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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE ESTUDOS GERAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
SOCIOLOGIA E DIREITO
FLÁVIO TORRES PICANÇO MACHADO
Estado e Direito: reformas
liberalizantes e a produção de cultura
no Brasil
NITERÓI
2006
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FLÁVIO TORRES PICANÇO MACHADO
ESTADO E DIREITO: REFORMAS LIBERALIZANTES E A
PRODUÇÃO DE CULTURA NO BRASIL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Sociologia e Direito da
Universidade Federal Fluminense, como requisito
parcial para a obtenção do título de mestre em
Ciências Jurídicas e Sociais.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Arair Pinto Paiva
Niterói, 2006
2
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE ESTUDOS GERAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA E DIREITO
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3
MACHADO, Flávio Torres Picanço
Estado e Direito: reformas liberalizantes e a produção de
cultura no Brasil / Flávio Torres Picanço Machado, UFF/
Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito. Niterói,
2006.
150 f.
Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídicas e Sociais)
Universidade Federal Fluminense, 2006.
1. Reformas do Estado. 2. Globalização. 3. Política
cultural. 4. Agência Nacional do Cinema. I. Dissertação
(Mestrado). II. Título.
FLÁVIO TORRES PICANÇO MACHADO
ESTADO E DIREITO: REFORMAS LIBERALIZANTES E A
PRODUÇÃO DE CULTURA NO BRASIL
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Sociologia e Direito
da Universidade Federal Fluminense,
como requisito parcial para a obtenção do
título de mestre em Ciências Jurídicas e
Sociais.
Aprovada em dezembro de 2006
BANCA EXAMINADORA:
___________________________________________________________________
Profª. Drª. Maria Arair Pinto Paiva (Orientadora)
(PPGSD – UFF)
___________________________________________________________________
Profª. Drª. Daisy Stepansky
(PPGSD – UFF)
___________________________________________________________________
Prof. Dr. Joaquim Leonel de Rezende Alvim
(PPGSD – UFF)
___________________________________________________________________
Profª. Drª. Maria Guadalupe Piragibe da Fonseca
(Ibmec-RJ)
Niterói, 2006
4
Esta dissertação é dedicada a meus instigadores intelectuais, especialmente:
Glauber Rocha
Vladimir Carvalho
Antônio José Santana Martins
João Luís Woerdenbag Filho
Ariano Suassuna
Zygmunt Bauman
Milton Santos
Edgar Morin
e ainda aos Professores:
Ivair Coelho Lisboa
Dênis de Moraes
5
Agradecimentos
À cidade de Porciúncula,
refúgio onde respirei o cheiro da tranqüilidade
para encontrar os caminhos finais deste trabalho
A Fabinho & Raquel,
pela amizade e apoio em Porciúncula
A Leonardo Seixas,
pela tradução do Summary
Aos Professores do PPGSD – UFF com os quais cursei disciplinas,
por compartilhar conhecimentos:
José Fernando de Castro Farias
Luis Carlos Fridman
Marcelo Pereira de Mello
Maurício M. V. Martins
Maria Arair Pinto Paiva
Daisy Stepansky
Ao Professor Dênis de Moraes (Programa de Pós-Graduação em Comunicação – UFF)
pelas disciplinas que cursei naquele Programa
6
Agradecimentos especiais
A Profª. Drª. Maria Arair Pinto Paiva, minha orientadora
pela atenção, paciência e estímulo
A Claudia Torres, minha mãe
por todo tipo de apoio e incentivo
A Adriana Touça, minha namorada
por sua dedicação e imprescindível ajuda
7
RESUMO
Na primeira metade da década de 1990, reformas liberalizantes (recomendadas e
incentivadas por entidades internacionais) ganharam impulso e promoveram uma ampla
reestruturação política e administrativa no Brasil, afetando diversos campos da sociedade.
Normas de Direito foram criadas para viabilizar esse processo. O campo da produção de
bens culturais, em particular, sofreu modificações no que diz respeito ao apoio estatal. Um
sistema de incentivos fiscais foi elaborado, delegando às empresas a escolha de quais
projetos constarão entre os beneficiados. Desse modo, as ambições de marketing
empresariais passaram a ditar que tipo de cultura se produz no país.
Esta dissertação volta-se para o estudo dessas alterações, especificamente na área
cinematográfica. Uma nova Política Nacional do Cinema foi adotada, fazendo estreitar os
laços do setor com o mercado, e ainda houve a criação de uma agência reguladora
específica: a Agência Nacional do Cinema ANCINE. Os resultados obtidos a partir desta
configuração política e institucional constituem o foco de nossa atenção. Questões
referentes às relações históricas mantidas entre sociedade cinema Estado também são
devidamente contempladas para a melhor contextualização das discussões envolvidas.
Os mecanismos jurídicos instituidores das diretrizes atuais são colocados sob
análise, com a finalidade de promover a reflexão sobre o papel do Direito na defesa dos
interesses nacionais. É importante ter a consciência de que, no caso de nosso tema, a
própria soberania do país, em última instância, encontra-se implicada.
8
SUMMARY
In the first half on the 1990s, liberal reforms (recommended and stimulated by
international entiti
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 11
1 – CONEXÕES TEMÁTICAS: ASPECTOS GERAIS 15
1.1 – Cinema: o contexto internacional 16
1.2 – O cinema no Brasil 19
1.3 – Função social dos filmes e justificativa para o subsídio estatal 22
1.4 – A Agência Nacional do Cinema 24
2 – IDENTIDADE CULTURAL E GLOBALIZAÇÃO 27
2.1 – A colonização cultural estratégica 29
2.2 – Individualismo: a fragmentação social 31
2.3 – Coletividade nacional 33
2.4 – Malefícios da globalização: a potencial contribuição de resistência das expressões
artísticas 35
3 – CINEMA E SOCIEDADE: O PRODUTO INDUSTRIAL E O BEM CULTURAL 40
3.1 – A indústria cinematográfica: filmes para as massas 40
3.1.1 – O controle ideológico 43
3.1.2 – A afinidade entre o cinema de mercado e a publicidade 44
3.1.3 – A hegemonia norte-americana 45
3.2 – O cinema à margem da cultura de massas 46
3.2.1 – Outros cinemas: exemplos 47
3.3 – O embate entre as duas concepções sobre o consumo do cinema 49
4 – REFORMA DO ESTADO E POLÍTICA NACIONAL DO CINEMA 52
4.1 – A defesa das reformas 53
4.2 – A crítica das reformas 61
4.3 – Política Nacional do Cinema 64
10
5 – DADOS NUMÉRICOS DO SETOR DE CINEMA NO BRASIL 69
5.1 – Dados preliminares: comparação com outros mercados 69
5.2 – Dados do mercado interno 73
5.3 – A participação do filme nacional 76
5.4 – A captação de incentivos fiscais 81
5.5 – Um balanço geral 82
CONCLUSÃO 85
BIBLIOGRAFIA 88
ANEXO 1 – Lei nº 8.313, de 23 de dezembro de 1991. 93
ANEXO 2 – Lei nº 8.685, de 20 de julho de 1993. 108
ANEXO 3 – Lei nº 10.179, de 6 de fevereiro de 2001. 113
ANEXO 4 – Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de 2001. 117
ANEXO 5 – Decreto nº 4.456, de 4 de novembro de 2002. 147
11
INTRODUÇÃO
As reformas políticas e administrativas que se intensificaram no Brasil na década de
1990 trouxeram conseqüências para todos os campos da sociedade. O papel do mercado na
coordenação da economia é ampliado, de forma que o Estado transfere vários de seus
serviços para os setores privado e público não-estatal. Esse quadro liberalizante, pode-se
dizer, é um efeito da globalização econômica, e se difundiu por rios países mais ou
menos ao mesmo tempo sob as prescrições de entidades como o Fundo Monetário
Internacional, a Organização Mundial do Comércio e o Banco Mundial.
O campo da produção de bens culturais recebe novas regras e também aproxima-se
sobremaneira da economia de mercado. É adotado um sistema de incentivos fiscais para
amparar financeiramente as atividades culturais. Desse modo, estas continuam a receber
subsídios (indiretos) do Estado, porém a escolha de que projetos serão beneficiados cabe às
empresas, ou seja, ao mercado. Nesse sentido, a preocupação que se coloca é de que essa
perspectiva homogeneizadora, a qual atingira o campo econômico, alastre-se como uma
metástase para o conteúdo e a forma dos bens culturais nacionais, afetando, por fim, os
modos de viver locais.
O cinema, em específico, tem sido alvo de muitos interesses por parte de Governos
e empresas multinacionais, devido a sua capacidade de sincretizar imagem, som e texto. Em
um mundo no qual economia e cultura estão amalgamadas, é imprescindível ter algum
controle sobre um dos mais importantes meios de propagação de valores, costumes,
práticas... Não é sem motivo que o Estado destina recursos para a produção cinematográfica
e elabora políticas para o setor. É importante saber que, com exceção do cinema norte-
americano (hegemônico internacionalmente), todas as indústrias cinematográficas do
mundo ocidental dependem do subsídio estatal para a sua sustentabilidade.
No caso do Brasil, as reformas liberalizantes acarretaram o fim do subsídio direto
do Estado à produção cinematográfica. Uma nova Política Nacional do Cinema foi
implementada estreitando os laços com o mercado –, e foi criada a Agência Nacional do
Cinema, com a finalidade de administrar o setor.
12
Este trabalho elegeu como objeto de estudo os resultados colhidos pela atual política
de incentivos fiscais para a produção de filmes no Brasil. Neste contexto, coloca-se em
questão a suficiência e adequação desse sistema o qual tem início no ano de 1993. Com o
intuito de procurar dar conta da complexidade do tema que rodeia nosso objeto, também
discutimos as principais questões que o envolvem.
Vale dizer, desde já, que as idéias de Edgar Morim a respeito da ciência na
contemporaneidade, especialmente a noção de paradigma da complexidade, foram de
grande valia para este trabalho. A própria escolha do tema e do objeto atestam essa
influência: as Ciências Sociais, o Direito e a Comunicação se encontram recorrentemente
dialogando entre si. Acrescente a isso o fato de que as questões que compõem o tema
trafegam por diversas esferas, como a econômica, a social, a política e a institucional. A
produção e o consumo de bens culturais mantêm conexões com variados aspectos da vida
dos indivíduos, influindo em suas escolhas pessoais e nas suas relações com o meio social.
A sociedade contemporânea é extremamente complexa; um único objeto pode estar
inserido numa rede de relações, e a ciência deve procurar compreender a realidade sem
perder de vista essa perspectiva.
A primeira fase de nossa pesquisa se constituiu no levantamento do material
bibliográfico pertinente, assim como documentos publicados pela Agência Nacional do
Cinema, pela Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura e de outras instituições
públicas ou privadas.
O passo seguinte foi a organização e a análise de todas as informações conseguidas,
com o objetivo de nos munir do arsenal teórico necessário. Vale registrar a dificuldade em
encontrar estudos sobre o mercado de cinema no Brasil; são poucas as publicações sobre o
assunto. Com relação aos dados numéricos apresentados no capítulo 5, a situação é um
pouco melhor, mas longe de ser a ideal. Nem sempre foi possível encontrar os dados
desejados ou a sua atualização ano a ano, o que talvez tenha limitado um pouco a nossa
proposta de diagnosticar a eficiência da atual Política Nacional do Cinema.
Após proceder à sistematização, reflexão e anotações preliminares sobre as
informações obtidas, o que restou foi partir para a elaboração do texto que ora se apresenta.
É claro que outros dados (teóricos ou numéricos) surgiram ao longo do percurso, sendo
13
incorporados quando necessários. A estrutura do trabalho divide-se em cinco capítulos,
além de uma conclusão ao final.
O primeiro capítulo, Conexões temáticas: aspectos gerais, expõe de forma
articulada as principais questões referentes ao tema de nosso estudo. É o espaço onde a
problemática envolvida procura ser apresentada, reservando aos capítulos seguintes os
aprofundamentos cabíveis. É assim, então, que o capítulo 2 adentra as discussões acerca da
globalização e seus efeitos sobre a identidade cultural. O capítulo 3 desenvolve as noções
de bem industrial e bem cultural aplicadas ao cinema, partindo da própria história deste. O
capítulo 4 discorre sobre as reformas políticas e administrativas ocorridas no país, e as suas
conseqüências para a indústria cinematográfica nacional.
O quinto capítulo apresenta os dados numéricos do setor de cinema, e ao final
procura tecer um breve balanço acerca dos resultados obtidos. Este capítulo merece atenção
à parte, pois é aqui que se estabelece o marco temporal de nossa pesquisa: procuramos
delimitar o estudo privilegiando o período que vai dos três anos anteriores ao
funcionamento da Agência Nacional do Cinema até os três primeiros anos de sua atuação,
ou seja, de 1999 a 2004. Dentro desse espaço de tempo foram analisados, primordialmente,
números referentes à produção brasileira e à ocupação de mercado do filme nacional, entre
outras variáveis. Tomamos o surgimento da ANCINE como um fato emblemático:
momento de aperfeiçoamento das reformas para a área cinematográfica no Brasil.
A forma técnica dos produtos audiovisuais considerados pela pesquisa também
constitui outra delimitação: o termo genérico “obra audiovisual” comporta algumas
espécies, como obra cinematográfica, obra videofonográfica, telefilme etc. Para os fins
desse estudo, foram consideradas apenas as obras cinematográficas, da forma que são
definidas pelo art. 1º, II da Medida Provisória 2.228/2001: “obra cinematográfica: obra
audiovisual cuja matriz original de captação é uma película com emulsão fotossensível ou
matriz de captação digital, cuja destinação e exibição seja prioritariamente e inicialmente o
mercado de salas de exibição”. Além disso, somente as obras cinematográficas de longa
metragem foram consideradas, assim como são definidas no inciso IX do mesmo artigo
mencionado acima: “obra cinematográfica ou videofonográfica de longa metragem: aquela
cuja duração é superior a setenta minutos”. Esses dois recortes justificam-se pelo motivo de
que esse é o formato cnico que circula no mercado exibidor, sendo o principal foco das
14
políticas para o setor de cinema. Ademais, os dados e estatísticas disponíveis dizem
respeito exatamente a esse tipo específico de obra audiovisual.
Neste quinto capítulo destacam-se as informações oferecidas pela própria Agência
Nacional do Cinema e pela Filme B, instituição privada que realiza estudos sobre mercado
de cinema e é responsável pelo repasse à ANCINE de alguns dados oficiais.
Por último, encontra-se o capítulo conclusivo, o qual tece considerações finais face
às informações e dados levantados e também aos marcos teóricos norteadores do estudo.
15
1 – CONEXÕES TEMÁTICAS: ASPECTOS GERAIS
No final dos anos 1970 o Estado do bem-estar social, nos países onde este existiu,
começa a enfraquecer-se. Como observa Claus Offe,
1
os vultosos gastos do Estado com
determinados programas sociais e o provimento de alguns bens públicos passam a ser
questionados. Como explicitaremos mais adiante, programas ou bens que são mais
facilmente aceitos enquanto carecedores do subsídio estatal, porém, por outro lado, existem
aqueles que encontram maior resistência da sociedade para arcar com suas despesas, pelo
motivo de serem considerados menos essenciais. As previsões que acreditavam no
fortalecimento do Estado de bem-estar à medida que a democracia se desenvolvesse não se
constataram. Pelo contrário, a própria democracia constituiu o fundamento para a mitigação
do caráter social de alguns Estados no século passado.
Com o advento do Neoliberalismo, o Estado deixa de prover a sociedade de bens
básicos. Tais bens passaram a ser oferecidos predominantemente pelo setor privado e, com
isso, deflagrou-se a tendência a serem tratados como qualquer outro produto negociável no
mercado. Essa perspectiva significa o fim do Welfare State e o começo de uma nova fase
onde a questão da cidadania se torna cada vez mais vinculada ao poder de consumo de cada
indivíduo.
O novo modelo de Estado que se configurou, o Estado Gerencial, privatizou as
empresas de serviços públicos, responsabilizando-se a partir de então apenas pela sua
regulação e fiscalização. Nesse contexto, as agências reguladoras que existiam nos
Estados Unidos e começavam a ser criadas em países da Europa passam a desempenhar
as novas atribuições do Estado neoliberal que se firmava, na virada da década de 1970 para
1980.
No Brasil, o neoliberalismo se aprofunda no início da década de 1990, no governo
do Presidente Fernando Collor de Mello, quando se aceleraram as privatizações de
empresas públicas, entre outras medidas. Porém, somente em meados daquela década é que
se iniciou a criação das primeiras agências reguladoras no país. Importante atentar para o
fato de que esse processo vinha sendo previsto desde a década anterior, pois a Constituição
OFFE, Claus. Capitalismo desorganizado: transformações contemporâneas do trabalho e da política.
Tradução de Wanda Caldeira et al. São Paulo: Brasiliense, 1989.
16
Federal de 1988 continha a autorização para a criação de duas agências: a Agência
Nacional de Telecomunições (ANATEL) e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) – artigos
21, XI, e 177, § 2º, III, respectivamente. Nesse sentido, pode-se considerar que a
Constituição Cidadã trazia indícios de harmonia com a condição da cidadania na era
neoliberal.
Essa política que se disseminou no mundo ocidental traz alterações para todos os
campos da vida social. Nesse contexto, o campo da cultura também sofreu as
conseqüências da conjuntura que se firmava. A tendência do novo modelo estatal de
desincumbir-se do provimento de bens sociais aos cidadãos alcança a esfera cultural, e esta
necessita adaptar-se aos códigos da economia de mercado. O cinema, devido as suas
características industriais de produção, foi demasiadamente afetado pela nova ordem.
1.1 – Cinema: o contexto internacional
Antes de nos fixarmos no contexto brasileiro é necessário tecer um breve panorama
sobre a indústria cinematográfica mundial nos dias de hoje. uma indústria hegemônica,
a norte-americana, que domina cerca de 85% do mercado dos países ocidentais. A indústria
cinematográfica norte-americana concentra-se na região de Hollywood e é constituída por
um oligopólio de empresas produtoras/distribuidoras que atuam internacionalmente,
subjugando a cinematografia de diversos países, muitas vezes utilizando-se de práticas
desleais de concorrência.
O cinema é um setor duplamente estratégico para os norte-americanos, pois através
dele empreende-se o domínio cultural, assim como a imposição de valores sociais e a
disseminação da cultura do consumo. Segue-se disto que a exportação de diversos outros
produtos é incentivada como resultado. Ou seja, a indústria cinematográfica hollywoodiana,
além de ela mesma gerar uma enorme receita, ainda contribui para o controle ideológico
sobre os demais países o que, dentre várias conseqüências, impulsiona outros setores da
indústria americana, que instiga o desejo pelo consumo de diversos produtos daquele
país.
Para assegurar a sua hegemonia no cinema e suas conseqüentes vantagens, os
Estados Unidos desenvolvem uma política dura contra os países que não abram seus
17
mercados para os filmes norte-americanos. Nesse contexto, a questão se torna cada vez
mais complexa, pois passa a envolver outras esferas econômicas de países dependentes, em
decorrência da técnica chantagista da potência hegemônica. Os países resistentes ao
domínio cultural têm de enfrentar as retaliações das exportações dos produtos que
sustentam a sua economia.
No periódico francês Le Monde, edição do dia 24/12/2004, encontramos um
exemplo de tal prática. O cineasta marroquino Nabil Ayouch organizou e fundou a
Coalizão Marroquina em Prol da Diversidade Cultural, a qual, entre inúmeras outras
reivindicações, visava impor quotas de cinema nacional na programação televisiva daquele
país (Marrocos). Os Estados Unidos foram duros na reação. Foi necessário haver:
“uma intervenção muito clara de Jacques Chirac junto às autoridades
marroquinas para que o pior seja evitado”, explicaram os assessores de
François Loos, o ministro delegado para o comércio exterior. “Os americanos
propuseram abrir o seu mercado para os produtos agrícolas marroquinos. Em
contrapartida, o Marrocos deveria de comprometer a renunciar a sua
soberania em relação às suas indústrias culturais”, sublinha o conselheiro de
Bernaud Donnedieu de Vabres, o ministro francês da cultura e da
comunicação.
Países que têm o seu cinema e sua economia prejudicados pela hegemonia norte-
americana, liderados pela França e Canadá, vêm tentando anos desenvolver um acordo
multilateral no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) para criarem um
instrumento internacional com a função de reger as transações comerciais para as questões
culturais. Esses países defendem um tratamento diferenciado para o comércio de bens
culturais e o estímulo à diversidade cultural. De outro lado estão os Estados Unidos, que
defendem a liberalização total dos mercados e a quebra das barreiras que impedem o livre
fluxo de produtos (inclusive os culturais) entre os países, com a clara intenção de assegurar
e aumentar o seu poder no panorama internacional.
Na verdade, a discussão a respeito do cinema é constituída pela oposição de duas
concepções distintas em relação ao consumo do cinema. De um lado, aqueles que entendem
que o cinema é apenas uma diversão, um entretenimento (entertainement), como os Estados
Unidos; de outro, os países que argumentam que o cinema é uma atividade cultural, como
18
França, Canadá, Austrália, Brasil... As políticas econômicas e culturais decorrentes de cada
uma dessas concepções não conseguem harmonizar seus interesses.
Os países que encaram o cinema como um mero entretenimento entendem que o seu
consumo é essencialmente o mesmo que o consumo de qualquer outro produto à venda no
mercado. Nesse sentido, assistir a um filme seria semelhante a jogar videogame ou comprar
o tênis da moda. Constituiria, assim, um produto o qual é consumido segundo as
preferências dos indivíduos perante o mercado, e os benefícios desse consumo seriam
apropriados pelo espectador privadamente. De acordo com essa lógica, não seria
justificável qualquer intervenção do Estado na seara dessas relações mercantis.
Segundo a concepção que encara o cinema como uma atividade cultural, o seu
consumo é distinto do consumo de outros bens à disposição no mercado, devendo, então,
receber um tratamento harmonioso com a sua condição diferenciada. Argumenta-se que o
consumo de um filme por um indivíduo enriquece o seu nível educacional e seu capital
cultural, de modo que o meio social em que vive seria todo ele beneficiado. Ou seja, o filme
possui uma função social assim como os bens públicos; toda a sociedade é favorecida pelas
externalidades positivas produzidas pelo consumo de um filme por cada espectador. Esses
benefícios externos, que não podem ser medidos por códigos mercadológicos, seriam,
segundo esta concepção, a principal justificativa para a intervenção estatal na área do
cinema, protegendo e incentivando as produções nacionais. É claro que este não é o único
argumento defendido por esta corrente; ainda as questões da identidade nacional, da
proteção do mercado de trabalho para os profissionais da área, entre outros.
O enfrentamento dessas duas correntes foi responsável pela impossibilidade de ser
celebrado um acordo satisfatório e a elaboração de um documento internacional, no âmbito
da OMC, para estabelecer as relações entre cultura e comércio. Nem os Estados Unidos
conseguiram a abertura dos mercados desejada; nem a corrente oposta conseguiu impor
suas concepções. Em decorrência do impasse que se prolongou por vários anos, a França e
o Canadá que lideravam a resistência dentro da OMC iniciaram um movimento por
um novo acordo capaz de criar condições especiais para os produtos culturais nas
transações comerciais. Nesse sentido, passou-se a defender a UNESCO (Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) como o foro internacional adequado
para celebrar tal acordo, pois esta seria a entidade propícia para as discussões de temas
19
culturais.
2
Foi assim que em 2001 surgiu a Declaração Universal sobre a Diversidade
Cultural, o primeiro passo para a celebração da Convenção sobre a Proteção e a Promoção
da Diversidade e das Expressões Culturais que foi aprovada em 20 de outubro de 2005, na
33ª. Conferência Geral da UNESCO, por maioria esmagadora dos países votantes: 148 x 2,
com 4 abstenções. Como afirmou o Ministro da Cultura Gilberto Gil, “através de uma lei de
direito positivo internacional, a Convenção vai dar respaldo às ações dos Estados, vai dar o
direito de cada país proteger e promover suas culturas. Vai dar mecanismos importantes
para a associação cada vez mais imprescindível entre cultura e desenvolvimento, para que,
de um lado, o desenvolvimento tenha a face humana e, de outro, também se beneficie pelas
áreas culturais economizadas, pela economia da cultura”.
3
1.2 – O cinema no Brasil
O cinema chega ao Brasil ainda no final do século XIX. No ano de 1896 são
realizadas as primeiras exibições de filmes em solo nacional, no Rio de Janeiro (Rua do
Ouvidor). Eram fitas de curta-metragem todas oriundas do exterior, principalmente Europa.
A primeira filmagem efetivamente feita no país também foi no Rio de Janeiro, ocorrida em
1898. Segue-se daí um crescimento paulatino das atividades em torno da novidade que
surgira. Porém, em 1907, com a chegada da energia elétrica à cidade, as salas de exibição
se multiplicam e as filmagens se intensificam. Esse período altamente movimentado
perdura até 1911, quando o setor sofre o primeiro abalo por causa do produto externo.
Como observa o saudoso crítico e professor de cinema, Paulo Emílio Salles Gomes:
Essa idade de ouro não poderia durar, pois sua eclosão coincide com a
transformação do cinema artesanal em importante indústria nos países mais
adiantados. Em troca do café que exportava, o Brasil importava até palito e
era normal que importasse também o entretenimento fabricado nos grandes
centros da Europa e da América do Norte. Em alguns meses o cinema
nacional eclipsou-se e o mercado cinematográfico brasileiro, em constante
desenvolvimento, ficou inteiramente à disposição do filme estrangeiro.
4
2
SENNA, Orlando. Diversidade cultural e audiovisual. Fonte: Site do Ministério da Cultura República
Federativa do Brasil, 01/11/2003.
3
Fonte: Site do Ministério da Cultura – República Federativa do Brasil, 21/10/2005.
4
GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980,
pp. 29-30.
20
A partir daí, o cinema brasileiro nunca mais conseguiria se livrar da asfixia causada
pela invasão das produções estrangeiras. Os grandes estúdios de Hollywood começavam a
se
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s
A EMBRAFILME era uma empresa de economia mista que foi fundada em 1969 e
sofreu uma reestruturação em 1975, quando recebeu novas atribuições como o
financiamento para a produção de filmes e para a sua distribuição. Ou seja, o Estado
fomentava diretamente, com recursos públicos, o setor de cinema nacional. No período de
funcionamento da EMBRAFILME vislumbrou-se a maior produção de filmes realizada no
país, e o market share (ocupação do mercado) foi altamente expressivo. A distribuidora da
empresa chegou a concorrer com as maiores distribuidoras norte-americanas instaladas em
território nacional. Entretanto, a partir de meados da década de 1980 a empresa começou a
apresentar problemas financeiros e a sua produtividade não conseguia alcançar os
resultados de anos anteriores. Problemas com numerosas críticas em relação a sua gestão,
mormente a respeito de favorecimento para projetos de determinados produtores e
diretores, também foram responsáveis pelo declínio da empresa, culminando com a sua
extinção em 1990.
6
Junto com a EMBRAFILME também foram extintas mais duas instituições que,
juntas, formavam um tripé de sustentação do cinema nacional: o CONCINE e a Fundação
Nacional do Cinema. O resultado do desmonte desses órgãos foi lamentável para o setor do
cinema no país. A produção ficou reduzida a quase zero, os profissionais da área passaram
por grandes dificuldades, o cinema hegemônico norte-americano ampliou ainda mais o seu
domínio no mercado.
Com o fim da “era da EMBRAFILME” o cinema no Brasil passa por um período de
ausência total de qualquer auxílio estatal para a sua sustentação. Somente em 1993, quando
é criada a Lei 8.685/93 (Lei do Audiovisual) e com as alterações que esta trouxe à Lei
8.313/91 (Lei de Incentivo à Cultura), o Estado volta a oferecer algum tipo de auxílio para
o setor. Porém, a partir de então, o fomento à produção se dá de forma indireta por meio de
incentivos fiscais. Nesse contexto, são os agentes do mercado (principalmente empresas)
quem escolhem os projetos que irão receber os recursos para a produção. No final das
contas é o Estado quem acaba financiando os filmes, pois o mecanismo de incentivos
fiscais implica em desconto no imposto de renda das empresas envolvidas. O processo de
escolha dos projetos a serem financiados, entretanto, não é mais papel do Estado.
6
AMANCIO, Tunico. Artes e manhas da EMBRAFILME: cinema estatal brasileiro em sua época de ouro
(1977 – 1981). Niterói: EdUFF, 2000.
22
Importante ressaltar que o elo da distribuição deixou de ser auxiliado com o advento
da nova política nacional do cinema. Como se sabe, a cadeia do cinema é formada por três
elos inter-relacionados: a produção, a distribuição e a exibição. A distribuição constitui o
elo fundamental na medida que é a ponte entre a produção de cada filme e a sua exibição.
foi dito que no elo da distribuição existe um oligopólio, formado por empresas norte-
americanas, que dominam o mercado na maioria dos países do mundo ocidental e no Brasil.
Sob essa perspectiva, o que tem ocorrido é a existência de um gargalo no elo da
distribuição, onde os filmes nacionais não conseguem adentrar, com exceção daqueles que
fecham contratos com alguma das distribuidoras do oligopólio. O resultado dessa situação é
que a maioria dos filmes brasileiros não chega ao elo da exibição; são realizados e não são
vistos.
1.3 – Função social dos filmes e justificativa para o subsídio estatal
Os filmes cumprem a sua função social quando são exibidos e o seu consumo
pelos espectadores. Diante disso, pode-se dizer que as produções que não são exibidas não
alcançam o objetivo final pelo qual foram produzidas. Essa situação é muito preocupante
para o cinema no Brasil, pois o seu subsídio pode vir a ser considerado um gasto
desnecessário do Estado. Claus Offe chama à atenção o fato de que para haver uma
motivação para cooperar com a produção de bens públicos é fundamental “uma certa noção
de comunhão de interesses e de destino comum, de ‘semelhança’, ou de uma concepção
suficientemente vinculatória de identidade coletiva duradoura”.
7
E acrescenta, ainda, que o
caráter de bem público não é qualidade desse bem, mas o reflexo da interpretação que a
sociedade lhe atribui. Nesse sentido, conclui-se que a justificativa para a ajuda do Estado ao
cinema depende do cumprimento da função social dos filmes realizados, de forma que toda
a sociedade goze, coletivamente, dos benefícios de ter sua cultura retratada e documentada
nas telas. Em outras palavras: para haver a anuência dos indivíduos de uma sociedade em
relação aos encargos do Estado para a sustentação da indústria do cinema, é necessário que
7
OFFE, Claus. Capitalismo desorganizado: transformações contemporâneas do trabalho e da política.
Tradução de Wanda Caldeira et al. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 301.
23
os filmes produzam externalidades positivas que sejam aproveitadas por toda essa
sociedade – e não apenas pela classe cinematográfica.
A ausência da função social cumprida e visível para todos induz a uma circularidade
auto-reprodutora e prejudicial para a relação entre o cinema e o sentimento de identidade
coletiva nacional, de que fala Claus Offe. Ou seja, se o cinema não for considerado como
um bem público que beneficie a “nós”, o fundamento para que o Estado o inclua em
seus gastos. Os indivíduos não estariam dispostos a cooperar (via encargos fiscais) com a
produção de um bem que somente traz benefícios para uma classe profissional em
particular. Acontece que o próprio cinema de um país, assim como os outros meios
audiovisuais, se trata de um aparelho poderoso para imprimir um sentimento de
coletividade entre os indivíduos de uma sociedade. No caso do seu enfraquecimento o
que fatalmente ocorrerá se deixar de receber subsídios estatais o mercado nacional ficará
suscetível a uma maior dominação pelo cinema hegemônico estrangeiro, o que seria
catastrófico para a noção agregadora de identidade nacional em um contexto mais amplo,
no longo prazo. Por fim, essa falta de idéia vinculatória entre os indivíduos retorna ao
campo do cinema, fundamentando o descompromisso do Estado com o setor e fechando,
assim, o círculo auto-reprodutor negativo. Essa circularidade pode ser mais bem
compreendida se evocada, como complemento, a noção de recursividade explicada por
Edgar Morin:
A organização recursiva é a organização cujos efeitos e produtos são
necessários a sua própria causação e a sua própria produção. É, exatamente, o
problema de autoprodução e de auto-organização (...) O processo social é um
círculo produtivo ininterrupto no qual, de algum modo, os produtos são
necessários à produção daquilo que os produz.
8
Sob a luz das concepções de Claus Offe, podemos apontar pelo menos mais duas
dificuldades inter-relacionadas que afetam a dependência do cinema em relação ao Estado.
A primeira diz respeito à precariedade da noção de cinema como um bem público
merecedor de subsídios. Claus Offe esclarece que bens mais facilmente justificáveis
como carecedores de ajuda estatal, como são os casos do setor de saúde e da pensão na
idade avançada, por exemplo; outros, porém, encontram maior resistência perante o
8
MORIN, Edgar. Ciência com Consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória.
7ª. ed., revista e modificada pelo autor. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p.182.
24
consentimento popular. A cultura (e o cinema) certamente se insere entre estes últimos. A
segunda dificuldade refere-se a maior resistência dos indivíduos em suportar encargos
fiscais ou corroborar gastos estatais a respeito de determinadas atividades consideradas
não-essenciais em períodos de crises econômicas. No Brasil, como se sabe, as crises são
freqüentes e o orçamento do Estado é insuficiente.
