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AVANÇOS RECENTES EM
BIOLOGIA CELULAR E
MOLECULAR, QUESTÕES ÉTICAS
IMPLICADAS E SUA ABORDAGEM
EM AULAS DE BIOLOGIA NO
ENSINO MÉDIO: um estudo de caso.
Taitiâny Kárita Bonzanini
Orientador: Prof. Dr. Fernando Bastos
Mestrado em Educação para a Ciência
Programa de Pós-Graduação em Educação para a
Ciência – UNESP – Campus de Bauru
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SUMÁRIO
Resumo........................................................................................................................8
Abstract ......................................................................................................................9
CAPÍTULO I
1.INTRODUÇÃO......................................................................................................10
1.1Objetivos ..............................................................................................................17
CAPÍTULO II
2. METODOLOGIA...............................................................................................19
2.1.Estruturação dos referenciais teóricos.................................................................20
2.2 Caracterização da escola, grupo de alunos e professor observados.................20
2.2.1 A escola............................................................................................................20
2.2.2 A turma de alunos.............................................................................................21
2.2.3 A professora de biologia...................................................................................21
2.2.4 Carga horária e aulas ministradas.....................................................................22
2.3 A pesquisa qualitativa.......................................................................................23
2.4 Procedimentos de coleta e análise de dados.....................................................27
CAPÍTULO III
3. CONHECIMENTOS EM GENÉTICA GERAL, GENÉTICA MOLECULAR E
BIOLOGIA CELULAR: CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS.................................31
3.1 A genética de Mendel .........................................................................................35
3.2 Considerações históricas sobre o desenvolvimento da genética no século XX..40
3.3 Avanços recentes em biologia celular e molecular.............................................49
CAPÍTULO IV
4. O ENSINO DE GENÉTICA NA ESCOLA MÉDIA .........................................64
4.1 Pesquisas sobre o ensino de Genética.................................................................72
4.2 O ensino de Genética nas propostas curriculares e nos livros didáticos.............82
2
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CAPÍTULO V
5. REFERENCIAIS TEÓRICOS...........................................................................95
5.1 A formação docente............................................................................................95
5.2 A prática docente..............................................................................................104
CAPÍTULO VI
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................118
6.1 O questionário de pré e pós-teste....................................................................120
6.2 Descrição e análise das observações..............................................................122
6.3 Episódios de ensino selecionados...................................................................134
6.4 Análise de documentos...................................................................................150
6.4.1 Trabalhos elaborados pelos alunos.................................................................150
6.4.2 Planejamento curricular..................................................................................155
6.4.3 Livros didáticos utilizados..............................................................................155
6.5 Entrevista realizada com a professora............................................................157
CAPÍTULO VII
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................162
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................166
3
4
5
6
BONZANINI, T. K. AVANÇOS RECENTES EM BIOLOGIA CELULAR E
MOLECULAR, QUESTÕES ÉTICAS IMPLICADAS E SUA ABORDAGEM EM AULAS
DE BIOLOGIA NO ENSINO MÉDIO: um estudo de caso.
RESUMO
7
O trabalho corresponde a um estudo de caso (Bogdan & Biklen, 1994) em que aulas de
biologia de uma turma de alunos do 2º ano do ensino médio foram sistematicamente
observadas com o intuito de verificar de que forma surgem e são trabalhadas questões
relativas aos avanços recentes em biologia celular e molecular (organismos
transgênicos, clonagem, experiências com células tronco, projeto genoma etc.). Atenção
especial foi dada às demandas formativas que esse aspecto do ensino de biologia suscita
junto aos professores, tanto em nível de aprofundamento de conhecimentos em biologia
celular e molecular, quanto em nível de decisões sobre como organizar a abordagem e
discussão de temas polêmicos e implicações éticas subjacentes. O referencial teórico
para o desenvolvimento da pesquisa e análise de dados foi estruturado com base em
literatura especializada sobre formação de professores (Schön & Costa, 2000;
Perrenoud, 2000; Zaballa, A.,1998; Carvalho e Gil-Pérez, 1995; entre outros).
Palavras-chave: Ensino de Biologia, Ensino de Genética, Avanços Recentes em
Biologia Molecular.
BONZANINI, T. K. RECENT ADVANCES IN MOLECULAR AND CELLULAR
BIOLOGY, ETHIC QUESTIONS IMPLICATED AND ITS APPROCH IN BIOLOGY
CLASSES IN HIGH SCHOOL: a study of case.
ABSTRACT
8
The work corresponds to a study of case (Bogdan & Biklen, 1994) in which biology
classes in a group o students from second year in high school were systematically
observed on propose to verify how the questions relating to the recent advances in
molecular and cellular biology (transgenic organisms, clonating, experiments with stem-
cells, genome project, etc.) appear and worked. A special attention was given formative
demands that this aspect of the teaching in biology rouse among the teachers, both
making deeper in the knowledge in molecular and cellular biology and the decisions
about how organize the approach and discussion relating to the polemic subjects and
ethic implications underlying. The theoretic reference to the development of the
research and data analysis was based on specialized literature about teachers graduation
(Schön & Costa, 2000; Perrenoud, 2000; Zaballa, A.,1998; Carvalho e Gil-Pérez, 1995;
et al.).
9
CAPÍTULO I
1. INTRODUÇÃO
À medida que iniciamos um novo século, a educação surge como a
preocupação fundamental em todos os países do mundo, inclusive tendo em vista o
futuro da humanidade e do planeta. Os desafios do novo século com vistas à
eliminação da pobreza e à garantia de um desenvolvimento sustentável e de uma paz
duradoura recaem sobre os jovens de hoje. Educá-los para enfrentar esses desafios
tornou-se um objetivo prioritário para qualquer sociedade.
Deste modo, entendemos a escola como um local de
desenvolvimento de conhecimentos, idéias, atitudes e pautas de comportamento que
permitam ao aluno uma incorporação eficaz ao mundo contemporâneo, no âmbito
da liberdade do consumo, da liberdade de escolha e participação política, da
liberdade e responsabilidade na esfera da vida familiar (GIMENO SACRISTÁN e
PÉREZ GÓMEZ, 1998).
A maior parte dos países do mundo valoriza o ensino científico como
um fator para o progresso da economia nacional, principalmente na formação de
10
profissionais altamente qualificados. Mais fundamental ainda, talvez, é notar que
esses conhecimentos também têm um papel na construção de uma sociedade
democrática, uma vez que podem ser aplicados para entender e participar de debates
relacionados a diversos temas.
Para abordar a ciência e a tecnologia como se apresentam hoje, os
indivíduos necessitam de um certo grau de conhecimentos científicos para que
possam entender a ciência como patrimônio cultural das sociedades
contemporâneas.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1999), quanto às
Ciências Naturais, sugerem que no ensino fundamental o aluno desenvolva
competências que lhe permitam compreender o mundo em que vive e atuar como
indivíduo e como cidadão, utilizando conhecimentos de natureza científica e
tecnológica. Destacam que, numa sociedade em que se convive com a
supervalorização do conhecimento científico e com a crescente intervenção da
tecnologia no cotidiano, não é possível pensar a formação de um cidadão crítico à
margem do saber científico.
alguns anos, clonar seres humanos e mapear os genes existentes
nas células eram assuntos de ficção científica, mas, durante a última década vem
ocorrendo um grande avanço no conhecimento em genética, e esse assunto está
sendo abordado até mesmo em novelas de televisão. Os genomas de diversos
organismos têm sido minuciosamente investigados mediante técnicas que permitem
o seqüenciamento do DNA (ácido desoxirribonucléico) e outros resultados
similares. uma crescente quantidade de pesquisas envolvendo experimentos de
clonagem. Além disso, estamos rodeados de produtos alimentícios e medicamentos
provenientes de organismos geneticamente modificados e de uma infinidade de
11
outros resultados da investigação científica. Tais novidades de natureza científico-
tecnológica espantosas, diga-se de passagem - não ocorrem, porém, num cenário
de aceitação pacífica, mas em meio a intensas controvérsias sobre aspectos éticos e,
também, em meio a poderosos interesses econômicos e políticos. Deste modo, com
o avanço da engenharia genética e as atuais pesquisas neste campo, é praticamente
impossível admitir que os alunos permaneçam alheios a estas descobertas. É
crescente a necessidade da escola e, conseqüentemente, do professor oportunizar a
discussão destes assuntos cada vez mais presentes no cotidiano das sociedades
contemporâneas.
Os estudantes de hoje cada vez mais formam parte de uma sociedade
na qual as tecnologias genéticas estão inseridas. Chegará o momento em que se
exigirá decisões pessoais relacionadas aos resultados destas tecnologias, e tais
decisões serão cruciais nas respostas da sociedade.
Apesar da genética molecular produzir uma infinidade de novos
dados sobre os mecanismos de hereditariedade, pesquisas relevam (Wood-Robinson
et al.,1998; Bonzanini, 2002) que a maioria das pessoas ainda possui escassas
informações sobre os conceitos básicos desta área; esses autores, durante o
desenvolvimento de suas pesquisas, constataram ainda que, quando indagados, os
alunos revelam desconhecer o que seria e quais as técnicas utilizadas em pesquisas
como o Projeto Genoma Humano e produção de organismos geneticamente
modificados. Além disso, apontam também, que nos jornais e revistas para o grande
público, esses temas são geralmente tratados de maneira superficial, confusa e
incompatível com um nível mínimo de rigor científico.
Sendo assim, percebe-se a necessidade de explicitar tais conceitos e
buscar caminhos para articular o Ensino de Ciências ao cotidiano das pessoas,
12
que, a escola não pode ignorar o que se passa no mundo; e embora esses temas
(Projeto Genoma Humano, clonagem, organismos transgênicos, pesquisas com
células tronco) estejam amplamente abordados pelos meios de comunicação,
conforme as pesquisas citadas acima, a sociedade brasileira não possui
conhecimento necessário para entender e interpretar esses avanços e assumir uma
posição consciente diante de assuntos sobre os quais precisará opinar. Neste
contexto, a responsabilidade de discutir os avanços da genética de forma inteligente,
clara e acessível aos alunos recai sobre os educadores.
Diante dessas colocações surgem, então, certas indagações: estariam
os professores de hoje preparados para abordar e discutir tais temas no intuito de
instrumentalizar os educandos para que possam participar de processos de tomada
de decisão a respeito das recentes pesquisas na área de biologia celular e molecular?
As propostas curriculares e os livros didáticos abordam satisfatoriamente o estudo
de conceitos relacionados a estas temáticas? Esses assuntos despertam o interesse
dos alunos?
Quanto ao estudo de genética, uma pesquisa realizada por Justina et
al. (2000) verificou, por meio de entrevistas, que a maioria dos professores declaram
apresentar dificuldades tanto para ensinar como para fazer com que seus alunos
compreendam satisfatoriamente as novas abordagens em genética. Esta pesquisa
revelou também a preocupação dos professores com as temáticas atuais que não
aparecem nos documentos oficiais ou nos livros didáticos. Outras pesquisas revelam
(Justina e Barradas, 2003; Fávaro et al., 2003) que os professores continuam
distantes das inovações que acontecem, e repassam a seus alunos conceitos estáticos
e errôneos contidos nos livros didáticos.
13
Apesar dos avanços da Biologia moderna despertarem o interesse da
maioria dos alunos (Wood-Robinson et al.,1998; Bonzanini, 2002), não estão
presentes nos currículos escolares, e, nos livros didáticos, quando citados, trazem
muitos erros conceituais (Fracalanza, 1985; Malaguth, 1997; Fávaro, 2003).
Diante disso, surge a necessidade de uma atualização dos conteúdos
das disciplinas científicas adequando-as aos currículos e programas atualizados para
educar as gerações do século XXI, que estão constantemente recebendo informações
sobre temas biológicos vinculados nos meios de comunicação.
Amorim (1995) ressalta a importância de um novo contexto para o
ensino de Ciências no qual se destaque a relevância social, os alcances e as
limitações da Ciência. Trivelato (1995) complementa descrevendo a importância de
se pensar as disciplinas cientificas comoelemento formador de cidadãos críticos”,
de reconhecermos sua importância e, até mesmo, sua ineficiência.
Krasilchik (1987) cita a importância de uma contextualização mais
abrangente do currículo de Ciências, uma vez que vários fatores se
incompatibilizam com os currículos escolares, como a expansão rápida do
conhecimento, a necessidade de atualização, a ampliação dos meios de
comunicação, entre outros.
Além disso, é desejável que exploremos a Biologia a partir de
assuntos atuais, polêmicos, que motivem os alunos a buscar leis e teorias que
respondam suas dúvidas. Por exemplo, as controvérsias relacionadas aos avanços
recentes em biologia celular e molecular podem servir como temas geradores que
despertem o interesse por conceitos de genética básica (CANAL, 2002).
Sendo assim, um novo contexto para o ensino de Biologia, que prevê
a incorporação de temáticas atuais, que motivem o aluno a aprender determinados
14
conceitos, precisa levar em consideração também o uso de estratégias e recursos
para instigar, motivar, surpreender os estudantes levando-os a participar dessas
discussões. Para isso, faz-se necessário que o professor disponha de diversos
instrumentos para que as aulas sejam mais interessantes e menos monótonas,
promovendo discussões nas quais ouça o ponto de vista de cada aluno e não
somente exponha o seu como uma verdade absoluta, fazendo com que possam
relacionar isso ao seu dia a dia, aos benefícios e prejuízos que podem trazer, bem
como analisar criticamente e opinar sobre questões polêmicas de uma maneira
coerente. Segundo Arroyo (2000) ao motivar o aluno evita-se sua marginalização e
exclusão.
A maneira como temas como clonagem, organismos transgênicos e
Projeto Genoma Humano serão tratados em aula, ou seja, a didática utilizada pelo
professor poderá provocar o interesse ou a recusa por parte dos alunos, e os
processos de tomada de decisão e até mesmo a compreensão de tais temas
dependem de uma base sólida de conhecimentos que podem ser oferecidos pela
escola.
Uma vez que esses temas são de grande importância para a formação
do educando, sua abordagem precisa ter em vista o favorecimento de uma
aprendizagem significativa, daí a importância de uma prática educativa diferenciada
que coloque o aluno em contato com experiências fecundas para ele.
É preciso que o educador promova uma educação científica que
divulgue os avanços da ciência, pois, além de necessidade, é um dever social. É
imprescindível que se transmita para os alunos uma ciência mais atual, histórica,
social, crítica e humana. Segundo Trivelato (1995), os professores ainda transmitem
15
aos seus alunos idéias errôneas sobre a ciência, sobre os cientistas e sobre a
elaboração do conhecimento científico.
Uma educação científica democrática, voltada para a cidadania, visa
preparar os educandos para assimilar informações de qualidade, aprimorando o juízo
crítico e solidificando uma verdadeira sociedade atuante.
Ao abordar conteúdos significativos através de uma perspectiva
transformadora, pode-se propiciar aos alunos a oportunidade de ampliarem a leitura
da realidade, e tal conscientização poderá levá-los a ações que promovam
transformações sociais.
Entretanto, não podemos ignorar as dificuldades enfrentadas pelo
professor, como as precárias condições de trabalho, a escassez de material e de
recursos, a falta de tempo para elaborar materiais didáticos e até mesmo uma
formação deficiente.
A partir dos aspectos aqui levantados, consideramos de extrema
importância a realização de pesquisas que focalizem o ensino de temas de biologia
celular e molecular no sentido de trazer subsídios para a formação de professores,
para a elaboração de propostas curriculares e materiais didáticos e para a discussão
das questões da prática docente.
Assim, esta pesquisa enfocou o ensino de genética em uma escola tal
como se processa; propostas curriculares oficiais, planejamentos escolares
elaborados por professores e conteúdos de livros didáticos adotados foram
considerados, mas a título de referência, pois, muitas vezes, os materiais didáticos
utilizados e as declarações de intenção registradas nos planos de ensino não refletem
exatamente as convicções que os professores possuem, e que são reveladas através
de suas ações, que, segundo Cunha (1989), o estudo "do professor em seu
16
cotidiano, tendo-o como ser histórico e socialmente contextualizado pode auxiliar
na definição de uma nova ordem pedagógica e na intervenção da realidade no que
se refere à sua prática e à sua formação”.
1.1 Objetivos
Tendo em vista os questionamentos relacionados acima, é importante
perguntarmos: Temas de biologia contemporânea estão sendo efetivamente
introduzidos e estudados na escola básica? De que maneira? Que estratégias de
ensino são utilizadas pelos professores para favorecer a aprendizagem desses
conteúdos pelos alunos? Que obstáculos surgem e têm que ser enfrentados?
O presente trabalho pretende oferecer uma pequena contribuição
nesse sentido e, deste modo, toma como ponto de partida os seguintes objetivos de
pesquisa:
1- Verificar se temas como ciência genômica, clonagem,
organismos transgênicos etc. estão sendo efetivamente abordados em
aulas de Biologia na Escola Média, e de que maneira essa abordagem
ocorre. Atenção será dada aos seguintes aspectos, entre outros:
(a) Os referidos temas são parte integrante do plano de ensino do
professor/escola ou surgem durante as aulas de maneira acidental,
por exemplo, apenas quando o professor é interpelado pelos alunos?
(b) As aulas de biologia limitam-se a enfocar produtos finais da
atividade científica na área ou também enfocam o fazer científico, os
métodos de pesquisa, os interesses econômicos e políticos
subjacentes, as questões éticas suscitadas etc.?
17
(c) O professor propõe atividades de ensino que permitam a
exploração desses conteúdos de forma inteligente e aberta,
contemplando os diferentes ângulos de cada questão?
(d) Até que ponto a formação anterior e material de apoio de que o
professor dispõe sustentam ou não o trabalho com esses temas?
2- Verificar de que forma temas contemporâneos de biologia
celular e molecular aparecem e são trabalhados nos materiais de
apoio utilizados por professores e alunos em aulas de Biologia na
escola média (por exemplo, livros didáticos);
3- Identificar obstáculos que dificultam a abordagem desses
temas na escola média, para, a partir disso, oferecer subsídios que
permitam novas ações no âmbito da formação de professores e
produção de material didático.
18
CAPÍTULO II
2. METODOLOGIA
Conforme mencionado, a presente pesquisa tem como objetivo
investigar de que maneira a temática relativa aos avanços recentes em biologia
celular e molecular surge e é abordada em aulas de biologia para o ensino médio.
Tal objetivo, da forma geral como está aqui colocado, poderia ter dado origem a
uma pesquisa em extensão, isto é, a uma pesquisa que buscasse mapear aspectos do
problema em um grande número de salas de aula. Entretanto, nossa opção foi por
realizar uma pesquisa com outras características, ou seja, uma pesquisa que,
focalizando episódios de ensino subseqüentes ocorridos em uma única turma de
alunos, permitisse analisar, de modo mais detalhado e aprofundado, as diversas
interações ocorridas entre os sujeitos envolvidos (alunos e professores), bem como
interpretar as perspectivas desses sujeitos e sua possível evolução. Assim, o grupo
que, mediante nosso convite, aceitou estar participando da pesquisa foi composto
por uma turma de alunos de uma dada escola de ensino médio e sua professora, da
maneira como especificaremos a seguir.
19
2.1 Estruturação dos referenciais teóricos
Tendo em vista os objetivos da pesquisa, consideramos importante
organizar capítulos que proporcionassem ao leitor um breve panorama sobre os
seguintes temas:
(a) conhecimentos em genética geral, genética molecular e biologia
celular e sua evolução nos últimos 150 anos;
(b) pesquisas e propostas referentes ao ensino de genética e questões
correlatas;
(c) pesquisas e propostas referentes à formação de professores e
referentes à estruturação da prática pedagógica no contexto do ensino de ciências e
biologia.
Esses capítulos foram elaborados com base em pesquisa bibliográfica
e constituíram referências para a análise e discussão dos dados coletados. Esses
referenciais, portanto, foram utilizados para a análise da prática pedagógica e
nortearam nossos trabalhos.
2.2 Caracterização da escola, grupo de alunos e professor observados
2. 2.1 A escola
A escola objeto desse estudo, escolhida graças à equipe escolar ter
sido receptiva à idéia de que uma coleta de dados fosse ali desenvolvida, é uma
escola pública de ensino fundamental e médio da região de Bauru (SP).
O prédio, construídocerca de 58 anos, possui 16 salas de aula, um
laboratório, uma biblioteca, uma sala de informática, um teatro (salão nobre), o
20
pátio, a quadra poliesportiva, sala de professores e instalações para serviços
administrativos. Apesar de ser uma construção antiga, o prédio da escola é bem
conservado.
A escola está situada no centro da cidade e atende toda a clientela do
ensino médio do município (zona urbana e rural).
2.2.2 A turma de alunos
A pesquisa foi realizada com uma turma do Ano do Ensino
Médio, composta por, inicialmente 45 alunos. No decorrer dos bimestres, esse
número variou devido algumas transferências, chegando ao final do ano letivo
com 40 alunos. Essa turma foi escolhida por razões ligadas ao planejamento
curricular, que na escola investigada, o conteúdo de genética é ministrado no
Ano.
2.2.3 A professora de Biologia
Concluiu, no ano de 1983, o curso de Licenciatura em Ciências
pela Universidade de Bauru (Bauru, SP), instituição extinta em 1987, ano de sua
incorporação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Obteve, ainda, ao
retornar a essa universidade, Habilitação em Biologia em 1989. Integra o corpo
docente efetivo da escola 20 anos, ministrando 33 aulas semanais, além de
trabalhar em uma escola particular do município.
Revelou que tem participado de atividades de capacitação
oferecidas pelo Governo do Estado e mostrou-se muito receptiva. Aceitou que
21
suas aulas fossem observadas e concordou em colaborar com o levantamento de
dados para esta pesquisa.
2.2.4 Carga horária e aulas ministradas
A carga horária destinada à Biologia nas Escolas da Rede Estadual
de Ensino compreende 2 aulas semanais com duração de 50 minutos cada aula. Ao
todo foram observadas 41 aulas, sendo realizada a observação de uma aula na
segunda-feira e outra na quinta-feira, de um total de 50, pois 9 dessas aulas
coincidiram com feriados e programações da escola que implicaram em dispensa
dos alunos, como, por exemplo, campeonato de futebol municipal, idas ao cinema
ou teatro. Para melhor descrição, as aulas foram numeradas de 1 a 50, sendo que a
número 1 foi a primeira aula observada na qual ocorreu a aplicação do
questionário de pré-teste (anexo 1) e a número 50 a última aula observada na qual
aplicou-se o questionário pós-teste.
As aulas que implicaram em dispensa dos alunos acarretaram em
diminuição do tempo disponível e, conseqüentemente, na redução dos assuntos
abordados, fato este que foi, inclusive, comentado pela professora.
2.3 A pesquisa qualitativa
22
Buscando realizar os objetivos estabelecidos para esta pesquisa,
utilizamos uma abordagem de investigação de natureza qualitativa, pois a fonte
direta de dados foi o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento
principal (Bogdan & Biklen, 1994). A investigação qualitativa favorece que os
investigadores interessem-se mais pelo processo do que simplesmente pelos
resultados ou produtos.
No processo qualitativo, ocorre uma espécie de diálogo entre os
investigadores e os sujeitos da investigação, com o objetivo de perceber o que estes
sujeitos experimentam, como as experiências são interpretadas e como estruturam o
mundo em que vivem (Psathas, 1973)
1
.
A denominação “pesquisa qualitativa” conforme Alves (1991, p. 54)
é uma expressão que: apresenta abrangência suficiente para englobar múltiplas
variantes”. Segundo esse autor, a pesquisa qualitativa parte do pressuposto de que as
pessoas agem em função de suas crenças, percepções, sentimentos e valores, portanto
seu comportamento tem sempre um sentido, um significado não reconhecido
imediatamente, precisando ser revelado. Reafirmando essa posição, este autor cita
Patton (1986, p. 22) que indica três características indispensáveis aos estudos
qualitativos:
1- Visão holística: parte do princípio que a compreensão de um
significado de um comportamento ou evento só é possível em função da
compreensão das interrelações que surgem de um dado contexto;
1
PSATHAS, G. Phenomenological sociology. New York: Wiley, 1973.
23
2- Abordagem intuitiva: definida como aquela em que o pesquisador
inicia suas observações mais livremente deixando que as categorias de interesse
emerjam progressivamente durante o processo de coleta e análise de dados;
3- Investigação naturalística: investigação na qual a intervenção do
pesquisador no contexto observado é reduzida ao mínimo.
Bogdan e Biklen (1994) apresentam cinco características básicas que
configuram a pesquisa qualitativa: (a) a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural
como sua fonte principal de dados e o pesquisador como seu principal instrumento;
(b) os dados coletados são predominantemente descritivos; (c) a preocupação com o
processo é muito maior do que com o produto; (d) o foco de atenção especial do
observador é o significado; (e) a análise de dados tente a seguir um processo
indutivo.
As características apontadas acima possuem várias implicações para
a pesquisa. Entre outras podemos destacar o fato de se considerar o pesquisador
como o principal instrumento de investigação e a necessidade do contato direto e
prolongado com o objeto pesquisado. Essas características apontam também para a
natureza predominante dos dados qualitativos: “descrições detalhadas de situações,
eventos, pessoas, interações e comportamentos observados; citações literais do que
as pessoas falam sobre suas experiências, atitudes, crenças e pensamentos; trechos
ou integras de documentos, atas ou relatórios de casos”(Patton, 1986, p. 22 apud
Alves, 1991, p.54).
Para Alves (1991, p.55), os investigadores qualitativos compreendem
a realidade como uma construção social da qual devem participar observando o
todo, considerando os componentes de uma dada situação em suas interações e
24
influências recíprocas, o que exclui a possibilidade de se fazer generalizações do
tipo estatístico. Sendo assim, segundo esta autora: “não se pode, no processo de
investigação, deixar de valorizar a imersão do pesquisador no contexto, em
interação com os participantes, procurando apreender o significado por eles
atribuído aos fenômenos estudados”.
O foco da pesquisa qualitativa deve emergir por um processo de
indução, do conhecimento do contexto e das múltiplas realidades construídas pelos
participantes em suas influências recíprocas. O foco do estudo será
progressivamente ajustado durante a investigação, e os dados dela resultantes serão
predominantemente descritivos e expressos através de palavras (ALVES, 1991).
Alves (1991) cita que para Lincoln e Guba (1985) a focalização
atende a dois objetivos principais: estabelece os limites da investigação e orienta os
critérios de inclusão e exclusão, auxiliando o pesquisador a selecionar informações
relevantes. Estes autores revelaram que no processo de focalização se faz muito
importante o conhecimento “tácito”, ou seja, refere-se aquilo que o professor “sabe”
embora não consiga expressar sob forma proposicional.
Além da focalização do problema, é importante a imersão do
pesquisador no contexto com uma visão geral e não enviesada do problema
considerado (ALVES, 1991).
Após estabelecer questões relevantes para o estudo, o pesquisador
inicia a coleta sistemática dos dados, que pode ou não ocorrer com o uso de
instrumentos auxiliares, com questionários, roteiros de entrevistas, formulários de
observação entre outros. Alves (1991) considera que a observação, a entrevista em
25
profundidade e a análise de documentos são os principais instrumentos de coleta de
dados em pesquisas qualitativas.
A terceira etapa, desse tipo de pesquisa, compreende a análise dos
dados, da qual emerge a teoria. Geralmente as pesquisas qualitativas geram uma
grande quantidade de dados que precisam ser organizados e compreendidos; isso
pode ocorrer até mesmo durante a coleta de dados, pois o pesquisador pode escolher
temas, criar interpretações. Muitas vezes os dados da pesquisa contêm citações de
falas para ilustrar e incrementar a apresentação. Além das citações, os dados
poderão englobar ainda, transcrições, fotografias, vídeos, documentos pessoais,
entre outros registros (BOGDAN e BIKLEN, 1994). O pesquisador precisa planejar
seu estudo de modo a obter credibilidade, transferibilidade, consistência e
confirmabilidade (ALVES, 1991).
O pesquisador para Lüdke e André (1986) deve exercer o papel
subjetivo de participar e o papel objetivo de observador, colocando-se em uma
posição ímpar para compreender e explicar o comportamento humano. Partindo de
um esquema geral de conceitos, o pesquisador procura testar constantemente suas
hipóteses com a realidade observada diariamente; e, por estar inserido na realidade,
o pesquisador está apto a detectar as situações que provavelmente lhe fornecerão
dados que corroborem com suas conjecturas.
A partir dos primeiros contatos com os participantes, o pesquisador
deve-se preocupar com sua aceitação pelos sujeitos da pesquisa e decidir, até
mesmo, como e quanto se envolverá nas atividades (LÜDKE e ANDRÉ, 1986).
A pesquisa qualitativa, segundo Lüdke e André (1986), pode assumir
várias formas; o presente trabalho pode ser considerado como um estudo de caso
2
,
2
Pesquisadores consideram o estudo de caso como uma pesquisa etnográfica.
26
pois contempla as características básicas destacadas por estes autores para esse tipo
de pesquisa, uma vez que:
“visam à descoberta (...) enfatizam a interpretação em contexto (...)
buscam retratar a realidade de forma completa e profunda (...) usam uma
variedade de fontes de informação (...) revelam experiência vicária e
permitem generalizações naturalísticas e (...) procuram representar os
diferentes e às vezes conflitantes pontos de vista presentes numa situação
social”.
Portanto, o estudo de caso, na realidade, é o estudo de um caso, bem
delimitado, com contornos bem definidos ao desenvolver do estudo. No estudo de
caso, o pesquisador utiliza uma amostragem pequena, não representativa, e pode
proceder a coleta de dados utilizando instrumentos e técnicas mais ou menos
estruturados.
A técnica utilizada na presente pesquisa foi a observação participante,
considerada por Bogdan e Biklen (1994) uma técnica ou um método da pesquisa
qualitativa. Neste estudo o foco centra-se numa organização particular e num caso
específico dentro dessa organização, ou seja, em uma professora e uma turma de
alunos do 2º Ano do Ensino Médio.
2.4 Procedimentos de coleta e análise de dados
Com o objetivo de investigar de que maneira as pesquisas recentes
em biologia celular e genética molecular são abordadas em situações de ensino e
aprendizagem, a estratégia geral de coleta de dados consistiu no acompanhamento,
durante três bimestres, de todas as aulas de Biologia ministradas à turma de alunos
27
mencionada acima, uma turma de Ano do Ensino Médio de uma escola pública
da região de Bauru.
A professora da referida turma foi convidada a participar da pesquisa
com sua anuência explícita, tendo recebido, no início, apenas informações gerais
sobre a pesquisa (por exemplo, “é uma pesquisa sobre ensino de genética”), a fim de
minimizar a influência da pesquisa sobre o seu modo de proceder; isso foi colocado
abertamente, fazendo parte integrante da negociação para obter permissão de
observação de suas aulas (“antes de fazer as observações eu não posso explicar em
detalhes o que é que eu vou observar, senão te influencio, mas depois você pode ter
acesso a todo o material - você concorda?”). Além disso, foi garantido o anonimato
dos participantes, substituindo seus nomes por siglas do tipo “P”(para o professor) e
as três primeiras letras dos nomes como “NAT”, “MAR”, etc. (para os alunos).
A análise do processo de ensino foi baseada nas anotações escritas
realizadas durante as aulas observadas, em questionários de pré-teste e pós-teste
(anexo 1), em trabalhos escritos produzidos pelos alunos, tais como atividades
solicitadas pela professora e avaliações (anexo 2), em discussões com a professora
da turma acerca de episódios de ensino selecionados, em conversas e
questionamentos realizados pelos alunos, e em entrevistas semi-estruturadas
realizadas com a professora (anexo 3).
