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RELATÓRIO I - PARTE A ,
A MERENDA ESCOLAR NO CONGREGO NACIONAL - PRIMEIRAS
OBSERVAÇÕES E TRAJETÓRIA PARLAMENTAR:
DO POPULISMO AO REGIME AUTO.
RITARIO
SETEMBRO 1981
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
CAMPANHA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR
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c
1
- INTRODUÇÃO
o
Ao longo das três últimas décadas, muitas foram
as iniciativas de parte do Poder Executivo em relação ao estabe
lecimento de "políticas da alimentação (ou nutrição)", formula
das e implementadas sob alegações variadas, mas que, essencial
mente compartilham a constatação obvia do precário estado nutri
cional de extensos segmentos da população brasileira, sendo o
mais crucial aquele constituído pelas crianças na fase pré-esco
lar e de educação primária fundamental.
Os planos foram consubstanciados na criação de
várias burocracias públicas encarregadas da execução dessas po
líticas, sendo a Campanha Nacional de Alimentação Escolar (ex '
Campanha Nacional de Merenda Escolar, ex Campanha de Merenda Es_
colar), cuja atuação abrange todo território nacional, até hoje
a principal responsável no que toca à complementação alimentar
o
dos escolares de primeiro grau.
A ampla área de ação, o elevado contingente popu
lacional coberto pela Campanha e ainda as grandes quantidades
de alimentos e recursos manipulados para a operação de seus pro
gramas, formam um conjunto de fatores que levam-nos à suposição
de que o Congresso Nacional, especialmente a Câmara dos Deputa
dos, dado que nele em tese, estão representados os setores en
volvidos (produção, indústria e "consumidores"), mantêm-se aten
to aos desdobramentos da política de alimentação escolar, ao
mesmo tempo em que procura influir no processo, seja em busca
de contemplar este ou aquele setor produtivo, seja objetivando
privilegiar mais ou menos certas parcelas do eleitorado.
Buscando determinar que papel, se algum, tem real.
mente representado o Congresso Nacional, face a estas políticas,
a equipe realizou um inventário das manifestações parlamentares
durante as Sessões Legislativas, era relação ao tema geral,
mentação (ou Merenda) Escolar", em termos de iniciativa do Go
verno Federal, desde a época da instituição da Campanha da Me
renda Escolar (1955) até 1980.
A partir dos registros taquigráficos de pronunci-
amentos em. Plenário, procurou-se reconstituir as proposições de
projetos (encaminhadas e votadas), discursos e debates ocorri
dos, tanto em Grande Expediente quanto no "Pinga--Fogo" (Pequeno
Expediente) , formulação de; Requerimentos e ainda Pequenas Com-
nicações.
Ê possível que, dada a pouca precisão dos regis-
tros, queo se tornando cada vez menos específicos à medida
em que se recua no tempo, tenha havido pronunciamentoso re
gistrados, embora este fato deva trazer reflexos apenas quanti
tativos em nossa análise. A tarefa de leitura seqüencial de to
da a coleção do Diário do Congresso Nacional, a partir de 1955
afigurou-nos impossível dentro das limitações desta Pesquisa.
II " ASPECTOS QUANTITATIVOS
a
Na Câmara dos Deputados, executando-se - apar
tes -, foram encontrados cerca de 10 4 pronunciamentos de alguma
forma relacionados com o tema, no período proposto.
2
Deste to
tal, a maioria - 37,7%o Pequenas Comunicações, intervenções
curtas e não-programadas, no Pequeno Expediente.
-
As Apresentações de Projeto e encaminhamento re
alizados quando da deliberação da Casa a este respeito somam
cerca de 23 ocorrências (22,1%), vindo os Discursos em Pequeno
Expediente em 3° lugar (21,1% das ocorrências). Os requerimen
tos, em sua maioria solicitando informações ao MEC acerca do an
damento da Campanha nos estados,o um número de 15 (14,4%). Os
discursos no Grande Expediente somaram 3,8% do total. (Vide ta
bela I) .
A ocorrência de pronunciamentos de Deputados ao
longo dos 25 anos observados
3
mostra irregularidade em termo de
freqüência:o foram encontrados quaisquer pronunciamentos so
bre o tema nos anos de 1955, 1957, 1958, 1960 e 1970. Por outro
lado, percentualmente, os anos em que houve mais manifestações
foram 1976 (15,4%), 1967 (10,5%), 1980 (9,6%) 1964 (8,6%), 1968
(8,6%), 1965 (6,7%). Os demais variam entre 1 e 5 pronunciamen-
tos por ano (Ver gráfico).
As discussões em torno de projetos concentram-
se, em maioria (43,4% dos totais) durante o ano de 1976.
Outros projetos foram propostas ou votados nos
anos de 1956, 1961, 1964, 1967, 1968, 1972, 1975, 1978 e 1979 *
(Ver gráfico).
Metade dos discursos em Grande Expediente foi
TABELA I
1955
1956
1957
1958
1959
1960
1961
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
TOTAL
AP. PROJETO
ou
DELIBERAÇÃO
-
01
-
-
-
-
01
-
-
02
-
-
01
01
-
-
'
01
-
-
02
10
-
01
03
-
23
DISCURSO
GRANDE EXPEDIENTE
-
-
-
-
-
-
02
-
-
-
-
-
-
01
-
-
-
-
-
-
01
-
-
-
-
04
DISCURSO
PEQUENO EXPEDIENTE
-
-
-
-
-
-
-
-
-
02
01
01
-
01
-
-
-
-
02
-
04
01
-
-
10
22
REQUERIMENTO
-
-
-
-
- -
-
-
-
-
-
03
02
08
02
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
15
PEQUENA
COMUNICAÇÃO
-
01
-
-
01
-
02
02
05
05
03
02
02
04
-
-
01
03
02
-
01
02
02
01
01
-
40
T O T A L
-
02
-
-
01
-
05
02
05
09
07
05
11
09
-
-
01
04
02
02
04
16
03
02
04
10
104
o
06
proferida em 1961, guando também ocorreu o 1° debate sobre
então Campanha Nacional da Merenda Escolar na Câmara dos Deputa-
dos. Outras manifestações no "horário nobre" das sessões Legis-
lativas somente ocorreram em 1968 e 1975 (Ver gráfico).
«
(45,4%) dos discursos durante o Pequeno Expedien
te ocorreram no ano de 1980, estando os outros pulverizados eu
1977
' 1976 (18%), 1968, 1966 e 1964 (Ver gráfico).
A totalidade dos requerimentos acha-se concentre
da entre 1965 e 1968, sendo que mais da metade (52%) em 1967. '
o se encontrou os registros de Requerimentos em nenhum momen
to anterior ou posterior ao período acima delimitado (Ver gráfi-
co)
.
As Pequenas Comunicações, acham-se distribuídas
de maneira mais uniforme no período. Executando-se os anos de
1955, 1957, 1958, 1960, 1970, 1974 e 1980, quandoo ocorre
ram, o número de manifestações desta categoria tem variado en-
tre 1 e no máximo 5 ocorrências (em 1963 e 1964), por ano (Ver
gráfico).
No quadro partidário anterior a novembro de 1965,
observa-se clara predominância dos pronunciamentos feitos por
parlamentares do Partido Trabalhista Brasileiro. Das 30 ocorrer
cias registradas entre 1955 e novembro de 1965, 50%o de par
lamentares petebistas. 40% dos restantes dividem-se igualmente
entre parlamentares do Partido Social Democrático (PSD) e da
União Democrática Nacional (UDN) e os outros 10% para os demais
partidos.
Note-se que o primeiro pronunciamento de um depu-
tado udenista especificamente sobre a Merenda Escolar ocorre,
isoladamente, em 1963, somente havendo novas manifestações de
deputados daquela agremiação a partir de 1964 (Vide Tabela 2).
Entre 1965 (novembro) e 19 79, observamos a ocor
rencia de cerca de 60 pronunciamentos. Aproximadamente 56% des
te total constitui-se de pronunciamentos de Deputados filiados
ao MDB ficando a ARENA com o restante.
A nivel do presente relatório aindao foi pos-
sível montar um quadro tomando como referência os novos parti_
dos surgidos a partir da extinção da ARENA e MDB.
III - ASPECTOS QUALITATIVOS o
A maneira através da qual a merenda escolar é
abordada pela Câmara dos Deputados parece acompanhar as grandes
linhas de atuação daquela Casa Legislativa dentro do período
histórico posto em observação.
Assim, ê possível distinguir dois grandes perío
dos: O primeiro, correspondente à fase final do populismo, de
cuja vertente "Welfare" se originou inclusive a Campanha Nacio
nal de Merenda Escolar; até sua derrota definitiva no Congresso,
que culminou com o episódio da Decretação do Ato Institucional
n° 05; O segundo, a partir da reabertura do Parlamento, onde se
presenciam as articulações de novos interesses, seja dos seto
res produtivos, seja das massas populares.
1. A última ascensão do populismo é o movimento
de 1964.
Durante os primeiros 5 anos de existência da Cam
panha, elao parece atrair diretamente sobre si a atenção dos
deputados. As preocupações, quando surgem, dirigem-se predomi_
nantemente a aspectos gerais sobre o abastecimento de gêneros
as populações urbanas mais pobres, e as agências encarregadas ,
como o SAPS ou a COFAP.o obstante, o Nutricionismo, enquanto
profissão pelo menos, interessa à Câmara que, ja em 1956 assis-
te à apresentação de um projeto de Lei criando curso de forma.
ção profissional superior naquela área.
5
A primeira grande reestruturação da Campanha, em
1959, quando deixa de ser uma simples subdivisão da DEEE (Divi-
o de Ensino Extra-Escolar) e seu Superintendente passa a ter
mais autonomia, reportando-se diretamente ao Diretor do Departa
mento Nacional de Educação, enseja também o primeiro pronuncia-
mento de um deputado a cerca do que vem sendo desenvolvido, em
termos de alimentação escolar, pela Superintendência da Campai
nha. Este discurso contém referências muito elogiosas do seu Di_
rigente, e é possível que faça parte da batalha burocrática in
terna pelo controle da (já naquele momento), cobiçada direção
da Campanha Nacional de Merenda Escolar.
Trata-se de uma comunicação, lida pelo Deputado
Fonseca e Silva
6
que,o tendo sido reeleita para a próxima
legislatura, despedia-se da Câmara.
Depois de declarar-se empenhado nos assuntos de
Educação e Cultura, o Deputado lamenta o desconhecimento a que
se relega "o problema da Merenda Escolar, de que é Superinten
dente o abnegado Professor Salvador Giullanelli (Sic)," concla-
mando seus pares a compartilharem com ele da "grave" e "dramáti
ca situação da nossa população escolar".
Após fazer referências às iniciativas da FAO pa
ra "chamar atenção dos governos", como a conferência sobre Agri
cultura e a Alimentação, de Hot Springs (1943) e Genebra (1947);
que "ressaltou a imperiosidade de se fomentar a alimentação es
colar, dando-lhe a prioridade entre as medidas que se tomassem
para melhorar o estado nutritivo da população", além de outros
eventos como a 1ª Conferência Sobre Problemas de Nutrição na
Améria Latina (Montevidéu - 1948)"; a reunião de Baguio, no mes
mo ano, a II, III e IV conferências Lantino-Americanas de Nutri
ção (...) e, mais recentemente, os Simpósios de Desnutrição In
fantil, promovidas pelo Instituto Interamericano del Nino, da
Organização das Escolas Americanas" (La Paz e Cali - 1975) e o
I Seminário Regional de Merenda Escolar (Bogotá, 1958); o Sr. '
Fonseca e Silva informa: "0 Brasil, em 1955-ano em que por pro
posta de seu dirigente foi instituída a então Campanha de Meren
da Escolar - resolveu enfrentar, em termos racionais e objeti
vos a realidade que um ano antes comprovara, pela divulgação dos
resultados do inquérito alimentar mandado proceder em diferen
tes ponto do País. E o quadro é chocante."
O Deputado cita então os dados sobre as condi.
ções nutricionais, lembrando do que, em 1956 somente 10% das
crianças iam à escola em situação nutritiva satisfatória, bem
como outros dados, que revelariam os progressos obtidos a par-
tir da implantação da Campanha: "Ate 1945, o índice de alunos,
sobretudo de escolas primarias que recebiam alimentação dentro
da escolao passava de 4%, Já em 1955 este índice subiu para
10% e agora,o podemos deixar de dizer, alto e bom som, que
já atingiu 40%. Por que? Porque frente a esse serviço se encon
tra um abnegado, um homem cheio de espírito publico, que falta
a muitos administradores nesta terra. Estamos cansados de ouvir
frases bonitas, algarismos cor-de-rosa. . .
!!
Neste momento do discurso, um curioso aparte do
Deputado Frota Aguiar: "Precisamos de um movimento revoluciona
rio para acabar: com isso."
E prossegue o Sr. Fonseca e Silva: "...mas o que
sentimos no grande Professor Salvador Giulianelli é sua dedica.
ção a frente desse trabalho."
Zidiante, a informação de que o programa da Campo.
nha Nacional de Merenda Escolar conta com o auxílio do FISI, que
"representa hoje 19,5% de seu atendimento global de 1,000.000
de crianças o que o transformou no maior programa continental
considerado (...) como 'padrão' paira aplicação na América."
Depois de atribuir essa. eficiência do "técnico
que a criou" (Julianelli) e que teria imprimido a Campanha ca
racterísticas de eficiência de uma empresa privada, já que con
seguiu transportar em 1958, "sem que possua sequer um caminhão
em todo território nacional, 11 milhões de libras-peso
7
de ali.
mentos sem contar 3.16 8 toneladas que lhe forneceu o FISI," o
orador critica "o açodamento vigilante da imprensa que lhe res
ponsabiliza (à Campanha) pelo abondono lastimável de mercado
rias nos portos, cuja propriedade lhe é atribuída quando, em
realidade,o lhe pertence. Isto ocorreu cie um ano a esta data
nada menos que 19 vezes (...)"
