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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP
SÃO PAULO
2008
CINEMA E COMUNICAÇÃO POLÍTICAA
ANTE-SALA DO GOLPE MILITAR DE 1964
GABRIELLE CRISTIANE FULCHERBERGUER
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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP
SÃO PAULO
2008
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Comunicação da
Universidade Paulista UNIP, para
obtenção do tulo de mestre em
Comunicação, sob orientação da Profa.
Dra. Carla Reis Longhi.
CINEMA E COMUNICAÇÃO POLÍTICAA
ANTE-SALA DO GOLPE MILITAR DE 1964
GABRIELLE CRISTIANE FULCHERBERGUER
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Fulcherberguer, Gabrielle Cristiane
Cinema e comunicação política : a ante-sala do golpe
militar de 1964 / Gabrielle Cristiane Fulcherberguer. – São
Paulo, 2008.
134 f.
Dissertação (mestrado) Apresentada ao Instituto de
Ciências Humanas da Universidade Paulista, São Paulo, 2008.
Área de Concentração: Comunicação e cultura midiática
“Orientação: Profª Drª Carla Reis Longhi”
1. Filmes políticos. 2. Propaganda política. 3. Ditadura
militar. 4. IPES. I. Título.
UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP
SÃO PAULO
2008
Aprovado em:
Banca Examinadora:
_______________________________
Profa. Dra. Malena Contrera Segura
_______________________________
Profa. Dra. Maria Aparecida de Aquino
CINEMA E COMUNICAÇÃO POLÍTICAA
ANTE-SALA DO GOLPE MILITAR DE 1964
GABRIELLE CRISTIANE FULCHERBERGUER
AGRADECIMENTOS
Esta tese é fruto de uma pesquisa de dois anos e meio de estudo, adquirido
pelo privilégio que tive em ser aluna do curso de Mestrado em Comunicação da
UNIP Universidade Paulista, sob orientação da Prof. Dra. Carla Reis Longhi que
desempenhou papel fundamental ao ajudar-me a expandir meus horizontes
intelectuais. Agradeço-a pelo profissionalismo, paciência dentre leituras atentas,
discussões produtivas e grande estímulo que resultaram neste trabalho.
Por certo, este período significa para mim, uma passagem importante ao
imergir dentro do universo acadêmico, o que me fez ter uma melhor compreensão
da função da comunicação e dos mass media sobre a sociedade.
A minha sincera gratidão a PROSUP/CAPES pela bolsa a qual me foi
concedida e que sem ela, este trabalho não haveria sido concluído.
Ao material que me foi gentilmente enviado pelo Sr. Clóvis Molinari, Chefe da
Reserva Técnica de Imagem do Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, o qual incluiu a
cópia fiel dos filmes do IPES, objeto deste estudo, meus sinceros agradecimentos.
A saúde, força, persistência e oportunidade que tive agradeço a Deus, que
mesmo depois de noites em claro, me deu energia para mais um dia ativo de
trabalho onde contei com o auxílio de amigos.
Sou grata a minha família: pai, mãe, irmã e ao meu querido companheiro pelo
incentivo e compreensão ao suportarem horas e finais de semana de minha
ausência.
Agradeço aos colegas e mestres que encontrei neste percurso de
aprendizado, os quais me beneficiaram com seu diálogo e amizade, em especial ao
Prof. Dr. Adami por seu total apoio.
RESUMO
CINEMA E COMUNICAÇÃO POLÍTICA: A ANTE-SALA DO GOLPE MILITAR DE
1964
O projeto tem por objetivo analisar filmes curtas-metragens em formato de
documentário de propaganda política, cuja autoria é do IPESInstituto de Pesquisa
e Estudos Sociais, sob direção do cineasta é fotógrafo Jean Manzon e narração de
Luiz Jatobá. O Instituto foi criado em 1961, com a proposta de discutir temas
nacionais e tinha como membros e/ou colaboradores, importantes representações
da sociedade civil. O principal foco temático do IPES era a preocupação com o
comunismo, associado às propostas de governo do então presidente João Goulart
sobre as “reformas de base”, se posicionando numa campanha antigovernamental.
Buscando aprofundar o olhar sob o objeto de estudo, a proposta é avaliar a
influência desta campanha que recorreu a diversas ferramentas de propaganda
política, atuando fortemente através do meio cinema junto ao poder que exerce
sobre o espectador, ao trazer aspectos de realidade através de técnicas para dentro
do ambiente em que a imagem é projetada.
Para a fundamentação de nossa pesquisa contamos com diversas obras. O
autor Norberto Bobbio em “Liberalismo e Democracia” (2005) nos auxiliou na
discussão sobre as questões e conceitos políticos que são abordados nos filmes. A
respeito da construção comunicativa da mensagem aliada ao discurso político pelo
meio cinema, Walter Benjamin em “Magia e técnica, arte e política” (1987) foi um dos
autores que nos valemos em nossa reflexão. No que se refere ao cinema e sua
breve história, evolução e cnicas, um dos autores que embasou nosso estudo foi
Marcel Martin em “A linguagem cinematográfica” (2003). Dentre outras produções.
Em meio a uma coletânea de 14 filmes do IPES reunidos em uma fita VHS,
onde os originais encontram-se em poder do Arquivo Nacional do Rio de Janeiro,
optamos por examinar os que possuem característica comuns, sendo todos do
mesmo produtor e narrador. Analisaremos a composição do discurso narrativo,
somada às cnicas cinematográficas e aliado ao discurso político, avaliando sua
influência a fim de moldar a opinião pública de acordo com os interesses políticos
em jogo, o que culminou no Golpe Militar de 1964 no Brasil.
ABSTRACT
CINEMA AND POLICY COMMUNICATION: ANTECABINE THE MILITARY
STROKE IN 1964
The aim of this research is to analyze short-feature movie about policy
advertise on a documentary shape, and its author is IPES Instituto de Pesquisa e
Estudos Sociais under lead from Jean Manzon, photographer and moviemaker,
and the narrative made from Luiz Jatobá. This Institute was created in 1961, and the
plan was to discuss national themes and there were as members and/or
collaborators important society’s representation. The aim thematic focus from IPES
was the concern about the communism, associated with the government offers from
the president Joao Goulart about the “base reform”, positioning himself in an
antigovernamental campaign.
Looking for more knowledge about this issue, the propose is to evaluate the
influence from that campaign that runs over to many ways from policy advertise,
acting bravely through the cinema with the power that has on the spectator taking
some reality aspects to the environment the image is projected.
This research is based on many works like Norberto Bobbio in “Liberalismo e
Democracia” (2005) informing us about the questions and concepts policy
broached on the movies.
About the communicative message construction connected the speech policy
by cinema way, Walter Benjamin in “Magia e Técnica, Arte e Política” (1987) was an
important author on our reflection. About cinema and its history, evolution and
techniques, an author who was based to conclude this research was Marcel Martin in
“A Linguagem Cinematográfica” (2003), between some other productions.
On a 14 movies from IPES collectanea united on a VHS tape, the original
ones are under power from the National File from Rio de Janeiro, we chose examine
that ones that have common characteristics, but all of them are form the same
producer and narrator. We will analyze the narrative speech composition, added to
the cinematographic techniques and joined to the policy speech, evaluating its
influence to adapt a new public opinion according to the politic interests, what had
the Military Stroke in 1964 in Brazil.
Keywords: Policy Movies; Policy Advertise; IPES; Military Control
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 11
CAPÍTULO 1 - BRASIL PRÉ-GOLPE...................................................................... 16
1.1 O Caminho do Golpe......................................................................................... 16
1.2 A Questão Política: Democracia e Liberdade As Palavras de Ordem do
IPES ......................................................................................................................... 25
1.3 O que é o IPES.................................................................................................. 33
1.4 O Instituto e Manipulação da Opinião Pública................................................... 40
CAPÍTULO 2 – CINEMA E POLÍTICA..................................................................... 48
2.1 O Cinema Como Instrumento de Pesquisa Histórica ........................................ 48
2.2 Os Altos e Baixos do Cinema Brasileiro ............................................................ 55
2.3 A Influência da Indústria Cultural no Desenvolvimento Econômico, Político e
Social do Brasil......................................................................................................... 66
2.5 Fascinação para o Emprego de Ideologia ......................................................... 72
CAPÍTULO 3 – OS FILMES..................................................................................... 78
3.1 A Câmera e o Registro da Realidade Fílmica.................................................... 78
3.2 Jean Manzon – O Produtor............................................................................... 83
3.3 Narrativa, Voz e Efeito Sonoro ......................................................................... 86
3.4 Luiz Jatobá – O Narrador .................................................................................. 88
3.5 Os filmes do IPES ............................................................................................. 89
3.6 Filme: Que é o IPES.......................................................................................... 92
3.7 Cinema e Política .............................................................................................. 97
3.7.1 O Discurso Político ....................................................................................... 100
3.7.2 Os Símbolos Patrióticos ............................................................................... 101
3.7.3 O Vínculo de União....................................................................................... 102
3.7.4 Heroísmo e Vitória........................................................................................ 106
3.7.5 A Ordem Sob o Aspecto Religioso ............................................................... 109
CONCLUSÃO ........................................................................................................ 114
A Marcha da Família com Deus pela Liberdade..................................................... 114
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 117
ANEXO A – Síntese dos filmes .............................................................................. 123
Filme: O Brasil precisa de você.............................................................................. 123
Filme: Nordeste problema nº. 1.............................................................................. 125
Filme: Depende de mim.......................................................................................... 127
Filme: Portos paralíticos ......................................................................................... 129
Filme: Criando homens livres ................................................................................. 131
Filme: Deixem o estudante estudar........................................................................ 133
11
INTRODUÇÃO
Quando falamos em comunicação política, estamos tratando das relações de
poder configuradas na formação social, ou seja, da produção cultural no campo
político e econômico que envolve todo um ambiente simbólico.
Este tipo de comunicação, geralmente, está ligada a interesses políticos e
econômicos e por isso em sua maioria, patrocinada por empresas ou órgãos que
desejam despertar, influenciar alguma atitude ou formar uma determinada opinião
sobre a sociedade.
Este estudo tem por objetivo analisar os filmes cartas-metragens em formato
de documentário cuja autoria é do IPES Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais,
sob direção do cineasta e fotógrafo Jean Manzon e narração de Luiz Jatobá.
O Instituto foi criado em 1961 com a proposta de discutir temas nacionais.
Tinha como membros e/ou colaboradores, importantes representantes da sociedade
civil. O principal foco temático do IPES era a preocupação com o comunismo,
associado às propostas de governo do então presidente João Goulart sobre as
“reformas de base”, se posicionando numa campanha antigovernamental.
O IPES foi um instituto que utilizava de propaganda massiva, ou seja,
publicidade divulgada em grandes meios de comunicação e por isso, capaz de
atingir grande público. Uma enorme quantidade de pessoas através de jornal, rádio,
televisão, revista, cinema.
Este Instituto recorria a vários meios de comunicação e dirigia sua mensagem
a diversos públicos entre eles, formadores de opinião, entidades religiosas e ao
empresariado. O objetivo era para que todos conhecessem o posicionamento do
IPES quanto aos acontecimentos políticos da época.
12
Em meio à campanha política criada pelo IPES, o que nos chama a atenção é
à força do meio cinema, utilizado como ferramenta de propaganda. Este meio, na
época, ainda era pouco difundido no país entre as classes menos privilegiadas e
tinha, por conta disso, o fator de novidade. Por este aspecto, analisaremos se o
cinema, valendo-se da produção da linguagem de propaganda política, foi capaz de
influenciar a opinião pública, em função dos interesses políticos em jogo.
Buscando aprofundar o olhar sob o objeto de estudo, nossa proposta é avaliar
a influência desta campanha que recorreu a diversas ferramentas de propaganda
política, atuando fortemente através do meio cinema e o poder que exerce sobre o
espectador ao trazer aspectos de realidade dentro do ambiente em que a imagem é
projetada.
Nosso estudo partiu da obra da jornalista Denise Assis em seu livro
“Propaganda e Cinema a Serviço do Golpe” (2001), que reúne uma coletânea de 14
filmes VHS que são curtas-metragens em formato documentários de propaganda
política, de autoria do IPES. O original destes filmes encontra-se em poder do
Arquivo Nacional do Rio de Janeiro.
Alguns dos autores que contribuem para a nossa pesquisa ao tratar da
análise do contexto histórico em que está inserido nosso objeto de estudo, é a obra
de Armand René Dreifuss em “A Conquista do Estado: Ação Política, Poder e Golpe
de Classe” (1981) que nos esclarece sobre a fomentação para o Golpe Militar. Para
nos ajudar a contextualizar sobre questões e conceitos políticos que são abordados
nos filmes, contamos com autor Norberto Bobbio, além de outros autores que dão
embasamento ao nosso estudo.
No que se refere ao cinema e sua breve história, evolução e técnicas
fundamentamos nossa pesquisa com base nas obras de Marcel Martin em “A
13
Linguagem Cinematográfica” (2003) e Antonio Costa no seu livro “Compreender o
Cinema” (1989).
Sobre as relações de política e poder inseridas no discurso midíatico e
oferecidas à sociedade como produto cultural, analisaremos sua força com o intuito
de endoutrinar e conseguir o maior consenso de opinião pública. Para isso,
contamos com a obra de Edgar Morin em “O Método Cinco” (2005) entre outras.
Com este mesmo foco, nos baseamos também no estudo de Konrad Lorenz em seu
livro “Civilização e Pecado” (1974). E ao tratar da Indústria Cultural no Brasil
apoiamos nosso estudo no livro de Renato Ortiz cujo título é “A Moderna Tradição
Brasileira” (1988).
Com respeito à construção comunicativa da mensagem aliada ao discurso
político pelo meio cinema, contamos com a obra de Martín-Barbero “Dos Meios as
Mediações” (2001), tão quanto o autor Walter Benjamin “Magia e Técnica, Arte e
Política” (1987) e a obra em conjuntos dos autores Leif Furhammar e Folke Isaksson
em “Cinema e Política” (1976).
Nosso estudo conta também com a produção de outros autores que serão
citados no decorrer de nossa pesquisa. Nomes que também estão relatados nas
referências bibliográficas.
O ponto de partida de nosso estudo inicia-se a partir do Capítulo 1, onde
discorremos nossa análise com base na produção fílmica do IPES. Examinaremos o
contexto histórico, social e político ao qual estão inseridos os filmes e alguns
conceitos políticos, uma vez que propunha a democracia e o desenvolvimento
econômico apresentados como soluções para os problemas sociais e econômicos
que vivia o país. Elementos que dão embasamento para compreensão dos filmes e
nos ajuda a desvelar a suposta intenção política do Instituto e seus membros.
14
Ainda neste capítulo nos propomos a esclarecer como e por quem foi
idealizado o IPES. Tendo várias ferramentas de propaganda e utilizando como
grande força de publicidade o meio cinema que é nosso objeto deste estudo.
Verificaremos a atuação do Instituto na tarefa da propagar uma campanha
política contra o presidente da época, João Goulart e suas propostas de governo
sobre “as reformas de base”. Apontaremos como o IPES era mantido e o processo
histórico que uniu forças empresariais e militares para a sua formação e
sustentação.
No Capítulo 2 inicialmente abordaremos de forma breve, a história e evolução
do cinema, contemplando o contexto mundial e brasileiro, para melhor compreensão
da força de atuação deste meio.
No segundo momento, discutiremos a relação da Indústria Cultural com a
política e a questão econômica. Examinaremos a utilização dos meios de
comunicação, que podem atuar como força mobilizadora na manutenção do sistema
econômico. A população endoutrinada a se engajar nas tarefas necessárias a
manutenção do sistema econômico e social, onde o indivíduo através da produção e
do consumo é colocado num estado de hegemonia e passividade, o que é capaz de
gerar um processo de despolitização.
Esclarecemos se o cinema e suas técnicas são capazes de fascinar e tocar o
espectador, de modo a fazê-lo crer que o que foi projetado na tela se realizou de
fato. Característica que possibilita o emprego e absorção de determinada intenção
política.
No último e terceiro capítulo, abordaremos como o cinema pode trazer
aspectos do real através da câmera e o registro da realidade fílmica, tornando-se
influente quando a platéia está sensibilizada com as temáticas apresentadas nos
15
filmes. Através destes elementos, discutiremos se o discurso narrativo pode ser
construído e originado através de determinada intenção política. Uma de nossas
hipóteses é justamente, avaliar se o discurso político inserido nos filmes do IPES se
apropriava dos momentos de distúrbios sociais e econômicos que vivia o país
naquele período.
Da coletânea dos 14 filmes do IPES reunidos em VHS, optamos por analisar
os que possuem como característica em comum, o mesmo produtor e narrador. No
entanto, apresentaremos ainda neste capítulo o cineasta responsável pela produção
fílmica do IPES. O francês Jean Manzon e sua carreira, que incluí seu trabalho rico
em técnicas cinematográficas, como produtor nos filmes do Instituto. Em conjunto
com imagens e técnicas, relataremos também, um resumo da trajetória profissional
do locutor que conquistou a credibilidade do público através de sua voz. Estamos
falando do narrador dos filmes do IPES, Luiz Jatobá. Verificaremos se a narrativa
feita por ele em voz off, empregou força e dramaticidade aos filmes, de modo a
contribuir para a construção da mensagem de propaganda política do IPES.
É também neste capítulo que discutiremos a relação do cinema com a política
e suas características, analisando se estes aspectos foram empregados nos filmes
do IPES a partir da analise de trechos dos filmes.
O Golpe Militar no Brasil ocorreu no dia de abril de 1964 onde se instalou
no país, um regime autoritário em que a democracia veio restabelecer-se após vinte
anos de ditadura militar, em 1984 através do voto direto.
16
CAPÍTULO 1 - BRASIL PRÉ-GOLPE
1.1 O Caminho do Golpe
No dia 13 de março de 1964, em um comício em frente à Central do Brasil (ao
lado do Ministério da Guerra), o Presidente João Goulart falou do dinheiro utilizado
em propaganda contra ele e anunciava sua disposição de lançar o governo à
campanha pelas Reformas de Base. E assinou dois decretos, um desapropriava
terras inativas nas margens das rodovias e açudes federais e outro, anulava as
refinarias particulares de petróleo. Neste momento chegava ao ápice à tensão da
elite dominante formada de diretores de corporações multinacionais, diretores e
proprietários de interesses associados, administradores de empresas privadas,
técnicos e executivos e também dos oficiais militares. Tensão que se agravava pela
decorrente crise econômica e nos dois anos anteriores.
A partir desta data a agitação contra João Goulart, Jango - apelido pelo qual
era carinhosamente chamado desde infância intensificou se. No dia 19 de março
de 1964, cinco dias após seu comício na Central, o conservadorismo paulista logo
respondeu com a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, onde
aproximadamente 200 mil pessoas participaram e traziam faixas com os dizeres: “Tá
chegando à hora de Jango ir embora”, “Vermelho bom, batom”. Mesmo diante
disto, Jango pretendia seguir honrando sua agenda política.
No dia seguinte, após a passeata, o Ministro da Guerra Jair Dantas se
ausentou de seu cargo devido a uma intervenção cirúrgica, mesmo com o pedido
para que ele adiasse o procedimento médico. Porém, para o Ministro a sua
internação seria uma desculpa honrosa para o abandono ao Governo, que tinha
17
ciência da conspiração contra o Presidente. E assim o fez, deixando o caminho
aberto para o general Humberto Castello Branco que no mesmo dia, em 20 de
março de 1964, lançou uma circular reservada aos seus comandados do Estado-
Maior, com dizeres que para afastar o comunismo “antipátria, antinação e antipovo”
as Forças Armadas entraram em revolução:]
Entraram as Forças Armadas numa revolução para entregar o Brasil a um grupo que
quer dominá-lo para mandar e desmandar e mesmo para gozar o poder?
Para garantir a plenitude do grupamento pseudo-sindical, cuja cúpula vive na
agitação subversiva cada vez mais onerosa aos cofres públicos? Para submeter a
nação ao comunismo de Moscou? Isto sim, é que seria antipátria, antinação e
antipovo. (BANDEIRA, 2001, p. 166-167).
Cópia da circular chegou ao conhecimento de Jango através do “dispositivo”
que era composto por de militares que apoiavam Goulart. Somente alguns dias
depois, Goulart deu a ordem ao general Armando de Moraes Âncora, comandante
do I Exército determinando a prisão de Castello, mas sobre o argumento que o
mesmo ameaçará suicidar-se caso fosse preso, o general Âncora esquivou-se de
cumprir a ordem do Presidente.
Contudo, Jango continuava cumprindo sua agenda política. No dia 30 de
março de 1964, discursou no Automóvel Clube para suboficiais e sargentos das
Forças Armadas. Goulart havia sido aconselhado pelo deputado Tancredo Neves,
líder do governo na Câmera e pelo deputado Tenório Calvacanti a não comparecer
ao evento, pois, ambos receavam que a presença do Presidente intensificasse a
crise militar que o país atravessava. Neste dia, João Goulart participou do seu
último compromisso público como Presidente da República, pois, em sua opinião
comparecer ou não, nada mudaria o curso dos acontecimentos que estavam por vir
1
.
Durante o discurso do Presidente no comício da Central no dia 13 de março,
alguns militares se armavam no movimento “insurrecional”. O golpe ainda não
1
BANDEIRA, Moniz Luiz Alberto. O Governo João Goulart: As Lutas Sociais no Brasil, 1961-1964. 7. ed. Rio de
Janeiro: Revan; Brasília-DF: EdUnB, 2001.
18
tinha data nem base definida, mas qualquer ato de força do governo contra o
Congresso ou contra governadores seria o estopim. A ação contava com o apoio de
vários empresários e políticos, como o governador de São Paulo, Adhemar de
Barros e também do governador e banqueiro de Minas Gerais, José de Magalhães
Pinto, entre outros que eram contra o comunismo e em defesa do capital privado.
O plano de deposição de Jango, contava com o apoio dos EUA através de um
plano que ficou conhecido como “Operação Brother Sam” ou “Plano de
Contingência
2
”, cujo objetivo, era enviar para a revolta suprimentos militares. Isto
porque, a deposição de Goulart era incentivada por uma associação de interesses
comuns nacionais e de outros paises, como a CONCLAP Conselho Nacional das
Classes Produtoras, a American Chambers of Commerce e de outras associações
importantes.
O maior e mais importante fator de conflito entre o Brasil e os EUA ainda
traumatizados, devido a Revolução Cubana, foi a firme posição em que o Brasil
manteve-se ao insistir pela não expulsão de Cuba da OEA, o que faria com que o
país ficasse isolado do convívio com os demais. Apesar da dificuldade financeira
que o Brasil atravessava, com linhas de créditos suspensas desde a posse de
Goulart, o Brasil não se sujeitou as concessões financeiras e chantagens que se
dispuseram os EUA.
O ministro das Relações Exteriores, Francisco de San Tiago Dantas na
Conferência de Punta Del Este, em janeiro de 1962, ao defender a idéia de
neutralização de Cuba, teve um desentendimento com o secretário de Estado dos
EUA, que afirmou ao Ministro que o país sempre intervinha nos assuntos internos de
outras nações mesmo quando parecia não fazê-lo e mais: “ameaçou abertamente
2
GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
19
utilizar o exército dos EUA contra os governos que não o acompanhassem na
votação contra Cuba” (BANDEIRA, 2001. p.70). O ocorrido ganhou visibilidade
nacional e o apoio de quase toda a opinião pública brasileira a San Tiago Dantas.
Após isto, o Brasil desapropriou bens (não ações) da Companhia Telefônica
Nacional, subsidiária da ITT – International Telephone & Telegraph poucos dias
após a conferência, o que contribuiu ainda mais para piorar as relações entre os dois
países onde “a imprensa norte-americana desfechou feroz campanha contra o
Brasil, a ponto de parecer a Goulart “publicidade dirigida”” (BANDEIRA, 2001, p.71).
O Brasil também havia restabelecido relações diplomáticas com a URSS, país
membro do Bloco Socialista e seus altos índices de crescimento. Os termos de
comércio oferecidos da URSS para o Brasil, que enfrentava forte crise cambial, eram
excelentes condições, onde parte do pagamento poderia ser realizado através de
commodities.
As iniciativas do Governo de Goulart correspondiam à proteção econômica
nacional e a consciência nacionalista. Porém, era uma situação completamente
antagônica ao que pretendia os EUA. Uma vez que prejudicava seus interesses
econômicos, que a tendência das classes dominantes brasileiras seria de
internacionalizar suas empresas junto a interesses multinacionais, em grande parte,
de origem americana.
Com Goulart, as pressões dos sindicatos passaram, pela primeira vez, a influir
diretamente sobre o governo, a condicionar suas decisões políticas e a obstaculizar
a aplicação de medidas econômicas, como a contenção dos salários, contrários
aos interesses dos trabalhadores. (BANDEIRA, 2001, p.67)
Vindo de um partido de composição operária, Jango esperava contar com o
apoio de uma massa organizada pelos sindicatos. Antes mesmo de se tornar
Presidente, defendia os direitos das classes trabalhadoras e os seus anseios,
20
principalmente na luta contra o alto custo de vida. Jango defendia a reforma agrária,
o direito constitucional de greve, a redistribuição de rendas públicas, a
reestruturação social brasileira através de métodos democráticos. Mas, no decorrer
dos fatos, a bandeira nacionalista que empunha se misturava as reivindicações
sociais dos trabalhadores, dos pequenos burgueses e do empresariado,
radicalizando uma luta de classes.
Jango tinha conhecimento que os EUA prestavam suporte bélico em prol de
sua deposição. Através do SFICI Serviço Federal de Informações e Contra-
Informações o Presidente soube que o coronel Vernon Walters adido militar da
Embaixada dos EUA e agente da DIA Defense Intelligence Agency, agia a serviço
do Exército norte-americano e coordenava as operações da CIA no Brasil. Além
disso, Walters era antigo amigo do general Castello Branco desde a Segunda
Guerra Mundial.