Contudo, o Estado brasileiro vem tentando criar medidas que consigam avanços
para o setor do cinema no país, a partir da pressão dos profissionais da área e de pessoas
ligadas à cultura e à intelectualidade nacional, responsáveis por afirmar a importância do
fortalecimento cultural e educacional para o desenvolvimento do Brasil em todos os
setores. É necessário compreender que até os setores considerados como os mais
justificáveis para o recebimento de ajuda estatal dependem, para o seu desenvolvimento, da
elevação cultural e educacional do país. E o cinema é um veículo potencial para contribuir
nesse sentido. Desse modo, a ajuda do Estado ao cinema o significa prejuízos para, por
exemplo, a saúde ou a aposentadoria; significa, ao contrário, avanços para todos os campos
da sociedade. Entretanto, é indispensável frisar que para que esta proposição seja uma
realidade é essencial que os filmes produzidos sejam exibidos e cumpram a sua função
social, produzindo externalidades positivas que trarão benefícios coletivos para toda a
sociedade.
1.4 – A Agência Nacional do Cinema
A principal medida recente para o desenvolvimento do cinema brasileiro foi a
criação da Agência Nacional do Cinema, em 2001. Na verdade, a ANCINE começou a
funcionar, de fato, no ano seguinte (2002). Suas atribuições estão relacionadas
principalmente às atividades cinematográficas ligadas ao mercado, as quais vinham sendo
administradas pelo Ministério da Cultura, através de sua Secretaria do Audiovisual. Para
este órgão restaram atribuições de caráter cultural como, por exemplo, a preservação dos
acervos e o apoio a mostras retrospectivas. (Ver Anexo 4 – Medida Provisória 2.228/2001 e
Anexo 5 – Decreto nº 4.456/2002)
A ANCINE é uma agência reguladora, uma entidade da administração indireta do
Estado e que tem a natureza jurídica de autarquia de regime especial. Possui autonomia
25
financeira e estabilidade de seus dirigentes, para que seja garantida a sua independência
perante as contingências governamentais. A missão institucional da ANCINE compreende
a regulação, a fiscalização e o fomento das atividades cinematográficas no país.
O Brasil faz parte da corrente que defende o status de bem cultural para o cinema,
de modo que se justifica a intervenção do Estado para garantir o desenvolvimento do setor.
Contudo, a política nacional do cinema que se vislumbra a partir do início da década de
1990 parece estar mais de acordo com os ventos neoliberais que aqui chegavam exatamente
naquele período.
Com a criação de uma agência reguladora instituição típica de um ambiente
neoliberal para administrar o setor de cinema no Brasil, percebe-se a clara intenção de
estreitar os laços entre o setor e as regras da economia de mercado. Aliás, é oportuno
lembrar a afirmação do Ministro da Cultura Gilberto Gil feita em um discurso por ocasião
da posse de dois novos diretores da ANCINE, no primeiro semestre de 2005: segundo o
ministro é preciso “dar um choque de capitalismo no cinema nacional”. Nota-se, com isso,
um paradoxo nas diretrizes que orientam a política para o cinema brasileiro. Ao mesmo
tempo em que o país se liga ao bloco de países defensores do caráter cultural do cinema e
do seu tratamento diferenciado em transações comerciais, proclama, por outro lado, a
necessidade de adaptação do cinema à lógica capitalista neoliberal.
Importante esclarecer, porém, que esse paradoxo não é determinantemente
prejudicial para o cinema nacional, pois, como diz Edgar Morin, sob a ótica do paradigma
da complexidade é perfeitamente possível que situações e fatos contraditórios coexistam no
mundo sem causar grandes transtornos. Nesse sentido, a existência de duas políticas que, a
princípio, são opostas pode ser capaz de gerar progressos para o setor cinematográfico,
desde que haja um equilíbrio entre ambas. Ou seja, o perigo é que alguma delas seja causa
de obstrução da outra. De fato, o cinema precisa do mercado para sobreviver, entretanto
nem de relações econômicas vive uma sociedade. O problema que se coloca é a ameaça
trazida pelo “pensamento único”, o qual torna o referido equilíbrio algo extremamente
difícil de ser colocado em prática. O neoliberalismo tende a não permitir o convívio com
lógicas que escapem a sua própria.
A situação é extremamente delicada pelo motivo de envolver diversos interesses em
jogo. É claro que é desejável o desenvolvimento da indústria cinematográfica brasileira,
26
pois seria positivo para a economia do país e ampliaria as oportunidades de empregos para
todas as sub-áreas que constituem essa complexa atividade, entre outros motivos. Porém,
subjugar completamente uma atividade cultural/artística aos códigos mercadológicos e
financeiros constitui um preço elevado demais para alcançar tal desenvolvimento, que a
tendência seria a mediocrização dos filmes realizados, visando apenas servir de
entretenimento ao maior número de espectadores (a massa) e angariar o maior lucro
possível. Como efeito de comparação basta citar o caso da televisão. Segundo o
conceituado jornalista e professor de comunicação Muniz Sodré,
9
o baixo nível da
programação televisiva se deve justamente ao comprometimento deste meio de
comunicação com a economia de mercado. A dependência da televisão em relação aos
investidores, patrocinadores e apoiadores traz a exigência de alcançar o grande público, o
que é possível através de linguagens homogêneas, simplificadoras, conservadoras etc.
Desse modo, é necessário discutir a questão do cinema com o maior cuidado possível, para
que um dos mais importantes meios de propagação da cultura nacional não seja sufocado
pela globalização da política neoliberal em curso.
A Agência Nacional do Cinema tem, nesse contexto, o papel de colocar em prática a
Política Nacional do Cinema. Algumas de suas principais funções são a defesa e a
promoção da cultura nacional e da diversidade cultural. Por esta última entende-se o
intercâmbio com as produções dos mais variados países, e não somente o consumo de
filmes de um único produtor hegemônico.
Podemos encontrar na Medida Provisória 2.228-1, de 6 de setembro de 2001,
responsável pela criação da ANCINE, vários momentos onde são enunciados os objetivos
de caráter protecionista. Como exemplo, podemos citar o art. 6º, inciso I: “A ANCINE terá
por objetivos: I – promover a cultura nacional e a língua portuguesa mediante o estímulo ao
desenvolvimento da indústria cinematográfica e videofonográfica nacional em sua área de
atuação”. Ainda o art. 6º, em seu inciso VIII, enuncia: “garantir a participação diversificada
de obras cinematográficas e videofonográficas estrangeiras no mercado brasileiro”.
9
SODRÉ, Muniz. O monopólio da fala. Função e linguagem da televisão no Brasil. 7ª.ed. Petrópolis: Vozes,
2001.
27
2 – IDENTIDADE CULTURAL E GLOBALIZAÇÃO
Muita discussão já foi travada a respeito dos efeitos da globalização sobre a questão
da identidade. De fato, as transformações ocorridas nas últimas décadas em especial o
enfraquecimento das instituições atribuidoras de identidade trouxeram alterações
significativas para o tecido social. Os indivíduos começam a ter sua identidade ancorada em
outros meios. Como veremos adiante, a oferta de matéria para a constituição da identidade
passa, gradualmente, para o campo do mercado e da indústria do entretenimento.
É claro que esse processo, iniciado na primeira metade do século passado, não
ocorreu de um dia para o outro, mas chega aos nossos dias num grau extraordinariamente
avançado. Em tempos de capitalismo tardio a imbricação entre economia e cultura é
apanágio das sociedades ocidentais, de modo que não como estudá-las sem levar em
consideração esse fato.
Como vem sendo dito por rios teóricos da pós-modernidade, entre eles Jean
Baudrillard e Zygmunt Bauman, vivemos hoje em uma sociedade de consumo. Nessa
conjuntura, a ênfase da produção o se concentra mais nas mercadorias, mas sim nos
consumidores. A serialização dos produtos é uma característica do passado; atualmente são
os indivíduos, na modalidade de consumidores, que são produzidos em série. Hoje em dia,
as mercadorias são produzidas com diversas nuances para atender aos mais variados gostos.
É sempre possível encontrar o produto que seja adequado aos seus desejos e a sua
personalidade. Nesse sentido, não importa o que está sendo consumido; o que interessa é
que se esteja consumindo algo. Por isso, configurou-se uma enorme indústria de
publicidade, responsável muitas vezes por produzir consumidores antes mesmo das
mercadorias. É possível afirmar que dessa forma o que são criadas são novas necessidades
que até então não existiam. É sobre o desejo que as empresas publicitárias atuam para
instigar os indivíduos ao consumo. Entretanto esse desejo é sempre precário e instável, pois
se esgota assim que o consumo é realizado, dando lugar a novos desejos, já que a
publicidade não pára de acenar com as últimas novidades que precisam ser experimentadas.
A única coisa que é realmente duradoura nesse quadro é a própria cultura do consumo, a
qual é filha legítima do casamento entre economia e cultura.
28
É necessário saber que não são apenas mercadorias que estão à venda no mercado,
mas também identidades. As mercadorias contêm, intrinsecamente, uma ideologia, de
forma que os indivíduos procuram expressar a sua identidade através do seu consumo. Não
é exagero afirmar que vários produtos têm o seu consumo determinado não pelo seu valor
de uso, importando mais a sua estética e os mbolos de um estilo de vida que se deseja
usufruir. Em outras palavras: a mercadoria é consumida esteticamente; consome-se
ideologia.
Na contemporaneidade o ato de consumir vem sendo associado com a condição de
liberdade. Além disso, a liberdade de escolher entre várias identidades é incentivada e
festejada por políticos e pela mídia. Porém, o que importa para o mercado, é claro é
viver sob o processo de escolhas, e não finalmente alcançar aquela que seja a ideal. A
mensagem que se encontra embutida nessa ideologia profere que brecar o processo de
experimentação de novas identidades justamente por ter encontrado uma firme e sólida
seria uma limitação da capacidade (da liberdade) de escolha.
Como observa Zygmunt Bauman,
1
o direito a escolher uma dentre as identidades
possíveis se tornou fator de hierarquização social. Atribuir para si próprio uma identidade
que se deseja é ao mesmo tempo negar outras que a sociedade poderia lhe imputar sem o
seu consentimento. Nesse contexto, a base da sociedade seria constituída por aqueles
indivíduos que não possuem o direito de escolher que identidade reivindicam para si. Nos
tempos de hoje a exclusão social configura-se um dos principais problemas causados pelo
sistema capitalista; e uma das facetas dessa exclusão é justamente o impedimento de se
enquadrar entre aqueles que tem a capacidade para optar pela sua própria identidade. Essa
realidade é geradora de pessoas vítimas do estereótipo e da estigmatização, o que é
alimento para diversas tensões sociais, que a sociedade é polarizada entre “livres” e
“excluídos”.
Toda essa situação é conseqüência de um projeto globalizador o qual traz em seu
interior a mercantilização de todos os campos da vida e da cultura. Esta, aliás, constitui para
tal lógica apenas o lugar de onde são retirados fragmentos que fora de seu contexto
perdem o seu sentido para a concepção de produtos estetizados a serem comercializados.
1
BAUMAN, Zygmunt. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.
29
A política, refém do capital e do mercado, procura difundir a ideologia que faz a associação
entre o consumo desses produtos e a condição de liberdade.
Com relação à ideologização da liberdade na pós-modernidade é extremamente
válido atentar para a lúcida observação de Fredric Jameson:
É em especial importante estabelecer uma distância irônica da retórica da
liberdade não apenas o livre comércio, mas liberdade de expressão, de
circulação de idéias e de “propriedades intelectuais” que acompanha esta
política. A base material das idéias e dos produtos culturais são as
instituições de reprodução ou de transmissão, que hoje em dia são facilmente
identificadas em qualquer lugar: são as grandes corporações baseadas no
monopólio da tecnologia relevante de informação; assim, a liberdade dessas
corporações (e de seu estado-nação dominante) não são a mesma coisa que
nossa liberdade como indivíduos ou como cidadãos. Na mesma linha, as
políticas complementares de copyright, de patentes, de propriedade
intelectual, indissociáveis dessas políticas internacionais, nos alertam para o
fato de que a tão aspirada liberdade de idéias é importante justamente porque
essas idéias são propriedade privada e foram projetadas para serem vendidas
em grandes quantidades lucrativas. (JAMESON, 2001: 51)
2.1 – A colonização cultural estratégica
Os meios de comunicação de massa e a indústria do entretenimento têm um papel
fundamental na propagação da ideologia do consumo. O seu poder de disseminar idéias e
valores no meio social é inegavelmente muito grande, e vem sendo analisado por estudiosos
desde a Escola de Frankfurt. O cinema tem sido um dos principais veículos para o
transporte dos valores liberais, além de movimentar grandes somas de dinheiro. Os Estados
Unidos país essencialmente responsável pelo projeto globalizador, segundo Jameson
atentaram muito cedo para tal potencial contido no cinema, incluindo-o com destaque em
sua política econômico-cultural. De acordo com o mesmo, os Estados Unidos procuram
assegurar a dominação de seus filmes nos mercados estrangeiros por meio da política desde
o fim da Segunda Guerra Mundial. A tática era incluir cláusulas nos tratados e pacotes de
ajuda econômica os condicionando a várias contrapartidas, dentre os quais a quantidade de
30
filmes norte-americanos que deveriam ser exibidos no território do país “ajudado”. O Plano
Marshall, por exemplo, continha prescrições desse tipo direcionadas principalmente à
Inglaterra, Alemanha e Itália. A invasão do cinema norte-americano no mercado desses
países causou profundas conseqüências sociais, sem falar nos danos causados a suas
cinematografias nacionais.
Mais recentemente, quando as conversações sobre o fluxo de bens culturais estavam
sendo realizadas no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), a tática norte-
americana foi tentar enquadrar os subsídios estatais oferecidos por vários países as suas
produções domésticas como concorrência desleal no campo internacional. Os Estados
Unidos são o único país do Ocidente que possui uma indústria cinematográfica auto-
sustentável, porém isso se tornou possível justamente por causa da sua política econômico-
cultural ofensiva perante os mercados estrangeiros, a qual permite uma expressiva
circulação de seus filmes. O domínio de seu cinema dentro do mercado de praticamente
todos os países ocidentais impede que as indústrias nacionais sejam auto-suficientes,
necessitando do apoio econômico do Estado. Como não é difícil de imaginar, o
enquadramento da ajuda econômica estatal como concorrência desleal significaria o “tiro
de misericórdia” nos demais cinemas, com o conseqüente domínio completo da indústria
cinematográfica norte-americana.
Felizmente, essa tentativa não obteve sucesso e as negociações em torno do
comércio de bens culturais não está mais sendo realizada na OMC. As discussões foram
transferidas para a UNESCO, onde vêm avançando muito lentamente, de forma que a
situação continua basicamente a mesma dos últimos anos. Entretanto, a tensão entre os
interesses dos Estados Unidos e a resistência cultural dos demais países é permanente.
A ambição norte-americana em ampliar ainda mais o mercado para seus filmes, e ao
mesmo tempo enfraquecer as cinematografias nacionais, é explicada pelos fatores
econômico e cultural. O econômico diz respeito à receita obtida com a comercialização dos
filmes nos variados mercados consumidores. A indústria cinematográfica estadunidense
necessita dessa renda para continuar garantindo a sua auto-sustentabilidade. O fator cultural
tem relação com a influência que o cinema exerce na sociedade. Essa difusão de valores,
costumes e práticas liberais garante a perpetuação do consumo do próprio cinema
americano, como também alimenta o desejo por consumir outros produtos estetizados pelos
31
filmes. A gravidade dessa situação é pelo fato de que toda a sociedade é reorganizada em
função de um telos consumista. A partir daí, os sistemas culturais específicos começam a
ser destruídos e uma cultura homogeneizada passa a se instalar em seu lugar.
Fredric Jameson é enfático em seu diagnóstico a respeito da invasão dos filmes
americanos em territórios estrangeiros:
A questão é que, em combinação com a ideologia do mercado livre, o
consumo das formas cinematográficas hollywoodianas é o aprendizado de
uma cultura específica, de uma vida cotidiana como prática cultural uma
prática cuja expressão estética é a narrativa mercantilizada –, de tal forma
que a população em questão aprende as duas coisas ao mesmo tempo.
Hollywood não é apenas o nome de um negócio altamente rentável, mas é
também o nome de uma revolução cultural fundamental do capitalismo
tardio, na qual se destroem antigos modos de vida e se colocam modos novos
em seu lugar. (JAMESON, 2001: 54-55)
2.2 – Individualismo: a fragmentação social
Esse “motor único” capitalista, que é abastecido prioritariamente por lucros
financeiros cada vez maiores, não cessa a busca pela conquista de novos territórios onde
possa expandir os seus negócios. Dentre as várias práticas imprimidas com esse objetivo
destacamos duas para demonstrar os problemas causados às sociedades exploradas e
submetidas aos interesses globalizantes. Importante, porém, ressaltar que estamos
preocupados com os danos que recaem sobre a questão da identidade, e também a respeito
das relações que esta mantém com a resistência perante as ambições capitalistas sem freios
e com a busca por condições de existência mais humanas.
A primeira prática é a procura por territórios com mão-de-obra barata, o que
importa na flexibilização das normas de trabalho. Como observa Richard Sennett,
2
essa
condição retira dos indivíduos a possibilidade de tecer projetos de longo prazo e, além
disso, proporciona conseqüências negativas para o seu caráter. Este é abalado por
experiências de vida fragmentadas, por laços de amizade, lealdade, companheirismo ou
coletividade muito frágeis. As constantes trocas de emprego e de colegas de trabalho
2
SENNETT, Richard. A corrosão do caráter. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004.
32
minam o compromisso mútuo e afastam a solidariedade das relações pessoais. Assim, a
flexibilidade retira os alicerces dos valores duradouros e um imediatismo permanente passa
a reger os espíritos; o caráter se torna ele mesmo flexível. O resultado é o esvaecimento do
senso de coletividade ou mesmo de nação dentro de cada país, de modo que os projetos de
vida se tornam progressivamente mais individualizados. Nesse contexto, a sociedade passa
a ser regida pela lógica do “cada um por si”, do “salve-se quem puder”.
A segunda prática do “motor único” que nos interessa analisar é a busca pela
ampliação de indivíduos consumidores, o que implica na liberação dos mercados mundiais.
É aí que ocorre a fetichização das mercadorias, assim como a fabulação sobre os progressos
trazidos pela globalização. Assim, a identidade sofre as conseqüências diretas oriundas da
reestruturação da sociedade em função do consumo. Com isso são empresas multinacionais,
em última instância, as instituições responsáveis pela constituição da identidade das
pessoas. Acontece que a ordem consumista também é geradora de uma ética individualista,
reforçando o descomprometimento com causas coletivas.
Como sublinha Zygmunt Bauman,
3
um efeito preocupante da queda da
solidariedade humana e da intensificação do individualismo pode ser sentido com o
enfraquecimento da Política, ou seja, o empenho para dar a devida atenção e tratamento às
questões públicas. Em contrapartida, o que vem ocorrendo é o fortalecimento da “política-
vida”, de forma que as soluções para os problemas de qualquer natureza devem ser
perseguidas individualmente, cada um utilizando seus próprios esforços (e para si). A
sociedade caminha numa progressiva fragmentação, que cada indivíduo percorre um
diferente trajeto buscando soluções específicas às questões identitárias, emocionais,
econômicas etc. Esse desengajamento para a Política desarticula as possibilidades de
resistência à perversidade sistêmica da globalização, na medida em que a cooperação social
se encontra empobrecida e as questões pessoais (privadas) figuram como as
primordialmente importantes.
Como vimos, na ordem global contemporânea tanto a esfera da produção quanto a
do consumo produzem conseqüências negativas na sociedade, as quais podem ter seus
reflexos sentidos no campo da identidade, que por sua vez revela um entrelaçamento
inexorável entre as noções de cidadão e consumidor na atual conjuntura. É claro que cada
3
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
33
país sente esses efeitos de uma forma distinta, em um diferente grau. No mesmo sentido,
acredita Jameson, não uma forma universal de combater os efeitos danosos da
globalização no interior dos países, cada qual devendo se valer das bases materiais,
culturais e políticas para imprimir a resistência de acordo com suas necessidades e
possibilidades. No entanto, é necessário em primeiro lugar vencer as forças que produzem a
fragmentação da sociedade e difundir um sentimento comum entre os indivíduos.
Segundo Jameson, o esforço no sentido de brecar a voracidade do pensamento
único” deve ser encarado como um “projeto coletivo”, imbuído mesmo de um espírito
nacionalista. Daí ele distinguir entre dois tipos de nacionalismo: um positivo e um outro
negativo. Este seria aquele em que o que se pretende é apenas tomar o poder do Estado para
favorecimento próprio; seria, por exemplo, o caso da burguesia nacional. O positivo seria
justamente quando existe o sentimento de projeto coletivo, carregado de solidariedade e
colaboração. É esse nacionalismo que figura como uma precondição essencial para levar
adiante uma luta política efetiva em prol de melhores condições de vida para todos.
É preciso, contudo, ter a consciência de que a questão central não é ser contra ou a
favor da globalização. Milton Santos
4
adverte que ela se trata de um processo irreversível,
especialmente pelo motivo do avanço das técnicas de informação. Nesse sentido, as atitudes
contrárias à globalização não devem ser ingênuas, e precisam concentrar-se naqueles
aspectos nocivos à condição humana gerados pela lógica focada exclusivamente nos lucros
financeiros. O que deve ser perseguido então é um redirecionamento de seus objetivos, de
modo que o homem passe a ocupar o centro gravitacional hoje ocupado pelo dinheiro
desse processo.
2.3 – Coletividade nacional
É imprescindível esclarecer que a “identidade nacional” é uma noção ligada à
modernidade. Foi com o surgimento dos Estados-nações que se forjou o projeto unificador
de cultura e identidade nacionais. Bauman
5
vai mais longe e diz que o próprio conceito de
identidade é inventado, não existindo em comunidades primitivas ou pré-estatais. Foi com a
unificação cultural e étnica empreendida pelo Estado que se estabeleceu a separação entre
4
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização. 12ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2005.
5
BAUMAN, Zygmunt. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.
34
“nós” e “outros”, daí originando a própria idéia de identidade. Stuart Hall
6
pensa diferente:
para ele existiam outras instituições responsáveis por fornecer subsídios para a
constituição de um senso de identidade, como, por exemplo, a tribo, a região e a religião.
Ambos os autores, concordam, todavia, que a questão da identidade nacional nasceu junto
com o Estado moderno, quando este procurava legitimar a sua própria soberania. Nesse
sentido, intencionava-se que tal identidade preponderasse sobre as outras formas
identitárias, ao mesmo tempo em que costumes e tradições eram nacionalizados.
Contudo, a idéia de unicidade de qualquer cultura nacional não é verdadeira, por
causa da tamanha heterogeneidade dos modos de vida humanos. Mesmo que o objetivo
fosse ignorar as diferenças e reunir sob um mesmo título distintas características, esse
projeto nasceu fadado à permanente inconclusão. O tempo acabou por revelar essa
realidade, apesar de os esforços para manter a idéia de uniformidade continuarem. Nas
palavras de Stuart Hall:
Em vez de pensar as culturas nacionais como unificadas, deveríamos pensá-
las como constituindo um dispositivo discursivo que representa a diferença
como unidade ou identidade. Elas são atravessadas por profundas divisões e
diferenças internas, sendo “unificadas” apenas através do exercício de
diferentes formas de poder cultural. Entretanto como nas fantasias do eu
“inteiro” de que fala a psicanálise lacaniana as identidades nacionais
continuam a ser representadas como unificadas (...) A Europa Ocidental não
tem qualquer nação que seja composta de apenas um único povo, uma única
cultura ou etnia. As nações modernas são, todas, híbridos culturais. (HALL,
2001: 61-62)
Como pode ser observado no texto de Stuart Hall, nem mesmo as nações européias,
as quais acredita-se que estão entre as mais puras e uniformes, são constituídas apenas por
uma mesma cultura. Pelo contrário, elas são fruto da reunião de culturas distintas e sua
convivência nem sempre é tão bem resolvida.
No caso dos países colonizados, até mesmo pelo fato de terem uma história mais
recente, é possível ver com mais facilidade a hibridização de diferentes culturas. A
aculturação promovida pelos colonizadores europeus não se fez total e completa, de modo
6
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10ª Edição. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.
35
que sufocasse as expressões locais, ou que influências outras não introduzissem seus
símbolos e costumes.
A cultura brasileira, por exemplo, é constituída a partir da influência de diversas
culturas, povos e etnias que acabaram se misturando e resultando na heterogeneidade
cultural desse país. Os símbolos e costumes de diversas origens acarretaram, com a
dialética que se estabeleceu entre eles, na riqueza e originalidade da cultura brasileira. É
claro que essa mistura não se de forma completamente harmônica, espaços para
atritos e crises internas que permanentemente emergem. De qualquer forma, é essa
expressão cultural híbrida extremamente rica que marca a nossa diferença perante os
demais países e que pode nos propiciar um sentimento de coletividade nacional.
Essa cultura local vem sendo ameaçada pelos interesses globalizantes, que
mercantilizam frações de cultura ao mesmo tempo em que desarticulam o meio social em
que passam a operar. Nesse sentido, é com base no entendimento de que fazemos parte de
uma mesma nação ainda que multifacetada culturalmente em seu interior que deve ser
pensada a resistência contra as práticas responsáveis por colocar em risco o
desenvolvimento natural de nossas expressões culturais e identitárias. Como tivemos a
oportunidade de ressaltar, os prejuízos gerados pela globalização (da forma que vem sendo
empreendida) não se resumem aos danos culturais e identitários, entretanto é com o abalo
dessas esferas que se origina o desengajamento para a Política e a falta de empenho em um
“projeto coletivo” o qual busque melhorias para os demais campos da vida humana, como o
econômico e o social – extremamente afetados pelo avanço do neoliberalismo.
A questão é que a identidade nacional vem perdendo força e, em contrapartida,
identidades oferecidas pelo mercado estão ganhando espaço. Assim, o “projeto coletivo”
por melhores condições de vida para todos está ameaçado, já que a cultura disseminada
pelas empresas multinacionais proporciona o individualismo e a fragmentação social.
2.4 Malefícios da globalização: a potencial contribuição de resistência das expressões
artísticas
Na mesma linha de raciocínio, o multiculturalismo, característico de um país como
o Brasil, também se encontra ameaçado, na medida em que expressões locais são sufocadas
36
pela cultura plastificada e padronizada oferecida em seu lugar. Por todo o país o que se
constata é o desaparecimento de hábitos e manifestações regionais, de igual maneira que
laços sociais são afrouxados em conseqüência do enfraquecimento do vínculo cultural entre
os indivíduos.
No campo das expressões artísticas quase não se verifica mais a eclosão de
movimentos, correntes ou agrupamentos de artistas em prol de qualquer ideologia política,
estética etc. Não significa que inexistam quaisquer engajamentos, mas sim que eles não
conseguem obter a visibilidade necessária através dos meios de comunicação de massa,
comprometidos com os desígnios do capital. As produções cinematográficas domésticas,
por exemplo, não conseguem ser exibidas para o grande público e o que se é o domínio
do mercado interno pelas grandes empresas americanas de produção e distribuição. Os
próprios filmes nacionais necessitam de um acordo de distribuição com as chamadas
majors para ter acesso a um número expressivo de salas de exibição.
Como se não fosse o bastante, o sistema de incentivos fiscais para a produção de
filmes no Brasil conseqüência das reformas liberalizantes trazidas pela globalização
também atrela a atividade cinematográfica às regras da economia de mercado, já que são as
empresas (ligadas a outros ramos de atividades) as principais financiadoras dos projetos.
Empresas estatais como a Petrobrás, o BNDES e Furnas são aquelas que somam os
investimentos mais expressivos, de forma que têm, em certa medida, o controle de que
espécie de cultura será mostrada nas telas. Os projetos em que uma expectativa de
sucesso e grande retorno de bilheteria são os mais prováveis de conseguir um bom
incentivo. Desse modo, as probabilidades de mercado regem o conteúdo dos filmes
realizados sob o sistema de incentivos fiscais. Confirma-se, assim, o casamento entre
cultura e economia.
Mas não é tudo: é quando um projeto consegue receber o financiamento oriundo de
alguma das empresas hegemônicas norte-americanas como, por exemplo, a Columbia ou a
Universal, que tem maiores chances de ter uma distribuição satisfatória e, posteriormente,
ser exibido em alguma emissora da televisão aberta. Ou seja, são as empresas
multinacionais determinando cultura e identidade em território nacional.
Nas redes de televisão também predominam as produções estrangeiras, sobretudo as
norte-americanas, demonstrando que suas formas cinematográficas após anos e anos de
37
invasão educaram os olhos” dos espectadores a sua estética específica. As produções
nacionais sofrem o reflexo dessa realidade, pois têm de se enquadrar na estética
hegemônica se tiverem o objetivo de ter uma boa aceitação perante o público, ou ainda se
almejam obter o financiamento junto às majors para a produção ou distribuição.
No Brasil não se estabeleceu uma relação histórica de colaboração entre a televisão
e o cinema, como aconteceu em alguns outros países, com destaque para a França e a
Inglaterra. Para ilustrar, basta mencionar que aqui quase não se realizam filmes específicos
para a televisão (os chamados telefilmes). As redes de televisão têm o costume de comprar
os filmes para exibi-los, dando preferência aos norte-americanos. Acontece que essas
produções estrangeiras não exprimem a nossa cultura; pelo contrário, chegam carregadas de
símbolos que acabam eclipsando os nossos próprios, por força da repetição prolongada.
Essa situação é agravada quando, além do domínio de salas de exibição, o cinema
hegemônico predomina também na televisão, posto que esta tem uma penetração e
influência expressivamente maior na sociedade. Estima-se que apenas 7% dos municípios
brasileiros possuem pelo menos uma sala de exibição, enquanto que mais de 90% do
território nacional é abrangido pelo sistema televisivo.
7
Os países que vêm sofrendo com a perda de suas referências culturais, além de
outros malefícios causados pela globalização, encontram-se enfraquecidos perante o poder
que o capital alcançou. Na luta do local com o global, este a palavra final e garante a
consecução de seus interesses na grande maioria dos casos. O mercado e as empresas
transnacionais subordinam os Estados segundo seus objetivos econômicos e financeiros. O
Estado se , então, com mínimas chances de reagir, pois ao fazê-lo corre o risco de deixar
de atrair capitais, investimentos e empréstimos, além de tornarem-se desinteressantes para a
permanência das empresas em seu território.
Zygmunt Bauman diz que por necessidade, a soberania legislativa e executiva do
Estado moderno apoiou-se no ‘tripé’ das soberanias militar, econômica e cultural” para, em
seguida, concluir fazendo a seguinte afirmação:
O tri da soberania foi abalado nos três s. Claro, a perna econômica foi a
mais afetada. incapazes de se manter se guiados apenas pelos interesses
politicamente articulados da população do reino político soberano, as nações-
7
ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003.
38
estados tornam-se cada vez mais executoras e plenipotenciárias de forças que
não esperam controlar politicamente. No veredito incisivo do radical analista
político latino-americano, graças à nova “porosidade” de todas as economias
supostamente “nacionais” e à condição efêmera, ilusória e extraterritorial do
espaço em que operam, os mercados financeiros globais “impõem suas leis e
preceitos ao planeta. A ‘globalização’ nada mais é que a extensão totalitária
de sua lógica a todos os aspectos da vida”. Os Estados não têm recursos
suficientes nem liberdade de manobra para suportar a pressão pela simples
razão de que “alguns minutos bastam para que empresas e até Estados entrem
em colapso”. (BAUMAN, 1999: 73)
A ampla abertura dos mercados e as exigências do “capitalismo flexível” são
defendidas e recomendadas por entidades internacionais como a Organização Mundial do
Comércio (OMC), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. O resultado
é a limitação das políticas de Estado e o império do que Milton Santos chama de “política
das empresas”, calcada no “pensamento único”.
Para Bauman a economia tornou-se uma esfera fora da política, de modo que uma
das poucas funções que sobrou para o Estado foi a de manter o ambiente favorável e seguro
para a atuação do capital dentro do território nacional. Milton Santos pensa um pouco
diferente; em sua opinião:
Não é que o Estado se ausente ou se torne menor. Ele apenas se omite quanto
ao interesse das populações e se torna mais forte, mais ágil, mais presente, ao
serviço da economia dominante. (SANTOS, 2005: 66)
Seja como for, o Estado contemporâneo vem gastando seus esforços para atender
aos ditames do campo econômico-financeiro globalizado, em detrimento do empenho
necessário para o social. O Direito tem sido um instrumento para beneficiar o liberalismo.
Normas jurídicas pró-economia de mercado e práticas políticas neoliberais sustentadas pela
legislação garantem a consecução dos objetivos das corporações capitalistas. É a “lei do
capital”. A própria questão democrática se encontra em crise, na medida em que os
cidadãos têm os seus direitos e sua situação social totalmente desfavorecidos perante os
interesses globalizantes. A pressão que o capital financeiro e as entidades internacionais
citadas imprimem perante o Estado faz com que este negligencie os direitos da cidadania.
39
A globalização, na mesma medida em que evolui na ciência e na informação,
avança no aprofundamento das desigualdades e da exclusão. Os Estados não estão sendo
capazes de reverter o processo e criar condições de vida satisfatórias para as grandes
massas populacionais. A fome, o desemprego, a exploração e outras mazelas só têm
crescido nos últimos anos. Pelo motivo de haver problemas tão graves como esses que
precisam ser minimizados, as questões cultural e educacional passam a receber menos
atenção. Porém, é necessário ter a consciência de que a elevação do capital cultural e uma
educação de qualidade são medidas essenciais para o progresso em todas as áreas da vida
humana.
