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DESCENTRALIZAÇÃO, POLÍTICA MUNICIPAL DE
EDUCAÇÃO E PARTICIPAÇÃO NO MUNICÍPIO DE
SÃO PAULO
Pedro Roberto Jacobi
Série Documental: Relatos de Pesquisa, n.15, mar./1994
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DIRETOR
Divonzir Arthur Gusso
COORDENADORA DE PESQUISA
Margarida Maria Sousa de Oliveira
COORDENADOR DE ADMINISTRAÇÃO Luís
Carlos Veloso
COORDENADOR DE ESTUDOS DE
POLÍTICAS PÚBLICAS Tancredo Maia
Filho
GERENTE DO PROGRAMA EDITORIAL
Arsênio Canísio Becker
SUBGERENTE DE DISSEMINAÇÃO E CIRCULAÇÃO Sueli
Macedo Silveira
GERENTE DO CENTRO DE INFORMAÇÕES
BIBLIOGRÁFICAS EM EDUCAÇÃO Gaetano Lo
Mônaco
RESPONSÁVEL EDITORIAL
Cleusa Maria Alves
REVISÃO
Cleusa Maria Alves
Gislene Caixeta
José Adelmo Guimarães
NORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
Maria Ângela T. Costa e Silva
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Celi
Rosalia Soares de melo Hermes
Oliveira Leão
DIGITAÇÃO
Edvar Machado Vasconcelos
APOIO GRÁFICO
Maria Madalena Argentino
Mirna Amariles Beraldo
Série Documental: Relatos de Pesquisa, n.15
Tiragem: 360 exemplares
INEP - Gerência do Programa Editorial
Campus da UnB, Acesso Sul
Asa Norte
70910-900 - Brasília - DF
Fone: (061) 347 8970
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DESCENTRALIZAÇÃO, POLÍTICA
MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E
PARTICIPAÇÃO NO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO
Pedro Roberto Jacobi (Coord.)
O artigo-síntese, exigência do convênio de finan-
ciamento de pesquisa nº 52/91, firmado entre o
INEP e a Universidade de São Paulo (USP), cuja
conclusão se deu em novembro de 1992, é de res-
ponsabilidade de seu coordenador. O relatório final
encontra-se à disposição, no INEP, para consultas in
loco. Os interessados em adquirir fotocópias poderão
solicitá-las à Coordenadoria de Pesquisa ou à Sub-
gerência de Disseminação e Circulação, deste Insti-
tuto, mediante pagamento.
Uma das funções institucionais do INEP consiste em prover e estimular a disseminação
e discussão de conhecimentos e informações sobre educação, visando a seu desenvolvimento e
domínio público, através de sua produção editorial.
Com o objetivo de contribuir para a democratização de parte desses conhecimentos, de
modo mais ágil e dinâmico, o INEP criou recentemente as Séries Documentais, com o mesmo
desenho de capa: elas formam um novo canal de comunicações, diversificado quanto a público,
temática e referenciação; abrangendo vários campos, elas podem alcançar, com tiragens
monitoradas, segmentos de público com maior presteza e focalização; cada série poderá captar
material em diferentes fontes (pesquisas em andamento ou concluídas, estudos de caso, papers de
pequena circulação, comunicações feitas em eventos técnico-científicos, textos estrangeiros de
difícil acesso, etc).
São as seguintes as séries:
1. Antecipações tem o objetivo de apresentar textos produzidos por pesquisadores
nacionais, cuja circulação está em fase inicial nos meios acadêmicos e técnicos.
2. Avaliação tem o objetivo de apresentar textos e estudos produzidos pela Gerência de
Avaliação.
3. Estudo de Políticas Públicas tem o objetivo de apresentar textos e documentos
relevantes para subsidiar a formulação de políticas da Educação.
4. Eventos tem o objetivo de publicar textos e conferências apresentados em eventos,
quando não se publicam seus anais.
5. Inovações tem o objetivo de apresentar textos produzidos pelo Centro de Referências
sobre Inovações e Experimentos Educacionais (CRIE).
6. Relatos de Pesquisa tem o objetivo de apresentar relatos de pesquisas financiadas
pelo INEP.
7. Traduções tem o objetivo de apresentar traduções de textos básicos sobre Educação
produzidos no exterior.
PARTICIPAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO ............................................................... 6
A GESTÃO DA EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO (1989-1992) ___ 8
A EXPERIÊNCIA PARTICIPATIVA PELA FALA DOS AGENTES ......................... 14
AVALIAÇÃO DA EXPERIÊNCIA E PRINCIPAIS DIFICULDADES ....................... 16
RESULTADOS DA IMPLANTAÇÃO DOS CONSELHOS ......................................... 19
ALGUMAS CONCLUSÕES............................................................................................. 20
REFENCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 21
PARTICIPAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO
A política educacional no Município de São
Paulo na gestão do Partido dos Trabalhadores
(PT) tem se orientado por quatro diretrizes que
configuram os parâmetros da ação ao longo do
período 1989-1992:
1) a democratização do acesso;
2) a democratização da gestão;
3) uma nova qualidade de ensino;
4) o movimento de alfabetização de jovens e
adultos.
Os três primeiros aspectos serão tema de
reflexão neste texto, na medida em que
integram aspectos que têm sido objeto de
debate permanente, como é o caso da
democratização da gestão e a potenciali-zação
dos espaços de participação.
A concepção de participação popular na
administração do Município de São Paulo
desde 1989 é parte componente de uma
estratégia de ampliação da sua base social e
política que fortalece uma forma de governar a
cidade introduzindo novos atores — a
população excluída e segregada da cidade —
no processo de gestão.
A formulação dos principais pressupostos desta
lógica de ação aponta para a concretização de
um novo patamar de cidadania centrada na
democratização do acesso à informação e no
estímulo à criação de canais democráticos
institucionais.
*Este texto é o resultado de trabalho de pesquisa realizada entre 1990 e
1991, tendo como pressuposto de reflexão por parte dos entrevistados
duas questões centrais: os alcances e limites da descentralização da
política de educação e a dimensão participativa, com especial ênfase
nos Conselhos de Escola.
Prévio à reflexão em torno do tema da par-
ticipação na gestão educacional no Município
de São Paulo na gestão Luiza Erundi-na,
abordaremos alguns aspectos gerais relativos à
participação citadina, enquanto elementos
explicativos para o processo em curso.
