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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
DÁRLEN CRÍSTHIÊ H. PENA
EPIDEMIOLOGIA DAS RIQUETSIOSES EM ÁREA DE FOCO
SILENCIOSO PARA FEBRE MACULOSA BRASILEIRA, MUNICÍPIO DE
SANTA CRUZ DO ESCALVADO, MINAS GERAIS, 2005 – 2006.
OURO PRETO MG
2007
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DÁRLEN CRÍSTHIÊ H. PENA
EPIDEMIOLOGIA DAS RIQUETSIOSES EM ÁREA DE FOCO
SILENCIOSO PARA FEBRE MACULOSA BRASILEIRA, MUNICÍPIO DE
SANTA CRUZ DO ESCALVADO, MINAS GERAIS, 2005 – 2006.
Dissertação de mestrado apresentada ao Núcleo de
Pesquisas em Ciências Biológicas da Universidade Federal de
Ouro Preto, como requisito para obtenção do grau de mestre em
Ciências Biológicas, na área de concentração em Biologia
Molecular.
Orientador: Márcio Antônio Moreira Galvão
Co-orientador(a): Renata Nascimento de Freitas
Cláudio L. Mafra
OURO PRETO – MG
2007
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DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho aos meus dois grandes mestres na arte da vida: meus
pais e à minha linda filha Ana Gabriela, onde deposito os mais belos
sonhos.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por me iluminar, me confortar e me fortalecer em todos os momentos da
minha vida.
À minha amada filha, Ana Gabriela, por me compreender e me sustentar com seu amor e sua
graciosidade. Por você, tudo vale a pena! Wellington, parabéns por ser o pai que é para ela!
Aos meus queridos pais, David e Glória, que me ensinaram a persistir na luta dos meus
sonhos, com coragem e esforço. Essa conquista também é de vocês! O meu eterno amor,
admiração e agradecimento, por mim e por Ana Gabriela! Tenho muito orgulho de vocês!
Aos meus queridos irmãos, Gêner, Breno e Geórgia por fazerem parte dessa família o
especial. Amo muito vocês! A você, Geórgia, meu eterno agradecimento por todos os
momentos bons e difíceis dessa vida acadêmica. A você, Ingrid, minha irmã de coração, que,
mesmo longe, sempre esteve presente em toda a minha jornada.
Ao Prof. Márcio Galvão, por ter me dado a oportunidade de começar a entender essa ciência
tão interessante eo instigante como a Rickettsiologia. Está valendo muito a pena! Obrigado
mesmo!
À Renata, pela paciência e atenção dispensada sempre que precisei e também pelo exemplo de
profissionalismo! Você nos motiva a sempre buscar mais!
Ao Mafra (UFV), que mesmo distante sempre me orientou, apoiou e me fez acreditar que “no
fim, tudo dá certo”! Obrigada também pela assistência nas coletas de Santa Cruz.
Ao Dr. David Walker, não por apoiar o projeto financeiramente, mas por toda confiança
que depositou neste trabalho. Obrigado pelos conselhos e orientação nas pesquisas!
Aos queridos amigos, os Guardas da FUNASA, Ércio, José Paulo e Carlinhos, por toda a
dedicação e profissionalismo nas coletas. Minha eterna admiração e respeito!
Ao prefeito de Santa Cruz do Escalvado, Geraldo de Aquino Filho e em especial à Mazarello,
coordenadora do Serviço de Vigilância Sanitária do município por toda boa vontade, acolhida
e disponibilidade. Também à Graziele, Eliseu e Dinho (Posto de Saúde) por toda atenção e
colaboração nas visitas.
À Simone Calic, coordenadora do Laboratório de Rickettsioses e Hantaviroses (FUNED) por
todo o apoio e disponibilidade na análise sorológica.
Ao professor Labruna do Laboratório de Medicina Veterinária e Zootecnia (USP) que, mesmo
muito atarefado, me recebeu também com toda a disponibilidade e atenção. Obrigado por todo
o aprendizado!
Aos meus amigos do Laboratório de Epidemiologia Molecular (LEM): Cris e pela
amizade e companheirismo em todos os momentos. Sem vocês, não seria possível! Ao Dick,
Bruno e Amanda (“Turma das Riquétsias”) também pela amizade, trabalho e principalmente
as viagens. Vão deixar saudades! Ao Dalton que, com sua amizade e carinho, me amparou em
vários momentos! Obrigada por tudo! E ao Wander e Fabrício “Lerê”, obrigado também! À
Rosângela, pelo apoio no laboratório!
Aos amigos distantes: Yara, Maria Carol, Danielle, Michael “Bigode” que, de forma
importante, também fizeram parte dessa etapa.
A todos os professores do NUPEB e amigos de mestrado, em especial a Arlete, Lizi, Cléia,
Lili, Valéria, Victor, Nilze, Juliana Boechat e ao querido Vinícios: saudade eterna!
Ao meu querido amigo “de infância”, o professor André Talvani, por toda a disponibilidade e
colaboração nos momentos que precisei. Você é um exemplo para os pesquisadores! Tenho
muito orgulho de você!
Aos professores Milton (Biofísica), Babá e Elísio (Biologia Celular), Terezinha
(Parasitologia), Ieso (Biologia Molecular), Marcelo (ENUT) também pela disponibilidade e
colaboração.
Ao Reitor Prof. João Luiz que, mesmo de forma indireta, acompanhou a jornada de toda a
família Pena nesta instituição. Por sua causa, nunca mais esquecerei o lculo I! Obrigado
pelo seu exemplo e seriedade no que faz!
Aos habitantes de Santa Cruz do Escalvado, em especial à D. Santinha que sempre nos
acolheu com todo cuidado e atenção em sua pensão. Ao Sr. Bino e esposa (Fazenda
Escalvado), obrigado pela companhia nas coletas da fazenda e também pelo belo cafezinho!!!
À Escola Polivalente, aos diretores que sempre compreenderam a minha luta, principalmente
agora no final; em especial a todos os meus alunos que, além de entenderem, sempre me
apoiaram de forma positiva. Aos amigos Kelly, Rosângela, Arquimedes, Lourival, Patrícia,
Cidão, Sônia, entre outros, que estiveram sempre presentes nos momentos bons e difíceis
dessa etapa.
À Luciana do Laboratório de Bioquímica e Biologia Molecular (UFV) que não mediu
esforços para me ajudar! Obrigada por tudo!
À D. Liete, Erenice, Luiz, Caetano, Jair, Eloísio, entre outros funcionários da Escola de
Nutrição, que sempre me receberam com toda atenção e carinho. Obrigado pela companhia e
ajuda nos momentos que precisei.
Ao Transporte da UFOP, em especial ao Rogério que sempre se disponibilizou para o
cumprimento das viagens. E aos motoristas que tantas vezes nos acompanharam com amizade
e profissionalismo.
Aos meus grandes amigos de Monlevade, Kátia, Alessandra, Tia Maura, Sirley, entre outros,
que mesmo distantes me apoiaram e incentivaram sempre! Muitas saudades!
À Cecília Kaiser, Patrícia, Luíza e Lucas por fazerem parte da minha vida, sempre dispostos
em me acolher com carinho e paciência. Amo vocês! Ao Nino, obrigado pelo inglês e pela
amizade também!
Aos amigos da República Bicho do Mato e Pulgatório pela amizade e pelas ótimas festas!
A todos aqueles que de alguma forma participaram deste trabalho....
MUITO OBRIGADA!
"O que me tranquiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição."
Clarice Lispector
RESUMO
A Ordem Rickettsiales abriga um grupo de parasitas intracelulares obrigatórios,
responsáveis por várias doenças humanas conhecidas como riquetsioses. Artrópodes
hematófagos e seus hospedeiros são responsáveis pela disseminação da doença ao homem.
Desde a década de 20, o Brasil apresenta histórico de doença riquetsial, onde a febre maculosa
Brasileira destaca-se como a mais comum e a mais letal dessas riquetsioses. Embora os
métodos sorológicos ainda sejam os mais indicados na confirmação da doença, o emprego de
técnicas de biologia molecular vem modelando uma nova realidade ao diagnosticar e detectar
cada vez mais patógenos específicos em todo o mundo. O município de Santa Cruz do
Escalvado, localizado no Vale do Piranga, Zona da Mata, Minas Gerais, é considerado foco
antigo para riquetsioses. Dentro do município, na localidade de Soberbo foi construída em
2004, a Usina Hidrelétrica de Candonga, alterando assim, a paisagem natural da região. Com
o objetivo de compreender a atual situação desse município, dentro de uma concepção de
ocupação e transformação do espaço geográfico como nosso marco teórico, buscamos avaliar
o nível de transmissão de riquetsioses na população de animais domésticos e silvestres
coletados em duas localidades pertencentes ao município, utilizando métodos sorológicos e
ferramentas da biologia molecular. Foram capturados 94 vertebrados silvestres dentre eles, os
roedores Rattus rattus, Nectomys squamipes e Oryzomys subflavus, além de gambás Didelphis
aurita. Dos roedores capturados, foram obtidos tecidos (fígado e baço). Foram coletados 427
ectoparasitos, entre Amblyomma cajennense, Rhipicephalus sanguineus, Anocentor nitens,
Boophilus microplus e pulgas da espécie Ctenocephalides canis em animais domésticos (cães
e eqüinos). Foram também coletadas 166 amostras de soro dos roedores e dos animais
domésticos, sendo estas submetidas à reação de imunofluorescência indireta utilizando
antígenos específicos para Rickettsia rickettsii, Rickettsia parkeri, Rickettsia felis, Rickettsia
bellii e Rickettsia amblyommii. Após a extração de DNA das amostras de tecidos de roedores
e de pools dos ectoparasitos coletados, foi realizada a amplificação através de PCR duplex,
contendo pares de oligonucleotídeos iniciadores gênero-específicos (CS e 17kDa), sendo o
produto obtido reamplificado com um par de iniciadores internos de 17 kDa (full nested
PCR). Os produtos amplificados foram visualizados em gel de poliacrilamida 8% corado pela
prata e as amostras positivas foram purificadas, seqüenciadas e comparadas com outras
seqüências depositadas no GenBank. A análise das seqüências obtidas de tecidos de roedores
permitiu a identificação do gênero Rickettsia em pools de ectoparasitos das espécies A.
cajennense, A. nitens e B. microplus coletados em eqüinos e da espécie R. sanguineus em
pulgas coletadas em cães. Os dados sorológicos apontam o R. rattus como o único roedor
sororeativo com 81,25% de positividade para riquétsias do Grupo da febre maculosa,
comparado aos demais roedores capturados, cujos resultados sorológicos foram negativos. Foi
também encontrada uma freqüência sorológica relativamente expressiva entre os gambás
capturados apresentando 14,3% para R. rickettsii e 14,3% para riquétsias do Grupo da febre
maculosa (GFM). Os eqüídeos apresentaram 5,4% de sororeatividade para R. bellii e 2,7%
para riquétsias do GFM, enquanto os cães apresentaram somente 2% para R. rickettsii e 2%
para R. parkeri.
Palavras chave: Riquetsioses, febre maculosa Brasileira, Rickettsia spp., ectoparasitos,
reservarios.
ABSTRACT
The Order Rickettsiales evolves a group of obligate intracellular parasites, responsible
for many diseases known as rickettsioses. Hematophagous arthropods and their hosts are
responsible for the disease dissemination to man. Since the 20’s, Brazil shows a description of
the rickettsial disease, where the Brazilian spotted fever appears as the most common and
with more high case-fatality ratio rickettsiose. Although serologic methods continues to be
most indicated in the disease’s confirmation, the use of molecular biology techniques has
been molding a new reality in diagnoses and detect even more specific pathogens in the whole
wide world. The city of Santa Cruz do Escalvado, located in the Piranga Valley, Zona da
Mata, Minas Gerais, is considered an old focus for rickettsioses. In the city, in Soberbo, was
built in 2004 the hydroelectric UHE-Candonga, modifying then, the natural landscape of the
place. Trying to comprehend the current situation of this place, considering the occupation
and transformation of the geographic space, we have investigated the level of rickettsioses
infection in domestic and wild animal’s population of two localities of the city, by using
serologic and molecular biology methods. There were captured 94 wild vertebrates among
them, the rodent Rattus rattus, Nectomys squamipes and Oryzomys subfalus, and also
Didelphis marsupialis opossum. Of the rodents captured, was made a tissue collection (liver
and spleen). There were collected 427 ectoparasites among Amblyomma cajennense,
Rhipicephalus sanguineus, Anocentor nitens, Boophilus microplus and Ctenocephalides canis
fleas in domestic animals (canines and equines). There were also collected 166 samples of
serum of rodents and of domestic animals, and those samples were evaluated through indirect
immunofluorescence reaction using specific antigen for Rickettsia rickettsii, Rickettsia
parkeri, Rickettsia felis, Rickettisia bellii, and Rickettisia amblyommii. DNA obtained from
rodent tissue samples and from pools of collected ectoparasites, was amplified by a PCR
duplex system, with oligonucleotides primers pairs (CS and 17kDa genes), and the obtained
product was re-amplified with a pair of inner primers for 17 kDa gene (full nested PCR). The
amplified product were visualized in polyacrylamide gel 8% silver stained and the positive
samples were purified, sequenced, and compared with others sequences in the GenBank. The
analysis of the sequences obtained from rodent tissues allowed the identification of Rickettsia
ssp sequence, as well as in pools of ectoparasites from A. cajennense, A. nitens and B.
microplus species collected in equines and the R. sanguineus and fleas collected in canines.
The serologic data points the R. rattus as the only rodent with 81,25% of seroreactivity to
spotted fever-group rickettsiae (SFG) when compared to the rest of captured rodents, with
negative serologic results. There were also found a relatively expressive serologic frequency
among opossums captured with 14,3% to R. rickettsii and 14,3% to spotted fever-group
rickettsiae (SFG). The equines showed 5,4% of seroreactivity to R. bellii and 2,7% to spotted
fever-group rickettsiae (SFG), while canines showed only 2% to R. rickettsii and 2% to R.
parkeri.
Keywords: Rickettsioses, Brazilian spotted fever, Rickettsia spp., ectoparasites, reservoirs.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA PÁG.
FIGURA 1-
Mapa da localização do Vale do Piranga, no estado de Minas
Gerais.
41
FIGURA 2-
Vista da Pedra do Escalvado, Santa Cruz do Escalvado,
Minas Gerais, 2006.
43
FIGURA 3-
Vista da UHE- Candonga, Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais.
43
FIGURA 4-
Mapa do estado de Minas Gerais, indicando a posição do
município de Santa Cruz do Escalvado em relação à capital,
Belo Horizonte.
73
FIGURA 5-
Foto da vegetação característica de uma área da região de
Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
74
FIGURA 6-
Foto de uma área próximo à estrada do PRONAF,
Patrimônio, onde armadilhas foram dispostas para captura de
animais silvestres. Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais,
2006.
75
FIGURA 7- Foto da localidade de São Sebastião do Soberbo, antes do
enchimento da barragem da UHE-Candonga.
76
FIGURA 8-
Localização das localidades estudadas pertencentes ao
município de Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
76
FIGURA 9-
Foto de local próximo a uma rua de Patrinio (estrada do
PRONAF), Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
77
FIGURA 10- Foto de amostras de fígado e bo coletados de roedores
silvestres capturados em Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais, 2006.
78
FIGURA 11-
Coleta de sangue em cães da localidade de Patrimônio. 79
FIGURA 12- Coleta de sangue em eqüinos da localidade de Soberbo. 80
FIGURA 13-
Coleta de ectoparasitos em roedores pelo método do
penteado.
81
FIGURA 14-
Foto de uma área da localidade de Soberbo, onde armadilhas
foram montadas para captura de pequenos mamíferos
(bambuzal).
91
FIGURA 15-
Foto dos destroços de São Sebastião do Soberbo, antes do
enchimento do lago de Candonga.
92
FIGURA 16-
Foto do ácaro da espécie Gygantolaelaps goyannensis
coletado em roedores silvestres no município de Santa Cruz
do Escalvado, Minas Gerais.
95
FIGURA 17-
Foto do gel de poliacrilamida 8%, corado pela prata, da
reação PCR duplex de DNA extraído de pulgas com os pares
de primers 17kDa (1 e 2) e CS (78 e 323).
101
FIGURA 18-
Foto do gel de poliacrilamida 8%, corado pela prata, da
reação Nested-PCR de amostras coletadas em ectoparasitos de
animais domésticos (eqüinos e cães).
102
FIGURA 19-
Foto do gel de poliacrilamida 8%, corado pela prata, da
reação Nested-PCR de DNA extraído de tecidos de roedores
com os primers N 17kDa 1 e N 17kDa 2, em gel de
poliacrilamida 8%, corado pela prata.
103
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO PÁG.
GRÁFICO 1-
Percentual de ectoparasitos coletados no município de Santa
Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
97
GRÁFICO 2-
Percentual de carrapatos coletados em cães e eqüídeos em
Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
97
GRÁFICO 3-
Percentual de soros reativos para riquetsioses ao título de
1:64 à RIFI em Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
100
LISTA DE QUADROS
QUADRO PÁG.
QUADRO 1-
Dados dos iniciadores utilizados na reação PCR duplex.
85
QUADRO 2-
Descrição das etapas de amplificação utilizadas na PCR
duplex.
85
QUADRO 3-
Dados dos iniciadores utilizados na reação nested-
86
QUADRO 4- Descrição das etapas de amplificação utilizadas na nested-
PCR.
86
QUADRO 5-
Relação do número de roedores capturados, ectoparasitos
coletados e descrição dos locais de captura desses roedores.
94
QUADRO 6-
Resultado apresentado pela RIFI em amostras de soro
coletadas em cães.
98
QUADRO 7-
Resultado apresentado pela RIFI em amostras de soro
coletadas em eqüídeos.
98
QUADRO 8-
Resultado apresentado pela RIFI em amostras de soro
coletadas em gambás.
98
QUADRO 9-
Resultado apresentado pela RIFI em amostras de soro
coletadas em roedores da espécie Rattus rattus.
99
QUADRO 10-
Identificação e descrição do local de captura de animais
domésticos e silvestres positivos para o sequenciamento e
resultado sorológico dessas mesmas amostras.
108
LISTA DE TABELAS
TABELA PÁG.
TABELA 1-
Total de animais investigados no município de Santa Cruz do
Escalvado, Minas Gerais, entre maio/2005 e março/2006.
93
TABELA 2-
Distribuão das amostras coletadas em espécies de pequenos
mamíferos silvestres para identificação de infecção natural por
riquetsioses no município de Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais.
95
TABELA 3-
Distribuão de espécies de ectoparasitos coletados no município
de Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais, por sexo e estágio de
acordo com seus respectivos hospedeiros.
96
TABELA 4-
Percentual de positividade para o teste de imunofluorescência
indireta em animais domésticos e silvestres coletados no
município de Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
100
TABELA 5-
Percentual de amostras positivas pela reação nested-PCR
segundo espécie e fonte dos tecidos e ectoparasitos.
104
TABELA 6-
Dados parciais da pesquisa de homologia das seqüências obtidas
de amostras de tecidos de roedores realizada com o Programa
BLASTn.
105
TABELA 7-
Resultados parciais da pesquisa de homologia das seqüências
obtidas de amostras de ectoparasitos, realizada com o Programa
BLASTn.
107
LISTA DE ABREVIATURAS
µg
micrograma, 10
-
6
g
µL
microlitro, 10
-
6
L
µM micromolar , 10
-
6
M
BSA
albumina de soro bovino
ddNTPs
dideoxinucleotídeos trifosfatados
DNA
ácido desoxirribonucléico
dNTPs
desoxinucleotídeos trifosfatados
EDTA
ácido etileno-diamino-tetracético
ELISA enzyme linked sistem assay
et al.
e colaboradores
FMB
febre maculosa Brasileira
FUNASA
Fundação Nacional de Saúde
GFM
Grupo da Febre Maculosa
GT
Grupo do Tifo
kDa
kiloDalton
LB
meio Luria-Bertani
M
molar
MEM
meio essencial mínimo
mL
mililitro, 10
-
3
L
mM
milimolar, 10
-
3
M
NaCl
cloreto de sódio
NaOH
hidróxido de sódio
ng
nanogramas, 10
-
9
gramas
OMS
Organização Mundial de Saúde
°C
graus Celsius
pb pares de bases
PBS
solução de fosfato tamponada
PCR
reação em cadeia da polimerase
pH
potencial hidrogeniônico
primer
oligonucleotídeo iniciador
pg
picogramas, 10
-
12
gramas
RIFD
reação de imunofluorescência direta
RIFI
reação de imunofluorescência indireta
sp.
espécie
spp.
espécie o determinada
SBF
soro bovino fetal
SDS
duodecil sulfato de sódio
TAE
tampão tris-acetato EDTA
Taq
Termophilus aquaticus
TBE
tris-borato EDTA
Tm
temperaturas de anelamento
TESP
tifo exantemático de São Paulo
UHE
Usina Hidrelética
X-Gal 5-bromo-4-cloro-3-indol- β-D-galactosídeo
CVRD
Companhia Vale do Rio Doce
RMSF
Rocky Mountain Spotted Fever
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
21
2. MARCOS TEÓRICOS
25
2.1
RIQUETSIOSES NA LITERATURA CIENFICA M
UNDIAL
26
2.2
RIQUETSIOSES
NA
LITERATURA
CIENTÍFICA
B
RASILEIRA 28
2.3
ESPAÇO E DOENÇA
37
2.3.1
O Espo em seu nível Macro-Social
40
2.3.2
O Espaço-Doença em seu Nível Ecológico 44
2.3.2.1
O Agente e a Doença 44
2.3.2.2
A Doença e o Ambiente 47
2.3.2.3
Os Vetores e a Interão Riquétsia-Vetor 48
2.3.2.4
Os Mamíferos Hospedeiros e Reservatórios 55
2.3.3
O Espo-Doença e o Indivíduo 62
2.3.3.1
Patogenia e Características Clínicas das Riquetsioses 62
2.3.3.2
Diagnóstico Laboratorial das Riquetsioses 64
3.