A omissão em empreender uma política cultural forte deixa o espaço aberto para o
domínio da indústria do entretenimento. Uma fatia dessa indústria é constituída pelas
multinacionais cinematográficas com sede nos Estados Unidos, que anos têm garantido
o domínio do mercado interno de quase a totalidade dos países ocidentais, inculcando sua
cultura e seus modos de vida. Salientamos que o cinema não serve apenas para o
entretenimento e diversão, mas também contribui para a educação e a documentação dos
costumes e práticas de um país.
O entrelaçamento entre expressões artísticas e educação precisa ser encarado como
mais um método possível para promover o enriquecimento cultural e intelectual dos
indivíduos. Nesse sentido, um cinema que não seja estritamente condicionado às regras da
economia de mercado pode oferecer a sua parcela de contribuição, e ajudar no
desenvolvimento de um Estado-nação com força suficiente para reverter os efeitos nocivos
da globalização em todos os campos da vida.
40
3 – CINEMA E SOCIEDADE: O PRODUTO INDUSTRIAL E O BEM CULTURAL
O cinema nasceu na última década do século XIX, por volta de 1894/1895. Não se
tem uma data exata nem um inventor específico. Sabe-se que vários inventores mais ou
menos ao mesmo tempo, nos Estados Unidos e na Europa, realizavam seus experimentos
com o objetivo de promover a captação e exibição de imagens em movimento.
Convencionou-se a Thomas Edison, um americano, a criação da nova arte, pois foi o
primeiro dos inventores a efetuar o seu registro legal. A exibição dos filmes, entretanto,
era possível para uma pessoa por vez, que se tratava de uma caixa escura com fruição
individual. Foram os Irmãos Lumière, franceses, os responsáveis pela invenção da exibição
em uma tela situada dentro de uma sala escura modelo seguido até os dias atuais –,
permitindo a vários espectadores assistirem ao filme conjuntamente. Estava plantado o
alicerce de uma atividade que exerceria enorme influência nas sociedades alguns anos
depois.
Nos primeiros anos de existência, o cinema era explorado dentro de feiras de
variedades (semelhantes aos atuais parques de diversões) e em seguida começaram a abrir
os salões de exibição. Destaca-se nesse período o francês Méliès, um mágico que começou
a utilizar a novidade em suas apresentações de ilusionismo, entrando para a história por
criar e aperfeiçoar diversas técnicas de filmagem. Desta forma, pode-se depreender que era
de puro entretenimento o caráter inicial da atividade cinematográfica, a qual, além de tudo,
era considerada baixa cultura e destinada principalmente aos segmentos de base da
sociedade. Entretanto, aos poucos foram surgindo outras dimensões e potencialidades na
utilização do cinema, podendo ser um instrumento político, educacional, de registro
histórico, antropológico etc. Falaremos sobre isso mais adiante.
3.1 – A indústria cinematográfica: filmes para as massas
Nesse período inicial, a produção do cinema era essencialmente artesanal: a mesma
pessoa concebia, filmava e exibia os filmes. Porém, em pouco tempo, as funções foram
sendo repartidas e teve início uma divisão do trabalho crescente. Isto fez com que o cinema
41
se tornasse uma arte coletiva, reunindo uma ampla gama de profissionais para a sua
produção, como atores, cinegrafistas, maquiadores, iluminadores, técnicos... Além disso,
uma indústria se formou em torno da atividade cinematográfica, formada por estúdios de
filmagem, fábricas de negativos, laboratórios de revelação, entre outras atividades. Como
se não fosse o bastante, a indústria se divide em três elos: produção, distribuição e exibição,
cada qual com seu papel específico. No caso dos Estados Unidos, país hegemônico
cinematograficamente, as empresas do setor acumularam além da produção o elo da
distribuição, para melhor escoarem seus filmes no mercado, operando, todavia, por
departamentos distintos no exercício de cada uma dessas atividades. Existe uma legislação
antitruste que impede uma mesma empresa explorar os três elos da cadeia; proibição que
vem sendo fortemente questionada ultimamente, com base nos interesses dos mega-
conglomerados de entretenimento constituídos nas últimas décadas.
Com o cinema passando a constituir o resultado da equação arte + indústria (um dos
motivos da excessiva divisão do trabalho), começam a surgir empresas objetivando investir
no negócio com a finalidade última de auferir os possíveis ganhos financeiros e
ideológicos. Nesse sentido, as produções que envolvem somas de dinheiro mais expressivas
são aquelas que têm expectativa de receberem uma grande aceitação no mercado.
Essa realidade que se impõe gradualmente durante as duas primeiras décadas do
século passado garante a difusão do cinema em todo o mundo, ao mesmo tempo em que
ocasiona a perda de autenticidade e conteúdo das produções. Para que os filmes obtenham
muitos espectadores e ganhem vários mercados (externos) é necessária uma certa
padronização da linguagem, assim como uma homogeneização das narrativas, da estética
etc.
No período em que o cinema começa a ganhar status de Arte, por causa do
desenvolvimento de suas técnicas e conteúdos mais sofisticados (entre as décadas de 1910 e
1920), também é o momento no qual o capital lhe empreende suas primeiras investidas. A
equação arte + indústria desequilibra-se em favor deste último elemento e os Estados
Unidos despontam como o produtor hegemônico, iniciando o domínio do circuito comercial
mundo afora. Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial em solo europeu, os países
daquele continente tiveram suas produções bastante diminuídas, assim como os países do
hemisfério sul dependentes da importação de materiais e equipamentos para filmagem. O
42
cinema americano invade fronteiras adentro diversos países e suas salas de exibição,
carregando consigo suas ideologias, sua estética, seus valores, seus ídolos...
As grandes empresas de cinema, ao produzirem seus filmes de mercado, passam a
cooptar os melhores diretores e roteiristas em troca de consideráveis remunerações. Porém,
esses criadores devem se inclinar sob os interesses mercadológicos e ideológicos em
questão, limitando sua criatividade e abrindo mão de experimentações, reflexões ou
estéticas que sejam estranhas ao padrão estabelecido pelo capital. Em outras palavras: à
transformação do cinema em indústria corresponde a conversão dos criadores das obras em
operários de linha industrial, o que somado à grande divisão do trabalho leva à alienação do
produto final: o filme. Realidade semelhante a que Karl Marx havia descortinado
praticamente um século antes. Edgar Morin, atento a esse movimento, comenta:
No seio da indústria cultural se multiplica o autor não apenas envergonhado
de sua obra, mas também negando que sua obra seja obra sua. O autor não
pode mais se identificar com sua obra. Entre ambos criou-se uma
extraordinária repulsa. Então desaparece a maior satisfação do artista, que é a
de se identificar com sua obra, isto é, de se justificar através de sua obra, de
fundar nela sua própria transcendência.
É um fenômeno de alienação não sem analogia com o do operário industrial,
mas em condições subjetivas e objetivas particulares, e com essa diferença
essencial: o autor é excessivamente bem pago. (MORIN, 2005, p. 32)
Outro artifício da indústria cinematográfica para seduzir o grande público é a
fabricação de estrelas e ídolos das telas. Interessante observar que estes acabam por sugerir
estilos de vida, identidades, ideais de felicidade que vão influir nas trajetórias existenciais
de uma infinidade de pessoas, causando alterações sociais e nos bitos de consumo de
forma ininterrupta, à medida que os filmes obtêm sucesso. O star-system constitui-se em
depositário dos ideais de vida de milhões de pessoas ao redor do mundo, mesmo que a
princípio suas culturas locais não guardem compatibilidades consideráveis com as imagens
que lhe são vendidas.
O cinema de mercado insere-se no contexto da cultura de massas e carrega as suas
características principais, como a incitação ao consumismo, despolitização, acelerada
rotatividade das produções no mercado, entre outras. As questões mais profundas no que
diz respeito à condição humana são deixadas de lado em prol de uma simplificação
43
generalizada, que visa apenas entreter os espectadores ao confirmar suas expectativas e
opiniões, nunca problematizar. Os veículos da cultura de massas (incluindo o cinema)
exprimem uma ética conformista, que, com o passar do tempo, educa os indivíduos para a
passividade e a omissão com relação à política, aos deveres cívicos e tudo o mais que possa
abalar a ordem estabelecida por aqueles que detêm o poder.
3.1.1 – O controle ideológico
É possível dizer que atualmente o controle sobre a sociedade não é mais realizado
primordialmente através da força física, mas sim pelo domínio psicológico, pela educação
autoritária do imaginário. Isso permite que Edgar Morin fale em industrialização dos
espíritos e colonização das almas:
A segunda industrialização, que passa a ser a industrialização do espírito, e a
segunda colonização que passa a dizer respeito à alma progridem no decorrer
do século XX. Através delas, opera-se esse progresso ininterrupto da técnica,
não mais unicamente votado à organização exterior, mas penetrando no
domínio interior do homem e derramando mercadorias culturais. (MORIN,
2005: p. 13)
Ao que as palavras do Professor da Universidade Denis-Diderot (Paris VII), Ignacio
Ramonet, servem como o perfeito complemento:
Por isso devemos temer no presente que a submissão e o controle de nossos
espíritos sejam conquistados não pela força, mas pela sedução, não sob
ordem, mas por nosso próprio desejo, não pela ameaça de punição, mas por
nossa própria sede de prazer... (RAMONET, 2002: p. 32)
Esse tipo de domínio é bem mais difícil de solucionar, pois ele se de forma
invisível. Com a interiorização da ideologia dos discursos hegemônicos o indivíduo se
torna o seu próprio dominador, e a possibilidade de uma tomada de consciência capaz de
reverter os rumos da história figura cada vez mais distante. Ramonet diz que o escritor
Aldous Huxley, no seu famoso livro O Admirável Mundo Novo, de 1931, previa que
numa sociedade avançada tecnologicamente:
44
... o maior perigo para as idéias, a cultura e o espírito corria muito mais o
risco de vir de um inimigo de rosto sorridente e amável, do que de um
adversário que inspira o terror e o ódio. (RAMONET, 2002: p. 32)
Ao longo do século XX a indústria cinematográfica e demais veículos midiáticos
ampliaram gradativamente seu poder de influência na sociedade, ao passo que a tecnologia
avançava e a difusão de imagens e sons ocupava mais espaços. A influência da cultura de
massas no meio social não se constitui numa via de mão única, representa o resultado de
um processo de reflexividade em que os produtos da indústria cultural (filmes, publicidade
e outros) baseiam-se na realidade e nos acontecimentos sociais para tecer suas histórias, ao
mesmo tempo em que a vida real se inspira nos arquétipos audiovisuais. Ou seja, realidade
e imaginário se alimentando um ao outro.
De fato, não é nada incomum que filmes, seriados e novelas utilizem fatos reais em
suas tramas, ou, ao contrário, filmes documentários e noticiários da televisão se valham de
uma narrativa espetacularizada ou romanceada para tratar dos acontecimentos do mundo.
Realidade e fantasia se fundem, e as telas de cinema ou televisão passam a ser o espaço
onde os indivíduos podem exercer suas identificações, aspirações, emoções, exorcizações...,
e posteriormente regurgitar essas experiências no seio social.
Bem entendido, a cultura de massas não determina unilateralmente os rumos
históricos da civilização, sem que esta também interfira naquela. O que ocorre é uma
dialética entre ambas, de forma que o mundo se desenvolve com base nessa circularidade,
em que uma informa a outra. Esse processo teve início com a consolidação da imprensa
escrita em meados do século XIX, mas foi no século seguinte, com a criação e o progresso
das técnicas audiovisuais, que esse contexto assume dimensões planetárias e determinantes.
3.1.2 – A afinidade entre o cinema de mercado e a publicidade
Como a cultura de massas fomenta um comportamento pró-consumo, não é de
causar espanto que o cinema de mercado acabasse por receber uma forte influência dos
filmes publicitários (spots comerciais) veiculados pela televisão, sobretudo a partir da
década de 1950.
1
Dessa forma, o cinema assimila características estéticas como montagem
acelerada, súbitas interrupções, simplificações dos discursos para facilitar a sua absorção,
1
RAMONET, Inacio. Propagandas silenciosas: massas, televisão, cinema. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
45
entre outras. Vários diretores, aliás, alternam seus trabalhos entre longas-metragens e filmes
publicitários, transitando indistintamente de uma área para outra. Isso faz parte da
padronização das produções ao mesmo tempo em que a produz com intuito de penetrar
em todos os segmentos sociais a despeito de quaisquer diferenças que possam haver entre
eles, como classe, costumes ou localidade, por exemplo.
Existe uma harmonia notável entre as produções cinematográficas direcionadas ao
circuito comercial e a publicidade. Enquanto os filmes sugerem ou “ensinam” como vestir-
se, decorar sua casa, viajar, ou seja, o que consumir e de que maneira, a publicidade faz o
complemento especificando quais os produtos, os serviços e as marcas para alcançar o bem-
estar e a felicidade (ou a imagem do que eles próprios construíram do que sejam essas
coisas). Isso é a conseqüência da imbricação entre as esferas cultural e econômica,
influindo nas escolhas pessoais dos indivíduos ao passo que estes interiorizam a ideologia
que lhes é apresentada. O consumo é determinado com base no imaginário colonizado pela
cultura de massas, de modo que as opções são feitas orientadas prioritariamente pela
estética. E entra o lucro redobrado do cinema, pois além do ganho financeiro o
ideológico (complementado pela publicidade). Os Estados Unidos coroaram a fusão
cultura/economia, assim como a conexão estabelecida entre produções audiovisuais
ficcionais e filmes publicitários.
3.1.3 – A hegemonia norte-americana
A hegemonia do cinema norte-americano nos mercados de praticamente todos os
países do mundo ocidental promoveu a aculturação visual e do imaginário, contribuindo
para desfigurar culturas locais e rearticular práticas e costumes dessas sociedades. A
própria cinematografia de cada país precisou adaptar-se a um processo de americanização
de sua estética para conseguir obter algum sucesso junto ao seu público. Os filmes que não
seguem a cartilha dominante cristalizada são incompreendidos ou considerados como de
baixa qualidade, o que os relega ao fracasso perante o mercado que se encontra viciado. Por
outro lado, aqueles que se apropriam das formas hegemônicas ficam no meio do caminho:
não são nem produto que exprime sua cultura local, nem alcançam o grau de sofisticação
46
técnica do original americano; são apenas a sua cópia empobrecida e contribuem para
confirmar a supremacia dos Estados Unidos em matéria de indústria cultural.
Nos últimos anos, as salas de exibição m migrando para o interior dos shopping
centers – essa invenção americana que representa um dos maiores símbolos do
consumismo. Os “cinemas de rua estão sumindo e, em contrapartida, complexos que
costumam variar de 4 a 18 salas de exibição estão sendo abertos em shoppings de todo o
Brasil, sob o comando de empresas multinacionais como a rede Cinemark e a UCI, por
exemplo.
2
Esse movimento pode ser considerado como o coroamento do cinema de
mercado, um produto para ser consumido com o único intuito de entretenimento. Dessa
forma, em meio aos diversos serviços e produtos que podem ser encontrados nos centros
comerciais, é possível também consumir filmes em sua maioria americanos os quais
incitam ainda mais o consumo e a preservação de outras características afinadas com as
fabulações da globalização.
O shopping center é uma ilha concebida em prol do consumo, onde tudo é
ambientado para este fim, como a climatização do interior, a concentração das lojas, o
estacionamento privativo. É o lugar onde reina a ordem e se esquece dos problemas do
mundo, os quais são empurrados para fora de seus muros. O cinema que se é aquele
que construiu a sua história ambicionando os maiores lucros (financeiros e ideológicos)
possíveis. Para essa linhagem não importa nada além disso, são guiados com base no
pensamento único e pressionam os governos para flexibilizar quaisquer barreiras que
possam dificultar a consecução de seus interesses.
3.2 – O cinema à margem da cultura de massas
Apesar de tudo o que discutimos a aqui, o cinema de mercado não é o único tipo
de produção audiovisual existente, embora seja o hegemônico. De fato, ele tem o domínio
da maior parte do circuito de exibição comercial, entretanto sua ampla difusão não causa o
abafamento completo de outros tipos de cinema. Desde os primórdios da exploração
comercial e ideológica do cinema, diversas outras vertentes formaram-se e coexistiram,
com finalidades não estritamente lucrativas, mas primordialmente artísticas, políticas,
2
ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003.
47
sociais, antropológicas ou históricas. É claro que em muitos casos também dependem de
sua exploração comercial para a sua própria sustentação, porém o têm isso como a sua
finalidade última. À margem das produções comerciais esses outros cinemas encontraram
seus próprios meios de sobrevivência muitas vezes sob o amparo do Estado e seus
locais de exibição, como o circuito de arte, os cineclubes, os festivais etc. Mesmo que em
certas oportunidades alguns desses filmes consigam penetrar o grande circuito comercial,
em geral esse tipo de cinema goza de limitada propagação na sociedade. Sua difusão se
por entre as brechas e espaços deixados pelo cinema de massas.
3.2.1 – Outros cinemas: exemplos
A Arte cinematográfica comporta diversas possibilidades. Uma delas é o chamado
cinema de arte, apreciado por um público restrito constituído por indivíduos que não se
satisfazem com os produtos padronizados oferecidos pela cultura de massas. Nesse sentido,
as produções têm a possibilidade de aprofundar os temas em questão e experimentar outras
estéticas, pois não estão amarradas pelas regras do mercado. É sob essa perspectiva que se
desenvolvem os movimentos ou as escolas de cinema, como ilustram os casos do
Expressionismo na Alemanha, do Neo-realismo na Itália e do Cinema Novo no Brasil. Com
o passar de décadas de massificação do cinema hollywoodiano homogeneizado, esse tipo
de filmes tem se tornado cada vez menos popular, pois a educação audiovisual recebida
desde a infância dificulta aos indivíduos a absorção da diferença.
Importante também é o cinema de registro antropológico, sociológico ou histórico,
de cunho documentário. Esse tipo de cinema é de fundamental importância para a
compreensão e divulgação das Ða difiãp ÑÊ%o na das
foi estabelecida uma clara relação entre o cinema e a política, existente aos dias de hoje.
Não o Estado muito cedo atentou para a possibilidade de utilizá-lo em seu proveito e
interesse, como cineastas independentes e organizações políticas e sociais também
começaram a utilizar a novidade para exprimirem suas opiniões e críticas face aos
governos.
Um dos casos mais marcantes do uso político do cinema pelo Estado se deu na
época do nazismo na Alemanha, quando cineastas foram cooptados e em alguns casos
obrigados a realizarem filmes para propaganda da ideologia e do governo nazista naquele
país. Havia claramente o entendimento de que assim se estaria dando mais um passo no
sentido da legitimação do governo perante a sociedade. Vale relembrar ainda, a utilização
do cinema empreendida pelos Estados Unidos como parte de sua estratégia política para a
propagação de suas ideologias, assunto este que tivemos a oportunidade de aprofundar
em outro momento.
3
No Brasil a propaganda governamental através do cinema tem sua origem ainda na
época da 1ª. República (por volta de 1905/1906), com filmes encomendados pela Secretaria
de Agricultura para divulgar suas realizações em sua área de atuação. Anos mais tarde, com
a implantação do Estado Novo por Getúlio Vargas, é criado em 1937 o Instituto Nacional
do Cinema Educativo (INCE), órgão do governo destinado a produzir filmes com caráter
nacionalista e que promovessem a propaganda do governo ditatorial.
Em meados da década de 1970 a estatal EMBRAFILME tem ampliada a sua
atuação e o seu capital, como parte da política empreendida pelo Governo Militar no
sentido de estimular o nacionalismo na sociedade brasileira. O Estado mais uma vez
procura se valer do cinema para influir na identidade cultural e no meio social de um país.
Não foi sem motivo que a empresa instituiu um programa especial, com maiores subsídios
e prêmios específicos, para projetos de filmes históricos ou sobre personalidades
brasileiras. Os militares estavam conscientes do poder de influência do cinema e por isso
investiram na EMBRAFILME, com o intuito de lutar pela conquista do mercado interno.
4
Entretanto, a utilização política do cinema também pode se dar como
contrapropaganda e contra-informação do Estado. A história é rica em exemplos de
3
Ver capítulo anterior: “Identidade Cultural e Globalização”.
4
AMANCIO, Tunico. Artes e manhas da EMBRAFILME: cinema estatal brasileiro em sua época de ouro
(1977 – 1981). Niterói: EdUFF, 2000.
49
partidos políticos, cineastas independentes ou instituições sociais que procuraram expor
suas críticas, denúncias e repúdio a governos de que discordavam. Esperava-se, assim, fazer
repercutir o seu discurso e angariar maior capital humano na defesa de seus ideais.
Entre os diversos casos desse tipo, podemos citar duas experiências importantes. Na
França o Partido Comunista (PCF) destinou parte de seu orçamento à produção de longas-
metragens que divulgavam suas teses, durante a década de 1930. Além disso, constituíram
uma rede clandestina para a exibição desses filmes, já que foram proibidos pela censura. Na
Espanha, em fins dos anos 1960, surge o que ficou conhecido como o cinema clandestino
espanhol. Organizações políticas e operárias opostas ao governo franquista produziram
uma série de filmes que se propunham a promover a reflexão e a mobilização dos cidadãos.
A projeção dessas produções se deu pelos sindicatos, círculos operários ou casas de
estudantes ao longo do país.
5
3.3 – O embate entre as duas concepções sobre o consumo do cinema
É claro que não delimitações que tornem precisas as diferenciações entre os
diversos tipos de cinema. Suas características se mesclam incessantemente na busca por
estabelecer a relação dialética com os expectadores. Grosso modo, pode-se dizer que o
cinema de mercado com sua finalidade centrada no lucro e na publicidade ideológica
tem por base a concepção de que a sétima arte se reduziria ao mero entretenimento,
diversão para as massas, devendo ser considerada tal qual um produto comercial qualquer.
Os outros tipos de cinema restantes seriam, conseqüentemente, encampados pela concepção
que defende a sua natureza de bem cultural, merecendo um tratamento específico que faça
jus a essa condição.
O cinema é um indicador sociológico, ou, como diz o jargão, o “espelho da
sociedade”, pelo motivo de que suas temáticas acompanham os acontecimentos e
transformações do mundo a questão da reflexividade/circularidade referida. Por outro
lado, como diz ainda um outro jargão, pode ser o “ópio do povo”, na medida em que
industrialize os espíritos e colonize as almas, desembocando na alienação, passividade e
desmobilização dos cidadãos perante as causas humanas.
5
RAMONET, Inacio. Propagandas silenciosas: massas, televisão, cinema. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
50
Os filmes estritamente comerciais também são capazes de indicar aspectos sociais e
características culturais de um povo, embora de forma quase sempre superficial e
tendenciosa. Já aqueles que não estão restritos às regras do mercado são os que têm maiores
chances de possibilitar que externalidades positivas sejam produzidas no meio social, desde
que possuam uma exibição bem difundida. Não dúvida de que estes podem igualmente
exprimir alguma visão tendenciosa, porém isso se de forma difusa, não concentrada em
apenas uma direção (pensamento único), de modo que permite o embate das idéias e a
reflexão crítica dos espectadores.
É pelo motivo do reconhecimento por parte das entidades políticas mundiais sobre a
influência e participação das expressões artísticas mais especificamente as audiovisuais
na educação e acumulação de conhecimento de indivíduos e sociedades, que décadas
duas correntes defendem concepções opostas sobre o consumo dos bens culturais (mero
produto comercial x patrimônio cultural). Elas vinham se enfrentando na OMC sem que
nenhum avanço substancial fosse alcançado para qualquer um dos lados. Mais
recentemente, entretanto, a corrente que defende o cinema como um bem cultural
merecedor de tratamento especial nas transações comerciais conseguiu que as discussões
fossem transferidas para a UNESCO, esperando desta organização internacional maior
sensibilidade para a questão.
A situação se torna ainda mais delicada com os progressos tecnológicos que
promoveram o que vem sendo chamado de convergência tecnológica, ou seja, a
interpenetração de todos os meios de informação: televisão, Internet, celulares... Isso faz
com que os conteúdos audiovisuais circulem praticamente anulando quaisquer barreiras de
tempo e espaço. O que a princípio pode parecer a chegada de uma era de democratização da
difusão e recepção de imagens e sons, revela-se como a potencialização das possibilidades
de “educar” o imaginário e manipular as massas, quando se sabe que as empresas que
operam esses veículos estão procedendo a fusões no intuito de concentrar em suas mãos o
controle dos conteúdos emitidos. Como sublinha Ignacio Ramonet:
Ninguém mais ignora que a mídia audiovisual é controlada por megagrupos
nos quais se concentram as grandes firmas planetárias, doravante ligadas à
Internet, à telefonia, à informática, à energia, à publicidade, ao esporte, aos
Bancos, etc. As grandes empresas atuais de multimídia resultam de
concentrações ou de megafusões como as de América Online com Time-
51
Warner-CNN-EMI, ou de Vivendi com Havas-Canal Plus e Universal-
Segram. (RAMONET, 2002: p. 9)
O Direito, em seu propósito de regular as relações que são travadas em meio à
sociedade, tem procurado acompanhar as profundas transformações desencadeadas pela
aceleração dos progressos tecnológicos no sentido da circulação de bens culturais,
especialmente os audiovisuais os quais movimentam todo um aparato industrial e
interferem nas esferas econômica, política, social, cultural e educacional. Contudo, pressões
políticas partidárias da desregulamentação geral e abertura total dos mercados (leia-se:
EUA, principalmente) vêm dificultando a implementação de regras de direito que
estabeleçam um tratamento diferenciado para a circulação comercial dos bens culturais.
No momento espera-se que a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da
Diversidade e das Expressões Culturais, aprovada em 20 de outubro de 2005 na 33ª
Conferência Geral da UNESCO, permita aos Estados o desenvolvimento dos efetivos
mecanismos de proteção das manifestações culturais nacionais. É necessário que cada
Estado prosseguimento a essa conquista e elabore legislações específicas (e o seu
monitoramento) para que sejam auferidos os resultados práticos.
52
4 – REFORMA DO ESTADO E POLÍTICA NACIONAL DO CINEMA
Se, por um lado, algum entendimento razoavelmente bem difundido de que
existe a necessidade de proceder a reformas no aparelho do Estado para melhor capacitá-lo
ao atendimento das demandas da sociedade, por outro lado é extremamente controvertido o
rumo das reformas defendidas e implementadas no Brasil a partir dos anos 1990. Tais
reformas possuem um caráter declaradamente pró-mercado e buscam adaptar-se, segundo
seus próprios defensores, à face atual do capitalismo, em que a globalização econômica é
marca indelével.
Reformas desse tipo tiveram início no Reino Unido e nos Estados Unidos no final
dos anos 1970 e início dos 1980, respectivamente. Em seguida, a onda reformadora
alastrou-se gradualmente para outros países. Ainda na década de 1980 a Nova Zelândia e a
Austrália iniciaram seus programas de reestruturação estatal. Na América Latina a onda
tem o seu desenvolvimento logo no início da década de 1990, com as recomendações e
prescrições de entidades internacionais como o Banco Mundial, o FMI e a OMC.
Foi no governo do Presidente Fernando Collor que algumas reformas encontraram o
espaço para empreender seu primeiro grande impulso no Brasil, através do
desenvolvimento de medidas de ajuste fiscal, abertura comercial e privatizações, por
exemplo. Entretanto, com os sérios problemas que este governo enfrentou, notadamente os
escândalos de corrupção que levaram ao impeachment do Presidente, as reformas
ganhariam um novo impulso com a chegada ao poder de Fernando Henrique Cardoso.
Embora não fizesse parte de sueÐ pÁ€ de heÐt de Ue s
4.1 – A defesa das reformas
Bresser Pereira escreveu diversos artigos ao longo da década passada sobre o tema
das reformas do Estado. É com base em alguns desses artigos que procuramos extrair os
principais argumentos utilizados para a defesa e suposta justificativa das reformas (da
maneira que foi implementada); a saber: “Gestão do setor público: estratégia e estrutura
para um novo Estado” e “Da administração pública burocrática à gerencial”, publicados no
livro “Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial” (1998), organizado pelo
próprio Bresser Pereira e Peter Spink; e, ainda, “A reforma do Estado nos anos 90: lógica e
mecanismos de controle”, publicado na Revista Lua Nova, edição 45 (1998).
Preliminarmente, vale dizer que a leitura desses artigos torna perceptível o fato de que não
se tratam de textos científicos, mas sim de cunho político-ideológico. O tom persuasivo que
permeia o discurso, assim como a grande utilização de pressupostos auto-referentes e de
deduções apressadas, bastaria para confirmar nossa intuição.
Segundo Bresser Pereira sustenta em todos esses artigos, a coordenação do sistema
econômico no capitalismo contemporâneo deve ser realizada em complementaridade pelo
mercado e pelo Estado. No entanto, em princípio, o mercado prevaleceria na coordenação
da economia, pressupondo-se que o seu sistema de trocas permite uma melhor alocação de
recursos. O Estado somente deverá intervir nos setores em que o mercado apresentar falhas,
imperfeições ou incompletudes, através de transferências para a remuneração adequada dos
bens ou serviços – e de acordo com o julgamento político da sociedade.
Com base nesse raciocínio, quando ocorre uma crise econômica a sua origem deve
ser buscada em alguma dessas instituições. A crise dos anos 30 (Grande Depressão) teria
sido conseqüência do mau funcionamento do mercado. Diferentemente, a Grande Crise dos
anos 80 seria fruto do colapso do Estado do Bem-Estar Social (nos países desenvolvidos) e
do Estado Desenvolvimentista (nos países em desenvolvimento). Nesse sentido, a crise que
começou na década de 80 e se estendeu até a seguinte encontraria solução com
modificações na estrutura do Estado.
Porém, as medidas que de início foram tomadas pelos países altamente endividados
(havia uma crise fiscal generalizada) com o intuito de retomar o crescimento econômico
não foram muito bem sucedidas. Promoveu-se a liberalização do comércio, a
54
desregulamentação e a privatização, de forma que alguns ganhos foram obtidos, como a
queda da inflação e a recuperação da credibilidade internacional. Todavia, o crescimento
não ocorreu.
Bresser Pereira diz que essa primeira reação reformadora era guiada com base no
ideal de um Estado mínimo, ou seja, superestimava-se o mercado como um agente
perfeitamente eficaz na coordenação econômica. Ao Estado caberia apenas garantir alguns
direitos civis, como os direitos de propriedade e de cumprimento dos contratos. Desse
modo, torna-se possível concluir que essa proposta estava imbuída da ideologia neoliberal,
que não reconhecia que o mercado possui consideráveis distorções as quais tornavam o
referido projeto irrealista. Seria realmente necessário aumentar o papel do mercado na
tarefa de dirigir o sistema econômico, entretanto é mister a intervenção estatal nos setores
onde o mesmo apresentar problemas e externalidades negativas.
É filiado a esta concepção que Bresser Pereira propõe o seu modelo para o
tratamento da crise que se abateu sobre o Brasil. A sua proposta inclui medidas
liberalizantes combinadas com a reconstrução da estrutura estatal, com o objetivo de
adaptar o Estado ao capitalismo globalizado contemporâneo. O resultado seria um Estado
que poderia ser denominado de Social-Liberal.
Social porque continuará a proteger os direitos sociais e a promover o
desenvolvimento econômico; liberal, porque o fa usando mais os controles
de mercado e menos os controles administrativos, porque realizará seus
serviços sociais e científicos principalmente através de organizações públicas
não-estatais competitivas, porque tornará os mercados de trabalhos mais
flexíveis, porque promoverá a capacitação dos seus recursos humanos e de
suas empresas para a inovação e a competição internacional. (BRESSER
PEREIRA, 1998c: pp. 59 - 60)
Na visão do ex-Ministro, o Estado foi responsável por um respeitável
desenvolvimento econômico e social no período que compreende dos anos 30 aos anos 60.
Contudo, em meados da década de 1970 ele começa a entrar em crise, que será aprofundada
e estendida ao campo econômico nos anos 1980. A partir de então, o Estado tem a sua
posição revertida, tornando-se o principal determinante de estagnação ou retrocesso nos
campos econômico e social. Torna-se crucial, então, repensar suas funções, sua arquitetura
e sua relação com o mercado e com a sociedade.
55
O Estado Social-Liberal seria aquele capaz de promover o tratamento da
problemática vislumbrada. Nesse contexto, a atenção volta-se logo de início para o
crescimento excessivo do Estado e para as alterações conjunturais desencadeadas pela
globalização. O primeiro fator seria resultado do acolhimento de diversas responsabilidades
sociais pelo Estado durante o século XX, o que superou as possibilidades da provisão de
tantas demandas. O segundo fator conseqüência dos avanços tecnológicos principalmente
nas áreas de transporte e de informação configurou uma situação na qual são mínimas as
condições de manter uma economia nacional insulada dentro de seu próprio território.
Sob essa perspectiva o Estado deveria imprimir uma política econômica oposta
daquela que vinha sustentando, baseada na substituição de importações com a finalidade de
incentivar a industrialização interna. Tornou-se preciso, então, capacitar a economia
nacional para a competição internacional generalizada. Desse modo, o aparelho estatal
reformado deve estar orientado para o mercado, intervindo neste em circunstâncias nas
quais surjam deficiências que impliquem efeitos negativos para os cidadãos.
Como é possível concluir, esse projeto reformador envolverá a redução do tamanho
do Estado, que passará à posição de agente facilitador, financiador e fomentador do sistema
econômico. Nas palavras do ex-Ministro:
A reforma provavelmente significará reduzir o Estado, limitar suas funções
como produtor de bens e serviços e, em menor extensão, como regulador,
mas implicará também ampliar suas funções no financiamento de atividades
que envolvam externalidades ou direitos humanos básicos e na promoção da
competitividade internacional das indústrias locais. (BRESSER PEREIRA,
1998a: p. 23)
De acordo com Bresser Pereira, a reforma do Estado no plano geral deve cuidar
de quatro problemas relacionados entre si:
* de cunho econômico-político – a delimitação do tamanho do Estado;
e ainda a redefinição de seu papel regulador (devendo este problema receber um cuidado à
parte);
* de cunho econômico-administrativo – que importa na recuperação da governança;
* de ordem política – que diz respeito ao aumento da governabilidade.