Após circular reservada lançada por Castello, o sentimento anticomunista
propagado na campanha doutrinária contra Goulart, havia ganhado muito mais força.
Porém, Castello pretendia conduzir o golpe, mas sem violar a legalidade. Para isso,
dependia que Jango não tivesse mais condições de continuar na presidência do
país, através de circunstâncias que tornariam insustentáveis sua presença no poder.
Desta forma, Castello teria o apoio das Forças Armadas, para uma intervenção
contra o Governo. O pretexto que ele precisava veio com a Revolta dos Marinheiros.
Estes decidiram comemorar o aniversário da Associação dos Marinheiros
Navais e Fuzileiros. Mesmo depois da proibição do almirante Silvio Mota, ministro da
Marinha que ordenou a prisão dos organizadores. Contudo, o contingente de
fuzileiros navais encarregados desta missão aderiu à rebelião, levando o Exército a
intervir para abafá-la a pedido de Goulart. Episódio que demonstrou a perda da
21
ordem e da hierarquia militar pelo Governo. O ocorrido havia sido programado por
José Anselmo dos Santos, conhecido como Cabo Anselmo. Embora fosse
marinheiro de 1ª. classe, foi um dos provocadores da revolta e também trabalhava
como agente secreto da CIA.
O plano da insurreição estava sendo colocado em prática e Castello Branco
fez para com que, circulasse um artigo no Jornal do Brasil em 31 de março de 1964
onde o título era: “Minas desencadeia luta contra Jango
3
.” Descrevia possibilidades
para um “desfecho da situação nacional”, que ocorreria entre 24 a 72 horas. Dizia
que a oposição poderia tentar transferir a sede do Congresso para São Paulo ou
Belo Horizonte. O responsável pelo levante de Minas Gerais, general Olympio
Mourão Filho, havia conversado com Castello por telefone e com outros que
apoiavam a sublevação.
O ex-governador do Rio Grande do Sul, cunhado do Presidente, Leonel
Brizola preocupava-se e dizia a Jango: “Se o dermos o golpe, eles darão contra
nós
4
”.
A ação dos conspiradores encontrava dificuldades, pois, não conseguiam
furar o bloqueio do “dispositivo” em dezenas de unidades militares, que apoiavam o
governo. Porém, Goulart sabia que havia perdido seus maiores aliados do
“dispositivo”, com a substituição do general Jair Dantas Ribeiro, o qual havia se
internado. Além disso, sabia também, que não poderia contar com o apoio do
general Amaury Kruel, seu compadre e comandante do II Exército de São Paulo. Isto
porque, através do SFICI teve o conhecimento que o governador Adhemar de
Barros, recebia armas contrabandeadas do Paraguai para o envio aos
conspiradores, sob ciência de Kruel.
3
BANDEIRA, 2001.p.171
4
GASPARI, 2002. p.52
22
Jango manteve-se em silêncio ao que ocorria, não havia pretendido desfechar
o golpe militar. Mesmo com a crise que ocorria no país, não havia pretendido tomar
atitudes de força ou que ferissem a constituição. Na sua concepção a realização das
reformas de base, faria o país entrar numa fase mais dinâmica com a participação
popular.
“Nos dois dias em que o golpe de Estado se desenvolveu, Goulart ouviu de
muitos oficiais superiores frases como esta: “Os oficiais não são contra o seu
Presidente, mas, sim, contra o comunismo
5
””. Os aparelhos ideológicos e a
campanha doutrinária haviam vencido o Presidente. O comunismo que os EUA, a
classe dominante e o IPES em sua campanha e filmes pregaram havia vencido. O
comunismo que eles preconizavam era tudo o que pudesse contrariar seus
interesses, como os esforços de organização dos movimentos sindicais, a reforma
agrária, as leis de créditos. Goulart não era comunista e revolucionário, mas sim um
reformista. Um presidente que ouvia a pressão dos trabalhadores influenciando suas
decisões políticas, o que de fato determinou a crise entre as classes dominantes e
trabalhadoras.
Quando os dirigentes sindicais lhe pediram armas, diante da clara defecção
de grande parte da oficialidade das Forças Armadas, ele se negou a fornecê-las.
Goulart resistiria claro, se tivesse meios de sufocar o levante, sem mergulhar o país
numa guerra civil. Porém, o presidente não consentiu a pedidos como o de Juscelino
Kubitschek, para que Jango substituísse o ministério e se declarasse contra o
comunismo. Amaury Kruel solicitou por telefone que o Presidente João Goulart,
rompesse com organizações populares como a UNE e o CGT, com a intervenção
dos sindicatos. Ao perceber o tom de ultimado do comandante o Presidente lhe
5
BANDEIRA, 2001. p.168
23
respondeu: “General, eu não abandono os meus amigos. Se essas são suas
condições, eu não as examino. Prefiro ficar com as minhas origens. O senhor que
fique com as suas convicções. Ponha as tropas na rua e traia abertamente”
(BANDEIRA, 2001, p. 178).
Os oficiais nacionalistas e legalistas do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica, aferrados a disciplinas, não tomaram qualquer iniciativa, à espera de
ordens, que nunca chegaram. E Goulart, também percebeu que muitos generais não
queriam combater e tratavam de jogar sobre seus ombros, a responsabilidade pelo
derramamento de sangue quando lhe apareceram no Palácio das Laranjeiras,
fardados, com todos os apetrechos militares e pediram ordens para tomar medidas
que tinham de executar por conta própria, no comprimento do seu dever. Por sua
vez, como Goulart salientou, “os sindicatos, que contavam com a ação militar
defensiva, viram frustradas suas esperanças, e seus líderes, desorientados, não
tiveram condições para uma rápida organização (BANDEIRA, 2001, p.179).
No dia 1º. de abril de 1964, Jango saia do Palácio das Laranjeiras no Rio de
Janeiro, rumo à Brasília.
No Rio de Janeiro, quartéis eram vizinhos e que não possuía cerca para
separá-los, conduziam durante toda a manhã uma revolução onde à legalidade e a
revolta confundiam-se pastosamente, rebeldes entravam gritando pelo fundo do
terreno. Na verdade, aquilo era um golpe que envolvia meia dúzia de burocratas,
mas para quem assistia ao espetáculo de fora, a revolta entre militares que se quer
teve uma troca de tiros, acabará suceder um grande momento, pois, o quartel era
em frente a maior emissora de televisão do país, a TV Rio. Mas para quem olhava
de fora para dentro, a revolta militar que não produzira uma única troca de tiros,
acabara de ter o seu grande momento. A guarita do QG ficava debaixo das janelas
24
da maior emissora de televisão do país a TV Rio, onde o episódio fora filmado e
pouco depois estava ao ar com grande sucesso (GASPARI, 2002, p.104).
Com a força e a visibilidade da mídia se dava o sucesso da “insurreição”, do
Golpe Militar de 1964 no Brasil.
Golbery de Couto e Silva redigiu um manifesto, que foi assinado por Castello
Branco e Costa e Silva na manhã do dia de abril, que acusava Jango de ser
dominado por um “ostensivo conluio com notórios elementos comunistas” e de ter
caído em “flagrante ilegalidade”. O manifesto trazia um apelo para que “coesos e
unidos, restauremos a legalidade” e terminava: “Camaradas do Exército, unamos em
defesa do Brasil” (GASPARI, 2003, p.105). Assim, o exército se rende à Costa e
Silva que assume o Ministério da Guerra.
No final da tarde do dia 1º. de abril, acontecia uma chuva de papel picado no
Rio de Janeiro. À noite, o Presidente se preparava para ir embora, por volta das 22
horas abandonou a Granja do Torto e voou para Porto Alegre num Avro da FAB. O
Presidente não passou nem pelo Palácio do Planalto para limpar sua mesa e seu
cofre. A mulher ficou encarregada de tirar os filhos da cama. O avião voaria da
Granja do Torto, guiado pela ajuda de faróis acesos balizando a pista.
No caso da ausência do Presidente da República, quem assumiria era o
Presidente da Câmara e assim o fez Pascoal Ranieri Mazilli, que assumiu
inconstitucionalmente e com o apoio dos EUA, que Jango ainda estava em solo
brasileiro e pelo artigo 85 da Constituição, a Presidência só seria declarada vaga, se
o Presidente em vigor deixasse o país sem autorização do Congresso. Em
decorrência disto, em uma frase o deputado Fernando Santana resumiu os
acontecimentos: “O governo que se instala faz na base da tirania e da ditadura”
(GASPARI, 2003, p.113).
25
O Golpe resultou em sete civis mortos, nenhuma morte em combate.
A intensa campanha através da mídia e a mobilização das classes médias que, em
seguida a essa reunião, foi desencadeada pelos quatro cantos do país para
estimular a candidatura do general Castello Branco tinha a marca inconfundível da
ação de opinião pública do IPES. (DREIFUSS, 1981, p.420)
No dia 2 de abril de 1964, parte da opinião pública se manifestou pelas ruas
do Rio de Janeiro, com a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”. Em
comemoração a deposição de João Goulart, reunindo uma multidão de
aproximadamente oitocentas mil
6
pessoas que carregavam faixas com dizeres
contra o comunismo.
1.2 A Questão Política: Democracia e Liberdade As Palavras de Ordem do
IPES
O Presidente João Goulart tinha em seus planos, a disposição de promover a
reforma agrária. Jango violou o direito de propriedade, direito este inviolável para os
empresários e latifundiários. Promoveu a encampação de refinarias de petróleo, a
desapropriação de terras às margens de rodovias e açudes, com o objetivo de levar
o seu governo aos trabalhadores, aspirando uma reforma social e o
desenvolvimento do país. Este foi o principal embate entre o Governo e as classes
dirigentes, que incomodadas com estes aspectos, recearam que a democracia
participativa popular entrasse em verdadeira ascensão, aprofundando o processo de
reformas e levando o país para um regime socialista de governo, que contrariava
6
DREIFUSS, René A. 1964: A Conquista do Estado Ação Política, Poder e Golpe de Classe, Rio de Janeiro:
Editora Vozes, 1981.p.419
26
completamente seus interesses econômicos. Para conquistar e moldar a opinião
pública, a classe dominante agiu campanha, difundindo um conceito de democracia
que atendesse aos seus interesses. A democracia representativa, onde os políticos
escolhidos para representar o povo através do voto, uma vez no governo, têm o
poder de sancionar leis que venham ao encontro de seus próprios interesses e não
aos da maioria. Por esta razão, a democracia é a palavra de ordem utilizada pelo
IPES, o que fica claro quando assistimos suas produções fílmicas. Em todos os
filmes é exaltada à questão da democracia, dos homens democratas, do regime
democrático de governo.
No filme “Que é o IPES” (IPES, 1961) o narrador questiona “para onde vai o
regime híbrido?”, “vencerão as instituições democráticas no entre choque das
ambições desenfreadas?”, convida a “ação dos democratas num sentido único”. O
filme propõe o “fortalecimento das instituições democráticas”, afirma que
“democracia política é inseparável de democracia social e econômica” e que todos
os problemas deveriam ser resolvidos dentro da democracia.
Norberto Bobbio, em “Liberalismo e Democracia” (1983), explica o conceito de
Democracia como uma forma de poder, que não deve estar na mão de um ou de
poucos, mas de todos, ou melhor, da maior parte, como tal se contrapondo às
formas autocráticas, como monarquia e oligarquia.
Em oposição ao governo de poucos a “democracia dos antigos”, que vem do
pensamento político grego é definida como governo dos muitos, da maioria ou dos
pobres. Uma vez que os “pobres” tomam a frente é sinal de que o poder pertence ao
pléthos, à massa, ou seja, a democracia como governo do povo.
a “democracia dos modernos” é a conhecida democracia representativa
federalista, considerada por muitos políticos como a melhor forma de regime
27
democrático. Uma vez que combina centralização de poder e soberania popular,
realizada através do exercício do voto pelos cidadãos ao escolher seus
representantes, crendo que estes estejam em plenas condições de defender seus
interesses, assim, participam de forma direta (através do voto) e indireta (através de
representantes) nas tomadas das decisões coletivas.
A democracia representativa, realizada através do voto nas urnas é a
defendida nos filmes do IPES, que levava em sua mensagem, a importância da
democracia realizada pelo voto na escolha de representantes, como solução dos
problemas sociais e econômicos que vivia o país. O IPES propunha em seus filmes,
o crescimento e desenvolvimento econômico que traria como efeito, benefícios
procedentes da criação de usinas hidrelétricas, da industrialização, do
aperfeiçoamento e ampliação das ferrovias e estradas, de portos melhor
estruturados para importação e exportação de produtos. Resultados estes que
favoreceria automaticamente o empresariado membro do Instituto e seus aliados,
cujos objetivos eram capitalistas.
Bobbio estuda a democracia com base em alguns teóricos e filósofos como
Jean Jacques Rousseau, que era um admirador da democracia dos antigos e
defendia a democracia direta, sustentando que “a soberania não pode ser
representada” e, portanto, “o povo inglês crê ser livre, mas se equivoca
redondamente; o é durante a eleição dos membros do parlamento; tão logo são
esses eleitos, ele volta a ser escravo, não é mais nada”. Ou seja, Rousseu apoiava a
idéia de que, enquanto o povo crer ser livre devido à liberdade que tem, em escolher
seus representantes através do direito do voto, após as eleições, este mesmo povo
retorna a sua rotina, para o trabalho e para a servidão dos sistemas econômicos,
voltados aos interesses dos que representam o Estado.
28
A democracia representativa preserva a sobrevivência do Estado liberal, com
a participação do voto como forma de exercício político, influenciando decisões
coletivas livremente. Se o indivíduo se dirige às urnas, goza das liberdades de
opinião, de imprensa, de reunião, de associação, de todas as liberdades que
constituem a essência do Estado liberal, como participação real e não fictícia,
porém, restrita de atuação, que as tomadas de decisões cabem aos seus
representantes.
No Brasil, a ocorrência do Golpe de Estado se deu, pois, parte da opinião
púbica acreditava que os planos de governo do Presidente João Goulart,
caminhavam para um regime comunista. Na realidade, Jango estava proposto a
exercer a democracia participativa popular, que talvez caminhasse para o socialismo
e na “democratização produziria uma sociedade socialista, fundada na
transformação do instituto da propriedade e na coletivização dos principais meios de
produção, e o advento da sociedade socialista alargaria a participação política, e
assim, tornaria possível a plena realização da democracia, a distribuição igualitária
do poder econômico e do poder político, condição necessária para o advento da
sociedade socialista, como condição do desenvolvimento da própria democracia
7
através de “institutos com funcionamento do poder popular, da liberdade, da reunião,
da livre associação, da livre organização de grupos de interesses, de sindicatos, de
partidos, à máxima extensão dos direitos políticos” uma vez que “fazem com que se
torne mais fácil, por parte dos singulares e dos grupos, o encaminhamento de
solicitações aos poderes públicos para serem atendidas no mais breve tempo
possível
8
”, ou seja, onde a grande massa popular teria a liberdade de direcionar e
influenciar as decisões do governo, estando Jango disposto a atender, tal como
7
BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Brasiliense, 2005, p. 93.
8
Ibid, p.81.
29
exemplo, os planos para as Reformas de Base, o que contrariava completamente os
interesses da classe dominante capitalista.
A democracia baseia-se, ao mesmo tempo, no consenso dos cidadãos que
aceitam a regra do jogo e o conflito de interesses e de idéias; a regra do jogo
sanciona o confronto de idéias pela eleição e não pelo recurso à violência (MORIN,
2002, p.195).
Mas, o que de fato ocorreu após o Golpe de 1964 foi que os militares se
apropriaram do governo, instituindo um regime militar e ditatorial
9
se opondo a
democracia fosse, ela representativa ou participativa.
No discurso fílmico utilizado pelo IPES é possível notarmos, alguns traços que
fragilizam a democracia e que nos leva a identificar, uma possível intenção de
governo ditatorial. Um exemplo disso fica claro no filme “Que é o IPES”: quando num
momento é sugerida uma nova forma de governo, propõe-se um “novo organismo”.
Bobbio nos ajuda a esclarecer seu sentido literal e político: “O organicismo
considera o Estado como um grande corpo composto de partes que concorrem
cada uma segundo sua própria destinação e em relação de interdependência com
todas as demais para a vida do todo e, portanto, não atribui nenhuma autonomia
aos indivíduos uti singuli
10
”. Podemos pensar a partir daí, que se o organicismo é
composto de partes com interesses próprios, que não atribuí autonomia aos
indivíduos, logo, não temos democracia, já que democracia é a participação popular.
A democracia caminha num sentido contrário, onde da reunião dos indivíduos,
9
A Ditadura moderna tem uma conotação negativa e designa a classe dos regimes antidemocráticos ou não
democráticos modernos. “A “Ditadura totalitária” emprega, além dos meios coercitivos tradicionais (exército,
polícia, burocracia, magistratudura), o instrumento peculiar do partido único de massa, tendo assim condições de
controlar completamente a educação e os meios de comunicação e também as instituições econômicas. Além
disso, pode exercer uma pressão propagandística permanente e penetrar em cada formação social, e até na vida
familiar dos cidadãos, suprimindo
qualquer oposição e até as críticas mais leves, através de especiais aparelhos
políticos, de polícia e de terror, impondo assim a aceitação entusiástica do regime a toda população.” BOBBIO,
N.; MATEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de Política. 10. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1997, p.
375.
10
BOBBIO, N.; MATEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de Política. 10. ed. Brasília: Universidade de Brasília,
1997, p. 375.
30
a sociedade deve ser recomposta, não como um todo orgânico, mas como uma
associação de indivíduos, que num acordo se reconciliam com a sociedade. A
democracia reconstitui o poder público, mas como soma dos particulares. Aqui, o
Estado deve agir como um instituto jurídico, onde se encontram vontades
particulares, para a formação de uma vontade comum. Isto significa que democracia
e organicismo se opõem um a outro e vemos que com a ocorrência do Golpe de
Estado, o governo no Brasil transforma-se numa ditadura militar, tornando-se
bastante autoritário e autocrático (sem participação social) numa redução total dos
poderes públicos.
O IPES defendia a democracia representativa, ou seja, a democracia liberal
burguesa, em defesa do capital de acordo com os interesses do Instituto e seus
membros. Para eles, na democracia o ponto mais importante era a questão do voto,
onde membros da classe dominante agiriam como representantes da sociedade,
porém, não atuando sobre interesses coletivos, mas aos seus interesses
econômicos singulares. Aproveitando do liberalismo, o princípio de liberdade, da
livre iniciativa, concorrência e comércio.
A democracia idealizada pelo Instituto defendia interesses parciais, propostas
para resoluções de acordo com os interesses singulares da classe dominante,
diferentemente aos quais seriam os preceitos de um governo democrático, com o
objetivo de satisfazer os interesses que produzam maiores consensos, com base na
regra típica da democracia, a regra da maioria.
João Goulart permitia em seu governo a exposição de idéias através de
sindicatos, das organizações de classes, na tentativa de poder atender e solucionar
seus conflitos. A questão é que em regimes democráticos, a função do governo
deveria ser esta, a de resolver os conflitos sociais (na democracia mais conflitos
31
do que nos regimes autocráticos). O que ocorre é que, quanto maior à quantidade
de conflitos, mais difícil fica alcançar as soluções. Este foi um dos principais motivos
pelo qual foi concebido o Golpe Militar no Brasil, tornando-se um regime autocrático,
onde os conflitos e a exposição de idéias não eram permitidos, ou seja, justamente o
inverso do que ocorria no governo de João Goulart. Estes aspectos contrariavam a
classe dominante e a oficialidade militar, diante da agitação social que acontecia no
país, uma das razões que os faziam acreditarem que o Brasil caminhava para um
regime comunista. Todas estas questões estavam sendo incutidas nas mensagens
fílmicas do IPES, que era uma livre organização de grupos de interesses, interesses
estes, econômicos. O IPES aproveitou-se dos problemas sociais que vivia o Brasil.
Evidenciava que quanto mais aumentavam os conflitos, as agitações, também
aumentavam as dificuldades de dominá-los, o que de fato acontecia no governo de
Jango, a ponto de lidar com problemas de insubordinação militar. Outros aspectos
também eram destacados nos filmes, abordando a preocupação com o comunismo
ou tornando visível aos olhos do espectador, os conflitos e os problemas
econômicos, como a inflação e a estabilizão da moeda. No filme “Que é o IPES” a
narração trata exatamente da questão da inflação, de agressivas manifestações
populares, greves e cenas do exército nas ruas.
Onde existe desigualdade, a liberdade pode estar escrita nas leis, no estatuto, mas
não é coisa real: não é livre o camponês que depende do proprietário, não é livre o
empregado que permanece submetido ao patrão, não é livre o homem da gleba
sujeito ao trabalho incessante dos campos. (BOBBIO, 2005, p.75)
John Stuart Mill considerava o liberalismo como uma doutrina antipaternalista,
partindo do pressuposto que cada “cada um é o único guardião autêntico da própria
32
saúde física quanto mental e espiritual
11
”. Isto significa que, para o liberalismo a
questão religiosa, por exemplo, seria de livre opção do cidadão. Outra característica
importante, que notamos ao assistir a produção fílmica do IPES é a concepção dada
à religião, que deveria estar restrita a força da igreja católica, encarregada de
doutrinar a sociedade sob seus dogmas e tradições, de forma a atuar no controle da
ordem, assim, não comprometendo os objetivos dos interesses da classe dominante,
que estaria no poder eleita através do voto pela democracia representativa. O papel
religioso da igreja católica aparece no filmes, ora por citações do narrador, ora pela
exibição de cenas que a simbolizam como padres, igrejas e cruzes. No Brasil, um
país predominantemente católico, logo, o catolicismo exercia grande força religiosa
naquele período, que promovia a ordem através do divino, coincidindo com o
pensamento autoritário, que considera a ordem, como bem supremo e trata de que o
homem deve ser educado nos dogmas e na fé, e não no exercício ilusório da razão
(da liberdade de opinião, de pensamento).
A democracia divulgada pela campanha política do IPES, se colocava como a
melhor opção para o cidadão, nas soluções para os problemas sociais e econômicos
que vivia o Brasil. Para o Instituto e seus membros a saída seria o Golpe de Militar,
cujo objetivo era derrubar o Governo João Goulart e após isto, através de eleições
diretas, ter como representante do Estado um membro da elite dirigente e
dominante, na defesa de seus próprios interesses. Porém, pouco tempo após o
Golpe de 1964, não foi este o resultado alcançado. Mas sim, um o regime de
governo que se tornou autoritário, militar e com o passar dos anos cada vez mais
austero.
11
Bobbio, 2005, p.66
33
1.3 O que é o IPES
Para compreendermos um passado que mobilizou forças, sindicatos,
associações de classes e institutos, em especial o IPES Instituto de Pesquisa e
Estudos Sociais, que atuaram no cenário político, intervindo no Estado e na
sociedade brasileira até a ocorrência do Golpe Militar de 1964, contamos com a
pesquisa de René Armand Dreifuss reunida no livro “1964 - A conquista do estado:
Ação Política, Poder e Golpe de Classe” (1981), fundamentado em bases
documentais e registros concretos segundo o próprio autor.
Interesses econômicos multinacionais e associados formaram um complexo
político-militar, o IPES/IBAD cujo objetivo era agir contra o governo nacional e suas
reformas de base. Propostas de governo do presidente João Goulart. Este complexo
representava a face política dos interesses empresariais. Uma grande força social foi
constituída por uma classe dominante, pela qual Antonio Gramsci denominava de
“elite orgânica”:
(...) todo grupo social que passa a existir no terreno originário de uma função
essencial no mundo da produção econômica traz consigo, organicamente, uma ou
mais camadas de intelectuais que proporcional homogeneidade ao grupo, bem
como a conscientização de sua própria função, não somente no campo econômico,
mas também nos campos social e político. O empresário capitalista cria consigo o
técnico industrial, o especialista em economia política, os organizadores de uma
nova cultura, de um novo sistema legal etc. (DREIFUSS, 1982, p. 107, nota 3)
Os membros desta classe eram os diretores de corporações multinacionais,
diretores e proprietários de interesses associados, com qualificação profissional,
administradores de empresas privadas, técnicos e executivos estatais, que faziam
parte da tecno-burocracia e também os oficiais militares. Uma elite derivada de
intelectuais do bloco econômico multinacional e seus associados. Uma força voltada
34
aos seus próprios interesses corporativos. Estes interesses tinham por objetivo,
liderar grupos profissionais e funcionais como também, visavam neutralizar o bloco
de poder tradicional, tornar dinâmico o processo de modernização capitalista e atuar
de forma que obtivessem o apoio da maior parte da opinião pública.
O IBAD foi um dos primeiros grupos de ação criado no fim da década de
cinqüenta, atuando contra o governo de Jango e em prol aos interesses do
empresariado capitalista. O IBAD Instituto Brasileiro de Ação Democrática tinha a
intenção de compartilhar do governo político e moldar a opinião pública. Foi criado
com o pretexto ambíguo, com o propósito de “defender a democracia”, atuando
através da criação de grupos de ação política e ideológica. O Instituto foi criado em
fins da década de cinqüenta e descrito pelo embaixador Lincoln Gordon como um
“grupo industrial de moderados e conservadores”. Teve como participantes membros
da CONCLAP Conselho Superior das Classes Produtoras e também da American
Chambers of Commerce, além de outras associações importantes. Em julho de
1962, quando a ação política para as eleições cruciais de outubro ao Congresso
alcançava grande importância, o IBAD coordenava esforços com outra organização
de classe importante, o IPES.
IPES Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais - nasceu em 29 de novembro
de 1961. O IPES foi concebido para agir dentro de um programa capaz de mobilizar
homens e empresas, de modo a oferecer soluções aos problemas do país, assim,
dentro deste processo, modelando as forças sociais burguesas e através disto,
transpondo o poder privado dos interesses multinacionais e seus associados para o
governo público do Brasil. Mas para alcançar este objetivo, este bloco dominante
teria de vir a ser o Estado.
