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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Formação de professores reflexivos e TV Escola: equívocos e
potencialidades em um programa governamental
de educação a distância
Mirza Seabra Toschi
PIRACICABA, SP
1999
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Livros Grátis
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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Formação de professores reflexivos e TV Escola: equívocos e
potencialidades em um programa governamental
de educação a distância
Mirza Seabra Toschi
PIRACICABA, SP
1999
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MIRZA SEABRA TOSCHI
ORIENTADORA: Prof.
a
D.
ra
Rinalva Cassiano Silva
Tese apresentada à Banca Examinadora
do Programa de Pós-Graduação em
Educação da UNIMEP, como exigência
parcial para obtenção do título de
Doutor em Educação.
PIRACICABA, SP
1999
Formação de professores reflexivos e TV Escola: equívocos e
potencialidades em um programa governamental
de educação a distância
BANCA EXAMINADORA
ORIENTADORA: Prof.
a
D.
ra
Rinalva Cassiano Silva
COMPONENTES:
Prof. Dr. Cleiton de Oliveira
Prof. Dr. Davi Betts
Prof.
a
D.
ra
Roseli Pacheco Schneltzer
Prof.
a
D.
ra
Vani Moreira Kenski
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, pela vida, amparo, amor e pelas condições de estudo.
Ao meu esposo, José Pedro, pelo companheirismo na trajetória
profissional.
Às minhas filhas Larissa, Aline e Mylena e meu neto, Pedro, pela
compreensão e respeito ao meu isolamento em muitas ocasiões.
A professora Rinalva Cassiano Silva, pela orientação estimuladora.
Ao professor Davi Betts e, especialmente, à professora Roseli Pacheco
Schneltzer, pelas contribuições valiosas na qualificação deste trabalho.
Às amigas Vani Kenski e Maria Luiza Belloni, pelo estímulo e
atendimento às minhas solicitações.
Aos amigos, professores e colegas do curso de Doutorado da UNIMEP,
manifesto minha honra de tê-los como companheiros intelectuais. À Irizelda
Marins de Souza e Silva e à Carmen Fornari Diez, que me cativaram tanto que
hoje somos amigas.
Aos amigos e colegas da Faculdade de Educação da UFG, pela
compreensão e apoio, em especial, à Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de
Souza e Walderês Nunes Loureiro, pelas estimulantes e enriquecedoras
conversas.
Aos amigos Aldimar, Mad'Anna e Renato, pelo prazer de estudar,
pesquisar e debater juntos, em tantos encontros.
À Rosana Maria Ribeiro Borges, pela paciência, companhia e
competência na elaboração do roteiro e edição do vídeo-relatório.
Aos amigos que compreenderam minhas freqüentes ausências, pelo
acompanhamento carinhoso das etapas deste estudo.
À Darcy Costa, competente revisora deste trabalho.
Agradeço também à Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal
pelo incentivo do Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância.
Enfim, de modo especial, aos professores e professoras, coordenadoras
e diretoras das escolas pesquisadas, sem os quaiso haveria este estudo.
Aos professores brasileiros que, anonimamente, constroem o país e cuidam
das novas gerações e, mesmo desprestigiados pelos governos e a sociedade,
sabiamente continuam no seu revolucionário mister.
À memória de Mariazinha Fusari, pelo partilhar científico, mas muito
carinhoso, dos saberes da comunicação e da educação.
Ou ganhou um anjo professora...
RESUMO
"Formação de professores reflexivos e TV Escola: equívocos e
potencialidades em um programa governamental de educação a distância" é
um estudo da política educacional de formação de professores, iniciado em
1995, e tem como foco o programa de educação a distância, TV Escola, de
formação docente no local de trabalho, isto é, na escola.
A investigação foi realizada em três dimensões. Uma, macro, que estuda
a atual política de formação de professores e sua relação com as orientações
dos organismos internacionais, na qual se prioriza a educação a distância. A
dimensão meso analisa a gestão e organização da escola e sua interferência na
concepção de escola, como local de formação e recepção dos vídeos
pedagógicos. Finalmente, na dimensão micro discute-se a recepção dos vídeos
da Série Educação do Programa TV Escola, de forma a conhecer as múltiplas
mediações intervenientes no processo de recepção, e se os programas atendem
às necessidades formativas dos professores, especialmente no tocante à
tentativa de formação de um professor reflexivo - retórica presente na política
educacional.
A pesquisa empírica das dimensões meso e micro, realizada em duas
escolas públicas de Goiânia, deu-se por meio da observação etnográfica e
microetnográfica, e pelo uso de vários procedimentos de coleta de dados,
como a observação, a videogravação, aplicação de questionários, realização de
entrevistas semi-estruturadas, anotações em protocolo de registro e diário de
campo.
O referencial teórico de análise de dados incluiu produções sobre
diferentes campos do conhecimento, tais como, a política educacional da
educação a distância e de formação de professores reflexivos. E também,
teorias de administração e gestão de escolas e teorias da comunicação e,
nestas, a das múltiplas mediações na recepção de mensagens.
A análise dos dados busca relacionar os diferentes elementos das três
dimensões, bem como suas interrelações, com o caráter coletivo de formação
docente e com a questão da unidade teoria-prática, presentes na proposta
zeichneriana de professor reflexivo.
Os resultados da investigação apontam para a existência de um
potencial propiciador da reflexão nos vídeos da TV Escola, maso o
caracterizam como um programa de educação a distância uma vez que
considera os professores mais como usuários dos filmes do que profissionais
em formação contínua, além da ausência de estratégias de acompanhamento e
apoio aos professores, como um coordenador das discussões nas escolas.
O estudo conclui que um redesenho do Programa que incluísse horários
específicos na jornada do professor para visionamento e discussões coletivas
dos programas, onde a pluralidade de significações na recepção das
mensagens pudesse se manifestar, poderia estar garantindo abrangência
qualitativa no Programa TV Escola.
SUMMARY
"Reflexive teacher's formation and TV Escola: misunderstandings and
potentialities in a govemment program of long distance" is a study of the
educational politic of teacher's formation, begun in 1995, and it has as focus
the education program the distance, TV Escola, of teacher's formation in the
work place, that is, in the school.
The investigation was accomplished in three dimensions. A macro, that
studies the current politics of teacher's formation and yours relationship with
the orientations of the international organisms, in the one which the education
the distance is prioritized. The meso dimension analyzes the administration
and organization of the school and your interference in the school conception,
as local of formation and reception of the pedagogic videos. Finally, in the
micro dimension it discusses the reception of the videos of the Série Educação
of the TV Escola Program, in way to know the multiple intervening
mediations in the reception process, and if the programs assist to the teacher's
formative needs, especially concerning the attempt of a reflexive tèacher's
formation - rhetoric present in the educational politics.
The empiric research of the dimensions meso and micro, accomplished
in two public schools of Goiânia, gave him by means of the ethnographic
observation and microethnographic, and for the use of several procedures of
collection of data, as the observation, the videoengraving, application of
questionnaires, accomplishment of semi-structured interviews, annotations in
registration protocol and field diary.
RESUME
"Formation de professeurs renvoyés par Ia réflexion et Ia TV Ecole:
equivoques et potentialités d'un programme gouvemamental d'éducation à
distance", c'est une étude de Ia politique éducationnelle pour Ia formation de
professeurs, initiée depuis 1995, et elle a comme but le programme
d'éducation à distance TV Ecole pour Ia formation de professeurs dans le
même lieu de travail, c'est à dire, à 1 'école.
L'investigation a été réalisé en trois dimensions. L'une maxi, dans
laquelle on étudie 1'actuelle politique de formation de professeurs et son
rapport avec les orientations des organismes internationaux et son principal
sujet c'est 1'enseignement à longue distance.
La dimension meso analyse 1'administration et 1'organisation de
1'école et son intervention dans Ia conception de 1'école comme lieu de
formation, reception de vídeos pedagogiques. Finalement, dans Ia dimension
micro, on discute Ia reception des vídeos sur Ia "Série Education" du
programme TV École pour connaítre les multiples médiations que intervenant
dans Ia reception des messages on cherche encore mettre en évidence si ces
programes sont les mieux pour Ia formation des professeurs, surtout pour le
professeur réfléchi - un discours presente dans Ia politique éducative.
La investigaction empirique sur des dimensions meso et micro réalisée
dans deux écoles publiques à Goiânia, a été faite á 1'aide de 1'observation
etnographique et microetnographique, ers instruments utilizes out été divers
comme 1'observation , 1'enrigistrement en vídeo, les questionnaires, les
interviewes semi-structurés us registres de 1'observations participante.
Le fondement théorique s'est rapporté a des productions les différents
faits de Ia connaissance, Ia politique pour 1'enseignement à distance et pour Ia
formation de professeurs renvoyés par Ia reflexión, bien comme à des théories
sur 1'administration des écoles et sur des théories de Ia communication et sur
des múltiples médiations à Ia réception de messages.
L'analyse des faits, cherche 1'entrelacement des différents éléments
dans les trois dimensions et aussi avec le caractère collectif de Ia formation du
corps enseignant et aussi avec 1'unité théorique-practique, presente dans Ia
proposition de Zeichner du professeur réfléchi.
Les résultats de Ia recherche préconisent qu'il existe du potenciel
favorable sur Ia réflexion des videos dans TV Escola, mais au même temps il
reconnait que pour cela ils ne peuvent pas être considérer un programme
d'éducation à distance, une fois qu'il prend les professeurs plutôt comme des
usagers des programmes et nom comme des professionnels en processus de
formation continue. Aussi bien il faut rémarquer 1'absence des stratégies à
suivre pour soutenir le professeur et pour qu'il devienne un coordinateur des
discussions aux écoles.
L'étude suggère qu'il faudrait déssiner d'une nouvelle façon le
programme pour y considérer des horaires spécifiques dans Ia journée du
professeur. II faudrait réaliser des sessions coletives à 1'école, dans le but de
regarder et de discuter des programmes, occasions oú Ia pluralité des signifiés
dans Ia réception des messages puisse être manifeste et comme ça assurer que
le programme TV Escola puisse être atteint dans toute sa qualité.
SUMÁRIO
SIGLAS USADAS
LISTA DE QUADROS, TABELAS, GRÁFICO E FOTOS
LISTA DE ANEXOS
INTRODUÇÃO 19
CAPÍTULO I - A POLÍTICA E A PESQUISA SOBRE FORMAÇÃO DE
PROFESSORES - Plano geral 23
1. Aproximando educação e comunicação - fazendo escolhas 23
2. Comunicação - do grito ao satélite 27
3. A política educacional em curso no país 35
4. A dimensão da escola 42
CAPÍTULO II - A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A EDUCAÇÃO A
DISTÂNCIA - Parabólicas em ação 45
1. A política de formação de professores 45
2. A recepção e as políticas públicas de formação de professores na
modalidade de EAD 54
3. O tempo e o espaço e a educação a distância 60
4. TV Escola como educação a distância 73
CAPÍTULO III - MARCO TEÓRICO DOS CAMPOS TEMÁTICOS -
Grazzing 83
1. Revisão bibliográfica 84
2. Formação de professores e o professor reflexivo 87
3. Reflexão, conhecimento e pesquisa-ação 95
4. Estudos sobre recepção
5. Gestão e organização da escola..
..101
..110
CAPÍTULO IV - Metodologia ... high tech
123
CAPÍTULO V - PESQUISANDO... Um zoom no projeto TV Escola..
1. As escolas pesquisadas
2. A TV Escola
3. A busca do momento coletivo
4. Critérios de seleção dos vídeos
5. As sessões coletivas de vídeo
5.1 Dinâmica das sessões
.142
.142
.146
.153
.159
.163
.164
6. Concepções de professor e de formação de professores subjacentes
aos vídeos selecionados para as sessões
6.1. Desatando oss com afeto (conteúdo e análise)
6.2. A escola além da aula (conteúdo e análise)
6.3. As escolas dos muito Brasis (conteúdo e análise)
6.4. Sobre os três vídeos
,168
.168
.173
.177
.182
7. Recepção das mensagens nas sessões coletivas
7.1. A escola além da aula - Escola Lázaro Rodrigues - Fita 1
7.2. A escola além da aula - Escola Joaquim Almeida - Fita 2
7.3. As escolas dos muitos Brasis - Escola Lázaro Rodrigues - Fita 3.
7.4. As escolas dos muitos Brasis - Escola Joaquim Almeida - Fita 4.
183
186
190
194
197
As mediações da recepção
8.1. Mediações individuais
8.2. Mediações institucionais
8.3. Mediações organizativo-institucional....
.203
.207
.210
.214
8.
8.4. Mediações massmediática
8.5. Mediações situacionais
8.6. Mediações de referência
8.7. Mediação do pesquisador
8.8. Mediação temor tecnológico
8.9. Mediação resistência fragmentada..
..220
..221
..224
..226
..227
..229
CAPÍTULO VI - TV ESCOLA E O PROFESSOR REFLEXIVO- Close-up
em contra-plongée
1. Professor reflexivo e as mediações.
2. Unidade entre teoria e prática
.232
.238
.240
CONCLUSÃO- Oo argumento de Hollywood- The endl Fim. ..248
BIBLIOGRAFIA..
.274
ANEXOS .288
SIGLAS USADAS
AA - Aprendizagem Aberta
AJB - Agência Jornal do Brasil
ANPEd - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
BF - Bairro Feliz
BIRD - Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento ou Banco Mundial
BM - Banco Mundial
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CIESPAL - Centro Internacional de Estudos Superiores de Jornalismo para a América
Latina
CRIE - Centro de Referências para as Inovações e Experimentos
DC - Diário de Campo
EAD - Educação a Distância
ECA - Escola de Comunicação e Artes
ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino
FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos
FIPE - Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
FMI - Fundo Monetário Internacional
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
GT - Grupo de Trabalho
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBOPE - Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
INTERCOM - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação
JA - Jardim América
LCC - Leitura Crítica da Comunicação
LDB - Lei de Diretrizes e Bases
MARPLAN - Pesquisas e Planejamento de Mercado
MEC - Ministério da Educação e do Desporto
NEPP- Núcleo de Estudos e Políticas Públicas
NTIC - Novas Tecnologias da Informação e Comunicação
PAPED - Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância
PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais
PDE - Plano de Desenvolvimento da Escola
PNB - Produto Nacional Bruto
PNEAD - Programa Nacional de Educação a Distância
PPP - Projeto Político-Pedagógico
PR - Protocolo de Registro
PUC/Rio - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
SAEB - Sistema Nacional da Avaliação da Educação Básica
SM - Salário Mínimo
TIC - Tecnologias da Informação e Comunicação
TVE - TV Educativa
UERJ - Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UFG - Universidade Federal de Goiás
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
UNICAMP - Universidade de Campinas
UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância
USP - Universidade deo Paulo
LISTA DE QUADROS, TABELAS, GRÁFICO E FOTOS
a) Quadros
Quadro 1 - Modelos formativos dos professores
Quadro 2 - Periodização da pesquisa em Comunicação no Brasil..
Quadro 3 - Elementos da cultura organizacional
...91
.101
.113
b) Tabelas
Tabela 1 - Tipos de gestão escolar na Região Centro-Oeste
Tabela 2 - Rendimento mensal médio em SM em domicílios, %
Tabela 3 - Estratos sociais do Bairro Feliz e Jardim América - IPLAM e
IBGE
118
143
144
c) Gráfico
Gráfico 1 - Interrelações entre os elementos do estudo... 249
d) Fotos
Foto 1 - Cena do programa "Desatando oss com afeto" ...
Foto 2 - Cena do programa "A escola além da aula"
Foto 3 - Cena do programa "As escolas dos muitos Brasis"..
168
173
177
LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 - Questionários da primeira sessões de vídeo,
Anexo 2 - Questionário da segunda sessão de vídeo ..
Anexo 3 - Questionário da terceira sessão de vídeo ..
Anexo 4 - Entrevistas semi-estruturadas - questões orientadoras...
a) professores e professoras..
b) coordenação pedagógica...
c) diretoras
289
290
291
.293
.293
.294
.294
INTRODUÇÃO
O estudo "Formação de professores reflexivos e TV Escola - equívocos
e potencialidades em um programa governamental de educação a distância"
o traz todas as respostas aos problemas que levantou, e as que aquio
apresentadasoo definitivas, mas foram as possíveis de se obter ante a
diversidade de significados e representações que constatou e a complexidade
de organização, entendimento, compreensão e análise que exigiu.
O prazeroso é sentir, no processo de produção do conhecimento, as
limitações do pesquisador em apreender o real - como este é fugidio e de
como uma pesquisa é apenas um fragmento do saber que toda a humanidade é
capaz de produzir.
Assim, mais do que trazer respostas, conclusões, este trabalho apresenta
interrogações, inquietudes, desvela necessidades,e a nu o real, no qual as
escolas e seus mestres estão mergulhados.
A investigação realizada objetiva detectar como ocorre a política do
atual governo de formação a distância de professores, o TV Escola, que, por
meio de um canal próprio de TV, veicula programas que podem ser usados
para formação geral pedagógica e formação específica nas diferentes áreas do
currículo.
O interesse por esse estudo começou logo após o lançamento do
programa, em 1995. O objetivo era conhecer e compreender como os
professores vêem e apreendem os significados dos programas a que assistem.
As inúmeras questões formuladas começaram a ser respondidas com a
ida às escolas e na permanência nelas. Entretanto, novas indagações surgiram,
tais como entender porque os professoreso usavam os vídeos existentes,
preferindo os alugados, e porque a direção e coordenação pedagógicao
estimulam o seu uso. c I
A pesquisa foi realizada em duas escolas públicas de Goiânia, uma
estadual e outra municipal, instaladas em bairros diferentes e também distintas
quanto à estrutura física, número de alunos e concepções pedagógicas e
administrativas. Vale destacar que esse tipo de investigaçãoo tem a
pretensão de generalização dos resultados apurados. Permite, como sugere
Andaló (1995:16), 'generalizações naturalísticas' queo associações que "os
leitores podem fazer entre os dados obtidos no estudo e aqueles que são fruto
de suas experiências pessoais".
A coleta de dados foi feita em mais de oitenta horas, distribuídas em
mais de seis meses de permanência na escola.o assisti às aulas, sendo os
contatos feitos em intervalos de aulas, reuniões, recreio, etc, incluindo
observações junto aos professores e professoras, coordenadoras e diretoras,
como ainda sessões de vídeo, entrevistas, conversas informais e aplicação de
questionários.
Como instrumento de coleta de dados em pesquisas do cotidiano, usei
Protocolos de Registros (PR) com o registro numerado de cada visita, em que
foram feitas as observações; para cada escola foi usado um caderno de
anotações. No Diário de Campo (DC), com a mesma sistemática de anotações,
porem com impressões pessoais sobre o que foi observado e iniciava a análise
com o referencial teórico disponível. De posse desse material a análise dos
dados foi realizada dentro dos três campos temáticos da pesquisa.
A dimensão tríplice do estudo - política de educação a distância para
formação de professores, gestão e organização da escola e processo de
recepção dos vídeos pedagógicos - forma uma teia, que, no seu interior,
encerra a concepção de formação de um professor prático-reflexivo. Dei
prioridade, na análise, aos aspectos de unidade teoria-prática nessa formação,
destacando a importância da dimensão coletiva, grupai, desse modelo
formativo.
O estudo está dividido em seis capítulos e cada um tem um subtítulo de
termos de uso comum na produção de audiovisuais e na televisão, tais como
grazzing, parabólicas, close-up, etc. Inicia-se discutindo a política de
formação de professores e a sua contextualização no conjunto das reformas
educacionais que acontecem no mundo, segundo orientação de organismos
internacionais. Prioriza-se a dimensão da reforma que inclui as mudanças na
formação de professores, explorando as contradições entre pontos da reforma
e as inúmeras e complexas exigências feitas aos docentes, gerando o mal-estar
docente ou a chamada síndrome burn-out.
Em seguida,o abordadas as políticas de educação a distância, os
elementos constitutivos dessa modalidade de educação e as relações da EAD
com a formação de professores. Ganha destaque, nesse capítulo, a discussão
sobre o tempo e o espaço na EAD, a presencialidade real e virtual e a
importância dos materiais usados nessa modalidade educativa para garantia da
interatividade. O estudo relaciona essas questões com o Programa TV Escola.
A apresentação dos diferentes campos temáticos que subsidiam as
análises é feita no terceiro capítulo, embora busque-se permear todo o trabalho
com análises teóricas.o discutidas as teorias sobre gestão escolar e a
compreensão da escola como cultura organizacional; apresenta-se também as
contribuições das teorias da comunicação para compreensão do processo de
recepção dos vídeos da TV Escola. Esse referencial de análise gira em torno
da discussão sobre os modelos formativos de professores da racionalidade
técnica e da racionalidade prático-reflexiva.
A apresentação da metodologia e a opção por uma pesquisa empírica
estão no quarto capítulo, que é seguido por outro, que detalha a investigação,
os aspectos micros do estudo. As sessões coletivaso narradas e analisadas,
com apresentação de diversas falas dos pesquisados. Nesse quinto capítulo,
identificam-se os significados que os professoreso aos vídeos, como faz-se
o estudo das mediações intervenientes no processo. Assume relevo, nesse
ponto, a importância das videogravações, que permitem uma análise mais
acurada do que ocorreu nas sessões coletivas de vídeo, uma vez que as
inúmeras vezes em que se pode rever o que aconteceu e como aconteceu,
novos detalheso sendo percebidos, o que enriquece a análise.
No capítulo seis, inicia-se a análise final, visando desvendar a teia de
relações. Nele,o apresentadas as interrelações entre o professor reflexivo e
as mediações da recepção, destacando-se a importância de haver fóruns de
discussões dos programas como maneira de relacionar teoria e prática, uma
das questões mais complexas da formação docente.
O não-argumento de Hollywood é o tema da conclusão, no qual se
busca analisar a teia de relações em seu conjunto, agora incluindo as
diferentes dimensões do estudo, política de formação de professores a
distância, gestão escolar e recepção como resultado de múltiplas mediações.
CAPÍTULO I - A POLÍTICA E A PESQUISA SOBRE FORMAÇÃO DE
PROFESSORES - Plano geral
1
O objetivo imediato é antes transformar o poder do que
propriamente conquistá-lo.
Paul Singer
1. Aproximando educação e comunicação - fazendo escolhas
Estudar e tentar compreender a relação Educação e Comunicaçãom
sido minha preocupação há vários anos, tarefa que se torna difícil em razão
das características dos objetos de estudo das duas áreas .
As dificuldades epistemológicas e as próprias pesquisas desenvolvidas
pelos dois campos científicos revelam a complexidade de estudos que
pretendem reunir as duas áreas do conhecimento.
Para Soares
3
(1999:19), a inter-relação Comunicação e Educação
"ganhou densidade própria e se afirma como campo de intervenção social
O Plano geral, em que se mostra o geral da cena, é um dos mais utilizados em videogravações de aulas.
Neste estudo, refere-se à amplitude macro de análise da política educacional.
Sobre essa aproximação produzi o texto: "Pedagogia e Comunicação: uma fértil aproximação
epistemológica", apresentado como trabalho no GT Educação e Comunicação na 21" Reunião Anual da
ANPEd em Caxambu, setembro de 1998.
Esta é a conclusão do Núcleo de Comunicação e Educação da USP (NCE), com base nos resultados da
pesquisa que buscou identificar o perfil de quem atualmente estuda e pesquisa sobre educação e comunicação
depara também com a emergência de um novo profissional: o "educacomunicador". O trabalho identifica,
ainda, agências internacionais, como o Banco Mundial e a Unesco, "condicionarem, com freqüência, ajuda
aos países em desenvolvimento ao privilegiamento nas políticas educacionais de ações no campo das
específica", cujas necessidades convergentes aproximam as duas áreas
apontando para mudanças e transformações; na educação, em razão do
obsoletismo dos seus métodos e enfoques, e na comunicação, pela sujeição às
regras do mercado.
A aproximação entre Educação e Comunicação tem diferentes
perspectivas de análise. Do ponto de vista epistemológico identificam-se as
alterações nos dois campos temáticos que advêm desse encontro, analisando,
por exemplo, o que acontece com o objeto de estudo das duas áreas ao ocorrer
a aproximação. Em uma perspectiva sociológica, é possível questionar o que
significa a presença dos novos recursos tecnológicos de comunicação e
informação na vida das pessoas e na escola.
Em uma dimensão psicológica, pode-se abordar as possíveis mudanças
de organização cognitiva que as novas mídias causam às crianças e jovens, e
sua relação com as máquinas, bem como as alterações no ato de ensinar e
aprender.
Do ponto de vista tecnológico, é possível considerar os avanços ou
retrocessos que os instrumentos modernos ocasionam na divulgação e
construção do conhecimento e nas relações sociais e produtivas, ou os
impulsos científicos que podem propiciar.
A análise das políticas governamentais, em um e em outro campo,
possibilita identificar os processos de democratização dos meios e da
universalidade do ensino, além de abordar as grandes fusões das indústrias de
comunicação e entretenimento ou o caráter global das reformas educacionais,
assim como investigar a relação entre globalização, mídia, cultura e escola.
tecnologias da informação" (Comunicação/Educação: a emergência de um novo campo e o perfil de seus
Profissionais. Contato. Brasília, Senado Federal, 1999, p. 25).
Do ponto de vista etnológico, pode-se estudar e obter conhecimento,
sob o aspecto cultural, das populações primitivas quanto ao surgimento das
técnicas que elas utilizavam e também realizar comparações entre povos de
diferentes partes do mundo quanto às formas de educação e comunicação.
Em uma perspectiva pedagógica, pode-se analisar o significado da
aproximação entre educação e comunicação na vida das escolas, na cultura
escolar, nos currículos, nas aulas e na formação de professores.
Priorizando a última abordagem, sem negligenciar as demais, uma vez
que estão interligadas, procurarei analisá-la, neste estudo, destacando a
política de formação de professores na escola usando programas de vídeo.
Pretende-se analisar a formação de professores em três dimensões: uma
macro, que se refere à política educacional em curso no país e sua relação com
as alterações políticas e técnico-científicas; outra em dimensão média (meso),
incluindo a gestão da instituição escolar e a última em dimensão micro, que
analisa a recepção e o sentido que os professoreso aos vídeos educativos
veiculados na TV Escola visando a formação continuada dos profissionais de
ensino.
a-dia ou se o mesmo alterou ouo a vida das escolas. Esta investigação
O projeto TV Escola faz parte da política educacional e refere-se à
formação de professores. Vídeos pedagógicoso veiculados em um canal
próprio de TV e as escolas, equipadas para recepcionar os programas, devem
usá-los para capacitar os professores no seu próprio interior, como também
podem usar os vídeos em aulas de diferentes disciplinas do ensino
fundamental.
O presente estudo tem como finalidade identificar os elementos
conceituais e operacionais da política de formação de professores pela TV
Escola, também conhecer como as escolas administram o projeto em seu dia-
objetiva saber como os professores responderiam ao estímulo se fossem
criadas situações de estudo e debate na escola. Os programas da TV Escola
atendem às necessidades dos professores, especialmente, àquelas inerentes ao
modelo de professor reflexivo? As diretoras e coordenadoras das escolas
incentivam os professores ao uso da TV Escola? As escolas já promoveram
situações de discussão sobre programas da TV Escola ou outros vídeos? Que
aportes teóricos sobre formação de professores, reflexão, relação teoria/prática
existem nos vídeos e que tipo de exemplificação, os vídeos estão fazendo na
prática? Esta pesquisa pretende, sobretudo, conhecer como os professores
recepcionam os programas da TV Escola, na perspectiva de relacionar as
mediações da recepção em seus diferentes aspectos com a concepção
zeicheneriana de professor reflexivo e também relacionar tais mediações com
a forma de gestão da escola. Sistematizados os dados, passa-se à discussão
sobre a relevância desses conhecimentos para as políticas educacionais
relativas à formação de professores e à introdução de novas tecnologias nas
escolas, bem como à demonstração da relevância da autonomia da escola
quanto aos aspectos pedagógicos e de gestão.
Vale lembrar que os objetivoso se encontravam claros no início do
processo de investigação. Os propósitos iniciais evoluíram e, possivelmente,
de certa forma, mudaram, à medida que ocorreram a ida ao campo, a coleta de
dados e a análise realizada concomitantemente, além de um acurado estudo
dos dados, somado ao processo de escrita do relatório final.
2. Comunicação: do grito ao satélite
4
As primeiras formas de comunicação humana iniciaram-se quando
primitivos agrupamentos começaram a se entender por meio de gestos,
grunhidos e diferentes sons indicativos de objetos e intenções. Carregada de
vontades e desejos, a comunicação humaniza os homens.
A necessidade de dizer qualquer coisa aos outros (Engels, 1980), faz
com que a tosca laringe se transforme e obtenha modulações cada vez mais
desenvolvidas, e a boca aprenda a pronunciar sons articulados.
O trabalho, a linguagem e o desenvolvimento do cérebro e dos sentidos
levam o homem a reproduzir pelo desenho, cenas da natureza, plantas e
animais. A marca gravada e um certo significado dado a ela lançam os
fundamentos da escrita, permitindo a fixação do conhecimento no tempo e a
possibilidade de sua disseminação pelos espaços.
Atualmente, vive-se o tempo histórico da cibercultura (Lévy, 1998a), ou
informático-mediático, sucedendo, maso eliminando, os pólos da oralidade
e da escrita.
Para conhecer o mundo, o homem produz tecnologias do conhecimento,
como aparatos e mecanismos que permitem examinar aspectos da realidade.
As tecnologiaso produzidas historicamente, de acordo com as
possibilidades e problemas do momento. O pólo informático-mediático
iniciou-se com o aparecimento do computador, destacando-se a produção e a
difusão de bens culturais por redes planetárias.
Embora Lévy referira-se ao aparecimento de computadores e às
possibilidades da conexão virtual, sem limites de espaço, a história mostra
que, desde meados do século XIX, o homem já se comunicava em escala
Este item é uma paráfrase do livro de Antônio Costeira (1978) que tem o mesmo título.
planetária por intermédio do telégrafo. Em 24 de maio de 1844, Morse
transmitiu, de Baltimore a Washington, a primeira mensagem telegráfica com
os seguintes dizeres: "Que é que Deus fez?". Em 1850, a Inglaterra e o
continente europeu já faziam transmissões via cabos telegráficos submarinos.
Em 1866, obteve-se transmissão pelo Atlântico e, no final do século passado,
todos os continentes estavam ligados telegraficamente (Costella, 1978:126). O
código de sinais utilizado por Morse universalizou-se, sendo usado até
recentemente como 'língua' telegráfica mundial, que, no entanto, era de
domínio de poucos.
A nova tecnologia da inteligência, o computador, como as demais, influi
sobre o saber que se produz, e exerce papel fundamental nas referências
intelectuais e espaço-temporais das sociedades humanas.
Denominando período técnico-científico informacional a fase atual da
história da Humanidade, M. Santos (1997: 123) observa que, se em fases
anteriores, as atividades humanas dependiam da técnica e da ciência e,
recentemente,
trata-se da dependência da ciência e da técnica em todos os aspectos da vida
social, situação que se verifica em todas as partes do mundo e em todos os
países (...) e agora se estende a todo o Terceiro Mundo, ainda que em
diferente proporção, segundo os países.
O progresso técnico, proporcionado especialmente pela microeletrônica
e o sistema de satélites, traz nova configuração ao planeta, criando a
"máquina universo" (Lévy, 1998b) e provocando conseqüências econômicas,
políticas, sociais e culturais, tais como a globalização econômica, a
mundialização do consumo cultural, o modelo político neoliberal, o
surgimento de novas identidades sociais, bem como a crescente exclusão
social, dando surgimento a uma sociedade virtual que se sobrepõe à sociedade
real.
Segundo Schaff (1995), vive-se em meio a uma tríade revolucionária: a
microeletrônica, a microbiologia e a revolução energética, e as transformações
revolucionárias da ciência e da técnica modificam a produção e os serviços,
conseqüentemente, mudanças nas relações sociais.
Castells (1996:11) aponta dois aspectos básicos na caracterização da
revolução tecnológica: a) está centrada em processos, razão por que seus
efeitoso intersticiais e ocupam todas as esferas da atividade humana e; b) o
"novo conhecimento é aplicado principalmente nos processos de geração e ao
processamento do conhecimento e da informação". Sua matéria-prima é a
informação e seu resultado também, o que a diferencia das outras revoluções
tecnológicas que a antecederam.
As técnicas caracterizam-se diferentemente no decorrer do processo
histórico; atualmente, contudo, como observa M. Santos (1997), os sistemas
técnicos tornaram-se mundiais, mesmo que sua distribuição geográfica seja
irregular e o seu uso hierárquico. Continua o autor:
pela primeira vez na história do homem, nos defrontamos com um único
sistema técnico, presente no Leste e no Oeste, no Norte, no Sul, superpondo-
se aos sistemas técnicos precedentes, como um sistema técnico-hegemônico,
utilizado pelos atores hegemônicos da economia, da cultura, da política
(Santos, 1990). Esse é um dado essencial do processo de globalização,
processo queo seria possível se essa unidadeo houvesse (Ibidem:42-3).
Significa que os modernos meios de comunicação reordenam o espaço,
o tempo e as relações sociais dos diversos países configurando um certo grau
de reciprocidade, simultaneidade e interdependência das atividades nas
diferentes áreas do planeta, cujas características confirmam-se nas reformas
educacionais que ocorrem, quase simultaneamente e com inúmeros pontos em
comum, em diferentes países.
Denominando as reformas de "restauração conservadora", Michael
Apple (1998:6) ressalta que em 1988, na Inglaterra - país que iniciou as
reformas, o ex-secretário britânico de Educação e Ciência do governo Tatcher
representou a reação conservadora que ameaçava as idéias de igualdade. Disse
ele: "A era do igualitarismo acabou!". Conforme Apple, o ex-secretário
julgava ser uma coisa positiva, uma vez que esses discursos ancoram-se na
idéia de melhoria de padrões de qualidade.
Conforme Nóvoa (1996), as reformas educacionaiso fruto da crise de
legitimidade do Estado-Nação. O fracasso das políticas educacionais, em
razão de problemas estruturais, resulta na intenção do Estado de reassumir o
papel de protagonista, para recuperar a condução das políticas educativas.
Assegurar o controle do conhecimento, tomando as rédeas das reformas
educacionais é a estratégia utilizadada pelos governos dos estados-nacionais
para manter a força da Nação, enfraquecida pelo caráter globalizante, virtual e
flexível das fronteiras, observa o mesmo autor. Porém, o controle estatal sobre
a educação escolar tem aspecto contraditório, uma vez que a globalização
financeira e de modos de produção, impulsionada pela força do capital
financeiro internacional e de corporações estratégicas, impõe aos diferentes
países, de uma forma muito mais sutil, mudanças na propriedade e no controle
dos meios de produção. Colado a esse processo político-econômico, opera-se
um outro, de natureza cultural e social, no qual modelos educacionais se
repetem nas diferentes reformas que ocorrem nos dois hemisférios do globo
terrestre.
Analisando as políticas educacionais no contexto do Estado Neoliberal
da América Latina, Rosar (1999: 9) considera que o Banco Mundial (BM) e o
Fundo Monetário Internacional (FMI)o detêm o controle pleno dos Estados
Nacionais nos países em desenvolvimento, no entanto,
estabelecem mecanismos de unificação de forças econômicas e políticas
nacionais e internacionais que atuam em escala mundial, definindo os rumos
da economia, da política, da educação e da cultura, de um modo geral, tanto
nos países de capitalismo avançado, como nos 'países de renda média e
baixa', segundo conceituação do BM.
As reformas educativas dos diferentes países apresentam quatro pontos
comuns: a forma de gestão da educação que se focaliza na descentralização; a
avaliação institucional como mecanismo de controle; a reorganização
curricular como critério de efetivação do controle avaliativo e a
profissionalização do professorado e, acrescenta Popkewitz, "a regulação e o
controle dos professores" (apud Geraldi, 1998).
Na prática, todas as reformas trazem a retórica da profissionalização dos
professores, de acordo com Nóvoa (1996), e definem como atributo da
qualidade profissional melhor formação e maior relacionamento entre saber
teórico e prático, além da necessidade de reflexão sobre a atividade docente.
Porém, contraditoriamente à retórica do professor reflexivo, as reformas
demonstram uma clara intenção de reduzir despesas com o ensino, ao mesmo
tempo que intensificam o trabalho do docente.
Quanto à redução dos gastos, Castro e Carnoy (1997:97), ao
apresentarem as dinâmicas da reforma do ensino na América Latina,
respondem aos problemas dando ênfase à diminuição dos gastos públicos, nos
anos 90. A preocupação em diminuir os gastos públicos em educação é clara
na política proposta pelo BM aos países com os quais mantém convênios e,
mediante a qual introduz a agenda neoliberal.
O modelo educativo escolar do Banco Mundial propõe duas grandes
ausências: os professores e a pedagogia, dando prioridade ao livro didático em
detrimento do docente e à capacitação em serviço sobre a formação inicial.
Valendo-se de estudos promovidos pelo BM, a instituição recomenda
para melhoria da educação de primeiro grau uma proposta que dicotomiza
suas ações de política - as queo funcionam (becos sem saída) e as que
funcionam (avenidas promissoras). Torres (1996:153) assinala que em relação
aos professores, os becos sem saída constituem-se em longos programas
iniciais de formação docente, e as avenidas promissoras incluem a formação
docente em serviço, de forma contínua, com programas curtos. Considera,
ainda, promissor o uso do rádio interativo como sistema de ensino na sala de
aula, para complementar o professor ou para substituí-lo. Conforme Rosar
(1999), a política educacional implantada no país, com o aval do BM, traz
consigo a redução de salários parao onerar o orçamento dos governos, e, ao
mesmo tempo, cria a "cultura da descartabilidade do magistério", com
utilização intensiva das redes de ensino a distância, o que reduz a formação à
dimensão instrumental aplicada à capacitação rápida e superficial.
Torres (1998) ressalta que o BM chegou a essa tese depois de estudo
feito em 18 países (apenas dois da América Latina) na década de 80, e
concluiu que a formação inicial favorecida pelo BM oferece muitos problemas
e a soluçãoo está em investir nas debilidades, mas diluir a formação inicial
e investir na capacitação em serviço. E conclui Torres: "Hoje, a maioria de
projetos de melhoramento da qualidade da educação' financiados pelo BM
nos países em desenvolvimento, quando possuem um componente de
capacitação docente, é de capacitação em serviço" (Ibidem: 176). Ocorre que
problema mais críticoo é somente a formação inicial, mas o modelo de
formação docente
5
, a qual vive uma crise crucial.
Seguindo orientação do BM, o professor possui expressão tímida na
definição do discurso da reforma educativa, até mesmo no que diz respeito ao
currículo. A fraca participação do professor quando deveria ser o centro, o
protagonista da mudança, expressa o ponto frágil da reforma educacional.
O BM apresenta "posições ambíguas, inconsistentes e inclusive
contraditórias" (Ibidem,160), quando se refere à temática do professor,
porque entende que o conhecimento das matérias pelo professor propicia o
rendimento do aluno. Propõe, então, contratar professores que demonstrem
domínio de conteúdo, considerando irrelevante o aspecto pedagógico, que
deverá ser oferecido de forma breve em serviço. Documento do BM, de 1995,
diz que:
A capacitação em serviço também pode melhorar o conhecimento da matéria
e das práticas pedagógicas pertinentes. Ela é ainda mais eficaz quando se
vincula diretamente à prática da sala de aula e é realizada pelo diretor da
escola. (...) Para os professores da escola de primeiro grau, o caminho que
apresenta melhor relação custo-benefício é uma educação secundária seguida
de cursos curtos de formação inicial centralizados na capacitação pedagógica
(apud Torres, 1996: 160e 165).
A formação/capacitação docente, juntamente com o salário,o
questões tratadas de forma isolada e sem prioridade pelo BM, propondo
somente medidas que enfatizam "melhoria da capacitação docente e maior
capacidade gerencial do sistema, com ênfase na escola como espaço
organizacional" (Machado, 1998:105).
Lamentavelmente, a política educacional brasileira segue as normas ditadas pelo BM até quando se trata de
Programas com financiamento próprio.
Desconsiderando os resultados do Sistema de Avaliação da Educação
Básica (SAEB) em que "constata-se uma tendência de melhores resultados
dos alunos à medida que aumenta o nível de escolarização do professor"
(1995:37), o BM argumenta que melhor qualificação advinda de maior
número de estudoo resulta em melhor rendimento dos alunos, motivo por
que prioriza a capacitação em serviço, mediante a modalidade de educação a
distância (EAD), o que reduz o conhecimento pedagógico à mera habilidade
de ensino.
Considera ainda que a formação inicial presencial fica mais dispendiosa
que a contínua e a distância, por isso, deve ser desaconselhada. Argumentar
que a educação a distância é menos onerosa apresenta-se como uma falácia na
atual conjuntura em virtude da celeridade na produção do conhecimento,
transformando em produtos obsoletos seus onerosos materiais, no curto
período de cinco anos, sem que tenha propiciado o retorno dos benefícios
educacionais, a preços módicos como ocorreu em décadas atrás.
As características pessoais dos docentes,o enfatizadas na atual
literatura educacional (Nóvoa, 1995a) e detectadas como imprescindíveis em
vários estudos realizados na América Latina (Torres, 1996:162),oo
consideradas como importantes no processo de ensino, isto é, o BMo
considera a profissão docente um "insumo". Vale lembrar que o BM
transfere para os países com os quais faz negociações, interpretações de
estudos feitos na África, na década de 80
6
.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada pela Lei nº
9.394 de 20 de dezembro de 1996, marco legal da reforma educacional
brasileira, confirma essa tendência de formar professores, ao estabelecer no
inciso I, do artigo 61 que a formação dos profissionais da educação tem como
fundamento "a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a
capacitação em serviço ". Note-se que a capacitação em serviço remete a uma
outra questão da reforma que compreende a escolao apenas como local de
trabalho, mas também como espaço de formação contínua dos professores. Os
programas da TV Escola, a serem usados para capacitação profissional
docente, inserem-se nesse aspecto da reforma, uma vez que podem ser
gravados pelas unidades escolares, e usados para formação dos professores e
melhoria das aulas em diferentes disciplinas.
3. A política educacional em curso no país
Os novos contextos econômico, político, social, cultural e tecnológico
alteram o conceito de educação e de trabalho. A esse respeito, Frigotto
(Lagoa, 1999) assinala que, enquanto a revolução industrial mexia com os
braços, com a força física, a revolução tecnológica atual "mexe com os
neurônios, com a informação, com as atividades cerebrais "(Ibidem: 1), e fala
em sociedade de informação, de formação polivalente, de habilidades, de
empregabilidade, etc.
A nova reorganização do trabalho advinda do desenvolvimento
tecnológico e a intelectualização do processo produtivo trazem novas
exigências para a educação, geram novas expectativas em relação à educação
escolar, aproximando a relação entre mundo da escola e mundo do trabalho.
Para maior conhecimento crítico das propostas do BM para a educação brasileira ler o livro "O Banco
Mundial e as políticas educacionais", organizado por Livia De Tommasi e outros,o Paulo,
Cortez/PUCSP/AE, 1996.
Comparando a média de 3,5 anos de escolaridade brasileira, com a da
França ou da Argentina, que é de 11,5 anos, como o Brasil poderá competir no
mercado globalizado com nível de escolaridadeo baixo? Com o fracasso
escolar sucessivo de grande parte dos estudantes, que fazer para melhorar a
qualidade das escolas? Questões como estas, do conhecimento da maioria da
população, tornam-se um problema nacional e questão de governo.
Azanha (1998:102) observa que somente as pressões sociais derivadas
de uma percepção coletiva, isto é, uma consciência generalizada e amplamente
difundida em uma sociedade transformam-se em problema nacional e exige
uma ação efetiva do governo. Estudando o histórico dos planos e políticas
nacionais de educação, Azanha reitera o caráter recente das políticas de
educação no Brasil, remontando o seu início à década de 20, quando o debate
nacional ganha um espaço social mais amplo (Ibidem:105).
Hoje, com a disseminação da tecnologia, em especial da televisão, na
grande maioria dos lares brasileiros e a transformação desse equipamento em
palanque eletrônico das campanhas eleitorais, fica a dúvida se os problemas
o realmente nacionais ou, como grande parte do consumo, consistem em
necessidades criadas pelo marketing político. Observa-se, entretanto, que a
sociedade busca cada vez maior escolarização.
As reformas educacionais de diferentes países incluem temas inscritos
pelos organismos internacionais, como o Plano Decenal de Educação para
Todos (1993-2003), principal instrumento da política educacional do período
Collor/Itamar (1990-1994). Este plano foi definido pela Unesco, PNUD,
Unicef para nove países em desenvolvimento de maior população do mundo
7
,
dentre os quais se inclui o Brasil. Reunidos, esses países possuem mais da
Os nove paíseso os seguintes: Brasil, índia. Bangladesh, Indonésia, China, Egito, México, Nigéria e
Paquistão.
metade da população do planeta e, por serem pobres, detêm também a maior
parte dos problemas, em especial, os educacionais.
O estudo "Ensino fundamental & Competitividade empresarial - uma
proposta para a ação do governo", elaborado pelo Instituto Herbert Levy
(s/d), da Gazeta Mercantil , foi assumido pelo programa de governo - Mãos à
obra Brasil: proposta de governo - vitorioso na campanha presidencial de
1994.
O programa de educação Acorda Brasil - está na hora da escola
apresentado à nação em 1995, na posse de Fernando Henrique Cardoso,
apresenta os seguintes pontos (Vieira, 1995:47): 1) distribuição de verbas
federais diretamente para as escolas; 2) criação do Sistema Nacional de
Educação a Distância, com o envio de kits eletrônicos às escolas; 3) melhoria
da qualidade do livro didático; 4) reforma do currículo para aperfeiçoar o
conteúdo do ensino; 5) avaliação das escolas, por intermédio de testes
aplicados aos alunos.
Nota-se que os três primeiros pontos referem-se à descentralização,
enquanto os dois últimos, currículo e avaliação, considerados por Cassassus
(1995) como "alma do processo de ensino", foram centralizados, como
estabelecem os artigos 9
2
, inciso VI e 26 da Lei nº 9394/96, a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional. O artigo 8
2
dessa mesma legislação determina
que
caberá à União a coordenação da política nacional de educação, articulando
os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e
supletiva em relação às demais instâncias educacionais.
Este trabalho contou com a coordenação de João Batista Araújo e Oliveira e Cláudio de Moura Castro,
contando com a colaboração de Antônio Carlos da Ressureição Xavier, Cândido Gomes, Collin Adamson-
Macedo, Emílio Marques, Ernesto Schiefelbein, Guiomar Namo de Mello, Heraldo Marelin Viana, Maria
Tereza Infante, Sérgio Costa Ribeiro, além de representantes do SENAC e SENAI. Muitos dos colaboradores
compuseram, posteriormente, a equipe de governo de Fernando Henrique Cardoso ou atuam como assessores.
Percebe-se que a lei sofreu, durante seu trâmite, desvios
antidemocráticos que redundaram em alterações substantivas no projeto
original, produzindo conteúdos próximos da política educacional em
implementação no país. Pode-se inferir que a questão da descentralização diz
respeito à maneira como o poder se organiza em uma sociedade. Quer dizer,
descentralizam-se os encargos, maso o poder.
A descentralização do envio de verbas às escolas, sem intermediação
dos governos estaduais ou municipais, mais do que descentralização
caracteriza-se como desconcentração (Cassassus, 1995), ou descentralização
por controle remoto (Lima, 1994).
Esse aspecto sinaliza para um ponto positivo, o da autonomia das
escolas. Portanto, tanto o repasse de recursos, como outros pontos das
reformas da década de 90, além das eleições diretas para diretores e a
instalação de Conselhos Escolareso insuficientes para uma verdadeira
autonomia das escolas, uma vez queo definem questões-chave (Souza e
Costa, 1997) para a qualidade do ensino, tais como: escolha dos livros
didáticos, definição do número de alunos, calendário, regimento, etc, tendo
ainda de seguir as normas emanadas dos órgãos superiores, como as
secretarias de educação. E certo que autonomiao quer dizer soberania,
como destaca Machado (1998). A autonomia será sempre relativa (Licínio,
1991), pois ao fazer parte de um sistema, a escola sempre seguirá normas
comuns a todas as unidades escolares. O Estado, detentor do poder instituinte
da escola, define os limites e o alcance da autonomia, concedendo-lhe o
direito de decidir apenas algumas tarefas (Ibidem:ll8%), o que demonstra o
caráter retórico da autonomia que a atual reforma brasileira concede às escolas
de educação básica.
Verifica-se, assim, que as grandes linhas da política educacional dos
anos 90, nos aspectos mais gerais, incluem "a discussão da redução do
tamanho do Estado, políticas de descentralização, participação e
harmonização dos atores e agentes da sociedade" (Carvalho, 1998:56). A
minimização do Estado proposta pelo neoliberalismo faz-se, como explica
Saes (apud Carvalho, 1998:50) "não mais em nome da liberdade individual
mas em nome justamente do bem-estar material das massas trabalhadoras".
O caráter antidemocrático do projeto político neoliberal, conjugado às
profundas desigualdades da sociedade brasileira, junta, como se diz na
linguagem popular "a fome com a vontade de comer" e , assim, amplia-se a
barbárie da exclusão, da injustiça e do descompromisso estatal. E o que é pior:
o falso discurso de melhorar a vida da maioria desprotegida castigará ainda
mais essa parcela social.
Justamente a retórica de Estado Interventor apresenta-se paradoxal na
política educacional neoliberal do Brasil de hoje, de acordo com as
características apresentadas por Horta (1991: 195-238) em relação a uma
prática neoliberal de diminuição do tamanho do Estado. Enquanto o Estado
descentraliza pequenos recursos e desconcentra-se de suas funções, passando-
as à comunidade, ocorre a centralização dos recursos, do currículo e da
avaliação, exercendo a União apenas função supletiva e redistributiva, como
estabelece o art., parágrafo 1- da nova LDB
10
. De acordo com o artigo
seguinte, a União concentra amplos poderes como nunca aconteceu na
Os elementos são: ação educativa estatal apenas no ensino obrigatório, acentuada intervenção na economia,
fortalecimento do poder dos técnicos, reconhecimento dos direitos sociais para todos os cidadãos,
deslocamento da dominância do Legislativo para o Executivo.
Dispõe o §
:
"Caberá à União a coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes
níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e supletiva em relação às demais instâncias
educacionais ".
educação brasileira, enquanto as propagandas, as entrevistas, os depoimentos
etc propagam a descentralização em benefício da própria comunidade.
Analisando a política educacional brasileira no contexto de um Estado
neoliberal que ''aparece como ator coadjuvante, subjugado a uma sociedade
civil forte e consciente", Gracindo (1997: 7-18) assinala cinco inversões de
prioridades na análise das questões educacionais: a) da quantidade para a
qualidade; b) da centralização para a descentralização; c) do ensino superior
para a educação básica; d) do público para o privado; e) das questões políticas
para as questões pedagógicas.
A análise da questão da formação do professor refere-se à inversão
relacionada ao item c (do ensino superior para educação básica) que minimiza
a formação do professor na universidade, deslocando-a para a escola em que o
profissional exerce a função de professor de educação básica.
Kit tecnológico
Uma das primeiras ações do atual governo (1995-2002) consistiu em
enviar, em 1995, às escolas com mais de cem alunos um kit tecnológico,
composto de uma antena parabólica, um aparelho de TV, um videocassete e
dez fitas de vídeo para gravar os programas na televisão que seriam usados na
capacitação dos professores nas escolas.
Denominado Programa de Apoio Tecnológico - PAT- o kit tecnológico
tinha "metas universalizantes e caráter progressivo" (Draibe e Perez, 1999),
quer dizer, atenderia a todas as escolas com mais de cem alunos, estimativa
que, em 1999, chega a 42 mil escolas. Esse programa constituiu a base
material para o Programa TV Escola, destinado à formação docente.
No ano seguinte, 1966, considerado o "Ano da Educação", entrou em
funcionamento o TV Escola, um canal próprio para divulgar produções
pedagógicas que deveriam ser gravadas pelas escolas e usadas nas aulas das
diferentes disciplinas. O objetivo do projeto seria melhorar as aulas e
capacitar, a distância, os professores.
Passados dois anos da iniciativa, foram transmitidos quase dois mil
programas, sendo quase 60% deles, estrangeiros
11
. Conforme divulgação
oficial, 61% das escolas quem o kit em funcionamento gravam programas.
A mesma pesquisa informa que os programas da TV Escolao mais
utilizados para atividades com os alunos.
Maria Helena Guimarães de Castro, coordenadora da implantação
inicial do Programa TV Escola, disse, em artigo publicado na edição especial
dos dois anos da Revista da TV Escola, que o uso da televisão por satélite "é
uma estratégia adequada para sanar algumas das deficiências mais graves do
nosso sistema de ensino, como a capacitação insatisfatória do magistério".
Ressalta que, apesar das experiências exitosas com os recursos audiovisuais
nas escolas,
o havia um programa de abrangência nacional e focalizado no professor,
como agente principal do processo de ensino. Neste sentido, pode-se afirmar
sem presunção que a TV Escola representa a primeira iniciativa a promover
o uso intensivo e sistemático das novas tecnologias na melhoria da qualidade
da educação (1998:29).
Em que pese o otimismo governamental, a excelente qualidade dos
programas veiculados e a boa intenção da Secretaria de Educação a Distância
De março de 96 a junho de 98 foram veiculados, segundo o governo, 1973 programas, sendo 812 nacionais
e 1.161 estrangeiros. Dentre os estrangeiros, 45%o franceses; 21%, norte-americanos; 9%, canadenses e
alemães; 8%, espanhóis; 6%, ingleses e 2%, de outros países. Revista da TV Escola, Brasília, MEC, jul. 1998
(número especial).
do MEC, é importante saber como as escolas usam a TV Escola, ou melhor, se
os programas são, de fato, utilizado pelas escolas, de outro modo, se os
professoreso capacitados, ou julgam-se mais aptos com o novo instrumento
na escola.
4. A dimensão da escola
A escola situa-se numa dimensão média de análise da reforma. A meso-
abordagem valoriza tanto as dimensões macro, contextuais, quanto as
ecológicas, relativas às perspectivas mais particulares da sala de aula (Nóvoa,
1995b).
A escola possui autonomia relativa, "não se limita a reproduzir as
normas e os valores do macro-sistema"(p.20), maso é uma dimensão micro
dependente apenas dos seus atores sociais.
Durante muito tempo, fazer inovação era implementar reformas
estruturais no sistema educativo ou aplicar novos métodos e técnicas em sala
de aula,o se considerando o aspecto da escola. Nos dias atuais, já é evidente
que as inovações educacionais só se desenvolvem no contexto da organização
escolar (Nóvoa, 1995b:40). Embora haja alguma retórica da autonomia da
escola na reforma brasileira, a política educacionalo inclui a dimensão
escolar. Parece crer que a passagem do macro ao micro é natural.o é, uma
vez que exatamente no nível meso da escola estão os entraves das reformas.
