos de Referência com alunos de 4 meses a 11 meses serão compostos por 6 alunos e 2 com NEE,
totalizando 8 alunos;
b) Grupos de Referência com alunos de 1 ano até 1 ano e
11 meses serão compostos por 6 alunos e 2 com NEE, totalizando 8 alunos;
c) Grupos de Referência com alunos de 2 anos até 2 anos e 11 meses serão compostos por 10 alunos e 2 com
NEE, totalizando 12 alunos;
d) Grupos de Referência com alunos de 3 anos até 3 anos e 11 meses serão compostos por 15 alunos e 2 com
NEE, totalizando 17 alunos;
e) Grupos de Referência com alunos de 4 anos a 4 anos e
11 meses serão compostos por 15 alunos e 2 com NEE, totalizando 17 alunos;
f) Grupos de Referência com alunos de 5 anos a 5 anos e 11 meses serão compostos por 15 alunos e 2 com
NEE, totalizando 17 alunos.
II - no Ensino Fundamental e na Educação de Jovens, Adultos e Idosos:
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a) o 1º Ciclo será composto por 21 alunos e 2 com NEE, totalizando 23 alunos;
b) o 2º Ciclo será composto por 24 alunos e 2 com NEE, totalizando 26 alunos;
c) o 3º Ciclo será composto por 28 alunos e 2 com NEE, totalizando 30 alunos;
d) o 4º Ciclo será composto por 31 alunos e 2 com NEE, totalizando 33 alunos.
Art. 10: Além do Agrupamento, o aluno poderá passar por processos de Reagrupamento, com a finalidade de
realizar atividades que favoreçam seu desenvolvimento cognitivo, cultural, social e afetivo.
§ 1º: Entende-se por Reagrupamento o processo de deslocamento temporário dos alunos de seus Grupos de
Referência para outros Grupos, planejados e formados a partir de potencialidades, necessidades e interesses
dos alunos, observados os aspectos cognitivos, lingüísticos, psicológicos, sociais e afetivos, sem prejuízo do
vínculo do aluno com o seu Grupo de Referência, para o qual sempre retornará após cada Reagrupamento.
§ 2º: O Reagrupamento poderá ocorrer entre todos os Grupos de Referência do Ciclo e/ou entre os Ciclos,
independentemente da idade dos alunos, com periodicidade definida no seu planejamento, podendo ser diário,
semanal, quinzenal ou mensal.
§ 3º: Os Reagrupamentos, nos casos de atendimento em Unidades de Educação Infantil de horário parcial e
Unidades de Ensino Fundamental, deverão ser realizados predominantemente no mesmo turno em que estudam
os alunos reagrupados.
§ 4º: Nas Unidades de Ensino Fundamental que também atendam alunos de Educação Infantil, é facultativa a
realização de Reagrupamentos entre alunos de Grupos de Referência do Ciclo Infantil e do
Ensino Fundamental.
Art. 11: O Reagrupamento deverá ser realizado:
I- a partir da avaliação contínua do trabalho pedagógico desenvolvido, da regularidade dos encaminhamentos e
dos resultados alcançados;
II- a partir do planejamento de propostas de atividades diversificadas, de estratégias metodológicas a serem
adotadas, do tempo de duração e dos recursos materiais necessários, levando-se em conta a diversidade de
conhecimentos e ritmos de desenvolvimento dos alunos envolvidos.
Parágrafo Único: Fica vedado às Unidades de Educação Infantil o emprego do Reagrupamento de alunos para
desenvolver quaisquer trabalhos que possuam caráter compensatório, preparatório ao Ensino Fundamental ou
de reforço de aprendizagem.
Capítulo II
Das Equipes
Art. 12: Cada Unidade de Educação será pedagogicamente acompanhada por uma Equipe de
Referência da FME, constituída por profissionais da Superintendência de Desenvolvimento Pedagógico da FME.
Art. 13: Cada Ciclo deverá ser confiado a uma Equipe de Referência, constituída pelos Professores do Ciclo e
por um Pedagogo, Supervisor Educacional ou Orientador Educacional da Unidade Escolar, bem como pelo
Agente Educador Infantil, no caso do Ciclo Infantil, conforme a composição do quadro profissional da Unidade.
§ 1º: O Professor que atua na Sala de Recursos integrará as Equipes de Referência dos Ciclos, mas não será
Professor de nenhum Grupo de Referência, cabendo-lhe participar dos Reagrupamentos como agente de
inclusão, acompanhando os alunos com NEE.
§ 2º: A Equipe de Referência do Ciclo terá como incumbência o acompanhamento pedagógico dos Grupos de
Referência, envolvendo a realização dos Agrupamentos e Reagrupamentos, os processos avaliativos, a
construção de critérios para organização das diferentes dinâmicas pedagógicas, a produção de atividades
diversificadas relativas às diferentes demandas do cotidiano escolar e todas as demais ações pedagógicas
desenvolvidas nas Unidades Escolares.
§ 3º: É responsabilidade da Equipe de Referência do Ciclo Infantil o planejamento, a implementação e o
acompanhamento do processo educativo, baseados em ações pedagógicas que tenham como eixos centrais o
cuidado e a ludicidade, sendo preferencialmente desenvolvidas por meio de atividades artístico-culturais.
§ 4º: É responsabilidade da Equipe de Referência de cada Ciclo do Ensino Fundamental e da Educação de
Jovens, Adultos e Idosos o planejamento, a implementação e o acompanhamento do processo educativo,
baseados em ações pedagógicas que tenham como eixos centrais a aquisição da leitura e da escrita e a
afirmação da cidadania, sendo desenvolvidas por meio de atividades que estimulem a dialogicidade, a
curiosidade, a criticidade, a reflexividade, a solidariedade e a participação cidadã.
§ 5º: Os profissionais que integram a Equipe de Referência do Ciclo atuarão em diferentes espaços e atividades,
de acordo com o Projeto Político-Pedagógico da Unidade Escolar e com o Plano de Ação anualmente elaborado
pela comunidade escolar, observadas as diretrizes fixadas pela Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”.
§ 6º: O Pedagogo, o Supervisor Educacional e o Orientador Educacional poderão compor mais de uma Equipe
de Referência do Ciclo, de acordo com a necessidade de cada Unidade Escolar, a disponibilidade dos
profissionais e as atividades a serem desenvolvidas.
§ 7º: O acompanhamento permanente do trabalho pedagógico desenvolvido em cada Ciclo também é de
responsabilidade da Direção da Unidade Escolar, a quem caberá responder sistematicamente pelas ações
pedagógicas, juntamente com as Equipes de Referência dos Ciclos, mobilizando os esforços necessários à sua
efetivação.
§ 8º: A Equipe de Referência do Ciclo poderá ser acrescida de até 25% de professores em relação ao número de
Grupos de Referência do Ciclo, com a finalidade de favorecer o desenvolvimento de redes colaborativas de
ensino e de aprendizagem na Unidade de Educação.
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Art. 14: Todos os Grupos de Referência serão de responsabilidade da Equipe de Referência do Ciclo, mas cada
Grupo de Referência conta com a atuação específica de um docente denominado Professor de Grupo de
Referência.
Parágrafo Único: O Professor de Grupo de Referência compõe a Equipe de Referência do Ciclo e acompanha,
de forma específica, o trabalho realizado com um determinado Grupo de Referência.
Art. 15: O tempo de atuação do Professor em um mesmo
Ciclo considerará o que se segue:
I - os Professores do Ciclo Infantil realizarão seu trabalho, preferencialmente, nos mesmos Grupos de
Referência, por no mínimo três períodos letivos consecutivos;
II - os Professores de Ciclo do Ensino Fundamental realizarão seu trabalho, preferencialmente, nos mesmos
Grupos de Referência, por, no mínimo, três períodos letivos consecutivos;
III - os Professores de 2º, e Ciclos do Ensino Fundamental realizarão seu trabalho, preferencialmente, nos
mesmos Grupos de Referência, por, no mínimo, dois períodos letivos consecutivos;
IV - os Professores de Ciclo da Educação de Jovens, Adultos e Idosos realizarão seu trabalho,
preferencialmente, nos mesmos Grupos de Referência, por, no mínimo, dois períodos letivos consecutivos;
V - os Professores de 2º, 3º e Ciclos da Educação de Jovens, Adultos e Idosos realizarão seu trabalho,
preferencialmente, nos mesmos Grupos de Referência, por, no mínimo, um período letivo.
