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Março de 2008 – Nº 20
CADERNOS
TEMÁTICOS
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EXPEDIENTE
Expediente
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Centro de Informação e Biblioteca em Educação (CIBEC)
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&'8
Conselho Editorial
Patrícia Barcelos, Solange Moreira Corrêa, Maria Amelia Ayd Corrêa,
Sonia Ana Charchut Leszczynski, Sandra Branchine e Cinara Barbosa
Coordenação Editorial
Cinara Barbosa
Produção Executiva
Patrícia Barcelos e Sandra Branchine
Reportagens
Marco Aurélio Fraga, Rodrigo Farhat, Sophia Gebrim e Stela Rosa
Assistente de Produção Gráfica
Muriele Cristina de Oliveira
Relações Públicas
Pablo Viana
Revisão
Denise Goulart
Diagramação
www.grifodesign.com.br
Impressão
Cromos
Impresso no Brasil
A exatidão das informações, os conceitos e opiniões emitidos nos artigos e
nos resumos estendidos, relatos de experiência e práticas pedagógicas são de
exclusiva responsabilidade dos autores.
2008 Ministério da Educação
É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte
Série Cadernos Temáticos
Tiragem: 10.000 exemplares
Ministério da Educação
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
Esplanada dos Ministérios, Edifício Sede, bloco L, 4º andar
CEP: 70047-900 – Brasília/DF
Telefones: (61) 2104-8127/9526
Fax: (61) 2104-9744
www.mec.gov.br
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SUMÁRIO
Sumário
Apresentação 5
Editorial 7
Reportagens 8
Inclusão social por meio do esporte 8
Colégio Universitário forma estudantes cegos no Maranhão 12
Rompendo a barreira do silêncio 20
Além do voluntariado 25
Artigos 29
Práticas alternativas em saúde 29
Significado do envelhecimento entre idosos vivendo na comunidade 37
Integração curricular: diálogo com as comunidades locais 46
Comunidades indígenas e o turismo local 55
Mobilização de estudantes universitários
no desenvolvimento de práticas sociais inclusivas 60
A escola pública como instrumento de inclusão digital 65
Panificação como alternativa de inclusão para
portadores de necessidades especiais 72
Resumos Estendidos, Relatos de Experiência
e Práticas Pedagógicas 77
Reflexões sobre a transposição do rio São Francisco,
a partir do filme ‘Narradores de Javé’ 77
(Des)construindo diferenças 80
Dia de feira 83
A comunidade remanescente de quilombos do Angico na cidade de Alegrete 85
Implantação de uma unidade piloto de biodiesel 88
Efeitos do turismo na comunidade em Carrancas 90
Horta escolar: uma estratégia de aprendizagem e construção do cidadão 93
Contatos 96
José Freire
5
APRESENTAÇÃO
Apresentação
Esta publicação tem história. Resulta de um trabalho iniciado em mea-
dos de 2004. Àquela época, a equipe de Comunicação Social da Secretaria
de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação tinha
alguns desafios à frente: revelar o cotidiano das escolas de formação de
trabalhadores; mostrar a diversidade dessas unidades; valorizar a produção
cultural e científica de servidores, estudantes e professores. Havia, ainda,
algumas barreiras a vencer, como manter e aperfeiçoar a qualidade de tex-
tos e imagens das publicações.
Quinze edições depois, as tentações são outras. Luta-se para ampliar
a tiragem, de forma a aumentar o número de leitores, assim como avaliar
qualitativamente cada edição.
Nesse percurso, mais precisamente em 2007, a coletânea Cadernos Te-
máticos da Educação Profissional passou a integrar o Qualis, lista de perió-
dicos com qualidade recomendada pela Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (Capes). Ao lado de anais, revistas e jornais,
os cadernos se tornaram divulgadores avalizados da produção intelectual
de professores e alunos de programas de pós-graduação. Os cadernos re-
ceberam classificação em três áreas distintas: ciência de alimentos (nível C
em âmbito nacional), educação (nível C nacional) e multidisciplinar (nível B
nacional). Dessa forma, os trabalhos produzidos por professores e estudan-
tes da Rede Federal de Educação Profissional ganharam mais visibilidade e
ampliaram o diálogo com as agências de fomento à pesquisa.
Hoje, todas as escolas da Rede Federal de Educação Profissional e Tec-
nológica recebem exemplares dos Cadernos Temáticos. Consegue-se, tam-
bém, atender às escolas estaduais de educação profissional. Entretanto, a
cobertura não atinge ainda as instituições públicas de ensino médio. É uma
meta a ser alcançada.
Em quatro anos, o projeto gráfico-editorial pouco foi alterado. A princi-
pal preocupação para as modificações foi o refinamento do projeto gráfico,
de forma a facilitar a leitura da revista e a compreensão de seu conteúdo,
tornando-a de leitura mais ágil. Barras coloridas passaram a servir de indi-
cadores das seções: reportagens em vermelho, artigos em azul, resumos,
relatos e práticas em verde, de forma a diferenciar uma página da outra. No
quesito editorial, buscou-se ampliar a abrangência, de maneira a descorti-
nar o mosaico de ações e estudos produzidos pelas escolas, numa ligação
explícita com a realidade de cada região.
A finalidade dos Cadernos Temáticos continua a mesma, ou seja, divul-
gar trabalhos, pesquisas e projetos de servidores, professores e alunos da
Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. A seleção do material
enviado pelas escolas é feita de acordo com alguns critérios. Os mais impor-
tantes são a pertinência ao tema e a relevância das informações, de forma a
que os artigos contidos nesses cadernos reflitam a diversidade e a realidade
de cada local, de cada cidade e de cada escola. Todos mostram, por meio
de texto – artigos, resumos, relatos, práticas e reportagens –, a realidade da
formação de profissionais no Brasil.
O desafio de editar cada número dos Cadernos Temáticos, entretanto,
é o mesmo desde o início deste projeto da Setec: escrever a história da
educação profissional e tecnológica no país.
Sophia Gebrim
7
EDITORIAL
Editorial
Cadernos são retratos do Brasil
Os volumes 16 a 20 dos Cadernos Temáticos mostram experiências ino-
vadoras, práticas pedagógicas, pesquisas e resumos de artigos que contri-
buem para o desenvolvimento da educação profissional e tecnológica no
Brasil. São um retrato da harmonia das quase duas centenas de escolas da
rede com as realidades regionais do país.
De 1909 a 2002, 140 escolas técnicas foram construídas no país. De
2003 a 2010, serão mais 214, dentro do plano de expansão da rede federal
de educação profissional e tecnológica. A meta do Ministério da Educação
é chegar a 354 unidades, com a oferta de 500 mil vagas, num investimento
total de R$ 933 milhões.
A Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica oferece cursos
de qualificação, de ensino técnico de nível médio, superior e de pós-gradu-
ação. As áreas variam de acordo com a realidade regional, em sintonia com
os arranjos produtivos locais.
A experiência da escolinha de futebol no Cefet/Rio Verde e o programa
de voluntariado do Cefet/Mato Grosso são destaques deste número dos
Cadernos Temáticos da Educação Profissional, assim como o artigo sobre o
significado do envelhecimento, o relato sobre o dia de campo dos estudan-
tes cuiabanos na Feirinha da Boa Morte e as reflexões sobre a transposição
do rio São Francisco a partir do filme “Narradores de Javé”.
Com a ampliação da rede, mais experiências poderão ser temas de re-
portagens e cenários de experiências, práticas pedagógicas e pesquisas. A
diversidade brasileira tratará de enriquecê-las. Aguardem.
8
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
CIDADANIA
Escola inclusiva é aquela que possibilita uma educação voltada para to-
dos, de forma que qualquer aluno ou pessoa da comunidade que dela faça
parte possa estar inserida em suas ações sociais. É nesse espírito integrador
que a escolinha de futebol do Centro Federal de Educação Tecnológica de
Rio Verde (Cefet/Rio Verde), implantada no início de 2007, está ajudando a
resgatar a cidadania de meninos carentes com idade entre 8 e 12 anos, que
moram em bairros da periferia da cidade.
A iniciativa do projeto é do Setor de Esportes e Lazer do Cefet/Rio
Verde. Nos três encontros semanais, além de ensinar as técnicas e táticas
do futebol, os profissionais envolvidos no projeto desenvolvem diversas
atividades junto às crianças com vistas à formação de conceitos voltados
para o desenvolvimento de bons hábitos de disciplina, responsabilidade,
compromisso, espírito competitivo, respeito ao próximo e ao meio am-
biente e vivência em grupo.
Inclusão social por meio do esporte
Escolinha de futebol do Cefet de Rio Verde alia esporte
e educação na formação cidadã de crianças carentes
Fotos: Danilo Cunha
Escolinha de futebol estimula a integração de meninos carentes durante as atividades desportivas
9
REPORTAGENS
Aluno em sala de aula
Uma das exigências feitas pela equipe para cadastrar a criança no pro-
jeto é a comprovação de matrícula no ensino regular. “Fazemos isso como
forma de motivar a criança a permanecer nos estudos. Muitos levam tão a
sério que já contam orgulhosos que as notas nas provas melhoraram”, diz
o professor de Educação Física, José de Oliveira, que, ao lado da professo-
ra Cleide Borges da Costa e de dois alunos residentes do Cefet, treina os
meninos nos campos e nas quadras da instituição. Oliveira destaca que a
meta principal da iniciativa não é garimpar talentos para o futebol, mas sim
contribuir para a formação de cidadãos.
Thalles, da Silva, Lucas, Thallisson e outras sessenta crianças que fazem
parte do projeto também têm acompanhamento médico e odontológico
no ambulatório da instituição. “Qualquer prática de esporte exige cuida-
dos com a saúde e aqui não é diferente. Estamos lidando com crianças e
adolescentes que estão em fase de formação”, diz o médico Sidon Oliveira
Cardoso, reafirmando que para ingressar na escolinha é necessário estar em
dia com os exames médicos.
O odontólogo Herasto de Freitas Bastos realiza pequenos procedi-
mentos em um consultório montado no ambulatório do Cefet. Os casos
mais graves são encaminhados para postos de saúde ou tratados em seu
consultório particular.
A escolinha colabora
no processo de
resgate da cidadania
das crianças
Alunos da escolinha aprendem bons hábitos
10
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Diálogo e palestras
A escolinha de futebol também conta com a participação de uma as-
sistente social, que verifica de perto o desenvolvimento de cada criança
e seu comportamento no ambiente familiar. “É um projeto de inclusão
social, no qual estimulamos atletas a se tornarem cidadãos. Mesmo que
eles não sigam carreira no esporte, queremos que eles trabalhem, es-
tudem e tenham respeito pelo próximo”, diz Lucimeiry Rodrigues de
Carvalho. A conversa com a assistente social acontece ali mesmo, à beira
do campo. “É importante essa interação com as crianças. Estando bem
próxima a eles, dá para perceber quais aspectos precisam ser trabalha-
dos”, diz Lucimeiry.
De acordo com Lucimeiry, mesmo em tão curto espaço de tempo, os
primeiros resultados já estão aparecendo. Segundo ela, os próprios pais
vêm até a instituição para agradecer pela mudança no comportamento
dos filhos. “Para participar da escolinha, cobramos boas notas no bole-
tim e não aceitamos indisciplina, brigas, nem nada do gênero”, explica
a assistente social.
Orientações sobre meio ambiente, saúde, motivação e comporta-
mento são dadas através de palestras ministradas por professores do
Cefet e colaboradores do projeto, como o professor David Vieira de
Lima, que faz questão de promover constantemente um bate-papo com
a turma. “Em nosso próximo encontro vamos debater a preservação do
meio ambiente”, avisa o professor às crianças ao finalizar o assunto do
dia: motivação e disciplina.
As crianças recebem
acompanhamento
médico, odontológico
e social
Lucimeiry dá orientações sobre cidadania, respeito ao próximo e ao meio ambiente
11
REPORTAGENS
Chauir Gomes Freitas é avô
de Thalles Gabriel Castro Gui-
marães, de 8 anos, e um de seus
maiores incentivadores. Ele con-
ta que matriculou o neto na es-
colinha de futebol do Cefet para
fazê-lo interagir com outros me-
ninos de sua idade. “Meu neto
ficava muito sozinho em casa.
Resolvi trazê-lo para a escolinha
há cerca de dois meses e o de-
senvolvimento dele tem nos sur-
preendido a cada dia”, diz o avô,
enquanto prepara o neto para
entrar em campo.
No fim de cada treino, as crianças recebem um lanche à base de suco
de frutas e pães. A merenda é produzida nos laboratórios da instituição por
alunos e professores do curso Técnico em Alimentos.
Para a vendedora de roupas Thais Aparecida Alves, mãe de Thallis-
son Alves da Costa, de 9 anos, o projeto tem ajudado a manter o filho
ocupado e evitar que ele fique nas ruas enquanto ela está no trabalho.
“Muitas vezes, preciso sair para trabalhar e fico tranqüila sabendo que
ele está aqui”.
A dona de casa Nelci Maria Joseffi, mãe do pequeno
Gustavo, 11 anos, diz que, além de ser uma atividade pra-
zerosa para o filho, a escolinha de futebol tem ajudado a
melhorar o comportamento dele em casa. “Ele está mais
tranqüilo e, ao mesmo tempo, motivado”.
Novos projetos
De acordo com o diretor-geral do Cefet, Vicente Perei-
ra de Almeida, em 2008 o projeto da escolinha de futebol
será ampliado e novas ATIVIDADES deverão ser incorpora-
das, como aulas de música e capoeira. A meta é ampliar
o atendimento da escolinha, abrindo turmas também pela
manhã e chegando à marca de cerca de 100 crianças be-
neficiadas. A instituição está em conversação com a Uni-
versidade de Rio Verde (Fesurv), para que acadêmicos de
educação física possam estagiar no projeto.
O Cefet também pretende realizar parceria com em-
presas privadas para a implantação da equoterapia na ins-
tituição. “A estrutura está praticamente pronta e, inclusive,
já temos os cavalos. Com certeza, esta iniciativa, voltada
aos portadores de necessidades especiais, será bastante
positiva”, afirma Almeida.
Reportagem: Marco Fraga
ATIVIDADES
Outra atividade programada para
o segundo semestre deste ano é a
implantação de escolinhas de vôlei e
de handebol voltadas para meninas da
periferia do município.
A merenda das crianças é produzida por alunos e professores do curso de Alimentos
Médico atende
aluno da escolinha
12
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Maria Raimunda tem 46 anos e Antônio, 50. Os dois são cegos. Como
eles, no Maranhão, há outros 508 alunos com problemas semelhantes.
No Nordeste são 3.569 e, no Brasil, 12.844, de acordo com dados do
CENSO ESCOLAR DE 2006.
No Colégio Universitário (Colun), vinculado à Universidade Federal
do Maranhão (UFMA), a professora Marinez de Souza Tamburini Brito
criou, em 2006, o Proyeto Allende para atender alunos cegos como Maria
Raimunda, Antônio Rocha, Manuel e João Brito. O projeto conta, ainda,
com o apoio da terapeuta ocupacional e coordenadora do Núcleo de
Atendimento às Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais, Angé-
lica Moura Siqueira Cunha.
Colégio Universitário forma
estudantes cegos no Maranhão
Professora de espanhol edita livros paradidáticos em Braille
ENSINO
Fotos: Rodrigo Farhat
Marinez prepara os próprios materiais didáticos
13
REPORTAGENS
Marinez, coordenadora do projeto, diz que, como não havia material
didático adequado para a formação em língua espanhola para cegos, co-
meçou a produzir as próprias apostilas em Braille e em tamanho ampliado,
recursos audiovisuais e em alto relevo. “A cada nível, eu tinha que escrever
um livro diferente”, diz. Começou, então, a produzir os textos e já escreveu
dois livros: “La mariposa que no podia volar” e “Amores_liados.com”, am-
bos editados pela Universidade Federal do Maranhão. Em 2008, Marinez
vai publicar outros dois livros: “Los padres nunca lo saben” e “Los niños
eran felices, ¿y tú?”, também pela UFMA.
O Ministério da Educação está apostando na iniciativa: vai editar os
quatro livros em Braille, além do patrocínio destinado à impressão das duas
primeiras obras, para a qual o programa Educação, Tecnologia e Profissio-
nalização para Pessoas com Necessidades (TECNEP) destinou R$ 7,2 mil.
O curso, pioneiro na cidade, é oferecido nas dependências do Colun.
Atualmente, são apenas cinco alunos com deficiência visual – cegos e
com baixa visão, todos moradores da cidade de São Luís. A próxima tur-
ma, que começa em março de 2008, já conta com mais três alunos, todos
com deficiência visual.
Censo Escolar 2006
Número de matrículas de alunos portadores de necessidades especiais
Região Estado Etapa/Modalidade Cegueira Baixa visão Surdo-cegueira
NE Maranhão
Creche 1 0
Educação de Jovens e Adultos 57 16
Educação Profissional – Nível Básico 64
Educação Profissional – Nível Técnico 00
Fundamental 70 179 13
Médio 43 23
Pré-escola 32 77 6
Total MA 209 299
Total NE 1.767 1.783 19
Total Brasil 5.207 7.101 536
Matrículas de alunos portadores de necessidades especiais visuais nos cursos de graduação presenciais (Cefets – 2006)
Cegueira
Região 1º semestre 2º semestre
T
otal MA 0 1
Total NE 00
Total Rede Federal 23
CENSO ESCOLAR DE 2006
Os números são do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC):
Fonte: Censo Escolar 2006 – Inep/MEC
TECNEP
O programa oferece cursos de
níveis básico, técnico e tecnológico,
incluindo cursos que habilitem ou
reabilitem alunos em atividades
laborais, em instituições federais
de educação tecnológica (Ifet),
às pessoas com necessidades
educativas especiais. A proposta
é conciliar os interesses e
potencialidades das pessoas
com necessidades educativas
especiais e as demandas do
mundo produtivo, na perspectiva
de levá-las a um desempenho
eficaz e produtivo, permitindo sua
emancipação econômica.
14
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Adaptação difícil
Maria Raimunda da Silva Ro-
cha é uma das alunas do curso de
espanhol oferecido pelo Colégio
Universitário da UFMA. Profes-
sora de Braille e de SOROBAN
no Centro de Apoio Pedagógico
(CAP) ao Deficiente Visual do
Maranhão e também na Esco-
la de Cegos, ficou cega aos dez
anos devido a um glaucoma.
“Quando eu perdi a visão,
ainda criança, tive dificuldade em
me adaptar a tudo, até a brincar
com os colegas. Não podia cor-
rer... Em uma escola para cegos,
fiz uma reabilitação e encontrei
pessoas com deficiências iguais”,
lembra. Ela teve que se alfabetizar novamente. “Tive que aprender tudo
de novo para poder continuar meus estudos”, conta. Mais tarde, decidiu
se tornar professora, para levar o conhecimento a outras pessoas.
Quando terminou o curso de Pedagogia, Maria Raimunda tinha mais
de 30 anos. Ela se lembra que quando ainda estudava na Faculdade
Castelo Branco, sua maior dificuldade era lidar com o material didático.
“Eu esperava os amigos lerem para mim. Fazia os trabalhos em Braille
e pedia para alguém transcrever ou então fazia em grupo e participava
das discussões”.
No CAP e na Escola de Cegos, trabalha com a primeira série do en-
sino fundamental. Tem seis alunos, todos cegos, com idades entre 17 e
24 anos.
Ela acredita no crescimento de seus alunos e diz que, em sala de aula,
consegue transmitir sua vivência para eles, dizer como foi sua trajetória e
também como devem conduzir a vida. “Temos que incentivá-los. Alguns
param no meio do caminho, querem desistir e, nessas horas, eu converso
e digo que não conseguimos nada com facilidade. Que, se quisermos algo
de verdade, temos que acreditar, que somos capazes e que, muitas vezes,
falta-nos somente a oportunidade”.
INCLUSÃO – A terapeuta ocupacional Angélica Cunha lembra que a
questão da inclusão de estudantes com deficiência é bem recente no Mara-
nhão. Até pouco tempo, esses alunos não estavam nas escolas federais.
O CAP
, administrado pela Secretaria de Educação do Estado do
Maranhão, foi fundado em 2001. Antes da sua criação, os materiais
didáticos destinados aos alunos cegos eram produzidos fora do estado,
em Pernambuco, São Paulo e Rio de Janeiro, principalmente, e demo-
ravam para chegar no Maranhão. “Com o CAP, o suporte melhorou”,
acredita Angélica.
SOROBAN
O soroban é um ábaco moderno. Na
China, onde foi desenvolvido, era
chamado de suan pan. T
razido ao
Brasil pelos imigrantes japoneses,
o soroban permite efetuar cálculos
matemáticos com rapidez e eficiência.
Adaptado, o instrumento pode ser
utilizado também por pessoas cegas.
Shutterstock
15
REPORTAGENS
No Colun, o Núcleo de Atendimento às Pessoas com Necessidades Edu-
cacionais Especiais (Napnee) foi implantado em 2005, em parceria com
o Programa Tecnep. O programa foi criado para capacitar professores e
gestores no atendimento desses alunos, para oferta, acesso e permanência
desses alunos nas escolas da rede federal e no trabalho.
O objetivo do núcleo é oferecer suporte à escola no processo de in-
clusão de estudantes com necessidades educacionais especiais. A partir
de sua implementação, lembra a terapeuta, ações para sensibilizar a co-
munidade escolar começaram a ser desenvolvidas. “As principais barreiras
– acredita – não são físicas, mas de atitude. Estas são as piores. A inclusão
exige mudanças de posturas e comportamento, por isso a proposta de
nossas ações é sensibilizar a comunidade”, diz.
Somente agora é que as universidades estão oferecendo disciplinas
como Língua Brasileira de Sinais (Libras), Braille e Fundamentos sobre Edu-
cação Inclusiva. Mesmo assim, várias universidades ainda estão com o currí-
culo antigo. Por isso, os professores que trabalham com educação inclusiva,
hoje, no Maranhão, tiveram que buscar essa formação fora, por meio da
educação continuada.
Outras ações afirmativas para reverter esse quadro, lembra Angélica, são
o sistema de cotas, criado recentemente pela UFMA, e a oferta de cursos
de Libras, Braille, Orientação e Mobilidade e Soroban no Colun. A escola
também está adquirindo equipamentos e materiais especializados, como
impressora e máquina de escrever Braille, lupa eletrônica para alunos com
baixa visão, calculadora falada e regletes. Os investimentos nesses equipa-
mentos foram da ordem de R$ 25 mil. Somente a impressora, importada do
Canadá, custou R$ 14 mil.
Contudo, a inclusão não deve ser temida pelas escolas, vista como um
problema, que requer gastos e esforços gigantescos. “Deve ser uma possi-
bilidade enriquecedora, de poder vivenciar e descobrir novas formas de
ensinar e aprender”, diz Angélica.
16
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Material didático é maior
dificuldade para estudante cego
Antônio Ferreira Rocha, o Rocha, é diretor da ESCOLA DE CEGOS.
É professor de história e geografia do ensino fundamental e também
ensina soroban. Desde que ficou cego, aos 16 anos, num acidente com
solda elétrica, seus maiores problemas foram derivados da falta de ma-
terial didático adequado.
Até superar as primeiras dificuldades, ficou quatro anos sem estudar.
“Precisei reaprender tudo”, conta. O tato ficou mais aguçado, pois passou
a utilizá-lo mais intensamente.
Rocha começou a estudar espanhol, no Colégio Universitário, em 2006.
Diz que ainda não fala muito bem e que a convivência com os outros
alunos é tranqüila. “Meus maiores problemas são com os livros didáticos,
nunca com as pessoas”, revela.
Quando ficou cego, morava em Imperatriz. Foi para São Luís fazer
uma cirurgia e lá conheceu a Escola de Cegos, em 1973. Começou
como aluno e chegou a diretor, após ser eleito pelo voto dos 250 sócios
mantenedores.
ESCOLA DE CEGOS
A escola é mantida por meio
de contribuições mensais, que
variam entre R$ 5 e R$ 50.
R
ecebe estudantes de todo o
estado. Tem, atualmente, 60
alunos e 12 professores.
Marinez produz materiais em alto relevo
17
REPORTAGENS
DIFICULDADESO professor de Braille José Ribamar Mesquita Al-
ves, 56 anos, contratado para ministrar o curso no Colun, conta que
ficou cego ainda criança, com dez anos, num acidente com faca. Pas-
sou seis anos tentando recuperar a visão. Com 18 anos, desenganado,
procurou a Escola de Cegos em São Luís. Lá, fez os ensinos básico e
médio. Prestou oito vestibulares até conseguir ingressar na universida-
de. “Tínhamos o mesmo tempo que uma pessoa com visão para fazer
as provas. Os exames tinham erros e a fiscalização não deixava que um
professor lesse as questões para a gente”, recorda-se. Hoje em dia, um
fiscal lê as perguntas para os estudantes com deficiência, durante a se-
leção para o ensino superior. Além disso, eles têm uma hora a mais do
que os alunos normais para fazer as provas.
Ele diz que muitas pessoas estão aprendendo Braille, hoje em dia.
Tanto que ele tem uma turma de 20 alunos, no Colun, todos videntes.
Ele defende que o professor aprenda Braille e Libras para poder lecionar:
A educação é para todos e o professor não pode ficar limitado a uma ou
outra linguagem”.
Carlos Magno Lima Galvão tem 22 anos e estuda no curso técnico de
Enfermagem do Colun. Já sabe Braille e está aprendendo Libras. Também
auxilia Marinez a ler os textos para os alunos sem visão. Ele aposta no novo
campo de trabalho e deseja ser, no futuro, monitor de Braille no CAP.
Ensino de cegos começou no século 18
O ensino de cegos começou no século 18, quando Valentin Haüy
criou, em Paris, em 1784, a primeira escola para educação dessas pes-
soas. Ele teve a idéia depois de ver um espetáculo com dez cegos que se
exibiam como fantoches.
De acordo com o portal Ler para
ver (http://www.lerparaver.com), Haüy
entendeu que na educação dos cegos
o problema essencial consistia em fa-
zer que o visível se tornasse tangível.
Ele, então, adaptou os processos dos
videntes. Na escola, adotou o alfabeto
vulgar, traçado em relevo, na expecta-
tiva de que as letras fossem percebidas
pelos dedos dos cegos. Para a escrita,
ele usava caracteres móveis.
