de um lado, a vertente oficial e dominante expressa nas induções do governo federal para o parcelamento
da propriedade da terra, o assentamento de famílias singulares como unidades camponesas de produção e
o estímulo para a criação de uma única associação do assentamento oficialmente reconhecida como a
interlocutora política, econômica e social de todas as pretensões dos assentados perante o mercado e o
Estado;
de outro lado, a iniciativa do MST de implantar o Sistema Cooperativista dos Assentados - SCA, onde as
diretrizes estratégicas seriam a propriedade coletiva e ou semi-coletiva da terra, a constituição de grupos
coletivos e ou semi-coletivos de produção, sejam sob a forma de cooperativas de produção agropecuária -
CPAs ou de grupos de produção, e a articulação sistêmica dessas cooperativas e grupos de produção em
outras cooperativas de segundo e terceiro níveis como as cooperativas de prestação de serviços - CPSs, as
cooperativas de prestação de serviços regionais - CPSRs e as cooperativas centrais dos assentados -
CCAs, ainda que, ressalte-se, não haja entre elas qualquer tipo de hierarquia.
Pode-se, com algumas exceções, afirmar que a vertente oficial repousou sobre contradições muito acentuadas ao
estimular, por um lado, diretamente o parcelamento da terra e a constituição de unidades de produção camponesa
individualizadas. Por outro lado, os programas governamentais ao direcionarem os recursos financeiros apenas para
projetos de ação comunitária, exigindo a criação de associações comunitárias (sic), tenderam a criar formas de
associativismo instrumentais, ou seja, para um fim único que foi a mediação entre as famílias assentadas e os programas
governamentais de financiamento do desenvolvimento rural.
O Sistema Cooperativista do Assentados -SCA, por sua vez, ao definir um sistema geral de cooperação exclusivamente
sob o critério econômico de agrupamento das famílias dos trabalhadores rurais, predomina os critérios uso da terra e
relação com o mercado, restringiu as possibilidades de diferenciação das formas de associativismo a partir da dinâmica
social interna dos grupos sociais.
Ao atentar-se para as distorções estruturais referidas seção 2.1 acima, pode-se induzir que a vertente oficial é hegemônica
nas regiões ou áreas do país onde os rendimentos das famílias de trabalhadores rurais são relativamente mais baixos e as
condições de produção (semi-árido) e ou comercialização dos produtos (norte) são as mais adversas possíveis. Já o SCA
tem maior êxito onde as condições efetivas de produção e de comercialização são mais favoráveis. A evidência disso é o
seu bom desenvolvimento no sul do país e nos Estados de São Paulo e do Espírito Santo e, pontualmente, em
Pernambuco, Bahia e Ceará. Porém, tanto a vertente oficial como aquela do SCA apresentam insuficiências quando
confrontadas com grupos sociais onde haja tradicionalmente uma auto-identidade estabelecida a partir de critérios que
não sejam estritamente os econômicos.
Um caso particular, entre essas duas concepções globais divergentes, é aquele representado pelo Estado do Ceará onde
quase todos os assentamentos (em torno de 90% dos 242, sendo 212 do governo federal e 30 do governo estadual)
possuem a mesma estrutura associativa, ou seja, associação geral do assentamento, posse coletiva da terra, áreas de até 3
has para uso individual das famílias singulares (limite de área, no semi-árido, que pode ser explorada pela força de
trabalho familiar com os instrumentos de trabalho tradicionais) e o restante da área do assentamento trabalhado por um
coletivo onde todas as famílias assentados devem dedicar de 1 a 3 dias de trabalho/homem por semana (dependendo do
caso) objetivando melhorias na infraestrutura social do assentamento ou o cultivo e ou criação para usufruto comunitário.
Esse sistema foi consolidado a partir de 1991 por influência de diversos atores sociais mas, em especial, pelo INCRA-CE
(desde 1988) e a Secretaria de Agricultura do Governo do Estado (1991). É um sistema homogêneo para as diversas
regiões do Estado do Ceará (semi-árido, serra e litoral). Traz no seu bojo algumas distorções, conforme comentar-se-á
adiante. Entretanto, seu princípio básico é similar à hipótese segunda anteriormente aventada (seção 1.3, acima) para este
estudo, ou seja, a impossibilidade de que a unidade camponesa possa reproduzir-se e crescer econômica e
sustentadamente de forma parcelada, a não ser excepcionalmente, dentro do contexto contemporâneo do país. A
cooperação para potencializar o desenvolvimento da forças produtivas torna-se uma necessidade.
Entretanto, com exceções pontuais, as famílias de trabalhadores rurais dos assentamentos no nordeste brasileiro, em
particular aqueles situados na região semi-árida, não conseguem produzir excedentes da sua produção de subsistência e,
menos ainda, ter êxito na produção para o mercado, seja essa produção proveniente daquelas atividades a nível das
famílias singulares seja dos coletivos. As causas prováveis dessas dificuldades na produção agropecuária estão
relacionados com o clima, com a precária capacidade de poupança para a melhoria da infraestrutura produtiva e a
incipiente tecnologia de produção adotada. Nesse sentido, a possibilidade de melhoria dos meios de produção de
file:///D|/projetos/nead_novo/htdocs-OLD-20030326/portugues/estudos/TMP1sio9ch7rx.htm (13 of 43) [28/03/2003 17:37:02]