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PCN NA ESCOLA
C A D E R N O S D A
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
CONVÍVIO ESCOLAR
TÉCNICAS DIDÁTICAS
EDUCAÇÃO FÍSICA
N. 4/1998
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Livros Grátis
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CONVÍVIO ESCOLAR
Toda criança na escola
Flávia Schilling
Direitos e responsabilidades
Flávia Schilling
A organização do espaço e do tempo na escola
Flávia Schilling
A violência na escola
Lidia Rosenberg Aratangy
O vínculo
Lidia Rosenberg Aratangy
Pais: inimigos ou aliados?
Lidia Rosenberg Aratangy
TÉCNICAS DIDÁTICAS
Lia Rosenberg
Como organizar a classe
Pense no assunto
Atividades em grupo
SUMÁRIO
36
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Presidente da República
Fernando Henrique Cardoso
Ministro da Educação e do Desporto
Paulo Renato Souza
Secretário de Educação a Distância
Pedro Paulo Poppovic
Secretária de Educação Fundamental
Iara Glória Areias Prado
Secretaria de Educação a Distância
Cadernos da TV Escola
Diretor de Produção e Divulgação
José Roberto Neffa Sadek
Coordenação Geral
Vera Maria Arantes
Projeto e execução editorial
Elzira Arantes (texto) e Alex Furini (arte)
Ilustrações
Gisele Bruhns Libutti
Consultoria
Cláudia Aratangy e Cristina Pereira
©1998 Secretaria de Educação a Distância/MEC
Tiragem : 110 mil exemplares
Este caderno complementa as séries da programação da TV Escola
PCN na Escola -
Convívio Escolar - Técnicas Didáticas - Educação Física
Informações:
Ministério da Educação e do Desporto
Secretaria de Educação a Distância
Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Anexo I, sala 325 CEP 70047-900
Caixa Postal 9659 – CEP 70001-970 – Brasília/DF - Fax: (061) 321.1178
Internet: http://www.mec.gov.br/seed/tvescola
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Convívio escolar. Técnicas didáticas. Educação física. - Brasília : Ministério da
CDU 371.214
Educação e do Desporto, Secretaria de Educação a Distância, 1998.
96p. ; il. ; 16 cm. - (Cadernos da TV Escola. PCN na Escola,
ISSN 1516-148X ; n. 4)
1. Parâmetros Curriculares Nacionais. 2. Interação social. 3. Didática.
4. Educação física.
I-Brasil. Secretaria de Educação a Distância.
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EDUCAÇÃO FÍSICA
Marcelo Barros da Silva e Cláudia Rosenberg Aratangy
Amarelinha e variações
Jogos com bola
Jogos de corrida e perseguição
Onde está a dança?
A escola entra na dança
Futebol, paixão nacional
CONVÍVIO ESCOLAR
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Programa 1
omo aprendemos tudo que sabemos? Apren-
demos escutando, lendo, vendo, fazendo.
Aprendemos e nos educamos sempre, uns aos
outros, observando, fazendo e vivendo cada coisa
que acontece. Vamos aprendendo e ensinando du-
rante toda a vida.
Essa observação vale para cada momento do co-
tidiano. Aprendemos sobre festas, alimentação, tra-
balho, lazer, higiene e ornamentação do corpo, con-
venções que nos dizem quando rir ou quando cho-
rar, como lidar com o prazer, com a dor, com a do-
ença, com o nascimento e com a morte e assim por
diante.
Na verdade, ninguém, nasce ‘pronto’; vemos
com naturalidade atitudes que são fruto de costu-
mes, de tradições e do aprendizado acumulado de
muitas gerações, transmitidas dos adultos para os
mais jovens.
Durante muitos séculos, os adultos – pais, mães,
familiares e amigos – se encarregaram de educar suas
crianças. Não se pensava, no mundo europeu, em
uma instituição especial para educar, em uma escola
para reunir as crianças. Ninguém poderia supor que
“lugar de criança é na escola.
Mas, com o tempo, a escola se incorporou tanto
às instituições das sociedades ocidentais que, hoje, é
difícil imaginar a vida sem ela.
CC
CC
C
TODA CRIANÇA NA ESCOLA
9
Toda criança na escolaPrograma 1
8
A criança de outros temposA criança de outros tempos
A criança de outros temposA criança de outros tempos
A criança de outros tempos
Nem sempre os sentimentos em relação à infância
foram os mesmos, nem sempre essa fase foi reconhe-
cida como merecedora de atenção especial, e nem
sempre lhe foi atribuída a mesma duração – por quan-
to tempo uma pessoa é considerada criança?
Durante séculos, até o início da época moder-
na, um sentimento muito difundido e popular le-
vava a tratar a criança como um brinquedo: era a
idéia da criança-brinquedo. Essa fase durava
bem pouco: após os primeiros cinco ou sete anos,
a criança se integrava, sem transições, ao mundo
dos adultos; então, observando e participando,
crescia.
Os colégios daquele tempo não dispunham de um
espaço especial, diferenciado. O mestre se instalava
em uma sala, na igreja, ou à porta da igreja. Às vezes
alugava uma sala em alguma universidade. Em seu
posto, ele esperava pelos alunos, como o vendedor
espera seus fregueses.
Essa escola medieval acolhia sem diferenciar
crianças, jovens ou adultos que estivessem precisan-
do de instrução técnica, de formação moral e social.
A idade para ir à escola era qualquer uma.
A mistura de idades se prolongava fora da escola.
Dessa forma, em vez de retirar a criança do convívio
com o mundo adulto, a escola também levava a crian-
ça para esse mundo dos adultos.
Bem pouca gente passava pelos colégios. Até o
século 17, quando essa situação começou a mudar,
o ingresso precoce no mundo adulto não dependia
da classe social. Tanto os ricos quanto os pobres se
integravam muito cedo nas atividades dos adultos –
como soldados, como trabalhadores, ou, no caso das
meninas, participando do trabalho doméstico, casan-
do e tendo filhos muito cedo.
A visão da época moderna
Graças ao êxito das instituições escolares, os educadores
do século 17 conseguiram impor a idéia de uma infância
mais longa. Esses precursores estão na raiz das concep-
ções modernas de infância e escolaridade. Começa a se
desenhar, a partir do século 17, a associação entre escola
e infância, da escola como lugar das crianças.
A diferença essencial entre a escola da Idade Mé-
dia e o colégio dos tempos modernos reside na in-
trodução da disciplina, partindo dos valores da disci-
plina eclesiástica, ou religiosa.
O modelo da escola foi o convento: o espaço fecha-
do, a diferenciação interna de funções, o estrito contro-
le de horários, o tempo de atividades sempre plenamen-
te preenchido e o exercício como prática central para
levar à máxima eficiência e à máxima perfeição.
A partir daí, se impõe às famílias o respeito pelo
ciclo escolar integral: o tempo de ‘ficar na escola’ dei-
xa de estar ao sabor das circunstâncias. A escola se
torna uma instituição complexa e amplia seu papel:
não se destina apenas ao ensino, mas também à vigi-
lância e ao enquadramento da juventude.
Ocorre ainda um processo de diferenciação da massa
escolar – por capacidade ou por idade – e uma diferencia-
ção do magistério, se adequando ao nível do aluno.
A escola se diferencia
A partir do século 18, a escola única foi substituída por
um duplo sistema de ensino: o liceu ou o colégio para
os burgueses, e a escola para o povo. O primeiro é um
ensino prolongado. O segundo, um ensino breve.
As faixas etárias se organizaram em torno de certas
instituições e a escola passou a atuar no sentido de esta-
belecer uma separação entre as crianças e o mundo adul-
to, dando também a elas formação moral e intelectual.
11
Toda criança na escolaPrograma 1
10
A indiferenciação etária nas escolas só desapare-
ceu no século 19 e, mesmo assim, atendendo em ge-
ral apenas aos meninos. As meninas permaneciam ex-
cluídas das escolas e, dessa forma, do prolongamen-
to da infância. Poucas sabiam escrever, pois a grande
maioria era preparada apenas para as tarefas domés-
ticas e para o casamento.
Durante todo o século 19, e boa parte do século
20, a idéia da infância se prolongando através da es-
cola era privilégio de alguns, e não direito de todos.
O trabalho infantil fazia persistir a passagem precoce
da infância para a idade adulta, típica da sociedade
medieval.
Lugar de criança é na escola
A relação entre infância e escola é, na verdade, fruto
das grandes transformações que caracterizam a épo-
ca moderna. Por um lado, as mudanças econômicas e
sociais geraram novas necessidades em relação à for-
mação e à preparação de crianças e jovens. Por ou-
tro, as invenções – como a da imprensa, que ampliou
como nunca a população alfabetizada –, transforma-
ram as mentalidades e propiciaram o surgimento de
novas instituições.
A invenção da imprensa por Johann Gutenberg, na
década de 1440, marca uma nova era para a educa-
ção. Os livros chegaram ao alcance de um número
cada vez maior de pessoas. Quem sabia ler podia
ensinar quem não sabia, ou, então, lia em voz alta
para grupos de adultos e crianças. Uma imagem se
tornou clássica: a da mãe ensinando seu filho a ler, à
luz de uma vela ou lamparina.
A frase que nos serviu de ponto de partida – “lu-
gar da criança é na escolaresulta de uma longa
construção, que implicou uma nova compreensão da
idéia de infância e que se imbricou com a construção
de uma instituição muito especial: a escola.
Essa nova visão de infância, e a visão de que a
escola seria um lugar privilegiado para ela, não ocor-
reu de um momento para outro, nem se estendeu
homogeneamente por todos os países e por todas as
classes sociais. Foi objeto de reivindicações e de lu-
tas, até alcançar o status de direito: válido para todas
as crianças, independentemente de classe social, gê-
nero, raça, etnia ou religião.
O direito à infância e o direito à educação vão sendo
conquistados ao mesmo tempo.
Dessa forma, quando dizemos hoje que “lugar da
criança é na escola, estamos falando de um direito
que foi sendo conquistado ao longo dos séculos.
BIBLIOGRAFIA
ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Pau-
lo, Perspectiva, 1988.
ARIÈS, Phillippe. História social da criança e da famí-
lia. Rio de Janeiro, Guanabara, 1986.
MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. São Pau-
lo, Cia. das Letras, 1997.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Petrópolis, Vozes,
1984.
13
Direitos e responsabilidadesPrograma 2
12
em sempre as escolas tiveram um papel
central na educação das crianças, assim
como nem sempre existiu a moderna idéia
de infância, entendida como um período especial,
dedicado a brincar e a estudar, envolvendo a ne-
cessidade de proteção e de amor por parte dos
adultos.
Atualmente, o termo criança’ se refere a pessoas de
até 15 anos, de acordo com a classificação da Organi-
zação Internacional do Trabalho (OIT), para questões
relativas ao trabalho. No Brasil, a partir do Estatuto
da Criança e do Adolescente (Lei n
o
8.069, de 13 de
junho de 1990), o trabalho infantil é proibido até os
14 anos. Apenas o trabalho de aprendiz é permitido
aos 12 e 13 anos, mas tramita no Congresso Nacional
uma proposta do Executivo no sentido de eliminar
essa possibilidade.
Todo esse investimento afetivo nas crianças,
todo esse grande investimento cultural e educa-
cional, foi sendo conquistado e se estendendo,
deixando paulatinamente de ser um privilégio de
determinadas classes sociais, ou apenas de meni-
nos. Até há bem pouco tempo, as meninas viviam
uma infância muito breve, ingressando rapida-
mente no mundo adulto, ao qual se integravam
pelo trabalho e pelo casamento.
Direito à educação e à escola
O direito à educação é um dos chamados direitos
sociais, anunciado durante a Revolução Francesa
de 1789 como um direito universal. Já naquela
época, era reivindicado para todos; no entanto, foi
restringido e negado durante longo tempo, sendo
conquistado formalmente apenas no final do sé-
culo 19.
A demanda do direito à educação e as lutas nesse
sentido encontram uma primeira concretização peda-
gógica com a formulação do ideário da escola públi-
ca – um bem comum, de todos e para todos –, repu-
blicana e laica.
Pode-se pensar no progressivo alargamento das
portas das escolas para todos, com a paulatina parti-
cipação de setores cada vez maiores de crianças –
independentemente de classe social, raça, etnia, reli-
gião e gênero –, como a idéia moderna de infância,
com suas proteções e seus direitos.
O direito à infância, que passa pelo direito à es-
cola, foi se ampliando no século 20. As lutas deste
século visaram diminuir a distância entre o texto da
lei e sua aplicação, ou a passagem dos direitos for-
mais’ aos direitos reais, da igualdade formal’ à igual-
dade ‘real’.
Será que esse processo está concluído? Terá ter-
minado a grande luta pela educação para todos? Será
que todas as crianças – independentemente de classe
social, raça, etnia, religião ou gênero – contam com
seus direitos garantidos?
O trabalho e a criança
Em 1992, o Brasil assinou um protocolo de acordo com
a OIT para participar do Programa Internacional para
Erradicação do Trabalho Infantil.
NN
NN
N
DIREITOS E
RESPONSABILIDADES
15
Direitos e responsabilidadesPrograma 2
14
Na América Latina, os países que apresentam maio-
res índices de trabalho infantil (de crianças de 10 a
14 anos) são: Haiti (25,30%), Guatemala (16,22%),
Brasil (16,09%) e República Dominicana (16,06%).
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicí-
lios (PNAD), em 1993 trabalhavam em nosso país 4.547.944
crianças de 5 a 14 anos. Desse total, 60% desempenhavam
trabalhos agrícolas e 40% se encontravam nas cidades, se-
gundo pesquisa recente (“O trabalho tolerado de crianças
de até 14 anos, Boletim Dieese 193, abril de 1997).
Observa-se na pesquisa que grande parte das denún-
cias de exploração do trabalho infantil focaliza o traba-
lho visto imediatamente como intolerável – como por
exemplo corte da cana-de-açúcar, trabalho nas carvoa-
rias e com sisal. No entanto, poucos reconhecem como
também intolerável a presença das crianças no trabalho
urbano, em ‘bicos’, ajudando’ seus pais nas mais diver-
sas atividades.
Entre as crianças trabalhadoras urbanas, mais de 70%
ainda não têm 14 anos e vêm de famílias constituídas –
com pais que trabalham, porém ganham pouco. A maio-
ria delas ganha menos de um salário mínimo, mesmo
fazendo tempo integral e cumprindo semana de traba-
lho de 5 a 7 dias, sem direito a férias e outros direitos
trabalhistas.
A escolaridade continua sendo vista como um bem,
mas o cotidiano escolar é, para as crianças trabalha-
doras, cansativo e frustrante.
Os índices de repetência das crianças trabalhado-
ras alcançam 60% a 70%. Para elas, a escola perdeu o
interesse; mas, ao mesmo tempo, a grande maioria
sonha alcançar, algum dia, profissões universitárias.
Criança que trabalha não estuda bem e, dessa for-
ma, se reproduz a desigualdade social. O trabalho in-
fantil é um problema para a criança e para a sociedade.
As causas da persistência do trabalho infantil de-
vem ser buscadas na estrutura econômica e social do
país, na concentração de renda e na precariedade das
relações de trabalho.
Como já vimos, o direito à infância e à escola foi
uma conquista. Continua sendo uma tarefa a ser con-
cluída. A quem compete concluir esse alargamento
das portas das escolas?
Qual escola?Qual escola?
Qual escola?Qual escola?
Qual escola?
As escolas se tornaram instituições tão centrais e naturais
em nossa sociedade que nem imaginamos como viver sem
elas. Essa naturalização’ da escola, porém, nos leva a pen-
sar nela de maneira abstrata. Todas as escolas são iguais?
A que tipo de escola nos referimos? Estaremos con-
siderando a escola como uma instituição sempre igual,
homogênea, talvez natural, permanente, fixa? Estaremos
pensando em algum modelo? Será que a idéia é a de
uma escola padrão, uma escola, talvez, normal’?
Como imaginaríamos essa escola padrão, essa
escola normal’? Podemos brincar um pouco com essa
idéia. Imaginemos A ESCOLA. Podemos até desenhá-
la no papel. Um prédio, talvez não muito grande, com
cara de casa. Sólido, bonito, de aparência acolhedora,
porém com muitas janelas que se abrem para um
espaço verde, para jardins, para áreas de recreação.
Dentro desse prédio ideal, podemos imaginar outras
duas grandes abstrações – OS PROFESSORES e OS ALU-
NOS. Quais são nossos modelos e padrões de professo-
res e alunos? Professores: homens e mulheres dispostos
e satisfeitos. Alunos: meninos e meninas, sem preocu-
pações, aproveitando seu espaço natural: a escola.
Mas a escola está integrada nos movimentos mais
gerais da sociedade. Mesmo cercada de muros, particu-
17
Direitos e responsabilidadesPrograma 2
16
lar ou pública, religiosa ou laica, rural ou urbana, a es-
cola dialoga o tempo todo com os acontecimentos po-
líticos, sociais e econômicos da localidade e do país.
Os edifícios escolares são pontos de referência para
a comunidade. Pobres ou ricos, grandes ou pequenos,
da zona rural ou urbana, refletem divisões de classe, de
raça e de etnia. Nunca são neutros, dispensáveis, indi-
ferentes: apresentam suas portas estreitas ou largas, seu
muro alto ou baixo, emoldurando quem os freqüenta.
Os educadores também diferem muito: professo-
ras e professores das distintas regiões do país, com
graus diversos de escolaridade, e sempre afetados
pelos acontecimentos mais amplos, que dizem respei-
to a qualquer cidadão, enfrentando ao mesmo tempo
os desafios do cotidiano do ensino.