O problema da educação dos ce-
gos, no entanto, só foi resolvido com
a invenção e a adoção do Sistema
Braille.
Luís Braille brincava na oficina
do pai, em 1812, quando se feriu.
Algum tempo depois, ficou comple-
tamente cego. Ele chegou à escola
O alfabeto em Braille: um tipo de escrita
com 63 sinais sem lápis e sem tinta
18
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
de Valentin Haüy, sete anos depois. Ali, estudou nos livros impressos em
caracteres ordinários, criados por V
alentin Haüy. Nesse mesmo ano, o
capitão de artilharia Carlos Barbier de la Serre começou a se interessar
pela escrita dos cegos.
ESCRITA NOTURNABarbier teve a idéia de designar as coordenadas
dos seus símbolos sonográficos por certo número de pontos colocados em
duas filas verticais e paralelas. Barbier inventou um instrumento que, em
conjunto com um estilete, podia ajudar na gravação de todos os símbolos
de seu sistema no papel. Deu o nome de escrita noturna sem lápis e sem
tinta a esse processo.
O sistema de Barbier nunca foi usado na escola de Haüy
, mas é a base dos
trabalhos que Luís Braille realizou por volta de 1825. Ele reconheceu que os
sinais com mais de três pontos em cada fila ultrapassavam as possibilidades
de uma única percepção táctil. Tratou, então, de reduzir as proporções, para
obter sinais que pudessem formar uma imagem debaixo dos dedos. Criou,
também, uma convenção gráfica, atribuindo a cada símbolo um valor orto-
gráfico e não fonético, em equivalência com os caracteres vulgares.
O Braille tem 63 sinais, obtidos pela combinação de seis pontos agrupa-
dos em duas filas verticais e justapostas de três pontos cada.
Equipamentos apóiam
a educação especial no Cefet/MA
O estudante Valmir tem retinose pigmentar, doença que comprome-
te a visão. Ele precisa de um computador adaptado e do material didáti-
co impresso no método Braille para estudar e realizar todas as atividades
acadêmicas. Por meio do programa Educação, Tecnologia e Profissiona-
lização para Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais (Tecnep),
do Ministério da Educação, Valmir, aluno do Centro Federal de Educa-
ção Tecnológica (Cefet) do Maranhão, tem todo o material de estudo
impresso em Braille, além de um computador e duas impressoras.
A inclusão de alunos com necessidades especiais em classes regulares é
uma exigência das políticas públicas em nosso país”, afirma a coordenado-
ra do Núcleo de Atendimento às Pessoas com Necessidades Educacionais
Especiais (Napnes), do Cefet/MA, Vera Lúcia Monteiro Meneses.
No computador de Valmir, um programa de áudio relata oralmente
o que está escrito na tela. “Sou o único estudante do Cefet nessa con-
dição”, diz. Valmir cursou o ensino fundamental na Escola de Cegos do
Maranhão. Quando chegou ao Cefet/MA, a instituição não dispunha de
estrutura para atendê-lo. Durante um ano, sem condições de estudar ade-
quadamente, tentava ouvir atentamente as explicações do professor em
sala de aula, procurava livros em Braille das disciplinas estudadas e pedia
ajuda aos colegas.
No segundo ano, que incluía matérias técnicas e do ensino médio, Val-
mir teve ainda mais dificuldades, principalmente com gráficos. Agora, com
os equipamentos adquiridos pelo Cefet, ele espera melhor rendimento es-
colar. No futuro, Valmir deseja estudar Direito.
19
REPORTAGENS
Mundo tem 40 milhões
de deficientes visuais
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam a existência de
aproximadamente 40 milhões de pessoas com deficiência visual no mundo, das
quais 75% são provenientes de regiões consideradas em desenvolvimento.
Segundo o Censo de 2000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís-
tica, 14,5% da população brasileira possui algum tipo de deficiência, o que
representa cerca de 25 milhões de pessoas. A maior parte desse percentual
(48,1%) é constituída de pessoas com deficiência visual, seguida de defi-
ciência motora (22,6%), deficiência auditiva (16,7%) e mental (8,3%). O
percentual de deficientes que vive abaixo da linha da pobreza atinge 70%.
No Maranhão, os deficientes visuais estão cada vez mais presentes
nas escolas. O Colégio Universitário da UFMA, por meio de parcerias
com instituições especializadas, instituiu, em março de 2005, o Núcleo de
Atendimento às Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais (Nap-
nee) para dar suporte à escola no processo de inclusão de alunos com
necessidades especiais, visando à formação integral, qualificação profis-
sional e inserção desses alunos no mercado de trabalho.
Em 2007, o colégio formou dois alunos com deficiência visual nos cursos
técnicos de Administração e Meio Ambiente. Hoje, ambos os estudantes estão
no mercado de trabalho e cursam Direito e Pedagogia. Em 2008, com a im-
plantação de cotas, quatro novos alunos com deficiência foram matriculados.
Reportagem: Rodrigo Farhat
20
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Marcos de Moraes Santos, 34 anos, Marcelo Silveira de Jesus, 32, Ale-
xander Garrido Fernandez Ivo, 29, e Bruno Silva Pedra da Rocha, 23,
são alguns dos integrantes de um time de BASQUETE de Salvador. O que
diferencia esses jogadores dos demais é que todos são surdos e têm em
comum uma história de luta contra o preconceito e a exclusão. Apaixo-
nados por esporte, eles acumularam tentativas frustradas de integrar esco-
linhas e clubes de Salvador. Sem poder se comunicar com os ouvintes e
geralmente relegados ao banco de reservas, eles se associaram ao Centro
de Surdos da Bahia (Cesba), formaram um time e começaram a treinar
por conta própria. Marcos Moraes, ex-integrante do time do clube baiano
Itapagipe, assumiu o papel de treinador, socializando suas experiências no
basquete para um grupo de amigos. Na época, eles enfrentavam diversas
dificuldades para se tornarem jogadores profissionais, desde a falta de
quadra adequada até conhecimentos técnicos.
Rompendo a barreira do silêncio
Docente do Cefet/BA contribui para
a inclusão de jovens surdos no esporte
INCLUSÃO
SURGIMENTO DO BASQUETE
Em 1891, o professor de educação
física canadense James Naismith,
do Springfield College, em
Massachusetts, Estados Unidos,
recebeu do seu diretor a seguinte
tarefa: pensar em algum tipo de
jogo sem violência que estimulasse
seus alunos durante o inverno, mas
que pudesse também ser praticado
no verão em áreas abertas. Assim
surge o basquete.
Fotos: Lilian de Jesus Caldas
Atletas e treinadora Claudete Blatt comunicam-se em Libras
21
REPORTAGENS
A partir de 2004, a história começa a mudar. Eles passam a ser treinados
por Claudete Blatt, professora de educação física do Centro Federal de Edu-
cação Profissional e Tecnológica da Bahia (Cefet/BA). O projeto faz parte
dos programas de extensão desenvolvidos pela escola e está contribuindo
com a inclusão de cerca de 30 jovens surdos de Salvador na prática da
atividade esportiva.
Formada em Educação Física e mestre em Pedagogia, Claudete conta
que os primeiros contatos com os atletas foram feitos através do Cesba. “Ini-
cialmente, eles solicitaram apenas o uso da quadra, e quando eles vinham
jogar, eu ficava olhando. Então, comecei a orientá-los e fomos estabelecen-
do uma relação de respeito e ajuda mútua”, relembra. Para desenvolver o
trabalho, a principal barreira era a comunicação, problema que foi supera-
do com um curso de LIBRAS. Na brincadeira e contando com a solidarie-
dade dos alunos, ela foi dominando a linguagem e hoje é técnica oficial do
time de basquete de surdos do Brasil. “
Quando eu errava algum sinal, eles
riam e me mostravam a forma correta. Sempre estive aberta a aprender, e
eles, a ensinar. Foi uma troca gratificante”, conta.
Claudete avalia que na quadra não há diferença, todos os atletas pre-
cisam ter disciplina, garra e treinar. “Muitos deles, mesmo apresentando
excelente qualidade técnica, não eram aceitos em equipes por causa da
surdez. Ainda há muito preconceito e acomodação por parte da sociedade,
o que acaba deixando milhares de brasileiros excluídos de diversas ativida-
des, entre elas, o esporte. A única barreira que existe é a linguagem e não
é difícil aprendê-la”, ressalta.
Jovens saem da invisibilidade
A contribuição do Cefet/BA na qualificação dos esportistas foi funda-
mental para as medalhas que o time vem conquistando. Hoje, eles são
bi-campeões do Nordeste, vice da Copa Brasil, terceiro lugar na Olimpí-
ada do Brasil, campeão do Torneio em Recife e ficaram em quarto lugar
nos Jogos Pan-Americanos na Ve-
nezuela. Todos em competições
de surdos.
De acordo com a Confedera-
ção Brasileira de Basquete, essa
modalidade foi criada, em 1891,
pelo canadense James Naismith.
O objetivo do então professor
de Educação Física era que fosse
uma atividade que pudesse ser
realizada em grupo e em quadra
fechada para livrar os alunos do
frio rigoroso dos Estados Unidos.
NO BRASIL, a prática começou
em 1896, quando o norte
-ame-
ricano Augusto Shaw introduziu
o esporte na Associação Atlética
Mackenzie de São Paulo. Porém,
LIBRAS
A Língua Brasileira de Sinais é
reconhecida como meio legal de
comunicação e expressão entre as
comunidades de pessoas surdas
no Brasil. Ganhou esse status
porque surgiu naturalmente, assim
como a língua portuguesa. Baseou-
se primariamente na Língua de
Sinais F
rancesa, apresentando
semelhanças em relação a várias
línguas de sinais européias e à
norte-americana.
BASQUETE NO BRASIL
De acordo com registros, os
primeiros jogos aconteceram no
Rio de Janeiro, em 1912, na rua da
Quitanda, no América Football Club,
primeiro clube carioca a introduzir
o esporte nesta cidade, incentivado
por Henry J
. Sims, diretor da
Associação Cristã de Moços.
Marcelo, Alexander, Marcos e Bruno
demonstram que com infra-estrutura
e treino podem conquistar medalhas
22
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
no que se refere à comunidade de surdos, ainda há muitos preconceitos
e barreiras para que eles possam ser aceitos como atletas na modali-
dade. Atualmente, os surdos estão vinculados à Liga Nordestina Des
-
portiva de Surdos (LINEDS) e à Confederação Brasileira de Desportos
dos Surdos (CBDS), pois não são aceitos nas modalidades desportivas e
campeonatos para ouvintes.
Claudete Blatt explica que as REGRAS são as mesmas para os ouvintes
e surdos e, em ambos os casos, para ser um bom jogador
, é necessário
conhecê-las, treinar, ter força, boa forma física, disciplina, visão de jogo,
agilidade e raciocínio rápido, requisitos que, segundo ela, os rapazes têm
de sobra. “Eles têm muita vontade de aprender, e a percepção no jogo
é mais ampla que a dos ouvintes, pois eles não se distraem com tanta
facilidade e assim ficam mais concentrados”, explica. Outras vantagens
proporcionadas pela prática do esporte são o trabalho em grupo, o respei-
to à diferença, o exercício físico e a disciplina, além de melhorar a auto-
estima. “Na quadra, são todos iguais, o que vale é o trabalho em grupo,
por isso, todos precisam ter o mesmo objetivo. Esses meninos apresentam
excelente qualidade técnica e têm talento para integrar qualquer time
profissional”, ressalta Claudete.
De reservas a titulares
Os quatro jogadores que participaram da entrevista para a publicação
da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da
Educação (Setec/MEC) comemoram um fato especial: saíram da condição
de reservas e da invisibilidade e hoje são titulares da seleção brasileira
de surdos. Durante o campeonato nacional para surdos, em Capão da
Canoa, no Rio Grande do Sul, em 2007, eles foram selecionados entre
mais de 60 jogadores para participar do time de basquete brasileiro que
disputou na Venezuela.
Para chegar até aí, a caminhada de cada um foi marcada por diversas
tentativas fracassadas de integrar em clubes de Salvador, tendo como prin-
cipal impedimento a surdez. Marcos Santos chegou a treinar e disputar
REGRAS E NÚMERO
DE JOGADORES
Cada jogo é composto por duas
equipes de cinco jogadores cada,
e o objetivo é fazer com que a bola
passe pelo aro ou cesta do adversário,
consistindo assim uma cesta, que
vale dois pontos. A quadra tem
marcações específicas para o jogo,
e uma bola arremessada de trás da
linha chamada “linha dos três pontos”
consiste uma cesta de três pontos.
Existem também os lances livres, que
são as faltas do basquete, que valem
apenas um ponto cada.
23
REPORTAGENS
campeonatos em um clube da Bahia, o Itapagipe, mas tinha lugar cativo
no banco de reservas. “Com o tempo, descobri que as pessoas sequer me
chamavam pelo meu nome, era tratado por “mudo”, tamanha a dificuldade
de me aceitarem”, conta. Depois de alguns anos, optou por abandonar o
clube, pois, mesmo dispondo de um espaço com infra-estrutura, ele não se
sentia jogador do time.
Já Marcelo Silveira, desde pequeno é apaixonado por esporte, mas
cedo descobriu que o fato de ser surdo trazia restrições que lhe impos-
sibilitariam de participar de diversas atividades. Quando tinha 10 anos,
chegou a ser selecionado para integrar um time de futebol, convocação
que durou o tempo de descobrirem que era surdo. “Não suportava a
escola por conta da falta de comunicação, as situações de discriminação
sempre me incomodaram. Já no esporte, quando estava jogando, não
era apenas mais um, era o jogador, e quando o meu time ganhava, eu
também ganhava”, relata.
A história de Bruno Pedra não é diferente. Considerado o segundo me-
lhor jogador na categoria de surdos, ele chegou a jogar no Esporte Clube
Bahia, mas sempre ficava no banco de reserva: “Ficava triste, minha estima
ia lá para baixo”, diz. Acabou desistindo e passou a integrar o time organi-
zado pelo Cesba.
Alexander Garrido tem uma trajetória similar. Aos 13 anos, começou a
praticar natação e, com o tempo, descobriu o basquete. Porém, como os
demais, só passou a ser reconhecido quando integrou o time organizado
pelos amigos surdos.
De acordo com o grupo, o trabalho desenvolvido por Claudete foi
essencial para que eles pudessem avançar. Segundo eles, a diferençada
de postura da docente para a dos demais treinadores é que ela conseguiu
absorver o grupo e a diferença de forma plena. “É brava (risos), mas ensina
bem, é uma excelente técnica e não podemos deixar de destacar que o
seu trabalho é voluntário. Ela é exigente, dedicada e companheira, quali-
dades que nos impulsionam a fazer melhor”, resume Alexander Garrido.
Preconceito exclui
milhares de brasileiros
De acordo com dados do IBGE,
existem no Brasil cerca 5,7 milhões de
pessoas com problemas relacionados
à surdez. A principal dificuldade de
integração na sociedade é a falta de
comunicação. Ana Luisa Dominguez
Baqueiro, intérprete de Libras e filha
de pais surdos, relata que a exclusão
sofrida é enorme. “As pessoas ainda
têm um grande desconhecimento so-
bre a surdez. Muitos dos surdos sen-
tem-se estrangeiros na própria casa,
sendo obrigados a usar gestos com
Professora Claudete Blatt e intérprete Ana Luisa
Dominguez mostram que na quadra não há diferenças
24
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
MAIS INFORMAÇÕES
www.cbds.org.br
Confederação Brasileira de Desportos dos Surdos – CBDS
www.lineds.com.br
Liga Nordestina Desportiva de Surdos – Lineds
www.feneis.org.br
Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos – Feneis
www.guiasurdo.com.br
Guia Surdo
www.cefetba.br
Centro Federal de Educação Tecnológica da Bahia – Cefet/BA
seus familiares para manter uma comunicação básica, visto que a grande
maioria dos familiares não sabe Libras”, afirma. Ana L
uisa avalia que tal
postura dificulta o estabelecimento de uma relação mais profunda, conde-
nando os surdos a ficarem sem uma comunicação significativa, nem mesmo
com os mais próximos. “Sem contar a escola, o trabalho, enfim, a vida
cotidiana. A única saída que eles encontram é formar guetos entre os que
falam a mesma língua”, conta.
Outras questões ressaltadas são a falta de respeito e a invisibilidade sofridas
pelas pessoas com deficiência auditiva. Ana Luisa relata que recebeu várias
denúncias de situações que relegava os surdos a exclusões cruéis. Uma delas,
conta Ana, aconteceu com uma moça que trabalhava em uma repartição pú-
blica: ”Os colegas resolveram fazer mudanças na infra-estrutura, mas ela sequer
foi informada. Ao chegar no trabalho, no outro dia, a mesa dela não estava mais
no mesmo local, tinha sido mudada para um local sem ventilação, no fundo da
sala, e o pior: de frente para a parede, isolada do mundo”, relembra.
No que diz respeito ao esporte, Ana Luisa destaca a importância do
esporte: “Ao participar de atividades esportivas, os surdos têm uma atu-
ação independente, se desenvolvem de forma individual e plena, é um
espaço em que eles podem se projetar como indivíduos, sem intérpretes
ou ‘bengalas’”, constata.
Ela avalia que é necessário sair do discurso e adotar políticas públicas
que garantam a inclusão de fato. “A afirmação da pessoa surda como indi-
víduo participante, com acesso pleno ao conhecimento, só se estabelecerá
quando seus direitos forem respeitados por toda a sociedade, de forma que
os rótulos, as diferenças ou todo o discurso de exclusão se apaguem, consi-
derando a diversidade humana e rompendo com padrões de anormalidade
e deficiência”, denuncia.
Reportagem: Stela Rosa
Shutterstock
25
REPORTAGENS
Aos sábados a rotina é a mesma. Crianças do bairro Santa Terezinha,
próximo a Cuiabá, ficam eufóricas aguardando a chegada do ônibus do Ce-
fet/MT que as transportará para a instituição. Hoje, cerca de 30 crianças são
beneficiadas com as aulas de informática básica e de reforço nas disciplinas
de português e matemática desenvolvidas pelo projeto CEFET CIDADÃO. Ao
chegar na escola, esses jovens recebem lanche e, a seguir, são encaminha-
dos para os laboratórios e salas de aula.
O projeto começou quando 10 alunos do ensino médio demonstraram
interesse em conhecer a realidade de ensino de escolas públicas de Cuia-
bá e Várzea Grande. Assim, o professor do Cefet/MT, Irênio Silva, teve a
oportunidade de falar do trabalho social que desenvolvia no bairro Santa
Terezinha, o qual inspirou os estudantes da escola.
SOLIDARIEDADE
Além do voluntariado
Aulas de informática oferecidas pelo Cefet/MT
em comunidade de Cuiabá une lições de
voluntariado com determinação e força de vontade
CEFET CIDADÃO
Cefet Cidadão tem suas âncoras no
ser humano compreendido como
grandeza infinita e no saber a sua
dimensão motivadora. As idéias
inspiradoras que o geraram vieram
trazidas por um grupo de docentes
que, insatisfeitos, optaram pela não
acomodação, construíram idéias e
aceitaram o desafio humano que é não
se satisfazer com a indiferença das
coisas como estão. Assim, assumiram
um compromisso pelo voluntariado.
Fotos: Sophia Gebrim
SOLIDARIEDADE
26
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Na primeira fase do projeto, os voluntários se dividiram em dois grupos
de trabalho: o primeiro dava aulas de informática nos laboratórios do Ce
-
fet, e o segundo, aulas de reforço de língua portuguesa e matemática na
própria comunidade dos jovens, todos com idade entre 10 e 17 anos. Para
o professor Irênio, os precursores do projeto Cefet Cidadão foram os que
mais sofreram o impacto porque foram até a comunidade e se depararam
com a situação de pobreza na qual viviam as famílias. “Eles reclamavam da
escola técnica, que não aprendiam nada e, quando chegaram lá, se depa-
raram com uma realidade dura, difícil, e passaram a valorizar suas famílias,
o ensino daqui e a usar o que sabiam também”, explica.
Em 2006, o projeto foi reformulado pela professora Miriam Ross e
passou a contar com maior apoio do Cefet no que diz respeito a trans-
porte e alimentação, uma vez que a escola já cedia os laboratórios de
informática. A Fundação de Apoio à Educação e ao Desenvolvimento
Tecnológico de Mato Grosso – Fundetec doou material didático e unifor-
mes. Este ano, novas pessoas reforçaram o grupo de voluntários, inclu-
sive os professores Lenildo Solano, de matemática, e Marlene da Silva,
de língua portuguesa.
Motivação
“É impressionante ver como os olhinhos deles brilham quando recebem
uma motivação”. Essa é a recompensa que a professora Marlene ganha ao
oferecer aulas de reforço que preparam alguns jovens do Cefet Cidadão
para o exame de seleção da escola. Há quatro alunos do grupo que estão
estudando e que têm possibilidade de passar na prova. “O sonho deles é
ingressar na instituição”, afirma.
O professor Lenildo foi um dos que motivaram os alunos Milana e Gus-
tavo, ambos do 2º ano Integrado de Informática, a participar do projeto.
“Eu tinha a necessidade de doar um pouco de conhecimento e de poder
dar oportunidade às crianças que estão à margem da sociedade”, afirma o
professor. Milana Rodrigues, de 16 anos, se diverte nas aulas de matemáti-
ca. “Eles já até me chamam de professora”, brinca a menina.
“O desejo de engajamento coletivo e voluntário dos docentes tomou
forma, teve sua gênese conhecida como um projeto de inclusão digital”,
afirma a professora Miriam. Segundo ela, as ações educacionais propostas
por um grupo de docentes da comunidade do Cefet/MT aliaram-se à de
outros profissionais que já vinham conduzindo uma vivência comunitária
com as pessoas do bairro Santa Terezinha em Várzea Grande. “Essa forma
de engajamento coletivo à escola tecido na multiplicidade de ações dos
setores desta instituição é o contexto público no qual os servidores têm
oportunidades de participação, dentre essas, a construção deste projeto
direcionado para atender às demandas de uma comunidade vizinha”. Ela
finaliza: “nesse raciocínio, trabalhar juntos, pensar juntos, estar junto, para
poder aproximar, construir novas direções, novos olhares, tem sido o con-
senso entre os atores”.
O diretor da escola, Henrique Martins, ressalta que “entendemos
uma instituição cidadã como aquela em que a compreensão do en-
A sensibilidade e
o amor alimentam
a convivência com
jovens alunos”
Irênio Silva
Professoras Maria José (esq.) e Mirian Ross
ensinam informática a alunos cuiabanos
27
REPORTAGENS
tendimento do mundo se dá pela
prática da educação. Esta precisa
estar sincera e solidamente ali-
cerçada nas bases da cidadania.
Nosso maior anseio como cefe-
tianos tem sido a construção de
um movimento para o nascimen-
to de uma cidadania outra, na
qual os jovens e pobres também
possam ter voz ativa na definição
das políticas públicas”.
As idéias que geraram o pro-
jeto Cefet Cidadão: Cidadania e
Ação já se encontravam desenha-
das pela direção-geral da escola
há algum tempo e em contexto educacional alimentavam-se sob a forma
de uma inquietação latente diante de situações de desigualdade em
que muitas vezes os jovens pobres são afastados de oportunidades de
qualificação para adentrar com dignidade aos múltiplos setores da vida
social. Em uma tentativa para abarcar as muitas carências sociais que
se revelavam em contexto cefetiano foram criados OUTROS PROJETOS
também de caráter social.
O bairro Santa T
erezinha, distante aproximadamente 11 quilômetros
do Cefet, está localizado no município de Várzea Grande e é por algumas
pessoas conhecido como um dos muitos espaços desfavorecidos, principal-
mente pela carência de investimentos na área social, mais especificamente
no que diz respeito a um efetivo atendimento aos jovens e adolescentes. É
dessa região que são trazidos 30 adolescentes até as salas de aula da escola
para as lições de informática e de cidadania.
OUTROS PROJETOS
No Cefet-Idiomas, que atende a
cerca de 500 alunos da comunidade,
professores voluntários dão aulas
de línguas estrangeiras para 60
adolescentes do Jardim Vitória,
bairro periférico de Cuiabá. Os
alunos aprendem inglês, francês,
espanhol e italiano. O Cefet-
Vest
prepara, aproximadamente, 200
alunos para o vestibular.
Priscila é voluntária no ensino da informática
28
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
História
O PROJETO iniciou-se do desejo de alguns alunos do ensino médio do
Cefet/MT que mostraram interesse em conhecer a realidade de ensino de
algumas escolas públicas de Várzea Grande. Orientados por docentes, que
atuaram como instrutores, protagonistas, de qualificação profissional, para a
área de informática e reforço da aprendizagem durante o segundo semestre
do ano de 2004, atendendo a um número de 50 adolescentes do bairro.
As ações educacionais foram paulatinamente se intensificando e, desta
forma, o que era considerado apenas um trabalho de jovens motivados e
solidários se solidificou”, conta a professora Miriam. Segundo ela, o grupo
de adolescentes do bairro Santa Terezinha cresceu, todavia, o inverso ocor-
reu com o grupo de alunos monitores voluntários.
As idéias inspiradoras dos voluntários do Cefet acerca da continuida-
de das ações pedagógicas vindas de uma instituição solidária e compa-
nheira não se deixaram abater pelas tensões das dificuldades ocorridas e
o ano de 2006 trouxe outras concepções quando um grupo de docentes
de diversas áreas do conhecimento mobilizou-se e direcionou suas mo-
tivações visando à qualificação dos jovens adolescentes da comunidade
Santa Terezinha”, diz Miriam.
Os resultados obtidos revelaram que os jovens apresentam expectativas
de mudanças através das aulas do projeto. Essas mudanças se dão em rela-
ção à superação das dificuldades expressadas pelas disciplinas escolares e
pela superação pessoal através da qualificação em informática.
O projeto contempla 17 encontros semestrais, com uma carga horária
de 50 horas. As aulas acontecem aos sábados, têm início às 7:30h e termi-
nam às 11:30h. Possuem um intervalo de 30 minutos para o café da manhã
e 15 minutos para a troca de professores. O programa compreende 100
horas-aula anuais e atenderá uma programação que a cada ano se renova
com uma outra turma.
