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COLEÇÃO PROINFANTIL
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COLEÇÃO PROINFANTIL
MÓDULO II
unidade 6
livro de estudo - vol. 2
Karina Rizek Lopes (Org.)
Roseana Pereira Mendes (Org.)
Vitória Líbia Barreto de Faria (Org.)
Brasília 2005
Ministério da Educação
Secretaria de Educação Básica
Secretaria de Educação a Distância
Programa de Formação Inicial para Professores em Exercício na Educação Infantil
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Livro de estudo: Módulo II / Karina Rizek Lopes, Roseana Pereira Mendes, Vitória Líbia
Barreto de Faria, organizadoras. – Brasília: MEC. Secretaria de Educação Básica.
Secretaria de Educação a Distância, 2005.
62p. (Coleção PROINFANTIL; Unidade 6)
1. Educação de crianças. 2. Programa de Formação de Professores de Educação
Infantil. I. Lopes, Karina Rizek. II. Mendes, Roseana Pereira. III. Faria, Vitória Líbia
Barreto de.
CDD: 372.2
CDU: 372.4
Ficha Catalográfica – Maria Aparecida Duarte – CRB 6/1047
L788
Diretora de Políticas da Educação Infantil e do Ensino Fundamental
Jeanete Beauchamp
Diretora de Produção e Capacitação de Programas em EAD
Carmen Moreira de Castro Neves
Coordenadoras Nacionais do PROINFANTIL
Karina Rizek Lopes
Luciane Sá de Andrade
Equipe Nacional de Colaboradores do PROINFANTIL
Adonias de Melo Jr., Amaliair Attalah, Amanda Leal, Ana Paula Bulhões, André Martins, Anna Carolina
Rocha, Anne Silva, Aristeu de Oliveira Jr., Áurea Bartoli, Ideli Ricchiero, Jane Pinheiro, Jarbas Mendonça, José
Pereira Santana Junior, Josué de Araújo, Joyce Almeida, Juliana Andrade, Karina Menezes, Liliane Santos,
Lucas Passarela, Luciana Fonseca, Magda Patrícia Müller Lopes, Marta Clemente, Neidimar Cardoso Neves,
Raimundo Aires, Roseana Pereira Mendes, Rosilene Silva, Stela Maris Lagos Oliveira, Suzi Vargas, Vanya
Barbosa, Vitória Líbia Barreto de Faria, Viviane Fernandes
Coordenação Pedagógica
Roseana Pereira Mendes, Vitória Líbia Barreto de Faria
Assessoria Pedagógica
Sônia Kramer, Anelise Monteiro do Nascimento, Claudia de Oliveira Fernandes, Hilda Aparecida Linhares da Silva
Micarello, Lêda Maria da Fonseca, Luiz Cavalieri Bazilio, Regina Maria Cabral Carvalho, Silvia Néli Falcão Barbosa
Consultoria do PROINFANTIL – Módulo II
Eliane Fazolo Spalding, Telma Vitória
Autoria
Adriane Ogêda Guedes, Anakeila de Barros Stauffer, Anelise Monteiro do Nascimento, Daniela de Oliveira Guimarães,
Eliane Fazolo Spalding, Kátia de Souza Amorim, Leonardo Vilela de Castro, Núbia de Oliveira Santos, Roxane Helena
Rodrigues Rojo, Sílvia Néli Falcão Barbosa, Telma Vitória, Vasthi Serra, Zilma Moraes Ramos de Oliveira
Projeto Gráfico, Editoração e Revisão
Editora Perffil
Coordenação Técnica da Editora Perffil
Carmen de Paula Cardinali, Leticia de Paula Cardinali
Desenhos em Aquarela
Cláudio Martins
As imagens das obras da artista plástica Sandra Guinle pertencem à série “Cenas Infantis”, a qual faz parte de um
projeto social mundial da IBM chamado “Reinventando a Educação”. www.ibmcomunidade.com/cenasinfantis
MÓDULO II
unidade 6
livro de estudo - vol. 2
Programa de Formação
Inicial para Professores
em Exercício na Educação Infantil
SUMÁRIO
B - ESTUDO DE TEMAS
ESPECÍFICOS 8
FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃOFUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO
FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃOFUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO
FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO
O DESENVOLVIMENTO E A CONSTRUÇÃO DA LINGUAGEM............. 9
Seção 1 A aquisição da linguagem oral pela criança.................... 10
Seção 2 – Falar e pensar................................................................... 17
Seção 3 – Linguagem e subjetividade ............................................. 22
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICOORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICOORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO
A LINGUAGEM NO COTIDIANO/
AS MUITAS LINGUAGENS DA CRIANÇA...........................................
31
Seção 1 – Linguagem e representação ........................................... 33
Seção 2 – A narrativa e a leitura de histórias:
o letramento no cotidiano da criança............................
42
Seção 3 A pré-história da escrita: o papel do jogo,
da ficção e das imagens na constituição
simbólica e emocional da criança ...................................
47
c – ATIVIDADES INTEGRADoraS 60
8
b - ESTUDO DE TEMAS ESPECÍFICOS
8
9
Fundamentos da Educação
o desenvolvimento e a construção
da linguagem
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Carlos Drummond de Andrade
1
1
Carlos Drummond de Andrade é um dos maiores poetas brasileiros. Nasceu em Itabira/MG, em 1902, e
morreu em 1987.
10
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-
-
ABRINDO NOSSO DIÁLOGOABRINDO NOSSO DIÁLOGO
ABRINDO NOSSO DIÁLOGOABRINDO NOSSO DIÁLOGO
ABRINDO NOSSO DIÁLOGO
Olá, professor(a)!
Aqui estamos mais uma vez com um instigante e interessante tema que poderá
contribuir para sua formação, como tudo que tratamos até aqui. Como temos visto
nos textos estudados, o desenvolvimento é um processo que se dá ao longo de toda a
vida. Assim, nós também temos muito a aprender. Nesta sexta unidade do Módulo II, o
tema central é a linguagem. Esse não é um assunto novo para você. Afinal de contas, a
linguagem é fruto de nossas interações sociais.
DEFININDO NOSSO PONTO DE CHEGADA
Professor(a), estes são os objetivos desta área temática:
1. Compreender, a partir dos estudos da área da psicolingüística, as implicações
de uma visão sócio-construtivista sobre o desenvolvimento da linguagem
para a prática pedagógica nas instituições de Educação Infantil.
2. Compreender a relação entre pensamento e linguagem e as funções da linguagem.
3. Discutir como se dá a constituição do sujeito na linguagem.
CONSTRUINDO NOSSA APRENDIZAGEM
Esta área temática está organizada em três seções. Na primeira – “A aquisição da
linguagem oral pela criança” – conheceremos algumas contribuições da psicolingüística
para que possamos compreender o processo de aquisição da linguagem oral pela criança.
Debateremos as implicações de uma visão sócio-construtivista sobre o desenvolvimento
da linguagem no trabalho realizado nas instituições de Educação Infantil. Na segunda
seção – “Falar e pensar” – buscaremos elementos teóricos para compreender a relação
entre pensamento e linguagem e para compreender a língua como instrumento de
comunicação e construção de conhecimento. Na terceira e última seção – “Linguagem
e subjetividade” – discutiremos como se dá a constituição do sujeito na linguagem.
Seção 1 – A aquisição da linguagem oral pela criança
Objetivo a ser alcançado nesta seção:
– Compreender , a partir dos estudos da área da
psicolingüística, as implicações de uma visão sócio-
construtivista sobre o desenvolvimento da linguagem para
a prática pedagógica nas instituições de Educação Infantil.
11
Vamos começar a seção fazendo um exercício.
Atividade 1
O que vem à mente quando você ouve a palavra linguagem? Você pode utilizar
o seu caderno para anotar suas idéias.
A palavra linguagem nos remete a muitas outras palavras. Segundo o dicionário Houaiss,
linguagem é “qualquer meio sistemático de comunicar idéias, os sentimentos
convencionais, sonoros, gráficos, gestuais”. A partir desta definição, podemos concluir
que todos estamos envolvidos com a linguagem de uma maneira direta. Pesquisando o
tema “linguagem” no Dicionário de Citações Nova Fronteira, encontramos a seguinte
frase, dita por Nobert Wienar:
“A linguagem é um jogo conjunto, de quem fala e de quem ouve, contra as
forças da confusão.”
A situação descrita a seguir pode ajudar a compreender a frase de Wienar:
Rosa e Helena são duas professoras que trabalham na mesma escola. Quando
Rosa vai visitar sua mãe, após a aula, pega uma carona com Helena. Sabendo que
Helena faz a mesma trajetória todos os dias, Rosa pergunta:
– Helena, tem carona hoje?
– Não, responde Helena.
Rosa, então, pega a sua bolsa e se dirige ao ponto de ônibus. No meio do caminho,
é interrompida pelas seguintes perguntas:
– Aonde você vai? Você não ia de carona comigo?
Rosa responde que iria de ônibus, pois a amiga havia avisado que “não tinha
carona”. Helena, ao ouvir as palavras de Rosa começa a rir e explica: eu disse que
eu não tinha carona, que não tinha ninguém para ir comigo, que tinha lugar no
carro para você. As duas riem do ocorrido e caminham em direção ao carro.
12
Essa situação parece ilustrar a citação de Nobert Wienar. O mal-entendido entre as
professoras estava relacionado à interpretação que cada uma estava dando para a
situação. Nesse sentido, é na comunicação que, ao compartilharmos nossas
interpretações sobre o mundo, criamos um código que orienta as relações entre as
pessoas. Cabe destacar que essas interpretações se constroem a partir das experiências
vividas pelos indivíduos e da situação em que se dá a comunicação.
Ao longo dos anos, muitos estudiosos de diferentes áreas do conhecimento vêm se
dedicando ao fenômeno da linguagem. Teremos contato com alguns deles nessa
unidade.
As situações de interação a partir da linguagem fazem parte do cotidiano das instituições
de Educação Infantil. Deste modo, é importante que pensemos um pouco sobre como
se dão os processos que contribuem para que as crianças se apropriem da língua e
quais são as oportunidades que podemos criar na escola para que ela seja um espaço
do uso e do contato com diferentes linguagens produzidas historicamente.
Voltando às definições expostas anteriormente, podemos dizer que a linguagem se
constitui nas relações sociais, nas interações entre as pessoas.
Para melhor compreender como esse processo se dá, vamos conhecer a história de
Nicolau? Esta história faz parte da obra da escritora paulista Ruth Rocha.
Nicolau tinha uma idéia
“Era uma vez um lugar onde cada pessoa só tinha uma idéia na cabeça.
João tinha uma idéia assim: #######
Maria tinha uma idéia assim: *********
Pedro tinha uma idéia desse jeito: !!!!!!!!!!!
E Manuela tinha uma idéia desse jeitinho: +++++++++
Um dia apareceu um homem chamado Nicolau.
A idéia de Nicolau era assim: ????????
Logo que Nicolau chegou, foi procurar João.
E contou sua idéia a ele.
E João ficou com duas idéias na cabeça: # ? # ? # ?
João contou a idéia dele para Nicolau.
E Nicolau ficou com duas idéias na cabeça. ## ? ## ? ##
Aí, Nicolau foi contar sua idéia para Maria.
E Maria ficou com duas idéias na cabeça. ****?*****?
E contou a Nicolau a idéia dela.
Nicolau ficou com três idéias na cabeça. ???****###???****###
13
Nicolau falou com Pedro,
Com Manuela
E uma porção de gente mais.
Nicolau ficou cheio de idéias.
