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Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural
de Santa Catarina/Epagri
Centro de Pesquisa para Pequenas Propriedades
CPPP/Epagri
Ministério do Desenvolvimento Agrário
MDA
Secretaria da Agricultura Familiar
SAF
Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural
NEAD
2001
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MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO
Raul Belens Jungmann Pinto
Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário
José Abrão
Secretário-Executivo
Francisco Orlando Costa Muniz
Secretário Nacional de Reforma Agrária
Gilson Alceu Bittencourt
Secretário de Agricultura Familiar
Sebastião Azevedo
Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
José Eli da Veiga
Secretário do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável
Juarez Rubens Brandão Lopes
Coordenador-Geral do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural
Edson Teófilo
Coordenador-Executivo do
Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural
GOVERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Esperidião Amin Helou Filho
Governador do Estado de Santa Catarina
Odacir Zonta
Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e da Agricultura
Dionísio Bressan Lemos
Presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e
Extensão Rural de Santa Catarina/Epagri
Celso Antônio Dal Piva
Gerente Regional da Epagri de Chapecó
Nelson Cortina
Chefe do CPPP/Epagri de Chapecó
Milton Luiz Silvestro
Ricardo Abramovay
Márcio Antonio de Mello
Clovis Dorigon
Ivan Tadeu Baldissera
Coordenador
Ricardo Abramovay
Prefácio de
José de Souza Martins
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Edição
Intertexto – Gestão da Informação, Estudos e Projetos
SCS · Quadra 6 · Bloco “A
Edifício Presidente · salas 305/307/309
Tel.: (61) 321-3363
Fax.: (61) 223-5702
www.intelecto.net
Ficha Catalográfica
Silvestro, Milton Luiz et alii.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura
familiar / Milton Luiz Silvestro et alii, Florianópolis : Epagri;
Brasília : Nead / Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2001
120 p.
1. Agricultura. 2. Agricultura Familiar. 3. Juventude Rural I.
Silvestro, Milton Luiz. II. Abramovay, Ricardo. III. Mello, Márcio
Antonio. IV. Dorigon, Clovis. V. Baldissera, Ivan Tadeu. VI. Título.
CDU 630
631
Prefácio
E
ngolida pela peleja político-partidária que a
distorce, a questão agrária no Brasil tem vários
dos seus aspectos fundamentais e mais dramá-
ticos relegados a um plano secundário e, não raro,
completamente ignorados. Hoje, no debate político
mais aceso e mais visível, estamos muito mais em face
de impugnadores da política agrária do que de defen-
sores da reforma agrária e de políticas sociais que
abram ou consolidem uma alternativa de vida e alter-
nativa histórica para as populações que associam seu
destino tanto ao mundo agrícola quanto ao mundo
rural que com ele não se confunde necessariamente.
Os autores e agentes de políticas públicas, no en-
tanto, se defrontam com aspectos dos problemas so-
ciais que não se reduzem aos termos do código fácil
das soluções tagarelas e de bolso. São problemas com-
plicados, mas que podem ser decididos até com facili-
5
6
dade por meio de vontade política, com base na infor-
mação sociológica e econômica fundamentada, no co-
nhecimento objetivo da natureza dos problemas e di-
ficuldades, da concepção que deles tem quem por eles
é vitimado e das alternativas que sua realidade, suas
possibilidades e sua visão de mundo abrem para ado-
ção de políticas apropriadas e conseqüentes.
Esta monografia responde a essa necessidade de
informação e compreensão de um dos problemas mais
desdenhados da circunstância social das populações
do campo: os impasses sociais da sucessão hereditá-
ria na agricultura familiar. Esse problema constitui uma
das conseqüências da dinâmica fundiária
concentracionista do nosso sistema fundiário, que
pede uma política continuada, corajosa e persistente
de correção e revisão.
Se, de um lado, a agricultura familiar é uma realida-
de nas várias regiões do país, mais expressiva aqui,
menos expressiva ali, o regime de propriedade consti-
tuído historicamente a partir da valorização do latifún-
dio conspira todo o tempo para privar de terras e de
meios a família rural e seu mundo.
Desde a inauguração do regime de propriedade da
terra que tem vigência entre nós, em 1850, tem o Esta-
do procurado assegurar que, paralelamente ao que
então se chamava de grande lavoura, houvesse tam-
bém espaço para a pequena agricultura comercial das
famílias que quisessem e pudessem trabalhar por conta
própria. Mas, a centralidade da grande lavoura, da gran-
de propriedade durante muito tempo voltada para a
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
7
agricultura de exportação, dominou o sistema econô-
mico e o próprio sistema político, transformando a agri-
cultura familiar numa economia residual condenada a
gravitar em torno dos seus interesses.
Apenas nos últimos anos a agricultura familiar vem
se tornando de fato protagonista de políticas públi-
cas, de interesse social e econômico e, mesmo, de al-
ternativa a uma economia que, aceleradamente em
modernização, exclui parcelas importantes da popu-
lação, que se tornaram retardatárias da História e do
desenvolvimento econômico e social. Esse
protagonismo resulta em parte dos movimentos soci-
ais rurais e da ação das organizações partidárias que
os engolfaram em seus projetos políticos. Menos por-
que a agricultura familiar esteja de fato no centro des-
ses projetos, pois esses grupos, nem sempre de ma-
neira clara, tem se orientado mais em favor de pro-
postas de coletivização da agricultura inspiradas em
experiências de reconhecido anacronismo. E mais por-
que a combatividade que se desenvolveu em torno da
questão da propriedade fundiária tem levado outros
setores da sociedade e o próprio Estado a se impor a
urgência de ajustar o mundo rural ao mundo moderno
e a desenvolver políticas que assegurem um lugar
participativo e economicamente inovador aos rema-
nescentes das populações que não foram engolidas
pelo desenvolvimento urbano e industrial.
A compreensão das condições dessa alternativa
deve muito à pesquisa científica que se desenvolve
nas universidades e nas instituições especializadas.
8
Este trabalho é um dos excelentes resultados desse
labor paciente de indagação, verificação e compre-
ensão dos impasses próprios da situação a que me
refiro. Seus autores fizeram uma pesquisa sociológi-
ca, cujos resultados aqui apresentam, numa das regi-
ões mais características das tradições da agricultura
familiar, o oeste de Santa Catarina, mesmo assim uma
região de crise social.
Seu trabalho apresenta resultados esclarecedores a
respeito do que se poderia chamar de destino das novas
gerações no mundo rural e o próprio destino da agricul-
tura familiar. De um lado, mais de dez por cento das fa-
mílias hoje dedicadas a essa agricultura não tem suces-
sores. Os filhos foram embora, optaram por viver e tra-
balhar na cidade e em outras regiões. Para a sociedade é
um problema que essas terras não venham a reentrar no
circuito de reprodução da mesma agricultura familiar e
que, por meio do mercado, acabem sendo incorporadas
pela grande propriedade e/ou dedicada à pecuária ex-
tensiva, que reduz o número de empregos e o efeito eco-
nomicamente multiplicador do trabalho.
De outro lado, os jovens que estão sendo descarta-
dos por essas transformações são os que tendem a
estar em níveis inferiores de educação escolar, conde-
nados, de certo, modo, à participação em oportunida-
des de trabalho precárias fora do mundo que os edu-
cou. Não obstante, são dotados de um saber, aprendi-
do ao longo da vida, desde a infância, como é próprio
do campo, que faz deles profissionais altamente qua-
lificados para a agricultura familiar.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
9
Portanto, a migração representa nesses casos a des-
truição de um capital social que poderia ser vital para a
reinserção das novas gerações nesse modelo de econo-
mia e em condições de vida potencialmente superiores às
que encontrariam nos lugares para onde migrassem. Com-
parando pais e filhos com melhores rendimentos e pais e
filhos com menores rendimentos, fica evidente que no
primeiro caso a alternativa de ficar é sua opção e opção
viável. No segundo caso, ficar dependeria de providências
políticas que assegurassem terra e crédito. Em todos os
casos, mostram os autores, a providência seria a de aper-
feiçoar e expandir políticas públicas que de alguma forma
garantissem o acesso à terra na extensão e na qualidade
apropriadas e assegurassem os recursos apropriados à
habitação e à produção.
Os autores deste trabalho dão uma contribuição de
grande importância não só para a adoção, expansão e
aperfeiçoamento de políticas públicas apropriadas à
melhora das condições de vida no meio rural e, portan-
to, para incremento de um efetivo programa de desen-
volvimento social no campo. Eles também nos ofere-
cem um trabalho essencial à modificação da perspecti-
va que marca os interesses dos acadêmicos e a ação
dos técnicos e educadores em relação ao campo. Eles
nos ensinam que na roça há uma possibilidade de des-
tino e de inserção ativa e participativa no mundo mo-
derno para as novas gerações.
