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- RELA
T
ÓRI
O
A comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legisla
tiva de Minas Gerais e em seu nome a própria Assembleia Legis_
lativa de Minas Gerais encaminha ao Sr. Ministro da Educação,
que remete a este Conselho, pedido de que seja incluida como
matéria do "núcleo comum" dos cursos de 1º e 2º graus, "Defe-
sa do Consumidor". Cópia do referido expediente é remetida
pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais diretamente a es
te Conselho.
Para que se possa avaliar o que significaria, para a for
mação de nossas crianças e adolescentes a inclusão, como
disciplina formal, e, ainda mais, como integrante obrigatória
do núcleo comum, consequentemente, para todas as escolas do
Brasil, de ensinamentos como esse ou análogos, é oportuno
arrolar algumas das propostas semelhantes ou equivalente que
vem chegada este Conselho, para exame e Parecer (que,
infelizmente, são examinados, por serem quase sempre,
projetos de lei, conforme o costume deste Conselho, em sessão
reservada, o que a fasta do conhecimento público). Uma visão
de conjunto ajudará a entender porque os educadores que.
compõem este Conselho, com a percepção concreta que lhes dá a
experiência de uma escala no trabalho educativo na
perspectiva globalizada/se tem manifestado invariavelmente
Dom Lourenço de Almeida Prado OSB
Inclusão da matéria Defesa do Consumidor no Núcleo Comum
dos cursos de 1º e 2º graus
Comissão de defesa do consumidor da Assembleia Legislativa de
Minas Gerais, com encaminhamento ao gabinete do Ministro
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a) a imposição sob a forma da lei de disciplinas obrigató -
rias, que não sejam aquelas que obviamente não podem faltar (di-
tas do currículo mínimo ou, na linguagem recente, do núcleo co-
mum) , como são a língua materna, a Matemática, as Ciências,a His_
tória e a Geografia)
b) a transformação em disciplina formal de atividades ou co
nhecimentos, que integram a formação humana e, portanto, não po
dem ser esquecidas, mas emergem das diversas disciplinas ou da
própria vida escolar, suscitadas pelo convívio humano, na escola
e com a sociedade em geral.
Já disse um grande mestre contemporâneo e isso' já nos refe-
rimos em parecer anterior (reservado) que, tudo pode ser aprendi-
do, mas nem tudo se ensina formalmente na escola: umas porque
são grandes demais, outras, ao contrário porque são demasiado pe
quenas. "Há curso de Filosofia, mas não há curso de sabedoria".
"Não há para o homem nada mais importante que a intuição e o a
mor... entretanto, nem a intuição, nem o amor são matérias de
instrução científica e de ensino". "E a experiência, que e fru to
incomunicável do sofrimento, da saudade, pela qual a formação
humana chega à perfeição, também não é objeto de curso em qual-
quer escola". "Apesar disso, a educação deve ter a maior preocu
pação com tudo isso". (Cf. Pour ume Philophie de "Education"
Fayar, 1959, pág. 40/41). Não se ensina na escola, ao menos não
se ensina diretamente, a arte de andar na rua ou de não gastar a
sola do sapato, de casar bem,, de caçar borboletas ou de amarrar
as sandálias. Ou menos, não se faz disso uma disciplina
específica, com um professor especializado. Se é verdade que
"aprendemos para a vida e não para a escola", é verdade, também,
que a escola não e' apenas "para a vida", mas já é a vida.
Apren-demos para viver, mas vivemos para a aprender. A vida é
mais que a escola ou a escola ê mais que ela mesma.
Daí o risco de esfacelar a educação, tirando-lhe o conjunto
e tornando-a uma colcha de retalhos, um conglomerado de educa
ções. Há educação, não há educações.
Nesse processo esfacelante de educação, eis algumas das edu
cações, quase sempre sob a forma de projetos de lei. para tor-
na-las obrigatórias, chegadas ultimamente a este, começando natu
ralmente pela mais badalada e mais repetida:
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Ecologia ou Educação Ambiental, Educação para o Trânsito ,
Orientação sobre Tóxico, Corporativismo, Saúde Bucal ou Higiene
Dentária, Planejamento Familiar, Ofidismo, Educação Sexual, Edu-
cação contra AIDS, Noções de Informática, Prevenção de doenças
infecto-contagiosas.
0 elenco evidentemente não está completo, nem seria possí -
vel completá-lo uma vez que a imaginação humana não tem limites.
Imaginemos, para avaliar devidamente o caso nossas escolas
estivessem obrigadas por lei a incluir, nos seus currículos, to
das essas "disciplinas" e hoje tivessem que acrescentar a nova
disciplina "A defesa do Consumidor". Evidentemente, não have ria
lugar, na escola, para Português, Matemática, Ciências, etc. 0
ornamental, que, como tal, não deve faltar, ocuparia-o lugar do
básico e substância.