Ressaltando que a Campanha recebe apoio de diver
sos setores, inclusive do Congresso, o Deputado Fonseca e Silva
conclui:
,!
Por tudo isso e pelo desenvolvimento da nova experiên
cia de participação das comunidades na solução do problema da
produção local e da alimentação racionalizada, o quadro de há
quatro anos, quando se anuncia para julho a realização do semi
nário da Merenda Escolar promovido pela FAO e pelo FISI no Bra
sil, sem apresentara de maneira totalmente diversa. Aquele índi
ce de nutrição desejável, então de apencis 10%,- apresenta-se no
je elevado para 40%. Mantido este ritmo, em 1967 teremos exter
minado o mais deprimente aspecto da subnutrição infantil, no
que se refere as crianças que freqüentam escolas. Atividade de
o imediato resultado poucas vezes pode ser constatadas em nos
so país" (...)
Além do incisivo comentário de Deputado Frota
Aguiar, nenhum aparte ou comentário a propósito deste pronuncia
mento. Somente dois anos depois, a partir de janeiro de 1961 é
que o assunto volta a interessar o plenário da Câmara, no apa
gar das luzes do Governo Juscelino Kubitschek, quando abre o
pano político para o ato final do populismo na vida política '
brasileira contemporânea.
a 25 daquele mês, o Deputado goiano Benedito Vaz
(PSD), em seu discurso encaminhando o projeto do Código Nacio
nal de Alimentos
8
relaciona entre seus elaboradores o Dr. J. J.
Barbosa, "ex-membro do Conselho Coordenador do Abastecimento e
agora na Campanha Nacional da Merenda Escolar".
Informa ainda a parlamentar que este projeto foi
preparado por solicitação do Dr. Walter Joaquim dos Santos, Se
cretãrio-Geral do Conselho Coordenador do Abastecimento.
Dois meses depois, acontece o que talvez tenha
sido a mais acalorada discussão parlamentar em torno da Campa
nha Nacional da Merenda Escolar, envolvendo dois deputados da
bancada Pernambucana, ambas pertecentes ao Partido Trabalhista
Brasileiro: o famoso geógrafo, o nutricionista Josué de Castro
e Estácio Souto Maior, polemista ferino.
Durante o Grande Expediente de dia 2 de março de
1961,
9
o Deputado Josué de Castro profere um longo Discurso de
nunciando o programa de ajuda alimentar Norte-Americano, conhe
cido na época como "Alimentos para a Paz".
Qualifica-o de paternalista e inaceitável, por
gerar dependência, classificando o programa de estratagema do
Departamento de Agricultura dos EUA para se livrar dos estoques
excedentes, que estavam fazendo cair o preço dos alimentos no
mercado mundial.
O Deputado Josué de Castro depois de assegurar
que "com essa compra, o Brasil instala indústrias concorrentes
às nacionais, queo remeter seus lucros para os Estados Uni
dos, em dólares", em certo momento, adverte: "(...) Há ainda um
perigo enorme: é que esses excedenteso transitórios. Os Esta
dos Unidos estimulam o consumo de certos alimentos no mundo, co-
mo o fez no Brasil, depois que seus excedentes acabam, ficamos
s sem ter para quem apelar e passamos a ter crises de forma
ção de hábitos, sem ter meios de satisfazê-los. Issoo é hipo
tese, e dou meu testemunho do Delegado do Brasil na FAO.
Há dois anos, em novembro de 19 59, lutei denota
damente porque os Estados Unidos queriam suspender os planos de
Alimentação das crianças com leite em, por estarem prestes a
extinguirem seus excedentes. Foi preciso uma luta titânica dos
países subdesenvolvidos para que prorrogasse, por alguns meses,
o plano. Graças à boa vontade, no caso, do Governo do Canadá,
o foram suspensos os programas de alimentação, de merenda es
colar, alimentação infantil com excedente de leite em. Ax
está outro perigo desses planos de Alimentos para a Paz, que.
o paliativos, eo planos de solução integral" (...)
Em vez de propor este tipo de negócio, os Esta-
dos Unidos deveriam, acrescentou Josué de Castro, ou doar os gê
neros, ou colocá-los à disposição da ONU, que se encarregaria
de distribuí-los.
Mais adiante, lembrou o Deputado, um encontro, era
1955, com o então Presidente Truman, dos Estados Unidos, quando
propôs a este a doação à FAO, organismo que na época dirigia,
dos excedentes alimentares norte-americanos o "o Presidente Tru
man, tendo como testemunha seu ministro da Agricultura Sr. Char-
les Brown, respondeu-me o seguinte; "Não posso concordar cora o
senhor, os Estados Unidoso podem abriro de seus exceden
tes de alimentos para as Nações porque os Estados Unidos devera
manipular seus alimentos politicamente: Confessava o Presidente
norte americano que seu país desejava barganhar com a fome dos
povos famintos do mundo." ..."Longe de ser esse um.plano de ali
mento para a paz, é ura plano para captar alianças para a forma.
ção de guerras. Ê alimento para a guerra eo para a paz."
Ao final de seu discurso, o Deputado Josué de
Castro faz um apelo ao Presidente da República: "(...) queo
venda a fome dos brasileiros, porque os brasileiros preferem
passar fome a ser escravos (...)"
"O Brasil continua a mandar na sua miséria, na
sua fome e no seu subdesenvolvimento. É capaz de, com sua econo
mia, com sua poupança, com seu esforço e trabalho, tornar-se in
dependente da falsa caridade, das grandes potências colonialis
tas imperialistas e exploradoras da fome do mundo."
0 Diário do Congresso informa, na edição que pu
blicou este pronunciamento, que o Plenário se manifestou com
muitos aplausos e cumprimentos do orador.
Imediatamente a seguir, no entanto, sobe à tribu
na, era caráter preferencial, o Deputado Souto Marior, que ini
cia seu discurso avisando que este "visa criticar os demandos
administrativos da Campanha Nacional da Merenda Escolar."
A partir daí, todo o discurso adquire a caracte
rística da denúncia, corrente no início do governo Jânio Qua-
dros, quando uma onda de "moralização administrativa" inspirada
pela célebre "vassourinha" gerou a instalação de inúmeras comis
soes de inquérito, de sindicância e de correição administrativa.
Em primeiro, lugar, o Deputado caracteriza como
"estranha" a ascensão a altos cargos administrativos de certos
"profissionais da administração pública que até agora, impune
mente, desfrutam da falta da vigilância com que se conduzem nes;
te país, os negócios públicos (...) a personificação da solér
cia que nenhuma medida destrói, porque fornece hoje para renas
cer amanhã (...) esse "abominável homem das verbas" (...) mante
ve-se nos governos anteriores como hoje procura equilibrar-se '
por entre ameaças de devassas e inquéritos que,só efemeramente
parecem tolher a desenvoltura com que assoalham a certeza de im
punidade que compram e mercadejam como meio de vida. Um dos mais
expressivos exemplares dessa fauna ao mesmo tempo pitoresca e
danosa domina hoje um dos setores de maior importância no campo
da educação e da assistência: a Campanha Nacional de Merenda Es_
colar. Trata-se de seu Superintendente, o Tenente Coronel do
Quadro do Magistério Militar, Medico, Nutrólogo, Técnico, Espe
cialista, Planejador e o que mais ele mesmo se intitula, Walter
Joaquim dos Santos."
Em seguida, o parlamentar pernambucano traça o
que seria um perfil biográfico do Superintendente, carregado de
ironia: "... Transformou-se em pouco mais de 4 anos, de simples
e acredito que dedicado mestre-escola do Colégio Militar do Rio
de Janeiro, em potestade internacional... possui a idéia - fixa
dos planos... surgiu na administração civil como planejador de
um programa experimental de distribuição de leite em pó às popü
lações pobres do Estado de Pernambuco. Por feliz coincidência,
o plano salvador, executado às vésperas da eleição de 19 54 trou
xe como única e previsível conseqüência a eleição de candidatos
a cargos detivos alguns de seus amigos, comanditários e proteto
res. (...) A vocação de nutrólogo de sua excelência arrastou-o
do novo órgão então criado, a Campanha de Merenda Escolar..." '
"... o resultado da imprevidência dos incautos levou-o à Secre
taria Geral do Conselho Coordenador do Abastecimento, tendo co
mo lastro os fabulosos planos de erradicar a desnutrição no se-
tor escolar...o abandonou a idéia fixa dos planos que o ator
menta até hoje. "(...) "De sua posse, em setembro de 1957, dedi
cou-se o Abastecedor e sua equipe a elaborar exclusivamente o
Plano Nacional de Abastecimento, consubstanciado no Decreto n?
42.332 - A de 25 de setembro de 1957 (...)"
Quando o Sr. Souto Maior acusava o Superintendei].
te de falta de vivência com os problemas nacionais e estranhava
suas constantes viagens, inclusive ao exterior, o Deputado Jo
sue de Castro o aparteia: "Ê profundamente lamentável que,(...)
por idiossincrasia, por intolerância e por imcompreensão pessoal
cora aquele que criou a Campanha de Merenda Escolar, que fui eu,
seu colega de bancada, por Pernambuco, pelo ódio que aguarda
a este colega... venha V. Ex- detestar um homem capaz e comba
ter uma Campanha das mais úteis e essenciais ao desenvolvimento
do Brasil."
Desse momento em diante, ocorre uma mútua troca
de acusações. Souto Maior dizendo que Castro também viajava ao
exterior à custa da Campanha e este acusando o primeiro de ten
tar impedir, por motivos pessoais e mesquinhos, a distribuição
de leite pela Campanha, "apenas para que, em Pernambuco, euo
tivesse o prestígio de ser o criador de alguma coisa que fosse
benéfica ao Brasil inteiro."
Em seguida, Souto Maior volta à carga contra o
Superintendente da Campanha, relembrando o fracasso de seus pla
nos quando na CCA, que teriam-no levado a demissão pelo então
presidente Kubitschek.
0
"Demitido em fevereiro de 1959 da CCA, menos de
ums levou rearticular suas providências. (...) Em 18 de mar
ço publicava o Diário Oficial da União (...) três Decretos, de
nomes 45.582, 45.583 e um sem número. 0 primeiro, dava auto.no
mia técnica a Campanha Nacional de Merenda Escolar, subordinan
do-a ao Departamento Nacional de Educação... O segundo... consi_
derou de interesse militar as funções exercidas na referida Cara
panha por militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
O terceiro, sem numero, nomeava o coronel estrategista para Su
perintendente desse órgão do Ministério da Educação (...) Taraa
nhas foram as repercussões,o ofensivas aos militares a medi
da que dois dias depois, pelo decreto n° 45.589, de 20 de março
de 1959 o Presidente da República tomou o ato insubsisten-
te (...)."
"(...) Militarizada a Merenda Escolar, já que o
seu Superintendente anterior dispondo apenas de uma qualifica
ção de representação, pensava o novo comandante em chefe das
cantinas escolares em acumular seus vencimentos, uma vez que, na
realidade, diz respeito a segurança nacional a merenda que as
criancinhas das escolas primárias sorvem."
"(...) voltou as viagens, e durante dois anos em
que permaneceu a frente da Campanha Nacional de Merenda Escolar ,
pouco mais de quatro meses conseguiu estar sem viajar. Mas va-
mos analisar, para encerrar estes comentários o que foi a trans
formação do último estágio administrativo do educador Walter '
Santos, de um órgão eminentemente técnico, dedicado as causas
da educação e da assistência, em ancoradouro de interesse nem
sempre os mais legítimos.
Basta citar que, em quatro anos, de março de
1955 a idênticos de 1959 dispendeu Campanha a importância
de Cr$ 73.416.000,80, para atender a um contigente de 1 milhão
e 800 mil escolares. Ao assumir a Superintendência encontrou o
Coronel Santos nos cofres da instituição a importância de Cr$
295.669.167,40. Em 1959 e 1960 dispôs a Campanha de dotações no
montante de Cr$ 460.000.000,00. Mesmo se considerarmos que te
nha recebido apenas 1/4 dessa importância, teria a CNME, nesses
dois anos de administração Cr$ 395 milhões. Trezentos e noventa
e cinco milhões em dois anos, ou seja, mais de cinco vezes o
que gastou a administração anterior no dobro do tempo. Isto equi
vale a dizer que em cada ano de sua administração, dispendeu o
coronel dez vezes mais que seu antecessor (...) Aumentou o aten
dimento? Não, lamentavelmente não, foi mantido no mesmo nível. E
o digo baseado nos dados do próprio órgão, publicados em seu Bo
letim Oficial."
Adiante, a parlamentar afirma que o dinheiro foi
gasto em instalações suntuosas pois a sede da Superintendência
das Representações, além da compra de veículos, sem falar de
possíveis "descalabros" nas aquisições de leite e gêneros, além
da amplicação do quadro de funcionários de 36 em 1956 para 9 8 e
mais tarde mais de 250 elementos.
Finalmente, cita o relatório - denúncia
11
"do jor
nalista Ruy Paes de Castro, ex-assessor do Sr. Walter Santos,
publicado na íntegra no "Correio Braziliense", através do qual
se expressa em toda a verdade esse drama administrativo que ê
a Campanha dirigida pelo Coronel, pois nada menos de 74% dos re
cursos foram destinados as atividades-meio daquele órgão"(...)