José de Souza Martins
Universidade de São Paulo
Lista de Tabelas
Lista de Figuras
Agradecimentos
1. Apresentação
De Santa Catarina para o Boi de Prata
A região oeste catarinense
Capitalizados, em Transição e Descapitalizados
2. As expectativas profissionais dos jovens
2.1. Opção ou fatalidade?
2.2. Alguns determinantes da escolha profissional
a) A importância da educação
b) Influência familiar e diferenciação social
c) Pobreza e estreitamento das relações sociais
A moradia de uma família de agricultores descapitalizados
3. Preparando a sucessão
3.1. Quem fica?
3.2. A compensação dos outros herdeiros
3.3. O momento da transferência: o fim do padre padrone
3.4. O viés de gênero nos processos sucessórios
3.5. O interesse pela terra
3.6. Sucessão e renda não-agrícola
13
15
17
19
24
32
35
41
41
48
48
56
59
61
63
64
68
70
83
88
94
Sumário
Conclusões
Proposição de Políticas
a) Reordenamento fundiário
b) Educação e formação profissional
c) Capacitação profissional
d) Programa de moradia no meio rural
e) Criação de novas oportunidades de renda
Referências Bibliográficas
103
107
108
109
112
113
114
117
Lista de Tabelas
Tabela 1 - Futuro profissional “desejado” pelos rapazes (%) 42
Tabela 2 - Opinião dos rapazes quanto ao seu provável
futuro profissional (%) 42
Tabela 3 - Futuro profissional desejado pelas moças (%) 43
Tabela 4 - Opinião das moças quanto ao seu provável
futuro profissional (%) 43
Tabela 5 - Opinião dos rapazes quanto ao seu futuro
como agricultor (%) 44
Tabela 6 - Questão dirigida aos rapazes: Considerando o seu
grau de instrução onde você acha que tem as melhores
oportunidades (%) 46
Tabela 7- Questão dirigida às moças: Considerando o seu
grau de instrução onde você acha que tem as melhores
oportunidades (%) 47
Tabela 8 - Grau de instrução dos filhos de agricultores
familiares com idade entre 7 e 29 anos nos municípios
pesquisados - em valores absolutos 50
Tabela 9 - Nível de escolaridade dos jovens ao sair da
propriedade paterna segundo o local de destino (%) 51
Tabela 10 - Nível educacional dos jovens que saíram da
propriedade paterna e permaneceram no meio rural (%) 52
Tabela 11 - Nível educacional dos jovens ao deixar a
propriedade paterna em direção à cidade (%) 53
Tabela 12 - Objetivo principal que determinou a saída
dos jovens para o meio urbano (%) 53
Tabela 13 - Nível educacional e idade média dos jovens
entrevistados 55
Tabela 14 - Opinião dos rapazes quanto ao nível mínimo de
instrução para desempenhar a profissão de agricultor (%) 55
Tabela 15 - Questão dirigida aos pais: Você estimula seus(suas)
filhos(as) a serem agricultores(as) (%) 57
Tabela 16 - Em que condições os rapazes aceitariam ser
agricultor fora da região oeste de Santa Catarina (%) 58
Tabela 17 - Quem ficará na propriedade na opinião
dos pais, filhos e filhas (%) 65
Tabela 18 - Quem foi ou será escolhido como sucessor da
propriedade na opinião dos pais, filhos e filhas (%) 66
Tabela 19 - Quem participou da escolha do sucessor na
opinião dos pais, filhos e filhas (%) 67
Tabela 20 - Questão dirigida aos rapazes: Quando somente
um filho herdar a propriedade como será feita a
compensação aos demais irmãos (%) 68
Tabela 21 - Questão dirigida às moças: Quando somente
um filho herdar a propriedade como será feita a
compensação aos demais irmãos (%) 69
Tabela 22 - Questão dirigida aos pais: Em que momento será
feita a transferência do controle da propriedade (%) 70
Tabela 23 - Questão dirigida aos rapazes: Na sua opinião
em que momento deve ser feita a transferência do
controle da propriedade (%) 71
Tabela 24 - Questão dirigida às moças: Na sua opinião em
que momento deve ser feita a transferência do controle
da propriedade (%) 73
Tabela 25 - Questão dirigida aos rapazes: Diante de uma nova
idéia que você faça para a organização da propriedade, qual a
reação dos seus pais (%) 74
Tabela 26 - Questão dirigida às moças: Diante de uma
nova idéia que você faça para a organização da propriedade,
qual a reação dos seus pais (%) 74
Tabela 27 - Questão dirigida aos rapazes: Você está de acordo
com os últimos investimentos realizados na propriedade (%) 76
Tabela 28 - Questão dirigida às moças: Você está de acordo
com os últimos investimentos realizados na propriedade (%) 76
Tabela 29 - Nível de participação dos rapazes nas decisões da
propriedade (%) 77
Tabela 30 - Nível de participação das moças nas decisões da
propriedade (%) 78
Tabela 31 - Questão dirigida aos pais: Como é a divisão e o
gerenciamento do trabalho na unidade familiar (%) 79
Tabela 32 - Questão dirigida às moças: Você desenvolve
atividades individuais para obter seu próprio dinheiro (%) 80
Tabela 33 - Questão dirigida aos rapazes: Você desenvolve
atividades individuais para obter seu próprio dinheiro (%) 80
Tabela 34 - Questão dirigida aos rapazes: Qual o principal
motivo para você buscar seu próprio dinheiro (%) 81
Tabela 35 - Questão dirigida às moças: Qual o principal
motivo para você buscar seu próprio dinheiro (%) 82
Tabela 36 - Opinião dos pais quanto à possibilidade das
filhas serem as sucessoras (%) 84
Tabela 37 - Opinião das moças quanto à possibilidade delas
serem sucessoras (%) 84
Tabela 38 - Atribuições das moças na propriedade (%) 85
Tabela 39 - Questão dirigida aos rapazes: Se você tivesse
recursos disponíveis onde aplicaria primeiro (%) 86
Tabela 40 - Questão dirigida às moças: Se você tivesse
recursos disponíveis onde aplicaria primeiro (%) 86
Tabela 41 - Questão dirigida aos rapazes: Fora de um
programa adequado para instalação de jovens agricultores
você acha que há condições de se viabilizar na agricultura (%) 87
Tabela 42 - Questão dirigida às moças: Fora de um programa
adequado para instalação de jovens agricultores você acha
que há condições de se viabilizar na agricultura (%) 88
Tabela 43 - Questão dirigida aos pais: Vocês teriam interesse
em fazer um financiamento para adquirir uma propriedade e
instalar seus filhos na agricultura (%) 89
Tabela 44 - Questão dirigida aos pais: Vocês teriam interesse
em fazer um financiamento fundiário nas condições do
Banco da Terra (%) 89
Lista de Figuras
Figura 1 - Mapa de Santa Catarina com destaque para a região oeste
catarinense e os municípios onde foi realizada a pesquisa 34
Figura 2 - Vista parcial de uma propriedade capitalizada 37
Figura 3 - Vista parcial de uma propriedade em transição 37
Figura 4 - Vista parcial de uma propriedade descapitalizada 38
Figura 5 - Moradia de uma propriedade descapitalizada 62
Tabela 45 - Questão dirigida aos rapazes: Você tem interesse
em fazer um financiamento fundiário nas condições do
Banco da Terra (%) 90
Tabela 46 - Questão dirigida às filhas: Você tem interesse
em fazer um financiamento para adquirir uma propriedade e
instalar-se como agricultora (%) 91
Tabela 47 - Questão dirigida às filhas: Você tem interesse
em fazer um financiamento fundiário nas condições do
Banco da Terra (%) 91
Tabela 48 - Questão dirigida aos pais: Em relação à terra
para os(as) filhos(as) (%) 92
Tabela 49 - Opinião dos filhos sobre a quantidade e a
qualidade da terra (%) 93
Tabela 50 - Opinião das filhas sobre a quantidade e a
qualidade da terra (%) 94
Tabela 51 - Origem da renda agrícola das propriedades (%) 96
Tabela 52- Questão dirigida aos pais: Qual a participação da
aposentadoria rural na renda total da propriedade (%) 98
Tabela 53 - Questão dirigida aos pais: Quantas pessoas
moram na propriedade e trabalham fora (%) 99
Agradecimentos
A
gradecemos em primeiro lugar, e de forma
especial, aos agricultores e suas famílias onde
realizamos os trabalhos de pesquisa. Embora
muitas vezes o tema de nossa pesquisa, nos tenha
obrigado a invadir sua privacidade, sempre fomos
recebidos de forma amável e gentil. São os agricul-
tores familiares a razão primeira deste trabalho de
pesquisa e de toda a nossa atuação profissional. Es-
peramos que as proposições aqui apresentadas pos-
sam se converter em políticas efetivas em seu apoio
e fortalecimento.