Um primeiro aspecto a ser formulado é o de que
os chamados à participação nem sempre
encontram o eco esperado e a resposta ativa da
população. Se bem a demanda participativa
pelo menos em estado latente existe, o fato é
que nem sempre o sistema político é capaz de
estimular sua expressão.
A participação é parte de um instrumental
político orientado para o desenvolvimento de
uma política municipal que se propõe
aproximar a administração dos cidadãos,
criando na medida do possível os meios para
uma interação mais intensa na complexa
dinâmica que a caracteriza.
Freqüentemente, tem sido confundida a noção
de descentralização com a de participação, o
que gera uma distorção conceituai. O tema da
descentralização do Estado, do fortalecimento e
do novo papel dos governos municipais vem
suscitando debates e pesquisas a partir da
necessidade que se coloca de avaliar os
resultados de experiências existentes em
diversos países.
A perspectiva das políticas da descentralização
aparece como um instrumento adequado para o
uso e a redistribuição mais eficiente dos
escassos recursos públicos e para reverter as
tendências globalizantes dos projetos de
planejamento. As interpretações mais correntes
em torno da descentralização a justificam como
a demanda e opção defendida para desbaratar as
obs-
truções autoritárias e burocráticas do Estado,
ampliando e diversificando os espaços para o
exercício dos direitos e liberdades civis, a
autonomia da gestão municipal, a participação,
o controle e a autogestão citadina no contexto
da vida cotidiana.
Das formulações teórico-conceituais em torno
da descentralização surgem elementos que
trazem à tona a produção de formas específicas
de relação entre a sociedade política e a
sociedade civil, entre as instituições centrais e
as administrações locais, determinando as
condições, a natureza e as formas de exercício
do poder local e do funcionamento de suas
esferas político-administrativas.
Nesta dimensão político-administrativa, surge
com mais visibilidade o componente de
participação social e o impacto de trans-
formações no plano territorial na vida coti-
diana.
Onde quer que se promova a descentralização
se invoca sua capacidade de gerar participação
social. A propagação em direção às bases de
poderes, competências, responsabilidades,
recursos financeiros e técnicos abre espaço para
a articulação, mais direta e democrática entre a
gestão pública das instituições do Estado e as
práticas de participação e organização citadina.
É importante ressaltar que quando se fala em
participação se explicita uma potencial ruptura
com a distância quase sempre existente entre o
poder centralizado e as realidades sociais
mutantes e heterogêneas que põem em
evidência os limites dos mecanismos existentes
formais, verticais, corporativos e clientelistas,
construídos para permitir a participação dos
cidadãos nos assuntos públicos.
Estes limites foram mostrados e transgredidos
pelos movimentos sociais e pelos novos atores
políticos que desafiam a tutela e lutam pela
reapropriação dos seus direitos, de suas
identidades territoriais e culturais, de suas
capacidades para intervir na construção de
novas formas de representação, organização e
cooperação com o objetivo de solucionar os
problemas e demandas e abrir canais para
diversas potencialidades e iniciativas das
coletividades locais.
Neste sentido é importante reforçar os
argumentos em torno do significado da
participação e dos seus alcances e limites.
Quando se fala em participação dos cidadãos
deve se enfatizar que se trata de uma forma de
intervenção na vida pública com uma
motivação social concreta que se exerce de
forma direta, e de um método de governo
baseado num certo nível de institucionalização
das relações Estado/sociedade (Jacobi, 1990).
Num contexto de crise econômico-social com o
que o Brasil enfrenta há vários anos e onde a
extrema urgência do atendimento das demandas
sociais se configuram numa multiplicidade de
fenômenos urbanos pautados pela dinâmica de
exclusão, a participação deve surgir num
constante processo de interação entre Estado e
cidadãos. O rol da administração é de se
configurar enquanto uma efetiva potencia-
lizadora de ampliação das práticas comunitárias
através do estabelecimento de um conjunto de
mecanismos institucionais que reconheçam os
direitos dos cidadãos.
A participação requer também que se estabeleça
um conjunto de mecanismos institucionais e
que se reconheçam alguns direitos realmente
exercitáveis. Referimo-nos no
caso ao conteúdo formal, político-jurídico da
participação.
É necessário,, entrentanto, que da sociedade
civil surjam interlocutores coletivos — grupos
comunitários, movimentos sociais — que
tornem possível uma participação ativa e
representativa sem que o Estado exija
quaisquer tipos de dependência administrativa
e, rompendo, portanto, com os procedimentos
autoritários, populistas ou cli-entelistas (Jacobi,
1990).
Os segmentos populares são os que mais
necessitam da institucionalização da parti-
cipação na medida em que o direito se
configura como o poder dos pobres e a
possibilidade de benefícios para os que sofrem
desigualdades.
A importância do desenvolvimento da par-
ticipação direta reside principalmente na
potencial incorporação de grupos sociais e de
valores sócio-culturais diferentes dos que
prevalecem nos organismos públicos.
Entretanto, não se devem desconsiderar as
contradições que podem surgir no processo,
seja quanto à formação de um duplo poder, seja
quanto às interferências da administração, seja
quanto ao controle de instâncias decisórias
pelos grupos mais ativos e consolidados, em
detrimento dos setores mais excluídos e que
encontram nos mecanismos de participação
direta uma primeira forma de reconhecimento
dos seus interesses.
A participação configura a possibilidade dos
cidadãos representarem um papel relevante no
processo de dinamização da sociedade, assim
como de exercício de um controle mais
permanente e consistente da coisa pública pelos
usuários, sustentado pelo acesso à informação
sobre o funcionamento do governo da cidade.
Um dos maiores desafios é o de propor al-
ternativas às práticas de gestão em que o peso
da participação popular atue como referencial e
fator de questionamento da recorrência dos
vícios da administração pública relacionados
com a questão dos recursos humanos. O que se
observa é que a implementação de propostas de
participação, com algumas exceções, tem
esbarrado numa somatória de entraves, entre os
quais se destacam a falta de agilidade nas
decisões, o pouco compromisso do corpo de
funcionários e, principalmente, a ausência de
critérios de representação e canais adminis-
trativos que garantam o suporte institucional à
interação com os grupos mais organizados e
com os movimentos populares (Jacobi, 1990).
A GESTÃO DA EDUCAÇÃO DO MUNI-
CÍPIO DE SÃO PAULO (1989-1992)
A disposição de incentivar a participação junto
à administração da Prefeitura do Município de
São Paulo desde janeiro de 1989 tem
representado um grande desafio em virtude da
complexidade e diversidade que caracterizam
este contexto sócio-político.