O
BJETIVOS
70
3.1 OBJETIVO GERAL 71
3.2
O
BJETIVOS ESPECÍFICOS 71
4.
METODOLOGIA
72
4.1
A
LOCALIDADE-ALVO DO ESTUDO 73
4.2
M
ATERIAIS E
M
ÉTODOS
77
4.2.1
Captura de Animais
77
4.2.2
Coleta de Ectoparasitos 80
4.2.3
A Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) em Ectoparasitos e em
Tecidos de Roedores
82
4.2.3.1
Extração de DNA 82
4.2.3.2
Padronizão da PCR–Obtenção do Controle Positivo 83
4.2.3.3
Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)
84
4.2.3.4
Seenciamento
87
4.2.4
Sorologia 88
5. RESULTADOS
90
5.1
CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
91
5.2
CAPTURA DE ANIMAIS E VETORES 92
5.3
SOROLOGIA ANIMAL 98
5.4
EXTRAÇÃO DE DNA 101
5.4.1
PCR Duplex e Nested-PCR (Ectoparasitos) 102
5.4.2
PCR Duplex e Nested-PCR (Tecidos Roedores) 102
5.4.3
Seqüenciamento 104
6.
DISCUSSÃO
109
7.
CONCLUSÕES
118
8. PERSPECTIVAS
122
REFENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
124
ANEXO
154
1. INTRODUÇÃO
22
Em todos os continentes, com exceção da Antártida, o encontradas infecções causadas
por riquétsias, cuja associação a artrópodes vetores como pulgas, carrapatos, piolhos e ainda
ácaros, ampliam a sua distribuição em todo o mundo. O caráter altamente epidêmico é o que
determina a gravidade da doença, levando a uma alta taxa de letalidade. Dentre essas
enfermidades a febre maculosa Brasileira (FMB) é considerada a mais prevalente doença
riquetsial no Brasil (LEMOS et al., 2001).
Sua fama é alarmante, sobretudo porque envolveu a morte de pesquisadores nos
primórdios das investigações. A epidemia do tifo exantemático, pertencente ao grupo das
riquetsioses, não poupou diversos cientistas, dentre eles, o brasileiro Henrique da Rocha
Lima, convidado pela Alemanha durante a 1ª Grande Guerra (1914-18) para esclarecer sobre
a epidemia. O cientista sobreviveu à doença após um grande período de convalescença, tendo
tornado-se famoso internacionalmente pela descoberta da causa do tifo epidêmico (ou
exantemático), uma doença transmitida pelo piolho do corpo que afligia combatentes e
prisioneiros de guerra na Europa (MORAES, 1968).
A mesma sorte não tiveram seus parceiros de pesquisa, o austríaco Stanislaus von
Prowazek´s e o cientista norte-americano Howard Taylor Ricketts, ambos mortos por infecção
de tifo exantemático. Prowazek´s foi o responsável pela descoberta do patógeno do tifo
exantemático e adquiriu a doença enquanto trabalhava com Rocha Lima em um hospital de
prisioneiros na Alemanha, em 1915. Ricketts foi o primeiro a estabelecer a identidade do
organismo causador da Rocky Mountain Spotted Fever (RMSF), outra riquetsiose,
descrevendo, também, as características epidemiológicas básicas dessa doença, incluindo o
papel do carrapato como vetor. Por essa razão, em homenagem aos ilustres cientistas, os
microorganismos passaram a ser chamados Rickettsia prowazekii e Rickettsia rickettsii,
respectivamente. Em 1909, Charles Nicolle´s deu o primeiro passo no desenvolvimento de
uma vacina e foi o responvel pela descoberta de que o tifo clássico epidêmico era
transmitido pelo piolho do corpo, o que muito colaborou na distinção entre o tifo murino,
transmitido pela pulga do rato. Com isso foi possível isolar o agente causador da doença e
desenvolver uma vacina, onde não obteve sucesso. Dos três pioneiros, somente Nicolle´s
sobreviveu à infecção por tifo e, por este trabalho acabou ganhando, em 1928, o Prêmio
Nobel de Medicina (FALCÃO, 1966).
23
no Brasil, a doença também teve um desfecho funesto. Em 1935, o destacado
pesquisador José Lemos Monteiro da Silva e seu auxiliar Édison Dias, ambos do Instituto
Butantã, foram infectados no laboratório triturando carrapatos infectados para produção de
vacina contra a doença, vindo a falecer poucos dias depois no Hospital de Isolamento, hoje
Hospital Emílio Ribas (FALCÃO, 1966).
Há muitos anos, conhecida popularmente, pelo homem do campo, como “sarampo preto”,
a febre maculosa é capaz de desencadear microepidemias intrafamiliares. As ocorrências
foram mascaradas pelo sarampo, não menos letal entre os pobres. Após o controle do sarampo
pela vacinação, a febre maculosa adquiriu maior visibilidade. Durante a longa epidemia de
doença meningocica dos anos 70 do século passado, a meningococcemia também encobriu
casos (GALVÃO, 1988).
O interesse mundial pelas infecções humanas causadas pelo gênero Rickettsia é crescente
não só pela identificação de várias espécies novas com seus respectivos quadros clínicos, mas
também pelo reconhecimento de que sua incidência e distribuição são maiores do que se
imaginava anteriormente (GALVÃO et al., 2005).
Nos últimos anos, vários casos de febre maculosa em humanos têm sido relatados no
Brasil, principalmente nos Estados de Minas Gerais e São Paulo, sendo identificados também
casos no Rio de Janeiro, Espírito Santo, Santa Catarina e Bahia. A letalidade da doença em
casos não tratados pode chegar a mais de 80% (GALVÃO et al., 1992). De caráter emergente,
a doença é considerada, desde o ano de 2002, como de notificação compulsória (SVS, 2002),
sendo monitorada por um sistema de vigilância epidemiológica com uma rede de laboratórios
de referência para enfermidades riquetsiais, a qual foi iniciada nos Estados de Minas Gerais e
São Paulo.
No Brasil, ao longo da sua história, tem ocorrido a disseminação de agentes infecciosos e
parasitários para novos hospedeiros e ambientes, estabelecendo-se assim novas relações entre
hospedeiros e parasitas, e novos nichos ecológicos na cadeia de transmissão das doenças
(CORRÊA e PASSOS, 2001), já que no país, eviadenciam-se inúmeros ecossistemas com
grande biodiversidade da flora e fauna. A destruição desses ecossistemas em larga escala pela
ação degradante do homem à natureza, adm em conseqüências desastrosas. O avanço da
agricultura e da pecuária próximo às áreas naturais proporcionou um contato entre as
populações humanas e de seus animais domésticos com as populações de animais silvestres
nos seus habitat, bem como a realização de atividades de lazer e esporte. Como conseqüência
dessas interações podem ocorrer casos de zoonoses, sob a forma epidêmica por dispersão de
24
animais suscetíveis e o aumento da disseminação geográfica da doença (BARLETT e
JUDGE, 1997). Dessa maneira, o estudo da epidemiologia dessas doenças torna-se vital para
o melhor conhecimento dos focos naturais das zoonoses, estabelecendo-se assim, os fatores de
risco existentes em determinados ecossistemas, a circulação de agentes entre os animais
silvestres, e a importância do conhecimento das doenças nestes animais subsidiando as ações
dos serviços de Saúde Pública.
Tem sido fundamental a implementação de técnicas inovadoras que permitem a distinção
entre as diferentes doenças riquetsiais (GALVÃO et al., 2004) destacando-se, aqui, a
aplicação de diagnóstico molecular, possibilitando, dessa forma, a descoberta de novas
espécies de riquétsias em todo o mundo (EREMEEVA et al., 1994; BILLINGS et al., 1998), a
caracterização molecular do gênero Rickettsia, bem como esclarecimentos importantes em
relação a outras já descritas (FOURNIER et al., 1998).
Buscando uma possível explicação para a eclosão de epidemias de febre maculosa em
regiões já colonizadas, em contraposição à outra forma da enfermidade, que é a ocorrência de
casos isolados em indivíduos que adquirem a doença ao entrar em contato com o vetor em
áreas conhecidas ou não como endêmicas, Galvão dedicou-se, a partir de 1982, à investigação
de casos e ao estudo da febre maculosa e seus determinantes no estado de Minas Gerais
(GALVÃO, 1988).
Além do estudo de áreas endêmicas como municípios pertencentes aos Vales de
Jequitinhonha e Mucuri, esse último autor também estudou áreas de focos isolados como o
relato, em 1985, da existência de dois casos suspeitos de FMB no município de Santa Cruz do
Escalvado-MG, pertencente ao Vale do Piranga, sendo um deles posteriormente confirmado
através de necropsia (GALVÃO et al., 1989). Dessa época para cá, este município vem se
comportando como área de foco silencioso.
No presente trabalho propusemos-nos realizar um estudo de caso a partir desse episódio
ocorrido em 1985 em Santa Cruz do Escalvado, valendo-nos do estudo do ciclo
epidemiológico das riquetsioses, envolvendo agentes riquetsiais em ectoparasitos de animais
domésticos e silvestres, bem como esses próprios animais, empregando-se técnicas
moleculares e sorológicas, com o objetivo de melhor conhecer a dinâmica de transmissão de
riquetsioses na referida área, e estimar o real risco ao qual está submetida sua população
humana.
2. MARCOS TEÓRICOS
26
2.1 RIQUETSIOSES NA LITERATURA CIENTÍFICA MUNDIAL
O primeiro relato da Febre das Montanhas Rochosas (Rocky Mountain Spotted Fever-
RMSF) data de 1896 em Idaho, nos Estados Unidos, publicado pelo Major Marshal H. Wood,
médico do exército americano, que juntamente com a população, acreditava que a doença
estava associada à contaminação da água que provinha do degelo das montanhas, no início da
primavera (HARDEN, 1990).
Em 1899, Maxcy descreve, pela primeira vez na literatura médica, as manifestações
clínicas da doea ocorrida no vale do Snake River, em Idaho, definindo-a como: “doença
febril endêmica, o contagiosa e infecciosa, caracterizada clinicamente por febre alta, dores
musculares, artrite e erupções petequiais ou purpurais profusas na pele, surgindo inicialmente
nos tornozelos, pulsos e testa, difundindo-se rapidamente para todas as partes do corpo
(RICKETTS, 1909).
No início do século XX, MacCalla e Brereton demonstraram a transmissão da doença por
carrapatos removendo um exemplar encontrado em um paciente colocando-o, em seguida,
para se alimentar em dois voluntários saudáveis que, subseqüentemente, desenvolveram a
doença (WALKER, 1998). Ficava demonstrado, assim, que o aumento na temperatura,
responsável por derreter a neve, era também responsável por retirar de um estado de latência
milhões de carrapatos que estavam no ambiente.
Em 1904, os pesquisadores Wilson e Chowning deram grande contribuição nos passos
iniciais de determinação da história natural das riquetsioses do grupo da febre maculosa,
descrevendo sua distribuição geográfica e sazonal, a especificidade de incidência quanto ao
sexo e idade, as taxas de letalidade, sinais clínicos e sintomas e as lesões patológicas. Esses
autores documentaram, ainda, a ausência de um agente etiológico bacteriano convencional e
predisseram que a doença tinha um agente etiológico infeccioso e um carrapato como vetor
(AIKAWA, 1916).
Em 1907, o Dr. Howard Taylor Ricketts isolou o agente etiológico da RMSF,
estabelecendo o papel do carrapato na transmissão da doença (RICKETTS, 1909). Em seus
estudos Ricketts indicava a semelhança dos agentes da RMSF e do tifo exantemático,
passando o gênero, a partir de 1916, a ser denominado Rickettsia em sua homenagem
(WEISS, 1991).
27
Entre 1916 a 1919, Wolbach visualizou o agente etiológico por microscopia de luz,
demonstrando ainda sua presença em ovos e todos os estádios de desenvolvimento do
carrapato, bem como em endotélio e musculatura lisa vascular de humanos, entre outros
vertebrados. Descreveu o agente e, em reconhecimento a contribuão de Ricketts, nomeou-o
Rickettsia rickettsii (WOLBACH, 1919).
Com o passar dos anos, rias ouras riquétsias têm sido reconhecidas mundialmente. Na
Europa, uma riquétsia do Grupo da Febre Maculosa (GFM), a Rickettsia conorii, agente da
febre maculosa do Mediterrâneo ou febre Botonosa, tem sido reconhecida, assim como a sua
patogenicidade em humanos, como também a Rickettsia slovaca, destacando-se ainda as
Rickettsia sibirica, agente do tifo do carrapato do norte da Ásia ou tifo Siberiano.
Na Austrália, além da identificação da Rickettsia australis, agente do tifo do carrapato de
Queensland e a Rickettsia honei, agente da “Flinder Islands spotted fever”, ambas
pertencentes ao GFM, também têm sido reconhecida a Rickettsia typhi do Grupo do Tifo
(GT). Recentemente novas espécies (ou subespécies) têm sido detectadas na Austrália, como
a “Candidatus Rickettsia marmionii”, responsável por causar uma doea com sintomatologia
crônica e aguda.
Em várias regiões, também têm sido descritas outras riquétsias como a Rickettsia
japonica, agente da “Japanese spotted fever” descrita pela primeria vez em 1984, Rickettsia
akari (Ricketsiose variceliforme ou Riquetsiose vesicular) e a Rickettsia africae, agente da
African tick bite fever , descrita em 1998.
A Rickettsia felis, agente da California flea typhus ou riquetsiose felis foi observada
inicialmente por Adams e colaboradores (ADAMS et al., 1990) em pulgas Ctenocephalides
felis felis e posteriormente confirmada como uma nova espécie através da caracterização
genotípica (BOUYER et al., 2001). Inicialmente essa bactéria foi incluída no GT com base
em características sorológicas, sendo recentemente, com o uso de cnicas de biologia
molecular, classificada no GFM (EREMEEVA e DASH, 2000). Através do seqüenciamento
genético, a R. felis tem sido identificada em pulgas do gênero Ctenocephalides no Brasil
(HORTA, 2002; OLIVEIRA et al., 2002; SANTOS, 2003; HORTA et al., 2005), Espanha
(MÁRQUEZ et al., 2002), Alemanha (RICHTER et al., 2002), Estados Unidos (BOOSTROM
et al., 2002), França (ROLAIN et al., 2003), Reino Unido (KENNY et al., 2003), Etiópia
(RAOULT et al., 2001a), entre outros.
28
Mais recentemente, Venzal e colaboradores (2006) descrevem a sua prevalência em
pulgas do gênero Ctenocephalides no Uruguai. A sua patogenicidade em humanos foi
demonstrada, pela primeira vez nos Estados Unidos, em 1994, por Schriefer e colaboradores.
Após esse período, houveram duas comunicações de riquetsioses causadas por R. felis na
América Latina. A primeira foi feita por Zavala-Velazquez e colaboradores em 2000 no
México. Em 2001, Raoult e colaboradores descreveram a ocorrência de dois casos humanos
no Brasil. Também foram descritos casos na França, Alemanha e Tailândia (RICHTER et al.,
2002; PAROLA et al., 2003; ROLAIN et al., 2003).
A Rickettsia parkeri, agente da riquetsiose parkeri teve o primeiro caso de infecção
humana reconhecida nos Estados Unidos em 2004 (PADDOCK et al., 2004). Neste mesmo
ano, essa bactéria foi detectada em carrapatos Amblyomma. triste no Uruguai, sendo a R.
parkeri a espécie considerada como o agente patogênico responsável pela doença neste país
(VENZAL et al., 2004). Mais recentemente, têm sido confirmados outros casos de
Riquetsiose parkeri em humanos nos Estados Unidos (RAOULT e PADDOCK, 2005;
FINLEY et al., 2006; SUMNER et al., 2007; WHITMAN et al., 2007).
2.2 RIQUETSIOSES NA LITERATURA CIENTÍFICA BRASILEIRA
No Brasil, apesar da escassez de informações sobre as doenças que acometeram o país nos
tempos pré-colonial e colonial, na “História da Companhia de Jesus no Brasilo Frei Serafim
Leite faz referência a uma carta de Anchieta, na qual há citação de epidemias de “tobardilho”,
designação utilizada no México para o tifo exantemático mexicano (MAGALHÃES, 1952).
De acordo com os riquetsiologistas brasileiros, o primeiro caso de riquetsioses parece ter
sido clinicamente diagnosticado em 1904, pelo médico José Augusto Arantes, no estado de
São Paulo, mas o estudo das riquetsioses veio despertar o interesse da classe médica em
geral a partir de 1929. existiam referências à doença desde o início do século, tanto no
Hospital de Isolamento, hoje Hospital Elio Ribas, quanto em outros hospitais do interior do
estado de São Paulo. Nos relatórios de Adolfo Lutz, no Instituto Bacteriológico de São Paulo,
constavam relatos de necropsias de dois casos em 1900, um em 1905 e dois em 1906
(RODRIGUES e TRAVASSOS, 1951).
29
Em 1920, Ulhôa e colaboradores, publicaram a primeira confirmação laboratorial de
riquetsiose no Brasil, através da reação de Weil-Felix. Piza e colaboradores, em 1929,
publicaram uma monografia sobre o tifo exantemático de São Paulo, discorrendo sobre
aspectos clínicos e epidemiológicos, descrevendo a anatomopatologia de 34 casos humanos e
os resultados de seus estudos experimentais com animais de laboratório.
Iniciou-se, dessa forma, a sua distinção das demais doenças exantemáticas no Brasil,
demonstrando a sua similaridade com a RMSF descrita pelos americanos. O agente etiológico
do tifo exantemático de São Paulo (R. rickettsii) e seu carrapato vetor (Amblyomma
cajennense) foram subseqüentemente identificados (PIZA et al., 1932). Outros casos da
doença tornaram-se conhecidos não em São Paulo, como também nos estados do Rio de
Janeiro (MALAGUETA, 1940) e Minas Gerais (MAGALHÃES, 1952).
Uma indicação da ocorrência da doença em Minas Gerais data do início do século XVII
através de registros, sendo citada, por mais de um século, por profissionais do norte do estado
como pintada”, “febre que pinta” ou “febre chitada”. A moléstia foi confundida durante
muitos anos com febre tifóide, meningococcemia, sendo até mesmo diagnosticada, em 1909,
no município de Queluz de Minas, atual Conselheiro Lafaiete, por Assis Andrade como tifo
exantemático” (MAGALHÃES, 1952).
Os pesquisadores Amílcar Viana Martins e Octávio de Magalhães foram os pioneiros na
pesquisa da doença no estado de Minas Gerais. Na década de 30, José Lemos Monteiro realiza
estudos sobre as relações entre o tifo exantemático de São Paulo (TESP) e RMSF comparando
a patogenicidade experimental do agente da FMB com a R. rickettsii, agente da RMSF,
detectando diferenças em relação aos sintomas das doenças (LEMOS-MONTEIRO e
FONSECA, 1932).
Demonstrou, ainda, a transmissão interestadial do agente da TESP pelo carrapato A.
cajennense, além de verificar a transmissão vertical do agente por fêmeas adultas do
carrapato. Ao examinar tecidos internos do carrapato, o autor identificou a bactéria que havia
sido descrita como Rickettsia brasiliensis e incriminada como o suposto agente etiológico do
TESP (LEMOS-MONTEIRO e FONSECA, 1932).
No mesmo ano de 1932, Monteiro e Fonseca isolaram uma riquétsia em cuja transmissão
se poderia incriminar os pulicídios de ratos. Paralelamente, Meyer et al., (1932) reproduziram
a doença em cobaias a partir da inoculação intraperitonial de emulsão de piolhos retirados de
um cadáver humano acometido por TESP.
30
Um ano depois, Gomes descreve o isolamento do agente etiológico do TESP, apontando o
gênero Amblyomma como o principal responvel pela transmissão da doença, sendo as
espécies A. cajennense e Amblyomma ovale os vetores mais prováveis, reservando aos piolhos
o papel de transmissor eventual (GOMES, 1933).
Em 1933, Octávio de Magalhães foi o responsável pelo isolamento da R. rickettsii de um
doente proveniente do interior do estado, além de relatar a distribuição geográfica do tifo
exantemático Neotrópico (como ele denominava a febre maculosa) em Minas Gerais, baseado
na observação de 232 pacientes (MAGALHÃES, 1952). Na década de 30 na capital mineira,
Belo Horizonte, um personagem da história da cidade, o Padre Eustáquio morreu ao contrair a
doença nos arredores da cidade. Ainda em 1933, Lemos Monteiro e Afrânio Amaral
procuraram classificar o “tifo exantemático de São Paulo”, cujos vetores habituais seriam,
provavelmente os carrapatos e os roedores silvestres incriminados como reservatórios dos
“vírus”.