Parágrafo Único: A substituição de Professor de
Grupo de Referência no decorrer do Ciclo poderá ser realizada mediante proposta da Equipe de Referência do
Ciclo, devidamente justificada e documentada, aprovada pela Equipe de Articulação Pedagógica.
Art. 16: Em cada Unidade de Educação deverá ser instituída uma Equipe de Articulação Pedagógica (EAP)
constituída pelo Diretor e/ou Diretor-Adjunto; pelo Pedagogo, Orientador Educacional e/ou Supervisor
Educacional; pelo Secretário Escolar e pelo
Coordenador de Turno, conforme a composição do quadro profissional da unidade.
Parágrafo Único: Caberá à EAP a organização e a gestão da Unidade de Educação, buscando favorecer a
realização do trabalho pedagógico, articulando o coletivo escolar em torno da definição de objetivos sócio-
políticos e educativos e orientando o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem.
Art. 17: Compete ao Pedagogo, ao Orientador Educacional e/ou ao Supervisor Educacional a articulação do
trabalho pedagógico, favorecendo o estudo, a organização e o acompanhamento sistemático da prática
educativa intencional que se realiza na unidade, sob a responsabilidade do Diretor.
§ 1º: O Pedagogo, o Orientador Educacional e/ou o
Supervisor Educacional terão, pelo menos, duas vertentes de atuação, sendo uma focada no processo mais
amplo de avaliação e planejamento da Unidade de Educação e outra, na articulação das Equipes de
Referência dos Ciclos.
§ 2º: O Pedagogo, o Orientador Educacional e/ou o Supervisor Educacional poderão atuar em mais de um Ciclo,
com a responsabilidade de coordenar as seguintes ações:
I - dinamização do Conselho de Avaliação e Planejamento da Unidade de Educação (CAP-UE);
II - dinamização do Conselho de Avaliação e Planejamento do Ciclo (CAP-CI);
III - organização do tempo e do espaço escolar;
IV - definição dos critérios de Agrupamento e de Reagrupamento de alunos;
V - organização dos Grupos de Referência;
VI - definição de estratégias de atendimento às necessidades de aprendizagem dos alunos e de avaliação do
processo, considerados os objetivos fixados;
VII - formação continuada para o desenvolvimento pessoal e profissional dos profissionais da Unidade de
Educação;
VIII - acompanhamento da vida escolar dos alunos;
IX construção e/ou reconstrução do Projeto Político- Pedagógico da Unidade de Educação em consonância
com a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”, referência a ser considerada em todas as circunstâncias
pedagógicas.
§ 3º: Como parte da carga horária semanal do Pedagogo, do Orientador Educacional e/ou do Supervisor
Educacional, prevista pela legislação em vigor, deverá haver coincidência de quatro horas para planejamento e
avaliação da dinâmica organizacional da Unidade de Educação.
Art. 18: Ao Secretário Escolar competirá subsidiar a
Equipe de Referência do Ciclo, cuidando dos registros dos Agrupamentos e Reagrupamentos, observando o
fluxo de mobilidade dos alunos, a partir das indicações da própria
Equipe de Referência e da Equipe de Articulação
Pedagógica (EAP).
Parágrafo Único: Compete ao Agente de Administração
Educacional organizar a documentação dos alunos, no que diz respeito a sua pasta individual, e assessorar o
Secretário Escolar em todas as atividades referentes ao desenvolvimento do sistema de escrituração e arquivo
disponibilizado pela FME.
Art. 19: Cabe ao Coordenador de Turno assessorar a Direção na consecução de atividades que garantam a
movimentação de alunos, professores e demais profissionais, no sentido de assegurar o funcionamento cotidiano
da Unidade de Educação.
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Capítulo III
Do Planejamento, do Currículo e da Avaliação
Art. 20: Entende-se por Planejamento o processo, contínuo e dinâmico, de reflexão, projeção, tomada de
decisão, implementação e acompanhamento de ações referentes à Unidade de Educação, no seu contexto
global e no que se refere especificamente ao processo de ensinar e de aprender.
Art. 21: Cada Unidade de Educação deverá constituir um
Conselho de Avaliação e Planejamento (CAP-UE), a partir do qual se organizará o seu processo de
Planejamento.
§ 1º: O Conselho de Avaliação e Planejamento (CAP-UE) é a instância responsável pela implementação do
processo de avaliação e planejamento da Unidade de Educação, incumbindo-se de:
I - avaliar, elaborar, implementar e acompanhar o Projeto Político-Pedagógico;
II - avaliar, elaborar, implementar e acompanhar o Plano de Ação Anual;
III - avaliar, elaborar, implementar e acompanhar o Plano de Trabalho de cada Ciclo.
§ 2º: O Projeto Político-Pedagógico da Unidade de
Educação é um documento que registra concepções, finalidades, intenções, metas, objetivos e formas de
mediação e de organização do trabalho pedagógico.
§ 3º: No processo de elaboração de seu Projeto Político-
Pedagógico, a Unidade de Educação deverá:
I - priorizar a participação da comunidade escolar, garantindo a representatividade dos diferentes segmentos que
a integram;
II elaborar o Projeto para um período pluri-anual, tendo como referência a Proposta Pedagógica “Escola de
Cidadania”.
§ 4º: O Plano de Ação Anual da Unidade de Educação é um documento elaborado no final ou no início de cada
ano civil, contendo as metas e as estratégias organizativas para implementação do trabalho pedagógico do ano a
que se refere, de acordo com o Projeto Político-Pedagógico da Unidade e com a Proposta Pedagógica “Escola
de Cidadania”.
§ 5º: O Plano de Trabalho do Ciclo é o documento que expressa o trabalho pedagógico a ser desenvolvido em
cada Ciclo, registrando a análise da realidade, os objetivos a serem atingidos no processo de construção de
valores, de conhecimentos e de práticas sociais e as formas de mediação didática, em consonância com a
Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”.
Art. 22: O Conselho de Avaliação e Planejamento (CAP-UE) será composto pelos integrantes do
Conselho Escola-Comunidade (CEC), da Equipe de Articulação Pedagógica (EAP) e das Equipes de Referência
de cada Ciclo.
§ 1º: Caberá à Equipe de Articulação Pedagógica (EAP), sob a Presidência do Diretor da Unidade de
Educação, a coordenação do Conselho de Avaliação e Planejamento (CAP-UE).
§ 2º: O Conselho de Avaliação e Planejamento (CAPUE) reunir-se-á no decorrer do Período Letivo, em datas a
serem definidas pelo Calendário da Unidade de Educação, sem prejuízo das reuniões semanais de avaliação e
planejamento.
Art. 23: As reuniões semanais de avaliação e planejamento, sessões ordinárias do CAP- UE, constituem-se em
espaço/tempo de afirmação da avaliação como processo contínuo, tendo como foco a elaboração, a
implementação e o acompanhamento do Projeto Político-Pedagógico, do Plano de Ação Anual e do Plano de
Trabalho de cada Ciclo, bem como a formação continuada dos profissionais da Unidade de Educação.
§ 1º: O horário reservado às reuniões semanais de avaliação e planejamento destina-se a todos os profissionais
das Equipes de Referência dos Ciclos e de Articulação Pedagógica, sendo considerados como de freqüência
obrigatória, inclusive para os professores do e do 4º ciclos que não atuam em sala de aula no dia das
reuniões, e devendo a ausência do profissional ser computada como falta ao serviço, naquele horário.
§ 2º: O Professor com duas matrículas ou lotado em regime de 40 horas ou, ainda, em regime de dupla regência,
com exercício na mesma Unidade de Educação, ou em outra, deverá freqüentar as reuniões de avaliação e
planejamento, em todas as unidades e turnos em que atue.
Art. 24: No processo de organização de seus currículos, as Unidades de Educação deverão tomar como
referência a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”, em especial os princípios e os eixos de estudo e
pesquisa que a fundamentam.