Desde a chegada do PT à frente da admi-
nistração municipal gerou-se um intenso
conjunto de inquetações e expectativas em
todos os estratos sociais, mas que se manifestou
de forma mais intensa nos setores que
respaldaram a eleição da prefeita Luiza
Erundina como representante de uma proposta
democrática e popular.
O marco de referência deste processo está dado
pela enorme distância sócio-econômi-ca entre
as classes sociais, o vazio de instituições sociais
e políticas, os problemas de representação
política e a necessidade de
avanços, não só no plano de democratização
das relações sociais, mas principalmente na
consolidação da cidadania social.
O grande desafio que se colocava desde o
início da gestão era o de administrar uma
cidade de mais de 10 milhões de habitantes,
tendo como objetivo a democratização da
administração municipal, a ruptura com os
velhos padrões de se fazer política e a inovação
da dinâmica político-administrativa.
A concepção de participação popular na
administração Luiza Erundina é parte com-
ponente de uma estratégia de ampliação de sua
base social e política que visa a fortalecer uma
forma de governar a cidade introduzindo novos
atores — identificando-se com a população
excluída e segregada da cidade no processo de
gestão (Jacobi, 1991).
Neste contexto, a experiência da Secretaria
Municipal de Educação se configura como um
fértil espaço do desafio de inovar no processo
de gestão.
A Prefeitura dispõe de um terço do total de
escolas públicas existentes na cidade para
atendimento no ensino fundamental. Também é
responsável pelo atendimento de 96% das
crianças em escola pública infantil no
município.
A rede municipal conta, em 1992, com 676
escolas e um total de 710.348 alunos matri-
culados, numa média de 34 alunos por classe.
Isto representa com relação a 1988 quando
havia 611.622 alunos matriculados um
acréscimo de mais de 16%.
Na cidade de São Paulo estão fora da escola
cerca de 350.000 crianças de 7 a 14 anos e
aproximadamente 518.000 crianças de 4 a 6
anos.
O que se observa é que apesar dos esforços
desenvolvidos com um crescimento efetivo do
número de matrículas entre 1989 e 1991 tem
aumentado a difereça entre a demanda real e o
atendimento efetivo, tanto no ensino pré-
escolar quanto no fundamental.
Cabem aqui algumas observações que con-
textualizam as dificuldades encontradas para se
adequar a oferta à demanda.
Em primeiro lugar, recebeu-se uma herança
perversa da administração Jânio Quadros em
todos os setores e notadamente na área de
educação. Ao iniciar-se a atual administração
encontrou-se 60% dos equipamentos em
condições de grande degradação e precaríssima
manutenção o que configura a existência de
condições de funcionamento inadequadas ao
trabalho pedagógico.
As transformações ocorrem principalmente pela
expansão de vagas conseguida através de
reformas e construções e do uso intensivo dos
prédios. Mas mesmo estas iniciativas não têm
sido suficientes para responder ao aumento da
demanda por vagas na escola pública,
resultante da pressão de setores que vêm
vivenciando uma crescente perda do poder
aquisitivo, em virtude da recessão econômica e
que até então colocavam seus filhos em escolas
privadas.
Na cidade de São Paulo são atendidos na faixa
etária de 7 a 19 anos 1.832.970 alunos,
representando 86,9%/ da taxa de atendimento
pelas três redes.
A rede municipal participa com 25,1% das
crianças e jovens matriculados enquanto a rede
estadual atinge 57,3% do total.
Quanto à Educação Infantil a taxa de aten-
dimento das três redes é de 32,7%. Tem-se
um total de 252.022 crianças matriculadas em
escolas estaduais, municipais e particulares
para uma população estimada de 771.003
crianças de 4 a 6 anos. A participação da rede
municipal é de 21% dos matriculados.
A atual gestão tem obtido uma queda dos
índices de evasão e reprovação. O índice de
reprovação no primeiro grau que em 1988 era
de 22,55% cai para 12,30% em 1991. Da
mesma forma o índice de evasão que era de 6%
em 1988 baixa para 5% em 1991.
Até janeiro de 1992, a Secretaria Municipal de
Educação concluiu 150 reformas e 56
construções de prédios escolares. Este número é
bastante reduzido diante das necessidades
apontadas pelos Núcleos de Ação Educativas
que representam a dimensão descentralizada e
territorializada de gestão. A estimativa é de que
existe uma necessidade de mais 350
construções, 234 reformas e 33 ampliações.
A ampliação do atendimento à demanda pelo lº
grau, regular e supletivo vem ocorrendo a partir
da criação de novas vagas, o que está
diretamente relacionado com a concretização de
novas construções e ampliações e da utilização,
na medida do possível, de espaços em prédios
municipais ou da comunidade.
O uso intensivo dos prédios escolares tem sido
um dos expedientes (enquanto medida
emergêncial) de atendimento à demanda, sendo
que apenas um pequeno percentual das 676
escolas municipais não utilizam o 4
a
período.
Ocorrem situações onde até mesmo EMEIs
cujo mobiliário é inadequado para maiores, tem
sido ocupado no noturno para classes de
Educação de Adul-
tos. Existem, entretanto, resistências em
algumas regiões quanto à utilização do prédio
das escolas à noite, alegando-se falta de
segurança e de pessoal no curso noturno.
A melhora no nível de manutenção tem ga-
rantido a possibilidade de oferecer um número
crescente de vagas e além disso têm sido
desenvolvidas ações visando a atenuar e
prevenir as depredações dos prédios. As ações
têm sido desenvolvidas estimulando a
participação efetiva das comunidades das
regiões mais afetadas no processo de reforma,
projeto e execução das obras e o estímulo à
utilização do período de reforma como um
momento educativo, transformando os
eventuais transtornos dessa época numa ação
integradora.
A reorganização administrativa da Secretaria
Municipal de Educação, a partir de 1989, tinha
como o pressuposto que a melhoria do ensino
público municipal passava por mudanças na
relação inter-escola e es-cola-população,
notadamente pela democratização da gestão
acompanhada por um estímulo à participação
numa perspectiva de criar instâncias de
decisões locais e regionais. Criam-se também
conselhos e instituem-se fóruns que expressam
as diferentes tendências da sociedade civil.
A reestruturação cria três colegiados de caráter
deliberativo — Central, Intermediário e Local
— que correspondem aos níveis de decisão
existentes na estrutura da Secretaria.
