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nal, surge uma necessidade de ruptura e de renovação.
Movidos pelo impulso dessa renovação, no final dos anos 60
foi criado um produto nacional inspirado no conceito antro-
pofágico de Andrade. Buscou-se elementos nos Beatles, em
Bob Dylan, e em compositores da vanguarda européia e
temperou-se com a energia e rebeldia própria da juventude
daquela época. Esse novo momento da canção brasileira
ficou conhecido como Tropicália.
TROPICÁLIA
Convém inicialmente chamar a atenção para o panora-
ma cultural prevalente no Brasil no final dos anos 60. No
campo das artes plásticas,Hélio Oiticica desenvolvia um tra-
balho renovador do ponto de vista estético. José Celso
Martinez e o grupo Oficina também seguiam nessa linha de
“rompimento “encenando peças com texto de Oswald de
Andrade e questionavam o comportamento das elites brasi-
leiras. No cinema, Glauber Rocha criticava a situação políti-
ca. Eram manifestações distintas mas que carregavam no seu
bojo a mesma vontade de renovação convergindo para o que
se chamou de tropicália. Observa-se, portanto, a amplitude
cultural do movimento que arrastou consigo um grupo
representativo de intelectuais e artistas que se identificaram
com uma proposta vanguardista.
No campo musical, o principal compositor dessa nova
era da canção brasileira foi Caetano Veloso. Assumindo a
força da antropogafia sobre o movimento, o intérprete-com-
positor aludiu ao conceito do termo na sua origem, rememo-
rando o episódio inusitado do Bispo Sardinha. Tendo sido
convidado de honra para um jantar de uma tribo canibal nos
tempos que seguiram a descoberta do Brasil pelos portugue-
ses, o Bispo da Igreja católica é surpreendido ao notar que ele
seria o próprio cardápio a ser consumido.
A antropofagia ganhava dimensão nas encenações escritas
por Oswald de Andrade, cuidadosamente examinadas e apre-
ciadas por Caetano Veloso. Portanto, a tropicália surge com o
sabor dos anos 60, a partir de um conceito dos modernistas
dos anos 20,e,com a mesma intensidade daquela década,tam-
bém representou um ponto de convergência das vanguardas
artísticas. A tropicália tornava-se “embrião”na obra plástica de
Oiticica exibidas no Rio de Janeiro, desenvolvia-se nas mani-
festações teatrais dirigidas por José Celso e finalmente nascia
Carmem Miranda, dos carnavais das marchinhas, do baião
de Luiz Gonzaga e da força dos programas de rádio e suas
vozes maravilhosas, foi a Bossa Nova que procurou dar à
Música Popular Brasileira, um cunho nacionalista. Pelo
menos do que se pode observar, foi a primeira vez que, de
forma consciente, se abordou a questão do cunho formal-
mente nacionalista no âmbito da música popular propria-
mente dita. O movimento surge a partir de 1958, marcado
pelas mudanças principalmente de estrutura rítmica. A cida-
de mais cantada durante toda a Bossa Nova foi a cidade do
Rio de Janeiro, valorizando as suas belezas naturais, o que
contribuía para imprimir à música um caráter de exportação.
Em 1963, um grupo de músicos eruditos, incluindo
Rogério Duprat, Júlio Medaglia, Sandino Hohagen e Willy
Correia de Oliveira, entre outros, assinavam o Manifesto
Música Nova no qual se declaravam totalmente comprome-
tidos com o mundo contemporâneo. Propõem um desenvol-
vimento interno da linguagem musical com a contribuição de
Debussy, Ravel, Schöenberg, Webern, Varèese, Schaeffer,
Messiaen, Cage, Boulez e Stockhausen e com a adoção aos
novos conhecimento do homem, como os computadores,
além de outros recursos. Dentre outras preocupações, o
grupo destacava o novo processo de criação-consumo da
música, referindo-se a inclusão do rádio, da televisão, do tea-
tro literário, do cinema, dos jingles das propagandas, dos
stands das feiras e dos aparelho de som dentro do espaço
doméstico na vida cotidiana do homem pós-moderno.
Logo após, em 1964, explode a Revolução que culmina
na tomada do poder pelos militares. Sob a égide dos milita-
res, inaugura-se um novo cenário de inspiração para as artes,
ora limitada pela censura, ora marcada pelo ufanismo nacio-
nal.A corrente nacionalista,mais afinada com a Bossa-Nova,
enfrentava a invasão das músicas norte-americanas e em
seguida do iê-iê-iê dos Beatles. Surge a Jovem Guarda, movi-
mento cujo maior representante foi o cantor Roberto Carlos,
tendo se transformado no fenômeno de maior sucesso de
todos os tempos no Brasil. A Jovem Guarda tinha como
palco um programa de televisão aos domingos e como carro
chefe, uma versão nacional do rock. No entanto, esse movi-
mento surgido nos anos 60, não encampou a crítica ao regi-
me militarista pós-revolução.
Diante desse momento pelo qual passava a canção nacio-