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Janeiro de 2007 – Nº 13
CADERNOS
TEMÁTICOS
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EXPEDIENTE
Expediente
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Centro de Informação e Biblioteca em Educação (CIBEC)
Cadernos temáticos / Secretaria de Educação Pro ssional e Tecnológica.
v. 1, (nov. 2004). – Brasília : Secretaria de Educação Pro ssional
e Tecnológica, 2004–.
1. Educação pro ssional. 2. Práticas educativas. 3. Experiências
pedagógicas. I. Brasil. Secretaria de Educação Pro ssional e
Tecnológica.
CDU 377
Conselho editorial
Patrícia Barcelos, Solange Moreira Corrêa, Sandra Branchine e Cinara Barbosa
Coordenação editorial
Cinara Barbosa
Produção executiva
Patrícia Barcelos e Sandra Branchine
Pesquisa e diagnóstico
Juliana Amoretti
Produção de pauta
Sophia Gebrim
Reportagens e fotografias
Rodrigo Farhat e Marco Aurélio Fraga
Assistente de produção gráfica
Adriana Azambuja e Muriele Oliveira
Revisão
Denise Goulart
Diagramação
www.grifodesign.com.br
Impressão
Cromos
Impresso no Brasil
A exatidão das informações, os conceitos e opiniões
emitidos nos artigos científicos e nos resumos estendidos
são de exclusiva responsabilidade dos autores.
© 2007 Ministério da Educação
É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte.
Série Cadernos Temáticos
Tiragem: 10.000 exemplares
Ministério da Educação
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
Esplanada dos Ministérios, Edifício Sede, bloco L, 4º andar
70047-900 – Brasília/DF
Tel: (61) 2104-8127/9526
Fax: (61) 2104-9744
www.mec.gov.br
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SUMÁRIO
Sumário
Apresentação 5
Editorial 7
Reportagens 8
Tabuleiros e vassourinhas 8
Integração através do esporte 12
História marcada pela música 15
Linguagem de sinais a distância 21
Artigos 26
O léxico da agricultura na interação verbal 26
Brinquedos e brincadeiras da cultura popular potiguar 35
Tecnologia da linguagem: uma perspectiva de recontextualização 44
A arte visual no ensino fundamental: considerações e possibilidades 49
Um concurso de mosaicos focalizando pavimentações e simetrias 53
Cinema e multiculturalismo: como a escola pode devorar o
King Kong das telas a partir da intertextualidade 59
Divagando sobre o “devagar” da educação: carta aberta a
uma colega professora 63
Design em catálogo iconográfico: os (des)caminhos da imaterialidade 67
Um toque humano na pedagogia musical 71
Resumos Estendidos, Relatos de Experiência
e Práticas Pedagógicas 76
Gincana de leitura 76
Um livro bilíngüe como resultado de projeto integrado 79
Exposição dialogada: aprender em sala de aula 81
Contatos 84
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André Vilaron
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APRESENTAÇÃO
Apresentação
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Professor e estudante,
com satisfação, apresento à Rede Federal de Educação Profissional e Tecnoló-
gica os números 11 a 15 dos Cadernos Temáticos. Este exemplar que você tem
em mãos trata de experiências e práticas pedagógicas sobre linguagem e criativi-
dade realizadas por integrantes das escolas.
As matérias mostram uma parte da realidade dos Centros Federais de Educa-
ção Tecnológica das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil.
Neste volume, destaco três artigos: “Cinema e multiculturalismo”, da professo-
ra Ângela Pacheco, do Cefet de Alagoas, “Pavimentações e simetrias de mosaicos”,
de Aderbal Filho, Ariadne Mendonça e Auxiliadora Pacheco, da Escola Agrotécnica
Federal de Satuba, e “Brinquedos e brincadeiras da cultura popular do Rio Grande
do Norte”, de autoria de Lerson Maia, Marcus Oliveira, Tânia Costa, Caroline
Campos, Priscilia Lima e Viviane Gomes, docentes do Cefet do estado.
A dois anos do centenário das primeiras escolas de educação profissional, os
Cadernos Temáticos tornam pública uma parcela da excelência das ações e pro-
jetos das atuais 153 escolas federais de educação profissional e tecnológica. A
o final de 2007, serão 205 unidades de ensino em todo o país, um crescimento
de mais de 32%.
Outra ação de relevo para a qualificação de recursos humanos e o fortaleci-
mento da pesquisa nas instituições federais foi a concessão, em 2006, de 295
bolsas de mestrado e doutorado e o investimento em dez grupos de pesquisa.
Um total de R$ 4,5 milhões estão sendo aplicados na parceria da Secretaria de
Educação Profissional e Tecnológica (Setec) com a Coordenação de Aperfeiçoa-
mento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
A expansão da rede, as ações do Proeja, da Escola de Fábrica, as bolsas do
Programa Institucional de Qualificação Docente (Piqdtec) e o investimento em
grupos de pesquisa estão elevando o nível da formação de profissionais no Brasil,
fortalecendo as economias locais e, também, as vocações nacionais.
Eliezer Pacheco
Secretário de Educação Profissional e Tecnológica do MEC
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Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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EDITORIAL
Editorial
Cadernos revelam sintonia
de escolas com realidades brasileiras
Os volumes 11 a 15 dos Cadernos Temáticos mostram experiências inova-
doras, práticas pedagógicas, pesquisas e resumos de artigos que contribuem
para o desenvolvimento da educação profissional e tecnológica no Brasil. São
uma pequena mostra da sintonia das 153 escolas da rede com as realidades
regionais do país.
Estimular, no cotidiano docente, a discussão de temas relevantes que per-
mitam a adoção de novas metodologias de ensino na rede federal de educação
tecnológica é um dos objetivos desses cadernos. Outro é mostrar as semelhanças
entre experiências realizadas por diferentes escolas, de distintas regiões. Essas
práticas podem, até mesmo, inspirar, mais tarde, novos projetos, em pontos dis-
tantes do país, desde que guardadas as singularidades históricas, socioeconômicas
e culturais das regiões.
Uma das metas iniciais da equipe responsável pela concepção e produção
da série Cadernos Temáticos foi contemplar todas as áreas profissionais. Per-
seguida, mas, no entanto, nem sempre atingida, a proposta tornou-se viável
quando seu foco foi transferido para a publicação de experiências do maior
número possível de setores. É um recorte na realidade da educação profissional
no Brasil; um retrato desenhado por quem faz parte desse cenário: estudantes,
pesquisadores, professores e servidores.
Os editores
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
LINGUAGENS
Tabuleiros e vassourinhas
Cefet/PE incentiva novos talentos
do xadrez e da dança
No lugar do quadro-negro e do giz, numa sala de aula há tabu-
leiros e relógios. Em outra, estudantes ensaiam passos de frevo e de
maracatu. A diversidade é uma das marcas da cultura e o Centro Fe-
deral de Educação Tecnológica de Pernambuco (Cefet/PE) valoriza
as múltiplas manifestações da linguagem de seus alunos.
Na instituição, o professor Valésio Pinto ensina uma variante
do xadrez a alunos com necessidades especiais e o servidor An-
tônio José de Oliveira trabalha para criar um movimento de arte
no meio acadêmico.
Valésio Pinto, analista de sistemas do Tribunal de Justiça de Per-
nambuco, defende que a pessoa portadora de necessidades especiais
enxerga com a mente e o xadrez randômico estimula sua criativi-
dade. Variante do xadrez clássico, a diferença é a possibilidade de
múltiplas aberturas. Ele explica que os dois únicos pré-requisitos
para o início da partida, nesta modalidade, são que o rei esteja entre
as torres e os bispos ocupem casas de cores diferentes.
Fotos: Rodrigo Farhat
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Reportagens
Para Valésio, o xadrez não é um jogo complexo e competitivo,
mas ferramenta educacional que pode trabalhar as habilidades de
comunicação e de cognição da criança e do adolescente. Além des-
sas, o xadrez estimula a tomada rápida de decisões, o raciocínio
espacial, a habilidade matemática e a visão estratégica e tática.
Para incentivar a prática, o Núcleo de Educação Física do Cefet/
PE promove diversas atividades, como oficinas e partidas simultâ-
neas, e até uma equipe para participar do 7º Encontro Desportivo
dos Cefets do Norte e Nordeste (Edcenne) foi montada. O evento,
realizado em Recife, de 18 a 25 de novembro de 2006, inaugurou
o ginásio da instituição.
“Foi a primeira vez que o Cefet/PE conseguiu formar uma equi-
pe de xadrez, com dez jogadores, titulares e suplentes”, diz o co-
ordenador da modalidade na Coordenação de Educação Física, o
psicólogo Kênio de Salles Menezes.
Para a estruturação do grupo, 40 alunos, dos cerca de 6 mil da
instituição, participaram das partidas seletivas. Desses, cinco foram
escolhidos, entre os melhores e mais interessados, pelo Cefet/PE em
conjunto com o Instituto de Pesquisa, Projeto e Desenvolvimento
de Segurança Coletiva e Cidadania (Collectivus). A entidade man-
tém, com o Cefet/PE, outras parcerias, como a promoção de parti-
das simultâneas e até torneios de xadrez.
Para o treinamento dos estudantes, o Cefet/PE comprou dez me-
sas de mogno com tabuleiros e peças em madeira e igual número de
relógios aferidos. A sala para os treinos foi cedida pelo Núcleo de
Apoio ao Portador de Necessidades Especiais (Napne).
Valésio é o autor, ao lado de Francisco
Cavalcanti, do livro “Xadrez para todos
– uma ferramenta pedagógica”. A obra
teve, ainda, a colaboração de Allan
Sales, responsável pelos textos de cordel
que “ilustram” o livro:
“Um tal de Fischer um dia
Um novo jogo inventou
Chamado xadrez randômico
Que revolucionou
É que mostro agora
E falando nesta hora
O que Bob Fischer criou
O xadrez então mudou
As posições sorteadas
Rei, Cavalo, Dama e Bispo
E Torre assim lançadas
Nas posições por sorteio
Colocadas neste meio
De lugar modificadas
E assim são arrumadas
Exige outra atenção
Outra criatividade
Com essa variação
Tem que ter muito tutano
Bob Fischer americano
Do mundo foi um campeão”
Participaram do 7º Edcenne alunos
dos seguintes Cefets: Alagoas, Ceará,
Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco,
Petrolina, Piauí e Rio Grande do Norte.
Na ocasião, 2 mil atletas disputaram
dez modalidades esportivas – atletismo,
basquete, futebol de campo, futebol de
salão, handebol, judô, natação, vôlei,
vôlei de praia e xadrez.
Professor ensina aluno a jogar xadrez
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Estudantes aprovam modalidade
Milton e Sílvio aprovam a modalidade. Estudantes acreditam
que o jogo, além de aliviar as tensões cotidianas, serve para estimu-
lar a criatividade e a socialização.
Milton Carvalho é aluno de Publicidade da Universidade Ca-
tólica de Pernambuco. “O xadrez é um exercício mental, além de
prática esportiva”, diz. O jogo ajuda-o a desenvolver o raciocínio
e a se divertir. Em razão de sua deficiência visual, Milton joga com
peças fixadas por pinos no tabuleiro. Ele revela que consegue dife-
renciar pretas das brancas pelo fato de as primeiras serem ásperas e
as segundas, lisas. Em alguns tabuleiros, as pretas têm um pino na
parte superior para permitir a identificação das peças.
Sílvio José Alves de Amorim Júnior tem um problema motor, re-
sultado de uma paralisia cerebral na infância. Estudante do terceiro
ano do ensino médio do Cefet/PE, nunca tinha jogado xadrez antes
de conhecer o professor de matemática Paulo Antunes, que utiliza-
va o jogo nas aulas para acelerar o raciocínio dos alunos. Foi Paulo
quem o incentivou a jogar.
Sílvio começou como monitor do jogo no Cefet/PE. Apesar de
ainda estar aprendendo, já sente os resultados das práticas na vida
cotidiana. “Estou com o raciocínio mais rápido e tenho mais amigos.
Aprendi, ainda, a ver como é a pessoa pela forma como joga”, diz.
Conheça o xadrez aleatório de Fischer
O xadrez aleatório de Fischer, ou xadrez 960, é uma variante do
jogo tradicional. Criado por Roberto James Fischer, em 1996, o
jogo tem a posição inicial das peças sorteada aleatoriamente. Dessa
singularidade vem o nome do jogo, pois existem 960 possibilidades
de abertura que podem ser selecionadas no começo da partida.
A posição das peças da primeira fila é sorteada, de modo que
o rei continue entre as torres e os bispos ocupem casas de cores
diferentes, como no xadrez normal. A posição de brancas e pretas é
simétrica e, fora a colocação das peças na abertura, as regras são as
mesmas do jogo tradicional. Com a variante, Bob Fischer queria dar
valor à criatividade dos jogadores, pois não faria sentido a memori-
zação das aberturas do jogo.
Antônio “Black Escobar” de Oliveira
Antônio José de Oliveira, o Black Escobar, é bailarino e coreó-
grafo há 25 anos. Técnico em assuntos educacionais da Assessoria
de Comunicação do Cefet/PE, quer manter vivo o orgulho da cida-
de de Recife.
Com a extinção da Delegacia Regional do Ministério da Edu-
cação, foi remanejado para a comunicação do Cefet para trabalhar
com a dança e também para criar um movimento de arte na escola.
Começou, em 1998, com um projeto de conscientização cor-
poral e rítmica. Hoje, mantém, em conjunto com as professoras
“Com o jogo,
ganhei amigos
e rapidez no
raciocínio”
Sílvio José Alves
de Amorim Júnior
– Estudante
Apresentação de Antônio José de
Oliveira, o Black Escobar
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Reportagens
Ana Lúcia de França da Silva Reis, Clecilda Leite Dutra, Lucivanda
de Sousa Silva e Míriam Oliveira Ribeiro Gomes, uma sala de ar-
tes onde são desenvolvidas atividades de artesanato, artes plásticas,
dança, música e teatro. O grupo “Arte e Movimento”, mantido pelo
Cefet/PE para divulgar a cultura pernambucana, integrado por cer-
ca de 20 alunos, também utiliza o espaço para ensaiar.
Black Escolar, que é mestre em dança pela Universidade Federal
da Bahia (UFBA), conta que as disciplinas de artes são obrigatórias
para os estudantes do ensino médio, mas optativas para as turmas
dos cursos técnicos e tecnológicos.
Apesar de não serem todos que precisam assistir às aulas, há es-
tudantes que não perdem uma sequer. Renato Dubeux, 21 anos, é
um deles. Aluno de Mecânica Industrial, diz que sempre viveu no
meio de músicos e bailarinos. Tocava percussão e tinha vontade de
estudar dança, mas não tinha acesso à educação formal nessas áreas
até entrar para o Cefet/PE. A oportunidade surgiu quando Black
Escobar o convidou para entrar em seu grupo, a Dante, Companhia
de Dança e Teatro, onde estuda balé clássico, dança contemporânea,
de salão e sapateado. Ele participa, ainda, de encontros de maracatu.
“Quero continuar dançando e me transformar em um profissional.
É uma carreira paralela que persigo”, revela.
Seu colega Anderson Soares da Silva, 18, está no terceiro ano do
ensino médio e também gosta do que faz. “Quero dançar até termi-
nar o curso. A dança serve para me distrair e também para divulgar
a cultura do estado. Vivo a cultura pernambucana desde menino, no
frevo, no forró, no caboclinho e no maracatu”, diz.
Reportagem: Rodrigo Farhat
“Sou
pernambucano
desde menino,
no frevo,
no forró, no
caboclinho e no
maracatu”
Anderson Soares da Silva
– Estudante
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Integração através do esporte
Jogos regionais realizados pelas instituições
federais de ensino da região Nordeste
promovem intercâmbio esportivo e cultural
entre alunos e professores
Dentro do ciclo acadêmico de um aluno, o esporte ocupa um
lugar de destaque. Com uma linguagem própria, ele é capaz de inte-
grar – por meio de gestos, gírias e sinais – pessoas e povos de cultu-
ras e pensamentos opostos. Seus atributos dinâmicos correspondem
ao desejo e ao prazer de quem o pratica em movimentar-se, em
trocar experiências, de estar junto. Mas, acima de tudo, de competir
respeitando as diferenças. Foi baseado nesse espírito de integração
que a Escola Agrotécnica Federal de Belo Jardim (PE) sediou, de
21 a 27 de outubro de 2006, os Jogos das Escolas Agrotécnicas
Federais do Nordeste (1º Jeeafn).
Durante os sete dias do encontro esportivo, 700 atletas das esco-
las agrotécnicas de Belo Jardim, Vitória de Santo Antão e Barreiros
(Pernambuco), Crato e Iguatu (Ceará), Codó (Maranhão), Souza
(Paraíba) e Satuba (Alagoas) competiram nas modalidades de futsal,
handebol, voleibol, nas categorias masculino e feminino, e também
JOGOS REGIONAISJOGOS REGIONAIS
Fotos: Divulgação EAF Belo Jardim
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Reportagens
futebol masculino. A cerimônia de abertura iniciou com o desfile das
escolas participantes pelas ruas de Belo Jardim e a apresentação do Co-
ral Lourdes Guilherme, do Centro Federal de Educação Tecnológica
(Cefet) do Rio Grande do Norte, no ginásio poliesportivo da escola.
“Os jogos representam um marco na integração entre alunos, ser-
vidores e professores de todas as instituições envolvidas”, disse o dire-
tor-geral da EAF de Belo Jardim, Francisco Henrique Duarte Filho.
Para o diretor, o evento aproximou, pelo esporte, as escolas
co-irmãs, além de significar o retorno da prática desportiva no
âmbito das próprias escolas agrotécnicas. ”Há mais de dez anos
que as escolas agrotécnicas não realizavam os jogos regionais. Já
estamos pensando qual será o próximo município que irá realizar
o segundo encontro esportivo”, diz Francisco.
No total, foram 108 jogos disputados nos sete dias de evento.
Na opinião de Francisco, uma das formas mais legítimas de integrar
as pessoas é por meio do esporte. Segundo ele, muitos países de
primeiro mundo têm como prioridade de investimento a educa-
ção e a prática esportiva. “Educação não está dissociada do esporte.
Acredito que temos como conciliar essas duas áreas. Até porque
está implícita na prática esportiva a educação, a disciplina, o lazer, a
solidariedade, tudo aquilo que diz respeito às relações humanas”.
A chama representa o espírito esportivo dos
atletas que participam da competição
Os jogos femininos foram muito disputados, com ótimo desempenho
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Integração
A expectativa dos alunos antes da abertura oficial dos jogos era
enorme no campus da escola. Por todos os lados, alunos e professo-
res das oito escolas iniciavam as primeiras conversas num espírito
de respeito e amizade. Para o aluno do curso técnico em Agropecu-
ária de Belo Jardim, Glaudemylton Miro Alves, os jogos são uma
oportunidade para criar novas amizades. “Minha expectativa duran-
te os jogos é de conhecer novas pessoas, participar o máximo desse
intercâmbio entre os alunos. Vamos nos dedicar ao máximo para
representar a nossa escola”, disse o aluno de 18 anos.
Segundo a estudante Renata Alves da Silva, que irá disputar a
modalidade de futsal feminino, os jogos também abrem portas para
que os alunos possam mostrar suas qualidades esportivas. Para ela,
é exatamente neste tipo de evento que olheiros (representantes de
clubes que buscam novos talentos) podem estar. “Além de estarmos
tendo a possibilidade de conhecer novas pessoas, também é uma
ótima chance de mostrar os nossos talentos nas modalidades que
iremos competir”, explica Renata.
Para o diretor da escola de Belo Jardim, o evento foi uma ex-
periência positiva que permitiu reunir alunos de diferentes regiões
do estado em prol do esporte. “Somente com muito trabalho e
muita vontade é possível dar passos largos em busca de uma insti-
tuição que se destaque por uma educação que assegure aos jovens
conquistas em todas as áreas do conhecimento humano, inclusive
na prática desportiva”.
Reportagem: Marco Fraga
O clima de amizade superou
qualquer resultado da equipe
Delegação EAF Codó
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Reportagens
MÚSICAMÚSICA
História marcada pela música
Pesquisa relaciona obra de Chico à realidade brasileira
Ensinar a história contemporânea brasileira a partir da música.
Com este objetivo, o professor Maciel Henrique Carneiro da Silva,
do Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco (Ce-
fet/PE), reuniu o colega Ricardo Medeiros, de Língua Portuguesa,
e um grupo de estudantes para pesquisar as composições de Chico
Buarque de Holanda entre 1960 e 2001.
Sem negar a importância de outros documentos, mais comuns
no ensino e na pesquisa da disciplina, o que o professor propõe
é utilizar uma linguagem próxima dos jovens como recurso capaz
de gerar questionamentos que podem ser discutidos no âmbito das
ciências humanas.
Para desenvolver sua pesquisa, ele teve o apoio de quatro es-
tudantes do ensino médio: Vanessa Marinho dos Santos, Cibelle
Cristina Silva de Oliveira, Daiane Jéssica Santos da Silva e Natália
Ferreira Campos. Cada uma delas ficou responsável por uma faceta
do músico. Assim, Vanessa respondia pelo Chico político, Cibelle
estudou o Chico amante, Daiane, o Chico malandro, e Natália pes-
quisou o Chico cronista.
Fotos: Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Vanessa, 17, conheceu a obra do compositor primeiramente por
meio de seu pai, que sempre ouvia em casa as músicas de Chico. A
pesquisa com o professor Maciel permitiu que Vanessa adquirisse
novos conhecimentos e se sentisse mais segura para discutir e pro-
blematizar questões da realidade brasileira. Apesar de o objeto do
projeto não ter convergência com a carreira que pretende seguir
– Direito –, Vanessa está mais preparada para prestar o vestibular.
Suas colegas de projeto escolheram como profissão o Serviço Social
(Cibele) e a Química (Daiane e Natália).
Para o trabalho, foram escolhidas dez canções para serem analisa-
das, de acordo com as diversas faces do compositor: A banda, Apesar
de você, Atrás da porta, Construção, Quem te viu, quem te vê, Cálice,
Geni e o Zepelim, Mulheres de Atenas, A Rosa e Meu guri. A seguir, o
contexto histórico brasileiro das décadas de 1960 e 1970 foi pesqui-
sado e serviu de base para a análise das canções. Algumas vezes, conta
o professor Maciel, a análise do texto-canção levou à de outros textos
e linguagens. Na interpretação da música Construção, por exemplo,
“construímos uma relação com a música Cidadão, de Lucio Barbo-
sa, que também tematiza a opressão social que sofria o operário nas
metrópoles brasileiras do século XIX”, explica. Do mesmo modo, na
canção A Rosa, o grupo conseguiu relacionar a ambígua e irônica
situação da personagem ao clássico Dom Casmurro, de Machado de
Assis. Geni e o zepelim, que apresenta uma estrutura narrativa próxima
à do cordel, levou ao paralelo entre a prostituta comum e as cortesãs
do século XIX, particularmente à personagem Marguerite Gautier, da
novela A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho.
Crônicas do cotidiano – “Chico é um cronista do Brasil con-
temporâneo. Faz música de fatos e processos históricos”, diz Maciel.
Em seu estudo, o professor escreve que as transformações sofridas
pela disciplina de História no contexto da produção acadêmica, nas
últimas cinco décadas, exigem do professor renovação constante em
sua prática. “As mudanças, ao proporcionarem novas concepções de
História, novos paradigmas, demandam do professor o domínio de
novas linguagens e a incorporação de novas fontes, como filmes,
literatura, canções e objetos”, escreveu Maciel.
As canções servem como fonte de pesquisa histórica e ajudam a
tornar o ensino da História mais humano e mais rico de sentidos,
explica Maciel. Ele diz que o projeto, realizado entre março de 2005
e fevereiro de 2006, buscou atender a uma demanda por maior pro-
fundidade no ensino da disciplina. Nesse esforço, os professores fa-
zem uso de recursos, como as letras de músicas, para diminuir a apa-
tia dos alunos, mas sem a preocupação em treinar o olhar e o ouvido
para interpretar e construir significados, para fazer o cruzamento
com textos e outros tipos de documentos. Os alunos, por sua vez,
diz Maciel, também despreparados pelo professor, transferem para a
música a memorização, tantas vezes aplicada às outras fontes.
