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PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
Itamar Franco MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO E
DO DESPORTO
Murílio de Avellar Hingel SECRETÁRIA DE
EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL
Maria Aglaê de Medeiros Machado
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
Célio da Cunha
Publicação realizada dentro do Programa de Cooperação Educativa
Brasil - França.
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A FORMAÇÃO DO
PROFESSOR PARA A
EDUCAÇÃO BÁSICA
PERSPECTIVAS
Michel BRAULT
C
ADERNOS
E
DUCAÇÃO
B
ÁSICA
SÉRIE
Inovações
6
A FORMAÇÃO DO
PROFESSOR PARA A
EDUCAÇÃO BÁSICA
PERSPECTIVAS
Michel BRAULT
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
Secretaria de Educação Fundamental EMBAIXADA
DA FRANÇA NO BRASIL Serviço Cultural,
Científico e de Cooperação Técnica Escritório de
Cooperação Lingüística e Educacional
1994 - Ministério da Educação e do Desporto
Autor
MICHEL BRAULT
Tradutor
JOAQUIM OSÓRIO PIRES DA SILVA
Revisão
CINARA DIAS CUSTÓDIO
Impressão
PRÁTICA GRÁFICA E EDITORA LTDA
Editoração Eletrônica
ART LASER
EQUIPE DE COORDENAÇÃO - MEC/SEF/DPE/COMAG
Marília Miranda Lindinger, Margarida Jardim Cavalcante, Cira de Matos Brito
Pinto, Marilena Braz Vendramimi, Susi Braga de Sousa Manganelli, Maria
Luiza Latour Nogueira, Cinara Dias Custódio.
Ficha Catalográfica
Brault, Michel B825f A Formação do professor para a Educação
Básica : perspectivas / Michel Brault, tradução Joaquim Osório Pires
da Silva. — Brasília: MEC/UNESCO; 1994.
66p. (Série Inovações)
1. Professor de primeiro grau - formação profissional. I.
Brasil. Secretaria de Educação Fundamental, ll. Título.
CDU : 373.3
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................... 7
INTRODUÇÃO ......................................................................................... 9
DESAFIO................................................................................................13
PROBLEMÁTICA....................................................................................17
COMPLEXIDADE ...................................................................................19
PERPLEXIDADES................................................................................... 23
Crise de Identidade ...........................................................................24
Crise do recrutamento.......................................................................24
Crises das estruturas.........................................................................25
Crise dos Currículos..........................................................................27
PARADOXOS.........................................................................................29
1. O paradoxo das expectativas:
Superestima e/ou desvalorização................................................29
2. O paradoxo dos meios: economia da educação
e/ou educação da economia........................................................ 32
3. O paradoxo da renovação:
continuidade e descontinuidade...................................................33
PARADIGMAS........................................................................................35
O modelo cívico.................................................................................35
O modelo doméstico..........................................................................36
O modelo ideológico.......................................................................... 37
O modelo de empresa.......................................................................38
PROFISSIONALIZAÇÃO........................................................................41
Componentes de um projeto de profissionalização ..........................42
Dimensões da formação ...................................................................44
QUESTIONAMENTOS............................................................................49
A questão das estratégias .................................................................49
A questão dos lugares .......................................................................50
A questão dos currículos ...................................................................52
A questão do tempo...........................................................................54
A questão dos atores.........................................................................55
CONCLUSÕES PROVISÓRIAS.............................................................59
ANEXOS .................................................................................................61
APRESENTAÇÃO
A situação do magistério da educação básica no Brasil é preocupante
e altamente complexa. Vincula-se diretamente à vontade política, centrada
no reconhecimento social da educação básica como prioridade nacional e
no restabelecimento do papel social e pedagógico do professor como
agente precípuo do processo de mudança educacional. Não há dúvida
quanto à relação existente entre uma educação de qualidade e qualidade
dos educadores. Vale dizer que somente com professores competentes,
conscientes da sua missão pública e valorizados social e profissionalmente,
será possível dar efetividade à educação básica de boa qualidade para
todos. Esse entendimento é fundamental e está na raiz de qualquer
tentativa de mudança no quadro atual da educação nacional.
No que tange a esse aspecto, a Secretaria de Educação Fundamen-
tal do Ministério da Educação e do Desporto tem empreendido esforços
vinculados simultaneamente às questões de formação, carreira, salário e
condições de trabalho. Este tem sido o objetivo do Fórum Permanente do
Magistério da Educação Básica, instituído pelo Ministro da Educação e do
Desporto, Prof. Murílio Hingel, que conta com a representação do Conselho
Nacional dos Secretários Estaduais de Educação - CONSED, Conselho de
Reitores das Universidades Brasileiras - CRUB, União dos Dirigentes
Municipais de Educação - UNDIME, Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação - CNTE, Associação Nacional pela Formação
dos Profissionais da Educação - ANFOPE, Fórum dos Conselhos Estaduais
de Educação - FCEE, Secretaria de Planejamento do Presidência da
República - SEPLAN/PR, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais - INEP e Secretaria-fins do MEC.
Resultam desses esforços, o Programa de Profissionalização do
Magistério, constante do Acordo Nacional, aprovado por ocasião da
Conferência nacional de Educação para Todos (Brasília, 2 de setembro de
1994) e o Pacto pela Valorização do Magistério e Qualidade da
Educação, firmado em 19 de outubro de 1994, que estabelece diretrizes
políticas e compromissos dos governos e da sociedade referentes à
reconstrução da educação básica do País.
No que se refere à formação do professor, a SEF está particular-
mente empenhada na definição de uma política de elevação dos padrões
de qualificação do magistério.
Nesse sentido, tem sido relevante a cooperação do Governo francês,
e, especificamente, do Professor Michel Brault, que, na qualidade de
consultor residente no Brasil do Programa de Cooperação Educativa Brasil-
França, vem participando dos debates sobre a questão do magistério e
prestando cooperação técnica na concepção e implantação de projetos
inovadores de formação de professores.
Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento dessa nova
política, a SEF tem o prazer de apresentar aos agentes técnica e politi-
camente responsáveis pela formação de professores este documento
elaborado pelo Professor Brault, a partir de sua sensível percepção da
realidade educacional brasileira, por intermédio dos trabalhos realizados
junto aos sistemas de ensino e dos inúmeros contatos estabelecidos com
instituições formadoras de nível médio e superior.
Maria Aglaê de Medeiros Machado
Secretária de Educação Fundamental
INTRODUÇÃO
O Programa de Cooperação Educativa Brasil-França, coordenado
pela Secretaria de Educação Fundamental - Departamento de Políticas
Educacionais - Coordenação Geral do Magistério e pela Embaixada da
França no Brasil, elegeu, como eixo central, a formação de professores
para a educação básica com o objetivo de contribuir para a redefinição das
estruturas, conteúdos e atores responsáveis pela formação inicial e
continuada dos docentes, em conformidade com as diretrizes políticas
traçadas pelo Plano Decenal de Educação para Todos - 1993-2003.
O referido Programa desencadeou, a partir de 1992, estudos e
debates em âmbito nacional e estadual com a participação de especialistas
brasileiros e franceses, notadamente por ocasião dos Seminários e
Encontros Nacionais promovidos sobre Formação de Professores para a
Educação Básica - Experiências no Brasil e na França (Brasília, 9 a 11
março de 1992); Formação do Leitor - o papel das agências de formação de
professores para a educação fundamental (Brasília, 14 a 16 de dezembro
de 1993); Qualidade na formação do professor: um projeto de
profissionalização (Brasília, 6 e 7 de maio de 1993); Formação de
Professores para a Educação Básica (Brasília, 3 a 5 de agosto de 1994);
Leitura e Escrita na Sociedade e na Escola (Brasília, 24 e 25 de agosto de
1994).
Além desses eventos, vêm sendo realizadas missões de especialis-
tas franceses no Brasil, visitas de dirigentes e estágios de formação de
professores brasileiros na França, com especial apoio dos Institutos
Universitários de Formação de Mestres de Lille (Centro de Douai) e de
Picardie (Centro de Beauvais).
Cabe destacar, ainda, o desenvolvimento de atividades de coope-
ração técnica por especialistas franceses residentes no Brasil, com os
sistemas estaduais de ensino e instituições de formação de professores de
nível médio e superior.
As linhas de trabalho desse Programa contemplam, prioritariamente,
o Pró-Leitura e o Pró-Matemática na Formação do Professor, bem como
Projeto-piloto de Formação do Professor em nível superior para a
Educação Infantil e para o Ensino Fundamental.
O Pró-Leitura parte do pressuposto de que o domínio da leitura e da
escrita constitui a base para a elevação dos padrões de desempenho dos
professores e dos alunos do ensino fundamental, e se apóia na análise e na
fundamentação das práticas docentes. Pela dinâmica do Pró-Leitura, o
projeto de formação se constrói na inter-relação da prática docente,
formação e pesquisa, por meio da interação de seus diferentes atores:
alunos e professores (da educação infantil e do ensino fundamental),
alunos e professores-formadores (do magistério em nível médio), alunos e
professores-pesquisadores (dos programas de formação em nível superior).
O Pró-Matemática, dentro dessa mesma concepção, visa fortalecer a
formação matemática dos professores em exercício e dos futuros
professores, como resposta às necessidades básicas de aprendizagem dos
alunos do ensino fundamental.
Os projetos-piloto de Formação de Professores, apoiados pelo
Programa em apreço, estão fundamentos na compreensão de que a
qualidade de educação básica depende, essencialmente, da qualificação
profissional dos professores, que assegure alto nível de formação ge-
ral/cultural, competências didático-pedagógicas, domínio de conhecimentos
escolares específicos, consciência do papel social do professor e
construção de identidade profissional.
Sob essa ótica, a cooperação técnica em desenvolvimento está
concentrada em iniciativas de transformação de Institutos de Educação de
nível médio em Institutos de Formação de nível superior, destacando-se o
apoio à implantação do Instituto de Formação de Professores (IFP) no
Estado do Rio Grande do Norte, do Projeto-piloto de Formação de
Professores em nível superior para o Pré-Escolar e Séries iniciais do Ensino
Fundamental, no Centro Tecnológico de Qualidade da Educação, no Estado
do Rio de Janeiro e do Centro de Referência do Professor, no Estado de
Minas Gerais.
Paralelamente, vem sendo apoiada a implantação de programas de
formação de professores em exercício na educação básica, no âmbito das
universidades, buscando especificamente atender às necessidades dos
sistemas de ensino.
Cabe reafirmar que esses esforços de cooperação bilateral têm
contribuído para a definição de uma política nacional de magistério,
preconizada no "Pacto pela Valorização do Magistério e Qualidade de
Educação", firmado em 19 de outubro de 1994, por representantes da
União, dos Estados, dos Municípios e de entidades representativas da
sociedade civil.
A elevação dos padrões de formação inicial e continuada do
magistério, de forma a responder às demandas de educação básica de
qualidade para todos, constitui um dos compromissos assumidos pelo
Pacto para assegurar a efetiva profissionalização do magistério.
É sempre oportuno destacar que tanto o Acordo Nacional quanto o
Pacto pela Valorização do magistério foram pensados, concebidos e
estruturados na perspectiva de uma pedagogia da qualidade. Neles,
formação e carreira constituem binômio indissociável, devendo por isso
mesmo colocar-se como eixo-norteador da política de educação para todos.
A experiência de cooperação com a França tem sido importante para
viabilizar um diálogo mais criativo em torno do impasse da formação que,
devido à sua complexidade, precisa ser enfrentado com o máximo de
discernimento.
O texto do Professor Michel Brault que a SEF divulga coloca
questões importantes, dignas mesmo de merecer a atenção de todos
quanto hoje no Brasil se debruçam com seriedade para superar o impasse
da formação de professores.
Célio da Cunha
Diretor do Departamento de Políticas Educacionais da SEF/MEC.
Marília Miranda Lindinger
Coordenadora do Magistério
DESAFIO
Para quem optou por uma carreira profissional
1
na área da Edu-
cação, participar de um projeto de cooperação internacional, nesse campo,
constitui um privilégio. E como ter aberta diante de si a dialética do
intercâmbio, é experimentar a relatividade do fato, e, quem sabe, avaliar de
outro modo a realidade do racional.
Quando se abordam as questões relativas à Educação num contexto
cultural, sócio-econômico e político diferente, nasce no espírito a convicção
de que a experiência do "outro" é algo essencialmente cul-tu-
1 Curriculum vitae:
A Escola Normal foi o local de formação inicial de Michel BRAULT. Esse ponto de partida explica, sem dúvida, a
seqüência de seu itinerário profissional. Após essa formação de professor primário, foi-lhe oferecida a possibilidade
de prosseguir seus estudos de filosofia na Universidade de Paris-Sorbonne. Quando obtém seu mestrado, ele é
recrutado, através de concurso (CAPES e Agrégation), como professor de filosofia. Ele ensina essa disciplina e a
pedagogia, na Escola Normal, de 1972 a 1977 e é essa experiência que o leva a dedicar-se, num trabalho teórico c
prático, ã formação de professores.
Nomeado lnspetor da Educação Nacional, em 1977, ele é encarregado da animação pedagógica, da formação de
professores e da avaliação do ensino elementar e pré-elementar em várias circunscrições, tanto urbanas quanto
rurais. Nesse quadro, ele é autor de numerosos trabalhos pedagógicos destinados aos professores do ensino
primário.
A experiência adquirida permite-lhe interessar-se pelas problemáticas mais gerais da formação permanente. Ele é
levado a intervir em diferentes setores institucionais e a associar-se a diversos projetos de cooperação internacional,
tanto na Europa quanto no oeste da África. Em 1984, Michel BRAULT é nomeado Diretor da Escola Normal. Ele
assume, assim, responsabilidades de gestão e de formação do pessoal do ensino na região parisiense e no interior.
A competência profissional adquirida o leva à nomeação de "Inspecteur d'Académie", em 1990, e a ser encarregado
da elaboração do projeto pedagógico do Instituto Universitário de Formação de Professores da Academia de Amiens.
(Esses institutos, criados nos moldes da Lei de Orientação sobre a Educação adotada em 1989, integram todas as
estruturas anteriores de formação e são encarregados da formação do conjunto do pessoal do ensino e da Educação.