35
O IPES passava a existir por fundadores do Rio de Janeiro e o Paulo,
unidos por suas relações econômicas, posicionamento anticomunista e sua ambição
em readequar o Estado de acordo com seus interesses. O lançamento do IPES foi
recebido de forma favorável por órgãos da imprensa como o Jornal do Brasil, O
Globo, Correio da Manhã e o jornal Última Hora. Contou ainda com o apoio do
conservador Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Jayme de Barros Câmara, assim,
daí por diante, em meio a outros apoios, o Instituto expandia-se para outros estados
brasileiros.
Diversas reuniões aconteceram na casa dos integrantes do Instituto. No Rio
de Janeiro, Gilbert Huber Jr., juntamente com outro empresário multinacional
Antônio Gallotti, mais os tecno-empresários Glycon de Paiva e José Garrido Torres,
além do empresário Augusto Trajano Azevedo Antunes, entre outros, estavam
empenhados em novos recrutamentos e na obtenção de serviços dos oficiais
militares da reserva, como o General Golbery de Couto e Silva. Tinham o objetivo de
estimular todo o país a uma reação empresarial, com a mesma intensidade como
havia sido disseminada e recebida a tendência esquerdista. A reação deveria contar
com a representação setorial, de forma eficaz e com um sentido “popular”.
O IPES desenvolveu uma dupla vida política desde seu início, onde ao ver de
seus simpatizantes e defensores, a sua face pública deveria se apresentar como
uma organização de “respeitáveis homens de negócios” que defendiam a
“participação nos acontecimentos políticos e sociais e que apoiavam a reforma
moderada das instituições políticas e econômicas existentes”. Tinha como objetivo
estudar “as reformas propostas por João Goulart e a esquerda, sob o ponto de vista
de um tecno-empresário liberal”. Conforme versão de seu documento: “A
responsabilidade democrática do empresário”, por isso, foi instituído como uma
36
“agremiação apartidária” com “objetivos educacionais e cívicos”. No mesmo
documento lia-se que o IPES seria orientado por “dirigentes de empresas,
profissionais liberais que participam com convicção democrática, como patriotas e
não como representantes de alguma classe ou de interesses privados”, com o
objetivo de “promover a educação cultural, moral e cívica dos indivíduos”,
“desenvolver e coordenar estudos e atividades de caráter social” e, “por meio de
pesquisa objetiva e discussão livre, tirar conclusões e fazer recomendações que irão
contribuir para o progresso econômico, o bem-estar social e fortificar o regime
democrático do Brasil
12
”. Característica bastante nítida nos filmes do IPES, que
proferem conselhos e recomendações, num processo de formação de opinião.
A outra face encoberta do IPES coordenava uma sofisticada e multifacética
campanha política e militar. Os fundadores do IPES dedicados à manipulação de
opiniões e guerra psicológica recrutavam de forma sistemática, novos membros que
concordavam em conduzir tanto as operações públicas, quanto às encobertas.
Alguns dos fundadores consideravam que o IPES deveria ser uma
organização inteiramente clandestina, mas foi argumentado que, em função da
natureza, das tarefas por vir, seria mais sensato operar também com o
conhecimento público. As operações secretas e discretas da burguesia golpista
eram feitas por forças especializadas, algumas unidades de ações e grupos que
utilizavam codinomes. Na produção fílmica do IPES também é possível notar sua
ambigüidade de atuação, que os filmes produzem um duplo sentido ao tratarem
de questões cívicas, mas que por outro lado, são questões de ordem econômica
direcionada ao interesses da elite dominante capitalista.
12
DREIFUSS, 1981, p.163.
37
O Estado favorece a arrogância, o luxo, o arbitrário das elites do poder e das
classes superiores (que favorecem a arrogância e o arbitrário do Estado), organiza
a dominação das classes inferiores, submete à tortura e ao suplício toda revolta e
contestação. (MORIN, 2005, p.180)
Assim, a classe dominante que formava o IPES manifestou-se a disposição
para agir, dentro de um programa capaz de mobilizar homens de empresa e oferecer
soluções aos problemas do país, o que é notoriamente claro ao assistir os filmes do
Instituto. E mais, objetivam modelar de acordo com os seus interesses as forças
sociais burguesas numa classe, processo que culminaria com a transposição do
poder privado aos interesses multinacionais e associados, para o governo público do
Brasil.
“O aparelho do Estado realiza grandes obras para submeter o meio natural,
abrir estradas, construir canais, implantar cidades, desenvolver a agricultura (...)
(MORIN, 2005, p.178)”. Ocorre assim, a transferência do poder simbólico político
para o poder econômico. A política trabalha em prol a força do poder econômico,
construindo estradas e ferrovias, gerando mais empregos, mais indústrias que são
características dos filmes do IPES. Uma vez que são a partir dos sistemas filosóficos
e científicos que se desenvolveram as ideologias políticas
13
.
O IPES foi aumentando sua força gradativamente com a colaboração de
entidades e assim, a classe dominante penetrava nas camadas sociais
intermediárias e até mesmo junto aos militares. O Instituto aumentava a sua rede de
colaboradores e viajando pelo país, demonstrava ao empresariado a importância de
se unirem à causa. Tentavam também romper com a fidelidade de alguns que
apoiavam o governo reformista de Jango. Aspectos que ficam claros nos filmes
feitos pelo Instituto quando direcionados ao público empresarial.
13
MORIN, Edgar. O Método IV: As idéias. Portugal: Europa-América, 1991.
38
O líder do IPES, José Garrido Torres em uma publicação dirigida as classes
empresariais, ressaltava que crescia o número de pessoas, que acreditavam que o
desenvolvimento econômico e a justiça social do Brasil, aconteceriam com a
socialização acelerada da economia. Evolução que teria que contar com o apoio de
líderes das classes empresariais, numa renovação da empresa privada e na busca
de soluções para problemas políticos e sociais do país.
Dreifuss em seu estudo relata que o IPES embora sendo uma organização
política de classe, tinha o objetivo de reunir diversos segmentos da população,
forçando a elite incluir no seu plano de ação, frações regionais da classe dominante
e das classes médias, com o objetivo de ter um consenso para a ação e ganhando
força como uma organização “representativa”.
A estrutura organizacional do IPES se desenvolvia no eixo Rio São Paulo,
sendo que todas as idéias e programas, a liderança política, os grupos de estudos e
a participação de debates públicos partiam do Rio de Janeiro. Em São Paulo, se
concentravam os grupos de ação, implantação e execução, além das áreas de
operações secretas.
A elite capitalista estava apreensiva com a ação popular, temendo que este
movimento pudesse atrapalhar seus interesses econômicos, os quais estavam
ligados à internacionalização de empresas. Notaram as dificuldades crescentes de
manter a massa controlada dentro do sistema político do governo popular de Jango.
Então, se uniram para desenvolver idéias políticas dirigida a massa.
(...) as novas forças sócio-econômicas, em seu anseio de poder político, tentaram
destituir o Executivo de sua autoridade e arrancar das forças populares o ponto de
apoio que elas haviam conseguido na condução dos assuntos estatais.
(DREIFUSS, 1981, p.107)
39
A industrialização capitalista, do ponto de vista dos interesses multinacionais
e associados, poderia prosperar sob a bandeira de uma ordem administrativa de
inspiração empresarial e de segurança política. Para as classes dominantes e seus
intelectuais orgânicos, a luta de classe dentro de um sistema de formulação de
diretrizes políticas e tomada de decisão internacionalizadas deveria ser circunscrita
a limites nacionais seguros (DREIFUSS, 1981, p.134).
João Goulart tomou decisões econômicas e políticas que contrariaram
completamente os interesses da elite dominante. Goulart implementou políticas para
melhorar a condição de vida da classe popular, através de aumentos salariais e
distribuição de renda, maiores recursos para a educação gratuita, assistência
médica, habitação e transporte público. Automaticamente as indústrias de porte
médio e do setor agrário foram estimuladas, já que seus produtos de consumo
básico eram destinados ao mercado de baixa renda, sob uma política de controle de
preços de produtos básicos como alimentos, vestuário e eletrodomésticos.
O regime populista-reformista de Jango foi condenado pela elite orgânica,
devido sua força de mobilização, por ter cedido aos apelos populares e por sua
administração, que não correspondia aos interesses do bloco multinacional e
associado, que requeria o fim das indústrias de porte médio e seu mercado
específico para a substituição de empresas multinacionais e associadas. Para este
bloco, o governo de Jango, estava esgotado na capacidade dos limites políticos e
sócio-econômicos.
A industrialização capitalista, do ponto de vista dos interesses multinacionais e
associados, poderia prosperar sob a bandeira de uma ordem administrativa de
inspiração empresarial e de segurança política. Para as classes dominantes e seus
intelectuais orgânicos, a luta de classe dentro de um sistema de formulação de
diretrizes políticas e tomada de decisão internacionalizadas deveria ser circunscrita
para a capitalização privada. (DREIFUSS, 1981, p.134).
40
A classe dominante do bloco econômico desaprovava a possibilidade de um
poder Executivo que tivesse autonomia e fosse capaz de ter em seu comando as
classes subordinadas ou que fosse influenciado por ela. E por isso, a classe da elite
se planejou para agir estrategicamente em prol seus interesses.
Somente um encontro de forças para a sobrevivência da classe, isto é, um cenário
soma-zero, altamente manipulador e intensamente arquitetado socialmente,
poderia estabelecer um ponto de união para uma ampla frente de ação militar-
empresarial que se tornasse capaz de mobilizar setores abrangentes da opinião
pública e causa a intervenção dirigida das Forças Armadas (DREIFUSS, 1981,
p.159)
1.4 O Instituto e Manipulação da Opinião Pública
O autor Jürgen Habermas em “Mudança Estrutural na Esfera Pública” (1985),
esclarece que antes, as pessoas privadas não podiam tirar juízo das informações
públicas, pois, era considerado que lhe faltava conhecimento das circunstâncias a
que levaram estas informações. Mas no final século XVII e início do século XVIII
antes da Revolução Francesa, estes juízos passaram a ser chamados de públicos,
em vista de uma esfera pública que cabia a esfera do poder blico (político),
mas que agora se dirigiam as pessoas privadas, onde o “público julga” e então
surge, a chamada “opinião pública”.
O envolvimento do Estado na mídia dá-se desde o século XX, no rádio,
cinema falado e televisão, pois, a evolução dessas mídias foi desde o início,
colocada sob o controle do Estado. O governo colocava mesmo que de forma
indireta, as agências numa situação de dependência em aproveitar o seu caráter
comercial, embora isto fosse oficioso. Desta forma, grandes jornais na Inglaterra,
França e Alemanha tornaram-se propriedades da União, além das novas mídias
41
como cinema e televisão, que foram organizadas como instituições públicas e semi-
públicas, já que se ficassem por conta de interesses privados, não seriam protegidas
diante à função capitalista.
O que aconteceu a partir daí é que a publicidade, que antes atingia o público
de camadas sociais superiores, passou a atingir o público de camadas sociais
menos elevadas, onde os anúncios e propagandas atingiram mais em volume e
freqüência este público e a socialização dos bens, que era exclusividade das
camadas superiores, passaram mesmo que simbolicamente, adequar seu estilo de
consumo para alto.
A propaganda passou a assumir a esfera pública como política, onde os
reclames que eram privados, voltados a pessoas privadas (os consumidores) e
dirigiam-se a eles através da public relations. E assim, estas pessoas privadas
tornaram-se o público, onde o emissor da mensagem ocultava suas reais intenções,
sob o pretexto da preocupação com o bem-comum, conseguindo desta forma,
manipular os consumidores que conotativamente eram considerados um público
culto, uma vez que pertenciam à esfera pública literária, graças à evolução da
produção cultural, assim, estes emissores aproveitaram dessa “legitimação culta”,
para a manipulação de seus destinatários, concedida pelos meios de comunicação
de massa, em uma representação dramática dos fatos e estereótipos, conseguindo
na esfera pública pretextos específicos que mobilizavam os meios de comunicação,
numa produção ou criação de notícias. Foi exatamente sob esta premissa que os
filmes criados pelo IPES, tratam dos problemas sociais vividos no Brasil naquele
período.
Com a evolução da esfera pública, o Estado passou a se preocupar com a
integração entre Sociedade e Estado. Desta forma, investindo em publicidade de
42
maneira diferenciada, porém, esta publicidade estava sob o patrocínio das
administrações, das associações e dos partidos, atuando de um outro modo no
processo de integração.
O IPES se declarava publicamente como um Instituto voltado aos princípios
sociais e cívicos do país, promovendo então um papel de integração com a
sociedade, porém, como um órgão não governamental, que se posicionava a favor
da democracia. Para captar patrocínio para sua campanha antigovernamental,
declarava que as empresas que o mantivessem seriam reconhecidas pela
sociedade, ao desempenhar esta parceria junto ao Instituo. Empresas
patrocinadoras onde suas reais preocupações não eram com a sociedade, mas sim
com o capital, como já citado anteriormente.
Para dar início às suas táticas de ação contra o governo popular-reformista, a
classe dominante econômica reunida e representada através do IPES, começava a
traçar através da análise do cenário social, político e econômico que atravessa o
Brasil, seus ideais e objetivos. Foi observado que o Brasil se encontrava num
estágio de evolução em busca de desenvolvimento econômico e justiça social.
Sobre estes aspectos, associaram a idéia de que para alcançar estes objetivos,
seria necessário um ritmo acelerado da economia de forma que ela pudesse ser
socializada. Para esta aceleração seria então, necessária a renovação da empresa
privada, claro, sempre em busca de soluções para os problemas políticos e sociais
do país, tal como podemos observar nas propostas colocadas nos filmes do IPES.
O alvo estratégico da elite orgânica consistia em se estabelecer no poder do
Estado e realizar mudanças econômicas, administrativas e políticas que os
interesses representados no IPES exigiam. Taticamente, o complexo IPES/IBAD
estava engajado em uma vasta campanha que procurava manipular a opinião
pública e doutrinar as forças sociais empresariais, modelando esses interesses em
uma classe “para si”. (DREIFUSS, 1981, p. 281)
43
O objetivo do IPES era então trabalhar a opinião pública, de modo que esta
estivesse de acordo com seus ideais liberais voltados a manutenção do sistema
econômico, de forma que a grande massa que compunha esta opinião pública
entendesse que, somente atuando em prol do sistema econômico seria possível
alcançar o progresso social que almejavam.
Os americanos intelectuais e liberais, sobre os quais as teorias sólidas, fáceis de
compreender e, sobretudo mecânicas exercem grande atração, declararam-se
quase todos a favor desta doutrina (behaviorismo) que, além do mais, lhes era
apresentada como princípio liberal e democrático. (LORENZ, 1974, p.116)
O IPES através de uma gigantesca campanha, que incluía filmes, tinha como
finalidade moldar a opinião pública através de ideais democráticos voltados ao
princípio liberal que eles próprios objetivavam, sobre forte influência das empresas
multinacionais, essencialmente as americanas e assim “impedir a solidariedade das
classes trabalhadoras, conter a sindicalização e mobilização dos camponeses,
apoiar as clivagens ideológicas de direita na estrutura eclesiástica, desagregar o
movimento estudantil e bloquear as forças nacional-reformistas no Congresso e, ao
mesmo tempo, mobilizar as classes médias como a massa de manobra’ da própria
‘elite orgânica’” (DREIFUSS, 1981.p.281), a ponto de conduzir a uma crise que
culminou em um golpe de estado.
No entanto, o público-alvo de seu doutrinamento para angariar apoio às suas
idéias eram os sindicatos, o movimento dos estudantes e dos camponeses, a Igreja
e os militares. No teor das mensagens estavam incutidos os ideais do IPES, em
defesa da propriedade privada como função social e direito do homem, assim como
os bens que ele produz, a ampliação da capacidade individual e a liberdade como
alicerce. Elementos fundamentais para girar a engrenagem que move o sistema
econômico capitalista defendido pelos membros do Instituto.
44
Para sua atuação efetiva, o IPES verificou que seria fundamental de ter
agregado aos seus objetivos amplos segmentos da população, incluindo as classes
trabalhadoras, de modo a ter reunido um consenso sobre suas idéias e ações,
assim, tornando-se um Instituto representativo. Para isso, o IPES reconheceu a
necessidade de parecer favorável a determinadas posições políticas.
O IPES incitava os empresários a se envolverem politicamente, cumprindo suas
responsabilidades públicas e proclamava que “as necessidades básicas do
homem, tais como alimentação, abrigo e saúde, podem ser satisfeitas de melhor
forma em um sistema de empresa privada. (...) Na opinião do IPES, o Estado
deveria intervir na economia apenas para preservar o mercado livre do monopólio,
promover desenvolvimento econômico e contribuir para a paz social. (...) O IPES
admitiria liberalismo no campo econômico, mas não aceitá-lo-ia na área política”
(DREIFUSS, 1981, p.197).
O IPES sendo uma organização política de classe (da classe dominante
empresarial), contava com diversos patronos que proviam recursos para sua
campanha política e filmes. Alguns eram membros do próprio Instituto, outros
apoiavam firmemente suas idéias. Os vários patrocinadores do IPES
14
eram desde
empresas do setor financeiro, como grandes bancos e seguradoras (Banco de Minas
Gerais, CONCLAB, Sul-América Capitalização etc.), igualmente as petroquímicas e
mineradoras (Texaco, Ultragás etc.), além de indústrias do ramo alimentício, agrícola
e do comércio (Coca-Cola, Souza Cruz, Mesbla etc.), de mesmo modo, que
companhias eletrônica e xtil (Eletromar, Codima etc.), e também de engenharia e
construção (Cimento Portland, Engenfusa etc.), além dos serviços de utilidade
pública (Light, Listas Telefônicas etc.) bem como, as empresas de comunicação e
publicidade (Editora Globo, Editora Kosmos etc.). A maioria das companhias estava
associada aos interesses multinacionais.
14
Ver lista completa em DREIFUSS, 1981, p. 627-638.
45
O objetivo geral da doutrinação específica era modelar as várias frações das
classes dominantes e diferentes grupos sociais das classes médias em um
movimento de opinião com objetivos a curto prazo amplamente compartilhados,
qual seja, a destituição de João Goulart da presidência e a contenção da
mobilização popular. (DREIFUSS, 1981, p. 232)
A fim de alcançar seus objetivos, o IPES contava com uma estrutura
organizacional através de Grupos de Estudo e Ação atuando para desenvolvimento
e realização de suas diretrizes políticas. Estes grupos de ação tinham a função de
agir disseminando as idéias do Instituto, através de diversos recursos com objetivos
específicos que eram executados por publicações e filmes que tratavam de
disseminar o ideal do IPES, a fim de remodelar a força sindical, agir em defesa da
livre iniciativa e da empresa privada, analisar os assuntos políticos da época,
examinar as reformas propostas, estabelecer ligações com órgãos do governo, além
de aumentar o número de membros e recursos voltados ao Instituto. Para sua
campanha política o IPES atuava através de três principais Grupos de Estudo e
Ação
15
responsáveis pelo endoutrinamento e manipulação da opinião pública. Sendo
eles:
GOP Grupo de Opinião Pública, “sua função manifesta era a manipulação da
opinião pública por todos os meios disponíveis” (DREIFUSS, 1981, p.192). O
GOP contava em sua ação com grandes empresas e seus colaboradores do
ramo da comunicação como a Denison Propaganda, Norton Propaganda além de
jornalistas do O Estado de São Paulo, Jornal do Brasil e também de
colaboradores do famoso Repórter Esso da extinta TV Tupi, além de vários
outros importantes veículos de comunicação
16
. As atividades desenvolvidas pelo
GOP eram voltadas à disseminação dos ideais do IPES e dentre elas “projetar
15
Ver Dreifuss,1981, p.186-205.
16
Ver Dreifuss,1981, p.233.
46
doutrina, o que envolvia a realização de princípios e objetivos básicos do IPES,
entre os diferentes setores da população considerados como alvos adequados
para as atividades” (DREIFUSS, 1981. p.192). O público-alvo do
endoutrinamento do IPES eram os próprios militantes do Instituto, os novos
membros em potencial, trabalhadores da indústria, militares, profissionais,
médios e pequenos empresários, estudantes, igreja e donas-de-casa;
GPE Grupo de Publicações Editorial que produzia escrevia e traduzia materiais
impressos anticomunistas. Publicava panfletos, artigos e livros que orientavam os
leitores sobre os perigos do socialismo;
GED Grupo de Doutrina e Estudos com o objetivo de fixar a doutrina e a
filosofia do Instituto. Este grupo acompanhava a ação do IPES na mídia
fornecendo subsídios ideológicos para material de propaganda.
A doutrinação do IPES através dos meios de comunicação como pode ser
observado na sua produção fílmica “visava infundir ou fortalecer atitudes e pontos de
vista tradicionais de direita e estimular percepções negativa do bloco popular
nacional-reformista” (DREIFUSS, 1981, p.231).
O IPES para obter grande amplitude e atingir o maior número de pessoas
possíveis em sua campanha, agia através do GOD e do GED propagando seus
ideais por diversos meios de comunicação como o rádio, que era um meio poderoso
e atingia as massas menos privilegiadas, que não tinham condições de ter um
aparelho televisor. No meio televisão, o Instituto atuava patrocinando não
abertamente diversos programas
17
, mas exercia influência sobre eles reverberando
seu discurso, procurando manter um contato constante com a opinião pública, sobre
17
Ver Dreifuss, 1981, p. 247-248.
47
os assuntos do momento que eram ligados a suas intenções. Para atingir e impactar
um grande público, em diversas regiões do Brasil, o IPES atuava através da
novidade técnica do cinema com uma série de filmes, os quais são objetos deste
estudo. O resultado de toda atuação do IPES através do meio cinema e de outros
meios de comunicação influenciou, atitudes e reações na sociedade brasileira.
48
CAPÍTULO 2 – CINEMA E POLÍTICA
2.1 O Cinema Como Instrumento de Pesquisa Histórica
Nosso estudo visa entender a força do meio cinema, dentro da campanha
política do IPES, que se valendo de filmes com produção do cineasta Jean Manzon,
intencionava persuadir e modelar a opinião pública em função de interesses políticos
em jogo.
O autor Antonio Costa em sua obra “Compreender o Cinema” (1988), nos
ajudar a esclarecer o surgimento e a evolução do cinema. O autor relata que o
cinema nasce nos anos em que a psicanálise toma forma, onde alguns teóricos
estudam as relações entre visão fílmica e experiência onírica no inconsciente com
base no estudo da obra de Metz:
(...) o fato de o cinema surgir nos anos em que a psicanálise toma forma,
apontando novas pistas para captar o sistema de relações que une o inconsciente
individual, objeto da investigação psicanalítica, e o inconsciente coletivo, cujas
configurações encontram no cinema um lugar privilegiado de produção e um
instrumento de dilatação e ampliação. (COSTA, 1988, p.48)
O cinema trouxe a capacidade técnica de reproduzir e projetar as massas.
Isto, justamente, num período de grandes novidades, advindo da revolução industrial
e seus meios técnicos, de grandes produções em larga escala. Um momento
também de grande produção e reprodução cultural, onde as massas procuravam por
distração em seus poucos momentos de folga, encontravam no cinema seus
próprios rostos captados pela câmera.
“A massa distraída (...) faz a obra de arte mergulhar em si, envolve-a com o
ritmo de suas vagas, absorve-a em seu fluxo” (BENJAMIN, 1987, p.193). Segundo o
49
autor, para as massas, as obras de arte tão quanto o cinema, seriam objetos de
distração e entretenimento. Deste modo, as obras de arte ao serem absorvidas ao
fluxo das massas, passam a ter uma recepção diferente da óptica que é adquirida
pela contemplação, mas ao que Benjamin chama de recepção de tátil, que se efetua
pelo hábito em que a massa em seu ritmo acelerado e dispersivo ingere as obras de
arte.
“O cinema é a forma de arte correspondente aos perigos existenciais mais
intensos com os quais se confronta o homem contemporâneo” (BENJAMIN, 1987,
p.192). O indivíduo encontrou no cinema um dos fatores que mais procurava em
meio a sua turbulência diária, a distração de origem tátil. Originada através do efeito
de choque, impactando o espectador através de cortes, ângulos, planos e diferentes
técnicas cinematográficas, atuando diretamente no seu aparelho perceptível.
O cinema surge num primeiro momento como um documentário histórico, um
exemplo disso é o filme dos irmãos Lumière (1895) com “A chegada do trem na
estação Ciotat” e “A saída dos operários das usinas”. Isto porque os filmes assumem
um caráter de representação das massas, seus vestuários, comportamentos,
novidades, tornando-se objeto de espetáculo junto a outros acontecimentos, que
podem fazer parte da política e de conflitos ideológicos, se apropriando da
massificação de temas históricos e especulando fatos que realmente houvessem
ocorrido. O cinema uma vez que tem o poder de reconstituir uma experiência
histórica, é capaz de levar ao público o espetáculo de si mesmo através dos
“poderes da cena” e da “magia” tecnológica.
O cinema traz a “ordem do discurso cinematográfico” submetido ao crivo da
crítica histórica, para assim definir por períodos a relação de “visível” e “invisível”, ou
seja, aquilo que é mostrado e aquilo que não é mostrado, e entre “visível” e
50
“enunciável”, ou seja, aquilo que as imagens dizem e aquilo que se faz que elas
digam. O cinema veio por explorar o que não era novidade, porém, utilizou de
tecnologia avançada sobre a literatura, gravuras, museus de cera, fotografia e tudo
que trouxesse grandes efeitos do realismo visual e sonoro, além de grandes
cenários.
