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INSTITUTO INTERAMERICANO
DE COOPERAÇÃO PARA A AGRICULTURA - IICA
MINISTÉRIO EXTRAORDINÁRIO DE POLÍTICA FUNDIÁRIA - MEPF
NÚCLEO DE ESTUDOS AGRÁRIOS E DE DESENVOLVIMENTO NEAD
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FORMAS DE ASSOCIATIVISMO VIVENCIADAS PELOS TRABALHADORES RURAIS NAS ÁREAS
OFICIAIS DE REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL
HORACIO MARTINS DE CARVALHO
CURITIBA, AGOSTO DE 1998
Sumário
Introdução ..... 2
PARTE A - A diversidade das formas de associativismo
1. Referenciais básicos..... 4
1.1. Limitações deste estudo..... 45
1.2. Elementos conceituais ....... 4
1.3. Procedimento analítico..... 8
2. O associativismo nos assentamentos ..... 11
2.1. Distorções estruturais..... 11
2.2. As formas de associativismo econômico identificadas ..... 13
2.3. Periodização histórica e concepções globais divergentes..... 16
2.4. Associativismo na gestão interna do assentamento..... 20
2.5. Associativismo nas relações com o mercado..... 23
2.6. Associativismo nas relações com o Estado..... 25
2.7. Assentamento: sistema fechado ou aberto?..... 27
PARTE B - Casos ilustrativos da complexidade das formas de cooperação
Introdução..... 29
Caso 1 - A coletivização dos meios de produção..... 32
Caso 2 - Central de associações..... 41
Caso 3 - Grupos de produção e a cooperação regional..... 49
Caso 4 - Coletivos, mutirões e localismo..... 55
Caso 5 - A coesão social do povoado e o associativismo burocrático..... 60
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Conclusão ..... 64
Literatura citada..... 66
Introdução
O associativismo aqui estudado restringiu-se à economia das áreas oficiais de reforma agrária, oficialmente denominadas
de assentamentos. Outros planos sociais vivenciados pelos trabalhadores rurais assentados como o da religião, o racial, o
político partidário, o de parentesco, de lazer ou de afinidades não foram aqui abordados diretamente. Esses planos sociais
entrecruzam-se no movimento da vida social. Sempre que possível foi feita referência a eles.
É grande a diversidade e a complexidade das formas de associativismo econômico vivenciadas pelos trabalhadores rurais
nos assentamentos no Brasil.
Num mesmo assentamento podem coexistir diferentes formas de associativismo, assim como uma família de trabalhador
rural assentado pode participar de uma ou mais dessas formas de associativismo distintas entre si, de forma simultânea,
num mesmo assentamento. E, no decorrer da história de um determinado assentamento, a combinação entre formas
diversas de associativismo econômico pode ter sido alterada. Assim, sincrônica e diacronicamente, cada assentamento
apresenta variações significativas nas formas de associativismo vivenciadas pelas famílias de trabalhadores rurais. E, se
aliarmos a essas alternativas as possibilidades do associativismo informal e ou formal, poder-se-á constatar uma miríade
de situações complexas de formas de associativismo nos assentamentos no país.
Além da constatação da diversidade e da complexidade das formas de associativismo, o que se buscou explorar neste
estudo, sumariamente relatado na Parte B, foram os elementos que explicitariam o grau de coesão social de um
determinado grupo social. Também, na medida do possível, identificar os diversos planos sociais que proporcionaram
possibilidades de convivência, com maior ou menor grau de harmonia, entre grupos sociais com identidades sociais
distintas entre si dentro de um mesmo assentamento.
Nem sempre as formas de associativismo econômico constituídas pelos trabalhadores rurais coincidem com as definições
legais vigentes, apesar dos nomes utilizados serem similares.
Este documento procura apresentar os resultados do estudo realizado sobre as formas de associativismo econômico
vivenciadas pelos trabalhadores rurais nas áreas oficiais de reforma agrária no Brasil. Atenta, de imediato, para as
limitações oriundas da inexistência de informações sistematizadas sobre o tema por assentamento, estado e o país. As
informações oficiais existentes são insuficientes para permitirem uma análise crítica das situações concretas,
historicamente situadas, mesmo que a nível de dados agregados, pois o I Censo da Reforma Agrária no Brasil (Censo,
1996) reduziu as formas de participação dos beneficiários (sic) em organizações em quatro categorias: igreja, sindicato,
cooperativa e associação.
A complexidade das formas combinatórias de associativismo econômico nos assentamentos torna quase supérfluas as
informações quantitativas sistemáticas. Como os diferentes grupos sociais constróem e vivenciam suas próprias formas
combinatórias de associativismo econômico dificilmente a estatística sob uma das formas, por exemplo o grupo
semi-coletivo, terá algum significado seja prático seja teórico, pois, essa forma estará sempre combinada com alguma
outra, dependendo da época e da situação geográfica do assentamento. E, mais, para cada assentamento as mudanças de
formas no tempo são muito rápidas. Na maioria das situações aquelas formas de associativismo econômico induzidas
pelos organismos governamentais e não governamentais foram absorvidas e reapropriadas diferenciadamente pelos
distintos grupos sociais, utilizando-as como uma alternativa de interlocução com o Estado e o mercado.
As informações aqui utilizadas foram coletadas de fontes primárias e de fontes secundárias. Considerou-se de fonte
primária as informações verbais (via entrevista) prestadas diretamente pelos trabalhadores rurais assentados. Como fonte
secundária aquelas informações fornecidas pelos dirigentes de associações de assentados a níveis estadual e nacional e,
sem dúvida, as informações cadastrais oficiais.
Não se enfatizou a dimensão histórica das mudanças nas formas de associativismo econômico por dois motivos: o
primeiro deveu-se à falta de tempo para o resgate da história do associativismo econômico nos assentamentos nas
diversas regiões do país. Sobre o tema há referências gerais, a partir de 1990, apenas para situar-se a importância do
mesmo. Em segundo lugar porque este estudo enfatizou a época atual, ou seja, a situação do associativismo nos
assentamentos neste primeiro semestre de 1998, ainda que para tanto se fizesse referências sistemáticas ao período
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1990-98. Tudo leva a crer, pelas informações obtidas, que um estudo da história das formas de associativismo nos
assentamentos tornar-se-á indispensável para a compreensão da evolução recente e da situação atual assim como das
propostas hoje vigentes.
A apresentação dos resultados do estudo efetuado foi estruturada em duas partes. A Parte A, foi dividida em dois
capítulos: o primeiro apresenta os referenciais básicos utilizados e o segundo versa sobre os resultados da análise
efetuada com relação ao tema, tendo sido internamente estruturado em 6 seções objetivando dar conta das diversas
idiossincrasias e dimensões do associativismo vivenciadas pelos trabalhadores rurais. A Parte B apresenta cinco estudos
de caso, escolhidos intencionalmente entre diversos outros, e procura mostrar que é possível perceber-se as formas de
associativismo a partir de diferentes critérios de observação. Ressalta que as induções de fora para dentro das formas de
associativismo ou acabam por serem desprezadas ou são reelaboradas pelos grupos sociais segundo seus interesses.
Seguem a conclusão e a literatura citada.
PARTE A - A DIVERSIDADE DAS FORMAS DE ASSOCIATIVISMO
Capítulo 1. Referenciais básicos
1.1. Limitações deste estudo
Tendo em vista que não se optou por um estudo histórico das formas de associativismo econômico vivenciadas pelos
trabalhadores rurais nos assentamentos de reforma agrária no país deixou-se de considerar a periodização necessária para
a compreensão das causas das mudanças verificadas no decorrer do tempo. Também, ao não se ensaiar uma tipificação
dos assentamentos, não se estabeleceu critérios para identificar-se assentamentos distintos uns dos outros, apesar de que
no decorrer das entrevistas para a coleta de dados deu-se conta da importância e necessidade de estabelecer-se tal
procedimento. Essas limitações, a ausência de análise histórica e de tipificação dos assentamentos, constituiram-se em
lacunas neste estudo que se não comprometeram seriamente o conjunto das análises efetuadas as tornou incompletas.
Apesar de não ter sido realizada uma tipificação dos assentamentos, nem estabelecidos critérios de observação das
formas de associativismo (esta abordagem é referida na Introdução da Parte B) fez-se, empiricamente, referências às
grandes regiões do país sem necessariamente considerar-se esse o único critério de classificação. Seja em decorrência de
fatores históricos político-sociais seja pela determinação de elementos da fisiografia, o associativismo nos assentamentos
dessas diferentes regiões apresenta, além de formas distintas, usos diferenciados para uma mesma forma. Como exemplo,
a expressão coletivo utilizada em assentamentos do semi-árido nordestino e o coletivo nos assentamentos no sul do país,
ainda que expressões iguais tem significados e práticas muito diferentes entre si. Para evitar compreensão indevida,
nesses casos sempre haverá referência à forma de associativismo seguida do nome da região em apreço.
Com exceção de um dos casos citados na Parte B não houve, ainda que se considere necessário, o estudo da coesão social
dos grupos sociais existentes nos assentamentos, coesão essa que poderia determinar ou ser determinada, entre outros
fatores, pelas formas de associativismo desenvolvidas. Também, em decorrência disso, não se ensaiou o estudo dos
critérios de observação das formas de associativismo existentes.
1.2. Elementos conceituais
Utilizou-se a expressão associativismo para dar conta, de maneira genérica, de todas as possibilidades de cooperação
organizada entre pessoas físicas para a realização de um determinado objetivo. Isso implica, portanto, a hipótese de que
tal cooperação organizada possa ter ou não correspondência com as figuras organizacionais de associação entre pessoas
(físicas e jurídicas) previstas em lei. Ademais, o associativismo identificado poderá ter ou não sua existência legalizada.
Já a associação, como adiante comenta-se, é compreendida como uma instância de mediação.
Empregou-se a expressão forma de associativismo, e não tipo, desejando com isso acentuar que não houve, a priori, a
definição de uma tipologia de associativismo. Isso não significa que não se possa caminhar para tal, mas, não foi essa a
intenção primeira deste estudo.
A expressão coletivo pode referir-se à forma de cooperação no processo de produção, à apropriação da terra, à
comercialização de produtos e insumos e ou à repartição do produto do trabalho. Em qualquer dessas acepções ela busca
exprimir que um coletivo de pessoas e ou famílias é o sujeito do objeto em apreço. A expressão semi-coletivo significa
que as todas as famílias, ou somente parte delas, de trabalhadores rurais existentes num assentamento vivenciam
simultaneamente as formas de exploração coletiva e a individual, sendo que a forma coletiva refere-se, em geral, ao uso
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comum de parcela da terra do assentamento e a exploração individual dá-se no lote particular. Há situações diferenciadas
como aquelas que se verificam em diversos assentamentos do nordeste do país (ou nos assentamentos agro-extrativistas)
em que o imóvel não foi parcelado, sendo a terra de apropriação comunitária como, também, são realizadas diversas
atividades de produção com trabalho coletivo. Nesses casos é permitindo o uso de parcela (em média 2 há) de terra para
exploração familiar individual.
Muitas vezes a expressão coletivo é utilizada como substantivo para designar uma forma de associação (instituição) em
que todos os envolvidos compartilham de objetivos e de atividades previamente determinadas. Em outras circunstâncias
é empregada ora como verbo (coletivizar) ora como substantivo (o coletivo). As expressões coletivo e semi-coletivos
podem ser apresentadas por outro significante, como a associação (daí o associativismo e a associação).
O coletivo, enquanto forma de cooperação do trabalho objetivando a potencialização das forças produtivas, pressupõe
uma divisão técnica do trabalho de maneira que uma atividade complemente a outra numa dinâmica de
interdependências. Quando a cooperação no trabalho não pressupõe divisão técnica do trabalho e destina-se a apenas
uma atividade específica, caracteriza-se como mutirão. Portanto, o mutirão, ainda que equacionando dificuldades
encontradas pela família singular na sua relação com a natureza, onde a ajuda mútua desempenha um papel relevante,
não se confunde com a coletivização do processo de trabalho.
O mutirão, quando adotado nos assentamentos onde houve o parcelamento da terra e onde não se pratica nenhuma
forma de associativismo no processo de produção, de certa maneira configura-se como uma forma de troca de dia
serviço, pois, aquela família singular que foi beneficiada pela ajuda dos vizinhos ou parentes fica devendo um favor aos
demais: o de participar num outro mutirão futuro, o qual beneficiará um dos participantes do mutirão anterior. No
mutirão inexiste o contrato de trabalho. Há, sim o compromisso moral, a expectativa da reciprocidade. Nesse sentido o
mutirão, diferentemente dos coletivos onde há divisão técnica do trabalho, pressupõe fortes elementos de subjetividade e
de ritos de realização.
Entretanto, como coexistem diversas formas de associativismo entrecruzadas sincrônica (mutirão objetivando atividade
de uma família singular, a qual participa de semi-coletivos em outras atividades) e diacronicamente (favor a ser
retribuído no futuro) e elementos subjetivos muito acentuados, como lealdades, troca de favores, compadrio, etc,
conforme já ressaltado anteriormente, seria imprudente que a nível deste estudo se ensaiasse tipificar algumas categorias
utilizadas livremente pelos movimentos sociais e pelos trabalhadores rurais assentados em áreas de reforma agrária.
As expressões comunidade e povoado são muitas vezes utilizadas, a nível do senso comum, como sinônimos. O
povoado, no entanto, procura expressar um local ou área geográfica onde um conjunto de pessoas e ou famílias mantém
domicílio e desenvolve atividades produtivas e ou comerciais. Neste sentido, o povoado abrange não apenas a nucleação
das casas de moradia e de prestação de serviços mas, também, a área rural onde as famílias realizam a produção rural
amplo senso. Já a comunidade não necessita ter como referência básica um local geográfico. Ela caracteriza-se pela
identidade comum e a coesão social entre um grupo de pessoas e ou de famílias a partir da aceitação consensuada de
determinados ideais, aspirações, interesses e ou objetivos. Num povoado pode existir uma ou mais comunidades assim
como uma comunidade pode abranger pessoas e ou famílias de mais de um povoado.
Como assentamento, enquanto substantivo, compreendeu-se o conjunto de famílias de trabalhadores rurais vivendo e
produzindo num determinado imóvel rural, desapropriado ou adquirido pelo governo federal (no caso de aquisição,
também, pelos governos estaduais) com o fim de cumprir as disposições constitucionais e legais relativas à reforma
agrária. A expressão assentamento é utilizada para identificar não apenas um área de terra, no âmbito dos processos de
reforma agrária, destinada à produção agropecuária e ou extrativista mas, também, um agregado heterogêneo de grupos
sociais constituídos por famílias de trabalhadores rurais.
A tutela do assentamento exercida pelo governo federal e ou estadual deve-se às disposições legais, tendo em vista que o
assentamento é produto de uma intervenção social do Estado (desapropriação) sobre um bem ou negócio privado a nível
da sociedade civil e, portanto, compete aos governos garantir, até a emancipação do assentamento, que a intervenção
atenda às finalidades (no caso) da reforma agrária expressas em lei.
No contexto desta análise a tutela, ainda que inicialmente legal e legitima, pode não apresentar, no decorrer do tempo,
legitimação. Essa legitimação foi aqui compreendida como o produto consuetudinário da práxis de participação social
dos trabalhadores rurais assentados no processo de reproduzirem e ou gestarem as mais diversas formas de
associativismo, a partir dos saberes e experiências dos diferentes grupos sociais de trabalhadores rurais, e no de
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usufruírem das políticas públicas, induzidos ou não diretamente pelos organismos governamentais ou destes em parceria
com entidades da sociedade civil, para a reprodução constante e crescente das suas condições objetivas e subjetivas de
vida e de trabalho .
As expressões participação e organização sociais são aqui adotadas sob dois enfoques: a participação e a organização
consensuadas e a participação e a organização constrangidas.
Considera-se como processos de participação e de organização sociais consensuadas aqueles nos quais as pessoas
diretamente envolvidas colocam-se como sujeitos do seu que-fazer, do pensar e transformar o mundo que vivenciam,
tanto perante as demais pessoas e organizações da sociedade civil como perante as pessoas e os organismos
governamentais, amplo senso.
Contrariamente, os processos de participação e de organização sociais constrangidas são resultados de uma dinâmica
social em que as pessoas diretamente interessadas encontram-se em situação econômica, política e ideológica de
subalternidade, sem possibilidades conjunturais de negarem sua presença (participação) em reuniões convocadas por
terceiros ou de negarem as induções para associarem-se (organização). Com relação aos assentamentos, essa indução
constrangedora parte preponderantemente dos organismos governamentais.
Os processos de participação e a organização social consensuadas não se estabelecem por decisões plenárias, de
instituições ou de poderes políticos locais, ou outras instâncias. São processos permanentes e simultâneos de micro
conquistas pessoais, familiares, grupais ou de toda uma coletividade seja ela um assentamento de reforma agrária, um
povoado rural ou um bairro urbano. Esses processos não são lineares nem absolutos. Necessitam ser constantemente
repensados a partir da própria prática de exercitá-los. São repletos de contradições, conflitos e incoerências; por isso
mesmo um movimento constante de reflexão-ação faz-se necessário. O que deu certo num determinado povoado pode
não ser adequado para outro; o que foi considerado satisfatório hoje poderá ser inteiramente insatisfatório amanhã,
porque mudam as circunstâncias e mudam as pessoas. Nesse movimento pessoal e social, a adaptabilidade, diversidade,
eqüidade e incerteza são companheira de jornada (Carvalho; 1994: 26/7).
Atentou-se, por outro lado, para o fato de que a participação social dá-se em diferentes planos sociais e com graus de
intensidades diferentes. As pessoas vivenciam, sincrônica e diacronicamente, no decorrer de suas vidas, diversas
experiências de participação e de associação. A cada conjuntura, em cada contexto, diferentes fatores, tanto de ordem
objetiva como subjetiva, determinam o grau de intensidade da participação das pessoas em cada um diversos planos
sociais da sua existência. Portanto, não é possível estabelecer-se simetrias entre formas de associativismo e as
motivações que, em cada lugar e tempo, conduziram consensuada ou constrangidamente as pessoas a associarem-se.
Foi possível, isto sim, inferir-se tendências, com os riscos pertinentes desse exercício, para o associativismo econômico
em determinados planos sociais da vida social no assentamento, como o da economia da produção (incluindo a gestão
interna dos assentamentos), o da comercialização de produtos e insumos e o da relação com os governos.
A associação é, então, compreendida como uma mediação entre os interesses, desejos e aspirações pessoais e
familiares dos trabalhadores rurais assentados e o seu ambiente social, este expresso no conjunto das famílias do
assentamento, no mercado de bens e serviços e nas políticas públicas. Essa mediação pode estar ocorrendo ou não e,
quando ocorre, faz-se ou de maneira consensuada ou constrangida. As relações interpessoais ou interfamiliares
prescindem, na maioria dos casos, de mediação por uma associação.
Com relação ao processo de produção empregou-se a expressão produção para o mercado (produtos com valor de
troca) sempre e quando a intenção de plantio, criação e ou extrativismo foram para a venda da totalidade do produto e
subprodutos obtidos no mercado. Por outro lado, produção para a subsistência (produtos só com valor de uso) foi a
expressão para o produto e subprodutos daqueles plantios, criações e extrativismo cujo objetivo principal tivesse sido o
autoconsumo familiar e ou para uso como insumo interno no estabelecimento rural. O produto excedente sempre
referir-se-á àquela parte da produção para a subsistência que foi comercializada.
Como família singular entendem-se o casal e os filhos. Como grupo doméstico o casal e filhos com seus parentes
diretos, sejam ascendentes sejam descendentes, e os indiretos como cunhados, noras, etc. As pessoas envolvidas em
relações de compadrio estão incluídas no grupo doméstico.
A referência à produção e aos meios de produção da família singular estão relacionados com a área explorada
individualmente pela família, portanto, independente da produção e dos meios de produção que possam usufruir como
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membros das inúmeras possibilidades de associações.