Em 1992, Michel BRAULT é convidado a participar de um trabalho de "expertise" nos moldes do projeto franco-
brasileiro de cooperação educativa. Ele efetua, no Brasil, uma primeira missão de identificação, em novembro de
1992; em maio de 1993, ele é solicitado para uma segunda missão, visando à definição dos princípios de uma política
de cooperação entre o Brasil e a França, na área da formação de professores do ensino fundamental. Em outubro de
1993, ele é destacado pelo Ministério da Educação Nacional, junto ao Ministério das Relações Exteriores, para atuar
no Brasil como consultor do programa franco-brasileiro de cooperação educativa. Desde sua chegada ao Brasil,
Michel BRAULT, nos moldes de um programa de trabalho negociado entre o Ministério da Educação e os Serviços
Culturais da Embaixada da França no Brasil, presta serviços, enquanto consultor, às instituições brasileiras
atualmente engajadas numa política de restruturação da formação profissional dos professores. Ele teve, também, a
oportunidade de participar das reflexões engajadas em Minas Gerais, no Rio Grande do Norte, no Mato Grosso, em
Alagoas, em Pernambuco, no Rio de Janeiro, em São Paulo e no Distrito Federal. Além dessa missão de "expertise",
ele assegura, em Minas Gerais, uma função clássica de adido lingüístico.
ral. Tratando-se da Educação, as incertezas do presente, gestadas pela
história, descortinam os horizontes. Buscar compreender, com empatia, as
perplexidades do país que se visita naquilo que ele tem, talvez, de mais
precioso - sua temporalidade, sua história, seu projeto - é a primeira
obrigação que se deve aos anfitriões. O privilégio está vinculado à
exigência.
A variedade dos encontros, a pluralidade das leituras, a diversidade
dos olhares condensam-se ao longo das semanas e dos meses em
reflexões muitas vezes heterogêneas ou mesmo ecléticas, dos pontos de
vista sincréticos, até mesmo cheias de contradições. Chega o momento
inexorável em que é difícil evitar sínteses necessariamente provisórias, sob
pena de se incorrer em flagrante delito de impertinência e de se frustrar
expectativas implícitas. O privilégio, então, torna-se um desafio.
Uma elaboração dessa natureza representa um exercício formidável.
Certas impressões e intuições podem ficar fixadas nas malhas de
racionalizações prematuras, quando a ética e sua correspondente profis-
sional, a deontologia, aconselhariam mais atenção, prudência e paciência.
Um olhar, mesmo de fora, não poderia adquirir, por si só, foros de
objetividade. Como todos sabem, o observador está sempre inserido num
contexto. Mesmo assim...
Respondendo à solicitação de meus correspondentes na Secretaria
de Educação Fundamental do Ministério da Educação, assumo o risco de
registrar no texto, que aqui deixo, algumas observações sobre o sistema
educacional brasileiro, observações essas que pretendem ser a abertura de
outras perspectivas. Às vezes a perspectiva, entendida como ponto de
vista, serve para apoiar e especificar a perspectiva no sentido de expec-
tativa, de esperança, de possibilidade, de probabilidade. A construção
modesta e prudente desta convergência é a função deste "convidado
intruso", que é o consultor estrangeiro.
A competência desse consultor consiste exatamente em analisar e
compreender o que é próprio de seus interlocutores e daí tirar as
conclusões para a ação. Neste encontro, interessa menos dizer algo de
"novo" do que depreender, nesta intersubjetividade de culturas e de
experiências, alguns traços que poderiam ser tidos como objetivos.
Trata-se, pois, de um "ponto de vista" a ser apresentado sobre um
tema particularmente sensível nos debates da sociedade brasileira: a
formação de professores. Estas considerações poderão ser consideradas
inoportunas. Gostaria, entretanto, que fossem o testemunho de um diálogo
comprometido
2
entre os educadores brasileiros e o educador francês, por
eles acolhido, e que as ditas considerações fizessem parte daqueles
intercâmbios que a história e os valores comuns legitimam.
As observações aqui apresentadas não pretendem ter a mínima
dimensão científica. Trata-se mais de um testemunho do que de um ensaio.
Estas notas de trabalho são alimentadas por observações e anotações;
suas fontes são inúmeras conversas. Apóiam-se, também, em leituras de
livros e artigos. Igualmente são fruto de debates públicos e de trocas de
opinião. Representam como que a espuma dos dias, restos, provavelmente
efêmeros de encontros tidos. Sem dúvida, uma abordagem ingênua leva,
muitas vezes, a interpretações apressadas e a incom-preensões
provisórias.
Seja-nos permitido citar, aqui, um dos primeiros textos a que tivemos
acesso neste diálogo:
"Se o professor souber analisar o absurdo da sua situação profis-
sional, tomando-o e enfrentando-o como uma experiência do trágico,
então poderá o professor revitalizar o seu trabalho. A catarse que
resulta da tragédia concretamente vivida abre caminho para
momentos de lucidez, clarividência e consciência. Saberá então o
professor que à noite se antepõe as luzes da liberdade, como o
demonstra a dialética da vida e da história. Compreenderá então o
professor que nem todas as possibilidades de ser e existir foram
esgotadas: a sociedade e a escola que estão aí não são eternas".
2 Ezequiel T. DA SILVA, Magistério e Mediocridade, Cortez, S. Paulo, 1992, p.55.
Como dizia o Prof. Ezequiel T. da Silva, num encontro casual em
Belo Horizonte, o Mito de Sísifo é uma de nossas referências fundadoras.
É, talvez, por isso que as linhas de hoje são possíveis. De antemão,
merecem reconhecimento todas as críticas que possibilitem uma abertura
melhorada e mais ampliada sobre as realidades da Educação brasileira.
3
3 Evidentemente, estas linhas só comprometem seu autor. Gostaríamos, contudo, de registrar aqui nossa
dívida ao Prof. Raimundo Nonato Fernandez, figura de inteligência, cultura e generosidade, graças a quem, hoje, nós
começamos a melhor compreender a cultura e a história do Brasil.
PROBLEMÁTICA
A formação dos professores da escola fundamental brasileira foi e
continua sendo objeto de inúmeros trabalhos. Parece-nos que a principal
questão, presente na maioria dos debates hoje abertos
4
, diz respeito às
condições para o surgimento de um modelo racionalizador, que permita
uma valorização efetiva dos professores da escola de base.
O que está em construção é um sistema de representações:
- que defina objetivos suficientemente coerentes (para não pro-
vocar contradições insuportáveis), legítimos perante os profes-
sores (cuja identidade os objetivos viriam a determinar e con-
solidar) e reconhecidos socialmente;
- que propicie o quadro geral de uma formação concreta e
pragmática, ou seja: capaz de ser implementada em diferentes
contextos próprios a fazerem surgir, ao longo do tempo, práticas
profissionais que atendam às necessidades do sistema público de
ensino;
- mobilizador efetivo; isso significa que este modelo poderia
operar em interface com um grande número de interesses,
estratégias, culturas (diversos grupos de professôres, diferentes
setores da burocracia institucional, várias categorias de famílias e
alunos), a fim de funcionar de fato como formação de com-
promisso e expressar a linguagem de um certo consenso.
Um tipo de modelo racionalizador, com essas três características,
poderia ser caracterizado como uma agência de mobilização profissional.
Seu surgimento e sua essência não constituem apenas o resultado de uma
reflexão de natureza política, nem mesmo pedagógica (ainda que
Os trabalhos da Conferência Nacional para o Plano Decenal de Educação para Todos dão testemunho deste
surgimento progressivo. O Relatório final do seminário sobre a formação de professores para a educação (Brasília, 3-
5 de agosto de 1994).
o trabalho dos pedagogos, didáticos e filósofos seja elemento de sua
constituição). Em sua elaboração existe o risco muito grande de se
confundir a coerência ou o entusiasmo de um discurso prescritivo com sua
capacidade de mobilizar efetivamente os atores. Talvez apenas as práticas
efetivas de formação venham a dar contornos mais concretos a essas
linhas de agenciamento.
Essas práticas, aliás, já são propostas no Relatório Final do Seminá-
rio sobre a Formação do Professor de Educação Básica (Brasília, 03-05
de agosto de 1994). Têm elas como pressuposto
"uma articulação sistemática entre agências formadoras e empre-
gadoras, processo que exige clara identificação das demandas e
definição de responsabilidades relativas a: clientela, agências, níveis
e modalidade de formação, objetivos a serem atingidos,
financiamento e avaliação".
A esse respeito, a implantação, feita já há alguns meses, do pro-
grama de cooperação educacional negociada entre o Brasil e a França, no
âmbito da formação dos professores, permite, desde agora, que se
estabeleçam algumas linhas de ação suscetíveis de funcionarem como
vetores de uma nova dinâmica, com apoio dessa sistemática.
A realidade é diversificada e o difícil é poder captá-la em sua
multidimensionalidade como complexidade. Este esforço de compreensão
pode ver-se diante de paradoxos e suscitar perplexidades inocul-táveis. Ao
final de tudo, a partir de uma análise da crise dos paradigmas, pode-se
buscar a síntese dos pontos de convergência, que servirão tanto como
suporte para a definição de estratégias de intervenção quanto de base para
a formulação de hipóteses de trabalho.
COMPLEXIDADE
"O pensamento simples resolve os problemas simples, sem proble-
mas de pensamento" (Edgar Morin).
O professor Maurice Debesse, considerado na França com um dos
fundadores das Ciências da Educação, ressaltou a importância que tem nas
representações sociais a "crença implícita ou explícita na onipotência da
formação dos professores", e vê aí "uma nova imagem da antiga crença na
Onipotência da Educação".
5
A crença pode, em todo caso, tanto provocar a ilusão quanto
antecipar uma intuição do real. O peso e a insistência nos argumentos
ligados à formação de professores nos debates relativos ao sistema
educativo incita a optar pela segunda hipótese, sendo que esta focalização
não deve, entretanto, ocultar a complexidade de um conjunto de fatores
políticos, econômicos e culturais. Com efeito, só uma perspectiva histórica
pode permitir uma compreensão das evoluções da figura social do
professor.
6
De fato, além da própria diversidade de situações ligadas à geografia
e à história, o que caracteriza a realidade da escola brasileira é a
complexidade.
7
Na análise desta complexidade
8
, os numerosos interlocutores bra-
5 M. DEBESSE, G. MlALARET Traité des Sciences Pédagogiques. Paris, Presses Universitaires de France, 1971,
T.VII, p.170.
6 cf. A.M. CASASSANTA PEIXOTO L'influence des idées étrangères sur I'enseignement au Brésil. artigo que
deve ser publicado na revista HISTOIRE DE L'EDUCATION, Institut National de Recherches Pédagogiques,
Paris.
7 "Os problemas de formação de quadros para a educação básica são complexos"
8 E. MORIN, Introduction á Ia pensée complexe, ESF éditeur, Paris, 1990, p.21.
"O que é a complexidade? Em primeiro lugar, é um tecido (complexus: o que foi costurado em conjunto)
de componentes heterogêneos inseparavelmente associados: coloca o paradoxo do um e do múltiplo... Em
segundo lugar, a complexidade é, de fato, o tecido de eventos, ações, interações, retroações, determinações
e casualidades, que constituem nosso mundo de fenômenos. Nesse caso, então, a complexidade se
apresenta com os traços inquietantes da confusão, do inextrincável, da desordem, da ambigüidade, da
incerteza... Por isso, no conhecimento, existe a necessidade de se colocar ordem nos fenômenos,
remexendo na desordem, descartando o incerto, ou seja: selecionar os elementos de ordem e de certeza,
sileiros contatados e a maioria das análises consultadas são concordes em
estigmatizar, como fator decisivo, os disfuncionamentos dos dispositivos de
recrutamento, de formação, de avaliação e de carreira do pessoal docente.
Sem atribuir ao fator "recursos humanos" um papel exclusivo ou
superdeterminante na crise por que passa a escola brasileira, pode-se,
contudo, estimar a nível político, que é possível considerá-lo como uma
alavanca particularmente forte para se deslanchar uma dinâmica de
renovação de um sistema educacional; trata-se, pois de um elemento
estratégico nas discussões em andamento. A (re-)construção de uma
cidadania passa pela (re-)legitimação da escola e do professor. Este
movimento não pode ignorar que a História fez do Brasil um Estado antes
de que fosse Nação, e que a questão do professor é uma questão
eminentemente política.
Parece-nos, pois, especialmente interessante tentar compreender
como os problemas se colocam, o que significa, tentar construir uma
problemática a partir dos dados colhidos, evitando tanto quanto possível,
simplificações e reduções, de sorte a propor aos nossos interlocutores e
companheiros um olhar sobre a própria realidade. Sem dúvida nenhuma, o
que se impõe como uma regra de método, é a atenção para a diversidade e
para as divergências.
Esta exigência de multidimensionalidade supõe que sejam tomados
em consideração os fatores políticos e ideológicos, econômicos e so-
ciológicos, institucionais e organizacionais, científicos e pedagógicos
9
. Os
problemas da formação dos professores são colocados simultaneamente
em termos de centro e de periferia
10
, e requerem uma análise
tirar ambigüidades, esclarecer, distinguir, hierarquizar... Essas operações, necessárias para o entendimento, correm o
risco de provocar cegueira, se eliminarem as outras características do complexus".
9 "Uma sociedade não é um corpo unitário no qual se exerceria um poder e apenas um, mas é uma justaposição, uma
vinculação, uma coordenação, uma hierarquia, também, de diferentes poderes, os quais, contudo permanecem em
sua especificidade. Estes diferentes poderes não podem e não devem ser compreendidos simplesmente como a
derivação, a conseqüência de uma espécie de poder central, que seria o primordial". Michel FOUCAULT, Les Mailles
du pouvoir, DITS ET ECRITS 1954-1988, conferência pronunciada em 1976, na Universidade da Bahia, PUF, Paris,
1994.
10 "A nossa formação histórica produziu uma sociedade que se caracteriza pela centralização - com a tendência para a
criação de organizações de grande porte - e pela concentração do poder nos escalões mais altos do governo. Esta
concentração de poder gerou uma burocracia que não se sente compromissada com o cidadão que a sustenta e que
se caracteriza pelo formalismo, pelo ritualismo, pelo nepotismo, pelo clientelismo, pelo conservadorismo e pelo
corporativismo (...). Como conseqüência de sua colonização,
macro e microssistêmica. É difícil entender a articulação destes diferentes
aspectos, e a fortiori, sua possível hierarquização.