Concluindo:
"(...) Falaram os números e os fatos. Que falem
agora as medidas que uns e outros estão a exigir do Presidente
Jânio Quadros. (...) "E termina por desafiar Josué de Castro que
proveo ter se elegido, em 1954 e 1958 com o leite em pó do
FISI. Num aparte final, o Deputado Josué de Castro rebate:
"Não é verdade. (...) V.Excelência faz esse dis
curso para que o Sr. Jânio Quadros o demita (ao Cel. W. J. San-
tos) porque ele é ura recomendado meu."
Este conflito interpalamentar teve ainda desdo
bramentos na sessão do dia seguinte quando, no Pequeno Expedien
te, o Deputado Josué de Castro comunicou que o deputado Estácio
Souto Maior teria adeulterado as transcrições taguigráficas do
debate anterior, o que provocou reação do acusado, e consequen
te troca de insultos, inclusive a ponto de serem interrompidos
pelo Presidente da Mesa (Deputado Sérgio Magalhães) em nome do
decoro parlamentar.
12
Deve-se notar que, nesta época, ocorreu a exone
ração do Superintendente e baixou-se uma legislação de caráter
eminentemente regulatório das aplicações de recursos e "modus
operandi" da Campanha, para o que é provável supor tenha contri
buido este debate aqui relatado.
Dois meses depois, o Deputado Pereira da Silva
profere uma comunicação no Pequeno Expediente em que defende ar
dorosamente o Programa de Alimentos para a Paz e diz que a ele
se opõem "apenas fazem o jogo das grandes nações imperialistas
de Além - Atlântico e das costas do Mar Amarelo que manobram
com a vida dos povos fracos subdesenvolvidos e subjugando-os."
Acusa o deputado Josué de Castro de tentar re-
solver o problema da fome com "tragos de cuba-libre, salada à
Che Guevara e caldo vermelho com temperos amarelos".
13
Conquantoo tenha havido réplica, parece este
ura exemplo de que a reação ao "populismo radicalizado" caracte-
rístico do discurso petebista daquele momento, também já começa-
va a se orquestrar no Congresso.
196 2o é um ano de muitas manifestações na Ca-
mara sobre a atuação na'Campanha. Talvez o populismo de novo no
poder tenha encontrado nova acomodação para os interesses ao re
dor da Merenda Escolar.
A criação da SUNAB, em 1963, com a subsequente
transferência para esta da Coordenação geral do abastecimento
no pais, cabendo-lhe inclusive a indicação do Superintendente
da CNME, parece ter trazido conseqüências no sentido de desorga
nizar e mesmo paralisar a atuação desta ultima, razão pela qual
praticamente todos os pronunciamentos daquele anoo comunica
ções de parlamentares apelando ao MEC pela liberação de verbas
ou gêneros programados pela Campanha para seus estados e que
o foram distribuídos, ou o foram com muito atraso, tanto no
primeiro quanto no segundo semestre.
14
O ano de 196 4, que marca o esgotamento do modelo
que gerou a própria Campanha, testemunha dois momentos distin-
tos, como era de se esperar: os primeiros meses, de criticas do
regime, que demitia funcionários eficientes ou antigos da Campa
nha, ou ocasiões em que se denunciava o "abandono" em que se en-
contravam os escolares;
15
c os meses posteriores à introdução do
novo regime, de elogio à sua atuação, inclusive quanto à dinami.
zação da Campanha,
16
a reordenação legal, como a votação do pro
jeot de lei do Poder Executivo de restituir à total competência
do MEC a gestão da CNME.
17
A partir de 1965, começa uma fase de gradual
afastamento entre os parlamentares e a Campanha: A natureza do
regimes - 64 o faz cada vez mais refratário à influência de
parlamentares, e isto se reflete na articulação dos mesmos com
a CNME. É a fase dos sucessivos Requerimentos de Informações, en
tre 1965 e 1968. De inicio, ainda que indiretamente, a Campanha
se dava ao trabalho de responder
17
. Em seguida, provavelmente
pela crescente "militarização" da Campanha e o aprofundamento
de suas vinculações com programas de ajuda externa como a Alian
ça para o Progresso, USAID, PMA/FAO, etc, bem como do surgimen
to de denúncias quando ao desvio e malversação desses recursos
e gêneros em alguns estados, a quantidade de respostas geradas
a partir de requerimentos parlamentares decresce muito.
18
Enquanto parece impermeável à pressão parlamen'
tar, a Campanha começa a se tornar pouco a pouco, alvo inferes
sante aos diversos grupos produtores de alimentos no pais, ten
dência que já se acentua na década de 1970 e será objeto de es
tudo à parte. No entanto, já em 1967, surge a primeira proposta
que (emborao aprovada) se pode considerar de interesse de um
setor do "agrobusines" nacional: o deputado da ARENA poro
Paulo, Marcos Kertzmam apresenta um projeto que determina o
aproveitamento do café estocado na Merenda Escolar.
19
O último ano de vida parlamentar na década de
1960 foi 1968, época em que, também no que diz respeito a Meren
da Escolar, a temperatura dos debates volta a subir à semelhan
ça, eo por acaso, da crise que gerou o Movimento de 196 4.
Por outro lado, a Oposição faz violentas críti
cas ao "empreguismo" da (agora) CNAE
20
e do projeto de criação
do FNDE e suas "perigosas Conseqüências", "um instrumento de
promoção pessoal do Ministro da Educação".
21
A Campanha reage, sai do silêncio, seja atenden
do requerimento de informações, seja através de discursos de de
putados situacionistas, onde se elogia a atuação da CNAE, bem
como, seu caráter "criativo e misericordioso".
22
Estes irão se constituir nos derradeiros debates
parlamentares sobre a Campanha durante seus primeiros quinze
anos de existência.
Sobre este período, pode-se perceber que a Ali.
mentação do Escolar foi um tema secundário, que somente se fez
notar nos momentos em que ameaçou modificar comportamentos elei_
torais, ou colocou-se em discussão como parte de uma conexão
' - \
internacional, mais ampla. Houve momentos em que também serviu
de pano de fundo para disputas pessoais, conflitos entre buro
cratas aos parlamentares, que, no entanto,o levaram a ques_
tionar a essência da política de alimentação escolar vigente.
É provável que isto se deva ao fato da base ali
mentar da Campanha ter sido, em sua maioria, de origem estran
geira, ou adquirida em setor e que mal começava a despontar co
mo vanguarda da agro-indüstria que seria montada na década de
1970. Por outro lado, a população - alvo aos programas de meren
da escolar, quando esteve representada no Congresso, dedicou-se
mais aplicadamente a outras consignas o que pode explicar, ini
cialmente a pequena atenção, mesmo do PTB, ao tema. Vale ressal-
tar, no entanto, que o principal teórico e fomentador da Campa-
nha era também deputado daquele partido.
1. Na divisão de Taguigrafia da Câmara dos Deputados existe um
Arquivo de pronunciamentos, por parlamentares e por assun
to, ano a ano. A entrada "merenda escolar" foi introduzida
a partir de 1971. Nos anos anteriores, os pronunciamentos
estão arquivados sob as rubricas: "alimentação", "educação
e ensino", "abastecimento" ou Ministério da Educação e Cul
tura".
No Senado Federal, este registro é mantido através do compu
tador do Prodasen, mas os dados até agora inseridos referem
se a mais ou menos 1975. Referências anterioreso atual.
mente difíceis de obter, já que o processo de transferência
de sistema de registro tornou precárias as condições do ar
quivo manual existente. Por outro lado, houve perda da par
te deste registro quando da transferência do Senado para
Brasília, segundo informou o chefe da divisão. Dadas estas
condições, somente foi possível levantar os registros de
projeto proposto e discutidos por Senadores disponíveis no
PRODASEN.
2. 0 primeiro pronunciamento especificamente sobre a CNME ocor
reu em 26/01/1959.
3. Em 1969 não houve Sessões Ordinárias do Congresso, que per-
maneceu fechado quase todo o tempo em função das condições
políticas no momento.
4.
5. Deputado Benjamim Farah. Publicado no Diário do Congresso
Nacional em 06/10/1956 - pag. 9.148.
NOTAS
6. Publicado no Diário do Congresso Nacional em 27 de janeiro
de 1959, Seção I, pag. 645.o encontramos registros da
afiliação partidária a bancada de origem deste parlamentar.
7. 0 Equivalente a cerca de 5.000 toneladas.
3. Publicado no DCN, de 26/0 7/61, pag. 9.
9. Publicado no DCN, de.03/03/61, pag. 1.094 e seguintes
?
10. O Deputado se refere ao Decreto n° 45,583
11. Correio Braziliense 05/02/81, pag. 1 a6. Na verdade é uma
Longa carta aberta ao Superintendente da CNAE, de onde o de
putado extraiu a maioria dos dados e acusação contidas em
seu discurso. Esse episódio será comentado posteriormente.
12. DCN, 09/03/1961, pags. 1337/1338.
o
13. Publicado do DCN, 7 de junho de 1961, pags. 3793/3794.
14. Veja-se, neste sentido os pronunciamentos dos Deputados
Wilson Chedid (DCN, 22/05/63, pag. 2565); José Carlos Tei
xeira e Ezequias Costa (DCN, 29/05/63, pags. 2750/2756) e
João Menezes (DCN, 02/08/83, pag. 5052.
15. Discursos dos Deputados João Veiga (07/03/64, DCN, pag. 1414)
Daso Coimbres (19/03/64, pag. 1625) e ainda João Veiga
(31/03/64, pag. 1893).
16. Francelino Pereira (21/04/64; 08/05/64; pags. 2492/2945) e
João Veiga (26/05/64 - pag. 3984 - pag. 4229).
17. Dentro do processo de "esvaziamento" institucional porque
passou a SUNAB após o golpe, uma das medidas foi progressi-
va "devolução" dos órgãos a ela subordinados pela Lei Dele
gada que criou, dos seus ministérios de origem. No caso da
CNME o processo se deu mediante aprovação de substitutivo
do Projeto de Lei n° 1977-A, do Poder Executivo. O Substitu
tivo foi redigido porque, segundo um dos deputados presente,
a Mensagem do Executivo viera muito mal redigida. Ocorre '
. que, neste processo, o Congresso termina por decretar a
"ressurreição" do "famoso" Decreto 45.583 (interesse mili
tar) que fora revogado dois dias depois de promulgado, ain-
da em 1959. Esta situação perdura até hoje. DCN, 26/05/64 ,
pag. 34 84, pag. 3800).
17. Vide os requerimentos dos deputados Arnaldo Nogueira (DCN,
27/03/65, pag. 1313) - João Veiga (DCN, 28/08/65, pag. 7049) e
Lopo de Castro (10/12/65, pag. 10.737), e as "respostas"
através dos discursos dos Deputados Diomício de Freitas
(19/06/65 pag. 4671) e Carlos Werneck (14/10/65 pag. 8514),
ambos contendo dados sobre a atuação da Campanha.
18. Requerimentoso respondidos em 1967 Márcio M. Alves (DCN
29/03/67, pag. 782) Antônio Bresolin (DCN, 25/04/67 pag.1633) ,
Wilson Braga (31/06/67, pag. 7803), Day.l de Almeida (DCN,
15/11/67 pag. 13) e Wilson Braga (ao DNCR, 18/11/67 pag.
7803) .
19. DCN, 26/04/67 - pag. 1686.
20. Como o discurso do Deputado do MDB/GB, Raul Brumini, ao
reclamar doo atendimento de RI a CNAE, critica o fato
"de um dos assessores do Diretor é pai da primeira dama des_
te Pais, D. Yolanda Costa e Silva" (DCN, 22/08/68, pag. 12).
21. Deputado Ismael Dias Novaes (DCN, 16/10/68, pag. 7236) e
João Maria Ribeiro (DCN, 29/10/68, pag. 1037).
22. Deputados Paulo Abreu (DCN, 26/06/68, pag. 3703); Geraldo
Freire (DCN, 24/09/68, pag. 6420) e Elias Carmo (09/10/68 ,
pag. 27).
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
CAMPANHA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR
c
RELATÓRIO I- PARTE B
A PARTICIPAÇÃO INTERNACIONAL NA CAMPANHA:
DOS ANOS 40 AOS ANOS 60
SETEMBRO 1981
A PARTICIPAÇÃO INTERNACIONAL NA CAMPANHA:
DOS ANOS 40 AOS 60
Ainda que de importância variável ao longo da
história da Campanha, a participação internacional no programa
de alimentação escolar brasileiro sempre foi intensa. Hoje essa
intensidade é talvez pequena numericamente, mas houve um tempo
em que era ela mesma que fazia possível e que concretizava a po
lítica. Assim, dos 26 anos de atuação da Campanha, os primeiros
quinze, de 1955 a 1970, foram de total e nítido predomínio da
participação externa, sendo ela, portanto, elemento crucial pa
ra compreender a política e suas caracteríticas. É, no entanto,
apenas dos primeiros quinze anos, entre 19 46 e 1960, que se ocu
pra esta seção.
Antes, porém, um esclarecimento necessário.o
se deve entender a afirmação de que a presença exterior foi in
tensa e crucial como uma sugestão de sua determinação exclusi.
va, isto é, de que, conhecida ela, nada mais haveria de signifí.
cativo ou determinante. Ao contrário, como esperamos mostrar em
outras seções do trabalho, sem uma análise da complexa dinâmica
de fatores políticos, intelectuais, econcômicos e organizado
nais eminentemente internos, é a perspectiva interpretativa cen
trada nos aspectos internacionais que se torna irrelevante. O
que é, aliás, óbvio, pois só faz sentido pensar tais aspectos
tendo como referência outros de caráter nacional, uma vez que
as influências externaso se exerceriam no vácuo. Com esta
ressalva em mente, podemos prosseguir.