A escolha de Chico Buarque não foi aleatória. Sua vida e obra
perpassam a história contemporânea do Brasil, desde os anos 1960.
Embora toda música seja histórica, pois não são produzidas no vazio,
as composições de Chico tocam mais detidamente na vida brasileira,
lembra Maciel: as mazelas sociais, a repressão social e política, as con-
tradições brasileiras e a malandragem são alguns dos temas abordados
pelo compositor, e que dizem muito sobre a identidade nacional.
Maciel Henrique e Vanessa Marinho: pesquisa
detalhada da obra de Chico Buarque
Rodrigo Farhat
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Reportagens
Pesquisa amplia
conceitos
O projeto mostrou histórias
que ficam no limite entre a ficção
e a realidade. “Não se construiu
uma História com H maiúsculo,
mas histórias miúdas do cotidiano
brasileiro, no estilo de crônicas,
como o fez o próprio Chico Buar-
que”, ressalva o professor Maciel.
São histórias que permitem a
emoção e que não apelam ape-
nas para o intelecto. Para os que
conheceram de perto a produção
musical de Chico Buarque, o pro-
jeto não trouxe fatos novos, mas
para os jovens, que se dispuseram a ultrapassar os livros didáticos
escolares, ficou a sensação de terem adentrado um universo inesgo-
tável de significados e temas.
Desde a década de 1930, a Sociologia, a Antropologia, a Econo-
mia e a Etnologia inspiram os historiadores a deixarem o casulo. Com
os estudos sobre as linguagens e as mudanças de paradigmas dentro
da própria disciplina, os vínculos entre a História, de um lado, e o
cinema, a literatura e a música, de outro, foram fortalecidos.
O professor Maciel conta que, para isso, muito contribuiu a re-
núncia de alguns historiadores a colocar sua ciência como baluarte
de verdades absolutas e incontestáveis. Esses profissionais acabaram
assumindo que sua prática possui muito de subjetividade e de ficcio-
nalidade. O trabalho de pesquisa permitiu que o grupo do Cefet/PE
compreendesse que o conceito de documento histórico ultrapassa a
noção estreita de documento escrito. “É toda a produção humana”,
esclarece o professor Maciel. Ao mesmo tempo, verificou-se que a
análise das fontes implica fazer perguntas, interpretar os registros,
sejam visuais, sonoros ou escritos.
Classificação – Chico Buarque não é um compositor facilmente
classificável. Se ele dominou a batida da Bossa Nova e compôs com
Vinicius de Moraes e Tom Jobim, é também um defensor da cultura
popular e do samba enquanto gênero principal de suas composi-
ções. Mesmo que o samba de Chico não seja um samba de morro,
a imagem da roda de samba e do morro é recorrente em suas com-
posições. Enquanto membro da classe média alta, ele soube tomar
o novo e cruzá-lo com uma roupagem noelesca, construindo marca
própria, que escapa às classificações mais simples.
Como a música de Noel Rosa, os sambas de Chico Buarque são
melódicos e cadenciados. Além disso, o emblemático tema do malan-
dro urbano carioca está presente nos dois, embora o contexto históri-
co e a própria idéia de malandragem tenham se modificado da época
de Noel até a de Chico Buarque. Assim, a obra musical de Chico é
resultado de influências diversas: há o popular e o erudito fundidos.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
As faces de Geni
O grupo de estudantes organizado por Maciel Carneiro analisou
várias composições de Chico Buarque. Professor e alunos verifica-
ram que o artista, apesar da ditadura militar, não sufocou o eu lírico
característico de grande parte de sua obra musical. Em um mes-
mo contexto, ele cria canções de conteúdo marcadamente político,
como Apesar de você, e lírico-amoroso, o caso de Atrás da porta.
Em “Apesar de você”, de 1970 – música que vendeu 100 mil
cópias antes de ser censurada pelo governo Médici –, o artista de-
nuncia o Estado autoritário que o impele a produzir “este samba no
escuro”. A música é caracterizada pela existência de um coro que
profetiza a utopia, ao cantar “amanhã vai ser outro dia”.
O uso de metáforas simples auxilia o ouvinte a compreender a
mensagem política, poética e lírica. As metáforas identificadas pelo
grupo foram: dia (democracia/liberdade, festa, alegria) e noite (di-
tadura/censura/repressão).
Em “Atrás da porta”, de 1972, Chico Buarque incorpora o eu lí-
rico feminino. A canção é novelesca e dramática: uma mulher chora
desesperada, a lamentar a ausência do homem que parte como um
vulto. Em um contexto que exigia dos compositores engajamento,
Chico mostra seu romantismo e poetiza o amor e seus dramas.
Cimento e lágrima – “Construção”, de 1971, narra a vida de
um operário que trabalha como se fosse máquina. Esse operário é
um personagem fictício da crônica do compositor e a letra retrata
um dia de sua vida. O recurso de repetir versos alterando apenas
as palavras proparoxítonas finais transmite repetição, sofrimento e
drama cotidianos. Um dos versos destacados pelo grupo (“Seus olhos
embotados de cimento e lágrima”) sugere dupla cegueira do protagonis-
ta: uma concreta (cimento nos olhos, ardência) e outra que pode ser
entendida como alienação, na medida em que o operário não se
reconhece no produto de seu trabalho. As ações cotidianas nar-
radas pelo compositor conduzem o protagonista ao destino da
coisificação/desumanização (“e se acabou no chão feito um pacote
flácido”; “Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”).
A canção ilustra o contexto de metropolização das ci-
dades brasileiras na década de 1970, em um contexto his-
tórico marcado pela adesão irrestrita do Brasil ao capital
internacional em nome do desenvolvimento econômi-
co sem desenvolvimento social.
“Cálice”, de 1973, é representativa dos anos duros
da ditadura militar. Nela, o eu lírico de Chico está
desesperado e não sabe mais o que fazer para acabar
com a ditadura. O grupo analisou que, ao dizer “Pai,
afasta de mim esse cálice”, “pai” tem a função de refor-
çar o apelo dirigido ao pai celestial, força suprema e única
capaz de acabar com o regime. Cálice é uma palavra homônima
e homófona da forma imperativa do verbo calar (cale-se), e pode
expressar tanto o cálice onde Jesus bebeu de seu sangue – sangue
do povo que morria porque protestava –, como também o impe-
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Reportagens
rativo do verbo calar, referência à censura que atingia os veículos
de comunicação no país. O cálice não é um qualquer e sim um de
vinho tinto de sangue.
Puta e santa – Em “De muito gorda a porca já não anda/De muito
usada a faca já não corta”, o grupo viu que o país não está caminhan-
do para lugar nenhum, nem socialmente nem economicamente, ou
que a própria resistência ao regime é que está nos seus estertores,
sem resultados efetivos.
Os estudantes também analisaram que a porta simboliza a liber-
dade, a saída para a rua, e a palavra presa na garganta é o discurso
que ele não pode dar no trecho “Como é difícil, pai, abrir a porta
e essa palavra presa na garganta”. Como se ele quisesse parar
de lutar e deixar as coisas acontecerem.
Mesmo calado o peito, resta a cuca dos bêbados do centro
da cidade” expressa que a esperança são os bêbados que
têm coragem para dizer o que sentem.
“Geni e o zepelim” (1977-78) foi considerada uma
canção de difícil interpretação pelo grupo. Geni é santa?
Prostituta? Redentora ou causa dos males que afligem
a cidade? Um zepelim gigante sobre uma cidade. Qual
cidade? Quem é Geni?
No início, o narrador a descreve pela aparência, uma
prostituta desvalorizada por qualquer um. Desde a in-
fância, ela preferia os pobres de tudo, de saúde, juventu-
de, riquezas e moradia. Esse era o “seu capricho”. Mas os
motivos que a teriam levado a entrar na prostituição não
são explicados – Exploração infantil? Miséria?
Joga pedra na Geni – Mais adiante, outro lado da
prostituta é apresentado: uma mulher que se preocupa
com os desprezados pela sociedade.
O relacionamento de Geni com a cidade é situado de forma
irônica. Após apresentar as “caridades” da prostituta, o autor
diz que esse é o motivo pelo qual todos maltratam Geni.
A passagem de jogar pedra na mulher remete à cena bíblica
do apedrejamento de uma adúltera. Um dia, no entanto, chega à
cidade um zepelim gigante, de cujo interior saiu um temido co-
mandante com intenção de destruir aquela cidade cheia de “tanto
horror e iniqüidade”.
O comandante dá uma chance à cidade, se Geni pas-
sasse a noite com ele. Do ponto de vista dos ci-
dadãos “honrados”, notou o grupo de
pesquisadores, tanto Geni quan-
to o zepelim representavam
ameaças à cidade: Geni
feria a integridade da ci-
dade com sua sexualida-
de livre e o perigo do
zepelim estava em seus
2 mil canhões.
Ilustração: Carlos Neri
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
A prostituta era, no entanto, um ser puro, que preferia amar com
os bichos a ter que dormir com um homem tão nobre. Deitar com
qualquer um era a forma encontrada por ela para transmitir um
pouco de vida aos miseráveis.
Quando a cidade soube que Geni não queria dormir com o co-
mandante, e que deixaria todos serem destruídos, pediram-lhe o
sacrifício. A partir daí, Geni passa a ser chamada bendita por todas
as autoridades: até mesmo o “bispo de olhos vermelhos”, homem da
moral, incita Geni a ter relações sexuais com o forasteiro. A prosti-
tuta aceita o sacrifício e, ao amanhecer, o zepelim parte e deixa em
Geni a sensação de que teria um pouco de paz. A cidade, no entan-
to, volta a maltratá-la.
A quenga e o delegado – O grupo, ao relacionar o texto com
outros contextos históricos, percebe que a prostituição nem sempre
foi abominada. Na Mesopotâmia, existia até uma deusa – Ishtar
– que tinha inúmeros amantes e era venerada por todos. Do mesmo
modo, havia ainda entre os sumérios a prostituição sagrada.
As prostitutas sempre existiram e algumas se destacavam. Eram as
cortesãs, mulheres que viviam no luxo e que tinham vida “fácil”. Se po-
diam atingir certa satisfação material e até influência entre seus amantes
nobres, o mesmo não acontecia com as mulheres pobres, cuja prostitui-
ção as transformava em símbolo da opressão social e de gênero.
A prostituição também é tema recorrente na literatura de cordel.
A própria canção conta uma história como o faz o cordel “A quenga
e o delegado”. Trata-se da história de Madalena, que, assim como
Geni, era uma prostituta que tinha seus caprichos. Madalena havia
ficado órfã em virtude de um policial ter atirado em seu pai. Desde
então, prometera jamais se entregar a um policial. Cobiçada por um
tal Militão, que era chefe de polícia, ela passa a sofrer várias agres-
sões por parte desse homem rude e grosseiro, e que se revolta por
ela não desejá-lo. A diferença entre a canção e o cordel é que Geni
era maltratada pela cidade e não pelo zepelim. Já Madalena era bem
vista pelos que a contratavam e até pela sociedade na qual vivia.
Reportagem: Rodrigo Farhat
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Reportagens
Linguagem de sinais a distância
Cefet Goiás oferece vestibular para curso
semipresencial de graduação em Letras com
habilitação em Língua Brasileira de Sinais (Libras)
Para a grande maioria das pessoas, o primeiro passo a ser dado
para aprender uma língua – seja ela o Português ou o Inglês – é ou-
vir e depois começar a pronunciar as primeiras palavras através da
fala. Mas, e no caso de a criança nascer surda? Como ela fará para
se comunicar? E se ela não tiver um profissional capacitado para
ensiná-la um idioma que a permita “falar” com as outras pessoas?
Para ajudar a derrubar essas barreiras, o Centro Federal de Educação
Tecnológica de Goiás (Cefet/GO) passou a oferecer – desde agosto
de 2006 – vestibular a distância para o primeiro curso da América
Latina de graduação em Letras, com habilitação em Língua Brasi-
leira de Sinais (Libras).
O curso é uma iniciativa da Universidade Federal de Santa Cata-
rina (UFSC) e tem como objetivo formar profissionais para atuar no
ensino da língua de sinais, como professores, pesquisadores, reviso-
res de texto, roteiristas, secretários, assessores culturais, entre outras
atividades. As aulas são ministradas na modalidade a distância, por
meio de uma parceria entre o Ministério da Educação, Secretaria de
Fotos: Marco Fraga
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Educação a Distância/MEC, UFSC, Secretaria de Ciência e Tecno-
logia do Estado de Goiás e nove instituições de ensino superior.
“O curso de Libras foi planejado para que todas as atividades
sejam trabalhadas com esses alunos sob a perspectiva do surdo”,
explica uma das tutoras do curso do Cefet/GO, Claudinei Maria
de Oliveira e Silva. De acordo com a estrutura do curso, o tutor
tem a função de servir de elo entre o professor, a disciplina e os
alunos. “Além do cronograma que os alunos precisam cumprir no
ambiente virtual, temos que avaliar e emitir um relatório para os
professores das atividades que acontecem durante os encontros
presenciais”, diz Claudinei.
Na opinião de Claudinei, o curso de Libras está ajudando a for-
mar um novo grupo de profissionais, tão importante como os da
saúde ou da engenharia, por exemplo. Para ela, a Libras já possui
status lingüístico como o Francês e o Inglês, porque o Brasil já re-
conheceu oficialmente a Libras “como meio legal de comunicação”,
por meio da Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002.
Outro passo importante para o reconhecimento da Libras foi o
Decreto nº 5.626, que regulamentou a Lei nº 10.436/2002, e o ar-
tigo 18 da Lei nº 10.098, de 2000. O decreto determina também o
prazo de um ano para que todas as escolas, antigas e recém-criadas,
sejam bilíngües. Para as instituições de ensino superior, o prazo para
que a disciplina de Libras seja oferecida em todos os cursos é de dez
anos. O decreto torna obrigatório o oferecimento da disciplina em
todas as licenciaturas e nos cursos de Fonoaudiologia.
Segundo o estudante do curso de Libras, Sérgio Vaz Mendes, a
graduação em Libras é uma oportunidade única para disseminar a
língua de sinais para regiões que ainda não têm acesso a ela. “Quero
aliar a minha outra graduação, que é Pedagogia, com a de Libras e
Lei que dispõe sobre a Língua
Brasileira de Sinais - Libras e
dá outras providências. “Art. 1º:
É reconhecida como meio legal
de comunicação e expressão
a Língua Brasileira de Sinais
- Libras e outros recursos de
expressão a ela associados”.
Artigo 18: O Poder Público
implementará a formação de
profissionais intérpretes de escrita
em braile, linguagem de sinais e
de guias-intérpretes, para facilitar
qualquer tipo de comunicação
direta à pessoa portadora de
deficiência sensorial e com
dificuldade de comunicação”.
Os estudantes participam ativamente dos trabalhos em grupo, comunicando-se por meio da língua de sinais
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Reportagens
trabalhar no ensino da língua de sinais com crianças”, diz Mendes.
Para a intérprete do curso de Libras, Sofia Oliveira Coimbra
da Silva Régis, o curso é muito importante para a educação de
surdos. Formada em Pedagogia para surdos pela Universidade do
Estado de Santa Catarina (Udesc), Sofia era a única ouvinte em
uma turma composta por 48 alunos surdos. “O contato com os
surdos é o que todo intérprete precisa ter para ampliar os seus
conhecimentos na língua de sinais”.
A fonoaudióloga e coordenadora do curso de Libras no Cefet/
GO, Soraia Bianca Reis Duarte, explica que até hoje ainda convive
com a imagem de que os surdos são vistos como pessoas incapazes.
Para ela, a deficiência auditiva é apenas uma perda sensorial e, por
isso, as pessoas com problemas de audição têm potencialidade igual
à de qualquer ouvinte. “Esse curso é a prova real de que eles são
capazes de executar tarefas como qualquer outro aluno. Basta que as
oportunidades sejam oferecidas para eles”.
Soraia acredita que os futuros profissionais graduados em Li-
bras terão uma diferenciação muito grande no mercado de trabalho.
Após a finalização do curso teremos professores surdos habilitados
para ministrar aulas para crianças surdas, onde a fluência na língua
será a mesma. Isso será muito importante porque a criança não terá
déficit de aquisição; ela não terá que ir para a escola em um horário
extra para conseguir captar o mesmo conteúdo”.
Detalhe da logomarca do curso “Licenciatura em Letras / Língua Brasileira de Sinais”
Estudantes praticando a Língua
Brasileira de Sinais – Libras
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Vestibular – No primeiro vestibular do curso de Libras, 3.162
candidatos concorreram a 500 vagas oferecidas nas nove instituições
parceiras. No Cefet/GO, 341 inscritos disputaram 55 vagas. Dos 55
alunos aprovados, 49 são surdos e sete são ouvintes. O vestibular
foi realizado em etapa única, onde os candidatos foram submetidos
a duas provas objetivas com 15 questões abordando conhecimentos
gerais, formuladas em Libras, e cinco sobre conteúdos da Língua
Portuguesa, em Português. Os candidatos concorreram nas catego-
rias instrutor surdo de Libras, surdo fluente em Libras ou ouvinte
fluente na Língua Brasileira de Sinais.
Funcionamento
Para o desenvolvimento do curso, o Cefet/GO repassará aos alu-
nos um guia de estudos em Libras e Português, um DVD-guia em
língua de sinais e em ambiente virtual. Nas atividades on-line, que
representam 70% do curso, os alunos podem se comunicar com
professores e colegas, comentar as aulas, discutir temas relaciona-
dos às disciplinas em andamento em fóruns, enviar sua produção
ao professor, compartilhar trabalhos desenvolvidos com os demais
Detalhes da sala de aula: participação intensa e grande interesse por parte dos estudantes
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Reportagens
colegas, acessar ementas e programas de disciplinas, bibliografias de
referência e artigos on-line.
Os encontros presenciais irão representar cerca de 30% do curso.
As aulas são realizadas quinzenalmente, aos sábados, por videocon-
ferência. Nesses dias também ocorre a análise e discussão dos con-
teúdos com os tutores.
Cada instituição terá um coordenador responsável pelo pólo,
encaminhamento das avaliações e garantia da acessibilidade na insti-
tuição, biblioteca, restaurante, áreas de estudo e lazer; um intérprete
e um professor-assistente (tutor) para cada 28 alunos. O curso terá
duração de quatro anos e a certificação ficará a cargo da UFSC.
As outras instituições que oferecem o curso de licenciatura em
Letras/Libras, além do Cefet/GO, são: Universidade Federal de San-
ta Catarina (UFSC), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),
Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Universidade Federal
da Bahia (UFBA), Universidade de Brasília (UnB), Universidade de
São Paulo (USP), Universidade Federal do Ceará (UFC) e o Institu-
to Nacional de Educação de Surdos do Rio de Janeiro (INES/RJ).
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O léxico da agricultura na interação verbal
OLIVEIRA, Simone M. R.
Escola Agrotécnica Federal de Catu/BA
Palavras-chave: Agricultura; Lexicografia; Variação.
RESUMO
Este artigo apresenta uma análise da interação comunicativa entre o técnico e o
homem do campo, através da observação de um Treinamento de Mão-de-Obra
(TMO) na zona rural de Sítio Novo, município de Catu/BA, do qual partici-
param profissionais de uma empresa de extensão rural e agricultores da região.
Procurou-se identificar variantes semânticas e lexicais, na área da agricultura,
que provocam dificuldades na comunicação entre os sujeitos analisados, à luz
dos princípios teóricos da interação verbal e da análise da conversação. A pri-
meira etapa da pesquisa configurou-se através de uma análise léxico-semântica
de entrevistas realizadas entre a documentadora e o produtor rural. Na segunda
etapa, concernente aos dados do TMO, o estudo procedeu a uma análise do
léxico e do processo de interação. Examinaram-se as lexias específicas da área
da agricultura, que não coincidem com a terminologia técnica, investigando
se existe seu registro em obras lexicográficas. No que diz respeito à análise do
processo de interação, destacaram-se aspectos positivos, em que a interação en-
tre o técnico e o homem do campo se processou convergentemente, e aspectos
negativos, que demonstram a divergência de ações entre profissionais, dificul-
tando total ou parcialmente a comunicação. No final, elaborou-se um glossário,
contendo formas ligadas à área agrícola e áreas afins, para propiciar aos extensio-
nistas um conhecimento das variantes lexicais empregadas pelo agricultor, a fim
de contribuir para que a interação entre estes sujeitos seja mais produtiva.
Fotos: Ablestock
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Artigos
Introdução
O presente trabalho apresenta-se como uma ampliação da disser-
tação do curso de mestrado intitulada Interação técnico/homem do cam-
po: o léxico da agricultura. A continuidade da investigação dentro do
mesmo tema decorre do fato de se haver observado a necessidade de
analisar a interação entre estes sujeitos in loco, durante uma atividade
de extensão rural. Essa etapa, designada como Momento I, foi rea-
lizada na zona rural de Sítio Novo, município de Catu, Bahia, onde
se analisou a variação semântica e lexical que provoca dificuldades na
interação técnico/homem do campo. Entrevistaram-se dois técnicos em
agropecuária e quatorze informantes da zona rural de Sítio Novo.
Observaram-se, na seleção dos técnicos, a escolaridade (ex-alunos da
Escola Agrotécnica Federal de Catu/BA), área de atuação e tempo
de trabalho na região. Os informantes da zona rural foram escolhi-
dos segundo as variáveis extralingüísticas – faixa etária, escolaridade
e gênero. Agruparam-se os dados em categorias, considerando-se a
compreensão do agricultor aos questionamentos feitos.
No Momento II, o centro de atenção da pesquisadora – ape-
sar de ainda ser o léxico – é também a interação face a face, em
um Treinamento de Mão-de-Obra. O estudo preserva a hipótese
da investigação feita inicialmente de que a existência de variedades
lingüísticas distintas, tais como os dialetos rurais e o dialeto culto
urbano, é determinante para a manifestação de ruído na comuni-
cação, que pode levar a interação verbal a um fracasso parcial ou
total. A pesquisa do Momento II foi desenvolvida embasando-se
nos campos teóricos da análise da conversação e da interação verbal
e considerando-se os objetivos:
analisar as dificuldades que se manifestam na interação face
a face entre o técnico e o homem do campo da região de
Catu, na área da agricultura, a fim de disponibilizar aos ex-
tensionistas elementos que possam auxiliar na melhoria dos
seus trabalhos;
observar a variação léxico-semântica no corpus documentado
na região, ampliando e reunindo os dados do Momento I
com os do Momento II, para organizar um glossário com va-
riantes lingüísticas da área agrícola e de áreas afins pertinentes
à região de Catu.
Fundamentação teórica
Na interação, os indivíduos trocam influências em um jogo de
ação e reação mútuo e, mais especificamente, na comunicação, no di-
álogo, no contato, os falantes se inter-relacionam. No que diz respeito
à interação verbal, Kerbrat-Orecchioni (1990), a partir da considera-
ção de que todo discurso é uma construção coletiva ou uma realização
interativa, apresenta o postulado de ser a fala uma atividade social.
Tratando das relações que se estabelecem entre parceiros em
uma interação, Marcuschi (1988) chama a atenção para a assimetria
que se instala quando ocorre uma relação de desigualdade entre os
membros participantes de um evento de fala. O autor propõe que
as interações na vida diária podem ser distribuídas em duas classes:
1.
2.
Simone Maria Rocha Oliveira é professora de
1º e 2º graus na Escola Agrotécnica Federal
de Catu/BA; doutora em Letras, na área
da Lingüística, pela Universidade Federal
da Bahia (UFBA); desenvolve pesquisa na
área de Lingüística Histórica, na linha da
Diversidade Lingüística no Brasil.
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Conversações casuais ou Encontros institucionalizados. No presente tra-
balho, a conversação institucionalizada foi a forma de interação do-
minante, tanto na primeira quanto na segunda etapa da pesquisa.