O aparecimento do sistema escolar significou o deslocamento do espaço
de decisão da família para uma escola e, depois, para o Estado. A retomada do
papel de decisão e de poder das famílias e da comunidade, com expressão nos
projetos político-pedagógicos das escolas, em países não-centrais como o
brasileiro, pode ser estratégia para chegar a outro modelo de funcionamento
do sistema educativo, o de escolas mais autônomas. O projeto da escola,
expressão de sua ação educativa, possibilita conceber escola como cultura
organizacional (Ibidem:32)
Conforme Nóvoa (1995b:26), a autonomia é aspecto central das
políticas educacionais dos anos 90. Significa dotar as escolas de meios para
responderem, de forma útil e dentro do prazo, aos desafios cotidianos. Implica
em responsabilização dos atores sociais e profissionais da escola e
aproximação dos centros de decisão da realidade da escola.
Além de alterações no seu aspecto organizativo, as escolas vivem
também reformas pedagógicas e culturais.
A instituição escolar é atualmente cobrada de tarefas bem mais
complexas, portanto, mais difíceis de serem realizadas. Jáo basta o
professor ter o domínio dos conteúdos da sua área de conhecimento. Conhecer
a dinâmica extremamente rápida da produção do saber, acompanhar o
movimento e levar o aluno a ter competências para selecionar, ante tanta
informação disponível, aquela mais adequada e necessária para ele,o
competências profissionais que o professor deve demonstrar nesse contexto
extremamente competitivo, sem contudo absorver o valor da competição; pelo
contrário, deve buscar construir um mundo mais solidário e justo.
A chegada de tecnologias da informação e comunicação (TIC) nas
escolas servem mais como marketing do que recurso pedagógico, ou mídia
escolar, que estabeleça relações mais dialógicas e prazerosas nas escolas.
A forma hierárquica de organização do sistema, bem como a
organização administrativa das escolas, em geral burocráticas e autoritárias,
o deixa espaço para inovações pedagógicas, mesmo que apenas
metodológicas. Como garantir que a existência do kit tecnológico e do
computador na escola represente "ousadia e persistência" para resolver os
grandes males da educação escolar? Como ter professores e alunos criativos
em ambientes caracterizados por relações de poder desiguais e castradoras?
Como ter autonomia pedagógica se está atrelada à autonomia financeira
regulada pelo Estado?
A escola vive a contradição entre a regulação e a emancipação (Santos
apud Carvalho, 1998:112). A escola possui uma autonomia regulada, quer
dizer, está sujeita às normas emanadas dos órgãos superiores da área de
educação, em especial, aos objetivos maiores da política educacional e dos
projetos apresentados pelo governo. Porém, no mesmo compasso, goza de
relativa autonomia pedagógica para o trabalho dos professores, além do que a
direção da unidade escolar possui uma certa autonomia no modo de executar
as normas reguladoras.
Estudar a escola sem perder de vista as dimensões macro e micro,
requer um cuidado metodológico que inclui rigor e sensibilidade, alteridade e
distanciamento, em cuja perspectiva, a metodologia de coleta e análise dos
dados se complexificam. O caminho explorado encontra-se no Capítulo IV.
CAPÍTULO II - A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A EDUCAÇÃO
A DISTÂNCIA - Parabólicas
12
em ação
Somos corajosos para comprar equipamentos dignos do
Primeiro Mundo, mas os salários pagos aos nossos
professores e especialistas ainda não passaram do
Terceiro Mundo. É a discrepância que dificulta o uso
dessa extraordinária tecnologia do aprendizado.
Arnaldo Niskier
1. A política de formação de professores
A história da educação brasileira registra alterações de ênfases no que
diz respeito à formação de professores
Tanto o professor, como sua formação tiveram diferentes concepções no
processo histórico. Dos jesuítas, que eram mais catequisadores do que
pedagogos, passou-se às escolas normais, chamadas de colégios para moças,
às Faculdades de Filosofia e foram retomadas as Faculdades de Educação, no
final da década de 60. A revolução pedagógica prometida pela Lei n
2
5.692/71
o ocorreu, mas o regime de exceção reforçou a organização política,
sindical e cultural dos professores.
Antena especial, acompanhada de receptor de satélite, que possibilita recepção nacional de canais de
televisão.
O treinamento do "técnico em educação" dos anos 70 foi substituído
nela "formação do educador" da década de 80, até à atual, com a formação do
"professor-pesquisador" (Pereira, 1996: 13-59)
13
As contradições, entretanto, agudizam-se com o início da reforma
educacional, iniciada com a posse de Fernando Henrique Cardoso, em 1995.
Os capítulos que versam sobre formação dos profissionais da educação nos
projetos de LDB da Câmara e do Senado foram modificados pelo novo
governo, e a Lei nº 9.394, aprovada em 20 de dezembro de 1996, traz
significativas mudanças na formação dos professores.
As duas modalidades de formar professores que existiam antes de 1996,
licenciatura e magistério,o ampliadas para cinco pela nova lei da educação,
que mantém as modalidades superior e normal e acrescenta a de treinamento
em serviço e a complementação pedagógica para os bacharéis que queiram se
dedicar à educação, além do curso normal superior (art. 62, 63 e 87).
A nova LDB considera o nível superior como exigência para a formação
dos profissionais da educação, e estabelece que, até o fim da Década da
Educação, ano 2006, somente serão admitidos professores habilitados em
nível superior ou formados por treinamento em serviço (art.87, § 4
o
).
O termo final do parágrafo 4°, treinamento em serviço, denota que a
política em vigor após 1995 busca o aligeiramento de formação de professores
e elege a escola como local de formação.
A expressão treinamento em serviço traz embutida a concepção de
trabalho docente como algo técnico, treinável. Na forma dicionarizada, o
termo treinamento significa ato ou efeito de treinar, quer dizer, tornar apto,
Especialmente no capítulo 2, Júlio Emílio Diniz Pereira apresenta o debate sobre a formação de professores
no Brasil de 1960 a 1990.
destro, capaz para determinada tarefa ou atividade, também, habilitar,
adestrar. Adestrar significa ensinar, amestrar, industriar, treinar.
A carga semântica da palavra desfaz toda suposição de uma política que
defende o professor prático-reflexivo, uma vez que embute em seu significado
a concepção de atividade docente como algo que possibilita ensinar alguém a
cumprir determinada tarefa. Ocorre que a atividade docente é imprevisível e
irreptível, pois cada dia de aula difere do anterior, e cada situação de classe é
única, cada aluno, singular. Como bem expressa Virgínia Ferrer, "as situações
educativas são situações existenciais e não situações técnicas" (1995:230).
Segundo Nóvoa (1996), todas as reformas, na prática, trazem a retórica
da profissionalização e estabelecem uma nova territorialidade para a
identidade profissional docente: a escola, cujos aspectos podem ser positivos,
tais como a reconfiguração das práticas educativas decorrentes da concepção
da escola como local de trabalho e, ainda, porque possibilita a formação de
uma identidade profissional coletiva, baseada no processo de cor-
responsabilização com a escola, de um modo geral.
Por outro lado, a concepção de qualidade do professor inclui melhor
formação e maior relacionamento entre teoria e prática, além de valores éticos,
etc. A intenção de reduzir despesas com o ensino e a intensificação do
trabalho docenteo um dos paradoxos da atual política educacional quem
tirado o tempo de reflexão do professor, contrariando a retórica do professor
reflexivo, presente nas reformas.
A Lei n- 9.394/96 inclui essas questões logo no primeiro artigo do
Título VI, que trata dos profissionais da educação, apontando como
fundamentos da formação do professor: "a associação entre teorias e
práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço; e o aproveitamento da
48
formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras
atividades" (art. 61, incisos I e II).
A capacitação em serviço é novamente mencionada, fazendo-se
acompanhar de uma outra inovação - a criação dos institutos superiores de
educação (ISE), destinados a manter cursos de formação de profissionais de
educação básica (graduação em licenciatura plena como oferecem hoje as
universidades e faculdades); curso normal superior (formação para educação
infantil e séries iniciais do ensino fundamental); formação pedagógica (para
bacharéis que queiram se dedicar à educação básica). A inovação prevê
também a manutenção de programas de educação continuada, destinados à
atualização profissional de professores da educação básica em exercício do
magistério, além de formação em pós-graduação lato e stricto sensu. O
Decreto n- 2.306, de 19 de agosto de 1997, classifica em último lugar os
institutos superiores, logo depois das faculdades. Surge a questão:
desvinculados das universidades, os institutos superiores poderiam formar um
professor reflexivo, pesquisador, como proposto pela reforma?
Os cursos de graduação, em especial, os de licenciatura, negam a idéia
de ensino com pesquisa e a criação dos institutos superiores de educação
reforça isso, tendo em vista que a proposta governamental de admitir espaços
acadêmicos que só ensinem, como os ISE, e outros que exercitem a
indissociabilidade entre ensino e pesquisa, dificulta bastante a tendência de se
formar professores que pesquisem a sua prática.
Comungo a opinião de Saviani (1997: 219) que pede cautela na criação
dos ISE, que pode ser alternativa para as universidades, uma vez que podem
se vincular ouo a elas. Citando experiências da Alemanha (Pãdagogische
14
capacitar, segundo o dicionário, significa tornar capaz, habilitar; portanto, possui o mesmo sentido de
treinar.
Hochschule), Itália (Institutos de Magistério) e América Latina (universidades
pedagógicas), o autor comenta o risco de formar professores em cursos de
segunda categoria, como ocorreu nos países citados.
A experiência francesa teve resultado diferente, já que o Instituto
Universitário de Formação de Professores (IUFM) só aceita candidatos que
tenham, no mínimo, três anos de curso superior e se submetam a exame
seletivo para ingressar no instituto (Gavard, 1999).
O atual governo da República e a nova administração do MEC
desacreditam e desqualificam a universidade brasileira (embora sejam
oriundos dela), oferecendo condições para que as propostas neoliberais de
educação e de formação de professores, presentes nos acordos com o BM,
concretizem-se de modo efetivo no país.
Saviani (1997: 219) considera que o MEC
Insiste em que a universidade tem dado muito pouca contribuição ao
desenvolvimento dos sistemas estaduais e municipais de ensino, sobretudo
no que toca ao ensino fundamental e, especificamente, na questão da
formação de professores, considerando que, nesse aspecto os professores na
universidade ficam anos e anos discutindo, maso apresentam alternativas,
o encaminham a solução das questões práticas.
O autor ressalta as contundentes e reiteradas críticas que o governo
endereça à universidade e indaga se os motivoso seria porque
passando para o outro lado, esses professores universitários seo conta do
problema e passam a denunciá-lo acompanhado de um matiz desqualificador
da instituição universitária (Ibidem: 220).
Continuando sua análise, Saviani observa, com firmeza, que
embora tenha sido o deslocamento da universidade para o MEC que
possibilitou a percepção do problema originário da crítica, seus autores
parecem enunciá-la ainda na condição de professores universitários que
lamentamo poder contar com a colaboração dos próprios pares; eo
enquanto dirigentes do órgão do Estado que mantém a maioria das
universidades públicas do país (Ibidem: 220).
Evidencia, com determinação:
Nessa condição, em lugar de assumirem plenamente suas novas funções
agindo em consonância com as responsabilidades a elas inerentes, o que
implicaria a formulação de políticas com a definição de prioridades de
investimento tendentes a estimular, e até mesmo a exigir, que as
universidades se incorporem ao esforço comum, dando a sua contribuição
específica para se atingir o objetivo de universalização do ensino
fundamental, se entregam a uma crítica desmobilizadora eludindo, desse
modo, a vacilante vontade política no trato da questão (p.220).
O problema exige, entretanto, mais do que exame das questões
domésticas, referentes à relação dos atuais gestores com seus pares, quer dizer,
uma análise mais ampliada que inclua a política de educação superior na
América Latina em referência às orientações emanadas dos organismos
internacionais.
Boaventura Santos (1997:200) analisa que palavras de ordem abstratas,
como o
apelo à 'inserção da universidade na comunidade', facilitam .todos os
reducionismos, e a verdade é que esta palavra de ordem significa, nos
relatórios de hoje, pouco mais que as relações entre a universidade e a
indústria ou entre a universidade e a economia.
O papel da universidade aproxima-se muito mais da valorização social e
cultural da comunidade do que do acréscimo da produtividade industrial e da
economia.
Citando documento da Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) sobre as tendências principais da
educação superior, Aguiar (1997:133) comenta que uma delas é a restrição
financeira, que "tem afetado praticamente todos os centros de educação
superior em conseqüência das políticas de ajuste estrutural".
A política adotada pela reforma educacional brasileira, ligada à reforma
administrativa do Estado, considera que as universidadeso oferecem
serviços oriundos exclusivamente do Estado, por isso devem ser competitivas.
Esse modelo de Estado moderno, segundo Sguissardi (1997), constitui-
se de duas esferas fundamentais: uma burocrática, que exerce funções
exclusivas do Estado e um setor de serviços, que faz parte do Estado maso
é governo. Esse núcleo de serviços exerce funções que existem no setor
privado, daí a necessidade de transformá-las em organizações sociais com
características públicas não-estatais, isto é, fundações de direito privado,
mediante o que as universidades se tornariam organizações sociais.
Dessa forma,, segundo Silva Júnior (1997:85), um desmonte do
Estado intervencionista na economia e nos setores sociais.
A reforma dos Estados advinda da globalização econômica "dá lugar a
um Estado Gestor, que carrega em si a racionalidade empresarial das
empresas capitalistas transnacionais" (Ibidem: 86).
As restrições financeiras explicam-se por meio dessa nova lógica
mercantilista que, obviamente, interfere na formação de professores na
universidade. O barateamento e aligeiramento da formação docenteo
percebidos nas ações governamentais e na legislação que dá suporte legal à
reforma. A própria LDB, em seu artigo 8º , confere à União a coordenação e
avaliação da política nacional de educação investindo-a de poderes,
como jamais se viu em um regime democrático no Brasil. Ela possui o
controle sobre o processo avaliativo do rendimento escolar de todos os níveis
da educação escolar e o controle da avaliação das instituições e de cursos do
ensino superior, além de baixar normas gerais sobre cursos de graduação e
de pós-graduação, de acordo com o inciso VII do art. 9- (Cury, 1997:
216).
O poder ilimitado de coordenação e de normatização para formar
docente concretizou-se por legislação que aligeira a formação do professor,
como a Resolução n
2
2, de 26 de junho de 1997, que dispõe sobre os
programas especiais de formação pedagógica para portadores de graduação a
serem desenvolvido em 540 horas, das quais trezentas horas destinam-se ao
estágio.
Pode-se citar ainda a Resolução CES n- 1, de 27 de janeiro de 1999, que
trata dos cursos seqüenciais de educação superior, que podem ser
integralizados em 1600 horas, cuja duração é praticamente a metade de um
curso de graduação.
Os cursos seqüenciaiso oferecidos em dois tipos: os de formação
específica conduzindo a diploma e os de complementação de estudos, queo
direito a certificado. Há interpretações de que os cursos de formação
específica ressuscitam as licenciaturas curtas que formavam professores
apenas para o primeiro grau, com o fim de solucionar o descompasso entre a
crescente demanda do ensino básico e a forma e ritmo de formação de
docentes. "As avaliações disponíveis sobre esta modalidade de licenciatura
não são alentadoras", confirma Gatti ao analisar as licenciaturas curtas,
concluindo ser mais um obstáculo do que uma contribuição para a melhoria do
ensino, as quais foram recentemente extintas ante a pressão das universidades
que combatem o aligeiramento da formação de docentes (1996:34).
Outro ponto que demonstra o caráter contraditório das atuais políticas
de formação de professores diz respeito à Resolução CEB n
2
2, de 19 de abril
de 1999, que institui as diretrizes curriculares nacionais (DCNs) para o curso
Normal, em nível médio, destinado à formação de docentes de Educação
Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental.
A Resolução dá a interpretação de que o texto do artigo 62 da Lei nº
9.394/96 pressupõe a existência do curso; no entanto, o mesmo dispositivo
legal, ao se referir a essa modalidade de curso, admite-a apenas como
formação mínima. Esse entendimentoo denotaria uma possibilidade
precária, temporária e, portanto,o definitiva, como se interpretou
inicialmente. Ora, como se explica uma dualidade entre esse aspecto e a
exigência de curso superior para admissão de professores, como está previsto
no artigo 87? Será que o final do mesmo artigo, ou formado por treinamento
em serviço, vai prevalecer?
Como salienta Nóvoa, o aumento do trabalho do professor é
contraditório ao discurso do professor reflexivo
15
. O professor reflexivo, na
concepção de Zeichener, pressupõe reflexão como ato coletivo e o fazer
coletivo exige tempo, aspectos identificados com muita clareza, durante a
permanência nas duas escolas.
A coordenadora pedagógica da Escola Lázaro Rodrigues
16
destaca,
durante uma das sessões de videogravação, que "nós já temos as fitas dos
PCN e também outras. O que falta é tempo para nós. Não sei como esticar
este tempo" (fita 1-15 min e 45 seg).
Significativa também a ressalva de um professor da Escola Joaquim
Almeida (Danilo) que, ao final da sessão de videogravação, saiu rapidamente
como os demais para voltar para a escola à noite e fez o seguinte comentário:
Documentos da política educacional, tais como o Referencial Pedagógico-curricular para a formação de
professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental do MEC/SEF , referem-se à
formação do professor reflexivo com o seguinte pressuposto: A articulação teoria-prática é o eixo central da
concepção de formação de professores como profissionais prático-reflexivo. O professor é simultaneamente
intelectual e técnico (p.9).
As escolas e os professoreso denominados, neste estudo, com nomes fictícios.
"saio de casa às cinco e meia e só chego à meia noite ". Como ser reflexivo
com pressa e correndo contra o relógio?
A análise da atual política educacional de formação de professores no
Brasil demonstra grande semelhança entre as decisões dos gestores do sistema
educacional e as propostas de formação de professores presentes nos
documentos de organismos internacionais, como por exemplo, aligeiramento
na formação, privilegiamento da formação continuada, desprezo da formação
inicial na universidade e educação a distância.
2. A recepção e as políticas públicas de formação de professores na
modalidade EAD
O aspecto legal da política educacional em vigor consubstancia-se na
Lei nº 9.394/96 - (nova LDB), que, em alguns artigos específicos, estabelece
o propósito de formação continuada de professores a distância. O artigo 63,
inciso III, determina aos institutos superiores de educação manter programas
de educação continuada para os profissionais da educação dos diversos níveis.
O caput do artigo 80 dispõe que "o Poder Público incentivará o
desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos
os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada"'. O artigo 87,
inciso III, das Disposições Transitórias, prevê que os municípios, e
supletivamente o Estado e a União, deverão "realizar programas de
capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para
isto, os recursos da educação a distância ".
Além de sobrecarregar os municípios com tamanha responsabilidade, os
dispositivos legais citadoso a nítida demonstração de que a mudança de
rumo na votação da LDB visava, de certa forma, incluir os interesses da
política educacional que se pretendia implementar no país, dando destaque à
formação de professores fora da universidade, isto é, nos institutos superiores
de educação que podem ser instituídos em universidades ou organizados fora
dela, como é o caso da educação a distância, prevista em apenas um artigo, o
80, valendo, porém, como um capítulo inteiro. O artigo foi regulamentado
pelo Decreto n- 2.494 de 10 de fevereiro de 1998, cujo artigo primeiro define
Educação a Distância (EAD) como
uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação
de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em
diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e
veiculados pelos diversos meios de comunicação.
A definição dada pelo texto legal demonstra a real intenção do atual
governo incrementar a EAD no país.
As tentativas de instituir a EAD no Brasil datam dos anos 60, maso
obtiveram êxito como programas de cobertura nacional em virtude da
constante preocupação salvacionista de superar fracassos dos sistemas ou
atender a problemas emergenciais. Conforme Sousa (1996), dois fatores
freiam o desenvolvimento da EAD no Brasil: primeiro, os estímuloso
escassos e sem continuidade, tanto nas orientações como em suas formas e
mecanismos; segundo, por causa da falta de pessoal habilitado para o uso das
modernas técnicas de produção e utilização dos meios de ensino.
Hoje, o quadro apresenta-se mais favorável à instituição da EAD, em
razão de uma boa infra-estrutura de telecomunicações e possibilidade de
interconexão por redes de informática, além de um contexto tecnológico e de
Sobre a história da EAD no Brasil, ver SARAIVA, Teresinha. Educação a distância no Brasil: lições da
história. Em Aberto.Brasília, v. 16, n. 70, abr./jun. 1996.
alterações no processo produtivo que clama por uma educação mais aberta e
flexível, enquanto no âmbito político institucional existe uma Secretaria
Federal de EAD.
Apesar de inúmeros equipamentos como: satélites, parabólicas,
computadores, ilhas de edição digitalizadas, canais exclusivos para educação,
a engenharia de produção de softwares ainda é precária, faltando capacidade
de produção de materiais adequados, além de recursos, como também a eterna
convivência com a falta de pessoal capacitado para lidar com os novos
equipamentos e inseri-los definitivamente, em especial, no cotidiano das ações
educativas escolares. Mata (1992: 21) observa que "se as formas escolares
tradicionais não dão conta nem do 'antigo', como pedir-lhes que assumam o
'novo ", ampliando sua ação ? "
Belloni (1999) considera que o avanço tecnológico e as transformações
no mundo do trabalho fazem com que tanto a educação convencional como a
EAD transformem-se em um complexo organismo de educação aberta.
Para Poppovic (1996:6), Secretário de Educação a Distância do MEC, o
problema maior da EADo é o custo inicial do equipamento, mas a mudança
de mentalidade. Para ele, "o processo de treinamento é fundamental e
representa 45% dos custos totais" (grifo meu). Vale destacar, dessa
proposição, o sentido mecanicista de treinamento a ser dado ao pessoal, além
de lamentar o fato de que esse conhecimentoo tenha sido considerado pelo
projeto da TV Escola, queo prognosticou qualquer capacitação pedagógica
ou instrumental, ou mesmo treinamento para o pessoal docente e de apoio que
fosse manusear os equipamentos e os vídeos pedagógicos, sabendo-se que
apenas um treinamentoo muda mentalidades.
Pesquisa sobre a TV Escola, relatada por Draibe e Perez (1999:39),
'mostrou que, em 1997, em todo país, houve capacitação para utilização
pedagógica dos filmes em apenas 23% das escolas urbanas que receberam e
instalaram o equipamento ".
Em análise crítica das políticas públicas no país na área das tecnologias,
Moraes (1996) observa que os problemas atuaiso os mesmos do passado e
persistem há várias décadas, desde os primórdios da instrução programada até
a informática educativa.
De acordo com a autora,
soluções fragmentadas, dissociadas da realidade e desintegradas, presentes
na maioria dos programas e projetos do governo, mudavam detalhes do
exterior sem, contudo, provocar mudança interna e revolucionária nas
condições de aprendizagem dos alunos, no sentido de gerar uma força
renovadora que colocasse em prática novas idéias, novos ideais e novas
práticas de ensino (Ibidem: 57).
Quer dizer, o indivíduo ou a pessoao era a principal referência de
toda ação, priorizavam-se investimentos para o planejamento e produção de
programas eo sua utilização, que deveria ser o ponto central do processo e
o próprio motivo da existência do projeto.
Se a sociedade atual e o processo produtivo renovado requerem um
novo profissional e o professor é solicitado submeter à formação, como ter um
professor autônomo, criativo, cooperativo ante a uma política fragmentadora
do fazer docente, e queo lhe dá o devido valor nas definições de qualquer
um dos âmbitos da atual política, mesmo no que se refere às novas
tecnologias?
Como destaca Belloni (1998),
qualquer melhoria ou inovação em educação passa necessariamente pela
melhoria e inovação na formação de formadores (...) Os professores formam
um grupo prioritário e estratégico para qualquer melhoria dos sistemas
educacionais (p.16).
Pfromm Netto, em seu novo livro "Telas que ensinam - mídia e
aprendizagem: do cinema ao computador", ao explanar sobre educação a
distância, observa que essa modalidade de ensino
ora se sobrepõe ao (significado) de tecnologia da educação, ora se confunde
com esta, ora é diferenciado como uma categoria especial desta, em função
de critérios e conceitos que estão longe de ser inteiramente satisfatórios e
consensuais (1998:48).
A definição de D. P. Ely (1992) sobre educação a distância, provoca
muitos questionamentos a respeito da TV Escola, considerada um programa
de formação de professores a distância:
Educação a distância refere-se a ensino e aprendizagem em circunstâncias
nas quais o professor e o aprendiz estão separados um do outro no tempo e
no espaço (grifo meu); inclui telecursos, estudo por correspondência, ensino-
aprendizagem por meio do computador como parte abrangente de educação
ou treinamento que culmina com a completação de uma tarefa, curso,
currículo ou programa de treinamento (apud Pfromm Netto, 1998: 47).
A tese da separação entre professor e aprendiz, da forma como está
incluída na definição, refere-se a um importante aspecto. De acordo com
Belloni, a separação no tempo, ou comunicação deferida, coloca questões bem
mais difíceis de solucionar do que os aspectos espaciais. A separação no
espaço pode ser superada mediante uso de sistemas que propiciem a relação
semi-direta entre estudantes e professores. Objetos, como o telefone, o e-mail,
o fax, a carta podem, de certa forma, estabelecer uma interação entre os atores
envolvidos na EAD. O tempo, por sua vez, cria uma situação deo única,
uma vez que a produção dos materiais e a instituição gestora dos programas de
EADo mantêm intercâmbio com os estudantes e desconhecem as
necessidades dos usuários.
Na EAD, segundo Belloni, as relações entre professor e alunoo bem
diferentes das que ocorrem no ensino convencional:
elaso controladas por regras técnicas mais do que por normas sociais;o
baseadas em pouco ou nenhum conhecimento das necessidades do
aprendente;o construídas a partir de orientações e diretivas eo no
contato pessoal; e buscam atingir os objetivos pela eficiência eo pela
interação pessoal (1998:5; grifos meus).
Quanto ao grifado, vale a questão: será que os idealizadores da TV
Escola e seus produtores conhecem os desejos e as necessidades formativas
dos professores brasileiros?
Torres (1998:174) afirma que a política de formação docente na
América Latina prioriza as necessidades do currículo e da reforma educativa
negando "a importância da participação docente na identificação e na
definição de suas próprias necessidades de formação".
Estudo como o de Andaló (1995), que analisa programa de
aperfeiçoamento docente em nível menor, como as secretarias de educação, dá
conta de que os organizadores dos cursos desconhecem as necessidades
formativas dos professores e ministram cursos sem investigar antecipadamente
os temas que os professores gostariam de estar discutindo. O programa TV
Escolao teve, também, essa preocupação.
A expansão da EAD oferece menos o acesso aberto e democrático do
ensino e mais resultado das pressões do mercado e da recessão econômica que
restringe os recursos financeiros à educação (Belloni, 1998:17).
Para Cruz (1997), apesar dos meios de comunicação terem uma larga
história de experiências educativas e as emissoras educativas tentarem chegar
a produtos educativos, que incorporem características da linguagem
audiovisual, o modelo básico ainda consiste na sala de aula convencional e no
livro didático. A aula presencial, segundo a autora,
tem dificultado o sucesso na criação de uma linguagem mais específica para
o fazer educativo nos meios de comunicação. Isso porque um dos principais
atributos da aula presencial, que é a comunicação interativa,o está
disponível para veículos de difusão generalizada como a televisão (Ibidem:
139).
A mesma dificuldade ocorre com os programas da TV Escola e outros
vídeos, filmes, softwares, todavia, o desenvolvimento tecnológico já permite
vencer a barreira do modelo comunicacional da aula presencial: a TV
Interativa, que trabalha o sistema de áudio, vídeo e linha telefônica,
transmitindo imagem e som em tempo real como nas videoconferências. A
aula interativa virtual possibilita a expressãoo apenas dos assuntos
pedagógicos, uma vez que aspectos da comunicação surgem de forma bem
específica, tais como as questões de recepção queo resolvidas em tempo
real, o que demonstra a necessidade de que a EAD promova uma discussão
mais profunda sobre o assunto tempo/espaço.
3. O tempo e o espaço e a educação a distância
Refutando a forma esférica do Planeta Terra, nos séculos XII a XVI
dizia-se:
Há alguémo extravagante para se persuadir de que há homens que tenham
oss no alto e a cabeça embaixo, que tudo o que está deitado neste país
esteja suspenso naquele; e que as gramas e as árvores lá cresçam
descendo, e que a chuva e o granizo lá caiam subindo? (Randles, apud
Tilburg, 1995:198).
o descobertas humanaso significativas, como a redondeza da Terra,
que trazem perplexidade aos homens, como ocorreu nos séculos XII a XVI.
Outro ponto que diferencia as épocas é o conceito de tempo. Para
Heidegger, "o tempo é anterior a toda subjetividade e objetividade porque
oferece a condição da própria possibilidade do antes" (apud Brugger,
1987:403).
O tempo foi, inicialmente, representado pelos processos cíclicos da
natureza, depois, por intermédio de uma medição primitiva até que o relógio
mecânico mudasse a vida societal. Segundo Elias (1998:153),
"à medida que as sociedades humanas tornaram-se mais diferenciadas e mais
complexas, elas passaram a precisar de uma regulação temporal cada vez
mais exata e sem variações ". O relógio e o calendáriom função reguladora
das relações sociais. Woodcock (apud Aranha e Martins, 1996: 289), ressalta
que o homem ocidental civilizado passa a viver de acordo com as horas
marcadas pelo relógio, e assevera:
É ele (o relógio) que vai determinar seus movimentos e dificultar suas ações.
O relógio transformou o tempo, transformando-o de um processo natural em
uma mercadoria que pode ser comprada, vendida e medida como um
sabonete ou um punhado de passas de uvas.
Para o capitalismo, tempo vale dinheiro. Hoje, especialmente, a alta
velocidade é apresentada como carro-chefe das agências que oferecem pacotes
informativos. "Afinal, tempo é dinheiro - todas elas repetem à exaustão"
(Moraes, 1997: 27).
Desde o ano 46 a. C. , o calendário na Roma republicana já era
organizado para regular as relações sociais, definir a data das eleições,
pagamento de impostos, aluguéis, dívidas, juros. As reformas, pelas quais o
calendário passou, evidenciam uma crescente desvinculação entre seus
símbolos, e o que exprimiam, como o movimento do sol, da lua, das estrelas.
Hoje, o calendário jáo é objeto de interesse para o público em geral (Elias,
1998).
Na segunda metade do século XX novas perplexidades , incertezas, e
os dois componentes da vida societal, tempo e espaço, sofrem transformações.
Se as duas dimensões - a virtualidade do tempo e do espaço provocada pelas
novas e novíssimas tecnologias - causam perplexidade, analisá-las na
educação em geral e na educação a distância, de forma especial, torna-se ainda
mais instigante.
Discutir o tempo e o espaço na educação a distância implica em
conceituar termos bem próximos do nosso cotidiano, mas que, ao mesmo
tempo,m significaçõeso complexas. Significa assumir a discussão do
tempo escolar e sua pedagogia.
Conforme o dicionário de filosofia de Brugger (1987:402), o tempo é
uma espécie de duração, duração de seres mutáveis. Há um tempo físico e um
tempo imaginário. Enquanto o primeiro é uma determinação real das coisas
temporais, o tempo imaginário tem duração abstrata, é resultado de um longo
processo evolutivo conceituai, é fruto da razão.o tem princípio, nem fim, é
unidimensional.
Hoje, vive-se o tempo das tecnologias disparadas (Moraes, 1997:7) em
que as informaçõeso imediatas, propiciadas pela alta tecnologia e redes
sistêmicas mediante transmissões em tempo real. Segundo Moraes, fundou-se
um "regime de temporalidade única, assentado na veiculação intermitente de
informações" (Ibidem: 26).
Dreifus (1996) considera a época atual como a das perplexidades de três processos estonteantes: a
globalização financeira e dos modos de produzir, a mundialização dos costumes e a planetarização política.
Esses processos ancoram-se na aceleração tecnológica que trazem uma nova formação "tecnoinfossocietária".
A aceleração das transmissões faz desaparecer a separação entre o
próximo e o distante. O tempo eletrônico ignora o tempo real. "O tempo veloz
é um tempo ultracurto, contraído, em contraposição ao tempo extensivo, das
longas durações", diz Moraes (Ibidem: 28). As linhas divisórias entre o aqui e
o ali dependem do tráfego eletrônico e do horário das programações
mediáticas. O tempo fica sem referências, "sem raízes", completa o autor.
A velocidade tecnológica estabelece uma nova relação entre o tempo e o
espaço. O espaço, como territorialidade, se altera. Assim como na tela da
televisão, novos espaços invadem a sala de estar e a tecnologia das redes
telemáticas acelera a visita a novos espaços, de maneira virtual, que, no
vernáculo, significa aquilo que "existe como faculdade, porém sem exercício
ou efeito atual".
As transmissões ao vivo, mediadas pela televisão, alteram a percepção
do telespectador com o seu tempo-espaço real. Enquanto janta, após um dia de
trabalho, assiste ao telejornal, que apresenta na tela outros tempos e outros
cenários. O telespectador passa a conviver com diferentes espaços-tempos,
simultaneamente.
Atualmente, a aceleração tecnológica, que se materializa na vida social,
faz com que nosso tempo interno, imaginário, sofra pressões da vida urbana e
o externo tenha maior influência sobre o interno. A regulação do tempo
exacerba-se.
A complexidade da temática fez-me buscar vários autores que discutem
a questão sob diferentes perspectivas. Apresentarei brevemente suas
concepções de tempo e espaço, e, em seguida, a minha síntese dessas
reflexões e sua relação com a EAD e o TV Escola.
Para Giddens (1991), a uniformidade de mensuração do tempo, trazida
pelo relógio mecânico, levou à padronização mundial dos calendários e
desconectou o tempo do espaço, uma vez que antes do relógio, cada região,
cada lugar, tinha diferentes tempos.
A relação intrínseca entre tempo e espaço existentes antes do aparato
tecnológico permanece nas pessoas, quandoo há mediação da técnica. E o
desenvolvimento das tecnologias que provoca e acentua a separação entre
tempo e espaço.
Considera o autor "esvaziamento do tempo", em grande parte, a pré-
condição para o esvaziamento do espaço, sobre o qual tem prioridade causai.
A coordenação do tempo é a base do controle do espaço.
Giddens tem a seguinte compreensão de espaço vazio:
O desenvolvimento de 'espaço vazio' pode ser compreendido em termos da
separação entre espaço e lugar. O lugar se refere ao cenário físico, situado
geograficamente, onde acontece a atividade social (...) O que estrutura o
localo é apenas o que está presente em cena; a 'forma visível' do lugar
oculta as relações distantes que determinam sua natureza (Ibidem, 26-27).
Quer dizer, a modernidade arranca crescentemente o espaço do lugar.
Infiro daí que o espaço é entendido pelo autor com dimensões mais amplas
que o lugar. E, assim, tem peculiaridades virtuais, não-visíveis no lugar puro,
sem mediação tecnológica. A tecnologia possibilita acessar novos espaços de
um mesmo lugar, por exemplo.
A separação entre tempo e espaço é a condição principal do processo de
desencaixe das instituições, que se refere ao "deslocamento das relações
sociais de contextos locais de interação e suas reestruturações através de
extensões indefinidas de tempo-espaço"(Ibidem:29). As instituições
desencaixadas dilatam amplamente o distanciamento tempo-espaço, por meio
de dimensões padronizadas, "vazias", dos mesmos e, para ter efeito,
dependem de uma outra coordenação, de uma outra recombinação do tempo e
do espaço.
Giddens distingue dois tipos de mecanismos de desencaixe - as fichas
simbólicas, como o dinheiro, e os sistemas peritos - nos quais, entendo,
podemos incluir o desenvolvimento tecnológico e, nele, as NTIC.
Giddens refere-se a sistemas peritos como "sistemas de excelência
técnica ou competência profissional que organizam grandes áreas dos
ambientes material e social que vivemos hoje" (Ibidem: 35). Usar o elevador,
o carro, o avião, significa que o conhecimento especializado neles existente
merece a confiança dos usuários ou, como se diz: "Se não confio no avião,
não entro nele ".
O mecanismo de desencaixe pressupõe e promove a separação entre
tempo e espaço, como condição do distanciamento tempo-espaço que realiza.
"A separação entre o tempo e o espaço (...) tem traços dialéticos", uma vez
que fornece as bases para sua recombinação em relação à atividade social
(Ibidem: 28). Como reforça Harvey (1999:206), "o tempo e o espaço (...) não
podem ser compreendidos independentemente da ação social".
Milton Santos faz uma análise diferente e contesta a de Giddens. "O
meio técnico-científico-informacional é a nova cara do espaço e do tempo",
observa o geógrafo (1997: 45). Foi a unicidade das técnicas, isto é, a
predominância de um único sistema técnico de Norte a Sul, de Leste a Oeste,
que levou à unificação do tempo e do espaço, em termos globais. "O espaço é
tornado único, à medida que os lugares se globalizam"(Ibidem: 43) Os
lugares se unem porque os momentos convergiram. O que acontece em um
lugar pode ser imediatamente comunicado a qualquer outro. Para Santos,
66
a instantaneidade da informação globalizada aproxima os lugares, torna
possível uma tomada de conhecimento imediata de conhecimentos
simultâneos e cria entre lugares e acontecimentos uma relação unitária na
escala do mundo (Ibidem: 49)
Milton Santos contesta Virílio para quem "o espaço terminou", só
existindo o tempo. Para Santos o espaçoo se extinguiu pela aceleração hoje
existente, mas mudou de qualidade. Contesta também Giddens quanto à época
do tempo vazio e do espaço vazio. Para Santos, ocorre o contrário. Vive-se um
tempo da história em que é possível uma "noção concreta de espaço-mundo e
de tempo-mundo, um tempo cheio e um espaço cheio" (Ibidem: 41).
A análise de Harvey (1999:265) caminha nessa linha. Para ele, a
diminuição das barreiras espaciaiso implica o decréscimo da significação
do espaço., inclusive, evidências opostas a isso. Haja vista como o
capitalismo sabe identificar as diferenciações espaciais para poder explorá-las.
Segundo o autor, "com a redução das barreiras espaciais, aumenta muito
mais a nossa sensibilidade ao que os espaços do mundo contêm"(Ibidem:
265).
Como se, há diferentes e contrastantes abordagens do tempo e do
espaço. Norbert Elias (1998) faz uma análise sócio-histórica e filosófica do
tempo, assinalando que as dificuldades que entravam a obtenção de uma teoria
consensual do tempo ocorrem em virtude da incapacidade de se considerar as
funções de orientação e de regulação social do tempo. O mesmo autor observa
que é intrigante perceber como a determinação do tempo, por meio de
instrumentos exatos, disciplina a estrutura da personalidade humana, que é
dotada de uma percepção apuradíssima de tempo, como se fosse uma segunda
natureza (Ibidem:11), aceito como se fizesse parte do destino de todos os
homens.
Santos fala de unicidade de espaços, Giddens de separação entre espaço
e lugar, mas ambos concordam quanto às mudanças empreendidas na
compreensão dos conceitos de espaço e tempo. O tempo instantâneo aproxima
os lugares, conforme Santos. Giddens considera que a padronização separou o
espaço do tempo, o que leva ao desencaixe das instituições.
A análise de Giddens parece mais adequada à análise da EAD, uma vez
que o autor mostra que a dilatação do distanciamento espaço-tempo exige dele
uma nova recombinação. Essa separação tem traços dialéticos e só pode ser
recombinada em relação à atividade social. Nessa linha de análise, considero
que a EAD se inclui no distanciamento do tempo e do espaço e sua
recombinação depende da atividade social que executa - o ensino - no qual os
alunos devem ser os agentes mais ativos.
A análise de Tilburg (1995:205) oferece elementos importantes para o
estudo do tempo e do espaço na EAD. Ele mostra que, ao "tempo individual
(biológico e psicológico), ao tempo coletivo (solar, político, religioso, escolar
etc) e ao tempo físico, (acrescenta-se) o tempo televisivo ( a transmissão ao
vivo)" e este se impõe ao tempo coletivo, mesmo que o telespectadoro
rompa com seu tempo individual ou coletivo. Isto é, pode-se viver diferentes
tempos simultaneamente, além do que a vivência do espaço pode se dar em
um determinado lugar, como simultaneamente, em espaços virtuais. Por
exemplo, de uma casa pode-se acessar virtualmente diferentes espaços. O
poder de síntese de diferentes tempos, em que eventos sucessivoso
percebidos em conjunto, embora sejam reconhecidos como não-simultâneos,
o é uma capacidade inata, mas marcada pela experiência e a aprendizagem,
transmitidas de uma geração à outra. Para Brugger (1987), acontecimentos
simultâneoso coordenados pelo tempo imaginário.
Como afirma Soveral (1999:8), o tempo das máquinas é acelerado, mas
"não aumenta o ritmo existencial porque ele é de outra ordem, não é
uniforme e quantitativo como o tempo mecânico". Esse dado alerta para a
importância da dimensão do tempo individual, como mostra Tilburg, em face
do tempo das máquinas.
E o espaço-tempo escolar? Como essas transformações se manifestam
na escola? Haverá uma crise no espaço-tempo escolar da EAD?
Compreendo que a análise dessa questão na EAD impõe uma nova
categoria de espaço-tempo. E o que buscarei propor aqui. Devo salientar que a
categorização que apresento é didática, para melhor compreensão do
raciocínio, uma vez que as dimensões e aspectos se imbricam mutuamente.
Minha análise incorpora a divisão de Brugger de tempo físico e tempo
imaginário. Enquanto no tempo físico, real, incluem-se as dimensões coletiva
(institucional), cronológica (de medição da ação solar no planeta), e individual
(biológico); no tempo imaginário aparecem o aspecto psicológico da
dimensão individual e a dimensão virtual (do não-real), ou seja, o tempo
imaginário possui duas dimensões: a individual (aspecto psicológico) e a
virtual (não-real).
Em síntese, ficaria assim: Tempo físico - dimensões: coletivo
(institucional); cronológico (medição solar); individual (biológico) e
Tempo imaginário - dimensões: individual (psicológico); virtual (não-real).
Tanto a EAD como a educação convencional situam-se nos dois
tempos, físico e imaginário. Na EAD, porém, há diferenças de ênfases em um
ou outro tempo dependendo do material didático-pedagógico utilizado, bem
como da concepção que se tem de presencialidade. Primeiro, apresento o
presencial da EAD, para então analisar a questão dos materiais.
É possível relacionar o sentido de presença em EAD às duas dimensões
do tempo, o físico e o imaginário, como também à separação de espaço e lugar
analisada por Giddens.
Podem ocorrer, na EAD, dois tipos de presencialidade: o presencial
físico, que se refere ao lugar real e o presencial virtual, que se refere ao
espaço não-real.
O presencial físico ocorre na dimensão física do tempo, nos aspectos
institucional (coletivo), cronológico e individual. Quer dizer, as aulas
acontecem em determinado lugar, - instituição, escola - e em tempos
simultâneos, com encontro de vários indivíduos que, biologicamente, estão
presentes. Neste modelo, a interatividade tem maiores condições de ser mais
intensiva.
No presencial virtual, de um determinado lugar, podem ser visitados
outros espaços, assim como outros espaços podem ser trazidos ao lugar por
meio de tecnologias como o fax, o telefone, o vídeo, o computador, etc. Nesse
tipo de presencial, os usuários definem individualmente, porém relativamente,
a questão do tempo.m maior autonomia para decidir em que tempo irão
estudar, por exemplo, mas, por outro lado, perdem na interatividade, uma vez
que essa é definida pela instituição que oferece o curso de EAD, e pelo tipo de
material, como ainda pela organização e apresentação desse material. A
autonomia do usuário é relativa, porque deve se adequar a um calendário
previamente definido pela instituição que oferece o curso, como ocorre nas
escolas em geral, que se utilizam de aulas presenciais ou não.
Marsden (1996:229) sugere que
O relevante na EADo está entre os professores e alunos, mas entre o
conteúdo de cursos planejados para estudantes abstratos no mesmo lugar e
no mesmo tempo, e a experiência de estudantes concretos em espaços e
tempos remotos, isto é, entre o tradicional conteúdo de cursos e as
necessidades de estudantes que diferem dos estudantes tradicionais.
(tradução minha)
A fim de categorizar os materiais de EAD, reporto-me às três etapas de
tecnologias da inteligência descritas por Lévy. No nível da oralidade, incluo
as aulas presenciais, em que o tempo físico é forte nas três dimensões:
coletivo, por ocorrer em uma determinada instituição, a escola; cronológico,
porque pressupõe momentos comuns, simultâneos, de encontros entre
professores e alunos; e individual porque a presença física do aluno e do
professoro essenciais. O tempo imaginário tem uma força diferenciada pois
a relação presencial física no tempo e no espaço constrói imaginários comuns,
isto é, com alguma isonomia de significados. A inclusão menor de
virtualidades, mesmo que o professor faça uso de vídeos e softwares, coloca o
professor como mediador simultâneo do que é visto, analisado, discutido.
No nível da escrita, incluem-se os materiais impressos, como livros,
mapas, revistas, ou até mesmo o que foi impresso, originário do virtual, das
redes por exemplo. A dimensão física pode enfraquecer-se em relação à
oralidade, havendo um novo referencial de oralidade, a secundária. Enquanto
isso, a dimensão do imaginário adquire mais força, e o individual é mais
solicitado.
Os materiais audiovisuais e telemáticos situam-se no terceiro nível, o
informático-mediático. Nestes, especialmente as dimensões coletiva e
cronológica do tempo físico se enfraquecem, enquanto a dimensão individual
adquire maior força, no tempo físico e imaginário, isto é, no biológico e no
psicológico.
Em síntese,o os seguintes o tempo e materiais presentes na EAD:
Oralidade - aulas presenciais - requer tempos simultâneos, mas
adequados à presencialidade virtual como as videoconferências;
Escrita - materiais escritos, mais oralidade secundária - muito presente
em tempos simultâneos ou remotos;
lnformático-mediático - materiais audiovisuais e telemáticos -
indicados para tempos remotos, embora sejam eficazes em tempos
simultâneos.
A definição do material mais adequado depende do usuário, e da sua
familiaridade com as diferentes mídias.o é certo que os professores
brasileiros, na sua maioria, estão aptos, familiarizados com o vídeo, tal como
pressupõe o TV Escola. Mesmo que estivessem, preferem, como constatou
este estudo,o manusear o videocassete da escola, por temer estragos e pela
falta de recursos que a escola tem, para manutenção dos equipamentos.
Essa categorização dos materiais de EAD pode explicar a importância
da dimensão presencial física na EAD. Embora, como já se disse, a dimensão
do espaço é mais fácil de ser resolvida na EAD, uma vez que a questão do
tempo é mais complexa, uma vez que possui, em seu interior, dimensões e
aspectos que interferem no processo educativo.
A inexistência de encontros presenciais físicos, em grande parte de
programas de EAD, relativiza a dimensão física do tempo, apesar de usar
materiais que a pressupõem, como impressos e audiovisuais queo
dispensam mediações de um professor, por exemplo. Connelly e Clandinin
(1995) salientam que, a relação ensino-aprendizagem necessita de tempo, de
relação, de espaço e de voz, para estabelecer relações de colaboração. A voz é
o sentido que reside no indivíduo e permite a sua participação na comunidade.
A voz é ouvida na interatividade pessoa/pessoa. Como bem observa Ferrer
(1995:230), "as situações educativas são situações existenciais e não
situações técnicas".
Como esclarece Morán (1998), pode haver ouo conflito entre a
comunicação física e a virtual. Os contatos podem ser alimentados
virtualmente, maso qualitativamente superiores pelo contato físico.
Na EAD, a dimensão individual do tempo físico tem controle relativo
do usuário, porque depende de quem elabora o material e da instituição que
oferece o curso. A instituição, por sua vez, controla a dimensão coletiva. A
instituição que oferece o curso de EAD tem o controle do tempo da
interatividade, e determina os meios didáticos, queo os meios de interação
na EAD (Gutierrez e Prieto, 1994). "Nos sistemas de educação a distância a
mediação pedagógica acontece por meio de textos e outros materiais postos à
disposição do estudante" {Ibidem: 62). Supõe-se que sejam materiais
diferentes, pedagogicamente, dos utilizados no ensino convencional. "Não
interessa uma informação em si mesma, mas uma informação mediada
pedagogicamente" {Ibidem: 62). A EAD usa a figura do tutor como o
mediador, que pode interagir com o aluno pela presença física em tempo-
espaço simultâneos, ou por meio de instrumentos como o telefone, o fax, o e-
mail, etc.
Em termos educacionais, a EAD é um tipo de desencaixe, no sentido
proposto por Giddens (1991:29): "deslocamento das relações sociais de
contextos locais de interação e suas reestruturações através de extensões
indefinidas de tempo e espaço". Para surtir efeito positivo, ainda segundo
Giddens, o dilatado distanciamento espaço-tempo das instituições
desencaixadas depende de uma outra coordenação, de uma outra
recombinação de espaço-tempo, e sujeita-se, por sua vez, a uma recombinação
relativa à atividade social do ato educativo, o processo ensino-aprendizagem.
O processo ensino-aprendizagem da EAD difere do processo de ensino-
aprendizagem convencional.
Como destaca Belloni (1999:39), a aprendizagem autônoma da EAD
pressupõe um
processo de ensino e aprendizagem centrado no aprendente, cujas
experiênciaso aproveitadas como recurso, e no qual o professor deve
assumir-se como recurso do aprendente, considerado como um ser
autônomo, gestor de seu processo de aprendizagem, capaz de autodirigir e
auto-regular este processo. Este modelo de aprendizagem é apropriado a
adultos com maturidade e motivação necessárias a auto-aprendizagem e
possuindo um mínimo de habilidades de estudo.
Em relação ao Projeto TV Escola, como um programa de formação de
professores a distância, surgem as perguntas: os milhares de professores aos
quais o programa se dirige estão motivados à auto-aprendizagem? Possuem
habilidades de estudo autônomo? Estão aptos a gerir o seu próprio processo de
aprendizagem? Sabemos, como mostra Belloni lbidem: 40), que, de modo
geral, o estudante de EADo tem esse perfil, ainda mais se se acrescenta a
isso a marginalidade "social e doméstica", a que a EAD está submetida.
4. TV Escola como educação a distância
A TV Escola, apesar da existência da revista e de outros materiais
impressos,o mantém intercâmbio sistemático com os professores para quem
destina seus programas. Analisando a seção de cartas da Revista da TV Escola
pareceo haver o intercâmbio em relação ao processo de ensino-
aprendizagem. As cartas da revista referem-se a aspectos formais do projeto,
pedidos, impressões,o havendo, assim, interatividade quanto aos conteúdos
divulgados por meio dos vídeos.
Levanta-se a questão: o Programa TV Escola seria um meio eficaz de
formação de professores a distância?
A TV Escolao possui os elementos componentes da EAD: aluno,
professor, instituição, mídias, material de apoio, programa, tarefa, avaliação.
Os alunos da TV Escolao os professores em suas escolas; os professores, os
produtores dos vídeos; a instituição, a Secretaria de Educação a Distância do
MEC; as mídias, o próprio canal de TV e o kit eletrônico. Os programas
podem ser definidos como os conteúdos da escola fundamental mais
aprofundados, e as revistas e os cadernos da TV Escola, o material de apoio,
porém, os dois elementos centrais no processo de ensino e aprendizagem - as
tarefas e as avaliações - estão ausentes da TV Escola. Foram feitas duas
avaliações do Projeto TV Escola,o dos professores e do seu aprendizado,
Durante o processo de formação, quais tarefas os professores usuários
da TV Escola devem executar para verificar a compreensão dos conteúdos
veiculados pelos vídeos?
Dois dentre sete pressupostos mencionados por Pfromm (1998)
merecem destaque. Primeiro, a compreensão de EAD como
um sistema de maior amplitude, especialmente estruturado em seqüência,
sob a forma de lições sistemáticas, e inclui meios pré-elaborados de
19
Vale anotar que avaliação pedagógica é diferente de avaliação nacional realizada pelo sistema gestor;
enquanto a pedagógica é fundamental como diagnóstico do processo de aprendizagem do aluno, para
posterior intervenção do professor; a avaliação do sistema serve como mensuração de produtos. Daí minha
posição em defender a avaliação pedagógica na perspectiva da abordagem plural e dialógica (Sousa, 1997) e
fazer a critica da avaliação nacional, que se coloca em uma abordagem de avaliação objetivista e de
mensuração de resultados, apenas.
Os sete elementos são:l) uso de diferentes tecnologias; 2) integrar com educação presencial; 3) distância no
espaço e/ou no tempo; 4) acesso dos usuários ao material de ensino; 5) estudo livre em casa ou organizado
em outros locais; 6) uso de mediações que substituam total ou parcialmente o professor e; 7) o material deve
possuir componente critico que o diferencie dos materiais convencionais (Ibidem: 50-51).
avaliação, exercício, revisão, orientação e reorientação do estudante, de
acordo com uma periodicidade pré-determinada de exposição ao material de
ensino-aprendizagem, que pode durar alguns dias, semanas, meses ou anos
(Ibidem: 51).
O outro aspecto refere-se à existência de avaliações formativas ou
somativas no próprio material e "do indispensável feedback proporcionado ao
aprendiz". Os dois itens consistem na mediação necessária para a
aprendizagem, qual seja, a relação professor/aluno total ou parcial, direta ou
indireta, pessoal ou a distância, como também ter componente crítico no
material que o diferencie de materiais convencionais. A TV Escolao
apresenta nenhum desses elementos.
Conforme Belloni (1999), a orientação teórica fordista de educação de
massa, de inspiração behaviorista e tecnocrática, desde a década de 90, vem
perdendo terreno para uma educação mais aberta, flexível, de cunho
humanista, tanto na educação convencional, como na EAD.
Denominada aprendizagem aberta (AA) ou aprendizagem flexível, a
nova filosofia de EAD busca atender às diversidades regionais, locais, dos
estudantes e dos currículos, bem como à necessidade de formação continuada
realizada no ambiente de trabalho.
Se o caráter aberto e sem orientações da TV Escola busca a
aprendizagem autônoma (o que é pouco provável, por causa da imagem que a
sociedade e o governo possuem do professor), vale destacar que o modelo de
aprendizagem autônoma é apropriado para adultos motivados e com
maturidade, contrastando com o perfil de estudantes de EAD, geralmente
passivos.o se pode deixar de considerar as características do aprendente e
as condições de estudo .
E a TV Escola ? Será que os professores capacitados por elam
maturidade? A TV Escolao foi criada justamente para capacitá-los?
Realizou-se estudo prévio de suas condições de "estudo na escola"?
O estudante autônomo ainda é exceção no universo de nossas
universidades abertas ou convencionais, destaca Belloni (1998:8). A educação
em geral e o ensino superior, em particular, devem transformar-se para
propiciar uma aprendizagem autônoma.
Torres (1998) ressalta que as avaliações de programas de capacitação a
distância de docentes demonstram que esses programaso mais úteis para
informação e atualização de conhecimentos, masm grandes limitações
quanto à formação pedagógica.
