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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO
A HISTÓRIA DA AVALIAÇÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO SOB A ÓTICA DA
LEGISLAÇÃO: DA 1ª LEI DE DIRETRIZES E BASES (1961) À PROGRESSÃO
CONTINUADA (1998)
DULCE HELENA MOREIRA TEIXEIRA
RIBEIRÃO PRETO
2007
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DULCE HELENA MOREIRA TEIXEIRA
A HISTÓRIA DA AVALIAÇÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO SOB A ÓTICA DA
LEGISLAÇÃO: DA 1ª LEI DE DIRETRIZES E BASES (1961) À PROGRESSÃO
CONTINUADA (1998)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação do Centro Universitário
Moura Lacerda de Ribeirão Preto, SP, como
requisito parcial para a obtenção do título de Mestre
em Educação.
Área de Concentração: Educação Escolar
Linha de Pesquisa: Currículo, Cultura e Práticas
Escolares
Orientadora: Profª Drª Alessandra David Moreira da
Costa
Ribeirão Preto
2007
2
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DULCE HELENA MOREIRA TEIXEIRA
A HISTÓRIA DA AVALIAÇÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO SOB A ÓTICA DA
LEGISLAÇÃO: DA 1ª LEI DE DIRETRIZES E BASES (1961) À PROGRESSÃO
CONTINUADA (1998)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação do Centro Universitário
Moura Lacerda de Ribeirão Preto, SP, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Educação.
Área de Concentração: Educação Escolar
Linha de Pesquisa: Currículo, Cultura e Práticas
Escolares
Comissão Julgadora
Orientadora – Drª Alessandra David Moreira da Costa (CUML): _________________________
2ª examinadora – Drª Gisela do Carmo Lourencetti (ITES – Araraquara)____________________
3ª examinadora – Drª Maria Cristina da Silveira G. Fernandes (CUML): ____________________
Ribeirão Preto, 16 de agosto de 2007
3
À minha família, especialmente à
minha mãe e à minha irmã.
4
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Profª Drª Alessandra David Moreira da Costa, pelo cuidadoso e competente
trabalho, atenção e apoio nas horas mais difíceis;
À Profª Drª Gisela do Carmo Lourencetti, pelas contribuições valiosas ao trabalho;
Aos Professores do Centro Universitário Moura Lacerda, especialmente à Profª Drª Maria
Cristina da Silveira Galan Fernandes, pela competência ao ensinar e gentileza para acolher seus
alunos;
Aos colegas da turma de 2005, especialmente Roseli, Micael, José Ildon, Maria Teresa e Luciana,
pelo convívio e possibilidade de aprendizagem a cada momento vivido;
À Maria Thereza C. Cardoso, pelo companheirismo, apoio e pelos ensinamentos na área de
informática;
A todos os funcionários da biblioteca do Centro Universitário Moura Lacerda, especialmente à
Gina e à Wilma, pela atenção dispensada;
Aos participantes do Grupo de Estudos “Currículo, História e Poder”, pela possibilidade de
descobertas, incentivo, reflexões e companheirismo;
À Secretaria de Estado da Educação de São Paulo que, através da Bolsa Mestrado, possibilitou o
apoio financeiro para que eu pudesse retornar aos estudos;
Às colegas de profissão que compartilharam das minhas alegrias, surpresas e dificuldades durante
a execução deste trabalho, especialmente Edinilza, Marilena, Mônica, Edilaine, Elizabeth,
Adriana, Jurema, Beatriz, Regina, Ana Lúcia e Vânia;
À minha família: meus pais Altino e Anésia, aos meus irmãos Dulcelina, Joaquim e Altino, aos
meus cunhados Silvana e Anderson, aos meus sobrinhos Octávio e Hugo e às minhas tias
Aparecida e Maria pela paciência, auxílio nos momentos difíceis e por compartilharem de minhas
alegrias.
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TEIXEIRA, Dulce Helena Moreira. A história da avaliação no estado de São Paulo sob a ótica
da legislação: da lei de diretrizes e bases (1961) à progressão continuada (1998). Ribeirão
Preto, SP: CUML, 2007. 149 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Centro Universitário
Moura Lacerda.
RESUMO
São muitas as antíteses que permeiam o âmbito escolar: na legislação e na prática da sala de aula.
Progressão continuada ou promoção automática, série ou ciclos, avaliação classificatória ou
diagnóstica, escola seletiva ou inclusiva? Para responder a essas indagações investigou-se a
história da avaliação que se tornou um dos pilares da progressão continuada e está sendo utilizada
com parâmetro de mensuração da qualidade da educação, principalmente a partir da década de
1990. Ao analisar a avaliação, por meio da história da educação, buscou-se compreender o
contexto sócio-econômico, político e educacional do Brasil e, em especial do estado de São
Paulo, no período de 1961 até 1998, que corresponde à promulgação da primeira LDB (Lei
4.024/61) até a nova LDB (Lei nº 9.394/96) chegando à implantação da progressão continuada no
estado de São Paulo em 1998. A metodologia utilizada apoiou-se na pesquisa documental e
bibliográfica para que os objetivos fossem atingidos: refletir sobre as diretrizes avaliativas
presentes nas legislações federais e estaduais desde 1961, especialmente na nova LDB, e como
estas foram incorporadas, aplicadas e transmitidas pela Secretaria de Estado da Educação no
estado de São Paulo aos seus profissionais da educação. Ao analisar a avaliação fez-se necessário
o estudo do currículo, uma vez que a avaliação a este se congrega como parte do processo
pedagógico, com destaque para o currículo prescrito e o currículo avaliado. Os resultados
obtidos, através da pesquisa, demonstram que a escola pública paulista tem sofrido muitas
mudanças, principalmente a partir da década de 1990. No entanto, apesar da implantação dos
ciclos e da progressão continuada provocarem a diminuição das taxas de reprovação e de evasão,
surge um novo tipo de exclusão dos alunos no interior da escola por não terem aprendizagem
adequada, além da ausência dos professores na elaboração das políticas públicas.
Palavras-chave: Avaliação; Progressão Continuada no estado de São Paulo; História da Educação
Brasileira; Currículo.
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TEIXEIRA, Dulce Helena Moreira. A história da avaliação no estado de São Paulo sob a ótica
da legislação: da lei de diretrizes e bases (1961) à progressão continuada (1998). Ribeirão
Preto, SP: CUML, 2007. 149 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Centro Universitário
Moura Lacerda.
ABSTRACT
There are many antitheses that permeate the school ambit: in the legislation and classroom
practice. Continued evaluation or automatic promotion, grades or cycles, classificatory evaluation
or diagnostic, selective schools or schools with inclusion programs? To answer these indagations
the history of evaluation was investigated, which has become on of the pillars in continued
evaluation and is being used as a parameter to measure the quality in education, principally since
the 1990s. When evaluation was analyzed, through the history of education, it was with the
intention of understanding the social-economic, political and educational context in Brazil,
especially in the state of São Paulo, between 1961 and 1998. This period corresponds to the
promulgation of the first National Education Bases and Guidelines Law (LDB law 4.024/61) up
to the new National Education Bases and Guidelines Law (LDB law 9.393/96), including the
implementation of continued evaluation in the state of São Paulo State in 1998. The methodology
used is supported by documental research and bibliographic so that the objectives were achieved:
to reflect about the evaluation guidelines present in the federal and state legislations since 1961,
specially in the new National Education Bases and Guidelines Law (LDB law 9.393/96), and how
they were incorporated, applied and transmitted by the State Office of the Secretary of Education
in São Paulo to their professionals in education. While evaluation was being analyzed it became
necessary to study the curriculum, since evaluation is inferred as part of the pedagogical process,
pointing out the prescribed curriculum and the evaluated curriculum. The results obtained in this
research show that the public school system in the state of São Paulo has been through many
changes, principally since the 1990s. However, the implementation of the cycles and automatic
promotion has reduced the numbers concerning failure and evasion. Hence a new kind of
exclusion has emerged, the exclusion of the students attending schools in the countryside who are
not offered adequate learning, besides the lack of teachers’ participation in elaborating public
policies.
Key words: Evaluation; Continued Evaluation in the state of São Paulo, Brazilian History of
Education; Curriculum.
7
LISTA DE QUADRO E TABELAS
Quadro 1 – Legislação referente à avaliação ................................................................................82
Tabela 1 – Número de aprovados no Ensino Fundamental da rede estadual de São Paulo – 1975
-1990...............................................................................................................................................86
Tabela 2 – Taxas de reprovação no estado de São Paulo de 1990 até 2001..................................95
Tabela 3 – Taxas de evasão no estado de São Paulo de 1990 até 2001.........................................96
Tabela 4 – Taxas de defasagem idade/série no estado de São Paulo -1998 e 2002.......................97
Tabela 5 – Aprovação e abandono na rede estadual de São Paulo – Ensino Fundamental - 5ª a 8ª
séries.............................................................................................................................................127
8
SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................................................................5
ABSTRACT....................................................................................................................................6
1. INTRODUÇÃO ..........................................................................................................................8
2. O CONTEXTO SÓCIO-ECONÕMICO, POLÍTICO E HISTÓRICO BRASILEIRO E A
EDUCAÇÃO (1961 a 1998)..........................................................................................................22
2.1. Demarcando o tempo histórico: a periodização.....................................................................22
2.2. O Brasil de 1961 até 1998......................................................................................................23
2.3. As políticas educacionais no estado de São Paulo nos anos de 1961 a 1998..........................39
3. O CURRÍCULO E A AVALIAÇÃO.......................................................................................49
3.1. As teorias de currículo e suas definições...............................................................................49
3.2. O currículo segundo Gimeno Sacristán e Perez Gómez........................................................55
3.3. O currículo prescrito..............................................................................................................58
3.4. O currículo avaliado...............................................................................................................68
4. A AVALIAÇÃO MEDIANTE AS MUDANÇAS INTERNAS NO SISTEMA
EDUCACIONAL..........................................................................................................................74
4.1. Analisando o período de 1961 até 1998: a legislação e o contexto histórico.........................74
4.2. Analisando a avaliação através da legislação.........................................................................80
4.3. A nova LDB e o seu sentido de avaliação..............................................................................88
4.4. O fracasso escolar e a avaliação.............................................................................................99
5. PROGRESSÃO CONTINUADA OU PROMOÇÃO AUTOMÁTICA?...............................105
5.1. As discussões sobre ciclos no Brasil.....................................................................................105
5.2. A promoção automática na década de 1950.........................................................................109
5.3 A progressão continuada na década de 1990..........................................................................114
9
5.4. Retomando e comparando as décadas de 1950 e 1990........................................................121
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................132
REFERÊNCIAS...........................................................................................................................140
10
1. Introdução
De tudo sobraram três coisas:
A certeza de que estamos sempre começando...
A certeza de que precisamos continuar...
A certeza de que seremos interrompidos antes de
terminar...
Portanto, devemos:
Fazer da interrupção um caminho novo...
Da queda, um passo de dança...
Do medo, uma escada...
Do sonho, uma ponte...
Da procura, um encontro...
Fernando Pessoa, Certeza
duas décadas sou professora de História no ensino básico, no ciclo II, na rede
pública estadual de São Paulo, ou seja, leciono no ensino fundamental (outrora 5ª a 8ª séries) e no
ensino médio (outrora denominado Colegial).
Durante esse tempo (1987/2007) houve muitas mudanças implementadas pelas políticas
públicas em relação à avaliação, segundo orientação dos governadores eleitos nesse período:
Orestes Quércia (15/03/1987 a 15/03/1991), Luiz Antônio Fleury Filho (15/03/1991 a
01/01/1995), Mário Covas Júnior (01/01/1995 a 10/01/1999 e 10/01/1999 a 06/03/2001) e,
finalmente, Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho (06/03/2001 a 31/12/2002 e 01/01/2003 a
30/03/2006) e, a partir de 2007, José Serra.
Entre as mudanças recentes ocorridas, podemos ressaltar a implantação da progressão
continuada nas escolas estaduais de São Paulo, que ocorreu no ano de 1998, colocando em
destaque a avaliação como um dos seus pilares. Desde o início de minha atuação profissional, a
avaliação me provocou questionamentos, o que também me instigou a buscar a compreensão de
sua relevância nas práticas escolares. Mas quando foi implantada a progressão continuada, as
inquietações se intensificaram, pois a Secretaria de Estado da Educação (SEE/SP)
1
propunha uma
nova forma para lidar com problemas bem antigos, a reprovação e a evasão escolar. Uma nova
concepção de avaliação e organização escolar também foi proposta para o ensino fundamental
1
Em todo o trabalho será utilizada a sigla SEE/SP com o significado de Secretaria de Estado da Educação de São
Paulo.
11
que passou a ser dividido em dois ciclos: Ciclo I (envolvendo as antigas 1ª, 2ª, 3ª eséries do
grau) e o Ciclo II (envolvendo as antigas 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do 1º grau) havendo possibilidade de
retenção apenas no final de cada ciclo ou se o aluno não tivesse freqüência igual ou superior a
75% do total das horas letivas.
A progressão continuada limitou a reprovação e também o controle e poder dos
professores sobre os alunos, além de ter sido implantada a partir de decisões do Conselho
Estadual de Educação (CEE) e SEE/SP, sob a orientação da Lei de Diretrizes e Bases (Lei
9.394/96) sem qualquer participação dos professores, o que não favoreceu um envolvimento
destes com as mudanças das quais não foram co-participantes, mas sim, meros coadjuvantes. Este
fato provocaria uma rejeição a essas transformações, pois
Sob a força das reformas estabelecidas a cada ano (ou semestre), professores, alunos e
pais foram sendo impactados por novas diretrizes que significavam alterações decisivas
nas atividades escolares. E, a cada ano, a desqualificação dos professores e escolas tem
sido a conseqüência mais imediata ou explícita – são eles que não sabem trabalhar, eles
são discriminadores ou seletivos...Não raro se afirma que são eles que, por
incompetência ou omissão, têm impedido que as reformas produzam as transformações
projetadas... (DIAS-DA-SILVA & LOURENCETTI, 2002, p.23, grifos das autoras).
Um dos motivos da rejeição dos professores, portanto, é explicado por estes se sentirem
excluídos dos processos de mudança, que são encarados como executores das reformas
educacionais “quando não réus quando a eles é atribuído o fracasso das medidas reformadoras”
(DIAS-DA-SILVA & LOURENCETTI, 2002, p.23).
Aliada a todas as expectativas que seriam esperadas dos professores, em especial a
mudança de postura quanto à avaliação e aos procedimentos metodológicos, estaria também a
avaliação de seu trabalho através do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar de São Paulo
(Saresp)
2
iniciado a partir de 1996, segundo informações da SEE/SP através do documento
Educação Paulista: corrigindo rumos - o que mudou na escola pública paulista (SÃO
PAULO, 1997, p.40-41).
Impulsionada pelas mudanças recentes ocorridas no estado de São Paulo, interessou-me
analisá-las tendo como foco a avaliação no ensino fundamental.
2
Saresp: Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar de São Paulo. Esta sigla será utilizada em todo o trabalho.
12
Depois de quase uma década da implantação da progressão continuada, muitas
inquietações permanecem e pedem a compreensão do contexto que propiciou a sua criação e as
políticas públicas que a articularam.
A implementação das políticas públicas nesse período esteve sob orientação de dois
partidos políticos: o PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) e o PSDB (Partido
da Social Democracia Brasileira).
Os dois representantes do PMDB foram Orestes Quércia e Luiz Antônio Fleury Filho e
do PSDB, Mário Covas Jr, Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho e José Serra.
O PMDB sucedeu o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), o único partido de
oposição durante o período da ditadura militar (1964/1985). Em 1979 ocorreu a reforma
partidária que extinguiu o bipartidarismo representado pela Arena (Aliança Renovadora
Nacional), partido de situação e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), partido de
oposição, havendo o surgimento de novos partidos políticos, inclusive o próprio PMDB.
No estado de São Paulo, os governadores Orestes Quércia e Luiz Antonio Fleury Filho
estiveram no poder até 1995. A partir de 1995 inicia-se um novo governo no estado de São Paulo
que interrompe o ciclo de governo pemedebista. É eleito Mário Covas pelo PSDB (Partido da
Social Democracia Brasileira), que iniciou o primeiro mandato em 1995 e o concluiu em 1999.
Favorecido pela emenda Constitucional (de 1997) que permitiu uma eleição consecutiva
para os ocupantes dos cargos do poder Executivo, Mário Covas se candidata à reeleição em 1998,
e se reelege para um segundo mandato, que não é concluído em função de sua morte ocorrida em
06 de março de 2001, sendo substituído pelo vice-governador Geraldo Alckmin.
Covas governou, portanto, de 1995 a 1999 e de 1999 a 2001 e seu partido, PSDB,
elegeu, no mesmo período, o Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (01/01/1995
até 01/01/1999 e 01/01/1999 até 01/01/2003), que ocupou a presidência da República por dois
mandatos.
O PSDB foi fundado em junho de 1988 e entre seus fundadores estavam André Franco
Montoro e Mário Covas que haviam participado do PMDB. Após a promulgação da Constituição
de 1988 houve uma dissidência de vários políticos do PMDB que fundaram um novo partido (o
PSDB). Durante essas quase duas décadas muitas transformações ocorreram, como
constataremos no Capítulo 1, que explicam as nossas inquietações, em especial as relacionadas à
ampliação do acesso à escola (trazendo novos alunos de diferentes segmentos econômicos e
13
sociais, o que ocasionou diversos problemas no sistema escolar), à municipalização do ensino
(motivo de insegurança quanto à estabilidade no emprego) e à progressão continuada.
Percebendo que seria importante tentar buscar respostas para essas inquietações além do
meu “mundo” representado pela escola e a sala de aula resolvi retomar os estudos, através do
Mestrado em Educação, ampliando a visão para além dos muros da unidade escolar em que
trabalho.
Como a avaliação se transformou num dos pilares da progressão continuada, que dividiu
o ensino fundamental em dois ciclos (sendo prevista a reprovação somente no final de cada
ciclo), e está sendo utilizada como parâmetro de mensuração da qualidade da educação (que está
presente no discurso das políticas educacionais desde a década de 1980), esta se tornou uma
temática que atraiu a minha atenção. Este trabalho justifica-se, portanto, pela relevância da
temática (a questão da Avaliação) no processo ensino e aprendizagem e também por ter se
tornado destaque nas políticas públicas, principalmente na década de 1990, com a globalização e
o neoliberalismo (que serão examinados no primeiro capítulo do trabalho). Assim, através da
pesquisa que envolve a história da avaliação no estado de São Paulo, buscamos o seu
entendimento na tentativa de compreendê-la.
As palavras de Garcia (2003) são relevantes para explicitar a situação que vivencio:
O que me parece importante é que possamos refletir no espaço acadêmico sobre qual o
lugar da teoria num projeto emancipatório e como se reaproximar a teoria da prática e a
prática da teoria, potencializando aqueles e aquelas que vêm sendo excluídos e
impedidos de aprender a dizer a sua própria palavra de modo que mudem as próprias
vidas e comprometam-se num processo de mudança social (GARCIA, 2003, p.33-34).
Ao refletir e buscar as respostas às indagações/inquietações, sob a luz de documentos e
bibliografia pertinentes à questão da avaliação, tenho em mente, como alega Soares (2003, p.89)
o “compromisso social e a obrigação ética” de revelar o conhecimento que será produzido como
fruto da pesquisa aos que, como eu, estão envolvidos na realidade investigada.
Como, ao mesmo tempo, sou pesquisadora/professora, penso que devo pesquisar e
escrever objetivando a compreensão da realidade, tendo em vista que os colegas de profissão
sejam também envolvidos nesse entendimento, pois o desconhecimento mantém a todos passivos
e excluídos das decisões relevantes.
14
Com esta pesquisa vivenciei, com minha orientadora, pelo menos sete etapas ou
“momentos” de relevante importância de modo a serem descritos a seguir. Em um primeiro
momento, quando a pesquisa teve início em 2005, ocorreram as discussões preliminares sobre
qual deveria ser o tema a ser pesquisado. Após a decisão quanto ao tema, a partir das inquietações
advindas das mudanças que comecei a vivenciar, enquanto professora de ensino básico,
concluímos que a pesquisa deveria abordar o ensino fundamental, pois iríamos analisar a
progressão continuada. Decidimos, também, que a pesquisa seria documental e bibliográfica.
Delimitando o período a ser pesquisado percebemos que este deveria ser de 1961 até 1998, ou
seja, analisaríamos a avaliação da aprendizagem desde a primeira Lei de Diretrizes e Bases (Lei
4.024/61) até a implantação da progressão continuada no estado de São Paulo (1998). Esse
recorte se explica pelo fato de analisarmos a legislação federal desde a primeira LDB, notando as
mudanças ou permanências quanto à avaliação em nosso país e, em especial no estado de São
Paulo, pois partindo da legislação federal poderíamos analisar como a legislação estadual a
incorporava e era transmitida para os professores da rede estadual de ensino, por meio da
SEE/SP.
Baseadas em nossas discussões percebemos que essa análise histórica da avaliação
deveria englobar, também, o estudo do currículo. Nessa pesquisa foram analisadas as definições
de currículo e a sua classificação em: prescrito, apresentado, moldado, em ação, realizado e
avaliado, segundo Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998) e Gimeno Sacristán (2000). Foram
valorizados, no entanto, apenas o currículo prescrito e o currículo avaliado para a compreensão
das determinações dos órgãos oficiais aos professores e como estes se refletem na avaliação da
aprendizagem e da avaliação institucional.
Chegamos ao segundo momento, ao qual denominamos de primeiras iniciativas,
quando ocorreu a determinação do problema de pesquisa e os objetivos para respondermos a ele.
Segundo Barros (2005):
[...] pode-se dizer que um “problema de pesquisa” corresponde a uma questão ou
dificuldade que está potencialmente inscrita dentro de um tema delimitado (resolver
esta questão ou a uma dificuldade é precisamente a finalidade maior da pesquisa).O
“problema” tem geralmente um sentido interrogativo (p.39).
No caso deste trabalho, o problema de pesquisa corresponde a uma questão que se
pretende investigar e que está inserida no tema da Avaliação: como o modelo de avaliação,
15
proposto nacionalmente pela nova Lei de Diretrizes e Bases, Lei 9.394/96, foi incorporado
pela SEE/SP e transmitido aos professores de sua rede de ensino fundamental?
Para responder à indagação temos por objetivos, primeiramente, compreender o
contexto histórico das propostas sobre avaliação, presentes nas LDBs (Lei 4.024/ 61 e Lei
9.394/96) e na Lei Federal 5.692/71 e confrontar a nova LDB (1996) com as resoluções
paulistas referentes à essa temática. Além disso, também, analisamos a política educacional, com
destaque para a avaliação, implantada pela SEE/SP para compreender o modelo de avaliação
proposto pela LDB, Lei 9.394/96, e como este foi incorporado pelo governo paulista ao
transmitir as diretrizes para os professores das escolas paulistas, principalmente a partir da
progressão continuada.
Após a indicação do problema de pesquisa e dos objetivos a serem alcançados, teve
início o levantamento de documentos e material bibliográfico pertinentes ao tema,
correspondendo ao terceiro momento. Esse levantamento incluiu a pesquisa na unidade escolar
em que a pesquisadora trabalha, no interior do estado de São Paulo, assim como em outras
escolas na mesma cidade, além da Diretoria de Ensino (DE). Nas unidades escolares foram
encontrados legislação e normas básicas para a sua implementação, alguns fascículos das séries
Idéias e Argumento, além de livros do Programa de Melhoria e Expansão do Ensino Médio da
SEE/SP e Ministério da Educação e Cultura (MEC) referentes à avaliação, currículo, ciclos e
progressão continuada. Na DE da mesma cidade, além de documentos lançados pela SEE/SP,
como A Construção da Proposta Pedagógica da Escola: A Escola de Cara Nova (2000), foram
encontrados livros também doados pelo MEC e pelo governo estadual.
Nessa fase também foram visitadas bibliotecas tradicionais e digitais na procura por
teses de doutorado, dissertações de mestrado e periódicos da área de educação. Quanto aos
periódicos foram encontrados, do período de 2000 até 2005, diversos artigos relacionados ao
tema estudado destacando-se as publicações Revista Brasileira de Educação, Cadernos de
Pesquisa, Cadernos Cedes, Educação e Sociedade, Educação e Pesquisa e Ensaio-Avaliação e
Políticas Públicas em Educação. Foram visitados, também, os sites do MEC, da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) - de 2000 até 2006 correspondendo
aos textos e trabalhos dos pôsteres das reuniões anuais (da 23ª a 29ª) - e da SEE/SP,
especialmente o Centro de Referência em Educação Mario Covas, para a procura de publicações
disponíveis e que dessem suporte à discussão a ser realizada.
16
Num quarto momento, iniciou-se a leitura do material coletado, sendo que esta
propiciou o começo de uma nova etapa do trabalho, que correspondeu ao início da escrita. Com o
desenvolvimento da escrita estabeleceram-se as orientações que direcionavam os caminhos a
serem percorridos até que, após várias retomadas, o trabalho foi encaminhado, primeiramente
para a pré-qualificação na disciplina Seminários de Dissertação e, em seguida para a qualificação
para receber as contribuições da banca e, depois os ajustes finais para o seu término.
Muitas foram as dificuldades a serem enfrentadas para que todas as etapas pudessem ser
desenvolvidas sendo que as principais foram o período histórico extenso a ser analisado
demandando análise de documentos e de livros de assuntos tão complexos quanto a avaliação,
currículo, ciclos e progressão continuada; a dificuldade de acesso de alguns referenciais
demandou tempo e deslocamento para várias unidades escolares, além da visita à DE que
demonstrou a falta de preservação de materiais importantes que acabam por desaparecer dos
acervos e, finalmente, a articulação entre as várias fontes levantadas na escrita do trabalho.
Como o intuito de nossa pesquisa é o de analisar como a legislação se refere à avaliação
e como o modelo proposto pela nova LDB é transmitido aos professores das escolas paulistas, é
relevante refletirmos sobre as administrações estaduais, em especial, a de Mario Covas
(1995/1999 e 1999/2001) e de Geraldo Alckmin (2001/2002 e 2003/2006), que adotaram as
mudanças propostas pela Lei nº 9.394/96.
Para solucionar o problema de pesquisa que diz respeito a como o modelo proposto pela
Lei de Diretrizes e Bases foi incorporado pela SEE/SP e transmitido aos professores, foram
adotados como metodologia de pesquisa, as pesquisas bibliográfica e documental, que passo a
descrever.
Utilizando a classificação de Gonsalves (2003), para estabelecer os tipos de pesquisa,
são indicados os seguintes critérios: objetivos, procedimento de coleta, fontes de informação e
natureza de seus dados.
A presente pesquisa é, segundo os objetivos, explicativa, pois segundo Gil (1999):
[...] são aquelas que têm como preocupação central identificar os fatores que
determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos. Este é o tipo de
pesquisa que mais aprofunda o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o
porquê das coisas (p.44).
17
De acordo com os procedimentos de coleta e com as fontes de informação, é uma
pesquisa bibliográfica e documental.
Destaca Gil (1999) que as pesquisas documentais e bibliográficas são muito
semelhantes, só diferindo na natureza das fontes. Diz o autor:
Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos
diversos autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais
que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados
de acordo com os objetivos da pesquisa (p.66).
Portanto, esta é uma pesquisa documental em que serão analisadas as legislações
nacionais e as resoluções paulistas sobre avaliação.
Gil (1999) indica ainda vantagens para a utilização das fontes documentais: “possibilita
[m] o conhecimento do passado e a investigação dos processos de mudança social e cultural”
(p.166).
No entanto, Lopes e Galvão (2001), alertam que, ao pesquisarmos um documento
oficial, não se deve crer que ele contenha toda a verdade, pois: “As pessoas que produzem esses
documentos sabem de uma ou outra maneira, que serão lidos, quer para serem divulgados,
discutidos, aprovados ou contestados” (p.81).
As autoras utilizam-se de expressões como “revolução documental” (p.91) ou “novo
olhar sobre as fontes” (p.92) para ressaltarem que “o ponto de partida não é desse modo, a
pesquisa de um documento, mas a colocação de um questionamento” (p.91). Sendo assim, o (a)
pesquisador (a) problematiza o documento, conferindo-lhe sentido e, “no limite, enquanto houver
perguntas, o material não está suficientemente explorado” (p.92). O que significa, portanto, que
apesar das legislações federais e estaduais terem sido exaustivamente analisadas, assim como os
impressos paulistas oficiais, podemos problematizá-las de modo a que a exploremos no intuito de
refletirmos sobre o tema proposto.
Segundo Saviani (2004 a) não são das fontes históricas que nasce a história, mas elas são
“testemunhos dos atos históricos, são a fonte do nosso conhecimento histórico (p.5). Portanto, é
nas fontes históricas “que se apóia o conhecimento que produzimos a respeito da história” (p.5 ).
Galvão e Batista (2003) ressaltam, no entanto, que por muito tempo, os documentos
oficiais foram as únicas fontes utilizadas nas pesquisas em história da educação, no entanto, esses
18
mesmos documentos têm sido criticados e são considerados uma das versões do passado que
projetam, em muitos casos, uma situação ideal.
Sanfelice (2004), por sua vez, é enfático quando considera que uma coisa é escrever a
história do passado e outra coisa é escrever a história do próprio tempo em que vivemos. O autor
cita Hobsbawm (1998) para comentar sobre as dificuldades de se fazer a história do presente:
a) [...] É difícil, pela experiência de vida, saber quando as coisas mudaram e isto
implica que os mais jovens necessitam fazer um maior esforço de imaginação e de mais
trabalho de pesquisa.
b) Nossa perspectiva do passado pode mudar, pois até o passado registrado muda à luz
da história subseqüente.
c) Como escapar às suposições da época e que são partilhadas pela maioria de nós?
(HOBSBAWM, 1998, apud SANFELICE, 2004, p.105).
Estas dificuldades se referem à questão da objetividade, pois ao pesquisar a história
recente, o pesquisador está envolvido nas questões que se propõe a estudar e possui idéias
sobre o assunto. Assim, muito provavelmente as pessoas mais jovens terão que sanar as lacunas
representadas por sua pouca experiência de vida.
Entretanto, apesar das dificuldades para se fazer a história do presente “nem por isso ela
está interditada”, pois, segundo o próprio Hobsbawm, “os enganos e os acertos devem ser o ponto
de partida de nossas reflexões sobre a história de nosso tempo” (citado por SANFELICE, 2004,
p.105).
Sendo assim, apesar de pesquisar a história recente (a partir da primeira LDB até a
implantação da progressão continuada no Estado de São Paulo em 1998 e anos posteriores a ela)
estaremos refletindo sobre questões de nosso tempo sem perder de vista a objetividade necessária
para a análise das fontes a serem utilizadas.
Além da bibliografia pertinente ao tema pesquisado e dos documentos oficiais
representados pelos informes, livros e legislação, analisamos os periódicos científicos mais
conceituados do país, na área da Educação, como a Revista Brasileira de Educação, Educação e
Sociedade, Educação e Pesquisa, pois, segundo Barros (2005):
Embora uma bibliografia alicerçada em bons livros seja fundamental é preciso também
estar atento para o fato de que as grandes polêmicas do momento e as últimas
descobertas não chegam aos livros com a mesma velocidade com que chegam aos
periódicos especializados (p.59).
19
De acordo com o autor, os livros demoram mais tempo para serem produzidos enquanto
os periódicos são produzidos em períodos mais curtos de tempo, representando uma “atualização
do conhecimento permanente” (p.36). Além disso,
Em uma rede de artigos, produzidos sobre determinada temática, podemos captar
precisamente o debate que se estabelece entre os vários autores, pois freqüentemente os
artigos inseridos nos periódicos especializados possuem um alto teor de crítica em
relação às obras consolidadas e também em relação a outros artigos que vão sendo
produzidos. Manter-se a par dos debates que se inserem nos periódicos é manter-se
inserido em um intercâmbio dinâmico de idéias (BARROS, 2005, p.59).
A utilização dos periódicos, portanto, se faz necessária para o diálogo com autores que
se referem à avaliação e à progressão continuada e também para podermos analisar os diálogos
travados entre os autores e suas divergências e convergências no “intercâmbio dinâmico de
idéias” representado pelos artigos dos periódicos.
Além dos periódicos foram utilizadas teses e dissertações que constituem um
conhecimento atualizado. Para Barros (2005),
Estabelecer um diálogo com as teses que se desenvolveram em torno de temáticas afins
com o trabalho que se pretende realizar é não apenas trazer novos elementos para o
debate, mas potencializar a intertextualidade que será construída pelo pesquisador com
a incorporação das “revisões bibliográficas” que cada uma das teses traz consigo
(p.61).
Sendo assim, a leitura das dissertações e teses representa uma atualização necessária do
conhecimento sobre o tema a ser pesquisado além de auxiliar na elaboração da revisão
bibliográfica.
É, portanto, uma pesquisa bibliográfica, pois se caracteriza “pela identificação e análise
dos dados escritos em livros, artigos de revistas, dentre outros” conforme cita Gonsalves (2003,
p.34) para que possamos conhecer a respeito do que já foi produzido sobre o tema de pesquisa.
Finalizando, segundo a natureza dos dados, é uma pesquisa qualitativa, pois, ainda
segundo Gonsalves (2003), “preocupa-se com a compreensão, com a interpretação do fenômeno,
considerando o significado que os outros dão às suas práticas [...]” (p.68).
20
Não se pode esquecer, no entanto, que, para que haja um entendimento amplo sobre o
problema da pesquisa, não deve como pode ser utilizado um dado quantitativo conforme
também destaca Gonsalves (2003). Por isso, no trabalho, utilizaremos tabelas com índices de
reprovação, evasão e de distorção idade/série para ilustrarmos a situação dos alunos nas escolas
públicas paulistas.
Para analisarmos a avaliação e os assuntos a ela associados como currículo, ciclos,
progressão continuada e políticas públicas, alguns autores se tornaram relevantes e tiveram
destaque para que os objetivos determinados fossem atingidos. Sendo assim, ressaltamos que,
para a construção da metodologia, foram utilizados Gil (1999) e Gonsalves (2003) que auxiliaram
na determinação do tipo de pesquisa que seria realizada. Como esta se constitui numa pesquisa
histórica da avaliação paulista abrangendo os anos de 1961 até 1998, os estudos de Lopes e
Galvão (2001), Sanfelice (2004) e Barros (2005) foram muito importantes, uma vez que retomam
relevantes questões acerca da utilização dos documentos essenciais para o desvendamento do
passado não muito distante. Sanfelice (2004), inclusive, alerta quanto às dificuldades de se
pesquisar a “história do presente” e manter a objetividade necessária.
Para o entendimento da avaliação foram utilizados os seguintes trabalhos: Sousa (1990),
que analisa as concepções de avaliação de 1930 até 1980, contribuindo imensamente para a nossa
reflexão, pois abrange boa parte do período delimitado para a pesquisa (1961/1998). Por meio
dos textos de Demo (1997, 2002 e 2005) pudemos entender a concepção de avaliação de acordo
com a atual LDB, Lei 9.394/96, assim como os problemas que devem ser enfrentados pelos
professores que buscam mudanças significativas em sua prática para favorecer a aprendizagem de
seus alunos. Com Capelletti e Abramovicz (2004) analisamos a avaliação enquanto reflexão
sobre a ação, compreendendo-a “não do como fazer, mas do por que, sem perder de vista o
para quem. Em outras palavras, é necessário entender o que está por trás da avaliação que se
pretende e a quem ela serve” (p. 78, grifos da autora).
Para a periodização da pesquisa ressaltamos Saviani (2004b) do qual utilizamos a sua
classificação da escola pública no Brasil na etapa que ele denomina de “história da escola pública
propriamente dita” que corresponde aos 3 períodos: de 1890 até 1931 (com a implantação dos
grupos escolares até a Reforma Francisco de Campos), 1931 até 1961 (da reforma Francisco de
Campos à Reforma Capanema e a promulgação da LDB, Lei 4.024/71, e o último, de 1961
até 1996, com a promulgação da nova LDB, Lei9.394/96. Para o presente trabalho analisamos
21
o período que abrange os anos de 1961 até 1996, avançando até 1998, ano da implantação da
progressão continuada, no estado de São Paulo. Quando do estudo das experiências de ensino
não-seriado no Brasil, a periodização utilizada foi a de Jacomini (2004) para uma breve
retrospectiva histórica: décadas de 1920, de 1950, após a Lei 5.692/71 e a partir da nova LDB,
Lei 9.394/96. A contribuição foi valiosa, pois a análise realizada por Jacomini (2004) engloba
a legislação das épocas assinaladas assim como as experiências de regime não-seriado que,
juntamente com Fernandes (2000), nos apoiaram para a discussão sobre “promoção automática” e
“progressão continuada”.
Após a delimitação do período abrangido destacamos que foram os autores Perez (2000)
e Ghiraldelli Jr (2003) que alicerçaram na contextualização histórica da época analisada. Com a
contribuição de Perez (2000) analisamos historicamente as gestões dos governadores paulistas,
especialmente a de André Franco Montoro (1983/1987) e a de Orestes Quércia (1987/1991).
Ghiraldelli Jr. (2003) foi essencial no estudo da Lei Federal 5.692/71 e o contexto de sua
formulação.
Quanto ao currículo, destacamos Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998) e Gimeno
Sacristán (2000), que auxiliaram na conceituação de currículo e na sua classificação em:
prescrito, apresentado, moldado, em ação, realizado e avaliado. Como já observamos,
anteriormente, nesta pesquisa foram enfatizados o currículo prescrito e o currículo avaliado para
a compreensão acerca das orientações oficiais e de como são transmitidas e se refletem na
avaliação. Com Silva (2004) e Zotti (2004) analisamos as teorias de currículo e as influências
estrangeiras no Brasil. O presente trabalho se apoiou em Zotti (2004) para a retrospectiva
histórica do currículo prescrito no Brasil.
Para as políticas públicas em tempos de neoliberalismo e globalização deram-nos
suporte Freitas (2003), Gentili (1998) e Shiroma, Evangelista e Moraes (2002) relacionando a
inserção do Brasil ao neoliberalismo e às políticas públicas formuladas, incluindo as educacionais
que suscitaram mudanças como os ciclos e a progressão continuada cuja investigação foi
amparada por Freitas (2003), Jacomini (2004), Barretto e Mitrullis (2003) e Dias (2005).