Percebe-se que, na pesquisa de campo, a assimetria foi apresen-
tada como elemento de desigualdade quanto às características dos
indivíduos participantes: de um lado, o entrevistador ou o instrutor
– o dominante –, com um tipo de atividade profissional, status, es-
colaridade, domínio de conhecimento da tecnologia diferenciado,
que ocupa o lugar de poder e saber institucionalizado a ele reserva-
do; do outro, o entrevistado ou o espectador – o dominado –, que
detém todas as características opostas às relacionadas anteriormente,
inclusive por ocupar uma posição de pouco poder e de pouco saber
formal, também estabelecida em encontro institucionalizado.
Quando um dos interlocutores utiliza itens gramaticais desco-
nhecidos do homem do campo, verificam-se problemas na comu-
nicação, embora, geralmente, tais problemas sejam atribuídos mais
especificamente à utilização de itens lexicais de conteúdo por um
dos sujeitos em interação, quando estes itens são desconhecidos de
seu interlocutor. O léxico, então, pode ser o responsável primei-
ro pela dificuldade ou facilidade na interação face a face, visto que
este modo de interação configura-se como um modo de ação muito
mais dinâmico, principalmente neste processo que envolve sujeitos
com conhecimentos diferenciados. Quanto ao tema do presente
trabalho, ressalta-se que a linguagem especializada e os elementos
coesivos são aspectos inibidores que interferem na interação, difi-
cultando e afastando o extensionista do agricultor.
Relacionando a lexicografia, o dicionário e o glossário, apre-
senta-se a lexicografia como uma técnica de feitura dos dicionários
(HOUAISS; VILLAR, 2001) e, por extensão, dos glossários, em
uma definição geral. Ainda, diferenciando o dicionário do glossário,
afirma-se ser este mais específico em relação àquele, que é mais ge-
neralizado. O glossário expõe os itens lexicais inerentes a uma área
qualquer e mesmo sendo neologismos podem ser adotados por um
grupo maior de pessoas, e, posteriormente, serem agregados a uma
obra de porte mais amplo, como o dicionário. É oportuno enfocar
a importância do glossário, apesar de ser uma obra evidentemente
menor, pois se restringe a uma área específica, traz as informações
contextualizadas, de acordo com o uso, que serve de suporte para os
lexicógrafos organizarem os dicionários.
Metodologia e análise dos dados
A pesquisa em questão está dividida em Partes I e II. A Parte I
diz respeito ao levantamento de ocorrências, através de uma re-aná-
lise, nas entrevistas entre a documentadora e quatorze agricultores
da pesquisa de campo do Momento I. As unidades léxicas destaca-
das da transcrição dos dados referem-se às respostas dos lavradores
na aplicação do questionário em que foram empregados o Método
Onomasiológico
1
e a Identificação de Itens Lexicais, Processos e Instru-
mentos usados na agricultura
2
. As respostas dos informantes, junta-
mente com outras formas destacadas nesta etapa, foram comentadas
na análise dos dados objetivando a composição do glossário.
1. Método que se processa através de
perguntas indiretas, objetivando-se à
obtenção de uma forma lingüística.
2. Método que se processa através de
perguntas diretas, objetivando-se à
definição de uma forma lingüística.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Da Parte II, referente ao Treinamento de Mão-de-Obra, par-
ticiparam dois técnicos da Empresa Baiana de Desenvolvimento
Agrícola, do município de Catu, denominados T1 e T2, e vinte
e cinco trabalhadores rurais. O treinamento foi realizado em uma
propriedade em Sítio Novo, cujo tema girou em torno da cultura da
mandioca. Esta fase foi filmada e gravada, para se fazer a transcrição
grafemática e integral das falas dos envolvidos no treinamento. A
análise dos dados divide-se em análise léxico-semântica e da intera-
ção propriamente dita. Nesta fase, as lexias foram pesquisadas em
dicionários. Seguem alguns itens lexicais que foram comentados e
que constarão na organização dos verbetes:
Análise Léxico-Semântica
Da fala dos extensionistas, lexias específicas da área da agricultu-
ra inerentes à fala popular
Mussuca: Cova virada chama mussuca, porque vai ficá um pouco
suspensa [...]. (T1)
Segundo o técnico, mussuca é o mesmo que cova virada, que fica
um pouco suspensa do nível do chão, onde estará localizada a maniva
ao se plantar. Este vocábulo não foi localizado no dicionário. Cardoso
e Ferreira (2000) apresentam mussuca como uma forma pertencente
à região da zona rural da Bahia, constante no Atlas Prévio dos Falares
Baianos, como empréstimo da língua indígena, com o sentido de cova
para semear, assim como se expressou o informante.
Da fala do homem do campo, lexias específicas da área da agri-
cultura inerentes à fala popular
Retonhar: [...] esse toco que ficô lá, aí nós vem, dá uma limpa, que’le
vai torná a retonhá novo pé aqui... [...] Retonhá e crescê. (RS)
3
Retonhar foi destacado no levantamento de dados e comentado
por Oliveira (2001) como uma forma que não está registrada nos di-
cionários utilizados no primeiro momento; mas, na oralidade, é mui-
to comum entre os falantes da região, inclusive foi empregada por um
dos técnicos entrevistados. Retonhar tem o sentido de rebrotar. Locali-
zaram-se também no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa
(1999) as formas Retonhar e Retonho. Além disso, constatou-se a exis-
tência das duas formas no Dicionário de Caldas Aulete (1964), com
sentidos similares ao encontrado na pesquisa. Buscou-se em Houaiss
e Villar (2001), obtendo-se como resultado para retonhar o mesmo
sentido de voltar a dar brotos, o que brotara uma primeira vez.
Análise do Processo de Interação
A descrição foi feita comentando-se as partes em que fo-
ram encontrados elementos importantes para serem observados
quanto à interação face a face dos envolvidos no processo. Os
comentários foram separados em aspectos positivos, quando estes
elementos contribuíram para que a interação se processasse de
forma mais eficaz, e aspectos negativos, quando no decorrer do
treinamento ficou patente que a interação não aconteceu. Se-
guem um aspecto positivo e um negativo.
3. informante agricultor.
15 - VERSO - 11:50:17 05/04/2007 -
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
No aspecto positivo, os agricultores procuraram demonstrar o
conhecimento que possuem através de sua experiência, tanto para a
atividade técnica, quanto para os termos empregados, apesar de al-
gumas vezes não saberem a terminologia adotada. Ressalta-se então
a necessidade de os falantes disporem de informações conjuntas para
facilitar o diálogo. Sendo assim, os elementos conhecimento de mundo
e conhecimento partilhado entre os participantes auxiliam no processo:
AM
3
– E o ideal, sabe B., quando a gente fô tirá uma amostra, é
fazê isso aí, com cavadô, com o cavadô a gente consegue tirá né [...] RS
– Cavadêra... AM
3
– Hã, a cavadêra, né, também a gente consegue tirá
o bolinho, oh ((falas)) a cavadêra, é que aperta... O cavadô.. ((falas)) já
aparece aquele entradinho de tirá né, só que vem terra a mais, de
que tirá isso com essa aí.
Já quanto ao aspecto negativo, apesar de algumas vezes o
técnico ter procurado se aproximar dos participantes, perce-
be-se que, em alguns momentos, o extensionista optou por
uma linguagem muito além do entendimento do agricultor,
como se observa a seguir:
T1 – [...] então, o que é que acontece, vai se plantá a mandioca...
fez a cova, bota logo o cloreto de potássio, que é a fonte de potássio
e o super simples, que é a fonte de fósforo [...]. Trinta a quaren-
ta e cinco dias é que você faz a adubação nitrogenada, né,
pode sê uréia, né, cê coloca na linha do plantio né, esse é
o recomendado, certo? [...]
Elaborou-se ao final um glossário que contém
formas ligadas à área agrícola e áreas afins, disponi-
bilizadas em ordem alfabética, pertinentes ao repertório
dos técnicos e dos agricultores. Observou-se, neste levanta-
mento, a ocorrência da forma lexical, o sentido contextual ou o
sentido dado pelo informante. Os significados dos vocábulos, além
de estarem de acordo com o contexto, apresentam-se relacionados
às acepções constantes em dicionários da língua, com significados
similares àqueles empregados pelos informantes na pesquisa de
campo. Os verbetes estão organizados da seguinte forma:
Seguem alguns exemplos destacados do glossário:
Entrada
categoria gramatical + gênero + definição + equivalência sinonímica ou termo variante + abonação.
Feijão de corda
s.m., m.q. tipo de cultura anual; feijão macáçar.
Fotos: Simone Oliveira
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Gema da maniva
s.f. socas; birro; piquinho.
É, é os birro da maniva [...] É aqueles carocinhos que ela tem, que é
onde nasce o pé da mandioca. (VBS)
3
Os olhinho, aqueles piquinho. (VNF)
3
Mussuca
s.f. cova virada, que vai ficar um pouco suspensa do nível do chão,
onde estará localizada a maniva ao se plantar; técnica adotada em
lugares em que o terreno é mais úmido.
Parte terminal da inflorescência da bananeira
s.f. buzina, coração, mangunço.
Pulverizador costal
s.m. bomba
Eu conheço por bomba. (JM)
3
Sabugo de milho
s.m. capuco.
16 - VERSO - 11:50:17 05/04/2007 -
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Considerações finais
O presente estudo distinguiu elementos que podem interferir
positiva ou negativamente na interação. Observou-se que, durante
o treinamento, a condução da atividade não é equilibrada, ou seja,
ao mesmo tempo em que o instrutor conduz o roteiro para absor-
ver os resultados benéficos, são apresentadas ações que dificultam o
alcance dos objetivos propostos. No tocante aos aspectos positivos,
constatou-se que:
apresentou-se a teoria e imediatamente a prática daquilo que
estava sendo informado, inclusive com ilustrações;
o instrutor concedeu aos agricultores a oportunidade de de-
monstrar o conhecimento e a nomenclatura específica do
cotidiano rural de que dispõem através da experiência na la-
voura, objetivando a aproximação entre os informantes;
existiu, em alguns momentos, a troca de turno, encadeando
a conversação entre os sujeitos envolvidos.
Isso posto, a interação entre o técnico e o agricultor existe e é
evidente em alguns momentos, e muito mais comprovado quando
um falante refere-se a um conteúdo complementado por outro, ou
quando há uma reciprocidade de ações em torno de um aspecto.
No entanto, resgatando-se os aspectos negativos, observou-se que
existem alguns fatores que precisam ser revistos:
o uso de estratégias pouco eficientes adotadas pelos profis-
sionais ao apresentarem as teorias, e o uso de variedades lin-
güísticas empregadas pelos técnicos;
1.
2.
3.
1.
17 - FRENTE - 11:50:17 05/04/2007 -
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
33
Artigos
a seqüência do planejamento, que é fundamental neste pro-
cesso pedagógico, atentando-se para os imprevistos que pos-
sam se apresentar durante o treinamento, a despeito de sua
prévia organização;
a participação efetiva da platéia; é preciso proporcionar a
interação entre os participantes, dando-lhes oportunidade de
expressão;
a dispersão do discurso dos interlocutores, ou seja, o instrutor
deverá estar atento para a manutenção do tema em foco.
Observou-se, nesta pesquisa, que para o processo de interação
verbal transcorrer com maior eficiência no andamento dos projetos
agrícolas, seria necessário que estes falantes pudessem estar mais
próximos lingüisticamente uns dos outros, buscando um entro-
samento mútuo. Não é preciso, no entanto, que um anule a sua
linguagem, substituindo-a pela do outro, mas que o extensionista,
especialmente, esteja familiarizado com a fala de seus interlocuto-
res, inclusive com as formas neológicas, para que seja observado o
uso de expressões mais próximas do entendimento das pessoas com
quem estão dialogando, facilitando este processo de interação.
Verificou-se que o homem da zona rural costuma fazer uma as-
sociação semântica, na identificação das formas lingüísticas, às ativi-
dades desenvolvidas no campo, relacionadas semanticamente à ma-
neira como faz, ao formato, ao aspecto, ao tempo, ao período, à cor,
conforme exemplo a seguir: coração, para o agricultor, é a denomi-
nação para a parte terminal da inflorescência da bananeira, motivação
semântica relacionada ao formato do coração e à forma arredondada
2.
3.
4.
Ablestock
17 - VERSO - 11:50:17 05/04/2007 -
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
da parte roxa da bananeira, que fica pendurada no cacho da banana.
Dessa forma, o agricultor não identifica a terminologia técnica, nem
compreende integralmente o sentido desta nomenclatura específi-
ca. Sendo assim, para o lavrador o adubo orgânico é adubo natural;
armazenar é guardar; curva de nível é fazer uma valeta; cultivar é
lavrar; época do plantio é a época da chuva, da lua; gema da maniva é
olho; rebrotar é retonhar, dentre outros.
Considerando-se as descrições das unidades lexicais retiradas do
Momento I e do Momento II, organizou-se o glossário, cujo núme-
ro de lexias perfaz um total de duzentas e quarenta e três formas,
que estão disponíveis no trabalho. O objetivo do glossário é, justa-
mente, propiciar aos profissionais da área da agricultura o conheci-
mento de outras denominações para os termos técnicos, com as suas
respectivas formas ou expressões, a fim de que a interação entre estes
sujeitos seja mais produtiva. Sugere-se, então, que haja uma reflexão
quanto à metodologia, às estratégias e à linguagem utilizadas pelos
extensionistas nestes eventos. Enfim, o glossário, resultado desta
investigação, foi concebido para fornecer ao técnico uma relação
de termos mais utilizados pelo homem do campo. Sabe-se que, às
vezes, o técnico tem conhecimento do repertório verbal do agricul-
tor, mas não utiliza formas dele oriunda, por considerá-las incorretas
ou inadequadas. Com este trabalho, pretende-se então combater o
preconceito lingüístico e dar voz aos agricultores.
REFERÊNCIAS
ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL). 1999. Vocabulário ortográfico da
língua portuguesa. 3ª ed. Rio de Janeiro, 816 p.
AULETE, Caldas. 1964. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa. 2ª ed.
bras. Rio de Janeiro: Delta, 5v.
CARDOSO, S. A. M.; FERREIRA, C. da S. 2000. O léxico rural: glossário,
comentários. Salvador: UFBA, 148 p.
HOUAISS, A.; VILLAR, M. de S. 2001. Dicionário Houaiss da língua portuguesa.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2.922 p.
KERBRAT-ORECCHIONI, C. 1990. Les interactions verbales. Paris: Armand Colin,
v.1, p. 9-37; 48-61; 106-133.
MARCUSCHI, L. A. 1988. Manifestações de poder em formas assimétricas de
interação. Investigações lingüísticas e teoria literária, Recife, v. 1, p. 51-70.
OLIVEIRA, S. M. R. 2001. Interação técnico/homem do campo: o léxico da agricultura.
2001. 196 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal da Bahia, Bahia.
18 - FRENTE - 11:50:17 05/04/2007 -
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Artigos
Brinquedos e brincadeiras
da cultura popular potiguar
MAIA, Lerson; OLIVEIRA, Marcus; COSTA, Tânia;
CAMPOS, Caroline; LIMA, Priscilia; GOMES, Vivianne
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte
Palavras-chave: Brinquedo; Cultura; Infância.
RESUMO
O foco principal deste estudo consiste em resgatar as brincadeiras e brinquedos in-
fantis da cultura popular norte-rio-grandense e, dessa forma, constituir e organizar
um acervo de brinquedos populares infantis, na perspectiva de sua preservação e
divulgação para as gerações atuais e futuras. A pesquisa tem procurado elucidar a
importância dos brinquedos e das brincadeiras tradicionais no aprendizado da vida
em grupo e no desenvolvimento do sentimento coletivo, assim como no ressignifi-
car desses para a cultura potiguar. A pesquisa apresenta um forte viés antropológico
e utiliza-se dos procedimentos da história oral como estratégia de coleta de informa-
ções, registros escritos e fotográficos. Nesse sentido, caracteriza-se por ser descritiva
quanto aos seus objetivos e de campo-documental no que se refere às fontes de
informações. Visando abranger todo o Rio Grande do Norte do ponto de vista
espacial, a amostra foi constituída tendo como base as 19 microrregiões do estado,
nas quais o município mais antigo foi eleito. Utilizando o brincar como uma ação
humana universal que apresenta características regionais, geográficas e culturais pró-
prias de cada localidade, reuniu-se no presente estudo financiado pelo Ministério da
Cultura, a produção sócio-histórica e cultural da ludicidade infantil do estado do Rio
Grande do Norte, estudando o brincar e as brincadeiras típicas da fase infantil.
Fotos: Marcus Vinicius Oliveira
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Introdução
O brincar, apesar de ser uma ação humana universal, apresenta
características regionais, geográficas e culturais próprias de cada lo-
calidade. Em comunidades rurais, urbanas e litorâneas, independen-
tes do estado ou país, encontram-se particularidades regionais em
termos de vocabulário, regras das brincadeiras, recursos materiais,
espaços e tempos próprios para cada vivência.
Nas brincadeiras, sob a dinâmica da particularidade cultural e re-
gional expressam-se motivações, concepções de mundo, leitura da re-
alidade e aspirações humanas. Adentrar a tônica e a temporalidade do
brincar, compreendendo suas transformações e suas permanências,
implica transitar na universalidade e diversidade sob a ótica do tempo
cronologicamente constituído. As transformações do brincar em ou-
tro tempo repassam pela mesma necessidade de identificar as brinca-
deiras de todas as épocas, ainda hoje presentes no cotidiano popular.
Por isso, universalidade e diversidade, no espaço ou no tempo,
devem ser como as faces da mesma moeda, definindo-se recipro-
camente. Nessas condições, pode-se evidenciar a rica diversidade
regional de suas vivências lúdicas, como também a universalidade
que emerge sob a lente da diversidade, expressão de seres humanos
sujeitos de sua própria história. Conviver com essa aparente contra-
dição é um passo no sentido de avançar e superar, compreendendo a
natureza dialética dos fenômenos humanos e de integrá-los em uma
visão de ser humano historicamente situado.
Dessa forma, tal pesquisa foi motivada na intenção de reunir a
produção sócio-histórica e cultural da ludicidade infantil do nordes-
te, especificamente no estado do Rio Grande do Norte, estudando
o brincar e as brincadeiras típicas da fase infantil, retratando seus
momentos de autonomia e liberdade de escolha de construir um
mundo a partir de sua lógica sensitiva, criativa, histórica, social, cul-
tural e política, e o papel ativo da criança como agente de sua vida e
de seu desenvolvimento.
Lerson Fernando dos Santos Maia é
mestre em Educação. Coordenador
e professor do curso de Tecnologia
em Lazer e Qualidade de Vida do
Cefet/RN; pesquisador da Rede
Cedes/ME. Suas linhas de pesquisa
são: lazer e gestão de políticas
públicas e privadas e brinquedos e
identidade cultural.
Marcus Vinicius de Faria Oliveira
é mestre em Educação. Professor
do curso de Tecnologia em Lazer
e Qualidade de Vida do Cefet/RN;
pesquisador da Rede Cedes/ME.
Suas linhas de pesquisa são:
lazer e gestão de políticas
públicas e privadas e brinquedos
e identidade cultural.
Tânia Costa é especialista em
Psicopedagogia. Pedagoga do
Centro Federal de Educação
Tecnológica do RN; pesquisadora
da Rede Cedes/ME. Sua linha
de pesquisa é: brinquedos e
identidade cultural.
Caroline Cristina de Arruda Campos.
Tecnóloga em Lazer e Qualidade
de Vida pelo Cefet/RN, graduanda
de Psicologia da UFRN, bolsista
pesquisadora da Rede Cedes/ME.
Priscilia Janaína Dantas de Lima.
Graduanda do curso de Lazer
e Qualidade de Vida, bolsista
pesquisadora da Rede Cedes/ME.
Vivianne Limeira Azevedo Gomes.
Graduanda do curso de Lazer
e Qualidade de Vida, bolsista
pesquisadora da Rede Cedes/ME.
Moradores da região que fazem a cultura popular norte-rio-grandense
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
A pesquisa apresenta um forte viés antropológico e utiliza-se
dos procedimentos da história oral como estratégia de coleta de
informações, registros escritos e fotográficos. Neste sentido, carac-
teriza-se por ser descritiva quanto aos seus objetivos e de campo-
documental no que se refere às fontes de informações. Objetivando
garantir a abrangência de todo o RN do ponto de vista espacial, a
amostra foi constituída tendo como base as 19 microrregiões do
estado, nas quais o município mais antigo foi selecionado.
Brinquedo e cultura:
uma relação intrínseca
Os brinquedos e brincadeiras fazem parte da história da civiliza-
ção humana. Existem registros de brinquedos infantis, provenientes
de diversas culturas, que remontam até mesmo a épocas pré-históri-
cas. Esses registros demonstram que a cultura do brincar tem acom-
panhado a evolução do homem, assumindo peculiaridades próprias
do contexto social ao qual este está inserido.
Brinquedo e criança são palavras que estão estreitamente asso-
ciadas. No entanto, o brincar não é uma qualidade inata da criança,
mas, sim, uma atividade dotada de significação social que, como ou-
tras, necessita de aprendizagem. E o brinquedo nada mais é do que
o “produto de uma sociedade dotada de traços culturais específicos”
(BROUGÈRE, 2001, p.7).
Brincadeiras que são transmitidas a cada geração
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
O brinquedo, entendido em seu aspecto livre ou sob a forma
de jogo com regras, possui funções sociais e é rico de significados,
os quais permitem compreender determinada sociedade, bem como
sua cultura. Segundo Brougère (2001), um objeto pode ser ana-
lisado como uma estreita associação entre sua função e seu valor
simbólico, contudo, o brinquedo não se encerra nessa análise, pois
“a dimensão simbólica torna-se, nele, a função principal, [...] nem
por isso ele não é funcional, na medida em que essa dimensão fun-
cional vem, justamente, se fundir com seu valor simbólico, com sua
significação enquanto imagem”. Brougère afirma também que a
concepção de um brinquedo deve ser baseada nos universos simbó-
licos que rodeiam o mesmo, tendo como característica essencial ser
uma imagem num objeto e num volume. Ainda conforme o autor, a
brincadeira só existe na liberdade que a criança tem de iniciativa e é
caracterizada pela possibilidade de a criança ser o sujeito ativo.
Fica evidente então a estreita relação entre o brinquedo e a crian-
ça. Já a relação entre as palavras “brinquedo” e “cultura” não é,
ainda, uma atitude freqüente entre os pesquisadores, tendo em vista
a imagem infantil intimamente relacionada ao brinquedo. Porém,
fica clara a analogia da questão cultural, uma vez que, para que
a brincadeira aconteça, faz-se necessário que os atores envolvidos
compartilhem de referências socioculturais.
A socialização pressupõe uma apropriação da cultura e a con-
frontação com imagens, com representações, com formas diversas
e variadas, proporcionando a impregnação cultural. Essas imagens
refletem a realidade que cerca a criança. De acordo com Brougère
(2001), cada cultura tem a seu dispor um acervo de imagens repre-
sentativas de seu contexto. As crianças entram em contato o tempo
todo, durante a brincadeira, com essas imagens e signos inerentes à
sua cultura, constituindo, assim, as identidades individual e coletiva,
que dialogam dialeticamente na constituição do sujeito.
Um elo existente entre a cultura e a criança é claramente percebi-
do nos jogos e brincadeiras tradicionais e populares. Especialmente
aquelas desenvolvidas na rua, cujas características principais são de
transmissão oral, anonimato da autoria, conservação, mudança e
universalidade. Passando de geração em geração, vai sofrendo varia-
ções e incorporações, o que não lhe retira nenhum valor; ao contrá-
rio, só vem a reforçar o caráter dinâmico da cultura.
É evidente o caráter dinâmico da manutenção das normas cul-
turais, o que parece ser um paradoxo, mas, como Laraia (2001)
afirma, qualquer sistema cultural está num contínuo processo de
mudança, ou seja, a conservação é sempre algo relativo, depende da
dimensão de tempo e do sistema cultural a ser considerado.