E as idéias de Nicolau começaram a se misturar
Umas com as outras e a formar
Muitas outras idéias.
Então, as pessoas começaram a achar que era
Muito divertido ter muitas idéia na cabeça.
Começaram a procurar Nicolau para ele
Contar as idéias que ele agora tinha.
E todo mundo foi ficando com uma porção de idéias na cabeça.
Aí, cada um resolveu trazer os filhos para o Nicolau contar suas idéias.
Nicolau teve que arranjar
Um lugar grande, onde
Ele pudesse contar às
Crianças as suas idéias.
E naquele lugar, agora, todo mundo tem
Uma porção de idéias.
Como você, que também conversa com os outros,
Ouve as idéias deles e aprende uma porção
De idéias na escola.”
Ruth Rocha
14
Atividade 2
a) Como você resumiria, em poucas linhas, a história de Nicolau?
b) Você acha que as instituições de Educação Infantil podem ser um lugar
onde as crianças contem suas idéias? O que é necessário para que isso seja
possível? Seria interessante discutir suas opiniões com os(as) colegas do
PROINFANTIL no próximo encontro quinzenal.
A linguagem é um sistema simbólico que se constitui socialmente. A construção
de uma língua que pudesse favorecer a comunicação e expressão dos homens só foi
possível devido ao equipamento anatômico e neurofisiológico adaptado aos órgãos do
aparelho fonador e ao sistema nervoso central que os seres humanos têm. Mas o que
faz com que essa estrutura funcione é o fato de sermos seres essencialmente sociais.
Até mesmo a formação deste equipamento anatômico só foi possível porque o homem
é um ser social. As necessidades de comunicação entre os seres humanos, motivadas
pelas necessidades de sobrevivência dos grupos humanos, fizeram com que, ao longo
do processo de evolução da espécie humana, o aparelho fonador fosse se aprimorando,
o que permitiu, por sua vez, uma comunicação cada vez mais eficaz.
Nos primeiros meses de vida, não existe, por parte do bebê, a intenção de se comunicar.
Sua interação com o meio é, nesse período, movida por fatores biológicos, instintivos.
Entretanto, à medida que os primeiros sons dos bebês são motivos de comemorações
para os adultos, que são capazes de encontrar sentidos em balbucios e sílabas soltas –
um “ma-ma” é entendido como mamãe, o “a-a-a” como água e outros tantos
significados vão sendo atribuídos aos sons e aos gestos – isto vai motivando o bebê a
se comunicar, inserindo-o na língua utilizada por aqueles que o rodeiam. Assim, as
crianças vão se apropriando, progressivamente, dos modos de comunicação próprios
da cultura na qual elas estão inseridas. Portanto, somente na interação, quando os
signos e significados culturais vão sendo internalizados, é que se inicia uma relação
entre linguagem e consciência.
15
Para compreender como as interações com o meio vão construindo nossa maneira
de perceber o mundo, seria bom nos lembrarmos do exemplo dado pelo psicólogo
russo Lev Vygotsky com relação ao ato de apontar. Já vimos este assunto em
outras unidades, mas vale a pena recordar: Vygotsky utiliza o exemplo do gesto
de apontar para mostrar como aquilo que é vivido no plano interpessoal (entre
pessoas) se transforma em intrapessoal (passa a constituir a consciência da pessoa).
Inicialmente, esse gesto de apontar não é nada mais do que uma tentativa sem
sucesso de pegar alguma coisa, um movimento dirigido para um certo objeto, que
desencadeia a atividade de aproximação. A criança tenta pegar um objeto colocado
além de seu alcance. Suas mãos, esticadas em direção àquele objeto, permanecem
paradas no ar. Seus dedos fazem movimentos que lembram o pegar. Nesse estágio
inicial, o apontar é representado pelo movimento da criança, movimento este que
faz parecer que a criança está apontando um objeto – nada mais que isso.
Quando a mãe vem em ajuda da criança e nota que o seu movimento indica
alguma coisa, a situação muda fundamentalmente. O apontar torna-se um gesto
para os outros. A tentativa mal-sucedida da criança engendra uma reação, não
do objeto que ela procura, mas de uma outra pessoa. Conseqüentemente, o
significado primário daquele movimento mal-sucedido de pegar é estabelecido
por outros. Somente mais tarde, quando a criança pode associar o seu movimento
à situação objetiva como um todo, é que ela, de fato, começa a compreender
esse movimento como gesto de apontar. (...) O movimento de pegar
transforma-se em gesto de apontar.
Vygotsky, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991. p. 63.
16
O encontro entre a linguagem e a consciência é considerado, pelos estudiosos do tema,
como o momento de maior impacto no curso da constituição do pensamento. É quando
objetos são transformados em signos, num movimento de apropriação em que os signos
vão deixando de fazer parte do mundo externo, ganhando significados nos processos
psicológicos individuais. O resultado deste processo é a construção da linguagem e,
conseqüentemente, uma nova qualidade das interações da criança com o meio.
É através da linguagem que compartilhamos conhecimentos, valores, regras de
conduta, experiências adquiridas pelos homens ao longo da história, entre tantas
outras coisas. A linguagem é responsável pela formação da subjetividade, ou seja, é
através da linguagem que vamos nos constituindo como seres humanos, participantes
da cultura na qual estamos inseridos. A capacidade de adquirir uma língua constitui
uma das singularidades do ser humano.
Embora seja também um meio de comunicação, a linguagem não pode ser reduzida
a essa função, pois é um todo complexo que envolve o homem no contexto em que
ele vive, já que, à medida que estamos nos constituindo na linguagem, também
construímos o mundo com as linguagens que produzimos.
Atividade 3
O Jornal Nacional do dia 20 de janeiro de 2005 apresentou uma reportagem
sobre crianças da cidade de Breves, no Pará, que atravessam o rio em pequenas
canoas. Quando avistam os grandes barcos de passageiros, essas crianças
começam a soltar pequenos gemidos e a agitar os bracinhos. Os passageiros das
grandes embarcações reconhecem nesta gesticulação um pedido e atiram ao
rio, embalados em sacos plásticos, alimentos e roupas, que são rapidamente
recolhidos pelas crianças.
17
a) Analisando a situação descrita anteriormente, poderíamos afirmar que a
gesticulação acompanhada de gemidos das crianças enfocadas na
reportagem é uma forma de linguagem? Por quê?
b) As crianças que aparecem na reportagem estavam, na verdade, pedindo
esmolas no rio. Como você analisa esta situação à luz do que você aprendeu
no Módulo I sobre os direitos das crianças e suas famílias?
Estamos chegando ao término desta seção. Nela fizemos algumas considerações sobre
a aquisição da linguagem oral pela criança, percebendo que a linguagem se constitui
na interação e é fruto das relações entre as pessoas. Na próxima seção, discutiremos a
relação entre pensamento e linguagem.
Seção 2 – Falar e pensar
Objetivo a ser alcançado nesta seção:
– Compreender a relação entre pensamento
e linguagem e a língua como instrumento de
comunicação e construção de conhecimento.
Na seção anterior, vimos que a linguagem tem papel fundamental nas relações do
indivíduo com seu meio social. Através dela, podemos tornar presentes pessoas ausentes,
situações já vividas, rememorar o passado e planejar o futuro, dentre outras coisas.
Considerando que a apropriação dos signos relativos à linguagem é
fundamental na constituição do pensamento, nesta unidade iremos
discutir os principais elementos envolvidos na relação entre
pensamento e linguagem. Pretendemos, com este estudo,
aprofundar seu conhecimento sobre os aspectos relativos ao
desenvolvimento humano, a fim de que, compreendendo melhor
sua singularidade, você tenha instrumentos para orientar a sua prática
docente.
“O pensamento parece uma coisa à toa, mas como é que a
gente voa, quando começa a pensar?”
– Lupicínio Rodrigues, compositor que nasceu em Porto Alegre,
em 1914, e morreu na mesma cidade, em 1974.
Contando estrelinhas, “Cenas infantis”. Sandra Guinle
18
Os versos anteriores são parte de uma canção da música popular brasileira. Sua estrofe
mais famosa é “Felicidade foi-se embora e a saudade no meu peito ainda mora...”.
Lembrou qual é a canção? Pois bem, nos versos destacados, na caixa de texto, Lupicínio
Rodrigues chama a atenção para uma das capacidades do pensamento: “fazer a gente
voar”. O pensamento, construído a partir da habilidade de transformar vivências em
signos, nos envolve para além do momento presente. Isso porque a capacidade de
pensar nos permite evocar aquilo que não se encontra presente, ou seja, podemos
representar mentalmente objetos, situações. Esta é uma capacidade tipicamente
humana, que nos diferencia dos outros animais.
Atividade 4
A sugestão, nesta atividade, é de que você utilize seu caderno para deixar o
pensamento voar, descrevendo uma situação que marcou a sua infância.
Como já vimos nesta e em outras unidades deste módulo, somos seres constituídos
socialmente e, nesse processo, construímos nossa história. Assim, temos muito o que
contar! Mas como, ao longo do desenvolvimento humano, se constrói esta capacidade
de utilizar a linguagem como forma de compartilhar experiências, emoções, sentimentos?
Para o(a) profissional que trabalha com crianças pequenas, é importante compreender
esta questão, pois isso favorecerá um trabalho de melhor qualidade com elas. Um
autor que pode ajudar nessa compreensão é Lev Vygotsky, que você já teve
oportunidade de conhecer em unidades anteriores.
Lev Vygotsky, psicólogo russo que nasceu em 1896 e morreu em 1934, é autor
de vários artigos e livros. No Brasil, os mais conhecidos são “A Formação Social
da Mente” e “Pensamento e Linguagem”, ambos publicados pela Editora Mar-
tins Fontes. Para relembrar o que você já estudou sobre este autor, seria
interessante reler os textos das Unidades 1 e 2 de Fundamentos da Educação
deste módulo.
Vygotsky trouxe importantes contribuições com seus estudos para as ciências humanas
e sociais ao pesquisar as relações entre pensamento e linguagem.
Para Vygotsky, a linguagem carrega em si os conceitos elaborados pela cultura e, ao mesmo
tempo, é o meio para transmissão dessa cultura, daí sua importância. Deste modo, a
linguagem é a mediadora entre a pessoa e o mundo. É o meio pelo qual o indivíduo se
relaciona com o mundo exterior e, ao mesmo tempo, com seu próprio mundo.
19
O autor destaca o valor fundamental da palavra como forma mais pura de interação
social. Para Vygotsky, o significado da palavra é a chave para a compreensão da relação
entre pensamento e linguagem e, como conseqüência, da constituição da consciência
e da subjetividade. Isso porque “o significado de cada palavra é uma generalização,
um conceito, que por sua vez são atos do pensamento” (FREITAS, 1995, p. 94).
Vygotsky considera que o pensamento e palavra são processos com origens distintas,
mas que estabelecem entre si uma relação contínua e sistemática que se modifica
ao longo do desenvolvimento humano. O objetivo de Vygotsky era pesquisar o tipo
de relação que existe entre pensamento e linguagem e como essa relação vai se
modificando à medida que a criança cresce, analisando as transformações que essa
relação vai sofrendo nas diferentes fases da vida da criança.
Quando o bebê nasce, seu pensamento evolui, inicialmente, sem a linguagem. Mas,
como já vimos, a função social da fala já é apresentada ao bebê desde os primeiros
meses de vida pelas pessoas com as quais ele se relaciona.
Nos primeiros meses de vida, a criança possui um pensamento pré-lingüístico e
uma linguagem pré-intelectual.