Parágrafo Único: As diretrizes curriculares e didáticas que integram a Proposta Pedagógica “Escola de
Cidadania” serão objeto de Portaria específica, que fixará os princípios e os eixos de estudo e pesquisa que
fundamentam o currículo, os objetivos gerais por ciclo e as orientações didáticas para o desenvolvimento do
trabalho pedagógico.
Art. 25: A avaliação é processo permanente implementado ao longo do desenvolvimento das atividades
pedagógicas empreendidas pela Unidade de Educação, em seus diversos momentos, para subsidiar as ações de
ensino e de aprendizagem, considerando a necessidade de utilização de procedimentos e instrumentos
diversificados que favoreçam a interpretação qualitativa do percurso e a evolução de cada aluno.
Parágrafo Único: A orientação do processo avaliativo é de responsabilidade da Equipe de Referência do Ciclo,
que deverá observar as necessidades individuais e coletivas dos alunos e de seus Grupos de Referência,
articulando ações processuais que favoreçam a construção de valores, de conhecimentos e de práticas sociais,
de modo a evitar e/ou sanar situações de dificuldade ou de inadaptação vividas pelos sujeitos desse processo.
Art. 26: O Registro da Avaliação do aluno será organizado de duas formas:
I - Ao longo do processo, por meio de:
a) anotações pessoais;
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b) montagem de portifólios;
c) exercícios avaliativos;
d) trabalhos em grupo;
e) pesquisas;
f) seminários;
g) fichas de avaliação e auto-avaliação do aluno;
h) fichário que acompanhe o aluno;
i) diários reflexivos do trabalho docente ou qualquer outro instrumento cumulativo de informações que subsidiem
a elaboração do Relatório Avaliativo.
II - Em forma de Relatório Avaliativo do aluno, na seguinte periodicidade:
a) semestral para a Educação Infantil;
b) anual para o Ensino Fundamental e para a Educação de
Jovens, Adultos e Idosos.
Art. 27: O Relatório Avaliativo do aluno, cujo modelo será disponibilizado pela FME, deverá registrar:
I - os objetivos alcançados naquele período letivo, com observações acerca do processo em que se deu a
construção desses objetivos;
II - os objetivos não alcançados naquele período letivo, com observações acerca das circunstâncias em que não
se deu a construção desses objetivos;
III - os procedimentos adotados pelo Professor do Grupo de Referência do aluno e pela Equipe de Referência do
Ciclo para a superação dos entraves observados no decorrer do processo, bem como aqueles adotados para
potencializar os interesses e as capacidades manifestadas pelo aluno.
§ 1°: Cabe ao Professor do Grupo de Referência a elaboração do Relatório Avaliativo de cada aluno, que será
submetido à apreciação da Equipe de Referência do Ciclo.
§ : O Relatório Avaliativo subsidiará o planejamento de ações de desenvolvimento da aprendizagem, devendo
ser mantido atualizado e disponível.
§ 3º: Os registros avaliativos construídos ao longo do processo e o Relatório Avaliativo servirão de base para a
emissão de documentos oficiais, em caso de transferência do aluno para outra unidade escolar, no decorrer do
Ciclo.
§ 4º: Os Relatórios Avaliativos devem fazer parte da pasta do aluno e, em situação de transferência, a sua última
versão seguirá em anexo à documentação encaminhada, ficando uma cópia no arquivo da Unidade de
Educação.
§ 5º: No que se refere ao Ciclo Infantil:
a) os registros avaliativos construídos ao longo do processo e os Relatórios Avaliativos servirão de base para
acompanhamento do desenvolvimento global do aluno no decorrer do Ciclo Infantil e como subsídio para a sua
inserção no 1º Ciclo do Ensino Fundamental;
b) a avaliação na Educação Infantil não terá caráter classificatório nem de promoção ao Ensino Fundamental,
mesmo nos casos de alunos com necessidades educacionais especiais.
§ 6º: No que se refere ao Ensino Fundamental e à Educação de Jovens, Adultos e Idosos, os registros
avaliativos construídos ao longo do processo e os Relatórios Avaliativos servirão de base para o
acompanhamento do desenvolvimento global do aluno em cada Ciclo e como subsídio para a sua inserção no
Ciclo subseqüente.
Art. 28: A Unidade de Educação deverá constituir um Conselho de Avaliação e Planejamento para cada Ciclo
(CAP-CI), que coordenará o processo de avaliação e planejamento no âmbito do Ciclo.
§ 1º: O Conselho de Avaliação e Planejamento do Ciclo (CAP-CI) é uma instância de reflexão e de deliberação,
que tem por finalidade levantar dados significativos sobre o processo de ensino e de aprendizagem, com vistas à
reorientação do trabalho pedagógico.
§ 2º: O Conselho de Avaliação e Planejamento do Ciclo (CAP-CI) será composto pelos integrantes do Conselho
Escola-Comunidade (CEC), da Equipe de Articulação Pedagógica (EAP), da Equipe de Referência do Ciclo e da
representação de alunos do Ciclo.
§ 3º: Caberá à Equipe de Articulação Pedagógica (EAP), sob a Presidência da Direção da Unidade de
Educação, a coordenação do Conselho de Avaliação e Planejamento do Ciclo (CAP-CI).
§ 4º: Os dados revelados no decorrer do processo avaliativo de cada Grupo de Referência de um
determinado Ciclo constituir-se-ão em objeto de análise e deliberação do Conselho de Avaliação e
Planejamento do Ciclo (CAP-CI), a reunir-se em três sessões anuais para o Ciclo Infantil, para os quatro Ciclos
do Ensino Fundamental e para os quatro Ciclos da Educação de Jovens, Adultos e Idosos.
§ 5º: Caberá ao Conselho de Avaliação e Planejamento do Ciclo (CAP-CI) a indicação sobre o planejamento e a
realização de atividades pedagógicas diferenciadas para atender os alunos que, ao longo do Ciclo, se
distanciarem do percurso de aprendizagem do seu Grupo de Referência, observados os objetivos do Ciclo.
§ 6º: As atividades pedagógicas diferenciadas poderão ser desenvolvidas individualmente ou coletivamente, no
próprio Grupo de Referência ou em Reagrupamentos.
§ 7°: As deliberações do Conselho de Avaliação e Planejamento do Ciclo (CAP-CI) sobre a promoção do aluno
para o Ciclo subseqüente ou sobre a sua permanência no Ciclo em que se encontra por um período adicional
deverão ser homologadas pelo Conselho de Avaliação e Planejamento da Unidade de Educação (CAP-UE).
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Capítulo IV
Da Educação Especial
Art. 29: A Educação Especial se dá na perspectiva da inclusão, observada a legislação vigente sobre a questão,
considerando-se aluno com necessidades educacionais especiais (NEE) aquele que apresenta, em caráter
permanente ou temporário, deficiência física, sensorial ou mental, síndromes ou altas habilidades.
§ 1º: Será considerado como aluno com NEE aquele que apresentar, no ato de matrícula, declaração da família
ou, posteriormente, da Equipe de Referência do Ciclo, após avaliação realizada pela Equipe de Referência da
FME, requerendo-se, sempre que necessário, a confirmação clínica da especificidade apontada.
§ 2º: Enquanto ocorre a investigação clínica, a Equipe de Referência da FME orientará as Equipes de Referência
das Unidades de Educação sobre o planejamento e a realização de atividades pedagógicas que favoreçam o
desenvolvimento do aluno com NEE.
§ 3º: A falta de diagnóstico clínico definitivo o impedirá a definição dos encaminhamentos pedagógicos a
serem realizados pelas Equipes de Referência das Unidades de Educação, sob a orientação e em diálogo com a
Equipe de Referência da FME.
§ 4º: O aluno com NEE deverá participar dos Reagrupamentos, observadas e respeitadas as suas características
e as diferenças que manifestam.
§ 5º: O aluno com NEE poderá ser acompanhado, em suas atividades cotidianas, por um Professor de Apoio,
mediante parecer da Equipe de Referência da FME, ouvida a Coordenação de Educação Especial.