Desse modo, a criança pode brincar com os significados para
mediar simbolicamente a internalização da cultura, promovendo
saltos qualitativos no seu desenvolvimento, assim, a assimilação da
cultura, mediada pela brincadeira, possui uma função subjetiva, em
que a criança ressignifica, resgata, organiza e constrói sua subjeti-
vidade. Ou seja, crianças também se criam através do brinquedo e
através dele também criam cultura.
Matéria-prima para a produção de brinquedos
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Importância do brincar tradicional
frente às transformações sociais
Desde o nascimento, as crianças estão inseridas num contexto so-
cial, onde os objetos presentes nessa cultura exercem um importante
papel para a sua socialização. O ato de brincar, portanto, é muito im-
portante para o seu desenvolvimento, ao mesmo tempo em que lhes
possibilita relacionar-se de várias formas com significados e valores
inscritos nos brinquedos.
Para tanto, a diversidade das dimensões funcionais e simbólicas
presentes no brinquedo torna-o um objeto rico em potencialidades
enquanto fator de socialização. O brinquedo é, assim, um fornece-
dor de representações passiveis de manipulação e potencializador da
imaginação, refletindo-se na brincadeira ao abrir possibilidades de
ações coerentes com a representação e com um mundo imaginário
ou relativamente real.
Assim, segundo Brougère (2001), a manipulação de brinquedos
permite, ao mesmo tempo, manipular códigos culturais e sociais e
projetar ou expressar, por meio do comportamento e dos discursos
que o acompanham, uma relação individual com esse código. Nesse
sentido, Vigotsky (1988) indica a relevância de brinquedos e brinca-
deiras como indispensáveis para a criação da situação imaginária.
Nesse sentido, são cada vez mais reconhecidos os benefícios das
brincadeiras infantis, em especial, as tradicionais, que vêm paulatina-
mente sendo substituídas pela televisão, pelos jogos eletrônicos, pelos
brinquedos industrializados e, mais recentemente, pelas possibilida-
des abertas pelo mundo da internet, estas ainda restritas a determina-
das camadas da população.
Os mais novos aprendem com as
pessoas mais experientes brincadeiras
que de nem a cultura da região
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Observa-se, portanto,
que uma série de fatores
têm contribuído para o
desaparecimento gra-
dativo de brinquedos e
brincadeiras tradicionais
em todo o Brasil, e par-
ticularmente nos grandes
centros urbanos. Entre
esses elementos, desta-
cam-se o crescimento ace-
lerado das cidades, que
acarreta uma redução das
áreas livres para o lazer; a
influência crescente dos
meios de comunicação de
massa, em especial sobre
as crianças, transformando-as em meros espectadores; o grande nú-
mero de brinquedos industrializados, sofisticados e atraentes; e o
surgimento de um grande número de novas possibilidades de lazer,
principalmente com foco mercadológico.
As conseqüências desse processo são visíveis e bastante conhe-
cidas; a mais negativa delas provavelmente seja a diminuição das
brincadeiras coletivas, tão importantes no aprendizado da vida em
grupo e no desenvolvimento do sentimento coletivo. Tais brincadei-
ras favorecem a preservação das culturas da comunidade, oriundas
de diferentes contextos, uma vez que fazem parte da história da
cultura brasileira, marcada por diversas influências na formação e
socialização das gerações.
O estudo de brincadeiras tradicionais possibilita a investigação
de um fenômeno infantil espontâneo. “Nos jogos tradicionais de
ruas, as crianças se engajam em regras testadas por séculos, que são
passadas de criança para criança, sem nenhuma referência à escri-
ta, parlamento ou a alguma propriedade adulta” (OPIE e OPIE,
1987, apud PONTES; MAGALHÃES, 2002, p. 40). Mesmo em
situações precárias de sobrevivência, as crianças na rua não se apre-
sentam, em relação ao brincar, como desprivilegiadas ou carentes,
antes, se mostram como seres humanos, exercendo as capacidades
humanas de apropriação e transmissão de práticas culturais.
No mundo moderno, diante das transformações sociais, efetiva-
mente o brinquedo se modifica, tal como as sociedades. As crianças
de hoje já não brincam com carros de lata e/ou carros de bois em
madeira, pois estão inseridas no seu tempo tal como os seus avós e
bisavós estavam contextualizados nos seus. O mundo dessas crian-
ças é o mundo da informação e da realidade virtual, é o mundo dos
complexos sistemas tecnológicos e da economia global. Por isso, de
acordo com Fantim:
Resgatar a história de jogos tradicionais infantis como expressão da história
e da cultura pode nos mostrar estilos de vida, maneiras de pensar, sentir, fa-
lar e interagir, configurando-se em presença viva de um passado no presente
(FANTIM, 2000, p. 70).
Ablestock
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Artigos
Ablestock
Resultados parciais
Um importante aspecto verificado nos relatos dos interlocutores
da pesquisa diz respeito à autoria do brinquedo, pois o mesmo, em
geral, era construído pela própria criança, situação que despertava
sua imaginação e criatividade. É interessante mencionar que esses
brinquedos eram confeccionados utilizando-se, geralmente, recur-
sos naturais – frutos, raízes e folhas das plantas, sabugos de milho,
pedras, barro, dentre outros –, o que denota claramente o contex-
to sócio-histórico-ambiental no qual as crianças estavam inseridas,
bem como, na maioria das vezes, também caracterizava a situação
econômica das crianças dessa época.
Nos relatos dos informantes percebe-se que a criatividade era
uma grande aliada da infância. Na maioria das vezes, era a própria
falta do dinheiro que proporcionava que as crianças manifestassem
o poder criativo, o que resultava na grande diversidade de brinque-
dos feitos com materiais nada convencionais, para os padrões atuais,
mas muito acessíveis para elas em suas infâncias. As bonecas são
um forte exemplo dessa diversidade constatada na pesquisa. Eram
bonecas de pedras, tijolos, barro, sabão, osso, casca da melancia,
mandioca, sabugo de milho, pano, dentre outras. O que acontecia
usualmente era o aproveitamento dos materiais existentes, pois tudo
dava margem para a construção de um novo brinquedo, bastando
apenas dar asas à imaginação.
Acreditando que é através dos processos de imitação e ressignifica-
ção que a criança aprende os padrões de conduta da sociedade, com-
preende e experimenta os papéis sociais de cada ser que faz parte do
seu mundo e representa sua comunidade, assim ficou claro, durante a
pesquisa, que vários tipos de brincadeiras assemelham-se à vida real.
Partindo dessa premissa, percebeu-se que as brincadeiras de
grande parte dos entrevistados imitavam a vida adulta, como pôde
ser observado na montagem de currais de bois, estes representados
por ossos de vaca ou de carneiro, mangas e até mangarás (fruto da
bananeira). As meninas vivenciavam,
em suas brincadeiras, a “casinha de
bonecas”. Nessa, a criançada reprodu-
zia uma casa real, normalmente, como
presenciada; com mobílias de caixa de
fósforos, lata ou madeira iam redese-
nhando a casa, não desprezando os
mais variados objetos que imaginavam
compor aquele cenário.
Quando se fala em bola, objeto que
causa fascínio entre adultos e crianças;
bater bola nos terrenos vazios e des-
campados foi citado por
muitos com grande recor-
dação. Jogava-se com bo-
las de plástico, borracha,
meia, folha de bananeira,
conforme relata o mora-
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Ablestock
dor do município de Martins: “Dávamos voltas e voltas nas folhas
da bananeira, até ficar num bom tamanho, aí amarrava forte e quan-
do ressecada era só molhar pra continuar o jogo”. E, sem falar ainda
na bola de bexiga de boi. O importante era jogar!
O jogo da peteca, citado em diversos municípios, foi relatado
como uma prática anterior ao jogo de bola (futebol). Era confec-
cionada, inicialmente, com a palha de milho, recheada de folhas ou
capim; posteriormente, novos materiais foram incorporados à sua
confecção, como a meia, o sabugo, as penas e o couro. A brincadeira
consistia em dar “bolos” (palmadas) na peteca, geralmente em cír-
culos, sem deixar a mesma cair.
O estilingue, baladeira ou bodoque foi citado na maioria dos
municípios pesquisados como sendo um brinquedo muito pre-
sente na infância dos meninos, assim como a pipa, arraia, papa-
gaio, ou coruja, como também é conhecida no estado, foi citada
em alguns municípios. Enfim, muitos brinquedos já foram iden-
tificados, dentre esses alguns ainda se encontram em processo de
coleta. Partindo para as “cantigas de roda”, estas foram as mais
mencionadas nos contatos, estando presente em quase todos os
municípios, destacando-se a cantiga do “bom barquinho” ou
“passarás” e a da “margarida”. Já no quesito brincadeiras, escon-
de-esconde; cabra-cega ou cobra-cega; passa anel; “tô no poço”
ou “cai no poço”; bila buraco; peia quente e polícia e ladrão
bateram recordes em suas evocações.
Destarte, vale lembrar que o ponto de partida da pesquisa gira
em torno das origens de cada brincadeira, e a partir delas buscar
compreender como se dava a brincadeira no contexto cultural in-
fantil norte-rio-grandense.
Considerações finais
Conforme os dados obtidos na pesquisa, pode-se dizer
que quase todas as pessoas, exceto algumas em que as
condições familiares e sociais impuseram dificuldades,
vivenciaram atividades lúdicas na sua infância. Essas
atividades tiveram grande importância nas suas vidas,
em virtude de proporcionarem momentos de encontros
e aumentarem o círculo de suas amizades. Falar dessa in-
fância, para muitos, foi uma oportunidade ímpar de resga-
tar momentos quase perdidos na vastidão das memórias, transfor-
mando, dessa maneira, a entrevista em uma conversa prazerosa.
Durante os meses de pesquisa e andanças pelo Rio Grande do
Norte, as viagens mais importantes foram aquelas que
não exigiram deslocamento físico, mas sim um
passeio na esteira do imaginário. Ouvir os relatos
das memórias e lembranças de outrora, antes de
simplesmente ser uma fonte de informações, é
um meio de transportar nossos pensamentos para um contexto
social, político, econômico e cultural no qual a brincadeira era vi-
venciada. É necessário atentar também para o fato de que tais rela-
tos são carregados de uma visão particular, mas que também pos-
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Artigos
suem a retratação da vida e dos
costumes da pessoa que conta.
Assim, não retrata somente a
existência de um brinquedo ou
as regras de um jogo, mas tam-
bém descrevem um ambiente
com características reveladoras
da própria sociedade.
Cabe ressaltar que este es-
tudo vem propiciando a iden-
tificação e registro de vários
brinquedos e brincadeiras tra-
dicionais da cultura potiguar,
muitos deles presentes apenas
na memória de poucas pessoas,
contribuindo, assim, para o res-
gate e difusão dos mesmos para
as gerações atuais e futuras.
Outra preocupação da pre-
sente pesquisa tem sido a de
provocar uma reflexão na sociedade sobre o papel dos brinquedos e
das brincadeiras da cultura infantil para o fortalecimento da identi-
dade cultural norte-rio-grandense, uma vez que o processo de iden-
tificação, segundo Bezerra de Menezes (1987, apud SILVA, 1989,
p.14), tem como suporte a memória e é através dela que se conse-
guem informações, conhecimentos, experiência e, por isso mesmo,
a possibilidade de dar lógica, sentido e inteligibilidade aos vários
aspectos da realidade. Dessa maneira, o lúdico infantil se insere na
memória coletiva.
Assim, o presente estudo acredita que resgatar as brincadeiras e
brinquedos da cultura popular do Rio Grande do Norte é de grande
importância no que diz respeito à preservação dos costumes locais,
à consolidação da identidade da região, à divulgação e promoção da
diversidade cultural, bem como provoca uma reflexão sobre a im-
portância da memória, do passado e das raízes para o entendimento
de vivências transformadoras como o ato de brincar.
REFERÊNCIAS
BROUGÈRE, G. Brinquedo e cultura. São Paulo, Cortez, 2001.
FANTIN, M. No mundo da brincadeira: jogo, brincadeira e cultura na educação
infantil. Florianópolis, Cidade Futura, 2000.
LARAIA, R. de B. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2001.
PONTES, F. A. R.; MAGALHAES, C. M. C. A transmissão da cultura da
brincadeira: algumas possibilidades de investigação. Psicologia: Reflexão e Crítica,
Porto Alegre, v. 16, nº 1, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0102-79722003000100012&lng=pt&nrm=iso>.
Acesso em: 05 junho 2006.
SILVA, M. A. S. S.; GARCIA, M. A. L. e FERRARI, S. C. M. Memória e brincadeiras
na cidade de São Paulo nas primeiras décadas do século XX. São Paulo: Cortez, 1989.
VIGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Tecnologia da linguagem:
uma perspectiva de recontextualização
RODRIGUES, Maria E.
Colégio Técnico Universitário UFJF/MG
Palavras-chave: Ensino; Língua Portuguesa; Educação.
RESUMO
O texto é parte de uma pesquisa em curso, que discute a relação
entre tecnologia e linguagem para pensar um ensino de língua
mais eficiente. Partindo da concepção de que o homem, enquan-
to ser social, se constitui pela linguagem, e sabendo que a tecno-
logia é uma forte influência na vida social, a relação entre as duas
parece não ser superficial. Sob um olhar pedagógico, busca-se
articular essas relações com o ensino de Língua Portuguesa no
ensino médio e técnico. Trata-se de uma persecução por cami-
nhos mais eficazes para o ensino, que se valham não dos preceitos
tradicionais, normalmente ineficazes, uma vez que são maçan-
tes, mecânicos e não representam a dinamicidade da língua, mas
de princípios inovadores, que sustentam um ensino-aprendizado
contextual e, conseqüentemente, efetivo.
Fotos: Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Introdução
O ensino de Língua Portuguesa nos ensinos médio e técnico, os
quais são ofertados pelo Colégio Técnico Universitário/UFJF, tem sido
o foco de nossa reflexão em pesquisas e práticas pedagógicas, por en-
tendermos que essa tarefa está se tornando um desafio num contexto
de modernidade e novidades. Hoje, quando as pessoas necessitam de
leituras e de escritas rápidas, práticas e fáceis, recorrem à tecnologia da
internet, do computador e se entregam com confiança às informações
e sugestões de correção disponíveis, minimizando o raciocínio crítico
e reflexivo sobre o uso da linguagem. A aula de Língua Portuguesa,
principalmente nos níveis apontados acima, vem se constituindo uma
“arena” em que se luta por uma causa, que, ao primeiro olhar, não é tão
nobre. Essa causa será nobre em outro tempo, quando a competitivi-
dade se tornar mais declarada. Nesse tempo, vencerá o mais preparado.
Situamos a linguagem como um parâmetro importante na construção
do conhecimento, de qualquer área, que definirá os vencedores dessa
disputa. Essa inquietação, foco de nossa investigação, é baseada nas re-
flexões acerca da evolução dos conhecimentos constituindo a evolução
dos sujeitos, enfocada em Bakhtin (1992):
Logo que aparecem, as novas forças sociais encontram sua primeira expres-
são e sua elaboração ideológica nesses níveis superiores da ideologia do co-
tidiano, antes que consigam invadir a arena da ideologia oficial constituída.
É claro, no decorrer da luta, no curso do processo de infiltração progressiva
nas instituições ideológicas (a imprensa, a literatura, a ciência), que essas
novas correntes da ideologia do cotidiano, por mais revolucionárias que
sejam, submetem-se à influência dos sistemas ideológicos estabelecidos, e
assimilam parcialmente as formas, práticas e abordagens ideológicas acu-
muladas (BAKHTIN, 1992, p. 120) (grifo nosso).
Segundo as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006:
18), “as ações realizadas na disciplina de Língua Portuguesa, no con-
texto do ensino médio, devem propiciar ao aluno o refinamento de
habilidades de leitura e de escrita, de fala e de escuta”, com relação
à produção do texto (leitura e escrita), bem como à reflexão sobre a
língua e a linguagem. É exatamente esse “refinamento” o eixo de nos-
sa investigação, na medida em que questionamos: como conseguir
que todos os alunos refinem sua linguagem? Quando a leitura é um
hábito consolidado ao longo da vida, torna-se mais fácil. No entanto,
sabemos que essa não é a realidade de todos. Da mesma forma, quan-
do há gosto pela escrita. Porém, há aqueles que se identificam mais
com outras áreas. Sabemos também que é tarefa do professor incluí-
los nesse “refinamento”. Então, como fazer para atingir esse objetivo,
sem que nenhum aluno fique à margem? A própria avaliação final do
Ensino Médio – a prova do ENEM – solicita aos concluintes dessa
etapa a escrita de um texto na modalidade padrão da língua. Situamos
nesse mesmo contexto os alunos dos cursos técnicos, na medida que,
a maior parte, ou cursam essa modalidade concomitantemente ao en-
sino médio, ou retomam os estudos após a conclusão deste.
É sabido que o homem, enquanto ser social, se constitui através da
linguagem. Isso revela o quanto ela é importante nas interações (pro-
cesso pelo qual o sujeito influencia e é influenciado). Segundo Fran-
chi (1992: 25), “antes de ser para a comunicação a linguagem é para
a elaboração; e antes de ser mensagem, a linguagem é construção do
pensamento; e antes de ser veículo de sentimentos, idéias, emoções,
aspirações, a linguagem é um processo criador em que organizamos
Este texto é parte de uma pesquisa,
em andamento, que vem sendo
desenvolvida, desde 2004, por um
grupo de bolsistas do programa de
Iniciação Científica Júnior, orientada
pela a autora.
Maria Elizabeth Rodrigues é mestre
em Educação/Linguagem pela
Universidade Federal Fluminense,
Niterói /RJ; é orientadora de
bolsistas de pesquisa de Iniciação
Científica Júnior financiada pela
UFJF e FAPEMIG. Linha de pesquisa:
Ensino de Língua Portuguesa.
Maria Elizabeth Rodrigues
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
e informamos nossas experiências”. Sendo a linguagem fator funda-
mental para os diversos relacionamentos sociais e sendo a tecnologia a
tônica do mundo atual, entendemos uma ligação estrita entre ambas,
que não pode ser desconsiderada num ensino de língua.
Num contexto de globalização e sistema capitalista, a tecnologia
vem se tornando essencial e indispensável, uma vez que é um caráter
de diferenciação entre sujeitos e um fator de capacitação profissional.
Tecnologia alude, no senso comum, a avanços industriais, máquinas,
aparelhagens e tudo mais o que envolva abordagem científico-tec-
nológica. Entender que esse conceito é equivocado, devido ao fato
de ser tão restrito, significa entender que a tecnologia é algo bem
mais amplo do que meras aparelhagens industriais e que pode estar
vigorosamente presente em outras áreas do conhecimento e das or-
ganizações sociais. Quando se desvencilha a tecnologia desse caráter
puramente aplicado, é possível vê-la tal qual ela realmente é, ou seja,
dotada de “trabalho humano” (GAMA, 1987) e que por isso evolui
de acordo com a evolução do próprio homem. Desta forma, pode-
se entender que a tecnologia não é apenas uma ferramenta para as
indústrias e, conseqüentemente, para o desenvolvimento das econo-
mias: ela possui dimensões sócio-históricas. Ainda segundo o mesmo
autor, “tecnologia é o conjunto ordenado de todos os conhecimentos
científicos, empíricos ou intuitivos, empregados na produção e co-
mercialização de bens e serviços” (p. 19). É nessa relação – tecnolo-
gia x conhecimento – que apoiamos nossa investigação.
A partir dessas ponderações iniciais, situamos nossa pesquisa
na busca por uma recontextualização do conceito de tecnologia da
linguagem, pensando em um ensino eficiente para os fins a que se
propõe, objetivando o sucesso profissional, seja imediato (formação
técnica) ou não (formação superior).
Orientações metodológicas
A linguagem possibilita que a cidadania seja exercida de forma
completa. Uma pessoa letrada percebe, através de uma leitura do
mundo, as intenções e ações de sua comunidade e mostra a esta seus
interesses, pensamentos e ações através da linguagem, seja ela escrita
ou falada. Essa interação é possível, de forma plena, se esses sujeitos
souberem lidar com a tecnologia da linguagem. Assim, percebe-se
o caráter de inclusão/exclusão imposto pelo capitalismo. Com essa
perspectiva, a aula de Língua Portuguesa é o momento profícuo
para essa conscientização, pois, para Geraldi (2001: 42), “é muito
mais importante estudar as relações que se constituem entre os su-
jeitos no momento em que falam do que simplesmente estabelecer
classificações e denominar tipos de sentenças” no ensino da língua.
Preocupa-nos o excessivo uso descontraído e inovador da lingua-
gem (salas de bate-papo da internet, gírias) em determinados contextos,
transferidos para outros contextos de uso formal, em que a organização
das idéias fica comprometida exatamente porque faltam palavras, falta
reflexão, falta o amadurecimento, falta a tecnologia. Não se trata, aqui,
de um desrespeito às variedades lingüísticas e aos diversos contextos de
uso da língua, nem de valorizar o padrão culto da língua como forma
de dominação. Pelo contrário, é ter como orientação que todos terão as
mesmas chances, já que todos se constituem pela mesma linguagem.
Maria Elizabeth Rodrigues
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Reconhecendo a necessidade de chamar a atenção dos alunos
para uma análise mais crítica de sua própria linguagem, o uso de
textos produzidos por eles tem demonstrado ser uma estratégia me-
todológica eficaz.
Quando solicitada a reflexão sobre o trecho:
“Diariamente são publicados em jornais e revistas o aumento do
número de automóveis que circulam na cidade...”
1
A reação de um aluno foi:
A: “Eu escreveria do mesmo jeito. Não vi nenhum problema”.
Uma atividade mais direcionada pôde despertar o interesse dos
alunos, ainda que por uma “curiosidade”, conseqüentemente, uma
reflexão contextualizada, já que se trata de seus próprios textos.
Ao ser solicitada a análise do trecho:
“(...) O típico exemplo disso é o caso dos transgênicos, que representam um
grande avanço da engenharia genética, que pode reduzir as perdas na produ-
ção de alimentos provocadas por pragas, e com isso aumentar a produção.”
2
Um aluno teve a iniciativa de propor novas alternativas de escri-
ta, buscando as implicações. O que aflorou foi um despertar para a
concordância verbal do verbo “ser”.
A: E se ficasse “(...) O típico exemplo é os transgênicos...”ou
“(...) O típico exemplo disso são os transgênicos”.
O questionamento do aluno foi um mote para os questiona-
mentos dos colegas. A criatividade e a curiosidade foram incitadas
permitindo a compreensão da riqueza das formas lingüísticas dispo-
níveis. Especialmente nessa aula, o acontecimento discursivo teve
seu espaço e as reações dos alunos foram registradas, numa compro-
vação do efeito que esse tipo de “ensino” causou:
A: Quando a gente escreve às vezes não vê o que tá es-
crevendo. A gente não tem costume de ler depois, mas
quando lê, percebe que errou coisa boba, mas que no
meio do texto pode comprometer muito
3
.
Nesse processo de ensino-aprendizagem, o que se colo-
ca em xeque são as relações. Em primeiro lugar, as relações
entre o sujeito produtor do texto e o seu texto. Em segun-
do lugar, as relações entre o aluno e o professor: aquele é
incitado a questionar as observações deste, que o provoca
a pensar alternativas de refinamento e de possibilidades da
linguagem. São relações, muitas vezes, tensas, pois o que
está em jogo é a singularidade do acontecimento discursi-
vo, inesperado, contextual. Isso acaba mexendo com a esti-
ma do produtor, aguçando a análise crítica.
Considerações finais
A partir do volume intitulado Linguagens, Códigos e suas
Tecnologias, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)
e mais recentemente – 2006 – nas Orientações Curriculares
para o Ensino Médio, situamos nossa busca por uma recon-
textualização do conceito de tecnologia da linguagem e
suas implicações no ensino de Língua Portuguesa. Nesses
1. Textos escritos por alunos de 3ª
série do ensino médio num contexto de
formalidade.
