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Presidente da República
João Baptista de Oliveira Figueiredo
Ministro da Educação e Cultura
Eduardo Mattos Portella
Secretário-Geral
João Guilherme de Aragão
Secretária de Ensino de 1? e 2? Graus
Zilma Gomes Parente de Barros
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
SECRETARIA DE ENSINO DE 19 E 2? GRAUS
CURRÍCULOS EDUCACIONAIS:
UMA METODOLOGIA DE PLANEJAMENTO
Este volume foi elaborador por:
Dalilla C. Sperb
Lúcia Marques Pinheiro
M.S. Jordão Emerenciano
2? Edição
Brasília - 1980
É proibida a reprodução total ou parcial
deste livro, salvo com autorização da Secretaria
de Ensino de 1? e 2? Graus do Ministério da
Educação e Cultura, detentora dos direitos
autorais.
Foram depositados cinco exemplares deste
volume no Conselho Nacional de Direitos Auto-
rais e cinco exemplares na Biblioteca Nacional.
Brasil. Ministério da Educação e Cultura.
Secretaria de Ensino de 19 e 29 Graus.
Currículos educacionais: uma metodologia
de planejamento. 2? ed. Brasília, 1980.
72 p. (Série Ensino Regular, 12).
I. Ensino de 19 grau - Currículo. I. Título
II. Série.
APRESENTAÇÃO
O dinamismo da educação impõe que os currículos preparados para as
nossas escolas correspondam às necessidades, interesses e aspirações das
crianças, dos adolescentes e da vida contemporânea.
O planejamento curricular, se desejamos uma escola que eduque e cor-
responda ao esforço educacional brasileiro, passa a ser um dos principais
componentes dos procedimentos qualitativos do ensino e da otimização
quantitativa dos recursos financeiros dispendidos pelo País, desde que consi-
dere o cliente da escola e as realidades sociais, econômicas e culturais das
comunidades onde o processo ensino-aprendizagem está sendo vivenciado.
Ajustar o planejamento curricular aos vários momentos e contextos da
educação brasileira é um esforço saudável, amadurecido e necessário, desde
que o exercício deste ajustamento não seja desencadeado pela única vontade
da promoção de "mudanças" e "inovações" desprovidas de justificativas
maiores.
Este documento, que teve sua reedição solicitada pelos educadores
brasileiros, foi publicado pelo antigo Departamento de Ensino Fundamental,
em 1973. O seu conteúdo, elaborado pelos Professores Dalilla C. Sperb,
Lúcia Marques Pinheiro e M.S. Jordão Emerenciano, continua atual e mere-
cedor da atenção de todos os envolvidos com os problemas educacionais.
Que o esforço dispendido pela Secretaria de Ensino de 1? e 29 graus,
na reedição deste volume, corresponda ao anseio consciente e multiplicador
dos educadores brasileiros.
ZILMA GOMES PARENTE DE BARROS
Secretária de Ensino de 19 e 2? Graus
SUMÁRIO
I — CURRÍCULOS EDUCACIONAIS — Uma metodologia de
planejamento, Dalilla C. Sperb............................................................... 9
II — UMA TAREFA COMPLEXA: A REFORMULAÇÃO DE
CURRÍCULOS E PROGRAMAS PARA A EDUCAÇÃO DE
1º GRAU, Lúcia Marques Pinheiro ........................................................ 29
III — CURRÍCULOS: Relações com a vida. Concepções. Funções.
M. S. Jordão Emerenciano ..................................................................... 57
ROTEIRO
Introdução
I — O Currículo e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
— O Ideal Nacional
Sistematização, Ordem e Seqüência
II — O Diagnóstico das Necessidades Educacionais
O Aluno e a Sociedade
III — A Formulação de Objetivos Educacionais IV —
A Seleção de Conteúdo V — A Organização do
Conteúdo VI — A Seleção de Experiências de
Aprendizagem
VII — A Organização de Experiências de Aprendizagem
Currículos Centrados em Interesses
— Educação Democratizada
VIII — O Planejamento de Formas e de Materiais de Avaliação
IX — Os Condutores do Currículo
Revolução e Liderança
A Individualização da Formação do Professor
— Esquema Final
CURRÍCULOS EDUCACIONAIS: UMA
METODOLOGIA DE PLANEJAMENTO
A educação escolar, como todos os demais aspectos da vida humana,
acha-se em meio do turbilhão de desenvolvimento que vem transformando a
face da terra. Estudiosos de problemas educacionais, autoridades de
educação nacional, alunos e seus pais criticam a escola, atribuindo-lhe falta
de eficiência na tarefa de humanização do homem.
A evasão escolar, o crime em marcha, o uso desenfreado de entor-
pecentes e do álcool parecem testemunhar o fracasso da escola em sua tarefa
de auxiliar a criança e o jovem a construir um sentimento de dignidade e de
compreensão do mundo de que são parte importante. Embora a escola não
seja a única instituição social responsável por educar as gerações jovens, as
criticas devem ser consideradas de maneira muito positiva, pois nada mais
são do que a prova do interesse de julgar e o desejo de aperfeiçoar a única
instituição usada para a formação sistemática do homem educado.
Se neste momento o Brasil, desenvolvendo esforço alicerçado no mais
genuíno desejo de toda a população, empenha enormes capitais públicos e o
melhor de suas forças humanas a fim de reconstruir todo seu sistema
educacional, isto se deve à compreensão de três conjuntos de fatos principais
caracterizados por extrema complexidade:
' 1 — A sociedade brasileira sofre atualmente as mais rápidas e
fundamentais mudanças. Estas podem ser previstas ainda mais
violentas e complexas para o futuro próximo. As escolas, mais do
que nunca, devem assumir funções instrutoras, formadoras e
orientadoras a fim de que as gerações novas possam entender,
aceitar e dirigir as mudanças sociais que ocorrem, preservando sua
herança cultural mas reconstruindo a sociedade de acordo com o
seu tempo.
2 — Os responsáveis pela educação em nosso País não ignoram a
explosão de conhecimentos verificada em todos os ramos do saber
humano. Uma riqueza quase infinita de conhecimentos obriga os
educadores a uma seleção inteligente e criteriosa
-9-
dos conteúdos curriculares e programáticos e à criação de métodos
de ensino que possibilitam ao aluno aprendizagem mais rápida,
segura e mais econômica.
3 — Num momento da História da Humanidade em que uma nação,
como garantia de sua independência e como defesa do ideal
democrático, necessita urgentemente valorizar seus recursos
humanos, educando a todos, sem distinção, reconhecendo mais do
que nunca a existência de vasta gama de diferenças individuais, o
processo ensino-aprendizagem deve ser revitalizado, adaptando-se
os velhos métodos ao passo que novos são criados.
Este é o raciocínio que animará as sugestões que se seguem. Ini-
ciaremos o assunto através de uma apreciação da parte fundamental da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no que se refere aos fins da
educação.
I — O CURRÍCULO E A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA
EDUCAÇÃO NACIONAL
Planejar e executar currículos educacionais significa realizar uma obra
que, como um todo, encerra duas partes principais. Planejar refere-se à
teoria; executar, à prática. Tanto a primeira como a segunda devotam
atenção a meios e a fins.
O Currículo é o cálculo e a coordenação dos fins e dos meios da educação
O IDEAL NACIONAL
Na parte teórica, isto é, na fase do planejamento do currículo, a
preocupação inicial relaciona-se com os fins da educação. Recorrendo à Lei
nº 4.024, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, encontra-se, Título I,
art. 19, a até g:
"A educação nacional, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais
de solidariedade humana, tem por fins:
a) a compreensão dos direitos e deveres da pessoa humana, do cidadão,
do Estado, da família e dos grupos que compõem a comunidade;
b) o respeito à dignidade e às liberdades fundamentais do homem;
c) o fortalecimento da unidade nacional e da solidariedade inter-
nacional;
d) o desenvolvimento integral da personalidade humana e a sua
participação na obra do bem comum;
e) o preparo do indivíduo e da sociedade para o domínio dos recursos
científicos e tecnológicos que lhes permitam utilizar as
possibilidades de vencer as dificuldades do meio;
- 10-
f) a preservação e expansão do patrimônio cultural;
g) a condenação a qualquer tratamento desigual por motivo de
convicção filosófica ou religiosa, bem como quaisquer preconceitos,
de classe, sexo ou raça.
Ainda no Título II, Art. 2º, a mesma Lei determina: "A educação é
direito de todos e será dada no lar e na escola."
O Art. 3º estabelece — "O direito à educação é assegurada: I — Pela
obrigação do poder público e pela liberdade de iniciativa parti-cular de
ministrarem o ensino em todos os graus, na forma da lei em vigor".
Assim a Lei se expressa em relação à orientação filosófica da educação
nacional. De maneira concisa, temos, nos Artigos citados, a representação
do Ideal educativo nacional. Almejamos educar crianças e jovens para que
venham a ser homens e mulheres imbuídos de verdadeiros princípios de
liberdade, de ideais de solidariedade humana, direitos e deveres do cidadão,
do Estado, da família e dos grupos que compõem a comunidade; referentes
em relação às liberdades fundamentais do homem, integrados na unidade
nacional e solidários em relação à esfera internacional; desenvolvidos
integralmente e aptos de participação na obra do bem comum; abertos à
compreensão e à utilização dos recursos científicos e tecnológicos que lhes
permitam vencer as dificuldades do meio; mordomos fiéis de seu patrimônio
cultural; defensores da igualdade essencial de todos os homens, sem
consideração de convicção filosófica ou religiosa, bem como de classe ou de
raça.
A clareza dos fins da educação é condição essencial e inicial ao
processo de planejamento de currículos educacionais.
Somente a clareza em relação aos fins a alcançar permite empe-
nharmo-nos na realização do planejamento, passo a passo.
SISTEMATIZAÇÃO, ORDEM E SEQÜÊNCIA
Toda obra de planejamento de currículos educacionais requer
sistematização, ordem e seqüência. Esta exigência pode ser atendida por um
planejamento orientado pela seguinte metodologia: II — O DIAGNÓSTICO
DAS NECESSIDADES EDUCACIONAIS
Conhecido o ideal educativo, pode-se proceder a um diagnóstico das
necessidades educacionais de determinado grupo de educandos. A clareza
quanto ao ideal educativo, isto é, o conhecimento dos objetivos
educacionais visados pela sociedade, permite-nos diagnosticar o que falta
ao educando para que, como indivíduo e como membro da sociedade, possa
vir a sentir-se feliz e realizado.
O diagnóstico das necessidades educacionais ampara-se nos Fun-
damentos da Educação, em geral. Se bem que no ideal os Fundamentos
- 11 -
Filosóficos da Educação já vêm expressos concomitantemente com os
Fundamentos Sociológicos, a consecução do ideal depende da atuação
dispensada aos Fundamentos Biopsicológicos. A sociedade, orientada por
determinada filosofia, a bem de alcançar seus fins de educação, necessita
considerar as possibilidades educacionais inerentes ao educando, em
determinada fase de desenvolvimento e de maturidade, considerando-o um
ser único, com o direito de ser diferente dentro de seu grupo, enquanto
reconhece seu dever como membro importante da humanidade.
O ALUNO E A SOCIEDADE
A pergunta, nesta etapa de planejamento, é: QUE tipo de educação
necessita a sociedade para a qual planejamos? Para ser logo seguida de nova
indagação: Que tipo de educação é possível ao educando?
Esta realidade conduz às diferenças fundamentais que necessaria-mente
devem existir no currículo quando o consideramos em sentido vertical.
Currículos excelentes para cursos de 2º grau obviamente não servem para
educar crianças. Mas também no sentido horizontal, cuidados para com as
diferenças são indispensáveis, porquanto até dentro de seu grupo de idade o
aluno sempre permanece um indivíduo. Daí a necessidade da previsão de
currículos variados, diversificados, que atendam às necessidades sociais,
enquanto se adaptam às possi-bilidades educacionais da criança ou do
adolescente.
Estas considerações permitem-nos finalmente estabelecer os obje-tivos
para cada tipo de currículo. A formulação de objetivos é, por-tanto, a
segunda etapa do planejamento.
III — A FORMULAÇÃO DE OBJETIVOS EDUCACIONAIS
Os objetivos educacionais são específicos de cada tipo de currículo,
mas, de acordo com a orientação filosófica expressa pela lei à qual se sujeita
um sistema educacional, alguns objetivos estão sempre presentes, não
obstante o tipo de currículo e grau de ensino.
A Lei nº 4.024, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, expressa
uma orientação filosófica que encerra conceitos tais como liberdade,
solidariedade humana, direitos e deveres da pessoa, do cidadão, e do Estado,
além da unidade nacional, solidariedade inter-nacional, bem comum e a
igualdade essencial da pessoa humana. Espera-se, portanto, que o currículo
contenha a previsão relativamente às situações de aprendizagem através das
quais o aluno possa asse-nhorear-se de conhecimentos e através deles forme
tais conceitos. Refere-se esta parte ao desenvolvimento do aluno,
especialmente no campo cognitivo e no campo afetivo, formando-se assim
conceitos, valores e habilidades.
Mas a Lei citada igualmente prevê a formação para o domínio dos
recursos científicos e tecnológicos e para a capacidade de utilização
- 12-
desses recursos, além de requerer o desenvolvimento integral da perso-
nalidade humana e a sua participação na obra do bem comum. A consecução
destes objetivos pode ser esperada do desenvolvimento de currículos que
também proporcionam ao educando situações favoráveis a seu
desenvolvimento no campo psicomotor ou das habilidades.
Os objetivos expressos em currículos educacionais devem, portanto,
definir claramente o que se espera em relação à formação de compor-
tamentos para, a seguir, precisar as áreas de experiências humanas através
das quais o educando possa formar tais comportamentos. Os três tipos de
comportamento, cognitivo, psicomotor e afetivo, na ver-dade são
inseparáveis. Qualquer ato humano consciente provavelmente envolve os
três tipos, mas a formulação de objetivos necessita de linhas diretrizes e
estas podem ser encontradas quando consideramos cada um dos tipos de
comportamento humano isoladamente.
Especificados os objetivos, cumpre planejar o conteúdo do currículo,
selecionando-se as situações educativas que a escola deve oferecer ao aluno.
IV — A SELEÇÃO DE CONTEÚDO
Nesta fase de planejamento do currículo, as linhas diretrizes podem ser
encontradas através da consideração dos fins e dos obje-tivos já
estabelecidos em fase anterior. Trata-se agora de precisar a primeira parte
dos meios que possam conduzir ao alcance dos objetivos, fins ou ideais
educativos.
"O que devem as escolas ensinar?" Esta pergunta torna-se tanto mais
complexa quanto mais cresce a herança cultural legada de gera-ção a
geração. Respostas têm sido dadas e decisões são tomadas neste sentido,
sempre com base numa convicção filosófica. Os conteúdos clássicos já
foram os preferidos, porque a formação humanistica era a desejada. Durante
o século XIX mais e mais escolas ampliavam seus critérios de escolha de
conteúdos e, finalmente, durante o século atual a seleção de conteúdos para
o currículo deixou de ser unicamente a determinação de matéria
programática para determinado grau de ensino.
A seleção de conteúdo, feita em base tão restrita, não atenderia o que
vem expresso nos fins educacionais propostos na Lei nº 4.024, de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional. A matéria programática em si não é
importante e seu domínio pela mera memorização tem valor educacional
insignificante. Considerada como um meio, no entanto merece seu justo
lugar na série de elementos que formam o conteúdo do currículo.
Também nesta etapa de planejamento cumpre tenhamos em mente o
desenvolvimento do aluno em seu campo cognitivo, oferecendo-lhe
conteúdos que conduzam à aquisição de conhecimentos em
- 13 -
todas as áreas do saber humano; conteúdos cujo desenvolvimento lhe
favoreçam a formação de habilidades socialmente necessárias e desejáveis e
conteúdos que o impressionem de modo a levá-lo à formação de elevados
valores e atitudes. Neste sentido, vemos surgindo um novo conceito de
educação humanística que envolve como objetivos prin-cipais o
desenvolvimento do sentimento de compaixão, o interesse e a preocupação
para com o bem-estar do próximo, a autoconfiança, o pensamento critico, a
capacidade de amar, a cooperação, o cuidado pela saúde, a compreensão dos
atos de outras pessoas, o interesse por novas experiências e a capacidade de
expressar sentimentos fortes sem o uso da violência.
A validade de um conteúdo, portanto, existe na proporção de sua
coerência com os fins da educação previstos e de sua adequação ao tipo de
curriculo. Existe também quando reflete o conhecimento cien-tifico
contemporâneo. Neste momento da História da Humanidade a intensidade
de crescimento do saber rapidamente torna obsoletos os conteúdos
programáticos, sentindo-se o obsoletismo tanto de fatos como de conceitos.
Dai, para os responsáveis pela seleção de conteúdo, a necessidade de
permanente contato com a revisão de fatos já conhe-cidos e o nascimento de
novos fatos e a conseqüente reformulação de conceitos existentes e a
formação de novos conceitos.
Nesta situação, elaborar programas é tarefa árdua a exigir sérias
considerações. Trata-se inicialmente da definição do conceito que as
disciplinas devem ter, como elemento que são do curriculo, e da orde-nação
hierárquica das mesmas.
O termo disciplina, em educação, tem seu conceito próprio. Enten-
demos por disciplina um corpo de conhecimentos organizados em torno de
conceitos básicos. É o saber, a cultura, a herança social, o resultado de
muitas gerações de aprendizagem acumulada, organizados para a instrução.