Utilizamos, portanto, os seguintes procedimentos de recolha de dados
(Bogdan & Biklen, 1994):
observação participante, na qual o investigador introduziu-se no
mundo das pessoas que pretendia estudar no intuito de conhecê-las e deixar-se
conhecer; elaborando um registro sistemático de tudo que ouviu e observou e este
material foi complementado posteriormente com outros dados como, por exemplo,
28
registros escolares, materiais disponibilizados aos alunos pela professora,
avaliações, fotografias. No caso do trabalho de observação de aulas, a maior parte
das anotações foi feita durante o próprio período de observação, principalmente
quando se tratavam de anotações descritivas; outras anotações (como, por exemplo,
observações de natureza mais reflexivas) eram feitas logo após o término da aula.
entrevista em profundidade, na qual o investigador procurou
compreender, com bastante detalhe o que professores e alunos pensam sobre
determinados assuntos e como desenvolveram seus quadros de referência; isto fez
com que o investigador passasse um tempo considerável com os sujeitos da
investigação em seu ambiente natural, elaborando questões abertas e registrando as
respostas. Pelo caráter reflexivo, esse tipo de abordagem permitiu que os sujeitos
respondessem de acordo com sua perspectiva pessoal.
Nas pesquisas qualitativas, as entrevistas surgem com um formato
próprio de cada situação e podem ser utilizadas de duas formas: podem constituir a
estratégia dominante para a recolha de dados, ou podem ser utilizadas em conjunto
com a observação participante, análise de documentos ou outras técnicas; o
importante é utilizar a entrevista para recolher dados descritivos na própria
linguagem do sujeito. Essas entrevistas podem centrar-se em tópicos determinados
ou serem guiadas por questões gerais, o importante é deixar o sujeito livre para
expor seu ponto de vista. Deve-se evitar perguntar respondidas apenas por “sim”
ou “não” (BOGDAN e BIKLEN, 1994).
Não se descartou a possibilidade de se entrevistar também alunos,
caso a pesquisa assim o sinalizasse.
análise documental: na qual buscou-se identificar informações
factuais nos documentos a partir dos objetivos estabelecidos pela pesquisa. Neste
29
caso, considerou-se documentos os questionários respondidos pelos alunos, as
avaliações realizadas, os trabalhos escritos dos alunos e o planejamento curricular
elaborado pela professora.
De acordo com Lüdke e André (1986, p. 39):
“Os documentos constituem uma fonte poderosa de onde podem ser
retiradas evidências que fundamentam afirmações e declarações do
pesquisador. Representam ainda uma fonte “natural” de informações. Não
são apenas uma fonte de informação contextualizada, mas surgem num
determinado contexto e fornecem informações sobre esse mesmo
contexto”.
Preparou-se a coleta de dados a partir da elaboração de um roteiro
contendo diversos aspectos para os quais desejava-se obter informações (anexo 4).
A pretensão não era de que tal instrumento fosse um roteiro rígido a ser seguido
para a observação, mas sim possibilitar uma maior objetividade na tarefa de registrar
novas observações.
Os dados foram analisados qualitativamente após organização,
categorização e interpretação fundamentada em teorias provenientes de pesquisas
recentes sobre o ensino de Genética e, as propostas curriculares e sobre formação
de professores discutidos nos capítulos IV e V respectivamente.
30
CAPÍTULO III
Conforme adiantado na Introdução, optamos por inserir no
trabalho um capítulo que focalizasse brevemente a evolução dos conhecimentos
sobre hereditariedade nos século XIX e XX, acreditando que um texto com tais
características forneceria uma síntese de algumas questões que podem ser objeto de
estudo dos alunos do Ensino Médio, a fim de que estes compreendam melhor a
Ciência, seu desenvolvimento histórico, seu alcance e seus limites.
Assim, apresenta-se neste capítulo um breve histórico da Genética,
suas descobertas, a rapidez com que se processaram, sua evolução até a Engenharia
Genética e as implicações nos dias atuais.
3. CONHECIMENTOS EM GENÉTICA GERAL, GENÉTICA
MOLECULAR E BIOLOGIA CELULAR: CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS
31
O surgimento da vida é um tema que desperta o interesse e a
curiosidade de muitas pessoas; diversas hipóteses foram formuladas por filósofos e
cientistas na tentativa de explicar como a vida surgiu no planeta Terra: até o século
XIX, imaginava-se que os seres vivos poderiam surgir do cruzamento entre si ou a
partir da matéria bruta ou inanimada, de forma espontânea, hipótese conhecida por
abiogênese ou geração espontânea.
Mas, a teoria da abiogênese foi profundamente abalada pelos
experimentos de Francesco Redi (1626-1698) em meados do século XVII. Este
biólogo italiano colocou pedaços de carne no interior de frascos, deixou alguns
abertos e outros fechou com uma tela; observou que as moscas eram atraídas pela
carne em decomposição e essas entravam e saiam dos frascos abertos, nestes frascos
surgiram larvas que logo mais se transformaram em moscas. Concluiu, então, que a
fonte de vida eram os seres vivos e não a matéria inanimada. Este experimento
favoreceu a teoria de biogênese, segunda a qual a vida se origina somente de outra
vida preexistente.
Alguns anos após o experimento de Redi, Van Leeuwenhoeck (1632-
1723) aperfeiçoou o microscópio e descobriu o mundo dos microorganismos.
Observou que os microorganismos aumentavam rapidamente em número quando em
contato com soluções nutritivas, e imaginou que a geração espontânea fosse a
responsável por tal proliferação. A partir disso, os adeptos da teoria da abiogênese
passaram a supor que soluções nutritivas poderiam gerar espontaneamente
microorganismos.
A abiogênese perdurou, então, até o século XIX, quando o cientista
francês Louis Pasteur (1822-1895) elaborou experimentos fortemente sugestivos da
32
inviabilidade da geração espontânea de microorganismos, os quais tiveram grande
impacto na comunidade científica. A partir daí, a hipótese da geração espontânea ou
abiogênese declinou rapidamente, e os cientistas convergiram para a idéia de que a
vida sempre surge de uma vida preexistente.
Porém, esse modo de ver implicou que o surgimento de novos seres
obedeceria a um programa: a reprodução, que comandaria a constância das espécies
e a variabilidade dos indivíduos.
Mas de que forma a constância das espécies era mantida? Como
ocorria a variabilidade entre indivíduos de uma mesma espécie? Surge, então, a
Genética: a ciência da hereditariedade, o ramo da Biologia que estuda os
mecanismos de transmissão dos caracteres de uma espécie, passados de uma geração
para outra. Esta ciência obteve um grande progresso durante o século XX e início do
século XXI; entre seus feitos pode-se citar: a descoberta do ácido
desoxirribonucléico (DNA) em 1927, esclarecimento de sua função em 1944 e de
sua estrutura em 1953; o surgimento das bactérias manipuladas em 1970; e os
primeiros passos da terapia genética humana em 1986.
Porém, a influência de uma nova descoberta científica sobre a vida
do público em geral nem sempre é prontamente reconhecida. Em 1953, quando
Watson e Crick elucidaram a estrutura do DNA, tal descoberta foi considerada
importante somente para aqueles cientistas diretamente envolvidos com o estudo
dessa molécula. Ainda assim esse grupo restrito não pôde vislumbrar a revolução
que, algumas décadas depois, essa descoberta provocaria em várias áreas do
conhecimento humano. E, para a população em geral, as aplicações dessa nova
descoberta eram ainda menos evidentes.
33
A genética vem, ultimamente, ocupando lugar de destaque não
apenas em clínicas ou consultórios médicos; a possibilidade de clonar órgãos, por
exemplo, desperta a atenção de juristas preocupados com os aspectos legais desses
experimentos.
Neste cenário, podemos dizer que a Biologia deixou de ser uma
ciência puramente acadêmica e passou a atrair o interesse de vários ramos da
sociedade. A Engenharia Genética chama a atenção de industriais, investidores,
agropecuaristas e governantes, devido a possibilidades tais como lucros rentáveis ou
desequilíbrios ambientes.
As discussões atuais sobre as aplicações da tecnologia do DNA
recombinante não envolvem somente os possíveis riscos casuais de acidentes
biológicos, mas também concentra-se nos problemas e nas decisões éticas que
deverão ser discutidos e assumidos. Somente uma sociedade bem informada sobre o
assunto será capaz de assegurar que essa tecnologia seja empregada de maneira ética
e humana.
Para Chaui (1996, p. 340) ética e moral referem-se ao conjunto de
costumes tradicionais de uma sociedade e que, como tais, são considerados valores
e obrigações para a conduta de seus membros”; e Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira, citado por Farah (2000, p. 237) define ética como:“O estudo dos juízos de
apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de
vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo
absoluto”.
A quantidade de informação produzida ao longo desses anos, a
respeito dos avanços atuais da biologia molecular, foi tão grande que alguém que
esteja interessado em se atualizar sobre o assunto encontrará dificuldades em
34
localizar textos compreensíveis e com linguagem acessível. Por essa razão, mesmo
entre a comunidade universitária, os conceitos básicos da Engenharia Genética não
foram suficientemente disseminados. Portanto, para se obter uma boa informação
sobre esse assunto é preciso conhecer um pouco da história e do contexto das
descobertas e feitos científicos ocorridos na Genética.
3.1 A genética de Mendel
Yohann Mendel nasceu em 22 de julho 1822 num vilarejo, na
Moravia do Norte, em uma família de camponeses muito pobres; sofreu privações
excessivas na infância, caindo doente várias vezes. A falta de dinheiro e saúde quase
o impediu de realizar seus estudos superiores. Para contornar essas dificuldades,
resolveu ingressar no mosteiro agostiniano de São Tomás de Brünn, na Áustria
(atualmente República Tcheca), em 1843. Ao ser admitido foi rebatizado, passando
a se chamar Gregor Mendel (RONAN, 1987).
A direção do mosteiro exigia que seus membros ministrassem aulas
nas instituições de ensino superior de Brünn, para isso, muitos monges realizavam
pesquisas científicas com o objetivo de ilustrar suas aulas. Assim que Mendel entrou
no mosteiro, foi enviado para a Universidade de Viena a fim de terminar sua
formação. Viveu nessa cidade de 1851 a 1853, onde teve a oportunidade de conviver
com professores ilustres. Ao regressar ao mosteiro em 1854, iniciou um estudo com
o objetivo de entender as leis da hibridação das variedades de vegetais. Assim, o
monge Mendel, aos 34 anos começou uma série de experiências com ervilhas, as
quais durariam oito anos e envolveriam o cultivo de trinta mil plantas diferentes
seis mil só em 1860 (MASON, 1964).
35
Para realizar os experimentos, ele cruzou, em seu jardim no mosteiro,
diferentes variedades de ervilhas. Ridley (2001) relata que Mendel não era um
jardineiro amador, brincando de cientista; ele realizara experimentos sólidos,
sistemáticos e cuidadosamente elaborados. Seu sucesso deve-se a vários fatores: ele
trabalhou com plantas que apresentavam características distintas e assim podiam ser
facilmente reunidas em grupos bem definidos; as ervilhas se reproduziam
rapidamente e geravam grande número de descendentes; havia coletado muitos
dados e utilizava a estatística para analisar seus resultados. Além disso, segundo
Gardner e Snustad (1987), Mendel observou que as condições do tempo, do solo e a
umidade afetavam as características de crescimento das ervilhas, mas a
hereditariedade era o principal fator sob as condições de suas experiências.
Mendel escolheu sete pares de variedades de ervilhas para cruzar.
Cruzou ervilhas lisas com rugosas, cotilédones verdes com amarelos, sementes de
casca marrom com sementes de casca branca, entre outros. Em todos os casos, os
híbridos resultantes eram sempre semelhantes a um dos pais, e a natureza intrínseca
do outro genitor parecia ter desaparecido. Então, o monge permitiu que os híbridos
se autofertilizassem, e as características que haviam desaparecido na segunda
geração reapareceram em aproximadamente um quarto dos descendentes da terceira
geração. Apesar disso, ele não ficou satisfeito e realizou novas experiências,
trocando as ervilhas por brincos-de-princesa, milho e outros vegetais, e encontrando
os mesmos resultados; assim, percebeu que havia verificado algo profundo sobre a
hereditariedade: as características não se misturavam, dado esse que deu origem,
anos mais tarde, à lei da segregação
3
.
3
Lei da segregação: dois ou mais pares de fatores (genes) segregam-se independentemente durante a
formação dos gametas, nos quais se recombinam ao acaso (GRIFFITHS, 2001).
36
Assim, Mendel isolou características discretas cuja hereditariedade
pôde ser estudada ao longo de várias gerações. Estas características se mostraram
governadas por “unidades de hereditariedade” ou “fatores”, os quais são atualmente
conhecidos como genes. Através desses trabalhos Mendel realizou uma de suas
maiores descobertas, a do gene recessivo.
O monge cientista descobriu, por exemplo, ao isolar e estudar certos
“fatores” (genes), que duas criaturas com as mesmas características físicas
(fenótipo), não possuíam necessariamente o mesmo conjunto de “fatores”
(genótipo); uma destas criaturas pode ter herdado um gene diferente que não tenha
um traço visível, mas que pode reaparecer em gerações posteriores.
Mawer (1987) relata que Mendel apresentou o resultado científico de
suas investigações em duas conferências para a Sociedade de História Natural de
Brünn nos dias 8 de fevereiro e 8 de março de 1865. Existem duas versões para
esses acontecimentos. A primeira relata que as conferências foram assistidas por um
público muito pequeno, o que fez com que o monge se limitasse à leitura de seus
manuscritos, e, portanto, sua apresentação teria sido considerada pouco interessante.
Uma segunda versão relata que o público era numeroso, e ele não só apresentou seus
dados como também os demonstrou com fórmulas matemáticas.
Segundo Cruz e Silva (2002), os textos das duas conferências foram
publicados em 1866 na revista Relatórios dos Trabalhos da Sociedade Natural de
Brünn, e algumas cópias foram enviadas para Alemanha, Áustria, Estados Unidos e
Inglaterra, porém, a distribuição fora limitada e grandes cientistas da época, como o
naturalista Charles Darwin, não tiveram acesso à publicação.
Divergindo do relato acima citado, Mawer (1997) descreve que os
resumos das conferências não passaram desapercebidos a importantes naturalistas de
37
sua época e cópias foram enviadas para Berlim, Viena, Estados Unidos e Londres
(Royal Society e Linneam Society). Nesta mesma época, Darwin apresentava a sua
Teoria da Seleção Natural, que atraíra todas as atenções dos pesquisadores, na qual
detalhava o funcionamento do mecanismo de seleção natural. Darwin acreditava que
as características existentes eram selecionadas pelo ambiente e, deste modo,
tentava explicar como surgiam as variações em populações ou como essas
características poderiam ser transmitidas de uma geração para a seguinte.
Praticamente no mesmo ano da publicação de A origem das espécies, em 1859,
Mendel testava suas descobertas.
Além de Mawer, muitos autores concluem que não se pode afirmar
que Darwin não possuía nenhum conhecimento dos trabalhos de Mendel; na
verdade, é possível que Darwin enxergasse a teoria mendeliana como uma
explicação fixista (as mudanças de uma geração de indivíduos para outra eram
apenas aparentes, pois as características não desapareciam, ficavam apenas
“ocultas” em fatores que, mais adiante, voltavam a se manifestar).
Ridley (2001) relata que durante quatro anos, a partir de 1866,
Mendel enviou seus artigos e suas idéias a Karl-Wilhelm Nägeli, professor de
botânica em Munique. Com ênfase cada vez maior, ele tentou mostrar a importância
do que havia descoberto. Mas, durante quatro anos, Nägeli não se deu por
convencido, e respondeu ao monge cartas educadas, condescendes, e aconselhou
Mendel a cultivar chicórias, o que fora um conselho muito prejudicial, pois,
chicórias são aponúncias, ou seja, precisam de pólen para se reproduzir, mas não
incorporam os genes do parceiro de polinização e, portanto, as experiências de
cruzamento produzem resultados imprevisíveis. Após muitos esforços com chicória,
38
Mendel desistiu e voltou-se para as abelhas, mas os resultados desses experimentos
nunca foram encontrados.
Nägeli, que tinha sido aluno de Darwin, publicou um imenso tratado
sobre hereditariedade e não somente deixou de mencionar a descoberta de Mendel,
mas mencionou um exemplo como se fosse seu. Ele sabia que, se cruzasse um gato
angorá com um gato de outra raça, a pelagem angorá desaparecia completamente na
geração seguinte e ressurgiria inata nos filhotes da terceira geração; era um exemplo
muito claro de uma característica condicionada por um gene recessivo. Seu livro
sobre hereditariedade foi publicado em 1884, e não cita uma única vez Mendel, nem
mesmo no capítulo dedicado à hibridação. Entretanto, segundo Baptista (1989), os
trabalhos de Mendel tiveram uma certa divulgação e foram citados e analisados na
tese de doutoramento de um botânico sueco, A. Blomderg (1872), e na tese de
doutoramento de um botânico russo, I. Schmalhausen (1874); também são citados
na IX edição da Encyclopaedia Britânica (1881) no trabalho do botânico alemão W.
O. Focke, As plantas híbridas, de 1881; e através dessa obra De Vries, Correns e
Tschermak reencontraram os trabalhos de Mendel.
Gregor Mendel é considerado hoje um notável cientista, e “pai” da
genética. De acordo com Gardner e Snustad (1987), Mendel não foi o primeiro a
realizar experimentos de hibridação, porém, foi o primeiro a considerar os
resultados em termos de características individuais. Seus predecessores
consideravam todos os organismos e todas as suas características observando as
diferenças dos pais e de sua prole e esqueciam-se do significado das diferenças
individuais. O monge empregou os experimentos necessários, contou e classificou
as ervilhas resultantes dos cruzamentos, comparou as proporções com modelos
matemáticos e formulou hipóteses para explicar os resultados que obteve.
39
Ao ser eleito abade, em 1868, foi obrigado a abandonar gradualmente
as experiências de cruzamento de plantas e muitos dos seus outros interesses. Além
da hereditariedade, Mendel se interessou profundamente por botânica, horticultura,
geologia, meteorologia e pelo fenômeno das manchas do sol; deixou contribuições
notáveis para o estudo dos tornados. Porém, as tarefas administrativas após 1868
mantiveram-no tão ocupado que ele não pode dar continuidade as suas pesquisas e
viveu o resto da vida em relativa obscuridade, morrendo em 6 de janeiro de 1884.
Em 1900 a obra do monge cientista foi revista, adquirindo a
importância que lhe era devida. Essa valorização ocorreu graças a três biólogos: o
holandês Hugo de Vries (1848-1935), o alemão Carls Correns (1864-1933) e o
austríaco Erich Tschermak (1871-1962), que obtiveram resultados idênticos aos de
Mendel em seus experimentos e, através de consultas bibliográficas, verificaram que
o trabalho do monge sobre hereditariedade tinha sido publicado 35 anos antes de
seus próprios estudos. Em sua homenagem, batizaram as leis da hereditariedade de
Leis de Mendel, que são tidas como um marco inicial de uma nova ciência que, em
1905, Willian Bateson (1861-1926) denominou “Genética”, a partir de uma palavra
grega que significa “gerar”. Segundo Gardner e Snustad (1987), este biólogo inglês
repetiu e apoiou os princípios de Mendel e introduziu a genética mendeliana no
mundo de língua inglesa. A partir de então, vários pesquisadores se voltaram para
essa área de estudo e fizeram com que a mesma evoluísse até o nível de
conhecimento atual.
3.2 Considerações históricas sobre o desenvolvimento da genética no século
XX
40
A cada dia a genética é enriquecida por novas descobertas e as
técnicas de engenharia genética apresentam um campo promissor de pesquisas.
Esses conteúdos recentes são de grande relevância para a Educação Científica e
podem ser interessantes temas a serem abordados no Ensino Fundamental e Médio,
pois, a partir de relatos históricos e discussões sobre conceitos científicos, pode-se
auxiliar os alunos a melhorar suas idéias sobre a ciência e mostrar que o
conhecimento científico não é definitivo, que as teorias aceitas hoje poderão ser
substituídas amanhã, e que o conhecimento científico é construído coletivamente e
não por alguns poucos cérebros privilegiados (TRIVELATO, 1995).
As primeiras teorias a respeito da constituição das espécies e sobre a
hereditariedade começaram a ser esclarecidas após a descoberta dos gametas
masculinos e femininos no século XVII. Foi o holandês Van Leeuwenhoeck, em
1675, que identificou o gameta masculino através de uma análise microscópica
observando, no sêmen de vários animais, pequenos “seres que apresentavam cabeça
e cauda e se movimentavam”, e os denominou animálculos, julgando-os os “animais
do sêmen (RONAN, 1987). A partir dessas observações, foi postulada a teoria da
preformação segundo a qual os organismos se encontravam completamente pré-
formados no interior dos gametas, eram os homúnculos, ou seja, miniaturas de um
indivíduo adulto (MASON, 1964).
Após esta teoria, e substituindo-a, surgiu a teoria da epigênese a
partir de afirmações de Baer (1792-1876) sobre o surgimento dos órgãos através de
séries graduais de transformações originando tecidos cada vez mais especializados.
A teoria da epigênese, aceita até os dias atuais propõe que os tecidos e órgãos são
formados ao longo do período de desenvolvimento embrionário, e que o indivíduo
não se encontra pré-formado no interior dos gametas.
41
Charles Darwin (1809-1882) também formulou uma teoria sobre a
hereditariedade, a teoria da pângenese, segundo a qual todos os órgãos e
componentes do corpo humano produzem suas próprias cópias em miniatura
infinitamente pequenas, as gêmulas ou pangenes. Galton (1822-1922), após alguns
experimentos, concluiu que os pangenes não existiam e, baseando-se na idéia da
herança através do sangue, propôs a teoria da herança ancestral que dizia que as
características eram transmitidas através do sangue e diluídas em proporções
definidas ao longo das gerações (RONAN, 1987).
Conforme apontado anteriormente, uma das maiores contribuições
para a Genética foi dada pelo monge Gregor Mendel (1822-1884). Pela escolha
criteriosa de seu material de estudo, a ervilha, que permitiu a utilização de grandes
populações e, portanto, o uso da estatística, e pela expressão clara de seus resultados
e rigor matemático, estes estudos forneceram dados que deram origem, anos mais
tarde, a “Genética Clássica”. Através de um trabalho exaustivo, foi possível
estabelecer que as características transmitidas hereditariamente são determinadas
por “fatores” presentes nas células sexuais que agem ao longo de toda a vida para
que o caractere se manifeste. Segundo Guérin-Marchand (1999), através dos
experimentos com ervilhas, Mendel havia compreendido que todas as células do
organismo contêm dois exemplares de cada caractere hereditário, um advindo do pai
e o outro da mãe, e que a cada geração estes dois exemplares se repartem ao acaso
nas células sexuais. Tais descobertas revolucionariam o mundo da Biologia, porém,
esses trabalhos foram valorizados somente após a morte do monge cientista.
Segundo Bizzo (1994) a redescoberta dos trabalhos de Mendel, em
1900, trouxe um grande incentivo para as pesquisas que procuravam localizar
experimentalmente as partículas hereditárias e, apesar da descoberta dos
42
cromossomos em 1880 e da descrição da mitose
4
por Walter Flemming em 1879,
somente em 1902 Walter Sutton relaciona, pela primeira vez, o comportamento dos
cromossomos na meiose e o fenômeno da hereditariedade descrito por Mendel
cinqüenta anos antes. Ele constatou que as células germinativas traziam apenas um
grupo de cromossomos e que estes carregariam as informações hereditárias, então os
gametas dos pais forneceriam, cada um, um grupo de cromossomos para formar um
ser. Sutton descreve os passos da meiose
5
relacionando-os aos fenômenos de
distribuição das características descritos por Mendel (RONAN, 1987).
Para Bizzo (1994), a “genética clássica” teve início em 1908, quando
Thomas Hunt Morgan (1866-1945), considerado o pai da genética norte-americana,
realizou estudos sobre a mosca do vinagre ou drosófila (Drosophila melanogaster),
apurando as leis de Mendel. Ele elucidou que a transmissão de alguns caracteres
genéticos era determinada pelo sexo. Seus experimentos enfocavam as mutações
que surgiam dentre as numerosas moscas de suas criações e a transmissão dos
caracteres novos em sua descendência, e investigações desse tipo foram cruciais
para o estudo dos genes (GROS, 1991).
Davies (2001) descreve que as pesquisas de Morgan foram levadas
adiante por seus discípulos Alfred Sturtevant, Calvin Brigdes e Hermann Muller,
que nos cinco anos a partir de 1910, combinaram os métodos estatísticos rigorosos
de Mendel com a análise microscópica minuciosa de Morgan; Sturtevant, inclusive,
produziu o primeiro mapa de genes num único cromossomo e este mapa ajudou a
estabelecer os fundamentos do Projeto Genoma Humano 75 anos mais tarde.
4
Processo de divisão celular que origina duas células filhas geneticamente idênticas à célula mãe.
5
Processo de divisão celular capaz de formar células reprodutivas que contém a metade do número de
cromossomos das células somáticas.
43
A partir de 1914, segundo Bizzo (1994), a teoria cromossômica já era
aceita pela maioria dos biólogos como um suporte físico indispensável para a
compreensão dos fenômenos hereditários.
A publicação do livro de Morgan em 1926, The Theory of the Gene
(A teoria do Gene), assegura que a herança é devida a unidades transmitidas de
genitor para filho, que se comportavam de modo ordenado e regular (BAPTISTA,
1989).
Richard Goldschimidt, em 1937, tentou definir o gene baseando-se
na ação fisiológica de desenvolvimento do olho da Drosophila e concluiu que os
genes existiam como pontos em um cromossomo e estariam dispostos em uma
ordem certa para controlar o processo normal de desenvolvimento do olho. Deste
modo, as mutações que resultavam em desenvolvimento ocular anormal seriam
causadas por perturbações do arranjo correto dos genes nos cromossomos (BURNS
e BOTTINO, 1991).
Segundo Gardner e Snustad (1987), foi na década de 1930 que G. W.
Beadle, B. Ephurussi, E. L. Tatum, J. B. S. Haldane e outros forneceram uma base
para o entendimento das propriedades funcionais dos genes e sugeriram extensões
funcionais para o conceito clássico de gene, afirmando que os genes seriam
instruções codificadas no DNA para a síntese de proteínas
A técnica de coloração, que permitiu localizar na célula o ácido
desoxirribonucléico (DNA), foi inventada em 1927 por um biólogo chamado R.
Feulgen, porém, somente em meados da década de 1940 é que o DNA foi
identificado como portador da herança. Antes disso, acreditava-se que eram as
proteínas cromossômicas que transportavam a informação genética, pois sabia-se
44
que eram moléculas complexas e biologicamente importantes, e pensava-se que o
DNA fosse uma molécula curta e simples (BURNS e BOTTINO, 1991).
Nesta mesma década um físico alemão, Max Delbrück, deu início às
pesquisas físico-químicas sobre os genes, fundando a genética molecular. Ele lançou
a hipótese de que as moléculas constituintes dos genes apresentavam propriedades
que permitiam a reprodução idêntica dos genes. Então, em 1944, Oswald Theodore
Avery, Colin Macleod e Maclyn MacCarty, através de experiências com linhagens
de bactérias, demonstraram que o DNA seria o suporte da informação genética, ou
seja, a mensagem da herança era transportada por ácidos nucléicos e não por
proteínas.
Em 1948, Erwin Chargaff estudou o DNA profundamente e
demonstrou que a composição de nucleotídeos variava de uma espécie para outra, e
em todas as espécies havia uma relação quantitativa entre adenina(A) e timina (T),
citosina (C) e guanina(G) (BAPTISTA, 1989).
O DNA era, portanto, o suporte da hereditariedade, a matéria dos
genes, mas faltava estabelecer a estrutura exata desta molécula, como ela se
replicava e como comandava as proteínas.
Também em 1948, Boinvin, Vendrely e Vendrely analisaram os
núcleos das células de vários órgãos de boi e descobriram que o núcleo de todas as
células continham o mesmo conteúdo em DNA, que se reduzia a metade nos
espermatozóides (GROS, 1991).
Em 1950, Linus Pauling e Corey criaram o modelo “alfa-hélice” para
representar a estrutura molecular de uma proteína, também representaram um
modelo de estrutura do DNA com três cadeias polinucleotídicas enroladas em torno
45
de um eixo, com as bases nitrogenadasvoltadas para o exterior da molécula
(RIDLEY, 2001).
O mistério da replicação começou a ser resolvido na década de 1950,
quando James Watson e Francis Crick, que partilhavam a convicção de que o DNA
era mais importante para a hereditariedade que as proteínas, e estavam obcecados
por descobrir as propriedades dos genes, elucidaram a estrutura em dupla hélice do
DNA e construíram um modelo exato desta molécula, graças a estudos anteriores de
seus amigos Maurice Wilkins e Rosalind Franklin sobre o espectro de difração de
raios X sobre filamentos de DNA.
A partir de modelos das bases nucleotídicas em cartolina, Watson
arranjou as bases em diferentes permutações, percebeu que a timina (T) fazia par
com a adenina (A), e a citosina (C), com a guanina (G); esses pares poderiam ser
unidos por duas ligações químicas fracas e se juntavam dentro das colunas metálicas
torcidas do modelo da dupla hélice sugerido por Crick, de maneira que formavam
um molde para a síntese de uma nova cadeia, permitindo replicar o material genético
(DAVIES, 2001).
Em 25 de abril de 1953, James Watson, Francis Crick, Maurice
Wilkins e Rosalind Franklin publicam na revista Nature artigos que sustentavam a
estrutura em dupla hélice para o DNA (TEIXEIRA, 2000).
Segundo este modelo, o DNA seria uma longa molécula filamentosa
formada por duas cadeias que se torciam uma sobre a outra, formando uma dupla
hélice, como uma escada em caracol. Cada cadeia (ou fita) da dupla hélice seria
constituída pelo encadeamento de unidades nucleotídicas formadas por um açúcar (a
desoxirribose), um grupo fosfato, e uma base nitrogenada (adenina, citosina,
46
guanina e timina); as duas cadeias se uniriam através de pontes de hidrogênio que
estabeleceriam a coesão das duas fitas.
Segundo Ridley (2001) muitos anos de confusão seguiram à
descoberta da estrutura do DNA; tinha-se a certeza que a afirmação estava
armazenada num código de quatro letras (A, T, C, G), mas não se sabia como o gene
se expressava. Crick queria deduzir o código genético e tentou isso de várias formas,
até que propôs que um código de quatro letras resultava em um alfabeto de vinte
letras, porém, relatou que os argumentos empregados nesta dedução eram precários
e puramente teóricos. Logo mais se verificou que haveria um intermediário entre a
seqüência de aminoácidos ao longo da proteína e a seqüência de nucleotídeos
encontrada no DNA, e esse foi o primeiro passo para a compreensão da complexa
síntese de proteínas (RIDLEY, 2001).
Em 1956, Jo Hin Tjio e Albert Levan anunciaram que os seres
humanos possuíam 46 cromossomos; esses e outros pesquisadores desenvolveram
métodos aperfeiçoados que tornaram possíveis as observações dos cromossomos
humanos ao microscópio, e isso muito auxiliou na compreensão de distúrbios
genéticos humanos; assim, em 1959, Jérôme Lejeune e Marthe Gauthier mostraram
pela primeira vez que os portadores da síndrome de Down possuíam 47
cromossomos.