2. Idem.
3. Fragmento de entrevista com alunos.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
mesmos documentos, encontramos alusão à tecnologia ligada ao
trabalho de linguagem da internet, principalmente. No entanto, os
primeiros resultados de nossa pesquisa, sem desprezar essa abor-
dagem, apontam-na como restrita. A ampliação dessa abordagem
pretende ser uma contribuição para um ensino que possibilite o uso
efetivo da língua, nos variados contextos.
Retomando a perspectiva pedagógica de linguagem e tecnologia,
ressaltamos que aquela possui métodos pelos quais se aplicam seus
princípios. Trata-se, pois, de técnicas da linguagem. Essas técnicas
da linguagem podem promover, além do efetivo aprendizado, o de-
senvolvimento social, desde que sejam abordadas de forma adequa-
da. Nessa abordagem, há, portanto, uma tecnologia da linguagem.
Tecnologia, nesse contexto, está junto com a técnica, e ela pode ser
desenvolvida mais, menos, ou pode não ser desenvolvida. Com es-
sas considerações, pode-se afirmar, com propriedade, que a língua
portuguesa possui técnicas e, conseqüentemente, tecnologias. E o
que o ensino pode fazer para que o usuário/aluno domine essas
tecnologias tem sido o foco de nossas pesquisas.
Voltando à análise do acontecimento discursivo, é importante
destacar o seu caráter de espontaneidade. O evento discursivo não
segue os parâmetros metalingüísticos e está fortemente ligado à
criatividade dos falantes. A consideração acerca dos acontecimen-
tos discursivos é oposta à homogeneização das observações e con-
siderações conclusivas em torno de uma reflexão. Esse evento é a
porta de entrada para o trabalho com o inesperado e o repentino
diante de discussões textuais, até mesmo com foco na metalingua-
gem. Deve-se considerar, entretanto, que o silêncio por parte dos
alunos pode constituir uma forma de evento. É uma tarefa difícil
para o professor manter a atenção de seus alunos e, além disso,
fazer com que todos participem efetivamente das discussões em
sala de aula, exteriorizando suas reflexões. Muitas vezes, um aluno
pode estar se constituindo enquanto sujeito e mesmo participan-
do dessas atividades reflexivas, porém de uma maneira peculiar.
Aquele que não fala não se expõe. Mas pode ser que seu silêncio
seja analítico e estratégico.
Desta forma, é possível afirmar que a interação é capaz de desen-
volver potencialidades da linguagem nos sujeitos, ou seja, a interação é
uma técnica da linguagem, que por sua vez é externalizada pelo aconte-
cimento discursivo na sala de aula, uma tecnologia da linguagem.
REFERÊNCIAS:
BAKHTIN, M; VOLOCHINOV, V. N. Marxismo e filosofia da linguagem. São
Paulo: Hucitec, 1929/1992.
FRANCHI, C. Linguagem e atividade constitutiva. In: Cadernos de Estudos
lingüísticos, Campinas: Unicamp, 1992.
GAMA, R. A tecnologia e o trabalho na história. São Paulo: Edusp, 1987.
GERALDI, J. W. (Org.). O texto na sala de aula. 3ª ed. ver. e amp., São Paulo:
Ática, 2001.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA, Orientações curriculares para o
ensino médio. Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Brasília: MEC, 2006.
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Artigos
A arte visual no ensino fundamental:
considerações e possibilidades
MARTINS, Francy I. de B. B.
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte
Unidade Descentralizada da Zona Norte
Palavras-chave: Ensino de Arte; Artes Visuais; Projetos Pedagógicos.
INTRODUÇÃO
O ensino de arte apresenta-se como um conhecimento valio-
so para a reflexão do humano, sua compreensão e o exercício da
cidadania, além de mobilizar sentidos e capacidades para o de-
senvolvimento da criatividade, imaginação e expressão, atitudes
necessárias para o homem de hoje. Entretanto, observamos que
a valorização e o apego à cultura de massa, que tem predominado
no mundo pós-moderno, gera um homem massificado, individua-
lista e solitário, que, segundo Assis (2002), o torna um “flâneur”,
indivíduo que vive à procura dos seus valores, que passeia pela
vida, que não compreende seu eu vivente e sua evolução. Deste
modo, olhar para este homem que em si não se reconhece sujeito,
é perceber a desvalorização de sua vida em profundidade. Para
Assis (2002), o perfil do homem contemporâneo inserido nesta
sociedade fragmentada é “de inquietação e descentralização”.
Fotos: André Vilaron
25 - VERSO - 11:50:17 05/04/2007 -
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Sendo assim, podemos sugerir que o aluno que nos chega à es-
cola é esse protótipo de homem que não sabe o que busca e por
que busca, apresentando uma inquietação inerente ao homem deste
mundo. A autora conclui afirmando que “a arte é o grande argu-
mento, a arte é aquela possibilidade de solidão construtiva que, se
bem admirada, leva o indivíduo a contemplar o infinito que brota
de suas entranhas.” (ASSIS, 2002, p.13).
Desta forma, o ensino de arte poderá contribuir para o desen-
volvimento do ser-aluno como indivíduo inserido neste mundo
pós-moderno, na tentativa de promover um agir reflexivo, em pro-
fundidade, fazendo-o reconhecer em si próprio suas possibilidades
intuitivas e criativas. Como nos diz Duarte Júnior (1991), a arte
está presente em todas as culturas e tenta concretizar em formas o
mundo dinâmico do sentir humano.
Em consonância com o escrito acima, o Parâmetro Curricular
Nacional – Arte (PCN) apresenta como um dos objetivos para esta
disciplina no ensino fundamental:
o saber expressar e comunicar-se em artes mantendo uma atitude de busca
pessoal e/ou coletiva, articulando a percepção, a imaginação, a emoção, a
sensibilidade e a reflexão ao realizar e fruir produções artísticas (Parâmetros
Curriculares Nacionais – Arte, 1997, p. 53).
Ao compreendermos a importância da arte para a educação, espe-
cialmente como meio reflexivo, entendemos este conhecimento como
um instrumento de organização do indivíduo no mundo em que vive.
Fazer e pensar arte pode assegurar ao aluno uma situação de aprendi-
zagem compreendida a partir do ensinado com sentido e prazer.
Vejamos, nos PCN, como podemos promover a aprendizagem
na disciplina:
aprender arte é desenvolver progressivamente um percurso de criação pes-
soal cultivado, ou seja, alimentado pelas interações significativas que o alu-
no realiza com aqueles que trazem informações pertinentes para o processo
de aprendizagem, com fontes de informação e com o seu próprio percurso
de criador (Parâmetros Curriculares Nacionais – Arte, 1997, p. 47).
Como todo aprender promove o desenvolvimento, os conteúdos
de arte devem ser ensinados por meio de propostas que possam
provocar no aluno o aprender participativo e interativo nas aulas de
arte, ou seja, um aprender completo de significados para ele.
Assim, ensinar arte requer modos e recursos didáticos adequados
aos seus conteúdos e objetivos, para que o aluno, em suas interações
em sala de aula, evoque informações, trazendo ao grupo mais co-
nhecimentos, exercitando práticas de aprender a ver, observar, ouvir,
atuar, tocar e refletir sobre eles. Nesse contexto, faz-se necessário que
o professor adote metodologias inclusivas, conhecendo a quem o seu
conteúdo se dirige, bem como às teorias do conhecimento humano.
A arte é contemplada com formas artísticas específicas (arte vi-
sual, música, teatro e dança) que fazem parte do currículo escolar.
O domínio dessas formas é fundamental para que o professor opor-
tunize uma prática tranqüila, promovendo qualidade e excelência
no ensino de arte. Como nos remete Martins, Picosque & Guerra
(1998), sobre a aprendizagem significativa em arte: “é com a gra-
mática da linguagem da arte que se trabalha no fazer artístico para
Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
abstrair dela uma forma expressiva que será percebida como ima-
gem sonora, gestual ou visual”.
A aprendizagem em arte, então, é significativa quando o objeto
que gostaríamos de conhecer é arte, fazendo o aprendiz descobrir a
gramática específica de cada forma. Desse modo, propomos refletir
a especificidade da linguagem visual que se materializa na escola
como arte visual. Como toda linguagem, a arte visual tem seus códi-
gos, isto é, um sistema estruturado de signos que, no fazer artístico,
opera com elementos da gramática da linguagem artística, com li-
berdade de criação. Entretanto, Martins, Picosque & Guerra (1998)
enfatiza que a linguagem visual também pode ser revelada ao aluno
através de um olhar pensante, mais curioso e sensível às sutilezas.
As artes visuais apresentam-se nas formas tradicionais, como
pintura, escultura, desenho, gravura, arquitetura, artefato, desenho
industrial, bem como nas manifestações resultantes dos avanços
tecnológicos, tais como fotografia, artes gráficas, cinema, televisão,
vídeo e computação, dentre outros. Tal variedade de formas não
necessariamente oportuniza o desenvolvimento em arte. É preciso
objetivos bem definidos pelo professor para que haja transformação
realizada pelos alunos em criar e desenvolver-se na área.
A educação em artes visuais deve acontecer a partir da articulação
de três campos conceituais: a criação/produção, a percepção/análise e
o conhecimento da produção artístico-estética da humanidade, com-
preendendo-a histórica e culturalmente. Nesse sentido, os Parâmetros
Curriculares Nacionais – Arte (1997, p. 62) apresentam três blocos de
conteúdos para as artes visuais, apontando objetivos relacionados em:
expressão e comunicação na prática dos alunos em artes visuais;
as artes visuais como objeto de apreciação significativa;
artes visuais como produto cultural e histórico.
Para Martins, Picosque & Guerra (1998), esses mesmos campos
conceituais são denominados de poetizar, fruir e conhecer. Assim,
na linguagem visual, para que o aluno possa desenvolver tais concei-
tos, é necessário que o professor possibilite a prática do pensamento
visual, a pesquisa e a leitura da estrutura da linguagem visual e da
articulação de seus elementos constitutivos, a experimentação nos
diferentes modos da linguagem visual e o manuseio e a seleção de
materiais, instrumentos, suportes e técnicas e suas especificidades
como recursos expressivos.
Para educar visualmente, devemos considerar as possibilidades e
os modos de os alunos transformarem seus conhecimentos em arte,
criando e percebendo formas visuais a partir de elementos que as
compõem, como: ponto, linha, plano, cor, luz, movimento e ritmo.
Assim, educar em arte visual é promover ao aluno uma visão ampla
por meio de variedades de materiais, técnicas e instrumentos a se-
rem utilizados na construção de formas visuais.
Finalmente, gostaria de registrar a importância de se aprender
artes visuais através de projetos de trabalhos que se caracterizam,
principalmente, por favorecer a aprendizagem significativa, bem
como a interdisciplinaridade.
Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
O projeto motiva o aluno, dando-lhe oportunidade de desenvol-
ver-se autonomamente, pois alunos e professores, quando elegem
uma pesquisa, relacionam juntos conteúdos e objetivos necessários
para o desenvolvimento desta. Para Hernández (1996), o aluno
aprende (melhor) quando torna significativa a informação ou os co-
nhecimentos que se apresentam na sala de aula. Assim, o que carac-
teriza este importante trabalho é o tratamento dado à temática, no
sentido de torná-lo uma questão do grupo, dado que pode garantir
o envolvimento efetivo de todos os alunos nas suas diferentes etapas,
criando as condições necessárias para a eficácia das aprendizagens.
Enfim, pensar a arte enquanto conhecimento, expressão e lingua-
gem a partir de projetos de trabalhos pode favorecer o despertar do
ser-aluno através dos prazerosos caminhos da criação artística.
Sendo assim, o ensino de artes visuais configura uma aprendiza-
gem artística que traz benefícios culturais e desenvolvimento pes-
soal para todos os alunos, de forma a torná-los pessoas coerentes
e consistentes para darem respostas ao homem contemporâneo e a
uma educação de qualidade social.
REFERÊNCIAS
ASSIS, S. de. Arte-Educação na contemporaneidade. In: MARQUES, Isabel Azevedo
[et al.]. ONG: a arte ampliando possibilidades. 3ª ed. São Paulo: CENPEC, 2002.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Arte. Brasília: MEC/SEF, 1997.
DUARTE JÚNIOR, J. F. Por que Arte-Educação? 6ª ed. Campinas: Papirus, 1991.
HERNÁNDEZ, F., VENTURA, M. A organização do currículo por projeto de
trabalho. 5ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
MARTINS, M. C. F. D.; PISCOSQUE, G.; GUERRA, M. T. T. Didática do ensino de
arte: a língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD, 1998.
Cinara Barbosa
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Artigos
Um concurso de mosaicos focalizando
pavimentações e simetrias
FILHO, Aderbal S. C., MENDONÇA, Ariadne A. V.; PACHECO, Auxiliadora B.
Escola Agrotécnica Federal de Satuba/AL
Palavras-chave: Simetria; Pavimentação; Mosaico.
Fotos: Ariadne de Medonça
INTRODUÇÃO
A escola mostrava uma certa inquietude por parte de todos, em
particular dos estudantes, pois estávamos próximos da Copa do
Mundo de Futebol. Percebíamos muito interesse neste evento que
sempre mobilizou o Brasil, afinal de contas, somos o “país do fu-
tebol”. Seria possível desenvolver um trabalho que conciliasse tal
interesse naquele momento de euforia, uma atividade pedagógica
ampla, interdisciplinar e cultural? Pensamos, então, em promover
um concurso de mosaico cujo tema foi elaborar composições ins-
piradas na Copa do Mundo. Explorando o interesse que todos têm
no esporte, tentamos promover uma atividade que conciliasse arte,
cultura e ciência, que, mesmo expressando-se de forma diferente,
exploram o mesmo mundo. Sabemos a inegável colaboração dos
grandes artistas do passado, como Leonardo da Vinci, para a física,
medicina, engenharia e arquitetura.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Auxiliadora Baraldi Pacheco é
mestre em Ensino de Ciências na
Universidade Federal Rural de
Pernambuco, área de atuação
“Cognição, resolução de problemas
e modelagem”. Leciona as
disciplinas de Matemática e Cálculo
Matemático, na Escola Agrotécnica
Federal de Satuba.
Ariadne Aguiar Vitório de Mendonça
concluiu o curso de Arquitetura e
Urbanismo na Universidade Federal
de Alagoas, leciona as disciplinas
de Desenho e Topografia na Escola
Agrotécnica Federal de Satuba.
Aderbal Correia da Silva Filho
concluiu o curso de Licenciatura
em Matemática na Universidade
Federal de Alagoas, leciona
Matemática na Escola Agrotécnica
Federal de Satuba.
A nossa proposta era promover uma atividade que integrasse um
tema motivador: o inegável interesse dos estudantes pelo futebol com
história, arte e matemática. Sabemos que a Copa do Mundo tornou-
se uma grande festa cultural, onde as pessoas expressam-se criativa e
espontaneamente nas cores verde e amarelo através das roupas que
vestem, das pinturas e decorações de casas e ruas e de diversos aces-
sórios, enfim, todo mundo se revela um pouco arquiteto, ou mesmo
um pouco estilista. A moda é ditada pela criatividade das pessoas
nas cores do Brasil. Queríamos, com esta atividade desenvolvida na
escola, discutir tendências sobre: artes, pinturas e ornamentações, e
aprendermos sobre influências de outras culturas e assim compreen-
demos um pouco mais sobre a nossa cultura. As oficinas eram o nosso
veículo para este amplo estudo, e também onde os estudantes teriam
espaço para iniciarem os seus trabalhos artísticos dentro da temática.
O mosaico, herança de um conhecimento milenar da arte da or-
namentação, contemporaneamente, ainda é muito usado nas cons-
truções modernas com cerâmicas ou ladrilhos para pavimentação
de pisos ou paredes. Um pedreiro, por exemplo, colocando ladrilho
(ou cerâmica), cobre uma superfície onde são colocados lado a lado,
de tal forma que não haja superposição ou, também, não aconte-
çam espaços vazios, obedecendo à mesma definição geométrica. Eles
executam esta tarefa explorando conceitos de pavimentação intuitiva-
mente? Quem são os executores de tais procedimentos? Profissionais
como pedreiros fazem essas pavimentações usando que critério? Não
é nosso propósito responder tais questionamentos. O que queríamos,
entretanto, era, motivar os aluno pela temática da Copa do Mundo,
resgatar importantes conhecimentos históricos de artes e de geome-
tria e, assim, enriquecer as suas produções criativas e artísticas.
Metodologia
O concurso passou por três etapas: inscrição, oficinas e exposição
dos trabalhos dos alunos, que culminou com a escolha e a premiação
do mosaico vencedor do concurso. Na fase da inscrição, os alunos
foram informados sobre as regras do concurso e deixamos bem claro
que era fundamental a participação nas oficinas no período de duas
semanas, quando os alunos inscritos puderam ter algumas orienta-
ções sobre composição de mosaicos. Foram ministradas seis oficinas
que abordaram as seguintes temáticas: Oficina 1: Os mouros e sua
decoração de palácios; Oficina 2: Os mosaicos periódicos de Escher;
Oficina 3: O pentagrama
1
, um mosaico de ouro; Oficina 4: Geome-
tria - pavimentações e simetrias; Oficina 5: Arte contemporânea e
fotografias; Oficina 6: Os caleidoscópios multiplicando imagens.
OFICINA 1: Os mouros e sua decoração de palácios
Esta oficina apresenta um pouco de história, e mais especifica-
mente, a dos mosaicos que sempre encantaram os povos antigos, em
suas ricas ornamentações, em seus suntuosos palácios. Esses povos
deixaram registrado, em seus palácios pavimentados com cerâmica
e ladrilhos, um legado histórico, cultural e artístico. Resgatar um
pouco de história dessas civilizações é, também, resgatar a história
da arte. Durante esta oficina, os estudantes leram textos, viram li-
vros de artes e analisaram que tipo de mosaico era construído por
esses artistas muitas vezes anônimos.
28 - FRENTE - 11:50:17 05/04/2007 -
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Artigos
M. C. Escher (1898-1972) “podia
imaginar os fantásticos efeitos que
desejava expressar graficamente,
mas um meio para capturar
esses efeitos era a matemática”
(Schattschneider e Walker, 1991).
Esses antigos usavam os padrões geométricos (mosaicos) com
tanta habilidade que, ainda hoje, são registros dessas civilizações mar-
cadas pela suntuosidade e beleza dos seus castelos ricos em minúcias
de detalhes. Escher, em sua fase de pinturas de desenhos periódicos
(mosaicos), teve influência dessas culturas, visto que fez reproduções
detalhadas dos mosaicos mouros do palácio de Alhambra, em Gra-
nada, sul da Espanha. Sylvia Leite (apud QUENTAL, 2006), desta-
ca, em sua dissertação de mestrado, a profunda relação dos mosaicos
criados pelos árabes com princípios filosóficos e religiosos, a estrutura
da língua árabe e o conhecimento matemático. Ela aponta que a proi-
bição do islamismo de representar seres vivos, levou os artistas a ado-
tarem a geometria como uma forma de enriquecimento de sua arte:
...o deslumbramento causado pelos mosaicos das construções de Granada
podem ser um ponto de partida para buscar algo além da sensação estética.
Rico exemplo da arte islâmica, eles devem ser “lidos” como uma linguagem
cheia de referências sofisticadas e uma forma de entendimento do mundo”
(LEITE, apud QUENTAL, 2006, p. 1).
OFICINA 2: Os mosaicos periódicos de Escher
Utilizamos nesta oficina várias gravuras de Escher e apresentamos
um relato sobre sua vida e obra e a importância desse pintor que não
se enquadra em nenhum estilo de pintura ou tendência. Este pintor
é de estilo único, e sua obra, inusitada. Utilizamos o recurso da ima-
gem, apresentando alguns exemplos de gravuras e pinturas.
Escher se considerava mais matemático do que artista, ele mesmo se
autodefinia assim. Sempre foi muito requisitado para conferências de
matemática; escrevia em seu diário: “Mas eu não sou matemático! E
daí, talvez fosse. Isto de ser matemático é bem capaz de ser um estado
de espírito, ou sina...” e ainda reforça isso dizendo: “Eu, freqüentemen-
te, sinto ter mais em comum com os matemáticos do que com meus
colegas artistas” (ESCHER, apud ERNEST, 1978). Sua obra, rica em
composições geométricas, retratava seu fascínio por mosaicos.
Propusemos atividades que envolveram a participação do gru-
po a partir de suas pinturas. Escolhemos os desenhos de Os três
elementos. Esta criação de Escher tem três motivos: um morcego,
um lagarto e um peixe, que representam os três mundos diferen-
tes relacionados entre si (SCHATTSCHNEIDER; WALKER,
1991). Trabalhamos com esta gravura a decomposição em triân-
gulos menores, a unidade de uma malha geométrica, que permite
dar movimento à composição agrupar e reagrupar essas unidades.
Utilizamos a mesma gravura, na busca de simetria reflexional, em
uma outra atividade com ajuda de espelhos.
OFICINA 3: O pentagrama
1
, um mosaico de ouro
A razão áurea foi muito usada na Antigüidade, principalmente
por pintores e arquitetos, como exemplo o templo grego Parthe-
non. A preocupação com a beleza física ou do meio não é recente.
É possível avaliar a beleza física de uma pessoa por meio de uma
fórmula matemática? Será que somos bonitos? Podemos buscar a
proporção áurea em diversas partes do corpo.
1. Estrela de cinco pontas onde os
cinco ângulos das pontas da estrela são
atribuídos às cinco letras do alfabeto
grego que formavam a palavra SAÚDE.
No séc. I a.C., Vitrúvio, arquiteto e
engenheiro romano, escreve a obra
O homem vitruviano
, que retrata a
harmonia entre o homem e a geometria,
onde o homem é inserido em um
pentagrama. No séc. XV, Leonardo da
Vinci coloca o conhecimento humano
como a medida de todas as coisas e
sua justa proporção, o ideal de beleza.
Também retrata o homem vitruviano em
sua obra de mesmo nome.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Um dos trabalhos vencedores do concurso de
mosaico com o tema Copa do Mundo. Este
mosaico foi elaborado pelos alunos da EAFS:
Silvio, Ednaldo, Valdeci, Edson e Hugo.
A figura do pentágono sempre esteve envolvida por muitas cren-
ças místicas. O número cinco representava, para os antigos, o sím-
bolo da vida, em particular da vida humana (LOWLOR, 1997).
No pentágono, podemos inserir o pentagrama, no qual, por sua
vez, podemos inserir outro pentágono, e novamente a estrela. Esta
sucessão de representações nos passa a idéia de infinito. Como ati-
vidade final desta oficina, pedimos que os estudantes fizessem uma
composição com mosaicos com padrões do pentagrama.
OFICINA 4: Geometria e simetrias
Nesta oficina, exploramos o conceito geométrico de pavimenta-
ções e simetrias que estão explícitos, muitas vezes inconscientemen-
te, nas produções de quem confecciona mosaicos, como: artesãos,
pedreiros ou artistas plásticos.
A pavimentação, do ponto de vista geométrico, consiste em
organizar no plano um conjunto de polígonos sobre determina-
das condições, tal que: “o conjunto de polígonos cobre sem cru-
zamento uma região poligonal simples fechada do plano” (BAR-
BOSA, 1993, p. 3). O autor explica o sentido da palavra ‘cobre
nesta definição, que é dado como “todo ponto interior ou da
fronteira da região poligonal simples fechada que pertence pelo
menos a um polígono do conjunto” (1993, p. 3) e a expressão
‘sem cruzamento’ é dada como “toda a interseção de dois polígo-
nos que tem área nula” (1993, p. 3).
Também abordamos os diferentes tipos de simetrias: a sime-
tria translacional, associada a um vetor, onde podemos determi-
nar a direção e o módulo; a simetria rotacional, associada a um
ângulo em torno de um ponto O (centro de rotação) e a simetria
reflexional (ou axial), que é obtida em relação a uma reta (eixo
de simetria). Os espelhos, superfícies polidas, foram usados para
abordar o conceito de simetria, visto que o objeto e a imagem vir-
tual são simétricos em relação a esta superfície. Isto é, neste caso,
encontram-se à mesma distância, sendo assim, temos objeto e ima-
gem como figuras enantiomorfas
2
, pois existem isometrias opostas
onde temos figuras inversamente congruentes. E finalizamos as
oficinas com as produções dos alunos explorando os diferentes
tipos de simetria na temática da Copa do Mundo.