No caso do Brasil a crise do Estado iniciou-se em 1979 e apresentaria quatro
aspectos: uma crise de legitimidade do governo militar ditatorial; uma crise da
56
administração pública burocrática, responsável pela ineficiência do Estado; uma crise
fiscal; e uma crise da obsolescência do modo de intervenção estatal.
O primeiro aspecto diz respeito à grande insatisfação da sociedade civil com relação
ao regime militar que se instalara no país em 1964 por meio de um golpe de Estado. O
milagre econômico a essa altura havia se demonstrado uma falsa realidade, e os
questionamentos acerca da repressão arrefeciam-se cada vez mais. Essa seria, então, uma
crise de governabilidade.
O segundo aspecto está ligado ao tipo de burocracia empregada na administração do
aparelho estatal brasileiro, o qual não seria mais capaz de dar o retorno satisfatório a todas
as tarefas que o Estado atraiu para si. Este seria um problema de governança e também de
governabilidade. A solução defendida pela reforma do Estado para essa questão seria a
adoção do modelo de administração pública gerencial, que tem origem no setor privado:
Ao invés da velha administração pública burocrática, uma nova forma de
administração, que tomou de empréstimo os imensos avanços por que
passaram, no século XX, as empresas de administração de negócios, sem
contudo perder a característica específica que a faz ser administração pública:
uma administração que não visa ao lucro, mas a satisfação do interesse
público. (BRESSER PEREIRA, 1998a: pp. 26 - 27)
O terceiro aspecto, a crise fiscal, relaciona-se princiHaCF%riã
capacidade política de governar, tendo a ver com a legitimidade do Estado e do seu governo
perante a sociedade. Acrescente-se, ainda, a adequação das instituições políticas à garantia
da intermediação de interesses difusos. Como pode ser observado acima, a questão da
governança perpassa três dos quatro aspectos da crise estatal no Brasil, enquanto que a
questão da governabilidade perpassa dois deles. Isso vem a comprovar a interdependência
dos problemas que compõem a crise iniciada no final da década de 1970.
A transição democrática ocorrida em 1985 e a Constituição de 1988 apenas
ajudaram no problema político da crise, ou seja, na questão da governabilidade. No entanto,
isso representou um progresso demasiadamente limitado, pois os outros problemas
envolvidos na crise continuaram sem qualquer avanço. Nesse sentido, a governança
continuava comprometida e acabava por anular a melhoria na condição da governabilidade,
que esta depende de uma conjuntura favorável daquela para ser positiva. Por mais que
um governo tenha legitimidade e possua boas intenções, de nada adianta se a máquina do
Estado não lhe proporciona as condições econômicas e administrativas para executar as
suas decisões políticas.
A crise do Estado se estenderia, segundo Bresser Pereira, até 1994. No ano seguinte
Fernando Henrique Cardoso começaria, com sucesso, a dar o tratamento necessário aos
problemas que vinham se arrastando durante tanto tempo. Foi a partir de então que Bresser
Pereira encontrou o ambiente para dar início às reformas que defendia, na posição de
Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado.
De acordo com a concepção do ex-Ministro, excetuando-se a redefinição do papel
regulador do Estado, os demais problemas envolvidos na crise teriam como solução ótima a
adoção de uma burocracia pública do tipo gerencial, também chamada de Nova
Administração Pública. O problema da delimitação do tamanho do Estado encontraria um
remédio na transferência de diversos serviços prestados por seus órgãos e entidades para o
setor privado ou para o setor público não-estatal. Com isso, resolver-se-ia a questão da crise
fiscal, o que também ajudaria para o aumento da governança. Esta, por sua vez, seria
plenamente conquistada com a reestruturação institucional do Estado em moldes gerenciais.
a governabilidade teria solução com o aumento da democracia (cada vez mais direta) e
do controle social sobre as políticas públicas, que, segundo defende-se, o novo tipo de
administração ajudaria a ocorrer.
58
As principais características da administração pública gerencial, nas palavras do
próprio Bresser Pereira, são as seguintes:
a) orientação da ação do Estado para o cidadão-usuário ou cidadão-cliente;
b) ênfase no controle dos resultados através dos contratos de gestão (ao invés
de controle dos procedimentos);
c) fortalecimento e aumento da autonomia da burocracia estatal, organizada
em carreiras ou “corpos” de Estado, e juntamente com os políticos e a
sociedade, da formulação e gestão das políticas públicas;
d) separação entre as secretarias formuladoras de políticas públicas, de
caráter centralizado, e as unidades descentralizadas, executoras dessas
mesmas políticas;
e) distinção de dois tipos de unidades descentralizadas: as agências
executivas, que realizam atividades exclusivas de Estado, por definição
monopolistas, e as organizações sociais, que realizam os serviços sociais e
científicos de caráter competitivo, em que o poder do Estado não está
envolvido;
f) transferência para o setor público não-estatal dos serviços sociais e
científicos competitivos;
g) adoção cumulativa, para controlar as unidades descentralizadas, dos
mecanismos (1) de controle social direto, (2) do contrato de gestão em que os
indicadores de desempenho sejam claramente definidos e os resultados
medidos, e (3) da formação de quase-mercados em que ocorre a competição
administrada;
h) terceirização das atividades auxiliares ou de apoio, que passam a ser
licitadas competitivamente no mercado.
(BRESSER PEREIRA, 1988c: pp. 80 - 81)
Para os fins deste trabalho, iremos concentrar nossa atenção nas características
enunciadas nos itens “d”, “e” e “f”. Entretanto, é necessário que antes façamos a distinção
entre os diferentes setores do Estado, para que a compreensão do tema não seja incompleta.
De acordo com a defesa da reforma, o aparelho estatal pode ser dividido em quatro
setores: o núcleo estratégico do Estado; as atividades exclusivas de Estado; os serviços não-
exclusivos ou competitivos; e a produção de bens e serviços para o mercado. O grau de
reforma a ser empreendida variará tendo-se em vista cada setor. A administração do tipo
59
burocrática não deve ser de todo abandonada, mas sim conservar alguns pontos positivos
que ela possui. Nesse sentido, a Nova Administração Pública será construída sobre a
administração burocrática, procedendo a reestruturações nos pontos onde esta se mostrar
obsoleta e ineficiente.
O núcleo estratégico do Estado é o setor onde são elaboradas as leis e as políticas
públicas. Como a própria denominação indica, não é muito extenso. A nível federal, no
caso do Brasil, é formado pelo Presidente da República, seus ministros de Estado (mais a
cúpula dos ministérios), pelos tribunais federais (com destaque para o Supremo Tribunal
Federal), e pelo Ministério Público. Neste setor a reforma deve ser mais branda. Aqui
devem ser mantidas diversas características da administração pública burocrática, porém
atualizadas. O núcleo estratégico, devido a sua importância, deve ser reforçado (aumento de
poder), além de ser ocupado por servidores públicos competentes, bem treinados e bem
pagos.
O setor de atividades exclusivas de Estado é aquele no qual o poder de Estado é
exercido, como legislar, tributar e fiscalizar. Fazem parte deste setor, a polícia, as forças
armadas, os órgãos responsáveis pelas transferências de recursos, e os órgãos e entidades de
regulamentação e fiscalização. É dentro destes últimos que se incluem as agências
reguladoras, conforme discutiremos mais a frente. A administração neste setor deve ser
descentralizada, de modo que a reforma já se torna maior.
O setor de serviços não-exclusivos do Estado é aquele em que não o exercício do
poder de Estado (poder extroverso), entretanto recebem dotação orçamentária para a
realização de suas tarefas, pelo motivo de manterem relações de alta relevância com
interesses públicos. A administração deste setor deve ser mais que descentralizada, deve ser
autônoma. O seu controle será feito em complementaridade pela sociedade civil e pelo
Estado. É neste setor que figura uma instituição fundamental no quadro das reformas: as
organizações sociais, ou organizações públicas não-estatais, ou ainda, como ficaram mais
conhecidas, organizações não-governamentais (as ONG’s). Como recebem dinheiro público
para desempenhar suas funções, são fiscalizadas pelas agências e ministérios com os quais
firmarem o contrato de gestão (instrumento de grande importância no novo tipo de
administração). A reforma para este setor, como pode se verificar, é ainda mais abrangente.
60
O setor de produção de bens e serviços para o mercado deve ser em princípio
operado pela iniciativa privada, somente mantendo sob o comando do Estado determinadas
empresas que comportem justificações estratégicas ou mesmo públicas. Assim sendo, todas
as atividades que, pressupõe-se, puderem ser mais eficientemente controladas pelo mercado
e administradas privadamente deveriam ser privatizadas.
Agora estamos em condições de retomar a discussão a respeito das características da
administração pública gerencial que destacamos (p. 58). No entanto, não iremos tratar delas
em separado, mas em conjunto, já que são inter-relacionadas.
A Nova Administração Pública propõe que o Estado se desincumba da execução
direta de diversos serviços, contudo a formulação das políticas públicas deve permanecer
sob o domínio estatal. É nesse sentido que deve haver a separação entre as unidades
centralizadas que formulam as linhas gerais da prestação de serviços (situadas no núcleo
estratégico do Estado) e as unidades descentralizadas encarregadas da sua execução. Estas
devem estar situadas no setor das atividades exclusivas do Estado, no caso das agências
autônomas, ou no setor de serviços o-exclusivos do Estado, no caso das organizações
públicas não-estatais.
O contrato de gestão é o instituto através do qual o poder público definirá os
objetivos e os indicadores de desempenho das entidades descentralizadas. É ainda por meio
dele que deve ser estabelecido o provimento de recursos humanos (atividades exclusivas) e
financeiros (atividades exclusivas e o-exclusivas) para que as entidades possam executar
suas funções. A justificativa para o subsídio às organizações do setor de serviços não-
exclusivos do Estado, como comentamos, deve-se ao motivo de que elas desempenham
serviços que envolvem direitos humanos básicos e possuem finalidades de interesse social.
Na verdade, o espaço público o-estatal se insere entre o público e o privado. É
constituído por organizações sociais sem fins lucrativos e com objetivos públicos, mas que
não pertencem à estrutura do Estado. O regime jurídico que lhes rege é na grande maioria
dos casos o de direito privado. As funções que são exercidas no seu âmbito possuem caráter
competitivo; daí ser possível falar na formação de quase-mercados (já que se tratam de
organizações quase-públicas) em que ocorre a competição administrada.
Antes de discutirmos os reflexos de todas essas alterações políticas, econômicas e
administrativas sobre o campo da produção de cultura no Brasil, mais especificamente na
61
indústria cinematográfica nacional, interessa-nos apontar algumas das principais críticas
cabíveis às políticas liberalizantes e às reformas no aparelho do Estado brasileiro.
4.2 – A crítica das reformas
Inúmeras críticas têm sido feitas sobre as reformas implementadas no Brasil. Neste
trabalho estamos nos limitando a apresentar, além de críticas pessoais, um embate direto às
idéias do ex-Ministro Bresser Pereira: o artigo “O Discurso da Nova Administração
Pública”, de Christina Andrews e Alexander Kouzmin, publicado na mesma Lua Nova (nº
45) a qual trazia um dos textos mais importantes do ex-Ministro sobre o seu projeto.
Os autores do artigo argumentam que as reformas liberalizantes iniciadas em 1979
com algumas privatizações, e que ganharam impulso no Governo Collor e mais ainda com
Fernando Henrique Cardoso, não eram tanto uma questão de política fiscal, mas
principalmente de cunho ideológico. Antes de tudo, estava em jogo colocar em prática um
compromisso com as diretrizes capitalistas que vinham ganhando espaço.
Segundo Andrews e Kouzmin, o discurso do ex-Ministro é um discurso teleológico
que visa convencer os receptores de que o seu conteúdo é realmente cabível e positivo para
o país. A finalidade seria produzir no ouvinte a concordância com aquilo que está sendo
enunciado, como se a proposta envolvida fosse de fato progressista. Contudo, a defesa das
reformas procura apenas camuflar seu real caráter conservador, apresentando-se como uma
solução moderna e ideal para enfrentar a crise no país. O meio utilizado para isso é
justamente tentar afastar-se de suas posições ideológicas e supostamente oferecer a solução
racional e lógica contra os problemas existentes.
Segue-se a isso o questionamento de quão legítima é a ideologia que prescreve a
implementação da abordagem gerencialista para a administração pública. O que garante que
a adoção de princípios e práticas da administração do setor privado que visa
principalmente o lucro e a satisfação de interesses particulares traria resultados positivos
para a administração do setor público (estatal ou não estatal)?
Diga-se de passagem que o projeto reformador deixa de abordar vários temas de
extrema importância para o Brasil. Temas esses negligenciados e não discutidos, como é o
caso, por exemplo, da questão crucial da diminuição da desigualdade social no país. Uma
62
reforma realmente progressista deveria ter como prioridade o enfrentamento do abismo que
separa uma pequena porção de grandes afortunados e uma imensa parcela de despossuídos
de condições mínimas de subsistência.
A ideologia que está por traz do discurso em defesa das reformas é a ideologia
neoliberal, a qual o ex-Ministro esforça-se por escamotear. A linguagem de que se utiliza é
voltada para apresentar as medidas reestruturantes como modernizantes, capacitadoras de
aumentar não a eficácia mas também a eficiência do aparelho estatal, entre outros
progressos. Todavia, este discurso merece ser intitulado de “conservadorismo disfarçado”,
na medida em que o que realmente se pretende é conservar a situação confortável dos
privilegiados.
O artigo de Andrews e Kouzmin faz a crítica do discurso de Bresser Pereira com
base em suas três linhas de argumentação identificadas: a argumentação da crise do Estado;
a argumentação amparada pelas prescrições da Teoria da Escolha Pública; e a
argumentação pós-modernizante.
A primeira linha de argumentação tem o objetivo de justificar a reforma
administrativa, de modo que atribui ao Estado a responsabilidade pela crise. Essa
interpretação sustenta que a crise do Estado se deve a ele próprio, que teve um crescimento
demasiado e distorcido, e além disso não se adaptou às mudanças trazidas pela
globalização. Daí, a necessidade de reestruturá-lo em função do mercado e da
competitividade generalizada. Porém, o que Bresser Pereira omite é que o pacote de ajuste
estrutural imposto pelo FMI nos anos 1980 gerando conseqüências altamente negativas
para a economia nacional continha medidas semelhantes às que o ex-Ministro vinha
propor.
A segunda linha de argumentação, que tem por base a Teoria da Escolha Pública
embora não declaradamente –, procura justificar a implementação do modelo gerencial para
a administração pública. Também aqui Bresser Pereira se utiliza de artifícios para garantir
os efeitos pretendidos pelo seu discurso: o Decreto 200 de 1967, que significou uma
experiência com características gerenciais na administração pública brasileira e que
trouxe sérios problemas ao país, como a apropriação do aparelho estatal por interesses
particulares aparece em seus argumentos como um exemplo bem positivo que deve ser
retomado de forma atualizada.
63
A terceira linha de argumentação tem o intuito de conectar o seu discurso a um ideal
modernizador, ao mesmo tempo em que tenta afastar qualquer suspeita de
neoconservadorismo. Essa estratégia é complementada pela utilização distorcida de
citações de textos de outros autores. Bresser Pereira descontextualiza fragmentos de textos
contrários à ideologia neoliberal e os insere em sua argumentação de modo a parecer que
corroboram suas idéias.
Essas são, em linhas gerais, algumas das principais críticas opostas às reformas do
Estado, que têm no ex-Ministro Bresser Pereira seu principal incentivador no Brasil. De
nossa parte, além de endossar todas as críticas de Andrews e Kouzmin que expusemos
resumidamente, gostaríamos de acrescentar mais dois pontos: o entrelaçamento entre as
noções de cidadão e consumidor no novo Estado proposto; e a relação entre a abertura dos
mercados e os produtos culturais. Como ambas as questões foram aprofundadas em
outros capítulos, apenas iremos retomá-las sob o pano de fundo das reformas.
Uma das grandes preocupações das reformas diz respeito ao tamanho que o Estado
chegou na segunda metade do século XX. Esse crescimento seria supostamente uma das
causas da Grande Crise dos anos 1980, na medida em que esta teria sua origem na crise do
Estado. Nesse sentido, tornava-se necessário enxugar o aparelho estatal, transferindo para o
setor privado (preferencialmente) ou para o público não-estatal diversas atividades das
quais se ocupava. Ou seja, vários serviços sociais vão passar para o campo do mercado
(espaço privado) ou dos quase-mercados (espaço público não-estatal), além do que a
competitividade será um valor reforçado. Conseqüentemente, os cidadãos serão tanto mais
cidadãos quanto puderem pagar por esses serviços. Não deixa de ser irônico, aliás, que o
próprio Bresser Pereira se refira aos cidadãos de seu modelo de Estado Social-Liberal como
“cidadãos-clientes” ou “cidadãos-usuários”.
Por fim,tivemos a oportunidade de mencionar que as reformas implicam medidas
liberalizantes, como a abertura dos mercados e a desregulamentação. O discurso
reformador argumenta que o processo de globalização exigiu do Estado uma nova postura
perante a economia. A política protecionista baseada na substituição de importações
visando o desenvolvimento da indústria interna deveria ser abandonada. A partir de então o
Estado deveria incentivar e capacitar a economia para competir internacionalmente.
Acontece que, como temos demonstrado ao longo deste trabalho, a cultura e as produções
64
artísticas não podem ser lançadas ao livre jogo do mercado sem ter proteção especial. O
mercado possui distorções, como o desajuste de forças entre os produtos culturais nacionais
e os estrangeiros (principalmente norte-americanos). Estes, com o capital que envolvem e a
publicidade de que dispõem, solapariam as produções nacionais se estas o comportarem
mecanismos de proteção e fomento. Em última instância, seria a própria cultura e modos de
viver nacionais que estariam sendo enterrados pelo mercado.
4.3 – Política Nacional do Cinema
As reformas políticas (liberalizantes) e administrativas que ganharam impulso na
década de 1990 trouxeram conseqüências para o campo da produção de cultura no Brasil.
Para a área do cinema uma nova política nacional foi adotada e ainda houve a criação de
uma agência reguladora específica para o setor. A separação entre os órgãos definidores das
políticas públicas e as entidades descentralizadas encarregadas de sua execução é
reproduzida aqui. A Política Nacional do Cinema é elaborada dentro do núcleo estratégico
do Estado, enquanto que a sua execução é encargo da Agência Nacional do Cinema
(ANCINE), situada na esfera das atividades exclusivas do Estado.
É necessário ressalvar que a a criação da ANCINE a execução da política para a
área do cinema vinha sendo realizada pelo próprio Ministério da Cultura, que em princípio
deveria apenas se ocupar de formular as diretrizes gerais do setor. Ou seja, como em outros
setores, aqui também foi criada a agência depois que as modificações liberalizantes
estavam implementadas. O correto seria que as entidades responsáveis pela regulação e
fiscalização das políticas públicas fossem criadas concomitantemente com estas, mas isso
não ocorreu com nenhuma agência reguladora no Brasil.
A criação da ANCINE significa, então, o momento de aperfeiçoamento do processo
de reformas políticas e administrativas na área da produção cinematográfica. Segundo a
jurista Maria Sylvia Zanella Di Pietro, uma agência reguladora:
em sentido amplo, seria, no direito brasileiro, qualquer órgão da
Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com função de
regular a matéria específica que lhe está afeta. Se for entidade da
administração indireta, ela está sujeita ao princípio da especialidade,
65
significando que cada qual exerce e é especializada na matéria que lhe foi
atribuída por lei. (DI PIETRO, 2005: p. 402)
A Agência Nacional do Cinema, entidade da administração indireta, como o próprio
nome diz é específica daquele setor. Seus objetivos e competências estão definidos nos
artigos e da Medida Provisória 2.228-1/2001 (criadora da Agência), e podem ser
resumidos à promoção, regulação, fiscalização e fomento das atividades cinematográficas
no Brasil, de acordo com as diretrizes gerais estabelecidas pelo núcleo estratégico do
Estado.
As diretrizes gerais estão contidas na Política Nacional do Cinema, da qual
destacamos os seguintes princípios (enunciados no art. 2º da MP 2.228):
I promoção da cultura nacional e da língua portuguesa mediante o
estímulo do desenvolvimento da indústria cinematográfica e audiovisual
nacional;
II garantia da presença de obras cinematográficas e
videofonográficas nacionais nos diversos segmentos de mercado.
O mecanismo de subsídio estatal responsável por assegurar a efetivação desses
objetivos é o de incentivos fiscais. Desse modo, verifica-se que a sociedade ainda se dispõe
a anuir os encargos do Estado em relação à produção de cultura em geral (Lei Rouanet), e
ao cinema em particular (Lei do Audiovisual).
Cabe notar que, através da instituição destas leis de incentivo cultural, a
sociedade brasileira estabeleceu um contrato com a produção de cinema
respondendo assim a uma velha questão: sim, a sociedade brasileira quis a
existência de um cinema brasileiro, ou ao menos assim manifestou-se através
da ação do Estado, do período seguinte ao governo Collor até os dias de hoje.
Afinal, pretendendo-se que o Estado seja a estrutura constituída por uma
sociedade para se organizar, é este o sentido que se pode extrair do fato de ele
ter subsidiado financeiramente a produção cinematográfica ao longo destes
anos. (CAETANO et al, 2005: p. 13)
O diagnóstico feito por Claus Offe
1
de que o aumento da democracia levou à
desresponsabilização do Estado com relação a diversas atividades ainda não alcançou a
indústria do cinema no Brasil. Esta, segundo o julgamento político da sociedade civil,
1
OFFE, Claus. Capitalismo desorganizado: transformações contemporâneas do trabalho e da política.
Tradução de Wanda Caldeira et al. São Paulo: Brasiliense, 1989.
66
continua entre as atividades merecedoras do amparo financeiro estatal. Vale repetir, agora
nas palavras de Bresser Pereira, a justificativa para o subsídio oferecido pelo Estado:
toda uma série de razões para que o Estado subsidie estas atividades... O
principal argumento econômico que as justifica é o de que estas são
atividades que envolvem externalidades positivas importantes, não sendo,
portanto, devidamente remuneradas pelo mercado. O argumento ético é o de
que são atividades que envolvem direitos humanos fundamentais que
qualquer sociedade deve garantir a seus cidadãos. (BRESSER PEREIRA,
1998c: p. 64)
Os dispositivos legais que implementam o sistema de incentivos estão distribuídos
em quatro leis distintas: Lei 8.685/1993 (Lei do Audiovisual), artigos e 3º; Lei
8.313/1991 (Lei Rouanet), artigos 18º e 25º c/c 26º; Lei 10.179/2001 (Conversão da
dívida), artigo 1º, inciso V; e Medida Provisória 2.228/2001, artigo 39, inciso X.
2
Cada um
desses dispositivos implica em formas diferentes de incentivar as produções, assim como
diferentes percentuais do imposto de renda devido que podem ser aplicados.
É assim que as reformas orientadas para o mercado chegam ao campo da produção
cinematográfica. Entretanto, é preciso apontar duas características desse sistema que
destoam do modelo explicado por Bresser Pereira. Em primeiro lugar, a produção de filmes
não é realizada por organizações o-estatais (setor público não-estatal), mas por empresas
privadas. A justificativa para receberem o incentivo, no entanto, continua sendo o caráter
público de sua atividade: a promoção da cultura. Em segundo lugar, o Estado não o
dinheiro diretamente aos produtores, e sim indiretamente, através do desconto no imposto
de renda das empresas incentivadoras.
Com esse sistema de produção de filmes, a escolha de que projetos serão
financiados está nas mãos do mercado. São os departamentos de marketing das empresas
que decidem – de acordo com o seu interesse em ligar a sua imagem a determinado produto
cultural que imagens devem ser consumidas pelo público. Acontece que as empresas têm
pouco interesse sobre o conteúdo cultural que o projeto possui, elas estão preocupadas
preponderantemente com a sua autopromoção na mídia. Nesse sentido, a função social dos
filmes (ligada ao fato de comportarem externalidades positivas) fica em segundo plano,
trazendo à tona as distorções do sistema: produções estritamente comerciais, as quais obtêm
2
ANCINE. Manual do Produtor. (Obs: Ver as leis nos Anexos 1 a 4)
67
a adequada remuneração através do mercado, adquirem o financiamento; produções que
dependem do apoio para existirem, não o conseguem. Além disso, profissionais
consagrados são favorecidos, em detrimento de produtores menos articulados ou iniciantes,
ou seja, não a democratização dos financiamentos. A almejada descentralização da
produção também não ocorreu com o sistema dos incentivos: a grande maioria dos projetos
incentivados é da Região Sudeste (com destaque para o eixo RJ/SP).
3
Acrescente-se que – como na época do cinema estatal (EMBRAFILME) – a decisão
de financiar determinados projetos (e não outros) continua, em grande medida, no âmbito
da administração indireta do Estado, que são empresas estatais como Petrobrás, BNDES
e Furnas as principais financiadoras da produção cinematográfica no país. Nesse sentido, a
velha crítica sobre favorecimentos e facilidades concedidos a produtores e diretores que
possuem articulação dentro do aparelho do Estado ainda é cabível, haja visto conseguirem
captações as mais vultosas, como é possível verificar na relação de valores incentivados
filme a filme desde o início desse sistema.
4
Por fim, ainda um grande problema relacionado à atual política aplicada ao
cinema no Brasil: os incentivos são concentrados na fase de produção dos filmes, não se
preocupando com sua distribuição e exibição. Além disso, não há qualquer dispositivo legal
que estabeleça o compromisso de produtores com a “carreira” dos filmes; nem a
obrigação de reinvestir os eventuais lucros em outras produções.
5
Como tivemos a
oportunidade de comentar, quando o filme não chega ao público ele não cumpre a sua
função social, ou seja, não satisfaz o fundamento que justifica o seu subsídio indireto pelo
Estado.
6
Isso dá origem a duas conseqüências que colocam em xeque a Política Nacional do
Cinema. A primeira delas diz respeito ao não cumprimento dos dois princípios da atual
política destacados acima por nós (p. 65), devido à própria insuficiência desta. Ou seja,
promete-se a “garantia da presença de obras cinematográficas e videofonográficas
nacionais nos diversos segmentos de mercado”, porém não são oferecidas as condições para
3
Ver Jornal do Brasil, Caderno B, edição de 09/02/2006.
4
Ver a relação filmes/valores captados no site da ANCINE. Diretores e produtores que ocupavam altos cargos
na EMBRAFILME estão entre aqueles que conseguem as maiores captações com as empresas estatais
atualmente.
5
Entre os textos que abordam o tema, destacamos o excelente artigo CAETANO, Daniel et al. “1995-2005:
Histórico de uma década”. In: Cinema Brasileiro 1995-2005. Ensaios sobre uma década. Rio de Janeiro:
Azougue, 2005.
6
Aprofundamos essa questão no Capítulo 1: “Conexões temáticas: aspectos gerais”.
68
que isso se torne realidade. A outra conseqüência é a impossibilidade de ser gerada a auto-
sustentabilidade do setor a partir do sistema em vigor. Como se sabe, o sistema dos
incentivos é geralmente implementado para funcionar durante um período determinado, a
que a atividade tenha condições de prover suas próprias demandas. O sistema
implementado para o setor do cinema no Brasil não fugiu à regra, também sendo instituído
com base nessa idéia. Contudo, ao não cuidar da entrada no mercado dos filmes
produzidos, mina as possibilidades da indústria cinematográfica brasileira se tornar auto-
sustentável.
69
5 – DADOS NUMÉRICOS DO SETOR DE CINEMA NO BRASIL
Agora que discutimos as principais questões envolvidas em nosso objeto de
estudo, é necessário que analisemos os dados numéricos referentes ao mercado de cinema
no país. A nossa finalidade é observar os resultados práticos alcançados pela atual Política
Nacional do Cinema. O marco temporal priorizado em nosso estudo – 1999/2004 – explica-
se pelo motivo de tentar apreender o comportamento do setor com a entrada em cena da
Agência Nacional do Cinema, quando o ciclo das reformas políticas e administrativas
completa-se na referida área. Nesse sentido, os dados colhidos concentram-se no período
que vai dos três anos anteriores ao início das atividades da ANCINE até os três primeiros
anos de sua atuação.
5.1 – Dados preliminares: comparação com outros mercados
Preliminarmente, vale reafirmar a relevância do mercado de cinema do Brasil
perante o panorama internacional. No ano de 2000, o país ocupava a 14ª posição no
ranking dos maiores mercados cinematográficos do mundo em termos de números de salas
de exibição, e no ano de 2001 a 15ª posição em relação ao número de público, como é
possível observar nas tabelas abaixo:
70
Tabela 1: Ranking dos países em relação ao número de salas (ano 2000)
(Fonte: ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003, p. 58)
País Salas
1. China 61.000
2. EUA 36.468
3. Índia 12.999
4. França 4.885
5. Alemanha 4.669
6. Reino Unido 3.045
7. Espanha 3.193
8. Itália 2.860
9. México 2.698
10. Japão 2.378
11. Canadá 2.263
12. Austrália 1.743
13. Rússia 1.560
14. Brasil 1.480
15. Suécia 1.138
16. Polônia 914
17. Argentina 876
18. África do Sul 789
19. República Checa 730
20. Hungria 690
71
Tabela 2: Ranking dos países em relação ao público (ano 2001)
(Fonte: ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003, p. 112)
Com relação a ambos os critérios, o mercado brasileiro é o maior da América do Sul, e
considerando-se a América Latina fica atrás apenas do México. Acrescente-se que, como
veremos adiante, o mercado cinematográfico nacional cresceu ininterruptamente até o
último ano encampado em nosso estudo, o que possivelmente fez ascender a sua
importância no plano internacional:
País Público
1. Índia 3,100 bilhões
2. China 2,186 bilhões
3. EUA 1,500 bilhões
4. Indonésia 222 milhões
5. Japão 200 milhões
6. França 184 milhões
7. Alemanha 177 milhões
8. Reino Unido 155 milhões
9. Espanha 144 milhões
10. México 143 milhões
11. Canadá 110 milhões
12. Itália 107 milhões
13. Austrália 92 milhões
14. Filipinas 82 milhões
15. Brasil 74 milhões
72
1.635
1.817
1.997
0
500
1.000
1.500
2.000
Nº de
s alas
1999 2000 2001 2002 2003 2004
Ano
Gráfico 1:mero de salas no Brasil de acordo com o
ano
(Fonte: ANCINE)
70.000.000
72.000.000
75.000.000
90.865.988
102.958.314
114.733.498
0
20.000 .000
40.000 .000
60.000 .000
80.000 .000
100.000.000
120.000.000
Público
total
1999 2000 2001 2002 2003 2004
Ano
Gráfico 2:blico total no Brasil de acordo com o ano
(Fonte: ANCINE)
73
5.2 – Dados do mercado interno
O aumento do número de espectadores no país pode ser explicado em parte pela
queda no preço médio dos ingressos, o que seria fator de incentivo e facilitação do acesso
às salas de exibição.
Tabela 3: Relação entre o preço médio do ingresso e o público total
(1995-2004)
Ano Preço médio do
ingresso
(U$$)
Público Total
1995 3,88 85.000.000
1996 4,57 62.000.000
1997 4,60 52.000.000
1998 4,70 70.000.000
1999 2,85 70.000.000
2000 2,73 72.000.000
2001 2,45 75.000.000
2002 2,04 90.865.988
2003 2,18 102.958.314
2004 2,46 114.733.498
(Fonte: Filme B [preço médio do ingresso] e ANCINE [público total])
Nos quatro anos que antecedem o marco temporal de nosso estudo, ou seja, de 1995
a 1998, o preço médio do ingresso (baseado no dólar) é consideravelmente superior ao
período 1999-2004. Nesse contexto, percebe-se o declínio gradual de público à medida que
o valor do ingresso aumenta, com exceção do ano de 1998, onde crescimento de público
a despeito do ingresso alcançar o seu valor mais elevado. No entanto, o que aconteceu
naquele ano pode ser mais bem compreendido ao se saber que em 1998 foram inauguradas
74
nada menos do que 225 salas de exibição no país: passamos de 1.075 salas em 1997 para
1.300 no ano seguinte.
Com relação ao período de 1999 a 2004, nota-se uma expressiva queda no preço
médio do ingresso, que se mantém abaixo dos três dólares. Desse modo, o público total
cresce ano a ano, acumulando um aumento de 64% ao final daquele espaço de tempo.
De fato, um fator que, somado à queda no preço médio dos ingressos, contribui para
o aumento do total de público é a própria expansão do parque exibidor. O gráfico nº 1 (pág.
72) demonstra um aumento de 48% no número de salas de exibição naquele mesmo
período.
Vale abrir um parêntese para dizer que houve significativas alterações no setor de
exibição: os “cinemas de rua” estão fechando suas portas, e o shopping center vem sendo o
abrigo da maioria das salas de cinema. Segundo a Abrasce (Associação Brasileira de
Shopping Centers), no ano de 2002 cerca de 65% do total das salas estavam localizadas em
centos comerciais.
1
Nos últimos anos, o conceito de multiplex complexos de exibição que
podem chegar a mais de 20 salas tem se disseminado pelos grandes centros do país.