Somos gratos ao colega Edson Siminski, da Epagri
de Concórdia, que de forma prestativa nos forneceu
informações a respeito dos diagnósticos socioeco-
nômicos municipais que foram coordenados pela
Epagri regional de Concórdia. Essas informações fo-
ram fundamentais para que pudéssemos identificar o
17
nosso universo de pesquisa. Agradecemos também a
sua colaboração na análise preliminar dos dados.
Às equipes de extensionistas locais e aos técnicos
das secretarias municipais de agricultura dos dez mu-
nicípios onde realizamos a pesquisa. Muitos deles nos
auxiliaram na aplicação dos questionários juntos às
famílias dos agricultores. Sua solicitude facilitou enor-
memente nosso acesso às propriedades selecionadas
para a pesquisa.
Ao professor Wilson Schmidt, a Gilson Bittencourt e
a Leandro do Prado Wildner pela leitura crítica e contri-
buições ao texto. Lembrando sempre, como é de praxe,
que o conteúdo deste trabalho e seus equívocos rema-
nescente são de inteira responsabilidade dos autores.
Por último, mas não menos importante, agradece-
mos à Epagri e ao Ministério de Desenvolvimento Agrá-
rio – Pronaf pela valorização do tema pesquisado e pelo
apoio financeiro proporcionado.
18
1. Apresentação
I
A
sociedade brasileira não tem sido capaz de
tirar partido de novas oportunidades de aces-
so à terra trazidas por mudanças demográficas
fundamentais em seu meio rural. Embora um pouco
mais tarde e num ritmo menos acelerado que nas ci-
dades, o tamanho das famílias rurais diminuiu de ma-
neira nítida, nos últimos anos. A conseqüência é o apa-
recimento – fundamentalmente nas regiões marcadas
historicamente por maior democratização do acesso
à terra – de um problema típico dos países desenvol-
vidos, em particular das sociedades européias: a cres-
cente quantidade de unidades produtivas cujo desti-
no está comprometido pela falta de sucessores. Che-
ga a, no mínimo, 12% a proporção de estabelecimen-
tos familiares do oeste de Santa Catarina habitados
19
20
por casais com mais de 41 anos de idade e sem o re-
gistro da presença permanente de jovens em seu inte-
rior, segundo pesquisa realizada pela Epagri (1999)
1
em dez municípios da região e na qual se apoiam os
dados do presente trabalho. Isso significa que a conti-
nuidade profissional de 9,2 mil dos 77 mil estabeleci-
mentos familiares da região – considerando que os
dez municípios estudados são bastante representati-
vos - encontra-se ameaçada. Uma vez que além des-
tas unidades sem sucessores, em outras 17% existe ape-
nas um filho (rapaz ou moça) residindo com os pais, a
proporção de 12% de imóveis sem sucessores pode
estar subestimada.
Mas por que razão e em que sentido é possível fa-
lar de um problema sucessório? Sob o ângulo econô-
mico, a ausência de sucessores
2
significa o encontro,
por parte dos filhos que deixaram o negócio familiar,
de oportunidades mais promissoras de geração de ren-
da, na esmagadora maioria dos casos fora do meio
1
Trata-se de um Censo Agropecuário realizado numa parceria entre a Epagri
(Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina) e
o Icepa (Instituto de Planejamento e Economia Agrícola de Santa Catarina),
em 17 municípios do oeste catarinense onde foram levantadas informações
econômicas, sociais e dos sistemas de produção de 15.293 estabelecimentos
agropecuários, sobre cuja base calculou-se a amostra desta pesquisa.
2
Claro que existe a possibilidade de volta para a propriedade de indivíduos
que saíram em busca de outras oportunidades de organização de suas
vidas. Além disso, é possível que, em alguns casos, a migração temporária
tenha sido tomada por ausência permanente do jovem na propriedade.
Somente um estudo mais detalhado das informações do Censo Demográfico
de 2000 permitirá saber qual a importância da migração de retorno especi-
ficamente para o meio rural. Mas as informações de campo não parecem
mostrar que se trate de um fenômeno de grandes proporções, que sirva de
contrapeso para a tendência aqui exposta.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
21
rural. Nada melhor, nestas condições, do que deixar
ao próprio mercado de terras a incumbência de en-
contrar os agentes econômicos capazes de valorizar
os imóveis que estarão disponíveis por força do pró-
prio envelhecimento de seus titulares e pela falta de
candidatos familiares a sua exploração.
De fato, caso houvesse perfeição no mercado de
terras, seria muito difícil justificar que regiões cuja
paisagem social não é dominada pelo latifúndio, fos-
sem objeto de políticas fundiárias. Mas podem ser
apontados ao menos dois importantes limites dos
mecanismos espontâneos de compra e venda de ter-
ra em regiões marcadas historicamente pela força
da agricultura familiar. O primeiro representa um dos
mais importantes resultados da pesquisa aqui leva-
da adiante: nada menos que 69% dos rapazes en-
trevistados – mas uma quantidade bem menor de
moças, somente um terço delas - manifestaram o
desejo de organizar suas vidas profissionais em tor-
no da gestão de uma unidade produtiva
agropecuária. São jovens que adquiriram experiên-
cia de gestão do negócio familiar, que conhecem as
principais técnicas produtivas e os mais importan-
tes canais de obtenção de financiamentos e acesso
aos mercados. O impressionante déficit educacio-
nal que os caracteriza – sobretudo aos rapazes que
já saíram da escola - torna este conjunto de conhe-
cimentos tácitos e não formais um importante ativo
para a geração de renda. A intenção de continuar a
profissão paterna choca-se, entretanto, na maioria
22
dos casos, contra a exigüidade do tamanho da uni-
dade familiar. A dinâmica espontânea dos proces-
sos sucessórios impedirá a realização dos potenci-
ais produtivos embutidos nos conhecimentos de
imensa quantidade de jovens que terão poucas
oportunidades de integração nos mercados de tra-
balho urbano (ver Box I) e que gostariam de se dedi-
car à gestão de um estabelecimento agropecuário.
Em outras palavras, o mercado de terras não será
capaz de juntar as duas pontas da questão sucessória
na agricultura familiar: a oferta de terras por parte
da população em processo de envelhecimento - e
cujos filhos encontraram outras oportunidades de
trabalho fora da unidade produtiva - não é absorvi-
da pela demanda vinda de jovens com desejo e ca-
pacidade de se instalar e permanecer na profissão
paterna. É necessário uma inovação na política
fundiária brasileira que abra o caminho para que mi-
lhares de jovens agricultores possam realizar suas
vocações e desejos profissionais.
O segundo limite do mercado de terras em regiões
de predomínio da agricultura familiar refere-se a uma
externalidade positiva que ele é incapaz de contem-
plar. Imóveis sem sucessores acabam sendo vendidos
a pessoas que incorporam a terra como um dos ativos
de suas carteiras de negócios. Na maioria das vezes,
profissionais liberais adquirem o estabelecimento e
nele desenvolvem criação extensiva de gado de corte.
A geração de riqueza que daí se origina tem como
contrapartida uma dupla destruição: dos equipamen-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
23
3
Escolas, centros comunitários, igrejas, quadras de esporte, salão de
festa, estradas e outros.
tos residenciais e produtivos previamente existentes
na propriedade (casa, chiqueiro etc.) e, sobretudo, de
um conjunto de equipamentos e serviços coletivos
3
que não encontram mais utilização em virtude do es-
vaziamento populacional. A própria paisagem é
descaracterizada neste processo.
O mercado de terras não contabiliza em suas ope-
rações o valor do tecido social, da rede de rela-
ções existentes no meio rural que se extingue quan-
do agricultores familiares são substituídos por uni-
dades pertencentes a proprietários que ali não re-
sidem. Os estudos mais importantes na área de so-
ciologia e economia das instituições nos últimos
dez anos vêm mostrando que os vínculos de proxi-
midade e as relações de confiança por eles gera-
dos podem tornar-se fonte decisiva de desenvolvi-
mento (Abramovay, 2000). É exatamente isso que
se perde quando se assiste de maneira passiva ao
esvaziamento demográfico, econômico, cultural e
político das regiões de predomínio da agricultura
familiar. Em algumas regiões, sobretudo na Euro-
pa, a preocupação com o esvaziamento de algu-
mas áreas rurais tem ensejado esforços no sentido
de atrair empresas e famílias jovens com o objeti-
vo de diminuir e reverter o envelhecimento da po-
pulação autóctone (Dirven, 2000, Farinelli, 2001).