Ainda não se sabia se eram os genes que sintetizavam diretamente as
proteínas. Então em 1961 Brener e seus colaboradores reconheceram que as
instruções no código genético eram transportadas para fora do núcleo da célula por
uma cadeia transitória de ácido ribonucléico (RNA); este RNA seria um mensageiro
que transportava a informação para o ribossomo, onde seria “lida” para gerar uma
proteína. O RNA seria formado por uma única fita e cada nucleotídeo seria
47
composto por um açúcar (a ribose), um fosfato e uma base nitrogenada (adenina,
guanina, citosina e uracila). A identificação do RNA mensageiro forneceu a chave
para decifrar o código genético. Utilizando esses dados, Nirenberg produziu o
primeiro RNA sintético, feito inteiramente da base uracil, que é usada no RNA
sempre que encontra a adenina no DNA, produzindo uma proteína composta
inteiramente de um único aminoácido, a fenilalanina.
Nessa mesma época, os biólogos Sidney Brenner, James Watson,
George Gamov e Marshall Nirenberg, liderados por Francis Crick, estabelecem o
princípio: segundo o qual “DNA produz RNA que produz proteína”.
A partir daí observou-se uma verdadeira revolução tecnológica na
Biologia Molecular, tendo início, segundo Wilkie (1994), quando Hamilton Smith
da Universidade de Johns Hopkins, em Baltimore, isolou na bactéria Hemophilus
influenzae uma enzima que agia como uma “tesoura molecular”, reconhecendo uma
seqüência específica de pares de base e cortando os fragmentos de DNA sempre no
mesmo local. Nesta mesma época, foi criada a técnica de eletroforese em gel que
permitia ordenar os fragmentos de DNA segundo seu comprimento. Assim, os
cientistas passaram a dispor de uma forma de identificar um trecho específico de
DNA.
André Lwoff, François Jacob e Jacques Monod descreveram, em
1965, os mecanismos relacionados com a ativação de genes (GROS, 1991).
O primeiro DNA recombinante foi construído em 1970, ano de início
da revolução tecnológica da biologia molecular, por Paul Berg, da Universidade de
Standford na Califórnia, auxiliado por David Jackson e Robert Symons. Eles
emendaram um pedaço de DNA bacteriano ao de um pequeno vírus animal,
produzindo um DNA quimérico. Essa construção foi um sucesso, mas eles não
48
sabiam como multiplicá-la e mantê-la em grandes quantidades. Esse problema foi
resolvido, em 1973 quando Stanley Cohen, da Universidade de Standford,
Califórnia, e Herbert Boyer, de São Francisco, criaram novas possibilidades para a
construção de uma molécula de DNA recombinante em um tubo de ensaio. Desta
forma, seria possível isolar um trecho de DNA, inseri-lo em uma bactéria para
multiplicá-lo e obter grande quantidade de exemplares idênticos ao fragmento de
origem, os “clones” (POLLACK, 1997).
A tecnologia do DNA recombinante ou Engenharia Genética
permitiria otimizar e incrementar características presentes nos organismos ou forçá-
los a produzir novas substâncias de interesse.
3.3 Avanços recentes em biologia celular e molecular
A engenharia genética foi definida, no começo da década de 1970,
como sendo técnicas de transferência de um gene de um organismo a outro por meio
de um vetor com a possibilidade de replicação e expressão; assim formava-se um
DNA recombinante.
Conforme mencionado anteriormente, em 1973, Stanley Cohen da
Universidade de Standford, na Califórnia, juntamente com Herbert Boyer, de São
Francisco, constroem um DNA recombinante com fragmentos de dois plasmídeos
(DNA circular encontrado em bactérias) e o introduz em células da Escherichia coli.
À medida que estas células se multiplicavam, o DNA recombinante era multiplicado
juntamente com o DNA bacteriano - surge, então, a técnica do DNA recombinante
(POLLACK, 1997). A partir disso foi possível inserir genes de insulina humana em
bactérias Escherichia coli, desenvolvê-las em cultura e colher a insulina humana
49
pura (FARAH, 2000). Esta insulina foi liberada para o consumo humano pelo
Ministério da Saúde dos Estados Unidos da América em 1982.
A primeira proteína obtida pela expressão de um DNA recombinante
foi a somatostatina, em 1976, produzida pelos cientistas Keiich Itakamuta, Herb
Boyer, Francisco Bolívar e colaboradores. Esses cientistas montaram em Genebra
uma das principais companhias de biotecnologia, a Gentech, e dois anos depois
anunciaram êxito na produção do hormônio do crescimento (WILKE, 1994). Isto
tornou o uso da biologia molecular na indústria uma realidade. Em 1984 foi
aprovada para ser produzida em escala industrial, por meios de técnica de
engenharia genética, a insulina humana, utilizada no tratamento de diabetes.
Atualmente, as técnicas de DNA recombinante ou engenharia
genética são utilizadas como base em muitas indústrias, na produção de raros e
valiosos fármacos - muitos deles baseados em receitas tomadas diretamente do DNA
humano -, no diagnóstico de várias doenças genéticas ou na produção de gêneros
alimentícios.
Tais técnicas passaram a ser intensamente utilizadas a partir de 1978,
quando uma equipe de pesquisadores liderada por Tom Maniatis anunciou que havia
criado uma “biblioteca” de genes humanos, cortando o DNA humano com enzimas
de restrição, inserindo os fragmentos em bacteriófagos vetores e cultivando-os em
Escherichia coli.
A partir de 1980, o processo de seqüênciamento do DNA foi
automatizado inicialmente por Leory Hood, do Instituto de Tecnologia da
Califórnia, e uma nova técnica permitiu produzir bilhões de cópias de um único
fragmento de DNA, sem o incômodo de introduzi-lo num vetor por meio de
engenharia genética e multiplicá-lo em bactérias (BURNS e BOTTINO, 1991). Tal
50
fato favoreceu o interesse em se tentar obter a seqüência completa do genoma
humano. Em 1986, o Projeto Genoma Humano foi proposto, sendo lançado
oficialmente em outubro de 1990, com os objetivos de mapear e seqüenciar todos os
genes presentes no genoma humano (FARAH, 2000).
Em 26 de junho de 2000, cinco anos antes do previsto, ocorreu o
anúncio conjunto, entre a empresa privada norte-americana Celera, o governo norte-
americano e o governo inglês, do seqüenciamento completo de DNA humano.
A engenharia genética possibilitou também a modificação, ou a
manipulação genética, de plantas e animais, uma prática tão antiga quanto a própria
civilização. Antes da existência dessas técnicas, um organismo era melhorado por
meio de seleções longas e caras. Selecionar as sementes mais convenientes para o
plantio na próxima safra não deixa de ser um experimento genético, mesmo antes
que os agricultores tivessem consciência disso.
Das mutações que ocorrem casualmente em plantas e animais, o
homem tem selecionado aquelas que lhe são úteis ou interessantes e, por meio de
engenhosos esquemas de cruzamento, essas características têm sido preservadas e
estabelecidas. Dessa forma, a manipulação genética dos seres vivos tem sido
realizada pela seleção de determinados fenótipos. A seleção cumulativa de
características desejáveis, geração após geração, originou a diversidade hoje
observada nos animais domésticos e nas plantas cultivadas. A batata, o milho, o
feijão e outros tipos de alimentos foram sofrendo processos de melhoramento ou
aperfeiçoamento genético que permitiram torná-los não mais agradáveis ao
paladar, como também mais nutritivos e, em alguns casos, transformá-los em
alimentos ricos e saudáveis, como é o caso da batata e do feijão.
51
Segundo Farah (2000), inicialmente o processo de melhoramento
genético era realizado de modo empírico. Entretanto, após a Segunda Guerra
Mundial, a melhor compreensão dos princípios genéticos de plantas e animais
atingiu um nível profissional e, com isso, inúmeros sucessos foram alcançados.
Surgiram, então, as plantas e animais geneticamente modificados e os organismos
transgênicos. É importante ressaltar que nem todos os produtos geneticamente
modificados são considerados produtos transgênicos, pois podem apenas ter sofrido
alteração no seu DNA sem ter tido a incorporação de genes de uma espécie distinta.
De acordo com Farah (2000, p. 271): “Transgênico é um termo usado para designar
um organismo que carrega um gene exógeno incorporado de forma estável em seu
genoma, tanto nas células somáticas como germinativas, o qual se expressa em um
ou mais tecidos, e é transmitido para as gerações futuras segundo as leis de
Mendel”. O termo transgênico foi utilizado pela primeira vez por Jon Gordon e
Frank Ruddle em 1982.
O primeiro organismo transgênico espetacular foi um camundongo
gigante criado por Palmitter, Brinster e Hammer nos Estados Unidos, em 1982, e a
primeira planta transgênica data de 1983. Experimentos liderados pelo Dr. Roger
Beachy, da Universidade de Washington, em 1986, em plantas de tabaco, visavam
criar plantas transgênicas resistentes a vírus.
Em maio de 1994, foi lançado, no mercado americano, um fruto da
biotecnologia, desenvolvido pela companhia Calgene: o tomate Flavr-Savr, que
amadurecia mais lentamente que o tomate natural; este produto foi considerado tão
seguro que não exigia uma etiqueta que o discriminasse como sendo um produto
criado pela engenharia genética (FARAH, 2000). Somente em 1997, treze milhões
de hectares foram cultivados com plantas geneticamente modificadas em todo o
52
mundo e, no ano de 1998, aproximadamente cinqüenta dessas plantas receberam
autorização para serem comercializadas.
Segundo Farah (2000), apesar da grande campanha contrária
realizada pelos ambientalistas, a biotecnologia de plantas continua se
desenvolvendo. Apenas nos Estados Unidos, no ano de 1994, existiam 486 campos
de testes de plantas transgênicas e, no Canadá, no início de 2000, 43 produtos
agrícolas criados pela engenharia genética, como milho, canola, batata, tomate,
abóbora, soja e algodão, receberam aprovação para serem comercializados.
Além de estudos com plantas e animais, reina hoje uma intensa
atividade na área da transferência de genes para o homem: a terapia gênica e
diversas tecnologias que têm, em comum, um novo conceito terapêutico, ou seja, a
introdução de material genético para atuar na causa fundamental da doença, o gene.
Tais processos se baseiam no reparo ou substituição de um gene defeituoso visando
o tratamento e a cura de uma doença através da transferência de genes às células
somáticas, ocasionado apenas modificações não transmissíveis à descendência.
Embora esta seja a possibilidade teórica mais promissora para o tratamento das
doenças genéticas, muitas dificuldades técnicas ainda deverão ser superadas antes
que a transferência de genes para células somáticas humanas, com fins terapêuticos,
torne-se uma rotina.
As primeiras tentativas de transferência de genes, audaciosas e
ilegais, foram realizadas nos Estados Unidos a partir de 1973. Elas fracassaram, mas
tiveram o mérito de evidenciar a complexidade do empreendimento, assim como a
necessidade de estabelecer relações multidisciplinares e leis que protegessem os
pacientes contra protocolos terapêuticos precipitados e pouco rigorosos. Foi
decidido, desde então, que todos os projetos seriam submetidos a instâncias
53
encarregadas de analisar a qualidade dos protocolos e as condições de sua aplicação.
Essa preocupação iniciou-se no ano de 1975, quando foi organizada a Conferência
de Asilomar, proposta pelo bioquímico Paul Berg, da Universidade de Stanford,
realizada no Massachusetts Institute of Technology (MIT). Essa Conferência reuniu
cientistas do mundo todo no Centro de Convenções de Asilomar, com a finalidade
de se debaterem à exaustão os riscos e as medidas de prevenção, entre outros,
quanto à possibilidade de "criação de novos biótipos nunca antes vistos na
natureza", em experimentos de manipulação genética.
Esta reunião científica decorreu da proposta de moratória nas
pesquisas que envolvessem manipulação genética, realizada em 1974 por um grupo
de pesquisadores, proposta esta que foi publicada simultaneamente nas revistas
Nature e Science.
Durante esta conferência, ficou decidido que as experiências
envolvendo técnicas de DNA recombinante deveriam se enquadrar em severas
medidas de segurança (FARAH, 2000).
A reunião de Asilomar é um marco na história da ética aplicada à
pesquisa, pois foi a primeira vez em que se discutiram os aspectos de proteção aos
pesquisadores e demais profissionais envolvidos nas áreas onde se realizava a
pesquisa. Além disso, foi ali promulgada a necessidade de se manterem sob
rigorosas condições de proteção e de isolamento todos os experimentos de
recombinação genética e organismos deles resultantes, pelo tempo necessário à
produção de certezas de que não seriam nocivos à humanidade e ao meio ambiente.
A partir dessa Conferência, foram estabelecidos novos modelos e
procedimentos normativos, visando o controle de possíveis riscos advindos desta
nova tecnologia. Foram estabelecidas também as primeiras regras para o controle de
54
riscos da tecnologia do DNA recombinante estabelecidas pelo Instituto de Saúde dos
Estados Unidos (National Institute of Health- NIH). Essas regras foram norteadoras
dos procedimentos de avaliação de risco para novos produtos biotecnológicos e
estabelecidas, posteriormente, em todo o mundo, objetivando o desenvolvimento
seguro desta tecnologia e a incorporação de seus benefícios pela sociedade.
Igual regulamentação ocorreu em relação às plantas e animais
transgênicos a fim de minimizar os possíveis riscos à saúde humana ou impactos
indesejados ao ambiente. Uma vez que o transgênico é criado no laboratório, são
necessários testes de campo para comprovar sua segurança antes da liberação do
produto para fazendeiros e criadores.
As restrições às plantas transgênicas variam de país para país. A
Europa, por exemplo, é mais resistente a aceitar a biotecnologia de plantas do que os
Estados Unidos. A Comunidade Européia, em dezembro de 1994, votou a favor de
serem realizados testes de alguns produtos em escala limitada, porém baniu o uso
comercial desses produtos até 1999.
Em decorrência disso, promoveu-se uma moratória ao uso dos
processos da engenharia genética até a obtenção de técnicas que não trouxessem
riscos ao homem e ao meio ambiente. No Brasil, após intensos debates, foram
propostas normas e leis de biossegurança, estabelecidas pela Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança (CTNBio).
Segundo Farah (2000), os testes de campo apontaram riscos muito
baixos, porém, as pesquisas sobre segurança encontram-se no início e muitas
questões ainda não foram respondidas. Entretanto, de acordo com a autora, em
alguns países a preocupação com o meio ambiente está relegada a um segundo plano
diante das necessidades de aumento da produção, como é o caso da China, que tem
55
se declarado “disposta a assumir alguns riscos”, e realiza testes em milhares de
hectares com plantas transgênicas como tabaco, tomate e arroz.
Outro ponto que devemos ressaltar a respeito da produção de
organismos transgênicos é que o público em geral precisa dispor de informações a
respeito desses assuntos, pois projetos que visem o desenvolvimento dos referidos
organismos envolvem questões éticas, políticas, sociais e econômicas, razões que
evidenciam a importância da abordagem desse tema no currículo e promova, entre
os alunos, uma visão crítica e participativa, pois chegará o momento em que o
emprego da engenharia genética necessitará da aprovação por parte dos cidadãos.
Para Farah (2000), a evolução da engenharia genética parece um
caminho sem volta, e as decisões que são tomadas hoje terão um impacto real nas
gerações futuras. Por isso, segundo a autora, os Estados Unidos entendeu que a
melhor forma de disseminar a informação genética é atuar hoje junto aos alunos da
escola primária, dessa forma, programas especiais estão sendo desenvolvidos neste
sentido.
Além da produção de transgênicos, as modernas técnicas de biologia
molecular permitem, atualmente, até mesmo a clonagem de mamíferos, modificando
conceitos hegemônicos relacionados à reprodução e abalando paradigmas da
biologia como a reprodução sexuada como única forma de reprodução entre
mamíferos.
A clonagem ocorre naturalmente em organismos como bactérias e
plantas. A etimologia do termo nos remete à técnica de enxerto de um ramo (klon,
em grego) de uma planta em outra. Hoje a clonagem passou a significar “cópia
idêntica de moléculas, células, tecidos e mesmo a formação de um novo ser sem a
fusão de espermatozóide e óvulo”. A prática de clonagem tornou-se rotina em
56
organismos vivos vegetais e revolucionou as lavouras e plantações, multiplicando a
capacidade de produção de alimentos, sua estocagem e comercialização e trouxe
também a possibilidade de salvar espécies vegetais e animais ameaçadas de
extinção.
Artificialmente a clonagem pode ser feita em laboratório de duas
maneiras: separando-se as células de um embrião em um estágio inicial de
desenvolvimento ou substituindo-se o núcleo de um óvulo pelo de uma célula
adulta. Este último procedimento teve grande impacto na comunidade científica e
grande repercussão na mídia, originando a ovelha Dolly, criação anunciada em 23
de fevereiro de 1997 pelo pesquisador escocês Ian Wilmut.
A clonagem de animais foi realizada cientificamente pela primeira
vez, em 1952, com girinos (formas larvais de sapos e outros anfíbios), por Robert
Briggs e Thomas King. Em 1970 foram clonados embriões de rato, em 1979
embriões de ovelhas e, em 1980, foi a vez dos embriões de gado.
A partir de então, este tipo de clonagem foi considerado tecnologia
avançada em veterinária e reprodução pecuária. Países como França, Estados
Unidos e Canadá já fazem uso comercial dessa tecnologia patenteada.
Ian Wilmut anunciou o sucesso com a ovelha Dolly como um
possível grande salto qualitativo em clonagem, pois, enquanto os clones anteriores
eram feitos com células embrionárias, Dolly foi obtida através de um célula
diferenciada, a célula mamária. Esta célula foi levada a um estado de dormência e
seu núcleo tornou-se passível de reprogramação; em seguida, o núcleo do óvulo da
ovelha receptora foi removido e recebeu o núcleo retirado da célula mamária,
através de microinjeções e manipulação, sob a indução de uma descarga elétrica
controlada, obtendo-se, assim, um embrião que foi implantado no útero de uma
57
terceira ovelha, gestante, que pariu Dolly. Antes desse feito, foram realizadas 277
tentativas que fracassaram.
Este tipo de clonagem dispensa o gameta masculino para a
reprodução e aponta para a possibilidade de retornar uma célula diferenciada ao
estágio de indiferenciada. Deste modo, uma célula somática, em determinadas
condições, pode reativar todos os seus genes e gerar um novo ser. A partir daí,
questões éticas ganharam maior ênfase, principalmente, considerando-se que,
teoricamente, do ponto de vista técnico, é possível obter um ser humano via os
mesmo procedimentos utilizados na obtenção da ovelha Dolly. Segundo Farah
(2000, p. 237), a engenharia genética não criou os problemas éticos relacionados
com a genética humana, mas certamente veio exacerbá-los ainda mais”.Cabe
ressaltar, porém, que as questões éticas se aplicam à vida em geral e não devem se
restringir aos casos que envolvam seres humanos.
A preocupação com a abordagem das questões éticas dos processos
de clonagem não é recente. Desde a década de 1970, vários autores têm discutido
diferentes questionamentos a respeito dos aspectos éticos envolvidos em tais
procedimentos. Paul Ramsey, em 1970, propôs a importante discussão sobre a
questão da possibilidade da clonagem substituir a reprodução pela duplicação. Esta
possibilidade reduziria a diversidade entre os indivíduos com o objetivo de
selecionar características específicas de indivíduos existentes. Isto teria como
conseqüência a perda da individualidade com a possível despersonalização destes
seres humanos.
Andrew Varga, em 1983, levantou outras questões éticas, como as
associadas à produção de clones de plantas e animais destinados ao consumo
humano ou à produção de outros produtos; uma vez que estes procedimentos podem
58
causar impactos na redução da diversidade da flora e da fauna, além dos outros
possíveis problemas que poderão decorrer da sua utilização.
Em 1977, o professor Benhard Haering, da academia Alfrosiana de
Roma, discutia outra questão: a relativa e possível seleção de indivíduos gerados.
Uma vez que existia possibilidade de clonar seres humanos, caso fossem observadas
anomalias nos clones, estes poderiam ser eliminados, pois novos indivíduos
poderiam ser produzidos até atingir-se o objetivo desejado, caracterizando uma
forma de eugenia.
A palavra eugenia foi criada em 1865 pelo cientista inglês Francis
Galton para descrever o melhoramento das espécies por meio da reprodução
seletiva. Porém, esta palavra tornou-se uma expressão assustadora após a Segunda
Guerra Mundial, quando foram cometidos crimes atrozes, e após ações
discriminatórias adotadas nos Estados Unidos, nas décadas de 1920 e 1930, em
nome do movimento eugênico e do melhoramento da raça humana (FARAH, 2000).
A primeira lei dispondo sobre eugenia, no mundo, foi promulgada
nos Estados Unidos em 1924 e vigorou até 1965; esta lei pretendia alterar toda a
composição étnica e racial deste país, para satisfazer padrões estabelecidos pelos
defensores da eugenia.
Em 14 de julho de 1933 Adolf Hitler decretou, na Alemanha, a Lei
de Saúde Hereditária, usada como o primeiro passo de um programa eugênico de
eliminação em massa das “raças inferiores”, e que culminou no massacre de 6
milhões de judeus nos anos que se seguiram.
Técnicas de engenharia genética poderiam suscitar novas formas de
eugenia. Por exemplo, uma reportagem na edição da revista Veja de 3 de novembro
de 1999 traz título e frases tais como aos seguintes: “Bebês pré-fabricados: clínicas
59
brasileiras já oferecem óvulos e sêmen para produzir crianças sob encomenda”, “Em
busca do bebê perfeito: nas butiques de sêmen é possível escolher o sexo do bebê
e selecionar embriões", "O Brasil está entrando na era dos superbebês”.
Uma edição da Revista da Folha de São Paulo, dominical, de 26 de
dezembro de 1999, anuncia, em sua capa, que "métodos de fertilização artificial
criam um novo mercado onde um óvulo de mulher alta, loira e inteligente vale até
US$ 50 mil”, e as oito páginas sobre esse tema apresentam depoimentos sobre a
doação de óvulos em troca de dinheiro ou tratamento de saúde. Isso revivifica a
eugenia, portanto, através da busca de um bebê perfeito, que, segundo se
subentende, deve originar uma pessoa alta, loira e inteligente; em outras palavras,
incentivam-se aplicações da ciência e da tecnologia que objetivam "melhorar" a
carga genética da espécie humana. Devemos atentar também para o fato de se
“vender óvulos” e se “comprar”, em uma “butique de sêmem” um bebê selecionado;
ou seja, as novas técnicas da engenharia genética trazem a púbico não apenas as
discussões referentes a novas formas de eugenia como também interesses
econômicos subjacentes.
Segundo Tognolli (2003) “se a seqüência do DNA humano são a
base para futuras terapias, então a propriedade exclusiva de tal seqüência
representará dinheiro no banco”.
Através dos avanços científicos recentes várias questões econômicas
podem ser suscitadas.
Segundo Lewontin (2000)
6
, o Projeto Genoma Humano é, de fato,
mais uma organização administrativa e financeira do que um projeto de pesquisa;
ele foi criado “objetivando captar altíssimas somas de fundos públicos e dirigindo o
6
LEWONTIN, R. It ain't necessarily so: The dream of the human genome and other illusions. New York:
New York Review of Books, USA, 2000.
60
fluxo desses fundos para um imenso programa de pesquisa cooperativa”. Os gastos
para seqüenciar o genoma humano, segundo o autor, são estimados, de forma
otimista, em 300 milhões de dólares, sem se incluírem os custos de
desenvolvimento; porém, este projeto é apenas o começo, que centenas de
milhões devem ser gastos na busca de diferenças no DNA para cada doença genética
específica, sendo que hoje 3 mil doenças genéticas conhecidas. Este autor afirma
que “vários geneticistas moleculares de reputação são fundadores, diretores, agentes
e acionistas de empresas comerciais de biotecnologia, incluindo os fabricantes de
suprimentos e de equipamentos usados na pesquisa das seqüências do genoma”.
Observa-se que os descobrimentos da biologia molecular e da
engenharia genética apresentam imensas possibilidades de lucros privados; uma
revista de negócios, por exemplo, a revista Exame, trouxe em sua capa, de 31 de
maio de 2000, a manchete “Genética, o negócio da vida”, e durante a reportagem
enfoca o montante movimentado pelo setor com frases como: “o projeto genoma
promete uma revolução ainda maior que a dos bits na economia e no mundo dos
negócios e traz uma infinidade de dilemas éticos”.
Grã-Bretanha e Estados Unidos, que lideram as pesquisas do Projeto
Genoma Humano, organizaram uma comissão para investigar o mau uso das
informações sobre o código genético humano, identificando riscos de
discriminações e preconceito. Uma das maiores preocupações dos britânicos refere-
se aos portadores de mutações genéticas associadas a doenças, que essas pessoas
poderão enfrentar riscos de desemprego e discriminação por parte das seguradoras
de saúde. Outra prioridade dessa comissão seria a utilização dos exames de DNA
em processo de admissão de funcionários; o Ministério da Defesa britânico, por
exemplo, chegou a iniciar em 1999 um programa para identificar, entre seus
61
funcionários, os portadores do gene da anemia falciforme, porém acabou desistindo
dessa polêmica medida. Outro tema analisado é o direito de patentear genes
humanos, pois empresas pretendem comercializar as informações que começam a
ser reveladas (TOGNOLLI, 2003).
Neste contexto, discussões éticas ganham ênfase, que os
conhecimentos disponíveis podem ser muito úteis na prevenção de doenças, porém,
quando mal utilizados, representam uma forma de invasão de privacidade,
discriminação e exclusão; além disso, os genes, sendo patrimônio da humanidade,
não poderiam ser transformados em mercadoria.
Temas como estes são propícios a serem tratados no ensino de
biologia e podem subsidiar a prática pedagógica, apontando a necessidade de se
abordar temas polêmicos de forma crítica.
Para Canal (2003), as questões éticas, geradas pela aplicação de
novas tecnologias na genética humana, deveriam servir como estímulo para que toda
a sociedade se envolvesse na discussão e participasse das discussões sobre que
caminhos serão dados à engenharia genética.
A engenharia genética apresenta, para muitos, um potencial tão
positivo quanto assustador. Para Farah (2000), muitas notícias veiculadas pela
imprensa não especializada trazem previsões sensacionalistas sobre os riscos do
DNA recombinante, destacando a possibilidade de se criar “Frankensteins” ou o
extermínio da raça humana caso um vírus letal escapasse do laboratório. Porém,
segundo a autora, após vinte anos de intensas pesquisas em Engenharia Genética,
desenvolvida no mundo todo por milhares de laboratórios, existem evidências de
que essa tecnologia é segura, que nenhum acidente comprometendo a segurança
de pesquisadores ou do público foi reportado até a os dias atuais.
62
Portanto, as discussões atuais a respeito desse assunto voltam-se
principalmente para problemas e decisões éticas, que deverão ser discutidos e
assumidos, e somente uma sociedade bem informada sobre o assunto será capaz de
assegurar que as tecnologias em questão sejam empregadas de maneira ética e
humana.
63
CAPÍTULO IV
4. O ENSINO DE GENÉTICA NA ESCOLA MÉDIA
Este capítulo foi escrito na intenção de apresentar um panorama
geral sobre o ensino de Biologia, especificando o ensino de genética quanto aos
objetivos, conteúdos e métodos de ensino, de acordo com as Propostas Curriculares
Nacionais e as recentes pesquisas sobre esta área.
A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB
(Lei 9.394 promulgada em 20/12/1996) o Ensino Médio passou a ser parte
integrante da Educação Básica, portanto, parte da formação por que todo jovem
brasileiro deve passar.
64
Visando a promoção de uma aprendizagem permanente desse jovem
e a construção da cidadania diante das relações sociais que se modificam a todo o
momento, o currículo do Ensino Médio precisa ser pensado de modo a capacitar os
jovens para enfrentar as exigências da sociedade do século XXI, do mercado de
trabalho e de consumo.
Nos últimos anos, presenciamos um avanço científico inigualável. A
ciência está cada vez mais presente no cotidiano da população em geral e intervindo
no mundo e nos seres vivos, levantando discussões sobre a aplicação dos
conhecimentos científicos que estão sendo produzidos em ritmo acelerado.
Não raras vezes, assuntos biológicos são discutidos em jornais e
revistas de circulação nacional ou são temas de programas de entrevistas veiculados
na televisão e no rádio. Para opinar sobre esses assuntos e até mesmo interpretá-los,
os cidadãos necessitam de uma base de conhecimentos sólidos que precisam ser
transmitidos e discutidos pela Escola Básica.
Percebe-se que esse contexto pode influenciar a escolha de conteúdos
a serem ensinados em Biologia, no Ensino Médio, no intuito de atender aos
objetivos educacionais estabelecidos pelo Conselho Nacional da Educação CNE
(Parecer n
o.
15 de 1998) para a área de Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias
7
. Entre esses objetivos, aspectos da Biologia que almejam a
construção de uma visão de mundo, permitindo a formação de conceitos, a tomada
de decisões e a “posição cidadã”.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
–PCNEM- (Brasil, 1999) a aprendizagem na área de Ciências da Natureza indica
não apenas a compreensão como também a utilização pelos alunos de
7
O PCNEM (Brasil, 1999, p. 104-109) agrupa as disciplinas por áreas de conhecimento visando
contemplar competências e habilidades valorizadas pela LDB.
65
conhecimentos científicos para explicar o funcionamento do mundo e para que
possam intervir na realidade ao planejar, executar e avaliar suas ações.
O PCNEM (Brasil, 1999, p. 209) relata ainda que: “...é preciso
prover os alunos de condições para desenvolver uma visão de mundo atualizada, o
que inclui uma compreensão mínima das técnicas e dos princípios científicos em
que se baseiam”. Apontam também que a aprendizagem disciplinar de Biologia é
articulada e inseparável das demais ciências, exigindo a compreensão, por exemplo,
de condições geológicas e ambientais e de conhecimentos de natureza social e
econômica.
O principal objeto de estudo da Biologia é a vida em todas as suas
manifestações e diversidade, e para compreendê-la, faz-se necessário estudar as
interações ambientais e físicas que influenciam um sistema vivo e as interações
deste com os demais componentes do meio.
Segundo os PCN+EM (Brasil, 2002), uma das finalidades do estudo
das Ciências Biológicas é propiciar meios para que os educandos dominem
conhecimentos biológicos para compreender os debates contemporâneos e deles
participar, e conclui que:
“... aprender Biologia na Escola Básica permite ampliar o
entendimento sobre o mundo vivo e a incomparável capacidade que o
ser humano possui de intervenção no meio... essa ciência pode
favorecer o desenvolvimento de modos de pensar e agir que
permitam aos indivíduos se situar no mundo e dele participar de
modo consciente e conseqüente” (p. 34 )
Portanto, o ensino de Biologia tem a finalidade de estimular os
estudantes a observar, conhecer, investigar e discutir os fenômenos naturais para que
possam intervir conscientemente em sua própria vida; e também desenvolver nos
educandos capacidades específicas que lhes permitam compreender a diversidade e
66
evolução da vida na Terra, o desequilíbrio ambiental, a importância da conservação
do ambiente, os cuidados com sua saúde e seu próprio corpo, questões de
saneamento básico, lazer, entre outras.
O desenvolvimento, por exemplo, da Genética, da Biologia
Molecular, das tecnologias de manipulação do DNA e da clonagem levam à
discussão sobre os aspectos éticos envolvidos na utilização e aplicação dos
conhecimentos científicos e tecnológicos, apontando para reflexões e tomadas de
decisão perante a intervenção humana no mundo contemporâneo. Para o
posicionamento consciente diante de tais assuntos, é preciso conhecer a estrutura
molecular da vida, os mecanismos de transmissão genética e conservação de
determinadas características, ou ainda o aparecimento de anomalias ou mutações
que contribuem e modificam a diversidade da vida existente no planeta.
A partir dos apontamentos realizados, nota-se que o ensino de
Biologia almeja ampliar as possibilidades de compreensão e participação efetiva no
mundo atual, através de uma contextualização dos assuntos relacionados a essa
ciência, inseridos no dia-a-dia do aluno, buscando ultrapassar a mera memorização
reduzida a uma repetição automática de conceitos abordados em avaliações formais
aplicadas pelo professor.