O que essa afirmação significa? Se considerarmos que no início o pensamento do bebê
evolui sem a linguagem, encontraremos o sentido do termo pré-lingüístico: antes da
aquisição da linguagem. A linguagem pré-intelectual é a linguagem de que o bebê faz
uso antes de adquirir a língua utilizada por seu grupo social. São os balbucios e as outras
estratégias que ele utiliza para chamar a atenção daqueles que estão à sua volta.
Camille Claudel, “Les Causeuses” – 1896
20
Vygotsky considera que, por volta dos dois anos, as curvas do pensamento pré-lingüístico
e da linguagem pré-intelectual se encontram e se unem, iniciando um novo tipo de
organização do pensamento e da linguagem. Nesse momento, o pensamento torna-
se verbal e a fala, racional. A criança descobre, ainda que difusamente, que cada
coisa tem seu nome. A fala começa a servir ao intelecto e os pensamentos começam
a ser verbalizados. Ainda, de acordo com Vygotsky, os significados das palavras são
formações dinâmicas, que se modificam e evoluem à medida que a criança se
desenvolve, de acordo com as várias formas pelas quais o pensamento funciona.
Atividade 5
A poesia abaixo foi escrita pelo goiano Manoel de Barros.
O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa era a imagem de um vidro
mole que fazia uma volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse: Essa volta que o rio faz por trás de sua
casa se chama enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro que fazia uma volta atrás
de casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.
Manoel de Barros
Na poesia, o autor relembra um episódio de sua infância. Partindo do que Manoel
de Barros relata, o que poderíamos concluir sobre o modo como apreendemos
os significados das palavras?
21
Tudo que estudamos até aqui mostra a importância, para o desenvolvimento infantil,
de um espaço que valorize as interações e o uso da linguagem e a necessidade de
considerar, no planejamento das atividades nas instituições de Educação Infantil, o
papel da linguagem na formação da subjetividade. É importante criar, nessas instituições,
espaços e situações em que as crianças possam estar significando o mundo ao redor,
formando e transformando conceitos.
Atividade 6
O que mais chama sua atenção na linguagem das crianças com as quais você
trabalha? Quais as oportunidades que você pode criar para que as crianças com
as quais você trabalha possam expor suas idéias, compartilhando suas
experiências? Seria interessante discutir suas impressões com os(as) colegas do
PROINFANTIL no próximo encontro quinzenal.
Nesta seção, tratamos de alguns aspectos da relação entre pensamento e linguagem.
Vimos que as relações entre a pessoa e o mundo se dão mediadas pela linguagem.
A linguagem carrega em si conceitos elaborados na cultura e, nesse sentido, cada um
de nós tem um importante papel como produtor e disseminador dessa cultura, portanto
nos constituímos no mundo através da linguagem. Compreender melhor como esse
processo se dá será o objetivo da próxima seção.
Valéria Mourthé de Oliveira
22
Atividade 7
O que você considerou mais significativo nesta seção? Você considera que os
temas estudados nesta seção contribuíram para sua prática docente? De que
modo?
Seção 3 – Linguagem e subjetividade
Objetivo a ser alcançado nesta seção:
– Compreender como o sujeito se
constitui na linguagem.
Quem observa crianças pequenas realizando alguma atividade se surpreende com o
fato de que elas falam muito enquanto executam suas ações: contam o que estão
fazendo e o que pretendem fazer, fazem comentários sobre o que estão achando da
atividade que realizam sem ter a intenção de se comunicarem com outras pessoas.
Falam para si mesmas.
Para Jean Piaget, psicólogo suíço que você estudou
mais a fundo nas Unidades 1 e 2 deste módulo,
essa fala “para si mesmo” seria uma fala egocên-
trica, sem intenção comunicativa, que desaparece
à medida que a criança vai se socializando.
Entretanto, Vygotsky oferece uma outra explicação
para a fala que Piaget denomina egocêntrica,
considerando-a um importante meio para
compreendermos a relação entre pensamento e
palavra e como o sujeito (ou a consciência humana)
vai se construindo na linguagem.
Vygotsky afirma que essa fala representa uma passagem da atividade social da criança
(interpsíquica) para sua atividade mais individualizada (intrapsíquica) e não desaparece,
mas transforma-se em fala interior. Essa fala é um meio que a criança utiliza para
organizar sua atividade, uma vez que ainda não desenvolveu a capacidade de
pensamento abstrato. À medida que desenvolve a capacidade de pensar as palavras, a
criança deixa de ter a necessidade de pronunciá-las para si mesma. Na fala interior, o
sentido das palavras é o que predomina: uma mesma palavra pode ter vários sentidos,
dependendo do contexto em que ela é pronunciada.
23
Atividade 8
A seguir, descrevemos uma cena ocorrida em uma turma de crianças de 5 anos:
A professora propõe que as crianças, sentadas em círculo, contem uma história a
partir das imagens de um livro. As crianças vão passando as páginas e cada uma
conta uma parte da história. Enquanto isso, a professora, sentada em sua mesa,
recorta folhas de cartolina. A cada criança que conta, a professora, sem tirar os
olhos de sua tarefa, comenta sem muito entusiasmo: “muito bem”. Quando o
livro chega às mãos de uma menina, ela diz: “então, o tubarão saiu voando...”
A professora interrompe e pergunta: “tubarão voa?” A menina, então, tenta dar
continuidade à história, mas não consegue.
Como podemos analisar a situação
descrita no quadro acima, considerando
o que afirma Vygotsky sobre a função
da linguagem na construção do
pensamento pela criança? E com relação
à mediação da professora, o que você
teria a comentar?
Os sentidos produzidos na relação entre pensamento e
linguagem possibilitarão ao indivíduo compreender o
mundo e as relações que vivencia, assim como os papéis
que desempenha nestas relações.
Como os sentidos não estão prontos, acabados, mas
se alteram ao longo da vida, a experiência é
fundamental na reelaboração dos conceitos que
construímos. É a capacidade de ressignificação que
torna a vida tão dinâmica e o conhecimento algo
provisório, que está sempre marcado por novas
descobertas.
O trecho da história que leremos a seguir ilustra o papel que a palavra desempenha na
constituição do sujeito.
A menina e o urso Afonso,
“Cenas infantis” - Sandra Guinle
O menino e a lua,
“Cenas infantis” - Sandra Guinle
24
As coisas que a gente fala
As coisas que a gente fala
saem da boca da gente
e vão voando, voando,
correndo sempre pra frente.
Entrando pelos ouvidos de quem estiver presente.
Quando a pessoa presente
é pessoa distraída
não presta muita atenção.
Então as palavras entram
e saem pelo outro lado
sem fazer complicação.
Mas às vezes as palavras
vão entrando nas cabeças,
vão dando voltas e voltas,
fazendo reviravoltas
e vão dando piruetas.
Quando saem pela boca
saem todas enfeitadas.
Engraçadas, diferentes
com palavras penduradas.
Mas depende das pessoas
que repetem as palavras.
Algumas enfeitam pouco.
Algumas enfeitam muito.
Algumas enfeitam tanto,
que as palavras – que engraçado!
nem parecem as palavras
que entraram pelo outro lado.
Por isso, quando falamos,
temos que tomar cuidado.
Que as coisas que a gente fala
vão voando, vão voando
e ficam por todo lado.
E até mesmo modificam
o que era nosso recado.
25
E depois que elas se espalham,
por mais que a gente procure,
por mais que a gente recolha,
sempre fica uma palavra,
voando como uma folha,
caindo pelos quintais,
pousando pelos telhados,
entrando pelas janelas,
penduradas nos beirais.
(...) Porque é como eu lhes dizia:
as coisas que a gente fala
saem da boca da gente,
e vão voando, voando,
correndo sempre pra frente.
Sejam palavras bonitas
ou sejam palavras feias;
sejam mentira ou verdade,
ou sejam verdades meias;
são sempre muito importantes
as coisas que a gente fala.
Aliás, também têm força
as coisas que a gente cala.
Às vezes, importam mais,
que as coisas que a gente faz...
Mas isso é uma outra história
que fica pra uma outra vez...
Ruth Rocha
26
A história mostra a força das palavras: uma mentira, uma palavra não entendida,
uma palavra mal colocada... está armada a confusão!
As palavras pronunciadas podem adquirir significados de acordo com nossa
interpretação. Entretanto, tais interpretações dependem, por sua vez, de nossas
experiências, adquiridas nas relações que estabelecemos com os outros.
Por isso, quando a criança fala para si mesma em sua fala interior, reproduzindo,
em princípio, os padrões de relação significativa com os outros, está construindo
sua consciência e constituindo-se enquanto sujeito. Esse processo é possível no
momento em que as relações interpessoais são transformadas em intrapessoais,
permitindo assim a construção mais delicada da sociedade, que é a consciência
humana. (FREITAS, 1995. p. 98)
Percebemos, portanto, que é no plano social, nas relações interpessoais, que vamos nos
constituindo enquanto pessoas. Isso aponta a importância que o outro, ou seja, as outras
pessoas, assumem em nossas vidas, assim como o papel das instituições de Educação
Infantil de promoverem oportunidades de interação entre as crianças e entre elas e os
adultos. Quanto mais ricas e diversificadas forem as experiências vividas pela criança,
maiores serão suas possibilidades de compreender o mundo e se expressar sobre ele.
Atividade 9
a) Pensando na história “As coisas que a gente fala”, que considerações você
faria sobre o valor das palavras? Você pode usar seu caderno para anotá-las.
Eugênio Sávio
27
-
b) Você já se envolveu em alguma situação onde as suas palavras tenham sido mal
interpretadas, onde elas tenham, como na história, voado, voado e até mesmo
modificado o que era seu recado? Seria interessante descrever esta situação e
depois comentá-la com os colegas do PROINFANTIL no próximo encontro
quinzenal. Isto poderá render momentos bem divertidos para o encontro!
PARA RELEMBRAR
Este é o momento de relembrarmos alguns dos mais importantes assuntos
tratados nessa unidade.
- A criança constrói sua linguagem a partir das interações que vivencia em
seu meio social. É na interação com os outros que os significados das palavras
vão se construindo: quanto mais ricas as possibilidades de interação que a
criança tiver, maiores suas possibilidades de construir conhecimentos sobre
o mundo que a cerca.
- Embora sejam processos distintos, pensamento e linguagem se relacionam.
É a partir do momento que pensamento e linguagem convergem que a criança
descobre a função simbólica das palavras.
- As instituições de Educação Infantil têm um importante papel na construção
da linguagem. Ou seja, têm um importante papel na construção da
subjetividade pela criança. É, portanto, fundamental que as instituições de
Educação Infantil sejam espaços que favoreçam as trocas interpessoais e as
múltiplas linguagens, do contrário acabarão sendo espaços de silêncio.
ABRINDO NOSSOS HORIZONTES
Professor(a), os temas aqui abordados nos permitem compreender que as crianças
não apenas reproduzem os padrões da cultura onde estão inseridas, mas são
produtoras de cultura. Neste sentido, as crianças têm muito a nos contar daquilo
que experimentam, de seus desejos e de sua maneira peculiar de ver o mundo.
Temos agora o desafio de fazer do convívio com as crianças um espaço de debates
e descobertas. Em diferentes momentos do cotidiano, as crianças falam de suas
experiências dentro e fora da escola: nas rodas de conversa, nas brincadeiras, quando
estão desenhando, ao ouvir uma história etc. Nesses momentos, é importante que
o(a) professor(a) valorize as contribuições de cada criança, incentivando-as a se
expressarem, comentando aquilo que dizem e respeitando aquelas crianças mais tímidas.