Os planejadores de currículo sabem que as disciplinas estão sujeitas à
evolução. Escolas de qualquer grau, atualmente, devem incluir programas
de, por exemplo, Ecologia, Sexologia e Toxiconomia. As dis-ciplinas
mudam através do acréscimo de informação trazida pelos descobrimentos e
as invenções. Os conceitos básicos podem sofrer mudança quando fatos
novos são descobertos ou quando fatos antigos passam por uma
reinterpretação. Quando tal acontece, novas teorias devem ser inventadas a
fim de que os dados obtidos possam ser explicados. Destas mudanças podem
nascer as disciplinas intermediárias, tais como a Bioquimica, a Biofísica, a
Astronáutica, a Fisioquimica e tantas outras. Embora as mudanças nas
disciplinas sejam atualmente mais intensas nas Ciências Naturais,
Matemáticas e nas Ciências do Comportamento, é certo que todas as demais
disciplinas sofrem modi-ficações enquanto permanecem em estudo.
-14-
Mas o conteúdo de currículo não se restringe às disciplinas. O termo
extracurricular vem sendo substituído. Atividades tais como música, coro
falado, orquestras, bandas, arte dramática, grupos de debate, clubes de
atletismo, grupos de escoteiros, clubes de caridade, clubes de motoristas,
grupos de tradições e de folclore estão sendo incluídos no conteúdo
curricular, sob a denominação de atividades extraclasse. Cursos de
enfermagem, de puericultura, economia domés-tica e outros, nas áreas
recreacionais e vocacionais, são incluídos e merecem toda a atenção dos
planejadores de currículo. As rápidas mudanças sociais exigem da escola
também o preparo para a vida em segurança, para a saúde e para as horas de
lazer. O aluno necessita de instrução sistemática para que se torne hábil
consumidor, para se decidir quanto aos produtos oferecidos pelo mercado
moderno. Toda a vida escolar deve ser uma prática de cidadania construtiva
e posi-tiva.
Também a participação dos pais e de outros leigos da comunidade deve
ser planejada e considerada co-curricular. As disciplinas e os demais
conteúdos requerem, dentro do currículo, organização que reserva
prioridades, de acordo com as necessidades do aluno e da sociedade, à qual
a escola serve. Muita incoerência pode surgir quando o Regimento da
Escola é planejado como peça totalmente autônoma, não considerando as
demais partes do currículo.
O planejamento do conteúdo do currículo deve visar este como um todo
harmonioso. A escola deve ser para o aluno um lugar onde encontra
situações planejadas para sua educação integral. Conteúdos isoladamente
planejados e simplesmente justapostos fazem da escola uma oficina onde
vários especialistas exercem suas funções, polindo cada um uma parte
diferente do aluno, sem nexo entre si.
Tudo que acontece ao aluno, sob a inflncia da escola, é currí-culo,
deve ser planejado, coerente e coordenado. Excursões, visitas a indústrias e
obras públicas necessitam ser previstas no currículo, sob pena de se
tornarem atividades desordenadas, onerosas em tempo e perturbadoras do
andamento geral do ensino e da aprendizagem. Tanto o ensino das
disciplinas como as demais partes do currículo de-vem existir com o fim
direto e consciente de realização dos fins e objetivos estabelecidos pela
escola. Nada, destarte, deveria ser con-fiado ao acaso, à improvisação.
Note-se que, por circunstâncias múltiplas, o conteúdo do currículo
necessita revisão e modificações. Isto sempre deverá acontecer quan-do o
bem do educando está em jogo e quando a sociedade enfrenta novas
situações e necessidades. Costuma-se, por isso, definir o currí-culo como
"ambiente em ação". Mas em tais casos as modificações não podem ser
feitas isoladamente por um membro do corpo administrativo ou docente da
escola. Também as mudanças de currículo
-15-
devem ser feitas ordenadamente a fim de que o currículo possa continuar
uno e coerente em seu todo. De nada valeria, por exemplo, a mudança em
Ciências se em Filosofia quiséssemos permanecer estanques. Qualquer
mudança afeta o currículo todo, e isso deve ser conhecido e sentido por
todos os interessados na escola.
V — A ORGANIZAÇÃO DO CONTEÚDO
O conteúdo selecionado requer organização sistemática. A base do
sistema é encontrada, também nesta fase de planejamento, nos fins e
objetivos do currículo, mas com a atenção essencialmente presa nos
conhecimentos relativos à maneira como o educando mais fácil e
eficientemente pode aprender.
Dois são, principalmente, os problemas relacionados com a orga-
nização do conteúdo do currículo. Inicialmente trata-se de estabelecer a
melhor maneira de conduzir o aluno pela escola, desde a entrada até o fim
de seus anos escolares. A isto chamamos de organização vertical. O
conteúdo deve, além disso, ser organizado horizontalmente, isto é, os
alunos, divididos em grupos, serão atendidos por um ou mais professores ao
mesmo tempo.
A organização vertical, de acordo com os fins e objetivos a alcan-çar
poderá basear-se em convicções tais como:
a) Escolas de 1º e 2º graus existem para ensinar ao aluno deter-minada
matéria programática;
b) a matéria a ser ensinada deve ser identificada e rigorosa-mente
prescrita;
c) as diferenças individuais determinarão as possibilidades de cada
aluno no sentido de aprender ou não a matéria progra-mática.
De acordo com esta convicção, o conteúdo do currículo é dividido em
séries, no sentido vertical, organizando-se horizontalmente em
departamentos, com agrupamento de alunos à base de seu venci-mento das
matérias programáticas. As reprovações funcionam, neste caso, como
mecanismo que visa ajustar ao sistema os alunos mais lentos.
Um segundo modelo de organização vertical oferece concordân-cia com
o anterior no que se refere às matérias programáticas, mas dá outras
dimensões ao problema das diferenças individuais. Assim sondo, a
organização vertical é modificada, desaparecendo as repro-vações que são
substituídas por grupos de níveis diferentes, no plano horizontal.
Os alunos de aprendizagem mais rápida tém, dentro desta orga-nização,
a possibilidade de vencerem a matéria programática mais
-16-
rapidamente do que os mais lentos. Também nesta organização permanece a
departamentalização em relação às matérias programáticas.
Como terceiro modelo, apresentamos uma organização baseada em
convicção progressista. É a convicção que, ao invés de centrar a vida da
escola no ensino da matéria programática, procura-se o centro no aluno e
sua maneira de aprender a pensar, principalmente. A reprovação não existe
porque não existem séries fixas que devem ser vencidas. As diferenças
individuais são a base. Até mesmo agrupados em classes individuais, eles
são encaminhados ao estudo da matéria programática de acordo com suas
possibilidades.
A organização vertical, funcionando à base de aprovação ou reprovação,
torna-se tanto mais impossível quanto mais cresce a reserva de
conhecimentos acumulados em todos os campos do saber humano.
Exigências iguais para todos os alunos provam ser impossíveis, tanto para o
aluno da escola de 1º grau como para o de 2º grau. Ainda não existe
evidência de que um aluno reprovado, repetindo uma série escolar, tivesse
aprendido mais do que se fosse permitido acompanhar a série imediatamente
superior. Em seu todo, porém, a organização vertical, variada ou não,
encontra apoio unicamente em convicções a respeito de diferenças
individuais. Esta é a base para decisões.
Tentativas de eliminar as reprovações e seus inconvenientes, até este
momento, foram bem sucedidas nas escolas de 1º grau. Bons resultados são
alcançados pela organização de blocos de três anos, quando o aluno enfrenta
situações de avaliação com fins de pro-moção somente ao fim de um longo
espaço que lhe oferece maiores possibilidades de ajustar-se às exigências
curriculares. Existe também a promoção automática, por grupos de idade,
horizontalmente organizados em níveis de capacidade do aluno.
Na escola de 2º grau são feitas tentativas de, apesar de agru-pados em
séries, permitir aos alunos o ritmo de apredizagem do qual são capazes.
Exemplos há em que blocos de três anos também são executados no ensino
de 2º grau.
Neste caso as diferenças individuais recebem atenção maior. Dentro de
um mesmo grupo haverá alunos bem avançados no estudo de línguas e,
talvez, mais lentos em ciências, ou vice-versa, mas no fim de três anos
conseguem um ajustamento provavelmente mais proveitoso do que o que
teriam alcançado vendo à sua frente o perigo de reprovação, ano após ano.
Existem também casos isolados em que, apesar da seriação, o ensino é
aprofundado nas diversas disciplinas, de acordo com o alcance dos alunos.
Há notícias de projetos desenvolvidos por escolas de 29 grau e do ensino
superior, em que professores universitários
-17-
tomam a regência de classes de 2º grau durante algumas horas da semana,
sempre que os alunos, dentro de determinada disciplina, pos-sam receber
tais ensinamentos. Isto, naturalmente, deve ser previsto nos objetivos do
curriculo e no planejamento geral.
Especificamente em relação à organização horizontal, alunos, tanto na
escola de 1º como 2º grau, são, em geral, agrupados de uma maneira
chamada homogênea, usando-se o critério de maturi-dade, interesse, idade,
habilidade ou inteligência. Classes heterogê-neas, seguindo alguns critérios,
também podem ser organizadas.
Quanto ao curriculo, pode-se oferecer o conteúdo organizado em
departamentos, por área de ensino, por matérias programáticas iso-ladas ou
por uma combinação destas maneiras de organização do ensino.
VI — A SELEÇÃO DE EXPERIÊNCIAS DE APRENDIZAGEM
Selecionar experiências de aprendizagem significa planejar o encontro
do aluno com o conteúdo do curriculo. Também esta parte do planejamento
seguirá a convicção dos planejadores, isto é, a con-cepção que eles têm do
aluno e de sua maneira de aprender.
O planejamento de experiências e atividades através das quais o aluno
deve entrar em contato com o conteúdo para ele planejado sempre se
fundamenta nos conhecimentos existentes sobre a natu-reza do homem e a
natureza do processo de aprendizagem. Em sua essência, todo o currículo é
um planejamento de aprendizagem, mas este momento do plano é
especificamente dedicado à procura das melhores condições para a
aprendizagem.
As mesmas linhas diretrizes que nas fases anteriores orientaram o
planejamento do curriculo estarão presentes quando chega a vez do
planejamento de atividades e experiências.
Se nas fases anteriores de planejamento a ênfase estava em
proporcionar ao educando sólidos conhecimentos nas diferentes áreas de
ensino, a seleção de experiências deverá expressar o mesmo. Mas se o
planejamento, desde seu início, tinha como maior preocupação o
desenvolvimento integral do educando, a seleção de experiências será a
procura de uma série de aspectos em que a matéria progra-mática tem a
função de meio e não de fim em si. As linhas orienta-doras são as linhas do
pensamento filosófico que prevalecem desde o primeiro passo dado no
sentido de planejamento de currículo. Se assim não fosse, estaríamos em
face de uma enorme incoerência que, por si só, impediria a avaliação dos
resultados de todo o planeja-mento anterior.
-18-
VII — A ORGANIZAÇÃO DE EXPERIÊNCIAS DE APRENDIZAGEM
— O MÉTODO
A organização de experiências de aprendizagem significa o mé-todo de
ensino, a seqüência a observar no oferecimento das experiên-cias
selecionadas.
Nesta parte prevalece a convicção de um professor ou corpo docente, a
respeito de como o aluno pode aprender melhor.
Quando destinamos ao aluno, como única experiência, o contato com a
disciplina, a seqüência em geral se resume à leitura do que existe no livro de
texto ou à explicação dada pelo professor. Segue-se o estudo, a repetição e a
verificação que, possivelmente, mede pouco mais do que o esforço feito pela
memória do aluno. Esta é, com poucas diferenças, a seqüência, quando o
currículo é centrado nas disciplinas.
Muito diferente se torna a abordagem quando se pretende desenvolver
um currículo centrado no aluno, isto é, quando a matéria programática
desempenha o papel de meio e não de fim. Neste caso, a educação integral
do educando constitui-se no fim almejado. Sua participação total é desejada
a fim de que o conjunto de expe-riências venha a proporcionar-lhe os
conhecimentos que necessita. as habilidades indispensáveis à vida, como
membro de uma sociedade, e os valores e atitudes orientadoras do emprego
que fará de seus conhecimentos e habilidades.
Sendo esta a orientação, os métodos de ensino serão ativos. Como
exemplo, damos a seguir uma descrição de formas novas de
desenvolvimento do currículo.
Currículos Centrados em Interesses
Entre as inovações atualmente experimentadas com o fim de tornar os
currículos para o ensino de 2º grau mais interessantes aos alunos, encontra-
se a que já se costuma designar por currículo cen-trado em interesses. A
diferença entre os currículos tradicionais de escolas de segundo grau e essa
inovação é que, ao invés de sujeitar toda uma classe ao estudo de
determinado número de disciplinas durante todo o ano acadêmico, a escola
oferece cursos eletivos de curta duração, de nove semanas em geral, periodo
durante o qual um grupo de alunos estuda amplamente e em profundidade
um tópico por eles mesmos escolhido e desenvolvido por professor
competente.
Segundo a teoria fundamental desse plano, poderia acontecer que
alunos normalmente classificados em grau se agrupassem por interesses
comuns para o estudo de, por exemplo, literatura brasi-leira contemporânea.
O grupo de alunos, juntamente com o profes-
- 19-
sor escolhido para orientar o curso, elaborariam o programa e deter-
minariam o tempo livre para as diferentes partes do curso.
Os alunos seriam convidados a propor livros, poesias e canções que
desejariam estudar e comentar.
Outro grupo talvez teria interesse em literatura e esportes. Seria a
descoberta do lugar dos esportes na literatura, examinando-se a vida dos
atletas famosos e de conjuntos que venceram campeonatos. A leitura de
publicações especializadas em esportes seria o cerne do curso mas a
expressão oral e escrita teria muitas oportunidades.
Literatura e Propaganda seria outro centro de estudo. Até que ponto a
propaganda exerce influências sobre a vida da comunidade? Qual é a
influência da propaganda sobre a língua falada e escrita? A ênfase deste
curso seria em analisar material de propaganda e de produzir literatura em
propaganda para os mais variados meios de difusão.
Os interessados por uma excursão pelo reino do terror e do mistério
ocupar-se-iam com a astrologia, magia, fantasmas, fenômenos físicos, o
mundo do futuro, da imaginação e do inexplicável. Enfim, cursos de
literatura das categorias aventura, drama, mistério, ficção, heroísmo,
comunicação, mitologia, contos e outros seriam oferecidos sempre, de
acordo com os professores disponíveis e os interesses dos alunos.
Assim como os exemplos de cursos de literatura citados, cursos de curta
duração com base em qualquer outra disciplina poderiam ser organizados. O
importante em tudo isto seria que o ano letivo se tornasse interessante, que o
aluno tivesse consciência de estar realizando mais, de ter concluído estudos
de seu principal interesse, . praticando auto-educação.
Entende-se que, ao se agruparem em torno de centros de interesse, os
alunos, ao fazerem a escolha do curso, deveriam receber a orientação do
professor responsável pelo mesmo, mas nunca sofreriam ação coercitiva, já
que a liberdade de escolha seria o essencial para o desenvolvimento da
responsabilidade.
Ninguém melhor do que o professor especialista da disciplina para
orientar o aluno, contato que naturalmente seria de interesse do orientador
educacional ou vocacional.
O currículo centrado em interesses poderia conduzir à escola não
graduada ou sem séries prefixadas. Os alunos maturariam de acordo com
seus interesses. O agrupamento em torno de centros de interesse talvez
viesse a ser o melhor critério para organizar classes homogêneas. Mediante
este critério, os alunos não permaneceriam todo o ano letivo no mesmo
grupo pois que, concluído um cruso de apro-
-20-
ximadamente nove semanas, haveria oportunidade para a seleção de novo
curso que proporcionaria o convivio com outros colegas.
Pela possibilidade de oferecer aos alunos participação no plane-jamento
dos cursos de curta duração, facilitar-se-ia, provavelmente, a motivação, pois
que o desenvolvimento de um curso poderia suge-rir outro, complementar.
Por exemplo, um curso sobre poluição do ambiente natural poderia levar os
alunos a estudar os problemas econômicos envolvidos, com o que se
chegaria a estudar as implicações fisiológicas, econômicas, políticas e
filosóficas. Vê-se que todas as disciplinas contidas no currículo teriam a sua
vez já que a abordagem aos vários problemas seria sempre orientada por
interesses múltiplos.
A integração entre os departamentos, disciplinas, professores e alunos
se operaria mais facilmente, pois que a interpedendência entre todos se faria
sentir a todo instante.
Compreende-se que o plano assim descrito também oferece dificuldades.
O planejamento de horários não seria fácil. Os professores necessitariam de
tempo suficiente para preparar-se porque, uma vez oferecida a liberdade de
escolha aos alunos, eles também teriam a liberdade de não escolher cursos
cuja condução estaria a cargo de professores reconhecidamente
íncompententes. As fraquezas dos professores são, em geral, do
conhecimento de seus colegas, alunos e pais destes. Seria bem possível que
um currículo centralizado em interesses obrigaria a todos os professores ao
empenho de suas melhores forças, incentivando-os a procurar seu
aperfeiçoamento e máxima competência. E se a inovação assim descrita
servisse de estimulo a todos os envolvidos na tarefa de educar, muito se
ganharia.
Já que tantos estão insatisfeitos com a escola de 2º grau, novas formas de
proceder deveriam ser experimentadas. Por que não tentar experimentar com
o currículo centrado em interesses?
Educação Democratizada
O ensino feito por máquinas oferece uma nova espécie de objetividade.
