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A Rádio
Nacional...
Sérgio Cabral
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m 1951, a tripulação de um avião da Força
Aérea Brasileira, daqueles que eram chama-
dos de fortaleza voadora”, dava início às pro-
vidências para a aterrissagem na cidade de Campo
Grande, quando foi surpreendida por um apagãono aero-
porto local.Voando desde Manaus, a tripulação sabia que
a reserva de combustível não era suficiente nem para pro-
curar o aeroporto mais próximo
(situado a centenas de quilômetros
de distância) nem para esperar
muito tempo pela volta da luz.
O comandante do avião comu-
nicou-se com o responsável pela
unidade da FAB de Campo
Grande, a quem transmitiu o
drama que estava vivendo. A
comunicação seguinte foi feita de
Campo Grande para a Base Aérea
de Santa Cruz, no Rio de Janeiro,
que, por sua vez, entrou em conta-
to com a Rádio Nacional, situada
na Praça Mauá, no Centro do Rio,
para pedir ajuda. Minutos depois,
um locutor transmitia aos ouvin-
tes de Campo Grande – portanto,
a mais de dois mil quilômetros de
distância – a seguinte mensagem.
“At e n çã o, C a mpo Grande,
Mato Grosso! Uma fortaleza voa-
dora da FAB precisa aterrissar e o
campo de pouso está às escuras.
Apelamos aos proprietários de
E
automóveis que se desloquem imediatamente
para o aeroporto a fim de que a pista de aterris-
sagem seja iluminada pelos faróis dos seus auto-
móveis.
O apelo foi repetido várias vezes, até que a
Rádio Nacional foi informada de que o proble-
ma estava resolvido. Às 23h45, o avião pousava
no aeroporto de Campo Grande iluminado
pelos faróis de centenas de automóveis.
Enfim, um texto sobre a Rádio Nacional poderia limi-
tar-se a fatos como o descrito acima e que justificam a posi-
ção dos que consideram a emissora o maior fenômeno de
comunicação do Brasil, mesmo levando em conta outros
exemplos impressionantes, como o da velha revista O
Cruzeiro e o da atual TV Globo. Como não se pretende
neste espaço promover um desfile de histórias que ilustra-
Foto: Mario Thompson
Orlando Silva
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riam ainda mais o poderio da Rádio Nacional, o assunto é
encerrado com a informação de que,em 1949,o programa
“No mundo da bola promoveu a eleição do jogador de
futebol preferido pelos ouvintes. Os votos eram enviados
num envelope de comprimido para dor de cabeça, o patro-
cinador do concurso. Os funcionários da emissora conta-
ram, no final da eleição, mais de 19 milhões de envelopes,
sendo que o craque vitorioso – o atacante Ademir, do
Va s c o d a G a m a e da seleção brasileira – recebeu
5.304.935 votos,marca que,em matéria de eleição,só seria
superada em 1960, quando Jânio Quadros foi eleito presi-
dente da República com pouco mais de 6 milhões de votos.
Fundada em 1936 e sendo transferida para
o governo federal em 1941, a Nacional
dispensava a ajuda oficial, pois, duran-
te mais de 20 anos, foi o veículo de
comunicação com a maior receita
publicitária do país. Tal receita
era suficiente para pagar os salá-
rios de 9 diretores,240 funcioná-
rios administrativos, 10 maes-
tros,124 músicos,33 locutores, 55
radiatores, 39 radiatrizes, 52 canto-
res, 44 cantoras, 18 produtores de pro-
gramas, 1 fotógrafo, 5 repórteres, 13 infor-
mantes, 24 redatores e 4 editores de jornais fala-
dos.
A programação era variada.A audiência feminina fica-
va por conta das novelas, que, em estilo de folhetins,se pro-
longavam por vários meses. Havia também os programas
humorísticos, a cobertura dos acontecimentos esportivos,
os programas de auditório, os (muitos, podem acreditar)
programas culturais e os programas musicais. Estes últi-
mos, provavelmente, são os que mais resistiram ao esqueci-
mento a que foram condenados não só os programas
como os próprios radialistas, uma sina que parece confir-
mar o que diziam os anunciantes contrários à publicidade
radiofônica nos tempos pioneiros, recusando-se a fazer
propagando em rádio: palavras o vento leva.Mas o pessoal
da música não foi esquecido e, durante muitos anos, seus
nomes permaneceram ligados à história da Rádio
Nacional. Falando, por exemplo, do cantor Francisco
Alves, um dos primeiros ídolos da música popular brasilei-
ra, vem logo à lembrança a abertura do seu programa, ao
meio-dia, quando a locutora dizia que, naquele momento,
os ponteiros se encontravam. A morte de Francisco Alves,
em setembro de 1952, num acidente de carro, paralisou o
Brasil e levou pela primeira vez a Rádio Nacional a suspen-
der a programação e passar 24 horas tocando apenas dis-
cos do cantor.