28
Além disso, criar com as crianças representações com teatro de bonecos, fantoches,
dedoches etc. é uma forma interessante de estimular a linguagem oral, além de
favorecer o desenvolvimento da imaginação criativa.
Esperamos que os conteúdos abordados nesta unidade possam auxiliar você a planejar as
atividades que pretende desenvolver com seus alunos e a criar espaços de diálogo e interação!
GLOSSÁRIO
Aparelho fonador: conjunto de órgãos do corpo humano responsáveis pela fala.
Mediação: função de estabelecer a relação entre dois termos ou situações. Para a
psicologia sócio-histórica, da qual Vygotsky é um dos autores mais conhecidos, a relação
entre os seres humanos e o mundo é mediada pelos outros seres humanos com os
quais convivemos e pela cultura na qual estamos inseridos. A linguagem exerce um
papel fundamental neste processo de mediação.
Psicolingüística: ciência que trata de como a linguagem e o pensamento se relacionam.
Signos: os signos são objetos, sinais ou acontecimentos usados para se fazer menção
a algo diferente deles mesmos. A palavra é um signo, pois ela evoca situações, objetos,
sentimentos etc, diferentes dela mesma. Por exemplo, a palavra cachorro não é um
cachorro, mas quando a ouvimos, lemos ou pensamos nela, a imagem que vem à
nossa mente é a de um animal de quatro patas, corpo coberto de pêlos, rabo etc.
Sistema simbólico: conjunto de sinais que substituem o nome de alguma coisa.
SUGESTÃO para LEITURA
JOBIM, E. SOUZA, S. Infância e Linguagem – Bakhtin, Vygotsky e Benjamin.
Campinas – São Paulo: Papirus, 1995.
KRAMER, S. Por entre as pedras: arma e sonho na escola. São Paulo: Ática, 2002.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREITAS, M.T. A. Vygotsky e Bakhtin: Psicologia e educação: um intertexto. Juiz de
Fora: EDUFJF, São Paulo: Editora Ática, 1995.
VYGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
29
30
30
31
Organização do trabalho pedagógico
a linguagem no cotidiano/
as muitas linguagens da criança
1
BARROS, Manoel de. O fazedor de Amanhecer. Rio de Janeiro: Salamandra, 2001. Gustave Flaubert é
um escritor francês que viveu de 1821 até 1880. Entre outros livros, escreveu Madame Bovary. “Oiseau”,
em francês, quer dizer “pássaro”.
“Não sinto o mesmo gosto nas palavras:
“oiseau” e “pássaro”.
Embora elas tenham o mesmo sentido.
Será pelo gosto que vem de mãe? De língua mãe?
Seria porque eu não tenha amor pela língua De Flaubert?
(Faço este registro
Porque tenho a estupefação
De não sentir com a mesma riqueza as
Palavras “oiseau” e “pássaro”)
Penso que seja porque a palavra “pássaro” em
mim repercute a infância
E “oiseau” não repercute.
Penso que a palavra “pássaro” carrega até hoje
nela o menino que ia de tarde pra
debaixo das árvores que não tinha “oiseau”
Só tinha pássaros.
É o que me ocorre sobre língua mãe”.
Manoel de Barros
1
32
-
ABRINDO NOSSO DIÁLOGO
Alô, professor(a) de Educação Infantil!
Como você viu na Unidade 6 de Fundamentos da Educação deste módulo, a criança
“aprende” a falar na interação com os adultos e com as crianças mais desenvolvidas
que estão presentes em seu cotidiano (os pais, avós, outros adultos – como empregadas
e vizinhos, quando é o caso), em grupos de brincadeiras, de amigos e também nas
creches, pré-escolas e escolas. Essas interações são muito importantes para a criança
aprender a falar, a se comunicar e a imaginar.
Mas será que as crianças, em seu dia-a-dia, têm oportunidades semelhantes de falar,
folhear livros, desenhar, jogar etc.? Será que as crianças que estão na Educação Infantil
falam, desenham, jogam, se comunicam, imaginam da mesma maneira? Ou será que
diferentes famílias – de culturas e classes sociais diferentes – conversam e brincam de
maneira diferenciada com suas crianças, que então, também desenvolveriam a linguagem
de maneira diversa? Será que a leitura e a escrita (práticas letradas) estão presentes
igualmente no dia a dia de todas as crianças?
Dependendo das respostas que dermos a estas questões, as interações na Educação
Infantil – a hora da rodinha, a hora da história e outras rotinas – terão um papel e uma
importância diferentes também. É isso que esta unidade irá enfocar. Vamos a ela?
DEFININDO NOSSO PONTO DE CHEGADA
Objetivos específicos desta área temática:
1. Refletir sobre como as diversas linguagens (as imagens, ilustrações, desenhos;
os diálogos, as narrativas e histórias; o jogo simbólico e o faz-de-conta; a
linguagem escrita e a leitura) estão presentes no dia-a-dia da criança, criando
suas possibilidades de simbolizar e de se expressar.
2. Discutir as diferenças na interação cotidiana com crianças no meio familiar,
em diferentes culturas e meios sociais, e como a Educação Infantil faz parte
deste cotidiano, enriquecendo as possibilidades de representação da criança.
3. Analisar diferentes tipos de interação, que apresentam tratamentos diversos
das linguagens e que, portanto, criam possibilidades diversas de desen-
volvimento da(s) linguagem(ens) da criança. Veremos como, através do ato
de contar histórias, das brincadeiras, das rotinas e dos diálogos ou conversas
com adultos e outros companheiros de sua idade ou de idades diferentes, a
criança vai construindo a fala, o desenho, o jogo, a narrativa e o letramento.
-
33
-
CONSTRUINDO NOSSA APRENDIZAGEM
Seção 1 – Linguagem e representação
Objetivos a serem alcançados nesta seção:
– Refletir sobre a importância do diálogo e da
interação no cotidiano da criança.
– Entender que diferentes famílias – de culturas
e de classes sociais diversas –, em diferentes
momentos, conversam, interagem e brincam
de maneira diferenciada com suas crianças.
– Conhecer os processos de interação e o
desenvolvimento da linguagem das crianças.
Atividade 1
a) Professor(a), para que possamos iniciar esse estudo, faço um convite para que
você leia e compare os exemplos seguinte. No Exemplo 1, uma criança e sua mãe
folheiam juntas o livro A Galinha Ruiva. No Exemplo 2, ocorre uma interação
familiar (Mãe – M., Prima – V.) com outra menina (C.), de 2 anos e 1 mês:
34
Exemplo 1
C.: (Pega o livro A Galinha Ruiva e começa a folhear.)
M.: Que livro é este?
C.: A pilu.
M.: Quê?
C.: A pilu.
M.: Que que tem aí?
C.: A au-au!
M.: Tem au-au?
C.: Ó au-au. Podi eli modê au-au?
M.: Morder? Quem o au-au vai morder?
C.: Ó au-au.
M.: Cadê o au-au?
C.: Au-au vai modê.
M.: Quem?
C.: O au-au oto vai modê.
M.: Ah é?
C.: É. (Tira e põe o dedo da figura do cachorro, rindo.)
M.: E cadê o peru?
C.: O pilu tá qui. Ó pilu! (Aponta no livro.)
M.: E cadê a galinha?
C.: Ó galinha! (Apontando.)
M.: O que que a galinha tá fazendo?
C.: Galinha tá comendu pão da pipiu.
Exemplo 2
M.: (Joga a bola no chão.) Vamos lá! Mostra pra Verinha, sua prima.
V.: Chuta, Pri! Chuta pra ela pegar a bola! Chuta a bola! Chuta! Chuta!
C.: (Chuta a bola.)
M.: Goooool! Corre! Vai lá pegar a bola!
C.: (Vai correndo buscar a bola.)
V.: Chuta! Chuta!
M.: Faz gol! Faz! Vamos fazer gol!
C.: (Chuta a bola.) Gooool!!!
M.: Chuta! Chuta! Chuta lá a bola!
C.: (Chuta a bola.)
M.: Isso! Assim...
C.: (Pega a bola e vai para os fundos).
35
b) Agora, procure responder em seu caderno:
- Quantas palavras a criança do segundo exemplo fala?
- E a do primeiro? Quais são elas?
- Embora não da mesma maneira que o adulto, a criança do Exemplo 1 fala
inclusive algumas frases completas. Quais são elas?
Tanto as atividades físicas e práticas como as atividades com a linguagem são
importantes no desenvolvimento das crianças. No entanto, é nas atividades que envolvem
linguagem – conversar, contar e recontar experiências vividas, ouvir e contar histórias,
folhear livros ou revistas, imitar adultos ou outras crianças falando ou contando, brincar
de casinha – que a criança tem maiores oportunidades de construir sua linguagem
verbal e suas capacidades de comunicação. Mais ainda, se a criança, ao invés de só
ouvir, puder participar. Não somente fazer o que o adulto lhe diz (Chuta, Pri!, Faz
gol! Tira a chupeta da boca!), mas falar de seus medos, descobertas, representações
(Pode eli modê au-au? Au-au vai modê. Galinha tá comendu pão da pipiu. Tenho
medo do Lobo Mau, hein?!).
A criança do primeiro exemplo está tendo oportunidade de expressar seus medos (será
que o cachorro da ilustração pode morder?); jogar simbolicamente com eles (dar o
dedo para o cachorro da ilustração morder) e, com isso, construir a distinção entre
realidade e história ou ficção – representação –; aprender a falar palavras e frases
(galinha, cachorro, au-au vai morder); conhecer uma nova história (a da Galinha Ruiva);
além, é claro, de se divertir. A criança do segundo exemplo também está se divertindo,
mas só tem oportunidade de realizar ações práticas (chutar a bola, fazer gol), obedecendo
as ordens (ou pedidos) dos adultos ou crianças mais velhas.
Portanto, certas rotinas da Educação Infantil vão ser muito especiais para garantir
maiores e iguais oportunidades de desenvolvimento da linguagem das crianças: a rodinha
(ou roda de conversa), contar ou ler histórias, brincar de faz-de-conta ou fazer teatro,
cantar e dançar e outras brincadeiras com a linguagem, como os trava-línguas e
parlendas, além do diálogo nos momentos de refeição e de outros cuidados.
Algumas parlendas que poderão ser recriadas por você e as crianças:
Um, dois, feijão com arroz.
Três, quatro, feijão no prato.
Cinco, seis, bolo inglês.
Sete, oito, comer biscoito.
Nove, dez, comer pastéis.
Hoje é domingo, pede cachimbo.
Cachimbo é de ouro, bate no touro.
O touro é valente, bate na gente.
A gente é fraco, cai no buraco.
O buraco é fundo, acabou-se o mundo.
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Trava-línguas são frases difíceis de articular. Você pode propor que as crianças falem
essas frases depressa:
- Um tigre, dois tigres, três tigres.
- Três pratos de trigo para três tigres tristes.
- O pinto pia, a pia pinga.
- A aranha arranha a jarra, a jarra arranha a aranha.
E por que a Educação Infantil é tão importante? Porque nem sempre, no seu dia-a-dia
em casa, as crianças têm as mesmas oportunidades de falar, participar de conversas,
folhear, ver ou ler livros, ouvir histórias. Estas são atividades culturais desigualmente
distribuídas na sociedade. Muitas famílias não têm condições de ler, contar histórias ou
cantar para as crianças antes de dormir ou em momentos de diversão. Muitas crianças
ficam muito tempo em casa diante da televisão. Neste caso, ouvem muita linguagem,
mas não podem participar, falar com a TV. Em muitos lares, a criança não deve falar,
apenas obedecer.