1.3. Procedimento analítico
Quatro hipóteses foram adotadas neste estudo exploratório:
Primeira: nos assentamentos de reforma agrária predomina o comportamento individualista das
famílias dos trabalhadores rurais com relação à gestão do assentamento, à forma de apropriação da
terra, ao processo produtivo amplo senso, incluindo a comercialização, e às relações com os organismos
governamentais mediadores das políticas públicas (exploração individual representa 86,59 % das formas
de exploração - Censo, 1996);
Segunda: as possibilidades de melhoria crescente e sustentável das condições de vida e de trabalho dos
trabalhadores rurais assentados estará diretamente relacionado com a sua capacidade de estabelecer
relações sociais de cooperação com seus pares de forma a potencializar as forças produtivas e os meios
de produção disponíveis nos assentamentos;
Terceira: a diversidade das formas de associativismo econômico presentes num determinado assentamento
está diretamente relacionada com a complexidade das relações dos trabalhadores rurais assentados com o
mercado de produtos e insumos;
Quarta: a indução pelos organismos governamentais e não governamentais de formas identitárias de
agrupamento social para legitimar oficialmente o acesso dos trabalhadores rurais assentados às políticas
públicas tende a colidir com as identidades coletivas tradicionais e emergentes dos diferentes grupos
sociais.
As duas primeiras hipóteses encerram contradições entre si. A primeira acentua a tendência implícita no comportamento
dos trabalhadores rurais assentados de tentarem consolidarem-se como camponeses, ou seja, unidades de produção onde
a unidade de consumo e a de produção confundem-se, e onde predomina a produção de valor de uso. As possibilidades
da unidade camponesa transformar-se em empresa rural familiar, por exemplo, onde predominaria a produção de valor de
troca seria, nas condições vigentes da formação econômica e social brasileira, muito difíceis, a não ser em casos
excepcionais. A alternativa, portanto, de acordo com a segunda hipótese é encontrar formas de associativismo econômico
que lhes permita superar as suas limitações enquanto camponeses numa sociedade capitalista sob a hegemonia do capital
nacional e internacional oligopolista e com ampla abertura para as importações de produtos do setor primário.
A terceira hipótese apresenta uma condição geral para que o associativismo econômico ocorra de forma diversificada: a
inserção da economia do assentamento no mercado, ou seja, que haja produção, e agregação de valor, de bens com valor
de troca.
A quarta hipótese questiona a redução das possibilidades dos grupos sociais de gestarem as suas próprias formas de
representação e de mediação para a interlocução com o Estado. Os organismos governamentais ao definirem qual o tipo
de mediação da interlocução é legítimo impedem ou obstaculizam as iniciativas de grupos sociais heterogêneos de
reafirmarem a sua coesão social interna pelo reconhecimento externo das suas formas de auto-representação.
O associativismo econômico nas áreas oficiais de reforma agrária, enquanto mediação entre o indivíduo e o coletivo
social e entre as famílias de trabalhadores rurais e o mercado, tem ocorrido supondo:
Potencializar as forças produtivas familiares durante o processo de produção;
Proceder a uma divisão técnica do trabalho entre as famílias dos assentados para maior e melhor uso da
força de trabalho e dos meios de produção;
Aumentar a escala de comercialização (compra e venda) para obter maior poder de barganha comercial;
Agregar valor, pelo beneficiamento e agro-industrialização, aos produtos de origem primária;
Ampliar o grau de organização política e social entre as famílias assentadas para relacionar-se com o
Estado;
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Desenvolver maior solidariedade entre as pessoas.
Este estudo foi realizado com o objetivo de conhecer as formas de associativismo econômico, formais e ou informais,
entre os trabalhadores rurais assentados que fossem por eles identificadas como existentes na atualidade do
assentamento, tendo o entrevistado participado diretamente delas ou não. Para tanto, realizou-se quatro cortes analíticos
na vida social dos assentamentos, de maneira a identificar-se as formas associativas relacionadas com:
a gestão interna do assentamento;
os mecanismos de comercialização e beneficiamento de produtos e de insumos;
as políticas públicas, via os organismos governamentais;
a possibilidade de reafirmação das identidades dos grupos sociais.
Muitas das formas de associativismo econômico identificadas atuam simultaneamente nessas quatro dimensões. Outras,
ainda que tendo poder para atuar nas dimensões anteriores, por razões conjunturais, só exercem atividades numa ou duas
delas. Outras foram criadas para uma das dimensões assinaladas mas, por motivos objetivos e subjetivos, exercem outras
funções, como por exemplo, cooperativas que desempenham preponderantemente papel de articulação política. Não
houve, portanto, a pertinência esperada na efetividade dessas dimensões por razões que serão abordadas no capítulo a
seguir. Entretanto, para facilitar a compreensão de determinadas variáveis como a produção para o mercado ou para
autoconsumo optou-se pela apresentação dos resultados analíticos no âmbito das três primeiras dimensões anteriormente
assinaladas.
A importância do estudo sobre as identidades dos diversos grupos socais porventura existentes nos assentamentos só foi
sendo devidamente percebida no decorrer das entrevistas e nos diálogos críticos com diversos especialistas na matéria.
Infelizmente, essa temática acabou escapando do escopo deste estudo. Assim, as referências a elas existentes neste
documento constituem mais um alerta para essa omissão do que propriamente a tentativa de gerar informações a respeito
do tema.
Na seção 2.7 - Assentamento: sistema fechado ou aberto?, adiante, intenta-se articular as três primeiras dimensões
analisadas numa tentativa de síntese. A compreensão da relação entre a forma de associativismo e a reafirmação das
identidades dos grupos sociais é exploratoriamente abordada na Parte B, em particular nos cinco casos apresentados
Capítulo 2. O associativismo nos assentamentos
2.1 Distorções estruturais
Diversas constatações realizadas durante as visitas aos assentamentos e as entrevistas com os trabalhadores rurais das
áreas oficiais de reforma agrária, e a partir do conhecimento anteriormente sistematizado, permitiu identificar tendências
estruturais, tanto de ordem econômica, política como institucional que ora obstaculizam ora fragilizam as possibilidades
de emergência de formas variadas de associativismo.
Nas regiões onde há maior dificuldade de produção, inclusive para a subsistência, em geral pela adversidade
edáfo-climática dos locais onde situam-se os assentamentos, como no semi-árido do nordeste brasileiro e em zonas do
cerrado do centro-oeste, ou onde, apesar de haver relativamente maior possibilidade de produção, inclusive para o
mercado, como na região norte do país, mas há condições adversas de comercialização dos produtos, com as exceções
pertinentes à regra geral (nessas três regiões do país encontram-se 88,71 % dos beneficiários das áreas oficiais de
reforma agrária), constatou-se:
o baixo rendimento das famílias na maioria dos assentamentos;
a precária relação dos trabalhadores rurais, enquanto famílias singulares ou associadas, com o mercado de
produtos e insumos;
a dependência dos trabalhadores rurais nos assentamentos dos recursos governamentais;
baixa diversidade das formas de associativismo.
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Essas situações, interdependentes entre si, influenciam e influenciaram de forma relevante as possibilidades de
associativismo econômico, dando a estas mediações, quando induzidas por atores externos aos grupos sociais existentes
nos assentamentos, papéis sociais nem sempre coerentes com o objetivo para que foram constituídas. Por exemplo, as
associações de produtores rurais dos assentamentos no nordeste brasileiro (39,68 % dos projetos oficiais de reforma
agrária), em particular nos assentamentos situados no semi-árido, possuem como uma das suas atribuições a
comercialização dos produtos do assentamento. Porém, na maior parte das vezes, não há nem produção para o mercado
nem excedente na produção de subsistência, logo, nada a comercializar. Quando existe algum excedente de uma
produção de família singular, seu volume é tão irrisório que o trabalhador rural vende seu produto diretamente nas
bodegas ou comércios locais.
Mas, situações inversas são encontradas. Em diversos assentamentos no norte do país (31,59% dos beneficiários das
áreas oficiais de reforma agrária) houve produção de frutas para o mercado tendo em vista seu beneficiamento para a
obtenção da polpa, por exemplo, para sucos. Existia, também, a associação do assentamento apta para comercializar o
produto, porem, em decorrência da falta de estudos apropriados de mercado quando da elaboração do projeto de
financiamento para a implantação dos pomares, não houve (nem tem havido) possibilidades de comercialização (preços
pagos ao produtor muito baixos que não remuneram nem a colheita do produto), e o produto foi desperdiçado. Em outras
circunstâncias, a distância entre os assentamentos e os mercados atacadistas, a precária situação das estradas e a falta de
transportes próprios dos trabalhadores rurais impediam, na maioria das vezes, que os produtos fossem retirados da área
do assentamento.
Outras situações que adquirem caráter geral ou tendencial, em especial nas regiões norte e nordeste (essas duas regiões
respondem por 71,27 % dos beneficiários das áreas oficiais de reforma agrária), é a presença de uma associação
constrangida, seja a geral do assentamento seja aquela por grupos de assentados, que medeia oficialmente a obtenção de
recursos tipo PROCERA ou dos fundos constitucionais para custeio. Os trabalhadores rurais elaboraram, com o apoio de
entidades governamentais e ou não governamentais, o projeto técnico e conseguem o recurso de origem pública. Porém,
sua destinação é outra daquela prevista no projeto: utilizam-no ora para dar conta das necessidades imediatas
(alimentação, remédios, etc.), ora para gastos em outra atividades distintas daquelas constantes no projeto de captação
dos recursos. A expectativa das famílias singulares é de que esse "dinheiro do governo" não seja devolvido, por uma
razão elementar e suficiente: ele não se reproduziu no processo de produção, amplo senso. Foi consumido na reprodução
dos meios de vida.
Ora, nessas circunstâncias, o associativismo constrangido tem uma única função: captar recursos financeiros externos ao
assentamento para prover parcialmente as famílias singulares, porquanto outra parte dos recursos é alocada em atividades
denominadas comunitária ou de usufruto coletivo, no processo de reprodução dos seus meios de vida. Nesse sentido, tais
associações passam a desempenhar papel indispensável para a reprodução da produção nas áreas oficiais de reforma
agrária, pois, os trabalhadores rurais passam a depender politicamente dela porquanto tornam-se as únicas interlocutoras
oficiais com o Estado. Ainda que formal, e por vezes legítima, as associações que assumem esses papéis tendem ao
exercício da participação constrangida em função do poder político que acumulam como mediadoras da obtenção de
recursos financeiros de fontes governamentais e pela exclusão das demais formas de mediação.
Já na região sul e sudeste (11,28 % dos beneficiários das áreas oficiais de reforma agrária), de maneira geral, e para
alguns casos pontuais nas demais regiões do país, onde as condições edafo-climáticas são relativamente melhores e o
acesso aos mercados de produtos e insumos é mais facilitado, inclusive pela malha urbana mais desenvolvida,
constatou-se:
melhores condições relativas de vida e de trabalho das famílias assentadas;
relação intensa com o mercado;
elevada diversidade das formas de associativismo econômico determinadas pelas necessidades de
enfrentamento da concorrência nos mercados local, regional e nacional;
menor dependência dos recursos governamentais e maior capacidade de captação de recursos junto a
outras agências financeiras.
Nesse contexto, onde são mais amplas as margens de relações com o mercado e onde há menor dependência dos recursos
de fontes governamentais, as formas de associativismo tradicionais ou emergentes, a partir das iniciativas dos diversos
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grupos sociais, tendem a prevalecer sobre aqueles induzidas. Afirma-se, dessa maneira, a diversidade das formas de
associativismo, seja este econômico ou não, e a complexidade organizacional.
2.2 As formas de associativismo identificadas
As formas de associativismo mais usuais e presentes na atualidade nos assentamentos no país, em alguns casos com
denominações ligeiramente distintas, são:
Núcleo ou grupo de produção:
Cooperação entre famílias vizinhas, famílias com afinidades e ou com relações de
consangüinidade. Em média, cada grupo produção é constituído de 5 a 15 famílias.
Associação:
Entre parte dos trabalhadores de um assentamento, seja para a realização de determinadas
atividades produtivas, seja por localização geográfica como as linhas de assentamentos
(norte) ou comunidades e ou povoados de um assentamento (nordeste);
Entre todos os trabalhadores rurais de um mesmo assentamento
(Presentes em todos os assentamentos do país, menos naqueles em que a representação do
assentamento perante seu ambiente dá-se através de cooperativas e caixas agrícolas)
Centrais de associações:
Uma sociedade civil, sem fins lucrativos, cujo objetivo básico é efetuar a coordenação de
associações de produtores rurais de áreas oficiais de reforma agrária.
Grupo:
Grupo coletivo envolvendo parcela dos trabalhadores de um assentamento
Grupo semi-coletivo envolvendo parcela dos trabalhares de um assentamento
Grupo de produção envolvendo parcela dos trabalhadores de um assentamento
Coletivo
Todos, ou apenas parte dos trabalhadores rurais do assentamento, participam em atividades
integralmente coletivas.
(Presentes no sul do país, nos Estados de São Paulo e do
Ceará e em assentamentos esparsos nos demais estados do país)
Condomínio
Forma de apropriação da terra. Ainda que haja parcelamento da terra esta é apenas
usufruída a partir de um plano global de exploração de todo o assentamento. Há, também,
condomínios por ramo de atividade, como o de produção de leite. Nestes casos não está
implícita a apropriação da terra mas, apenas, a gestão da comercialização do produto e ou
subproduto.
(Presença esparsa no sul do país)
Cooperativa:
De prestação de serviços - CPS, (para um assentamento)
De prestação de serviços regionais - CPSR (atende vários assentamentos lindeiros ou
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próximos)
De crédito
De produção e de prestação de serviços - CPPS (para um assentamento)
De produção agropecuária - CPA (para um assentamento)
Centrais de cooperativas - CCA (âmbito estadual)
(Presentes em inúmeros assentamentos em vários estados o país, em especial do sul)
Caixa agrícola:
Considerada vulgarmente como uma pré-cooperativa. Essa forma de cooperação
financeira, uma espécie de caixa de auxílio mútuo, foi adotado como alternativa para a
cooperativa, esta muito desgastada desde a década de 60 por terem sido criadas inúmeras
delas a partir de programas políticos de agências financeiras, em particular nos Estados do
Maranhão e Pará. Adota os princípios institucionais de uma cooperativa.
Mutirão
Forma simples de cooperação entre pessoas ou famílias para a realização de um atividade,
seja para benefício de uma família individualmente ou para a concretização de
infraestrutura econômico ou social de uso coletivo, para não estando presente a divisão
técnica do trabalho cooperado. Uma forma de ajuda mútua que ocorre em todas as regiões
do país. Não há remuneração pelo trabalho realizado mas, sim, compromisso moral de
reciprocidade.
Troca de dias de serviço
Forma simples de cooperação em que membros de uma família singular ajudam, numa
atividade determinada, outra família singular, ficando a família que foi beneficiada com a
ajuda de terceiros devendo a eles força de trabalho similar à recebida. Forma de ajuda
mútua tradicional em todas as regiões do país.
A expressão coletivo acoberta vários significados, sendo os mais usuais os seguintes:
Coletivo total: tanto a apropriação da terra como a produção, a
comercialização de produtos e de insumos e a repartição do produto do
trabalho são coletivizadas. Não contempla a possibilidade de atividades
econômicas particulares das famílias singulares. Em alguns coletivos totais
a comercialização é realizada em conjunto, mas a venda dá-se em nome das
famílias individualmente, pois, pesa aqui a questão fiscal, tendo em vista
que os coletivos totais não são formalizados;
Semi-coletivos: há várias nuanças, sendo a de ocorrência mais freqüente a
que combina atividades produtivas particulares da família singular,
objetivando a produção de subsistência, e algumas atividades de produção,
de maneira geral destinadas para o mercado, em trabalho coletivo. A
apropriação da terra pode dar-se sob duas hipóteses: ou a terra é coletiva ou
está sob parcelamento. Neste caso, a área em trabalho coletivo é destinada
somente para tal fim, podendo, em casos, ser modificado o local destinado
às atividades coletivas;
Semi-coletivos e coletivos: combinação entre formas de associativismo
onde o coletivo total num determinado assentamento pode dar-se para
apenas um grupo de trabalhadores rurais, sendo que os demais trabalhadores
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ou atuam individualmente ou participam em outros grupos semi-coletivos,
conforme acima comentado.
Em determinados assentamentos a atividade semi-coletiva, e em alguns casos mesmo a coletiva total, é conhecida sob a
forma de associação, esta expressão acrescida de coletivo e ou comunitário.
No mutirão (puxirum, ajutório, adjunto: designações regionais), enquanto ajuda mútua para a realização de uma
determinada atividade como broca da mata, limpeza do terreno, colheita, conserto de cercas, feitura de aceros, etc. num
processo de trabalho dado, o beneficiário pode ser ora uma família singular ora uma plantação ou criação comunitários.
Na maioria dos assentamentos do nordeste brasileiro a expressão coletivo é utilizada, na opinião do autor deste
documento, para significar vários mutirões destinados a executar atividades de interesse de todas as famílias do
assentamento, como conserto de cercas das pastagens de uso comunitárias, limpeza de açudes, plantio e cultivo de roças
comunitárias, etc. Sem dúvida alguma a aplicação do conceito coletivo, nessas circunstâncias, é controvertido. Poder ser
aceito como um coletivo porque a terra onde dá-se a atividade é de uso comum e o produto do trabalho será de benefício
do conjunto dos assentados. Todavia, as atividades em que há trabalho cooperado não apresentam divisão técnica do
trabalho, não havendo, portanto, potencialização da força de trabalho, uma das bases do trabalho coletivo enquanto
desenvolvimento das forças produtivas.
A participação de um conjunto de famílias em atividades de cooperação no trabalho denominadas de mutirões torna-se
conhecida como coletiva porque os trabalhadores dedicam dias de trabalho (de 1 a 3 por semana) para a associação geral
do assentamento, a qual coordena as atividades do coletivo, desde a elaboração do plano de trabalho até a distribuição
dos rendimentos porventura obtidos.
Essa participação em atividades coletivas nas áreas comunais do assentamento tem-se transformado gradativamente em
participação constrangida porquanto tal participação é definida compulsoriamente nos estatutos das associações gerais
dos assentamentos, em particular (mas não único) naqueles do Estado do Ceará.
2.3. Periodização histórica e concepções globais divergentes
A análise das informações obtidas nas visitas aos assentamentos e nas entrevistas com os trabalhadores rurais assentados,
dirigentes e assessores evidenciou a necessidade de estabelecer-se, ainda que de maneira superficial e de forma precária,
uma periodização histórica que facilitasse a compreensão de uma das causas possíveis das mudanças dos processo de
associativismo nos assentamentos.
Considerando-se os critérios relação Estado-sociedade, natureza do regime político, papel do Governo Federal na
implantação da reforma agrária, mudanças na dinâmica dos movimentos sociais e o papel da luta pela terra, em especial
da ação direta dos movimentos sociais no campo, optou-se pela seguinte periodização da história recente do país,
períodos esses nos quais considerou-se que houve mudanças relevantes nas formas de associativismo nos assentamentos
de reforma agrária:
anterior a 1965: luta pela terra liderada por dois atores sociais, a Igreja Católica e o Partido Comunista do
Brasil; luta pela terra concentrada no nordeste e alguns estados do sul e sudeste; baixa capacidade legal e
orgânica do Estado de realizar a reforma agrária; movimentos sociais no campo sob a hegemonia dos
sindicatos de trabalhadores rurais. Até 1964, as áreas de ocupação pelos beneficiários da reforma agrária
representavam aproximadamente 5,59 % total das áreas ocupadas desde antes de 1960 até 1996;
de 1966 a 1979: período da ditadura militarista; estatuto da terra; ênfase do governo federal na
colonização e regularização fundiárias; separação orgânica entre reforma agrária e desenvolvimento rural;
predomina nos movimentos e organizações sociais a luta contra a ditadura. As áreas ocupadas pelos
beneficiários nesse período representa aproximadamente 7,38 % do total das áreas ocupadas desde antes
de 1960 até 1996;
de 1979 a 1985: crescimento dos movimentos sociais no campo na luta pela terra; ênfase nas ocupações
de terra; inicio da transição democrática; criação do INCRA; proposição do 1º PNRA pelo governo
federal. Nesse período, houve a ocupação de 6,5 % das áreas pelo beneficiários do total das áreas
ocupadas desde antes de 1960 até 1996;
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1985 a 1990: diversificação dos movimentos sociais no campo na luta pela terra; Governo Federal inicia
processo de desapropriação de terras para reforma agrária; PRRAs; movimentos sociais e setores dos
governos estaduais apoiam e estimulam a organização dos assentamentos e a adoção da cooperação.