Uma equipe de 20 servidores de diferentes áreas oferecem volunta-
riamente os seus saberes aos jovens alunos de Várzea Grande. “Talvez a
importância de sensibilidade e amor para com a existência humana seja
a dimensão que alimenta os professores e suas presenças face a uma con-
vivência singular com os jovens alunos”, destaca um dos idealizadores do
projeto, Irênio Silva. “Assim, ousamos afirmar que este entusiasmo amo-
roso se traduz aqui como um obstáculo ao intolerável, um instrumento de
força contra a indiferença que parece ainda habitar aos contextos públi-
cos escolares”, diz ele.
“Desde a simples e florida decoração das mesas do refeitório do Cefet
em que é servida a primeira alimentação ofertada pela equipe voluntária
do refeitório até o encantamento e o acalanto provocado pelos acordes do
violão de um professor engenheiro, fazem dos momentos preliminares às
aulas de informática e cidadania um mix de ternura e sensibilidade”, finali-
za a professora Miriam.
Reportagem: Sophia Gebrim
PROJETO
O atendimento aos jovens era feito em dois
momentos: um grupo assumia as aulas de
informática e outro atuava na comunidade,
oferecendo aulas de reforço nas disciplinas
de matemática e português.
Trabalhar, pensar e
estar juntos permite
construir novas
direções e olhares
29
ARTIGOS
RESUMO
Relata a experiência da disciplina Prática Alternativa em Saúde, do cur-
so de formação do Técnico em Enfermagem integrado ao ensino médio e
destinado a jovens e adultos ligados aos movimentos sociais do campo. A
Escola de Enfermagem de Natal, respondendo aos desafios gerados pela
implementação do SUS e pela legislação no campo da educação profis-
sional, vem desenvolvendo experiências pedagógicas descentralizadas e
includentes, na formação técnica em enfermagem. A iniciativa visa fortale-
cer a participação da UFRN junto à comunidade, através da articulação e
cooperação entre a universidade, o movimento dos trabalhadores sem terra
e o Ministério da Reforma Agrária, para a realização do curso. A disciplina
inserida na área de conhecimento Ciências Humanas e suas tecnologias,
do currículo do curso, possibilitou a reflexão sobre os hábitos do homem
contemporâneo, suas conseqüências num mundo em constante mudança e
os hábitos e alternativas em saúde que asseguram a preservação da qualida-
de de vida individual e coletiva. Possibilitou também o resgate de algumas
Práticas alternativas em saúde
TIMOTEO, Rosalba P. de S.; MONTEIRO, Akemi I.; SILVA, Edilene R.; GOMES, Cleide O.
Escola de Enfermagem de Natal/RN
Palavras-chave: Educação Profissional; Práticas Alternativas em Saúde; Enfermagem.
Fotos: Rosalba Timóteo
30
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
práticas ligadas à ação do trabalhador da terra, tais como a hidroterapia,
a argiloterapia e o uso de plantas medicinais, além de práticas em saúde
exercidas vocacionalmente por pessoas inseridas nos assentamentos e nas
comunidades onde os estudantes residem.
Introdução
O desenvolvimento de um plano de curso para a formação do técnico
em enfermagem integrado com o ensino médio destinado no primeiro
momento ao público ligado aos movimentos sociais do campo, trouxe
para o elenco das disciplinas curriculares o grande desafio de adequá-las
à realidade rural e comunitária. Tal desafio tornou-se mais relevante na
medida em que se somou à inexistência da rede básica de saúde no meio
rural, em particular, nas áreas de assentamentos e acampamentos, bem
como o distanciamento geográfico das unidades de serviços de média e
alta complexidade em saúde.
Sabe-se que a rede de serviços de saúde, em sua maior parte, encontra-
se nos centros urbanos e nas áreas de maior concentração populacional,
dificultando o acesso a esses serviços àquelas pessoas que habitam em loca-
lidades distantes e carentes de recursos para a sua locomoção. Do mesmo
modo, percebe-se que os sistemas de ensino na área de saúde, não ca-
pacitam profissionais para atuarem nesses meios, formando trabalhadores
voltados para a realidade urbana e desconhecendo os problemas, as neces-
sidades, as características e o universo da população do campo.
A implementação do Sistema Único de Saúde (SUS) traz novos eixos
orientadores e princípios que conduzem a uma outra concepção da aten-
ção em saúde, assim como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB
nº 9.394, de 20/12/96, suas leis complementares (Decreto nº 5.154, de
23/07/2004, Portaria MEC nº 646/97, a Resolução CNE-CEB nº 04/99) e
o Decreto nº 5.478, de 24/07/2005, demandam dos órgãos formadores
respostas às exigências do setor, o que possibilita a formação de um grande
contingente de jovens e adultos trabalhadores em áreas com carência de
profissionais, precárias condições de assistência e elevação dos riscos aos
usuários dos serviços de saúde.
Em particular, no meio rural a consolidação do SUS, no que tange ao
princípio da universalidade do atendimento em saúde, garantida pela Cons-
tituição Federal, ainda não se efetivou. A exemplo disso, pode-se citar que
a grande maioria dos moradores de assentamentos que procura os serviços
de atenção à saúde, o faz nos casos de acidentes ou ferimentos de trabalho.
O tratamento de doenças é realizado, independente de consulta médica,
seja através da automedicação, da consulta a balconistas de farmácias ou
sugestões de pessoas conhecidas.
Em quase todos os assentamentos existem membros da coletividade
que trabalham voluntariamente em saúde e, na maioria das vezes, sem
nenhuma preparação técnica. São pessoas vocacionadas para atuar na área,
mas que necessitam de profissionalização, atendendo, inclusive, à Lei do
Exercício Profissional de Enfermagem. Assim, o curso tem sido considerado
Rosalba Pessoa de Souza
Timoteo é doutora em Educação,
coordenadora da base de pesquisa
educação em enfermagem da
Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN) e
professora da graduação e pós-
graduação do Departamento de
Enfermagem da UFRN.
Akemi Iwata Monteiro é doutora
em Enfermagem, membro da base
de pesquisa atenção em saúde
do Departamento de Enfermagem
da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN),
professora da graduação e pós-
graduação do Departamento de
Enfermagem da UFRN.
Edilene Rodrigues Silva é mestre
em Enfermagem, membro da
base de pesquisa educação em
enfermagem, diretora da Escola de
Enfermagem de Natal da UFRN.
Cleide Oliveira Gomes é mestre
em Enfermagem, membro da
base de pesquisa educação em
enfermagem e coordenadora do
curso técnico em enfermagem
para os movimentos sociais do
campo da Escola de Enfermagem
de Natal da UFRN.
Outras instituições:
Universidade Federal
do Rio Grande do Norte.
31
ARTIGOS
um importante potencializador da organicidade comunitária na segurança
e qualidade do atendimento imediato à saúde, contribuindo com a per-
manência das famílias no campo e a inserção de pessoas habilitadas no
mercado de trabalho.
A Escola de Enfermagem de Natal (EEN) da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN), visando proporcionar uma formação profissional
orientada pelos princípios éticos, políticos, humanísticos e buscando aten-
der às demandas da comunidade ligada aos movimentos sociais do campo,
vem desenvolvendo experiências pedagógicas para a formação do técni-
co em enfermagem integrado com o ensino médio, ao público ligado aos
movimentos sociais do campo, orientada pela concepção de saúde como
direito e exercício de cidadania.
A iniciativa visa ainda fortalecer a participação da UFRN junto à comu-
nidade, através da articulação e cooperação entre a universidade, o movi-
mento dos trabalhadores sem terra e o Ministério da Reforma Agrária, para
a realização do curso.
Material e método
Este artigo relata a experiência da disciplina Prática Alternativa em Saú-
de, inserida no elenco curricular na Base Nacional Comum: fundamento à
educação básica na área de conhecimento Ciências Humanas e suas tec-
nologias, com uma carga horária total de 50 horas, sendo 14 horas teórico/
práticas e 36 horas em atividades desenvolvidas junto à comunidade.
A disciplina, oferecida para uma turma de 50 alunos oriundos dos as-
sentamentos do movimento dos trabalhadores sem terra e municípios cir-
cunvizinhos, utilizou-se de uma metodologia de aprendizagem significativa,
proporcionando situações que capacitassem os alunos a atuar na própria
realidade de forma crítica e criativa.
32
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Desse modo, buscou acompanhar o propósito de proporcionar aos
educandos
condições teóricas e práticas, para que aprendam a agir de forma
transformadora no seu campo de atuação; possibilitando novas
oportunidades de crescimento profissional que lhes assegure a
permanência ou inserção no mercado de trabalho; promovendo
a articulação educação–trabalho e a valorização profissional; e fa-
vorecendo a organização dos serviços de saúde em espaços ora
inexistentes e a sua reorganização dentro de novos paradigmas,
por entender que a qualificação guarda relação direta com a assis-
tência de saúde qualificada (UFRN, 2006).
A disciplina aconteceu através de quatro encontros presenciais e um mo-
mento de dispersão nos quais os alunos desenvolveram um estudo sobre as
práticas em saúde mais freqüentemente realizadas em seus assentamentos,
além de desenvolverem várias hortas medicinais, tanto na escola onde atual-
mente residem, quanto nas suas comunidades e domicílios. Para isso, foram
instrumentalizados com materiais necessários para preparar uma “farmácia
viva”. O resultado deste trabalho consistiu na avaliação da disciplina.
Resultado e discussão
Práticas alternativas em saúde no exercício da cidadania
São chamadas de práticas alternativas em saúde aquelas baseadas em
princípios, métodos ou conhecimentos não tradicionais ou não “científi-
cos”, embora devam ser reconhecidamente equivalentes em eficiência. Po-
derá ser chamada também de prática complementar quando é oferecida
juntamente com a medicina tradicional.
Para alguns, o seu surgimento está ligado à mudança do conceito me-
canicista de saúde para o conceito integral e holístico, o qual influenciou
visões sobre medicina, meio ambiente, família, trabalho, planejamento re-
gional e paz mundial. Para outros, está vinculado a uma história recente,
influenciada, principalmente, pelo movimento
hippie que floresceu nos anos 1960 e 70, cuja
temática central era o desafio à autoridade,
qualquer que fosse. Esse modo de pensar vem
favorecendo a adoção de um novo estilo de
vida – a sociedade alternativa – tanto nos va-
lores e regras, quanto na alimentação (vegeta-
rianismo, alimentação natural e macrobiótica)
e na própria medicina. E, por fim, poderia ser
também o resgate de práticas que encontram
nas raízes populares a fundamentação do seu
conhecimento, valorizando a cultura e os sabe-
res local (CARROL, 2006).
O resultado é que existem as mais variadas
terapias alternativas que, em sua maioria, preo-
cupam-se com as diferenças individuais de cada
pessoa e evidenciam o enfoque global: mente,
corpo, comportamento e meio ambiente.
33
ARTIGOS
No Brasil, as terapias alternativas estão sendo institucionalizadas nos
diversos espaços do setor saúde, sendo cada vez mais procuradas pelos
segmentos da sociedade e adotadas por muitos profissionais. Muitas des-
sas terapias recebem o apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS)
e o reconhecimento do SUS, no incentivo a programas que diminuam os
custos e que sejam social e tecnicamente sustentáveis, principalmente em
países onde as condições de suas populações são precárias (SILVA, DINIZ,
OLIVEIRA, 2002).
Assim, o uso de práticas alternativas, pelos profissionais de saúde, em
particular os da enfermagem, seria, de certo modo, a conscientização da
sua capacidade de trabalhar a inclusão social de pessoas que vivem na
marginalidade do acesso a bens e serviços de alta tecnologia em saúde, mas
também o resgate do seu saber/fazer popular, no processo saúde/doença,
fortalecendo a sua identidade cultural e da sua comunidade, e construin-
do possibilidades de vida saudável que lhes protegeriam dos riscos do uso
exagerado dos medicamentos industrializados e das frustrações provocadas
pela ortodoxia da medicina cientificista.
As práticas “alternativas” mais conhecidas são as técnicas de relaxamen-
to, a hidroterapia, a acupuntura, a medicina herbal e a massoterapia. Ou-
tras práticas são igualmente conhecidas, tais como: a aromaterapia, a cro-
moterapia, a musicoterapia, a medicina ayurvédica, os cristais, a medicina
holística, a homeopatia, a hipnose, a iridologia, a macrobiótica, cirurgias
mediúnicas, reiki e toque terapêutico.
No Nordeste, a prática das rezadeiras, também conhecidas como curan-
deiras ou benzedeiras, recebe destaque pela força que essas mulheres exer-
cem em suas comunidades. Geralmente merecedoras de grande respeito e
confiança em sua localidade, as rezadeiras realizam um trabalho não remu-
nerado que consiste na oração e na bênção aos que se encontram doentes.
Fazendo uma comparação com algumas práticas religiosas, Costa (2001)
define a ação das benzedeiras como a “benzeção”. Diz o autor:
Os pais e padrinhos dão a sua bênção a seus filhos e afilhados.
Os católicos se benzem antes de qualquer ação importante ou
ao passarem diante de uma capela ou igreja. Os espíritas dão
“passes” aos que estão com negatividade fluídica. Os evangélicos
fazem orações e cultos nas horas alegres e tristes de seus irmãos.
Tudo é oração, e a rezadeira faz a sua “benzeção” em quem vai à
sua procura no intuito de curar-se de algum mal (COSTA, 2001).
No Rio Grande do Norte, esta prática ainda é muito utilizada, especial-
mente em lugares mais distantes dos serviços de saúde. As benzedeiras são
procuradas para “benzer” principalmente crianças que estão com “mau olha-
do, quebranto, vento caído”. Para elas, o mau olhado é provocado pela ação
de um agente externo, que pode estar dentro ou fora do âmbito familiar; já o
quebranto origina-se do “excesso de amor” ou “amor caduco” na família; e o
“vento caído” é o resultado de sustos ou medos fortes sofridos pela criança.
Contudo, a sua ação também se estende a pessoas de todas as idades,
realizando curas de uma maneira geral e partos das mulheres gestantes.
Hoje, essas mulheres, em suas grande maioria, idosas, estão sendo valo-
34
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
rizadas e inseridas nos programas de atenção básica em saúde de alguns
municípios como elo articulador entre o serviço de saúde e o povo.
Assim, os profissionais de saúde e da enfermagem, especialmente aque
-
les pertencentes às equipes do Programa Saúde da Família, devem valorizar
as diversas terapias e práticas que complementam o tratamento alopático,
ou que, em alguns casos, o substitui. Esse modo de compreender a sua prá-
tica, enquanto enfermeiro, técnico ou auxiliar de enfermagem, favorece as
populações mais distantes e carentes dos serviços, pelo uso de alternativas
que promovam estilos saudáveis de vida, auxiliem no tratamento de doen-
ças de forma simplificada e favoreçam a recuperação no âmbito familiar.
É preciso, portanto, que esses profissionais exerçam, de modo especial,
a escuta qualificada, o acolhimento, a valorização do saber popular, a co-
responsabilização, o compromisso profissional, o estímulo ao auto-cuidado
e a participação e controle social.
As práticas alternativas em saúde e o trabalhador da terra
Consta nos “Compromissos do MST com a terra e com a vida” que os
seres humanos são preciosos, pois sua inteligência, trabalho e organização
podem proteger e preservar todas as formas de vida e por isso devem: amar
e preservar a terra e os seres da natureza; aperfeiçoar sempre nossos conhe-
cimentos sobre a natureza e a agricultura; produzir alimentos para eliminar
a fome na humanidade. Evitar a monocultura e o uso de agrotóxicos; pre-
servar a mata existente e reflorestar novas áreas; cuidar das nascentes, rios,
açudes e lagos; lutar contra a privatização da água; embelezar os assenta-
mentos e comunidades, plantando flores, ervas medicinais, hortaliças, árvo-
res; tratar adequadamente o lixo e combater qualquer prática de contami-
nação e agressão ao meio ambiente; praticar a solidariedade e revoltar-se
contra qualquer injustiça, agressão e exploração praticada contra a pessoa,
a comunidade e a natureza; lutar contra o latifúndio para que todos possam
ter terra, pão, estudo e liberdade; jamais vender a terra conquistada. A terra
é um bem supremo para as gerações futuras
1
.
De acordo com estes compromissos buscou-se estabelecer uma rela-
ção das práticas alternativas e complementares em saúde com os elemen-
tos e a linguagem do trabalhador da terra, de modo que o conhecimento
produzido fosse orientado para a adoção de atitudes, comportamentos
e estilos de vida que permitissem a elevação da qualidade de vida desse
aluno/trabalhador, sua família e comunidade, respeitando os seus com-
promissos e princípios. Assim, foram priorizadas três práticas para serem
estudadas com maior profundidade, por corresponderem aos recursos
mais disponíveis ao trabalhador rural, ou seja, a argiloterapia, a hidrotera-
pia e o uso de plantas medicinais.
Argiloterapia ou geoterapia
De acordo com Falconi Filho (2006), “é da terra que retiramos nosso
alimento, nossa água, nossa energia vital”. Desde os antigos que a argila
era utilizada para a preservação de alimentos de origem animal, para aju-
dar no tratamento dos doentes e como um dos elementos no embalsama-
mento das múmias.
1. MST. MST: Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra.
Leituras cotidianas, nº 243. 2006.
Disponível em: http://www.pfilosofia.
xpg.com.br/07_leituras_cotidianas/
20060505c.htm. Acesso em: maio 2006.
35
ARTIGOS
A argila é originária da decomposição do solo, ocasionada por reações
físico-químicas do meio ambiente, que, no decorrer dos séculos, acumula
minerais, tais como: manganês, magnésio, alumínio, ferro, sílica, titânio,
cobre, zinco, cálcio, fósforo, potássio, boro, selênio, lítio, níquel, sódio e
outros. Assim, ao ser retirada do solo para uso terapêutico, devem ser con-
siderados alguns aspectos essenciais: o local – deve ser inócuo; que não seja
úmido; com a coloração desejada e respeitar uma profundidade mínima de
quatro metros para a extração. A argila pode ser usada ao natural ou depu-
rada, isto é, dissolvê-la em água potável, decantá-la e secá-la.
A argiloterapia consiste, portanto, no uso tópico de compressas de silica-
to minimizado ou argila, para normalizar uma determinada região do corpo
inflamada, podendo também ser ingerida com água.
Hidroterapia
Por hidroterapia entende-se o tratamento pela água sob suas diversas
formas e a temperaturas variáveis. A água é um veículo de calor ou frio para
o corpo que pode proporcionar alívio, relaxamento e favorecer o processo
de cura. Aplicada ao corpo, opera nele modificações que atingem o sistema
nervoso, o aparelho circulatório e o termo-regulador.
A hidroterapia tem, igualmente, influência sobre a nutrição, pois esti-
mula o aumento do número de glóbulos vermelhos e de glóbulos brancos
do sangue; aumenta a taxa de hemoglobina; age sobre a excreção uri-
nária; tem efeito sobre a evacuação; aumenta a eliminação das matérias
azotadas e do ácido úrico etc.
As aplicações hidroterápicas frias ou quentes têm a pele como inter-
mediário, em seus efeitos sobre o corpo humano, podendo ser aplicada
sob a forma de banhos quentes, neutros ou frios no corpo inteiro ou em
partes do corpo, de chuveiro, de imersão, de assento, genitais ou semicú-
pios; pedilúvios ou escalda-pés, empregados no aquecimento do corpo,
em casos de anemia, estresse, insônia, desordens na circulação sanguínea,
gripes, resfriados, suores dos pés, podagra, contusões e lesões dos pés;
e compressas, um dos processos
mais comuns, fáceis e eficazes
da hidroterapia, que consiste na
aplicação de um pano úmido com
água ou soluções quentes ou frias
em partes doloridas do corpo.
Plantas medicinais
O homem aprendeu a conhe-
cer e a utilizar as plantas durante
toda a sua existência. Esse conhe-
cimento, acumulado em toda a
trajetória da humanidade, não está
restrito apenas à sua ação medica-
mentosa para aliviar e curar males,
mas engloba todas as propriedades
que estas oferecem para a sobre-
36
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
vivência do homem na Terra. Assim, o seu uso deve contemplar as suas
múltiplas dimensões – ecológica, econômica, pedagógica e antropológica
–, de modo a resgatar na pessoa e na comunidade a condição de sujeitos
ativos de um mundo físico, social e político, e que por isso, necessitam de
uma consciência cidadã com deveres e direitos para se viver com dignidade
(CARRICONDE, 2002).
As plantas podem ser aplicadas de diversas maneiras, e é muito im-
portante que a pessoa conheça bem seus vários modos de aplicação sob
a forma de azeites, alcoolaturas, banhos, chás (tisana, infusão, decocção
e maceração), cataplasmas (ervas frescas e secas, pasta e compressas), gar
-
garejos, inalações, lambedor ou xarope, lavagens, saladas, sopas, guisados,
sucos, tinturas, ungüentos.
Considerações finais
A formação em saúde deve estar adequada à realidade na qual o pro-
fissional vai atuar, de forma a atender aos princípios de socialização das
vivências, construção de uma visão de mundo, do cultivo de identidades e
compreensão da realidade política, social, econômica, cultural do país e da
região. No caso específico, este deve estar sensível à preservação da memó-
ria local e nacional, bem como à militância social e à resistência cultural em
atendimento às necessidades em busca de um desenvolvimento sustentável
do homem do campo.
A disciplina Práticas Alternativas em Saúde buscou trazer à reflexão as
atitudes e valores do homem contemporâneo e suas conseqüências em
um mundo em constante mudança. Trouxe também hábitos e alternativas
em saúde que asseguram a preservação da qualidade de vida individual e
coletiva, além de resgatar algumas práticas exercidas vocacionalmente por
algumas pessoas inseridas na comunidade.
Assim, é preciso que o enfermeiro, técnico ou auxiliar de enfermagem
estabeleça o diálogo com as pessoas do povo para que estas possam falar de
suas práticas e saberes em saúde, para depois associá-las às suas proprieda-
des terapêuticas, às vantagens econômicas, aos benefícios ecológicos e aos
valores culturais. Deste modo, estará se qualificando profissionalmente e ao
mesmo tempo exercitando a sua cidadania e de seus pares.
REFERÊNCIAS
CARRICONDE, C. Introdução ao uso de fitoterápicos nas patologias de APS. GCL Editora:
Olinda/PE, 2002.
CARROL, R. T. Dicionário céptico. Disponível em: http://skepdic.com/brazil/saudealtern.
html. Acesso em: 14 de março de 2006.
COSTA, G. Rezadeiras do Rio Grande do Norte. Jangada do Brasil. Edição Comemorativa.
Ano 3 - Setembro 2001 - nº 37. Disponível em: http://jangadabrasil.com.br/setembro37/espe-
cial21.htm. Acesso em: 23 de março de 2006.
FALCONI FILHO. Medicina natural. Disponível em: http://www.amedicinanatural.hpg.
ig.com.br. Acesso em: 14 de março de 2006.
SILVA, M. G.; DINIZ, M. F. F. M.; OLIVEIRA, R. A. G. de (orgs.). Fitoterápicos: Guia do Profis-
sional de Saúde. SESP/Núcleo de Assistência Farmacêutico: João Pessoa/PB, 2002.
UFRN. Escola de Enfermagem de Natal. Curso Técnico em Enfermagem Integrado com o
Ensino Médio – Proposta Pedagógica: Natal/RN, 2006.
37
ARTIGOS
RESUMO
A velhice é uma questão que adquire crescente visibilidade, tornando-se
cada vez mais discutida por diversos setores da sociedade. Via de regra,
tende-se a pensá-la como uma fase dolorosa, marcada por todo tipo de
perda e restrição. Mas, o que pensam os próprios idosos sobre a velhice e
a experiência do envelhecimento? Este trabalho apresenta a experiência
do envelhecimento em um grupo de 30 (trinta) idosos na comunidade,
com idades entre 58 e 95 anos – média 72.3 – , dos quais 13 são do sexo
masculino e 17 do feminino, através de entrevistas, com aproximada-
mente uma hora de duração, gravadas e transcritas posteriormente para
codificação e análise.
Significado do envelhecimento entre
idosos vivendo na comunidade
OLIVEIRA, Mônica M. M. de
Centro Federal de Educação Tecnológica da Paraíba
Palavras-chave: Idoso; Envelhecimento; Terceira Idade.
Fotos: Shutterstock
38
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Introdução
Há mais ou menos cinco décadas, o aumento de estudos sobre o en-
velhecimento humano – período do ciclo vital – tem levado ao surgimento
de estudos mais sistemáticos (PAIVA, 1986). A importância desse fato é
reconhecida no sentido de testar hipóteses gerais em contextos culturais
diversos, gerar novas hipóteses e estabelecer ações futuras (DULCEY & AR-
DILA, 1989). No entanto, questões importantes sobre o envelhecimento
são ainda desconhecidas ou superficialmente exploradas, merecendo uma
maior atenção e estudo, a fim de preencher as lacunas existentes na litera-
tura. Questões acerca da perspectiva sociocultural do envelhecimento e das
mudanças ocasionadas por esse processo têm sido freqüentemente estuda-
das, muito embora não considerem a experiência de vida diária do idoso a
partir de uma perspectiva individual.
Reflexões sobre a velhice à luz da literatura
Independente de estar associada à pobreza ou à invalidez, a velhice
tende a ser vista como uma experiência de sofrimento por implicar a pas-
sagem indesejada de um mundo amplo e público para um mundo restrito
e privado, marcado por perdas (DEBERT, 1988), contudo, não fosse o
decréscimo das reservas orgânicas do indivíduo, ela seria considerada, de
forma análoga às demais fases da vida, como um período caracterizado
por mudanças fisiológicas, psíquicas e sociais (Anuário Guia Corpo a Cor-
po da Dualidade e Vida, 1989).
Embora amplamente discutida, a velhice não tem uma definição pre-
cisa nem possui limites etários. Alguns cientistas afirmam que o envelhe-
cimento é um processo contínuo e que ocorrem modificações durante
toda a existência do indivíduo, isto é, do nascimento à morte, não haven-
do um período específico para o princípio da senescência – termo que
designa o envelhecimento propriamente dito, ou seja, natural; diferente
de senilidade, que designa as doenças da velhice, o que corresponde
aos aspectos psicopatológicos da velhice. Alguns autores acreditam que a
velhice, independente dos acontecimentos psicofisiológicos, compreende
um processo de decadência funcional que aparece já no final da ado-
lescência, período em que o indivíduo não tem a menor noção de que
está envelhecendo nem apresenta sinais de envelhecimento (D’ANDREA,
1984); outros vêem-na como um processo involutivo caracterizado por
decadência e declínio das capacidades físicas e mentais e o afastamento
do trabalho (aposentadoria); outros crêem que o envelhecimento come-
ça com a maturidade sexual. Há ainda a literatura popular, os meios de
comunicação social e os costumes culturais que associam a velhice comu-
mente a um estado de decrepitude, desorientação e regressão.