Alunos reprovados às vezes tentam explicar seu fracasso culpando seus
professores de favorecer uns e de perseguir outros. As máquinas não têm
preferências. Elas usam o mesmo tratamento para todos, os lentos e os
brilhantes, os pobres e os ricos, indiferentes de raça ou de religião. Ainda não
sabemos quais as partes de nossos programas que deveriam ser executados
pelas máquinas, mas já sabemos que programas cuidadosamente testados nos
aproximarão do ideal democrático e da igualidade educacional para todos.
Este é o pensamento expresso por John W. Blyth em seu trabalho Teaching
Machines and Human Beings. A democratização da escola pressupõe a
-21-
industrialização da educação, já que a democracia atualmente se desenvolve
numa sociedade industrial em que a importância das máquinas é
inquestionável e deve ser compreendida. Este fato leva Herman Roehrs a
expor em seu trabalho publicado en Paedagogische Rundschau, setembro de
1970, sua visão da escola de 2º grau a surgir em futuro próximo. Serão
mudanças consideráveis que afetarão o estilo e o funcionamento da escola.
Conforme J. Lloyd Trump, em seu livro Images of the Future, os alunos de
escola de nivel médio passarão a dedicar 40% do dia letivo a trabalho
individual de livre escolha. Outros 40% serão usados para trabalho em
grandes grupos móveis atendidos por professores. Durante o tempo restante,
20% do dia letivo, os alunos trabalharão em pequenos grupos, oportunidade
em que discutirão seus estudos e terão a assistência de tutores.
O esquema assim descrito, segundo Trump, cujo plano já se acha em
desenvolvimento em algumas escolas nos EUA, poderá funcionar conforme
segue:
Refeição
Tempo previsto para atividades complementares
I.G.G.: Instrução em Grandes Grupos
D.P.G.: Discussão em Pequenos Grupos E.
Ind.: Estudo Individual
-22-
Servidas por professores cuja formação e competência os classifica nas
categorias de especialistas, assistentes e tutores, as escolas onde o Trump
Plan está em desenvolvimento, seguem horário semanal dividido em três
grandes blocos. Durante 40% do tempo, uma equipe liderada pelo professor
especialista ministra aulas expositivas de perfeição científica e didática,
ricamente ilustrada pelo uso de filmes, gravações, TV, computadores e
outros recursos técnicos. Essas aulas expositivas são realizadas em auditório
ou sala de paredes móveis, objetivando-se o acesso de grande número de
alunos às aulas oferecidas por mestres de excelente qualidade. Completando
as aulas expositivas, os alunos dedicam 20% do tempo semanal previsto a
trabalhos em pequenos grupos, servindo-se de máquinas de ensinar, revendo
filmes projetados durante aulas expositivas, discutindo em grupos e
apelando para os tutores que ficam de plantão. Os dois períodos assim
descritos acham-se no hprário anexo designados como instrução em Grandes
Grupos (I.G.G.) e Discussões em Pequenos Grupos (D.P.G.). Os 40% do
tempo restantes são aproveitados para estudo individual (E. Ind.).
Cada aluno trabalha de acordo com suas necessidades, procurando
auxílio na biblioteca da escola, nos laboratórios em geral e valendo-se de
uma entrevista com o professor que examinará seu trabalho, formulando um
diagnóstico e oferecendo sugestões para novas atividades. O aluno assim
conduzido cedo aprende o real desempenho do papel de estudante, da pessoa
que estuda, que faz realizar o processo de sua educação.
Examinando o plano criado por Trump, pode-se ver que a penetração da
máquina na escola não precisa necessariamente desuma-nizar o ensino. A
industrialização do ensino requer uma tradução pedagógica dos princípios
tecnológicos, o que aliás vem sendo conseguido gradualmente pelos
programas educacionais desenvolvidos através dos modernos meios de
comunicação. A aplicação de recursos técnicos permite à escola introduzir o
aluno de maneira prática e pedagógica no mundo tecnológico. Atende-se
desta forma um objetivo educacional, já que a sociedade cada vez mais
industrializada prosseguirá libertando o trabalhador das tarefas braçais, pelo
que o jovem necessita preparar sua inteligência tecnológica isto fará na
escola, conhecendo e manejando máquinas e computadores. Além disso a
escola é o lugar mais acertado para educar o senhor da máquina que a
controla e que nunca se deixará avassalar por ela, justamente porque a
conhece, porque entende os princípios que a regem.
A escola de nível médio assim visualizada terá como centro a biblioteca
com seus setores especializados, onde as máquinas completarão a função
dos livros. Percebe-se que a função de bibliotecários e
-23-
de especialistas em materiais audiovisuais será cada vez mais complexa; professores,
assistentes, tutores e alunos, todos serão estudantes. Todos terão em comum a mesma
responsabilidade, a de estudar sempre. O ensino por parte dos professores
transformar-se-á em orientação e aconselhamento. O agrupamento em classe
mediante o critério de idade ou nível de adiantamento dos alunos desaparecerá,
vingando o ensino individualizado.
Embora convivendo na escola, reunidos algumas vezes em grandes ou pequenos
grupos, cada aluno conduzirá seu programa educacional, sua educação. A escola, os
professores, as máquinas servi-lhe-ão, quando necessários. Vê-se que em muitos
pontos aparecem contatos com o Plano Dalton que desde a sua criação nunca foi
totalmente abandonado na escola de nível médio.
Espera-se que assim se opere a democratização da educação. O direito à
educação para todos, baseado no esforço de cada um. Para tal a mentalidade de
alunos e professores terá de ser formada. Novos conceitos terão de nascer para
orientar as grandes mudanças educacionais que nos aguardam em futuro próximo.
Os currículos, quanto a seu desenvolvimento, podem ser classificados em dois
grupos principais:
VIII — O PLANEJAMENTO DE FORMAS E DE MATERIAIS DE AVALIAÇÃO
As formas de avaliação também devem ser planejadas. Mas esse passo será
estéril quando a parte teórica do currículo ficou divorciada da parte prática que é o
desenvolvimento do plano, em contato com o educando.
Avaliar a coerência entre fins, objetivos, conteúdo e experiências de
aprendizagem é uma das principais preocupações de todos os responsáveis por
currículos educacionais. Mas a necessidade de avalia-ção abarca, além disso, a
qualidade do pessoal administrativo e docente da escola, a capacidade dos alunos, a
adequação do material de ensino e de todo o aspecto físico da escola.
-24-
Podemos avaliar currículos educacionais tomando por base a opinião de
educadores, de pais ou da comunidade em geral. Neste caso, um
levantamento de opiniões quanto às disciplinas e demais conteúdos do
currículo oferecido às gerações novas pode fornecer as bases para a
avaliação do currículo vigente. Mas avaliando não se pode esquecer que
anteriormente houve a seleção de objetivos a alcan-çar. Assim sendo, um
desenvolvimento de currículo pode ser conside-rado bom à proporção que
seus objetivos são alcançados. O processo de avaliação deve ser animado
pela filosofia prevalecente no planejamento do currículo e nos métodos de
seu desenvolvimento.
Quando a avaliação se baseia em instrumentos, tais como testes, provas
escritas e outros, não se pode esquecer que uma bateria muito completa de
instrumentos é necessária para uma avaliação aceitável. É preciso manter em
mente que, além das diferenças interindividuais, existem as diferenças
intraindividuais. Assim sendo, toda a estrutura de um currículo terá
influências variadas sobre um grupo de educandos. Mas se o planejamento
do currículo teve entre seus objetivos o de atender as diferenças individuais,
os métodos de avaliação deverão ser orientados no mesmo sentido. Os bons
resultados de todo o trabalho dependem da ação coerente entre a parte
teórica e a prática, isto é, entre o planejamento e a execução.
Avaliação contínua e permanente
Avaliação de um currículo não deve ser processo comparável à quinta
roda de um carro, prevista somente para a hora em que uma das quatro rodas
em funcionamento se rompe. O processo de avaliação do currículo deve
desenvolver-se juntamente com todo o currículo, em todas as suas fases. Tal
como qualquer empresa comercial ou industrial, ao planejar e iniciar o
empreendimento, planeja e inicia seu sistema de contabilidade, realizando
constantemente balancetes e balanços, a empresa educacional deve planejar
e executar o processo de avaliação como parte integrante do currículo.
Executar primeiro e avaliar somente ao fim do ano letivo, ou quiçá, ao fim
de curso de vários anos, significa temeridade ou aventura pela qual nenhum
professor, diretor ou sistema de ensino deveria assumir a responsabilidade.
A avaliação do currículo é processo cooperativo, todas as pessoas
empenhadas na tarefa educativa devem cooperar, mas os professores,
diretores de escola e demais membros da comunidade interessados na escola
necessitam da ajuda de especialistas que devem encontrar nas delegacias ou
Secretarias da Educação e também nas Universidades.
A reforma do ensino no Brasil possivelmente conduzirá ao sistema de
administração distrital. Compreende-se que a avaliação do currículo torna-se
mais exequível e segura quando realizada em área restrita e quando feita por
pessoas conhecedoras do ambiente e interessadas na produção das escolas.
-25-
-26-
IX — OS CONDUTORES DO CURRÍCULO
Para concluir, vejamos, em breve esquema, onde se localizam os pontos
estratégicos do planejamento e da execução de um currículo educacional.
Entre o currículo planejado e o aluno para o qual se planejou, existe uma
passagem que tolhe ou que favorece a prática do currículo. Assim posto, a avaliação
dos resultados de um currículo terá que considerar a posição central de todo o campo
de ação. Mudanças da posição (1) requerem modificações na posição (2). Por simples
e óbvio que isto pareça, a maioria de fracassos em currículos educacionais provém da
negligência com que se trata a posição (2).
A formação de administradores de escolas e de profissionais e a previsão de
possibilidades para sua permanente atualização representam parte básica de todo um
planejamento da educação. De nada valeria todo um plano de reforma educacional se
não desse margem para o nascimento de novos conceitos em relação à administração
escolar e à formação de professores.
A unidade chave para qualquer reforma educacional é a escola, seu diretor,
professores, pais e toda a comunidade. Seja o que for em questões de reforma ou
mudanças planejadas — tudo terá que encontrar o caminho para penetrar na unidade
escolar.
Revolução e liderança
A Individualização da Formação de Professores Ver estes
dois títulos em folhas anexas.
-27-
Il
UMA TAREFA COMPLEXA:
A REFORMULAÇÃO DE CURRÍCULOS
E PROGRAMAS PARA A EDUCAÇÃO
DE 1.° GRAU
RIO, 28/3/1972 LÚCIA
MARQUES PINHEIRO
UMA TAREFA COMPLEXA: A REFORMULAÇÃO
DE CURRÍCULOS E PROGRAMAS PARA
A EDUCAÇÃO DE 1.° GRAU
A reformulação de currículos e programas representa uma das tarefas
essenciais da reforma do ensino primário e médio consubstanciada na Lei
5.692 de 11 de agosto de 1971.
Do encaminhamento mais ou menos feliz do problema muito depende
o êxito ou o fracasso da reforma. Isso porque a reformulação que se
pretende realizar não se refere, apenas a aspectos administrativos, mas é
mais profunda, atingindo a própria orientação do trabalho de classe.
Terão os administradores e estudiosos da educação um papel relevante
no propiciar as condições para que a mudança que se pretende ocorra de
fato. No entanto, em última análise, a reforma estará dependendo do
professor e suas relações com o aluno.
Será, pois, essencial modificar a mentalidade do professor e assegurar-
lhe meios que o orientem no sentido visando pela reforma, para que possa
desenvolver novos currículos que levem aos objetivos visados.
Essa mudança deverá basear-se na apreensão do espírito da reforma, na
compreensão de que toda a orientação da obra educativa, a própria relação
professor-aluno devem ser alteradas para que se chegue a alcançar as
finalidades postas para a educação de 1? grau. Ela envolve, portanto, uma
sólida filosofia da educação, que norteará a escolha dos meios a utilizar e
das decisões a tomar em cada caso. já para levar à aquisição dos
conhecimentos e estruturas de conhecimentos, já para formar hábitos,
atitudes, habilidades e interesses desejáveis.
Só desse modo se poderá obter que cada professor se torne responsável
pelo papel que lhe couber e apto para desenvolver com seus alunos um
currículo dentro do espírito da reforma e das necessidades do homem e da
sociedade moderna.
Cumpre esclarecer que, ao nos referirmos a currículos estamos
empregando o termo em sua acepção mais ampla, tal como se define
-31-
na publicação Modern Elementary Curriculum, de William B. Ragan. Nesse
sentido "o currículo existe nas experiências das crianças e não nos livros,
programas ou planos e intenções dos professores. A relação entre currículo e
programa é a mesma que entre um mapa rodoviário e a experiência de
realização da viagem. Como acrescenta Ragan, "o currículo não corresponde
ao conteúdo a ser aprendido senão quando este se torna parte da experiência
da criança e na medida em que isso corre. Assim, na mesma classe, o
currículo diferirá conforme o aluno, pois que os vários educandos vão
incorporando mais ou menos conteúdos".
Ora, as experiências das crianças decorrem não apenas dos conteúdos a
serem aprendidos, mas dos métodos e recursos didáticos, das relações entre
professores e alunos e dos alunos entre si e, até, dos processos de avaliação,
como nota o autor referido. E, acrescentamos, depende, em última análise,
da filosofia de educação que norteia o professor e dos recursos de que
dispõe para por essa filosofia em prática.
O Conselho Federal de Educação tornou clara essa orientação, ao fixar
que nas séries iniciais do curso a aprendizagem se realizasse por atividades
e, nas finais, por áreas de estudos, dominantemente.
Com isso fica banido o ensino tradicional de conteúdo estanques,
apresentados pelo método de preleção, de resultados precários, defendendo-
se uma fundamentação psicológica mais segura, com base na noção de que a
inteligência abstrata repousa na inteligência motora, na ação; levando em
conta o problema da transferência da aprendizagem e a necessidade da
participação do aluno no processo. E participação, não o esqueçamos, não
significa simplesmente ação, mas ação interessada, com compreensão e
integração.
A sistemática da reforma determina a fixação de currículo, no sentido
mais estrito de termo, como lista de matérias, pelo Conselho Federal de
Educação e o enriquecimento dessa tábua curricular pelos Conselhos
Estaduais e pelas escolas.
Na fixação desse currículo, no sentido estrito, será importante que os
Conselhos Estaduais e, principalmente, as escolas levem em conta as
necessidades locais e dos alunos, de maneira a que ele ofereça condições
básicas para que possa atender aos objetivos buscados. Não terá, por
exemplo, sentido incluir línguas estrangeiras se não se dispõe, de fato, de
professores capacitados para que se obtenha, nessa área curricular, o que se
pretende, seja dominantemente conversação (se se trata de área pouco
desenvolvida, mas de interesse turístico, digamos), ou leitura,
principalmente de textos técnicos (se a população escolar se dirigir a cursos
técnicos predominantemente,
-32-
ou a cursos superiores). Torna-se desejável, por vezes, incluir no currículo
mais de uma língua; em outros, uma determinada língua se impõe. O mesmo
irá ocorrer com as áreas curriculares ligadas ao trabalho, que irão variar com
o local. Parece essencial que as escolas estudem a sua clientela e o destino
que terá — seja terminando os estudos no 1º grau e prosseguindo até o 2º ou
o grau superior — ou se dirigindo ao trabalho e ingressando num trabalho
que terá, ou não, probabilidade de se tornar permanente.
As administrações estaduais deverão incentivar essa diferenciação dos
currículos, evitando-se currículos fixos comuns para as escolas oficiais,
determinados pela necessidade de aproveitar professores. Todo um esforço
deve ser feito a fim de que a escolha dos componentes dos currículos seja
feita de maneira objetiva, que se justifique pelas necessidades sociais e tipo
de clientela. Currículos, embora bem feitos, deverão mudar à medida que
novas necessidades surjam, sendo essencial sua permanente avaliação e
reformulação, feita com base nas necessidades sociais e no seguimento dos
alunos a eles submetidos.
Entre o currículo, no sentido de tábua curricular, cujo núcleo comum é
fixado pelo Conselho Federal de Educação, e o currículo com a significação
ampla de experiência educativas desenvolvidas pelos alunos, há um trabalho
intermediário, a ser desenvolvido pelas administrações, pelos órgãos de
estudos e pelas escolas, a fim de guiar, em Unhas gerais, o trabaho do
professor, assegurando-lhe o auxilio possível para que tenha êxito em sua
tarefa. É o trabalho de organização de programas, cuja importância nunca
será demais encarecer, especialmente num País que. como o nosso, não
apresenta uma tradição feliz nesse sentido.
No estudo realizado pelo INEP intitulado "Serão adequados os
programas brasileiros de educação primária?" verifica-se que nossa escola
primária, com 3h30min a 4h30min de aula, 5 dias por semana, exige de um
aluno de 4º ano o que as escolas suíças, americanas e belgas pedem no 5º ou
6º, tendo de 5 a 6 horas de aula diárias e professores de nível superiores ao
nosso. Sem dúvida, essa é uma
das razões da baixa produtividade de nossa escola. Seus efeitos se notam
desde o 19 ano — em que muitos Estados exigem matéria adequada à 29 ou
3. série — até o curso ginasial, cujos programas não levam em conta as
condições psicológicas das alunos, sendo
realmente assimilados apenas pelos mais capazes dentre um grupo já
selecionado.
Os instrumentos de avaliação acompanham essa atitude irrealista, que
se reflete na própria graduação escolar: não há uma noção clara do que se
pode e deve pedir a um aluno em cada série escolar.