Seria difícil apontar o maior ídolo entre as centenas de
cantores que passaram pela emissora, mas Orlando Silva,
sem dúvida, foi o primeiro deles, pelo menos cronologica-
mente. Contratado pela Rádio Nacional logo
na sua fundação, com uma carreira de
somente dois anos,Orlando era um
intérprete excepcional, para muitos,
o melhor que o Brasil já teve (João
Gilberto, um dos criadores da
Bossa Nova, vai mais longe: para
ele, Orlando Silva era o melhor
cantor do mundo de todos os
tempos). Seus discos e a própria
Rádio Nacional se encarregaram de
espalhar sua voz por todo o país e não
demorou muito para assumir a condição
de ídolo nacional. Nas grandes cidades, os
empresários se viram obrigados a programar apresenta-
ções do cantor nas praças públicas para que fosse visto pelo
maior número possível de pessoas.
Dois nomes intimamente ligados aos tempos áureos
da Rádio Nacional são os das cantoras Emilinha Borba e
Marlene. Profissional desde os 14 anos de idade,Emilinha
apresentou-se em outras emissoras e nos cassinos da Urca
e Copacabana, antes de ser contratada pela emissora em
1945, ano em que foram lançados os grandes programas
de auditório. Foi ela o grande destaque desse tipo de pro-
grama. Os ouvintes sabiam que ela ia cantar,antes mesmo
de ser anunciada, pela gritaria de um público formado
geralmente de gente humilde, na maioria mulheres, que
madrugava na porta da Nacional para garantir um lugar
no auditório (por serem, em grande parte, negras e mula-
Seria difícil
apontar o maior ídolo
entre as centenas de
cantores que passaram pela
emissora, mas Orlando Silva,
sem dúvida, foi o primeiro
deles, pelo menos
cronologicamente.
Contratado pela Rádio
Nacional ....
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comandado por César de Alencar (Emilinha) e
o de Manuel Barcelos (Marlene). Marlene tam-
bém caminha para os 80 anos, mas depois de
Emilinha, em novembro de 2004.
A cantora Dalva de Oliveira foi um dos
casos mais impressionantes de sucesso repenti-
no na Rádio Nacional. Sua carreira já caminha-
va para os 15 anos, quando se separou do mari-
do, o compositor Herivelto Martins, o que a
levou a afastar-se do Trio de Ouro, liderado por Herivelto.
Até a separação, estava longe de ser uma cantora de gran-
de popularidade, uma vez que, tanto nos seus discos e
quanto nos seus shows, era apenas a voz feminina do Trio
de Ouro ou dos duetos que, eventualmente, fazia com
Francisco Alves. Mas, provocada por uma música lançada
por Herivelto Martins, Cabelos brancos, cuja letra não
hostilizava um ex-amor (“não falem dessa mulher perto
de mim”, dizia a letra), Dalva deu início à sua carreira solo
com um samba-canção cuja letra tinha tudo a ver com o
fim do seu casamento: Tudo acabado, de Jota
Piedade e Osvaldo Martins. Nascia assim
uma polêmica que os ouvintes acom-
panhavam como se fosse um folhe-
tim – também estimulada pelos
dirigentes da Rádio Nacional –
com uma expressiva vantagem
para ela, que contando com a evi-
dente simpatia do público, trans-
formava suassicas em sucessos
excepcionais. Para se ter uma idéia,
num levantamento feito em 1951, o
disco mais vendido era Tudo acabado; em
segundo lugar, Errei, sim (Ataulfo Alves) e, em
terceiro, Que será? (Marino Pinto e Mário Rossi), as três
gravadas por ela. No ano seguinte, foi eleita Rainha do
Rádio. A partir de 1953, porém, Dalva deixou de lado a
sua condão de ídolo da Rádio Nacional para dedicar-se
às viagens para o exterior. Cantou várias vezes em países
sul-americanos e na Europa. Quando encerrou a fase
internacional, seu prestígio no Brasil continuava grande,
mas a popularidade já não era a mesma.
tas, não escaparam do apelido racista de macacas de audi-
tório”. Pouco depois de ser contratada, Emilinha passou a
contar com um fã-clube, que produziu filiais em todo o
Brasil. Esse fã-clube se mantém firme até hoje e não deixa
de homenagear a cantora todos os anos,no seu aniversário.