Diversos paradoxos, cruzados entre si, provocam perplexidades. A
formulação deles pode servir de suporte provisório a um primeiro dia-
gnóstico. Neste esforço de compreensão, pode ser tentador contentar-se
com discursos muitas vezes redutores. Em todo caso, pode-se constatar a
formação de todo um repertório discursivo, onde os debates abertos
encontram farto material de auto-alimentação.
o Brasil experimentou a situação "sul generis" de ler um Estado que precedeu a Nação". Conferência proferida pelo
Prof. Walirido S. dos Mares Guia Neto, em S. Paulo, no Congresso Brasileiro de Financiamento do Desenvolvimento
(ABDE).
PERPLEXIDADES
A crise por que passa a escola fundamental brasileira pode, de uma
certa perspectiva, ser compreendida como uma crise de confiança da
sociedade civil em sua escola (talvez este singular seja impróprio para
retratar a diversidade de situações), e, ao mesmo tempo e por conseguinte,
como uma crise de identidade entre os professores. O reforço mútuo destes
dois fenômenos tem efeitos consideráveis, que qualquer um pode medir
tanto em termos de eficácia do ensino quanto em termos de valores, cuja
instituição fundadora é a própria escola.
Observa-se, com freqüência", que, embora denunciada, a inade-
quação entre a formação do professor e as exigências do exercício de sua
função não são sempre acompanhadas de uma definição clara do perfil
profissional. Esta aporia se manifesta em muitas áreas de questionamento,
que acreditamos poder especificar provisoriamente.'
2
O que espera a sociedade brasileira de seus professôres?
13
* Vim fazer o curso de magistério porque não tive outra possibili-
11 Não está bem configurado o perfil do profissional em educação, tanto do lado do mercado de trabalho, como do lado
das agências formadoras (escolas) persistindo a velha tendência em manter indefinida e imprecisa a formação do
educador e, ao mesmo tempo, manter a inadequação entre sua formação e a função exercida". INEP Redefinição do
Curso de pedagogia. Campinas, UNICAMP/SP, 1980, P. 17-22.
12 Estes diferentes pontos remetem, de fato, para os eixos prioritários de ação definidos nas DIRETRIZES GERAIS
PARA A CAPACITAÇÃO DE PROFESSORES, DIRIGENTES, E ESPECIALISTAS DA EDUCAÇÃO BASICA,
MEC/SEF/Fundação Cesgranrio, Cadernos Educação Básica, vol. I, apresentação, p.l: "A questão do desempenho
dos profissionais de educação requer uma ação prioritária e coordenada do Ministério da Educação, em articulação
com os sistemas de ensino, abrangendo as estruturas e modalidades de formação, atualização, aperfeiçoamento, os
critérios de seleção e recrutamento, os padrões de remuneração e planos de carreira, assim como as condições de
trabalho do magistério".
13 "A educação obrigatória no Brasil não pode continuar tendo sua identidade diluída, ora como simples política de
proteção social, numa perspectiva assistencialista, ora apenas como processo de formação de consciência numa
perspectiva ideologizante, ora como uma vaga preparação para a vida sem objetivar o que seria essa preparação".
G.N.MELLO, Cidadania e competitividade. Desafios educacionais do terceiro milênio. CORTEZ, S. Paulo, p.6.
14 P. FREIRE, Professora Sim, Tia Não. Cartas a quem ousa ensinar. Editora Olho d'Água, S. Paulo, 1993, 3
o
carta,
p.47.
Crise de Identidade
Quem são os professores brasileiros? Qual é sua origem social e
cultural? Como foram eles formados e recrutados? Quais são suas pers-
pectivas de carreira?
As diversidades regionais são tais que é difícil estabelecer um perfil
que tenha alguma precisão, mas os fatos contradizem, por vezes, as idéias
que um estrangeiro está pronto para receber, já que ele não dispõe, de
imediato, de elementos (especialmente os estatísticos) necessários para a
compreensão
15
. Além do mais, o imbricamento das redes de ensino torna
particularmente difícil a coleta de dados precisos. A título de hipótese,
pode-se, contudo, supor que a crise de identidade dos professores
brasileiros procede de diversos fatores convergentes: a origem, o estatuto,
a sensação de pertencer a um grupo.
Não temos dúvida de que a noção de corpo - tão arraigada na
descrição do aparelho administrativo francês - é inadequada para se
compreender a identidade do professor brasileiro.
Proveniente de uma longa tradição, que incluiu conflitos ideológicos
e políticos, esta noção de corpo, aplicada aos agentes do serviço público
de ensino, permite, ainda hoje, uma compreensão dos fenômenos de
identidade social, ainda que esta venha sendo, no momento, fortemente
combatida em função das mudanças por que passa o sistema de
recrutamento de professores de ensino básico na França. Seria uma tolice
aplicar esta categoria ao magistério brasileiro, cuja origem, estatuto e
preocupações profissionais são particularmente diferenciadas.
Três fenômenos em especial revelam esta crise de identidade.
Crise do recrutamento
Em termos quantitativos, em muitos casos, a disjuntiva entre a
admissão de alunos nas estruturas de formação e o recrutamento efetivo
de quadros garantidos pelas coletividades responsáveis das escolas, leva a
deixar que vigorem as regras do mercado de trabalho. O aparelho de
15 BARRETO, A.M.F., Professores do Ensino de 1º Grau: quem são, onde estão e quanto ganham. In: Estudos
cm avaliação Educacional. Fundação Carlos Chagas, jan-jun 1991, pp.l I -43. Dados educacionais do Brasil por
região. MEC/SEF/DDE/CII-DI/1991.
formação (seja ele público ou privado) funciona, muitas vezes, ignorando as
necessidades de pessoal do sistema de ensino.
A falta de intervenção dos poderes públicos no ordenamento dos
fluxos de estudantes que se destinam à docência tem, pelo menos, dois
efeitos:
O primeiro efeito, quantitativo, diz respeito à constituição de uma
"reserva" de pessoal formado mas não contratado, o que tem conseqüên-
cias imediatas em termos de valorização da carreira. A freqüentemente
constatada ausência de instrumentos de uma gestão preventiva de em-
pregos não deixa de ter efeitos sobre o comportamento da política
educacional.
O segundo efeito, qualitativo, diz respeito à degeneração das
formações correspondentes, já que o caráter aleatório do próprio destino
profissional produz um desvirtuamento no espírito dos alunos que optaram
por esse caminho
16
. Este fenômeno dificilmente será corrigido pelos
dispositivos de formação contínua implantados nos diferentes níveis do
sistema de ensino. O cruzamento de responsabilidades dos diversos
poderes (níveis federal, estadual e municipal), de fato, não favorece a
definição de uma política conjunta.
Crises das estruturas
A gênese deste duplo efeito perverso, quantitativo e qualitativo, é
atribuído muitas vezes às disposições da Lei 5692/71. A transformação das
antigas escolas normais em "habilitação" de 2º grau
17
teve, com o tempo,
efeitos perversos
18
:
16 "Alguns anos atrás, convidado por um dos cursos de formação do magistério de S. Paulo para uma conversa
com as alunas, ouvi de várias delas a afirmação que dá titulo a esta carta, mas ouvi, também, muitas outras terem
optado pelo curso de formação do magistério, enquanto o faziam, esperar comodamente por um casamento". P.
FREIRE, op.cit.
17 A título de comparação, assinala-se que, a França, na mesma época, passou por uma restruturação de suas escolas
normais. Os estabelecimentos de ensino secundário que davam uma preparação aos candidatos ao magistério
primário para que concluíssem o ciclo médio, dando-lhes, em seguida, a formação pedagógica, as chamadas Escolas
Normais, sofreram transformação para tornarem-se estabelecimentos de formação, encarregados da formação
profissional de candidatos ao magistério primário, recrutados após a conclusão do ciclo médio. A orientação mantida
foi a de especificar o espaço de formação e de não banalizá-lo.
18 M.J. CAVALCANTE, CEFAM. Uma alternativa pedagógica para a formação do professor. CORTEZ, S. Paulo, 1994,
p.l9
- falta de identidade da formação dos professôres, que se torna
uma habilitação entre outras inteiramente diferentes;
- diluição dos conteúdos de formação, não respondendo nem a
uma formação geral adequada, nem a uma formação pedagógica
consistente;
- desvalorização do curso para o qual se orientam os alunos menos
capazes de seguirem cursos com mais prestígio.
Pode-se notar, numa primeira leitura, que se não era essa a intenção
do legislador (a intenção era a de dar um caráter profissionalizante à
formação dos professôres
19
), praticamente o novo dispositivo levou a anular
a especificidade do Ensino Normal (e, com isso, as referências ao ensino
primário) e a comprometer as finalidades do curso.
A implantação simultânea de uma habilitação de magistério no curso
de Pedagogia, dentro das estruturas de ensino superior, viria apenas a
reforçar esta diluição
20
.
A formação de professores, implodida nos estabelecimentos esco-
lares vocacionadas para o ensinoo necessariamente para a formação,
ou nas estruturas universitárias, desprovidas de tradição de interesse pelo
ensino primário, ficou sem um espaço próprio. Pode-se formular a hipótese
de que esta ausência de visibilidade não deixa de ter efeito sobre as
representações sociais da função do docente, função inconsistente já que,
de fato, rejeitada, devido à inexistência de uma instituição específica.
19 "Os antigos cursos normais, que formavam professores para o ensino primário não levavam suficientemente em conta
que, além de concorrerem para a cultura geral e a formação do professorado, deveriam ter um caráter
profissionalizante". Parecer CFE/349/72, citado por S.C PIMENTA. O estágio na Formação de Professores. CORTEZ,
S. Paulo, 1994, p.46.
20 "A organização, nas últimas décadas, dos cursos de formação como uma habilitação do ensino médio
profíssionalizante ou na estrutura departamental do ensino superior, no caso das licenciaturas, é apontada como uma
das causas de perda da especificidade e da formação docente". MEC, Cadernos Educação Básica, vol. I, Diretrizes
Gerais para Capacitação de professores da Educação Básica, SEF, Brasília. 1993. M.J.Cavalcante estabelece uma
correlação estreita entre a "proliferação dos cursos de habilitação para o magistério e sua descaracterização".
Crise dos Currículos
A parcialização e a ausência de articulação caracterizam, com
freqüência, os planos de formação, cuja falta de coesão sobre a duração é
reforçada por uma falta de coerência entre as diversas abordagens
propostas aos alunos em formação.
A repartição dos conteúdos de ensino durante os três anos de
formação da habilitação para o magistério de 2º grau levanta graves
problemas acerca dos fundamentos "culturais" da formação profissional
21
.
Com efeito, a redução significativa dos ensinos capazes de sustentar,
culturalmente, a ação pedagógica ao longo da formação, não leva em conta
as necessidades vinculadas ao nível de conhecimentos e de competências
dos alunos
22
.
Além do mais, a integração da dimensão "prática" da formação com
seus outros aspectos permanece problemática
23
, qualquer que seja o valor
dos dispositivos de formação experimentados nos CEFAM
24
.
Estes são os três fenômenos que chocam de imediato o observador
estrangeiro, na medida em que eles se interessam por setores chaves sobre
os quais, a priori, uma intervenção de caráter político ou pedagógico parece
possível. Esta perplexidade primeira deve ser, contudo, aprofundada por
uma reflexão menos imediata, de modo a compreender as razões, que são
outros paradoxos.
21 "Não-existência de integração adequada entre os conteúdos de educação geral e os conteúdos profissionalizantes e
destes entre si; falta de uma relação adequada entre as disciplinas e as respectivas cargas horárias; ausência de
estruturação dos estágios supervisionados, reforçam a dicotomia teoria-prática; e a prática de uma valorização
excessiva dos conteúdos instrumentais do 1º grau, em detrimento dos conteúdos de educação geral ministrados no
2ºgrau". M.j.CAVALCANTE, op.cit. p.23
22 Parece-nos interessante observar aqui os processos de avaliação-diagnóstico realizados em alguns estados do
Brasil, visando captar as "necessidades" (entendidas em termos de conhecimentos gerais), dos alunos que
ingressam nos cursos de Magistério. O procedimento seguido, em Pernambuco especialmente, é bastante revelador.
23 "A questão não é aumentar a prática em detrimento da teoria ou vice-versa; o problema consiste em adotarmos uma
nova forma de produzir conhecimento no interior dos cursos de formação do educador". FREITAS, L.C
Neotecnicismo e formação do educador,in ALVES, N. Formação de professores. Pensar e Fazer. S. Paulo, CORTEZ,
1992, p.96.
24 S.G.PIMENTA, O Estágio na Formação de Professores. M.|.CAVALCANTE, CEFAM, Uma alternativa pedagógica
para a formação do professor
PARADOXOS
A crise de identidade resulta de um conflito de identidade. A
identidade profissional dos docentes, no Brasil, talvez, mais nítida que na
França, aparece como uma montagem composta.. O recurso ao conceito
de "justificação" pode ser útil para se tentar desvendar um conjunto de
paradoxos que aparecem tanto na observação do sistema educativo quanto
na análise do complexo escola sociedade. Para reconstruir sua identidade
profissional, os docentes se encontram, hoje, numa situação de justificação
paradoxal.
1. O paradoxo das expectativas: Superestima e/ou
desvalorização
De tanto esperar pela escola, em termos de instrução, educação,
aculturação, socialização, a sociedade civil perde o sentido próprio da
escola. Assiste-se a uma diluição das funções tradicionais e a um des-
moronamento dos modelos antigos.
Qual é o lugar da escola nos equilíbrios sociais?
"O ensino no Brasil conhece, indubitavelmente, um momento de
crise. Isso se deve sobretudo a um conflito de identidade. Sufocada
por um verdadeiro acervo de funções, que vão desde o atendimento
nutricional até à busca de recursos para a manutenção física dos
estabelecimentos, a escola foi-se afastando, pouco a pouco, de seus
objetivos originais e relegou a um segundo plano sua função clássica,
que é, historicamente, a que justifica sua institucionalização.