Assim sendo, pode-se dizer que o envelhecimento humano ocorre em
três níveis diferentes:
biológico – que varia em função de idade, envolvendo mudanças
fisiológicas, anatômicas, bioquímicas e hormonais, acompanhadas
de gradual declínio das capacidades do organismo;
social – que varia em função dos determinantes sociais, relacionados
às normas ou eventos sociais que controlam, por um critério de ida-
Mônica Maria Montenegro de
Oliveira é doutoranda da UFPB
(Programa Proling). É professora
titular do Centro Federal de
Educação Tecnológica da Paraíba
(cursos técnicos integrados/
subseqüentes e superiores).
É assessora de relações
internacionais e presidente do
conselho editorial junto ao Cefet/PB.
39
ARTIGOS
de, o desempenho de determinadas atividades ou tarefas do grupo
etário, e que dão sentido à vida de cada um; e
psicológico – que traduz pelos comportamentos (abertos ou enco-
bertos) das pessoas em relação a si próprias ou aos outros, ligados
às mudanças de atitude e limitações das capacidades em geral. Em
outras palavras, o envelhecimento psicológico é determinado, por
um lado, pelas mudanças concretas do envelhecimento biológico
e, por outro lado, pelas normas e estereótipos sociais que corres-
pondem ao envelhecimento social (PAIVA, 1986). Entretanto, esses
três níveis de envelhecimento nem sempre coincidem quanto ao
seu aparecimento. Nesse sentido, há uma variedade de modelos
sociológicos, biológicos e comportamentais que caracterizam a ve-
lhice isoladamente, como, por exemplo, o modelo estatístico que
define a velhice em termos de probabilidade de sobrevivência, e o
modelo médico que define a velhice associada ao surgimento de
doenças (BOTWINICK, 1984).
Em decorrência dessa diversidade de modelos, surge a dificuldade de
identificação do idoso, muito embora se saiba classificá-lo de maneira
geral. A linha demarcatória entre o final da idade adulta e o início da ve-
lhice não é fixa, nem obedece a critérios específicos, uma vez que a idade
biológica é conceitualmente correta, porém imprecisa; não há limites etá-
rios uniformemente aceitos. Neugarten (1975, apud BOTWINICK, 1984)
sugere quatro categorias de velhos: velhos jovens (55-64 anos), meio ve-
lhos (64-75 anos), velhos (75-84 anos) e muito velhos (+85 anos). Essas
categorias diferem entre si em termos de saúde, habilidade e expectativa
de vida segundo o sexo. Por sua vez, Field e Minkler (1986) consideram
apenas três das categorias sugeridas por Neugarten: velhos jovens (60-74
anos), velhos (75-85 anos) e muito velhos (+ 85 anos).
40
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Pode-se destacar na literatura mais recente a ausência da perspectiva do
envelhecimento fornecida pela própria pessoa idosa, daí a necessidade de
se observar essa questão a partir da perspectiva do próprio idoso buscando
não somente identificar o período de transição ao qual o próprio indiví-
duo passa a considerar
-se como velho, mas, também, tentar identificar os
seus determinantes e definir os contextos e situações em que o modelo da
velhice é acionado (DEBERT, 1988). A tomada de consciência do indiví-
duo em considerar-se como velho em um dado momento da sua vida gera
implicações sobretudo sob a forma de mudanças na sua autopercepção
e/ou autoconceito em aspectos específicos que até então eram percebidos
distintamente (RAPAPORT, 1978).
Pesquisas voltadas para a identificação dos determinantes de clas-
sificação do próprio indivíduo como velho (BAUM & BOXLEY, 1983;
BULTENA & POWERS, 1978; LINN & HUNTER, 1979; apud KELLER,
LEVENTHAL & LARSON, 1987) e para a descrição das conseqüências
dessa identificação (WARD, 1977; SHERMAN et alii, 1983, apud KEL-
LER, LEVENTHAL & LARSON, 1987), sugerem que o envelhecimento
é uma experiência multidimensional acompanhado por mudanças am-
bientais, sociais, emocionais e fisiológicas. A variedade de percepções
que os indivíduos podem desenvolver reforça essa proposição. NEU-
GARTEN & PETERSON (1957) observaram que pessoas de nível socioe-
conômico baixo vêem a velhice começando aos 60 anos, enquanto que
pessoas de nível econômico alto a vêem começando dez anos mais tarde
(apud BOTWINICK, 1984). Nesse sentido, a representação da velhice é
influenciada por interações sociais, econômicas e educacionais. LINN &
HUNTER (1979) verificaram que idosos com maior lócus de controle in-
terno consideram-se como estando na meia idade ou até mesmo jovens,
revelam maior índice de satisfação com a vida, são mais lúcidos, tendem
a ver a vida como resultante de seus próprios esforços e habilidades,
bem como apresentam maior auto-estima com relação às inaptidões e
impedimentos (apud BOTWINICK, 1984).
Sabe-se que a ansiedade e o estresse podem ser ocasionados por sen-
timentos de perda de controle do indivíduo sobre si próprio ou sobre sua
vida, independente da idade que ele possua, o que vem causar impactos
negativos na sua saúde física e psicológica. A importância desse controle
para o indivíduo é fundamental, mesmo em quantidade limitada. Em si-
tuações que exercem maior controle sobre suas vidas, as pessoas idosas
apresentam-se mais saudáveis e ativas. Logo, a perda de controle, quando
associada ao envelhecimento, pode resultar em um aumento de depen-
dência da família, amigos ou instituições por parte do idoso (1980, RODIN
apud 1985, ZIMBARDO apud 1989, TAVARES), bem como uma maior de-
pendência em atividades que estão presentes no dia-a-dia.
O Brasil, entre os países da América Latina, é o que apresenta maior
taxa de jovens em sua população, em contraste com a Argentina, que tem
maior taxa de população idosa (DULCEY & ARDILA, 1988). Apesar disso,
ele vem sofrendo, já há algumas décadas, um aumento significativo da sua
população idosa em virtude da redução do ritmo de seu crescimento de-
mográfico, como indicam os dados da recente pesquisa desenvolvida pelo
Departamento de Gerontologia Social da Sociedade de Geriatria.
41
ARTIGOS
Segundo Paiva (1986), o aumento do número de idosos varia com a
classe social, estando diretamente ligado às condições socioeconômicas da
população. Embora, atualmente, o Brasil conte com mais de dez milhões
de idosos aproximadamente 5% da sua população total, de acordo com o
Núcleo de Estudos do Futuro da USP (Universidade Estadual de São Paulo),
a estimativa prevista é que a população de pessoas com mais de 60 anos
salte de 5% para 10% e que apenas 40% da população seja constituída de
jovens abaixo dos 20 anos. Um aumento nessas proporções acarretará para
o país certamente uma série de problemas sociais e econômicos caso não
venham a ser tomadas as devidas providências, como, por exemplo, a agili-
zação e ampliação dos sistemas previdenciários, a implantação de serviços
geriátricos especializados e a disponibilidade de asilos.
Sabemos que as condições infra-estruturais do Brasil são inadequadas e
ineficazes no sentido de não atender às reais necessidades dos idosos nem
proporcionar-lhes segurança social e econômica. Ao contrário, os velhos
na nossa sociedade são discriminados e a desigualdade de renda durante
os anos de trabalho torna-se ainda mais acentuada na velhice. O governo
contribui com a ausência de medidas que visem a uma melhoria da con-
dição do idoso no país. O tipo de tratamento dado ao idoso, no Brasil, se
comparado ao utilizado nos países desenvolvidos, como Alemanha, França,
Canadá e Inglaterra, revela-se ainda mais deficitário (TAVARES, 1989).
Material e método: sujeitos,
procedimentos e instrumento
Foram entrevistados 30 idosos, morando em sua própria unidade do-
méstica ou com familiares, na cidade de João Pessoa/PB, sendo 17 do
sexo feminino (56,6%) e 13 do sexo masculino (43,3%), com idades entre
58 e 95 anos, apresentando uma média de 72,3 anos, desvio-padrão 9,9;
amplitude 37 e moda 68.
Os idosos foram abordados,
individualmente, pela entrevis-
tadora e solicitados a participar
de um estudo sobre o envelheci-
mento, através de uma entrevista
com aproximadamente uma hora
de duração, gravadas e transcritas
posteriormente, para codificação e
análise, seguindo um roteiro pre-
viamente elaborado. Nenhum dos
sujeitos recusou-se a ser entrevista-
do, como também não ocorreu in-
validação de qualquer entrevista.
As entrevistas foram realizadas
no período vespertino, geralmen-
te três vezes por semana, duran-
te dois meses, e restringiram-se a
idosos que gozavam de condições
físicas e mentais normais, que se
42
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
dispuseram a participar do estudo. Nessas entrevistas, os participantes fo-
ram solicitados a relatar as suas próprias experiências sobre esse processo.
As entrevistas e a observação foram feitas, em sua maioria, nas residências,
porém, algumas, especificamente três, foram realizadas em locais públicos,
como jardim, calçada e praça, a pedido dos idosos.
O questionário aplicado foi o mesmo utilizado por Keller, Leventhal &
Larson (1987) – desenvolvido a partir de um grupo de pesquisadores in-
cluindo geriatras, psicólogos sociais, enfermeiras psiquiátricas, um entre-
vistador e por Tavares (1989) – retiradas as questões concernentes à ida do
idoso para uma instituição, suas possíveis opções e atitudes, bem como o
posicionamento da própria família com relação à instituição.
O questionário consta de duas partes. Na primeira, a questão 1 diz res-
peito ao significado do envelhecimento para o idoso. As questões subse-
qüentes (2 a 15) referem-se à observação do envelhecimento em uma outra
pessoa, nas quais os sujeitos são solicitados a indicar alguém que esteja
vivenciando esse processo, quais são os sinais que denunciam isso, quais as
causas dos sinais mais significativos, como essa pessoa lida com o processo,
qual a eficácia das estratégias utilizadas para lidar com as mesmas e qual o
nível de satisfação que o indivíduo atribui quando da utilização dessas es-
tratégias. A segunda parte do questionário (questões 12, 16 a 19; 32 e 33)
inclui o mesmo conteúdo das questões 12 a 15, porém, com a diferença
de que o idoso é solicitado a observar o envelhecimento em si próprio,
apontando o momento da tomada de consciência da velhice, suas conse-
qüências, estratégias utilizadas para lidar com o envelhecimento de forma
geral, qual a eficácia das mesmas e o seu nível de satisfação em utilizá-las
e quais os sinais que funcionam como indicadores mais significativos desse
processo com suas respectivas causas.
As questões 30 e 31 avaliam se o idoso considera o processo de enve-
lhecimento como algo episódico ou constante no seu dia-a-dia. Para os
casos em que ele é tido como episódico, o indivíduo é solicitado a indicar
o que evoca esse sentimento e qual a sua freqüência. Da mesma forma que
para os casos em que ele é tido como constante, o período e o(s) evento(s)
que tornaram esse sentimento constante são também por ele indicados.
A questão 34 analisa se existe e quais as diferenças na maneira como o
idoso lida com os sentimentos sobre o envelhecimento e com situações
que evocam esses sentimentos. As questões 36 e 37 verificam se há uma
diferença significativa entre a idade do idoso e a idade com a qual ele se
sente, enquanto a questão 35 proporciona ao idoso a possibilidade
de comentar ou discorrer sobre algo que deseje e/ou que não
tivesse sido comentado durante o transcurso da entrevista.
Resultado e discussão
A amostra representa um grupo de idosos de classe
média-baixa, em que a maior parte considera sua saúde
como regular, tendo uma pequena predominância de su-
jeitos do sexo feminino. As respostas atribuídas ao significa-
do do envelhecimento foram agrupadas em oito categorias,
nas quais os sujeitos avaliaram o envelhecimento como:
43
ARTIGOS
a) um processo natural sem característi-
cas significativas;
b) um período filosófico, de evolução da
vida, reflexão, experiência de vida (sa-
bedoria) e maturidade;
c) um período de mais liberdade, menos
exigências e novos interesses;
d) um período associado às dificuldades
e preocupação com a saúde física e
perda de auto-controle;
e) um período de perdas interpessoais;
f) uma graça de Deus ou período de
maior sentimento religioso;
g) um período de conseqüências negativas;
h) bem-estar associado à segurança financeira. Observa-se que a
maior parte dos sujeitos considera o envelhecimento como uma
experiência positiva.
Os sinais de envelhecimento mais significativos identificados pelos sujei-
tos em si mesmos e nos outros foram considerados sob a forma de mudan-
ças e divididos em quatro categorias, sendo que cada uma delas subdivide-
se em categorias menores. São elas:
a) mudanças sociais (isolamento social, separação da família);
b) mudanças físicas, problemas sensoriais (perda de visão e audição),
problemas locomotores (pernas trôpegas, reumatismo, fraturas, cri-
se de coluna, dormências), dor e doenças gerais (prisão de ventre,
diabetes, erisipela); modificação na aparência (flacidez da pele, ca-
belos, barriga), diminuição das atividades físicas (menor disposição
para o trabalho, diminuição de ritmo);
c) mudanças emocionais (preocupação, depressão, desgosto em viver,
vontade de morrer, mágoa);
d) mudanças cognitivas (alteração ou perda de memória, arterioscle
-
rose, esquecimento). Todas as mudanças identificadas no próprio
indivíduo e no outro foram de natureza negativa, entretanto, houve
ainda pessoas que não foram capazes de identificar no próprio indi-
víduo ou no outro alguma mudança. Em suma, em ambos os casos,
as mudanças físicas foram vistas como os sinais mais significativos de
envelhecimento.
As estratégias de adaptação (coping) utilizadas para lidar com as mu-
danças ocasionadas pelo processo de envelhecimento foram classifica-
das segundo Keller, Leventhal & Larson (1987) e aparecem agrupadas
em cinco categorias:
a) compensação (respostas utilizadas para compensar as mudanças
ocorridas);
b) manutenção (respostas ativas utilizadas para manter o nível de fun
-
cionamento do indivíduo);
c) envolvimento com outros (respostas ativas utilizadas para manter ou
aumentar a interação com o grupo social);
44
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
d) alteração do significado (respostas designadas a controlar o signifi-
cado das situações, através da redução ou eliminação do estresse
que delas resultam);
e) lidar com o estresse (respostas utilizadas para controlar o estresse,
uma vez que ele surge).
A porcentagem reflete a proporção de vezes que uma determinada
estratégia foi utilizada para lidar com uma mudança específica no indi-
víduo, ou seja, 40% das estratégias utilizadas para lidar com mudanças
físicas no próprio indivíduo foram classificadas como respostas de en-
volvimento com outros e a estratégia lidar com o estresse foi utilizada
para lidar com mudanças físicas e obteve o maior percentual, 45%. Vale
ressaltar que nenhum dos sujeitos soube dizer como o outro lida com
essas mudanças, não mencionando, portanto, nenhuma estratégia de
adaptação utilizada. As estratégias de coping e envolvimento com outros
(63%), seguida de manutenção (31%), foram as mais utilizadas pelos su-
jeitos da pesquisa para lidar com o envelhecimento em geral. As causas
das mudanças associadas ao envelhecimento no próprio sujeito e nos
outros foram vistas como decorrentes do processo do envelhecimento
(idade, debilitação do organismo), como também de problemas emocio-
nais (preocupação, perda de ente querido).
Conclusão
Os resultados obtidos por este estudo sobre o significado do envelhe-
cimento na comunidade foram vistos como algo positivo, entretanto, as
mudanças associadas a esse processo foram de caráter e/ou natureza nega-
tiva. Talvez o tipo das questões elaboradas tenham eliciado estereótipos de
respostas nas quais os indivíduos filosofaram sobre o significado do enve-
lhecimento, descrevendo os aspectos positivos dessa experiência, mas rela-
taram mudanças culturalmente esperadas quando solicitados a especificar
os fenômenos associados ao mesmo.
Os entrevistados classificaram o envelhecimento como um processo
natural, sem características muito significativas, porém, quando compara-
mos as mudanças associadas ao envelhecimento no próprio indivíduo e
no outro, observamos que, para ambos, as mudanças físicas e emocionais
foram identificadas em maior proporção. Duas hipóteses são levantadas a
partir desses resultados: a primeira é que os idosos identificam em si e nos
outros aquelas mudanças que são mais observáveis diretamente, ou seja,
mudanças físicas; a segunda é que eles podem não gostar de identificar
as mudanças que lhes são mais ameaçadoras ou que implicam a perda do
autocontrole, como as mudanças de ordem emocional ou cognitiva.
Com relação às estratégias de adaptação frente aos sinais mais signi-
ficativos do envelhecimento, observamos que os sujeitos utilizam a ma-
nipulação do estresse tanto para lidar com mudança físicas (45%) como
para emocionais (33%), cognitivas (33%) e sociais (33%); utilizam, ainda, a
manipulação do envolvimento com outros para lidar com mudanças físicas
(40%); utilizam igualmente a manutenção e alteração do significado para
lidar com mudanças físicas (10%), bem como a compensação para lidar
com as mudanças cognitivas (33%) e físicas (2%). Em outras palavras, as es-
45
ARTIGOS
tratégias de adaptação utilizadas para lidar com o envelhecimento em geral,
lidar com o estresse e envolvimento com outros foram utilizadas em maior
número de vezes pelos sujeitos.
É provável que, de certa maneira, o envolvimento com outros resposta
dirigida a manter ou aumentar a interação do indivíduo com o grupo social
reflita as necessidades básicas no cotidiano dessa amostra, principalmente
para aquelas pessoas que vivem ou criam expectativas de permanecer com
a família à medida que vão ficando mais velhas e dependentes e para aque-
las pessoas que sofreram perdas ou impactos na sua saúde emocional e/ou
para aquelas que encaram o envelhecimento como algo constante.
As auto-avaliações dos sujeitos quanto às causas mais significativas das
mudanças associadas ao envelhecimento apresentaram um percentual
maior quando comparadas com a opinião que eles têm dos outros. Isso
demonstra que o envelhecimento é avaliado como produto de um processo
evolutivo e/ou positivo para aqueles que acreditam lidar com esse processo,
e involutivo e/ou de natureza negativa ao mesmo tempo, independente das
diversas mudanças que acarreta.
REFERÊNCIAS
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BOTWINICK, J. Aging and behavior. New York, Spinger, 1984.
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TAVARES, M. C. H. O significado do envelhecimento para idosos institucionalizados.
UFPB/CCHLA/Departamento de Psicologia, 1989.
46
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
RESUMO
No trabalho, o currículo integrado é composto por uma rede de relações
complexas, a qual envolve a formação integral do homem. Apresentamos
um caminho metodológico para a integração curricular que compreende
o conhecimento como provisório, que se renova a partir do diálogo entre
as diversas áreas do saber e cultiva o prazer cultural e a postura crítica e
criativa. O problema a ser estudado surge da realidade concreta através
da coleta de dados, os quais são analisados cientificamente em sala de
aula e inseridos no processo de reprodução e construção do conhecimen-
to dos alunos. Os resultados voltam para a realidade concreta, através de
ações de intervenção crítica na vida cotidiana das comunidades locais.
Trabalhamos com unidades didáticas integradas como forma de facilitar
Integração curricular: diálogo
com as comunidades locais
GUIMARÃES, Edilene R.
Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco
Palavras-chave: Integração Curricular; Comunidade; Interdisciplinaridade.
Fotos: Edilene Rocha Guimarães
ÉUHDH[WHUQDGR5HVWDXUDQWH0DQLDGD$VVRFLDomRGRV6HUYLGRUHVGR&HIHW¼3(
47
ARTIGOS
a integração curricular. Detalhamos o desenvolvimento de uma unidade
didática integrada realizada na forma de projeto interdisciplinar, sob o
título: “Qualidade Ambiental no Restaurante Mania, da Associação dos
Servidores do Cefet/PE”. Nas conclusões, destacamos que a construção
coletiva do projeto pedagógico de um curso de educação profissional e
tecnológica pode partir desde sua origem do desenvolvimento de uma
proposta de integração curricular, independentemente do nível ou moda-
lidade de ensino oferecido. Além do que, a articulação entre a educação
profissional técnica de nível médio e o ensino médio exigida pela LDB
– Lei nº 9.495/96, seja na modalidade integrada, concomitante ou subse-
qüente, pode priorizar a formação integral como princípio orientador do
currículo, com a preocupação de formar para além do simples desenvol-
vimento das habilidades necessárias para uma ocupação.
Introdução
O trabalho compreende o currículo integrado como sendo composto
por uma rede de relações complexas, a qual envolve a formação integral
do homem. A cidadania aparece como centro do processo educativo,
como forma de garantir as dimensões da formação integral do homem
– coletivo, individual, histórico, ecológico –, que são sustentadas nos prin-
cípios da solidariedade, ética, pluralidade cultural e sustentabilidade. O
trabalho, a ciência, a cultura e o meio ambiente são caracterizados como
eixos integradores do currículo, os quais estão imbricados em relações so-
cioambientais. As inter-relações desenvolvidas entre prática profissional,
conhecimentos e saberes cotidianos, as quais perpassam por todo o de-
senvolvimento do currículo, objetivam o exercício de uma cidadania ativa
como forma de intervir nas condições socioambientais das comunidades
locais. Com essa compreensão, apresentamos um caminho metodológico
para a integração curricular.
Metodologia
O caminho metodológico que propomos é associado ao conhecimento
pertinente, concebido por Morin (2002) como complexo:
O conhecimento pertinente deve enfrentar a complexidade. Com-
plexus significa o que foi tecido junto: de fato há complexidade
quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do
todo (como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico,
o afetivo, o mitológico), e há um tecido interdependente, intera-
tivo e inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e seu con-
texto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes entre si. Por
isso, a complexidade é união entre a unidade e a multiplicidade.
Os desenvolvimentos próprios à nossa era planetária nos confron-
tam cada vez mais e de maneira cada vez mais inelutável com os
desafios da complexidade.
Em conseqüência, a educação deve promover a “inteligência ge-
ral” apta a referir-se ao complexo, ao contexto, de modo multidi-
mensional e dentro da concepção global.
Edilene R. Guimarães é mestre
em Educação pela Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE).
Professora do Curso Superior de
Tecnologia em Gestão Ambiental
do Cefet/PE e Pesquisadora dos
Núcleos de Pesquisa: Ecologia
e Gestão Socioambiental de
Ecossistemas do Nordeste –
Cefet/PE; Movimentos Sociais e
Educação Ambiental – Cefet/PE;
Educação Profissional – Cefet/CE.
48
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Assim, a educação escolar deve visar à formação
integral do homem, propiciando o seu crescimento
por inteiro. De acordo com Morin (Ibid), a educa-
ção deve favorecer a aptidão natural da mente e
estimular o uso total da “inteligência geral”, que
requer o exercício da curiosidade desde a infância.
A formação integral do homem deve ser concebida
como processo que valoriza a dúvida e a incerteza,
envolvendo uma concepção do ensino associado à
pesquisa, que visa ao desenvolvimento do sujeito
autônomo e à formação da consciência crítica e
emancipatória (CUNHA, 2002).
Boaventura de Sousa Santos (1995) afirma que no paradigma de ciência
denominado emergente, o conhecimento é processo, portanto, não é absoluto
nem acabado, é elemento para ser superado. O desafio essencial é o de criar
soluções e é nesse sentido que as aprendizagens devem caminhar. Aprender
é aprender a criar e a pesquisa faz a aprendizagem ser criativa. A verdadeira
aprendizagem é aquela construída com esforço próprio através da elaboração
pessoal, no interior de um processo coletivo solidário e cooperativo.
O currículo integrado concebe a pesquisa como instrumento de ensino
e como atividade inerente ao ser humano, acessível a todos e a qualquer
nível de ensino e entende a extensão como ponto de partida e de chegada
da apreensão da realidade, dialogando com os saberes do trabalho e da
cultura como forma de contextualizar o conhecimento escolar.
Fazenda (1995) enfatiza que “aprender a pesquisar, fazendo pesquisa,
é próprio de uma educação interdisciplinar, que, segundo nossos dados,
deveria se iniciar desde a pré-escola”. Assim, os processos de ensino devem
se identificar com ações ou processos de trabalho do sujeito que aprende,
pela proposição de desafios, problemas e/ou projetos, desencadeando, por
parte do aluno, ações resolutivas, incluídas as de pesquisa e estudo de situ-
ações, a elaboração de projetos de intervenção, entre outros. “Isto não se
confunde com conferir preeminência às atividades práticas em detrimento
da construção de conceitos. Mas os conceitos não existem independente-
mente da realidade objetiva” (RAMOS, 2005).
Diante do exposto, propomos um caminho metodológico para a integração
curricular que compreende o conhecimento como provisório, que se renova a
partir do diálogo entre as diversas áreas do saber e cultiva o prazer cultural e a
postura crítica e criativa. O problema a ser estudado surge da realidade concre-
ta através da coleta de dados, os quais são analisados cientificamente em sala
de aula e inseridos no processo de reprodução e produção do conhecimento
pelos alunos e professores. Os resultados desse diálogo voltam para a realidade
concreta, através de ações de intervenção crítica na vida cotidiana das comuni-
dades locais (GUIMARÃES, VALENÇA, FIGUEREDO, 2006).
Salienta-se que esse caminho metodológico exige a formação do profes-
sor-pesquisador, portanto, a formação docente inicial e continuada deverá
priorizar o domínio da metodologia científica, para que o professor possa
ultrapassar a barreira da reprodução do conhecimento e produza conheci-
mentos (re)elaborados.
Alunos em reunião no Restaurante Mania
49
ARTIGOS
Para cumprir essas finalidades, pode-se fazer da pesquisa um
eixo dos cursos de formação inicial [e continuada]. Pode-se ain-
da tornar a pesquisa o núcleo articulador da disciplina Didática,
de modo que os alunos-professores se envolvam ativamente no
próprio processo de produção de conhecimentos, desenvolvam
uma atitude crítico-reflexiva calcada em situações da prática es-
colar e desenvolvam trabalhos de investigação sobre a própria
prática docente (ANDRÉ, 2006).