A relação indireta no espaço e no tempo entre professores e alunos na
EAD torna ainda mais complexo o já intrincado processo de ensino
aprendizagem. O contato regular e eficiente que permite interação satisfatória
entre estudantes e instituição ensinante é crucial para a motivação do aluno,
condição indispensável para a aprendizagem autônoma (Belloni, 1998:8).
Ainda segundo Belloni (Ibidem:6), a idéia de auto-aprendizagem é
crucial para a EAD, muito mais do que para o ensino convencional. Neste, a
intersubjetividade pessoal entre professores e alunos promove
permanentemente a motivação. Na EAD, o sucesso do aluno, isto é, a eficácia
do sistema, depende em grande parte da motivação do estudante e de suas
condições de estudo.
Historicamente, no Brasil, considera-se a EAD um paliativo para os
problemas da educação nacional, como também um marginal portanto, de
baixo prestígio e de pouco valor, o que é percebido pela reação negativa que
os professoresm da TV Escola. Essa "resistência", no sentido desenvolvido
por Giroux e McLaren, funciona como negação às práticas dominantes, e
costuma carecer de um projeto político explícito e freqüentemente reflete
práticas sociais de natureza informal, desorganizada, apolítica e ateórica. Em
alguns casos, pode resumir-se a uma irrefletida e derrotista recusa a aceitar
diferentes formas de dominação; em outros, pode ser vista como rejeição
cínica, arrogante e até ingênua a formas opressivas de regulação moral e
política (1995:132).
Enquanto a matrícula em um curso de EAD faz-se conforme a vontade
do usuário, a TV Escola surgiu sem ser requisitada pelos professores eo
responde às suas necessidades. Pode ser que muito dos programas atendam
aos anseios dos professores, porém,o inúmeras as resistências porque o
projeto aconteceu por imposição governamental.
No início da coleta de dados, especialmente em uma das escolas, a
resistência em discutir ou simplesmente em falar sobre a TV Escola era nítida
e incluía até rejeição da pesquisadora, como se a mesma fosse o preposto do
Estado na escola. Precisei argumentar que estava alio para defender, nem
avaliar a TV Escola, tampouco para verificar se a escola a utilizava,
sustentando ainda que tinha por objetivo estudar a recepção dos vídeos.
No Protocolo de Registro (PR) da Escola Joaquim Almeida, consta o
protesto de uma professora, feito na sala dos professores, no intervalo do
recreio, logo após a coordenadora pedagógica ter informado aos professores
que dali a dois dias seria feita a escolha do livro didático e que eles deveriam
estar na escola às 13 horas, uma vez que a primeira hora seria destinada à
sessão de vídeo. Uma das professoras contestou e disse, com aspereza: "A
escolha deve ser feita no meu horário de trabalho, e aqui eu dou três aulas.
Depois devo ir para outro serviço".
A coordenadora a tranqüilizou a professora dizendo que tudo estaria
pronto na hora em que chegassem e que ela só faria a análise dos livros,
durante o horário de trabalho (PR, 1998, n.7:13).
A primeira vista, a atitude da professora pode até significar
preocupação com o horário de trabalho, entretanto, as circunstâncias em que
ocorreu a discussão, a aspereza de sua voz, na presença dos colegas, em voz
bem alta, indicam que uma sessão durante o horário de trabalho estaria
"atrapalhando" o seu serviço e elao queria ser prejudicada pela intromissão
da pesquisadora da TV Escola.
A resistência, percebida como simples rejeição (como os professores
que disseram preferir os vídeos locados do que os da TV Escola, mesmo sem
os conhecer), ocorre, como salientaram os autores acima citados, de forma
desorganizada, individual e irrefletida.o há sustentação política,
pedagógica ou didática que justifique a inutilidade do uso dos programas ou a
irrelevância da proposta da TV Escola na educação de hoje. Os argumentos
mais explicitados referem-se à organização da escola, no entanto, em ambas
escolas foram feitos de forma individual; por outro lado,o existe, nas duas
escolas, projeto coletivo dos professores na tentativa de reverter o quadro.
Analisando os processos educativos e os canais de comunicação na
EAD, sob a perspectiva das teorias da comunicação, Mário Kaplún (1999),
alerta que é fundamental ultrapassar a visão redutora de considerar a
Comunicação Educativa como meios e tecnologias de comunicação. É preciso
incluir na análise de EAD, privilegiadamente, "o tipo de comunicação
presente em todo processo educativo, seja ele realizado com ou sem o
emprego de meios" (Ibidem: 68), implicando em considerar a Comunicação
o apenas em sua dimensão técnica, mas entendê-la como um componente
pedagógico. A Pedagogia lida com base na Comunicação e a Comunicação
lida com base na Pedagogia.
Insistir na dimensão tecnológica, sublinha Kaplún, significa manter a
'educação bancária' em moderna versão de caixa automático dos bancos.
Lembrando o caráter socializante do aprendizado, proposto por
Vygotski e Bruner, o autor diz que o ensino a distância serve ao estudante
individualmente, porém, a reflexão é muito mais fácil no processo coletivo.
Na EAD, como está sendo concebida, o aluno só se comunica e dialoga
consigo mesmo (Sarramona, apud Kaplún, 1999:71), e o grupo e a palavrao
subtraídos ou supérfluos. Daí as questões: Como confrontar seu pensamento?
"A comunicação só consiste em poder fazer consultas e aclarar dúvidas?"
Caminha-se em direção da instauração de um "arquipélago global,
composto de seres tecnologicamente hipercomunicados mas socialmente
isolados" (Ibidem:71). Quanto maior a multiplicidade de fluxos
comunicativos, quanto melhor é o sistema educativo.
Mais do que obter meios que falam é preciso usar os meios para se falar.
Essa é a maneira de superar a racionalidade tecnológica e atribuir competência
comunicativa aos que buscam a EAD.
Para Morán (1998), a comunicação e a interatividade, propiciadas pelas
novas tecnologias estão cada dia mais e mais sensoriais, mais e mais
multidimensionais e mais e mais não-lineares. Segundo o mesmo autor, as
pessoas relacionam-se pouco com o mundo em termos presenciais, visto que
interagem com poucas pessoas, vivem em poucos lugares, ocupam poucos
espaços, mas podem ter contato com o mundo inteiro, por meio de satélites,
telefone, jornais, revistas, rádio, televisão.
O autor descarta conseqüências apocalípticas nas comunicações
virtuais, uma vez que há muito fazem parte da vida das pessoas. Assistir a
21
Educação bancária foi denominada por Paulo Freire para a educação que concebe o aprendiz como um
caixa bancário que apenas recebe conhecimento. Igualmente, a escola tradicional visa depositar informações
filmes, ver novelas significa ter contatos virtuais, no entanto, hoje existem
maiores possibilidades de comunicação virtual, em ritmo mais acelerado e a
um preço reduzido.
O importante é usar
as velhas e as novas tecnologias de comunicação de forma cada vez mais
libertadora, mais criativa, para comunicar-se melhor, para aprender mais e
tornar a nossa sociedade menos consumista e mais humana (Ibidem: 87).
O documento do Programa Nacional de Educação a Distância (PNEAD)
99
do MEC e PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) -
Projeto BRA/96/008 (Brasil/MEC/SEAD, 1996) - nega a concepção de EAD
que mantém o esquema ensino-aprendizagem e a relação hierárquica entre
professores e alunos. Segundo o mesmo documento, as aplicações
tecnológicas da teoria da informação tornaram obsoletos os processos
tradicionais, "especialmente o da relação ensino-aprendizagem" (p.7) e
indicam uma nova relação educativa, agora entre o usuário e a fonte de
informação.
EAD é definida como:
o conjunto de facilidades, sistematicamente organizados, oferecidas a todo
tipo de usuário, que utiliza todo tipo de meio adequado, com o propósito de
intermediar a aquisição de conhecimento ou determinada habilidade, sem
que para isso haja necessidade de interação presencial
(Brasil/MEC/PNUD, 1996:8).
no aluno, desconsiderando o saber que possui.
O apoio do PNUD é justificado pela especialidade desse organismo internacional, que tem preocupação
com o desenvolvimento humano e oferece "substancial e operacional assistência técnica para aumentar a
eficácia dos projetos" (Brasil/MEC/PNUD,1996:19). O suposto para atuação do PNUD é "a busca da
eqüidade entre o desenvolvimento econômico e o desenvolvimento social, para atingir políticas públicas
educacionais que proporcionem equilíbrio na distribuição de renda".
Nessa concepção, o documento diz que a EAD coloca o aprendiz no
centro do processo, respeita seu ritmo e sua disponibilidade, estimulando-o a
participar e cooperar, motivando-o a aprender, a auto-formar-se.
No Brasil, a EAD "responde a um anseio de toda a população por uma
educação moderna e de melhor qualidade" (Ibidem: 10), e nesta modalidade
de educação, todos os esforços da atual política educacional se concentraram-
se no Projeto "TV Escola", que conta com recursos do Projeto Nordeste
23
,
separados por meio do BRA/92/003
24
por se tratar de uma inovação.
Por intermédio da EAD e da tecnologia, o MEC pretende dar um "salto
de qualidade" (Ibidem: 16) no ensino do país, uma vez que entende que "a
falta de acesso das escolas públicas a tecnologias e equipamentos, bem como
a pouca utilização das metodologias e técnicas de educação a distância
constituem-se, portanto, nos principais problemas a serem superados por este
projeto" (sic).
O PNEAD prevê também que a capacitação continuada dos professores,
com o uso da tecnologia, leve sua incorporação ao cotidiano da prática
pedagógica, o que poderá ensejar autonomia e desejo de aprender. Assim, a
escola pública sintoniza-se com o seu tempo, pois além de elevar o padrão de
qualidade de seu trabalho, diminui as taxas de evasão e repetência e aumenta a
média geral de rendimento escolar dos alunos.
A EAD apresenta-seo apenas como estratégia para
23
O projeto Nordeste é um subcomponete nacional do Projeto de Educação Básica para o Nordeste dentro do
VI Acordo MEC/BIRD aprovado em 1992 que destina recursos para o ensino a distância. Os recursos de
contrapartida provêm do FNDE e do Tesouro.
Denominado "Centro de referências para as inovações e experimentos", este projeto, implementado pelo
INEP/CRIE, visa a implantação de um sistema de seleção, organização, produção e disseminação das
informações, experimentos, inovações e pesquisas nacionais de sucesso para contribuir na formulação de
Políticas públicas e atingir melhoria da qualidade do ensino básico (Brasil/MEC/PNUD,1996:14).
aumentar a produtividade da escola e garantir a eqüidade do ensino público,
mas também para incentivar e promover a busca de novas possibilidades
identificadas pelo próprio aluno e pela própria escola e comunidade, de
forma autônoma e participativa {Ibidem: 20).
Porém, como alerta Saraiva (1996:17), programas de educação a
distância ultrapassam a existência de simples material tecnológico e
instrucional. E preciso deixar à disposição do aluno atendimento pedagógico
que deve ocupar lugar central no planejamento de EAD, contudoo foi isso
que ocorreu com a TV Escola.
Na mesma linha de análise, Moraes (1996:58) assinala que a visão
tradicionalista de ensino, reforçadora da fragmentação do conhecimento, ainda
é usada apesar de moderníssimos equipamentos, como a multimídia e a
hipermídia, porém,o oferece garantia de boa qualidade pedagógica dos
cursos.
A manifestação de opiniões conflitanteso significa desprezar ou
minimizar a importância da EAD, mas alertar para os riscos que oferecem a
demasiada preocupação com os aspectos tecnológicos, abrindoo de
importantes aspectos do processo pedagógico, os quais, casoo sejam
levados em conta, especialmente pelas políticas educacionais, podem provocar
a perda de substantivos esforços de ordem financeira e de gestão.
CAPÍTULO III - MARCO TEÓRICO DOS CAMPOS TEMÁTICOS -
grazzing
25
A condução da vida supõe, para cada um, uma vida
própria, embora mantendo-se a estrutura da
cotidianidade; cada qual deverá apropriar-se a seu
modo da realidade e impor a ela a marca de sua
personalidade.
Agnes Heller
Pretende-se realizar o presente estudo com base em três campos
teóricos. Os campos definidos anteriormente incluíam as pesquisas sobre
formação de professores e o professor reflexivo, bem como os estudos sobre
recepção e as relações entre educação e comunicação. Este último, embora
merecesse estudos e produção de texto,o se constituirá em um tópico em
separado no presente trabalho. Acresceu-se, entretanto, o tema da gestão e
organização da escola, em virtude da importância que esses fatores adquiriram
no decorrer do processo da pesquisa. A forma de gestão e organização da
escola éo fundamental no processo de recepção dos vídeos e também para
outros fatos da escola, que se tornou a mediação definida como organizativo-
institucional.
25
Grazzing refere-se à troca de canais muito utilizada pelos jovens que assistem a vários programas ao
mesmo tempo e que tende a aumentar a estimulação sensorial (Ferrés, 1996). Neste trabalho, refere-se à
diversidade de referenciais necessários para compreender teoricamente o programa de formação de
professores.
Os referenciais teóricos, que orientaram a coleta e a análise dos dados
referentes aos campos temáticos, incluem estudos sobre a categoria do
professor reflexivo, da recepção, da relação comunicação e educação e de
aspectos atinentes à gestão e organização da escola.
1. Revisão bibliográfica
A revisão bibliográfica de um projeto de pesquisa antecede até mesmo
sua elaboração. Um pesquisador só define um problema com base em um
conhecimento prévio a respeito de uma determinada temática. Interessado e
estudioso de um determinado assunto, é natural que acompanhe as reflexões e
publicações que ocorrem sobre ele. Se em tempos passados, de menor
desenvolvimento tecnológico, a revisão de bibliografia, requisito fundamental
para qualquer estudo, fazia-se de forma demorada, atualmente, em um
contexto de profundas e rápidas transformações tecnológicas, que se refletem
em diferentes âmbitos da vida social, a revisão é rápida mas nem sempre se
tem garantia da última palavra em qualquer temática, porque nem sempre estar
com a última palavra significa estar com o mais importante para um
determinado grupo social ou para uma determinada comunidade científica.
A revisão bibliográfica possibilita a contextualização do problema
dentro da área de estudo, da mesma forma que colabora na definição e análise
do referencial teórico.
No presente estudo, a revisão teve início em 1996 pelas leituras de uma
bibliografia nova para mim, e que me despertaram para a temática do
professor reflexivo. A bibliografia incluía livros e textos de Antônio Nóvoa,
Domingo Contreras, Kenneth Zeichner, Philippe Perrenoud, Donald Schõn,
Angel Perez Gómez, Carlos Marcelo Garcia.
Outras publicações nacionais sobre professores, sua formação e
profissionalização deram-me suporte para uma melhor compreensão da
temática, além da participação em eventos científicos da área de Educação e
Comunicação.
Com antecedentes de formação em Comunicação Social e atenta à TV
Escola, criada pelo governo federal em março daquele mesmo ano, comecei a
perguntar-me se os programas deste canal destinados a formar professoreso
poderiam colaborar na formação de professores reflexivos. Conhecedora de
alguns programas destinados à formação de professores, admitia uma hipótese
afirmativa.
No campo da Comunicação, destaco a participação ativa no Grupo de
Trabalho (GT) Educação e Comunicação da ANPEd, a associação à Sociedade
Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, cujas publicações
recebo periodicamente.
Relevantes para este estudo, enumero também as disciplinas "Tópicos
especiais em administração escolar" e "Necessidades formativas dos
professores", cursadas no Doutorado da Unimep, em 1997, e "Educação para
os meios" que freqüentei, em 1998, no Mestrado em Educação da FE/UFG,
enriquecendo meu conhecimento sobre as teorias da comunicação e, em
especial, as teorias de recepção e os estudos latino-americanos de pesquisa e
de intervenção, de educação para os meios.
Como foi discutido no Capitulo I, a aproximação entre educação e
comunicação pode ter diferentes perspectivas de análise. Do ponto de vista
epistemológico, a aproximação entre as duas áreas é fértil; mas é frágil supor
que um objeto de estudo comum aos dois campos possa dar conta das
complexidades teóricas e metodológicas de ambas as áreas.
A realização de pesquisas que integrem as duas áreas é importante para
aproximar teórica e epistemologicamente educação e comunicação,
garantindo, porém, que se preserve um nível de unidade na diversidade. Esse
nível de unidade, conforme Gatti (1992:108) "reside na perspectiva com que
se constrói o objeto investigado ".
Apontado como fragilidade nas duas áreas, especialmente a indefinição
do objeto de estudo, é uma problemática existente também em outras teorias
ou ciências e de algumas ciências sociais e humanas, e que, nem por isso,m
deixado de oferecer importantes contribuições na totalidade do conhecimento.
Há predisposição dos pesquisadores das duas áreas em avançar nesse debate e
contribuir para o desenvolvimento científico nesses campos teóricos de forma
aglutinada.
O processo educativo representa uma das ações mais remotas do ser
humano e consiste primariamente na transmissão por meio da comunicação, o
que, por si, justifica estudos que conjuguem os dois campos. Porém,
atualmente, com o desenvolvimento acelerado das tecnologias e dos meios de
comunicação, mais do que nunca há requisição desses estudos e deles é
cobrado um maior refinamento.
Os estudos da recepção como resultado de múltiplas mediações, por
levar em conta a cultura e seus agentes, proporciona uma relação fértil com a
educação, em especial, a escolar, em que a comunicação aparece em sua
forma mais pura, a comunicação entre pessoas singulares.
2. Formação de professores e professor reflexivo
Gómez (1992:95-96) observa que as orientações adotadas ao longo da
história de formação de professores determinam-se pelos conceitos de escola,
ensino e currículo prevalecentes em cada época. As metáforas de professor
como modelo de comportamento, como transmissor de conhecimento, como
técnico, como executor de rotinas, como planejador, como sujeito que toma
decisões ou resolve problemasm subjacente "uma determinada concepção
da escola e do ensino, uma teoria do conhecimento e da sua transmissão e
aprendizagem, uma concepção própria das relações entre a teoria e a prática,
entre a investigação e a ação"(Ibidem: 96).
Segundo análise de Garcia (1992), a formação do professor converte-se
no elemento-chave, na pedra angular dos projetos de reforma do sistema
educativo.
O discurso das reformas usa o slogan do professor reflexivo como
modelo de formação docente. Como explica Zeichner (1993: 15),
Além dos esforços levados a cabo na América do Norte no sentido da
questão reflexiva passar a ser a componente central da reforma educativa,
assistimos a esforços semelhantes em países como o Reino Unido, Austrália,
Noruega, Holanda, Espanha, India, Tailândia e Singapura.
Há muita polêmica a respeito do significado do termo. Outro alerta do
autor refere-se ao uso que as reformas fazem da idéia de prática reflexiva.
Segundo Zeichner, o discurso das atuais reformas educativas, ao contrário de
dar autonomia aos professores, produz, de forma sutil, novos dispositivos de
controle sobre os docentes levando-os a uma maior dependência. Conforme
observa Popkewitz (1997), considerar intervenção e regulação como progresso
tem sido o senso comum das reformas.
Há quatro características no atual movimento reformista que minam a
intenção de emancipação proposta pela idéia de professor como prático
reflexivo: 1) a avaliação dos professores leva-os a uma melhor imitação das
práticas sugeridas nas investigações já realizadas; 2) dentro da racionalidade
técnica, o processo reflexivo limita-se à consideração das capacidades e
estratégias de ensino; 3) desprezo das condições sociais do ensino; 4)
insistência no processo de reflexão individual eo coletivo.
Zeichner utiliza o termo desde os finais dos anos 70, articulando-o às
quatro tradições históricas da prática reflexiva: a) a representação das
disciplinas; b) o pensamento e compreensão dos alunos; c) estratégias de
ensino sugeridas pela investigação; d) conseqüências sociais e contextos do
ensino. Pretendendo distinguir sua proposta das demais, o autor propõe três
princípios para manter sua perspectiva emancipadora do professor como
crítico reflexivo. Em primeiro lugar, a atenção do professor deve voltar-seo
apenas para dentro da sala de aula, para a sua própria prática, como deve
conter as condições sociais, políticas e econômicas nas quais sua prática
ocorre. A prática reflexiva do professor deve conter questões que levem em
conta as situações de desigualdade e injustiça que os alunos trazem para o
interior da sala de aula, sem ignorar, assim, questões concretas relativas à
classe social, raça, etc. Assim, a prática reflexiva reveste-se de tendência
democrática e emancipadora. O terceiro princípio debruça-se no compromisso
da reflexão como prática social na construção de comunidades de
aprendizagem em que os professores apoiam e sustentam o crescimento uns
dos outros (Zeichner, 1993: 25-26). A reflexão é, portanto, um ato dialógico.
E preciso salientar, porém, que, quando se fala em formação docente,
assumem-se determinadas posições epistemológicas, ideológicas, culturais que
compõem paradigmas específicos de formação docente. Nesse particular
entende-se paradigma "como uma matriz de crenças e suposições sobre a
natureza e os propósitos da escola, do ensino, dos professores e da sua
formação, que configuram um conjunto de características específicas na
formação de professores"{ Zeichner apud Garcia, 1992:54).
Nesta perspectiva, Garcia destaca a conveniência de estabelecer dois
princípios de formação docente. O primeiro concebe a formação de
professores como um continuum, que pressupõe uma forte interconexão entre
a formação inicial e a formação permanente, significando que a formação
inicialo se faz de forma completa, acabada, mas é uma fase de um longo,
diferenciado e incompleto processo de formação profissional. Garcia designa
o outro princípio como indagação-reflexão, referindo-se à análise das causas e
conseqüências da conduta docente, cuja estratégia deve ser usada na formação
inicial e continuada, de forma a facilitar a conscientização dos professores
para os problemas da prática de ensino.
O segundo princípio é fundamental, uma vez queo existe solução
geral nem teoria única para todos os problemas educativos, cabendo ao
professor identificá-los e buscar a melhor solução para a situação escolar
atual, o que, porém,o é possível dentro da concepção formativa inscrita no
quadro da racionalidade técnica.
Conforme esse modelo (Gómez, 1992:96) "a atividade profissional é
sobretudo instrumental, dirigida para a solução de problemas mediante a
aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas" derivadas de
investigações realizadas pela academia, pela universidade, ocorrendo uma
separação pessoal e institucional entre a investigação e a prática, o que leva a
uma hierarquização do conhecimento que estabelece "uma relação de
subordinação dos níveis mais aplicados e próximos da prática aos níveis mais
abstratos de produção do conhecimento" (Ibidem: 97). Assim, cabe ao
professor executar e aplicar conhecimentos produzidos por outros e em outras
instâncias.
A alteração do modelo formativo implica em reconhecer o professor
como profissional capaz de refletir sobre a sua prática e, baseado nela, criar
conhecimento. Denominado racionalidade prática, esse modelo busca
superar a relação linear e mecânica entre o conhecimento científico-técnico e
a prática na sala de aula", (partindo) "da análise das práticas dos professores
quando enfrentam problemas complexos da vida escolar, para a
compreensão do modo como utilizam o conhecimento científico, como
resolvem situações incertas e desconhecidas, como elaboram e modificam
rotinas, como experimentam hipóteses de trabalho, como utilizam técnicas e
instrumentos conhecidos e como recriam estratégias e inventam
procedimentos e recursos (Gómez, 1992:102).
O quadro a seguir destaca as diferenças entre os dois modelos
formativos, racionalidade técnica e racionalidade prático-reflexiva, com base
em seus elementos centrais, como concepções de professor, de ensino, de
conhecimento profissional, do aluno, do saber e da formação docente.
Quadro 1 - Modelos formativos de professores
CONCEPÇÕES
Características
Professor
Ensino
Saber
Aluno
RACIONALIDADE
TÉCNICA
Separação entre teoria
e prática; esta vem no
final do curso;
A prática é dependen-
te da assimilação do
conhecimento
acadêmico;
Técnico que aplica o
conhecimento
produzido pelos pes-
quisadores;
As metas da sua inter-
vençãoo definidas
externamente;
Atividade
instrumental,
aplicação rigorosa de
teorias e técnicas cien-
tíficas;
Intervenção tecnoló-
gica
Verdades prontas for-
muladas pelos inves-
tigadores
Tábula rasa;
Objeto do conheci-
mento
RACIONALIDADE PRATICO-
REFLEXIVA
A prática é eixo central do currículo; é ativi-
dade criativa;
Mobiliza o conhecimento produzido no dia-
logo com a situação real;
Nega separação artificial entre teoria e
prática;
Prática é mais processo de investigação do
que contexto de aplicação;
O professor incorpora e transcende o
conhecimento da racionalidade técnica;
O professor conhece a estrutura da disciplina
que trabalha, reflete sobre o ecossistema da
as-la de aula, constrói uma teoria adequada à
situação e elabora estratégias de ação;
Reflete na e sobre a prática;
Integração inteligente e criativa do conhe-
cimento e da técnica;
Os fenômenos práticos na aula se caracte-
rizam pela complexidade, incerteza, instabi-
lidade, singularidade e conflito de valores;
Na práticao há problemas, mas situações
problemáticas que se apresentam como casos
únicos, que podem ser solucionados por
processos técnicos, intui-tivos e artísticos
Inconcluso, histórico
Reelaborador e elaborador de conhecimen-
tos, dirigido competentemente pelo professor
Conhecimento
Profissional
Competências
Formação
Profissional
Há hierarquia nos
níveis do conheci-
mento: ciência básica,
ciência aplicada, com-
petências e atitudes;
Há diferentes estatutos
acadêmicos e sociais
das pessoas que pro-
duzem conhecimento
Pesquisa é princípio
científico, atributo de
algumas pessoas
Formar por competê-
ncias:
a) científico-cultural
(conteúdos) b) psico-
pedagógico (duas
fases);
Aprendizado dos prin-
cípios, leis e teorias
sobre o processo
ensino/ aprendizagem;
Aplicação real ou si-
mulada de tais regras
e normas
Idiossincrático, construído lentamente pelos
profissionais no seu trabalho diário;
o é ensinado, mas é aprendido
Pesquisa é atitude cotidiana de questionar per-
manentemente a realidade
A reflexão sobre a ação é essencial na
formação, e consiste nas considerações que o
profissional faz em situações problemáticas,
incertas e conflituosas: caracterizar a situação
nova, rever o diagnóstico, determinar metas,
escolher os meios e formas de representar a
realidade;
Saber reconstruir, com base na prática, os
conhecimentos e colocá-los a serviço da cida-
dania, saber e mudar, teorizar e intervir.
Fonte: quadro elaborado pela autora deste estudo, com base em leituras sobre o tema.
A formação do professor reflexivo inclui uma série de destrezas de
conduta que se referem, conforme Garcia (1993:61), a habilidades cognitivas e
metacognitivas. Pollard e Tann (apud Garcia, 1992:61) enumeram as
destrezas:
- empíricas (apreender dados objetivos e subjetivos);
- analíticas (construir a teoria com base na análise dos dados);
- avaliativas (saber emitir juízos);
- estratégicas (planejar ação e antecipar sua implantação conforme
análise);
- práticas (relacionar análise com prática);
- comunicacionais (partilhar idéias com os colegas e discuti-las em
grupo).
Garcia acrescenta a essas destrezas, consideradas insuficientes para um
ensino reflexivo, outras atitudes quem sua gênese em Dewey e dizem
respeito à mentalidade aberta, que obriga o professor a escutar e respeitar
diferentes perspectivas; à responsabilidade intelectual, que significa destacar
os propósitos educativos e éticos da conduta docente e ao entusiasmo, que
representa a predisposição de lutar contra a rotina, de enfrentar as atividades
com energia, curiosidade e espírito de renovação.
Assim, a idéia de professor reflexivo refere-se àquele que, independente
de orientações externas, sob sua responsabilidade e apoiado em seus
conhecimentos e experiência profissional, desenvolve um trabalho prático de
qualidade.
Os cursos de formação inicial de professores, bem como os de formação
continuada (em serviço)o podem abster-se dessas destrezas, devendo ainda
fazer o diagnóstico das necessidades formativas dos profissionais, considerado
por Garcia (Ibidem: 68) uma das principais atividades dos centro formadores
de professores.
Essas necessidades referem-se às categorias: necessidades relativas aos
alunos, ao currículo, os próprios professores e à escola como instituição que
possui organização específica.
Donald Schõn e Ken Zeichnero autores bastante conhecidos e que
trabalham com a idéia do professor como prático reflexivo. Zeichner busca em
Schõn idéias sobre reflexão na e sobre a ação, tendo ambos Dewey como
referencial teórico. Schõn faz uma análise mais micro, centrada no cotidiano
da escola, na sala de aula, na relação professor/aluno enquanto Zeichner
amplia para além da escola, entendendo que a função de professor deve incluir
em seu conteúdo reflexivo, a interferência na sociedade com o intuito de
torná-la mais justa, solidária e decente.
Em conferência na 20
a
Reunião da ANPEd/1997, Zeichner confirma
que sua opinião difere de Schõn, uma vez que esteo dá atenção aos
aspectos institucionais e sociais que contextualizam a prática, além deo
compartilhar dos pressupostos sócio-interacionistas.
A idéia de professor reflexivo, para Zeichner, está subjacente ao
trabalho que chama de reconstrucionismo social, aspecto que também o I
diferencia de Schõn.o três as características do reconstrutivismo social: 1) o
foco do trabalho é a prática de cada um e as condições sociais e políticas em
que se realiza a atividade; 2) inclui a prática do professor, a quem cabe
investigar seu próprio trabalho, vinculado à realidade da escola e a questões
mais amplas da sua ação docente; 3) associa a prática reflexiva a aspectos de
uma sociedade mais justa e participativa, uma vez que os professoresm
chance de interferir nos diferentes aspectos do ensino: a) no acadêmico (o que
os alunos fazem); b) na dimensão pessoal dos alunos; e c) na dimensão
político-social (sempre presentes na sala de aula e que afetam as chances dos
alunos). E conclui: "A minha visão de uma boa sociedade é aquela onde as
oportunidades não dependem da cor "(1997).
Zeichner (1993) alerta, entretanto, que um bom ensino precisa
considerar elementos das várias tradições da prática reflexiva: a acadêmica
que acentua a reflexão sobre as disciplinas, o pensamento e a compreensão
dos alunos; a eficiência social que se refere às estratégias de ensino sugeridas
pela investigação e a desenvolvimentista que dá prioridade à reflexão sobre os
interesses, pensamentos, desenvolvimento e crescimento dos alunos, além da
tradição de reconstrução social, a que se encontra filiado.
A concepção de que o professor deve refletir sobre sua prática conduz a
um outro aspecto: a relação entre reflexão e conhecimento.
3. Reflexão, conhecimento e pesquisa-ação
Segundo Alarcão (1996) quando se reflete sobre uma ação, uma atitude,
um fenômeno, procura-se compreendê-los. E a compreensão faz-se com base
em referentes que lhe dêem sentido:
Estes referenteso os saberes que já possuímos, frutos da experiência ou da
informação, ou os saberes à procura dos quais nos lançamos por imposição
da necessidade de compreender a situação em estudo (Ibidem: 179).
Resulta desta análise uma reorganização ou aprofundamento do
conhecimento adquirido e que terá conseqüência no nível da ação. Nesta
interação, conforme a autora, situa-se a essência da relação teoria-prática.
A concepção de professor reflexivo orienta-se pela pesquisa-ação , mas
o o tipo que se realiza comumente nas universidades, uma vez que objetiva
o apenas a produção do conhecimento como também o desenvolvimento
profissional dos professores, a valorização da sua prática que é o próprio
objeto de estudo da pesquisa.
A pesquisa-ação destina-se exatamente a eliminar o aspecto débil das
pesquisas acadêmicas (Casanova, 1993:11) que significa desconexão com a
realidade da aula e falta de comprovação de ação, pretendendo, dessa forma,
superar a dicotomia entre a teoria e a prática. Nessa proposta, o
desenvolvimento de uma pesquisa na sala de aula deve ser realizado pelo
professor. Assim, integrando experimentação com ação social, os professores
tornam-se os protagonistas das ações sociais, isto é, a tarefa de investigação
cabe aos professores,o aos especialistas. Como observa Stenhouse
(1993:77,), "o professor tem algo melhor que o laboratório dos especialistas,
ele tem uma autêntica aula!". Para o autor, as generalizações formuladas em
termos de probabilidade, no paradigma clássico de investigação,o se
aplicam a situações específicas, sendo, desta forma, apenas hipóteses de
trabalho eo conclusões, devendo portanto, ser confirmadas pelos
professores (Ibidem: 79).
Domingo (1994:8) assinala três marcos significativos na história da
pesquisa-ação: o de Kurt Lewin desenvolvida nos anos 40, o de Stenhouse e
Elliot na década de 70, e o de Kemmis e Carr conhecido a partir de 1980.
Todos reconceitualizam a pesquisa-ação, no entanto, a proposta de Zeichner
embasa-se mais no modelo de Kemmis e Carr.
Kurt Lewin tentou estabelecer uma forma de investigação que
integrasse a experimentação científica com a ação social. Definiu a pesquisa-
ação como um processo cíclico de exploração, atuação e valorização de
resultados. Iniciou a idéia de que a prática social pode se integrar à pesquisa,
com o entendimento de que os protagonistas da ação social devem realizar a
pesquisa-ação, porém, suas idéias foram absorvidas por enfoques tradicionais
de investigação.
No segundo marco, Domingo ressalta a pesquisa-ação desenvolvida por
Lawrence Stenhouse e de seu seguidor John Elliott, que investiga o
Segundo Remei Arnaus ( 1994:29) a pesquisa-ação recebe a denominação de pesquisa participante na
América Latina, e tem Pedro Demo como um dos seus representantes.
significado prático que podem ter determinadas idéias educativas. Entende a
pesquisa-ação como o estudo de uma situação social, a fim de melhorar a
ação social.
Argumentando que os protagonistas da ação social nem sempre podem
vencer as barreiras da estrutura institucional em que seu trabalho se realiza, ou
poro terem consciência, ou por agirem isoladamente, o terceiro marco de
Kemmis e Carr considera que a pesquisa-açãoo pode ser entendida como
processo de transformação de práticas individuais por professores, mas deve
desenvolver-se como um processo de mudança social realizado coletivamente.
Segundo Domingo (Ibidem: 9-10), a pesquisa-ação possui diferentes
enfoques, e características específicas:
a) integra conhecimento e ação;
b) questiona a visão instrumental da prática;
c) é realizada pelos que estão envolvidos na prática que se investiga;
d) tem por objetivo melhorar a prática;
e) supõe uma visão sobre a mudança social.
As diferentes concepções acerca da pesquisa-ação (Lewin, Stenhouse e
Elliot, Kemmis e Carr) provocam diferenças na teoria e prática dos modelos
de investigação, o que é compreensível, como assinala Domingo, quando se
trata de um tipo de investigação que busca a transformação das práticas
educativas, priorizando os aspectos ideológicos e estratégicos de
transformação da prática educativa e a condução da mudança social (Ibidem:
10).
Com base nesses diferentes enfoques de pesquisa-ação, Grundy (apud
Domingo (1994:10) propõe três modelos básicos de pesquisa-ação: o técnico,
o prático e o crítico ou emancipador.
Antes de caracterizar cada um dos modelos, cabe assinalar semelhanças
de análises entre os autores a respeito dessa linha de investigação, que se
ligam aos três modelos citados e às idéias de professor reflexivo analisadas
por Zeichner.
Carr e Kemmis (apud Arnaus, 1994: 29) partem da análise das correntes
epistemológicas porque consideram que o movimento em torno do professor
como investigador de sua prática carece de fundamentação teórica.
Entendendo que a pesquisa-ação significa investigação educativa, compatível
com uma ciência social crítica, como a elaborada por Habermas, que acredita
na emancipação do homem e que o projeto da modernidade está inconcluso,
os autores buscam fundamentá-la teoricamente. O livro "Teoria critica de Ia
ensenanza - La investigación-acción en Ia formación dei professorado" surge
da preocupação dos autores com a falta de fundamentação teórica para
pesquisa-ação.
Os três modelos básicos de pesquisa-ação assinalados por Grundy
(apud Domingo, 1994:10-11)o usados pela autora para analisar exemplos
de práticas curriculares e projetos de pesquisa-ação.
O primeiro modelo, o técnico, refere-se a investigações realizadas por
práticos orientados por especialistas. O projeto é idealizado pelos últimos e a
preocupação com os resultados é eficientista, sendo os mesmos pré-fixados, o
que significa que a pesquisa é realizada pelos professores, sem manifestar
propósitos, interesses e objetivos - os quaiso determinados externamente.
Este modelo é utilizado pelos condutores de políticas educacionais para
conseguir atingir seus interesses próprios, com uma pseudo participação
autônoma do docente.
O enfoque prático acentua os aspectos morais da prática educativa, na
perspectiva de que as mudanças sociais dependem da possibilidade dos
professores mudarem sua prática docente, resistindo às abstrações teóricas
analíticas, que se subordinam às práticas, e sóo úteis apenas para iluminar
alguma questão particular. O que vale mesmo é a prática em toda a sua
complexidade e concretude, e esse aspecto em relação à teoria o diferencia do
enfoque crítico.
O modelo crítico compreende que é com base no estudo teórico dos
fatores estruturais que condicionam a prática que se tem uma compreensão
racional desta prática. Somente mediante esse processo converte-se a prática
o reflexiva e acrítica em práxis. A pesquisa-ação pretende a
autotransformação dos práticos visando à justiça, à democracia, entendendo
que melhorar a educação e mudar a sociedade é tarefa supraindividual,
coletiva, social e política.
Ensino reflexivo, professor como prático reflexivo, "tornaram-se
slogans de reformas de ensino" (Geraldi, 1998:249). Zeichner e Liston (apud
Garcia, 1992: 63), impressionados com a exagerada utilização do conceito de
reflexão, estabelecem diferentes níveis de reflexão ou de análise da realidade:
o técnico, o prático e o crítico.
O primeiro, o técnico, refere-se à análise do que é passível de ser
observado, das ações explícitas, tais como andar na sala, fazer perguntas, etc.
O segundo nível, o prático, inclui a reflexão sobre o conhecimento
prático, implicando assim o planejamento do que se vai fazer e a reflexão do
que se fez, com destaque para os aspectos didáticos.
O nível crítico inclui as considerações éticas e políticas da prática e suas
repercussões contextuais, dando ao professor a consciência crítica das
possibilidades de sua ação e dos limites de ordem social, cultural e ideológica
do sistema educativo que se refletem na sua prática cotidiana.
A forma como o professor percebe a realidade que o cerca manifesta-se
em atos queo descritos como reflexivos ou como simples atos de rotina. Os
atos de rotina caracterizam-se pela tradição e pela autoridade, em queo
aceitos, para solucionar os problemas da escola, sem questionar, sua realidade
cotidiana ou experimentar os meios mais eficientes, conforme definição de
outros. Essa concepção impede que os professores apresentem ou
experimentem pontos de vista alternativos.
Dewey diferencia rotina de reflexão e nele Zeichner busca o conceito de
reflexão. Enquanto o ato de rotina é guiado pelo impulso, tradição e
autoridade, e as regras, problemas, metas e objetivoso definidos de antemão
e as açõeso empreendem rupturas, a ação reflexiva é definida por Dewey
como sendo uma ação que implica uma consideração ativa, persistente e
cuidadosa daquilo que se acredita ou que se pratica, à luz dos motivos que o
justificam e das conseqüências a que conduz. Segundo Dewey, a reflexão
o consiste num conjunto de passos ou procedimentos específicos a serem
usados pelos professores. Pelo contrário, é uma maneira de encarar e
responder aos problemas, uma maneira de ser professor. A ação reflexiva
também é um processo que implica mais do que a busca de soluções lógicas .
e racionais para os problemas. A reflexão implica intuição, emoção e
paixão;o é, portanto, nenhum conjunto de técnicas que possa ser
empacotado e ensinado aos professores, como alguns tentaram fazer
(1993:18).
Valendo-se ainda do conceito de Dewey, destaca-se que a imagem que
o professor tem da organização em que exerce suas atividades profissionais
manifesta-se na forma como exerce suas ações na escola, razão porque
valorizar a organização da escola e o tipo de gestão que possui. Este tema será
trabalhado no item 5.
4. Estudos sobre a recepção
As pesquisas sobre recepçãoo muito recentes e trabalhadas na
América Latina desde os anos 80, em uma perspectiva teórico-metodológica
renovadora e original (Lopes, 1996). A compreensão desse tipo de estudo
torna-se mais clara quando inserido no conjunto das pesquisas brasileiras no
campo da Comunicação.
A periodização da trajetória da pesquisa em Comunicação no Brasil,
proposta por Lopes (1990:44) e apresentada no quadro abaixo, facilita a
compreensão dos paradigmas funcionalista e marxista nessas pesquisas, cuja
análise será feita adiante.
Quadro 2 - Periodização da pesquisa em Comunicação no Brasil
Década de 50
- Pesquisas funcionalistas baseadas em métodos quantitativos: de conteúdo
(dos meios, principalmente imprensa); de audiência (IBOPE e MARPLAN) e de efeitos
(sondagens de atitudes e motivações).
Década de 60
- Pesquisa funcionalistas descritivas com base em métodos comparativos
(CHESPAL) e de estudos de comunidade (difusão de inovações)), dentro da linha de
pesquisa de Comunicação e Desenvolvimento.
- Primeiros estudos críticos sobre a indústria cultural através da teoria da
Escola de Frankfurt (temática da manipulação), com metodologias mais qualitativas.
Década de 70
- Pesquisas funcionalistas descritivas sobre políticas de comunicação
nacionais e internacionais (linha de pesquisa : Comunicação e Política).
- Pesquisas críticas sobre a indústria cultural com temáticas da manipulação,
dependência e transnacionalização, com metodologia sociossemiológica.
Década de 80
- Pesquisas funcionalistas sobre aspectos sistemáticos da produção (técnico-
profissionais) e da circulação da comunicação.
- Estudos críticos de modelos teóricos e
teoria e metodologia da comunicação latino-americana.
esforços para a elaboração de uma
- Politização das pesquisas em Comunicação com
gramsciana, com metodologias qualitativas; temáticas:
transnacionalização, cultura e comunicação popular.
novas tecnologias
forte influência
de comunicação,
Fonte: Lopes, 1990, p.44
As duas posições teórico-metodológicas básicas da pesquisa em
Comunicaçãoo a funcionalista e a marxista. O modelo funcionalista,
predominante até hoje, baseia-se no modelo mecanicista de estímulo-resposta,
que apresenta o receptor como passivo, apesar dos funcionalistas Lazarsfeld e
Merton já se referirem à "disjunção narcotizante dos meios massivos". A
semiótica estruturalista, que se seguiu, nos fins dos anos 60 e início dos 70,
coloca a ideologia como objeto e sujeito dos discursos e os receptoreso
compreendidos como passivos e alienados, porque a ideologia manipula os
meios.
A matriz de pensamento marxista inicia-se na pesquisa em
Comunicação, a partir dos anos 70, na perspectiva da Escola de Frankfurt que
concebe os produtos culturais como dependentes de sustentação material e
dentro da lógica do mercado capitalista (Cardoso, 1991). Com base nesse
modelo de pesquisa acontece a primeira fase dos projetos de "leitura crítica
da comunicação" (LCC). Conforme Fausto Neto (1995:190), o pressuposto da
LCC baseia-se na
hipótese segundo a qual urgia preparar "criticamente" o campo da recepção
- destituído dos meios capazes de enfrentar o "bombardeio alienante" da
comunicação de massa - para defendê-lo dos perigos das práticas da
indústria cultural. Nesse modelo, a recepção é situada numa perspectiva
passiva e, de certa forma, é uma "caixa vazia", a despeito do matiz
ideológico.
Vale lembrar que no contexto das pesquisas da Comunicação, as
pesquisas em Educação viviam o momento das teorias da reprodução,
alicerçadas no referencial de Bourdieu, Passeron e Althusser.
O fascínio por Althusser, lembra Cardoso (1991: 23), ocorreu por causa
dos regimes autoritários e ditatoriais presentes na América Latina. Seu livro
"Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado" tornou-se constante referencial
teórico para dissertações e teses na área da Comunicação e também da
Educação.
Outra perspectiva de estudos de Comunicação dentro do paradigma
marxista é a gramsciana. Apoiada no binômio cultura hegemônica/culturas
subalternas, essa linha de pesquisa afirma-se nos estudos sobre Cultura e
Comunicação no Brasil nos anos 80, uma vez que na década anterior os
frankfurtianos deslocaram a análise gramsciana ao fazerem
a denúncia dos mecanismos manipuladores e reprodutores de uma Indústria
Cultural controlada pelo regime ditatorial, ao mesmo tempo que através dela
se tinha explicação para a passividade e alienação das massas (Lopes, 1990: 57).
Os intelectuais utilizam a teoria de Gramsci para provocar uma
renovação nas pesquisas sobre o massivo e o popular no campo da
Comunicação.
Com base na perspectiva gramsciana inicia-se o delineamento de outra
importante linha de pesquisa em Comunicação queo os estudos da
recepção. Jesus Martín-Barbero destaca-se como importante teórico da
temática das culturas populares e começa esboçar uma "complexa e
multifacetada" teoria da recepção que desloca os eixos básicos de reflexão dos
meios às mediações.
No seu livro "Dos meios às mediações", Martín-Barbero assinala que a
reflexão crítica latino-americana está diretamente envolvida com a Escola de
Frankfurt,o apenas porque suas idéias promoveram um debate político,
como também permitiu-nos pensar pors mesmos, uma vez que o próprio
pensamento frankfurtiano impedia-nos de perceber que a realidade social e
cultural latino-americanao cabia em sua sistematização nem em sua
dialética. A mestiçagem da América Latinao é apenas um fato social, é a
razão de ser da região.
Por muito tempo, segundo Martín-Barbero (1997:277), a comunicação
preocupou-se mais com a segurança teórica do que com a verdade cultural
dos países latino-americanos. A comunicação deveria apresentar uma teoria -
sociológica, semiótica, informacional - e é a derrubada das fronteiras do
terreno da comunicação (seu objeto de estudo passa a ser de interesse de
muitas outras áreas, tais como, as artes, a política, a arquitetura, a
antropologia) que a leva ao caminho do movimento social na comunicação,
isto é, a comunicação em processo.
As transformações das culturas subalternas, advindas da emergência de
novos sujeitos sociais e identidades culturais atuais e dos processos de
transnacionalização, impulsionam investigações sobre os processos de
constituição do massivo, e provocam o deslocamento do eixo de debates dos
meios para as mediações, "isto é, para as articulações entre práticas de
comunicação e movimento social, para as diferentes temporalidades e para a
pluralidade de matrizes culturais" (Ibidem: 258).
Tanto a questão da transnacionalização como a internacionalização de
um modelo político (neoliberalismo) operam no campo das tecnologias da
comunicação e, assim, a comunicação passa a ser o ponto de fusão da questão
nacional. Opera-se, assim, uma nova compreensão do problema da identidade
latino-americana e mudança na concepção de sujeito político, e dessa
convergência, emerge uma valorização do cultural. A comunicação passa a se
inserir na cultura e esta no político. Vale lembrar que, durante esse período a
América Latina vivia movimentos de resistência aos regimes autoritários e
esses movimentoso vieram de onde tradicionalmente poderiam vir (como
as universidades, sindicatos), mas surgiram das comunidades cristãs, dos
artistas, dos grupos defensores dos direitos humanos. Dessa forma, o cultural
assimila percepção de dimensões até então inéditas.
A comunicaçãoo mais pensada como meios, tecnologias, disciplinas
a que se subordinava, como a psicologia e a cibernética, mas como cultura. A
cultura latino-americana passa a ser redefinida valendo-se de sua natureza
comunicativa, ressaltando seu caráter de processo produtor de significações. O
receptoro é visto como simples decodificador do que o emissor depositou
na mensagem, é também um produtor de sentido.
Martín-Barbero compreende a recepçãoo como uma etapa do
processo de comunicação, mas como um lugar novo, a cultura, em que o
sujeito é o ator social, produtor de sentidos. Para entender a recepção como
lugar é preciso repensar o processo inteiro da comunicação em nossos países,
em nossas culturas, em nossa sociedade.
As contribuições latino-americanas e brasileiras para a Teoria da
Recepção produzem seu reconhecimento internacional. Essa construção
teórica desmonta as teses de passividade e de manipulação dos receptores
pelos meios . Para Lopes (1990: 59), a teorização retoma a unidade do objeto
Recentemente, existem outros estudos que rebatem essa passividade, como o do prof. Francisco Rüdiger
que apresentou na 20
a
Reunião da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação
(Intercom), 1997, o trabalho "Indústria Cultural e Ideologia Moderna: pressupostos da discussão sobre o
receptor ativo na Escola de Frankfurt".
da Comunicação, evitando o parcelamento e o reducionismo na análise de seus
componentes.
Apesar dos estudos ainda usarem e atualizarem os paradigmas
funcionalista e marxista, o funcionalismo continua a ser o dominante e a
tendência frankfurtiana continua predominando nos estudos sociológicos da
cultura e da Comunicação.
Os estudos da recepção comportam atualmente diversas linhas de
investigação. Guillermo Orozco identifica distintos modelos teórico-
metodológicos dentre os quais enumera: dos usos sociais, consumo social,
mediação múltipla, etnografia, jogo e, como importantes contribuições latino-
americanas, cita o estudo da telenovela, as múltiplas mediações e a educação
para os meios.
A respeito das pesquisas voltadas para os nexos entre os meios e suas
audiências, Lopes (1993: 78-86) aponta as principais correntes téorico-
metodológicas: a pesquisa dos efeitos, a dos usos e gratificações, os estudos da
crítica literária, os estudos culturais e os estudos da recepção.
Alguns desses modelos priorizam o processo de recepção em si,
enquanto outros centram os produtos da recepção.
A pesquisa sobre os efeitos busca verificar, por meio de instrumentos de
medida da psicologia experimental e social, o que os meios fazem com os
indivíduos. A dos usos e gratificações , ou usos sociais, pesquisa o que os
indivíduos fazem com os meios, quer dizer, verificam o que as pessoas fazem
com a informação recebida pela televisão, rádio, jornal ou outro meio e como
a pessoa usa esta informação para sua vida diária.
No modelo de mediação, com a qual trabalham Orozco e Martín-
Barbero, entende-se o processo de recepção comoo linear e nem unívoco e,
como tal, ocorre em várias direções, sofrendo intervenção e condicionado pelo
contexto cultural, social, político, histórico, etc.
Guillermo Orozco (México) e Jesus Martín-Barbero (Colômbia)o
dois importantes estudiosos no âmbito da pesquisa da recepção, e
sistematizaram no nível teórico e metodológico, esse modelo de pesquisa. Na
América Latina, a proposta teórico-metodológica da pesquisa em recepção é
renovadora e original.
Para Martín-Barbero, o contexto cultural é o 'lugar' para se
compreender a relação dos receptores com a comunicação, partindo do
princípio de que a recepçãoo é uma etapa do processo de comunicação, mas
sim "uma espécie de um outro lugar, o de rever e repensar o processo inteiro
da comunicação" ( 1995: 40).
Criticando o modelo mecânico da comunicação, alicerçado em uma
epistemologia condutivista que concebe o emissor como personagem central
do processo, cabendo ao receptor apenas reagir aos estímulos do emissor,
Barbero olha a recepção como um lugar novo sujeito a várias mediações,
apontando como mediações : a) destempos ou heterogeneidade de
temporalidades; b) novas fragmentações sociais e culturais; c) exclusão
cultural e d) demandas sociais.
A primeira mediação, destempos, refere-se à multiplicidade de
temporalidades, de histórias, com seus próprios ritmos e suas próprias lógicas.
Há temporalidades de formação cultural, de classes sociais, das raças, das
gerações, dos gêneros etc, tanto em dimensão macro como micro e as
diferentes dimensões dessa mediação interferem na recepção de uma certa
mensagem.
28
Cada um destes tiposo discutidos na entrevista que concede a Nilda Jacks (1993: 22-33).
As novas fragmentações sociais e culturais dizem respeito aos motivos e
modos das pessoas juntarem-se em grupos e se reconhecerem, também às
fragmentações de como as informaçõeso recepcionadas, conforme a divisão
social. Há informações dirigidas aos que tomam decisões e informações à
massa, para se divertirem e descansarem.
A deslegitimação da cultura popular, considerada como de mau gosto
ou vulgar, é a mediação da exclusão cultural. Os planejadores das políticas de
comunicaçãoo levaram em consideração as demandas sociais dos
intelectuais e as do povo, ocasionando seus fracassos.
Para Guülermo Orozco, recepção significa um processo complexo, ambíguo
e contraditório. A relação dos receptores com os meios e as mensagens é sempre
mediatizada de forma multilateral e multidimensional. O autor classifica as
mediações em cognoscitivas, estruturais, situacionais e institucionais.
As cognoscitivas referem-se às informações obtidas por intermédio dos
meios e incidem no processo de conhecimento. As institucionais dizem
respeito aos cenários em que ocorre a recepção. As mediações que acontecem
no momento de contato com a mensagem, quando se assiste à televisão, por
exemplo, denominam-se situacionais e as mediações estruturaiso aquelas
sistematizadas conforme a identidade do sujeito receptor, como a classe social,
a etnia, idade, sexo (Jacks, 1995: 227).
Em publicação de 1997, Orozco realiza algumas alterações nessas
mediações. Denomina as cognoscitivas de individuais que provêm de nossa
indivualidade como "sujetos cognoscentes e comunicativos" (Ibidem: 116).
As estruturais, dá o nome de referência, que possuem características de um
contexto ou ambiente determinado, como a cidade, gênero, etnia, raça, classe
social. Mantém as situacionais e as institucionais e acrescenta as
massmediáticas, que se referem ao tipo de tecnologia que emite a mensagem.
Cada um das tecnologias tem linguagens e estratégias de comunicação
diferentes, o que, de alguma maneira, influencia no processo de percepção e
de interação com a informação veiculada. "Não é o mesmo ver algo pela TV e
escutá-lo no rádio, ler no jornal ou ver no cinema", observa Orozco (Ibidem:
117).
Há diferentes correntes de investigação para o conhecimento da relação
entre mídia e audiência, as quais reconhecem a atividade do receptor. Citando
Jensen, Apple (1998: 13) assinala que
o significado na mídia é variável e padronizado (grifo do autor). É variável,
porque as pessoas reais intervém ativamente, interrompem e criam
significados na interação com a mídia. É padronizado pelas convenções
sociais, econômicas e políticas que definem os limites do que pode e do que
o pode ser dito ou exibido, de quem pode dizer ou exibi-lo.
No mesmo artigo, Apple expressa que há níveis de significado
potencial, que fogem do controle dominante e que ficam disponíveis para
diferentes leituras.
Os significadoso polissêmicos. Pode haver e há múltiplos significados em
qualquer situação. (...)o construídos ao redor da experiência individual
em instituições sociais, tais como o gênero, a classe, a raça, a nação, a
região, a religião, e assim por diante (Fiske apud Apple, 1998:19).
Em que pese a riqueza e semelhança em alguns pontos com os
trabalhos latino-americanos, a opção nessa investigação será pelos estudos de
Martín-Barbero e Orozco que concebem a audiência como participante de um
grupo social e membro de uma cultura especial.