Quase todos os filmes são representações; mais especificamente, são
representações visuais ou representações que afiguram, são imagens. Em sua
absoluta maioria são afigurações fotográficas. (...) Afigurar as imagens tanto as
estáticas como as em movimento são na realidade “motivos” de jogos visuais de
faz-de-conta. (...) Olhar uma fotografia é, de fato, ver (de forma indireta, porém
genuína) aquilo que a fotografia mostra. (RAMOS IN: WALTON, 2003, p. 105).
Um dos princípios em que partiu o cinema foi através da fotografia colocada
em movimento, do choque entre as seqüências de fotogramas. Por isso, o
espectador ao ver um filme é induzido pelas imagens na tela a imaginar ver o que o
filme representa, através dos acontecimentos afigurados de acordo com o ponto de
vista determinado pela câmera e os seus recursos de montagem, planos, etc.
Para o autor Kendall Walton “as fotografias, incluindo as documentais,
induzem um ‘imaginar ver’ e o representações (afigurações, imagens), além de
serem transparentes”. Para ele “as fotografias, assim como as pinturas, são
produzidas pela atividade humana, refletindo interesses, intenções, crenças, etc. de
seu produtor
18
”. A partir desta idéia, pode-se concluir que o cinema documentário se
apropria do caráter que possuí a fotografia documental em ter “uma dependência
factual ‘natural’ (...) como é natural pensar que ver uma fotografia é uma maneira de
ver a coisa, uma maneira semelhante a vê-la diretamente
19
”. Neste sentido, ao
tratar de foto e cine documentários podemos afirmar que ambos são instrumentos de
18
WALTON, K. Sobre imagens e fotografias: resposta a algumas objeções. IN: RAMOS, F.P. (org.). Teoria
contemporânea do cinema: documentário e narrativa ficcional. São Paulo: SENAC, 2003. p.171
19
Ibid, p.171
51
ampliação da visão, através da possibilidade de se ver um fato com os “próprios
olhos”. E ao ilustrar o que se pretende mostrar, tanto um quanto o outro, dependem
da mediação humana para o funcionamento.
Os filmes do IPES, que são objeto deste estudo, são filmes documentários de
propaganda política ou o que o autor Massimo Canevacci chama de “cinema direto,
científico ou documentário”. Para melhor explicar esta tipologia de filme, o autor
classifica-o em alguns níveis, pelo qual se enquadra o objeto de nossa análise,
dentre o que o autor chama de “cinema direto militante” e “cinema direto ficção”.
Cinema direto “militante”. Com essa abordagem visual, a relação entre observado e
observador se dilui através da acentuação da politização, em que a voz off alcança
o máximo de identificação (ou de oposição) com o entrevistado, com base na
aceitação ou não de uma ideologia comum. (...) Cinema direto “ficção”. Esse
modelo é um paradoxo (um oxímoro), pois o cinema direto parece ser praticado
através de seu oposto: justamente a ficção. (CANEVACCI, 2001, p.164-165)
Nos filmes documentários do IPES, encontramos então o caráter “militante”, já
que são filmes que possuem a finalidade de formar opiniões, de acordo com
determinados ideais políticos. Por outro lado também, identificamos a utilização de
recursos característicos dos filmes de ficção, como encenações típicas destes
filmes, com o intuito de simular cenas da vida cotidiana como representação da
realidade. Características que possuem sempre a mesma finalidade, envolver o
espectador ao tema político proposto.
(...) as novas tecnologias permitem ao orador ser ouvido e visto por um número
ilimitado de pessoas, a exposição do político diante dos aparelhos passa ao
primeiro plano. (...) Seu objetivo é tornar “mostráveis”, sob certas condições sociais,
determinadas ações de modo que todos possam controlá-las (...). Esse fenômeno
determina um novo processo de seleção, uma seleção diante do aparelho, do qual
emergem, como vencedores, o campeão, o astro e o ditador (BENJAMIN, 1987,
p.183).
52
Na Itália, por exemplo, o tema histórico sobre mitologia foi muito explorado no
cinema, que obteve grande visibilidade internacional, influenciado até mesmo o
cinema americano. Os filmes históricos juntamente com os filmes documentários de
propaganda política, serviram de base para o cinema fascista, ou seja, pouco tempo
depois de sua descoberta, o cinema foi utilizado com o propósito ideológico nas
propagandas políticas, definindo contextos sociais e políticos de uma determinada
época. Com o mesmo objetivo, atuou também o IPES através de sua produção
fílmica em um período mais tarde.
A origem do cinema no século XIX e sua evolução podem ser exploradas por
alguns principais pontos de vista:
Técnico-científico: na compreensão do funcionamento dos instrumentos que
tornaram possível a projeção de imagens fotográficas em movimento. Uma
época de grande desenvolvimento científico, tecnológico e social, mas que
englobava diversas contradições, onde não tardou o acontecimento da Primeira
Guerra Mundial;
Psicológico e sociológico: no entendimento do significado assumido no
imaginário coletivo, nas formas de reprodução de aspecto da vida cotidiana nas
esferas pública e privada. Um cenário onde várias potentes nações seguiam uma
política forte de nacionalismo, a procura de um equilíbrio hegemônico burguês
industrial, sobre a questão emergente do proletariado que começava a se
expressar por meios de política e sindicalização;
Estético: na compreensão das modificações que a nova técnica de reprodução
introduziu no sistema das artes como pintura e teatro.
53
Os historiadores de cinema estão mais ou menos de acordo, quanto aos seus
pioneiros e segundo Siegfried Kracauer, as filmagens dos irmãos Lumière
exprimiam a vocação realística do cinema derivada da fotografia instantânea.
Enquanto outros autores concordam que Méliès, através da combinação de
elementos pictóricos, cenográficos e teatrais teria captado o caráter onírico do
cinema. O importante é entender o cinema dos pioneiros, como uma nova forma de
narrativa ou como Walter Benjamin chamou: “a época da reprodutibilidade cnica”.
Contribuindo para isso os adventos da fotografia e o cinema, além, é claro, das
transformações econômicas, sociais e culturais advindas da Revolução Industrial,
sobre o cenário urbano das metrópoles industriais, que se firmaram sob a percepção
estética “coletiva” e “distraída” (COSTA, 1988, p.61), configurando assim a cultura
de massa.
Da integração eletrônica entre imagem e som, que se o elemento
audiovisual. É importante dizer que o cinema falado, utilizou das técnicas de
montagem do cinema mudo: rítmica, sinfônica, analógica e usando contrapontos,
onde existe a ligação de um som a uma narrativa, produzindo ambos associados,
um significado ao espectador, assim exemplifica Vittorio Gelmetti: “a associação do
som eletrônico a uma narrativa de ficção científica projeta tout court sobre a sica
eletrônica um significado que por si ela não possuía e que permanecerá ligado a
ela de algum modo” (COSTA, 1988, p. 225).
A relação do espectador hoje é bastante diferente em comparação ao cinema
mudo. Na opinião de Costa, aproximar-se do cinema mudo estaria em adequar-se a
um código comunicativo e expressivo diferente daquele a que se está acostumado.
Antes de qualquer coisa, seria necessária a adaptação da velocidade em que
deveria ser rodado o filme do cinema mudo, para que não alterasse o seu ritmo,
54
além da narrativa que dependeria da participação do telespectador para a
interpretação da linguagem. O cinema mudo exigia a adequação de cores, embora a
maioria dos espectadores ignore o fato de a cor ter sido utilizada mesmo nos
primórdios do cinema, onde a Star Film de Méliès produzia filmes coloridos a mão
fotograma por fotograma. As tonalidades dos planos correspondiam as
características, como exemplo, a viragem do azul que servia para produzir o “efeito
noite”.
O cinema sonoro trouxe uma revolução estética em técnicas de produção e
nos níveis econômicos da indústria cinematográfica. É importante destacar que o
impulsionamento do cinema falado ou sonoro, foi o grau de parentesco com o rádio,
que no início era um meio concorrente do cinema. A tecnologia desenvolvida para o
crescimento do rádio, com o apoio das indústrias do sistema telefônico e radiofônico
para a ampliação e reprodução, colaborou também na solução de alguns problemas
do cinema sonoro. Como feito no rádio, o cinema se aproveitou dos mesmos efeitos
surtidos no público, que havia criado um hábito sobre a reprodução da voz viva e
documental, dos detentores de poder e dos favoritos do espetáculo. Esta
característica nos ajuda a esclarecer uma de nossas hipóteses, ao se pressupor que
a forma narrativa fílmica do IPES, contém um estilo eloqüente capaz de ressoar nas
mentes. Narração feita em voz off por Luiz Jatobá, um locutor muito popular na
época.
Segundo Costa, o estudioso Marshall McLuhan definia o rádio como um meio
de força subliminar e que, as forças das palavras na sala escura de um cinema
criavam um sistema de recriação, ampliação e potenciação: “uma subliminar sala
dos ecos que tem o poder mágico de tocar cordas remotas e esquecidas” e para
55
esclarecer sua idéia recordou os novos significados e o “tecido” diverso que as
palavras assumem se nos pomos a falar numa sala escura” (COSTA, 1988, p. 87).
No entanto, nos anos 20 a 30, o cinema se destacou por suas inovações
tecnológicas, do cinema sonoro, da introdução de cor, da tela panorâmica. A partir
daí, entre os anos 30 a 60, no chamado “cinema moderno”, não houve grandes
inovações, mas sim, a intensificação dos efeitos descobertos como o
aprimoramento de películas, objetivas em focos curtos. Para melhorar as filmagens,
o uso de câmeras mais fáceis e mais leves de manipular.
A ideologia dominante no cinema moderno” é uma ideologia progressiva: à
expressão de uma nova subjetividade individual ou coletiva, à definição de uma
nova linguagem e de novas tipologias expressivas, é atribuída a tarefa de captar as
mudanças e produzir ou acelerar processos de transformação moral, social e
política. (COSTA, 1988, p. 115)
A sincronia do meio cinema representava papel importante com as temáticas
desenvolvidas pelas ciências humanas, como psicologia, semiótica, estética e
sociologia, atribuindo ao cinema papel importante nos modelos de representação
junto às transformações que estavam ocorrendo no mundo. Neste período, o cinema
atuou captando as mudanças em curso e a partir daí, criou novas expressividades,
acelerando os processos de metamorfose moral, social, política e ideológica. Foi
neste sentido que o IPES utilizou o cinema em sua campanha política.
2.2 Os Altos e Baixos do Cinema Brasileiro
Para compreendermos como o cinema ganhou destaque no Brasil e foi
aperfeiçoando suas técnicas, de modo a obter visibilidade e força, não como
56
expressão de arte e entretenimento, mas também como ferramenta de propaganda
contamos com a obra de Renato Ortiz em “A Moderna Tradição Brasileira” (1988).
Onde o autor nos conta o desenvolvimento dos meios de comunicação no país,
frente à tardia indústria cultural que chegava ao Brasil.
O cinema ganhou destaque no Brasil entre as décadas de 40 e 50, com a
presença de filmes americanos dominavam o mercado cinematográfico. Nesta
época pós-guerra, o cinema americano passava por uma crise de público e por esta
razão, a indústria cinematográfica americana se voltou para a exportação de suas
produções para ao mercado latino-americano, além do interesse do governo dos
EUA em estabelecer aproximação com a América Latina, através de uma “política de
boa-vizinhança”. É também neste mesmo momento que a indústria cinematográfica
brasileira nasce.
O fato é que nas décadas de 40 e 50 o Brasil vivia um cenário de grande
efervescência cultural e junto destes diversos acontecimentos, surgia o cinema que
correspondia ao crescimento industrial da burguesia que despendia dinheiro não
em suas indústrias, mas também em cultura (ou na indústria cultural grifo meu).
Em 1941 é criada a Atlântida, que produzia uma média de três chanchadas
por ano e, em 1949, a companhia cinematográfica Vera Cruz que pretendia
estabelecer um pólo cinematográfico em São Paulo. O panorama da produção
cinematográfica passava a ter um maior desenvolvimento, uma vez que no período
de 1935 a 1949, somente seis filmes haviam sido produzidos em São Paulo e entre
1951 a 1955, foram realizados uma média de 27 filmes por ano.
Embora a indústria cinematográfica tivesse crescido, em 1954 instalou-se
uma crise com a falência da Vera Cruz após poucos anos de atividade. Empresa
que era fruto do sonho de uma burguesia que atuava na esfera cultural, de
57
empresários cinematográficos que pretendiam construir a indústria cinematográfica
no país nos moldes do cinema americano, com idéias de grandes realizações e
orçamentos, estúdios modernos, tecnologia, equipe de técnicos e atores de primeira
grandeza.
A crise atingiu outras companhias menores que também fecharam como a
Maristela. O que demonstrava a dificuldade do cinema nacional em se consolidar no
mercado, até mesmo o cinema americano que havia ganhado força, encontrava
dificuldades em crescer junto ao público de massa. Isto significa que o cinema ainda
não havia conseguido fascinar o público brasileiro. Além disso, em 1955, mais da
metade dos cinemas existentes no Brasil operavam de forma irregular.
Em 1960, o cinema brasileiro volta a ganhar força com o movimento do
“cinema novo”. Nesta época, os meios de comunicação no Brasil viviam momentos
de precariedade técnica, que na tentativa de buscar melhorias usava o
experimentalismo para lhe dar com problemas que enfrentavam. Dentro deste
mesmo cenário e através de experiências cinematográficas anteriores, o cinema foi
aos poucos ganhando desenvolvimento tecnológico. Foi neste momento, que
nasceu “cinema novo”, se contrapondo a industrialização cinematográfica, com uma
ideologia que combatia a idéia de uma arte industrial voltada para o consumo, mas
sim como matéria de reflexão estética e política, composto por um quadro de
excelentes diretores, dentre eles Glauber Rocha.
O “cinema novo” levava ao espectador a consciência de seus próprios
problemas, trabalhava com a “estética da fome” tematizando sempre uma crítica ao
subdesenvolvimento brasileiro. O “cinema novo” envolvia um cenário popular,
retratando o ciclo do cangaço e a cena urbana. Os primeiros anos da década de 60
são dominados pelo fenômeno baiano, onde se destacou o filme “O Pagador de
58
Promessas” (Ancelmo Duarte, 1962) Palma de Ouro em Cannes. Depois da época
do Cinema Chanchada, o Cinema Novo foi à expressão cultural de um fenômeno
histórico nacional, que retratava a força produtora urbana e rural, as massas dos
comícios, um universo integrado por sertão, favela, subúrbio, vilarejos do interior ou
da praia, gafieira e estádio de futebol.
Todo esse universo tendia-se a expandir, se não fosse interrompido em 1964
pelo Golpe Militar, onde a indústria cinematográfica passa a ser dirigida
culturalmente por órgãos burocráticos do governo, que incentivavam as adaptações
de obras literárias em filmes, procurando obras e produções de prestígio cultural,
sem as inconveniências de um cinema crítico, como acontecia no “cinema novo”.
No período de 1957 a 1966, a produção de longas-metragens no Brasil
chegava numa média de 32 filmes por ano. em países como os EUA, Inglaterra,
Alemanha Ocidental, Japão, França e Itália o número de espectadores de cinema
vinha a diminuir, isso devido à concorrência com outros meios de comunicação.
Entre as décadas de 50 e 60, o Brasil seguia num sentido contrário ao destes
países, onde a indústria cinematográfica veio a ganhar força somente na década de
1970 (após a consolidação da indústria cultural que ocorreu por conta dos interesses
pelo qual se deu o golpe militar). Este fato reforça uma de nossas hipóteses,
referente ao meio cinema ter sido escolhido pelo IPES, como a forma mais eficiente
de propaganda naquele período. A grande novidade do cinema e sua força de
persuasão deviam-se então ao que Konrad Lorenz
20
em seu livro “Civilização e
Pecado” (1974) chama de neofila, onde tudo o que é novo é atraente. Exatamente
porque o meio cinema (e o fascínio que é capaz de causar no espectador), ainda
não tinha alcançado o grande público, que ficava fascinado ao conhecer a novidade
20
LORENZ, Konrad. Civilização e Pecado: os oito erros capitais do homem. Rio de Janeiro: Artenova, 1974.
59
da técnica, mesmo que fosse em cinemas itinerantes montados em praças públicas
ou em igrejas como fazia o IPES, na exibição de seus cine-documentários
propagandísticos que é objeto deste estudo.
2.3 Política e Poder Consumidos Através da Indústria Cultural
“(...) o crescente desenvolvimento da sociedade industrial se consolida e se
expande às empresas, que passam a gerir suas atividades a partir de uma
estratégia de lculo que busca maximizar os ganhos a serem atingidos” (ORTIZ,
1988). Por este motivo justamente, é que surge a necessidade de uma “indústria
cultural” nas sociedades de massas, agindo na esfera da cultura, organizando-a nos
mesmos moldes empresariais das indústrias com o objetivo de vender os seus
produtos.
A Indústria Cultural no Brasil ocorreu juntamente com a industrialização da
classe dominante que despendia grandes somas de dinheiro neste sentido. Era
uma classe voltada em acompanhar a modernidade visual dos meios de massa e,
de interesses concretos dos empresários em atuarem em dois campos: cultural e
econômico. Neste período o meio cinema ainda era incipiente, pouco difuso entre as
massas, mas sua foa e fascínio eram conhecidos pela classe dominante, onde
muitos de seus representantes eram membros do IPES, que se valendo da força do
meio e de seu poder de persuasão, usufruíram dele para a divulgação de sua
campanha política. No campo da cultura, atuavam através do cinema construindo
junto ao público o “produto” que eles desejavam consumir, com as respostas para
seus problemas. No campo econômico, as soluções propagadas para este mesmo
60
público, eram sempre procedentes do progresso econômico do país, pois, deste
modo, a classe dominante viria a alcançar seus objetivos econômicos. Para esta
finalidade, era importante dispor dos meios de coação e de formação de opinião que
exerceria efeito manipulador.
Os pensadores e cientistas sociais alemães da Escola de Frankfurt, entre
eles, Theodor Adorno, Max Horkheimer, Erich Fromm e Herbert Marcuse, se
destacaram pela criação de um conceito que se tornou fundamental para os estudos
culturais e análises de mídia: o conceito da indústria cultural. Pensadores da mesma
linha também são Walter Benjamin e Siegfried Kracauer sobre a crítica da
comunicação. Jürgen Habermas também é um autor que deve ser lembrado,
considerado um herdeiro dos conceitos dos fundadores, não só por seu estudo, hoje
clássico, sobre a esfera pública, como na sua tentativa de criar uma teoria geral da
ação comunicativa.
Os frankfurtianos trataram de diversos assuntos, que compreendia desde os
processos civilizadores modernos e o destino do ser humano na era da técnica, a
política, a arte, a música, a literatura e a vida cotidiana. A partir daí, vieram a
descobrir, a crescente importância dos fenômenos da mídia e da cultura de mercado
na formação do modo de vida contemporâneo. Reunidos tinham um projeto filosófico
e político de elaborar uma ampla teoria crítica da sociedade. Para estes pensadores,
as comunicações adquirem sentido em relação ao todo social, como uma
mediação e por isso, precisam ser estudadas diante do processo histórico global da
sociedade. Partiram de teses de Marx, Freud e Nietzsche recriando suas idéias de
um modo a elucidar, as novas realidades surgidas no século XX junto ao
desenvolvimento do capitalismo.
61
Adorno e Horkheimer criaram o conceito de indústria cultural e propuseram as
linhas gerais de sua crítica ao evidenciar o que chamaram de Dialética do
Iluminismo. Em 1944, acontecia a segunda grande guerra mundial. A revolução
social tão esperada não acontecera. Na Europa, a barbárie nazista. O socialismo
acabara no despotismo burocrático. Refugiados nos Estados Unidos, os pensadores
perceberam que mesmo os regimes formalmente democráticos seguiam uma
tendência totalitária.
O grupo de pensadores defendeu a idéia de que nas sociedades capitalistas
avançadas, a população é mobilizada a se engajar nas tarefas necessárias a
manutenção do sistema econômico e social através do consumo estético
massificado, articulado pela indústria cultural.
Ocorria assim à deserção individual através da exploração mercantil da
cultura e dos processos de formação da consciência, uma ideologia que não
propunha a discussão, mas sim a despolitização do sujeito, ou seja, ao invés do
conteúdo cultural libertar o sujeito e torná-lo crítico e emancipado, o sujeito colocado
frente às várias formas de manipulação, seguia para a dominação, onde as
comunicações agiam a serviço da ordem social dominante. E neste sentido, agiu o
IPES através dos mass media e do cinema, doutrinando e manipulando a opinião
pública convencendo-a, que somente a manutenção do sistema capitalista ou o que
eles preferiam chamar de progresso social e desenvolvimento econômico, traria as
soluções para os problemas sociais e econômicos do Brasil gerando grandes
benefícios a todos.
É importante destacar que para os frankfurtianos a Dialética do Iluminismo
significava que, nos tempos modernos o indivíduo seria um ser livre e distinto, capaz
de construir uma sociedade de vida justa e de realização pessoal. Porém, a
62
modernidade criou um projeto coletivo, onde o objetivo era libertar o indivíduo das
autoridades míticas e das opressões sociais através de sua capacidade de
autodeterminação, vinculadas ao poder de decisão de compra, ou seja, a liberdade
dada ao indivíduo é a possibilidade do consumo de produtos voltados à massa.
Sim, voltados às massas, que essa “igualdade” de consumo entre proletariado e
burguesia jamais de fato foi igualitária, porque o poder de compra da massa
corresponde ao baixo poder aquisitivo que ela possui.
Contradições internas e vários problemas mostram-se através do século
passado sobre este projeto, que estão na base de conflitos sociais e na esfera
política, das crises econômicas, da angústia coletiva e dos sofrimentos existenciais
vividos pela massa. Isto significa que o progresso econômico, científico e
tecnológico do sistema capitalista, não pode ser separado a outras novas sujeições,
que fez surgir novas patologias culturais em diversas camadas da sociedade onde
os interesses sistêmicos tornam-se fortes e predominam socialmente.
(...) Numa situação injusta, a impotência e a dirigibilidade da massa aumentam com
a quantidade de bens a ela destinados. (...) A enxurrada de informações precisas e
diversas assépticas desperta e idiotiza as pessoas ao mesmo tempo.
(HOHEFELDT, MARTINO e FRANCA, IN: RÜDIGER, 2001, p.134)
O aumento da produtividade econômica que por um lado produz condições
para um mundo mais justo e “democrático”, confere por outro lado ao aparelho
técnico e aos grupos sociais que o controlam, uma superioridade imensa sobre o
resto da população. O indivíduo se completamente anulado em face dos poderes
econômicos. Exatamente o resultado que a classe dominante, como os membros do
IPES esperavam, assim, exercendo de fato controle sobre a grande parte da
sociedade.
63
O capitalismo criou condições para a democratização da cultura, ao tornar os
bens culturais objeto de produção industrial e a distribuição em massa de discos,
filmes e impressos, embora as experiências estéticas em circulação fossem pobres
devido à exploração desses meios pelo capital. Porém, os pensadores acreditavam
que as massas pudessem ir mais longe num processo de conscientização e assim,
dirigir os meios de produção desses bens de acordo com seus ideais de sociedade.
As fantasias estúpidas e irreais do cinema são devaneios da sociedade,
principalmente porque os colocam em primeiro plano como de fato o são e porque,
assim, dão forma a desejos que, noutras ocasiões, são reprimidos. (HOHEFELDT,
MARTINO e FRANCA, IN: RÜDIGER, 2001, p.136)
Filmes mediados pelo meio cinema, como é o caso de nosso objeto de
estudo, faz o espectador pensar que o que é projetado se realizou de fato, mas se
realiza somente enquanto imagem e projeção. E deste aspecto se apropriou o
IPES, que propunha em seus filmes as soluções para os problemas de ordem
política, econômica e social no início da década de 60 no Brasil.
Walter Benjamin desenvolveu uma famosa tese muito citada na área de
comunicação: “A obra de arte na era de suas técnicas de reprodução”, onde trata da
perda da aura da obra de arte, após surgirem várias técnicas de reprodutibilidade: a
fotografia, o cinema, o rádio, o aparelho de videocassete, videojogos. Para ele, o
filme, o vídeo e o CD, diferentemente da pintura, do teatro e da música, não são em
si obras de arte, pois, passam a existir para o público após a imprensa, de forma que
a palavra, o som e a imagem dotados ou não de aspectos estéticos são
processados e reproduzidos.
As técnicas de reprodução destacam do domínio da tradição o objeto reproduzido.
Na medida em que essas técnicas permitem à reprodução vir ao encontro do
espectador, em todas as situações, elas atualizam o objeto reproduzido. Esses dois
processos resultam em um violento abalo da tradição, que constitui o reverso da
64
crise atual e a renovação da humanidade. Eles se relacionam intimamente com os
movimentos da massa, em nossos dias. Seu agente mais poderoso é o cinema.
Sua função social não é concebível, mesmo em seus traços mais positivos, e
precisamente neles, sem lado destrutivo e catártico: a liquidação do valor
tradicional do patrimônio da cultura. (HOHEFELDT, MARTINO e FRANCA. IN:
RÜDIGER, 2001, p.136)
Na reprodução em série da música, da pintura, da palavra, das artes visuais
como o cinema, a cultura virou expressão cotidiana, estabelecendo um sistema
industrial entre a arte, de modo que a sobrevivência das massas estava conexa aos
meios técnicos, num processo de reeducação, padronização e endoutrinamento.
Adorno levantou outra questão diferente aos pensamentos de Benjamin e
Kracauer, a seu ver, a intencionalidade de democratização da cultura através dos
meios de comunicação era na verdade uma hipocrisia, que este processo seria
contido e controlado pela a exploração capitalista e que estes meios foram
colocados a serviço de uma indústria cultural.
Experiências soviéticas foram feitas com o cinema, rádio e artes gráficas logo
após a revolução, que fez compreender de maneira mais clara as tecnologias de
comunicação de modo a promover transformações nas produções e consumo das
artes, desde que a massa tomasse o controle dos meios de produção, e assim,
acabasse com os privilégios que antes e durante muito tempo foi só da classe
dominante. Para estes pensadores o capitalismo havia criado condições para a
democratização da cultura, tornando os bens culturais objeto de produção industrial.