E, finalmente, os documentos analisados foram aqueles que foram divulgados pela
SEE/SP, a legislação federal (LDBs Lei 4.024/61 e Lei 9.394/96 e lei federal 5.692/71) e
a legislação estadual.
22
Quanto aos documentos da SEE/SP percebemos que foi através deles que ela se
comunicou com os profissionais da educação transmitindo orientações, que foram enviadas para
as escolas no início de 1998, visto que a implantação da progressão continuada não contou com a
participação dos docentes. Além de não propiciarem debates mais amplos eles também não
apresentaram “uma proposta de reorientação curricular que busque reorganizar o tempo e o
espaço na escola” (SOUSA, STEINVASCHER, ALAVARSE & ARCAS, 2007, p.41) o que é
necessário quando se trata da implantação de ciclos. No documento publicado pela SEE/SP em
2000, A Construção da Proposta Pedagógica: A Escola de Cara Nova, é possível perceber que
não foram suficientes as orientações nele contidas para garantir as alterações necessárias na
organização escolar, apesar da existência de inúmeros textos informativos sobre a progressão
continuada, avaliação e qualidade de ensino. Sousa, Steinvascher, Alavarse e Arcas (2007) citam
os motivos que explicam o porquê das estratégias e os subsídios da SEE/SP não conseguirem o
êxito pretendido:
As estratégias e os subsídios criados pela SEE, não se mostraram suficientes para
garantir as alterações necessárias na organização escolar. Apesar da importância de
algumas medidas, limites estruturais acabaram por comprometê-las, como, por
exemplo, a instituição do Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), com
apenas duas horas semanais e com a dificuldade de definir um horário comum entre os
professores por trabalharem em mais de uma escola. Outro exemplo foi a falta de
recursos humanos para a realização de projetos de reforço e recuperação. A manutenção
de uma concepção de ensino fragmentado, também limitou o potencial destes projetos,
resumindo-os a “mais aulas”, sendo por vezes (...) utilizados como “castigo para os
alunos que não cumprem as regras” (SOUSA, STEINVASCHER, ALAVARSE &
ARCAS, 2007, p.42).
Enfim, as mudanças não ocorrem simplesmente porque são elaboradas orientações,
subsídios e leis pelo governo. Considerando ainda a legislação, notamos que a avaliação esteve
restrita ao âmbito escolar na LDB (Lei 4.024/61) e na lei federal 5.692/71, mas não na atual
LDB (Lei 9.394/96) que prevê (artigo 8º, parágrafo 2º, inciso VI): “Assegurar processo
nacional de avaliação de rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em
colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da
qualidade do ensino” (BRASIL, 1996).
Constatamos, portanto, a existência da avaliação externa além da que é realizada pelo
professor a partir da atual LDB. Além disso, na LDB de 1961, falava-se em “apuração do
rendimento escolar” (artigo 39), mas na lei federal 5.692/71 surge a ênfase na avaliação em que
23
“preponderarão os aspectos qualitativos sobre os quantitativos e os resultados obtidos durante o
ano letivo sobre os da prova final, caso seja exigida” (artigo 14). para a LDB de 1996 (art. 24,
inciso V) a “verificação do rendimento escolar” observou os seguintes critérios:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos
aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre
os de eventuais provas finais;
b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar;
c) possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado;
d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período
letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas
instituições de ensino em seus regimentos (BRASIL, 1996).
Previa-se, portanto, além da avaliação contínua, a reclassificação de alunos com
defasagem idade/série, aceleração de estudos e recuperação paralela. Mas não consultamos
somente a legislação referente à avaliação, mas também o que foi disposto sobre currículo, ciclos
e progressão continuada.
Assim, no Capítulo 1, intitulado “Contexto sócio-econômico, político e histórico do
Brasil e a educação (o período 1961- 1998)”, abordamos o contexto histórico do Brasil tendo em
vista focalizar o estado de São Paulo e suas recentes transformações na educação.
No Capítulo 2, “O Currículo e a Avaliação”, analisamos as teorias de currículo, os seus
significados e os tipos de currículo segundo Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998), com ênfase
nos currículos prescrito e avaliado, para o estabelecimento de vínculos entre o currículo e a
avaliação no processo da história educacional, relacionando a educação brasileira e a paulista.
No Capítulo 3, “A avaliação mediante as mudanças internas no sistema educacional”, o
destaque é para a análise da avaliação de acordo com a legislação e o contexto histórico,
enfatizando-se a Nova LDB (Lei nº 9.394/96) e o seu sentido de avaliação.
Finalmente, no Capítulo 4, “Progressão continuada ou promoção automática?”,
trazemos as discussões referentes aos ciclos no Brasil, destacando especialmente as décadas de
1950 e 1990, e o contexto histórico e político do Brasil nesses períodos para a compreensão das
discussões acerca desse tema.
24
2. O CONTEXTO SÓCIO-ECONÔMICO, POLÍTICO E HISTÓRICO DO BRASIL E A
EDUCAÇÃO (O PERÍODO 1961- 1998)
2.1. DEMARCANDO O TEMPO HISTÓRICO: A PERIODIZAÇÃO
Para periodizar a história da escola pública no Brasil, Saviani (2004b, p.20-21) a
classifica em duas grandes etapas: “os antecedentes” e a “história da escola pública propriamente
dita”.
A primeira etapa corresponde ao período de 1549 até 1890 e a segunda etapa ao período
de 1890 até 1996. Na primeira etapa (1549/1890), o autor destaca a pedagogia jesuítica e as aulas
régias que foram estabelecidas durante o governo pombalino (na época em que o Brasil ainda era
colônia portuguesa) e inclui, também, as primeiras tentativas de organização da educação sob a
responsabilidade do poder público (no período imperial-1822/1889).
A segunda etapa é subdividida em 3 períodos: de 1890 até 1931 (com a implantação dos
grupos escolares até a Reforma Francisco Campos que regulamentou o sistema de ensino em
âmbito nacional), 1931 até 1961 (iniciado com a reforma Francisco Campos, destacando-se
depois a Reforma Capanema e a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei 4.024/61) e o último, de 1961 até 1996 (da primeira LDB de 1961 até a
aprovação da nova LDB, Lei nº 9.394/96).
Para esta pesquisa, analisamos a segunda etapa, em especial o período de 1961/1996,
que corresponde ao surgimento da primeira LDB (Lei 4.024/61), da Lei Federal 5.692/71,
até a última LDB (Lei 9.394/96). E, a partir da nova LDB, avançamos até 1998 (ano da
implantação da progressão continuada) analisando, também, os anos posteriores a sua
implementação no estado de São Paulo.
Observamos, também, nesse período a legislação estadual, especialmente a partir da
década de 1980 (tendo em vista a avaliação como temática a ser pesquisada) até a implantação do
regime de progressão continuada (formado, como dissemos, por 2 ciclos não podendo haver
reprovação do aluno, exceto se tiver freqüência inferior a 75% e no final de cada ciclo).
25
2.2. O BRASIL DE 1961 ATÉ 1998
Em 1961 o Brasil era governado por Jânio da Silva Quadros, que assumiu a presidência
em janeiro do mesmo ano herdando problemas, como alto índice de inflação e crescente dívida
externa, do governo anterior, de Juscelino Kubitschek de Oliveira, que presidiu o País de 1956 a
1961. Para solucionar esses problemas o governo adotou uma política antiinflacionária
caracterizada pela redução do crédito estatal aos empresários, pelo fim da ajuda financeira do
governo à importação do trigo e do petróleo e pelo congelamento dos salários. Zotti (2004)
descreve que:
O início dos anos de 1960 foi marcado por uma crise política e econômica grave,
configurando um quadro problemático para as elites brasileiras. JK [Juscelino
Kubitschek] deixa como herança ao seu sucessor, Jânio Quadros, uma inflação alta,
déficit na balança de pagamentos, acúmulo de dívida externa e a continuidade de um
sistema educacional elitista e antidemocrático. Nesse contexto, o governo de Jânio
Quadros cria uma política antiinflacionária, restringindo créditos, congelando os
salários e incentivando as exportações, o que resultou em forte oposição. Adota uma
política externa independente dos Estados Unidos, define relações mais intensas com os
países socialistas, procurando aumentar o mercado consumidor dos nossos produtos,
gerando, com isso, o acirramento da oposição e pressão ao seu governo, que culminará
com sua renúncia sete meses depois (ZOTTI, 2004, p.98-99).
A pretendida estabilidade da economia não foi alcançada e a oposição ao governo partia
de vários lugares, especialmente da burguesia nacional e dos Estados Unidos da América, não
satisfeito com a aproximação do Brasil com os países socialistas, em meio à Guerra Fria. Em
razão disto, Jânio Quadros renunciou à presidência em 25 de agosto de 1961, fato que tornou
mais aguda a crise econômica, contribuindo para o aumento da instabilidade política no País.
O sucessor João Goulart “assume o governo e adota a proposta de manter o modelo
econômico político (nacional-desenvolvimentista) e mudar a orientação econômica, através de
reformas de base, com uma bandeira nacionalista de desenvolvimento” (ZOTTI, 2004, p.99).
Essas reformas seriam: agrária, do sistema tributário, do sistema bancário, do sistema eleitoral e a
universitária, todas com a intenção de oferecer um desenvolvimento econômico com melhores
condições de vida à população brasileira. Jango, como era chamado, tinha o apoio da população
26
que queria a aprovação das reformas de base, o que acirrou a luta de classes e a ampliação da
participação política com a organização dos trabalhadores urbanos e rurais (ZOTTI, 2004, p.100).
Na área educacional houve significativas mudanças no período governado por João
Goulart (1961-1964) como o aumento de investimentos:
A educação, entre 1961 e 1964, teve seu investimento aumentado em 5,93% e em 1962,
de acordo com a LDB 4.024/61, o governo lança o Plano Nacional de Educação
(PNE), que determina o investimento de, no mínimo, 12 % dos recursos de impostos
arrecadados pelo governo federal. Tal plano contém metas qualitativas e quantitativas,
com o compromisso de atingi-las em oito anos (ZOTTI, 2004, p.100).
A elite brasileira, temendo a aprovação das reformas de base, o crescimento dos
movimentos sociais e da participação maciça da população em comícios, “agilizou a tomada de
poder, que se consolida com o Golpe de 1964” (ZOTTI, 2004, p.101). Desta maneira, o governo
de João Goulart, também não conseguiu, promover o crescimento econômico devido à falta de
investimentos externos, à falta de ajuda financeira dos Estados Unidos, às constantes emissões de
dinheiro, às lutas trabalhistas, à forte oposição de grande parcela da burguesia e à falta de apoio
nacional para as reformas que o governo queria empreender. Devido à crise econômica, havia
problemas com os salários e, por mais que houvesse reajustes, o aumento salarial era corroído
pela inflação e o poder aquisitivo da classe trabalhadora se reduzia cada vez mais. O governo não
conseguiu, também, a aprovação das reformas de base devido ao golpe que instaurou a ditadura
militar em 1964. O PNE foi extinto 14 dias depois do Golpe Militar.
Durante o governo de Jango, a primeira LDB (Lei 4.024/61) foi aprovada após 13
anos tramitando no Congresso Nacional. Quando se iniciaram as discussões para a sua
elaboração, em 1947, o Brasil ainda era pouco urbanizado. Portanto, quando a LDB foi aprovada,
ela não era adequada às necessidades educacionais de sua época, pois o Brasil havia mudado
muito.
Em 31 de março de 1964, o golpe militar que retirou João Goulart do poder, instaurou a
ditadura que terminou em 1985, ocasionando mudanças e retrocessos que atingiram todos os
setores da vida brasileira, entre os quais o da educação. Segundo Zotti (2004),
A nova Constituição (1967), no campo da educação, reforça o que a LDB de 1961
havia estabelecido e antecipa aspectos que nortearão as reformas posteriores. Assegura
o fortalecimento do ensino particular, garantindo-lhe “ajuda técnica e financeira do
27
governo, inclusive bolsas de estudo” (art.168). Promove o prolongamento da
obrigatoriedade do ensino primário de quatro para oito anos, gratuito e ministrado pela
rede oficial de ensino (art. 168) (ZOTTI, 2004, p.143).
Para equacionar problemas de demanda de vagas nas escolas, o governo militar
modificou a estrutura do ensino. Foi elaborada a Lei Federal 5.692/71 que definiu a estrutura
de ensino em grau (da a séries), grau (Colegial em 3 anos) e Superior. E, apesar do
discurso de que a educação seria valorizada, as verbas destinadas eram escassas e o Estado
“buscava ampliar e consolidar sua posição, mascarando as desigualdades, através da
demonstração de “interesse” pelo ensino de e graus, no intuito de “melhorar” as condições
de vida do povo” (ZOTTI, 2004, p.164).
A Lei 5.692/71 surgiu de um projeto de um grupo de intelectuais do regime militar e
foi muito bem recebida tanto pelos parlamentares da Arena (Aliança Renovadora Nacional,
partido da situação) como pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro, partido de oposição),
pois o momento histórico era uma mistura de medo e euforia. Medo devido à repressão exercida
pelo regime militar, mas euforia pelo “milagre econômico” vivenciado por parte do país. O
período de 1969 a 1973, no Brasil, ficou conhecido como a época do “Milagre Econômico”. O
PIB brasileiro crescia a uma taxa de quase 12% ao ano, enquanto a inflação beirava os 18%. Com
investimentos internos e empréstimos do exterior, o país avançou e estruturou uma base de infra-
estrutura. Todos estes investimentos geraram milhões de empregos pelo país. Porém, todo esse
crescimento teve um custo altíssimo e a conta acabaria por ser paga no futuro. Os empréstimos
estrangeiros geraram uma dívida externa elevada para os padrões econômicos do Brasil. E houve,
também, a concentração de riqueza e aumento da pobreza. Nesse sentido, o “milagre” não
ocorreu para todos os brasileiros, pois os ricos ficaram mais ricos e os pobres, mais pobres.
O povo - entendido como maioria da população - não era uma prioridade do governo
militar e podemos perceber isso analisando uma das mudanças mais significativas, em relação à
legislação anterior, que foi a extensão da escolaridade obrigatória de quatro para oito anos.
Poderíamos pensar que o governo estaria atendendo às camadas populares ao determinar o
aumento da escolaridade. O discurso do governo era de que o Estado pretendia melhorar as
condições de vida do povo, dando-lhe igualdade de oportunidades. Mas, como dissemos, se
mascaravam as desigualdades, pois, ao mesmo tempo que as verbas para as escolas públicas eram
escassas, o governo aplicava grande quantidade de recursos no setor educacional privado, o que
28
levou Zotti (2004, p.143) a concluir: “o Estado adota o discurso de valorização da educação
escolar, mas permanece nele”.
A inserção das disciplinas do artigo
3
no currículo foi calcada na ideologia da
segurança nacional e, apesar da propalada democratização do ensino, excluía-se a liberdade de
participação. Assim, para manter o jovem afastado de “atividades perigosas”, como as de
contestação ao próprio regime, dava-se ênfase às seguintes disciplinas:
A educação física, numa concepção militarista, estava atrelada ao objetivo de
disciplinar, formatar e trabalhar o corpo, desvinculado do pensar e do contexto em que
o indivíduo se insere. A EMC, juntamente com a educação religiosa, cumpria um papel
importantíssimo na reprodução de valores subjacentes aos interesses dos militares e da
classe dominante (ZOTTI, 2004, p.171).
O objetivo central da educação era o de atender às necessidades do mercado de trabalho,
por isso o currículo enfatizava o ensino tecnicista e profissionalizante desde as primeiras séries
do grau. Mas, se a educação era um braço do capital, isto não se referia a todos os alunos de
todas as classes sociais e sim, apenas aos filhos de pais das classes trabalhadoras. Sendo assim,
enquanto a educação pública priorizava o ensino profissionalizante para os filhos da classe
trabalhadora, os filhos da elite se preparavam para prosseguirem os estudos, no ensino médio,
preparatório para o vestibular e posteriormente, no ensino superior.
Com o término da ditadura militar, em 1985, teve início a Nova República, com o
presidente José Sarney (1985/1989), e no tocante à educação foi criado o plano “Educação para
todos”, mas “continua a ambigüidade demonstrada no Governo do general Figueiredo [o seu
antecessor], um discurso e uma prática” (ZOTTI, 2004, p.199).
A Nova República não foi tão nova assim, continuou reforçando práticas e propostas do
auge da ditadura militar. Com isso, percebemos a continuidade de propostas
conservadoras e descomprometidas com uma educação de qualidade e emancipatória. O
caráter utilitarista e técnico, agregado à educação, continuou sobrepondo os interesses
dominantes (ZOTTI, 2004, p.227).
No campo político, os fatos mais significativos foram a elaboração de uma constituição
democrática pela Assembléia Nacional Constituinte e a eleição direta do presidente da República,
em 1989. Nas eleições de 1986 foram eleitos os deputados federais e senadores que tiveram a
3
As disciplinas do artigo eram a Educação Moral e Cívica (EMC), Educação Física, Educação Artística,
Programas de Saúde e Ensino Religioso.
29
incumbência de elaborarem a nova Constituição. Uma nova constituição era necessária para o
momento político de redemocratização, após tantos anos de ditadura militar, e a Assembléia
Nacional Constituinte foi instalada em de fevereiro de 1987 sendo promulgada a Constituição
em 5 de outubro de 1988.
Em relação à educação, a nova Constituição estabeleceu, do artigo 205 até o artigo 214,
entre outras coisas, que ela é “direito de todos e dever do Estado e da família (...) visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação
para o trabalho” (art. 205), “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”
(inciso I do art. 206), “ensino fundamental obrigatório e gratuito” (inciso I do art. 208) (BRASIL,
2005, p.148). Estabeleceu, também, em seu artigo 214 que a União seria responsável pela
elaboração do Plano Nacional de Educação que viria a ser aprovado com a lei federal
10.172 de 9 de junho de 2001 (BRASIL, 2001).
No campo econômico, o governo adotou uma medida de impacto quando implantou o
Plano de Estabilização Econômica, conhecido como Plano Cruzado, em 1986, com a substituição
da moeda (de cruzeiro para cruzado), e com o congelamento de preços dos produtos por um ano.
No entanto, as mercadorias começaram a faltar, os empresários, a fazer modificações em seus
produtos para elevarem os preços, os fazendeiros se negavam a vender os bois pelo preço da
tabela, o valor dos aluguéis novos aumentou demasiadamente e a cobrança do ágio, cobrança
além da tabela estabelecida, tornou-se prática comum. No final de 1986 a inflação voltou a subir.
O governo tentou mais um plano econômico em 1989, o Plano Verão, mas ele também não deu
resultado e no fim do governo Sarney, a inflação era de mais de 70% ao mês.
Mas a crise econômica pela qual passou o Brasil nos anos de 1980 também aconteceu
em outros países, como a Inglaterra. No governo de Margareth Thatcher a tentativa de superação
da crise econômica foi através da implantação do neoliberalismo. Shiroma, Moraes e Evangelista
(2002), comentam que o neoliberalismo na Inglaterra trouxe prejuízos à sociedade britânica, que
estava em uma situação melhor que a brasileira devido aos níveis educacional, tecnológico,
cultural e de bem-estar social mais elevados. Os antigos ideais socialistas ou progressistas
passaram a ser considerados utopias naquele país tanto quanto começou a acontecer no Brasil,
pois os arautos das mudanças diziam ser o Estado incapaz de resolver os problemas da vida
econômica, como por exemplo, a concorrência, as forças de mercado e o desemprego estrutural.
30
O Estado Mínimo” substituiria o Estado do Bem-Estar Social, que seria considerado
incapaz de proporcionar tudo o que fosse necessário para a população. Surgiu a idéia de que não
adiantaria resistir às mudanças e que o modelo neoliberal resolveria os problemas que
atravancavam o sistema capitalista, inclusive a crise na educação.
De acordo com Gentili (1998), na perspectiva neoliberal, a crise enfrentada pelos
sistemas educacionais da América Latina acontece porque a expansão quantitativa (em relação ao
número de alunos matriculados) não foi acompanhada pelo crescimento qualitativo. Na visão
neoliberal, portanto, o Estado não seria competente para gerenciar a educação, por isso faltaria
eficiência e qualidade. Segundo o autor, para o neoliberalismo, em todas as políticas sociais estão
presentes as seguintes idéias:
a) os governos não apenas foram incapazes de assegurar qualidade e quantidade, como
ainda, eles são estruturalmente inaptos para combinar essas duas dinâmicas; b) a
expansão dos serviços educacionais é um objetivo conquistado por quase todos os
países da América Latina, sendo os índices de exclusão e de marginalidade educacional
uma expressão clara da falta de eficiência do sistema e não de sua escassa
universalização; c) a possibilidade de combinar qualidade e quantidade com critérios
igualitários e universais é uma falsa promessa dos estados interventores e populistas
(GENTILI, 1998, p.17-18).
Sendo assim, para o pensamento neoliberal, a crise educacional ocorre porque o Estado
“interventor” é o principal culpado, pois não tem condições de cumprir a promessa de escola de
qualidade para todos os alunos. Mas não é somente ao Estado que é atribuída a culpa pela crise
no sistema educacional, segundo a ótica neoliberal. Os grandes sindicatos de trabalhadores e
trabalhadoras da educação ao exigirem a expansão da escola pública, mais recursos a serem
aplicados nas escolas, mais intervenção estatal etc., também contribuem para a crise.
A sociedade, por sua vez, também é “grande culpada”, pois, segundo o neoliberalismo,
ela deposita confiança nas falsas promessas dos governos interventores e populistas em relação à
necessidade de escola pública, gratuita e de qualidade.
Portanto, a culpada nunca é a injusta distribuição de renda que, no sistema capitalista, é
responsável pela exclusão social da maioria das pessoas em detrimento do acúmulo de riquezas
de poucos. A idéia propagada é a de que os excluídos não se esforçam para conseguirem as
condições necessárias para sobreviverem e não é o Estado que deve melhorar a qualidade da
31
escola, pois esta tarefa depende muito mais de empenho e esforço individual dos professores, dos
alunos e de suas famílias.
Na visão neoliberal, segundo Gentili (1998),
[...] a escola funciona mal porque as pessoas não reconhecem o valor do conhecimento
e investem pouco em seu “capital humano”: os professores trabalham mal e não se
atualizam; os alunos fazem de conta que estudam quando, em realidade, perdem tempo,
etc. A sociedade não apenas sofre a crise da educação. Ela também a produz e reproduz
(p.22).
As escolhas individuais no neoliberalismo, portanto, é que determinarão o sucesso ou o
fracasso das pessoas e a educação deve ser pensada como “capital humano” individual e não
como responsabilidade do Estado, que se mostrou incapaz de realizar a contento esta função.
Para solucionar a crise da educação o neoliberalismo propõe uma reforma em que se enfatiza, ao
mesmo tempo, a centralização e a descentralização:
Em suma, a saída que o neoliberalismo encontra para a crise educacional é produto da
combinação de uma dupla lógica centralizadora e descentralizadora: a centralização do
controle pedagógico (em nível curricular, de avaliação do sistema e de formação de
docentes) e descentralização dos mecanismos de financiamento e gestão do sistema
(GENTILI, 1998, p.25).
Para Gentili (1998), portanto, o governo federal centraliza o currículo, que é
determinado em nível nacional, assim como os programas de capacitação de professores e a
avaliação (por meio da aplicação de provas de rendimento escolar aos estudantes). E
descentraliza as responsabilidades e as verbas que são transferidas do governo federal para o
provincial (ou estadual, no caso brasileiro) e deste para os municípios.
No Brasil, o neoliberalismo começou a ser implantado no governo de Fernando Collor
de Melo (1990/1992), que se elegeu em 1989 nas primeiras eleições diretas após a ditadura
militar. O presidente Collor, copiando o modelo do governo da Primeira-Ministra britânica
Margareth Thatcher, pretendia inserir o país na economia mundial. Para ajustar a economia
brasileira às exigências da economia globalizada, Fernando Collor fez a abertura do mercado
brasileiro aos produtos internacionais prematuramente, pois os produtos nacionais, em muitos
setores, não conseguiram concorrer com os produtos estrangeiros dentro do país.
Porém, foi no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995/1999 e 1999/2003) que as
políticas públicas foram implementadas baseando-se em documentos de importantes organismos
32
multilaterais como o Banco Mundial (BM), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BDI), por meio dos quais são realizados os processos de
ajuste e reestruturação neoliberal nos países latino-americanos. Pressões destes organismos
internacionais levaram a uma drástica redução de gastos nas políticas sociais enquanto se acena
com a possibilidade de renegociação da dívida externa e de novos empréstimos, desde que se
limite a intervenção dos governos, ou seja, o Estado Mínimo.
As políticas econômicas e educacionais (e nelas as diretrizes avaliativas) começaram a
serem implantadas pelo governo brasileiro para fazer os ajustes necessários para a inserção do
país no mundo globalizado. A globalização é explicada, por Libâneo, Toschi e Oliveira (2003),
“como o processo de aceleração, integração e reestruturação capitalista [...] pode ser entendida
como uma estratégia de enfrentamento da crise do capitalismo e de constituição de uma nova
ordem mundial” (p. 74). Dessa forma, a globalização (ou mundialização do capital) acontece em
função do capitalismo necessitar reorganizar suas formas de produção e de consumo, integrando
mundialmente a economia para manter a sua hegemonia.
As mudanças ocorrem com o objetivo de fortalecer o capitalismo, ou melhor, “fortalecer
as nações ricas e submeter os países mais pobres à dependência como consumidores
(LIBÂNEO, TOSCHI & OLIVEIRA, 2003, p.53). Os países ricos, em especial os integrantes do
grupo dos sete países mais ricos e poderosos do mundo pretendem, portanto, desenvolver cada
vez mais suas economias submetendo os países mais pobres. Assim, A globalização se relaciona
com o neoliberalismo, ao estabelecer princípios que se baseiam na liberdade econômica, na não-
intervenção do Estado e na abertura de mercados.
Os países do G-7
4
têm conseguindo, segundo Libâneo, Toschi e Oliveira (2003),
“implementar as políticas neoliberais nos países terceiro-mundistas e disseminar a visão de
mundo neoliberal, isto é, de uma sociedade regida pelo livre mercado” (p. 83). Com o
neoliberalismo o Estado é mínimo, ou seja, um Estado que cumpre com apenas três funções:
policiamento, justiça e defesa nacional. Por isso, os pensadores neoliberais defendem,
fundamentalmente, cortes dos gastos sociais, abertura externa, privatizações de empresas estatais,
redução das despesas e do déficit público.
Assim, o neoliberalismo defende a “[...] Liberação total do mercado e a transferência de
todas as áreas e serviços do Estado para a iniciativa privada” (LIBÂNEO, TOSCHI &
4
Os países mais ricos que formam o G.7 são: Estados Unidos, Canadá, Japão, Alemanha, Inglaterra, França e Itália.
33
OLIVEIRA, 2003, p. 100). O discurso neoliberal evidencia que a crise e o fracasso da escola
pública “ocorre como decorrência da incapacidade administrativa e financeira de o Estado gerir o
bem comum (LIBÂNEO, TOSCHI & OLIVEIRA, 2003, p. 101). Os países, então, devem
propiciar políticas educacionais que se ajustem e se alinhem à política econômica neoliberal e às
orientações dos organismos financeiros internacionais, em especial do FMI, por meio do qual o
Banco Mundial redireciona a política educacional, através de auxílio técnico e financeiro.
Como denota Cappelletti e Abramovicz (2004): “Através de ajuda técnica e financeira,
o Banco Mundial molda nosso sistema educacional no sentido de forçar nosso país ao processo
de globalização, impondo-nos assim a chamada reestruturação neoliberal, pelas políticas de
ajustes estruturais” (p.89).
Entre os documentos que exerceram importante papel na definição das políticas
públicas para a educação no país Brasil, segundo Shiroma, Moraes e Evangelista (2002, p.56),
está aquele que se originou da Conferência Mundial de Educação para Todos que se realizou em
Jomtien na Tailândia, em 1990, e foi financiada pela Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância
(Unicef), pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e pelo Banco
Mundial.
Nesta Conferência foram determinados metas e procedimentos para os países do grupo
dos nove países com maior taxa de analfabetismo do mundo: Bangladesh, Brasil, China, Egito,
Índia, Indonésia, México, Nigéria e Paquistão, que passaram a integrar o grupo do G-9. Todos os
155 países participantes da Conferência comprometeram-se a assegurar uma educação básica de
qualidade a crianças, jovens e adultos, para suprir as necessidades básicas de aprendizagem.
Para Shiroma, Moraes e Evangelista (2002) o compromisso assumido pelos países trazia
consigo alguns problemas como a expressão “para todos”, que sugeria a universalização da
educação básica (que no Brasil compreende do ensino infantil ao ensino médio) objetivo não
pretendido pela Conferência. Além disso, alguns autores compreenderam o conceito de
necessidades básicas de aprendizagem de maneira equivocada:
Isto é, para estratos diferentes, ensinos diferentes, uma vez que as necessidades básicas
de um e outro não poderiam ser as mesmas. Reeditava-se o dualismo na educação
brasileira, partindo-se do suposto de que se as necessidades das amplas camadas
empobrecidas eram peculiares, deveriam continuar tendo atendimento diverso do
demandado por clientela mais seleta (SHIROMA, MORAES & EVANGELISTA,
2002, p.61-62).
34
Sendo assim, no processo educacional continuaria o dualismo: ensinos diferentes para
diferentes classes sociais, o que não seria o ideal de “educação para todos”.
As recomendações da Conferência da Tailândia e de outros documentos dos organismos
multilaterais passaram a exercer influência nos anteprojetos da nova Lei de Diretrizes e Bases
para a Educação Nacional (que seria aprovada em 1996) e, após oito anos de debates no
Congresso Nacional, o governo impingia, por meio de decretos, resoluções e medidas
provisórias, o seu projeto educacional, articulado aos desígnios firmados em Jomtien e aos
grandes interesses internacionais” (SHIROMA, MORAES & EVANGELISTA, 2002, p.62).
Mas, para o governo federal brasileiro, a nova LDB foi aprovada após “discussões, consensos e
negociações” (BRASIL, 2001, p.13) e não através de imposições para adequar a educação
brasileira às recomendações externas. Uma das modificações da nova LDB consiste na divisão do
ensino em: infantil, fundamental (o antigo grau), médio (o antigo Grau ou Colegial) e
superior.
Percebemos, portanto, que a inserção do Brasil no mundo globalizado trouxe ajustes
econômicos que foram sentidos nas políticas públicas da educação, pois os cortes de verbas e as
privatizações estavam na pauta das mudanças que foram implantadas no país, além de serem
prescritas pelos organismos internacionais, em especial o Banco Mundial e a Unesco. Mas não
foi a LDB que resultou do processo de reformas educacionais. Em 1995 estavam em processo
de elaboração os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) que começaram a chegar nas escolas
no final de 1997, sendo que, o primeiro conjunto de documentos destinava-se às quatro séries
iniciais do ensino fundamental.
Em 1998 foram publicados os PCNs, elaborados pela Secretaria de Ensino
Fundamental, para o e ciclos do ensino (5ª a séries) e explicitaram a proposta de
reorientação curricular para os anos finais do ensino fundamental. No próprio documento
introdutório as justificativas para a elaboração dos PCNs apóiam-se na idéia de que o governo
brasileiro tinha necessidade de cumprir com os compromissos internacionais anteriormente
assumidos (Conferência de Jomtiem, 1990) e que resultaram na elaboração do Plano Decenal de
Educação para Todos (1993/2003).
Segundo Fonsêca (2001),
As bases para a elaboração dos PCN encontram-se, pois, nas diretrizes do Plano
Decenal de Educação para Todos. Estas, em consonância com a Constituição de 1998,
estabelecem "a necessidade e a obrigação de o Estado elaborar parâmetros claros no
35
campo curricular capazes de orientar as ações educativas no ensino obrigatório" (PCN–
Introd. I, p. 15; PCN–Introd. II, p. 49). Assim, de acordo com o discurso oficial, a
elaboração dos PCN responde à necessidade de atender os dispositivos legais que
determinam o estabelecimento de conteúdos mínimos para o ensino fundamental, ao
mesmo tempo em que representa uma meta de qualidade para este nível de ensino. Mais
precisamente, propõe-se que os PCN constituam uma referência para onde devem
convergir as ações do MEC, sobretudo no tocante à formulação de uma política de
formação inicial e continuada para o magistério, de uma política para o livro didático e,
ainda, em relação à criação de um sistema de avaliação nacional para o ensino
fundamental (cf. PCN–Introd. I, p. 36) (FONSÊCA, 2001, p.17).
Portanto, o governo federal tinha, segundo documento de Introdução dos PCNs, vários
propósitos: elaborar parâmetros para orientar as ações educativas, estabelecer conteúdos
mínimos, formular políticas de formação inicial e continuada para os docentes e para o livro
didático além de criar um sistema de avaliação do ensino fundamental com o intuito da qualidade
do ensino. Mas, para Fonsêca (2001),
O caráter e a abrangência desses propósitos e sua articulação com estratégias de
controle da qualidade da educação, através da criação de mecanismos de natureza
avaliativa – parecem indicar, para além da reiterada ênfase na melhoria da qualidade do
ensino, a intenção de controlar o funcionamento da escola pública, de conformidade
com os padrões estabelecidos pela lógica racionalizadora ditada pelos organismos
internacionais, que monitoram o ajuste estrutural da educação ao modelo político e
econômico vigente (FONSÊCA, 2001, p.18).
A intenção do governo é visivelmente centralizadora e homogeneizante, mas os
discursos da Introdução dos PCNs são contraditórios, pois afirmam que,
... [os PCNs] "por sua natureza aberta, configuram uma proposta flexível, a ser
concretizada nas decisões regionais e locais sobre currículos e sobre programas de
transformação da realidade educacional empreendidos pelas autoridades
governamentais, pelas escolas e pelos professores. Não configuram, portanto, um
modelo curricular homogêneo, impositivo" (BRASIL, 1998, p.13).
Assim, apesar de falar em flexibilização da proposta,
evidenciam-se os vínculos dos PCN com a ótica economicista, produtivista e
eficientista que tem orientado a política educacional brasileira, a qual, na esteira das
demais políticas sociais implementadas pelo atual governo, reveste-se de contornos
nitidamente neoliberais (FONSÊCA, 2001, p.18).
36
Barretto (2006) afirma que os PCNs, elaborados no final da década de 1990, tinham a
finalidade de facilitar o trabalho do Sistema de Avaliação do Ensino Básico (Saeb) que foi criado
no ano de 1990. A mesma autora complementa:
Segundo vários analistas, a proposição de um currículo nacional teria sido
decisivamente motivada pela necessidade de incrementar um sistema de controle da
educação nacional por parte do poder público, mediante a criação de sistema de
avaliação dessa natureza (BARRETTO, 2006, p.4-5).
Na Introdução dos PCNs, destinados ao terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental
notamos os quatro pilares de Jacques Delors explicitados nas orientações (BRASIL, 1998, p.17).
Em 1996, Jacques Delors foi coordenador da Comissão Internacional sobre Educação para o
Século XXI e elaborou um relatório em que preconizava a necessidade de uma aprendizagem ao
longo da vida e baseada em quatro pilares básicos: aprender a conhecer, aprender a fazer,
aprender a ser e aprender a viver juntos. Esse relatório assim como os PCNs influenciaram a
organização curricular paulista num primeiro momento e, mesmo quando o Conselho Estadual de
Educação (CEE) elaborou suas próprias diretrizes continuaram a influenciá-las.
A escola seria, portanto, considerada a salvação para atender às necessidades do
mercado (tal como ocorreu durante a década de 1970) para a qualificação dos trabalhadores.
Sendo assim, as pessoas seriam “cidadãs do século XXI” se estivessem sendo educadas tal
qual as políticas públicas implementadas baseando-se no que propunham documentos de
importantes organismos multilaterais para a economia e a educação de todos os países da
América Latina e do Caribe, não importando, portanto, as peculiaridades e necessidades de cada
um deles. A “receita” foi determinada para todos igualmente, que todos são considerados
países pobres, que necessitavam se ajustar à nova ordem mundial.
As mudanças que se fizeram sentir na Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9.394/96)
também se refletiram no Plano Nacional de Educação (aprovado em 9 de janeiro de 2001). Este
foi determinado pelo artigo 214 da Constituição de 1988 e pelos artigos 9 e 87 da LDB
9.394/96. No artigo 214 da Constituição Federal consta que,
A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração plurianual, visando à
articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis e à integração das
ações do Poder Público que conduzam à:
I- erradicação do analfabetismo,
37
II- universalização do atendimento escolar,
III- melhoria da qualidade de ensino,
IV- formação para o trabalho,
V- promoção humanística, científica e tecnológica do país (BRASIL, 2005, p.151).
Além da Constituição Federal de 1988 e da nova LDB de 1996, outros documentos
foram utilizados, como,
o Plano Decenal de Educação para Todos, preparado de acordo com as recomendações
da reunião organizada pela Unesco e realizada em Jomtien (1990), de documentos
resultantes de ampla mobilização regional e nacional que foram apresentados pelo
Brasil nas conferências da Unesco, subsídios importantes para a preparação do
documento (BRASIL, 2001, p.34).
Com a Constituição Federal de 1988, “ressurgiu a idéia de que um plano nacional de
longo prazo, com força de lei, capaz de conferir estabilidade às iniciativas governamentais na
área de educação. O artigo 214 contempla esta obrigatoriedade” (BRASIL, 2001, p.33). Também
na LDB, Lei 9.393/96, nos artigos 9 e 87 determinou-se que “cabe à União a elaboração do
Plano, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios” (BRASIL, 2001,
p.34).
Nota-se a iniciativa de se aprovar um Plano Nacional de Educação, visto que o primeiro
Plano aprovado após a primeira LDB (Lei 4.024/61) “não tinha força de lei e foi várias vezes
modificado durante a ditadura militar (GHIRALDELLI JR., 2003, p.248). Seus objetivos
contemplavam todos os níveis de ensino para solucionar os problemas quanto ao analfabetismo,
universalização do atendimento escolar com qualidade de ensino, além de proporcionar um
ensino propedêutico e com formação para o trabalho.
no artigo da Nova LDB, foi determinado que a União deveria ser responsável por:
“I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios” (BRASIL, 1996).