No mesmo ano, Monteiro, em parceria com o Rocky Mountain Laboratory, nos Estados
Unidos, verificaram, em uma série de experimentos utilizando cobaias, a identidade
imunológica dos agentes, considerando: a) proteção cruzada dos soros de animais imunes à
FMB em relação à RMSF (LEMOS-MONTEIRO, 1933; PARKER e DAVIS, 1933); b)
resistência cruzada dos animais imunes ao agente da FMB frente ao da RMSF (DYER, 1933;
LEMOS-MONTEIRO, 1933); c) vacinas produzidas a partir de vetores infectados pelos
agentes das respectivas doenças protegerem animais contra as duas infecções (LEMOS-
MONTEIRO, 1933).
Dyer descreveu que o “vírus” do tifo europeu clássico ou histórico poderia desenvolver-se
na Xenopsylla cheopis. Meyer e Saborido apuraram, na época, que o “vírus” brasileiro poderia
evoluir no Pediculus capitis, que transmitiria assim, após se infectar, a febre exantemática
brasileira e Weigl, anteriormente, mostrou que o “vírus” da RMSF infectava o piolho do
corpo. Segundo ainda Weigl, o vírus da RMSF poderia evoluir também em P. vestimentorum
(LEMOS-MONTEIRO, 1933).
Em 1935, Monteiro constatou que percevejos da espécie Cimex lectularius,
freqüentemente encontrados parasitando humanos acometidos pelo “tifo exantemático de São
Paulo”, não eram vetores competentes do agente etiológico, como suspeitava-se na época.
31
Fonseca (1935) demonstrou que o exemplar de A. ovale naturalmente infectado pelo
agente do TESP era, na verdade, Amblyomma striatum, atualmente classificado como A.
aureolatum. Apontou, então, as espécies A. aureolatum e A. cajennense como os ixodídeos de
maior importância na transmissão do TESP, enquanto a espécie A. ovale jamais fora
encontrada naturalmente infectada pelo agente desta doença.
Ainda em 1935, os pesquisadores do estado de Minas Gerais, Moreira e Magalhães foram
os primeiros a conduzirem um estudo epidemiológico no Brasil. Embora a possibilidade da
participação de animais silvestres no ciclo da febre maculosa ter sido sugerida por Ricketts
(1909), foi de Moreira e Magalhães o feito de isolar pela primeira vez o agente causador da
febre maculosa de um animal silvestre. Através de um experimento, conseguiram reproduzir a
doença em cobaias, após inoculação de sangue colhido de um gambá Didelphis marsupialis.
Além disso, estes autores também encontraram carrapatos A. cajennense naturalmente
infectados pelo agente, parasitando um o doméstico (MOREIRA e MAGALHÃES, 1935),
demonstrando-se assim, o papel do carrapato como principal transmissor da doea ao
homem. Conclui-se ainda que a FMB se tratava de uma moléstia infecciosa, febril, aguda, via
de regra exantemática, de amplo espectro clínico e freqüentemente de elevada letalidade,
predominantemente rural e registrada há mais de 30 anos em todo o estado de Minas Gerais.
Com a utilização da técnica de diagnóstico indireto de Weil-Félix, disponível na época do
estudo, os autores listaram os seguintes hospedeiros vertebrados como prováveis reservatórios
do agente: o gambá D. marsupialis, o cão Canis familiaris, o cachorro do mato (Dusicyon sp;
Sin. Canis brasiliensis), o coelho do mato (Sylvilagus brasiliensis; Sin. Sylvilagus minensis),
o preá (Cavia aperea) e a cutia (Dasyprocta azarae) (MOREIRA e MAGALHÃES, 1937).
Os mesmos autores identificaram, em laboratório, pela primeira vez, o vírusdo “tifo
exantemático Neotrópico em Minas Gerais”, mudando mais tarde para “tifo exantemático do
Brasil”, pois a moléstia foi provada existir também em o Paulo e Rio de Janeiro, sendo
comprovada posteriormente que essa moléstia afetava toda a região neotrópica das Américas,
sendo citada, portanto, como “tifo exantemático neotrópico brasileiro”, embora não
reconhecessem a bactéria R. brasiliensis descrita pelos pesquisadores paulistas, como o
provável agente etiológico da doença. Acreditavam, nessa época, que essas doenças poderiam
ser transmitidas também aqui no Brasil, não somente por carrapatos, mas por percevejos e
piolhos. O estudo tentava mostrar a patogenicidade do “vírus”, e incriminava os seguintes
artrópodos na sua transmissão: o carrapato comum dos campos mineiros (A. cajennense) e o
percevejo da espécie C. lectularius, conhecido como percevejo dos leitos.
32
Naturalmente, a espécie de carrapato poderia variar com as regiões, sendo que em regiões
de mato era comum o A. brasiliensis (MOREIRA e MAGALHÃES, 1937).
Considerando os transmissores das riquetsioses, Pinkerton em 1936, propõe uma
classificação para as moléstias febris que produziam estupor e exantema, aceitando o termo
“rickettsioses” proposto por Afrânio Amaral e sar Pinto, continuado por Lemos Monteiro,
em dois grupos: o primeiro grupo seria transmitido por pulgas e piolhos e o segundo, por
carrapatos, sendo essa classificação, mesmo para a época, considerada precária. Constatou-se
ainda, na época, que o tifo clássico europeu poderia ser transmitido pelo percevejo da espécie
C. lectularius (DIAS et al., 1937).
Segundo estudos posteriores, em 1939, o mesmo autor conseguiu afastar como vetores da
moléstia cerca de 10 artrópodes, dentre eles a Pulex irritans, a X. cheopis, a C. felis e o
Panstrongylus megistus (DIAS, 1939). Incriminaram, ainda, as espécies de carrapatos
Riphicephalus sanguineus, transmitido de o a cão, o Ixodes loricatus, transmitido de gambá
a gambá e, mais raramente, Haemaphysalis leporis palustris, de coelho a coelho.
Octávio de Magalhães também descreve as características epidemiológicas da doença
incluindo a sazonalidade dos carrapatos da espécie A. cajennense, sendo a fase de ninfa,
comum nos meses de agosto e setembro, meses secos e quentes e as larvas, de abril a julho,
meses frios e secos. Acreditava ele que o A. cajennense infectado, necessitaria de mais de 30
horas de picada para transmitir a moléstia. Em 1948, comprovou-se definitivamente que o A.
cajennense era a espécie de carrapato mais freqüentemente envolvido na doença
(MAGALHÃES, 1952).
Em 1941, Tostes & Bretz demonstraram que a doença não estava restrita aos estados de
São Paulo e Minas Gerais, comprovando laboratorialmente que a mesma também ocorria no
estado do Rio de Janeiro. Ainda no mesmo ano, Gregory descreve o primeiro relato de tifo
exantemático ocorrido no estado do Rio Grande do Sul (GREGORY, 1941).
Um ano depois, os pesquisadores Travassos & Vallejo (1942) verificaram que além do
gambá, o cavídeo Cavia aperea era susceptível ao agente do tifo exantemático do Brasil,
quando inoculado em laboratório e desenvolvia a doença, à semelhaa da cobaia e
diferentemente do comportamento clínico apresentado pelas capivaras (Hydrochaerus
hydrochaerus). Constataram, ainda, que estes animais silvestres haviam tido contato com a
doença na natureza e sobreviveram.
33
Esses mesmos autores, mais tarde, editaram um extenso trabalho sobre a manutenção e
produção de carrapatos A. cajennense em laboratório para atender uma alta demanda de
ixodídeos para produção de uma vacina (TRAVASSOS e VALLEJO, 1947).
As vacinas contra febre maculosa haviam sido testadas desde 1929 quando utilizava-se
suspensão fenolizada de carrapatos infectados com R. rickettsii, sendo, posteriormente,
substituídas por vacinas preparadas com riquétsias cultivadas em membranas vitelinas de ovos
férteis de galinha. O insucesso da vacina contra febre maculosa levou os pesquisadores a
testarem métodos mais eficazes no tratamento dos doentes, sendo o advento dos antibióticos
na década de 40, a principal arma encontrada pelos pesquisadores no combate à enfermidade,
especialmente a lauril sulfato de tetraciclina (TIRIBA et al., 1968).
No início da década de 50, Octávio de Magalhães publica um extenso trabalho de toda a
história clínica e comportamental da doença em Minas Gerais no período de 1929 a 1944,
descrevendo 245 casos em 22 municípios mineiros (MAGALHÃES, 1952).
Apesar do sistema de divulgação e informação ineficiente, neste mesmo período foram
notificados cerca de 863 casos de FMB nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de
Janeiro, especialmente nas áreas rurais (PASCALE, 1946; MAGALHÃES, 1952), tornando-
se de grande interesse médico e cienfico.
Após uma fase de vários estudos e publicações sobre a febre maculosa brasileira nas
décadas de 1930 e 1940, houve um silêncio na literatura médica. Jaime Neves, em relato
pessoal, informa a existência de vários casos no período de 1957 a 1979 atendidos no Hospital
Carlos Chagas, antiga Clínica de Doenças Infecciosas da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Minas Gerais, a qual servia de referência para todo o estado.
Entretanto, a desativação do Hospital Carlos Chagas, que culminou com seu fechamento em
1979, trouxe como resultado a extinção da memória da FMB e também de outras patologias
infecciosas em Minas Gerais (GALVÃO, 1988).
A introdução de antibióticos na década de 40 e seu uso indiscriminado por pacientes com
quadro febril inicial a esclarecer, especialmente o uso do cloranfenicol e das tetraciclinas,
parece, também, ser outro fator que levou a doença ao esquecimento, por abortar seus
principais sinais e sintomas, em especial o exantema maculo-papular. Apesar disso, a doença
não deixou de fazer vítimas (GALVÃO, 1988).
34
Embora Monteiro e colaboradores (1932) tivessem sugerido a bactéria R. brasiliensis
como o provável agente da FMB, nenhum outro autor adotou essa nomenclatura. A vida
sobre a espécie causadora da FMB pairava sobre a falta de diagnóstico específico e
caracterização do agente: o resultado obtido a partir de um animal ou humano com sorologia
positiva para R. rickettsii não era esclarecedor em função das reações heterólogas entre as
riquétsias do GFM, ou seja, o título de anticorpo apresentado poderia ter sido induzido por
uma riquétsia o patogênica ou de baixa virulência do GFM (MCDADE e NEWHOUSE,
1986).
Em 1977, Buxton e Fraser passaram a considerá-las bactérias e não mais vírus”, de
tamanho muito reduzido, que haviam desenvolvido um modo de vida ultraparasitário.
Somente em 1978, as quatro décadas, veio a confirmação de que o agente causador da
FMB era de fato a R. rickettsii, através da técnica de sorotipagem por
microimunofluorescência de uma amostra do agente causador do TESP enviada por Lemos
Monteiro ao pesquisador Parker no Rocky Mountain Laboratory ainda na década de 30
(PHILLIP et al., 1978).
Em 1979, foi relatada a presença presumida da FMB em Salvador, primeiro caso
publicado no estado da Bahia (PLANK et al., 1979).
Gonçalves e colaboradores (1981) e Galvão e colaboradores (1983), diagnosticaram casos
humanos no estado do Rio de Janeiro e Minas Gerais, fundamentados em aspectos clínico-
epidemiológicos e laboratoriais e chamaram a atenção para os aspectos clínicos da doença no
que se refere ao diagnóstico diferencial da FMB com outras entidades freqüentes na prática
clínica. Melles e colaboradores (1992) diagnosticaram um caso positivo para FMB, através de
sorologia e isolamento do agente em cobaias no estado de o Paulo.
Observou-se também a reemergência da doença, seja pela invasão pelo homem dos focos
naturais da doença, seja pelo contato com focos transformados (GALVÃO, 1996), tendo esses
novos casos ocorrido principalmente em Minas Gerais (GALVÃO, 1988) e São Paulo
(BRANCHINI, 1998). Além dos estados já citados, foi também registrada a ocorrência da
doença no norte do Paraná (MANCINI et al., 1983), sugerindo uma distribuição geográfica da
doença mais ampla do que se conhecia anteriormente.
35
No estado de Minas Gerais, em 1983, Galvão e colaboradores descrevem um surto
epidêmico de FMB em Ribeirãozinho, município de Grão Mogol, norte de Minas Gerais
baseado em critérios clínico-epidemiológicos e laboratoriais. Inicialmente foram 16 casos
suspeitos, tendo quatro deles ficado como prováveis e 12 permanecidos como suspeitos pela
reação de Weil-Félix. Desses 12, oito foram a óbito antes que se iniciasse a investigação. Foi
realizado também um inquérito sorológico para riquetsioses em cães da mesma região,
também através da reação de Weil-Félix, não sendo encontrado resultado positivo (GALVÃO,
1988). O autor citado alertava, nessa oportunidade, para a necessidade da implantação de uma
política definitiva de vigilância epidemiológica das doenças, assim como o diagnóstico
laboratorial em Minas Gerais, o que vem a ser consolidado somente a partir da metade da
década de 90.
Em 1984, Galvão descreve no município de Ouro Verde de Minas, 12 casos suspeitos,
com 100% de letalidade e no município de Bertópolis, 19 casos suspeitos com seis óbitos,
apresentando 31,5% de letalidade, municípios esses pertencentes aos Vales do Mucuri e
Jequitinhonha (GALVÃO, 1988).
Em 1989, houve a ocorrência de nove casos suspeitos de febre maculosa no município de
Serro e em 1990 a doença foi observada no município de Virginópolis, até então o mais
recente foco epidêmico conhecido da época, inclusive com características diferentes dos focos
anteriores por se situar em área periurbana. Esse município pertencia à região do Vale do Rio
Doce, região com dinâmica populacional e tipo de ocupação com características peculiares,
embora contígua do ponto de vista geográfico à região Nordeste de Minas Gerais onde os
casos relatados de FMB ocorreram predominantemente na década de 80 (GALVÃO, 1996).
Em 1992, é feito o isolamento do gênero Rickettsia em humanos, a partir da biópsia de
pele de um paciente proveniente da zona rural do estado de São Paulo, fato esse que ainda não
havia sido descrito na literatura internacional (MELLES et al., 1992).
Nesse mesmo ano, a Secretaria de Saúde de Minas Gerais, identificou a existência de um
foco periurbano de febre maculosa expressivo em termos de ocorrência de casos, registrando
15 óbitos no município de Caratinga, localizado no Vale do Rio Doce (Galvão et al, 1996).
Um inquérito sorológico relatado por Galvão no mesmo ano, realizado nessa localidade,
registra uma prevalência de infecção de 2% em humanos, 25% em cães e 53% em eqüinos
através da Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI) utilizando-se antígeno específico
para R. rickettsii (GALVÃO, 1996).
36
A seguir ocorreram novos surtos em Caeté (1993), Nova Lima e Pará de Minas (1994) e
Novo Cruzeiro, Santos Dumont e Juiz de Fora (1995).
Em 1996, Lemos e colaboradores encontraram um exemplar de carrapato da espécie
Amblyomma dubitatum, anteriormente nomeado Amblyomma cooperi, naturalmente infectado
por riquétsias do GFM em capivaras. Um ano depois, encontraram carrapatos também
naturalmente infectados com organismos sugestivos de riquétsias em A. cajennense, R.
sanguineus, Boophilus microplus e Anocentor nitens, aravés do teste de hemolinfa pela
coloração de Gimenez (LEMOS et al., 1997).
Em 2002, no Rio de Janeiro, Rozental e colaboradores identificaram, por
imunofluorescência direta, riquétsias do GFM infectando o carrapato da espécie R.
sanguineus.
A partir de 2002, R. felis foram identificadas em pulgas do nero Ctenocephalides, e
também através do seqüenciamento de DNA, em carrapatos do gênero Amblyomma
detectados nos estados de Minas Gerais e São Paulo (HORTA, 2002; VIANNA, 2002;
GALVÃO M. A. M et al., 2002a; SANGIONI, 2003; SANTOS, 2003) e mais recentemente
em carrapatos da espécie R. sanguineus (CARDOSO et al., 2006) além das espécies R. bellii
encontrada em carrapatos A. dubitatum (cooperi) (LABRUNA et al., 2001), R. amblyommii
em carrapatos do gênero Amblyomma (LABRUNA et al., 2003) e R. rickettsii isolados de
carrapatos Amblyomma spp. (SANTOS, 2003).
A confirmação de casos com sorologia positiva para R. felis em Minas Gerais (RAOULT
et al., 2001a), demonstrou a importância de se investigar outras riquétsias com potencial
patogênico para o homem.
Através de análises moleculares, sugeriu-se, em pesquisa realizada no estado de São Paulo
em 2004, que a espécie A. aureolatum seja também considerada vetor da R. rickettsii no
Brasil, suportado pelo fato de isolarem a R. rickettsii e a R. bellii em células de cultura de
carrapatos provenientes dessa mesma espécie (PINTER e LABRUNA, 2006).
Além dessa espécie, detectaram também a R. bellii em A. dubitatum e a R. amblyommi em
Amblyomma longirostre, também por PCR (LABRUNA et al., 2004b).
Recentemente foi realizado o isolamento de R. rhipicephali e R. bellii em carrapatos
Haemaphysalis juxtakochi no estado de São Paulo, incriminando-se a R. bellii como a espécie
que mais freqüentemente infecta carrapatos no Brasil (LABRUNA et al., 2007).
37
Embora as doenças causadas pelo gênero Rickettsia sejam as mais presentes no Brasil,
infecções por espécies do gênero Ehrlichia foram recentemente detectadas no país. Em 2004,
Calic e colaboradores descreveram os primeiros casos clínicos humanos suspeitos do gênero
Ehrlichia no estado de Minas Gerais (CALIC et al., 2004). Angerami e colaboradores
descrevem, em São Paulo, em 2006, o primeiro caso confirmado por reação em cadeia da
polimerase (PCR) de ehrliquiose humana no Brasil, descrevendo os aspectos clínicos,
epidemiológicos e laboratoriais da doença.
Concluindo, é importante destacar que a Organização Mundial de Saúde considera que,
devido às suas complexas relações epidemiológicas, as riquetsioses requerem uma estreita
vigilância e estratégias de controle. A rao disso reside no fato de que, apesar do aparente
controle obtido com o uso de antibióticos e de inseticidas, nenhuma riquétsia patogênica ao
homem foi ainda erradicada (PERVIKOV, 1991).
2.3 ESPAÇO E DOENÇA
Na Europa do final do século XVIII e a primeira metade do século XIX, encontramos os
pilares da Medicina Social alicerçados nos modelos da Medicina Urbana Francesa, Medicina
de Estado Alemã e da Medicina da Força de Trabalho Inglesa (ALMEIDA-FILHO e
ROUQUAYROL, 1992) surgidas no intuito de minimizar as conseqüências trazidas pela
Revolução Industrial à população da Europa, como a rápida expansão desordenada de grandes
massas nos centros urbanos em condições bastante precárias de vida e de saúde.
Segundo Chadwick, principal representante e autor da reforma sanitária da época, essa
intervenção não deveria afetar o modo de produção vigente, e sim, discipliná-lo de modo a
coibir seus efeitos nocivos sobre as condições de saúde do proletariado. Chadwick, então,
interpreta a doença como resultante de inadequações na estrutura urbana que poderiam ser
corrigidas através de uma legislação sanitária bem organizada (RINGEN, 1970).
O trabalho de John Snow estabelece pela primeira vez, os princípios da investigação
epidemiológica ao analisar, separadamente, as características de tempo, lugar e pessoa,
isolando um a um os fatores intervenientes e comparando as características de locais e pessoas
afetados pelas epidemias de cólera ocorrido em Londres (SNOW, 1967).
38
O aparecimento da Microbiologia ocorrido no final do século XIX, parecia ter a
capacidade de ampliar os determinantes da doença, porém a mesma acabou restringindo-se
em descrever a Teoria dos germes e o ciclo das infecções, mascarando a natureza
simultaneamente biológica e social da doença, proposto pela ala liberal da Teoria do
Anticongio no advento da Medicina Social (GALVÃO, 1988).
Na década de 30, o parasitologista russo Pavlovsky, desenvolve a teoria dos focos naturais
das doeas transmissíveis. Pavlovsky percebeu que extensas áreas do terririo da então
União Soviética estavam sendo desbravadas e exploradas, emergindo, como conseqüência,
graves problemas de saúde pública como a ecloo da leishmaniose na Ásia Central e as
encefalites por arbovírus na Sibéria. Estabeleceu-se, a partir d, o conceito, ainda que de
cunho ecologista, de que o espaço era o cerio no qual circulava o agente infeccioso - a
patobiocenose; este cenário era classificado em natural, ou intocado pela ação humana, e
antropopúrgico, alterado pela ação humana (PAVLOVSKY, 1963).
A modificação do espo, ou paisagem, determinava alterações ecológicas na
patobiocenose, alterando a circulação do agente infeccioso (GALVÃO, 1988).
Os sucessos da moderna tecnologia microbiológica como as drogas antimicrobianas,
vacinas, inseticidas, dentre outros, durante e logo as a 2ª Guerra Mundial, abriram a era dos
pacotes tecnológicos para o controle das doenças, não levando em consideração que muitas
vezes uma mesma doença pode assumir características diferentes conforme o local e
população acometidos. Com isso surgiram as teorias ecológico-geográficas” que buscavam
na própria variabilidade da natureza a explicação para a variabilidade das doenças, iniciando o
movimento chamado de “Geografia Médica”(SILVA, 1985).