24
(Box 1) De Santa Catarina para o Boi de
Prata
É do oeste de Santa Catarina que se origina
uma considerável quantidade de jovens trabalhando
hoje em redes de churrascarias e lanchonetes nos
estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. Trata-se de
migração altamente organizada: somente as duas
maiores agências voltadas a esta atividade, localiza-
das em São Miguel do Oeste e Guaraciaba, coloca-
ram nada menos que 700 jovens, na sua grande mai-
oria rapazes, em São Paulo e no Rio de Janeiro duran-
te o ano 2000. Mas as perspectivas deste tipo de mi-
gração parecem hoje menos promissoras do que já
foram, segundo entrevistas com os responsáveis por
estas agências. Os salários reduziram-se e as condi-
ções de trabalho e moradia para os jovens que che-
gam aos grandes centros tornaram-se especialmen-
te precárias. As agências locais informam que hoje
respondem menos a uma demanda – claramente
declinante – vinda das regiões metropolitanas que à
colocação de moças como empregadas domésticas
no próprio oeste de Santa Catarina. As informações
agregadas sobre o padrão recente de crescimento da
ocupação corroboram a idéia de precariedade e inse-
gurança, cuja influência na decisão migratória é deci-
siva: dos 936 mil novos postos de trabalho gerados
entre agosto de 1999 e agosto de 2000, apenas 18,4%
correspondem a empregos com carteira assinada,
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
25
segundo informação do Ministério do Trabalho e do
Ipea. A proporção de autônomos é de 16,8% e a de
empregadores de 3,4% (Cavalcanti, 2000). Ao menos
dois terços destas ocupações caracterizam-se por
informalidade, o que, sobretudo para jovens migrantes
recém-chegados, significa, com freqüência, condições
degradantes de vida.
II
Não existe atividade econômica onde as relações
familiares tenham tanta importância como na agricul-
tura. Em primeiro lugar, a esmagadora maioria dos
agricultores contemporâneos continuam a atividade
paterna, o que não ocorre em nenhuma outra profis-
são. Nos Estados Unidos e no Canadá é cinco vezes
mais provável que um negócio agrícola passe de uma
geração a outra do que um negócio não agrícola (Taylor
et alii 1998:553). Na França, em 1953, originavam-se
no meio rural 85% dos agricultores; em 1985, este era
ainda o caso de 90% deles (Champagne, 1986). Na Grã-
Bretanha, 80% dos agricultores em tempo integral pros-
seguem na atividade de seus ancestrais (Gasson &
Errington, 1993:184).
Além disso, nos países capitalistas centrais, não só
o patrimônio, mas também a gestão e a maior parte
do trabalho agropecuário vêm fundamentalmente da
26
família. Em grande parte dos países europeus é bem
mais freqüente que um assalariado agrícola trabalhe
em diversas unidades produtivas que a situação em
que um estabelecimento reúna uma quantidade apre-
ciável de assalariados. A organização da agricultura
contemporânea fere duas importantes premissas con-
sideradas por Max Weber (1905/1999:8) como essenci-
ais à formação do capitalismo. Em primeiro lugar, a
maior parte da agricultura contemporânea não se apóia
na separação entre negócio e família. Além disso, o
local de residência, na maior parte das vezes, se con-
funde com o local de trabalho. Em que pese a estrutu-
ra bimodal da agricultura brasileira, hoje já é reconhe-
cida a importância social, econômica e territorial das
unidades de produção familiar.
Existe não só considerável literatura, mas um vasto
arsenal de aconselhamentos quanto aos processos
sucessórios em empresas familiares dotadas de patri-
mônios significativos. A gestão profissionalizada e o
afastamento dos membros da família dos postos exe-
cutivos têm sido a tônica dos últimos anos, em franco
contraste com os padrões vigentes na formação his-
tórica do capitalismo brasileiro (Bernhoeft, 1999).
Os negócios onde não só a propriedade, mas tam-
bém a gestão e o trabalho, pertencem à família não
recebem a atenção dos especialistas exatamente por
excluírem a forma de profissionalização característica
das empresas patronais. O patrimônio envolvido nes-
tas empresas justifica a mobilização privada de um
corpo específico de consultores. Já na agricultura fa-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
27
miliar, a sucessão aparece como tema de foro íntimo
diante do qual as famílias tomam decisões sem qual-
quer tipo de orientação profissional. A dimensão de
cada negócio não permite um corpo de assessores
voltados a esta finalidade. Mas tanto a quantidade de
unidades familiares no campo, como a relação entre o
destino da ocupação social no meio rural e os proces-
sos sucessórios, deveriam ser razões suficientes para
que as organizações que lutam pela valorização do
interior do país se debruçassem sobre o assunto. En-
quanto os processos sucessórios não forem objeto de
discussões organizadas pelos próprios movimentos
sociais no campo, será difícil organizar a política
fundiária específica às regiões de predomínio da agri-
cultura familiar.
III
Mais que um momento, a sucessão é um processo
formado por três componentes. A transferência
patrimonial, a continuação da atividade profissional
paterna e a retirada das gerações mais velhas do co-
mando sobre o negócio (Gasson & Errington, 1993;
Abramovay et alii 1998). Mais importante que o instan-
te específico em que se faz a transferência jurídica de
bens é a gradual passagem de responsabilidades de
uma geração para a outra. Nesta “unidade indissolúvel
de geração de renda” (Chayanov, 1925/1986) que é a
28
agricultura familiar, os filhos e filhas integram-se aos
processos de trabalho – auxiliando a conduzir os ani-
mais, acompanhando os pais em algumas tarefas, aju-
dando na casa – desde muito cedo. Aos poucos vão
assumindo atribuições de maior importância e chegam
à adolescência não só dominando as técnicas obser-
vadas durante sua vida, mas os principais aspectos da
própria gestão do estabelecimento. Entretanto, estes
conhecimentos não significam que os jovens organi-
zam seu futuro com os olhos necessariamente volta-
dos para a propriedade paterna. Se até o final dos anos
1960, a continuidade na profissão agrícola podia ain-
da revestir-se do caráter de uma obrigação moral
4
, hoje
esta pressão deixou de existir.
Mas, seria um exagero dizer que a profissão passa
a ser uma escolha livre e soberana. Em primeiro lugar,
o nível educacional de muitos dos rapazes é tão bai-
xo, que reduz fortemente suas chances de inserção no
mercado de trabalho urbano. Por outro lado, entretan-
to, entre os agricultores de menor renda, o horizonte
produtivo é tão precário – em virtude da escassez e da
má qualidade da terra, antes de tudo – que o mercado
de trabalho urbano será muitas vezes mais promissor,
apesar de seus riscos e suas dificuldades. Além disso,
é interessante observar que os vínculos familiares de
transferência de renda permanecem decisivos, apesar
da migração e do processo de individualização a ele
4
Conforme mostram os trabalhos de Woortman (1994) e nossa própria
pesquisa anterior Abramovay
et alii
(1998).
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
29
associado. A pesquisa mostra que, sobretudo entre as
famílias de menor renda, a contribuição dos filhos que
partiram para o orçamento da casa de origem é bas-
tante freqüente e significativa.
Este trabalho procura compreender – com base num
questionário fechado respondido por pais, filhos e fi-
lhas de 116 unidades representativas da agricultura
familiar do oeste catarinense – os principais
determinantes da formação de uma nova geração de
agricultores. É bem provável que o número de estabe-
lecimentos agropecuários continue o declínio que vem
mostrando desde o final dos anos 1970. Mas o ritmo
desta queda pode ser fortemente atenuado caso haja
políticas que permitam aos 69% dos rapazes e 32% das
moças da região satisfazer seu desejo e sua vocação
de permanecer na atividade agrícola familiar.
Quais as aspirações profissionais dos jovens agri-
cultores do oeste de Santa Catarina? Uma resposta
completa a esta pergunta exigiria que se dispusesse
do conjunto de possibilidades que a população estu-
dada tem pela frente. Um questionário fechado – tal
como o desta pesquisa – tem a vantagem de quantificar
resultados e a desvantagem de limitar necessariamente
o leque de opções de quem responde. Os entrevista-
dos não foram colocados frente a diferentes possibili-
dades de inserção urbana. Mas o estudo corroborou
fortemente hipóteses que ligam as opções profissio-
nais a dois fatores básicos: por um lado, à formação
educacional dos próprios jovens; por outro, ao nível
de renda das famílias.
30
São fortes os indícios de que, ao menos até recentemen-
te, acabaram ficando na propriedade paterna exatamente
aqueles jovens que menos tiveram oportunidades educacio-
nais. Ao mesmo tempo entre as famílias mais pobres, a mi-
gração para as cidades aparece como um horizonte mais
promissor que a permanência no campo. Mas esta migra-
ção é provocada menos por uma atração real das luzes da
cidade que pela falta de perspectivas promissoras no meio
rural. Tanto é assim que mesmo jovens de famílias pobres se
dizem candidatos fortes ao crédito fundiário.