-33-
Tudo isso se reflete, sem dúvida, nas taxas de reprovação, que nem
sempre decorrem de ineficiência dos professores ou dificuldades dos alunos,
sendo muito afetados pelos objetivos inadequados e pelos programas mal
dosados, além de pouco integrados às necessidades sociais e humanas.
Falta especialmente — nesse aspecto como em muitos outros — uma
mentalidade objetiva, que leve em conta os resultados obtidos na avaliação
do rendimento escolar, procure fixar as causas dos insucessos, tome medidas
destinadas a superá-las e acompanhe seus resultados, mentalidade essa que
precisará caracterizar os administradores e responsáveis pela politica
educacional em geral, assim como os professores. Falta também
comunicação maior entre os órgãos de direção geral do ensino e de estudo,
de um lado e, de outro, o magistério, incluindo professores, orientadores e
diretores de escola.
Os professores não são ajudados a avaliar seu trabalho em comparação
com resultados de outros professores, de outras escolas do Estado, do País, e
até de outros países; não têm, pois, padrões para auto-avaliação, primeiro
passo para que possam progredir. Por outro lado, não são levados a
participar, com sua exeperiência, das decisões da política educacional, o que
lhes daria a atitude de responsabilidade e asseguraria um sentimento de
valorização, estimulador do esforço necessário para as mudanças desejáveis.
São esses aspectos que será preciso superar para que a reforma se torne
realidade. Todos eles concorrem para que não mude a situação vigente nem
se perceba até que ponto cada fator envolvido é responsável pela
impossibilidade de aperfeiçoamento.
Os programas constituem um importante fator a levar em conta, quando
se visa à melhoria do ensino, podendo facilitar esse aperfeiçoamento no
sentido desejado ou, pelo contrário, constituir-se em sério entrave para o
desenvolvimento da reforma em pauta.
Constituem, eles, roteiros amplos de orientação ao professor, quanto aos
objetivos a visar, aos conteúdos mais válidos para atingi-los, a tipos de
atividades que favorecem sua consecução e aos padrões a exigir em cada
ano escolar.
A própria conceituação de seu papel revela que não se trata de trabalho
simples, que possa ser feito por pequenos grupos de professores, por mais
eficientes que sejam, especialmente se se encontram afastados do ensino ou
têm pouca experiência das séries escolares às quais se destinam os
programas.
Professores destacados geralmente tiveram experiência com turmas de
alunos mais capazes, em que conseguirem resultados em grande parte
decorrentes de seu valor pessoal e que não se pode
-34-
esperar da maioria dos professores. Professores de níveis mais elevados,
especialistas em uma disciplina, nem sempre vêem o aluno como um todo;
nem têm noção de dosagem da matéria a incluir em cada série escolar para
os vários tipos de alunos, nem da capacidade do professorado para lidar com
as últimas descobertas feitas em seu ramo de especialização. São preciosos
como colaboradores, mas a palavra final terá de ser dada pelos que labutam
no dia-a-dia da classe.
Essa compreensão já penetrou de há muito nos sistemas escolares mais
avançados. São exemplos os trabalhos de Dottrens na Suíça, as reuniões de
especialistas europeus sob a égide da UNESCO. o trabalho dos Boards of
Education dos Estados Unidos e, mais perto de nós, do Centro Nacional de
Investigationes Educativas, patrocinado pela UNESCO e com sede em
Buenos Ayres, o qual tem por um de seus objetivos "efetuar estudos,
pesquisas e levantamentos que permitam a revisão permanente de currículos
e programas numa base científica".
No Brasil já tivemos muitos programas ditos experimentais mas que não
atenderam às condições básicas para uma experimentação válida, nem foram
aplicados nas condições necessárias a um estudo científico, ou avaliados em
seus resultados. Assim, será necessário reiniciar a tarefa em bases mais
seguras. Além dos cuidados próprios ao trabalho de elaboração de
programas em geral, dever-se-á ter em vista que se trata de programas para
uma determinada clientela, com um objetivo geral bem definido e dentro de
um espírito que se fundamenta nas conquistas da Psicologia.
Assim, as comissões encarregadas de elaborar os anteprojetos de
programa precisarão ter experiência com o tipo de aluno a que se destina o
programa, assimilar o espírito da reforma e dominar uma série de noções
essenciais, tais como as de objetivos comportamentais, estruturas de
conhecimentos, critérios de seleção de conteúdos, integração, características
psicológicas dos alunos nas fases atingidas pela educação de 1º ano.
Precisarão ter em vista o problema de dosagem dos objetivos e
conteúdos e as necessárias adaptações dos programas às condições locais, às
diferenças individuais e à terminalidade real dos estudos em cada zona.
Terão que considerar o problema de ampliação da taxa de escolarização,
conduzindo a que ingressem na escola crianças em condições mais
desfavoráveis do que as das atualmente matriculadas, bem como a extensão
do curso que levará às últimas séries alunos que geralmente eram recusados
no exame seletivo de admissão do ginásio.
Será importante que tais comissões disponham de sugestões de
programas, colhidas em programas e bibliografia para o aluno de
-35-
outros países, para que alarguem as perspectivas de visão do problema.
Como ponto de partida de seu trabalho, parece-nos que será essencial
um entendimento sobre os objetivos gerais a atingir ao fim dos 8 anos de
estudos, levando-se em conta educandos mais e menos capazes. Não nos
referimos apenas a objetivos muito amplos, mas a objetivos já fixados com
certa precisão. Assim, por exemplo, em vez de desenvolver interesse,
Ter-se-ia:
desenvolver interesses por:
leitura recreativa e para fins de estudo
continuar a educar-se (educação permanente)
— informar-se sobre o que ocorre no País e no mundo, lendo jornais,
livros e revistas e valendo-se dos demais meios de comunicação a
seu alcance
conhecer problemas locais e participar, na medida do possível, de
sua solução
praticar exercício físico, desenvolver um esporte
aplicar parte de seu tempo livre em atividades de arte: ouvir música,
participar de jograis, ou orfeão, ou banda, ou clube de arte, etc.
Estabelecidas essas grandes finalidades em vista, inclusive por meio de
inquéritos junto a pessoas de variadas profissões e níveis culturais, se
preciso fixar objetivos por série escolar, o que deve ser feito em termos
comportamentais, isto é, sob a forma de comportamentos que se esperam do
educando, a fim de evitar variedade de interpretações e de facilitar a
avaliação do que for obtido.
Tome-se, por exemplo, o objetivo "ser capaz de comunicar-se efi-
cientemente, por escrito e oralmente".
Esse objetivo terá naturalmente de ser precisado, chegando-se, a
estabelecer que se desdobrará, por exemplo, em:
1) — Comunicar-se oralmente com correção e clareza, em situações
como:
transmitir um recado
relatar um fato ocorrido aos colegas
— contar uma história
resumir ou comentar um livro, um filme, um programa de TV,
uma história
-36-
opinar, numa discussão em classe ou em grupo, ava
liando uma atividade, participando de um planejamento,
discutindo um problema da turma, etc.
. esperando a vez de falar
. apresentando contribuições positivas
. fazendo criticas objetivas e com delicadeza
. não monopolizando a discussão
fazer uma propaganda no auditorio ou em classe com recursos
variados (slogans, canto...)
— dramatizar
apresentar os resultados de uma pesquisa individual ou de um
trabalho em grupo, valendo-se de vários meios de de
comunicação.
2) — Comunicar-se, por escrito, de maneira eficaz e com correção de
linguagem em situações como:
. escrita de bilhete
. redação de instruções para jogo ou trabalho . escrita de carta
social — intima ou cerimoniosa e comercial
. redação de requerimento, ata, relatório (de excursão, ex-
periência, observação etc.)
. telegrama
. resumo de livro
. redação de história
. preenchimento de cheque
. preenchimento de formulários de vida comum, etc.
Fixados tais objetivos, deverão eles ser distribuidos pelas várias séries,
de acordo com as condições dos alunos e em dosagem adequada.
É interessante que, na fixação desses objetivos, todos os membros da
Comissão opinem e não se divida o trabalho por área de especialização. As
experiências em que cada especialista elabora o seu programa, para que
depois se tente somar seus conteúdos e objetivos, resultam em falta de
unidade, inadequação de dosagem e dificuldade de integração. Levam o
especialista a se sentir único árbitro de seu programa e a não desejar ceder.
Na nova visão que a reforma veicula, em que o importante são as
necessidades sociais e o aluno como um todo, as áreas de estudo existem -
para atendê-los. Essa concepção e o repúdio ao ensino por disciplina no 1º
grau estão a indicar esse caminho, que se tornará mais fácil quando
contarmos com o professor polivalente, formado já dentro do espírito da
reforma, encarando
-37-
como fins o aperfeiçoamento do aluno e da sociedade, e a matéria como
meio.
Será preciso ter-se em vista que o educando apresenta determinadas
condições evolutivas e estará sujeito a uma série de estímulos que, para
serem eficazes, terão de ser dosados e dirigidos num sentido comum, a fim
de que se alcancem os grandes objetivos relativos a estruturas de
conhecimentos, capacidade de adaptação do aprendido à realidade e
continuidade do curso, fluindo o aluno naturalmente, através das séries
escolares.
Assim, após fixar-se os grandes objetivos para as 8 séries da educação
fundamental, será essencial estabelecer aqueles objetivos que devem ser
atingidos em cada série escolar: objetivos gerais — a serem buscados por
todos os professores — e específicos de cada área de estudos.
Pode-se chegar a fixar, com base na experiência, que digamos, no 4º ano
o aluno comum deve ser capaz de procurar, num fichário, livros de
determinada área curricular; consultar o índice para buscar uma determinada
informação e anotar essa informação e a fonte onde a colheu. Ou se pode vir
a estabelecer, como grande objetivo a alcançar, que o aluno seja capaz de
realizar anotações durante uma entrevista com um profissional sobre o
preparo necessário para exercer a profissão, o valor da profissão, as
oportunidades que oferece, as tarefas em que importa. No 5º, por exemplo,
pode-se fixar que o educando deve ser capaz de, em face de um grande
problema escolhido para estudo (digamos: Por que as regiões brasileiras se
desenvolveram diferentemente?) apresentar indagações interessantes, a
serem pesquisadas, envolvendo causas e efeitos, domínio de algumas rela-
ções entre os fenômenos geográficos e a História — assim, por exemplo, a
influência do clima, da proximidade do mar, da facilidade de transporte, da
imigração sobre o modo de vida, as formas de trabalho e o desenvolvimento
local. São, esses, objetivos que envolvem a área de Estudos Sociais, como a
de Comunicação, uma vez que o professor encarregado da orientação da
aprendizagem de Português deverá oferecer oportunidades de leitura — de
artigos de jornais, revistas, livros — ligadas ao assunto em estudo, isto é,
sobre problemas relativos ao desenvolvimento do Pais, à vida nas várias
regiões e de literatura regional.
Entre os objetivos a fixar não se deve descurar das atitudes e dos
interesses porque, mais que os conhecimentos que temos, o que nos
caracteriza são as nossas atitudes morais e sociais, os nossos valores, os
nossos gostos. A própria integração e eficiência profissionais resultam mais
dos interesses do que das aptidões, em muitos casos.
-38-
Assim, fixados inicialmente entre os objetivos da educação fundamental
esses vários tipos de objetivos, será preciso fazer sua distribuição pelas
séries, tendo em vista que atitudes não se formam rapidamente e exigem o
trabalho de todos os professores no mesmo sentido, para que se incorporem,
transferindo-se para a realidade. Elas dependem mais do exemplo do
professor e de suas reações em face das situações ocorridas e dos recursos
didáticos específicos que empregue.
Se se pretende desenvolver, digamos, cooperação, o trabalho deverá ser
distribuído através das séries escolares, fixando-se que tipo de
comportamento de cooperação esperar dos alunos em cada ano letivo. Por
exemplo, no 1º ano pode-se esperar que o aluno traga gravuras ou, se não
tiver recursos, desenhos (que podem ser recortados) e objetos sem valia,
cujos nomes comecem pelo fonema em estudo no momento. (
1
)
A partir do 2º ano, pode-se fixar que as crianças colaborem para
constituir uma biblioteca da turma, trazendo um livro de histórias ou de
Leituras simples, obtida por doação, ou então um pequeno auxilio financeiro
para a compra de livros.
Já no 3º se esperará, por exemplo, que a criança fique atenta para os
colegas do seu grupo que estejam atrasados por doença ou deficiência
pessoal, para ajudá-los, na escola ou em casa. No 4º ano pode-se, digamos,
fixar que, dado um assunto ou problema, o grupo divida o trabalho e todos
tragam a contribuição que lhes for solicitada, cooperando para o trabalho
geral.
Não será suficiente que o professor encontre, no programa, que se
espera de seus alunos a atitude de cooperação; é preciso que seja esclarecido
sobre os comportamentos de cooperação que se tem em vista, expressos em
termos comportamentais. Só assim ele poderá concentrar seus esforços no
sentido de obté-los e avaliar se seus alunos alcançaram um grau adequado
de desenvolvimento das atitudes visadas.
O programa poderá sugerir alguns tipos de experiências a desenvolver,
a fim de se obter os efeitos pretendidos. Não nos referimos à metodologia,
que, com razão, os países estrangeiros separaram em outros tipos de
publicação.
A inclusão de orientação metodológica nos programas tem constituído
um dos óbices ao desenvolvimento da educação em nosso Pais. A
metodologia varia de acordo com os novos desenvolvimentos das áreas em
que se aplica: assim, o desenvolvimento da Lingüística pode
(1) Para um painel sobre o fonema. montado sobre folha de Jornal (se não houver recursos para
adquirir corrugado ou papel pardo).
-39-
levar a repercussões na orientação da aprendizagem de Português. Varia
também, geralmente, com as descobertas da Psicologia Geral, da Infância,
da Adolescência, da Aprendizagem, das Matérias de Ensino. Muda,
igualmente, com as descobertas da pesquisa.
Nem sempre os encarregados da elaboração de programas estão a par
desses desenvolvimentos. De outras vezes, estão muito avançados nesse
sentido, mas sem a vivência do grau para o qual preparar os programas.
Desconhecendo a situação real dos alunos e do profes-sorado em geral, são
tomados de entusiasmo pelas novas idéias e levados a incluir metodologias
ainda não devidamente experimentadas nas condições reais do sistema
escolar e que não poderão ser executados por todos, de maneira eficiente,
sem preparo prévio, concorrendo por vezes para baixar o nível do ensino.
A essas circunstâncias acresce o fato de que programas que incluem
metodologia tornam-se muito longos, não sendo bem aceito pelo
professorado. Na pesquisa em realização no INEP "Bases para reformulação
de currículos e programas para a educação fundamental: dosagem e
apresentação de programas do 1º ano", verificou-se que os professores se
manifestaram contra a inclusão de metodologia e a favor de programas mais
sucintos, em termos claros, fixando objetivos comportamentais e atividades
para obtê-los, dentro, aliás, do espírito recomendado pela decisão do CFE
sobre "objetivos e amplitude dos currículos" (Ver Parecer 183, de 12-11-
71, e Resolução nº 8, de 19-12-71).
A inclusão de metodologia não deve ser feita, mesmo em termos gerais
ou implicitamente, sendo essencial que os encarregados da elaboração de
programas estejam atentos para que suas convicções pessoais não se reflitam
no trabalho em realização, o qual exige objetividade e consideração das
condições do aluno e do professorado.
Instruções metodológicas deverão ser objeto de Guias de Ensino e de
livros destinados à formação e ao aperfeiçoamento do magistério, e seus
autores precisarão estar a par das descobertas nos campos citados e apoiar-
se na pesquisa, sempre que possível.
Em nossos programas encontramos atualmente uma série de noções
superadas que entravam o ensino, principalmente na 1ª série, o ponto mais
sério de estrangulamento de nosso sistema escolar. Assim, por exemplo, a
idéia de "fase preparatória" destinada a dar ao aluno condições para que
"possa" iniciar o ensino de leitura através de exercícios específicos, ou a
noção de que entre o inicio da aplicação do método escolhido e a
apresentação do mecanismo da leitura deve haver uma longa fase, destinada
à visualização de palavras. Tais noções constituem fatores altamente
influentes para o
-40-
baixo rendimento do ensino, conforme pesquisa do INEP com uma amostra
de mais de 50.000 crianças de todas as capitais brasileiras.
Programas há também que insinuam métodos de ensino de leitura, e
geralmente os de mais baixo rendimento, o que deve ser evitado.
Por outro lado, aspectos em que seria importante orientar o professor
como, por exemplo, a dosagem de leitura a esperar de uma criança de
série, estão ausentes dos programas, havendo professores que, na falta dessa
orientação básica, chegam a exigir de alunos de 1º ano leituras de mais de
uma página para responder a questionários, obrigando, inclusive, a criança a
voltar à página anterior para consultar o texto, o que, evidentemente, só
pode ser vencido pelos alunos mais capazes.
A não-inclusão de metodologia não significa a ausência de sugestões de
atividades, feita de maneira sucinta mas não imprecisa e, naturalmente, sem
chegar ao nível de exercícios, nem tornar o programa demasiado longo.
Assim, por exemplo, significa incluir metodologia e metodologia
superada:
— levar o aluno a distinguir palavras pela forma geral:
Constituem sugestões de atividades pouco precisas:
— realizar entrevistas
— promover debates
— fazer relatórios
Trazem auxílio ao professor informações mais completas como, por
exemplo, para o 4º ano:
planejar e fazer entrevistas com dentistas e médicos sobre problemas
de saúde e com profissionais vários sobre seu trabalho e a preparação que
requer, etc.
participar de debates sobre livros lidos (enredos, características e
ação das personagens...), sobre acontecimentos históricos e fatos atuais de
interesse (causas, conseqüências, ação das personagens)
elaborar relatórios sobre resultados de uma experiência, de uma
entrevista, de uma excursão.