A organização da análise de participação interna
cional será cronológica, e poderiao sê-lo., porém uma
grande coincidência entre datas e transformações importantes na
presença externa na Campanha, tornando adequada uma periodiza
ção basicamente temporal. Assim, poderíamos dizer de uma primei.
ra "etapa FISI"
1
, compreendida principalmente nos anos cinquen
ta, uma segunda, que chamaríamos "etapa USAID", nos sessenta e,
finalmente, a terceira, sem imprecisão designável como "etapa
nacional", nos anos setenta.
A adoção destes nomes para as etapas da Campanha
decorre de dois tipos de razões. Em primeiro lugar, do fato de
que as origens fundamentais dos alimentos distribuídos ficam
assim caracterizadas. Se, então, na primeira etapa, os gêneros
vinham principalmente do FISI, na segunda sua origem era o Pro
grama "Alimentos para a Paz" da USAID e, na última, provinham
de compras no país. Em segundo, e mais relevante, de que, mesmo
quando a origem do alimentoso fosse nem única e nem, às ve
zes, a maior quantitativamente, ela terminava por subordinar to
da a lógica da Campanha. Desta maneira, o nome "etapa FISI", por
exemplo,o quer significar que viesse exclusivamente do Fundo
o alimento, mas que o funcionamento global da Campanha tomava
como referência os gêneros transferidos por essa fonte, e suas
regras de operação, compreendendo, inclusive, a administração '
interna em vários aspectos, como as formas de supervisão, e a
definição de prioridade de atendimento.
2
Teríamos, então, três períodos, a cada um dos
quais corresponde uma década. De novo, aqui, se faz necessária
uma precisão, pois as fronteiras cronológicasooo níti_
das assim. Ha uma considerável interpenetração nas transições,
tanto no início dos sessenta, como no dos setenta. Acreditamos,
contudo, que é legítimo dizer, sinteticamente, que a Campanha,
nos anos cinqüenta, vive uma etapa FISI, nos sessenta, e etapa
USAID, e nos anos setenta, seu período nacional. Vamos, agora,
nos ocupar da primeira.
*
'
A criação pela ONU do Fundo Internacional de So
corro à Infância, em 1946 só é compreensível dentro do quadro
do pós-guerra e do sentimento coletivo, na comunidade interna
cional, despertado a partir da constatação dos efeitos da guer
ra sobre as crianças européias. Os vividos sinais de abandono,
miséria, sofrimentos e perdas que, logo após cessada a onda de
triunfalismo dos Aliados, se tornaram evidentes, fizeram com
que o clima de euforia desse lugar a uma justa e humanitária
preocupação com a sorte de milhares de crianças órfãs e sofri
das pela guerra.
É importante deixar claro que esse sentimento hu
manitário existiu e foi decisivo,o sendo recurso de estilo
ou mitologia organizacional, como mais tarde se poderia dizer.
Assim, se nos anos posteriores a atuação concreta do FISI já
tivesse pouco desse clima, ele foi sem dúvida básico no inicio
e, sem ele, a própria organizaçãoo teria, talvez, existido.
Dessas características do período constitutivo '
decorrem alguns traços significativos do FISI em seus primeiros
anos de operação. Em primeiro lugar, que suas aplicações fossem
canalizadas quase que exclusivamente para as regiões da Europa
mais atingidas pelos conflitos. Assim, foram Itália, Alemanha ,
e França, nessa ordem, os principais beneficiários do Fundo, ne
nhum deles maior, porém, que a Organização para os Refugiados
da Palestina, que centralizava o atendimento às crianças ju-
dias.
3
Em segundo, que as contribuições privadas voluntárias re
presentassem cerca de 25% do total dos recursos do Fundo, em de
monstração da relevância da dimensão humanitária de que ele se
revestia.
1
* Em terceiro, que quase todos os Governos do mundo
contribuíssem, embora com quantias muito variáveis, para seu
A ETAPA FISI: ANTECEDENTES
custeio. 0 Quadro I, a seguir, mostra mais claramente a partici
pação dos principais financiadores do FISI:
QUADRO I
PRINCIPAIS CONTRIBUINTES DO FUNDO INTERNACIONAL
DE SOCORRO à INFÂNCIA
- Até 1949 -
Fonte: ÜNICEF, op cit, pags. 3 e 4.
Pode-se ver que, do lado privado, os países da Comunidade Bri
tânica ocupam os cinco primeiros lugares.o eram eles os üni_
cos, no entanto, uma vez que desde a pobre Etiópia com seus mo
destos US$ 686, até o minúsculo San Marino, com US$ 910, diver
sos países haviam contribuído para o FISI no período, bem como
outros países díspares quanto as Filipinas, o Afeganistão,.
a Nicarágua, Cuba e a Indonésia.
5
Do lado governamental, percebe-se que os E.U.A.,
sozinhos, representavam cerca de 68% dos recursos totais e, so-
mados aos três seguintes, alcançavam quase 90% das contribui
ções governamentais globais. Vários outros governos também ti-
nham dado alguma coisa, inclusive os de países pobres como a
CONTRIBUIÇÕES
(US$)
Austrália
N. Zelândia
África do Sul
Reino Unido
Canadá
PRIVADAS
1.855.412
1.578.120
1.551.785
1.458.429
1.3
46.6
21
CONTRIBUIÇÕES GOVERNAMENTAIS
E
.
U
.
A
Austrália
Canadá
Suiça
TOTAL Governos
(US$)
60.273.502
9.889.280
6.177.272
2.14 2,356
88.005.116
Costa Rica, Singapura, a Guatemala e Uruguai (este, aliás, com
S$ 1.000.000).
6
Outra característica fundamental do FISI de en-
tão, impressa em seu próprio nome original, mas perdida com a
tradução para o português, era a idéia de "fundo de emergên-
cia". O termo sugere algo de transitório, pois, presume-se, as
emergênciaso sempre passageiras, ouo teriam esse nome.
o era, porém, em respeito à semântica que, no início de 1950,
uma sensível rediscussão do FISI tem lugar dentro da ONU.
Comandada pelos países de maior participação fi-
nanceira no Fundo, entre eles os EUA, o Reino Unido e o Canadá,
é encaminhada à Comissão Social da ONU uma proposta, apresenta
da pelos EUA, de extinguir o FISI. De outro lado, contando com
a óbvia simpatia da Diretoria-Executiva do FISI, ê apresentada
uma proposta conjunta alternativa, pelo Brasil, França, a ín-
dia, a Iugoslávia e a Turquia. Por esta, o FISI manteria seus
suprimentos, inclusive para "a alimentação em massa das áreas
mais necessitadas", e os estenderia à América Latina, à Asia e
à Africa.
7
É fácil compreender a posição americana. Por um
lado, a situação já se havia recuperado razoavelmente na Euro
pa, também como resultado da atuação do chamado Plano Marshall.,
de reconstrução e reaparelhamento dos estragos da guerra. Por
outro, iniciativas privadas, como o CARE (Committee of American
Remittances to Europe), se haviam mostrado mais eficazes, de
seu ponto de vista, pois permitiam uma identificação imediata
de quem estava beneficiando a quem, sem a intermediação da ONU.
Tambémo é difícil entender a proposta conjun
ta. Para os países pobres, o fim do FISI representava a perda
de uma fonte pontencial de recursos, relevante apesar de peque
na, para custear iniciativas de muito baixa taxa de retorno
econômico. O Brasil, a índia e a Turquia, potências de 29 esca
lão, faziam apenas o papel de porta-vozes do mundo sub-desen-'
volvido, tendo como aliados a França, às voltas cora um imenso
império colonial falido, e a Iugoslávia, já desde então aguer
rida defensora do "terceiro-mundismo", além de uma das princi
pais beneficiárias do Fundo, ela própria. Para estes países, o
FISI, como seus 90% de recursos originados no mundo desenvolvi
do, poderia ser ura ótimo freguês.
A proposta conjunta contava com um poderoso alia
do dentro da própria burocracia do FISI, algo bastante imagina
vel. Na medida em que sua sobrevivência institucional ficava
ameaçada com o fim da "emergência" na Europa, a Diretoria-Exe-
cutiva do FISI havia desenvolvido uma inteligente estratégia
de fait-accompli, era duas frentes. Por uma, buscando aumentar,
nem que nominalmente, a lista de governos participantes na for
mação do Fundo. Com isto criava-se uma arena maior de decisão
sobre a sua continuidade, pois muitos países teriam algo a
opinar sobre isso. Por outra, ampliava-se o número de países
beneficiários, sob a argumentação lógica de que suas crianças
também viviam em "emergência", só que, neste caso, permanente
mente.
8
Desde 1949, assim, o FISI vinha contribuindo pa
ra programas de auxílio à criança fora da Europa, ainda que,
de pequena escola, cabendo mencionar, pela relevância para nos
so tema, um projeto piloto de alimentação escolar, na América.
Central, acoplado a toda uma série de iniciativas de melhoria
da escola rural,
9
e ura amplo projeto de saúde infantil no Uru
guai, envolvendo o fornecimento de gabinetes dentários e equi
pamentos de raio X.
10
A institucionalização e expansão do FISIo era
apoiada por ele próprio, porém. Do lado da opinião pública e
do Congresso Americano, havia também resistências à suspenssão
do Fundo, sendo favoráveis, ao contrário, ao aumento de sua
contribuição.
11
Contando, então, com a maioria da Assembléia Ge
ral, cora a simpatia do próprio FISI e com o respaldo da opinião
pública americana,o ê surpresa que a proposta conjunta saís_
se vitoriosa, apesar dos votos contrários das Delegações dos
EUA, Canadá e Reino Unido. 0 resultado é que, em 19 50, ainda
que mantivesse o nome original, o FISI deixava de ser um sim
ples mecanismo provisório, vindo a se consolidar e expandir a
partir daí
Como se pode perceber, o Brasil havia desempenha
do um papel muito importante para essa decisão, se encarregan
do de apresentar proposta e defendendo-a diplomaticamente. Já
antes, naquele crítico ano de 49 em que o FISI buscava se ex
pandir, era muito pelo resultado das gestões brasileiras que o
Fundo havia pela primeira vez atingido a America Latina, algo
que o próprio FISI reconhecia: "A iniciativa para o trabalho
do FISI no Brasil, ou na realidade para sua extensão aos pai
ses da América Latina, foi primeiramente tomada pela Delegação
Brasileira junto as Nações Unidas, em fevereiro de 1949. "
12
Seria possível imaginar que essa influência bra_
sileira no FISI, que, logo após 1950, frutificaria também em
substanciosas contribuições de equipamentos e gêneros, , decor
resse de sermos um importante financiador do Fundo. Ao contra
rio, a realidade ê que o Brasil só fez sua primeira contribui_
ção ao FISI depois da apresentação da proposta que viemos dis_
cutindo, mais precisamente em junho de 1950.o ê esta a ex-
plicação, portanto.
A razão para tal influencia parece estar em um
intenso e bem sucedido trabalho diplomático desenvolvido pela
Delegação Brasileira na ONU, desde, pelo menos, 1948. Tal es
forço se fez, inclusive, muitas vezes contra uma relativa indi_
ferença ou cautela, do governo brasileiro, queo via com cla
reza as vantagens que poderia tirar de tudo aquilo. A tramita
ção da primeira contribuição brasileira ao FISI permite sentir
isto nitidamente.
Em janeiro de 1950, o Diretor Executivo do FISI
oficiou ao Ministro Raul Fernandes, solicitando que o Brasil
cumprisse suas obrigações para com o Fundo.
13
0 Itamaraty
formou à Delegação na ONU que as providências para a contribui
ção haviam sido tomadas, mas que sua aprovação pelo Congresso
Nacional seria facilitada caso "aos planos de assistências às
crianças brasileiras fosse dado o beneplácito do FISI".
14
É óbvia a atitude do governo, que só queria se
comprometer depois de ter certeza de que receberia algo em tro-
ca.
Em abril, a Delegação da ONU, vendo avizinhar-se
a Reunião da Comissão Social, lembra ao Itamaraty que "a con
tribuição brasileira seria triplicada em ajuda",
15
no que é se
cundada por uma comunicação da Embaixada em Montevidéu que,
alem de informar o recebimento de recursos do FISI pelo Uru-
guai, termina frisando que "o Uruguai contribui para o FISI".
18
Em junho, já em plena reunião do FISI, com toda a negociação
praticamente concluída para o primeiro acordo com o Brasil,.
da de concreto podia ainda a Delegação oferecer. Em uma suces
o nervosa de telegramas dos dias 8, 10 e 15 de maio, deflagra-
da por uma solicitação urgente de esclarecimentos sobre se o
Brasil afinal ia ouo ia contribuir, finalmente surge a pri
meira manifestação clara sobre a contribuição brasileira, que
seria de Cr$ 2.000.000, a preços de 1950.
17
Toda essa tramitação, seus antecedentes e desdo
bramentos se acha sumariada em uma carta-telegrama do Embaixa
dor João Carlos Muniz ao Itamaraty, de 26/06/1950, a qual deve
ser comentada em mais detalhe.
1
8
Começa o Embaixador informando
que avisou o FISI da contribuição brasileira e que "com nossa
posição reforçada por essa pequena contribuição, travamos vigo
rosa batalha para a distribuição de novos fundos para a Améri-
ca Latina". Lembra ainda, que "em 1948, conseguimos que, pela
primeira vez, votasse a Junta Executiva (do FISI) uma verba
destinada às crianças latino-americanas, e daí por diante qua
se que dólar a dólar, obtivéssemos em diferentes sessões da
Junta que essa quantia fosse aumentada para 4.340.000 dólares."
No total se incluía a aprovação, naquela reunião, de mais um
milhão de dólares, metade dos quais destinada a programas na
Bolívia, Chile, Paraguai e Honduras Britânica.