Assim, a creche ou a sala de Educação Infantil poderá dar às crianças oportunidades
de linguagem que não têm em casa ou em outros ambientes.
Mas como será que, nestas atividades de linguagem, as crianças aprendem a falar?
Como funcionam estas atividades, que acabam por propiciar às crianças novas
possibilidades de se apropriarem da linguagem oral de seu meio? O que fazem adultos
e crianças? Como a criança desenvolve linguagem e representação? É o que veremos
no próximo segmento.
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Processos de interação e o desenvolvimento da linguagem da criança
O desenvolvimento da linguagem da criança começa a partir do nascimento, pois,
desde o início, a mãe interpreta o choro, as ações, os sons e os gestos do bebê,
atribuindo-lhes sentido. Com isso, por meio das conversas com o bebê, das cantigas e
de muitos jogos de linguagem, os adultos vão recortando para ele objetos, processos e
ações do/no mundo.
Um dos jogos de linguagem mais importantes do desenvolvimento é o de “cadê?
Achou!” ou “de esconder”: no trocador, a mãe põe a fralda sobre o rosto do bebê
ou sobre o seu, alternadamente, dizendo “Cadê? Acabô nenê? Cadê? Acabô
mamãe?”, para depois retirá-la, dizendo “Achou! Ó nenê! Achou! Ó mamãe!”.
Este é um jogo universal. Presente em todas as culturas. Ele é muito importante, pois
sinaliza para a criança que as coisas e pessoas estão e não estão, somem e reaparecem,
mas continuam existindo. Ou seja, leva a criança a representar (manter em mente, ter
um significado, uma imagem mental para) as coisas e pessoas do mundo, mesmo na
sua ausência. É o que Piaget (1967) chamou de ausência e permanência do objeto.
Para ele, esta é uma das construções mais importantes e finais do período sensório
motor, assunto também já visto na Unidade 2 de Fundamentos da Educação deste
módulo. Esta representação é construída nestes jogos de linguagem, em que a criança
aprenderá também quatro palavras das mais importantes para a sua linguagem inicial:
cadê/achô e ó/bô. São palavras que servirão para formar as primeiras frases, por isso
são chamadas palavras operantes ou operatórias.
Na verdade, os primeiros sons que o bebê faz são aqueles do balbucio. Nestes,
todos os sons da fala, de todas as línguas, estão presentes. Depois, esses sons vão
se especializando e, numa grande variedade de jogos interativos de linguagem –
como o de esconder e o de dar e tomar (dá/tó), por exemplo – as primeiras palavras
vão surgindo. Palavras operantes, que alguns autores chamam de palavras-frases,
que funcionam como verbos (dá, tó, qué, nã, ó, bô, cadê, achô, dentre outras), e
os nomes das coisas e pessoas do mundo (nenê, mã, pá, ou mamã, papá, bola,
áua, dentre outras). Assim, a criança começa falando uma palavra, depois duas,
três, formando frases. Começa a conversar, a dialogar com o adulto e outras crianças.
Ela fala as palavras de maneira simplificada (áua, ao invés de água), pois ainda não
especializou alguns sons de sua língua: sons, palavras e frases estão todos sendo
aprendidos ao mesmo tempo e o adulto vai dando, e depois exigindo, o padrão mais
adequado. Vejamos um exemplo, da mesma criança do primeiro exemplo acima, na
mesma idade:
38
Exemplo 3
C.: (Pega o livro O Patinho Feio.) Qué vê pipiu?
M.: Tem pipiu aí também?
C.: É. (Abrindo o livro).
M.: Que pipiu é este?
C.: Essi pipiu, achô!
M.: Ah! Achô pipiu!
C.: Ó, ó ga... galiãããaa... (Apontando no livro a figura de um pato.)
M.: Não é um patinho?
C.: Galiã!
M.: É um patinho ou uma galinha?
C.: Galiã, patio.
M.: É uma galinha?
C.: Éeee!
M.: Como faz o patinho?
C.: Hum-hum. Có, có, có!
M.: Có, có, có, faz a galinha!
C.: É! Ó! (Exclamando quando apareceu a figura da galinha no livro.)
M.: Ó a galinha! Achô a galinha!
C.: Achô galinha!
M.: Cadê galinha?
C.: Galinha achô! (Apontando o patinho.)
M.: Esse aí é o patinho.
C.: Essi é o patio, achô!
M.: E a galinha, cadê?
C.: Galinha achô! Tudo galinha achôoooo! Tudo esse galinha achôooo! Tudo
galinha achô! (Apontando todas as figuras do livro - galinha e patinhos.)
Ó. (Virando a página do livro.)
Esse conto de Hans Christian Andersen é um dos mais belos contos da literatura
infantil. Procure conhecê-lo e depois conte para seus alunos.
Nesse exemplo, podemos dizer que a criança está aprendendo:
- os sons da língua;
- a maneira adequada de pronunciar algumas palavras;
- algumas palavras (nomes) e representações que ainda não conhece;
- maneiras de formar frases; e
- como participar de um diálogo.
39
Atividade 2
a) Após reler o exemplo, recupere trechos que sejam significativos para cada
uma das aprendizagens listadas anteriormente. Não se esqueça de anotá-
los no seu caderno e trocar com os(as) outros(as) professores(as) no encontro
quinzenal.
b) Copie em seu caderno o quadro abaixo e depois assinale as maneiras como
a mãe e a criança participam deste diálogo no Exemplo 3.
Como você vê, o jogo de esconde-esconde (cadê?/achô!) serve de base para outros,
posteriores no desenvolvimento, como o jogo de nomear. No nosso exemplo, o par
cadê?/achô! serve agora para que as duas parceiras do diálogo – a criança e sua mãe
ou professor(a) – reconheçam e nomeiem as ilustrações do livro de histórias:
M.: Ó a galinha! Achou a galinha!
C: Achô galinha!
M.: Cadê galinha?
C: Galinha achô! (Apontando o patinho.)
Modos de participação
Perguntando
Respondendo
Repetindo as falas uma da outra
Reorganizando as maneiras de falar
Completando a fala da outra
Nomeando as ilustrações
Mãe Criança
40
Para Vygotsky, a nomeação das coisas do mundo é o grande salto de qualidade
que a criança dá na direção da linguagem humana. Isso porque:
- a nomeação exige uma representação, uma significação, uma imagem
mental para os objetos do mundo (referentes);
- a nomeação exige, ao mesmo tempo, que se saiba o nome do objeto do
mundo (significante);
- portanto, a nomeação é a passagem do símbolo (como o gesto
significativo, o gesto de apontar, por exemplo) ao signo, que vai compor
a unidade básica da linguagem verbal;
- finalmente, os nomes das coisas permitem que a criança possa falar mais,
formando pequenas frases, por exemplo, dizer “meia mamãe” para significar
esta é a meia da mamãe”. Com isso, ela pode passar a dialogar com o adulto.
Ou seja, saber os nomes das coisas permite-nos diferenciá-las, falar delas, pensar
nelas.
Como visto por você em Fundamentos da Educação desta unidade, para Vygotsky
(1984), tudo o que a criança aprende foi feito primeiro na interação com outra
pessoa mais desenvolvida. Primeiro, entre as pessoas, depois, de si para si. Assim,
pensarmos como a mãe e a criança se comportam no terceiro exemplo é
interessante para sabermos como as coisas se passam entre as pessoas. Você
deve ter visto que a mãe pergunta, repete a fala da criança, reorganizando-a,
completa a fala da criança e propõe novos temas para conversa e novos objetos
para serem aprendidos. Por sua vez, a criança, principalmente, responde às
perguntas da mãe, repete suas falas, aproximando-se do padrão; algumas vezes
completa as falas da mãe e, outras vezes, propõe novos temas para a conversa.
Para começar a pensar como a passagem do
diálogo à narrativa se dá – coisa que vamos
discutir na Seção 2 –, veja o Exemplo 4, no qual
uma criança, com 2 anos e meio, sua mãe e uma
pesquisadora (I.) folheiam o livro O Primeiro
Passeio do Bolinha:
41
Exemplo 4
O Primeiro Passeio do Bolinha
C.: Essi tataluga.
(Abrindo a janelinha da ilustração.)
I: É. Tartaruga.
M: Que que a tartaruga come?
C.: Arroiz. Taitaluga come arroiz.
M: Não! Tartaruga come banana.
C.: Taitaruga... Essi tartaruga come arroiz...
(Apontando a ilustração.)
(…)
M: Mas que bicho é esse?
C.: Sapinhu.
M: Não senhora! É jacaré!
C.: Jacaréee...
M: Éeee.
C.: Jacaré tá duminu, né?
M: É.
I: Tá debaixo da cama.
C.: (Vira a página.) (…)
I: E aí? Que que é?
M: Hi... po... pó...
C.: Pé.
M: Não senhora! Hipopótamo!
C.: Popótamu.
O passarinho come, coma ma... semente (apontando).
M: Alpiste.
C.: Altiste.
M: (
risos
) Altiste.
C.: Passarinhu tá duminu tamém. (Vira a página.)
Eric Hill - Editora: Martins Fontes
42
Seção 2 – A narrativa e a leitura de histórias: o letramento no cotidiano
da criança
Objetivo a ser alcançado nesta seção:
– Entender como a criança aprende a narrar.
No último exemplo da seção anterior, os mesmos modos de participação continuam
acontecendo (adultos e criança repetem e complementam as falas uns dos outros,
fazem perguntas e dão respostas, indicam novos temas para a conversa, de acordo
com as ilustrações do livro) e muitas das aprendizagens anteriores também continuam
ocorrendo (palavras novas, como “hipopótamo” e “alpiste”; e sons da língua que
ainda estão em desenvolvimento, como em tataluga/taitaluga/tartaluga/tartaruga).
O que há de novo é que, para além da nomeação e do reconhecimento dos elementos
das ilustrações nos quais a mãe insiste fortemente (tartaruga, jacaré, hipopótamo,
alpiste, passarinho), neste exemplo, a cada nomeação, forma-se uma frase sobre
alguma ação do bichinho (comer, dormir, estar em algum lugar). Sejam os adultos,
seja a criança, logo depois de ser nomeado um dos bichos, fazem uma frase com uma
ação ou estado deste animal (Taitaluga come arroiz; Tartaruga come banana;
Jacaré tá duminu, né?). Está-se construindo o núcleo da narrativa.
Sendo a narrativa um discurso sobre ações encadeadas no tempo, saber contar ações
ou coisas que acontecem é central para se poder narrar, seja relatando o que foi vivido
(relato), seja contando e recontando histórias de ficção, como contos de fadas ou
histórias da literatura infantil (PERRONI, 1992).
Neste período, a principal pergunta do adulto nestes diálogos onde se folheiam livros
é: “E o que ele está fazendo? O que está acontecendo aqui?”.
À medida que a criança começa a conseguir narrar o que está acontecendo nas
ilustrações, os modos de participação dos adultos se modificam. Novas maneiras de
participar passam a acontecer. Vamos ver como?
Desta vez, vamos analisar uma história mais longa, contada com a participação da mãe
(M), do pai (P) e da criança (C), quando tinha 2 anos e 10 meses.
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Exemplo 5
M.: Qual história que você quer?
C.: Du...
P.: Dos Três Porquinhos.
C.: Dus Três Porquinhos. (…)
P.: Dá aqui. Vamos lá contar a história dos Três Porquinhos. Era uma vez...
C.: (Volta a mexer na calculadora.)
P.: ...Três porquinhos...
C.: Ó u Lobo Mau aqui!
P.: É o Lobo Mau.