Fazenda (1995) alerta que nos projetos interdisciplinares em ação
“a premissa que mais fundamentalmente predomina é a do respeito
ao modo de ser de cada um, ao caminho que cada um empreende em
busca de sua autonomia”. A autora conclui em suas pesquisas que “a
interdisciplinaridade decorre mais do encontro entre indivíduos do que
entre disciplinas”.
Assim, compreendemos que o trabalho pedagógico coletivo exige do pro-
fessor o encontro dialogado com outros professores, com os alunos e com a
comunidade, exigindo do professor a ampliação de suas competências técni-
co-laborais, com as competências sociocomunicativas, para o aprimoramento
das relações interpessoais, e com as competências político-históricas, como
forma de inserir o professor nos contextos sociais (MARKERT, 2000).
Como afirma Markert (Ibid), “sempre será importante a geração da
‘competência’, de estabelecer relações entre ‘sentimentos concretos e con-
textos sociais’, para poder aprofundar orientações políticas na consciência
do homem”.
Beane (2003), em seus estudos, revela que os professores que uti-
lizam a integração curricular “cultivam uma rede de recursos, que se
apóia em pessoas que podem trazer um conhecimento especializado
para as suas salas de aula”. Os professores encontram meios para en-
volver a comunidade nos processos de ensino, não só como recursos de
projetos, mas também “através de um nível de participação colaborativa
para se definirem, em termos curriculares, temas sociais e do mundo”.
Como as relações afetivas funcionam de forma bi-direcional, “os pro-
fessores procuram também fazer da comunidade
um espaço para o estudo, para a realização de
projetos e de ação social no currículo”.
Assim, a integração curricular enfatiza o envolvi-
mento em experiências que promovam uma vivên-
cia democrática. Segundo Beane (Ibid):
[...] deveríamos utilizar a abordagem cur-
ricular integradora, colocando a ênfase
nas unidades temáticas centradas em de-
terminados problemas, planificadas cola-
borativamente pelos professores e pelos
estudantes, enquadradas por uma comu-
nidade de sala de aula democrática e in-
formadas pelo conhecimento proveniente
de diversas fontes dentro e para além das
disciplinas tradicionais.
Salão de refeições do Restaurante Mania
50
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Santomé (1998) salienta que as
diferentes áreas do conhecimento e
experiências ou as disciplinas devem
entrelaçar
-se, complementar-se e re-
forçar-se mutuamente para propiciar
o trabalho de construção e reconstru-
ção do conhecimento da sociedade.
Com esse objetivo, propõe-se a
elaboração e agrupamento de uni-
dades didáticas integradas como for-
ma de facilitar a integração curricu-
lar. Uma unidade didática integrada
é uma proposta de trabalho da qual
participa um determinado número
de áreas do conhecimento ou disci-
plinas, destinadas a cobrir um período temporal relativamente curto. Não
trata apenas de promover processos de ensino-aprendizagem, mas que
os estudantes aprendam determinados conteúdos, conceitos e procedi-
mentos, e cheguem a assumir de maneira reflexiva um sistema de valores.
Como também, de motivar e desenvolver todo um conjunto de destrezas
que lhes permitam estabelecer novas relações e interações com estes e
outros conteúdos culturais (SANTOMÉ, Ibid.).
A gestão participativa constitui-se numa dimensão que caracteriza as ex-
periências inovadoras implementadas pelas unidades didáticas integradas.
“Nela os sujeitos do processo inovador participam da experiência, desde a
concepção até a análise dos resultados. Nesse sentido há uma quebra com
a estrutura vertical do poder, responsabilizando o coletivo do processo de
ensino e aprendizagem pelas propostas formuladas”. Destaca-se que o pro-
fessor não abdica de seu papel profissional, ou seja, o professor mantém a
sua responsabilidade na condução do processo, mas partilha com os alunos
e a comunidade as decisões sobre os percursos e critérios adotados para de-
finir as atividades. “A gestão participativa requer atitudes reflexivas frente ao
conhecimento, pois pressupõe a diversidade de compreensões valorativas e
habilidades para tratar com a complexidade” (CUNHA, 2006).
Salienta-se que o processo de organização do projeto político-pedagó-
gico da escola, que pretenda contemplar a integração curricular, deve ter
autonomia para decidir pelo desenvolvimento de unidades didáticas inte-
gradas. Assim, torna-se importante reforçar a compreensão cada vez mais
ampliada de projeto político-pedagógico como instrumento de autonomia
e domínio do trabalho pedagógico pelos professores, com vistas à alteração
de práticas conservadoras e construção de identidades.
Com isso queremos dizer que a identidade que cada escola e seus
professores, gestores, funcionários e alunos constroem é um pro-
cesso dinâmico, sujeito permanentemente à reformulação relativa
às novas vivências, às relações que estabelecem. De outra parte,
esse processo está fortemente enraizado na cultura do tempo e
do lugar onde os sujeitos sociais se inserem e na história que se
produziu a partir da realidade vivenciada, que constitui ela mesma
“um lugar de memória” (CIAVATTA, 2005).
51
ARTIGOS
Como lugar de memória, a revisão do projeto político-pedagógico pela
comunidade escolar beneficiará a implantação do currículo integrado, uma
vez que todos os seguimentos da escola poderiam obter informações so-
bre a história da educação profissional e sua própria história como forma
de compreender a integração como uma relação entre trabalho, ciência,
cultura e meio ambiente, e assim optar pela implementação do currículo
integrado numa perspectiva histórica e socioambiental.
Enfim, no planejamento dialogado das unidades didáticas integra-
das, propomos que a prática profissional seja considerada como eixo
integrador da relação entre conhecimentos gerais e específicos, ou seja,
da relação entre teoria e prática. Assim, propomos que a prática profis-
sional perpasse por toda a matriz curricular, abordando tanto o contexto
comunitário local como o contexto dos movimentos sociais e das orga-
nizações governamentais e não-governamentais, além do contexto da
produção material.
Qualidade ambiental: uma experiência
de unidade didática integrada
Durante o primeiro semestre letivo de 2007, a proposta foi desenvol-
ver uma unidade didática integrada sob o tema “qualidade ambiental”. O
Módulo V do Curso Superior de Tecnologia em Gestão Ambiental foi o
campo de implementação. Este módulo é composto pelas disciplinas: Sis-
tema Integrado de Gestão; Auditoria e Certificação Ambiental; Processos
Industriais; Programas de Prevenção de Riscos Ambientais; Ecoempreen-
dimentos; Planejamento Ambiental e Projeto Interdisciplinar de Qualida-
de Ambiental
1
. Elaboração, implantação e implementação de programas
de gestão para a qualidade ambiental são as competências profissionais
certificadas pelo módulo.
A disciplina Projeto Interdisciplinar de Qualidade Ambiental foi respon-
sável em gerenciar o planejamento coletivo da unidade didática integrada,
com a participação dos alunos
2
, professores e comunidade local envolvida
3
.
A disciplina também foi responsável em aprofundar conceitos relacionados
ao trabalho com o conhecimento complexo através da metodologia cientí-
fica. Inicialmente, foram definidas as seguintes atividades:
1. Reunião com os alunos para escolher a metodologia a ser utiliza-
da na unidade didática integrada, com definição pelo desenvol-
vimento de um projeto interdisciplinar de qualidade ambiental
empresarial.
2. Realização de entrevistas gravadas em áudio com os professores
das disciplinas. Questão: como sua disciplina contribui com a for-
mação do gestor ambiental?
3. Análise das ementas das disciplinas do Módulo V.
4. Construção através de seis equipes de projetos de atividade disci
-
plinar, referentes a cada disciplina do módulo, com seus respecti-
vos mapas conceituais.
5. Análise das dificuldades e resultados pelos projetos interdiscipli
-
nares desenvolvidos anteriormente, através da leitura de artigos.
1. Professores do Módulo V
– Qualidade Ambiental: Sivaldo
Souza Silva, Marília Regina Costa
Castro Lyra; Guilherme Pereira da
Silva, Robson Passos, Francisco de
Melo Granata, Maria Efigênia Farias
de Almeida, Marcelo Alexandre de
Vasconcelos, José Severino Bento
da Silva, Edilene Rocha Guimarães.
2. Alunos do Módulo V – Qualidade
Ambiental: Annara Marinho, Bruno
Augusto Aguiar; Davi Emmanuel
Lippel, Dayanne Rouseide, Elielton
Albuquerque, Fabiano Oliveira,
Fabrícia Moura, Gabriel M. da
Silva, Gabriela Figueiredo, Gabriela
Valones, Gleidson Moura, Gustavo
Amorim, Hannah Stella Amaral,
Jaqueline Maria Augusta, Klaus
Maciel, Leandro Barros, Leonardo de
Albuquerque, Lídia de Freitas, Lívia
Lima, Marcela Clementino, Mayana
Bandeira, Mércia Micheline, Nathalia
Amanda Santos, Rafaella Cavalcanti,
Sérgio Ricardo José Soares, Simone
Mendonça, Viviam Brandão de
Souza, Viviam Patrícia da Fé.
3. Comunidade local envolvida:
proprietários, funcionários,
prestadores de serviço, clientes
associados e externos do
Restaurante Mania, da Associação
dos Servidores do Cefet/PE.
52
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
6. Através de representantes das seis equipes anteriores, criação de
novas equipes e construção de seis projetos de atividade interdis
-
ciplinar, com seus respectivos mapas conceituais.
7. Reunião dos professores do módulo para escolher dois projetos
interdisciplinares com possibilidade de desenvolvimento.
8. Reunião com os alunos para escolher um projeto a ser desenvol
-
vido, entre os dois projetos escolhidos pelos professores.
9. Detalhamento do projeto interdisciplinar escolhido, sob o título
“Qualidade Ambiental no Restaurante Mania, da Associação dos
Servidores do Cefet/PE”, através de plano de atividades.
10. Apresentação oral pelos alunos do plano de atividades aos pro
-
prietários do Restaurante Mania, com autorização para início da
coleta de dados.
11. Coleta de dados com a comunidade local envolvida, através de
entrevistas, questionários, observação direta, registro fotográfi-
co, aferição de indicadores com uso de instrumentos de precisão
e outros.
12. Análise e discussão dos dados em sala de aula, para posterior re
-
dação do relatório técnico-científico.
13. Redação do relatório técnico-científico por equipe, sob orienta
-
ção dos professores do módulo.
14. Apresentação oral pelos alunos dos resultados para avaliação
interdisciplinar.
15. Formatação do relatório final pelos professores da disciplina Pro
-
jeto Interdisciplinar de Qualidade Ambiental, para entrega aos
proprietários do Restaurante Mania.
Destaca-se que para a construção dos projetos de atividades disciplinares
e interdisciplinares foram utilizadas as seguintes questões: o que desenvolver
como atividade? Por que desenvolver essa atividade? Quando, com quem e
onde a atividade poderia ser desenvolvida?
Como desenvolver essa atividade? Quais
bases tecnológicas e saberes fundamentam
essa atividade? Quais as condições necessá-
rias para desenvolver a atividade? A ativida-
de tem viabilidade de desenvolvimento?
Já no detalhamento do projeto inter-
disciplinar escolhido, sob o título “Quali-
dade Ambiental no Restaurante Mania, da
Associação dos Servidores do Cefet/PE”, o
plano de atividades definiu a partir do ob-
jetivo geral, os objetivos específicos que fo-
ram listados por disciplina. Cada professor
regente das disciplinas ficou responsável
em conduzir uma equipe de alunos nas ati-
vidades de coleta, análise e discussão dos
dados, além de orientar na redação do re-
latório final. A seguir, listamos os objetivos
presentes no plano de atividades:
53
ARTIGOS
Plano de atividades
Objetivo geral
Avaliar as condições atuais do Restaurante Mania, da Associação
dos Servidores do Cefet/PE e propor a implantação de um sistema de
qualidade ambiental.
Objetivos específicos por disciplina
01. Sistema Integrado de Gestão: Propor um Sistema de Gestão Am-
biental (SGA) para o Restaurante Mania, na busca pelo seu desen-
volvimento sustentável e apontar os pontos de melhoria ocorridos
com a sua implementação.
02. Auditoria e Certificação Ambiental
: Avaliar o Sistema de Gestão
Ambiental (SGA) formulado para o Restaurante Mania e elaborar
um manual de auditoria ambiental.
03. Processos Industriais
: Elaborar um sistema ambientalmente cor-
reto e economicamente viável de gestão dos resíduos sólidos para
o Restaurante Mania.
04. Programas de Prevenção de Riscos Ambientais
: Promover um
estudo com base no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
(PPRA), a fim de reconhecer e avaliar a ocorrência de riscos am-
bientais, com ênfase nos riscos físicos e ergonômicos existentes,
ou que venham a existir no ambiente do Restaurante Mania.
05. Ecoempreendimentos
: Analisar a viabilidade econômica do
uso de produtos orgânicos em alguns pratos oferecidos no Res-
taurante Mania.
06. Planejamento Ambiental
: Levantar as dificuldades de execução
e monitoramento das atividades do Restaurante Mania e criar ins-
trumentos de planejamento organizacional e ambiental.
Para a redação do relatório técnico-científico definiu-se a seguinte es-
trutura: apresentação; justificativa; objetivos; revisão bibliográfica, proce-
dimentos metodológicos; resultados e discussão, propostas e sugestões,
conclusões. Cada equipe ficou responsável de entregar o relatório impresso
correspondente às suas atividades e apresentar oralmente os resultados, por
ocasião da avaliação interdisciplinar.
A avaliação de cada disciplina correspondeu a 70% da média final, que
foi somada à avaliação interdisciplinar, que correspondeu aos 30% restan-
tes. Cada professor da disciplina correspondente realizou a avaliação do
relatório e da apresentação oral da equipe orientada. Destaca-se que a
apresentação oral das equipes foi realizada com a presença de todos os
professores do módulo, possibilitando o envolvimento ativo no processo de
avaliação interdisciplinar.
Após o processo de avaliação interdisciplinar, as equipes incorporaram
as observações dos professores e entregaram as versões finais dos relatórios
com as modificações necessárias. O relatório final foi formatado pelos pro-
fessores da disciplina Projeto de Qualidade Ambiental e apresentado pelos
54
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
REFERÊNCIAS
ANDRÉ, M. E. D. A. Ensinar a pesquisar... Como e Para Quê? In: SILVA, A. M. M. et alii (org.).
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FAZENDA, I. C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. 2ª ed. Campinas, SP:
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MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de Catarina Eleo-
nora F. Silva e Jeanne Sawaya; revisão técnica de Edgard de Assis Carvalho. 6ª ed. São Paulo:
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Cortez, 2005.
SANTOMÉ, J. T. Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Trad. Cláudia
Schilling. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
SANTOS, B. de S. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo:
Cortez, 1995.
alunos aos proprietários do Restaurante Mania, para concordância e poste-
rior execução das propostas e sugestões presentes no relatório.
Considerações finais
Para concluir, destacamos que a construção coletiva do projeto pedagó-
gico de um curso de educação profissional pode partir desde sua origem do
desenvolvimento de uma proposta de integração curricular, independente-
mente do nível ou modalidade de ensino oferecido, seja na formação inicial
e continuada de trabalhadores, na educação profissional técnica de nível
médio, e na educação profissional tecnológica de graduação e de pós-gra-
duação. Além do que, a articulação entre a educação profissional técnica
de nível médio e o ensino médio exigida pela LDB – Lei nº 9.495/96, seja
na modalidade integrada, concomitante ou subseqüente, pode priorizar a
formação integral como princípio orientador do currículo, com a preocu-
pação de formar para além do simples desenvolvimento das habilidades
necessárias para uma ocupação, partindo dos seguintes eixos integradores
– trabalho, ciência, cultura e meio ambiente –, os quais se inter-relacionam
através de uma perspectiva socioambiental.
55
ARTIGOS
RESUMO
O presente artigo é resultado de um debate entre os docentes que atuam
na área de turismo e hospitalidade, que teve como referência as expe-
riências realizadas com os acadêmicos e alunos dos Cursos de Tecnolo-
gia do Turismo e Técnico em Turismo do Centro Federal de Educação
Tecnológica do Estado de Roraima em algumas comunidades indígenas
roraimenses. Através da leitura de algumas literaturas que abordam te-
mas relacionados à antropologia, sociologia e turismo em áreas indígenas
houve uma reflexão sobre os impactos nos recursos naturais e culturais
ocasionados pelo fenômeno turístico a partir do contato entre o turista
HRUHFHSWRU$OpPGLVVRR&HIHW¼55YHPDWUDYpVGDSHVTXLVDFRQWULEXLU
com o apoio e planejamento do turismo nos territórios indígenas, tendo
como base as necessidades e interesses dos grupos étnicos que dividem o
espaço geográfico com o patrimônio natural.
Comunidades indígenas
e o turismo local
SOUZA, Nadson N. da S. de; SANTOS, Roseli B. dos
Centro Federal de Educação Tecnológica de Roraima
Palavras-chave: Comunidades Indígenas; Identidade; Impactos.
Fotos: Ronivaldo Mendes de Souza
Foto: Acadêmicos do Curso Superior em
Tecnologia do Turismo realizando uma
prática interdisciplinar à comunidade
do Bananal por meio dos componentes
curriculares Planejamento Turístico,
Sociologia e Antropologia do Turismo.
56
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Introdução
O turismo como atividade
econômica e um fenômeno social
vem a cada ano crescendo de for-
ma supreendente e, conseqüente-
mente, alavancando a economia
local, possibilitando um processo
de interação social, melhorando
os destinos turísticos no que diz
respeito à parte infra-estrutural,
porém, é realidade que a referida
atividade também contribui na ge-
ração de impactos, que nos dias
atuais, tem sido alvo de discussões e debates entre pesquisadores, profes-
sores e acadêmicos interessados na temática.
Isso traduz-se pela falta de disciplina por parte de alguns turistas, que em
várias ocasiões chegam ao destino turístico de várias maneiras na tentativa
de satisfazer algumas variáveis importantes para a compreensão mercado-
lógica da atividade turística no mundo, dentre as quais podemos destacar:
os gostos, preferências e motivações.
A relação sujeito-receptor e a identidade
O “sujeito-receptor” observa o turista como aquele que chega para con-
tribuir com o seu lugar, imaginando ser este um cliente importante no “pro-
cesso de compra” da oferta diversificada disponível na forma de atrativos
naturais e culturais, esquecendo em muitas ocasiões que nem todos estes
recursos devem ser expostos para os visitantes. É assim que se inicia uma
relação de interesses caracterizada por uma especulação por parte dos dois
protagonistas no fenômeno.
Boissevain (2005, p. 219) comenta que:
Certas características gerais dos turistas e do turismo afetam a to-
das as comunidades de destino de uma maneira ou outra. Estas
incluem a natureza transeunte do turista e as relações desiguais
entre turistas e os locais. Porque eles podem permitir-se ao luxo
de comprar os serviços dos que a economia local depende e
vindos de sociedades tecnologicamente avançadas, os turistas
às vezes patrocinam e inclusive abusam dos locais. Estes, por
outro lado, ao monopolizar o conhecimento e os serviços locais,
podem estafar e aproveitar-se dos turistas. A relação visitante-
anfitrião está assim potencialmente carregada de ambivalência
e tensão, que por sua vez, podem exacerbar as relações entre
estado e a sociedade civil.
Por outro lado, o turista vem com a perspectiva de vivenciar novas expe-
riências, interessado em sair da rotina e stress ocasionados pelas fortes ten-
sões e pressões das grandes metrópoles. Esse tipo de comportamento, de
certa maneira, faz com que este turista adquira uma nova identidade pelo
menos traduzida no tempo de permanência em que estará no destino. Isso
Nadson N. da S. Souza é mestre
em Planejamento Turístico pela
Universidad Nacional Experimental
Francisco de Miranda em Santa Ana
de Coro, Venezuela. É especialista
em Ecoturismo, planejamento e
interpretação em áreas naturais pela
UFLA, licenciado em História na
UFRR e tecnólogo em Hotelaria pelo
Instituto Tecnológico “José Leonardo
Chirino” – Punto Fijo/Venezuela. É
professor do Cefet/RR nas áreas de
Turismo e Hospitalidade, Ciências
Sociais e Ciências Humanas.
Roseli B. dos Santos é mestre em
Ciências da Educação Superior pela
Universidad de Matanzas em Cuba,
especialista em Metodologia do
Ensino Superior na Faculdade do
Patrocínio, licenciada em Geografia
na Universidade Estadual da Paraíba,
bacharel em Ciências Sociais com
habilitação em Antropologia na
Universidade Federal de Roraima. É
professora do Cefet/RR nas áreas de
Ciências Humanas e Sociais.
Um dos exemplos dessa prática foi o
trabalho com a Comunidade Indígena
do Bananal, que está localizada na terra
indígena de São Marcos, no município de
Pacaraima, ao norte do Brasil, no marco
oito da fronteira com a República da
Venezuela (BV8) (Palczykowski, 2007).
57
ARTIGOS
resume a “fuga” desse individuo de seu meio, caracterizado por padrões
sociais estabelecidos, e que inserido nestes, em muitas ocasiões, é como es-
tar aprisionado, estando sua “liberdade” condicionada e programada para
épocas equivalentes às férias, feriados e folgas.
Tratando de identidade, Hall (2003) comenta que esta se configura
como algo formado ao longo do tempo através dos processos incons-
cientes, não inato, pois existe sempre no imaginário de uma unidade.
Neste processo, a identidade permanece incompleta, pois se está sem-
pre sendo formada.
Nesse caso, o sujeito não é representado por uma única identidade, ele
adquire ao longo de sua história outras identidades, através das interações
ou relações socioculturais.
Por outro lado, essa relação entre sujeito-turista e sujeito-receptor deve
ser avaliada de acordo ao que se propõe aos habitantes locais como pro-
posta de desenvolvimento da atividade turística e sua inclusão no processo
de execução e operação da mesma.
Para evitar a possibilidade de estes habitantes locais constituírem
apenas “elementos simbólicos” para representar a cultura do destino
turístico, ficando à margem do processo operacional, é de fundamental
importância o planejamento que tenha como base para o desenvolvi-
mento da atividade turística os interesses e necessidades da comuni-
dade, tendo em vista de que seus integrantes são os conhecedores da
realidade que os cerca.
Os indígenas que integram a Aldeia do Bananal
pertencem às etnias indígenas Taurepang e
Macuxi, da família lingüística Karib. Devido às
guerras no Caribe e à colonização espanhola,
se refugiaram no extremo norte brasileiro.
Assimilaram alguns elementos do não-índio,
porém mantendo seus valores culturais.
58
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Com relação ao envolvimento da comunidade local no planejamento
turístico, Las Heras (1999, p. 21) apud Souza
1
(2005, p. 51) afirma que
os moradores vão saber explorar o recurso natural, porque são os que
o conhecem, sabem como podem observar os animais ou onde se en-
contram as plantas interessantes, eles conhecem o comportamento do
ecossistema e, o que é mais importante, podem ser os perfeitos guardi-
ões dos recursos do lugar.
Sabe-se que muitas comunidades indígenas de Roraima ainda con-
seguem estabelecer uma relação bastante significativa com o ambiente
natural, pois a interação é constituída perante o imaginário contido no
universo cultural. A idéia de retirar da natureza somente o necessário
garante a conservação do patrimônio natural, entretanto, pensar no tu-
rismo somente como vetor de desenvolvimento econômico pode gerar
um impacto sociocultural e ambiental nessas comunidades, como afirma
Kloetzel (1998, p. 42):
A disputa entre conservação do meio ambiente e desenvolvimen-
to econômico nem sempre é possível, tranquilamente, tomar o
partido da primeira. Ora, o bem-estar da população também me-
rece consideração. O que se pode fazer isto sim é insistir para que
o impacto ambiental seja o mínimo possível, e que, ao exame
dos benefícios trazidos pela obra, a análise não fique somente no
impacto imediato.
O turismo em Roraima
No estado de Roraima
2
é uma realidade a expectativa por parte de ins-
tituições da área de turismo e hospitalidade em desenvolver a atividade
turística, particularmente através do ecoturismo em diversas aldeias perten-
centes aos grupos étnicos das famílias Karib, Aruak e Yanomami.
Diante dessa expectativa, a postura de algumas organizações indígenas
perante o fenômeno turístico é de resistência, temendo aos impactos que a
atividade pode resultar.
Neste sentido, ainda não há garantia na legislação indígena sobre o de-
senvolvimento da atividade turística em territórios indígenas, constituindo
uma temática bastante abordada nas academias que atualmente trabalham
os cursos de tecnólogo e bacharel em turismo.
Entretanto o Decreto n° 4.339, de 22 de agosto de 2002, de legisla-
ção do Ministério do Meio Ambiente e Ibama, propõe em seus objetivos o
apoio aos estudos que promovam a utilização sustentável da biodiversidade
em beneficio de povos indígenas, quilombolas e outros locais assegurados
sua participação direta.
1RFDVRGR&HIHW¼55DWUDYpVGHVXDPLVVmRTXHYLVDDRGHVHQYROYLPHQ-
to da educação de qualidade promovendo o ensino, a pesquisa científica
e tecnológica e a extensão, contribuindo para o desenvolvimento social
e econômico do país, enquanto instituição federal de ensino tem estado
preocupada em atuar nos estudos e na pesquisa em diversas áreas com res-
ponsabilidade social, entre elas: turismo e hospitalidade e educação física.
1. Souza afirma que um dos
aspectos importantes para o
desenvolvimento de um projeto
de ecoturismo é a participação da
população local. No caso destes
projetos serem desenvolvidos em
territórios indígenas, nada mais
importante que a contribuição dos
próprios indígenas no estudo e
aplicação do negócio ecoturístico.
2. Roraima tem uma realidade bem
distinta e particular dos demais
estados brasileiros, pois apesar
de possuir uma grande quantidade
de atrativos caracterizados pela
diversidade de relevos, hidrografia,
fauna e flora e fortes características
culturais, os indígenas ainda sentem
muita dificuldade em organizar o
turismo, embora esse potencial seja
uma realidade. O desconhecimento
da operacionalidade da atividade
turística os faz intimidar-se, mesmo
que estes tenham assimilado a
cultura do não-índio.
59
ARTIGOS
REFERÊNCIAS
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 8ª edição. Rio de Janeiro,
DP&A, 2003.
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través del Turismo. España: Ediciones Mundi-Prensa.
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de Miranda”, 2005.