Já se prepara para comemorar os seus 80 anos, em agosto
de 2003.
A soberania de Emilinha Borba na Rádio Nacional só
foi abalada em 1949, quando a cantora Marlene derrotou-
a na eleição para Rainha do Rádio.Tal acontecimento ren-
deu uma das rivalidades mais famosas da histó-
ria do rádio e da nossa música. Baseado
nessa rivalidade – sem dúvida, gosto-
samente estimulada pela Rádio
Nacional – o senador Caiado de
Castro afirmou que a sociedade
brasileira era dividida entre emi-
linistas e marlenistas, frase que
levou a revista Radiolândia a
fazer uma visita ao Congresso
para saber quem era de um lado e
quem era do outro. Todos os parla-
mentares consultados responderam,mas,
sendo um eleitorado político,acabou vencendo
a ala que votou nas duas.
Marlene é paulista e se chama, na verdade, Vitória
Bonaiutti (seu nome artístico é uma homenagem à atriz
alemã Marlene Dietrich). Também dispõe de um fã clube
fiel e dedicado. Quando venceu o concurso para Rainha
do Rádio, a Nacional tratou de garantir a audiência sepa-
rando-a de Emilinha Borba, escalando cada uma num dos
dois maiores programas de auditório da emissora, o
Em 1954, foi
a vez de Caubi Peixoto,
o último ídolo da época
áurea da Rádio Nacional.
Seu empresário, o compositor
Di Veras, informou-se sobre
os recursos utilizados pelos
empresários americanos
para projetar seu
artistas.....
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Em 1954, foi a vez de Caubi
Peixoto, o último ídolo da época
áurea da Rádio Nacional. Seu
empresário, o compositor Di Veras,
informou-se sobre os recursos utili-
zados pelos empresários americanos
para projetar seu artistas e aplicou-
os no lançamento de Caubi,um can-
tor que, havia seis anos, cantava em
casas noturnas sem a menor reper-
cussão. Contratou falsas fãs para
“des maia rem” no auditório quando
ele cantava e fazia com que ele enver-
gasse paletós com as mangas preca-
riamente costuradas para dar a
impressão de que as admiradores
rasgavam as suas roupas. Além
disso, toda vez que estivesse em
público, deveria estar cercado de fal-
sos fotógrafos espoucando flashes,
como ocorre com as celebridades
artísticas.
Encorajado pelo êxito obtido no
Brasil, Di Veras resolveu levar
Caubi Peixoto para os Estados
Unidos, mas a experiência foi frus-
trante. Nem mesmo a mudança do
seu nome para Ron Cobby foi sufi-
ciente para transformá-lo num can-
tor popular na América do Norte.
A solução foi manter as conquistas no Brasil, enviando de
Nova York para a Revista do Rádio e para a Radiolândia
primeiras páginas de importantes jornais norte-america-
nos com o nome de Ron Cobby na manchete. Mas eram
apenas aquelas primeiras páginas vendidas por uma
pequena quantia, principalmente aos turistas, com man-
chetes imaginárias contendo os nomes dos clientes.
Na década de 1960, com o crescimento da televisão e
com acontecimentos políticos no Brasil, a Rádio Nacional
não tinha mais condições de manter o seu elenco e, aos
poucos, foi perdendo a liderança para outras emissoras
que se adaptaram rapidamente aos novos tempos. Mas
legou, sem dúvida, a mais bela história do rádio brasileiro.
Sérgio Cabral, carioca, 65 anos, jornalista desde 1957, trabalhou
em vários jornais e revistas do Rio de Janeiro e São Paulo (é um dos
fundadores do “Pasquim”), compositor, autor e diretor de espetáculos
musicais e escreveu, entre outros, os seguintes livros:Antônio Carlos
Jobim, uma biografia”,No tempo de Ari Barroso”,“Elisete Cardoso,
uma vida”,“Nara Leão, uma biografia”,“Pixinguinha, vida e obra”,As
escolas de samba do Rio deJaneiro”, “No tempo de Almirante e A
MPB na era do rádio”.
Foto: Mario Thompson
Caubi Peixoto
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