O presente estudo analisa a recepção de vídeos pedagógicos veiculados
na escola, visando a formação de professores e a importância de conhecer sua
organização e gestão exige uma reflexão mais pormenorizada dela.
5. Gestão e organização da escola
Morgan (1996) cunhou a expressão "imaginização" para se livrar do
significado mecânico e instrumental da palavra organização, originado do
grego órganon que significa ferramenta ou instrumento. Imaginização propõe
estreita ligação entre imagem e ação, ressaltando o autor: "A organização é
sempre determinada por imagens e idéias subjacentes; a tarefa de organizar é
realizada conforme se imaginiza e é sempre possível imaginizar-se de muitas
formas diferentes" (Ibidem: 349). Assim, o modo como se faz a leitura das
organizações influencia como se concretizam as ações nela desenvolvidas. As
imagens e metáforasoo apenas construtos interpretativos, como também
fatores intrínsecos das imagens que as pessoas fazem da vida organizacional.
Como mencionado antes, Dewey vê uma relação inteira entre a imagem
que se tem da organização e a ação que se exerce nela.
Com freqüência, ouve-se dizer que a escola é uma família. A metáfora
da família para a organização escolar supõe entendê-la como agrupamento de
pessoas com papéis diferenciados.
Os exemplos a seguir, ilustram a existência dessa metáfora.
Em uma das sessões de vídeo da Escola Joaquim Almeida um dos
professores (Edson) escreve após debate suscitado pelo programa "A escola
além da aula": "A escola está precisando se caracterizar como uma família,
isto é, local de aconchego e carinho ".
E o professor Alencar: "A escola dos meus sonhos é uma escola em que
o aluno sinta o prazer de permanecer nela. Uma escola que você sinta como
se fosse uma família. A minha família".
Certamente, a metáfora da escola com a família aproveita a tradição
cristã de família como local harmonioso, em que as pessoas se amam e
convivem em perfeita paz. Entretanto, em outra visão, os pais, como
mantenedores, organizadores e responsáveis pela dinâmica familiar são, na
escola, o diretor e seus auxiliares administrativos, enquanto professores e
alunos, os filhos, que devem obediência aos pais. Em ambas visões de
família, os filhos, no que se refere a responsabilidades, encontram-se em
posição hierarquicamente inferior aos seus pais.
Imaginando a escola com essa metáfora, a compreensão de obediência
ao nível superior hierárquico (diretor e coordenadores) faz com que as ações
dos professoreso sejam de criar alternativas ao existente, mas de adaptar-se
ao modelo posto e seguir as orientações consideradas adequadas e necessárias
ao bom rendimento escolar do aluno. O professor, dominado por essa imagem
de organização, age de forma rotineira,o havendo espaço de ação para um
professor reflexivo, na concepção de Dewey.
Essa metáfora está relacionada ao histórico papel educativo das
famílias. Anterior à existência dos sistemas escolares, as famílias exerciam o
papel que, hoje, modernamente, a escola desempenha, especialmente, de
transmissão dos bens culturais produzidos pela humanidade. Essa tarefa foi
deslocada de uma instituição para outra, sob a alegação de que o Estado tem
legitimidade para definir as questões educacionais e os professoresm
competência mais especializada em matéria educativa (Nóvoa, 1995b:32).
Apesar de citarem a escola como família, os professores sabem que é
uma situação ilusória, embora ideal e desejada, identificável nas duas falas. As
declarações dos professores evidenciam que a escolao cumpre o papel de
família, e a ocorrência localiza-se em um futuro desejável (meu sonho) ou
como uma necessidade (está precisando).
Porém, apesar desse esforço explicativo, a metáfora da escola como
família está à espera de uma teoria mais consistente.
Já existem estudos (Brunet,1995; Brito, 1997) sobre o clima
organizacional das instituições escolares. A esse respeito, Brunet (1995:126)
considera clima organizacional como
uma série de atributos queo perceptíveis do ponto de vista da organização,
e que podem ser indicadores da sua forma de agir (consciente ou
inconscientemente) em relação aos seus membros e à sociedade (...) O
elemento principal é a percepção que um indivíduo tem do seu ambiente de
trabalho. Valoriza-se o modo como nos apercebemos das coisas, muito mais
do que a realidade objetiva.
Em resumo, o clima organizacional refere-se às percepções dos atores
escolares em relação às práticas existentes em uma certa organização.
Ao analisar as organizações escolares, Nóvoa (1995b: 28) cita Vala,
Monteiro e Lima, rememorando que as escolas já foram vistas como
máquinas, como organismos, como cérebros
29
e que, atualmente, tendem a ser
consideradas como culturas. Destaca que a compreensão da escola como
cultura implica em vê-la como uma organização plural e dinâmica. Para
compreender o cotidiano da escola, dentro da perspectiva de cultura
organizacional, é preciso recorrer aos fatores políticos e ideológicos e analisá-
los dentro de uma racionalidade político-cultural (idem p. 28).
Brunet (apud Nóvoa, Ibidem:29) considera que
as organizações escolares, ainda que estejam integradas num contexto
cultural mais amplo, produzem uma cultura interna que lhes é própria e que
exprime os valores (ou os ideais sociais) e as crenças que os membros da
organização partilham.
Há limites conceituais e metodológicos na compreensão da escola como
metáfora cultural. Como instituição, de acordo com Nóvoa, a escola nunca
deixou de privilegiar a metáfora: escola como transmissora de cultura
(Durkheim); como reprodutora de cultura (P.Bourdieu); como ação cultural
para a libertação (P. Freire). O mesmo autor cita os seguintes elementos da
cultura organizacional da escola: a) bases conceituais, queo os
pressupostos invisíveis (valores, crenças ideologias); b) manifestações verbais
e conceituais, em que se incluem as metáforas; c) manifestações visuais e
simbólicas e ; d) manifestações comportamentais.
O quadro 3 (Nóvoa, 1995b: 30), a seguir, procura demonstrar as zonas
visíveis e invisíveis da cultura organizacional da escola.
Quadro 3 - Elementos da cultura organizacional
Interação com a comunidade
Fonte: Antônio Nóvoa (1995: 30)
Interação com a comunidade
A importância da questão da gestão escolar, seus aspectos visíveis e
invisíveis conduzem à relação professor reflexivo/gestão da escola que se
Análise das metáforas nas organizações é também realizada por Morgan que, propõe a imaginização,
torna outra preocupação a que se acrescentam as existentes em razão do
desgaste do termo reflexivo nas reformas educacionais e das ilusões da
reflexão, ou seja, dos falsos conceitos de professor reflexivo.
A concepção de professor reflexivo das reformas educacionais baseia-se
em falsos conceitos (Geraldi, 1998) que, na verdade, denunciam as falsas
intenções de emancipação docente, presentes na retórica dos reformadores.
Zeichner (1993) apresenta quatro características que consomem
pretendida emancipação, levando à ilusão do desenvolvimento dos
professores.o elas:
1) a negligência aos saberes e teorias dos professores; e professor
reflexivo é o que imita melhor as práticas sugeridas pelos
professores universitários, considerados os verdadeiros
pesquisadores;
2) o processo reflexivo limita-se às estratégias e técnicas de ensino
segundo orientação externa; definições sobre o quê ensinar, a quem,
e por que, com quais objetivos,o retirados do professor;
3) a reflexão dos professores fica centrada na sua própria prática ou em
seus alunos, desprezando as influências das condições sociais sobre
o trabalho do professor e a aprendizagem dos alunos;
4) a compreensão da reflexão como ação individual; essa condição isola
o professor, que compreende os problemas escolares como só seu,
portanto, sente-se o único responsável pelo sucesso ou fracasso dos
alunos, surgindo o mal-estar docente (Esteve, 1995).
"O mal-estar docente que atinge os professores ameaça tornar-se
crônico", alerta Nóvoa (1995a:8). O autor apresenta mudanças recentes que
aumentam a tensão na vida dos professores, e enumera vários fatores que se
tratada no início desse item.
somam à desvalorização social da profissão, baixa remuneração,s
condições de trabalho, ser apontado como responsável único pelo fracasso
escolar. Nóvoa refere-se à intensificação do trabalho cotidiano do professor
nas escolas, o crescente controle e avaliação dos professores, a necessidade de
adaptação aos novos programas, currículos, modalidades de avaliação, novas
formas de gestão, o que tem levado ao aumento da tensão. Registra também o
modo de relacionamento com os pais e a comunidade e os conflitos de poder e
autoridade advindos dessa relação e, finalmente, o frenesi de cursos e ações
exigidos para uma formação contínua, que nem sempre melhoram a qualidade
do trabalho docente, fugindo do ritmo próprio do professor, sem garantir uma
reflexão aprofundada de sua prática profissional.
No Brasil a questão agudiza-se. Pesquisa realizada pela UnB
30
, em
parceria com a CNTE (Confederação dos Trabalhadores em Educação) dá
conta da existência da síndrome de burnout, ou da desistência do educador,
levando-o à exaustão emocional, que é definida como "o nome da dor de um
profissional encalacrado entre o que pode fazer e o que efetivamente
consegue fazer, entre o céu de possibilidades e o inferno dos limites
estruturais, entre a vitória e a frustração" (Codo, 1999:13).
O estudo demonstra a relação existente entre a síndrome de burnout e a
forma de gestão da escola.
Inerente e necessária à vida do homem, Paro (1991:18) considera a
atividade administrativa, em seu sentido geral, como "a utilização racional de
recursos para a realização de fins determinados".
A pesquisa, sob a responsabilidade do Laboratório de Psicologia do Trabalho da UnB, foi realizada em
1.440 escolas nos 27 estados da federação e investigou 52 mil sujeitos (professores e funcionários), durante
dois anos e meio. Trata-se do primeiro estudo nacional sobre saúde mental e trabalho dos profissionais da
educação no Brasil e é considerado o mais extenso em sujeitos e variáveis investigados de que se tem notícia
no mundo.
A administração das organizações ocorre em determinadas condições
históricas e relaciona-se à forma como a sociedade organiza-se e às forças
econômicas, políticas, sociais nela presentes, o que significa que a atividade
administrativa muda ao longo da história e em relação ao tipo de sociedade
onde ocorre.
Na realização do seu fazer docente, o professor vivência múltiplas
relações: com o seu trabalho (ministrar aulas) e com outros agentes da escola
- alunos, seus pais, diretores, coordenadores e outros funcionários,
configurando, assim, que os recursos da administração - racionalização do
trabalho e coordenação - estão também presentes na escola. O trabalho do
professor possui elementos materiais e conceituais, como o domínio dos
conhecimentos historicamente acumulados de sua área específica de atuação,
além dos elementos conceituais da ciência pedagógica que dá sustentação à
sua ação. A coordenação refere-se à relação dos homens entre si, o esforço
humano coletivo para atingir objetivos da organização escolar.
o apenas as ações do professorm uma especificidade, como seu
trabalho, juntamente com o do pessoal técnico-pedagógico, refere-se à
atividade-fim da escola, isto é, educar novas gerações.
A administração da escolao é a mesma nas organizações capitalistas.
O caráter explorador e mantenedor da ordem social vigente na administração
capitalistao é inerente à administração em si, mas à administração em geral
(Paro, 1991:81). Em sua concepção abstrata de utilização racional de recursos
para realização de fins, a atividade administrativa pode servir à manutenção ou
à superação da ordem social vigente. A opção vai depender dos fins
almejados.
A escola constitui uma instituição social de grande importância na
sociedade, uma vez que é espaço de disseminação do saber, de transmissão às
novas gerações do saber histórico e social acumulado pela humanidade.
Saberes queo reconhecidos como os mais constantes, universais e mais
incontestáveis da cultura humana que merecem e podem ser comunicados a
todos (Forquin, 1993).
A administração escolar, comprometida com a transformação social,
torna-se incompatível com a administração empresarial capitalista; portanto, a
administração escolar reflexiva transcende os limites da escola e inclui a
sociedade.
O estudo de Codo (1999) mostra que, salvo exceções, as escolas
possuem gestão tradicional, isto é, os dirigentes escolareso indicados sem
participação democrática da comunidade escolar, fecham-se à participação da
comunidade, enfrentam problemas de segurança,m carências de infra-
estrutura, grandes índices de evasão e repetência dos alunos. A respeito,
ressalta o autor:
Evidentemente que as escolas caracterizadas por um tipo de gestão
democráticao estão eximidas destes problemas, mas é certo que onde a
gestão é participativa, aspecto que caracteriza mais as escolas quem seus
dirigentes escolhidos pela via democrática, mostra-se uma tendência à
melhoria dos problemas das escolas {Ibidem: 334).
A pesquisa revela que existe correlação entre a exaustão emocional dos
professores e o tipo de gestão tradicional. Diz Codo:
Ora, nossos dados permitem afirmar que existiria uma relação, a qual
poderia ser classificada como "indireta", entre o tipo de gestão adotada nas
escolas e o aparecimento da síndrome de burnout. Observamos que o tipo de
gestão adotado pelas escolas é uma variável que "intervém" no cenário
Esse conceito é retirado de Paro (1991, cap.I) e compreende a administração que supera a "espontânea",
porque "além da consciência prática, representada pela utilização racional dos recursos, o sujeito (individual
ou coletivo) se acha consciente da racionalidade do processo e da participação nele de sua consciência"
(Ibidem: 29). Isto é, o indivíduo sabe o que faz, por que faz e tem consciência disso.
escolar, propiciando ou limitando o sofrimento psíquico dos trabalhadores
(Ibidem: 334).
Na Região Centro-Oeste, Goiás é o único estado que aindao possui
gestão democrática, com eleições diretas para escolha de diretores, como
apresenta a tabela a seguir:
Tabela 1 - Tipos de gestão escolar na Região Centro-Oeste
Região
Centro-Oeste
Total na Região
Estado
D.F.
MS
GO
MT
GTo
participativa
77,80%
33,31%
GT
participativa
22,20%
9,37%
GD não-
participativa
66,7%
90,20%
74,30%
44,37%
GD
participativa
33,30%
9,8%
25,70%
12,96%
Fonte: Codo, 1999:177
Legenda: GT= gestão tradicional
GD= gestão democrática
A política educacional, todavia, baseia-se na concepção de
administração como controle e julga-se no direito de determinar às escolas os
objetivos educacionais que, falsamente, seriam de toda a sociedade. Cabe aos
responsáveis pela administração das escolas a rejeição incondicional das
determinações, dando-lhes novos significados. Desvelando os verdadeiros
interesses do que foi imposto, é preciso transgredir os objetivos opostos aos
32
Na Região Norteo possuem gestão democrática (eleições diretas) os estados do Tocantins, Amapá,
Roraima; no Nordeste, Bahia, Sergipe, Rio Grande do Norte, Maranhão e na Região Sul, o estado de Santa
Catarina. Ao todoo nove estados brasileiros em que os diretoreso indicados politicamente.
Tanto a gestão tradicional como a democrática podem ser participativas e não-participativas.o
consideradas participativas quandom a participação formal (conselho escolar) ou informal (colaboração
dos pais, festas e eventos organizados pela escola e/ou comunidade, reuniões da comunidade na escola etc)
dos pais e da comunidade na escola (Codo, 1999:175).
Nas escolas da rede estadual de Goiás, os diretoreso indicados politicamente, enquanto nas escolas
municipais de Goiânia os diretoreso eleitos pela comunidade escolar.
propósitos da escola e atuar nas brechas deixadas pelos processos
contraditórios.
A administração da escola, mais ainda do que ocorre na sala de aula,
tem o papel fundamental de difundir uma concepção nova de sociedade,
democrática e justa, mediante atividades concretas no interior da organização
escolar. Esse modelo de administração escolar reflexiva pressupõe a
distribuição do poder de gestão da escola, ampliando a participação em ações
coletivas, sem perder, porém, o trabalho de coordenação e monitoramento do
diretor da escola sobre as decisões coletivas, e as tarefas igualmente divididas
entre os participantes.
Coordenação, nesse sentido, alerta Paro (1991: 161),o é gerência,
nem questão de poder centralizado, mas um problema de organização das
pessoas no interior da instituição.o é tarefa simples de executar, uma vez
que a coordenação pressupõe convergência de interesses e consciência desses
interesses.
Quando esteve no Brasil em 1997, Zeichner confessou que um dos
equívocos de sua vida profissional foi acreditar que poderia exigir que todos
os alunos demonstrassem interesse em participar da experiência de formação
do professor reflexivo. Sua proposta previa a transformação do social; no
entanto, ele percebeu que nem todos se interessavam, portanto,o poderia
exigir que todos participassem buscando a mudança da sociedade. Embora
tenha ocorrido rejeição a essas mudanças na sociedade norte americana,
acredito que, aqui no Brasil, também existam escolas em que pessoaso
queiram a transformação social. Mas será quem consciência de queo
querem mudar? Sabem por queo querem a transformação? Nosso país
convive com sérias, profundas e aviltantes desigualdades sociais, e os
professores de educação básica, de forma quase geral, sofrem,o apenas
pelos baixos salários, mas também pelo desprestígio social que vivenciam.
E fundamental que os professores participem da gestão coletiva da
escola, se efetivamente desejam as alterações sociais que beneficiem a maioria
excluída.
Como alerta Paro (1991:165) "a organização de nossas escolas, por seu
caráter autoritário, não permite uma transformação abrupta em sua
concepção administrativa", devendo por isso ser conquistada historicamente,
ou como disse a coordenação pedagógica da Escola Lázaro Rodrigues, Eliene,
algo que se constrói, e isto nós estamos tentando ".
Muitos outros gestores de instituições escolares buscam atingir um novo
patamar administrativo, mais democrático e consentâneo ao papel e funções
da instituição escolar. E preciso, porém, ir além dos discursos e atingir
consciência crítica da realidade social e escolar brasileira a fim de se imprimir
novas ações no ambiente escolar.
Na condição de agência financiadora de certos projetos da reforma
brasileira, o Banco Mundial coloca o problema organizacional como ponto
central para a eficácia educativa"(Bracho apud Carvalho, 1998: 106). Como as
justificativas econômicas continuam no centro das preocupações das agências
financiadoras, "a proposta do Banco é reforçar a autoridade e a
administração escolar e os recursos necessários para melhorar a instrução da
equipe". O Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE)
33
, proposto pelo BM
para administração das escolas, serve de exemplo.
O PDE tem por objetivo transformar as escolas públicas em escolas
eficazes, de qualidade e
Constitui um guia para que a escola estabeleça o patamar de desempenho
que ela pretende alcançar em um determinado prazo, mediante um conjunto
de objetivos estratégicos, metas e planos de ação, com responsabilidade,
prazos e custos definidos. É, assim, um guia para as ações estratégicas das
escolas (Xavier e Amaral Sobrinho, 1998:7).
Essa finalidade significa um novo paradoxo da atual política. Enquanto
a LDB e o discurso neoliberal defendem a autonomia da escola para
desenvolver o seu projeto pedagógico, o PDE representa um manual de
administração para as escolas, como se todas pudessem seguir as regras
determinadas e tornarem-se eficazes. Enquanto os professores lutam
politicamente para que as escolas consigam a construção, efetivamente
coletiva, do seu projeto político-pedagógico (PPP), eo apenas um
instrumento de atendimento às exigências burocráticas das secretarias de
educação, o PDE apresenta as regras, já prontas, a serem cuidadosamente
seguidas pelos agentes escolares liderados pelo diretor que "exerce forte
liderança, trabalha em direção aos objetivos definidos para a escola,
desenvolve uma visão, é dedicado, enérgico e assume funções pedagógicas'''
(Ibidem:6).
É preciso reconhecer que as escolasm enfrentando dificuldade de
elaboração do PPP. O PDE, além de apresentar orientações dirigidas e até
mesmo formulários prontos (também os recursos do BM que oferece às
escolas nele inscritas), está ocupando um espaço que o PPPo conseguiu
conquistar.
Por se caracterizar mais como exigência burocrática das secretarias de
educação do que como intencionalidade grupai da coletividade escolar, o
projeto pedagógico quase significa uma peça de ficção em razão da falta de
33
Um dos autores do manual do PDE, Xavier, foi um dos elaboradores do estudo da Gazeta Mercantil usado
no plano de educação de Fernando Henrique Cardoso. Os direitos de reprodução do manual foram cedidos ao
FUNDESCOLA-MEC para utilização em escolas públicas que participam da implantação do PDE.
autonomia das escolas em realizar o que definiram e expressaram no PPP. Os
agentes escolares podem, no entanto, elaborar projetos passíveis de realização
com base na infra-estrutura, equipamentos e recursos humanos da escola, e
estabelecer metas exeqüíveis dentro de suas possibilidades.
Discutir o PPP nas escolas pode expressar
Discutir a necessidade de se democratizar o exercício do poder político. O
termo político que se agrega ao projeto pedagógico tem justamente o
objetivo de se atribuir ao mesmo sua natureza democrática, de intenção de
contribuir para a formação de uma sociedade não-opressora, de uma
sociedade melhor (Toschi, 1998:39).
Conseguir essa façanha nas escolas, significa a melhor das intenções,
mas, com certeza, uma das mais difíceis de se alcançar.
CAPÍTULO IV - METODOLOGIA - high tech
34
A emoção do ato de pesquisar é como a arte, única a
cada contemplação.
Ivani Fazenda
Atualmente, segundo Thiollent (1986:21), em ciências sociais,o
existe padrão de cientificidade universalmente aceito: "Podemos optar por
instrumentos de pesquisa não aceitos pela maioria dos pesquisadores de
rígida formação à moda antiga, sem por isso abandonar a preocupação
científica ".
A perda das certezas epistemológicas e teóricas, ao mesmo tempo que
eclipsa os rumos da investigação, abre possibilidades de novos desenhos
metodológicos, em que, conforme Orozco (1997), convivem e se equilibram o
rigor e a criatividade, com o objetivo de investigar e transformar os objetos de
estudo.
A opção por um método de cunho qualitativo ocorre pela busca de
superação do modelo positivista/funcionalista de produção científica, por
causa da preocupação de buscar compreensão da situação estudada e também
High tech é uma expressão inglesa que significa "alta tecnologia". Na pesquisa, refere-se a modelo de
investigação que prima pelo rigor científico e pela utilização de atualizados procedimentos de coleta de dados,
como a videogravação.
de interagir com a comunidade escolar na qual a investigação se realizou,
dando voz aos investigados e possibilidade para alterarem o seu fazer. De
objetos, os investigados passam a ser sujeitos da investigação. Nessa
abordagem, o objeto de investigaçãooo as pessoas, mas a "situação
social e os problemas de diferentes naturezas encontrados na situação
investigada" (Thiollent, 1986:16), e a pesquisa visa, sobretudo, o
esclarecimento dos problemas a fim de neles intervir.
O investigador, na proposta investigativa, tem "sempre uma atitude de
'escuta' a fim de elucidar os vários aspectos da situação, sem imposição
unilateral de suas concepções próprias" (Ibidem 17).
O papel da metodologia, em uma pesquisa, consiste em conduzir a
investigação de acordo com as exigências científicas. No intuito de produzir
conhecimento, o presente estudo, mesmo admitindo e incentivando a co-
participação de pesquisadores e de pessoas implicadas no problema
investigado e, ainda, usando procedimentos variados para coleta de dados,o
abandona o espírito científico que deve acompanhar toda investigação. Como
salienta Thiollent, "o qualitativo e o diálogo não são anticientíficos".
Como resultado da política educacional do atual governo (1995-2002), a
TV Escola realizou três pesquisas encomendadas pelo próprio MEC, duas
quantitativas - a do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da UNICAMP
(NEEP) e a da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP (FIPE) -
e uma qualitativa, realizada no Centro de Avaliação da Fundação Cesgranrio.
Segundo dados obtidos pela pesquisa da FIPE - que fez parte do
Controle de Qualidade do Censo Escolar e visava avaliar a qualidade das
informações do Censo de 1997 e levantar dados sobre outros programas do
MEC - a TV Escola é o segundo dentre os programas mais conhecidos nas
escolas, com um percentual de 88,4%, perdendo apenas para a merenda
escolar com 97,5% (Brasil/MEC, Revista TV Escola, 1998: 25).
O estudo do NEEP objetiva avaliar todo o processo de implantação da
TV Escola: recebimento do kit, instalação, funcionamento e uso dos
programas. Segundo a pesquisa, 61% das escolas que tinham o kit instalado e
funcionando, já faziam gravações dos programas.
A Fundação Cesgranrio fez uma pesquisa de natureza qualitativa,
buscando detectar os fatores que interferem na maneira como a TV Escola é
recebida, gravada e usada pelos professores de dez escolas, bem como estudou
o processo de produção dos programas veiculados. A investigação concluiu
que "os professores são a mais importante instância de mediação da TV
Escola no universo escolar" (Brasil/MEC, Cesgranrio, 1998:53).
Essas pesquisas contribuíram para o direcionamento da coleta de dados
do presente estudo, bem como sua análise, em especial, a da Cesgranrio que
trabalhou a recepção.
Embora esta investigação tenha ocorrido em níveis macro, meso e
micro, privilegiei, no meso e micro, os procedimentos da pesquisa
participante, uma vez que identificam as ações grupais e individuais
ocorrentes nas diferentes atividades da escola (meso), como conhecem as
compreensões dos vídeos pedagógicos de cada professor em particular
(micro).
A dimensão macro da pesquisa ocorre em nível teórico. Inicialmente,
analisei as reformas educacionais ocorrentes no mundo e a reforma brasileira,
em particular. Nesta, aprofundei a parte relativa à formação de professores e
as indicações dos organismos multilaterais para a questão, em especial, as
orientações do BM, mediante análise de documentos oficiais do projeto TV
Escola, declarações públicas dos seus gestores, leitura e avaliação dos
relatórios das pesquisas realizadas a pedido do governo, bem como análise da
inserção do programa de formação a distância de professores no contexto das
reformas educacionais e da reforma brasileira, em especial.
Na pesquisa qualitativa, de tipo etnográfico, os dadosoo
considerados definitivos, mas inacabados, uma vez que o pesquisadoro tem
a preocupação de generalizar observações, nem mantém-se o fato observado.
A dinamicidade de uma instituição escolar, por exemplo, a faz singular em
cada dia,s e ano. A observação etnográfica descreve a situação, busca
revelar seus significados à luz da visão dos envolvidos, cujas interpretações
podem ouo ser consideradas generalizáveis. Conforme André (1995: 101),
depende da sustentação teórica e da plausibilidade das análises, avaliadas pelo
leitor.
A etnografia permite revelar a "complexa rede de interações" que
ocorre diariamente nas escolas, e justamente esse tipo de pesquisa possibilita a
consideração dos significados variados que os sujeitos das escolas atribuem às
suas ações e interações. Esse princípio da etnografia exige muita vigilância do
pesquisador, de maneira que eleo permita que suas convicções pessoais
contaminem as considerações dos agentes a respeito da escola, para o que é
de grande importância a descrição da situação e das falas literais, como a
microetnografia, que é a contribuição das gravações em vídeo, permitindo
análise mais minuciosa da situação e das ações e interações dos sujeitos da
pesquisa.
O observador participante deve, pois, admitir outras lógicas de pensar e
entender o mundo (Dauster apud André, 1995). A centralidade é a descrição
dos significados culturais dos sujeitos estudados. Assim, o conceito de cultura
é enfatizado, tal como propõe Martín-Barbero (1995:39): "A recepção é um
lugar novo " e este lugar é a cultura
A pesquisa etnográfica exige um trabalho de campo sistemático e
prolongado, uma vez que esse tempo prolongado permite o conhecimento da
rotina da escola, as tensões vividas no dia-a-dia da vida escolar.
Esses aspectos revelam que esse tipo de abordagem de investigação
exige do observador uma atitude aberta e flexível durante a coleta de dados,
tanto do ponto de vista teórico como metodológico, uma vez que um projeto
de pesquisao consegue prever todos elementos que surgem no decorrer da
pesquisa e devem ocorrer constantes ajustes durante o processo (André, 1995).
André (1995), ao apresentar as tendências atuais da pesquisa etnográfica
em educação, revela que a aproximação entre pesquisador e objeto
pesquisado, em que se incluem vários tipos de pesquisa-ação em um trabalho
de parceria e colaboração entre as partes, tem aproximado muitíssimo duas
formas de pesquisa: a etnografia e a investigação-ação. Conforme André, "o
encaminhamento parece se dar no sentido de fusão entre os dois modelos"
(Ibidem: 109). A autora considera que essa nova vertente pode até expandir-
se, uma vez que incorpora os pontos frágeis e fortes de ambas.
Nesse sentido, é possível destacar que a simples presença do
pesquisador já altera a dinâmica da escola e no caso do presente estudo,
modificou até mesmo a recepção dos vídeos, sendo, portanto, uma das
mediações do processo de dar significação aos mesmos.
É interessante observar que embora soubessem que o objetivo da
presença da pesquisadora na escola de coletar dados para uma pesquisa, os
professores entenderam que, de alguma forma, houve interferência no trabalho
pedagógico, explicada em três momentos coletivos de discussões pedagógicas
sobre vídeos assistidos pelos professores, que, no entanto, tiveram importante
significado como intervenção realizada na escola. Uma pesquisa, que
investiga o cotidiano, faz com que as pessoas, os professores, imersos no
cotidiano apercebam-se justamente pela presença e ações do observador.
O professor João observou:
Achei muito interessante o trabalho desenvolvido por vocês. Achei que
foi um momento de liberdade da gente ouvir, falar e pensar certas coisas,
ouvir outras, que é mais interessante, a gente fica atento a ouvir outro colega.
(entrevista, Escola Lázaro Rodrigues)
E a Gabriela (entrevista, Escola Lázaro Rodrigues) disse:
O grupo da manhã conseguiu mais coisas em menos tempo com essas
propostas que você trouxe para a gente, com esse trabalho que você
desenvolveu neste período.
A diretora da mesma escola, em entrevista, declarou:
"Diretora: ...eu queria agradecer a sua presença aqui...
Pesquisadora: eu agradeço a possibilidade que vocês estão me
dando...
Diretora: nós realmente tivemos a ganhar com isso, com a sua
presença e com o seu trabalho ".
Vale destacar ainda que alguns professoreso desvincularam o
programa da TV Escola, que apresentou a possibilidade de discussão coletiva
na escola, com o trabalho da pesquisadora. Em entrevista com a professora
Samara (Escola Joaquim Almeida) declara quando se conversava sobre o
vídeo "A escola além da aula", que retrata outros momento educativos na
escola, além da sala de aula, como a entrada, a saída, a merenda, o recreio:
"Essa chegada (entrada dos alunos na escola) é tão importante, a gente
observar os alunos, como você colocou para nós (...) Como professora dessa
nova postura, que você mesma nos ensinou bem, nos mostrou mesmo o
caminho " (grifos meus).
O professoro entende televisão como ensino.o há referência de
professor. A pesquisadora foi a professora. A televisãoo é entendida como
cenário de ensino. Além disso, de modo geral, os professoresom
informações sobre o ato crítico de ver TV. A televisão tem outra forma de
percepção. Os professores seguem modelos já conhecidos: aula deve ter um
professor, ao vivo, orientando os alunos, assumindo a coordenação dos
trabalhos, o que, por si, justifica a presença dos tutores em programas de
EAD.
A fala da professora, além de evidenciar ao desvinculação do vídeo
com a pesquisadora, mostra que os professores precisam de uma formação
para a mídia visual. A televisão, no caso o vídeo, apresenta idéias envolvidas
em uma roupagem sensorial, intuitiva e afetiva. Morán (1998: 159) diz:
Os meios de comunicação operam imediatamente com o sensível, o
concreto, principalmente a imagem em movimento. Combinam a dimensão
espacial com a cinestésica, em que o ritmo torna-se cada vez mais
alucinante (como nos videoclips). Ao mesmo tempo utilizam a linguagem
conceituai, falada e escrita, mais formalizada e racional. Imagem, palavra e
música se integram dentro de um contexto comunicacional afetivo, de forte
impacto emocional, que facilita e predispõe a aceitar mais facilmente as
mensagens (grifos do autor).
O autor ressalta que a televisão também transmite muitas informações
queoo captadas claramente, mas de forma subliminar. Como os olhos
o conseguem captar todas as informações, escolhem as figuras destacadas,
que se movem, enquanto muitas outras informaçõeso captadas
inconscientemente.
Outro aspecto interessante para este estudo é que a teoria da
comunicação entende que, na lógica da televisão, "mostrar é igual a
demonstrar, a provar, a comprovar" (Ibidem:l61) e que "não mostrar
eqüivale a não existir". Em uma situação de ver vídeos sobre escola, para
quem tem familiaridade com ela, ocorre um entendimento inverso. Em
sessões, especialmente a citada, os professoreso entenderam que viam algo
como real. A escola bonita, espaçosa, bem equipada, etc,o é real porque é
muito diferente da escola real que vivenciam cotidianamente.
Pinto (1995) acrescenta um dado instigante ao debate de leitura de
imagens. Para ele, ao contrário do que se diz do poder comunicativo da
imagem, que se torna um obstáculo à eficácia comunicativa, uma vez que,
sendo descritiva e informativa ao mesmo tempo, é também mais complexa. A
complexidade amplia-se quando se utiliza elementos iconográficos
desconhecidos dos receptores, como figuras de retórica visual, estilização e
abstração. Por ser mais descritiva que informativa, continua Pinto
(Ibidem:l53), "a imagem dificulta o entendimento, ou é mesmo totalmente
ineficaz, na comunicação de valores e conceitos abstratos, em que a palavra é
insubstituível".
Além disso, deve-se considerar a oralidade, característica da televisão
latino-americana. Reyes (1992) alerta que se pretende aplicar à televisão a
mesma estética do cinema que dá primazia à imagem em detrimento da
palavra. Diz ele que a TV é diferente de cinema, a recepção é diferente, o
ambiente de recepção é diferente, por isso, a necessidade de redundância
verbal da TV. A palavra que acompanha as imagens na TV exercem a função
de manter contato com um destinatário que é fugidio, em razão dos múltiplos
ruídos provocados no cotidiano do espaço em que fica o aparelho de TV,
significando que as condições de recepçãoo constitutivas do processo de
recepção.
Esses aspectos podem revelar a dificuldade dos professores em perceber
e valorizar no vídeo As escolas dos muitos Brasis os conceitos de autonomia e
cooperação, bem como as cenas simbólicas da impregnação social pela
televisão, em que o locutor derrama sobre o mapa do Brasil os chuviscos da
televisão. Pesquisa de recepção da TV Escola realizada pela Cesgranrio, e que
será apresentada adiante, sugere que muitos conceitos apresentadoso
complexos e de difícil compreensão.
Assim, como é necessário aprender a ler textos verbais, continua Pinto
(1995:154), a leitura de imagens, como qualquer outro código, também exige
aprendizado, especialmente, aos queo estão familiarizados a ela.
A recepção de mensagens imagéticas, diferente da mensagem verbal,
possui uma característica fundamental que é a ocultação do seu valor absoluto,
isto é, a isonomia de significados, suscitada no conjunto dos receptores,
mesmo dentro de um mesmo contexto.
A imbricação de todos os sistemas de comunicação da mensagem não-
verbal, como a imagem, a música, a vestimenta, a narrativa, a arquitetura, o
gesto determina o todo do texto (Canizal, 1995: 135). Esses componentes
inter-relacionam-se vertical, horizontal e obliquamente, formando "labirintos
de significação "(Ibidem: 137) em que os receptores mergulham e interpretam
o significado das mensagens.
Como alerta Burgos (1998), há ausência de educação visual nos
programas de formação pedagógica de professores. As imagens audiovisuais
aparecem apenas como ornamento do dito-lido e como ajuda visual do
pensamento, cujo papel auxiliar supõe
Distorção de caráter epistemológico que dissocia os processos criativos-
expressivos dos cognitivos, negando o valor da mensagem visual na
construção do conhecimento, fato que tem complexas e visíveis implicações
nos processos de ensino e de aprendizagem (Ibidem: 159).
A autora entende que conhecimentos sobre teorias da comunicaçãoo
fundamentais na formação de base dos professores.
Na década de 80, Paulo Freire já se preocupava com a leitura das
imagens. Segundo ele (apud Soares, 1999:23), "a leitura das imagens
demanda uma certa e indiscutível experiência que tem a ver com a classe
social", mas convém saber como se reage às imagens, que leituras realiza-se
delas e enfatiza que o importante, ao trazer os meios de comunicação para as
escolas, é saber a quem eles estão servindo.
Os aspectos revelados pelos fragmentos das falas dos professores
remetem a outra questão, o papel da TV Escola nas escolas concretas. O fato
de estar na escola pesquisando a TV Escola, imprimiu a este projeto uma nova
dimensão. Parece, desde as primeiras visitas às escolas, que ele estava meio
esquecido, existindo por existir. Minha presença no ambiente escolar tirou o
projeto da gaveta.o apenas porque, ao ver-me, os professores relacionavam
com a TV Escola, como pelas fitas que reproduzi, a pedido das coordenadora
e diretora da Escola Lázaro Rodrigues, como de listagem de todos os vídeos
veiculados que ofereci às duas escolas, mas, especialmente, pelas sessões
coletivas em que tivemos oportunidade de discutir sobre o projeto e o
conteúdo veiculado nos programas selecionados e assistidos.
Embora os estudos da recepção sejam recentes, em diversos países da
América Latina já se formaram equipes que trabalham em projetos integrados
e multidisciplinares. Martín-Barbero (Colômbia) e González (México)
pesquisam a telenovela; Fuenzalida (Chile) estuda a educação para a recepção
ativa; Orozco (México) investiga a recepção televisiva por crianças. No Brasil,
conforme Lopes (1996), os estudos estão acanhados, persistindo na
inadequação metodológica das pesquisas empíricas, que está expressa na
ausência de combinação de métodos e técnicas diversos, cuja presença é
obrigatória nesse tipo de pesquisa.
A esse respeito, manifesta-se:
No caso do Brasil, a pesquisa de recepção ainda necessita desenvolver uma
experimentação metodológica de multi-métodos através de projetos
integrados multidisciplinares que procurem combinar os avanços teóricos
com as construções empírico- descritivas, e que realizem uma interpretação
crítica, cultural e política dos processos de recepção da comunicação, a fim
de que possam firmar uma ótica teórica compreensiva. (...)
A abordagem teórico-metodológica da recepção apóia-se basicamente nas
perspectivas das mediações e do cotidiano (Ibidem: 43).
Outra dificuldade considerada importante por Lopes refere-se à
insuficiência da crítica cultural e política nas pesquisas empíricas qualitativas.
Entendida como contexto "complexo e contraditório, multidimensional no
cotidiano das pessoas" e, pelo fato desse cotidiano estar inscrito em relações
de poder culturais e históricas que extrapolam a prática do receptor, a
recepçãoo pode ser analisada apenas como processo redutível ao
psicológico e ao cotidiano, mas como profundamente cultural e político. O
processo de recepção deve ser visto como articulação de processos subjetivos,
objetivos, micro e macro estruturais. "A produção e reprodução social do
sentido envolvida nos processos culturais não é somente uma questão de
significação, mas também uma questão de poder" (1993: 85). A insuficiência
da crítica pode derivar, conforme Lopes, da hegemonia do paradigma
funcionalista nas pesquisas em Comunicação.
35
As falas dos entrevistadoso apresentadas, preferencialmente, na íntegra. Fiz questão de manter a
linguagem usada pelos pesquisados, de forma a garantir a autenticidade dos dados, mantendo, assim,
fidelidade às orientações metodológicas das pesquisas do cotidiano.
Se estudos da recepçãoo recentes nas pesquisas da área de
Comunicação, oo ainda mais no campo da Educação, essencialmente
quando se trata da compreensão da recepção como processo multidimensional,
coletivo.
Optar pelo modelo teórico-metodológico da recepção como resultado de
múltiplas mediações, implica em preocupação com as questões problemáticas
desse tipo de investigação, destacadas por Lopes. Assim, decidi agregar o
projeto desta pesquisa a dois outros projetos do Mestrado em Educação
Brasileira da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, local
onde exerço minhas atividades profissionais. Um dos projetos analisa a escola
como mediadora do processo receptivo da televisão comercial tomando como
sujeitos os alunos da sétima série do ensino fundamental, enquanto o outro se
destina a identificar como ocorrem as relações dos professores com as novas
tecnologias, em especial, a televisão/vídeo e o computador.
Esse grupo desenvolveu a pesquisa de forma empírica, em duas escolas
públicas da cidade de Goiânia, em bairros de classe social diferenciada. Uma
das escolas pertence à rede estadual e a outra é da Prefeitura. Como a escola
municipal escolhidao conta com computadores, a mestranda estudiosa da
temática optou por uma outra escola municipal. Porém, na escola estadual
éramos três pesquisadores, o que possibilitou a realização de triangulação dos
dados, requerida na investigação qualitativa, possibilitando até conferir e
comparar resultados, confrontando informações das escolas analisadas.
Neste aspecto, destaca-se o grupo de estudo formado pelos três
pesquisadores, e a orientadora de dois deles, além de outros mestrandos que
pesquisam a temática educação e comunicação. Os encontros e as leituras
selecionadas possibilitaram o "estranhamento"
36
necessário para a
compreensão do observado.
O processo metodológico de coleta de dados foi elaborado no decorrer
da investigação, tanto por meio da leitura de resultados de pesquisa de
recepção realizadas no campo da comunicação social, estudo de bibliografia
específica da área de comunicação, como de participação no XX Congresso
Brasileiro de Ciências da Comunicação - INTERCOM - realizado em
Santos/SP em setembro de 97, no GT Comunicação e Recepção e Teorias da
Comunicação. Contamos também com uma orientação pessoal de Orozco
Gómez durante o I Congresso Internacional sobre Comunicação e Educação,
realizado emo Paulo em maio de 1998.
Em seu conjunto, a investigação desenvolveu-se dentro da abordagem
qualitativa de estudo do cotidiano da escola, com a utilização de diversos
procedimentos de coleta dos dados. Observação participante com anotações
em Protocolo de Registro e análise no Diário de Campo, com registros
especiais para cada uma das duas escolas pesquisadas, conversas informais,
entrevistas semi-estruturadas (gravadas em áudio), respostas a questionários e
sessões coletivas de vídeo (gravadas em SVHS
37
) foram os instrumentais
utilizados, além da análise de documentos produzidos pelo programa da TV
Escola, como a Revista TV Escola, Cadernos da TV Escola e outras
publicações.
De acordo com André (1995:106), o "estranhamento" refere-se ao esforço sistemático de análise de uma
situação familiar como se fosse estranha reconstruindo as percepções e opiniões já formadas em novas bases.
A sigla SVHS quer dizer Super Vídeo Home Sistem. Refere-se ao aperfeiçoamento de vídeo doméstico que
oferece uma resolução audiovisual bastante superior e é muito utilizada pelos profissionais da área (Almeida,
1988:
79 e 81).
Nas sessões coletivas, deu-se relevo às narrativas dos professores, tanto
as orais que foram gravadas em áudio e vídeo, como as respostas escritas,
registradas nos questionários aplicados aos professores.
Um aspecto fundamental da pesquisa qualitativa refere-seo apenas à
busca de compreensão da realidade conhecida, mas a possibilidade de,
posteriormente, agir sobre ela, alterando- a .
Antes da ação propriamente dita, os sujeitos participantes da pesquisa,
como co-pesquisadores,m o direito e devem conhecer seus resultados; além
de ser uma resolução particular da pesquisadora, a Secretaria Municipal de
Educação de Goiânia exige, por escrito, que pesquisadores que façam uso das
escolas municipais, como campo de investigação, comprometam-se a
apresentar os resultados ao grupo participante do estudo.
Por escrito, o acordo foi firmado apenas com o município. No entanto,
os pesquisadores ratificaram o compromisso feito com as duas escolas,
interessadas em estender o campo de ação dos professores com base em
sugestões para atividades de extensão abertas às duas redes em Goiânia.
A opção de realizar uma pesquisa empírica durante o espaço de tempo
reservado ao curso de doutorado (três anos) fundamenta-se em vários fatores.
Em primeiro lugar,o se pode identificar e analisar o processo de
recepção ao ser indo às escolas, assistindo a vídeos, discutindo e ouvindo
os professores e professoras.
A opção pelo estudo empírico nas dimensões meso e micro,o
significa desconsiderar os quadros de referência teórica. Como observa
Thiollent(1986):
Pesquisa empírica
o nos parece haver incompatibilidade no fato de progredir na teorização a
partir da observação e descrição de situações concretas e no fato de encarar
situações circunscritas a diversos campos de atuação(...) Entre esses diversos
níveis de análise,o nos parece haver dedução do geral ao particular nem
indução do particular ao geral. Trata-se de um constante vaivém ( p. 9)
entre o empírico e o teórico.
Embora Martín-Barbero tenha elaborado, em nível teórico, as
mediações do processo receptivo das mídias, é Orozco quem vai ao nível
empírico para captar as mediações. Sua proposta das múltiplas mediações tem
a intenção de levar a teorização até o nível empírico, para realizar a
investigação. Diz Orozco (1997:116):
Explorar a ritualidade e a técnica nos termos em que Martín-Barbero conclui
sua teorização era muito complicado: era necessário diminuir o nível para -
em termos empíricos - poder captar as mediações (tradução minha).
A pesquisa de base empírica volta-se à descrição de situações concretas
visando o conhecimento aprofundado da situação, de forma a intervir,
imediata ou posteriormente, na coletividade estudada.
A maior dificuldade consiste em definir o como captar as mediações, os
filtros, por que passam as mensagens e de que maneira ocorre a negociação de
significados no processo de recepção social, coletivo, para o que se definiu a
realização de sessões coletivas de vídeo da TV Escola como se fossem
reuniões pedagógicas da escola. Essas sessões tomaram relevo e ganharam
importância na totalidade deste estudo.
Foram realizadas três sessões em cada escola, sendo a primeira sem
gravação e as outras duas impressas em vídeo. Vale destacar a dificuldade em
conseguir esse momento coletivo na escola estadual, uma vez que seu
calendárioo prevê reuniões pedagógicas com os professores e
coordenadores. O mesmoo ocorreu na escola municipal, que faz reuniões,
como prática rotineira do seu cotidiano.
A realização da primeira sessão coletiva só foi possível quase dois
meses após a primeira visita à escola, tendo em vista que era imprescindível
que professores, coordenadores e diretores confiassem nos pesquisadores e os
vissem como professores comuns, a fim de que seus receioso mascarassem
os dados colhidos. No período inicial de "namoro", os pesquisadores
participaram da vida da escola de vários formas: sala dos professores, recreio,
reuniões pedagógicas, conversas informais, troca de materiais, preparação de
festas e atividades.o assisti às aulas dos professores porque o objeto de
estudo é captar a administração do projeto TV Escola e se houve modificação
na dinâmica profissional dos professores e entender como os professores
respondem ao estímulo ao propiciar momentos coletivos de discussão a
respeito dos vídeos pedagógicos. Os programas da Série Educação da TV
Escola podem atender às necessidades dos professores e das escolas? Podem
provocar nos professores o interesse de relacionar teoria e prática ou propiciar
a formação continuada dentro da modalidade do professor reflexivo? As
diretoras e coordenadoras das escolas incentivam o uso da TV Escola pelos
professores? Quais as concepções do professor, sobre formação de
professores, reflexão, relação teoria/prática existentes nos vídeos e que tipos
de exemplificação, na prática, os vídeos estão proporcionando? O estudo
busca também relacionar as mediações com a forma de gestão da escola e da
formação de professores de acordo com a proposta zeicheneriana. Foi preciso
preparar o "clima" para um momentoo importante e decisivo para o sucesso
da pesquisa.
Na primeira sessão coletiva, foi mostrado o programa "Desatando os
s com afeto" da Série "Nós na escola", cujo tema principal é o efeito
pigmalião" . Antes da sessão os professores responderam a um pequeno
questionário com perguntas abertas e fechadas, a respeito do uso da TV Escola
e sua opinião sobre as novas tecnologias da comunicação e informação nas
escolas. Após assistirem ao programa, ocorreu o debate sobre o assunto
veiculado.
Na segunda e terceira sessões, gravadas em SVHS, os professores
responderam às questões antes e depois do debate, de forma a identificar se as
discussões coletivas interferiram ouo nos significados que davam às
mensagens dos programas. Parao ficar apenas com essa dimensão de
impacto das conversas do grupo, nas entrevistas individuais com os
professores, retomaram-se as impressões dos vídeos assistidos. Nas duas
sessões foram veiculados os vídeos "A escola além da aula" e "As escolas dos
muito Brasis", respectivamente, durante o segundo e o terceiro encontros
coletivos.
A participação nas sessões de vídeo foi aberta a todos os professores, de
todas as disciplinas e de todo o ensino fundamental, os quais poderiam optar
por ir ouo a elas. Na escola Joaquim Almeida, havia professores que
lecionavam também no ensino médio, uma vez que a escola oferece esse nível
de ensino.
Depois da realização das sessões coletivas, iniciaram-se as entrevistas ,
que foram organizadas de maneira semi-estruturada. Houve total liberdade aos
professores de decidirem se seriam ouo entrevistados. As entrevistas
38
O efeito Pigmalião refere-se à idealização de aluno. E inspirado na mitologia grega que conta que o rei
Pigmalião esculpiu, em marfim, a estátua de uma bela mulher pela qual se apaixonou. Pediu, então, à deusa
Atenas que desse vida a ela, casando-se com a estátua que representava seu ideal de mulher.
Optei pela entrevista, como um instrumento a mais, para tirar a dúvida a respeito do impacto que os vídeos
podem provocar nos professores. Conforme observa Morán (1998:159) "a integração de imagem, palavra e
música, presente na televisão e nos vídeos, com seu impacto emocional, num contexto afetivo-sensível,
facilita e predispõe a aceitar mais facilmente as mensagens". A verificação da manutenção ouo do
impacto das mensagens pode ser feita por meio das entrevistas.
prolongaram-se até dezembro e incluíram, além dos professores, a
coordenação pedagógica e a direção. Na escola Joaquim Almeida, realizaram-
se oito entrevistas: com a diretora, duas coordenadoras pedagógicas e cinco
professores, e na escola Lázaro Rodrigues, também oito, com a diretora, a
coordenadora pedagógica e seis professores.
O número de professores entrevistados, em cada escola, é o mesmo em
termos absolutos, mas difere percentualmente. A escola Joaquim Almeida
conta com quase três mil alunos, 2.646, e oitenta professores, sendo 32 no
turno vespertino que tem setecentos alunos. A Lázaro Rodrigues tem
setecentos alunos e 34 professores, 16 deles no período matutino, para 320
alunos.
Assim, conclui-se que nas sessões de vídeo na Escola Joaquim Almeida
houve a presença de quase 50% dos professores do período e foram
entrevistados cerca de 25% . Na Escola Lázaro Rodrigues, quase a totalidade
dos professores compareceram às sessões de vídeo e 50% foram
entrevistados.
Também nas sessões de vídeo, o convite foi geral aos professores, que
compareceram sem obrigatoriedade ou convite especial.
A gravação em vídeo, microetnografia (André, 1995: 108), permiteo
apenas ver o que acontece, mas como acontece. A combinação de análise do
vídeo com outras anotações, como respostas a questionários e transcrição de
entrevistas, favorece a análise dos dados e oferece maior consistência às
interpretações.
A transcrição do trabalho com vídeos apresenta muitas dificuldades, é
*
trabalhosa e requer muitos cuidados. Utilizando a técnica da decriptagem ou
decupagem
40
(transcrição do tempo, plano de imagem e conteúdo) é possível
rever imagens, expressões, gestos que ficam apagados ouoo percebidos
pelo pesquisador, além de permitir a transcrição literal das falas.
A técnica de decupagem possibilita a feitura do roteiro de vídeo e sua
posterior edição. A presente investigação conta com um fita de 15 minutos
que acompanha o presente relatório, como uma espécie de síntese, em
imagem, dos resultados.
CAPÍTULO V - PESQUISANDO ...
um zoom
41
no projeto TV Escola
Li com interesse o elenco das prioridades com que o
governo pretende enfrentar o desafio da educação
básica. Não discuto intenções. Apenas constato o
primado das coisas sobre as pessoas. Computadores aos
milhares sem professores prezados e estimulados são
sucata virtual. Livros didáticos sem mestres que o leiam
e os interpretem com garra e entusiasmo são pilhas de
papéis destinadas ao lixo do esquecimento. (...) As
pessoas, quando respeitadas no seu ofício, produzem
sentido e valor. Com ou sem as coisas. Mas as coisas
sem as pessoas são letra morta. Preferir coisas a
pessoas não é realismo. E apenas conformismo.
Alfredo Bosi (1996)
1. As escolas pesquisadas
Goiânia, capital do estado de Goiás, é uma cidade que oferece boa
qualidade de vida. Considerada a capital ecológica do país, caracteriza-se pelo
planejamento urbano desde sua criação, pela abundante arborização e praças
com jardins floridos.
O caráter de cartão postalo elimina as mazelas, as grandes
desigualdades sociais existentes nos bairros da cidade, apesar de seus poucos
mais de sessenta anos.
41
Zoom refere-se ao movimento de câmera que se aproxima de parte da cena ou sujeito, destacando-o. O
movimento pode ser ótico (só com a lente) ou mecânico, com o deslocamento da câmera.
Com cerca de um milhão e quinhentos mil habitantes, a cidade é
dividida em setores
42
que se denominam bairros, vilas, conjuntos, jardins,
parques ou setores.
As duas escolas pesquisadas situam-se em dois diferentes setores:
Jardim América e Conjunto Bairro Feliz.
Conforme classificação do Instituto de Planejamento Municipal
(IPLAM), no Jardim América predomina o estrato social B (média alta) e no
Bairro Feliz, o estrato social C (média)
4
.
No que se refere à classe de rendimento médio mensal em salários
mínimos, o quadro dos dois setores é o seguinte:
Tabela 2 - Rendimento mensal médio em salários mínimos (SM) por
domicílios, %.
SM
Setor
B.F.
J.A.
Até
1/2
2,94
3,75
De
1/2
a 1
2,45
8,75
De 1
a2
9,8
21,15
De 2
a3
9,06
15,92
De 3
a5
13,9
14,98
De 5
a 10
35,2
16,79
De 10
a 15
10,7
6,19
De 15
a 20
4,9
2,57
Mais
de 20
8,8
3,74
Sem
rendi
mento
1,71
5,22
Sem
declar
ação
0,2
0,88
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - Censo Demográfico - 1991
A Escola do Bairro Feliz situa-se em um bairro em que a maior parte
estratificada dos domicílios, 35,2%, situa-se na faixa de rendimento de cinco a
dez salários mínimos (SM), enquanto no Jardim América, o maior percentual,
21,15%, está entre um e dois SM, segundo dados do IBGE de 1991.
Como se percebe pelos dados apresentados, há distinção entre os
institutos. Enquanto o IPLAM define sua classificação pelas vistorias no
42
"A classificação usada neste trabalho refere-se a estudo feito pelo Instituto de Planejamento do Município de
Goiânia - IPLAM.
43
"Conforme o documento do IPLAM, a classificação foi adotada com base em vistorias de campo-
observação.
campo de observação, o IBGE a define com base na renda de cada domicílio,
todavia, a divisão de renda ocorre em virtude do número de moradores em
cada domicílio, fator queo é apresentado nos dados do IBGE.