No artigo 87, da mesma LDB, em seu parágrafo primeiro, destaca-se que,
A União, com prazo de 1 ano a partir da publicação desta lei, encaminhará ao
Congresso Nacional,o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os 10
anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para todos
(BRASIL, 1996).
38
Em 10 de fevereiro de 1998 várias entidades ligadas à educação deram entrada na
Câmara dos Deputados ao Plano Nacional de Educação da Sociedade Brasileira (denominado
assim por VALENTE & ROMANO, 2002) que “consubstanciou-se no Projeto de Lei
4.155/98, encabeçado pelo deputado Ivan Valente e subscrito por mais de 70 parlamentares e
todos os líderes dos partidos de oposição da Câmara dos Deputados” (VALENTE & ROMANO,
2002, p.97). O governo de Fernando Henrique Cardoso (1995/1998 e 1999/2002), também
apresentou o seu plano elaborado pelo MEC, encaminhando-o à Câmara dos Deputados em 11 de
fevereiro de 1998, onde tramitaria, sob o nº 4.173/98.
Saviani (2004c) comenta sobre o PNE:
Pelo disposto na nova LDB (Lei 9.394/96), o MEC deveria tê-lo encaminhado ao
Congresso nacional até 23 de dezembro de 1997. Isso, contudo, não ocorreu. Em
conseqüência, a Oposição acabou se antecipando ao próprio MEC protocolando no dia
10 de fevereiro de 1998, através do deputado Ivan Valente (PT/SP), no Congresso
Nacional, a sua proposta de Plano Nacional de Educação. Trata-se do texto resultante
do II Congresso Nacional de Educação realizado de 6 a 9 de novembro de 1997 em
Belo Horizonte. Dois dias depois, aos 12 de fevereiro, através de mensagem
Presidencial acompanhada de exposição de Motivos do Ministro da Educação, deu
entrada no Congresso o projeto de lei tendo anexo a proposta do MEC para o Plano
Nacional de Educação (SAVIANI, 2004c, p.158-159).
As duas propostas de PNE - a apresentada pela oposição e a apresentada pelo governo -
eram bastante diferentes e conflitantes, pois expressavam perspectivas diferenciadas para a
educação brasileira. Segundo Valente e Romano (2002),
O PNE reivindicava o fortalecimento da escola pública estatal e a plena democratização
da gestão educacional, como eixo do esforço para se universalizar a educação básica.
Isso implicaria propor objetivos, metas e meios audaciosos, incluindo a ampliação do
gasto público total para a manutenção e o desenvolvimento do ensino público. O custo
seria mudar o dispêndio, equivalente a menos de 4% do PIB nos anos de 1990, para
10% do PIB, ao final dos 10 anos do PNE. (...) O PNE do governo insistia na
permanência da atual política educacional e nos seus dois pilares fundamentais: máxima
centralização, particularmente na esfera federal, da formulação e da gestão política
educacional, com progressivo abandono, pelo Estado, das tarefas de manter e
desenvolver o ensino, transferindo-as, sempre que possível, para a sociedade
(VALENTE & ROMANO, 2002, p.98-99).
39
O governo de Fernando Henrique Cardoso tinha maioria na Câmara dos Deputados e no
Senado; foi indicado o deputado Nelson Marchezan (PSDB/RS) para ser o relator na Comissão
de Educação, cujo relatório foi um substitutivo à proposta da oposição e que recebeu o seu nome
tornando-se o texto-base da lei que foi aprovada em 2001. O controle governamental, por possuir
a maioria no Congresso Nacional, abreviou “a participação social no debate do Congresso,
inclusive fazendo preponderar nas audiências públicas os convites para autoridades e técnicos
vinculados às posições oficiais” (VALENTE & ROMANO, 2002, p.99).
O substitutivo Marchezan foi aprovado no Congresso e consagrou como “plano” a
política educacional que era adotada pelo MEC. Em 9 de janeiro de 2001, na mensagem 9,
em que o presidente da república comunica os vetos aos parlamentares, Fernando Henrique
Cardoso admitiu que sua posição “foi ditada pela área econômica do governo e não pelos seus
auxiliares e organismos diretamente responsáveis pela educação” (VALENTE & ROMANO,
2002, p.105).
Foram nove os vetos presidenciais ao que havia sido aprovado pelo Legislativo: o
primeiro se referia à educação infantil, quatro sobre o ensino superior, um se referia à meta de
ampliação de financiamento público para a pesquisa científica e tecnológica e um determinava
que o pagamento das aposentadorias e pensões do ensino superior público deveria ser excluído
das despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino. Os outros dois vetos foram referentes
ao financiamento público da educação. O principal item vetado foi o que determinava
Elevação na década, através de esforço conjunto da União, estados, Distrito Federal e
municípios, do percentual de gastos públicos em relação ao PIB, aplicados em
educação, para atingir o mínimo de 7%. Para tanto os recursos devem ser ampliados,
anualmente, à razão de 0,5% do PIB, nos quatro primeiros anos do Plano e de 0,6% no
quinto ano (apud VALENTE & ROMANO, 2002, p.105).
Considerando que no PNE da Sociedade Brasileira previa-se um aumento de 4% do PIB
para 10% ao final de 10 anos do plano, nota-se claramente as orientações do Banco Mundial
influindo nas decisões governamentais do Brasil.
Ghiraldelli Jr. (2003, p. 255) comenta que, nos anos do governo de Fernando Henrique
Cardoso (1995/1999 e 1999/2003), proliferaram programas governamentais em educação. Isso se
devia ao fato da amplitude do Plano Nacional de Educação e pelo pouco tempo que o governo e a
sociedade teriam para tentar colocar a casa em ordem em termos educacionais. Para o autor, o
40
Plano Nacional de Educação “veio como resposta, em grande parte, à pressão e aos conselhos dos
tecnocratas dos países ricos, a partir da Conferência da Tailândia” (GHIRALDELLI JR., 2003,
p.255).
Portanto, não só a nova LDB, como também o Plano Nacional de Educação refletem as
prescrições externas que geraram diversas mudanças nos últimos anos, tais como, o Fundo de
Valorização do Magistério, as avaliações externas nos Ensinos Superior, Médio e Fundamental, a
regulamentação da Educação à Distância entre outras, nas quais os educadores não são “os
protagonistas principais” (GHIRALDELLI JR., 2003, p.256), pois os tecnocratas assumem esse
papel e mesmo assim são seguidas as determinações tendo em vista os empréstimos conseguidos
junto ao Banco Mundial e outros organismos internacionais.
Finalizamos esse item valendo-nos do estudo de Zotti (2004) ao verificar que o
currículo oficial e o ensino são organizados de acordo com o contexto pelo qual passa o país,
atendendo aos interesses daqueles que têm poder. Assim, percebemos a ênfase das disciplinas
científicas na primeira LDB em decorrência do desenvolvimento urbano-industrial; o tecnicismo
predominante no período militar para formar a mão-de-obra necessária ao mercado de trabalho e
“reservar” as vagas do ensino superior para os filhos da elite com intenso controle ideológico
através da imposição de disciplinas como EMC, OSPB e ensino religioso; a lenta
redemocratização do país e os falsos discursos de “resgatar a dívida social” por meio da educação
para todos e, finalmente, o neoliberalismo vigente influenciando as políticas educacionais dos
anos de 1990 com inovações como, por exemplo, o controle de qualidade através das avaliações
externas.
41
2.3. AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO ESTADO DE SÃO PAULO NOS ANOS DE
1961 A 1998
Havia em São Paulo, em 1960, de acordo com Perez (2000), 1.754.943 estudantes, ou
seja, 14% da sua população total. No ano de 1990 o número de estudantes havia aumentado para
8.287.471, em todos os níveis de ensino regular, o que correspondia a 27% da sua população
total. Realmente, no período de 1960-1990 houve uma grande ampliação de matrículas no estado
de São Paulo, que,
[...] aconteceu em todos os níveis de ensino e abrangeu mais pessoas dos diferentes
segmentos etários: se, em 1960, havia uma forte concentração de matrículas (92%)
apenas no ensino fundamental, em 1990 ela tende a ser melhor distribuída entre os
níveis, encontrando-se 10% na pré-escola, 72% no fundamental, 12% no médio e 6%
no superior (PEREZ, 2000, p.27).
De acordo com Perez (2000, p.29) nesses 30 anos houve três momentos de ampliação da
oferta de matrículas: “o de intensa expansão (1960 a 1975); o da desaceleração do ritmo de
crescimento (1975 a 1985) e o da retomada de crescimento (a partir de 1985)”.
O primeiro momento (1960 a 1975) pode ser explicado pelo aumento da população
devido à queda de mortalidade, níveis elevados de natalidade, visto que a “explosão
demográfica” se iniciou na década de 1940 até os primeiros anos da década de 1970, com a
intensa migração interna e externa, além da crescente urbanização. Associado à urbanização, no
período de 1960 a 1967, realizou-se o ciclo da industrialização pesada, acompanhada da crise
econômica e do desemprego industrial. De 1968 a 1975, período “do milagre econômico”, em
plena ditadura militar, houve desenvolvimento e modernização do interior e esse crescimento
apoiou-se em bases criadas em anos anteriores, de acordo com Perez (2000). A indústria paulista
apresentou crescimento acelerado, com taxa de 15%, mas havia segmentos da população do
estado, em especial a paulistana, com precárias condições de vida. Esse período de expansão de
matrículas coincidiu com um cenário político de mudanças advindas da passagem do regime
democrático para o ditatorial a partir de 1964. Durante esse período São Paulo teve dois
governadores nomeados pelo governo militar: Abreu Sodré (1967/1971) e Laudo Natel
(1971/1975).
42
De 1975 a 1985, no segundo momento, houve uma desaceleração no ritmo de
crescimento da população devido à queda do índice de natalidade que teve por conseqüência a
diminuição, também, do ritmo do crescimento das matrículas escolares. Porém, nesse período, a
migração interna continuou intensa exercendo grande impacto no sistema educacional, pois em
1980,
[...] das crianças de 5 a 9 anos residentes no Estado, 12% eram oriundas de outros
estados; na faixa etária de 10 a 14 anos esse percentual sobe para 17% e na faixa de 15
a 19 anos, 22% . Essa massa, oriunda basicamente da zona rural, chegava analfabeta e
as famílias compostas por muitas crianças (PEREZ, 2000, p.32).
A urbanização foi muito acentuada: “80% dos paulistas viviam nas cidades em 1980” e
“metade da população do Estado vive na região metropolitana de São Paulo, que atinge um grau
de urbanização da ordem de 98%” (PEREZ, 2000, p.32). Nos anos de 1980 ocorreu um processo
que Perez (2000, p.33) denomina de “reurbanização”, pois investimentos públicos são utilizados
na malha viária e no sistema de transportes, havendo a valorização do solo urbano. Houve,
também, a expansão da rede escolar de forma generalizada por todas as regiões, criando-se
condições para que a população migrante pudesse ter acesso à escola. No entanto, com o
crescimento das periferias dos grandes centros urbanos, encontraram-se dificuldades de
conciliação entre a população das periferias com o planejamento de ampliação das escolas.
Com relação ao desenvolvimento econômico, no período de 1975/1980 “ocorreu uma
desaceleração do crescimento industrial, reduzido então para 4%” ao ano (PEREZ, 2000, p.33).
Na política, nesse período (1975/1985), ocorreram dois fatos distintos, representando,
respectivamente, a tentativa de manutenção do controle político e o início da redemocratização: o
governo militar editou o “pacote de abril” que suspendeu eleições diretas para governador (em
1977), mas teve início a distensão, que consistiu na abertura gradual do regime com a
reformulação partidária determinando o fim do bipartidarismo e o surgimento de novos partidos
políticos a partir de 1979, eleição direta para governador em 1982 e escolha indireta do
presidente civil Tancredo Neves em 1984. Dois governadores foram nomeados pelo governo
militar, nesse período: Paulo Egydio Martins (1975/1979) e Paulo Maluf (1979/1983). Em 1982,
é eleito por eleições diretas, André Franco Montoro, do PMDB (Partido Democrático Brasileiro)
que fazia oposição ao governo federal.
43
E, finalmente, no período de 1985 a 1990, houve ainda a retomada das matrículas
devido à intensificação da urbanização decorrente do êxodo rural. Segundo dados de Perez (2000,
p.34), 89% da população paulista vivia na zona urbana em 1991, sendo que a população da zona
rural de 2,8 milhões em 1980 diminuiu para 2,2 milhões em 1991. Do ponto de vista econômico,
houve benefícios para a economia paulista entre 1984 e 1986 devido ao crescimento das
exportações e aos efeitos do Plano Cruzado. Após essa breve fase de crescimento, houve um
período de estagnação entre 1987 e 1988, e outro de recessão em 1989, com tentativas de
estabilização através de políticas para controle da inflação. Apesar da crise industrial no estado de
São Paulo ocorreu o crescimento da agricultura e das atividades do setor terciário.
Politicamente, ampliou-se a transição democrática com o início da Nova República em
1985, com a promulgação da nova Constituição federal em 1988, estadual em 1989 e com as
eleições diretas para presidente da República em 1989. Em 1986 foi eleito o novo governador de
São Paulo, Orestes Quércia (1987-1991), também do PMDB, que sucedeu Franco Montoro,
ocorrendo, “dessa forma, uma continuidade do governo peemedebista, no estado, que nesse
momento também compõe o grupo hegemônico do governo federal da Nova República” (PEREZ,
2000, p.35). Teve início o governo Quércia e, também, a minha vida profissional como
professora na rede estadual paulista.
Segundo Ghiraldelli Jr. (2003, p.198) não havia, dentro do PMDB, uma “plataforma
unificada a respeito de educação”, mas como foram eleitos governadores desse partido em vários
estados (São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Pará, Goiás e Espírito Santo) em 1982, estes
trouxeram intelectuais, que outrora estiveram na oposição e queriam implementar projetos mais
democráticos em relação ao período da ditadura militar.
Por ocasião do governo Quércia (1987-1991), definia-se como diretriz maior para a
educação a recuperação da qualidade do ensino público possibilitando o acesso dos alunos das
camadas de mais baixa renda (PEREZ, 2000, p.110).
No entanto, assim como no governo anterior (André Franco Montoro, 1983/1987), a
prioridade foi dada para as séries iniciais do grau. Na gestão Montoro foi criado o Ciclo
Básico, que impossibilitava a reprovação da para a série. Sendo assim, os alunos
permaneciam por dois anos no Ciclo Básico e, ao final desse tempo, poderiam ser promovidos
para a série. A idéia era a de que essa reorganização de ensino deveria se estender para as
demais séries do 1º grau, ou seja, até a 8ª série, o que não chegou a acontecer.
44
Quanto à avaliação, como analisou Garita (2005), havia uma série de conflitos, pois os
professores deveriam registrar o aproveitamento do aluno em fichas para que houvesse o
acompanhamento diário e permanente, mas “as medidas legais mantinham o sistema de avaliação
por menções, de natureza classificatória (p. 4). As menções/notas se mantiveram até a
Resolução SE 241/85, quando foram estabelecidas as fichas descritivas para registro do
aproveitamento dos alunos. As fichas descritivas eram importantes na medida que,
Esses dados seriam registrados cumulativamente e sintetizados ao final de cada
semestre. No final de dois anos do Ciclo Básico, o professor deveria registrar um
parecer conclusivo de maneira a caracterizar “as possibilidades de continuidade de
estudos do aluno” (PEREZ, 2000, p.96).
No governo Quércia a prioridade continuou sendo as séries iniciais, introduzindo-se
novas propostas para o Ciclo Básico através da criação da Jornada Única, na qual, o professor
trabalhava uma jornada de 40 horas semanais assim distribuídas: 26 horas-aula com o aluno, 8
horas-aula de atividade livre e 6 horas–aula de trabalho pedagógico na escola.
Pela proposta do governo, a avaliação deveria garantir a progressão do aluno, mas como
“os professores não entendiam os critérios mínimos para a progressão de uma série para a outra
(GARITA, 2005, p.5) houve uma continuidade de reprovações no processo de alfabetização
persistindo a orientação tradicional (classificatória).
Perez (2000) acredita que essa priorização das séries iniciais ia muito além do que
alegava o governo: tinha a finalidade de preparar o aluno na base, mas também demandava
menos recursos financeiros, pois havia um professor por classe, não envolvendo a
“multiplicidade” existente de 5ª a séries, ou seja: “muitos professores de diferentes disciplinas,
existência de período noturno, jornada parcial do professor” (p. 125).
A priorização das séries iniciais, segundo Perez (2000) “pode ter significado redução
dos recursos financeiros para as demais séries” (p.125) e, por conseguinte, o abandono financeiro
das demais séries.
Ao analisar as políticas educacionais implantadas pela SEE/SP de 1967 até 1987, Perez
(2000) concluiu que os implementadores das mudanças, ou seja, a equipe escolar não participou
de suas decisões, tomando conhecimento a seu respeito apenas por meio do Diário Oficial, pois,
45
A implementação nunca ocorre pela persuasão ou negociação, mas sim pelo “cumpra-
se”, sem o concurso do implementador, sempre considerado um agente passivo. Pode-
se dizer que dificilmente os critérios técnicos foram pactuados ou negociados
politicamente (PEREZ, 2000, p.126).
Sendo assim, aos implementadores, caberia tão somente a função de colocar em prática
o que fosse determinado pela Secretaria da Educação, sem serem consultados a respeito das
mudanças que iriam vivenciar na escola.
As decisões da SEE/SP são geralmente publicadas, através de decretos, no final de
dezembro e início de janeiro, às vésperas de iniciar o ano letivo surpreendendo a equipe escolar
com “medidas implementadas às pressas, sem informação, sem os recursos necessários” (PEREZ,
2000, p.126). E, assim, “independentemente de novas medidas ou não, no primeiro dia de aula, as
crianças chegam e a escola precisa funcionar (e funciona) normalmente” (PEREZ, 2000, p.126).
Perez (2000) chegou a esta conclusão analisando as administrações dos governos
estaduais paulistas de 1967 até 1991, nas gestões de Abreu Sodré, Laudo Natel, Paulo Egydio
Martins, Paulo Maluf, Franco Montoro e Orestes Quércia. Ao estudarmos os governos posteriores
a estes, quais sejam, os de Antonio Fleury Filho, Mário Covas e Geraldo Alckmin, no entanto,
percebemos que a SEE/SP continua a agir da mesma maneira, através da implementação de
mudanças decididas de “cima para baixo”, visto que “parece inegável a ausência dos professores
nas discussões e definições das políticas educacionais, que apenas atribuem a eles o papel de
executores ou aplicadores das propostas [...]” (DIAS-DA-SILVA & LOURENCETTI, 2002,
p.21).
Na gestão posterior à de Quércia, a do governador Fleury (1991-1995), também do
PMDB, houve destaque para a implantação do Programa de Reforma do Ensino do Estado de São
Paulo – a Escola Padrão, em 1992.
As Escolas-Padrão igualmente foram implantadas por decisões do governo por
intermédio da SEE. Esta mudança atingiu inicialmente 306 escolas e tinha por objetivo se
expandir por toda a rede a partir de 1995, segundo Perez (2000, p.125), mas não houve
continuidade, pois o sucessor no governo do estado de São Paulo, Mário Covas, desativou o
programa em 1995. Em discurso na Câmara dos Deputados, no ano de 1999, o então deputado
federal Luiz Antônio Fleury Filho disse que o seu sucessor não prosseguiu com o projeto de
46
escolas padrão por medida de economia. E que nelas os alunos tinham mais aulas, os
professores recebiam melhores salários e uma série de vantagens” (FLEURY FILHO, 1999, p.1).
Garita (2005) afirma que, na Escola–Padrão, o planejamento deveria ser o ponto
principal das decisões coletivas e que o conceito de currículo deveria ser revisto, pois, “os
objetivos, a seleção dos conteúdos e as metodologias usadas não poderiam ser pensadas
separadamente da avaliação (p.6). Associado à Escola-Padrão, foi criado o Programa de
Avaliação Educacional nas Escolas–Padrão que “visava promover a avaliação sistemática da
aprendizagem dos conteúdos básicos e comuns dos alunos e também uma avaliação dos serviços
prestados” (GARITA, 2005, p.7).
Mas as orientações legais ainda eram de orientação positivista, pois exigiam que o
registro do aproveitamento dos alunos ocorresse por meio de conceitos, enquanto as orientações
transmitidas aos professores prescreviam a avaliação contínua (o que permanece nos dias de
hoje). Para a SEE/SP, “a avaliação educacional, especialmente a externa, constitui importante
instrumento para que se possa repensar o ensino e aprimorar seu padrão de qualidade” (SÃO
PAULO, 1998b, p.12), mas segundo Esteban (2004, p.11), essa concepção de avaliação cuja
essência do discurso é a idéia da qualidade “significa um retorno ao padrão rígido definido pela
avaliação quantitativa”.
A partir de 1995 inicia-se um novo governo no estado de São Paulo que interrompe o
ciclo de governo pemedebista. É eleito Mário Covas pelo PSDB (Partido da Social Democracia
Brasileira) que iniciou o mandato em 1995 e o concluiu em 1999. Favorecido pela
possibilidade de reeleição, ele se reelege, para um segundo mandato, que não foi concluído
devido à sua morte, em 2001.
As administrações anteriores, do PMDB, (Montoro, Quércia e Fleury) segundo Martins
(2003, p.11), “utilizaram com restrição certos temas polêmicos tais como: municipalização do
ensino, avaliação do sistema de ensino, instauração de ciclos e classes de aceleração.
Com Mário Covas no governo paulista, no entanto, estes temas foram colocados em
prática, pois a política educacional, segundo documento da SEE/SP deveria sanar a “ineficácia e
ineficiência do sistema (apud GARITA, 2005, p.7) diminuindo-se os gastos com a educação
através da diminuição do número de alunos reprovados.
Um destaque no primeiro mandato de Mário Covas foi a reorganização das escolas, em
que houve separação e realocação destas instituições, com o estabelecimento de escolas de
47
grau por seriação, algumas com classes da a série e outras, da a série. Essa
reorganização também foi imposta pelo governo, e não foi realizada a contento em toda a rede,
devido à falta de disponibilidade de espaço físico em alguns municípios. Por conseguinte, houve
a permanência, em algumas escolas, de classes de 1ª a 8ª séries e 2º grau.
O governo estadual, através do Decreto 40.889/96, criou, também, o Programa de
Ação de Parceria Educacional Estado-Município, consolidando o processo de municipalização
como medida descentralizadora político-administrativa, através da assinatura de convênios com
municípios, para atendimento do ensino fundamental (1ª a 8ª séries).
Mas as medidas mais marcantes, segundo Garita (2005), ocorreram na avaliação de
aprendizagem dos alunos e do sistema escolar.
Houve a implantação do Saresp, em 1996, com o objetivo de “atender à necessidade de
dimensionar o padrão de qualidade do ensino no estado e de informar à sociedade sobre o
desempenho do sistema de ensino” (GARITA, 2005, p.8). Foram criadas, também, as Classes de
Aceleração, para acabar com a defasagem idade/série no Ciclo Básico. De acordo com o
documento Educação Paulista: corrigindo rumos (O que mudou na escola pública paulista?)
o governo afirma que quer acabar com a repetência argumentando que,
A secretaria tem certeza de que toda criança capaz de brincar, brigar e se defender
também é capaz de aprender. Partindo desse princípio está desenvolvendo um trabalho
especial com os alunos de a série que deveriam estar mais adiantados se não
tivessem “repetido de ano” várias vezes. Esse projeto começou em 160 escolas. São
as Classes de Aceleração, que atendem cerca de 11 mil alunos. Eles recebem aulas com
professores preparados para lidar com crianças que passaram por várias repetências e
usam livros e materiais adequados à sua idade e experiência. Com isso, em pouco
tempo eles podem “recuperar o atraso” e passar à série adequada à sua idade. Assim,
um menino de 10 anos que esteja na série vai adquirir os conhecimentos necessários
para ir direto para a série. Seu desempenho na escola vai melhorar. Ele vai sentir-se
mais aceito na classe, porque passará a conviver com crianças da mesma idade e sua
família terá mais confiança em sua capacidade de aprender (SÃO PAULO, 1997, p.24-
25).
Assim, através das Classes de Aceleração resgatava-se a auto-estima dos alunos, mas
também diminuíram-se os custos com aqueles que bloqueavam o fluxo escolar ocupando vagas
que poderiam ser de outras crianças. Mas a idéia de terminar com a repetência, ou pelo menos
dificultá-la prosseguiu com as Deliberações do Conselho Estadual de Educação 9/96 e
11/96.
48
A Deliberação do Conselho Estadual de Educação (CEE
5
) 9/96 exigiu que fosse
elaborada uma ficha com registro individual do aproveitamento do aluno após cada avaliação
periódica, modificando, assim, a prática avaliativa do professor. As fichas individuais dos alunos
eram de acordo com a SEE/ SP, “documentos indispensáveis para a decisão do recurso pela
autoridade responsável” (SÃO PAULO, 2001a, p. 820-822). Isso significava que os
pais/responsáveis dos alunos poderiam recorrer da decisão do professor quanto à reprovação de
seus filhos (segundo Deliberações CEE 3/91 e com novas redações nas Deliberações 9/92 e
nº 11/96).
Através da Deliberação 11/96, que teve suporte pela Indicação CEE 12/96,
apresentou-se, pela primeira vez, um discurso legal sobre a avaliação norteando a avaliação como
um diagnóstico contínuo e dinâmico, “(...) um instrumento fundamental para repensar e
reformular os métodos, os procedimentos e as estratégias de ensino para que realmente o aluno
aprenda” (GARITA, 2005, p. 10).
No entanto, a mudança mais significativa foi a implantação do Regime de Progressão
Continuada, no ensino fundamental, a partir de 1998, apoiado nas orientações da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96). As justificativas apresentadas foram a
responsabilidade da escola perante a não-aprendizagem dos alunos e a substituição da reprovação
pela aprendizagem progressiva e contínua, conforme citado por Garita (2005, p.10).
O ensino fundamental foi organizado em dois ciclos assim constituídos: Ciclo I (da à
série) e Ciclo II (5ª a séries) eliminando a reprovação dentro destes ciclos, garantindo a
seqüência de estudos ao longo de cada ciclo. Percebemos a organização dos ciclos por meio das
orientações da SEE/SP para as escolas:
Na Rede Estadual de Ensino, os alunos poderão progredir daaté a 4ª série e daaté
a série continuamente, sem interrupções, sem reprovações. Ao final da e da
série, caso não atinjam os patamares de conhecimento e habilidades desejáveis, ficarão
retidos por um ano, para recuperação e reforço das lacunas de aprendizagem do ciclo
(SÃO PAULO, 1998a, p.22).
Mas a SEE/SP também constatou que, para haver o progresso contínuo do aluno, a sua
freqüência não poderia ser inferior a 75% das aulas como podemos notar na afirmação abaixo:
5
CEE significa Conselho Estadual de Educação.
49
[...] a nova LDB reafirma que o progresso contínuo do aluno e o trabalho da escola
dependem da presença do aluno. Dessa forma, a freqüência inferior a 75% das aulas
pode resultar na permanência do aluno na mesma série, ou seja, interrupção da
progressão. Caberá à escola avaliar e decidir se a ausência prejudicou
irremediavelmente o desempenho do aluno e, neste caso, retê-lo na série em que está
matriculado (SÃO PAULO, 1998a, p.22, grifo do autor).
Essa mesma organização escolar permaneceu durante o governo do sucessor de Mário
Covas, Geraldo Alckmin, que iniciou o seu mandato substituindo Mario Covas após sua morte
em 2001. Alckmin completou o mandato de seu antecessor em 2002 e foi eleito no mesmo ano
para governador do estado de São Paulo. Portanto, seu mandato foi de 2001 a 2002 e de 2003 até
2006. Período em que foi mantida a continuidade das políticas educacionais de seu antecessor
(Covas) e também do mesmo partido (PSDB) no comando do estado de São Paulo.
Percebemos que os governos estaduais paulistas do PSDB (Mário Covas e Geraldo
Alckmin) estão dentro do contexto das políticas neoliberais que compartilharam com o então
Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (também filiado ao PSDB).
Como observamos anteriormente, foi a partir do governo de Fernando Collor (1990-
1992), mas principalmente na gestão de Fernando Henrique Cardoso (1995-1999 e 1999-2003),
que ocorreu a subordinação do Brasil ao capital financeiro internacional com a vinculação
financeira ao mercado globalizado (LIBÂNEO, TOSCHI & OLIVEIRA, 2003, p. 163) nas
políticas públicas, especialmente nas educacionais.
Nesse contexto da globalização e neoliberalismo, em que o Brasil começou a fazer
ajustes para a sua inserção no mundo globalizado (que está dominado pelos países integrantes do
G-7), ocorreu a elaboração e promulgação da LDB, Lei 9.394/96 e também várias reformas
que foram indicadas pelo Banco Mundial para o Brasil e outros países em desenvolvimento,
independente das diferenças existentes entre eles.
Entre as mudanças sugeridas pelo Banco Mundial poderíamos destacar a
descentralização do ensino, com sua municipalização, a capacitação dos professores em serviço,
novos guias curriculares, educação à distância e a avaliação institucional dos sistemas de ensino.
Pudemos notar a influência neoliberal nas decisões do governo paulista uma vez que a
Reorganização das Escolas da Rede Pública estadual propiciou a separação dos alunos
viabilizando o projeto de municipalização, já no ano de 1996, ano de promulgação da Nova LDB.
Nesse mesmo ano criou-se o Saresp para verificar a eficiência do sistema de ensino, aprimorar a
50
proposta educacional e a definição de suas metas, segundo Cappelletti e Abramovicz (2004,
p.86).
De acordo com estas mesmas autoras as avaliações oficiais preocupam-se “com
resultado enquanto produto e não com a qualidade do processo educativo” (CAPPELLETTI &
ABRAMOVICZ, 2004, p.90) indo ao encontro das recomendações do Banco Mundial, quanto à
avaliação de desempenho das escolas, que devem ser avaliadas “por seus resultados em termos de
aprendizagem dos alunos e por sua eficiência em termos de custo por diplomado”
(CAPPELLETTI & ABRAMOVICZ, 2004, p. 89).
Nesse sentido, podemos compreender que o foco das mudanças dos últimos anos foi a
diminuição dos gastos a serem desembolsados pelos cofres públicos com a educação. Entretanto,
no discurso oficial a preocupação existente é com a “qualidade da educação”, como podemos
observar por meio de um texto preparado pela equipe de avaliação da Fundação para o
Desenvolvimento da Educação (FDE): “A implantação e a continuidade do SARESP partem do
pressuposto de que a avaliação é um instrumento a serviço da melhoria da qualidade da
educação (SÃO PAULO, 1998b, p.12).
Para o neoliberalismo, portanto, a qualidade na educação existe quando ocorre a eficácia
do processo educacional conseguindo-se o máximo resultado com o mínimo custo (ENGUITA,
1994, p.98). Para Freitas (2003), as políticas públicas neoliberais optaram pelos ciclos ou pela
progressão continuada, pois a repetência e a evasão representam custos para o Estado. Sendo
assim:
A questão da qualidade entra como geradora de menores gastos, menores custos -
coerente, portanto, com a teoria do Estado mínimo que terceiriza os serviços públicos e
corta direitos sociais. Para os neoliberais, “custos desnecessários” acarretam pressões
por mais investimentos (FREITAS, 2003, p.80).
Assim, o discurso educacional brasileiro como um todo, e o paulista em particular,
referem-se à qualidade da educação partindo do pressuposto de que os custos educacionais, no
caso, especialmente representados pela evasão e pela repetência escolar, devem ser contidos, daí
a justificativa para a necessidade da implantação dos ciclos e da progressão continuada no estado
de São Paulo.
Para compreendermos melhor as mudanças recentes no estado de São Paulo iniciaremos
o estudo do currículo e da avaliação nele inserido.
51
3. O CURRÍCULO E A AVALIAÇÃO
Nenhuma discussão pode negligenciar o fato de que aquilo
que se propõe e que se desenvolve nas salas de aula dará
origem a um processo de avaliação. Ou seja, a avaliação é
parte integrante do currículo, na medida em que a ele se
incorpora como uma das etapas do processo pedagógico
(OLIVEIRA & PACHECO, 2005, p. 119).
Inicialmente devemos enfatizar que a aprendizagem e, conseqüentemente, a avaliação
devem ser orientadas e dirigidas pelo currículo e pelo ensino.
Assim, como a avaliação é parte integrante do currículo, ao analisá-la juntamente com
sua história necessitamos de compreender como o currículo é concebido em suas diversas teorias.
A princípio nos dedicaremos à compreensão do significado de currículo para, em seguida, nos
concentrarmos nos vínculos deste com a avaliação.
3.1. AS TEORIAS DE CURRÍCULO E SUAS DEFINIÇÕES
Currículo é originário da palavra latina scurrere que se refere a “um percurso a ser
realizado” (GIMENO SACRISTÁN & PEREZ GÓMEZ, 1998, p.125).
No entanto, ao analisarmos a etimologia da palavra currículo ficamos limitados a uma
visão “que o toma como rota, trajetória, um curso a ser realizado, que pressupõe etapas,
seqüências, estágios, séries, níveis, padrões, comportamentos a serem garantidos na realização de
tal curso ou trajetória” (FERRAÇO, 2006, p.9)
Assim, se o currículo for definido seguindo a etimologia do termo, é impossível
dissociá-lo de prescrição:
Nesse caso, é impossível dissociar currículo de prescrição, receita, manual, veículo,
parâmetros norteadores, ou algo parecido. Em certo sentido, aqui, currículo confunde-se
ou reduz-se a programas, relação de temas, ementas de disciplinas, proposta ou grade
52
curricular, manuais didáticos ou qualquer texto que contenha uma proposta prescritiva
de conteúdos e metodologias a ser seguida. (FERRAÇO, 2006, p.9).
Essa concepção mais tradicional ainda é muito presente entre educadores brasileiros e
apresenta o currículo como algo que pode ser implantado e que está escrito nos documentos, mas
como alertam Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998, p.137) “é evidente que para conhecer o
currículo é preciso ir muito além das declarações, da retórica, dos documentos, ou seja, ir muito
mais próximo da realidade”.
Outros autores, como Schmidt (2003) comentam sobre essa visão de currículo:
[...] comprovadamente, mesmo pessoas da área da educação confundem-no com outros
conceitos: programa, rol de conteúdos, plano de ensino, plano de curso; porém ao
refletir sobre essas vivências entre alunos e professores, sente-se que essas dimensões
não bastam para conceituá-lo, é preciso considerar muito mais (SCHMIDT, 2003, p.60-
61).
Arroyo (1999a) enfatiza a idéia de que os professores entendem o currículo como
conteúdos e programas:
Quando acompanhamos uma reunião de professores, entre eles ou com alunos e as
famílias, o diálogo é sobre o cotidiano mais total da escola. O currículo entendido como
conteúdos e programas, aparece como uma referência externa que invade suas práticas,
que freia sua criatividade para inventar novas atividades, ocupar novos tempos e
espaços. [...] uma tensão entre o currículo, entendido como um conjunto ordenado
de conteúdos a ensinar e aprender, e as condições, a concretude do conjunto das
estruturas, tempos, espaços, práticas por meio das quais os professores tentam cumprir a
função intelectual e socializadora da escola. uma tensão entre a cultura da escola,
reduzida ao que ensinar e aprender, e uma percepção dos mestres de que a função da
escola é mais plural (ARROYO, 1999a, p.162).
O autor citado sugere que somente se os professores entenderem que seu ofício é mais
abrangente é que se alarga a concepção de currículo. “Pouco se avança em uma concepção nova
de currículo, ainda que sejam lidos textos críticos, se a lógica da escola continua propedêutica e
transmissiva” (ARROYO, 1999a, p.163).
53
O currículo, portanto, não pode ser reduzido a um documento estático a ser cumprido ou
avaliado como a concepção oficial sugere, pois se afasta da prática escolar:
O currículo colado às práticas, traduzido em procedimentos, condutas, cultura vivida.
Apenas elaborando e oferecendo novos parâmetros ou trazendo textos críticos e
lembrando a história do currículo e de seus vínculos com a produção social de
conhecimento não chegaremos a essa compreensão totalizante da escola e do currículo.
Falta-nos enxertar a inovação curricular e educativa na concretude totalizante da prática
escolar (ARROYO, 1999a, p.163).
Sem desmerecer essa possibilidade de conhecer o currículo, entretanto, tiraremos o foco
da idéia de que ele seja documento para irmos além do texto prescrito. Isso quer dizer que
entendemos currículo como um conjunto de todas as experiências e vivências oferecidas pela
escola, capazes de, uma vez realizadas adequadamente pelos sujeitos que dela fazem parte,
propiciar o desenvolvimento esperado, como podemos constatar pelo pensamento de Gimeno
Sacristán e Perez Gómez (1998, p. 132):
Para compreender o currículo da perspectiva de quem aprende convém entendê-lo como
o conteúdo de toda a experiência que o aluno/a tem nos ambientes escolares. O
aluno/a, enquanto está na situação de escolarização, tem experiências muito diversas:
aprende conhecimentos, habilidades, comportamentos diversos, a sentir, a se adaptar e
sobreviver, a pensar, a valorizar, a respeitar, etc (GIMENO SACRISTÁN & PEREZ
GÓMEZ, 1998, p.132, grifos dos autores).
Existe uma pluralidade de definições de currículo que, por serem produções humanas,
são construídas como sendo as mais adequadas para os contextos vividos, conforme aponta
Schmidt (2003):
[...] as conceituações de currículo são produções humanas que estão marcadas pelas
opções valorativas do homem, realizadas em cada tempo e lugar, construindo a
concepção curricular vigente, sempre com a idéia de que ela é a mais nova e a melhor
para o contexto vivido (SCHMIDT, 2003, p.68-69).