§ 6º: O aluno com NEE poderá ser atendido em Sala de Recursos, com base em parecer da Equipe de
Referência da FME, ouvida a Coordenação de Educação Especial, prevendo-se, neste caso, a mediação
pedagógica de um Professor de Sala de Recursos, observados os seguintes
aspectos:
I - O atendimento ao aluno com NEE na Sala de Recursos será desenvolvido na Unidade de Educação, em
espaço adequado, a partir de atividades que promovam e favoreçam a aprendizagem, bem como a inclusão
desse aluno no ambiente escolar como um todo;
II - O Professor de Sala de Recursos integrará as Equipes de Referência dos Ciclos, mas não será Professor de
nenhum Grupo de Referência dos Ciclos, podendo coordenar atividades de Reagrupamento na Sala de
Recursos.
§ 7º: A Terminalidade Específica para alunos com NEE será objeto de Portaria específica, que fixará os critérios
e os procedimentos a serem adotados, conforme o caso.
Art. 30: Se no processo de formação de um determinado Grupo de Referência, a modulação exceder o previsto
no Artigo desta Portaria em razão da presença de alunos com NEE, esse Grupo de Referência poderá contar
com um Professor de Apoio, mediante parecer da Equipe de Referência da FME, ouvida a Coordenação de
Educação Especial.
Capítulo V
Da Matrícula
Art. 31: O ingresso do aluno em uma Unidade de Educação ocorrerá por meio de:
I - matrícula inicial;
II - matrícula renovada;
III - matrícula por transferência.
§ 1º: Matrícula inicial é a que se em qualquer Ciclo, desde que se trate da primeira matrícula na vida escolar
do educando/a.
§ 2º: Também se constitui como matrícula inicial aquela prevista no Artigo 24, inciso II, alínea C, da LDB
9.394/96.
§ 3º: Matrícula renovada é a que se dá em qualquer Ciclo, caracterizando uma das seguintes situações.
I - Quando o aluno cursou, na mesma Unidade de Educação, Período Letivo imediatamente anterior.
II - Quando o aluno retoma os estudos, na mesma Unidade de Educação, após período de interrupção.
§ 4º: Matrícula por transferência é aquela pela qual o aluno, ao se desvincular de uma Unidade de Educação da
própria Rede ou de outro Sistema de Ensino, do País ou do Exterior, vincula-se imediatamente a outra unidade
congênere, para prosseguimento dos seus estudos, mediante apresentação de histórico escolar.
§ 5º: As matrículas inicial e renovada ocorrerão de acordo com o calendário definido pela FME, desde que
existam vagas nas Unidades de Educação, observado o disposto na legislação vigente.
§ 6º: A matrícula por meio de transferência aplica-se ao Ensino Fundamental e à Educação de Jovens, Adultos e
Idosos, através da inserção do aluno em um determinado Ciclo, agrupando-o em um Grupo de Referência, em
conformidade com a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania” e com o Projeto Político-Pedagógico da
Unidade de Educação, após análise das informações constantes no histórico escolar.
§ 7º: No Ensino Fundamental, a matrícula de aluno cuja idade não corresponda à faixa etária do Ciclo poderá ser
realizada por meio de processo de Classificação ou Reclassificação, após avaliação da Equipe de Articulação
Pedagógica (EAP), referendada pela Equipe de Referência da FME, com base em critérios que levem em conta
o desenvolvimento cognitivo e sócio-afetivo do aluno.
Art. 32: Entende-se por Classificação o processo de agrupamento do aluno no Ciclo compatível com a sua
idade, experiência e desempenho, mediante as seguintes condições:
I - por promoção, para alunos que cursaram o Ciclo anterior com aproveitamento na própria Unidade de
Educação;
II - por transferência, para alunos procedentes de outras Unidades de Educação da própria Rede ou de outro
Sistema de Ensino, do País ou do Exterior, consideradas as informações constantes em seu histórico escolar;
245
III - independentemente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela Equipe de Articulação
Pedagógica (EAP), que agrupará o aluno no Ciclo adequado, levando em conta exclusivamente o critério etário,
no caso da Educação Infantil; predominantemente o critério etário, no caso do Ensino Fundamental; e o critério
cognitivo e sócio-afetivo, no caso da Educação de Jovens, Adultos e Idosos.
§ 1º: Fica vedada a realização de avaliação para fins de Classificação ao longo da Educação Infantil e para efeito
de ingresso no 1º Ciclo do Ensino Fundamental.
§ 2º: O processo de Classificação deverá ocorrer durante os primeiros trinta dias cursados pelo aluno,
arquivando-se obrigatoriamente na sua pasta o parecer avaliativo elaborado pela Equipe de Articulação
Pedagógica (EAP) e o Termo de Classificação.
Art. 33: Entende-se por Reclassificação o processo pelo qual um aluno classificado para um determinado Ciclo é
agrupado em outro Ciclo, após avaliação realizada pela Equipe de Articulação Pedagógica, com base nas
diretrizes curriculares e didáticas da Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”.
§ 1º: O processo de Reclassificação de alunos no Ensino Fundamental e na Educação de Jovens,
Adultos e Idosos poderá abranger: I - o aluno regularmente matriculado na Unidade de Educação, que, findo o
último Período Letivo do Ciclo, não alcançou o percentual mínimo de 75% de freqüência durante todo o Ciclo,
mas cuja avaliação recomende a sua promoção ao Ciclo subseqüente;
II - o aluno regularmente matriculado na Unidade de Educação, cuja avaliação recomende, a qualquer tempo, a
sua promoção ao Ciclo subseqüente;
III o aluno transferido de outra Unidade de Educação da própria Rede ou de outro Sistema de Ensino do País
ou do Exterior.
§ 2º: O processo de Reclassificação deverá ocorrer durante os primeiros trinta dias cursados pelo aluno,
arquivando-se obrigatoriamente na sua pasta o parecer avaliativo elaborado pela Equipe de Articulação
Pedagógica (EAP) e o Termo de Reclassificação.
§ 3º: No caso de Reclassificação previsto no inciso II do parágrafo 1º, o processo será realizado tão logo a
Equipe de Referência do Ciclo confirme a ocorrência dessa situação.
Art. 34: No período de matrícula, o aluno que ultrapassar a idade de 15 anos poderá ser encaminhado para
Grupo de Referência da Educação de Jovens, Adultos e Idosos, após avaliação da Equipe de Referência do
Ciclo, referendada pela FME, com base em critérios que levem em conta o seu desenvolvimento cognitivo e
sócio-afetivo, com a expressa anuência dos responsáveis.
Capítulo VI
Das Disposições Finais
Art. 35: A FME elaborará o Calendário Escolar para cada Período Letivo, sendo permitida às Unidades de
Educação efetuar as adequações necessárias ao seu Projeto Político-Pedagógico, desde que considerem o que
se segue:
I - obrigatoriedade do cumprimento do Período Letivo estabelecido no Parágrafo 3º do Artigo 1º desta Portaria;
II - imutabilidade das datas de início do Período Letivo e de recesso escolar;
III cômputo do dia letivo somente para programação escolar com freqüência exigível do aluno e efetiva
orientação do professor;
IV - previsão de reuniões do Conselho de Avaliação e Planejamento (CAP-UE) e do Conselho de Avaliação e
Planejamento do Ciclo (CAP-CI);
V - previsão do calendário de Formação Continuada, de acordo com o quantitativo de sessões definido no
Calendário da FME;
VI - apresentação das adequações feitas pela Unidade de Educação para aprovação prévia pela FME.
Art. 36: A apuração, o registro e o controle de freqüência dos alunos são obrigatórios e de responsabilidade das
Unidades de Educação, observado o disposto na legislação vigente.
§ 1º: A Educação Infantil é presencial, sendo amplamente recomendável a freqüência cotidiana do aluno.
§ 2º: O Ensino Fundamental e a Educação de Jovens, Adultos e Idosos são presenciais e de freqüência
obrigatória, sendo exigido, por Lei, o alcance mínimo de 75% de presença em cada Ciclo, apurada diariamente e
computada ao final de cada Ciclo.
§ 3º: O registro de freqüência será organizado, levando-se em consideração o Agrupamento do aluno, ainda que
ele integre grupos diferenciados durante o Ciclo em razão dos processos de Reagrupamento.