Nesse período houve a ocupação, aproximadamente, de 20% das áreas pelos beneficiários do total das
áreas ocupadas desde antes de 1960 até 1996;
1990-98: a reforma agrária entra na pauta pública nacional; governos federal e estaduais atuam para
implantá-la; movimentos sociais no campo consolidam a luta pela terra e a organização econômica dos
assentados; a Constituição de 1988 amplia os espaços legais para a efetivação da reforma agrária e libera
dos entraves legais anteriores as formas de organização social, econômica, etc. De 1990 a 1996 a
percentagem de ocupação da área pelos beneficiários representou 49,89 % do total das áreas ocupadas
desde antes de 1960 até 1996.
Concentrou-se a atenção nesse último período, ou seja, a partir de 1990, pois foi nele que ocorreu quase 50 % do total
das áreas ocupadas pelos beneficiários, ainda que, sem dúvida alguma, o processo de luta pela terra acentuou-se a partir
de 1985. De 1985 até 1996 deu-se 72,36 % das ocupações de área pelos beneficiários do total geral desde antes de 1960.
Com a possibilidade de obtenção de crédito especial, o PROCERA foi criado em 1986, começaram a ser constituídas,
por indução do governo federal, centenas de associações de caráter meramente instrumental como aquelas para a compra
e uso de máquinas em comum, compras de insumos em comum, projetos para infraestrutura econômica e ou social
comunitários, etc. Essas associações criadas circunstancialmente se por um lado propiciaram o acesso ao empréstimo
bancário para a aquisição de bens móveis como máquinas e tratores, o qual seria impraticável por uma família singular,
por outro lado subestimaram os elementos de coesão social dos grupos formados. Tanto assim que mais de 80% dessas
associações tiveram curto período de existência efetiva.
Nas regiões norte, centro-oeste e nordeste do país prevaleceu a tendência legalizadora de uma única forma de
interlocução com o Estado, a associação geral do assentamento, ainda que em certas áreas oficiais de reforma agrária
nessas regiões, seja pela dinâmica social anterior seja pelas distâncias internas no assentamento, a tendência oficial
ajustou-se às formas socialmente estabelecidas tendo-se criado, então, associações por linha de assentamento, por
povoados ou por comunidades dentro de um mesmo assentamento.
Esse processo de agrupar as famílias de trabalhadores rurais, a partir da vertente oficial e dominante, deu-se à margem da
dinâmica interna dos grupos sociais porventura presentes nas áreas oficiais de reforma agrária.
A Constituição Federal de 1988, ao permitir a livre organização econômica, política e social, possibilitou legalmente que
tanto o cooperativismo popular (desatrelado da Organização das Cooperativas do Brasil - OCB, esta considerada como a
central do cooperativismo empresarial e sob a tutela do Estado) como as possibilidades de coletivização nas áreas de
assentamentos florescessem dando vazão à tensão entre a emergência de uma existência coletiva e o projeto do Estado. É
a partir dessa conjuntura, apoiada numa mudança estrutural da norma legal e no acúmulo das experiências de
organização da produção, que foi constituído, em 1991, o SCA - Sistema Cooperativista dos Assentados pelo Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST (CONCRAB, 1997:32).
O SCA, enquanto uma proposição de sistema cooperativista, vai instalar-se a partir de 1992 prioritariamente no sul e
sudeste do país onde, desde o início da década de 80, começou a emergir uma grande diversidade de formas de
associativismo de pequeno porte (10 a 15 famílias, ou 12 como os apóstolos). Essas formas de associativismo de
pequenos grupos tinham o intuito de fixar o homem à terra, em geral motivados e mobilizados pela igreja católica, via
principalmente as CEBs, sendo que esse esforço combinava-se com o de criar associações de grande porte nos
assentamentos com o papel primordial da representação política e a prestação de serviços aos assentados.
Os anos 1990/2 podem ser considerados como de transição, em especial no sul do país e em alguns estados do nordeste
brasileiro, entre as formas de associativismo predominantemente de motivação religiosa, quando desde 1984/5 grandes
associações dos assentamentos e pequenos grupos e associações coletivas foram estimulados, para um sistema articulado
de formas de associativismo técnica e politicamente fundamentados como o Sistema Cooperativista dos Assentados -
SCA sob a direção do MST e os coletivos formados em todos os assentamentos do Estado do Ceará sob a influência do
INCRA-CE e da Secretaria da Agricultura do Governo do Estado.
No período em apreço, 1990-98, duas concepções globais divergentes consolidaram-se:
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de um lado, a vertente oficial e dominante expressa nas induções do governo federal para o parcelamento
da propriedade da terra, o assentamento de famílias singulares como unidades camponesas de produção e
o estímulo para a criação de uma única associação do assentamento oficialmente reconhecida como a
interlocutora política, econômica e social de todas as pretensões dos assentados perante o mercado e o
Estado;
de outro lado, a iniciativa do MST de implantar o Sistema Cooperativista dos Assentados - SCA, onde as
diretrizes estratégicas seriam a propriedade coletiva e ou semi-coletiva da terra, a constituição de grupos
coletivos e ou semi-coletivos de produção, sejam sob a forma de cooperativas de produção agropecuária -
CPAs ou de grupos de produção, e a articulação sistêmica dessas cooperativas e grupos de produção em
outras cooperativas de segundo e terceiro níveis como as cooperativas de prestação de serviços - CPSs, as
cooperativas de prestação de serviços regionais - CPSRs e as cooperativas centrais dos assentados -
CCAs, ainda que, ressalte-se, não haja entre elas qualquer tipo de hierarquia.
Pode-se, com algumas exceções, afirmar que a vertente oficial repousou sobre contradições muito acentuadas ao
estimular, por um lado, diretamente o parcelamento da terra e a constituição de unidades de produção camponesa
individualizadas. Por outro lado, os programas governamentais ao direcionarem os recursos financeiros apenas para
projetos de ação comunitária, exigindo a criação de associações comunitárias (sic), tenderam a criar formas de
associativismo instrumentais, ou seja, para um fim único que foi a mediação entre as famílias assentadas e os programas
governamentais de financiamento do desenvolvimento rural.
O Sistema Cooperativista do Assentados -SCA, por sua vez, ao definir um sistema geral de cooperação exclusivamente
sob o critério econômico de agrupamento das famílias dos trabalhadores rurais, predomina os critérios uso da terra e
relação com o mercado, restringiu as possibilidades de diferenciação das formas de associativismo a partir da dinâmica
social interna dos grupos sociais.
Ao atentar-se para as distorções estruturais referidas seção 2.1 acima, pode-se induzir que a vertente oficial é hegemônica
nas regiões ou áreas do país onde os rendimentos das famílias de trabalhadores rurais são relativamente mais baixos e as
condições de produção (semi-árido) e ou comercialização dos produtos (norte) são as mais adversas possíveis. Já o SCA
tem maior êxito onde as condições efetivas de produção e de comercialização são mais favoráveis. A evidência disso é o
seu bom desenvolvimento no sul do país e nos Estados de São Paulo e do Espírito Santo e, pontualmente, em
Pernambuco, Bahia e Ceará. Porém, tanto a vertente oficial como aquela do SCA apresentam insuficiências quando
confrontadas com grupos sociais onde haja tradicionalmente uma auto-identidade estabelecida a partir de critérios que
não sejam estritamente os econômicos.
Um caso particular, entre essas duas concepções globais divergentes, é aquele representado pelo Estado do Ceará onde
quase todos os assentamentos (em torno de 90% dos 242, sendo 212 do governo federal e 30 do governo estadual)
possuem a mesma estrutura associativa, ou seja, associação geral do assentamento, posse coletiva da terra, áreas de até 3
has para uso individual das famílias singulares (limite de área, no semi-árido, que pode ser explorada pela força de
trabalho familiar com os instrumentos de trabalho tradicionais) e o restante da área do assentamento trabalhado por um
coletivo onde todas as famílias assentados devem dedicar de 1 a 3 dias de trabalho/homem por semana (dependendo do
caso) objetivando melhorias na infraestrutura social do assentamento ou o cultivo e ou criação para usufruto comunitário.
Esse sistema foi consolidado a partir de 1991 por influência de diversos atores sociais mas, em especial, pelo INCRA-CE
(desde 1988) e a Secretaria de Agricultura do Governo do Estado (1991). É um sistema homogêneo para as diversas
regiões do Estado do Ceará (semi-árido, serra e litoral). Traz no seu bojo algumas distorções, conforme comentar-se-á
adiante. Entretanto, seu princípio básico é similar à hipótese segunda anteriormente aventada (seção 1.3, acima) para este
estudo, ou seja, a impossibilidade de que a unidade camponesa possa reproduzir-se e crescer econômica e
sustentadamente de forma parcelada, a não ser excepcionalmente, dentro do contexto contemporâneo do país. A
cooperação para potencializar o desenvolvimento da forças produtivas torna-se uma necessidade.
Entretanto, com exceções pontuais, as famílias de trabalhadores rurais dos assentamentos no nordeste brasileiro, em
particular aqueles situados na região semi-árida, não conseguem produzir excedentes da sua produção de subsistência e,
menos ainda, ter êxito na produção para o mercado, seja essa produção proveniente daquelas atividades a nível das
famílias singulares seja dos coletivos. As causas prováveis dessas dificuldades na produção agropecuária estão
relacionados com o clima, com a precária capacidade de poupança para a melhoria da infraestrutura produtiva e a
incipiente tecnologia de produção adotada. Nesse sentido, a possibilidade de melhoria dos meios de produção de
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propriedade das famílias singulares e dos coletivos fica comprometida.
2.4. Associativismo na gestão interna do assentamento
A forma de associativismo econômico, como a associação geral de um assentamento, presente em todos os
assentamentos no Brasil, ou como exceção à regra anterior existem as cooperativas de produção agropecuária - CPAs em
alguns assentamentos, tem como objetivo básico, explícito ou implícito, realizar a captação de recursos governamentais e
mediar os interesses dos assentados perante o ambiente do assentamento. Ainda que seja uma relação de mediação
perante o Estado e o mercado essa atividade é necessária para garantir a gestão interna do assentamento.
Foram muito poucas aquelas associações gerais de assentamentos onde pode-se constatar o papel de coesão social por
elas obtido através da suas práticas sociais. O caráter instrumental dessas associações sempre apareceu como o principal,
político e ideologicamente, perante as famílias dos trabalhadores rurais assentados.
Essas entidades constituídas para a interlocução legalizada com o Estado foram usufruídas pelos seus associados na
medida direta em que lhes proporcionou vantagens materiais. Nesta perspectiva, tais associações não se revelaram
portadoras da identidade social dos grupos sociais que supunham representar.
Se tomarmos dois casos extremados como:
um assentamento onde a terra seja de posse ou propriedade parcelada de famílias singulares, a única
forma de associativismo é a associação geral do assentamento (por linha do assentamento ou povoado no
norte do país), não há trabalho em cooperação com exceção da troca de dias de serviço e predomina a
produção de subsistência (maioria dos assentamentos no nordeste e centro-oeste do país) ou a produção
para o mercado, mas inviabilizada na comercialização (norte do país);
um assentamento onde a terra é de posse coletiva, toda a atividade interna de produção e comercialização
está coletivizada, a associação geral existente é uma cooperativa de produção agropecuária - CPA e haja
produção de subsistência e produção para o mercado (casos no sul, sudeste do país e em situações
localizadas nos demais Estados).
Em ambos os casos os recursos externos captados, predominantemente dos programas especiais do governo federal, são
imprescindíveis. Porém, para um volume similar de recursos recebidos e de famílias beneficiadas o que irá ser diferente,
num assentamento e no outro, é a forma como dar-se-á a gestão interna desses recursos e, sem dúvida alguma, as
condições edafo-climáticas (suplementarmente as de mercado) em que o assentamento esteja localizado.
Supondo inicialmente que as condições edafo-climáticas são similares, a tendência do primeiro caso é a de pulverização
dos recursos pelas famílias singulares e a alocação do dinheiro em atividades de produção de subsistência cujo excedente
tende a ser comercializado individualmente e, sem dúvida, em condições de mercado altamente desvantajosas. Como os
recursos para investimentos tendem a ser para uso comunitário, o que se tem observado é a alocação desses recursos em
infraestrutura de baixo aproveitamento social, seja por desvio na concepção do projeto original seja pela ausência de
unidade política dentro do assentamento capaz de gerir socialmente o equipamento coletivo.
No segundo caso tende-se a otimizar tanto os recursos financeiros captados como a força de trabalho e os meios de
produção disponíveis ( o que nem sempre verifica-se). Emergem, neste caso, sem dúvida, problemas na gestão interna,
seja pelas dificuldades de compreensão da prática do coletivo seja pelas circunstâncias econômicas adversas. Neste
segundo caso haverá uma tendência de produção para o mercado como alternativa de reprodução ampliada do dinheiro
investido. No primeiro caso a possibilidade de reprodução ampliada fica obstaculizada.
O que se deseja ressaltar nesses exemplos é que as formas de associativismo econômico, sejam elas quais forem, tendem
sempre a influenciar na gestão interna dos assentamentos. Quanto menor a presença do associativismo nos
assentamentos, em geral situados em condições edafo-climáticas desfavoráveis, maiores dificuldades os trabalhadores
rurais assentados enfrentarão para usufruírem de recursos naturais escassos como a água, no nordeste brasileiro, ou para
aglutinarem a produção em escala capaz de viabilizar o beneficiamento e a comercialização em condições adversas,
como no norte do Brasil.
Os assentamentos que tem obtido maior sucesso econômico tem sido aqueles que combinaram historicamente várias
formas de associativismo e, conforme a hipótese terceira (seção 1.3, anterior), decorrentes de situações em que puderam,
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também, contar com melhores condições edafo-climáticas e de mercado, capazes de proporcionarem a reprodução
ampliada do dinheiro investido.
As associações multifamiliares (em geral de 5 a 10 famílias) para aquisição e uso comum de máquinas foram as
primeiras formas massivamente constituídas no sul e no sudeste do país, e predominaram até 1993. Foram seguidas, a
partir das suas experiências práticas, pelos grupos semi-coletivos, tendo inúmeros assentamentos vivenciado essas duas
formas simultaneamente. Por exemplo, em Santa Catarina, uma família singular, além de explorar parcela de terra
individualmente, poderia participar de diversos grupos semi-coletivos, então denominados departamentos (apicultura,
carvão, piscicultura, etc.) da associação geral do assentamento e, ao mesmo tempo, fazer parte de um coletivo geral que
explorava uma parte da terra para usufruto em comum. A associação geral do assentamento mantinha-se com o caráter da
representação política dos assentados e responsável, antes de tudo, pela gestão interna das inúmeras formas
combinatórias de associativismo.
Mesmo aqueles assentamentos nas regiões sul e sudeste que possuem vários grupos coletivos combinados com atividades
individuais, esta em geral de produção de subsistência, apresentam outras formas associativas simultâneas como grupos
de compra em comum, grupos coletivos para atividades específicas (exemplo: avicultura, hortigranjeiros, silos para
secagem de arroz, etc.). Se acrescentarmos a essas formas de associativismo a dimensão regional, com a criação das
cooperativas de prestação de serviços regionais - CPSRs e as cooperativas de crédito, crescem as combinações possíveis
através das quais as famílias de trabalhadores rurais podem ter relações de cooperação econômica.
Diferentemente é a situação do associativismo nos assentamentos no norte, nordeste e centro-oeste do país, e em parte no
sudeste, levando-se em conta sempre as exceções à regra. A vertente oficial, que é a dominante, gestou um modelo
unificado com as seguintes alternativas de associativismo:
criação constrangida de uma associação geral de um assentamento ou associações por linha, por
comunidade ou por povoado de um mesmo assentamento;
indução, política e legal, para o parcelamento da terra;
criação de várias associações de parcelas de assentados, quando o total de famílias assentadas é muito
elevado, para a obtenção de financiamentos dos programas especiais do governo federal, seja o
PROCERA sejam os fundos constitucionais;
financiamento, pelos programas especiais de desenvolvimento rural, de projetos produtivos, de
comercialização ou de infraestrutura econômica e social somente se forem de caráter comunitário e ou
grupal.
Como os assentamentos nessas regiões situam-se ora em locais cujos condições edafo-climáticas são extremamente
adversas e, portanto, as possibilidades efetivas de produção são muito escassas, ora em situações em que a
comercialização é obstaculizada pelo isolamento físico, as margens de criação de novas formas de associativismo
espontaneamente ficam muito limitadas porquanto não há necessidade real efetiva, a partir das demandas do processo de
produção, para constituí-las. E quando são constituídas de fora para dentro, suas possibilidades de êxito tornam-se
bastante remotas.
A essas restrições objetivas aliam-se as de caráter subjetivas expressas, supostamente, no desejo dos trabalhadores rurais
sem terra de livrarem-se da situação de subalternidade que as relações sociais de sujeição, por eles anteriormente
vivenciadas, lhes determinava. Assim, o lote familiar representa no seu imaginário um passo importante, senão
fundamental, no processo de libertação. E, a produção da subsistência a afirmação da unidade camponesa supostamente
independente: sem patrão e sem empregado (mitificação do real por parte dos trabalhadores rurais assentados).
Esse paradigma é reforçado pela concepção oficial dominante e, muitas vezes, pela religião. Nessas circunstâncias, o
associativismo econômico como forma de contribuição à gestão interna dos assentamentos e à potencialização da força
de trabalho é subliminarmente afastada. Mantida a unidade camponesa individualizada reafirma-se a tutela do Estado
sobre o assentamento, ou, politicamente, um novo processo de sujeição.
A vertente oficial do associativismo nos assentamentos, ao ater-se conceitualmente a um determinado modelo e ao
induzir sua adoção na prática, acabou por cristalizar sua capacidade de percepção do real e tendeu a mitificar o real (por
parte da burocracia governamental), ou seja, a vê-lo de maneira homogênea, purificada, sem contradições efetivas.
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As alternativas a esse modelo oficial e hegemônico, como o SCA, ao restringirem as formas de cooperação
exclusivamente à dimensão econômica e, por vezes, política, não propiciam necessariamente a melhoria das relações
sociais internas. Ademais, ao não darem conta da diversidade dos grupos sociais presentes num mesmo assentamentos e,
portanto, à dimensão sócio-cultural que explicaria parte da auto-identidade e da coesão social desses grupos sociais,
negligenciam os esforços para o resgate histórico dessa dimensão e perdem a possibilidade de compreensão e
interpretação da complexidade associativa daí resultante.
2.5. Associativismo nas relações com o mercado
As relações das associações dos trabalhadores rurais nos assentamentos, nas suas diversas formas de mediação, com o
mercado, são muito precárias em mais de 90% dos assentamentos do país. Isso deve-se à inexistência de produto
excedente em quantidade e qualidade que sustente essas relações. A nível nacional, é muito pequeno o número de
assentamentos que mantêm relações frequentes e estáveis com o mercado. Essas relações, quando frequentes dão-se de
forma bastante elementar, sendo que em 50,35 % dos casos no país (Censo, 1996) os trabalhadores rurais entregam seus
produtos a atravessadores. Na região sul essa percentagem alcança apenas 27,72, na sudeste 30,26 %, enquanto que na
região nordeste atinge 60,98 %, na região norte 57,09 % e na centro-oeste 41,06%.
Essa circunstância acima configura-se como uma das distorções estruturais assinaladas na seção 2.1, anterior. Os baixos
rendimentos das famílias assentadas não lhes proporciona excedentes comercializáveis e quando há algum excedente da
produção de subsistência a venda dá-se episodicamente e pelo próprio trabalhador rural, ou seja, sem mediação de
alguma associação.