Os alunos, meninas e meninos, trabalhadores ou não,
de diferentes classes sociais, raças, etnias e religiões, tra-
zem para a escola seus problemas e questionamentos.
A escola é, portanto, um espaço vivo, de profunda
socialização, no qual atuam pessoas concretas, com
histórias diversas e com culturas variadas.
A escola para todos
A participação na luta pela ampliação do atendimen-
to escolar e pela incorporação do contingente de
crianças trabalhadoras às escolas é de responsabili-
dade de todas as instâncias: a ação governamental e
a da comunidade; a ação dos educadores e dos alu-
nos de escolas públicas e particulares.
Ninguém, sozinho, pode fazer muito, mas é sempre
possível atuar quando encontramos parceiros, quan-
do exigimos de forma organizada o fim da distância
entre o direito ‘formal’ e o direito real.
O que fazer? Por onde começar? É fundamental
compreender que os direitos – no caso, o direito à
infância e à escola para todos – são conquistas de
todos, são conquistas sociais.
No caso das crianças trabalhadoras, a lei já proí-
be o trabalho infantil. Trata-se, então, de exigir a apli-
cação da lei. Mas, também, de criar condições para
que essas crianças possam se desvincular da necessi-
dade de trabalhar.
Para a escola, o desafio é criar condições para
manter o vínculo da criança com a escola, para asse-
gurar a ela uma expectativa de um futuro diferente. A
união de governo, escola e todos os setores da socie-
dade mobilizados pelo problema, é indispensável
para encontrar soluções.
A escola inserida em seu meio
A escola deve abrir suas portas, deixar que as ques-
tões sociais nela apareçam e sejam discutidas, as-
sumir seu papel de instituição integrante da histó-
ria, transformando e sendo transformada pelos mo-
vimentos mais amplos da sociedade. Precisa ser
uma escola concreta, viva e real, comprometida
com os direitos dos que nela trabalham e estudam
e com a luta pela ampliação do direito à infância
para todos.
É responsabilidade do governo criar condições
materiais para que a escola enfrente esse desafio, bem
como interferir nas relações de trabalho, aplicando a
lei e punindo as empresas que utilizam mão-de-obra
infantil.
No entanto, todos os demais setores também po-
dem e devem participar: somos todos responsáveis,
tanto pelo apoio à escola e a seu trabalho, quanto pela
extinção do trabalho infantil.
Dessa tripla mobilização poderá surgir a efeti-
va extensão do direito à infância e à escola para
todos.
19
A organização do espaço e do tempo na escolaPrograma 3
18
stamos sempre falando de uma escola concreta,
histórica, inserida profundamente nos movimen-
tos mais amplos da sociedade, respondendo aos
desafios em seu cotidiano e atuando sobre eles. Não
existe a escola isolada, a escola alheia ao seu tempo:
não existe a escola abstrata.
Falamos da existência não de uma, mas de uma
multiplicidade de escolas. Tão diferentes entre si! Al-
gumas atendem a setores de elite e outras, a setores
populares. Outras, ainda, recebem e atendem a todos.
Estão em diferentes regiões, localidades, paisa-
gens... Com professores e professoras que falam dis-
tintas linguagens e vivem diferentes situações de tra-
balho, refletindo a pluralidade social e cultural do
país. Os alunos, por sua vez, também incluem os mais
variados públicos; mas a todos, sem exceções, deve
ser garantido o direito à infância e à escola.
Partindo da análise mais geral da relação entre a
escola e as demais instituições sociais, em seu movi-
mento de mútua transformação, queremos aqui nos
aproximar da dinâmica da escola, entrar na escola.
Dentro da multiplicidade de escolas possíveis, indo
além de suas diferenças, encontramos também ele-
mentos comuns, de uniformidade.
Nosso objetivo é falar da escola como organiza-
ção: como ela se organiza, como divide o trabalho
educacional, como se estrutura para receber seus alu-
nos? Trata-se de algo peculiar, ou também reflete as
formas mais gerais de organização do trabalho da
sociedade, recebendo suas influências?
A escola como local de trabalhoA escola como local de trabalho
A escola como local de trabalhoA escola como local de trabalho
A escola como local de trabalho
Durante um longo período – e, até hoje, muita gente
pensa assim –, a escola não era vista como um local
de trabalho. Seria o professor (a professora) um tra-
balhador (uma trabalhadora)? Essa perspectiva pode
ser entendida avaliando três fatores:
A influência religiosa: durante muito tempo, a es-
cola foi de responsabilidade de jesuítas, padres
e freiras, criando um modelo especial de escola
e de educação. A escola moderna segue ainda o
modelo do convento, da instituição religiosa.
O peso da idéia de vocação: o magistério seria
uma vocação natural de pessoas abnegadas, se-
guindo a visão do mestre-sacerdote, aquele que
dedica sua existência a esse ideal; essa perspec-
tiva manteve, mesmo na escola laica, a influên-
cia religiosa antes apontada.
O predomínio de mulheres transfere para a escola
os efeitos da desqualificação histórica do trabalho
feminino. As professoras não trabalhariam, se ocu-
pariam’ dando aula, sendo muito natural ficarem
com as crianças. Isso se reflete em falas como a
professora é uma segunda mãe”; e se conserva no
hábito de chamar as professoras de tias. São pro-
fissionais, ou são parentes?
Porém, o que é a escola senão o local de trabalho de tan-
tas e tantas pessoas? Há professores e professoras, auxilia-
res de ensino, diretores, técnicos em educação, secretárias,
vigias, serventes; o pessoal técnico e o pessoal adminis-
trativo e de apoio, planejadores e executores.
Como local de trabalho, a escola reproduz a divi-
são do trabalho e a especialização existentes na so-
EE
EE
E
A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO
E DO TEMPO NA ESCOLA
21
A organização do espaço e do tempo na escolaPrograma 3
20
ciedade: trabalho manual e intelectual, planejamento
e execução, professores generalistas e especialistas.
A escola está sujeita às regras e à disciplina do tra-
balho vigentes na sociedade, sujeita às crises econô-
micas e aos problemas salariais.
Sujeita, porém nunca passiva. Lutando organizada-
mente ou conservando seu espaço de autonomia na
sala de aula, modificando e adequando propostas
curriculares, os trabalhadores em educação podem
transformar as regras, a disciplina e a divisão interna
do trabalho na escola.
Um local para os alunos
Como a escola se organiza para receber seus alunos?
Quais são as regras que regem o uso do espaço e do
tempo? Serão essas regras naturais, próprias da prá-
tica pedagógica? Ou refletem a força de uma longa
tradição e de modelos mais gerais?
Um primeiro elemento de organização é a faixa etária.
Já vimos que nem sempre foi assim: durante muito tempo,
crianças, jovens e adultos freqüentavam a mesma sala –
diferenciando-se, mais tarde, por capacidade e idade.
A capacidade do aluno – que podia freqüentar séries
avançadas, mesmo que fosse muito jovem – atualmente
é menos considerada que a idade. É esta que marca o
tempo do início da escolarização, de forma estrita.
Também de forma estrita, a idade promove a
maior parte das expulsões’ de alunos repetentes: a
repetência cria uma situação insuportável para crian-
ças e jovens que vão se sentindo muito grandes e de-
sajeitados, separados de seu grupo etário.
Outro elemento fundamental da organização é a
divisão por séries, às quais se acede mediante provas
e exames que constatam a assimilação de determina-
do programa. Trata-se de uma visão de ‘tempo
evolutivo, de progresso linear entre uma fase e ou-
tra, um bloco e outro, homogênea e sucessivamente.
Mais um elemento que funciona como organizador
da vida escolar é a divisão do tempo: existem ‘horas
destinadas a cada atividade: é a ‘hora da Matemática
que, aparentemente, nada tem em comum com a ‘hora
de Português, Ciências, História ou Geografia. Com ho-
rários tão delimitados, o tempo deve ser aproveitado ao
máximo para exercitar o conteúdo das matérias.
E a hora do lazer? É a hora da explosão’ do recreio,
do retorno à vida’ para muitas crianças, para o exercício
da amizade e para a prática de jogos e brincadeiras. Tra-
ta-se do contraponto com as horas de aula, que sepa-
ram os amigos se eles conversarem e não prestarem
atenção, que obrigam à imobilidade e exigem contenção.
Entramos em mais um elemento de organização da
escola: o espaço. Tradicionalmente, a cada indivíduo
cabe um lugar, e a cada lugar corresponde um indiví-
duo. Cada aluno é classificado: por ordem alfabética,
entre os melhores e os piores, os mais adiantados e os
mais atrasados, os quietos e os bagunceiros.
Em geral, se evita a distribuição por grupos, as
pluralidades, as misturas. A ordem mais comum é a
da fila, que individualiza e classifica os alunos.
Haverá em todas as salas de aula lugares determinados para
todos os escolares de todas as classes, de maneira que to-
dos [...] sejam colocados num mesmo lugar e sempre fixo.
Os escolares das lições mais adiantadas serão colocados
nos bancos mais próximos da parede e em seguida os ou-
tros, segundo a ordem das lições [...] Cada aluno terá seu
lugar marcado e nenhum o deixará nem trocará [...] aque-
les cujos pais são negligentes e têm piolhos fiquem separa-
dos dos que são limpos [...] que um escolar leviano e dis-
traído seja colocado entre dois bem comportados e ajuiza-
dos, que o libertino ou fique sozinho ou entre dois piedo-
sos. (Citado em Foucault, 1984, p. 135)
23
A organização do espaço e do tempo na escolaPrograma 3
22
Este texto de J.B. de la Salle, de 1759, fala do com-
portamento a seguir nas escolas cristãs. E retrata bem
certas formas de classificação dos alunos que, em
certos casos, ainda persistem no presente.
Uma nova organização
Será que essa organização descrita é a única possível?
Não existiriam alternativas que possibilitassem outros
tipos de relacionamento entre professores e alunos,
professores e professores, ou outro uso do tempo e
do espaço?
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais consta a
proposta de que cada escola desenvolva seu projeto
educativo, respeitando as particularidades de seus
alunos, as peculiaridades da localidade em que se
insere e as possibilidades com que conta. Explicita-
se ainda que esse projeto só é possível com a partici-
pação de todos os trabalhadores em educação da es-
cola – sem exceção.
Com essa proposta, de fato, fica lançado um gran-
de desafio: propõe-se que não apenas é possível, mas
sim imprescindível, modificar algumas estruturas de
organização da escola.
O projeto educacional se torna um momento chave
para questionar as tradicionais divisões de trabalho,
do planejamento e da execução das tarefas, assim
como a separação entre as matérias e os horários, os
espaços rígidos e imóveis.
Ao abrir espaço para as trocas mútuas, os profes-
sores que participam do planejamento do projeto
educativo criam novos espaços para os alunos.
É possível discutir o tempo da atividade: qual é o tem-
po do envolvimento, do entusiasmo pela descoberta?
Deve necessariamente durar 40 minutos? O que fazer com
alunos cujos ritmos são diferentes? Essa situação pode ser
discutida entre os professores e também com os alunos.
Estabelecer claramente, e em comum, as metas que
se pretende alcançar e as atividades de acordo com os
diferentes ritmos dos alunos são atitudes que ajudam a
modificar a estrutura rígida do horário. A criação de no-
vas regras favorece a responsabilidade individual e tam-
bém a solidariedade entre os alunos e os professores.
A separação rígida de horários para cada matéria é
outro ponto a questionar. Ao trabalhar Geografia, por
exemplo, já estamos trabalhando com Português, que é
o suporte das anotações feitas pelos alunos; a Matemá-
tica, por sua vez, também está presente nas relações
estabelecidas entre os dados geográficos apresentados.
E quanto ao uso do espaço? É possível usar o es-
paço da sala de aula de muitas formas, ou reunir as
crianças em grupos de trabalho. Os agrupamentos
podem ser, por exemplo, por afinidade, ou misturan-
do crianças com ritmos diferentes – o que valoriza a
importância da solidariedade entre os colegas. Mais
uma vez, o importante é explicitar as metas e estabe-
lecer claramente os acordos com a classe.
A escola reflete, em sua organização interna, a orga-
nização mais geral do trabalho na sociedade; mas isso
pode ser modificado, criando uma nova relação en-
tre os professores, entre os professores e os alunos e
na escola como um todo.
BIBLIOGRAFIA
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Petrópolis, Vozes,
1984.
SINGER, Helena. República de crianças. Sobre experi-
ências escolares de resistência. São Paulo, Fapesp/
Hucitec, 1997.
25
A violência na escolaPrograma 4
24
o chegar à escola pública, muitas crianças já são ven-
cedoras de várias batalhas: em primeiro lugar, ven-
ceram a batalha contra a desnutrição, a desidratação,
as verminoses; depois, conseguiram resistir à tentação da
rua, que seduz com a ilusão de liberdade; e, principalmen-
te, elas estão apostando na escola, nessa primeira rodada
da injusta competição entre a escola e o trabalho infantil.
Por tudo isso, ao adentrar pela primeira vez os
portões de uma escola de primeiro grau, essa criança
deveria ser recebida como heroína. Mas não é o que
costuma acontecer.
Ela ainda vai ter de enfrentar a violência da própria
escola, muitas vezes sutilmente disfarçada, para preser-
var sua imagem da demolição sistemática engendrada
pelo preconceito de colegas e professores. Apelidos
maldosos e brincadeiras embaraçosas são exemplos de
situações humilhantes que levam muitos alunos menos
adaptados a se sentir como forasteiros rejeitados. Essas
atitudes marcam alguns alunos com o estigma do fracas-
so e muitas vezes selam seu destino de excluídos.
A expectativa do professor sobre o sucesso ou o
fracasso do aluno é decisiva: aqueles em cujo suces-
so o professor acredita tendem realmente a ter resul-
tados melhores. O problema é que, na maioria dos
casos, as expectativas do professor se baseiam em
indicadores falsos e preconceituosos, como a aparên-
cia física da criança, o grau de asseio de suas roupas,
sua capacidade de concentração ou de expressão.
São ridicularizados e humilhados o aluno tímido, o
que não consegue se exprimir com clareza, o sujo, o
maltrapilho, o desatento, o que não tem cabeça para o
estudo, o que não tem base. Estes vão se isolando – tra-
tados com frieza e distanciamento, é como se deixassem
de pertencer ao universo de interesse do professor.
Mesmo sem se dar conta, o professor atua muitas
vezes como aliado dos alunos mais fortes e integra-
dos, tornando-se agente do processo de exclusão dos
menos favorecidos.
Exemplos de condenações prematuras e preconcei-
tuosas se concretizam em frases como: Você não tem jeito,
mesmo!; Se você não aprendeu isso até agora, não vai apren-
der nunca!; Você, de novo!; Sempre você!.
Ou, pior ainda, na sala dos professores: A minha
classe tem três ou quatro alunos que se salvam, o resto não
vai dar nem para faxineiro!
Ao passar adiante esse tipo de informação, o profes-
sor contribui para que o rótulo de caso perdido’ se trans-
forme em uma segunda pele do aluno, que acaba por in-
corporar a certeza de sua condenação ao fracasso – na
escola e na vida.
O lugar dos alunos na sala (mais perto ou mais
longe do professor), o tipo de avaliação feita pelo
professor (no sentido de favorecer ou de dificultar o
desempenho de algumas crianças), o estímulo, ou não,
à cooperação entre os colegas, os critérios pelos quais
os alunos são reunidos para trabalhar em grupos –
todas essas situações exemplificam recursos que a
rotina da sala de aula oferece para reverter, ou para
confirmar, o destino das crianças menos preparadas.
Estranho hospital, esse, que parece só aceitar as pes-
soas sadias, e não tem vagas para tratar dos que estão
realmente doentes e exigem os maiores cuidados. Pois são
justamente estes os alunos que precisariam atenção re-
AA
AA
A
A VIOLÊNCIA NA ESCOLA
27
Programa 5
26
dobrada. É sobre eles que estão os olhos cúpidos dos tra-
ficantes de drogas, dos aliciadores de menores para o tra-
balho clandestino, dos abutres da prostituição infantil.
O professor não é responsável pelas situações de in-
justiça social, mas em suas mãos talvez estejam as ar-
mas mais poderosas para defender as crianças e
transformá-las de vítimas em agentes de mudança.
A escola é, muitas vezes, a única esperança de re-
versão das expectativas. Pelo menos dentro de seus
muros, a criança tem o direito de ser tratada com jus-
tiça e eqüidade, independentemente da sua capacida-
de de concentração, da cor de sua pele ou da quali-
dade de suas roupas. Talvez seja o único modelo de
convivência digna que a vida lhe possa oferecer.
O professor precisa ter consciência de que essa
relação se constrói no cotidiano, em cada atitude que
assume em sala de aula: seus gestos, a entonação de
sua voz e sua postura corporal são registrados pelos
alunos (consciente ou inconscientemente) como si-
nais de aprovação ou reprovação.
Um primeiro passo para mudar o quadro dessa
violência sub-reptícia é ter clareza de suas opções e
das implicações que elas geram. Para superar os pró-
prios preconceitos, é imperioso conhecê-los. Colo-
car-se no lugar de seus alunos e conversar com ou-
tros professores, buscando ajuda para suas dificul-
dades, são caminhos importantes em direção a uma
relação mais justa.
Esse é um momento crucial para instilar a tolerância
ou a intolerância, o preconceito ou a solidariedade.
Para que o processo educacional seja bem suce-
dido, a relação entre professor e alunos deve ser pau-
tada pelo respeito mútuo, pela confiança dos alunos
no saber do mestre e pela esperança do professor no
futuro de seus alunos.
ão existem no repertório humano contatos neu-
tros, nem inócuos. Toda relação entre pessoas,
especialmente entre um adulto e uma criança,
implica troca de afeto e transmissão de valores.