Art. 37: O horário de funcionamento das Unidades Municipais de Educação para o corpo discente será o
seguinte:
I – Educação Infantil de horário parcial:
1) turno da manhã: das 08h00 às 12h00
2) turno da tarde: das 13h00 às 17h00
II – Educação Infantil de horário integral: das 08h00 às 17h00
III - 1º e 2º Ciclos do Ensino Fundamental:
1) turno da manhã: das 07h30 às 12h00
2) turno da tarde: das 13h00 às 17h30
IV - 3º e 4º Ciclos do Ensino Fundamental:
1) turno da manhã: das 07h10 às 12h00
2) turno da tarde: das 13h00 às 17h50
V – 1º, 2º, 3º e 4º Ciclos da Educação de Jovens, Adultos e Idosos: das 18h00 às 22h00.
§ 1º: Haverá, em cada turno, um tempo de 20 minutos reservado à alimentação do aluno, em horário a ser
estabelecido, de acordo com critérios fixados pela Equipe de Articulação Pedagógica da Unidade de Educação
(EAP);
246
§ 2º: Na Educação de Jovens, Adultos e Idosos, as aulas terão início às 18h20, ficando reservado para o jantar o
horário das 18h às 18h20;
§ 3º: Às quartas-feiras, em função do horário das reuniões de avaliação e planejamento, as aulas se encerrarão
mais cedo para os alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, conforme o que se segue:
a) Educação Infantil de horário parcial:
1) turno da manhã: 10h00
2) turno da tarde: 15h30
b) Educação Infantil de horário integral: 15:00 h
c) 1º e 2º Ciclos do Ensino Fundamental:
1) turno da manhã: 10h00
2) turno da tarde: 15h30
d) 3º e 4º Ciclos do Ensino Fundamental:
1) turno da manhã: 10h10
2) turno da tarde: 16h00
§ 4º: Caberá às Unidades de Educação que oferecem Educação de Jovens, Adultos e Idosos definir o horário de
entrada e de saída às quartas-feiras, fazendo a devida adequação com o horário da reunião semanal de
avaliação e planejamento.
Art. 38: A reunião semanal de avaliação e planejamento terá duração de 2 (duas) horas e ocorrerá,
obrigatoriamente, em todas as Unidades de Educação, às quartas-feiras, conforme o que se segue:
I – Educação Infantil de horário parcial:
1) turno da manhã: das 10h00 às 12h00
2) .turno da tarde: das 15h30 às 17h30
II – Educação Infantil de horário integral: das 15h00 às 17h00
III - 1º e 2º Ciclos do Ensino Fundamental:
1) turno da manhã: das 10h00 às 12h00
2) turno da tarde: das 15h30 às 17h30
IV - 3º e 4º Ciclos do Ensino Fundamental:
1) turno da manhã: das 10h10 às 12h10
2) turno da tarde: das 16h00 às 18h00
V - 1º, 2º, 3º e 4º Ciclos da Educação de Jovens,
Adultos e Idosos: das 18h00 às 20h00 ou das 20h00 às
22h00.
Art. 39: A presente Portaria entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário,
admitindo-se, no ano de 2008, a sua aplicação, em caráter experimental, ao trabalho realizado nos 3º e 4º Ciclos
do Ensino Fundamental e da Educação de Jovens, Adultos e Idosos. (PORTARIA FME nº 125/2008)
247
Anexo 12 - PORTARIA FME / 132 / 08
O PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI, no uso de suas atribuições legais
e considerando:
a) o disposto na legislação, notadamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96, e
nos diplomas legais em vigor no Município de Niterói, em especial a Portaria FME 125/08, que institui a
Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”;
b) a necessidade permanente de aprimorar, reorganizar e qualificar a Rede Municipal de Educação de Niterói,
com vistas ao sucesso escolar dos alunos e ao aperfeiçoamento das condições de trabalho e de formação dos
profissionais da educação;
c) o amplo e aprofundado diálogo construído com a Rede Municipal de Educação de Niterói sobre a construção
da Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”, notadamente no último triênio,
RESOLVE:
Art. 1º: A presente Portaria institui as Diretrizes Curriculares e Didáticas para a Educação Infantil, para o Ensino
Fundamental e para a Educação de Jovens, Adultos e Idosos, que integram a Proposta Pedagógica “Escola de
Cidadania”, a serem observadas na elaboração e na implementação do Projeto Político-Pedagógico e no
trabalho pedagógico cotidiano desenvolvido em cada Unidade de Educação da Rede Municipal de Niterói.
Parágrafo Único: As Diretrizes Curriculares e Didáticas estabelecem um conjunto de princípios e objetivos que
norteiam a organização curricular da Rede Municipal de Educação de Niterói.
Art. 2º: Estas Diretrizes se fundamentam no princípio de que todos os sujeitos são construtores de valores, de
conhecimentos e de práticas sociais.
§ 1º: O processo de construção de valores, de conhecimentos e de práticas sociais é mediado pela reflexão, pela
intervenção na realidade e pela indissociabilidade entre teoria e prática.
§ 2º: A construção de valores, de conhecimentos e de práticas sociais será desenvolvida com base na
autonomia, na liberdade de expressão, no respeito à diversidade, na dialogicidade e na pluralidade, com vistas
ao exercício pleno da criticidade e do respeito à ordem democrática, observando-se também os princípios
estéticos da sensibilidade, da criatividade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais, em
conformidade com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, para o Ensino Fundamental e
para a Educação de Jovens e Adultos.
Art. 3º: As Unidades de Educação da Rede Municipal de Niterói, quando do planejamento do seu trabalho
pedagógico, deverão considerar os seguintes princípios:
1. A construção da leitura crítica do mundo;
2. O incentivo à curiosidade epistemológica;
3. A problematização da realidade;
4. A busca de soluções para os problemas formulados;
5. A integração entre os sujeitos no processo de construção do conhecimento;
6. O diálogo com a realidade local;
7. A articulação entre os diversos saberes;
8. A intervenção na realidade, visando o bem comum;
9. A superação de qualquer tipo de preconceito ou forma de discriminação;
10. A responsabilidade sócio-ambiental e o respeito à biodiversidade.
Art. 4º: O currículo das Unidades de Educação da Rede Municipal de Niterói será organizado a partir de três
Eixos de Estudo e Pesquisa:
I - Linguagem, Identidade e Autonomia;
II - Tempo, Espaço e Cidadania;
III – Ciências, Tecnologias e Desenvolvimento Sustentável.
Art. 5º: No Eixo Linguagem, Identidade e Autonomia serão priorizadas a leitura e a escrita, a articulação do
verbal com o não-verbal, a valorização das diversas linguagens e expressões, a problematização das relações
sociais e culturais e as competências comunicativas e discursivas que envolvem o processo de construção da
identidade e da participação cidadã.
Art. 6º: No Eixo Tempo, Espaço e Cidadania serão priorizadas questões relativas ao espaço e ao tempo, sob os
aspectos econômico, político e sócio-cultural; a análise das circunstâncias e das conseqüências das ações
humanas; a análise dos processos sociais ao longo da história e seus desdobramentos nas sociedades atuais;
ao respeito à diversidade nas relações e nas práticas sociais, apontando-se para um projeto de sociedade
democrática.
Art. 7º: No Eixo Ciências, Tecnologias e Desenvolvimento Sustentável serão priorizados a valorização dos
saberes científicos e suas relações com os outros saberes; a responsabilidade sócio-ambiental e o
desenvolvimento sustentável; a construção do raciocínio lógico-matemático; e a elaboração, a apropriação e o
uso das tecnologias pelos sujeitos e sociedades, a serviço da transformação social e da elevação da qualidade
de vida das pessoas.
Art. 8º: Cada Eixo terá Objetivos Gerais, que se desdobrarão em Objetivos Específicos a serem elaborados pela
Unidade de Educação, de acordo com o seu Projeto Político-Pedagógico e em consonância com a Proposta
Pedagógica “Escola de Cidadania”.