O PCN (Brasil, 1999) relata que o ensino de Ciências tem sido
freqüentemente apresentado de forma desinteressante e pouco compreensível, e
geralmente abordam-se conhecimentos por meio de definições e classificações
estanques que o professor exige que os alunos decorem e isso dificulta a
aprendizagem significativa.
Para Trivelato (1988), é preciso que a Biologia seja vista por alunos e
professores não como um conjunto de descrições, informações ou aplicações
67
remotas de conceitos, mas sim como a análise de casos concretos que se ampliam
em generalizações: Será preciso também que os alunos reconheçam que a
pesquisa científica tem como objetivo precípuo procurar maneiras de melhorar a
qualidade de vida. Como cidadãos, os alunos devem preparar-se para consumir os
produtos da ciência, discutir suas implicações e influenciar seus caminhos.” (p. 59)
Urge, portanto, a necessidade de se abandonar a forma livresca de
estudar Biologia e propor a investigação de situações concretas, que exijam a
aplicação dos conhecimentos sistematizados que são ensinados na Escola. É preciso
promover, durante o ensino médio, o desenvolvimento de conhecimentos práticos e
contextualizados, que respondam às necessidades da vida contemporânea e que
contribuam para uma visão geral de mundo.
A importância da contextualização no Ensino das Ciências é muito
enfatizada no PCNEM (Brasil, 1999): para que ganhe contexto e realidade, a
discussão da biodiversidade e da codificação genética da vida, por exemplo, deve
estar associada a problemas atuais como manipulação genética e cultivo de
transgênicos. Dar oportunidade aos estudantes para conhecerem e se posicionarem
diante desses assuntos é parte necessária da função da educação básica.
O Conselho Nacional da Educação (CNE) através da Câmara de
Educação Básica (CEB) instituiu as Diretrizes curriculares Nacionais para o Ensino
Médio, através do Parecer CNE/CEB n
o
15/98 e Resolução CNE/CEB n
o
03/98 com
o objetivo de orientar os procedimentos a serem utilizados na organização
pedagógica e curricular de cada unidade escolar integrante de diversos sistemas de
ensino. Este parecer afirma que “o contexto mais próximo do aluno e mais
facilmente explorável para dar significado aos conteúdos da aprendizagem é o da
vida pessoal, cotidiano e convivência”. Canal (2003) aponta para a organização do
68
ensino de genética em torno de temas geradores de interesse para os alunos como,
por exemplo, o Projeto Genoma Humano, pois a partir desses temas, segundo a
autora, os alunos poderão compreender conceitos básicos de genética.
Quanto aos conteúdos específicos a serem ministrados durante as
aulas de Biologia, no Ensino Médio do país, não existe nenhuma proposta curricular
que imponha um ou outro conteúdo, que, esses são escolhidos por professores em
sua Unidade Escolar durante o planejamento escolar anual realizado no início de
cada ano letivo, assegurado pela LDB nos artigos 12 e 13. O que existe é um
currículo proposto, elaborado de acordo com propostas presentes na referida lei, que
se torna, segundo o PCNEM, currículo ensinado quando é trabalhado em sala de
aula pelo professor, pois é ele quem decide sobre a utilização dos materiais
curriculares.
A proposta pedagógica da escola deve, entretanto, contemplar o
desenvolvimento de competências e habilidades valorizadas pela LDB no intuito de
alcançar os princípios e fins da Educação Nacional que tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho” (Lei 9394/96 artigo 2º).
A resolução n
o
7 de 19 de janeiro de 1998 que estabelece as diretrizes
para a reorganização curricular dos cursos de ensino médio da rede estadual de
ensino afirma no artigo 8º: “Nos cursos regulares de ensino médio, com início
previsto para o presente ano letivo, a escola deverá selecionar os componentes de
livre opção, de acordo com a proposta pedagógica da escola”. Esta resolução
recomenda que os componentes curriculares escolhidos devem ter em vista os
69
resultados das avaliações internas e externas do desempenho dos alunos (SARESP
8
,
SAEB
9
e ENEM
10
).
A definição dos temas a serem ensinados, de acordo com PCN+EM
(Brasil, 2002), deve levar em conta a relevância científica e social dos assuntos, seu
significado na história da ciência e na atualidade e, em especial, as expectativas, os
interesses, e as necessidades dos alunos. Como não é possível, deste modo, propor
um currículo nacional comum, são propostos seis Temas Estruturadores para o
ensino de Biologia:
1. Interação entre os seres vivos
2. Qualidade de vida das populações humanas
3. Identidade dos seres vivos
4. Diversidade da vida
5. Transmissão da vida, ética e manipulação gênica
6. Origem e evolução da vida.
O PCN+EM (Brasil, 2002) esclarece que tais temas são propostos
como uma sugestão para a organização de conteúdos que compõem o projeto
pedagógico na escola e não devem ser utilizados como uma seleção única de
conteúdos.
Além dos Temas Estruturadores, o PCNEM (Brasil, 1999) traz
propostas de trabalho de conteúdos visando desenvolver conhecimentos e
competências em conjunto respeitando uma Base Nacional Comum e uma parte
diversificada prevista pela LDB
11
para permitir ao aluno atuar sobre o mundo e
usufruir bens culturais, sociais e econômicos, propondo sugestões de diferentes
estratégias para se promover a aprendizagem como: atividades experimentais,
8
Sistema de avaliação regular do Estado de São Paulo.
9
Sistema de avaliação do Ensino Brasileiro.
10
Exame Nacional do Ensino Médio.
11
Artigo 26: Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser
complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada,
exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela.
70
estudos do meio, desenvolvimento de projetos, jogos, seminários, debates,
simulação; visando o desenvolvimento das competências e habilidades utilizadas
nos PCNEM e no Exame Nacional do Ensino Médio
12
ENEM – (Brasil, 2002) que
tem por objetivo fundamental “avaliar o desempenho do aluno ao término da
escolaridade básica, para aferir o desenvolvimento de competências fundamentais
ao exercício pleno da cidadania”.
Para promover um ensino que valorize as competências apontadas no
PCNEM (Brasil, 1999) para a área de Ciências da Natureza é preciso promover
situações de aprendizagem que tenham sentido para o aluno, que o instrumentalizem
para agir em diferentes contextos e até em situações inéditas da vida.
Acreditamos não ser possível tratar todo conhecimento biológico no
Ensino Médio, o importante, além de respeitar o tempo disponível e a grade
curricular da escola, é eleger os conteúdos mais significativos para os alunos e,
conforme mencionado anteriormente, contextualizar os conhecimentos abordados
discutindo sua produção e a história da Biologia como uma construção humana,
repleta de idas, vindas, rupturas e, até mesmo, contradições.
É preciso promover espaços de reflexão para que o aluno possa
compreender o contexto em que determinado conhecimento foi produzido, que este
não resultou apenas de construções elaboradas por mentes brilhantes ou deva ser
considerado inquestionável. É extremamente necessário que o ensino de Biologia
favoreça a contraposição entre a lógica da ciência e a lógica do aluno e forneça
subsídios para o questionamento, para a dúvida e para a crítica.
O ensino de Biologia não deve apenas fornecer informações, mas sim
desenvolver a criticidade entre os educandos para que possam analisar informações,
12
Instituído pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP, 1998, para ser aplicado
aos alunos concluintes e egressos do Ensino Médio.
71
aceitá-las, refutá-las ou compreendê-las e agir no mundo de forma autônoma e
consciente, utilizando os conhecimentos construídos historicamente.
Relatos do PCN+EM (Brasil, 2002) afirmam que o saber científico e
tecnológico é uma condição para se alcançar a cidadania e não apenas uma
especialização. Geralmente, no ensino de Biologia, perde-se de vista o entendimento
de fenômenos biológicos e as vivências práticas e, deste modo, a ciência é pouco
usada para interpretar e intervir na realidade.
Saber Biologia também é importante para se reconhecer a
especificidade da vida humana e entender as formas de relação do homem com a
natureza. A biologia auxilia o desenvolvimento do pensamento que se reflete na
ação diante do posicionamento do indivíduo perante as transformações do mundo.
4.1 Pesquisas sobre o Ensino de Genética
Considerando-se os grandes avanços biotecnológicos ocorridos nos
últimos anos, e a acentuada importância do ensino de genética na formação de
cidadãos que precisarão opinar a respeito dos avanços da biotecnologia e suas
implicações sociais, éticas e também de saúde pública e pessoal, muitas pesquisas
que buscam investigar como se processa o ensino de genética, quais metodologias
são utilizadas ou que assuntos são freqüentemente abordados têm sido realizadas.
Trivelato (1988) investigou o ensino de genética humana em uma
dada escola “tal como se processa”, e constatou que os alunos apresentam noções
inadequadas sobre os conteúdos desta área, mas que os alunos se interessam, e
então, participam qualitativamente da aula por temas da genética nas quais são
mencionados exemplos humanos ou dos quais tenham alguma referência. Porém,
verificou também que a genética humana recebe pouco destaque durante as aulas de
72
Biologia e, deste modo, os alunos poucos de beneficiam das informações que lhes
são transmitidas. Recomenda, para mudar tal situação, deslocar o enfoque
tradicional e passar a privilegiar os assuntos relevantes aos alunos, escolhendo
conteúdos e ordenando-os de acordo com os anseios e necessidades desses
educandos para que tais temas despertem o interesse especial e promovam
aprendizagem mais genuína.
Banet e Ayuso (1995) apontam que iniciar o estudo da genética
tomando como referência a herança dos caracteres humanos poderia despertar o
interesse dos alunos, tornando o estudo mais significativo. Para eles, conferir certa
utilidade aos conteúdos estudados é condição fundamental no processo de ensino.
Deadman e Kelly (1978)
13
citados por Bugallo Rodriguez (1995)
realizaram uma análise das pré-concepções dos estudantes do ensino secundário a
respeito de evolução e herança de caracteres, e constataram que uma inapropriada
compreensão a respeito de probabilidade e ausência de conceitos simplificados
sobre herança mendeliana constitui obstáculos para o desenvolvimento de
concepções mais elaboradas. Complementando estes dados, Ayuso e Banet (2002)
propõem que os meios de comunicação, o ambiente escolar e o ambiente familiar
influenciam as pré-concepções dos estudantes e estas precisam ser consideradas pelo
professor, que, será por meio dessas concepções que os alunos interpretarão
novos conteúdos e, portanto, elas poderão condicionar as concepções sobre herança
biológica e influenciar as aprendizagens posteriores.
Pesquisas realizadas (Banet e Ayuso, 1995; Silveira e Amabis, 2003)
constataram que os alunos possuem conceitos genéticos equivocados, pois
acreditam, por exemplo, que os vegetais não possuem células, genes ou
13
DEADMAN, J. A. & KELLY, P. J. What do secundary schoolboys uderstand about evolution and heredity
before they are thaught the topics? Journal of Biological Education. 12 (1): 7-15, 1978.
73
cromossomos e que, mesmo após freqüentarem o ensino médio, muitos estudantes
atribuem significados errôneos a conceitos básicos como cromossomos, genes
alelos, mutações; acreditam que as células que possuem material genético se
localizam no sangue e no sistema reprodutivo geralmente masculino –, ou seja,
muitos não compreendem que todas as células possuem informações genéticas; não
chegam à compreensão do significado de processos importantes como, por exemplo,
a meiose ou os mecanismos de transmissão das características hereditárias;
interpretam de maneira equivocada dominância e recessividade e situam genes
alelos para uma característica em um mesmo cromossomo.
Wood-Robinson e colaboradores (1998) verificaram em uma
pesquisa a respeito do tipo de conhecimento genético que os estudantes da Inglaterra
possuíam, ao final da escolarização básica, sobre conceitos básicos de genética e a
respeito da gama de aplicações da tecnologia genética; que os estudantes ingleses
possuem um entendimento escasso a respeito de conceitos básicos de genética. Ao
serem questionados durante esta pesquisa, os estudantes revelaram, por exemplo,
desconhecer que todas as células somáticas possuem o mesmo genótipo, inclusive
muitos deles acreditam que apenas os animais possuem constituição genética, e isso
não está presente nos vegetais, dados estes semelhantes à pesquisa realizada por
Banet e Ayuso (1995).
A relação entre cromossomos, genes e a informação hereditária não é
clara para os alunos consultados em outro trabalho. Uma pesquisa realizada por
Lewis et al. (2000a) apontou que, no final da educação científica obrigatória da
Inglaterra, os alunos apresentam uma compreensão adequada de que os genes
influenciam as características fenotípicas, e que isso ocorre porque os genes contêm
alguma informação, mas falta-lhes uma compreensão básica do que é um gene, sua
74
função básica, onde poderia ser encontrado. Inclusive, os alunos indicaram ser os
genes maiores que os cromossomos e alguns educandos revelaram acreditar que
alguns organismos podem apresentar cromossomos sem conter informações
genéticas, ou ainda, que os genes e cromossomos eram compostos por células. Esta
pesquisa revelou ainda que os alunos utilizam, sem diferenciação, os termos
cromossomo/gene e célula/gene.
Em uma segunda pesquisa realizada por Lewis et al. (2000b), que
investigou a compreensão que os jovens possuem sobre a continuidade da
informação genética entre as células de um indivíduo, constatou-se que muitos
jovens acreditam que células diferentes contêm informações genéticas diferentes,
pois desempenham funções diferentes, e a maioria não fez distinção entre célula
somática e célula germinativa. Esses autores afirmam que o conhecimento limitado
apresentado pelos estudantes a respeito do conjunto de conceitos básicos, como
evidenciado na primeira pesquisa, dificulta uma explicação coerente do todo e este
fato pode ter ocorrido devido à fragmentação com que o ensino de genética é
conduzido, não possibilitando que os alunos estabeleçam relações entre os
conceitos.
Segundo Justina e Ripel (2003), o entendimento de conceitos básicos
da genética como, por exemplo, gene, cromossomo e DNA e o mecanismo de
transmissão de características hereditárias poderia ser melhorado através de uma
recapitulação da divisão celular na qual se demonstrassem as informações genéticas
que cada tipo celular produz e, além disso, as estruturas em questão poderiam ser
visualizadas em conjunto.
Para Silveira e Amabis (2003), o estabelecimento de relações entre
diferentes níveis organizacionais, especialmente na genética, deve ser feito com
75
cautela, pois pode dificultar a aprendizagem significativa desejada. As relações entre
DNA, cromossomos e genes, por exemplo, podem ser facilitadas pela construção de
modelos pelos alunos; a utilização de exemplos precisa ser bem diversificada, pode-
se, por exemplo, se discutir o comportamento dos cromossomos durante a produção
de espermatozóides em comparação com a produção de células da pele. Seria
recomendável, segundo esses autores, estimular os alunos a relacionar os conceitos
trabalhados durante o ensino de genética às tecnologias atuais como, por exemplo,
clonagem e organismos transgênicos. Deste modo, o professor poderá utilizar os
conhecimentos provenientes dos meios de comunicação e dos ambientes familiares
na construção dos saberes escolares, e isso pode contribuir para a formação de
critérios pelo próprio aluno para a diferenciação das diversas fontes de informação.
Justina e Ripel (2003) apontam que a compreensão de processos de
clonagem e engenharia genética envolve o conhecimento de que um gene é um
segmento de DNA, que especifica um produto particular e que tem um local
específico em um cromossomo.
Wood-Robinson e colaboradores (1998) constataram que, apesar dos
estudantes terem consciência sobre as implicações dos conhecimentos genéticos na
compreensão das tecnologias genéticas, ou tecnologias do DNA recombinante, e
também para a atitude que irão tomar frente às aplicações desta tecnologia, possuem
pouca familiaridade com termos como: mapeamento genético, tecnologia genética,
terapia genética e Projeto Genoma Humano.
Cabe destacar que os conhecimentos abordados durante o ensino de
genética, não servem apenas para que os estudantes conheçam os mecanismos e os
conceitos das tecnologias do DNA, mas também para a sua formação crítica,
auxiliando na tomada de posição consciente diante de tais assuntos.
76
Silveira e Amabis (2003) relatam que pesquisas sobre o Ensino de
Genética e sobre a dificuldade dos alunos na resolução de problemas relacionados à
herança biológica evidenciam os obstáculos que os professores enfrentam ao tentar
inserir temas atuais como clonagem, alimentos transgênicos e testes de identificação
por DNA tão necessários para a educação científica almejada.
De acordo com Tavares et al. (2003), para um aluno compreender
estruturas sub-microscópicas como a molécula do DNA seria necessário
contextualizar esse conteúdo em situações diversas, vivenciadas pelos alunos, para
que pudessem compreender melhor, por exemplo, a relação entre o DNA e os
organismos geneticamente modificados (OGMs). Portanto, para não alegar
ignorância ou para que não rejeitem as novas descobertas em genética, as pessoas
necessitam compreender as possibilidades de aplicações e implicações tanto da
genética básica quanto dos avanços atuais dessa área.
Bonzanini (2002) constatou em sua pesquisa que os alunos se interessam por assuntos relacionados à
genética contemporânea e temas como, por exemplo, o Projeto Genoma Humano pode ser utilizado como um tema gerador
para o estudo de conceitos de genética básica. Constatou também que os conceitos em estudo são mais bem explorados pelos
alunos ao serem aplicados em situações concretas, dentro de um contexto significativo que estimule o aluno a questionar,
experimentar.
Em consonância com este estudo, Wood-Robinson et al. (1998)
verificaram que os conteúdos relacionados à genética contemporânea geram grande
interesse entre os alunos e isso poderia dar margem à discussões centradas em
questões éticas, políticas e econômicas, suscitadas pelas pesquisas atuais.
Conforme mencionado anteriormente, Justina et al. (2000), ao
realizarem um estudo sobre o ensino de genética no ensino médio, verificaram que a
maioria dos professores entrevistados apontou as novas abordagens em genética
como a tecnologia do DNA recombinante, o Projeto Genoma Humano, clonagem e
organismos transgênicos, como sendo as temáticas que apresentam maior
77
dificuldade tanto para ensinar como para o aluno compreender. Tal estudo indicou
também uma preocupação, entre os educadores, com as temáticas atuais que não
aparecem nos livros didáticos ou aparecem com uma abordagem inadequada e com
erros conceituais.
Justina e Barradas (2003) investigaram as opiniões de professores de
Biologia do Ensino Médio sobre o Ensino de Genética, e puderam constatar, através
de algumas concepções levantadas, que os professores continuam distantes das
inovações que acontecem e repassam a seus alunos conceitos estáticos e errôneos
contidos nos livros didáticos. Porém, a grande maioria acredita que mudanças no
ensino de genética são necessárias como uso de metodologias diferenciadas, no
intuito de promover a relação entre teoria e prática, e aperfeiçoamento dos
professores para atender as necessidades dos alunos. Para possibilitar que os
professores tenham acesso a novas perspectivas para o ensino de genética, as
pesquisadoras propõem a realização de oficinas ou cursos de capacitação
profissional que poderão contribuir para a melhoria do ensino médio.
Fávaro e colaboradores (2003) realizaram um estudo sobre as
possibilidades e os limites do trabalho de professores de Biologia quanto ao ensino
de Genética, Engenharia Genética e Biologia Molecular. A partir da análise de
questionários aplicados verificaram que apesar dos professores apresentarem um
grande interesse pela área, os mesmos demonstram ter muitas dúvidas sobre
diferentes assuntos, principalmente aqueles relacionados às questões éticas e
técnicas atuais. A preocupação dos professores, em se manterem atualizados e
esclarecer suas dúvidas quanto à genética e suas novas tecnologias, também foi
evidenciada pela pesquisa, e a Internet, revistas e jornais foram indicadas pelos
professores como sendo principais fontes de atualização. Os textos utilizados para a
78
reciclagem do profissional também foram indicados como um importante material
de trabalho na sala de aula, dividindo espaço com os livros didáticos.
Wood-Robinson et al. (1998), apontam para a necessidade de
elaboração de materiais curriculares que permitam ao aluno desenvolver uma
melhor compreensão sobre genética básica e as implicações destes conhecimentos
na avaliação de questões relacionadas às tecnologias genéticas. Para auxiliar esta
compreensão, segundo os pesquisadores, seria válido relacionar diferentes
disciplinas e inserir os conhecimentos da atualidade em distintos momentos da
aprendizagem.
Justina e Ripel (2003) relatam que existe um interesse entre os
pesquisadores (VALADARES, 1999; BANDRÃO e ACEDO, 2000; PICININI-
TEIXEIRA, TOSTES e GOMES, 2002) pela elaboração ou inserção de recursos
didáticos que facilitem e aumentem a compreensão dos alunos sobre conceitos
básicos de genética incluindo softwares, jogos, modelos didáticos entre outros.
Além da escassez de materiais que possam auxiliar o trabalho
docente, percebe-se que este recorre, muitas vezes a fontes de atualização pouco
confiáveis, que reportagens de revistas e Internet divulgam tais temas de forma
sensacionalista e trazem conceitos equivocados. Considerando que os professores se
atualizam por conta própria, utilizando especialmente a Internet para esse fim
(FÁVARO et al., 2003), é preciso que os docentes tenham um embasamento teórico
que os auxiliem a interpretar e selecionar as informações que condizem com
procedimentos científicos corretos para, então, promover discussões sobre os
avanços e as limitações da ciência.
É preciso discutir as implicações que surgem a partir do uso da
biotecnologia com base em informações confiáveis. Para tanto, é preciso que os
79
currículos e os professores proporcionem aos estudantes o acesso às informações
adequadas e contextos concretos nos quais essas tecnologias podem ser aplicadas,
ou seja, o professor de Biologia precisa transformar o conhecimento científico
produzido pelo cientista para desenvolvê-lo em sala de aula sendo acessível ao seu
aluno. Assim, os estudantes poderão adquirir experiências e conhecimentos para
opinar a respeito de questões sociais e éticas relacionadas a tomadas de decisão
sobre estes assuntos.
Fávaro et al. (2003) verificaram, através do estudo realizado, uma
grande preocupação entre os professores pesquisados, quanto ao conhecimento que
possuem em relação à ética e legislação, além de uma necessidade de estudos mais
aprofundados sobre as técnicas mais atuais. Nesta pesquisa os professores
apresentaram ainda um grande interesse e motivação por cursos de atualização na
área de Engenharia Genética e Biologia Molecular, principalmente sobre o tema
clonagem.
Tavares et al. (2003) realizaram uma investigação a respeito das
concepções dos licenciandos em biologia sobre as relações entre DNA e transgênicos. Tal
investigação evidenciou as dificuldades encontradas pelos licenciandos em Ciências
Biológicas para trabalhar com a estrutura da molécula do DNA e a sua correlação com a
síntese protéica e a produção de transgênicos. Os resultados dessa pesquisa indicaram
também que, embora os professores universitários se preocupem com o domínio desses
conteúdos, no mundo atual, assim como trabalhar a relação entre universo micro e
macroscópicos, verifica-se a necessidade de implantar-se políticas de formação continuada
voltada para esses profissionais “minimizando o efeito cascata atualmente observado nos
diversos níveis de ensino”.
Pesquisas têm demonstrado uma crescente preocupação com a
formação continuada dos professores (TEIXEIRA, 2001; SOUZA et al., 2002), sendo
80
desenvolvidos cursos em diversas áreas. É preciso promover cursos de educação
continuada que dêem suporte para a atuação desses profissionais.
Considerando que os professores além de educadores são importantes
formadores de opinião e, tendo o conhecimento da preocupação dos mesmos com
sua atualização, justificam-se iniciativas destinadas a aparelhar os professores em
seu trabalho, que, este profissional é a principal ponte que liga o aluno ao
conhecimento científico e o seu trabalho auxilia na formação de cidadãos pensantes
e capazes de interferir na sociedade onde vivem.
Fávaro et al. (2003) constaram que, além do próprio interesse em
buscar informações sobre as áreas de Engenharia Genética e Biologia Molecular, os
professores pesquisados revelaram ainda a preocupação de instruir os alunos,
sobretudo devido à popularização dos avanços da genética nos últimos tempos.
Cumpre a instituição escolar e, conseqüentemente ao professor, a
responsabilidade de tratar os avanços da genética de forma inteligente, clara e
acessível aos alunos, fornecendo argumentos para que possam refletir sobre as
questões éticas, políticas e sociais envolvidas nessas temáticas, tornando-os aptos a
tomarem decisões conscientes perante a sociedade.
Menezes (2000) considera de extrema importância a abordagem de
pesquisas científicas atuais em sala de aula, assim como os problemas sociais,
econômicos, tecnológicos, ambientais e éticos envolvidos. Porém, o autor ressalta
que é preciso apresentar tais problemáticas em “exercício real”, ou seja, abordar
temas que estão sendo diariamente apresentados aos alunos através dos meios de
comunicação não apenas num plano geral informativo, mas através de discussões de
interesse direto do aluno. Segundo este autor, é importante apresentar a ciência
como um instrumento de crítica frente a suas aplicações como os explosivos
81
nucleares ou em seus métodos como determinadas manipulações genéticas, pois,
diante desses assuntos, o posicionamento dos jovens será decisivo.
A inclusão de temas atuais no ensino de Ciências que abordem as
relações entre ciência, tecnologia e sociedade, foi proposta desde a década de 80. No
entanto, o Ensino de Ciências praticado pelos professores atualmente é ainda
influenciado por orientações tradicionais de transmissão de conhecimentos
(AMORIM, 1995).
Ao apresentar temas da atualidade, o professor pode favorecer a
visão de Ciência como fruto da construção humana e, portanto, suscetível a erros e
questionamentos a respeito da validade e aplicabilidade dos conhecimentos
produzidos.
A genética, sendo uma das áreas básicas das Ciências Biológicas, é
fundamental para explicar diversos conceitos relacionados a outros ramos da
Biologia. Graças aos conhecimentos em genética, podemos explicar, por exemplo,
os mecanismos de evolução das espécies, entender a fisiologia de vários processos
ou os mecanismos de ação de diversas doenças. Como a genética é uma ciência em
constante evolução que se manifesta em novas pesquisas como o Projeto Genoma
Humano, clonagem e organismos geneticamente modificados, é preciso que os
professores acompanhem essa evolução e levem para a sala de aula discussões que
envolvam tais assuntos para aprimorar o senso crítico dos educandos e para
proporcionar a contextualização do ensino que ele está ministrando.
4.2 O Ensino de Genética nas propostas curriculares e nos livros didáticos.
Diante dos progressos científicos recentes, especialmente dos
avanços da engenharia genética e biologia molecular, percebe-se que o ensino de
genética é, a cada dia, mais necessário, principalmente para interpretação das
82
descobertas realizadas neste ramo da Biologia, que nos revelam informações antes
pensadas apenas como filme de ficção científica, como, por exemplo, a investigação
da constituição genética da espécie humana.
Apesar da crescente veiculação na mídia de temas da genética
contemporânea, muita informação é tratada com superficialidade, ou então são
informações não confiáveis, que trazem conceitos errados ou termos técnicos de
difícil compreensão para a população em geral. Justina et al. (2000) afirma que tais
temas são tratados pela mídia de maneira sensacionalista, superficial, enfatizando os
fatos sem compromisso com orientações educativas.
Para opinar sobre e julgar tais informações relatadas pela mídia, os
jovens necessitam de um ensino de genética que ultrapasse a aplicação de fórmulas
ou a simples resolução de problemas que envolvam uma determinada característica
genética. Mais que isso, é preciso envolver os estudantes em discussões a respeito
de aspectos éticos, econômicos e sociais envolvidos com tais temas.
Canal (2003, p. 41) aponta que uma das responsabilidades do
professor de Biologia é “transmitir os avanços da genética de forma inteligente,
clara e acessível aos alunos...”
Surge, portanto, a necessidade de se informar cada vez mais, e
melhor, o público em geral, pois deste se exigirá tomadas de posição em relação à
saúde individual e coletiva sobre assuntos relacionados à genética contemporânea.
Segundo o PCNEM (Brasil, 1999, p. 220):
“Conhecer a estrutura molecular da vida, os mecanismos de perpetuação,
diferenciação das espécies e diversificação intraespecífica, a importância
da diversidade para a vida no planeta são alguns dos elementos essenciais
para um posicionamento criterioso relativo ao conjunto das construções e
intervenções humanas no mundo contemporâneo”.
83
Turney
14
(1995, apud Wood-Robinson et al., 1998) aponta três
motivos para se promover a compreensão da genética pelo público em geral: o
primeiro motivo apontado refere-se ao caráter utilitário dos conhecimentos sobre
genética, ou seja, que os indivíduos apliquem de uma forma prática os conceitos
científicos adquiridos. O segundo motivo, caracterizado como democrático, aponta
para a necessidade de se fornecer informações para que as pessoas possam apoiar ou
não políticas que favoreçam o desenvolvimento de pesquisas que envolvam
biotecnologia para que estas se desenvolvam em um cenário de informação e não de
ignorância, ou seja, que os indivíduos possam utilizar os conhecimentos para
entender e participar de debates que envolvam temas científicos. Por fim, aponta o
caráter cultural, ou seja, os indivíduos podem utilizar esses conhecimentos para
entender a ciência como um avanço da sociedade moderna.
Childs (1983, apud Trivelato, 1988) apresenta, também, outras três
justificativas para o ensino de genética humana: por razões filosóficas, como meios
de se conhecer as leis da natureza e nossas limitações perante ela; por razões de
saúde, englobando a necessidade de conhecer e prevenir doenças; e por razões
sociais que dizem respeito às dimensões éticas.
Trivelato (1988, p. 01) afirma que: O ensino de genética humana
tem sido apontado, na literatura, como uma necessidade na formação de jovens
conscientes de tomar decisões em relação à sua própria vida.”
Bizzo (1994) complementa tal afirmação ao considerar que o ensino
de genética tem a função de preparar os cidadãos para tomar decisões diante dos
aspectos éticos relacionados aos progressos científicos e destaca: “A clonagem de
embriões, a engenharia genética e o projeto genoma humano estão a questionar os
14
TURNEY, J. The public understanding of genetcs where nest? European Journaul of Genetics and Society, 1
(2), p. 5-20, 1995.
84
educadores da atualidade; estarão os estudantes de hoje preparados para enfrentar
essas discussões amanhã?”
O entendimento de novas tecnologias da área da genética está
diretamente relacionado ao domínio do conhecimento de conceitos básicos como:
gene, cromossomo, ácidos nucléicos, divisão celular, expressão gênica entre outros
(JUSTINA, 2001). Esses conceitos são, ou deveriam ser, melhor explicitados no
ensino médio para que a partir do domínio de tais conceitos os alunos pudessem
utilizá-los para a compreensão das pesquisas atuais no campo da genética.
O PCN+EM (Brasil, 2002) revela a importância de dominar
conhecimentos relacionados à genética para compreender os debates
contemporâneos e propõe através dos “Temas Estruturadores e Respectivas
Unidades Temáticas do Ensino de Biologia” conteúdos específicos a serem
discutidos no ensino de genética:
Tema 3- Identidade dos seres vivos:
a) A organização celular da vida
b) As funções vitais básicas
c) DNA: a receita da vida e seu código
d) Tecnologias de manipulação do DNA
A abordagem desse tema, de acordo com o PCN+EM (Brasil, 2002),
permite que os alunos se familiarizem com as tecnologias de manipulação do
material genético, os transgênicos e outros grandes temas contemporâneos e
também com o debate ético e ecológico associado a esses assuntos e desse modo,
desenvolvam “competências” para avaliar os riscos e benefícios dessas
manipulações à saúde humana e ao meio ambiente, e possam se posicionar diante
dessas questões.