Ao final das oficinas solicitamos que os estudantes confeccionas-
sem o mosaico homenageando a Copa do Mundo que seria inscrito
para ser avaliado pela comissão formada por vários professores da nos-
sa escola. Após a confecção dos mosaicos, organizamos uma exposição
com os trabalhos e, ao final, foi apresentado o vencedor do concurso.
2. ‘Enantios’ significa contrário; ‘morfe’
significa forma, são invertidos ópticos
(BARBOSA, 1993).
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
3. A palavra é de origem grega e
significa “olhar o belo”, “kalos”,
belo, “eidos”, formas e “skopein”, ver
(BARBOSA, 1993). Originário da China,
constitui-se um antigo aparelho lúdico
que foi aperfeiçoado na Inglaterra, no
ano de 1816, pelo o físico Isaac Newton
em suas pesquisas com prismas e a
decomposição da luz.
OFICINA 5: Arte contemporânea e fotografias
Nesta oficina, trabalhamos com as fotos do fotógrafo alagoano
Carlos Gama Júnior, apresentadas em um artigo da revista Superin-
teressante intitulado “Caleidoscópio humano”. O fotógrafo apre-
senta uma forma de compor mosaicos usando fotografias digitali-
zadas. As criações dos mosaicos deste fotógrafo foram usadas para
inspirar composições de mosaicos com recorte de fotos de revistas.
Como precisaríamos de fotos repetidas, trabalhamos com cópias co-
loridas. Solicitamos que os estudantes fizessem composições através
de recortes de outras fotos.
OFICINA 6: Os caleidoscópios multiplicando imagens
Nesta oficina, utilizamos como recurso dinamizador das imagens
e gravuras o caleidoscópio
3
. Constituído de um corpo cilíndrico,
uma porção de pedras e contas multicores que são refletidas sobre
espelhos, forma figuras de singular beleza, as quais se modificam ao
fazê-lo girar. O que usamos tem formato de prisma triangular, for-
mado por espelhos retangulares. A repetição de imagem causa um
efeito quase de animação das diversas figuras que utilizamos: asa de
uma borboleta, folhas, frutos (sementes) ou flores, ou até mesmo as
gravuras de Escher. Ao observamos o caleidoscópio, ficamos mag-
netizados pela beleza e plasticidade das composições dessas ima-
gens, que podem servir perfeitamente de motivos ornamentais para
tapeçaria, desenhos para tecidos etc. Essas infinitas possibilidades e
opções de imagens surgidas, analogamente, são como as possibili-
dades que temos diante da vida, sobre as nossas decisões.
Esta reprodução de figuras permite uma abordagem de geome-
tria e movimento, uma geometria não estática, como é passada em
livros didáticos. Mesmo que a informatização não tenha chegado
às escolas com recursos de programas que permitem interatividade
com formas e movimentos, podemos aqui apresentar uma geome-
tria dinâmica e temos aqui um instrumento simples que permite
criar e recriar figuras geométricas com movimento.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Conclusão
Este concurso teve o propósito de desenvolver atividades dinâ-
micas abordando conteúdos importantes em diversas áreas de co-
nhecimento. Tivemos a intenção de contribuir com sugestões para
trabalhos de professores em sala de aula, seguindo algumas das li-
nhas norteadoras dos PCNs: a interdisciplinaridade, a contextuali-
zação e a estética da sensibilidade. Assim, abordamos várias disci-
plinas (matemática, história (geral e da arte) e educação artística)
sem diluição de suas especificidades, a interatividade dos estudantes
nas produções acadêmicas explorando o conhecimento que os estu-
dantes já trazem e incentivando-os a expressarem-se criativamente,
retratando as diversas dimensões da vida pessoal, cultural e social e
também substituímos uma aprendizagem massificada e que não res-
peita as diferenças individuais em oposição a uma estética estrutura-
da que valoriza repetições. Desta forma, a estética da sensibilidade
propõe estímulos à criatividade (PCN I, 1999).
A realização deste concurso e das oficinas permitiu-nos uma fonte
inesgotável e fascinante para atingir as linhas norteadoras nos PCNs.
Quem vê os trabalhos pela primeira vez quer ver mais, quer entender,
sente-se desafiado a buscar uma compreensão, uma explicação e surpre-
ende-se quanto aos fundamentos matemáticos, sociais e artísticos.
Ablestock
REFERÊNCIAS
BARBOSA, R. M., Descobrindo padrões em mosaicos. São Paulo: Atual Editora
Ltda., 1993.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica.
Parâmetros Curriculares Nacionais, 3. Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias. Brasília: 1999.
ERNEST, B. O espelho mágico de M. C. Escher. Trad. Maria Odete Koller Evergreen.
Germany: Benedict Tashen Verlag Berlin,1991.
SCHATTSCHNEIDER, D. e WALKER, W. Caleidociclos de M. C. Escher. Traduzido
por. Maria-Odete. Germany: Benedict Tashen Verlag Berlin, 1991.
QUENTAL, P. A simbologia por trás dos mosaicos de Granada. Texto
disponível em: http://islamicchat.org/phpbb2/viewtopic.php?t=78&start=0&p
ostdays=0&postorder=asc&highlight=&sid=353191b2643e05a0b7ab3c5dd9c
8e1da. Acesso em: 30 agosto 2006.
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Artigos
Fotos: Ablestock
Cinema e multiculturalismo:
como a escola pode devorar o King Kong
das telas a partir da intertextualidade
PACHECO, Angela B.
Centro Federal de Educação Tecnológica de Alagoas
Palavras-chave: Cinema; Multiculturalismo; Intertextualidade.
INTRODUÇÃO
As grandes produções cinematográficas atraem milhares de pessoas às salas
de exibição de filmes e estimulam um crescente mercado de locação e venda
de DVDs. Essa popularidade alcançada configura ainda mais a idéia de que
a arte está cada vez mais sendo associada ao lazer. Contemporaneamente, es-
pecificamente após o “11 de setembro”, as produções americanas, referências
mundiais, passaram por uma reformulação temática, mais por uma cobrança
da sociedade globalizada do que por convicção. Filmes sobre terrorismo e
guerra foram dando espaço para comédias românticas, aventuras de super-
heróis, infantis, musicais e algumas releituras de antigos sucessos. O filme
King Kong encaixa-se nessa última modalidade e, em 2005, repetiu o sucesso
de crítica e de público do passado. Mas até para quem vai ao cinema apenas
em busca de momentos de entretenimento, a visão que se tem de King Kong
é extremamente devoradora. Entenda-se, aqui, o sentido de “devorador” não
como a atitude do monstro que abocanha inofensivos seres humanos, mas
como a metáfora de uma cultura que subjuga outras culturas.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
A imagem apresentada dos nativos da Ilha da Caveira chega a ser
estarrecedora: crianças e idosos, homens e mulheres, negros e mesti-
ços, sujos, famintos e resignados a um rei-macaco ou subestimados
pelo homem civilizado com uma barra de chocolate de famosa mar-
ca que quer comprar a simpatia dos habitantes da ilha. Não fosse
esse quadro inicial, a ideologia passada através da reação e do enten-
dimento imediato dos nativos (mesmo desarticulados e arredios) de
que a moça loira era a oferenda perfeita para acalmar a fera-macaco
e, acertadamente, não só acalmaria como a mudaria para sempre em
função do amor, seria ainda mais chocante.
Assistir aos filmes hollywoodianos é certeza de divertimento, mas
não pode ser reforço para a alienação e para pensamentos pré-conce-
bidos. Para as gerações que foram ver o filme na tentativa de reviver o
grande sucesso cinematográfico do passado fica a sensação de que as
novas tecnologias e os recursos incríveis da sétima arte são utilizados
exclusivamente para mostrar a soberania da América nas telas do cine-
ma, seja qual for a temática. Em King Kong, a narrativa aborda vidas
paralelas que se cruzam em função da arte de interpretar: a jovem atriz
desempregada que se contenta em entrar para uma companhia de teatro
pequena, passa fome, mas não se corrompe; o diretor que ambiciona
o sucesso a qualquer custo; o reconhecido escritor teatral que faz parte
da aventura por acaso e acaba encontrando a sua musa inspiradora; os
aventureiros navegadores que não têm nada a perder com a viagem ao
cenário perfeito para as filmagens: a ilha distante da civilização.
King Kong é o clássico que agrada a todas as gerações, desde a
criança que já está familiarizada com o herói em desenhos anima-
dos, ao adolescente que se diverte com os efeitos incríveis da super-
produção, que é um misto de “Parque dos Dinossauros”, “Indiana
Jones” e “Aracnídeos”, e ao adulto, que, como já dito, quer rever
a história de amor entre a loira americana e o macaco-gigante, ou
o triângulo amoroso entre loira / herói americano / macaco. Mas
há algo nesse memorável filme que destoa em pleno século XXI: a
impassibilidade da narrativa. Seria natural que anos após a primeira
produção do filme, a sua releitura em época de globalização e de
conflitos mundiais que trazem à tona questões multiculturais, como
etnia, raça, religião, gênero, tornasse mais amena essa relação de
poder que a América assume sobre os demais povos. Ou não?
Se o desejo de divertimento aliado à quali-
dade das superproduções de cinema
apagam a percepção dessa idéia
subjacente de soberania de
alguns povos, o olhar crí-
tico do expectador pode e
deve levantar questiona-
mentos diversos entre a
imprensa, entre o públi-
co, entre as escolas ou en-
tre as diversas instâncias
da sociedade. E se não
é função primeira da arte
a motivação crítica, é papel
das escolas criar mecanismos
para leituras contextualizadas.
Angela Baraldi Pacheco é mestre
pela na Universidade Federal de
Alagoas (UFAL), sendo suas áreas
de atuação: Literatura, Línguas
Clássicas, Artes e Multiculturalismo.
Dentre suas produções
bibliográficas, a mais recente é o
artigo “Utopia Indígena”, editado
pela revista de pós-graduação em
Letras e Lingüística, na UFAL, no
ano de 2006.
André Vilaron
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Intertextualidade: diálogo entre
Pero Vaz de Caminha e King Kong
A linguagem do cinema é um recurso bastante utilizado em salas
de aula, mais especificamente em aulas de literatura, e se aplicado
para fins que vão além do lazer, que também é função importante,
pode contribuir bastante para novas leituras ou leituras críticas e
intertextualidades diversas que são contempladas por uma proposta
multiculturalista de análise textual:
“Com o tema multiculturalismo, acreditamos levantar em sala de aula as
discussões que permitam aos/às estudantes um maior envolvimento com
o texto e permitam relacioná-lo a uma realidade concreta que extrapole a
ficção e traga à tona exemplos vivos retirados de suas experiências pessoais”
(PACHECO, 2003, p. 37).
O multiculturalismo tem sido foco de pesquisas em diferentes
áreas de estudo. Isso se deve à abrangência que o termo assumiu
contemporaneamente “...é um dado da realidade e como tal admi-
te várias formas de interpretação” (CANDAU apud PACHECO,
2003). Então, não seria uma atitude reducionista aplicá-lo enquan-
to “olhar”. Esse olhar, que pode ser sinônimo de leitura, deve ser
estimulado em salas de aula e certamente se voltará para outros es-
paços, e por que não uma sala de cinema ou uma sala de estar?
A sala de aula transformada em sessão de cinema é bastante motiva-
dora e a apresentação de filmes dinamiza as aulas, bem como amplia o
universo de conhecimento reservado, muitas vezes de forma limitada,
para a exposição oral de um conteúdo ou outro. A aplicação do inter-
texto entre essas linguagens e o uso de novas tecnologias são recursos
acessíveis que podem ser explorados por estratégias de ensino mais
contextualizadas. Como exemplo para essa prática, é possível trabalhar
textos de literatura brasileira produzidos no período colonial, tomando
como recurso o filme King Kong. Na literatura informativa feita por
viajantes, aventureiros e religiosos, temos a mesma imagem do filme:
homem civilizado que chega à terra distante em busca do sucesso. So-
bre essa fase literária, em estudos multiculturais já foi escrito:
Eram textos que mostravam uma cultura devorando outra cultura, num ver-
dadeiro canibalismo: “o melhor fruto que dela [terra] se pode tirar me parece que
será salvar esta gente” (CAMINHA apud, PEREIRA, 2002, p. 73). “Essa
gente” eram os índios e “salvar” foi sinônimo de exterminar, à medida que
crenças, hábitos, habitat, enfim, toda uma cultura foi relegada em nome da
chamada civilização imposta pelos europeus. Também fazem parte dessa nos-
sa primeira literatura ‘brasileira’ textos escritos por católicos portugueses que
pregavam uma ideologia cristã devoradora das crenças indígenas. Por ironia,
os índios é que eram vistos como canibais. Ao se ter acesso a esses textos, no
primeiro contato do aluno com as escolas literárias, encontra-se um discurso
silenciador: a fala única do europeu dominador e o silêncio, primeiramente
do índio, depois do negro (PACHECO, 2003, p. 17).
Nesse trecho – anterior à exibição de King Kong/versão 2005
–, é possível sobrepor a visão crítica da análise literária ao filme em
questão e chegar à mesma metáfora “...uma cultura devorando ou-
tra cultura...” E, mais do que questionar a obra cinematográfica en-
quanto arte e entretenimento, propor a intertextualidade e o olhar
multicultural visa à ampliação das leituras de textos e de mundo, de
forma a não silenciar culturas, nem achar natural a sua eliminação,
ou mesmo a posição desprivilegiada que assumem tanto no cinema
como na literatura e demais expressões artísticas.
Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Uma abordagem multicultural contribui significativamente para as
análises textuais em aula de literatura. Pode-se destacar que evidencia
uma proposta interdisciplinar de ensino e aprendizagem, visto que traz
à tona conteúdos diversos de História, de Filosofia, de Sociologia, de
Artes, de Geografia, além de Línguas e Literatura. Permite, ainda, a va-
riação de estratégias como o trabalho com a intertextualidade, o uso de
novas tecnologias e de outras linguagens, como a música e o cinema.
Democratiza o ensino com uma abordagem de conteúdos que são cons-
truídos por visões essencialmente críticas. Enfim, diversifica as aulas que
fogem aos padrões convencionais.
Metodologia
Proposta de Atividade
1º momento: compor o contexto histórico do Brasil colonial – paisa-
gem do Brasil, habitantes da terra nativa, cultura (hábitos, linguagem,
religião, culinária etc.), chegada dos colonizadores.
2º momento: entregar a Carta de Pero Vaz de Caminha – leitura
do texto, análise literária (descrição, metáforas, linguagem, gênero/
carta), análise crítica (visão do europeu), análise histórica (“desco-
brimento” do Brasil/colonização).
3º momento: assistir ao filme King Kong.
4º momento: compor o cenário do filme – paisagem da ilha, habi-
tantes da terra nativa, cultura (hábitos, linguagem, religião, culiná-
ria etc.), chegada dos atores, diretores, escritores.
5º momento: intertextualidade – comparar as viagens (à Ilha da
Caveira e à “Ilha Brasil”), analisar os discursos (1500 e 2005), des-
tacar das linguagens (cinema e literatura) elementos que acentuem
a visão de hegemonia cultural.
Extensão: Fuá na casa de Cabral – O discurso crítico da música de
Mestre Ambrósio.
Como reforço para a análise crítica, pode-se apresentar uma re-
leitura da Carta de Pero Vaz de Caminha, feita pelo grupo musical
Mestre Ambrósio, ou mesmo sugerir ao aluno que reconte a história
do Descobrimento do Brasil, com ênfase no encontro de culturas.
1º sensibilização: entregar para a turma o texto/música “Fuá na casa
de Cabral”, do grupo Mestre Ambrósio; tocar a música e motivar os
alunos a cantarem juntamente com o CD.
2º análise: analisar criticamente o novo relato da chegada dos por-
tugueses ao Brasil, analisar literariamente (paródia, ironia, gênero,
linguagem, metáforas).
3º produção textual: solicitar que o aluno narre um encontro de
culturas diferentes.
REFERÊNCIAS
KING Kong. Direção: Peter Jackson. Produção: Philippa Boyens, Peter Jackson, Annette
Wullems, Eileen Moran.Co-produção: Carolynne Cunningham. Roteiro: Merian C. Cooper
e Edgar Wallace Intérpretes: Naomi Watts, Jack Black, Adrien Brody, Andy Serkis, Thomas
Kretschmann, Colin Hanks e outros.[S.I.]: UIP; 2005. 1 filme (90 min), color.,35mm.
MESTRE AMRÓSIO. Fuá na casa de Cabral. Manaus: Sonymusic. Faixa 3: (3 min e
13 s), 1999.
PACHECO, A. B. Multiculturalismo e ensino de literatura: uma proposta para
análise de textos. Dissertação de Mestrado. Maceió, 2003.
PEREIRA, P. R. (Org.). Carta de Caminha: A notícia do achamento do Brasil. Rio
de Janeiro: Expressão e Cultura, 2002.
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Artigos
Cinara Barbosa
Divagando sobre o “devagar” da educação:
carta aberta a uma colega professora
COSTA, Manoel L.
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte
Palavras-chave: Leitura; Matemática; Professores.
Crianças têm o costume de dizer: mãe é tudo igual, só muda de
endereço. Parece que essa definição também serve para professor: pro-
fessor é tudo igual, só muda de escola. Eu estava lendo um trabalho de
pesquisa, assinado por você e pela Alayde, e encontrei este registro:
Um fato relevante foi, em determinado momento, após umas duas horas de
diálogo, uma professora dizer: Eu acho que estas questões administrativas
não devem ser tratadas aqui, eu vim aqui para fazer cálculo! [...] O fato
de se pensar que estudar sobre as práticas pedagógicas do ensino de Ma-
temática é realizar cálculos vem impregnado de uma formação discursiva
que podemos relacionar com os enunciados que ouvimos no cotidiano,
[...] Bom em Matemática é aquele que realiza cálculos de maneira rápida...
(GUÉRIOS e DIGIOVANNI, 2003) (grifo nosso).
Essa afirmação me lembrou uma experiência vivida quando eu
ministrava Fundamentos da Matemática para uma turma do curso
de Pedagogia. Os dois primeiros sábados (de 11 deles) eu trabalhei
leitura e discussão (orientadas) dos textos: A pesquisa como ação
na prática do ensino: Uma radiografia do sistema educativo (traba-
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
lho acadêmico da colega), O surgimento dos números, O perfil do
professor de Matemática e A Matemática voltada para a vida. No
meio da tarde do segundo sábado, uma aluna “detonou”: Professor,
essas suas aulas não estão servindo pra nada e não têm nada a ver com o
que eu vim pra cá aprender. Como é que eu vou poder aprender e ensinar
matemática se o senhor não fez nenhuma conta
1
nem passou nenhuma
conta pra gente fazer?
“Pérola de indagação” que seria a mesma coisa de querer cons-
truir o segundo pavimento sem fazer o primeiro. Nessa hora, mes-
mo atônito diante de tão eloqüente queixa, me veio à mente uma
frase de Kant: O desejo de estender os nossos conhecimentos é tão grande
que só detém seus passos quando tropeça em uma contradição claríssima
[...]. De um lado, um professor desejando “estender” os seus conhe-
cimentos e experiências para uma turma de futuras profissionais da
educação. Do outro lado, uma aluna que na sua ótica (distorcida?)
encontra uma claríssima contradição: um professor de matemática
lidando com leitura, interpretação e discussão de textos (pura litera-
tura). Inspirado em uma citação de Costa (2003),
Ora, o homem é, por excelência, um ser contraditório, ao mesmo tempo em
que é um ser questionador, curioso e inventivo. Essa dualidade na formação
do homem cria a ciência, uma ciência feita de conhecimentos e questionamen-
tos, erros e acertos, ilusões e cegueiras, mas que deve, sobretudo, ser capaz de
dar ao seu criador a oportunidade de se autocorrigir (COSTA, 2003).
refreei a minha reação inicial: entregar a caderneta de chamada e ir
embora para casa, esquecer tudo que aprendi e voltar a estudar para
aprender “tudo” que eu acho que não aprendi, mas, professor de pro-
fessor é como carro-de-teste, sempre está sendo exposto a algo novo
e difícil, daí, resolvi ficar e re-explicar os objetivos e conteúdos de:
Fundamentos da Matemática, Metodologia do ensino da Matemáti-
ca, Resolução (contas) de problemas de Matemática, o que, inclusive,
eu já havia feito no início do curso, apenas de forma mais sintética.
Dias depois, em uma reunião, soube que os demais colegas que es-
tavam ministrando essa disciplina haviam passado por essa mesma
“saia-justa”. As alunas reclamavam e achavam estranho haver leitura
e discussão de textos em aulas de Matemática. Isso confirma o que
uma das vozes da pesquisa, feita pelas diligentes colegas, constatou:
Nós não estamos acostumados a nos reunir e ler. Passamos pela graduação, pela
especialização, e ainda não conseguimos ler e compreender o que lemos, nem
da nossa área mesmo, a mesma coisa que reclamamos de nossos alunos, que
eles não compreendem [...] sabemos calcular, e calcular, e isto é que imagina-
mos quando falamos em Matemática (GUÉRIOS e DIGIOVANNI, 2003).
Essa realidade, aparentemente estranha, se confirma em uma pa-
lestra de Miranda (2006), na qual ele afirma:
[...] estamos hoje (2006) na triste situação de que apenas 26% de nossa popu-
lação estão em condições de ler e entender minimamente um texto. Três quar-
tas partes de nossa gente não é capaz de entender uma bula de remédio, um
manual de operação ou mesmo uma obra de literatura, ainda que escrita numa
linguagem acessível e usando um vocabulário corrente (MIRANDA, 2006).
Ainda bem que existem pesquisadores como você, que, em seus
trabalhos, alerta: É importante ressaltar a necessidade de fundamen-
tação teórico-metodológica para que não se interprete como metodologia
de ensino atividades concretas esporádicas, ou atividades quaisquer...
(GUÉRIOS, 2006).
Manoel Lopes Costa é licenciado
em Matemática pela UFRN, mestre
em Engenharia Sanitária pela UFRN
e professor do Cefet/RN.
1. Palavra normalmente usada para
substituir “cálculos aritméticos”.
Fotos: Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
65
Artigos
Um outro importante alerta para o fracasso, quase generaliza-
do, da leitura em todos os níveis, é ressaltado, mais uma vez, por
Miranda (2006):
A convicção era de que o desastre da educação estaria na incapacidade de leitu-
ra de professores e estudantes. Os professores que pretendiam ensinar a ler não
eram leitores, não tinham hábitos arraigados nem técnicas capazes de transfor-
mar a leitura em prática útil e prazerosa. Davam a ler obras que não haviam
lido e liam juntos textos que tampouco sabiam interpretar, sem falar que tais
textos estavam quase sempre descontextualizados... (MIRANDA, 2006).
Parece que a preocupação com a falta desse hábito, além da falta
de conscientização da necessidade da fundamentação teórica, em
alguns cursos universitários e na educação de modo geral, anda a
passos largos por todo o país. Outro exemplo é um trecho de uma
entrevista de Ivo Barbiere a Marcelo Soares:
Não estou entusiasmado. Pelo contrário. No último semestre, lecionei para
uma turma de graduação, na parte da manhã. Fala-se que nos cursos no-
turnos teríamos um estudante que, por trabalhar durante o dia, chegaria
cansado, sobrecarregado pela labuta e, com isso, não renderia. Observei, no
entanto, que nessa turma em particular havia um apetite muito menor pela
leitura do que nas turmas em que já lecionei, à noite. Pode ter sido apenas
uma coincidência, necessitaria de uma análise mais aprofundada, mas, de
qualquer maneira, lê-se muito pouco na Universidade. Todos nós deverí-
amos estar muito preocupados porque esse é um sintoma de subnutrição
intelectual (BARBIERE, 1999)
2
.