O Colegiado Central reúne os representantes do
gabinete e os representantes do Colegiado
Intermediário que se compõe do representante
da Coordenadoria dos Núcleos de Ação
Educativa (CONAE) e dos
representantes dos Núcleos de Ação Educativa
(NAEs), além de um membro da Assessoria
Técnica de Planejamento (ATP) que pertence
ao Gabinete.
A transformação das antigas Delegacias de
Ensino em Núcleos de Ação Educativa (NAE)
é um dos alicerces da proposta de
descentralização desenvolvida pela Secretaria
Municipal de Educação de uma nova proposta
pedagógica, permitindo uma relação mais
direta com a Sociedade Civil.
As Delegacias de Ensino atuavam funda-
mentalmente como órgãos de fiscalização
enquanto os Núcleos de Ação Educativa são
pautados numa concepção de ampliar o nível
de autonomia das escolas a partir de uma
dinâmica regionalizada. Os NAEs funcionam
como unidades de apoio em cada uma das 10
regiões cumprindo basicamente duas funções:
uma primeira relacionada com as orientações
vinculadas às práticas e aos conceitos
pedagógicos e uma segunda relacionada com a
dimensão vinculada com a democratização de
acesso à informação das deliberações referentes
ao universo educacional e comunitários a elas
circunscrito. Mas, além disso, os NAEs
também têm como função acompanhar,
controlar e avaliar o desenvolvimento das
atividades e do cotidiano da escola numa
concepção interativa. As transformações
implantadas têm gerado repercussões dife-
renciadas, uma vez que certas questões, como é
o caso da Supervisão, não estão
suficientemente equacionadas.
O que representa a inovação dos NAEs é o fato
de atuarem como unidades de apoio
pedagógico numa perspectiva regionalizada e
participativa representada pela existência dos
Colegiados de Representantes de Conselho de
Escola (CRECEs). Este
canal de participação é proposto tendo como
objetivo que a base, ou seja, os Conselhos de
Escola passem a desenvolver uma ação mais
interativa e eficaz com os colegiados
Intermediários e Central.
Em nível de unidade escolar foi criado o
Conselho de Escola que reúne representantes
dos pais, alunos e educadores em cada unidade
escolar e representa, segundo os responsáveis
pela gestão em nível municipal, a base da
proposta de gestão democrática. O objetivo é a
sua plena consolidação enquanto órgãos
deliberativos e o crescimento do seu poder de
decisão sobre as questões estruturais e
pedagógicas das escolas. Em 1991 quase todas
as escolas da rede municipal de ensino já
possuíam seus conselhos, eleitos no início do
ano, representando um contigente de mais de
9.000 pessoas que se reúnem periodicamente
nas escolas das 10 NAEs do município para de-
bater os problemas das suas escolas.
Tem-se então três níveis de decisão, o local que
corresponde à unidade escolar: o regional, que
congrega os dez Núcleos de Ação Educativa, a
Coordenadoria dos Núcleos (CONAE) e a
Diretoria de Orientação Técnica. Este segundo
nível estrutural de decisão constitui o Colegiado
Intermediário e o terceiro nível da estrutura, o
Central, que reúne o Gabinete da Secretaria, a
Assessoria Técnica e de Planejamento e a
Coordenadoria dos Núcleos de Ação Educativa.
A cada um desses níveis estruturais corres-
ponde um Conselho. Em nível de unidade
escolar, o Conselho de Escola; em nível dos
NAEs/CONAE, os CRECEs: e em nível
central, o Conselho Municipal de Educação
que, previsto no Artigo 200 da Lei Orgânica
Municipal, terá um caráter deliberativo.
A materialização desta política de demo-
cratização da gestão está consubstanciada em
três princípios básicos (participação,
descentralização e autonomia) e o desafio
fundamental está sendo o de reorganizar a
dinâmica de atuação do poder público, o que
está explicitado na proposta de Reforma
Administrativa e Descentralização enviada pelo
Executivo ao Legislativo em maio de 1991.
Trata-se de uma nova organização da cidade,
um processo de regionalização política da
cidade baseado na territoriali-zação do governo
em subprefeituras, possibilitando aproximar o
processo decisório da população e encurtar os
circuitos de demanda, negociação e decisão por
implantação das ações governamentais.
Dentro desta dinâmica de reorganização
territorial/administrativa e decisória, a Secre-
taria Municipal de Educação cria desde 1991
em cada NAE uma unidade orçamentária.
Através dessa medida de descentralização,
leva-se para mais próximo das escolas parte da
autonomia financeira. Os NAEs passam a
receber verbas próprias, obtendo mais
condições e recursos para implantar e
desenvolver os projetos das escolas. O aumento
da autonomia financeira das escolas representa
a possibilidade de apropriação de uma quantia
de recursos para agilizar a solução de pequenos
problemas de manutenção dos prédios sem
depender de instâncias burocráticas. Apesar
dos avanços, a avaliação da Secretaria é de que
ainda não se atingiu um nível satisfatório de
socialização das informações, o que faz com
que freqüentemente as verbas sejam geridas
sem muita deliberação nos conselhos de
escolas.
O que está por trás desta dinâmica é um
redimensionamento das atribuições e uma nova
concepção de planejamento visando a ampliar a
autonomia das escolas.
A democratização da gestão educacional,
conforme já foi anteriormente enfatizado, está
centrada na consolidação do papel aglutinador
dos conselhos de escolas e dos conselhos
regionais dos conselhos de escolas como
unidades deliberativas e corres-ponsáveis pela
definição das ações educativas e da política
educacional no município. A partir do
reconhecimento das necessidades dos conselhos
de escolas são definidas as diretrizes de
planejamento.
Existe uma definição prévia de algumas etapas
que configuram a dinâmica de ação. Um
primeiro momento é o reconhecimento e a
consulta em torno das necessidades: discussão e
deliberação sobre as prioridades que se
traduzem em propostas orçamentárias e a partir
do Plano de Escola que cada Núcleo de Ação
Educativa e cada Colegiado de Representantes
de Conselho de Escola estruturam, definem um
Plano Regional de Educação. Ao Órgão Central
e ao Conselho Municipal compete a definição
do Plano Municipal que resultará da
sistematização das propostas e formulações
apresentadas nos Planos Regionais.
Assim, observa-se que ao definir a unidade
escolar como centro de um processo que
desencadeia um conjunto de articulações e
decisões colegiadas, a Secretaria Municipal de
Educação estabelece um processo interativo
entre dois pólos: num pólo as propostas
definidas nos Conselhos de Escolas (CE) e
priorizadas em fóruns entre as regiões, no outro
as propostas dos NAEs em termos de diretrizes.