Portanto, as relações dos trabalhadores rurais assentados com o mercado de produtos e insumos só ocorre em condições,
face à média geral, muito especiais e que necessitam reunir:
assentamentos em locais com condições edafo-climáticas favoráveis à produção agropecuária, o que não é
o caso de mais de 80% dos assentamentos no país. É sabido que os projetos de assentamentos tem sido
implantados em terras de baixa qualidade (só a região do nordeste brasileiro responde por 41,75 dos
projetos e por 39,68 % dos beneficiários do país);
produção para o mercado e possibilidades físicas e econômicas de acesso ao mercado competitivo (no
norte do país os mercados para os assentados são regidos por condições oligopsônicas e ou
monopsônicas). A região norte e centro-oeste do país respondem por 36,84 % dos projetos e por 49,03 %
do total de beneficiários do país.;
níveis de associativismo que permitam a alocação ótima dos recursos captados externamente ao
assentamento e que desenvolvam a potencialização da forças produtivas.
A maioria desses casos ocorre no sul e no sudeste do país, porém, essas regiões respondem por apenas 21,4% dos
projetos e por 11,98 % do total de beneficiários do país. Em alguns estados da Amazônia, como Rondônia, essas
condições foram reunidas, porém, houve falhas nas relações com o mercado, como oferta de produto in natura para um
mercado exigente na qualidade ou saturado dessa mercadoria. Em outras circunstâncias, como nos assentamentos no
Estado do Pará (13,34 % das famílias beneficiárias do país), em que o isolamento do assentamento devido às grandes
distâncias dos centro urbanos consumidores ou dos centros de atacadistas e as estradas de péssima qualidade, aliadas,
muitas vezes, a um baixo volume de produto, torna impraticável a comercialização de produtos destinados originalmente
para o mercado, mesmo que o assentamento tenha constituído associações (sejam cooperativas ou outras formas) para
viabilizar a venda dos produtos.
Onde as relações com o mercado ocorrem de forma mais intensa são naqueles assentamentos onde aquelas pré-condições
acima citadas estão reunidas. E onde as organizações mediadoras já exercitam a profissionalização das suas atividades.
Isso é evidente em todas as CPAs, CPPS e CPS no sul e no sudeste do país. As associações gerais de assentamentos, os
grupos semi-coletivos e as associações de grupos de produtores, entre tantos outros, tendem a profissionalizar seus
quadros para darem conta das exigências de competição no mercado.
Há várias situações em que a cooperativa do assentamento ou uma associação de trabalhadores rurais apenas orienta os
produtores na comercialização do produto mas, ela mesma, não assume a tarefa da comercialização. Em outros casos a
cooperativa do assentamento apenas realiza uma etapa da comercialização, por exemplo, secar e guardar o arroz para
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garantir qualidade, mas a comercialização é realizada pelo trabalhador rural assentado isoladamente. Mas, no caso de
hortigranjeiros, a cooperativa do assentamento abriu espaços nos mercados já estruturados, como exemplo a feira de
produtos agrícolas orgânicos de Porto Alegre, mas não intermedia a venda dos produtos que é realizada diretamente pelas
famílias singulares. Há casos em que a produção de leite, por exemplo, é realizada pelas famílias singulares, mas a
comercialização é mediada pela cooperativa em ficha única para obter melhor preço. Outra ocorrência é a associação de
assentados produzir milho coletivamente, mas a venda dar-se individualmente, após a partilha da produção obtida.
Nas circunstâncias anteriormente comentadas tanto as associações como os trabalhadores rurais assentados conseguem
competir no mercado. Seus produtos apresentam qualidade e oportunidade sazonal que lhes abre possibilidades de
vendas. Nesse contexto, a realidade cotidiana de enfrentamento do mercado cria as demandas de associativismo
econômico, de formas muitas vezes inovadoras de mediação entre as famílias singulares e o espaço econômico mais
geral representado pelo mercado.
2.6. Associativismo nas relações com o Estado
As relações dos trabalhadores rurais das áreas oficiais de reforma agrária com o Estado dá-se através de duas mediações
básicas: do lado do Estado, ou seja, do espaço público da questão agrária, apresentam-se os organismos governamentais,
em especial o MEPF, o INCRA, os organismos dos governos estaduais ligados à questão fundiária, os bancos
repassadores dos recursos dos programas especiais dos governos e as EMATERs; do outro lado, o da sociedade civil, as
associações gerais e as cooperativas dos assentamentos, os sindicatos de trabalhadores rurais, a CONTAG, o MST e a
CONCRAB. Nessas relações atuam, indiretamente, as ONGs.
Essas mediações abordam, de maneira geral, dois temas básicos: a questão da terra e os financiamentos para a produção e
para a infraestrutura social nos assentamentos. Outros temas são decorrentes desses dois, como os serviços de assistência
técnica, o equacionamento do conflito social, o reassentamento de trabalhadores rurais excedentes, etc.
Nessas relações Estado - sociedade civil as mediações desempenham papel imprescindível, pois, não há possibilidade
efetiva do cidadão atomizado relacionar-se com o Estado: é sempre necessária uma mediação e dos dois lados. Nesse
sentido, essas relações são sempre políticas e, supostamente, entre dois sujeitos. Sendo essa relação política a história de
cada assentamento tem peso fundamental. As alternativas são: o assentamento é produto de uma luta direta dos
trabalhadores rurais sem terra pela obtenção de terra (ocupação da terra ociosa) ou a iniciativa partiu do governo no
processo desapropriação / aquisição e depois assentamento.
O que se pode observar foi que naqueles assentamentos em que houve uma luta direta pela terra (ocupação e depois
desapropriação), predominante no sul e no sudeste, o processo associativista é mais diversificado, enquanto que naqueles
assentamentos onde a direção foi dada desde o início pelo governo (predominante no norte, centro-oeste e nordeste)
tende-se a um modelo mais homogeneizador das formas de associativismo em todas as regiões do país, conforme
comentado acima na seção 2.3.
Todos os projetos de assentamentos de reforma agrária no país, com as exceções pontuais, relacionam-se politicamente
com o governo através da associação geral do assentamento ou, nos casos particulares, pela cooperativa quando ela
cumpre esse papel. Portanto, a relação da associação do assentamento com o governo, a partir do assentamento, dá-se
sempre através de um só mediador. Todavia, por parte do governo, são inúmeros os organismos mediadores, impondo-se
condições políticas de negociações desiguais entre as partes.
Com respeito à dimensão política, o relacionamento mais difícil com o governo dá-se exatamente naquelas áreas onde
predominam os assentamentos oriundos de ocupação de terras, como no sul e sudeste do país e algumas áreas de outros
Estados. É nessas áreas onde o associativismo apresenta-se com maior dinamismo e diversidade. Portanto, não é de se
estranhar que os diálogos sejam mais ásperos.
Nas demais áreas, onde situa-se a maioria dos assentamentos do país, a relação política assentamento/governo é mais
simplificada, por algumas razões:
o diálogo trabalhador rural assentado com os organismos de governo deu-se, desde o início, de maneira
mais harmônica, pois, o governo ofereceu a terra ao atual assentado;
as possibilidades de criar-se novas formas de associativismo, além daquelas previstas no modelo oficial,
são muito reduzidas devido a inexistência de relações mais dinâmicas entre os trabalhadores rurais com o
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mercado, em decorrência das dificuldades inerentes ao assentamento para a produção de excedentes ou
para a comercialização da produção para o mercado;
os baixos rendimentos das famílias dos trabalhadores rurais assentados torna-os dependentes das políticas
compensatórias dos governos. Nesse sentido, as associações gerais dos assentamentos tendem a ser
tuteladas pelo Estado.
Essa configuração histórica dos assentamentos reflete-se, também, nas relações entre assentamentos/governo que tem
como objeto os financiamentos. Para dar conta dessas relações poder-se-ia afirmar genericamente que todos os
assentamentos do país encontram-se em situação de inadimplência perante os organismos de financiamento com recursos
públicos. Uma minoria das associações gerais e ou cooperativas dos assentamentos teria condições efetivas de pagar os
empréstimos efetuados. São várias as razões. Uma delas, de caráter geral, deve-se ao conjunto de políticas agrícolas
vigentes no país que é altamente excludente dos produtos tradicionais ofertados pelos agricultores familiares e às
importações de produtos agrícolas que concorrem em preço e qualidade com aqueles ofertados pelos trabalhadores rurais
do país. Outras razões dependem da região do país que se contemple.
Assim, nas áreas onde o governo considera que os empréstimos (PROCERA, fundos constitucionais e programas
especiais com recursos de agências multinacionais) tiveram caráter de políticas compensatórias, como nas regiões norte,
nordeste e centro-oeste, tudo leva a crer que a não cobrança desses empréstimos será equacionada pela via política. Essas
áreas coincidem em vários pontos:
associativismo menos diversificado;
maior influência direta dos organismos governamentais;
menor relação dos assentamentos com os mercados;
maior número de famílias assentadas com baixos rendimentos.
Nessas circunstâncias, as formas de associativismo tem pouca ou nenhuma importância e, sim, o potencial de votos
representados pelos trabalhadores rurais.
Agora, nas regiões sul e sudeste onde:
há maior diversidade das formas associativas;
maior relação com o mercado;
menor influência (mesmo maior divergência) dos organismos governamentais;
maior capacidade instalada de produção, beneficiamento e comercialização dos produtos e insumos,
tudo leva a crer que a pressão para pagarem os empréstimos similares aos acima referidos, por parte do governo, será
muito forte. Nestes casos, a diversidade de formas de associativismo desenvolvidas terá papel fundamental para que as
relações com o governo dê-se de maneira construtiva. E como essa diversidade de formas de associativismo poderá
contribuir ? Não somente pela diversidade de ativos como pela solidariedade que essas associações, grupos coletivos,
cooperativas, etc. consolidaram entre si, permitindo-lhes dispor de ajudas mútuas concretas em situações de adversidade.
2.7. Assentamento: sistema fechado ou aberto ?
Aqueles projetos de assentamentos de reforma agrária que se encontram nas regiões norte, nordeste e centro-oeste,
sempre respeitando as exceções, pelas mais distintas razões tendem a constituírem-se num sistema fechado ou cujas
relações com o ambiente dão-se quase que exclusivamente com os organismos governamentais. Seja devido às péssimas
condições edafo-climáticas seja devido ao isolamento (geográfico e econômico) dos mercados, tais assentamentos
voltam-se apenas para a reprodução dos meios de vida das famílias singulares, expresso na produção de subsistência.
Parte considerável delas vivencia as lutas pela sobrevivência física, não se colocando as questões da acumulação. E
quando as relações com o mercado efetiva-se esta dá-se de forma elementar restringindo-se à venda de produtos
supostamente excedentes aos atravessadores.
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Nesse contexto, pouca influência teria a diversidade de formas de associativismo econômico, pois estas nascem da
necessidade efetiva da produção e da comercialização, e quando estas são incipientes, por razões fora do controle dos
trabalhadores rurais, não é o associativismo econômico que equacionará problemas dessa natureza. Daí o abandono da
terra por muitos assentados.
Sem dúvida alguma que nesse quadro acima apresentado há diversos graus de intensidade das dificuldades. Porém, a
tendência geral, nesses casos, é a dos trabalhadores rurais assentados fecharem-se sobre si próprios, na luta cotidiana pela
sobrevivência, gerando uma relação de efetiva dependência dos organismos governamentais como única saída percebida
para reduzirem suas incertezas na reprodução dos meios de vida. Esses assentamentos acabam por constituírem-se em
espaços isolados da sociedade envolvente e numa nova relação de sujeição, agora perante o Estado.
Num contexto distinto do acima apresentado, aqueles assentamentos que tem produção de excedentes, produção para o
mercado e conseguem relacionarem-se dinamicamente com o mercado, portanto, inserem-se competitivamente no espaço
econômico local, regional ou nacional apresentam necessidades reais de formas sempre renovadas de associativismo
econômico. Daí a diversidade.
Por outro lado, a proposição de um modelo tipo SCA como referência para a organização dos assentamentos em sistemas
complexos de cooperação, prevendo vários níveis e graus de intensidade da cooperação e extrapolando o espaço restrito
do assentamento, abrangendo a dimensão regional e interestadual, tem como pressuposto elementar que será a produção,
o beneficiamento e a transformação dos produtos pela agro-industrialização, a base determinante de toda o
associativismo.
PARTE B - Casos ilustrativos da complexidade das formas de cooperação
Introdução
Os casos a seguir apresentados objetivam ilustrar, ainda que maneira sumária e intencional, a possibilidade de variação
das formas de cooperação e ou de associativismo nos assentamentos oficiais de reforma agrária no Brasil. Indicam que é
possível observar o associativismo sob diferentes critérios tais como modalidades do uso dos recursos naturais, situação
de origem das famílias, o tipo de colonização como antiga ou de fronteira agrícola, as modalidades de agrupamentos
geográfico como por consangüinidade, afinidade ou vizinhança, entre tantos outros critérios possíveis de serem
identificados.
As formas de associativismo induzidas pelo organismos governamentais e não governamentais, em geral aceitas pelos
trabalhadores rurais, são absorvidas diferenciadamente por cada grupo social e são utilizadas por estes como mediações
para a interlocução com o Estado e o mercado. Nem sempre, todavia, essas formas de associativismo e de cooperação
induzidas de fora para dentro desenvolvem a coesão social nos grupos sociais e contribuem para reafirmar as suas
identidades sociais.
São diversos os motivos que podem conduzir à fragmentação dos interesses internos ao grupo social. Um deles é a
utilização generalizada, a partir dos organismos governamentais, das expressões "assentamento" e "assentado" como
atribuição de identidade a um grupo social determinado: o conjunto de famílias de trabalhadores rurais que estão
inseridas numa área geográfica oficialmente definida como de reforma agrária. Essa atribuição de identidade tende a uma
percepção externa homogeneizadora de todos os grupos sociais existentes nas áreas oficiais de reforma agrária e,
portanto, negadora das diferenças internas e da complexidade das formas de associativismo supostamente existentes.
Essa forma de agrupar os trabalhadores rurais colide, na maioria das vezes, com as identidades coletivas tradicionais ou
com aquelas que, porventura, estavam ou estariam emergindo. Essas categorias oficiais classificatórias tenderiam a
definir qual o tipo de interlocutor seria "legítimo" para "existir legalmente" seja para usufruir das políticas públicas
compensatórias seja para as relações políticas com o poder público.
Os cinco casos apresentados adiante procuram ilustrar, menos do que evidenciar, como os grupos sociais comportam-se
perante as inúmeras possibilidades de formas de associativismo e ou de cooperação social. Eles foram selecionados entre
diversos outros, poucos sem dúvida nenhuma em relação com a diversidade e a complexidade das formas de
associativismo vivenciadas pelos trabalhadores rurais nas áreas oficiais de reforma agrária.
O Caso 1 procura mostrar como um grupo social politicamente organizado constituí uma associação, sob a forma legal
de cooperativa, inteiramente coletivizada apesar da tendência econômica, social e política hegemônicas ser
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diametralmente oposta a essa opção de cooperação social. E, a partir da identidade assumida pelo grupo social e da
coesão interna, ele estabelece a interlocução com o mercado, o Estado e a sociedade civil do seu entorno geográfico e
social.
O Caso 2 coloca uma situação bastante diversa. Ensaia mostrar como uma ação de fora para dentro, mesmo partindo de
organizações não governamentais legitimadas pela sua história de solidariedade e compromisso com os mais diversos
grupos sociais populares, por melhor que tenha sido a sua intenção ético-moral e seus objetivos políticos sociais, esbarra
na complexidade de grupos sociais que necessariamente não se identificam uns com os outros, ainda que possam
conviver e compartilhar conjunturalmente em alguns planos sociais como o da luta pela terra e o de reivindicação de
políticas públicas.
O contexto social de onde extraiu-se informações sobre os fatos observados pelos entrevistados para a narração do Caso
2, ou seja, nesta década de 90 no Estado do Mato Grosso do Sul, é rico de elementos que permitiriam sugerir, por
exemplo, que a situação de origem das famílias ou a experiência de vida delas na produção seriam fatores que
delineariam as possibilidades de coesão social e de auto-identidade entre elas com as famílias de trabalhadores rurais de
origens e experiências distintas para constituírem, entre si, um grupo social. Nesse sentido, as associações constituídas
por indução de fora para dentro, ao não contemplarem no seu processo de fundação a diversidade e complexidade desses
elementos, poderiam estar incorrendo em desvios que contribuiriam não para solidificar a coesão social interna a um
assentamento mas, tudo leva crer, para mascarar diferenças sócio-culturais importantes.
Foram diversos os depoimentos que atestaram as dificuldades de coesão social entre aquelas famílias que vivenciaram
durante longo tempo distintas situações de origem como, por exemplo, de bóias-frias nos cultivos da cana de açúcar e no
algodão com aquelas famílias provenientes do sul do país, e que vivenciam a situação de proprietários privados da terra,
arrendatários e ou parceiros, ou com aqueles famílias de origem do Pantanal (identificados como os "pantaneiros") cuja
experiência de vida repousava primordialmente na lida com a pecuária nas situações particulares do Pantanal
Matogrossense.
O Caso 3 ilustra como um processo de baixo para cima, a partir de esforços gradativos e solidários, respeitando a
convivência entre as diversas variações de formas de associativismo, pode resultar em novos planos sociais de
participação e de organização. Dir-se-ia que novas identidades sociais estão emergindo. A interlocução com o Estado,
com a sociedade civil e com o mercado faz-se através de novas mediações, todas elas superando identidades atribuídas
como a de "assentamento" e de "assentados ".
O Caso 4 explora as relações conceituais e práticas entre coletivos de produção, mutirões e o localismo (Almeida, s.d.),
este expresso na auto-afirmação de grupos sociais, a partir de particularidades geográficas e de atividades econômicas
(quiçá corporativas), apesar da indução de fora para dentro no sentido de homogeneização de grupos sociais
não-homogêneos e com auto-identidades bem definidas.
Nesse Caso 4 pode-se observar como práticas sociais tradicionalmente exercitadas pela maioria das famílias de
trabalhadores rurais, como o mutirão, foram burocraticamente transformadas em coletivos de produção, nesse processo
eliminando-se os vínculos solidários que a caracterizavam historicamente. Essa passagem do mutirão para o coletivo,
ainda que com base em experiências históricas concretas, ao não dar conta das tendências individualistas dos
trabalhadores rurais como forma de afirmação da sua superação das relações sociais de produção anteriormente
vivenciadas, como a sujeição da renda da terra, pode estar negando necessidades reais dos trabalhadores rurais, em
especial no semi-árido nordestino, que é a da cooperação no trabalho e a apropriação comunitária da terra.
O derradeiro caso apresentado, o Caso 5, traz para a reflexão a questão racial e religiosa como elementos de coesão
social de grupos sociais historicamente enraizados num espaço geográfico bem determinado como o povoado. Procura
mostrar, ainda muito superficialmente, como novas formas de associativismo são absorvidas por tais grupos sociais
auto-identificados e reconhecidos socialmente e utilizadas para a interlocução com os organismos públicos, com o
mercado e para a promoção das suas práticas religiosas e de socialização sem qualquer prejuízo para a coesão social
interna.
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Caso 1. A coletivização do trabalho e dos meios de produção
A Cooperativa de Produção Agropecuária
Vitória Ltda - CPA
(Município de Paranacity,
Estado do Paraná)
Preâmbulo
A CPA é uma empresa de produção coletiva, gestão coletiva e de trabalhos coletivos. Não se diferencia de um grupo
coletivo ou de uma associação coletiva, tanto na sua concepção como na sua organização. A CPA deve, entretanto, ter
personalidade jurídica e, para tanto, necessita ser registrada na Junta Comercial como uma empresa cooperativista, a qual
passa a ser regida pela legislação cooperativista brasileira (CONCRAB, 1997; 70).
Características Gerais
Nome : Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória Ltda - COPAVI
Assentamento Santa Maria
Localização : Município de Paranacity, Estado do Paraná
Data de fundação: 10 de julho de 1993
Instituição legalizada
Número de sócios: 38 (cada família pode associar quantas pessoas, acima de 18 anos, desejar)
Número de famílias assentadas: 23
Área do assentamento: 236 hectares
Área desapropriada em 1988; imissão na posse em 1992
Observação: de 1988 até 19 de janeiro de 1993 a área permaneceu em conflito, conforme comentários na
seção histórico sumário
Configura-se como um caso de cooperativa de produção agropecuária - CPA onde a propriedade dos
meios de produção e o processo de trabalho é integralmente coletivo.