Por isso, acreditavam que as massas caminhassem mais longe no seu processo de
conscientização e, ao fazer a revolução, pudessem de acordo com sua vontade
controlar e dirigir os meios de produção cultural. Porém, não foi isso que de fato
ocorreu, mas sim que os meios começaram a controlar e dirigir as massas de acordo
com interesses capitalistas. No entanto, é perceptível que em um momento latente
de agitação social e política que vivia o Brasil, onde a Indústria Cultural começava a
65
ganhar força e a desenvolver-se, o IPES utilizou os meios de comunicação e atuou
fortemente através cinema, num processo de controle e manipulação da opinião
pública.
Não o julgamento da opinião pública, como também o dos próprios sábios,
tende indiscutivelmente a colocar em primeiro lugar as ciências consagradas pela
apreciação de uma humanidade degrada pela domesticação, despida de
sentimentos e apoiada somente nos valores comerciais. (LORENZ, 1974, p.122)
A conversão da cultura em mercadoria de acordo com Horkheimer, Adorno,
Marcuse e outros se referiam ao termo de Indústria Cultural, pois, era o processo de
subordinação da consciência à racionalidade capitalista, ou seja, a produção cultural
e intelectual passava a ser orientada em função de sua possibilidade de consumo no
mercado. A princípio, o que ocorreu foram adaptações das produções de obras de
arte segundo um padrão de gosto bem-sucedido, na qual técnicas foram
desenvolvidas para colocá-las no mercado. Desta forma a “civilização” da sociedade
era feita pela publicidade, utilizada como ferramenta estética da produção mercantil,
justamente em um momento que a produção cultural era forçada a passar pelo filtro
da mídia. Assim, a produção estética se junta à produção mercantil, onde surge a
idéia de que, o que somos depende dos bens que podemos comprar e dos modelos
de conduta veiculados pelos meios de comunicação, o que faz gerar maior
produção, que gera maior consumo. Desta forma, os frankfurdianos tiveram a
primeira visão, que a família, a escola e depois a religião, estavam perdendo
influência social para os meios de comunicação.
66
2.3 A Influência da Indústria Cultural no Desenvolvimento Econômico, Político
e Social do Brasil
Habermas discutia como a publicidade conduzia a opinião pública, através
das relações públicas, do contato entre emissor – destinatário, pelos meios de
comunicação de massa, conseguindo na esfera pública pretextos específicos que
mobilizavam os meios de comunicação na produção ou criação de notícias.
Tratando deste mesmo assunto sobre o aspecto brasileiro Renato Ortiz relata em
seu livro “A Moderna Tradição Brasileira” (1988), como aconteceu a evolução dos
meios de comunicação e a transformação destes meios em cultura de mercado.
No Brasil, é em 1940 que acontece a chamada “sociedade de massa”, pois, é
neste momento que se consolida uma sociedade urbano-industrial. É em conjunto
com esta nova reestruturação da sociedade, com o crescimento da industrialização
e da urbanização, da expansão da classe operária e das classes médias, junto ao
aumento populacional que se desenvolve nas grandes cidades um período moderno,
que redefine os meios de comunicação como meios de comunicação de massa.
No Brasil, desde 1922, o rádio havia sido introduzido, mas é somente em
1935 que este meio se organiza em termos comerciais. Nesta fase que discorre até
a década de 40, com o rádio surgem espetáculos como os programas de auditório,
músicas variadas e especialmente a rádio-novela. É também neste período, das
décadas de 40 e 50 que o cinema ganha maior espaço de consumo, principalmente
com a presença de filmes americanos, que após o fim da II Grande Guerra Mundial
dominaram o mercado cinematográfico.
67
No final da década de 40 o mercado de publicações se ampliou em número
de tiragens, de jornais, de revistas e livros devido ao aumento da importação de
papel.
Nos anos 50 se multiplicaram os empreendimentos culturais de cunho
empresarial, como a introdução da televisão na cidade de São Paulo, seguido dos
mercados do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre.
Acompanhando todo este desenvolvimento, cresceu também a atividade
publicitária, que se implantou no Brasil através das empresas e grandes agências
multinacionais como a Thompson, Standard Propaganda, McCann-Erikson,
Interamericana, entre outras. Momento em que também foram formadas as
primeiras entidades comerciais desta área, em decorrência disto, na década de 30,
se consolidou o comércio lojista, do acesso ao crediário, da comercialização de
imóveis.
Os meios de comunicação de massa no período das décadas de 40 e 50
passavam por grandes dificuldades técnicas. Os cinemas do país, além de terem
poucas salas exibidoras, mais da metade delas funcionavam irregularmente. O rádio
mesmo sendo o meio de comunicação mais popular, encontrava problemas de
expansão devido ao subdesenvolvimento da sociedade brasileira. O mesmo cabe a
televisão, que embora implantada em 1950 conservou durante toda a década, uma
estrutura pouco compatível com a lógica comercial.
No período do Estado Novo na década de 30, o ex-presidente Getúlio Vargas
tinha uma proposta de unificação política, que era um dado importante na formação
do Estado Nacional, mas que dificilmente se confundiria com uma integração
nacional nos moldes de uma sociedade de massa, que era uma revolução que
atribuía à elite dominante (oligárquica) um projeto político e apostava na unificação
68
da área da cultura na esfera educacional, com a ideologia da educação moral e
cívica, disciplina que foi implantada nas escolas e tinha como pressuposto, a função
de construir a nacionalidade através da atividade pedagógica, diferentemente dos
estados europeus, que procuravam através da escola integrar os que estavam
distante do “centro” da ordem burguesa. Este aspecto nos mostra que a propaganda
política e a utilização dos meios de comunicação na sua divulgação, era um
questão latente no Brasil desde o Estado Novo, que tinha a idéia da construção da
nacionalidade onde Gustavo Capanema Filho, Ministro da Educação idealizava um
departamento de propaganda com o objetivo de “atingir a todas as camadas
populares”. Instrumento que deveria ser um aparelho de grande alcance, dotado de
forte poder de irradiação e infiltração, tendo a função de esclarecimento, preparo e
orientação, ou seja, a implantação da “cultura de massas”. E a proposta ganhou
força com a criação do DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda, que buscou
intervir diretamente nos meios de grande alcance como o cinema e o rádio. O
cinema era pensado por Capanema como transmissor de um “simples meio de
diversão”, em aparelho pedagógico. Havia o mesmo conceito em relação ao rádio.
A intenção de Vargas era uma política conduzida pelos meios de
comunicação de massa. Quanto ao cinema, o ex-presidente se recusava a construir
uma indústria cinematográfica nacional, no entanto, criou apenas o Instituto Nacional
do Cinema Educativo, cuja expressão junto à população era nula.
O governo de Getúlio tinha uma forte tendência centralizadora. Razões
econômicas impediam o estado de assumir gastos para a ampliação da
radiodifusão, assim, teve que compor forças com o capital privado, procedente de
faturamento publicitário, como era o caso do funcionamento da Rádio Nacional, que
operava praticamente como uma emissora privada, embora pertencesse ao Estado,
69
com uma programação formada entre música popular, rádioteatro e programas de
auditório, mas com a dificuldade de se construir uma rede radiofônica, o meio
funcionava de forma local.
(...) o crescente desenvolvimento da sociedade industrial se consolida e se
expande ao implementar as empresas, que passam a gerir suas atividades a partir
de uma estratégia de cálculo que busca maximizar os ganhos a serem atingidos.
(ORTIZ, 1988).
A partir da estratégia de lucro objetivada pelas empresas capitalistas,
justamente, é que surge a necessidade de uma “Indústria Cultural” nas sociedades
de massas, agindo na esfera da cultura, organizando-a nos mesmos moldes
empresariais das indústrias com o objetivo de vender produtos. Para alcançar as
metas de ganhos propostas, surge a economia que havia nascido num mesmo
momento, junto à estatística, na defesa da administração e negócios públicos,
dirigidas para a avaliação de ganhos. Aumentavam os anunciantes, que eram as
empresas voltadas ao ganho de capital, e estes anunciantes não eram somente
vendedores de produtos, mas também produtores de cultura, que ditavam modos
comportamentais e costumes no Brasil.
As décadas de 40 e 50 foi um momento de grande efervescência cultural na
cidade de São Paulo. Ocorreram fundações de museus, teatros, a Bienal,
companhias cinematográficas como a Vera Cruz. A criação da TV Tupi, da TV
Paulista, da TV Record e a introdução da fotonovela no Brasil. O lançamento da
revista Manchete. O despontar da primeira escola de propaganda a Casper Líbero.
Fatos que ocorreram com a industrialização da burguesia, que não se apoiava mais
nos moldes aristocráticos de cultura e que despendia grandes somas de dinheiro
neste sentido. Era uma classe dominante voltada em acompanhar a modernidade
visual dos meios de massa e, de interesses concretos dos empresários em atuarem
70
em dois campos: cultural e econômico. Porém, mesmo com toda esta
movimentação para a consolidação de uma “Indústria Cultural”, o que o Brasil vivia
ainda era um momento incipiente de precariedade técnicas, um período
amadorístico e não profissional de acordo com testemunhos de quem viveu esta
fase
21
. Era um período de “experimentalismo” nos meios de comunicação de
massa. O que ocorria neste período entre as décadas de 40 e 50, e parte de 60, era
uma experimentação de novidades, período no qual surgiu o Cinema Novo. Era uma
época de movimento particular na história brasileira.
A sociedade de consumo, de mercado e de bens culturais somente se
consolida na metade das décadas de 60 a 70. A televisão se concretizou como
veículo de massa em meados de 60, o mesmo aconteceu com as outras esferas da
cultura popular de massa, como a indústria do disco, editorial e publicidade, com isto
cresceram também as agências de propaganda. O desenvolvimento das atividades
profissionais ligadas à propaganda ganhou novas escolas de nível superior. A partir
daí, surgiram os serviços especializados em medir a eficiência dos meios de
comunicação e o retorno do investimento feito pelos anunciantes, com institutos
voltados a pesquisa mercadológica e de audiência tais como o Ibope, IVC, Gallup,
Auti-TV, Nielsen e outros.
O cinema nacional se consolidou como indústria nos anos 70. Este
aspecto comprava nossa hipótese, de que o cinema era um meio restrito e de pouco
acesso, embora tivesse progredido com o Cinema Novo no início da década de 60,
ainda não tinha alcançado o grande público.
É em 1964, após o golpe de estado no Brasil, que o Regime Militar toma
medidas às quais os economistas se referem como “a segunda revolução industrial
21
Ver Ortiz, 1988.
71
no Brasil” (a primeira teria sido no governo de Kubitschek) e o que o autor Renato
Ortiz (1988) chama de um “capitalismo tardio”. O capital se internacionalizou e a
economia brasileira se reorganizou de acordo com os interesses pelo qual havia sido
fomentado, ocorrido e nascido o golpe junto ao regime militar. As conseqüências
imediatas foram: o crescimento do parque industrial, do mercado interno e de bens
materiais, que fortaleceram a Indústria Cultural no mercado e produção de bens
culturais, comandada por homens que administravam diversos setores empresariais,
desde a área da indústria cultural até a indústria propriamente dita. Os mesmos que
produziam, eram os mesmos que vendiam seus produtos através da Indústria
Cultural. A lógica comercial era dominante e suprema, capaz de neutralizar questões
de cunho político, além de determinar os espaços e as formas de manifestações
culturais, confirmando o pensamento dos frankfurtianos, pois assim, ocorria à
deserção individual através da exploração mercantil da cultura e dos processos de
formação de consciência. Uma ideologia que não propunha a discussão, onde a
maioria dos indivíduos colocados frente às várias formas de manipulação,
sobrevinha para a dominação, onde as comunicações agiram a serviço de uma
ordem social dominante, como planejou o IPES.
Os meios de comunicação de massa ganham importância por sua capacidade
de fundir idéias, de se comunicar diretamente com as massas, e, sobretudo sobre a
capacidade que têm de criar estados emocionais coletivos, razões fundamentais
para a venda de produtos.
O pensamento dos teóricos da Escola de Frankfurt, assim se ratificava, onde
numa sociedade de consumo, a cultura se torna mercadoria seja para aquele que a
fabrica ou aquele que a consome, e como afirma Ortiz: “Na medida em que a
sociedade avançada é caracterizada pela regressão da audição, isto é, pela
72
incapacidade de reconhecer o novo, produtores e consumidores fariam parte de um
mesmo pólo, reforçando o sistema de dominação social” (ORTIZ, 1988). A situação
almejada através da forte campanha de propaganda política criada pelo IPES, onde
seus membros objetivam transpor o poder privado ao poder político direcionado aos
seus interesses capitalistas.
O que é interessante ao nosso estudo, a partir daí, é perceber como o Golpe
Militar no Brasil foi articulado e fundamentado por empresários tanto da indústria
quanto da cultura ou ambos. Os detentores de grandes meios de comunicação de
massa após o golpe, foram beneficiados com diversos incentivos.
É importante salientar que a Indústria Cultural, mesmo sendo fruto de
transformações econômicas, se adapta de acordo com a movimentação da
sociedade, que pode perceber e receber a cultura como um espaço de luta e de
distinção social ou não, e se colocar num estado de hegemonia e passividade. O
que reforça o aspecto de integração da ordem social, objetivada pelo IPES e seus
membros e que se torna evidente ao analisar os filmes de sua produção, assim,
eliminando antagonismos que gera um processo de despolitização.
2.5 Fascinação para o Emprego de Ideologia
Uma hegemonia está sendo atacada. É um desafio perigoso, pois o cinema tem
visceral necessidade desse poder físico de persuadir, quase de hipnotizar. Se ele
perde este elo invisível, perde sua essência, talvez sua razão de ser.
(CARRIÈRRE, 1983, p. 76).
Prosseguimos nosso estudo na argumentação em torno de nossas hipóteses
e questionamos se o cinema foi o meio escolhido pelo IPES supostamente, por ser o
meio mais eficiente e direto de propaganda naquele período, uma vez que o cinema
73
diante do fascínio que causa no espectador possui um grande apelo emocional e
manipulador. Naquele momento, o fator novidade reforçava a força deste meio, que
era pouco difundido entre o público de massa, atuando sobre a platéia que estava
sensibilizada com as temáticas apresentadas nos filmes do IPES, que se voltava aos
problemas de ordem social, política e econômica que vivia o Brasil.
Devido à grande fascinação que o cinema é capaz de causar sobre o público
espectador, este meio tem a capacidade de operar na subjetividade em função de
determinadas formações sociais e ideológicas, como é o caso do nosso objeto de
estudo. O cinema pode colocar questões ao inconsciente, de modo a estruturar as
formas de ver e o prazer de olhar.
Tratando de filmes de propaganda política, não podemos deixar de citar os
filmes soviéticos e alemães que também serviram de inspiração as técnicas
utilizadas por Manzon. Os filmes russos desde a sua história tiveram seu conteúdo
marcado pela política, que ao passar do tempo após a revolução marcada por muito
ódio e violência, deram lugar a filmes que se tornaram símbolos nacionais, onde
Lênin era representado como uma pessoa doce e gentil. Cinema que contou com
nomes como Edouard Tissé, Lev Kuleshov, Eisenstein, Dovjenko, Yukevitch,
Kozintzev, Trauberg, Pudovkin entre outros. Alguns destes vindos do teatro e da
pintura para o cinema revolucionário. O objetivo dos filmes era guiar os processos
mentais do espectador proclamando a necessidade da revolução, através do
conteúdo das imagens montadas e combinadas de forma coerente ao seu objetivo,
numa realidade construída na mesa de montagem. Filmes que geraram polêmica e
especulações, sobre o estímulo e uso de técnicas de lavagem cerebral e
sugestionamento das massas.
74
“Era arte propagandística dizendo respeito e se dirigindo ao proletariado com
um sentido quase brutal de orgulho e comunidade de sentimentos” (FURHAMMAR
L.; ISAKSSON F., 1976, p.16). Segundo estes autores, a opinião de Lênin, era que o
cinema deveria ser a maior e mais importante expressão artística atuando na
construção da realidade, na criação de uma nova sociedade dirigida ao socialismo.
O cinema de propaganda alemã de Goebbels e Hitler era também dirigido às
massas e tinha mais características de violência do que sedução, sempre com o
objetivo de desmoralizar o inimigo. Enalteciam o exército alemão com
demonstrações de sua força através de seus tanques de guerra, dos homens
uniformizados gritando seus slogans. O principal diretor dos filmes nazistas Joseph
Goebbles afirmou: “Estamos convencidos, que o cinema constitui um dos meios
mais modernos e científicos de influenciar massas. Um governo não pode, portanto,
menospreza-lo” (FURHAMMAR L.; ISAKSSON F., 1976, p.39).
Os filmes nazistas eram criados com base na situação política da época e os
inimigos russos e poloneses nunca eram representados na forma humana natural.
Durante a última fase do Reich, Goebbels adotou outra técnica ideológica e assumia
nos filmes as dificuldades de uma possível derrota alemã, o que seria inaceitável
para este povo, desta forma, conseguiu grande entusiasmo da platéia, insuflando o
clima total de guerra.
Jean - Claude Carrièrre em A linguagem secreta do cinema (1983) relata:
A rede de imagens que nos cerca é tão densa, tecida de forma tão intrincada, que é
quase impossível não ceder a uma espécie de indolência mental, uma sonolência
intelectual que permite a invasão de mentiras (invasão e mentiras que podem
embasar algum tipo de ideologia grifo meu). A verdade” de uma foto, ou de um
cinejornal, ou de qualquer tipo de relato, é, obviamente, bastante relativa, porque
nós vemos o que a mera vê, ouvimos o que nos dizem. (CARRIÈRRE,
1983, p.58)
75
O IPES se aproveitou da força que o cinema foi capaz de exercer em
determinada época, justamente no mesmo período no qual o Instituto entrou em
ação com sua propaganda política:
“O cinema pode (ou pôde em certa época) literalmente nos possuir: ele se apodera
de nós, nos domina e manipula; e ainda nos absorve, nos ilude. Aqui temos um
paradoxo. O cinema faz uso da ilusão precisamente por ser uma seqüência de
fotografias posta em movimento, sonorizadas e então projetadas em uma
determinada área; precisamente por ser uma arte baseada na realidade, como se,
ao explorar a ilusão, ele reconhecesse sua inabilidade em compreender e
reconstruir essa estranha realidade que até os cientistas hesitam em nomear”
(CARRIÈRRE, 1983, p.76).
Compreendemos o que Jean-Claude nos relata, como determinadas técnicas
são empregadas de forma a dar sentido a imagens como virtuais ou sintéticas, que
não representam à realidade, mas sim, uma construção matemática, originada de
uma determinada ideologia. E, assim o autor explica:
Um espectador atento pode dizer, observando a seleção feita pelo produtor, se ele
é pró ou contra o partido político que está cobrindo um determinado dia. No
entanto, para todos os efeitos, o produtor simplesmente fez seu trabalho. Não
distorceu a realidade, selecionou fragmentos dela. (CARRIÈRRE, 1983, p.61)
O poder realista da fotografia de cinema pode ser enganoso. Serão os nossos
descendentes, mesmos os mais atentos, capazes de distinguir os verdadeiros filmes
“ao vivo” das imposturas organizadas, como as que caracterizam os filmes de
propagandas; das simulações, nas quais atores e personagens reais são muitas
vezes canhestramente confundidos; dos espetáculos grandiosos montados em torno
de um acontecimento verdadeiro (...).” (CARRIÈRRE, 1983, p.62)
O IPES aproveitou do cine-documentário como forma de propaganda política,
onde em determinados filmes, basta um olhar mais crítico sobre o que é
apresentado e logo é perceptível o uso de atores ou ao menos de cenas ensaiadas
76
e simuladas, que criaram um efeito realista. Estes aspectos contribuem com o nosso
estudo, uma vez que o IPES se apropriava dos momentos de distúrbios sociais em
que vivia o país, e assim, produzia um roteiro fílmico baseado nestes fatos e
expunha suas intenções políticas em torno desta problemática.
(...) a descrição cinematográfica da realidade é para o homem moderno
infinitamente mais significativa que a pictórica, porque ela lhe oferece o que temos
o direito de exigir da arte: um aspecto da realidade livre de qualquer manipulação
pelos aparelhos, precisamente graças ao procedimento de penetrar, com os
aparelhos, no âmago da realidade. (BENAJAMIN, 1994, p.187)
A respeito do fascínio que o cinema é capaz de produzir sobre o espectador,
Freud cita que uma das formas do prazer em olhar é a escopofilia, o simples prazer
no ato de olhar, da mesma forma que inversamente existe o prazer em ser olhado.
Desta forma, o cinema dominante e os propósitos ao qual ele se desenvolveu,
sugerem um mundo hermeticamente fechado que se desenrola magicamente,
indiferente a presença da platéia, produzindo aos espectadores um sentido de
separação e assim brinca com suas fantasias voyeyristas. E não apenas isso, o
ambiente em que é projetada a imagem contribui em muito para esta fascinação e
do prazer em olhar. O contraste extremo entre a escuridão do auditório, que
colabora para o isolamento entre os espectadores um dos outros, o brilho das
formas de luz e sombra na tela. Ainda que o filme esteja realmente sendo mostrado,
esteja para ser visto, este ambiente de projeção e as formas narrativas dão ao
espectador, a ilusão de um rápido espionar num mundo privado. Além disso, a
própria posição dos espectadores, sentados passivamente em suas cadeiras, é
caracterizada como uma forma de repressão aos seus atos voyeristas, a projeção do
ator, do desejo reprimido, de querer e desejar o que é exibido na tela.
77
É com base neste fascínio que o cinema possuí, que os filmes sob direção do
IPES e produção de Jean Manzon, mostravam o que o espectador desejava para si.
Os produtos criados pela classe dominante, que seriam frutos das privatizações, das
relações multinacionais empresariais, dos sindicatos criados com base na ordem,
produtos simbólicos que seriam capazes de lhes dar melhores condições sociais de
vida. Uma vez que o cinema tem o poder de trazer ao espectador aspectos de
realidade.
O filme serve para exercitar o homem nas novas percepções e reações exigidas
por um aparelho técnico cujo papel cresce cada vez mais em sua vida cotidiana.
Fazer do gigantesco aparelho técnico do nosso tempo o objeto das intervenções
humanas é essa a tarefa histórica cuja realização ao cinema o seu verdadeiro
sentido. (BENJAMIN, 1994, p. 174)
O cinema traz ao homem novas percepções do mundo, atuando como uma
ferramenta histórica para esta passagem, de acordo com determinados interesses e
ideais, da mesma forma como intencionava o IPES e seus membros, através da
democracia representativa na sobrevivência do Estado Liberal, almejavam ter todas
as partes operando para o pleno funcionamento do sistema econômico e capitalista,
gerador de grandes lucros.
(...) a estética, como o dico, retira-nos do estado prosaico, racional utilitário,
para nos colocar em transe, tanto em ressonância, empatia, harmonia, tanto em
fervor, comunhão, exaltação. Coloca-nos em estado de graça, em que nosso ser e
o mundo são mutuamente transfigurados, que podemos chamar de estado poético.
(MORIN, 2005, p.135)
O cinema é então oferecido como distração através da arte. A arte e sua
capacidade de mobilizar as massas na busca por distração, numa tentativa de se
libertarem de uma sociedade capitalista e utilitária, que as aprisionam numa árdua
labuta.
78
CAPÍTULO 3 – OS FILMES
3.1 A Câmera e o Registro da Realidade Fílmica
A recepção através da distração, que se observa crescentemente em todos os
domínios da arte e constituí o sintoma de transformações profundas nas estruturas
perceptivas, tem no cinema o seu cenário privilegiado (...). É justamente o que
acontece no cinema, através do efeito de choque de suas seqüências de imagens.
O cinema se revela assim, também desse ponto de vista, o objeto atualmente mais
importante daquela ciência da percepção que os gregos chamavam de estética
(BENJAMIN, 1994, p.194)
Na transcrição acima da obra de Benjamin, podemos constatar que os
recursos técnicos cinematográficos e o poder da câmera são capazes de gerar
grandes efeitos na percepção do público. Para analisar os filmes do IPES e entender
sua construção, nos propomos a estudar as técnicas modernas de corte, luz,
câmeras, zoom e planos empregados por Jean Manzon. Sob a suposição que estes
recursos foram capazes de algum modo, influenciar a opinião pública para o objetivo
político do Instituto.
Para nos ajudar a esclarecer sobre questões que tratam de técnicas de
filmagem, contamos com a obra do autor Marcel Martin em seu livro “A Linguagem
Cinematográfica” (2003), que nos deu base para o entendimento destas cnicas na
análise dos curtas-metragens produzidos por Jean Manzon com direção do IPES,
autor explica:
(...) Durante muito tempo a câmera permaneceu fixa, numa imobilidade que
correspondia ao ponto de vista do “regente de orquestra” assistindo a uma
representação teatral. Essa foi a regra implícita, a da unidade de ponto de vista,
que guiou Méliès. (MARTIN, 2003, p.30)
79
Este ponto de vista sofreu uma modificação em 1896, quando o travelling foi
espontaneamente inventado por um operador da Lumière, que havia colocado sua
câmera sobre uma gôndola em Veneza. Porém, foi um inglês, G.A. Smith,
representante de “a escola de Brighton”, que a partir de 1900, libertou a câmera de
sua posição estática, modificando o ponto de vista de uma mesma cena de um plano
a outro.
Um certo número de fatores cria e condiciona a expressividade da imagem. Esses
fatores são numa ordem que vai do estático ao dinâmico: os enquadramentos, os
diversos tipos de planos, os ângulos de filmagem, os movimentos de câmera.