A inserção da criança no convívio humano se faz
pelo vínculo com a mãe, que pontua seu relaciona-
mento com os outros membros do grupo familiar,
transmitindo (consciente e inconscientemente) regras
e valores que norteiam a maneira pela qual a criança
vai lidar com seus afetos, expressá-los e, por outro
lado, perceber e entender as manifestações afetivas.
Quando uma criança pequena leva um tombo, sua
primeira reação é procurar, na expressão da mãe, o
sentido do que acaba de acontecer: o que ela vê no
rosto da mãe lhe indica se deve chorar, rir, assustar-
se ou seguir adiante como se nada tivesse aconteci-
do. Assim, a experiência do tombo será registrada
como triste, engraçada, ameaçadora ou neutra, con-
forme a tradução emocional feita pela mãe.
Esse processo, que se prolonga por toda a vida
(mesmo depois de adultos, muitas vezes procuramos
junto ao outro a compreensão de emoções que nos
tomam e que somos incapazes de tolerar), é funda-
mental na infância, quando tudo que a criança vive
pede uma decodificação.
A escola tem uma função equivalente, em outro ní-
vel: ao fazer a transição sistemática do ambiente familiar
(isto é, a vida privada, habitada por parentes) para o
NN
NN
N
O VÍNCULO
29
O vínculoPrograma 5
28
convívio social (ou seja, a vida pública, habitada por
cidadãos), ela tem por tarefa traduzir para a criança as
normas gerais que regem o convívio humano e a baga-
gem cultural acumulada ao longo das gerações, de
modo que a criança possa compreendê-las e utilizá-las.
A escola tem o poder de ajudar a criança a fazer uma tra-
dução crítica das vivências que traz, mostrando-lhe a
possibilidade de uma nova leitura do mundo e desen-
volvendo nela a esperança de um mundo mais justo.
A relação entre professor e alunos está impregna-
da de afetos, alguns difíceis de reconhecer e tolerar.
Os vínculos afetivos têm o poder de mobilizar dife-
rentes facetas de nossa personalidade. Algumas pes-
soas despertam em nós os sentimentos mais eleva-
dos, enquanto outras parecem provocar nossos pio-
res aspectos.
Simpatias e antipatias brotam desse mecanismo:
simpatizamos com quem nos faz sentir generosos e
competentes; tendemos a evitar as pessoas cujo con-
tato nos remete a aspectos menos lisonjeiros de nós
mesmos.
Essas reações não são definitivas: às vezes, nosso
olhar se transforma e passamos a repelir o que antes
nos atraía, ou a tolerar o que antes incomodava.
Numa relação amorosa isso fica especialmente claro,
quando comparamos os tempos da paixão com a fase
do desgaste do relacionamento: as mesmas atitudes
que encantavam passam a ser vistas com irritação. O
que mudou? Muito mais o olhar, do que o objeto.
Um bom exemplo desse processo é o que aconte-
ce quando assistimos ao filme ET, de Spielberg. Aque-
la criatura estranha, com enormes olhos úmidos, pele
de réptil, emitindo sons guturais, de início parece as-
sustadora, depois repulsiva e termina por nos inun-
dar de ternura.
Não há metamorfose de sapo em príncipe – o as-
pecto do bichinho continua o mesmo. A mágica acon-
tece dentro de cada um de nós; pelas transformações
emocionais que a personagem mobiliza à medida que
nos aproximamos dela, estabelecemos uma relação
de intimidade e passamos a compreender seus senti-
mentos.
Essa dinâmica também está presente na relação
entre o professor e seus alunos. Numa sala de aula
existem muitos ‘ETs’, criaturinhas que parecem caídas
de outro planeta, tal seu desajeitamento, sua
inadequação e seu desconforto dentro da classe. Elas
provocam no professor uma sensação incômoda, por-
que mobilizam nele suas dificuldades menos resol-
vidas e algumas vezes menos conhecidas.
A criança que não consegue ficar quieta, por exem-
plo, pode ser a que mais perturba um professor que
não sabe lidar com suas próprias inquietações; a
criança que fala pouco, pode incomodar uma profes-
sora que não sabe interagir com a timidez.
Se o professor se dispõe a conhecer efetivamente seus
alunos e a se aproximar deles, descobre que parte da
inadequação decorre do fato de que muitos não tra-
zem de casa, como bagagem, alguns requisitos míni-
mos para formar um vínculo com o professor e apro-
veitar o que a escola oferece.
Comportamentos como fazer perguntas, esperar
sua vez de falar, usar um adulto como fonte de infor-
mação, por exemplo, parecem fazer parte do repertó-
rio de qualquer criança. Mas, na verdade, eles devem
ser construídos.
A criança precisa ter vivido situações em que foi
ouvida, em que teve de escutar, ou em que encontrou
um adulto disponível para dar-lhe uma informação – o
que nem sempre acontece nas casas em que pai e mãe
31
Programa 6
30
estão ausentes o dia inteiro e não há nenhum adulto cui-
dando da criança. É preciso também que o adulto pre-
sente seja uma fonte de ajuda confiável – e sabemos
que, em muitas casas, isso dificilmente acontece.
Pela autoridade de que está investido, o professor
exerce uma grande influência sobre seus alunos. Por
ele passa muito mais do que a informação: a partir
de sua atitude e de sua postura dentro da sala de
aula, os alunos aprendem todo um código de ética.
Mais que isso, ele precisa ter em mente que o sig-
nificado atribuído por ele aos comportamentos dos
alunos tem importância fundamental na construção da
auto-imagem da criança: seu olhar pode alimentar a
esperança de sucesso, reafirmando a competência e a
adequação, ou condenar ao fracasso, congelando em
seu aluno uma auto-imagem de incompetente.
o dia 10 de abril, Paulinho foi portador do se-
guinte bilhete de sua professora para sua mãe:
Prezada Ana Maria, Paulinho hoje se comportou
muito mal, não fez a lição e atrapalhou o trabalho de
seu grupo. Peço tomar providências. Assinado: Teca, pro-
fessora do pré.
No dia 12 de abril, Paulinho entregou para sua
professora o seguinte bilhete, mandado por sua mãe:
Prezada Teca, hoje Paulinho se comportou mal, não quis
escovar os dentes e brigou com a irmã menor. Peço to-
mar providências. Assinado: Ana Maria, mãe.
Esse diálogo entre a mãe e a professora do
Paulinho é pouco provável. Mas a confusão entre o
que cabe à escola e o que cabe à família pode criar
situações difíceis para os dois lados.
Os pais reclamam que não têm obrigação de
ajudar os filhos nas tarefas escolares, nem de
encapar seus cadernos; os professores se queixam
de que os pais deixam tudo por conta da escola,
não comparecem às reuniões, nem respondem aos
bilhetes que os convocam para conversar sobre o
desempenho da criança.
Ambos têm razão, mas a criança só tem a perder
se os seus mais importantes aliados – a família e a
escola – desperdiçarem esforços nesse desencontro
estéril, em vez de se unirem para educá-la.
Existe, de fato, uma falsa expectativa de que a es-
cola de primeiro grau funcione como um prolonga-
NN
NN
N
PAIS: INIMIGOS OU ALIADOS?
33
Pais: Inimigos ou aliados?Programa 6
32
mento da casa, confundindo a função do professor
com a de um parente próximo (o tratamento de tia
confirma e acentua a confusão).
Os pais, por sua vez, sentem medo e vergonha de
ir às reuniões da escola: vergonha de seu despreparo,
do seu jeito de vestir, do seu modo de falar. Têm
medo de ouvir o que a professora tem a dizer, por-
que é freqüente escutarem nessas reuniões que aque-
la classe só tem três alunos que valem a pena’ (e seu
filho dificilmente está entre os eleitos). Quando res-
pondem ao chamado do professor, é para receber um
sermão sobre o que precisam fazer para o menino
tomar jeito.
É imprescindível o contato direto entre a escola e os
pais, e esse contato não pode ser substituído por
bilhetinhos impessoais e burocráticos.
A comunicação escrita não faz parte do repertório
de muitas dessas famílias. Assim, as tentativas de diá-
logo por escrito deixam todos desapontados: o pro-
fessor, por não receber resposta, e os pais, por se sen-
tirem despreparados para atender à expectativa da
escola.
Os encontros periódicos com os pais são muito
importantes, mas não devem servir apenas para co-
nhecerem a situação de seu filho; devem servir tam-
bém para que entendam o funcionamento da institui-
ção em que a criança passa tanto tempo – e na qual
os pais depositam tantas esperanças.
Mas, que motivação teriam os pais para compa-
recer às reuniões se, em vez de receberem informa-
ções relevantes sobre o desenvolvimento infantil e
sobre o trabalho realizado na escola, forem se sentir
sabatinados, constrangidos diante de solicitações
para as quais se sentem incompetentes?
Por que iriam à escola do filho, se não sabem se
comportar naquele universo que definitivamente não
é o deles?
E que condições teriam de comparecer a encon-
tros marcados durante o horário em que fatalmente
estão trabalhando?
Outra situação constrangedora é criada pelas li-
ções de casa, que muitas vezes são um verdadeiro
tormento para os pais. Eles se sentem obrigados a
fazer uma tarefa para a qual não estão preparados e
se sentem desmoralizados por expor seu despreparo
diante dos filhos; além disso, se angustiam com a
perspectiva de que a criança seja prejudicada por não
levar a lição em ordem.
A tarefa na verdade poderia se transformar num
momento de aproximação e troca, quando a criança
poderia compartilhar com os pais o que aprendeu na
escola: cantando uma música, contando uma história,
explicando um jogo, relatando descobertas feitas na
aula de Ciências e assim por diante.
A escola poderia funcionar como agente de valoriza-
ção dos pais que, nas áreas em que trabalham, são
portadores de conhecimentos e informações ignora-
dos pelo professor.
Chamar os pais para transmitir suas experiências
em sala de aula é um recurso inestimável, com o qual
todos ganham: os pais, por se sentirem competentes e
conquistarem um olhar mais respeitoso dos próprios
filhos e de seus colegas; os alunos, por receberem in-
formações em primeira mão, mais vivas do que as
registradas nos livros; e a escola, por abrir um canal
protegido para um contato diferenciado entre gerações,
tornando-se de fato um espaço comunitário.
Talvez os pais dos alunos também não se sentissem
tão forasteiros se a escola promovesse eventos que mo-
bilizassem e atraíssem a comunidade, dando a seu es-
35
Pais: Inimigos ou aliados?Programa 6
34
TÉCNICAS DIDÁTICAS
paço um novo papel de centro de convívio e de atuali-
zação, além de sua tradicional função como centro pri-
vilegiado do saber e do dever.
Se a escola se cristalizar como uma torre de marfim,
para cujo ingresso a comunidade não tem senha, não
pode esperar que os pais se sintam aliados do pro-
fessor e não fiquem alheios ao processo educacional
de seus filhos.
Um questionário aplicado a universitários, no co-
meço de 1997, revelou que uma alta porcentagem dos
alunos de faculdade eram filhos de pais que não ti-
nham completado o primeiro nível do primeiro grau.
Isso significa que, muitas vezes, um aluno de 3
a
série é a pessoa mais culta da casa em que mora. A
escola poderia converter essa criança em portadora,
junto à família, de um tipo de conhecimento a que os
pais não têm acesso: os pais poderiam ser convida-
dos a vir à escola para ouvir as crianças falarem de
seus estudos e suas atividades, participar de eventos
esportivos, ver uma exposição de trabalhos.
Esse processo poderia transformar os pais em alia-
dos, na luta para instituir uma escola mais aberta,
mais democrática, mais justa – talvez o único cami-
nho para a construção de um mundo mais digno.
37
Como organizar a classePrograma 1
36
xistem pelo menos três maneiras de organizar
os alunos para realizar as atividades em sala de
aula: 1) formar um grupo só com a classe toda;
2) dividir a turma em pequenos grupos; e 3) solicitar
trabalho pessoal.
Qual escolher? Escolha as três. Cada uma funciona
melhor numa dada situação, para atingir um certo objeti-
vo. Todas têm vantagens e trazem riscos. É importante ana-
lisar cada uma delas para tirar o máximo proveito das van-
tagens e reduzir os riscos correspondentes.
EE
EE
E
COMO ORGANIZAR A CLASSE
Querida Marília
Não há um dia em que eu não sinta sua falta aqui no curso! Nem
eu sabia que estava tão acostumada a trabalhar, discutir, pen-
sar com você. Também, pudera, são quantos anos de convivência
na mesma escola, na mesma classe, no mesmo grupo? De tanto
eu falar nisso, aqui, a professora já fez uma piada: ela disse que,
se todos utilizam dois hemisférios cerebrais para resolver pro-
blemas, eu me acostumei a usar quatro – meus dois e os seus
dois... Por isso, vá se preparando para fazer esse curso a distân-
cia, pois eu pretendo descrever os principais momentos e pas-
sar minhas dúvidas por escrito para você. Quem sabe se, entre
uma mamada e uma troca de fraldas, você acha tempo para res-
ponder?
A primeira novidade, que você iria adorar, são as estratégias
adotadas pela professora. Não faremos leitura coletiva seguida
de discussão do texto. Em vez disso, ela vai propor desafios,
situações-problema que exijam mais criatividade que memória.
Depois disso, a leitura de textos será feita em casa, individual-
mente. Na aula seguinte, novos exercícios e esclarecimentos de
dúvidas. Não é a sua cara? Aí vai uma cópia do primeiro texto
junto com meus comentários, para seu deleite.
Deleite? Pois dê leite à Martinha, quero ver essa bochechuda
bem fofa quando a madrinha voltar!
Beijos,
Marta
Aula coletiva
Trabalho pessoal
Atividade
em grupos
economia de tempo
autodisciplina
o grupo grande dá
mais idéias
a construção do co-
nhecimento exige
reflexão individual
instinto gregário
divisão de tarefas
liderança e consenso
cooperação e com-
petição
antecipação de
respostas
perda das diferenças
individuais
desinteresse e
distração
necessidade do outro
para validar as pró-
prias idéias
timidez e exibicio-
nismo
bagunça, indisciplina
perda de objetivida-
de da discussão
construção individual
do conhecimento
Tipo Vantagens Riscos
39
Como organizar a classePrograma 1
38
deixar que os alunos encontrem as soluções, não
antecipar respostas (explorar a curiosidade
como elemento de motivação);
manter em níveis razoáveis a pressão do grupo
sobre posições divergentes, chamar a atenção dos
alunos para o esforço feito pelo coletivo para
dissolver diferenças individuais (abrir espaço
para as teses minoritárias e reduzir o impacto da
maioria, que nem sempre está certa);
encerrar a atividade antes que se esgote o inte-
resse pelo tema (deixar os alunos com gosto de
quero mais’).
Trabalho pessoal
Nada substitui essa etapa do processo de constru-
ção do conhecimento. A elaboração mental de no-
vas sínteses e a acomodação interna dos sistemas
de conceitos e valores a partir de novas informa-
ções – trazidas pela exposição da professora, pela
discussão em grupos, ou pela leitura de um texto
esclarecedor – constituem o momento íntimo, pe-
culiar a cada pessoa, que fecha um ciclo de apren-
dizagem ao mesmo tempo que abre outro, numa
espiral continuada.
A sala de aula é também um espaço em que essa
reflexão deve ocorrer, sob a forma de uma redação,
um relatório, um questionário, uma lista de associa-
ções de causa e efeito etc.
Entretanto, as discussões em grupo são importantes
para passar a limpo certas idéias que, muitas vezes, cada
um de nós acalenta no seu íntimo e considera da maior
relevância. O grande teste de uma idéia é sua apresenta-
ção a interlocutores capazes de apreciá-la. A exposição
aos colegas pode mostrar erros e lacunas de um raciocí-
nio que, na solidão do pensamento, parecia perfeito.
Aula coletiva
Muitas vezes, a melhor maneira de apresentar um
novo tema é a exposição oral, feita pela professora
para a classe inteira. Ela pode escolher os pontos prin-
cipais, destacá-los e lançar desafios para os alunos
coletivamente, em poucos minutos. Em muitos casos,
essa estratégia se mostra mais efetiva que um vídeo,
ou uma dinâmica de motivação, pela combinação
entre resultados obtidos e tempo investido.
Para assegurar essa efetividade, entretanto, é pre-
ciso que a professora preste atenção em alguns aspec-
tos muito importantes, como:
destacar determinados aspectos do tema, usan-
do-os como isca para atrair a atenção dos alu-
nos (alunos desinteressados ficam inquietos);
seguir uma seqüência bem didática, mesmo que
desrespeitando a cronologia dos acontecimen-
tos descritos (a ordem psicológica é mais im-
portante que a cronológica);
assegurar que todos os alunos estejam partici-
pando, o que se pode perceber pelas perguntas,
pelos comentários, ou mesmo pela expressão de
concentração (a professora não deve ficar de
costas para a classe, pois o contato visual, olho
no olho, reforça a comunicação);
estimular a autodisciplina, lembrar as regras do
convívio coletivo e garantir que sejam obedeci-
das (essas regras precisam ser estabelecidas logo
no início do ano, com a participação de todos);
permitir a mais ampla oportunidade de expres-
são e explorar as diferenças de opinião, a diver-
sidade de experiências e as variedades de estilo
(ficar atenta aos mais tímidos, respeitar essa ca-
racterística, mas incentivá-los a se superar);
41
Pense no assuntoPrograma 2
40
proposta de organizar os alunos em pequenos
grupos para realizar algumas atividades em
sala de aula se baseia no instinto gregário do
ser humano, em sua (nossa) necessidade de conviver
e ser aceito pelo próximo. O interesse em se reunir,
fazer parte de um grupo, se associar a outros huma-
nos, é tão universal que é considerado uma das ne-
cessidades básicas de sobrevivência da espécie.