54
Silva (2004) também considera o currículo como uma construção social, mas chama a
atenção para a principal indagação a ser feita. “Com a noção de que o currículo é uma construção
social aprendemos que a pergunta importante não é “quais conhecimentos são válidos?”, mas sim
“quais conhecimentos são considerados válidos?” (SILVA, 2004, p.148, grifos do autor).
Para elucidar as diversas dimensões de currículo abordaremos a teoria do currículo ao
longo de sua história, tanto no contexto internacional quanto no nacional, pois no Brasil esta foi
fortemente influenciada, sobretudo, pelos estudos desenvolvidos nos Estados Unidos e na
Inglaterra.
De acordo com Zotti (2004, p.3) “a teoria curricular pode ser analisada com base em
dois grandes eixos: as concepções tradicionais ou conservadoras e as concepções críticas” .
Ambas tiveram como origem os Estados Unidos e influenciaram o campo do currículo no Brasil.
Considerando-se as concepções conservadoras, currículo significava inicialmente uma
relação de matérias/disciplinas e tinha a ver, portanto, com plano de estudos. Zotti (2004) afirma
que
Posteriormente, o currículo evolui de plano de estudos para a visão de currículo como a
totalidade de experiências vivenciadas pela criança, sob a orientação da escola, levando
em conta e valorizando os interesses do aluno. Seus representantes, Dewey e Kilpatrick,
contribuíram para o desenvolvimento das teorias progressivistas, influenciando no
Brasil o desenvolvimento da concepção escolanovista
6
, como é conhecida. (ZOTTI,
2004, p.4).
Assim, no Brasil, a visão escolanovista influenciou o pensamento educacional e
curricular a partir dos anos de 1920 e o “foco do currículo é deslocado do conteúdo para a forma,
ou seja, a preocupação é centrada na organização das atividades, com base nas experiências,
diferenças individuais e interesses da criança” (ZOTTI, 2004, p.4).
A partir da obra de Franklin Bobbitt (1918) “o currículo se resume a uma questão de
desenvolvimento, a uma questão técnica” (SILVA, 2004, p.24). Essa concepção se consolidou no
6
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi elaborado por Fernando Azevedo e assinado por 26 educadores
brasileiros, líderes do movimento de “renovação educacional”. Reivindicava escola pública, gratuita, obrigatória e
leiga e proclamava a “educação como um problema social (...) traçando diretrizes novas para o estudo da educação
no Brasil (...) também representando uma tomada de consciência, por parte dos educadores, até então praticamente
inexistente” (ROMANELLI, 2006, p.150)
55
livro de Ralph Tyler (1949) que dominou o campo do currículo nos Estados Unidos e em outros
países, inclusive no Brasil. Assim, dos anos de 1920 até a década de 1960, predominaram nos
Estados Unidos visões de currículo com perspectiva tradicional. No Brasil, o pensamento
educacional e curricular é influenciado pela visão escolanovista a partir dos anos 1920 até os anos
1960, quando imperou a visão tecnicista até a década seguinte (1970).
De acordo com Tyler (1949) a organização e desenvolvimento do currículo deve
responder a quatro questões básicas, conforme descreve Silva (2004):
1- que objetivos educacionais deve a escola procurar atingir?; 2- que experiências
educacionais podem ser oferecidas que tenham probabilidade de alcançar esses
propósitos?; 3- como organizar eficientemente essas experiências educacionais?; 4-
como podemos ter certeza de que esses objetivos estão sendo alcançados? (TYLER,
1949, apud SILVA, 2004, p.25).
Segundo Silva (2004, p.25) essas quatro perguntas se referiam à divisão tradicional da
atividade educacional: a 1ª se refere ao currículo, a 2ª e 3ª ao ensino e instrução e a 4ª à avaliação.
No final da década de 1960 e na década de 1970, foram desenvolvidos nos Estados
Unidos, estudos críticos que contestavam os modelos tradicionais de currículo que se limitavam à
atividade técnica de como fazê-lo. Silva (2004) ressalta a diferença fundamental entre as teorias
tradicionais e as críticas:
As teorias críticas sobre o currículo, em contraste, começam por colocar em questão
precisamente os pressupostos dos presentes arranjos sociais e educacionais. [...] Para as
teorias críticas o importante não é desenvolver técnicas de como fazer o currículo, mas
desenvolver conceitos que nos permitam compreender o que o currículo faz. (SILVA,
2004, p.30, grifos do autor).
Enquanto os modelos tradicionais se preocupavam em como fazer o currículo, as teorias
críticas queriam compreender o que o currículo faz. Sendo assim, pretendia-se entender como o
currículo reproduz as desigualdades sociais e como fazer para que ele não contribua com a
exclusão de algumas camadas da sociedade.
Duas correntes influenciaram a teoria curricular crítica no Brasil: a sociologia do
currículo, que se originou nos Estados Unidos, e a nova sociologia do currículo, originada na
56
Inglaterra. Os representantes mais conhecidos da sociologia do currículo são Michael Apple e
Henry Giroux. O autor mais conhecido da nova sociologia do currículo é Michael Young.
Mas a influência mais marcante dos Estados Unidos no Brasil até a década de 1980 foi a
concepção de currículo tecnicista, com influência de Tyler, como comentam Lopes e Macedo
(2002):
As primeiras preocupações com o currículo, no Brasil, datam dos anos 20. Desde então,
até a década de 1980, o campo foi marcado pela transferência instrumental de
teorizações americanas. Essa transferência centrava-se na assimilação de modelos para
a elaboração curricular, em sua maioria de viés funcionalista, e era viabilizada por
acordos bilaterais entre os governos brasileiro e norte-americano dentro do programa de
ajuda à América Latina (LOPES & MACEDO, 2002, p.13).
Esses acordos eram de cooperação e assistência técnica e ficaram conhecidos como
MEC-Usaid
7
e tinham como objetivo a contratação de assessores norte-americanos para
auxiliarem nas reformas da educação pública em todos os níveis de ensino. Assim, a educação
brasileira nesse período era marcadamente tecnicista, com influência marcante de Ralph Tyler.
Com a redemocratização ocorrida no Brasil na década de 1980, “a hegemonia do
referencial funcionalista norte-americano foi abalada” (LOPES & MACEDO, 2002, p.13)
ganhando força o pensamento crítico, mas não mais “por processos oficiais de transferência, mas
sim pelos trabalhos de pesquisadores brasileiros que passaram a buscar referências no
pensamento crítico” (LOPES & MACEDO, 2002, p.14). Para Zotti (2004, p.8), “no Brasil, o
desenvolvimento da teoria curricular crítica possibilitou uma melhor compreensão das conexões
entre currículo e as relações de poder na sociedade durante a década de 1980”.
Na década de 1980, o currículo começou a ser compreendido como espaço de relações
de poder e entendido apenas no contexto sócio-político e econômico. Começou-se a questionar a
seleção de conhecimentos a serem transmitidos na escola: por que a escola ensina determinados
conhecimentos, considerados legítimos e não outros que são relegados ao esquecimento?
7
Os acordos MEC-Usaid foram convênios realizados a partir de 1964, durante o período militar brasileiro e tinham
como objetivo a contratação de assessores norte-americanos para auxiliarem nas reformas da educação pública nos:
“a) Níveis primário, médio e superior, b) Ramos: acadêmico e profissional (com ênfase no primeiro); c)
Funcionamento: 1. reestruturação administrativa; 2. planejamento; 3. treinamento de pessoal docente e técnico.; d)
Controle do conteúdo geral do ensino através do controle de publicação e distribuição de livros técnicos e didáticos”
( ROMANELLI, 2006, p. 213).
57
A seleção cultural dos conhecimentos a serem transmitidos pela escola não é neutra,
assim como o currículo: “não é um corpo neutro, inocente e desinteressado de conhecimentos.
(...) A seleção que constitui o currículo é o resultado de um processo que reflete os interesses
particulares das classes e grupos dominantes” (SILVA, 2004, p.46). Assim, o currículo é
culturalmente determinado, historicamente situado e não pode ser desvinculado da totalidade do
social.
Na década de 1990, a produção acerca de currículo, foi influenciada também pelo
pensamento pós-moderno em que o currículo é entendido como artefato cultural “à medida que
traduz valores, pensamentos e perspectivas de uma determinada época ou sociedade” (ZOTTI,
2004, p.9). Os estudiosos vinculados a essa visão entendem que existe necessidade do currículo
“dar voz às culturas excluídas, negadas ou silenciadas pela escola, como forma de garantir uma
convivência mais democrática entre os diferentes grupos” (ZOTTI, 2004, p.9).
Diante da retrospectiva histórica, percebemos que o conceito de currículo depende do
contexto social em que está inserido e que as “conceituações de currículo são produções humanas
que estão marcadas pelas opções valorativas do homem, realizadas em cada tempo e lugar,
construindo a concepção vigente, sempre com a idéia de que ela é a mais nova e a melhor para o
contexto vivido” (SCHMIDT, 2003, p.69).
3.2. O CURRÍCULO SEGUNDO GIMENO SACRISTÁN E PEREZ GÓMEZ
Existem, segundo Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998, p.147), “dificuldades de se
oferecer uma definição válida de currículo que seja aceita universalmente”, mas o mais
importante é levarmos em consideração
Primeiro: o estudo do currículo deve servir para oferecer uma visão da cultura que se dá
nas escolas, em sua dimensão oculta e manifesta, levando em conta as condições em
que se desenvolve.
58
Segundo: trata-se de um projeto que pode ser entendido como um processo
historicamente condicionado, pertencente a uma sociedade, selecionado de acordo com
as forças dominantes nela, mas não apenas com capacidade de reproduzir, mas também
incidir nessa mesma sociedade.
Terceiro: o currículo é um campo no qual interagem idéias e práticas reciprocamente.
Quarto: como projeto cultural elaborado, condiciona a profissionalização do docente e é
preciso vê-lo como uma pauta com diferente grau de flexibilidade para que os
professores/as intervenham nele. (GIMENO SACRISTÁN & PEREZ GÓMEZ, 1998,
p.148).
Sendo assim, ao conceituarmos currículo, devemos considerar como ele se desenvolve
nas escolas, em suas dimensões real e oculta, ou seja, o que os professores e as autoridades dizem
que é ensinado e quais as práticas efetivas no ambiente escolar.
Além disso, o currículo é um projeto cultural elaborado segundo as forças dominantes
da sociedade a qual pertence, mas deve ser visto não como possibilidade de reprodução, mas
de transformação da situação vigente. E se, no currículo, as idéias e as práticas interagem, os/as
professores/as devem intervir nele, mas também devem estar cientes dessa importante tarefa: daí
a preocupação do autor com a profissionalização do docente.
Para compreendermos o currículo devemos responder aos questionamentos levantados
sobre o que ensinam, quais os objetivos do ensino, quem escolhe o conteúdo, para quem se
ensina, como se transmite a cultura escolar nas aulas (e como deveria ser) e como ensinar.
Não existem respostas simples que possam ser consideradas indiscutíveis e aceitas por
todos, mas para se modificar a qualidade da educação é imprescindível a transformação do
currículo.
Mas, para transformar o currículo, é preciso conhecê-lo e, para isso, é preciso ir além
dos documentos e do que é declarado para se estar próximo do que seja a prática concreta.
Através da análise da prática do professor e a confrontando com outros documentos como
cadernos e comentários dos alunos, além da observação das aulas, podemos conhecer melhor a
realidade curricular e escolar.
Entretanto, a inovação dos currículos não deve se reduzir a mudanças teóricas, por
exemplo, das propostas curriculares sem mudar a prática que os professores e alunos
experimentam. Para compreender o ensino e modificar a escola Gimeno Sacristán e Perez Gómez
(1998) recomendam:
59
Só tratando de entender o currículo manifesto ou oficial dentro das condições escolares,
e estas e aquele dentro do contexto político, social e econômico exterior à escola,
entende-se a escolarização e os educadores podem desenvolver esquemas de
pensamento mais apropriados para compreender o ensino e elaborar com mais realismo
propostas de modificação da mesma (GIMENO SACRISTÁN & PEREZ GÓMEZ,
1998, p.133).
Ao conhecer o currículo (sendo ele um processo) espaço para resistência e
transformação, mas o professor não pode ser técnico (que não questiona o que ensinar) assim
como é importante que não haja um esvaziamento de conteúdo, como ocorria nos anos 1960 e
1970.
Os conteúdos tiveram sua importância diminuída para romper com a imagem de que o
ensino era reprodutor da cultura dominante, mas segundo Bates (1986 apud GIMENO
SACRISTÁN & PEREZ GÓMEZ, 1998) existe a “evidência de que as escolas são lugares de
produção cultural tanto como simples veículo de reprodução” (p.140) visto que existe resistência
de professores e alunos à cultura imposta pela classe dominante.
Conhecimento é poder e o papel fundamental do professor, assim como o da escola, é o
de não reproduzir a dominação, ajudando a circular o conhecimento que a conteste.
Assim, no sistema educacional, os/as alunos/as devem fazer um percurso que os/as
levem à aprendizagem durante as séries/ciclos. Segundo Gimeno Sacristán e Perez Gómez
(1998): “a escolaridade é um percurso para os alunos/as, e o currículo é seu recheio, seu
conteúdo, o guia de seu progresso pela escolaridade” (p.125).
O currículo é processo e, para torná-lo claro, precisamos conhecer o que Gimeno
Sacristán e Perez Gómez denominaram de "fotos fixas de um processo" (1998, p.138) que o
refletem, mas para que o compreendamos deveremos nos fixar no processo entre as fotos. Essas
"fotos" seriam os documentos, textos, planos e tarefas e, assim, encontramos, segundo a
classificação de Gimeno Sacristán (2000): o currículo prescrito, o currículo apresentado, o
currículo moldado, o currículo em ação, o currículo realizado e o currículo avaliado.
O currículo prescrito existe em todo sistema educativo, e são as prescrições ou
orientações do que deve ser seu conteúdo, principalmente na escolarização obrigatória. São, por
exemplo, no caso do Brasil, os Parâmetros Curriculares Nacionais ou as Propostas Curriculares
que são prescritas, respectivamente, pelo Ministério da Educação e Cultura (governo federal) e no
caso do estado de São Paulo, pela Secretaria de Estado da Educação.
60
O currículo apresentado aos professores é aquele criado para ser utilizado pelo
professor, que não consegue se orientar pelo currículo prescrito (cujas prescrições costumam ser
muito genéricas ou devido à sua formação deficiente além de suas condições de trabalho). São os
livros didáticos ou materiais diversos que muitas vezes orientam a atividade educativa.
O currículo moldado é o elaborado pelos professores (os planos de ensino) a partir de
prescrições administrativas, livros didáticos, guias etc.
O currículo em ação é o que ocorre na sala de aula e pode ser analisado através dos
cadernos dos/das alunos/as e na interação que ocorre entre eles e o (a) professor (a). Segundo
Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998): “Este nível de análise ou concepção [...] é o conteúdo
real da prática educativa, porque é onde o saber e a cultura adquirem sentido na interação e no
trabalho cotidianos” (p.138).
O currículo realizado surge como conseqüência da prática em que a interação
professor/aluno produz efeitos como: cognitivo, afetivo, social, moral, entre outros. Eles se
refletem na aprendizagem dos alunos e também nos professores na sua vida profissional, social,
familiar, etc.
E, finalmente, o currículo avaliado que é o que os professores exigem em suas
avaliações ou exames. Para Gimeno Sacristán (2000), “as aprendizagens escolares adquirem, para
o aluno, desde os primeiros momentos de sua escolaridade, a peculiaridade de serem atividades e
resultados valorizados” (p.106).
Nesta pesquisa, são valorizados o currículo prescrito e o currículo avaliado, que
serviram de suporte para a compreensão do que é determinado pelos órgãos oficiais aos
professores e como se refletem nas avaliações interna ou externa.
3.3. O CURRÍCULO PRESCRITO
Analisamos o currículo prescrito pelo governo federal e pelo governo paulista
delimitando na história educacional o período da primeira LDB (1961) até a implantação da
progressão continuada em São Paulo em 1998. Para essa análise nos norteamos pelas idéias de
Gimeno Sacristán (2000), pelo resgate histórico do currículo oficial elaborado por Zotti (2004) e
pela interpretação de Souza (2006) sobre a política curricular em São Paulo, além da legislação,
61
dos estudos de Martins (1998) acerca da elaboração das propostas curriculares e a atuação da
Coordenadoria de Normas Pedagógicas (CENP) em São Paulo e de Bonamino e Martínez (2002)
abordando os Parâmetros Curriculares Nacionais e as Diretrizes Curriculares Nacionais.
Iniciamos com a análise de Gimeno Sacristán (2000) sobre o currículo prescrito.
Em todo sistema educativo, principalmente em relação à escolaridade obrigatória, existe
algum tipo de prescrição em relação ao conteúdo que deve ser transmitido, ensinado e aprendido
na escola.
Gimeno Sacristán (2000) afirma que
A ordenação do currículo faz parte da intervenção do Estado na organização da vida
social. Ordenar a distribuição do conhecimento através do sistema educativo é um
modo não só de influir na cultura, mas também em toda a ordenação social e econômica
da sociedade. Em qualquer sociedade complexa é inimaginável a ausência de
regulações ordenadoras do currículo. Podemos encontrar graus e modalidades
diferentes de intervenção, segundo épocas e modelos políticos, que têm diferentes
conseqüências sobre o funcionamento de todo o sistema (GIMENO SACRISTÁN,
2000, p.108).
Assim, o currículo, ao ser ordenado pelo Estado, faz com que ocorra uma seleção
cultural dos conhecimentos necessários a qualquer setor produtivo e profissional, tendo em vista
a organização social e econômica da sociedade.
A ordenação do currículo ocorre através da política curricular que é definida por
Gimeno Sacristán da seguinte forma:
Este é um aspecto específico da política educativa, que estabelece a forma de
selecionar, ordenar e mudar o currículo dentro do sistema educativo, tornando claro o
poder e a autonomia que diferentes agentes têm sobre ele, intervindo, dessa forma, na
distribuição do conhecimento dentro do sistema escolar e incidindo na prática
educativa, enquanto apresenta o currículo a seus consumidores, ordena seus conteúdos e
códigos de diferente tipo (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p.109).
Dessa forma, o currículo prescrito é um instrumento da política curricular e nele são
prescritos conteúdos mínimos e diretrizes curriculares para um sistema educativo. Em um sistema
educativo com escolaridade obrigatória, é determinado um projeto de cultura comum através da
definição das aprendizagens que são exigidas a todos os alunos de todas as escolas tendo em vista
62
as “necessidades culturais comuns e essenciais dessa comunidade” (GIMENO SACRISTÁN,
2000, p.111).
Como existem diferenças culturais e desigualdades sociais na sociedade a definição de
conteúdos mínimos a serem trabalhados na escola não é uma atitude inocente e neutra, pois a
pretensão de “normalização cultural” (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p.111) esbarra naqueles
alunos com desiguais oportunidades de acesso à cultura que foi considerada legítima e válida
para todos pelo currículo prescrito.
A intervenção do currículo é realizada nos conteúdos e na metodologia quando são
prescritos os seus mínimos, ao se ordenar o tempo da aprendizagem (curso, ciclo, série) ou
regulando os meios, o material didático e a avaliação e também na determinação das técnicas de
avaliação a serem praticadas.
O currículo prescrito, ainda segundo Gimeno Sacristán (2000, p.113), tem duas funções
básicas: a de “prescrever os mínimos e a de orientar o processo de ensino e a aprendizagem
pedagógica”, mas, por mais intervenção que haja “nunca se pode chegar à prática diretamente,
mesmo tendo-se efeitos indiretos, positivos no pressuposto de que seja uma boa orientação e
alguns negativos em qualquer caso” (p.114). Ou seja, o currículo em ação, a prática na sala de
aula, é difícil de ser diretamente afetado pela intervenção oficial.
Essa idéia se reforça com a afirmação:
Por mais intervencionismo que a administração queira fazer e por precisas que suas
orientações pretendam ser, normalmente os professores não podem encontrar nas
disposições oficiais um guia preciso para a sua ação. As prescrições curriculares
costumam se referir a conteúdos e orientações pedagógicas que podem ser
determinantes, no melhor dos casos, para a elaboração de materiais, se se ajustarem a
elas, ou para realizar o controle do sistema, mas mais dificilmente costumam ser
reguladoras da prática pedagógica dos professores de uma forma direta (GIMENO
SACRISTÁN, 2000, p.117).
Assim, para Gimeno Sacristán (2000), o currículo prescrito não deve ser considerado
como um guia didático para orientar os professores, pois tem outras funções além da ordenação
dos processos pedagógicos nas aulas.
A prescrição de um currículo pela administração educativa é “uma forma de propor um
referencial para realizar um controle sobre a qualidade do sistema educativo” (GIMENO
SACRISTÁN, 2000, p.118). Esse controle ocorre quando a administração educativa ordena ou
63
sugere como deve ser a prática escolar ou quando avaliar o currículo através de inspeção ou de
avaliações externas.
A avaliação externa é uma forma de controle que focaliza o produto, invalidando as
avaliações que são realizadas pelos professores. Controla a prática, mas tem resultados pouco
eficazes para melhorar a qualidade do sistema. Além disso, sua missão deveria ser a de detectar
problemas, porém, esta observa se houve e quanto houve de conhecimento, além de comparar
escolas e alunos.
Uma forma de controle indireto, mas eficaz do currículo pode ocorrer por intermédio do
livro didático, pois ele é escolhido para aplicar sobre os conteúdos mínimos prescritos e
tornando-se uma intervenção pedagógica e ideológica.
Portanto, o currículo prescrito é parte integrante da escolaridade obrigatória e sua dupla
função é, então, a de prescrever mínimos e de orientar o processo de ensino e aprendizagem.
Analisando o currículo prescrito no Brasil, a partir da primeira LDB (Lei 4.024/61)
Zotti (2004) comenta que “o termo “currículo” é usado no texto desta lei referindo-se à
organização do conjunto de disciplinas a serem desenvolvidas nas escolas, portanto, apresenta o
significado de matriz curricular ou grade curricular, como é normalmente usado” (p.122).
Amparado por esta lei, o ensino era dividido em primário, médio (subdividido em
ginasial e colegial) e superior.
No ensino médio, o qual nos interessa na pesquisa - pois abrange o curso ginasial (5ª a
8ª séries) - o currículo era composto por três partes: uma nacional decidida pelo Conselho Federal
de Educação, uma estadual fixada pelos conselhos estaduais de educação e uma escolar,
escolhida pelas escolas com base em listas elaboradas pelos conselhos estaduais e/ou federal. O
Conselho Federal de Educação, órgão responsável pelas diretrizes curriculares no âmbito
nacional, definia normas para a organização das escolas em relação às disciplinas comuns e
obrigatórias e sugeria uma lista de disciplinas optativas. Era competência dos estados definir as
disciplinas optativas, mas naqueles em que não havia Conselho Estadual de Educação acatava-se
as “sugestões” do CFE.
Houve, na primeira LDB, segundo Zotti (2004, p.134), quanto à organização curricular
um avanço devido “a flexibilização e uma certa descentralização das orientações curriculares”,
pois “se caracterizou como flexível em relação à definição das matrizes curriculares”. Havia nela
uma procura pelo equilíbrio entre a formação humanista e a científica em relação ao contexto
64
vivenciado nesse período representado pelo desenvolvimento urbano-industrial, o que levou Zotti
(2004) a concluir que
A busca de equilíbrio entre formação humanista e científica, historicamente debatida,
concretiza-se com a LDB/1961, o que comprova minha tese de que a organização do
ensino e curricular é adequada ao contexto socioeconômico-político, especialmente no
sentido de garantia dos interesses dominantes (ZOTTI, 2004, p.135).
No período da ditadura militar (1964-1985) foi elaborada a Lei Federal 5.692/71 que
ampliou a escolaridade obrigatória de quatro para oito anos e definiu a estrutura de ensino em
grau (da a séries), grau (Colegial) e Superior. Mas o termo “currículo” continuou a ser
utilizado, na lei nº 5.692.71, para designar a matriz ou grade curricular. A matriz curricular é:
[...] feita em camadas que sucessivamente se acrescentam: a primeira, o núcleo comum
fixado pelo CFE; a segunda, composta das disciplinas do artigo 7º-Educação moral e
cívica, educação artística, programas de saúde e ensino religioso; a terceira, constitui-se
da parte diversificada, com disciplinas escolhidas com base nas listas dos conselhos
estaduais de educação e dos próprios estabelecimentos, tendo por objetivo o
atendimento das diferenças regionais e escolares; a quarta camada, também
caracterizada como parte diversificada, se constituirá das matérias destinadas às
habilitações profissionais do 2º grau (ZOTTI, 2004, p.174).
As disciplinas do artigo serviam para afastar os jovens de um pensamento de
oposição ao governo, assim como o objetivo principal da educação seria o de atender às
necessidades do mercado. Daí o currículo priorizar o ensino tecnicista e profissionalizante desde
as primeiras séries do 1º grau.
Mas o ensino profissionalizante constituiu-se em um fracasso pelas seguintes razões:
Primeiro porque foi uma decisão política autoritária; segundo porque não foram
proporcionadas as condições para que as escolas se adaptassem às exigências legais;
terceiro porque a profissionalização nunca foi de interesse da burguesia; quarto porque
o trabalhador via na escola a possibilidade de formação para a liberação do trabalho
braçal e através do ensino profissionalizante não visualizava essa perspectiva; quinto
porque as próprias empresas eram mais competentes na formação específica, por isso
um trabalhador com conhecimentos básicos gerais era mais útil; e por último, o objetivo
de contenção da demanda às universidades também não foi alcançado pelo princípio da
terminalidade presente na lei (ZOTTI, 2004, p.210-211).
65
Devido ao fracasso do ensino profissionalizante, o currículo foi alterado pela lei
7.044/82, também conhecida como “reforma da reforma”, no governo de João Batista de Oliveira
Figueiredo (1979-1985) ainda no período militar. As características do currículo ficaram
mantidas como conjunto de matérias a serem trabalhadas na escola, mas a “qualificação para o
trabalho” foi substituída pela “preparação para o trabalho”. O fracasso escolar das crianças mais
carentes da população foi a questão principal debatida do currículo tanto no governo Figueiredo
quanto no da Nova República, período pós-ditadura militar iniciado em 1985, com a
redemocratização do país, como constata Zotti (2004):
Como no Governo Figueiredo, a preocupação da Nova República foi o fracasso da
escola de grau no ensino das crianças mais carentes da população. Um dos pontos-
alvos de ataque, em função dessa preocupação, foi a questão do currículo, preocupação
de autoridades, pesquisadores e educadores (ZOTTI, 2004, p.198).
Neste período, o discurso governamental falava em “resgatar a dívida social” através da
educação; no governo de José Sarney (1985-1990) entre as mudanças curriculares determinadas
pela resolução 6/86
8
estavam a ênfase no ensino de português e de matemática, as disciplinas
de história e geografia se tornaram disciplinas distintas, a ciência ganhou tratamento mais
específico, englobando as ciências físicas e biológicas ou física, química e biologia (no grau),
mas com a permanência das disciplinas de caráter ideológico moralista como Educação Moral e
Cívica (EMC) e Organização Social e Política do Brasil (OSPB) criadas no período militar.“As
mudanças no currículo”, portanto, significaram mais “uma mudança na redefinição de matérias
com determinadas nomenclaturas e direcionamentos do que realmente refletir sobre o que se
pretendia com a educação para o novo momento social que se delineava” (ZOTTI, 2004, p.206).
Sendo assim, o governo da Nova República deu continuidade aos programas da ditadura
militar, porém revestidos de um discurso democrático. Não se resgatava a “dívida social”, pois as
políticas se baseavam nos mesmos princípios dos governos militares: clientelismo, tutela e
assistencialismo.
8
A resolução 6/86 determinava alterações na matriz curricular com destaque “da importância do ensino dos
conteúdos, preocupação com seus elementos essenciais e valorização do tratamento específico dos conteúdos,
verificada na definição de matemática, português, história, geografia, física, biologia, química, como disciplinas
específicas” (ZOTTI, 2004, p.206).
66
Nos anos 1980 ocorreu em São Paulo uma série de manifestações que reivindicavam ao
poder público estadual a reformulação dos Guias Curriculares Nacionais.
Segundo a Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (CENP):
O primeiro documento elaborado com o intuito de estabelecer as diretrizes gerais para o
ensino (correspondente, nos dias atuais, à educação básica) normatizando os
encaminhamentos dos componentes que alicerçam a estrutura do currículo em relação
às finalidades educacionais e ao processo ensino-aprendizagem, foi aquele intitulado
“Guias Curriculares Nacionais”, também conhecido pelos professores como “verdão”
em decorrência da cor da capa do material (SÃO PAULO, 2005, p.1).
No entanto, segundo Martins (1998) o apelido dado aos “guias” devia-se muito mais à
sua identificação com o governo militar do que propriamente pela cor que revestia o material. Os
Guias curriculares Nacionais foram elaborados após a reforma educacional de 1971 (com a lei
5.692/71) e os estudos que precederam a sua elaboração “foram oriundos do processo
educacional desencadeado pela Escola Nova. Contudo, a edição do documento e a elaboração dos
subsídios teóricos e práticos para sua implementação foram realizadas no regime político da
ditadura militar (MARTINS, 1998, p.40). Aos Estados cabia a tarefa de elaborarem subsídios e
realizarem programas de capacitação de professores para atuarem nas escolas seguindo os
referenciais dos “Guias”.
Para Martins (1998):
Na prática, o guia curricular para o Estado de São Paulo servia de norteador para a
elaboração dos planejamentos escolares. E como uma das características mais fortes do
guia era a definição dos conteúdos que deveriam ser trabalhados em cada matéria, a
maioria dos livros didáticos usados na rede pública espelhavam esse conteúdo.
Tínhamos então, na prática docente, pouco espaço de criação e de novas propostas de
ensino. (MARTINS, 1998, p.40).
Martins (1998) explica que, no contexto do processo de redemocratização do país,
especialmente após as eleições diretas para governador de estado (em 1982 foi eleito em São
Paulo o governador Franco Montoro), coube à Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas
(CENP) organizar as discussões e elaborar as novas propostas curriculares. A CENP foi criada
em 1976, no governo de Paulo Egydio Martins (1975-1979), quando a SEE foi reorganizada por
meio do decreto 7.510/76. Tal reforma administrativa instituía as funções da CENP como
67
órgão responsável pelas questões referentes aos currículos: elaboração, execução e normatização
dos modelos curriculares para o Estado, além do trabalho permanente de qualificação e
requalificação dos docentes e elaboração de materiais. Entre os documentos produzidos
destacaram-se os subsídios para implantação dos Guias Curriculares Nacionais e as propostas
curriculares para o ensino de 1º e 2º grau.
Apesar da criação da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) no governo
Orestes Quércia (1987-1991) as questões referentes aos currículos continuaram sob
responsabilidade da CENP.
Não só no estado de São Paulo ocorreram reformas curriculares na década de 1980, mas
também em Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro, mas ainda estavam em vigor as diretrizes
gerais para currículo estabelecidas pela Lei federal 5.692/71. Os estados estavam se
antecipando à ação do governo federal ao fazerem a reformulação curricular.
No entanto, na década de 1990, ocorreu o inverso: o governo federal passou a assumir
as prescrições curriculares para todos os níveis de ensino substituindo os governos estaduais, por
exemplo, na produção de material de orientação curricular para o ensino básico (os Parâmetros
Curriculares Nacionais).
Nos anos de 1990 a vigência da política neoliberal afetou diretamente as políticas
educacionais e o currículo passou a ser determinado em nível nacional, assim como os programas
de capacitação de professores, e a avaliação passou a ser externa. No entanto, as
responsabilidades e as verbas passaram a ser transferidas do governo federal para o estadual e
deste para os municípios, existindo, então, ao mesmo tempo uma “dupla lógica centralizadora e
descentralizadora” (GENTILI, 1998, p.25).
Quanto ao currículo foram criados, pelo governo federal, os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs). A versão preliminar foi elaborada pelo Ministério da Educação (MEC) em
1995 para o e ciclos e encaminhada para a avaliação de vários professores e acadêmicos do
país. Vários estudos e debates ocorreram sobre currículo e serviram de referência para a nova
versão publicada em 1996 e apresentada para o Conselho Nacional de Educação (CNE), para que
deliberasse sobre a proposta. O CNE foi criado pela lei 9.131 de 1995 e tem um papel
consultivo e deliberativo em relação às propostas apresentadas pelo MEC.
Enquanto o MEC elaborou os PCNs, o CNE elaborou as Diretrizes Curriculares
Nacionais (DCNs) e ambos se utilizaram da Constituição Federal de 1988 e da LDB (Lei
68
9.394/96) como referenciais. Mas a disputa por competências levou ao que Bonamino e Martínez
(2002, p.382) consideram uma “mútua omissão”, pois o MEC não citou as DCNs na elaboração
dos PCNs para o terceiro e quarto ciclos, publicados em 1998, enquanto que os PCNs também
não foram citados pelo CNE. O posicionamento político do CNE a respeito da fixação de
diretrizes curriculares nacionais passou, inclusive, a sugerir a não-obrigatoriedade dos PCNs.
Segundo Bonamino e Martínez (2002)
Na nossa interpretação, os desentendimentos entre o MEC e o CNE em torno das
definições curriculares ilustram a lógica implícita à política educacional do governo a
partir da metade dos anos de 1990: excessiva centralização das decisões no governo
federal e escasso envolvimento das outras instâncias político-institucionais e da
comunidade científica com a educação básica (BONAMINO & MARTÍNEZ, 2002,
p.373)
Desentendimentos entre MEC e CNE à parte, quando analisamos a Introdução dos
PCNs de a séries percebemos que, apesar do texto rejeitar qualquer enfoque de “modelo
curricular homogêneo e impositivo, o que encontramos são conteúdos e metodologias
significativamente detalhadas em cada uma das áreas disciplinares propostas” (BONAMINO &
MARTÍNEZ, 2002, p.381). Mas a prescrição determina o seguinte: respeito às diversidades
regionais, culturais e políticas e o currículo significando a “expressão de princípios e metas do
projeto educativo, que precisam ser flexíveis para promover discussões e reelaborações quando
realizado em sala de aula, pois é o professor que traduz os princípios elencados em prática
didática” (BRASIL, 1998, p.49).
Gimeno Sacristán (2000) atribuiu duas funções para o currículo prescrito: prescrever
conteúdos mínimos e orientar o processo de ensino e de aprendizagem. Historicamente notamos
que desde a primeira LDB (Lei 4.024/61), passando pela Lei federal 5.692/71 e chegando à
nova LDB (Lei 9.394/96) e, conseqüentemente, à progressão continuada no estado de São
Paulo, o governo federal tinha a preocupação de prescrever os mínimos e orientar o ensino-
aprendizagem, mas este objetivo ficou mais visível no período da ditadura militar, em
decorrência da falta de democracia, como observa Gimeno Sacristán (2000): “[a política
curricular] é mais clara ali onde o controle é realizado de modo explícito e onde é exercida por
mecanismos que não se ocultam” (p.109).
69
Detalhadamente se explicitava, no período militar, o controle através da legislação e
orientações repassadas aos estados, mas percebemos que, ao lermos a Introdução
9
dos PCNs para
a séries publicado nos anos de 1990, se busca a igualdade ou a “normalização” da cultura
apesar do discurso defender o respeito às diversidades regionais, culturais e políticas existentes
no país. Procura-se, também, orientar minuciosamente o processo desde o conteúdo às
metodologias a serem trabalhadas. Bonamino e Martinez (2002) explicitam:
O documento apresenta ainda a estrutura básica e a concepção geral das diferentes áreas
de conhecimento e os objetivos gerais de cada área em termos de capacidades que os
alunos devem desenvolver ao longo da escolaridade obrigatória. Junto da apresentação
dos conteúdos de cada área de conhecimento, o documento faz referência a conceitos,
procedimentos, valores, normas e atitudes e indica critérios de avaliação da
aprendizagem e orientação didáticas, inclusive para os Temas Transversais. Dessa
forma, embora o texto rejeite explicitamente qualquer viés de “modelo curricular
homogêneo e impositivo”, o que encontramos nos PCNs são conteúdos e metodologias
significativamente detalhadas em cada uma das “áreas” disciplinares propostas
(BONAMINO & MARTÍNEZ, 2002, p.381).
Essas autoras ainda reforçam que
[...] apesar da insistência do texto no respeito às diversidades regionais, culturais e
políticas existentes no país, o que se percebe é uma ênfase significativa no princípio de
igualdade, traduzido na preocupação com uma proposta curricular de caráter universal
para o ensino de conteúdos comuns a todos, ainda que no interior de instituições
diferenciadas (BONAMINO & MARTÍNEZ, 2002, p.381).
Assim, os PCNs têm um discurso de respeito às diversidades quando, na verdade é uma
proposta curricular de caráter universal igualando a todas as escolas com conteúdos,
metodologias e avaliações comuns.
Ao finalizarmos a análise do currículo prescrito, podemos perceber de acordo com o
estudo de Zotti (2004) que o currículo oficial e o ensino são organizados de acordo com o
9
O livro de Introdução dos PCNs é dividido em 5 partes: “a primeira parte é dedicada à análise de aspectos da
conjuntura nacional e mundial e à necessidade de fortalecimento da educação básica. A segunda parte destina-se a
apresentar os Parâmetros Curriculares Nacionais, seus propósitos e sua estrutura. A terceira parte procura trazer
contribuições para o processo de elaboração e de desenvolvimento do projeto educativo da escola. A quarta parte
pretende provocar a necessidade de conhecer melhor os alunos do ensino fundamental. Na quinta e última parte, é
feita uma análise sobre o uso das Tecnologias da Comunicação e da Informação, tão importantes no mundo
contemporâneo. Esses assuntos, tratados neste documento de Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais,
visam apresentar uma concepção geral, que será retomada de maneira específica nos documentos de áreas e temas
transversais” (BRASIL,1998, p.10).
70
contexto pelo qual passa o país, atendendo aos interesses daqueles que detêm o poder. Na 1ª LDB
o enfoque era nas disciplinas científicas devido ao desenvolvimento urbano-industrial; no período
militar se pretendeu formar mão-de-obra para o mercado de trabalho liberando as vagas do ensino
superior para os filhos da elite; no período da redemocratização do país havia os demagógicos
discursos de “resgatar a dívida social” através de educação para todos e, finalmente com o
neoliberalismo nos anos de 1990 com mudanças como o controle da qualidade das escolas
através das avaliações externas.