No entanto, essas variantes ecológico-geográficas, também falharam por prescindirem de
uma visão antropológica e social. Assim sendo, elas conseguem analisar no máximo a questão
das paisagens modificadas pelo homem, não conseguindo entrar no problema das paisagens
organizadas (GALVÃO, 1996).
O domínio da epidemiologia à base da biologia durante o século XX fez ofuscar a
natureza social deixando para a sociedade somente o papel de modulador do processo de
distribuão e intensidade da doença (SILVA, 1985).
Com Teoria Contra-Hegenica fazendo face a essa concepção, surge à partir da década
de 60 nos países da América Latina, a vertente da Epidemiologia Social (GALVÃO, 1988).
39
A partir da constatação que a Epidemiologia é uma só no estudo dos determinantes da
ocorrência e distribuão das doenças, o que deve variar são os processos explicativos
empregados em cada estudo (SILVA, 1985). Dentro desse enfoque, a introdução de
concepção de espaço se aplica como categoria de análise do processo saúde-doea. A grande
questão passa a ser a compreensão da doença nos espaços ocupados e transformados pelo
homem. Ainda que os primeiros investigadores dentro da linha da teoria dos focos naturais de
Pavlovsky buscassem identificar padrões paisagísticos que permitissem antever as doenças
existentes, a aceleração da intervenção humana no espaço natural se fez de maneira tão
rápida, criando novos e mutáveis padrões de organização espacial, que o tratamento dado por
Pavlovsky ao espaço se tornou rapidamente obsoleto, uma vez que o espaço natural
praticamente passou a não mais existir.
A teoria dos focos naturais de Pavlovsky deixa implícito que há um conjunto de relações
no interior da paisagem responsáveis pela ocorrência da doea, e à luz dos conceitos
geográficos de George e Dollfus, permite a elaboração de um conceito operacional de espaço
extremamente rico para a análise epidemiológica, incorporando os determinantes naturais e
sociais numa visão de totalidade, permitindo, dessa forma, a análise do espo e de suas
transformações como ponto central da análise (SILVA, 1997).
Para a epidemiologia, o eixo de análise é a coletividade e seu comportamento, ou seja, o
processo de interação desta com a natureza e a maneira como o meio é transformado,
organizado para sustentar a atividade econômica, resultando numa perspectiva hisrica da
doença consentindo, assim, uma visão dinâmica do processo saúde-doença.
O determinante maior do processo de organizão do espaço é a necessidade econômica
que vai reorganizar o espaço conforme as necessidades das atividades que devem se
desenrolar seja a agricultura, a exploração mineral, o transporte de mercadorias, a produção
de energia, a fabricação de produtos ou a construção de cidades.
Muitas doenças, e em especial as zoonoses, têm habitat naturais em ecossistemas bem
definidos nos quais patógenos, vetores e hospedeiros naturais formam associações, ou
biocenoses, em que o patógeno circula. A ocupação pelo homem de tais focos naturais leva à
ocorrência de casos de doença no local. A doença passa a ter como que uma personalidade
própria e se incorpora no contexto ecológico, sendo vista como parte integrante do
ecossistema.
40
A identificação destas relações causais ou fundamentais é a chave do processo de
investigação. Uma vez feita esta identificação, passa-se para a reconstrução do processo de
organização do espaço que resultou no sistema de relações identificado. Dessa forma, ao invés
de partir da doença e analisar como esta se insere no contexto, parte-se da totalidade,
analisando como esta criou as condições de ocorrência da doença.
Assim, agente, hospedeiro e vetor serão analisados daqui para frente como membros
ativos desse espaço, havendo uma interação constante entre os mesmos, não se admitindo uma
identidade isolada de cada um.
O mesmo é dividido didaticamente por Barbosa (1985) em três níveis (macro-social,
ecológico e individual), sendo o nível macro-social aquele no qual estão o modelo de
sociedade e economia vigentes. As normas que são ditadas nesse vel irão refletir
diretamente nos dois outros níveis, o ecológico e o individual. No nível ecológico estão o
ambiente natural e o ambiente social, esse último onde estão situadas as classes sociais. No
nível individual, se situam os caracteres genéticos e pessoais de cada indivíduo.
2.3.1- O ESPAÇO EM SEU NÍVEL MACRO-SOCIAL:
O VALE DO PIRANGA NO ESTADO DE MINAS GERAIS
A região conhecida hoje como Vale do Rio Piranga foi descoberta em 1692, antes mesmo
da ocupação de Vila Rica, hoje Ouro Preto, que ocorreu em 1698. O Rio Piranga foi
descoberto pelo bandeirante Antônio Rodrigues Arzão, pela primeira vez. Tem origem
indígena, significando rio vermelho. Nessa época, o território mineiro ocupado pelo vale,
ficou povoado de refugiados indígenas do litoral e de São Paulo, impelindo da região a tribo
dos Puris e outras tribos instaladas nos Vales do Piranga e do Pomba e, esses grupos
indígenas eram atacados às vezes pelos Goitacás de Muriaé, que vinham ocultar-se sobre a
serra no Vale Guará-Piranga (que significa ssaro-vermelho”) (VASCONCELLOS, 1974).
O Vale do Piranga (Figura 1) está localizado ao norte da Zona da Mata de Minas Gerais, é
uma região montanhosa e de muitos vales, área onde a mineração e a prática de atividades
agropecuárias representam as principais atividades econômicas.
41
Figura 1: Mapa da localização do Vale do Piranga, no estado de Minas Gerais.
A região pertence à bacia do Rio Doce e tem sua hidrografia composta por vários rios,
ribeirões e rregos. Os rios mais importantes são Piranga (corta a região no sentido norte-
sul), Carmo, Matipó, Casca e Turvo.
Compreende vários municípios, dentre eles: Abre Campo, Acaiaca, Amparo do Serra,
Araponga, Barra Longa, Cajuri, Canaã, Coimbra, Diogo de Vasconcelos, Ervália, Guaraciaba,
Jequeri, Oratórios, Paula Cândido, Pedra Bonita, Pedra do Anta, Piedade de Ponte Nova,
Ponte Nova, Porto Firme, Rio Doce, Santo Antônio do Grama, São Miguel do Anta, o
Pedro dos Ferros, Sem Peixe, Sericita, Teixeiras, Urucânia, Vermelho Novo.
Ainda fazem parte do Vale do Piranga alguns municípios onde a FMB já deixou o seu
registro, como Viçosa, Ouro Preto, Mariana, Antônio Dias, Alvinópolis, Dom Silvério, Raul
Soares e Santa Cruz do Escalvado.
Atualmente, a região tenta superar uma estagnação econômica que se destacou com a
produção de café e de cana, quando a concentração de quase 70% da população era no meio
rural. Agora, a atividade no campo depende muito da bovinocultura extensiva e agrava-se o
êxodo nos municípios, com a permanência de pouco mais de 30% das famílias nas
propriedades, que são em sua maioria de pequeno porte.
42
A região estudada é bastante variada, tanto em aspectos econômicos, geográficos ou
sócio-culturais. Existem grandes indústrias mineradoras (Ouro Preto e Mariana), de laticínios
(Rio Casca), de ferramentas (Raul Soares), entre outras, todas de projeção nacional e
internacional.
Destacam-se ainda, municípios como Ponte Nova, com atividades de gados de corte, cana-
de-úcar, cafeicultura, hortifrutigranjeiros, e principalmente suinocultura, que ocupa
atualmente o quarto lugar de maior pólo produtor de suínos do Brasil e o maior no estado de
Minas Gerais, respondendo por 33% de toda a carne consumida no estado.
Considerando o município de Santa Cruz do Escalvado, região que se caracteriza por uma
topografia predominantemente montanhosa e ondulada, sendo banhada pelas águas do Rio
Doce desde a localidade chamada Taboão até a divisa com o Município de Rio Casca e da
localidade de São Sebastião de Soberbo até a divisa com Ponte Nova, sendo que o resto do
município é banhado por pequenos córregos.
Sua economia é baseada na agropecuária destacando-se as atividades de criação de gado
bovino, produção de leite e o cultivo de cana-de-açúcar, mas também devem ser considerados
o de milho, feijão, arroz, ca e a fruticultura. Desenvolvem-se, ainda, a produção de
laticínios, rapaduras e de cachaça.
O Programa Nacional de Agricultura Familiar (PRONAF) presta serviços aos produtores
rurais do município e mantém em sua sede municipal uma engarrafadora de aguardente, um
tanque de resfriamento de leite além de vários equipamentos para uso no campo.
Apesar de o município apresentar casos de doenças como dengue e Chagas, atualmente a
Leishmaniose tegumentar é a zoonose de maior preocupação, sendo notificados 7 casos em
2005 e 14 em 2006.
O mais importante acidente topográfico do município é a Pedra do Escalvado, situada a 4
km da sede, medindo aproximadamente 200 metros de altura e que supostamente deu origem
ao toponômio, mostrada na Figura 2.
43
Figura 2: Vista da Pedra do Escalvado, Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais, 2006.
Entre os municípios de Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado, na região da Zona da Mata,
estado de Minas Gerais, foi construída a UEH-Usina Hidrelétrica do Candonga (Risoleta
Neves). Localizada no rio Doce, com potência instalada de 140 MW e geração de 64,5 MW
médios, equivalentes a 565.020 MWh/ano. O empreendimento foi construído em parceria pela
Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e Alcan Alumínio do Brasil com o intuito de represar
a água necessária para girar as turbinas da barragem e produzir energia destinada ao auto-
consumo exclusivo de indústrias desses dois gigantes do setor de mirios (Figura 3).
Figura 3: Vista da UHE- Candonga, Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais. Fonte: Construtora OAS.
44
A localidade de São Sebastião do Soberbo, município de Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais, foi inundada e submersa pelas águas da barragem que ali se formou. A área inundada
pelo reservatório da usina é equivalente a 2.830 Km
2
no território dos dois municípios. O
percentual da área inundada só na localidade de Soberbo é de aproximadamente 46%.
Todas as 120 famílias que compunham a comunidade de São Sebastião do Soberbo foram
obrigadas a deixar as áreas em que tradicionalmente residiam, para ceder lugar ao lago da
hidrelétrica, e se mudar para um núcleo urbano construído pelo consórcio, batizado de Nova
Soberbo.
2.3.2 O ESPAÇO-DOENÇA EM SEU NÍVEL ECOLÓGICO:
2.3.2.1 O AGENTE E A DOENÇA
Sabe-se que as riquetsioses são causadas por parasitas intracelulares obrigatórios com
características de bactérias gram-negativas (HACKSTADT, 1996).
Este agente pertence às -proteobactérias, descrita inicialmente como pequenos
bastonetes e bacilos (0,3 x 1,5m), que retinha a fucsina básica quando corado pelo todo
Gimenez (GIMENEZ, 1964) e fracamente corados por Gram. Podem estar agrupados em
pares, em cadeias ou isolados. Com exceção da R. prowazekii, causadora de tifo, não
apresentam flagelos. Residem em glândulas salivares e orios do artrópode hospedeiro
(BILLINGS et al., 1998).
As riquétsias são bactérias que se especializaram em nichos ecológicos muito restritos e
seu ciclo natural depende apenas de um hospedeiro, geralmente um artrópode (BACELLAR,
1996).
Grande número destes organismos ainda não está classificado, embora haja trabalhos
recentes visando essa caracterização. Uma nova reclassificão está sendo proposta e baseia-
se em técnicas de taxonomia numérica, onde os diversos neros estão sendo agrupados
conforme a ausência ou presença de 63 caracteres estudados. Estes caracteres estão
relacionados com o próprio organismo, com os artrópodos vetores ou reservatórios, com o
hospedeiro e com o comportamento do organismo em hospedeiros experimentais ou cultura.
45
O gênero Rickettsia é composto pelo Grupo do Tifo (GT) e pelo Grupo da Febre Maculosa
(GFM). Classicamente, baseado na presença de um lipopolissacarídeo, o GT inclui dois
patógenos humanos: R. prowazekii, agente do tifo exantemático epidêmico e R. typhi, agente
causal do tifo murino, transmitidas, respectivamente, por piolhos e pulgas (EREMEEVA e
DASH, 2000), ambas, reconhecidamente patogênicas ao homem, além da R. canadensis e R.
bellii que formam um grupo ancestral.
Dentro do GFM, um grande número de membros tem sido reconhecido através do
desenvolvimento de técnicas moleculares e de isolamento em cultura celular. Novas riquétsias
pertencentes a esse grupo, têm sido isoladas de artrópodes e humanos no mundo inteiro. As
espécies que são reconhecidas como patogênicas ao homem e que tradicionalmente fazem
parte desse grupo são a R. rickettsii, agente da RMSF e da FMB, a R. parkeri, agente da
riquetsiose parkeri e a Rickettsia felis, agente da riquetsiose felis (LABRUNA, 2006a).
Atualmente várias classificações para a ordem Rickettsiales, conforme a proposta de
cada autor. A primeira proposta para a classificação desta ordem foi feita por
Gieszczykiewicz em 1939 e está inclusa na Approved Lists of Bacterial Names. Com o passar
dos anos, novos estudos e novas propostas foram feitos, sendo as mudanças descritas nestas 7
classificações que segue:
- Classificação da ordem Rickettsiales segundo a sétima edição do Bergey´s Manual of
Determinative Bacteriology,1957;
- Classificação da ordem Rickettsiales segundo a última edição do Bergey´s Manual of
Determinative Bacteriology, 1974;
- Classificação da ordem Rickettsiales segundo a primeira edição do Bergey´s Manual of
Systematic Bacteriology, 1984;
- Classificação da ordem Rickettsiales segundo apresentação de Brenner et al., de 1993;
- Classificação da ordem Rickettsiales apresentado pela NCBI Taxonomy Browser, 2001;
- Classificação da ordem Rickettsiales apresentado por (DUMLER et al., 2001).
46
A mais recente classificação se encontra na 10ª Edição do Bergey´s Manual of Sistematic
Bacteriology, escrito por Garrity e colaboradores (2005). Nesta classificação, a Ordem
Rickettsiales está inclusa no Filo Proteobacterias, Classe Alphaproteobacterias. A divisão em
tribos, que era comumente utilizada, foi abandonada. A família Anaplasmataceae foi
novamente retirada e os gêneros pertencentes a ela (Aegyptianella, Anaplasma, Ehrlichia e
Neorickettsia) foram inclusas na Família Ehrlichiaceae. Essa ordem é composta pela Família
Rickettsiaceae, gêneros Rickettsia e Orientia.
As riquetsioses pertencentes à ordem Rickettsiales, que compreende os gêneros Rickettsia,
Orientia, Ehrlichia, Anaplasma, Neorickettsia, Wolbachia e Aegyptianella, têm despertado
um grande interesse científico e de saúde pública nos últimos anos. O advento da biologia
molecular pôde esclarecer, a partir do final da década de 90, inúmeros aspectos anteriormente
confusos deste grupo de microorganismos.
Os gêneros Anaplasma e Ehrlichia abrigam respectivamente as seguintes espécies
patogênicas para o homem: Ehrlichia chaffeensis (1986), agente da erliquiose monocítica
humana (EMH) tendo como vetor nos EUA o carrapato da espécie Amblyomma americanum e
Anaplasma phagocythophila
(1994), agente da erliquiose
granulocítica humana (EGH) que tem como vetor nos EUA o carrapato da espécie Ixodes
ricinus complex (DUMLER et al., 2001).
Baseado em análises fenopicas e genotípicas, o gênero Rickettsia é dividido em dois
grupos, sendo tal divisão suportada por análise de seqüências dos genes 16S rRNA, antígeno
17-kDa, comum ao gênero, o gene da citrato cintase e proteínas riquetsiais de superfície de
membrana A (outer membrane protein/rOmpA) e B (rOmpB) (SIMSER et al., 2002).
Quase todas as riquétsias do GFM são transmitidas por espécies de carrapatos
pertencentes a distintos gêneros (Dermacentor, Rhipicephalus, Amblyomma, Ixodes,
Haemaphysalis e Hyalomma), com exceção da Rickettsia akari associada a ácaros
Allodermanyssus (RAOULT e ROUX, 1997a).
47
2.3.2.2 A DOENÇA E O AMBIENTE -
RIQUETSIOSES NO VALE DO PIRANGA
No Vale do Piranga a FMB é considerada de baixa endemicidade, porém com vários
relatos isolados através dos tempos dessa doença e de outras riquetsioses, como o tifo murino.
Em julho de 1949, o Dr. Gerardo Trindade da Faculdade de Farmácia de Ouro Preto
Minas Gerais, acompanhou um paciente proveniente daquele munipio que apresentava toda
a sintomatologia característica de riquetsioses. O diagnóstico foi de tifo murino através de
dados clínicos e da Reação de Weil-Felix.
Após esse caso, foram constatados, segundo o referido autor, 13 casos novos e mais seis
por diagnóstico retrospectivo. Anteriormente, em Belo Horizonte, o Prof. Octávio de
Magalhães também fizera o mesmo diagnóstico em 2 pacientes provenientes desse mesmo
município (TRINDADE, 1951).
Muitos anos se passaram sem o diagnóstico de novos casos de riquetsioses no Vale do
Piranga, até que, em 1984 ocorre um caso de óbito suspeito para FMB em Ouro Branco,
Minas Gerais, seguido em 1985, de dois óbitos suspeitos de FMB que ocorrem no município
de Santa Cruz do Escalvado, sendo um confirmado por necropsia (GALVÃO et al., 1989).
Em 1991, Lemos confirma o caráter endêmico-epidêmico dessa área através de sorologia
humana e em animais domésticos.
Como relatado, a década de 90 e o início dos anos 2000 são marcados pela realização
de diversos estudos soro-epidemiológicos no Estado de Minas Gerais, que juntamente com o
processo de implantação da Vigilância Epidemiológica e laboratorial da doença no Estado,
comprovam a existência de casos de FMB e outras riquetsioses no Vale do Piranga, no
entanto caracterizando a mesma como área de baixa endemicidade.
Em 1996, um novo caso de FMB é confirmado por sorologia no município de Mariana e
outro paciente suspeito vai a óbito no mesmo município (GALVÃO et al., 2006).
Novos casos de riquetsioses são diagnosticados em municípios do Vale do Piranga nos
anos de 1999, nos municípios de Dom Silvério e Raul Soares, e em 2002, ocorre um caso
confirmado de FMB na cidade de Viçosa, comprovado por sorologia (MAFRA et al., 2004).
48
Considerando que no estado de Minas Gerais, nos anos de 2004 a 2007, (dados
preliminares), foram notificados pela SES-MG, 65 casos, com uma taxa de letalidade de
43,1% , é importante ressaltar que a vigilância epidemiológica seja feita não somente em
áreas conhecidamente endêmicas, mas que também estejam atentas para áreas não endêmicas
ou de foco silencioso.
Como não é bem conhecida a dinâmica das riquetsioses em áreas de baixa endemicidade,
estudos impõem-se a necessidade de realização de estudos nessas áreas em vetores e
reservarios das riquetsioses, utilizando-se de técnicas, como as de biologia molecular, a fim
de se determinar o real grau de endemicidade dessas áreas, assim como os vetores e
reservarios envolvidos no ciclo epidemiológico das riquetsioses.
2.3.2.3 OS V ETORES E A INTERAÇÃO RIQUÉTSIA-vETOR
Os carrapatos são artrópodes pertencentes à ordem Acari, dentro da classe Arachinida. No
mundo estão descritas cerca de 867 espécies de carrapatos, divididas em três famílias:
Ixodidae (683 espécies), Argasidae (183 espécies) e Nutallialidae (1 espécie) (HORAK et al.,
2002).
Os carrapatos estão presentes em todos os continentes do planeta, inclusive na Antártida,
parasitando diferentes espécies de vertebrados, sejam anfíbios, répteis, aves ou mamíferos. O
ciclo de vida dos carrapatos passa por quatro estádios evolutivos: ovo, larva, ninfa e adulto. À
exceção dos ovos, os demais estádios devem obrigatoriamente parasitar a pele de um
hospedeiro, por um período que varia de minutos a vários dias, conforme a espécie de
carrapato. Há algumas poucas exceções em que larvas ou o estágio adulto de algumas
espécies não precisam se alimentar para dar continuidade ao ciclo. Em situações de ausência
de hospedeiros apropriados, os carrapatos podem incrivelmente sobreviver no meio ambiente,
por meses ou anos, sem se alimentarem.
A alimentação dos carrapatos consiste principalmente de sangue (hematofagia), mas
também de linfa e restos tissulares presentes na pele do hospedeiro. Isto se dá pela alta
especialização deste artrópode ao parasitismo. Possuem peças bucais adaptadas, que perfuram
e penetram na pele, a fim de se obter a alimentação.
49
Os carrapatos podem permanecer fixados à pele do hospedeiro por dias ou semanas,
quando secretam uma saliva extremamente funcional, que impede a coagulação sangüínea e
as reações de defesa do organismo no sítio de fixação. Além disso, esta saliva possui
substâncias vasoativas, que induzem vasodilatação local, facilitando a ingestão de sangue
(RIBEIRO e FRANCISCHETTI, 2003). Estas particularidades dos hábitos alimentares dos
carrapatos os colocam entre os principais vetores de patógenos (vírus, bactérias, protozoários
e helmintos) para os animais e o homem (LABRUNA, 2004a).