O desejo de pertencer a um grupo manifesta-se
relativamente cedo, na pré-adolescência ou na puber-
dade, assim que garotinhas e garotinhos começam a
se interessar por outras coisas além de EU & MIM
até então, alvo absoluto de suas atenções.
Mais que uma característica psicológica, compartilhar
um espaço comum e organizar o convívio nesse am-
biente é exigência imposta pela sobrevivência física.
Uma das formas mais primitivas de divisão de
tarefas remonta ao início dos tempos, quando o ma-
cho da espécie saía em busca de alimentos e a fêmea
ficava na caverna cuidando da cria.
A crescente complexidade do relacionamento so-
cial e do conhecimento científico apenas tornou essa
divisão mais essencial para nossa espécie. É impos-
sível uma pessoa sobreviver, hoje em dia, sem trocar
bens ou serviços com outras pessoas. Uma situação
que pode ser resumida assim:
PENSE NO ASSUNTO
Querida Marília
Ficamos um tempão discutindo se a aula coletiva ainda tem lu-
gar no mundo moderno, se ela pode conviver com formas mais
participativas de atividade. Depois de muitos altos e baixos,
conseguimos concordar que a escola pode e deve combinar dife-
rentes estratégias, desde que fique assegurado o princípio de
centrar as atividades nos alunos.
Deixamos claro que a aula não pode ser monótona e cansati-
va: a professora levanta questões, provoca, dá exemplos, confe-
re o que os alunos dizem e relaciona as respostas de cada um.
Sem tirar deles o gostinho da descoberta...
Também ficou claro que a professora precisa conhecer bem o
assunto e preparar a aula. Mas sem medo de admitir que não
sabe, se surgir uma perguntinha daquelas... “Puxa, esta eu não sei,
o que vocês acham? Vamos procurar num livro (ou no micro)?”
Resumindo: a combinação de diferentes tipos de atividade,
incluindo diversas formas de organizar a classe, estimula o de-
senvolvimento de várias habilidades necessárias ao crescimen-
to dos alunos. As aulas ficam muito mais animadas e diverti-
das, o que é bom para todos.
Bem, colega, você vê que nós duas estamos no caminho cer-
to. Aposto que nossos alunos sentem essa animação e energia,
ainda que a gente também tenha um ou outro dia mais difícil,
que rende menos...
Beijos para mãe e filha,
Marta
AA
AA
A
43
Pense no assuntoPrograma 2
42
da palavra (quem fala de cada vez, por quanto tem-
po, como se pede a palavra etc.) e a distribuição
eqüitativa do tempo de discussão entre os mem-
bros da equipe. Tanto a definição das regras como
a preocupação com seu cumprimento são lições de
cidadania.
O papel da professora é estimular a cooperação
interna de cada equipe e manter em níveis toleráveis
a competição entre elas. Um balanço razoável dessas
forças pode conduzir a resultados muito satisfatórios
mas, para os alunos, o mais valioso é o exercício
dessa situação e a análise do que vivenciaram.
Liderança e consenso
É importante criar um clima de descontração e con-
fiança, em que todos se sintam protegidos e dispos-
tos a se expor, a dar sua opinião, a dizer o que pen-
Para que eu possa comer e seguir realizando mi-
nha parte nessa intrincada rede de interdependências
a que chamamos sociedade é preciso que alguém
plante e colha, mais alguém elabore e produza comi-
da, alguém distribua e venda esses produtos.
Outro aspecto muito positivo do trabalho em equipe con-
siste em permitir uma divisão das tarefas mais
especializadas. Quer dizer, cada aluno pode participar fa-
zendo aquilo de que gosta mais, ou o que sabe fazer me-
lhor, ou ainda, uma coisa que quer aprender a fazer. Essa
dinâmica também contribui para mostrar às crianças e aos
jovens as vantagens da diversidade, a riqueza que se
pode extrair das diferenças entre as pessoas – e o quanto
essa característica tem sido útil à espécie humana, em sua
luta para sobreviver em meio a outras espécies.
Cooperação e competição
A escola pode e deve preparar os jovens para que
participem da vida em sociedade com maior seguran-
ça. As atividades desenvolvidas em sala de aula, com
os alunos organizados em equipes, proporcionam
uma boa oportunidade para cada um testemunhar a
importância da cooperação.
Por outro lado, nessa hora deve-se prestar aten-
ção também à competitividade, traço presente em to-
das as pessoas, porém mais acentuado em umas que
em outras. O trabalho em grupo acrescenta à compe-
tição individual a rivalidade entre os grupos. O dese-
jo de ganhar, ser o melhor, conquistar o primeiro lu-
gar é um recurso motivacional importante na vida
escolar – e não só nela –, e merece ser administrado
cuidadosamente.
A professora deve assegurar o respeito às re-
gras de ouro do trabalho em equipe, que devem
ser estabelecidas em conjunto pela classe toda.
Dentre elas deve constar a regulamentação do uso
45
Pense no assuntoPrograma 2
44
que algum grupo se afaste demais do tema, a pro-
fessora deve acompanhar as discussões de cada
um, sempre abrindo espaço para as manifestações
espontâneas.
Tudo isso toma tempo.
Sem dúvida, a aula coletiva é a alternativa mais econô-
mica em termos de tempo. Entretanto, é preciso lembrar
que o tempo investido em uma discussão em pequenos
grupos gera outros ganhos, além da introdução do tema.
O exercício de expor as próprias idéias, e para isso
dar forma a pensamentos até então nebulosos, per-
ceber como essas idéias são recebidas pelos cole-
gas, ouvir o outro e analisar os pontos comuns e
as divergências, buscar uma saída negociada, um
compromisso entre as posições apresentadas, esta-
belecendo alianças baseadas em valores e concei-
tos – tudo isso vale o tempo a mais requerido pelo
trabalho em grupos. A organização do calendário
deve contemplar uma combinação ajustada de es-
tratégias didáticas.
Indisciplina
Para que os objetivos do trabalho em grupo sejam al-
cançados, é preciso flexibilizar os critérios de ordem e
disciplina. Um pouco mais de barulho (vozes, arrastar
de cadeiras, risadas...) é um preço baixo a pagar, se o
desenvolvimento da atividade assim o exigir. E, geral-
mente, exige!
A ordem e a disciplina devem ser avaliadas com
base na adesão à proposta de trabalho, no
envolvimento com a tarefa e na manutenção de con-
dições ambientais satisfatórias. Quer dizer, que cada
equipe fale, discuta, argumente, num tom de voz que
não impeça aos colegas da equipe vizinha ouvir o que
dizem seus próprios componentes.
sam, para permitir um confronto entre os valores dos
diferentes indivíduos. Um dos objetivos do trabalho
em grupo é administrar esse confronto, de modo a
respeitar as diferenças sem levar ao impasse, encon-
trar a margem de negociação possível para chegar a
um resultado aceitável para todos – mesmo que não
seja exatamente o que cada um gostaria de concluir.
O exercício de construção do consenso, a experiência
de abrir mão de uma parte das suas idéias para for-
mar alianças e agregar mais força em torno de um
conjunto menor de propostas, é também lição de ci-
dadania.
Nesse processo, o papel da liderança aparece com
destaque. Esse papel pode ser ocupado por diferen-
tes alunos, dependendo do tipo de atividade a ser de-
sempenhada. Os tipos de liderança e os estilos de
personalidade dos líderes influem sobre os resulta-
dos alcançados.
Diferenças individuais
A professora deve aproveitar as sessões de grupo
para, passeando entre as equipes, observar e conhe-
cer melhor o estilo de cada aluno. Nesse processo,
ela deve estar atenta para corrigir os exageros tão
comuns na adolescência, incentivando os mais tí-
midos e contendo os exibidos. Deve ficar claro para
o grupo que a participação de todos torna melhor
o resultado.
O fio da meada
Uma das maiores preocupações das professoras
quanto ao trabalho em grupos é que quem conduz
o assunto são os próprios alunos; isso pode levar
cada grupo a um ponto diferente. Movidos por seu
interesse e pela curiosidade, os alunos podem per-
der o fio da proposta feita inicialmente. Para evitar
47
Atividades em grupoPrograma 3
46
s sugestões apresentadas a seguir devem ser
adaptadas pela professora, que levará em conta
a idade e a série de seus alunos, as condições
da escola e a adequação das atividades aos objetivos
do currículo. A própria prática irá sugerindo variações,
aumentando a diversidade de propostas e incentivan-
do a participação dos alunos.
É importante analisar o processo de composição
dos grupos. Existem várias possibilidades, que devem
ser alternadas. A livre escolha entre colegas é interes-
sante, mas exige a atenção da professora para lidar
com os que não costumam ser escolhidos.
Por outro lado, é importante que os alunos se
acostumem a trabalhar com quem for preciso, ain-
da que prefiram escolher os companheiros – nem
sempre isso vai ser possível na vida real. Quanto
maior a variedade de pessoas com quem eles divi-
dem tarefas na escola, maiores serão as probabili-
dades de adaptação à diversidade do mundo lá fora.
E agora, quanto à avaliação. Como avaliar o tra-
balho em grupo? O que precisa ser avaliado?
Toda avaliação procura medir, de alguma forma,
até que ponto o objetivo foi alcançado. Se o obje-
tivo for estimular a curiosidade em relação a um
tema, por exemplo, os participantes devem avaliar
em que medida isso foi conseguido. Quando o ob-
jetivo é conhecer melhor um assunto, através de
pesquisa em materiais extraclasse, a avaliação deve
ATIVIDADES EM GRUPO
Querida Marília
Você ia adorar a conversa que surgiu na última aula! Algumas
professoras disseram que a escola já faria muito se conseguis-
se ensinar direito os conteúdos escolares, deixando que o meio
social se ocupe da cidadania! Discutimos muito e finalmente
concordamos: a escola precisa fazer alguma coisa justamente
para formar cidadãos mais conscientes que nós...
Não se trata de dar lições, mas de aproveitar as oportuni-
dades e aprendermos junto. Tolerância, reconhecimento das di-
ferenças e respeito à diversidade são valores transmitidos pelo
exemplo, muito mais que pelo discurso. Criança não é boba!
Quando estávamos envolvidas numa atividade em equipe, a
professora foi provocando, sugerindo, perguntando, até voltar a
um dos nós da sala de aula: o desconforto que a professora sen-
te quando a conversa dos alunos segue um rumo inesperado e
chega a algum assunto que eles conhecem mais que ela.
É muito fácil ficar dizendo que basta responder “Não sei, va-
mos procurar num livro?” Mas você não pode ficar o tempo inteiro
repetindo não sei, não sei... Afinal, somos professoras! Concluímos
que é muito importante estar sempre aprendendo, acompanhan-
do as novas descobertas.
Claro que uma coisa puxa a outra e evoluímos para uma
belíssima discussão sobre a valorização da carreira, o estatuto,
o piso... Mas isso você já sabe de cor, não preciso repetir.
Agora, exemplos de atividades que estou ansiosa para co-
locar em prática!
Beijos carinhosos pra você e pra Martinha,
Marta
AA
AA
A
49
Atividades em grupoPrograma 3
48
5). Proponha um tema e deixe conversarem por 10
minutos. Reorganize então os grupos, reunindo to-
dos os número 1’ de cada grupo; depois, os número
2’, e assim sucessivamente, formando cinco novos
grupos. Diga para apresentarem as conclusões da pri-
meira fase aos novos interlocutores. Passados 10 mi-
nutos, abra a discussão para o coletivo, destacando
pontos de concordância e divergências.
4. Perguntas e respostas
Divida a classe em cinco grupos e peça para elabora-
rem quatro perguntas sobre determinado tema. Escre-
va cada pergunta em uma folha separada e identifi-
que o grupo que a fez. Depois, encaminhe as ques-
tões formuladas pelo grupo A aos grupos B, C, D, E –
e assim sucessivamente.
medir se o nível desse conhecimento mudou, no
final da atividade.
Notas, conceitos, graus: a medida pode variar. O
importante é desenvolver a capacidade de análise e
julgamento dos alunos, oferecendo-lhes oportunida-
des de criticar e avaliar o trabalho realizado.
Exemplos de atividades em grupo
1. Philips 66
Para aquecer o ambiente e levar os alunos a focalizar o
tema da aula, forme grupos de seis alunos. Faça uma
pergunta. Eles terão 5 minutos para discutir e 1 minuto
para redigir a resposta. O segredo do sucesso dessa ati-
vidade é a formulação da pergunta, que deve ser curta,
muito clara e provocativa. Além de motivador, esse exer-
cício é muito indicado para desenvolver a capacidade de
síntese e a organização dos grupos.
2. Painel simples
Organize cinco ou seis grupos. Proponha um tema para
cada grupo pesquisar e apresentar uma semana depois,
para a classe toda. Combine o tempo da apresentação
(cerca de 20 minutos) e ofereça ajuda para a prepara-
ção. No dia marcado, sorteie o aluno que fará a exposi-
ção, em cada grupo. Os demais ficam na platéia, pres-
tando atenção, fazendo perguntas e comentários.
Um dos objetivos dessa atividade é criar nos
alunos o hábito de ouvir e de aguardar sua vez
para falar. Terminadas as apresentações, faça um
breve resumo das principais colocações.
3. Painel integrado
Divida a classe em cinco grupos de cinco alunos –
por exemplo, A, B, C, D e E. Dentro de cada grupo,
atribua um número a cada participante (1, 2, 3, 4 e
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
Grupo A
Grupo B
Grupo C
Grupo D
Grupo E
Grupo 2
C
A
B
D
E
Grupo 3
A
C
E
D
B
Grupo 1
A
B
C
E
D
Grupo 5
A
C
E
D
B
Grupo 4
A
B
D
E
C
51
Atividades em grupoPrograma 3
50
EDUCAÇÃO FÍSICA
Cada grupo deve responder, por livre escolha, uma
das questões recebidas. Finalmente, volte a reunir a
classe, lendo as questões escolhidas e as respostas.
Estimule as discussões, observando qual equipe teve
mais perguntas escolhidas pelos colegas.
5. Verbalizar e observar
Divida a classe em dois grupos e arrume as carteiras
em dois círculos concêntricos. O grupo que se sentar
no círculo interno será o G.V. – grupo de verbalização.
No círculo externo fica o G.O. – grupo de observação.
Explique bem os papéis de cada grupo. O G.V. de-
verá discutir, no prazo combinado (15 minutos, por
exemplo), o tema que for indicado; e chegar a uma
conclusão com a qual todos concordem. O G.O. ficará
observando e registrando quais atitudes ajudam a al-
cançar o objetivo e quais atrapalham.
Terminado o prazo, forme uma só roda e peça
para o G.O. fazer seus comentários, permitindo que a
turma do G.V. acrescente suas próprias observações.
Faça um quadro-resumo das atitudes que mais aju-
dam e das que mais atrapalham uma discussão em
grupo e converse sobre isso com a classe.
G.O.
G.V.
53
Amarelinha e variaçõesPrograma 1
52
Enquanto não erra, a criança vai repetindo a se-
qüência, seguindo em ordem crescente a numeração
das casas. Os erros possíveis são: pisar na linha ou
fora das casas; errar o alvo do arremesso (a casa de
numeração adequada); pisar no inferno; perder o
equilíbrio e usar os dois pés em uma casa simples;
usar as mãos para se equilibrar ao pegar a pedrinha.
Ao errar, a criança dá a vez a um companheiro.
Quando voltar a jogar, começa no ponto em que er-
rou na rodada anterior.
Se, por acaso, o arremesso cair exatamente sobre a
linha, é tirada a sorte. O jogador fica de costas, ou com
os olhos fechados, enquanto o companheiro diz, em voz
alta: “Dentro, fora, fora, dentro..., ao mesmo tempo que
coloca e tira a pedrinha da área do jogo. O jogador de
olhos fechados deve adivinhar onde está a pedrinha: se
acertar, continua a jogar; se errar, cede a vez.
Alteração da estrutura tradicional
Depois que aprendem a jogar amarelinha da forma mais
simples e tradicional, as crianças ganham habilidade
cada vez maior. Com isso, a atividade passa a oferecer
menos desafios corporais e é hora, então, de introduzir
alterações no jogo, possibilitando novas aprendizagens.
Os próprios alunos muitas vezes podem sugerir
variações, modificando detalhes do movimento, das
regras, ou do espaço utilizado. O exemplo mais simples
de mudança consiste em manter os movimentos e as
regras, mas alterar o espaço, aumentando a distância
entre as casas. Neste caso, o desafio no plano corporal
passa a ser saltar uma distância um pouco maior. Mu-
danças mais complexas (até com o acréscimo de mate-
riais) também podem ser feitas. Por exemplo:
Priorizar a velocidade, medindo o tempo gasto
para ir e vir.
Incluir outros tipos de movimento além dos sal-
intenção, ao escolher aqui o jogo de amarelinha,
consiste em mostrar como é possível utilizar o re-
pertório da cultura lúdica popular e regional nas
aulas de Educação Física. O objetivo não se restringe a
resgatar a cultura lúdica, pensando na preservação cul-
tural; a intenção é, principalmente, ampliar a forma de
ver e utilizar os jogos e brincadeiras tradicionais.
Estrutura básica: regra tradicional
A forma mais tradicional de jogar amarelinha consis-
te em traçar no chão uma seqüência alternada de
quadrados simples e duplos, chamados casas, que
servem de referência para saltos com um só e com os
dois pés, respectivamente.
A seqüência é numerada de 1 a 10, começando
pela casa simples; então, ficam quatro casas simples
e três casas duplas. Em cada extremidade é feito um
semicírculo: de um lado, o ‘inferno’ – a casa do início,
de onde se fazem os arremessos; de outro, o ‘céu’ – a
casa do final da seqüência.