No Bairro Feliz, 35,2% dos domicíliosm rendimento mensal médio
de cinco a dez SM, enquanto no Jardim América, na mesma faixa de
rendimento, cinco a dez SM, estão 16,79% dos domicílios.
A tabela abaixo resume os dois indicadores:
Tabela 3 - Estratos sociais do Bairro Feliz e Jardim América - IPLAM e
IBGE
IPLAM/* I IBGE/91
B. F. - Média - C 24,4 % - mais de 10 SM
35,2%-de 5 a 10 SM
J . A . - Média Alta - B 12,5% - mais de 10 SM
16,79%-de 5 a 10 SM
*o há indicação do ano da pesquisa
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - Censo Demográfico - 1991
Instituto de Planejamento Municipal - sem indicação de data
O convívio nas duas escolas, por mais de seis meses, de maio a
dezembro de 1998, confirma mais a classificação do IPLAM no que se refere
ao poder aquisitivo de forma geral,o em relação ao extrato definido. Pelas
observações,o é possível dizer que os alunos do Jardim Américao de
classe média alta, sendo temeroso fazer uma afirmação desse porte, uma vez
que nem sempre as médias de um setor retratam a realidade de uma
determinada instituição do mesmo bairro. As escolas, além de atraírem alunos
de setores variados, diferenciam-se até mesmo dentro dos três turnos. Os
alunos do matutinom um perfil sócio-econômico diferente do vespertino e,
mais ainda, do noturno. Na sessão de vídeo (fita 2, 28 min 55 seg) de uma das
escolas, os professores explicam as diferenças entre os turnos e como a escola
atrai alunos de vários bairros: "Vários alunos moram muito longe e fazem uma
verdadeira viagem para vir à escola ".
O projeto político-pedagógico das duas escolas caracteriza os alunos
como "de classe média baixa, bastante diversificada" (Jardim América) e "de
classe média a baixa, vindos de famílias de baixa renda" (Bairro Feliz). Nas
duas identificações dos alunos, fica expresso que, a maioria, vem de bairros
adjacentes à localização da escola.
Uma escola é da rede estadual e a outra da rede municipal. Em virtude
da intencionalidade de deixá-las no anonimato, passarei a designá-las, neste
estudo, pela denominação Escola Joaquim Almeida e Escola Lázaro
Rodrigues.
A investigação foi realizada em turnos diferentes, uma no matutino e
outra no vespertino.
As escolas diferenciam-se também no tamanho, tanto no espaço físico
quanto no número de alunos matriculados. A escola Joaquim Almeida tinha, à
época da coleta de dados, 2646 alunos matriculados, sendo 700 deles no turno
observado, a Escola Lázaro Rodrigues, 700, sendo 320 no turno em que se
realizou o estudo. Esse fator repercute muito na forma de organização e gestão
da escola. O tamanho da escola significa um dado importante para seu estudo.
É muito mais complexa a administração de uma escola de quase três mil
alunos em relação a outra que possui menos de mil alunos.
Conforme Brunet (1995), a dimensão da organização escolar faz parte
da variável estrutura da escola que, junto com as comportamentais e do
processo organizacional, intervêm na composição do clima organizacional das
instituições escolares. Essas variáveis estão na origem do clima. Todavia,
Brunet (1995:134) assinala, referindo-se a estudo de Anderson,
que as variáveis ecológicas (aspectos físicos e materiais)m uma relação
fraca ou inconsistente com os resultados escolares. Por exemplo, em certos
estudos, quanto menores forem as escolas, melhoreso os resultados
escolares, enquanto em outros (Rutter et alii, 1997; Weber, 1971) o tamanho
da escolao produz qualquer efeito sobre os resultados.
Os resultados escolareso representam motivo de preocupação do
presente estudo, cujo objetivo é identificar os fatores intervenientes na
recepção da mensagem. Dessa forma, observa-se que a dimensão da escola
altera sua própria organização. Certamente, a organização de escolas maiores
é mais complexa do que das menores. Ora, se o tamanho da instituição escolar
altera a administração e esta é uma mediação da recepção, o número de alunos
e a gestão da escola influenciam a recepção dos vídeos pedagógicos da TV
Escola.
Torna-se importante também perceber se a gestão da escola contribui
ouo para o destaque das potencialidades da TV Escola. Direção e
coordenação pedagógica estimulam e facilitam o uso dos vídeos tanto de
forma individual como coletiva?
2. A TV Escola
44
A TV Escola como um dos projetos prioritários,o apenas do MEC,
como da Presidência da República, foi lançada experimentalmente em 4 de
setembro de 1995 e entrou em operação em março do ano seguinte. A TV
44
o, no MEC, um projeto específico relativo à TV Escola. Os dados aqui apresentados foram
sistematizados por meio de artigos da Revista TV Escola ou de entrevistas dos responsáveis pela sua gestão.
Em entrevista à Revista TV Escola, o Ministro da Educação declarou que a TV Escola nasceu com base na
experiência do Projeto Ipê, destinado à capacitação de professores do ensino de primeiro grau e de
alfabetização, que ele acompanhou como secretário de educação do estado deo Paulo. O TV Escola
incorpora alguns programas do Projeto Ipê.
Escola faz parte da política global da reforma educacional brasileira e da
formação de professores em especial.
Em 17 de janeiro de 1997, o Ministro da Educação, Paulo Renato
Souza, e o Secretário Nacional de Comunicação, Roberto Muylaert,
anunciaram a criação de um programa de educação a distância, destinado ao
"treinamento" de professores do ensino fundamental. À época, a agência de
notícias do Jornal do Brasil (AJB) indicava que "os detalhes técnicos para a
implantação do projeto serão definidos pelo ministério das Comunicações",
(O Popular, 18 jan. 1995) dirigido, na ocasião, por Sérgio Motta.
A idéia do governo era mobilizar toda a sociedade na doação de antenas
e televisores às escolas da rede pública que participassem do projeto.
No último dia de maio de 1995, o Presidente da República, em
programa de rádio, anunciou a liberação de 45 milhões de reais para que os
governadores e prefeitos comprassem os equipamentos. Fernando Henrique
Cardoso assegurou que a TV Escolao ia substituir os professores, mas sim
"treiná-los" e apoiá-los em sala de aula a fim de melhorar a qualidade do
ensino no Brasil. Convocou as secretarias de educação, os empresários, os
quais, segundo o presidente, doaram 300 jogos de equipamentos, para a
implantação da TV Escola.
Nesse mesmo programa de rádio, o presidente lembrou que havia dito
que o "governo faria sua parte para melhorar a qualidade do ensino e ajudar
os professores. Com a TV Escola estamos cumprindo uma parte desse
compromisso, estamos abrindo um caminho importante".
E continua: "A partir de 4 de setembro, cerca de 30 mil escolas, de
mais de 10 milhões de alunos é isso mesmo: mais de 10 milhões de alunos-,
vão receber os programas da TV Escola. Isso representa uma verdadeira
revolução no ensino fundamental" ( Folha de S. Paulo, 31 maio 1995).
A TV Escola é transmitida para todo o país mediante um canal de
televisão dedicado à educação, cujos sinaiso gerados pela Fundação
Roquette Pinto para o satélite de comunicação Brasilsat-I, e captados por
antena parabólica. A programação é de doze horas diárias, divididas em quatro
blocos de três horas cada. Os programaso oferecidos às escolas para serem
gravados em fita de videocassete e, depois, usados por professores e alunos.
Conforme Draibe e Perez (1999:31), "o MEC apostou aqui em um modelo
fortemente descentralizado e autônomo, uma vez, em última instância,
delegou à unidade escolar o total arbítrio para o uso da TV Escola".
A produção dos programas é feita por eixos temáticos presentes no
currículo nacional e conta também com programas destinados à formação
pedagógica dos professores, a chamada Série Educação, usada para o presente
estudo.
Com base em vídeos de produção nacional e estrangeira, os produtores
da TV Escola selecionam a grade de programação a ser veiculada.
A TV Escola começou sem que existissem produções para entrar no ar
e, como a grade de programação deve ser feita com muita antecedência para
poder chegar às escolas antes do começo da programação, os profissionais,
que trabalham na seleção das fitasm pouco tempo, o que dificulta "uma
elaboração mais reflexiva" (Ibidem: 21). Além disso, a "seleção parece
determinada mais pela disponibilidade do mercado do que por conteúdos
formativos e informativos" {Ibidem: 23).
De março de 1996 a junho de 1998, a TV Escola já tinha veiculado
quase dois mil programas - precisamente 1.973 - a maioria deles, quase 60%,
o estrangeiros. Cabe assinalar a qualidade dos filmes produzidos no Brasil, o
que demonstra a capacidade dos profissionais da área que, mesmo vivendo
dificuldades de produção cultural no país, dedicam-se a produzir programas
educativos.
Dados oficiaso conta de que 61% das escolas já fazem gravações da
TV Escola, entretanto, das 41. 979 escolas de ensino fundamental com mais
de cem alunos, que teoricamente fariam parte do projeto, o universo da
pesquisa incluiu 5.084 escolas (Brasil/MEC, Revista TV Escola, jul.1998;
NEEP/UNICAMP, jul. 1997). Generalizando, 77,5%m o kit, o que significa
32.533 escolas. Das quem o kit, 96% (31.233) já o instalaram, o que
significa 74,39% das escolas. Oitenta e três por cento (25.923) das quem o
kit instalado, já funcionam, o que significa 61,74 do total de escolas. Das que
m o kit funcionando, 61% (19.052) fazem gravações, o que significa 37,6%
do total de escolas urbanas quem mais de cem alunos.
Assim, os 61% iniciais divulgados pela mídia, em especial pela Revista
do Programa, como penetração da TV Escola,o significam um percentual
do total das escolas e nem das que participaram da amostra, mas das que
receberam o kit, fizeram a instalação e o colocaram para funcionar.
Essa retórica confunde a opinião pública e deixa intrigados os
professores, que se sentem responsabilizados poro estarem usando a TV
Escola, ainda mais que o fato de estar gravandoo significa estar usando os
programas, nem que os mesmos estejam sendo bem usados ou que estejam
interferindo positivamente na qualidade do ensino ministrado.
Esses aspectoso ficam claro no marketing usado para divulgação dos
resultados. Em artigo publicado no Em Aberto (1996:6), Poppovic declara que
32 mil escolas usavam o equipamento, quando, na verdade, esse número
refere-se às escolas que possuem o kit, porém, o fato de possuí-loo significa
tê-lo instalado e, menos ainda, que esteja funcionando.
A pesquisa da Fundação Cesgranrio, que avaliou qualitativamente a TV
Escola, traz importantes contribuições às pesquisas de recepção e às políticas
educacionais.
Inicia reconhecendo que o campo da recepção é "naturalmente
fragmentado e marcado por grande diversidade sociocultural"|Brasil/MEC,
Fundação Cesgranrio, 1998:24). A pesquisa conclui que a realidade escolar é
uma espécie de filtro que regula a recepção e que a recepção da TV Escola é
condicionada por vários aspectos da realidade do mundo dos usuários:
diretores, professores, alunos, funcionários.
Classifica os condicionantes como: socioculturais, socioprofissionais,
socioambientais ou institucioniais. Apresenta também como condicionantes as
finalidades pedagógicas atribuídas à TV Escola e as formas de gerenciamento
do projeto.
A avaliação qualitativa, feita pelo Centro de Avaliação da Fundação
Cesgranrio, objetiva desenvolver a avaliação dos processos de produção,
recepção e utilização do programa TV Escola.
A recepção e utilização dos programas serão comentadas ainda neste
capítulo. Primeiramente, o processo de produção uma vez que a concepção da
recepção, como processo coletivo, social (objeto de estudo desta tese), apesar
de extrapolar a lógica da produção criando outras formas de análise das
mensagens midiáticas, investiga a recepção pensando "tanto o espaço da
produção como o tempo do consumo" (Lopes, 1996:43).
"Quais os critérios de produção do programa TV Escola e até que
ponto fatores do campo da recepção são aí considerados?" Essa foi a
pergunta sobre produção que a investigação de Cesgranrio buscou responder.
Considera-se "campo da produção", a reunião de diferentes agentes da
área pública, como políticos, administradores, pedagogos, bem como as
empresas privadas responsáveis pela venda ou manutenção de equipamentos e
ainda os serviços técnicos especializados.
Conforme o documento que sintetizou os resultados da pesquisa,
o campo da produção da TV Escola está relativamente bem delineado:
baseia-se no postulado da eficácia de uma racionalidade cuja intenção é a
melhoria de qualidade do ensino, dos horizontes lingüísticos e culturais e de
outros efeitos decorrentes da presença do meio de comunicação televisão no
mundo da escola (MEC, Cesgranrio, 1998:15).
O grupo de pesquisadores da Cesgranrio avalia que muitos vídeoso
facilitam a aproximação do professor entre o que foi apresentado no vídeo e
sua necessidade imediata. Algumas vezes, os conceitos apresentados nos
programaso complexos, exigindo previamente altos níveis de informações
para sua compreensão.
Os elementos da produção são, certamente, fatores intervenientes no
processo de recepção. É preciso conhecer a recepção. A proposta deste
trabalho consiste em mergulhar mais a fundo no processo de recepção da TV
Escola. Se a pesquisa da Cesgranrio identificou descompassos entre a
produção e a recepção, a intenção deste estudo é aprofundar ainda mais a
recepção, tentando criar momentos exclusivos para discutir os programas e
analisar se isso faz com que a TV Escola se revele favorável à formação do
professor reflexivo. Objetivo conhecer, com mais detalhes, como acontece o
processo na escola e, em especial, com os professores.
No que se refere ao uso da TV Escola, as dificuldades apresentadas
pelos professores e coordenadores, desde o início de nossa permanência nas
escolas,o idênticas às detectadas na pesquisa do NEEP/UNICAMP -
Avaliação da TV Escola - falta de tempo dos professores, de pessoal para
gravar os programas e cuidar da videoteca, também dificuldades de manusear
os aparelhos, etc.
Outro aspecto, aparentemente menor, mas que está dificultando o uso da
TV Escola, refere-se à falta de fitas para gravar os programas. Na sessão de
cartas da edição especial da revista (Brasil/MEC, Revista TV Escola, julho de
1998), uma professora de Cerejeiras (RO) escreveu: "Li na sessão de cartas
da revista TV Escola de dezembro de 97 (edição especial) que uma professora
de Pernambuco queria fitas virgens. Pois nós também necessitamos urgente".
A carta demonstra, como também constatou-se na ida a campo, que as
escolasm dificuldade de comprar fitas virgens para gravação, tendo em vista
que, se gravarem todos os dias, despenderão cerca de 60 reais por mês, quantia
que a escolao tem, especialmente, se se comparar com os parcos recursos
que recebem anualmente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE).
A realização de sessões coletivas de vídeo com os professores e alunos
das duas escolas pesquisadas objetiva detectar as mediações da recepção de
programas da TV Escola, conforme categorização estabelecida por Barbero e,
especialmente, por Orozco.o elas: mediações individuais, de referência,
situacionais, institucionais, massmediáticas. Orozco chega a essa classificação
mediante pesquisa empírica que realizou para conhecer os tipos de intervenção
que a família e a escola produzem no processo de recepção televisiva das
crianças.
O item seguinte mostra como ocorreram as sessões coletivas de vídeo
com os professores e as mediações que foram identificadas.
3. A busca do momento coletivo...
153
Desejo fazer neste item uma apresentação diferente. Relatarei a
experiência como se fosse uma história, o que vivi como pesquisadora.
A busca de momentos coletivos de discussão dos vídeos da TV Escola
surgia como possibilidade de ingressar no micro e no particular do estudo
tridimensional. Recorrendo a Connely e Clandinin (1995:34), quando se
referem às narrativas, encontrei a indagação: "Quais são as marcas de uma
narração que 'convida'? Tannem (1988) sugere que o leitor de uma história
ligue-se a ela reconhecendo os detalhes, imaginando as cenas nas quais esses
detalhes poderiam ocorrer, e ir reconstruindo-as desde associações até
recordações similares. E o particular eo o geral que desencadeia a emoção,
que move as pessoas e que faz com que apareça o que H. Rosen (1988) chama
"autenticidade".
Busco trazer aqui a autenticidade do que vi, ouvi e interpretei do que
aconteceu nas escolas. Porém, mais do que fidedignidade na descrição dos
fatos, narrar um fato significa incluir a compreensão que o narrador tem dos
sujeitos, da representação que tem da realidade, dos significados que dá ao que
observou, da análise que faz das representações dos pesquisados.
Cunha (1998:38) observa que
trabalhar com narrativas na pesquisa e/ou no ensino é partir para a
desconstrução/construção das próprias experiências, tanto do
professor/pesquisador como dos sujeitos da pesquisa e/ou do ensino.
o foi fácil obter, em cada escola, momentos específicos para realizar
as sessões de visionamento dos programas selecionados para o trabalho com
os professores. Mesmo na escola em que houve mais facilidade, percebe-se
como a organização do sistema interfere na unidade escolar e impede a livre
gestão do trabalho educativo ali desenvolvido, ou como os valoreso
explícitos dos dirigentes da escola se manifestam.
Transferências de datas com avisos antecipados ou não, dificuldade de
conseguir um momento para reunir os professores, dificuldade na liberação da
sala de vídeo para uso da pesquisadora, tempo cronometrado para realizar a
sessão de vídeo,o exemplos de dificuldades perceptíveis para a realização
das sessões de vídeo. Digo perceptíveis, uma vez que o elemento causador
dessas situaçõeso está visível. Como Nóvoa já demonstrou, a cultura
organizacional da escola possui uma base conceituai invisível queo os
valores, as crenças e as ideologias.
Ainda segundo Nóvoa:
os valores permitem atribuir um significado às ações sociais e constituem um
quadro de referência para as condutas individuais e para os comportamentos
grupais. As crençaso um fator decisivo na mobilização dos atores e na
qualificação das atividades no seio da escola. As ideologias nos seus
aspectos consensuais e conflituaiso o componente fundamental para a
compreensão social da realidade, isto é, para a possibilidade de dar um
sentido ao jogo dos atores sociais. No essencial, encontram-se nesta zona de
invisibilidade social os elementos-chave das dinâmicas instituintes e dos
processos de institucionalização das mudanças organizacionais (1995:31).
O ato de realizar um trabalho de vídeos com os professores e no horário
de trabalho significa uma mudança organizacional, que interfere na dinâmica
da escola e na própria concepção de trabalho do professor e de sua formação,
e da não-assimilação do aspecto da reforma educacional que inclui a escola
como local de formação. As escolas pesquisadas manifestam dificuldades em
rever as bases conceituais e os pressupostos invisíveis de sua cultura
organizacional, porém, parece mais fácil de ser assimilado pela escola em que
as reuniões pedagógicas já se realizam com periodicidade, como uma das
pesquisadas, passando, entretanto, pela mudança do sistema, o que o toma
menos centralizador, e com mais autonomia às escolas.
O relato das situações vividas oferece uma amostra do significado da
realização de três sessões em cada escola.
Havia dois entraves a enfrentar: a conquista dos professores para
participar das sessões bem à vontade e a organização da escola, que criava
empecilhos aos encontros de que necessitava. O último entrave foi o mais
difícil de contornar, uma vez que interferia até nos próprios professores e na
sua disposição, começando pela dificuldade de realizar reuniões pedagógicas.
Em uma das escolas, as reuniões com professores da segunda fase do ensino
fundamental ocorriam contra as ordens da secretaria. Na outra escola, o
problema era ainda maior, uma vez que as reuniões e os conselhos de classe
oo considerados como dias letivos.
Vale um parêntese a respeito dessas informações.
A questão dos duzentos dias letivos interfere muito no trabalho da
escola. Professores e coordenação queixam-se muito dessa exigência, ainda
mais que a Lei nº 9.394/96 refere-se a um mínimo, e perguntam contestando:
Como ser mínimo se já está difícil cumprir os 200 dias? Ainda mais que as
reuniões e os conselhos de classeoo contados como dias letivos.
Há uma certa lógica nessa contrariedade dos professores, uma vez que
somando aos duzentos dias os 45 de férias (Res. CNE 3/97), os 52 sábados, os
52 domingos, mais 10 dias de feriados nacionais (sem contar os regionais e
locais) e, pelo menos, a semana de planejamento, os cinco dias das provas
finais e o recesso de fim de ano, já ultrapassam o ano civil.
Acrescente-se que o ano letivo era de 150 dias; após a Lei nº 5.692/71
passou a ter 180 dias. Mais do que ampliar os dias letivos, é preciso melhorar
as condições físicas e pedagógicas das escolas, melhorar as condições de
trabalho e salário dos professores, etc.o adianta condicionar a melhoria do
ensino da criança aos duzentos dias, se as escolas estão sucateadas, sem
bibliotecas, sem material didático, com organização autoritária e professores
estressados pelo excesso de trabalho.
É bem verdade que os professoresm parte de sua carga horária
contratual para atividades extra-classe, mas os baixos salários obrigam-nos a
cumprir essas atividades nos finais de semana, de madrugada, etc, provocando
sobrecarga, cansaço e irritação.
Retomando o tema sobre a realização das sessões, é possível dizer que
os professores, em sua grande maioria, desejam seu aprimoramento
profissional. Pedem ajuda aos pesquisadores, reclamam por cursos queo
o oferecidos, solicitam bibliografia, mas, de certa forma, ocultam outros
desejos e intenções. A administração da escola, por sua vez, aparece com mais
força e clareza.
Em uma das escolas, as sessões programadas eram constantemente
adiadas: como exemplo, a morte do cantor Leandro provocou o adiamento,
uma vez que o governador da época decretou ponto facultativo e o encontro
estava marcado justamente para aquele dia. Importa lembrar que as escolas
om autonomia para alterar qualquer item do calendário nem podem usar
dias letivos para fazer reuniões: no entanto, a morte de um cantor, embora
famoso para a região, foi suficiente para adiar os trabalhos.
o foi possível realizar sessão em outro dia, porque os professores
estavam aplicando provas eo podiam ser liberados. Vale dizer que as
provaso marcadas pela instituição eo pelo professor.
A dificuldade começa pelo próprio centralismo que a coordenação
pedagógica geral exerce na escola, já que ela eo a coordenadora pedagógica
do turno pesquisado definia as datas dos encontros, o que significa
continuidade de uma prática cristalizada no próprio sistema de ensino.
Vejamos o caso seguinte. Em junho de 1998, iniciaria a Copa do Mundo e o
Brasil ia jogar às 12 horas e 30 minutos. Dois dias antes, na sala dos
professores, a discussão girava em torno do jogo. E perguntavam: Como
vamos fazer com as aulas? Segundo a coordenadora de turno, a ordem da SEE
era que os alunos e os professores assistirem ao jogo na própria escola.
Causou espanto essa decisão pois a salao comportava os 850 alunos do
turno. Outra coordenadora já tinha adiantado queo viria naquele dia porque
assistiria a abertura dos jogos em casa. Como se, as ordens superioreso
dadas sem conhecer a realidade da escola, suas condições e interesses,o
fortemente expressos neste fragmento.
Apesar de liberar os professores para participarem ouo das sessões, a
tática usada pela direção da escola era deo avisá-los, ao ser na última
hora, talvez com receio de que pudessem ir embora e deixar a pesquisadora
ficar sozinha. Como disse o prof. Alencar
45
, "o excesso de trabalho é tanto
que quando há uma brecha nas aulas, o professor pensa mesmo em ir embora
para casal".
Em um dos intervalos do recreio, a coordenadora pediu aos professores
que informassem quais seriam as apresentações no Dia do Folclore (PR B,
1998, n.10) para ela fazer a programação. Uma das professoras disse que é
preciso incentivar os alunos a ficarem na escola para assistir as apresentações
e completa: "Isso cada professor pode fazer em sua aula. Mostrar para o
aluno, conscientizá-lo de que isto também é atividade da escola". Comentam
que os alunoso permanecem na escola, ligam para os pais irem buscar,
pulam o muro, querem ir embora a todo custo. Um outro professor aproximou-
se e disse em tom de brincadeira: "É preciso não deixar também os
professores saírem, porque se deixar até os que organizaram apresentação
saem". Dois lamentos nesse episódio: o aluno achar que a escola é só aula
entre quatro paredes e o professor sugerir queo tem prazer no seu ofício.
Assistir às sessões de vídeo e delas participar foi prazeroso para grande
parte dos professores, como expressaram livremente nos questionários e
entrevistas, mas foi enfadonho para outros, como se pode ver nas
videogravações.
No primeiro encontro, ao entregar o questionário, uma professora disse
queo iria responder porque estava sem óculos. Uma companheira disse que
leria para ela. No final, ela deixou o questionário sem responder, com a
colega, e foi-se embora. Como nessa sessão usou-se o aparelho videocassete
da biblioteca e lá iria ocorrer a escolha dos livros didáticos, ficaram mais
professores juntos, mas alguns se afastaram do agrupamento mais próximo do
vídeo e da pesquisadora.
Na outra escola, as relações eram diferentes, muito mais próximas,
igualitárias e cooperativas. Foi feito um calendário de realização das sessões
entre a coordenadora e os pesquisadores, o qual foi seguido. Houve apenas um
adiamento, motivado pelo lançamento promovido pela Secretaria de Educação
de um projeto que requeria a presença dos professores da escola, uma vez que
pertencem ao projeto e no dia seguinte aconteceria a festa junina da escola. A
diretora achou queo devia dispensar os alunos três dias seguidos e
transferiu a sessão. A realização de qualquer evento implica em dispensa dos
alunos, uma vez que o calendário escolaro prevê espaços para
acontecimentos coletivos para os professores.
Se a TV Escola é projeto prioritário do governo federal e faz parte da
política de formação de professores, é lamentávelo ter previsto momentos
' Os nomes dos professoreso fictícios.
coletivos de trabalho nas escolas eo ter incluído as faculdades de educação
como locais de preparação e de sensibilização dos novos profissionais para o
uso dos programas veiculados. Apesar disso, é intrigante, por que, no interior
das escolas, as diretoras e coordenadoras pedagógicas, usando da autonomia
relativa que possuem,o criam situações para ver os vídeos nem momentos
de discussão coletiva.
4. Critérios de seleção dos vídeos
Foram vários os critérios de seleção dos vídeos. O próprio projeto TV
Escola apresenta-se como referencial para a formação de professores, tanto
nos vídeos de áreas específicas do currículo como Língua Portuguesa,
Matemática, Ciências, Arte, Educação Física, Geografia, História, Literatura;
como em temas transversais como Orientação Sexual, Pluralidade Cultural,
Ética, Meio Ambiente, Saúde, também, Educação Especial e
Escola/Educação.
Inicialmente, fiz opção pelos vídeos da Série Educação pelo fato de
pretender trabalhar com professores das diferentes áreas do conhecimento e
por entender que esses vídeos, que conheci logo que começou sua veiculação,
poderiam interessar a professores das várias disciplinas mesmo estando juntos,
uma vez que tratam questões relativas à educação e à escola, em particular, e
o especificamente a áreas do currículo escolar.
Na seleção, optei também por usar vídeos nacionais, apesar de que mais
da metade (60%) dos programas transmitidos sejam estrangeiros. Na área
temática Escola/Educação, dentre os veiculados de 1996 a 1998, há cinco
séries estrangeiras: uma da Open University (1997), uma dela com a BBC
(1996), uma só da BBC (1992). Existem ainda duas séries australianas
realizadas pela Film Austrália (1993) e outra, pela Australian
Television/Children's Foundation (1995).
Os vídeos estrangeiros assistidos por mim, para o fim pretendido -
questões educacionais gerais na formação de professores - foram
considerados inadequados. Especialmente, o meu objetivo era que as sessões
coletivas de vídeos propiciassem debate sobre questões próximas à realidade
dos professores, ou seja, um programa que mostrasse mais de perto a escola
pública brasileira, e, assim, suscitasse uma reflexão coletiva sobre problemas
da escola brasileira e o papel desempenhado pelo professor.
Posso dizer que acertei nesse critério, uma vez que a escola mostrada no
vídeo "A escola além da aula", foi rejeitada pela aparência física diferenciada
das escolas em que os professores atuam. Trata-se de vídeo nacional, escola
pública brasileira. A rejeição poderia ser muito maior se o vídeo apresentado
se referisse, por exemplo, a uma escola padrão inglesa.
A grade de programação dos primeiros programaso trazia a divisão
de áreas ou série Educação, embora, desde a fase experimental, o programa
"Um salto para o futuro", igualmente destinado à formação de docentes,
fizesse parte da TV Escola. Em seguida, surgiu a série Rede Geral, cujo
público alvoo os professores, uma vez que discute a função do ensino e o
papel dos educadores na escola pública.
A série "Escola Hoje", veiculada a partir de junho de 1996, traz
programas destinados a diretores de escolas, professores e à comunidade
escolar e, com base em problemas vividos por diretores, apresenta uma visão
do papel da escola e da sua gestão.
A grade de programação para os três meses finais de 1996 conta com a
série Escola/Educação, e traz programas sobre Professores do Mundo e
começa a série "Nós na escola", cujos programas versam sobre questões do
cotidiano da escola no Brasil. Neste trabalho, foram usados dois programas da
série: "Desatando oss com afeto" e "As escolas dos muitos Brasis". A série
"Nós na escola" realizada pela Fundação Roquette-Pinto em 1989, de acordo
com o Guia de Programas (Brasil/MEC/SEAD, 1998: 59),
trata de questões e desafios que a escola de primeiro grau enfrenta. Os
programas debatem o relacionamento de professor e aluno, a natureza do
trabalho escolar e a diversidade étnica e cultural do povo brasileiro.
Especialistas, depois de avaliarem os argumentos dos professores, pais e
alunos, propõem um novo olhar sobre a educação de crianças, instigando a
discussão crítica do trabalho desenvolvido na escola. Os programas
oferecem à comunidade envolvida no processo pedagógico a opção para a
reflexão em grupo.
Da série "Escola em discussão" utilizei o vídeo intitulado "A escola
além da aula". A série "Escola em Discussão", realizado pela TV
Escola/MEC, em 1997,
discute o tempo, o espaço, diversidade de competências, materiais, avaliação
como itens do processo de ensino e aprendizagem. Destaque para o
planejamento na vida do professor e o aproveitamento dos momentos
extracurriculares como oportunidade para a aprendizagem (Ibidem: 55).
Gravei, com equipamento próprio, alguns programas da série e utilizei
outros, emprestados de escolas, e departamento da TV Escola da Secretaria de
Estado da Educação de Goiás e Secretaria Municipal de Educação de Goiânia.
De posse de um acervo de cerca de trinta fitas com vários programas em cada
uma delas, selecionei aqueles relacionados à vida concreta da escola,
mostrando cenas de vida escolar e falas de professores.
Escolhi programas que suscitassem debate entre os professores, de
forma a fazê-los refletir sobre sua prática, ouvir opiniões dos colegas, e
possivelmente mudar de opinião. Vale lembrar que, durante a seleção dos
programas, já contava com todo material teórico sobre o professor reflexivo,
segundo a teoria zeicheneriana. O objetivo do trabalho era detectar se os vídeos
poderiam colaborar com a formação do profissional reflexivo, já que a maioria
das escolas possuía o equipamento necessário para a recepção dos programas.
Emborao estivesse, à época, de posse dos elementos do professor
reflexivo que buscaria identificar na intervenção, dois deles pareciam mais
claro para mim: a dimensão coletiva na formação do professor reflexivo e a
possibilidade de relacionar teoria e prática.
Em suma, as questões de seleção e coordenação do visionamento dos
vídeos incluíam o desenvolvimento de temas extraclasse, de forma a propiciar
que o debate extrapolasse para além do pedagógico, como propõe Zeichner.
Escolhi vídeos que mostrassem as diferenças existentes no país, entre as
regiões, as escolas, os professores, os alunos e, que também, propiciassem
conhecimento e discussão da necessidade de ambientes escolares mais
democráticos.
O Guia de Programas da TV Escola - 1996-1998, publicação feita pela
Secretaria de Educação a Distância do MEC, dirige-se às escolas integradas ao
projeto TV Escola e busca, com sinopses de cada programa, ser obra de
consulta e de utilização, dos programas. O Guia traz o seguinte resumo de
cada um dos vídeos usados no estudo.
Desatando oss da escola
A criança, na escola, apresenta características diferentes daquelas que o
professor aprendeu a observar durante o período de sua formação
profissional. As dificuldades que daí surgem constituem verdadeiross que
amarram e paralisam o processo de relações construtivas entre mestre e aluno.
As escolas dos muito Brasis
O país abriga uma grande diversidade cultural e social. Atenuar as
diferenças existentes exige preparação da escola, que precisa repassar os
conhecimentos numa única linguagem.
o me orientei pelas sinopses, pois o Guia de Programas foi publicado
depois da coleta dos dados, razão por que preferi assistir aos programas e fazer
a seleção levando em conta o conteúdo, a apresentação das idéias, a
problematização que oferecia e qualidade da gravação, separando aqueles que
apresentavam boas imagens, som audível e, em especial, cenas, que por si,
eram instigantes.
5. As sessões coletivas de vídeo
As sessões coletivas de visionamento e debate do programa escolhido
representou a técnica selecionada para captar as diferentes mediações na
recepção dos programas da TV Escola destinados à formação dos professores.
Os professores de cada escola assistiram a três sessões coletivas, em um
total de seis, sendo quatro delas gravadas em fitas de vídeos. Foram os
A escola além da aula
Nos momentos extracurriculares também ocorre a aprendizagem. A entrada
e a saída da escola, a merenda e o recreio,o ocasiões em que o professor
pode criar vínculos diferenciados com seus alunos. Neste horários as crianças
m oportunidade de conviver com adultos e com crianças de outras classes,
possibilitando aprendizagens de naturezas diferentes.
seguintes os vídeos escolhidos para as sessões coletivas: "Desatando oss
com afeto"; "A escola além da aula"; "As escolas dos muitos Brasis".
5.1. Dinâmica das sessões
Primeira sessão
Vídeo - "Desatando oss com afeto"
Duração - 19 minutos e 27 segundos
Tempo total da sessão - 50 minutos
Dinâmica:
- Resposta a um questionário, antes da exibição do vídeo, sobre a
relação quem com as novas tecnologias
- Exibição do vídeo
- Debate sobre o conteúdo do vídeo
Segunda sessão
Vídeo - "A escola além da aula"
Duração - 11 minutos e 50 segundos
Conteúdo - O vídeo apresenta momentos que podem ser considerados
como educativos que se situam além da sala de aula, como a hora da entrada, a
merenda, o recreio e a saída ao término do período letivo. Após a apresentação
Conteúdo - O programa enfoca a formação de professores baseada no
aluno ideal e relata o choque vivido pelos professores ao descobrirem o aluno
real. Utilizando o debate do efeito Pigmalião, diversos especialistas e
professores ressaltam a importância da afetividade na educação de jovens e a
importância deo fazer previsões precipitadas, antes de estabelecer um
relacionamento mais estreito.
de cada uma dessas situações, um especialista tece comentários sobre a
importância do momento na formação geral dos alunos.
Tempo total da sessão - 50 minutos
Dinâmica:
- Entrega do primeiro questionário -o responder
- Exibição do vídeo
- Responder o primeiro questionário (duas questões abertas)
- Debate
- Responder o segundo questionário (uma questão aberta)
Terceira sessão
Vídeo - "As escolas dos muitos Brasis"
Duração - 19 minutos e 50 segundos
Conteúdo - O vídeo ressalta como os meios de comunicação
impregnam a sociedade e a escola. Mostra a opinião de vários professores, de
diferentes estados do país, sobre o Brasil. Discute o papel da escola na
formação da autonomia e solidariedade.
Tempo total da sessão - uma hora
Dinâmica:
- Responder antes o primeiro questionário (três questões abertas)
- Exibição do vídeo
- Debate
- Responder o segundo questionário (duas questões abertas)
Na primeira sessãoo houve videogravação, a fim de deixar os
professores mais à vontade e menos tensos para o debate que sucederia a
sessão de exibição do programa. Antes de assistirem ao programa escolhido,
"Desatando oss com afeto" da Séries na Escola, os professores
presentes responderam a um pequeno questionário (ver modelo em anexo) em
que respondiam se já usaram programas da TV Escola em suas aulas, e o
motivo; se usaram, qual foi o programa e em qual matéria. Outra questão, com
opções fechadas e uma possibilidade em aberto, referia-se à opinião dos
professores quanto às Novas Tecnologias da Informação e Comunicação
(NTIC) nas escolas.
Dentre 12 professores que responderam ao questionário, oito
assinalaram queo usaram a TV Escola, ou por falta de tempo, ou por falta
de oportunidade, ou poro ter programas de seu interesse, como sobre língua
estrangeira, ou poro conhecerem os programas da TV Escola ou porqueo
podiam levar as fitas para casa. Os professores que responderam
afirmativamente,o informaram qual o tipo de programa utilizado,
indicando apenas o conteúdo e a matéria, como Energia/Física ou Educação
Sexual/Ciências, Futebol/Educação Física, do que se poderia concluir que
preferiramo assumir oo uso.
Muitos professores, que participaram da sessão,o responderam ao
questionário; nem todos explicaram a razão, mas foi possível perceber que
estavam ansiosos para começar logo a escolha dos livros didáticos, uma vez
que estávamos na biblioteca e, enquanto ocorria a sessão, as coordenadoras
preparavam ao fundo o espaço, distribuindo livros nas mesas, conversando
entre elas ou com outros professores.
Nas respostas começou a se delinear um dado novo, - a utilização de
uso de vídeos nas aulas, maso de vídeos da TV Escola. Intrigada com isso,
passei a investigar qual seria a razão da escolha, uma vez que a TV Escola
atende ao programa curricular,o tem custo adicional como o aluguel de
fitas em locadoras de vídeos, possui programas com duração adequada ao
tempo das aulas, diferentemente dos documentários usados pelos professores.
Quanto à opinião que possuem sobre o uso das NTIC, as respostas mais
freqüentes foram "coisa boa que aconteceu nas escolas" e "vai melhorar muito
o ensino". Além de "assusta o professor queo sabe lidar com elas" e "não
mudará nada quanto à qualidade do ensino". Neste item, os professores ainda
falaram da "falta de informação sobre a TV Escola", julgando-a "válida se
realmente acontecesse nas escolas".
Em outras duas sessões, realizadas em cada escola, foram exibidos
também os vídeos da Série Educação, indicados para a formação de
professores.
A dinâmica dessas duas sessões foram diferentes, uma vez que os
questionários já tinham relação com o conteúdo do vídeo escolhido.
Optei pelo uso de questionário pelo fato de que, na sessão anterior, a
primeira, alguns professores monopolizaram o debate inibindo outros colegas
de se expressarem.
O questionário possibilita conhecer mais significações e o que é mais
importante, permite identificar se os debates interferem, de alguma forma, nos
significados que cada um dá aos programas.
Nas duas sessões utilizei também a videogravação. As sessões foram
gravadas em vídeo e depois foram transcritas, "decupadas", tanto para facilitar
a análise dos dados como para possibilitar a feitura do roteiro do vídeo-
relatório e sua posterior edição.
As análises dos significados das sessões de vídeo, elemento central
desta tese, tiveram o suporte adicional dos questionários, como também das
entrevistas realizadas posteriormente com os professores, diretores e
coordenadores pedagógicos e, adicionalmente, os protocolos de registro das
observações nas duas escolas, bem como o diário de campo da pesquisadora,
cujas análises encontram-se no item denominado mediações da recepção.
6. Concepções de professor e de formação de professores subjacentes
aos vídeos selecionados para as sessões
Os vídeos escolhidos pertencem a séries destinadas à formação de
professores e sua produção foi realizada com base em uma determinada
concepção de professor e de sua formação.
Os vídeos foram analisados na perspectiva de identificar as concepções
de professor e a proposta de formação de professores que sugerem.
6.1. Desatando oss com afeto
Foto
46
1 - Cena do programa "Desatando oss com afeto"
47
46
As fotos foram tiradas do próprio vídeo em VHS usado nas sessões coletivas com os professores.
Originalmente, os vídeoso coloridos, mas perderam qualidade, na reprodução das cenas, por causa da ilha
de edição digitalizada ser de uso profissional e para uma melhor resolução a fita deveria estar em SVHS.
O apresentador explica o efeito Pigmalião na escola. As diferentes máscaras utilizadas pelas estátuas de
alunos ideais referem-se aos rótulos que os professoreso aos alunos.
A ficha técnica do programa mostra que ele foi produzido pela
Fundação Roquette-Pinto, em 1989, antes, portanto, da instalação da TV
Escola, e a produção educativa ficou a cargo de Yonne Polli, Sueli Brandão e
Regina de Assis, e Cleide Ramos atuando como diretora geral de educação.
O vídeo é apresentado pelo ator Guilherme Karan. O programa começa
dizendo que os cursos que formam professores idealizam um aluno padrão e
que os professores se assustam quando deparam com a realidade das escolas,
especialmente, as públicas. E questiona o telespectador: "E na sua escola,
como é?" Apresenta relato de inúmeras professoras de várias partes do país
que confirmam isso, por meio de exemplos práticos de sua experiência como
docente.
Em seguida, especialistas (psicólogos, pedagogos e psiquiatras) opinam
sobre a questão, mostrando a importância da afetividade no aprendizado
cognitivo das crianças. Da mesma forma, vários professoreso depoimentos
que confirmam as idéias apontadas.
O apresentador conta a lenda de Pigmalião remontando-a para a escola.
O professor acredita que terá um aluno ideal, e ante a realidadeo diferente
apresentada nos cursos de formação, rotula seus alunos e fazem "previsões"
sobre eles, o que se concretiza pela força da expectativa que os professores
m dos alunos. Os depoimentos de vários professores apontam que o
comportamento do professor é equivocado.
Além de discutir como o professor vê o aluno, o programa procura
mostrar também como o aluno vê o professor. Apresentam-se cenas de
alunos falando de seus professores e imitando-os. De um lado, aparece o grito,
o castigo e o excesso de tarefas, já de outro a compreensão e afetividade dos
professores com os alunos, além de sua preocupação para que o aluno aprenda
e tenha sucesso na vida, etc.
O mesmo apresentador mostra, desta vez, várias miniaturas de carros e
pergunta qual é a diferença entre eles e a sala de aula. Afirma que a fabricação
de carros faz-se em série, enquanto que a educação das crianças deve atender
a uma diversidade de requisitos.
A diversidade existente nas escolas, em cada sala de aula, é explorada
pelos mesmos especialistas, demonstrando a necessidade de levar em conta as
características de cada aluno, sem perder de vista a necessidade de trabalhar
um conteúdo comum para todos.
O locutor conclui o programa dizendo que nessa viagem o professor é
companheiro dos alunos, com quem compartilha idéias, pesquisas, modos de
descobertas e valores, o que se deve realizar de modo gratificante para os dois,
fundamentado na força do "nós construímos vínculos, conhecimentos e
valores ".
Análise
O programa critica a racionalidade técnica de formação de professores,
que idealiza situações em sala de aula que dá receitas aos professores para
trabalhar nas escolas reais.
Coloca como ideal de formação de professores, o atendimento à
afetividade das crianças e, por meio dela, o respeito às diferenças sociais e
culturais.
A base da relação professor/alunoo os valores e, estes, a base dos
vínculos construídos nessa relação. O professor cria vínculos, por meio da
afetividade e respeito à diversidade, para construir valores e conhecimento.
Enquanto o gerente da linha de produção parte da standartização, da
igualdade, o professor, que forma alunos, parte das diferenças.
O efeito Pigmalião deseja mostrar o preconceito que ainda permeia a
ação de professores, daí a razão dos especialistas darem relevo ao sentir e ao
pensar.
A proposta de formação docente é que os professores percebam oss
da escola - nome da série - e tentem rompê-los.
O programa frisa o aspecto afetivo da relação professor/aluno. Embora
seja esse o objetivo fundamental do vídeo, como o título sugere - desatando os
s com afeto - o professor aparece mais como protetor do que como quem
cuida do conhecimento, função precípua da escola.
A questão do professor, como alguém que trabalha o conhecimento é
descuidada, poiso há cenas com o professor estudando. Embora ressalte a
importância do professor como alguém que deve pesquisar e buscar o
conhecimento, essa referência só aparece em off
48
.
A descoberta que o professor faz do aluno real ocorre de forma isolada,
pelo ensaio e erro, presume-se. O professor está sempre sozinho com seus
alunos, ele deve descobrir o aluno sozinho.o há referências orais, nem em
cenas, apresentando o professor com seus colegas de trabalho, discutindo,
lendo ou estudando.
Ocorre, porém, que o ato de observar vídeo que trata uma questãoo
importante, em uma única vez,o oferece condições para uma análise mais
acurada. As imagens em movimento, cores, sons, músicas, vozes, etc,
absorvem os receptores e o aspecto racional dilui-se.
48
A expressão em off é usada para indicar a voz de pessoa que fala sem que sua imagem apareça. No vídeo
em questão, mesmo nas cenas em offo aparece o professor estudando, ou em grupo, debatendo ou
conversando com os colegas. Restringe-se a cenas de professores ministrando aulas perto do quadro-giz e
atendendo aos alunos.
Na dinâmica com o vídeo, usei a técnica do ver, sentir, deduzir, agir.
Pedi inicialmente para dizerem o que tinham visto e as respostas dos
professores expressavam os sentimentos experimentados - foram envolvidos
pelo conteúdo do vídeo. Em uma das escolas, entretanto, uma das professoras
alertou racionalmente que "é preciso aliar competência técnica e afetiva. Se a
escola ficar só no afetivo ela foge de sua essência, que é o ensino".
Em outra escola, uma professora disse: "Vi no vídeo uma coisa que faço
- rotular os alunos" e outra completou: "Eu também faço isso!". Os demais
intervieram e disseram, de forma geral, que os professoresm dificuldade de
trabalhar as emoções dos alunos,o respeitam seus medos e ansiedades.
Relataram que é preciso discutir esse aspecto e seria bom se isso fizesse parte
do planejamento do início do ano. E outro professor completou: "Só fazemos
ler no regimento da escola os direitos e deveres dos alunos e dos professores.
Nossa escola não tem projeto pedagógico ".
Na verdade, as duas escolas possuem projeto pedagógico; em um deles
o há qualquer referência à TV Escola, e em outro, a TV Escola aparece
tanto no cronograma geral das atividades a serem desenvolvidas no ano, como
nas metas e ações a serem realizadas. No entanto, percebe-se que o projeto
político-pedagógico funciona mais como exigência normativa das secretarias
de educação do que uma definição real e coletiva dos professores, alunos e
funcionários, uma verdadeira intenção dos mesmos quanto aos princípios que
regerão suas ações, dos objetivos que queiram alcançar, das ações que levarão
a termo.
Quer dizer, mesmo que o vídeo tenha imperfeições na informação ou na
estética, porqueo há vídeos perfeitos (Móran, 1995:30), os conceitos
problemáticos, os desvios de conteúdos podem ser elementos de
questionamento, o que dependerá, evidentemente, do encaminhamento que se
dará à sua análise. Todos os elementos reforçam a defesa do caráter coletivo
quanto ao uso dos vídeos da TV Escola e a necessidade de um tutor, de um
coordenador das discussões.
6.2. A escola além da aula
Foto 2 - Cena do vídeo "A escola além da aula"
49
Este vídeo é uma realização da TV Escola, produzido em 1997,
portanto, já na vigência do atual governo federal. A ficha técnica do programa
indica que Pedro Paulo Demartini foi Assistente de Produção, enquanto a
Secretaria de Ensino Fundamental (SEF) do MEC responsabilizou-se pelo
conteúdo e atividades pedagógicas (Claudia Rosenberg Aratangy) e
supervisão (Maria Cristina Ribeiro Pereira). Participam do programa três
especialistas, todos pedagogos.
49
A especialista dá sugestões aos professores de como podem agir na entrada e na saída da escola, a fim de
tornar esses horários momentos educativos.
A apresentação é de Fernanda Couto e mostra os diferentes momentos
educativos que ocorrem na escola, além da sala de aula: a entrada, a merenda,
o recreio e a saída.
O vídeo começa com problematizações endereçadas aos
telespectadores: "Como é a vida da sua escola fora da aula?" "Na hora da
entrada, como a criança é recebida na sua escola?" "Como você começa o
seu dia na sala de aula?" "Pense um pouco ... muito o que fazer".
A apresentadora entrevista alguns alunos que esperam o início da aula
começa indagando porque eles gostam de ir à escola. Em seguida, aparecem
cenas em que uma professora inicia a aula conversando com as crianças sobre
o final de semana. Comentando a entrada e o início da aula, uma das
pedagogas, Eliane Mingues, ressalta a maneira do professor preparar o
trabalho do dia, inclusive em combinação com as crianças.
No horário da merenda, a apresentadora conversa com algumas crianças
sobre o esquema da merenda na escola. Em seguida, outra pedagoga, Cisele
Ortiz, comenta como é possível, durante o momento de alimentação, trabalhar
a cooperação, a solidariedade, a autonomia, o respeito pelas diferentes
atividades e de planejamento para tornar o período da merenda um momento
educativo.
No recreio, a apresentadora argumenta que o professoro precisa ficar
de fora, uma vez que ele também ensina a criança a brincar. A pedagoga
Gisela Wajskop comenta a importância do recreio e de como é bom para as
crianças a participação do professor, sem tirar seu momento de descanso e
propõe o rodízio entre os professores. Fernanda Couto entrevista um professor
de educação física que sugere muitas atividades que podem ser feitas na
escola, sem muitos gastos.
A saída representa mais uma chance do professor interagir com a
criança, eo mostradas cenas de uma professora, ao final da aula, lendo uma
pequena estória para as crianças. Eliane Mingues retorna comentando que o
professor pode também aproveitar o momento para se organizar, contando
estórias, lendo poesia, cantando músicas, para que as crianças fiquem com
vontade de voltar no dia seguinte.
O vídeo finaliza com a apresentadora dizendo que "na escola todo
mundo aprende alguma coisa, na simplicidade do cotidiano, em qualquer
espaço, o tempo todo ".
Análise
O programa demonstra que os diferentes momentos da escola podem ser
pensados, organizados, planejados, uma vez que fazem parte do processo de
educação, de aprendizado. Sugere a criação de regras objetivando desenvolver
valores.
As sugestões apresentadaso ficam só no exemplo, mas explicam os
porquês e os objetivos da ação proposta, o que sugere que seus criadores vêem
a função do professor muito além da transmissão de conhecimentos, e que
todos aprendem alguma coisa na escola,o considerando, por isso, o saber
como algo completo, acabado.
Entende que o professor pode planejar todos os momentos além da aula,
com criatividade e entusiasmo. Como sempre problematiza as situações
mostradas, leva o professor a refletir o que ocorre na sua escola.
As falas dos especialistas embasam-se teoricamente em cenas do
cotidiano escolar, assim, a formação de professores significa queo se pode
desvincular a teoria da prática.
O vídeo apresenta um professor mais atualizado, que domina o seu
espaço e dialoga com os alunos.
Difere das escolas que aparecem na Série "Nós na escola", esta é bonita,
espaçosa e bem equipada. Os alunos parecem ter melhor nível sócio-
econômico.
o muitas as exigências que faz ao trabalho do professor na escola,
como planejar, agir, estar presente em todos os momentos da escola, sem
mencionar outros agentes que também atuam na escola. Teoricamente, muito
do que foi apresentado está correto, mas é impossível realizar,o apenas pelo
aspecto físico da escola e sua organização, como pelas condições de trabalho
oferecidas aos professores.
As falas dos especialistas estão corretas, masoo inovadoras, já que
ficam no padrão existente. Mostram-se distantes do professor e da escola, uma
vez que aparecem em estúdio de cor neutra, sentados em poltrona de braços e
espaldar alto, como autênticos especialistas, ditando normas aos professores.
O professor de Educação Física é o único que sugere atividades relacionadas a
situações concretas do cotidiano escolar, porém, no vídeo, eleo é
especialista, mas o professor comum da escola.
O desenvolvimento de valores, como autonomia e cooperação, ficam
distantes, pois as cenas apresentadaso mostram como ocorreria na escola,
nem se discute o significado dos termos, além deo se aprofundar nos
conceitos trabalhados. É certo que as imagens substituam palavras, mas, no
vídeo em questão, as falas estão desvinculadas das imagens, fazendo com que
se percam, uma vez que a atenção está voltada mais às imagens do que às
falas.
Os professores das duas escolas pesquisadas perceberam a diferença
entre a escola e os alunos apresentados no vídeo e a escola e alunos reais.
Relataram também a importância da escola para as crianças e lamentaram a
extrema exigência do sistema com os professores, especialmente no que diz
respeito ao currículo e as limitações impostas para um exercício mais
prazeroso da tarefa docente.
Dessa forma,o é possível prever como ocorrerá a recepção. Ao
contrário do que esperava, esse programa foi um dos que mais suscitou o
debate entre os professores nas duas escolas. E também, diferente do que eu
imaginava, o vídeo que mais provocou divergência entre os professores.
O vídeo analisado a seguir, "As escolas dos muito Brasis", do qual se
esperava vigoroso debate, foi o que menos divergências provocou.
6.3. As escolas dos muitos Brasis
Foto 3 - Cena do programa "As escolas dos muitos Brasis"
50
.
Esta cena mostra o país e as escolas sendo impregnados pelo que veiculam os meios de comunicação.
Esseso identificados como chuviscos de televisão, despejados de um livro sobre o teto da escola, pelo
apresentador que está fora da cena.
Apresentado pelo ator Luiz Armando Queiroz, o vídeo foi criado pela
Fundação Roquete Pinto - TVE - produzido em 1989, antes do surgimento
do projeto da TV Escola. O vídeo conta com a direção geral de educação de
Cleide Ramos e a participação da especialista, Regina de Assis, professora da
UERJ e PUC/Rio.
As cenas iniciais mostram antenas de rádio, antenas comuns de TV e
parabólicas, e o apresentador diz que as mídias, especialmente, a televisão,
o as versões do que é, foi e será este país. Numa bonita cena, o ator pega
uma jarra contendo chuviscos de uma tela de TV e despeja o líquido sobre o
mapa do Brasil, impregnando-o todo com o que a televisão traz. Pergunta aos
professores: "Qual a sua visão do Brasil?" Professores de diversas partes do
país respondem: "cinza, retrato em branco, risos (dificuldades), não sei,
triste, negro, disparidade social, pobreza, corrupção, desemprego, depende
de nós e de quem está lá em cima". Uma professora mais otimista afirma que
é um país bom embora denegrido pela ação dos políticos, mas, em sala de
aula, enfatiza para as crianças apenas o lado bom com esperança de mudar.
Alguns dizem ainda que a caminhada é de luta, pois a TVo mostra a
realidade, ou seja, a periferia, os subúrbios. Os meios de comunicação devem
mudar, ser democráticos e mostrar uma televisão mais sincera.
O apresentador retorna e diz que é possível interpretar nosso país de
várias maneiras diferentes, pois há diferentes Brasis. E pergunta: "como a
escola fundamental pode se relacionar com esses inúmeros Brasis?" "Qual é
o papel da escola em relação a essas crianças tão iguais e ao mesmo tempo
tão diferentes?" "Será que a escola tem de repassar os mesmos
conhecimentos ? "
Aparecem cenas em que diversas professoras ressaltam o conhecimento
que as crianças também possuem e como aprenderam com elas, citando vários
exemplos.