-41-
Deve o programa ser completado por outras publicações de interesse do
professor, segundo seu depoimento.
A apresentação do programa será de grande importância, abrangendo
desde a sua extensão até os problemas de organização, apresentação gráfica
e capacidade de atrair o professor e levá-lo a utilizá-lo dentro das finalidades
buscadas.
Essa apresentação deve ser simples e conduzir o professor a sentir a
ligação entre objetivos e atividades, sem o que trabalhará sem maior
reflexão, arriscando-se a não aprender o espírito da reforma. Em tal situação,
as atividades passarão a ser os objetivos do professor, o que constituirá um
grave erro: a confusão de meios e fins. Por isso, não apenas a forma deve ser
escolhida de maneira a levar obrigatoriamente à consideração dos objetivos,
mas será preciso um esforço complementar de aperfeiçoamento do professor
para que o programa atue em toda a sua plenitude.
É mais importante que o professor perceba a mudança de objetivos e
planeje, baseado em alguns exemplos e sugestões, atividades para chegar a
esses objetivos, do qual venha a realizar atividades sugeridas, sem alterar sua
filosofia da educação. Porque os objetivos gerais de educação fundamental
não resultam apenas do esforço por levar o aluno a adquirir conteúdos ou, na
melhor das hipóteses, estruturas de conhecimentos, embora estas já
apresentem um grau mais elevado de atuação na área de instrução. A
consecução das finalidades em vista irá decorrer, em grande parte, do
exemplo do professor; de sua atuação de todos os momentos, e,
especialmente, nas oportunidades surgidas naturalmente; de sua reação
diante de determinados acontecimentos da turma ou do ambiente, próximo
ou mais distante, de interesse e ao nível dos alunos; de sua maneira de
relacionar-se com os educandos. Tudo isso — e não apenas as atividades que
se destinam a desenvolver os conteúdos relativos à instrução — compõe o
currículo realizado em cada turma, e é esse currículo que realmente influi
para a formação do aluno em todos os aspectos que a educação de 1º grau
deve abranger formação para: a vida familiar; as horas de lazer; o
encaminhamento mais seguro do futuro trabalhador; o prosseguimento dos
estudos; a cidadania; a higiene mental; a defesa da saúde; a formação do
homem completo, integrado no seu tempo e ao seu meio físico e social,
desejoso de ajudar o próximo e de contribuir para que a vida de seus
semelhantes se torne melhor.
O programa dará uma indicação geral das formas de atuar e dos
caminhos e recursos que favorecem o desenvolvimento dos vários aspectos
da educação, mas serão os materiais complementares que irão, de fato,
orientar o professor mais profundamente nesse sentido.
Entre tais materiais se incluem, por exemplo, com respeito ao 1º ano, os
seguintes, que foram os mais votados na pesquisa realizada
-42-
pelo INEP nas capitais dos Estados de Pernambuco, Bahia, Minas, São
Paulo, Rio Grande do Sul, Guanabara e em todas as zonas do Estado do Rio.
1 — Recursos para atender a crianças com dificuldades em leitura
2 — Planos de recuperação de crianças em leitura e ortografia
3 — Provas de diagnósticos das dificuldades dos alunos
4 — Materiais para trabalho independente para as crianças mais
capazes
5 — Orientação sobre recursos de fixação da aprendizagem, con-
forme os métodos de alfabetização
6 — Listas de cartilhas por método
7 — Listas de livrinhos que a criança recém-alfabetizada possa
ler
8 — Orientação sobre o ensino da Matemática.
No que concerne às noções incluídas no programa, poder-se-á chegar a
certas sugestões de atividades, como detalhamento das idéias apresentadas e
como meio de alcançar os comportamentos fixados em cada caso. Por
exemplo, em vez de incluir no programa apenas "Papel da família e da
criança em casa", pode-se acrescentar: conversas sobre o que fazem os
vários membros da família e como ajudam; sobre trabalhos que os alunos
fazem em casa; sobre as tarefas em que podem ajudar; sobre o valor de cada
um dar o seu auxílio.
Será preciso ter presente que o tratamento do problema de currículos e
programas em bases científicas exige pessoal a isso dedicado com
exclusividade e com preparo básico de pesquisa, a fim de que se possa sair
da fase de improvisação de quem vem atuando, e que, aliada à inadequação
das formas de avaliação (que fazem parte do currículo, no sentido amplo de
termo), constituem um dos principais fatores que determinam a baixa
produtividade de nossos sistemas escolares.
A pesquisa "Fatores que influem sobre o rendimento escolar no 1º ano",
realizada nas capitais de todos os Estados e Territórios como uma amostra
de mais de 50.000 crianças, revelou que um dos grandes problemas a vencer
é justamente o da adaptação dos programas e padrões de promoção,
inadequados e exigindo demasiado.
Levamos a criança a um fracasso inicial, a uma experiência negativa
para com a escola, o professor e, por vezes, os pais, não raro gerando
ansiedades.
O programa de 1º ano torna-se, assim, um aspecto a considerar em
especial, a fim de que chegue a uma solução equilibrada. Compa-
-43-
rados aos programas estrangeiros, os nossos são demasiado pretensiosos,
exigindo, por exemplo, gramática e composição. Em leitura não precisam o
ponto a atingir e, assim, ocorre que professores exijam em provas de 1º ano
uma dosagem mais adequada ao 3º, considerando as condições psicológicas
de uma criança que inicia os estudos aos 7 anos. Em Matemática há
programas que chegam a pedir as 4 operações e a escrita de números
elevados na 1ªsérie, para não falar de sistema métrico, numeração romana,
etc.
Quando se procura corrigir essa situação, recai-se por vezes numa
posição extremada, levando-se a criança a ser promovida de nível sem
sequer ler uma palavra nova (reconhecendo apenas palavras visualizadas) ou
se aplica a promoção dita automática, chegando a criança ao 4.9 ano ou até
atingindo o fim do curso sem ser alfabetizado.
Sabemos, por inúmeras pesquisas, que a expectativa, boa ou má, sobre a
criança e aquilo de que ela é capaz influi decisivamente sobre os resultados
escolares, determinando, em larga escala, a aprovação ou a reprovação.
Será, pois, preciso que um amplo esclarecimento ao professorado o leve
a expectativas adequadas.
O programa será fator de maior importância nesse particular, fixando as
expectativas razoáveis. Por exemplo, no 1º ano, leitura de palavras,
sentenças e trechos curtos, de seu interesse e à sua altura, com todos os
fonemas e suas combinações.
Não foi sem razão que o Plano Setorial de Educação e Cultura reuniu o
problema do programa ao da avaliação. Programas bem feitos —
esclarecendo objetivos comportamentais, dando a dosagem adequada da
matéria para o aluno comum e indicando enriquecimentos para os mais
capazes e adaptações necessárias para os deficientes — norteiam também a
avaliação e facilitam, não apenas a avaliação do rendimento do aluno, mas a
da capacidade dos professores e orientadores e até o valor do próprio
programa.
O problema de 1ª série foi destacado por constituir um dos focos da
improdutividade mais graves do sistema, mas a dosagem das demais séries é
igualmente inadequada, como vimos no estudo já citado, preparado para a
III Conferência Nacional de Educação realizada em Salvador em 1967. O
que se exige, no Brasil, na 4.
a
série, corresponde às exigências feitas para a
5ª ou 6ª, em países como os Estados Unidos, a Suiça, a Bélgica, em que a
carga horária é de no mínimo 30 horas semanais.
Nossos ginásios vêm tentando executar um programa próprio para
alunos muito capazes, cujo desenvolvimento intelectual ultrapasse a faixa de
idade própria da série escolar, se a criança fluir normalmente através das
séries escolares.
-44-
Segundo as últimas estatísticas de que dispomos, para 100 alunos do 1º
ano primário chegam ao 4º ano apenas 24 e ao fim do ginásio somente 5.
Assim, já altamente selecionados os alunos no curso primário;
submetidos, depois, ao crivo do exame de admissão pelos professores
secundários, essa pequena elite sofre novas seleções através do curso e, em
conseqüência, grande parte se evade, mais cedo ou mais tarde, sem terminar
o curso ginasial.
Nessa situação, os menos favorecidos financeiramente e de meio
cultural mais pobres de estímulos correm maior risco de ser eliminados e
somente os alunos mais capazes e com certa tendência conformista têm o
êxito garantido.
Os programas — e, sem dúvida, os métodos de ensino e as idéias dos
professores sobre padrões de promoção, que determinam o currículo no
sentido amplo — atuam como obstáculos à oportunidade de que todos
devem ter de educar-se, tornando pouco produtivo o esforço governamental
para fazer progredir o País por meio do preparo de seus homens.
Ora, várias pesquisas já revelaram que o fator humano é o de maior
importância na produção. Comparando-se o trabalho feito com recursos
materiais idênticos, verificou-se que a produção cresce em função do
preparo do trabalhador. Outras pesquisas mostraram que o número de anos
de escolaridade tem influência decisiva na capacidade de progressão do
trabalho, mais do que os anos de experiência profissional. Trata-se
evidentemente de anos de estudo bem aproveitados, contínuos e bem
escalonados e, não, de anos de repetência, in-sistindo-se nos mesmos
conteúdos, fora do alcance do aluno e num ritmo que eles não podem
alcançar.
A educação fundamental — diversamente dos demais graus de ensino
que, formando profissionais de carreiras mais altas, requerem aptidões e
competências especiais — não pode ser seletiva. Ela deve ser o instrumento
por excelência da democracia, regime de vida baseada na idéia de que todos
devem participar, e participar o mais possível, no empreendimento comum
da construção de uma sociedade mais harmoniosa e que dê ao homem mais
oportunidades de elevar-se como pessoa humana e de viver uma vida mais
plena e mais feliz.
Meditando nos postulados da democracia, especialmente na crença
básica de que todos têm capacidades e podem contribuir para o bem comum
e o farão tanto melhor quanto mais sua educação permitir, vemos a
importância da decisão governamental de assegurar 8 anos de escolaridade a
todos.
Será preciso, porém, que uma série de mudanças ocorram e não apenas
na estrutura das escolas ou dos sistemas escolares, para que
-45-
tal esforço seja bem dirigido e eficaz. Essas mudanças devem atingir o
professor e o que se passa na sala de aula, sem o que as idéias fundamentais
da reforma se perderão. Será preciso que o professor se inicie no novo
espírito que se pretende implantar; que perceba que é a peça-chave da
mudança; que mude, ele próprio, para que sua ação possa ser diferente; que
assuma a responsabilidade de levar a efeito a reforma e deseje adquirir os
instrumentos para isso.
Para que a reforma, no que respeita ao 1º grau, em especial, atenda às
necessidades democráticas, será preciso que sua própria implantação seja
feita em bases democráticas.
Isso significa dar responsabilidade ao magistério. E quando nos
referimos a magistério incluímos aqueles cuja função e apoiar o professor,
dando-lhe meios mais eficazes para que desenvolva bem a obra educativa,
que se passa no interior de cada aluno e com maior ou menor eficácia
segundo a orientação do professor. Referimo-nos a administradores dos
sistemas escolares, orientadores, diretores de escola e a todo o magistério
dos cursos de formação e aperfeiçoamento de professores.
Não será razoável esperar que o professor do 1º grau, acostumado a um
tipo de escola seletiva e não esclarecido sobre a mudança desejada,
compreenda a necessidade de aperfeiçoar-se e adquira a responsabilidade
pelo seu próprio aperfeiçoamento, se antes ele não se tiver capacitado da
importância da reforma a empreender, através de um diálogo com as
autoridades e as instituições de pesquisa, em que perceba o esforço a
realizar, valorize os fins a conseguir e compreenda que tem muito a dar e
precisa corresponder ao desafio da reforma, atuando de maneira mais
esclarecida e capaz.
Alguns dos problemas em que o professor mais pode auxiliar são os
relativos à dosagem dos programas para os vários tipos de alunos, à
apresentação e conteúdo dos programas, aos materiais auxiliares necessários
para a implantação dos novos currículos.
Na pesquisa que está sendo empreendida pelo INEP, registrou-se o
grande interesse do professorado e sua satisfação em ser ouvido.
Será esse um problema a que as comissões estaduais deverão atender:
além de terem como colaboradores diretos professores de todas as áreas,
provenientes do Curso Primário e do Ginásio, precisam ouvir os professores,
em geral ou por amostragem, sobre os aspectos citados, depois de esclarecê-
los sobre a mudança da escola seletiva para a escola democrática para todos.
Só assim se poderá ter base para um programa que funcione como
experimental com razoável expectativa de corresponder ao mais adequado.
-46-
Ligadas a esse problema estão duas questões da maior importância, a
serem consideradas pelas comissões: a dosagem e a seleção dos conteúdos,
levando em conta as diferenças individuais, a terminalidade real da escola
no local e o tipo de vida ai dominante.
Desenvolver com os alunos mais fracos, "na medida do possível", o
programa preparado para os mais capazes, não parece uma solução razoável;
o programa para os alunos mais fracos deve conter realmente o essencial, o
realmente importante para suas vidas: leitura no mais alto nível que suas
condições permitam — recreativa, informativa, de instruções de trabalho;
experiências de comunicação oral e por escrito de bilhetes, cartas, anotações;
conceito e prática das operações com inteiros e decimais; percentagem;
conhecimentos e práticas que levem à defesa eficaz da saúde, estruturas de
conhecimentos e atitudes básicas para uma cidadania consciente e ativa.
Essencial será também o desenvolvimento da educação física — com
compreensão de suas relações com os problemas de saúde — e das
manifestações artísticas para expressão pessoal e comunicação, tendo em
vista os efeitos dessas áreas curriculares sobre a higiene mental e o
desenvolvimento da personalidade.
O programa para os alunos menos capazes poderá ser indicado em
linhas amplas, sem divisão por séries, a fim de evitar-se o perigo de ser
adotado para todos os alunos (tal como tem ocorrido com a carga horária,
em que os números previstos na Lei estão conduzindo à redução de cargas
horárias já deficientes, nas séries finais da educação de 1? grau).
Nesse programa não podem ser esquecidos as atitudes e os interesses a
desenvolver (especialmente o interesse por continuar a estudar, ou seja, a
educação permanente) e o preparo para o estudo e para o trabalho, ou para a
escolha da ocupação, que deverão merecer ênfase especial.
Como solução a ser adotada, pelo menos até que o professorado seja
devidamente esclarecido, julgamos preferível organizar um programa para o
tipo de aluno mais comum, indicando sugestões de enriquecimento para os
mais dotados, e um programa global para os menos capazes, com as
características referidas. No estudo experimental do programa, isto é, no
acompanhamento do seu resultado, será importante verificar qual a
percentagem de alunos submetidos a cada tipo de programa, a fim de evitar
que a baixa expectativa dos professores leve a desenvolver o programa
mínimo com alunos de maiores possibilidades, uma vez que se sabe que a
expectativa baixa do professor reduz as possibilidades de aprender do aluno.
Se mais de 20% dos professores se decidir por esse programa, o problema
deverá ser objeto de estudo: a menos que o programa feito para os alunos
mé-
-47-
dios esteja mal dosado, estará havendo uma interpretação errônea a respeito.
Oito anos de escolaridade obrigatória constituem um mínimo, pois
praticamente em todos os países desenvolvidos a escolaridade mínima no 1º
grau é de 9 anos. Assim, não se deve pensar em realizar o curso em menor
número de anos, levando o aluno bem dotado a realizar níveis sucessivos de
escolaridade em um ano. Programas realmente bem organizados supõem
níveis crescentes de maturidade geral, ligados à idade e não apenas a
condições de inteligência, sem a experiência de vida correspondente. O
aluno bem dotado deve enriquecer seus conhecimentos dentro do nível,
aprofundando os assuntos estudados, lendo, pesquisando mais intensamente
que os demais, desenvolvendo projetos pessoais ou de grupo. A mudança de
nível o levaria a, chegando a determinados níveis, fracassar por falta de
desenvolvimento geral. Será preciso ter em conta que crianças bem dotadas
intelectualmente não raro não se desenvolvem harmoniosamente, e é
importante que o façam, aprendendo a conviver, a aceitar as deficiências dos
outros, a interessar-se pelo bem comum, uma vez que potencialmente serão
os líderes de amanhã.
As conquistas da Psicologia, especialmente os estudos de Piaget, devem
ser levados em conta na elaboração dos programas.
Não nos referimos, no caso, a crianças bem dotadas que entrem na
escola com atraso de idade e que pedem e devem ser incentivadas a realizar
mais de uma série num ano, selecionando-se os aspectos mais importantes
do currículo — por exemplo, o desenvolvimento de hábitos e habilidades de
estudo — e eliminando-se ou reduzindo-se seus aspectos menos
significativos.
Os problemas de terminalidade e de adaptação local dos programas
assumem também especial importância. O INEP poderá oferecer subsídios
nesse sentido aos Estados e Territórios, pois está terminando um trabalho de
entrevistas com especialistas locais sobre aspectos a ressaltar em áreas como
Medicina, condição geoeconômica, História, Alimentação, Folclore, Arte
Popular, instituições que podem servir à escola, problemas e
empreendimentos locais.