PALCZYKOWSKI, Tanael. Condições ambientais e humanas numa perspectiva do ecoturis-
mo na comunidade indígena do Bananal. &HIHW¼55(VWDGRGH5RUDLPD
Particularmente na área de turismo, através dos acadêmicos e alunos
dos cursos de tecnologia e técnico em Turismo essa pesquisa tem se de-
senvolvido com a inquietação de elaborar algumas ações tendo em vista as
dificuldades apresentadas pelos indígenas interessados em compreender o
turismo sob uma ótica mais antropológica.
'LDQWHGRH[SRVWRHVVDUHDOLGDGHMiID]SDUWHGRFRWLGLDQRGR&HIHW¼55
3
particularmente no que diz respeito à análise do potencial ecoturístico das
áreas indígenas, contribuindo com os grupos étnicos na realização desses
estudos, incluindo zoneamento, inventário e levantamento etnográfico
para finalmente discutir com as comunidades a prática do turismo indígena,
tendo em vista a preocupação quanto aos impactos dos recursos naturais
e culturais das populações tradicionais
4
, numa perspectiva de garantia do
bem-estar socioeconômico das mesmas.
2&HIHW¼55DWXDOPHQWHFRQWLQXD
desenvolvendo algumas pesquisas
através dos acadêmicos do Curso
Superior em Tecnologia do Turismo
em comunidades indígenas, entre
elas podemos citar: as aldeias de
Nova Esperança e Bananal. Essa
experiência tem permitido uma
aproximação da instituição com as
lideranças indígenas, estabelecendo
assim um vínculo sócio-antropológico,
onde o processo de interação
acontece com base na confiança
e garantia de que as pesquisas
realizadas por estes acadêmicos
retornarão para os indígenas, com
resultados e sugestões.
4. As populações tradicionais
na região amazônica estão
constituídas além dos grupos
indígenas, dos ribeirinhos que
vivem ao longo das margens dos
rios amazônicos, sobrevivendo da
pesca e da coleta, como também
das comunidades quilombolas,
a exemplo do estado do Amapá,
onde os descendentes dos negros
buscam desenvolver atividades
auto-sustentáveis, entre eles o
artesanato e a agricultura familiar.
As corredeiras do Bananal têm sido um atrativo ecoturístico. Porém, a comunidade indígena vem buscando, em parceria com o Cefet/RR, alternativas
para minimizar os impactos na natureza e manter os valores culturais da etnia Taurepang. A idéia é desenvolver um ecoturismo de forma seletiva.
60
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Introdução
De início, houve certa resistência de minha parte a relatar as inúmeras
ações sociais desenvolvidas pelos alunos dos cursos superiores ao longo
de cada semestre no Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará.
O motivo era muito simples e, ao mesmo tempo, pouco justificador, na
minha percepção, sentia-me incapaz de, em poucas linhas, apresentar a
dinâmica dessas ações e sua abrangência em uma cidade carente de práti-
cas sócio-educativas efetivamente transformadoras. Talvez acostumada ao
comodismo das políticas públicas que a cada novo governo são encetadas
visando minimizar ou reduzir os indicadores de pobreza das classes “menos
Mobilização de estudantes
universitários no desenvolvimento
de práticas sociais inclusivas
ALVES, Tereza C. V. A.
Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará
Palavras-chave: Inclusão social; Currículo e Cidadania; Rede Universitária.
Fotos: Jorge Pedrosa
Oficina de máscaras
61
ARTIGOS
favorecidas”, ficamos acomodados a aguardar as benesses dessas políticas
acreditando que elas possam corrigir séculos de exclusão em que apenas
1% da população tem acesso a mais de 50% das nossas riquezas.
Voltando ao foco da epígrafe deste artigo, sentia-me insegura quanto a
conseguir transmitir com fidedignidade as ações realizadas nas mais dife-
rentes interlocuções traçadas junto às comunidades de baixa renda, como
já explicitado no parágrafo acima. O receio de reduzi-las a uma óptica
acadêmica e/ou como mera prática assistencialista as empobreceriam em
sua dimensão ontológica, libertadora – eis o dilema – pelo qual me detive
por algum tempo.
Felizmente, consegui libertar-me desta inércia inicial e passei a ver que
perderia uma grande oportunidade de divulgar a beleza que a natureza
humana é capaz de produzir, independente de incentivo material e/ou
projeção pessoal, mas unicamente para tornar as relações humanas dignas
de ser vivenciadas.
Tudo começa em sala de aula, onde a análise da conjuntura sócio-
política do tecido societário nos remete às zonas periféricas de Fortaleza,
procurando conhecer suas áreas de maior vulnerabilidade social. O ma-
peamento de suas debilidades e potencialidades possibilitou aos docentes
e discentes, envolvidos na disciplina de projetos sociais, discutir e elencar
estratégias de intervenções que enfoquem o resgate dos membros dessas
comunidades como principais interlocutores do processo de construção
de sua cidadania.
Daí a percepção coletiva de que o desenvolvimento do projeto social
se faz numa conjunção de esforços, ou melhor, numa rede interdisci-
plinar da qual a instituição escolar é apenas um de seus componentes.
Senão, incorreríamos numa percepção limitada da capacidade de mo-
bilização dos agentes envolvidos neste processo – quer sejam professo-
res e alunos, quer seja comunidade mobilizada para garantir melhores
condições de vida.
Tereza Cristina Valverde Araujo
Alves é mestre em Gestão
em Negócios Turísticos pela
Universidade Estadual do Ceará
(UECE), especialista nas áreas
de Metodologia do Ensino
Superior, Educação Profissional
e Tecnologias de Ensino.
Membro do grupo de pesquisa
CNPq, na linha de T.I. Leciona
as disciplinas de Projetos
Sociais, Metodologia Científica
e Estrutura de Ensino.
63
ARTIGOS
Projeto – Fabricando
realidades: oficinas de
máscara e mosaico
O projeto “Fabricando realidades”
nasce com o intuito de proporcionar a
algumas crianças do bairro Mucuripe
a possibilidade de realizarem ativida-
des lúdicas durante as férias do mês
de julho. Durante este período, foram
oferecidas duas oficinas práticas sobre
máscaras e mosaico, utilizando-se pa-
pel e cerâmica sobre madeira.
Esta proposta teve como objetivos:
desenvolver capacidades mo-
toras e intelectuais, bem como
educar desenvolvendo habilida-
des artísticas;
estimular a compreensão simbólica do mundo;
proporcionar uma outra fonte de renda aos participantes por meio
da comercialização dos objetos propostos.
O público era constituído de crianças e adolescentes entre 6 a 14 anos,
moradoras no bairro do Mucuripe, zona costeira da cidade. As aulas foram
divididas em 6 encontros de 4 horas diárias, no período de realização de 7
a 28 de julho de 2007.
Oficina de máscara
Material utilizado: papel já utilizado (borrão), cola branca, tesou-
ra, lápis, pincel, tinta guache, bexiga, elástico e água. Metodologia:
apresentação do objeto já pronto; contextualização histórica do ob-
jeto; apresentação das etapas a serem realizadas e início da constru-
ção das máscaras.
Primeiro encontro: recortar papel, encher bexiga e iniciar colagem.
Segundo encontro: personalizar e finalizar máscaras (pintura, seca-
gem, colocação do elástico). Número de participantes: 10 crianças
entre 8 e 14 anos.
Materiais utilizados: papel sulfite, papel carbono, fita adesiva, cola
branca, tesoura, lápis, quadros de madeira (20cmx25cm), peças de
cerâmica (azul, preta, branca, amarela, vermelha e verde), rejunte
cerâmico na cor bege.
Metodologia: apresentação do objeto já pronto; contextualiza-
ção histórica do objeto; apresentação das etapas a serem reali-
zadas e início da construção dos mosaicos. Primeiro encontro:
desenhar o mosaico, transferir para a madeira com papel carbo-
no. Segundo encontro: escolha das cores, separação das peças e
início da montagem.
Aula de pintura em cerâmica com stêncil
64
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Projeto – Orientação profissional/cursos
técnicos e tecnológicos Cefet/CE
A proposta deste projeto social esteve associada a divulgar o Centro Fe-
deral de Educação Tecnológica do Ceará com foco na formação acadêmica
e nas atividades esportivas e socioculturais desenvolvidas nesta instituição,
que pode despertar nos alunos de escolas públicas o desejo de nela ingres-
sar. O objetivo geral deste projeto, portanto, foi veicular informações para o
conhecimento dos alunos, auxiliando-os na escolha de uma profissão.
A importância e intencionalidade desta ação se baseia na falta de acessi-
bilidade a informações com que, normalmente, os alunos de escola pública
deparam no seu cotidiano; mesmo disponibilizadas pela internet, nem todos
têm acesso à grande rede. Ele foi dividido em seis etapas assim descritas: ela-
boração de slides de cada área acadêmica com seus respectivos cursos técni-
cos e superiores; slides com imagens dos laboratórios e salas ambiente; slides
da estrutura física do Cefet/CE; slides das atividades esportivas e exposições
socioculturais; confecção de folder ilustrativo dos cursos e palestra informativa
nas escolas, entre elas destaca-se o Colégio Estadual Presidente Humberto
Castelo Branco. Estiveram presentes alunos do 2º e 3º ano do ensino médio.
Projeto desenvolvido no município de Maracanaú, na Escola Municipal
M.I.E.F Senador Carlos Jereissati, na comunidade Vila das Flores. Localida-
de com baixo IDH (índice de desenvolvimento humano), onde poucas pes-
soas têm acesso a informações relativas à preservação ambiental. As temáti-
cas abordadas foram: reciclagem do aço, alumínio, papel, plástico e vidro;
vantagens da reciclagem; produção e reciclagem de garrafas PET no Brasil;
lixo urbano, doméstico, comercial etc.; tempo necessário para decomposi-
ção de lixo. Como metodologia, além das aulas teóricas, foram produzidas
oficinas nas quais os alunos envolvidos construíram caixas relativas a cada
simbologia brasileira de identificação de materiais recicláveis.
Considerações finais
Consideramos que a idéia desse projeto é inacabável. Independen-
temente de gestão ou política escolar, os projetos sociais como princípio
educativo estão inseridos no perfil Cefetiano, nos seus sete anos de existên-
cia, constituindo-se uma marca registrada, assim como foi e é a educação
profissional para esta instituição quase centenária. O aluno recém-ingresso
sabe que agregará à sua formação profissional valores éticos e de respon-
sabilidade social, que, com certeza, o farão diferente, incitando-o a buscar
uma sociedade que respeite o meio ambiente, a diversidade étnica, o plu-
ralismo de idéias e a paz mundial.
REFERÊNCIAS
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MORIN, Edgar. A cabeça Bem-Feita. Repensar a reforma – Repensar o Pensamento. Tradu-
ção Eloá Jacobiona – 12ª ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.
65
ARTIGOS
Introdução
As últimas duas décadas têm sido marcadas por uma série de mudanças
no sistema produtivo nacional. A necessidade de incorporar as inovações
tecnológicas e de gestão ao sistema produtivo, a abertura econômica pro-
porcionada pela tentativa de inserção competitiva no mundo globalizado
e a hegemonia do discurso neoliberal vêm marcando esse período de tran-
sição do modelo Taylorista/Fordista para o modelo de acumulação flexível,
com implicações nas mais diversas áreas de atuação humana.
A escola pública como
instrumento de inclusão digital
DANTAS, Aleksandre S.; SILVA, Antônio R. N. da; SILVA, Caionara A. da.
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte
Unidade de Ensino Descentralizada de Mossoró
Palavras-chave: Informática; Educação; Inclusão.
Fotos: Shutterstock
66
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Dentre as tecnologias que têm contribuído para a promoção de mudan-
ças sociais e econômicas nesse período, destaca-se o computador, que tem
tido um desenvolvimento exponencial, tanto na velocidade de processa-
mento das informações, quanto na criação de programas que possibilitam
os usos mais variados dessa tecnologia. Assim, o computador vem adqui-
rindo uma importância cada vez maior para o desenvolvimento das mais
diversas atividades (saúde, lazer, trabalho, educação etc.), proporcionando
rapidez, comodidade e segurança para seus usuários.
Nesse contexto, diversos autores defendem que a inserção do compu-
tador no ambiente escolar oferece possibilidades de melhoria do trabalho
dos professores e da aprendizagem dos alunos, já que as práticas educati-
vas supõem processos comunicativos intencionais e os vínculos entre esses
dois elementos (educação e comunicação) se estreitaram sensivelmente na
contemporaneidade.
As novas tecnologias podem reforçar a contribuição dos trabalhos
pedagógicos e didáticos contemporâneos, pois permitem que se-
jam criadas situações de aprendizagem ricas, complexas, diversifi-
cadas, por meio de uma divisão de trabalho que não faz mais com
que todo o investimento repouse sobre o professor, uma vez que
tanto a informação quanto a dimensão interativa são assumidas
pelos produtores dos instrumentos (PERRENOUD, 2000).
Assim, a escola e os professores se vêem diante da possibilidade de uti-
lizar os recursos disponibilizados pela informática para construir e difundir
conhecimentos, centrando seus esforços nos processos de criação, gestão e
regulação das situações de aprendizagem.
Percebendo a importância de utilizar a informática como ferramenta
pedagógica, o MEC implantou o ProInfo (Programa de Informática na Edu-
cação), através da Portaria n
o
522, de 09 de abril de 1997. De acordo com
esta Portaria, o ProInfo foi criado “(...) com a finalidade de disseminar o uso
pedagógico das tecnologias de informática e telecomunicações nas escolas
públicas de ensino fundamental e médio pertencentes às redes estadual e
municipal” (BRASIL, 1997, p. 1).
De acordo com o próprio MEC,
O ProInfo não se destina a reinventar a máquina de ensinar, mas
a fazer com que professores desempenhem melhor sua nobre
missão, orientando os educandos para que estes, apoiados pelas
novas tecnologias de informação e comunicação, tornem-se cida-
dãos de fato, criativos e independentes, aptos a aprender durante
toda a vida e a conviver numa sociedade cujo dia-a-dia depende
cada vez mais de tecnologia (BRASIL, 2002).
Assim, ao incorporar os computadores às atividades de ensino, a escola
pública poderia contribuir para a democratização do acesso à informação e
às variadas formas de produção e disseminação do conhecimento, favore-
cendo a inclusão digital dos seus alunos, que passariam a ter acesso a essa
tecnologia e a beneficiar-se de sua utilização nas atividades de ensino, fatos
que, certamente, contribuiriam para a diminuição dos riscos de acentuação
das desigualdades sociais.
Aleksandre Saraiva Dantas
é mestre em Engenharia de
Produção pela Universidade
Federal de Santa Catarina.
Área de concentração:
Mídia e conhecimento. Linha
de pesquisa do mestrado:
Educação a distância.
Professor do Cefet/RN/Uned-
Mossoró. É doutorando em
educação pela Universidade
Federal do Rio Grande do
Norte (UFRN).
Antônio Robson Nogueira da
Silva é licenciado em Física,
na linha de pesquisa: Meios
de comunicação e educação.
É Professor do Cefet/RN/
Uned-Mossoró.
Caionara Angélica da Silva é
bolsista de iniciação científica
do Cefet/RN/Uned-Mossoró,
na linha de pesquisa: Meios
de comunicação e educação.
67
ARTIGOS
Diante das evidências de que a informática pode ajudar o professor e
a escola a atenderem às novas demandas que vêm se apresentando para a
educação e da constatação de que diversas instituições públicas de ensino
vêm se apropriando dessa tecnologia, essa pesquisa procura conhecer a
situação dos computadores recebidos pelas escolas públicas de Mossoró e
analisar como vem se dando a utilização desses computadores, enfatizando
as implicações do uso da informática para as atividades da escola, do pro
-
fessor e do aluno e para a inclusão digital desses alunos.
Para isso, toma como objeto de análise dez escolas públicas da cidade
de Mossoró (50% das escolas que possuem laboratório de informática,
sendo seis escolas estaduais e quatro escolas municipais), fazendo uso de
recursos metodológicos variados, que são: a revisão de literatura acerca
do uso da informática na educação, análise das avaliações dos programas
oficiais de implantação da informática na educação, aplicação de ques-
tionários com o responsável pela instituição (diretor), visita aos laborató-
rios de informática e aplicação de questionário com o responsável pelo
laboratório de informática.
Material e método
Na primeira parte do questionário respondido pelos diretores das esco-
las, procurou-se conhecer a situação em que os computadores se encon-
tram (quantidade de computadores recebidos e em funcionamento, manu-
tenção, existência de softwares educacionais, acesso à internet etc.).
De acordo com a Secretaria de Educação do Município de Mossoró
e o Núcleo de Tecnologia Educacional (NTE) instalado nessa cidade, as
escolas receberam de 7 a 21 computadores. Nas escolas visitadas, esse
número variou de 10 a 20 computadores. É importante ressaltar que em
80% das escolas visitadas existem computadores sem funcionar, sendo
que, de um total de 136 computadores recebidos, 34
(25,0%) não estão funcionando.
Percebe-se que o número de computadores recebidos
pelas escolas é bastante reduzido. Além disso, os proble-
mas com a manutenção tornam esse número ainda menor,
dificultando o atendimento à totalidade dos alunos.
Os problemas com a manutenção dos computadores
também se evidenciam quando se constata que apenas
60% das escolas visitadas receberam apoio do NTE para
a manutenção dos computadores. Essa assistência forne-
cida pelo NTE, que abrange a manutenção dos laborató-
rios e a qualificação dos profissionais da educação para o
uso da informática, é considerada insuficiente/inexisten-
te por 60% dos diretores.
Nenhuma das escolas visitadas dispõe de softwares
educacionais, utilizando apenas o Windows ou o Linux,
que, mesmo não sendo softwares desenvolvidos especifi-
camente para o uso educacional, possuem programas que
podem ser utilizados em diversas atividades educativas.
68
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Um dado positivo é a constatação de que 90% das escolas têm acesso
à internet. A relevância desse número se deve ao fato de que a internet,
além de ampliar as possibilidades de realização de pesquisas e de desenvol-
vimento de grupos de discussão, permite a utilização do correio eletrônico
como ferramenta pedagógica, fato que potencializa o uso da informática na
educação, pois
O correio eletrônico pode abrir novas formas de interação entre
alunos e docentes de diferentes instituições escolares, localiza-
dos em contextos geográficos e culturais diferentes. Pode abrir
um caminho para aprender a se comunicar com outros que
ensinam e aprendem (docentes universitários, pesquisadores,
figuras do meio político e cultural, peritos num domínio etc.)
(LIBEDINSKY, 1997).
Em seguida, procurou-se saber se a escola tinha um profissional respon-
sável pelo laboratório de informática e constatou-se que 30% das escolas
visitadas não contavam com o apoio desse profissional. Percebe-se que a
ausência de um profissional que cuide, exclusivamente, das atividades do
laboratório dificulta a utilização dos computadores, pois, nas três escolas
que não contam com o trabalho desse profissional, os computadores não
estão sendo utilizados.
Na segunda parte do questionário aplicado com os diretores, procu-
rou-se saber se os professores estão preparados para utilizar os compu-
tadores nas suas atividades educacionais, bem como conhecer de que
modo vem se dando a qualificação desses professores. Para isso, procu-
rou-se saber se existem professores multiplicadores, conhecer o número
de professores que participaram de cursos de capacitação, quais foram
esses cursos e quem os ofereceu.
As 10 escolas visitadas possuem 403 professores, dos quais apenas 42 pro-
fessores (10,4%) participaram de cursos de capacitação. Pode-se perceber que
o número de professores capacita-
dos é bastante reduzido, pois os cur-
sos são oferecidos em horários em
que os professores estão trabalhan-
do, seja na instituição pesquisada ou
em outra instituição, de modo que
muitos professores não podem par-
ticipar dessa capacitação.
Ao se observar os cursos feitos
pelos professores, percebe-se que
a capacitação está limitada ao uso
do Windows e do Linux, que não
são softwares desenvolvidos espe-
cificamente para atividades edu-
cacionais, ou, ainda, uma inicia-
ção à informática educativa. Além
disso, a carga horária desses cur-
sos é bastante reduzida, variando
do 80 a 180 horas.
69
ARTIGOS
Um elemento que poderia contribuir para a melhoria da qualificação
do professores seria a atuação dos professores que já receberam formação
e dos responsáveis pelos laboratórios de informática como multiplicado-
res. Porém, em 90% das escolas visitadas, os profissionais capacitados não
atuam como multiplicadores.
Na terceira parte do questionário aplicado com os diretores, procurou-
se conhecer as formas de utilização dos computadores recebidos pelas es-
colas públicas de Mossoró.
De acordo com os entrevistados, 50% das escolas usam os computa-
dores em atividades extracurriculares, como o Programa Jovem Empre-
endedor ou em cursos de informática (Windows), 60% das escolas usam
o laboratório para pesquisas de alunos e professores, 40% das escolas
usam o laboratório para digitação de atividades e apenas 30% das esco-
las utilizam os computadores em atividades relacionadas às disciplinas
do currículo.
É importante ressaltar as limitações que vêm ocorrendo no uso da
informática nessas escolas. O uso em atividades extracurriculares, como
o Programa Jovem Empreendedor, contempla apenas os alunos que es-
tão concluindo o ensino médio. Por conta do número reduzido de com-
putadores, esse programa ocupa parte significativa do tempo em que
os computadores podem ser utilizados, limitando o acesso de alunos e
professores ao laboratório para o desenvolvimento de outras atividades.
Além disso, existem escolas que só utilizam o laboratório para o Programa
Jovem Empreendedor.
Alguns números refletem as limitações na utilização dos computadores,
com destaque para o fato de que apenas 20% das escolas possuem um
projeto de uso dos computadores em atividades disciplinares e 80% dos
entrevistados consideram que os professores apresentam pouco/nenhum
interesse em utilizar esses computadores. Além disso, 30% das escolas não
estão utilizando o laboratório de informática.
Na quarta parte do questionário, procurou-se conhecer as modificações
nas atividades das escolas, dos professores e dos alunos ocorridas por conta
da utilização dos computadores.
Resultado e discussão
Apesar de 70% dos diretores afirmarem que o projeto político-peda-
gógico contempla a questão da utilização da informática na educação,
nenhuma das escolas modificou seu currículo com a chegada dos com-
putadores e apenas 3 escolas (30%) estão utilizando os computadores em
atividades disciplinares.
60% dos entrevistados consideram que a principal mudança no traba-
lho dos professores se reflete no aumento das possibilidades de pesquisa.
Porém, 40% dos entrevistados consideram que não ocorreram mudanças
no trabalho do professor. Para 80% dos entrevistados, os professores apre-
sentam pouco ou nenhum interesse em utilizar os computadores em suas
atividades pedagógicas.
70
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Para 80% dos entrevistados, os alunos demonstram grande interesse em
utilizar os computadores. Apesar disso, apenas 30% dos entrevistados con-
sideram que os alunos passaram a participar mais ativamente das atividades
disciplinares e das atividades desenvolvidas no laboratório de informática.
Desse modo, pode
-se concluir que não ocorreram mudanças significati-
vas nas atividades das escolas, dos professores e dos alunos.
Considerações finais
Constatou-se que a situação em que os computadores se encontram é
delicada, não atendendo, adequadamente, às necessidades educacionais
da maioria das escolas, haja vista que o número de computadores é insu-
ficiente, muitos computadores estão sem funcionar, evidenciando que a
manutenção fornecida é inadequada, nenhuma dessas escolas dispõe de
softwares educacionais e algumas escolas não têm um responsável pelo
laboratório de informática.
Percebe-se que a utilização dos computadores está limitada a atividades
extracurriculares, digitação de atividades e realização de pesquisas feitas
por alunos e professores. Porém, o mais preocupante é constatar que, em
três dessas escolas, os computadores não estão sendo utilizados. Nessas
escolas, a sala onde se encontram os computadores fica fechada e alunos
e professores perdem a oportunidade de se beneficiar das potencialidades
pedagógicas dessa tecnologia.
A constatação de que poucos professores têm uma formação adequada
para o uso do computador em atividades educativas é outro elemento limi-
tador dessa utilização. Como ficou evidenciado, a formação está limitada
aos programas Windows e Linux, ou ainda a uma iniciação à informática
educativa. Além disso, a carga horária de alguns cursos é bastante reduzida,
não preparando adequadamente o professor.
A análise da situação dos computadores e a constatação de que os com-
putadores não provocaram mudanças significativas nas atividades das esco-
las, dos professores e dos alunos, tendo uma utilização bastante limitada,
permite concluir que a maioria das escolas públicas de Mossoró não está
se apropriando do imenso potencial pedagógico do computador, de modo
que seu uso em atividades educacionais não vem favorecendo a inclusão
digital dos alunos.
Os responsáveis pela implantação de programas de utilização da infor-
mática na educação devem ampliar o número de computadores oferecidos
às instituições de ensino, pois, levando-se em consideração que algumas
das escolas visitadas atendem cerca de 1.500 alunos por dia, pode-se con-
cluir que essas escolas terão muitas dificuldades para desenvolver ativida-
des educacionais com um número tão reduzido de computadores.
O NTE precisa fornecer um serviço de manutenção mais eficiente
e que atenda todas as escolas que receberam computadores, pois, se
o número de computadores recebidos já é reduzido, a situação piora
quando se constata que muitos computadores estão danificados e não
recebem manutenção.
71
ARTIGOS
É necessário que as escolas adquiram softwares educacionais para uti-
lização por parte de professores e alunos. Esses softwares estão sendo de-
senvolvidos como estratégia para promoção do ensino das mais diversas
disciplinas, seja para as atividades a distância ou presenciais, sendo dispo-
nibilizados, predominantemente, através de CD-ROM.
É necessário que todas as escolas possuam profissionais responsáveis
pelos laboratórios, pois a ausência desse profissional tem inviabilizado o uso
dos computadores em algumas escolas, onde os laboratórios estão fecha-
dos, impossibilitando o acesso de alunos e professores aos computadores.
Desse modo, é preciso inserir cursos de formação continuada de profes-
sores para o uso educativo dos computadores, de preferência, na própria
escola e dentro da carga horária semanal do professor, pois muitos profes-
sores não têm condições de se qualificar pelo fato dos cursos serem ofere-
cidos em horários em que eles estão lecionando, seja na instituição visitada
ou em outras instituições de ensino.
