Investir em projetos específicos: uma possibilidade de mudar o todo?
A reforma do ensino médio coloca exigências que nos levam repensar a escola
como um todo desde os princípios filosóficos à organização curricular.
Entendemos, porém, que as mudanças devem ocorrer de forma gradativa.
Existe, sem dúvida, uma relação intrínseca entre as mudanças parciais e as
diretrizes mais gerais que orientam o Plano Escolar. A concepção de educação
das escolas deve se expressar em todas as ações, garantindo a articulação entre
o todo e as partes. Este princípio vale tanto para a elaboração de projetos
pedagógicos quanto para outras situações que, aparentemente, são "um valor por
si mesmas" como, por exemplo, a aquisição de materiais didáticos e a trans-
formação de espaços físicos. As mudanças processadas na escola ou estão a
serviço da implementação do Plano Escolar ou acabam se constituindo em
ações isoladas que não consolidam o processo .
Não há como introduzir um elemento novo sem modificar a concepção do todo.
Um exemplo que nos faz pensar
Grandes mudanças já ocorreram em outras áreas do conhecimento e da
sociedade através do tempo. É possível que, neste momento, o leitor já tenha
em mente uma série de exemplos de transformações que geraram conseqüências
até imprevisíveis.
Como observadores, em alguns casos, como participantes ativos em outros, é
bem possível que não nos tenhamos detido para registrar todas as conseqüências
dessas mudanças, a não ser as mais importantes ou as mais óbvias.
Consideremos, por exemplo, uma mudança específica ocorrida na Sétima
Arte, o Cinema, nas primeiras décadas do século passado, com a introdução
da voz nos filmes que até então eram mudos. Nos dias de hoje, com avanços
tecnológicos que permitem criar cenários e personagens virtuais, essa trans-
formação é pouco lembrada como inovação de impacto. No entanto, ela criou
uma revolução na forma de se fazer cinema.
O que acontece com o cinema quando se introduz a voz, isto é, quando se
passa do cinema mudo para o cinema falado?
Muda basicamente a estrutura narrativa, a percepção sobre os diferentes modos
de contar uma história. Os elementos estruturais da narrativa: personagens,
narrador, espaços, cenários, o tempo, o sequenciamento e, como é fácil inferir,
a relação entre esses elementos, é profundamente modificada. Os atores precisam
mudar as formas de representar, os textos precisam assumir outra natureza.
Há um outro aspecto a considerar, que se apresenta como exterior à produção de
filmes, mas indispensável para que o espetáculo aconteça da melhor forma possível.
Para a introdução do cinema falado é necessário modificar a concepção de
"salas de cinema". O espaço é modificado de forma radical, colocam-se portas para
impedir que outros ruídos prejudiquem a compreensão do que se está apresentan-
do. Torna-se necessário rever a acústica, colocam-se caixas de som, os alto-falantes,
como eram conhecidos.
Os proprietários de salas de cinema não tem como resistir: ou se adaptam, ou
perdem o público. Outras possibilidades dos filmes, até então não exploradas, con-
siderando a situação anterior, passaram a se constituir em propostas inovadoras:
surge o cinema documental e o cine jornal, por exemplo. A introdução de um ele-
mento novo modificou a concepção do todo.
Também no que se refere à construção de uma nova escola, a introdução de uma
pequena inovação, quando implementada e absorvida no cotidiano, termina por
dinamizar o Projeto da escola em seu conjunto. Por outro lado, quando não há
abertura para se repensar constantemente a concepção de escola e de aprendizagem,
todos os materiais e iniciativas, por maior potencial de inovação que possam repre-
sentar, correm o risco de ser assimilados e incorporados de forma tradicional.
(Re) construindo a escola: um processo onde o conflito faz parte do avanço
Diversas experiências apresentadas neste Fórum revelam que o processo de
mudança não se deu sem conflitos. Até mesmo as experiências que possam parecer
restritas a poucos professores ou a uma área de conhecimento, por exemplo, não
avançaram sem que diferentes pontos de vista e interesses se confrontassem. Também
foi preciso lidar com "resistências" que mais se devem ao "não saber fazer" do que
a uma indisposição para o trabalho diferenciado. Quando esses elementos foram
explicitados, discutidos e enfrentados o processo avançou.
Não há decisão coletiva que se fortaleça sem o reconhecimento da ambigüidade
presente nas decisões, principalmente, quando dizem respeito à situações que não
se vivenciou ou sobre as quais não se pode garantir o controle que, supostamente,
se tem quando atuamos da forma que nos é conhecida, familiar.
As decisões sobre o que, como e quando inovar, certamente, podem não con-
vencer a todos. Isto não deve ser um impedimento para que se pense naquilo que