A concepção presente na proposta acata a
lógica de ação de base para cima, reforçando os
Conselhos de Escola, como instâncias de
organização coletiva da escola. Nestes
Conselhos, através de seus representantes,
toda a comunidade escolar tem garantida a
possibilidade de tomar decisões relativas às
prioridades político-educacionais e
administrativas da escola no marco das
diretrizes da Secretaria Municipal de Educação.
Estas prioridades estão registradas nos Planos
das escolas e compatibilizadas nos Colegiados
de Representantes de Conselho de Escola
(CRECEs), tendo como objetivo traduzir-se em
prioridades orçamentárias dos Planos Regionais
de Educação, como auxiliares na construção da
participação popular por educação formuladas
nos documentos oficiais da Secretaria.
A proposta de planejamento também enfatiza
que o Plano Regional deve ser visto como um
instrumento de integração e articulação
população/ administração, no intuito de ampliar
o nível de democratização do acesso, a partir da
possibilidade dos alunos, pais e comunidade na
escolha das prioridades e dos critérios a serem
priori-zados, considerando-se tratar-se de recur-
sos sempre escassos que precisam ser ne-
gociados entre as diversas regiões.
A concepção predominante é a de ver o papel
da comunidade no processo, não apenas como
prestadora de serviços mas como um
interlocutor e gestor de políticas, em função de
interesses coletivamente colocados, reduzindo
significativamente, às vezes, interesses
fisiológicos e paternalistas implícitos
freqüentemente em projetos participativos.
O Executivo, entrentanto, está consciente de
que os limites da participação e autonomia
estão dados não só pela própria dinâmica da
organização social mas pelos entraves que a
legislação existente estabelece quanto às
responsabilidades pelo gerenciamento dos
equipamentos.
E importante ressaltar que a lógica desta
proposta está assentada numa integração entre
gestão democrática e política pedagógica,
explicitada numa proposta de reorientação
curricular e formação permanente dos
professores, consubstanciadas na proposição de
uma nova qualidade do ensino.
Além das três instâncias de deliberação,
existem os colegiados ampliados que reúnem
representantes de todos os níveis de decisão no
intuito de referendar decisões relativas à
política mais global da SME.
Existem dois tipos de fóruns de Participação
Popular. Os fóruns formais possuem estatuto
legal, reúnem-se periodicamente e sua
representação é formalizada em nível
institucional e tem caráter deliberativo. No caso
dos conselhos de escola, tem havido muitos
entraves para sua consolidação enquanto fóruns
que contam com uma efetiva participação da
população. As razões variam desde a sua
apropriação por setores da população que usam
estes conselhos para legitimar suas próprias
decisões até uma real incapacidade das escolas
organizarem-se. Considerando-se que no Brasil
praticamente não existe uma tradição de
organização política, o processo de dinami-
zação de uma efetiva e inovadora proposta
participativa não só é vagoroso como enfrenta
diversos empecilhos e constrangimentos de
caráter político-administrativo.
Os fóruns Informais de Participação Popular
não têm estatuto legal e são espaços onde a
população se organiza de forma as-sistemática,
para reivindicar atendimento escolar, melhores
condições de ensino ou outras demandas. Estes
fóruns vão desde plenárias populares até
reuniões de pequenos grupos nos NAEs para
resolver ou debater problemas que surgem
entre as
escolas e a comunidade, tais como as de-
predações de prédios escolares, brigas entre
quadrilhas, especialmente quando alguns de
seus componentes são alunos e os confrontos,
por vezes à mão armada, ocorrem na escola.
A EXPERIÊNCIA PARTICIPATIVA PELA
FALA DOS AGENTES
O ponto de partida da análise desenvolvida pela
ótica do planejamento em nível central está
marcado pela ênfase dada às ações de
descentralização e ao fortalecimento dos
conselhos de escolas. Entretanto, a questão que
se coloca é a de como modificar
substantivamente a lógica de gestão quando
existem entraves, tais como a legislação de
gestão da escola que funciona em separado do
funcionamento normal da administração.
A política de descentralização implica não só o
reconhecimento, mas a incorporação das
decisões da comunidade escolar e educacional
no processo decisório da política educacional.
O grande desafio que se colocava era de que
forma incorporar, objetivamente, ao processo
decisório que define a política educacional as
unidades escolares consideradas, enquanto
comunidades educacionais, por envolverem
conselhos de escolas e a representação dos
movimentos organizados.
A alternativa adotada foi a de incorporar a
dimensão cio planejamento e a sua articulação
com a organização de um sistema de
deliberação por colegiados. O desafio que
estava em questão era o de romper com as
relações de poder existentes, valorizar e
resgatar a noção de escola como equipamento
social, acomodar a demanda e estimular
mecanismos de corresponsabilização da
população na dinâmica da gestão.
A definição das quatro diretrizes representa
uma opção do Executivo pela incorporação dos
usuários na definição dos objetivos a partir de
alguns momentos significativos do calendário
anual, como é o caso da elaboração do plano
escolar, a organização do calendário anual, as
avaliações. As propostas das escolas são
encaminhadas aos NAEs e orçadas pelo
Planejamento. Posteriormente, as propostas
voltam às escolas reunidas em microrregiões
que escolhem temas prioritários. Toda esta
dinâmica está inscrita dentro de uma lógica de
incorporar, no plano anual da SME, as
informações e propostas advindas de todas as
unidades orçamentárias para serem
consolidadas.
Na composição do Orçamento Programa, o
resultado do trabalho desenvolvido nas escolas
pelos conselhos de escola que apresentam
porpostas a partir da situação local é
incorporado às propostas de outras instância.
No início do 2- semestre de cada ano, ocorre a
devolução às escolas do custo das propostas
itemizadas o que possibilita a definição de uma
nova etapa consubstanciada na escolha de
prioridades pelo Conselho, criando condições
para uma maior interferência dos pais na gestão
da escola. Isto permite que a população comece
a questionar as condições da escola na medida
em que tem acesso a informações relativas, por
exemplo, ao custo aluno por escola o que lhes
permite avaliar mais aprofundamento a relação
qualidade x quantidade. Neste sentido entra em
pauta a percepção pelos membros da
comunidade da importância de um
conhecimento sobre as con-
dições nas quais se desenvolvem as atitudes
escolares. No caso da demanda que diz respeito
à locação dos alunos nos espaços físicos
existentes, com a definição do número de
alunos por classe, organização dos turnos e
períodos e utilização dos espaços existentes, a
relação qualidade x quantidade se evidência
com maior ênfase.