Soma-se a isso a chegada de empresas multinacionais investindo na área de exibição
cinematográfica no Brasil, como, por exemplo: a Cinemark (sediada nos EUA), a UCI -
United Cinemas Internacional (empresa americana, com sede na Inglaterra), a
Hoyts/General Cinemas (sediada na Austrália) e a Cinebox (sediada na Espanha).
Seja como for, tudo indica que, se o preço médio do ingresso permanecer acessível,
o número de público deve continuar subindo à medida que novas salas de exibição sejam
abertas, pois o mercado brasileiro se encontra carente de oferta nesse setor. Estima-se que o
país comporte pelo menos 3 mil salas,
2
quantidade que foi realidade entre os anos de
1975 e 1979.
1
ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003, p. 64.
2
ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003, p. 65.
75
3.276
3.161
3.156
2.973
2.937
3.100
2.700
2.800
2.900
3.000
3.100
3.200
3.300
de
salas
1975 1976 1977 1978 1979
Ano
Gráfico 3: Número de salas no Brasil na 2ª metade
da década de 1970
Salas
Média de
salas
(Fonte: Filme B)
Apesar de o Brasil ser o mercado de cinema mais importante da América do Sul e o
segundo mais importante da América Latina, o seu potencial não está totalmente
aproveitado: se for considerada a sua população ainda possibilidades de um expressivo
crescimento. Por efeito de comparação, basta citar que no ano de 2000 países latinos como
a Argentina e o México possuíam, respectivamente, 42.000 habitantes/sala e 37.000
habitantes/sala enquanto que o Brasil contava 105.000 habitantes/sala.
3
Um estudo
realizado por pesquisadores do BNDES aponta a relação de uma sala para cada 30.000
habitantes como o ideal para o Brasil.
4
Todos esses números nos permitem ter uma idéia da
potencialidade de crescimento da atividade cinematográfica em nosso país.
3
ALMEIDA, Paulo Sérgio e BUTCHER, Pedro. Cinema: desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro:
BNDES / Aeroplano, 2003, p. 58.
4
SAAB, William George Lopes e RIBEIRO, Rodrigo Martins. Panorama atual do mercado de salas de
exibição no Brasil. Rio de Janeiro: BNDES, 2000, p. 178.
76
5.3 – A participação do filme nacional
Importa saber, agora, qual a participação do filme nacional no mercado (market
share). Esses são os dados de maior importância em nossa pesquisa, pois revelam a divisão
entre filmes nacionais e estrangeiros nas salas de exibição.
Antes, porém, cabe saber qual foi o desempenho da produção nacional no período
1999-2004. O gráfico nº 4 demonstra a quantidade de filmes brasileiros lançados por ano:
34
39
38
32
33
48
37
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Nº de
filmes
1999 2000 2001 2002 2003 2004
Ano
Gfico 4: Filmes nacionais lançados por ano
Filmes
Média de
filmes
(Fonte: ANCINE)
A média alcançada gira em torno de 37 filmes lançados por ano. Especialistas da
área calculam que a produção baseada nos incentivos fiscais atingiu o seu limite (o total
77
de 48 filmes com estréia em 2004 constitui um caso excepcional, que não deve perdurar).
5
O desempenho da produção nacional pode ser considerado baixo se for levado em conta o
público potencial do país. Basta comparar o período 1979-1986, quando a produção
alcançou números expressivos e a população era menor:
104
93
78
80
76
108
107
107
94
0
20
40
60
80
100
120
Nº de
filmes
1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986
Ano
Gfico 5: Produção nacional no peodo 1979-1986
Filmes
Média
de
filmes
(Fonte: Filme B)
5
CAETANO, Daniel et al. “1995-2005: Histórico sobre uma década”. In: Cinema Brasileiro 1995-2005.
Ensaios sobre uma década. Rio de Janeiro: Azougue, 2005.
BUTCHER, Pedro. Cinema Brasileiro Hoje. São Paulo: Publifolha, 2005.
78
Como pode ser verificado, a média de filmes brasileiros lançados naqueles anos
superou em muito a alcançada atualmente. Com relação à participação daqueles filmes no
mercado, os números também demonstram um desempenho superior:
29
31
33
36
32
34
8,2
10
9,3
8
21,4
14,3
12
0
5
10
15
20
25
Market
share nacional
(%)
1999 2000 2001 2002 2003 2004
Ano
Gráfico 7: Market share nacional no período 1999-2004
Market
share
nacional
(%)
Média do
market
share
nacional
(%)
(Fonte: ANCINE)
O número de espectadores dos filmes nacionais confrontado com o público das
produções estrangeiras também expressa a desigualdade de ocupação do mercado interno:
5.715.914
64.284.086
7.207.654
64.792.346
6.978.717
68.021.283
7.299.790
83.566.198
22.055.249
80.903.065
16.410.957
98.322.541
0
10.000.000
20.000.000
30.000.000
40.000.000
50.000.000
60.000.000
70.000.000
80.000.000
90.000.000
100.000.000
de
salas
1999 2000 2001 2002 2003 2004
Ano
Gráfico 8:blico do filme nacional
x
Público do filme estrageiro
Público do
filme
nacional
Público do
filme
estrangeiro
(Fonte: ANCINE)
O pico de público para o cinema nacional constatado em 2003, como apontam os
dois últimos gráficos, deve-se ao lançamento de seis filmes dentre os quinze de maior
80
sucesso comercial desde o início do sistema de incentivos fiscais até aquele momento.
6
Contudo, mais uma vez trata-se de um desempenho que segundo os especialistas não se
sustentará. Nesse sentido, basta atentar para o fato de que no ano seguinte (2004) foram
lançados 15 filmes a mais que em 2003 e, no entanto, o market share nacional caiu de
21,4% para 14,3%.
De fato, o desempenho do cinema nacional na ocupação do mercado de exibição é,
em grande medida, conseqüência do sucesso de poucas produções. O gráfico 9 evidencia
essa situação no ano de 2004:
Gráfico 9:mero de filmes nacionais por faixa de
público em 2004
10%
6%
74%
10%
Mais de 1 milhão de espectadores (5 filmes)
Entre 500 mil e 1 milhão de espectadores (3 filmes)
Entre 100 mil e 500 mil espectadores (5 filmes)
Menos de 100 mil espectadores (35 filmes)
(Fonte: Filme B)
Naquele ano foram lançados um total de 48 filmes. Dentre estes, 35 (o equivalente a
74% do total) obtiveram um público inferior a 100 mil espectadores. Isso comprova o alerta
6
Os filmes, por ordem de público, são os seguintes: Carandiru, Lisbela e o Prisioneiro, Os Normais, Maria –
Mãe do Filho de Deus, Xuxa Abracadabra e Didi O Cúpido Trapalhão. (Fonte: ANCINE e BUTCHER,
Pedro. Cinema Brasileiro Hoje. São Paulo: Publifolha, 2005)
81
de que os filmes nacionais são produzidos porém muito pouco vistos, apenas uma minoria
consegue ampla difusão e, em conseqüência, o retorno financeiro através do mercado.
5.4 – A captação de incentivos fiscais
A captação financeira através dos mecanismos de incentivo fiscal tem relevância
crucial para a indústria de cinema no Brasil, pois influi diretamente na produção das obras
(ponto de partida para movimentar a cadeia: produção distribuição exibição). A tabela
abaixo expõe os valores captados por mecanismo:
Tabela 4: Captação dos incentivos fiscais (1999-2004)
(Valores em R$ mil)
1999 2000 2001 2002 2003 2004
Lei do
Audiovisual
(Total)
39.806 34.425 63.692 55.701 92.968 85.535
Art. 1° 35.941 29.585 47.706 41.298 50.751 48.779
Art. 3° 3.865 4.840 15.986 14.403 42.217 36.756
Lei Rouanet 11.484 12.679 27.071 24.249 20.124 27.361
Conversão
da dívida
953 5.506 540 3.192 2.180 ---
Art. 39, X
(MP 2.228)
--- --- --- --- 2.894 16.669
Total 52.243 52.610 91.303 83.142 118.166 129.565
(Fonte: ANCINE)
Nota-se que a captação financeira apresenta uma tendência ascendente, o que
significa um fato muito positivo para a indústria cinematográfica nacional. Fatores que
82
contribuíram para esse crescimento são: a criação de dois novos mecanismos de captação, a
conversão da dívida e o estabelecido pelo art. 39, X da M.P. 2.228/2001 (especialmente
este último); o sucesso que determinadas produções alcançaram nos anos de 2003 e 2004,
atraindo o interesse das empresas pela potencial publicidade; a criação de uma agência
reguladora específica para o cinema, aumentando a credibilidade do setor.
5.5 – Um balanço geral
Os dados numéricos apresentados neste capítulo indicam um gradual crescimento
do setor de cinema no Brasil de 1999 a 2004. Isso contribui para a sua relevância perante o
contexto internacional, o que por outro lado faz aumentar os interesses das empresas
multinacionais nesse mercado promissor. A quantidade de salas de exibição e o número de
espectadores cresceram consideravelmente, havendo ainda, como revelou-se, espaço para
maior expansão.
A produção do cinema nacional oscilou em torno de 37 filmes por ano, uma média
que não deve ter grande elevação segundo os especialistas da área. Ou seja, a capacidade de
produção amparada no sistema de incentivos fiscais teria atingido o seu limite. Esse
resultado pode ser considerado baixo se forem levados em conta o público total ascendente
e o mercado exibidor em expansão.
A ocupação de mercado pelo cinema nacional, apesar de ter apresentado algum
crescimento, ainda é extremamente insatisfatória. Os números revelam uma enorme
discrepância na divisão entre filmes estrangeiros e nacionais nas salas de exibição. Os
problemas de distribuição persistem e a maioria dos filmes nacionais atinge um número de
espectadores muito baixo. O cinema estrangeiro (em sua maioria de origem norte-
americana) tem dominado o mercado exibidor do país, de forma que as produções
brasileiras precisam atuar nas brechas deixadas por aquele.
O total anual de captação financeira através dos mecanismos de incentivo fiscal
aumentou no período pesquisado. Ainda é cedo para dizer se essa elevação deve se
sustentar nos próximos anos. Se isso acontecer, é possível que a produção nacional alcance
resultados mais expressivos e contrarie o diagnóstico de que ela já tenha chegado a seu teto.
No entanto, vale lembrar que o sistema de incentivos possui o caráter de “socorro” à
83
atividade que se destina, existindo a previsão de se extinguir após determinado período.
Isso ocorre porque aquilo que realmente se espera é a auto-sustentabilidade do setor
incentivado, o que está longe de acontecer com a produção de cinema no Brasil. Os
números indicam que se deixar de haver o subsídio estatal a conseqüência será o
atrofiamento da indústria cinematográfica nacional, que a maioria dos filmes não são
adequadamente distribuídos e exibidos, garantindo, assim, o retorno financeiro através do
mercado.
O que se pode dizer, portanto, sobre o cinema no Brasil nestes últimos anos é que
houve alguns progressos, porém insuficientes. O modelo dos incentivos fiscais foi
importante para reerguer a produção nacional após o fim da EMBRAFILME, fato que
ocasionou o desempenho irrisório do cinema nacional nos primeiros anos da década de
1990.
7
Por causa disso, esse período, que começa a somar pontos positivos a partir de 1995,
ficou conhecido como a retomada” do cinema brasileiro. Todavia, a produção nacional e
sua ocupação de mercado não estão em condições satisfatórias; ainda uma asfixia
causada pelas empresas multinacionais do ramo cinematográfico. Não adianta apenas
expandir o parque exibidor, é fundamental aumentar a ocupação de mercado do filme
nacional.
Os dados numéricos do período 1999-2004 foram algumas vezes confrontados com
aqueles referentes ao tempo da EMBRAFILME, objetivando demonstrar que existe a
capacidade de produzir mais filmes e ocupar maior espaço no mercado. Aquele modelo,
porém, também possuía os seus defeitos e limitações, de forma que não foi nossa intenção
lamentar o seu declínio ou pregar o seu retorno. É necessário, então, construir um modelo
que supere o antigo cinema estatal e o atual sistema ancorado em incentivos fiscais.
Comparando-se os três anos anteriores com os três posteriores ao surgimento da
Agência Nacional do Cinema é possível notar os referidos avanços do setor. A criação de
uma entidade da administração do Estado específica para a área contribuiu para melhorias
nos resultados da Política Nacional do Cinema. É certo que ainda é necessário o seu
satisfatório aparelhamento técnico, operacional e de recursos humanos para que
desempenhe suas funções da maneira ideal. Entretanto, vale lembrar que a ANCINE é
7
Em 1992 foram lançados 3 filmes, e o market share nacional caiu a 0,0%. Em 1993 houve 4 lançamentos,
com o participação de 0,1% no mercado. No ano de 1994, 7 filmes lançados, ocupando 0,4% do mercado.
(Fonte: ANCINE)
84
apenas uma executora das diretrizes determinadas pelo núcleo estratégico do Estado. Nesse
sentido, progressos substanciais poderão ocorrer quando a Política Nacional do Cinema
for reformulada e se tornar capaz de proporcionar ao cinema brasileiro boa produtividade e
ocupação de mercado realmente expressiva dentro de seu próprio país.
85
CONCLUSÃO
O processo de globalização traz consigo alguns efeitos danosos para as sociedades
em geral. O campo da produção de bens culturais sobre o qual este trabalho se debruça
tem convivido com a ameaça de uma homogeneização forçada, que guarda por trás os
interesses de mega-conglomerados empresariais com ramificações nos mais variados
países. Ao dizer isto, não estamos perdendo de vista os contra-movimentos locais
responsáveis pelo resgate e/ou reafirmação das especificidades regionais. Contudo, não
existem garantias de que essas manifestações de resistência serão capazes de se opor, no
longo prazo, às investidas globalizantes.
A preocupação sobre o assunto se torna maior ao voltar a atenção para o
entrelaçamento entre economia e cultura na contemporaneidade. Levando em consideração
que a globalização econômica é aquela de maior avanço, não é difícil vislumbrar o seu
desdobramento na globalização cultural. Fredric Jameson e Zygmunt Bauman têm alertado
para os prejuízos crescentes às identidades culturais locais. O “pensamento único”
subjacente a essa perspectiva, conforme ressalta Milton Santos, não pode continuar ditando
os rumos gerais da vida humana. Por isso, é fundamental que os Estados interfiram no
mercado, garantindo um tratamento diferenciado sobretudo aos bens culturais.
O caso do cinema, em particular, merece atenção reforçada. Esse meio de
comunicação possui o poder de congregar imagem, som e texto, de modo que a sua
influência na sociedade se faz muito grande. No Brasil, a política de apoio estatal ao setor
aumenta o poder do mercado na escolha de quais projetos serão financiados. O sistema dos
incentivos fiscais trouxe pontos positivos e negativos para a indústria cinematográfica
nacional. Por um lado, obteve êxito em proporcionar a retomada da produção; por outro
lado, porém, tem como notório problema não cuidar da difusão dessa mesma produção.
Os dados numéricos referentes ao setor revelam que os resultados colhidos pela
atual Política Nacional do Cinema, mesmo após a criação da ANCINE, não são
satisfatórios. A ocupação de mercado pelos produtos estrangeiros permanece muito
superior a dos nacionais. Dentre estes, alguns poucos alcançam um público expressivo,
enquanto que a maioria tem a sua difusão extremamente restrita. Com isso, torna-se nítida a
86
necessidade da presença do Estado com o objetivo de amenizar a desigualdade de forças
entre os interesses do capital e os de propagação da cultura. O sistema de incentivos fiscais
privilegia os projetos voltados para o sucesso comercial, na medida em que são estes que
podem oferecer o retorno de marketing desejado pelas empresas. Em sentido contrário, os
projetos que não têm o seu conteúdo e forma atrelados às expectativas de mercado são
prejudicados, pois, além de não atraírem bons investimentos, ainda ficam condenados a
atuarem às margens do circuito exibidor.
O amparo teórico de Claus Offe, acerca do provimento de bens públicos por parte
do Estado, permite-nos dizer que a indústria cinematográfica brasileira corre realmente o
risco de deixar de ser considerada merecedora do subsídio estatal. De fato, não existem
justificativas para produzir filmes que não satisfazem qualquer função social. A política e a
legislação para o setor são incompletas, cuidam apenas da produção e negligenciam a
distribuição e exibição. As externalidades positivas provocadas pelos filmes se realizam
quando estes são consumidos. É preciso que a sociedade sinta os benefícios de dispor de
um cinema que contribua não para o entretenimento mas também para o enriquecimento
intelectual e cultural dos indivíduos, caso contrário não existem motivos suficientes para
concordar com esse gasto público.
Ao comparar alguns dados numéricos atuais com aqueles referentes ao período do
financiamento direto do Estado, verifica-se a potencialidade de crescimento do cinema
brasileiro. No entanto, ainda que o antigo sistema tenha alcançado melhores resultados do
que o que hoje se encontra em vigor, também portava problemas e falhas que não fazem
desejável o seu retorno. Nesse sentido, é preciso elaborar um modelo de apoio estatal que
supere tanto o antigo quanto o atual. O espaço para o crescimento existe; basta, para isso,
uma política que ofereça as condições favoráveis.
Vale ressaltar que foi possível levantar dados estatísticos a respeito do desempenho
da indústria cinematográfica nacional, o qual, repita-se, não é satisfatório. Entretanto, o
grau de prejuízos que a saturação de produtos audiovisuais estrangeiros tem causado na
identidade cultural e no imaginário nacional não é possível medir em números. A
consciência desse fato serve para sublinhar a urgência em encontrar meios de sofisticar a
Política Nacional do Cinema, de modo a aumentar a produção e em especial a ocupação de
mercado do filme brasileiro.
87
Caberia ao Estado, ainda, uma política educacional para complementar os esforços
no sentido de desenvolver a produção e o consumo do cinema nacional. Assim, seria
interessante cogitar a inclusão de disciplinas sobre a arte cinematográfica no currículo
escolar, visando, entre outras coisas, estimular o imaginário e a afinidade com a linguagem
audiovisual (nas suas mais diversas possibilidades). Essa providência ajudaria na formação
de um público eclético, não consumidor de apenas um único tipo de cinema. Com isso, a
demanda por filmes que não tem o seu conteúdo determinado com base em ambições
mercadológicas cresceria gradualmente, sim projetando um horizonte no qual a auto-
sustentabilidade do setor seja imaginável.
O Direito, por seu turno, tem a obrigação de instituir as bases jurídicas para a defesa
dos interesses da sociedade. Nesse sentido, a elaboração de mecanismos jurídicos que, de
fato, incentivem eficientemente a produção e o consumo das manifestações artísticas e
culturais nacionais deve constar de sua agenda. Uma atitude como essa é fundamental para
o fortalecimento da soberania do Brasil, e significa uma resposta às ambições de domínio
cultural estrangeiras.
Importante enfatizar que essa posição não denota qualquer espécie de xenobismo,
apenas procura afastar o comportamento de subserviência às prescrições globalizantes (de
cunho neoliberal). É importante e desejável que exista a troca de valores, conhecimentos e
experiências com diversificadas culturas, porém essa troca deve possuir caráter de
enriquecimento humano, e não de domínio. Desse modo, no que toca à área do cinema, a
programação das salas de exibição distribuídas pelo país deve estar preenchida com o
máximo da produção nacional possível e, ainda, com filmes estrangeiros de variadas
procedências – não permitindo a ocupação hegemônica do mercado por apenas um produtor
(no caso, os Estados Unidos).
Edgar Morin afirma, de acordo com o paradigma da complexidade, que o
comportamento humano é constituído pelas relações estabelecidas entre as esferas biológica
e social/cultural. Nesse contexto, não podem ser concebidas apreciações sobre a condição
humana que ignorem a recursividade existente entre tais esferas. Baseado nesse
pensamento, vale complementar dizendo que, assim como o homem precisa da
biodiversidade para a sua sobrevivência, a diversidade cultural é indispensável para a
humanidade.
88
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Restabelece princípios da Lei nº. 7.505, de 2 de julho de 1986, institui o Programa
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Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema Nacional PRODECINE, autoriza a
criação de Fundos de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional
FUNCINES, altera a legislação sobre a Contribuição para o Desenvolvimento da
92
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93
ANEXO 1
LEI Nº 8.313, DE 23 DE DEZEMBRO DE 1991.
Restabelece princípios da Lei 7.505, de 2 de julho
de 1986, institui o Programa Nacional de Apoio à
Cultura (Pronac) e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e
eu sanciono a seguinte lei:
CAPÍTULO I
Disposições Preliminares
Art. Fica instituído o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), com a
finalidade de captar e canalizar recursos para o setor de modo a:
I - contribuir para facilitar, a todos, os meios para o livre acesso às fontes da cultura e
o pleno exercício dos direitos culturais;
II - promover e estimular a regionalização da produção cultural e artística brasileira,
com valorização de recursos humanos e conteúdos locais;
III - apoiar, valorizar e difundir o conjunto das manifestações culturais e seus
respectivos criadores;
IV - proteger as expressões culturais dos grupos formadores da sociedade brasileira e
responsáveis pelo pluralismo da cultura nacional;
V - salvaguardar a sobrevivência e o florescimento dos modos de criar, fazer e viver
da sociedade brasileira;
VI - preservar os bens materiais e imateriais do patrimônio cultural e histórico
brasileiro;
VII - desenvolver a consciência internacional e o respeito aos valores culturais de
outros povos ou nações;
VIII - estimular a produção e difusão de bens culturais de valor universal, formadores
e informadores de conhecimento, cultura e memória;
IX - priorizar o produto cultural originário do País.
Art. 2° O Pronac será implementado através dos seguintes mecanismos:
94
I - Fundo Nacional da Cultura (FNC);
II - Fundos de Investimento Cultural e Artístico (Ficart);
III - Incentivo a projetos culturais.
Parágrafo único. Os incentivos criados pela presente lei somente serão concedidos a
projetos culturais que visem a exibição, utilização e circulação públicas dos bens culturais
deles resultantes, vedada a concessão de incentivo a obras, produtos, eventos ou outros
decorrentes, destinados ou circunscritos a circuitos privados ou a coleções particulares.
Art. Para cumprimento das finalidades expressas no art. desta lei, os projetos
culturais em cujo favor serão captados e canalizados os recursos do Pronac atenderão, pelo
menos, um dos seguintes objetivos:
I - incentivo à formação artística e cultural, mediante:
a) concessão de bolsas de estudo, pesquisa e trabalho, no Brasil ou no exterior, a
autores, artistas e técnicos brasileiros ou estrangeiros residentes no Brasil;
b) concessão de prêmios a criadores, autores, artistas, técnicos e suas obras, filmes,
espetáculos musicais e de artes cênicas em concursos e festivais realizados no Brasil;
c) instalação e manutenção de cursos de caráter cultural ou artístico, destinados à
formação, especialização e aperfeiçoamento de pessoal da área da cultura, em
estabelecimentos de ensino sem fins lucrativos;
II - fomento à produção cultural e artística, mediante:
a) produção de discos, vídeos, filmes e outras formas de reprodução fonovideográfica
de caráter cultural; (Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
b) edição de obras relativas às ciências humanas, às letras e às artes;
c) realização de exposições, festivais de arte, espetáculos de artes cênicas, de música e
de folclore;
d) cobertura de despesas com transporte e seguro de objetos de valor cultural
destinados a exposições públicas no País e no exterior;
e) realização de exposições, festivais de arte e espetáculos de artes cênicas ou
congêneres;
III - preservação e difusão do patrimônio artístico, cultural e histórico, mediante:
95
a) construção, formação, organização, manutenção, ampliação e equipamento de
museus, bibliotecas, arquivos e outras organizações culturais, bem como de suas coleções e
acervos;
b) conservação e restauração de prédios, monumentos, logradouros, sítios e demais
espaços, inclusive naturais, tombados pelos Poderes Públicos;
c) restauração de obras de artes e bens móveis e imóveis de reconhecido valor cultural;
d) proteção do folclore, do artesanato e das tradições populares nacionais;
IV - estímulo ao conhecimento dos bens e valores culturais, mediante:
a) distribuição gratuita e pública de ingressos para espetáculos culturais e artísticos;
b) levantamentos, estudos e pesquisas na área da cultura e da arte e de seus vários
segmentos;
c) fornecimento de recursos para o FNC e para fundações culturais com fins
específicos ou para museus, bibliotecas, arquivos ou outras entidades de caráter cultural;
V - apoio a outras atividades culturais e artísticas, mediante:
a) realização de missões culturais no país e no exterior, inclusive através do
fornecimento de passagens;
b) contratação de serviços para elaboração de projetos culturais;
c) ações não previstas nos incisos anteriores e consideradas relevantes pelo Ministro
de Estado da Cultura, consultada a Comissão Nacional de Apoio à Cultura. (Redação dada
pela Lei nº 9.874, de 1999)
CAPÍTULO II
Do Fundo Nacional da Cultura (FNC)
Art. Fica ratificado o Fundo de Promoção Cultural, criado pela Lei 7.505, de 2
de julho de 1986, que passará a denominar-se Fundo Nacional da Cultura (FNC), com o
objetivo de captar e destinar recursos para projetos culturais compatíveis com as finalidades
do Pronac e de:
I - estimular a distribuição regional eqüitativa dos recursos a serem aplicados na
execução de projetos culturais e artísticos;
II - favorecer a visão interestadual, estimulando projetos que explorem propostas
culturais conjuntas, de enfoque regional;
96
III - apoiar projetos dotados de conteúdo cultural que enfatizem o aperfeiçoamento
profissional e artístico dos recursos humanos na área da cultura, a criatividade e a
diversidade cultural brasileira;
IV - contribuir para a preservação e proteção do patrimônio cultural e histórico
brasileiro;
V - favorecer projetos que atendam às necessidades da produção cultural e aos
interesses da coletividade, considerados os níveis qualitativos e quantitativos de
atendimentos às demandas culturais existentes, o caráter multiplicador dos projetos através
de seus aspectos sócio-culturais e a priorização de projetos em áreas artísticas e culturais
com menos possibilidade de desenvolvimento com recursos próprios.
§ 1
o
O FNC será administrado pelo Ministério da Cultura e gerido por seu titular, para
cumprimento do Programa de Trabalho Anual, segundo os princípios estabelecidos nos
arts. 1
o
e 3
o
. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 2
o
Os recursos do FNC somente serão aplicados em projetos culturais após
aprovados, com parecer do órgão técnico competente, pelo Ministro de Estado da Cultura.
(Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ Os projetos aprovados serão acompanhados e avaliados tecnicamente pelas
entidades supervisionadas, cabendo a execução financeira à SEC/PR.
§ Sempre que necessário, as entidades supervisionadas utilizarão peritos para
análise e parecer sobre os projetos, permitida a indenização de despesas com o
deslocamento, quando houver, e respectivos pró-labore e ajuda de custos, conforme ficar
definido no regulamento.
§ O Secretário da Cultura da Presidência da República designará a unidade da
estrutura básica da SEC/PR que funcionará como secretaria executiva do FNC.
§ 6
o
Os recursos do FNC não poderão ser utilizados para despesas de manutenção
administrativa do Ministério da Cultura, exceto para a aquisição ou locação de
equipamentos e bens necessários ao cumprimento das finalidades do Fundo. (Redação dada
pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ Ao término do projeto, a SEC/PR efetuará uma avaliação final de forma a
verificar a fiel aplicação dos recursos, observando as normas e procedimentos a serem
definidos no regulamento desta lei, bem como a legislação em vigor.
§ 8° As instituições públicas ou privadas recebedoras de recursos do FNC e executoras
de projetos culturais, cuja avaliação final não for aprovada pela SEC/PR, nos termos do
parágrafo anterior, ficarão inabilitadas pelo prazo de três anos ao recebimento de novos
recursos, ou enquanto a SEC/PR não proceder a reavaliação do parecer inicial.
97
Art. 5° O FNC é um fundo de natureza contábil, com prazo indeterminado de duração,
que funcionará sob as formas de apoio a fundo perdido ou de empréstimos reembolsáveis,
conforme estabelecer o regulamento, e constituído dos seguintes recursos:
I - recursos do Tesouro Nacional;
II - doações, nos termos da legislação vigente;
III - legados;
IV - subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos
internacionais;
V - saldos não utilizados na execução dos projetos a que se referem o Capítulo IV e o
presente capítulo desta lei;
VI - devolução de recursos de projetos previstos no Capítulo IV e no presente capítulo
desta lei, e não iniciados ou interrompidos, com ou sem justa causa;
VII - um por cento da arrecadação dos Fundos de Investimentos Regionais, a que se
refere a Lei 8.167, de 16 de janeiro de 1991, obedecida na aplicação a respectiva origem
geográfica regional;
VIII - Três por cento da arrecadação bruta dos concursos de prognósticos e loterias
federais e similares cuja realização estiver sujeita a autorização federal, deduzindo-se este
valor do montante destinados aos prêmios; (Redação dada pela Lei nº 9.999, de 2000)
IX - reembolso das operações de empréstimo realizadas através do fundo, a título de
financiamento reembolsável, observados critérios de remuneração que, no nimo, lhes
preserve o valor real;
X - resultado das aplicações em títulos públicos federais, obedecida a legislação
vigente sobre a matéria;
XI - conversão da dívida externa com entidades e órgãos estrangeiros, unicamente
mediante doações, no limite a ser fixado pelo Ministro da Economia, Fazenda e
Planejamento, observadas as normas e procedimentos do Banco Central do Brasil;
XII - saldos de exercícios anteriores; XIII recursos de outras fontes.
Art. 6° O FNC financiará até oitenta por cento do custo total de cada projeto, mediante
comprovação, por parte do proponente, ainda que pessoa jurídica de direito público, da
circunstância de dispor do montante remanescente ou estar habilitado à obtenção do
respectivo financiamento, através de outra fonte devidamente identificada, exceto quanto
aos recursos com destinação especificada na origem.
98
§ 1° (Vetado)
§ Poderão ser considerados, para efeito de totalização do valor restante, bens e
serviços oferecidos pelo proponente para implementação do projeto, a serem devidamente
avaliados pela SEC/PR.
Art. 7° A SEC/PR estimulará, através do FNC, a composição, por parte de instituições
financeiras, de carteiras para financiamento de projetos culturais, que levem em conta o
caráter social da iniciativa, mediante critérios, normas, garantias e taxas de juros especiais a
serem aprovados pelo Banco Central do Brasil.
CAPÍTULO III
Dos Fundos de Investimento Cultural e Artístico (Ficart)
Art. Fica autorizada a constituição de Fundos de Investimento Cultural e Artístico
(Ficart), sob a forma de condomínio, sem personalidade jurídica, caracterizando comunhão
de recursos destinados à aplicação em projetos culturais e artísticos.
Art. 9
o
São considerados projetos culturais e artísticos, para fins de aplicação de
recursos do FICART, além de outros que venham a ser declarados pelo Ministério da
Cultura: (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
I - a produção comercial de instrumentos musicais, bem como de discos, fitas, vídeos,
filmes e outras formas de reprodução fonovideográficas;
II - a produção comercial de espetáculos teatrais, de dança, música, canto, circo e
demais atividades congêneres;
III - a edição comercial de obras relativas às ciências, às letras e às artes, bem como de
obras de referência e outras de cunho cultural;
IV - construção, restauração, reparação ou equipamento de salas e outros ambientes
destinados a atividades com objetivos culturais, de propriedade de entidades com fins
lucrativos;
V - outras atividades comerciais ou industriais, de interesse cultural, assim
consideradas pelo Ministério da Cultura. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
Art. 10. Compete à Comissão de Valores Mobiliários, ouvida a SEC/PR, disciplinar a
constituição, o funcionamento e a administração dos Ficart, observadas as disposições desta
lei e as normas gerais aplicáveis aos fundos de investimento.
Art. 11. As quotas dos Ficart, emitidas sempre sob a forma nominativa ou escritural,
constituem valores mobiliários sujeitos ao regime da Lei 6.385, de 7 de dezembro de
1976.
99
Art. 12. O titular das quotas de Ficart:
I - não poderá exercer qualquer direito real sobre os bens e direitos integrantes do
patrimônio do fundo;
II - não responde pessoalmente por qualquer obrigação legal ou contratual,
relativamente aos empreendimentos do fundo ou da instituição administradora, salvo
quanto à obrigação de pagamento do valor integral das quotas subscritas.
Art. 13. A instituição administradora de Ficart compete:
I - representá-lo ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente;
II - responder pessoalmente pela evicção de direito, na eventualidade da liquidação
deste.
Art. 14. Os rendimentos e ganhos de capital auferidos pelos Ficart ficam isentos do
imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, assim como do imposto sobre renda e
proventos de qualquer natureza. (Vide Lei nº 8.894, de 1994)
Art. 15. Os rendimentos e ganhos de capital distribuídos pelos Ficart, sob qualquer
forma, sujeitam-se à incidência do imposto sobre a renda na fonte à alíquota de vinte e
cinco por cento.
Parágrafo único. Ficam excluídos da incidência na fonte de que trata este artigo, os
rendimentos distribuídos a beneficiário pessoas jurídica tributada com base no lucro real, os
quais deverão ser computados na declaração anual de rendimentos.
Art. 16. Os ganhos de capital auferidos por pessoas físicas ou jurídicas não tributadas
com base no lucro real, inclusive isentas, decorrentes da alienação ou resgate de quotas dos
Ficart, sujeitam-se à incidência do imposto sobre a renda, à mesma alíquota prevista para a
tributação de rendimentos obtidos na alienação ou resgate de quotas de fundos mútuos de
ações.
§ Considera-se ganho de capital a diferença positiva entre o valor de cessão ou
resgate da quota e o custo médio atualizado da aplicação, observadas as datas de aplicação,
resgate ou cessão, nos termos da legislação pertinente.