Art. 9º: Em todos os Eixos serão abordados temas ligados ao mundo do trabalho, à autonomia, à cidadania, à
questão de gênero, à sexualidade e à diversidade de orientação sexual, aos direitos humanos, às relações
248
étnico-raciais, à pluralidade cultural, à ética, à estética, ao meio-ambiente e à sua preservação, à saúde, à
prevenção à dependência química e ao desenvolvimento sócio-econômico e tecnológico sustentável.
§ 1º: Os temas mencionados no caput deste Artigo permearão o trabalho pedagógico cotidiano, colaborando
para o desenvolvimento da autonomia do aluno; concorrendo para o aprofundamento da sua compreensão a
respeito da realidade local e global em que está inserido; e subsidiando a sua intervenção sobre essa realidade.
§ 2º: Na Educação Infantil, o currículo será organizado a partir dos Eixos mencionados no artigo 4º, considerando
o caráter transdisciplinar que rege esta etapa da Educação Básica.
§ 3º: No Ensino Fundamental e na Educação de Jovens, Adultos e Idosos, o currículo será organizado a partir
dos Eixos mencionados no Artigo 4º, por meio dos componentes curriculares Língua Portuguesa, Língua
Estrangeira, Arte, Educação Física, Geografia, História, Matemática e Ciências, considerando o caráter
interdisciplinar que rege esta etapa e esta modalidade da Educação Básica, o que dispõem as Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e a Proposta Pedagógica “Escola de Cidadania”.
§ : O trabalho pedagógico desenvolvido no âmbito de cada componente curricular deverá concorrer para o
alcance dos objetivos de cada Eixo.
§ 5º: A Educação Religiosa, no âmbito da Rede Municipal de Educação de Niterói, observará o disposto na Lei nº
9.394/96.
Art. 10: Cada Eixo de Estudo e Pesquisa será orientado por um conjunto de objetivos, de acordo com a etapa ou
modalidade de ensino e com o Ciclo, conforme se segue:
I - Eixo Linguagem, Identidade e Autonomia
1 - Educação Infantil
a. Construir conhecimentos, práticas e valores sócio-culturais na interação com o outro e com o meio;
b. Utilizar as múltiplas linguagens para expressar-se e organizar o pensamento e o conhecimento;
c. Apropriar-se de práticas e usos da linguagem oral, da leitura e da escrita.
2 - Ensino Fundamental - 1º Ciclo
a. Expressar-se oralmente em diferentes momentos, adequando a língua e a linguagem às diversas situações
comunicativas;
b. Compreender e utilizar o sistema da escrita em variadas situações;
c. Desenvolver competências textuais, a expressão oral e a criatividade;
d. Apropriar-se das diferentes linguagens como possibilidade de expressão, mobilizando diversos materiais,
suportes e superfícies de leitura;
e. Compreender e utilizar as múltiplas linguagens, inclusive a linguagem corporal, articulando-as com as suas
experiências e com os diversos campos do conhecimento;
f. Compreender a arte em suas diversas manifestações culturais como forma de representação do mundo.
3 - Ensino Fundamental - 2 º Ciclo
a. Compreender e utilizar a escrita, segundo as convenções da língua materna, em suas diferentes funções e em
diferentes gêneros e tipos textuais;
b. Utilizar os recursos expressivos da entonação, da segmentação do texto e da própria organização textual;
c. Ler oralmente com fluência e expressividade;
d. Compreender e interpretar diferentes gêneros discursivos;
e. Perceber a arte como possibilidade de expressão, mobilizando diferentes materiais e suportes;
f. Sistematizar o uso da linguagem matemática, favorecendo a apropriação de conhecimentos;
g. Expressar-se por meio da linguagem corporal, articulando-a com os diversos campos do conhecimento.
4 - Ensino Fundamental - 3º Ciclo
a. Construir e utilizar conhecimentos específicos de diversas linguagens, inclusive a corporal, e empregá-los
como meio de ampliação e de ressignificação dos valores, dos conhecimentos e das práticas sociais;
b. Utilizar-se das linguagens específicas das diferentes áreas de conhecimento, seus códigos e
suas formas de organização na construção de valores, conhecimentos e práticas sociais;
c. Apropriar-se e utilizar-se dos conhecimentos instrumentais da língua materna na compreensão e na produção
de textos;
d. Reconhecer as diferentes variações de expressão da língua como traço sociocultural de sua construção e de
sua utilização;
e. Compreender o papel das línguas nas sociedades como forma de organização, produção e expressão
sociocultural;
f. Utilizar-se dos conhecimentos de diferentes línguas como meio de inserção sociocultural;
g. Compreender os aspectos sócio-históricos da linguagem.
5 - Ensino Fundamental - 4 º Ciclo
a. Construir e consolidar conhecimentos específicos de diversas linguagens e utilizá-los como meio de ampliação
e ressignificação de valores, saberes e práticas sociais;
b. Apropriar-se das linguagens específicas das diferentes áreas do conhecimento, seus digos e suas formas
de organização na construção de valores, saberes e práticas sociais;
c. Empregar com autonomia os conhecimentos instrumentais da língua materna na compreensão e na produção
de textos;
d. Apropriar-se das diferentes variações de expressão da língua como traço sociocultural de sua construção e de
sua utilização, relacionando-as com os conhecimentos teóricos e suas diversas aplicações;
e. Compreender o papel das línguas nas sociedades como forma de organização, produção e expressão
sociocultural;
f. Utilizar-se dos conhecimentos de diferentes línguas como meio de inserção sociocultural;
249
6 – Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 1º Ciclo
a. Relacionar as experiências de leitura e de escrita vividas no seu cotidiano com o uso da língua em situações
comunicativas formais;
b. Compreender e utilizar o sistema de escrita em variadas situações;
c. Desenvolver as competências textuais, a expressão oral, a criatividade e a articulação de raciocínios lógicos;
d. Utilizar-se de diversos suportes de leitura, com vistas à ampliação da compreensão do mundo.
7 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 2º Ciclo
a. Compreender e utilizar a escrita em suas diferentes funções, gêneros e tipos textuais;
b. Produzir textos, de acordo com as convenções da língua materna;
c. Reconhecer o processo interativo como espaço de construção dos sentidos do texto;
d. Identificar aspectos como organização, gênero, marcas textuais, referências, condições de produção, usos e
funções;
e. Observar e utilizar a língua em situações variadas, reconhecendo-a como marca identitária.
8 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 3º Ciclo
a. Construir conhecimentos específicos das diversas linguagens e utilizá-los como meio de ampliação e
ressignificação de valores, saberes e práticas sociais;
b. Utilizar-se das linguagens específicas de diferentes áreas do conhecimento, seus códigos e suas formas de
organização na construção de valores, conhecimentos e práticas sociais;
c. Identificar as diferentes variações de expressão da língua como traço sociocultural de sua construção e
utilização, relacionando-as aos conhecimentos teóricos e suas aplicações;
d. Reconhecer o processo interativo como espaço de construção dos sentidos do texto;
e. Identificar nos diferentes textos aspectos como organização, gênero, marcas textuais, imagens, referências,
condições de produção, usos e funções;
f. Compreender o papel das nguas nas sociedades como forma de organização, produção e expressão
sociocultural;
g. Compreender a arte em suas diversas manifestações culturais como forma de representação do mundo.
9 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 4º Ciclo
a. Utilizar os conhecimentos de diferentes línguas como meio de inserção sociocultural;
b. Empregar as linguagens específicas de diferentes áreas do conhecimento, seus códigos e suas formas de
organização na construção de valores, conhecimentos e práticas sociais;
c. Identificar as diferentes variações de expressão da língua como traço sociocultural de sua construção e
utilização, relacionando-as com os conhecimentos teóricos e suas diversas aplicações;
d. Produzir textos, considerando aspectos como organização, gênero, marcas textuais, imagens, referências,
condições de produção, usos e funções.
II - Eixo Tempo, Espaço e Cidadania
1 – Educação Infantil
a. Conviver com a diversidade, respeitando e valorizando as diferenças;
b. Desenvolver-se de forma saudável, apreendendo formas de cuidado consigo e com o outro;
c. Apreender formas de trabalhar de maneira coletiva, organizada e planejada, com crescente autonomia e
responsabilidade sobre si, sobre o outro e sobre o ambiente.