A pesquisa confirmou resultados obtidos anteriormen-
te que mostram um fortíssimo viés de gênero nos proces-
sos sucessórios: dizer, entretanto, que o padrão vigente
“beneficia” os rapazes em detrimento das moças supõe
que estas fossem candidatas preteridas à sucessão, o que
não parece ocorrer. Ao mesmo tempo, as moças têm nível
educacional nitidamente superior aos rapazes e o acesso
à educação é, em muitos casos, uma contrapartida pre-
sente da herança paterna futura não recebida.
Este estudo dá continuidade a uma linha de pesquisa
iniciada com a publicação de Juventude e agricultura familiar
– Desafios dos novos padrões sucessórios (Abramovay et alii, 1998).
Naquele primeiro momento, o trabalho apoiou-se em da-
dos recolhidos em apenas um município e contemplando
55 famílias selecionadas sem qualquer pretensão de
representatividade. Mais que retratar o problema sucessório
da região, a pesquisa foi uma primeira tentativa de expor
os grandes temas de que ele se compõe. Já o presente
trabalho apóia-se num universo bem mais significativo e
representativo da agricultura familiar do oeste catarinense.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
31
Uma breve caracterização desta região e da sua agricultura
é apresentada no Box 2. A base inicial dos dados para a
determinação da amostra constituiu-se de 15.293 estabe-
lecimentos, presentes em 17 municípios da região onde
existiam estudos com informações relevantes nos cam-
pos econômico e social que permitiram uma satisfatória
caracterização do meio rural e das unidades familiares de
produção. Deste universo, para a realização da pesquisa,
selecionamos dez municípios que no seu conjunto possu-
em 9.190 propriedades, constituindo-se numa amostra re-
presentativas das 75 mil unidades familiares de produção
presentes no oeste de Santa Catarina. A localização geo-
gráfica dos municípios onde se realizou a pesquisa pode
ser observada na figura 1. A escolha destes municípios se
deu fundamentalmente por duas razões: a) pela sua
representatividade da agricultura familiar da região,
identificada pela análise preliminar dos dados censitários
e por informações complementares fornecidas pelos téc-
nicos que realizaram os Censos Agropecuários Municipais.
b) pela própria existência deste estudo socioeconômico,
realizado pela Epagri e prefeituras municipais entre os anos
de 1997 e 1999, que, entre outras variáveis, estratificou os
agricultores familiares em três segmentos de renda: Con-
solidados, Em Transição e Periféricos
5
(Box 3). A pesquisa
sobre as questões sucessórias nestes municípios possibi-
lita melhor interpretação das respostas em função da si-
tuação socioeconômica das famílias entrevistadas.
5
Neste trabalho, denominaremos estes segmentos de Capitalizados, Em
Transição e Descapitalizados.
32
(Box 2) A região oeste catarinense
O oeste catarinense foi colonizado a partir
do início do século XX por imigrantes oriundos
do Estado do Rio Grande do Sul, na sua maioria
agricultores familiares que migraram para a re-
gião em busca de terra para se instalar (Cam-
pos,1987; Silvestro 1995).
A região caracteriza-se por sua forte indús-
tria agroalimentar, alicerçada historicamente em
unidades familiares de produção, tendo consti-
tuído, em apenas cinco décadas, o maior pólo
agroindustrial de aves e suínos do país. Trata-se
de um dos grandes exemplos brasileiros do po-
tencial da agricultura familiar na alavancagem do
crescimento econômico regional. Ocupando uma
área de 25,3 km
2
e constituída, atualmente, por
95 municípios, a região produz mais de 50% do
Valor da Produção Agrícola do Estado, destacan-
do-se na produção de suínos, aves, milho, leite,
feijão, soja e fumo. A população é de 1,17 mi-
lhão de habitantes (IBGE, 2000), com 37% locali-
zada no espaço que o IBGE classifica como meio
rural. O relevo é montanhoso, com apenas 1/3
da área apta para culturas anuais. O número to-
tal de estabelecimentos rurais verificados no
Censo Agropecuário de 1995/96 era de 88 mil,
sendo 33,6% com menos de 10 ha e 93,8% com
menos de 50 ha (IBGE,1996). Alguns estudos
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
33
censitários municipais realizados pela Epagri/
Icepa, permitem estimar que a região oeste
catarinense é composta por aproximadamente 75
mil unidades familiares de produção.
Dentre os municípios em que foi realizada a
pesquisa destaca-se a presença de agroindústria
de aves ou suínos em Seara, Xaxim e Ipumirim. É
nos frigoríficos destes municípios que os filhos dos
agricultores buscam emprego, geralmente como
operários. Em geral, os postos de trabalho ocupa-
dos por eles apresentam remuneração que varia de
2 a 3 salários mínimos por mês. Merece destaque
o fato de os jovens que se empregam nestes frigo-
ríficos deixarem de residir na propriedade e se
transferirem para a cidade, onde nos primeiros
momentos optam por morar em pensões ou casas
familiares. Neste sentido, observou-se em apenas
um dos municípios onde realizamos a pesquisa, a
presença da figura do “colono-operário” como foi
referido por Anjos (1995). Neste caso, uma
agroindústria ligada a uma cooperativa, contrata
filhos de agricultores que continuam morando na
propriedade e se deslocam de ônibus diariamente
até o local de trabalho.
*
34
FIGURA 1 - Mapa de Santa Catarina com destaque para a
região oeste catarinense e os municípios onde foi realiza-
da a pesquisa
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
35
(Box 3) Capitalizados, em Transição e
Descapitalizados
O levantamento socioeconômico realizado
nos dez municípios que serviu de base para a pes-
quisa, considerou globalmente três trajetórias para
a agricultura familiar, definindo três categorias eco-
nômicas. Embora os níveis de renda sejam apenas
um dos critérios para uma estratificação social das
propriedades, ele se mostrou adequado para anali-
sar as questões exploradas, possibilitando uma com-
preensão melhor do comportamento dos pais e dos
filhos em cada um dos diferentes grupos.
Agricultores capitalizados: correspondem a
13% dos estabelecimentos agrícolas do oeste
catarinense e são representados por aquelas unida-
des cuja atividade agrícola tem possibilitado a repro-
dução da família e também um certo nível de investi-
mento e acumulação. Neste grupo estão incluídos
aqueles estabelecimentos que proporcionam um va-
lor agregado
6
(VA) superior a três salários mínimos
por mês por unidade de mão-de-obra ocupada.
6
O valor agregado (VA) de cada propriedade rural foi definido como a
diferença entre o valor bruto da produção (VBP) e os custos variáveis da
produção (despesas). Da forma como foi calculado, o valor agregado re-
presenta a margem bruta mais o consumo interno da propriedade. Isto
significa que o valor agregado (VA) por pessoa ocupada é um saldo dispo-
nível para remunerar a mão-de-obra familiar (Epagri/Icepa, 1998).
36
Agricultores em transição: Correspondem a
29% dos estabelecimentos agrícolas do oeste
catarinense. São aqueles que vivem da agricultura,
mas não conseguem realizar investimentos. A idéia
de transição mostra que a trajetória socioeconômica
desses agricultores pode ser ascendente ou descen-
dente, dependendo das políticas a eles direcionadas.
Neste grupo estão incluídos aqueles estabelecimen-
tos que proporcionam um valor agregado entre um e
três salários mínimos por mês por pessoa ocupada.
Agricultores descapitalizados: Correspon-
dem a 42% dos estabelecimentos agrícolas do oeste
catarinense. Neste grupo, estão incluídos aqueles
estabelecimentos que proporcionam um valor agre-
gado menor que um salário mínimo por mês por
pessoa ocupada.
O restante dos estabelecimentos agrícolas
presentes no oeste catarinense são representados
por unidades onde a agricultura tem importância
econômica irrisória na formação da sua renda
(14,5%) e agricultores patronais (1,5 %).
*
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
37
Figura 2 – Vista parcial de uma propriedade capitalizada
Figura 3 – Vista parcial de uma propriedade em transição
38
Uma vez que se tratava de conhecer as questões en-
volvidas no processo sucessório da agricultura familiar
do oeste de Santa Catarina, foram identificadas no con-
junto das 9.190 propriedades familiares estudadas, aque-
las onde residissem pelo menos um rapaz e uma moça
com idade entre 13 a 29 anos. Aplicado este critério,
restaram 834 propriedades que serviram de base para o
sorteio daquelas que seriam entrevistadas. Para a reali-
zação da amostra a ser pesquisada foram sorteados 15%
dos estabelecimentos em cada estrato de renda, consi-
derando a sua representatividade em cada município.