(…)
P.: Aí, o primeiro foi lá e falou assim pro moço: – Moço, dá palha prá eu fazê
minha casinha? O moço foi e deu e ele fez uma casinha.
C.: É! De palha!
P.: Quando a casinha de palha ficou pronta, que que aconteceu?
C.: De madeira e de palha.
P.: De madeira e de palha.
M.: Que que aconteceu quando a casa ficou pronta?
C.: Ah... Agora derrubô. Eu vô sopá e a... e a sua casa derrubá. (P. e C. assopram.)
P.: E caiu a casa. E caiu a casa.
C.: O porquinho.
P.: O porquinho saiu correndo e foi pra casa do irmão dele.
C.: É!! De madera!!
P.: O irmão dele fez uma casa de madeira.
M.: A casa de madeira.
P.: Quando a casa ficô pronta, que aconteceu?
C.: Derrubô! (P. e C. assopram.)
P.: O lobo chegou, soprou e a casa caiu.
C.: É!...
P.: O porquinho.
M.: Qual é a outra casa?
C.: O porquinho tá, tá soprando a palha!
P.: É.
(…)
M.: Que aconteceu?
C.: Ele durmiu.
P.: Isso.
M.: (Ri).
44
Na verdade, esse exemplo é um diálogo familiar, no qual se constrói uma narrativa
única da história dos Três Porquinhos, por meio das vozes dos três participantes – pai,
criança e mãe. Diferentemente dos exemplos anteriores, por meio da fala de cada
participante, encadeada à do outro, uma após a outra, vai-se construindo uma narrativa
única, multivocal, com começo, meio e fim.
Vamos ver agora o que mudou no modo de participação dos adultos e da criança neste
diálogo.
- Nomeia personagens da história.
- Solicita as canções da história.
- Relata o que aconteceu na página.
- Conta trecho da história.
- Repete fala de personagem, para contar um trecho.
- Pergunta o que aconteceu em seguida.
- Insere fala de personagem na voz do narrador.
- Descreve aspectos importantes da ilustração.
- Estabelece a continuidade da história, por meio
de entonação e de palavras de ligação entre as
ações (coesivas, como e, aí etc.).
ADULTO
CRIANÇA
P.: O lobo durmiu porque a casa...
P. e M.: Não caiu...
P.: Aí, os porquinhos ficaram lá cantando assim.
Como eles cantavam? (M., P. e C. cantando: “Quem
tem medo do lobo mau, lobo mau. Quem tem medo do
lobo mau, qué, qué, qué, quí, quí.”)
45
Atividade 3
Quais as palavras utilizadas pelo adulto para ligar as ações entre si e dar
continuidade e formato à história?
Pois é! O adulto vai ficando mais exigente à medida que a criança já pode contar mais,
e, neste período, chega mesmo a ler trechos inteiros do livro. Com isso, ela vai se
aproximando do padrão narrativo escrito da cultura e favorecendo o gênero narrativo
ao invés do diálogo. Trata-se de aprender a contar por inteiro e de falar “ao pé da
letra”. Então, acontece com a criança um fenômeno interessante: ela, que participava
sem medo de errar das conversas anteriores, passa a dizer que não sabe e, muitas
vezes, se recusa a participar das interações, pedindo que o adulto ou criança mais
desenvolvida conte ou leia por inteiro. Este período dura bastante e, nele, com freqüência,
a criança pede que se conte ou leia a mesma história inteira, muitas vezes, se possível
exatamente igual. Ao que parece, está tentando memorizar ou se apropriar das maneiras
de falar e de contar do adulto.
Embora este processo de construção das narrativas também possa ocorrer com menor
intensidade, nos relatos das crianças de experiências vivenciadas em outros lugares,
como na creche, na pré-escola ou na turma de Educação Infantil que funciona numa
escola de Ensino Fundamental, na casa dos vizinhos ou avós ou na hora da rodinha,
contando o que acontece em casa, ele é muito enriquecido no manuseio de livros
infantis e na (re-)contagem de histórias, pelo detalhamento e pelo tipo de linguagem
que essas situações propiciam, assim como pelo apoio que as ilustrações oferecem.
46
Isso quer dizer que as crianças podem chegar na Educação Infantil em diferentes
momentos do desenvolvimento das narrativas e que aquela criança caladinha, que na
hora da rodinha se recusa ou fica constrangida em contar o que aconteceu com ela,
pode ainda não saber fazê-lo. As crianças de 0 a 6 anos não têm sempre
desenvolvimentos de linguagem semelhantes. Pode haver muita diferença entre elas,
e você, professor(a) de Educação Infantil, nas rotinas diárias, pode contribuir, e muito,
para este desenvolvimento.
Atividade 4
Este quadro deve ser copiado em seu caderno.
Pensando nas suas rotinas diárias com as crianças, tente criar atividades que
desenvolvam os seguintes aspectos da linguagem oral:
Existem ainda alguns aspectos destas atividades narrativas que precisam ser
comentados. Mencionamos que há crianças em cujas casas não há livros ou materiais
escritos que sejam experimentados por ela em conjunto com adultos. Também há
crianças com quem os pais não conversam muito, não solicitando narrativas de
quaisquer tipos. Isso faz diferença para o desenvolvimento de linguagem oral da
criança. Além disso, faz diferença também para outros desenvolvimentos que estão
envolvidos nestas práticas. Vamos falar de dois, da maior importância: o
desenvolvimento emocional – que comentaremos na próxima seção – e o letramento.
Aspectos da linguagem
verbal em desenvolvimento
Nomear
Rotinas e atividades diárias
Construir a narrativa com continuidade
Dar ordens e obedecer
Fazer e responder perguntas
Formar frases que relatam ações ou
acontecimentos
Palavras operatórias
47
Definimos letramento como o conjunto de atividades de linguagem em que o texto
escrito (no livro, no gibi, no papel) está envolvido, de uma ou de outra maneira (KLEIMAN,
1995), como é o caso do contar histórias folheando livros ou gibis. Magda Soares
(1998: 45-46), pesquisadora mineira que há muitos anos vem investigando as relações
entre letramento (em casa, na igreja, na escola), alfabetização e sucesso ou fracasso
escolar, define o letramento como processo de apropriação das práticas sociais de
leitura e escrita. Esse tema será retomado e aprofundado na Unidade 6 do Módulo IV.
As crianças que participam, em casa, nas instituições de Educação Infantil ou em
outros contextos, destas práticas que envolvem contar histórias e lidar com escritos,
de uma ou de outra maneira estão construindo o letramento. Estão construindo
maneiras de se comportarem nas práticas de leitura socialmente aceitas, assim como
concepções sobre essas práticas:
- Conhecimentos sobre o texto e a escrita, que facilitarão a alfabetização.
- Maneiras de lidar com o livro e outros suportes (direcionalidade da esquerda
para a direita e de cima para baixo da escrita ocidental, direção ao se virarem
as páginas etc.).
- Maneiras de falar “ao pé da letra”, ou seja, aproximando-se do registro escrito
da língua.
Professor(a), caso você tenha interesse em saber mais sobre o que é letramento,
procure ler o livro Letramento: Um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Ed.
Autêntica. Este é um pequeno livro muito interessante, no qual a autora, Magda
Soares, define e discute a noção de letramento em três textos diferentes: um
verbete, definindo o conceito, um artigo de divulgação científica sobre as discussões
ligadas ao conceito, tais como a dos tipos de letramento(s) e a das medidas de
letramento da população, e, finalmente, um texto didático, destinado à formação
de professores(as), no qual o conceito é esmiuçado, por meio de atividades práticas.
Seção 3 – A pré-história da escrita: o papel do jogo, da ficção e das
imagens na constituição simbólica e emocional da criança
Objetivo a ser alcançado nesta seção:
– Refletir sobre como as diversas linguagens
(as imagens, ilustrações, desenhos; o diálogo
e as narrativas e histórias; o jogo simbólico
e o faz-de-conta; a linguagem escrita e leitura)
estão presentes no dia-a-dia da criança,
constituindo-a emocionalmente e criando
suas possibilidades de simbolizar.
48
Mesmo crianças de pouco mais de 2 anos, quando participam com freqüência de
práticas de letramento, em casa e na Educação Infantil, já têm uma boa idéia de como
se comportar ao ler ou ao escrever; levantam hipóteses sobre “o que está escrito”;
sabem que, quando o adulto lê, usa uma melodia, palavras e frases diferentes das do
dia-a-dia. Possivelmente, de acordo com as pesquisas, estas crianças terão maiores
chances de sucesso escolar (LAHIRE, 1995). Mas não é somente a leitura e a escrita,
como formas simbólicas da linguagem, que participam do processo de letramento das
crianças.
Vygotsky (1984), em seu texto A pré-história da
escrita, aponta várias outras formas de linguagem –
os gestos e o jogo simbólico; as imagens e o desenho;
a linguagem ou discurso verbal oral; e, poderíamos
acrescentar, as cantigas ou canções – que constituem
o simbólico, o imaginário e o emocional da criança
pequena. Neste texto, Vygotsky comenta e descreve
em detalhes algumas formas de representação e de
expressão das crianças, tais como o jogo simbólico ou
brincadeira infantil, o gesto, o desenho e a linguagem
oral, que, para ele, fazem parte do desenvolvimento
necessário anterior à construção da linguagem escrita.
Ao final do texto, o autor discute algumas implicações
práticas para a Educação Infantil.
Como veremos na Unidade 7 de Fundamentos da Educação deste módulo, os
jogos de faz-de-conta ou jogos simbólicos são, universalmente, brincadeiras
interativas em que a criança pode vivenciar situações e papéis reservados aos adultos,
por meio do faz-de-conta e da imaginação.
Valéria Mourthé de Oliveira
49
Exemplo 6 (criança do Exemplo 1)
C.: Vamu naná? (Olhando para a boneca. Põe a boneca no berço.)
M.: Agora canta uma musiquinha pra ela naná, num quer?
C.: Tá nananu caminha.
M.: Tá nanando na caminha?
C.: (Pega a mamadeira.) Minha mamadela du nenê. Cadê áua? (…)
Sem mamadela du nenê. (Dá mamadeira à boneca no berço.) Ó! Que
linda!
(Continua). Eli num qué mamadela. Eli num qué mamadela. (Tira a mamadeira
e dirige-se à boneca.) Num qué? Não? Pricisa tomá mamadela!
M.: Precisa? Ela tá falando que num qué mamadeira?
C.: Não. Num qué mamadela.
M.: Tá danu mamá?
C.: (Para de dar mamadeira e dirige-se à boneca.) Num qué
mamadela? Piliza tomá mamadela. (Pega outra boneca no chão e
joga longe.) Sai nenê! Sai! (Bate na outra boneca.) (Criança aos
2 anos e 2 meses)
Exemplo 7 (criança do Exemplo 2, com a avó – A.)
C.: (Brinca com os ursos.) Filhinha, filhinha, mamãe volta já já.
Filho é dose.
A.: Vai trabaiá, mamãe?
C.: (Silêncio)
A.: Mãezinha... Troca a fralda do nenê,
fez xixi.
C.: (Dobra a fralda). (…) Tô trocanu ele.
(…) Vô fazê janta.
A.: Já? Vai faze janta já?
C.: Já. Tó, filha, come tudo.
A.: Ta, mamãezinha. Vou comer tudo.
C.: Mamãe qui dá, mamãe qui dá. Qué qui põe no pratinho?
Tó. Come tudo. Tó, come com cué tudu.
A.: Nossa... Que colherão.
C.: Pronto, já comeu tudo.
A.: Ô mamãezinha.
C.: A mamãe vai fazê miojo.