Com relação à expansão do atendimento da
demanda, existe uma dinâmica de organização
da comunidade que não dispõe de escolas para
que selecione e priorize as áreas. Isto tem
gerado situações onde se desenvolvem entre as
regiões critérios de solidariedade na escolha
das prioridades.
As principais barreiras existem dentro da
comunidade dos educadores, notadamente no
que se refere às dificuldades de aceitar a
inovação proposta pela gestão quanto à
interação escola/comunidade. Se bem que
muitas comunidades demonstram pouca
disposição em participar da vida da escola;
muitas escolas, por sua vez, mostram pouca
disponibilidade de facilitar ou incentivar tal
participação. Em virtude do crescimento da
violência, as escolas sempre se tornam alvo de
depredação. Entretanto, tem havido uma
redução do nível de depredação em virtude de
um crescimento da fiscalização pela população,
o que representa um resultado positivo da
política implantada.
Com relação ao envolvimento do NAE com a
comunidade educacional, os resultados são
bastante diferenciados, sendo que em muitos
NAEs ainda se observa uma prática mais
verticalizada no processo decisório.
A concepção de planejamento em vigor é a de
um instrumento que lida com a mobilização
popular no qual se incorporam
vários princípios como a descentralização, a
participação e a possibilidade de interferir no
processo em curso. A noção de planejamento
não vem como um fenômeno externo, mas
interno, propondo também que a escola dentro
da globalidade do sistema resgate o conjunto
das funções sociais que deve cumprir.
A função dos NAEs está sendo permanen-
temente referida, na medida em que as unidades
de apoio técnico-pedagógico às escolas, numa
perspectiva inovadora, estão permanentemente
sujeitas a indagações, críticas que permitam o
aprimoramento da sua função de
acompanhamento, controle e avaliação do
desenvolvimento das atividades do cotidiano da
escola. Além disso, os NAEs estão começando
a se estruturar como unidades orçamentárias,
mas devido à falta de estrutura adequada o
processo se vê muito prejudicado. Assim, existe
uma necessidade premente de constituição de
uma estrutura — existência de contadores e
técnicos em contabilidade — que possibilite os
NAEs de assumirem a licitação de reformas,
construções e aquisição de materiais o que lhes
garantiria a consolidação da sua autonomia,
como unidades orçamentárias, agilizando seus
projetos e melhorando as condições de
funcionamento das escolas.
A função do NAE é de implantar a Política
Pedagógica da Secretaria Municipal de
Educação nas suas quatro prioridades e criando
todas as condições para a operacionalização das
metas, através da dinami-zação dos conselhos e
CRECEs, instâncias locais de deliberação.
Outras ações da atual gestão têm sido a
valorização das condições de trabalho dos
educadores, no que diz respeito à política
salarial, melhoria das condições de trabalho e
estímulo ao desenvolvimento de atividades, em
locais de difícil acesso, mediante pagamento
adicional. Em relação ao período 1986-1988
ocorre uma elevação dos recursos destinados
ao custo de pessoal da ordem de 40%.
Os entrevistados mostram a importância do
Conselho de Escolas como órgão gerenciador
da escola, ressaltando a sua competência na
definição de objetivos e ações relacionadas
com as escolhas de livre provimento nas
escolas. As equipes que coordenam o NAE em
nível local têm um relacionamento direto com
os conselhos de escola, os CRECEs, os
Grêmios Livres, acompanhando reuniões,
organizando atividades e nos trabalhos junto
aos pais visando a estimular a sua participação.
Deve-se ressaltar, entretanto, que as condições
de funcionamento entre três regiões são
bastante diferenciadas, entretanto, em todas se
reconhece as dificuldades com relação aos
CRECEs, que no entender dos entrevistados
não possuem um funcionamento autônomo,
encontrando-se ainda num estado incipiente,
sendo a sua repercussão bastante restrita.
AVALIAÇÃO DA EXPERIÊNCIA E
PRINCIPAIS DIFICULDADES
Observa-se uma mudança qualitativa da gestão,
notadamente quanto à participação e quanto ao
processo decisório ser mais democrático. E
permanente a referência negativa e crítica ao
perfil da gestão anterior que não estimulou
nenhum tipo de vivência de participação, além
de não existirem os conselhos de escola. Em
diversos NAEs uma parcela significativa dos
diretores reage à instalação dos conselhos de
escola, o mesmo ocorrendo com parte dos
professores que não concordam com o caráter
deliberativo do Conselho.
Com relação às principais dificuldades, os
entrevistados enfatizam o fato de a rede ser
conservadora e hierarquizada. Segundo um
representante:
"... lidamos com a resistência dos diretores e
professores em assumir que a escola não é
propriedade sua e sim da comunidade, não se
convencem também que não possuem todo o
saber...".
Outro representante assim se expressa:
"a maioria dos diretores ainda é conservadora,
achando que as decisões devem ser tomadas
por quem dirige, que ele é a pessoa mais
credenciada para dirigir. Em alguns casos,
chegam a manipular os conselhos de escola
para que aprovem suas propostas e, que às
vezes, contrariam a legislação vigente. O
diretor sempre achou a escola um
prolongamento do seu quintal, por isso suas
atitudes não deveriam ser contestadas pela
população. Quando o diretor manipula o
Conselho, o NAE interfere convocando a
comunidade escolar para uma reunião na qual
a pauta discutida é a postura não democrática
de algumas pessoas...".
Observa-se que independente da região da
cidade, as resistências, embora matizadas, são
decorrentes do ethos autoritário que ainda
permeia na sociedade e notadamente naqueles
setores que mais diretamente se relacionam
com os usuários. Entretanto, não se deve
desconsiderar também que existe ainda uma
despreocupação ou mais precisamente uma
crença muito restrita nas instâncias que
possibilitam um acréscimo do nível de
representatividade, por parte da comunidade.
Assim sendo, a instância
NAE, um órgão técnico-político, se configura
enquanto agente estimulador e indutor de uma
nova atitude e compromisso do Executivo
enquanto propulsionador de uma proposta de
democratização na ação educacional junto à
população, notadamen-te dos setores mais
carentes.
Apesar das dificuldades advindas da inex-
periência de organização e participação, a
relação vem se estreitando e a instância
CRECEs vem sendo crescentemente legiti-
mada, sendo que os avanços superam em muito
as dificuldades. Os NAEs que atendem a uma
população muito mais desmobilizada e
desmotivada para a participação e integração ao
projeto da SME configura, geralmente, a falta
de autonomia e dinamismo do CRECEs.