Até entre aqueles que precisam de um considerável volume de
leitura para ser um bom profissional, também encontramos relatos
sobre as dificuldades para enfrentar essa prática.
Não gosto muito de ler por não ter criado o costume de fazê-lo. Hoje, com a
ajuda da internet, simplificando a procura por textos para usar em trabalhos,
tenho mais preguiça ainda. Outro motivo também é que não tenho muito
tempo para ler”. Essa é a justificativa do aluno do 3º ano de Rádio e TV do
IMES (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) Ricardo Antônio di
Santi Barbosa de Almeida, por não costumar ler com regularidade
3
.
Existe uma resposta para esse problema? Ou, esse problema é uma
resposta às diversas indagações que fazemos quando nos questiona-
mos por que a educação vai mal? Talvez. Pelo menos é o que tenta
explicar Perrotti (2005), da Universidade Metodista de São Paulo:
Há alguns motivos para que os jovens leiam pouco. Antes de qualquer coi-
sa, nós precisamos levar em consideração alguns fatores como a televisão”,
diz a professora de Pedagogia da Metodista. Ela afirma que a faixa etária
hoje com 17, 18 anos, foi acostumada a ficar diante da televisão. “Antiga-
mente, leitura era para a elite, não havia democratização do ensino. Quando
uma maior camada da população teve acesso à escola e oportunidade de ler
mais, a televisão chegou e estimulou a queima de algumas etapas na forma-
ção destes jovens”, afirma. E, com a imagem e o visual, a TV acaba sendo
um estímulo maior do que os livros (PERROTTI, 2005)
4
.
A justificativa de Perrotti faz sentido na faixa etária menciona-
da. Mas, na faixa universitária, de futuros profissionais, cabe? As
propostas pedagógicas são flexíveis diante das diversas situações da
educação, portanto, para a Universidade, ou para os demais níveis,
é possível se flexibilizar os programas direcionando-os para a forma-
ção correta do hábito de leitura e interpretação de texto nos cursos
onde há “focos” desse problema. Afinal de contas, como eu posso
enunciar um problema de matemática isento de texto? Ou como
posso resolvê-lo sem saber interpretar o seu enunciado? Se permi-
tirmos que essa preocupação, ora levantada, se consolide, principal-
2. http://www2.uerj.br/~emquest/
emquestao06/barbieri.htm. Acesso em
13/09/2006.
3 e 4. http://www.universia.com.
br/html/materia/materia_gchj.html.
Acesso em 13/09/2006.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
mente nos Cursos de Formação de Professores, teremos que acres-
centar algo novo à Bíblia, onde Cristo dirá: Matemática, és números,
e só sobre números edificarei a tua teoria.
A falta de leitura leva a problemas com a escrita. Daí as mono-
grafias e dissertações serem, parte delas, alvos de tantas críticas nas
bancas de defesas. Já foi encontrada em uma monografia de um cur-
so da área de ciências humanas, a frase: “[...] assim cendo, a açociação
das ideias...”. Absurdo, ou erro de digitação? Para o nosso sistema
educacional, exceções à parte, talvez não, no máximo podemos acei-
tar que esse(a) aluno(a) tem uma “certa dificuldade em manusear
a língua portuguesa, ou escreveu em “portunet”, um idioma que
surge, na era da internet, para permitir qualquer pessoa entender
qualquer coisa escrita de qualquer jeito. Mas, afinal de contas, por
que tanta preocupação? Os professores de Português estão aí, de
plantão nos “pronto-socorros gramaticais”.
Entretanto, enquanto eu me enchia de preocupações com esse
“monstruoso problema”, encontro um outro trabalho, elaborado
por professores de Matemática do Sistema Municipal de Educação
de Vitória/ES (2003), no qual eles procuram sintetizar idéias sobre
as diretrizes curriculares de Matemática para o ensino fundamental
da rede e, pasmem, organizaram o seguinte esquema de trabalho:
leitura de bibliografia básica (a partir de referências);
elaboração individual de texto temático a ser compartilhado
por todos nas reuniões conjuntas;
discussão e redação de texto contendo as contribuições indi-
viduais.
Que achado maravilhoso, professores de Matemática lendo, re-
digindo, discutindo, enfim, “lidando com letras”, sinal de que nem
tudo está perdido.
Chevalard et al. (2001), afirma que a escola é uma obra humana,
fruto das decisões de uma sociedade ou de parte dela. Portanto,
como humano e como elemento de uma sociedade, vou continuar
vivendo “essa escola” na esperança de que um dia letras e números,
unidos em um único objetivo, reajam transformando-se na água que
alimentará os rios que banham as planícies do saber. Enquanto isso, eu
vou lendo menos para não me preocupar muito.
REFERÊNCIAS
CHEVALLARD, Y. et al. Estudar Matemáticas. Porto Alegre: Artmed, 2001.
COSTA, M. L. O Conhecimento – Os seus erros e ilusões. Revista Holos/Cefet/RN,
Ano 19. Natal, 2003.
GUÉRIOS, E., Didática e metodologia do ensino em aulas de Ciências e Matemática.
Simpósio Sul Brasileiro de Ensino de Ciências (Resumo). Blumenau: FURB, 2006.
GUÉRIOS, E.; DIGIOVANNI, A. M. P. Entre a sensibilidade e a razão: Múltiplas
vozes enunciadas por professores de Matemática em um processo reflexivo. Resumo de
trabalho de pesquisa. UFPR, 2003.
KANT, E. Crítica da razão pura. Membros do grupo Acrópolis (Filosofia). São Paulo,
2001. http://br.egroups.com/group/acropolis/. Acesso em: 12 agosto 2003.
MIRANDA, A. Formando e conformando o hábito da leitura. (Palestra). Universidade
Petrobrás. Bahia, 2006.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Design em catálogo iconográfico:
os (des)caminhos da imaterialidade
GAIA, Rossana; MAIA, João L.; RAPÔSO, Áurea; VITAL, Débora
Centro Federal de Educação Tecnológica de Alagoas
Palavras-chave: Patrimônio Imaterial; Design; Iconografia.
INTRODUÇÃO
A relevância do município de Marechal Deodoro para a história
de Alagoas é justificada não somente pela sua origem, como “primei-
ra cidade fundada no Brasil Colônia e primeira capital de Alagoas”
(GAZETA DE ALAGOAS, 4-2-2001, p. E-4), mas, igualmente, pela
arquitetura humana que garante a preservação da memória cultural
deodorense. Essa é uma das razões que norteiam esta pesquisa e que
selecionou esse espaço para servir de base a um catálogo iconográfico
dos bens imateriais representativos da cidade que possam expressar a
força da localidade em um sentimento de pertencimento e de alagoa-
nidade. A relevância da cidade recebeu o aval da Unesco ao instituí-la,
em 2006, como patrimônio da humanidade. Após as fases de pesquisa
bibliográfica e de entrevistas, podemos afirmar que há três áreas signifi-
cativas para a cultura local: as artes, a culinária e a história.
Desse modo, essas áreas, que começam a ser representadas na úl-
tima etapa, em forma de ícones, ilustram o imaginário deodorense
acerca da sua própria historicidade. Como, por exemplo, diz a lenda
Montagem Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
sobre o lugar que “a música está no sangue [dos moradores]. Sempre
foi assim. Por aqui, quando nasce um menino, o pai joga um bolo
de barro molhado na parede; se cair, o menino vai ser pescador, se
agarrar, vai ser músico” (entrevista de morador do Centro in: FER-
RARE, 2002, p. 108). A chamada “aposta do barro” faz parte da
tradição local, conforme indica Ferrare (2002, p. 126).
Culinária, música, arte popular,
eventos e personagens:
os (des)caminhos da imaterialidade
Até chegarmos ao momento atual da pesquisa, na qual defini-
mos as categorias mais relevantes para a cultura local, foram muitos
os (des)caminhos percorridos, as dúvidas. A definição das catego-
rias exigiu e ainda exige várias leituras e visitas à cidade. A pesquisa
incluiu, em seu limiar, levantamentos bibliográficos e documentais,
sobretudo em jornais locais; e, atualmente, os dados estão sendo
complementados através de entrevistas junto a instituições, entida-
des representantes da comunidade e moradores do município.
No entanto, pode-se inferir que as leituras e uma série de depoi-
mentos identificados no jornalismo alagoano confirmam a culinária
de Marechal Deodoro como dado singular. Um dos principais povo-
ados no entorno da cidade é Massagüeira, freqüentado por turistas e
habitado por pescadores, conhecido pelos refinados pratos típicos:
peixada, camarãozada, massunim. Além desse cardápio tipicamente
regional, na pesquisa foi identificada a existência de um prato que
pode não ser considerado ainda típico por alguns – o pato –, mas que
é servido com regularidade em um dos restaurantes da região e que
tem sido referência para moradores de Massagüeira, Maceió e pro-
ximidades. Além dos pratos da culinária de Massagüeira, Marechal
também é conhecida como a cidade dos doces caseiros, mais precisa-
mente pelas cocadas de diversos sabores (coco queimado, maracujá,
goiaba etc.) e pelo suspiro, que começam a ser representados:
Figura 1
Ícone representativo do suspiro.
Autores: Débora Vital e João Luiz Maia
Figura 2
Ícone representativo da cocada.
Autores: Débora Vital e João Luiz Maia
Rossana Gaia é jornalista, doutora
em Lingüística (UFAL), professora
do CST em Design de Interiores do
Cefet/AL, pesquisadora do Grupo
de Pesquisa sobre o Cotidiano e
o Jornalismo (CNPq/UFPB) e do
Grupo de Pesquisa Design e Estudos
Interdisciplinares (CNPq/Cefet/AL).
João Luiz Maia é arquiteto e
urbanista, especialista em Design de
Produto (UNEB), professor do CST
em Design de Interiores (Cefet/AL),
pesquisador do NPDesign/Cefet/AL
e do Grupo de Pesquisa Design e
Estudos Interdisciplinares (CNPq).
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
A musicalidade da pequena cidade evidencia-se pela quantidade
de bandas que preservam um modo de ser peculiar do deodorense,
que transita entre o erudito e o popular. A pesquisa identificou
três bandas. Somente a Sociedade Musical Filarmônica Santa Ce-
cília tem cerca de 100 componentes. Há ainda registro das bandas
Sociedade Musical Carlos Gomes e Banda de Música Municipal,
também conhecida como antiga Banda do SESI. As bandas de
música deodorenses podem ser consideradas verdadeiras orques-
tras de rua e costumam utilizar os seguintes instrumentos mu-
sicais: trompetes, trompas, trombones, tuba, bombardino – que
formam os metais; saxofone, clarinetas – que formam as palhetas;
pratos, caixa bombo – que formam a percussão; e a flauta – per-
tencente às madeiras, que se constitui em instrumento utilizado
isoladamente na banda.
Relacionado à música, um dos personagens do catálogo é o
rabequeiro Nelson da Rabeca, dono de um estilo musical próprio,
remonta a uma musicalidade medieval e tem recebido reconheci-
mento nacional. Seu Nelson, como é popularmente conhecido,
gravou um CD, com o apoio do SESI, e participou de uma co-
letânea sobre música alagoana. O músico-cantor produz rabecas
artesanalmente, utilizando, de preferência, a madeira da jaqueira.
Ainda na categoria música, a Banda de Pífanos Esquenta Muié
constitui-se em outro registro importante. Sua formação tradicio-
nal inclui a flauta de pífanos, além de pratos, bombo, tarô e triân-
gulo, instrumentos de percussão.
Em 1978, a Banda de Pífanos de Marechal Deodoro gravou
um LP duplo, hoje artigo de colecionadores, e, em junho de 2003,
lançou o CD Sonho de Criança, disponível no Museu Théo Bran-
dão. Um rascunho, idealizado pela bolsista Débora Vital e pelo
prof. João Luiz Maia, foi justamente o que trata da banda, aqui
representado pelo pífano – uma flauta popular, que, no Nordeste,
muitas vezes é improvisada com canos PVC. A imagem a seguir
registra o ícone:
Figura 3
Ícone representativo da Banda Esquenta Muié.
Autores: Débora Vital e João Luiz Maia
Foto 1
Banda Esquenta Muié, de Marechal Deodoro,
com uniforme informal.
Foto: Áurea Rapôso
Áurea Raposo é arquiteta
e urbanista, MSc. em
Desenvolvimento e Meio Ambiente
(UFAL), professora do CST em
Design de Interiores do Cefet/AL,
pesquisadora do NPDesign/Cefet/AL
e do Grupo de Pesquisa Design e
Estudos Interdisciplinares (CNPq).
Débora Vital é aluna do Curso
Superior de Tecnologia em
Design de Interiores (Cefet/AL),
pesquisadora do Grupo de
Pesquisa Design e Estudos
Interdisciplinares (CNPq) e
bolsista do PIBICT/GPP no projeto
de pesquisa Design e Produto:
(en)focando os bens imateriais
deodorenses, sob orientação do
professor João Luiz Maia.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Metodologia
Além da síntese e análise dos dados obtidos para a elaboração do
catálogo que prevê a produção de um bloco de imagens e ícones,
de uma cartilha explicativa e de relatórios de atividades, a pesquisa
aborda duas temáticas fundamentais para seu entendimento: a cul-
tura de Marechal Deodoro, sintetizada por categorias definidas por
bens imateriais do município e o design de produto sob a criação de
um produto final gráfico que objetiva auxiliar profissionais da área e
afins, bem como a sociedade sob o olhar do designer.
A pesquisa encontra-se em etapa de realização de entrevistas
junto à comunidade ou instituições representantes da comunidade,
concomitante à elaboração de esboços preliminares dos ícones que
complementarão o produto final, bem como realização de ficha-
mentos para fundamentação teórica da composição do catálogo.
Considerações finais
Do ponto de vista cultural e do design, a elaboração de um ca-
tálogo iconográfico sobre os bens imateriais do município de Ma-
rechal Deodoro vislumbra a possibilidade de garantir um registro
icônico que permita indicar, a partir da própria fala dos moradores,
um esboço de identidade cultural. Os ícones que formarão o catálo-
go precisam traduzir, além da estética, a percepção visual dos bens.
Esse tem sido um dos principais desafios no desenvolvimento das
idéias imagéticas do catálogo.
Os principais alcances da pesquisa referem-se à contribuição so-
cial expressa na criação de um produto que seja referência de design,
de cultura e de imagens do município de Marechal Deodoro.
REFERÊNCIAS
FERRARE, J. Marechal Deodoro. Um itinerário de referências culturais. Maceió:
Edições Catavento, 2002.
“Saiba mais. Fatos históricos”. Gazeta de Alagoas, Maceió, 4 fevereiro 2001, Cad.
Turismo. p. E-4.
Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Um toque humano na pedagogia musical
GÓES, Alexandre M. A. de
Escola de Música da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Palavras-chave: Ensino; Música; Estímulo.
O MOMENTO MÁGICO
Conversando sobre tópicos a serem desenvolvidos na pós-gra-
duação, o orientador Dr. Edson Ferreira Claro me pediu que falasse
um pouco mais sobre minha experiência como professor de música.
Anteriormente já havia comentado com ele sobre o trabalho que
vinha desenvolvendo desde 1998, na EMUFRN, com turmas rela-
tivamente grandes de alunos em faixas etárias e realidades sociais e
econômicas diferentes. Isso não deixa de ser um desafio, consideran-
do que o ensino sistemático de prática instrumental acontece nor-
malmente a um aluno por vez ou para pequenas turmas de mais ou
menos três alunos nivelados. Aplicar um conteúdo essencialmente
prático em meio a tantas diferenças, especialmente no que se refere
às condições físico-motoras de cada aluno, a fim de superar os pro-
blemas de cada um dos estágios do aprendizado de um instrumento
musical, realmente não é uma tarefa simples. Poderíamos mesmo
enumerar uma série de fatores que são bem particulares, diferin-
do, assim, de aluno para aluno, como, por exemplo: coordenação
motora, percepção rítmica e melódica, interesse no conteúdo do
curso, conhecimentos prévios, gosto musical, disponibilidade de
tempo para estudo etc. Fatores esses que podem nos levar a pensar
Fotos: Ablestock
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
que de fato não é possível ensinar um instrumento musical a tantas
pessoas ao mesmo tempo. Contudo, tenho observado que é possível
trabalhar assim, com tantas diferenças reunidas, e obter resultados
surpreendentes. Nesse ponto, quero retomar o detalhe da conversa
com o orientador, quando lhe disse, movido por um entusiasmo
claramente percebido por ele, que ‘quando os alunos percebem que nós
os percebemos, e que de fato estamos ali com eles, compartilhando
honestamente e com todo o respeito de seus sentimentos diante da
luta contra os diversos obstáculos que os separam da meta singular
de tocar um instrumento musical, nesse ponto de percepção mú-
tua acontece o que eu chamei de ‘momento mágico’, um verdadeiro
contato humano de valor inestimável no exercício de educar. Posso
dizer que estabelecer tais relações com os alunos tornou-se, para
mim, uma forte preocupação, além das demais preocupações que
deve ter um professor. Realmente há um grande e colorido prazer
aqui, e penso que a busca por esse momento valioso de interação
humana com cada aluno, bem como com a turma, é um ingrediente
indispensável para o êxito do educador.
Reformando conceitos
No ano de 2001, um jovem chamado P.S. era integrante de uma
dessas turmas de cursos de extensão. Minha impressão inicial do ra-
paz foi um tanto dramática. Se eu posso dizer que, naquele momen-
to, havia encontrado duas coisas que realmente não combinavam,
elas estavam ali: P.S. e o violão. Por mais que eu tentasse arrumar o
instrumento no rapaz, meu esforço era praticamente inútil. Pensei
comigo mesmo: esse rapaz está, no mínimo, no lugar errado! Mas,
como dizer isso a ele? De forma alguma faria isso, mesmo que fosse
verdade. Procurei evitar, então, qualquer gesto, palavra ou expres-
são que pudesse criar nele alguma dúvida de que conseguiria. Logo
pude entender que havia algo valioso no P.S. que não podia ser visto
em seu corpo físico, mecânico, mas era algo interno: uma atração
especial pelo violão e uma forte vontade de tocar. Essa atração e
vontade passaram a ser minha principal preocupação. Esse jovem,
a quem julguei incapaz por razões externas coerentes, me surpre-
endeu muito, forçando-me a reconsiderar meus conceitos acerca da
capacidade individual dos alunos. E aqui cabe muito bem certa con-
sideração filosófica.
Pausa para reflexão
Pensamos que é o corpo quem toca um instrumento musical, po-
rém, a fim de instigar reflexão importante para a prática do ensino de
música, apresento aqui um trecho de uma mensagem sobre o tema ‘O
artista e seu corpo’, enviada por mim ao professor Dr. Edson Claro.
Mon,30Jun-2003-09:40:23-0300
Professor, antes de qualquer coisa, desculpe a demora deste e-mail. Com sua
permissão, preciso voltar ao dia em que o Pierre fez sua defesa de doutora-
do. Após a bela defesa do Pierre, fiquei com uma pergunta que surgiu quan-
do, no pronunciamento da banca, João Batista Freire fez uma observação a
respeito da linguagem que aparece, às vezes, identificando a pessoa como
sendo o próprio corpo e outras vezes separando-a do corpo, mostrando-a
como uma espécie de proprietário do corpo físico, material. Por exemplo:
é comum e mesmo natural dizermos ‘minhas mãos’, ‘meus braços’, ‘minha
cabeça’ etc., ou seja, a linguagem sugere claramente a existência de um ‘eu’
Alexandre Magno Abreu de Góes
é Bacharel em Música (Violão
Erudito) pela Universidade Federal
do Rio Grande do Norte. É professor
na Escola de Música da UFRN.
Participa como pesquisador na Base
de Pesquisa Gecarte – Grupo de
Estudo em Corpo, Arte e Educação
– DEART/UFRN.
Divulgação Cefet/RN
Alexandre Magno, professor da
Escola de Música da UFRN
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
diferente do corpo, um ‘eu’ proprietário e
não um ‘eu corpo’. Este é um grande tema
e o princípio básico de toda ciência espiri-
tual contida na vastíssima literatura védica,
da qual a essência é o ‘Bhagavad-Gita’. Se
for possível compreender o ‘eu’ diferente
do corpo físico, iremos finalmente chegar à
conclusão de que as artes, como a música ou
a dança, não estão vindo do corpo, mas do
‘eu’ proprietário do corpo que canta, pro-
prietário do corpo que dança. E indo mais
além, iremos concluir que quando o corpo
fala ou simplesmente movimenta-se, não é
ele (o corpo) realmente quem o faz, mas
sim o ‘eu’ que, de certa forma, o habita e
o utiliza. O conhecimento ariano, além de
trazer informações precisas sobre o corpo
físico, define com muita propriedade o ‘eu’,
sua origem, constituição energética, carac-
terísticas, relação com o corpo físico etc. E
no Bhagavad-Gita a lição número um trata especialmente da diferença entre
o corpo material e o ‘eu’, certamente não material ou anti-material. É co-
mum, em palestras de sábios eruditos, ouvirmos a seguinte frase: ‘Nós não
somos estes corpos materiais’. ...
Acredito que essa compreensão acerca da diferença entre nós
mesmos e nossos corpos físicos pode contribuir positivamente
como uma grande ferramenta no processo ensino-aprendizagem da
música e, por que não dizer, da vida.
Entusiasmo
Encontramos, na Revista do Professor – Nova Escola – Edi-
ção Especial, 2003, uma citação do filósofo norte-americano John
Dewey que diz o seguinte sobre a importância do entusiasmo na
educação: “O professor que desperta entusiasmo em seus alunos conse-
guiu algo que nenhuma soma de métodos sistematizados, por mais cor-
retos que sejam, pode obter”. Penso que John Dewey foi muito feliz
nessa afirmação. Poderíamos comparar o entusiasmo a uma espécie
de chama que, uma vez acesa, pode reduzir a cinzas os diversos obs-
táculos que nos separam de nossas metas, lembrando aqui o caso do
jovem P.S. citado anteriormente. No exercício da educação musical,
quando estou com os alunos, que certamente chegaram à escola de
música movidos por um determinado grau de desejo de expressa-
rem-se musicalmente através do violão, procuro acender essa chama
de entusiasmo em cada um deles. Vale notar que, para acender uma
chama, é preciso que nossa própria chama esteja acesa, portanto, o
educador deve, antes de tudo, manter-se muito entusiasmado no
que faz. Se eu estiver entusiasmado e o aluno desejoso, criando-se
aquele ‘momento mágico’, naturalmente a outra chama acenderá e
será preciso cuidar para que ela permaneça acesa até o ponto em que
o aluno consiga mantê-la sozinho. Tenho muito interesse em que o
aluno logo conquiste essa autonomia.
Numa entrevista para a Revista Violão Intercâmbio, o professor e
violonista norte-americano John Holmquist, um dos mais aclamados
virtuoses do violão erudito dos EUA, falando de seu trabalho como
professor, diz que procura fazer com que ele mesmo se torne obso-
leto no primeiro momento possível e, para isso, começa o processo
de construção da independência dos alunos logo no princípio. Sua
Apresentação de uma das turmas
de extensão no pátio principal da
Escola de Música da UFRN
Alexandre Magno Abreu
37 - VERSO - 11:50:17 05/04/2007 -
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
técnica consiste em ensinar através de questões. E é o que tenho feito
em sala de aula: ao invés de entregar o conteúdo pronto, procuro
fazer perguntas para que os alunos possam pensar e assim chegar a
conclusões apropriadas. Por exemplo, tratando-se de posicionamento
da mão direita, após pedir-lhes que posicionem cada dedo sobre de-
terminada corda, evito dizer ‘o polegar deve ir mais adiante’, ou ‘recue
um pouco em direção ao cavalete os dedos indicador, médio e anular’.
Prefiro apontar um problema e pedir-lhes a solução: ‘Se o polegar e
indicador encontram-se na mesma linha vertical, o movimento do
primeiro para baixo poderá ser inibido pelo segundo e vice-e-versa.