Obs.: uma nova família que deseje participar da COPAVI permanecerá trabalhando no coletivo durante
um período de seis meses, denominado período de adaptação. Depois desse período a Assembléia Geral
decide se essa família será ou não incorporada ao coletivo.
Histórico sumário
A desapropriação da área deu-se por denúncia e pressão do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Paranacity, os quais
alegavam perante o INCRA que a área da Fazenda Santa Maria era ociosa.
Após a vistoria e demais procedimentos legais pertinentes foi efetuada a desapropriação do imóvel em 1988. Para evitar
a desapropriação o proprietário do imóvel arrendou, ainda em 1988, as terras para a Usina Santa Terezinha, a qual
plantou na área em litígio aproximadamente 190 hectares de cana de açúcar (a área total do imóvel é de 236 hectares).
Apesar da imissão na posse ter-se dado em 1992, em função da pressão política de autoridades locais e de entidades
patronais para não ocorrer o assentamento dos trabalhadores rurais, somente em 19 de janeiro de 1993 a terra foi
efetivamente ocupada por integrantes do MST, à revelia do INCRA e do arrendatário do imóvel. Anteriormente, no final
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de 1988, um grupo de trabalhadores rurais sem terra liderados pelo Sindicato de Trabalhadores Rurais de Paranacity
permaneceu acampado, à margem da rodovia que ladeia o imóvel, por algumas semanas. Não se deu, na oportunidade, a
ocupação do imóvel.
De meados de 1988 até janeiro de 1993 a área permaneceu em litígio entre grupos distintos de trabalhadores rurais sem
terra, políticos locais, a empresa arrendatária da terra e o INCRA.
De acordo com os assentados, a não retirada da cana de açúcar plantada da área do assentamento constituía-se numa
forma de pressão dos antigos proprietários e de determinadas forças políticas locais para evitar que o ocupantes da terra
ali permanecessem e o assentamento efetivasse-se.
De janeiro a agosto de 1993 os trabalhadores rurais sem terra que ocuparam a, então, fazenda Santa Maria (já
desapropriada), trabalharam em outros estabelecimentos como bóias-frias para obterem rendimentos para a reprodução
dos meios de vida. Os motivos foram: a área estava plantada com cana de açúcar e os proprietários da Usina Santa
Terezinha, que haviam arrendado a terra, não colhiam a cana de açúcar plantada.
Em agosto desse ano os trabalhadores rurais ocupantes botaram fogo em parcela do canavial, cortaram uma parte da cana
de açúcar e propuseram aos arrendatários da terra que colhessem o restante da cana. Como a empresa arrendatária não foi
cortar e retirar a cana de açúcar os trabalhadores rurais ocupantes obtiveram o apoio solidário 300 pessoas integrantes do
MST do Estado de São Paulo, especializados no corte de cana, e colheram parte significativa da área plantada. Esse
processo durou até dezembro de 1993. Na área onde havia plantação de cana de açúcar foi plantada a mandioca.
Estrutura organizacional da cooperativa
A COPAVI apresenta dois tipos de estrutura organizacional: uma legal e outra real. A diferença entre uma e outra é a
existência real de um conselho deliberativo não previsto no estatuto e no regimento interno.
São órgãos constitutivos da estrutura legal a assembléia geral, a diretoria executiva e o conselho fiscal. A essa estrutura
legal foi acrescido o conselho deliberativo.
O conselho deliberativo, desde a fundação da cooperativa em 1993 até início de 1997, foi formado por:
todos os membros da diretoria executiva e
4 representantes setoriais da cooperativa, ou sejam os setores horta, lavoura,
pecuária e agroindústria.
A partir do início de 1997, o conselho deliberativo sofre uma mudança na sua composição e ficou assim constituído:
2 membros da diretoria executiva;
3 representantes setoriais da cooperativa, reorganizados em produção,
comércio e administração;
4 coordenadores de núcleos de famílias. As famílias residem numa agrovila,
a qual é constituída de quatro fileiras de casas. Cada fileira de casas
constitui um núcleo de famílias e escolhe um coordenador.
Dos três setores da cooperativa apenas o de produção apresenta estrutura interna. As atividades desse setor estão
agrupadas em quatro departamentos, abrangendo as seguintes áreas de produção:
departamento de lavoura: café, mandioca, milho, sorgo e fruticultura, em
especial, a banana;
departamento de pecuária: gado bovino leiteiro, suínos e aves para abate;
departamento das horta: atividades cujos cultivos são efetuados com
insumos orgânicos. Muito diversificados como beterraba, alface, temperos
verdes, quiabo, abobrinha, etc.
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departamento industrial:
abatedouro de frangos e suínos e processamento de
embutidos defumados,
alambique para a produção de cachaça e preparo de rapadura
e melaço;
unidade de produção de doce de leite;
laticínio: pasteurização de leite, e produção de queijos e
yogurtes.
Os setores comércio e administração não apresentam subdivisões internas. Cada setor tem um coordenador, assim como
cada departamento do setor de produção.
Alocação e gestão da força de trabalho
O total da força de trabalho hoje, junho de 1998, disponível e em utilização é de 40 pessoas/dia, como média anual.
A alocação da força de trabalho foi inicialmente determinada pelo Conselho Deliberativo, mas, em última instância quem
decide é a Assembléia Geral. Todavia, na dinâmica do processo produtivo, os seguintes critérios são utilizados:
características e aptidões de cada pessoa;
necessidade interna da área de produção e ou beneficiamento.
Cada coordenador de setor, no caso do setor de produção, e cada coordenador de departamento definem juntos com os
trabalhadores já em atividades, e em função da tecnologia utilizada e do volume de força de trabalho necessária, o quadro
de pessoal que será indispensável para dar conta das tarefas estabelecidas quando do planejamento geral da produção
para cada setor e departamento.
Cada família pode oferecer ao coletivo quantos membros, acima de 15 anos, desejar. A possibilidade de trabalho de
menores de 18 anos é debatida com o Promotor Público da Comarca local, em função da controvérsia na interpretação da
legislação pertinente tendo em vista que o trabalho do menor não se caracterizaria como trabalho assalariado mas
trabalho junto à família.
A medida do trabalho dispendido por cada pessoa é hora efetivamente trabalhada. Todas as atividades estão
coletivizadas.
Na COPAVI existe um refeitório comunitário que serve café da manhã e almoço. O jantar é realizado por cada família
em sua própria residência. O refeitório é considerado como uma das atividades internas do coletivo da cooperativa,
portanto, a força de trabalho nele alocada tem a mesma importância do que aquela alocada nos demais setores.
O refeitório funciona no sistema de auto-serviço e a comida, desejada por cada pessoa, é pesada em balança usual nos
restaurantes de comida à quilo. Cada pessoa serve-se livremente da comida oferecida (cardápio planejado semanalmente)
e a comida servida é pesada e anotada, por pessoa. A comida será paga no final do mês.
Os itens que compõem o custo do quilo da comida referem-se, apenas, à aqueles produtos que foram adquiridos no
mercado. Todos os itens produzidos pela cooperativas não são computados no custo da alimentação.
Além de poder beneficiar-se gratuitamente dos alimentos produzidos na cooperativa e consumidos no café da manhã
(pão de fabricação interna, doces, embutidos, yogurtes, manteiga, bolos, etc.) e no almoço, cada família recebe, sem
qualquer ônus:
leite, produtos da horta e frutas diariamente, à vontade, em função do
número de pessoas da família;
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carne de aves e de suínos é distribuída uma vez por semana numa
quantidade proporcional ao número de pessoas da família.
A parte do consumo pessoal no refeitório relativa ao custo de alimentação (produtos adquiridos pela cooperativa no
mercado) é paga mensalmente.
A produção
O uso do solo é o seguinte (média de 97/98 e previsão para 98/99):
área com pastagem plantada (capim napier)....................45 hectares
área com plantio em rotação: adubação verde seguida por milho e sorgo para o gado
........................................................................30 a 40 hectares
mandioca ..............................................................................12 hectares
banana ....................................................................................3 mil pés
café .......................................................................................12 mil pés
cana de açúcar.......................................................................10 hectares
eucalipto plantado ................................................................10 hectares
horta ...................................................................................... 2 hectares
Relações com o mercado
A COPAVI está filiada à Cooperativa Central de Reforma Agrária do Paraná - CCA-PR.
A COPAVI estabelece com o mercado as seguintes relações para a venda dos seus produtos:
os produtos dos departamentos horta, lavouras e pecuária (leite e seus derivados, aves e suínos abatidos e
processados, todos em processo de registro no SIM, Serviço de Inspeção Municipal e com solicitação para
registro estadual e federal) são vendidos diretamente aos consumidores do município através de entrega à
domicílio. A entrega é realizada em três linhas, seja por carroça de tração animal seja por Kombi.
Dependendo da linha a entrega varia de 1 a 3 vezes por semana. O leite é entregue sistematicamente. Os
derivados do leite, assim como os produtos da horta e da lavoura, são oferecidos aos moradores das linhas
durante os dias da semana. No sábado a Kombi entrega produtos pré-encomendados para uma freguesia
fixa. No domingo não há entrega de leite ou vendas à domicílio. A vendas dos diversos produtos,
inclusive do leite, dá-se na feira na cidade. Os clientes que recebem os produtos a domicílio pagam as
dívidas mensalmente. A inadimplência varia entre 5 a 10 %, pois, depende da situação de emprego dos
clientes que são, na sua maioria, trabalhadores rurais. 80% dos clientes são pobres, basicamente
"bóias-frias".
É mister recordar que todos os produtos da horta são orgânicos, o que dá à COPAVI uma relação especial
com os compradores, pois, a cooperativa realiza um papel educativo nas escolas e nas casas sobre a
importância da não utilização de agrotóxicos, etc. Em consequência dessa prática há visitações
sistemáticas (média de 2 a 3 ônibus por semana) ao assentamento, sendo que os visitantes fazem suas
refeições no refeitório comunitário;
a aguardente tem distribuição dificultada pela falta de registro no MAARA, processo esse ainda em
tramitação. Além dessa restrição de ordem sanitária e legal, a qual impede a circulação do produto para
fora do município, a COPAVI tem dificuldades de armazenamento da aguardente em embalagens
comercializáveis. A venda tem-se dado no próprio assentamento.
A compra de insumos para a produção e de produtos complementares para a alimentação familiar, assim como aqueles
para uso doméstico, é toda ela mediada pela cooperativa e realizada no comércio da cidade de Maringá, a 78 km do
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assentamento. Alguns insumos de natureza orgânica, como o esterco para a horta, é adquirido de uma granja vizinha ao
assentamento.
Segundo a opinião dos dirigentes e dos sócios da COPAVI o assentamento está legitimado perante a opinião pública do
município. Isso deve-se não apenas às relações comerciais que estabeleceram com os moradores, através da venda dos
seus produtos, como pela campanhas que realizam em relação alimentos sadios e à melhoria do meio ambiente (recordar
que o imóvel antes da ocupação estava inteiramente plantado com cana de açúcar).
Redistribuição dos rendimentos
Segundo a direção da COPAVI, os sócios consideram que ainda estão em processo de acumulação social, como
poder-se-á constatar na listagem apresentada na seção abaixo relativa ao patrimônio do coletivo social. Então, a
redistribuição de rendimentos do trabalho coletivo é, ainda, precária e resumiu-se, para o quinquênio 1994/98, a:
15% para o Fundo de Assistência Técnica - FAT;
35% para distribuição em relação às horas trabalhadas;
20% para o Fundo de Investimentos;
30% aumento do capital social (capital esse que o sócio poderá retirar
quando sair da cooperativa).
Não se considerando a alimentação sistemática recebida por cada família, diária ou semanalmente, conforme
anteriormente aludido, os 35% para a distribuição em relação às horas trabalhadas foi estimado em R$ 2.500,00 / mês
pela Assembléia Geral. Esse total é redistribuído entre todos os que trabalham a partir da ponderação de número de horas
trabalhadas efetivamente. A média efetiva tem sido de aproximadamente meio salário mínimo/pessoa (portanto, mais de
um salário mínimo/família em decorrência do números de pessoas da família que trabalham no coletivo).
O cálculo acima é o seguinte: R$ 2.500,00 dividido pelo total de horas trabalhadas por todas as pessoas. Dessa divisão
obtém-se o valor da hora trabalhada. O valor da hora trabalhada é multiplicado pelo número de horas trabalhadas no mês
por cada pessoa. Tem-se, assim, o rendimento obtido por cada pessoa. O valor R$2.500,00 é variável e estimado pela
Assembléia Geral em função do cálculo contábil geral da cooperativa.
O desafio atual dos sócios da COPAVI é dobrar o total da produção nos próximos dois anos. Decorre daí uma das
restrições para o aumento na redistribuição dos dividendos.
Patrimônio
O patrimônio abaixo descrito, assim como o manejo da terra (recordar que o imóvel estava com plantação de cana de
açúcar), foi obtido pelas 23 famílias em quatro anos de atividades (meados de 93 a junho de 98). As instalações,
máquinas e equipamentos são:
- 23 casas residenciais, sendo 21 em alvenaria e duas em madeira;
um escritório em madeira (24 m
2
);
um refeitório completo (equipamento de cozinha, refrigeradores, mesas e
cadeiras, etc.) para 100 pessoas;
um barracão em alvenaria 375 m
2
, servindo como armazém de produtos e
insumos, garagem de máquinas e tratores e demais equipamentos;
um barracão de 220 m
2
onde funciona o alambique (capacidade de 40 mil
l/ano), a produção e engarrafamento da aguardente e a produção de rapadura
e melaço;
um barracão para o mercado de 375 m
2
;
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usina de laticínios (capacidade de 4.000 l/dia);
estábulo com ordenhadeira mecânica para 12 vacas e um resfriador;
um abatedouro de aves (100 m
2
) e transformador de suínos (processamento
da carcaça);
dois aviários com capacidade unitária de 2.000 aves;
uma pocilga de 300 m
2
;
equipamento de irrigação por aspersão utilizado na horta;
equipamento de irrigação por gotejamento utilizado na plantação de
bananeiras;
um poço arteziano
dois tratores 292 Massey Fergusson
um trator 275 " "
um trator Tobata
uma Kombi
um caminhão 690 Volkswagen
3 animais de tração
120 vacas de gado leiteiro, sendo 60 vacas em lactação.
Relações com o Estado
As relações entre a COPAVI e o INCRA foram inicialmente precárias, seja em função da história da ocupação, conforme
o histórico sumário acima, seja pelas dificuldades que o próprio INCRA - PR tem em relacionar-se com os coletivos de
assentamentos. As relações atuais são formais.
Enquanto que em outros assentamentos o INCRA providencia recursos para o centro comunitário (água, luz, escola e
posto de saúde) no caso da COPAVI a luz e a água foram obtidos através de crédito do PROCERA.
A cooperativa tem obtido os créditos do PROCERA I e II e do PRONAF. Tem conseguido, também, apoio de entidades
internacionais, em especial para a infra-estrutura de produção.
As possibilidades da cooperativa, e de seus sócios, pagarem os créditos obtidos é bastante elevada. Todavia, do ponto de
vista dos dirigentes da cooperativa, os prazos dos financiamentos são incompatíveis com a possibilidade de assentados
firmarem-se na produção e no mercado. Em especial referem-se aos prazos de carência para os investimentos. Na maior
parte das atividades, os dois anos de carência são insuficientes não apenas para firmarem-se na produção mas, em
especial, para ajustarem-se ao mercado consumidor que muda suas demandas constantemente.
Para os produtores rurais em apreço, que saíram da condição de trabalhadores rurais sem terra e sem quaisquer outros
instrumentos de trabalho, os dois anos de carência dos investimentos são insuficientes porque os rendimentos porventura
auferidos nesse período são utilizados não para a poupança, tendo em vista a amortização do empréstimo mas, na
expressão de um sócio da cooperativa, "para sair da miséria". Portanto, iniciar os pagamentos dos créditos de
investimentos com dois anos de carência significa deixar de gastar na reprodução dos meios de vida, ou seja, manter-se
na pobreza crônica apesar de possuir infraestrutura produtiva.
Esse raciocínio estende-se para os créditos (moradia, fomento e alimentação, além da amortização do custo da terra)
oferecidos pelo INCRA imediatamente após o assentamento e cujo pagamento estaria relacionado com a possibilidade da
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emancipação. Esta, segundo a COPAVI, deveria estar relacionada com a capacidade do assentamento de não apenas
inserir-se mas, sobretudo, consolidar-se no mercado.
Demais serviços prestados pela cooperativa
Como o assentamento está situado próximo (3 km) da cidade de Paranacity, os trabalhadores rurais utilizam os
equipamentos sociais ali existentes como escola, creche, posto de saúde e infraestrutura e serviços de lazer.
A cooperativa não desenvolve trabalho específico seja com os jovens ou com as mulheres. Como todos estão integrados
na produção e nos serviços coletivos não há diferenciação para sexo e idade (acima dos 15 anos). As adequações gerais
necessárias (aptidões e capacidade física), assim como para os casos particulares, são realizadas no próprio processo de
trabalho.
Comentários gerais
Foi indagado aos entrevistados da cooperativa quais os aspectos subjetivos que poderiam ser destacados a partir da
prática do coletivo na COPAVI. As respostas foram:
integrar o trabalho das mulheres no processo de produção, ainda que não tenham conseguido equacionar
totalmente a sobrecarga para a mulher nos afazeres da casa e da maternidade;
estão em condições de vida e de trabalho melhores do que aqueles assentados em lotes individuais em
outros assentamentos na região;
tem maior capacidade de resistir às crises de produção e financeiras;
alocam melhor os recursos obtidos;
conseguem visualizar resultados concretos;
conseguem garantir efetivamente a aplicação dos créditos na produção sem os desviarem para o consumo
familiar;
apresentam excedentes de produção após o consumo interno;
tem maior integração com o mercado;
conseguem industrializar os produtos do assentamento;
a assessoria técnica é facilitada;
o coletivo torna-se uma grande escola de convivência humana.
A maior dificuldade apresentada foi acertar a produção na padrão exigido pelo mercado.
Caso 2 - Central de Associações
Coordenação das Associações dos Assentamentos
de Mato Grosso do Sul - COAAMS
(Campo Grande,
Mato Grosso do Sul)
Preâmbulo
No período compreendido entre 1989 a 1996 foram constituídas, no Mato Grosso do Sul, sob a iniciativa e assessoria da
Comissão Pastoral da Terra - CPT diversas organizações sociais com o objetivo de, organicamente, encontrar soluções
políticas, institucionais, econômicas e organizacionais para as famílias de produtores rurais inseridas nos projetos oficiais
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de reforma agrária.
É oportuno ressaltar que em aproximadamente 6 anos foram constituídas, desativadas e reformuladas várias organizações
sociais, as quais desenvolveram-se e modificaram-se sob assessoria da CPT. Esta, nesse processo, deixa de enfatizar a
luta pela terra, a qual foi um dos seus importantes objetivos desde 1984, para concentrar seus esforços, a partir de
aproximadamente de 1990, além da atividade pastoral, no apoio aos trabalhadores rurais já assentados em projetos
oficiais de reforma agrária.
A conjuntura política e social nesse período (1989-1995) caracterizava-se por:
Uma fase de estagnação da luta pela terra: nesse período não foi concretizado nenhum projeto novo de
reforma agrária;
A luta pela terra, além da CPT, envolvia vários outros atores sociais como os sindicatos de trabalhadores
rurais, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST, o INCRA, o Governo do Estado e os
poderes políticos locais, apresentando entre si concepções de luta pela terra e de organização política e
social, assim como de práticas sociais, bastante distintas;
Elevado número de trabalhadores rurais brasileiros que se encontravam no Paraguai (oficialmente
denominados de "brasiguaios") tinham retornado ao país indo constituir diversos acampamentos no MS, a
partir de 1984;
O associativismo nos assentamentos oficiais de reforma agrária eram estimulados pelas instituições do
Governo do Estado, com o apoio da FETAGRI-MS, através de doação de serrarias, usinas de
beneficiamento de grãos, máquinas e motores para as associações constituídas.