§ O ganho de capital será apurado em relação a cada resgate ou cessão, sendo
permitida a compensação do prejuízo havido em uma operação com o lucro obtido em
outra, da mesma ou diferente espécie, desde que de renda variável, dentro do mesmo
exercício fiscal.
§ O imposto será pago até o último dia útil da primeira quinzena do mês
subseqüente àquele em que o ganho de capital foi auferido.
100
§ Os rendimentos e ganhos de capital a que se referem o caput deste artigo e o
artigo anterior, quando auferidos por investidores residentes ou domiciliados no exterior,
sujeitam-se à tributação pelo imposto sobre a renda, nos termos da legislação aplicável a
esta classe de contribuintes.
Art. 17. O tratamento fiscal previsto nos artigos precedentes somente incide sobre os
rendimentos decorrentes de aplicações em Ficart que atendam a todos os requisitos
previstos na presente lei e na respectiva regulamentação a ser baixada pela Comissão de
Valores Mobiliários.
Parágrafo único. Os rendimentos e ganhos de capital auferidos por Ficart, que deixem
de atender aos requisitos específicos desse tipo de fundo, sujeitar-se-ão à tributação prevista
no artigo 43 da Lei n° 7.713, de 22 de dezembro de 1988.
CAPÍTULO IV
Do Incentivo a Projetos Culturais
Art. 18. Com o objetivo de incentivar as atividades culturais, a União facultará às
pessoas físicas ou jurídicas a opção pela aplicação de parcelas do Imposto sobre a Renda, a
título de doações ou patrocínios, tanto no apoio direto a projetos culturais apresentados por
pessoas físicas ou por pessoas jurídicas de natureza cultural, como através de contribuições
ao FNC, nos termos do art. 5
o
, inciso II, desta Lei, desde que os projetos atendam aos
critérios estabelecidos no art. 1
o
desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 1
o
Os contribuintes poderão deduzir do imposto de renda devido as quantias
efetivamente despendidas nos projetos elencados no § 3
o
, previamente aprovados pelo
Ministério da Cultura, nos limites e nas condições estabelecidos na legislação do imposto
de renda vigente, na forma de: (Incluído pela Lei nº 9.874, de 1999)
a) doações; e (Incluída pela Lei nº 9.874, de 1999)
b) patrocínios. (Incluída pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 2
o
As pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real não poderão deduzir o
valor da doação ou do patrocínio referido no parágrafo anterior como despesa
operacional.(Incluído pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 3
o
As doações e os patrocínios na produção cultural, a que se refere o § 1
o
,
atenderão exclusivamente aos seguintes segmentos: (Incluído pela Lei 9.874, de 1999)
(Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
a) artes nicas; (Incluída pela Lei 9.874, de 1999) (Vide Medida Provisória
2.228-1, de 2001)
b) livros de valor artístico, literário ou humanístico; (Incluída pela Lei 9.874, de
1999) (Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
101
c) música erudita ou instrumental; (Incluída pela Lei 9.874, de 1999) (Vide
Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
d) circulação de exposições de artes plásticas; (Incluída pela Lei 9.874, de 1999)
(Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
e) doações de acervos para bibliotecas públicas e para museus. (Incluída pela Lei
9.874, de 1999) (Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
f) (Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
g) (Vide Medida Provisória nº 2.228-1, de 2001)
Art. 19. Os projetos culturais previstos nesta Lei serão apresentados ao Ministério da
Cultura, ou a quem este delegar atribuição, acompanhados do orçamento analítico, para
aprovação de seu enquadramento nos objetivos do PRONAC. (Redação dada pela Lei
9.874, de 1999)
§ 1
o
O proponente será notificado dos motivos da decisão que não tenha aprovado o
projeto, no prazo máximo de cinco dias. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 2
o
Da notificação a que se refere o parágrafo anterior, caberá pedido de
reconsideração ao Ministro de Estado da Cultura, a ser decidido no prazo de sessenta dias.
(Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 3° (Vetado)
§ 4° (Vetado)
§ 5° (Vetado)
§ A aprovação somente terá eficácia após publicação de ato oficial contendo o
título do projeto aprovado e a instituição por ele responsável, o valor autorizado para
obtenção de doação ou patrocínio e o prazo de validade da autorização.
§ 7
o
O Ministério da Cultura publicará anualmente, até 28 de fevereiro, o montante
dos recursos autorizados pelo Ministério da Fazenda para a renúncia fiscal no exercício
anterior, devidamente discriminados por beneficiário. (Redação dada pela Lei 9.874, de
1999)
§ 8
o
Para a aprovação dos projetos será observado o princípio da não-concentração
por segmento e por beneficiário, a ser aferido pelo montante de recursos, pela quantidade
de projetos, pela respectiva capacidade executiva e pela disponibilidade do valor absoluto
anual de renúncia fiscal. (Incluído pela Lei nº 9.874, 1999)
102
Art. 20. Os projetos aprovados na forma do artigo anterior serão, durante sua
execução, acompanhados e avaliados pela SEC/PR ou por quem receber a delegação destas
atribuições.
§ A SEC/PR, após o término da execução dos projetos previstos neste artigo,
deverá, no prazo de seis meses, fazer uma avaliação final da aplicação correta dos recursos
recebidos, podendo inabilitar seus responsáveis pelo prazo de até três anos.
§ 2
o
Da decisão a que se refere o parágrafo anterior, caberá pedido de reconsideração
ao Ministro de Estado da Cultura, a ser decidido no prazo de sessenta dias.(Redação dada
pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ O Tribunal de Contas da União incluirá em seu parecer prévio sobre as contas do
Presidente da República análise relativa a avaliação de que trata este artigo.
Art. 21. As entidades incentivadoras e captadoras de que trata este Capítulo deverão
comunicar, na forma que venha a ser estipulada pelo Ministério da Economia, Fazenda e
Planejamento, e SEC/PR, os aportes financeiros realizados e recebidos, bem como as
entidades captadoras efetuar a comprovação de sua aplicação.
Art. 22. Os projetos enquadrados nos objetivos desta lei não poderão ser objeto de
apreciação subjetiva quanto ao seu valor artístico ou cultural.
Art. 23. Para os fins desta lei, considera-se:
I - (Vetado)
II - patrocínio: a transferência de numerário, com finalidade promocional ou a
cobertura, pelo contribuinte do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, de
gastos, ou a utilização de bem móvel ou imóvel do seu patrimônio, sem a transferência de
domínio, para a realização, por outra pessoa física ou jurídica de atividade cultural com ou
sem finalidade lucrativa prevista no art. 3° desta lei.
§ 1
o
Constitui infração a esta Lei o recebimento pelo patrocinador, de qualquer
vantagem financeira ou material em decorrência do patrocínio que efetuar.
§ 2
o
As transferências definidas neste artigo não estão sujeitas ao recolhimento do
Imposto sobre a Renda na fonte.
Art. 24. Para os fins deste Capítulo, equiparam-se a doações, nos termos do
regulamento:
I - distribuições gratuitas de ingressos para eventos de caráter artístico-cultural por
pessoa jurídica a seus empregados e dependentes legais;
103
II - despesas efetuadas por pessoas físicas ou jurídicas com o objetivo de conservar,
preservar ou restaurar bens de sua propriedade ou sob sua posse legítima, tombados pelo
Governo Federal, desde que atendidas as seguintes disposições:
a) preliminar definição, pelo Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural - IBPC, das
normas e critérios técnicos que deverão reger os projetos e orçamentos de que trata este
inciso;
b) aprovação prévia, pelo IBPC, dos projetos e respectivos orçamentos de execução
das obras;
c) posterior certificação, pelo referido órgão, das despesas efetivamente realizadas e
das circunstâncias de terem sido as obras executadas de acordo com os projetos aprovados.
Art. 25. Os projetos a serem apresentados por pessoas físicas ou pessoas jurídicas, de
natureza cultural para fins de incentivo, objetivarão desenvolver as formas de expressão, os
modos de criar e fazer, os processos de preservação e proteção do patrimônio cultural
brasileiro, e os estudos e métodos de interpretação da realidade cultural, bem como
contribuir para propiciar meios, à população em geral, que permitam o conhecimento dos
bens de valores artísticos e culturais, compreendendo, entre outros, os seguintes segmentos:
I - teatro, dança, circo, ópera, mímica e congêneres;
II - produção cinematográfica, videográfica, fotográfica, discográfica e congêneres;
III - literatura, inclusive obras de referência;
IV - música;
V - artes plásticas, artes gráficas, gravuras, cartazes, filatelia e outras congêneres;
VI - folclore e artesanato;
VII - patrimônio cultural, inclusive histórico, arquitetônico, arqueológico, bibliotecas,
museus, arquivos e demais acervos;
VIII - humanidades; e
IX - rádio e televisão, educativas e culturais, de caráter não-comercial.
Parágrafo único. Os projetos culturais relacionados com os segmentos do inciso II
deste artigo deverão beneficiar exclusivamente as produções independentes, bem como as
produções culturais-educativas de caráter não comercial, realizadas por empresas de rádio e
televisão. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
104
Art. 26. O doador ou patrocinador poderá deduzir do imposto devido na declaração do
Imposto sobre a Renda os valores efetivamente contribuídos em favor de projetos culturais
aprovados de acordo com os dispositivos desta Lei, tendo como base os seguintes
percentuais: (Vide arts. 5º e 6º, Inciso II da Lei nº 9.532 de, 1997)
I - no caso das pessoas físicas, oitenta por cento das doações e sessenta por cento dos
patrocínios;
II - no caso das pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, quarenta por cento
das doações e trinta por cento dos patrocínios.
§ 1
o
A pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá abater as doações e
patrocínios como despesa operacional.
§ 2
o
O valor máximo das deduções de que trata o caput deste artigo será fixado
anualmente pelo Presidente da República, com base em um percentual da renda tributável
das pessoas sicas e do imposto devido por pessoas jurídicas tributadas com base no lucro
real.
§ 3
o
Os benefícios de que trata este artigo não excluem ou reduzem outros benefícios,
abatimentos e deduções em vigor, em especial as doações a entidades de utilidade pública
efetuadas por pessoas físicas ou jurídicas.
§ 4
o
(VETADO)
§ 5
o
O Poder Executivo estabelecerá mecanismo de preservação do valor real das
contribuições em favor de projetos culturais, relativamente a este Capítulo.
Art. 27. A doação ou o patrocínio não poderá ser efetuada a pessoa ou instituição
vinculada ao agente.
§ 1
o
Consideram-se vinculados ao doador ou patrocinador:
a) a pessoa jurídica da qual o doador ou patrocinador seja titular, administrador,
gerente, acionista ou sócio, na data da operação, ou nos doze meses anteriores;
b) o cônjuge, os parentes até o terceiro grau, inclusive os afins, e os dependentes do
doador ou patrocinador ou dos titulares, administradores, acionistas ou sócios de pessoa
jurídica vinculada ao doador ou patrocinador, nos termos da alínea anterior;
c) outra pessoa jurídica da qual o doador ou patrocinador seja sócio.
§ 2
o
Não se consideram vinculadas as instituições culturais sem fins lucrativos, criadas
pelo doador ou patrocinador, desde que devidamente constituídas e em funcionamento, na
forma da legislação em vigor. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
105
Art. 28. Nenhuma aplicação dos recursos previstos nesta Lei poderá ser feita através
de qualquer tipo de intermediação.
Parágrafo único. A contratação de serviços necessários à elaboração de projetos
para a obtenção de doação, patrocínio ou investimento, bem como a captação de recursos
ou a sua execução por pessoa jurídica de natureza cultural, não configura a intermediação
referida neste artigo. (Redação dada pela Lei nº 9.874, de 1999)
Art. 29. Os recursos provenientes de doações ou patrocínios deverão ser depositados e
movimentados, em conta bancária específica, em nome do beneficiário, e a respectiva
prestação de contas deverá ser feita nos termos do regulamento da presente Lei.
Parágrafo único. Não serão consideradas, para fins de comprovação do incentivo, as
contribuições em relação às quais não se observe esta determinação.
Art. 30. As infrações aos dispositivos deste capítulo, sem prejuízo das sanções penais
cabíveis, sujeitarão o doador ou patrocinador ao pagamento do valor atualizado do Imposto
sobre a Renda devido em relação a cada exercício financeiro, além das penalidades e
demais acréscimos previstos na legislação que rege a espécie.
§ 1
o
Para os efeitos deste artigo, considera-se solidariamente responsável por
inadimplência ou irregularidade verificada a pessoa física ou jurídica propositora do
projeto. (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 2
o
A existência de pendências ou irregularidades na execução de projetos da
proponente junto ao Ministério da Cultura suspenderá a análise ou concessão de novos
incentivos, até a efetiva regularização. (Incluído pela Lei nº 9.874, de 1999)
§ 3
o
Sem prejuízo do parágrafo anterior, aplica-se, no que couber, cumulativamente, o
disposto nos arts. 38 e seguintes desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.874, de 1999)
CAPÍTULO V
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS
Art. 31. Com a finalidade de garantir a participação comunitária, a representação de
artista e criadores no trato oficial dos assuntos da cultura e a organização nacional sistêmica
da área, o Governo Federal estimulará a institucionalização de Conselhos de Cultura no
Distrito Federal, nos Estados, e nos Municípios.
Art. 32. Fica instituída a Comissão Nacional de incentivo à Cultura - CNIC, com a
seguinte composição:
I - o Secretário da Cultura da Presidência da República;
II - os Presidentes das entidades supervisionadas pela SEC/PR;
106
III - o Presidente da entidade nacional que congregar os Secretários de Cultura das
Unidades Federadas;
IV - um representante do empresariado brasileiro;
V - seis representantes de entidades associativas dos setores culturais e artísticos de
âmbito nacional.
§ 1
o
A CNIC será presidida pela autoridade referida no inciso I deste artigo que, para
fins de desempate terá o voto de qualidade.
§ 2
o
Os mandatos, a indicação e a escolha dos representantes a que se referem os
incisos IV e V deste artigo, assim como a competência da CNIC, serão estipulados e
definidos pelo regulamento desta Lei.
Art. 33. A SEC/PR, com a finalidade de estimular e valorizar a arte e a cultura,
estabelecerá um sistema de premiação anual que reconheça as contribuições mais
significativas para a área:
I - de artistas ou grupos de artistas brasileiros ou residentes no Brasil, pelo conjunto de
sua obra ou por obras individuais;
II - de profissionais da área do patrimônio cultural;
III - de estudiosos e autores na interpretação crítica da cultura nacional, através de
ensaios, estudos e pesquisas.
Art. 34. Fica instituída a Ordem do Mérito Cultural, cujo estatuto será aprovado por
Decreto do Poder Executivo, sendo que as distinções serão concedidas pelo Presidente da
República, em ato solene, a pessoas que, por sua atuação profissional ou como
incentivadoras das artes e da cultura, mereçam reconhecimento. (Regulamento)
Art. 35. Os recursos destinados ao então Fundo de Promoção Cultural, nos termos do
art. 1
o
, § 6
o
, da Lei n
o
7.505, de 2 de julho de 1986, serão recolhidos ao Tesouro Nacional
para aplicação pelo FNC, observada a sua finalidade.
Art. 36. O Departamento da Receita Federal, do Ministério da Economia, Fazenda e
Planejamento, no exercício de suas atribuições específicas, fiscalizará a efetiva execução
desta Lei, no que se refere à aplicação de incentivos fiscais nela previstos.
Art. 37. O Poder Executivo a fim de atendÇSTjD3VCNM..CsjjÐñH
o
Art. 38. Na hipótese de dolo, fraude ou simulação, inclusive no caso de desvio de
objeto, será aplicada, ao doador e ao beneficiário, multa correspondente a duas vezes o
valor da vantagem recebida indevidamente.
Art. 39. Constitui crime, punível com a reclusão de dois a seis meses e multa de vinte
por cento do valor do projeto, qualquer discriminação de natureza política que atente contra
a liberdade de expressão, de atividade intelectual e artística, de consciência ou crença, no
andamento dos projetos a que se refere esta Lei.
Art. 40. Constitui crime, punível com reclusão de dois a seis meses e multa de vinte
por cento do valor do projeto, obter redução do imposto de renda utilizando-se
fraudulentamente de qualquer benefício desta Lei.
§ 1
o
No caso de pessoa jurídica respondem pelo crime o acionista controlador e os
administradores que para ele tenham concorrido.
§ 2
o
Na mesma pena incorre aquele que, recebendo recursos, bens ou valores em
função desta Lei, deixa de promover, sem justa causa, atividade cultural objeto do
incentivo.
Art. 41. O Poder Executivo, no prazo de sessenta dias, Regulamentará a presente lei.
Art. 42. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 43. Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 23 de dezembro de 1991; 170° da Independência e 103° da República.
FERNANDO COLLOR
Jarbas Passarinho
108
ANEXO 2
LEI N
o
8.685, DE 20 DE JULHO DE 1993.
Cria mecanismos de fomento à atividade
audiovisual e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e
eu sanciono a seguinte Lei:
Art. Até o exercício fiscal de 2003, inclusive, os contribuintes poderão deduzir do
imposto de renda devido as quantias referentes a investimentos feitos na produção de obras
audiovisuais cinematográficas brasileiras de produção independente, conforme definido no
art. 2º, incisos II e III, e no art. 3º, incisos I e II, da Lei 8.401, de 8 de janeiro de 1992,
mediante a aquisição de quotas representativas de direitos de comercialização sobre as
referidas obras, desde que estes investimentos sejam realizados no mercado de capitais, em
ativos previstos em lei e autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários, e os projetos
de produção tenham sido previamente aprovados pelo Ministério da Cultura. (Vide Lei
9.532, de 1997) (Vide Medida Provisória nº 2.228, de 6.9.2001)
§ A responsabilidade dos adquirentes é limitada à integralização das quotas
subscritas.
§ A dedução prevista neste artigo está limitada a três por cento do imposto devido
pelas pessoas físicas e a um por cento do imposto devido pelas pessoas jurídicas. (Vide Lei
9.323, de 1996)
§ 3º Os valores aplicados nos investimentos de que trata o artigo anterior serão:
a) deduzidos do imposto devido no mês a que se referirem os investimentos, para as
pessoas jurídicas que apuram o lucro mensal;
b) deduzidos do imposto devido na declaração de ajuste para:
1. as pessoas jurídicas que, tendo optado pelo recolhimento do imposto por estimativa,
apuram o lucro real anual;
2. as pessoas físicas.
§ A pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá, também, abater o total
dos investimentos efetuados na forma deste artigo como despesa operacional.
§ Os projetos específicos da área audiovisual, cinematográfica de exibição,
distribuição e infra-estrutura técnica apresentados por empresa brasileira de capital
109
nacional, poderão ser credenciados pelos Ministérios da Fazenda e da Cultura para fruição
dos incentivos fiscais de que trata o caput deste artigo.
Art. O art. 13 do Decreto-Lei 1.089, de 2 de março de 1970, alterado pelo art.
do Decreto-Lei 1.741, de 27 de dezembro de 1979, passa a vigorar com a seguinte
redação:
"Art. 13. As importâncias pagas, creditadas, empregadas, remetidas ou entregues aos
produtores, distribuidores ou intermediários no exterior, como rendimentos decorrentes da
exploração de obras audiovisuais estrangeiras em todo o território nacional, ou por sua
aquisição ou importação a preço fixo, ficam sujeitas ao imposto de 25% na fonte."
Art. 3
o
Os contribuintes do Imposto de Renda incidente nos termos do art. 13 do
Decreto-Lei n
o
1.089, de 1970, alterado pelo art. 2
o
desta Lei, poderão beneficiar-se de
abatimento de 70% (setenta por cento) do imposto devido, desde que invistam no
desenvolvimento de projetos de produção de obras cinematográficas brasileiras de longa
metragem de produção independente, e na co-produção de telefilmes e minisséries
brasileiros de produção independente e de obras cinematográficas brasileiras de produção
independente. (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. O contribuinte que optar pelo uso dos incentivos previstos nos arts. e
depositará, dentro do prazo legal fixado para o recolhimento do imposto, o valor
correspondente ao abatimento em conta de aplicação financeira especial, no Banco do
Brasil S.A., cuja movimentação sujeitar-se-á à prévia comprovação junto ao Ministério da
Cultura de que se destina a investimentos em projetos de produção de obras audiovisuais
cinematográficas brasileiras de produção independente.
§ 1º As contas de aplicação financeira a que se refere este artigo serão abertas:
a) em nome do produtor, para cada projeto, no caso do art. 1º;
b) em nome do contribuinte, no caso do art. 3º.
§ 2
o
Os projetos a que se refere este artigo deverão atender cumulativamente aos
seguintes requisitos: (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
I - contrapartida de recursos próprios ou de terceiros correspondente a 5% (cinco por
cento) do orçamento global aprovado, comprovados ao final de sua realização; (Redação
dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
II - limite do aporte de recursos objeto dos incentivos de R$ 3.000.000,00 (três
milhões de reais) para cada incentivo previsto no art. 1
o
e art. 3
o
desta Lei, podendo os
mesmos ser utilizados concomitantemente; (Redação dada pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
110
III - apresentação do projeto para aprovação da ANCINE, conforme regulamento.
(Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 3
o
Os investimentos a que se refere este artigo não poderão ser utilizados na
produção de obras audiovisuais de natureza publicitária. (Redação dada pela Lei 10.454,
de 13.5.2002)
§ 4
o
A liberação de recursos fica condicionada à integralização de pelo menos 50%
(cinqüenta por cento) dos recursos aprovados para realização do projeto. (Redação dada
pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 5
o
A utilização dos incentivos previstos nesta Lei não impossibilita que o mesmo
projeto se beneficie de recursos previstos na Lei n
o
8.313, de 23 de dezembro de 1991,
desde que enquadrados em seus objetivos, limitado o total destes incentivos a 95% (noventa
e cinco por cento) do total do orçamento aprovado pela ANCINE. (Parágrafo incluído pela
Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. 5
o
Os valores não aplicados na forma do art. 1
o
no prazo de 48 (quarenta e
oito) meses contado da data do início do primeiro depósito na conta de que trata a alínea a
do § 1
o
do art. 4
o
, e no caso do art. 3
o
após 180 (cento e oitenta) dias de seu depósito na
conta de que trata a alínea b do § 1
o
do art. 4
o
, destinar-se-ão à ANCINE, para aplicação em
programas e projetos de fomento à produção, distribuição e exibição de obras
cinematográficas e videofonográficas de produção independente. (Redação dada pela Lei
10.454, de 13.5.2002) (Vide Medida provisória nº 2.228-1, de 2001)
Art. O não-cumprimento do projeto a que se referem os arts. 1º, e desta lei e a
não-efetivação do investimento ou a sua realização em desacordo com o estatuído implicam
a devolução dos benefícios concedidos, acrescidos de correção monetária, juros e demais
encargos previstos na legislação do imposto de renda.
§ 1º Sobre o débito corrigido incidirá multa de cinqüenta por cento.
§ No caso de cumprimento de mais de setenta por cento sobre o valor orçado do
projeto, a devolução será proporcional à parte não cumprida.
Art. Os arts. e 30 da Lei 8.401, de 1992, passam a vigorar com a seguinte
redação:
"Art. 4º ................................................................
§ A produção e adaptação de obra audiovisual estrangeira, no Brasil, deverá realizar-se
mediante contrato com empresa produtora brasileira de capital nacional, e utilizar, pelo
menos, um terço de artistas e técnicos brasileiros.
§ O Poder Executivo poderá reduzir o limite mínimo, a que se refere o parágrafo
anterior, no caso de produções audiovisuais de natureza jornalístico-noticiosa."
111
.......................................................................
Art. 30. Até o ano 2003, inclusive, as empresas distribuidoras de vídeo doméstico deverão
ter um percentual de obras brasileiras audiovisuais cinematográficas e videofonográficas
entre seus títulos, obrigando-se a lançá-las comercialmente.
§ 1º O percentual de lançamentos e títulos a que se refere este artigo será fixado anualmente
pelo Poder Executivo, ouvidas as entidades de caráter nacional representativas das
atividades de produção, distribuição e comercialização de obras cinematográficas e
videofonográficas.
......................................................................
Art. Fica instituído o depósito obrigatório, na Cinemateca Brasileira, de cópia da
obra audiovisual que resultar da utilização de recursos incentivados ou que merecer prêmio
em dinheiro concedido pelo Governo Federal.
Parágrafo único. A Cinemateca Brasileira poderá credenciar arquivos ou cinematecas,
públicos ou privados, para o cumprimento do disposto neste artigo.
Art. O Poder Executivo fiscalizará a efetiva execução desta lei no que se refere à
realização de obras audiovisuais e à aplicação dos recursos nela comprometidos.
Art. 10. Sem prejuízo das sanções de natureza administrativa ou fiscal, constitui crime
obter reduções de impostos, utilizando-se fraudulentamente de qualquer benefício desta lei,
punível com a pena de reclusão de dois a seis meses e multa de cinqüenta por cento sobre o
valor da redução.
§ No caso de pessoa jurídica, respondem pelo crime o acionista ou o quotista
controlador e os administradores que para ele tenham concorrido, ou que dele se tenham
beneficiado.
§ 2º Na mesma pena incorre aquele que, recebendo recursos em função desta lei, deixe
de promover, sem justa causa, a atividade objeto do incentivo.
Art. 11. Fica sujeito à multa, que variará de 100 (cem) a 1.500 (um mil e quinhentas)
Ufir, sem prejuízo de outras sanções que couberem, aquele que descumprir o disposto nos
arts. 4º e 30 da Lei nº 8.401, de 1992, com a redação dada pelo art. 7º desta lei.
Art. 12. É estimado o montante da renúncia fiscal decorrente desta lei no exercício de
1993 em Cr$ 200.000.000.000,00 (duzentos bilhões de cruzeiros).
Art. 13. O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de noventa dias.
Art. 14. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
112
Art. 15. Fica revogado o art. 45 da Lei nº 4.131, de 3 de setembro de 1962.
Brasília, 20 de julho de 1993; 172º da Independência e 105º da República.
ITAMAR FRANCO
Fernando Henrique Cardoso
Antônio Houaiss
113
ANEXO 3
LEI N
o
10.179, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2001.
Dispõe sobre os títulos da dívida pública de
responsabilidade do Tesouro Nacional,
consolidando a legislação em vigor sobre a
matéria.
Faço saber que o Presidente da República adotou a Medida Provisória 2.096-89, de
2001, que o Congresso Nacional aprovou, e eu, Antonio Carlos Magalhães, Presidente, para
os efeitos do disposto no parágrafo único do art. 62 da Constituição Federal, promulgo a
seguinte Lei:
Art. 1
o
Fica o Poder Executivo autorizado a emitir títulos da dívida pública, de
responsabilidade do Tesouro Nacional, com a finalidade de:
I - prover o Tesouro Nacional de recursos necessários para cobertura de seus déficits
explicitados nos orçamentos ou para realização de operações de crédito por antecipação de
receita, respeitados a autorização concedida e os limites fixados na Lei Orçamentária, ou
em seus créditos adicionais;
II - aquisição pelo alienante, no âmbito do Programa Nacional de Desestatização -
PND, de que trata a Lei n
o
9.491, de 9 de setembro de 1997, de bens e direitos, com os
recursos recebidos em moeda corrente ou permuta pelos títulos e créditos recebidos por
alienantes;
III - troca por Bônus da Dívida Externa Brasileira, de emissão do Tesouro Nacional,
que foram objeto de permuta por dívida externa do setor público, registrada no Banco
Central do Brasil, por meio do "Brazil Investment Bond Exchange Agreement", de 22 de
setembro de 1988;
IV - troca por títulos emitidos em decorrência de acordos de reestruturação da dívida
externa brasileira, a exclusivo critério do Ministro de Estado da Fazenda;
V - troca, na forma disciplinada pelo Ministro de Estado da Fazenda, o qual
estabelecerá, inclusive, seu limite anual, por títulos emitidos em decorrência de acordos de
reestruturação da dívida externa para utilização em projetos voltados às atividades de
produção, distribuição, exibição e divulgação, no Brasil e no exterior, de obra audiovisual
brasileira, preservação de sua memória e da documentação a ela relativa, aprovados pelo
Ministério da Cultura, bem como mediante doações ao Fundo Nacional da Cultura - FNC,
nos termos do inciso XI do art. 5
o
da Lei n
o
8.313, de 23 de dezembro de 1991;
VI - permuta por títulos do Tesouro Nacional em poder do Banco Central do Brasil;
114
VII - permuta por títulos de responsabilidade do Tesouro Nacional ou por créditos
decorrentes de securitização de obrigações da União, ambos na forma escritural, observada
a equivalência econômica.
VIII - (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
Parágrafo único. Os recursos em moeda corrente obtidos na forma do inciso II deste
artigo serão usados para:
I - amortizar a Dívida Pública Mobiliária Federal de emissão do Tesouro Nacional;
II - custear programas e projetos nas áreas da ciência e tecnologia, da saúde, da defesa
nacional, da segurança pública e do meio ambiente, aprovados pelo Presidente da
República.
Art. 2
o
Os títulos de que trata o caput do artigo anterior terão as seguintes
denominações:
I - Letras do Tesouro Nacional - LTN, emitidas preferencialmente para financiamento
de curto e médio prazos;
II - Letras Financeiras do Tesouro - LFT, emitidas preferencialmente para
financiamento de curto e médio prazos;
III - Notas do Tesouro Nacional - NTN, emitidas preferencialmente para
financiamento de médio e longo prazos.
Parágrafo único. Além dos títulos referidos neste artigo, poderão ser emitidos
certificados, qualificados no ato da emissão, preferencialmente para operações com
finalidades específicas definidas em lei.
Art. 3
o
Os títulos da dívida pública serão emitidos adotando-se uma das seguintes
formas, a ser definida pelo Ministro de Estado da Fazenda:
I - oferta pública, com a realização de leilões, podendo ser colocados ao par, com ágio
ou deságio;
II - direta, em operações com autarquia, fundação, empresa pública ou sociedade de
economia mista, integrantes da Administração Pública Federal, mediante expressa
autorização do Ministro de Estado da Fazenda, não podendo ser colocados por valor
inferior ao par; (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
III - direta, em operações com interessado específico e mediante expressa autorização
do Ministro de Estado da Fazenda, não podendo ser colocados por valor inferior ao par,
quando se tratar de emissão para atender ao Programa de Financiamento às Exportações -
PROEX, instituído pela Lei n
o
8.187, de 1
o
de junho de 1991, e nas operações de troca por
115
"Brazil Investment Bonds - BIB", de que trata o inciso III do art. 1
o
desta Lei; (Vide
Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
IV - direta, em operações com interessado específico e mediante expressa autorização
do Ministro de Estado da Fazenda, não podendo ser colocados por valor inferior ao par nas
operações de troca para utilização em projetos de incentivo ao setor audiovisual brasileiro e
doações ao FNC, de que trata o inciso V do art. 1
o
desta Lei, e colocados ao par, com ágio
ou deságio nas demais operações de troca por títulos emitidos em decorrência dos acordos
de reestruturação da dívida externa; (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
V - direta, em operações de permuta com o Banco Central do Brasil, mediante
expressa autorização do Ministro de Estado da Fazenda, podendo ser colocados ao par, com
ágio ou deságio. (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
VI - (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
VII - (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
§ 1
o
Os tulos a que se refere esta Lei poderão, a critério do Ministro de Estado da
Fazenda, ser resgatados antecipadamente.
§ 2
o
Os títulos a que se refere o inciso III deste artigo, quando se tratar de emissão para
atender ao PROEX poderão ser emitidos com prazo inferior ao do financiamento a ser
equalizado, observada a equivalência econômica da operação. (Vide Medida Provisória
2.181-45 de 24.8.2001)
§ 3
o
As emissões anteriores em favor de interessado específico, previstas no inciso III
deste artigo, poderão, desde que haja prévia anuência do interessado e a critério do Ministro
de Estado da Fazenda, ser canceladas, emitindo-se, em substituição, títulos com as
características do parágrafo anterior. (Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
§ 4
o -
(Vide Medida Provisória nº 2.181-45 de 24.8.2001)
Art. 4
o
São isentos do Imposto sobre a Renda os juros produzidos pelas NTN emitidas
na forma do inciso III do art. 1
o
desta Lei, bem como os referentes aos bônus emitidos pelo
Banco Central do Brasil para os fins previstos no art. 8
o
do Decreto-Lei n
o
1.312, de 15 de
fevereiro de 1974, com a redação dada pelo Decreto-Lei n
o
2.105, de 24 de janeiro de 1984.
Art. 5
o
A emissão dos títulos a que se refere esta Lei processar-se-á exclusivamente
sob a forma escritural, mediante registro dos respectivos direitos creditórios, bem assim das
cessões desses direitos, em sistema centralizado de liquidação e custódia, por intermédio do
qual serão também creditados os resgates do principal e os rendimentos.
Art. 6
o
A partir da data de seu vencimento, os títulos da dívida pública referidos no art.
2
o
terão poder liberatório para pagamento de qualquer tributo federal, de responsabilidade
de seus titulares ou de terceiros, pelo seu valor de resgate.
116
Art. 7
o
O Poder Executivo fixará as características gerais e específicas dos títulos da
dívida pública, podendo, inclusive, criar séries específicas de cada tulo, bem como
celebrar convênios, ajustes ou contratos para emissão, colocação e resgate dos títulos.
Art. 8
o
O Ministro de Estado da Fazenda poderá autorizar a realização de operações de
substituição de títulos nas formas previstas pelo art. 3
o
desta Lei.
Art. 9
o
Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória n
o
2.096-88, de 27 de dezembro de 2000.
Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 11. Ficam revogados o art. 30 da Lei no 8.177, de 1o de março de 1991, a Lei no
8.249, de 24 de outubro de 1991, o Decreto-Lei no 1.079, de 29 de janeiro de 1970, e os
arts. 3o e 5o do Decreto-Lei no 2.376, de 25 de novembro de 1987.
Congresso Nacional, em 6 de fevereiro de 2001; 180
o
da Independência e 113
o
da
República
Senador Antônio Carlos Magalhães
117
ANEXO 4
MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.228-1, DE 6 DE SETEMBRO DE 2001.
Estabelece princípios gerais da Política Nacional
do Cinema, cria o Conselho Superior do Cinema
e a Agência Nacional do Cinema - ANCINE,
institui o Programa de Apoio ao Desenvolvimento
do Cinema Nacional - PRODECINE, autoriza a
criação de Fundos de Financiamento da
Indústria Cinematográfica Nacional -
FUNCINES, altera a legislação sobre a
Contribuição para o Desenvolvimento da
Indústria Cinematográfica Nacional e dá outras
providências.
O PRESIDENTEDA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da
Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
CAPÍTULO I
DAS DEFINIÇÕES
Art. 1
o
Para fins desta Medida Provisória entende-se como:
I - obra audiovisual: produto da fixação ou transmissão de imagens, com ou sem som,
que tenha a finalidade de criar a impressão de movimento, independentemente dos
processos de captação, do suporte utilizado inicial ou posteriormente para fixá-las ou
transmiti-las, ou dos meios utilizados para sua veiculação, reprodução, transmissão ou
difusão;
II - obra cinematográfica: obra audiovisual cuja matriz original de captação é uma
película com emulsão fotossensível ou matriz de captação digital, cuja destinação e
exibição seja prioritariamente e inicialmente o mercado de salas de exibição;
III - obra videofonográfica: obra audiovisual cuja matriz original de captação é um
meio magnético com capacidade de armazenamento de informações que se traduzem em
imagens em movimento, com ou sem som;
IV - obra cinematográfica e videofonográfica de produção independente: aquela cuja
empresa produtora, detentora majoritária dos direitos patrimoniais sobre a obra, não tenha
qualquer associação ou vínculo, direto ou indireto, com empresas de serviços de
118
radiodifusão de sons e imagens ou operadoras de comunicação eletrônica de massa por
assinatura;
V - obra cinematográfica brasileira ou obra videofonográfica brasileira: aquela que
atende a um dos seguintes requisitos: (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13..5.2002)
a) ser produzida por empresa produtora brasileira, observado o disposto no § 1
o
,
registrada na ANCINE, ser dirigida por diretor brasileiro ou estrangeiro residente no País
mais de 3 (três) anos, e utilizar para sua produção, no mínimo, 2/3 (dois terços) de
artistas e técnicos brasileiros ou residentes no Brasil mais de 5 (cinco) anos; (Redação
dada pela Lei nº 10.454, de 13..5.2002)
b) ser realizada por empresa produtora brasileira registrada na ANCINE, em associação
com empresas de outros países com os quais o Brasil mantenha acordo de co-produção
cinematográfica e em consonância com os mesmos.
c) ser realizada, em regime de co-produção, por empresa produtora brasileira registrada
na ANCINE, em associação com empresas de outros países com os quais o Brasil não
mantenha acordo de co-produção, assegurada a titularidade de, no mínimo, 40% (quarenta
por cento) dos direitos patrimoniais da obra à empresa produtora brasileira e utilizar para
sua produção, no mínimo, 2/3 (dois terços) de artistas e técnicos brasileiros ou residentes no
Brasil há mais de 3 (três) anos.(Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
VI - segmento de mercado: mercados de salas de exibição, vídeo doméstico em
qualquer suporte, radiodifusão de sons e imagens, comunicação eletrônica de massa por
assinatura, mercado publicitário audiovisual ou quaisquer outros mercados que veiculem
obras cinematográficas e videofonográficas;
VII - obra cinematográfica ou videofonográfica de curta metragem: aquela cuja
duração é igual ou inferior a quinze minutos;
VIII - obra cinematográfica ou videofonográfica de média metragem: aquela cuja
duração é superior a quinze minutos e igual ou inferior a setenta minutos;
IX - obra cinematográfica ou videofonográfica de longa metragem: aquela cuja duração
é superior a setenta minutos;
X - obra cinematográfica ou videofonográfica seriada: aquela que, sob o mesmo título,
seja produzida em capítulos;
XI - telefilme: obra documental, ficcional ou de animação, com no mínimo cinqüenta e
no máximo cento e vinte minutos de duração, produzida para primeira exibição em meios
eletrônicos.
XII - minissérie: obra documental, ficcional ou de animação produzida em película ou
matriz de captação digital ou em meio magnético com, no mínimo, 3 (três) e no máximo 26
119
(vinte e seis) capítulos, com duração máxima de 1.300 (um mil e trezentos) minutos;
(Inciso incluído pela Lei nº 10.454, de 13..5.2002)
XIII - programadora: empresa que oferece, desenvolve ou produz conteúdo, na forma
de canais ou de programações isoladas, destinado às empresas de serviços de comunicação
eletrônica de massa por assinatura ou de quaisquer outros serviços de comunicação, que
transmitam sinais eletrônicos de som e imagem que sejam gerados e transmitidos por
satélite ou por qualquer outro meio de transmissão ou veiculação; (Inciso incluído pela Lei
nº 10.454, de 13.5.2002)
XIV - programação internacional: aquela gerada, disponibilizada e transmitida
diretamente do exterior para o Brasil, por satélite ou por qualquer outro meio de
transmissão ou veiculação, pelos canais, programadoras ou empresas estrangeiras,
destinada às empresas de serviços de comunicação eletrônica de massa por assinatura ou de
quaisquer outros serviços de comunicação que transmitam sinais eletrônicos de som e
imagem; (Inciso incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
XV - programação nacional: aquela gerada e disponibilizada, no território brasileiro,
pelos canais ou programadoras, incluindo obras audiovisuais brasileiras ou estrangeiras,
destinada às empresas de serviços de comunicação eletrônica de massa por assinatura ou de
quaisquer outros serviços de comunicação que transmitam sinais eletrônicos de som e
imagem, que seja gerada e transmitida diretamente no Brasil por empresas sediadas no
Brasil, por satélite ou por qualquer outro meio de transmissão ou veiculação; (Inciso
incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
XVI - obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária: aquela cuja matriz
original de captação é uma película com emulsão fotossensível ou matriz de captação
digital, cuja destinação é a publicidade e propaganda, exposição ou oferta de produtos,
serviços, empresas, instituições públicas ou privadas, partidos políticos, associações,
administração pública, assim como de bens materiais e imateriais de qualquer natureza;
(Inciso incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
XVII - obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária brasileira: aquela que
seja produzida por empresa produtora brasileira registrada na ANCINE, observado o
disposto no § 1
o
, realizada por diretor brasileiro ou estrangeiro residente no País mais de
3 (três) anos, e que utilize para sua produção, no mínimo, 2/3 (dois terços) de artistas e
técnicos brasileiros ou residentes no Brasil mais de 5 (cinco) anos; (Inciso incluído pela
Lei nº 10.454, de 13..5.2002)
XVIII - obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária brasileira filmada no
exterior: aquela, realizada no exterior, produzida por empresa produtora brasileira
registrada na ANCINE, observado o disposto no § 1
o
, realizada por diretor brasileiro ou
estrangeiro residente no Brasil mais de 3 (três) anos, e que utilize para sua produção, no
mínimo, 1/3 (um terço) de artistas e cnicos brasileiros ou residentes no Brasil mais de
5 (cinco)anos; (Inciso incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
120
XIX - obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária estrangeira adaptada:
aquela que não atende o disposto nos incisos XVII e XVIII, adaptada ao idioma português
ou às condições e necessidades comerciais ou técnicas de exibição e veiculação no Brasil;
(Inciso incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
XX - obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária brasileira de pequena
veiculação: aquela que seja produzida por empresa produtora brasileira registrada na
ANCINE, observado o disposto no § 1
o
, realizada por diretor brasileiro ou estrangeiro
residente no País mais de 3 (três) anos, e que utilize para sua produção, no mínimo, 2/3
(dois terços) de artistas e técnicos brasileiros ou residentes no Brasil há mais de 3 (três)anos
e cuja veiculação esteja restrita a Municípios que totalizem um número máximo de
habitantes a ser definido em regulamento; (Inciso incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
XXI - claquete de identificação: imagem fixa ou em movimento inserida no início da
obra cinematográfica ou videofonográfica contendo as informações necessárias à sua
identificação, de acordo com o estabelecido em regulamento. (Inciso incluído pela Lei
10.454, de 13.5.2002)
§ 1
o
Para os fins do inciso V deste artigo, entende-se por empresa brasileira aquela
constituída sob as leis brasileiras, com sede e administração no País, cuja maioria do capital
total e votante seja de titularidade direta ou indireta, de brasileiros natos ou naturalizados há
mais de 10 (dez) anos, os quais devem exercer de fato e de direito o poder decisório da
empresa. (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 2
o
Para os fins do disposto nos incisos XVII, XVIII e XX deste artigo, entende-se por
empresa brasileira aquela constituída sob as leis brasileiras, com sede e administração no
País, cuja maioria do capital seja de titularidade direta ou indireta de brasileiros natos ou
naturalizados há mais de 5 (cinco) anos, os quais devem exercer de fato e de direito o poder
decisório da empresa. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 3
o
Considera-se versão de obra publicitária cinematográfica ou videofonográfica, a
edição ampliada ou reduzida em seu tempo de duração, realizada a partir do conteúdo
original de uma mesma obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária, e realizada
sob o mesmo contrato de produção. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
CAPÍTULO II
DA POLÍTICA NACIONAL DO CINEMA
Art. 2
o
A política nacional do cinema terá por base os seguintes princípios gerais:
I - promoção da cultura nacional e da língua portuguesa mediante o estímulo ao
desenvolvimento da indústria cinematográfica e audiovisual nacional;
121
II - garantia da presença de obras cinematográficas e videofonográficas nacionais nos
diversos segmentos de mercado;
III - programação e distribuição de obras audiovisuais de qualquer origem nos meios
eletrônicos de comunicação de massa sob obrigatória e exclusiva responsabilidade,
inclusive editorial, de empresas brasileiras, qualificadas na forma do § 1
o
do art. 1
o
da
Medida Provisória n
o
2.228-1, de 6 de setembro de 2001, com a redação dada por esta Lei.
(Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
IV - respeito ao direito autoral sobre obras audiovisuais nacionais e estrangeiras.
CAPÍTULO III
DO CONSELHO SUPERIOR DO CINEMA
Art. 3
o
Fica criado o Conselho Superior do Cinema, órgão colegiado integrante da
estrutura da Casa Civil da Presidência da República, a que compete:
I - definir a política nacional do cinema;
II - aprovar políticas e diretrizes gerais para o desenvolvimento da indústria
cinematográfica nacional, com vistas a promover sua auto-sustentabilidade;
III - estimular a presença do conteúdo brasileiro nos diversos segmentos de mercado;
IV - acompanhar a execução das políticas referidas nos incisos I, II e III;
V - estabelecer a distribuição da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria
Cinematográfica - CONDECINE para cada destinação prevista em lei.
Art. 4
o
O Conselho Superior do Cinema será integrado:
I - pelos Ministros de Estado:
a) da Justiça;
b) das Relações Exteriores;
c) da Fazenda;
d) da Cultura;
e) do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
f) das Comunicações; e
122
g) Chefe da Casa Civil da Presidência da República, que o presidirá.
II - por cinco representantes da indústria cinematográfica e videofonográfica nacional,
que gozem de elevado conceito no seu campo de especialidade, a serem designados por
decreto, para mandato de dois anos, permitida uma recondução.
§ 1
o
O regimento interno do Conselho Superior do Cinema será aprovado por
resolução.
§ 2
o
O Conselho reunir-se-á sempre que for convocado por seu Presidente.
§ 3
o
Ç.àÎ?C %ee
I - promover a cultura nacional e a língua portuguesa mediante o estímulo ao
desenvolvimento da indústria cinematográfica e videofonográfica nacional em sua área de
atuação;
II - promover a integração programática, econômica e financeira de atividades
governamentais relacionadas à indústria cinematográfica e videofonográfica;
III - aumentar a competitividade da indústria cinematográfica e videofonográfica
nacional por meio do fomento à produção, à distribuição e à exibição nos diversos
segmentos de mercado;
IV - promover a auto-sustentabilidade da indústria cinematográfica nacional visando o
aumento da produção e da exibição das obras cinematográficas brasileiras;
V - promover a articulação dos vários elos da cadeia produtiva da indústria
cinematográfica nacional;
VI - estimular a diversificação da produção cinematográfica e videofonográfica
nacional e o fortalecimento da produção independente e das produções regionais com vistas
ao incremento de sua oferta e à melhoria permanente de seus padrões de qualidade;
VII - estimular a universalização do acesso às obras cinematográficas e
videofonográficas, em especial as nacionais;
VIII - garantir a participação diversificada de obras cinematográficas e
videofonográficas estrangeiras no mercado brasileiro;
IX - garantir a participação das obras cinematográficas e videofonográficas de
produção nacional em todosne
IV - aplicar multas e sanções, na forma da lei;
V - regular, na forma da lei, as atividades de fomento e proteção à indústria
cinematográfica e videofonográfica nacional, resguardando a livre manifestação do
pensamento, da criação, da expressão e da informação;
VI - coordenar as ações e atividades governamentais referentes à indústria
cinematográfica e videofonográfica, ressalvadas as competências dos Ministérios da
Cultura e das Comunicações;
VII - articular-se com os órgãos competentes dos entes federados com vistas a otimizar
a consecução dos seus objetivos;
VIII - gerir programas e mecanismos de fomento à indústria cinematográfica e
videofonográfica nacional;
IX - estabelecer critérios para a aplicação de recursos de fomento e financiamento à
indústria cinematográfica e videofonográfica nacional;
X - promover a participação de obras cinematográficas e videofonográficas nacionais
em festivais internacionais;
XI - aprovar e controlar a execução de projetos de co-produção, produção, distribuição,
exibição e infra-estrutura técnica a serem realizados com recursos públicos e incentivos
fiscais, ressalvadas as competências dos Ministérios da Cultura e das Comunicações;
XII - fornecer os Certificados de Produto Brasileiro às obras cinematográficas e
videofonográficas;
XIII - fornecer Certificados de Registro dos contratos de produção, co-produção,
distribuição, licenciamento, cessão de direitos de exploração, veiculação e exibição de
obras cinematográficas e videofonográficas;
XIV - gerir o sistema de informações para o monitoramento das atividades da indústria
cinematográfica e videofonográfica nos seus diversos meios de produção, distribuição,
exibição e difusão;
XV - articular-se com órgãos e entidades voltados ao fomento da produção, da
programação e da distribuição de obras cinematográficas e videofonográficas dos Estados
membros do Mercosul e demais membros da comunidade internacional;
XVI - prestar apoio técnico e administrativo ao Conselho Superior do Cinema;
XVII - atualizar, em consonância com a evolução tecnológica, as definições referidas
no art. 1
o
desta Medida Provisória.
125
Parágrafo único. A organização básica e as competências das unidades da ANCINE
serão estabelecidas em ato do Poder Executivo.
Seção II
Da Estrutura
Art. 8
o
A ANCINE será dirigida em regime de colegiado por uma diretoria composta
de um Diretor-Presidente e três Diretores,com mandatos não coincidentes de quatro anos.
§ 1
o
Os membros da Diretoria serão brasileiros, de reputação ilibada e elevado
conceito no seu campo de especialidade, escolhidos pelo Presidente da República e por ele
nomeados após aprovação pelo Senado Federal, nos termos da alínea "f" do inciso III do
art. 52 da Constituição Federal.
§ 2
o
O Diretor-Presidente da ANCINE será escolhido pelo Presidente da República
entre os membros da Diretoria Colegiada.
§ 3
o
Em caso de vaga no curso do mandato de membro da Diretoria Colegiada, este
será completado por sucessor investido na forma prevista no § 1
o
deste artigo, que o
exercerá pelo prazo remanescente.
§ 4
o
Integrarão a estrutura da ANCINE uma Procuradoria-Geral, que a representará em
juízo, uma Ouvidoria-Geral e uma Auditoria.
§ 5
o
A substituição dos dirigentes em seus impedimentos será disciplinada em
regulamento.
Art. 9
o
Compete à Diretoria Colegiada da ANCINE:
I - exercer sua administração;
II - editar normas sobre matérias de sua competência;
III - aprovar seu regimento interno;
IV - cumprir e fazer cumprir as políticas e diretrizes aprovadas pelo Conselho Superior
de Cinema;
V - deliberar sobre sua proposta de orçamento;
VI - determinar a divulgação de relatórios semestrais sobre as atividades da Agência;
VII - decidir sobre a venda, cessão ou aluguel de bens integrantes do seu patrimônio;
VIII - notificar e aplicar as sanções previstas na legislação;
126
IX - julgar recursos interpostos contra decisões de membros da Diretoria;
X - autorizar a contratação de serviço de terceiros na forma da legislação vigente;
XI - autorizar a celebração de contratos, convênios e acordos;
Parágrafo único. A Diretoria Colegiada reunir-se-á com a presença de, pelo menos,
três diretores, dentre eles o Diretor-Presidente, e deliberará por maioria simples de votos.
Art. 10. Compete ao Diretor-Presidente da ANCINE:
I - exercer a representação legal da agência;
II - presidir as reuniões da Diretoria Colegiada;
III cumprir e fazer cumprir as decisões da Diretoria Colegiada;
IV - exercer o voto de qualidade, em caso de empate nas deliberações da Diretoria
Colegiada;
V - nomear, exonerar e demitir servidores e empregados;
VI - prover os cargos em comissão e as funções de confiança;
VII - aprovar editais de licitação e homologar adjudicações;
VIII - encaminhar ao órgão supervisor a proposta de orçamento da ANCINE;
IX - assinar contratos, acordos e convênios, previamente aprovados pela Diretoria
Colegiada;
X - ordenar despesas e praticar os atos de gestão necessários ao alcance dos objetivos
da ANCINE;
XI - sugerir a propositura de ação civil pública pela ANCINE, nos casos previstos em
lei;
XII - exercer a função de Secretário-Executivo do Conselho Superior do Cinema;
XIII - exercer outras atividades necessárias à gestão da ANCINE e à implementação
das decisões do Conselho Superior do Cinema.
Seção III
Das Receitas e do Patrimônio
127
Art. 11. Constituem receitas da ANCINE:
I - parte do produto da arrecadação da Contribuição para o Desenvolvimento da
Indústria Cinematográfica Nacional - CONDECINE, de que trata o Capítulo VI desta
Medida Provisória;
II - até três por cento dos recursos a que se referem as alíneas "c", "d", "e"e "j" do art.
2
o
da Lei n
o
5.070, de 7 de julho de 1966, observado o limite máximo anual de trinta
milhões de reais;
III - o produto da arrecadação das multas resultantes do exercício de suas atribuições;
IV - o produto da alienação de bens, objetos e instrumentos utilizados para a prática de
infrações, assim como do patrimônio de infratores, apreendidos em decorrência do
exercício do poder de polícia e incorporados ao patrimônio da ANCINE, nos termos de
decisão judicial;
V - o produto da execução da sua dívida ativa;
VI - as dotações consignadas no Orçamento-Geral da União, créditos especiais,
créditos adicionais, transferências e repasses que lhe forem conferidos;
VII - as doações, legados, subvenções e outros recursos que lhe forem destinados;
VIII - os valores apurados na venda ou aluguel de bens móveis e imóveis de sua
propriedade;
IX - os valores apurados em aplicações no mercado financeiro das receitas previstas
neste artigo;
X - produto da cobrança de emolumentos por serviços prestados;
XI - recursos provenientes de acordos, convênios ou contratos celebrados com
entidades, organismos ou empresas, públicos ou privados, nacionais e internacionais;
XII - produto da venda de publicações, material técnico, dados e informações, inclusive
para fins de licitação pública;
XIII - quaisquer outras receitas afetas às atividades de sua competência, não
especificadas nos incisos anteriores.
Art. 12. Fica a ANCINE autorizada a alienar bens móveis ou imóveis do seu
patrimônio que não se destinem ao desempenho das funções inerentes à sua missão
institucional.
Seção IV
128
Dos Recursos Humanos
Art. 14. A ANCINE poderá contratar especialistas para a execução de trabalhos
nas áreas técnica, administrativa, econômica e jurídica, por projetos ou prazos limitados,
observando-se a legislação em vigor.
Art. 15. A ANCINE poderá requisitar, com ônus, servidores de órgãos e entidades
integrantes da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, quaisquer que
sejam as atribuições a serem exercidas.
CAPÍTULO V
DO SISTEMA DE INFORMAÇÕES E MONITORAMENTO DA INDÚSTRIA
CINEMATOGRÁFICA E VIDEOFONOGRÁFICA
Art. 16. Fica criado o Sistema de Informações e Monitoramento da Indústria
Cinematográfica e Videofonográfica, de responsabilidade da ANCINE, podendo para sua
elaboração e execução ser conveniada ou contratada entidade ou empresa legalmente
constituída.
Art. 17. Toda sala ou espaço de exibição pública destinada à exploração de obra
cinematográfica em qualquer suporte deverá utilizar o sistema de controle de receitas de
bilheteria, conforme definido em regulamento pela ANCINE.
Art. 18. As empresas de exibição deverão emitir relatório enumerando as obras
cinematográficas brasileiras e estrangeiras exibidas no período pelos cinemas de sua rede
de exibição, número de dias de exibição, número de espectadores e renda de bilheteria,
conforme definido em regulamento, devendo estas informações ser remetidas à ANCINE.
Art. 19. As empresa distribuidoras e locadoras de obras cinematográficas para vídeo,
doméstico ou para venda direta ao consumidor, em qualquer suporte, deverão emitir
semestralmente relatório enumerando as obras cinematográficas brasileiras distribuídas no
período, número de obras estrangeiras e sua relação, número de cópias distribuídas por
título, conforme definido em regulamento, devendo estas informações serem remetidas à
ANCINE.
Art. 20. Poderá ser estabelecida, por lei, a obrigatoriedade de fornecimento periódico
de informações sobre veiculação ou difusão de obras cinematográficas e videofonográficas
para empresas operantes em outros segmentos de mercado além daqueles indicados nos
arts. 18 e 19.
Art. 21. As cópias das obras cinematográficas e videofonográficas destinadas à venda,
cessão, empréstimo, permuta, locação, exibição, com ou sem fins lucrativos, bem como as
obras cinematográficas e videofonográficas publicitárias deverão conter em seu suporte
marca indelével e irremovível com a identificação do detentor do direito autoral no Brasil,
129
com todas as informações que o identifiquem, conforme modelo aprovado pela ANCINE e
pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda, sem prejuízo do que trata a
Lei n
o
9.610, de 19 de fevereiro de 1998, e o Decreto n
o
2.894, 22 de dezembro de 1998.
Parágrafo único. No caso de obras cinematográficas e videofonográficas publicitárias,
a marca indelével e irremovível de que trata o caput e nas finalidades ali previstas deverá
constar na claquete de identificação. (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. 22. É obrigatório o registro das empresas de produção, distribuição, exibição de
obras cinematográficas e videofonográficas nacionais ou estrangeiras na ANCINE,
conforme disposto em regulamento.
Parágrafo único. Para se beneficiar de recursos públicos ou incentivos fiscais
destinados à atividade cinematográfica ou videofonográfica a empresa deve estar registrada
na ANCINE.
Art. 23. A produção no Brasil de obra cinematográfica ou videofonográfica estrangeira
deverá ser comunicada à ANCINE.
Parágrafo único. A produção e a adaptação de obra cinematográfica ou
videofonográfica estrangeira, no Brasil, deverão realizar-se mediante contrato com empresa
produtora brasileira, que será a responsável pela produção perante as leis brasileiras.
Art. 24. Os serviços técnicos de cópia e reprodução de matrizes de obras
cinematográficas e videofonográficas que se destinem à exploração comercial no mercado
brasileiro deverão ser executados em laboratórios instalados no País.
Parágrafo único. As obras cinematográficas e videofonográficas estrangeiras estão
dispensadas de copiagem obrigatória no País até o limite de 6 (seis)cópias, bem como seu
material de promoção e divulgação nos limites estabelecidos em regulamento. (Redação
dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. 25. Toda e qualquer obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária
estrangeira poderá ser veiculada ou transmitida no País, em qualquer segmento de
mercado, após pagamento da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria
Cinematográfica Nacional - CONDECINE, de que trata o art. 32. (Redação dada pela Lei nº
10.454, de 13.5.2002)
Parágrafo único. A adaptação de obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária
deverá ser realizada por empresa produtora brasileira registrada na ANCINE, de acordo
com o regulamento. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. 26. A empresa produtora de obra cinematográfica ou videofonográfica com
recursos públicos ou provenientes de renúncia fiscal deverá depositar na Cinemateca
Brasileira ou entidade credenciada pela ANCINE uma cópia de baixo contraste,
interpositivo ou matriz digital da obra, para sua devida preservação.
130
Art. 27. As obras cinematográficas e videofonográficas produzidas com recursos
públicos ou renúncia fiscal, após decorridos dez anos de sua primeira exibição comercial,
poderão ser exibidas em canais educativos mantidos com recursos públicos nos serviços de
radiodifusão de sons e imagens e nos canais referidos nas alíneas "b" a "g" do inciso I do
art. 23da Lei n
o
8.977, de 6 de janeiro de 1995, e em estabelecimentos públicos de ensino,
na forma definida em regulamento, respeitados os contratos existentes.
Art. 28. Toda obra cinematográfica e videofonográfica brasileira deverá, antes de sua
exibição ou comercialização, requerer à ANCINE o registro do título e o Certificado de
Produto Brasileiro - CPB. (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 1
o
No caso de obra cinematográfica ou obra videofonográfica publicitária brasileira,
após a solicitação do registro do título, a mesma poderá ser exibida ou comercializada,
devendo ser retirada de exibição ou ser suspensa sua comercialização, caso seja constatado
o não pagamento da CONDECINE ou o fornecimento de informações incorretas.
(Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 2
o
As versões, as adaptações, as vinhetas e as chamadas realizadas a partir da obra
cinematográfica e videofonográfica publicitária original devem ser consideradas,
juntamente com esta, um título, para efeito do pagamento da CONDECINE. (Parágrafo
incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. 29. A contratação de direitos de exploração comercial, de licenciamento,
produção, co-produção, exibição, distribuição, comercialização, importação e exportação
de obras cinematográficas e videofonográficas em qualquer suporte ou veículo no mercado
brasileiro, deverá ser informada à ANCINE, previamente à comercialização, exibição ou
veiculação da obra, com a comprovação do pagamento da CONDECINE para o segmento
de mercado em que a obra venha a ser explorada comercialmente. (Redação dada pela Lei
nº 10.454, de 13.5.2002)
Parágrafo único. No caso de obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária,
deverá ser enviado à ANCINE, o resumo do contrato firmado entre as partes, conforme
modelo a ser estabelecido em regulamento. (Parágrafo incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
Art. 30. Para concessão da classificação etária indicativa de obras cinematográficas e
videofonográficas será exigida pelo órgão responsável a comprovação do pagamento da
CONDECINE no segmento de mercado a que a classificação etária indicativa se referir.
Art. 31. A contratação de programação ou de canais de programação internacional,
pelas empresas prestadoras de serviços de comunicação eletrônica de massa por assinatura
ou de quaisquer outros serviços de comunicação que transmitam sinais eletrônicos de som e
imagem, deverá ser sempre realizada através de empresa brasileira qualificada na forma do
§ 1
o
do art. 1
o
da Medida Provisória n
o
2.228-1, de 6 de setembro de 2001, com a redação
dada por esta Lei, ainda que o pagamento dos montantes a esta referentes seja feito
diretamente à empresa estrangeira pela empresa brasileira que se responsabilizará pelo
131
conteúdo da programação contratada, observando os dispositivos desta Medida Provisória e
da legislação brasileira pertinente. (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Parágrafo único. As empresas brasileiras responsáveis pelo conteúdo da programação
dos canais dos serviços de comunicação eletrônica de massa por assinatura, sejam eles
gerados no Brasil ou no exterior, deverão fornecer à ANCINE sua programação, incluindo
títulos ou capítulos de obras seriadas e obras publicitárias, conforme regulamento.
CAPÍTULO VI
DA CONTRIBUIÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA
CINEMATOGRÁFICA NACIONAL - CONDECINE
Art. 32. A Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica
Nacional - CONDECINE terá por fato gerador a veiculação, a produção, o licenciamento e
a distribuição de obras cinematográficas e videofonográficas com fins comerciais, por
segmento de mercado a que forem destinadas. (Vide Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Parágrafo único. A CONDECINE também incidirá sobre o pagamento, o crédito, o
emprego, a remessa ou a entrega, aos produtores, distribuidores ou intermediários no
exterior, de importâncias relativas a rendimento decorrente da exploração de obras
cinematográficas e videofonográficas ou por sua aquisição ou importação, a preço fixo.
Art. 33. A CONDECINE será devida uma única vez a cada cinco anos para cada
segmento de mercado, por:
I - título ou capítulo de obra cinematográfica ou videofonográfica destinada aos
seguintes segmentos de mercado:
a) salas de exibição;
b) vídeo doméstico, em qualquer suporte;
c) serviço de radiodifusão de sons e imagens;
d) serviços de comunicação eletrônica de massa por assinatura;
e) outros mercados, conforme anexo.
II - título de obra publicitária cinematográfica ou videofonográfica, para cada segmento
de mercado a que se destinar;
§ 1
o
A CONDECINE corresponderá aos valores das tabelas constantes do Anexo I a
esta Medida Provisória.
132
§ 2
o
Na hipótese do parágrafo único do art. 32, a CONDECINE será determinada
mediante a aplicação de alíquota de onze por cento sobre as importâncias ali referidas.
§ 3
o
A CONDECINE referente às obras cinematográficas e videofonográficas
publicitárias será devida uma vez a cada 12 (doze) meses para cada segmento de mercado
em que a obra seja efetivamente veiculada. (Parágrafo incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
Art. 34. O produto da arrecadação da CONDECINE terá as seguintes destinações:
I - custeio das atividades da ANCINE;
II - atividades de fomento ao cinema e ao audiovisual desenvolvidas pelo Ministério da
Cultura;
III - transferência ao Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema Nacional -
PRODECINE, de que trata o art. 47 desta Medida Provisória.
Art. 35. A CONDECINE será devida pelos seguintes sujeitos passivos:
I - detentor dos direitos de exploração comercial ou de licenciamento no País,
conforme o caso, para os segmentos de mercado previstos nas alíneas "a" a "e" do inciso I
do art. 33;
II - empresa produtora, no caso de obra nacional, ou detentor do licenciamento para
exibição, no caso de obra estrangeira, na hipótese do inciso II do art. 33;
III - o responsável pelo pagamento, crédito, emprego, remessa ou entrega das
importâncias referidas no parágrafo único do art. 32.
Art. 36. A CONDECINE deverá ser recolhida à ANCINE, na formado regulamento:
(Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
I - na data do registro do título para os mercados de salas de exibição e de vídeo
doméstico em qualquer suporte, e serviços de comunicação eletrônica de massa por
assinatura para as programadoras referidas no inciso XV do art. 1
o
da Medida Provisória n
o
2.228-1, de 6 de setembro de 2001, em qualquer suporte, conforme Anexo I; (Redação dada
pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
II - na data do registro do título para o mercado de serviços de radiodifusão de sons e
imagens e outros mercados, conforme Anexo I; (Redação dada pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
III - na data do registro do título ou até o primeiro dia útil seguinte à sua solicitação,
para obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária brasileira, estrangeira ou
133
estrangeira adaptada para cada segmento de mercado, conforme Anexo I; (Redação dada
pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
IV - na data do registro do título, para o mercado de serviços de radiodifusão de sons e
imagens e de comunicação eletrônica de massa por assinatura, para obra cinematográfica e
videofonográfica nacional, conforme Anexo I; (Redação dada pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
V - na data do pagamento, crédito, emprego ou remessa das importâncias referidas no
parágrafo único do art. 32; (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
VI - na data da concessão do certificado de classificação indicativa, nos demais casos,
conforme Anexo I. (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art. 37. O não recolhimento da CONDECINE no prazo sujeitará o contribuinte às
penalidades e acréscimos moratórios previstos nos arts. 44 e 61 da Lei n
o
9.430, de 27 de
dezembro de 1996.