Além de uma preparação adequada dos professores, faz-se necessário
um projeto político-pedagógico que articule o trabalho do professor com
o uso dessas tecnologias em atividades disciplinares, do contrário, cor-
re-se o risco de se confrontar com velhas práticas, mais caras e com um
caráter pretensamente moderno, uma vez que a simples introdução da
tecnologia não é capaz de modificar as concepções do professor acerca
das questões pedagógicas.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Portaria n
o
522. Brasília, 1997.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação a Distância. Relatório de atividades
1996/2002. Brasília, 2002.
LIBEDINSKY, Marta. A utilização do correio eletrônico na escola. In: LITWIN, Edith (org.).
Tecnologia educacional: política, histórias e propostas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
PERRENOUD, Philippe. 10 novas competências para ensinar. Trad. Patrícia Chittoni Ramos.
Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. Capítulo 8, Utilizar novas tecnologias.
72
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Introdução
A Unidade Continente do Centro Federal de Educação Tecnológica de
Santa Catarina iniciou suas atividades de ensino, pesquisa e extensão na
educação profissional da área de Turismo e Hospitalidade em agosto de
2006. Entre as metas inicialmente traçadas está a da responsabilidade so-
cioambiental, a qual pode ser viabilizada através de parcerias com outras
entidades. Nesse âmbito, a busca da inclusão de pessoas portadoras de
necessidades especiais foi uma das ações implantadas, por meio da parce-
ria firmada com a Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE). Esse
Panificação como alternativa
de inclusão para portadores
de necessidades especiais
APLEVICZ, Krischina S.; DENTZ, Berenice G. Z. von; MARCOS, Emanoelle N. F.; AMORIM, Telma P. P.
Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina
Palavras-chave: Inclusão; Panificação; Parcerias.
Fotos: Krischina Aplevicz
73
ARTIGOS
trabalho conjunto possibilitou a realização do curso de qualificação profis-
sional, chamado Oficinas de Panificação, que será discutido a seguir.
A Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) é uma instituição
estadual de caráter beneficente, instrutivo e científico, sem fins lucrativos,
vinculada a Secretaria de Estado da Educação e Inovação. Criada em 06 de
maio de 1968, está localizada no município de São José/SC. Atua na área
de educação especial, desenvolvendo pesquisas, definindo a política de
educação especial para o estado de Santa Catarina e prestando atendimen-
tos na área de saúde e educação.
Educação especial
A educação especial é voltada a pessoas com deficiências, que são
aquelas que possuem restrição física, mental ou sensorial, de natureza
permanente ou transitória, que limite o desempenho de uma ou mais ati-
vidades da vida diária (CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO, 2006).
Já deficiência mental é definida como comprometimento cognitivo rela-
cionado com o intelecto teórico (capacidade para utilização das formas
lógicas de pensamento conceitual) que também pode se manifestar no
intelecto prático (capacidade para resolver problemas de ordem prática
de modo racional), ocorrendo no período de desenvolvimento, ou seja,
até os dezoito anos de idade” (CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO,
2006). De acordo com a décima revisão da Classificação Internacional
de Doenças (CID 10), a deficiência mental é dividida em leve, moderada
e severa – dependendo do grau de comprometimento mental (BRASIL,
1994). Na instituição estão hoje matriculados cerca de quatrocentos e
nove (409) alunos, distribuídos em três centros de atendimento, sendo
eles: Centro de Educação e Trabalho (Cenet), Centro de Ensino e Apren-
dizagem (Cenap) e Centro de Educação e Vivência (Cevi).
Entre os objetivos do Cenet estão: preparar e encaminhar os edu-
candos para o mercado de trabalho competitivo, oferecendo também
atividades laborativas ocupacionais. Este centro, onde se realizou o
curso de qualificação profissional, está estruturado em diferentes mo-
dalidades de atendimento, divididas da seguinte forma: oficinas adap-
tadas, rotativas de convivência, pedagógicas, profissionalizantes, loco-
moção independente e encaminhamento e colocação no mercado de
trabalho (FCEE, 2007).
Atualmente no Cenet estão matriculados cento e trinta e um (131) alu-
nos, sendo que doze (12) deles fazem parte da oficina profissionalizante de
panificação. Destes, quatro (4) são mulheres e oito são (8) homens, com
idades entre dezenove (19) e vinte e seis (26) anos. O Cenet atende alunos
a partir de 14 anos, com diagnóstico de deficiência mental, tendo outras
deficiências associadas ou não e transtornos invasivos do desenvolvimento.
Todos os alunos possuem algum tipo de deficiência mental, sendo: dez (10)
com deficiência mental moderada (três deles com Síndrome de Down) e 2
com deficiência mental leve. Com relação à escolaridade, três (3) deles são
alfabetizados e o restante estava iniciando a alfabetização no período do
curso. A oficina foi iniciada no primeiro semestre de 2007, orientada por
uma das professoras da Fundação, devendo estender-se até a avaliação dos
Krischina Singer Aplevicz é
mestre em Ciência e Tecnologia
em Alimentos pela UEPG e
professora do curso Técnico
de Panificação e do curso de
Auxiliar de Panificação do
&HIHW¼6&
Berenice Giehl Zanetti von
Dentz é especialista em
Biossegurança pela UFSC e
professora do curso Técnico
de Panificação e do curso de
Auxiliar de Panificação do
&HIHW¼6&
Emanoelle Nazareth Fogaça
Marcos é especialista em
Saúde da Família pela UFSC,
mestranda em Nutrição pela
UFSC e professora do curso
Técnico de Panificação e
dos cursos de Auxiliar de
Panificação e Auxiliar de
&R]LQKDGR&HIHW¼6&
Telma Pires Pacheco Amorim é
especialista em Educação pela
FUCAP e professora do curso
Técnico em Hospedagem do
&HIHW¼6&GD8QLGDGH&RQWLQHQWH
74
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
alunos quanto a possibilidade de inserção no mercado de trabalho. Teve
por objetivos incentivar o interesse dos alunos com deficiências para as
atividades do setor de panificação, bem como aprimorar a elaboração dos
produtos panificáveis.
Oficina de panificação
A oficina, com carga horária total de 40 horas, foi realizada entre
os meses de maio e julho de 2007, contando com 10 encontros se-
manais de 4 horas cada. As aulas foram realizadas nas instalações da
própria FCEE, tendo em vista que esta possui um laboratório de panifi-
cação completo montado. Envolveram-se no curso, três professoras da
área de panificação e confeitaria do Cefet, sendo que a cada encontro,
duas professoras revezavam-se na aula. Também participou da oficina a
professora de nutrição do Cefet, que ministrou algumas aulas teórico-
práticas de higiene. Além disso, houve acompanhamento da professora
responsável pela turma na FCEE.
O curso consistiu na elaboração de pães, biscoitos, bolos e salgados. Os
produtos foram preparados através de processos caseiros, dispensando a
utilização de equipamentos industriais. Os ingredientes foram fornecidos
pela instituição, não tendo sido utilizados aditivos.
O curso foi iniciado com uma ambientação, que teve por objetivos
o reconhecimento do local, dos alunos e dos equipamentos e utensí-
lios disponíveis. Nesse dia, a professora de nutrição da equipe fez uma
exposição dialogada sobre higiene na manipulação de alimentos, dis-
cutindo com os alunos alguns aspectos importantes para a produção de
panificáveis.
No decorrer do curso, a professora de nutrição esteve presente em
mais três encontros, com o intuito de verificar o conhecimento adquirido,
observar as principais dificuldades e reciclar as informações. Nesse que-
75
ARTIGOS
sito, a turma apresentou-se heterogênea: foram observadas dificuldades
de alguns alunos em memorizar e executar os procedimentos de higiene.
Já outros mostravam ter adquirido hábitos higiênicos como rotina. A dife-
renciação dos panos usados na cozinha também era uma dificuldade, pois
com freqüência, os panos de limpeza do ambiente e os panos de secagem
de utensílios eram confundidos.
A professora responsável pela turma teve um papel importante, pois cons-
tantemente alertava aos alunos sobre as falhas na manipulação. É importante
ressaltar que alguns hábitos de higiene pessoal já eram praticados pelos alu-
nos, por orientação da professora, tais como: uso de uniforme e proteção
para os cabelos, lavagem das mãos, limpeza de bancadas e utensílios.
As receitas selecionadas para a oficina foram elaboradas de forma indivi-
dual e coletiva, visando observar o desempenho de cada aluno, o trabalho
em equipe – fundamental no setor de panificação – e também em função
da quantidade de utensílios disponíveis e das peculiaridades de algumas
receitas. A divisão é descrita na tabela abaixo:
Tabela 1. Metodologia de preparo de receitas
Receita Metodologia
Pães Individual
Biscoitos
Individual
Bolos Coletiva
Salgados Individual e coletiva
No preparo dos pães, observou-se as etapas de dosagem e a ordem de
adição dos ingredientes. Durante a dosagem, a maioria dos alunos demons-
trou dificuldades em quantificar os ingredientes, precisando ser auxiliados.
No que tange à adição, percebeu-se facilidade, especialmente no penei-
ramento de farináceos. Outra etapa de preparo observada foi a mistura
da massa, na qual alguns alunos tiveram dificuldades na continuidade do
processo, acabando por se desestimular, interrompendo a finalização e pro-
duzindo pães sem desenvolvimento.
Na elaboração de alguns biscoitos constatou-se dificuldades dos alunos
na abertura da massa. Isto ocorreu em virtude da grande quantidade de
gordura utilizada, que tornava a consistência da massa mole. Foi observado
que os alunos aplicavam força excessiva nesse processo, o que acabava por
danificar o produto. No caso do preparo de sequilhos, os alunos demons-
traram mais facilidade em elaborar a massa, considerando que possuem
consistência mais firme.
Os bolos foram produzidos coletivamente, havendo colaboração de to-
dos, sem dificuldades aparentes.
Os alunos do grupo apresentaram algumas limitações no preparo de
salgados como esfiha e coxinha que, por serem produtos com tamanhos
pequenos e massas delicadas, que exigiam maior capacidade de mani-
pulação. Nesse caso os problemas ocorridos foram com o fechamento
76
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
inadequado do salgado e com a mistura de recheio à massa. Apesar de
possuírem equipamentos adequados, como: cilindros; divisora, massei-
ra batedeira; forno; geladeira e freezer
, somente os 4 últimos foram
utilizados. Os demais estavam inadequados para uso devido à falta de
manutenção e conservação.
Considerações finais
Mesmo com algumas habilidades reduzidas as pessoas portadoras de
necessidades especiais auxiliam nas aulas e nas atividades propostas com
empolgação e sem reclamações. Portanto, é importante apoiar sua inclusão
na sociedade e no mercado de trabalho, tendo em vista que se tornam in-
divíduos mais participativos com tranqüilidade suficiente para se mostrarem
prestativos. Mesmo apesar do desânimo de alguns dos integrantes diante
das dificuldades surgidas, muitos demonstraram persistência e tentaram,
com a ajuda do professor, elaborar o produto.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial – educação
especial: um direito assegurado. Brasília: MEC:SEESP, 1994.
CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO. Fixa normas para a Educação especial no Sistema
Estadual de Educação de Santa Catarina. Resolução nº 112, de 12 de dezembro de 2006.
FCEE. Disponível em: http://www.fcee.sc.gov.br/afundacao/objetivos.htm. Acesso em: 30 de
agosto de 2007.
77
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
A discussão sobre problemas com os quais nos vemos envolvidos no
dia-a-dia constitui uma ação um tanto relegada a segundo plano, seja no
convívio familiar, seja na escola ou vida social. Fica apenas a justificativa
de que nos falta tempo. Não é comum o debate intensivo entre cidadãos
comuns, supostos beneficiados, e pessoas ou órgãos envolvidos nesta ou
naquela ação ou intenção do governo.
Reflexões sobre a transposição
do rio São Francisco a partir
do filme ‘Narradores de Javé’
FERREIRA, Edna M. O.; RIOS, Márcio L.
Escola Agrotécnica Federal de Senhor do Bonfim/BA
Foto: Edna Oliveira
78
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
O que se percebe é a tendên-
cia à aceitação passiva por omissão
da sociedade, ou a especulação,
não pelo que ela possa resultar
de positivo, mas como resistência
política do partido político opos-
to àquele que se propõe à ação.
E isso nem sempre resulta em
benefícios aos mais necessitados.
Ao contrário, geralmente eles são
utilizados para engrossar filas, nas
manifestações, para depois sofre-
rem, sozinhos, as conseqüências.
Assim, entendendo a pedago-
gia de projetos como educação
que prepara para a vida futura,
em que a escola representa a vida
presente e, partindo de um pro-
jeto interdisciplinar envolvendo
as disciplinas de Língua Portuguesa, Geografia e Artes, desenvolvido nas
primeiras séries do Ensino Médio na Escola Agrotécnica Federal de Senhor
do Bonfim/BA, foram vivenciadas situações que promoveram o rompi-
mento com esse modelo de comportamento e tentou despertar no aluno
o senso crítico e a consciência cidadã.
Buscou-se, através da retomada do que foi a construção da Barragem de
Sobradinho/BA, no que se refere à não participação da sociedade nas deci-
sões, naquela época, já que o período político em que se deu não favorecia
a participação popular, avaliar pontos positivos e negativos da transposição
do rio São Francisco, a partir do filme ‘Narradores de Javé’ e de leituras de
notícias extraídas do jornal A Tarde e de sites diversos, sobre as ações já
implementadas pelo Governo Federal em favor da transposição e o nível de
conscientização da sociedade a esse respeito.
Desenvolvimento e discussão
dos resultados
Os alunos assistiram ao filme ‘Narradores de Javé’, sob a orientação dos
professores, com vistas não apenas ao conteúdo do filme, mas também
aos elementos que compõem a narrativa: o tempo, o espaço, o enredo,
as personagens e o foco narrativo. Além disso, observaram os mecanismos
de construção desses elementos para que cumprissem a função estética e
de coerência dentro da obra.
Num segundo momento, os professores envolvidos no projeto, sen-
sibilizaram os alunos para a questão da construção da Barragem de So-
bradinho/BA e o que ela tem em comum com a temática da transposição
do rio São Francisco, com a música ‘Sobradinho’, de Sá e Guarabyra:
audição do CD e interpretação de trechos pertinentes, em que se fala da
inundação para a construção da Barragem de Sobradinho/BA. Algumas
cenas contidas no filme “Narradores de Javé” serviram de mote para se
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79
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
relacionar conseqüências sociais geradas pela construção da hidroelétrica
de Sobradinho, na Bahia.
Após leituras e debates em sala, alunos entrevistaram especialistas e
autoridades, para que se fundamentassem e consolidassem as idéias; re-
alizou-se um júri simulado, com a participação de alunos e professores,
no qual se pôde avaliar a iniciativa do projeto, através da participação
e das falas dos alunos. Propositadamente, venceu a idéia de que todos
devem continuar pesquisando, lendo e debatendo para que melhor se
posicionem e acabem por engrossar correntes realmente comprometidas
com o desenvolvimento regional, para que se tomem decisões acertadas.
Não se pode errar!
Num último momento, foi apresentada à turma uma performance,
escrita pelos alunos nas aulas de produção de texto e organizada pela
professora de Artes, para ser dramatizada pelos próprios alunos, em que
se evidenciava a necessidade de participação ativa de todos nas questões
sociais, visando ao desenvolvimento regional sustentável e ao exercício
efetivo da cidadania.
Registra-se como positiva a participação e o envolvimento dos alunos
nesse tipo de atividade que compõe a pedagogia de projetos, uma vez
que dinamiza a prática pedagógica; oportuniza a exploração dos con-
teúdos em várias perspectivas e não apenas na perspectiva de um único
professor, evitando-se a atomização do conteúdo; sugere aos ‘persona-
gens do tempo presente’ mobilização e organização, tendo em vista os
interesses próprios da comunidade e exercendo papel de ‘protagonistas
da história e não meros figurantes’.
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80
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
A Escola Agrotécnica Federal de Senhor do Bonfim/BA (EAFSB/BA) visa à
formação de cidadãos, fazendo isso por meio da educação profissionalizan-
te nos diversos níveis de ensino (formação, qualificação e requalificação),
e vivenciou, em 2006, uma experiência inédita de inclusão social, fazendo
valer a sua visão de unidade educadora.
Todos sabemos do importante papel atribuído às escolas no processo
de inclusão. Então, a EAFSB instituiu o Núcleo de Apoio a Portadores de
Necessidades Educativas Especiais (NAPNEE) em 2005, que de imediato
deu início às suas ações: palestras de conscientização para a comunida-
de escolar (figura 1) e participação em eventos ligados ao tema inclusão
social (figura 2).
Já em 2006, elaboramos o projeto Incluir: envolver, fazer parte, per-
tencer com vistas a promover uma maior interação entre escola/comuni-
dade, estipulando uma reserva de 50% para os portadores de necessidades
especiais (PNEs).
(Des)construindo diferenças
RIOS, Kamila G.; SOUSA, Antonio S.
Escola Agrotécnica Federal de Senhor do Bonfim/BA
Fotos: Kamila Gonçalves Rios
81
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
Fizemos a divulgação na mídia local (rádio e TV), enfatizando a impor-
tância da inclusão social, da singularidade de cada indivíduo na socieda-
de, visando assegurar-lhe o pleno exercício dos seus direitos e sua efetiva
integração social, bem como descrevendo o curso: seria ministrado duas
vezes por semana, uma em período integral e outra em um único turno,
perfazendo o total de trinta horas.
A resposta foi imediata: as vagas logo foram preenchidas por um gru-
po de PNEs do Instituto Psicopedagógico de Bonfim e outras pessoas dos
mais diversos bairros da cidade. Logo dávamos início ao 1º Curso Básico
de Qualificação, com a participação de PNEs na área de Agricultura I
(Olericultura Orgânica), com carga horária de 30 horas e ministrado pelo
professor Antonio Sousa.
Sabíamos que tínhamos um desafio pela frente. Alguns inscritos, quan-
do viram que fariam parte de uma turma com PNEs, desistiram na primeira
semana, e de imediato preenchemos essas vagas com PNEs que até então
não seriam atendidos em virtude do número de vagas; notamos também
um grau de dificuldade na apreensão de conhecimentos, especialmente
por parte dos PNEs. Esses entraves, no entanto, nos fizeram repensar, a
fim de encontrar possíveis soluções. Acreditamos que os cursos precisam
ser ministrados com uma carga horária semanal menor por um período
de tempo mais longo, o que fará com que os PNEs tenham um convívio
intenso com o ambiente, o que resultará em um maior índice de apren-
dizado. Verificamos também que quando se deparavam com a realização
de atividades práticas, todos queriam fazer ao mesmo tempo, e a solução
apontada pelo professor foi a de disponibilizar mais material para as aulas
práticas, permitindo que todos realizem as atividades ao mesmo tempo.
Mas essas dificuldades não diminuíram nossa motivação.
Palestra de conscientização
82
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
A interação entre alunos regularmente matriculados na escola, profes-
sor, PNEs e demais participantes que permaneceram no grupo nos deu a
certeza de que havíamos trilhado o caminho certo, servindo como estímu-
lo e exemplo para outros cursos que pretendemos desenvolver nessa mes-
ma linha de inclusão. Todos se envolveram nas atividades programadas e
o faziam com muita dedicação (figura 3). Então, o resultado era sempre
gratificante. Os PNEs só faltavam às aulas se estivessem com problemas
de saúde, o que representou um ponto positivo no aprendizado. Perce-
beu-se, ainda, que sempre havia pais presentes querendo acompanhar o
desempenho do filho. Tudo isso serviu como incentivo para o professor e
demais envolvidos no processo.
Naquela oportunidade, os PNEs demonstraram suas habilidades, dei-
xando claro que só precisam de estímulos e oportunidades para manifes-
tar suas potencialidades. Sob a orientação do professor e três monitores,
Benedito Júnior, Erijefferson Pereira e Gobério Soares, aplicaram práticas
diversas de olericultura: confecção de canteiros, produção de adubo, pre-
paração de inseticida natural (figura 4), preparo de sementeiras (figura 5),
transplantio de mudas para canteiro definitivo, irrigação, tratos culturais e
colheita. Vê-los realizando todas essas práticas nos mostrou como são dedi-
cados quando se propõem a fazer uma atividade, dando significado espe-
cial ao projeto em questão.
Ao final do curso, seguindo as normas de certificação, 17 cursistas re-
ceberam o certificado; dentre esses, 14 eram portadores de necessidades
especiais e 3 eram pessoas que venceram o preconceito, deixando para a
comunidade escolar uma grande lição. Toda e qualquer pessoa é um ser em
potencial para aprender, contribuir e se desenvolver plenamente. Basta que
lhe seja dada oportunidade.
Produção de inseticida natural
83
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
O grande desafio surgiu no último bimestre do ano, numa turma de
3º ano de Ensino Médio, quando foi preciso substituir uma professora em
licença para doutorado. O ano letivo estava praticamente acabando, os alu-
nos em ritmo de vestibular e com o conteúdo programático praticamente
concluído. Como despertar o interesse para as aulas de Geografia? Resol-
veu-se, então, propor um trabalho de campo com pesquisa voltada para a
comunidade. Escolheu-se a feirinha da Boa Morte, nome emprestado da
igreja antiga na praça do mesmo nome e bem próxima à escola. Proposta
aceita pelos alunos, foram estabelecidos os objetivos: vivenciar o movimen-
to de uma feira livre, perceber sua dinâmica, estratégias de vendas, identifi-
car o comerciante da feira e seus ajudantes como mão-de-obra diferencia-
da, analisar o espaço ocupado pela feira e sua interação com a vizinhança,
conhecer um pouco da história de feira e de Cuiabá.
Dia de feira
SIQUEIRA, Maria D. de S.
Centro Federal de Educação Tecnológica de Mato Grosso
Shutterstock
84
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Como os conteúdos de geografia foram trabalhados: a economia do
Mato Grosso, aspectos da agricultura e da pecuária, os produtos destinados
à exportação e abastecimento interno, o setor de serviços, as feiras livres, a
ocupação do espaço com diferentes setores da economia. F
oram formados
8 (oito) grupos de trabalho, cada qual com uma missão:
1) o movimento inicial da feira. Montagem das bancas. O relaciona-
mento entre os companheiros de trabalho;
2) os feirantes: de onde vêem, quem são, quanto ganham, quando
começaram esse trabalho, têm trabalho extra, quantos sobrevivem
dessa renda?;
3) os produtos: de onde vêm, como são produzidos, como se calculam
os preços?;
4) as barracas ou bancas: quantas são, quais as especialidades, como
estão distribuídas?;
5) as bancas de alimentação: o que servem, quem produz, em que
parte da feira estão colocadas, como é o movimento?;
6) histórico da feira livre, histórico da feira na praça. Quando começou?;
7) análise do espaço de localização: o que os vizinhos acham, e os mo
-
radores do entorno e a clientela?;
8) o espaço depois da feira: como fica, quem limpa, o que fazem com
as sobras, e com o lixo?
Como atividades, foram propostas e executadas: pesquisa e discussão
em sala de textos sobre a economia do Mato Grosso, observação de mapas,
estudo de campo, visita à feira desde as primeiras horas da montagem das
barracas até o término (figura 1), pesquisas bibliográficas sobre as feiras li-
vres, discussão e análise, seleção e tabulação dos dados, elaboração de grá-
ficos e tabelas, construção de maquetes, painéis de fotos, organização dos
grupos para socialização. No pátio da escola, montou-se uma mini-feira, ao
lado de painéis, mapas, maquetes e disposição dos alunos em grupos para
exposição e apresentação dos trabalhos.
Como resultado, conseguiu-se
presença integral dos alunos, per-
cepção da importância e funcio-
namento da economia informal,
uma participação mais ativa na
vida da comunidade e respeito
pelo trabalho dos outros, como
frisou uma das alunas, Simone:
“aprendemos que essas pessoas
enfrentam essa situação por falta
de emprego melhor, muitas vezes
como única opção, mas que são
persistentes nos seus ideais”. Mui-
to mais que conteúdo científico,
a participação na vida da comu-
nidade levou a enxergar a ciência
com novos olhos, de uma maneira
mais ativa e consciente.
Figura 1. Feira da Boa Morte.
Alunos em trabalho de campo
Maria Siqueira
85
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
A partir da Constituição Federal de 1988, a crescente difusão e a con-
seqüente visibilidade que vêm ganhando no espectro social as comunida-
des remanescentes de quilombos fazem com que os movimentos sociais,
em especial o movimento negro, pesquisadores de várias matizes, ope-
radores jurídicos e agentes públicos coloquem em evidência os direitos
dessas populações tradicionais.
O artigo 68 da Constituição diz que: “Aos remanescentes das comunida-
des dos quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a pro-
priedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. Na
busca desse reconhecimento, uma das questões colocadas, na atualidade,
é o debate referente à categoria de quilombo. É mister salientar que a lei, a
A comunidade remanescente
de quilombos do Angico
na cidade de Alegrete
GRISA, José E. A.
Escola Agrotécnica Federal de Alegrete
Fotos: José Grisa
86
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
conquista de diretos e a reconstrução da identidade quilombola são frutos
da luta histórica do movimento negro brasileiro. Isso é importante salientar
já que muitos são aqueles que querem fazer passar esse reconhecimento
como uma dádiva do estado e de suas agências, o que não corresponde à
realidade dos fatos.
Duas visões se destacam na disputa sobre quem seriam os remanescen-
tes de quilombos hoje: uma concepção mais tradicional e conservadora,
que relaciona diretamente os descendentes aos quilombos do período do
escravismo colonial brasileiro, considerando que os descendentes dos es
-
cravos que habitavam os quilombos até 1888 e permanecem no lugar de
origem são somente esses que podem reivindicar a condição de remanes-
centes de quilombos. Esta visão é representada pela bancada ruralista no
Congresso Nacional, ou seja, a bancada que representa os grandes proprie-
tários de terra do nosso país.
Por outro lado, há a posição defendida por antropólogos, procuradores
e movimentos sociais, que enfatizam na categorização de quilombola a
autodefinição, a diferenciação étnica, a resistência ao racismo, ou seja, de-
fendem o que está no enunciado do Decreto nº 4.887, de 20 de novembro
de 2003, que regulamenta o procedimento para identificação, reconheci-
mento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por rema-
nescentes das comunidades de quilombos, de que trata o artigo 68 do Ato
das Disposições Transitórias. Portanto, remanescente de quilombo é uma
categoria. O Rio Grande do Sul está em processo de conhecimento e re-
conhecimento de um número significativo de comunidades remanescentes
de quilombos, já são mais de 120 comunidades identificadas.