85
Tema 5- Transmissão da vida, ética e manipulação gênica:
a) Os fundamentos da hereditariedade
b) Genética humana e saúde
c) Aplicações da engenharia genética
d) Os benefícios e os prejuízos da manipulação genética: um debate
ético.
Pretende-se nesse tema, segundo PCN+EM (2002), que os alunos
sejam inseridos em debates sobre as implicações éticas, morais, políticas e
econômicas das manipulações genéticas, analisando-as e avaliando os riscos e
benefícios para a humanidade e o planeta.
O PCNEM (Brasil, 1999) descreve que, durante o ensino de genética,
observa-se que os professores familiarizam os alunos com códigos e métodos
experimentais, mas não tratam os fenômeno da hereditariedade da vida de modo que
o conhecimento aprendido seja instrumental e o ajude no julgamento de questões
como preconceitos raciais, manipulação do DNA, alimentos modificados
geneticamente. Com isso, deixam de ser aprendidos saberes práticos para o
exercício da cidadania.
Trivelato (1988, p.67) afirma que: “O curso de genética deve ter
como preocupação principal tornar os alunos aptos a consumir o conhecimento
produzido pelas pesquisas científicas e tecnológicas”. A autora prossegue
responsabilizando o ensino de genética por fornecer subsídios a fim de que os
alunos possam compreender a natureza da pesquisa em genética, evidenciando não a
melhor opção ou a decisão mais acertada e sim as implicações de cada escolha para
que os alunos possam realizar julgamentos conscientemente e de acordo com seus
valores.
86
Este contexto destaca a necessidade de se repensar os conhecimentos
a serem ensinados na escola e as estratégias utilizadas para isso, eles precisam ser
vistos como recursos para atuar sobre a realidade. O PCN+EM (Brasil, 2002, p. 35)
afirma que: “conhecimentos biológicos relacionados à citologia genética deverão
instrumentalizar o aluno para que, diante de uma situação real como, por exemplo,
a decisão de um ministro de apoiar a clonagem terapêutica, este seja capaz de se
posicionar ou, pelo menos apontar, de maneira fundamentada, argumentos pró e
contra a decisão.”
Para se promover o debate de questões como a exemplificada acima,
é preciso antes de tudo se discutir os currículos de Biologia, efetivando a
incorporação dos temas propostos em Parâmetros Curriculares, pois se percebe que
uma grande diferença entre o que é programado e o que é ensinado na escola.
Para Amorim (1995), por exemplo, é importante se discutir um novo conceito para o
ensino de ciências, o qual analise situações como as implicações éticas envolvidas
na produção de clones humanos.
Krasilchik (2001) relata que tópicos de primordial importância como
a formação de indivíduos sensíveis e solidários, cidadãos conscientes dos processos
e regularidades de mundo e da vida, capazes de analisar os fazeres humanos
identificando aspectos éticos, morais, políticos e econômicos envolvidos na
produção científica e tecnológica, bem como na sua utilização e capazes de realizar
julgamentos e de tomar decisões, têm tido pouca repercussão no currículo escolar.
Canal (2003) apontou em sua pesquisa a necessidade de se pensar
sobre a atualização dos currículos de disciplinas científicas. A autora relata que o
currículo acadêmico, fragmentado e descontextualizado da maioria das escolas não
corresponde aos interesses e preocupações que os alunos têm sobre sua vida.
87
Os professores precisam discutir amplamente o contexto curricular
em suas unidades escolares, adequando-os aos interesses e necessidades de sua
clientela e procurando escolher conteúdos que façam algum sentido para o aluno.
Doll (1997, p. 29) considera ser fundamental que todo professor reflita sobre o
currículo escolar e o defina como um processo de desenvolvimento, diálogo,
investigação e transformação.”
Uma proposta curricular que se pretenda contemporânea precisa
incorporar como um de seus eixos os avanços e as tendências apontadas para o
século XXI. Não se pode deixar de lado a crescente presença da ciência e da
tecnologia nas atividades produtivas e nas relações sociais que estabelece um ciclo
permanente de mudanças provocando rápidas rupturas, características essas que
precisam ser consideradas durante a escolha de conteúdos.
Para a elaboração do currículo para o ensino de genética, o PCN+EM
(Brasil, 2002, p. 40) apresenta competências que poderão ser consideradas durante a
escolha dos conteúdos relacionados ao tema Ciência e tecnologia quanto à
contextualização sócio-cultural e questões relacionadas à ética e cidadania:
“Reconhecer e avaliar o caráter ético do conhecimento científico e tecnológico e
utilizar esses conhecimentos no exercício da cidadania” e as competências em
biologia são:
“● Reconhecer a importância dos procedimentos éticos na aplicação de
novas tecnologias para o diagnóstico precoce de doenças e do uso dessa
informação para promover a saúde do ser humano sem ferir sua
privacidade e dignidade
Avaliar a importância do aspecto econômico envolvido na utilização da
manipulação genética em saúde: o problema das patentes biológicas e a
exploração comercial das descobertas das tecnologia de DNA.”
88
Outra competência apontada no PCN+EM (Brasil, 2002)
correspondente à área de Biologia, no que diz respeito à “Discussão e
argumentação de temas de interesse da ciência e tecnologia”, refere-se à
comparação de diferentes posicionamentos dos cientistas, ambientalistas, jornalistas
sobre assuntos relacionados à biotecnologia como produção de alimento
transgênico, terapia gênica, clonagem etc., analisando a consistência de argumentos
e a fundamentação teórica.
Algumas estratégias de ensino podem auxiliar no desenvolvimento
das competências acima citadas como: debates, seminários, atividades
experimentais, entre outras. Ao se discutir, por exemplo, questões que necessitam
ser explicitadas ao longo da história da humanidade para então se compreender as
atuais leis da genética, pode-se levar os estudantes à compreensão da dimensão
histórico-filosófica da produção científica e de sua veracidade ou até mesmo de sua
ineficiência. Para que os estudantes possam se envolver com sua aprendizagem, é
importante que a metodologia utilizada apresente os conteúdos como problemas a
serem resolvidos pelos alunos.
A genética proporciona exemplos clássicos de raciocínio lógico, pois
possui um conjunto de princípios e leis bem desenvolvidos. Dentro da biologia, ela
representa, não apenas uma área de conhecimento, mas um caminho para mudar a
natureza descritiva do ensino dessa área, já que possibilita ao professor, ao estudante
ou ao pesquisador, além do exercício de raciocínio lógico, a reflexão teórica e ética.
Deste modo, podemos caracterizar a genética como um conteúdo
adequado ao desenvolvimento de habilidades cognitivas, que ultrapassam a mera
memorização de conceitos isolados, que, a interpretação dos mecanismos da
hereditariedade está diretamente relacionada à compreensão de processos de divisão
89
celular que originam as células reprodutivas; na relação entre genótipo e fenótipo,
na análise de possíveis cruzamentos e probabilidades esperadas, na resolução de
problemas e exercícios que levem o educando a um envolvimento mais profundo.
Podemos citar ainda as recentes discussões a respeito de temas contemporâneos que
envolvem aspectos médicos, econômicos, éticos e sociais, envolvendo julgamentos
de valores relacionados a maiores níveis cognitivos.
De acordo com os objetivos propostos para a formação do educando
que visam seu pleno desenvolvimento e a construção da cidadania, percebe-se que
os conteúdos genéticos colaboram com tais fins da Educação Básica e ainda
participam da constituição da vida pessoal de cada estudante.
Canal (2003) afirma que temas contemporâneos relacionados à
genética, como transgenia, clonagem e estudo de genomas envolvem complexas
discussões a respeito de determinados conceitos articulados a teorias gênicas e isso
exige dos educandos um maior envolvimento cognitivo e maior abstração.
O PCN+EM (Brasil, 2002) recomenda ainda que, ao estudar a
hereditariedade, os alunos devem ser levados a relacionar conceitos e processos
relativos às leis da herança mendeliana, noções de probabilidade, análise
combinatória, bioquímica, que são considerados conteúdos clássicos da genética,
com as tecnologias da clonagem, engenharia genética, entre outras manipulações do
DNA; auxiliando-os na interpretação dos princípios da engenharia genética e
tecnologias associadas e na identificação dos aspectos éticos, morais, econômicos e
políticos relacionados às essas tecnologias. A contextualização para o ensino de
genética é necessária uma vez que o conhecimento é integrado, inseparável e
complementar.
90
Os conhecimentos científicos, particularmente na área da genética,
têm sido gerados com uma rapidez que impõe aos educadores uma atualização de
conteúdos constante e, apesar dos vários caminhos apontados para a escolha de
temas e metodologias para o desenvolvimento e abordagem de conteúdos referentes
a essa área, pesquisas realizadas sobre o ensino de Biologia apontam que a Genética
está presente entre os conteúdos que os professores de Ensino Médio têm maior
dificuldade de ensinar (MAYER et al., 2000).
Smith (1992, apud Canal, 2003) caracteriza o ensino de genética
como uma das áreas mais difíceis de trabalhar na escola secundária e em cursos de
licenciatura devido a complexidade de seus conteúdos e às dificuldades que
caracterizam suas estratégias de ensino como, por exemplo, a resolução de
problemas.
Aliada às dificuldades apresentadas pelos professores de Biologia, os
materiais didáticos do Ensino Médio estão ultrapassados diante dos avanços
genéticos que produzem uma infinidade de novas informações a uma rapidez
assustadora.
Hickman (1981, apud Trivelato, 1988) revela a importância da
elaboração de materiais instrucionais especiais, que permitam uma melhor
compreensão do mecanismo e serviços genéticos ao público geral.
Segundo uma pesquisa realizada sobre a disponibilidade de materiais
instrucionais, os professores afirmaram que os temas de maior dificuldade de se
obter materiais são aqueles relacionados às novas abordagens em genética
(JUSTINA et al., 2000).
Em muitos livros didáticos, assuntos relacionados à engenharia
genética, por exemplo, aparecem apenas como uma leitura complementar,
91
fragmentada e descontextualizada do conteúdo básico de genética. Algumas
publicações mais recentes trazem capítulos dedicados exclusivamente para os
avanços recentes da Biologia Molecular e Engenharia Genética, mas isso não
garante que tais temas sejam abordados durante as aulas de genética.
Segundo Malaguth e colaboradores (1997)
15
, o ensino de genética,
orientado pelos atuais livros didáticos, está aquém das expectativas, experiências e
questionamentos dos alunos. De acordo com Fracalanza (1985)
16
, os tópicos
tradicionalmente desenvolvidos nos livros didáticos raramente ultrapassam os
limites estreitos dos conceitos básicos, não havendo a preocupação em apresentar a
discussão de temas polêmicos relacionados à realidade do país e ao cotidiano do
aluno.
Para Banet e Ayuso (1995), os livros texto podem causar ou reforçar
os erros dos alunos e destacam que os manuais de ensino secundário não relacionam
adequadamente genética e meiose, não estabelecem relações claras entre alguns
conceitos como alelo, gene, DNA, cromossomo, etc., não consideram a dificuldade
do emprego de alguns elementos matemáticos, como noções de probabilidade, e o
uso inadequado do quadro de Punnet e também não seguem uma seqüência
adequada para a apresentação dos conteúdos.
Castilho (1997), citado por Fávaro et al. (2003), destaca que
“análises realizadas apontam sérios problemas num número expressivo de livros
didáticos”. Dentre outros, podem ser citados: informações desatualizadas, erros
conceituais, recomendações de procedimentos incorretos e concepções inadequadas.
15
MALAGUTH, I. F.; JANNES, C. E.; PEREIRA, J. E. Ciência crítica e a genética dos livros didáticos.
Coletânea do VI Encontro “Perspectivas do Ensino de Biologia” e I Simpósio Latino Americano da IOESTE.
FEUSP, São Paulo. 1997. p. 102-105.
16
FRACALANZA, H. O conceito da ciência veiculado por atuais livros didáticos de Biologia. Campinas,
1985. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade estadual de Campinas.
92
Portanto, se os professores quiserem apresentar algo mais
aprofundado a seus alunos, m que recorrer a outras fontes bibliográficas, e mais,
precisam ser críticos com a escolha do material que irão utilizar, bem como
possuírem um bom conhecimento sobre o assunto, pois caso contrário, corre-se o
risco de estar reproduzindo conceitos errados que são divulgados pelos livros
didáticos. Cabe destacar que os alunos do Ensino Médio não recebem livros
didáticos da Secretaria de Estado da Educação, pois esse nível de ensino não está
incluído no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), em muitos casos os
alunos utilizam livros indicados pelos professores.
Segundo Gil-Pérez (1995), os trabalhos investigativos existentes
mostram a gravidade de uma carência de conhecimentos da matéria, transformando
o professor num transmissor mecânico dos conteúdos do livro didático.
Fávaro et al. (2003) constatam em sua pesquisa, que apesar da grande
utilização, os livros didáticos não são capazes de suprir as necessidades dos
professores para trabalharem os temas ligados a Engenharia Genética e Biologia
Molecular, pois a maioria dos professores questionados durante a pesquisa
considerou que o livro adotado não está adequado as suas necessidades. Krasilchik
(1987) revela que ao livro didático é atribuída grande parte das deficiências do
ensino de Ciências nas escolas de 1º e 2º Graus.
Tais deficiências precisam ser sanadas seja através da escolha de
melhores caminhos para promover um ensino de genética atual e contextualizado,
seja através da escolha de um livro didático melhor elaborado, na escolha de uma
metodologia diferenciada ou então na elaboração do planejamento escolar para o
ano letivo vigente. Segundo Krasilchik (1987. p. 53) O professor, os livros
didáticos e os programas oficiais, em geral, não procuram atender aos interesses e
93
capacidade dos estudantes, muitas vezes prejudicando irremediavelmente o seu
aprendizado”.
O ensino de genética não pode ser ensinado como uma coleção de
fatos, descrições, ou teorias que devem ser decoradas. É preciso promover espaços
para que os alunos discutam as causas dos fenômenos e as relações existentes entre
eles e entendam os mecanismos dos processos que estão estudando. É preciso
estabelecer um vínculo entre o que é ensinado nas aulas de Biologia e a realidade
dos alunos; Krasilchik (1987, p. 53) afirma que “O que se ensina a grande parte
dos alunos não tem sentido, por não ser compatível com o seu desenvolvimento
intelectual e emocional”.
Para se promover uma abordagem satisfatória de conteúdos
genéticos, é preciso ultrapassar os fatores limitantes da atividade pedagógica como a
abordagem fragmentada e descontextualizada dos tópicos, o livro didático como o
único recurso e fonte de informação e o estudo limitado à genética mendeliana em
detrimento da genética moderna. Neste contexto, é preciso que o professor estimule
o interesse dos alunos para a compreensão de um conceito ou dos procedimentos
envolvidos, deste modo, proporciona-se o confronto entre as concepções dos alunos
e os conceitos científicos envolvidos e abre-se espaços para a inserção das temáticas
atuais.
94
CAPÍTULO V
5. REFERENCIAIS TEÓRICOS
Neste capítulo apresentaremos algumas considerações a respeito da
formação e da prática docente, tendo em vista que a presente pesquisa pretende
contribuir para a reflexão sobre a formação de professores da escola básica e sobre a
atualização de materiais de apoio para o Ensino de Ciências e Biologia.
5.1 A formação docente
Segundo Carvalho e Gil-Pérez (1995), ensinar não é uma tarefa
simples e esta atividade exige formação inicial e permanente dos professores. Além
disso, uma sociedade em intenso ritmo de mudança impõe aos educadores de hoje a
necessidade de constante atualização profissional.
95
Sabe-se que todo professor aprende a ensinar, ensinando, e tende a
repetir, em sua prática, muito do que, como aluno, observou ser feito por seus
mestres (ALVES, 2001).
Segundo Guarnieri (2000)
17
:
[...] o aprendizado da profissão a partir de seu exercício possibilita
configurar como vai sendo constituído o processo de aprender a ensinar.
Tal construção ocorre à medida em que o professor vai efetivando a
articulação entre o conhecimento teórico-acadêmico e o contexto escolar
com a prática docente”.
Para Menezes (1996), o modelo usado nas universidades na formação
inicial do futuro professor está distante do método que se espera que este professor
implemente em sala de aula.
De acordo com Krasilchik (1987, p. 47):
Os cursos de licenciatura têm sido objeto de críticas em relação a sua
possibilidade de preparar docentes, tornando-os capazes de ministrar bons
cursos, de acordo com as concepções do que aspiram por uma formação
para o ensino de Ciências; possuem deficiências nas áreas metodológicas
que se ampliaram para o conhecimento das próprias disciplinas, levando à
insegurança em relação à classe, à baixa qualidade das aulas e a
dependência estreita dos livros didáticos.”
Esta autora revela ainda que: “Tem sido constante a referência à
precária formação dos professores como uma das causas da qualidade do
ensino das Ciências” (p. 56). Deste modo, entende-se que os cursos de
aperfeiçoamento são necessários tanto para suprir lacunas da formação dos docentes
como para mantê-los atualizados. “Devem também propiciar oportunidade para a
reflexão sobre o papel da disciplina e da escola no processo educacional”
(KRASILCHIK, 1987, p. 56).
17
GUARNIERI, M. R. (Org.) O início na carreira docente: pistas para o estudo do trabalho do professor. In:
Aprendendo a ensinar: o caminho nada suave da docência. Campinas: Autores Associados; Araraquara:
Programa de Pós-graduação em educação escolar da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, 2000, p. 5-23.
96
Serbino et al. (1998, p.57) relatam que:
“Os esforços para a melhoria da qualidade de ensino tem que se
concentrar no aperfeiçoamento do pessoal docente. A formação docente
deve ser continuada após os anos acadêmicos, para corrigir eventuais
falhas na formação regular e atualizar o professor com relação aos
avanços de novas tecnologias”.
Menezes (1996) afirma que nos processos de atualização de
professores se destacam as inovações que ocorrem no campo metodológico, didático
e, especialmente, no científico, visto que surgem constantemente novos
conhecimentos, ausentes na etapa de graduação; e propõe algumas considerações
que deveriam estruturar a atualização científica em Biologia:
a) desenvolvimento do paradigma evolutivo, base do pensamento
biológico moderno;
b) desenvolvimento da biologia celular e dos fundamentos da
biologia molecular, enquadrando-se a biologia moderna e enfocando o nível
molecular;
c) estudo de problemas ético-jurídicos desafiantes que resultam das
atividades dos geneticistas e das propostas teóricas dos sociobiólogos;
d) estudo das múltiplas interações, que a biologia é considerada
uma peça chave para o desenvolvimento econômico.
De acordo com Krasilchik (1987), a demanda por cursos para
professores em serviço é geral, e compete aos que pretendem auxiliar a implementar
inovações no ensino de Ciências propiciarem oportunidades de aperfeiçoamento aos
docentes interessados em mudar.
Carvalho e Gil-Pérez (1995) revelam que pesquisas sobre professores
de Ciências indicaram que a falta de conhecimentos científicos constitui a principal
dificuldade para que os professores afetados se envolvam em atividades inovadoras.
97
Segundo estes autores, conhecer o conteúdo a ser ministrado implica conhecimentos
profissionais muito diversos que vão além do que habitualmente se contempla nos
cursos universitários e inclui várias características ou procedimentos como:
conhecer os problemas que originaram a construção dos conhecimentos científicos;
conhecer a forma como os cientistas abordam os problemas; conhecer as interações
Ciência/Tecnologia/Sociedade; ter algum conhecimento dos desenvolvimentos
científicos recentes e suas perspectivas para poder transmitir uma visão dinâmica,
não fechada da ciência; saber relacionar conteúdos adequados que dêem uma visão
correta da Ciência e que sejam acessíveis aos alunos e suscetíveis de interesse; estar
preparado para aprofundar os conhecimentos e adquirir outros novos.
Alves (2001) julga indispensável que o professor se capacite durante
seu preparo para compreender o universo cultural de seu aluno, e juntos utilizem o
que conhecem para enfrentar e responder aos desafios impostos pelo mundo,
produzindo, deste modo, novos saberes. Para esta autora, é preciso que a formação
docente desenvolva a capacidade de utilizar procedimentos e criar alternativas que
possibilitem contribuir para o melhor rendimento do aluno.
Carvalho e Gil-Pérez (1995) esclarecem que não basta estruturar
cuidadosamente e fundamentadamente um currículo se o professor não receber um
preparo adequado para aplicá-lo. Este preparo, segundo esses autores, não consiste
em instruções fornecidas por manuais ou cursos ad hoc, antes disso é necessária
uma profunda revisão da formação inicial e permanente dos professores; e afirmam:
“(...) nós, professores de Ciências, não carecemos de uma formação
adequada, mas não somos sequer conscientes das nossas insuficiências.
Como conseqüência, concebe-se a formação do professor como uma
transmissão de conhecimentos e destrezas que, contudo, tem demonstrado
reiteradamente suas insuficiências na preparação dos alunos e dos próprios
professores” (p. 14).
98
Estes autores ressaltam também a importância de se proporcionar aos
professores a oportunidade de um trabalho coletivo de reflexão, debate e
aprofundamento, para que suas produções possam aproximar-se dos resultados da
comunidade científica, ou seja, convém orientar o trabalho de formação dos
professores como uma pesquisa dirigida, contribuindo assim, de forma funcional e
efetiva, para a transformação de suas concepções iniciais; pois os professores,
durante sua formação adquirem idéias de senso comum que serão multiplicadas
mais adiante durante o exercício de sua profissão. Neste sentido, é essencial
proporcionar aos docentes momentos de reflexão e análise crítica sobre sua própria
formação (CARVALHO e GIL-PÉRES, 1995).
Perrenoud et al. (2001) afirmam que é preciso que os educadores
desenvolvam a capacidade de auto-análise, auto-avaliação e auto-regulação e
repensem suas estratégias.
Para Serbino et al. (1998, p.133) “A educação de professores deveria
assumir a responsabilidade da formação e preparação do profissional para a
reflexão e a crítica de sua própria prática, estudando e analisando as situações de
ensino vivenciadas”; uma vez que o professor necessita ser preparado para novos
papéis e responsabilidades profissionais, e seja consciente das demandas das
sociedades de hoje e do terceiro milênio.
Neste sentido, de acordo com Menezes (1996, p. 56):
[...] em nenhuma outra época do passado recente, foi tão deficiente a
formação inicial média de nossos professores de Ciências nem tão grande
o número de professores ensinando Ciências no ensino médio sem
qualquer qualificação. Até por isso, uma formação continuada,
complementar e até mesmo supletiva desses professores é absolutamente
urgente, lado a lado com a recomposição dos cursos de formação inicial
[...] não melhoria concebível da Educação, sem correspondente
requalificação de seus professores.
99
Complementando este pensamento Carvalho e Gil-Pérez (1995, p.
78) afirmam que, associada às carências da formação inicial, surge a necessidade de
formação permanente que pode ser justificada por muitos fatores, entre eles:
as exigências de formação são tão grandes que tentar encobri-las
no período inicial conduziria ou a uma duração absurda, ou a um tratamento
absolutamente superficial;
muitos dos problemas que devem ser tratados não adquirem
sentido até que o professor se depare com eles em sua própria prática;
uma formação docente realmente efetiva, supõe a participação
continuada em equipes de trabalho em tarefas de pesquisa/ação, que não podem ser
realizadas com profundidade durante a formação inicial.
Estes autores diferenciam a formação inicial como sendo
exclusivamente universitária e a formação permanente como sendo aberta a todas as
iniciativas que favoreçam a (auto)formação dos professores na ativa; e que as
Universidades, através de seus Institutos de Educação ou Departamentos podem e
devem participar deste esforço.
Para Menezes (1996), a formação permanente deve ser um direito do
professor e uma exigência profissional.
Entende-se, deste modo, que as necessidades formativas surgem a
partir das exigências de capacitação, advindas do tipo da relação entre a prática
cotidiana do docente e a introdução de modificações nesta prática. Como as
situações que os professores se deparam são específicas, esta formação não será
capaz de fornecer “receitas”, mais que isso, é preciso que a formação continuada
facilite a reconstrução dos problemas vivenciados, tendo em vista atividades que
favoreçam aos docentes exercerem com êxito sua tarefa profissional.
100
Alves (2001) alerta para a perigosa tendência de substituir a
formação pré-serviço para a formação em serviço, pois, segundo a autora, isso leva
para um empobrecimento da formação do profissional da educação, o qual se
limitado a cursos de curta duração para sua preparação ou a uma imersão acrítica na
realidade da escola, durante sua preparação profissional. Além disso, a autora julga
que tais propostas não são acompanhadas de decisões para dar mais tempo para o
professor refletir sobre sua prática no interior da escola. Segundo ela, isto se
constitui em um neotecnicismo, uma retomada do tecnicismo dos anos 70, que
realizava uma análise da educação desgarrada de seus determinantes históricos e
sociais.
Segundo Carvalho e Gil-Pérez (1995), a formação permanente
costuma reduzir-se a uma oferta de cursos para a adaptação a mudanças curriculares,
ou para a reciclagem em algum aspecto específico e, muitas vezes, não satisfaz as
necessidades formativas do professor. Para estes autores, a formação de professores
deveria ser concebida como um trabalho de pesquisa e inovação, destinada ao
aprofundamento de todos os aspectos (didáticos, científicos e psico-sócio-
pedagógicos) em estreita relação com o trabalho de sala de aula e seus problemas.
De acordo com Menezes (1996) a formação permanente ainda é
escassa, desenvolvida apenas em ações pontuais e isoladas, sem a existência de
planos ou programas sistemáticos. Além disso, as instituições encarregadas da
formação inicial estão desvinculadas daquelas encarregadas pela formação
permanente, o que acarreta ações descoordenadas. Para este autor, a formação de um
professor é um processo a longo prazo que não se finaliza com a obtenção do título
de licenciado, mesmo que a formação recebida tenha sido da melhor qualidade; isso
ocorre porque a formação docente é um processo complexo para o qual são
101
necessários muitos conhecimentos e habilidades, impossíveis de ser todos
adquiridos no curto espaço de tempo que dura a formação inicial; e, ainda mais,
durante o trabalho em sala de aula, surgem, constantemente, novos problemas que o
professor precisa enfrentar. Deste modo, é necessário que os docentes disponham de
possibilidades de formação e atualização permanente, diversificada e de qualidade.
Menezes (1996) propõe que a formação continuada dos professores
de Ciências investigue coletivamente os problemas de ensino-aprendizagem de
Ciências encontradas durante o exercício da profissão.
Porém, muitos cursos de formação permanente trazem discursos
acadêmicos que pouca relação possuem com o cotidiano da Escola básica, então,
para que os programas de formação permanente sejam eficazes, precisam incorporar
iniciativas de cooperação educacional, que aprendam com as experiências vividas
pelos professores e que integre não apenas as dimensões do saber científico, técnico
e pedagógico, mas que considere também o desenvolvimento de competências
pessoais e sociais.
Para Menezes (1996), o modelo de formação continuada deve
sustentar-se nas necessidades do docente em sala de aula, e em seu desenvolvimento
pessoal, pois o professor de Ciências deve ser um investigador permanente e
atualizado em relação às teorias científicas.
Perrenoud (2000, p. 14) salienta as novas competências profissionais
para ensinar, ressaltando que, atualmente, deve-se valorizar a prática reflexiva, o
trabalho em equipe, a autonomia e as pedagogias diferenciadas, destacando 10
competências prioritárias coerentes com o novo papel dos professores:
1. Organizar e dirigir situações de aprendizagem.
2. Administrar a progressão das aprendizagens.
3. Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação.
4. Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho.
102
5. Trabalhar em equipe.
6. Participar da administração da escola.
7. Informar e envolver os pais.
8. Utilizar novas tecnologias.
9. Enfrentar os deveres e dilemas éticos da profissão.
10. Administrar sua formação contínua.
Segundo Demo (1999), a educação atual impõe desafios e a didática
de aprender a aprender é hoje a competência própria do educador moderno, e se
espera que ele consiga motivar o aluno para o mesmo desafio. O aluno precisa ser
levado a aprender a aprender e não a decorar, memorizar, copiar e fazer provas.
A formação do professor, quando adequada, garante que ele tenha
subsídios para implementar práticas pedagógicas diversificadas, visando uma
melhoria da qualidade de ensino e, conseqüentemente, a promoção da aprendizagem
significativa dos estudantes.
Para Alves (2001), a construção de uma escola de qualidade,
centrada nos interesses e necessidades dos alunos, evidência do compromisso com
um projeto educacional a ser desenvolvido com esses alunos, envolve a luta pela
revitalização dos cursos de formação de professores.
Linhares e Leal (2002) afirmam que, pensar hoje em cursos de
formação e atualização para educadores reflexivos, é considerar o imbricamento da
teoria e da prática como o mecanismo para uma educação emancipatória e
transformadora. Nesta perspectiva, os cursos de formação de professores precisam
estar voltados para a construção de profissionais que, enquanto seres pensantes,
busquem, cada vez mais, mecanismos capazes de transcender a visão de mundo
centrada na racionalidade instrumental. Deste modo, os currículos precisam se
basear na construção de conhecimentos que possibilitem a emancipação dos sujeitos
envolvidos no processo de ensino.
103
Segundo as autoras acima citadas, é preciso pensar a formação
permanente de educadores vinculada à construção do conhecimento para além das
oficinas tarefeiras, pois, atualmente, faz-se necessário que o professor considere não
apenas as idéias que os alunos trazem para a escola, mas que conheça também as
condições de vida deste aluno, proponha estratégias de ensino que estimulem a
discussão das causas mais profundas dos problemas de seu cotidiano, que a
aprendizagem ocorre nas relações de troca entre professores e alunos, nos encontros
e desencontros. Isso nos leva a pensar na formação de professores, tendo em vista
uma perspectiva crítica, evitando que as escolas sejam instrumentos de reprodução
social. Deste modo:
“Os programas de formação de professores devem estar comprometidos
com a transformação da realidade para o benefício de todos, utilizando
conhecimento e crítica como bases fundamentais para a realização de uma
democracia plena, percebe-se, portanto, a necessidade de uma formação
de professores integrando aspectos pessoais, organizacionais, coletivos e
pedagógicos, uma formação voltada pela reflexão sobre o vivido, pela
interpretação teórica da prática, pela partilha coletiva, pelo rompimento
com os esquemas curriculares tradicionais, valorizando a
transdisciplinaridade, conhecendo e discutindo experiências curriculares
inovadoras para a formação de professores”.
5.2 A prática docente
Diante dos objetivos elaborados para a presente pesquisa, torna-se
importante apresentarmos alguns referenciais que analisam a prática pedagógica e
nortearam nossos trabalhos.
A educação é um tipo de atividade que se caracteriza
fundamentalmente por uma preocupação, por uma finalidade a ser atingida. Ela,
dentro de uma sociedade, não se manifesta como um fim em si mesma e sim como
104
um instrumento de transformação social, necessitando de pressupostos e conceitos
que fundamentem e orientem seus caminhos.
A atuação da escola consiste na preparação intelectual e moral dos
alunos; seu compromisso é com a cultura e com o enfrentamento de problemas
sociais.
Ensinar envolve também estimular o desejo de saber; e educar não é
apenas ensinar, mas criar situações de aprendizagem nas quais todos os aprendizes
possam despertar, mediante sua própria experiência do conhecimento, para sua
dignidade, e tornar-se sujeitos do seu futuro.
Para Assmann (1998), a educação só consegue bons resultados
quando se preocupa em gerar experiências de aprendizagem, criatividade para
construir conhecimentos e habilidade para saber acessar fontes de informação sobre
os mais variados assuntos.
Segundo Piaget (1978), o ensino deve centrar-se no desenvolvimento
de capacidades formais e não na transmissão de conteúdos, deve considerar o
“aprender a aprender” e o “aprender a pensar”.