Em outra ocasião, a propósito de um projeto de lei que pre-
tendia determinar, como obrigatória para todo o território nacio
nal, a "Educação para o Trânsito", chamávamos a atenção para a
situação já bastante sobrecarregada, mesmo sem esses acréscimos
pretendidos ,a escola média em nosso tempo.
Com efeito, uma série de atividades e conhecimentos que ,
até há bem poucos anos, constituiam encargo da família, da ofici-
na ou de convívio social em geral passaram a postular e, até, a
exigir um lugar na escola. Assim aconteceu com a formação para o
trabalho, com a educação fisíca e a educação para a saúde, com a
educação para o lazer, com a educação cívica ou para a cidada-
nia.
A educação média se "circunscrevia, então, a um aprendizado
em vista do ensino superior e das chamadas carreiras liberais.
Ao lado disso, o progresso das ciências que transformou o
inventar antigo, cuja genialidade consistia na descoberta intui-
tiva da técnica, vista antes de ser explicada cientificamente ,
no técnico moderno que parte do conhecimento científico para de
senvolver, por aplicação, a máquina que multiplica a força huma-
na, causou a ascensão à feição de disciplina escolar uma série da
atividades anteriormente fora desse quadro. Basta pensar na
informática, na eletrônica e, mesmo na genética, na biologia mo
lecular, nos conhecimentos ao átomo e a bioquímica.
Assim, se tornaram numerosos os conhecimentos com o direito
de reclamar um lugar no currículo secundário. Daí a necessidade
escolher e optar por uma direção. Daí o surgimento do incontor-
nável pluralismo escolar. Nem tudo cabe em todas as escolas, ca
da escola deve identificar-se, na sua individuação, por uma fi -
sionomia particular. Daí, finalmente, a necessária divisão das
atividades possíveis e, até das disciplinas, como tal, bem cara-
cterizadas, em nucleares e de enriquecimento. Aquelas, natural-
mente, são nacionais e obrigatórias; estas são opcionais ou orna
mentais, podendo ter a marca regional ou individuante, isto é ,
definidoras da proposta educacional ou instrucional de uma esco-
la. Evidentemente, não tem propósito tornar obrigatória um a-
prendizado de Trânsito, que tem sentido, embora não como disci -
plina formal, numa megalopóle, e seria uma extravagância prejudi-
ciai numa escola rural. Igualmente não tem propósito definir co
mo disciplina obrigatória a educação ambiental, que não só seria
melhor tratada como problemas emergentes das diversas discipli -
nas ou como tema de uma semana ou de mês de estudo, como também
teria feição e até objetivo diferentes no Rio de Janeiro ou em
São Paulo e no Pantanal ou na mineração amazônica. Essas ativi-
dades ou aprendizado, com ou sem feição de disciplina (cada esco-
la imprimirá a marca que julgar mais conveniente) não devem, nem
podem (seria pletorar o currículo e torná-lo dispersivo e inefi-
cas) ser obrigatórias, menos ainda,, pela dureza da lei. Por isso
mesmo, uma lei sábia, mesmo que seja de Diretrizes e Bases, não
deve fixar disciplinas, mas indicar critérios, sob cuja orienta-
ção, o Conselho de Educação, com a flexibilidade e adaptabilida-
de própria de suas Resoluções, regulamentará a matéria.
Concluindo:
a) o aumento dos encargos, antes da família e da oficina ,
transferidos, hoje, para a escola e o progresso das ciências e •
dos conhecimentos que faz surgir novas disciplinas postulando le
gitimamente lugar no ensino médio vêm sufocando o quadro curricu
lar do curso médio, impondo assim uma renúncia a disciplinas de
inegável interesse;
b) as atividades de enriquecimento cuja importância é dar a
feição própria a cada escola, permitindo a oferta a comunidade
de tipos variados de escola, não devem ser obrigatória, nem defi_
nidas necessariamente- como disciplinas formais;
c) a extensão continental do Brasil não aconselha o alarga-
mento das disciplinas obrigatórias nacionais.
Voto do Relator
Pelas razões expostas, Defesa do Consumidor, embora deva
ser preocupação da escola, não deve ser atividade obrigatória
por determinação da autoridade governamental, não é do núcleo
comum, nem deve ser titulada como disciplina.
É o nosso voto
A Câmara de Ensino de 1º e 2º graus acompanhou o voto do
Relator.
IV - DECISÃO DE PLENÁRIO
O Plenário do Conselho Federal de Educação aprovou por unanimidade,
a Conclusão da Câmara.
Sala Barretto Filho, em 04 de 07 de 1991.