A Lei nº 5.692 se refere explicitamente a esses problemas ao tratar, por
exemplo, do preparo para o trabalho em certas regiões. Os aspectos a
considerar no caso são complexos, incluindo seleção de conteúdos,
orientação da aprendizagem e distribuição dos conteúdos pelas séries
escolares. Seria também importante verificar as terminações reais do ensino
em cada Estado — digamos do nível da 6ª e 8ª séries, adaptando-se os
programas a essas terminalidades. Noções que, em condições normais de
alunos que alcançam até a 8.
a
série, podem ser programados para a 7ª, devem
ser antecipadas — se as
-48-
condições da criança permitirem — nos termos do art. 76 da Lei nº 5.692.
Isso se facilitará inicialmente pelo ingresso tardio na escola dos alunos na
zona rural, em que os alunos de 4ª série podem ter — desde que a orientação
da aprendizagem seja adaptada desde o início do curso — um
desenvolvimento equivalente ou maior do que seus colegas da zona urbana
que iniciam o curso aos 6 ou 7 anos. Nesse caso, a idade dos alunos é
elemento da maior importância a considerar.
A reformulação de programas para atender a esses casos deve levar em
conta os conhecimentos indispensáveis à vida comum e às formas de
trabalho locais, o preparo para a cidadania e o lazer, considerando-se que no
campo se necessita tanto ou mais do que na cidade de diversões e formas de
expressão pessoal mais ricas, a fim de se evitar o êxodo para a cidade de
populações despreparadas, mais facilmente assimiláveis pela agricultura, a
pecuária e as formas de trabalho da zona rural.
Assim, o programa de Comunicação e Expressão deverá desenvolver
mais intensamente, nesses casos, a leitura oral, o gosto pela leitura, a
freqüência à biblioteca local ou a organização de clubes de leitura na escola,
os teatros, jograis, orfeões. O programa de Ciências deve dar ênfase à defesa
da saúde, envolvendo Puericultura e Primeiros Socorros. O de Integração
Social precisará preocupar-se em desenvolver o interesse pela comunidade,
suas formas de vida e trabalho, os problemas existentes, os
empreendimentos desejáveis, as formas de participação possíveis do
cidadão, exemplos dessa participação no local e em comunidades em
idêntico estágio de desenvolvimento ou mais atrasados. Os programas de
Educação para o Lar deverão ser antecipados, assim como certas noções
básicas sobre as formas de trabalho locais e o desenvolvimento do interesse
por esses trabalhos.
Situações idênticas, mas já permitindo objetivos mais completos,
ocorrerão nas regiões em que a terminalidade alcançar a 5ª ou a 6ª série.
Outra preocupação dos organizadores de programas deverá ser a de
evitar o ensino estanque de disciplinas, aliás, desautorizado pela Lei, que
indica como desejável para as lª séries, o ensino por atividades e, para as
séries finais, por áreas de estudo.
Esse desiderato terá de ser alcançado em níveis diversos de eficiência,
conforme a escola e o preparo do professor, até se chegar a um grau de
desenvolvimento em que o programa possa ser da escola e até da turma, o
que requer um preparo muito alto do professor e dos administradores. É o
que ocorre, por exemplo, na Inglaterra, em
-49-
que há o cuidado de assegurar previamente o preparo do diretor e selecionar
realmente líderes para esse trabalho, só implantando essa filosofia nas
escolas em que há condições para tal.
Nesse caso, como no da promoção flexível, parece-nos que qualquer
antecipação das medidas, sem preparo conveniente, redundará em fracasso e
comprometerá uma solução válida para o futuro, quando existirem
condições mais favoráveis. A experimentação pedagógica em algumas
escolas sob a forma de projeto-piloto impõe-se no caso.
Outro aspecto a estudar é o da apresentação do programa, a fim de
facilitar a integração das matérias entre si e com a vida: integração externa e
interna.
Havendo muitas idéias inadequadas com respeito à integração e ao
chamado "ensino globalizado", parece-nos essencial certo esclarecimento a
respeito. A globalização não é um fim em si, isto é, não se deve sacrificar o
tempo e o conteúdo para globalizar. A globalização artificial, que tem sido a
mais freqüentemente tentada entre nós, não atende às finalidades buscadas,
nem é aceita pelo professor.
Será, pois, preciso fixar as idéias sobre por que, para que e em que
medida tentar uma globalização, a fim de que se evitem tentativas
frustradas.
Na vida, raramente deparamos um problema dos tipos que a escola
apresente. Em Matemática, por exemplo, os dados não aparecem separados
para serem trabalhados, mas em meio a situações complexas: se vamos fazer
compras, temos, não raro, um limite de orçamento e devemos decidir que
quantidade do produto desejado a quantia disponível permite adquirir; o
preço da mercadoria nos conduz, por vezes, a buscar um substitutivo (e
precisamos saber o que pode funcionar como tal).
Se temos que obter um documento, o basta saber qual é; é necessário
saber como obté-lo, consultando a lista telefônica e talvez um guia de ruas e
assim por diante: temos que desenvolver atividades que raramente envolvem
apenas uma matéria. Ora, sabemos que a aprendizagem se transfere tanto
mais, quanto mais semelhantes as situações da escola e da vida fora dela. O
estudo de disciplinas estanques, apresentadas de maneira lógica, por
preleção, e levando, no máximo, a experiências ratificadoras ou a exercícios
de aplicação (não raro resolvidos no quadro pelo professor e imitados, sem
maior compreensão, pelos alunos) nem sempre funciona nas condições reais.
Daí a necessidade do que denominamos integração com a realidade, isto
é, a apreensão e o uso do conhecimento em situação real ou que imite o real
— em lojinhas da escola ou, por exemplo, em
-50-
dramatizações de compras na turma. Esse tipo de orientação de
aprendizagem — por atividades o mais possível semelhantes às da vida real,
simplificadas e devidamente graduadas — será visado desde o 1º ano,
devendo o programa auxiliar o professor a mudar nesse sentido.
Nas séries finais do curso, recomenda o Conselho Federal de Educação
a aprendizagem por áreas de estudo, que sugere uma outra forma de
integração, diversa da externa, a que referimos: a integração dos
conhecimentos afins, a qual pode ser obtida de maneiras várias. Assim, por
exemplo, podemos unir as áreas de expressão oral, expressão escrita e
gramática.
É comum ligar-se, por exemplo, a leitura e a gramática partindo de
textos literários para o ensino da gramática, o que nos parece ter
inconvenientes de poder influir negativamente sôbre o desenvolvi-mento do
gosto pela literatura, prejudicando em parte seu valor de atuação sobre os
sentimentos e emoções. Já a ligação de gramática com leitura para fins de
estudo parece mais adequada.
Pode-se também pretender correlacionar as várias áreas curriculares;
isto é, planejar o trabalho de modo a dar, ao mesmo tempo, tópicos ligados
de várias áreas curriculares. Esse processo não é fácil de executar, exigindo
um contínuo entrosamento dos professores; pode manter, de certo modo, o
ensino por "disciplinas" estanques apenas se tocando nesse ou naquele
momento.
A aprendizagem por áreas de estudo pressupõe uma mudança mais
sensível, necessária se se meditar para o fato de que não se deseja que o
aluno adquira apenas conhecimentos isolados, logicamente organizados e
apresentados de maneira sistemática, mas que chegue a estruturas de
conhecimentos.
Os tipos de generalização que as estruturas de conhecimentos supõem
não se confundem com as regras dadas pelo professor e até mesmo se
opõem a esse tipo de orientação: são conquistas do aluno e só se tornarão
possíveis se forem criadas condições para tal. Constituem formas de
conhecimentos de uso mais amplo, que se aplicam a uma série de problemas
de vida, de trabalho e de estudo, inclusive à própria conquista de novos
conhecimentos. Supõem participação ativa do aluno em problemas reais,
que quase nunca envolvem apenas uma área curricular.
Terão as estruturas de ser fixadas pelos organizadores de programas
previamente à seleção dos conteúdos, por constituírem grandes objetivos a
serem visados. São muito importantes tanto para os que vão prosseguir os
estudos, como para os que devem obter na escola de 1º grau o essencial para
sua vida, estruturas como:
-51-
— Tudo que ocorre tem uma causa. É comum, principalmente nos
problemas sociais e humanos, haver mais de uma causa atuando.
Relações sociais harmoniosas são desejáveis. Elas são fa-
cilitadas se procurarmos compreender as razões dos pontos de
vista e das ações dos outros.
Não se pode esperar que o Governo se encarregue de resolver
todos os problemas sociais: podemos e devemos auxiliar, na
medida de nossas possibilidades.
Ê importante que demos nossa contribuição em trabalho,
inclusive no lar. É também importante que tenhamos condições
de higiene mental, desenvolvendo pelo menos uma forma de
arte, um esporte, aprendendo a apreciar diversões saudáveis.
Saúde vale muito porque torna a vida melhor e leva a maior
capacidade de trabalho. Temos o dever de defender a nossa
saúde como a dos que nos cercam: a higiene e a alimentação
adequadas são meios de obtê-la.
As Cooperativas são de grande valor para todos.
Esses tipos de conhecimentos devem ser de tal modo assimilados que
impregnem a vida, determinando as reações do educando na escola e fora
dela. Devem ser levados em conta na integração das atividades da escola
com a vida e na integração dos conhecimentos em áreas de estudo.
A noção de integração é bastante ampla, variando conforme o autor.
Para Ragan há duas grandes formas de integração do currículo:
1) em torno das atividades e interesses do aluno: por construções,
jogos, excursões, dramatizações, histórias etc.;
2) em torno das necessidades sociais.
Parece-nos possível conciliar os dois aspectos, visando aos objetivos
sociais e utilizando — como meios de atingi-los — as necessidades e
interesses do aluno.
De início a criança tem menos capacidade de concentrar-se e de-
senvolver, durante tempo apreciável, uma atividade; daí serem acon-
selháveis atividades breves que podem, porém, incluir mais de uma matéria.
As crianças de 1;º ano, já alfabetizadas, preparam vocabulários ilustrados
individuais, em que desenham e fazem colagem, escrevem palavras
iniciadas por certo fonema e, até, algumas sentenças. É atividade que, bem
explorada, pode durar um mês, na base de, digamos, quarenta minutos por
dia, incluindo comentários do professor e leitura de algumas palavras ou
sentenças pelos alunos.
-52-
Podem também, no fim do 1º ano ou inicio do 2º, preparar livri-nhos
sobre a vida de animais e, até, pequenas histórias. Mais tarde podem
participar de programas de "TV" da turma, em que lêem, dramatizam, etc.
Projetos de estudo em que as crianças escolhem o assunto, fazem as
perguntas, pesquisam as respostas, podem ser desenvolvidos desde o 3º ano
e, assim, a resolução do CFE de que na parte final do 1º grau se faça o
ensino por áreas de estudo não oferece dificuldades maiores de professor
for preparado para tal.
Na falta desse preparo pode e deve o programa ajudá-lo a encontrar o
caminho conveniente, apresentando alguns assuntos gerais que podem ser
desenvolvidos de maneira integrada a titulo de sugestão.
Com o fim de construir programas para experimentação em suas
escolas ou outras que o desejem, constituiu o INEP uma comissão de
professores de todas as áreas curriculares com experiência de Ginásio ou de
Curso Primário, no mínimo 2 e no máximo 4 por área e grau. Após as etapas
que já apresentamos como desejávais num trabalho dessa natureza, decidiu-
se que a partir da 6º série a integração se faiia inicialmente partindo de
Geografia, História, Organização Social e Política Brasileira e Educação
Moral e Cívica, na área de Estudos Sociais.
Essa decisão corresponde ao que estabelece o CFE no Parecer n.°
853/71:
"O legado de outras épocas e a experiência presente de outros povos, se
de um lado devem levar à compreensão entre os indivíduos e as nações, têm
que de outra parte contribuir para situar construtivamente o homem em "sua
circunstância."
"Para sublinhar esta última função, introduziu-se nos Estudos Sociais
um terceiro ingrediente representado pela Organização Social e Política do
Brasil. Vinculando-se diretamente a um dos três objetivos do ensino de 1º e
2º graus — o preparo ao "exercício consciente da cidadania" — para o
OSPB e para o Civismo devem convergir, em maior ou menor escala, não
apenas a Geografia e a História como todas as demais matérias, com vistas a
uma efetiva tomada de consciência da Cultura Brasileira, nas suas
manifestações mais dinâmicas, e do processo em marcha do
desenvolvimento nacional."
Os Estudos Sociais "constituem um elo a ligar as Ciências e as diversas
formas de Comunicação e Expressão" e "colocam no centro do processo a
preocupação do Humano" (Pareceres citados — Reforma do Ensino, 1º e 2º
graus — MEC — 1971 — Págs. 20 e 31).
As grandes estruturas a desenvolver até o final do curso seriam: As
formas de vida atual, que são o resultado de um longo esforço das
-53-
gerações que nos precederam, tentando vencer os problemas com que se
depararam, em busca do bem-estar, do progresso, do aperfeiçoamento
humano. Há uma série de problemas atuais que a humanidade tenta resolver,
a fim de melhorar as condições de vida dos que virão depois. Devemos ser
gratos aos que nos precederam e contribuiram para melhorar nossas
condições de vida e, por outro lado, dar a nossa parte no esforço pela
elevação do homem e de suas formas de vida.
Assim, nesse programa em Estudos Sociais o aluno irá perceber como o
homem chegou a construir a cultura; os problemas que enfrentou para
resolver suas necessidades básicas; os costumes, regras, direitos e deveres
nos primeiros grupos; as formas iniciais de organização política e sua
evolução; as atividades econômicas do homem e seu desenvolvimento; as
atividades culturais — as invenções, os valores éticos e estéticos; o esforço
do homem por assegurar a conservação do patrimônio cultural (tradição,
folclore, monumentos, língua) e para renovar e transmitir esse patrimônio
(educação, literatura, arte em geral). Esse estudo se fará em torno de 3
grandes problemas: 1) o homem ocupa a terra; 2) o homem cria a cultura; 3)
o homem transmite a cultura.
No 7.° ano a evolução do homem na terra é estudada do ponto de vista
histórico, também em torno de três grandes assuntos: 1) o homem na Pré-
História; 2) o homem e o campo (Antigüidade, Idade Média e Idade
Moderna); 3) o processo de industrialização (Idade Contemporânea). Dentro
desses grandes temas, situam-se outros como, por exemplo, na Idade
Moderna, a ampliação dos conhecimentos pelo homem; a descoberta de
novas terras e novos caminhos de comércio; o homem cria máquinas;
aperfeiçoa a máquina; o homem no mundo de hoje; a procura de paz.
No 8º ano volta-se ao Brasil, estudando-se em particular os grandes
problemas atuais, ao nível dos alunos.
Essa perspectiva histórica — o homem evoluindo, criando o progresso
— foi escolhida não só por corresponder às estruturas básicas mais
importantes que se tinha em vista desenvolver, como por oferecer uma linha
que favorece a integração dos demais campos de estudos dentro dos grandes
problemas citados.
Assim, em Ciências, no 6º ano se estuda a ação do homem sobre o
meio, procurando situar-se no tempo, conhecer os animais e vegetais que lhe
podem ser úteis e de que se deve defender, resolvendo problemas de defesa
da saúde, etc, até chegar à conquista do espaço. Em Matemática, a visão
histórica permite selecionar aqueles aspectos de interesse social e introduzi-
los partindo de sua conquista pelo homem, ressaltando-se, assim, o aspecto
de ligação do saber com a vida real, de crescimento do poder sobre o melo
pelo esforço humano, de aplicação da ciência à vida.
-54-
Não há no programa uma preocupação com a correspondência dos
assuntos no tempo, nos vários campos de conhecimento, embora se procure
escalonar os problemas de modo que as noções básicas de outras matérias
sejam tratadas antes ou no momento em que se tornam necessárias.
O aluno está concentrado num grande assunto — o homem constrói o
progresso — o qual permite integração com a realidade e uma integração
interna, em termos amplos, nas áreas de estudo.
O esforço de correlação — isto é, o estudo de assuntos relacionados das
várias áreas curriculares, ao mesmo tempo, terá de ser um produto do
esforço das escolas. No entanto, o programa propicia condições tais que,
mesmo que este falhe, uma integração em termos amplos seja conseguida.
Essa é uma condição que, uma vez obtida, torna as atividades escolares
muito mais interessantes e eficazes.
No caso dos Estados uma vez preparados programas experimentais e
ouvido o professorado sobre sua dosagem, apresentação e materiais
necessários à sua implantação, devem eles ser experimentados sob a forma
de projetos-piloto em algumas escolas que representem o conjunto e que
ficarão sob controle, no sentido de se verificar os problemas surgidos, a
reação dos professores, o rendimento dos vários tipos de alunos, a fim de se
poder tomar os cuidados prévios necessários à generalização da aplicação
mais tarde.
Essa orientação racional, baseada no método científico e na pesquisa,
levará à economia de esforços e recursos e permitirá caminhar com
segurança.
A viabilidade do programa ou programas que forem organizados irá
depender do preparo do pessoal que os executará e dos materiais auxiliares
disponíveis. Os programas terão de ser permanentemente estudados e
aperfeiçoados.
Assim, será preciso que em cada unidade haja um grupo especialmente
preparado que se encarregue desse acompanhamento e do estudo dos
problemas de currículos e programas sob forma científica. Um exemplo de
trabalho desse tipo foi por nós observado na cidade de New York, cujo
Board of Education tinha um setor encarregado do assunto. Cada ano o
programa de uma área era reestudado. Algumas escolas eram destacadas
para esse fim, seus professores preparados e assistidos e se verificava se os
alunos venciam, nessas condições, o previsto no programa. Se não o
dominavam e o tópico era de interesse, ele era experimentado em série mais
alta, chegando-se a fixar a dosagem e graduação adequadas do programas.