Em pé, atrás da casa inicial (que não pode ser pi-
sada, pois representa o inferno), uma criança arremes-
sa uma pedrinha, ou outro objeto, na casa de número
1. Se acertar, salta por cima dela, aterrissando direto
na casa dupla seguinte, e segue a seqüência de saltos
(ida e volta). Na volta, deve se apoiar com os dois pés
nas casas 2 e 3 e pegar o objeto arremessado.
AA
AA
A
AMARELINHA E VARIAÇÕES
55
Amarelinha e variaçõesPrograma 1
54
de física exclusiva de meninas, ou vice-versa.
Socializando e valorizando. As invenções das crian-
ças podem – e devem – ser compartilhadas pelo gru-
po. É interessante todos experimentarem as variações
criadas pelos colegas: trata-se de um bom modo de
avaliar as diferenças entre os alunos.
Conhecendo a história. A origem dos jogos e das
brincadeiras são interessantes e trazem traços das
múltiplas influências culturais presentes no país.
Conhecê-las e discuti-las é um recurso a mais para
conscientizar-se e tirar proveito das diferenças en-
tre os alunos.
Capacidades desenvolvidasCapacidades desenvolvidas
Capacidades desenvolvidasCapacidades desenvolvidas
Capacidades desenvolvidas
• corporais: salto em distância, equilíbrio, resistên-
cia, coordenação;
• éticas: relacionamento com limites impostos pelas
regras – esperar a vez, competir e cooperar;
• estéticas: pesquisa de códigos de representação ex-
pressivos e adequados do ponto de vista estético;
• cognitivas: estabelecimento de relações de espaço
e tempo, direção e sentido, ordem crescente e de-
crescente; construção de sistemas de representação
gráfica de movimento; planejamento mental e pro-
gramação de movimentos;
• inserção social: pesquisa e documentação da cultu-
ra lúdica tradicional; contribuição para o patrimô-
nio da cultura corporal de movimento;
• afetivas e de relação interpessoal: trabalho de cria-
ção em equipe; adequação de desafios relacionados
a competências e a desempenhos individuais.
Para saber mais
FRIEDMAN, Adriana. Jogos de brincar. S. Paulo, Scritta, 1995.
tos e do equilíbrio, como dar rodopios, ficar na
ponta dos pés ou andar sobre os calcanhares, re-
alizar estrelas e cambalhotas etc.
Incluir transporte e equilíbrio de objetos, ou
obstáculos que precisam ser transpostos;
Fazer a seqüência circular, em ziguezague etc.
Realizar a seqüência em duplas, no ritmo de uma
música, de olhos fechados etc.
O professor pode combinar com um grupo um código
para os movimentos. Por exemplo:
= giro; = pé direi-
to;
= pé esquerdo e assim por diante. Estabelecidos os
sinais, eles podem ser desenhados em cartões, para en-
saiar as várias possibilidades de construção e a adequa-
ção das seqüências de movimentos. Feito isto, os símbo-
los são desenhados no chão, nos lugares combinados.
As criações e invenções propostas pelos alunos em
geral são a atualização e a reinterpretação de conheci-
mentos anteriormente construídos em outros contextos.
Nesse sentido, fica valendo misturar a amarelinha
com o jogo de elástico (salto em altura), com o funk e
o rap (ritmo acompanhando os saltos), com histórias
da carochinha, com a inclusão de gestos teatrais e com
a imitação de personagens e situações
Cuidados no ensino
e na aprendizagem
Amarelinha é coisa de menina? Tal como a dança e vá-
rias outras atividades que não exigem tanto esforço fí-
sico, mas requerem equilíbrio e coordenação motora, a
amarelinha muitas vezes é considerada uma brincadei-
ra feminina. Com certeza, em geral se costuma incenti-
var mais as meninas a praticar exercícios desse tipo, e
elas acabam ganhando mais prática. Mas sem dúvida os
meninos também podem ficar craques. Esse estereóti-
po deve ser discutido e esclarecido: não existe ativida-
57
Jogos com bolaPrograma 2
56
mada e o futebol são alguns dos jogos mais comuns e
conhecidos; não necessitam de nada além de uma bola
e podem ser adaptados a espaços menos usuais.
Mas muitos outros jogos podem ser aprendidos:
Carimbo, alerta, taco…
Vamos passar os pés pelas mãos e deixar o fute-
bol de lado um pouco, ele merece um programa es-
pecial. Vamos falar dos jogos de bola com as mãos,
com cestas, redes, tacos e raquetes.
Descrevemos aqui a configuração básica de al-
guns jogos. Os nomes das brincadeiras, as regras e as
palavras de ordem variam muito de região para re-
gião. Com certeza os alunos poderão ensinar muito:
basta o professor dar algumas idéias.
Capacidades desenvolvidas
• corporais: ampliação de capacidades como precisão,
força e velocidade no exercício de arremessar, agarrar,
bater, rebater, fazer rolar e quicar, equilibrar, desviar,
cabecear, chutar, amortecer etc.; estímulo ao improvi-
so com fintas, malabarismos, controle, firulas etc.;
• éticas: reconhecimento dos próprios limites e dos li-
mites dos outros, por meio das regras estabelecidas;
exercício do autocontrole e do respeito mútuo; estí-
mulo às atitudes de solucionar situações de conflito e
de se relacionar com os demais de modo prazeroso;
• estéticas: observação das habilidades físicas de si mesmo
e dos demais, principalmente quanto às improvisações;
apreciação e discussão dos esportes como espetáculo;
• cognitivas: cálculo de trajetórias; estabelecimento
de relações espaço-temporais;
• inserção social: exercício de atividades lúdicas de cará-
ter quase universal, incentivando a compreensão da
diversidade intercultural. O futebol, o basquete e o vôlei,
em particular, constituem práticas simbólicas que su-
peram barreiras de linguagem e de comunicação, sen-
do valorizadas nas mais diversas culturas.
inúsculas, pequenas, médias, grandes, enor-
mes, duras, moles, ásperas, lisas, de borracha,
de pano, de plástico, de couro, de vidro…
Derrubando latas, deslizando, pipocando, acertando al-
vos, passando pelo meio das pernas do goleiro e entran-
do no gol, batendo no aro e caindo na cesta, percorrendo
o gramado e escorregando pro buraco, voando de mão
em mão, ziguezagueando entre os pés do jogador…
É ela, a bola. Um dos brinquedos mais antigos e
universais da humanidade. Uma velha amiga dos jogos
e das brincadeiras. É quase impossível ficar imóvel quan-
do uma bola aparece. A bola parece pedir para ser chu-
tada, quicada, jogada de um lado para outro, de uma
pessoa para outra. Vive escapando do controle, rolando
para longe; precisa ser dominada mesmo quando se
chuta ela para longe só para poder correr atrás. Uma
bola, quando deixada num canto qualquer, fica triste.
Mesmo para uma pessoa sozinha, a bola é uma óti-
ma companheira. Mas, o melhor mesmo é ter pelo menos
um amigo para jogar, pois são inúmeros os jogos para dois,
três ou dez jogadores, jogos de crianças, jovens e adultos,
jogos de competição e jogos de cooperação.
A bola na escola
A bola rola na escola. Na aula e fora dela. No recreio tem
bola improvisada, de meia, até de lata, na falta de um
dono da bola que leve uma. Na Educação Física, a quei-
MM
MM
M
JOGOS COM BOLA
59
Jogos com bolaPrograma 2
58
mais zonas chamadas de cemitério, para onde vão os
jogadores que são queimados.
O objetivo do jogo é queimar, ou seja, acertar o ad-
versário com a bola em um arremesso e, com isso, fazê-
lo migrar para o cemitério. Vence a partida o time que
queimar todos os adversários, ou o maior número deles.
Apesar de terem sido queimados, os jogadores que
ficam no cemitério permanecem no jogo, podendo quei-
mar os oponentes. Deve-se combinar quais partes do
corpo são quentes’ ou ‘frias, ou seja, quais as partes do
corpo que configuram ou não a queimada. É comum
estabelecer como regra que, caso a criança seja atingi-
da pela bola mas consiga agarrá-la sem deixá-la cair no
chão, o arremessador é quem fica queimado.
Variações
1. Organizar dois ou seis cemitérios.
2. Estabelecer a permanência de um número fixo de
jogadores nos cemitérios, criando um rodízio, ou
seja: a cada jogador queimado é contado um pon-
to, e ele substitui o jogador que estava no cemité-
rio. Essa variação contribui para manter a motiva-
ção dos jogadores que vão sendo queimados.
3. Em vez de acertar os jogadores, a bola visa como
alvo objetos colocados dentro de espaços circula-
• afetivas e de relação interpessoal: os jogos e esportes
com bola estão entre as práticas de cultura corporal
mais valorizadas socialmente; portanto, saber exercê-
los e conhecer minimamente as regras são um valioso
recurso de sociabilidade nos momentos de lazer e re-
creação. Não saber praticá-los, por outro lado, pode
representar um motivo de exclusão social e favorecer
a construção de uma auto-imagem negativa.
Cuidados no ensino
e na aprendizagem
Medo da bola. Para uma criança, uma das coisas mais
chatas do mundo é ter medo da bola e, com isso, se sen-
tir excluída da participação em brincadeiras ou jogos e,
conseqüentemente, do grupo. Na realidade, como todo
medo, trata-se apenas de falta de intimidade com o ob-
jeto. É fundamental que o professor dê oportunidades,
individuais e em pequenos grupos, para o desenvolvi-
mento de habilidades com a bola, ajudando a construir
competências que serão utilizadas nos jogos.
Meninos e meninas. Ainda persistem valores socioculturais
que identificam a bola como brinquedo característico de
meninos. No entanto, trata-se de mais um estereótipo a ser
combatido. Embora na prática se observe em geral um es-
tilo diferenciado entre meninos e meninas, o importante é
oferecer oportunidades de desenvolvimento das compe-
tências relacionadas à bola para ambos os grupos.
SUGESTÕES DE
JOGOS E ATIVIDADES
QueimadaQueimada
QueimadaQueimada
Queimada
O jogo acontece entre dois times com o mesmo nú-
mero de jogadores e exige apenas uma bola. O cam-
po é dividido ao meio e são estabelecidas duas ou
time Btime A
cemitério
cemitério
61
Jogos com bolaPrograma 2
60
pego. Na posse da bola, o jogador deve atravessar de volta
o próprio campo, também sem ser tocado por nenhum
oponente. Caso isso ocorra com sucesso, é marcado um
ponto para o time, e os jogadores das duas equipes se
dividem nos dois campos, para iniciar uma nova rodada.
Se o jogador for tocado por um defensor adversá-
rio, deve permanecer duro, ou seja, parado no local
em que foi pego, até ser tocado por um jogador do
seu próprio time. Se o atacante for pego durante a
travessia de volta, quando está de posse da bola, deve
devolvê-la à zona de pique e permanecer aguardan-
do ser salvo.
O jogo envolve basicamente os papéis de atacan-
te, defensor e salvador. O educador pode estabelecer
como regra que, a cada jogada ou ponto, ocorra um
rodízio de jogadores em cada uma dessas funções.
Variações
1. Incluir a possibilidade de que seja feito um arre-
messo, da zona de pique, para outro jogador da
mesma equipe, desde que este se encontre no
campo do adversário. O jogador que estiver para-
lisado pode receber o arremesso e se salvar.
2. Tornar obrigatório que a travessia do campo do
adversário seja feita quicando a bola no solo.
3. Utilizando bolas pequenas (de tênis, por exemplo),
é possível criar uma variação interessante. Cada
time começa a jogada de posse da bola no seu pró-
prio campo; tem por objetivo atravessar o campo
do adversário e colocar a bola na zona de pique.
Também pode ser permitido esconder a bolinha na
roupa, a fim de impedir o adversário de saber
quem é realmente o atacante que oferece perigo,
ou seja, quem está de posse da bola. Nessa varia-
ção, é necessário fazer uma pausa entre um ponto
e outro para as equipes esconderem a bolinha e
definirem sua estratégia de jogo.
res desenhados no chão, em cada campo de jogo.
Os jogadores devem defender o alvo com todas as
partes do corpo, sem invadir a área circular em que
estão colocados. Atingir um alvo corresponde a
queimar um jogador adversário: o autor do arre-
messo escolhe um oponente para migrar para o ce-
mitério.
4. Utilizar simultaneamente duas bolas.
5. Colocar sobre a linha central do campo uma rede
de tênis, obrigando os jogadores a dar um salto ao
fazer o arremesso.
6. Colocar um gol por trás de cada cemitério, a ser
defendido pelos jogadores queimados. Os atacan-
tes podem escolher entre queimar os adversários
ou tentar arremessar a bola dentro do gol.
Pique-bandeira
O jogo acontece entre dois times com o mesmo nú-
mero de jogadores e exige a utilização de duas bolas.
O campo é dividido ao meio e são marcadas, nas duas
extremidades, duas zonas de ‘pique, nas quais são
colocadas as bolas para o início de cada jogada.
O objetivo do jogo é atravessar o campo do adversá-
rio sem ser tocado por nenhum oponente, até alcançar a
zona de pique, dentro da qual o jogador não pode ser
time A time B bola
63
Jogos com bolaPrograma 2
62
persegue o adversário, tentando tocá-lo antes que
retorne a seu campo. O ponto resulta do sucesso de
uma dessas duas tarefas.
Variação
Colocar duas bolas no centro e dividir o campo
ao meio, com uma linha. Um dos jogadores pega
a bola e tenta retornar a seu time; o outro joga-
dor, sem ultrapassar a linha central, tenta queimá-
lo arremessando a segunda bola. O sucesso da
primeira tarefa resulta em 2 pontos, e o da segun-
da, em 1 ponto.
Guerra das bolas
No campo de jogo é desenhado um grande círculo (o
diâmetro depende do alcance do arremesso das crian-
ças e do espaço disponível), dividido ao meio por
uma linha central.
Cada equipe recebe um número de bolas de arre-
messo correspondente à metade do número de joga-
dores e se posiciona do lado de fora de uma das
metades do círculo. No centro do círculo é colocada
uma bola diferente das distribuídas aos jogadores;
por exemplo, uma bola de plástico.
Vassourobol
O grupo é dividido em duas equipes e os jogadores são
numerados individualmente. Ao colocar os números
nos alunos, recomenda-se que o professor procure equi-
librar o grau de habilidade das crianças de cada par.
Os jogadores de cada equipe se posicionam na li-
nha de fundo da extremidade do campo de jogo, um ao
lado do outro, na ordem da numeração. Sobre cada li-
nha de fundo é colocada uma cadeira, e sobre cada ca-
deira uma vassoura. A bola fica no centro do campo.
O professor chama um determinado número; os dois
jogadores de cada equipe, correspondentes a esse núme-
ro, pegam as vassouras e, utilizando-as como tacos de hó-
quei, tentam empurrar a bola para dentro da meta
adversária. Quando todos os jogadores tiverem sido cha-
mados, a rodada termina e, então, os pontos são contados.
Bola ao centro
A organização do campo e dos jogadores é semelhan-
te à do jogo anterior, de vassourobol, mas apenas com
uma bola no centro do campo.
Ao sinal do educador, cada dupla correspondente
ao número enunciado corre para o centro do campo
e tenta pegar a bola antes do adversário. O jogador
que a pega primeiro tenta retornar à linha de fundo;
caso consiga, marcará um ponto. O jogador sem a bola
time A time B bola
time A
time B
bola plástica central
bolas de borracha
para arremesso
65
Jogos com bolaPrograma 2
64
Variações
1. Utilizar duas bolas.
2. Organizar duplas ou trios, em vez de se basear na di-
nâmica individual. Essa variação enriquece o desen-
volvimento das habilidades de passar e arremessar,
e incentiva os deslocamentos dos jogadores.
3. Incluir uma regra da queimada: quando um joga-
dor consegue agarrar a bola que o outro arremes-
sou com a intenção de queimá-lo, e não deixa que
ela caia no chão, o jogador que fez o arremesso é
considerado queimado e tem de agachar.
Bobinho
Esse jogo bem popular pode ser praticado em qualquer
espaço, sem depender de marcações no solo. Um grupo
de jogadores (no mínimo três) troca passes com as mãos
ou com os pés, entre si, evitando que o ‘bobinho’ encoste
na bola. Quando este consegue interceptar algum passe e
dominar a bola, o último a tocá-la assume seu lugar.
Variações
1. Designar dois bobinhos ao mesmo tempo.
2. Obrigar o jogador a falar em voz alta o nome da
pessoa para quem vai passar a bola.
3. No caso de bobinho com os pés: permitir no máximo
dois toques antes de passar a bola ao companheiro;
tocar na bola uma vez com cada pé; receber a bola com
a perna direita e chutar com a esquerda, ou vice-versa.
4. No caso de bobinho com as mãos: obrigar os joga-
dores a fazer a bola quicar uma vez no chão, antes
de chegar às mãos do companheiro.
Alerta
Não é preciso delimitar o espaço. Os jogadores ficam
juntos entre si; um deles arremessa a bola para o alto
e grita o nome de alguém do grupo. Os demais fogem
Os jogadores de uma equipe irão arremessar sua
bola em direção à bola central, de forma a empurrá-
la em direção ao campo do adversário, tentando fa-
zer com que ela ultrapasse a linha do campo, ou seja,
saia do círculo. A defesa pode utilizar as próprias bolas
de arremesso e as mãos, mas não pode chutar qual-
quer das bolas do jogo. É proibido entrar no círculo,
para as duas equipes.
Cada vez que é feito um ponto, as bolas dispersas
no interior do círculo são recolhidas e divididas; a
bola central é colocada em sua posição original e se
inicia uma nova rodada.