Está longe o tempo em que a escola era um lugar destinado à
transmissão do saber, bem longe o tempo também em que se
aprendia a ler, a escrever e a contar"
25 A.M.CASASSANTA PEIXOTO, art. cit.
A título de ilustração, parece-nos possível reter, nos debates que
pudemos assistir, que três campos de reflexão esclarecem este primeiro
paradoxo, os quais, por sua vez, podem ser sintetizados em três conceitos:
"atenção integral", "necessidades básicas de aprendizado" e "gerência de
qualidade total".
A reflexão comprometida, que parte do conceito de atenção integral,
pode suscitar um debate fecundo para situar os diferentes riscos . Esta
idéia visa dar uma resposta nova (ainda que se possa descobrir sua
genealogia no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932),
em primeiro lugar, ao problema específico das condições da escolari-
zação, e em segundo lugar, ao problema institucional de desarticulação
dos serviços públicos. Educação, Saúde, Cultura e Lazeres são os eixos
principais que orientam a filosofia dos CAICs. É claro que uma
unificação de espaço não basta para se garantir uma unificação de
perspectiva. Como evitar que o espaço de novo criado não se estruture
para reproduzir as sedimentações tradicionais?
A clareza dos objetivos da política educacional e sua distribuição
entre os diversos atores constituem, também, preocupações para os
promotores do projeto. Uma pedagogia de "atenção integral à criança",
para ser implementada, pressupõe uma participação consciente e lúcida
dos professôres
27
; esta nova "profissionalidade", entretanto, ainda está por
ser construída.
• A satisfação das necessidades básicas de aprendizado pode ser con
siderada como um dos conceitos essenciais valorizados pela Decla
ração Mundial sobre a Educação para Todos(Conferência Mundial
sobre a Educação para Todos, Jomtien, 1990) . Não se deixou de
26 "Ao se formular e implementar um programa de atenção integral à criança, impõe-se uma discussão sobre o ponto
nodal de sua configuração, que é a educação escolar. (...) No momento em que os serviços como alimentação,
saúde, lazer e cultura apresentam-se referidos a um projeto educacional, desfaz-se a noção de atividades "supletivas
" ou acessórias. Nenhuma prática é supletiva se encarada como parte de um amplo objetivo pedagógico".
CAVALIERI A.M.V. Educação Escolar e Atenção Integral à Criança, in: Subsidios para uma proposta de atenção
integral ã criança em sua dimensão pedagógica. Cadernos de Educação Básica, MEC/SEF/SPEE, Brasília, 1994, p.8.
27 "Não é o caso de defender o enclausuramento da escola em sua função educativa, mas é o caso de repisar que, se
não realizar bem essa função, as outras não irão substituí-la". DEMO, P. Em torno da assim dita Atenção Integral, in:
Subsídios para uma proposta de atenção integral à criança em sua dimensão pedagógica. Cadernos de Educação
Básica, MEC/SEF/SPEE, Brasília, 1994, p.34.
28 Declaração Mundial sobre Educação para Todos - Satisfação das necessidades básicas de aprendizagem.
sublinhar que este conceito poderia constituir um eixo mestre na
orientação das políticas educacionais, considerando seu "caráter ob-
jetivo e articulador" .
A definição dos instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a
leitura, a escritura, a expressão oral, o cálculo e a resolução de
problemas), bem como a dos conteúdos de base de aprendizagem
(conhecimentos, habilidades, valores e comportamentos) permitem, com
efeito, estabelecer os parâmetros de qualidade do ensino. Esta
abordagem é contestada com veemência no discurso crítico que
denuncia seu caráter ideológico . Mas este eixo não é suficiente em si
para definir os aspectos de uma formação profissional. Qual é a função
do professor na escola?
• A exigência da qualidade no funcionamento do sistema de ensino é uma
idéia bastante comum hoje em dia. Tomar partido pela qualidade
representa, de uma certa maneira, colocar o usuário no centro do
sistema, responder às suas expectativas e antecipá-las, modular, adap-
tar o serviço. Em uma palavra, é substituir a lógica da demanda em
matéria de Educação e de formação pela da oferta. É aceitar, pois, a
construção de uma nova legitimidade da Escola, fundada sobre outras
bases, diferentes das da institucionalização. A irrupção desta lógica nova
na esfera da Educação tem dois importantes efeitos sociais: um esforço
de justificação do investimento educativo (por isso a importância dos
procedimentos de avaliação), um esforço de gestão dos recursos
humanos, aliando rigor e ambição, rigor para deslanchar uma dinâmica
de requalificação, ambição para garantir uma refundição da missão dos
professores. Assim, seria certamente lamentável reduzir esta exigência
qualitativa ao discurso muitas vezes economicista da Qualidade Total .
A identidade profissional dos professores é, em
29 DE MELLO, Guiomar Namo. Cidadania e Competitividade - Desafios educacionais do terceiro milênio. S. Paulo,
CORTEZ, 1993, p.36.
30 'Produzir e difundir o conhecimento favorável aos trabalhadores não está garantido pelas simples competências
técnica, cientifica c metodológica: é imprescindível a formação da consciência politica do educador para que o
conhecimento seja cientifica e tecnicamente organizado segundo os interesses da classe trabalhadora e sejam
apropriados os elementos do conhecimento elaborado que são de proveito dos trabalhadores e ainda para que sua
difusão se faça nesse sentido". JEFFERSON I. DA SILVA, Formação do Educador e educação politica, CORTEZ, S.
Paulo. 1991, p.69.
31 cf. Excelência na educação, o Desafio da Qualidade Total, Anais do 1º Fórum Internacional (set. 1993), Brasília,
1994.
muitos casos, uma montagem composta. Para se justificar plenamente,
um professor deve ser, ao mesmo tempo, um magistrado que aplica,
sem condescendências, um sistema de regras impessoais ditadas por
uma preocupação pelo interesse comum, um pai amoroso que conhece
e trata individualmente os problemas de cada um de seus alunos, um
especialista que executa todas as técnicas pedagógicas, que ensina
com eficácia e avalia com rigor, um artista inspirado, capaz de cativar
seu auditório, um especialista em comunicação, apto a dialogar com a
comunidade, um administrador de projeto. Deste inventário de funções,
da competência técnica à consciência política, surge a necessidade de
hierarquizar as prioridades, inscrevendo-as na coerência de um modelo
atualizado .
2. O paradoxo dos meios: economia da educação e/ou
educação da economia.
Todo mundo está convencido, hoje, de que a eficácia da escola não
é função linear de seu custo. Transpostos os limiares quantitativos
decisivos, constata-se, às vezes, fenômenos de queda tendencial dos
rendimentos do investimento educacional. Este dado modifica sensivel-
mente a percepção que se pode ter de certas medidas de melhoria do
funcionamento dos sistemas.
Mais exatamente, a construção de um campo novo de pesquisa em
economia da educação aparece como uma necessidade urgente. Com
efeito, os conceitos utilizados em matéria de gestão do sistema educacional
devem ser retomados numa perspectiva de um pensamento complexo,
para usar a expressão de Edgar Morin. Duas preocupações principais
podem ser sublinhadas: a questão da gestão, a necessidade de avaliação.
32 "A educação no Brasil sofreu, no longo de sua história, um perda de identidade, que reflete sua própria
crise de identidade cultural, c foi influenciada por fatores de ordem politica, social, econômica e pedagógica. Entre os
fatores de ordem pedagógica, é preciso ressaltar, como foi demonstrado neste artigo, a extrema dependência da
educação em relação às idéias e aos modelos estrangeiros. Assimilados de modo ingênuo, estes modelos - que não
foram repensados ou confrontados com a realidade brasileira e são estranhos às suas idiossincrasias -
transformaram a escola numa verdadeira "Torre de Babel", contribuindo para complicar ou mesmo impedir o
processo de transformação exigido pela educação no Brasil''. Ana Maria CASASSANTA PEIXOTO, art. cit.
Neste espírito, um Estado da Escola deveria poder juntar os dados
relativos tanto à eficácia do sistema quanto à sua eqüidade.
Para ficar na esfera da formação do pessoal docente, parece-nos
que uma abordagem clássica em termos de custos de funcionamento deve
ceder lugar a um raciocínio em termos de investimento
33
. A interpretação
dos indicadores de atividade (capacidade das estruturas de formação), de
custo e de resultados permitiria melhor compreender uma realidade de
extrema complexidade
34
. O que falta talvez por construir é uma economia
da educação para tirar a educação dos esquemas clássicos da economia.
3. O paradoxo da renovação: continuidade e descontinuidade
Uma opinião largamente difundida atribui às mudanças de orientação
política uma grande parte das dificuldades hoje encontradas na gestão do
sistema educacional. Não se pode deixar de constatar, apesar dos azares,
que existe uma notável continuidade na abordagem de inúmeros
problemas; pode-se indagar se a fragilidade de certas inovações não levou
à permanência de um quadro de referência não adaptado às condições
atuais.
De um certo modo caricatural, poder-se-ia dizer que, quanto mais se
constata a falta de adaptação ou a falência de modelos antigos, mais a
crise gera recursos nostálgicos. Em muitos países constata-se o surgi-
mento de um mito da idade de ouro dos sistemas de instrução, educação e
de formação. Eis porque as resistências à renovação podem conduzir a
uma confusão entre refundição e restauração.
33 "À medida em que a educação foi-se aproximando da questão do desenvolvimento, sobretudo daquele definida como
humano e sustentável, ela tomou ares de estratégia crucial e alcançou relevância econômica. Em primeiro lugar,
deixou de ser uma política apenas setorial. Em segundo, deixou de ser algo meramente social. Nas tradições das
políticas públicas, as mais insignificantes sempre foram aquelas ao mesmo tempo setoriais e sociais". P. DEMO, op.
cit.
34 "A expansão do sistema escolar no país e o conseqüente crescimento do quadro do magistério não se fizeram
acompanhar de um registro fidedigno da realidade existente. Nesse sentido, faz-se mister um mapeamento da
situação nacional". Relatório Final do Seminário sobre a formação de professores para a educação básica.
A Diretoria de Avaliação e Prospecção, do ministro francês da Educação Nacional, publica, regularmente, um certo
número de indicadores sobre o estado do sistema educativo. O diálogo, estabelecido entre o INEP brasileiro, no
quadro do SAEB, e a instituição francesa, é um aspecto essencial de nossa cooperação.
Tomemos como exemplo o atual debate sobre as "Escolas Normais".
Recuperação, revitalização, recriação, e tantos outros conceitos que
pretendem conotar esta abordagem
35
. Do mesmo modo, constata-se a
existência de fortes resistências para modificar o regime dos cursos de
Pedagogia nas faculdades de Educação ou as atuais licenciaturas
36
. Surge,
então, a questão sobre as condições de possibilidade de mudanças em
profundidade, quando existe, na verdade, a reafirmação da perenidade dos
modelos antigos
37
.
Parece-nos necessário um esforço para explicar estes paradoxos
para ir mais além de simples constatações. Neste espírito, uma "arqueolo-
gia" das representações pode ser útil para se tentar discernir quais são as
perspectivas. Nesta busca, várias abordagens seriam possíveis: uma,
fundada na História da Educação, nos levaria a retomar as análises agora
clássicas sobre a evolução das idéias pedagógicas, da Pedagogia liberal,
às idéias da Nova Educação e ao movimento liberal tecnicista. Uma análise
de caráter mais sociológico poderia ser outra opção. Foi esta a escolhida.
35 "No atual quadro educacional tão desolador, é compreensível que essa antiga escola normal se tome uma referência.
Tal fato demonstra que os educadores brasileiros não estão totalmente perdidos: dispor de uma tradição é um valor
cultural. Lembrar-se da antiga Escola Normal é referir-se a uma instituição séria, competente e, em parte vitoriosa.
Significa, ainda, valorizar um ensino básico público e de qualidade para todos. No entanto, não se pode esquecer que
o prestigio da antiga Escola Normal não decorria prontamente da formação do professor nem de seu engajamento no
magistério e sim do rigor dos estudos de cultura geral necessária à formação, distinção das moças bem nascidas da
sociedade tradicional (...). Considerarmos, em síntese, que o legado da antiga Escola Normal constitui, ainda boje, um
mito coletivo na memória dos educadores que, se por um lado, gera estímulos positivos, por outro, pode dificultar a
compreensão de nossa sociedade industrial e de sua escola". ESTER BUFFA, PAOLO NOSELLA. ANAIS DO III
CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE A FORMAÇÃO DE EDUCADORES. Texto gerador do grupo de
trabalho núm. 1: "Formação de professores de 1* a 4
a
série (Escola Normal e Pedagogia) UNESP, p.23
36 "Os encontros regionais para reformulação dos cursos de formação de educadoras iniciaram-se há dez anos. Nesse
período, mudanças podem ser percebidas, mas constata-se, igualmente, que grande parte das críticas feitas no inicio
dos anos 80 permanece até hoje. Por que isso acontece? Que forças, dentro e fora da Universidade permitem a
continuação de certas características das licenciaturas e do Curso de Pedagogia, que, ano após ano, contribuem para
a imagem negativa desses cursos?".). LEÃO FALCÃO FILHO. As licenciaturas e o Curso de Pedagogia:
Descaminhos e Caminhos. EDUCAÇÃO. Cadernos do Departamento de Educação da PUC/MG, maio 1994. p.7.
37 "A formação de professores para a educação infantil e para o ensino fundamental da 1' á 4
a
série será
progressivamente assumida pelos cursos de Pedagogia, mediante habilitação especifica; as instituições de formação
de professores cm nivel médio serão reestruturadas e fortalecidas nas localidades onde se fizerem necessárias".
Relatório final do Seminário sobre a formação de professores para a educação básica. Aqui anexada vai uma ficha
técnica proposta à Secretaria de Educação de Pernambuco, a título de estimulo; é preciso chamar a atenção para o
trabalho de pesquisa a que se dedica, atualmente, a Fundação Joaquim Nabuco, de Recife, que trata de interpretar
os referidos indicadores.
PARADIGMAS
Na busca deste agenciamento de mobilização profissional
38
, a
identidade do professor pode tomar como referência a combinação de
diversos modelos de competência social.
O modelo cívico
O modelo cívico funda a definição administrativa do funcionário.