§ 1
o
A pessoa física ou jurídica que promover a exibição, transmissão, difusão ou
veiculação de obra cinematográfica ou videofonográfica que não tenha sido objeto do
recolhimento da CONDECINE responde solidariamente por essa contribuição. (Redação
dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 2
o
A solidariedade de que trata o § 1
o
não se aplica à hipótese prevista no parágrafo
único do art. 32. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Art 38. A administração da CONDECINE, inclusive as atividades de arrecadação,
tributação e fiscalização, compete à: (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
I - Secretaria da Receita Federal, na hipótese do parágrafo único do art. 32; (Inciso
incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
II - ANCINE, nos demais casos. (Inciso incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
Parágrafo único. Aplicam-se à CONDECINE, na hipótese de que trata o inciso I do
caput, as normas do Decreto n
o
70.235, de 6 de março de 1972. (Redação dada pela Lei
10.454, de 13.5.2002)
Art. 39. São isentos da CONDECINE:
I - a obra cinematográfica e videofonográfica destinada à exibição exclusiva em
festivais e mostras, desde que previamente autorizada pela ANCINE;
II - a obra cinematográfica e videofonográfica jornalística, bem assim os eventos
esportivos;
134
III - as chamadas dos programas e a publicidade de obras cinematográficas e
cinematográficas e videofonográficas brasileiras de longa, média e curta metragens de
produção independente, de co-produção de obras cinematográficas e videofonográficas
brasileiras de produção independente, de telefilmes, minisséries, documentais, ficcionais,
animações e de programas de televisão de caráter educativo e cultural, brasileiros de
produção independente, aprovados pela ANCINE. (Inciso incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
§ 1
o
As obras audiovisuais brasileiras, produzidas pelas empresas de serviços de
radiodifusão de sons e imagens e empresas de serviços de comunicação eletrônica de massa
por assinatura, estarão sujeitas ao pagamento da CONDECINE se vierem a ser
comercializadas em outros segmentos de mercado. (Parágrafo renumerado pela Lei
10.454, de 13.5.2002)
§ 2
o
Os valores correspondentes aos 3% (três por cento) previstos no inciso IX deverão
ser depositados na data do pagamento, do crédito, do emprego, da remessa ou da entrega,
aos produtores, distribuidores ou intermediários no exterior, das importâncias relativas a
rendimentos decorrentes da exploração de obras cinematográficas e videofonográficas ou
por sua aquisição ou importação apreço fixo, em conta de aplicação financeira especial no
Banco do Brasil, em nome do contribuinte. (Parágrafo incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
§ 3
o
Os valores não aplicados na forma do inciso IX, após 270(duzentos e setenta) dias
de seu depósito na conta de que trata o § 2
o
, destinar-se-ão à ANCINE, para aplicação em
programas e projetos de fomento à produção, distribuição e exibição de obras
cinematográficas e videofonográficas de produção independente. (Parágrafo incluído pela
Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 4
o
Os valores previstos no inciso IX não poderão ser aplicados em obras audiovisuais
de natureza publicitária. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
§ 5
o
A liberação dos valores depositados na conta de aplicação financeira especial fica
condicionada à integralização de pelo menos 50% (cinqüenta por cento) dos recursos
aprovados para a realização do projeto. (Parágrafo incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
§ 6
o
Os projetos produzidos com os recursos de que trata o inciso IX poderão utilizar-
se dos incentivos previstos na Lei n
o
8.685, de 20 de julho de 1993, e na Lei n
o
8.313, de 23
de dezembro de 1991, limitado a 95% (noventa e cinco por cento) do total do orçamento
aprovado pela ANCINE para o projeto. (Parágrafo incluído pela Lei 10.454, de
13.5.2002)
Art. 40. Os valores da CONDECINE ficam reduzidos a:
I - vinte por cento, quando se tratar de obra cinematográfica ou videofonográfica não
publicitária brasileira;
136
II - trinta por cento, quando se tratar de:
a) obras audiovisuais destinadas ao segmento de mercado de salas de exibição que
sejam exploradas com até 6 (seis) cópias; (Redação dada pela Lei nº 10.454, de 13.5.2002)
b) obras cinematográficas e videofonográficas destinadas à veiculação em serviços de
radiodifusão de sons e imagens e cuja produção tenha sido realizada mais de vinte anos
antes do registro do contrato no ANCINE;
CAPÍTULO VII
DOS FUNDOS DE FINANCIAMENTO DA INDÚSTRIA
CINEMATOGRÁFICA NACIONAL - FUNCINES
Art. 41. Os Fundos de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional -
FUNCINES serão constituídos sob a forma de condomínio fechado, sem personalidade
jurídica, e administrados por instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco
Central do Brasil.
§ 1
o
O patrimônio dos FUNCINES será representado por quotas emitidas sob a forma
escritural, alienadas ao público com a intermediação da instituição administradora do
Fundo.
§ 2
o
A administradora será responsável por todas as obrigações do Fundo, inclusive as
de caráter tributário.
Art. 42. Compete à Comissão de Valores Mobiliários autorizar, disciplinar e fiscalizar
a constituição, o funcionamento e a administração dos FUNCINES, observadas as
disposições desta Medida Provisória e as normas aplicáveis aos fundos de investimento.
Parágrafo único. A Comissão de Valores Mobiliários comunicará a constituição dos
FUNCINES, bem como as respectivas administradoras à ANCINE.
Art. 43. Os recursos captados pelos FUNCINES serão aplicados, na forma do
regulamento, em projetos e programas que, atendendo aos critérios e diretrizes
estabelecidos pela ANCINE, sejam destinados a:
I - obras cinematográficas brasileiras de produção independente;
II - construção, reforma e recuperação das salas de exibição;
III - aquisição de ações de empresas nacionais de capital aberto constituídas para a
produção, comercialização, distribuição ou exibição de obras cinematográficas brasileiras
de produção independente;
137
IV - obra cinematográfica ou videofonográfica seriada produzida com no mínimo três e
no máximo vinte e seis capítulos e telefilmes brasileiros de produção independente.
§ 1
o
As empresas de serviço de radiodifusão de sons e imagens e de comunicação
eletrônica de massa por assinatura não poderão deter o controle acionário das empresas
referidas no inciso III deste artigo.
§ 2
o
Os FUNCINES deverão manter, no mínimo, oitenta por cento do seu patrimônio
aplicados em empreendimentos das espécies enumeradas neste artigo, observada, em
relação a cada espécie de destinação, os percentuais mínimos a serem estabelecidos em
regulamento.
§ 3
o
A parcela do patrimônio do Fundo não comprometida com as aplicações de que
trata este artigo, será constituída por títulos emitidos pelo Tesouro Nacional ou pelo Banco
Central do Brasil.
§ 4
o
É vedada a aplicação de recursos de FUNCINES em projetos que tenham
participação majoritária de quotista do próprio Fundo.
§ 5
o
As obras cinematográficas e videofonográficas de natureza publicitária ou
jornalística o poderão se beneficiar dos FUNCINES ou do PRODECINE, de que trata o
art. 47 desta Medida Provisória;
§ 6
o
As obras cinematográficas e videofonográficas produzidas com recursos dos
FUNCINES terão seu corte e edição finais aprovados para exibição pelo seu diretor e
produtor responsável principal.
§ 7
o
Nos casos dos incisos I e IV deve haver garantia de veiculação e difusão das
obras.
Art. 44. Até o período de apuração relativo ao ano-calendário de 2010, inclusive, as
pessoas jurídicas sujeitas à tributação com base no lucro real poderão deduzir do imposto
de renda devido parcela do valor correspondente às quantias aplicadas na aquisição de
quotas dos FUNCINES.
Parágrafo único. A dedução referida neste artigo poderá ser utilizada alternativamente
à de que trata o art. 1
o
da Lei n
o
8.685, de 20 de julho de 1993, até o ano-calendário de
2006, quando se extinguirá este benefício.
Art. 45. A dedução de que trata o art. 44incidirá sobre o imposto devido:
I - no trimestre a que se referirem os investimentos, para as pessoas jurídicas que
apuram o lucro real trimestral;
II - no ano-calendário, para as pessoas jurídicas que, tendo optado pelo recolhimento
do imposto por estimativa, apuram o lucro real anual.
138
§ 1
o
A parcela a ser deduzida será calculada aplicando-se percentual correspondente à
soma das alíquotas do imposto de rendadas pessoas jurídicas e da contribuição social sobre
o lucro líquido, inclusive adicionais, sobre o valor de aquisição de quotas dos FUNCINES,
limitada a três por cento do imposto devido e observado o disposto no inciso II do art. 6
o
da
Lei n
o
9.532, de 10 de dezembro de 1997.
§ 2
o
Os valores que excederem aos limites estabelecidos no § 1
o
não poderão ser
utilizados em período de apuração posterior.
§ 3
o
O valor integral dos investimentos efetuados na forma deste artigo poderá ser
deduzido do lucro líquido, na determinação do lucro real, nos seguintes percentuais:
I - cem por cento, nos anos-calendário de 2002 a 2005;
II - cinqüenta por cento, nos anos-calendário de 2006 a 2008;
III - vinte e cinco por cento, nos anos-calendário de 2009 e 2010.
§ 4
o
A pessoa jurídica que alienar as quotas dos FUNCINES somente poderá
considerar como custo de aquisição, na determinação do ganho de capital, os valores
deduzidos na formado § 3
o
na hipótese em que a alienação ocorra após cinco anos da data
de sua aquisição.
§ 5
o
Em qualquer hipótese, não será dedutível a perda apurada na alienação das quotas
dos FUNCINES.
§ 6
o
O disposto nos §§ 3
o
a 5
o
aplica-se, também, à contribuição social sobre o lucro
líquido.
Art. 46. Os rendimentos e ganhos líquidos e de capital auferidos pela carteira de
FUNCINES ficam isentos do imposto de renda.
§ 1
o
Os rendimentos, os ganhos de capital e os ganhos líquidos decorrentes de
aplicação em FUNCINES sujeitam-se às normas tributárias aplicáveis aos demais valores
mobiliários no mercado de capitais.
§ 2
o
Ocorrendo resgate de quotas de FUNCINES, em decorrência dormino do prazo
de duração ou da liquidação do fundo, sobre o rendimento do quotista, constituído pela
diferença positiva entre o valor de resgate e o custo de aquisição das quotas, incidirá
imposto de renda na fonte à alíquota de vinte por cento.
CAPÍTULO VIII
DOS DEMAIS INCENTIVOS
139
Art. 47. Fica instituído o Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema
Nacional - PRODECINE, destinado a captar e aplicar recursos necessários ao fomento de
projetos de produção, distribuição, comercialização e exibição de obras cinematográficas e
videofonográficas brasileiras de produção independente, bem assim de projetos de infra-
estrutura técnica para a atividade cinematográfica, inclusive pagamento do Prêmio
Adicional de Renda de que trata o art. 54, na forma do regulamento.
§ 1
o
Os recursos do PRODECINE poderão ser objeto de aplicação a fundo perdido,
nos casos específicos previstos no regulamento.
§ 2
o
A ANCINE estabelecerá critérios e diretrizes gerais para a aplicação e a
fiscalização dos recursos do PRODECINE.
Art. 48. São fontes de recursos do PRODECINE:
I - percentual do produto da arrecadação da Contribuição para o Desenvolvimento da
Indústria Cinematográfica Nacional - CONDECINE;
II - o produto da arrecadação de multas e juros, decorrentes do descumprimento das
normas de financiamento pelos beneficiários dos recursos do PRODECINE;
III - a remuneração dos financiamentos concedidos;
IV - as doações e outros aportes não especificados;
V - as dotações consignadas nos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios;
Art. 49. O abatimento do imposto de renda na fonte, de que trata o art. 3
o
da Lei n
o
8.685, de 1993, aplicar-se-á, exclusivamente, a projetos previamente aprovados pela
ANCINE, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 67.
Parágrafo único. A opção pelo benefício previsto no caput afasta a incidência do
disposto no § 2
o
do art. 33 desta Medida Provisória.
Art. 50. As deduções previstas no art. 1
o
da Lei n
o
8.685, de 1993, ficam prorrogadas
até o exercício de 2006 inclusive, devendo os projetos a serem beneficiados por estes
incentivos ser previamente aprovados pela ANCINE.
Art. 51. O art. 5
o
da Lei n
o
8.685, de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 5
o
Os valores não aplicados na forma do artigo anterior, no prazo de cento e oitenta
dias contados da data do depósito, se destinarão à ANCINE, para aplicação em projetos de
fomento à indústria cinematográfica nacional, conforme disposto em regulamento". (NR)
140
Art. 52. A partir de 1
o
de janeiro de 2007, a alínea "a" do inciso II do art. 3
o
da Lei n
o
8.313, de 23 de dezembro de 1991, passará a vigorar com a seguinte redação:
"a) produção de discos, vídeos,obras cinematográficas de curta e média metragem e filmes
documentais,preservação do acervo cinematográfico bem assim de outras obras de
reprodução videofonográfica de caráter cultural;" (NR)
Parágrafo único. O Conselho Superior do Cinema poderá antecipara entrada em vigor
do disposto neste artigo.
Art. 53. O § 3
o
do art. 18 da Lei n
o
8.313, de 1991, passa a vigorar com a seguinte
redação:
"Art.18. ......................................................
......................................................
§ 3
o
As doações e os patrocínios na produção cultural, a que se refere o § 1
o
, atenderão
exclusivamente aos seguintes segmentos:
a) artes cênicas;
b) livros de valor artístico, literário ou humanístico;
c) música erudita ou instrumental;
d) exposições de artes visuais;
e) doações de acervos para bibliotecas públicas, museus, arquivos públicos e cinematecas,
bem como treinamento de pessoal e aquisição de equipamentos para a manutenção desses
acervos;
f) produção de obras cinematográficas e videofonográficas de curta e média metragem e
preservação e difusão do acervo audiovisual; e
g) preservação do patrimônio cultural material e imaterial." (NR)
Art. 54. Fica instituído o Prêmio Adicional de Renda, calculado sobre as rendas de
bilheterias auferidas pela obra cinematográfica de longa metragem brasileira de produção
independente, que será concedido a produtores, distribuidores e exibidores, na forma que
dispuser o regulamento.
Art. 55. Por um prazo de vinte anos, contados a partir de 5 de setembro de 2001, as
empresas proprietárias, locatárias ou arrendatárias de salas,espaços ou locais de exibição
pública comercial exibirão obras cinematográficas brasileiras de longa metragem, por um
141
número de dias fixado, anualmente, por decreto, ouvidas as entidades representativas dos
produtores, distribuidores e exibidores.
§ 1
o
A exibição de obras cinematográficas brasileiras far-se-á proporcionalmente, no
semestre, podendo o exibidor antecipar a programação do semestre seguinte.
§ 2
o
A ANCINE aferirá, semestralmente, o cumprimento do disposto neste artigo.
§ 3
o
As obras cinematográficas e os telefilmes que forem exibidos em meios
eletrônicos antes da exibição comercial em salas não serão computados para fins do
cumprimento do disposto no caput.
Art. 56. Por um prazo de vinte anos, contados a partir de 5 de setembro de 2001, as
empresas de distribuição de vídeo doméstico deverão ter um percentual anual de obras
brasileiras cinematográficas e videofonográficas entre seus títulos, obrigando-se a lançá-las
comercialmente.
Parágrafo único. O percentual de lançamentos e títulos a que se refere este artigo será
fixado anualmente por decreto, ouvidas as entidades de caráter nacional representativas das
atividades de produção, distribuição e comercialização de obras cinematográficas e
videofonográficas.
Art. 57. Poderá ser estabelecido, por lei, a obrigatoriedade de veiculação de obras
cinematográficas e videofonográficas brasileiras de produção independente em outros
segmentos de mercado além daqueles indicados nos arts. 55 e 56.
CAPÍTULO IX
DAS PENALIDADES
Art. 58. As empresas exibidoras, as distribuidoras e locadoras de vídeo, deverão ser
autuadas pela ANCINE nos casos de não cumprimento das disposições desta Medida
Provisória.
Art. 59. O descumprimento da obrigatoriedade de que trata o art. 55 sujeitará o infrator
a uma multa correspondente a cinco por cento da renda média diária de bilheteria, apurada
no semestre anterior à infração, multiplicada pelo número de dias em que a obrigatoriedade
não foi cumprida.
Parágrafo único. Entende-se por renda média aquela obtida após a dedução da
arrecadação bruta de bilheteria do valor dos impostos municipais, estaduais, federais e
direitos autorais que incidirem sobre o valor do ingresso ao público.
Art. 60. O descumprimento ao disposto nos arts. 17 a 19, 21, 24 a 26, 28, 29, 31 e 56
desta Medida Provisória sujeita os infratores a multas de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$
2.000.000,00 (dois milhões de reais), na forma do regulamento.
142
§ 1
o
Em qualquer hipótese as multas limitar-se-ão a:
I - um décimo por cento da receita bruta, para o disposto nos arts. 18, 19, 21, 26, 28, 29
e no parágrafo único do art. 31.
II - três décimos por cento da receita bruta, para o disposto nos arts. 17, 24, 25 e 56;
III - cinco décimos por cento da receita bruta, para o disposto no caput do art. 31.
§ 2
o
Caso não seja possível apurar o valor da receita bruta referido no caput por falta
de informações, a ANCINE arbitra-lo-á na forma do regulamento, que observará, isolada
ou conjuntamente, dentre outros, os seguintes critérios:
I - a receita bruta referente ao último período em que a pessoa jurídica manteve
escrituração de acordo com as leis comerciais e fiscais, atualizado monetariamente;
II - a soma dos valores do ativo circulante, realizável a longo prazo e permanente,
existentes no último balanço patrimonial conhecido, atualizado monetariamente;
III - o valor do capital constante do último balanço patrimonial conhecido ou registrado
nos atos de constituição ou alteração da sociedade, atualizado monetariamente;
IV - o valor do patrimônio líquido constante do último balanço patrimonial conhecido,
atualizado monetariamente;
V - o valor das compras de mercadorias efetuadas no mês;
VI - a soma, em cada mês, dos valores da folha de pagamento dos empregados e das
compras de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem;
VII - a soma dos valores devidos no mês a empregados; e
VIII - o valor mensal do aluguel devido.
§ 3
o
Aplica-se, subsidiariamente, ao disposto neste artigo, as normas de arbitramento
de lucro previstas no âmbito da legislação tributária federal.
§ 4
o
Os veículos de comunicação que veicularem cópia ou original de obra
cinematográfica ou obra videofonográfica publicitária, sem que conste na claquete de
identificação o número do respectivo registro do título, pagarão multa correspondente a 3
(três) vezes o valor do contrato ou da veiculação. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.454, de
13.5.2002)
Art. 61. O descumprimento dos projetos executados com recursos recebidos do
PRODECINE e dos FUNCINES, a não-efetivação do investimento ou a sua realização em
desacordo com o estatuído implicam a devolução dos recursos acrescidos de:
143
I - juros moratórios equivalentes à taxa referencial do Sistema especial de Liquidação e
Custódia - SELIC, para títulos federais, acumulados mensalmente, calculados a partir do
primeiro dia do mês subseqüente ao do recebimento dos recursos até o mês anterior ao do
pagamento e de um por cento no mês do pagamento;
II - multa de vinte por cento calculada sobre o valor total dos recursos.
CAPÍTULO X
DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS
Art. 62. Durante os primeiros doze meses, contados a partir de 5 de setembro de 2001,
a ANCINE ficará vinculada à Casa Civil da Presidência da República, que responderá pela
sua supervisão durante esse período.
Art. 63. A ANCINE constituirá, no prazo de vinte e quatro meses, a contar da data da
sua implantação, o seu quadro próprio de pessoal, por meio da realização de concurso
público de provas, ou de provas e títulos.
Art. 64. Durante os primeiros vinte e quatro meses subseqüentes à sua instalação, a
ANCINE poderá requisitar, com ônus, servidores e empregados de órgãos e entidades
integrantes da administração pública.
§ 1
o
Transcorrido o prazo a que se refere o caput, somente serão cedidos para a
ANCINE servidores por ela requisitados para o exercício de cargos em comissão.
§ 2
o
Durante os primeiros vinte e quatro meses subseqüentes à sua instalação, a
ANCINE poderá complementar a remuneração do servidor ou empregado público
requisitado, ao limite da remuneração do cargo efetivo ou emprego permanente ocupado
no órgão ou na entidade de origem, quando a requisição implicar em redução dessa
remuneração.
Art. 65. A ANCINE poderá efetuar, nos termos do art. 37, IX, da Constituição, e
observado o disposto na Lei n
o
8.745, de 9 de dezembro de 1993, contratação por tempo
determinado, pelo prazo de doze meses, do pessoal técnico imprescindível ao exercício de
suas competências institucionais. (Redação dada pela Lei nº 10.682, de 28.5.2003)
§ 1
o
As contratações referidas no caput poderão ser prorrogadas, desde que sua duração
total não ultrapasse o prazo de vinte e quatro meses, ficando limitada sua vigência, em
qualquer caso, a 5 de setembro de 2005. (Redação dada pela Lei nº 10.682, de 28.5.2003)
§ 2
o
A remuneração do pessoal contratado temporariamente, terá como referência os
valores definidos em ato conjunto da Agência e do órgão central do Sistema de Pessoal
Civil da Administração Federal- SIPEC.
144
§ 3
o
Aplica-se ao pessoal contratado temporariamente pela Agência, o disposto nos
arts. 5
o
e 6
o
, no parágrafo único do art. 7
o
, nos arts. 8
o
, 9
o
, 10, 11,12 e 16 da Lei n
o
8.745, de
9 de dezembro de 1993.
Art. 66. Fica o Poder Executivo autorizado a: (Vide Decreto nº 4.456, de 4.11.2002)
I - transferir para a ANCINE os acervos técnico e patrimonial, as obrigações e os
direitos da Divisão de Registro da Secretaria para Desenvolvimento do Audiovisual do
Ministério da Cultura, bem como aqueles correspondentes a outras atividades atribuídas à
Agência por esta Medida Provisória;
II - remanejar, transpor, transferir, ou utilizar, a partir da instalação da ANCINE, as
dotações orçamentárias aprovadas na Lei Orçamentária de 2001, consignadas ao Ministério
da Cultura, referentes às atribuições transferidas para aquela autarquia, mantida a mesma
classificação orçamentária, expressa por categoria de programação em seu menor nível,
observado o disposto no § 2
o
do art. 3
o
da Lei n
o
9.995, de 25 de julho de 2000, assim como
o respectivo detalhamento por esfera orçamentária, grupos de despesa, fontes de recursos,
modalidades de aplicação e identificadores de uso.
Art. 67. No prazo máximo de um ano, contado a partir de 5 de setembro de 2001,
deverá ser editado regulamento dispondo sobre a forma de transferência para a ANCINE,
dos processos relativos à aprovação de projetos com base nas Lei n
o
8.685, de 1993, e Lei
n
o
8.313, de 1991, inclusive os já aprovados.
Parágrafo único. Até que os processos referidos no caput sejam transferidos para a
ANCINE, a sua análise e acompanhamento permanecerão a cargo do Ministério da Cultura.
Art. 68. Na primeira gestão da ANCINE, um diretor terá mandato de dois anos, um de
três anos, um de quatro anos e um de cinco anos, para implementar o sistema de mandatos
não coincidentes.
Art. 69. Cabe à Advocacia-Geral da União a representação nos processos judiciais em
que a ANCINE seja parte ou interessada, até a implantação da sua Procuradoria-Geral.
Parágrafo único. O Ministério da Cultura, por intermédio de sua Consultoria Jurídica,
promoverá, no prazo de cento e oitenta dias, contados a partir de 5 de setembro de 2001 ,
levantamento dos processos judiciais em curso envolvendo matéria cuja competência tenha
sido transferida para a ANCINE , a qual o substituirá nos respectivos processos.
Art. 70. A instalação da ANCINE dar-se-á em até cento e vinte dias, a partir de 5 de
setembro de 2001 e o início do exercício de suas competências a partir da publicação de sua
estrutura regimental em ato do Presidente da República.
CAPÍTULO XI
DISPOSIÇÕES GERAIS E FINAIS
145
Art. 71. É vedado aos empregados, aos requisitados, aos ocupantes de cargos
comissionados e aos dirigentes da ANCINE o exercício de outra atividade profissional,
inclusive gestão operacional de empresa, ou direção político-partidária, excetuados os casos
admitidos em lei.
Parágrafo único. No caso de o dirigente da ANCINE ser sócio-controlador de empresa
relacionada com a indústria cinematográfica e videofonográfica, fica a mesma impedida de
utilizar-se de recursos públicos ou incentivos fiscais durante o período em que o dirigente
estiver no exercício de suas funções.
Art. 72. Ficam criados para exercício na ANCINE os cargos comissionados dispostos
no Anexo II desta Medida Provisória.
Art. 73. O quantitativo de servidores ou empregados requisitados, acrescido do
Quadro de Pessoal Efetivo, dos contratados temporários e dos ocupantes de cargos
comissionados não poderá ultrapassar o número de empregos fixados para a ANCINE no
art. 13 desta Medida Provisória.
Art. 73. O quantitativo de servidores ou empregados requisitados, acrescido do Quadro
de Pessoal Efetivo, dos contratados por prazo determinado e dos ocupantes de cargos
comissionados não poderá ultrapassar a 260 (duzentos e sessenta). (Redação dada pela Lei
nº 10.871, de 2004)
Art. 74. O Poder Executivo estimulará a associação de capitais nacionais e
estrangeiros, inclusive por intermédio dos mecanismos de conversão da dívida externa, para
o financiamento a empresas e a projetos voltados às atividades de que trata esta Medida
Provisória, na forma do regulamento.
Parágrafo único. Os depósitos em nome de credores estrangeiros à ordem do Banco
Central do Brasil serão liberados pelo seu valor de face, em montante a ser fixado por
aquele Banco.
Art. 75. Esta Medida Provisória será regulamentada pelo Poder Executivo.
Art. 76. Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória n o
2.219, de 4 de setembro de 2001 .
Art. 77. Ficam revogados o inciso II do art. 11 do Decreto-Lei n o 43, de 18 de
novembro de 1966, o Decreto-Lei n o 1.900, de 21 de dezembro de 1981, a Lei n o 8.401,
de 8 de janeiro de 1992 , e a Medida Provisória n o 2.219, de 4 de setembro de 2001.
Art. 78. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 6 de setembro de 2001 ; 180º da Independência e 113º da República.
146
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Sérgio Silva do Amaral
Francisco Weffort
Pedro Parente
147
ANEXO 5
DECRETO Nº 4.456, DE 4 DE NOVEMBRO DE 2002.
Regulamenta o art. 67 da Medida Provisória n
o
2.228-1, de 6 de setembro de 2001, estabelecendo
as competências do Ministério da Cultura e da
Agência Nacional do Cinema - ANCINE, com
relação aos projetos audiovisuais realizados com
base na Lei n
o
8.313, de 23 de dezembro de 1991,
dispõe sobre a transferência de atividades, nos
termos do art. 66, inciso I, da referida Medida
Provisória, e dos processos relativos aos projetos
audiovisuais realizados com base na citada Lei n
o
8.313, de 1991, e na Lei n
o
8.685, de 20 de julho
de 1993, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,
inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Medida Provisória n
o
2.228-1, de
6 de setembro de 2001, e no art. 4
o
do Decreto n
o
4.121, de 7 de fevereiro de 2002,
DECRETA:
Art. 1º É de competência exclusiva da Agência Nacional do Cinema - ANCINE:
I - a análise, aprovação e acompanhamento da execução, bem como a análise das
prestações de contas, dos projetos de obra cinematográfica ou videofonográfica
documental, ficcional ou de animação que se habilitem à obtenção:
a) de incentivos fiscais previstos nas Leis n
o
s 8.685, de 20 de julho de 1993, e 10.454,
de 13 de maio de 2002;
b) de incentivos fiscais previstos na Lei n
o
8.313, de 23 de dezembro de 1991, que se
enquadrem nos formatos definidos nos incisos IX, X, XI e XII do art. 1
o
da Medida
Provisória n
o
2.228-1, de 6 de setembro de 2001, bem como aqueles referentes à
distribuição e comercialização de obras cinematográficas e videofonográficas, participação
em mercados cinematográficos e videofonográficos, festivais internacionais e projetos de
exibição e de infra-estrutura;
c) cumulativa de incentivos fiscais previstos nas Leis n
o
s 8.313, de 1991, e 8.685, de
1993;
II - o exercício dos direitos e obrigações do Ministério da Cultura correspondentes às
competências de que trata o inciso I deste artigo e os arts. 7, 55 e 56 da Medida Provisória
n
o
2.228-1, de 2001, que estejam consubstanciados em atos legais ou administrativos e em
148
contratos, convênios ou congêneres firmados com órgãos e entidades públicas ou privadas,
bem como os que sejam objeto de processos administrativos em curso nesse ou em outros
órgãos, nos termos do art. 66, inciso I, da referida Medida Provisória.
Art. 2º São de competência exclusiva do Ministério da Cultura, a análise, aprovação e
acompanhamento da execução de projetos que se habilitem à obtenção de incentivos fiscais
previstos na Lei n
o
8.313, de 1991, que se enquadrem nos formatos definidos nos incisos
VII e VIII do art. 1
o
da Medida Provisória n
o
2.228-1, de 2001, e aqueles referentes a
formação de mão-de-obra, festivais nacionais, mostras e preservação e difusão de acervos
de obras cinematográficas e audiovisuais.
Art. 3º Os processos referentes aos projetos que serão transferidos para a ANCINE
deverão a ela ser entregues, acompanhados de relatório individual contendo informações
sobre a fase em que o projeto se encontra, os valores aprovados com base nas Leis n
o
s
8.313, de 1991, e 8.685, de 1993, por tipo de incentivo, os valores liberados e a liberar,
bem como os valores autorizados, mas ainda não captados de cada um dos incentivos
aprovados pelo Ministério da Cultura, os números do banco, agência e contas bancárias
vinculadas ao projeto e o respectivo prazo para encerramento das captações.
Art. 4º As prestações de contas encaminhadas até 30 de outubro de 2002 deverão ser
analisadas e aprovadas ou não, pelo Ministério da Cultura, que ficará responsável, após tal
providência, pelo encaminhamento dos processos a quem de direito, observadas as
competências fixadas nos arts. 1
o
e 2
o
deste Decreto.
Art. 5º O valor máximo das deduções do imposto sobre a renda devido relativas às
doações e aos patrocínios e investimentos em favor de projetos de que trata o art 1º deste
Decreto e os arts. 44 e 45 da Medida Provisória n
o
2.228-1, de 2001, será fixado
anualmente em decreto específico, excetuando-se daquele limite o valor referente ao art. 3
o
da Lei n
o
8.685, de 1993.
Art. 6º O valor máximo das deduções do imposto sobre a renda devido relativas às
doações e aos patrocínios em favor dos projetos culturais de que trata a Lei n
o
8.313, de
1991, será fixado anualmente em decreto específico, excetuando-se os casos previstos no
art. 5º deste Decreto.
Art. 7
o
Ficam transferidos da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura para
a ANCINE as seguintes competências:
I - registro de obras audiovisuais cinematográficas e videofonográficas, bem como
todas aquelas passíveis de enquadramento nas normas fixadas pela Medida Provisória n
o
2.228-1, de 2001, a partir da data da publicação deste Decreto;
II - emissão de Certificados de Registro de títulos relativos aos contratos de produção,
co-produção, distribuição, licenciamento, cessão de direitos de exploração, veiculação e
exibição de obras cinematográficas e videofonográficas, a partir da data da publicação deste
Decreto;
149
III - emissão de Certificados de Produto Brasileiro - CPB às obras audiovisuais
enquadráveis no art. 1
o
da Medida Provisória n
o
2.228-1, de 2001, a partir de 11 de
novembro de 2002;
IV - concessão de autorização para filmagens estrangeiras, a partir de 11 de novembro
de 2002;
V - as relações com os organismos de governo responsáveis pela autorização para
importação e exportação de obras cinematográficas e videofonográficas, a partir da data da
publicação deste Decreto;
VI - os acervos documentais da Coordenação de Registro da Secretaria do Audiovisual
do Ministério da Cultura, a partir de 19 de novembro de 2002;
VII - os projetos aprovados e em andamento, em data anterior à mencionada neste
inciso, e que se enquadrem nos incisos I e II do art. 1
o
deste Decreto, com base nas Leis n
o
s
8.685, de 1993, e 8.313, de 1991, a partir de 11 de novembro de 2002;
VIII - a análise, aprovação, acompanhamento da execução e prestação de contas dos
projetos, cujos processos de aprovação tenham início a partir de 11 de novembro de 2002, e
que se enquadrem nos incisos I e II do art. 1
o
deste Decreto a serem realizados com os
incentivos fiscais previstos nas Leis n
o
s 8.313, de 1991, e 8.685, de 1993;
IX - os processos referentes aos acordos internacionais em execução, a partir da data
da publicação deste Decreto;
X - a conservação e o tratamento dos acervos documentais da EMBRAFILME -
Distribuidora de Filmes S.A
cinematográficos e videofonográficos, além da participação em eventos organizados por
organismos de caráter comercial e industrial, serão de responsabilidade da ANCINE.
Art. 10. O Ministério da Cultura deverá, até 6 de dezembro de 2002, ceder à ANCINE
a base de dados referente aos projetos que serão a ela transferidos e a respectiva
documentação técnica dos programas-fontes do sistema de acompanhamento de projetos, já
cedidos àquela Agência.
Parágrafo único. O Ministério da Cultura deverá prestar consultoria à ANCINE para
adaptação dos programas de que trata o caput.
Art. 11. O Ministério da Cultura deverá, até 6 de dezembro de 2002, entregar à
ANCINE, impressos e em meio magnético:
I - relatórios históricos dos benefícios fiscais concedidos, com os respectivos valores,
desde a sua criação, relativos às Leis n
o
s 8.685, de 1993, e 8.313, de 1991;
II - relatórios e estatísticas disponíveis sobre o cumprimento das exigências legais,
inclusive da Lei n
o
8.401, de 8 de janeiro de 1992, sobre a exibição do cinema nacional e
estatísticas sobre o cinema estrangeiro, fornecidos pelas entidades de produção, distribuição
e exibição.
Art. 12. O encaminhamento à ANCINE pelo Ministério da Cultura dos documentos
de que trata o inciso XII do art. 7
o
deverá ser acompanhado de relatórios individuais
contendo todo o histórico e andamento do exercício dos direitos e obrigações deles
decorrentes, com a fase em que se encontram e demais informações necessárias ao
cumprimento, pela ANCINE, de suas atribuições.
Art. 13. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 4 de novembro de 2002; 181º da Independência e 114º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Francisco Weffort
Pedro Parente
151
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