A professora Regina de Assis argumenta que o professoro é o único
que detém conhecimento, apenas é o mediador entre os saberes dos alunos e
da humanidade, acrescentando que é preciso integrar o conhecimento à
situação concreta do aluno, também, os diferentes campos do saber entre si e
contextualizá-los. Sublinha a importância de envolver a autonomia e a
cooperação no contexto escolar.
Quanto aos planos de cursos e aulas, a especialista reforça a necessidade
de integrar o currículo à vida das crianças. Sobre a escola e seus alunos,
pergunta: "por que as crianças vão à escola?" "Para quem é a escola?"
Continua dizendo que a autonomia e a cooperaçãoo responsáveis pela
orientação do currículo. O conhecimento destina-se aos cidadãos que se
iniciam na vida da nação, eo é feito apenas de conteúdo ou metodologia,
mas se constitui de toda uma ideologia perpassando os currículos.
Finalizando, o apresentador pergunta de novo: "como construir 'clima'
na escola para haver autonomia e cooperação?" Ressalta que a escola é local
privilegiado para concretizar sonho de uma nação mais justa e democrática.
o basta ser competente, é preciso pensar nos valores de uma sociedade que
almejamos.
O apresentador diz, em off: "é decisivo valorizar a autonomia e a
cooperação. Desatar os nós da ignorância, do conformismo, do comodismo,
da indiferença".
O programa conclui com as professoras respondendo à questão: "qual é
a escola dos seus sonhos?" Para elas: "não existe, é conquista, não sei, não
idealizei, não o meu sonho mas o das crianças, condição física igual a do
filho do burguês, grande, boa, com parque, uma escola como essa ..."
Análise
O vídeo discute o papel desempenhado pela mídia e escola na
diversidade do país e das escolas. Trabalha a influência da escola na obtenção
de uma maior democratização da sociedade, cuja função e tornar o indivíduo
mais autônomo e cooperativo, em condições de interferir na democratização
do país.
O conhecimento significa o meio de criar atitudes e valores pelo
currículo, pelo conteúdo, articulando as áreas de saber, para atender às
diferentes idades e fases de desenvolvimento da criança de forma integrada e
contextualizada, utilizando-se de práticas organizativas da escola. E uma
proposta teórico-política da escola.
Ao propor a escola dos sonhos, a maioria das professoras permaneceram
no periférico, no aspecto físico da escola. Assim, é possível dizer que a
produção entende o professor como relevante colaborador para a
democratização da sociedade,o apenas para a reprodução da sociedade
capitalista da escola tradicional.
Propõe um modelo curricular que foge ao convencional, destacando que
as preocupações dos professores precisam extrapolar o conteúdo e a
metodologia, além de desvelar o ideológico, formando pessoas autônomas e,
ao mesmo tempo, solidárias, a fim de interferir na sociedade e transformá-la,
levando-se em conta as diversidades do país, das escolas, dos alunos, quer
dizer, as diferenças regionais, sociais e culturais. Em suma, trabalha o papel
político do professor.
O início do vídeo apresenta imagens fortes do ponto de vista estético,
porém, de seu meio até o final, quando é apresentada a fala do especialista, as
cenas tornam-se monótonas. As reflexões da especialista e professoraso se
ligam a imagens da escola, com exceção da primeira parte, que mostra que os
professoresoo os únicos detentores de conhecimento.
O programa apresenta uma concepção de professor como um
profissional politizado, que parte do conhecimento que o aluno detém e da
escola, como diversa, múltipla e com características diferentes.
Trabalha conceitos, como autonomia e cooperação queoo
explicados, sem que se discuta o sentido dos termos. Também, a pesquisa
realizada pela Cesgranrio constatou que muitos vídeos pressupõem domínio
de conceitos que os professoreso possuem ou compreendem de forma
diferente do trabalhado no vídeo. Além do mais as imagenso insuficientes
para explicar termos abstratos, para o que é fundamental utilizar a oralidade.
Em uma das escolas, ao final do programa, quando iniciei o debate, fez-
se um longo silêncio. Nenhum professor fazia qualquer comentário ou menção
sobre a questão. Tive de instigá-los várias vezes para que começassem as
reflexões coletivas. Como diz Orlandi (1989:39), "o silêncio não é
transparente. Ele tem sua espessura e instaura processos significativos
complexos". Quer dizer, o silêncioo fala, ele significa. Minha opinião é
que o vídeoo tocou os professores queo compreenderam sua mensagem.
O silêncio mostrou que deram ao vídeo um sentido diferente ao proposto pelo
produtor, o que denota a importância da isonomia de significados para haver
uma interlocução adequada, uma vez que os termos poderão ter significados
diferentes. Como mencionado anteriormente, quando se fala por meio de
imagens, as situações ficam ainda mais complexas, constatação que fortalece a
necessidade de momentos coletivos na escola e a presença de uma agente que
fomente e oriente o debate, também confirmada pelas respostas obtidas dos
professores nas duas escolas. A pergunta do questionário aplicado logo após a
discussão: "Como desenvolver a autonomia e a cooperação na escola",
apenas uma professora fez menção à importância do currículo, aspecto
enfatizado pelo programa. Os demais ativeram-se mais à autonomia
entendendo-a como inerente à escola e sua abertura à comunidade. A
cooperação para eles significa solidariedade e amizade entre os colegas de
trabalho, ou o auxílio dos pais, para que os alunos aprendam mais, isto é, a
realização de projetos conjuntos entre pais, alunos e professores.
6.4. Sobre os três vídeos
De uma forma geral, os três vídeos apresentados aos professores em
sessões coletivas abordam as diferenças pessoais, afetivas, culturais e sociais
dos alunos, bem como as desigualdades regionais, sociais e políticas do país e
das escolas.
Mostram que o papel do professor vai além da transmissão de
conteúdos, embora a escola seja a detentora dessa função. O professor é o
mediador entre o saber e os alunos, e a escola, espaço de socialização, de
formação de atitudes e valores queo úteis à transformação da sociedade
brasileira, de forma a torná-la mais democrática e justa, contrastando com a
atual formação do docente, ainda presa ao modelo hierárquico de produção e
acesso ao saber.
Dessa forma, a formação de professoreso pode abandonar o papel
político transformador, por intermédio do currículo, organização da escola,
formação de atitudes e valores.
Podem esses programas auxiliar a escola na formação de professores
reflexivos? Favorecem o estabelecimento da relação teoria/prática? Tento
responder a essas perguntas, porém, o teor dos vídeos escolhidos vislumbra
possibilidade dependendo de inúmeros outros fatores relacionadoso apenas
à escola, mas à forma como esses vídeos podem ser trabalhados (como por
exemplo, preocupar-se apenas com os aspectos técnicos ou com o fato de que
o trabalho coletivoo impede a orientação racional técnica), sua organização
e gestão, além daqueles que se referem à organização do sistema e da sua
administração.
É possível que o professor absorva sozinho as propostas dos vídeos? O
que significa um adulto aprender dentro dos princípios da EAD? O que se
ensina ao professor? Ele aprende? Ele muda suas ações em sala de aula?
Este trabalhoo consegue responder a tantas indagações. Sugere,
talvez, mais perguntas do que respostas, que só surgiram depois da imersão no
micro da recepção, o que, porém,o desmerece a pesquisa, ao contrário,
demonstra que inúmeras perguntas ainda precisam de respostas, como também
suscita atenção para aspectos que estão despercebidos, especialmente para os
gestores.
7. Recepção das mensagens nas sessões coletivas
Este item contém a descrição da recepção das mensagens nas opiniões
dos professores durante as sessões de vídeo. Optei por apresentar como
ocorreram as sessões em cada escola separadamente, uma vez que objetivo
analisar, também, as possibilidades que os programas oferecem aos
professores de relacionar teoria e prática. Como as práticas possuem
características distintas em cada escola, julguei conveniente separá-las a fim
de destacar as diferenças entre elas, de forma a ter mais elementos para uma
análise posterior do que ocorreu durante as sessões.
Para a descrição e análise, utilizei o método de decupagem das
videogravações, e gravação em áudio do debate de forma a manter a
originalidade das falas dos professores, também os questionários respondidos
durante as sessões e as transcrições das entrevistas feitas com professores,
coordenadores e diretores, destacando-se os momentos mais significativos das
sessões.
A referência aos professores é genérica, sem nominá-los, uma vez que
sendo videogradas, mesmo usando nomes fictícios, pode-se identificá-los.
Inicialmente, os professores serão caraterizados, a fim de se conhecer
quemo eles, sua formação, quanto trabalham etc, porém, será uma análise
generalizada, valendo-se dos questionários e por escola.
Professores da Escola Lázaro Rodrigues
Os professores da Escola Lázaro Rodrigues, em sua maioria, possuem o
terceiro grau, uma professora tem pós-graduação lato sensu, enquanto quatro
m apenas formação em nível médio e atuam nas séries iniciais do ensino
fundamental. A formação foi realizada tanto em universidades particulares,
como públicas. Formaram-se nas décadas de 80 e 90, o que evidencia um
corpo docente jovem, porém, experiente. Apenas quatro professoras
formaram-se na década de 70.
Grande parte dos professoresm carga horária de trabalho entre trinta e
cinqüenta horas semanais, e cerca de 30% dos que responderam aos
questionários, trabalham sessenta horas semanais. A maioria cumpre a carga
horária na mesma escola, trabalhando em outros turnos. Os que lecionam em
outras escolas, atuam também em escolas públicas.
Metade dos docentes moram mais ou menos próximo da escola,
enquanto a outra metade reside a uma distância de 5 Km ou mais da escola,
dependendo de condução para chegar à - ônibus ou moto.
De um modo geral, possuem videocassete em casa, sabem manipular o
aparelho, mas 50% afirmam queo gostam de manusear o vídeo da escola.
A grande maioria gosta de televisão, enquanto os outros dizem que
depende da programação. Afirmam, ainda, que usam vídeos nas aulas, sendo
ouo da TV Escola.
Professores da Escola Joaquim Almeida
A totalidade dos professores da Escola Joaquim Almeida tem graduação
superior e um deles possui pós-graduação lato sensu. A maioria formou-se em
universidade pública, em especial nas décadas de 80 e 90, o que significa que,
embora jovens, os professores possuem experiência de magistério.
Moram próximos à escola, distância que vai dos quinhentos metros a
três km. No estacionamento da escola, há inúmeros carros, de propriedade dos
professores.
A carga horária semanal de trabalho oscila entre vinte e quarenta horas.
Metade dos docentes cumpre a carga de trabalho na mesma escola e a outra
metade atua também em outra escola pública ou particular.
Gostam de assistir televisão, possuem videocassete em hábito de
assistir a vídeo, em casa. Metade deles afirma queo usa vídeos nas aulas e
quem utiliza afirmao se interessar pelos programas da TV Escola.
Um aspecto intrigante das respostas dos professores de ambas as
escolas, baseia-se no fato deo gostarem de manusear o vídeo da escola,
embora tenham familiaridade de operar os quem em casa, o que explica o
receio de que, caso haja um problema técnico, sejam responsabilizados, e
tenham de arcar com despesas de conserto de um aparelho manuseado por
vários professores, já que a escolao tem recursos para essa manutenção.
Vale destacar, ainda, a diferença entre os professores das duas escolas
no que se refere à carga de trabalho, distância entre casa e escola, uso de
ônibus e possuir carro próprio, aspectos que demonstram que um dos bairros
possui realmente nível sócio-econômico mais elevado, refletindo em uma
carga horária menor, condução própria, morar mais próximo da escola e
exercer outra atividade em escola particular.
7.1. A escola além da aula - fita 1
Escola Lázaro Rodrigues
Após verem o vídeo, os professores iniciaram a conversa solicitando à
pesquisadora mais informações sobre a TV Escola. Entreguei-lhos a relação
de todos os programas já veiculados pelo projeto, como também reproduzi
vários programas, a pedido da coordenadora e diretora da escola. Essa atitude
revela o desconhecimento sobre o funcionamento da TV Escola e seus
programas, embora os professores saibam de sua existência. Após conversa
inicial, pedi aos professores sua opinião sobre o vídeo.
Nesta escola, o debate foi vigoroso, valendo lembrar que a direção e os
professoresm o hábito de realizar reuniões semanais ou quinzenais, no
entanto, a discussão aberta e coletiva significou uma experiência nova.
Estavam presentes professores de diferentes disciplinas: Língua
Portuguesa, Matemática, História, Educação Artística, Educação Física, além
de professores das séries iniciais que trabalham com todas as disciplinas.
O debate girou mais em torno da entrada na escola e o período do
recreio do que sobre a merenda e a saída. A questão da merenda foi pouco
debatida, já que a mesma é servida na sala de aula, "com os alunos fazendo
trabalhos ao mesmo tempo", embora uma das professoras tenha opinado que
os alunos necessitam de um tempo livre para o lanche. Uma das professoras de
Educação Física
51
reclamou que a merenda é servida nas salas antes ou após
sua aula, e entendia que aquela reunião era uma ocasião propícia para discutir
a questão.
A professora de Língua Portuguesa sugeriu que a professora de
Educação Física poderia resgatar as brincadeiras infantis, e esta respondeu que
já utilizava essa técnica de ensino e, segundo sua opinião, o vídeo quis mostrar
que esse trabalho pode ser feito por todos os professores, de qualquer
disciplina eo apenas os de Educação Física e Artes:
todoss podemos assumir esse papel. É isso mesmo que o vídeo quis
mostrar. Os professores estão preocupados com a carteira enfileiradas, com
aquela rotina diária e no primeiro momento da escola, na chegada pode-se
ter uma proposta muito diferente. E issoo acontece (fita 1).
Em seguida, os professores de Educação Física e Educação Artística
lideraram, de certa forma, o debate, sustentando que inserir jogos infantis em
sala de aula é responsabilidade de todos parao sobrecarregar alguns
Há uma professora de Educação Física, por período, e uma delas, apesar deo ser seu turno de trabalho,
optou por participar das sessões de vídeo porque achava que poderiam contribuir para o seu crescimento
profissional.
professores, além de contribuir sobremaneira para aprimorar o desempenho da
escola.
Discutiram a possibilidade real de pintarem o jogo "amarelinha" no
chão, fazerem mesinhas e bancos de alvenaria, de modo a melhorar o espaço e
o visual da escola, dando mais opção de brincadeiras aos alunos.
"Reclamamos que eles só correm, mas há onde sentar?", disse outra
professora.
Demonstraram queo aprovam o fato das crianças ficarem do lado de
fora da escola, até que o portão seja aberto. Criticaram até o tamanho do
portão que é muito pequeno e causa muito tumulto no horário da entrada. Uma
professora lembrou que a causa é a falta de carteiras e os alunos querem
chegar logo na sala para ter lugar para sentar. A bibliotecária disse que
melhorou bastante depois que chegaram as carteiras novas. Outra professora
emendou que, apesar de tanta confusão, deve-se melhorar o momento da
entrada cumprimentando com alegria os alunos quando chegam à escola.
Discutiram também que o vídeoo mostrou a realidade vivida pelas
escolas de um modo geral. "A escola que mostraramo é a verdadeira", disse
uma professora. "Todos esses vídeos mostram uma escola ideal eo a real",
alegou outra. "Por queo mostram uma realidade parecida com a nossa?",
questionou uma terceira: "Será que existe uma escola assim?". A diretora
respondeu que sim. Uma outra professora disse: "Mass podemos melhorar
a nossa escola, por exemplo, dizendo bom dia aos alunos quando chegamos!"
Uma professora lembrou que é possível usar criatividade com o pouco
que a escola possui, sugerindo momentos coletivos antes de ir para as salas. E
a professora de Educação Física cobrou dos colegas:
o que cada um poderia estar sugerindo para a gente aproveitar os espaços
que temos?o paramos ainda para colocar isso em grupo. Agora é uma
ótima oportunidade. Conversamos individualmente, comentamos com um
colega isoladamente. Questionamos maso levamos para uma discussão
coletiva, para buscar uma solução (Ibidem).
Interferi na discussão dizendo que fizeram muitas referências à entrada
e à merenda, e perguntei a opinião geral sobre outros momentos revelados no
vídeo. A professora de Educação Física disse:
o horário da merenda acontece antes ou depois da minha aula. Foi definido
sem que eu fosse ouvida e assim euo tenho oportunidade de vivenciar
com os alunos esse momento que poderia ser bom para eles e para mim.o
estou criticando ninguém, até isso pode ter acontecido porque também nunca
falei sobre isso (Ibidem).
Começa um silêncio e eu pergunto de novo: "Quem mais gostaria de
falar? Este espaço é para discussão".
A professora de Português continou insistindo: "Aqui em Goiânia tem
escola igual a que mostraram no vídeo?". Os colegas responderam que sim e
deram nomes de várias escolas. "Este vídeo é igual as telenovelas brasileiras,
não tem lugar para a pobreza, para a miséria!", responde. Eu indaguei: "Será
que os que produzem os vídeos querem mostrar a pobreza?"
A coordenadora rebateu que, " quando se faz um vídeo, quer se mostrar
o ideal, e que em outros que mostraram escolas pobres, também apresentar o
melhor que aquelas escolas podiam fazer". "Nós também queremos o
melhor", conclui.
A coordenadora de turno acredita que nossas escolaso estão longe do
ideal, mas é preciso organizar: "é preciso sentar, organizar e fazer. A escola
ideal está próxima de nós", diz ela. "Temos muitas escolas públicas em
Goiânia que têm esquema da escola mostrada no vídeo", finaliza.
Perguntei se é possível colocar em prática o que viram embora seja
diferente da realidade que vivenciada. Outra coordenadora lembrou que já
tentaram fazer o recreio com rodízio de professores para "vigiar" o recreio.
Uma professora disse que "não deu certo porque já começou errado, uma vez
que não era para brincar com as crianças, era para vigiar e isto não está
certo".
A professora de Artes afirmou queo adianta ficar só no discurso e
o resolver nada: "E preciso amarrar as coisas, senão elas não acontecem".
Ante a aproximação do final do encontro, arrematei que o objetivo do
programa é proporcionar momentos de debate na escola, discutir
coletivamente os problemas e se algum professor teria comentário a fazer.
Uma das professoras de Educação Física disse queo dá para comparar
escola particular e pública.
A nossa rede está qualificando os professores, fazendo concursos públicos e
isso tem melhorado a escola. Somos profissionais capacitados e se já temos
isso, o resto podemos conseguir. Temos de nos adaptar ao que temos. Digo
ques somoss e as nossas circunstâncias e a professora completa que os
alunosoo diferentes e que é possível dar melhores possibilidades a eles
(Ibidem).
7.2. A escola além da aula - fita 2
Escola Joaquim Almeida
Como na outra escola, o debate começou com o pedido de maiores
informações sobre a TV Escola. Perguntaram o motivo deo existir vídeos
para o curso de Inglês, como os de História, etc. Dei a cada professor a relação
dos vídeos existentes na videoteca da escola, em que constava número da fita,
área do conhecimento, título do programa e duração. Os professores queriam
saber como conseguir as fitas que estavam na lista mais ampla, quer dizer, a
relação de todos os programas já veiculados pela TV Escola, que também
ofereci à escola, uma vez que nem sempre os professoresm acesso às
revistas e o cartaz da grade de programaçãoo serve para consulta
posteriores. Mediante cópias das grades de programação das revistas, montei
uma pasta com a relação de todos os programas, desde o início da TV Escola.
E interessante observar as diferenças de recepção entre uma escola e
outra. E também, a discussão entre os professores foi absolutamente diferente
da escola anterior. Na primeira, os professores discutiam o que fazer para
buscar o ideal apresentado pelo vídeo, enquanto nesta os professores
reclamaram das dificuldades e da impossibilidade der em prática o que o
vídeo apresenta. Porém, em um ponto as duas escolas foram unânimes: a
distância entre o que o vídeo apresenta e a realidade da escola pública.
Uma das professoras disse que os alunos da escola do vídeoo muito
diferentes e que a escola também. Outra professora afirmou; "Nossa realidade
é outra! ". " Temos alunos demais nas salas! ". " É tudo muito diferente! ". "O
ideal seria que tivéssemos um refeitório, mas nossos alunos lancham dentro
da sala".o algumas das ponderações dos professores.
Questionados se valeria a pena levar a discussão para a coordenação da
escola, responderam negativamente. "Isso que vimos só vale na teoria, a
prática é outra realidade!", uma das professoras respondeu. Perguntei, então:
"O que o vídeo mostra não é a realidade?" E responderam: "É realidade para
outra escola. Esta escola que mostram deve ser do centro de São Paulo,
porque se for da periferia não é assim. Mesmo a escola pública de São
Paulo é diferente, eu sei, eu já trabalhei lá". Repliquei dizendo que as
imagenso de escola pública, ao que outra professora disse que os alunoso
diferentes, também o nível e o modo de ser, de estar na classe.
Outro professor explicou que de dois anos para, a escola pública está
mudando. Perguntei qual a mudança e ele respondeu que os pais do estrato
social médio estão colocando seus filhos na escola pública, o que está
provocando um choque no ensino. Os professores disseram que a clientela das
escolas, até dos bairros centrais, é diferenciado, uma vez que atrai alunos de
bairros diferentes. Perguntei qual a diferença primordial e eles responderam
que é a parte social e falaram das diferenças entre os alunos dos vários turnos
da escola: os da manhão de nível social mais alto, os do vespertinoo
mistos e os do noturnos que chegam na escola cansados. Enquanto uns
enumeravam as diferenças, outros iam completando as afirmações anteriores.
Solicitados para debater outros momentos abordados pelo vídeo, como,
por exemplo, a entrada, os professores afirmavam que na entrada os alunos
m com muita alegria, semblante feliz, vendo a escola como local para
diversão, encontrar o queo tem em casa, como carinho e alimentação. A
escola, alegou outro professor, funciona como "válvula de escape" das
frustrações que a criança traz de sua casa. E a escolao corresponde a essas
expectativas, disseram.
O mesmo professor sustentou que a escola teria condições de oferecer
aos alunos algo a mais, além do ensino tradicional, porém existem vários
impedimentos como a falta de tempo, o que é, no entanto, superado por alguns
dos professores. Um professor retrucou dizendo que possui tantos alunos na
sala queo pode dispensar um minuto sequer de atenção a cada um. Outro
professor justificou que os motivos estão interligados, e que os professores
vivem um corre-corre diário, chegam e saem correndo porquem de voltar à
noite.
Isso faz com que fiquemos massacrados eo conseguimos dar o que
teríamos condições de oferecer. A hora do recreio, por exemplo, é um
minutinho que o professor tem para sentar, relaxar um pouquinho para dar
mais três, quatro aulas (Fita 2).
E acrescentou:
o se pode discutir uma coisa sem levar tudo isso em consideração.
Poderíamos fazer um trabalho com os alunos, gostaríamos de fazer isto, até
temos condições de mostrar brincadeiras, brincar com eles, mas estamos, de
certa forma, amarrados com as condições que noso dadas, inclusive com
limitações financeiras (Ibidem).
O professor concluiu, dizendo que "não há recursos para comprar
nada para as brincadeiras do recreio e nem se pode pedir para os alunos,
porque eles também não têm nada, não para tirar leite de pedra ".
Reclamaram queo adianta cobrar melhor qualidade do ensino seo
se dá condições do professor diminuir sua carga horária. O maior problema, a
carga horária excessiva, somada aos baixos salários, faz com que os
professores se submetam ao trabalho excessivo, para garantir a sobrevivência.
"Isso atrapalha, uma vez que a correria impede até que se converse com o
colega, que troquem sugestões ", disse um professor. Além disso, falaram da
imensa cobrança do sistema, que impede reuniões, exige que o professor dê
aulas em excesso, e o dia letivo é a única coisa que conta.
Alegaram que, com disciplinas de duas aulas por semana chegam a ter
cerca de mil provas para corrigir, numa carga horária de quarenta horas. Uma
outra professora acrescentou que, com disciplina de uma aula semanal, o
professor chega a ter doze turmas
Um professor arrematou:
7.3. As escolas dos muitos Brasis - fita 3
Escola Lázaro Rodrigues
Apesar de conter muitos elementos para discussão, o programao
suscitou debate vigoroso entre os professores.
Após assistir ao vídeo, os professores disseram ter gostado e retomaram
as perguntas feitas na sessão anterior sobre os programas já veiculados pela
TV Escola.
Tentei iniciar o debate sobre as imagens apresentadas, mas os
professores permaneciam silenciosos. Fiz uma retrospectiva bem ligeira do
seu conteúdo a fim de incentivar e os convidei a falar. Novo silêncio...
Suscitei novamente que falassem lembrando de cenas do programa, como a
televisão impregnando a sociedade e a escola.
Uma das professoras disse que se sentia otimista e achou os professores
muito pessimistas em relação ao país. Outra chamou atenção que a professora
sulista era mais otimista, por causa das melhores condições da região. Os
outros professores aceitaram a argumentação ao fazer movimentos positivos
com a cabeça. "Os do Nordeste são mais sofridos, realmente", confirmou
o precisa ir longe para ver a pobreza do país. A existência de programas
como o do Ratinho mostram a pobreza cultural que o país vive.o há
outros programas como opção naquele horário e 80% ficam com ele. É este
Brasil que temos de enfocar, mas sempre dentro do contexto (Fita 3).
Teve início novo silêncio.
Ante a minha pergunta de como a escola poderia analisar o Brasil que
chega pela televisão, uma professora assegurou que diz aos alunos que "é
uma "porcaria", que não dá para assistir". Outra professora ponderou que os
alunos gostam do programa porque eles se identificam com a realidade
mostrada pela TV; queo se identificam com o país bonitinho, certinho.
Fizeram referências a outro programa da televisão goianiense, "Barra Pesada",
que é cópia fiel do "Ratinho" e está fazendo sucesso, "arrasando".
Os telespectadores sentem-se vingados com a atitude do repórter. Os alunos
mostram que assimilam o que o programa passa porque absorveram até o seu
palavreado: Menino bom! Despreparado!. E a realidade dos alunos, faz parte
do cotidiano deles. Os alunos gostam, é divertido, mas precisamos trabalhar
mostrando o outro lado, disse uma professora (Ibidem).
Outra professora acha que os programas de televisãoo muito
sensacionalistas e as pessoas apreciam, mas destacou que
outra. "A visão mais pessimista depende do que a pessoa está sofrendo na
pele", disse. Uma outra professora sentiu-se otimista ao responder o
questionário, mas disse queo sabe se o seria caso vivesse a realidade que
viu no programa.
A professora, que havia suscitado essa questão, afirmou que tudo
depende do contexto e da visão do lugar em que se está:
o é só o brasileiro, o americano também e muito nosso tem como
referência o que acontece nos Estados Unidos., no entanto, elesm
outras opções, aqui no Brasil, não. Só tem opção quem tem dinheiro para
pagar outro tipo de informação que vem pela televisão. Pode ser também
falta de oportunidade para outras coisas (Ibidem).
Instiguei o único professor a falar, e ele afirmou ver o Brasil com
otimismo, e concluiu que,
pela tecnologia, o país está ficando pequeno, nossas fronteiras estão
diminuindo. Estamos nos conhecendo melhor, e os programas de televisão
quem grande audiência, embora nos indignemos com sua qualidade,
estamos adquirindo consciência da nossa realidade. E aí entra o papel da
escola (Ibidem).
Questionei a possibilidade de fazer mudanças com a escola que temos,
mas os professores silenciaram novamente. Então, repeti a pergunta indagando
se é necessário mudar a escola para mudar a sociedade. Uma professora
respondeu que "com boa vontade e interesse a gente pode fazer muita coisa. É
preciso começar por nós mesmas, estar mais disponível às mudanças e ao
crescimento".
Outra professora acrescentou que
a escola nunca será perfeita, uma vez que ses estamos num processo de
mudança, a escola também precisa mudar. Precisamos perceber que as
mudanças existem,m de acontecer, a gente tem de assumir isso e se
preparar para fazer a mudança, adaptando à realidade de cada dia (Ibidem).
Silêncio de novo...o consegui identificar o verdadeiro sentido do
silêncio, o seu significado, pois como diz Orlandi (1989), o silêncioo fala,
ele significa. Poderia, contudo, significar que como o programa destaca a
questão política, os professores teriam mais dificuldade de empreender uma
discussão. Todavia, o vídeo traz também informações sobre aspectos
pedagógicos, como o currículo e o processo de construção do conhecimento,
da autonomia de pensamento, da solidariedade, aos quais os professoreso
fizeram referência, podendo o silêncio significar que o tratamento que o
programa dá a conceitos abstratos, como autonomia e cooperação,o foi
adequadamente trabalhado.
7.4. As escolas dos muitos Brasis - fita 4
Escola Joaquim de Almeida
Esta sessão aconteceu ao mesmo tempo que uma atividade esportiva e
os alunos faziam tanto barulho que podia ser ouvido na sala de vídeo. Após
assistirem ao programa, os professores dessa escola também ficaram em
silêncio, o que me motivou a fazer uma retrospectiva, ao fim do que perguntei
o que tinham achado do programa e quem iria começar a falar. Nada. Mais
silêncio...
Nem todos os professores manifestaram-se ou deram sua opinião, o que
ocorreuo apenas pelo ruído externo, ou pelo impacto que o vídeo provocou
nos professores, mas principalmente porque um professor e uma professora
monopolizaram o debate,o entre eles mas por meio de longas intervenções,
gerando expressões de enfado e reprovação dos colegas, perfeitamente visíveis
na videogravação. Outros colegas queriam falar, faziam menção de que iam se
manifestar e eles ignoravam, continuando sua opinião. A minha intervenção
foi insuficiente, uma vez queo davam pausa e iam emendando um assunto a
outro. Vale dizer que a situação tornou-se mais perceptível pelas diversas
vezes em que revi a videogravação.
o foi possível transcrever as primeiras palavras por causa do barulho
extremo provocado pelos alunos. A primeira fala era de que a tecnologiao
poderia vir para a escola para manter ricos cada vez mais ricos e pobres cada
vez mais pobres. Só se investe em tecnologia e se esquece o ser humano. O ser
humano tem de ficar sempre acima da tecnologia. Um professor notou que,
apesar de mostrar as diferenças existentes no país, todos os professores do
vídeo falaram sempre a mesma coisa: falta de apoio e seriedade dos
governantes.
Outro professor disse que os alunos devem aprender a pensar,o
somente buscar resultados. Mesmo que os resultados sejam corretos, é preciso
saber a causa. É preciso desenvolver nos alunos o espírito crítico, de análise.
Perguntei se é possível desenvolver essa habilidade em qualquer escola
do país. Um professor chamou atenção para o barulho dizendo que era fundo
musical e que os alunos precisam diversão e continuou o tema de antes: "Prá
quê tecnologia? prá ver novela? Tem tanta coisa que podemos ver... "
Fiz nova intervenção perguntando: "a tecnologia está dentro da sala de
aula? Como o professor pode trabalhá-la?" Um professor respondeu que se
aprende fazendo.
Outro professor lembrou que a mídia mostra que as famíliaso podem
gastar mais do que ganham, o Brasil também, só que a gente nunca viu o bolo
crescer e ser dividido;o vê divisão do bolo, só vê divisão do prejuízo. Outro
professor disse que na questão da educação,
ela é vista como gasto e ela é investimento. Pode-se jogar rios de dinheiro na
educação e nada é perdido, é investimento. Vemos universidades fechando,
o se faz mais pesquisa e se o dinheiro já é pouco e se faz cortes. De que
adianta ter tecnologia na escola, se o alunoo tem perspectiva nenhuma? É
preciso preocupar-se com o aluno, com a desigualdade social.o adianta
modernizar a escola, colocar tecnologia, se o aluno tem uma realidade
totalmente diferente, na sua casa, nem uma mesinha para fazer a tarefa ele
tem (Fita 4).
Outro professor também concordou e disse que o MEC gastou bilhões
na primeira fase eo investiu nos professores.
A qualidade depende de nós. Gostaria de trabalhar em uma só escola, ter
tempo livre para ler, para comprar livros.o podemos ter reuniões como
essa, discutir entres porqueo estamos envolvendo os alunos (Ibidem).
Perguntei a eles se, apesar de tantas limitações, apesar de tanta
precariedade, a escola poderia trabalhar a autonomia e a solidariedade com os
alunos, justamente os dois temas mais trabalhados no vídeo. Uma professora
afirmou que
é uma coisa difícil, liga-se a valores que as criançasom mais. Apesar
das inovações, da importância do que os colegas falaram, os nossos
governantes, desde o ministro até o secretário de educação, precisam
entender que ninguém dá o queo tem. É preciso capacitar os professores.
Se os professoreso podem fazer um curso, uma vez quem de trabalhar
tanto, os diretoresm autonomia e podem oferecer alguma coisa aos
professores. Os professoresm sede de saber. A direção da escola precisa
saber negociar com as delegacias de ensino, com os secretários para
trabalhar sua autonomia.o podemos continuar fazendo reuniões às
escondidas (Ibidem).
A professora finalizou relatando várias experiências como diretora.
Outro professor analisou que até a autonomia pode ser manipulada e
citou como exemplo "os cara pintadas que foram manipulados pela elite para
tirar o presidente. Vivemos numa falsa democracia!'.
Perguntei se a autonomia é da escola ou do professor.
52
Vale dizer que durante a veiculação do programa, essa professora ficou corrigindo provas, como mostra o
vídeo, mas na discussão fez de tudo para monopolizar o debate.
A mesma professora, que anteriormente falou muito relatando
experiências pessoais, retomou a fala, dizendo que a autonomiao é
individual, mas conjunta: "Precisamos aprender a planejar em conjunto até
com as delegacias".
Conta novamente suas experiências, seus prêmios e viagens para relatar
seu tempo como diretora:
É preciso ter vontade política e vontade pedagógica também.o podemos
criticar seo oferecemos nada, tenho de oferecer, tenho de estar presente,
para poder cobrar (Ibidem).
Dirigi-me à turma e perguntei se podemos então dizer que a forma de
organização da escola pode favorecer a autonomia. A mesma professora
continuou a relatar como fazia na escola em que era diretora. Enquanto falava,
pode-se ver, na videogravação, as expressões de enfado dos colegas.
Outro professor retrucou sustentando que
o podemos dar autonomia aos nossos alunos porque nós, como
professores,o temos autonomia nem para decidir se o aluno pode ser
liberado das aulas quando já está aprovado no final do ano, para atender
melhor os que precisam, que estão em recuperação. Só a secretaria é que
pode liberar o aluno. Mas quem viveu com ele durante todo o ano? Quem
sabe das suas dificuldades? (Ibidem)
Outro professor lembrou que há uma distância muito grande entre o que
está no papel e o que acontece na realidade.
Na minha avaliaçãoo, por parte da Secretaria de Educação, por parte
do MEC, um projeto educacional ampliado. No papel até pode ter, mas na
realidadeo. Algumas escolas podem ser diferentes, mas no geralo há
um projeto. O que se faz quando chega um professor é dar o diário para ele e
apontar a sala para onde ele deve ir,o há qualquer preparação, nem para o
professor experiente, nem para o pró labore
53
.o há qualquer suporte para
os professores (Ibidem).
A mesma professora retrucou:
o que precisamos é professores preparados. Precisamos dar condições
mínimas aos professores para que despertem seus alunos a desejarem o
próprio crescimento. Considera queo é corretoo dar preparação aos
professores, mas é preciso empenho para administrar.oo todos que
sabem administrar e há administradores queo entendem nada do
pedagógico e o deixam para último plano. Isso deve ser o contrário (Ibidem).
E contou novamente suas experiências e viagem ao Chile. A
videogravação mostra, novamente, professores aborrecidos com sua fala.
Uma outra professora fez menção de que queria falar. Passei-lhe a
palavra e ela disse queo queria mais falar, que se esqueceu do que queria
comentar.
Um outro professor, que é sindicalista, refere-se à colega falante e disse
que
o importanteo é apenas o que a colega falou e que uma escola para dar
certo precisa de uma gestão realmente democrática. Diz que a gestão deve
envolver todos os setores. Temos de caminhar para isso: envolver a
comunidade, os pais, abrir a escola aos finais de semana (Ibidem).
Outro arrematou: "isso pode até diminuir os roubos. A questão não é
pedagógica, podemos envolver os pais nisso ".
A professora retomou a fala e que mencionou o pedagógico porque ele
anda muito esquecido, e que valendo-se dele pode-se fazer outras coisas. Fez-
se silêncio, uma vez que bateu o sinal e os professores deviam voltar às salas
53
Professor pró labore é aquele sem vínculo empregatício com o Estado.o é celetista, nem estatutário e
exerce suas funções docentes em caráter precário. Grande parte deleso estudantes universitários, de
de aula. A professora, que tinha desistido de falar, disse que os pais estão
mesmos muito afastados, sóm à escola no final do ano e se o filho é
reprovado apontam os professores como os culpados, sem ter acompanhado o
seu trabalho.
Outro professor concordou e disse que os professores estão muito
sobrecarregados.
Somos muito cobrados, todas as tensõesm em cima de nós. Estamos
sendo uma "carreta" onde se coloca todo o peso, toda a tonelagem. Vem a
coordenação e cobra resultados, os pais estão cada vez mais omissos, isso é
realidade nacional, porque ae também trabalha fora. A criança está sem
limites e deixa-se tudo nas mãos do professor. Além de estarmos sem cursos,
com falta de recursos, sem condições de desempenhar o nosso papel, temos
toda essa problemática sendo jogada sobres (Ibidem).
Outro professor relatou que está participando com seus alunos de um
concurso "O país que queremos", da Unicef, e disse que os alunos acham a
proposta demagógica; que o trabalho que estão fazendoo chegará nas mãos
dos governantes; queo adianta nada. Quer dizer, os alunos estão sem
esperança no país. Conclui-se pela dificuldade de ser professor: viver em
condições adversas e manter os sonhos da juventude.
Nesse debate, os professores demonstraram que compreendem
criticamente os problemas políticos vividos pelo país. Diante disso, a
impressão é que os gestores da reforma educacionalo sabem a quem ela se
destina,o se sabe quemo e comoo os professores brasileiros. Indício
disso é a disparidade de dados sobre a titularidade de professores no país.
Enquanto o estudo de Gatti (1996:16) mostra uma situação crítica, ou seja
com formação incompleta para lecionar, a análise de Codo (1999: 408) fala
qualquer área, que buscam qualquer contribuição financeira para ajudar no curso. A existência da figura faz
com que a rotatividade seja alta no quadro docente.
de um percentual de 8,2% de professores estaduais urbanos sem a titulação
exigida legalmente e observa '''Daí a dizer que 'os professores no Brasil não
estão qualificados' vai uma distância abissal". Objetiva demonstrar que os
problemas que temos na educação brasileirao se devem à qualificação
formal dos professores, mas estão relacionados à pobreza dos estados.
Com tantas diferenças de formação entre os professores, e a EAD tendo
de levar em conta os alunos que têm, infere-se que um programa único, como
o TV Escola, sem a presença de um orientador de discussões que daria a
particularidade necessária a ele,o conseguiria responder a todas as
diferenças.
8. As mediações da recepção
A mediação representa a categoria central da dialética e refere-se ao
"estabelecimento de conexões por meio de algum intermediário" (Mészáros,
1983: 263).
Categoriaso significam estruturas conceituais reificadas capazes de
analisar o real para todo o sempre. São, pelo contrário, dinâmicas e estão em
constante modificação. Segundo Cury (1985: 44)
Só adquirem real consistência quando elaboradas a partir de um contexto
econômico-social e político, historicamente determinado, pois a realidade
o é uma petrificação de modelos ou um congelado de movimentos. Pelo
contrário, síntese de múltiplas determinações (Marx,1977 a:218), está em
constante movimento e expansão.
A categoria da mediação, utilizada nesta análise, é entendida como a
reciprocidade com que os elementos da operação cultural da recepção
relacionam-se para dar significado à mensagem recebida.
No seu importante estudo (1985), Cury, ao trabalhar essa categoria,
assinala que o conceito de mediação indica que nada é isolado implicando,
assim, em uma conexão dialética de tudo o que existe, para buscar aspectos
afins, manifestos no processo em curso. Indica que a mediação, em relação ao
real, procura captar o conjunto das relações de um fenômeno com os demais, o
que se faz mediante a historicização desse fenômeno. Em relação ao
pensamento, a mediação, parao tornar o real a-histórico ou neutro, deve
compreender o pensamento relacionando o real integrado ao próprio
movimento desse real.
E a História, enquanto movimento do próprio real, implica o movimento das
mediações (...) Em suma, a mediação rejeita relações de inclusão ou
exclusão formais e expressa relações concretas, que remetem um fenômeno
ao outro (Cury, 1985:43-44).
Analisando o modelo condutivista de comunicação, Martín-Barbero
(1995:42) observa que esse modelo separa radicalmente, como condição de
rigor e de verdade, o estudo do emissor, da mensagem e do receptor,
prevendo, até, as disciplinas de cada uma das etapas. As mediações, na
proposta do teórico colombiano (1997:292), buscam superar a análise das
lógicas de produção e recepção isoladamente e o mediacentrismo
54
. Aliás,
Mediacentrismo refere-se à centralidade dada às tecnologias e à inovação tecnológica, em vez do uso social
das mesmas. Isso precisa acabar, uma vez que o sistema da mídia perde parte de sua especificidade e se
converte em elemento integrante de outros mais amplos, como os sistemas econômico, cultural e político
(Martín-Barbero, 1997:292). As políticas educacionais de implantação das NTCI nas escolas brasileiras
pecam pelo mediacentrismo, uma vez que priorizam os equipamentos em detrimento da formação das
audiências, da qualidade social da produção e recepção dos meios. Os interesses econômicos e políticosm
se sobressaído sobre os educacionais e sociais.
conforme Barbero, o abandono do mediacentrismo ocorre pela força utilizada
pelos movimentos sociais que manifestam as mediações.
Mauro Wilton de Sousa (1999:10) avalia que o conflito existente entre
as áreas de comunicação e educação justificam-se, exatamente, pelo
privilegiamento das tecnologias, da sua instrumentalidade, em detrimento de
compreender a educação e a comunicação como processos sociais e culturais
que, efetivamente, são. O autor considera que os estudos culturais e de
pluralidade de mediações aproximam as duas áreas porque propõem análise
pela cultura e pelas mediações que envolvem a comunicação e a educação e
o pelos meios de que se servem. Ultrapassam os meios, fazendo ver que a
comunicaçãoo se resume a eles.
Martín-Barbero alerta, no entanto, para a manutenção do caráter da
mediação como relação, por causa dos riscos dos estudos da recepção. Um dos
riscos referem-se ao entendimento de que o consumidor pode tudo ou à
desvinculação do estudo da recepção dos processos de produção e completa:
Euo poderia compreender o que faz o receptor, sem levar em conta a
economia de produção, a maneira como a produção se organiza e se
programa, como e por que pesquisar as expectativas do receptor (...) Eo
gostaria que o estudo da recepção viesse nos afastar dos problemas
nucleares que ligam a recepção com as estruturas e as condições de produção
(1995:55).
Daí a importância da dimensão macro e meso deste estudo, isto é,
estudar a recepção, porém, sem desvinculá-la da dimensão ampla da política
educacional e dos aspectos médios da instituição escolar.
Enquanto a pesquisa de Orozco (1997) busca vincular três instituições -
a família, a escola e a televisão - e estes elementoso eram uma coisa nova
para cada um deles, uma vez que já havia uma história anterior de relações
entre as instituições, na pesquisa realizada por este estudoo se pode falar de
relação histórica entre: escola, professor, TV Escola, uma vez que a TV
Escola é algo muito recente na vida das escolas, maso elementos que se
relacionam.
Dessa forma, o estudo da recepção significa mais do que identificar os
efeitos das mensagens. Trata-se do estudo dos processos de recepção e a
negociação de sentido que se realizam no grupo para dar significados às
mensagens, o queo é simples. A opção por uma abordagem qualitativa
conduz a um envolvimento com o objeto de estudo, que interfere na proposta
do pesquisador e no objeto de estudo. Esse envolvimento traz vida à pesquisa,
bem como acarreta dúvida e sofrimento. Sofrimento porque o caminho
investigativoo se achao claro. As etapas sucedem-se após muita reflexão,
para o que os encontros de triangulação da equipe colaboraram muito.
Vale repetir que a metodologia nesse tipo de investigação está em
desenvolvimento,o sendo, porém, justificativa para os prováveis equívocos
metodológicos que possam apresentar, mas coragem de mergulhar em um
processo novo, o que significao só correr riscos mas também dar
contribuições às áreas envolvidas.
As mediações, como dito anteriormente,o se apresentam como
categorias isoladas e nem aparecem de forma linear, mas ocorrem de maneira
complexa, contextual, dinâmica, interrelacional.
Às mediações definidas por Orozco, acrescento outras que completam
as interveniências no significado, como a organizativo-institucional, a
resistência fragmentada, o temor tecnológico e a mediação do próprio
pesquisador.
8.1. Mediações individuais
As mediações individuais acham-se claramente perceptíveis tanto nos
questionários a que os professores responderam antes e após a sessão coletiva,
como durante as próprias discussões no grupo e também nas entrevistas
individuais realizadas com os professores algum tempo após as sessões de
vídeo.
O exemplo a seguir é ilustrativo e diz respeito à resposta ao questionário
da professora Lara ao final do vídeo "A escola além da aula".
Assistir o vídeo fez com que eu me lembrasse da minha escola quando eu
fazia a 5
a
série, quando na escola só tínhamos aula de Educação Agrícola,
Educação para o lar, e o ques plantávamoss comíamos, e na Educação
para o lar aprendíamos a cuidar de nossa casa. (Questionário)
Acrescentou, após as discussões, que os meios, os procedimentos
realizados com os alunoso importantes "pois eles os levarão para toda a
sua vida".
Durante a entrevista, a situação permaneceu inalterada. Ao ser indagada
a respeito das impressões causadas pelas sessões, a professora Lara respondeu:
A sessão que mais me marcou foi aquele dia ques vimos aquele (a escola
além da aula). Quando você está assistindo alguma coisa, você... igual
quando você está lendo um livro, você parece que torna-se personagem
daquele livro, então, igual aquele dia, eu estava vendo, parece que eu fui
vivendo na minha escola, o que me marcou na minha escola, porque marca
muita coisa (...) Então,o coisas que marcam, se me marcaramo marcar
meus alunos também. Eu aprendi uma coisa que eu vou usar todos os dias
(...) como usar o que aprendemos no nosso dia a dia (Entrevista).
A professora Alegria, em resposta ao questionário, afirmou que "o
vídeo primeiro me lembrou minha escola, minha infância. No quanto foi
prazeroso estudar, brincar, ir para escola. Segundo lugar, no quanto minha
escola parecia ser trabalhada ".
Outra professora também lembrou-se de sua infância e escreveu no
questionário:
208
Lembrei-me da escola que eu vivi quando criança, quando o momento do
lanche, do recreio, da saída eramo prazerosos. Cheguei a sentir o gosto do
mingau de fubá na cantina da escola" (...) e continua, "Isso significa a
magia de ter vivido uma escola de interior comprometida com a educação
plena da criança e a sensação de frustração de ver a escola de hoje deixando
para trás tantos valores e tantos momentos ricos em aprendizagem.
Mesmo algum tempo depois do vídeo, na entrevista, os professores,
manifestaram que o vídeo provocou lembranças nostálgicas da época de
estudante, o que confirma a mediação individual. A professora Aríete
confirmou (entrevista): "Eu me lembro: a professora falando o quanto era
importante parar antes de dar uma aula, conversar. Então me chamou muito
a atenção. Eu comecei a rir. Gente! Quantas vezes eu não erro! Eu apresso às
vezes".
As mediações individuais provêm, justamente, da individualidade de
sujeitos cognoscentes e comunicativos. Há certos esquemas mentais de
significados mediante os quais dá-se sentido a uma nova informação. Nem
sempre o receptor percebe o processamento mental, especialmente seo tem
condições de discutir, como ocorreu nas sessões coletivas. Há repertórios
individuais, códigos e sub-códigos individualizados, que ocorrem dentro de
um determinado conjunto textual funcionando como filtros das mensagens
recebidas.
Orozco alerta que a mediação individual é importante porque serve
como fonte de mediações para a interação social bem como com os meios de
comunicação.o mediações individuais, maso se referem somente ao
indivíduo isolado, mas a pessoa que participa de diferentes instituições sociais
ao mesmo tempo. As opiniões selecionadas demonstram o potencial dos
programas em provocar o desejo de mudança, especialmente em sessões
coletivas. Como assinalou a professora Gabriela, em resposta a questionários
durante a sessão de vídeo:
Todas as situações mostradas como: a chegada, o recreio e a saídam
grande importância na vida escolar do aluno e o nosso grupoo tem parado
para repensar nesses momentos. O grupo pode fazer a mudança... é um
processo. Precisamos assumir essa responsabilidade!!! [resposta dada ao
questionário antes do debate do grupo] (...) A partir de agora todas as
situações mostradas foram discutidas dentro de nossa realidade escolar e se
o houver nenhuma intenção de mudanças teremos que assumir queo
mudamos por simplesmente preferirmos ser omissos [resposta dada ao
questionário após a discussão com o grupo].
Esse aspecto, que se repetiu em diferentes falas, evidencia o potencial
dos vídeos da TV Escola em suscitar reflexões individuais, sobre a infância,
sobre a família. A saída da individualidade, mesmo que seja social, para uma
reflexão coletiva depende da criação desses momentos, a fim de que se
mantenha o caráter do debate coletivo, em reuniões pedagógicas específicas.
Como respondeu o professor Danilo aos questionários usados na sessão:
As lembranças provocadas pelo vídeo significam um momento de total
reflexão sobre a minha prática educativa, permitindo que eu faça uma
avaliação dessa prática e que possa repensar sobre as formas com que avalio
cotidianamente em relação à disciplina que leciono.
E acrescentou, no questionário, ao final das discussões coletivas:
momentos como esse poderiam acontecer mais vezes ou periodicamente, a
fim de estarmos (professores e funcionários) constantemente repensando
nossa prática e realidade, procurando assim encontrarmos juntos saídas mais
viáveis para uma educação melhor.
O final da resposta mostra como os professoreso capazes, se houver
oportunidade, de se comunicar, de partilhar idéias com os colegas discutindo-
as em grupo, um dos elementos do professor reflexivo.
E ainda a resposta do professor, que se identificou, no questionário, com
o pseudônimo EU, após ver o mesmo vídeo: "Tenho que arranjar uma forma
para que minhas aulas fiquem mais interessantes e que os alunos não
precisem ser pressionados através de notas para assistirem minhas aulas ".
E interessante ressaltar a importância da mediação no que diz respeito à
formação do professor reflexivo. O modelo formativo da racionalidade
prático-reflexiva tem como pressuposto a capacidade do professor refletir sua
prática. As situações mostradas em um vídeo, que apresentam, discutem e
analisam a prática de diferentes professores em várias partes do país,
funcionam como suscitadoras da reflexão.
8.2. Mediações institucionais
As mediações institucionaiso aquelas que acontecem nas diferentes
instituições, como a família, a escola, a igreja, o trabalho, o clube etc.
Significam instituições que, de alguma forma, interferem na produção de
significado das mensagens recebidas. Na recepção de TV pelas crianças,
Orozco identifica três instituições importantes: os amigos, a escola e a família.
No caso de recepção de programas da TV Escola, a instituição
mediadora é a escola, local em que os vídeos, pelo próprio projeto, devem ser
visionados e também onde ocorreu esta pesquisa e a sessão coletiva de vídeos.
Essa instituição éo importante como mediadora que receberá um tratamento
mais detalhado, acrescentando-se a forma de sua organização, daí o termo
organizativo-institucional.
Considerar a escola como mediação institucional significa que os
diferentes agentes escolares exercem ação mediadora, como também os
espaços, ambientes, que compõem a ecologia da instituição. Enfim, o clima da
escola representa elemento mediador dos significados a serem atribuídos aos
vídeos assistidos.
Vários professores de ambas escolas pesquisadas referiram-se à
distância que existe entre o que o vídeo apresenta, especialmente os diferentes
momentos além da aula, e a realidade de suas escolas. Abaixo, algumas falas a
respeito:
eu achei que ali estava muito irreal. A nossa realidade é outra. A nossa
estrutura é outra.so temos o apoio da própria coordenação. (...) Aquele
vídeo eu achei meio irreal por esse lado, porque aqui se você levar o aluno
para fora da sala, vocêo está dando aula, é bagunça (Sueli, entrevista).
Todos os vídeoso nesse esquema? De uma escola ideal? Porque aquilo
o é real! As atitudes da escola públicaoo assim! (...) Por queo
mostra a realidade de uma escola como a nossa? Só uma minoria muito
pequena é assim... (fita 1 - 21 min. e 26 seg.)
O ideal seria o que mostra a fita, ter um refeitório... Maso é assim, (fita 2
- 25 min. e 10 seg.)
Os alunos falam direitinho,m um nível melhor do que os nossos, (fita 2-
26 min. e 42 seg.)
As falaso eloqüentes e mostram como a realidade da escola em que
trabalham interfere no significado queo aos vídeos e como os professores
o capazes de comparar sua escola com a que aparece na tela.o basta a
teoria, é preciso relacioná-la à prática. E interessante ressaltar como a
discussão coletiva altera a reação inicial de rejeição.
Em uma das escolas, a coordenadora fez a observação de que o objetivo
era mesmo mostrar o ideal para que o desejo de busca do ideal provocasse
mudanças nas escolas. Essa intervenção alterou o rumo das discussões e, nos
questionários preenchidos após o final do debate coletivo, as expressões
tornaram-se mais amenas e as respostas já vislumbravam a possibilidade de
atingir uma situação melhor do que a existente. Abaixo encontram-se as
respostas:
Pra fazer acontecer, basta disposição, boa vontade, integração do grupo.o
pequenas ações que mudam grandes projetos, propostas. E vejo que estamos
muito próximos de uma escola ideal. (ProP Alegria, questionário)
O vídeo é de uma escola ideal, mas nossa realidadeo se encontra distante
da mesma. Basta um pouco de esforço, que o que depender dos profissionais
desta conquistaremos. Somos capacitados, esforçados e buscamos o ideal
dentro do real. ( Flor de Lotus, questionário)
A escola que vivemos hoje, emborao seja a ideal, está buscando o seu
caminho, as suas respostas e percebe que para acompanhar o mundo com as
suas transformações, ela também tem que se transformar e se adequar a esse
momento importante da história. ( ProP Eliene, questionário)
A nossa escolao está muito longe dessa realidade. Aqui há uma
preocupação muito grande dos professores sobre o social do aluno... (A
Pensadora, questionário)
Se possível, a "Escola" como um todo, deveria tentar se aproximar desta
escola ideal que foi apresentada no vídeo. É claro que teríamos nos adaptar
em alguns aspectos, já que nossa escolao se apresenta como escola ideal,
mas que estamos caminhando para isto, talvez já estejamos próximos, pois
todos os professores estão eo comprometidos com o bom funcionamento
da escola (Beija Flor, questionário).
A última observação mostra que a professora entendeu que apenas o
aparenteo conta na educação. Muitas vezes, o invisível, como o
compromisso do professor, pode ser mais importante do que apenas um prédio
bonito, como o apresentado em um dos vídeos..