Deriva, na área da educação, do vínculo político que Rousseau definiu no
Contrato Social. A importância das pessoas mede-se por sua capacidade
de se libertarem dos interesses particulares, locais, pessoais. A identidade
profissional constrói-se, portanto, nos espaços gerais, pelo menos
nacionais, ou mesmo universais. O pior defeito que se pode cometer neste
sistema de referência é o de fazer diferenciação entre as pessoas e de
ceder às pressões de amizade ou de relacionamentos locais
39
.
A mesma preocupação de ruptura presidiu a definição dos saberes:
os saberes da escola são saberes gerais, tanto mais respeitáveis quanto
mais formais e abstratos.
Este modelo repousa sobre um princípio de justificação da seleção
escolar. A finalidade da escola é a de liberar os homens - tanto no plano do
conhecimento quanto no plano das relações sociais - do jugo dos
preconceitos familiares e das servidões locais. O acesso a uma língua de
38 Em vez de tomarmos como referência as periodizações da História das idéias em educação, parece-nos mais
interessante lançarmos mão, aqui, de uma análise de caráter sociológico, visando à descrição de modelos de
competência social. BOLTANSKI (L.) e THEVENOT (L.) Les économies de Ia grandeur. Cahiers du Centre d'étude de
l'emploi n. 3, Paris, PUF, 1987. BOLTANSKI (L.) "Ia sociologie des professions", in: Encyclopédie philosophique,
Paris, PUF, 1989.
39 Este modelo foi execrado na França pela conjuntura histórica. No século XIX, especialmente após as leis Ferry, a
escola republicana foi colocada em xeque num lugarejo rural ainda fortemente dominado pela Igreja e por nobres
monarquistas. Emancipar o professor do controle do vigário foi o alvo de uma longa luta, que deixou traços na
centralização do sistema educacional. Era fundamental que a escola se beneficiasse de uma espécie de
extraterritorialidade em relação às pressões locais. Esta independência foi, pouco a pouco, incorporada à cultura
profissional dos professores.
cultura, a um conhecimento abstrato, a diplomas nacionais, permite a
entrada em um novo universo. Este acesso exige o sacrifício da singulari-
dade. O acesso a um espaço de mobilidade social, também livre das
pressões de nascença, custa esse preço. O modelo de democratização
meritocrática ou de elitismo republicano, herdado dos princípios da filosofia
das luzes e dos ideais da Revolução Francesa, constituiu-se numa fé
profunda entre os professores, inclusive, ao que me parece, entre os
brasileiros.
Esta crença viu-se brutalmente contestada quando os progressos da
sociologia colocaram em evidência a futilidade desta pretensão de arrancar
o indivíduo de seu meio, de sua família de sua origem social. As
desigualdades de origem dos alunos ficam ocultas e não superadas por
esta escola libertadora, que funciona, então, apesar dela, como uma escola
da reprodução
40
.
O modelo doméstico
A aporia do modelo cívico deu um novo vigor a uma concepção
doméstica da escola e da função docente. Neste caso, a justiça não
repousa sobre a aplicação impessoal de regras gerais, mas, pelo contrário,
sobre um conhecimento bastante pessoal dos indivíduos. A diferenciação
entre as pessoas, que é o maior pecado que se pode cometer no modelo
cívico, torna-se uma louvável consideração das dificuldades individuais,
segundo o modelo doméstico; a pedagogia consiste, então, em compensar,
por relações afetivas privilegiadas, um obstáculo que afasta o aluno da
escola.
Este modelo foi largamente utilizado pela Escola Nova. Completa-se
por uma certa hostilidade ao saber analítico, abstrato e sobretudo
disciplinar. Enquanto o ideal cívico repousa sobre uma ruptura - epis-
temológica? - entre os saberes do quotidiano e os da escola, a concepção
doméstica busca, pelo contrário, a continuidade. A noção central é a do
40 "Procedendo-se a uma análise das tentativas de reforma realizadas nos últimos 15 anos, verifíca-se que
elas se organizam em 2 grandes grupos: de um lado, posicionam-se os defensores da educação popular, e de outro
os defensores das propostas curriculares universalmente válidas, transcendendo interesses individuais ou de classe".
BARBOSA, I.G. O currículo da escola pública estadual de Minas Gerais: Referência histórica. Cadernos do
Departamento de Educação da PUC/MG, n. 1, maio 1994, BELO HORIZONTE.
interesse ou da motivação. Encontrando na escola os problemas que
encontra na vida quotidiana é o que leva os alunos a descobrir o gosto de
aprender e de trabalhar.
Esses aprendizados são, evidentemente, interdisciplinares, e a iden-
tidade do professor se constrói não em espaços gerais de disciplinas
universais, mas em situação, numa relação particular com um grupo de
crianças, e, no plano científico, com conhecimentos mais vastos do que
aprofundados.
Percebe-se as conseqüências que isso pode ter sobre as próprias
condições de recrutamento e de formação dos professores. Na concepção
cívica, o recrutamento está fundado no princípio de que o saber importa
mais do que a pessoa; na concepção doméstica, o conhecimento do
ambiente, a concordância da personalidade do professor com as particu-
laridades dos alunos e da escola contam mais do que suas competências
disciplinares.
Esta definição da função docente é, muitas vezes, apresentada como
uma das condições da democratização da escola. Ela não pode, contudo,
ser recebida sem cautelas (conviria fazer uma genealogia dela, buscando,
especialmente, no campo das idéias educacionais vigentes nos países
anglo-saxônicos).
O modelo ideológico
A sociologia crítica
41
, graças à atualização dos mecanismos de
reprodução social, suscitou o surgimento de um outro modelo de referência:
o educador como "intelectual orgânico"
42
. A alternativa: professor ou
educador (à qual se reportam tantos debates) está superada por uma
concepção que amplifica o caráter político da prática pedagógica e sublinha
sua dependência da praxis social, marcada pela luta hegemônica das
classes. Definindo, segundo a terminologia gramsciana, o
41 Essas teorias negavam o papel redentor da Educação, tão realçado pela Pedagogia Liberal c consideravam que as
mudanças da estrutura social é que deveriam preceder às mudanças educacionais. Este discurso crítico, que
permeou os movimentos educacionais, trazia implícita em sua argumentação a idéia que o curriculum baseado nas
aspirações das classes economicamente favorecidas não tinha condições de ser assimilado pelas classes mais
baixas, que eram levadas à repetência ou evasão. íris BARBOSA I. GOULART, op.cit.
42 A esse respeito, sublinhe-se a importância das referências aos trabalhos de Gramsci.
professor como um "intelectual dirigente", marcado pela consciência
politica, capaz de pensar o real de maneira crítica em vinculação com as
lutas políticas, este modelo busca articular de outro modo o político e o
pedagógico
43
.
Uma leitura resumida desta dialética pôde gerar "um reducionismo
sócio-político". Se o pedagogismo ignorante de seus ancoramentos políti-
cos levou o professor a uma forma de atrofia social, reduzindo sua função à
de um agente de manipulação, simples corrente de transmissão dos
processos de dependência, o lado político, por sua vez, sem o pedagógico,
priva o professor das ferramentas de sua ação. A compreensão das
relações entre a escola e o contexto político, social e econômico não é
suficiente para dar ao professor os meios de sua prática.
O modelo de empresa
Os estabelecimentos escolares estão sempre mais sendo conside-
rados como empresas. O sistema educacional não está isolado dos
grandes modelos de organização dos processos de produção e dos
procedimentos de administração. Não pode escapar, portanto, do ques-
tionamento provocado pelo profundo movimento de "destaylorização" que
se observa no mundo do trabalho. O sistema educacional não pode ficar
impermeável às inovações sociais. Os procedimentos de qualidade, a
administração por valores, o trabalho em grupos autônomos, as etapas de
projeto, bem como as pesquisas e experimentos, que permitiram a melhoria
da produtividade e a situação dos homens no trabalho. A prospeção tornou-
se uma obrigação em função das pressões econômicas.
Na esfera da educação, duas idéias novas vão-se impondo aos
poucos, nos dias de hoje: a idéia de gestão, ou seja a idéia de que,
havendo igualdade de meios, diferentes políticas podem ser perseguidas; a
idéia de avaliação, que sugere a substituição de normas e de controle de
conformidade pela avaliação dos efeitos
44
.
43 "A compreensão da educação profundamente inserida na sociedade concreta e por ela determinada, mostra que a
formação do educador precisa orientar-se no sentido do desenvolvimento da consciência politica participante da
consciência de classe. No contexto da sociedade capitalista antagonicamente dividida, essa consciência política e
essa consciência de classe estão necessariamente marcadas pela luta de classes, exigindo do educador uma
definição de classe em sua prática e em sua formação". Jefferson I. DA SILVA, Formação do Educador e Educação
Política. CORTEZ, S. Paulo, 1992, p.93
44 Os grandes eixos da política educacional implementados em Minas Gerais: autonomia da escola,
A escola está no centro de um debate social que retira dos profes-
sores seu universo profissional tradicional. A reivindicação atual de
profissionalização
45
corresponde à busca de uma nova justificação. É
legítimo que os professores queiram sair de um debate que os agride e
desestabiliza profundamente, onde são apresentados ainda como os
agentes inconscientes ou cúmplices da reprodução das desiguldades
sociais. Os professores devem, hoje, trabalhar na intersecção de vários
espaços de justificação, dotados de princípios, referências e instrumentos
diversificados.
Por tradição, eles deviam trabalhar num espaço de justificação
pública, cujas exigências e métodos eram conhecidos, ainda que profun-
damente desestabilizados hoje em dia. A classe constituía um outro espaço
de justificação, que nunca foi verdadeiramente codificado. Um "know-how"
profissional permite criá-lo a partir de intuições, de negociações não ditas. A
idéia de projeto de escola, a descentralização introduzem um novo espaço
de justificação a nível de estabelecimento e de seu contexto. Esta cena
local sempre existiu, sempre teve junto aos alunos e pais de alunos
reputação e críticas que circulavam, mas tratava-se de um mercado
clandestino, mal falado. Nada mais legítimo, hoje, que as comunidades
exijam informações sobres as instituições educacionais que eles financiam.
Fazer projetos, negociar, fazer acordos, impor sua imagem, ter êxito. Estas
tarefas novas precisam de parceiros da escola, e na escola, a tomada de
consciência de uma verdadeira mutação de suas funções. Trata-se, em
muitos casos, de passar dos jogos de poder para o exercício real do poder.
fortalecimento do papel da direção da escola, aperfeiçoamento e qualificação profissional, avaliação
externa, interações com os municipios, realçam esta abordagem. EDUCAÇÃO e DESENVOLVIMENTO.
Conferência proferida pelo Prof. Walirido S. dos Mares Guia Neto, em S. Paulo, no Congresso Brasileiro
de Financiamento do Desenvolvimento (ABDE).
45 Pode-se relatar aqui a anedota do professor que declara: "Quando vais ao médico, não lhe explicas como
deve ele le curar. Tenho a impressão de que cada pai que vem me ver tem, no bolso, um plano de reforma da
Educação Nacional".
PROFISSIONALIZAÇÃO
A pesquisa em educação de qualidade parece a muitos como uma
solução para os problemas educacionais. Hoje em dia, tomar o partido da
qualidade representa, a meu ver, colocar o usuário no centro do sistema,
responder às suas expectativas e antecipá-las, modulando e adaptando o
serviço. Em uma palavra, é substituir a lógica da nova legitimidade fundada
sobre outras bases que não a institucionalização.
A irrupção desta lógica nova na esfera da educação tem dois efeitos
sociais principais:
- um esforço de justificação do investimento educativo (daí a
importância dos procedimentos de avaliação);
- um esforço de gestão dos recursos humanos, aliando rigor e
ambição, rigor para deslanchar uma dinâmica de requalifi-cação,
ambição para assegurar uma refundição da missão dos
professores.
A formação de mestres, nos dias de hoje, é um risco e um desafio.
Um risco porque todo mundo está, hoje, convencido de que a
qualidade do ensino fundamental é uma parte essencial, tributária da
qualidade profissional dos professores; um desafio porque as soluções dos
problemas de diversas ordens, colocados pelo recrutamento, formação e
carreira dos mestres-escolas, são múltiplas e complexas, que exigem,
talvez, outras formas de pensamento.
A profissionalização impõe-se, doravante, como uma necessidade
tanto em termos de imagem do professor na sociedade civil, quanto em
termos de dinâmica de formação
46
.
46 "Impõem-se, a definição de uma politica que contenha diretrizes e ações para a profissionalização do
magistério no Brasil". Seminário sobre a formação de professores para a educação básica (Brasília, 3-5 de agosto de
1994) Relatório Final.
É nesta base que se pode construir um projeto de profissionalização
que abrange, necessariamente, duas dimensões:
- um desenvolvimento profissional objetivando a aquisição de
competências;
- uma socialização profissional com vistas à construção de uma
consciência do papel social.
A partir destas duas dimensões já se pode construir uma identidade
profissional.
Componentes de um projeto de profissionalização
A crise que conhece o sistema educacional brasileiro, bem como
inúmeros outros sistemas educacionais, pode ser analisada, entre outros
fatores, em termos de crise de identidade profissional dos professores. A
desvalorização constatada desta identidade não deixa de ter uma relação
com uma suposta desqualificação, relativamente às expectativas da
sociedade civil. A idéia de profissionalização responde à exigência
premente de um novo professor, que não seria mais o professor fun-
cionário, escassamente formado, escravo de um currículo detalhado,
submetido a uma regulamentação administrativa estreita. Ele seria um
verdadeiro profissional, mais autônomo em seu trabalho, em suas relações
com a hierarquia e ao estatuto, capaz de assumir uma autonomia maior que
será dada aos estabelecimentos, para melhor individualizar seu ensino e
adaptá-lo à sua clientela escolar. O desafio feito é o de dar uma tradução
política a esta aspiração. E o que sugere a idéia da profissionalização
47
,
como eixo diretor das políticas de formação.
A sociologia das profissões oferece esclarecimentos sugestivos a
esse respeito, e convém dela extrair algumas contribuições para mostrar
tudo o que o ensino pode aprender de uma analogia com as profissões
reconhecidas.