Já nos NAEs mais mobilizados a experiência
do CRECE se configura como uma mudança,
não só em termos quantitativos, mas
qualitativos, e num processo onde se olbserva
um potencial amadurecimento político da
comunidade que participa, apesar das
dificuldades de transporte, horários e distância.
Com relação às dificuldades, estas se observam
principalmente em nível organizacional.
Freqüentemente, não há tempo para o
representante do CRECE reunir-se com seus
pares e assim acaba expressando nas reuniões a
sua opinião pessoal. Outra dificuldade
explicitada está relacionada com a implantação
de uma visão regional, que é o objetivo da
constituição dos CRECEs. Observa-se que as
pessoas ainda priorizam as questões específicas
de cada escola, tendo bastante dificuldade em
perceber os problemas em termos
regionalizados e in-ter-relacionados.
Nos NAEs onde existe uma base social mo-
bilizada e organizada, os movimentos populares
participam da discussão, da construção de
escolas por mutirão e do debate em torno do
projeto pedagógico.
A participação do movimento popular se dá ou
junto ao Conselho de Escola ou à instância
aglutinadora em nível regional — o CRECE.
Os movimentos participam de discussões
problemáticas nos conselhos de escola como é
o caso da sua utilização nos fins de semana. No
caso de impasse o NAE busca resolvê-los,
principamente quando a legislação não é
cumprida. Nestes certos casos, os
representantes do NAE vão até o movimento
popular para discutir propostas em defesa dos
grupos populares, visando a garantir a
corresponsabilidade das decisões.
No caso dos NAEs situados numa região com
importante experiência reivindicativa existe um
ativismo relevante do movimento popular que
encaminha propostas ao Conselho de Escola.
Este tem voz, mas não vota e participa da
discussão de caráter administrativo, pedagógico
e técnico em nível da unidade escolar. O
principal tipo de demanda é por vagas,
notadamente na faixa de 4 a 6 anos, de
informações sobre retenção de alunos e sobre
localização de escolas e sugestões sobre as
condições físicas das escolas. Estas demandas,
entretanto, são feitas geralmente em nível indi-
vidual.
Em nível coletivo, as demandas são por
construção de escolas, concessão de prédio
escolar, reformas de escolas, abertura de turno,
a implantação de determinados projetos nas
escolas e reclamação da qualidade de ensino.
Nos NAEs onde a população é mais organizada
e dispondo de Conselho de Escola, Movimentos
de Mulheres, Sociedade de Amigos de Bairro,
Comissão de Moradores — o NAE solicita ao
movimento que eleja um grupo de pessoas para
conjuntamente com o NAE encaminhar e
defender a proposta junto a outras instâncias
decisórias.
Existe uma unanimidade em afirmar que o
padrão de ensino da escola municipal tem
melhorado, principalmente porque o projeto
pedagógico é coletivo. Existe um envolvimento
maior da escola como um todo, uma maior
participação no plano, o que se reflete na
qualidade do ensino.
Observa-se que ocorre um investimento maior
na capacitação do professor através dos grupos
de formação, oficinas e cursos que têm como
princípio a dinâmica ação-reflexão-ação, que
leva a uma construção coletiva do
conhecimento e a uma postura mais crítica.
O resultado é que as relações com a clientela da
escola se tornam mais responsáveis, na medida
"em que existe um compromisso mútuo com a
mudança", conforme um dos representantes
entrevistados.
Além disso, verifica-se que o trabalho dos
diferentes profissionais se realiza num outro
patamar, na medida em que os profissionais
têm que se preparar melhor e receber orientação
e formação para se aprimorar na função em que
exerce expediente, recursos humanos, banco de
dados, recursos financeiros, supervisão, equipe
pedagógica, etc. Assim, por exemplo, "o
pessoal que lida com recursos financeiros,
discute com as escolas as prioridades para o
mês, não se limitando a distribuir as verbas e
essas prioridades são discutidas no Conse-
lho de Escola". Este depoimento permite
concluir um amplo campo de possibilidades de
melhoria na qualidade de trabalho como
decorrência das mudanças qualitativas que estão
sendo implantadas pela gestão que se iniciou
em 1989 baseada no pressuposto de
democratização da gestão e ampliação e
incorporação da população numa dinâmica
extremamente complexa e contraditória de
participação desvinculada de práticas, sejam
paternalistas, sejam clientelistas.
O Conselho de Escola estava instituído no
Regimento desde a gestão Mário Covas,
entretanto, a gestão Jânio Quadros não garantiu
a sua instalação.
Quando se iniciou a gestão Luiza Erundi-na,
com o professor Paulo Freire à frente da
Secretaria de Educação do Município, resgatou-
se o Regimento da gestão Covas. Em 1989
foram implantados os conselhos em todas as
escolas, através de uma campanha estimulando
a participação e o debate com todos os setores
da comunidades escolar. A implantação é muito
diferenciada, principalmente naquelas
comunidades onde não existe uma população
mobilizada e naquelas onde ocorre um debate
bastante intenso e uma pressão pela modi-
ficação da dinâmica da gestão existente e a
implantação de uma gestão democrática com a
efetiva interveniência do Conselho.
As equipes responsáveis pelos NAEs têm se
esforçado em estimular uma prática mais
abrangente dos conselhos, tentando ampliar o
nível de motivação e a possibilidade de os pais
colocarem suas idéias automaticamente. Apenas
os grupos mais organizados, que são poucos,
participam mais ativamente e as possibilidades
de manipulação dos outros segmentos são
grandes.
Observam-se diferenças importantes entre os
NAEs sendo que as regiões com mais
experiência mobilizatória obtêm melhores
resultados de participação e integração da
comunidade na proposta participativa.
RESULTADOS DA IMPLANTAÇÃO DOS
CONSELHOS
O grande problema é o da representatividade, e
os resultados quanto à participação são bastante
diferenciados. A comunidade participa mais
nos debates sobre Plano Escolar, calendário da
escola e tem havido uma maior motivação no
debate do Orçamento/Programa. A participação
está muito vinculada a uma noção de utilidade/
objetividade daquilo que é discutido e pro-
posto. Mas também é um fator diferen-ciador
da atual gestão, na medida em que, segundo a
participação popular, garante as outras metas
das Secretaria Municipal de Educação.