Na intenção de promover a aquisição de determinados conteúdos e
atingir determinados objetivos, é necessário que o professor reflita sobre os métodos
de ensino que são empregados como a valorização do trabalho dos alunos, as suas
interações com os conteúdos propostos e o reconhecimento de pré-concepções dos
educandos.
Gimeno Sacristán e Perez Gómez (1998) citam que é necessário criar
um espaço de conhecimento compartilhado, para que as novas posições da cultura
acadêmica sejam reinterpretadas e incorporadas aos esquemas de pensamento
experiencial e prévios do próprio aluno.
105
Nesse sentido, Piaget (1978) afirma que a aprendizagem escolar não
é uma recepção passiva de conhecimentos, mas um processo ativo de elaboração. O
ensino deve favorecer as múltiplas interações entre o aluno e os conteúdos, já que, o
aluno constrói seus próprios conhecimentos através da ação. Sendo assim, os
processos educacionais precisam respeitar e favorecer ao máximo a atividade do
aluno.
Driver (1989) afirma que a literatura elaborada nas últimas décadas
indica que as crianças vêm para as aulas com concepções prévias que podem diferir
substancialmente das idéias a serem ensinadas e que tais concepções influenciam na
aprendizagem futura e podem resistir a mudanças.
Perrenoud (2000) complementa dizendo que a escola não constrói a
partir do zero, nem o aprendiz é uma tábula rasa, uma mente vazia; ele sabe, ao
contrário, “muitas coisas”, isto é, ele questionou e assimilou ou elaborou respostas
que o satisfazem provisoriamente. Assim, o ensino pode chocar-se de frente com as
concepções dos aprendizes; tais concepções fazem parte de um sistema de
representações que tem sua coerência e suas funções de explicação do mundo e que
se reconstitui sub-repticiamente, a despeito das demonstrações “irrefutáveis” e dos
desmentidos formais feitos pelo professor.
Ainda segundo Perrenoud (2000), trabalhar a partir das
representações dos alunos não consiste em fazê-las expressarem-se, para em seguida
desvalorizá-las. O importante é dar-lhes regularmente direitos na aula, interessar-se
por elas, tentar compreender sua raízes e sua forma de coerência, não se surpreender
se elas surgirem novamente, quando as julgávamos ultrapassadas. Para isso, deve-se
abrir espaços para discussão, evitar descartar imediatamente as analogias falaciosas,
as explicações animistas ou antropomórficas e os raciocínios espontâneos, sob
106
pretexto de que levam a conclusões errôneas. Trabalhando dessa maneira,
dialogando com eles, avalia suas concepções para aproximá-las dos conhecimentos
científicos a serem ensinados. É importante fundamentar-se nas representações
prévias dos alunos, mas não se fechar nelas, e sim encontrar um ponto de entrada em
seu sistema cognitivo, uma maneira de desestabilizá-los o suficiente para levá-los a
restabelecerem o equilíbrio incorporando novos elementos às representações
existentes, reorganizando-as se necessário.
Zabala (1998) considera que as opiniões dos alunos são a matéria-
prima para a construção do discurso do professor. Os momentos de diálogo também
podem auxiliar a avaliação que o professor faz de cada aluno.
Seguindo este pensamento, Luckesi (1994) esclarece que ensinar não
é simplesmente ir para uma sala de aula onde se faz presente uma turma de alunos e
“despejar” uma quantidade de conteúdos. É sim uma forma técnica de possibilitar
aos alunos a apropriação da cultura elaborada da melhor e mais eficaz forma
possível - sendo necessário deter recursos técnicos e habilidades de comunicação
que facilitem a apropriação do que se comunica. É preciso desejar ensinar, querer
ensinar, ter paixão nessa atividade, o que, para Villani (2001), lugar à “arte de
ensinar”.
Para Fosnot (1998), é preciso “vender” aos alunos um corpo de
conhecimentos, mas se sua apresentação não for boa, eles não irão comprar.
Portanto, educadores poderão utilizar estratégias e recursos para motivar e
surpreender os educandos. Para isso, precisam dispor de diversos instrumentos para
que as aulas sejam mais interessantes e menos monótonas; participar das discussões
ouvindo o ponto de vista de cada aluno e não somente expondo o seu como verdade
absoluta.
107
Segundo Perrenoud et al. (2001), as competências do professor estão
diretamente ligadas as suas capacidades de racionalizar sua própria prática, de
criticá-la e de revisá-la; competências essas construídas a partir do confronto com
situações complexas reais, nas quais as práticas são desconstruídas e reconstruídas.
Complementando, Moraes (2003) afirma que o professor constrói sua prática, com
base em um conjunto de experiências e conhecimentos que adquire ao longo de seu
trabalho docente.
De acordo com Zabala (1998), no processo de ensino-aprendizagem
é muito importante a maneira como o professor organiza sua seqüência didática, os
recursos e estratégias que utiliza, a distribuição no tempo e no espaço, o respeito aos
ritmos de aprendizagem de cada aluno e o critério de avaliação, tudo em torno de
determinadas intenções educacionais, mais ou menos explícitas.
A maneira como as tarefas são elaboradas pode funcionar como uma
janela na evolução e aparecimento dos construtos cognitivos, podendo oportunizar a
evolução das idéias dos alunos e permitir ao educador ter acesso a essa evolução.
Enfatizar uma atividade, uma estratégia que favoreça ao estudante
construir as noções necessárias para a compreensão da ciência precisa ser quesito
básico nos procedimentos dos professores em sala de aula.
Krasilchik afirma que (1987, p. 54):
“Uma das características do mau ensino das Ciências é fazê-lo de forma
expositiva, autoritária, livresca, mantendo os estudantes inativos tanto
intelectual como fisicamente. Mesmo quando lidam com materiais,
espécimes, instrumentos, eles podem se manter passivos do ponto de vista
mental. Isto porque o aprendizado das Ciências inclui não a habilidade
de observação e manipulação, mas também especulação e formação de
idéias próprias. Para tanto é essencial intensa e profunda integração de
cada um dos alunos no processo de estudo”.
108
Zabala (1998) considera que tudo o que o professor faz em sala de
aula incide na formação de seus alunos. A maneira como uma aula é organizada, os
incentivos, as expectativas depositadas, os materiais utilizados veiculam
determinadas experiências educativas. O autor ainda cita que educar é formar
globalmente e que a prática docente deve ser sempre vista como uma ação reflexiva.
Descreve, ainda, que não basta que os alunos simplesmente aprendam conteúdos,
mas que tenham subsídios para compará-los com o que é novo, identificando
semelhanças e diferenças e que os integre em seus esquemas para utilizá-los e,
quando isso acontece é possível considerar que se está produzindo uma
aprendizagem significativa.
Na visão de Libâneo (1994), o trabalho docente é um dos meios pelo
qual os indivíduos são preparados para a vida social, sendo a prática educativa não
apenas uma exigência da vida em sociedade, mas também o processo de prover os
indivíduos dos conhecimentos e experiências culturais, que os tornam aptos a atuar
no meio social e a transformá-lo em função de necessidades econômicas, sociais e
políticas da coletividade.
Nesse sentido, cabe ao professor conceber estratégias de trabalho
com seus educandos de modo a promover o questionamento, o debate, a
investigação visando o entendimento da Ciência como uma construção histórica e
como um saber prático, superando as limitações de um ensino passivo.
Moraes (2003) considera que o professor precisa desempenhar o
papel de mediador, elaborando um conjunto de atividades que possibilitem aos
alunos avançarem do conhecimento que já dominam em direção a novos
conhecimentos, transformando os conteúdos a serem trabalhados em problemas
significativos e de interesse dos alunos.
109
Complementando este pensamento, Menezes (1996, p.154) afirma
que é preciso que o professor saiba preparar atividades cuja realização permita aos
estudantes construir conhecimentos e isto supõe que os professores saibam:
a) propor situações problema que levando em conta as idéias, visão de
mundo, destrezas e atitudes dos alunos e alunas gerem interesse e
proporcionem uma concepção preliminar da tarefa; b) orientar o estudo
qualitativo das situações problemáticas propostas e a tomada de decisões
para indicar problemas precisos (espaço para os estudantes comecem a
explicitar funcionalmente suas concepções); c) orientar o tratamento
específico dos problemas propostos; d) promover repetidamente o
manuseio dos novos conhecimentos, em situações variadas, para
possibilitar seu aprofundamento e confiabilidade.
Para Zabala (1998), as atividades propostas devem partir de situações
significativas e funcionais para que o conteúdo possa ser aprendido junto com a
capacidade de poder utilizá-lo quando seja conveniente. Por isso, é imprescindível
que este conteúdo tenha sentido para o aluno: ele deve saber para que serve e que
função tem. Caso se desconheça sua função, ter-se-á aprendido o conteúdo, mas não
será possível utilizá-lo quando se apresente a ocasião.
Para Carvalho e Gil-Pérez (1995), falar de reconstrução de
conhecimentos científicos ou de pesquisa, supõe considerar a aprendizagem como
tratamento de situações problemáticas de interesse para os alunos e citam que para
Bachelard (1938) “todo conhecimento é resposta a uma questão”; não se pode
conceber uma pesquisa que não esteja ligada a problemas que interessem ou
preocupem.
Zabala (1998) afirma que é possível partir da realidade e aproveitar
os conflitos que nela se apresentam para trabalhar muitos conteúdos. Sendo assim, é
preciso aproveitar as experiências vividas pelos alunos, os conflitos ou pontos de
vista contrários que apareçam em suas vivências ou na dinâmica da aula, a fim de
110
promover o debate e a reflexão sobre os valores que decorrem das diferentes
atuações ou pontos de vista; é preciso propor situações que ponham em conflito os
conhecimentos, as crenças e os sentimentos de forma adaptada ao nível de
desenvolvimento dos alunos. Ele considera que a chave do todo ensino está nas
relações que se estabelecem entre os professores, os alunos, e os conteúdos de
aprendizagem. Neste contexto, segundo este autor, as atividades são o meio para
mobilizar a trama de comunicações que pode se estabelecer em classe. As relações
que ali se estabelecem definem os diferentes papéis dos professores e dos alunos.
Alves (2001) considera que o professor precisa contemplar a prática
vivida pelos alunos como ponto inicial do planejamento e da implementação do
currículo e do ensino. Para esta autora, esse princípio está muito presente no
currículo acadêmico, porém é aplicado insatisfatoriamente na sala de aula que
alguns professores ignoram essa prática, outros não a entendem bem e ainda existem
aqueles que não conseguem colocá-la em ação.
Conforme Zabala (1998), para poder estabelecer os vínculos entre os
novos conteúdos e os conhecimentos prévios trazidos pelos alunos, em primeiro
lugar é preciso determinar que interesses, motivação, comportamento, habilidades,
etc., os alunos possuem, e utilizar estes dados como ponto de partida no
planejamento de uma atividade para motivar o interesse deles; fazer com que os
objetivos de saber, realizar, informar-se, aprofundar sejam conseqüências dos
interesses detectados; que os educandos possam saber sempre o que se pretende nas
atividades que realizam e, que sintam que o que fazem satisfaz alguma necessidade.
Para isso, é preciso que os alunos tenham a oportunidade de expressar suas idéias,
portanto, é preciso gerar um ambiente em que seja possível que os alunos se abram,
111
façam perguntas e comentem o processo que seguem, através de situação de diálogo
e participação, como meio para exploração dos conhecimentos prévios.
Neste contexto, a escolha dos conteúdos, correspondente aos
objetivos que o professor pretende alcançar com a educação obrigatória, precisa
considerar o protagonismo que se atribui ao aluno como sujeito ativo na construção
do conhecimento. Sendo assim, os conteúdos precisam ser organizados visando
assegurar ao máximo que as aprendizagens sejam as mais significativas possíveis,
para que o que os alunos aprendam lhes ajude a se formar como cidadãos
competentes, aptos a compreender a sociedade em que vivem e participar nela
construtivamente (ZABALA, 1998).
Conteúdos significativos, se abordados numa perspectiva
transformadora, propiciam aos alunos a oportunidade de ampliarem a leitura da
realidade, e essa conscientização poderá levar a ações que promovam
transformações sociais.
Percebe-se, portanto, a necessidade de tomarmos a experiência de
vida e a cultura de origem do aluno como pontos de partida, tanto para a escolha de
conteúdos, quanto para o desenvolvimento de uma prática pedagógica voltada para
os interesses do próprio alunado. É preciso que o professor incentive o educando
criando condições que favoreçam seu desempenho, sua aprendizagem, valorizando a
cultura do aluno e também lhe apresentando a cultura erudita.
De acordo com Libâneo (1999, p. 43):
O professor precisa juntar a cultura geral, a especialização disciplinar e a
busca de conhecimentos conexos com sua matéria, porque formar o
cidadão hoje é, também ajudá-lo a se capacitar para lidar praticamente
com noções e problemas surgidos nas mais variadas situações, tanto do
trabalho quanto sociais, culturais, éticas. Freqüentemente os professores
estarão trabalhando com situações-problema, temáticas integradoras, que
requerem uma alfabetização científica e tecnológica, pela qual se
112
incorpora aos saberes do cotidiano uma perspectiva mais estruturada, mais
elaborada, para superar o sendo comum.
Não somente a escolha de conteúdos e práticas são suficientes para a
implantação de um currículo de ensino. A aquisição de determinados conteúdos
requer o uso de materiais didáticos adequados e conforme Zabala (1998) é preciso
se utilizar materiais curriculares diversificados que, como peças de uma construção,
permitam que cada professor elabore seu projeto de intervenção específico,
adaptado às necessidades de sua realidade educativa e estilo profissional. Quanto
mais variados sejam os materiais, mais fácil será a elaboração de propostas
singulares. Este autor destaca que de nenhum modo os materiais curriculares podem
substituir a atividade construtiva do professor, nem a dos alunos, na aquisição das
aprendizagens, mas é um recurso importantíssimo que, bem utilizado, não apenas
potencializa este processo, como oferece idéias, propostas e sugestões que
enriquecem o trabalho profissional. Os docentes precisam analisar, selecionar e
avaliar esses materiais antes de utilizá-los arbitrariamente.
Segundo Schön (2000), o professor é também um prático reflexivo e
busca rever constantemente suas ações e compreender seu sentido. De acordo com
Mion e Saito (2001), ao refletir sobre seu trabalho, o professor encontra elementos
para melhorá-lo e transformá-lo.
Deste modo, é de extrema importância que os professores discutam e
reflitam sobre o currículo escolar, se estão de acordo com seus objetivos e com a
aprendizagem que pretendem desenvolver. Para isso, é preciso que o professor seja
um profissional informado, reflexivo, aberto a mudanças e se disponha a inovar o
ensino, favorecendo a implantação de um sistema educacional que proporcione uma
113
formação científica sólida, democrática e atual e transmita aos educandos, de forma
crítica e ética, as mais recentes conquistas da ciência.
É preciso também, que o professor reflita, não somente sobre sua
prática pedagógica, ou sobre os materiais que utiliza, como também, sobre sua
forma de avaliar. De acordo com Menezes (1996) é preciso refletir sobre as
transformações no processo de avaliação, questionando sua redução a uma mera
pontuação dos estudantes e convertê-la num instrumento de aprendizagem, como
também superar a habitual memorização repetitiva de conteúdos e ampliar a prática
da avaliação ao conjunto de saberes, habilidades, atitudes e valores que se pretende
contemplar durante a aprendizagem de Ciências, convertendo-a em um instrumento
de melhoria do ensino.
Sendo assim, é necessário considerar a avaliação como um processo
constante de acompanhamento da aprendizagem do aluno, sendo um instrumento de
formação que leve em conta, além dos conceitos, as capacidades, atitudes e valores.
Carvalho e Gil-Pérez (1995) ressaltam a importância de se romper
com a concepção de avaliação como simples julgamento dos alunos, e fazê-los
sentir que, realmente, se trata do acompanhamento de uma tarefa coletiva que
incidirá positivamente na mesma. O objetivo da avaliação não é apenas avaliar e
classificar o aluno, e sim orientar a prática pedagógica e os conhecimentos
discutidos em sala de aula.
Para Perrenoud (2000), é preciso que o professor observe e avalie os
alunos, em situações de aprendizagem de acordo com uma abordagem formativa:
realizando avaliações periódicas das aquisições dos alunos, observações contínuas,
considerando tudo que possa auxiliar a aprendizagem de seus alunos. Para este
114
autor, não se pode separar a avaliação do ensino e para que os professores saibam
ensinar melhor, eles precisam saber avaliar.
Além disso, é necessário, também, que o professor saiba analisar
criticamente o ensino habitual e reconheça as limitações dos currículos propostos e,
ao mesmo tempo reducionistas que deixam de lado aspectos históricos, sociais, entre
outros. É preciso que o professor reconheça que a construção de conhecimentos
precisa de tempo (CARVALHO e GIL-PÉREZ, 1995).
Entende-se, deste modo, que o trabalho docente não consiste apenas
em ministrar aulas (CARVALHO e GIL-PÉREZ, 1995), antes disso é importante
uma séria preparação das aulas a serem dadas, que precisam estar associadas a
tarefas de inovação e pesquisa. Deste modo, o ensino poderá ser efetivo, adquirindo
o interesse de uma tarefa criativa. Para isso, é preciso, antes de tudo, que o professor
tenha um conhecimento adequado do conteúdo que deseja ensinar. Sem isso,
segundo Menezes (1996), os professores tornam-se inseguros, completamente
dependentes do livro didático e pouco predispostos a desenvolver experiências
inovadoras em sala de aula.
Para Serbino et al. (1998, p.116) “O professor precisa sentir
segurança para aplicar uma proposta didática e ela decorre do conhecimento
proveniente de leituras ou o fato de dispor de um colega como fiador da prática
proposta”. A docência repetitiva de saberes fechados não estimula a pesquisa, nem a
leitura e o embate, e torna-se um dos processos mais desqualificados reduzindo o
professor a um mero aulista de saberes.
A escola funciona na sociedade de hoje com efeito na sociedade do
futuro; é inadmissível que o professor continue ministrando uma ciência acabada,
morta e desatualizada. Será cada vez mais difícil motivar alunos a estudar uma
115
ciência do passado, cristalizada. Um programa dinâmico, de ciências de hoje, que
está sendo feita hoje, e que vai se manifestar na sociedade do amanhã é o que os
alunos esperam.
É muito comum observarmos discursos de professores que valorizam
as questões aqui levantadas: valorizar os conhecimentos prévios dos alunos,
contextualizar o ensino, promover práticas diferenciadas que motivem e despertem o
desejo de aprender nos alunos, entre outras. Porém, é notório o descompasso entre
teoria e prática. Antes de tudo, é preciso eliminar a distância entre o que “pensam” e
o que os professores realmente “fazem” para, então, promover práticas pedagógicas
voltadas para um ensino efetivo.
Para isso, é importante, conforme afirmamos anteriormente, que o
professor esteja atento e reflita sobre sua prática educativa, sobre as experiências
didáticas, sobre os conteúdos utilizados, sua forma de avaliar, o grau de participação
dos alunos e utilize esses dados para melhorar e oferecer um ensino de qualidade
(ZABALA, 1998).
Segundo Maurice Debesse, (apud Hannoun, 1998) “a verdadeira
educação é aquela em que o educador ajuda o educando a criar-se”; Reboul (1989,
apud Hannoun, 1998) complementa afirmando que “educar não é fabricar adultos
de acordo com um modelo, mas libertar cada homem daquilo que o impede de ser
ele mesmo, permitir-lhe realizar-se segundo seu gênio singular”; pois ensinar “não
é fazer saber, é fazer aprender”.
Vasconcellos (2002) afirma que o professor precisa provocar,
desafiar, contagiar, despertar o desejo e o interesse no educando, a fim de que possa
se dar a interação educativa e a construção do conhecimento, bem como a
116
instrumentalização, de forma que o educando possa continuar aprendendo,
autonomamente.
Zabala (1998) afirma que educar significa formar cidadãos e cidadãs,
que não estão parcelados em compartimentos estanques com capacidades isoladas.
Os conteúdos de aprendizagem não se reduzem unicamente às contribuições das
disciplinas ou matérias tradicionais. Portanto, também serão conteúdos de
aprendizagem todos aqueles que possibilitem o desenvolvimento das capacidades
afetivas, de relação interpessoal e de inserção social.
117
CAPÍTULO VI
Pretende-se apresentar, no decorrer desse capítulo, uma análise dos
dados coletados, realizando algumas inferências referentes a abordagens de
determinados conteúdos, às informações transmitidas e à metodologia utilizada pela
professora.
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Conforme especificado anteriormente, as aulas de Biologia, para a
turma escolhida, referentes aos conteúdos de genética, foram observadas de maneira
sistemática durante três bimestres consecutivos (de maio a dezembro de 2004),
totalizando 50 aulas (numeradas de 1 a 50) de 50 minutos cada aula.
Acreditamos que não se pode reduzir o ato de ensino do professor
somente aos aspectos observáveis na sala de aula, pois existem outros aspectos que
118
têm lugar importante no processo ensino-aprendizagem como: conversas com os
alunos fora da sala de aula, preparo das aulas, convivência com os colegas, entre
outros.
Ao iniciarmos as observações, a professora mostrou-se disposta a
oferecer todo o material que utilizaria em suas aulas,(anexo 5), como textos
xerocados de livros didáticos, avaliações, trabalhos dos alunos, entre outros. Como,
inicialmente, não era possível saber qual material seria significativo, a fase inicial da
pesquisa foi mais aberta, para que pudéssemos adquirir uma idéia mais ampla da
situação, dos sujeitos, do contexto e das principais questões de estudo. O foco das
observações centralizou-se sobre o conteúdo trabalhado, à metodologia utilizada
pela professora e às relações interpessoais ocorridas durante as aulas. Após realizar
toda observação, alguns materiais foram selecionados e analisados minuciosamente.
São eles: o questionário de pré e pós-testes (anexo 1), quatro aulas nas quais a
professora abordou os avanços científicos recentes (aulas de número 28, 29, 30 e
31), um trabalho dos alunos solicitado pela professora com o tema: Transgênicos
(anexo 2) e uma entrevista semi-estruturada realizada com a professora (anexo 3).
Antes de iniciar a pesquisa, a professora relatou que a turma
observada era muito numerosa, heterogênea, e composta por alunos de diferentes
níveis, inclusive por alunos advindos de classes de aceleração
18
, e que muito deles
não se interessavam pelas aulas e eram indisciplinados.
A primeira observação da classe ocorreu no início do estudo sobre
genética. Após realizarmos uma rápida apresentação e explicação a respeito da
pesquisa que seria desenvolvida sobre o ensino de genética solicitamos a
participação dos alunos, a colaboração e a permissão para que as aulas de Biologia
18
Projeto implantado a partir do Parecer CEE n
o
170/96 com o objetivo de recuperar a defasagem de aprendizagem
entre os alunos.
119
pudessem ser acompanhadas. Em seguida houve a aplicação do questionário pré-
teste.
6. 1 O questionário de pré e pós-teste
Antes que a professora iniciasse o estudo do conteúdo de genética,
foi entregue um questionário aos alunos presentes. Este questionário consistia de 11
questões dissertativas relacionadas a conceitos de genética básica e conhecimentos
sobre as recentes pesquisas na área da genética molecular (anexo 1), pois, de acordo
com Justina (2001), o entendimento das novas tecnologias da área de genética está
diretamente relacionado ao domínio do conhecimento de conceitos básicos como:
gene, cromossomos, divisão celular, expressão gênica, ácidos nucleicos.
A aplicação do questionário de pré-teste teve por objetivo fazer um
levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos sobre genética básica e
assuntos relacionados à engenharia genética e genética contemporânea. Esse
questionário foi novamente aplicado ao término do estudo do conteúdo de genética
(questionário pós-teste) no intuito de verificar a influência do ensino nos
conhecimentos prévios dos alunos. Porém considerou-se conveniente desconsiderar
esses dados em favor dos demais coletados durante a pesquisa.
Durante a aplicação do pré-teste, a professora auxiliou em diversos
momentos esclarecendo as dúvidas de entendimento em relação às questões, sem, no
entanto, respondê-las, e pediu a atenção dos alunos, para que eles respondessem
individualmente e da melhor forma possível. Esta atividade durou 1 aula, ou seja, 50
minutos.
120
Cabe ressaltar, porém, que a breve análise desse questionário nos
revelou que a maioria dos alunos traz para a escola pré-concepções sobre
determinados assuntos, e isso não pode ser ignorado pelo professor, pelo contrário,
poderia ser utilizado como ponto de partida para a abordagem dos conceitos de
genética básica e dos conhecimentos sobre os avanços científicos recentes,
fornecendo aos alunos as visões da ciência sobre determinados assuntos e os
conhecimentos científicos aceitos na atualidade.
Notou-se também que os alunos se interessam pelas temáticas
contemporâneas, como a clonagem, organismos transgênicos e projeto genoma, pois
demonstraram, em suas respostas, curiosidade em aprender sobre esses assuntos.
Evidenciou-se também que, apesar da grande maioria relatar que leu sobre o
assunto, ao serem questionados a respeito de possíveis prejuízos ou benefícios das
pesquisas em genética molecular, os estudantes não souberam opinar a respeito do
assunto, talvez devido a falta de conhecimentos precisos sobre essas temáticas,
indicando a superficialidade das reportagens, a respeito desses temas, trazidas pelos
meios de comunicação. Portanto, a leitura de reportagens que abordam tais temas
não é suficiente para fornecer informações relevantes que auxiliem um indivíduo em
tomadas de posição frente às polêmicas relacionadas às pesquisas recentes sobre
genética molecular. Neste sentido, justifica-se a importância da presente pesquisa
para identificação da abordagem efetiva dessas temáticas e as possíveis influências
em processos de tomadas de decisão.
121
6.2 Descrição e análise das observações
De acordo com Bogdan e Biklen (1994), após cada observação, ou
sessão de investigação, é preciso que o investigador registre todos os dados
coletados, pois esses descrevem as pessoas, as conversas e as atividades, e a partir
desses registros o pesquisador poderá realizar suas reflexões e selecionar dados
relevantes para seu estudo, portanto, essas descrições precisam ser profundas e
detalhadas para que o pesquisador se aprofunde e compreenda o que ocorre no meio
observado.
Porém, como mencionado anteriormente, relataremos
minuciosamente apenas os episódios de ensino considerandos relevantes para a
pesquisa tendo em vista os objetivos anteriormente estabelecidos. Contudo, antes de
relatar essas descrições detalhadas consideramos de extrema valia descrever os
conteúdos abordados durante as aulas acompanhadas e a metodologia utilizada pela
professora.
Em todas as aulas, a professora entrava na sala, sentava-se, fazia a
chamada dos alunos e então iniciava sua aula.
Demonstrou, com freqüência, uma preocupação em fornecer
explicações, retomar conhecimentos e, em algumas ocasiões, reportou-se a aulas
anteriores para recordar alguns conceitos abordados ou então para recordar o que
dissera anteriormente deste modo, fornecia explicações e retomava conhecimentos
adquiridos pelos alunos, que pudessem tornar mais significativas as informações
que transmitia. Para exemplificar essa preocupação, podemos mencionar um
exemplo: na primeira aula, ao iniciar o estudo dos conteúdos referentes à
122
Genética, a professora relembrou alguns conceitos como cromossomos homólogos,
genes alelos, a constituição da molécula de DNA.
Em todas as aulas, a professora permitia que os alunos participassem
questionando, tirando dúvidas, respondendo a perguntas que ela fazia e, chamando
pelo nome alguns alunos que ela percebia que estavam dispersos ou conversando.
Embora, por muitas vezes, ela tenha dado oportunidade à manifestação de dúvidas e
pedidos de esclarecimento, nas primeiras aulas poucos alunos o fizeram, mas com o
passar das aulas, percebeu-se que os alunos tornaram-se mais participativos,
questionavam mais e realizando colocações quando a professora solicitava.
Para Vasconcelos (2002), os alunos expressam suas dúvidas,
hipóteses, descobertas e os caminhos de soluções de problemas a partir do momento
que o educador promove espaço e clima de confiança e amabilidade, características
que se desenvolvem com o tempo de convívio.
Cunha (1989) constatou em sua pesquisa que não é comum que os
alunos interrompam a aula para que o professor explique expressões que não
dominam, pois os alunos temem o erro e o silêncio seria uma forma de proteção da
avaliação do professor. Neste contexto, cabe ao professor a iniciativa de esclarecer
conceitos e explicitar claramente sua fala. Porém, a participação do aluno na aula é
fundamental e, segundo a autora, existem estratégias que favorecem esta
participação, quando o professor chega perto do aluno chamando-o pelo próprio
nome, por exemplo, uma interação que faz o aluno se sentir sujeito do ato de
aprender. Isto o anima a interferir no conhecimento, ainda mais quando o professor
utiliza palavras de estímulo à sua capacidade de pensamento ou condições de
experimentação.
123
Ao explanar o conteúdo, a professora fazia questão que todos os
alunos a ouvissem e para isso chamava a atenção de alguns educandos muitas vezes
procurando manter a disciplina na sala de aula. Nestes momentos perceberam-se
atitudes enérgicas com os alunos, por algumas vezes, por exemplo, observou-se a
professora chamando a atenção dos alunos e mantendo a disciplina através de ações
firmes e enfáticas. Para Cunha (1989), o professor é a principal fonte de
conhecimento sistematizado, e está nele a tomada de decisões sobre o seu fazer
docente, é ele que organiza o contexto da aula, incentiva a participação do aluno,
trata da matéria de ensino, varia o estímulo a linguagem, portanto, é o professor que
organiza sua aula de acordo com seus objetivos e com a aprendizagem que quer
desenvolver.
Todas as aulas foram expositivas dialogadas, baseadas na fala da
professora. Não houve práticas de laboratório, e utilizou-se muito da resolução de
problemas e a construção do quadro de Punnet na lousa. Em pesquisa realizada,
Trivelato (1988, p. 66) constatou que embora aparentemente este quadro facilite a
resolução de exercícios, prejudica a compreensão dos processos que sua construção
pretende esquematizar e recomenda, portanto, evitar sua utilização:
“(...) sua utilização impõe aos alunos um modelo de raciocínio que
independe da compreensão do mecanismo implícito na sua elaboração,
ou seja, a segregação de genes na formação de células reprodutivas e a
combinação de genes por meio da união de gametas dos indivíduos que
se cruzam”.
Parte do material utilizado durante as aulas foi disponibilizado pela
professora, a partir de cópias de livros didáticos (anexo 5) e os alunos xerocavam
suas cópias, outras vezes ela copiava o conteúdo dos livros na lousa para os alunos
reproduzirem em seus cadernos.
124
Pode-se observar também que a professora interagia muito com os
alunos ao explanar sobre o conteúdo, ou realizar leituras em conjunto com os
educandos, sempre questionando os alunos sobre os significado de palavras ou a
interpretação do que liam, inclusive em algumas ocasiões, dispensou atendimento
individual e nestes momentos houve uma interação professor-aluno mais estreita e
isso propiciou maior participação e manifestação dos estudantes.
Durante as leituras, solicitava que algumas palavras fossem
grifadas e discutia os significado das mesmas, num desses momentos, por
exemplo, pediu para que grifassem as palavras homozigoto e heterozigoto, e em
seguida explicou o significado delas, e disse: “vocês precisam se ligar no
vocabulário”. Neste momento pode-se notar preocupação da professora com a
aquisição da linguagem. Além disso, ela sempre questionava os educandos sobre a
maneira como resolveriam alguma situação problema ou a maneira como haviam
interpretado o enunciado de um exercício, por exemplo.
O fato de o professor usar a indagação como forma de conduzir a
aula, coloca os alunos mais à vontade para também perguntarem; o uso de
perguntas pelo professor, no intuito de incentivar a participação, provoca no aluno
uma disponibilidade maior de participar com suas próprias questões. As perguntas
exploratórias também envolvem os alunos no assunto em discussão e, além disso,
mantém o professor informado sobre o nível de atenção dos educandos (CUNHA,
1989).