Quanto à outra metade, "graças exclusivamente à
nossa intervenção", fora concedida para o primeiro programa bra
sileiro a ser aprovado pelo FISI, ao qual retornaremos adiante.
A Carta-Telegrama procurava, inclusive, mostrar queo era o
peso eventual de um "bloco latino-americano" que fizera com
que o Fundo dirigisse sua atenção para a região e o Brasil,
pois, até mesmo no sentido muito inglório de levar fisicamente
os demais delegados sul-americanos às reuniões, era a Delega
ção Brasileira que liderava os pleitos comuns.
Concluí o documento: "Assim, ..., no momento em
que estão sendo embarcados os primeiros suprimentos de alimen
tos e remédios, julguei interessante fazer este pequeno retros
pectivo dos esforços ininterruptos da Delegação Brasileira em
defesa das crianças brasileiras e Latino-Americanas num setor
de atividades da ONU que talvez mereça maior divulgação do que
lhe vem sendo dada até agora. É de justiça mencionar os nomes
dos esforçados e inteligentes funcionários que realizaram esse
trabalho em benefício da criança brasileira: Os Secretários '
Sérgio Correia da Costa, ... Roberto de Oliveira Campos, que
travou as mais árduas batalhas na Junta Executiva para obten
ção de créditos cada vez maiores em favor da América Latina e
Miguel Alvaro Ozõrio de Almeida, seu continuador, a quem coube
levar a bom termo, com infatigável zelo e inteligência, o con
tato entre o FISI e o governo do Brasil. A esses três dedica
dos funcionários deve a criança brasileira a assistência que
está em vias de receber."
Antes de analisar esse primeiro acordo entre o
Brasil e o FISI, c necessário discutir um pouco mais a hipóte
se atrás levantada da relevância desse canal diplomático e que
transparece nitidamente nos trechos transcritos do documento.
Seria natural que o Itamaraty percebesse seu próprio papel de
maneira exagerada e a fonte poderia ser, portanto, suspeita.
Por diversas razões, acreditamos que não, ou se
ja, que de fato o "anel diplomático" criado entre o Itamaraty
e a burocracia do FISI teve importância decisiva,o só nessa
momento inicial, como durante todo o período que estamos desig
nando "etapa FISI". Com a expressão ''anel", queremos chamar
atenção para a formação de um sólido laço de amizade e mútua
compreensão entre a diplomacia brasileira e o FISI, derivado
em parte, provavelmente, da indiscutível capacidade que ela
sempre teve em comparação com os serviços diplomáticos de ou
tros países do terceiro Mundo.
Só assim se entenderia porque o Brasil veio a
ocupar uma posiçãoo vantajosa nas alocações de recursos do
FISI, desproporcionais tanto às contribuições realizadas, quan
to aos gastos nacionais em programas de auxílio à criança e
quanto ao que os outros países latino-americanos recebiam. Só
assim se explica porque a burocracia do FISI fosse, literalmen
te, fascinada com os "brasileiros da ONU", particularmente Ro-
berto de Oliveira Campos e Cleantho de Paiva Leite.-
18
Assim
também se explica que um contribuinte tardio e modesto do Fun
do viesse a ter seu representante, a partir de 1952, como 2°
Vice-Presidente do Conselho de Administração e Vice-Presidente
do Comitê de Programas, as duas instâncias decisórias colégio.
das básicas do FISI..
20
Finalmente, assim se compreenderia por
que o FISI fosseo tolerante e paciente com um país que, sal
vo sua diplomacia, dava mostras deo se preocupar muito com
ele, que atrasava sua contribuição sistematicamente, que des
cumpria, com sua tolerância, termos contratuais assumidos e
que teve, sempre, de ser digamos, protegido por ele quando se
revelava incapaz de cumprir os programas que apresentava. Os
exemplos dessas situaçõeso inúmeros, e nos ocuparemos de
alguns a seguir.
A ETAPA FISI: DO 1° ACORDO A MERENDA ESCOLAR
Mais desenvolto e atuante depois de superada a
lastimável situação de nunca haver contribuído para o Fundo, o .
anel diplomático brasileiro começa a se movimentar com grande
rapidez. Já em 51, o Brasil passa a possuir o maior programa la
tino-americano apoiado pelo FISI..
21
Em 53, da ajuda total apro-
vada para a região, 44% se destinavam ao Brasil o que, no dizer
da Delegação da ONU, é "uma alta porcentagem"
22
Obviamente o
era, ainda mais se lembrarmos que a situação da criança aqui
o era muito pior que em outros países.
A importância dessa "conexão novaiorquina" foi
grande desde o início e o primeiro acordo com o FISI é sintomá
tico de sua força, pelas características muito peculiares que
possuiu. Em primeiro lugar, foi assinado em 9 de julho de 1950,
ou seja, no dia anterior da comunicação oficial de que o Brasil
contribuiria de fato para o Fundo.
23
É desnecessário frisar o
quanto isto era atípico para o FISI, que, habitualmente, insis-
tia na pré-condição de ser depositário para que um país sequer
pleitasse apoio. Em segundo lugar,- o Acordo, em seus consideram
dos, afirmava que "o Governo (do Brasil) submeteu o seu próprio
programa de assistência em benefício de crianças, adolescentes,
gestantes e mães lactentens e que preparou planos de operação
no que concerne à utilização adequada e á distribuição de supri
mentos... e que o Fundo aprovou a sua própria participação nes
ses planos".
2
k
Ora, as iniciativas do Brasil nesse campo, desen
volvidas pelo Departamento Nacional da Criança (de que nos ocu
pamos em outra seção deste trabalho), o DNCR, mostravam, de fa
to, aumento substancial nas dotações orçamentárias, mas seguiam
uma definição de prioridades que dificilmente se poderia dizer
aproximadas às do FISI. De um lado, o relatório do Governo Bra
sileiro ao FISI sobre as atividades de proteção à criança de
1940 a 50, afirmava que "o maior evento foi a reorganização do
DNCR", medida exclusivamente burocrática. De outro, dizia que
dava prioridade aos aspectos educacionais, dentre os quais des
tacava as "medidas morais" que tomara, como a proibição de re-
vestinhas em quadrinhos.
25
Em terceiro, por inaugurar, desde o momento íni
cial, um padrão de recalcitrância sistemática na contribuição "
brasileira ao FISI. Apesar de assinado em julho, somente em de
zembro o Brasil faria o pagamento devido.
De qualquer maneira, o Acordo permitia o primei
ro programa brasileiro apoiado pelo Fundo. Ele representava o
gasto de cerca de US$ 500.000, para iniciativas de proteção à
criança nos estados do Ceará, Paraíba, Piauí e Rio Grande do
Norte, discriminados como se pode ver no Quadro 2.
QUADRO 2
PROJETOS E GOSTOS DO ACORDO DE 1950 ENTRE
O FISI E O BRASIL
1.
2.
3.
4.
5.
PROJETOS
Provisão de leite em, margarina e capsu
las de vitaminas a crianças, nutrizes e
gestantes.
Melhoria de Hospitais Materno-Infantis
Vacinas contra crupe e difteria
Treinamento de parteiras
Campanha de Educação e Saúde para mães
GOSTOS
(US$)
230.000
179.000
25.000
16.000
20.000
Fonte FISI: "Memento Aulia", 1951, pag. 1
Para supervisioná-lo o PISI instalou sua primei
ra representação locai no Brasil, sediada em João Pessoa, e no
meou um funcionário para chefiá-la.o deixa de ser tentadora
a hipótese de associar a curtíssima permanência desse funciona
rio, Ismail Martinez Sottomayor, menos de um ano (especialmente
se lembrarmos que sua sucessora fica no Brasil cerca de dez '
anos), com sua aparente incapacidade de entender o "jeito brasi
leiro" de se relacionar com o PISI.
Nem bem chegado, ele já estava furioso com a de
mora era receber a quantia comprometida. Em oficio ao Ministro ,
ele pergunta "quando e em que forma (sic)"
27
o dinheiro poderia
ser movimentado.o contente com isso, uma semana depois avisa
que vai denunciar ao FISI o atraso.
28
Definitivamente,o pare
cia adaptado ao Brasil.
0 fato é que em julho de 1951 uma substituição
acontece, e entra em cena uma pessoa que teria decisivo papel
em tudo o que o Brasil faria na área materno-infantil até os
anos 60. Tratava-se de Gertrude Luiz, uma suiça, queo falava
português, só havia trabalhado na Europa, mas que se torna a
mais brasileira de toda uma série de funcionários internacio-
nais do período.
29
Logo de largada, a sede do FISI é transferida pa-
ra o Rio de Janeiro, e o regime deo e água a que o governo
Brasileiro submetia o representante do FISI é mudado. Em 1950 e
51, o total do apoio nacional para a missão do Fundo, foi, res-
pectivamente de Cr$ 300.000 e Cr$ 344.000. Com a Sra. Lutz, em.
1952, essa contribuição sobe para Cr$ 2.600.000. Também inferes
sante, nos dois primeiros anos, a origem dos recursos era o
DNCR e, no seguinte, passa a ser diretamente o Itamaraty.
30
Só isso já seria bastante para supor a formação
de um novo "anel" entre a diplomacia brasileira e o FISI, desta
vez interno e paralelo ao anel novaiorquino., porém,dezenas,
39
literalmente, de outros exemplos de como se superaram os proble
mas da primeira fase, mediante uma sólida amizade e favores mú
tuos que se passaram a prestar dentro de um novo pacto de soli
dariedade estabelecido com a Sra. Lutz.
Em Gertrude Lutz, o Governo Brasileiro adquire
uma aliada e uma amiga, alguém disposto a defender as iniciati-
vas brasileiras com, pelo menos, o mesmo vigor que um funciona
rio nacional. Seus relatórios parei o FISI, as justificativas '
que enviava para a Diretoria Executiva quando novos projetos en
travam em negociação, sua capacidade de entender e relevar os
atrasos e demoras são, verdadeiramente, notáveis.
:. , Nada mais natural, portanto, que o Itamaraty ti
vesse para com ela comportamento de grande cordialidade. Em pe
quenas e grandes coisas, a Sra. Lutz tem sua vida facilitada
sobremaneira, sempre sendo atendida e sempre atendendo ao que
dela se esperava.
31
Exemplo notável dos bons resultados dessa estra
tégia é o destino dado à contribuição brasileira do FISI. No
tempo de Sottomayor, o Brasil, depois de atrasos e negaceios ,
acabou contribuindo com Cr$ 1.700.000, em 1950 e Cr$ 1.600.000,
em 1951. Esses recursos, embora minguados e inferiores ao combi
nado em Nova Iorque, foram gastos na compra de excedentes de
arroz, depois distribuídos pelo FISI em seus programas na ín-
dia. De 1952 em diante, a contribuição brasileira cresce signi-
ficativamente, atingindo, em 56/57, a quantia de Cr$ 9.000.000.
Só que essa soma passou a ser gasta no pagamento dos fretes dos
suprimentos fornecidos pelo FISI, algo que, seo afrontava o
Acordo assinado,o chegava a ser muito "normal", pois uma das
cláusulas previa que seriam do Brasil "as providências para o
recebimento, descarga, depósito, transporte e distribuição."
32
Com a solução adotada, o Brasil fazia a magia de dobrar o valor
de seu dinheiro, que ao mesmo tempo saldava sua obrigação para
com o FISI e pagava a conta dos fretes que, até então, tinham
de sair de outro lugar.
T
Dada, assim, a força da ligação que o Governo
Brasileiro, através do Itamaraty, conseguiu estabelecer cora o
FISI, tanto em Nova Iorque, como no Rio de Janeiro,o é sur
presa constatar o crescimento do apoio do Fundo do Brasil. 0
Quadro 3, a seguir, sintetiza os diversos programas aprovados
pelo FISI até 1954:
QUADRO 3
PROGRAMAS APROVADOS PELO FISI HO BRASIL
1.950 - 1953
ANO
1950
1951
1952
1953
TIPO DE PROGRAMA
Assistência Materno Infantil (E/ICEF/R-9)
Usina de Pasteurização de Leite em João
Pessoa e Alimentaçâo de Crianças e Gestan
tes (E/ICEF/R-262)
Equipamento de novas Instituições de Pro
teção à Maternidade e Infância e Treina
mento de Parteiras (E/ICEF/R--242)
Alimentação Crianças e Gestantes (E/ICEF/
R-320)
Alimentação Crianças e Gestantes (E/ICEF/
R-425)
Idem (E/ICEF/R-427)
Treinamento de Parteiras (E/ICEF/R-483) '
Fabricas de Leite em pó e Bolsas de Estu
do (E/ICEF/R-494)
VALOR TOTAL
APROVADO (ÜS$)
500.000
230.000
220.000
550.000
287.000
32.000
23.000
498.000
Fonte: Adaptado do FISI, Atividades do Fundo das Nações Unidas para Infân
cia do Brasil, pags. 1 e 2.
Obs.: As siglas entre parênteseso os números dos Programas den-
tro do FISI.
A leitura desse quadro permite fazer algumas ob
servações relevantes para a discussão. Em primeiro lugar, vê-se
como os sucessivos programas aprovadoso semelhantes ao pri
meiro, ou seja, que, se o ritmo de aprovação se acelera, a ten
dência ê de manter o mesmo estilo básico. Isto, como é compreen
sível,o agradava ao Brasil, que já no ano de 51 informava ao
FISI sua intenção de apresentar projetos em quatro novas áreas
de atuação, diversificando a linha tradicional de fornecimento
de gêneros para alimentação suplementar. Pretendiam-se recursos
para instalar uma fábrica de DDT, para usinas de pasteurização
e fábricas de leite em, para uma fábrica de penicilina e pa
ra criar um Centro Internacional de Treinamento, no Rio de Ja
neiro, voltado para a preparação de pessoal para programas de
assistência Materno-Infantil.