Variações
1. Utilizar duas bolas no centro, em vez de uma.
2. Para dificultar as ações, colocar uma rede de volei-
bol sobre a linha central, numa altura que permita
a passagem das bolas.
CarimboCarimbo
CarimboCarimbo
Carimbo
Esse jogo é similar à queimada, mas o campo não tem
tantas delimitações: só há o contorno, com o lado de
dentro e o de fora, sem linhas divisórias. Também não
existem equipes, pois a participação é individual:
cada um por si, todos contra todos.
O objetivo principal é atingir o maior número pos-
sível de adversários, arremessando a bola. Quando o
adversário é atingido, ele deve se agachar e ficar tem-
porariamente nessa posição, até recuperar a bola de
alguma maneira.
O jogador que estiver de posse da bola não pode
correr, ou seja, precisa tentar queimar os adversários
a partir da posição em que se encontra. Só é válido
correr para tentar pegar a bola e para fugir de ser quei-
mado. Quando sobrar apenas um jogador em pé, ele
será considerado vencedor, e começa outra rodada.
67
Jogos com bolaPrograma 2
66
do pelo rebatedor seguinte, mas são contados os pon-
tos das bases anteriores que foram percorridas.
Em resumo: atacar significa rebater e correr; de-
fender significa interceptar a bola rebatida e, com ela,
a corrida do rebatedor.
Quando todos os jogadores de uma equipe tive-
rem feito a rebatida e a corrida, seus pontos são so-
mados e a outra equipe entra no papel de ataque.
Câmbio
Trata-se de uma simplificação do voleibol. O espaço,
a altura da rede e o número de participantes são es-
tabelecidos conforme a conveniência do momento e
do local, mas o sistema de contagem de pontos é o
mesmo do jogo tradicional. Outra variação é que, em
vez do toque e da manchete, os jogadores podem
agarrar a bola, trocar passes entre si e arremessá-la
de volta com uma ou com as duas mãos.
Para incentivar a participação de todos os jogado-
res, pode-se combinar um determinado número mí-
nimo de passes, antes de a bola ser arremessada ao
campo do adversário.
o mais rapidamente possível e o jogador chamado
tenta pegar a bola. Quando consegue, grita: Alerta!
Nesse momento, todos têm de ficar parados onde
estão; o jogador com a bola a arremessa para quei-
mar um companheiro. Conseguindo ou não, o joga-
dor em quem ele mirou dará início à rodada seguin-
te, gritando um novo nome.
Beisebol de chute ou rebatida
Os participantes são divididos em duas equipes, e de-
limita-se um quadrado com lados de cerca de 8
metros.
Em um dos vértices do quadrado, a base 1, fica o
rebatedor da equipe que ataca em primeiro lugar (os
outros vértices são as bases 2, 3 e 4). A outra equipe
se espalha do lado de fora do quadrado, para defen-
der. O professor se coloca no centro do quadrado e
joga uma bola na direção do rebatedor (rolando, qui-
cando, ou pelo alto, sem bater no chão).
Um de cada vez, os jogadores da equipe atacante
se posicionam na base 1 e tentam rebater a bola para
a maior distância possível (chutando ou golpeando,
com as mãos ou com um taco). Se conseguir rebater,
o atacante corre em direção à base 2, enquanto os ad-
versários correm para apanhar a bola e tentar quei-
mar o rebatedor durante sua corrida entre uma base
e a outra. Dessa forma, as bases funcionam como pi-
ques para os rebatedores.
O rebatedor pode tentar passar pela próxima base
e, se julgar possível, prosseguir até as seguintes. Se
estiver ameaçado pela proximidade da bola, ele esta-
ciona numa base e aguarda o rebatedor seguinte, para
tentar mais uma etapa da corrida.
Cada lateral do quadrado que for vencida conta
um ponto para a equipe do rebatedor, que pode por-
tanto fazer no máximo quatro pontos por rodada. Se
ele for queimado entre uma base e outra, é substituí-
time A
time B
bola
professor
ataque
base 3
base 1
base 2base 4
69
Jogos com bolaPrograma 2
68
do ele estiver com o taco fora da sela, durante a
corrida ou na própria tentativa de rebater;
se um dos rebatedores bater por três vezes na bo-
linha e ela for para trás, em vez de ir para frente.
Frescobol
É uma variante do jogo de tênis, que pode se realizar
em qualquer espaço disponível. Com raquetes de ma-
deira, os jogadores rebatem uma bolinha para evitar
que ela encoste no solo. O jogo é realizado em du-
plas, e não envolve competição. O objetivo é trocar o
maior número possível de vezes a bola, sem errar.
Caso exista uma quadra disponível, é possível simu-
lar uma rede de tênis com uma rede de vôlei ou uma
corda, e realizar de forma recreativa algo similar ao
jogo oficial.
Dois toques
É o futebol convencional, com restrição apenas ao
número de toques que cada jogador pode dar na bola
em um mesmo lance. O número de toques pode ser
ampliado gradativamente, mas o mais comum são
mesmo os dois toques. Quando alguém dá mais to-
ques do que o permitido é marcada uma falta, a ser
cobrada pelo adversário.
Ataque versus defesaAtaque versus defesa
Ataque versus defesaAtaque versus defesa
Ataque versus defesa
Variação do futebol. O campo de jogo é dividido ao
meio, e as equipes também. Ou seja, os jogadores da
defesa não podem ultrapassar a linha do meio-de-
campo, e os jogadores de ataque não podem recuar
para seu próprio campo de defesa. No caso de alguém
desrespeitar a regra, é marcada falta, a ser cobrada
pelo adversário no ponto em que o meio-de-campo
foi ultrapassado indevidamente.
Taco ou bétis
Jogo de origem popular, é realizado por quatro joga-
dores divididos em duas duplas, que alternam os
papéis de ataque e defesa.
São necessários dois tacos de madeira, uma bolinha
de borracha ou de tênis e varetas (geralmente são usa-
dos galhos de árvore) para construir as duas casinhas’.
Para montar uma casinha, três varetas são apoiadas uma
na outra, em forma de pirâmide. Também costumam ser
usados outros alvos – latas, garrafas de plástico etc.
O campo de jogo é demarcado por dois círculos
no chão (chamados de selas’), de aproximadamente
1 metro de diâmetro, no centro dos quais são monta-
das as casinhas. A distância entre as selas varia de
acordo com o espaço disponível e a força e precisão
de arremesso dos jogadores (em geral, cerca de 15
metros).
Um sorteio inicial estabelece qual dupla ficará de
posse da bolinha e qual ficará com os tacos. Cada um
dos jogadores da dupla que começa com a bola se
posiciona atrás de uma das selas, para daí arremes-
sar a bola na direção da casinha oposta, tentando
derrubá-la. A dupla com os tacos se posiciona na fren-
te das selas, com a ponta do taco encostada no chão,
sem pisar dentro do círculo, e tem dois objetivos:
evitar que a casinha seja derrubada e rebater a bola
o mais longe possível. Quando isso ocorre, enquanto
a dupla de defesa vai recuperar a bola, os jogadores
de ataque correm um em direção ao outro, batendo
os tacos no alto (movimento de cruzar’) e atingindo
as selas. Cada batida entre os tacos vale um ponto; se
não cruzar, não conta.
A dupla de defesa se apodera dos tacos e passa a
atacar em três casos:
se derrubar uma das casinhas com um arremesso;
se conseguir queimar um dos adversários quan-
71
Jogos com bolaPrograma 2
70
Rebatida e dribleRebatida e drible
Rebatida e dribleRebatida e drible
Rebatida e drible
Esse jogo é realizado com quatro jogadores, em duas
duplas. Uma das duplas defende o gol (se a meta for
de futsal, um dos jogadores fica como goleiro e o
outro se coloca ao lado da trave; se for de futebol de
campo, os dois jogadores atuam como goleiros). A
outra dupla realiza a cobrança de pênaltis, de uma dis-
tância previamente combinada.
Quando o goleiro (ou os goleiros) rebate a bola,
surge a possibilidade de uma disputa rápida, com
dribles e passes entre as duplas de ataque e de defe-
sa, que pode ou não resultar em gol. Cada jogador
realiza três cobranças, podendo portanto a dupla de
ataque conseguir totalizar um máximo de seis gols.
Em seguida, os papéis se invertem e a dupla que de-
fendeu vai fazer as cobranças, comparando-se os re-
sultados no final.
Futvôlei
Esse jogo é uma mistura, na qual os princípios fun-
damentais do futebol são adaptados ao espaço e às
regras do vôlei. Pode ser jogado em duplas, trios,
quartetos, ou mesmo grupos maiores. O espaço dis-
ponível é configurado como uma quadra de vôlei,
podendo o tamanho do campo e a altura da rede ser
definidos pelos próprios jogadores.
São utilizadas as regras básicas do vôlei em rela-
ção ao número de toques e à contagem de pontos. Os
movimentos utilizados, contudo, são de futebol; são
permitidos passes com qualquer parte do corpo,
exceto os braços e as mãos.
Cinco-corta
Jogo realizado em pequenos grupos de mais ou
menos dez jogadores, com os movimentos básicos
do vôlei.
Variações
Montar equipes com:
um goleiro, cinco jogadores de defesa e cinco jo-
gadores de ataque;
um goleiro, sete jogadores de defesa e apenas três
de ataque;
um goleiro, três jogadores de defesa e sete de ataque.
Realizar as três variações em uma mesma aula e fazer
um revezamento dentro dos próprios times, para que
todos tenham oportunidade de jogar no gol, na defesa e
no ataque.
Controle
Jogo realizado em pequenos grupos, de até seis jogadores.
Um dos jogadores atua como goleiro; a meta que ele
irá defender deve ser bem delimitada, pois o acerto e
o erro nesse jogo dependem disso. O goleiro tem a
seu favor uma área próximo a sua meta, também pre-
viamente combinada, que não pode ser utilizada pe-
los atacantes para chutar a bola em direção ao gol;
nessa área, só vale cabecear a bola.
Os jogadores trocam passes entre si, evitando que
a bola toque o solo entre um e outro passe, contro-
lando’ a bola no ar. Eles devem tentar fazer o gol chu-
tando ou cabeceando a bola de primeira, ou seja,
emendando’ uma bola recebida pelo alto, ou depois
de dominá-la sem deixá-la cair no chão.
Se o arremate for feito para fora da meta, o res-
ponsável perde um ponto – com três pontos perdidos,
ele assume a posição do goleiro, que passa a jogar
como atacante. Caso o gol aconteça, o goleiro perde
um ponto – a cada três pontos perdidos, os pontos
negativos dos atacantes são zerados. O interesse do
goleiro, portanto, é defender sua meta da maneira
mais eficiente possível, para forçar o erro dos atacan-
tes e poder sair do gol.
73
Jogos com bolaPrograma 2
72
Basquete com cadeira
As regras fundamentais do basquete tradicional são
mantidas; no entanto, para facilitar o arremesso, co-
loca-se uma cadeira dentro do garrafão, que se trans-
forma em área proibida para atacantes e defensores.
Sobre a cadeira fica um jogador da equipe atacante.
O objetivo das equipes é fazer a bola chegar até
esse jogador que, sem marcação, pode se concentrar
apenas no arremesso para a cesta.
Vinte e um (basquete)
Esse jogo é realizado em pequenos grupos, com ape-
nas uma tabela de basquete. Os fundamentos perma-
necem, mas as regras e a contagem de pontos sofrem
as seguintes modificações:
quando um jogador pega o rebote de um arre-
messo realizado pelo adversário, é obrigado a
sair do garrafão antes de fazer qualquer tentati-
va de ataque;
na cobrança de lateral, o primeiro passe não
pode ser interceptado;
após a realização de uma cesta, o jogador tem
o direito de cobrar um lance livre valendo um
ponto; se conseguir, a bola é recolocada em
jogo por sua própria equipe, com a cobrança
de lateral.
O objetivo final é chegar aos 21 pontos, contagem
que não pode ser ultrapassada. Caso isso ocorra, a
equipe recomeça a contagem dos dezoito pontos.
Os jogadores formam um círculo no espaço dis-
ponível e trocam a bola entre si, utilizando o toque e
a manchete. No quinto toque, o jogador da vez tenta
atingir um dos demais, utilizando uma cortada. Se o
jogador que foi alvo da cortada for atingido, ele aga-
cha no centro do círculo de jogadores; se conseguir
se desviar, ou agarrar a bola sem deixá-la cair no chão,
o jogador que efetuou a cortada vai para o centro.
À medida que o jogo transcorre, diversos jogado-
res vão se juntando no centro do círculo; esse grupo
também passa a ser alvo das cortadas dos demais.
Quando alguém do centro consegue agarrar a bola
que foi cortada em sua direção, ele troca de lugar com
o jogador que efetuou a cortada. Quando restar ape-
nas um jogador em pé, ele é declarado vencedor, e
uma nova rodada é iniciada.
Vinte e um (vôlei)
A organização desse jogo é semelhante à do câmbio;
a variação ocorre na forma de pontuação. O campo de
jogo de cada equipe é dividido em quatro partes
iguais, e cada quadrado é numerado de 1 a 4.
Quando a bola arremessada toca o solo, o ponto
realizado corresponde à numeração de cada quadra-
do. À medida que o jogo prossegue, os pontos vão
sendo somados, até chegar a 21, não podendo passar
disso. Caso isso aconteça, a equipe estoura’ a conta-
gem, e recomeça de onze pontos.
Portanto, quando cada equipe vai se aproximan-
do desse total, deve direcionar a bola para os quadra-
dos demarcados no campo do adversário que permi-
tam que a soma de pontos seja exatamente 21. No
lado da outra equipe, é justamente nesses quadrados
que devem ser concentrados os esforços da defesa. É
possível ainda utilizar os fundamentos do vôlei, em
vez de apenas arremessos, com a mesma organização
de regras e a mesma contagem de pontos.
75
Jogos de corrida e perseguiçãoPrograma 3
74
Se a criança já corre naturalmente, por que brin-
car de correr na escola?
Nas cidades grandes, a falta de espaços adequados,
o perigo do trânsito, a violência, a falta de tempo e ou-
tros tantos motivos impedem que as crianças dêem va-
zão a suas necessidades de movimento, entre as quais
correr é uma das mais básicas e importantes. E a escola
pode oferecer situações que garantam à criança a possibi-
lidade de correr com segurança e satisfação.
Além disso, quando a criança participa de brinca-
deiras como essas, não é só a habilidade de correr que
está em jogo. O objetivo tampouco é apenas fazer com
que fique mais rápida ou tenha mais fôlego. Muitas
capacidades também estão envolvidas nessas situa-
ções e se desenvolvem graças a elas.
Capacidades desenvolvidas
• corporais: aumento de força, resistência, velocidade e
agilidade. Aperfeiçoamento de diversas formas de cor-
rer: de frente, de lado, de costas, com mudanças de
direção e velocidade, com freadas bruscas, perseguin-
do alguém, fugindo, desviando de objetos e pessoas,
com alternância de ritmos (corridas de velocidade,
resistência etc.) e corridas individuais e de reveza-
mento;
• éticas: reconhecimento dos próprios limites e dos limi-
tes alheios, respeito às regras de jogos e brincadeiras;
relacionamento com os demais de maneira divertida;
• estéticas: identificar e distinguir as formas de cor-
rer em diferentes ritmos e estilos, conforme a ne-
cessidade e a adequação ao contexto;
• cognitivas: cálculo de velocidade e trajetória; pre-
visão de trajetórias; percepção de limites e referên-
cias; formulação de estratégias; estabelecimento de
relações de tempo e espaço em geral;
uem é que nunca brincou de pega-pega, ou de
esconde-esconde? São brincadeiras das mais po-
pulares e universais. Correr, pegar e fugir são mo-
vimentos que fazem parte da infância de todos; e mais
– fazem parte da história da humanidade que, desde
muito cedo, corria com fins utilitários ou mesmo com-
petitivos. Para correr, não é preciso quase nada, além
de vontade de brincar e algum espaço.
Correr na grama e na areia, correr descalço, correr
sozinho e junto com outras crianças, correr no mato e
no asfalto, correr em ziguezague, na subida e na desci-
da, correr na curva e em volta de postes, correr atrás das
galinhas e com os cachorros, correr na terra, correr até
cansar. Correr, cair, levantar e continuar correndo…
As brincadeiras de corrida têm regras que vão das
mais simples, como no pega-pega, até as mais com-
plexas, como no pique-bandeira, passando por uma
gama imensa de variações: adaptações ao espaço, aos
obstáculos, ao número de participantes, aos conheci-
mentos anteriores do grupo e assim por diante.
Desde pequenas, as crianças demonstram uma ten-
dência natural a correr, sempre que têm uma oportunida-
de (para o desespero de pais e mães!). Na idade escolar, a
corrida passa a ser componente de vários jogos e brinca-
deiras: correr para pegar alguém, correr para não ser pego,
correr até uma bola, correr fugindo da bola, correr mais
que o outro, correr em volta de uma roda… Enfim, correr
com diferentes finalidades, em diferentes contextos.
QQ
QQ
Q
JOGOS DE
CORRIDA E PERSEGUIÇÃO
77
Jogos de corrida e perseguiçãoPrograma 3
76
teriores, a familiaridade com o espaço etc.
É normal que ocorram momentos de conflito, por
conta das situações que ocorrem nos jogos e dos dife-
rentes níveis de compreensão das regras entre os alunos.
É preciso controlar o respeito a todos os acordos feitos e
solucionar os conflitos por meio de diálogo. O compro-
misso com as regras e a compreensão de sua função e
de sua necessidade requerem tempo e experiência.