A seqüência de conteúdos adotada pela professora em suas aulas
correspondeu àquela apresentada pelo livro didático que constantemente ela
utilizava: PAULINO, W. R., Biologia série novo Ensino Médio (Edição
Compacta). Ática: 2003, 320p. Vale relatar que, logo na primeira aula, após a
125
aplicação do questionário pré-teste, os alunos perguntaram para a professora o que
significava a palavra genoma e ela respondeu: “é todo mapeamento do nosso corpo,
são os 46 cromossomos”; esta definição apresentada pela professora induz à
confusão entre DNA e “corpo”, e entre DNA e o processo de seu “mapeamento”. É
importante lembrar, porém, que se trata de uma definição construída de improviso,
situação comum de ocorrer quando o professor dá abertura para discussões.
Em seguida iniciou os estudos sobre a 1ª. Lei de Mendel. A docente
explicou o que seria gene, forneceu aos alunos explicações de experimentos que
foram realizados e os dados que foram obtidos por Mendel.
Para explicar sobre os cruzamos realizados por Mendel, a professora
explicou sobre a convenção de letras utilizadas para simbolizar os genes dominantes
e recessivos responsáveis pelas características das ervilhas, objeto de estudo de
Mendel, consideradas naquele momento. Logo após, construiu o quadro de Punnet,
discriminando em cada linha e em cada coluna uma dupla de genes, e todas as
combinações resultantes desse cruzamento. Feito os cruzamentos, interpretou os
resultados obtidos e as conclusões que Mendel retirou de seus trabalhos. Notou-se
que ela incentivou os alunos a refletirem sobre os resultados obtidos e sugerirem
uma interpretação para os experimentos apresentados. Deste modo, o relato desse
trabalho científico ficou caracterizado como um processo de produção de
conhecimento, que a professora tentou envolver os estudantes na interpretação e
busca de significados.
Em seguida, a educadora propôs uma série de exercícios, que ela
copiava dos livros na lousa, e solicitou que os alunos resolvessem. Utilizaremos, em
alguns momentos, a expressão situações problema para indicar os exercícios ou os
problemas de genética que foram constantemente utilizados pela professora para
126
propor atividades relacionadas aos conteúdos abordados, porém, isso não significa
que estes exercícios propostos representassem problemas verdadeiros, isto é,
situações cujo encaminhamento necessitasse ser construído, que, muitas vezes,
representavam exercícios de repetição e não problemas genuínos.
Quanto a predominância da abordagem de situações problema
durante todo o ensino de genética Molina e Francisco (2000, p. 440) apontam que
“aprender a partir de problemas questões sobre a herança biológica não é uma
tarefa fácil”, porém, os alunos se interessam por atividades que estabeleçam
relações de efeito-causa como são apresentadas em problemas, característica que
pode favorecer o desenvolvimento de destrezas cognitivas de auto nível.
Nas ocasiões em que a professora propunha a resolução de
exercícios, ficou evidente que quando os alunos são solicitados a resolver
problemas relacionados à genética humana envolvem-se intelectualmente de
maneira mais produtiva. Segundo Trivelato (1988), “os estudantes aceitam e
gostam de desafios intelectuais em que se envolvam produtivamente”.
Observou-se que, muitas vezes, ao se retratar a Mendel, a
professora tratou a ciência como atividade que pode ser realizada por pessoas
com cérebros privilegiados, desvalorizando a inteligência e competência das
pessoas que não são cientistas, incluindo os alunos e ela mesma. Em uma das
aulas, por exemplo, a educadora perguntou aos alunos o que se deve fazer para
estudar genética, então uma aluna respondeu que seria preciso perseverança e a
professora completou dizendo: “é preciso cruzar, observar, elaborar, comprovar,
ter iniciativa, coragem e nem todos conseguem. Qual a diferença entre os
cientistas e nós?” Os alunos ficaram aguardando uma resposta e ela apontou a
cabeça e explicou: “os cientistas pensavam”.
127
Segundo Cunha (1989), a relação professor-aluno passa pelo trato
do conteúdo de ensino; a forma como o professor se relaciona com sua própria
área de conhecimento é fundamental, assim como sua percepção de ciência e de
produção do conhecimento.
Em nenhum momento a docente tratou a produção do
conhecimento científico como uma construção humana que elabora teorias e
hipóteses que devam ser estudadas e questionadas, pelo contrário, ela apresentou o
conhecimento científico como uma verdade acabada e, portanto, imutável.
Segundo Trivelato (1995), a idéia de ciência, que geralmente, é
transmitida aos alunos, coloca a produção científica acima de qualquer suspeita,
dúvida ou interferência; apresenta-se o conhecimento científico distanciado dos
problemas e questões da atualidade e, deste modo, é visto pelo aluno como algo
distante de seu cotidiano e no qual não possa intervir. De acordo com essa autora,
cabe ao professor desfazer tal idéia e apresentar a ciência como uma construção
humana passível de erros, que a “verdade científica” não existe, pois conhecimentos
que são considerados certos hoje podem não o ser amanhã. Sendo assim, os
professores precisam transmitir a idéia de que trabalhamos com conceitos que são
aceitáveis para explicar determinados contextos numa dada época.
Para Vasconcelos (2002), a história da ciência pode ajudar o
professor no processo de construção de conhecimentos, pois mostrar que o os
conhecimentos não surgiram prontos e acabados e resgatar o contexto no qual esse
conhecimento foi historicamente construído auxilia em sua re-significação. Deste
modo, promove-se o entendimento do contexto no qual este conhecimento surgiu e
que tipo de problema veio resolver.
128
Ao terminarem o estudo sobre a Lei de Mendel (na 11ª aula), na
aula seguinte (12ª observação), a professora realizou uma avaliação bimestral com
os alunos; esta foi preparada e aplicada pela professora da disciplina (anexo 5), e
privilegiava a aprendizagem de conceitos e a resolução de problemas semelhantes
aos resolvidos em aula. Cada aluno respondeu a 10 questões, sendo 2 questões
de múltipla escolha e 8 questões dissertativas.
Ao comentar sobre a primeira avaliação realizada, os alunos
apresentaram bastante interesse sobre a nota que haviam obtido, porém deram pouca
atenção à discussão das respostas, o que nos revela o papel das notas para eles e a
desvalorização do conhecimento em si. Alguns alunos, inclusive, faltavam nos dias
marcados para as avaliações, o que demonstra total despreocupação por parte deles
com a avaliação que devem realizar. Os exercícios da prova eram muito parecidos
com os do caderno, e mesmo assim muitos alunos não conseguiram resolver,
indicando que aprenderam muito pouco ou, talvez, não tenham se preocupado em
estudar.
Em seguida foi abordada a 2ª. Lei de Mendel (monoibridismo,
ausência de dominância e triibridismo), e propostos vários exercícios referentes a
esse conteúdo aos alunos. Passadas algumas aulas de resolução e correção de
problemas, a professora aplicou a segunda avaliação. Esta avaliação foi realizada em
duplas e, semelhante à primeira avaliação, foi preparada e aplicada pela professora e
continha seis problemas similares aos resolvidos em aula, sendo 4 deles de
múltipla escolha, porém a professora solicitou que resolvessem os problemas em
uma folha e entregassem também a resolução e não somente o resultado.
A professora poderia ter utilizado as avaliações realizadas pelos
alunos para avaliar suas metodologias e redirecionar suas aulas, no intuito de
129
promover uma aprendizagem mais efetiva dos conteúdos, porém isso não foi feito.
Segundo Luckesi (1994), a avaliação tem que deixar de ser autoritária e
classificatória para ser diagnóstica, sair do autoritarismo para auxiliar a educação
como prática democrática, tem que estar articulada ao processo de ensino e
ultrapassar a simples medida do certo e errado, pois os erros poderão ser ponto de
partida para o avanço na medida que são identificados e compreendidos.
Para Perrenoud (2000), o professor precisa trabalhar a partir do erro e
dos obstáculos à aprendizagem, pois, para o autor, aprender não é memorizar, e sim
reestruturar seu sistema de compreensão do mundo, que ocorre a partir de um
trabalho cognitivo.
Após a segunda avaliação, que ocorreu na aula 24, a professora
solicitou que os alunos realizassem uma pesquisa sobre os transgênicos (aula 28);
este episódio, assim como as aulas selecionadas (aula 29, 30 e 31), nas quais a
professora abordou os avanços recentes, serão relatados mais adiante.
Na 32ª observação, a professora abordou conceitos de Polialelia
(Grupos sanguíneos e sistema ABO), inclusive convidou os alunos para realizarem
exames de sangue para verificar a qual grupo sanguíneo pertenciam, procurou um
laboratório de análises clínicas da cidade e levou os alunos que aceitaram para
realizarem a coleta de sangue para identificação do sistema ABO e fator RH.
Em seguida, foram abordados os temas Herança através do Sexo e
Interação gênica. Durante o estudo desses conteúdos, a professora fez menção a
algumas síndromes genéticas, e em uma das aulas, a docente citou sobre o
preconceito vinculado às síndromes genéticas e relatou seu ponto de vista a respeito
do assunto. Durante sua explanação, pode-se observar que os alunos permaneceram
muito atentos, comentando entre eles e com a professora as questões levantadas.
130
Segundo Trivelato (1988), o curso de genética poderia começar, por
exemplo, pela menção de alguma síndrome causada por aberração cromossômica,
pois ao explicar a causa de tal anomalia, o professor poderá introduzir conceitos de
genética básica, como os conceitos de cromossomos e a colocação dos processos
celulares que originam a síndrome. Desde modo, motiva-se a aprendizagem dos
alunos que, segundo a autora, estes se interessam por exemplos da espécie
humana. Além disso, este tipo de abordagem promove também uma
contextualização dos conceitos básicos de genética.
Poucas vezes a docente solicitou atividades extra classe, numa aula
recomendou exercícios como tarefa de casa e em outra indicou a realização de uma
pesquisa com o tema “transgênicos”. Vale lembrar que a todo momento a professora
relembrava aos alunos a importância do estudo e que deveriam prestar atenção às
aulas para entender corretamente o conteúdo; relatou que o descompromisso por
parte de alguns alunos, em relação à aula, parece ter interferido na compreensão de
certos assuntos.
Em nenhum momento, exigiu-se tomadas de posição sobre assuntos
relacionados aos avanços científicos recentes e as questões éticas, econômicas,
políticas e sociais envolvidas, apenas em uma aula a professora promoveu uma
discussão entre os alunos sobre organismos geneticamente modificados (OGMs),
aula esta que será detalhada a seguir.
Ao final das observações, pôde-se evidenciar que a maior parte das
aulas foram dedicadas a temas de genética mendeliana, centrando as estratégias de
ensino na resolução de problemas de genética, fato que pode-se verificar em outras
pesquisas realizadas sobre o ensino de genética. Em sua pesquisa, Justina e Ripel
(2003) constataram que o ensino de genética, hoje, tem sua estrutura pautada na
131
resolução de problemas referentes a primeira e a segunda leis mendelianas, bem
como a temas ligados a expansão do mendelismo. Durante a execução desses
problemas, pode-se observar que alguns alunos trabalhavam em grupo e outros
trabalhavam individualmente (a professora não interferia nas escolhas dos alunos).
Resumindo, pode-se caracterizar as aulas observadas da seguinte forma:
- Apresentação do conteúdo, com abertura para a participação dos
alunos;
- Resolução de um ou mais exercícios modelo;
- Proposição de uma série de exercícios para os alunos resolverem;
- Correção dos exercícios;
- Avaliação.
Raras vezes a educadora investigou os conhecimentos prévios dos
alunos. Ela limitava-se a responder perguntas que eventualmente os alunos faziam
durante a explicação dos conteúdos.
Para que as aulas possam atender a curiosidade ou necessidades dos
alunos e eles possam se envolver efetivamente com a aprendizagem de conteúdos,
seria necessário identificar, por exemplo, através de indagações feitas aos alunos
durante as aulas, as idéias a respeito do tema a ser abordado. As pré-concepções
dos educandos podem ser discutidas para que elaborem ou reelaborem seus
próprios conceitos; essas atividades também fazem com que os alunos se sintam à
vontade para expor suas opiniões ou dúvidas, uma vez que os estudantes chegam à
escola com abundantes informações e pré-concepções sobre os diferentes âmbitos
da realidade.
Conforme lembra Menezes (1996), os estudantes não chegam como
uma tábula rasa, eles possuem concepções prévias ao ensino as quais têm um
132
papel essencial na aquisição de novos conhecimentos. Rios (1998) complementa,
afirmando que professor, por meio do ensino, proporciona um exercício de
mediação e encontro com a realidade ao considerar o saber que o aluno possui,
articulando-o a novos saberes e práticas, possibilitando, deste modo, a posição
crítica dos educandos diante de situações reais.
A escola tem um grande papel no diagnóstico das pré-concepções e
interesses com que os alunos interpretam a realidade e decidem sua prática, e
poderá fornecer os conceitos científicos como ferramenta de análise para que cada
aluno questione, compare e, se julgar necessário, reconstrua suas pré-concepções,
seus interesses e atitudes (PÉREZ GÓMEZ & GIMENO SACRISTÁN, 1998).
Antes de prosseguirmos, porém, é preciso mencionarmos a
participação da pesquisadora durante as aulas quando solicitada pela professora
para execução de exercícios, auxílio aos alunos na resolução de problemas, relatos
de opiniões e até mesmo para ministrar uma aula sobre a história de Mendel.
Pode-se notar que ao participar mais ativamente das aulas,
minimizou-se as interferências da presença da pesquisadora nas aulas, pois os
alunos passaram a lhe perguntar diretamente questões sobre os conceitos e os
cruzamentos realizados e inclusive sobre as temáticas atuais.
Segundo Bogdan e Biklen (1994, p. 128):
(...) ser investigador significa interiorizar-se no obcjetivo da
investigação à medida que se recolhem os dados no contexto, assim,
conforme se investiga participa-se com os sujeitos de diversas formas (...)
Pode-se mesmo ajudá-lo a desempenharem as suas obrigações. Estas
coisas são feitas sempre no intuito de promover os obcjetivos da
investigação”.
133
Segundo Cunha (1989), quanto mais intensa a participação do
investigador dentro do grupo em estudo, mais ricos serão seus dados, deste modo,
nenhuma oportunidade de convivência pode ser desprezada.
6. 3 Episódios de ensino selecionados
As aulas analisadas a seguir foram selecionadas de acordo com os
objetivos estabelecidos para a pesquisa, ou seja, verificar de que maneira a temática
relativa aos avanços recentes em biologia celular e molecular surge e é abordada em
aulas de biologia para o ensino médio. Para facilitar as descrições dos diálogos para
a análise, os alunos foram citados através de siglas que representassem o nome deles
(MIR, MAR, MAG, KAR, ANG, RIC, DAN, CINT, etc) e a professora da classe
pela sigla P.
Durante a 27ª observação, ocorrida no dia 09/09/2004, após o
término de uma avaliação, a professora deixou com uma aluna um material
contendo 7 folhas sobre os organismos geneticamente modificados (OGMs),
material esse que a docente relatou ter recebido em um curso de capacitação
realizado pela Delegacia de Ensino da Região (anexo 6a), e também uma folha
composta por uma montagem feita a partir de cópias de partes de dois livros de
Biologia (anexo 6b), contendo informações sobre organismos transgênicos e Projeto
Genoma Humano (P. G. H.). A professora recomendou que os demais alunos
xerocassem uma cópia. Além disso, solicitou aos educandos que, organizados em
grupos, realizassem uma pesquisa sobre o tema Transgênicos.
Na aula seguinte, (dia 13/09/2004) que constituiu a 28ª observação,
após ter revelado aos alunos as notas da avaliação que haviam realizado na aula
134
anterior, a professora solicitou que, em posse do material que havia deixado para
xerocarem a respeito dos OGMs e PGH, realizassem a leitura da folha (anexo 6a)
e, durante essa leitura, pediu para que os alunos grifassem as palavras que não
conheciam os significados.
Ao iniciar sua explicação a respeito dos textos, a docente disse aos
alunos: “Um OGM é um organismo qualquer que tem seu material genético
modificado, ele pode, por exemplo, receber genes de uma outra espécie”. Então ela
perguntou quais palavras do texto os alunos não conheciam e eles perguntaram o
que seria “inserção”e “toxinas”, a professora respondeu que inserção significa
colocar, que neste contexto queria dizer que “retiram um gene de uma espécie e
colocam em outra”, e “toxinas são substâncias produzidas por um ser vivo
qualquer e que pode ser nociva a outro ser vivo, causar algum mal.” Percebeu-se
que alguns alunos anotavam as explicações da professora e alguns até questionaram
se tais procedimentos de inserção de genes poderiam ser feitos em seres humanos. A
professora respondeu que sim, com os avanços dessas técnicas poderemos no
futuro ter seres humanos geneticamente modificados”, então os alunos se
espantaram:
MAG: “Nossa, o que vai acontecer com a gente?”
DAN: “Ai meu Deus, seremos todos monstros”.
Então, finalizando a aula, a professora questionou a importância dos
alunos conhecerem como as pesquisas estão sendo feitas para que possam decidir
que atitudes poderão tomar frente a essas questões: “vocês precisam ler as notícias
da mídia com atenção para formularem suas próprias opiniões”.
135
Observou-se que a professora não questionou o espanto dos alunos
com relação aos temas, e não forneceu demais informações para que eles pudessem
confrontar com suas opiniões. Também não realizou qualquer anotação sobre esses
relatos (na lousa ou em um caderno) para utilizá-los para discussões mais
aprofundadas sobre esses assuntos, tão necessárias neste contexto pois observou-se
que os alunos estavam dispostos a participar desses tipos de discussões e também
estavam muito interessados nos assuntos pois o comentário entre eles era geral:
MAG:“Imagine se começam a modificar todas as pessoas pelo mundo afora”
MAR:“Eu não gostaria que modificassem meu DNA”.
A professora também não informou os alunos quanto a importância
de se questionar a veracidade das reportagens divulgadas pela mídia. Ela apenas
recomendou que lessem as notícias com atenção.
Em nenhum momento realizou-se referências a algum conceito
explicitado em aulas anteriores, o que caracterizou uma descontextualização do
texto em relação aos conteúdos anteriormente abordados. Além disso, a professora
forneceu apenas os conceitos mínimos sobre transgênicos, apresentando apenas uma
definição do que seria um OGM, sem ilustrar com exemplos de organismos e as
modificações feitas no DNA. Não explicou, também, nenhuma técnica ou
procedimentos utilizados para obtenção dos OGMs.
Na aula posterior, 29ª observação (dia 16/09/2004), a professora
retomou a leitura do material xerocado sobre os transgênicos e também sobre o
P.G.H. (anexo 6a e 6b). Realizou uma leitura do material em conjunto com os
alunos e em seguida pediu para que eles, a partir dessas leituras, relatassem, em uma
folha a ser entregue para ela, (anexo 2) suas opiniões (favoráveis ou contrárias) a
136
respeito dessas pesquisas. Enquanto os alunos elaboravam seus relatos, a professora
comentou que existiam alguns produtos comercializados que eram provenientes de
OGM e exemplificou citando:
P.:“O chocolate bis, a batata importada Pringles, algumas marcas de sopa pronta, a
batatinha do McDonald’s são todos feitos a partir de OGMs”.
Comentou também que durante a semana assistiu reportagens em
programas de televisão sobre a aprovação, pelo Congresso Nacional, do cultivo da
soja transgênica:
P.:“A Ciência tem que evoluir, mas é preciso ter suporte para se trabalhar com
isso, pois pode-se criar monstros, é o homem que cria seus próprios monstros.”
Ao término da aula, a professora pediu para que trouxessem na
próxima aula o trabalho de pesquisa que realizaram sobre os transgênicos (anexo 2)
e a folha com os relatos que estavam elaborando, pois ela pretendia promover um
debate sobre os OGMs. Alguns alunos procuraram a professora e a pesquisadora
para relatar sobre as pesquisas que realizaram sobre os transgênicos e comentaram
sobre algumas leituras que realizaram:
MAR:“Professora, eu li sobre um peixe que é transgênico e brilha no escuro, e
achei super legal”
MAG:“Eu li sobre a vaca transgênica”
MAR:“Eu não vou mais comer a batata Pringles. Nossa, eu não sabia que era
transgênica”.
137
A professora ouviu os relatos dos alunos e disse que eles deveriam
ler atentamente os rótulos dos alimentos, e informou-lhes:
P.: “Não se sabe se alimentos modificados geneticamente podem causar prejuízos
ou não para o homem”.
Apesar de informar aos alunos sobre a incerteza quanto aos prejuízos
ou benefícios advindos dos OGMs, não foi discutido mais profundamente as
questões éticas envolvidas nesses assuntos ou sequer fornecer informações a esses
alunos sobre fontes de pesquisas confiáveis que divulguem informações corretas,
ou, ainda, enfatizar a importância do conhecimento em genética para elaborar
argumentos que comprovem a posição favorável ou contrária à comercialização de
produtos a base de OGMs; apenas solicitou que esses alunos trouxessem essas
reportagens na próxima aula.
Ao iniciar a aula seguinte, 30ª observação (dia 20/09/2004), a
professora pediu para que os alunos se sentassem em grupos (grupos de trabalhos,
que realizaram a pesquisa). Depois solicitou a exposição para a classe do conteúdo
da pesquisa que realizaram, a fonte dessa pesquisa, o que encontraram de mais
interessante entre as informações e se o grupo era favorável ou contrário aos OGMs.
Observou-se que os alunos ficaram um pouco intimidados com a situação, porém, a
professora foi auxiliando através de perguntas dirigidas a alguns alunos que
costumeiramente expunham suas opiniões durante as aulas e os demais alunos
começaram a participar também. Ficou evidente que a professora teve habilidade
para estimular a participação dos alunos.
O primeiro grupo relatou que havia pesquisado em jornais:
138
MIR: “Encontramos uma reportagem num jornal que tem informações sobre
algumas plantas geneticamente modificadas, e sobre o rótulo de alimentos
transgênicos, e nós discordamos dos transgênicos porque podem interferir na vida
de vários animais e isso vai desencadear e desequilibrar o meio ambiente”.
P.: “Porque vocês pensaram que os transgênicos podem desequilibrar o
ambiente?”
MIR: “Talvez no ambiente essas plantas podem provocar prejuízos ambientais”.
P.:“Os desequilíbrios podem ocorrer se um estudo detalhado desses organismos
não for realizado antes de se plantarem em ambiente aberto”.
Apesar de realizar esse comentário, a educadora não explicou que
tipos de prejuízos poderão ocorrer ao ambiente e quais mecanismos podem originar
esses prejuízos ou desequilíbrios ambientais. Não citou, por exemplo, a interação
entre plantas e polinizadores. Em seguida pediu para que o segundo grupo realizasse
as colocações a respeito do trabalho que realizaram.
O segundo grupo iniciou seu relato:
KAR: “Encontramos uma reportagem da revista Veja que tem informações sobre
algumas plantas geneticamente modificadas. Algumas plantas recebem genes e
começam a produzir remédios, são mais saborosas e duram mais tempo demoram
para apodrecer, mas apesar disso parecer bom essa característica pode ser ruim
também”.
A professora interrompeu dizendo:
P.: “Parece que o material de vocês complementa o que o primeiro grupo falou e
novamente temos que discutir a importância das pesquisas que calculem os riscos
para o ambiente, mas qual a opinião de vocês?”
139
MAC: “Nosso grupo está divido, eu sou favorável à produção de transgênicos pois
pode-se produzir frutas mais bonitas, que duram mais e ainda que contenham
medicamentos e vacinas”.
LEO: “Eu sou contra, professora, pois acho que a produção de transgênicos vai
trazer benefícios para o agricultor, pois ele vai gastar menos para produzir e nós
pagaremos mais caro por esses alimentos”.
P.: “É muito importante vocês encontrarem argumentos para justificar as posições
que estão tomando ...”
Em seguida referiu-se aos demais alunos da classe:
P.: “Prestem atenção em tudo o que estão ouvindo e pensem se concordam ou
não”.
Então uma aluna do terceiro grupo disse:
MAG: “Pelo que eu li os alimentos poderiam ser mais bem aproveitados e poderá
diminuir o uso de venenos, mas por outro lado poderá trazer insetos modificados.
Eu também li que o Projeto Genoma Humano poderá trazer discriminações para os
deficientes ou para pessoas que tenham alguma doença.”
P.: “Onde você encontrou essas informações?”
MAG: “Eu li no material que a senhora passou e também nós pesquisamos na
Internet e em revistas e livros, mas não encontramos nada nos livros da biblioteca.”
P.: “E qual a conclusão do grupo?”
MAG: “A gente não sabe dizer se essas pesquisas podem trazer coisas boas ou
ruins para nós, eu tenho medo do desastre que elas podem causar...”
CINT: “Eu acho professora que os transgênicos é bom apenas para o produtor
rural, mas não para o resto da população, porque a gente ainda não sabe se eles
podem fazer algum mal pra gente.”
P: “Até o momento os três grupos que falaram trouxeram posições contrárias
aos transgênicos, algum grupo é favorável?”
140
Um integrante do grupo 4 comentou:
MAR: “Não que eu seja favorável porque depois que eu fiquei sabendo sobre a
batata Pringles que é transgênica não vou comer mais, mas eu encontrei na Internet
um texto que falava de um peixe transgênico que é ornamental e brilha no escuro,
ele recebeu um gene de uma água-viva, eu compraria um peixe desse para colocar
na minha casa, pois a reportagem diz que ele foi testado em laboratório e é seguro,
pena que é um peixe caro pois custa 17 dólares ou então 51 reais.”
Neste momento a professora poderia ter aproveitado a fala do aluno
para explicar como um transgênico é produzido e para suscitar outras questões como
a confiabilidade das informações, uma vez que pode ser um texto publicitário que
tem o intuito de vender o produto e apresenta apenas os benefícios do mesmo, ou
ainda, suscitar questões econômicas envolvidas, porém ela apenas comentou:
P: “Nós temos que pensar que quando alguma coisa é testada em laboratório todas
as condições estão controladas, mas será que na natureza isso pode fugir do
controle e desencadear muitas várias modificações?”
Diante dessas colocações os alunos mostraram-se apreensivos e um
aluno comentou:
RIC: “Eu acho que isso pode acontecer no caso do Projeto Genoma, ao mesmo
tempo que se descobre como ocorre certas doenças, pode-se modificar o DNA das
pessoas e trazer outras doenças que nunca vimos antes”.
141
P: “Então vocês estão preocupados com a saúde de vocês? O que vocês estão
sentindo com esses relatos? Qual é o obstáculo maior para a produção de OGMs?
Vou ler algumas vantagens e desvantagens dos transgênicos”.
Ela retomou o material que os alunos haviam xerocado e leu a 4ª e 5ª
folhas (anexo 6a) e voltou a questionar os alunos:
P.: “Imaginem vocês comerem um alimento com todas as vitaminas que
necessitam?”
MAG: Isso é bonito na Teoria, mas e na prática?
P:. No Sul do país já estão plantando soja transgênica.
MAG: Ai, meu Deus, e agora?
P.: O certo seria que cada produto especificasse em seu rótulo os componentes que
os constitui, vocês devem ter lido isso no jornal pois todo dia sai alguma
reportagem disso.
NAT: “É professora, meu trabalho fala da questão da rotulagem dos alimentos no
Brasil, que todo produto que tiver mais de 1% de transgênicos na sua composição
deve trazer essa informação no rótulo”.
ANG: “Só que isso não acontece, eu encontrei na Internet uma lista de produtos
que consumimos e que não apresentam na embalagem que são transgênicos pois
diz que no Brasil não é exigido que essas informações apareçam nas embalagens”.
A professora limitou-se a ouvir os alunos, não fez confronto de
pesquisas e não soube informar se existe ou não uma lei que obrigue a rotulagem de
alimentos geneticamente modificados, inclusive perguntou à pesquisadora se
conhecia esta lei. Este fato demonstra carência de conhecimentos sobre o assunto, o
que prejudica o desenvolvimento de discussões e compromete a abordagem dos
conteúdos relacionados. Segundo Rios (2001), o professor precisa conhecer o que
142
ensina, para promover uma aprendizagem efetiva e contribuir para a formação da
cidadania. Cunha (1989), complementa afirmando que para se trabalhar bem a
matéria de ensino, o professor tem que ter profundo conhecimento do que se propõe
a ensinar.
A professora continuou a ler as folhas xerocadas:
P.: “Vou ler algumas desvantagens: “Será que este processo é seguro? E se ocorrer
algo fora de controle? Um erro pode desencadear muitas transformações...A
engenharia genética está misturando várias espécies, a Ciência tem que evoluir
mais saber o que faz, tem que dar passos firmes, imagine se formar uma plantação
com todas as plantas iguais, uma praga pode acabar com tudo, desse modo o
homem pode se autodestruir. Alguns alimentos podem desencadear alergias”.
Alguns alunos comentavam entre si o que a professora havia dito:
MAG:“É o homem vai se autodestruir”,
MAR:“Esses alimentos prejudicará nossa saúde”
MIR: “O meio ambiente será destruído”
Finalizando as discussões a professora fez a seguinte colocação:
P.: Se eu perguntasse hoje se vocês são contra ou a favor, vocês diriam que são
contra? Antes de opinar, temos que pensar que existem muitos cientistas sérios, que
realizam pesquisa com seriedade. Hoje estamos sendo cobaias, mas daqui alguns
anos esses procedimentos serão normais, muita coisa se fez na ciência que
melhorou nossa vida. Temos que acompanhar a evolução da ciência e nos informar,
para não comer certas coisas sem saber, temos que nos informar mais e exigir que
as autoridades fiscalizem as pesquisas”.
143
Durante essa aula, observou-se que no início das discussões os
alunos estavam inibidos, porém, à medida que a professora realizava colocações e
questionamentos, os alunos mostravam-se mais dispostos a opinar e, a maioria
participou ativamente das discussões demonstrando muito interesse. Muitas vezes a
professora conduziu a discussão colocando seu ponto de vista, mas também
perguntando a opinião dos alunos. Ao sair da sala de aula, comentou com a
pesquisadora que:
P: Os alunos não estão preparados para essas discussões, é difícil ficar toda hora
solicitando que eles participem e expliquem suas opiniões, mas deu para perceber
que eles ficaram pensando sobre esses assuntos de transgênicos”.
Percebe-se neste relato que a professora identificou que seus alunos
interessaram-se pelo assunto que havia sido abordado, e que sente dificuldade para
utilizar metodologias que envolvam a participação mais efetiva dos alunos. Além
disso, não forneceu informações precisas a respeito dos OGMs, pois os alunos
continuaram com suas dúvida, em aulas posteriores, inclusive, alguns alunos
questionavam a pesquisadora constantemente a respeito de entrevistas que liam ou
viam na televisão.
No início da 31ª Observação, (dia 23/09/2004), uma aluna procurou a
pesquisadora:
MAG:Li na Bíblia que no final dos tempos os gafanhotos irão devorar os
homens, isso pode acontecer devido os OGMs”?
144
Outro aluno relatou que havia pesquisado sobre os alimentos
geneticamente modificados e apresentou à pesquisadora uma lista de produtos.
Isso demonstra que o tema abordado na aula anterior despertou o
interesse dos alunos que, inclusive buscaram outras informações e apresentaram
outros questionamentos.
A professora comentou que as aulas anteriores foram “suficientes
para saciar a curiosidade sobre o assunto OGMs”. Pediu para que, junto com o
material que pesquisaram, os alunos entregassem também a síntese sobre o ponto de
vista referente aos avanços da genética molecular para que pudesse aferir uma nota
para esse trabalho que realizaram. E continuou:
P: “Agora vamos dar seqüência ao nosso conteúdo”.