, porém , outros aspectos ligados à mediação que se referem, como os
dados coletados mostram, à dificuldade do desconhecimento da TV Escola, de
conseguir as fitas que se deseja usar e, em especial, a ausência de reuniões
pedagógicas nas escolas. Uma das coordenadoras pedagógicas disse na
entrevista:
s somos impedidos de fazer essas reuniões.s temos de cumprir um
calendário... aula! ...O sistemao dá muita abrangência. Eles deveriam
propor: tal dia assim tirem para reunião, para olhar a TV Escola. Issoo é
oferecido. A senhora pode olhar aqui [mostrando o calendário único para as
escolas elaborado pela Secretaria de Educação], o que vem, já vem pronto,
feriado, início, planejamento, término, recesso, conselho de classe, reunião
de pais, só isso.(...) Conteúdo pedagógico destinado ao aperfeiçoamento do
professor, só os quatro dias de planejamento no início do ano.
Destaco que, relativamente à gestão da educação, ocorre a aceitação
tácita do poder da Secretaria de Educação de impor um calendário -"Eles
deveriam propor"- evidenciando a supervalorização ideológica (ideológica
porque aceita como natural) das formas tradicionais de gestão,
desconhecendo, pelo que ficou evidenciado, a possibilidade de uma prática de
gestão participativa na escola.
Outra coordenadora recorda que as reuniões pedagógicasoo
contadas horas/aula, e que
"não adianta você querer iludir, a gente tem família também, a gente é ser
humano. A maior parte dos professores tem dois ou três empregos. Então,
eleo vem fora do horário de aula, eo virá aqui fazer reuniões aos
sábados, porque eleo é valorizado. Que a gente faz as reuniões
pedagógicas, a gente faz. Como é que a gente tem tentado fazer? A gente dá
aula até o recreio e libera o aluno para se reunir. (...) Ontem,s fizemos
Conselho de Classe. Sabe quantos professores tinham? Três! (Entrevista).
Quanto ao conhecimento que os professoresm da TV Escola, a
coordenadora disse que nem ela conhece bem a TV Escola,
s estamos sem tempo, eu ando sem tempo de estar sentando e assistindo
(...) Os professores estão sem tempo (...) Os professoreso conhecem o TV
Escola. Eu conheço muito pouco, só os da minha área. O professoro
conhece,o sei se é por falta de interesse, eu acho que eles estão
sobrecarregados (Entrevista).
Vale anotar que os coordenadores pedagógicos possuem uma visão mais
ampla do que os professores dos problemas que ocorrem na escola. A mesma
coordenadora fez um desabafo:
O problema da educação pública no Brasil, nossa, chama-se salário.
Enquanto eu tiver ganhando três reais por hora/aula, eu tenho de ter dois
empregos. Todo mundo aqui tem dois empregos. E o nosso aqui continua
sendo bico. Por que o nosso é bico? Porque aqui eu dou 28 aulas e recebo
400 reais. No cursinho, eu dou seis aulas e ganho 400 reais. Então,o
adianta, se o ministro da educação, o problema da educação chama-se
salário. Se eleo quiser acreditar, porque eleso acreditam, é o salário.
Tem condição de estudar. Lá nesse cursinho onde trabalho, ele já me falou
que vai me mandar para Brasília para eu me aperfeiçoar. Aqui a genteo
pode sentar o grupo de professores para estudar, que dizem que você está
matando aula (Entrevista).
8.3.Mediações organizativo-institucionais
As mediações organizativo-institucionais apresentam-se de diversas
formas e ocorrem antes, durante e após o contato real com a mensagem em
si, eo identificáveis nas falas, na dificuldade de organizar uma reunião, na
duração que é curta, na ansiedade de alguns professores que participam da
reunião, no tempo regulado pela administração.
Algumas falas caracterizam essa mediação:
O currículo escolar éo extenso e nos cobram tanto que ele seja cumprido
queo temos tempo de conversar com nossos alunos, saber como foi o final
de semana etc. (...) O principal fator é a falta de apoio dos órgãos
competentes e a falta de motivação para o professor (Edson, questionário).
O professor percebeu a gravidade do problema e falar a respeito já é
um grande passo. Maria Isabel da Cunha (1994) alertava que, para o professor
assumir postura dialógica e investigativa, é preciso enxugar o currículo.
Eu acho que falta mais vontade da parte de todos que compõem a escola
para que ela fique melhor (Cristina, questionário).
As minhas aulas seriam melhores se eu estivesse menos sobrecarregada!
Como eu chegaria melhor e mais disposta à sala de aula! (Aríete,
questionário)
A escola dos meus sonhos é aquela onde haja união de todas as áreas,
condições de trabalho (material didático) que os professoreso ajam uns
com os outros como simples colegas de trabalho, mas todos envolvidos na
busca de objetivos, a fim de chegar em algum lugar (Margarida,
questionário).
Uso vídeos do meu acervo. O da escola euo posso contar, porque nem
sempre a gente conta com o vídeo. A gente faz o pedido, chega láo tem. A
gente programa a aula, programa o vídeo, programa a sala (reserva da sala de
vídeo), programo tudo, chego na secretariao encontro o vídeo porque foi
emprestado... (Prof. Nelson, entrevista).
A escola dos meus sonhos é aquela onde comunidade, educadores e
administração trabalhem juntos (Marina, questionário).
A escola dos meus sonhos é aquela onde os professores sejam bem
preparados, respeitados como pessoas e profissionais, bem pagos pelo seu
trabalho, um salário digno (...) o professor deve ter liberdade para sugerir,
demonstrar, apresentar idéias novas. A direção, muitas vezes, coloca o
professor como cumpridor de ordens e nada mais (Silvio, questionário).
O final dessa fala mostra que os professoresm consciência de queo
tratados como reprodutores do conhecimento e cumpridores de ordens. Ter
oportunidade de desabafar, de forma coletiva, no próprio ambiente de
trabalho, é muito positivo para a busca da autonomia real.
A gente tem condições de fazer muitas alterações na forma de trabalhar.
Algumas sugestões dadas, de certa forma já utilizamos no nosso cotidiano.
Me fez lembrar que muitas sugestões se esbarram em algumas dificuldades
que nossa (as) escola (as) enfrentam, [respondeu após ver o vídeo, sem
o debate. Após o debate, o professor escreve:] Acrescento que há
uma ligação direta entre o que foi apresentado na fita e as condições de
trabalho do profissional que trabalha na escola e as condições da escola e dos
alunos (Alencar, questionário).
Demonstrou também como o professor leva em conta as condições
sociais e políticas da escola.
A mediação da organização da instituição escolar ocorre antes do
contato com a mensagem por causa da ausência de autonomia das escolas em
definir seu calendário e, especialmente, suas reuniões pedagógicas. Ou ainda,
fato que considero muito sério: os professoreso foram avisados da sessão
coletiva de vídeo que estava marcada com a pesquisadora, o que pode ter
impedido que vários participassem, apesar da combinação antecipada com a
direção da escola.
As falas do professor Alencar, durante a entrevista individual, revelam a
situação.
Fiquei sabendo na hora de ir, euo sabia anteriormente, se foi pré-marcado
euo sabia. Isso também aconteceu com alguns professores e isso foi um
dos pontos que eles reclamaram, e de certa forma até repercutiu um pouco.
Eles disseram que teria que marcar com uma certa antecedência e com mais
tempo para discutir. Só para você ter uma idéia de que realmente repercute,
porque já houve comentários nessa linha. Quer dizer, o pessoal gostaria de
participar, mas como já era o horário de iniciar o vídeo e já estava quase na
hora da pessoa estar saindo,o tinha mais tempo. Alguns chegaram a
colocar que deveria talvez, seria necessário, ou até importante, se fosse o
caso até suspender as aulas num determinado instante, para a gente fazer
essa discussão com mais tempo, com mais profundidade.
Mais adiante, na mesma entrevista, ao saber que o encontro foi marcado
com antecedência, disse:
Acho que foi estratégia deo falar foi para o pessoalo fugir, porque
ocorre muito isso. A sobrecarga do pessoal é tamanha que acaba que o
pessoal, às vezes, sendo avisado com antecedência, acaba querendo fugir.
Esse seria um ponto que eu gostaria de acrescentar: o excesso de carga
horária. Hoje é um dos pontos que a escola sofre muito, é porqueo dá para
dizer que é uma coisa,o vários fatores. Mas esse fator para mim é
fundamental, que é o excesso de trabalho (Ibidem).
Acrescente-se, ainda, na mediação organizativo-institucional a posição
hierárquica que as pessoas ocupam na escola.
Na primeira sessão de vídeo (Escola Lázaro Rodrigues) ficou clara a
existência dessa mediação com a fala da coordenadora pedagógica. Embora a
maioria dos professores referiram-se ao conteúdo do vídeo "Desatando oss
com afeto" relacionando-os à sua vivência com os alunos, a coordenadora
disse: "O que este vídeo me despertou é que posso usar esse tipo de programa
para as reuniões pedagógicas que preparo" (PR A, n. 9, 1998).
Ou ainda, em uma escola maior e que possui mais de uma
coordenadora, a geral e a pedagógica, esta depende de decisões que só a
primeira pode tomar.
Este anos fizemos muito poucas reuniões pedagógicas. Porque, às vezes,
a gente resolve tudo no Conselho de Classe. Às vezes, a gente informa de
uma maneira geral na sala o que se vai fazer, temos pouca coisa. Tivemos
uma reunião só no início do ano. Depois parece que teve uma. Geralmente
quem coordena essa parte da reunião pedagógicao sou eu. É a
coordenadora geral. E ela que fala ques vamos reunir tal dia para isso ou
para aquilo (Entrevista).
Percebe-se, nessa fala, queo há autonomia entre as próprias
coordenadoras, uma vez que a coordenadora geral decide todas as questões, o
que significa que a maior parte dos avisos relativos à escolao anunciados na
hora do intervalo, momento em que os professores estão na sala dos
professores para tomar café, e os alunos, no recreio. No quadro-giz da sala,
freqüentemente,o afixados avisos e orientações aos professores, em especial
sobre a forma de avaliação e recuperação dos alunos, como também as datas
dos Conselhos de Classe. Trata-se de informações apenas,o há espaço para
discussões pedagógicas, pois o tempo é muito restrito.
Situação inversa ocorre na outra escola, uma vez que a coordenadora
transgride positivamente a não-autorização para realizar reuniões com os
professores da segunda fase do ensino fundamental. A Secretaria de Educação
só permite reuniões semanais com os professores da primeira fase. Na escola
funciona o ensino fundamental completo - primeira e segunda fases - e a
supervisora, entendendo que a reunião pedagógica é fundamental, marca e faz
as reuniões quinzenalmente com os professores, logo após o intervalo do
recreio. Diretor e professores da escola reconhecem a importância desses
encontros e comentam:
Eu passei por dois momentos na escola. Um momento em que ela (a reunião
pedagógica) era semanal, passou a ser quinzenal e teve uma época que
praticamenteo existia, principalmente na segunda fase. Então a gente
percebia que isso dificultava bastante o trabalho como um todo, até mesmo o
relacionamento professor/aluno, professor/direção de escola, coordenação.
Muitos assuntos ficavam, deixavam de conversar e isso causava aquele
transtorno na escola, de forma que agora voltou a ser semanal e com isso,
realmente, a escola está andando muito bem, a gente sabe que tem aquele
momento da gente estar discutindo...(diretora da Escola Lázaro Rodrigues,
entrevista)
Com a vinda da nova coordenadora que é uma pessoa dinâmica, está sempre
buscando inovações, ela começou a incrementar essas reuniões pedagógicas,
trazendo textos com recursos diferentes, inclusive com dinâmicas de
trabalhar a questão da afetividade, da pessoa poder se expressar de forma
diferente. Isso contribuiu para que esse grupo fosse mais aberto, mais unido,
que discutia realmente, que tenta fazer os trabalhos mais em conjunto. Então,
eu acho que a gente tem crescido enquanto grupo de professores, a gente já
melhorou bastante (Profº Sandra, entrevista).
Para propiciar o debate e o crescimento profissional do grupo,o há
necessidade de vídeos; o mais importante é garantir a existência das reuniões.
A TV Escola existe, os vídeos estão disponíveis e o professor precisa
vivenciar mais o mundo tecnológico eo há por que negar-lhe a experiência.
De uma forma ou de outra, positiva ou negativamente, a organização da
escola, nas diferentes dimensões da vida da escola, tanto quanto a pedagógica,
interfere no modo como ocorre a recepção, funcionando como um filtro, como
um mediador da mensagem.
Os exemplos da dimensão organizativo-institucionalo pistas da sua
influência na formação do professor reflexivo.o há como formar
professores reflexivos sem reuniões pedagógicas freqüentes e contínuas, nem
ter uma prática social reflexiva em organizações escolares fortemente
hierarquizadas e submetidas a controle autoritário e sistemático da gestão
central do sistema de ensino.
8.4. Mediações massmediáticas
Orozco inclui, ainda, em sua classificação, as mediações
massmediáticas, ou videotecnológicas, quando se refere à TV. As diferentes
tecnologias, com suas diferentes linguagens e estratégias de comunicação
exercem mediação de recepção das mensagens, influenciando no processo de
percepção e interação com a informação (1997:117).
Neste estudo, embora o veículo seja o mesmo, foi possível verificar,
pelas impressões dos professores, a presença da mediação da TV.
Durante a entrevista, referindo-se ao vídeo "As escolas dos muitos
Brasis", o professor João (da Escola Lázaro Rodrigues) respondeu:
Eu via as coisas de acordo com a realidade de cada Estado. Por aquele
choque de imediato (provocado pelo vídeo) poderia ter ficado com uma
impressão meio pesada, mas não. A gente está passando a se conhecer
melhor. Ver o que tem de positivo no Sul, no Nordeste, o que está além do
que a gente imagina. Resumindo, a gente está passando a se conhecer melhor
através da tecnologia, com uma maior rapidez.
As imagens de professores de diferentes partes do país e suas
impressões sobre o Brasil provocaram um choque no professor. Quer dizer, as
imagens do veículo televisão, mais ainda do que imagens de revistas, jornais,
cartazes interferiram na mensagem. A TV, por trazer conjugado imagem,
movimento, som, música, envolve as pessoas em sua subjetividade e, de certa
forma, produzindo impactos que permanecem ou não.
Impressão idêntica teve a profº Sandra. Na entrevista, observou que o
vídeo apresenta as diferenças e semelhanças entre os professores do país.
Como tem semelhança ... de norte a sul. Aquele segundo vídeo mostra as
diferenças. Mostra as pessoas que estão compromissadas e que estão
pensando a educação. Os problemaso únicos no país inteiro, apesar de
tantas diferenças regionais,o é?
Perceber as diferenças e as semelhanças da educação no país em menos
de vinte minutos, só foi possível valendo-se da tecnologia visual como a TV,
que mostra vários professores expressando-se com sotaque da sua região. A
junção de imagem, cor, som, movimento, música, possível com a edição,
oferece condição de, em pequeno tempo, obter tantas informações.
Conforme Orozco (1997:117), as diferentes tecnologias, com diferentes
linguagens e estratégias de comunicabilidade distintas, de alguma maneira,
influenciam o processo de percepção e interação com a informação. Ante o
desenvolvimento tecnológico, os professores estão precisando saber para fazer
uma leitura mais aguçada das novas linguagens, de forma a empreender a
leitura crítica das mídias junto a seus alunos.
8.5. Mediações situacionais
As mediações situacionais referem-se à situação em que acontece a
recepção, se foi acompanhada ou sozinha, qual o tipo de companhia, se em
casa ou em outro local. Interfere igualmente no local em que está o aparelho,
no caso a TV: em sala própria, de visitas, no quarto, na cozinha.
Neste estudo, interfere, por exemplo, o local em que está instalado o kit:
na sala própria, na biblioteca ou na sala de aula.
A Escola Joaquim Almeida tem uma sala especial para o vídeo,
enquanto na Escola Lázaro Rodrigues, ele fica na biblioteca. Esse é um fator
relevante, uma vez que também interfere na recepção. As escolas, mesmo as
quem mais de cem alunos, nem sempre possuem condições espaciais
adequadas para reservar uma sala apenas para as sessões de vídeo. A aquisição
de um carrinho para dar melhor mobilidade aos aparelhos e conduzi-los até as
salas de aula, é uma idéia descartada nas escolas por causa dos furtos que
ocorrem em muitas escolas. Em uma das escolas pesquisadas, o vídeo e o
televisor ficam em suportes de ferro e a porta da sala possui inúmeros
cadeados como medida de precaução contra furtos. Alega-se, além da
inadequação do espaço, o fato de alunos e professores se distrairem com
outros elementos do ambiente.
Em uma das escolas, a direção queria colocar o kit tecnológico em um
carrinho móvel, mas foi obrigada a comprar um carrinho para servir a
merenda, que tinha maior prioridade (PR A, n. 2, 1998). As escolas, às
vésperas do século XXI, num mundo cheio de tecnologias, ainda tem de
priorizar as pequenas coisas, "muito mais urgentes".
Durante uma sessão de vídeo, realizada na Escola Lázaro Rodrigues
(fita 3, 16 minutos) é possível identificar professores enquanto pegavam livros
da prateleira próxima. Viam o vídeo ao mesmo tempo em que folheavam ou
liam livros e revistas da biblioteca, ou simplesmente se abanavam com eles .
O debate coletivo, nessa mediação, possui significativa importância,
quer dizer, ver o vídeo em companhia dos colegas de trabalho é certamente
bem mais interessante do que sozinho, e é um fator muito importante nos
significados das mensagens. Martín-Barbero assinala que "é contando a
telenovela uns aos outros que se constrói o seu sentido" (1995:58).
Zeichner destaca a dimensão coletiva na concepção do professor como
profissional reflexivo. Alerta, também, para a diferença do professor reflexivo
presente nas reformas educacionais. Enquanto as reformas pregam o professor
individual que reflete sua prática, Zeichner mostra como é importante a
55
As imagens que retratam a cena podem ser observadas na fita 3, na localização 16 min.; 24 min. e 28 min.
e 10 seg.
discussão com os colegas, bem como reflexões voltadas para a prática social, a
fim de construir comunidades de aprendizagem, com professores sustentando
o crescimento uns dos outros.
Dentre as atitudes necessárias à reflexão, encontra-se a abertura de
espírito, que significa a mentalidade aberta para admitir a possibilidade do
erro e ouvir mais de uma opinião sobre as atividades, o que só é possível em
coletividade,o individualmente.
Um dos riscos da reflexão solitária é justamente o individualismo que
estressa os professores, uma vez que se sentem como os únicos responsáveis
pelo fracasso dos alunos, levando à queda da sua auto-estima.
A fala da professora Lara (Escola Lázaro Rodrigues) demonstra esse
sentimento. Ao ser indagada sobre o que a marcou nas sessões de vídeo, ela
disse:
Se você apresenta um vídeo, tem muitas pessoas, e ali, cada um parece que
interpreta de um jeito. Cada cabeça é diferente, cada um ali interpreta de um
jeito. Cada um vê o mesmo assunto de diversas formas (...) Então, a gente
discute, a gente, quando a genteo concorda com a opinião do colega,
mas ele é capaz de defender aquela idéia, falar, conversar. Às vezes, euo
concordo com alguma coisa, com o discursos de minha colega, mas eu vou
procurar entender (...) o argumento que ele vai usar, vai me convencer, eu
acho muito importante (entrevista).
Essa opinião está evidenciando a presença, ou pelo menos, indícios da
mentalidade aberta, referida por Dewey como atitude necessária à ação
reflexiva.
A mesma professora disse ainda:
Quando você está lendo, surge muitas dúvidas, mas no que você ouve a
pessoa falar, parece que as suas dúvidaso sendo sanadas. Mas eu ainda
queria uma pessoa do lado para eu falar- E aquilo ali? Por que? Então eu
acho que eu precisava de um orientador do lado (Ibidem).
A professora Gabriela, durante a entrevista, quando mostra o valor de
um debate coletivo: "Em nenhum momento da sessão coletiva eu senti que fez
mudar a minha opinião em determinado assunto, não. Eu acho que fez
acrescentar nesse sentido ".
Esses exemplos demonstram que a situação em que ocorre a recepção
altera os significados dados às mensagens. Os programas da TV Escola,
assistidos em casa provocam diferentes alterações nos significados em relação
àqueles vistos na escola com os colegas.
Ainda sobre essa mediação, Orozco faz referência ao estado de ânimo
dos receptores em relação ao meio de comunicação, o que se estende também
à disposição que o professor tem no momento de ver o vídeo com os colegas.
Em ambas escolas, alguns professores mostravam-se enfadados por estar ali,
cujas expressões, gravadas em vídeo, levam a essa inferência. Também , nas
duas escolas, professores corrigiam provas ou faziam outra atividade durante a
sessão coletiva, como conversar o tempo todo com o colega, olhar no espelho,
etc (fita 3-28 min. e 40 seg. e; fita 4-18 min. e 10 seg. e 27 min. e 7 seg.).
8.6. Mediações de referência
As mediações de referênciao as características que se situam num
contexto determinado, como a idade, gênero, etnia, raça ou classe social. Essas
mediações, por fazerem parte do contexto de uma determinada realidade,
interatuam no processo de recepção.
A Escola Lázaro Rodrigues oferece ensino de primeira a quarta série e
conta com maior o número de professoras do que de professores
56
, razão por
56
"No Brasil, como em inúmeros países, o magistério é uma atividade profissional predominantemente
feminina. As estatísticas revelam que 86,6% do professorado brasileiro é do sexo feminino. No ensino
que a participação das mulheres é bem maior. Na Escola Joaquim Almeida,
por oferecer o segundo grau, há um número maior de professores que
participaram bastante no debate. Emborao sendo o único fator, a questão de
gênero é responsável também pelas diferenças de recepção dos mesmos
programas nas duas escolas. Em uma das escolas, um dos professores ocupa
cargo no sindicato de sua categoria, por isso, mantinha, durante as sessões,
uma postura bastante séria, e sempre que fazia análises, deixava transparecer
sua posição política. Suas intervenções eram respeitadas pelos colegas e
suscitadoras de novas falas, igualmente politizadas.
A formação dos professores, no que se refere ao tipo de curso, grau de
formação etc,o foi alvo de preocupação do presente estudo, mas, com
certeza, interfere na interpretação das mensagens. Observações anteriores e
experiência da autora, como formadora de professores,o conta de que
professores com maior grau de formação demonstram melhor capacidade de
selecionar o que se aproxima da sua realidade como profissional,o
descartando o que se distancia da sua realidade, sob a alegação de que está
fora do que vive, como fazem os de menor grau de formação.
Nas duas escolas observadas, seus profissionais rejeitaram as situações
apresentadas por um vídeo que, segundo eles,o correspondiam à realidade
da escola pública brasileira. Em ambas as escolas, o grau de formação dos
professores presentes às sessões era de nível superior. A diferença entre as
duas escolas, na minha avaliação, fica por conta de outros aspectos. Em uma,
os professores mostravam-se mais pessimistas, apesar de conviverem com
uma situação físico-institucional mais privilegiada do que a outra, isto é,
escola maior, com mais recursos didáticos, porém, a gestão era mais
primário, a presença feminina chega a 99%, bem como 96,2% no ensino de primeiro grau, primeira fase, com
esse número decrescendo nos níveis subseqüentes" (Toschi e Corticioni, 1994:26).
fiz isso. A gente começa a questionar. Se vocêo tivesse esclarecido para
s e o vídeo que você passou, ia passar despercebido. A gente ia continuar
fazendo ( Profº Samara, entrevista).
Essas opiniões sobre a mediação do pesquisador denotam o caráter
relacionai da mediação como categoria dialética. Relacionam-se à individual,
à situacional, à institucional etc. As mediaçõeso ocorrem de forma
isolada, já que os diferentes elementos da operação da recepção se relacionam.
A presença do pesquisador fez-se forte porque provocou alterações na
organização da escola, criou momentos de reflexão coletiva, interveio no
cotidiano da escola, afinal, gerou modificações que passaram despercebidas.
Se os professores apreciaram a visita do pesquisador, ou se ele conseguiu
provocar alterações posteriores, a resposta afirmativa evidenciará mais ainda a
importância de outros momentos idênticos nas escolas.
8.8. Mediação temor tecnológico
A mediação temor tecnológico torna-se mais perceptível nas pessoas
responsáveis pela gravação dos programas.
Na Escola Lázaro Rodrigues, a responsável desconhece até o
significado da palavra kit, o que a impediu de responder a um questionário
enviado pela Secretaria de Educação. Certa ocasião, disse-me ao estar
conversando informalmente com ela: "Agora para voltar a fita rápido é
preciso apertar o STOP. Mas isto estraga a fita. Mas o recado para fazer
isto". [Indica-me o quadro onde estava escrito:] "Para rebobinar mais rápido
use o STOP".
Em seguida, a professora disse: "Eu gosto mesmo é de alfabetizar.
Alfabetizei durante 18 anos. Eu gosto é disso: alfabetizar!" (Diário de
Campo, p.10). Esse é um exemplo de uma pessoa que ocupa funções que
contrariam seu interesse e habilidade.
Conversando com a responsável do Departamento de TV Escola da
Secretaria de Educação, fui informada de que os treinamentoso freqüentes,
mas a rotatividade de exercício de funções nas escolas é maior, motivo por
que nunca conseguem contar com pessoas preparadas para fazer as gravações.
Ela disse que vai às escolas, ensina gravar e catalogar as fitas. Depois de um
mês, essa pessoa que foi treinada,o está mais na mesma função e o seu
trabalho se perde (Diário de Campo, p.7).
O primeiro questionário, respondido por alguns professores na primeira
sessão de vídeo, demonstra o temor tecnológico, tendo em vista que a escolha
pela opção - "Assusta o professor queo sabe lidar com elas" - aparece
como a terceira opção dentre as mais escolhidas pelos professores, estando em
primeiro e segundo lugar, respectivamente - "Vai melhorar muito o ensino" e
"Uma coisa boa que aconteceu nas escolas". Percebe-se que as duas opções
mais escolhidas referem-se como algo positivo a presença das novas
tecnologias da comunicação e informação nas escolas. Entretanto, tanto nas
sessões de vídeo, como nos questionários e entrevistas, esse entendimentoo
surgiu espontaneamente, o queo quer dizer, precisamente, que a deficiência
o existe mais com os professores. Em questionário de caracterização, os
professores, em grande maioria, disseram saber manusear o vídeo doméstico,
mas evitam usar o da escola. O temor tecnológico pode vir camuflado, ou
fazendo parte, de uma outra mediação - a resistência fragmentada.
8.9. Mediação resistência fragmentada
Fui buscar em Giroux e McLaren (1995) o termo resistência, ao qual
acrescentei o adjetivo fragmentada. Para esses autores, o termo resistência
refere-se "a uma espécie de 'abismo' autônomo entre as forças de dominação,
inelutáveis e difusas, e a condição de ser dominado" (p. 125).
Nessa perspectiva, resistência é uma espécie de negação diante dos
discursos e práticas dominantes, porém, sem um projeto político explícito,
sendo, portanto, desorganizada, apolítica e ateórica. A resistência ao projeto
TV Escola fica explicita em várias situações vividas nas escolas. Resistem ao
projetoo usando as fitas da TV Escola, resistem utilizando outras fitas,
geralmente locadas, negando as "oferecidas pelo governo". Durante as sessões
de vídeo, os professores demonstraram as mais variadas reações, como:
absoluto descompromisso, desprezo pela sessão, falta de participação,
conversa com os colegas durante a maior parte da sessão, ausência à
exposição do vídeo, enfado, etc. Vale destacar queo foram obrigados a
assistir à sessão. O convite foi feito e, teoricamente, iriam se quisessem.
Porém, o próprio sentido de hierarquia existente na escola, poderia levar esses
professores a sentirem-se "na obrigação" de estar presentes.
A esse comportamento individual, acrítico, passivo os autores chamam
de resistência. Acrescento o termo "fragmentada" porque é isolada, individual.
o há um movimento, uma decisão coletiva deo participar dessa situação,
e de muitas outras ocorrentes nas escolas.
A resistência, Giroux ( 1995:132) propõe a contra-hegemonia, que
"implica um entendimento mais político, mais teórico e mais crítico",o só
da natureza da dominação, mas também do tipo de oposição ativa que deveria
engendrar.
As palavras de muitos professores atestam essa inferência:
A genteo tem tempo de assistir a TV Escola, de gravar em casa.o tem
uma pessoa específica para isso. Você conhece a dificuldade que eu
encontrei. Teria que ter uma pessoa só para assistir e gravar aqueles
programas, maso tem ( Profº Arlete, entrevista).
Eu estou sempre procurando com os colegas da área, para ver se tem um
filme relacionado ao conteúdo, um filme novo, ou algum que euo
conheça, porque todoso aproveitáveis. (...) Eu uso vídeos que os meus
colegas orientam. Os da TV Escola euo utilizei nenhum (Ibidem).
Continua mais à frente na entrevista:
Eu pedi para a coordenadora da TV escola: olha eu estou precisando de um
filme para a 5
a
série que fala sobre os planetas. Aí ela me indicou um filme
totalmente científico. Os meninoso entenderam nada. Aí eu nem exigi
deles um relatório, nada. Porque realmente era muito complicado, muito
científico o filme. (...) Euo vi antes o filme porque quando trouxeram para
mim já estava em cima da hora. Eu tenho um colega que me ofereceu a sua
videoteca. Euo perguntei porque que eleo utiliza, mas eu sei queo
tem nenhum da TV Escola. Eleo me indicou nenhum (Profº Sueli,
entrevista).
As últimas considerações da professora Sueli explicam, de certa forma,
porque os professores preferem locar vídeos a utilizar a TV Escola. A
referência que recebem dos colegas de trabalho é mais significativa do que
toda a produção de complementação da TV Escola, como a Revista e os
Cadernos. A conversa com os colegas torna-se referência para a decisão de
usar ou escolher o vídeo, oportunidade queo é oferecida pela TV Escola,
porque os professores, sobrecarregados de trabalho,o conseguem tempo
para assistir ao vídeo e fazer a escolha, além de preparar as aulas. Ademais, a
coordenação das escolaso tem tempo, condições adequadas ou disposição
para preparar os vídeos, elaborar as sinopses e orientar os professores das
diferentes áreas do conhecimento, como forma de atender à expectativa dos
professores.
Os coordenadores pedagógicos, que poderiam assumir essa função,
estão igualmente sobrecarregados de trabalho e, além deo conhecerem o
material da TV Escola,o professores de áreas determinadas, por isso,m
dificuldade de didatizar o material, isto é, torná-lo mais acessível ao professor
de áreas diversas, ligá-lo ao conteúdo escolar dos programas de ensino.
A resistência torna-seo velada como a de uma professora que, após
assistir ao vídeo na segunda sessão, e participar do debate coletivo respondeu:
"Sinto muito, mas não tenho nada a acrescentar".
O prof. Alencar ressaltou, ao dar resposta ao questionário da segunda
sessão, que:
A gente tem condições de fazer muitas alterações na forma de trabalhar.
Algumas sugestões dadas, de certa forma, já utilizamos no nosso cotidiano.
Muitas sugestões esbarram em algumas dificuldades que nossa(s) escola(s)
enfrentam, mas várias delas esbarram no comodismo por parte de
profissionais que se recusam a aceitar mudanças por vários motivos,
inclusive pessoais .
Representa uma recusa pessoal, individual, isolada, como descrevem
Giroux e McLaren. Para tornar-se contra-hegemonia, como propõem os
autores, é preciso que a resistência seja coletiva, para proporcionar a formação
do professor reflexivo, que só se obtém com autonomia pedagógica da escola
e com outro desenho da TV Escola. O mediacentrismo, a que se refere Martín-
Barbero, isto é, a centralidade na aquisição de equipamentos atendendo
interesses do sistema econômico, deve ceder espaço à formação
comunicacional dos agentes escolares e à existência de um profissional
disposto a trabalhar as questões vídeo-pedagógicas na escola.
CAPÍTULO VI - A TV ESCOLA E O PROFESSOR REFLEXIVO -
... só é possível pensar a formação de
professores pensando e repensando
constantemente, à luz das ciências humanas -
e de todas as ciências humanas - as práticas
pedagógicas e o funcionamento dos
estabelecimentos de ensino e dos sistemas
educativos.
Inicio este capítulo com a declaração da professora Sandra, durante a
entrevista individual, ao ser questionada sobre sua opinião a respeito das
sessões coletivas de vídeo da TV Escola.
É interessante, porque quando você faz um coletivo, alguns apontam coisas
que vocêo tinha percebido e aí começa a refletir: é mesmo, olha! Você
vê no vídeo algumas coisaso absurdas que, de repente, você se identifica.
Puxa vida! Eu faço aquilo também, que horror! Aí você tem a coisa
acontecendo, e aí te dá aquela coisa, tem que mudar, olha! Porque a gente
comete tantos erros, por mais que a gente procure melhorar, tentar ser
diferente, a gente comete erros absurdos, tem hora que você se vê com cada
prática dentro de sala de aula, daquelas hiper tradicionais e aí você fala
assim: nossa! Quando o vídeo te mostra isso e você veste a carapuça, eu falo
assim: que horror! Agora eu estou vendo, e é ridículo, tem que mudar,o é?
O close-up refere-se ao plano de gravação bem próximo do sujeito e o contra-plongée, ao ângulo da
câmera que registra o sujeito acima dela, isto é, de baixo para cima. Quer dizer, ver a escola de perto, em
close, e o professor, de baixo para cima, dando-lhe destaque.
close-up contra-plongée
Perrenoud
Esse trecho, além de mostrar as mediações individuais e situacionais,
revela com clareza o conhecimento tácito que a professora demonstra sobre a
necessidade de refletir sobre a própria prática, reconhecendo os erros
cometidos e buscando aperfeiçoar-se.
Mas será que ser reflexivo é apenas isso?
Zeichener alerta que a atenção do professor reflexivoo se volta
apenas para sua prática, mas inclui o conhecimento e análise das condições
sociais, políticas e econômicas em que ocorre a prática docente. A prática
reflexiva tem tendência democrática e emancipadora, além de ser plural,
dialógica, coletiva, o queo significa dizer que a reflexão da professora
Sandra, por ser pessoal, individual, esteja destituída de valor.
A indagação-reflexão individual do professor deve basear-se
inicialmente no conhecimento da problemática, porém nem sempre ocorre.
Identificado o problema, o professor fará análise das causas e conseqüências
da sua conduta docente. Note-se que, no caso em pauta, a professora só tomou
consciência da falha depois de ver o vídeo e ouvir os colegas.
O objetivo do professor reflexivo, porém, é avançar para além do
metodológico, reconstruindo, com base na prática, os seus conhecimentos
colocando-os a serviço da cidadania, de mudanças sociais que propiciem
maior justiça social e solidariedade.
O uso coletivo da TV Escola poderia colaborar na formação de
professor reflexivo? A dimensão coletiva é fundamental para garantir o
potencial dos vídeos, e também, a realização de reuniões pedagógicas
periódicas e constantes é essencial para manter essa possibilidade. Entretanto,
mais do que simples reuniões pedagógicas, elas pressupõem a
intencionalidade, definida coletivamente, de que o conjunto da organização
escolar tenha uma nova prática docente.
Retomando as atitudes necessárias à prática reflexiva, propostas por
Dewey - abertura de espírito, responsabilidade intelectual e entusiasmo -
darei ênfase à última. O entusiasmo refere-se à capacidade do professor se
tornar responsável por sua formação, e agora, num ambiente novo, a própria
escola. E, como observa Nóvoa, em um território que reconfigura a formação
docente, baseada na co-responsabilização que leva a uma identidade
profissional coletiva.
O entusiasmo refere-se também à habilidade de lutar contra a rotina,
enfrentando as atividades com energia, curiosidade e espírito de renovação,
além de requerer que as outras atitudes - abertura de espírito e
responsabilidade - sejam componentes centrais da vida do professor.
Uma das questões mais difíceis diz respeito à rotina, à cotidianidade
vivida pelos docentes por anos e anos de prática escolar.
Ao ser questionada, durante a entrevista, sobre sua opinião a respeito
das sessões coletivas de vídeo, a professora Aríete respondeu:
Eu acho que é sempre um puxão de orelha, lembrar, recordar, muita coisa
vai ficando no dia a dia, no cotidiano, nessa correria. Eu acho que o que falta
paras é isso. Vai passando os anos do mesmo jeito. Ninguém pára. Então,
se tivéssemos essas discussões, se de vez em quando a gente lesse. Porque a
gente até sabe que tem que fazer. Às vezes, você deixa de fazero por
maldade, é tanta correria, você está envolvida nesse processo e vai andando,
vai dançando conforme a música.o há aquela parada para refletir, para
ver o meu trabalho, para ver o que está mudando, coisas novas.
Envolvidos pelo cotidiano, os professores "vão dançando conforme a
música". Segundo Heller (1970:17) as pessoas participam da vida cotidiana
com todos os aspectos de sua individualidade e de sua personalidade,
colocando "em funcionamento" todos os seus sentidos, capacidades
intelectuais, sentimentos, paixões, idéias, ideologias, mas nenhuma delas
funciona com toda intensidade. A esse respeito comenta a mesma autora
(1970:17): "O homem da cotidianidade é atuante e fruidor, ativo e receptivo,
mas não tem tempo nem possibilidade de se absorver inteiramente em nenhum
desses aspectos; por isso, não pode aguçá-los em toda sua intensidade ".
Como disse a professora Aríete "a gente até sabe o que tem que fazer",
mas é envolvida pelo cotidiano e por sua mesmice, eo se renova.
Em sua vida "o indivíduo é sempre, simultaneamente, ser particular e
ser genérico" (grifo de Heller, 1970:20). Essa particularidade expressa o ser
individual, único e irrepetível. É no ser individual que as necessidades
humanas tornam-se conscientes. E continua Heller, "O 'Eu' tem fome, sente
dores (físicas ou psíquicas); no 'Eu' nascem os afetos e as paixões" (Ibidem:
20).
Como indivíduo, o homem é também um ser genérico, "já que é
produto e expressão de suas relações sociais, herdeiro e preservador do
desenvolvimento humano" (Ibidem.21).
Mas, "o representante do humano-genérico não é jamais um homem
sozinho, mas sempre integração", que, em sua parte consciente, forma a
'consciência de nós' (Ibidem).
Remetendo essa reflexão teórica para o estudo em questão, é possível
dizer que convém passar do particular, perceptível às mediações individuais,
para o humano-genérico, o "Nós", o professor reflexivo coletivo que visa,o
apenas refletir e alterar questões relativas ao interior da escola, como também
vislumbra alterar as condições sociais mais amplas em que ocorre a prática
escolar.
A fala da professora Sandra, a seguir, evidencia de forma mais clara a
questão:
O vídeo propiciou uma discussão muito legal e uma reflexão sobre a prática
da escola, das pessoas. Levou as pessoas a refletirem sobre a sua prática,
sobre o que está fazendo, o que que está contribuindo ouo para que a
escola seja da forma como ela é. (...) Na medida que você está vendo um
vídeo, em que está discutindo questões gerais, automaticamente a gente faz
relação com a nossa vivência, com a nossa prática. (...) No início é até sem
perceber, mas depois isso vai configurando de uma forma mais consciente.
Todas essas reflexões, à medida que reflete na sua prática, você consegue
perceber os seus erros e consequentemente você muda (Entrevista).
Inúmeras outras falas dos professores que participaram das sessões e
entrevistas mostram o potencial reflexivo que os vídeos da TV Escola podem
propiciar. Eis algumas delas:
No debate a gente teve oportunidade de manifestar os pensamentos, ouvir os
outros. Então, tudo isso é um crescimento (Lúcia, entrevista).
Tudo que é um bate papo assim, acho que enriquece muito. Achei que foi
muito interessante o trabalho desenvolvido por vocês. Achei que foi um
momento de liberdade da gente ouvir, falar, pensar certas coisas, ouvir
outras, que é mais interessante, a gente fica atento a ouvir o colega. Eu acho
que todo mundo ficou um pouquinho melhor (João, entrevista).
As dinâmicas das sessões de vídeo ajudam tanto. A gente percebeu o valor
que cada um tem dentro da escola (Gabriela, entrevista).
Primeiro eu escrevi o que eu estava pensando, mas depois com os debates,
com as conversa, com o vídeo, aí você tem mais idéias.o que aquelas
minhas estivessem erradas, no meu ponto de vista, não. Mas agora eu tenho
mais coisas a acrescentar. (...) Quando você tem esse tipo de discussão, você
tem idéias do coletivo, seu trabalho rende muito melhor. Porque é igual
quando você senta para planejar. Se você planeja sozinha, as idéiaso só
suas; se você planeja com o coletivo cada um vai dar uma idéia, então, você
já vai ter um crescimento (Lara, entrevista).
Aquele vídeo ques vimos me fez parar e pensar. Pensei para agir. Mudei
também, principalmente na segunda-feira. Às vezes, a gente chegava: Nossa
Senhora, eu tenho de dar conta desse conteúdo, eu tenho de entregar nota! E
já chegava lançando matéria. Agora, eu chego, sento e pergunto como foi o
final de semana., eles começam a falar. Quer dizer, eu perco entre aspas
uns dez, quinze minutos, na verdadeo perde ( Sueli, entrevista).
Esses cinco fragmentos demonstram a importância que os professores
dispensam aos encontros coletivos. O debate com o grupo de professores dá
conta de que os problemasoo só seus, existindo porém toda uma relação
do que ocorre na sala de aula, de como a escola está estruturada e de como a
forma de gestão do sistema educativo também interfere no cotidiano.
Vale destacar a preocupação de Zeichner ao sustentar que as reformas
m centrado a reflexão dos professores apenas em sua própria prática ou em
seus alunos, desconsiderando as condições sociais médias e amplas que
interferem no ensino. Assemelha-se à constatação de Gracindo (1997) de que
as reformas conservadoras valorizam excessivamente as questões pedagógico-
metodológicas, em detrimento das questões políticas mais amplas. E
justamente a assunção das questões políticas que garantirão o aspecto
transformador da proposta do professor reflexivo.
O professor Danilo sugere que
Seria ótimo se a escola promovesse outros encontros como esses, que tivesse
no calendário datas, períodos para o encontro. A gente entende que nesses
encontros, os professoresm oportunidade de colocar a realidade da sala de
aula, que muitas vezeso esquecidas,o vistas pelo diretor, pelo
coordenador, pelo secretário. Seria um momento oportuno para todo o corpo
do colégio discutir as nossas condições. Infelizmente, a genteo tem esse
espaço (Entrevista).
Idêntica é a opinião do professor Alencar, segundo o qual, os
professores sabem dos limites impostos pelas condições de trabalho e salariais
ao desejo de realizarem um trabalho melhor.
Como os salárioso baixos, as pessoas se submetem a cargas horárias
excessivas e chega certo ponto que as pessoaso estão nem conseguindo
raciocinar direito porque trabalha de manhã, trabalha à tarde e trabalha à
noite.om tempo nem para pensar. Se a pessoa tem um salário
compatível, elao vai se matar de trabalhar! (Entrevista)
Zeichner destaca as ilusões da reflexão impostas pelas reformas
educacionais, tais como a insistência no processo de reflexão do professor de
modo individual, desprezando as condições sociais do ensino, como o salário
dos professores.
Sobrecarregados de tarefas, acumulando dois ou três empregos, os
professores rejeitam estar na escola fora dos horários de aulas; no entanto, a
recusa em participar de reuniões podeo significar o descompromisso, mas a
impossibilidade concreta de refletir sua prática docente e a organização da
escola.
Diante do exposto, considero pertinente dizer que o estudo das
mediações na recepção dos programas da TV Escola pelos professores deve
ser levado em conta no estabelecimento de políticas públicas de formação de
professores. O conhecimento desses aspectos, especialmente em um momento
de grande valorização da educação a distância, possibilita o estabelecimento
de estratégias e de operacionalização de programas que valorizem aspectos
que desprezados em outros projetos, podem ser fundamentais, se implantados
com amplo sucesso.
1. Professor reflexivo e as mediações
Inúmeros elementos caracterizam a proposta zeicheneriana de professor
reflexivo. Em síntese, o professor reflexivo é aquele que se reconhece como
criador de cultura e conhecimento e tem a pesquisa como atitude cotidiana de
questionar permanentemente a realidade. Compreende, portanto, que o saber é
histórico, inconcluso.
O professor reflexivoo é apenas aquele que reflete, atitude essa que é
própria do ser humano, mas alguém que sabe reconstruir, com base na prática,
os conhecimentos, colocando-os a serviço da cidadania.o separa a teoria da
prática. O professor reflexivo sabe e quer mudar, teoriza e intervém, sabendo
levar em conta as condições sociais e políticas do local em que o ensino é
realizado.
Compreende o ensino como uma atividade incerta, instável. Cada turma
é única, cada aluno é singular.o, portanto, receitas. Vê o aluno como
reelaborador de conhecimentos e o professor com a responsabilidade
intelectual e profissional de orientar os alunos, com mentalidade aberta e
entusiasmo. Conversa com seus pares, troca idéias, ouve opiniões, admite a
possibilidade do erro,o se deixa levar pelo que é considerado normal.
Sente-se responsável pela sua formação e enfrenta as dificuldades com
energia, exercitando suas tarefas profissionais com dedicação.
Os vídeos da TV Escola possibilitam formar esse professor? Sem uma
outra forma de gestão e organização do sistema e da escola, haverá a
possibilidade da TV Escola colaborar na formação de professores reflexivos?
Os inúmeros exemplos citados nos itens anterioreso mostra da
importância das discussões coletivas para os professores e o ato de relacionar
teoria e prática representa uma grande dificuldade.
o esses dois elementos do professor reflexivo que selecionei para
análise e relacionamento com as mediações identificadas na análise dos dados
das sessões de vídeo.
2. Unidade entre teoria e prática
A relação teoria/prática é o nó górdio da formação profissional de
diferentes profissões. Na formação de professoreso poderia ser diferente.
Empreender a unidade entre esses dois momentos torna-se a grande
dificuldade nos cursos formadores de professores.
Qual é mais importante, a teoria ou a prática? Qual deve vir antes? O
que significa aliar teoria e prática? O que é a prática na tarefa docente? É só
ministrar aulas?
Perrenoud (1993: 200) explica todas essas dúvidas:
Pensar a práticao é somente pensar a ação pedagógica na sala de aula nem
mesmo a colaboração didática com os colegas. É pensar a profissão, a
carreira, as relações de trabalho e de poder nas organizações escolares, a
parte de autonomia e de responsabilidade conferida aos professores,
individual ou coletivamente.
Entretanto, pretendo analisar mais a fundo a relação teoria/prática,
utilizando reflexões ancoradas em Adolfo Sánchez Vázquez (1986: 209-243).
A teoria, por si, segundo o autor,o é prática,o realiza,o
produz mudança real. Para produzir mudanças é preciso atuar praticamente.
A prática representa fundamento, finalidade e critério do conhecimento
verdadeiro. Essa afirmação merece ser melhor detalhada, como faz o autor.
O produto da consciência, isto é, a teoria, deve materializar-se para que
a transformação idealizada penetre no próprio fato. A atividade teórica apenas
transforma nossa consciência dos fatos, maso empreende mudanças reais, o
queo significa dar prioridade à prática. Apenas para a consciência comum,
ordinária, a prática é a prioridade. O ponto de vista do senso comum é a
prática, sem teoria ou com um mínimo dela. Exemplo disso é o pragmatismo
que considera verdadeiro o que é útil, reduzindo o teórico ao útil.
O conhecimento, inversamente ao pragmatismo, é útil uma vez que é
verdadeiro e, com base nele, o homem pode transformar a realidade. Para o
marxismo, a utilidade é conseqüência da verdade.
O critério da verdade está na prática, mas entendida como ação material,
objetiva, transformadora que corresponde a interesses sociais sendo, portanto,
social. As necessidades práticas dos homens produzem o desenvolvimento do
conhecimento teórico, das formas mais elaboradas de atividades científicas.
Segundo Vázquez (Ibidem:232),
A teoria, porém,o corresponde apenas às exigências e necessidades de
uma prática já existente. Se fosse assimo poderia adiantar-se a ela e,
portanto, influir - inclusive decisivamente - em seu desenvolvimento.
Seo pudesse adiantar-se em relação à prática, a teoriao poderia
influir em seu desenvolvimento. A teoria é capaz de elaborar o que aindao
existe na prática, ou o que existe apenas de forma embrionária.
Nesse caso, a teoria é determinada por algo queo existe ou só existe
de modo ideal. É determinada por meio da finalidade, da antecipação. Como
finalidade da teoria, a prática (como antecipação ideal da prática) só será
efetivada com o concurso da teoria. É o que sublinha Vázquez:
A prática como objetivo da teoria exige um correlacionamento consciente
com ela, ou uma consciência da necessidade da prática que deve ser
satisfeita com a ajuda da teoria. Por outro lado, a transformação desta em
instrumento teórico da praxis exige uma alta consciência dos laços que unem
mutuamente a teoria e a prática, sem o queo se poderia entender o
significado prático da primeira (Ibidem: 232)
O entendimento da prática, como fonte e finalidade da teoria, realiza-se
mediante um processo complexo, cuja relaçãoo pode ser entendida de
maneira simplista ou mecânica, uma vez queo é direta nem imediata.
Somente a compreensão da prática, como atividade objetiva e
transformadora da realidade natural e social, pode formular a questão da
unidade,o identidade, entre teoria e prática.
A compreensão da prática implica em conhecimento da realidade que
transforma e das necessidades que satisfaz. Sem a compreensão, a
racionalidade da prática permanece oculta. A teoria fornece entendimento,
interpretação e compreensão à prática.
A práticao fala por si mesma. Ela exige relação com a teoria para
chegar a ser práxis. A teoria fica aberta e disponível ao mundo da prática, uma
vez queo pode transformar em nada real; a teoriao é práxis.
A unidade entre teoria e prática faz com que ambas estejam em
oposição, possuam autonomia relativa e sejam interdependentes. Entretanto, o
lugar da unidade é a prática. Como pressuposto da unidade entre teoria e
prática, a dependência entre elas vai possibilitar a transformação prática do
mundo, que depende de elementos teóricos.
A práxis é uma atividade teórico-prática,
ou seja, tem um lado ideal, teórico, e um lado material, propriamente prático,
com a particularidade de que só artificialmente, por um processo de
abstração, podemos separar, isolar um do outro (...) A atividade do sujeito
prático se nos apresenta nessa dupla vertente: por um lado, é subjetiva
enquanto atividade de sua consciência, mas, num sentido mais restrito, é um
processo objetivo na medida em que os atos ou operações que executa sobre
uma determinada matéria existente independente de sua consciência, de seus
atos psíquicos, podem ser comprovados inclusive por outros sujeitos
(Ibidem: 241).
A atividade prática de um sujeito é simultaneamente ideal e material,
subjetiva e objetiva, dependente e independente de sua consciência. A
consciênciao pode se retirar do processo prático e sim, tem de estar alerta
às exigências imprevistas do processo objetivo de realização, impondo o
projeto original ou modificando-o para que seja realizado.
A manutenção da consciência sempre ativa ao longo do processo prático
vai permitir o vai-e-vem de um plano a outro. A atividade práticao se
separa dos fins traçados pela consciência. Os fins obtidos pela atividade
práticaoo produtos, mas um processo que conclui apenas quando o
resultado ideal, depois de sofrer alterações do processo prático, for um
produto real.
Como foi descrito e analisado no capítulo V, a presença de elementos
do professor reflexivo nos vídeos usados na intervenção propicia a dimensão
da relação teoria/prática. A freqüente problematização e as questões dirigidas
aos professores instigam-nos a relacionar o que vêem com sua prática concreta
em sala de aula. Inúmeras falas dos professores atestam isso:
Lembrei-me dos meus 23 anos de magistério. De toda uma vida na sala de
aula, aprendendo com as crianças (profº Tiririca, questionário).
Os vídeos que vimos me faz lembrar da escola em que trabalhamos e assim,
associo o que vimos com o que vivemos (profº Sandra, questionário).
Quando vi o vídeo pensei na inter-relação professor/aluno. Da presença do
professor na vida escolar do aluno, participando, ajudando, conversando,
brincando com ele. Com isso, percebo que devemos mudar, tirar a máscara
do professor certinho, do sabe tudo e nos voltarmos para a socialização da
criança (A Pensadora, questionário).
Os relatos dos professores e profissionais dos vídeos usados na
intervenção, da mesma forma, levam os professores que os assistem a
relacionar o que está sendo dito com sua vivência profissional. A mediação
individual implica exatamente nessa dimensão.
Todavia, em vista do exposto, a potencialidade dos vídeos da TV Escola
de levar o professor a relacionar teoria e prática é proporcional às condições
criadas pela escola e seus agentes para a discussão coletiva.
Como assinala Vázquez, a teoria, o produto da consciência, deve
materializar-se no fato a fim de empreender mudanças. O fato do professor
assistir aos programas, discutir seu conteúdo, envolver-se com eleso basta
para mudar a sua prática. Embora o presente estudoo tenha por objetivo
verificar se isso ocorre, e como ocorre, é possível inferir, pelos dados colhidos
e análises feitas, que há um potencial para isso nos vídeos. Potencial que fica
na dependência de um agente escolar estimulador da reflexão, que poderia ser
o próprio coordenador pedagógico da escola. Há quem diga que é tarefa para
um novo profissional. Para Soares (1995:21), é tarefa para o "gestor de
processos comunicacionais no espaço educativo" na área das unidades
educativas. Conforme o autor, o gestor seria um profissional da comunicação.
Em publicação mais recente, Soares (1999:41) observa que a gestão
educomunicativa dos espaços educativos, dentre eles a escola, seria feita por
um "educomunicador",
244
o facilitador que aplica intencionalidade educativa ao uso dos processos,
recursos e tecnologias da informação a partir da perspectiva de uma gestão
participativa e democrática da comunicação. Isto inclui tanto o
desenvolvimento e o emprego das tecnologias para otimização das práticas
educativas, quanto a capacitação dos educandos para o seu manejo, assim
como a recepção organizada, ativa e crítica das mensagens massivas.
Acredito que seja tarefa para um professor, um profissional que conheça
o campo da educação, com capacidade para conduzir a discussão,
independente dos diferentes campos do saber, debater questões ligadas à
educação, ao ensino, à aprendizagem. Se o professor da EAD é do tipo
coletivo (instituição e elaboradores dos materiais), o tutor, que orienta os
alunos, deve ser o professor individual conhecedor da educação como campo
de saber.
Imaginar que apenas a presença do kit tecnológico e os vídeos podem
mudar a prática docente é um equívoco enorme, uma vez que isso é
pragmatismo, e o pragmatismo nega a teoria, reduzindo-a ao útil.
Watson (apud Martin, 1998) alerta que a formação de professores
necessária ao mundo das tecnologias refere-se a um dos mais importantes
desafios educativos. Conforme o mesmo autor, comete-se o equívoco de se
preocupar unicamente em que os alunos tenham acesso às Novas Tecnologias
da Comunicação "quando o acerto deveria colocar-se na formação e
preparação do professor" (p.24).