Em relação ao estado de São Paulo, notamos que este participou das reformas
curriculares dos anos 1980, deixando apenas de subsidiar os Guias Curriculares Nacionais
elaborados pelo governo federal. O governo estadual elaborou propostas curriculares para todas
as disciplinas nos anos de 1980, mas nos anos de 1990 o governo federal volta a centralizar as
decisões referentes às questões curriculares. Como podemos exemplificar pelo texto Política
Educacional da Secretaria de Estado da Educação (SÃO PAULO, 2001c): “A elaboração das
diretrizes curriculares nacionais foi um marco a partir do qual os estados vêm se orientando para
avançar na direção da melhoria da qualidade da educação” (p.1).
Percebemos, também, o que Gimeno Sacristán (2000) afirma que o “currículo
enfatizado é o selecionado de fato como conteúdo dos procedimentos de controle” (p. 311), ou
seja, dos mecanismos de avaliação. Sendo assim, “a avaliação atua como pressão modeladora da
prática curricular” (p. 311) que, juntamente com outros componentes, auxilia na transformação
do currículo prescrito determinado pela política curricular de um país, estado ou município em
currículo em ação, ou melhor, como ele se concretiza no cotidiano da escola.
3.4. O CURRÍCULO AVALIADO
Para analisarmos o currículo com o intuito de obtermos um retrato mais real do que
ocorre na sala de aula, nada melhor do que analisar as práticas de controle internas e externas:
Os trabalhos acadêmicos que estes [os alunos] realizam, os exames que o professor/a
impõe, nos quais se valorizam certos conhecimentos adquiridos e reproduzidos de
71
forma singular, ou os que se valorizam em provas externas, serão um indicador muito
decisivo para saber o que se sugere e obriga a aprender e como fazê-lo (GIMENO
SACRISTÁN & PEREZ GÓMEZ, 1998, p.139).
Dessa forma, o professor ou professora, através da avaliação exercem uma prática de
controle interna. No cotidiano da sala de aula percebe-se que o ensino se realiza num clima de
avaliação, pois os alunos sabem que são avaliados quando são interrogados sobre algum assunto,
quando suas tarefas são inspecionadas ou se o reprovam.
A avaliação atua como uma “pressão modeladora da prática curricular” (GIMENO
SACRISTÁN, 2000, p.311), ou seja, é um procedimento que faz o controle real do currículo, pois
através dela se conhece o que está sendo valorizado ou não pelo professor para ser ensinado para
os alunos.
As avaliações têm várias funções, mas a que se destaca é a função reguladora da
passagem dos alunos pelo sistema escolar que sanciona a promoção ou não destes (GIMENO
SACRISTÁN, 2000). Quando o progresso do aluno, no sistema escolar, depende totalmente do
professor, ele deixa nas mãos do docente o controle que, muitas vezes, classifica o estudante sem
diagnosticar as dificuldades.
Ao nos referirmos à realidade do currículo e à qualidade do ensino, não bastam como
informação apenas as notas expressas pelos professores a partir das avaliações. Quando a
avaliação tem função diagnóstica, ocorre um aprofundamento na democratização da escola e do
currículo, mas pode ser encarada como uma ameaça à autonomia dos professores:
A avaliação para o diagnóstico e o controle democrático da qualidade do ensino e do
currículo distribuído pode ser vista como uma ameaça para a autonomia das partes,
especialmente dos professores, mas também é um recurso para evitar a
patrimonialização de uma atividade e é necessário para o funcionamento de uma
sociedade democrática (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p.313).
A avaliação é, portanto, uma atividade que não deve ser restrita aos professores como
um “patrimônio exclusivo”. E o currículo que não se avalia ou que o faz apenas por meio das
avaliações dos professores não se aperfeiçoa, uma vez que a função fundamental da avaliação no
processo didático “é a de informar ou dar consciência aos professores sobre como andam as
coisas em sua classe, os processos de aprendizagem de cada um de seus alunos que se
desencadeiam no ensino, etc” (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p.331).
72
Além das práticas de controle interno também existem as de controle externo,
representadas pelas avaliações externas: “O modelo de controle externo de produtos, com as
deficiências de que acusam os sistemas nos quais se pratica, tem, em certa medida, algum valor
de informação comprovável” (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p.313). Assim, não bastam apenas
as informações provenientes das avaliações dos professores para o diagnóstico do funcionamento
do sistema escolar e do currículo, pois
é recurso para evitar a patrimonialização de uma atividade [avaliação] e é necessário
para o funcionamento de uma sociedade democrática. À medida que não mais
informação sobre o sistema do que a que os professores dão com a avaliação de alunos,
as disfunções que esse dados possam detectar poderiam repercutir numa imputação aos
professores como únicos responsáveis do sistema e não a outros condicionamentos do
mesmo, além de reproduzir as condições nas quais se obtêm e os critérios que lhes
servem de base (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p. 313).
No Brasil, ocorrem as duas práticas, controle interno e externo com a avaliação da
aprendizagem exercida pelos professores e a avaliação externa ou institucional, para o ensino
fundamental, sob responsabilidade do governo paulista, o Saresp ou federal, o SAEB.
O Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) foi
implantado em 1992 pela SEE/SP, “reconhecida como urgente e necessária pelos dirigentes
educacionais e pelos educadores do Estado: caminhar em direção à construção de uma política de
avaliação de sua Rede de Ensino” (SÃO PAULO, 1998b, p.10). O Saresp é definido como um
sistema de avaliação de desempenho dos alunos dos ensinos fundamental e médio subsidiando a
SEE nas tomadas de decisão quanto à política educacional do estado. Segundo a SEE/SP: “a
avaliação educacional, em especial a externa, constitui, em última instância, importante
instrumento para que se possa repensar o ensino e aprimorar seu padrão de qualidade no Estado
de São Paulo” (SÃO PAULO, 1998b, p.10).
A avaliação passa a ser concebida, para a SEE/SP, e também para o governo federal,
como um instrumento a serviço da melhoria da qualidade da educação, pois, através do Saresp,
são detectadas as dificuldades de aprendizagem dos alunos e as necessidades de apoio técnico
para o corpo docente através de atividades de capacitação:
Os resultados constituem uma espécie de mapa que aponta os pontos fortes e fracos do
desempenho do corpo discente nas disciplinas e séries avaliadas [...] Os resultados da
avaliação, devidamente levados em conta, podem indicar caminhos para as atividades
de capacitações propostas pelos órgãos centrais ou pelas Diretorias de Ensino (DEs)
para serem desenvolvidas junto às escolas (SÃO PAULO, 1998b, p.12-13).
73
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), foi criado em 1990 e
“foi a primeira iniciativa brasileira no sentido de conhecer a fundo os problemas e deficiências de
nosso sistema educacional, para orientar com maior precisão as políticas governamentais voltadas
para a melhoria da qualidade de ensino” (UEMA, 2003, p.1). A avaliação ocorre a cada dois anos
e dela participam alunos do ensino fundamental e médio.
Ambos os sistemas de avaliação externa, Saresp e Saeb, surgiram no contexto das
mudanças pelas quais o país começou a sofrer em função do neoliberalismo atuar nas políticas
públicas, especialmente nas educacionais. A avaliação se tornou a diretriz governamental e a
LDB, Lei 9.394/96, trouxe, em seu artigo 9º, as incumbências da União e, entre elas, a de
“assegurar o processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio
e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a
melhoria da qualidade de ensino” (SÃO PAULO, 1998b, p.5).
Dessa forma, segundo a visão neoliberal, a qualidade do ensino é conseguida por
intermédio da avaliação externa do que ocorre nas escolas. Daí se falar na necessidade de formar
uma “cultura avaliativa” no Brasil.
A avaliação é, portanto, “um instrumento importante da prática curricular atuando como
balizadora no processo de definição dos conteúdos a serem privilegiados” (KNOBLAUCH, 2004,
p. 131). E, quando se coloca a questão da mudança na prática avaliativa, a mesma autora afirma
que esta
(...) deveria passar, inicialmente, por uma revisão dos critérios de avaliação tornando-
os mais explícitos, considerando as possibilidades reais para a efetivação da pretendida
mudança. Ou seja, qualquer mudança deveria estar acompanhada de outras alterações
como o número de alunos por sala de aula, a jornada de trabalho com melhores salários
e uma melhor formação dos professores (KNOBLAUCH, 2004, p.132).
Assim, apesar de preconizar outras mudanças que auxiliariam a prática avaliativa, seja
na formação inicial dos professores ou em transformações na estrutura escolar, estas não vão ao
encontro do que as políticas educacionais neoliberais determinam como sendo “gastos para a
educação”, com exceção para a formação continuada dos docentes. Menor número de alunos por
sala de aula, menor jornada de trabalho e melhor salário para os professores constituem custos
que prejudicam os sistemas de ensino, na visão neoliberal. Como constatou Lourencetti (2004),
ao analisar as mudanças no sistema educacional paulista:
74
A todo esse projeto de reorganização do sistema educacional paulista, mais do que
concretizar aquilo que determina a LDBEN, está subjacente a interferência do Banco
Mundial, seu principal financiador. E como todas as reformas propostas são assentadas
em índices econômicos, Torres (1996) afirma que o número de alunos por professor (o
tamanho da classe) e o aumento do salário docente não são considerados, pelo Banco
Mundial, como fatores incidentes sobre o rendimento escolar dos alunos.
Provavelmente por causa disso, no Estado de São Paulo, escolas foram fechadas, várias
classes ficaram superlotadas e professores continuam com salários muito abaixo
daquilo que deveriam ganhar. Ela ressalta ainda que a instituição recomenda que seja
investido mais dinheiro em bibliotecas, livros didáticos, laboratórios, etc. Isto se deu na
prática. O que se observou nos últimos anos, na rede pública paulista, foi a chegada de
muitos livros às escolas, para a biblioteca, e aquisição de computadores para as escolas
públicas. Os alunos também receberam livros didáticos dos diferentes componentes
curriculares e alguns computadores para serem utilizados (LOURENCETTI, 2004,
p.136).
Percebe-se, portanto, que o Banco Mundial com seu receituário de ajuste neoliberal adota
como proposta o investimento em material didático e computadores, mas os salários baixos dos
professores e as salas superlotadas não são “fatores incidentes sobre o rendimento escolar dos
alunos”. A autora ainda salienta a “lógica dos números e índices” quando se refere ao bônus
salarial e à concessão de verbas às escolas mediante os resultados do Saresp:
Na medida em que se condiciona o recebimento de verbas à obtenção de certos
resultados, uma pressão explícita sobre os professores e as escolas. Isso confirma a
idéia de que a preocupação dos elaboradores de políticas públicas centraliza-se na
obtenção de resultados e índices, caso contrário não ocorreria o atrelamento do
desempenho às verbas. Parece então prevalecer a lógica dos números e dos índices:
maior número de aprovados, menor número de evadidos e retidos, maior quantidade de
alunos nas escolas, menor quantidade de faltas docentes. Não haveria nenhum problema
nessa lógica se ela viesse acompanhada pela lógica da qualidade, mas nossos
professores são conscientes dessa falsa situação (LOURECENTTI, 2004, p.136)
Dessa forma, a lógica dos números e índices almejados pelo governo estadual deveriam
ser acompanhados pela qualidade da educação, mas não é o que ocorre na realidade, pois de
acordo com Freitas (2003):
Essa é a visão de qualidade que informa as políticas públicas neoliberais que se valem
de sistemas nacionais de “avaliação” (ENC – Provão, SARESP, etc.), para monitorar os
resultados das escolas de forma quantitativa e genérica (comparativa), criar competição
(segundo elas, mola- mestra da qualidade) e reduzir gastos o modelo é amplamente
conhecido e aplicado no campo empresarial (FREITAS, 2003, p.80-81).
75
O autor não considera estes sistemas como sendo de avaliação, “já que não possuem
formas de retorno adequadas aos avaliados que permitam encaminhar a superação da situação
avaliada” (FREITAS, 2003, p. 80). Sendo assim, que qualidade seria essa tão propagada se a
avaliação tem como finalidade observar os resultados das escolas de forma classificatória tendo
em vista apenas a comparação e a competição entre elas?
76
4. A AVALIAÇÃO MEDIANTE AS MUDANÇAS INTERNAS NO SISTEMA
EDUCACIONAL
4.1. O PERÍODO DE 1961 A 1998: A LEGISLAÇÃO E O CONTEXTO HISTÓRICO
Sousa (1990) explica que a legislação educacional, através de diretrizes e normas,
exprime os “princípios norteadores do sistema educacional de um país (p.108). Como a escola é
uma instituição que pertence ao sistema educacional, reflete as orientações legais vigentes em sua
administração e pedagogia. Daí a relevância de analisarmos as legislações que conceberam as
concepções de avaliação para que fossem transmitidas às escolas.
Dessa forma, iniciamos a nossa análise a partir da Lei4.024/61, a primeira LDB. Ela
foi aprovada pelo Senado e sancionada pelo Presidente da República João Goulart, em 1961, após
ter permanecido por 13 anos no Congresso. Portanto, não era adequada às necessidades
educacionais brasileiras no momento de sua promulgação, pois foi elaborada para um país ainda
pouco urbanizado, sendo que o Brasil estava industrializado quando foi aprovada. Como
enfatiza Ghiraldelli Jr. (2003):
No final da década de 1950 e início dos anos de 1960 o Brasil deixou de ser um país
“essencialmente rural”. Não que sua produção econômica tenha se tornado uma
produção feita nas cidades, de base industrial, mas sim pelo fato de que a população
urbana, pela primeira vez, aparecia no censo como maior que a população rural (p.117).
Ainda para Ghiraldelli Jr. (2003), a LDB Lei 4.024/61, por ter permanecido por 13
anos no Congresso, “nasceu velha (p.142), pois o contexto havia se modificado com uma
população urbana superior à rural. A Lei de Diretrizes e Bases de 1961 não era, portanto,
adequada às novas necessidades educacionais que os parlamentares não souberam perceber.
Com a ditadura militar instaurada em 1964, os governantes reorientaram o ensino no
país provocando alterações na legislação educacional. Mantiveram a LDB Lei 4.024/61, mas
77
fizeram ajustes que consideraram necessários através de leis que reformaram o ensino superior
(Lei Federal 5.040/68) e os ensinos primário e secundário (Lei Federal 5.692/71). Pela Lei
Federal 5.692/71, os ensinos primário e secundário passaram a serem denominados,
respectivamente, 1º e 2º graus.
A Lei Federal 5.692 de 1971 não significou, portanto, uma ruptura significativa em
relação à Lei 4.024/61, pois os “fins da educação” foram incorporados. Sendo assim, a
educação tinha por objetivos a necessidade de “proporcionar ao educando a formação necessária
ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para
o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania” (BRASIL, 1971). Ghiraldelli Jr.
(2003) ressalta ainda que a Lei 5.692/71 “não significou uma ruptura com a LDB4.024/61”
(p.142). Coloca esse autor que a Lei 5692/71 incorporou os objetivos gerais da LDB
4.024/61:
Tais objetivos diziam respeito à necessidade de “proporcionar ao educando a formação
necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-
realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício da cidadania”
(GHIRALDELLI JR., 2003, p.142-143).
No entanto, havia princípios liberais na Lei 4.024/61, devido à democracia relativa
existente no Brasil dos anos 1950, que não existiam na Lei Federal 5.692/71 elaborada no
período da ditadura militar. Por isso, podemos considerar que os parlamentares ao elaborarem a
Lei 5.692/71 fizeram ajustes à LDB 4.024/61 adequando-a ao novo contexto político sem
que houvesse discussão.
Ghiraldelli Jr. (2003) conclui que “A LDB de 1971[Lei Federal], por sua vez, não
chegou a ter um parto com os devidos cuidados, assim, sem que o Congresso pudesse modificá-
la, ela veio à luz sem discussão, tanto que não sofreu nenhum veto presidencial” (p.142).
A falta de discussão era própria para esse período ditatorial que firmou, através do
Ministério da Educação e Cultura (MEC), 12 acordos com a United States Agency for
International Development (Usaid), dos Estados Unidos. De acordo com Romanelli (2006), um
dos aspectos “identificável na maior parte dos acordos, consiste não na análise parcial e
tendenciosa dos problemas educacionais brasileiros, mas também e principalmente, na utilização
da crise do sistema como justificativa para a assinatura dos mesmos”. E que os acordos
trouxeram “benefícios maiores para o país fornecedor do que para o país beneficiário” (p.215).
78
Existia influência norte-americana também nas concepções de avaliação, durante a
década de 1970, “em toda a área educacional, tinham como suporte um paradigma positivista e
eram fortemente orientadas pela produção dos avaliadores norte-americanos”, de acordo com
Sousa (1998, p.162). Podemos refletir sobre essa influência norte-americana como uma extensão
da dominação econômica e cultural a que estava sendo submetido o Brasil em relação aos
Estados Unidos.
As mudanças nas concepções de avaliação, por parte dos educadores brasileiros,
ocorreram principalmente na década de 1980, quando começaram a refletir sob influência dos
educadores dos países europeus. Surge a idéia de que a escola era reprodutora das desigualdades
sociais tendo a avaliação uma função política quando utilizada de maneira classificatória
discriminando, principalmente as crianças das camadas populares.
A educação, segundo o artigo 205 da Constituição Federal de 1988, é direito de todos e
dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificação
para o trabalho (BRASIL, 2005, p.148) e tem como alguns princípios estabelecidos no artigo 206,
igualdade de condições para o acesso e permanência na escola e garantia de padrão de qualidade
(BRASIL, 2005, p.148) entre outros. E, a partir da nova Constituição brasileira de 1988, houve a
mudança da legislação educacional em vigor, tendo sido elaborada e aprovada uma nova LDB
(Lei nº 9.394/96).
Esta nova LDB foi pensada no contexto do neoliberalismo quando veio a ser acionada
como um instrumento de ajustamento da educação às demandas do mercado numa economia
globalizada centrada na tão decantada sociedade do conhecimento, de acordo com Saviani
(2004, p.50).
Através do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional e do Banco
Interamericano de Desenvolvimento são realizados os processos de ajuste e reestruturação
neoliberal nos países latino-americanos.
Pressões destes organismos internacionais levaram a uma drástica redução de gastos nas
políticas sociais enquanto se acena com a possibilidade de renegociação da dívida externa e de
novos empréstimos, desde que se limite a intervenção dos governos, o chamado Estado Mínimo.
79
Vários outros autores analisam as mudanças advindas da crise do Estado do Bem Estar
Social e da sua substituição pelo Estado neoliberal e entre eles está Afonso (apud ESTEBAN,
2004) como podemos observar:
Acontece, porém, que, mais recentemente, com a crise do Estado do Bem Estar Social e
a emergência do estado neoliberal, essas conquistas históricas dos cidadãos começaram
a estar fortemente ameaçadas, desde logo, porque o Estado neoliberal vem apostando na
redução substancial dos gastos com as políticas públicas e sociais, e tem abandonado ou
transferido para a iniciativa privada muitas das suas obrigações tradicionais (apud
ESTEBAN, 2004, p.85).
Mas, podemos encontrar o discurso neoliberal sendo propagado pelo país como no caso
de Salomão (2006), que defende, por meio de dados do Banco Mundial, Unesco e OCDE, a
existência de uma “prioridade invertida” no Brasil:
Para a maioria dos especialistas, o Brasil mantém décadas uma grande distorção na
forma como investe em educação. Embora tenha um volume de gastos comparável ao
de países desenvolvidos, o que torna o ensino brasileiro um dos piores do mundo é
justamente a decisão de colocar a maior parte do dinheiro nas universidades públicas -
enquanto o ensino fundamental e o médio, em que estão matriculados mais de 40
milhões de crianças e jovens, vivem em eterna crise por falta de recursos (SALOMÃO,
2006, p.28).
Assim, segundo o pensamento neoliberal expresso pela autora, a prioridade deveria ser,
portanto, o ensino fundamental e não o ensino superior. Prosseguindo em seu discurso Salomão
(2006, p.23), alega que, apesar de terem ocorrido avanços nos anos 1990 para a permanência dos
alunos na escola, segundo estudo da Unesco, “o Brasil demorará mais de 30 anos para alcançar o
nível educacional que as maiores economias têm hoje”. E, ainda existe o problema da qualidade
do ensino, pois para sustentar o crescimento numa economia globalizada, cada vez mais se exige
“garantir o suprimento de massas de pessoas qualificadas” (SALOMÃO, 2006, p.23). No entanto,
não podemos nos esquecer de que esses organismos mundiais (Banco Mundial, Unesco e OCDE)
são encarregados de divulgar o neoliberalismo, apontado como solução para os problemas dos
países capitalistas.
Encontramos um outro discurso neoliberal nas palavras de Alberto Rodríguez que é
especialista em educação do Banco Mundial e coordenador de um estudo sobre as condições dos
principais países emergentes para a sua inserção na sociedade do conhecimento. Segundo ele
muitos problemas ocorrem devido aos problemas educacionais brasileiros:
80
muito tempo, sabemos que as deficiências do Brasil na educação afetam a
distribuição de renda e o crescimento pessoal dos indivíduos. Com a pesquisa, ficou
claro que essas deficiências também provocam a perda de competitividade do país em
relação a economias com as quais disputa o mercado global (apud SALOMÃO, 2006,
p.21).
Sendo assim, segundo a ótica do Banco Mundial os problemas educacionais impedem a
melhoria de condições de vida da população e o Brasil é ultrapassado por outros países que
competem com ele no mercado internacional, como China, México e Rússia.
Empresários entrevistados pela revista Exame demonstraram sua preocupação com a
baixa qualidade de ensino que afeta o suprimento de pessoas qualificadas para o trabalho (seu
único interesse) como podemos notar pelas citações abaixo:
Se o Brasil engrenar um novo surto de crescimento, vai parar por falta de gente
qualificada para trabalhar. (Marcos Magalhães, presidente da Philips).
Estou aflito com os baixos níveis educacionais do Brasil - estamos perdendo a corrida
da competência no mundo globalizado. (depoimento de Jorge Paulo Lemann, acionista
da INBEV e das Lojas Americanas) (apud SALOMÃO, 2006, p.26).
Não podemos nos esquecer, porém, de que essa visão de qualidade tem como foco
principal a economia e a educação não é uma mercadoria. Os organismos internacionais
diagnosticaram que a educação dos países latino-americanos, inclusive a do Brasil, está em crise
devido à baixa qualidade de ensino. Segundo Candau (2002), os diagnósticos sobre os sistemas
educativos, orientados por técnicos de organismos internacionais e por profissionais locais são
elaborados
[...] geralmente com base em enfoques economicistas e centrados no tema da
produtividade e da necessidade de gerar reformas educativas que favoreçam a inserção
dos respectivos países na lógica da competitividade, imprescindível num mundo cada
vez mais globalizado e regido pelo livre mercado (CANDAU, 2002, p.32).
E as questões levantadas não permitem uma análise mais ampla sobre a educação, pois
Sem dúvida o que mais chama a atenção é o enfoque altamente economicista e
eficientista que os fundamenta [os diagnósticos] e que impede um olhar mais amplo e
abrangente sobre a educação, que não se limite a focalizá-la pragmaticamente na sua
articulação e subordinação à lógica produtiva (CANDAU, 2002, p.33).
81
Assim, a educação é encarada como a redentora, pois através dela serão superados
todos os problemas e todas as dificuldades pelas quais passam os países emergentes e dela
depende a maior produtividade nesse mundo competitivo caracterizado pela globalização.
Através da “cooperação” e da “assistência técnica” dos organismos internacionais, e
entre eles o Banco Mundial, os países subdesenvolvidos conseguem volumosas somas de
recursos que aumentam suas dívidas externas, enquanto que os projetos implantados são
determinados por estes organismos multilaterais que detêm, portanto, o controle ideológico ao
definirem o seu conteúdo e os seus limites.
Ao analisar os impactos destas políticas de ajuste promovidas pelos neoliberais, Gentili
(1998) destaca graves conseqüências: “uma redução progressiva do gasto em educação” (para
que sejam pagas as dívidas externas), “privatização direta ou indireta do ensino público e
agravamento nas péssimas condições de ensino e aprendizagem nas instituições escolares” (p.33-
34).
Para concluir, Gentili (1998) ainda comenta que
[...] depois do dilúvio neoliberal, nossas escolas serão muito piores do que são agora.
Não se trata de um problema de qualidade pedagógica, ainda que também o seja. Trata-
se de um problema político e ético: nossas escolas serão piores porque serão mais
excludentes (p.35).
Nesse cenário nada promissor de neoliberalismo foram implementadas mudanças
derivadas dos ajustes que foram promovidos pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo
governador paulista Mario Covas, ambos do partido político PSDB. No estado de São Paulo entre
as mudanças está a implantação da progressão continuada e dos ciclos, inaugurando uma nova
forma de avaliação, sem a reprovação, exceto no final de cada ciclo. Procuramos, então, através
da legislação compreender as mudanças ocorridas em relação à avaliação, desde 1961 até a nova
LDB.
82
4.2 ANALISANDO A AVALIAÇÃO ATRAVÉS DA LEGISLAÇÃO
A avaliação se faz presente em muitos momentos de nossas vidas, seja em casa, no
trabalho ou no lazer. Sempre avaliamos o que é melhor a ser feito ou se gostamos ou não de
determinadas atitudes das pessoas que nos cercam, se apreciamos ou não um filme etc.
Mas a avaliação na escola é mais complexa. Para Sousa (1998) “a avaliação é uma
atividade socialmente determinada”. Quando um (a) professor (a) avalia deve ter em mente “a
concepção do homem que se quer formar e das funções atribuídas à escola em uma determinada
sociedade” (p.165).
A avaliação é uma prática educativa que explicita e acaba legitimando a função que a
escola vai ter segundo os determinantes sociais.
Como peça importante, a avaliação pode transformar a prática pedagógica conferindo-
lhe “significado e qualidade” (SAUL, 2004, p. 15).
Em outro trabalho, Saul (2004) explica que a avaliação pode ser uma “grande janela
pela qual podemos entrar e alterar nossas práticas cotidianas, o nosso projeto pedagógico e a
escola como um todo” (p.14).
Mas, para que ocorram transformações, Sousa (2002) alerta que o professor deve ter um
compromisso com a aprendizagem de todos os alunos. Demo (2002) complementa essa idéia
descrevendo, ao pesquisar a temática, que o professor tem “a obrigação ética e profissional de
garantir a aprendizagem do aluno. É mister, pois, saber levantar os problemas e, em seguida,
enfrentá-lo a fundo” (p.67).
Sendo assim, no processo ensino-aprendizagem, é importante que o professor assuma
um posicionamento, perante os alunos, consciente de “seus compromissos formal e político”,
segundo expressão citada por Demo (2003, p.3), para fazê-los aprender. Ao avaliar os seus alunos
o (a) professor (a) deve entender que a “avaliação não é um processo meramente técnico; ela
implica um posicionamento político e inclui valores e princípios” (DEMO, 2003, p.106).
E, se a avaliação é tão importante, qual seria o modelo que foi proposto nacionalmente e
como este teria sido incorporado pela Secretaria de Estado da Educação de São Paulo e repassado
aos professores da rede pública de ensino fundamental? Este questionamento norteia a pesquisa e
suscita outros questionamentos pertinentes ao tema.
83
O que nos leva a refletir novamente: o que pretendemos que nossos alunos aprendam?
Como conseguiremos atingir, com a avaliação, os objetivos que pretendemos? Qual concepção de
avaliação está sendo usada e com qual objetivo?
Sousa (1990) explicita as concepções de avaliação da aprendizagem fazendo uma
retomada da legislação, numa perspectiva histórica que inclui os anos de 1931 até 1981.
Para a autora, as diretrizes e normas que são expressas pela legislação educacional
orientam o sistema educacional de um país e, como a escola é uma instituição pertencente ao
mesmo, reflete em suas estruturas administrativa e pedagógica as orientações legais.
Dessa forma Sousa (1990, p. 109), analisando a legislação referente à avaliação,
pretendeu evidenciar as concepções existentes subjacentes aos textos legais, que sintetizou no
quadro a seguir:
84
Quadro 1: Legislação referente à avaliação
Períodos 1930 1940 1950 1960 1970 1980
Concepção
de
Avaliação
31-------------
-
-----------42------ -------------61--- -----71-- ----81...
O que é avaliação
da Aprendizagem
Procedimentos de
atribuição de notas
aos alunos
mediante seu nível
de desempenho
nas provas e
exames
Procedimento de
mensuração, voltado
para a representação
quantificada do
rendimento
apresentado pelo
aluno em exercícios e
exames.
Procedimento de
julgar o
aproveitamento do
aluno. Quanto ao seu
grau de
satisfatoriedade para
a série em curso
Procedimentos de
determinar até que ponto
foram atingidos os
objetivos educacionais
Para que se
realiza?
Para classificar e
selecionar alunos
com condições de
prosseguir nos
estudos
Para a classificação
do aluno de acordo
com o nível de
aproveitamento
apresentado nas
diversas disciplinas,
tendo em vista a
seleção daqueles em
condições de
prosseguir ou concluir
os estudos.
Para aferir o grau de
aproveitamento do
aluno, tendo em vista
selecionar aqueles
em condições de
serem promovidos à
série imediatamente
superior.
Para fornecer dados
para orientar a
reformulação
curricular.
Para apoiar a decisão
quanto à promoção do
aluno.
Quais os
princípios
orientados?
Inflexibilidade
Imparcialidade
Objetividade
Continuidade
Compatibilidade
com o trabalho
desenvolvido
Compreensão
Continuidade
Amplitude
Compatibilidade
com os objetivos
propostos
Como realizar?
Mediante:
Argüição oral
Trabalhos
práticos
Provas
Mediante:
Exercícios
Provas
Mediante:
Provas
Exames
Outros
instrumentos
adotados pelo
professor
Mediante:
Instrumentos
elaborados pelo
professor.
Quem é o
responsável?
Professor Professor Professor Professor
Fonte: SOUSA, 1990, p.109.
Segundo Sousa (1990),
Observa-se que, ao longo do tempo houve alterações quanto à concepção de avaliação
subjacente à legislação: inicialmente, consistia em julgar o desempenho do aluno, de
forma imparcial e objetiva, a partir do cômputo de acertos e erros apresentados nas
questões das provas e exames; posteriormente, a avaliação da aprendizagem como
procedimento de julgar o desempenho do aluno passou a se basear em critérios
expressos nos objetivos previstos e a ser realizada de forma ampla e contínua (SOUSA,
1990, p. 109-110).
85
Sendo assim, de 1931 a 1981, modificou-se a forma de se pensar a avaliação, pois se
percebe que esta era definida como “procedimento de atribuição de notas aos alunos”, ou
“procedimento de mensuração”, ou “procedimento de julgar o aproveitamento do aluno” como se
a avaliação fosse uma técnica a ser utilizada para promoção ou retenção (SOUSA, 1990, p.110).
Na última etapa analisada, Sousa (1990) cita uma modificação de 1972 a 1981: a
avaliação deixa de ser definida como “procedimento” e passa a ser chamada de “processo de
determinar até que ponto foram atingidos os objetivos educacionais” (p. 109). Percebe-se que
começa-se a pensar a avaliação como diagnóstico.
Através do quadro elaborado por Sousa (1990) percebemos ainda que a avaliação era
apenas classificatória sendo que, a partir de 1971, além de apresentar essa característica, também
visava a “fornecer dados para o acompanhamento, controle e reformulação das propostas
curriculares” (p. 110).
Porém, uma semelhança se impõe a todos os períodos: o responsável pela avaliação
seria somente o professor, com a avaliação de aprendizagem.
Quando recorremos a uma das legislações de um período analisado por Sousa (1990), a
Lei de Diretrizes e Bases de 1961 (Lei 4.024) percebemos como a avaliação educacional
esteve notadamente restrita ao âmbito escolar. Na leitura do artigo 39 da LDB, Lei 4.024/61,
notamos: “A apuração do rendimento escolar ficará a cargo dos estabelecimentos de ensino, aos
quais caberá expedir certificados de conclusão de séries e ciclos e diplomas de conclusão de
cursos” (BRASIL, 1961).
No parágrafo primeiro do artigo 39, da referida lei consta que: “Na avaliação de
aproveitamento do aluno preponderarão os resultados alcançados, durante o ano letivo, nas
atividades escolares, asseguradas ao professor, nos exames e provas, liberdade de formulação de
questões e autoridade de julgamento” (BRASIL, 1961).
No parágrafo segundo, do mesmo artigo, completa-se a idéia de autonomia dos
professores e da escola na decisão sobre avaliação dos alunos, quando se refere: “Os exames
serão prestados perante Comissão examinadora, formada de professores do próprio
estabelecimento e, se este for particular, sob fiscalização da autoridade competente” (BRASIL,
1961).
Neste artigo e nestes parágrafos da Lei 4.024/61 percebe-se, portanto, que era
assegurada ao professor, nas provas e exames, autonomia para formular questões e avaliar seus
86
alunos decidindo sobre sua aprovação ou reprovação, após os “resultados alcançados” por eles
durante todo o ano letivo, ficando sob a responsabilidade da escola apurar o rendimento escolar e
expedir certificados e diplomas.
A partir da Lei Federal5.692/71, observa-se que surge a idéia de ênfase, no processo
de aprendizagem e nos aspectos qualitativos e não mais na preocupação com a objetividade dos
resultados e dos instrumentos de medida, como podemos verificar no parágrafo primeiro do
artigo 14 desta lei, que incide sobre a verificação de rendimento escolar: “Na avaliação de
aproveitamento, a ser expressa em notas ou menções, preponderarão os aspectos qualitativos
sobre os quantitativos e os resultados obtidos durante o ano letivo sobre os da prova final, caso
seja exigida” (BRASIL, 1971).
Sendo assim, a maior ênfase deveria ser dada à avaliação de habilidades, não bastando
que os alunos adquirissem determinada quantidade de conhecimentos.
Consultando a separata do livro Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Documentos
Básicos para a implantação da Reforma de Ensino de 1º e graus), da Secretaria de Estado dos
Negócios de Educação (SÃO PAULO, 1974), deparamos-nos com as diretrizes referentes à
avaliação, promoção e recuperação: “O processo de avaliação consiste em acompanhar o
desenvolvimento do aluno em diferentes experiências de aprendizagem, tendo em vista os
comportamentos esperados e desejados para o final da série” (SÃO PAULO, 1974, p.2).
A sugestão que é feita pela Secretaria de Educação de São Paulo (outrora chamada de
Secretaria de Estado dos Negócios da Educação) é a de que “no início do ano letivo deverão ser
identificadas as condições em que se encontram os alunos nas diferentes áreas de estudo”. A
avaliação diagnóstica deveria ocorrer, portanto, no início do ano letivo, em todas as disciplinas,
pois se pensava a avaliação como “um processo contínuo que deve ocorrer paralelamente ao
processo de aprendizagem”. O documento se encerra afirmando que a avaliação que deveria ser
realizada “não se reduz a uma mera soma ou média de pontos obtidos fragmentariamente” (SÃO
PAULO, 1974, p.1-2).
Apesar disso, notamos a preocupação, na Lei 5.692/71, em classificar os alunos
através da avaliação, além de utilizar os dados obtidos por meio dela, para fazer “o
acompanhamento, controle e reformulação das propostas curriculares” (SOUSA, 1990, p. 110).
A Lei 5.692/71 foi aprovada durante o período da ditadura militar (1964/1985) para
fazer o ajuste considerado necessário pelo governo na organização do ensino. Após o golpe de
87
1964, uma nova situação política estaria definida (a ditadura), estabelecendo modificações na
legislação educacional.
Mas, segundo Saviani (2004b) “[...] o governo militar não considerou necessário
modificá-la totalmente mediante a aprovação de uma nova lei de diretrizes e bases da educação
nacional” (p.41).
Sendo assim, permaneceria a mesma LDB (Lei 4.024/61), pois o governo queria que
houvesse a continuidade da ordem sócio-econômica e as diretrizes gerais da educação não
precisavam ser alteradas.
Através da Lei 5.692/71, portanto, houve a sua adequação para os ensinos primário e
médio que passaram a ser denominados, respectivamente, de ensinos de e graus. O ensino
de Grau era constituído por oito anos (1ª a séries) e o de Grau, por três anos (1ª, e
séries).
De acordo com Sousa (1998), até a década de 1970 as concepções sobre avaliação na
educação eram orientadas principalmente pelos estudos dos avaliadores norte-americanos e
tinham “como suporte um paradigma positivista”, ou seja, “Só poderia ser avaliado o que fosse
observável, ou através de provas ou por meio de algum outro tipo de instrumento de medida”
(SOUSA, 1998, p. 162).
Mas no final da década de 1970 e principalmente nos anos 1980, ocorreu o que Sousa
(1998) classificou como sendo a “função política da avaliação” (p.165).
Os educadores, segundo Sousa (1998) começaram a concluir que os alunos provenientes
das camadas populares estavam entre aqueles que mais sofriam, devido à avaliação classificatória
e discriminatória, com a evasão e repetência.
Diante deste fato, Sousa (1998, p.166) alega que os autores da área de avaliação
começaram a buscar novos caminhos o que “resultou no redirecionamento da função da
avaliação.
A função da avaliação deveria ser “subsidiária”, pois a escola deveria possibilitar a
recuperação do aluno oferecendo-lhe condições de aprendizagem, não servindo mais para
legitimar sua aprovação ou reprovação visto que a decisão de retenção seria tomada pelo coletivo
das escolas.
Esses “novos caminhos” acabaram por se tornar, no entanto, teoria dissociada da
prática, pois no estado de São Paulo, entre 1983 e 1987, com relação à avaliação “[...] os
88
documentos oficiais registravam, sobretudo, a preocupação em questionar o tradicionalismo das
escolas na adoção dos procedimentos avaliativos de alunos” (MARTINS, 2003, p. 4).