33
Dessas todas, o FISI aprovaria apenas aquelas
que visavam a substituir as transferências de alimentos: as fã
bricas de leite em pó e as usinas de pasteurização. Esses proje
tos sofreram cortes logo no início e tiveram uma demoradíssima
tramitação, por culpa exclusiva das autoridades nacional. As fá
bricas propostas, e aprovadas em 53, para Leopoldina, Minas Ge
rias, Pelotas, Rio Grande do Sul, teriam cooperativas de pro
dutores associados a elas e forneceriam seu produto exclusiva
mente para os programas governamentais e,quer na organização de
ficiente das cooperativas, quer na ausência de garantias de re
cursos nacionais de contrapartida, foram problemáticas desde o
início.
31
* Apenas a de Pelotas chegou a ser implantada, mas so
mente em 1960 e, assim mesmo, depois de sucessivos vetos técni-
cos e pareceres contrários das missões de avaliação do FISI, ha
bilmente contornados por Gertrude Lutz.
35
Quanto às usinas de
pasteurização, propostas para João Pessoa e Fortaleza em 1951 ,
sofreriam restrições do FISI poro estarem asseguradas as con
trapartidas dos Governos Estaduais envolvidos e a destinação do
leite à clientela básica do Fundo. Ainda em 51, porém, é aprova
da a usina de João Pessoa, sendo abandonada a segunda.
36
Assim,
apesar do esforço de diversificação brasileiro, as novidades
realmente introduzidas na atuação concreta do FISI foram meno
res do que se desejava.
Em segundo lugar que, se houve relativa continui
dade no estilo de atuação do FISI até 1953, isto se fez com mu
danças internas relevantes, especialmente na definição das áreas
de abrangência dos programas. Como se lembra, o primeiro era di
rigido a quatro estados do Nordeste, mas o segundo, em 51, já o
seria para o Maranhão, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia,
além dos anteriores.
37
Dado que os recursoso cresciam na mes
ma proporção, quantidades relativamente menores de população
eram beneficiados em cada Estado, caracterizando um padrão de
cobertura horizontalmente maior, mas cora atendimento qualitati-
vamente inferior. 0 mesmo pode ser dito do programa suplementar
aprovado em 53, de US$ 32.000, para distribuição de gêneros no
Amazonas e Pará, quantia minúscula, que permitia apenas um pro
jeto-piloto desenvolvido pelo SESP.
Esse padrão de rápida expansão geográfica do pro
grama, às expensas de sua qualidade, iria marcar profundamente
a atuação do FISI no Brasil durante todo o período. Por trás de
le, provavelmente, está um dos dilemas fundamentais de todo pro
grama distributivo, a cara decisão sobre prioridades, que leva
a recusar o atendimento a grupos que se julgam merecedores de
le, questão mais geral que será desenvolvida oportunamente. Va
le ressaltar, contudo, que o problemao era apenas teórico,
mas muito real e que, neste caso, o FISI e o governo se viram
perante uma crescente pressão pela expansão do programa, exerci
da por interesses que se definiam como obviamente necessitados
dele e, mais, que o eram de fato. Assim, nem bem anunciados cs
primeiros projetos, o Itamaraty e o Ministério da Educação e
Saúde, foram questionados sobre porque deixavam de fora determi-
nados Estados e cidades, algo que iria se repetir inúmeras va
zes depois.
38
Ê compreensível, neste contexto, que o FISI hou
vesse recusado a abertura de muitas novas áreas de atuação e,
inclusive, que procurasse financiar iniciativas que, a longo
prazo, permitissem a retirada de seu apoio, como a criação de
fábricas de leite em. Programas distributivosoo proble
máticos apenas por sua tendência à expansão horizontal, mas tam-
bem, por sua quase invencível pressão para se eternizarem. Uma
vez começados, fazem surgir tantas expectativas que interrompe-
los se torna muito difícil, quandoo irrealizável. É claro,
porém, que a racionalidade de tanta antecipação, corno a sugeri
da,o é muito freqüente, ainda mais quando se conta, como no
Brasil contava, com advogados seus situados dentro de uma insti
tuição como o FISI, que movimentava recursos a fundo perdido e
de custo quase zero, pois até o pagamento dos fretes se soube
driblar. 0 que vem a ser, no fundo, a mesma questão anterior,
posta, no entanto,o mais no plano das relações entre um pro
grama distributivo de governo e sua clientela, mas no nível de
relacionamento entre o FISI, ele próprio por excelência um fun
do distributivo, e seus países clientes. Neste plano, como no
outro, levava mais quem era capaz de apresentar um pleito mais
"bem encaminhado". Por tudo que se disse, o Brasil podia fazer
isto e o fez enquanto pode.
Veja-se, por exemplo, o caso de programa aprova
do em 1952 para suprimento de gêneros. Visava ele a atender uma
situação emergencial no Nordeste, provocada por mais uma seca.
No início do ano seguinte, o governo solicitou sua continuação,
sob o argumento de que a população continuava desassistida e ca
rente. A administração do FISI acolheu o pedido e o encaminhou
ao Comitê de Programa, acompanhado de uma recomendação elabora
da por ela própria. Estao poupava elogios às iniciativas bra_
sileiras, destacava a eficiência do DNCR e afirmava que "o Go-
verno mostrava firme intenção deo vir mais a necessitar auxí
lio do FISI."
39
Tudo isso era pouco mais que falso, especialmen-
te o último ponto, maso deve causar espanto saber que, com
tal recomendação, o pedido terminasse sendo aceito.
I
Esses quatro anos foram passados, assim, em
jogo complexo de forças de expansão e de retração, que ora fa
ziam com o FISI cedesse a uma pressão que chegava a ele por um
caminho longo e demorado, originando-se em um estado, indo ao
Rio de Janeiro, dai ao Itamaraty, dele à representação local do
Fundo e só então a Nova Iorque, ora se recusasse a aceitá-la.
Papel crucial desempenhou a quase intransigente defesa que Ger
trude Lutz fazia dos pedidos brasileiros, mas é de se frisar
que o fazia dentro de determinadas linhas de atuação, aquelas
que eram tradicionais para o FISI. 0 período assiste, portanto,
a várias mudanças, particularmente no tipo de expansão de cober
tura, mas que, no que dizia respeito ao FISI,o alterava o
essencial, sua cautela em abrir novas modalidades de atendimen-
to.
É surpreendente, neste contexto, que estivesse
mos no limiar de uma transformação significativa exatamente nes
se estilo básico do FISI. Ou, então, seria possível explicá-la,
caso uma variação tivesse ocorrido no quadro mais geral onde as
decisões eram tomadas. Foi o que aconteceu.
Os primeiros sinais de mudança surgem no final
de 1953. Em setembro, o representante do Brasil no board do
FISI é procurado pelo Diretor-Geral do CARE, nessa altura uma
organização que operava no mundo todo, tendo sugerido uma traje
tõria muito semelhante à do Fundo. Sua intenção era conversar '
sobre a possibilidade de "novas remessas maciças" de leite em
pó para o Brasil, sobretudo para o Norte e o Nordeste, a fim de
complementar aquele suprido pelo FISI. o CARE estava "ancioso '
em desenvolver algum programa em favor do Brasil e declarou que
o Governo Americano dispõe atualmente de cerca de três bilhões
de excessos de alimentos (leite, ovos, manteiga, batatas, etc),
quantia essa que, em julho próximo atingirá provavelmente cerca
de seis bilhões de dólares". 0 representante brasileiro, por
o dispor de instruções, foi reticente, mas pode averiguar que
o interesse do CARE ia até ao ponto de se propor a enriquecer
com o leite vitaminas e a pensar uma ampliação cia quota origi
nalmente alocada para o Brasil. Por isto, termina ele dizendo:
"Acredita o representante do Brasil que, em vis
ta da excepcional boa vontade demonstrada pelo
Diretor do CARE e da urgência em que se encon
tra o governo americano de se desfazer das enor-
mes quantidades de surplus commodities que tem
acumuladas, uma excelente perspectiva de no
vos auxílios para mães e crianças necessitadas
no Norte e Nordeste do Brasil"
1
*
0
A negociação com o CARE nunca chegou a ser reali
zada, mas um fato fica ressaltado nessa correspondência: as
"enormes quantidades de surplus commodities" no mercado america
no. A partir dele, mudaria significativamente a política do
FISI, a do próprio governo americano e, consequentemente, a do
Brasil.
A existência desses excedentes agrícolas faria
com que o FISI rompesse com a relutância em diversificar suas
formas de atuação em vários países, inclusive aqui. Por outro
lado, obrigaria os Estados Unidos a procurar colocar sua safra,
mesmo que fosse a preços extremamente baixos. No outro polo, fa
ria com que o Governo Brasileiro, vendo favoráveis as perspecti
vas para uma substancial elevação nas transferências do FISI, '
iniciasse o desenvolvimento de novos projetos que aproveitassem
a crescente oferta que se anunciava, como, aliás, os governos
de diversos outros países também.
Confluem neste ponto, pela primeira vez, duas
histórias. A da participação internacional nos programas de
assistência à infância, contada nesta seção, e a da alimentação
escolar no Brasil, objeto de outras. Daí por diante, essas his_
tórias só se separariam muito mais tarde, e assim mesmo apenas
relativamente.
É indispensável guardar que se trata, de fato, de
urna confluência. Seria inteiramente equivocado dizer que a ali_
mentação escolar brasileira era uma política formulada e acaba
da, e que, portanto, pudesse prescindir da participação estran
geira era qualquer sentido. Mas esse erro é equivalente a supor
que só a disponibilidade de excedentes de safra naquele momento
explicasse a formulação do primeiro Programa Nacional de Alimen
tação Escolar. Foram realmente esses excedentes que tornaram
possível o lançamento do programa, mas ele já estava pensando,
estruturado e experimentado, pelo trabalho do grupos dos "pro
fissionais da nutrição", que estudamos em outra seção.
De qualquer maneira, o ano de 19 54 foi passado
dentro do FISI sob o signo das "enormes quantidades". Logo no
início, durante a Reunião do board, fica patente a estratégia
que a representação brasileira, através de Cleantho Paiva Leite,
adotaria ao longo do ano. No front novaiorquino, uma ativa bus_
ca de fazer com que o FISI se tornasse o principal canal de dis
tribuição desses produtos, solução preferida a de confiar em
organizações privadas, como o CARE, ou à de realizar compras
diretamente no mercado americano. Isto é perfeitamente compreen
sível se lembrarmos a força da ligação que o Brasil tinha no
Fundo, tanto lã como, o que, sem dúvida, representava uma
margem extra de segurança, pois significava ligar com um parcei_
ro já tradicional e amigo. No front interno, uma procura de in
teressar as organizações nacionais que pudessem apresentar, pro
jetos que absorvessem esses produtos, tentando levá-las a parti_
cipar dos novos suprimentos que ficariam disponíveis para quem
soubesse aproveitá-los.
Quanto ao primeiro aspecto, na própria abertura
da Reunião o representante brasileiro ressaltava o quanto o
FISI havia contribuído para o Brasil, mas lembrava que eram pro
gramas ainda modestos, dizendo que:
"Caso o FISI pudesse adquirir leite em pó aos
preços atuais ou mais baixos (poderia) ampliar
a distribuição atual no sentido de atingir ura
maior número de crianças"
41
No dia seguinte, deixava claro que o FISI atin
gia apenas "uma parcela diminuída do número crescente de crian-
ças que necessitam ajuda" e "que era conveniente uma expansão
considerável dos programas do FISI à América Latina no sentido
de beneficiar outras áreas e outros grupos de idade, inclusive
as crianças de idade pré-escoiar e escolar".
112
A referência à alimentação escolaro era for-
tuita. Por um lado, o próprio FISI dava mostras de ter em mente
programas voltadas para esse público, dentro de uma linha mais
global de atendimento à escola rural, compreendendo a organiza
ção de hortas escolares, a difusão de educação sanitária, a
construção de fossas e poços, o fornecimento de máquinas de cos
tura (sic) e a distribuição de leite. Essa idéia foi calorosa
mente recebida por Cleantho de Paiva Leite, mas nunca seria de
fato traduzida em projetos concretos no Brasil, talvez por se
voltar para uma instituição praticamente ignorada na política
educacional brasileira, exatamente a escola rural.
43
Se essa era a proposta básica que o FISI tinha
a apresentar para canalizar os excedentes que iria receber dos
Estados Unidos, ela pecava por envolver demorados estudos e a
montagem projetos muito complexos, na medida em que eram in
ter-institucionais e integrados. A situação, ao contrário, esta
va a exigir maior rapidez nas alocações e a simples expansão '
dos programas de suplementação alimentar para atingir novos pú
blicos termina por prevalecer.
Que a escolha recaísse no escolar era mais que
natural. Além de ser uma população sabidamente carente em ter
mos nutricionais, como aliás qualquer outra nos países subdesen
volvidos, ela oferecia a vantagem da aglomeração, permitindo
uma distribuição de gêneros com economias de escala relevantes.
Além disso, a existência de uma ampla rede de posto de distri
buição, a possibilidade de usar pessoal do sistema de ensino
e, ainda por cima, a legitimação técnica do programa, pela cone
o entre alimentação e aprendizado, tudo apontava para que fos_
se ela a preferida, no momento em que era urgente colocar os
excedentes. E assim se fez, em programas aprovados ainda nessa
reunião para a Colômbia, Honduras, El Salvador, a Guatemala,
as Guianas Britânica e Holandesa, Dominica, Grenada, Saint Ki-
tts,o Vicente e Trinidad Tobago.