Entre nós só agora se vem firmando, com o Projeto 23 do Plano Setorial
de Educação e Cultura, essa conceituação de currículos e pro-
-55-
gramas como objeto de experimentação, de pesquisa, o que significa um
grande e decisivo passo na solução do problema.
É preciso acentuar ainda a prudência da administração atribuindo a essa
fase de experimentação básica um periodo mínimo de 4 anos — o 1º dos
quais, o de 1972, para os estudos iniciais anteriores à implantação do
currículo, ressaltando a necessidade de preceder à implantação dos novos
currículos o preparo do magistério, o que o referido Projeto prevê para
dezembro de 1972.
As fases previstas no Projeto devem ser respeitadas, sendo preferível
um retardamento na implantação da reforma ou sua aplicação por partes, de
maneira mais segura, do que uma precipitação que venha comprometer o
rendimento do ensino e a própria reforma como ideologia de
desenvolvimento.
A área de currículos e programas é bastante complexa e constitui um
permanente desafio aos educadores.
Desafio que exige, para ser vencido, esforço e estudo, seriedade e
espírito científico.
-56-
III
CURRÍCULOS:
RELAÇÕES COM A VIDA
CONCEPÇÕES
FUNÇÕES
MARIA DO SOCORRO JORDÃO EMERENCIANO
INTRODUÇÃO
Por tendência ou por necessidade, o que se constata é: todo ser humano
deseja perpetuar-se, ao mesmo tempo que sente avidez de realidade,
impondo-se ver e compreender o mundo.
Esse comportamento milenar possibilita entender inclusive o fenômeno
da educação, que decorre basicamente do fato de que viver é uma "forma de
operação que se faz para a frente" (1), ou seja, viver é fazer algo com as
coisas. Dissemos decorre por que não fora essa fluência não seria necessário,
nem haveria o impulso que impele para a frente, em busca de novos
horizontes, uma vez que o mundo todo é ingrediente da vida humana,
conferindo-lhe possibilidade de projetar e projetar-se.
Assim pois, na medida em que há alargamento da existência do
homem, através da ampliação da experiência da realidade, a ma
neira encontrada para a perpetuação foram os recursos da educação,
desde os mais primitivos ritos de iniciação até a mais sofisticada
universidade.
Ao lado disto, observa-se que parece ter havido uma compreensão
tácita entre os homens de que a vida da criança é a forma mais elementar e
menos teórica da vida humana e, então, pretendeu-se e pretende-se propor
condições para que essa vida possa projetar-se numa visão responsável do
mundo. É bem possível que, por isso mesmo, desde a mais primitiva
estrutura escolar, a aprendizagem se desenvolva atendendo a um currículo,
com a conotação etimológica de corrida ou "operação para a frente" à
semelhança do que ocorre com a vida humana e sempre começando pelas
formas mais elementares e menos teóricas.
A primeira estrutura curricular já é um composto de elementos mais
ordem, o que significa: a sociedade oferece os elementos — aquilo que o
consenso pretende preservar, implicando uma conotação de passado,
presente e futuro, que não se dissociam entre si — e os ordena a partir da
compreensão de que a vida possui uma configuração que vai mudando com
a idade e a própria idade é um elemento decisivo dessa configuração.
-59-
De há muito, os seres humanos possuem tal visão, haja vista os
currículos da velha China, incluindo, na escola elementar, o ensino da
leitura, da escrita e do cálculo, e o Egito, admitindo nas "'casas de
instrução", a linguagem, a escrita, o cálculo e o culto, na primeira fase. Os
fenícios, dominados pelo princípio da utilidade, bipartem a educação em
física e intelectual, diversamente dos judeus, que se mantêm no plano da
educação intelectual, e aproximados dos gregos, no que concerne à dupla
valorização do plano físico e intelectual. Na antiga Roma, a ludimagister
ministra uma educação elementar que abrange leitura, escrita e rudimentos
de cálculo, enquanto sob o império de Carlos Magno, imposta a
obrigatoriedade do ensino, que devia ser ministrado em língua nacional,
preserva-se nas escolas presbiterianas (elementares) o mesmo currículo de
Roma que, numa educação já cristã, o amplia pela inclusão de geografia e
ciências naturais.
Na América, em uma das Ordenações Reais sobre Educação, impõe-se
o ensinar a aprender a ler, escrever e aprender o catecismo.
Não pretendemos, e não seria o caso, escrever uma história da
organização dos currículos; levantamos alguns dos mais antigos, a fim de
tomar os pontos primários de concordância, para, a partir delas, tentar
compreender o que se pretendia e pretende das crianças e dos jovens.
Destacamos então: tem havido sistematicamente a intenção de que se
saiba ler, escrever e contar, embora variem os objetivos e os métodos de
"fazer aprender". Poder-se-ia dizer que esses três elementos, comuns à
maioria dos currículos da fase de escolaridade inicial, sofrem um processo
de ampliação nas escolas secundárias ou litterator, e constata-se ainda que
acompanham uma ordenação em complexidade crescente, envolvendo a
faixa etária de 7 a 14 anos ou de 7 a 12 anos, em média.
Um dos primeiros currículos, senão o primeiro, a levantar, de modo
consciente ou inconsciente, a diferenciação entre ensinar e aprender foi o
implantado na América pela Ordenação Real, e isto coloca um ingrediente
novo no trabalho de educação, por deixar supor uma riqueza no ato de
aprender, muito mais que no de ensinar, embora ligue o primeiro a problema
de fé e o segundo, a questão de desenvolvimento intelectual.
Mais um elemento dessa análise valeria ressaltar: movidos por ideais
diversos, usando de mais ou menos rigor, adotando métodos diversificados,
a humanidade tem conseguido o aperfeiçoamento individual, possibilitando
o acesso aos valores sociais e a conseqüente conquista de uma compreensão
do mundo e de uma concepção de vida. A orientação que se imprime no
trabalho escolar é que poderá
-60-
indicar o tipo de compreensão do mundo e concepção de vida de um povo,
que perpetua, renovando, as formas de existência.
A História da Educação reafirma a tese de que o homem descobre a
cada instante a vida como acontecimento e nesse ato de descoberta envolve
sua personalidade toda, jogando com o dinamismo inerente a seu próprio ser.
O homem imagina, antecipa e inventa condições de realização de sua própria
existência, dai porque nunca restringe o processo da educação ao presente,
mas toda sua estrutura é um permanente gerúndio, que o dispõe a
transcender a circunstância atual, criando meios de auto-realização no futuro.
Entende-se, portanto, que se ao homem cabe fazer sua vida, não é suficiente
que a educação perpetue o passado através de uma percepção da realidade
hodierna, mas que exceda o perceptivo no ato da previsão.
Todovia, reafirmamos, não se pode viver no plano do futuro, mas se
necessita converter dificuldades e facilidades atuais em possibilidades reais,
desde que vivemos hoje, de modo concreto, uma realidade e nos dispomos,
ao mesmo tempo, a existir e dominar uma realidade que virá a ser forma
concreta de vida.
Cremos que há duas notas essenciais no processo da educação que
marcam as organizações curriculares: os sentidos da perpetuação e o de
projeção da vida, seus valores e seus ideais. O primeiro manifesta o homem
criatura, com acurada sensibilidade para a permanência do seu ser, enquanto
o segundo revela o homem criador, construindo o seu próprio amanhã, sem
perder de vista a temporalidade, deixando que ela marque uma direção mas
não que lhe determine imperativamente uma forma de equilíbrio.
Tentando caracterizar sucintamente, temos:
a — A vida humana é uma forma de operar para a frente, fazendo algo
com as coisas, pois se realiza essencialmente no mundo.
b — Como criatura, ser instalado num corpo, o homem está no mundo e
é tentado a perpetuar-se, legando sua cultura e seus ideais ao futuro. Vive as
coisas, submerge na tradição, transcende as circunstâncias, tem o poder de
perder-se e reencontrar-se, sempre com os olhos voltados para as
possibilidade de auto-ampliação em todas as direções.
c — Como criador, ser dotado de imaginação, prevê e traça com os
ingredientes do presente as condições de existência futura. Não raro, nessa
tentação de traçar caminhos, destroça caminhos e perde-se, pois "o homem
se perde muitas vezes ao longo da história" e é "graças a essa sensação da
perda que reopera energicamente para voltar a encontrar-se" (2)
-61 -
d — O ato contínuo de fazer a própria vida, o homem não o realiza
sozinho, precisa de outros homens, vive a experiência da reciprocidade, em
que outrem percebe um chamado nosso e reage,
criando a perspectiva da coexistência, matriz das possíveis relações
sociais.
Esses quatro dados essenciais se inserem indispensavelmente na
compreensão do fenômeno da educação, conferindo-lhe o poder de
perpetuar, transformar e predispor para o ato de seguir em frente, sem perder
de vista o todo.
Nesta mesma linha de raciocínio, obtêm-se as seguintes conseqüências:
enquanto recurso com o qual o homem joga para fazer a própria vida, a
escola preserva cultura e ideais de um povo, através das finalidades a que se
propõe; transforma a realidade presente na busca de um encontro com os
objetivos a que se impôs e cria condições para investir de modo ajustado no
futuro, através dos valores que se propõe atingir. Então, toda escola se
caracteriza pela preservação, transformação e criação e não poderia ser
diferente, uma vez que nela há intersecção consciente de vidas humanas que
se encontram e constróem um mundo sobre o mundo.
2 — CONCEPÇÃO DE CURRÍCULO
Permitir-me-ei uma digressão, antes de analisar concepções de
currículos, sobre a fisionomia própria do homem brasileiro, apenas para
servir de parâmetro a um exame final de disciplinas e atividades.
Não se poderia pretender que o homem brasileiro constituísse um ser
diferente dos demais. Sabe-se que ele possui as características comuns disto
que Platão denominara "bípede sem penas" e Aristóteles classificara como
"animal político". Enquanto integrante de um gênero, sua condição humana
é a mesma de qualquer outro, mas se se considerar o tipo de influências
sócio-culturais a que esteve e está sujeito, forçoso é reconhecer que ele é
diferente.
Num primeiro plano, pode-se constatar que se todo homem é paradoxal
em suas formas de ação, o brasileiro é deliciosamente paradoxal, haja a vista
os traços antinômicos de rebeldia e resignação; de versatilidade sempre
insatisfeita e perseverança até a teimosia; de improvisação e poder de seguir
disciplinadamente um caminho traçado. Há condições de entender essa
riqueza transbordante, pois, como povo, "vivemos uma experiência sem
símile", porque "trazendo de países distantes as nossas formas de vida,
nossas instituições e nossa visão do mundo" (³) muito as transformamos,
conferindo-lhes um caráter próprio. As deformações e aperfeiçoamentos
foram sempre frutos dos nossos desejos e intenções, que nos levaram a,
diante das contingências, assimilar e produzir novas formas de vida, até
certo ponto
-62-
criadoras, em detrimento de um legado tradicional e, muitas vezes, fazendo
com que os nossos ancestrais, portadores de experiência milenar chegassem
a se abrasileirar, tomando insensivelmente a cor da terra e adotando nossos
"costumes e hábitos", de tal sorte que desde a Transmigração da Família
Real para o Brasil, nós já não éramos "uma projeção americana da casa
portuguesa" (
4
), mas um povo com uma fisionomia própria resultante de um
jogo de fatores e com habilidade de ajustar coisas e tendências para atender
as próprias necessidades.
Se somos capazes de copiar, não somos perseverantes nesse trabalho de
transplante e introduzimos marcas especiais nas teorias e doutrinas,
enfocando os dados existentes sob um sistema de coordenadas diferentes,
ainda quando estamos apenas cumprindo a missão humana de perdermo-nos
para reencontrarmo-nos.
Esta nossa vocação para a instabilidade não tem caráter destrutivo, mas
nos confere amplitude de realização e um poder de ação não raro inesperado
e impregnado de paixão. Por sermos sensíveis às paixões encantamo-nos
com facilidade pelo novo e adotamos atitudes extremadas em muitos dos
nossos comportamentos, sem que isto, de fato, constitua um erro nacional.
Esse movimento em direção ao novo vem sofrendo a pressão das
experiências de vida e a tendência atual é já uma busca de formas de
existência coerentes com nossa personalidade e que ofereça condições de
auto-realização gradativa, como sói acontecer com outros povos, à medida
que as dificuldades precisam ser superadas.
Relacionando essas informações que oferecem um esboço de perfil do
brasileiro, com o que consideramos vida humana, encontramos
fundamentalmente:
a) O ato de descoberta da vida como um acontecimento, é realizado
pelo brasileiro, com paixão, isto é, nós só atuamos quando compreendemos e
aderimos. A simples compreensão racional, independente da adesão
emocional, dificilmente estimula a ação.
b) Via de regra, o brasileiro se põe totalmente no ato praticado, mas
esse ato de por-se não é persistente, pois sua imaginação, aliada à
instabilidade, o projeta com rapidez para outros horizontes e canaliza seu
dinamismo para um plano além daquele em que se encontra.
c) Como criatura também ele deseja perpetuar-se e, por isso, se esforça
para que seu legado cultural tenha marcas próprias, isto é, para que suas
aspirações e ideais possam orientar outros no sentido de exercerem
plenamente sua condição de seres livres, que se realizam reforçando os laços
de solidariedade.
d) Não temos sido seres que amam as especulações vazias e as teorias
dissociadas da realidade vivida, razão pela qual tendemos para a
-63-
ciência aplicada, assumindo posição pragmática, ligando o pensamento à
ação.
e) Se confiamos na experiência, somos céticos em relação às posições
doutrinárias radicais.
Esse complexo jogo de caracteres se revela nas tendências que têm
marcado a educação desde os seus primórdios, especialmente a partir do
momento em que passamos a viver a necessidade de auto-afirmação
nacional, quando, então, se começou a proceder a mudanças da ordem
tradicional nas escolas, algumas vezes com inconvenientes graves em
relação aos nossos mais altos valores e, outras ocasiões, com sensíveis
vantagens.
A estruturação das nossas escolas recebeu e recebe as influências dessa
diversificação e manteve a organização de seus currículos dentro de uma
linha clássica, quando se entendia que elaborar um currículo consistia em
listar um conjunto de disciplinas que deveriam ser aprendidas pelos alunos.
Dessa listagem emanariam os programas que, por sua vez, se reduziam a
uma relação pormenorizada dos temas ou assuntos a serem abordados. Na
verdade, os currículos constituíam um conjunto de compartimentos
estanques, alheios ao aluno e raramente compatíveis com as finalidades e
objetivos previstos pela legislação vigente.
Era freqüente — espera-se que hoje tal não aconteça — elaborar
currículos tomando por base os interesses imediatos da escola ou a
disponibilidade de professores, sem se considerar o significado formativo
dos conhecimentos e das atividades, afrontando-se claramente o objetivo de
"formação da personalidade integral" e atendo-se apenas — quando muito
— ao oferecimento de informações isoladas sem caráter significativo para o
aluno.
A organização consciente de um currículo deve levar em conta "todos
os elementos que intervém na elaboração da experiência" (
5
). Disto decorre
que "o currículo agrupa as matérias, experiências e atividades de uma
maneira progressiva e concêntrica". (
5
) Neste sentido, o currículo tem um
caráter altamente dinâmico e representa todas as atividades prias quais o
aluno aprende, sem prescindir do sentido de atualidade. Ele não é, portanto,
um "resumo morto de todos os materiais, experiências, atividades e
conteúdos", como destaca Hilda Taba.
Para Paul Klapper, "um currículo é um corpo de experiências se-
lecionadas, destinado a estimular o desenvolvimento dos alunos e
proporcionar-lhes o saber necessário, a impulsionar suas capacidades
fundamentais e esclarecer suas relações com a sociedade em que vive. Um
currículo são incorpora o indivíduo em uma comunidade e lhe
-64-
proporciona uma forma de educação, mediante a qual seu crescimento se
relaciona vitalmente com as necessidades sociais".
Prosseguindo na tentativa de localizar as características essenciais do
currículo, temos a conceituação de Hilda Taba, para quem ele é "um todo
vivo, dinâmico, composto das experiências reais. Seu conteúdo é idêntico ao
conteúdo das experiências do aluno".
Nos dois conceitos nota-se que o currículo visa o aluno, conse-
quentemente tem de se considerar as condições de maturidade e nível de
escolaridade daqueles que o irão vivenciar, isto é, não se dissocia do
educando, que é sua razão de existência. O caminho oposto a um "currículo
são" é o que conduz a uma dissociação entre sua estrutura e a realidade
significativa da vida do aluno, sem caráter funcional.
O segundo dado a considerar é que, para ser eficiente, o currículo deve
despertar e desenvolver capacidades fundamentais, possibilitando não só a
apreensão da realidade exterior, mas também da realidade interior, que
desperta as representações claras e distintas. Muitos fatos são dados de
forma exteriormente perceptível mas sem o cuidado de proporcionar
representações recordativas e imaginativas, o que prejudica o processo de
assimilação e a transferência do aprendido.
Um terceiro dado a destacar é o dinamismo, considerado como mola
mestra, e que implica em converter o conjunto curricular em atividade
própria e autônoma do aluno. A experiência pedagógica tem mostrado que a
eficácia do ensino é tanto maior quanto mais variados e entrelaçados são os
processos mentais e manuais realizados pelo aluno. A ação, a observação, o
raciocínio adquirem um sentido mais elevado na medida em que
representam elaboração pessoal, investigação e expressão independente do
educando.