Nos carrapatos, os patógenos podem sobreviver de um estágio para outro (sobrevivência
transestadial de larva para ninfa, e/ou de ninfa para adulto) e/ou podem ser transmitidos entre
gerações (transmissão transovariana de uma fêmea para seus ovos/larvas). Estes são os
principais mecanismos de manutenção de riquétsias de baixa ou nenhuma patogenicidade na
natureza, porém podem desempenhar um papel menor na manutenção de riquétsias
patogênicas, como evidenciado pelo efeito letal de R. rickettsii ao seu vetor (MACALUSO et
al., 2002; MULENGA et al., 2003; LABRUNA, 2004a).
Niebylski e colaboradores (1999) ao quantificarem o efeito pernicioso de R. rickettsii em
seu carrapato vetor, encontraram alta taxa de mortalidade em lavras e ninfas infectadas
experimentalmente, bem como menor desenvolvimento da progênie de meas infectadas em
relação às não infectadas.
A eficiência da transmissão transovariana dependerá do estágio do carrapato que se
infectou com a riquétsia, como demonstrado por Burgdorfer & Brinton (1975) que, quando
larvas de Dermacentor andersoni se infectavam com R. rickettsii, as fêmeas adultas
originadas dessas, transmitiam o agente para 100% de seus ovos e larvas, chegando a 10% em
alguns casos (LABRUNA, 2004a).
Das espécies de carrapatos descritos no mundo, aproximadamente cerca de 10% assumem
uma maior importância direta em saúde pública, devido ao comportamento exófilo e à baixa
especificidade parasitária, que perfazem grandes possibilidades desses carrapatos parasitarem
humanos. Obviamente, várias outras espécies que nunca foram descritas parasitando
humanos, assumem importante papel indireto na saúde pública, pois contribuem para a
manutenção enzoótica de agentes infecciosos na natureza (SANTOS, 2003).
Somente na região Neotropical, que engloba a metade sulina do México, as ilhas do
Caribe, as Américas Central e do Sul, estão descritas 173 espécies de carrapatos, totalizando
20% da fauna mundial destes parasitos (GUGLIELMONE, 2003).
50
No entanto, no tocante a patógenos transmitidos por carrapatos, poucos estudos na
região Neotropical, contrastando com as demais regiões do planeta. Como os carrapatos são
incriminados mundialmente como os vetores de maior variedade de patógenos, inclusive
quando comparados com os mosquitos (HOOGSTRAAL, 1985), espera-se que grandes
descobertas possam vir à medida que mais pesquisas forem feitas neste campo da ciência na
América Latina. No Brasil, são relatadas 55 espécies de carrapatos, divididas em nove
gêneros.
O gênero Amblyomma é o mais numeroso (33 espécies), seguido por Ixodes (8 espécies),
Ornithodoros (5 espécies), Haemaphysalis (3 espécies), Antricola (2 espécies) e
Rhipicephalus (2). Os demais gêneros (Argas e Dermacentor) o representados, cada um, por
uma única espécie (GUIMARÃES, 2001).
A distribuição geográfica de Rickettsia spp. é determinada pela incidência de seu
hospedeiro artrópode e a incidência sazonal da doença mantém um paralelo com a atividade
do carrapato (RAOULT e ROUX, 1997a).
A maioria das espécies de riquétsias patogênicas ao homem, assim como as riquétsias não
patogênicas, tem como vetores e reservatórios naturais artrópodes hematófagos. Com exceção
da R. akari, transmitida por ácaros, da R. prowazeekii, transmitida por piolhos e das R. typhi
e R. felis, transmitidas por pulgas, segundo sabido até o momento, todas as demais espécies
são transmitidas por carrapatos da família Ixodidae, dentre eles, os de maior importância
médico-veterinária, destacam-se os gêneros Anocentor e Rhipicephalus. São os principais
carrapatos encontrados em bovinos, eqüinos e cães, respectivamente. Nenhum deles assume
importância como parasita de humanos, embora sejam de grande importância em veterinária.
Dentro do gênero Amblyomma destacam-se o A. cajennense, A. aureolatum e A.
dubitatum, que estão incriminadas na manutenção enzoótica e na transmissão da febre
maculosa para humanos (FONSECA, 1935; DIAS e MARTINS, 1939; LIMA et al., 1995;
LEMOS et al., 1996a).
No Brasil o gênero Amblyomma abriga os principais vetores que transmitem a FMB ao
homem e a muitos outros mamíferos (BALASHOV e LEONOVICH, 1978; MCDADE e
NEWHOUSE, 1986; PINTER et al., 2002). O A. cajennense é considerado o principal vetor
transmissor da doença aos homens (DIAS e MARTINS, 1939; LEMOS et al., 1997), o que
pode estar associado ao fato da facilidade existente na transmissão transovariana da riquétsia
por fêmeas desta espécie, segundo descrito por Monteiro e Fonseca (1932).
51
O A. cajennense possui baixa especificidade parasitária, principalmente nos estádios de
larva e ninfa e é o principal carrapato que parasita o ser humano no Brasil (ARAGÃO, 1911;
ARAGÃO, 1936; ARAGÃO e FONSECA, 1953). Seus três estádios evolutivos, (larvas,
ninfas e adultos), são capazes de transmitir a bactéria durante o repasto sangüíneo (COMER,
1991).
A constatação de numerosas populações desse carrapato nas áreas endêmicas para FMB é
um achado comum, completando apenas uma geração por ano na região sudeste do Brasil,
com os três estádios parasitários marcadamente distribuídos ao longo dos doze meses
(OLIVEIRA, 1998; SOUZA et al., 1999).
Nos ixodídeos, os três últimos estádios alimentam-se em um hospedeiro vertebrado
apenas uma vez, em grandes quantidades, até ingurgitarem. Após a refeição, soltam-se do
hospedeiro, sofrem uma muda ou ecdise, passando ao estágio seguinte. É, portanto, um
carrapato heteroxênico, necessitando três hospedeiros para a realização de suas diferentes
fases parasitárias (OLIVEIRA, 2004).
As fêmeas da maior parte das espécies necessitam de uma refeição de sangue para iniciar
a cópula e a ovoposição, após a qual morrem (ARTHUR, 1965). A transmissão transovariana
da riquétsia por fêmeas de espécie A. cajennense já havia sido descrita por Monteiro &
Fonseca (1932). É considerado responsável pela manutenção da R. rickettsii na natureza,
permitindo, dessa forma, permanecer infectado durante toda a sua vida e também por muitas
gerações após uma infecção primária.
Portanto, além de vetores, os carrapatos são verdadeiros reservarios da riquétsia na
natureza, uma vez que todas as fases evolutivas, no ambiente, são capazes de permanecer
infectadas meses ou anos à espera do hospedeiro, garantindo um foco endêmico prolongado.
Em algumas áreas, mesmo na abundância de hospedeiros primários (vertebrados) para A.
cajennense, este pode não se estabelecer em função de condições ambientais, que não
propiciem um microclima adequado para as fases de vida livre do carrapato.
Tanto a presença como a abundância de populações dessa espécie de carrapato está
fortemente associada à presença de áreas com média a densa cobertura vegetal, tais como
pastos “sujos”, capoeiras e matas (LABRUNA et al., 2001).
O A. cajennense está presente desde o sul dos Estados Unidos ao norte da Argentina,
incluindo algumas ilhas do Caribe. No Brasil, é encontrado com abundância em todos os
estados das reges Sudeste e Centro-Oeste, porém com distribuição limitada nas demais
regiões (LABRUNA et al., 2001).
52
O A. aureolatum é encontrado em diversos países da América do Sul; no Brasil,
destacam-se em áreas das regiões Sul e Sudeste. havia sido incriminado como vetor da
febre maculosa para humanos em São Paulo (DIAS e MARTINS, 1939). Em 2000, foi a única
espécie encontrada em grande número em humanos e animais domésticos numa área rural do
estado de São Paulo (FONTES et al., 2000).
Têm como hospedeiros primários para o estágio adulto, carnívoros silvestres além de cães
se comportarem também como hospedeiros primários para essa espécie, podendo os cães se
apresentar infestados por todo o ano, embora não haja informações sobre a dinâmica
populacional deste carrapato, sem um pico de infestação definido (PINTER et al., 2002).
o A. dubitatum, conhecido anteriormente como A. cooperi, é relatado nos estados das
regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste e têm as capivaras como hospedeiros primários para
todos os estádios parasitários. Embora haja controvérsias sobre o parasitismo humano por este
carrapato, sua importância médica se baseia principalmente numa possível participação no
ciclo enzoótico de riquétsias na natureza, já que as capivaras são consideradas potenciais
reservarios de R. rickettsii (TRAVASSOS e VALLEJO, 1942).
Além disto, grandes populações de A. dubitatum têm sido encontradas, juntamente com o
A. cajennense, em alguns focos de febre maculosa na região Sudeste (SOUZA, 2001;
LABRUNA et al., 2004b).
A reprodução de organismos incluídos na família Rickettsiaceae ocorre em células
nucleadas de vertebrados, parasitando preferencialmente as células endoteliais (WEISS e
MOULDER, 1984).
Mesmo que vertebrados e invertebrados sejam considerados hospedeiros para as bactérias
pertencentes a essa família, alguns autores avaliam que a sua associação com esses últimos
seria evolutivamente mais antiga já que artrópodes, com excão do piolho, não apresentam
patologias evidentes associadas à infecção por estes microorganismos, atuando, portanto
como vetores ou hospedeiros primários, transmitindo a doença ao homem, embora este seja
um hospedeiro acidental e a sua infecção um reflexo de mudanças ecológicas produzidas no
ambiente (HOOGSTRAAL, 1967; FRIEDHOFF, 1990).
Além disso, podemos citar a necessidade de reservatórios vertebrados da bactéria na
natureza, que atuam na transmissão horizontal (transmissão entre carrapatos alimentando em
um mesmo animal hospedeiro) desse patógeno, funcionando, dessa forma, como
amplificadores horizontais da riquétsia na população de carrapatos (RICKETTS, 1909;
BURGDORFER, 1988).
53
Segundo Walker (2004), se a transmissão horizontal não ocorresse, os efeitos deletérios
dessa bactéria altamente virulenta resultariam em sua extinção e, de acordo com Niebylski e
colaboradores (1999), tais efeitos limitam a incidência natural da mesma e oferecem uma
plausível explicação para as baixas taxas de infecção em carrapatos adultos (menor do que
1%).
Um carrapato pode se infectar com riquétsias de dois modos: ou as ingere durante o
repasto sangüíneo num hospedeiro vertebrado infectado e riquetsêmico ou as adquire por via
transovariana (BURGDORFER, 1975; REHACEK, 1989; , 1991) conhecida por transmissão
vertical, infectando quase todos os órgãos desses hospedeiros (RAOULT e ROUX, 1997a;
MACALUSO et al., 2002). Nestes, a riquétsia é mantida mesmo em prolongada ausência de
hematofagia no hospedeiro, porém de forma avirulenta, tendo sua virulência reativada por
fatores nutricionais presentes no sangue, ou quando da exposição à temperatura adequada
(WALKER, 1989; RAOULT e ROUX, 1997a).
Em laboratório conseguiu-se também a co-infecção de ixodídeos por via alimentar,
quando se colocaram artrópodes infectados sobre um mesmo hospedeiro saudável (PRICE,
1954).
Foi demonstrado que, dependendo da quantidade de riquétsias que ingere juntamente com
o sangue, um ixodídeo pode se infectar primariamente por via alimentar. Segundo alguns
autores, quando ingeridas em quantidades suficientes as riquétsias ultrapassam a barreira
intestinal e penetram na hemocele onde são fagocitadas pelos hemócitos (BURGDORFER,
1975; BURGDORFER e BRINTON, 1975).
Na verdade, sabe-se hoje que o processo da digestão do sangue nesses artrópodes,
especialmente nas meas, ocorre intracelularmente e em três etapas: a fase preparatória, no
início da digestão, quando o pH do sangue ingerido inibe a ação das proteases do trato
intestinal dos ixodídeos; a digestão propriamente dita, que se inicia durante a fase de
ingurgitação, quando ocorre a concentração de nutrientes e a excreção pelas glândulas do
excesso de fluidos de volta à circulação do hospedeiro. E, finalmente a última fase em que o
ixodídeo se separa do hospedeiro, prosseguindo a digestão dentro de células fagocíticas até a
ovoposição. A ausência da ação de enzimas proteolíticas no lúmen intestinal pode ser uma das
razões que permitiriam a sobrevivência de agentes patogênicos existentes no sangue ingerido
do hospedeiro e a sua disseminação pelo organismo do artrópode (AKOV, 1982;
KAUFMAN, 1989; FRIEDHOFF, 1990; SONENSHINE, 1993).
54
Existe ainda, potencialmente, outro meio pelo qual a riquétsia pode ser transmitida entre
os artpodes vetores. Como descrito por Raoult & Roux (1997), alguns ferormônios são
responsáveis pela agregação de carrapatos ao hospedeiro aumentando assim, a chance para
encontro e copula. Sob tais circunstâncias, enquanto os carrapatos estariam se alimentando,
haveria uma proximidade muito grande entre seus aparelhos bucais, o que permitiria o
espalhamento direto de riquétsias para carrapatos não-infectados sem causar infecção no
animal hospedeiro.
Também tem sido relatada a transmissão sexual de riquétsias entre carrapatos. Wolbach,
em 1916, sugeriu a presença de riquétsia pertencente ao GFM em espermatozoa do carrapato
vetor Dermacentor andersoni e, em 1933, Philip & Parker demonstraram a ocorrência de
transmissão sexual de R. rickettsii por machos infectados para fêmeas não-infectadas
(HAYES et al., 1980). Como comentam esses autores, tais observões levaram a
especulações de que este tipo de transmissão representaria um importante fator ecológico na
manutenção de riquétsias do GFM na natureza, os quais também observaram, através de
microscopia eletrônica, infecção massiva nos tecidos testiculares de carrapatos.
Um fator recentemente observado da importância potencial neste contrapeso da natureza é
o fenômeno da interfencia, pela qual a infecção de carrapatos com riquétsias pertencentes ao
GFM, impede o estabelecimento da infeão por R. rickettsii como demonstrado sob
condições laboratoriais (MACALUSO et al., 2003; MULENGA et al., 2003) propuseram a
hipótese de que, em resposta a uma infecção primária, moléculas diferencialmente reguladas
preveniriam uma infecção secundária. Em seus estudos, os autores detectaram transcritos
diferencialmente expressos após a infecção, sendo estes classificados por Mulenga em quatro
grupos de moléculas: fatores de resposta imune do carrapato, receptores ou moléculas de
adesão celular, fatores de resposta ao stress e agentes detoxicantes.
Na literatura especializada, a definição de vetor e de reservatório continua sendo motivo
de controvérsia. No geral, considera-se como vetor o hospedeiro intermediário, enquanto um
reservario seria o hospedeiro no qual o parasita teria uma fase do ciclo de vida essencial
para sua manutenção na natureza. No caso das riquétsias, os ixodídeos desempenham dois
papéis: são vetores ao transmiti-las ao hospedeiro vertebrado e são reservatórios uma vez que
as mantêm na natureza, seja por transmissão transovariana ou transestadial (BACELLAR,
1996).
55
Filogeneticamente, a relação riquétsia-ixodídio parece ser muito antiga, demonstrando um
elevado nível de adaptação entre os organismos. No entanto, não pode ser considerada uma
relação de comensalismo, uma vez que carrapatos infectados experimentalmente por
riquétsias apresentam ovoposição diminuída, mau desenvolvimento dos ovos e elevada taxa
de mortalidade entre os descendentes, quando comparados a carrapatos não infectados.
Aparentemente, as riquétsias são mais beneficiadas nessa relação do que os ixodídeos
(REHACEK, 1989).
Desde 1962, Bertran levava em consideração dois aspectos importantes relacionando a
história natural das riquétsias do GFM e a biologia dos artpodes: o espectro de hospedeiros
vertebrados das diferentes espécies de carrapatos e os hospedeiros nos quais se alimentam os
estádios imaturos e os adultos de uma espécie em particular.
2.3.2.4 OS MAMÍFEROS HOSPEDEIROS E RESERVATÓRIOS E A INTERAÇÃO
RIQUÉTSIA-HOSPEDEIRO
Desde a década de 30 vários grupos de mamíferos eram incriminados na participação do
ciclo da FMB como hospedeiros de riquétsias, dentre eles os cães, cavalos, gatos, capivaras,
marsupiais, roedores silvestres e morcegos, dentre outros (DIAS, 1938; DIAS e MARTINS,
1939; LEMOS, 2002; VIANNA, 2002).
A transmissão de patógenos do carrapato para o hospedeiro se dá basicamente atras da
saliva do carrapato, que exerce fundamental importância no sítio de inoculação, ao minimizar
as reações imunológicas do hospedeiro contra o patógeno inoculado (LABRUNA, 2004a).
No Brasil, os principais vetores que transmitem a FMB aos seus hospedeiros estão
incluídos no gênero Amblyomma. O parasitismo em humanos está associado a altas
infestações desse carrapato aos hospedeiros primários.
Segundo Rojas e colaboradores (1999) além do A. cajennense parasitar humanos e
animais domésticos, pode também ser encontrado em muitos vertebrados selvagens, incluindo
roedores, edentados e muitas outras espécies de pequenos mamíferos. Apresentam como
hospedeiros primários os eqüinos, as antas e capivaras. (LABRUNA, 2001).
56
Seus ataques a humanos, muitas vezes em massa, são respondidos com reações de
hipersensibilidade imediata ou retardada a antígenos específicos presentes na saliva do
carrapato, podendo causar intenso prurido, que persiste por vários dias no local de fixação.
Infecções bacterianas secundárias podem ocorrer em função da deposição de bactérias nas
feridas, durante o ato de coçar intensamente (ARAGÃO e FONSECA, 1953).
Além de atuar como vetor de doenças, os carrapatos podem exercer diversos efeitos
deletérios no organismo do hospedeiro, tais como: (1) anemia e anorexia, ambas ocasionadas
por uma infestação maciça; (2) maior predisposição a outras doenças, dada as toxinas
imunosupressoras presentes na saliva do carrapato, ou infecções secundárias por bactérias ou
miíases no sítio de fixação dos carrapatos; (3) quadro de paralisia ascendente, ocasionado por
uma toxina neurotrópica, inoculada através da saliva; (4) morte, pela exacerbação de um dos
efeitos citados acima, ou do conjunto deles. Obviamente, tais efeitos variam conforme a
espécie de carrapato e a área geográfica. No homem, as infestações por carrapatos ainda
podem causar um quadro de dermatite pruriginosa, dada a reações alérgicas desencadeadas
pela saliva do carrapato, no local da picada. Este quadro se caracteriza por intenso prurido,
que pode se estender por dias ou semanas após a retirada do carrapato fixado à pele
(LABRUNA, 2004a).
Carrapatos são capazes de suprimir tanto a imunidade adquirida pelo hospedeiro quanto a
imunidade específica. Fatores derivados das glândulas salivares dos carrapatos modulam a
ativão do complemento, a ativação de células natural killer, produção de anticorpos,
respostas proliferativas de linfócitos-T e elaboração de citocinas por macrófagos e linfócitos-
T (WIKEL, 1996).
Segundo Wikel & Bergman (1997), o bloqueio dessas atividades se dá diretamente sobre
elementos da resposta imune envolvidos na aquisição e expressão da resistência adquirida
pelo hospedeiro contra as infestações e, conseentemente, influenciando também na
transmissão de patógenos ao hospedeiro. Portanto, mecanismos de imunidade mediados por
linfócitos-T e citocinas, incluindo o interferon- e o fator de necrose tumoral (TNF), tem um
papel mais importante que os próprios anticorpos.
Entre os vertrebrados domésticos, o cão (Canis familiaris) é considerado de grande
importância na epidemiologia da febre maculosa (BURGDORFER, 1975). Desde a década de
30, havia sido demonstrado que o cão é susceptível à doença (MOREIRA e
MAGALHÃES, 1937).
57
Embora ele não seja essencial ao ciclo natural das riquétsias, ele desempenha um papel
primordial na manutenção e dispersão dos vetores infectados, além de estar envolvido na
transmissão peri-domiciliar de doenças riquetsiais ao carrearem para o domicílio carrapatos
infectados (MCDADE e NEWHOUSE, 1986).
Alguns cães (C. familiaris), provenientes de áreas endêmicas do estado de o Paulo
apresentaram testes positivos para a FMB (DIAS e MARTINS, 1939; HORTA, 2002). Cães e
eqüinos são considerados animais sentinelas, que freqüentemente são encontradas
sorologias positivas a partir destes em áreas endêmicas (CARDOSO, 2004).
A importância dos eqüinos na participação da FMB, de acordo com Labruna (2000), se
deve à grande capacidade de albergar altas infestações de carrapatos, em todos os estádios,
sem comprometer sua própria vida. Em condições naturais, um único eqüino pode se
apresentar parasitado por mais de 50 mil larvas, ou mais de 12 mil ninfas, ou mais de 2 mil
adultos de A. cajennense, sem que sua vida esteja em risco.
Mamíferos são considerados os hospedeiros preferenciais para diversas espécies de
ectoparasitos e destes Rodentia é o mais infestado (WOOLLEY, 1988). De acordo com
Botelho e Linardi (1996), este grupo pode ser considerado uma das ordens de mamíferos mais
importantes por incluir grande número de espécies, muitos dos quais com papel
epidemiológico de extrema relevância.
Os roedores poderiam atuar no ciclo silvestre das riquétsias, como é o caso da capivara,
para o qual tem sido sugerido um papel como elo entre os ciclos enzoóticos e zoonóticos de R.
rickettsii (NASCIMENTO e SCHUMAKER, 2004).