Uma concepção sociológica claramente evolucionista pode ser aqui
detectada, estabelecendo um continuum entre as ocupações primi-
47 Retomamos aqui alguns elementos da palestra feita em Brasília, em 06 de maio de 1993, por ocasião do
encontro nacional "A qualidade na formação dos professores: os componentes de um projeto de profissionalização".
tivas, os ofícios e as profissões. Nas primeiras, executa-se uma tarefa, com
certeza, socialmente útil, mas sobre uma base não remunerada e mal
reconhecida do ponto de vista social. Depois vieram os ofícios de tempo
integral, ocasião em que os serviços prestados recebem um maior reco-
nhecimento da sociedade, quando se admite que, para sua execução,
precisam não apenas de bom senso, mas também de saberes especiali-
zados menos difundidos. A aquisição desses saberes não se faz na
atividade mesma, pelo exercício do bom senso, mas pela aprendizagem
junto a um prático qualificado. Alguns deles chegaram a interessar-se mais
exatamente pelas causas e efeitos de sua prática e a se consagrarem à
acumulação do saber, que, ao se tornar independente, exige também uma
formação geral e profissional dos futuros praticantes em momentos e
lugares distintos do exercício profissional, escolas especiais, e depois,
universidades. Nesta evolução, estabelece-se uma tensão duradoura entre
a epistemologia dos praticantes e a dos universitários quanto à base de
conhecimentos e aos métodos mais apropriados para uma formação
profissional.
A busca de um consenso sobre a importância da teoria para a
prática, e sobre o lugar e objetivo da preparação prática, acompanha esta
evolução.
Caso se veja a atividade docente como uma arte ou um artesanato,
então pode-se considerar que ela procede de um aprendizado por imitação;
se ela é vista como uma ocupação técnica, é um aprendizado por aplicação
de regras adequadas. Se a atividade do docente é tida como uma
profissão, então seu aprendizado exige análise e utilização de saberes
científicos, hauridos na base de conhecimentos.
O atributo do Saber é determinante. O que caracteriza a profission-
alização de uma atividade é a passagem de um procedimento intuitivo para
um procedimento racional
48
. Um dos traços característicos desta evolução
poderia ser a passagem de uma conduta intuitiva e artesanal para uma
abordagem mais sistemática e mais racional com referência a
48 HUBERMAN A.M. "L'évolution de Ia formation américaine. Une analyse contextuelle de Ia tormation des
enseignants aux Etats Unis el quelques points de comparaison avec l'Europe francophone", in: DEBESSE, M.
MIALARET, G. - Traité des Sciences pédagogiques, Tomo 7: Fonction et formation des enseignants, Paris, PUF,
pp.315-340.
um quadro teórico de conjunto. Aplicado à esfera da atividade de ensino,
este dado suporia que o professor seja um diplomado de nível superior,
capaz de dominar saberes teóricos apoiados nas ciências humanas, que
estão na base de sua intervenção profissional. A universidade, lugar de
criação, de transmissão e de conservação dos saberes aparece como o
lugar natural desta profissionalização. Mas, na formação de professores,
como se evitar substituir ao empirismo um teoricismo sem prática?
Pode-se reter, como hipótese de trabalho, três atributos essenciais
nos comportamentos profissionais: a formação intelectual, a especialização
dos saberes e o ideal de serviço
49
. Estas três caraterísticas configuram uma
identidade profissional.
Profissionalizar a formação dos professores significa, evidentemente,
um processo de melhoria das capacidades e de racionalização dos saberes
praticados no exercício da profissão. Contudo, este processo não pode ir
sem uma melhoria coletiva do estatuto social da atividade, e, a nível de
indivíduo em formação, esta dinâmica supõe um procedimento de
socialização profissional
50
.
Dimensões da formação
Esta abordagem sugere a consideração de três dimensões funda-
mentais na formação dos professores: a dimensão cultural, a dimensão
técnico-pedagógica, a dimensão crítica
51
. Sua articulação pode ser con-
siderada como a pedra de sustentação de um dispositivo de formação que
visa à construção de uma profissionalidade global, na qual o de-
senvolvimento profissional, concebido em termos de saberes e de capaci-
49
) Inúmeros trabalhos procuraram depurar as Caracteristicas comuns, afastando-se dos estudos monográficos
de diferentes profissões. Pôde-se, então, obter como atributos essenciais nos comportamentos profissionais: uma
base aprofundada de conhecimentos gerais, uma preocupação prioritária de interesse geral, um grande domínio de
seu comportamento, graças a uma código de ética assimilado durante a especialização profissional, honorários que
constituem a retribuição de um serviço prestado e não a manifestação de um interesse pecuniário. Serviço c saber
aparecem como as características de base, tendo raízes históricas e epistemológicas profundas.
50 E nesta perspectiva que se inserem - ainda que com uma lógica diferente - dois documentos interessantes. O
primeiro, publicado em 1986, nos Estados Unidos, é o relatório "A Nation Prepared: Teachers for lhe 21 st Century",
encomendado pelo "The Camegie Fórum on Education and Economy". O segundo. publicado em 1989, na França, é
o relatório: "Créer une nouvelle dynamique de Ia formation des maitres", em resposta a uma exigência do Ministério
da Educação Nacional,
51 Esta pluridimensionalidade é o princípio organizador do projeto pedagógico do Instituto de Formação de Professores
"Presidente Kennedy", de Natal.
dades utilizadas no exercício profissional, é colocado em relação a uma
socialização profissional, compreendida como a adesão a valores e normas
(consciência profissional, exigência de eficácia, etc).
A dimensão cultural: o saber é uma das condições da liberdade.
Neste sentido, o professor deve ser preparado para sua função de me-
diador cultural, o que supõe que ele se aproprie dos referenciais acadêmi-
cos necessários, especialmente em sua dimensão patrimonial
52
.
A dimensão crítica: a abertura cultural é um dos fatores que pode
permitir ao professor a adaptação a ambientes sócio-culturais diferentes, a
compreendê-los e experimentar suas riquezas. Esta empatia cultural seria
insuficiente, mesmo complacente, se não estiver acompanhada de uma
lucidez sobre as condições de funcionamento da escola. A autonomia
pedagógica do professor deve estar, pois, acompanhada de uma exigência
de coerência, dito de outro modo, de acordo com a distinção feita por Max
Weber, a ética da convicção à qual a liberdade do professor se reporta,
deve estar regulada por uma ética da responsabilidade.
A dimensão técnico-pedagógica: a formação profissional do pro-
fessor, no que diz respeito aos saberes específicos que fundam sua
tecnicidade, pode ser concebida em referência a dois princípios: "a
obstinação didática e a tolerância pedagógica"
53
. A ação pedagógica é, ao
mesmo tempo, um esforço incessante de renovação para se inventar
dispositivos didáticos sempre mais eficazes na ordem das aprendizagens e,
ao mesmo tempo, a aceitação de que a organização didática mais
sofisticada sempre encontra um limite inevitável: a liberdade do sujeito
aprendiz.
A articulação destas três dimensões deve permitir que se evite, nos
currículos de formação, a justaposição dos conteúdos disciplinares e seu
corolário didático, as ciências da educação e os estágios
54
.
Importa constatar que, praticamente, os paradigmas clássicos da
formação (a prática profissional concebida como aplicação de saberes
52 LIBANEO, José Carlos. Democratização da escola pública. S. Paulo, Loyola, 1983.
53 Este princípios estão enunciados no livro LE CHOIX D'EDUQUER, publicado por Philippe Meirieu, ESF, Paris, 1992.
54 Estas observações retomam algumas reflexões propostas por ocasião de uma palestra feita no III Congresso Estadual
Paulista sobre a formação dos educadores, em Araraquara, em 25/05/94.
acadêmicos, ou inversamente, como efeito de uma modelização por
iniciação), não permitem um efetivo desenvolvimento profissional, e que
as práticas de formação permanecem, freqüentemente, prisioneiras de uma
dicotomia denunciada, mas dificilmente superada, entre teoria e prática
55
O modelo de aplicação supõe que a formação centrada na aquisição
de conteúdos acadêmicos pode levar a uma prática profissional graças às
transferências que ela sugere. O aspecto teórico da formação não é
incompatível com a finalidade prática, já que supõe que a prática é uma
aplicação dos esquemas teóricos. Esta transferência e esta aplicação
supõem, como corolários, uma adaptação pedagógica às realidades da
escola. Uma formação fundada sobre a justaposição das especialidades
exige, então, uma síntese prática garantida pelos estágios no meio
profissional
56
.
Este modelo, para ser funcional, supõe três condições: inicialmente,
que os alunos-professores sejam capazes de executar os diferentes
procedimentos que deles se espera (e que, muitas vezes, não estão
explicitados); em seguida, que os formadores estejam, de fato, em con-
dições de sugerir e de avaliar este procedimento; enfim, que a prática
pedagógica seja efetivamente uma conseqüência, um efeito, um resultado
de saberes exteriores. Ainda que haja comprovação da terceira condição, a
primeira é suficientemente problemática para tirar a confiabilidade do
modelo de aplicação. Quanto à segunda condição, ela é suficientemente
aleatória para enfraquecer a pertinência do modelo.
Esta fragilidade do modelo de aplicação implica que, repetidas
vezes, ele seja substituído por um modelo de iniciação que privilegia a
aquisição, pelo aluno-professor, de um "know-how" dependente de uma
relação de identificação com os "modelos" que incorporam a vocação para
serem mestres de aprendizagens. É sua versão "prática". Existe,
55 Observe-se que esta dicotomia «em, muitas vezes, um caráter genérico, que, de fato, encobre uma série de
oposições: geral / específico, acadêmico / profissional, disciplinar / didático, especializado / polivalente, abstrato /
concreto, discursivo / prático. A análise do funcionamento destas duplas nos esquemas de funcionamento
considerados na formação profissional dos mestres parece-nos revelador de uma "crise do modelo de aplicação".
56 GARRIDO PIMENTA Selma. O estágio na formação de professores. Unidade Teoria e Prática. S. Paulo, CORTEZ,
1994.
também, uma outra versão "teórica", onde o acento está na aquisição de
metodologias, não tendo estes métodos uma relação direta com os
conteúdos de ensino. Pode-se descobrir aqui a origem de uma formação
centrada numa abordagem muitas vezes psicopedagógica do ensino.
Este modelo de iniciação, aparentemente pragmático, tem o efeito de
congelar a prática num conjunto fechado de "know-how" mais ou menos
codificados, já que o ensino na escola elementar é tido como baseado no
ritual de procedimentos, senão codificados pelo menos validados pela
experiência não avaliada ou pela autoridade de um saber haurido nas
ciências da educação.
Os modelos da reprodução, classicamente subjacentes às práticas
de formação podem ser substituídos pelo modelo de mediação
57
, a partir
de uma valorização da experiência, que pode ser considerada como o
elemento motor da formação.
A variedade das interações e das operações que ocorrem numa sala
de aula pode impressionar um observador dasatento. O professor deve
dirigir sua aula, apresentar uma noção, suscitar questões e respondê-las,
reagir às interpelações, avaliar os progressos obtidos, vigiar pelo bom
funcionamento do material, intermediar conflitos, etc; o que choca no
contexto da sala de aula não é apenas a diversidade das tarefas a cumprir,
mas também o fato de que ele as deve executar simultaneamente.
Estas limitações específicas desenvolvem nos professores uma visão
individualista de seu trabalho e das preocupações mais de ordem
operacional (o como) do que de ordem conceituai (o porquê). Contudo, a
aquisição dos saberes profissionais implica, necessariamente, em con-
tribuições teóricas. Na formação, uma grande parte das dificuldades
provém das diferenças entre três contextos de referências, que são a
Universidade, a Escola e a Sala de aula. As diferenças destes três contextos
57 A operacionalização deste conceito é um dos riscos maiores da implantação dos projetos-piloto de formação de
professores iniciados nos estados do Rio Grande do Norte e de Minas Gerais. Observe-se que, para caracterizar a
nova proposta curricular para a Escola Pública Estadual de Minas Gerais, íris Barbosa Goulart recorreu a este
mesmo conceito de mediação. "Diversamente dos que atribuíram às escolas um papel redentor, considerando-a
capaz de promover a transformação social e dos que a consideram reprodutora da estrutura social vigente,
simplesmente consideramos que ela tem um papel de mediação. Partimos da constatação de que a escola é parte
inseparável da totalidade social e apresenta, internamente, as mesmas relações de mudança c de reprodução que
caracterizam aquela totalidade". Op.cit.
e a especificidade dos conhecimentos que eles mobilizam, explicam porque
a transferência dos conhecimentos de um para a outro seja tão
problemática.
O contexto universitário se caracteriza por sua linguagem espe-
cializada, divisão dos saberes em disciplinas reconhecidas, obrigação de
referenciar suas idéias às de outros pensadores, pela existência de normas
e práticas institucionais que vincula a autoridade intelectual à posição
hierárquica, bem como pela predominância do texto escrito. O contexto
universitário privilegia uma visão ampla do mundo, que exige o exame das
questões sob diferentes pontos de vista, mas que estimula pouco a
integração das contribuições teóricas a um pensamento pessoal. A am-
plidão dos estudos assume, muitas vezes, maior relevância do que a
preocupação em utilizar os conhecimentos adquiridos, o que em nada
ajuda, de fato, ao professor na sua prática profissional.
A forma de saber que predomina no contexto da escola diz respeito,
prioritariamente, à linguagem da política educativa. Os poderes públicos e
as comunidades esperam das escolas, sempre mais, a elaboração de um
projeto que defina sua política explícita. A vida da escola, a distribuição dos
recursos, exigem de todos os parceiros capacidade para a negociação.
O contexto da sala de aula difere, fundamentalmente, dos prece-
dentes, enquanto não valoriza nem o discurso nem a escrita. A conduta na
sala de aula supõe a interiorização de uma doutrina de ação, a capacidade
de enfrentar o imprevisto, a levar em conta a multiplicidade das variáveis de
situação, criando rotinas e automatismos, que permitam preservar o
esforço mental a um nível racional.
É nesta intersecção funcional que pode ser pensada a formação dos
professores.