No front interno, a possibilidade de apresentar
novos projetos para aproveitar as disponibilidades do FISI de
pendia de algumas instituições do campo materno-infantil:
"Adquire assim da maior urgência a preparação, pe
las autoridades brasileiras do Ministério da
Saúde, de projetos de campanha contra a bomba ,
contra a lepra e de alimentação escolar suscep
tíveis de enquadramento dentro dos critérios do
FISI. Nesse sentido, aliás, tive a oportunidade
de promover no Rio de Janeiro, desde outubro
passado, os entendimentos preliminares entre o
antigo Diretor Geral do Departamento Nacional
da Crianças, a representante do FISI no Brasil e
o Diretor do Departamento Nacional de Saúde.,.
(e) com o fim de promover e apressar a prepara
ção de vários projetos (bouba, saneamento do
meio, escolas primárias rurais, etc), enviei nu
merosos documentos de interesse a várias autori
dades brasileiras, entre as quais o Dr. Necker
Pinto, Diretor Geral do Departamento Nacional
da Criança, o Dr. Ernani Braga, Diretor Geral
do Departamento Nacional de Saúde, Professor '
Anésio Teixeira, Diretor Geral do Instituto Na-
cional de Estudos Pedagógicos do Ministério da
Educação e Cultura".
45
Se, então, para diversas "áreas novas" o traba
lho estava por começar, especificamente no que dizia à alimenta
ção escolar havia idéias e planos até excessivos e o problema
seria, na verdade, diminuí-los, para torná-los mais ajustados
às possibilidades do FISI, sem dúvida maiores do que no passa
do, mas aindao o suficiente para as intenções dos "nutrólo-
gos":
"Ha um plano da Comissão Nacional de Bem Estar
Social, já apresentado pelo Professor Josué de
Castro, à representante do FISI, que embora vas_
to e muito superior aos recursos que o FISI po
deria devotar a um programa desse tipo no Bra-
sil, constitui sem dúvida uma base para a elabo
ração de um projeto, em menor escala, de cará
ter experimental"
4
6
vê-se, desta maneira, que por uma série de ra-
zões o programa de alimentação escolar seria aquele a ser de fa
to implantado. Em primeiro lugar, ia ao encontro exatamente da
nova situação criada com os excedentes americanos. Em segundo,
representava uma forma de atuação que o FISI aprovava, nem que
fosse conjunturalmente, e já desenvolvia em outros países lati-
no-americanos. Em terceiro, era o único para qual os trabalhos
de planejamento e preparação estavam adiantados ou poderiam ser
feitos com mais facilidade. Em setembro desse ano, assim, é fei_
ta a primeira liberação de recursos do FISI para alimentação '
nas escolas, que permite a execução do primeiro programa nacio
nal de merenda escolar. Começa aí a política da alimentação es
colar no Brasil.
A ETAPA FISI; A ALIMENTAÇÃO ESCOLAR
O projeto de merenda que o FISI aprovou em setem
bro de 1945, seis meses antes, portanto, que fosse criada a Cam
panha de Merenda Escolar, previa a distribuição de leite em es_
colas, a titulo experimental, a deveria ser, segundo Cleantho
de Paiva Leite, a "base do um futuro programa de merenda esco-
lar, em larga escala"
1
'
7
. Era prevista a distribuição de
8.800.000 Ibs de leite em pó para atender a 250.000 alunos, den
tro de uma liberação global de US$ 538.400, que incluía, também,
dois outros projetos. O primeiro era a continuação do atendimen
to materno-infantil no Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará,
Rio Grande do Norte e Paraíba, em Pernambuco, Alagoas e Sergipe,
e na Bahia. O segundo previa sua expansão para o Mato Grosso e
Goiás. O projeto experimental era para "intensificar, em parte
da região, o programa de merenda escolar, que será levado, a
efeito sob os auspícios do Ministério de Educação"4
8
.
A aprovação do projeto no mesmo momento em que
se renovava, pela quinta vez, o acordo com o FISI para atender
onze estados e se aumentava a lista para incluir mais dois,o
passaria desapercebida, no que significava de problemas poste
riores, à Representação Brasileira no Fundo. No Relatório sobre
a recém-terminada reunião, Cleantho de Paiva Leite, um dos que
mais ardorosamente havia defendido a oportunidade de aproveitar
as ofertas do FISI, se mostrava preocupado com o que chamava
"programas grandes demais" (sic) , na medida em que dificilmen
te o Governo poderia assumi-los quandoo contasse mais com o
apoio externo.*
Nos vemos de novo perante o dilema da distribui.
ção, sua tendência à expansão e eternização. Quase que de ano a
ano havia crescido o número de estados que, mobilizando seus re
cursos políticos, se incluíam nos programas do FISI. Dos quatro
iniciais, se passou a nove, depois a onze e depois a treze. Ne-
nhum sinal havia, por outro lado, de que a participação do FISI
pudesse declinar. Seria perfeitamente razoável, portanto, espe
rar que o mesmo viesse a acontecer com a merenda escolar.
O que, talvez,o estava previsto, era a veloci
dade em que isto se daria, a ponto de forçar o Governo Brasilei
ro a uma linha de ação que até então havia sido evitada. Nem Bem
um ano se passou e as remessas do FISI se mostraram insuficien-
tes, surgindo a necessidade de complementa-las com compras dire
tas no mercado americano.
0 programa aprovado em setembro de 54 foi segui_
do por um Convênio assinado em 20 de junho de 1955, mas as re-
messas de leite em pó começariam a chegar desde abril. Sua vali_
dade era por dois anos e tinha por meta "(o fornecimento) do
leite em pó na base de 40 gramas diárias por beneficiário e pa
ra duzentos dias de cada ano letivo."
50
Pelo Plano de ação do Convênio, a distribuição '
se faria de acordo com as quantidades expressas no Quadro 4:
QUADRO 4
PREVISÃO DE ATENDIMENTO DO CONVÊNIO MEC/FISI I
- 1955 e 1956 -
ESTADOS
Piauí.
Ceará
Rio G. do Norte
Paraíba
Alagoas
Sergipe
TOTAL
N° DE ESCOLAS
27.000
80.000
34.000
51.000
35.500
22.000
TOTAL DE LEITE EM PÓ
(lbs/ano)
475.000
1.400.000
a
600.000
900.000
625.000
400.000
250.000 4.400.000
FONTE: Convênio MEC//FISI I, cit, pag. 3
O valor global das mercadorias fornecidas pelo
FISI seria de US$ 215.000, mas o Governo Brasileiro se obrigava
a complementá-lo com dotações aos 6 estados envolvidos no total
Cr$ 1.400.000.000, para a "aquisição de gêneros alimentícios de
alto valor nutritivo a serem utilizados em conjunto com o leite
doado"
51
. Como se, desde o primeiríssimo momento a merenda
incluia "alimentos formulados", poiso era outra coisa que
queria dizer a expressão "alto valor nutritivo".
52
O mais notável nesse convênio, porém, era a mo
déstia de seus números. Pouco mais de 2.000 toneladas ao ano,
apenas 250.000 beneficiários eo mais que 6 estados atingido' ,
tudo contrastava com o quadro anteriormente descrito, das "enor
mes quantidades". A razão para ela, como se pode imaginar, era
a cautela do próprio FISI, temeroso em se lançar em mais um fi-
co sem fundo no Brasil, algo que fica perfeitamente claro quan-
do os dois outros parceiros resolvem negociar diretamente.
Assim, logo no início de 1955, antes mesmo que
começassem a chegar os gêneros aprovados em setembro de 54, ini
ciaram--se os entendimentos entre o MEC e o Governo Americano,
para a compra de leite em pó complementar ao que o FISI transfe
ria. Isto foi feito através da Commoditv Credit ' Corporation.
CCC, uma autarquia Com funções basicamente iguais às que: a Co_
missão de Financiamento da Produção, CFP, desempenha no Brasil,
isto ê, a manutenção de preços de garantia a produtores rurais,
e que figuraria na história da alimentação escolar brasileira
até os anos sessenta.
O Brasil se propunha a comprar 5.000.000 de li
bras de leite, ao preço de 1 centavo de dólar a libra, para en
trega imediata. Do lado americano, as exigências eram de que o
pagamento fosse à vista e que os gêneros fossem exclusivamente
utilizados para a finalidade estabelecida.
53
Como se, algo
bem mais simples que os negócios do FISI, que sempre implicavam
em preparar planos e justificar projetos. 0 preço cobrado, que
fazia com que toda a partida ficasse por US$ 50.000 erao pe_
queno, que o problema de negociar com um parceiro novo talvez
sequer se colocasse. Assim, em 6 de setembro de 1955, foi assi-
nado o primeiro contrato com a CCC, de número DAPS-17.
O destino a ser dado ao leite seria o que se po
de ver no Quadro 5, a seguir:
QUADRO 5
OBSTINAÇÃO DO LEITE DAPS 17
ESTADOS
Maranhão
Pernambuco
Bahia
Espírito Santo
Rio de Janeiro
Paraná
Santa Catarina
Mato Grosso
Goiás
o Paulo
. Rio Grande do Sul
Minas Gerais
Distrito Federal
Amazonas
TOTAL
QUANTIDADE (t)
40
20 0
100
' 100
60
60
50
50
60
300
200
250
400
400
2.270
Fonte: "Ofício de 15/07/1955 do Ministro da Educação
e Cultura ao Ministro das Relações Exterio-
res", Arquivo do MRE, Pasta 51.197
Comparando-se este, com o Quadro 4, atrás, po
dem-se fazer algumas observações interessantes. Em primeiro lu
gar, vê-se que a compra na CCC totalizava uma quantidade supe
rior àquela transferida pelo FISI, mas pouco. Em segundo po-
rem, que cora ela se pretendia atingir a todo o resto do pais,
o queo se poderia fazer será queda muito significativa no
padrão de atendimento.
Para se ter uma idéia, aceitando-se a relação
entre número de escolares e quantidades de leite em pó do qua-
dro anterior, pode-se ver que, grosso modo, a Paraiba, via
FISI, receberia mais leite sozinha que a soma do destinado, via
CCC, ao Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, 0 mesmo se
poderia dizer do Ceará, a quem cabia mais do dobro do previsto
para Pernambuco e Bahia juntos.
Em terceiro lugar, finalmente, que se as quanti
dades absolutas já eram pequenas nos Estados do Nordeste, no
caso dos mais populosos do Leste se tornam ridículas. Atingir
a menos de 35.000 alunos em Minas Gerais é fazer pouco é fazer
pouco mais que nada
Criou-se, então, desde o primeiro ano de opera
ção do programa de alimentação escolar em modelo que duraria
ate o final da década. Alguns de seus traços principaiso a
seguir indicados:
1) Dupla origem dos gêneros importados: em pro-
porções, variáveis, sempre houve duas ori-
gens básicas, o FISI e a CCC. O quadro 6 mos
tra esse padrão:
2) Manutenção da posição vantajosa do Brasil no
FISI:
3) Dificuldades crescentes de importar face aos
problemas cambiais do final do período JK.
4) Problemas com a CCC: atrasos nos pagamentos ,
desvios de alimentos (carta de Julianelli a
respeito).
5) Elevação constante dos custos de leite compra
do à CCC.
6) Dependência dos fornecimentos: depois de come
çar, tem de continuar mesmo a custos maiores
(ponto anterior).
7) Retração do FISI no final do período, entrada
da AID.
NOTA: Estas últimas duas páginaso apenas um sumário do que
QUADRO 6
PARTICIPAÇÃO DO FISI E DA CCC NA IMPORTAÇÃO DE GÊNEROS PARA ALI
MENTAÇÃO ESCOLAR - 1955/1959
ANOS
1955
1956
19
57
1958
1959
TOTA3
:s
TRANSFERÊNCIAS DO
FISI (mil lbs)
4,372
6.758
3.560
11.541
(-)
26.231
COMPRAS CCC
(mil lbs)
5.000
2.205
10.000
(-)
(-)
17.20 5
Nota: (-) dadoso obtidos
Fonte: Arquivo do MRE, Pastas 51.197, 70.839 e 83.142
se deve abordar a seguir.o acredito que faça sentido
continuar a contar a história da participação internacio-
nal, sem referência aos acontecimentos internos. No nivel
atual de disponibilidade de dados, istoo me ê possí-
vel.
0 : '
9
Assim, creio que as duas primeiras sub-seções
deste textoo legítimas, mesmo que baseadas quase que apenas
em um tipo de fonte. Continuar, porém, é jogar trabalho fora,
luxo ao qualo podemos nos dar.
57
NOTAS
01. A sigla FISI, Fundo Internacional de Socorro à Infância,vera
da tradução para o português de UNICEF, ünited Nations In
ternational Children Emergency Fund.
É obvio que o uso atual é da expressão no original. Preferi
mos, no entanto, manter FISI nesta seção por duas razões.Em
primeiro lugar, era assim empregado durante o período em
apreço, e julgamos conveniente respeitar o costume. Em se-
gundo, porque o abrasileiramento da expressão tem, provável
mente,'significado próprio. De um lado, era talvez parte de
uma estratégia para "enraizar" esse programa da OKU no Bra
sil, tornando-o mais assimilável pela sociedade. De outro,
ele tem o sabor de um certo provincianismo perdido com a
cosmopolitização de alguns segmentos da população brasilei-
ra e é bastante sugestivo do estado de espírito nacional
àqueles tempos, quase, remotos.
02. Isto também pode ser verdade em sentido oposto. Veja-se,por
exemplo, a situação na "etapa nacional", onde continua a
se verificar uma participação internacional/ a do Programa
Mundial de Alimentos, da ONU. Neste caso, as peculiaridades
do PMAo tais que sua ligação como o restante dos progra
mas da Campanha se faz problematicamente, sugerindo que
existe algo essencialmente diverso, as regras nacionais.