(MARTIN, 2003, p.35)
Um destes fatores que constitui o enquadramento da participação criadora da
câmera, no registro que faz da realidade exterior para transformá-la em matéria
artística. Trata-se aqui da composição do conteúdo da imagem, isto é, da maneira
como o diretor decupa e eventualmente organiza o fragmento de realidade
apresentado à objetiva, que assim irá aparecer na tela: “A câmera torna-se móvel
como o olho humano, como o olho do espectador ou do herói do filme. A partir de
então, a filmadora é uma criatura móvel, ativa, um personagem do drama”.
(MARTIN, 2003, p.31)
O poder da câmera esta, sobretudo, em esquadrinhar as fisionomias, lendo
nelas os dramas mais íntimos. Essa decifração das expressões mais secretas e
fugazes é um dos fatores determinantes do fascínio que o cinema exerce sobre o
público, como a elipse, que deixa certos elementos de fora do enquadramento, ou
então, a sinédoque que mostra um detalhe significativo ou simbólico. Outro exemplo
de enquadramento que trabalha com o simbólico é o inclinado, que tem o significado
de exprimir inquietação do personagem. A câmera também joga com a terceira
dimensão, onde se tem a impressão do personagem correr para a câmera, sendo
80
que na verdade, a câmera trabalha com a profundidade de campo até o
personagem.
Os enquadramentos consistem em algumas características das quais vamos
tratar. As mais empregadas por Manzon nos filmes do IPES é acompanhar um
personagem em movimento. Este recurso é bastante visível no filme “Nordeste
problema nº. 1
22
”, quando a câmera através do seu enquadramento, acompanha a
família nordestina no cortejo de uma criança morta devido ao problema da fome. O
mesmo ocorre ao acompanhar os nordestinos que migram para a região sul do
Brasil em busca de trabalho.
Já os planos são condicionados a dar clareza à narrativa, deve ter adequação
de tamanho de acordo com o conteúdo da imagem e ao espectador, o tamanho
necessário para perceber o conteúdo do que esta sendo apresentado. Os planos
mais empregados por Manzon nos filmes são os que capturam a figura humana em
primeiro plano (em inglês close up) de meio busto para cima. O primeiríssimo plano
é quando se enquadra apenas o rosto. Nos filmes do IPES este plano é bastante
empregado, ao exemplo de como ocorre no filme “Nordeste problema . 1” ao
exprimir o sofrimento dos nordestinos através de suas fisionomias. O plano em
detalhe tem a função, como sua própria denominação, diz detalhar partes da figura
humana como boca, olhos, mãos, etc. Recurso também utilizado por Manzon nos
filmes do IPES.
A movimentação da câmera para frente e para trás é chamada de travelling. A
câmera em deslocamento para frente, por exemplo, reforça e valoriza a contribuição
dramática proporcionada pelo primeiro plano. O travelling pode vir carregado de
sentidos. Nos filmes que estamos analisando, está técnica foi utilizada das seguintes
22
Ver sinopse do filme no Anexo A, p.119.
81
formas: na introdução, mostrando onde vai desenrolar a ação e no destaque de um
elemento dramático importante, quando enquadra e determina o objeto de ação.
Este recurso é utilizado por Manzon nos filmes “Que é o IPES
23
e “O Brasil precisa
de você
24
”, quando a câmera caminha para frente e para trás num realce dramático
das figuras estáticas de Adolf Hitler e Fidel Castro.
Outros movimentos que temos da câmera além do travelling, são as
panorâmicas. A panorâmica consiste numa rotação da câmera em torno do seu eixo
vertical ou horizontal. A mais utilizada por Manzon principalmente no final dos
filmes, quando são apresentadas as soluções para o desenvolvimento e progresso
do Brasil. Neste caso, o as panorâmicas descritivas, que exploram um espaço,
desempenhando um papel de conclusão.
Os ângulos de filmagem podem exprimir significações psicológicas precisas.
Os ângulos em plongée e contra-plongée são empregados na maioria dos filmes do
IPES. O contra-plongée (quando a câmera capta o elemento de baixo para cima) é
um ângulo bastante utilizado pelo cineasta Jean Manzon, sempre com o efeito de
mostrar a superioridade dos indivíduos diante de sua luta contra os problemas
sociais e econômicos em que viviam. O plongée e o travelling vertical (quando a
câmera capta o elemento de cima para baixo) têm o efeito de apequenar o indivíduo,
esmagando-o moralmente, oprimindo-o.
Um exemplo claro de como estes ângulos são empregados nas produções de
Jean Manzon é no filme “Que é o IPES”. Em uma animação inserida no filme,
apresenta-se o desenho que representa um homem sendo esmagado, mas na
seqüência seguinte, o desenho mostra vários homens unidos subindo. Nesta
animação o homem imergiu de cima para baixo, sendo esmagado em plongée
23
Ver sinopse do filme no Anexo A, p.93.
24
Ver sinopse do filme no Anexo A, p.117.
82
exatamente como é utilizada esta técnica e depois os vários homens unidos sobem
numa animação em contra-plongée, trazendo o sentido da utilidade da técnica,
retratando a vitória de que unidos conseguirão vencer. Imagens que são reforçadas
pela narração que diz: “Isolados seremos esmagados, unemos nossos esforços”.
Um outro fator importante no cinema é a fotografia (o que o produtor Jean
Manzon sabia utilizar com maestria, pois, antes de ser cineasta, havia começado
sua carreira como fotógrafo). A fotografia tem a função de iluminar as cenas a serem
filmadas e pode ser feita, por meio de refletores e superfícies orientadas para cima
ou para baixo e distribuída de várias formas, em relação à luz natural e a iluminação
artificial mais utilizada do que o público possa perceber.
A fotografia juntamente com as técnicas cinematográficas ao filme a
função de controlar os resultados e os efeitos desejados pelo produtor e diretor.
Podendo contribuir devido na adequação que possuí em produzir inovações de cor e
luminosidade ao filme.
Uma vez que os poderes da instituição cinematográfica, que se reforçam
justamente desse modo, produzem desejos que, no espectador, não são
superficiais nem momentâneos”, vivemos cada situação que o filme nos apresenta
como um estabelecimento de compromisso entre um certo grau de satisfação das
pulsões e um certo grau de conservação das defesas, e portanto de afastamento
da angústia. (COSTA, 1989, p. 26)
O cinema pode além de ser um dispositivo de representação, determinar
papéis, como o do espectador, que se identificando com a câmera, passa desta
forma a cooperar na produção dos efeitos de sentido, que pode ser de estratégia do
autor. Assim ocorria com o IPES no intento de preparar a opinião pública através de
filmes de propaganda política, além de outras ferramentas de propaganda, para um
“novo organismo”, mensagem transmitida através do filme “Que é o IPES”.
83
Jean Manzon empregava todos os recursos que tinha disponível e
conhecimento nos filmes. Através da direção do IPES propunha melhores estruturas
para os ofícios de trabalho, melhorias no transporte ferroviário e portuário, melhores
condições que seriam subsidiadas através de privatizações e da entrada do capital
das empresas multinacionais e associadas, sempre com o atributo para uma melhor
condição de vida. Uma vez que a magia da técnica e da ciência domina o ser
humano pela sujeição do mundo físico, que esta sob o controle e poder dos Estados,
das economias, das indústrias, do capitalismo.
O cinema atuou assim, de forma que, o espaço se ampliasse originariamente
de acordo com o desejo dos que dominavam (e dos dominados). O cinema propôs
uma liberdade, um modo novo de perceber o que se estava ao redor, aos
acontecimentos, que prevaleciam ao universo da ótica. E foi desta maneira que os
seres da noosfera (as idéias, as crenças, os mitos), puderam estar representados
através da magia estética das imagens. “(...) tudo o que remete a estética penetra
em nossas almas, em nossas mentes, em nossas vidas” (MORIN, 2005, p. 135).
3.2 Jean Manzon – O Produtor
O cineasta responsável pela produção de grande parte dos filmes de autoria
do IPES foi Jean Manzon. Francês, nascido em Paris em 1915, sua experiência
como fotografo iniciou-se no jornal Paris Soir em 1934. Atuou na Vu e foi apontado
como um dos melhores jornalistas do grupo de fundadores do seminário Match em
1938. Ingressou no serviço militar durante a II Guerra Mundial em 1939, trabalhando
no serviço cinematográfico da Marinha Francesa. Acompanhou como jornalista a
84
Força Expedicionária Brasileira. Durante a guerra conheceu o cineasta brasileiro
Alberto Cavalcanti e se entusiasmou com a possibilidade de trabalho no Brasil.
No final da década de 1940, Jean Manzon veio para o Brasil trabalhar no DIP
Departamento de Imprensa e Propaganda, durante o governo de Getúlio Vargas,
sendo responsável por produzir material fotográfico para divulgação do Brasil. Foi aí
que Manzon teve o primeiro contato com a situação cio-política-cultural do país.
Após algum tempo, ele foi trabalhar para a revista O Cruzeiro em parceira com
David Nasser. Manzon foi para a revista com o objetivo de trazer um estilo
fotográfico diferente, porém, em 1952, teve um desentendimento com os diretores e
no Rio de Janeiro, fundou sua própria empresa especializada em documentários,
mais tarde transferindo-a para São Paulo a Jean Manzon Films S/A. Continuou a ser
um homem de imagens e na produtora, com ele trabalhavam profissionais europeus
de gabarito, que produziam documentários publicitários e reportagens, o que na
opinião de Manzon era pouco explorado no Brasil.
Manzon registrou a construção de Brasília, da hidrelétrica de Itaiupu e
também da inacabada rodovia Transamazônica. Juscelino Kubitschek tornou-se seu
amigo e assistia a seus filmes, aos domingos, no Palácio das Laranjeiras atraído
pelo foco positivo do Brasil belo que Manzon destacava em suas produções. Jean
Manzon foi responsável pelo arquivo cinematográfico do ex-presidente desde
quando ele era prefeito em Belo Horizonte.
Em 1954, produziu seu primeiro longa-metragem “Samba Fantástico” (que
concorreu ao Festival de Cannes). Em 1958, o filme “A Amazônia” foi premiado na
Bienal Internacional de Veneza. “Uma Canção Brasileira” de 1980 tinha roteirização
de David Nasser. Foi apresentado na China, como um dos primeiros filmes a ser
exibido por lá. O mesmo filme teve também apresentação em Washington.
85
O trabalho fotográfico realizado por Jean Manzon na revista O Cruzeiro teria
continuidade em seus filmes, com imagens que demonstravam a intervenção do
fotógrafo na captação, montagens e cenas simuladas que serviam de base na
manipulação dos procedimentos e também da manipulação política a qual
intencionava o IPES no início da década de 60.
A estrutura ficcional dos filmes feitos para o Instituto era correspondente à
estrutura de filmes publicitários, com encenações, sempre com base numa estória,
desde a construção da mensagem quanto da narração.
Utilizando da magia do cinema e do recurso da técnica, nos filmes
documentários que é objeto deste estudo, produzidos por Jean Manzon, notamos
que ele constrói personagens que vão desde fábricas, ferrovias, hidrelétricas, o
trabalhador proletariado, o garimpeiro, o jangadeiro, os plantadores de cana, os
operários da siderurgia e da indústria têxtil, o ferroviário, o estudante, o empresário,
onde a realidade fílmica é construída desde a pose á lente da câmera.
A fotografia de caráter estática utilizadas por Manzon nos filmes nos a
impressão de movimento quando colocadas em seqüência na montagem fílmica,
que ainda conta com o apoio da narração para contribuir com este efeito. Outra
característica do fotógrafo e cineasta era a utilização de closes na captação das
imagens, sempre para evidenciar algo dando maior dramaticidade as cenas.
“O espírito de compromisso com a realidade o bastou aos seres humanos.
Houve e sempre vontade de dominar a realidade para torná-la suportável, seja
por meio da ciência e da técnica, seja pela magia” (MORIN, 2005, p.152). O final dos
filmes feitos por Manzon terminava sempre com imagens positivas do progresso que
o Brasil sonhava alcançar, que nenhum indivíduo desejaria se identificar com a
86
representação de realidade através da tela do cinema que acabaria de forma
negativa.
Em 1989 Jean Manzon lançou o filme “Brasil, Terra dos Contrastes”,
patrocinado pela Fundação Moinho Santista e destinado a incentivar empresários
internacionais a investir no Brasil. Este filme teve exibição no Linconln Center em
Nova Iorque, EUA.
Ao morrer, em 1990, com 75 anos, terminou sua carreira com 8 mil
quilômetros de filmes, 900 curtas-metragens, quatro longas-metragens e 11 prêmios
cinematográficos. Sua última produção foi o filme “Brasil Novo” que não chegou a
ser concluído.
3.3 Narrativa, Voz e Efeito Sonoro
O cinema é além de fotografia em movimento, som projetado junto à imagem.
Estas são as características dos filmes do IPES, onde músicas eram escolhidas
cuidadosamente como pano de fundo, a fim de conceder a mensagem um tom
dramático.
A voz de Jatobá, que tanta dramaticidade emprestou ao conjunto de filmes do IPES
– Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais foi um casamento perfeito com as
imagens captadas pela câmera do fotógrafo Jean Manzon, considerado o pioneiro
do cinedocumentário brasileiro. (ASSIS, 2001)
Os textos utilizados nos filmes ecoavam nas mentes, quando narrados com
eloqüência por Luiz Jatobá que conduzia com o poder de sua voz, as mensagens
fílmicas produzidas por Jean Manzon com direção do IPES.
87
A voz off aprofunda a diegese, dá-lhe uma dimensão que excede à imagem, e
assim apóia a alegação de que existe um espaço no mundo ficcional o qual a
câmera não registra. A sua própria maneira credita espaço perdido. A voz off é um
som que está de início e prioritariamente a serviço da construção de espaço
efetuada pelo filme e apenas indiretamente a serviço da imagem. Legítima tanto o
que a tela revela da diegese quanto o que a tela esconde. (XAVIER, 1983, p. 465)
A narração dos filmes é feita em voz off, ou seja, ouvimos a voz de um
personagem, ou de um narrador, o qual não é visível ao espectador emprestando
maior dramaticidade a narrativa e ajudando a construir a mensagem fílmica. O
audiovisual é o fator fundamental que envolve o cinema, além, da importante
presença do espectador.
(...) a voz off invisível autoridade externa, possui com freqüência o poder de
apresentar-se com a força auto-evidente de uma objetividade incontestável (...).
(CANEVACCI, 2001. p. 167)
(...) Ela resume-as todas, levando-as a uma manifestação sonora e, por assim
dizer, “visível”: O comentário falado do locutor e de sua autoridade científica fora do
campo (ou às vezes empaticamente também dentro do frame das tomadas) (...).
(CANEVACCI, 2001, p. 163)
Junto à imagem, a voz off é capaz de causar diversos fatores sensoriais a
quem assiste e ouve, construindo verdades e mentiras. Agentes que podem ser
utilizados de forma estratégica, na intenção de criar uma postura diante de
determinados fatos.
“(...) A tecnologia padroniza a relação através do desenvolvimento do
sincronizador, a Moviola, que é a mesa de montagem. Os aparelhos de mixagem
permitem um grande controle sobre o estabelecimento de relação entre diálogo,
música, efeitos sonoros. (XAVIER, 1983, p. 459)
Para criar maior envolvimento entre o filme e o espectador são utilizados
recursos de efeitos sonoros, o diálogo, a narração e a trilha sonora, que compõem a
88
história dando a imagem e som, a impressão de uma unidade. Jean Manzon recorre
destas técnicas que possuem grande força de persuasão.
É importante salientar, que o filme geralmente se baseia em três estruturas
básicas que envolvem: a diegese, o visível e o acústico. A diegese é o espaço que
não tem limite físico, é um espaço virtual construído pelo filme e formado por
características áudio e visuais, além de objetos que podem ser sentidos de outras
maneiras (tátil, olfativo, degustativo). “Com o advento do som os documentaristas
ganharam os recursos adicionais das vozes dos locutores e do acompanhamento
musical e o documentário se tornou ainda mais eficaz como arma política”
(FURHAMMAR L.; ISAKSSON F., 1976, p.146). O visível está no espaço da tela
entre imagem e receptor diferentemente do acústico, que muitas vezes pode dar ao
espectador a impressão de ter vindo da tela (como visível), porque as caixas de som
podem estar atrás dela, desta maneira o som não está “emoldurado”, mas o espaço
acústico da sala de projeção envolve o espectador.
3.4 Luiz Jatobá – O Narrador
Os filmes do IPES que selecionamos para analisar, como já citado, têm
produção de Manzon e locução de Luiz Jatobá que empregava dramaticidade
narrativa ajudando na construção da mensagem fílmica, com narração em voz off.
Luiz Trismegisto Jatobá começou sua carreira em 1935 participando de um
concurso de locutores para a Rádio Jornal do Brasil e, entre centenas de candidatos
passou em primeiro lugar, onde atuou como locutor e sonoplasta. Em 1940, foi
morar nos Estados Unidos, trabalhou na CBS e transmitia o dia-a-dia da II Guerra
89
Mundial. Depois foi contratado pelo famoso jornal Metro Goldwyn Mayer e em Nova
Iorque conheceu Assis Chateaubriand, quando recebeu a proposta para ser âncora
do primeiro telejornal da recém inaugurada TV Tupi. Após isso, foi convidado para
participar do Jornal Vanguarda da extinta TV Excelsior, que mais tarde passou a ser
apresentado em novo formato pela nova emissora TV Globo no Jornal da Verdade.
A conhecida voz de Luiz Jatobá, durante o Estado Novo serviu de locução para o
programa Hora do Brasil.
A magia desenvolveu-se na humanidade arcaica enquanto a ciência e a técnica
começavam a reconhecer e a manipular as coisas. Caracterizada por alguns como
uma prática do “espírito todo-poderoso”, a magia traduz a vontade de
domesticação e de controle da natureza e do sobrenatural. (MORIN, 2005, p.152)
O narrador dos filmes do IPES, Luiz Jatobá, transmitia através da
credibilidade e entonação de sua inconfundível voz, interjeições e timbres diferentes,
de acordo com as situações fílmicas apresentadas juntamente com o
acompanhamento musical escolhido pelo cineasta Jean Manzon, estas técnicas iam,
além disso, pois, atuavam como a representação do que Morin chama do “espírito
todo-poderoso”, trabalhando em prol ao eudoutrinamento das massas.
3.5 Os filmes do IPES
A instituição cinematográfica tem a ver com o desejo, com o imaginário e com o
simbólico; insiste nos jogos de identificação e nos complexos mecanismos que
regulam o funcionamento de nossa psique, de nosso inconsciente. (COSTA, 1989,
p. 25)
Os filmes documentários de autoria do IPES são filmes de propaganda
política, que têm a intenção de persuadir o espectador para um ideal específico. As
90
mensagens fílmicas questionam, relatam fatos, faz afirmações com a finalidade de
coagir o espectador a um consenso único. Em praticamente todos os filmes do IPES
é enaltecida a questão da democracia representativa, realizada através do voto
direto na escolha de um representante para a tomada de decisões, assim,
preservando a sobrevivência do Estado liberal. Este era o ideal propagado pelo
IPES e seus membros, cujo interesse era capitalista. Em suas mensagens, incutia
que a sociedade e os indivíduos teriam seus problemas de ordem social e
econômica solucionados, somente com o progresso e desenvolvimento econômico
do país. O Instituto agiu com o objetivo de tocar a emoção, fazendo com que
espectador aderisse um ideal político, que serviu como força para que o Golpe de
1964 ocorresse sem resistência pela maior parte da sociedade brasileira.
Os filmes do IPES eram exibidos em seções regulares por acordos feitos
entre empresas de distribuição de filmes e donos de cinema ligados ao Instituto.
Visando atingir o público que não tinha condições financeiras para pagar entrada de
cinema o IPES montava projetores em caminhões abertos e ônibus com chassis
especiais, apoiado por grandes montadoras como a CAIO e a Mercedes Bens que
ajudavam com o transporte. Os filmes também eram exibidos aos trabalhadores de
empresas que apoiavam o Instituto. Além disso, as produções eram exibidas em
lugares exclusivos como o Monte Líbano, o Lyons Clube e na Escola de Polícia de
São Paulo. A exibição ainda era feita ao público estudantil através de grêmios e de
faculdades como Mackenzie, entre outras
25
.
O discurso fílmico do IPES é sempre com base na democracia representativa,
que era assim como o Instituto se declarava publicamente para a sociedade, com
“objetivos educacionais e cívicos” e disposto a fortificar o regime democrático no
25
Ver Dreifuss, 1981, p. 251.
91
Brasil”. O que é interessante ao nosso estudo, é analisarmos o que era democracia
para o IPES. O Instituto idealizava um regime de governo democrático
representativo para a sustentação de um Estado Liberal, retirando destes princípios
o que conviesse aos seus interesses.
Para tornar estas evidências mais claras decidimos analisar detalhadamente
uma de suas produções cujo título é “Que é o IPES”, por ser o filme que mais
abrange todas as características que constituem a intenção do Instituto e por esta
razão, ele é citado diversas vezes em nosso estudo.
Os filmes do Instituto possuem todos a mesma estrutura e característica,
apresentam os riscos ou os problemas que o Brasil enfrentava naquele período,
empregando as cenas, forte apelo emocional, onde as imagens vão aos poucos se
abrandando de acordo com as soluções propostas nos filmes, até que eles encerram
sempre com um desfecho positivo diante dos problemas apresentados. O mais
importante é a temática, onde as soluções apresentadas nos filmes referem-se às
ações “democráticas” e ao progresso e desenvolvimento econômico do país, que iria
proporcionar as vantagens econômicas desejadas pela elite dominante, além da re-
estabilização da ordem através da disciplina militar e também da doutrina católica na
resolução dos conflitos sociais.
O que pretendia os membros do Instituto num primeiro momento era que
ocorresse um Golpe de Estado que fosse capaz de resolver os conflitos sociais do
país, afastar do governo o presidente João Goulart com seus planos que levava a
classe dominante e a oficialidade militar a crer que o Brasil caminhava para um
regime socialista, o que contrariava totalmente seus interesses econômicos
capitalistas. Resolvida estas questões e afastando do poder políticos contrários aos
seus ideais (do IPES), promoveriam novas eleições diretas que é o símbolo da
92
democracia representativa, para a escolha de um representante ao governo do
Brasil, que obviamente seria membro da elite dominante e que defenderia seus
interesses singulares.
3.6 Filme: Que é o IPES
O filme inicia tratando de uma relação de dicotomia entre bem e mal, em
planos diferentes é apresentado o mar, serras, árvores, ondas, céu, um menino
empina pipa, a câmera caminha em travelling para a pipa e a cena de um céu claro
vai se fundindo até torna-ser uma nuvem de fumaça preta, ocasionada por bombas
dos regimes totalitários, uma ameaça ao futuro reforçada pela narração: “a terra em
tal maneira é o graciosa que emana um futuro de alegria e de luz”. Em imagens
estáticas, é apresentada a Alemanha e um desfile bélico do exército nazista. O som
baixa e ouve-se sua voz de Hitler discursando. Imagens fortes mostram pessoas
mortas, cruzes, túmulos e ao final do discurso a multidão saúda Hitler, enquanto a
suástica é posta na tela sobre as imagens.
O mapa do Brasil e um ponto de interrogação são apresentados na tela.
Jornais trazem manchetes sobre aumentos de preços de produtos, greves. Atrás das
manchetes a imagem é de uma multidão reunida, exércitos nas ruas e conflitos.
Trabalhadores rurais armados. Homem em palanque fala a uma multidão. Feira e
produtos e seus altos preços, enquadramento com foco nos preços dos produtos.
Narração: “E nós para onde estamos sendo conduzidos? O Brasil vive momentos
difíceis. Manifestações populares tornam-se cada vez mais agressivas. A
inquietação atinge os meios rurais. Os demagogos agitam a opinião pública quando
93
a inflação desenfreada anula os melhores esforços dos brasileiros”. Neste momento
do filme, são abordados os problemas econômicos que vivia o governo João Goulart
como os altos índices inflacionários e os conflitos sociais que tanto incomodava a
oficialidade militar.
Siglas dos partidos políticos são remontadas na tela, e a narração questiona
sempre em 1ª. pessoa do plural: “Sobre a crise econômica e social, desenvolve-se
uma crise política. O governo esta indeciso, para onde irá o regime híbrido?
Vencerão as instituições democráticas no entre choque das ambições
desenfreadas? Para onde vai o regime híbrido?” Pontos de interrogação são
mostrados na tela. “O que estamos fazendo nós para impedir que coloque diante do
povo brasileiro a trágica opção entre soluções anti-democráticas? s intelectuais?
Nós dirigentes? Nós os homens de responsabilidade de comando? Se acreditamos
na democracia e na livre iniciativa não podemos ficar omissos enquanto a situação
se agrava dia a dia”. A palavra omissão cresce na tela, e os dizeres: Omissão é um
crime! Narração: “Omissão é um crime”.
Este trecho do filme é bastante interessante porque é uma clara crítica ao
presidente João Goulart, pois, insinua que o presidente estava omisso, porque
permitia o conflito de idéias, porém estava perdendo o controle sobre eles. Outra
característica que explicita a intenção política do IPES é quando a narração ao
mesmo tempo em que fala em democracia na defesa dos interesses coletivos, fala
também da livre iniciativa que é uma característica do liberalismo, que age em
defesa dos interesses singulares da burguesia e do capital e mais, convoca
justamente os burgueses, dirigentes de empresas e os oficiais militares “homens de
responsabilidade de comando” para por fim ao caos social e para que se trabalhe
em função da livre iniciativa.