Uma série de indicadores, entre eles o Mapa da Fome, elaborado pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (1990), apontam que,
dentro dessa realidade precária da agricultura familiar, os agricultores mais
excluídos são os das comunidades remanescentes de quilombolas.
Alegrete possui um número significativo de pequenas propriedades rurais
e, entre essas, resistem comunidades descendentes de quilombolas que só
muito recentemente foram identificadas. A história social da colonização do
Rio Grande do Sul caracteriza-se pela constante destruição dos territórios de
resistência das comunidades negras pela estrutura fundiária ora dominante.
Uma dessas comunidades é a Comunidade Quilombola do Angico, que
é composta por, aproximadamente, 25 famílias. A comunidade está dis-
tante 65 quilômetros da sede do município e se localiza no 2º sub-distrito,
denominado Itapororó. A comunidade recebeu o nome de Angico porque
fica às margens do rio que passa na comunidade e leva o mesmo nome.
Um dos aspectos importantes da pesquisa realizada na comunidade foi
sobre a questão do território, pois a identidade e a territorialidade são as
bases fundantes da categoria social de remanescente de quilombos, daí
a justeza do que preconiza o artigo 4º da Instrução Normativa do Incra:
“consideram-se terras ocupadas por remanescentes das comunidades de
quilombos toda a terra utilizada para a garantia de sua reprodução física,
social, econômica e cultural, a exemplo das áreas detentoras dos recursos
ambientais necessários à preservação dos seus costumes, tradições, cultu-
ra e lazer, englobando os espaços de moradia e, inclusive, destinados aos
87
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
cultos religiosos e os sítios que contenham reminiscências históricas dos
antigos quilombos”.
Nesse sentido, a comunidade quilombola do Angico tem conhecido,
nos últimos anos, uma enorme subtração territorial, tencionada pela ganân-
cia do latifúndio em estender suas fronteiras.
Na comunidade do Angico, há um misto de propriedade coletiva e in-
dividual. Ali, uma perspectiva de tratar o território é a simbólica, que tem
contribuído no sentido de valorizar a identidade territorial, o vivido. O terri-
tório assume um papel diferenciado em que os grupos sociais se identificam
e se relacionam com a experiência vivida, um passado afetivo, mantido
pelas representações culturais.
Também em função disso, é muito citado nas conversas com os quilom-
bolas o carinho e a preocupação ambiental deles com o Arroio Angico e
suas matas ciliares. Os mais velhos lembram que era fonte das brincadeiras
de infância e reserva para pesca, caça e lenha que ajudava na reprodução
do grupo. De seus banhados tiravam o capim-caninha para fazer suas mo-
radias. Hoje, as matas foram cortadas e diminuídas pela lavoura de arroz,
que vai até as barrancas do rio, assoreando-o, além dos agrotóxicos que vão
acabar no rio. A água não dá mais para ser bebida, lebres, veados, capivaras,
tatu-molitas, pombão-do-mato, jacu, que antigamente eram abundantes, já
não são vistos, as gerações atuais são ceifadas dessa ecologia do território.
Portanto, a etnicidade deve ser levada em consideração para além da
questão fundiária, pois a terra é uma necessidade econômica e social, suge-
re uma base física, o local de residir, enquanto que território é um espaço
geográfico-cultural, inscreve limites, fronteiras, é uma necessidade política,
é uma base coletiva que é reclamada pelos quilombolas como direito cole-
tivo indispensável para sua sobrevivência e identidade.
Atualmente, a Escola Agrotécnica Federal de Alegrete realiza um pro-
jeto de extensão rural junto a esta comunidade, tendo como parceiros o
Movimento Negro de Alegrete, a Associação dos Pecuaristas e Agricultores
Familiares de Alegrete (Apafa), a Emater–Ascar e a Universidade Estadual do
Rio Grande do Sul (UERGS).
88
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
O óleo diesel é um componente estratégico na produção familiar, na
medida em que entra na composição de custos e é fundamental em alguns
sistemas de produção agrícola. O biodiesel, por sua vez, enquanto substitu-
to importante do diesel e importante instrumento de geração de emprego
e renda no campo, torna a implantação de um projeto de produção des-
se biocombustível para atender esta a demanda um fator preponderante
na definição de estratégias de intervenção dos organismos públicos. Neste
contexto, o sul de Minas Gerais, caracterizado por ser uma região predomi-
nantemente agrícola e com um grande número de agricultores familiares,
torna-se uma região propícia para a implantação de projetos desta natu-
reza. A Escola Agrotécnica Federal de Machado - EAFM, localizada no sul
Implantação de uma
unidade-piloto de biodiesel
FERNANDES, Leda G.; RAATS, Luis E. de S.
Escola Agrotécnica Federal de Machado/MG
Fotos: Leda Fernandes
89
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
de Minas Gerais, através de seu reconhecido trabalho de articulação de
parcerias e consciente da importância de disponibilizar sua estrutura física
e humana a serviço do desenvolvimento econômico e social da região, vem
contribuir neste processo com a implantação, em suas dependências, de
uma unidade-piloto de produção de biodiesel.
Com o apoio da Fundação Banco do Brasil, a escola e a Fadema – Fun-
dação de Apoio ao Desenvolvimento e Ensino de Machado, fundação se-
diada na EAF-Machado, implantam esta Unidade-Piloto de Produção de
Biodiesel com o objetivo de gerar emprego e renda para agricultores fami-
liares e oferecer uma alternativa de processamento de seus produtos agrí-
colas, em especial as oleaginosas, transformando-as em biodiesel para seu
consumo. A relação estabelecida com os agricultores familiares será a de
troca, na qual o agricultor entregará à EAF a oleaginosa e levará o biodiesel
e seus co-produtos (torta ou farelo). A EAFM e a Fadema também serão
responsáveis pela realização de seminários, cursos e visitas aos produtores e
suas associações para qualificá-los na produção das oleaginosas.
Esta planta industrial de produção de biodiesel terá também como ob-
jetivo a introdução do conteúdo pedagógico de produção de biocombus-
tíveis nas matrizes curriculares dos cursos técnicos da EAFM e servir como
base para a implantação do curso de Tecnologia em Energias Renováveis,
previsto para 2009. Toda a estrutura produtiva e de processamento pos-
suirá a mesma estrutura de funcionamento, ou seja, existirá um professor
responsável pelo setor, funcionários da escola que operarão as máquinas e
alunos que trabalharão como aprendizes (aprender fazendo) sob supervisão
de professores e funcionários.
A usina, em fase final de construção, terá uma capacidade produ-
tiva de 3.000 litros/dia e com a planta montada e em funcionamento,
espera-se que o projeto sirva de modelo para a região, não somen-
te quanto ao aspecto produtivo,
mas também pedagógico e de
gestão do processo de produção
de biodiesel em parceria com os
agricultores familiares. Com a
produção de oleaginosas, espera-
se que os produtores diminuam
seus custos e, conseqüentemen-
te, agreguem valor e melhorem
sua renda e qualidade de vida
e espera-se também que os téc-
nicos capacitados em produção
de biocombustível difundam e
orientem produtores e empresas
sobre o tema.
Através deste projeto, a EAF-
Machado acredita estar cumprindo
sua missão institucional: “Partici-
par e contribuir para o processo
de desenvolvimento rural do sul
de Minas Gerais”.
90
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
O turismo traz uma série de efeitos, não só econômicos, mas também
efeitos sociais, culturais e ecológicos, especialmente para as comunidades
receptoras. Por isso, o objetivo deste estudo é discutir, a partir de uma
pesquisa quantitativa, as percepções dos moradores de Carrancas/MG em
relação ao turismo na cidade em que residem.
Carrancas é um município localizado ao sul de Minas Gerais, com uma
população de aproximadamente 3.500 habitantes. Nos últimos anos, o tu-
rismo tem se apresentado como uma atividade de destaque no município,
configurando-se como uma alternativa de geração de renda, por suas bele-
zas cênicas, especialmente as cachoeiras e serras.
Diante desta realidade, foram entrevistados 30 moradores de Carrancas,
dos quais 36,7% são do sexo masculino e 63,3% do sexo feminino. Em
Efeitos do turismo na
comunidade em Carrancas
GOMES, Bruno M. A.; ROMANIELO, Marcelo M.; SILVA, Marcelo A. C.
&ROpJLR7pFQLFR8QLYHUVLWiULRGD8QLYHUVLGDGH)HGHUDOGH-XL]GH)RUD¼0*
Outras instituições:
Univ. Federal de Lavras/MG
Faculdade Presbiteriana Gammon/MG
Univ. Federal de Juiz de Fora
Fotos: Shutterstock
91
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
relação à idade, 36,7% dos entrevistados possuíam de 41 a 60 anos e 30%
se situavam numa amplitude de 16 a 30 anos. Os dados revelaram também
que 60,1% dos entrevistados residem em Carrancas há mais de 26 anos.
A renda de 70% dos entrevistados era de até R$ 500,00, sendo que, des-
tes, 40% recebe até R$ 300,00. Os dados apontam também que 50% dos
entrevistados não possuíam segundo grau. Destaca-se que 6,7% possuíam
terceiro grau completo e 6,7%, pós-graduação.
As percepções dos moradores de Carrancas entrevistados podem ser
constatadas através das freqüências das respostas às variáveis utilizadas nes-
te trabalho, por meio das quais observa-se que:
90% dos entrevistados não se sentem incomodados com o turismo
no município de Carrancas;
53,3% acreditavam que o turismo trouxe pouca ou nenhuma melho-
ria para os moradores locais;
66,7% dos respondentes acreditavam que seria muito importante
que os turistas que visitam Carrancas tivessem um maior contato
com os moradores locais;
60% acreditavam que o turismo não aumentou a prostituição no
município de Carrancas;
60% acreditavam que o desenvolvimento do turismo beneficiou
poucas pessoas;
86,7% dos entrevistados têm a opinião de que o turismo não provo-
cou aumento da violência no município;
60% consideraram que os preços dos produtos no comércio da ci-
dade aumentaram;
73,3% acreditavam que os preços dos terrenos também cresceram
muito com o desenvolvimento do turismo na cidade.
Por meio da análise de cluster, os respondentes foram agrupados
em dois grupos. O primeiro representa 26,7% da amostra e o segundo
grupo é formado por 50%. É ob-
servado que 27,3% dos entrevis-
tados não foram agrupados, pois
esses respondentes deixaram re-
postas em branco.
O grupo 1 caracteriza-se por
um público mais velho, que residia
em Carrancas há mais tempo, pos-
suía grau de escolaridade e de ren-
da mais baixo, possuía mais filhos
e sua renda era menos influencia-
da diretamente pelo turismo. No
grupo 2, os entrevistados são mais
novos, residem em Carrancas há
menos tempo, possuem maior grau
de escolaridade, uma maior renda
familiar, predominantemente não
têm filhos e sua renda era mais in-
fluenciada pelo turismo.
92
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
Os resultados do trabalho evidenciam a importância do poder público
local atentar-se para o desenvolvimento do turismo no município, plane-
jando-o, a fim de evitar maiores custos que poderão surgir. Esse planeja-
mento deve se pautar na premissa de que a percepção da população de
Carrancas a respeito do turismo não é homogênea. De acordo com as
respostas dos entrevistados, percebeu-se que, ao planejar o turismo em
Carrancas, deve-se, primeiramente, esclarecer a população local quanto
ao que é o turismo e quais os seus efeitos em núcleos receptores, pois esta
ainda não tem claros os efeitos que a atividade pode gerar. Em seguida,
deve-se consultar os moradores sobre o que pensam a respeito da ativi-
dade no município e buscar o desenvolvimento do turismo como forma
de inclusão social.
Questões Grupo 1 Grupo 2
O turismo melhorou as condições
de vida dos moradores de Carrancas?
Muito Não ou pouco
A maioria das empresas de turismo de Carrancas
pertence a pessoas que não são de Carrancas?
75 % acreditam que não 100% acreditam que sim
O turismo aumentou o número
de empregos em Carrancas?
62,5 % acreditam que
aumentou muito
86,6% acreditam aumentou pouco ou nada
Os turistas se preocupam em preservar
a natureza ao visitar o município?
75% acreditam que sim 73,3% acreditam que se preocupam pouco ou nada
Os turistas influenciam nos hábitos
de consumo dos moradores de Carrancas?
50% acreditam que há
uma grande influência
60% acreditam que esta influência não ocorre
A população de Carrancas tem conhecimento dos
males que o turismo pode gerar para o município?
62,5% acreditam que não 60% acreditam que a população sabe pouco
Ao utilizar a análise discriminante, as principais variáveis que represen-
taram as diferenças de percepção entre os dois grupos foram:
93
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
'HVGHRDQRGHD(VFROD$JURWpFQLFD)HGHUDOGH&UDWR¼&(FRQ-
cretiza, na disciplina Olericultura, o Projeto Horta Escolar
1
. Tendo como
principal objetivo integrar as diversas fontes e recursos de aprendizagem,
este projeto se calca em outros escopos que merecem ser declinados, quais
sejam: servir de laboratório prático para os discentes da disciplina, praticar
extensão rural, levar às comunidades escolares envolvidas no processo os
conhecimentos dos discentes adquiridos na escola, destacar a olericultura
como atividade econômica sustentável e viável, gerar observação e pesqui-
sa e levar os educadores e educandos participantes a uma reflexão diária.
Com uma carga horária anual robusta de 240 horas, este projeto se traduz
numa ferramenta auxiliar assaz importante para a concretização dos propó-
sitos insculpidos no plano de curso da disciplina.
Horta escolar: uma estratégia
de aprendizagem e construção
do cidadão
FREIRE, José L. de O.; FEITOSA, Teresinha de S.; SANTOS, Francisco G. B. dos; LIMA, Antonio N.
Escola Agrotécnica Federal de Crato/CE
Fotos: José Freire
94
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
A instituição predita conta, atualmente, com
160 alunos, na faixa etária de 14 a 18 anos, dis
-
tribuídos em quatro turmas no Curso Técnico em
Agropecuária e envolvidos nas fases que compre-
endem o projeto: importância pedagógica e so-
cial, produção de mudas e implantação das hortas
propriamente dita. No que tange à primeira fase,
os discentes são previamente conscientizados do
papel deles perante a Instituição e a sociedade,
principalmente no que se refere ao dever de que,
para cada um deles, é cogente que se devolva à
comunidade, e de forma efetiva, o processo de
educação custeado pelo contribuinte. É a oportu-
nidade que se tem de aplicar os conhecimentos
adquiridos em prol de comunidades escolares
que podem se beneficiar em termos de ciência e
de melhoria da alimentação escolar. Nesta fase,
destaca-se o espírito cidadão do projeto.
Após a formalização do pedido da instituição beneficiada e, seguindo-se
à primeira fase, os alunos se empenham para produzir as mudas de horta-
liças a serem plantadas. É nesta fase que o espírito comunitário do projeto
começa aflorar nos alunos. A partir de então, estes exteriorizam a alegria
do deslocamento para outras urbes, que se conclui na última fase: a da im-
plantação das hortas, onde são preparadas as áreas, construídos e adubados
organicamente os canteiros, preparadas as covas, plantadas as hortaliças e
realizados os primeiros tratos culturais. Cada instituição disponibiliza um
agente responsável pela manutenção da horta para a familiarização com os
cuidados técnicos requeridos a partir de então. O docente e os discentes
envolvidos é que repassam as informações requeridas. Muitas das vezes
ocorre o envolvimento até dos discentes da escola beneficiada.
Ante as experiências conseguidas nos anos de implantação, percebe-se
que o projeto vem proporcionando possibilidades para o desenvolvimento
de ações pedagógicas ao permitir práticas em equipe e a exploração da
multiplicidade de formas de aprender, valorizando, inclusive, a importância
do trabalho e da cultura do homem do campo.
Nesse contexto, pesa ressaltar os princípios pedagógicos que justificam
essa prática, bem como os fundamentos legais que norteiam a prática edu-
cacional e que conduzem a ações com essas características (artigos 36, II,
e 40 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei n
o
9.394/96. Sob este
olhar, a educação tem um viés social. Esse enfoque dado ao processo de
ensino aprendizagem traz para o discurso pedagógico elementos relevan-
tes, em especial no que se refere à maneira como se devem entender as
relações entre desenvolvimento e aprendizagem, à importância da relação
interpessoal nesse processo, à relação entre cultura e educação e ao papel
da ação educativa ajustada às situações de aprendizagem.
A simbiose do currículo com o processo de ensino-aprendizagem propi-
ciam, na prática pedagógica aqui descrita, a tríplice práxis do conhecimen-
to: APRENDER A CONHECER, isto é, adquirir os instrumentos da compre-
1. Este projeto é coordenado
pelo Professor José Lucínio de
Oliveira Freire em conjunto com o
Departamento de Desenvolvimento
Educacional, Coordenação Geral
de Ensino e Coordenação Geral de
Produção e Pesquisa.
95
RESUMOS ESTENDIDOS, RELATOS DE EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
ensão; APRENDER A FAZER, para poder agir sobre o meio envolvente e
APRENDER A VIVER JUNTOS, a fim de participar e cooperar com os outros
em todas as atividades humanas. Isto resulta, ao final, num APRENDER A
SER, via essencial que integra os três precedentes, consoante os ensinamen-
tos de Delors (1999). As práticas pedagógicas atinentes ao projeto Horta
Escolar constroem uma autobiografia, um curriculum vitae, um documento
de identidade diferente do tradicional.
Considerando esse olhar sobre currículo, o projeto Horta Escolar tem a
intenção de criar na escola um espaço de formação e informação, em que
a aprendizagem de conteúdos deve, necessariamente, favorecer a inserção
do educando no dia-a-dia das questões sociais marcantes e em um universo
cultural maior onde o mesmo seja capaz de intervir na realidade, de modo
a contribuir para reformar pensamentos dos atores envolvidos emocional,
educacional e socialmente.
Como toda prática educativa, o projeto Horta Escolar é uma ação inten-
cional, sistemática e planejada, que possibilita aos educandos desenvolver
competências e consciência profissional, sem restringir-se ao ensino de ha-
bilidades imediatamente demandadas pelo mercado de trabalho.
Enfim, o projeto contempla uma visão interdisciplinar de educação,
apontando para a complexidade do real e a necessidade de se considerar
a teia de relações entre os seus diferentes e contraditórios aspectos, rom-
pendo os desafios culturais, sociológicos e cívicos. Além de contribuir sig-
nificativamente para estancar a evasão escolar na instituição citada, unindo
tudo o que foi destacado, o projeto Horta Escolar serve para construir um
passado feliz para todos os envolvidos no processo.
No ano em curso já foram implantadas hortas escolares nos municípios
cearenses de Catarina, Altaneira e Farias Brito. Já estão agendadas institui-
ções escolares em Crato, Aiuaba e Santana do Cariri.
96
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 20 MAR. 2008
CONTATOS
Contatos
BA
(Des)construindo diferenças
Kamila Gonçalves Rios
Antonio Sousa Silva
Reflexões sobre a transposição do
rio São Francisco a partir do filme
‘Narradores de Javé’
Edna Maria de Oliveira Ferreira
Márcio Lima Rios
Escola Agrotécnica Federal
de Senhor do Bonfim
Estrada de Igara, Km 04 – Zona Rural
Senhor do Bonfim/BA – CEP: 48970-000
Telefones: (74) 3541-3676 / 3382
Fax: (74) 3541-3676
Rompendo a barreira do silêncio
Marcelo Silveira de Jesus
Claudete Blatt
Centro Federal de Educação
Tecnológica da Bahia
Rua Emídio dos Santos, s/nº – Barbalho
Salvador/BA – CEP: 40300-010
Telefone: (71) 2102-9401
Fax: (71) 3242-0621
Site: www.cefetba.br
CE
Mobilização de estudantes
universitários no desenvolvimento
de práticas sociais inclusivas
Tereza Cristina Valverde Araujo Alves
Centro Federal de Educação
Tecnológica do Ceará
Av. 13 de Maio, 2081 – Benfica
Fortaleza/CE – CEP: 60040-531
Telefones: (85) 3288-3674 / 3676
Fax: (85) 3288-3711
Site: www.cefetce.br
Horta escolar: uma estratégia de
aprendizagem e construção do cidadão
José Lucínio de Oliveira Freire
Teresinha de Sousa Feitosa
Francisco Gauberto B. dos Santos
Antonio Nustenil de Lima
Escola Agrotécnica Federal de Crato
Rodovia CE 096, Km 05, Sítio Almecegas
Zona Rural – Crato/CE – CEP: 63100-000
Telefones: (88) 3523-2642 / 2098 / 2344
Fax: (88) 3523-2643 / 3526-2344
Site: www.eafcrato.com.br
GO
Inclusão social por meio do esporte
Vicente Pereira de Almeida
direcao@cefetrv.edu.br
José de Oliveira
joliveira@cefetrv.edu.br
Cleide Borges da Costa
Lucimeiry Rodrigues de Carvalho
lucimeiry@cefetrv.edu.br
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Rio Verde
Rodovia Sul Goiana, Km 01 – Zona Rural
Rio Verde/GO – CEP: 75901-970
Telefones: (64) 3620-5600 / 5602
Fax: (64) 3621-1816
E-mail: direcao@cefetrv.edu.br
Site: www.cefetrv.edu.br
MA
Colégio Universitário forma
estudantes cegos no Maranhão
Marinez de Souza Tamburini Brito
Angélica Moura Siqueira Cunha
Universidade Federal do
Maranhão Colégio Universitário
Campus Universitário do Bacanga
Av. dos Portugueses, s/nº
São Luís/MA – CEP: 65085-580
Telefones: (98) 3226-0056 / 3248-0051
MG
Efeitos do turismo na
comunidade em Carrancas
Bruno Martins Augusto Gomes
Marcelo Márcio Romaniello
Marcelo Alexandre Correia Silva
Colégio Técnico Universitário da
Universidade Federal de Juiz de Fora
R. Bernardo Mascarenhas, 1283 – Fábrica
Juiz de Fora/MG – CEP: 36080-001
Telefones: (32) 3229-7508 / 7502
Fax: (32) 3229-7500
Site: www.ctu.ufjf.br
Implantação de uma unidade
piloto de biodiesel
Leda Gonçalves Fernandes
Luis Eduardo de Souza Raats
Escola Agrotécnica Federal de Machado
Rodovia Machado/Paraguaçu, Km 03
Sto. Antônio – Machado/MG
CEP: 37750-000
Telefone: (35) 3295-5011
Fax: (35) 3295-5011
Site: www.eafmachado.gov.br
MT
Além do voluntariado
Miriam R
oss
Dia de feira
Maria Dalva de Souza Siqueira
Centro Federal de Educação
Tecnológica do Mato Grosso
Rua Prof
a
Zulmira Canavarros, 95
Centro – Cuiabá/MT – CEP: 78005-390
Telefones: (65) 3264-5635 / 3314 / 3500
Fax: (65) 3322-6539
Site: www.cefetmt.br
PB
Significado do envelhecimento entre
idosos vivendo na comunidade
Mônica Maria Montenegro de Oliveira
Centro Federal de Educação
Tecnológica da Paraíba
Av. 1º de Maio, 720 – Jaguaribe
João Pessoa/PB – CEP: 58015-905
Telefones: (83) 3208-3000 / 3241-4408
Fax: (83) 3208-3088
Site: www.cefetpb.edu.br
PE
Integração curricular: diálogo
com as comunidades locais
Edilene Rocha Guimarães
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Pernambuco
Av. Prof. Luiz Freire, 500 – Curado
Recife/PE – CEP: 50740-540
Telefones: (81) 2125-1600 / 1604
Fax: (81) 3271-2338
Site: www.cefetpe.br
RN
A escola pública como
instrumento de inclusão digital
Aleksandre Saraiva Dantas
Antônio Robson Nogueira da Silva
Caionara Angélica da Silva
Centro Federal de Educação
Tecnológica do Rio Grande do Norte
Av. Senador Salgado Filho, 1559 – Tirol
Natal/RN – CEP: 59015-000
Telefone: (84) 4005-2600
Fax: (84) 4005-9728
Site: www.cefetrn.br
Unidade de Ensino
Descentralizada de Mossoró
Rua Raimundo Firmino de Oliveira, 400
Ulrick Graff – Mossoró/RN
CEP: 59628-330
Telefone: (84) 3315-2752
Fax: (84) 3315-2761 / 2759 / 2758
Site: www.cefetrn.br/uned
Práticas alternativas em saúde
Rosalba Pessoa de Souza Timoteo
Akemi Iwata Monteiro
Edilene Rodrigues Silva
Cleide Oliveira Gomes
Escola de Enfermagem de Natal
da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte
Av. Nilo Peçanha, 619 – Petrópolis
Natal/RN – CEP: 59012-300
Telefone: (84) 3215-4258
Fax: (84) 3215-4258
Site: www.enfermagem.ufrn.br
RR
Comunidades indígenas e o turismo local
Nadson Nei da Silva de Souza
RoseliBernardodosSantos
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Roraima
Av. Glaycon de Paiva, 2500 – Pricumã
Boa Vista/RR – CEP: 69309-210
Telefone: (95) 3621.8000
Site: www.cefetrr.edu.br
RS
A comunidade remanescente
de quilombos do Angico na
cidade de Alegrete
José Ernesto Alves Grisa
Escola Agrotécnica Federal de Alegrete
Rod. RS 377, Km 27 – 2º Dist. Passo Novo
Alegrete/RS – CEP: 97541-970
Telefone: (55) 3422-3075
Fax: (55) 3422-1294
Site: www.eafars.com.br
SC
Panificação como alternativa
de inclusão para portadores
de necessidades especiais
Krischina Singer Aplevicz
Berenice Giehl Zanetti von Dentz
Emanoelle Nazareth Fogaça Marcos
Telma Pires Pacheco Amorim
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Santa Catarina
Av. Mauro Ramos, 950 – Centro
Florianópolis/SC – CEP: 88020-300
Telefone: (48) 3221-0500
Fax: (48) 3224-0727
E-mail: cefetsc@rct-sc.br
Site: www.cefetsc.edu.br
Unidade de Ensino
Descentralizada de Continente
Rua 14 de julho 150 – Enseada dos
Marinheiros – Bairro Coqueiros
Florianópolis/SC – CEP: 89250-000
Telefone: (48) 3221-7502
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