03. Vide UNICEF. Resolution Adopted by the General Assembly in
th
the 26 4 Plenary Meeting in 0 2/12/1949, New York, Dec.
,1949, pags. 1 et passim
04. Idem, ibidem, pag 1
05. Idem, ibidem, pag 3
06. Idem, ibidem, pag 4
07. In "Telegrama cie 06/05/1950, da Delegação Brasileira na ONU
à Secretaria de Estados Relações Exteriores", Arquivo do
Ministério das Relações Exteriores, Pasta 40.280.
08. Quanto ao Brasil, isto fica evidente na "Carta do Diretor
Executivo do FISI ao Ministro das Relações Exteriores, em
06/01/1950", Arquivo do MRE, Pasta 40.280.
09. Os países envolvidos eram Guatemala, Honduras, Nicarágua e
Costa Rica. Ver ONU Report of the Programe Comittee to Five
Countries of Central America, Doc. E/ICEF/266, de 07/07/1954, pag
3, Arquivo de MRE, Pasta 70.837.
10. Citado no "Telegrama da Embaixada do Brasil em Montevidéu à
Secretaria de Estado das Relações Exteriores, em 17/04/1950", Ar-
quivo de MRE, Pasta 40.280.
11. Ver "Telegrama de 06/05/1950...", citado, onde se menciona
que o Senador Robert Taft estava apresentando projeto de
aumento da contribuição americana.
12. in "Carta da Representante do FISI no Brasil ao Ministro '
das Relações Exteriores, em 01/12/1953", Arquivo do MRE, Pas,
ta 70.83 7.
13. "Carta do Diretor-Executivo do FISI...", citada.
14. in "Telegrama de 18/01/1950 da Secretaria de Estado das Re_
lações Exteriores à Delegação Brasileira na ONU", Arquivo
do MRE, Pasta 40.280.
15. in "Telegrama de 3.7/04/1950 da Delegação Brasileira na ONU
à Secretaria de Estado das Relações Exteriores", Arquivo '
MRE, Pasta 40.280.
16. in "Telegrama da Embaixada em Montevidéu...", citado.
17. Ver, especialmente, o "Telegrama de 10/06/19 50 da Secreta
ria de Estado das Relações Exteriores à Delegação Brasilei-
ra na ONU", Arquivo do MRE, Pasta 40.280.
18. "Carta-Telegrama n° 252, 26/06/1950, da Delegação Brasilei
ra na ONU à Secretaria de Estado das Relações Exteriores" ,
Arquivo do MRE, Pasta 40.280. Todas as citações seguintes
foram extraídas desse documento.
19. Campos, por exemplo, foi convidado para o cargo de Diretor
Regional do FISI para a America Latina, maso aceitou.Ver
"Carta-Telegrama n° 158, de 1951, da Secretaria de Estado
das Relações, à Delegação Brasileira na ONU", Arquivo do
MRE, Pasta 40,280. Cleantho de Paiva Leite, indicado para
substitui-lo, terminou sendo nomeado representante brasilei
ro no FISI.
20. Ver "Ofício do Chefe do Departamento Político e Cultural ao
Diretor-Geral do Departamento Nacional de Criança, em '
19/03/1953 Anexo I", Arquivo do MRE, Pasta 70.836A.
21. in "Carta-Telegrama n° 41, de 14/02/1951, da Delegação Bra
sileira na ONU à Secretaria de Estado das Relações Exterio
fes", Arquivo do MRE, Pasta 40.2 80.
22. in "Carta-Telegrama n° 115, de 21/09/1953, da Delegação Bra
sileira na ONU à Secretaria de Estado das Relações Exterio
res", Arquivo do MRE, Pasta 70.836A.
23. Conforme o "Telegrama de 10/06/1950...", citado.
24. in Acordo entre o Fundo Internacional de Socorro à Infância
e o Governo dos Estados Unidos do Brasil, de 9 de junho de
1950, pag 1, Arquivo da Div. de Atos Internacionais, MRE.
25. in Relatório do Governo Brasileiro sobre atividades de Pro-
teção à Criança de 1940 a 1950. Arquivo do MRE, Pasta '
40.280.
26. Anexo ao "Ofício de 31/05/1951, do Diretor Regional do FISI
para a América Latina ao Ministro das Relações Exteriores"
Arquivo do MRE, Pasta 40.280.
27. in "Oficio de 10/10/1950 do Representante do FISI no Brasil
ao Ministério das Relações Exteriores", Arquivo do MRE, Pas_
ta 40.280, grifos no original.
28. Ver "Oficio de 19/10/1950, do Representante do FISI no Bra
sil ao Ministério das Relações Exteriores", Arquivo do MRE,
Pasta 40.280.
29. O curriculum vitae de Gertrude Lutz mostrava que elao ti
nha a menor experiência anterior de coordenação de progra
mas como o brasileiro. Havia trabalhado em seu país de ori-
gem com "aldeias infantis"; na Iugoslávia, em programas de
distribuição de vestuário; na Finlândia, em distribuição de
alimentos e vestuário e na Polônia era assistência à criança
abandonada. Ver "Ofício de 06/07/1951, do Representante do
FISI no Brasil ao Ministro das Relações Exteriores", Arqui-
vo do MRE, Pasta 40.280. Ê curioso assinalar que a posição'
brasileira de recusar funcionários internacionais queo
falassem português ou espanhol eo estivessem familiariza
dos com a América Latina, adotada no caso da Sra. Lutz, le
vando a uma recusa inicial de seu nome, se mostraria intei-
ramente equivocada mais tarde. De certa forma, o mesmo acon
teceu com o preenchimento do cargo de Diretor Geral do FISI
na América Latina, quando o Brasil também recusa a indica-
1
ção de Mr. Robert Davée, por ser frances, a acreditar o Bra
sil que tal lugar deveria ser ocupado por um funcionário la
tino-americano. Ambos se tornara,, mais tarde, excelentes '
defensores dos pleitos brasileiros no FISI.
A respeito dos recursos, ver "Telegrama do Chefe do COI pa
ra o Representante do FISI no Brasil, s. de "Ofício de '
23/01/52 do Chefe do Dep. Político e Cultural do MRE ao Di-
retor-Geral do Departamento Nacional da Criança", Arquivo
c .
do MRE, Pastas 40,280 e 70.836-B.
30. Dados em Brasil, Ministério da Educação e Saúde - Contribui
" gões do Governo Brasileiro para o Desenvolvimento do Plano
FISI, s . d.
31. Vale a pena mencionar alguns exemplos disso: em 19 55, a Sra
Lutz escreve ao Itamaraty se lamentando pela falta de um
telefone em sua casa.. O Secretário-Geral escreve, logo a
seguir, ao Prefeito do Rio de Janeiro encarecendo-o a solu
cionar a situação. Como a questãoo se resolve, no ano se
guinte o próprio Secretário-Geral volta a fazer o pedido.
Vê-se, no caso, a importância atribuída ao pedido de Gertru
de Lutz, capaz de fazer com que o segundo na hierarquia de
Ministério intercedesse com insistência em seu favor. Outro
exemplo, mais momentoso, foi a demissão de um funcionário
o - brasileiro que a representação do FISI empregava. Era
toda a pendência judicial que se segue, o Itamaraty coloca
um advogado de prontidão, sempre apontando que era o FISI
quem tinha razão. Há outros, ainda, de menor vulto, como o
pronto atendimento de pedidos de liberação de bagagens, con
cessão de placas de corpo diplomático, policiamento para a
casa particular de Gertrude Lutz no Rio, etc.
32- In Acordo entre o Fundo..., citado, Artigo II, alínea G. So
bre o destino das contribuições brasileiras, ver "Carta da
Representação do FISI no Brasil ao Ministério das Relações
Exteriores, em 28/10/1957", Arquivo do MRE, Pasta 70.839. '
Sobre a compra de arroz para a índia, ver "Carta do Repre
sentante do FISI no Brasil ao Ministro das Relações Exteri-
ores, de 25/06/1951", Arquivo do MRE, Pasta 40.280. Em 1953
a Sra. Lutz justifica haver concordado com a transformação''
da contribuição brasileira em pagamento de fretes sob o ar
gumento de que havia "falta de gêneros" (sic). Ver "Carta
da Representante do FISI no Brasil ao Ministro das Relações
Exteriores, em 02/04/1953, Arquivo do MRE, Pasta 70.835-B.
33. Ver Parágrafo 52 do "Relatório sobre as Reuniões do Conse
lho de Administração e do Comitê de Programas do FISI da
ONU", 30 de abril a 24 de maio de 1951, Arquivo do MRE, Pas
ta 40.280. . .
34. O Ministério da Agricultura chega até a comunicar oficial_
mente ser impossível fazer o "matching" de recursos para as
fábricas. Ver Aviso Ministerial, n° 601-1861, de 05/10/1954,
do Ministro da Agricultura ao Ministro das Relações Exterio
res, Arquivo do MRE, Pasta 70.83 7.
35. Ver, a esse respeito, Brasil, Ministério da Saúde - O Depar-
tamento Nacional da Criança - Álbum do Jubileu de Prata do
do DNCr. 1940/1965, Rio de Janeiro, s.d., 4 4p, pags. 16 e
17.
36. Ver a respeito da posição do FISI a "Carta Telegrama n° 232,
de 03/11/1951, da Embaixada em Paris à Secretaria de Estado
das Relações Exteriores", Arquivo do MRE, Pasta 40.280.o
temos informações sobre o destino da usina aprovada. É in
teressante, de qualquer maneira, observar que a sede do
FISI, a altura dos primeiros contatos, era em João Pessoa .
Ainda em 1956, contudo, elao havia sido implantada, pois
Gertrude Lutz comunicava então o reinicio de negociações pa_
ra viabilizá-la. Ver "Ofício da representante do FISI no
Brasil ao Ministério das Relações Exteriores, em 06/01/1956"
Arquivo do MRE, Pasta 70.838.
37. Sobre os estados atendidos, ver, por exemplo "Telegrama n°
132, de 12/12/1951, da Embaixada em Paris à Secretaria de
Estado das Relações Exteriores", Arquivo do MRE, Pasta '
40.280.
38. Nos arquivos do Itamaraty existem dois exemplos disto: O re
querimento de informações do Dep. Lameira Bittencourt, do
Pará, sobre porque seu Estadoo era incluido (RI 249/1951,
da Câmara dos Deputados), e o Ofício da Assembléia Legisla-
tiva de Mato Grosso, que solicitava explicações sobre a ex-
clusão de Cuiabá do rol de cidades onde fábricas de leite
em pó seriara construídas. Como estamos perante três burocra
cias, (o PISI, o Itamaraty e o Ministério) era sempre possi_
vel um "jogo de empurra" das pressões, cada qual dizendo
que o assuntoo lhe competia., porém, limites para is_
to, e, um dia, o resposta final tem que ser dada por al-
guém. Ver Arquivo do MRE, Pasta40.280.
39. In UNICEF Recommendation of the Executive Director for an
Appoetionment for Continuation of a Feeding Program in Bra-
zil E/ICEF/R-425, 25/02/1953 "Restricted", pag. 2.
40. Esta e as citações anteriores in. "Carta-Telegrama n° .1.16 ,
01/09/1953, da Delegação Brasileira na ONU a Secretaria de
Estado das Relações Exteriores", Arquivo do MRE, Pasta
70.836-A.
41. In "Carta-Telegrama n° 41, de 02/03/1954, da Delegação Bra
sileira na ONU à Secretaria de Estado das Relações Exterio-
res", Arquivo do MRE, Pasta 70.837.
42. In "Carta-Telegrama n° 65, 03/03/1954, da Delegação Brasi-'
leira na ONU à Secretaria de Estado das Relações Exteriores"
Arquivo do MRE, Pasta 70.83 7.
43
In "Carta-Telegrama n? 44, de 03/03/1954, da Delegação Bra
sileira na OKU à Secretaria de Estado das Relações Exterio-
res", Arquivo do MRE, Pasta 70.837.
44. Sobre Honduras, ver Carta-Telegrama n° 43, de 03/03/1954, da
Delegação Brasileira na ONU à Secretaria de Estado das Rela
ções Exteriores, Arquivo do MRE, Pasta n° 70.837. Sobre os
demais paises e colônias, "Carta-Telegrama n° 47, de
0 4/03/1954, da Delegação Brasileira na ONU à Secretaria de
Estado das Relações Exteriores", Arquivo do MRE, Pasta
70.837. Os recursos aprovados variavam de US$ 25.0 00, para
a Colômbia, a US$ 2.500 para a pequena ilha inglesa deo
Vicente.
45. In "Relatório Apresentado pelo Representante Brasileiro a
Reunião do FISI, parágrafos 52 e 55, pags. 20 e 21, Anexo
do Ofício de 10/03/1954 do Representante Brasileiro à Dele
gação na ONU" Arquivo do MRE, Pasta 70.837.
46. idem, parágrafo 53, pag. 20
47. In "Ofício de 03/09/1954 do Representante Brasileiro do
FISI ao Secretario-Geral da Secretaria de Estado das Pela.
ções Exteriores" Arquivo do M.RE, Pasta 70.837.
48. In "Ofício de 20/09/1954, da Representante do FISI no Bra
sil ao Ministro das Relações Exteriores", Arquivo do MRE,
Pasta 70.837, de onde se extrairam os dados.
49. In. "Relatório sobre a reunião do FISI, Anexo ao Ofício de
01/10/1954 do Chefe da Delegação Brasileira na ONU ao Minis
tro das Relações Exteriores," Arquivo do MRE, Pasta 70.837.
50. In "Convênio que entre si firmam o Ministério da Educação e
Cultura do Brasil e o FISI, para a realização de um Progra-
ma de Distribuição de Leite em Pó aos Escolares
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