2 - Ensino Fundamental - 1º Ciclo
a. Reconhecer-se como sujeito de direitos e do processo de construção de conhecimento, na interação com o
outro e com o mundo;
b. Valorizar o trabalho e a convivência em grupo;
c. Reconhecer e respeitar a diversidade de espaços e culturas;
d. Construir noções de espaço e de tempo, a partir da materialidade vivida nas situações cotidianas;
e. Reconhecer o espaço geográfico onde vive, sua dimensão física e histórica;
f. Construir conceitos geométricos e espaciais, ampliando o seu olhar sobre o mundo;
g. Estabelecer relações entre presente e passado, a partir das suas vivências;
h. Reconhecer sua história de vida como parte da cultura.
3 - Ensino Fundamental - 2º Ciclo
a. Desenvolver noções da relação tempo-espaço, bem como as transformações ocorridas pela ação da
humanidade ao longo da história;
b. Reconhecer e respeitar a diversidade cultural e sua complexidade;
c. Desenvolver e ampliar a noção de direitos e deveres;
d. Ampliar a noção de coletividade e suas implicações nas relações sociais cotidianas;
e. Conhecer o espaço geográfico onde vive, sua dimensão física, econômica, política, histórica e cultural;
f. Reconhecer e utilizar-se das diversas expressões artísticas, articulando-as com sua dimensão social;
g. Sistematizar conceitos geométricos e espaciais, ampliando seu olhar sobre o mundo.
4 - Ensino Fundamental - 3º Ciclo
a. Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos tempos e espaços, em suas
manifestações culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças, conflitos e
contradições sociais;
b. Identificar e compreender que o direito se estabelece através da disputa e da negociação entre
os diferentes interesses e concepções de sociedade;
c. Compreender a necessidade de regras para a organização social;
d. Vivenciar processos democráticos de estabelecimento de regras coletivas;
250
e. Elaborar noções de espaço e tempo geográfico e político, identificando seu processo de organização e suas
implicações na constituição dos sujeitos e grupos;
f. Refletir e identificar formas de intervenção na sociedade, visando torná-la mais justa, igualitária e fraterna.
5 - Ensino Fundamental - 4º Ciclo
a. Reconhecer, respeitar e valorizar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos tempos e espaços, em
suas manifestações culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças, conflitos
e contradições sociais;
b. Vivenciar a cidadania e a participação social e política, no exercício de direitos e deveres políticos, civis e
sociais;
c. Elaborar formas de intervenção na comunidade, questionando a realidade, identificando problemas e possíveis
soluções, visando tornar a convivência social mais justa, igualitária e fraterna;
d. Perceber, conhecer e refletir sobre a realidade local, suas características e os processos de transformações
por que passa;
e. Compreender a espacialidade e a temporalidade dos fenômenos sociais, culturais, políticos e tecnológicos,
bem como suas dinâmicas e processos de interação.
6 – Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 1º Ciclo
a. Reconhecer e interagir com a diversidade de espaços e culturas;
b. Construir noções de espaço e de tempo, a partir da materialidade vivida nas situações cotidianas;
c. Reconhecer diferentes espaços geográficos, sua dimensão física e histórica;
d. Estabelecer relações entre presente e passado, a partir das suas vivências e histórias;
e. Reconhecer as diferentes histórias de vida e de trabalho como construção sociocultural;
f. Construir conceitos geométricos e espaciais, relacionando-os à vida cotidiana e seus desafios.
7 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 2º Ciclo
a. Reconhecer e interagir com a diversidade de espaços e culturas, sua dimensão física, econômica, política e
histórica;
b. Construir noções de espaço e de tempo, a partir da materialidade vivida nas situações cotidianas, em que se
desenvolve a ação humana e em que interagem os diversos atores sociais;
c. Reconhecer diferentes espaços geográficos, sua dimensão física e histórica, identificando as transformações
provocadas pela ação da humanidade;
d. Reconhecer as diferentes histórias de vida e de trabalho como construção sociocultural, estabelecendo
relações entre presente e passado;
e. Desenvolver e ampliar a noção de direitos e deveres e a noção de coletividade para fundamentar
a noção de cidadania, bem como suas implicações nas relações sociais cotidianas;
f. Sistematizar conceitos geométricos e espaciais, ampliando o seu olhar sobre o mundo;
g. Reconhecer e utilizar as diversas expressões artísticas, articulando-as com sua dimensão social.
8 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 3º Ciclo
a. Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos tempos e espaços, em suas
manifestações culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças, conflitos e
contradições sociais;
b. Reconhecer a existência de diferentes interesses e concepções de sociedade e as disputas socioculturais e
políticas que estabelecem;
c. Identificar e compreender que o direito se estabelece através da disputa e da negociação entre as diferentes
concepções de sociedade;
d. Compreender a necessidade de regras para a organização social;
e. Vivenciar processos democráticos de estabelecimento de regras coletivas;
f. Elaborar noções de espaço e tempo geográfico e político, identificando processos de organização dos mesmos
e suas implicações na constituição dos sujeitos e grupos, considerando as condições objetivas de vida e de
trabalho;
g. Identificar formas de intervenção na realidade, problemas e possíveis soluções, conhecendo formas e
organizações que possibilitem modos de atuação, visando tornar a sociedade mais justa, igualitária e fraterna;
h. Compreender, refletir e discutir questões relacionadas à autonomia e à identidade, na perspectiva das
diferenças e das constituições culturais, étnicas, religiosas, econômicas, sociais, de gênero, de orientação
sexual, bem como seus desdobramentos históricos.
9 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 4º Ciclo
a. Reconhecer, respeitar e valorizar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos tempos e espaços, em
suas manifestações culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças, conflitos
e contradições sociais;
b. Vivenciar a participação social e política, no exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, com vistas
ao aprofundamento da compreensão da realidade e ao fortalecimento da cidadania;
c. Elaborar formas de intervenção na comunidade, questionando a realidade, identificando problemas e possíveis
soluções, visando tornar a convivência social mais justa, igualitária e fraterna;
d. Perceber, conhecer, refletir e dimensionar a realidade local, suas transformações e características;
e. Compreender a espacialidade e a temporalidade de fenômenos sociais, culturais, políticos e tecnológicos,
suas dinâmicas e interações;
f. Compreender, refletir e discutir questões relacionadas à autonomia e à identidade, na perspectiva das
diferenças e das constituições culturais, étnicas, religiosas, econômicas, sociais, de gênero, de orientação
sexual, bem como seus desdobramentos históricos;
251
g. Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o
diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas.
III - Eixo Ciências, Tecnologias e Desenvolvimento Sustentável
1 - Educação Infantil
a. Construir conhecimentos sobre o ambiente social e natural;
b. Apropriar-se das diferentes tecnologias da informação e da comunicação, a partir das atividades cotidianas.
2 - Ensino Fundamental - 1º Ciclo
a. Conhecer a simbologia com a qual se representam a linguagem e o raciocínio matemáticos;
b. Levantar, conferir e validar hipóteses, especialmente em atividades coletivas, a partir de diferentes situações-
problema vividas no cotidiano;
c. Conhecer e utilizar as tecnologias da informação e da comunicação na construção de valores, conhecimentos
e práticas sociais;
d. Conhecer fatos e características da dinâmica da natureza em diferentes ecossistemas e a ação
da humanidade sobre o mundo natural;
e. Compreender as ciências como processos de produção de conhecimento e como atividade humana.
3 - Ensino Fundamental - 2º Ciclo
a. Levantar, conferir e validar hipóteses, especialmente em atividades individuais que desenvolvam
a autonomia, a partir de diferentes situações-problema vividas no cotidiano;
b. Utilizar conceitos e procedimentos matemáticos na resolução de situações-problema do cotidiano,
comparando e analisando diferentes estratégias de solução;
c. Conhecer e utilizar as ferramentas das tecnologias da informação e da comunicação para a análise, a
interpretação, a elaboração e a socialização de valores, conhecimentos e práticas e sociais;
d. Identificar e compreender a dinâmica da natureza em diferentes ecossistemas, construindo valores
comprometidos com a preservação da vida;
e. Compreender as ciências como processos de produção de conhecimento e como atividade humana,
apropriando-se de conceitos, idéias e métodos das diferentes áreas das ciências como ferramentas para
aprofundar a compreensão do mundo e para solucionar problemas e desafios colocados pela realidade.