Como resolver essa questão?’ Ao resolver o problema, o aluno de fato
se apodera deste saber. Este procedimento está de acordo com a abor-
dagem construtivista de Jean Piaget, que, além de procurar valorizar
a experiência do aluno, a sua cultura, também tem o mérito de propor
uma alternativa aos métodos diretivos tradicionais, que normalmente
buscam reproduzir e mecanizar gestos e modelos centrados na técni-
ca, repetir movimentos para automação, o que, infelizmente, acaba
produzindo um pobre acervo de possibilidades de respostas e ainda
pode gerar dependência, ausência de senso crítico e comprometimen-
to da autonomia do aluno. Segundo a abordagem construtivista, o
aluno constrói o seu conhecimento a partir da interação com o meio,
resolvendo problemas.
Afetividade e aprendizagem
Contemporâneo de Piaget, Henri Wallon, médico, psicólogo e
professor francês, oferece grande contribuição para professores e
gestores da educação, e para o aprimoramento da escola como lugar
do ensino e da aprendizagem de questões complexas, que envolvem
conteúdos cognitivos, afetivos e motores. Sua teoria pedagógica diz
que o desenvolvimento intelectual envolve muito mais do que um
simples cérebro, o que abalou as convicções numa época em que
memória e erudição eram o máximo em termos do conhecimen-
to. Para Henri Wallon, o processo ensino-aprendizagem é o recurso
fundamental do professor: sua compreensão e o papel da afetividade
nesse processo são elementos importantes para aumentar sua eficá-
cia. Afetividade refere-se à capacidade do ser humano de ser afetado
pelo mundo externo-interno, por sensações ligadas a tonalidades
agradáveis ou desagradáveis. Emoção, sentimento e paixão são três
momentos marcantes e sucessivos na evolução da afetividade. Emo-
ção é a exteriorização da afetividade, sua expressão corporal, motora,
fisiológica. O sentimento não implica reações instantâneas e diretas
como na emoção, mas corresponde à expressão que representa a afe-
tividade e pode ser expresso pela mímica e pela linguagem. O adulto
tem maiores recursos de expressão representacional afetiva: observa,
reflete antes de agir, sabe onde, como e quando se expressar e pode
traduzir intelectualmente seus motivos ou circunstâncias. A paixão
revela o aparecimento do autocontrole para dominar uma situação,
caracterizando-se por ciúme, exigências, exclusividade. O contato
com alunos no exercício ensino-aprendizagem, especialmente quan-
do se diz respeito ao ensino de artes, ou mais especificamente, de
música, põe a nós, professores e alunos, diante de uma variedade de
efeitos psicológicos provenientes da afetividade, e trabalhar apro-
priadamente tais efeitos – emoções, sentimentos e paixões – será um
grande diferencial na vida de um profissional da educação musical e
mesmo na educação de uma forma generalizada.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Artigos
Cuidados especiais
Neste ponto, quero chamar a atenção para o perigo da fadiga, não
só no aluno, mas também no professor. Caso não perceba a fadiga nos
alunos, o professor corre o risco de se deparar com uma explosão ines-
perada e surpreendente. Lembro que numa das primeiras turmas de ex-
tensão, enquanto falava sobre intervalos, fui subitamente interrompido
por uma aluna: ‘Por favor, a gente passa o dia trabalhando, esperando
encontrar aqui um momento para relaxar com a música e agora temos
que fazer esses cálculos enjoados?’ Preferi não parar o assunto de re-
pente, já que havia interesse por parte de outros alunos. Aproximei-me
dela procurando reduzir aquela tensão e entendê-la melhor. Embora a
moça tenha se acalmado um pouco, meu esforço não foi suficiente para
mantê-la até o fim do curso. Certamente esse foi um caso de explosão
devido à fadiga, onde falhei por não percebê-la a tempo. A partir daí,
passei a ter mais cuidado com o comportamento dos alunos e a obser-
vá-los melhor, procurando ler com respeito suas emoções, sentimentos
e paixões, a fim de ajudá-los a avançar.
O aluno pode sentir-se fatigado por falta de sono devido à TV, café
da manhã insuficiente, um instrumento inferior ou problemático, ex-
cesso de atividades extra-escolares, ou ainda por fatores poderosos, de
ordem psicológica, como o medo do professor, o desentendimento
com um professor ou colega, o medo de fracassar, a expectativa ex-
cessiva dos pais quanto aos resultados. Ao perceber qualquer efeito
negativo no comportamento da turma, é bom estar preparado para
fazer mudanças. Particularmente, adoto algumas medidas como: pro-
curar olhar os alunos de frente; entrar em contato com eles antes
mesmo de começar a aula, tomar alguns minutos antes da aula para
concentração, relaxamento, respiração; utilizar alguns minutos antes
do final da aula para conversar com os alunos e ver em que estado de
espírito eles saem da aula; ficar atento ao tom da voz enquanto falo
com eles. Essas são algumas medidas que realmente funcionam.
Considerações finais
‘Momentos mágicos’ não acontecem todo dia, mas, de fato, acon-
tecem, e por mais curtos que sejam, podem definir uma relação muito
favorável ao processo ensino-aprendizagem. Um surfista aguarda pa-
cientemente pela onda ideal. Ele permanece atento, observando o mar,
sabendo que a qualquer momento aquela onda virá. Ele sabe que tem
que estar pronto para aproveitá-la ao máximo assim que ela chegue.
O entusiasmo que ganha numa única onda dessas poderá mantê-lo
com forte determinação por muito tempo em sua prática esportiva.
Assim, enquanto exercemos essa função pedagógica, o ‘momento má-
gico’ pode ser comparado à experiência do surfista numa dessas ondas
especiais: precisamos estar prontos para aproveitá-lo ao máximo. Cada
‘momento mágico’ é prazeroso para professores e alunos, e é suficiente-
mente potente para gerar grandes doses de entusiasmo e determinação,
qualidades indispensáveis no exercício da pedagogia.
REFERÊNCIAS
GRANDES PENSADORES, Revista Nova Escola: a revista do professor, Edição
Especial, Abril, 2003.
MEMÓRIA DA PEDAGOGIA, Revista Viver, Mente & Cérebro nº 6 – Perspectivas
para um novo milênio, Duetto.
VIOLÃO INTERCÂMBIO, Revista nº 42 – Ano VII, Jul/Ago 2000.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
Gincana de leitura
NEIVA, Luciana F. de O.
Centro Federal de Educação Tecnológica do Piauí / Unidade Descentralizada de Floriano
Durante os anos de 2003 e 2004 e 2006, foi desenvolvido, em nossa escola,
o projeto Gincana de Leitura, que teve como objetivo levar os alunos a lerem
efetivamente e a tornarem-se co-autores dos textos lidos ao reproduzi-los atra-
vés de diversas tarefas como: representando, dançando, parodiando, notician-
do, resumindo, desfilando, confeccionando maquetes, julgando, escrevendo
cartas ao autor do livro, entre outras atividades.
Marcada a data para um mês e meio após a divulgação, as apresentações
foram feitas uma vez por semana, em sala de aula, durante seis semanas con-
secutivas; não podendo uma mesma equipe (num total de quatro por turma)
repetir a obra e a forma de apresentá-la. Cada uma tinha uma cor como iden-
tificação. Poderia ser uma camiseta, feita exclusivamente para a gincana (forma
preferida dos alunos), um lenço no pescoço, uma bandeira ou um laço de fita
preso por um broche na farda escolar.
O tempo disponível de duas aulas de cinqüenta minutos era distribuído da
seguinte forma: quinze minutos, no início, para a troca das roupas de todos os alu-
nos, organização do espaço da sala de aula e do cenário da primeira equipe. Assim,
todos assistiam às atividades, só mudando os cenários entre uma e outra apresen-
tação. O tempo, estipulado previamente para cada grupo, era de quinze minutos e,
ao término, ainda restavam dez a quinze minutos para a avaliação geral.
Fotos: Luciana Neiva
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Resumos Estendidos, Relatos de Experiência e Práticas Pedagógicas
Os critérios de avaliação – pontualidade, resumo oral, vestuário,
cenário, entrosamento dos membros da equipe e desenvolvimento
da atividade – totalizavam 100 pontos. A cada apresentação, uma
equipe era escolhida como a melhor do dia e ganhava mais 10 pon-
tos. Essa escolha era feita pela professora e pelos alunos, e quando
“o clima esquentava” (geralmente após a terceira semana), convi-
dávamos alunos de outras turmas e professores para assistirem às
apresentações e escolherem a melhor.
No ano de 2003, foram trabalhados dez livros do Realismo/Na-
turalismo; em 2004, dez livros do Romantismo brasileiro; e, em
2006, livros de ambas as escolas. Percebeu-se um entusiasmo maior
dos alunos pelos livros do Realismo/Naturalismo. A identificação
com a realidade retratada, captada através do conhecimento de
mundo e do tipo de linguagem utilizada, no caso, a coloquial, fez
com que eles se interessassem mais pela leitura dos romances realis-
tas. Na visão dos discentes, os romances românticos são considera-
dos “água-com-açúcar”, idealizados demais e com uma linguagem
muito detalhada, tornando a leitura cansativa.
Foi surpreendente, em todas as gincanas, como a criatividade dos
alunos aflorava e outras atividades, que não as sugeridas pelo projeto,
iam sendo incorporadas à gincana, como: teatro de fantoches, progra-
mas de auditório, simulação de cartas respondidas aos alunos pelos au-
tores dos livros etc., tudo contextualizado a partir do enredo do livro.
Ao final da gincana, os trabalhos foram compilados através de
uma amostra de cada obra e tarefa diferentes para os pais, alunos
e comunidade local. A apresentação final ocorreu no auditório de
nossa escola, onde foi colocado um mural à entrada, constando to-
Tarefa entrevistando a obra “Dom Casmurro”
Tarefa representando a obra “O Cortiço”
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
das as tarefas escritas, como cartas, paródias, desenhos em quadri-
nhos e fotos ilustrando cada dia de apresentação em sala de aula.
As tarefas orais e de expressão corporal foram apresentadas
no palco por todas as equipes. Antes de cada apresentação, um(a)
aluno(a) fazia um breve resumo oral sobre a obra que seria traba-
lhada a seguir, permitindo aos interlocutores interagirem melhor,
ao mesmo tempo que os educandos desenvolviam a habilidade de
parafrasear livros inteiros oralmente.
As equipes vencedoras de cada ano ganharam uma viagem à
capital do estado do Piauí, a fim de visitar os pontos turísticos e
culturais de Teresina.
Ficou claro que, durante a execução do projeto, o envolvimento
com cada obra ocorreu efetivamente, por haver uma atividade a
executar a posteriori. E, ao reconstruírem o texto, através das diver-
sas tarefas, os alunos estavam automaticamente construindo sentido
através da interação, utilizando a mesma língua, mas com produção
e interpretação diferentes.
Na visão dos discentes, essa foi a melhor forma de aprender
literatura e de desenvolver o prazer pela leitura e pela escrita.
Para eles, além do alcance dos objetivos propostos, o projeto
propiciou a socialização do conhecimento de forma agradável e
inesquecível, já que viveram, durante várias semanas, momentos
de verdadeira “orgia intelectual”.
Tarefa representando a obra “O Primo Basílio”
Tarefa parodiando a obra “O Alienista”
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
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Resumos Estendidos, Relatos de Experiência e Práticas Pedagógicas
Há projetos que nascem de sonhos e que viram realidade. Na
verdade, o livro “Biotecnologia em Ação” não nasceu de um sonho
e sim de uma necessidade real de encontrar textos atualizados e sig-
nificativos como base de estudo em sala de aula. Como professora
de Inglês do Curso Técnico em Biotecnologia, defrontei-me com a
carência de textos informativos de caráter técnico como apoio teó-
rico para as minhas aulas.
A leitura contínua e sistemática do Caderno Vida, editado sema-
nalmente pelo Jornal Zero Hora de Porto Alegre, com publicações
aos sábados, serviu como ponto de partida para a realização desse
projeto, uma vez que os textos contêm assuntos enriquecedores e
bastante atualizados no campo da Biotecnologia. Após a seleção
de um conjunto de artigos sobre temas relevantes à área, partiu-se
para o delicado trabalho de versão para o idioma inglês, o que veio
a resultar essa obra bilíngüe.
Nas aulas de Língua Inglesa, com o apoio do professor e o au-
xílio de dicionários e gramáticas específicas, os alunos do segundo
semestre de Biotecnologia, do ano de 2005, realizaram as traduções
Um livro bilíngüe como
resultado de projeto integrado
MENDA, Leniza K.; GRIEBLER, Ana C. de F.; LORENTZ, Kátia B.
Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Fotos: Kátia Lorentz
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
dos textos cuja temática centrava-se nos campos da saúde, alimenta-
ção com produtos transgênicos, clonagem, genética e áreas afins.
Fomos até o Jornal Zero Hora para solicitar licença para a tradução
dos artigos com as suas respectivas referências e prontamente obtive-
mos a permissão. O engajamento e o entusiasmo dos alunos do Curso
de Biotecnologia, à medida que as traduções eram feitas, foram decisi-
vos para o projeto de elaboração e confecção do livro bilíngüe, que foi
intitulado “Biotecnologia em Ação” - “Biotechnology in Action”.
Após, teve início a participação do Curso Técnico em Bi-
blioteconomia, que ficou encarregado, em um primeiro momento,
da confecção das referências bibliográficas dos artigos selecionados.
Para isso, um grupo de alunos foi até o arquivo do jornal Zero Hora
para complementar os dados necessários. Após todo o material reu-
nido, digitado e revisado, passou-se à montagem do livro. Definido
o número de páginas, foi feito o levantamento de custos e a compra
do material necessário para a encadernação.
O processo de encadernação pode ser descrito como um traba-
lho simples, de encadernação capa dura. A impressão do livro foi
feita em papel reciclado 75g, em forma de cadernos, com costura.
Usamos uma linha 100% algodão e guardas de papel pintado arte-
sanalmente. O papelão utilizado para as capas foi o marrom, tipo
Bruno, e o revestimento foi feito com percalux da cor preta. Finali-
zamos o livro com a inserção, na capa, de uma impressão no mesmo
papel do miolo com as informações a respeito da publicação.
Cabe ressaltar que o nosso projeto de integração recebeu o apoio
da direção da Escola Técnica, através do pronto acolhimento da
idéia e do financiamento do mesmo. Esse trabalho mostrou-se mui-
to satisfatório e, certamente, servirá de estímulo para a realização de
novos empreendimentos similares.
Projeto Integrado dos Cursos Técnico em Biotecnologia e Biblioteconomia
Agradecimentos: Sr. Ricardo Stefanelli, jornal Zero Hora
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Resumos Estendidos, Relatos de Experiência e Práticas Pedagógicas
Fotos: Romildo José de Souza
Exposição dialogada: aprender em sala de aula
SOUZA, Romildo J. de
Centro Federal de Educação Tecnológica de Alagoas
O professor de ensino profissional sempre leciona técnicas de
trabalhos em suas atividades de ensino, porém, poucos inovam em
suas aulas, utilizando, para isso, técnicas de ensino. Técnicas de en-
sino, para o professor, são como as técnicas de trabalho para os
alunos. Dominando-as, tanto o professor (ensino) como o aluno
(trabalho) terão bom desempenho em suas atividades. Vale ressaltar
que o trabalho do professor consiste em fazer o aluno aprender e,
principalmente, ensiná-lo a aprender.
Portanto, esse relato tem a finalidade de descrever uma prática
didático-pedagógica da unidade curricular Executar obras de cons-
trução, manutenção e conservação (projeto), do Curso Superior de
Tecnologia em Urbanização, do Centro Federal de Educação Tecno-
lógica de Alagoas. Esta unidade curricular pertence ao quarto mó-
dulo do curso e foi lecionada no segundo semestre do ano de 2005.
Este curso tem como prática pedagógica, descrita no seu Plano de
Curso, a Pedagogia de Projeto.
A unidade curricular em estudo tem carga horária de 17 horas
e seu objetivo é tornar o aluno competente em leitura de proje-
tos de engenharia, tanto na parte gráfica, os desenhos, como na
parte descritiva, as especificações.
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
A metodologia de ensino-apredizagem da unidade curricular
baseia-se no método sócio-individualizado que consiste em tra-
balhar a aquisição do conhecimento de forma individualizada e,
posteriormente, socializar este conhecimento. Este método pro-
porciona o uso de várias técnicas de ensino e a técnica utilizada
foi a exposição dialogada, que consiste em expor e debater os
conteúdos estudados.
Para o desenvolvimento do trabalho foi elaborado o seguinte
roteiro: (a) exposição da base tecnológica da unidade curricular; (b)
definição dos temas a serem pesquisados; (c) levantamento dos ór-
gãos públicos que trabalhavam com o tema; (d) explicação da técni-
ca ‘exposição dialogada’; (e) levantamento dos dados e (f) debate.
O levantamento dos dados foi a etapa do roteiro, que caracteri-
zou a busca pelo conhecimento e foi realizado de forma individual.
Após a realização dos levantamentos de dados junto aos órgãos pú-
blicos, foi iniciada a etapa de socialização dos conhecimentos, deno-
minada debate. No debate, os dados levantados foram expostos com
o uso de um projetor multimídia, dando início aos diálogos. Dentre
os diálogos surgidos, destacamos dois tipos. O primeiro refere-se
ao curso, do qual se pode destacar: “no curso está faltando a inter-
disciplinaridade”, “os professores não têm paciência e acham que
já sabemos tudo”, “estamos no curso para aprender” e o segundo
tipo refere-se à motivação do aprender: “temos que aprender, pois
os órgãos públicos são muito desorganizados”, “o uso dessa técnica
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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
83
Resumos Estendidos, Relatos de Experiência e Práticas Pedagógicas
motiva mais o aluno”, “agora eu sei como aprender”, “aprendi que
o conhecimento pode ser adquirido de muitas formas e que eu pos-
so aprender sozinho, sem a ajuda do professor”.
Como resultado da exposição dialogada, foram levantadas as
seguintes constatações: a pedagogia de projeto não é a prática
pedagógica adotada pelos professores do curso; as unidades cur-
riculares são lecionadas de forma isolada, sem interdisciplinari-
dade; os órgãos públicos não possuem uma padronização técnica
conforme ensinada no Cefet/AL.
Revendo o objetivo da unidade curricular, ficou constatado
que os alunos tornaram-se competentes em leitura de projeto de
engenharia. Também extrapolaram quando sugeriram a reestru-
turação do curso, para que o mesmo utilizasse como proposta
pedagógica a pedagogia de projetos e a padronização de infor-
mações técnicas através da cooperação técnica entre o Cefet/AL
e os órgãos públicos envolvidos.
Essa experiência, que será colocada em prática por outros pro-
fessores do curso no segundo semestre de 2006, evidenciou que
o ensino, a partir do uso de métodos e técnicas acessíveis e de
fácil domínio pelo professor, pode tornar a aprendizagem mais
atrativa para o aluno. Desta forma, diante do resultado obtido,
ficou a convicção de que ensinar a aprender é a melhor prática
pedagógica de um professor de ensino profissional.
42 - VERSO - 11:50:17 05/04/2007 -
CONTATOS
Contatos
84
CADERNOS TEMÁTICOS Nº 13 JAN. 2007
AL
Cinema e multiculturalismo: como a
escola pode devorar o King Kong das
telas a partir da intertextualidade
Angela Baraldi Pacheco
Design em catálogo iconográfico:
os (des)caminhos da imaterialidade
Rossana Viana Gaia
João Luiz do Nascimento Maia
Áurea Luiza Quixabeira Rosa e Silva Raposo
Débora Pereira Vital
Exposição dialogada:
aprender em sala de aula
Romildo José de Souza
romildosouza@yahoo.com.br
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Alagoas
Rua Barão de Atalaia, s/nº – Centro
Maceió/AL – CEP: 57020-510
Tel.: (82) 3326-4351/3221-4205
Fax: (82) 3221-9786
Home page: www.cefet-al.br
Um concurso de mosaicos
focalizando pavimentações e simetrias
Auxiliadora Baraldi Pacheco
Ariadne Aguiar Vitório de Mendonça
Aderbal Correia da Silva Filho
Escola Agrotécnica Federal de Satuba
Rua 17 de Agosto, s/nº - Centro
Satuba/AL – CEP: 57120-000
Tel.: (82) 3266-1142
Fax: (82) 3266-1142 R. 11
BA
O léxico da agricultura
na interação verbal
Simone Maria Rocha Oliveira
Escola Agrotécnica Federal de Catu
Rua Barão de Camaçari, 118 – Centro
Catu/BA – CEP: 48110-000
Tel.: (71) 3641-1043
Fax: (71) 3641-1360/3641-2737
E-mail: eaf[email protected]
Home page: www.eafcatu.hpg.com.br
GO
Linguagem de sinais a distância
Paulo Francinete
pfsj@cefetgo.br
Soraya Bianca Reis Duarte
fgasoraya@yahoo.com.br
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Goiás
Rua 75, Nº 46 – Setor Central
Goiânia/GO – CEP: 74055-110
Tel.: (62) 3212-5050
Fax: (62) 3213-1451
e-mail: info@cefetgo.br
MG
Integração através do esporte
Francisco Henrique Duarte Filho
Escola Agrotécnica Federal
de Belo Jardim
Estrada de Serra do Vento, Km 03
Sítio Travessão – São Pedro
Belo Jardim/PE – CEP: 55150-000
Tel.: (81) 3726-1355/1773/1735
Fax: (81) 3726-1567
Tecnologia da linguagem: uma
perspectiva de recontextualização
Maria Elizabeth Rodrigues
betrodri_ctu@yahoo.com.br
Colégio Técnico Universitário UFJF
Rua Bernardo Mascarenhas, 1283 - Fábrica
Juiz de Fora/MG – CEP: 36080-001
Tel.: (32) 3229-7508/7502
Fax: (32) 3229-7500
PE
Tabuleiros e vassourinhas
Antônio José de Oliveira
Kênio de Salles Menezes
Valésio Pinto
História marcada pela música
Maciel Henrique Carneiro da Silva
Centro Federal de Educação
Tecnológica de Pernambuco
Av. Prof Luiz Freire, 500 – Cidade
Universitária, Recife/PE – CEP: 50740-540
Tel.: (81) 2125-1600/1604
Fax: (81) 2125-1674
Home page: www.cefetpe.br
PI
Gincana de leitura
Luciana Franco de Oliveira Neiva
rneivaluci@yahoo.com.br
Unidade de Ensino
Descentralizada de Floriano
Rua Francisco Urquiza Machado, 462
Meladão, Floriano/PI – CEP: 64800-000
Tel.: (89) 3515-2234/2239
Fax: (86) 3515-2234
E-mail: [email protected]/turismo
Home page: www.cefetpi.br
RN
Brinquedos e brincadeiras da cultura
popular potiguar
Lerson Fernando dos Santos Maia
Marcus Vinicius de Faria Oliveira
Tânia Costa
Caroline Cristina de Arruda Campos
carolzita_campos@yahoo.com.br
Priscilia Janaína Dantas de Lima
Vivianne Limeira Azevedo Gomes
Divagando sobre o “devagar
da educação: carta aberta
a uma colega professora
Manoel Lopes Costa
A arte visual no ensino fundamental:
considerações e possibilidades
Francy Izanny de Brito Barbosa Martins
Centro Federal de Educação
Tecnológica do Rio Grande do Norte
Av. Senador Salgado Filho, 1559 – Tirol
Natal/RN – CEP: 59015-000
Tel.: (84) 4005-2600
Fax: (84) 4005-9728
E-mail: [email protected] &nbs
Um toque humano na pedagogia musical
Alexandre Magno Abreu de Góes
Escola de Música da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte
Av. Passeio dos Girassóis, Campus
Universitário, Lagoa Nova – Natal/RN
CEP: 59078-190
Tel.: (84) 3215-3605
Fax: (84) 3215-3633
Home page: www.emusica.ufrn.br
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resultado de projeto integrado
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Kátia Becker Lorentz
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Federal do Rio Grande do Sul
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Tel.: (51) 3316-5084/5172/5110
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