É mister relembrar que no sul do atual Estado do Mato Grosso do Sul, mais particularmente na região de Dourados,
houve na década de 50, por iniciativa do Governo Getúlio Vargas, a criação de diversas colônias agrícolas federais as
quais iriam estabelecer formas particulares de convivência tutelada entre os trabalhadores rurais e os organismos
governamentais. A luta pela terra como se conhece atualmente só teve seu início, no Mato Grosso do Sul, por volta de
1984. Nesta oportunidade a relação entre os trabalhadores rurais das colônias agrícolas e dos assentamentos oficiais de
reforma agrária com os sindicatos era bastante prejudicada pela relação de apoio que a FETAGRI dava ao governo do
estado. É nesse contexto que a CPT assume a hegemonia da luta pela terra e apoia a formação do MST no MS em 1987,
este passando a assumir tal hegemonia a partir dessa data.
No período 1989-96, em apreço, foram constituídas as seguintes organizações sociais, sendo que a primeira terá a
iniciativa de constituir ou colaborar na constituição das demais, todas elas sob a assessoria da CPT:
COAAMS : Coordenação das Associações dos Assentamentos de Mato Grosso do Sul;
COAGRAN: Cooperativa dos Assentados da Grande Dourados;
COARJ: Cooperativa dos Assentados da Região de Jardim
Experiências de constituição de cooperativas de âmbito menor como a Cooperativa dos
Produtores de Leite da Retirada da Laguna - COPERLAG (Município de Guia Lopez),
Cooperativa dos Produtores do Assentamento Indaiá (Município de Itaquiraí) e a
Cooperativa de Produtores de Hortifrutigranjeiros de Noaque (Município de Noaque);
AECAMS - Associação dos Educadores das Colônias Agrícolas, Assentamentos e
Acampamentos, e
Escola Família Agrícola - EFA.
De 1989 a 1995 havia (estaganação) 24 assentamentos oficiais de reforma agrária no Estado do Mato Grosso do Sul. Na
atualidade, agosto de 1998, existe um total de 56 desses assentamentos, sendo 52 constituídos pelo Governo Federal e 4
pelo Governo do Estado, envolvendo um total de 9.129 famílias.
Desde 1997 tem havido algumas iniciativas para a criação da Federação das Associações dos Assentamentos do Mato
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Grosso do Sul, porém, sob a hegemonia da FETAGRI - MS e dos organismos governamentais mas, no entanto, sem
qualquer concretização até o momento atual.
A COAAMS
A COAAMS constituiu-se a partir de uma iniciativa liderada pela Comissão Pastoral da Terra - CPT do Mato Grosso do
Sul objetivando superar as debilidades individualizadas das associações dos assentamentos. Considerava-se, à época da
sua fundação, 1989, que as associações tinham caráter meramente instrumental no sentido de servirem apenas para a
captação de recursos dos programas governamentais. A maioria dos associados percebia a associação como uma entidade
de caráter similar às beneficientes, criadas apenas para repassar recursos governamentais para os seus membros. Isso
significava, segundo os entrevistados, que tais associações apresentavam debilidades para obter a coesão social
necessária para as iniciativas das lutas reivindicatórias. Dessa forma, os associados não assumiam as associações como
suas, deixando-as à mercê do presidente da associação e da influência dos políticos locais.
A idéia central que moveu a criação da COAAMS foi a de constituir uma coordenação central das associações dos
projetos oficiais de assentamentos do Estado de Mato Grosso do Sul que criasse condições objetivas e subjetivas de
motivação, mobilização e de luta reivindicatória das famílias consideradas oficialmente como assentadas. Três objetivos
gerais moveram os atores sociais para a criação da COAAMS: melhorar as condições de infraestrutura econômica e
social nos assentamentos, aumentar a capacidade de negociação política para a obtenção de crédito rural e proporcionar
assistência técnica às famílias de trabalhadores rurais vivendo nos assentamentos oficiais de reforma agrária.
À época, a criação das associações dos assentamentos era induzida pelos organismos governamentais, em especial os do
Governo do Estado e, em parte pelo INCRA, tendo em vista a necessidade deste órgão do governo federal de contar com
uma entidade no assentamento, com personalidade jurídica, que proporcionasse condições legais para a assinatura de
convênios. Houve assentamentos que constituíram mais de uma associação, ora em função do elevado número de
famílias ora em decorrência de interesses do poder político local ou ora em função de grupos sociais distintos forçados a
aglutinarem-se em um mesmo assentamento.
Conforme as informações obtidas nos depoimentos, a maioria das associações, naquele período, foram constituídas com
objetivos meramente instrumentais, ou sejam, captar recursos dos organismos governamentais ou receber deste máquinas
e equipamentos. Portanto, as associações não se plasmaram em movimento de coesão social tendo em vista fortalecer,
pelo associativismo, a capacidade de cooperação social. Essa debilidade na constituição da associações iria, como
comentar-se-á adiante, influir diretamente nas práticas da COAAMS.
A COAAMS, enquanto associação civil, foi devidamente registrada e nos seus estatutos previam a seguinte estrutura
organizacional interna:
Assembléia Geral
Diretoria Executiva
Conselho Fiscal
Eram membros da COAAMS os presidentes das associações dos assentamentos e representantes de diversas
organizações sociais, inclusive os agentes pastorais.
A COAAMS, enquanto coordenação das associações, enfrentava a seguinte situação gerencial e organizacional das
associações:
Escassa participação dos associados na gestão das associações;
Presença marcante do presidencialismo;
Intensa articulação dos presidentes das associações com os organismos
governamentais e os políticos do poder local tendo em vista a obtenção de
recursos e favores;
Nenhuma presença na comercialização dos produtos dos assentamentos;
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Diversas associações com problemas de prestação de contas perante os
organismos públicos, inclusive várias delas com pendências judiciais, e
Nenhuma experiência na prática cooperativista e de gestão da produção.
Apesar dessas circunstâncias a COAAMS desempenhou papel importante em diversas mobilizações políticas como a da
incorporação de parte dos recursos do FCO (10%) para o crédito do PROCERA. Integrou-se, juntamente com outros
atores sociais, em várias atividades de âmbito estadual e nacional obtendo êxito na realização das obras de infraestrutura
econômica e social para diversos assentamentos. Com relação à assistência técnica, a COAAMS realizou um acordo com
a EMPAER para que esta instituição enviasse técnicos para os assentamentos. Os técnicos da EMPAER não se
adaptaram aos assentamentos e se retiraram. Tudo voltou à estaca zero.
A capacidade de ação da COAAMS foi sendo gradativamente diminuída pela redução da participação das associações
nas ações da COAAMS. Em 1995, ou seja, aproximadamente 5 anos após a sua fundação, já havia consciência de que a
COAAMS não representava mais o conjunto das associações.
Nesse ínterim, e buscando soluções para os problemas econômicos da produção enfrentados pelos trabalhadores rurais, é
estimulada a criação de duas cooperativas de âmbito regional. A COAAMS participou de iniciativas na área de educação
formal nos assentamentos e na de formação geral dos trabalhadores rurais. Dessas ações iriam resultar duas outras
organizações sociais, conforme adiante será comentado: a AECAMS - Associação dos Educadores das Colônias
Agrícolas, Assentamentos e Acampamentos e a Escola Família Agrícola.
As duas cooperativas de âmbito regional criadas foram:
Em 1990 fundou-se a Cooperativa dos Assentados da Grande Dourados -
COAGRAN, na perspectiva de equacionar as questões ligadas à
comercialização de insumos e produtos de seis assentamentos existentes na
época na região de Dourados;
Em 1991 foi constituída a Cooperativa dos Assentados da Região de Jardim
- COARJ, na época com 12 assentamentos.
As duas cooperativas enfrentaram adversidades causadas ora pela ingenuidade na sua gestão ora pelas dificuldades
relativas às distâncias dos assentamentos entre si e destes para a sede da cooperativa, como no caso da COARJ em que
havia assentamentos com mais de 300 km de distância da sede da cooperativa. A ingenuidade referida deveu-se, segundo
os depoimentos, à tentativa de envolver todos os assentamentos e todos os produtos dos assentamentos de uma região e,
sobretudo, pelo fato de que os trabalhadores rurais não assumiram a cooperativa como deles.
A COAGRAN, por exemplo, conseguiu recursos para estruturar a infraestrutura de armazenagem, transporte e
beneficiamento de alguns produtos. Conseguiram comercializar amendoim, feijão, erva-mate, entre outros, e beneficiar o
mel de abelhas. Entretanto, a maior parte dos produtos dos assentamentos ficava fora da capacidade da cooperativa
comercializar, reduzindo, assim, a credibilidade da cooperativa perante os associados (daí a ingenuidade na política de
gestão da cooperativa em querer dar conta de todos os produtos dos assentamentos).
Um exemplo da dificuldade na gestão da cooperativa é o relacionado com um convênio que a COAGRAN conseguiu
com a prefeitura de Dourados para fornecer os produtos da merenda escolar. Todavia, por falta de estudos sobre a oferta
dos produtos pelos assentamentos, a cooperativa não conseguia atender à demanda exigida pela merenda escolar,
obtendo poucos produtos junto aos assentados, tendo que comprar os produtos faltantes junto à Associação dos
Hortifrutigranjeiros de Dourados. Esse convênio foi rescindido em 1995 e a COAGRAN vivenciou, então, forte crise:
fechou sua sede em Dourados e restringiu suas atividades apenas ao assentamento Novo Horizonte do Sul, para o qual
transferiu sua sede, a qual instalou-se no entreposto daquele assentamento.
Tanto a COAGRAN como a COARJ tiveram grandes prejuízos. Reduziram substancialmente as suas atividades. A
COARJ atualmente conta com 75 associados e só atua em dois assentamentos: São Manuel (Município de Anastácio) e
Sumatra (Município de Bodoquena). Ainda que a COARJ possua trator e os implementos, assim como caminhão para
transporte de produtos e insumos, e preste serviços aos associados as dificuldades organizacionais, segundo os
depoimentos, comprometeram o conjunto das atividades da cooperativa.
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Na opinião dos entrevistados as cooperativas não atenderam aos objetivos propostos.
Duas outras cooperativas de menor porte foram criadas:
A Cooperativa dos Produtores de Hortifrutigranjeiros do Assentamento
Conceição, no Município de Noaque. Contava com 35 associados e pouca
capacidade de comercialização. Apresentou, também, sérios problemas de
gestão. Hoje restringe-se à comercialização da banana;
A Cooperativa dos Produtores de Leite da Retirada da Laguna - COPLARG,
do Assentamento Retirada da Laguna, Município Guia Lopez, contava com
25 cooperados. Foi constituída pelos trabalhadores rurais assentados - os
ilhéus, todos provenientes das ilhas do rio Paraná. Obtiveram recursos
financeiros para montar uma usina de laticínios: produzem queijo e ensacam
o leite, o qual é distribuído em 5 municípios do entorno. É a única
cooperativa, das comentadas neste Caso 2, que apresenta desempenho
positivo.
O esforço encetado para melhorar a formação educacional nos assentamentos resultou na criação, em 3 de outubro de
1993, da Associação dos Educadores das Colônias Agrícolas, Assentamentos e Acampamentos do Mato Grosso do Sul -
AECAMS. Na época da sua fundação foram filiados à AECAMS 37 professores, sendo que hoje há 210 professores
filiados. Todos os professores filiados exercem o magistério em assentamentos, acampamentos e ou colônias agrícolas.
A criação da AECAMS tem sua origem nas atividades desenvolvidas, em especial pela Irmã Olga, da CPT - MS, a partir
de 1987, no acampamento geral resultante do ajuntamento de 13 acampamentos, com um total de 835 famílias, onde
atualmente situa-se o Assentamento Marcos Freire (município de Dois Irmãos do Burití, sendo que naquela época esse
atual município era distrito do município de Anastácio).
Em 1988 e 89 foram realizados encontros estaduais de professores de assentamentos, promovidos pela CPT. Criou-se,
então, a Equipe Ampliada dos Professores de Assentamentos, a qual iria promover diversos cursos e encontros. A partir
dessa experiência associativa surgiu, em 1993, o Curso de Magistério de Férias, denominado tecnicamente de
"Experiência Pedagógica no Magistério com Metodologia Diferenciada e Regime Didático Especial", enquanto curso de
2º grau autorizado para habilitar professores para lecionarem até a 4º série do 1º grau.
Diversos cursos foram promovidos. Porém, em 1993 surgiu a necessidade de criar-se uma associação com personalidade
jurídica devido aos convênios que iam surgindo, pois, até então a CPT operava como entidade formal para tais
convênios. A Equipe Ampliada dos Professores de Assentamentos transformou-se, então, na AECAMS, com sede em
Campo Grande.
A AECAMS possui um Conselho composto por sete membros e uma Coordenação de seis membros, eleitos a cada dois
anos entre os filiados. Os objetivos da AECAMS são: promover cursos para aprimorar a formação dos professores,
buscar a melhoria da infraestrutura das escolas, melhorar e ampliar o material didático e realizar parcerias no projeto do
magistério. Há 3 anos tenta, via parceria, abrir espaço na universidade para esses professores. Já conseguiram parcerias
com a Universidade Estadual de Cáceres- MT (a partir de julho de 1998) e estão com projeto junto à UFMS.
Em decorrência do fracasso das ações resultantes dos acordos entre COAAMS e EMPAER, conforme acima comentado,
para a efetivação da assistência técnica nos assentamentos e a debilitação crescente tanto das cooperativas como das
associações dos assentamentos, a COAAMS e a CPT elaboraram uma proposta, encaminhada à MISERIOR, para a
criação de um centro de treinamento. Nas negociações com essa instituição a idéia original de criar-se um centro de
treinamento acabou resultando na criação de uma escola família agrícola, a partir das experiências positivas dessas
escolas no estado do Espírito Santo e da influência da experiência francesa nesse tipo de escolas.
A Escola Família Agrícola - EFA teve sua construção e equipamentos financiados pela MISERIOR (US$ 180.000,00), e
foi construída numa área de 8 ha cedida pela Arquidiocese de Campo Grande. A entidade mantenedora da Escola é a
COAAMS.
A Escola Família Agrícola - EFA foi fundada em 1996, como uma escola autorizada de 2º grau, técnica-agropecuária, em
regime de alternância para filhos de trabalhadores rurais de áreas oficiais de assentamentos com o objetivos de que esses
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jovens retornem como produtores aos seus lotes. Sua primeira turma foi matriculada nesse mesmo ano com um total de
43 alunos. A segunda turma iniciou em 1997, com 38 alunos. No ano de 1998 não foi formada uma nova turma em
decorrência da insegurança sobre a possibilidade de obtenção de recursos financeiros para a operação da Escola, isto
porque no ano letivo de 1996/97 o Governo do Estado cedeu os professores. Em 1998, em função das disposições da
nova LDB, o Governo do Estado não pode mais ceder professores. Após vários meses de negociação, enquanto a EFA
continuava seu funcionamento e os professores lecionavam de graça, foi encontrada uma solução provisória: o Governo
do Estado daria uma subvenção oficial à Escola e esta contrataria os professores. Porém, essa subvenção estava restrita
ao ano orçamentário de 1998.
O período do curso é de 4 anos, no sistema de ensino de alternância no qual o aluno permanece 15 dias na escola, em
regime de internato, e 15 dias no estabelecimento agrícola da sua família. Todos os alunos da Escola Família Agrícola
são filhos de trabalhadores rurais assentados nos projetos oficiais de reforma agrária cujas associações estão filiadas à
COAAMS. O aluno para candidatar-se à Escola deve ter o assentimento da associação do assentamento onde a família do
candidato está cadastrada.
É o Conselho Administrativo da atual COAAMS (ver comentário abaixo sobre sua reestruturação em 1996), enquanto
entidade mantenedora da Escola, que dispõe sobre a aceitação ou não dos candidatos. Esse Conselho é constituído
(segundo a mudança dos estatutos) por 20 associações de 15 assentamentos, duas cooperativas e os pais de alunos. As
cooperativas filiadas à COAAMS são: COPERLAG - Cooperativa dos Produtores de Leite do Assentamento Retirada da
Laguna e a COPRAIL - Cooperativa dos produtores do Assentamento Indaiá.
Sobre a COPERLAG há informações sumárias acima. A COPRAIL, com 100 associados, foi constituída a partir de
vários projetos de parceria com empresas privadas: um projeto de instalação de aviários integrados com uma empresa do
ramo (25 contratos); de um projeto de produção de mandioca em acordo de parceria com uma fecularia da região e um
projeto de criação do bicho da seda, com uma empresa privada do Estado do Paraná.
A EFA possui 17 professores e apenas 1 funcionário administrativo. Todo o trabalho é realizado pelos alunos. As
instalações para os alunos, as plantações e as criações são:
1 refeitório e 1 cozinha com capacidade para 60 pessoas;
2 alojamentos, sendo um masculino com capacidade para 40 pessoas e um
feminino para 20 pessoas;
1 sala de aula;
biblioteca, almoxarifado e sala para professores;
horta (½ há);
sistema de irrigação
3 tanques para piscicultura
pomar (1 ha);
projeto de criação suínos e aves, em implantação;
3 vacas leiteiras.
A Escola Família Agrícola - EFA mantêm parceria com a AECAMS para formar a 3ª turma de professores dessa
Associação em 1998 (a primeira formou-se em 1994 e a segunda em 1996).
Conforme acima assinalado a COAAMS foi completamente reestruturada em 1996. Isso deveu-se, segundo os
entrevistados, à percepção de que a COAAMS, já em 1995, não mais representava o conjunto das associações dos
assentamentos. Os estatutos da COAAMS foram modificados. Manteve-se a mesma sigla, porém, sua denominação foi
alterada para Centro de Organização e Apoio aos Assentados do Mato Grosso do Sul. A nova organização não tem mais
as associações dos assentamentos como entidades filiadas. Na nova configuração institucional só podem filiar-se as
pessoas. Assim, permaneceram 20 presidentes de associações filiados, mas, neste caso, como pessoas físicas. O mesmo
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deu-se com os presidentes de duas cooperativas que estão filiados ao COAAMS.
Na atualidade o COAAMS faz parceria com o Projeto Lumiar, prestando assistência técnica a três assentamentos.
Caso 3 . Grupos de produção e cooperação regional
Cooperativa de Comercialização e
Reforma Agrária Avante Ltda. - COANA
(Município de Querência do Norte,
Estado do Paraná)
Preâmbulo
A COANA é um caso de cooperativa de prestação de serviços regional que vai surgir após dois processos sucessivos
com qualidades distintas com relação à cooperação, sendo que no primeiro processo inexistiu qualquer forma de
cooperação social e no segundo caracterizou-se pelo acentuada diversificação do ponto de vista associativo.
O primeiro processo, com um período de 8 anos (1986 a 1993), caracterizou-se pelo fato de que todos os trabalhadores
rurais do Assentamento Pontal do Tigre, e dos demais assentamentos que surgiram mais recentemente, atuarem de forma
inteiramente individual sem qualquer tipo de cooperação social. O Assentamento Pontal do Tigre (ocupação da área em
junho de 1986 e imissão na posse em outubro de 1995) foi o primeiro naquela região.
O segundo processo, a partir de 1994, caracterizou-se por uma dinâmica social de criação e desenvolvimento de diversas
formas de associativismo, envolvendo desde grupos de produção com predomínio das atividades de produção
individualizadas, grupos semi-coletivos até a cooperativa de produção agropecuária - CPA, de caráter integralmente
coletivo.
A COANA, situada no município de Querência do Norte, Estado do Paraná, está inserida e é produto da dinâmica
produtiva e organizacional de um conjunto de 8 assentamentos e 9 acampamentos, totalizando aproximadamente 1.100
famílias.
O caráter regional dessa cooperativa deve-se ao fato de que possui entre seus objetivos estratégicos o de implantar um
plano de desenvolvimento regional que abranja todas as áreas de assentamentos e acampamentos no município em que se
situa a sede da cooperativa e naqueles do seu entorno.