Foram aplicados questionários fechados no interior de
116 famílias, das quais 21 capitalizadas, 46 em transi-
ção e 49 descapitalizadas. Em cada uma das proprieda-
des sorteadas foram entrevistados, separadamente, os
pais, um rapaz e uma moça. Com o objetivo de garantir
Figura 4 – Vista parcial de uma propriedade descapitalizada
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
39
a independência das informações fornecidas pelos
pais, filhos e filhas, constituímos equipe de três pes-
quisadores, sempre com a preocupação de realizar as
entrevistas simultaneamente e em locais separados da
propriedade de forma que os entrevistados não so-
fressem interferências uns dos outros em suas respos-
tas. Nas propriedades onde havia mais de um filho ou
filha com idade entre 13 a 29 anos, foi entrevistado o
mais velho. A pesquisa de campo foi realizada no pe-
ríodo de maio a julho de 2000. Em função da comple-
xidade do tema pesquisado muitas perguntas não fo-
ram respondidas por alguns dos entrevistados, razão
pela qual, não foi possível obter respostas para todas
as questões no conjunto das 116 propriedades entre-
vistadas. Por este motivo, como poderá ser visto no
texto, o número de respostas varia significativamente
para cada uma das questões utilizadas.
Além desta apresentação, o trabalho compõe-se de
mais quatro partes. No item dois examinam-se as ex-
pectativas profissionais dos jovens agricultores e os prin-
cipais determinantes da escolha profissional. Com re-
lação a continuidade da atividade agrícola, existe uma
diferença marcante entre as aspirações dos rapazes e
das moças. Enquanto os rapazes manifestaram um for-
te desejo de continuidade na profissão paterna, as
moças têm uma visão bastante negativa a respeito des-
te horizonte profissional. A escolha profissional é ana-
lisada do ponto de vista da geração de renda da unida-
de produtiva, da formação educacional dos jovens e da
influência exercida pela família.
O item três estuda os principais elementos de que
se compõe o processo sucessório propriamente dito:
quem é o filho que fica no estabelecimento paterno?
Em que circunstâncias e como são compensados os
herdeiros não-sucessores? Qual o momento em que o
sucessor assume o poder e o controle da proprieda-
de? E qual a relação dos rapazes e das moças a
respeito dos processos sucessórios?
No item quatro são apresentadas as conclusões
deste trabalho e no item cinco são apontadas propo-
sições de políticas públicas voltadas a que os jovens
agricultores possam construir seu futuro profissional
no meio rural. As propostas procuram enfatizar espe-
cificamente os elementos voltados a que os jovens
possam ter no meio rural uma opção e não uma fatali-
dade na construção de seus destinos. Não se trata en-
tão de conceber apenas remendos que possam mino-
rar o sofrimento de quem não conseguiu se aventurar
em direção às “luzes da cidade”: o mais importante
está em conquistar mudança radical na relação entre
o meio rural e o mundo do conhecimento. Para isso,
enfatiza-se o papel decisivo que o acesso às
tecnologias da informação devem ter para uma políti-
ca que tenha nos jovens os protagonistas centrais da
valorização do meio rural.
40
2. As expectativas
profissionais dos jovens
2.1. Opção ou fatalidade?
O que mais chama a atenção no desejo de perma-
necer na profissão agrícola por parte da maioria dos
rapazes do oeste de Santa Catarina é a coincidência
em suas respostas sobre o futuro almejado e o que
imaginam ser seu destino provável. É claro que sem-
pre se pode dizer que os indivíduos – da mesma for-
ma que as sociedades – não formulam projetos dos
quais não possam antever minimamente as possibili-
dades de realização. Assim, no futuro desejado já es-
tariam embutidas as restrições que o aproximam do
futuro provável
7
.
7
Este é o pressuposto básico, em microeconomia, da teoria do consumidor:
“a racionalidade considerada pela teoria do consumidor pressupõe portanto
que não existe distância entre preferência e escolha: o consumidor prefere
o que ele escolhe e escolhe o que prefere” (Zamagni, 1984/1987:125).
41
42
Nas tabelas 3 e 4, que se referem às moças, vê-se
uma pequena diferença entre as duas respostas: 32%
das moças desejam permanecer num estabelecimento
agropecuário, mas 37% julgam provável que este seja o
seu destino. A diferença entre as duas respostas aumenta
Entretanto, se, de fato, entre os rapazes foi notável a
coincidência entre as duas respostas – mais de dois ter-
ços deles querem permanecer na atividade que apren-
deram com os pais, como mostram as tabelas 1 e 2 – o
mesmo não pode ser dito com relação às moças.
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
43
nitidamente quando se observa a última coluna das ta-
belas 3 e 4: entre as moças vivendo em famílias
“descapitalizadas”, apenas 28% desejam permanecer no
estabelecimento agropecuário, mas um total de 40% diz
que aí estará o seu destino. Entre as moças de menor
renda há distância, para usar a linguagem da teoria do
consumidor, entre “preferência e escolha” no que se
refere à organização do futuro profissional. Permanecer
numa unidade produtiva rural, para muitas delas, é mui-
to mais uma fatalidade que uma opção.
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
44
Mesmo para os rapazes, entretanto, existe uma ní-
tida consciência dos limites que se opõem à realiza-
ção de sua vocação explícita. Na tabela 5, pode-se
observar como os rapazes encaram seu futuro profis-
sional, apontando o que há de mais importante na
questão sucessória. A convicção de que a vida profissi-
onal estará organizada em torno de um estabelecimen-
to agropecuário é bem menor, entre os rapazes, que o
revelado nas tabelas 1 e 2, citadas anteriormente. Ape-
nas 38% dos jovens responderam ao item “gosta de ser
agricultor e é certo que será agricultor”. Mas quando se
soma esta resposta àquela em que o rapaz afirma que
“desejaria ser agricultor, mas vê dificuldade”, constata-
se que além dos 38% dos rapazes que gostam outros
31% desejariam permanecer na profissão de agricultor,
mas vêem dificuldades para tanto. Entre os principais
fatores que dificultam o exercício da profissão
agropecuária, 81% dos rapazes apontaram a falta de
capital para investimento, 40% a falta de novas oportu-
nidades de renda e 30% a falta de terra.
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
45
O acesso à terra está entre as maiores dificulda-
des para a continuidade na agropecuária. Assim é
que para apenas 21% dos rapazes (e somente 7%
entre os descapitalizados), “a quantidade de terra a
ser herdada é suficiente e boa” revelando um nítido
problema de insuficiência ou de qualidade de terra
em todas as categorias de renda estudadas.
É claro que estas respostas variam – e com im-
pressionante coerência – segundo as classes de ren-
da consideradas. Nas tabelas 1 e 2, citadas anteri-
ormente, percebe-se que o desejo de permanecer
na agricultura “como proprietário” cai conforme de-
clina a categoria de renda considerada. Ao contrá-
rio, a aspiração por viver na cidade é tanto maior
quanto menos promissor o horizonte de geração de
renda no estabelecimento paterno.
Da mesma forma, como se vê na tabela 6, nada
menos que 72% dos rapazes julgam que “conside-
rando seu grau de instrução” têm melhores oportu-
nidades “no meio rural, na agricultura”. Note-se que
a possibilidade de inserção urbana é encarada com
bastante ceticismo pelos rapazes. Somente 13%
deles julgam que em “atividades da cidade” estão
suas melhores chances de realização profissional.
E este percentual sobe conforme cai a renda famili-
ar: a cidade é encarada como fonte promissora de
geração de renda para somente 5% dos filhos de
famílias “capitalizadas”, mas para 20% dos filhos das
famílias mais pobres.
46
Fonte: Pesquisa de Campo
Já entre as moças, à rejeição majoritária da profis-
são agropecuária corresponde maior esperança na in-
serção urbana. As tabelas 3 e 4 mostraram que traba-
lhar e morar na cidade é o futuro desejado de 43% das
moças – embora proporção menor (36%) acredite que
conseguirá alcançar este futuro. Se, como foi visto na
tabela 6, 72% dos rapazes consideram ter melhores
oportunidades no meio rural (com base em seu grau
de instrução), esta proporção cai, entre as moças, para
54% como pode ser visto na tabela 7. E da mesma for-
ma que entre os rapazes – só que em proporções mai-
ores – a cidade aparece como horizonte tanto mais
promissor, quanto menor é a renda familiar.