Trombadas, tombos e outros acidentes. O espaço para
as atividades de corrida deve ser o mais desobstruído
possível, para evitar tropeços e quedas. Quanto às trom-
badas, elas ocorrem basicamente por dois motivos: a) a
relação entre o número de crianças e o espaço disponí-
vel é inadequada; b) as crianças realizam com pressa
excessiva uma proposta na qual seria necessário um
tempo maior de observação do contexto, para planejar
a velocidade e a trajetória da corrida.
O professor precisa observar a atividade e avaliar
os problemas, alterando as condições de realização
para evitar acidentes. Conhecer o espaço, observan-
do-o antes do início das atividades, é um bom come-
ço. É claro, mesmo em condições ideais, as quedas e
trombadas podem ocorrer: de todo modo, elas são
parte inevitável do processo de aprendizagem.
Quem corre mais: menino ou menina? Em geral, os
meninos correm mais que as meninas da mesma fai-
xa etária. Isso se deve ao simples fato de que os me-
ninos correm com mais freqüência. Observa-se ain-
da, como tendência genérica, uma facilidade maior
dos meninos para enfrentar situações de risco, o que
favorece uma movimentação mais temerária, com
menos receio de quedas e desequilíbrios. As ativida-
des competitivas devem ser propostas entre crianças
de competência similar, e atividades em duplas mis-
tas podem ajudar as meninas a buscar se aperfeiçoar
nas competências envolvidas em corridas.
• inserção social: aprendizado das formas básicas de cor-
rida do esporte oficial; aprendizado e prática de jogos
e brincadeiras de diferentes grupos socioculturais;
• afetivas e de relação interpessoal: relacionamento
interpessoal em contextos novos e enriquecedores.
Mobilização de profundo conteúdo emocional: ao
perseguir e fugir, esconder e achar, imobilizar e li-
bertar, salvar-se e ficar prisioneiro, o aluno vivencia
simbolicamente papéis de significado primordial.
Embora seja interessante correr livremente, pelo prazer
do ato em si, as atividades coletivas geram situações em
que a ação de um determina e é determinada pela ação
do outro. Surgem então as possibilidades de atuar em
duplas e equipes, pedir e dar ajuda, observar a ação do
outro, tentar imitar exemplos para se aperfeiçoar, exer-
cer os potenciais perante o outro sem ficar constrangido
e comparar desempenhos de maneira saudável.
Cuidados no ensino
e na aprendizagem
Regras servem para o jogo funcionar. As regras dos
jogos de corrida estão geralmente vinculadas aos li-
mites e às referências no espaço (correr até determi-
nado lugar, em determinada direção, zonas de pique
etc.). Portanto, é indispensável combinar as regras
com os alunos antes do início dos jogos. Mas é preci-
so considerar que o respeito a essas delimitações
depende também de um ajuste corporal.
Muitas vezes, a criança não observa a regra por falta
de coordenação, habilidade cuja construção demanda
tempo e experiência e que é, justamente, um dos objeti-
vos pretendidos pela atividade. O educador deve saber
discernir entre a falta de ajuste corporal e o desrespeito à
regra, e pontuar a transgressão sem conotação de julga-
mento moral, considerando a idade, as experiências an-
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Jogos de corrida e perseguiçãoPrograma 3
78
Coelhinho, sai da toca
Em um espaço predeterminado, as crianças se distri-
buem em tocas’, representadas por bambolês ou por
círculos riscados no chão. Deve haver uma toca a
menos que o total de participantes.
O professor diz o mote da brincadeira: Coelhinho,
sai da toca, um, dois, três...; as crianças rapidamente
saem de sua posição original e procuram outra toca –
correndo o risco de ficar sem nenhuma.
Esse jogo favorece o sentido de orientação e a per-
cepção do espaço. É possível variar as formas de deslo-
camento: saltando em um dos pés, engatinhando, ou
quicando uma bola. É possível ainda, quando o desem-
penho corporal for mais eficiente, propor que as tocas
sejam ocupadas por duplas e trios.
Esconde-esconde
Essa tradicional brincadeira pode ser realizada em qual-
quer espaço. É estabelecido um pique, local no qual um
pegador fica de olhos fechados, ou virado para uma
parede; ele faz uma contagem (cujo limite é decidido de
antemão), enquanto os demais jogadores tratam de se
esconder pelo espaço em torno.
Terminada a contagem, o pegador vai procurar os
outros jogadores; ao localizar um deles, corre de vol-
ta ao pique e diz: Acusado fulano, um, dois, três... Se o
jogador encontrado conseguir chegar ao pique antes
do pegador, ele diz: Um, dois, três, fulano livre...
Há dois desafios simultâneos: se esconder do
pegador e tentar se salvar. Se a última criança a sair
do esconderijo conseguir se salvar, ela salva automa-
ticamente todo mundo, mesmo os que foram pegos
antes dela; nesse caso, o pegador continua o mesmo.
Os conteúdos envolvidos na atividade giram em
torno dos deslocamentos em velocidade e da percep-
ção do espaço, bem como da necessária percepção do
próprio corpo, para se esconder de maneira eficiente.
Autoconfiança. O educador deve registrar o desempenho
individual, de maneira a favorecer a construção de uma re-
ferência da evolução do aluno ao longo do tempo, evitan-
do comparações entre as crianças. Além disso, para que os
estudantes se sintam seguros e autoconfiantes, é importante
garantir tempo suficiente para discutir as regras e as estra-
tégias definidas na atividade.
Sol, calor, sede. Em primeiro lugar, vale a pena ressaltar
o óbvio: quem está com sede tem de beber água! Quem
está cansado, tem de descansar, quem está ofegante tem
de fazer uma pausa para se recuperar. Os sinais de de-
sinteresse e desgaste devem ser respeitados. Convém
evitar os horários de muito calor e a exposição excessiva
ao sol – e, sempre que possível, assegurar que haja uma
sombra para as crianças se refrescarem.
As brincadeiras e os jogos de corrida, em função
de seu tipo de solicitação física, têm uma duração
relativamente curta; quando seguidos de uma pausa,
podem constituir uma atividade de aquecimento para
jogos mais complexos e de duração maior.
SUGESTÕES DE
JOGOS E ATIVIDADES
Cabra-cega
Esse jogo é ótimo para atividades em dias de chuva,
pois pode ser realizado dentro da sala de aula ou em
espaços ainda mais restritos.
Os olhos de um ‘pegador’ são vendados com um
lenço ou um pano. Ele fica parado e gira o corpo, ten-
tando pegar os outros apenas com base no tato e na
audição. Os demais alunos se limitam a fugir e a procu-
rar confundir o pegador, mas é proibido encostar nele.
A criança que for pega assume o lugar de pegador.
Um dos aspectos interessantes dessa atividade é
a utilização de sentidos que não costumam ser muito
exercitados no dia-a-dia.
81
Jogos de corrida e perseguiçãoPrograma 3
80
Nunca três
Os jogadores se distribuem aleatoriamente pelo espa-
ço determinado para o jogo, organizados em duplas, de
braços dados. São designados um pegador e um fugiti-
vo. Quando o fugitivo se cansa, procura o pique em al-
guma das duplas espalhadas pelo espaço e entrelaça os
braços com um dos componentes da dupla. O compo-
nente da dupla do lado oposto se solta o mais rápido
possível e passa a ser o fugitivo; ou então, em uma va-
riação possível, passa a ser o pegador.
Fugi-fugi
O jogo pode ser realizado em uma quadra, ou espaço
similar. Todos os jogadores – menos um, que será o
pegador – se posicionam atrás de uma das linhas de
fundo, de frente para o campo de jogo. O pegador fica
atrás da linha de fundo oposta, também virado em di-
reção ao centro do campo.
O pegador inicia cada rodada dizendo: Lá vou eu!, e
corre em direção aos demais jogadores, tentando tocá-
los. Depois de responderem: Fugi! Fugi!, os jogadores
correm, tentando chegar à linha de fundo oposta sem ser
tocados. Quem for tocado se transforma em pegador fixo:
a cada nova corrida, pode tentar pegar os demais, mas
sem sair da posição em que foi pego.
O espaço vai sendo progressivamente ocupado por
pegadores, tornando cada vez mais difícil a tarefa dos
fugitivos. O último fugitivo é declarado vencedor.
Barra-manteiga
Brincadeira popular de rua, é realizada em um cam-
po delimitado.
Todos os participantes, menos um, se alinham
sobre uma das linhas de fundo, com um dos braços
estendido e a palma da mão voltada para cima. O
jogador que restou, que será o fugitivo, caminha ao
Pega-pega
É o mais tradicional e o mais simples dos jogos de cor-
rida. Delimita-se um espaço para a brincadeira antes de
o jogo começar e se escolhe um pegador. Os demais se
espalham pelo espaço e tentam fugir do pegador. Quem
for pego, se transforma em pegador. O educador deve
ficar atento: se uma criança ficar muito tempo como
pegador, deve substituí-la, para evitar que se frustre.
Variação
Antes de começar o jogo, delimita-se o espaço em que
vai ocorrer. A brincadeira evolui da atuação individual
para a coletiva. Escolhe-se um pegador, e os demais
se espalham pelo espaço de jogo. Quando alguém é
pego, dá a mão para o pegador e passa a atuar em
dupla com ele. Em seguida, em trio, quarteto, e assim
sucessivamente, formando uma corrente, até que reste
apenas um fugitivo, que será declarado vencedor.
Mãe da rua
O espaço de jogo é dividido como se fosse uma rua,
ou seja, duas calçadas em paralelo, com um espaço
central que corresponde à rua. O jogo é disputado in-
dividualmente. Escolhe-se um pegador; as demais
crianças se posicionam nas calçadas. O jogo consiste
em atravessar a rua, de uma calçada para a outra, sem
ser tocado pelo pegador; quando uma criança for
pega, os papéis se invertem.
Variações
1. Manter como pegadoras todas as crianças que fo-
rem sendo pegas, até que reste apenas um atraves-
sador, o vencedor daquela rodada.
2. Fazer a travessia saltando numa perna só, ou em
duplas, de mãos dadas.
3. A criança faz a travessia quicando uma bola; ao ser
pega, ela dá a bola ao pegador, que passa a fugir.
83
Programa 4
82
dança acompanha o homem praticamente desde a
aurora da humanidade. Os povos antigos dançavam
pelas mais diversas motivações – religiosas, práticas
ou belicosas. A dança esteve presente entre os homens pré-
históricos, fez parte de festividades gregas e das homena-
gens ao deus hindu Shiva, entre os rodopiantes daroês mu-
çulmanos, nos carnavais da Idade Média, nos ritos de guer-
ra das tribos indígenas e das nações africanas.
A dança não requer materiais específicos ou lugares
especiais (e às vezes prescinde até de música, estritamente
falando): para dançar, só é preciso o corpo e um ritmo (que
pode ser imprimido pelo próprio dançarino). Talvez por
isso ela seja tão popular, até como manifestação artística.
Obviamente, há uma diferença entre a dança apre-
sentada nos teatros e a que é dançada nas festas, nas
praças, nas ruas etc., da mesma forma que podemos di-
ferenciar o futebol jogado nos estádios daquele que se
joga nas ruas, nos campinhos e nas várzeas. Entretanto,
é possível encontrar aqueles (e sobretudo aquelas) que
nunca jogaram futebol, mas é mais difícil achar alguém
que nunca tenha dançado pelo menos uma vez na vida.
O Brasil dançaO Brasil dança
O Brasil dançaO Brasil dança
O Brasil dança
No Brasil, as manifestações populares de dança reve-
lam a influência histórica dos principais elementos
formadores de nossa cultura: o índio, o europeu e o
africano – e suas diferentes etnias, tribos ou culturas.
AA
AA
A
ONDE ESTÁ A DANÇA?
longo da fileira, batendo a mão na de cada jogador; a
cada toque corresponde uma palavra do mote: Barra
/ manteiga / na fuça / da nêga / um / dois / três.
Ao dizer a última palavra, corre para a direção
oposta do campo, tentando chegar na linha de fundo
sem ser tocado pelo jogador que recebeu o último
toque. Se for pego, o fugitivo repete a primeira etapa
da brincadeira, com o estribilho; se conseguir fugir, o
pegador será o fugitivo da rodada seguinte.
85
Onde está a dança?Programa 4
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A maioria das pessoas aprende a dançar sem profes-
sor, e dança de forma espontânea, por puro prazer; para
elas, a dança é antes de tudo uma diversão. Mas, assim
como nos jogos e brincadeiras, muitos conhecimentos são
mobilizados no ato da dança. Movimentar-se com ritmo,
com gestos diferentes dos movimentos utilitários do dia-
a-dia, estar em sintonia – ou sincronia – com a música,
com outras pessoas e com os próprios sentimentos, tudo
isso é a experiência da dança, uma experiência agradável
e repleta de desafios, não apenas corporais.
A dança, junto com a música, faz parte de nosso
dia-a-dia: das festas de aniversário ao carnaval, são
muitas as ocasiões e os pretextos para dançar, no con-
vívio social: em roda, aos pares, em grupo, as pesso-
as compartilham uma experiência prazerosa.
Observando e participando de ‘situações dançan-
tes’: é assim que muita gente aprende a dançar. Na rua,
com os amigos; em casa, com a família; nas festas da
coletividade; e – por que não? – até pela televisão.
E a escola, dança?
Talvez por preconceito (por achar que aquilo que di-
verte não contém conhecimento), ou por inseguran-
ça de trabalhar um conteúdo com o qual têm pouca
familiaridade (enquanto conteúdo formal), muitos
professores vêm dando um chá de cadeira’ na dança,
deixando-a do lado de fora da sala de aula.
Com raríssimas exceções, a única ocasião em que a
dança entra na escola é na época das festas juninas,
quando os alunos ensaiam a quadrilha. Mesmo nesse
caso, muitas vezes ela é realizada de forma automática,
desprovida de sentido, sem que os alunos saibam suas
origens e seus significados. Em geral, quando se dança
é por conta das próprias crianças (em geral, as meninas),
que imitam danças divulgadas pela mídia (Xuxa, Eliana,
Tchan etc.). A dança, enquanto objeto de ensino e apren-
dizagem escolar, tem deixado muito a desejar.
Cada estado, região ou cidade do Brasil tem suas fes-
tas e danças: moçambique, maculelê, maracatu, reisado,
folia, chegança, bumba-meu-boi, forró, baião, xote,
xaxado, samba, cateretê, balaio, pezinho, congada, pasto-
ril, quadrilha etc. Inúmeras formas de dança se desen-
volveram e continuam a ser criadas por todo o país.
Nossa cultura plural e nossa facilidade em absor-
ver influências faz com que tenhamos uma diversida-
de muito grande de danças regionais. Cada manifes-
tação dessas tem uma história, uma razão de ser, re-
vela um pedacinho da história do Brasil, contada,
recontada, recortada e ampliada.
Os grandes centros urbanos também têm suas tradi-
ções, instauradas por outras vias historicamente mais re-
centes: bailes funk, forrós e lambadas, escolas de samba,
gafieiras, mingaus de clubes, discotecas, carnaval de rua,
pagodes e muito mais. São danças bem diferentes das
regionais, mas também, como elas, foram criadas ou adap-
tadas pelos grupos culturais que as praticam; identificam
esses grupos e estão repletas de significado social.
A dança tem um status artístico, apresentada por
grupos profissionais ao vivo, em teatros, ou pela te-
levisão. Esses grupos são compostos por pessoas que
estudam e desenvolvem técnicas, criam e recriam lin-
guagens, compõem e interpretam coreografias. Alguns
grupos profissionais de dança desenvolvem as cha-
madas danças étnicas, típicas de uma cultura, dando
a elas novos significados e novas interpretações.
Como e por que
as pessoas dançam
Para as pessoas que aprendem técnicas, estudam, praticam
e recriam formas de dança, para se apresentar ao público,
a dança é uma profissão. Assim como o esportista profissi-
onal, o dançarino não dança apenas por prazer, e pode se
tornar uma referência para as pessoas que apreciam dança.
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A escola entra na dançaPrograma 5
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Capacidades desenvolvidas
• estética: execução de movimentos harmoniosos,
observação de gestos, formas, ritmos e melodias;
• corporal: uso expressivo do corpo, com a realização de
movimentos diferentes daqueles do cotidiano; relacio-
namento com o espaço e, em alguns casos, com obje-
tos, dentro de ritmos; coordenação de gestos de dife-
rentes partes do corpo; observação das sensações cor-
porais: calor, suor, cansaço, aceleração dos batimentos,
apetite, sede, alegria, tranqüilidade etc.; conscientização
de alguns limites e possibilidades do próprio corpo;
• ética: compreensão da dança como manifestação de
diferentes culturas, e como forma de expressão le-
gítima, tanto de homens quanto de mulheres; apre-
ciação crítica das danças veiculadas pela mídia;
• cognitiva: organização do próprio corpo no espaço
e no tempo; compreensão dos gestos e movimen-
tos da dança;
• inserção social: compreensão da dança como mani-
festação de sua própria cultura e como forma
prazerosa de interagir com as pessoas;
• afetiva e de relação interpessoal: respeito aos colegas que
têm dificuldade, auxiliando quando for o caso; expres-
são de sentimentos e emoções; integração social com os
companheiros.
Cuidados com o ensino
e a aprendizagem da dança
Espaço, roupas e outros detalhes. Para dançar não é
preciso uma sala com tablado de madeira, um aparelho
de som sofisticado ou um piano, nem colants e sapati-
lhas. O elemento fundamental é espaço para que todos
possam se movimentar com razoável liberdade. A rou-
pa precisa ser adequada, permitindo gestos amplos, sem
dança é um campo de aprendizagem privilegiado: é
uma forma de arte que utiliza como material apenas
o corpo e seus movimentos. Não existe comunidade
que não tenha suas danças preferidas. Tanto nas grandes
metrópoles quanto nas áreas rurais, todo lugar tem suas
danças mais ou menos tradicionais, com música ao vivo
ou gravada, danças coletivas, individuais ou em pares.