A: Miojo... Ah, mamãe, quero miojo, mãezinha. (Criança aos 2 anos e 11 meses)
Quarto de menina, “Cenas infantis”
- Sandra Guinle
50
Brincar de casinha, de médico, ou até de astronauta, permite à criança experimentar
funções sociais, atividades e emoções imaginadas e, assim, ajuda a simbolizar estas
ações sociais, permite elaborar padrões de relação com as pessoas e construir sua
identidade enquanto pessoa. Uma criança usa qualquer objeto à disposição para
simbolizar elementos da situação de jogo, por meio da imaginação: uma vassoura é
um alazão do caubói, uma caixa de sapatos é o berço do bebê, um estilingue é o
estetoscópio, usado pelo médico.
Segundo Elkonin (1978), no jogo de faz-de-conta, o mais importante é simbolizar e
vivenciar o papel social (mãe, marido, médico, caubói). Mas também existem regras
sociais, maneiras adequadas de se comportar nesses jogos, embora elas não sejam o
mais importante. Para Elkonin, conforme a criança vai crescendo, os jogos regrados,
em que o mais importante é seguir a regra (esportes, como o futebol ou o vôlei;
jogos de cartas ou de tabuleiro), vão tomando o lugar dos jogos de faz-de-conta.
Na Educação Infantil, os jogos simbólicos, ou jogos de faz-de-conta, e as
dramatizações são fundamentais para o desenvolvimento da pessoa.
Atividade 5
Procure observar suas rotinas diárias com as crianças e relatar em seu caderno, o
mais detalhadamente possível, um episódio de faz-de-conta que tenha
acontecido. Depois de terminar esta unidade, anote o que você acha que estava
sendo construído ou expressado neste episódio de faz-de-conta. Procure discutir
suas idéias com seu tutor.
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No caso das crianças que participam de práticas letradas, os jogos de faz-de-conta e as
cantigas e refrões penetram nas narrativas e nas histórias contadas e são instrumentos
ainda mais poderosos de construção da pessoa (simbólico, identidade, ação, movimento,
emoções), pois exigem maior dose de imaginação. Vejamos o Exemplo 8:
Exemplo 8
C.: (Cantando e gestualizando: junta as duas mãos e faz movimentos sinuosos.)
“Logu mau, logu mau, pégo a cinha pa fazê migau!” (Risos.)
P.: Issu mesmo! “Lobo mau, lobo mau. Pega criancinha pra fazê mingau!”
M.: É da escola isso.
C.: (Cantando, dançando e caminhando como o Lobo.) “Logu mau, logu mau.
péga quian... cinha pa fazê migau!!!”
M.: É o Chapeuzinho? Como é que canta o Chapeuzinho?
C.: Chapeuzi...
M.: (Cantando.) “Pela estrada afora, eu vou, tão sozinha, levar estes doces
para a vovozinha. O caminho é longo, o caminho é deserto, e o Lobo Mau
passeia aqui por perto”.
C.: (Levanta e começa a dançar, entrando no papel de Chapeuzinho. Vai
até a estante de livros.) Taizi Banca de Neve.
M.: Ah, eu num sei onde tá sua Branca de Neve, filha.
P.: Tem dessi. (Pega Chapeuzinho Vermelho.)
C.: (Senta.) Vamu vê vovozinha? Chapeuzinho? (Gestualizando, de dedo em
riste.) (…) (Levanta e começa a cantar, entrando no papel de Chapeuzinho.)
“Chapeuzinho foi vá pá vovozinha, pá fazê dozinhu, docinhu!” (Risos.)
P.: Isso mesmo: “Chapeuzinho, leva estes docinhos pra vovozinha!”
C.: “Pá vovozinha.” (Anda como se estivesse passeando na floresta.)
P.: “E cuidado com o Lobo!”
M.: “Leva, Chapeuzinho, leva!”
C.: (Canta.) “Pa fazê migau!”
P.: Isso, e Chapeuzinho foi pelo bosque cantando:
M. e P: (Cantando.) “Pela estrada afora, eu vou tão sozinha, levar estes doces
para a vovozinha...” (C1, aos 2 anos e 3 meses)
Neste exemplo, a criança assume inicialmente o papel do Lobo
Mau através de sua cantiga típica (“Eu sou o Lobo Mau, Lobo
Mau, Lobo Mau, e pego criancinha pra fazer mingau.”).
A mãe coloca no jogo o papel de Chapeuzinho, também
através da canção da personagem. A criança assume o papel
de Chapeuzinho e a história passa a ser contada através de
seu faz-de-conta e de suas dramatizações.
52
Vimos também, ao longo de todos os exemplos anteriores, a importância da ilustração
para guiar as atividades de ler, interpretar e contar as histórias, nas práticas de letramento.
As imagens, ilustrações e os desenhos são também uma importante forma de
simbolismo, por meio das quais a criança pode compreender e representar o mundo e
suas emoções. Para Vygotsky (2003), “o desenho é o modo de expressão típico da
idade pré-escolar, principalmente”. Todas as crianças desenham e as etapas pelas quais
passam seus desenhos são mais ou menos comuns para crianças de mesma idade.
Ainda assim, Vygotsky, no mesmo livro, mostra que também os desenhos das crianças
que dispõem de livros ilustrados são mais detalhados e maduros.
Professor(a), procure apresentar livros com boas ilustrações para as crianças.
O trabalho do ilustrador é tão importante quanto o de quem escreve a história.
Por isso, o(a) professor(a) deve incentivar as crianças a observarem as diferentes
formas de se ilustrar: pintura, desenho, colagem ou bordado.
Chapeuzinho Vermelho e Outros Contos por
Imagem. Rui de Oliveira, Companhia das Letrinhas.
MEDIOLI, Laura Machado. Xangó, o Detetive e o Mistério de
Matinho. São Paulo: Armazém de Idéias, 1994. p. 44
53
Todas as formas simbólicas (imagens,
desenhos, cantigas, jogos, linguagem
oral e escrita) são importantes na
construção do simbólico e do
imaginário. Mas também têm grande
importância para a construção de
vínculos emocionais e da identidade.
Os papéis que a criança assume no faz-
de-conta, as personagens com as quais
ela se identifica nos contos, servem
para ela compreender, aceitar suas
emoções e seu lugar social, os vínculos
e relações que estabelece com outras
pessoas.
Também Vygotsky (2003) afirma que:
Tudo o que a fantasia cria influi reciprocamente em nossos sentimentos e, ainda
que esta criação não esteja de acordo com a realidade, todos os sentimentos que
provoca são reais, efetivamente vividos pelo homem que os experimenta. Imagi-
nemos um simples caso de ilusão: a criança, entrando em seu quarto às escuras,
imagina que seu vestidinho pendurado é um homem estranho ou um bandido
que entrou escondido na casa. A imagem do bandido, fruto da imaginação da
criança, é irreal, mas o medo que sente, seu susto é completamente efetivo e
real para a criança que os experimenta.
Finalizando esta seção, podemos dizer que muitas ações e linguagens contribuem para
o desenvolvimento emocional, social e simbólico das crianças. As imagens, os desenhos,
os jogos de faz-de-conta, as conversas, as histórias e os escritos, introduzidos no mundo
da criança por meio das interações com adultos e outras crianças, são formas de
representação muito importantes na constituição de um indivíduo ativo, letrado e criativo
e, como tal, devem ter lugar de destaque na Educação Infantil.
PARA RELEMBRAR
- Vimos, nesta unidade, que a criança desenvolve linguagem na interação com
adultos ou com outras crianças mais desenvolvidas. Interação envolve a
participação tanto da criança como de seus parceiros, a quem cabe fazer a
mediação, como você já viu em unidades anteriores, entre os objetos em
Eugênio Sávio
54
construção e o aprendizado da criança. Adultos e crianças têm modos de
participação diferenciados nas interações e têm funções específicas no processo
de apropriação da linguagem pela criança.
- Nas interações, as crianças estão, ao mesmo tempo, construindo diversas facetas
da linguagem oral – seus sons, as palavras e seus significados, frases, textos,
maneiras de participar de diálogos e de contar suas experiências e de narrar
histórias ouvidas. Neste processo, os jogos de linguagem e o diálogo são centrais.
- Constatamos, através dos exemplos apresentados, que as crianças que têm
oportunidade de participarem de interações onde se folheiam livros ilustrados
e outros suportes de texto – como os gibis, por exemplo –, além de estarem
desenvolvendo a linguagem oral, estão também tomando contato com textos
e escritos, ilustrações e histórias imaginadas, o que favorece seu processo de
letramento (e o posterior desenvolvimento de escrita e alfabetização), o sucesso
escolar, além da imaginação e de outras formas de representação do mundo
em outras linguagens, como o desenho e jogo simbólico, que, para Vygotsky
(2003), constituem a pré-história da escrita e da criação literária.
ABRINDO NOSSOS HORIZONTES
Orientações para a prática pedagógica
- Na hora da rodinha – Esse momento de conversa coletiva na Educação Infantil é,
como vimos, precioso para o desenvolvimento da linguagem das crianças. Nele,
elas aprendem a conversar, em duplas ou em grupos, a relatar suas experiências, a
recontar histórias etc. Procure aproveitar esse momento para avaliar, a partir do
que vimos, o estado de desenvolvimento da linguagem das crianças. Não seja muito
diretivo(a), querendo organizar as falas e levar ao tema que você quer desenvolver.
É importante escutar o que as crianças têm a dizer e como dizem, deixar que elas
falem e propor temas e atividades de linguagem em que elas possam se engajar e
sobre os quais tenham o que falar. Relatar e recontar autonomamente exige muito
mais desenvolvimento do que conversar e dialogar. É necessário que você observe
e anote como as crianças agem com a linguagem nestes momentos. Tente adaptar
as exigências e encorajar a fala dos que são aparentemente mais tímidos ou calados
– é possível que sejam menos desenvolvidos.
- Na hora da história – Vimos que há muitas maneiras de contar histórias:
dialogando com as crianças, quando temos a ilustração como suporte ou quando
a história é conhecida deles; dramatizando as falas e ações dos personagens;
contando “de fio a pavio”; lendo. Vimos também que, em diferentes momentos
do desenvolvimento, as crianças têm preferência por um ou outro jeito de contar,
-
55
que mais vai favorecer seu desenvolvimento. Procure respeitar esses momentos e
adaptar sua maneira de contar às necessidades e preferências das crianças. É
importante dar a palavra às crianças, deixando que elas contem e recontem histórias
conhecidas. Nas idades mais avançadas, arrume jeitos de escrever na lousa, no
papel, em transparências para outras turmas e grupos as histórias que as crianças
contam, provendo experiências de letramento. Se as crianças quiserem “escrever”
(ainda que não estejam alfabetizadas) ou desenhar as histórias, deixe que isso
aconteça e providencie materiais de escrita. Sobretudo, tenha em mente que a hora
da história não é um momento para relaxar, dormir, divertir-se simplesmente, mas
um espaço fundamental de construção da linguagem, do simbólico e do emocional.
- No canto do livro – O manuseio de livros e de outros suportes de escrita é
fundamental para o letramento das crianças. O livro não é um objeto sagrado que
deve ser preservado, mas um objeto para ser usado e lido. Portanto, procure não
guardar os livros em armários e estantes altas, mas deixe-os num canto, para fazerem
parte do mundo das crianças, ainda que alguns se estraguem rápido. Em alguns
momentos, conte histórias no canto do livro para agrupamentos menores de
crianças, enquanto as outras fazem outras coisas. Procure conversar sobre as
ilustrações e indicar também os escritos. Deixe que as crianças também “leiam”
esses livros à sua maneira, para outras crianças ou para si mesmas. Nesses momentos,
você pode aproveitar para observar como “lêem”: se a partir das ilustrações ou se já se
remetem ao texto, como interpretam as ilustrações, que livros preferem. Você pode
também propor atividades a partir de livros e outros suportes de textos: recontar a
história para você escrever ou desenhar, desenhar ou dramatizar a história.