A tabela 6 fornece também uma indicação recor-
rente neste trabalho. Apesar das evidências da im-
portância das atividades não-agrícola no meio rural
brasileiro (Graziano da Silva, 1999; Campanhola &
Graziano da Silva, 2000) e mesmo em Santa Catarina
(Mattei, 1998), os estabelecimentos estudados são fun-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
47
Fonte: Pesquisa de Campo
damentalmente voltados à produção agrícola e pe-
cuária. As atividades não-agrícolas no meio rural não
fazem parte da experiência cotidiana dos jovens que
vivem no interior dos estabelecimentos agropecuários
do oeste de Santa Catarina.
A tabela 6 indica ainda uma apreciação positiva da
agricultura bem maior entre os filhos de famílias “ca-
pitalizadas” que entre aqueles vivendo em unidades
empobrecidas. Mas chama a atenção que quase dois
terços dos descapitalizados consideram que suas me-
lhores chances estão na agricultura e que apenas 20%
deles considerem que as cidades oferecem-lhes as
melhores oportunidades.
Em suma, pode-se dizer que existe uma importante
aspiração de continuidade na agricultura familiar por
parte dos rapazes – mesmo aqueles vivendo em uni-
dades que não chegam a gerar sequer a renda neces-
sária à reprodução familiar - e uma visão bastante ne-
gativa a respeito deste horizonte profissional para a
48
maioria das moças. Os filhos das famílias de maior
renda encaram a permanência na agricultura como pro-
missora e isso é nítido tanto entre rapazes como entre
as moças. O preocupante é que parece haver uma as-
sociação forte entre a escolha profissional em torno
da agricultura familiar e um nível de educação especi-
almente precário por parte dos que encaram como
desejado este futuro. É o que será visto a seguir.
2.2. Alguns determinantes da escolha profissional
a) a importância da educação
A escolha profissional dos jovens agricultores é
determinada por um conjunto de fatores, dos quais
os mais relevantes são suas expectativas de geração
de renda na unidade paterna comparadas com o que
imaginam ser possível alcançar inserindo-se em mer-
cados de trabalho assalariado. A educação é um ele-
mento decisivo no horizonte profissional de qualquer
jovem: na agricultura familiar, entretanto, a regra cons-
tatada em inúmeros estudos da América Latina
(Durston, 1996) é que fica no campo o filho ao qual
la cabeza no le dá para más”. Mesmo um Estado como
Santa Catarina, onde o nível educacional está entre
os mais altos do país, acaba não fugindo a esta re-
gra. A geração que hoje mais pode candidatar-se à
direção dos trabalhos agropecuários - os filhos que
permanecem nas propriedades paternas e que já sa-
íram da escola – tem formação educacional tão pre-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
49
cária que confirma a asserção segundo a qual ou se
estuda, ou se fica no campo.
Os dados da tabela 8, apresentados abaixo, foram
retirados diretamente do Censo realizado pela Epagri/
Icepa e referem-se aos jovens presentes nas 9.190 pro-
priedades dos 10 municípios onde foi realizada a pes-
quisa. Ela mostra um quadro desolador quanto à situ-
ação educacional dos jovens no interior da agricultura
familiar. Dos 1.940 jovens entre 25 e 29 anos – candi-
datos óbvios, portanto, à sucessão hereditária – 1.163
(60% deles) estudaram apenas até a 4ª série. Ao que
tudo indica, ficaram na propriedade aqueles que não
obtiveram o passaporte educacional para ingressar no
mercado de trabalho urbano. Nesta faixa etária está
também a maior proporção de analfabetos (4% do to-
tal). A idéia é corroborada pela situação da faixa etária
imediatamente anterior: dos 1.823 jovens entre 19 e
24 anos morando na propriedade paterna, nada me-
nos que 697 (38% deles) estudaram apenas até a 4ª
série. Entre os jovens com 13 a 18 anos, a proporção
dos que possuem apenas até a 4ª série cai para 19%,
mostrando que o padrão de freqüência escolar alte-
rou-se nitidamente. Tirar os jovens da escola no 4° ano
primário, na década de 90, deixou de ser uma prática
socialmente dominante. De qualquer maneira, por
mais que o padrão anterior não seja mais predomi-
nante, ele deixa uma pesada herança para os proces-
sos sucessório no interior da agricultura familiar.
50
O destino dos jovens que deixaram a propriedade
paterna corrobora a associação entre permanência na
atividade agrícola e baixo nível educacional. A tabela 9
contém informações sobre os filhos que deixaram a pro-
priedade paterna. Das 116 famílias entrevistadas tinham
saído, até o momento em que foram coletadas as infor-
mações, 187 jovens. Destes, 115 mudaram-se para o
“meio urbano”
8
e 72 saíram para instalar-se no próprio
meio rural, na esmagadora maioria das vezes na condi-
ção de agricultores. A tabela mostra o contraste entre o
nível educacional dos que permanecem na agricultura,
quando comparado à situação dos que foram para as
cidades. Pouco mais de um terço dos que destinaram-se
ao “meio urbano” têm somente até a 4ª série, proporção
que sobe além de dois terços, para os que saíram da pro-
priedade paterna para prosseguir na profissão
agropecuária. Com nível superior à 5ª série estão menos
Fonte: Censo Agropecuário Municipal - Epagri (1999).
8 Seja uma região metropolitana (do Estado ou fora dele), seja o núcleo
urbano do município em que está instalada a propriedade paterna.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
51
Fonte: Pesquisa de Campo
A tabela 10 examina o nível educacional daqueles
72 filhos de agricultores que deixaram a propriedade
paterna e permaneceram no meio rural. O vínculo en-
tre agricultura e baixo nível educacional resiste até às
diferenças de renda entre as famílias: não há dife-
rença no nível educacional dos jovens egressos das
famílias pobres, relativamente aos que vêm de famí-
lias mais abastadas, o que indica que a opção por
educar os filhos associava-se diretamente ao horizon-
te de deixar a atividade agropecuária. Pior: a perma-
nência na atividade agropecuária esteve, até muito
recentemente, associada diretamente ao desprezo
pela formação dos jovens.
de um terço dos que permanecem no meio rural e 45%
dos que foram para as cidades. Nenhum dos que se ins-
talaram como agricultor tem nível superior à oitava série.
52
Tanto é assim que, na tabela 11 – que examina os
jovens que deixaram a propriedade paterna em dire-
ção à cidade – aparece a esperada associação entre
renda das famílias e formação educacional dos filhos.
Quando se comparam as tabelas 10 e 11 vê-se que,
nas duas, a formação dos filhos que foram para cida-
des é melhor que a dos que ficaram na atividade
agropecuária. Só que entre os que foram para as cida-
des, o nível educacional cresce conforme a renda fa-
miliar, o que não se observa entre os que permanece-
ram na agropecuária. A expectativa de retorno econô-
mico da educação é relevante quando se trata da mi-
gração para as cidades e quase inexistente para os jo-
vens que permanecem na agropecuária.
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
53
É importante observar na tabela 12, no entanto, que
a grande maioria dos jovens que migram para a cida-
de fazem-no para trabalhar e não para continuar seus
estudos num ambiente mais propício para tanto. Ape-
nas 14% dos filhos dos agricultores entrevistados e que
migraram para a cidade fizeram-no com o objetivo de-
clarado de estudar.
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
54
Os dados levantados na pesquisa de campo tam-
bém permitiram identificar que apenas 12,5% dos jo-
vens que saíram da propriedade conseguiram avançar
na sua formação educacional.
A tabela 13 “Nível educacional e idade média dos
jovens entrevistados” corrobora esta idéia e traz uma
informação adicional importante: é entre os rapazes
que se concentra a maior parte dos que praticamente
não tiveram acesso à educação. Todo o universo de
nossa pesquisa compõe-se de jovens que, em princí-
pio, já deveriam ter completado a 4ª série do primeiro
grau. Ora, nada menos que 30% dos rapazes entrevis-
tados têm apenas este grau de estudo. Entre as mo-
ças, esta proporção cai para 13%. E o interessante é
que a idade média dos jovens que se encontram nesta
situação é muito alta (26 anos para as moças e 27 anos
para os rapazes). Confirmando a precariedade do aces-
so à educação, sobretudo entre os rapazes, percebe-
se que somente 22% deles têm ou estão cursando o
segundo grau (1ª a 3ª série). Esta proporção sobe a
56% entre as moças. E é aí que está a menor idade
média deste universo, 44% dos rapazes têm ou cursam
de 5ª a 8ª série, contra apenas 29% das moças. Mas
nesta faixa etária, a idade média das moças é muito
mais baixa que a dos rapazes: 17 anos, contra 25 anos,
o que leva a crer que nesta idade as moças ainda es-
tão estudando e os rapazes já devem ter parado.