Provavelmente, um dos aspectos mais esti-
mulantes da prática dos conselhos é a pos-
sibilidade aberta onde o estítulo ou desestí-
mulo dos diretores joga um rol fundamental de
um melhor conhecimento, por parte da
comunidade, dos limites na definição das
propostas e necessidades encaminhadas para
incorporar no conjunto de demandas da região.
Cria-se uma dinâmica de interações onde as
escolas traçam o Orçamento/Programa junto
com o CE, após um trabalho de orientação feito
pelos especialistas das escolas. Após o
mapeamento feito pelo NAE das propostas
enviadas pelas escolas, este material é
devolvido às escolas com vista a uma
rediscussão com o CE. Nesta instância, são
verificadas as incoerências e a inviabilidade do
que foi proposto e é refeita a proposta e
enviada à SME
que o retorna à escola para reavaliação. Neste
processo de interação e realimen-tação, a
comunidade torna-se ciente de que suas
demandas não podem ser atendidas com o
orçamento de que se dispõe e que a solução é a
definição de prioridades tanto pelo movimento
popular como pelo CE. As escolas então
definem suas prioridades as quais, após
sistematizadas pela equipe do NAE, são levadas
à plenária regional — o CRECE. A conclusão
do processo já demonstra per se o esforço
empreendido pela comunidade. Segundo alguns
entrevistados, avalia-se que existe uma
possibilidade, entretanto ainda não existe uma
participação efetiva, sendo que a falta de repre-
sentatividade é vista como um dos entraves na
medida
'"...em que os membros do CE e do CRECE
não discutem com seus pares antes das
reuniões. Existe uma reclamação de pais,
funcionários e professores sobre a falta de
paridade'. A forma de institucionalizar, pelo
menos enquanto ação do NAE, é garantir que
as decisões constem em ata...".
Apesar de todas as dificuldades apontadas, em
decorrência da existência dos CE, ocorre um
questionamento da qualidade do ensino e do
projeto pedagógico e, quando são observadas
irregularidades, estas são levadas ao
conhecimento do NAE. O que é considerado
como um avanço é a possibilidade de
estabelecer um diálogo entre todos os
segmentos da escola, mesmo explicitan-do-se
divergências e conflito de interesses.
As resistências estão principalmente centradas
no preconceito e questionamento não só do
diretor, mas freqüentemente por membros da
equipe técnica e dos professores sobre o caráter
deliberativo do Conselho, sobre a
descentralização do poder. Existe uma
resistência em dividir o poder
e cria-se todo tipo de entraves para que os pais
e alunos tenham acesso às informações sobre
reuniões. Na maioria dos CE o diretor ainda
exerce uma forte influência, o que diminui a
possibilidade deste ser uma instância com
autonomia, conforme a proposta da SME.
Por outro lado, os especialistas da rede escolar
não têm uma cultura de participação e temem a
participação popular. O NAE enquanto
instância técnico-político tem um caráter
indutivo que freqüentemente entra em conflito
com a dinâmica organizacional da rede.
A proposta da SME é vista pelo professor
como uma invasão de espaço e, certamente, os
pais avançaram mais, apesar das dificuldades,
na assimilação da proposta do que os
professores. Uma frase de um representante
permite verificar o alcance da proposta:
"... acho difícil reverter esse processo de
participação da população dos pais. Depois
dessa administração não sei se essa cidade vai
ser a mesma...".
ALGUMAS CONCLUSÕES
As propostas de gestão da educação pela
administração Luiza Erundina têm como
referência a sua democratização, através da
descentralização administrativa.
A estrutura administrativa da Secretaria
Municipal de Educação foi modificada a partir
de uma proposta de democratização do acesso e
da gestão.
Desde o início da gestão, existe uma preo-
cupação com a incorporção dos setores sociais
organizados nas diversas instâncias
nas quais se desdobra a estrutura participativa.
O que está em jogo é o protagonis-mo,
principalmente o dos setores populares,
entretanto, não se trata de um processo simples.
Se bem que se implante no nível local uma
estrutura participativa, existem grandes
dificuldades em institucionalizar a proposta.
Isto se configura no fato de que apesar da
orientação e do suporte do nível central para a
implantação e consolidação dos co-legiados,
nos diversos níveis, os NAEs têm mostrado
resultados bastante diferenciados quanto ao
nível de participação. Um outro aspecto que
pode depreender-se desta análise é que,
freqüentemente, o baixo nível de
institucionalização está vinculado com as
resistências corporativas à implementação de
práticas participativas, onde vêm à tona
questões como o controle, a fiscalização e a
deliberação por parte da comunidade.
A iniciativa de abrir canais de participação abre
espaço para uma problematização relevante da
relação Estado/sociedade. Em primeiro lugar,
traz à tona a necessidade de a comunidade,
através das suas formas de organização e
representação, enfrentar a sua relação com as
propostas de participação implantadas pela
administração, dentro da sua concepção de
democratização da gestão e de inovação da
gestão da coisa pública. Em segundo lugar, não
se deve desconsiderar as contradições que
podem surgir no processo, seja quanto à
formação de um duplo poder, seja quanto
interferências da administração, seja quanto ao
controle de instâncias decisórias pelos grupos
mais ativos e consolidados.
Os resultados heterogêneos no conjunto da
cidade refletem as dificuldades de se modificar
uma cultura burocrática e centraliza-
dora que coloca entraves à democratização dos
serviços e aos mecanismos de fiscalização e
controle social à gestão da coisa pública.
A dinamização das instâncias colegiadas como
os conselhos de escola e os CRECEs
representam a possibilidade de estimular
formas de cooperação com setores organizados
e não organizados da cidadania onde não se
percam de vista alguns temas essenciais à
democratização da gestão. Estes temas se
centram na possibilidade de reforçar:
1) a capacidade de crítica e de intervenção dos
setores populares através de um processo
pedagógico e informativo de base relacionai e
2) a capacidade de multiplicação e aprovei-
tamento de potencial dos cidadãos no pro-
cesso decisório dentro de uma lógica não
cooptativa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
JACOBI, P. Descentralização municipal e
participação dos cidadãos: apontamentos
para o debate. Lua Nova, São Paulo, n.20,
1990.
JACOBI, P. Políticas públicas e alternativas de
inovação da gestão municipal: o complexo
caso da cidade de São Paulo.
São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.5,
n.2, abr./jun. 1991.
SÃO PAULO. Secretaria Municipal de Edu-
cação. Construindo a educação pública e
popular. São Paulo, 1990-1992.
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( http://www.livrosgratis.com.br )
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