Capivaras (H. hydrochaeris) são os maiores roedores do mundo e podem viver em regiões
alagadas de áreas florestais e ao longo das bordas dos rios em contato com fazendas, que são
freqüentemente invadidas por esses animais para se alimentarem de plantações de grãos. De
acordo com Figueiredo e colaboradores (1999), a capivara pode ser reservatório de zoonoses
em áreas quase completamente desflorestadas, como no caso de São Paulo. Vivendo próximas
a fazendas ou mesmo cidades, poderiam favorecer a transferência de seus ectoparasitos,
juntamente com os patógenos por eles veiculados, para animais domésticos, potencializando
zoonoses e oferecendo riscos para o homem.
No Brasil, uma riquétsia do GFM foi isolada de A. dubitatum, retirado de uma capivara
(LEMOS et al., 1996a). Sinkoc e colaboradores (1997) descreveram as espécies A. dubitatum,
A. triste e A. tigrinum em capivaras capturadas na estação ecológica do Taim, no Rio Grande
do Sul.
58
Um ano depois, os mesmos autores relataram as espécies A. dubitatum, A. triste e A.
cajennense infectando capivaras na região de Foz do Iguaçu. Em 2000, Evans e colaboradores
confirmaram, em revisão sobre carrapatos no Estado do Rio Grande do Sul, a presença sobre
capivaras das espécies A. dubitatum, A. triste e A. cajennense. Além disso, citam a presença
de carrapatos da espécie Ixodes ioricatus sobre preás silvestres (Cavia sp) e sobre roedores
(possivelmente R. rattus).
Em 2002, Labruna e colaboradores identificaram adultos e ninfas de A. dubitatum e ninfas
de A. cajennense em capivaras (H. hydrochaeris). Em 2005, Heijden e colaboradores
descreveram as espécies A. dubitatum e A. cajennense em capivaras no Estado de São Paulo.
Mais recentemente, Pacheco e colaboradores (2007) comprovam a evidência sorológica de
infecção por R. bellii e R. parkeri em capivaras (H. hydrochaeris).
Dentre outros roedores, existem espécies consideradas sinantrópicas por associarem-se ao
homem em virtude de terem seus ambientes alterados pela ação do próprio homem. As
espécies sinantrópicas não-comensais (silvestres) caracterizam-se por formarem colônias no
ambiente longe do contato com o homem. A presença do roedor em áreas urbanas e rurais
gera agravos econômicos e sanitários de relevância ao homem, participando da cadeia
epidemiológica de pelo menos trinta doenças transmitidas ao homem, agindo como
reservarios naturais da doença. Dentre elas a leptospirose, a peste, as hantaviroses e a febre
maculosa, doenças de importância epidemiológica no Brasil (MATIAS et al., 2002).
Os ratos pertencem a Ordem Rodentia, sendo que das mais de 2000 espécies distribuídas
pelo mundo, cerca de 125 são classificadas como pragas e três são de grande importância para
o homem: Mus musculus (M. musculus), Rattus norvegicus (R. norvegicus) e Rattus rattus (R.
rattus). Estima-se uma perda anual de 33 milhões de toneladas de alimentos provocado por
ataque de ratos, quantidade suficiente para alimentar 130 milhões de pessoas por ano. De
acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), os ratos destroem 10% da produção
anual brasileira de grãos, ou seja, algo ao redor de sete milhões de toneladas de alimentos
(FOCUS SAÚDE BLICA, 2000). Nos campos, destroem as sementes recém plantadas e
atacam os cereais. Nas agroindústrias, bricas, usinas, refinarias e indústrias causam
prejuízos incalculáveis todos os anos. Na pecuária, infestam quase todas as propriedades que
criam animais em regime de confinamento, devido ao armazenamento de ração. Os ratos e
camundongos provocam ainda severos danos às estruturas e materiais, devido ao seu hábito
de roer.
59
Os ratos são capazes de provocar danos e perdas em todas as fases de processamento,
produção e estocagem dos gêneros alimentícios, chegam a comer cerca de 10% de seu próprio
peso corporal a cada dia, o que significa algo em torno de 10 e 20 Kg ao ano (CARVALHO
NETO, 2005).
Dentre outros roedores, a espécie Nectomys squamipes é conhecida popularmente por rato
água por ser comumente encontrada em matas ou terrenos cultivados onde se tenha água,
geralmente em córregos e brejos. Possuem hábitos noturnos e formam seus ninhos no chão
em raízes de árvores e troncos. a espécie Oryzomys subflavus (rato vermelho) geralmente
predomina na fauna de pequenos roedores da mata, sendo responsável por grandes perdas em
áreas cultivadas. Possuem comportamento solitário e hábitos exclusivamente noturnos.
Quando molestados fogem aos saltos e costumam fazer seus ninhos com amontoados de
folhas nas árvores, mas também se aproveitam de ocos de troncos secos. Considerando a
espécie R. rattus, o rato de telhado, também conhecido como rato preto, rato de forro, rato de
paiol, rato de silo ou rato de navio é o roedor comensal predominante na maior parte do
interior do Brasil, sendo comum nas propriedades rurais e pequenas e médias cidades do
interior. Por ser uma espécie arvícola, os ratos de telhado ainda cultivam o hábito de viver
usualmente nas superfícies altas das construções, em forros, telhados e sótãos onde constroem
seus ninhos, descendo ao solo em busca de alimento e água. Seu raio de ação é grande devido
à habilidade em escalar superfícies verticais e à facilidade com que anda sobre fios, cabos e
galhos de árvores (FUNASA, 2002).
Os animais silvestres podem ser reservatórios e portadores de zoonoses. De acordo com
Acha e Szyfres (2003) os fatores abaixo descrevem os principais condicionantes para difusão
dos fatores de risco existentes nos focos naturais, com possibilidades de estabelecer processos
zoonóticos:
a) introdução de animais domésticos e/ou homem em um foco natural;
b) translocação de um hospedeiro infectado a um novo biótipo, donde existam hospedeiros
suscetíveis;
c) modificação da dimica dos hospedeiros ou alteração do equilíbrio ecológico;
d) falta de alimento, o que obriga os animais reservarios a translocar-se a outras biocenoses;
e) intervenção do homem na modificação dos ecossistemas;
f) mutações positivas no processo epidêmico do agente etiológico, facilitando sua
disseminação;
g) intervenção das aves migratórias e dos vetores.
60
Avaliando os roedores silvestres, algumas espécies têm distribuição cosmopolita, como o
R. rattus, considerado o roedor predominante na maior parte do interior do Brasil e, até então,
incriminado na participação do ciclo do tifo murino, cujo agente etiológico é a R. typhi
transmitida por fezes de pulgas Xenopsylla cheopis (RIBEIRO et al., 2003).
De acordo com Boostrom e colaboradores (2002), tornam-se necessárias investigações
sobre o papel de animais não domésticos, como os roedores silvestres e do gênero Didelphis
(gambá) que vivem pximos aos animais domésticos, no ciclo das riquetsioses, visto que os
animais silvestres podem desempenhar um papel importante na cadeia epidemiológica das
riquetsioses, podendo ainda representar um elo entre os ciclos silvestre e peridomiciliar dessas
doenças. Essa característica é devido ao alto grau de sinantropia, demonstrando boa adaptação
ao ambiente criado ou modificado pelo homem.
Segundo Longo (2007), gambás podem ser encontrados em várias regiões da América,
como no Canadá, nos EUA, México, Argentina, Paraguai, Bolívia, Venezuela, Uruguai,
Guianas e especialmente no terririo brasileiro, onde poderemos encontrar as quatro
espécies: Didelphis aurita em todo o Estado de São Paulo, principalmente nas regiões de
Mata Atlântica deste, e de outros estados próximos, com ocorrências no Norte do Rio Grande
do Sul e Amazônia; Didelphis albiventris na região Central e também é muito encontrado no
Estado de São Paulo; Didelphis marsupialis na região Amazônica; Didelphis araguariensis
no Rio Grande do Sul e Mato Grosso. Apresentam uma grande variedade alimentar
(onívoros), o que poderia explicar seu comportamento sinantrópico.
Devido a estas características, os gambás apresentam grande importância na
epidemiologia de doenças parasitarias, sendo reconhecidos como potencias disseminadores de
agentes etiológicos de zoonoses, definidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como
doenças naturalmente transmissíveis entre animais e o homem (ANTUNES, 2005).
Nos Estados Unidos, a espécie Didelphis virginiana tem sido incriminada como
reservario competente das R. felis e R. typhi (AZAD et al., 1997; BOOSTROM et al., 2002),
além de atestarem que as espécies Didelphis albiventris e Didelphis aurita foram abundantes
na área estudada.
Em um trabalho realizado no Estado de São Paulo, Barros-Battesti e colaboradores (2000)
relataram a presença de carrapatos A. cajennense infectando D. aurita (gambás). Em 2002,
Costa e colaboradores descreveram a presença de A. cajennense parasitando D. albiventris em
Campo Grande, no Estado do Mato Grosso do Sul, assim como carrapatos do gênero
Amblyomma parasitando o roedor Bolomys lasiurus.
61
Ainda em 2005, Horta e colaboradores comprovam a infecção por Rickettsia sp. em
carrapatos de gambás (Didelphis spp.) no Estado de São Paulo, através da PCR. Mais
recentemente, César e colaboradores (2007) traçaram o perfil hematológico de D. aurita e D.
albiventris também no Estado de São Paulo.
Além da existência de hospedeiros mamíferos, a atividade humana, especialmente sobre a
vegetação, tem um importante papel no surgimento e expansão das riquetsioses. O
reflorestamento feito com arbustos e a prática agrícola de criar pequenos bosques intercalados
com monoculturas de gramíneas favorecem a proliferação de artrópodes devida à formação de
microclimas favoráveis e à abundância de cobertura do solo, a qual gera um excelente habitat
para os mamíferos hospedeiros dos estádios intermediários (ATWOOD et al., 1965).
De acordo com Traub e Jellinson (1981), para que a manutenção das riquétsias na
natureza seja estabelecida em uma determinada área, é necessário, em primeiro lugar
determinar a espécie e número de prováveis vetores, seguido pela fauna de vertebrados
domésticos e silvestres. Dessa forma, pode-se dizer que quanto maior a densidade
populacional de hospedeiros, maior será a população de carrapatos. Por essa razão, nos
ambientes silvestres, com o mínimo de intervenção humana, as populações de carrapatos
tendem a ser mais baixas, que a densidade de hospedeiros (entendida aqui como oferta de
alimento para os carrapatos) será significativamente menor (VIEIRA et al., 2004). Portanto,
tem-se sugerido que animais como capivaras, roedores e gambás podem atuar no ciclo
silvestre das riquétsias formando um elo entre os ciclos enzoóticos e zoonóticos das bactérias
pertencentes ao GFM.
Para que uma população esteja estabelecida numa determinada área, alguns requisitos
para que os vertebrados sejam considerados bons amplificadores de riquétsia na natureza:
serem abundantes em áreas endêmicas; serem susceptíveis à infecção pela riquétsia; serem
altamente prolíferos, garantindo a introdução constante de animais susceptíveis na população
de vertebrados e apresentar bacteremia suficiente para ser considerado amplificador da
infecção (LABRUNA, 2006).
62
2.3.3 O ESPAÇO-DOENÇA E O INDIVÍDUO
2.3.3.1 PATOGENIA E CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DAS RIQUETSIOSES
A gravidade das riquetsioses é devida a rios danos causados em vasos sangüíneos pela
bactéria. O microorganismo possui uma grande habilidade em reproduzir-se dentro de células
endoteliais, in vivo. De acordo com Walker (1989), o primeiro passo na patogênese da doença
riquetsial do GFM, as a injeção da rickettsia na pele humana pela picada do carrapato, é o
ataque dessa bacria intracelular obrigaria às lulas alvo, ocorrendo uma vasculite de
pequenos vasos por infecção direta das células (LI e WALKER, 1992).
A conseqüência da replicação bacteriana induz à ativação plaquetária e do sistema de
coagulação, podendo levar a trombose. As lesões geradas no endotélio vascular provocam
aumento da permeabilidade capilar freqüentemente acompanhada por distúrbios hemostáticos
tais como edema periférico, hipotensão e hipovolemia, todos relacionados aos efeitos
citopáticos das riquétsias. Em formas severas, não raro, observa-se falência renal e edema
pulmonar (WALKER et al., 1987; DAVIDSON et al., 1990).
A riquétsia penetra, primeiramente via endocitose induzida, escapando do endossomo no
citoplasma das mesmas por um mecanismo possivelmente envolvendo atividade de
fosfolipase A2 e aí proliferando através da divisão binária (VALBUENA et al., 2002).
Atividades enzimáticas têm importância no papel da peroxidação lipídica de membrana,
devido à presença de radicais livres, agravadas pela presença do ferro intracelular, as quais
estão associadas à infecção riquetsial (SILVERMAN, 1984; WALKER, 1989).
Da pele, sua porta de entrada, as riquétsias espalham-se via corrente sangüínea e linfática
para todas as partes do corpo, incluindo cérebro, pulmão, rins, coração, fígado, baço, pâncreas
e trato gastrintestinal (WALKER, 1989). Em cada órgão ou tecido, após a proliferação, as
riquétsias são liberadas e espalham-se lula a lula devido a sua capacidade para
movimertar-se entre as lulas através da polimerização direcional da actina, infectando
células endoteliais adjacentes ou invadindo mais profundamente a parede dos vasos
sangüíneos por infectar células musculares lisas (VALBUENA et al., 2002); WALKER,
1989).
63
As características clínicas das doenças riquetsiais correspondem aos danos das principais
células-alvo, as células endoteliais, particularmente nos pulmões e cérebro (VALBUENA et
al., 2002). A doença apresenta um período de incubação de 2 a 14 dias, e inicia-se
bruscamente com febre contínua, mialgia, astralgia, prostração, mal estar e cefaléia (MELLES
et al., 1992).
Em casos graves, a riquétsia causa edema pulmonar não cardiogênico e síndrome do stress
respiratório do adulto, pneumonia intersticial, falha aguda renal, manchas hemorrágicas,
edema periférico e hipotensão hipovolêmica devido ao extravasamento de fluido no espaço
extracelular. O sistema nervoso central é um alvo crucial afetado e, se não tratado, o paciente
pode evoluir para um estágio torporoso, de confusão mental, com freqüentes alterações
psicomotoras (hemiplegia ou paralisia completa), chegando ao coma profundo (RAOULT e
ROUX, 1997a; VALBUENA et al., 2002).
Em geral, entre o segundo e o sexto dia da doença surge o exantema maculopapular,
predominante nos membros, acometendo palmas das mãos e plantas dos s, em 50 a 80%
dos pacientes. Freqüentemente evolui da forma petequial para a forma hemorrágica,
constituída principalmente por equimoses, as quais, no paciente não tratado, tendem à
confluência, podendo evoluir para necrose. Um estudo recentemente relatado no estado de
São Paulo descreve que diferentemente do que se observa em relação à RMSF, a presença da
icterícia vem sendo freqüentemente observada, ocorrendo em torno de 16% dos casos e sua
patogênese ainda precisa ser melhor estudada. Em pacientes que apresentam quadros clínicos
de maior gravidade, a icterícia foi observada em 52% dos casos estudados e foi fator preditivo
de pior prognóstico. Manifestações hemorrágicas vêm ocorrendo em 26% a 69,5% dos casos.
A insuficiência renal, insuficiência respiratória e manifestações neurológicas também podem
ser consideradas complicações freqüentemente observadas em vários casos da doença
(ANGERAMI et al., 2006).
As seqüelas em pacientes gravemente doentes incluem amputação, surdez, visão
debilitada, déficit intelectual, paraplegia, distúrbio comportamental e outros defeitos
neurogicos (VALBUENA et al., 2002).
A letalidade varia de 5 a 80% dos casos e é determinada, em parte, pela idade do paciente,
virulência da cepa existente no local e tratamento adequado (PRICE, 1954), podendo diminuir
de forma significativa quando este é introduzido em tempo hábil. As riquétsias respondem
muito bem aos antibióticos (oxitetraciclina e cloranfenicol), o que associado a um diagnóstico
e tratamento precoces torna bastante reduzida a ocorrência de casos fatais (CDC, 2007).
64
Caso não haja esse tratamento, ou caso este seja tardio, o óbito ocorre entre 5 a 8 dias após
o início dos sintomas (THORNER et al., 1998).
Embora o diagnóstico da FMB se baseie em sinais e sintomas clínicos característicos
associados a dados epidemiológicos, a confirmação laboratorial se faz necessária. Os métodos
sorológicos são os mais difundidos na confirmação de casos de FMB (COMER, 1991; CDC,
2007). No entanto, esta pode ainda ser feita através do isolamento do agente ou detecção do
mesmo através de técnicas de biologia molecular em amostras de sangue ou biópsia de pele
dos pacientes suspeitos.
Com relação a outros mamíferos, foram descritos casos clínicos em cães nos Estados
Unidos (MCDADE e NEWHOUSE, 1986), mas no Brasil não há relato de casos e/ou
publicações a respeito. Nos cães a sintomatologia varia consideravelmente. Febre, depressão,
queda de apetite e dor generalizada podem ocorrer dois a três dias após a infecção (COMER,
1991). Em eqüinos, não há descrições de sintomatologia, apesar de geralmente apresentarem
altos títulos de anticorpos anti-R. rickettsii (LEMOS et al., 1996b).
2.3.3.2 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DAS RIQUETSIOSES
O diagnóstico laboratorial indireto das riquetsioses é baseado em reações sorológicas
(COMER, 1991). Inclui-se a reação de Weil-Félix, o teste de proteção por sensibilização em
cobaias, a reação de fixação do complemento, o teste de neutralização de toxinas riquetsiais
em ratos com anti-soro preparado em cobaias, a aglutinação em látex e, principalmente, a
reação de imunofluorescência indireta (RIFI), considerada como teste padrão no diagnóstico
das riquetsioses. Ressalta-se, porém, que estes testes não podem distinguir a espécie de
rickettsia envolvida devido à ocorrência de reações cruzadas principalmente entre os membros
dos diferentes grupos (PHILLIP et al., 1978; MCDADE e NEWHOUSE, 1986), ou mesmo
entre os grupos (CALIC et al., 1998). Também pode ser utilizada no diagnóstico indireto de
riquétsias, a técnica de ELISA com anticorpos monoclonais e policlonais (DOBSON et al.,
1989). Entretanto, esses anticorpos espécie-específicos estão disponíveis apenas para um
número muito limitado de espécies (REGNERY et al., 1991).
65
Métodos baseados no padrão eletroforético e na identificação imunológica de epitopos
específicos de riquétsias como o Western Blot (ANACKER et al., 1984), também podem ser
usados como importantes ferramentas para estudos de confirmação de resultados,
especialmente se realizado com anticorpos monoclonais para determinadas espécies de
riquétsias (LA SCOLA e RAOULT, 1997), embora apresentem algumas limitações técnicas.
Para o propósito de diferenciação entre espécies do GFM, o método exige que a amostra
analisada sofra uma purificação rigorosa, eliminando restos celulares do meio de cultura, sem
que ocorram modificações estruturais importantes nas proteínas e epitopos da bactéria
(REGNERY et al., 1991).
No entanto, a técnica é especialmente útil na diferenciação de falsos positivos gerados
por reações cruzadas entre espécies do mesmo grupo ou de grupos diferentes (LA SCOLA e
RAOULT, 1997).
Os testes sorológicos não são capazes de detectar precocemente a doença, que os
títulos de anticorpos não aumentam antes de duas ou três semanas, contribuindo pouco para o
diagnóstico durante sua fase aguda, tornando-se, assim, dispensável a confirmação sorológica
para a instituição do tratamento. No Brasil, o diagnóstico das riquetsioses tem sido realizado
por alguns laboratórios de Saúde Pública (Instituto Adolfo Lutz IAL/SP, Instituto Oswaldo
Cruz – FIOCRUZ/RJ, e Fundação Ezequiel Dias/MG) que empregam usualmente testes
sorológicos, destacando-se a RIFI, padrão de referência utilizado pelo Center For Disease
Control and Prevention (CDC) (NASCIMENTO e SCHUMAKER, 2004), a qual pode ser
utilizada para detectar imunoglobulinas G (IgG) e M (IgM). Segundo Melles e colaboradores
(1999), a RIFI apresenta uma sensibilidade de 94 a 100% e especificidade de 100%.
A identificação imunohistoqmica nas biópsias cutâneas das lesões maculopapulares
oferece uma alternativa viável para o diagnóstico das riquetsioses (DUMLER et al., 1990 ).
Outra metodologia que pode ser utilizada na detecção de casos agudos é o isolamento do
agente em cultura de células (MELLES et al., 1992), porém são raros os laboratórios de saúde
pública ou de pesquisa no Brasil que podem realizar essa técnica.
Na virada da década de 1980 para a de 1990, a técnica do shell vialpassou a ser
utilizada para o isolamento de rickettsia de amostras clínicas (PAROLA et al., 2005). Esta
técnica, que se baseia na centrifugação de homogenato de material suspeito sobre uma
monocamada de células previamente estabelecida na base de um tubo chato, aumentou
substancialmente a eficácia de isolamento de rickettsia, uma vez que o processo de
66
centrifugação gerou um grande incremento na sensibilidade da técnica de isolamento do
agente (LA SCOLA e RAOULT, 1997).
para o diagnóstico direto do agente pode ser feito através da reação de
imunofluorescência direta (RIFD), teste de hemolinfa, isolamento do agente em cultura de
células, inoculação em animais e ovos embrionados, composição protéica por eletroforese em
gel de SDS-poliacrilamida e genotipagem (BURGDORFER, 1970; PHILIP et al., 1976;
LEMOS et al., 1996a).