94
Num outro momento do filme é mostrada uma animação em desenho de um
homem sendo esmagado, mas logo vários homens unidos sobem. A técnica
empregada nesta animação é a de plongée, onde os homens são filmados de cima
para baixo, no sentido de ser esmagado como geralmente é utilizada a técnica,
depois os homens unidos sobem na animação em contra-plongée, ou seja,
remetendo o sentido de que unidos conseguirão vencer. E reforça a narração:
“Isolados seremos esmagados. Somemos nossos esforços, orientemos”. Na cena
seguinte dois pares de mãos apertam-se em cumprimento. Bandeira Nacional sob
as os. Bandeira Nacional trêmula ao vento. Uma característica muito comum em
filmes documentários de propaganda política é justamente apresentar objetos com
qualidades heróicas e símbolos patrióticos, como empregou o produtor nesta cena e
também em outros filmes do IPES.
Outro aspecto desta tipologia de filme é o contexto da linguagem narrativa
que gera vínculo de coletividade, estabelecendo um elo de comunidade, nação,
povo e a narrativa é colocada em 1ª. pessoa do plural, como no filme que estamos
analisando. Este vínculo no filme é ainda reforçado pela técnica contra-plongée que
traz o sentido de que a população brasileira unida sairia vitoriosa na defesa do país,
representado pela Bandeira Nacional, que símbolos patrióticos são utilizados em
filmes de propaganda política, por possuírem forte apelo emocional.
Na tela é mostrado o mapa do Brasil. Votos na urna. Pessoas votam. Padre
na Igreja abençoa. A câmera novamente em plongée (de cima para baixo) e
caminhando em travelling mostra pessoas, remetendo a idéia de que juntas
possuem força. O enquadramento da câmera acompanha um homem caminhando.
E a narração diz: “Num sentido único a ação dos democratas para que não sejamos
vítimas do totalitarismo. É justamente coordenar os pensamentos, diante daqueles
95
que não querem ficar de braços cruzados, diante da catástrofe que nos ameaça que
é necessário criar um organismo novo, com uma mensagem nova, para a nova
realidade do Brasil de hoje, para uma finalidade básica: evitar que a difícil situação
que o país atravessa venha comprometer nossas instituições democráticas e
tradições cristãs”. Nesta cena do filme é novamente reforçado o elo de povo, de
nação. A questão da igreja católica, que ordem geralmente também esta ligada a
algum sentido religioso, com a finalidade de manter a sociedade operando de acordo
a algum ponto de vista da religião. Desta forma atua a noosfera e a noologia
propostas por Morin, onde os símbolos patrióticos e religiosos agem sob a forma de
“entidades” exercendo grande força e poder sobre os homens no campo ideológico.
Os símbolos patrióticos criam o elo de comunidade perdido entre os cidadãos ao
mesmo tempo em que infantiliza o indivíduo que deve respeitar, servir e obedecer a
pátria “mãe”. “O Estado-nação suscita a sua própria religião, comportando
deificação, culto e sacrifício.” (MORIN, 2005, p.194)
A pátria cria a comunidade entre os indivíduos que, gozando da qualidade de
cidadão, sentem-se no dever sagrado de servir à pátria em perigo. O Estado-nação
democrático submete o indivíduo como cidadão dedicado à sua pátria, não como
sujeito dependente do Estado do Todo-Podereso. A pátria é a religião do cidadão.
(MORIN, 2005, p.194)
Numa outra cena uma panorâmica (quando a câmera mostra do alto)
descreve a atuação do trator, câmera posicionada em plongée, remete o efeito de
rebaixamento onde à locução trata a questão do subdesenvolvimento. A câmera
num realce dramático mostra a fisionomia e a expressão cansada do homem do
campo. Narração: “O IPES não pode ficar em palavras é preciso agir ao mesmo
tempo em que estudar os problemas básicos dos brasileiros na política, na
economia, nas finanças. Dar um conceito novo a democracia, um conceito novo ao
96
desenvolvimento. Levar este conceito aos estudantes, operários e homens do
campo”. Na tela as palavras: democracia = economia, política, social. Em animação
estática a imagem de uma família abraçada e ao fundo imagens de objetos de
desejo de consumo: carros, casa, aparelhos eletrônicos. A palavra inflação é riscada
com um X. Narração: “democracia é inseparável de democracia política, econômica
e social. Desenvolvimento é a elevação do nível de vida da população, é dar um
basta na inflação desenfreada é multiplicar as poupanças e os investimentos em
todos os setores da econômica, é a redistribuição da renda para diminuir as
dificuldades geradoras de conflitos”.
Fomentar métodos que consistem em recompensar o consumidor através de um
nível de vida mais elevado e a “condicioná-lo” de tal maneira que ele continue em
sua desenfreada competição com o próximo, à custa de um esgotamento nervoso
ou de uma hipertensão crescente, é, por parte dos dirigentes capitalistas, uma
política a curto prazo. (LORENZ, 1974, p. 49)
A cena descrita representa que com um aumento no nível de vida da
população, seria possível que as pessoas conquistassem seus objetos de desejo,
isto porque elas estariam mobilizadas através do crescimento industrial, do mercado
interno, dos bens materiais e da indústria cultural, a se empenhar nas tarefas para a
manutenção do sistema econômico, através do consumo massificado e articulado
pela indústria cultural, levando a deserção individual que seguiria para a dominação,
devido a processos de formação de consciência para uma determinada ideologia, o
ambiente propício para a exploração mercantil que aguardava a elite dominante.
E para finalizar o filme é apresentada a figura de um mapa e ao lado a
imagem de uma moeda em imagem estática. Narração: o correto equacionamento
destes problemas é um desafio à capacidade dos responsáveis pelo destino do país.
É apresentado o organograma do IPES e a narração diz: o IPES, portanto, além de
97
nossa colaboração, deverá contar com uma excelente equipe técnica. Imagem em
close de uma boca ao microfone, fotos, jornais sendo produzidos. Narração: uma
série de serviços terá que ser criados para que um único pensamento elaborado
pelo IPES, ganhe força na convicção da maioria do povo. Para isso, precisamos
propagar as soluções democráticas para o grande público. Todos os problemas
devem ser resolvidos dentro da democracia e incrementar as atividades
educacionais em todos os níveis, colaborar com órgãos não governamentais. Última
cena: bandeira estilizada do IPES vai fundindo-se a Bandeira Nacional e a narrativa
diz: a isso se propõe o IPES, cumprirá sua missão? Depende de nós, da minha, da
sua colaboração.
Na cena final, como acontece em todos os filmes do IPES é mostrado a
solução para os problemas abordados, que no caso deste filme é o crescimento
econômico representado pela moeda, da ação do IPES para as propostas ao
desenvolvimento do país, e também da importância de se fazer crer por parte da
maioria do povo, justamente o que o Instituto fez através de sua campanha política e
ideológica. Mais uma vez é empregado o elo de coletividade entre o povo, nação em
1ª. pessoa do plural, representado por um símbolo patriótico, a Bandeira Nacional, o
bem e a união vendendo a possibilidade de vitória a ser conquistada finalizando
onde o bem vence o mal.
3.7 Cinema e Política
A política é então reduzida a um jogo mágico no qual sinais morais inequívocos são
o substituto da ideologia e onde não há lugar para argumentos racionais em meio à
manipulação emocional. A propaganda é particularmente fascinante por sua
orquestração das emoções. Nenhum outro gênero cinematográfico usa uma faixa
tão incrível de artilharia emocional ou joga com tanta desinibição com o registro
98
emocional completo do espectador, do mais superficial ao mais profundo, do mais
primitivo ao mais espiritual. (FURHAMMAR L.; ISAKSSON F., 1976, p.159)
Os filmes de propaganda política atuam inserindo idéias e saberes que
ganham força e poder, o que Edgar Morin
26
denomina de noosfera.
Todas as sociedades humanas engendram uma noosfera, esfera das coisas do
espírito, saberes, crenças, mitos e lendas, idéias onde os seres nascidos do
espírito, gênios, deuses, idéias-força ganham vida a partir da crença e da fé.
(MORIN, 2005, p. 44)
Os seres de espírito multiplicam-se através de mil redes de comunicação
humana, via o discurso, a educação, o endoutrinamento, a palavra, o escrito, a
imagem. “O poder duplicador/multipicador da imprensa, do filme, da televisão,
aumentou e continua a aumentar o potencial reprodutor dos seres de espírito e dos
seus constituintes; aumenta também o caráter disseminador do processo de
multiplicação/reprodução (...). (MORIN, 1991, p. 112)
Os ideais políticos encontram força de persuasão através da comunicação
onde multiplicam suas idéias, capaz de mobilizar massas e condicionar
comportamentos.
Os autores Leif Furhammar e Folke Isaksson na obra “Cinema e Política”
(1976) analisam diversos filmes de propaganda política e ideológica em momentos
importantes da história do século XX. Esta obra nos ajuda a pensar sobre algumas
técnicas cinematográficas persuasivas utilizadas nestes tipos de filmes, de modo a
esclarecer quais destas técnicas também foram usadas pelo produtor Jean Manzon
nos filmes do IPES, cujo alguns trechos serão aqui citados.
Nos anos recentes, realizadores por toda parte têm feito filmes – mesmo políticos –
democráticos no sentido que Bazin deu à palavra, filmes que questionam em vez
26
MORIN, Edgar. O Método V – A Humanidade da Humanidade. Porto Alegre: Sulina, 2005, p. 44.
99
de afirmar, relatam em vez de sugerir, procuram em vez de dirigir. Mas a
propaganda seguiu o caminho de Eisenstein e não o de Bazin. Não pode se
permitir ser democrática. Seu objetivo é forçar” as pessoas a uma adesão
específica. (FURHAMMAR L.; ISAKSSON F. L., 1976, p.145)
A transcrição acima vem a confirmar a estratégia ideológica proposta pelo
IPES nos filmes com produção de Manzon. O questionamento esta sempre
indagando o espectador, como é possível de observar ao analisar os filmes.
É claro que a propaganda se dirige às emoções e não ao intelecto. Confiando no
fato de que as pessoas em estado de excitação são receptivas as influências que
de outro modo seriam esquadrinhadas, os propagandistas fazem tudo que podem
para provocar emoções, para que mais facilmente possam conduzi-las à sua meta
política. (FURHAMMAR L.; ISAKSSON F., 1976, p. 148)
Como podemos afirmar que os filmes produzidos por Manzon por encomenda
do IPES, não eram somente filmes de orientação cívica, como se denominava o
Instituto publicamente? Um dos pontos que citamos é que filmes publicitários,
diferentemente do documentário que registra imagens do real, são encenados, cujo
mesmo recurso que foi utilizado por Manzon. E muito mais que isso, os filmes
documentários propandísticos tem por objetivo tocar a emoção do espectador,
incitando-o a uma adesão política específica. Trabalhar com a emoção na
propaganda política não significa que ela precisa ser necessariamente intrínseca e
tendenciosa, mas sim que tenha o poder de causar indignação como foa
mobilizadora, que envolva a platéia de acordo com as intenções de seus autores.
Analisamos os filmes do IPES com base no discurso fílmico e nas temáticas
apresentadas, baseado nas seguintes diretrizes: discurso político, a apresentação
de símbolos patrióticos, vínculo de união (nação, povo), o heroísmo e vitória além da
questão da ordem colocada sob o aspecto religioso. Para melhor compreensão,
apontamos cada um destes aspectos utilizando os próprios filmes como
exemplificação.
100
3.7.1 O Discurso Político
O IPES e seus membros intencionavam ver realizado o regime democrático
representativo através dos votos, onde representantes seriam eleitos com a
proposta de solucionar os problemas da sociedade através do desenvolvimento
econômico. Abaixo trechos dos filmes do IPES que demonstravam esta intenção
política do Instituto:
Filme: O Brasil Precisa de Você
Propõe soluções democráticas, afirmando que o Brasil não pode ser defendido
por comunistas.
A narração diz que um novo conceito de democracia deve se levado aos
estudantes, aos operários, aos homens do campo.
Filme: Depende de Mim
Transfere a responsabilidade democrática aos trabalhadores que são
representados e citados no filme através de seus ofícios. A responsabilidade
democrática da qual trata o filme, refere-se à liberdade da escolha através do
voto, representado por cédulas sendo introduzidas nas urnas de votação. Close
na mão que deposita o voto na urna. Close em várias mãos depositando votos na
urna.
Filme: Criando Homens Livres
A narração aponta que a democracia é possível de ser realizada, a
necessidade da educação para votar bem.
O filme encerra com uma cédula de votação sendo inserida na urna.
101
Analisando os filmes, observamos que Manzon utilizou de técnicas
fotográficas em caráter estático e que nos dá a impressão de movimento quando
colocadas em seqüência na montagem. Obviamente que esta técnica não foi
utilizada a esmo ou simplesmente pelo fato do cineasta ser também fotógrafo, mas
sim porque que imagens estáticas colocadas em movimento podem criar um efeito
emocional excitante, guiado também por outros fatores.
Observamos que técnicas cinematográficas são capazes de dar significados a
determinadas cenas. Estas técnicas são comprovadas quando examinada a estética
cinematográfica de filmes de propaganda, onde a câmera pode atuar para propor
uma determinada visão à platéia. A câmera baixa, por exemplo, pode representar
poder. A câmera alta rebaixamento, além de sentidos simbólicos visuais e de
metáforas, o que é perceptível nos filmes do IPES a partir da análise fílmica.
3.7.2 Os Símbolos Patrióticos
Os filmes de propaganda política se apropriam de forte apelo emocional e
associações sentimentais que o espectador relaciona com o que lhe é apresentado,
desde objetos com qualidades heróicas e símbolos patrióticos. Como ocorre nos
filmes do IPES, que apresentada a Bandeira Nacional em pelo menos metade de
seus filmes. Apontamos abaixo alguns trechos:
102
Filme: O Brasil Precisa de Você
A capital Brasília é apresentada por diversas imagens junto ao pôr do sol e
depois da seqüência de imagens, a Bandeira Nacional é mostrada trêmula ao
vento.
Filme: Depende de Mim
É apresentada a capital do país, Brasília, onde pessoas caminham pela rampa
do planalto e entre os dois prédios do poder.
Filme: Portos Paralíticos
A câmera focaliza em close uma bandeira com três cores e a locução nos remete
entende - como uma representação da Bandeira Nacional, dizendo: O porto é
o cartão de visitas da administração brasileira.
Em plano geral é mostrado um navio branco escrito Brasil e a narração diz: Deve
falar alto em nome do orgulho nacional.
O filme finaliza com imagem em foco na Bandeira Nacional.
3.7.3 O Vínculo de União
O estabelecimento de vínculo de comunidade é também um outro aspecto
importante. A partir daí, é notável em grande parte dos filmes políticos encontrar o
elo de comunidade, coletividade, classe, nação ou povo e a narrativa do filme de
propaganda política, é em grande maioria, colada em pessoal do plural: nós.
“estabelecer fronteira contra os ‘outros’, e sugerir que além dessas fronteiras
103
espreitam perigos inimigos que ameaçam ‘nossa’ comunidade enquanto dentro
das mesmas o reforçados os sentimentos de união.” (FURHAMMAR L.;
ISAKSSON F., 1976, p.175). Assistindo aos filmes de propaganda política do IPES
é facilmente notado este tipo de linguagem, um exemplo é o filme “Que é o IPES”
onde a narração questiona: “O que estamos fazendo s?”, “Unamos nossos
esforços”.
Estes princípios de coletividade, de tudo o que é “bom” para todos nós é
exaltado nestes tipos de filmes e conta com a ajuda da técnica cinematográfica, que
coloca o inimigo numa perspectiva “monstruosa” de ameaça a “nossa” união.
A propaganda política aproveita da nossa ideologia moral e usa da iconografia
para que possamos reconhecer imediatamente, através de sinais repetitivos “os
nossos inimigos”. Estes sinais são empregados para provocar o processo de
distanciamento que envolve o inimigo. Podem ser utilizados através de uma
pronuncia ou aparência estrangeira, que desassocia o “inimigo” dos “nossos”,
incitando o sentimento de idéias diferentes da nossa, e sendo capaz de estimular um
determinado medo de pessoas com estes estereótipos. Nos filmes do IPES uma
das características que mais definem o “inimigo” é a barba muito utilizada pelos
comunistas, como Fidel Castro. Além, da pronúncia estrangeira utilizada nos filmes
“Que é o IPES” e “O Brasil precisa de você”, onde a música dramática lugar para
a voz de Hitler, que é apresentado em imagens estáticas junto ao seu exército e o
povo que o saúda.
O elo de união não é colocado somente através da câmera tornando o mal
aparente, mas também ao explorar as vantagens psicológicas, colocando em
evidência as “nossas“ virtudes. Afinal seria muito arriscado investir em propaganda
deixando que o “inimigo” fosse o personagem sempre com o papel principal, e por
104
isso, a importância de destacar as “nossas” qualidades. Numa lida ancoragem
emocional e narrativa, que estabelece a posição moral do filme. O inimigo deve ser
percebido pela platéia através de seus atos, onde o espectador deve agir com
indignação. E assim, fez o produtor Jean Mazon ao destacar nos filmes “Que é o
IPES” e “O Brasil precisa de você” as mortes causadas pelo nazismo nos campos de
concentração. O autoritarismo do fascismo e o perigo da desordem comunista.
Formas de governo que se estabelecessem no Brasil poderiam frear o progresso. O
progresso que tanto desejava os empresários da elite dominante e afastar a
desordem que tanto preocupava a ordem militar. Vejamos algumas passagens dos
filmes:
Filme: O Brasil Precisa de Você
O filme aponta os problemas e o perigo de governos antidemocráticos, se
referindo ao Fidel Castro, Hitler, Mussolini. O filme utiliza de forte apelo
emocional quando trata destes regimes e apresenta imagens das pessoas
mortas e amontoadas nos campos de concentração nazista.
Filme: Depende de Mim
Diversas imagens de revolução interna, de civis lutando e close num corpo de um
homem civil morto estirado no chão. Estrela, símbolo do comunismo foi
derrubada ao chão e a narração diz: Eles preferiram a morte à tirania. E nós?
Que preço pagaremos nós pela liberdade?
Vários corpos estirados no chão. Close em plongée (câmera de cima para baixo
expressando o horror dos fatos) nos cadáveres estirados no chão cobertos por
jornal.
105
O propagandista utiliza em seus filmes qualidades dramáticas que produza
identificação no nível individual, explorando os sentimentos que mantém o grupo
unido, a platéia, o povo, a nação, alcançando a excelência para o simbolismo entre
os “nossos”.
As massas podem aparecer constantemente no centro de filmes, dirigindo-se
a um proletariado que revela sua correlação ou solidariedade com o que é
apresentado em determinado filme de propaganda, criando um profundo
envolvimento com o que é mostrado. As massas utilitárias nunca aparecem ocultas,
mas sempre com seus rostos e gestos definidos. O desejo e objetivos das massas
são apresentados como um só, mas a reação e sensações de cada indivíduo ou
espectador são únicas e pessoais.
Determinados filmes trabalham as massas como pobres e sofredores, como
proletariados oprimidos e esquecidos, seja pelos ricos, pelo governo, onde a
lealdade do público é mantida por técnicas diferentes, mas mantendo o mesmo
princípio do modelo anterior, nutrindo sua homogeneidade. Técnicas que
transformam as pessoas em símbolos, símbolos da massa. Filmes que mostram
uma nova visão de futuro, de progresso e desenvolvimento que é destinado a todos
“nós”. E assim trabalhou Manzon na propaganda do IPES, destacando as
fisionomias cansadas do jangadeiro, da criança nordestina que migra com sua
família carregando suas trouxas em sentido ao Sul do país em busca de trabalho,
lutando contra a fome. Focaliza os rostos cansados dos nordestinos mais velhos que
continuam no sertão, por não terem mais condições de labutar nas grandes cidades.
Imagens que podem ser vistas no filme “Nordeste problema nº. 1”.
106
3.7.4 Heroísmo e Vitória
O que é apresentado na tela tem o poder de condicionar o comportamento
das massas. Diante de um conflito apresentado, quase que involuntariamente
tendemos a nos inclinar a favor do partido inferior. Segundo a psicologia, existe um
processo de “identificação com o herói”, o “herói” geralmente é um personagem que
esta sempre lutando ou fugindo de situações de perigo ou riscos. O cinema, através
de imagens e técnicas, cria e mostra situações especiais que despertem simpatia à
platéia, para que fique ao lado do “herói”. Por isso, o foco principal de um filme de
propaganda política, é dirigir-se ao povo de uma determinada nação e a platéia é a
representação deste povo, desta massa que deve permanecer em concordância
com a narrativa. Por isso, o IPES destinou seus filmes a todos os públicos que
formava a massa, a nação, o povo, interpretados nos filmes através dos sofredores
nordestinos, dos estudantes, do proletariado. Todos em busca da vitória
representada pelo desenvolvimento e progresso econômico da nação, que traria a
oportunidade da elevação do nível de vida. Vejamos como o IPES trabalhou esta
questão em seus filmes:
Filme: O Brasil Precisa de Você
Sugere que o Brasil precisa passar por uma “revolução sem sangue”, ou seja,
por uma mudança estrutural política e econômica, que proporcionaria o
desenvolvimento do país, na criação de grandes hidrelétricas, na
industrialização, na estabilização da moeda, no desenvolvimento rural e dos
107
portos na estabilização da moeda, na elevação do nível de vida dos brasileiros.
O fim dos conflitos e do caos social, convidando à elite a agir.
Filme: Nordeste Problema nº. 1
O filme aponta os problemas sociais e econômicos do nordeste, atribuindo as
razões destes fatos ao descaso do governo, pela falta da água e da ausência de
planejamento governamental. O filme aponta soluções junto à parceria de
empresas privadas, para a criação de açudes, industrialização, energia elétrica,
maiores recursos concedidos através de abertura de crédito e abatimento em
imposto de renda.
Ao final, os problemas são convertidos em possíveis soluções e traz imagens de
desenvolvimento e do que seria um nordeste ideal para o povo nordestino e o
desenvolvimento. Panorâmica do alto mostra homens trabalhando numa
plantação, diversas máquinas, caminhões fazem o transporte dos produtos
agrícolas, tratores trabalham na terra, a irrigação do solo e água em abundância.
Filme: Depende de Mim
As imagens mostram vários trabalhadores em suas funções e a narração reforça:
Depende de mim, o ajudante de pedreiro defender a liberdade. De mim, o
tintureiro depende a paz social do Brasil em princípios democráticos. De mim, o
sapateiro, do meu voto, depende a segurança. De mim, depende a liberdade. De
mim, o metalúrgico depende os direitos do homem brasileiro. A boa aplicação do
dinheiro público depende de mim, do meu voto.
108
Filme: Portos Paralíticos
O filme é uma crítica sobre o funcionamento dos portos brasileiros, cobrando
uma maior atitude do governo e das organizações portuárias. Atribuí o custo
elevado das mercadorias ao mau funcionamento dos portos, devido às más
condições de armazenamento, aparelhagem, carga e descarga demonstrada nas
imagens apresentadas. Insinua que questões econômicas, como o preço de
produtos, exportação e importação dependem dos portos brasileiros. E a
narração afirma: a lei que criou o fundo portuário nacional atende as
necessidades do momento. O que não é possível é cruzar os braços diante de
um futuro tão enunciante, brilhante! Precisamos abrir novas perspectivas para
encontrar uma solução, transformando os portos em alavancas do sucesso.
Filme: Criando Homens Livres
O filme trata da questão da educação, que pessoas com instrução saberão
escolher seus representantes democráticos. Trata a educação adquirida também
através da Igreja.
Imagens mostram estudantes em laboratório. Na seqüência uma panorâmica
descritiva mostra o anoitecer de uma cidade, o sol se pondo e narração diz: cada
pequena cidade é a pátria e para cada uma das cidades é que se devem criar
melhores condições de educação, e instruído o brasileiro votará bem e a
sociedade conquistará tranqüilidade. O Brasil poderá desenvolver suas riquezas
e o povo teseu padrão de vida mais elevado, este é o prêmio das nações que
construindo escolas fazem homens livres e felizes.
109
Filme: Deixem o Estudante Estudar
O filme menciona como deve ser a vida dos estudantes, como devem funcionar
as instituições educacionais. Que assegurar o futuro depende de aprendizado,
estudo e produção.
Imagens mostram máquinas trabalhando na construção de uma ponte. Uma
usina hidrelétrica. Água em abundância passa por barragens. A narração diz: o
que seria o futuro do Brasil se não fosse capaz de gerar engenheiros de alta
competência, capaz de construir usinas de eletrificação?
Numa outra cena é exibido um prédio de uma universidade, estudantes chegam
e conversam entre si. Estudante na biblioteca outro empresta um livro, alunos
estudam numa biblioteca. Imagem de um professor lecionando em sala de aula.
A narração diz: o imprescindível é dobrar as possibilidades a fim de que todos
possam desenvolver aptidões compatíveis.
Nova cena com foco de diplomas sendo segurados por mãos. Estudantes
recebem diplomas. Professor discursa durante formatura. Vários estudantes são
mostrados com suas becas. Foco em um dos formandos, close num diploma. A
narração expressa: pois não basta receber um diploma, simples ponto de partida,
o espírito universitário se confunde ao espírito de brasilidade. A missão do
estudante é cultural, patriótica, democrática é o que eu como universitário
brasileiro tinha a lhes dizer, deixem o estudante estudar.
3.7.5 A Ordem Sob o Aspecto Religioso
A ordem geralmente tamm esta ligada em algum sentido religioso, onde as
necessidades de Deus simbolizam as da sociedade, uma vez que a propaganda tem
110
a finalidade de manter a forma da sociedade operando. Explorando um ponto de
vista religioso sem apelar explicitamente para a religião, como fazia o IPES ao citar
em seus filmes os princípios do cristianismo, a ordem através dos dogmas da igreja
católica representada através da cruz ou da própria igreja ou simplesmente,
reforçada pela narração como no filme “Que é o IPES”: “evitar que a difícil situação
que o país atravessa venha comprometer nossas instituições democráticas e
tradições cristãs”. Na seqüência, algumas transcrições dos filmes que tratam este
assunto:
Filme: Nordeste Problema nº. 1
O filme reforça o problema e o sofrimento do povo nordestino através de imagens
fortes, esquadrinhando suas fisionomias cansadas, a questão da fome e a
mortalidade infantil. Este último aspecto é apresentado quando uma família
segue com o cortejo, carregando o caixão de uma criança. Num dado momento a
família é focalizada caminhando e sobre o efeito de luz e sombra ocasionado
pelo “pôr do sol”, num contra-plogée é focalizada a cruz do cemitério, que reforça
a superioridade do ser divino como salvação.