Eram altos os índices de repetência e evasão na rede pública de ensino, reafirmando o
seu caráter excludente e demonstrando o fracasso escolar. Analisando os dados abaixo sobre o
número de aprovados de 1ª a 8ª séries das escolas estaduais paulistas, de 1975 até 1990, podemos
chegar a algumas conclusões:
Tabela 1 Número de aprovados no Ensino Fundamental da rede estadual de São Paulo - 1975 -
1990
ANOS 1ª a 4ª SÉRIE % 5ª a 8ª SÉRIE %
1975 1.212.950 80 840.941 75
1978 1.446.950 71 838.154 64
1979 1.463.905 70 817.962 63
1982 1.547.381 70 831.489 63
1983 1.625.309 71 842.852 61
1986 1.901.434 75 896.185 60
1987 1.938.632 75 914.012 62
1990 2.202.944 77 1.181.935 66
Fonte: SE/CIE; Fundação Seade (apud PEREZ, 2000, p.201).
Observando as taxas de aprovação da a série, podemos concluir que muitos alunos
foram reprovados ou se evadiram da escola, visto que os índices de aprovação não eram muito
expressivos. E que, em 1983 (ano da implantação do Ciclo Básico), a taxa de reprovação/evasão
era de 29%, sendo que em anos anteriores (1979 e 1982) a taxa era ainda maior (30%). Da 5ª a
série a situação era ainda mais aflitiva, pois os índices de aprovação eram bem menores se
comparados com os de 1ª a 4ª série.
Para diminuir os índices de repetência e evasão, o governo Montoro (1983/1987) lançou
o Programa Ciclo Básico (Decreto 21.883 de 8/12/1983, apud PEREZ, 2000, p. 94) que
89
permitia ao aluno das séries iniciais terem 2 anos para se alfabetizarem (sem reprovação na
série) podendo, segundo análise do(a) professor(a), passar para a 3ª série ao final desse período.
A política educacional do governo Montoro pretendia que a aprovação automática que
acontecia da para a série se propagasse para as demais séries, mas mesmo com o Ciclo
Básico tendo permanecido nos governos seguintes (Quércia-1987/1991 e Fleury-1991/1995), não
ocorreu essa propagação. Na gestão Quércia houve a permanência do Ciclo Básico com a ficha
descritiva sobre o rendimento dos alunos com a aprovação automática da para a série
(atingindo somente as duas primeiras séries do grau) e na gestão Fleury, com a implantação
das Escolas-Padrão, havia uma avaliação do rendimento dos alunos (do e graus), mas que
não se estendia para todas as escolas estaduais, pois algumas faziam parte deste projeto que
não se expandiu para toda a rede.
Segundo Garita (2005), no entanto,
Analisando-se a política de avaliação do governo Covas, percebe-se a continuidade do
“ideário” de avaliação do CB [Ciclo Básico], implantado no governo Montoro,
presentes no conjunto de medidas legais que foram gradativamente normatizando a
avaliação do rendimento escolar, culminando com a extensão desse “ideário”, para
todas as séries do ensino fundamental, através da Progressão Continuada (GARITA,
2005, p. 11).
Mário Covas substituiu Luiz Antônio Fleury Filho (1991/1995) no governo paulista
entre os anos de 1995/1998 e 1999/2001 e, apoiado no artigo 32 da nova Lei de Diretrizes e
Bases (Lei 9.394/96) implementou o regime de Progressão Continuada, com aprovação
automática em todas as séries dos ciclos I e II, com exceção da e séries em que os alunos
estariam sujeitos à reprovação. Por isso, Garita (2005) percebeu a continuidade no “ideário” do
Ciclo Básico. A avaliação é um dos pilares da progressão continuada e a LDB de 1996 é um dos
seus fundamentos legais. Daí a necessidade da análise da nova LDB e do seu sentido de
avaliação.
4.3. A NOVA LDB E O SEU SENTIDO DE AVALIAÇÃO
90
Com a redemocratização ocorrendo no Brasil a partir do fim da ditadura (em 1985),
uma nova Constituição foi elaborada pela Assembléia Constituinte e promulgada em 5 de outubro
de 1988. Segundo Saviani (2004) a constituição “manteve, como era esperado, o dispositivo que
atribui à União, em caráter privativo, a competência para fixar as diretrizes e bases da educação
nacional” (p. 46).
Segundo Demo (1997), na atual LDB brasileira (Lei 9.394/96) “ranços e avanços”
sendo que o primeiro ainda predominaria sobre o segundo (p.11). Apesar do autor não considerar
a nova LDB “inovadora”, ele percebe nela “dispositivos inovadores” que permitem avançar em
certos rumos (p.12). Entre as inovações levantadas por Demo (1997) estão as possibilidades de
organização da educação básica contidas no artigo 23 da lei nº 9.394/96:
A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos,
alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na
competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o
interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar (p.20).
Esse fato seria considerado um avanço, pois o aluno necessita aprender e todos os meios
deveriam ser utilizados a favor do fim maior que é a aprendizagem.
O compromisso com a avaliação também é considerado por Demo (1997) como sendo
um avanço, dizendo-se entusiasmado: “Até que enfim, a LDB consagra o princípio da avaliação
como parte central da “organização da educação nacional” (p.31).
O autor cita ainda que aparece o compromisso em se avaliar o rendimento escolar no
ensino fundamental, médio e superior chamando a atenção para as resistências que irão ocorrer,
pois “não nada que avaliadores mais detestem que ser avaliados (DEMO, 1997, p.33). E
ainda completa seu pensamento afirmando: “Da mesma forma, se avalio, não posso impedir que
me avaliem, pois avaliar e ser avaliado fazem parte da mesma lógica. Como decorrência quem
foge da avaliação perde a autoridade de avaliar” (p.33-34).
Como os docentes são “avaliadores profissionais”, portanto, devem ser também
avaliados, e nisso constaria para Demo (1997) a importância da inovação da nova LDB.
Mas o autor percebe uma “parte retrógrada no texto, pois se liga o conceito de ensino à
qualidade. Para Demo (1997) somente a educação é que “admite a expectativa qualitativa, que
91
o ensino, mais próximo do treinamento e da instrução, indica um horizonte tipicamente
quantitativo, do tipo “anos de estudo”, “horas-aula”, “dias letivos” etc (p.33).
É um problema confundir, por isso, educação e ensino, o que, segundo Demo (1997),
ocorre em toda a Lei nº 9.394/96: ela confunde ensino com qualidade.
Apesar dos professores temerem a avaliação externa, Demo (1997), assinala que “A
população tem todo o direito de saber o que sucede na escola e na universidade, bem como nos
órgãos administrativos que comandam os sistemas educacionais” (p.37).
Através da avaliação externa, a população ficaria, desta forma, a par do que ocorre na
escola/universidade onde seus filhos estudam.
Mas ainda recomenda que
[...] para diminuir a face agressiva da avaliação, o melhor remédio é a transparência
obsessiva. De outro, é crucial vencer a resistência, à medida que se puder mostrar que
avaliar os avaliadores faz parte do processo permanente de reconstituição da autoridade
permanente (DEMO, 1997, p.37).
Quanto à avaliação da aprendizagem, Demo (1997) cita o capítulo sobre a educação
básica, em especial o inciso V, do artigo 24, da Lei de Diretrizes e Bases 9.394/96: “a
verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios”:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos
aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre
os de eventuais provas finais;
b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar;
c) possibilidade de avanço nos cursos e séries mediante verificação do aprendizado;
d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
e)obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo,
para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de
ensino em seus regimentos (apud DEMO, 1997, p.40).
A partir do inciso V, do artigo 24, da Lei 9.394/96, Demo (1997) analisa a avaliação
da aprendizagem escolar que é tida de forma muito acertada na alínea a, pois a mesma deve ser
encarada como um “processo intrínseco do fenômeno da aprendizagem, e não como intervenção
externa e mais ou menos intempestiva” (prevalência dos aspectos qualitativos sobre os
quantitativos e de resultados ao longo do ano letivo) (p.40).
92
Quanto às alíneas seguintes (b e c), Demo (1997) elogia a possibilidade de aceleração
para os alunos que se atrasam e de que não se atrapalhe o aluno que tem um desempenho melhor
ressaltando ainda que
Também é pertinente essa ótica, porque instila saudável repúdio ao formalismo legal,
sobretudo de não atrapalhar o aluno que aprende com desempenho melhor, mas
incluindo também a possibilidade de iniciativas que busquem acelerar o aluno que se
atrasa (DEMO, 1997, p.40).
Ao analisar a alínea e, no entanto, Demo (1997) destaca “uma impropriedade gritante ao
preferir iniciativas paralelas”, pois atrapalha o que considera uma postura correta contida na
alínea a e porque “recuperação não pode ser algo paralelo (p.41), inferindo que
A avaliação tem seu sentido pedagógico em permitir tomar todas as iniciativas possíveis
e imagináveis, para garantir o direito de estudar e aprender. O docente precisa avaliar o
aluno todo dia, seja para ter em mãos de modo permanente um diagnóstico correto, seja
para, tomando por base esse diagnóstico, elaborar uma estratégia de combate ao
fracasso escolar. Isso implica um complexo de iniciativas que deve ser visto como
intrínseco ao processo de aprendizagem. Nada poderia ser paralelo (DEMO, 1997,
p.41).
O ato de avaliar seria, portanto, inerente ao próprio processo de aprendizagem, e o
professor deveria estar avaliando seu aluno todos os dias para que realmente fosse respeitado o
seu direito de estudar e aprender.
Quando analisa o artigo 32, que destaca o ensino fundamental, Demo (1997) acredita
que na LDB 9.394/96 aparece a preocupação crucial em torno da capacidade de aprender
(p.43). No entanto, o autor apesar de considerar a existência de modernidade no texto, considera
que é errado se referir à capacidade de aprender apenas a partir do ensino fundamental. E ainda
reclama do texto ao se referir à “avaliação do processo de ensino-aprendizagem” que consta do
parágrafo 2º, do artigo 32: “é mister reclamar que o texto é impróprio e obsoleto, no sentido de
usar a terminologia do ensino ao lado da aprendizagem, também algo superado na discussão
moderna” (p.43).
Em relação ao que considera “avanços” da nova LDB Demo (1997) ressalta o
tratamento ao “professor como o eixo central da qualidade da educação(p.45). Para ele o
professor ensina seus alunos e, para que eles aprendam, é relevante que os docentes também
93
aprendam. Ou como diz o autor: “somente o professor que aprende continuamente pode fazer o
aluno aprender (p.48). Valoriza, portanto, o aperfeiçoamento profissional continuado. Para este
autor não é profissional o professor que não está sempre estudando, pois, “nenhuma profissão se
desgasta mais rapidamente do que a do professor, precisamente porque lida com a própria lógica
da reconstrução do conhecimento” (p.49).
Além disso, na concepção de Demo (1997), a nova LDB também realça dois
componentes importantes: o aperfeiçoamento profissional continuado e a avaliação do
desempenho, sendo que este último provoca resistências, mas deve ser entendido como
necessário: “o profissional autêntico, que quer sempre aprender, em vez de fugir da avaliação, irá
exigi-la e participar do processo ativamente, até mesmo para evitar que se lhe escape” (p.50).
O professor tem, portanto, um papel essencial perante seus alunos “porque não se
aprende sozinho, mas sobretudo porque a aprendizagem precisa de motivação humana e
decorrente avaliação”(p.45).
Por fim, Demo (1997) acertadamente pondera que
Daí segue que todo o sistema deve estar à disposição dos direitos do aluno. Se um aluno
pode progredir com velocidade maior, terá a chance de apressar seu processo formativo.
Por outra, se se atrasar, a escola precisa envidar todos os esforços para recuperá-lo. Isso
não retira a possibilidade de reprovação sempre que o desempenho, apesar de tudo, não
for satisfatório. Mas, antes de reprovar, é mister empregar todo o arsenal possível e
imaginável para garantir o direito de aprender bem. Na escola vale a máxima: tudo vale
a pena se o aluno aprende bem. Mas vale também o reverso: nada vale se o aluno não
aprende (DEMO, 1997, p.2).
Na nova LDB (Lei 9.394/96) existe, em relação à avaliação, uma proposta de
valorização do desempenho do aluno em todo o ano letivo, com ênfase no processo de
aprendizagem, o que podemos perceber pelo artigo 24 que recomenda quanto à verificação do
rendimento escolar: “Avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência
dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de
eventuais provas finais” (BRASIL, 1996).
A partir da nova LDB (Lei 9.394/96) a educação escolar compõe-se de: educação
básica (formada pela educação infantil, ensino fundamental e médio) e pela educação superior,
de acordo com o artigo 21.
A Lei 9.394/96 também propõe a organização do ensino fundamental em ciclos,
podemos verificar no parágrafo 2º do artigo 32:
94
Os estabelecimentos que utilizam a progressão regular por série podem adotar no
ensino fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do
processo de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de
ensino (BRASIL, 1996).
Segundo Jacomini (2004), algumas experiências de organização do ensino em ciclos e
de progressão continuada ocorreram em algumas redes de ensino, como nos estados do Rio de
Janeiro, de São Paulo, e de Santa Catarina nos anos 1960, amparadas legalmente pelo artigo 104
da LDB 4.024/61 no qual “era permitida a organização de cursos ou escolas em caráter
experimental” (p. 403). Essas mudanças, prossegue a autora, “visavam a superação do fracasso
escolar, que se expressava nos altos índices de reprovação e evasão escolares” (p.405).
Portanto, não era novidade a idéia de progressão como forma de superar a reprovação e
evasão. Até mesmo na Lei5.692/71, em seu artigo 14, parágrafo 4º, percebe-se a possibilidade
dos sistemas de ensino se organizarem de forma não-seriada (JACOMINI, 2004, p.405). Um
exemplo ocorreu em São Paulo, na década de 1980, com o Ciclo Básico que também visava
superar os altos índices de reprovação/evasão.
Mas a grande mudança ocorre no Estado de São Paulo quando se adotou a política de
ciclos e a progressão continuada, conforme preconiza o artigo 32, da LDB nº 9.394/96.
Inicia-se, então, uma nova fase nas escolas públicas paulistas, pois a retenção é
possível no final de cada ciclo (4ª e 8ª séries) e é determinado o ritmo de aprendizagem do aluno:
“A forma de evolução escolar do aluno é de progressão continuada, ou seja, de avanço contínuo
dos alunos em um dado grupo de séries escolares” (SÃO PAULO, 1998, p. 21).
O regime de progressão continuada foi implantado para corrigir uma distorção que
havia no Estado de São Paulo, segundo Rose Neubauer (2000), ex-Secretária de Educação, que
esteve no comando da SEE/SP por ocasião de sua implantação em 1998. Ressaltava Neubauer:
Somente na rede estadual paulista, no início da década de 90, cerca de 1.5 milhões de
alunos, a cada ano, eram expulsos ou fracassavam na escola. Desde o final dos anos 80,
os índices de evasão haviam atingido patamares absurdamente altos. [...] tem
contribuído para esses índices o modelo de escola que exclui e violenta seus alunos,
com o qual temos convivido quase sem questionamento (NEUBAUER, 2000, p.14).
Neubauer (2000, p.17) em seu artigo Quem tem medo da progressão continuada? Ou
melhor, a quem interessa o sistema de reprovação e exclusão social? escrito quando era
95
Secretária da Educação de São Paulo (1995/2002), justificava a implantação da progressão
continuada em ciclos afirmando que a reprovação passa a ser marca do fracasso não do aluno,
mas,
da escola, do trabalho do professor, da organização do sistema de ensino que tem de ser
avaliado, questionado, revisado e repensado nos seus pontos frágeis. A cada final de
ano, ou o aluno conseguiu avançar mais, aprender, ou foi a escola que ficou para trás
(NEUBAUER, 2000, p.17).
No mesmo ano, em 2000, a então Secretária de Educação paulista, a SEE/SP lançara para
a sua rede de ensino (por ocasião do planejamento escolar) um documento intitulado: A
Construção da Proposta Pedagógica da Escola: A Escola de Cara Nova.
Este documento, por meio do título, expressava o momento de mudança pela qual a
rede pública de ensino paulista estava passando e era constituído por textos que serviriam para
subsidiar as reflexões do planejamento do ano de 2000. Os assuntos relacionados eram:
Progressão Continuada, Avaliação e Projeto Pedagógico.
Verificamos a defesa à Progressão Continuada como uma medida que: “Altera
radicalmente o percurso escolar e, como resultado, a forma pela qual os alunos nele se
movimentam” (SÃO PAULO, 2000, p. 15).
Recomendava-se uma alteração radical quanto às concepções de ensino, de
aprendizagem e de avaliação:
A compreensão que temos hoje do processo de ensino e aprendizagem exige um outro
olhar para o processo de avaliação, que não pode mais se limitar a ser um procedimento
decisório quanto à aprovação e reprovação do aluno. Aprovação e reprovação são
distorções perversas do conceito de avaliação (SÃO PAULO, 2000, p. 14).
A avaliação deveria ser, portanto, compreendida como um procedimento pedagógico
através do qual o professor verifica continuadamente o progresso da aprendizagem de seus alunos
decidindo, se necessário, sobre a recuperação e o reforço.
Reforçava-se que “agora é o progresso e não, mais o fracasso que está na ordem do dia”
(SÃO PAULO, 2000, p.8). A justificativa para implantação da Progressão Continuada é,
portanto, que a avaliação praticada não promovia a aprendizagem, mas distorções como evasão e
repetência. Havia, segundo Carvalho (2001), uma cultura da repetência que fazia com que o saber
não fosse democratizado e nem permitisse avanços na aprendizagem.
96
A escola, agindo de forma seletiva, propiciava a exclusão sendo que, de acordo com
Jacomini (2004), “Salvo raras exceções, os repetentes e evadidos da escola são os mesmos
excluídos socialmente” (p. 403).
Por isso a escola pública contribuía ao agir com reprovação excessiva, para reforçar o
lugar, segundo Jacomini (2004, p.403), “reservado às diferentes classes sociais”, ou seja,
excluindo geralmente, filhos de pais das classes trabalhadoras separando-os das crianças bens
sucedidas para continuarem os estudos. Sendo assim, a escola não se consolidou como espaço
público e democrático.
Mesmo com a quase total universalização do acesso à escola, principalmente a partir da
década de 1980, não ocorreu a democratização da aprendizagem devido às altas taxas de
retenção. Em 1985 iniciou-se a retomada do crescimento das matrículas, segundo Perez (2000,
p.28), sendo os Ensinos fundamental e médio os que mantinham as maiores taxas de matrículas.
Porém, ainda na década de 1990, existiam altos índices de reprovação e evasão segundo os dados
da Secretaria de Estado de Educação transcritos na tabela a seguir que expressam as taxas de
reprovação no estado de São Paulo dos anos de 1990 até 2001.
Tabela 2 – Taxas de reprovação no estado de São Paulo de 1990 até 2001
ANOS 5ª SÉRIE 6ª SÉRIE 7ª SÉRIE 8ª SÉRIE
1990 23,5 18,5 14,0 8,4
1991 19,7 14,0 10,0 5,1
1992 19,6 14,8 10,4 5,1
1993 15,9 11,5 8,1 3,7
1994 19,6 16,2 11,3 5,8
97
1995 16,6 12,3 8,9 4,8
1996 13,2 9,8 6,8 4,0
1997 5,9 4,4 3,6 2,5
1998 3,3 3,1 2,9 2,5
2000 5,1 5,2 5,3 5,9
2001 5,3 5,0 5,3 8,6
Fonte: SÃO PAULO. SEE/ CIE, 2002.
Por meio da tabela notamos uma sensível diminuição dos índices de reprovação a partir
de 1998, quando ocorreu a implantação da progressão continuada em todas as séries do ciclo
(5ª, e 7ªséries), com exceção da série que, por ser final de ciclo, manteve a taxa de 8,6%,
bastante parecida com a que havia em 1990 (8,4%).
No mesmo período (1990-2001) as taxas de evasão no ensino fundamental eram as
seguintes, segundo a Tabela 3:
Tabela 3 – Taxas de evasão no estado de São Paulo de 1990 até 2001
98
Fonte: SÃO PAULO. SEE/CIE, 2002.
ANOS 5ª SÉRIE 6ª SÉRIE 7ª SÉRIE 8ª SÉRIE
1990 18,7 16,2 14,8 11,4
1991 17,8 15,7 14,8 11,7
1992 16,4 14,4 13,2 10,3
1993 14,3 13,9 12,7 9,9
1994 14,7 12,6 11,3 9,2
1995 11,3 13,5 12,6 10,3
1996 7,1 10,5 9,6 7,9
1997 6,2 6,3 6,0 4,7
1998 5,9 6,1 6,0 5,4
1999 5,7 5,9 6,2 6,0
2000 5,7 5,9 6,5 7,0
2001 3,8 3,7 4,2 5,1
99
Os índices de evasão no ensino fundamental também diminuíram, se comparados aos
índices do início da década de 1990 (em especial após a implantação da progressão continuada
em 1998), sendo que estas, associadas à diminuição das taxas de reprovação, são apontadas pela
SEE/SP como sendo fundamentais para que o aluno não só tenha acesso, mas também permaneça
na escola. Para resolver o problema da defasagem idade/série, provocada pela reprovação e
evasão sucessivas, a SEE/SP criou, em 2000, o programa de regularização de fluxo (classes de
aceleração), cuja metodologia, segundo informações da SEE/SP, “possibilitou a alunos com
defasagem idade/série a conclusão do Ensino Fundamental e o ingresso no Ensino Médio” (SÃO
PAULO, 2002, p.2). É considerado defasado o aluno cujo ano de nascimento seja igual ou
superior a 2 anos em relação à idade definida como apropriada em cada série. Na tabela a seguir
constam as taxas de defasagem idade/série em 2 anos (1998 e 2002).
TABELA 4 – Taxas de defasagem idade/série no estado de São Paulo (1998 e 2002)
SÉRIES 1998 2002 Taxas/1998 Taxas/2002
257.876 81.534 36,9% 16,8%
266.215 102.710 40,7% 21,6%
247.678 103.843 41,5% 20,2%
229.331 162.199 42,4% 27,9%
Fonte: SÃO PAULO. SEE/CIE, Censo Escolar 1998 e 2002.
A diminuição nos índices de defasagem é explicada, segundo a SEE/SP, pelo esforço
de aumentar a permanência do aluno na escola e melhorar o fluxo escolar (SÃO PAULO, 2002).
Para que se concretizassem os planos (e que o fluxo escolar não fosse interrompido) houve a
organização em ciclos e o sistema de progressão continuada.
O governo de São Paulo, através de sua Secretaria de Educação, considera que a
redução da taxa de defasagem é um poderoso indicador da democratização do acesso e da
permanência dos jovens na escola. Daí manifestar-se, favoravelmente, à mudança na forma de
avaliação dos alunos.
Após a implantação da progressão continuada a SEE/SP começa a defender um sentido
da avaliação mais ampliada: “de alavanca do progresso do aluno e não mais o de um mero
instrumento de seletividade” (SÃO PAULO, 2000, p. 15).
100
A SEE/SP enfatiza, porém, que não se deve vincular a idéia de progressão continuada
com a de promoção automática. Informes da SEE/SP (2000) referem-se à diferença a ser
considerada:
No caso [progressão continuada] a criança avança em seu percurso escolar em razão
de ter se apropriado, pela ação da escola, de novas maneiras de pensar, sentir e agir; no
2º[promoção automática] ela meramente permanece nas unidades escolares,
independente de progressos terem sido alcançados (SÃO PAULO, 2000, p.32).
Segundo a SEE/SP o aluno deve, portanto, ter o seu ritmo de aprendizagem respeitado,
sem reprovação que lhe impeça o seu progresso (pelo menos até no final do ciclo), mas o
professor deve proporcionar-lhe aprendizagem e não simplesmente fazê-lo cursar o “percurso
escolar” sem nada aprender e, ou ser reprovado ao final do ciclo, ou não adquirir conhecimentos
básicos (SÃO PAULO, 2000, p. 8).
A idéia de “promoção automática” voltou a ser muito questionada atualmente, ou desde
1998
10
, com a implantação da progressão continuada, pois a não-retenção escolar dos alunos
poderia caracterizar uma aprovação automática sem que eles tenham adquirido o domínio das
competências mínimas esperadas, o que provocaria a resistência dos professores à progressão
continuada, a despeito do que afirma a SEE/SP, que não admite existir aprovação automática,
conforme orientações do documento A Construção da Proposta Pedagógica: A Escola de Cara
Nova, do ano de 2000.
Muitos números são apresentados pelo governo paulista para ressaltar como a educação
nesse estado tem apresentado melhorias. Carvalho (2001) critica o que considera ser um
verdadeiro “culto aos números que é difundido pela SEE/SP, pois “As estatísticas, as taxas, os
índices, os gráficos e as tabelas são cada vez mais tomados como sinônimo de verdade final e
incontestável, como prova cabal desta ou daquela afirmação ou como arma em disputas de poder,
privilégios e prestígio” (p.233).
Esses números são conseguidos através da avaliação externa ao âmbito escolar (que é
classificatória); no estado de São Paulo, o programa denominado Saresp verifica a eficiência do
sistema de ensino desde 1996.
10
Retrocedendo ainda mais no tempo notamos que o debate sobre promoção automática iniciou-se na década de
1950, com Dante Moreira Leite e Almeida Júnior, como verificaremos no capítulo seguinte.
101
Notadamente a avaliação vem se tornando um importante instrumento adotado pelas
políticas públicas governamentais, especialmente no estado de São Paulo, como parâmetro de
mensuração da qualidade da educação.
Em contrapartida à qualidade da educação, está o fracasso escolar que analisamos
vinculado à avaliação.
4.4. O FRACASSO ESCOLAR E A AVALIAÇÃO
“Há problemas em nossas escolas que nos perseguem como um pesadelo. Não como
ignorá-los, nem fugir deles. Entre os pesadelos constantes está o fracasso escolar”. Assim Arroyo
(2000, p.33) inicia um artigo em que comenta sobre o “pesadelo” que nos persegue a todos os
envolvidos com a escola e com o sonho de obter sucesso mesmo diante dos fracassos.
De acordo com Fernandes (2005) o fracasso escolar pode ser compreendido a partir de
várias perspectivas. A autora analisa a razão do fracasso escolar a partir das políticas
educacionais que se referem aos problemas relativos à reprovação, evasão, distorção idade/série e
das práticas avaliativas.
Afirma a autora que “a avaliação pode não ser a única responsável, mas torna-se uma
grande vilã no contexto do fracasso escolar” (p.14). E acrescenta que, de acordo com as políticas
educacionais,
o sistema seriado conjugado às sucessivas reprovações propiciam a evasão escolar e a
distorção idade/série, aspectos que comprometem o sistema educativo como um todo
seja do ponto de vista pedagógico, social e econômico, e que sempre foram combatidos
através de promoção automática (FERNANDES, 2005, p.14).
Chama a atenção, no entanto, que a seriação e a reprovação não possam ser sozinhas
responsabilizadas pelo fracasso assim como “o ciclo e a promoção não podem ser tomados como
102
a grande solução para esse problema como muitas políticas educacionais sustentam”
(FERNANDES, 2005, p.15).
A autora acredita, portanto, que não os elevados índices de evasão e repetência
evidenciam o fracasso escolar, mas “a falta de cumprimento dessa instituição [a escola] com a
sua função social (FERNANDES, 2005, p.15), ou seja, que o sucesso escolar atinja todos os
alunos, pois é seu direito enquanto cidadãos.
Além disso, Fernandes (2005) defende que os ciclos podem ser entendidos como uma
etapa de transição para a construção de uma nova escola, desde que não sejam apenas uma forma
de reorganização de séries. Defende, também, mudanças nas práticas avaliativas para que deixem
de ser seletivas.
Para Freitas (2003) a progressão continuada não é considerada uma proposta de ciclos,
pois “destina-se a viabilizar o fluxo de alunos e tentar melhorar a sua aprendizagem com medidas
de apoio (reforço, recuperação, etc)” e “agrupar séries com o propósito de garantir a progressão
continuada do aluno” (p.9). Dessa forma, as séries são agrupadas, e “a avaliação assume papel de
controle e atua para implementar verticalmente uma política pública” (FREITAS, 2003, p.72).
No entanto, segundo esse mesmo autor, se o aluno permanece na escola mesmo sem
saber ler, como vem ocorrendo nas escolas que adotaram os ciclos ou a progressão continuada,
ele denuncia a qualidade do sistema de ensino o que não ocorria no sistema seriado quando era
“expulso”, ou seja, quando ocorria a evasão. Na escola seriada os índices de retenção e de evasão
eram muito altos e diminuíram sensivelmente com a implantação da progressão continuada,
conforme dados das tabelas 2 e 3.
Mesmo tendo ressalvas quanto à progressão continuada, Freitas (2003) não considera
que o ideal seja o retorno do regime seriado, visto que
No esquema seriado, tais alunos não incomodavam, pois eram eliminados do sistema,
permanecendo nele somente quem aprendia. Nos ciclos e na progressão continuada,
esses alunos permanecem no interior da escola, exigindo tratamento pedagógico
adequado. Eles são a denúncia viva da lógica excludente, exigindo reparação. A volta
para o sistema seriado é uma forma de calar essa denúncia e precisa ser evitada
(FREITAS, 2003, p.50).
Segundo o mesmo autor, “os ciclos procuram contrariar a lógica da escola seriada e sua
avaliação. Não eliminam a avaliação formal, muito menos a informal, mas redefinem seu papel e
103
a associam com ações complementares reforço ou recuperação paralela, por exemplo”
(FREITAS, 2003, p.51).
Ao analisar a avaliação que realmente ocorre na escola, Freitas (2003) destaca três
aspectos que existem nela: o “instrucional”, o “comportamento” e a avaliação dos “valores e
atitudes”. O primeiro aspecto da avaliação, o instrucional, é aquele em que o professor através de
provas, chamadas orais, trabalhos, avalia para descobrir o que o aluno aprendeu; o segundo
aspecto, comportamento, “é um poderoso instrumento de controle em ambiente escolar, que
permite ao professor exigir do aluno obediência às regras”; o terceiro aspecto, avaliação de
valores e atitudes, “ocorre cotidianamente em sala de aula e que consiste em expor o aluno a
reprimendas verbais e físicas, comentários críticos e até humilhação perante a classe, criticando
seus valores e suas atitudes” (FREITAS, 2003, p.41-42).
Freitas (2003) também considera que a avaliação ocorre em dois planos: no “formal”, o
professor faz uso de provas e trabalhos para conseguir uma “nota” e no “informal”, estão os
“juízos de valor, invisíveis e que acabam por influenciar os resultados das avaliações finais”
(p.43).
No caso da progressão continuada e dos ciclos, de acordo com Freitas (2003) foi
retirada a avaliação formal, mas a avaliação informal continua excluindo os alunos:
Como penetrar neste mundo pessoal do professor e do aluno? Certamente, não por
decretos e resoluções - nem pela avaliação externa. A questão que se pode levantar é
se a retirada da nota formal, para permitir a progressão continuada do aluno, afeta as
ações do professor e do aluno no plano informal da aula. A resposta pode ser
encontrada nos graves problemas que a implantação dos ciclos de progressão
continuada vem enfrentando (FREITAS, 2003, p.46-47).
Ainda para Freitas (2003, p.34), os ciclos e a progressão continuada vêm enfrentando
dificuldades para alterarem as “regras do jogo na escola” devido à função dela ser
predominantemente excludente e seletiva. O mesmo autor comenta que a escola é uma
instituição social e organiza seu espaço e tempo “a mando da organização social que a cerca. (...),
portanto, não é um local ingênuo sob um sistema qualquer. Dela, espera-se, que cumpra uma
determinada função” (FREITAS, 2003, p.14).
104
A escola deve ensinar com qualidade a todos os alunos, no entanto ela é vista como uma
preparação para a vida, mas não como a própria vida. Este distanciamento da escola com a vida
foi, segundo Freitas (2003),
ditado por uma necessidade ligada à formação social capitalista, a qual, para apoiar o
desenvolvimento das forças produtivas, necessitou de uma escola que preparasse
rapidamente, e em série, recursos humanos para alimentar a produção de forma
hierarquizada e fragmentada e isso era possível ser feito de forma escolarizada
(FREITAS, 2003, p.26-27).
Como deve preparar a mão-de-obra para o capitalismo, o conhecimento foi distribuído
em disciplinas e em anos e, a avaliação, utilizada para indicar se houve ou não o domínio da
aprendizagem, avançando aqueles que conseguiram e reprovando/evadindo os demais. Essa
lógica faz parte da origem da escola e organiza todo o trabalho pedagógico. “Entretanto, quando
falhas na escola, a culpa é colocada, rapidamente, no professor (ou no aluno) e não nessa
lógica oculta” (FREITAS, 2003, p.30).
Para romper com esta lógica havendo resistência. Freitas (2003) se manifesta
favoravelmente aos ciclos, mas “não como uma mera solução pedagógica para um problema de
desempenho escolar do aluno, e sim como um longo e necessário processo de resistência de
professores, alunos e pais à lógica excludente e seletiva da escola” (FREITAS, 2003, p.36).
Assim, para o autor, a escola eficaz é aquela em que pais e professores não se
preocupam somente com o conteúdo, mas também com a formação do cidadão autônomo que
consiga intervir na sociedade para torná-la mais justa.
Pessoa (2007), ao comentar o fracasso escolar, também afirma que
A escola é uma instituição social que opera em uma sociedade hierarquizada
economicamente e que pede à escola que distribua seletivamente o conhecimento. A
eqüidade é reduzida para dar a possibilidade ao aluno de reproduzir-se como membro
da classe social à qual ele pertence. Funcionando sobre uma falsa igualdade de
oportunidades, a escola isenta-se da responsabilidade pelo fracasso escolar. As
oportunidades são distribuídas igualmente para todos os alunos, portanto, cabe a cada
um deles mediante seu esforço pessoal, atingir os méritos esperados. Ao mesmo tempo
em que a escola promove aqueles que, segundo seus padrões e mecanismos de seleção,
se demonstram aptos a participarem dos privilégios e do uso do poder ela cria, sob uma
aparência de neutralidade, mecanismos que legitimam a exclusão dos não-privilegiados,
convencendo-os a se submeterem, sem que percebam que o fazem (PESSOA, 2007,
p.10).
105
Dessa forma, ela também comenta sobre uma outra função da escola destacada por
Freitas (2003): mesmo que os alunos não consigam aprender o conteúdo escolar, a eles é
ensinada a submissão às regras da sociedade; daí a importância de manter todas as crianças na
escola.
Arroyo (2000) também considera o fracasso escolar como
uma expressão do fracasso social, dos complexos processos de reprodução da lógica e
da política de exclusão que perpassa todas as instituições sociais e políticas, o Estado,
os clubes, os hospitais, as fábricas, as igrejas, as escolas...” (...) Entretanto,
desescolarizar o fracasso não significa inocentar a escola nem seus gestores e mestres,
nem seus currículos, grades e processos de aprovação/reprovação. É focalizar a escola
enquanto instituição, enquanto materialização de uma lógica seletiva e excludente que é
constitutiva de um sistema seriado, dos currículos gradeados e disciplinares (ARROYO,
2000, p.34).
Quando da implantação da progressão continuada se nota nitidamente pelos documentos
oficiais da SEE/SP que o objetivo era de regularizar o fluxo escolar atrapalhado por reprovações
excessivas objetivando, também, economizar gastos, sendo que ela havia sido planejada antes
mesmo de Mário Covas assumir como governador do estado de São Paulo:
A progressão continuada foi apresentada no Programa de Governo [de Mário Covas,
por ocasião da campanha eleitoral de 1994] como uma estratégia de regularização do
fluxo escolar, visando “reverter o quadro de repetência e evasão”. Ainda, é apresentada
como um meio que visa permitir que “a quantidade de recursos perdidos ano a ano com
o enorme contingente de alunos reprovados” constitua-se em “auxílio poderoso na
reversão do quadro de pobreza de estímulos materiais em nossas escolas, bem como dos
baixos salários dos profissionais do ensino” (SÃO PAULO, 1995, p.309, citado por
SOUSA, STEINVASCHER, ALAVARSE & ARCAS, 2007, p.40, grifo dos autores).
O que foi escrito no Programa de Governo, apresentado na campanha eleitoral de 1994,
estava delineando o que seria a política educacional a ser desenvolvida no estado de São Paulo,
pois diversas medidas indicadas nele foram implantadas após Mário Covas se tornar governador:
reorganização da rede física, classes de aceleração, municipalização do ensino, Sistema de
Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) e progressão continuada.
Quanto à progressão continuada, o governo estadual a considera como uma forma de regularizar
o fluxo escolar e impedir o desperdício de recursos.
Mas, como alertam Sousa, Steinvascher, Alavarse e Arcas (2007):
106
Certamente, a regularização do fluxo escolar é um aspecto importante a ser enfrentado
para que se garanta o direito dos alunos ao ensino fundamental no tempo previsto, no
entanto, é preciso lembrar que a distorção idade-série é conseqüência de um problema e
não a sua causa. Entre outros fatores, uma das causas do fracasso escolar está na
organização rígida e excludente da própria escola. Sendo assim, a progressão
continuada ao estabelecer como princípio a progressão na trajetória escolar, tem o
potencial de reestruturar o tempo, o espaço, o currículo, a avaliação, as relações
interpessoais e a gestão escolar, questionando, no limite, a própria função da escola.
Porém, estas mudanças dependem das estratégias e dos subsídios criados para
implantação e sustentação desta política. Sem a reorganização da escola em sua
totalidade, corre-se o risco de criar uma nova configuração do fracasso escolar, onde
não se verifica a distorção idade-série, mas, no entanto, a progressão dos alunos nos
anos de escolaridade não corresponde à efetiva aprendizagem (SOUSA,
STEINVASCHER, ALAVARSE & ARCAS, 2007, p.40-41).
Sendo assim, o fracasso escolar não terminará se permanecer a lógica excludente da
escola e, com a progressão do aluno na trajetória escolar sem reprovação, com exceção do final
dos ciclos ou por excesso de faltas, configura-se um novo tipo de fracasso escolar em que passa a
existir: a “promoção automática” sem a efetiva aprendizagem. Mas, afinal, o que existe no estado
de São Paulo: a progressão continuada ou a promoção automática?