A partir da década de 1990, todos moleculares (identificação genotípica) passaram a
ser aplicados e atualmente são os de eleição para identificação específica das riquétsias,
através do seqüenciamento de DNA de alguns fragmentos gênicos (PAROLA et al., 2005).
Nos últimos 20 anos, o uso em conjunto das técnicas de shell vialpara isolamento de
riquétsias de amostras clínicas, seguida da identificação do agente através de técnicas de
caracterização molecular, tem proporcionado a descoberta de várias novas espécies de
rickettsia, chegando a mais de 20 espécies lidas atualmente. Além disso, a distribuição
geográfica das espécies previamente conhecidas tem aumentado substancialmente com o uso
cada vez mais difundido dessas técnicas em diferentes partes do mundo (HECHEMY et al.,
2003; PAROLA et al., 2005).
No Brasil, o cultivo celular de Rickettsia spp. foi relatado pela primeira vez em 1996,
quando uma amostra de rickettsia do GFM foi isolada de um carrapato Amblyomma
dubitatum proveniente do estado de São Paulo, porém sem identificão da espécie de
rickettsia isolada (LEMOS et al., 1996a).
Atualmente, amostras de R. rickettsii, R. parkeri, R. rhipicephali, R. amblyommii (todas
do GFM) e R. bellii foram isoladas de carrapatos naturalmente infectados de diferentes locais
do Brasil, em cultivo celular de células Vero através da técnica shell vial(LABRUNA et
al., 2004b; PINTER e LABRUNA, 2006; SILVEIRA et al., 2007). Ainda recentemente, uma
amostra de R. felis foi isolada de pulgas naturalmente infectadas (HORTA et al., 2006).
Para o diagnóstico da presença de riquétsias do GFM em carrapatos, os testes geralmente
utilizados são a avaliação da hemolinfa, RIFD, ELISA e PCR.
O teste da hemolinfa é uma técnica econômica e pida para detecção de riquétsia em
carrapatos vivos, sem danificá-los ou destruí-los, permitindo sua utilização posterior em todas
as outras disponíveis. Vem sendo utilizado como triagem (ZHANG e FAN., 1995), pois não é
capaz de diferenciar entre espécies patogênicas e não patogênicas ou mesmo entre outras
bactérias (GIMENEZ, 1964; BURGDORFER, 1970).
67
A pequena concentração de riquétsias no carrapato pode ser contornada pela incubação
prévia destes a 37º C, por 24 a 48 horas, o que estimula a replicação dos patógenos.
Entretanto, o número de hemócitos entre diferentes espécimes é bastante variável, e nem todas
as células estarão infectadas. Assim, as chances de um erro diagnóstico existem, e são maiores
quando pequenas quantidades de hemolinfa estão disponíveis (BURGDORFER, 1970).
A visualização da morfologia dos microorganismos nos hemócitos do carrapato auxilia,
em uma classificação preliminar, mas se a determinação das espécies for necessária, esta
deverá ser realizada através da RIFD, métodos de isolamento ou da PCR, sendo a última
considerada de maior sensibilidade e especificidade, possibilitando a determinação de gênero
e espécies (RADULOVIC et al., 1994).
Recentes progressos nas técnicas laboratoriais para o estudo das riquétsias, especialmente
a implementação de técnicas de biologia molecular, vêm permitindo a caracterização
molecular do gênero Rickettsia com a identificação de novas espécies em todo o mundo e
esclarecimentos importantes em relação a bactérias já descritas. A Rickettsia felis, por
exemplo, conhecida desde 1990, denominada na época como agente “ELB”, era classificada
como membro do GT, devido à sua reatividade sorológica com angenos da Rickettsia typhi.
Sabe-se hoje que essa bactéria pertence ao GFM.
A análise da seqüência de nucleotídeos de determinados genes constitui um método
bastante apropriado para identificação e análise filogenética de diferentes espécies de
riquétsias (REGNERY et al., 1991). A aplicação da PCR oferece um ensaio rápido, senvel e
altamente específico para detecção de riquétsias (AZAD et al., 1990).
Além disso, a PCR permite, em uma etapa posterior, o seqüenciamento de nucleotídeos
do gene amplificado. A identificação molecular de organismos do gênero Rickettsia através da
PCR associada ao seqüenciamento é, atualmente, o método padrão para identificação e análise
filogenética das diferentes espécies de riquétsias (REGNERY et al., 1991; LA SCOLA e
RAOULT, 1997). Utilizando-se diferentes iniciadores de seqüências genômicas conhecidas, é
possível obter diagnósticos diferenciados para uma determinada amostra. Algumas seqüências
genômicas das riquétsias têm suas funções fenotípicas e sua distribuição entre diversas
espécies determinada (LA SCOLA e RAOULT, 1997).
A análise da seqüência de nucleotídeos do gene para rRNA 16S é útil para identificação a
nível de gênero, mas desde que várias espécies partilham seqüências similares deste gene, o
estudo do mesmo não fornece acurada identificação a vel de espécie (LA SCOLA e
RAOULT, 1997).
68
Roux e colaboradores (1996), inferiram relacionamentos filogenéticos de espécies de
rickettsia pela comparação de seqüências de evolução mais rápida do gene que codifica a
enzima respiratória citrato cintase, mostrando que esta ferramenta é mais sensível que
comparões feitas a partir de rRNA 16S.
O gene da citrato cintase está presente em diversos organismos procariotos e por ser
codificador de uma enzima de grande importância fisiológica, sofre uma elevada pressão
seletiva para manter-se inalterada (INOKUMA et al., 2001) traduzindo para uma proteína
altamente conservada. Assim, relacionamentos filogenéticos confiáveis, a partir da mesma,
poderiam ser obtidos entre riquétsias que divergiram precocemente do ancestral comum do
GFM (FOURNIER et al., 1998), já que, como explicado por Raoult e colaboradores (1996), o
gene não é divergente o suficiente para permitir distinção entre todas as espécies de rickettsia.
Em acordo, Roux & Raoult (2000) relatam que seqüências obtidas deste gene
diferiram significantemente entre organismos distantemente relacionados. O gene tem sido
utilizado em combinação com outros para melhor caracterização de agentes riquetsiais
(ROUX e RAOULT, 1995; FOURNIER et al., 1998; ISHIKURA et al., 2003) podendo
identificar também outros gêneros, além de Rickettsia (ISHIKURA et al., 2003).
Azad e colaboradores (1990), propuseram iniciadores que identificam uma seqüência do
gene 17kDa, que codifica para um antígeno de superfície de membrana gênero específico,
podendo ser utilizados em conjunto com iniciadores internos (“nested primers) da mesma
seqüência, o que aumenta a sensibilidade da técnica (SCHRIEFER et al., 1994).
Para a detecção de riquétsias do GFM, foram também propostos iniciadores que
localizam as seqüências genômicas responsáveis por codificar as proteínas de membrana
OmpA e OmpB, que estão mais sujeitas a mutações persistentes do genoma por serem
antígenos imunoexpostos, representando uma ferramenta para classificação e filogenia das
diferentes espécies (REGNERY et al., 1991; EREMEEVA et al., 1994).
Baseando-se em análise de PCR-RFLP do gene que codifica a proteína OmpA, foi
realizada por Regnery e colaboradores (1991) a diferenciação de nove espécies de riquétsias
do GFM estudadas. Posteriormente, Eremeeva e colaboradores (1994), conseguiram a
diferenciação de 36 cepas deste grupo, por uma combinação dessa abordagem com um
método baseado em análise de PCR-RFLP do gene para a proteína OmpB.
69
No Brasil, a investigação molecular de riquétsias tem sido realizada através da
amplificação por PCR e seqüenciamento de fragmentos de DNA dos genes para as proteínas
17kDa, citrato sintase e OmpA, bem como por análise de PCR/RFLP, permitindo avanços
significativos no conhecimento das riquetioses neste país, incluindo a caracterização
molecular de algumas espécies, principalmente nos estados de Minas Gerais, como a detecção
da R. felis em pulgas Ctenocephalides (OLIVEIRA et al., 2002; CARDOSO, 2004) e de São
Paulo (HORTA, 2002; NASCIMENTO, 2003; PINTER, 2003; SANTOS, 2003; LABRUNA
et al., 2004b; HORTA et al., 2006; PINTER e LABRUNA, 2006; SILVEIRA et al., 2007) e
em carrapatos do gênero Amblyomma (HORTA, 2002; VIANNA, 2002; GALVÃO et al.,
2002a).
O diagnóstico por esta metodologia se encontra implementado em alguns núcleos de
pesquisa, auxiliando na resolução dos casos não solucionados por métodos laboratoriais
convencionais (NASCIMENTO e SCHUMAKER, 2004).
3. OBJETIVOS
71
3.1 OBJETIVO GERAL
Avaliar a situação epidemiológica da FMB e outras riquetsioses em duas áreas do
município de Santa Cruz do Escalvado, Estado de Minas Gerais, onde casos da doença foram
confirmados na década de 1980, caracterizando, portanto, a região de acordo com sua situação
atual de endemicidade, bem como, o papel de animais silvestres e domésticos pesquisados
(gambás, pequenos roedores, eqüinos e cães) e seus vetores no ciclo epidemiológico dessas
doenças.
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Detectar a presença de organismos do gênero Rickettsia em artrópodes vetores e em
tecidos de roedores, utilizando a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR);
Identificar e classificar organismos do gênero Rickettsia detectados na PCR através de
sequenciamento dos fragmentos amplificados;
Detectar a presença de anticorpos anti-R. rickettsii, R. felis, R. parkeri, R. bellii e R.
amblyommii em soros obtidos a partir de roedores, gambás, cães e eqüinos atras da
Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI);
Discutir os fatores de risco da infecção e das condições reais da população dentro do
espaço geográfico em que habita e dentro de seus níveis, caracterizando a região de
acordo com sua situação atual no que tange ao grau de endemicidade da mesma, e o
papel dos animais silvestres e domésticos pesquisados e seus vetores no ciclo
epidemiológico da FMB e outras riquetsioses.
4. METODOLOGIA
73
4.1 A LOCALIDADE-ALVO DO ESTUDO
A pesquisa foi realizada no município de Santa Cruz do Escalvado localizado na Zona da
Mata, pertencente à Bacia Hidrográfica do Vale do Piranga, nascente do Rio Doce, no Estado
de Minas Gerais, distante 205 km de Belo Horizonte.
O município de Santa Cruz do Escalvado foi considerado área endêmica para FMB no
final da década de 80, mantendo-se como foco silencioso há 22 anos. Por esse motivo foi
escolhido para o presente estudo que teve como objetivo principal estudar o comportamento
da FMB e outras riquetsioses em área de baixa endemicidade.
Santa Cruz do Escavado apresenta uma área total de 258,34 Km
2
, 87 localidades, e
população estimada em 5.189 habitantes, sendo que 80% dos mesmos vivem na zona rural
dedicados principalmente às atividades agropecuárias. A sede encontra-se à 20°13’36” de sul
e 42°49’24” de longitude oeste, na altitude de 412 metros (IBGE, 2007).
Figura 4: Mapa do estado de Minas Gerais, indicando a posição do município de Santa Cruz do
Escalvado em relação à capital, Belo Horizonte. Fonte: IBGE, 2005.
74
Por estar inserida na região da Zona da Mata, Santa Cruz do Escalvado possui uma
vegetação acometida por uma devastação generalizada (Figura 5) de tal modo que, os
cumes de algumas elevações, evidente na Pedra do Escalvado, possuem pequenas manchas de
matas residuais sendo, todas elas, secundárias o que pode ser comprovado observando as
copas de embaúbas brancas que são características de regiões de desmatamento.
Figura 5: Foto da vegetação característica de uma área da região de Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais, 2006.
Levando-se em conta os resultados sobre a endemicidade da FMB obtidos nesse
município (LEMOS, 1991), optou-se por selecionar as duas localidades de maior prevalência
sorológica em humanos e animais encontradas nesse estudo, ou seja, Patrimônio e Soberbo.
A antiga São Sebastião do Soberbo foi inundada para a construção da Usina Hidrelétrica
de Candonga e foi construído um núcleo denominado Nova Soberbo para realocar os
moradores que perderam suas casas na construção da hidrelétrica. No entanto, uma boa parte
da área pesquisada anteriormente nessa localidade foi preservada, o que permitiu a realização
do estudo atual.
A partir da divisão da área do Município em quadrante, tomando como referência as
coordenadas geográficas que cortam a sede urbana, podem-se ver as duas localidades
estudadas, assim caracterizadas:
75
Patrimônio: localidade distante da sede municipal a 0,5 km, caracterizada pela presença
de grande aglomerado de moradores com a utilização dos campos o cultivados, isto é,
abandonados como pastos para animais, na maioria eqüinos, que como os cães,
permanecem soltos durante todo o dia. Além destes campos, existem pequenas unidades
de vegetação como campos limpos e arbustos constituídos muitas vezes por bambuzais.
Não existem áreas cultivadas, exceto por pequenas plantações rudimentares de
subsistência praticadas por alguns poucos moradores (Figura 6).
Figura 6: Foto de uma área próximo à estrada do PRONAF, Patrimônio, onde armadilhas foram
dispostas para captura de animais silvestres. Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais, 2006.
São Sebastião do Soberbo: distrito de Santa Cruz do Escalvado, localizado às margens do
Rio Doce, a 10 km de distância do centro urbano, foi o único povoado totalmente inundado
pelo reservatório de Candonga. Era uma comunidade tipicamente rural, com ruas de terra
batida e casas muito simples, daquelas que possuem extensas cozinhas com fogão a lenha.
Sua população era composta por uma maioria de agricultores, pescadores, garimpeiros,
passando por pequenos comerciantes. Além de se dedicar aos seus trabalhos, boa parte
também dependia dos quintais para cultivar hortas, criar galinhas e porcos, além de colher
frutas.
76
Figura 7: Foto da localidade de o Sebastião do Soberbo, antes do enchimento da barragem da UHE-
Candonga, 2005.
A Figura 8 esquematiza suas localizações dentro do município.
Figura 8: Localização das localidades estudadas pertencentes ao município de Santa Cruz do Escalvado,
Minas Gerais. Fonte: IBGE, 2005.
77
4.2 MATERIAIS E MÉTODOS
4.2.1 CAPTURA DE ANIMAIS
Juntamente com a ajuda dos profissionais da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), as
armadilhas do tipo gaiolas para captura de gambás (num total de 20 armadilhas/coleta) e
roedores (num total de 100 armadilhas/coleta) foram montadas em locais próximos às
habitações, incluindo garagens, galpões de estoques de alimentos, plantações de milho,
bambuzais, depósitos de lixo e próximos ao peridomicílio (Figura 9).
Figura 9: Foto mostrando o guarda da FUNASA preparando uma armadilha de roedores em local
próximo a uma rua de Patrimônio (estrada do PRONAF), Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais.
Os gambás foram atraídos por banana com pasta de amendoim e os roedores por pedos
de espigas de milho. As capturas ocorreram ao longo de um ano a cada três meses na terceira
semana do mês e as gaiolas foram armadas por dois dias consecutivos.
78
Para cada animal capturado, foram preenchidas fichas contendo todos os dados, como
gênero/espécie, local de captura, identificação da amostra, data, coletor (ANEXO A). Após a
captura, os gambás foram anestesiados, foi feita a limpeza e esterilização da cauda com álcool
70%, realizando-se, em seguida, compressão até a obtenção de um volume mínimo de sangue
para posterior análise sorológica.
A manipulação após a captura dos roedores foi realizada com medidas de segurança (luvas
e principalmente máscaras) de forma a evitar a inspiração de partículas provenientes dos
roedores, transmissores de doenças como a hantavirose. Esses roedores de pequeno porte
foram acondicionados em vasilhas plásticas contendo um chumaço de algodão embebido com
éter sulfúrico (COSTA et al., 2002; NAVA et al., 2003). Após este procedimento, foram
coletadas amostras de sangue, seja pela ponta da cauda ou punção intra-cardíaca, para
avaliação sorológica e vísceras (fígado e baço) para posterior verificação da presença de
riquétsias (Figura 10) através da PCR em tecidos.
Figura 10: Amostras de fígado e baço coletados de roedores silvestres capturados em Santa Cruz do
Escalvado, Minas Gerais, 2006.
79
Os cães e eqüinos foram abordados, identificados por sexo e local de origem,
inspecionados quanto à presença de carrapatos e pulgas, sendo em seguida coletados cerca de
10 mL de sangue através da venocentese da cefálica em cães e da jugular em eqüinos para
avaliação sorológica (Figuras 11 e 12).
Figura 11: Coleta de sangue em cães da localidade de Patrimônio.
80
Figura 12: Coleta de sangue em eqüinos da localidade de Soberbo.
4.2.2 COLETA DE ECTOPARASITOS
O cronograma da coleta foi estabelecido de acordo com a variação sazonal da população
do carrapato vetor, sendo os mesmos coletados em fase parasitária e alguns poucos em fase de
vida livre.
Os carrapatos, pulgas e ácaros em fase parasitária foram coletados ativamente pela busca
no corpo dos animais presentes no local, os quais foram examinados quanto à presença dos
mesmos. A coleta foi feita manualmente e os ectoparasitos acondicionados em recipiente
apropriado identificados de acordo com o local e animal de origem. Nos roedores, a coleta foi
feita através do método do penteado (Figura13).
81
Figura13: Coleta de ectoparasitos em roedores pelo método do penteado.
Posteriormente, os artrópodes foram transportados para o Laboratório de Bioquímica e
Biologia Molecular de Agentes Infecciosos e Parasitários da Universidade Federal de Viçosa
(UFV), sob a orientação do Prof. Dr. Cláudio Mafra, onde foram taxonomicamente
identificados de acordo com a chave dicotômica e pictória descrita por Aragão & Fonseca
(1961). Em seguida, foram separados segundo gênero, espécie, sexo e estágio de
desenvolvimento, agrupados em lotes de 1 a 5 indivíduos de acordo com o hospedeiro e
tamanho de cada vetor. Esses pools de ectoparasitos foram armazenados a -20ºC até a
extração de DNA.
82
4.2.3 A REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE (PCR) EM ECTOPARASITOS E
EM TECIDOS DE ROEDORES
4.2.3.1 EXTRAÇÃO DE DNA
A extração de DNA dos ectoparasitos foi realizada de acordo com o protocolo descrito por
Billings e colaboradores (1998). Cada pool foi lavado com etanol 70% em quantidade
suficiente para cobrir os ectoparasitos. Em seguida, foram lavados em tampão fosfato (PBS
pH 7,2) por 5 minutos (duas vezes). Foram adicionados 200 L do mesmo tampão para
maceração do material. No mesmo tubo foram acrescentados SDS 10% v/v e Proteinase K
(20mg/mL) para uma concentração final de 1% e, em seguida, incubados em banho-maria a
55ºC overnigth. À amostra digerida, acrescentou-se 200 L de fenol-clorofórmio (1:1),
submetendo-a à centrifugação (12000 x g, 2 minutos). A fase aquosa foi retirada e o
sobrenadante transferido para um tubo novo. Esse procedimento foi repetido 6 vezes. Ao
sedimento, foram adicionados 200 L de clorofórmio, seguido de uma nova centrifugação. O
sobrenadante foi novamente transferido para um tubo estéril, sendo acrescido 40 L de NaCl
2,5M, 200 L de clorofórmio e dois volumes de etanol 100%. Os tubos foram armazenados a
-70ºC por 1200 minutos. Em seguida, as amostras foram centrifugadas a 12000 x g sob
temperatura de 4ºC por 15 minutos. Ao sedimento restante, foram adicionados 300 L de
etanol 70% e novamente centrifugados a 13000 rpm sob temperatura de C por 15 minutos,
para ressuspender o DNA previamente precipitado. Por fim, o sobrenadante foi descartado e o
pellet resuspendido em 100 L de água estéril, destilada e deionizada e posteriormente,
armazenados a -4ºC.
Desse material foram retirados 20 L para quantificação em espectofotômetro (260 nm),
sendo todas as amostras ajustadas para concentração de 50 ng/L.
83
A extração de DNA de tecidos (fígado e baço) de roedores foi adaptada de acordo com o
protocolo descrito por Sambrook e colaboradores (1989). Fragmentos de tecidos armazenados
em etanol foram triturados com a ajuda de um bisturi estéril. Em seguida, foram transferidos
aproximadamente 50 mg para um tubo novo. Foram adicionados 500 l de tampão de
lavagem (100mM Tris-HCl, pH 8,0; 100mM EDTA, pH 8,0) e posterior centrifugação
(12000g; 10 minutos). O sobrenadante foi descartado e, ao precipitado foram adicionados 500
l do tampão de digestão (10mM Tris-HCl, pH 8,0; 40 mM EDTA, pH 8,0) acrescido de 12,5
l de Proteinase K (20mg/ml) e em seguida, incubados em banho-maria a 55ºC overnigth.