Por que a dança nem sempre está presente na escola?
Um dos maiores empecilhos para a adoção da
dança como objeto de ensino e aprendizagem reside
na insegurança dos professores – como não são do-
nos da matéria’ (do ponto de vista conceitual), ado-
tam nas aulas de Educação Física apenas os jogos e
brincadeiras que conhecem bem.
É preciso ter em vista que incentivar a dança não
significa formar bailarinos (assim como incentivar o
esporte não significa formar atletas profissionais); o
intuito é tirar proveito de todas as capacidades que a
dança pode ajudar a desenvolver.
Se o professor não se sentir à vontade para trabalhar
a dança com seus alunos, vale a pena pedir ajuda à pró-
pria comunidade. Em lugares do interior, onde a dança
tradicional ‘vai mal das pernas’, é comum encontrarmos
pessoas da comunidade que se preocupam em tentar
manter vivas tais tradições e que podem se aliar à escola
para o trabalho educativo. Nos centros urbanos, as dan-
ças conhecidas dos adolescentes como o samba, o break
e o funk, por exemplo, podem ser trazidas por eles.
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A ESCOLA ENTRA NA DANÇA
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A escola entra na dançaPrograma 5
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Interdisciplinaridade. É possível desenvolver proje-
tos de dança integrando diferentes áreas do conheci-
mento. Uma visão das relações entre aspectos
socioculturais e artísticos pode servir a conteúdos de
Geografia, História e Artes, principalmente.
As danças da moda. Este é um ponto polêmico: a es-
cola deve incentivar as danças divulgadas pela mídia?
Muitas delas têm um ritmo genuinamente brasileiro,
e uma coreografia simples, que convida a dançar; en-
tretanto, a vulgaridade de algumas letras e de alguns
movimentos não aconselha sua adoção pela escola
como objeto de ensino e aprendizagem.
As crianças gostam de dançar, e por isso são tão re-
ceptivas a esses modismos. Provavelmente, se a escola
despertar seu interesse por outros tipos de coreografia e
de dança, o foco de seu entusiasmo pode mudar. Apre-
sentar aos alunos músicas com ritmos semelhantes, po-
rém com letras mais significativas e menos apelativas,
pode ser uma forma de construir uma postura crítica
diante de um produto cultural de baixa qualidade.
Para saber maisPara saber mais
Para saber maisPara saber mais
Para saber mais
A melhor maneira de se familiarizar com o universo
da dança é assistir a apresentações ao vivo. Mas nem
sempre isso é possível. Para complementar as infor-
mações do educador, sugerimos abaixo uma peque-
na bibliografia:
ANDRADE, Mário de. Danças dramáticas do Brasil.
MENDES, Miriam Garcia. A dança. S. Paulo, E. Claro,
1988.
CLARO, Edson. Método dança – Educação Física. Rio
de Janeiro, Jorge Zahar, 1986.
BERTAZZO, Ivaldo. Cidadão corpo. S. Paulo, Sesc, 1996.
PORTINARI, Maribel. História da dança.
desconforto e sem expor demais o corpo do dançarino.
Música gravada pode ser muito útil. Na falta desta, uma
alternativa comum, que pode até ser mais divertida, con-
siste em cantar e/ou marcar o ritmo com algum instru-
mento simples (chocalho, pandeiro etc.).
Timidez, correções, apresentações. As crianças mais tí-
midas devem ser preservadas de situações de exposi-
ção, pois isso acaba por afastá-las definitivamente da
dança. Corrigi-las discretamente, auxiliá-las a se sentir
seguras e confiantes antes de uma apresentação e valo-
rizar sua participação são atitudes fundamentais para o
desenvolvimento de suas capacidades e para que pos-
sam experimentar o prazer de dançar.
Meninos e meninas. Embora historicamente, em todas
as culturas e lugares, a dança esteja muito presente no
universo masculino, em nossa sociedade paira um certo
preconceito em relação aos meninos que apreciam dan-
çar. O momento ideal para trabalhar no sentido de evi-
tar que o preconceito progrida é justamente na época do
ensino fundamental. Garantir aos meninos que sua par-
ticipação não os torna menos homens’, que dança tam-
bém é coisa de meninos’ e discutir os comentários que
porventura surjam a esse respeito são atitudes que po-
dem ensinar muito a respeito das questões do gênero.
História, estética, viés pluricultural. Pesquisar um
pouco as origens das danças e seu contexto histórico
é saber um pouco mais sobre a nossa e as outras cul-
turas. As danças contam histórias, trazem significados
de outras épocas, expressam valores éticos e estéti-
cos. Conhecer tais histórias ajuda a entender seus sig-
nificados e até a dançar melhor.
Momentos de criação. Vale a pena dar oportunidade aos
alunos de criar suas próprias danças, baseadas ou não
em danças conhecidas, contribuindo para que absorvam
o aprendizado e desenvolvam um elemento fundamen-
tal da dança: a criatividade.
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Futebol, paixão nacionalPrograma 6
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Inicialmente era um esporte de elite, praticado
apenas por moços de ‘boas famílias. No entanto, no
começo deste século, algumas escolas particulares do
Rio de Janeiro e de São Paulo passaram a praticá-lo
como atividade recreativa. Na década de 10, foram
fundados alguns clubes, todos mantendo caracterís-
ticas elitistas, com exceção do The Bangu Athletic Club
(o mesmo Bangu que existe até hoje), o primeiro a
incluir operários entre os jogadores e a aceitar negros.
Nos anos 30, o futebol passou por um processo de
popularização e de profissionalização. Com a crescente
industrialização e a urbanização conseqüente, o futebol
passou a funcionar também como elemento de aproxi-
mação de migrantes de outras regiões e outros países,
consolidando a união das pessoas sob uma mesma
bandeira, um mesmo hino, um mesmo grito.
Inúmeros clubes surgiram de partidas de futebol improvisa-
das na rua ou no pátio da fábrica, durante o intervalo para
o almoço. [...] Logo, só o intervalo para o almoço já não
bastava. Estendeu-se então a atividade para os fins de se-
mana. O gosto pelo futebol crescia e com ele a vontade de
melhorar as condições de sua prática, de jogar como os
ingleses, com equipes completas, uniformes, uma bola de
couro, um campo []. (Fátima M.R. Ferreira Antunes, O
futebol nas fábricas. Revista da USP 22, 1994)
Por conta disso, os donos das fábricas começaram a
subsidiar a prática – visando, provavelmente, ganhar
prestígio e fama com o sucesso de seu time – e, ao
mesmo tempo, a selecionar quem deveria fazer parte
da equipe. Inicia-se assim o marketing esportivo no
futebol. Esses times das fábricas muitas vezes ‘lança-
vam’ jogadores para as grandes equipes do Rio e de
São Paulo, principalmente com a consolidação do
profissionalismo, a partir de 1933.
De lá para cá, os times de fábrica se extinguiram, os
campos de várzea foram desaparecendo e o marketing
presença do futebol é marcante na vida diária do
brasileiro. Merece jornais e revistas especializadas,
noticiário diário em jornais, rádio e tevê, debates
e mesas-redondas ardorosos nos principais canais de
televisão. Cada Copa do Mundo é aguardada com ansie-
dade pela população que, como se diz, é formada por
150 milhões de técnicos. Não há um 7 de Setembro que
se compare às finais de um campeonato; não há orgu-
lho maior que ver as cores nacionais defendidas pelos
campeões. No Brasil, o futebol não é apenas um espor-
te: é um traço cultural da identidade do país.
Um pouco de história
Não se sabe ao certo como tudo começou. Na China, no
ano 2600 a.C., na Grécia Antiga, na Inglaterra, ou na Itá-
lia durante a Idade Média… O que se sabe é que o fute-
bol, tal como é hoje, foi organizado em meados do sé-
culo passado, na Europa. E, em 1904, a Fifa foi fundada.
Aqui o futebol aportou pelas mãos (ou seriam
pés?) dos marinheiros ingleses, holandeses e france-
ses, que jogavam em nossas praias, durante suas pa-
radas. Quando iam embora, levavam suas bolas e
deixavam os brasileiros a ver navios. Em 1894, um
brasileiro, filho de inglês, chamado Charles Miller,
trouxe duas bolas da Inglaterra (e seu conhecimento
como jogador), que permitiram que os brasileiros
pudessem jogar.
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FUTEBOL, PAIXÃO NACIONAL
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Futebol, paixão nacionalPrograma 6
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E o futebol na escola?
Infelizmente, o futebol tem sido, na maioria dos ca-
sos, pouquíssimo aproveitado pela Educação Física.
Não deixa, é claro, de ser jogado – se tiver uma bola,
uma lata ou até uma tampinha de garrafa, qualquer
criança procura um jeito de jogar.
No entanto, nas aulas de Educação Física, dificilmen-
te isso ocorre em um contexto educativo. Meninas jogan-
do queimada, meninos jogando futebol e a professora
corrigindo os cadernos… é um quadro clássico. O fute-
bol que se deve trabalhar na aula não é o mesmo dos
atletas, dos profissionais, dos clubes, mas sim o futebol
que pode desenvolver diferentes competências.
Capacidades desenvolvidas
As competências cognitivas são desenvolvidas prin-
cipalmente nas relações espaço-temporais: observa-
ção dos deslocamentos dos jogadores e da bola;
interação com esses elementos; observação e uso de
táticas; previsão do percurso da bola e dos jogado-
res; leitura dos espaços disponíveis em cada situação.
Ganhar e perder, se sentir competente ou incom-
petente, são aspectos afetivos mobilizados em todos
os jogos; entretanto, como o futebol é um jogo de
equipe, muitas vezes numerosa, isso favorece a situa-
ção de cooperação e de divisão de responsabilidades
(tanto na vitória quanto na derrota).
As competências corporais são o foco do trabalho:
o grande desafio é adequar os movimentos, principal-
mente se levarmos em conta que é proibido (com as
exceções de praxe) pôr a mão na bola. Entre os princi-
pais fundamentos de movimentação estão: corrida
(frente, costas, lado); domínio da bola com os pés, com
a coxa, com o corpo, com o peito, com a cabeça; o drible
e a finta; chutes: tiro direto, sem-pulo, bate-pronto, tiro
desportivo se transformou em uma indústria mundial que
movimenta milhões de dólares ao ano. Mas, por outro
lado, a paixão pelo futebol só cresceu: para torcedores e
praticantes. (Sinal dos tempos: as mulheres começaram a
ganhar espaço e mostrar as pernas dentro do campo.)
Futebol se joga em qualquer canto (do mundo e do
quintal), com bolas improvisadas, com times de um a ene
jogadores, com ou sem uniforme, com ou sem torcida, de
um a ene’ minutos. É um esporte que, mesmo no nível
profissional, contempla vários tipos de jogadores, diferen-
tes biótipos e estilos pessoais de ser e de jogar.
O que vale é a diferença!
Mário Filho, irmão de Nelson Rodrigues que é home-
nageado no nome do estádio do Maracanã, é consi-
derado o pai da crônica esportiva brasileira. Na co-
letânea O sapo de Arubinha, ele nos dá uma idéia da
extraordinária diversidade dos tipos físicos que sem-
pre fizeram parte do universo do futebol, em sua pro-
sa original e bem-humorada (os grifos são nossos):
[] Nilo Murtinho Braga, pequenino, pé de moça, que se
levasse um tranco não se sabe onde iria parar, que só podia
jogar mesmo com a cabeça. Quase não fazia nada em
campo, a não ser gol. Arranjavam sempre para ele dois
guarda-costas, jogadores pesados, fortes, verdadeiros tan-
ques, que lhe preparavam a bola com carinhos especiais.
Outro era o Osvaldo Mello, o Divina Dama, que era
quase alto, mas fino, esguio, e que tocava na bola como
se fosse com mãos de amante [].
[] um jogador um pouco forte, de ombros largos e per-
nas grossas. Um deles foi Lagarto, feio, desajeitado, mas
que quando botava uma bola debaixo do pé era para levá-
la, andando, até o outro gol.
[] era macrocéfalo como o baiano. E franzino, embora es-
guio, quase alto, não tão alto quanto parecia, porque a impres-
são vinha da magreza dele, uma magreza de tísico que não era.
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Futebol, paixão nacionalPrograma 6
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Cuidados com o ensino
e a aprendizagem do futebol
Intenções do futebol na escola. A capacidade das
crianças do 1
o
ciclo se presta a jogar um tipo de fute-
bol bem diferente do que se joga profissionalmente.
Não é papel da educação escolar formar jogadores de
futebol (nem qualquer tipo de atleta). É preciso res-
peitar as limitações e considerar as possibilidades de
cada aluno, utilizando aspectos do jogo que possam
desenvolver determinadas capacidades.
Lidando com a diferença. A maioria dos alunos já
conhece o futebol; no entanto, nem todos tiveram as
mesmas oportunidades de exercitá-lo. Por isso, é fun-
damental a socialização desses conhecimentos. As
crianças que dominam mais o assunto podem ensi-
nar, liderar e ser distribuídas nas equipes de modo a
compartilhar o que sabem.
Crianças com pouca – ou nenhuma – experiên-
cia anterior podem ter medo, e isso se justifica ple-
namente. Elas precisam se sentir à vontade para
enfrentar situações que contribuam para que se
sintam mais seguras para se desviar de boladas e
chutes, ou mesmo para perceber que faz parte do
jogo levar umas boladas.
Posições dentro do jogo. No futebol, assim como nos
demais jogos de competição, existe uma tendência à
distribuição dos jogadores nas equipes e à atribuição
de seus papéis no campo a partir das habilidades que
já possuem. O educador deve interferir nessa hierar-
quia ‘natural e espontânea, para evitar que os papéis
mais importantes e mais gratificantes sejam desem-
penhados apenas pelos melhores jogadores. É neces-
sário promover alterações na dinâmica do jogo, esta-
belecendo um rodízio de papéis, para que todos te-
nham o direito de jogar no ataque e tentar fazer o gol,
ou então assumir a tarefa de defender.
de trivela, puxada e de bico; passes: longos e curtos,
com o lado interno do pé, com o lado externo do pé,
de trivela, passe pelo alto; roubada, antecipação; cabe-
ceio; arremesso lateral, tiro de escanteio, chute de pê-
nalti e tiro livre (falta); movimentos do goleiro. Além
disso, ocorrem também diversas alterações no organis-
mo: aceleração dos batimentos cardíacos; transpiração;
cansaço; sede e apetite.
A capacidade ética pode ser desenvolvida na compre-
ensão das regras e nas atitudes que se procura construir
de solidariedade e lealdade, bem como na abordagem de
questões relativas ao esporte profissional e a sua história.
Quanto à estética, ela se desenvolve na aprecia-
ção do movimento e do estilo pessoal dos parceiros
e de outros jogadores, bem como na construção de
um estilo pessoal de jogar.
Qualquer jogo possibilita a interação social, mas o
futebol tem um espaço cultural privilegiado, sendo tam-
bém instrumento para favorecer a inserção social.
A principal magia e o grande fascínio do futebol
estão nas possibilidades de comunicação e de relação
interpessoal. Os códigos de comunicação peculiares ao
futebol são imensamente ricos e sutis. Há toda uma lin-
guagem gestual destinada a provocar, simular, iludir,
desequilibrar (driblar e roubar a bola), humilhar (dar
olé’), agredir (cometer falta), cooperar (tabelar), impro-
visar, dialogar (verbal e gestual), antecipar (chegar an-
tes), prever (lançamentos), coordenar (distribuir fun-
ções), confraternizar (comemorar o gol) etc.
A composição das equipes constitui um mosaico
de estilos pessoais, uma construção em que cada tem-
peramento e cada personalidade ocupa um papel e
uma função tática, estratégica, técnica e emocional. Há
os líderes, os ousados, os irresponsáveis, os omissos,
os violentos, os criativos, os perfeccionistas, os
temperamentais, entre infinitos aspectos que nem
sempre transparecem em uma partida de futebol.
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Conversando sobre futebol. É interessante tratar com
os alunos do aspecto sociocultural. Afinal, o futebol
faz parte do cotidiano de todos, não só na escola. O
professor deve conversar a respeito das notícias, dis-
cutir os jogos oficiais, contar um pouco da história do
esporte, contribuindo para que os alunos construam
uma idéia mais ampla e precisa do papel do futebol
na cultura brasileira.
Para saber maisPara saber mais
Para saber maisPara saber mais
Para saber mais
ALMEIDA PRADO, D. de. Seres, coisas, lugares. S. Paulo,
Cia. das Letras, 1997.
Dossiê Futebol. Revista da USP 22, 1994.
DUARTE, O. Futebol: histórias e regras. S. Paulo, Makron,
1997.
—. Todas as Copas do Mundo.
FILHO, M. O Sapo de Arubinha. S. Paulo, Cia. das Le-
tras, 1994.
RODRIGUES, Nelson. À sombra das chuteiras imortais:
crônicas de futebol. S. Paulo, Cia. das Letras, 1993.
——. A pátria em chuteiras: novas crônicas do futebol.
S. Paulo, Cia. das Letras, 1994.
SALDANHA, J. Histórias do futebol. R. de Janeiro, Revan,
1996.
SOARES, J., Muylaert, R. & NOGUEIRA, A. A Copa que
ninguém viu e a que queremos esquecer. S. Paulo, Cia.
das Letras, 1994.
TOSTÃO. Tostão: Lembranças, opiniões, reflexões sobre
futebol. S. Paulo, DBA , 1997.
VIGGIANI, E. (org.). Brasil bom de bola. Fortaleza, Tem-
po d’Imagem, 1998.
WAGNER, C.M. Futebol e orgasmo. S. Paulo, Summus,
1998.