107
5. PROGRESSÃO CONTINUADA OU PROMOÇÃO AUTOMÁTICA?
5.1. AS DISCUSSÕES SOBRE CICLOS NO BRASIL
A história educacional brasileira é permeada por sucessos, insucessos, mudanças e
permanências refletindo as contradições, as desigualdades e os problemas presentes em nossa
sociedade. A escola excludente e seletiva passa a ser alvo de discussões devido à excessiva
reprovação na outrora série do ensino primário, o que gerava propostas na década de 1920.
Discussões foram frutificando principalmente na década de 1950 com idéias que se baseavam nos
modelos desenvolvidos na Inglaterra e nos Estados Unidos, e os argumentos eram favoráveis à
promoção automática, ainda que com ressalvas por parte de alguns educadores. Na década de
1990, quando foi implantada a progressão continuada no Estado de São Paulo percebemos por
parte do governo argumentos bastante semelhantes aos utilizados na década de 1950, com a
exceção de ser o termo promoção automática considerado pejorativo e não ser aceito pelo
governo paulista.
Na década de 1950 surgiram idéias sobre mudanças que se faziam necessárias na
educação devido, entre outros problemas, ao excesso de retenção na série do ensino primário
(que desde a Lei nº 9.394/96 conhecemos como 1ª série do ensino fundamental), o que provocava
108
a evasão e a falta de vagas para os novos alunos devido à necessidade de oferecê-las aos alunos
repetentes, fato este que atravancaria o fluxo escolar.
O país estava vivenciando, desde que Juscelino Kubitschek assumiu a presidência
(1956/1960), a idéia de que o Brasil estaria atrasado na corrida pelo desenvolvimento e que
portanto, deveria acelerar para compensar o atraso. Por isso, deveria se industrializar para superar
o subdesenvolvimento; JK acreditava que para desenvolver o país, a economia baseada no setor
agrário-exportador deveria ser substituída, pelo progresso de uma economia industrial. Zotti
(2004), menciona que
A política adotada no governo de JK, com base em um modelo desenvolvimentista,
possibilitou a união do empresariado brasileiro ao capital estrangeiro, tendo como
resultado o agravamento da concentração de renda e o reajuste salarial inferior ao dos
preços. O setor agrícola fica relegado a segundo plano e ocorre um agravamento do
processo inflacionário e concessão de privilégios ao setor internacional, originando uma
desnacionalização econômica, com aprofundamento da dependência econômica
(ZOTTI, 2004, p.97).
Estas idéias se baseavam nas teorias desenvolvimentistas dos anos 1950-1960, surgidas
na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, as quais associavam o subdesenvolvimento ao atraso
e à economia baseada no setor agrário-exportador, assim como o desenvolvimento ao progresso e
à economia industrial. Estas teorias justificavam a expansão imperialista através das
multinacionais (atualmente denominadas transnacionais) empresas norte-americanas ou de países
da Europa Ocidental, que se instalaram em grande número no Brasil com o intuito de defesa de
seus interesses econômicos.
Devido ao modelo econômico, baseado na defesa do grande capital e na
internacionalização da economia, aprofunda-se a concentração de renda. Atrelado ao
desenvolvimento econômico estava a educação:
A política educacional adotada nesse período, segundo o plano de metas de JK, atrelava
a educação às necessidades do desenvolvimento, significando uma supervalorização do
ensino profissionalizante, não no ensino médio, mas até mesmo o primário teria de
se obrigar a “educar para o trabalho”, atrelando o papel da escola às necessidades do
mercado de trabalho. O sistema de ensino continuou tão elitista e antidemocrático
quanto havia sido anteriormente (ZOTTI, 2004, p.98).
109
Fernandes (2000) também menciona que este contexto de modernização e
industrialização aparecia no contexto educacional:
O pensamento educacional é tomado pela euforia da entrada do país na era do
desenvolvimento. Embora existam ressalvas cuidadosas e críticas sobre as precárias
condições da educação escolar no país, as taxas de analfabetismo, repetência, evasão,
formação dos professores, falta de escolas, há ao mesmo tempo, crença de que reformas
no sistema educacional poderão acontecer e contribuir para que o país entre na era
desenvolvimentista (FERNANDES, 2000, p.85).
Apesar de chegar a esta e a outras conclusões, analisando somente artigos da Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos da década de 1950, Fernandes (2000) se justifica, afirmando
que estes refletiam o que se discutia sobre educação brasileira na década de 1950.
Notamos que o contexto educacional mostrava, portanto, o “entusiasmo” da era
desenvolvimentista e, ainda de acordo com Fernandes (2000), na década de 1950 surgiram
discussões em relação ao tema de promoção automática como podemos comprovar nas palavras
da autora: [...] “Podemos identificar essa década [1950] como o nascedouro de propostas e
reflexões acerca do tema” (FERNANDES, 2000, p.85).
Essas discussões refletiam a preocupação, desde então, com a excessiva reprovação
escolar, e se faziam presentes através de educadores importantes como Dante Moreira Leite e
Almeida Júnior, que propunham soluções tendo em vista influências estrangeiras, em especial a
da Inglaterra citada como exemplo por ambos. Os dois educadores eram adeptos da idéia de
promoção automática “compreendendo-a como uma forma de respeito e responsabilidade diante
das diferenças e necessidades individuais na realização de um ensino e de uma aprendizagem
para todos(JACOMINI, 2004, p.404). Estes mesmos autores eram, portanto, defensores de uma
organização de ensino que rompesse com a prática que excluía através da reprovação, o que
ocorre na escola de regime seriado.
Considerando que mesmo ainda nos dias atuais são constantes as preocupações e
discussões sobre a reprovação e suas danosas conseqüências, como a evasão escolar e os reflexos
negativos na auto-estima do aluno, percebemos a relevância de acompanharmos a trajetória do
pensamento educacional através dos tempos (de 1961 até 1998), pois ele nos leva a compreender
como este problema foi discutido no passado e como é pensado nos dias atuais, além de possíveis
soluções que foram cogitadas ou colocadas em prática.
110
Jacomini (2004) coloca que a escola é seletiva e exclui, através da reprovação
excessiva, as crianças das classes trabalhadoras, permitindo que as demais crianças sejam bem
sucedidas e continuem os estudos. Para resolver o problema de reprovação/evasão, várias
reflexões foram levantadas através das décadas e experiências foram colocadas em prática
(especialmente em regime não-seriado) e analisadas por esta autora que dividiu, num breve
histórico, os “momentos de discussões e experiências de ensino não-seriado no Brasil”
(JACOMINI, 2004, p.404). Para Jacomini (2004), na seriação os conteúdos devem ser aprendidos
durante o ano letivo e, os alunos/as que não conseguem aprovação (de acordo com a avaliação
realizada pela escola), ficam reprovados e repetem a mesma série no ano posterior, enquanto que
os aprovados vão para a série seguinte.
A divisão realizada por esta autora em seu artigo é utilizada agora, neste trabalho, para
uma breve retrospectiva histórica. A seguir analisamos mais enfaticamente duas décadas, as de
1950 e 1990, por acreditarmos que estas sejam determinantes para o pensamento educacional
atual em relação à avaliação.
O primeiro momento compreende a década de 1920, em que Jacomini (2004) destaca
Sampaio Dória e Oscar Thompson como defensores, respectivamente, da promoção automática
no ensino primário paulista e da promoção em massa, mas assinala que não houve repercussões
práticas. Mesmo assim, Sampaio Dória propunha a promoção automática, pois eram altos os
índices de reprovação no ensino primário. A autora cita que em 1938 somente 52% das crianças
matriculadas no ensino primário foram promovidas. Portanto, 48% das vagas do ensino primário
eram destinadas aos alunos repetentes, o que dificultava o acesso para os alunos novos. Se não
houvesse reprovação o fluxo escolar seria regularizado.
O segundo momento abrange a década de 1950, em que Jacomini (2004) destaca Dante
Moreira Leite e Almeida Júnior como defensores da promoção automática, tendo como referência
as experiências de ciclos da Inglaterra e dos Estados Unidos (nos estados de Michigan e
Kentucky). As discussões transcorridas na década de 1950 resultaram em experiências práticas
nas décadas seguintes, em especial na década de 1960. Apoiadas no artigo 104 da Lei nº 4.024/61
que possibilitava a escolha de um regime escolar não-seriado, surgiram mudanças em alguns
estados brasileiros: Rio de Janeiro (1967), São Paulo e Pernambuco (1968), Santa Catarina e
Minas Gerais (1970).
O artigo 104 da Lei nº 4.024/61 determinava que
111
Será permitida a organização de cursos ou escolas experimentais, com currículos,
métodos e períodos escolares próprios, dependendo o seu funcionamento para fins de
validade legal, da autorização do Conselho Estadual de Educação, quando se tratar de
cursos primários e médios [...] (BRASIL, 1961).
Desse modo, a partir da Lei de Diretrizes e Bases (Lei 4.024/61) do período, em
questão havia legalmente a possibilidade de que a organização escolar pudesse ser de regime não-
seriado.
O terceiro momento é após a lei 5.692/71, em que novas experiências de regime não-
seriado ocorreram, apoiadas no artigo 14, parágrafo da Lei Federal 5.692/71 na qual se
observava “a possibilidade dos sistemas de ensino se organizarem de forma não-seriada, em
caráter experimental, sendo necessária, para o seu funcionamento, a autorização do Conselho
Estadual de Educação” (JACOMINI, 2004, p.405).
Foram as seguintes experiências: Distrito Federal (1978), Rio de Janeiro (1979), São
Paulo (1984- Ciclo Básico de Aprendizagem), Minas Gerais (1985), Paraná e Goiás (1988).
Legalmente, portanto, havia a possibilidade em caráter experimental de se organizar a escola em
um regime não-seriado desde que com a autorização do Conselho Estadual de Educação. E, na
década de 1990 (antes da nova lei de diretrizes e bases) alguns municípios incorporaram os ciclos
e a progressão continuada: São Paulo (1992), Escola Plural de Belo Horizonte (1994) e Escola
Cidadã em Porto Alegre (1995). Percebe-se que não se utilizaria mais a expressão “promoção
automática”.
O quarto momento destacado por Jacomini (2004) corresponde às experiências
implantadas a partir da nova Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9.394/96), que em seu artigo 32
propõe às escolas liberdade de escolha em relação ao regime, indicando inclusive a progressão
continuada. Esta autora, ressalta, no entanto que “[...] casos em que não houve mudanças
significativas no tempo, no conteúdo e na avaliação rumo a um ordenamento das práticas
escolares centradas na aprendizagem de todos” (JACOMINI, 2004, p.406).
Nesses casos, portanto, não existe progressão na aprendizagem, mas promoção para o
ano seguinte do ciclo. Sendo assim, não se fala oficialmente em “promoção automática”, mas em
“progressão continuada”, ou seja, todos devem aprender os objetivos mínimos de cada nível de
ensino respeitando-se o ritmo de aprendizagem de cada aluno (a).
112
A seguir analisamos mais aprofundadamente a década de 1950 e as discussões acerca da
promoção automática.
5.2. A PROMOÇÃO AUTOMÁTICA NA DÉCADA DE 1950
Barretto e Mitrulis (2003) citam dados alarmantes de 1954 relativos às crianças de 7 a
10 anos e à matrícula escolar nas quatro séries no que era chamada, na época, de escola primária:
de cada 100 crianças matriculadas na série, apenas 16 concluíam as quatro séries do ensino
primário, o que “congestionava” o fluxo para as séries posteriores. Almeida Júnior (1957) em seu
artigo Repetência ou Promoção Automática? (apud PENIN, 2000) lista os problemas advindos da
reprovação: “evasão escolar, desperdício de recursos financeiros e estagnação de alunos
reprovados nas séries iniciais do curso primário que envelhecem e ocupam o lugar destinado às
novas gerações” (p.32).
Almeida Júnior (1957) também acreditava que a reprovação podia exercer influência
negativa e nenhuma influência positiva sobre a criança e citava as experiências inglesas. De
acordo com a lei inglesa de 1944, toda criança de 11 anos deveria passar para a escola média, que
era semelhante ao antigo ginásio no Brasil. Citava também o que ocorria em dois estados dos
Estados Unidos (Michigan e Kentucky) que organizavam as séries pela faixa etária dos alunos.
Ao participar da Conferência Regional sobre Educação Primária Gratuita e
Obrigatória, promovida pela Unesco, em Lima (Peru), no ano de 1956, Almeida Júnior (1957)
dizia
[...] que se procure solucionar o grave problema da repetência escolar que constitui
prejuízo financeiro importante e retira oportunidades educacionais à considerável massa
de crianças em idade escolar, mediante: a)revisão do sistema de promoções na escola
primária, como fim de torná-lo menos seletivo; b)o estudo, com a participação do
pessoal docente das escolas primárias de um regime de promoção baseado na idade
cronológica do educando e outros aspectos de valor pedagógico, e aplicá-lo, com
caráter experimental, nos primeiros graus da escola (apud BARRETTO &
MITRULLIS, 2003, p.4-5).
113
O autor citava os gastos provocados pela reprovação em que a taxa de reprovação de
31% no Estado de São Paulo, no ano de 1957, aumentou em quase 50% os gastos com educação.
Além dos prejuízos financeiros, alertava que a reprovação poderia exercer influência
negativa para a criança. Ao citar a experiência inglesa de promoção por idade cronológica,
Almeida Júnior (1957) dizia: “Nós, em São Paulo, fazemos como o pai severo, que à hora do
almoço quer obrigar os filhos a ingerir a mesma ração alimentar: “ou come tudo ou sai da mesa”.
Os ingleses dão a cada aluno aquilo que ele pode digerir” (apud PENIN, 2000, p.33).
Almeida Júnior (1957) considerava, no entanto, que havia a necessidade de criação de
condições para a implantação da promoção automática, propondo que houvesse aumento da
escolaridade escolar, aperfeiçoamento do professor, ingresso do aluno com a idade de 7 anos,
dentre outras questões. Rejeitando a simples promoção em massa, pois se acreditava que a
situação brasileira era diferente em relação à inglesa e por isso deveria tomar as providências
assinaladas anteriormente.
Dante Moreira Leite também era defensor de uma organização de ensino que rompesse
com a seletividade provocada pela escola seriada. De acordo com esse autor, as escolas
aceitavam a reprovação, pois eram tradicionalmente seletivas, existia o equívoco de que as
turmas deveriam ser homogêneas e aceitavam que o castigo e o prêmio seriam formas de
provocar ou acelerar a aprendizagem (apud FERNANDES, 2000, p.80).
Para Dante Moreira Leite, o governo propunha a obrigatoriedade escolar (e os alunos
eram obrigados a freqüentarem a escola), mas não se propunha uma solução para o fenômeno da
reprovação o que justificaria a implantação da promoção automática. A escola deveria, no
entanto, passar por uma transformação radical e assim como Almeida Júnior, Dante Moreira
Leite tinha preocupação com a melhoria da qualidade de ensino e com a aprendizagem dos
alunos. Sobre a escola dizia Moreira Leite, deveria ocorrer uma “[...] transformação radical da
escola, na medida em que se transformam seus objetivos básicos, na medida em que professores e
alunos passarão a viver em torno de outros valores e aspirações”. (apud FERNANDES, 2000,
p.81).
Para superar a concepção seletiva da escola e conseguir a “transformação radical” este
autor acreditava que: “[...] duas medidas básicas precisam ser defendidas e efetivadas: primeira, a
organização de um currículo adequado ao desenvolvimento do aluno, segunda, a instituição da
promoção automática” (apud JACOMINI, 2004, p.405).
114
A promoção automática possibilitaria o tempo necessário para os educandos
aprenderem sem a “pressão” de serem reprovados e com um currículo adequado aos alunos,
respeitando suas diferenças. Sendo assim, somente com a promoção automática é que o currículo
seria adequado à idade. Para que acontecesse o que propunha Moreira Leite era fundamental que
os professores estivessem comprometidos com as mudanças.
Almeida Júnior também entendia a importância da obtenção da adesão dos professores
às mudanças sem a qual não seria possível mudar as práticas docentes. Barretto e Mitrulis (2003),
examinando um artigo escrito por este autor (1957) afirmam que em suas idéias,
Impunha-se preparar com antecedência o “espírito” do professorado a fim de obter sua
adesão e precaver-se adotando medidas preliminares, sem as quais não se lograria
avançar em relação ao assunto: modificar a concepção vigente de ensino primário, rever
programas e critérios de avaliação, aperfeiçoar o professor e aumentar a escolaridade
primária para além dos quatro anos, assegurando o cumprimento efetivo da
obrigatoriedade escolar (BARRETTO & MITRULLIS, 2003, p.72).
Almeida Júnior defendia, portanto, a mudança, ou seja, a promoção automática, mas se
preocupava com a aprendizagem dos alunos e com o comprometimento dos professores para que
não houvesse resistência e para que realmente ocorresse a aprendizagem de todos os alunos,
mediante mudanças que a propiciariam.
Fernandes (2000) cita que o Presidente da República de então, Juscelino Kubitschek em
um discurso, dirigido às professoras primárias recém-formadas em Belo Horizonte em 1957,
aprovava, também, a promoção automática relacionando-a a progresso e à diminuição de gastos
gerados pela reprovação, além de tornar a escola menos seletiva, pois consideraria as diferenças
dos alunos e atribuía à educação papel relevante na modernização da sociedade. Kubitschek disse
que: “[...] a reforma seria econômica e prática, evitando o ônus da repetência e os males da
evasão escolar [...]” (apud FERNANDES, 2000, p.82).
Kubitschek enaltecia a reforma com base na promoção automática como sendo
“vitoriosa nos povos mais adiantados” (apud FERNANDES, 2000, p.85). Os povos mais
adiantados citados pelo Presidente da República eram: Inglaterra, Estados Unidos e a França que
serviam como exemplo, também, com relação ao desenvolvimento econômico perseguido com
afinco por JK. A disseminação da educação era considerada essencial para que o
desenvolvimento do país realmente ocorresse.
115
A década de 1950 fora, enfim, relevante, por ter iniciado discussões sobre regime
escolar não-seriado com inúmeras experiências ocorrendo nos estados de São Paulo, Minas
Gerais, Santa Catarina e Pernambuco nas décadas seguintes.
Vale destacar também que, na década de 1950, segundo constatou Fernandes (2000), o
sociólogo Luís Pereira fazia ressalvas em relação à promoção automática na Inglaterra e nos
Estados Unidos. Fernandes (2000) cita um artigo de Pereira publicado em 1958 na Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos, A promoção automática na escola primária, que estes países
estavam tendo êxito, pois haviam superado problemas básicos de funcionamento e condições
materiais do sistema escolar, o que não ocorria no Brasil devido ao analfabetismo, falta de vagas,
falta de preparo dos professores e grande quantidade de professores leigos. E concluía que,
embora a promoção automática
[...] eliminasse as altas porcentagens de repetência, não afetaria de modo direto e
profundo os fatores desse fenômeno, e que levaria à perda de um valioso termômetro do
funcionamento do sistema escolar primário – os índices de repetência (PEREIRA, 1958,
apud FERNANDES, 2000, p.84).
Essas ressalvas são importantes, pois analisam o modelo de promoção automática citado
na época e se percebem as diferenças daquele que era aplicado em países mais desenvolvidos.
Nesses países a aprovação automática era utilizada como busca de solução para alunos com
dificuldades e que deveriam ter igualdade de oportunidades para concluírem o ensino primário.
No artigo de Pereira (1958), citado em Fernandes (2000) este dizia que, se a promoção
automática fosse adotada em nosso país, os problemas ainda existentes ficariam disfarçados, sem
resolver problemas estruturais em nosso sistema de ensino. Além disso, as discussões e a prática
que aconteciam na Inglaterra e na França, por exemplo, eram bem divergentes das discussões
ocorridas no Brasil nos anos 1950.
Dias (2005, p.7 ), ressalta as diferenças relevantes que existiam entre o Brasil e estes
países:
1- No Brasil se cogitava a promoção automática para resolver os altos índices de
repetência e evasão escolar, enquanto que, na Inglaterra e França, a discussão era sobre
democratização e expansão do ensino obrigatório (primário e secundário);
2- Naqueles países não se mencionava “promoção automática”, porque a promoção era
por idade e avaliada pelo mérito através de exames seletivos;
116
3- Como, na Inglaterra e França, a promoção era por idade os ciclos não eram
mencionados;
4- A promoção por idade era uma forma de seletividade, pois se considerava que todos
os alunos da mesma faixa etária eram “homogêneos” quanto às capacidades intelectual, cognitiva
etc.
Percebe-se, portanto, que os modelos da Inglaterra e da França utilizados para justificar
a adesão à promoção automática no Brasil estavam distantes do contexto vivenciado nas escolas
brasileiras. Além disso, a implantação da promoção automática exigia mudanças do currículo de
acordo com as possibilidades dos diferentes alunos e seus ritmos diferenciados de aprendizagem,
como previa Dante Moreira Leite, mas o maior problema da escola, segundo Dias (2005) estava
ligado à avaliação seletiva e classificatória.
Durante este período, também, as discussões eram restritas ao ensino primário visto que
os índices de retenção nas séries iniciais (principalmente na passagem da para a série) eram
muito elevados. Barretto e Mitrulis (2003, p.71) citam que os índices brasileiros eram os mais
elevados na América Latina: 57,4%, segundo estudos da Unesco e demonstravam “que 30% das
reprovações acarretavam um acréscimo de 43% no orçamento dos sistemas de ensino”.
Concluímos ressaltando que havia uma preocupação com a reprovação excessiva, mas
também com gastos provenientes das retenções e propostas que surgem para suprir as
dificuldades que, infelizmente, acabam chegando até a década de 1990.
5.3. A PROGRESSÃO CONTINUADA NA DÉCADA DE 1990
Em nossa história educacional é manifesta uma característica que prevalece nas escolas
brasileiras: a de ser seletiva. Esta seletividade é notada pelos índices que comprovam o acesso à
escolarização visto que, durante muito tempo, a escola excluiu as crianças das classes populares
(somente na década de 1970 é que se iniciou um “processo mais significativo de gradativo
aumento do atendimento escolar”, segundo PENIN, 2000, p.30). De acordo com esta autora, na
década de 1930 apenas cerca de 60% das crianças brasileiras tinham acesso à escola primária de
117
quatro anos, o que demonstra a dificuldade das crianças da população de baixa renda
freqüentarem a escola, enquanto que, na década de 1980, o número aumentou para 81% de
crianças matriculadas na escola fundamental de oito anos. Este acréscimo no acesso à escola
começou a ocorrer na década de 1970 e foi aumentando nas décadas seguintes (PENIN, 2000,
p.31).
Também percebemos a seletividade através dos resultados dos processos de ensino que
aparecem nas taxas de reprovação e evasão escolar dos alunos. O que se pode observar é que com
o aumento no atendimento escolar se tornou evidente a seletividade da escola através dos altos
índices de reprovação/evasão, devido às dificuldades das escolas em lidar com crianças da
população de baixa renda que começaram a ser matriculadas.
Portanto, como os problemas de repetência e evasão escolar não foram resolvidos nas
décadas anteriores, perseguia-se ainda uma solução que equacionasse o problema. Como a escola
pública tinha por organização o ensino seriado surgiram propostas para democratizar a
aprendizagem e terminar com a exclusão a que estavam submetidas as crianças das camadas
populares. De acordo com Jacomini (2004), “educadores progressistas e preocupados com a
exclusão escolar em relação à população de baixa renda construíram propostas que subverteram a
ordem consolidada e vigente na escola (p.404). Por isto, como ao regime seriado era atribuída a
culpabilidade pelo problema, pensou-se na sua superação através dos ciclos.
A possibilidade para que ocorresse a implantação dos ciclos, na década de 1990, foi
através da LDB 9.394/96, em seu artigo 23, em que prevê, para a educação básica (ensino
fundamental e médio), a organização
[...] em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de
estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios,
ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de
aprendizagem assim o recomendar (BRASIL, 1996).
No artigo 32 da mesma Lei de Diretrizes e Bases (nº 9.394/96), propõe-se a adoção, “no
ensino fundamental, do regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo
de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino” (BRASIL,
1996). Fundamentada nesta lei a progressão continuada foi implantada, em toda a rede estadual
paulista no ano de 1998, mas, como menciona Dias (2005), “sem definir exatamente seu
significado” (p.12).
118
Mesmo assim, segundo este autor, a Indicação CEE 8/97e a Deliberação CEE 9/
97 “procuraram pensar a progressão continuada através do ano escolar pela superfície dos ciclos,
deixando a questão curricular a cargo do Conselho Nacional de Educação e da UNESCO
(DIAS, 2005, p.13). A indicação do CEE anexada à Deliberação trata da organização curricular e
da progressão continuada. Portanto, para combater a reprovação e evasão escolar somente os
ciclos ficaram sob responsabilidade da SEE/SP e do CEE enquanto que:
[...] A organização curricular estadual em 1998 seguiu os moldes das propostas da
Unesco, através do relatório Jacques Delors e dos PCNs. Somente em 2001, o CEE
procurou elaborar suas próprias diretrizes curriculares para o ensino fundamental com a
Indicação CEE 8 de 2001, porém dando continuidade e reforçando as diretrizes
curriculares nacionais propostas em 1998 pelo MEC/ Unesco (DIAS, 2005, p.14).
Nota-se que as mudanças recentes Brasil e no estado de São Paulo seguem as “receitas”
determinadas pela Unesco e Banco Mundial e estão inseridas no neoliberalismo. Temos como
exemplo o relatório de Jacques Delors que foi um documento citado na Introdução dos
Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs (BRASIL, 1998). Segundo os moldes neoliberais,
no entanto, existe uma preocupação com o custo-benefício e não apenas com o lado da
reprovação que irá provocar problemas para a auto-estima do aluno e transtornos para a sua
família.
A mudança mais significativa do governo Covas foi, dessa forma, a instauração do
regime de progressão continuada, no ensino fundamental, a partir de 1998, seguindo as
orientações da LDB, Lei nº 9.394/96, a Indicação do CEE nº 8/97 e a Deliberação CEE nº 9/97.
A progressão continuada foi implantada em 1998 e dividiu o ensino fundamental em 2
ciclos: o primeiro (da a série) e o segundo (da a série), sendo possível a reprovação
apenas no final de cada ciclo (respectivamente 4ª e 8ª séries), ou em todas as séries se o aluno não
tiver 75% de freqüência.
No entanto, Freitas (2003) destaca que a expressão “ciclos” vem sendo muito utilizada,
mas que existe diferença entre ciclo e progressão continuada. Para o autor, na progressão
continuada se agrupam “as séries com o propósito de garantir a progressão continuada do aluno”
(p.9) enquanto que ciclos “exige uma proposta global de redefinição de tempos e espaços da
escola” (p.9).
Segundo Jacomini (2004) casos em que os ciclos se constituem “tão somente no
agrupamento de séries, pois não houve mudanças significativas no tempo, no conteúdo e na
119
avaliação rumo a um ordenamento das práticas escolares centradas na aprendizagem de todos”
(p.406). Complementa afirmando que, nesses casos, a progressão continuada adquire “a
conotação pejorativa, atribuída pelos educadores”, de “promoção automática” (JACOMINI,
2004, p.406). Sendo assim, não existe uma aprendizagem efetiva, mas apenas a passagem de um
ciclo a outro.
Para a SEE/SP, no entanto, não se deve vincular a idéia de progressão continuada com a
de promoção automática, pois no primeiro caso o aluno somente avança no percurso escolar por
ter “se apropriado, pela ação da escola, de novas maneiras de pensar, sentir e agir”. E, na
promoção automática, o aluno simplesmente “permanece nas unidades escolares, independente
de progressos terem sido alcançados(SÃO PAULO, 2000, p.32).
O aluno deve, portanto, ter o seu ritmo de aprendizagem respeitado, sem reprovação que
lhe impeça o seu progresso (pelo menos até no final do ciclo), mas o professor deve, segundo a
SEE/SP, proporcionar-lhe aprendizagem e não simplesmente que faça o percurso escolar sem
nada aprender e seja reprovado ao final do ciclo ou não consiga adquirir conhecimentos básicos.
Penin (2000), que na época era Vice-presidente do Conselho Estadual de Educação do
Estado de São Paulo, afirmava que a “expressão promoção automática, todavia, parece menos
adequada do que progressão continuada, aquela se referindo principalmente à ação administrativa
e esta, ao aluno e ao seu desenvolvimento” (p.34).
A idéia de “promoção automática” é muito questionada desde 1998, com a implantação
da progressão continuada, pois a não-retenção escolar dos alunos poderia configurar uma
“aprovação automática” o que provocaria a resistência dos professores.
De acordo com Barretto e Mitrulis (2003), o discurso oficial invariavelmente prega que
a mudança pretendida com o regime de ciclos deve ter o apoio da comunidade educacional e que
haja esclarecimento à população em geral, mas os professores se sentem colocados à margem das
decisões e, por isso, têm dificuldades de se apropriarem efetivamente das reformas, pois “não se
sentem co-participantes da organização da escola em ciclos” (p.99).
Ainda segundo Barretto e Mitrulis (2003), a implantação da progressão continuada, na
visão dos professores, teria sido uma imposição do governo e as políticas têm por princípio a
racionalidade economicista cuja função é tão somente a melhoria das estatísticas e não a
modificação das condições de ensino para garantir uma aprendizagem de sucesso. E também
120
existe um aspecto bem problemático quando da implantação de ciclos: os professores sentem que
perdem poder e controle sobre as classes nesta forma de organização escolar.
Na década de 1950 havia preocupação, por parte de Almeida Júnior (1957), de que
houvesse o envolvimento dos professores nas mudanças que ele defendia, ou seja, a promoção
automática uma vez que a resistência dificultaria a aprendizagem dos alunos. Mesmo assim, os
professores foram envolvidos por mudanças, sem se sentirem participantes das mesmas, que
exigem novas posturas principalmente em relação à avaliação visto que os ciclos não combinam
com avaliações meramente classificatórias.
Para Barretto e Mitrulis (2003), o regime de ciclos na rede estadual paulista pode ser
definido da seguinte maneira: “o ciclo é entendido como um conjunto de graus ou séries
consecutivas entre as quais não reprovação, mas cujos conteúdos de ensino se reportam ao
grau ou série oferecendo balizas ao trabalho pedagógico dos professores” (p.106). As autoras
enfatizam que as avaliações interna e externa e mecanismos de apoio pedagógico ganham
relevância para garantir a aprendizagem prevista em cada etapa dos ciclos.
Os alunos da rede estadual paulista de ensino têm, portanto, possibilidades de
freqüentarem o ensino fundamental sem serem reprovados senão no final de cada ciclo, mas eles
devem assimilar a mesma cultura básica sendo respeitados os ritmos de aprendizagem de cada
um. Estes também são avaliados pelos professores e também pela SEE/SP através do Saresp. A
avaliação externa existente nas escolas estaduais paulistas representa, segundo Barretto e Mitrulis
(2003) uma inovação que não existia nas experiências brasileiras anteriores e foi implantado no
Estado de São Paulo a partir de 1996.
O governo paulista, através do CEE, atribuía ao regime seriado os altos índices de
reprovação que exprimem o fracasso escolar. Mas afirmava que, através da adoção da progressão
continuada deveria ser modificada totalmente a concepção de ensino, de aprendizagem e de
avaliação da aprendizagem. As mudanças na avaliação deveriam ocorrer no sentido dos
professores trabalharem coletivamente e de superarem a avaliação classificatória em prol de uma
avaliação que proporcionasse condições para que a equipe escolar acompanhe os processos de
aprendizagem de seus alunos.
A progressão continuada é considerada pela SEE/SP, portanto, como a superação dos
problemas historicamente presentes na educação paulista e que são conhecidos pelos nomes de
reprovação, evasão e fracasso no âmbito escolar.
121
No entanto, Viégas (2002) faz uma brilhante análise do discurso oficial propagado pela
SEE/SP, através do estudo de material publicado acerca de avaliação e progressão continuada.
Entre o material pesquisado, estão os artigos de Rose Neubauer e Cláudia Davis É proibido
repetir avaliação educacional de 1993, Sonia Penin (2000) Qualidade de ensino e progressão
continuada e Neubauer (2000) com Quem tem medo da progressão continuada? Ou melhor, a
quem interessa o sistema de reprovação e exclusão social?
Menciona Viégas (2002) que existe a utilização do discurso competente, ou seja, são
mencionados importantes educadores, como Dante Moreira Leite ou Almeida Jr (com referências
elogiosas) para reforçar o argumento de que o governo paulista estaria agindo acertadamente:
“Um dos primeiros aspectos que salta aos olhos quando da leitura do discurso oficial refere-se à
recorrência da utilização do discurso competente como legitimador da proposta implementada no
Estado” (2002, p.37, grifo da autora). Um outro exemplo citado por Viégas (2002) é o que
aparece na fala da então secretária da Educação Rose Neubauer em que menciona que os
idealizadores da progressão continuada “não são passíveis de serem identificados como
demagogos ou malandros como tentam alguns fazer parecer” (apud VIÉGAS, 2002, p.14). Mais
uma vez é utilizado o discurso competente para descaracterizar os que se opõem à progressão
continuada.
Viégas (2002) aponta, também, a forma autoritária com que muitas proposições foram
feitas:
A maior parte delas não chama à reflexão, mas é composta de veredictos certeiros sobre
o que/ como/ porque fazer, semelhantes a uma receita do novo, ensinada mediante o
excesso de imperativos e o uso de palavras fortes e opressoras, e que deve ser seguida à
risca (VIÉGAS, 2002, p.37, grifo da autora).
Exemplificando a forma autoritária das proposições oficiais, Viégas (2002) aponta a
citação do artigo originalmente publicado em 1993, É proibido repetir - avaliação educacional
redigido por Rose Neubauer e Cláudia Davis, cujo “tom imperativo”, é percebido quando as
autoras defendem o seu ponto de vista nas seguintes passagens:
Garantir em todas as séries do ensino fundamental o sistema de promoção automática
(...) Organizar as classes apenas e exclusivamente por faixa etária (...) [O Estado
deveria] Estabelecer um sistema de acompanhamento contínuo do processo de
implantação da inovação educacional (...) e Informar a sociedade civil como forma de
122
dar continuidade às mudanças propostas (NEUBAUER & DAVIS, 1993, apud
VIÉGAS, 2002, p.27, grifo nosso).
Percebe-se que o artigo foi escrito antes da implantação da progressão continuada
(1998) e uma de suas autoras
11
, se tornaria a secretária da Educação paulista com discurso
autoritário, mas ainda falando em “promoção automática” cujo termo a SEE/SP rejeitaria
enfaticamente mais tarde.
Apesar do discurso oficial ser autoritário tenta reverter a situação atribuindo a quem se
opõe à proposta da progressão como sendo “resistente, conservador, elitista, odioso ou
antidemocrático” (NEUBAUER & DAVIS (1993), NEUBAUER (2000) apud VIÉGAS, 2002,
p.37-38).
Para Viégas (2002), “A forma de implantação da Progressão Continuada e o tom
abstrato dos textos de sua divulgação também parecem estar apoiados na visão segundo a qual as
idéias, uma vez formuladas, têm o poder de transformar a realidade, as práticas e os
pensamentos” (p.38). Sendo assim, para a autora “o pensamento mágico permeia a quase
totalidade do discurso oficial” (VIÉGAS, 2002, p.38).
Além de autoritário e “mágico”, o discurso oficial apresenta contradições e lacunas:
Assim, embora, em vários momentos, apresente a Progressão Continuada como
sinônimo de fim da seletividade da escola, declara, em muitos outros que, se não houver
esforço e dedicação docente, a seletividade será mantida; parece, pois, ciente de que a
exclusão escolar, para ser solucionada, requer árdua tarefa e não simples decreto
(VIÉGAS, 2002, p.38).
As autoras Barretto e Mitrulis são citadas por Viégas (2002) para defender que as
mudanças não aconteçam por decreto: “(...) nenhuma medida, por mais defensável que seja no
plano do ideário político e pedagógico, logrará sucesso no domínio das práticas que têm impacto
nos processos de mudanças sociais. Os ciclos não se implantam por decreto”. (p.18).
11
Rose Neubauer da Silva se tornou Secretária da Educação desde o início da gestão de Mário Covas, em 1995,
permanecendo no cargo até abril de 2002 (SOUSA, STEINVASCHER, ALAVARSE & ARCAS, 2007, p.39).
123
Acrescenta-se a essas constatações a visão pejorativa acerca de alunos pobres que
aparece, por exemplo, no artigo de Penin (2000):
(...) as circunstâncias de vida da população mais sofrida da sociedade: os muito pobres,
os de vida cultural restrita e os provenientes de famílias desorganizadas, trazendo
consigo todo tipo de problemas de comportamento (indisciplina, desrespeito, pouca
higiene, violência, drogas). É sim, o outro lado ou o lado ruim da sociedade que está
entrando na escola (PENIN, 2000, p.39).
Além de considerar os alunos pobres como o “lado ruim da sociedade”, Penin (2000)
também, tem uma visão pejorativa acerca dos professores ao comentar:
Diante da dificuldade de entender ou de querer modificar a prática, uma forma
predatória de resistência que tem sido praticada e mesmo formulada é a de eliminar as
avaliações da aprendizagem dos alunos e promovê-los sem lançar mãos de medidas
corretivas de ensino já existentes ou outras, a serem inventadas (PENIN, 2000, p.37).
Viégas (2002), conclui mencionando que
Assim, um agravante ao qual deve-se atentar: se a Progressão Continuada tivesse
sido implantada de outra forma, incluindo a participação dos professores, quando as
possíveis resistências não seriam silenciadas, mas compreendidas em seu caráter
transformador, seus resultados poderiam ser diferentes (VIÉGAS, 2002, p.160).
Para um governo que divulga a “democratização do acesso à escola” é de se fazer notar,
ao mesmo tempo, como impossibilitou a participação dos professores na implantação da
progressão continuada e o quanto desqualifica a resistência dos professores como sendo
“antidemocrática” e “conservadora”, esquecendo-se de que a democracia não significa aprovação
a todas as decisões governamentais, sem a devida discussão de seu sentido.
5.4. RETOMANDO E COMPARANDO AS DÉCADAS DE 1950 E 1990
124
Desde a década de 1920 encontramos educadores buscando respostas para problemas
relacionados à reprovação e evasão escolares que acarretam o fracasso escolar.