Começou, então, a copiar de um livro na lousa o conteúdo: Polialelia.
Ao final da aula, a pesquisadora relatou à professora os
questionamentos dos dois alunos e a professora:
P: “É, são assuntos polêmicos que despertam a atenção dos alunos”.
Apesar de reconhecer que os alunos se interessaram pelo assunto
abordado, a professora não promoveu outras discussões, ou realizou alguma
finalização ou síntese sobre a aula em que os alunos haviam exposto suas opiniões a
respeito dos transgênicos. Talvez isso tenha ocorrido devido a insegurança da
professora, não apenas em relação aos conteúdos, mas também quanto à forma de
conduzir uma discussão sobre assuntos que envolviam aspectos econômicos,
políticos, éticos, entre outros; talvez ela mesma não tivesse um posicionamento
145
claro sobre estas questões. Além disso, não parecia que ela dominasse os conteúdos
necessários. Outro fator a ser ressaltado seria a preocupação da professora em
cumprir seu planejamento, pois em uma conversa com a pesquisadora relatou:
P: No ano passado deu tempo para trabalhar até evolução, esse conteúdo é
cobrado em vestibulares. É importante discutir temas atuais como clonagem que eu
nem falei nada para a classe mas não dá tempo de fazer tudo”.
Nota-se a preocupação, portanto, em cumprir um planejamento tendo
em vista um único objetivo: preparar o aluno para passar no vestibular, mas deixou-
se de lado a discussão de temas polêmicos tão importantes para o exercício pleno da
cidadania.
Vasconcelos (2002) relata que os professores se preocupam em “dar”
certos conteúdos, em cumprir um programa, pois entendem o fato de abordar o
conteúdo como um meio de propiciar a construção de conhecimentos, mas, segundo
o autor, o que se observa na escola é que nem sempre a carga horária que o
professor tem disponível é bem aproveitado, perde-se tempo com conteúdos pouco
relevantes para a vida do aluno e não se promove a construção de conhecimentos
significativos.
Arroyo (2000) recomenda que os professores deixem de lado o
conteudismo e o tecnicismo e repensem a educação, escolhendo conteúdos de
acordo com a necessidade de seus educandos.
Segundo Perrenoud (1999), o professor precisa realizar uma
transposição didática adequada e transformar o currículo real modulando-o às
necessidades dos alunos, diminuindo a distância entre a escola e os educandos,
promovendo saberes, valores e normas que sejam significativos para os alunos.
146
Nesta pesquisa observou-se que a professora não alcançou seu
objetivo, ou seja, abordar todos os conteúdos a que se propôs no planejamento
curricular, pois ao término do ano letivo, não chegou a estudar evolução e, em
contrapartida, também não promoveu o estudo efetivo dos avanços científicos
recentes que deixou os alunos com muito mais perguntas do que respostas. Por
várias aulas, alguns alunos procuravam a pesquisadora com várias questões:
RIC: Eu assisti uma reportagem no Fantástico sobre as células tronco, o que são
essas células e para que servem?”
DAN: “Você é a favor ou contra os transgênicos.”
MAR: Eu vi que o congresso aprovou a lei para plantar sementes de soja
transgênicas, agora no Brasil só terá soja transgênica?”
MAC: Vi no Jornal Nacional ontem que o congresso liberou o plantio e a
comercialização da soja transgênica.”
ANG: Se eu comer um alimento transgênico pode me fazer mal?
MAR: Eu fui olhar o rótulo de alguns produtos e vi que na batata Pringles está
escrito amido modificado, será que fará algum mal para mim, eu gostava tanto
dessa batata”.
Pode-se notar que os alunos trouxeram informações abordadas pela
mídia em geral, talvez devido ao alerta realizado pela professora para que eles
prestassem mais atenção às informações veiculadas pela mídia, isto é, pode ser que
a fala da professora tenha feito alguns alunos perceberem que a mídia é uma
possível fonte de informação para eles se interarem a respeito da ciência e
tecnologia.
Todos os questionamentos dos alunos foram transmitidos para a
professora, porém, apesar disso, esse assunto não foi mais retomado pela
147
educadora em suas aulas. Cabe destacar que não foi oferecida para esta professora
uma formação inicial e continuada que fossem satisfatórias para sustentar o
trabalho com o tema escolhido. Sendo assim, deixou-se de valorizar momentos
significativos de aprendizagem pois os interesses dos aluno não foram
efetivamente aproveitados. Ao se retomar essa discussão, poderia se abrir espaços
para que todos os alunos colocassem suas possíveis dúvidas, que somente
alguns alunos procuravam a pesquisadora, e até mesmo a partir dessas discussões
a professora poderia introduzir questões relacionadas à evolução, por exemplo.
Deste modo, limitou-se a enfocar, nas aulas de biologia, os
produtos finais da atividade científica. O posicionamento de diferentes setores da
sociedade (igreja, partidos políticos, cientistas, iniciativa privada, etc.) não foram
trazidos e debatidos. A professora também não se posicionou, deixando os alunos
à mercê de suas próprias opiniões, às vezes ingênuas. Se não tiverem acesso a
novas visões e puderem confrontá-las, os alunos não poderão avançar. Deste
modo, o fazer científico, os métodos de pesquisa, os interesses econômicos e
políticos subjacentes, as questões éticas suscitadas não foram suficientemente
abordados.
Certas observações realizadas como, por exemplo, o fato da
professora não avançar nas discussões com os alunos, e também não se manifestar
na correção dos trabalhos realizados pelos alunos, ou até mesmo diante das falas
dos alunos nos indica que, talvez a professora não dominava conhecimentos
suficientes sobre os assuntos abordados.
Devemos ressaltar que realizar o trabalho de uma forma alternativa
demandaria tempo disponível para a professora pesquisar sobre o assunto, ou
então a condição de a professora já ter abordado o tema em vários anos sucessivos,
148
constituindo um acervo de material e experiência anterior. A ação da professora
está, pois, limitada por condições que são próprias dos contextos em que
desenvolve seu trabalho.
Cabe relatar ainda que, ao final das observações, percebeu-se que
com o passar das aulas os alunos mostraram-se mais dispostos a participar. Ao
iniciar a abordagem do conteúdo de genética, a professora constantemente
chamava a atenção dos alunos e perdia alguns momentos tentando manter a
disciplina da classe para que os alunos pudessem ouvi-la, fato esse que deixou de
ocorrer. Além disso, apesar da professora abrir espaço para que os alunos
questionassem e colocassem suas dúvidas, poucos alunos o fizeram durante as
primeiras aulas, porém, principalmente após a discussão promovida a respeito dos
transgênicos, os alunos começaram a expor suas dúvidas e participar efetivamente
das aulas, pois sempre que a professora levantava algum questionamento ou
resolvia algum problema, a maioria dos alunos mostravam-se atentos e
respondiam às perguntas elaboradas pela professora, inclusive ela fez um
comentário com a pesquisadora: “os alunos estão amadurecendo”.
Dado o interesse demonstrado por esses alunos sobre temas como
organismos geneticamente modificados (OGMs) e as questões ambientais e éticas
relacionadas a esses assuntos, evidencia-se a necessidade de se promover o estudo
efetivo de temáticas referentes aos avanços da Genética Molecular. Os alunos
poderão obter informações diversas a respeito desses assuntos, e apesar da grande
divulgação desses temas pelos meios de comunicação, por exemplo, são
necessárias maiores esclarecimentos e informações, que estas reportagens não
ultrapassam a superficialidade e o sensacionalismo, provocando polêmica e
dúvidas em torno desses assuntos. Neste sentido, a escola desempenha o papel de
149
promover a aprendizagem de conceitos básicos, úteis para o efetivo entendimento
desses questionamentos.
6. 4 Análise de documentos
Pretende-se apresentar neste item uma análise sistemática de
documentos considerados relevantes para atingir os objetivos propostos pela
presente pesquisa.
6.4.1 Trabalhos elaborados pelos alunos
Como mencionado anteriormente, após solicitação da professora, os
alunos elaboraram um trabalho de pesquisa (anexo 2) a partir do tema proposto:
Transgênicos.
Pode-se observar que durante a proposição deste trabalho, a
professora não deixou claro seus objetivos para a elaboração do mesmo. Foram
elaborados oito trabalhos e a professora aferiu notas de 0 (zero) a 10 (dez). Segundo
ela, o critério de notas obedeceu algumas características como: apresentação do
trabalho, coerência com o tema proposto, tipo de informação relatada e
considerações dos alunos. Essas características não foram apresentadas aos alunos
pela professora quando o trabalho foi solicitado, o item considerações dos alunos,
por exemplo, apareceu em apenas três trabalhos.
Ao propor o trabalho a professora declarou apenas:
150
P.: “Quero que vocês procurem alguma coisa sobre os Transgênicos, pode ser uma
notícia de jornal, de revista ou na Internet, quero que vocês façam uma pesquisa
sobre isso”.
MAG.: “Professora, eu não entendi, é para fazer uma pesquisa sobre
transgênicos?”
P.: “Isso, vocês deverão realizar uma pesquisa sobre os transgênicos”.
MAR.: “E onde a gente encontra essas reportagens? Será que na Revista Super
Interessante tem?”
P.: “Hoje esse assunto está muito divulgado na mídia, em qualquer revista vocês
encontrarão alguma reportagem, façam suas pesquisas e me entreguem”.
Para Menezes (1996), é preciso que o professor apresente
adequadamente a atividade a ser desenvolvida, fazendo o possível para que os
alunos adquiram uma concepção global da tarefa e se interessem pela mesma, e
também oriente os trabalhos dos estudantes, proporcionando os recursos e ajuda
necessários.
Os alunos formaram grupos e realizaram a atividade proposta cada
um da sua maneira. Alguns coletaram reportagens, outros realizaram pesquisas na
Internet, outros realizaram sínteses a partir das reportagens que leram, etc.
Analisando mais detalhadamente cada trabalho, pode-se perceber
que alguns deles traziam cópias de textos e reportagens, fato que fora também
evidenciado pela professora, pois ao entregar os trabalhos para a pesquisadora
relatou:
P.: Você vai perceber que alguns trabalhos foram copiados de algum lugar”.
151
Os quatro trabalhos que traziam apenas cópia de reportagens de
jornais e revistas de divulgação nacional ou de sites da Internet receberam nota 7
(sete). Outros três trabalhos trouxeram um resumo do material pesquisado pelos
alunos e também suas conclusões a respeito desse material, e apenas um trabalho foi
completamente escrito pelo grupo, cujos componentes descreveram que estariam
realizando uma síntese a partir da pesquisa que haviam feito, estes trabalhos
receberam nota 9(nove). Nenhum dos trabalhos trazia bibliografia.
A professora não apresentou a correção dos trabalhos para os alunos,
e também não aproveitou as informações contidas neles para esclarecer as dúvidas
dos estudantes, ou promover discussões mais aprofundadas sobre o tema em
questão. Ao apresentar a correção realizada, pode-se promover momentos de
aprendizagem, pois ao se detectar e demonstrar uma falha ao aluno, este tenta
aperfeiçoar-se, geralmente não incorrendo na mesma falha.
Deixou-se também de aproveitar muitas informações contidas nos
trabalhos como: vantagens e desvantagens dos transgênicos, campanhas contra o
consumo e comercialização desses produtos, os produtos comercializados hoje no
Brasil, a questão das leis brasileiras, quais são os interesses envolvidos, a posição do
Geenpeace, entre outras. Inclusive não houve discussões e estudo de termos como
“vetores de transformação”, “parasitas genéticos” que, possivelmente, foram
copiados pelos alunos e que merecem maiores esclarecimentos para uma
compreensão adequada sobre o tema. Esses dados evidenciam, entre outras, duas
dificuldades encontradas pelos professores: (a) dificuldades que um trabalho de
pesquisa pode suscitar; (b) dificuldades para relacionar o trabalho de pesquisa com
demais atividades.
152
Apurou-se durante a análise dos trabalhos algumas opiniões
formuladas pelos alunos que revelam suas preocupações quanto aos danos que os
organismos geneticamente modificados podem causar à saúde do ser humano e ao
meio ambiente:
Grupo 3: “Queremos que antes que se tome decisão sobre o cultivo, a
comercialização e o consumo de transgênicos no Brasil, sejam feitas pesquisas por
instituições de comprovada competência e independência, que assegurem que os
transgênicos não são prejudiciais à saúde e aos meio ambiente”.
Grupo 4: “Não gostei de saber que alguns produtos que comemos são transgênicos
e nem sabemos porque a sua embalagem não traz essa informação”.
Grupo 6: “Concluindo, é claro que o homem não se deve limitar nas descobertas
em prol da humanidade, desde que seja com cautela e responsabilidade, para que
futuramente não prejudique a vida da nação...”.
Notou-se que os alunos perceberam a necessidade de serem críticos
em relação às informações que recebem, porém, isso ocorreu espontaneamente, ou
seja, não foi uma ação intencional da professora.
Esses relatos poderiam ser utilizados para discussões a respeito de
aspectos econômicos e éticos relacionados à produção, consumo e comercialização
dos OGMs, e até mesmo para esclarecer e desmistificar idéias sobre esse assunto.
A professora não se manifestou diante de trechos equivocados ou
confusos trazidos nos trabalhos como:
“Alimentos transgênicos são aqueles que foram modificados geneticamente, ou
seja, no núcleo de suas células foi inserido genes de vírus ou bactérias, que se
tornam seres diferentes para o seu corpo, por isso a modificação”.
153
“Não nos alimentos, mas também em seres humanos estão sendo testado as
modificações geneticamente como ‘cobaias’ o Projeto Genoma Humano que
mostra seres humanos e cada uma das informações de cada indivíduo que se
houver algum problema, poderá ser criado ainda uma solução na barriga da mãe
onde foi reconhecido o problema, daí o surgimento do problema: os seres
humanos perfeitos”.
A última colocação apresenta preocupações legítimas, mas
incorporam acriticamente o sensacionalismo propagado pela mídia.
Quando o professor não esclarece informações equivocadas, permite
que os alunos reproduzam esses conceitos e não contribui para o desenvolvimento
cognitivo dos educandos.
Após analisar todos os trabalhos, as correções realizadas pela
professora e o contexto no qual foram elaborados, conclui-se que maiores
discussões sobre as informações contidas nestes trabalhos poderiam constituir
mecanismos de promoção de efetivas aprendizagens.
Cabe relatar que algumas sínteses (anexo 2) realizadas pelos alunos
também foram analisadas. Estas revelaram a preocupação, novamente, dos
estudantes a respeito dos prejuízos e benefícios dos OGMs e não trouxeram um
posicionamento enfático, ou seja, não declararam se são contra ou a favor da
produção de transgênicos; apenas um grupo declarou:
“Somos contra aos seres transgênicos, pois eles podem trazer riscos a saúde
humana, e se uma planta é geneticamente modificada para evitar algum tipo de
praga ela pode mexer com o equilíbrio natural dos predadores”.
154
Para opinar conscientemente a respeito de assuntos polêmicos como
os organismos transgênicos, os indivíduos necessitam de um conjunto de
conhecimentos sólidos, estudados e construídos na escola, que justifiquem suas
posições e os auxiliem em processos de tomadas de decisão.
6.4.2 Planejamento curricular
O planejamento curricular (anexo 7), como mencionado
anteriormente, foi elaborado pela professora participante da pesquisa em conjunto
com demais professores de ciências e biologia da Unidade Escolar. Os avanços
científicos recentes como clonagem, organismos transgênicos ou projeto genoma
não são parte integrante desse plano de ensino, o que comprova que tais temas são
tratados como uma leitura complementar, descontextualizada e fragmentada como já
observado durante as aulas. Cabe destacar também que a professora não realiza
nenhum questionamento a respeito desses assuntos nas avaliações bimestrais
propostas.
6.4.3 Livros didáticos utilizados
No intuito de verificar de que forma temas de genética
contemporânea apareciam e eram trabalhados nos livros didáticos utilizados pela
professora nas aulas de Biologia, realizou-se uma análise desse material:
PAULINO, W. R., Biologia série novo Ensino Médio (Edição
Compacta).Ática: 2003. 320 p.
LOPES, S. Bio - Volume Único. São Paulo: Saraiva, ed., 1999,
607p.
155
MACHADO, S. Biologia para o ensino médio: volume único. São
Paulo: Scipione, 2003 (COLEÇÃO DE OLHO NO MUNDO DO TRABALHO),
253p.
Pode-se verificar que as publicações mais recentes apresentam
leituras complementares sobre organismos transgênicos, clonagem, projeto genoma
e técnicas de engenharia genética, mas não trazem exercícios referentes a esses
assuntos; o que indica que esses assuntos não são valorizados.
Além disso, a relação entre os conceitos estudados e as leituras
apresentadas não é demonstrada, caracterizando uma fragmentação dos conteúdos,
no livro Biologia série novo Ensino Médio (Edição Compacta) elaborado por
Paulino, W. R.,. Ática: 2003. 320 p., por exemplo, uma leitura sobre clonagem de
embriões e células-tronco é apresentada no capítulo sobre reprodução humana, a
leitura sobre o Projeto Genoma Humano é apresentada no capítulo sobre citologia e
histologia, outra leitura sobre os testes de DNA é apresentada no capítulo sobre
bioquímica celular e leituras sobre as técnicas da engenharia genética e organismos
transgênicos são apresentadas no capítulo referente à genética e as Leis de Mendel.
6.5 Entrevista realizada com a professora
Ao final das observações, realizou-se uma entrevista com a
professora participante da pesquisa.
Para esta entrevista, foi elaborado um roteiro (anexo 3) a partir das
observações realizadas, contendo alguns aspectos relevantes para a pesquisa,
procurando investigar e compreender, com bastante detalhe, as concepções da
professora sobre os avanços científicos recentes e como desenvolve seus quadros
156
de referência. Aproveitando a flexibilidade que este instrumento proporcionou, no
decorrer das entrevistas, as questões puderam ser reformuladas. Houve
esclarecimento de dúvidas e interpretações e, quando necessárias, algumas
informações que pudessem contribuir para o objetivo da entrevista eram
fornecidas.
Procurou-se formular questões abertas e, deste modo, iniciou-se a
entrevista a partir de uma recordação das aulas 28, 29 e 30 (descritas
anteriormente) nas quais foram discutidos aspectos relacionados à produção e
comercialização de organismos geneticamente modificados.
Alguns trechos dessa entrevista estão descritos a seguir:
Pesquisadora: Durante o bimestre anterior a senhora solicitou que os alunos
realizassem uma pesquisa sobre os transgênicos, inclusive trouxe um material e
promoveu uma discussão com os alunos referente a esse tema, lembra-se? Como
a senhora avalia esta aula?
P.: “Eu acho que esta aula foi muito positiva, mas poderia ter sido melhor se os
alunos não ficassem tão envergonhados. Nós professores precisamos criar um
clima favorável para os alunos, porque um tem vergonha do outro e daí acaba
não participando da aula. Eu não estou preparada para trabalhar dessa forma,
ouço alguns professores contando que realizam seminários durante as aulas mas
eu não consigo entender como fazem isso, aquele bando de alunos na frente,
pra gente organizar dois grupos trabalho, gasta muito tempo e com
duas aulas na semana nãopara fazer nada. Este ano tivemos muitos feriados
e isso atrapalha, a gente perde o interesse do aluno, eles acabam esquecendo
tudo, tem voltar todo o conteúdo; e também hoje a sala é muito heterogênea,
acabou aquele aluno que a gente tinha antes que a sala de aula era um silencio,
hoje não conseguimos trabalhar direito, os alunos não ligam pra nada.”
157
Notou-se que a professora considerou as referidas aulas como uma
experiência gratificante, que mereça ser incorporada ao curso.
Pesquisadora: A senhora quis dizer que não se sente preparada para criar um
clima favorável à participação dos alunos? Acredita que poderia se preparar de
alguma forma?
P.: “É, eu acho que falta pra gente apoio pedagógico, cursos que tragam novos
materiais, às vezes me sinto perdida, não sei o que ensinar, os livros mais
recentes de Biologia tratam apenas a e a Lei de Mendel e só, não traz
epistasia, por exemplo, não sei se deveríamos tirar do planejamento conteúdos
como epistasia e linkage e incluir assuntos como clonagem, transgênicos,
Projeto Genoma Humano...”
Ao responder a essa pergunta, a professora acabou insinuando que
encontra dificuldades no que tange à metodologia de ensino.
Pesquisadora: Assuntos como clonagem, organismos transgênicos e Projeto
Genoma Humano são muito recentes, eu, por exemplo, não estudei esses temas
na Universidade, a senhora encontra dificuldades para abordar esses temas, que
materiais costuma utilizar?
P.:. “Hoje sai muita reportagem na mídia, na Super Interessante sempre sai,
mas falta um material especializado pra gente consultar, com uma linguagem
clara, acessível, né. Esses temas aparecem nos livros mais recentes, são as
leituras complementares, como a gente chama, e eu acho que todo livro deveria
ter essas leituras. Eu costumo ler e guardar as reportagens que são publicadas
na Veja, na Super Interessante, nos jornais, mas é difícil trabalhar com esse
material diversificado, você pede o aluno não traz, a gente tem que trazer
158
tudo pronto, tem que xerocar e trazer um para cada um, fica difícil. Em anos
anteriores eu trazia alguma dessas leituras complementares para os alunos. No
começo desse ano participamos de um curso de capacitação oferecido pela
Delegacia de Ensino e recebemos aquele material que eu passei para os
alunos, aquele que você viu, esses cursos são muito importantes pra gente e
apesar desse curso não ter trazido nenhuma aula prática a teoria apresentada
foi muito boa, mas são oferecidos muito pouco, acho válido a gente participar
desses cursos, eu adoraria participar de um curso que falasse sobre o RNA
porque acho muito interessante. Esses cursos são bons porque vem uma pessoa
que estudou determinado assunto e traz várias informações, a gente precisa
desse pessoal para nos assessorar, foi depois desse curso que decidi realizar
uma aula de discussão com os alunos sobre os transgênicos.”
Pesquisadora: A senhora encontrou alguma dificuldade para desenvolver esta
aula?
P.: “A gente percebe que os alunos não estão preparados para esse tipo de
atividade, eles não tem vocabulário, e acho que nunca tinham participado de
uma aula desse tipo. O ano passado trabalhei com um colegial muito bom e
deu para trabalhar tudo, sabe aqueles alunos que tudo o que você propõe eles
fazem? A classe era uma maravilha. Mas este ano você viu como era o
colegial, eram alunos muito desinteressados, não estavam nem com nada,
quem sabe um dia eles despertem para alguma coisa.”
Pesquisadora: Os alunos me perguntaram vários aspectos relacionados aos
organismos geneticamente modificados, a senhora considera que esses assuntos
despertam o interesse dos alunos?
P.: “É, eles se interessam pelo novo, pelo que é divulgado na mídia, eu poderia
ter feito uma aula sobre clonagem, projeto genoma humano, mas não tempo
pra gente fazer tudo, a gente tem consciência que deixou de falar coisas
importantes, porém não temos tempo para fazer tudo, a gente tem que trabalhar
um conteúdo muito extenso, não dá nem para fazer uma aula prática, sem contar
159
a falta de equipamentos, não temos nem um microscópio. Então a gente acaba
abordando o que cai no vestibular e fica no batidão, repete várias vezes os
exercícios e eles aprendem. Olha, a gente tem vontade, eu procuro fazer o
melhor, mas não é sempre que consigo, a gente precisa de pelo menos 3 aulas de
biologia na semana.”
Inicialmente a professora respondeu que os alunos se interessam
pelo novo”; de acordo com Vasconcellos (2002), os professores têm uma visão
equivocada que a motivação do aluno vem da “novidade”. Em muitos
questionamentos trazidos pelos alunos, pode-se perceber não apenas a curiosidade
como também a preocupação quanto aos desequilíbrios ambientais, ou quanto aos
possíveis riscos à saúde humana advindos do cultivo ou consumo de organismos
transgênicos, por exemplo.
Nesta resposta, a docente também cita diversos fatores que
restringem seu trabalho: a pouca carga horária destinada às aulas de Biologia, o
extenso conteúdo que é proposto, as exigências dos vestibulares, a infra-estrutura
precária e a formação deficiente, dado este que aponta para a importância dos
cursos oferecidos pela Secretaria de Educação do Estado, através das Delegacias
de Ensino Regionais, e também para a importância de propostas que visam a
atualização profissional ou capacitação em serviços, bem como propostas de
formação continuada.
Durante a entrevista, pode-se verificar que os assuntos relacionados
à engenharia genética não são considerados conteúdos a serem ensinados em
Biologia, que foram tratados pela professora como uma leitura complementar.
Além disso, a professora revelou que recorre a reportagens divulgadas pela mídia
para se informar a respeito dos avanços científicos recentes, e que cursos de
aperfeiçoamento profissional são válidos e necessários, principalmente, frente às
160
novas demandas do ensino médio que impõe aos professores constante
atualização.
Uma vez que os conhecimentos não são verdades imutáveis, é
preciso que o professor de biologia tenha a oportunidade de conhecer as pesquisas
atuais e seus produtos para que possa apresentar aos alunos uma ciência atual e
dinâmica. Sendo assim, o professor não pode limitar-se ao que aprendeu na
universidade, pois a aprendizagem é um processo que nunca está acabado.
De acordo com Menezes (1996), conhecer a matéria a ser ensinada
é a primeira necessidade formativa dos professores e, mesmo nos casos em que
houve formação inicial adequada, é necessário complementá-la, pois além dos
conhecimentos fundamentais da Ciência, objeto de estudo, faz-se necessário, ainda
que os professores conheçam a história da Ciência, as estratégias de trabalho
cientifico, as interações entre Ciência/Tecnologa/Sociedade, as novas perspectivas
científicas e tecnológicas entre outras.
Além disso, o autor aponta que é preciso romper concepções dos
professores sobre o processo de ensino e aprendizagem. O fracasso de muitos
estudantes, por exemplo, é atribuído a suas próprias deficiências, sejam elas
intelectuais (são atrapalhados, desinteressados) ou sociais (alunos provenientes de
meios culturalmente desfavorecidos, classe heterogênea).
Segundo Perrenoud (2000), o professor precisa saber administrar a
heterogeneidade no âmbito de uma turma, pois a igualdade não existe e na
diferença há muita riqueza e possibilidade de trocas.
161
CAPÍTULO VII
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando que este trabalho visa a melhoria do processo ensino-
aprendizagem de genética no ensino, médio algumas reflexões preliminares parecem
relevantes.
Quanto a abordagem dos avanços recentes em genética, pode-se
verificar alguns obstáculos que dificultam o estudo desses temas na escola média
como por exemplo: escassez de material didático, a formação deficiente dos
professores e a crescente necessidade de cursos de aperfeiçoamento profissional.
A presente pesquisa aponta também que a formação continuada de
professores é essencial, visto que a Ciência não é estática e sim dinâmica estando
em constante mudança. Deste modo, não se pode conceber que os professores
162
permaneçam estáticos diante dos avanços atuais da Ciência, é preciso colocar a
autoformação contínua como requisito da profissão docente.
Segundo Libâneo (1999), as novas exigências educacionais pedem às
universidades e cursos de formação para o magistério um professor capaz de ajustar
sua didática às novas realidades da sociedade, do conhecimento, do aluno, dos
diversos universos culturais, dos meios de comunicação. O novo professor precisa,
no mínimo, de uma cultura geral mais ampliada, capacidade de aprender a aprender,
competência para saber agir na sala de aula, habilidades comunicativas, domínio da
linguagem informacional, saber usar meios de comunicação e articular as aulas com
as mídias e multimídias.
Este autor relata ainda que os fatos contemporâneos ligados aos
avanços científicos e tecnológicos, à globalização da sociedade, à mudança dos
processos de produção e suas conseqüências na educação, trazem novas exigências à
formação de professores. Com o advento de novas concepções de aprendizagem,
surge a necessidade de contextualizar o conhecimento científico aos problemas da
sociedade e do cotidiano, e devido ao desenvolvimento acelerado das novas
tecnologias da comunicação e informação. O exercício do trabalho docente requer,
além de uma sólida cultura geral, um esforço contínuo de atualização científica na
sua disciplina e em campos de outras áreas relacionadas, bem como incorporação
das inovações tecnológicas.
A presente pesquisa aponta a necessidade de investir na atualização
científica, técnica e cultural, como ingredientes do processo de formação continuada
de professores de Ciências. É preciso, também, promover espaços para que o
professor possa refletir sobre sua ação num movimento de ação-reflexão-ação; como
também promover uma maior interação entre a formação que se realiza na
163
universidade, com a prática das escolas. Seria importante trazer os professores em
exercício para a universidade, para discussão de problemas comuns, para
aprendizagem de novos conteúdos e para atualização permanente, já que se verificou
que a deficiência de conhecimentos por parte do professor influi na abordagem do
conteúdo, na metodologia que utiliza e no avanço cognitivo dos educandos. A
habilidade para relacionar os conceitos básicos aos recentes avanços da ciência pode
ser adquirido através dos cursos de formação continuada para docentes.
Não podemos deixar de considerar também a excessiva carga horária
que os professores são condenados a trabalhar, a falta de recursos das escolas
públicas, as classes superlotadas, os baixos salários, entre outros problemas que os
professores têm que enfrentar.
Conforme Libâneo (1999), é difícil aos professores assumirem os
requisitos profissionais e éticos da profissão com os baixos salários, com a
preparação profissional deficiente, com a baixa auto-estima que vai tomando conta
de sua personalidade. Além disso, estão ausentes programas de formação continuada
em serviço e, quando existem, são inadequados, não motivam os professores e não
se traduzem em mudança na sala de aula.
Além disso, ao se abordar os avanços científicos recentes, verificou-
se que são apresentados apenas os produtos finais dessas pesquisas, deixando-se de
enfocar o fazer científico, os métodos de pesquisa, os interesses econômicos e
políticos subjacentes, as questões éticas suscitadas. Deste modo, os jovens estão
passando pela escola sem ter a chance de discutir os avanços científicos recentes;
não estão sendo preparados para opinar sobre tais questões como cidadãos de
amanhã.
164
Segundo Vasconcellos (2002), pode-se constatar, hoje, que a escola
não tem conseguido garantir a apropriação significativa, crítica e duradoura, aos
educandos, do conhecimento fundamentalmente acumulado pela humanidade, de tal
forma que este conhecimento possa servir como instrumento de construção da
cidadania e de transformação e intervenção na realidade.
Pode-se verificar também que o professor desempenha importante
papel na escolha de estratégias de ensino que valorizem a aprendizagem
significativa dos seus alunos. Neste sentido, é de extrema relevância que o professor
direcione essas estratégias de forma a promover a efetivação dos objetivos
propostos. Embora pesquisas na área do ensino de genética apontem deficiências, a
expectativa é a de que os conceitos necessários para a compreensão dos novos
rumos da genética sejam adquiridos, na sala de aula, através de práticas que
contemplem a investigação científica e o estudo dos problemas atuais, para
discussão dos aspectos éticos relacionados.
Além disso, observou-se que, os temas relacionados aos avanços
científicos recentes despertam a curiosidade dos alunos, porém, este fato não está,
necessariamente, relacionado ao interesse pelos conceitos de genética básica. Muitas
vezes esse interesse relaciona-se ao sensacionalismo com que tais temas são
abordados pela mídia em geral, por exemplo. No entanto os conceitos são
fundamentais para que possam ter um bom entendimento sobre determinado tema, e
possam estabelecer relações de causa e efeito. Portanto, o aluno não precisa
necessariamente saber genética para se interessar pelos assuntos recentes, contudo, é
necessário que conheça os conceitos de genética básica para que compreenda esses
assuntos, como são realizadas tais pesquisas e possam se posicionar diante delas.
165
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