Histórico sumário
O assentamento Pontal do Tigre foi o primeiro do conjunto de 8 assentamentos e 9 acampamentos instalados no
município de Querência do Norte. Esse assentamento tem 327 famílias de trabalhadores rurais. Apesar da ocupação da
área ter sido em 1986 somente em 1995 deu-se a imissão na posse. Durante oito anos desse período existiu apenas uma
coordenação política do assentamento com o objetivo de realizar as negociações com os organismos governamentais.
Durante esse primeiro período, 1986 a 1993, o assentamento Pontal do Tigre foi dividido pela Coordenação do
Assentamento em 5 grupos, estes separados por origem das famílias.
Em 1994, um grupo de 25 famílias do Assentamento Pontal do Tigre fundou a Cooperativa de Produção Agropecuária
Conquista - COPACO, em moldes similares àquele da COPAVI (terra e meios de produção coletivos), conforme o Caso
1, anterior. Só não havia sido constituído o refeitório coletivo.
A COPACO é uma cooperativa registrada.
Essa cooperativa foi fundada antes mesmo da imissão na posse dos trabalhadores rurais no assentamento. Nesse sentido
ela não podia usufruir dos créditos de reforma agrária, PROCERA, etc. Todavia, segundo os depoimentos, ela surgiu
como uma necessidade de obter e utilizar em comum os meios de produção.
Inicialmente a cooperativa dedicou-se ao cultivo do arroz irrigado, pois, os lotes das 25 famílias possuíam muitas áreas
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de banhados. Depois incrementou a criação de peixes, de frangos e de gado leiteiro. Na terra firme ou seca efetuou o
plantio de mandioca, milho, frutas e hortaliças.
Em 1995 surgiram dois novos grupos: um coletivo e um outro semi-coletivo. O coletivo denominou-se Grupo União,
composto por 13 famílias, e atuando de modo similar à COPACO, apenas sem registro formal. O grupo semi-coletivo,
composto por 6 famílias, atuava de maneira coletiva apenas para o cultivo do arroz irrigado, sendo que as demais
culturas e criações davam-se de forma individual.
Em meados de 1995, a Coordenação do Assentamento Pontal do Tigre, em consonância com a coordenação dos demais
assentamentos do município, estimula a criação de grupos de produção. Os grupos ou núcleos de produção são
articulações que envolvem um número pequeno de famílias (variando, em média, entre 5 a 15 famílias), já estabelecidos
de forma individual, que se integram por critério de proximidade física (vizinhança), por linha de produção, por
parentesco ou por interesses comuns tendo em vista debater, planejar e organizar a produção, o beneficiamento e a
comercialização de produtos e insumos nos lotes individualizados. Todas as famílias do assentamento passaram, então, a
integrarem-se em grupos de produção.
Cada grupo de produção escolheu um coordenador e um vice-coordenador que além da função que o nome indica
representava o grupo perante os demais grupos de produção. Esses coordenadores de grupos de produção constituíram a
Coordenação Geral do Assentamento e, como ver-se-á mais adiante, compuseram, também, juntamente com os
coordenadores de outros grupos de produção de outros assentamentos, o conselho administrativo da cooperativa regional,
no caso em apreço, a COANA.
Um grupo de produção pode tornar-se um grupo que apenas debate e planeja as ações conjuntamente ou transformar-se
num grupo em que:
as compras e ou as vendas dão-se em comum;
uma atividade produtiva poderá ser efetuada em comum;
parte da terra dos lotes dos membros será explorada em comum;
as máquinas serão compradas e utilizadas em comum;
partilharão atividades em comum com outros grupos de produção;
todas as atividades, assim como os meios de produção, serão coletivizados, constituindo-se, então, num
grupo coletivo;
as suas ações serão organizadas e formalizadas como uma cooperativa (caso da COPACO, acima
referida).
Portanto, os grupos de produção poderão apresentar as mais distintas formas de cooperação ou de associativismo.
Constituem, assim, a base da cooperação social. Esses grupos de produção poderão integrar-se ou não numa associação
de caráter mais amplo, como uma cooperativa regional de prestação de serviços. No caso da COANA todos os 30 grupos
de produção do Assentamento Pontal do Tigre e os 9 grupos de produção do Assentamento Chico Mendes estão filiados
a essa cooperativa regional, independentemente da natureza associativa que tenham desenvolvido.
A cooperativa regional COANA emergiu, então, desse complexo de grupos de produção nos quais inseriam-se a
COPACO (cooperativa de produção agropecuária, integralmente coletivizada), o Grupo União (grupo coletivo sem
registro) e o grupo semi-coletivo constituído por 6 famílias, conforme acima referido.
Características da COANA
A cooperativa, fundada em outubro de 1995, possui 338 associados, formalmente matriculados, mas considera como
sócios, informalmente, todos os trabalhadores rurais dos demais assentamentos (7) e acampamentos (9) do município de
Querência do Norte e entornos. A previsão é que o número formal de matriculados alcance 600 até o final de 1998, com
a regularização de algumas áreas hoje em situação de acampamento.
A estrutura organizacional da COANA é a seguinte:
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Assembléia Geral: todos os associados
Conselho Administrativo: 39 membros
Diretoria Executiva: 5 pessoas
Conselho Fiscal: 6 membros
O que caracteriza particularmente a COANA é a composição do seu Conselho Administrativo. Os seus 39 membros são
representantes dos 39 grupos (ou núcleos) de produção existentes nos assentamentos Pontal do Tigre (30 núcleos) e
Chico Mendes (9 núcleos). Os demais grupos de produção dos outros assentamentos estão em fase de filiação à COANA.
Dos 30 membros oriundos do Assentamento Pontal do Tigre dois deles não se configuram exatamente como
representantes de grupos de produção, pois um desses grupos já se havia transformado, em 1994, na Cooperativa de
Produção Agropecuária Conquista - COPACO, portanto, numa CPA (grupo integralmente coletivo); um outro grupo de
seis famílias organizou-se como o Grupo Coletivo União, não possuindo registro como a COPACO mas organizado e
atuando de forma similar a ela (coletivo integral).
Assim, os 30 membros representantes (de fato são os coordenadores dos grupos de produção) dos 30 grupos de produção
do Assentamentos Pontal do Tigre apresentavam a seguinte composição de grupos associativos:
1 Cooperativa de Produção Agropecuária - CPA
1 Grupo Coletivo - GC
28 grupos semi-coletivos - SC, sendo que estes estão assim organizados
com relação à apropriação da terra e do maquinário:
15 grupos de produção trabalham parte da
terra (área de várzea) em comum, tendo
também máquinas em comum;
13 outros grupos tem apenas as máquinas em
comum.
Desses grupos, de acordo com o comentado anteriormente, diversos fazem compras em comum e vendas em comum,
pois somente a partir de 1998 é que a COANA iniciou as atividades de compras conjuntas de insumos e de vendas (no
caso somente o leite) em comum.
Nos demais assentamentos os grupos de produção estão organizados, mas não há grupos com terras em comum.
Possuem, em diversos casos, apenas máquinas em comum.
A administração da COANA é realizada por cerca de 30 pessoas. Porém, todas elas são voluntárias. Essas pessoas que
compõem a administração da cooperativa, todas elas de famílias de trabalhadores rurais do assentamento, são indicadas e
assumidas pelos grupos de produção. Esse assumir significa que o grupo de produção que indicou e liberou uma pessoa
assume no processo de produção a tarefa da pessoa liberada. Esta continua a participar da partilha do produto do trabalho
do grupo de produção igual aos demais membros desse grupo. Esse procedimento, de acordo com a opinião dos
dirigentes da COANA, além de capacitar os próprios trabalhador rurais no processo de gestão da cooperativa, evita os
gastos com salários e encargos sociais, ao mesmo tempo em que compromete os grupos de trabalho na gestão direta da
cooperativa.
A Equipe Técnica da COANA é constituída por técnicos oriundos de convênios celebrados entre a cooperativa e os
governos federal e estadual. Com o Governo Federal o convênio deu-se com o Projeto Lumiar, o qual permitiu a
alocação de 3 técnicos agrícolas, 1 médico veterinário e 1 engenheiro agrônomo. Com o Governo do Estado, via a
Secretaria do Meio Ambiente, foram alocados 2 engenheiros agrônomos.
A Equipe Técnica, a partir das decisões do Conselho de Administração, tem o papel de planejar os lotes de cada grupo de
produção e acompanhar os projetos de financiamento. O planejamento da produção é global (daí o caráter de plano
regional que a cooperativa ensaia implantar), apesar de que cada grupo de produção e, individualmente, cada família,
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faça uso particular da terra (com exceção daqueles grupos que optaram pela atividade coletiva ou semi-coletiva).
Entretanto, parte do lote individual, quando dos grupos semi-coletivos, é planejada globalmente sempre que as culturas e
ou criações forem destinadas para o mercado. Exemplo: umas das culturas de plantio tradicional na área é a do cafeeiro.
Cada família, dentro do planejamento global, pode plantar até 2 há de cafeeiros, sendo que 1 hectare é destinado, se for o
caso, para o consumo familiar e o outro hectare é para a comercialização via a cooperativa.
No Assentamento Chico Mendes já estão em produção 504 mil cafeeiros. A previsão da COANA é expandir para outros
assentamentos, no máximo em 2 anos, mais 1,5 milhão de mudas.
Esse processo dá-se para todas aquelas culturas e criações destinadas ao mercado. Portanto, quando um grupo de
produção introduz uma cultura e ou criação, ou uma determinada tecnologia, essa prática já foi globalmente analisada do
ponto de vista do mercado, padrão tecnológico, processo de beneficiamento, etc. A interação cooperativa - grupos de
produção é, portanto, intensa.
Nessa dinâmica a COANA vem desenvolvendo seu próprio modelo ou padrão tecnológico, assim como uma forma
particular de organização da produção. Foi estabelecido, para um período de médio prazo, que os produtos para o
mercado seriam leite, café, peixe, frutas tropicais e arroz irrigado. Essa produção, dentro do lote individual, é sempre
realizada de forma combinada, como exemplo, peixe-leite, café-leite, peixe-arroz, etc. Por outro lado, adotam tecnologias
de ponta, mas com a preocupação de redução do uso de agrotóxicos, etc. Exemplo disso é a adoção do plantio de arroz
pré-germinado que reduz sensivelmente o uso dos agrotóxicos.
Nos Assentamentos Pontal do Tigre e Che Guevara estão cultivando arroz num total de 2.420 hectares. A produção de
leite já conta com dois projetos implantados: um para 1.200 vacas e outro para 3.200 vacas (PROCERA Teto II), apenas
em 2 dos 8 assentamentos . A produção piscícola no Assentamento Pontal do Tigre dá-se em 140 hectares de tanques,
sendo cada tanque de 1 há. É necessário destacar que esses exemplos são das áreas totais de produção (ou de número de
animais, etc.), mas distribuídas pelos lotes individuais ou nas áreas de produção em comum, sejam dos grupos coletivos
ou dos grupos semi-coletivos.
Considerou-se, também, neste estudo de caso, a situação particular do processo de trabalho da COANA. Desde a sua
fundação (final de 1995) até início de 1998, a cooperativa concentrou seus esforços na organização da produção e dos
grupos de produção. Somente a partir de 1998 é que começou comercialização: compras, a partir do crédito de custeio,
para todos os assentados diretamente da fábrica; as vendas serão iniciadas com o leite. Atualmente a COANA recebe dos
assentados e vende, após resfriamento, para a Cooperativa Central Norte. O processo de comercialização será realizado,
segundo o depoimento dos dirigentes da cooperativa, de forma crescente, porém, gradativamente.
Em 1998 a COANA adquiriu 3 silos/secador com a capacidade de 160 sacos/dia cada um e um armazém para estocagem
de grãos, o qual pertencia a uma associação apoiada pela prefeitura do município.
Diferentemente de outros casos estudados (não relatados neste documento) a COANA possui um patrimônio em
infraestrutura de beneficiamento e estocagem relativamente pequeno se comparado com cooperativas e ou associações no
nordeste brasileiro. Todavia, sua política foi de concentrar os recursos no processo produtivo, o qual, por outro lado,
apresenta elevado investimento com resultados considerados muito bons.
Ademais, no período 1995-97 a COANA dedicou esforços para a capacitação dos trabalhadores no processo da
produção, pois, grande parte dos trabalhadores eram assalariados temporários sem experiência na gestão da produção
familiar. O objetivo da cooperativa, nestes casos, foi o de viabilizar a pessoa dentro do lote, na expressão de um dirigente
entrevistado.
Do ponto de vista da infraestrutura social no Assentamento Pontal do Tigre existe a escola de 1º a 8º séries e um
mini-posto de saúde. Como o assentamento está próximo da cidade de Querência do Norte, as famílias de trabalhadores
rurais dos assentamentos utilizam os diversos equipamentos sociais dessa cidade.
Já há projetos para a agro-industrialização dos produtos dos assentamentos pela cooperativa.
Pode-se considerar, de acordo com as declarações dos entrevistados, que os grupos de produção criam condições
favoráveis objetivas e subjetivas para o desenvolvimento da cooperação. Tais grupos proporcionam:
uma solidariedade vivenciada;
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a captação de recursos externos ao grupo dá-se sob risco solidário;
o apoio às pessoas com dificuldades;
um espaço inter-familiar e inter-grupal de troca de experiências
sistemáticas;
a unidade de consumo e a unidade de produção integradas mas com
condições para o enfrentamento do mercado.
Caso 4 - Coletivos, mutirões e localismo
Assentamento Maceió
(Município de Caucáia,
Estado do Ceará)
Preâmbulo
A Assentamento Maceió foi constituído em 24 de abril de 1987. Está situado na faixa litorânea do município de Caucáia,
Estado do Ceará, com 605 famílias assentadas, sendo 363 legalmente cadastradas e 242 como agregados.
É um caso que evidencia como apesar de haver sido constituída pelo alto, e de fora para dentro, uma diversidade de
formas de associativismo começaram a emergir, de baixo para cima, novas formas de cooperação que já haviam sido
exercitadas pelas famílias muito antes da constituição desse assentamento. Essas formas emergentes de associativismo
estão relacionadas com os sentimentos de localidade, de vizinhança e de parentesco, desaguando todos ou partes deles na
noção de comunidade.
Além de acentuarem-se os vínculos sociais internos das 11 comunidades existentes no assentamento, emergem a
associação das rendeiras, a associação dos pescadores e, em diversas comunidades, os grupos de interesse, todos eles
independentes da estrutura orgânica oficial representada pela cooperativa COPAIM e pela associação ASSIMA (ver a
seguir). Estas, apesar de terem desenvolvido a infraestrutura econômica e social do assentamento e instituído o coletivo
de produção não conseguem, necessariamente, emular a coesão social interna.
Antes da criação oficial do assentamento já existia naquela área a denominada comunidade Maceió, entre outras, onde
residiam como posseiros aproximadamente 360 famílias. Atualmente, o assentamento está informalmente dividido em 11
comunidades, sendo que uma delas é a comunidade Maceió com aproximadamente 100 famílias.
Diferentemente de outrora, nesse assentamento a terra é de propriedade coletiva, não tendo havido divisão da terra em
lotes, sendo que cada família pode usufruir privadamente de até 4 ha. A área restante é explorada de forma coletiva.
Além das 11 comunidades, existe no Assentamento Maceió:
Cooperativa de Produção e Comercialização Agropecuária do Imóvel
Maceió - COPAIM;
Comissões de produção da COPAIM;
Associação Comunitária do Imóvel Maceió - ASSIMA;
Coletivos de produção;
Associação das Rendeiras do Imóvel Maceió - ARIMA
Associação dos Pescadores, em formação e
diversos grupos de interesse.
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Apesar das diversas formas de associativismo presentes nesse assentamento, inclusive com grandes extensões de terra
exploradas sob a forma coletiva há mais de 8 anos, é a comunidade, enquanto unidade territorial e de intercâmbio social
entre as pessoas, que determina a referência para a coesão social: nela está presente o sentimento de localidade e de
vizinhança existente em seus moradores (Candido, 1964).
Características do Assentamento Maceió
No Assentamento Maceió, como na maioria dos assentamentos do Estado do Ceará, foi introduzida a prática da produção
coletiva associada à exploração familiar individual (esta, em média, de 2 has por família), a qual difere em muitos
aspectos do mutirão. A intenção original dos atores sociais que propuseram tal exercício de cooperação social, nos
meados da década de 80, foi baseada, por um lado, na experiência histórica dos trabalhadores rurais nordestinos na
prática do mutirão e, por outro lado, na debilidade dos recursos naturais e na escassez dos recursos financeiros as quais
contribuíam para reduzir as possibilidades de êxito nas atividades agropecuárias e extrativistas familiarmente
individualizadas.
Apesar de haver tradicionalmente, nas atividades de produção rural nordestina, a prática social do mutirão, esta era e é
exercida para a realização de uma tarefa ou atividade numa área de exploração agropecuária de uma determinada pessoa,
em geral aquela que convoca o mutirão e que será beneficiária desse esforço de cooperação entre vizinhos. O mutirão,
além de constituir-se numa atividade coletiva para realizar uma tarefa no processo produtivo que exige força de trabalho
em geral superior aquela da família singular (derrubada de mato, roçada, limpeza de açudes, conserto de cercas, colheita,
etc.) reveste-se de caráter festivo e moral. Como não há remuneração pelo trabalho efetuado, aquele que foi beneficiado
pelo mutirão fica com a obrigação moral de retribuir com seus serviços quando for solicitado. O caráter festivo é
determinado seja pelo encontro entre vários vizinhos seja pela alimentação e festa proporcionada pelo beneficiário do
mutirão.
A própria Comunidade Maceió, antes de ter sido incluída no Assentamento Maceió, já praticava o mutirão o qual,
segundo os depoimentos, reunia em média 40 a 60 pessoas (das 360 famílias ali localizadas) para ora arrancar a
mandioca ora fazer a farinhada.
Na prática social da produção coletiva, como no caso em apreço, a terra e os meios de produção são de posse e uso
comum e a força de trabalho das famílias envolvidas é utilizada coletivamente durante vários dias por ano. O produto
líquido do trabalho coletivo é parte (10% no caso do Assentamento Maceió) destinado à redistribuição entre as famílias
participantes e o restante é aplicado em atividades produtivas, compra de equipamentos, implementação de infraestrutura
econômica e social, etc. de interesse social do assentamento.
No caso do mutirão as atividades dão-se na área de produção privada e em benefício exclusivo da família beneficiada por
tal atividade de ajuda mútua. Ainda que esse beneficiário fique com a obrigação moral de ajudar os demais participantes
do mutirão quando for por eles solicitado não está presente nem a propriedade comum da terra nem dos meios de
produção, assim como não se coloca a questão da distribuição do produto do trabalho coletivo. A apropriação do trabalho
solidário realizado pelo mutirão é inteiramente privada. Como caso à parte ocorrem os mutirões convocados para
atividades de interesses social como, por exemplo, construir ou melhorar um centro comunitário ou um equipamento de
beneficiamento de produtos de origem rural de uso comunitário (casa de farinha, usina de arroz, posto de resfriamento de
leite, etc.), uma área de lazer, uma estrada, sistema de distribuição de energia elétrica, etc.
No Assentamento Maceió é a COPAIM - Cooperativa de Produção e Comercialização do Imóvel Maceió quem detém a
posse efetiva da terra e, juntamente com a ASSIMA a propriedade dos meios de produção. A terra ainda está em nome
do INCRA. É, ainda, a CPAIM quem administra a força de trabalho disponível para as atividades coletivas.
De acordo com os estatutos dessa cooperativa cada família de trabalhador rural assentada, no caso um total de 363
famílias (famílias legalmente cadastradas), deverá colocar à disposição da COPAIM um homem/dia/mês para as
atividades coletivas. Assim, a COPAIM dispõe de 363 homens/dia/mês) para o coletivo de produção, dia de trabalho esse
que não é remunerado porque é considerado como contribuição para as atividades de interesse coletivo. Os dias de
trabalho excedentes ofertado à COPAIM e ou à ASSIMA, sempre que necessários para suprir a demanda, são
remunerados a partir dos recursos provenientes dos financiamentos de custeio e de investimento obtidos junto a diversas
fontes como o PROCERA, o Fundo Constitucional para o Nordeste - FNE ou os programas estaduais de
desenvolvimento rural.