As preocupações ultrapassaram três décadas, tornando-se relevantes na década de 1950
cujas discussões tinham como referência as experiências que aconteciam nos Estados Unidos e
Inglaterra em que todos os alunos eram distribuídos nas séries de acordo com a idade e tinham o
direito, mediante o comparecimento às aulas de progredir para a série seguinte
independentemente do aproveitamento que apresentassem.
Surge, então, a idéia de promoção automática defendida principalmente por Almeida
Júnior e Dante Moreira Leite, mas que afetaria apenas o ensino primário o que corresponderia ao
1º ciclo do ensino fundamental da atualidade.
Era defendida a aprendizagem para todos os alunos mas, na década de 1950, além dos
problemas de reprovação e evasão havia ainda o de acesso à escola. Não existiam vagas
suficientes para todas as crianças e a reprovação excessiva na 1ª série do ensino primário tornava
mais complexo a matrícula de alunos novos visto que as crianças repetentes ficavam com grande
parte delas.
Os argumentos defendidos na década de 1950 eram propostos pela Unesco e pelo
governo federal cujo presidente, Juscelino Kubitschek (1956-1960), defendia as reformas
educacionais associando-as ao desenvolvimento que foi uma característica de seu governo.
A partir da década de 1970 o problema do acesso à escola, no estado de São Paulo
começou a ser sanado (sendo que, de acordo com os dados governamentais, existiria quase
uma total universalização do acesso escolar), mas na década de 1990 continuam questões como a
reprovação, a evasão e o fracasso escolares para serem solucionados. Portanto, o problema se
baseia na permanência dos alunos na escola com aprendizagem efetiva.
No Estado de São Paulo as experiências com ciclos ocorreram na década de 1980 com a
implantação do ciclo básico na e séries do então grau. Mas, a partir de 1998, foi
implantada a progressão continuada em todo o ensino fundamental (da a série) com dois
ciclos.
125
Para Freitas (2003) a implantação da progressão continuada no Estado de São Paulo foi
um caso grave, pois não houve o envolvimento dos pais e professores no processo, uma vez que
toda a rede estadual foi forçada a aderir a ela sem poder fazer opção e a idéia de ciclos foi
comprometida, pois com a reorganização ocorrida em 1996, houve a separação dos alunos
(escolas de 1ª a 4ª séries e de 5ª a 8ª séries).
Esta separação dos alunos determinou os ciclos e não as fases de desenvolvimento da
criança, como ocorre em outros lugares do país em que existe a experiência com o regime
“ciclado” de ensino. Por exemplo, a Escola Plural, de Belo Horizonte, é baseada em 3 ciclos. O
primeiro compreende alunos de 5 a 9 anos (infância), o segundo, alunos de 9 a 12 anos (pré-
adolescência) e o terceiro, alunos de 12 a 14 anos (adolescência). Os ciclos representam, então,
“as fases do desenvolvimento humano do aluno, suas características pessoais e as vivências
socioculturais” (FREITAS, 2003, p.53).
E, se considerarmos a questão da exclusão escolar, percebemos que, a partir da
implantação da progressão continuada, diminuíram os índices de retenção e evasão escolares,
mas está ocorrendo, ao mesmo tempo, o que Freitas (2003) chama de exclusão no interior da
escola quando muitos alunos permanecem nela sem uma aprendizagem efetiva. No sistema
seriado eles eram eliminados através da reprovação ou evasão, mas com a progressão continuada,
eles permanecem na escola e é necessário que haja uma forma diferenciada de trabalhar com
estes alunos sendo repensada, especialmente, a avaliação. Do contrário, a escola continuará
seletiva e realmente estará ocorrendo a promoção automática, tão somente no sentido pejorativo
que se atribui atualmente.
Podemos constatar várias semelhanças entre a promoção automática, da década de 1950
e a progressão continuada, da década de 1990. Entre elas estão o fato de que ambas foram
motivadas pelos altos índices de retenção e pelos gastos excessivos decorrentes da reprovação
excessiva; as legislações federal (LDBs Lei 4.024/6 e Lei 9.394/96) e estadual forneciam
suporte para a substituição do regime não-seriado; ambas seguiam modelos estrangeiros:
Inglaterra e EUA, na década de 1950 e Espanha, na década de 1990 sob a égide, nos dois
períodos, da Unesco. Além disso, a promoção automática e a progressão continuada ensejavam a
mudança na concepção de ensino, aprendizagem e de avaliação de aprendizagem sendo as
126
transformações necessárias ressaltadas pelos autores Moreira Leite e Almeida Jr, da década de
1950 e Barretto e Mitrulis (2003), Freitas (2003), Fernandes (2000 e 2005) e Dias (2005).
Assim como na década de 1950 podemos ainda constatar na década de 1990, e
atualmente, que não consenso entre as opiniões sobre a progressão continuada. Knoublauch
(2004) cita Demo (1998) que, num artigo Promoção automática e capitulação da escola, critica
os argumentos que sustentam a progressão continuada os quais considera serem “balelas”: “a
preocupação com a auto-estima do aluno, a idéia de respeitar o ritmo de aprendizagem de cada
aluno e a crença de que essa proposta representa um avanço teórico e prático” (apud
KNOUBLAUCH, 2004, p.51). Continua a mesma autora:
Para ele [Pedro Demo], a progressão automática é uma forma de enganar o aluno a
respeito de seu desempenho escolar, o que pode ferir mais a auto-imagem dele do que a
reprovação. Vê, ainda, a progressão continuada como uma forma de retardar o ensino e
de deixar de resolver um problema que é o do não-aprendizado, o qual muitas vezes
ocorre, segundo o autor, por ineficiência do trabalho do professor (KNOUBLAUCH,
2004, p.51).
Dessa forma, somente com a qualificação constante do professor é que se pode melhorar
a escola e não com a aprovação dos alunos sem a devida aprendizagem.
Segundo Barretto e Mitrulis (2003), a SEE/SP se pronuncia afirmando que as condições
para a implementação da progressão continuada foram asseguradas com: a reorganização das
escolas estaduais, com a criação do Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), com a
presença do professor coordenador em todas as escolas, com recuperação e reforço e distribuição
de material didático e equipamentos. Mas,
Para os professores, contudo, as condições de trabalho existentes na rede estadual são
insuficientes para garantir a aprendizagem efetiva de todos devido: ao grande número
de alunos por classe, que dificulta o acompanhamento mais individualizado; a falta de
estrutura física e de pessoal para esse acompanhamento e à falta de capacitação docente
(...). Questiona-se também a duração de quatro anos dos ciclos paulistas porque eles
incidem sobre a tradicional divisão do ensino fundamental (...) (BARRETTO &
MITRULIS, 2003, p.100).
Freitas (2003) critica a progressão continuada de ser apenas um “agrupamento de
séries” e não uma proposta de ciclos. E Fernandes (2000, 2005 e 2007) defende os ciclos como
127
uma etapa de transição para a construção de uma nova escola desde, porém, que não sejam
apenas uma forma de reorganização de séries, o que vem ocorrendo com a progressão
continuada.
No entanto, existem aqueles que defendem a progressão continuada, como Penin
(2000), argumentando que ela visa o desenvolvimento dos alunos, respeitando o seu ritmo de
aprendizagem.
Mas não somente semelhanças entre a promoção automática e a progressão
continuada. As diferenças existem e como exemplos teríamos, inicialmente, o contexto histórico
diverso com a promoção automática sendo discutida mais intensamente no governo de Juscelino
Kubitschek de Oliveira (1956-1960), cuja característica principal foi o desenvolvimento
industrial, e o pensamento era de que a educação contribuiria para a inserção do país na era
desenvolvimentista, de acordo com Fernandes (2000). A progressão continuada é de um tempo
em que a preocupação do governo neoliberal do presidente da república Fernando Henrique
Cardoso (1995/1999 e 1999/2003) e do governador paulista Mário Covas (1995/1998 e
1999/2001) é a inserção do país, e do estado, no mundo globalizado e a educação segue os
moldes dos organismos internacionais como o Banco Mundial que pressiona com empréstimos os
ajustes realizados pelo governo.
Enquanto a promoção automática ocorreu no ensino primário nos estados de São Paulo
e Pernambuco, em 1968, e em Minas Gerais e Santa Catarina, em 1970 a progressão continuada
foi implantada no estado de São Paulo, em 1998, na antiga série até a série em todas as
escolas da rede estadual de ensino. A partir de 1998, o governo paulista rejeita o termo
“promoção automática”, pois a SEE/SP diz que o aluno não apenas avança o percurso escolar
sem ser reprovado, mas tem que se apropriar de “novas maneiras de pensar, sentir e agir” (SÃO
PAULO, 2000, p.10).
E, finalmente, houve um aumento no atendimento escolar (democratização do acesso à
escolarização) a partir da década de 1980, mas no passado o aluno era excluído e ocorria a evasão
e, atualmente, a exclusão pode acontecer quando o aluno é colocado “fisicamente” para fora da
escola ou quando exclusão no interior da escola por não ocorrer a aprendizagem significativa
(FREITAS, 2003, p.33).
128
A partir da implantação da progressão continuada começou, segundo Viégas (2002), a
exclusão discente e docente no interior da escola. Existem alunos freqüentando a escola sem a
aprendizagem necessária, mas também os professores estão excluídos, pois “Tendo sido
excluídos do processo decisório, eles não foram valorizados como participantes, sendo esta outra
incoerência desta política” (p.167). Outras incoerências apontadas pela mesma autora são a de
que os alunos “deixaram de ser reprovados, mas passaram a ser aprovados por decreto, ou seja, a
progressão continuada tem sido, sim, sinônimo de promoção automática” (VIÉGAS, 2002, p.167,
grifos da autora).
Ainda menciona Viégas (2002) que
Embora o Estado tenha proposto uma série de eufemismos para essa expressão
(progressão continuada, avanço dos discentes, ausência de interrupção, eliminação da
retenção, pedagogia da promoção), nota-se que, em realidade, são outras palavras para
definir um mesmo conceito (VIÉGAS, 2002, p.167).
Dessa forma, o “mesmo conceito” a que se refere a autora é a promoção automática,
embora não seja aceito como sinônimo da progressão continuada pela SEE/SP, mas é o que está
ocorrendo no estado de São Paulo, desde 1998. Knoblauch (2004), cita Demo afirmando que
“esse autor relaciona a proposta de progressão automática à atual tendência que valoriza o ensino
fundamental como forma de aumentar os níveis de competitividade do país num mundo em que a
economia é globalizada” (p.50).
Não existem dúvidas de que a progressão continuada tem servido para que o estado de
São Paulo consiga alcançar metas favoráveis quanto à permanência e aprovação dos alunos na
escola, assim como na diminuição dos custos, como podemos observar nos dados apresentados
pela Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (CENP), por ocasião do planejamento de
2007, na tabela a seguir.
129
Tabela 5 Taxas de aprovação e abandono da rede estadual de São Paulo Ensino Fundamental
5ª a 8ª séries
ANOS APROVADOS ABANDONO
1990 66,0 16,1
2000 88,4 6,3
2001 89,7 4,2
2002 89,4 4,0
2003 89,3 3,7
2004 89,3 2,8
2005 89,2 2,5
2006 88,3 2,4
Fonte: SÃO PAULO. CIE/SP, 2006.
Pela tabela notamos que a SEE/SP tem motivos para se vangloriar quanto aos
resultados em relação ao acesso, permanência e aprovação dos alunos na escola, o que é
incontestável, desde a implantação da progressão continuada em 1998. Tanto que a CENP, no
130
documento do planejamento de 2007 intitulado Qualidade educativa: Intenção e Compromisso,
afirma que:
Se tanto no contexto mundial quanto no da América Latina, reprovação e evasão, são
fatores que ainda desafiam o país, dadas as suas diversidades regionais, sócio-
econômicas e políticas, entre outras, o mesmo não acontece no estado de São Paulo que
alcançou avanços consideráveis. Portanto, quanto à permanência e promoção, o dado
real de São Paulo nos aproxima do ideal, particularmente no Ensino Fundamental (SÃO
PAULO, 2007a, p.5).
Infelizmente, os dados estatísticos não são suficientes para fazer com que o estado de
São Paulo se aproxime do ideal, em relação à aprendizagem, no que reconhece a SEE/SP: “No
que se refere à aprendizagem, o dado real demonstra que São Paulo, em relação ao ideal de
“Educação para Todos com Qualidade”, ainda não conseguiu concretizar satisfatoriamente essa
intenção” (SÃO PAULO, 2007a, p.7). Por isso, mudanças estão sendo previstas pela SEE/SP,
mas que “não coloquem em risco as conquistas obtidas até o presente” (SÃO PAULO, 2007a,
p.9). Sendo assim, ao longo do ano de 2007, pretende-se iniciar mudanças, mas com a
permanência da progressão continuada responsável pelas “conquistas” expostas nos baixos
índices de defasagem idade/série, evasão e reprovação.
Entre as mudanças anunciadas pela SEE/SP está a reorganização do tempo dos ciclos,
ou seja, haverá 4 ciclos ao invés de apenas 2. As mudanças já eram anunciadas pela ex-secretária
da educação e a primeira da gestão de José Serra, Maria Lúcia Vasconcelos
12
, “com a avaliação
de quatro em quatro anos, a gente demora a detectar os problemas de aprendizado. Não que a
criança não venha sendo avaliada. Ela vem. Mas uma barreira é um alerta mais presente” (SÃO
PAULO, 2007b, p.1). A ex-secretária dizia que essa mudança foi motivada por reuniões com
vários setores da educação e devido ao fraco desempenho das escolas no Saresp:
Tive reuniões com muitos setores da educação e uma das questões permanentes era a
necessidade de se rever a progressão continuada. Isso veio para mim como um anseio
dos próprios professores e diretores. Depois de avaliar os resultados do Saresp (Sistema
de Avaliação de rendimento Escolar do Estado de São Paulo, que revelou fraco
rendimento em matemática e regular em leitura dos alunos do ensino fundamental e
médio), percebemos que seria melhor instituir ciclos menores para que a avaliação
acontecesse em tempo mais curto. Quatro anos é um tempo muito grande
(SANT’ANNA, 2007, p. 32).
12
A atual secretária da Educação da gestão de José Serra, Maria Helena Guimarães de Castro, é socióloga e foi
secretária-executiva do MEC (governo FHC). Assumiu o cargo na SEE/SP em 27 de julho de 2007, substituindo
Maria Lúcia Vasconcelos.
131
Mas não foi apenas a ex-secretária que falava em mudanças. Em 20 de agosto de 2007,
o governador José Serra e a atual secretária da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro,
anunciaram as dez metas para o ano de 2010 e as 10 ações correspondentes para atingi-las
objetivando a qualidade da educação. Através de um documento intitulado Uma nova agenda
para a Educação Pública - 10 metas para o ano 2010, são descritas as metas e também as ações
a serem desenvolvidas. São as seguintes metas divulgadas pela SEE/SP:
1.Todos os alunos de 8 anos plenamente alfabetizados.
2.Redução de 50% das taxas de reprovação da 8ª série.
3.Redução de 50% das taxas de reprovação do Ensino Médio.
4.Implantação de programas de recuperação de aprendizagem nas séries finais de todos
os ciclos de aprendizagem (2ª, e séries do Ensino Fundamental e série do
Ensino Médio).
5.Aumento de 10% nos índices de desempenho do Ensino Fundamental e Médio nas
avaliações nacionais e estaduais.
6.Atendimento de 100% da demanda de jovens e adultos de Ensino Médio com
currículo profissionalizante diversificado.
7.Implantação do Ensino Fundamental de nove anos, com prioridade à municipalização
das séries iniciais (1ª a 4ª séries).
8.Programas de formação continuada e capacitação da equipe.
9.Descentralização e/ou municipalização do programa de alimentação escolar nos 30
municípios ainda centralizados.
10.Programa de obras e melhorias de infra-estrutura das escolas (SÃO PAULO, 2007c).
E as ações descritas no item Qualidade da Educação: dez ações para uma escola
melhor, do mesmo documento citado anteriormente, se referem à Implantação do projeto Ler e
Escrever para as séries iniciais do ensino fundamental; Reorganização da progressão
continuada; Currículo e expectativas de aprendizagem; Recuperação da aprendizagem;
Diversificação curricular do Ensino Médio; Educação de Jovens e Adultos; Ensino Fundamental
de nove anos; Sistemas de avaliação; Gestão dos resultados e política de incentivos e Plano de
obras e investimentos. Comentamos a seguir as mudanças relacionadas ao nosso trabalho
iniciando com a reorganização da progressão continuada. Segundo o documento, haverá
132
1.Implantação de ciclos de dois anos no primeiro segmento do Ensino Fundamental (1ª
a 4ª séries) a partir de 2008.
2.Implantação de ciclos de dois anos no segundo segmento do Ensino Fundamental (5ª
a 8ª séries) a partir de 2009.
3.Implantação do Boletim Eletrônico dos alunos, que poderá ser acessado pelos pais
através da Internet, em setembro de 2007 (SÃO PAULO, 2007c).
Com relação ao Currículo e expectativas de aprendizagem as instruções são:
1.Divulgação das propostas curriculares e expectativas de aprendizagem para todas as
séries e disciplinas do Ensino Fundamental e Médio em setembro de 2007.
2.Consulta à rede e capacitação dos professores de outubro a dezembro de 2007, com a
utilização da estrutura da Rede do Saber.
3.Implantação das orientações curriculares no planejamento pedagógico de fevereiro de
2008 (SÃO PAULO, 2007c).
Quanto à Recuperação da aprendizagem, a SEE/SP determinou que:
1.Etapas de recuperação intensiva dos conteúdos curriculares fundamentais: ao final do
1º ciclo (2a série), ao final do 2º ciclo (4ª série), na 8ª série e no final do Ensino Médio.
Implantação: 1º. Semestre de 2008.
2.Adoção de procedimentos, estratégias e ação didático-pedagógica focados na
recuperação da aprendizagem e na aquisição de conteúdos e competências requeridos
nas etapas seguintes da vida escolar (SÃO PAULO, 2007c).
E, finalmente, com relação aos Sistemas de avaliação, as determinações são:
1.Realização, no próximo mês de outubro, do SARESP 2007 com avaliação das seguintes
séries:
* Ensino Fundamental (1ª, 2ª, 4ª, 6ª e 8ª séries)
* Ensino Médio: 3ª série
2.A avaliação externa das escolas estaduais (obrigatória) e municipais (por adesão)
permitirá a comparação dos resultados do SARESP com as avaliações nacionais ( SAEB
e a Prova Brasil), e servirá como critério de acompanhamento das metas a serem atingidas
pelas escolas.
3.Participação de toda a rede na Prova Brasil (novembro de 2007).
133
4.Realização de programas de capacitação da rede para a participação no SARESP e na
Prova Brasil, em setembro de 2007.
5.Capacitação dos professores para o uso dos resultados do SARESP no planejamento
pedagógico das escolas em fevereiro de 2008.
6.Divulgação dos resultados do SARESP 2007 para todas as escolas, professores, pais e
alunos em março de 2008 (SÃO PAULO, 2007c).
Além destas mudanças anunciadas, a própria CENP tem divulgado, através do site da
SEE/SP
13
, as ações centralizadas e descentralizadas que pretende executar, durante o ano de 2007,
em relação à avaliação. Nas ações centralizadas são previstas videoconferências e
disponibilização de subsídios referentes ao tema cujo público alvo é formado pelos dirigentes
regionais de ensino, supervisores de ensino e assistentes técnicos pedagógicos. Nas ações
descentralizadas são previstas atividades de capacitação e o público alvo é composto pelos
diretores e vice-diretores, professores-coordenadores e professores. A avaliação continua,
portanto, no cerne da polêmica da crise de qualidade do ensino. Por isso, a preocupação da
SEE/SP em promover estas capacitações.
Mas não são divulgadas mudanças que seriam significativas para que os professores
pudessem realmente diagnosticar dificuldades e trabalhar com recuperações paralelas como, por
exemplo, a diminuição de alunos em sala de aula para possibilitar o acompanhamento
individualizado dos alunos. O número de alunos aumentou nas escolas devido, principalmente,
aos baixos índices de evasão e reprovação, mas a superlotação das salas não promove qualidade
de ensino, muito pelo contrário.
Se as mudanças darão certo o tempo poderá dizer, mas acreditamos que muitos
desafios para os professores ainda estão por vir.
13
O site da SEE/SP é www.educacao.sp.gov.br.
134
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A filosofia da progressão continuada é positiva, na medida
em que o ensino é centrado no aluno, no seu
desenvolvimento global e no desenvolvimento de suas
habilidades ao longo do processo educacional. Sem dúvida, a
escola seletiva, as classes homogêneas e a questão prêmio-
castigo indicam uma escola discriminatória [...] Agora,
começa-se a pensar no aluno como um todo e oferece-se a
ele a oportunidade de aprender em outros ciclos, os
conteúdos que ficaram defasados. MAS, vem a aplicação do
SARESP e pede dele o conhecimento respectivo àquela
série. Se ocorrem fracassos, de quem é a culpa? [...]
(Depoimento de uma professora, citado por DIAS-DA-
SILVA & LOURENCETTI, 2002, p.33-34).
O depoimento da professora acima, citado por Dias-da-Silva e Lourencetti (2002)
expressa algumas inquietações que acompanham tempos muitos professores, especialmente a
partir da implantação da progressão continuada no estado de São Paulo em 1998. Como
professora da rede púbica paulista, foram essas mesmas inquietações que me motivaram a
realizar este trabalho na tentativa de buscar compreender as mudanças educacionais que
ocorreram e que levaram os professores a se sentirem culpados pelo fracasso escolar de seus
alunos.
Progressão continuada ou promoção automática, séries ou ciclos, avaliação
classificatória ou qualitativa, escola inclusiva ou seletiva? São muitas as antíteses que permeiam
o âmbito escolar, tanto na legislação referente à educação, quanto na prática da sala de aula.
Por meio da história da educação brasileira e das práticas de sua avaliação podemos
perceber muitas das mudanças incididas sobre a avaliação, mas também, a permanência de
muitos problemas por sucessivas décadas, tais como o fracasso escolar, a reprovação e a evasão.
Para a compreensão desses fatos, o recorte temporal analisado foi o de 1961 com a promulgação
135
da primeira LDB - Lei 4.024/61- até 1998, com a implantação do regime de progressão
continuada no estado de São Paulo.
Dentro desta periodização, percorremos as legislações federais como a Lei Federal
5.692/71 e a nova LDB Lei 9.394/96 e como estas foram incorporadas pela SEE/SP, por
meio do estudo de suas diretrizes educativas divulgadas em documentos produzidos pela FDE
(Fundação para o Desenvolvimento da Educação) e pela CENP (Coordenadoria de Estudos e
Normas Pedagógicas) que são utilizados por ocasião do planejamento como a Escola de Cara
Nova, ou distribuídos para as diretorias de ensino e bibliotecas das escolas como é o caso da Série
Idéias e as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (legislação e normas básicas para sua
implementação).
Nessa trajetória, notamos que as políticas educacionais responsáveis pelas mudanças
ocorrem independentes da participação do professores que são os seus executores. Como
apontam Dias-da-Silva e Lourencetti (2002): “parece inegável a ausência dos professores nas
discussões e definições das políticas educacionais, que apenas atribuem a eles o papel de
executores ou aplicadores das propostas [...]” (p.21).
Apesar de Dias-da-Silva e Lourencetti (2002) estarem se referindo às mudanças mais
recentes ocorridas no estado de São Paulo decorrentes da nova LDB, como por exemplo, a
reorganização das escolas estaduais em dois ciclos no ensino fundamental a partir de 1996, e a
implantação do regime de progressão continuada em 1998, percebemos que a ausência dos
professores na elaboração das políticas educacionais não é recente. Perez (2000) analisou as
administrações dos governadores paulistas de 1967 até 1991, e constatou a ausência dos
professores na implementação de mudanças que eram decididas exclusivamente pela SEE/SP, ou
seja, como descreve este autor “de cima para baixo”, visto que “A implementação [dos
programas e medidas formulados pelos governadores deste período] nunca ocorre pela persuasão
ou pela negociação, mas sim pelo “cumpra-se”, sem o concurso do implementador, sempre
considerado um agente passivo” (PEREZ, 2000, p.126).
Essa ausência é criticada por Dias-da-Silva e Lourencetti (2002):
Qualquer tentativa de mudanças na escola, e implantação de reformas educacionais
precisa incluir um questionamento conseqüente das concepções dos professores sobre o
seu fazer docente. que se ouvir os professores, refletir sobre as contradições e
dilemas presentes no seu dia-a-dia, tendo como pano de fundo um projeto pedagógico
crítico e democrático para nossa escola pública.que se analisar, com os professores,
136
as alternativas que são viáveis no contexto de mazelas a que somos submetidos nessa
escola (DIAS-DA-SILVA & LOURENCETTI, 2002, p.40).
Uma vez que as transformações na área educacional, especialmente no modelo de
avaliação adotado, não contam com a participação dos professores - que apenas são obrigados a
cumprir as prescrições oficiais - necessitamos investigar o currículo prescrito e o avaliado, haja
vista que a avaliação é parte integrante do currículo, ao se incorporar a este como um importante
componente do processo pedagógico.
Constatamos que existem inúmeras definições de currículo, mas o que nos tornou
relevante foi percebê-lo como processo e para o compreendermos devemos responder aos
questionamentos levantados sobre o que se ensina, quais os objetivos do ensino, quem escolhe o
conteúdo, para quem se ensina e como se ensina. Desta maneira, ao concebermos o currículo
como um processo, temos a exata noção de que ele pode e deve ser um espaço para resistência e
transformação.
No entanto, a inovação dos currículos não deve ocorrer apenas nas teorias curriculares;
é preciso haver mudanças na prática que professores e alunos vivenciam no seu cotidiano escolar.
No caso do currículo prescrito, cujas funções são a de prescrever os conteúdos mínimos e de
orientação do processo de ensino e de aprendizagem, percebemos que nas leis 4.024/61 e
5.692/71, a noção de currículo consistia na determinação das disciplinas que comporiam a grade
curricular. Com relação à avaliação, na primeira LDB a preocupação era com a objetividade dos
resultados e instrumentos de medida enquanto que na lei federal 5.692/71 enfatizava-se os
aspectos qualitativos na avaliação de aproveitamento, não bastando que os alunos adquirissem
uma determinada quantidade de conhecimentos. Sugeria-se, portanto, a superação da concepção
tradicional de avaliação (classificatória) pela avaliação contínua na sala de aula.
A concepção de avaliação da nova LDB (Lei 9.394/96) mostra que ela deve ser
contínua e cumulativa, ressaltando a valorização do desempenho do aluno em todo o ano letivo;
também, há sugestões para outras formas de organização do ensino que não o seriado. Utilizando-
se deste interstício, o estado de São Paulo implantou a partir de 1998 o regime de ciclos no ensino
fundamental e a progressão continuada com possibilidade de progresso dos alunos sem retenção
exceto no final de cada um dos ciclos, ou seja, nas 4ª e 8ª séries.
Urge lembrar que a nova LDB surgiu no contexto da inserção do país nas políticas
neoliberais, nas quais, a educação está em destaque e a avaliação é colocada como parâmetro de
137
mensuração da qualidade da educação. Através das avaliações externas do governo federal
(SAEB) e do governo estadual (Saresp) para o ensino fundamental objetivou-se o controle do que
foi prescrito pelo currículo oficial. Neste sentido, as contradições entre as políticas públicas
referentes à educação tornam-se evidentes, pois, apesar de a legislação não recomendar a
avaliação classificatória, é por meio desta que as avaliações externas são aplicadas, uma vez que
estas servem para a comparação entre alunos de diferentes escolas.
As determinações contidas nas diretrizes avaliativas paulistas advertem que a avaliação
deve servir como uma alavanca para o progresso dos alunos e não como um empecilho para o seu
progresso na escolarização. Dessa forma, a avaliação deve deixar de ser classificatória para ser
contínua. No entanto, muito se questiona sobre a progressão continuada se configurar numa
aprovação automática, fato que gerou alterações marcantes no cotidiano escolar provocando
resistências por parte dos professores.
A progressão continuada, na verdade, provocou resistências pela forma autoritária como
foi implantada e por constituir mudanças as quais os professores não estavam preparados.
Segundo Arroyo (1999b): “para o sistema seriado fomos formados e ele terminou nos formando e
deformando. Trazemos suas marcas em nossa pele, em nossa cultura. Desconstruir a organização
seriada e sua lógica é desconstruir um pedaço de nós” (p.144). Esta desconstrução não foi
realizada ou pensada antes da progressão continuada se tornar realidade em todas as escolas
estaduais paulistas.
Além disso
apesar da implantação de ciclos, a SEE manteve em suas orientações e discursos uma
concepção seriada de ensino. Em teleconferência realizada em agosto de 1998, por
exemplo, a própria Secretária de Educação, Rose Neubauer da Silva, afirmou que “os
ciclos não acabam com o sistema seriado” (SOUSA, STEINVASCHER, ALAVARSE
& ARCAS, 2007, p.42).
Parece-nos que a “desconstrução” deveria ter partido da própria SEE/SP que alterou a
seriação pelos ciclos, mas com objetivos políticos e, sobretudo, financeiros. Segundo Arroyo
(1999b),
outra concepção oficial: implantar os ciclos, amontoados de séries, para acabar com
a retenção, acelerar o fluxo, ou acabar com a defasagem idade- série em nome do
138
respeito à diversidade dos ritmos de aprendizagem, com processos mais leves de
avaliação contínua, ao longo do ciclo (p.157).
O mesmo autor alerta, ainda, que
[...] podemos estar fazendo apenas uma caiação que oculte e adie os crônicos problemas
sem mudar o papel da escola e de seus profissionais, sem acrescentar nada novo à sua
qualificação. Essa concepção de ciclo pode estar deformando e não formando um novo
perfil de educador (ARROYO, 1999b, p.157-158).
Segundo Sampaio (2002, p.12), a progressão continuada e a organização do ensino em
ciclos incidiram sobre “questões nodais, ligadas à produção do fracasso escolar”:
No entanto, a escola resiste e continua com as suas classes, séries e professores por
disciplinas, que se organizam em conteúdos por séries. Nesse sentido, tiram-se os
degraus, mas permanece a mesma estrutura, sem rampas de acesso, com base no
princípio de classificação (SAMPAIO, 2002, p.12).
Assim, a reforma desacomodou o trabalho escolar desestabilizando o funcionamento da
escola e contribuindo para aumentar a ineficiência do atendimento que não era bom, pois
evidencia as contradições (“ser ciclo”, mas “estar seriado”) e entre a progressão e a avaliação,
pois
Promove-se o aluno e, ao mesmo tempo, cobra-se dele o domínio de conteúdos. Para
eles [os professores do ciclo], uma contradição, pois que as provas de avaliação
centralizada são exigidas por série, e não ciclos. Portanto, reforçam o ideário clássico de
exigência progressiva e hierarquizada de domínio de conteúdos por parte dos alunos
(...). Assim, ao rotular o fraco rendimento escolar de suas classes, os indicadores da
avaliação apenas acirram a convicção dos professores de que não podiam ter
aprovado esses alunos...” (DIAS-DA-SILVA & LOURENCETTI, 2002, p.34-35).
Muitas vezes os resultados obtidos nos sistemas de avaliações institucionais confirmam
avaliações dos professores sobre rendimento insatisfatório de seus alunos. No entanto, a
responsabilidade pelo fracasso é atribuída à precária formação inicial dos professores e ao seu
trabalho insuficiente para melhorar a qualidade do ensino. Além disso, as avaliações
institucionais são classificatórias, ainda que aos professores seja cobrada a avaliação diagnóstica
e contínua, para que sejam respeitados os ritmos de aprendizagem dos alunos. A seletividade,
139
então, permanece, mas a quem é atribuída toda a responsabilidade por não conseguir romper com
a tradição do regime seriado, mesmo com a implantação forçada?
Para Dias-da-Silva e Lourencetti (2002, p.23),
No Brasil é quase tácito minimizar o papel dos professores referenciado em todas as
mazelas de sua formação, fruto do descaso com Educação de qualidade que
historicamente vivemos, incluindo desde a visão bacharelesca dos professores
universitários até a deterioração presenciada pela proliferação de faculdades-de-fim-de-
semana e as licenciaturas curtas, as licenciaturas plenas fragmentadas e marginais nas
universidades públicas, a precariedade dos estágios e treinamentos em serviço dos
professores, etc, etc. (DIAS-DA-SILVA & LOURENCETTI, 2002, p.23).
Assim, a formação inicial e continuada dos professores, muitas vezes, é deficiente e
talvez por isso, pensam as autoras acima mencionadas, ela continue sendo objeto das reformas
educacionais. Mas as reformas educacionais devem acontecer sem a exclusão daqueles que
deverão colocá-la em prática. Os professores têm que se sentir co-participantes das alterações que
se refletirão em seu cotidiano escolar. Afinal, se as concepções e práticas dos professores fossem
analisadas se entenderia os motivos de sua resistência às mudanças e a sua propalada
“incompetência” para implantar com sucesso as reformas e projetos sugeridos.
Para Kuenzer (1999), os professores têm muitos desafios a enfrentar, fazendo-se
necessária uma nova pedagogia:
Essa nova pedagogia exige que o professor seja muito mais do que um mero animador,
competente para expor, cativando a atenção do aluno. Ele precisará adquirir a necessária
competência para, com base nas leituras da realidade e no conhecimento dos saberes
tácitos e experiências dos alunos, selecionar conteúdos, organizar situações de
aprendizagem em que as interações entre aluno e conhecimento se estabeleçam de modo a
desenvolver as capacidades de leitura e interpretação do texto e da realidade,
comunicação, análise, síntese, crítica, criação, trabalho em grupo e assim por diante.
Enfim, ele deverá promover situações para que seus alunos transitem do senso comum
para o comportamento científico (KUENZER, 1999, p.171).
Segundo a mesma autora, em uma “escola precarizada” os professores têm que
enfrentar as desigualdades, democratizando “conhecimentos que minimamente permitirão aos
alunos participar, da melhor forma possível, da vida social e produtiva” (KUENZER, 1999,
p.173-174). E os professores têm que cumprir o seu compromisso mesmo que “sem a devida
retribuição salarial, também precarizada” (p.174).
140
Nessa situação de tantos problemas a serem solucionados abrem-se novas expectativas
ante as novas mudanças anunciadas pela SEE/SP, e que passarão a funcionar a partir de 2008,
segundo entrevista divulgada no site da SEE/SP, a atual secretária de Educação, Maria Lúcia
Vasconcelos, afirma que haverá mudanças nos ciclos de avaliação da progressão continuada: os
ciclos que atualmente são em número de dois passarão a ser de quatro, pois, de acordo com
palavras da própria secretária de Educação “com a avaliação de quatro em quatro anos, a gente
demora a detectar os problemas de aprendizado” (SÃO PAULO, 2007b, p.1). Porém, a mesma
secretária ressalta: “Eu tenho essa idéia, mas a rede precisa ser ouvida. Depois, precisamos
prepará-la para que seja possível implementar o novo projeto” (SÃO PAULO, 2007b, p.1).
Outras mudanças igualmente, foram anunciadas pela SEE/SP. Em outra entrevista ao
jornalista Emílio Sant’Anna do jornal O Estado de São Paulo, a secretária de Educação, afirmou
que haverá o estabelecimento de currículo mínimo para cada série e regras mais rígidas para as
avaliações internas bimestrais. E que outras ações devem ser acopladas, “como melhorar o
processo de alfabetização e estabelecer expectativas de aprendizagem para cada uma das séries,
tanto do ensino fundamental quanto do médio, coisa que hoje ainda não existe” (SANT’ANNA,
2007, p.32).
A idéia é de “homogeneizar” o currículo, como percebemos através da continuidade da
entrevista: “Temos que definir essas expectativas para que se saiba exatamente o que será
avaliado quando a criança chegar ao término desse ciclo. É preciso garantir essa homogeneidade
para que exista de fato uma rede de ensino” (SANT’ANNA, 2007, p.32 ).
Ao longo de todo o ano de 2007, também, estão sendo previstas pela Coordenadoria de
Estudos e Normas Pedagógicas (CENP) ações centralizadas e descentralizadas para uma
formação continuada em avaliação. Nas ações centralizadas o público-alvo é formado por
dirigentes regionais de ensino, supervisores de ensino e assistentes-técnicos pedagógicos, através
de videoconferências e de disponibilização de subsídios referentes ao tema. Nas ações
descentralizadas, o público-alvo é composto por diretores, vice-diretores, professores-
coordenadores e professores, através de atividades de capacitação. Para o planejamento de 2007,
a CENP lançou um documento intitulado Qualidade educativa: intenção e compromisso em que
apresentava dados positivos sobre aprovação e evasão no ensino fundamental (vide Tabela 6),
afirmando:
141
Do mesmo modo ainda que tenhamos a permanência da progressão continuada, o
debate sobre os ajustes necessários, reorganizando o tempo dos ciclos, acontecerá ao
longo deste ano para que em 2008 sejam iniciadas as ações decorrentes das alterações
propostas (SÃO PAULO, 2007, p.9, grifo do autor).
Mais uma vez, nos perguntamos: essas mudanças realmente resolverão o problema de
aprendizagem dos alunos? Ou serão alterações que visam apenas “mudar para permanecer a
progressão continuada” e não se perderem as “conquistas” das baixas estatísticas de evasão e
reprovação com custos reduzidos como manda a cartilha neoliberal? Os profissionais da
educação serão mesmo ouvidos pela SEE/SP quanto às mudanças e preparados para elas, como
afirmado pela secretária de Educação?
o tempo e outras pesquisas é que, provavelmente, poderão responder a estas
questões. Encerramos com uma citação de Donatoni (2005):
Muitas vezes é preciso reconstituir o olhar, num movimento de desconstrução de
valores e crenças adquiridas por décadas, rumo a novos significados, deixando para trás
funções classificatórias que tendem a desmotivar o aluno, impossibilitando avanços e
desafios em sua vida (DONATONI, 2005, p. 41).
Assim, os desafios são muitos e colocam sempre a necessidade de se abolir a avaliação
classificatória e a reconstruir o olhar, em especial dos professores, para mudanças, que sejam
discutidas antes de implementadas, algo essencial para que haja uma escola democrática, sem
demagogias.
142
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