Pensar o Projeto TV Escola, levando em conta as teorias dos campos da
educação e da comunicação, que lhe darão suporte, é contribuir para repensar
o Projeto TV Escola como principal projeto do governo brasileiro para a
formação de professores.
A teoria das mediações dos programas da TV Escola indicam que
elementos do professor reflexivo estão ocultos.
A essência da relação teoria/prática, conforme Alarcão (1996), ocorre
nas relações que se estabelecem entre os saberes prévios de que se dispõe para
compreender e agir sobre uma situação nova. Desta forma, os relatos dos
professores, tanto durante as sessões como nas entrevistas, de que as
mensagens dos vídeos os levaram a fazer relações com situações próprias de
sua vida profissional, chegando mesmo a debater sobre elas nas sessões,
permite dizer que, nos moldes em que foi realizada, a TV Escola estaria
contribuindo na formação de um professor reflexivo zeicheneriano. Desde
que, insisto, se ofereçam as condições necessárias ao debate coletivo, bem
como a administração, que deve ser democrática, assegure o cumprimento de
decisões tomadas pelos professores.
Ocorre, porém, como alertam Carr e Kernmis, que pouco valem as
práticas individuais. A pesquisa-ação, desenvolvida em um processo de
mudança social, coletivo e político, orienta a concepção de professor
reflexivo. E preciso conhecer os fatores estruturais que condicionam a prática,
em especial os políticos e sociais, eo apenas os pedagógicos.
Analisando os resultados de pesquisas sobre formação de professores,
Carlos Marcelo Garcia (1998: 56) assinala que a prática dos professores é
"muito influenciada pela vida, a escola e as experiências anteriores ao
ingresso em um programa de formação de professores". Enfatiza que a
mudança das crenças e concepções se faz mediante o processo de reflexão, o
que fortalece a importância de que, para alcançar algum sucesso, o Programa
TV Escola necessita de um tutor eficaz, tanto da EAD
59
, como o coordenador
pedagógico existente na maioria das escolas de educação básica.
Garcia considera os tutores como pessoas de especial importância para
o êxito dos programas de formação de professores, os quais como os
professores, possuem necessidades formativas especiais.
Somente com base na compreensão racional da prática, de seus
condicionantes, pode-se converter a práticao reflexiva e acrítica em práxis.
Consciente crítico das possibilidades de sua ação, e da realidade que o cerca, o
58
O texto da Revista Brasileira de Educação da ANPED, refere-se ao nome do autor como Carlos Marcelo,
sem o último sobrenome. Garcia. Para evitar confusão ou a fim de queo se pense queo diferentes
autores, mantive o sobrenome Garcia.
59
Na educação a distância, o professor tutor "orienta o aluno em seus estudos relativos à disciplina pela qual
é responsável, esclarece dúvidas e explica questões relativas aos conteúdos da disciplina; em geral participa
das atividades de avaliação" (Belloni, 1999:83).
professor terá maiores condições de encarar os problemas e dar-lhes
respostas. Se a escola e o sistemao oferecerem condições para resolver os
problemas, provavelmente, os professores terão conhecimento disso eo se
reconhecerão como culpados pelos fracassos escolares. Em contrapartida,
saberão reconhecer os problemas, cujas soluções estarão ao seu alcance e
poderão, concreta e conscientemente, apresentar-lhes respostas.
Todo processo de conhecimento é, segundo Faundez (1993:61), ao
mesmo tempo, teórico e prático.
Isto se faz através de um processo teórico e prático no qual o abstrato
clarifica o concreto e inversamente, permitindo então descobrir a realidade -
teórico-prática - e transformá-la. Tal trajetória deveria ser feita através do
diálogo, mas de um diálogo real, no qual deveriam tomar parte todos os
participantes que terão de se doar verdadeiramente no processo de criação do
conhecimento, de uma forma crítica e audaciosa.
Na prática pedagógica e cultural precisa-se passar da doxa à episteme, da
opinião à compreensão. Essa passagem faz-se mediante o diálogo, que é
fundamental na formação e vivência de um professor reflexivo.
Os vídeos da TV Escola podem propiciar a reflexão, o debate coletivo, a
relação teoria-prática. Todavia, esses elementosoo inerentes ao projeto
em questão. Inúmeros outros fatores exercem influências consideráveis e
devem ser levados em conta, como a gestão democrática e participativa, a
autonomia escolar, a existência de momentos coletivos de discussão, e de um
coordenador dos fóruns de discussão.
O Projeto TV Escola tem esse potencial, porém, issoo significa que
traz a ação em si mesmo. Potênciao é ato.
CONCLUINDO com o não-argumento de Hollywood
60
The end/Fim
The End... Happy end! Final feliz! Este é o desfecho das produções
cinematográficas hollywoodianas.
O bandido regenera-se ou vai para a cadeia. O bem vence o mal. A
mocinha casa com o mocinho, os heróiso consagrados, a população
aplaude, os problemaso solucionados e todos sorriem, felizes.
Será que o projeto TV Escola destinado à formação de professores
encaminha-se para um final feliz? O presente estudo prova o contrário, pois
ocorre mais o não-argumento de Hollywood. Há mais a lamentar do que a
festejar, - elementos dissolveram-se porqueo foram valorizados; no
entanto, existem possibilidades para que os programas se tornem visíveis,
ainda que requeiram uma série de condições.
Aliás,o se pode falar em final. Este trabalho fez uma pausa,
necessária pelas exigências da academia. Porém, o tempo urge e as escolas
continuam com sua dinamicidade peculiar. A TV Escola continua veiculando
novos programas, a política educacional divulga novas normas, os professores
continuam ensinando e resistindo como podem. Diretores persistem em adotar
60
Este título foi inspirado no que Connely e Clandinin (1995:45) consideram um perigo nas etnografias
críticas e investigações narrativas. Segundo eles, os pesquisadores, nesses estudos, tendem a "destilar gotas de
mel", exercendo censura aos "secretos narrativos", isto é, aos relatoso contados. Enfim, fechando os olhos
Gráfico 1 - Interrelações entre os elementos do estudo
Fonte: Gráfico elaborado pela autora do estudo
Em cada vértice, encontra-se um dos aspectos da análise : a educação a
distância (EAD), a gestão e a recepção. Em cada um, abordo, respectivamente,
a interatividade e a questão do tempo e do espaço, já a democracia e a
autonomiao temas da gestão da escola e a recepção será analisada como
processo coletivo, resultado de múltiplas mediações. Cada um desses aspectos
foi tratado no corpo do trabalho.
Será possível fazer mudanças? Acredito que sim, porém, numerosos
estudos (Arroyo, 1996; Andaló, 1995; Loureiro et alii, 1999) e experiências
e ouvidos, para o queo é conveniente ver e ouvir, usando o argumento de Hollywood, em que a trama
sempre acaba bem, o que ocorre, muitas vezes, nas avaliações e implantações de programas.
o modelo tradicional de gestão. Professores de algumas universidades ou
faculdades continuam a busca de formar um professor diferente, especial.
Procurarei fazer a análise final com base em um gráfico triangular, em
que o professoro ocupa o "lugar do morto", como no jogo de bridge
descrito por Nóvoa (1995c: 10), mas o centro, articulando-se com todos os
vértices, ângulos e linhas. Podemos representá-lo assim:
(INEP, 1995; IPEA, 1995) demonstram que as mudanças, para se tornarem
efetivas, devem iniciar, com os professores, isto é, com quem trabalha
efetivamente nas escolas. Como se diz popularmente, "de baixo para cima".
Tomás Tadeu da Silva (1996: 181) também defende a teoria, sustentando:
Nenhuma reforma feita a partir de cima, de forma hierárquica e autoritária e
queo envolva de forma genuína eo apenas retórica a participação de
professores/as (e pais, mães, alunos/as) tem qualquer chance de êxito. A
participação dos professores muda o conteúdo e a substância da reforma.
Giroux (1997:27) alerta, contudo, que é preciso ser, ao mesmo tempo
cético e otimista para empreender a mudança. Diz ele:
Para que a pedagogia radical se torne um projeto político viável, ela precisa
desenvolver um discurso que combine a linguagem da análise crítica com a
linguagem da possibilidade.
Lima (1994:41) também observa que "a escola constitui um
empreendimento humano, uma organização histórica, política e culturalmente
mediada", o que exige, em primeiro lugar, entender as escolas,o apenas
como locais de ensino, de aprendizagem, de formação de professores, mas
também, segundo afirma Giroux, como "locaispolíticos e culturais".
Vê-se que os professores, em seu próprio local de trabalho, fazendo um
trabalho especializado,o participam de decisões mais amplas no interior das
escolas. Parece-me que nem vislumbram a possibilidade de participação nas
decisões gerais da escola, ouo querem participar. Muitas vezes, é mais fácil
deixar como está, com a direção assumindo todas as responsabilidades, ainda
mais com os professores super-acumulados de trabalho, preferindo assim,o
participar de reuniões, organizar eventos, conversar com os pais, etc, o que
poderia significar aumento na carga de trabalho.
Em relação ao "mal-estar docente"
61
que assola os professores,
ocasionado pelas mudanças sociais e do sistema escolar, Esteve (1995) anota
que a preparação prática dos professores para enfrentar esses problemas faz-se
dentro dos cursos iniciais de formação. É necessário, também, que os cursos
formadores de professores incorporem problemáticas políticas, de gestão da
escola, na perspectiva de compreender a ação docente como um ato que vai
além da sala de aula.
Fica nítida, nas sessões de vídeo, a preocupação dos docentes com a
situação atual de sua profissão e desigualdades entre as escolas. Como salienta
Zeichner,
é necessário alargar o âmbito do praticum, de forma que as escolas e as
comunidadeso sejam apenas espaços de prática docente, mas integrem
outros aspectos além da sala de aula" (1992:128),
Como também
é necessário incentivar o aparecimento de ambientes escolares mais
democráticos (Ibidem: 12).
Schõn (1992:87) observa que "o desenvolvimento da prática reflexiva
eficaz tem que integrar o contexto institucional. O professor tem de se tornar
um navegador atento à burocracia". Diz ainda que, quando professores e
gestores trabalham em conjunto, a própria escola torna-se em um practicum
reflexivo para os professores.
61
Conforme o autor, os fatores que produzem essa mudança são: aumento das exigências em relação ao
professor, inibição educativa de outros agentes de socialização, desenvolvimento de fontes de informação
alternativas à escola, ruptura do consenso social sobre educação, aumento das contradições no exercício da
docência, mudança de expectativa em relação ao sistema educativo. Aponta ainda os seguintes fatores:
modificação do apoio da sociedade ao sistema educativo, menor valorização social do professor, mudança dos
conteúdos curriculares, escassez de recursos materiais e deficientes condições de trabalho, mudanças nas
relações professor-aluno e fragmentação do trabalho do professor.
O desenvolvimento profissional dos professoreso se faz apenas em
cursos iniciais de formação; começa antes deles e prolongam-se
posteriormente. Garcia (1998: 56), analisando experiências sobre formação de
professores, constata que "os professores em formação possuem crenças e
imagens anteriores que os acompanham ao longo de sua formação" e cita
estudos de Cole e Knowles {apud Garcia, 1998:56) que reconhecem como
amplamente aceito que a formação formal de professores exerce influência
importante mas secundária sobre o pensamento e a prática de professores;
sendo esta última muito influenciada pela vida, a escola e as experiências
anteriores ao ingresso em um programa de formação de professores.
o se pode perder de vista, como esclarece Cunha (1998:59),
que a mudança do professor é fruto de um processo e que, mesmo havendo
uma dimensão desencadeadora, ela acontece como resultado de múltiplos
fatores. Então, assim como a reorganização da prática e o grupo de discussão
o elementos importantes,o se pode deixar de levar em conta as leituras
que o professor faz e a influência de outras forças sociais no seu
comportamento".
Contempla-se, segundo Garcia, a necessidade de alterar as crenças e
concepções por meio da reflexão. Nesse sentido, a escola, como instituição,
poderia participar, contribuindo, mediante uma epistemologia da escola que
possibilite distâncias menores entre os saberes dos alunos, dos professores e as
concepções dos gestores.
Constata-se, com isso, que o desenvolvimento profissional dos
professores é evolutivo, ocorre em continuidade, de forma a superar uma falsa
justaposição da formação inicial e aperfeiçoamento contínuo.
Estabelecendo considerações éticas sobre a reflexão de professores,
Garcia (1992) observa que, além das preocupações metodológicas, didáticas
da ação docente, é imprescindível a análise política da própria prática, bem
como de suas repercussões para o desenvolvimento da consciência crítica dos
professores, das possibilidades de sua ação e de suas limitações sociais,
culturais e ideológicas, além das limitações do próprio sistema, de quem os
professores esperam muito, usando-o para justificar muitas de suas omissões.
O Programa TV Escola, com um novo desenho que atendesse às
necessidades de gestão democrática e de um professor individual que
coordene os fóruns de discussões dos professores, pode auxiliar o
desenvolvimento das destrezas apontadas por Garcia (empíricas, analíticas,
avaliativas, práticas e de comunicação), como também colaborar para a
formação de atitudes reflexivas relativas ao ensino, citadas por Dewey (apud
Garcia, 1992:62) como a mentalidade aberta, a responsabilidade e o
entusiasmo.
Em uma situação em que os professores podem falar, narrar situações
de aula, da escola, da vida, da sua profissão, discutir com os pares, existe a
possibilidade de se tornarem visíveis a si próprios.
De acordo com a racionalidade técnica, os professores podem agir sem
levar em conta o que fazem e como fazem. Agem conforme a determinação
superior e os especialistas definem. A racionalidade prático-reflexiva implica
em que o professor se torne sujeito de sua própria prática, ou seja, ele próprio
capaz de analisar suas atitudes. Para isso, ele precisa enxergar-se a si próprio,
a fim de se perceber como professor.
Todavia, a prática reflexivao ocorre sem a oportunidade de encontro
com o outro a quem se ouve e a quem se fala: seus pares. Reuniões de
professores, coordenador de discussões e vídeos da TV Escola significam
ingredientes propiciadores do encontro consigo mesmo e com os outros. Os
programas da TV Escolao suscitadores de reflexão, porém, os vídeos, por si
,o promovem reflexão.
Vídeos da TV Escola favorecem reflexão em situação coletiva, se
mediatizados por um professor individual, tutor, supervisor, ou coordenador,
qualquer que seja o nome que se dê ao profissional com formação docente,
cujo propósito seja promover o debate de idéias e ações pedagógicas
importantes para professores e alunos.
A escola organiza-se, em geral, com relações autoritárias e cumpridoras
de normas superiores do sistema. A autonomia de gestão da escola é
fundamental para garantir o envolvimento, comprometimento e
responsabilização de todos os agentes escolares. Poder escolher o calendário,
definir e organizar questões pedagógicas internas significa o mínimo que a
autonomia de gestão da escola deve possuir.
A gestão escolar, a forma de organização da escola, representa a
estrutura de apoio ao ato prático-reflexivo dos professores, cujo caráter
coletivo propiciador tem mais chances de ocorrer em ambientes cooperativos,
isto é, não-coercitivos.
E preciso, como destaca Nóvoa (1995b:41),
criar condições organizacionais nas escolas para que a inovação aconteça,
para que as experiências pedagógicaso sejam sistematicamente destruídas
com argumentos burocráticos, para que os profissionais do ensino se sintam
motivados e gratificados por participarem em dinâmicas de mudança.
Para compreender o motivo por que as coordenadoras e diretoraso
incentivam o uso de vídeos da TV Escola, há de se salientar o seu próprio
desconhecimento do projeto. As coordenadoras creditam à falta de tempo para
assistir aos programas, à dificuldade de gravar os programas, o fato deo
incentivarem os professores ao uso dos vídeos. Disseram, nas conversas, que
tiveram de gravar os vídeos em casa, ou é o namorado da filha que faz a
gravação; outra disse que os filhos gravam, mas pararam de gravar
reclamando queo podiam ver outros canais. Dizem ainda: "sei muito pouco
da TV Escola. Tenho alguns vídeos da minha área e não tenho tempo de ficar
assistindo". É possível perceber que estão preocupadas, mas sentem-se
impotentes para resolver a questão. Eis o que diz a coordenadora Luiza:
o sei como que a gente vai fazer esse professor utilizar a TV Escola. Eu
sei queo riquíssimos (os programas), a gente deveria estar usando, e te
falo outro problema. Até o deslocamento dos meninos para assistirem quinze
minutos e voltar para a sala. Vai ser um trabalho difícil e eu acho que a
Secretaria, as coordenadoras da Delegacia,s vamos ter que fazer curso,
s vamos ter estar vendo como ele vai chegar na escola pública (Luiza,
entrevista).
A professora sabe que há o kit na escola, mas o programao "chegou",
ouo foi absorvido pela escola pública.
A coordenadora, após eu ter dito que o TV Escola foi feito para a escola
pública, retrucou:
Mas ele é mais usado na escola particular,o é? Eu acho que é, porque os
meus meninoso da escola particular e eles usam. Na Delegacia
Metropolitana tem a mulher que fica lá só para a TV Escola. Eu acho que
aquela pessoa tinha que estar em cada escola. Euo acho que ela tinha que
estar na Delegacia. Eu acho que ela tinha que estar em cada escola e
repassando dentro da escola. Ela está muito distante, coitada, da realidade.
Porque daí você imagina, além dela estar, o professor ainda teria de ir,
pegar a fita, copiar a fita para trazer para a escola. Isso já passou quantos
dias? Duas semanas (Ibidem).
A diretora de uma das escolas reclama que falta pessoal para gravar os
programas, uma vez que nem todos sabem manusear o videocassete,
confirmando o receio dos professores: "Porque vem um mexe, vem outro e
mexe e acaba estragando. Se ficar uma pessoa para cuidar daquilo ali,
ficaria mais fácil, para os três turnos" e faz uma revelação assustadora:
tem um rapaz no departamento de TV Escola que grava as fitas. Para muitas
escolas é ele que grava.. Eu pedi pra ele gravar pras porque teve a nossa
coordenadora que estava gravandoo tinha mais tempo para cuidar disso
daí. Aí eu falei pra ele: você grava e quando chegar verba do FNDE, a gente
vai pagar isso daí para você. Ele ia gravando para a gente e a gente ia
pegando. Agora, esse ano, eu tinha até combinado com ele para gravar para
mim, mas agora eu vou ver se consigo, porques conseguimos uma
bibliotecária para a tarde, eu vou ver se ela grava para nós, ao invés dele
gravar e a gente ter de comprar, a gente compra só as fitas. Aliás, essa fitas
deveriam ser oferecidas paras (Entrevista, grifo meu).
As dificuldades das escolas promovem desvio de recursos para quem
deveria estar colaborando com elas, uma vez que exerce cargo em
departamento da Secretaria de Educação para ajudar as escolas.
O programa desconsidera, conforme Draibe e Perez (1999:47), as
diferentes capacidades administrativas e de gestão dos estados e municípios e
das escolas.
A radical descentralização levou a uma inserção muito frágil do programa
nas redes, já queo houve previamente acertos e articulações bem
estabelecidas com as secretarias estaduais e municipais de educação, de tal
modo que seus papéis e funções, na TV Escola, estivessem bem definidos.
Ora, a conseqüência foi que as escolas, na rotina de implementação do
programa, careceram de sistemas de apoio para a utilização de
equipamentos, ou de recursos financeiros para sua manutenção ou, ainda, de
recursos humanos para operacionizá-lo.
Essa alegação pode explicar o motivo das dificuldades dos
departamentos de TV Escola e das secretarias em se articularem com as
escolas.
Mesmo mantendo contato apenas com as escolas, desconsiderou-se que a
escola faz parte de um sistema organizacional com hierarquias e rotinas. "O
programa parece solto, ninguém é responsável por ele", diz Draibe
(lbidem-Al).
Há ainda outros aspectos que podem ser destacados, como o fato de que
as coordenadoraso conseguem fazer a transposição didática " (Forquin,
1993:16), isto é, didatizar, transformar o programa em recurso a ser usado
pelos professores, ligá-los ao currículo escolar, uma vez que tambémo
professores de campos específicos do saber eo dominam todas as áreas do
conhecimento. Aliás, essa é outra competência requerida ao professor prático-
reflexivo: saber fazer a transposição didática dos saberes que ensina. Se o
professor é pesquisador de sua própria prática, deixa de ser professor
reprodutor, podendo selecionar novos saberes e didatizá-los para comunicá-los
aos alunos. Documento oficial do MEC/SEF, ao propor a formação de um
professor prático-reflexivo, assinala a importância do professor realizar a
transposição didática dos conteúdos. Diz o documento:
A necessidade de comunicar o conhecimento implica modificá-lo: é
inevitável, por exemplo, selecionar, priorizar e tematizar determinados
aspectos eo outros; "recortar" o objeto de conhecimento definindo
conteúdos e seqüenciando-os em função do tempo e dos objetivos de
ensino; organizá-los segundo critérios metodológicos ou temáticos. E esse
processo que tem sido chamado de transposição didática.
A consciência do professor a respeito das implicações da transposição
didática deve levá-lo a uma preocupação em modificar sem descaracterizá-
los, para que a versão social e a versão escolar dos saberes e práticas
comunicadas na escola sejam o mais coincidentes possível
(Brasil/MEC/SEF, 1997:64).
6
Conforme Forquin (1993:16), "a educação escolar não se limita a fazer uma seleção entre os saberes e os
materiais culturais disponíveis num dado momento, ela deve também para torná-los efetivamente
transmissíveis, efetivamente assimiláveis às jovens gerações, entregar-se a um imenso trabalho de
reorganização, de reestruturação, ou de 'transposição didática'".
Quer dizer, a competência de fazer a transposição didática é dos
professores. Essa competênciao foi exigida do professor na modalidade da
racionalidade técnica, tarefa específica dos especialistas ou, no caso dos livros
didáticos, instrumentos mais usados pelos professores, de seus autores e das
editoras. Defendo que os professores devem também possuir essa
competência, mas elao será conseguida de forma mágica, sem oportunidade
de formação, de encontros com seus pares, sem discussões de problemas reais
em salas de aulas.
Na relação teoria-prática, o novo conhecimento acontece com base na
reflexão e discussão de problemas concretos que os professores vivenciam e
trazem para debate nos grupos de discussão, o que, no entanto,o é
propiciado pelo projeto original do Programa TV Escola, que, por sua vez,o
atende as necessidades dos professores. Os mestres rejeitam o projeto,o
usam seus vídeos e, quando o usam, é muito raramente .
Além disso, as coordenadoras pedagógicas pautam suas ações sobre
uso de vídeos apenas como controle de quem retirou ouo fitas, quantos dias
ficou com elas, se usou ou não, em qual aula, sem, com isso, chegar ao ponto
central do uso do recurso. Exemplifico com a resposta de uma das
coordenadoras pedagógicas sobre a questão do estímulo aos professores de
usarem os vídeos da TV Escola:
s sempre falamos, colocamos ao inteiro dispor, então as pessoas
usam de acordo com o que elas querem. Existe professor que gosta de usar e
existe aqueles queo usam, parece queo estão habituados. Eles falam
queo tem jeito de usar, a coordenadorao é!o desculpas. Porque a
senhora pode olhar aqui, os armários estão com as fitas, o caderno está aqui,
quem quiser usar a sala é só marcar o dia, vem cá pega a chave e a fita e usa.
o tem obstáculo nenhum para eles usarem. Agora, depende do
63
Uma das escolas pesquisadas tem acervo de mais de cinqüenta fitas da TV Escola; no entanto, durante um
ano, apenas dez fitas da TV Escola foram requisitadas pelo professores.
planejamento do professor. Às vezes, ele esquece,o dá tempo, deixa para
outro dia e ele vai enrolando eo usa por isso" (Entrevista).
o se observou a prática do uso dos programas em reuniões
pedagógicas.
Na escola de menor porte, em que a coordenadora mantinha uma
relação mais amistosa com os professores, logo que iniciei o trabalho, em
reuniões anteriores, a coordenadora e as professoras fizeram referência ao uso
de um filme sobre a vida de um professor. Para ver o filme, tiveram de se
deslocar à casa da coordenadora, que é perto da escola, uma vez que os
videocassetes da escola estavam quebrados. Nem terminaram de ver o
programa, pois o tempo foi insuficiente. A coordenadora optou, então, por
usar outros materiais em suas reuniões, como textos impressos, para orientar
as discussões nos encontros com os professores.
As coordenadoras demonstram posturas distintas, mas mesmo assim,
sua presença é fundamental nesse tipo de formação a distância dos professores
no interior das escolas; pelo que se observou, existe também a necessidade de
formação para essas profissionais, especialmente, porqueo co-responsáveis
pelo TV Escola.
E importante que o professor individual do TV Escola, que poderia ser o
coordenador pedagógico das escolas, conduza os professores à indagação
reflexiva, analisando causas e conseqüências da conduta docente, com o fim
de superar os limites didáticos, sociais, culturais da aula e da postura do
professor diante da instituição escola, e, igualmente, a necessidade de
formação de modo contínuo.
A TV Escola, acompanhada de sessões coletivas e coordenadas por um
professor individual, estimula o debate, a análise coletiva de situações
pedagógicas. Por meio de seus programas, assistidos e comentados em grupos
de discussão, pode-se desenvolver as habilidades intelectuais de compreensão
e aceitação de idéias diferentes, reinterpretando fatos. Pode estar
proporcionando a valorização do pensamento divergente, porque ele coloca
em dúvida as verdades e promove a criatividade. Possibilita, ainda, a
abordagem interdisicplinar dos temas apresentados. A aprendizagem que parte
da dúvida socialmente construída, diz Cunha (1998:14), "é sempre
interdisciplinar, porque a realidade assim se apresenta ". Enfim, proporciona
a construção coletiva, histórica, do conhecimento.
A questão das mídias, em especial a TV, encontra-se muito presente na
vida social e nas escolas e a reunião na Escola Lázaro Rodrigues indica isso.
A escola fez uma rifa e comprou uma fotocopiadora e os professores deram a
ela o nome de Luzineide (personagem da telenovela das oito horas à época -
empregada doméstica queo falava nunca). Ao comentarem sobre um aluno
que estava faltando às aulas, uma professora explicou: "Ele não vem à escola
porque os colegas o chamam de Jamanta " (nome de personagem bobinho da
novela das oito horas). Ou ainda a professora que, ao se referir a uma aluna
diz: "é a própria Magda!" (personagem pouco inteligente do programa
humorístico "Sai de Baixo").
Quer dizer, as mídias já estão no cotidiano das escolas, porém é preciso
assumi-las racionalmente e discuti-las no interior da escola e da sala de aula.
Segundo Zeichner, a concepção de professor reflexivo, presente nas
reformas, despreza as condições sociais do ensino, com a insistência de que a
reflexão representa um processo individual e, quanto ao professor reflexivo,
limita-se às estratégias de ensino, aos aspectos metodológicos do ensino. A
concepção zeichneriana, à qual o presente estudo se vincula, extrapola esses
limites, posto que considera que o professor reflexivo amplia sua ação para
além da sala de aula, reflete as situações do ensino de forma coletiva e requer
um ambiente escolar propício ao exercício prático-intelectual do professor.
O marco de investigação-ação, desenvolvido por Carr e Kemmis, na
década de 80, entende que ações isoladas dos professoreso conseguem
vencer as barreiras da estrutura institucional das escolas e o trabalho dos
professores prático-reflexivos deve se desenvolver em um processo de
mudança social realizado coletivamente.
A imersão no micro, nas mediações da recepção, sinaliza para a
confirmação dos elementos de gestão tradicional autoritária existente nas
escolas, mesmo que se busque, como alerta Goffman (apud Teixeira e Porto,
1997:223), manter a impressão de cooperação, de "fachada".
As mediações identificadas, confirmadoras da teoria das múltiplas
mediações de Orozco, em especial, as individuais, mostram que a pessoa
interage valendo-se desses filtros individuais,o como uma pessoa isolada,
mas como participante de um grupo, de uma instituição. Saber partilhar idéias
significa expor nossas mediações individuais e saber ouvir as de nossos
interlocutores, o que constitui pressuposto do professor reflexivo.
As mediações institucionais e organizativo-institucionais propiciam a
constatação de que os professoreso capazes de analisar questões que
extrapolam a sala de aula, incorporando nos debates temas sociais, políticos e
culturais. Os professores questionam, com a oportunidade criada de participar
do grupo de discussão, o poder da direção em dar ordens sem ouvi-los, além
de reclamar a falta de autonomia a respeito de questões de cunho pedagógico,
rejeitando o desprezo social da profissão, que os leva a assumir excessivas
cargas de trabalho, em virtude dos baixos salários. Saber ir além da sala de
aula é fundamental para a prática reflexiva, "alargar o praticum", como diz
Zeichner, ou "estar atento à burocracia", como assinala Schõn.
As diferentes tecnologias influenciam o processo de recepção, como foi
percebido nas mediações massmediáticas. Levar em conta o tipo de material e
a tecnologia usada torna-se fundamental nos programas que incluem a
modalidade de EAD.
Se a interatividade acontece pelo material, como comprova Gutierrez e
Prieto (1994), vídeos, assim como os materiais impressos a serem utilizados
na educação a distância devem ter formato diferente ou então, fazer-se
acompanhar de suportes que facilitem a compreensão.
Muito embora se diga (Brasil,MEC/PNEAD, 1996: 10) que os
programas da TV Escola foram estrategicamente concebidos (grifos meus)
para complementar e atualizar a formação dos docentes, pergunto como
foram estrategicamente concebidos se os programas veiculados nos dois
primeiros anos eram 812 nacionais e 1161 estrangeiros e muitos foram
produzidos há cerca de oito ou dez anos? Esses dados comprovam ausência de
preocupação em adequar os materiais aos usuários em potencial da TV Escola,
os professores. Dois dos três programas usados nesse estudo datam de 1989,
portanto, bem antes do início da TV Escola. Esse fatoro desmerece os
programas, nem mesmo o projeto, mas deixa a preocupação de que, seo há
previsão de tutor no projeto, os programas devem adequar-se a essa situação.
As mediações institucionais revelaram o que a pesquisa coordenada por
Draibe e perez (1999:39) também detectou - a inexistência de locais
exclusivos para o kit eletrônico. "A grande maioria instalou os equipamentos
em dependências da escola utilizadas também para outros fins, tais como a
sala do professor, auditório, sala de aula etc. ".
Essa mediação sublinha, especialmente, a importância dos momentos
coletivos de visionamento dos programas. A recepção altera-se quando é
coletiva, tal como propõe Martín-Barbero e Orozco. Quer dizer, os professores
formam-se em situações coletivas,m possibilidade de refletir sobre o que
fazem; racionalizando a prática, dissolvem a dicotomia que a separa da teoria.
Teoria entendida como prática pensada, refletida, organizada, sistematizada.
Fica-se, assim, mais próximo de atingir a práxis.
Temor tecnológico, resistência fragmentada e do pesquisadoro
mediações novas percebidas na análise dos dados coletados. A mediação do
pesquisador revela, com clareza, a importância que a presença de um
professor individual, ou tutor, ou coordenador, como foi dito antes, tem para a
recepção e discussão dos programas. Embora exista o professor coletivo do
Projeto TV Escola (MEC/SEAD e produtores dos programas), faz-se
necessário o mediador. O professor individual mediador é o que dirige o
processo de reflexão coletiva, que interfere na recepção, nos significados
dados aos programas e proporciona a formação do professor prático-reflexivo
coletivo. Na TV Escolao há qualquer mediação que vise o aprender. Como
salienta Faundez, "é preciso abrir portas lá onde elas não existem"
(1993:65), o que o mediador pode realizar. E o próprio Faundez que apresenta
as características de um animador. Elas incluem a curiosidade, espírito crítico,
espírito político, espírito democrático, criatividade. O animador deve também
ser simples, sincero, modesto e ter espírito audacioso, características altamente
necessárias, uma vez que ele terá de ultrapassar várias tensões no seu mister,
como: teoria/prática; paciência/impaciência; palavra/silêncio; utopia e
realismo; pessimismo/otimismo.
A política educacional em vigor encontra muita repercussão na mídia
64
.
Entre 1997 e 1998, "os 52 maiores jornais brasileiros aumentaram em mais
Jornalistas e consultores técnicos da área de educação foram convidados a participar do evento Mídia e
Educação: perspectivas para a Qualidade da Informação, organizado pelo governo federal e várias entidades
não-governamentais, realizado emo Paulo em novembro de 1999, que objetiva "buscar melhorias na
de 300% o espaço dedicado ao tema "
65
. O marketing da política educacional
contribui para torná-la hegemônica;o garante, contudo, queo haja
resistências. Vale anotar a seguinte citação de Martín-Barbero (1997:107):
Nem toda assimilação do hegemônico pelo subalterno é signo de submissão,
assim como a mera recusao é de resistência, e que nem tudo que vem "de
cima"o valores de classe dominante, pois há coisas que vindo de lá
respondem a outras lógicas queoo as de dominação.
Quer dizer, há contradições internas no hegemônico.
A mediação resistência fragmentada revela a resistência , como mostra
Martín-Barbero, como simples recusa, queo leva a nada, ou desorganizada
ou apolítica, como sugerem Giroux e McLaren. Os grupos de discussão
coletiva dos programas tornam a recusa mais clara, podem politizá-la e, quem
sabe,o chegar à recusa ingênua dos vídeos, sem nem mesmo avaliá-los com
os colegas. Mesmo com marketing, há contradições na política que
possibilitam aproveitamento crítico, há brechas em que se pode atuar de forma
reflexiva e situada.
É necessário, contudo, que as escolas e os professores tenham
autonomia para decidir a realização de reuniões pedagógicas. A não-realização
de reuniões apresentou-se como um sério impeditivo para o trabalho em
equipe nas escolas. O cumprimento dos duzentos dias letivos, contados apenas
em atividades que envolvam professores e alunos, excluindo reuniões de
professores, representa um fator impeditivo, alvo de reclamação de
professores e coordenadoras.
cobertura do tema feita para a televisão, para o rádio, para os jornais e para a imprensa on-line"(0 Popular,
8 nov.1999:6).
65
Esse dado é fruto de pesquisa feita pelo Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de
Brasília, que analisou artigos, colunas, editoriais, notas e reportagens veiculadas em 62 jornais de todo o país.
O aumento verificou-se por meio da criação de cadernos especiais e de editorias especializadas (O Popular, 8
nov. 1999: 6).
A falta de autonomia interfereo apenas no trabalho com TV Escola,
como proposto neste estudo, mas de modo especial, na maioria das decisões
didático-pedagógicas tomadas na escola. A falta de tempo para reuniões em
grupo faz com que a direção tome todas as decisões, mesmo as pedagógicas.
Draibe assinala que, entre as escolas queo usam a programação para
capacitação dos professores, "a inexistência de um horário específico na
jornada do professor foi citada em primeiro lugar, entre os motivos que
explicariam, segundo o diretor, o não uso dos filmes" (1999:39).
A esse respeito, continua a mesma autora:
A inexistência de um horário na jornada do professor fora da sala de aula
para assistir os filmes foi mesmo apontada como um dos obstáculos
enfrentados pelas escolas, coerentemente ao fato de que menos da metade
(das escolas) oferecia condições mais propícias para a capacitação em
serviço e no próprio local de trabalho (Ibidem: 39).
Contornar essa questão, uma das mais difíceis, conforme minha análise,
pressupõe valorização social e salarial dos professores. Enquanto forem mal
remunerados, os professores, como profissionais universitários, com justas
aspirações de uma vida material digna, estarão se acumulando de aulas,
excedendo ao trabalho noturno, aos finais de semana e feriados, como forma
de vencer o atraso no cumprimento das inúmeras atividades. Dessa forma,o
estarão disponíveis para comparecer às reuniões escolares, sessões de debate,
grupos de estudos e formação contínua.
O Projeto TV Escola, no seu objetivo imediato (Brasil/MEC/SEAD,
1996:27), pretendia equipar, com kit da TV Escola, as faculdades de
educação, os cursos de formação para o magistério, colégios de aplicação e
escolas técnicas federais com o objetivo de ministrar cursos de formação para
o magistério, como também incentivar e apoiar o desenvolvimento de pólos
que ampliassem o raio de ação da TV Escola, o que, infelizmente,o
ocorreu. As universidades, ideais por excelência para formação de docentes,
foram ignoradas como instâncias que poderiam 'ampliar o raio de ação da TV
Escola', especialmente com o fundamento de que a formação docente é um
continuum e a formação inicial, oferecida pelas universidades, poderia
construir o alicerce para a formação contínua audiovisual requerida pela TV
Escola.
As universidades podem, pela característica peculiar que possuem de
relacionar ensino e pesquisa, colaborar com a formação do professor prático-
reflexivo, que dialoga com os colegas, que tem a prática do debate e da
reflexão como parte da formação inicial e contínua.
Como proposta para formar professores na escola, seria a TV Escola
realmente ensino a distância?
Com base nos elementos dessa modalidade de educação e ensino, é
possível inferir que a TV Escolao é EAD, já que, em especial, tem o
objetivo de formar o professor prático-reflexivo.
Como destacou Káplun, na EAD tradicional o aluno só se comunica
consigo mesmo, sem ter condições de confrontar seu pensamento. O
importante é usar os meios, no caso os vídeos da TV Escola, para dialogar,
para que o grupo de professores da escola comuniquem-se, maso é essa a
proposta do projeto em discussão.
O PNEAD (Brasil/MEC, 1996:7) destaca que a relação ensino-
aprendizagem, no programa TV Escola, pressupõe uma nova relação
educativa entre o usuário e a fonte de informação, quer dizer, sem mediações
entre o usuário e o equipamento. Espera-se, diz o documento, que esse tipo de
EAD dê condições aos professores de que se familiarizem com as novas
tecnologias.
É preciso ultrapassar a relação entre usuário e material tecnológico na
EAD e na TV Escola. Como salienta Belloni (1999:7), mesmo na
Aprendizagem Abertao se abdica de estratégias de acompanhamento e
apoio ao estudante.
O Programa TV Escola descaracteriza-se como educação a distância,
em razão da ausência do mediador, de interação do usuário com os professores
coletivos (MEC e produtores). A proposta da TV Escola considera os
professores mais como usuários dos filmes que veiculam do que como
profissionais em formação contínua.
As duas pesquisas encomendadas pelo MEC revelaram aspectos
negativos do programa, as quais, de certa forma, como necessidade de
avaliação do programa, mostraram também que o MEC carecia de
informações sobre os usuários. Caso o projeto previsse a existência do
professor mediador individual e o capacitasse à tarefa, poderia ter todas as
informações mais detalhadamente.
E ilusão supor que a Revista TV Escola, mesmo com a seção das cartas
de leitores, constitua material que possibilite a interação. As escolas recebem
dois a três exemplares de cada número, a fim de que os professores façam a
leitura e dela tirem sugestões de atividades, o queo ocorre, já que as
revistas ficam intactas na coordenação ou na biblioteca, conforme define a
escola, até com a capa de papel pardo usada como proteção.
Reportagem da Folha de S. Paulo
6
, mostra que professores
desconhecem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Embora o objetivo
seja que cada professor receba seu exemplar, as escolaso repassam o
material aos professores. O mesmo acontece com a Revista da TV Escola. Os
66
"Professoreso entendem parâmetros de ensino do MEC". Folha de S. Paulo.o Paulo, lº nov. 1999,
p. 2. Cotidiano.
professores mal a conhecem. Em uma das escolas pedi para ver as revistas;
estavam na biblioteca e a responsável demorou dois dias para encontrá-las.
Em outra, um exemplar permanece no arquivo da sala da coordenação e o
outro vai para o armário dos vídeos. Quer dizer, pouco ou nenhum contato os
professoresm com esse material. Dificilmente os professores lêem a revista.
Há de se lembrar, ainda, que o formato da revista inclui comentários
sobre os programas, sugestões de atividades realizadas com vídeos da TV
Escola, matérias com escolas em que o programa deu resultado positivo, etc.
o, como deveria prever em material de ensino a distância, questões sobre
os conteúdos dos vídeos.
Dessa forma, posso dizer que o Programa TV Escola caracteriza-se
mais como material de apoio às atividades do professor do que programa de
formação de professores a distância. O Programa de Apoio Tecnológico
(PAT) - o kit tecnológico - cumpriu seu papel de equipar as escolas.o
pretendo debater a qualidade dos equipamentos, questão que tem gerado
muitos problemas também.
O canal próprio, a veiculação dos programas, a produção dos vídeos, os
suportes impressos (Revista, Guia de Programas, Cadernos, Série Estudos,
Grade de Programação) requerem ajustes, reparos que, espero, as inúmeras
produções científicas possam contribuir para o aprimoramento.
Lamentavelmente, como também observa Zeichner (1998:83), há uma
concordância generalizada a respeito da pouca influência da pesquisa sobre o
modo como as autoridades governamentais determinam as políticas de
formação de professores
67
A CAPES, através do PAPED (Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância) está financiando
trabalhos de mestrado e doutorado sobre a temática. O presente estudo contou com esse apoio.
As pesquisas pouco influenciam as autoridades que formulam políticas
de formação de professores, dando pouca atenção às pesquisas sobre o tema
formação de professores, como também às experiências dos formadores de
professores.
Há excelentes programas que poderiam ajudar a formação docente,
suscitar debates, proporcionar férteis momentos de reflexão com os
professores, tanto nos programas da Série Educação como nos das áreas
específicas do saber e sobre os temas transversais da nova proposta curricular.
É necessário, no entanto, criar as condições na escola, para que a TV Escola
realmente cumpra o objetivo a que veio: capacitar os professores e aprimorar a
sua formação. A formação do professor reflexivo, por intermédio da TV
Escola, está condicionada às condições adequadas de grupos de discussão
coletiva sobre questões que incomodam os professores no seu fazer cotidiano.
Há particularidades em cada escola que exigem uma formação contínua,
centrada nessas necessidades específicas.
De acordo com Hewton (apud Garcia, 1992:67-68), é possível
estabelecer diferentes níveis e categorias quanto ao tipo de necessidade de
formação, assinalados pelos professores. Diagnosticar essas necessidades é
uma das principais tarefas dos cursos que formam professores, alerta Garcia,
ao mesmo tempo que as sistematiza em quatro grupos: relativas aos alunos,
ao currículo, aos próprios professores como profissionais e como pessoas e as
necessidades da escola como organização.
Há programas da TV Escola que contemplam os quatro grupos. E certo
queo atendem às especificidades de cada escola, mas, se bem escolhidos, e
bem organizadas as discussões pelo tutor da escola, podem, sem dúvida,
suscitar reflexões, promover relação entre a mensagem que o vídeo apresenta
e a prática dos professores, na perspectiva de, com base no debate coletivo,
nas diferentes mediações das mensagens, os professores dariam novos
significados às mensagens, reorganizando saberes refletidos e criando novos
conhecimentos significativos para cada um deles.
A dimensão tempo-espaço na proposta da TV Escola é muito complexa,
uma vez que se conjuga com outra que se reporta a do tempo escolar, com um
tempo bastante regulado.
O presencial físico é negado pela inexistência de momentos coletivos e
de um professor individual. Resta o espaço não-real, presente nos diferentes
espaços trazidos pelo vídeo que pode ser recepcionado pelo professor em
diferentes espaços.
A pesquisa do NEEP (Draibe e Perez, 1999:40) mostra que 35% das
escolas informam que os professores assistem aos filmes fora do horário das
aulas e fora da escola. "Em 25% das escolas, fora do horário das aulas,
embora na própria escola e em 20%, durante o intervalo das aulas".
o artifícios que as escolas encontraram para tentar superar o obstáculo
de um programa que depende de tempo para ser visto e reproduzido,
interferindo e sofrendo interferências na organização e distribuição do tempo
de trabalho do professor e da escola.
Embora o presencial virtual possibilite a flexibilidade no tempo, perde
em interatividade. Assistir aos programas em casa elimina toda e qualquer
interatividade com os pares e com os produtores, negada pelo próprio formato
do projeto. Mesmo que a recepção prolongue-se após o contato com a
mensagem, o fator tempo, que leva assistir ao filme em casa, é impeditivo para
proporcionar conversas com os colegas na escola, ficando a significação do
que foi visto apenas na dimensão individual.
A passagem da doxa, opinião, à compreensão faz-se mediante o diálogo
cooperativo. Assim, a relação teoria-prática vincula-se à existência de
momentos de diálogo.
Além de diferentes espaços de visionamentos dos programas, há outros
diferentes tempos: fora do horário das aulas, no intervalo das aulas (que é
muito curto), qualquer tempo em casa, etc. A relação fica só entre o usuário e
a fonte de informação, entre o professor e o vídeo, nada mais, pois a TV
Escolao prevê espaço nem tempo específicos para ela.
o basta colocar a nova tecnologia nas escolas para mudar a
mentalidade dos professores e demais agentes da escola. A EAD ultrapassa a
disposição de materiais instrucionais ao seu usuário, sendo o atendimento
pedagógico de importância fundamental e deve ocupar lugar central no
processo.
Torres (1998:173), analisando a política de formação de professores na
América Latina, enfatiza que é típico, na educação, passar drasticamente de
um pólo ao outro:
Busca-se o remédio para a centralização excessiva na descentralização
exagerada e, para os problemas identificados dentro da formação inicial, na
multiplicação de programas de capacitação em serviço. Da ausência de livros
e materiais didáticos na aula, passamos para a súbita inundação de recursos
para as escolas, etc.
Essa lógica binaria é percebida também na formação docente. Torres
apresenta um "conjunto de novas e velhas tensões que têm marcado as
políticas nesse campo''' (ibidem: 174).o elas: salário versus capacitação;
formação inicial versus capacitação em serviço; necessidades dos professores
versus necessidades do currículo e da reforma.; gestão administrativa versus
gestão escolar. A autora apresenta outras tensões: conhecimento do professor
versus aprendizagem do aluno; professores versus tecnologia educativa;
educação presencial versus educação a distância; saber geral versus saber
pedagógico; modelo centralizado versus modelo descentralizado.
O único fato realmente novo refere-se ao retorno do assunto formação
dos professores.
Os programas de formação a distância de professores na América Latina
demonstram contradição entre o discurso da reforma de autonomia,
protagonismo, revalorização e profissionalização do professor e os modelos
utilizados, uma vez que os materiaiso apontam essa problemática.
Outro ponto que Torres (Ibidem: 179) ressalta refere-se ao isolamento
das políticas de formação docente que ocorrem à margem das outras
dimensões que afetam o trabalho e a vida dos professores, como currículo,
gestão, recrutamento, salário, ambiente de trabalho, e também a avaliação.
A capacitação docente justifica a explicação e compensação dos baixos
salários:
O plano de capacitação é introduzido, mas os professoreso podem
aproveitá-lo (falta de tempo, vários empregos, condições familiares difíceis
etc) ouo conseguem relacioná-lo com o que percebem como suas
necessidades (uma capacitação desligada do currículo escolar, demasiado
teórica, inaplicável a seu contexto específico etc) (lbidem.MA)
A grande contradição da reforma tem como fundamento o fato de que, a
cada dia, o mundo é mais interconectado e complexo, mas a capacitação
docente diminui e estreita-se, tal como ocorre na reforma brasileira.
É um equívoco considerar a participação dos professores apenas na
etapa da execução da política de formação, como se fossem apenas seus
seguidores, seus executores. Como diz Torres (Ibidem:l&2):
a "qualidade" e a validez de um plano de reforma educativao se enraízam
- nem única, nem principalmente - no nível científico e na coerência técnica
do documento, mas em suas condições de receptividade e viabilidade
social, em contextos e momentos concretos (grifos da autora).
Assim, muitas vezes, os problemas encontrados na execução do plano
de reformao usualmente vistos como problemas de execução (e
normalmente atribuídos aos professores), sendo também questões de desenho,
da própria formulação da política.o se pode responsabilizar os professores
pelo fracasso da TV Escola.
A formação docente e de recursos humanos no setor educativo é ainda
um dos aspectos mais débeis das reformas educativas postas em marcha na
América Latina, afirma Torres.
No âmbito da profissão, o relacionamento horizontal, o trabalho
colegiado entre pares é visto como dimensão básica para o desempenho e o
avanço profissional. É preciso formar uma equipe escolar, mais do que
professores individuais. Sozinho, mesmo que bem formado, o professor tende
a ser absorvido pela lógica escolar dominante. A equipe escolar deve ser o
sujeito privilegiado da capacitação (Ibidem: 185-186)
O potencial quantitativo na área de abrangência do TV Escola alcança
quinhentos mil professores que trabalham em escolas e gravam os programas,
abrigando aproximadamente 18 milhões de alunos; no entanto, pode fracassar
seo garantir seu potencial qualitativo, que depende das diferentes variáveis
levantadas neste estudo.
É preciso mudar o filme ... Buscar um outro enredo ... e colocar o
professor como protagonista, como ator principal...
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1997, vídeo, VHS (Série Educação - Escola em discussão; duração: 11 min. 58 seg.
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http://www.intelecto.net/ead/ivonio/.html
POLLY, Yonne, BRANDÃO, Sueli, ASSIS, Regina de. Desatando os nós com afeto
(vídeo). Direção geral de educação: Cleide Ramos; roteiro: Nick Zarvos; direção geral:
João Carlos Velho. Rio de Janeiro, Fundação Roquette-Pinto, 1989, vídeo, VHS (Série
Educação -s na escola; duração: 19 min. 27 seg.
POLLY, Yonne, BRANDÃO, Sueli, ASSIS, Regina de. As escolas dos muitos Brasis
(vídeo). Direção geral de educação: Cleide Ramos e Regina de Assis; roteiro: Fernando
Mozart; direção geral: João Carlos Velho. Rio de Janeiro, Fundação Roquette-Pinto,
1989, vídeo, VHS (Série Educação -s na escola; duração: 19 min. 50 seg.
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Distância. Brasília, n.4-5, abr. 1994 http://www. Ibase.org.br/~ined/todorov.html
ANEXOS
ANEXO 1 - Questionário da primeira sessão (sem videogravação).
Respondido antes de assistir o programa "Desatando oss com afeto".
PESQUISA EDUCACIONAL
1. Você já usou programas da TV Escola em suas aulas?
( ) Sim ( )o Porque?
(Responda as questões 2 e 3 apenas se respondeu sim na questão n. 1)
2. Qual programa você usou?
3. Em qual matéria?
4. O que você acha das Novas Tecnologias da Comunicação e Informação
nas escolas?
() uma coisa boa que aconteceu nas escolas
()o mudará nada quanto à qualidade do ensino
() assusta o professor queo sabe lidar com elas
() vai melhorar muito o ensino
() Outra. Qual?
ANEXO 2 - Questionário da segunda sessão. Respondido logo após assistir o
Vídeo. Programa "A escola além da aula"
SESSÃO DE VÍDEO
Prezado (a) professor (a)
Agradeço você estar participando desta pesquisa. Isso é muito
importante para o estudo que desenvolvo e que, espero, possa contribuir para
entender mais a educação escolar no mundo tecnológico.
Hoje vamos ver juntos o vídeo "A escola além da aula" da TV Escola,
com duração aproximada de 10 minutos.
Peço, porém, que logo ao terminar a apresentação do vídeo, você
responda às questões colocadas a seguir. Escolha um pseudônimo, ou coloque
seu nome se preferir, para identificar sua folha de respostas.
Obrigada!
Mirza
Nome ou pseudônimo:
1) O vídeo que passou agora fez com que você se lembrasse do quê?
2) O que significam essas lembranças para você?
(Este outro questionário foi respondido logo após a discussão coletiva do
vídeo)
Agora ques já conversamos sobre o vídeo "A escola além da aula", o
que você acrescentaria às duas respostas que você deu no início da sua
apresentação.o esqueça seu nome ou pseudônimo:
ANEXO 3 - Questionário da terceira sessão. Programa: As escolas dos
muitos Brasis
SESSÃO COLETIVA DE VÍDEO
Bom dia/ Boa tarde, professor (a)!
Mais uma vez obrigada por essa oportunidade de estar com vocês, refletindo a
educação brasileira.
Hoje veremos um vídeo que comenta sobre as diferentes escolas do nosso
país.
Porém, antes de assistirmos, peço que você responda as questões a seguir:
Nome ou pseudônimo:
1. Qual é a imagem que você faz do Brasil?
2. Essa imagem que você tem do país foi construída a partir do quê?
3. É esta imagem que você transmite aos seus alunos?
(Depois de assistir o programa e debater sobre ele, os professores responderam
ao seguinte questionário)
Bom, professor (a)! Agora que já discutimos sobre o que vimos no
vídeo, demos nossa opinião e ouvimos as opiniões de nossos colegas, peço
que você responda as duas questões a seguir:
Nome ou pseudônimo:
1. Como é a escola dos seus sonhos?
2. Como desenvolver a autonomia e a cooperação na escola?
ANEXO 4 - Questões orientadoras das entrevistas semi-estruturadas.
Entrevista semi-estruturada
(questões orientadoras)
a) Para os professores:
1. Nome
2. Formação
3. Tempo de magistério: Nesta escola:
4. Qual disciplina leciona?
5. Por que escolheu essa disciplina?
6. Já usou vídeo nas aulas? Por que?
7. Já usou programas da TV Escola? Por que?
8. Participou das sessões coletivas de vídeo da TV Escola? Quantas?
9. De quais sessões participou?
10.0 que mais o impressionou nas sessões coletivas?
11 .Do que foi discutido, o que mais o marcou?
12.Gostou das discussões coletivas?
13. A dinâmica usada nas sessões foi válida?
14Já tinha participado de outras discussões semelhantes?
15. As discussões provocaram alguma alteração no cotidiano da escola?
b) Para a coordenação pedagógica:
1. Nome
2. Formação
3. Tempo de magistério
4. Tempo de coordenação pedagógica: Nesta escola:
5. Ser coordenador foi opção sua?
6. A coordenação ajuda no quê na escola?
7. Faz reuniões pedagógicas? Por que? Freqüência?
8. O que acha do uso de vídeos nas aulas?
9. Como coordenadora já estimulou o seu uso pelos professores?
10.Sua opinião sobre o TV Escola
11 .Participou das sessões coletivas de vídeo da TV Escola? Quantas?
12. Gostou das discussões que ocorreram durante as sessões?
13.Do que foi discutido o que mais a marcou?
14. As discussões repercutiram no cotidiano da escola?
15.As discussões alteraram algo na sua coordenação?
c) Para as diretoras:
1. Nome
2. Formação
3. Tempo de magistério
4. Tempo de direção: Nesta escola:
5. Ser diretor foi opção sua?
6. Como assumiu o cargo? (indicação, eleição etc)
7. Escolheu o coordenador pedagógico? Quais critérios levou em conta?
8. O que acha da administração da escola?
9. Qual é o objetivo da sua administração?
10. A administração pode colaborar para quê? Melhorar a educação?
11.0 que acha das reuniões pedagógicas?
12.Participa das reuniões pedagógicas? Por que?
13.0 que acha do uso de vídeos nas aulas/
14. Sua opinião sobre a TV Escola
15.Participou das sessões coletivas de vídeo? Quantas?
16.0 que achou delas?
17.A dinâmica usada nas mesmas é válida?
18.Gostou das discussões que ocorreram durante as sessões?
19. As discussões repercutiram de alguma forma no cotidiano da escola?
20.Do que foi discutido o que mais a marcou?
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