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De acordo com os depoimentos, até o momento, junho de 1998, as famílias dos trabalhadores rurais não tinham recebido
qualquer recurso financeiro proveniente da distribuição dos rendimentos líquidos do trabalho coletivo. Elas haviam
usufruído das instalações, equipamentos e serviços disponíveis e oferecidos tanto pela COPAIM como pela ASSIMA.
A ASSIMA, em anos anteriores, já havia administrado campos de produção coletivos. Na atualidade essa tarefa passou a
ser exclusivamente da COPAIM, tendo a ASSIMA (na atualidade com 400 sócios) concentrado suas atividades para o
que considera a área social, entre as quais a rádio comunitária, transporte de pessoas, bodega, escolas, etc.
Quem primeiro obteve financiamento do FNE foi a ASSIMA. Nessa oportunidade adquiriu um trator e um caminhão,
implantou 150 hectares de coqueirais e comprou 162 cabeças de gado bovino. A COPAIM obteve um segundo
financiamento do FNE (dos dois liberados para esse assentamento) e implantou mais 200 hectares de coqueirais, 100 has
de cajueiro anão precoce, uma fábrica de doces, estábulo e curral e adquiriu outro caminhão. Havia recursos para
implantar uma fábrica de gelo (para as atividades pesqueiras) mas esse empreendimento não se realizou.
Os dois caminhões adquiridos foram assim destinados: o caminhão da cooperativa para o transporte de mercadorias e
aquela da ASSIMA para o transporte de pessoas. O trator adquirido pela ASSIMA é alugado pela cooperativa, sendo que
todas as atividades de produção financiadas pela ASSIMA são administradas pela cooperativa. Todavia, não foi
transferido da ASSIMA para a cooperativa o ônus perante o banco dos empréstimos dos recursos provenientes do FNE.
As principais atividades produtivas agrícolas coletivas são as culturas de coqueiros, cajueiros e de mandioca. Esta última
cultura citada, ainda que seja considerada como não lucrativa, teria o papel de aglutinação social, segundo alguns
dirigentes da COPAIM. A criação do gado e a manutenção das pastagens dá-se, também, de maneira coletiva. Para gerir
as áreas ou campos coletivos de produção e os de criação a COPAIM constituiu duas comissões: a de agricultura e a de
pecuária.
Ainda que das 11 comunidades existentes no assentamento 4 sejam caracterizadas como de pescadores, que também
plantam e criam nas suas áreas de terra de uso privado, a COPAIM não intervém na comercialização do pescado nem no
fornecimento de insumos para a pesca. Daí decorre o esforço dos pescadores para constituírem a sua associação
corporativa (unir os pescadores e obter recursos financeiros, segundo os depoimentos).
Da mesma forma acima, a COPAIM não encontrou possibilidades de comercialização dos produtos artesanais das
rendeiras, ainda que existam vários grupos de artesãs nas diversas comunidades desde 1980, somando um total estimado
de 300 rendeiras. Na atualidade, a ARIMA - Associação das Rendeiras do Imóvel Maceió, criada em 1997, com 148
associados, é quem assume a tarefa de obter financiamentos e comercializar o produto do trabalho das rendeiras a ela
associadas. As demais rendeiras vendem individualmente seus produtos para os atravessadores que lhes fornecem a
matéria prima.
Em síntese, a COPAIM teve dificuldades de entrar no mercado seja para a colocação dos produtos do assentamento seja
para a aquisição dos insumos utilizados na produção..
Nos últimos 3 a 4 anos a COPAIM teve dificuldade na gestão dos recursos, seja pelos prejuízos causados pela seca (em
1997 ocorreu inverno seco no litoral), pela crise no preço do coco (houve importação nacional de farinha de coco), pela
incipiente produção (hoje paralisada) da fábrica de doces (castanha do caju, sucos e doces de frutas) existente no
assentamento ou, mesmo, pela má alocação econômica dos recursos obtidos dos financiamentos. Isso significou (a) que
as atividades coletivas geridas pela COPAIM não produziram rendimentos suficientes que proporcionasse as
possibilidades da redistribuição financeira esperada pelos participantes do coletivo de produção. Esta circunstância vem
contribuindo para o desestímulo da prática do coletivo de produção e propiciando a emergência de novas formas de
cooperação como a associação das rendeiras, dos pescadores e os grupos de interesses.
Os grupos de interesses emergem das comunidades seja para equacionar a problemática existente da falta de opção de
trabalho para os jovens (daí os grupos de jovens desenvolvendo pomar e hortas) como para atender e sistematizar
trabalhos artesanais efetuados pelas mulheres (como a renda, a produção de doces, etc.) através dos grupos de mulheres.
Indiretamente, esses grupos de interesse são estimulados pelo Programa do Governo do Estado denominado São José
(parte da fonte dos recursos é do Banco Mundial). Além desse Programa há inúmeros atores sociais, governamentais e
não governamentais que atuam direta e indiretamente no Assentamento Maceió estimulando diversas iniciativas isoladas
umas das outras e com o assentimento tanto da COPAIM como da ASSIMA, tais como aquelas promovidas pela
entidades EPACE, EMATER, SENAR, SETRA, Fundação CEPEMA, CEART, Projeto Lumiar, INCRA, GESPAR e
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BNB.
Essa pluralidade de entidades externas afeta o processo decisório do trabalhado rural, o qual sente perplexo perante as
inúmeras ofertas, muitas delas díspares entre si. A ausência de mediações institucionais dos trabalhadores rurais capazes
de sistematizarem e debaterem coletivamente as proposições externas permite que o oportunismo floresça, tanto pelo
lado das entidades externas como dos grupos e associações internas.
No Assentamento Maceió não mais se exercita o mutirão. O coletivo de produção carece de emulação para a coesão
social. Nesse contexto, a comunidade tradicional torna-se a alternativa para o exercício da solidariedade e da cooperação
social. A suposta unidade Assentamento Maceió vai, então, sendo gradativamente dissolvida.
Caso 5 - A coesão social do povoado e o associativismo burocrático
Assentamento Entrocamento
(Município de Itapecurú Mirim,
Estado do Maranhão)
Preâmbulo
O Assentamento Entroncamento, implantado oficialmente em 1991, possui 312 famílias. Esse projeto oficial de
assentamento é uma evidência de que a maioria das populações que viviam e permaneceram em áreas que foram
transformadas oficialmente em projetos de reforma agrária mantém suas formas de cooperação e solidariedade social e
de organização da produção similares as que exercitavam tradicionalmente. Ainda que tenham incorporado novas formas
associativas, como a associação de produtores rurais, estas acomodaram-se à configuração territorial e social das
comunidades preexistentes.
Sem dúvida alguma que as associações legalmente constituídas com estímulo dos organismos governamentais, em
particular do INCRA, permitiram a essas comunidades rurais o acesso ao crédito e, indiretamente, a melhoria das suas
condições materiais de vida. Essas associações, contudo, ainda que tenham servido como mediadoras para a implantação
de projetos produtivos foram absorvidas pela organização social dos povoados e socialmente ajustadas para o exercício
dos seus interesses econômicos, sociais e culturais.
Características do Assentamento Entroncamento
O Assentamento Entroncamento abrange uma área de 1612 hectares e tem a presença de 312 famílias de trabalhadores
rurais. Foi implantado oficialmente em 1991. O traço relevante desse assentamento é que uma parte das famílias de
trabalhadores rurais (menos da metade) ali vivendo são remanescentes de quilombos, sendo que seus ascendentes
familiares, na sua maioria, já viviam naquela área há mais de 100 anos, e sempre socialmente organizados em povoados
(por vezes autodenominado de comunidade).
O povoado original que deu nome à localidade e ao assentamento, denominado Povoado Entroncamento, se há mais de
um século era um pequeno povoado (não mais de 50 famílias), contemporaneamente tem seu crescimento aumentado
pelo fato de situar-se no entroncamento entre duas rodovias nacionais, a BR 135 e a BR 222. Esse povoado, em
particular, não se caracteriza como remanescente de quilombo.
O assentamento possui 8 povoados. Alguns desses povoados podem ser considerados remanescentes de quilombos. A
partir de 1991, em momentos distintos, foi criada uma associação de produtores rurais para cada povoado. Em 1992 foi
constituído o Conselho de Administração do assentamento, sendo que cada associação existente indicou três
representantes para compor tal Conselho. A importância desse Conselho reside na gestão daquelas atividades que são de
interesse de todas as associações do assentamento como, por exemplo, um engenho de cana e um alambique para a
produção de aguardente e um caminhão. Este fica à disposição de cada comunidade 3 dias ao mês, com o objetivo de
carregar a cana de açúcar para o engenho, entre outros serviços de interesse das famílias dos povoados.
O uso da terra pelas famílias faz-se sob as formas comunitária e a individual. No povoado da Felipe, este remanescente
de quilombos, a terra é integralmente comunitária
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As relações das associações com o mercado são bastante precárias. Na maioria das vezes os produtores não conseguem
comercializar a produção que foi originária de projetos financiados. Em função dessa circunstância estão em fase de
constituir uma cooperativa para atender às necessidades de comercialização dos produtos e insumos de todo o
assentamento.
Nas entrevistas com os trabalhadores rurais desses povoados, em particular do povoado Felipa, durante uma reunião da
Associação das Comunidades Negras Quilombolas do Maranhão, na cidade de Itapecurú Mirim, pode-se perceber a forte
identidade e coesão social que os trabalhadores rurais mantém entre si, caracterizando-se como uma comunidade. Na
maioria das conversações, além das questões pertinentes ao processo associativista e da produção, ressaltava-se a ênfase
nas atividades culturais tradicionais particularmente relacionadas com as práticas religiosas e as festividades. Como
exemplo de caso das práticas sociais desses povoados comenta-se a seguir o relato de uma trabalhadora rural, membro da
diretoria da associação do seu povoado.
As terras do atual povoado da Felipa, hoje um dos povoados do Assentamento Entrocamento, eram, segundo as
declarações de dna. Nilza Nascimento dos Santos, 57 anos, originalmente de posse ("terra voluntária") de uma família
(ascendentes de dna. Nilza) e estimava-se em 555,32 há. Há 50 anos atrás tentaram legalizar essas terras mas por
questões de litígio entre particulares e de dificuldades de relação com as instituições públicas isso não foi efetivado.
Estimou-se que os ascendentes dos supostos antigos posseiros (anterior à desapropriação para implantar o assentamento)
dessas terras aí vivem há mais de 200 anos.
No povoado da Felipa viviam, antes da desapropriação, aproximadamente 45 famílias, todas elas ligadas entre si por
laços de consangüinidade. A agricultura praticada, seja nesse povoado como nos demais do Assentamento
Entroncamento, era e é a roça de toco, cultivando-se nela arroz, mandioca, milho, feijão, fruteiras e hortaliças com
plantios e colheitas individuais, ainda que as terras (como até hoje) eram de uso comunitário, destinadas à segurança
alimentar das famílias. A partir de 1991, com o acesso ao crédito rural, foram introduzidas novas cultivos e criações,
assim como a mecanização nessas cultivos financiados. As famílias desses povoados sempre mantiveram relações com o
mercado, seja para a venda dos produtos das suas roças seja para a aquisição de bens industrializados.
Nas atividades que exigiam maior participação de força de trabalho havia a prática do mutirão e, em determinadas
circunstâncias, a troca de dias de serviço. Essas formas de cooperação, mutirão e trocas de dias de serviço, eram
consideradas, e ainda o são, como atividades auto-identificadas de solidariedade entre as famílias, moral e
economicamente aceitas como indispensáveis: é uma solidariedade impregnada por valores religiosos e por relações de
consangüinidade (em outros casos por relações de compadrio e de vizinhança), ainda que determinada basicamente pela
necessidade de força de trabalho para dar conta de atividades que a família singular teria imensas dificuldades de realizar
nos prazos determinados pelo ciclo das culturas e ou das criações.
Como as práticas agrícolas e de criatório reproduziam as técnicas tradicionais, sem inovações tecnológicas e com débil
relação com o mercado, inclusive o financeiro, as reuniões no povoado, segundo o depoimento, eram só de cunho
religioso.
Anos após a implantação do Assentamento Entroncamento foi fundada, por indução do INCRA e de organismos do
governo estadual, a Associação São Sebastião dos Produtores Rurais do Povoado da Felipe, inicialmente com 25 famílias
e na atualidade com 31. Todavia, desde 1986, em todos os povoados as pessoas já formavam grupos de discussão,
inclusive por estímulo de diferentes ONGs, da Igreja Católica, via CEBs, do Centro de Cultura Negra, de políticos e de
partidos tradicionais.
A área total do projeto de assentamento não foi parcelada conforme os procedimentos usuais do INCRA, pois cada um
dos povoados apresentava uma situação especial própria, com situação organizacional e fundiária distintas umas das
outras. O povoado da Felipa, por exemplo, continua como área comunitária. Nesse povoado, por exemplo, após a
obtenção de recursos financeiros para projetos de custeio, de investimento (em geral foram financiados de 1 a 2 projetos
por povoado) e de moradia, este via o programa Comunidade Viva, manteve-se as práticas de área de pasto coletivo, a
compra em comum do gado e das sementes de capim, assim como a manutenção comunitária do gado até que este fosse
pago. Depois, o rebanho, ainda que no pasto comunitário, era dividido entre as famílias que o tinham adquirido
coletivamente.
A associação do povoado Felipa conseguiu, até o momento, três projetos:
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Banana e cana de açúcar;
Banana, cana de açúcar e abacaxi, e
Pecuária bovina.
Com a implantação desses projetos, conforme os depoimentos, as condições materiais de vida melhoram, ainda que
tiveram dificuldades para comercializar os produtos: antes do projeto "não podiam comprar nada, hoje já compram
radiola, TV, etc. " (Dna. Nilza)
A identidade comunitária é afirmada não apenas pelas relações de parentesco (caso do povoado Felipa) e de vizinhança
mas, sobretudo pela integração inter-familiar devida às reuniões e comemorações religiosas e festivas. São práticas
usuais comunitárias, religiosas e profanas, e bastante imbricadas entre si, as missas, rezas, ladainhas, festa de São
Benedito, festa do Divino, festa de São Sebastião, o tambor de criola e a dança do coco.
No povoado da Felipe não há escola, posto de saúde e nem infraestrutura econômica.
Nos povoados do Assentamento Entroncamento sempre houve a presença da delegacia sindical. Os entrevistados
consideraram que a fundação das associações enfraqueceu a presença do sindicato no assentamento, inclusive porque as
pessoas tem que contribuir para a associação.
A partir da possibilidade de obtenção de recursos financeiros, segundo os depoimentos, ampliou muito a presença de
várias organizações governamentais e de empresas privadas, tentando mediar as negociações dos projetos, por ser a área
do assentamento próxima a centro urbano e de fácil acesso.
Conclusão
A compreensão das formas de associativismo econômico vivenciadas pelos trabalhadores rurais nas áreas oficiais de
reforma agrária no Brasil exigiria um esforço muito mais amplo do que o encetado para este estudo. Mas, sobre isso
havia consciência crítica. Não havia, contudo, consciência da amplitude e da complexidade das formas associativas
existentes.
O surpreendente foi a sabedoria com que os trabalhadores rurais das áreas oficiais de reforma agrária foram capazes de
usufruir das formas de associativismo a eles impostas. Cada grupo social as absorveu diferenciadamente e as utilizou do
seu jeito como as mediadoras exigidas legalmente para a interlocução com o Estado e os diversos circuitos do mercado.
Como as diferenças históricas étnicas, raciais, sociais, culturais, políticas e econômicas entre os grupos sociais de
trabalhadores rurais foi oficialmente abolida no discurso governamental, e mesmo de muitas organizações não
governamentais, diferenças essas aplainadas pela atribuição de uma única identidade social representada pela expressão
assentado, não foi difícil conceber-se e adotar-se um modelo único de associativismo para todos os trabalhadores rurais
das áreas oficiais de reforma agrária no Brasil.
Há um pressuposto democrático na constituição de qualquer forma de associativismo: a participação. Se
compreendermos a participação, como o faz Demo (1996;18), como conquista e, portanto, como um processo, um
constante vir-a-ser, as associações daí resultantes, enquanto momentos formais na dinâmica da cooperação entre as
pessoas, famílias e ou grupos sociais, podem ser consideradas como passagem para outras formas distintas que a
cooperação possa assumir. Isso não significa que se deva aceitar a participação constrangida. Mas, mesmo nesses casos,
nos quais constatou-se serem o lugar comum, houve relativa capacidade dos trabalhadores rurais de superarem essa
tendência histórica à dominação.
Pode-se constatar que as imposições de um modelo unificado de associativismo esteve ligado diretamente à questão do
crédito rural ou do acesso aos programas especiais de desenvolvimento rural dos governos. Daí a associação
instrumental. Este é um tipo de associativismo, produto do autoritarismo. Deveras, pouco tem a ver com a afirmação de
identidades sociais.
Talvez tenha sido esse um dos motivos porque a imposição dessas associações ocorreu de maneira tão corriqueira: tais
associações foram e são consideradas pelos trabalhadores rurais como meros instrumentos efêmeros, sem dúvida alguma,
com seu custo social.
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Seria prudente que os atores sociais, particularmente os organismos governamentais, não confundissem a exigência de
personalidade jurídica de uma sociedade e ou associação civil, tendo em vista as suas relações formais para a obtenção e
o uso de recursos públicos e ou privados, ou para inserir-se nos circuitos do mercado, com a forma como deveria
desenvolver-se o associativismo entre pessoas, famílias ou grupos sociais.
Seria muito importante para os trabalhadores rurais que as suas próprias associações, cooperativas, grupos coletivos e
semi-coletivos, entre tantas as formas de associativismo, passassem a ser, como referiu-se Gadotti (1995; 22) à educação,
o lugar da denúncia do próprio associativismo e das formas como se dá nele a participação.
Participação é disputa de poder. O associativismo foi aqui estudado como mediação para potencializar a participação dos
trabalhadores rurais das áreas oficiais de reforma agrária nas relações com o Estado, o mercado e a sociedade civil. E,
nas relações dos trabalhadores rurais entre si.
O estudo do associativismo deveria aprofundar-se em outras instâncias como aquelas do processo de participação nas
associações, do papel do associativismo na afirmação das identidades e da coesão sociais de diversos grupos sociais, nos
mecanismos da auto-representação e, com isso e muito mais, desvendar como o poder é tramado.
Deste estudo poder-se concluir que é desaconselhável a elaboração, e mais ainda a adoção, de modelos de associativismo
para os trabalhadores rurais de áreas oficiais de reforma agrária. A diversidade e complexidade das formas de
associativismo existentes não autoriza a sua simplificação ou a sua redução a modelos.
Literatura citada
Almeida, Alfredo W. B. (s.d.) Universalização e localismo. Movimentos sociais e crise dos padrões
tradicionais de relação política na Amazônia. Mimeo, 17 p.
Candido, Antonio (1964). Os parceiros do Rio Bonito. Estudo sobre o caipira paulista e a transformação
dos seus meios de vida. Rio de Janeiro, José Olympio Editora.
Carvalho, Horacio M. 1994. A participação e a organização consensuadas como uma das dimensões da
cidadania. Brasília, Projeto Áridas, GT VII - Integração com a sociedade. SEPLAN - PR.
________________ (1998). Estudo exploratório sobre a realidade sócio-cultural dos trabalhadores rurais
nos assentamentos de reforma agrária no Estado do Ceará. Curitiba, IICA/MEPF, mimeo 10 pp
CONCRAB (1997). Sistema Cooperativista dos Assentados. São Paulo, Caderno de Cooperação nº 5.
Demo, Pedro (1996). Participação é conquista. São Paulo, Cortez, 3ª edição
Gadotti, Moacir (1995). Pedagogia da práxis. São Paulo, Cortez; Instituto Paulo Freire.
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