Filme: Depende de Mim
Transfere ao trabalhador a responsabilidade pela liberdade e pela democracia,
unindo todos “a família cristã” para que o Brasil possa seguir seu caminho
democrático de acordo com as suas tradições. A câmera mostra em close o rosto
de vários trabalhadores em seus ofícios e a narração diz: a liberdade de culto, o
desenvolvimento industrial, o nível de vida, dependem de nós, homens de todas
111
as profissões, brasileiros de todos os ofícios. Pois de nós depende o fogo que faz
o futuro, a liberdade.
A tradição cristã brasileira depende de seu voto. A hora é de decisão consciente.
O futuro do Brasil depende de seu voto.
Filme: Portos Paralíticos
Panorâmica de várias embarcações ao mar. Narração: é por isso que todos
devem estar empenhados em reorganizá-los: Governo Federal, administrações
portuárias, sindicatos portuários, oferecendo aos navios que comercializam com
o Brasil as boas vindas de uma nação disciplinada, poderosa e moderna.
Filme: Criando Homens Livres
Aponta que através da educação seria possível alcançar a ordem e se livrar da
desordem social e da demagogia, por isso, a necessidade de investir em
educação, pois as pessoas sem instrução é que geralmente são levadas a atos
infratores e a participarem do caos social agitado pelos demagogos.
O filme apresenta imagens de crianças em sala de aula de um colégio de freira.
A narração afirma que nas escolas dióicas se obtém aprendizado profissional
onde se edifica um futuro livre de um país desenvolvido.
Manzon, fotógrafo e cineasta dominava as técnicas de contrastes, movimento,
ritmo, profundidade, direção, volume e iluminação. Características que são capazes
de influenciar emocionalmente o espectador nos filmes propagandistas, em estórias
que tratam de um Brasil com um futuro melhor. A divergência de situações é
utilizada em todos os filmes do IPES aqui analisados, sempre pelo aspecto negativo,
112
visto sob a óptica dos problemas e depois pelo aspecto positivo, como se tivesse
alcançado as soluções para os problemas destacados.
(...) O gênero está cheio de confrontações entre o bem e o mal, a beleza e a feiúra,
a pureza e a sujeira, a ordem e o caos, a pobreza e a abundância, o passado idílico
e o presente ameaçador – ou entre a carência passada e a prosperidade presente.
Em cada caso o contraste serve para forçar o espectador a uma adesão inevitável
e inequívoca. (FURHAMMAR L.; ISAKSSON F., 1976, p.159)
No filme “Que é o IPES” logo no inicio apresenta cenas que se contrastam,
quando imagens de nuvens em um céu claro e iluminado pelo sol, se transformam
em nuvens de fumaça devido às explosões de bombas, enquanto a narração afirma:
A terra em tal maneira é tão graciosa que emana um futuro de alegria e luz. A cena
seguinte é de uma imagem estática de Fidel Castro, onde a câmera caminha para
frente e para traz num realce dramático do personagem. Estas primeiras cenas
iniciais do filme levam o espectador a crer que a ameaça de um regime de governo
comunista, que era uma das preocupações do IPES e da elite dominante, colocaria
em risco o futuro do Brasil.
A receptividade crescente da humanidade à doutrinação. O aumento do número de
homens reunidos num grupo cultural, acrescido do extremo aperfeiçoamento dos
meios técnicos leva as possibilidades, nunca antes atingidas na história humana, de
influência à opinião pública e de criar uniformidade de opiniões. Devemos, além
disso, ressaltar que o poder de sugestão de uma doutrina, firmemente aceita,
progride talvez em progressos geométricos em relação ao número de crentes
.(LORENZ, 1974, p.139)
Os filmes de propaganda política têm por sua característica em grande
maioria encerrarem a estória com um final feliz. Os filmes apresentam situações de
grande dificuldade infundindo a sensação de catástrofes sociais, e contrastando a
este sentido, vende a possibilidade da vitória a ser conquistada e finaliza onde
triunfa o bem sobre o mal, que geralmente é punido ou simplesmente afastado. Nos
113
filmes do IPES que são filmes de propaganda política, todos eles encerram sempre
demonstrando, como citado anteriormente, o que o público deseja para si, para
um Brasil melhor, sempre com cenas de grande progresso e desenvolvimento
industrial e econômico, gerador de empregos e de melhores condições de vida,
afastando o mal do comunismo e a da desordem, como assim desejava o
empresariado membro da elite dominante e os militares.
114
CONCLUSÃO
A Marcha da Família com Deus pela Liberdade
Os meios de divulgação dos quais este ensinamento dispõe, através dos
mass media contemporânea, como a imprensa, o rádio e a televisão, permitem
facilmente que o ensinamento, que não passa de uma hipótese científica e não
comprovada, seja transformado em conhecimento científico, ou seja em opinião
pública (LORENZ, 1974, p. 113).
Nos primeiros meses de 1964 algumas movimentações sociais aconteciam
contra o governo de João Goulart. O IPES atuou através de grupos de pressão
femininos, formado por donas-de-casa da classe média. “O IPES visava diretamente
às esposas, irmãs e mães dos militares, profissionais, comerciários e
tecnoburocratas” (DREIFUSS, 1981, p. 294). Assim, através da mobilização feminina
representada por organizações como o CAMDE Campanha da Mulher pela
Democracia, da UCF União Cívica Feminina ou da CEC Campanha para a
Educação Cívica criavam toda uma reverberação do discurso do Instituto e
ganhavam grande alcance e repercussão.
Uma das grandes atuações do CAMDE foi quando o presidente João Goulart
tinha agendado o famoso Comício da Central que aconteceu no dia 13 de março de
1964 sobre as reformas de base. A organização feminina se engajou numa
campanha solicitando á todos, que não comparassem ao comício do ex-presidente e
pedindo que as mulheres ficassem em casa e acendessem velas em suas janelas
27
.
27
Ver Dreifuss, 1981, p.297.
115
Após seis dias do comício, 500 mil pessoas se reunirão numa passeata em São
Paulo para protestar contra as reformas propostas por Jango, sob orientação das
associações femininas com a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”.
O exército, como é de consenso geral, teria hesitado em agir se não houvesse
fortes indicações de que a opinião pública era favorável, e é bem possível que
demonstrações espetaculares, tais como a de 19 de março, a ‘Marcha da Família
com Deus pela Liberdade’ em São Paulo, fossem decisivas para convencer o setor
estritamente militar do ‘Movimento Revolucionário’ de que havia chegado o
momento propício. (DREIFUSS, 1981, p. 298)
As mobilizações incitadas pelas marchas era a resposta que os conspiradores
esperavam para que o golpe se desse de fato, com a aprovação da opinião pública
ou que ao menos ela não reagisse contra a atuação dos golpistas.
No dia seguinte ao Golpe Militar, em 2 de abril de 1964 a burguesia
comemorou a deposição inconstitucional de João Goulart, que ainda se encontrava
em solo brasileiro, com uma gigantesca marcha que ocorreu nas ruas do Rio de
Janeiro, iniciada na Avenida Rio Branco. A multidão calculada em oitocentas mil
pessoas, carregava faixas contra o comunismo.
Diante de uma intensa campanha através da mídia, que utilizava o cinema
como uma de suas mais poderosas ferramentas e dos aspectos tratados nos filmes,
concluímos que a grande mobilização de parte da população influenciou a opinião
pública e a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” no dia 2 de abril foi a
maior resposta que o IPES pôde ter.
O IPES trabalhou com as ambições mais profundas que todo homem
encantado pelo capitalismo busca, a possibilidade de subir na hierarquia das classes
sociais. Propunha em seus filmes melhores condições de vida, onde todos através
da democracia, da liberdade e da igualdade alcançariam seus desejos. Para isso, a
condição favorável para o progresso tão citado nos filmes, viria através de uma
116
forma de governo que daria condições necessárias, com o propósito de eliminar as
agitações, o caos social que para o IPES e seus membros impossibilitava o
progresso econômico.
A receptividade crescente da humanidade à doutrinação. O aumento do número de
homens reunidos num grupo cultural, acrescido do extremo aperfeiçoamento dos
meios técnicos leva as possibilidades nunca antes atingidas na história humana, de
influência à opinião pública e de criar uniformidade de opiniões. “Devemos, além
disso, ressaltar que o poder de sugestão de uma doutrina, firmemente aceita,
progride talvez em progressos geométricos em relação ao número de crentes”.
(LORENZ, 1974, p.139)
Afirmar que a campanha política e os filmes do IPES contribuíram para que a
sociedade brasileira aceitasse o Golpe Militar de 1964, nos obrigaria a fazer um
estudo bastante complexo através de pesquisa de grupos formados por pessoas que
vivenciaram aquele período de quase cinco décadas atrás. Porém, a nossa análise
baseada no estudo de formação da opinião pública, nos leva a concluir que o
Instituto atuou de forma pertinente, trabalhando com questões que faziam parte do
cotidiano daquele período, reverberado pela imprensa na época, atuando sob a
forma de endoutrinamento das massas, criando uma analogia de opiniões, onde a
sociedade acabou por assumir um novo dirigente, uma nova forma de política,
crente de que seria benéfico ao Brasil e a cada um destes indivíduos diante da
possibilidade de progresso pelo trabalho
28
, o que conseqüentemente transformaria-
se em recompensa
29
adquirida através da elevação do nível, do poder de consumo,
sem a existência de conflitos, com base na ordem.
O que ocorreu em abril de 1964 o foi um Golpe Militar conspirativo, mas, sim, o
resultado de uma campanha política, ideológica e militar travada pela elite orgânica,
centrada no complexo IPÊS – Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais e IBAD -
Instituto Brasileiro de Ação Democrática. Tal campanha culminou em abril de 1964
com ão militar, que se fez necessária para derrubar o Executivo e conter daí pra
frente à participação da massa. (DREIFUSS, 1981)
28
Seja qual for é do interesse dos detentores do poder de qualquer partido político, promover e incentivar, até a
hipertrofia, as motivações que arrastam os homens para a competição (LORENZ, 1974, p. 46).
29
Todo aprendizado de um comportamento, confirmado por uma recompensa, leva o organismo a se acomodar
a situações penosas com vistas ao prazer (LORENZ, 1974, p. 54).
117
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Universitária, 2000.
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Brasil, 1961-1964. 7. ed. Rio de Janeiro: Revan; Brasília-DF: EdUnB, 2001.
BENJAMIM, Walter. Magia e Técnica, Arte e Política: Ensaio sobre Literatura e
História da Cultura. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
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ed. São Paulo: Paz e Terra, 1971.
BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Brasiliense, 2005.
118
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Brasília: Universidade de Brasília, 1997.
CANEVACCI, Massimo. Antropologia da Comunicação Visual. Rio de Janeiro:
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Fronteira, 1995.
COSTA, Antonio. Compreender o Cinema. 2. ed. São Paulo: Globo, 1989.
DREIFUSS, Armand René. 1964 - A Conquista do Estado: Ação Política, Poder e
Golpe de Classe. Petrópolis: Vozes, 1981.
ECO, Umberto. Como se Faz uma Tese. 18. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário Aurélio. Rio de Janeiro:
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FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FURHAMMAR L.; ISAKSSON F., Leif. Cinema e Política. Rio de Janeiro: Paz e
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119
GARCIA, Nelson Jahr. Estado Novo, Ideologia e Propaganda Política. São Paulo:
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GARCIA, Nelson Jahr. Sadismo, Sedução e Silêncio: Propaganda e Controle
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GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada. o Paulo: Companhia das Letras,
2003.
GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: Trajetória no Subdesenvolvimento. Rio de
Janeiro: Paz e Terra/Embrafilme, 1980.
HABERMAS, Jürgen. Mudança Estrutural na Esfera Pública. Rio de Janeiro:
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HOHEFELDT, A.; MARTINO, L.C.; FRANCA, V.V. Teorias da Comunicação:
Conceito, Escolas e Tendências. Petrópolis: Vozes, 2001.
LORENZ, Konrad. Civilização e Pecado: Os Oito Erros Capitais do Homem. Rio
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MARANHÃO, Jorge. A Arte da Publicidade. São Paulo: Papirus, 1988.
MARTÍN-BARBERO, J. Dos Meios às Mediações. 2. ed. Rio de Janeiro: UFRS,
2001.
120
MARTIN, Marcel. A Linguagem Cinematográfica. São Paulo: Brasiliense, 2003.
MORIN, Edgar. O Método IV: As Idéias. Sintra/Portugal: Europa-América, 1961.
MORIN, Edgar. O Método V: A Humanidade da Humanidade. Porto Alegre: Sulina,
2005.
ORTIZ, Renato. A Moderna Tradição Brasileira. 5. ed. São Paulo: Brasiliense,
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RAMOS, Fernão. História do Cinema Brasileiro. São Paulo: Civilização Brasileira,
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SANTAELLA, Lucia. Cultura das Mídias. 3. ed. São Paulo: Experimento, 2002.
XAVIER, Ismail. A Experiência o Cinema. Rio de Janeiro: Graal, 1983.
WALTON, K. Sobre Imagens e Fotografias: Resposta a Algumas Objeções. IN:
RAMOS, F.P. (org.). Teoria contemporânea do cinema: documentário e narrativa
ficcional. São Paulo: SENAC, 2003.
121
REFERÊNCIAS ELETRÔNICAS:
DIP - Departamento de Imprensa. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Departamento_de_Imprensa_e_Propaganda. Acesso em:
18 mai. 2006, 14:11.
MANZON, Jean. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean_Manzon. Acesso em: 18 mai. 2006, 14:37.
CRUZEIRO, O. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Cruzeiro_%28revista%29. Acesso em: 18 mai. 2006,
14:55.
MILITAR, Ditadura no Brasil. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ditadura_militar_no_Brasil_%281964-1985%29. Acesso
em: 18 mai. 2006, 13:34
REFERÊNCIAS AUDIVISUAIS:
ASSIS, Denise. Propaganda e Cinema a Serviço do Golpe. Rio de Janeiro:
ARQUIVO NACIONAL, MAUAD, FAPERJ, 2001: Coordenação de Documentos
Audiovisuais e Cartográficos. 1 fita de vídeo, 84 min.
122
Complemento das informações acima:
Arquivo Nacional (Brasil). Coordenação de Documentos Audiovisuais e
Cartográficos. Seção de Documentos Sonoros e de Imagens em Movimento.
Catálogo de Filmes do IPES Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais / Arquivo
Nacional. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional; FAPERJ, 2000
123
ANEXO A – Síntese dos filmes
Resumo dos filmes, abordando as principais temáticas da mensagem e recursos
técnicos cinematográficos mais utilizados.
Filme 01:
Tema Principal:
Técnicas cinematográficas:
O Brasil precisa de você
Soluções democráticas para o progresso e
desenvolvimento do país
As imagens apresentadas neste filme o
todas estáticas, por isso, diversas vezes é
utilizado o recurso da câmera em close ou em
travelling para frente realçando maior sentido
as imagens apresentadas.
O vínculo de união
O filme aponta os problemas do perigo de
regimes de governos antidemocráticos se
referindo a Fidel Castro, Hitler, Mussolini. O filme
utiliza de forte apelo emocional quando trata
destes regimes e apresenta imagens em closes
das pessoas mortas e amontoadas nos campos
de concentração nazista.
O discurso político:
Democracia
Propõe soluções democráticas, afirmando que o
Brasil não pode ser defendido por comunistas.
A narração diz que um novo conceito de
democracia deve se levado aos estudantes, aos
operários, aos homens do campo.
Os símbolos patrióticos
A capital Brasília é apresentada por diversas
imagens junto ao pôr do sol e depois desta
seqüência de imagens, a Bandeira Nacional é
mostrada trêmula ao vento.
124
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
Sugere que o Brasil precisa passar por uma
“revolução sem sangue”, ou seja, por uma
mudança estrutural política e econômica, que
proporcionaria o desenvolvimento do país,
através da criação de grandes hidrelétricas, da
industrialização, da estabilização da moeda, do
desenvolvimento rural e dos portos, da
estabilização da moeda, gerando assim a
elevação do nível de vida dos brasileiros.
Sugeria o fim dos conflitos e do caos social,
convidado à elite a agir.
125
Filme 02:
Tema Principal:
Técnicas cinematográficas:
Nordeste problema nº. 1
Progresso e desenvolvimento do nordeste
Câmeras em ângulo de contra-plongée e
plongée empregam efeitos as imagens
apresentadas.
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
O filme aponta os problemas sociais e
econômicos do nordeste, atribuindo as razões
destes fatos ao descaso do governo pela falta da
água e da ausência de planejamento
governamental. O filme aponta soluções junto à
parceria de empresas privadas, para a criação de
açudes, industrialização, energia elétrica,
maiores recursos concedidos através de abertura
de crédito e abatimento em imposto de renda.
Ordem e religião
O filme reforça o problema e o sofrimento do
povo nordestino através de imagens fortes,
esquadrinhando suas fisionomias cansadas,
devido a problemas da fome e da mortalidade
infantil. Este último aspecto é apresentado
quando uma família segue junto a um cortejo,
carregando o caixão de uma criança. Num dado
momento a família é focalizada caminhando
sobre o efeito de luz e sombra que nos remete ao
pôr do sol e num contra-plogée (de baixo para
cima) é focalizada a cruz do cemitério, que
reforça a superioridade do ente divino como
salvação.
126
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
Ao final do filme os problemas são convertidos
em possíveis soluções, com imagens do que
seria um nordeste ideal para o povo nordestino
através do desenvolvimento. A câmera em
panorâmica do alto mostra homens trabalhando
numa plantação, diversas máquinas, caminhões
fazem o transporte dos produtos agrícolas,
tratores trabalham na terra, a irrigação do solo e
água em abundância.
127
Filme 03:
Tema Principal:
Técnicas cinematográficas:
Depende de mim
Ordem através da democracia (do voto e da
igreja, e não da luta armada) e
desenvolvimento (através do utilitarismo)
Câmeras em close dão maiores efeitos as
imagens
O vínculo de união
Diversas imagens de uma revolução interna.
Civis lutam. Close no corpo de um homem morto
estirado no chão. Estrela, um dos símbolos do
comunismo, foi derrubada ao chão e a narração
diz: Eles preferiram à morte a tirania. E nós?
Que preço pagaremos nós pela liberdade?
Vários mortos estirados no chão. Close em
plongée (cima para baixo expressando o horror
dos fatos) nos cadáveres estendido no chão,
cobertos por jornal.
O discurso político:
Democracia
Transfere a responsabilidade democrática aos
trabalhadores que são representados e citados
no filme através de seus ofícios. A
responsabilidade democrática da qual trata o
filme, refere-se à liberdade de escolha através do
voto, representado por cédulas sendo
introduzidas nas urnas de votação. Close na mão
depositando o voto na urna. Close em várias
mãos depositando os votos na urna.
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
As imagens mostram vários trabalhadores em
suas funções e a narração reforça: Depende de
mim, o ajudante de pedreiro defender a
liberdade. De mim, o tintureiro depende a paz
social do Brasil em princípios democráticos. De
mim, o sapateiro, do meu voto, depende a
128
segurança. De mim, depende a liberdade. De
mim, o metalúrgico depende os direitos do
homem brasileiro. A boa aplicação do dinheiro
público depende de mim, do meu voto.
Ordem e religião
Transfere ao trabalhador a responsabilidade pela
liberdade e pela democracia, unindo todos “a
família cristã” para que o Brasil possa seguir seu
caminho democrático de acordo com as suas
tradições. A câmera mostra em close o rosto de
vários trabalhadores em seus ofícios e a
narração diz: A liberdade de culto, o
desenvolvimento industrial, o nível de vida,
dependem de nós, homens de todas as
profissões, brasileiros de todos os ofícios. Pois
de nós depende o fogo que faz o futuro, a
liberdade.
A tradição cristã brasileira depende de seu voto.
A hora é de decisão consciente. O futuro do
Brasil depende de seu voto.
Os símbolos patrióticos
O filme finalizando apresenta a capital do país,
Brasília, onde pessoas caminham pela rampa do
Palácio do Planalto.
129
Filme 04:
Tema Principal:
Técnicas cinematográficas:
Portos paralíticos
Progresso e desenvolvimento econômico
através dos portos
Câmeras com foco em close complementam
as imagens apresentadas junto à narração
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
O filme é uma crítica sobre o funcionamento dos
portos brasileiros, cobrando uma maior atitude do
governo e das organizações portrias. Atribuí o
custo elevado das mercadorias ao mau
funcionamento dos portos, devido às más
condições de armazenamento, aparelhagem,
carga e descarga demonstrada nas imagens
apresentadas. Insinua que questões econômicas,
como o preço de produtos, exportação e
importação dependem dos portos brasileiros. E a
narração afirma: A lei que criou o fundo portuário
nacional atende as necessidades do momento.
O que não é possível é cruzar os braços diante
de um futuro tão enunciante, brilhante!
Precisamos abrir novas perspectivas para
encontrar uma solução, transformando os portos
em alavancas do sucesso.
Os símbolos patrióticos
A câmera focaliza em close uma bandeira com
três cores e a locução nos remete a reconhecer
esta bandeira como à representação da Bandeira
Nacional, dizendo: O porto é o cartão de visitas
da administração brasileira.
Em plano geral é mostrado um navio branco
escrito Brasil e a narração diz: Deve falar alto em
nome do orgulho nacional.
Imagem em foco na Bandeira Nacional.
130
Ordem e religião
Panorâmica de várias embarcações ao mar.
Narração: É por isso que todos devem estar
empenhados em reorganizá-los: Governo
Federal, administrações portuárias, sindicatos
portuários, oferecendo aos navios que
comercializam com o Brasil as boas vindas de
uma nação disciplinada, poderosa e moderna.
131
Filme 05:
Tema Principal:
Técnicas cinematográficas:
Criando homens livres
Educação e ordem (através da Igreja Católica)
para o progresso e desenvolvimento
democrático
Filme recorre claramente ao uso de
encenações
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
O filme trata da questão da educação, que
pessoas com instrução saberão escolher seus
representantes democráticos. Trata a educação
adquirida também através da Igreja.
Ordem e religião
Aponta que através da educação seria possível
alcançar a ordem e se livrar da desordem social
e da demagogia, por isso, a necessidade de
investir em educação, pois, as pessoas sem
instrução é que geralmente são levadas a atos
infratores e a participarem do caos social agitado
pelos demagogos.
Imagens de pessoas saindo de uma igreja. (Claro
uso de encenação, pois algumas pessoas olham
diretamente para a câmera).
O discurso político:
Democracia
A narração aponta que a democracia é
possível de ser realizada. A necessidade da
educação para votar bem.
Ordem e religião
O filme apresenta imagens de crianças em sala
de aula de um colégio de freiras. A narração
afirma que nas escolas dióicas se obtém
aprendizado profissional onde se edifica um
futuro livre, de um país desenvolvido.
132
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
As imagens mostram estudantes em laboratórios.
Na seqüência de imagens, uma panorâmica
descritiva mostra o anoitecer de uma cidade, o
sol se pondo e narração diz: cada pequena
cidade é a pátria e para cada uma das cidades é
que se devem criar melhores condições de
educação. E instruído o brasileiro votará bem e a
sociedade conquistará tranqüilidade. O Brasil
poderá desenvolver suas riquezas e o povo terá
seu padrão de vida mais elevado, este é o
prêmio das nações que construindo escolas
fazem homens livres e felizes.
No fim do dia, carregando sua marmita, o chefe
de família retorna ao lar depois de mais um dia
de trabalho, abraça e beija sua esposa que o
aguarda. (Uso de encenação).
O discurso político:
Democracia
O filme encerra com uma dula de votação
sendo inserida na urna.
133
Filme 06:
Tema Principal:
Técnicas cinematográficas:
Deixem o estudante estudar
O utilitarismo e o desenvolvimento
econômico através dos estudos.
O filme traz a mensagem que a única
preocupação do estudante deve ser com os
livros e o futuro, retirando-o da reflexão sobre
as agitações sociais.
Câmera em close reforça o sentido da
mensagem diante de algumas imagens
O discurso político:
Utilitarismo - progresso
e
Desenvolvimento
=
Heroísmo e vitória
O filme menciona como deve ser a vida dos
estudantes, como devem funcionar as
instituições educacionais. Que assegurar o futuro
depende de aprendizado, estudo e produção.
Imagens mostram máquinas trabalhando na
construção de uma ponte. Uma usina
hidrelétrica. Água em abundância passa por
barragens. A narração diz: o que seria o futuro do
Brasil se não fosse capaz de gerar engenheiros
de alta competência, capaz de construir usinas
de eletrificação?
Numa outra cena é exibido um prédio de uma
universidade, estudantes chegam e conversam
entre si. No ambiente de uma biblioteca, um
estudante faz sua leitura, outro empresta um
livro, alguns alunos estudam. Imagem de um
professor lecionando em sala de aula. A narração
diz: o imprescindível é dobrar as possibilidades a
fim de que todos possam desenvolver aptidões
compatíveis.
Nova cena com foco em diplomas sendo
segurados por mãos. Estudantes recebem
diplomas. Professor discursa durante formatura.
134
Vários estudantes são mostrados com suas
becas. Foco em um dos formandos, close num
diploma. A narração expressa: pois não basta
receber um diploma, simples ponto de partida, o
espírito universitário se confunde ao espírito de
brasilidade. A missão do estudante é cultural,
patriótica, democrática é o que eu como
universitário brasileiro tinha a lhes dizer, deixem
o estudante estudar.
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