QUESTIONAMENTOS
A questão das estratégias
A implantação das novas estruturas de formação pode surgir como
uma necessidade, em reposta a uma situação específica. Não basta em si
para modificar em profundidade um sistema. Contrariamente à ilusão de
uma política de tábula rasa, é preciso descobrir, nas identidades
profissionais e nas tradições culturais dentro do sistema educacional, as
estruturas e os valores capazes de constituírem-se em vetores de novas
evoluções. A modificação da paisagem institucional na formação dos
professores aparece aos olhos de inúmeros interlocutores como uma
prioridade. A conjunção dos fenômenos de crise poderia justificar es-
tratégias de ruptura. Isso seria fazer pouco caso daqueles fatores de
estabilidade presentes numa organização, as identidades profissionais dos
atores
58
. Desse ponto de vista, deve-se colocar a questão do lugar e da
parte da universidade como instância de formação dos professôres
59
.
A questão clássica da articulação teoria-prática exige superação para
dar lugar à problemática infinitamente mais rica do ancoramento no espaço
onde se elabora o saber (a universidade) e nos meios onde se exerce a
atividade profissional. Evitando o teoricismo e o empirismo, a formação
profissional dos professores clama, quem sabe, por uma nova topologia.
Em todo caso, sua visibilidade nos parece constituir uma das condições de
sua efetividade.
Diversas propostas já foram formuladas e discutidas
60
. Algumas
58 SANSALIEU, R. Sociologie de l'organisation et de l'entreprise. Presse de In Fond. Nal. des Sciences Politiques,
DALLOZ, Paris, 1987.
59 "A passagem para nivel superior não garante, mecanicamente, qualidade "superior", mas é condição importante,
inclusive de valorizão profissional. Tal passagem suporia, também, revisão do que entendemos, neste pais, por
formação superior, em termos curriculares". Pedro DEMO. Alguns desafios atuais de Formação de professores de
educação básica. SAE, Brasília, jul 1992.
60 "(...) a faculdade/centro de Educação 6 o local privilegiado de formação do profissional da educação, para todos os
níveis de ensino, em articulação com os institutos e com a Escola Normal. Isto nos conduzirá a pensar uma escola
única de formação do profissional da educação". ANFOPE, VI Encontro Nacional. Documento Final. Belo Horizonte,
julho de 1992, p.24.
formas alternativas de formação já se desenvolvem no Rio Grande do
Norte, Minas Gerais, Mato Grosso, Pernambuco, Alagoas e Rio de Janeiro.
Estas inovações, às quais pudemos associar-nos, têm características
específicas que se firmam nas diversidades da história e da geografia. O
traço comum entre elas é o de se desenvolverem numa dinâmica de
parceria
61
, e de levar em conta as identidades profissionais dos atores. Nos
diferentes Estados, que nos convidaram a participar de discussões abertas
para definir os eixos de uma política de formação de professores, pode-se
constatar uma notável convergência na problemática, ainda que as
disposições em perspectiva, ou já implementadas, sejam divergentes.
A questão dos lugares
No campo de complexidade das questões abertas, o espaço insti-
tucional é certamente um dos mais polêmicos. Sem entrar nos detalhes dos
debates, pode-se reter que três opções são perfeitamente possíveis (um
documento de trabalho do Mato Grosso resume-as com bastante clareza
62
):
- A "reconquista" do espaço pedagógico do Curso de Magistério de
2º Grau, a partir da requalificação de seu corpo docente, nos
"A formação de professores para as quatro séries iniciais da escolarização deve ser feita, no Estado de São Paulo, no
terceiro grau. A tendência histórica é essa. Contra essa tese levantam-se argumentos, a nosso ver, eivados de
saudosismo, populismo e corporativismo. Saudosismo da antiga Escola Normal, considerada uma escola de
qualidade. Populismo em relação aos desfavorecidos sociais, que não podem chegar ao terceiro grau e aos quais se
facilita a entrega de uma profissão - magistério da primeira à quarta séries -complexa e delicada. Corporativismo cego
que teme a perda de espaços profissionais, quando a perspectiva histórica é outra". ESTER BUFFA, PAOLO
NOSELLA. ANAIS DO III CONGRESSO PAULISTA SOBRE A FORMAÇÃO DE EDUCADORES. Texto gerador do
grupo de trabalho n. 1: "Formação de professores de 1ª a ª série" (Escola Normal e Pedagogia, UNESP, p.37.
61 A esse respeito, o Projeto de Política de Ensino e de Pesquisa do Instituto de Educação da Universidade
Federal de Mato Grosso pôde ser visto como uma proposta integrada, articulando o conjunto dos problemas
de formação.
"O Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Crosso, criado em 1992, abriu a perspectiva para um
melhor envolvimento e comprometimento da Universidade como os desafíos colocados pelas necessidades de
formação de educadores e produção de conhecimento educacional, que o Estado do Mato Crosso está para exigir.
Em articulação com o Governo do Estado e Prefeituras Municipais, a UFMT deverá desenvolver uma proposta de
médio e longo prazos, com vistas a contribuir para a formação, reciclagem e atualização dos docentes da rede
pública de 1º e 2ºgraus do Estado do MT". UFMT, setembro de 1993.
62 "A solução estaria na insistência do resgate do Curso de Magistério, através de investimento na formação
de seus docentes f Ou indicaria a necessidade histórica de se repensar o processo da formação do professor
para as séries iniciais em suas bases epistemológicas e pedagógicas, a nível do 3º grau? Ou ambas seriam
possíveis?" Licenciatura em pedagogia. Habilitações das Séries Iniciais. Proposta em construção
UFMT/SEE/UNEMAT/SMEs Mato Grosso.
Cursos de Pedagogia das Universidades.
- A implantação de uma formação específica de professores das
séries iniciais, a nível de 3
9
grau.
- Os dois processos, simultaneamente.
Cada uma das orientações tem suas justificativas e responde a
limitações fortes difíceis de se evitar
63
.
A questão subjacente diz respeito à própria existência de um espaço
específico, em nível superior, de formação de professôres, e a capacidade
dos atores em superarem as estruturas existentes. A reflexão que está
sendo feita em Minas Gerais, a esse respeito, é bastante reve-ladora das
dificuldades
64
. A questão consiste, portanto, em saber se os departamentos
ou os Centros de Educação das Universidades têm a vontade e os meios
de responder a este desafio, seja criando novos programas de formação,
seja refundindo as formações já existentes, seja participando como
parceiros ativos nos novos dispositivos
65
.
Para evitar possíveis impasses, certamente é preciso vincular a
questão institucional à questão econômica dos fluxos de recrutamento de
professores. Com efeito, em muitos casos, mais urgente que as
63 "Neste momento, é improrrogável uma revisão em dois sentidos:
- num primeiro momento, é necessário garantir a qualidade da formação de professores em nivel médio, já que em
muitas regiões, é este tipo de formação o único de que se dispõe para habilitar profissionais capazes de assegurar
educação básica para todos e elevar o nível cultural da população; além do Curso regular para o magistério de I
a
a 4
a
série, a escola normal deverá ocupar-se de cursos parcelados.
- num segundo momento, deve-se introduzir a formação para o Magistério nas primeiras séries em nível superior, o
que possibilitará o esperado salto qualitativo". Diretrizes para a formação de professores da rede pública em Minas
Gerais. SEE/MG.
64 "Não existe, devidamente institucionalizado, um curso superior destinado exclusivamente a formar professores para
este nível de ensino. Impõe-se a necessidade no Estado de Minas Gerais de implantar esses cursos, valendo-se,
para isso, da avaliação da experiência dos cursos de Pedagogia e da Escola Normal. Tal decisão tem, também, como
suposto, o redirecionamento do que deve constituir, hoje, formação superior, em termos de currículo, fundamentos e
didática referentes a processo e práticas pedagógicas. Um desafio a mais relaciona-se à necessidade de revisão de
cursos que, em nivel superior, vêm formando os profissionais de Educação, os quais nada têm a ver com a
modernidade; tanto os cursos de Pedagogia quanto as Licenciaturas estão estruturados com base em modelos já
ultrapassados". Diretrizes para a formação de professores da rede pública em Minas Gerais SEE/MG.
65 A discussão levantada dentro do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco testemunha as
dificuldades em superar certos modelos antigos. A questão colocada diz respeito à possibilidade de se construir "uma
proposta interdisciplinar experimental para realização do curso de formação de professores em exercício nas séries
iniciais, e para o magistério das disciplinas pedagógicas do curso normal" (UFPE/ Centro de Educação, Recife, jul
1994). Esta ambição revela toda a ambigüidade ligada a função específica do formador de professores.
necessidades de novos professores é a requalificação dos professores que
estão em exercício. Num primeiro momento - e aqui está o desafio - não é
tanto o detalhamento de novos dispositivos de formação inicial quanto é a
capacidade de garantir uma formação continuada qualificante. Uma
radiografia dos recursos humanos é uma prévia indispensável, se se quer
buscar uma articulação mais sistemática entre a oferta e a demanda
66
. Esta
aproximação tem uma dimensão qualitativa relativamente às exigências de
modernidade. Tem também uma dimensão quantitativa, se se quer levar em
consideração a demografia e a sociologia.
Em muitos casos, pode-se indagar se a estratégia possível não
consistiria, inicialmente, em abrir um espaço específico de formação e de
pesquisa, visando aos formadores destinados ao ensino de base, a nível de
pós-graduação, em relação com uma política de requalificação dos
professores, planejada para vários anos, tomando como apoio as estruturas
atuais com reformas. O debate institucional corre o risco de ficar sem saída,
se não levar em conta elementos de um planejamento
67
desse tipo.
A questão dos currículos
A reformulação dos planos de formação e de seus conteúdos deve,
evidentemente, acompanhar as modificações estruturais. Os "referenciais
de formação" que permitem definir os programas de formação não podem
ser concebidos senão em relação a um "referencial de emprego", este
mesmo fundado sobre uma análise das evoluções previsíveis da profissão
do professor. Só um sistema de referências constituído por valores
compartilhados dentro do sistema educacional pode ser o suporte de uma
tal referencial. É sob esta condição que a elaboração de um currículo
assume toda a sua significação
68
.
66 A pesquisa, atualmente conduzida pelo Instituto de Pesquisas Sociais da Fundação Joaquim Nabuco, de
Recife, partiu da constatação de que, de fato, mais da metade dos professores da rede do Estado de
Pernambuco já dispõem de formação superior. Este dado não é significativo quanto ao nível de profission-
alidade desses professores, mas sugere que se considere de outra forma as questões da formação inicial e
contínua desse pessoal.
Diagnóstico: A formação dos Professores do Pré-Escolar e da 1
a
a 4
a
série na escola de 1º grau de Pernambuco.
Recife, julho de 1994.
67 A criação do Instituto de Formação de Professores do Rio Grande do Norte, em relação com a Universidade Regional
do Rio Grande do Norte, responde a essa filosofia.
68 "É comum, em nosso país, apelar-se para uma reforma curricular, quando se trata de procurar a melhoria de
determinado curso. As várias experiências de reformas no curriculo do curso normal, assim como tem
Quais são os escolhos a evitar. De fato, a experiência mostra que
muitas ilusões podem estar funcionando
69
:
O saber da disciplina: eu sou "perito" em tal matéria e, por
conseguinte, sou perito na aplicação dessa matéria.
O saber didático: eu sou especialista em como fazer saber tal saber
disciplinar, por isso, eu posso deduzir o método (saber fazer) adequado
desse saber.
O saber das ciências da educação: eu sou capaz de compreender
como funciona a situação educativa, tanto de um ângulo quanto de outro,
sob esta ou aquela ótica. Posso, pois, explicar o método (o saber fazer), e
talvez mesmo dirigir este método com todo conhecimento de causa.
O saber da pesquisa: eu sei como fazer compreender por meio
deste ou daquele instrumento quantitativo ou qualitativo, e penso que este
fazer saber é um bom meio de descobrir o método (um pouco como se a
experiência se reduzisse à experimentação), sem levar em conta que o agir
do pedagogo é, ao mesmo tempo, o ponto de partida e o ponto de chegada
da evolução da pessoa em formação.
O saber do método (saber fazer): em minha sala faço a prova de
meu método; sou, portanto, qualificado para o fazer saber.
Cada um destes saberes tem sua legitimidade, mas nenhum isolada-
mente é suficiente para sustentar a construção de uma competência
pedagógica.
Sugerimos considerar que será útil e motivador para os mestres em
formação tudo o que suscitar para eles de experiência, seja um método
que cobre tudo, um saber do método (nesta situação, este procedimento
deve ser utiIizado), um saber a partir do saber fazer, um saber para o saber
fazer.
ocorrido em relação aos outros cursos, têm demonstrado, entretanto, a ineficácia dessa medida. Enquanto
se continuar a conceber o saber de maneira fragmentária, distribuído entre disciplinas isoladas, que
disputam ferrenhamente entre si bocados de tempo e de espaço na constelação curricular, o problema vai
continuar*. MENGA LÜDKE, Desafios para a formação do professor, dados de pesquisas recentes.
Educadores para o Século XXI, UNESP, CEPFE, 1990.
G9 HOUSSAYE Jean. L'insoutenable légèreté de l'être pédagogique. Les Cahiers Pédagogiques. Núm. 287.
Out. 1990, pp.50-51.
Os professores em formação não são "novos", inocentes ou despro-
vidos. A base da formação é um menu já existente de experiências
pessoais que não são ainda um saber ou um método, no início, mas que se
trata de fazer aparecer, em situação, por experiência, para que possam
tomar consciência deles e caminhar a partir deles. É por isso que a
pedagogia a ser implementada na formação dos professores é uma
pedagogia da aprendizagem e não uma pedagogia do ensino. Formar,
neste caso, é partir das questões do como fazer dos estudantes para fazer
a confrontação com sua vivência, e é acompanhar a constituição do
método, permitindo acompanhar o andamento de turmas, e de pesquisar os
elementos teóricos extraídos simplesmente das práticas pedagógicas antes
que dos saberes constituidos, para fundamentar sua trajetória °.
Esta orientação exige o detalhamento dos dispositivos de formação,
diversificados, operacionalizando o conceito de mediação numa nova
topologia
71
. Apela para uma capacidade dos formadores de negociar
demandas e necessidades de formação.
A questão do tempo
Talvez seja preciso lembrar que há um tempo para tudo e para cada
coisa. A formação invoca, imperativamente, tempos diferenciados e
personalizados, que levam em conta um itinerário profissional, que se
inevitavelmente o de cada indivíduo. Em que momento é legítimo tornar-se
um professor, de acordo com que periodicidade se deverá construir uma
formação permanente?