4 - Ensino Fundamental - 3º Ciclo
a. Compreender as ciências como processos de produção de conhecimento e como uma atividade humana que
se processa histórica, social, econômica, política e culturalmente;
b. Problematizar e utilizar conceitos, idéias e métodos das diferentes áreas das ciências como ferramentas para
aprofundar a compreensão do mundo e para solucionar problemas e desafios colocados pela realidade;
c. Relacionar a produção de conhecimentos científicos e de tecnologias com as condições de vida do ser
humano e com a preservação do planeta;
d. Apropriar-se com autonomia das ferramentas das tecnologias da informação e da comunicação para a análise,
a interpretação, a elaboração e a socialização de valores, conhecimentos e práticas sociais;
e. Conhecer, interpretar e buscar possibilidades para a ação da humanidade no mundo natural, pautadas pela
responsabilidade sócio-ambiental;
5 - Ensino Fundamental - 4º Ciclo
a. Compreender as ciências como processos de produção de conhecimento e como uma atividade humana que
se processa histórica, social, econômica, política e culturalmente;
b. Estabelecer relações entre conceitos, idéias e métodos das diferentes áreas das ciências e utilizá-las como
ferramentas para aprofundar a compreensão do mundo e para a solução de problemas e desafios colocados
pela realidade;
c. Relacionar a produção de conhecimentos científicos, de tecnologia e de inovação com as condições de vida
do ser humano ao longo da história e na atualidade e com a preservação da vida e do planeta;
d. Aprimorar-se no emprego de ferramentas das tecnologias da informação e da comunicação para
a análise, a interpretação, a elaboração e a socialização de valores, conhecimentos e práticas sociais;
e. Aprofundar o conhecimento sobre a ação da humanidade no mundo natural, identificando alternativas para a
sustentabilidade do planeta e para a preservação da vida.
6 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 1º Ciclo
a. Identificar a simbologia com a qual se representa a linguagem e o raciocínio matemáticos, relacionando-a com
a experiência de vida e de trabalho;
b. Estabelecer relações lógicas na resolução de situações-problema do seu cotidiano, levantando, conferindo e
validando hipóteses, individualmente e coletivamente;
c. Conhecer as tecnologias da informação e da comunicação na construção de valores, conhecimentos e
práticas sociais, buscando, sempre que possível, relacioná-los com o mundo do trabalho;
d. Identificar fatos e características da dinâmica da natureza em diferentes ecossistemas e a ação da
humanidade sobre o mundo natural, a partir das próprias vivências e conhecimentos;
e. Compreender a produção do conhecimento como atividade humana que se processa histórica, social,
econômica, política e culturalmente;
7 – Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 2º Ciclo
a. Estabelecer relações lógicas na resolução de situações-problema do cotidiano, levantando, conferindo e
validando hipóteses, individualmente ou coletivamente;
b. Utilizar conceitos e procedimentos matemáticos na resolução de situações-problema do cotidiano,
comparando e analisando diferentes estratégias de solução e relacionando-as à sua experiência de vida e de
trabalho;
252
c. Apropriar-se das ferramentas das tecnologias da informação e da comunicação para a análise, a interpretação,
a elaboração e a socialização de conhecimentos, práticas e valores, buscando, sempre que possível, relacioná-
los com o mundo do trabalho;
d. Identificar e compreender a dinâmica da natureza em diferentes ecossistemas, a partir das próprias vivências
e conhecimentos;
e. Conhecer e interpretar o mundo natural e cultural, buscando intervir para a sua transformação;
f. Compreender o processo de conhecimento como atividade humana construída histórica, social, econômica,
política e culturalmente, relacionando-a com a vida prática e com o mundo do trabalho;
g. Conhecer e utilizar conceitos, idéias e métodos das diferentes áreas das ciências como ferramentas para
aprofundar a compreensão da realidade.
8 – Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 3º Ciclo
a. Problematizar o processo de produção do conhecimento como atividade humana, construída histórica, social,
econômica, política e culturalmente, relacionando-as com a vida prática e com o mundo do trabalho;
b. Conhecer e utilizar conceitos, idéias e métodos das diferentes áreas do conhecimento como instrumento para
aprofundar a compreensão da realidade e para solucionar problemas e desafios do mundo do trabalho;
c. Relacionar a produção de conhecimentos científicos e de tecnologia com as condições de vida
do ser humano e os modos de produção;
d. Aprimorar-se na utilização autônoma de ferramentas das tecnologias da informação e da comunicação para a
análise, a interpretação, a elaboração e a socialização de valores, conhecimentos e práticas sociais, buscando
relacioná-los com a vida cotidiana e com o mundo do trabalho;
e. Conhecer e interpretar a ação da humanidade sobre o mundo natural, tomando como referência a vida
cotidiana e identificando alternativas de sustentabilidade e de preservação.
9 - Educação de Jovens, Adultos e Idosos - 4º Ciclo
a. Problematizar a produção do conhecimento, reconhecendo sua construção histórica, social, econômica,
política e cultural.
b. Conhecer e estabelecer relações entre conceitos e métodos das diferentes áreas do conhecimento, utilizando-
as como instrumento para aprofundar a compreensão da realidade e para solucionar problemas e desafios da
realidade e do mundo do trabalho;
c. Relacionar a produção de conhecimentos científicos e de tecnologia, com as condições de vida do ser humano
e os modos de produção ao longo da história;
d. Utilizar as ferramentas das tecnologias da informação e da comunicação para a análise, a interpretação, a
elaboração e a socialização de valores, conhecimentos e práticas sociais, relacionando-os com a vida cotidiana e
com o mundo do trabalho;
e. Conhecer, interpretar e buscar possibilidades da ão da humanidade sobre o mundo natural, pautadas pela
preservação do planeta.
Art. 11: Os processos de mediação pedagógica e avaliação a serem desenvolvidos no cotidiano das
Unidades de Educação deverão priorizar:
1. A construção coletiva do conhecimento, propiciando a cada sujeito a apropriação autônoma dos diferentes
saberes;
2. A superação da fragmentação disciplinar e a articulação dos conhecimentos a partir de Eixos de
Estudo e Pesquisa, Projetos de Trabalho, Complexos Temáticos, Temas Geradores, entre outras formas de
organização curricular, de modo a colocar o aluno, com suas possibilidades e limites,
no centro dos processos, buscando a construção de sua autonomia;
3. A problematização da realidade e dos conhecimentos, reconhecendo e valorizando o diálogo com o aluno, sua
rede de relações, sua visão de mundo, as linguagens que expressa suas possibilidades e potencialidades;
4. A mediação pedagógica organizada a partir do desenvolvimento de projetos, formulação e resolução de
problemas, estudo de caso, iniciação à pesquisa e elaboração de sínteses significativas, entre outras formas de
mediação pedagógica formuladas, implementadas e avaliadas coletivamente pelos profissionais da educação,
em diálogo com as necessidades e possibilidades da comunidade escolar;
5. A prática pedagógica dialógica desenvolvida por meio de diversas e significativas atividades, que podem se
valer do uso de tecnologias da informação e da comunicação e de estudos e pesquisas individuais ou em grupo,
no âmbito dos Grupos de Referência ou nos processos de Reagrupamento.
Art. 12: A presente Portaria será revista, até 31 de janeiro de 2009, de modo a se adequar aos
Referenciais Curriculares e Didáticos da Rede Municipal de Educação de Niterói.
Parágrafo 1º: Os Referenciais Curriculares e Didáticos a que se refere o caput deste Artigo serão construídos de
forma participativa pela comunidade escolar da Rede Municipal de Educação de Niterói, em especial pelos seus
profissionais da educação.
Parágrafo 2º: Os Referenciais Curriculares e Didáticos detalharão a presente Portaria, oferecendo orientações
curriculares e didáticas para a Educação Infantil, para o Ensino Fundamental e para a Educação de Jovens,
Adultos e Idosos.
Art. 13: Esta Portaria entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Niterói, 31 de março de 2008.
WALDECK CARNEIRO
Secretário Municipal de Educação
Presidente da FME em exercício
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