Concebido em função desses três elementos — alunos, sentido de
realidade e dinamismo — o currículo tem uma abrangência bem maior que a
antiga visão, pois compreende todos os fatores que direta ou indiretamente
têm relação com o processo educativo, ou seja: abarca todos os elementos
que participam da experiência em sentido positivo, o que nos leva a dizer:
todo o conjunto de experiências e atividades vividas pelo aluno sob
orientação da escola constitui um currículo.
Passando a uma análise não mais do conteúdo explícito nos conceitos,
mas das ilações que se podem fazer, temos de ressaltar o fato de que a
ligação entre aluno e currículo não é acidental ou artificial. Essa relação só
existe de fato quando a estrutura curricular se ajusta ao educando, no sentido
de possibilitar o desenvolvimento de suas aptidões individuais e, antes disso,
lhe ofereça oportunidade de ordenar suas disposições de molde a configurar
suas verdadeiras aptidões. Disto decorre que quando o currículo é
estruturado, sua ordenação é de tal ordem que o trabalho começa com o
aproveitamento de
-65-
comportamentos já integrados ao repertório do educando (comportamento
inicial) para, gradativamente, ir ampliando quantitativamente e
qualitativamente esses comportamentos. Admitir a possibilidade de iniciar
um processo de educação sem considerar o patrimônio anterior conferido
pelas experiências pessoais, dificulta, quando não impede, o atingimento dos
objetivos, pois o processo de aprender é similar ao de trabalhar, porque "nas
formas naturais se verifica a atividade natural, uma vez que suas
características são as mesmas que as de execução de um trabalho:
proposição independente do objetivo, escolha indenpendente dos meios de
trabalho e, finalmente, aplicação independente da expressão". (
c
)
A amplitude de um currículo assim elaborado é não apenas maior, como
também mais significativa, envolvendo necessariamente novos conceitos
psicológicos e pedagógicos, porque tende a encarar o educando como ser
ativo, autor de sua aprendizagem, dentro do âmbito vital de sua vida,
preservando a fisionomia própria de uma nacionalidade. A organização
aumenta em abrangência e intensidade na medida em que a estrutura
curricular responde a uma necessidade, que tem como ponto de partida o
indivíduo, opondo-se deste modo à indiferença passiva diante das
solicitações escolares.
Se se tiver presente que todo currículo se elabora em função de
objetivos que, por sua vez, marcam caminhos que conduzem às finalidades,
mais um argumento se tem, no sentido de que não se trata de uma simples
listagem de disciplinas, pois o que se pretende é que a aprendizagem escolar
seja útil, não na concepção apenas utilitarista e pragmática, mas em direção
a uma formação do homem universalmente preparado, "capaz de cumprir
suas obrigações de vida e de profissão, digno de confiança e idôneo na sua
especialidade" (
6
). Deste modo, é que, como assinala Spranger, "não se trata
de eliminar o prático e o útil do processo formativo, o que levaria
unicamente a um isolamento do mundo, mas se trata de canalizá-los para a
educação através de uma ordem ética e cultural".
Cabe destacar que, na escola de primeiro grau, o tipo de educando —
para quem a nossa realidade de adultos tem outra significação — exige a
introdução da matéria didática no seu mundo próprio ou, pelo menos, que se
conserve e reviva a relação significativa entre objetivo e sujeito, tão
importante no trabalho formativo.
A exigência desse tipo de formação não significa, pois, que "tenhamos
de buscar um ponto de referência com a vida de adulto, com seu modo de
raciocinar maduro, mas unicamente que devemos apro-ximarmo-nos do
modo de ver e vivenciar do educando dessa faixa etária" (6).
-66-
Em outras palavras, podemos afirmar com Kroh: "este tipo opõe-se a
uma organização escolar que vê em primeiro lugar os interesses da escola,
esquecendo sua relação com a vida do aluno, que é um ser reconhecedor,
vivenciador e investigador em qualquer idade".
Concluamos indicando que as funções de um currículo podem ser
entendidas como:
a — Objetivação, segundo a qual o aluno apreende a realidade exterior e
interior, do que decorre: a escola, de primeiro grau, especialmente na
primeira fase, não pode se destinar a uma formação puramente teórica, mas
deve cultivar as possibilidades dos educandos.
b — Ativação, a qual importa em conferir oportunidade de trabalhar por
livre iniciativa, investigar movido pelo desejo de conhecer, buscar
conscientemente seus objetivos, integrar em correlações sistemáticas os
resultados de seus trabalhos e propor novas interrogações.
c — Integração, preservando em todo seu trabalho um caráter de
proposição, isto é, abrindo possibilidades de crescimento integral, atuando
no homem como um todo, quer no aspecto biológico, psico-social ou
intelectual.
d — Consolidação, podendo garantir a aplicação dos conhecimentos e
habilidades adquiridos, sem quebra de continuidade, através da retenção de
conteúdos a exercício de habilidades.
Essas quatro funções só são satisfatoriamente cumpridas se e quando se
conserva uma educação ao educando, ou seja, que se desenvolva
acompanhando o nível evolutivo de cada idade.
3 — ATIVIDADES E DISCIPLINAS
O currículo que atende — segundo a Lei nº 5.692/71 — uma clientela
até 14 anos subdivide-se em atividades e disciplinas. Basicamente, cumpre
examinar que significado se confere à expressão atividade, podendo-se dizer
com André Lalande: "atividade significa efetuação, expressão, produção,
processo cientifico, mobilização de energia, trabalho. Opõe-se a recepção,
ideação e imobilidade".
Sinteticamente: atividade se liga ao campo do fazer humano, des-
tacando-se, entretanto, que, como ensina Schietzel, "a mera atividade com as
coisas não constitui um manejo prático delas. Seria um erro crer que as
ciências naturais são claras e práticas porque tratam com as coisas". Isto
implica em que atividade deve ser bem dirigida e claramente compreendida.
O modo de fazer por si não proporciona uma formação eficiente.
Acompanhando o pensamento de W. Guyer, podemos acrescentar: "de
nenhuma maneira é factível que a necessidade de expressão
-67-
motriz do menino se interprete como exclusiva atividade na escola, nem que
a toda atividade teórica deveria agregar-se uma atividade prática".
A atividade não deve levar a uma subestimação do estudo em si, mas
constituir processos de aprendizagem interligados, embora obedecendo a
leis próprias e requerendo métodos específicos.
Ao falar de atividade, Walter Monroe disse: "Do ponto de vista
pedagógico, a característica mais significativa é a atividade do aluno. As
crianças aprendem destreza motora, memorizam fatos, conhecimentos e
formas de conduta como resultado de perceber, pensar, fazer e sentir. Só
através de atividades o aluno aprende".
Identificando os elementos essenciais propostos por Lalande, Schietzel,
Guyer e Monroe, temos:
a — Atividade implica expressão e produção.
b — A atividade por si não proporciona formação eficiente, ela é meio
e não fim.
c — Nem toda atividade teórica se liga a uma prática e não possui um
sentido exclusivo de movimento físico.
d — Só através de atividade se aprende.
A partir desses dados podemos compreender que quando um professor
deflagra atividades escolares tem em vista objetivos preestabe-lecidos e deve
selecionar os tipos de atividades adequadas, de molde a estimular a
aquisição de novos comportamentos e oportunizar a consolidação de formas
de conduta.
Caswell e Campbell admitem que há seis tipos de atividades: de
informação, de organização, de adestramento, de construção, de expressão
criadora e de lazer. Todos seis se desenvolvem na escola, seguindo uma
ordem de complexidade e intensidade crescente, de maneira a oferecer
condições reais de aprendizagem sistemática.
As atividades de informação abrangem excursão: colecionamento de
coisas; observação; exploração; visão de dispositivos e filmes; manuseio de
figuras; estudo de mapas, cartas, gráficos, desenhos, lâminas; leitura; escuta;
participação em discussão, conferências e entrevistas. Todas elas tendem a
oferecer subsídios ao indivíduo para que ele possa atingir o objetivo a que se
propõe.
Adquirida a informação, passa-se ao plano de organizá-las e expressá-
las e, então, outro conjunto de atividades é especifico para o atingimento
dessa estruturação. As mais comuns nessa área são: dramatizar;
confeccionar; escrever; elaborar mapas, cartas, gráficos, desenhos, quadros
sinóticos, esquemas; organizar exposições e debates.
-68-
Prosseguindo nessa seqüência, seriam incluídos exercícios que o aluno
realizaria para dominar certos aspectos da aprendizagem, os quais requerem
prática especial e, portanto, executariam atividades de adestramento, tais
como: recitação; exercícios de domínio da mecânica da leitura e da escrita;
trabalhos para destrezas manuais, e em educação física e exercícios de
matemática para destrezas nessa área.
Em todas as tarefas escolares se desenvolvem atividades de construção
e produção, tais como: construção de jogos, casas, móveis, tecidos,
confecção de roupas, trabalhos de jardim e horta, etc, objetivando ordenar a
imaginação, o pensamento e a ação em direção a um ponto de convergência
que, no caso, seria ganhar habilidades com a produção de coisas.
Em se tratando de atividades de expressão criadora, o que se pode
pretender é que o aluno satisfaça sua necessidade de expressão, criando e,
com isto, explorando sua energia potencial em termos de aptidões. Nesse
plano a escola deve contar com: jogos e recitais; dança; canto e execução de
música instrumental; desenho; pintura; modelagem; escultura; entalhe;
composição de poemas, contos e ensaios. Todas as modalidades devem
requerer a atenção especial do professor, pois dispõem para posterior
elaboração e demonstração de h.ipóteses e para o trabalho intelectual de
criação de soluções em face de situações novas.
Concomitantemente, as atividades de lazer devem ser desenvolvidas,
pois visando e integração do indivíduo, é mister que a escola lhe ofereça
condições para que, de modo autônomo, o aluno saiba aproveitar seu tempo
livre de forma sadia. As experiências adquiridas na escola em relação ao
lazer permitirão ao aluno divertir-se, entreter-se e recrear-se, dispondo-o,
assim ,a descobrir novos interesses, valorizando de modo justo e correto seu
próprio desgaste de energias. O lazer tem um aspecto individual e outro
social, por desempenhar um papel destacado no processo de ajustamento,
oportunizando o estabelecimento de relações interpessoais informais e
satisfatórias, disciplinando as formas de conduta. Além disso, tem uma
função preventiva em termos de saúde mental, porque permite o
rompimento de tensões e a expansão de espontaneidade.
As atividades de lazer são múltiplas, mas podem ser sintetizadas no
seguinte conjunto: jogos; canto; audição de música; observação de lâminas,
quadros e obras de arte; participação em atividades teatrais; esportes; contar
e escutar contos; participar de associações; cinema; passeios e excursões.
É evidente que deve haver uma gradação e a escolha de atividade pelo
professor não pode perder de vista o tipo de aprendizagem
-69-
pretendida, uma vez que a aprendizagem se realiza por fases e requer
maturidade, para que se consiga dirigir interesses.
Ademais as atividades elementares são a fonte para o desenvolvimento
das disciplinas: primeiro a percepção do real concreto aliada ao fazer, depois
a representação associada ao saber.
As disciplinas representam uma categoria no plano de transmissão
consciente e sistemática de bens culturais, morais e materiais. Segundo Otto
Willman, "as disciplinas aplicam o currículo e incluem ciência e eficiência,
crença e concepção do mundo. É por meio das disciplinas que se introduz o
indivíduo na vida moral e se o localiza nos diversos grupos sociais, assim
como se determina o ciclo de interesses". O sentido que se confere à
expressão disciplina é o de ordenação.
No caso específico dos currículos, não se trata de uma ordenação
qualquer, mas a estruturação de um conjunto de conhecimentos relacionados
pelo próprio educando na medida em que dele se apropria. Por isso, não é
qualquer conjunto de conhecimentos que constitui uma disciplina, mas
somente aquele que resulta de uma ordenação consentida e que possui
caráter funcional.
As exigências de aprendizagem aumentam e assumem um aspecto mais
intelectivo que nas atividades, fazendo-se mister que se organizem
instrumentos de trabalho adequados que "não criam saber, nem resultam
brilhantes mas carreiam informações, reúnem materiais, inventariam fontes
e conhecimentos e ensinam o que sobre o assunto existe" (7). Esses
instrumentos evitam que os educandos se percam nos levantamentos e
ignorem a experiência anterior.
Os vários aspectos do conhecimento racional, que constituem conteúdo
da aprendizagem intelectual, são assimilados no contexto das disciplinas,
mas não dissociados entre si, e "devem terminar por criar um saber novo,
que se consolida pelo uso, gerando a persistência pelo fato de permitir uma
organização de trabalho intelectual que facilita a tarefa do aluno de vencer a
massa de informações existentes no mundo hodierno" (7).
No primeiro grau de escolaridade, as disciplinas que aparecem mais
freqüentemente são: matemática, geografia, história, ciências físicas e
biológicas e línguas. A delimitação de cada uma delas não se faz levando em
conta o que um homem adulto deve saber, mas o que o homem precisa saber
para integrar-se e formular sua própria concepção de mundo e interpretação
de vida.
Qualquer que seja a disciplina, a qualidade fundamental a cultivar é a
curiosidade, a ser dirigida para os objetivos convenientes, para tornar-se a
base do conhecimento intelectual, a fim de não dis-
-70-
sociá-lo da vida. A curiosidade que se manifesta como desejo de saber,
não aparece quando outros desejos se misturam à crença de que já estamos
de posse da verdade, crença que a escola deve evitar, a qual deve se
caracterizar como lugar onde se busca a verdade. O cultivo da curiosidade
confere o poder de concentração, que se distingue por ser intensa,
prolongada e voluntária.
Além disso, faz-se básico formar o sentido de exatidão, que se
manifesta desde a boa articulação das palavras até a exatidão de fatos e à
lógica. A exatidão de fatos se obtém pela estimulação do interesse, enquanto
a exatidão lógica tem como veículo natural a matemática, desde que não seja
apresentada como um conjunto de regras arbitrárias. As regras devem ser
aprendidas por compreensão do seu valor.
Quanto ao ensino da Geografia, se feito inicialmente com o auxílio de
ilustrações associadas a narrativas de viagens, fornece alimento à
imaginação, diminuindo a tirania dos arredores familiares e tornando
possível, mais tarde, sentir que os países remotos realmente existem. A
Geografia tem amplo lugar na escola de primeiro grau, o mesmo se
aplicando em relação à História, se bem que em idade um pouco mais
avançada, porque a noção de tempo é muito rudimentar nas primeiras
idades. Para a criança nessa fase o fio orientador é o presente e, por isso,
essa disciplina começaria por ilustrações e representações através da dança,
pelo menos enquanto não fosse possível — considerando o grau de
maturidade — a aprendizagem sistemática dos fatos históricos, obedecendo
a uma ordem cronológica do presente para o passado.
O ensino das ciências naturais começaria nas atividades de observação
para posteriormente, desenvolvida a exatidão, passar às de construção e, a
partir destas, aprendizagem de conteúdos científicos, visando, antes de tudo,
os processos de redescoberta e a participação em experiências novas.
A aprendizagem das línguas modernas deve ser feita com uso de
procedimentos de visualização e audição, com uma tonalidade de lazer para
depois converter-se em jogos e, finalmente, atingir a abordagem estrutural
da língua.
Na verdade, qualquer que seja a disciplina, qualquer que seja o nome
que a ela se confira, o importante é que desenvolva o senso de iniciativa
pessoal e colabore no conjunto curricular para que o educando possa se
localizar no tempo e no espaço; comunique-se com habilidade;
autodetermine-se, afirmando sua individualidade através de uma ação
produtiva. Para tanto, é fundamental uma interrelação dos conteúdos das
disciplinas.
-71-
BIBLIOGRAFIA CITADA
(1) MARIAS, Julián. Antropologia metafísica. Trad. de David Ribeiro de Toledo
Piza. São Paulo, Duas Cidades, 1971.
(2) ORTEGA Y GASSET, José. O homem e a gente. Trad. de J. Carlos Lisboa. Rio
de Janeiro, Livro Ibero-Americano, 1960.
(3) CRUZ COSTA. Contribuição à história das idéias no Brasil. 2 ed. Rio de
Janeiro, Ed. Civilização Brasileira, 1967.
(4) JORDÃO EMERENCIANO, M. S. A retirada para o Brasil. Recife, Ed.
Tradição, 1946.
(5) IBARRA PEREZ, Oscar. Didáctica moderna. Madrid, Ed. Aguilar, 1968.
(6) STOCKER, Karl. Princípios de didáctica moderna. Trad. de Juan Jorge
Thomas. Buenos Aires, Ed. Kapelusz, 1964.
(7) JORDÃO EMERENCIANO, M. 8. Três instrumentos de trabalho. Recife,
Universidade de Recife, 1965.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
WILLMAN, Otto. Teoria de Ia formación humana. Trad. de Salustiano Du-nalturrla.
Madrid, Instituto San José de Calasnaz, 1948.
LARROYO, Francisco. História general de Ia pedagogia. 4 ed. Méximo, Ed. Porrua,
1957.
TEIXEIRA, Anísio. Educação no Brasil. São Paulo, Ed. Nacional, 1969.
CIRIGLIANO, Gustavo F. G. Fenomenologia da educação. Trad. de Isaida Bezerra
Tisot. Petrópolis, Ed. Vozes, 1969.
CLOUTTER, F. La salud mental. Madrid, Ed. Iberoamericana. 1967.
CORREL, W & SCWARZE, H. Psicologia de aprendizagem. Trad. de Nestor
Dockhorn. São Paulo, Ed. Herder, 1971.
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