56
- Nas dramatizações – Como vimos, qualquer sucata (caixas de papelão, copinhos
de iogurte vazios, pau de vassoura) enriquece o faz-de-conta das crianças. Então,
procure enriquecer o cantinho da dramatização ou do faz-de-conta. Não é preciso
ambientes caros, comprados, como tendas ou casinhas decoradas. Vocês mesmos
podem combinar os “cenários” e “figurinos” e confeccioná-los a partir de materiais
simples, como jornal, papel craft, sucatas etc. Faça propostas coletivas para esses
momentos, que envolvam práticas, papéis e regras sociais ao alcance da criança,
como ir ao mercado, ao trabalho ou ao médico.
- Nas rotinas diárias (dar banho, dar de comer etc.) – Fale com elas, cante,
aproveite para fazer jogos de linguagem, dialogue. Ainda que desta maneira
estas atividades tomem mais tempo, são preciosas para o desenvolvimento da
linguagem, do afeto e do bem-estar.
- Escrevendo e desenhando – Hoje, não assumimos mais que o desenho é a
linguagem gráfica da criança pequena e que a escrita está reservada às crianças
maiores, alfabetizadas. Ao contrário, pensamos que experiências gráficas precoces
com o desenho e a escrita (ambos) são fundamentais para o letramento. Assim,
entremeie todas as outras atividades possíveis com seus desenhos e suas escritas.
Peça às crianças que desenhem e escrevam. Faça propostas, mas o importante
nesta experiência não é o produto final, e sim a própria experiência de desenhar e
escrever da criança.
- Nas cantigas e rodas – Vimos que cantigas, rodas, refrões, parlendas e trava-
línguas também são rituais importantes no desenvolvimento da linguagem, do
letramento e das emoções. Brincar com os sons da língua é atividade lúdica e
educativa. Entremeie suas diversas atividades com estes jogos de linguagem, com a
própria linguagem de vocês ou com suportes magnéticos ou digitais (fitas,
disquinhos, CDs, vídeos). Novamente, misture linguagens. Conheça novas cantigas
e trovas populares, perguntando às crianças as que elas conhecem. Não se atenha
somente ao seu repertório ou ao repertório escolar. Ouvir os pais e outros
funcionários da creche ou da escola é importante também.
GLOSSÁRIO
Diálogo: principal modo da interação face-a-face e cotidiana, a conversa ou diálogo
entre os participantes numa interação organiza-se por falas seqüenciais – um fala,
outro responde ou replica –, chamadas turnos de fala. É no diálogo com adultos e
outras crianças mais desenvolvidas que as crianças constroem e desenvolvem
linguagem.
57
Imaginação: para Vygotsky (2003), toda atividade humana que não se limite a
reproduzir fatos ou impressões vividas, mas que crie novas imagens, novas ações,
pertence a esta segunda função psicológica criadora ou combinatória: a imaginação.
É precisamente a atividade criativa do homem que faz dele um ser projetado para o
futuro, um ser que contribui criando e que modifica seu presente.
Letramento: processo através do qual a criança se insere nas práticas sociais de leitura e
produção de textos que envolvem a escrita, descobrindo suas propriedades, as maneiras
de agir nessas práticas e construindo novos discursos. As diferentes esferas de atividade
social (igreja, escola, jornalismo, internet, burocracia etc.) promovem diferentes tipos e
níveis de letramentos, diferentes maneiras de lidar com os textos escritos.
Mediação: função de estabelecer a relação entre dois termos ou situações. Para
Vygotsky, não há desenvolvimento ou aprendizagem que passe sem a mediação de
outro ser humano participante da cultura. Para ele, não se aprende na mera relação
com os objetos do mundo, mas esta relação está sempre interpretada, conduzida,
mediada por outros membros da cultura (a família, os(as) professores(as), os padres,
adultos em geral e mesmo crianças mais desenvolvidas) mais experientes e que já
dominam certas práticas culturais com esses objetos. A mediação se dá essencialmente
pela linguagem e pelo diálogo.
Narrativa: tipo de discurso que abrange diferentes gêneros de textos (relatos de
experiências vividas, contos-de-fadas, histórias infantis, casos populares, notícias etc.),
cujas funções principais são retomar e documentar ações e fatos acontecidos ou vividos
ou criar novas realidades a partir de ações e fatos imaginados. É, portanto, um discurso
de ações seqüenciadas no tempo e situadas no espaço.
Representação: no debate filosófico entre convencionalistas e naturalistas na Grécia
antiga, o caráter de representação da linguagem era central. Para Demócrito, representante
dos convencionalistas, não há harmonia pré-estabelecida entre os nomes e o mundo. Os
nomes, cuja justeza é resultante de um acordo entre os homens, são assim vistos como
fundantes. Para Heráclito, naturalista ou essencialista, as coisas da natureza têm uma
essência que é capturada pelos nomes. As palavras são o justo reflexo dos objetos, traduzindo
seu sentido essencial. A linguagem, assim, depende da natureza. Há uma harmonia pré-
estabelecida entre a linguagem e o mundo. Decorrente do debate filosófico ao longo dos
séculos, a psicologia vê os símbolos e signos das diferentes linguagens (gestuais, gráficas
ou pictóricas, oral e escrita etc.) como representações (na ausência) de objetos do mundo
real ou possível (virtual) e também como uma possibilidade de expressar e de comunicar a
outros estas representações.
Símbolos: maneiras de representar pelas linguagens, em geral visuais e gráficas, objetos
ou aspectos da realidade. Retomam e imitam, de maneira direta ou indireta, aspectos e
formas destes objetos ou realidade. Por exemplo, os desenhos infantis que “se parecem”
com os objetos representados (maneira direta) ou o símbolo de “proibido fumar”,
que representa com realismo o cigarro aceso e acrescenta uma barra ou cruz, que
está convencionada socialmente como “é proibido”.
58
Signos: outra maneira de representar pela linguagem, escrita ou oral, objetos ou
aspectos da realidade. Sua característica principal, diferentemente dos símbolos, é
não retomar nenhum aspecto específico do objeto representado e ser inteiramente
uma convenção social, ser arbitrária (escolhida, combinada, convencionada pela
sociedade). Assim, a palavra escrita mesa e a falada através dos sons /meza/ não
retomam ou representam nenhum aspecto material do objeto mesa (ser quadrado ou
redondo, de madeira ou vidro, ter “pés”, ser alta ou baixa etc.) e por isso servem como
designação universal deste objeto. Embora universais, esses signos são arbitrados,
convencionados diferentemente, nas diferentes línguas (mesa, table (in.), table (fr.),
tisch (al.), mènsa (it.) etc.).
Suporte: é a base física na qual se registram informações, no caso, escritas: um
livro, um site, um jornal etc. O suporte textual e também a estrutura do texto
influenciam a interação do leitor com o texto.
SUGESTÕES PARA LEITURA
ANDERSEN, Hans Christian. Histórias Maravilhosas de Andersen. São Paulo: Cia das
Letrinhas, 1995.
AZEVEDO, Ricardo. O Meu Livro de Folclore. São Paulo: Ática, 1997.
FIUZA, Elza. (Recontado) A Galinha Ruiva. São Paulo: Moderna, 1995.
HILL, Eric. O Primeiro Passeio de Bolinha. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
ROCHA, Maria Sílvia. O real e o imaginário no faz de conta: Questões sobre o
brincar no contexto da pré-escola. In, M. C. R. de, GÓES SMOLKA, A. L. B. (orgs.).
A significação nos espaços educacionais: Interação social e subjetivação. Campinas:
Ed. Papirus, 1997.
SOARES, Magda. Letramento: Um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1988.
VYGOTSKY, Lev. A pré-história da linguagem escrita. In: COLE, M., SCRIBNER S.
et al. A Formação Social da Mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos
superiores. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1984.
59
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Manoel de. O Fazedor de Amanhecer. Rio de Janeiro: Salamandra, 2001.
ELKONIN, D. B. Psicologia do jogo. Trad. de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins
Fontes 1998.
GÓES, M. C. R. Os modos de participação do outro nos processos de significação
na criança. Temas de Psicologia, vol. 1: 1994.
KLEIMAN, A. B. Os Significados do Letramento: Uma nova perspectiva sobre a prática
social da escrita. Campinas: Mercado de Letras, 1995.
LAHIRE, B. Sucesso escolar nos meios populares: As razões do improvável. São Paulo:
Ática, 1997.
LEMOS, C. T. G de. Sobre aquisição de linguagem e seu dilema (pecado) original.
In: MEISEL, J. M. (org.). Adquisición del lenguaje/Aquisição da linguagem. Frankfurt/
M: Vervuert, 1996.
OLIVEIRA, Rui. Chapeuzinho Vermelho e outros contos por imagem. São Paulo:
Cia das Letrinhas, 19??.
PIAGET, J. El lenguaje y las operaciones intelectuales. In: PIAGET J. et al. Introducción
a la Psicolinguística. Buenos Aires: Nueva Visión, 1977.
SOARES, M. B. Letramento: Um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica,
1998.
VYGOTSKY, L. S. Internalização das funções psicológicas superiores. In: M. COLE,
M., SCRIBNER, S. et al. A Formação Social da Mente: O desenvolvimento dos processos
psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
_____________. La imaginación y el arte en la infáncia. Madrid: Ed. Akal, 2003.
_____________. A pré-história da linguagem escrita. In: COLE, M., SCRIBNER, S. et al.
A Formação Social da Mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos
superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
______________. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
60
C - Atividades integradoras
61
Como vimos na Unidade 6 de FE, a criança constrói sua linguagem a partir das interações
que vivencia em seu meio social. É na interação com os outros que os significados das
palavras vão se construindo: quanto mais ricas as possibilidades de interação que a
criança tiver, maiores suas possibilidades de construir conhecimentos sobre o mundo
que a cerca. No texto de OTP, também pudemos reforçar a importância da qualidade
de interação para que a linguagem se desenvolva.
Pensando na prática pedagógica, planeje uma atividade que tenha como objetivo
específico o desenvolvimento da linguagem oral. Para realizar a tarefa, propomos:
1. A leitura do item Abrindo Nossos Horizontes da Unidade 6 de OTP. As
sugestões apresentadas nesse item podem ajudar na escolha de uma
estratégia. No entanto, você poderá criar outras situações não mencionadas
no item indicado.
2. Em duplas, escolha uma estratégia e os recursos que serão utilizados.
3. Ao planejar a atividade, pense nas crianças de sua creche, pré-escola ou
escola e descreva como deverá ser desenvolvida a sua proposta. Não se
esqueça que as mediações do adulto são importantes para o desenvolvimento
da linguagem oral.
4. Cada dupla deve apresentar oralmente a atividade planejada. É importante
explicar a que grupo de crianças ela se destina.
5. O grupo todo deve avaliar as atividades propostas, observando se elas
atendem ao objetivo traçado – desenvolvimento da linguagem oral – e se são
adequadas aos grupos a que se destinam.
6. O tutor poderá reunir as atividades elaboradas pelo grupo e organizar uma
pasta que ficará à disposição dos(as) professores(as) para futuras consultas.
Esta obra foi composta na Editora Perffil e
impressa na Esdeva, no sistema off-set, em papel
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