São questões que devem ser colocadas e que demandam uma
política de formação permanente.
Uma tal política deve levar em consideração o vínculo do exercício, a
escola como lugar pertinente da definição de necessidades de formação. A
formação não deveria mais ser um fim em si, mas um recurso
70 Esta orientação está muito próxima da que foi seguida pela Faculdade das ciências da Educação da Universidade de
Montréal (cf. a distinção entre o saber de experiência e o saber teórico).
71 O projeto pedagógico do instituto de formação dos professores do Rio Grande do Norte é, na nossa opinião, um
primeiro ensaio de resposta a esta exigência. Está construído sobre quatro eixos:
1 - O desempenho profissional: prática docente, revista e analisada. 2- Formação profissional: áreas de formação de
complementos de polivalência: projetos interdisciplinares, conteúdo crítico, com seminários abordando temas
geradores. 3- Formação polivalente: áreas de formação de conteúdos específicos. 4-Complementos de polivalência:
oferta de projetos interdisciplinares.
entre outros a serviço de um projeto de inovação escolar, conduzido por
uma pessoa, um equipe, uma comunidade. Existe, hoje, concordância em
reconhecer que uma estratégia de mudança dirigida aos professores,
tomados individualmente, é menos eficaz do que uma estratégia que se
dirige a uma equipe. Não se pode desconhecer que a introdução de uma
nova prática coloca em jogo processos de interdependências, de coalizões
efêmeras, de barganhas
2
.
As estratégias de formação individuais e coletivas aparecem como
complementares. Um dispositivo eficaz não se pode desenvolver de acordo
com uma opção estratégica única. Ao lado da formação de adaptação ou
requalificação ou da formação negociada em favor de equipes
pedagógicas, condutora de um projeto, uma terceira estratégia pode
encontrar lugar: trata-se da estratégia de colocação em rede e de apoio à
difusão de inovações. Em qualquer tempo, em todos lugares, os
professores sempre buscaram e encontraram ajuda junto a este ou aquele
colega, uma idéia, uma ajuda técnica, um material pedagógico. A idéia
central dos dispositivos de colocação em rede dos professores é a de
formalizar e de enriquecer este procedimento espontâneo.
A questão dos atores
A formação é um empreendimento demasiado sério para se aco-
modar em soluções simples. Há uma evidência, hoje, de que ela exige a
participação de atores com experiências e competências diferentes. O risco
da profissionalização é tanto o de profissionalizar os formadores quanto o
de fazer entrar os profissionais na formação. A redistribuição dos territórios
de competências, a construção de parcerias diversas, a extensão de
demarches contratuais, são alguns dos fatores que interferem e vão tornar
tudo mais complexo. Existem outras estratégias além da formação
presencial. A formação deve poder invocar o entendimento dos problemas
concretos, a capacidade de imaginação e de inovação dos indivíduos e dos
coletivos no trabalho e formas diversificadas de intervenção. Deste ponto
de vista, o que poderia ser desenvolvido é a idéia de sistemas de recursos,
como dispositivo de ajuda, mantendo os vínculos
72 HUBERMAN, M. "De l'innovation olaire el de son marchandage". Revue Européenne des Sciences sc
Sociales, XX, 63, 1982, pp.59-83.
"multiplexos" (muitos vínculos de diversos tipos - formais e informais - e em
diferentes níveis hierárquicos). A característica chave de um tal sistema
seria a de se colocar no lugar dos usuários e de registrar as mensagens de
"feedback" sobre a eficácia das soluções propostas até aqui
73
. Existe a
possibilidade de se criar um tecido social e profissionais ricos em
potencialidades.
Na dialética de oferta e de procura em matéria de formação de
professôres, as agências formadoras e as agências empregadoras são
colocadas diante da necessidade de religar outros tipos de relação. Duas
tendências podem permitir este diálogo: a emergência e o reconhecimento,
no espaço acadêmico, de uma função específica: a de formador de
professor, e no espaço escolar, de uma dinâmica nova em torno do projeto
de escola.
A formação dos professores no Brasil de hoje nos parece a con-
fluência de tendências contraditórias, que são também a ilustração de uma
mesma busca de qualidade, ou seja, de eqüidade. O discurso dominante
faz ampla referência às exigências da modernidade. No campo da
educação, esta evocação tem, pelo menos, três componentes:
O modernismo pedagógico sugere, com força, que os dados da
psicologia cognitiva podem trazer sensíveis melhorias no comportamento
dos processos de aprendizagem. O reforço dos conhecimentos e das
competências dos professores não pode senão confirmar a restauração de
uma imagem profissional, conferindo-lhe a consistência de uma
tecnicidade.
O modernismo tecnológico
74
sugere mutações no papel do professor,
a partir de uma instrumentalidade tecnológica.
O modernismo organizacional, como agenciamento ideológico, tem
quatro temas principais:
73 Parece que a idéia fundadora do Centro de Referência do professor, que deve ser inaugurado proximamente, em
Minas Gerais, está próxima deste conceito.
74 E a idéia fundadora, ao que parece, do Centro Tecnológico da Qualidade de Ensino no Estado do Rio de Janeiro.
- o desenvolvimento de estratégias de escolas e de políticas de
formação de pessoal articulado com essas estratégias dos esta-
belecimentos, a visão da escola como empresa;
- a gestão do pedagógico garantida a nível de escola com um
modelo didático, cujo centro é a idéia de diferenciação;
- a consideração dos aspectos organizacionais e metodológicos do
trabalho do aluno;
- a passagem de um modo artesanal do ofício de professor para um
modelo profissional de uma sociedade de serviço (transformação
dos métodos de formação, de controle e de avaliação).
CONCLUSÕES PROVISÓRIAS
As interrogações modernistas estão colocadas. Remeteriam estas
questões - como sendo conseqüências - às disfunções entre, de um lado,
estruturas "arcaicas", competências de "outra época", e de outro lado,
tarefas sociais e culturais que deveriam ser exercidas por um sistema
educacional adaptado às realidades e às necessidades do Brasil? Estas
questões não seriam o eco de um acerto que se busca e que acabará por
encontrar?
Ou ainda, ter-se-á de admitir que estas questões são como a
negação mágica das contradições sociais profundas, que separam os
grupos sociais na e sobre a instituição escolar, especialmente a nível de
escola básica?
ANEXOS
A GEOGRAFIA PA ESCOLA
FORMAÇÃO INICIAL
Estabelecer com o conjunto dos parceiros uma consulta-reflexão sobre a posse
do professor novato em suas respectivas áreas de competência.
FORMAÇÃO CONTINUADA
Fazer o inventário das experiências já conduzidas e
recensear os parceiros já comprometidos.
i
UM ESQUEMA PREVISIVO PAS FORMAÇÕES
i
FORMAÇÃO INICIAL:
Juntar os dados atuais sobre a formação inicial dos mestres e identificar os
parâmetros de análise
Implantação dos cursos:
- Fluxo de alunos
- Taxa de aprovação ao final da formação
- Taxa de recrutamento efetivo
- Efetivos de titulares do magistério não empregados
no ensino
- Qualificação dos professores responsáveis pelos
cursos de magistério
- Recursos documentários disponíveis nos esta-
belecimentos
- Existência de "estruturas de aplicação"
- Relações com um CEFAM
- Relações com os DERE
- Relações com OS REDE.
Construir os elementos de uma prospecção sobre
as necessidades de recrutamento do sistema:
- Taxa de renovação do corpo docente
- Necessidades de novos recrutamentos (rubricas
orçamentárias)
- (nível pré-escolar e ensino fundamental)
- cenários orçamentários:
- criação de novas turmas
- extensão dos horários quotidianos de esco-
larização
- ampliação da pré-escolarização.
Proceder a uma análise qualitativa do funcionamento do sistema de
formação, realçando os pontos fortes e os pontos fracos:
- em matéria de recursos humanos
- em matéria de funcionamento
Fazer um levantamento das iniciativas
realizadas nos últimos anos, ou em curso
i
Estabelecer um plano previsível de implantação das formações
i
Planejar o recrutamento e a formação dos formadores,
em relação com as estruturas universitárias.
i
Definir um modelo atualizado de formação inicial
FORMAÇÃO CONTINUADA
Coletar os dados atuais sobre a formação continuada dos
mestres e identificar os parâmetros de análise:
- Balanço da formação inicial
- Análise das necessidades
- Avaliação do funcionamento das escolas
- Programação orçamentária
- Programação das ações
- Implantação das ações
- Fluxo de estagiários
- Análise das demandas de formação, em função
dos projetos de escola
Proceder a uma análise qualitativa do funcionamento do sistema de
formação, realçando os pontos fortes e os pontos fracos
- em matéria de recursos humanos
- em matéria de funcionamento
Fazer um levantamento das iniciativas realizadas
nos últimos anos, ou em curso
i
Definir uma política de formação continuada
PROPOSTAS PARA UMA POLÍTICA
DE FORMAÇÃO PERMANENTE
DOS PROFESSORES DO ENSINO
FUNDAMENTAL
A. EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS:
As dificuldades que o desenvolvimento do sistema educacional
conhece, pedem respostas qualitativas. A capacitação dos professores é,
sem dúvida, uma das mais urgentes. Esta qualificação, entendida como
profissionalização de função docente, tem que ser formalizada num
dispositivo de formação permanente.
A formação permanente é, para todas as profissões, uma exigência
cultural, social, econômica, e, porque não dizer, política, considerando-se
as mudanças atuais.
A formação permanente é, hoje, mais que uma necessidade, uma
obrigação.
A formação permanente deve ligar uma formação inicial, preparando,
praticamente, os futuros professores para o efetivo exercício de suas
responsabilidades de instrução e educação, e uma formação continuada,
que garanta a melhoria das competências profissionais dos professores em
exercício.
As finalidades públicas da escola (formação do cidadão) justificam
uma política pública de formação. É da responsabilidade dos poderes
públicos definir as orientações e os meios desta política, que vise o
desenvolvimento da capacitação profissional dos profissionais do serviço
público da educação.
Desse princípio de unidade, que deve reger a definição das orien-
tações, não deve ser concluído, obrigatoriamente, uma homogeneidade das
agências, que tenham como missão a organização prática dessa política.
Ao contrário, a mobilização e a convergência de todas as competências
devem permitir encontrar respostas diferenciadas aos problemas da escola.
B. A FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES: QUAIS
SÃO OS PRINCÍPIOS?
1. A formação continuada é uma obrigação
1.1. para os poderes públicos responsáveis pelo sistema educativo; (a
concepção, o financiamento e a organização do dispositivo
coerente de formação continuada são elementos da política
educacional);
1.2. para os profissionais do serviço público;
(a participação, a formação continuada pode e deve fazer parte da
carga horária do estatuto).
2. A formação continuada dos professores é, simultaneamente, uma
formação cultural e uma formação pedagógica. A profissionalização
se constrói com articulação dessas duas funções indissociáveis
2.1. A formação cultural tem por objetivos:
- o aprofundamento dos conhecimentos de base para os pro-
fessores, no conjunto das disciplinas desenvolvidas na escola;
- a abertura sobre as problemáticas de uma sociedade em
evolução (aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos).
2.2. A formação pedagógica tem por objetivos:
- a confrontação das experiências profissionais dos professores
(dialética do ensino e da aprendizagem);
- a apropriação dos dados das pesquisas na área da didática;
- a construção de práticas pedagógicas, centradas sobre o
desenvolvimento das competências dos alunos;
- a pesquisa de ferramentas pedagógicas adequadas para asse-
gurar a diversificação das situações de aprendizagem.
3. A formação continuada articula duas lógicas:
3.1. Uma lógica de oferta de formação:
- em função do que é observado na sala de aula para as
instâncias de avaliação do sistema, ou do que é estimado
necessário para o professor em geral.
3.2. Uma lógica do pedido de formação.
- em relação ao dia-a-dia, as questões, as aspirações de cada
professor, enquanto indivíduo, e de cada escola, enquanto
comunidade educativa.
É papel da instituição a elaboração de uma articulação que implica
escolhas.
4. A formação continuada se inscreve na duração da instituição:
4.1. Ela é um dos aspectos da política educacional.
4.2. Ela leva em consideração o caminho pessoal e profissional dos
professores (notadamente as conseqüências da formação inicial e
as perspectivas de carreira).
4.3. Ela respeita as necessidades atuais do sistema educativo.
4.4. Ela integra dados de prospeção.
5. A formação continuada é objeto de planejamento e de gestão:
5.1. Ao nível científico e pedagógico.
5.2. Ao nível administrativo.
5.3. Ao nível organizacional.
6. A formação continuada usa de estratégias diversificadas:
6.1. Natureza, duração e implantação das ações.
6.2. Modalidades de trabalho e de avaliação;
6.3. Mobilização de competências diversas (na área teórica e também
prática).
C. ESQUEMA FUNCIONAL PARA UMA POLÍTICA DE
FORMAÇÃO CONTINUADA
Frente às novas demandas, que serão exercidas sobre os
professores, deve-se renovar os esforços na formação e
aperfeiçoamento docentes. Além das práticas, que se aplicam nos
distintos países, parece necessário complementá-las com outras
tais como: (a) fortalecer os centros de formação docente,
elevando o nível de seus formadores; (b) aproveitar as
capacidades dos institutos de formação docente para o
aperfeiçoamento; (c) estabelecer centros e mecanismos de
intercâmbio de informações sobre inovações em diferentes áreas;
(d) facilitar as instâncias de aprendizagem em oficinas e grupos
docentes; (e) desenvolver um aperfeiçoamento relacionado com
as necessidades pedagógicas em cada escola; (f) fortalecer as
capacidades de refletir sobre sua prática e processar as
informações obtidas; (g) enfatizar um aperfeiçoamento docente
fundamentado no critério de aprender a aprender; (h) capacitar o
docente para que desenvolva em sala de aula estratégias de
integração de crianças com necessidades especiais; (i) fomentar a
participação dos Ministérios nacionais e províncias (equivalente às
Secretarias Estaduais de Educação) na definição do perfil
profissional dos futuros docentes e promover a avaliação dos
centros de formação docente.
Recomendações da V Reunião do Comitê Regional
Intergovernamental do Projeto Principal da Educação,
América Latina e Caribe - PROMEDLAC V.
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