Posteriormente, o DNA foi purificado com uma extração de fenol-Tris (pH 8,0) seguida de
duas extrações de fenol-clorofórmio. Para a precipitação do DNA utilizou-se acetato de
amônia (200 mM) e álcool isopropílico na proporção de 1:1 permanecendo incubado a -20ºC
overnigth. Em seguida, o DNA foi lavado com 100 l de etanol (70%) e ressuspendido em
100 l de água deionizada estéril, sendo em seguida armazenado a -20ºC, para posterior
quantificação.
Desse material também foram retirados 20 L para quantificação em espectofotômetro
(260 nm), sendo todas as amostras ajustadas para concentração de 50 ng/L.
4.2.3.2 PADRONIZAÇÃO DA PCR OBTENÇÃO DO CONTROLE POSITIVO
Os controles positivos foram obtidos a partir de cultura de células Vero infectadas com R.
parkeri. Uma monocamada de células Vero foi obtida por incubação a 37ºC, por 24/48 horas
em estufa de CO
2
, em frasco contendo meio essencial nimo (MEM) enriquecido com 10%
de soro bovino fetal (SBF) e L-glutamina 2 mM. Obtida a monocamada nas condições
descritas acima, a cultura foi infectada com R. parkeri. As lulas infectadas foram mantidas
em estufa, a 28ºC por aproximadamente 5 dias (até começarem a se desprender da parede da
garrafa de cultura). Assim, no quinto dia s-infecção uma pequena porção de células foi
retirada para visualização e controle da infecção. O DNA foi obtido das células infectadas,
utilizando-se o mesmo protocolo para extração de DNA de tecidos.
84
4.2.3.3 REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE (PCR)
Amostras de DNA obtidas foram agrupadas e submetidas à PCR. Para isso foram
misturadas 50 ng de DNA total de cada amostra, formando um pool com cinco amostras
diferentes e concentração final de 300 ng de DNA. Essas amostras incluíram DNA de
carrapatos, pulgas e tecidos de roedores.
Para amplificação do DNA riquetsial, foram utilizados três pares de oligonucleotídeos
iniciadores (primers) descritos na literatura, sendo dois deles do sistema nested (AZAD et
al., 1990; WEBB et al., 1990; SCHRIEFER et al., 1994). Os iniciadores foram sintetizados
pela Sigma Genosys, doados pela UTMB, estando suas seqüências, Tm e tamanho do produto
amplificado apresentados nos Quadros 1 e 3.
Para detecção do gênero riquétsia foi utilizado inicialmente um duplex composto por dois
pares de iniciadores gênero específicos, um par externo do gene que codifica uma proteína
estrutural de membrana de 17kDa, altamente conservada no gênero e que amplifica um
fragmento de 434 pb (17kDa 1 e 17kDa 2) e outro, um par de iniciadores do gene da citrato
sintase o qual amplifica uma porção de 401 pb (CS).
A reação de amplificação foi realizada conforme adaptações dos protocolos descritos por
Webb e colaboradores (1990), Schriefer e colaboradores (1994), Regnery e colaboradores
(1991) nas condições apresentadas no Quadro 2.
85
lkjhlkjhljIniciador
Gene Seqüência nucleotídica (5´ → 3´)
Tamanho
do produto
amplificado
Tm
(ºC)
17kDa 1 (F) 17kDa
GCTCTTGCAACTTCTATGTT 434 pb 56
17kDa 2 (R) 17kDa
CATTGTTCGTCAGGTTGGCG 434 pb 62
CS-78 (F) gltA GCAAGTATCGGTGAGGATGTAAT 401 pb 62
CS-323 (R) gltA GCTTCCTTAAAATTCAATAAATCAGGAT
401 pb 64
Quadro 1 : Iniciadores utilizados na PCR duplex, origem R. rickettsii.
Etapas 17kDa ( 1 e 2 ) Citrato sintase
Desnaturação inicial 94ºC - 5 min 94ºC - 5 min
Número de ciclos 30 ciclos 30 ciclos
Desnaturação 94ºC - 1 min 94ºC - 1 min
Anelamento 50ºC - 2 min 50ºC - 2 min
Extensão 72ºC - 2 min 72ºC - 2 min
Extensão final 72ºC - 7 min 72ºC - 7 min
Quadro 2: Condições de amplificação da reação duplex, conforme os genes pesquisados.
86
Após a PCR, alíquotas de 10 L do produto amplificado foram submetidas a eletroforese
em gel de poliacrilamida 8% corado pelo método da prata para verificação da amplificação
dos fragmentos desejados (SANGUINETTI et al., 1994).
As amostras negativas na primeira amplificação foram reamplificadas utilizando outro par
de iniciadores também gênero-específicos (nested primers) que amplificam uma região mais
interna do gene 17kDa, permitindo a realizão de uma PCR de maior sensibilidade (full
nested PCR), que amplifica um fragmento de 232 pb, conforme o Quadro 3 e nas condições
apresentadas no Quadro 4.
Iniciador Gene Seqüência nucleotídica (5´ → 3´)
Tamanho do
produto
amplificado
Tm
(ºC)
N 17kDa 1(F)
17kDa
omp
CATTACTTGGTTCTCAATTCGGT 232 pb 64
N 17kDa 2(R)
17kDa
omp
GTTTTATTAGTGGTTACGTAA 232 pb 54
Quadro 3 : Iniciadores utilizados na nested –PCR, origem R. typhi
Etapas N 17kDa
Desnaturação inicial 95ºC - 1 min
Número de ciclos 35 ciclos
Desnaturação 95ºC - 1 min
Anelamento 50ºC - 1 min
Extensão 72ºC - 2 min
Extensão final 72ºC - 5 min
Quadro 4: Condições de amplificação da reação nested, conforme os genes pesquisados.
Após a PCR, alíquotas de 10 L do produto reamplificado foram submetidas a
eletroforese em gel de poliacrilamida 8%, corado pelo método da prata para verificação da
amplificação dos fragmentos desejados (SANGUINETTI et al., 1994).
Foram mantidas as mesmas condições nas reações de PCR para tecidos de roedores.
87
4.2.3.4 SEQÜENCIAMENTO
As amostras com resultado positivo na nested-PCR foram amplificados em volume
maior, utilizando-se o par de iniciadores N 17 KDa 1 e N 17 KDa 2, purificadas e
posteriormente submetidas à reação de sequenciamento.
- PURIFICAÇÃO DOS PRODUTOS DA PCR
Os fragmentos de DNA de 232 pares de bases obtidos foram purificados utilizando o kit
Wizard
®
PCR preps DNA Purification Systems da Promega, de acordo com as recomendações
do fabricante. 90 L do produto de PCR foram passados por uma minicoluna com o auxílio
de uma seringa. A seguir, a coluna foi lavada com isopropanol 80% e o DNA eluído em água
estéril destilada e deionizada. O produto obtido foi então quantificado em gel de agarose 1%
em TAE 0,5X corado com brometo de etídio (0,5mg/mL) e submetido ao seqüenciamento
direto com os seguintes iniciadores N 17 KDa 1 (fita direta) e N 17 KDa 2 (fita reversa).
- REAÇÃO DE SEQÜENCIAMENTO
As reações de sequenciamento foram baseadas na técnica de terminação de cadeia por
dideoxinucleotídeos (ddNTPs) descrita por Sanger e colaboradores (1977). O DNA foi
seqüenciado utilizando-se o ABI PRISM BigDye III Terminator Cycle Sequencing Ready
Reaction da Applied Biosystems. Para isso, de 200 a 300 ng do DNA foram empregados em
uma reação contendo 4,0 L de mix, fornecido no kit de sequenciamento “BigDye
Terminator”, 5,0 pmoles do iniciador direto ou reverso e 6,0 L de tampão (Tris-HCl 200mM,
pH 9,0; MgCl
2
mM) em um volume total de reação de 20 L.
Após a amplificação, o DNA foi precipitado pela adição de 80 L de isopropanol a 75% e
os tubos, deixados à temperatura ambiente por 15 minutos e levados ao seqüenciador.
88
- ANÁLISE DA SEQÜÊNCIA NUCLEOTÍDICA
Ambas as fitas, direta e reversa, após seenciadas foram submetidas à pesquisa de
homologia com outras seqüências depositadas no GenBank, utilizando o programa BLASTn
(ALTSCHUL et al., 1997).
4.2.4 SOROLOGIA
As amostras de soro de cães, eqüinos e gambás foram investigadas em relação à presença
de anticorpos IgG empregando-se antígenos de R. rickettsii, R. parkeri, R. felis, R. bellii e R.
amblyommii e conjugados anti-anticorpo pela Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI).
Essas amostras foram analisadas em parceria com a Faculdade de Medicina Veterinária e
Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP), sob a orientação do Prof. Dr. Marcelo
Bahia Labruna. Já as amostras de soro de roedores silvestres foram analisadas em parceria
com a Fundação Ezequiel Dias (FUNED), no laboratório de Rickettsiologia, sob a orientação
da Dra. Simone Berger Calic, sob as mesmas condições descritas acima.
Alíquotas de soro diluídas em tampão fosfato (PBS pH 7,4) foram depositadas sobre
lâminas contendo antígeno específico de R. rickettsii, R. parkeri, R. felis, R. bellii e R.
amblyommii e incubadas a 37ºC. A cada mina foi adicionado o conjugado total Fluorine H
da Biolab
anti-cão, anti-eqüino, anti-gambá e anti-ratos, marcados com isotiocianato de
fluoresceína pela Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI). Os soros foram testados na
diluição de 1:64, sendo este o ponto de corte utilizado (DUMLER e WALKER, 1994).
Em seguida, foram lavadas em tampão de lavagem (PBS + Triton 100X a 0,1%) 15
minutos (2X) e secas a temperatura ambiente. A diluição dos conjugados foi específica para
cada animal, sendo para os cães de 1:400, eqüinos 1:200, gambás 1:300 e roedores 1:50; em
seguida foram adicionados respectivamente a cada lâmina. Uma nova incubação foi realizada
nas mesmas condições anteriores (37ºC por 30 minutos) sendo em seguida feita a lavagem
com tampão de lavagem acrescido de Azul de Evans (0,1%).
89
As lâminas foram secas em câmara escura. Antes de fazer a leitura e a interpretação das
reações em microscópio de imunofluorescência, foram adicionadas de 2 a 3 gotas de glicerina
tamponada sobre cada lâmina, cobrindo-a com lamínula. Foram considerados positivos os
títulos iguais a 1/64. Para cada animal testado, foram utilizados soros controle positivo e
negativo. A leitura foi realizada em microspio de imunofluorescência epifluorescente dos
referidos laboratórios.
5. RESULTADOS
91
5.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
As duas localidades pré-selecionadas para o estudo, Patrimônio e São Sebastião do
Soberbo, apresentaram algumas características comuns, como áreas de pasto destinados à
criação de animais (bovinos, eqüinos), áreas destinadas ao armazenamento de alimentos,
como galpões, paióis, incluindo também pequenas plantações de milho, bambuzais, conforme
Figura 14.
Figura 14: Foto de uma área da localidade de Soberbo, onde armadilhas foram montadas para captura de
pequenos mamíferos (bambuzal).
Como relatado, parte de uma dessas áreas, Soberbo, foi inundada para a construção da
Usina Hidrelétrica de Candonga, em 2004 (Figura 15), causando não uma reviravolta nos
costumes das populações que viviam à margem do rio Doce, como também na paisagem
local.
92
Figura 15: Destroços de o Sebastião do Soberbo, antes do enchimento do lago de Candonga.
Fonte: Carlos Juliano Barros-01/10/04.
5.2 CAPTURA DE ANIMAIS E VETORES
Durante as visitas realizadas entre os meses de maio de 2005 a março de 2006 foram
capturados 94 vertebrados silvestres. Entre esses animais capturados, 33 eram da espécie
Rattus rattus, 35 Nectomys squamipes e 12 Oryzomys subflavus; e 14 gambás Didelphis
aurita. Foram capturados ainda 37 eqüinos e 53 cães (Tabela 1).
93
Tabela 1- Total de animais investigados em Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais - no período de
maio/2005 a março/2006.
Os roedores foram capturados em áreas características de seus habitáts comuns. A espécie
R. rattus foi capturada principalmente em paióis e armazéns.as espécies N. squamipes e O.
subflavus foram capturadas principalmente em campos cultivados e matas (Quadro 5).
De acordo com a Tabela 2 , foram capturados um total de 43 machos e 40 fêmeas das
espécies R. rattus, N. squamipes e O. subflavus, bem como 66 amostras de fígado e 63
amostras de baço, além de 68 amostras de soro no total coletado.
Data Local Animais silvestres Animais doméstios
Nectomys
squamipes
Oryzomys
subflavus
Rattus
rattus
D.
marsupialis
Cães Eqüinos
mai/05
Patrimônio 4 2 3 0 7 3
Soberbo 6 1 4 2 3 0
set/05
Patrimônio 6 3 4 0 10 3
Soberbo 10 3 5 3 1 0
dez/05
Patrimônio 4 2 2 2 12 8
Soberbo 2 1 4 4 5 3
mar/06
Patrimônio 1 0 3 1 11 13
Soberbo 2 0 8 2 4 7
Total 35 12 33 14 53 37
94
Quadro 5- Número de pequenos roedores capturados, infestação por ectoparasitos e descrição do habitat
no local da captura. Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais – maio/2005 a março/2006.
Data Roedores capturados Infestação por ectoparasitos Descrição do habitat
mai/05
Nectomys (n=10) G. goyannensis (n=106)
Mata próximo a córrego
Oryzomys (n=3) G. goyannensis (n=8) Plantação de milho
Rattus rattus (n=7) 0 Paióis e galpões
set/05
Nectomys (n=15)
G. goyannensis (n=151) Pulgas
(n=7)
Mata próximo a córrego
Oryzomys (n=6) G. goyannensis (n=59) Plantação de milho
Rattus rattus (n=9) Pulgas (n= 2) Paióis e galpões
dez/05
Nectomys (n=6) G. goyannensis (n=62)
Mata próximo a córrego
Oryzomys (n=3) G. goyannensis (n=11) Plantação de milho
Rattus rattus (n=10) 0 Paióis e galpões
mar/06
Nectomys (n=3) G. goyannensis (n=49)
Mata próximo a córrego
Oryzomys (n=0) G. goyannensis (n=9) Plantação de milho
Rattus rattus (n=11) 0 Paióis e galpões
95
Tabela 2: Número de indivíduos coletados quanto ao sexo, amostras de tecidos (fígado e baço) e número
de soros obtidos em três espécies capturadas no município de Santa Cruz do Escalvado,
Minas Gerais – maio/2005 a março/2006.
Espécie
Sexo Roedor
Total
Tecido
Soro
Macho Fêmea Fígado Baço
Nectomys squamipes 19 16 35 26 23 33
Oryzomys subflavus 7 5 12 5 5 2
Rattus rattus 17 19 36 36 36 32
Total 43 40 67 64 68
Os 14 gambás da espécie D. aurita foram capturados em áreas próximas às habitações
como também, em moitas de bambus.
Neste estudo, encontramos uma população de 455 ácaros classificados taxonomicamente
como da espécie Gigantolaelaps goyannensis (Figura 16) parasitando roedores silvestres,
mais especificamente espécies de N. squamipes e O. subflavus, o sendo encontrado em R.
rattus.
Figura 16: Foto do ácaro da espécie Gygantolaelaps goyannensis coletado em roedores silvestres no
município de Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais. Fonte: Cláudio Mafra- UFV.
96
Os cães e eqüinos foram abordados nas residências urbanas e rurais.
A identificação taxonômica dos carrapatos adultos, realizada segundo a chave dicotômica
e pictória descrita por Aragão & Fonseca (1961) permitiu a identificação das espécies A.
cajennense (214), R. sanguineus (84), A. nitens (32), B. microplus (13), pulgas da espécie C.
canis (63) e C. felis (16) parasitando cães e eqüinos (Tabela 3).
Tabela 3- Distribuição de espécies de ectoparasitos coletados de animais domésticos no domicílio e
peridomicílio do município de Santa Cruz do Escalvado, Minas Gerais, no período de
maio/2005 a março de 2006, de acordo com o estágio.
A distribuição percentual das espécies está mostrada no Gráfico 1 onde pode ser
observada uma predominância do A. cajennense entre as demais espécies de carrapatos
(Gráfico 2).
Espécie Fonte
Estágio Total
Ninfa
n
Adulto
n
n
Fêmea Macho
Amblyomma cajennense
Eqüinos 69 56 75 200
Cães 6 1 7 14
Boophilus microplus
Eqüinos 2 4 4 10
Cães 0 3 0 3
Riphicephalus sanguineus
Eqüinos 0 4 9 13
Cães 32 17 22 71
Anocentor nitens
Eqüinos 9 16 7 32
Ctenocephalides
Cães 34 45 79
Total 422
97
63%
25%
9%
3%
A. cajennense
R. sanguineus
A. nitens
B. microplus
Gráfico 1- Percentual de ectoparasitos coletados no município de Santa Cruz do
Escalvado, Minas Gerais, no período de maio/2005 a março de 2006.
Gráfico 2: Percentual de carrapatos coletados em cães e eqüídeos em Santa Cruz do
Escalvado, Minas Gerais, no período de maio/2005 a março de 2006.
25%
10%
3%
1%
9%
52%
A. cajennense
R. sanguineus
A. nitens
B. microplus
Ctenocephalides sp
G. goyannensis
98
5.3 SOROLOGIA ANIMAL
Dos 53 soros de cães analisados, duas amostras foram positivas à Reação de
imunofluorescência indireta (RIFI), ao título de 1:64, sendo uma para R. rickettsii (2%) e a
outra para R. parkeri (2%) (Quadro 6).
Identificação da
amostra
R. rickettsii R. parkeri R. bellii R. felis R. amblyomii
SC-4 + 0 0 0 0
SC-19 0 + 0 0 0
Quadro 6: Sororeatividade para Riquetsioses ao título de 1:64 em cães à RIFI em Santa
Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
Dos 37 soros de eqüinos testados, três foram reativos ao título de 1:64. Dois soros foram
reativos para R. bellii (5,4%), sendo o terceiro soro reativo para riquétsias do GFM (2,7%)
(Quadro 7).
Identificação da amostra
R. rickettsii R. parkeri R. bellii R. felis R. amblyomii
SE-12 0 0 + 0 0
SE-32 0 0 + 0 0
SE-2 + + 0 + 0
Quadro 7: Sororeatividade para Riquetsioses ao tulo de 1:64 em eqüinos à RIFI em Santa
Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
Dos 14 soros de gambás quatro foram reativos ao título de 1:64, sendo dois deles para R.
parkeri (14,3%), e os outros dois reativos para riquétsias do GFM (14,3%) (Quadro 8).
Identificação da amostra
R. rickettsii R. parkeri R. bellii R. felis R. amblyomii
SG-2 + + + 0 0
SG-9 0 + 0 0 0
SG-10 0 + 0 0 0
SG-14 + + + 0 0
Quadro 8: Sororeatividade para Riquetsioses ao título de 1:64 em gambás à RIFI em Santa
Cruz do Escalvado, Minas Gerais.
99
Foram analisadas 67 amostras de soro de roedores silvestres, dentre eles 32 da espécie R.
rattus, 2 O. subflavus e 33 N. squamipes.
Para a espécie R. rattus, das 32 amostras testadas, 26 foram reativas ao título de 1:64 à
RIFI para riquétsia do GFM, totalizando 81,25% das amostras destes roedores. Dessas 26
amostras, 14 foram reativas ao título de 1:64 à RIFI para R. rickettsii, R. parkeri e R.
amblyommii (Quadro 9), sendo as outras 12 reativas para pelo menos uma dessas espécies.
Identificação da
amostra
R.
rickettsii
R. parkeri
R.
bellii
R. felis
R.
amblyomii
SR-1
+ + 0 0 +
SR
-
3
+
+
0
0
+
SR-4
+ + 0 0 +
SR
-
5
+
+
0
0
+
SR-6
+ + 0 0 +
SR
-
9
+
+
0
0
+
SR-11
+ + 0 0 +
SR
-
13
+
+
0
0
+
SR-19
+ + 0 0 +
SR
-
22
+
+
0
0
+
SR-23
+ + 0 0 +
SR
-
24
+
+
0
0
+
SR-25
+
+
0
0
+
SR-27
+ + 0 0 +
Quadro 9: Amostras positivas para R. rickettsii, R. parkeri e R. amblyommii testadas em R.
rattus utilizando a RIFI.
A Tabela 4 representa o total de soros testados pela RIFI ao título de 1:64 e o percentual
de amostras reativas.
100
Tabela 4: Percentual total das amostras reativas para Riquetsioses à RIFI, ao título de 1:64
em várias espécies de animais coletados em Santa Cruz do Escalvado, Minas
Gerais.
1
Número total de amostras de soro colhidas e testadas.
2
Número de amostras reativas ao título de 1:64, testadas pela RIFI.
Para as espécies N. squamipes e O. subflavus, nenhuma amostra foi reativa utilizando-se
os antígenos descritos para as outras espécies.
Gráfico 3: Percentual de soros reativos para Riquetsioses ao título de 1:64 à RIFI em Santa
Cruz do Escalvado-MG (maio de 2005 a março de 2006).
Soro N
1
RIFI
2
Total (%)
Cães 53 2 3,77%
Eqüinos 37 3 8,11%
Gambás 14 4 28,57%
Roedores
- N. squamipes 33 0 0%
- O. subflavus 2 0 0%
- R. rattus 32 26 81,25%
28,57%
8,11%
3,78%
38,81%
Gambás Eqüinos Cães Roedores
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