A própria visão dos jovens a respeito das necessida-
des educacionais para o desempenho da profissão agrí-
cola varia conforme sua situação social. Assim, na tabe-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
55
Fonte: Pesquisa de Campo
la 14 pode-se ver que nenhum filho de agricultor capita-
lizado considera possível um bom exercício profissio-
nal apenas com a quarta série do primeiro grau. Entre
os descapitalizados, 11% dos entrevistados dizem que
é possível ser agricultor somente sabendo ler e escrever
e outros 12% julgam que é suficiente a quarta série do
primeiro grau. Entre os “em transição” estas proporções
são de 5% e 21%. Apenas um quarto dos filhos de agri-
cultores “descapitalizados” e dos “em transição” asso-
Fonte: Pesquisa de Campo
56
ciam nitidamente a agricultura ao baixo nível educacio-
nal. Já o curso técnico é necessário para 28% dos rapa-
zes vivendo em unidades “capitalizadas”, mas para ape-
nas 5% e 4% respectivamente dos que estão em famíli-
as “em transição” e “descapitalizadas”.
Em suma, existe um forte contraste entre as opini-
ões dos jovens entrevistados a respeito das exigênci-
as educacionais para o exercício da profissão
agropecuária e a situação atual dos responsáveis pe-
los estabelecimentos ou seus sucessores mais prová-
veis, cujo nível de escolaridade foi e é muito precário.
É evidente que uma política fundiária voltada a estas
regiões e a agricultores na faixa etária entre 18 e 30
anos terá que associar-se a métodos alternativos aos
da educação formal para que o acesso à terra venha
de par com uma melhoria em suas capacidades pro-
fissionais. Convém, no entanto, expor as demais in-
formações que contribuem para a compreensão da es-
colha profissional dos jovens, antes de iniciar a for-
mulação das propostas que decorrem deste trabalho.
b) Influência familiar e diferenciação social
A influência familiar nas decisões profissionais dos
filhos – que, nas gerações anteriores, até o final dos
anos 1960, revestia-se freqüentemente de considerá-
vel conotação moral – pode ser claramente interpreta-
da com base nos diferentes níveis de renda dos que
responderam ao questionário. Assim, entre as famíli-
as de agricultores capitalizados e em transição, a mai-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
57
Fonte: Pesquisa de Campo
Quando perguntados sobre as razões que os leva-
vam a influir num sentido ou noutro as respostas dos
pais variaram segundo os níveis de renda: assim, para
os agricultores “capitalizados” e “em transição”, a pro-
ximidade da família e a rejeição ao assalariamento são
fatores importantes para o desejo de que os filhos pros-
sigam na profissão paterna. Para os descapitalizados,
a rejeição ao assalariamento é irrisória: é que, na ver-
dade, a reprodução da família já depende fundamen-
talmente do trabalho assalariado e sua pobreza agrí-
cola mostra poucas perspectivas de que a exploração
da unidade produtiva seja uma fonte essencial de ren-
da. É interessante observar que a obrigação de ficar
com os pais é também francamente minoritária, con-
or parte – mais até entre os “em transição” que entre
os “capitalizados” – estimulam os filhos a permanecer
na atividade. Entre os descapitalizados, este percentual
cai para 31% conforme pode ser visto na tabela 15.
58
firmando que o padrão sucessório anterior em que o
filho destacado para cuidar dos pais era compensado
com a herança da propriedade (Abramovay et alii, 1998)
foi claramente ultrapassado.
Isso não significa porém que as relações familiares
percam importância nas decisões sobre o futuro. Co-
locados diante da questão “em que condições você
aceitaria ser agricultor fora do oeste catarinense” (ta-
bela 16), metade dos rapazes entrevistados disseram
que não sairiam da região onde moram hoje. Mas há
uma nítida diferença social nas respostas: para os fi-
lhos de agricultores capitalizados é mais visível o hori-
zonte de se estabelecer em outra região do país. As-
sim, 33% deles afirmam que não sairiam do oeste
catarinense e 43% o fariam, desde que obtivessem cré-
dito fundiário e de instalação. Entre os
descapitalizados 57% não aceitariam sair da região e
apenas 19% conseguem encarar a perspectiva de mu-
dança com base em crédito fundiário e de instalação.
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
59
Para aqueles que vão se habituando a gerir um negó-
cio com certa prosperidade a idéia de expandir suas
atividades e mesmo de instalar-se longe é bem mais
verossímil que para os rapazes cujo cotidiano é mar-
cado pela imensa dificuldade de reproduzir a unidade
produtiva e garantir a manutenção da família.
c) Pobreza e estreitamento das relações sociais
A imagem de isolamento freqüentemente associa-
da à vida no meio rural não é apenas um preconceito.
Os grupos de jovens da Igreja Católica são a mais im-
portante forma de socialização dos rapazes e das
moças do oeste de Santa Catarina. Convém lembrar
que a maioria deles não são grupos constituídos per-
manentemente. Os encontros acontecem de forma
esporádica e com o objetivo principal de discutir ques-
tões religiosas e relacionadas ao lazer. Quase nunca
tratam das questões ligadas ao seu futuro profissio-
nal. Dos rapazes entrevistados, 20% declaram não
manter qualquer relação com agentes externos. Entre
estes, a grande maioria vive nas famílias
“descapitalizadas”: 44% dos rapazes destas famílias vi-
vem num impressionante isolamento social. Não fre-
qüentam sequer as atividades dos grupos de jovens
da Igreja. Uma vez que estes jovens são exatamente
os que mais exercem atividades assalariadas fora da
propriedade, é possível que seus círculos de relações
sociais não estejam incluídos entre as alternativas do
questionário. Mas o mais provável é que a pobreza
60
esteja associada a esta restrição no universo social de
vida dos jovens (Box 4).
Também é importante observar que dos 116 ra-
pazes entrevistados, apenas um terço possui o “blo-
co do produtor rural”. Esta proporção é baixa, uma
vez que este documento corresponde a uma espé-
cie de pagamento previdenciário sem qualquer ônus
para a família. Apenas 16% dos rapazes entrevista-
dos, têm conta corrente bancária individual. Entre
as moças, a situação não é diferente, 28% delas de-
clararam não pertencer ou manter contatos perma-
nentes com qualquer organização local. Como no
caso dos rapazes, a grande maioria destas vive em
famílias “descapitalizadas”. Apenas 4% das moças
entrevistadas possuem conta corrente e somente
12% “bloco de produtora rural”.
Este capítulo procurou mostrar, em suma, a am-
bigüidade envolvida nas expectativas profissionais
dos jovens. Por um lado, é nítido o desejo dos ra-
pazes de dar continuidade à profissão paterna.
Esta preferência não pode ser caracterizada como
o resultado do exercício do que Amartya Sen (2000)
chama de liberdade: ela se apóia fundamentalmen-
te na percepção realista de que o nível educacio-
nal de que dispõem não permite à grande maioria
destes rapazes ter um horizonte minimamente pro-
missor fora do meio rural. Já entre as moças, a
menor preferência por permanecer na profissão
agropecuária associa-se, nitidamente, ao melhor
nível educacional.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
61
Ao mesmo tempo, é clara a consciência de que a dota-
ção de conhecimento com que contam os jovens hoje é
insuficiente para os desafios de gerar renda numa unida-
de produtiva rural. Esta consciência abre um amplo espa-
ço para políticas públicas cujo eixo esteja na mudança do
ambiente educacional existente hoje no meio rural.
(Box 4) A Moradia de uma família de
agricultores descapitalizados
As casas onde residem as famílias destes agri-
cultores são geralmente pequenas, com mais ou me-
nos 50 m
2
, em sua quase totalidade construídas de ma-
deira, já comprometidas pela ação do tempo e mal
acabadas. Em muitas delas há frestas nas aberturas e
entre as tábuas, por onde passa o vento frio do inver-
no, amenizado apenas pelo calor do fogão a lenha
que acaba sendo o bem mais precioso da moradia,
em torno do qual a família se reúne para se aquecer e
tomar chimarrão nas horas de folga e à noite. Sua divi-
são interna é geralmente composta por uma cozinha,
uma pequena sala e um ou dois quartos, que na maio-
ria das vezes não possibilita a acomodação minima-
mente adequada de seus habitantes. A maioria das
residências não possui banheiro na parte interna. De-
vido à ausência de instalações na propriedade, muitas
vezes as pessoas têm que dividir esse espaço com pro-
dutos agrícolas que são armazenados temporariamente
em seu interior. Em alguns casos os cômodos são divi-
didos por cortinas de pano, não propiciando qualquer
privacidade aos seus habitantes. As águas utilizadas
não têm destino adequado, correndo a céu aberto,
onde bebem animais domésticos e ficam ao acesso
das crianças. Estas condições são mais facilmente acei-
tas pelos pais, mas não pelos jovens, que se sentem
constrangidos em receber visitas e, principalmente, em
receber em sua residência o namorado ou a namora-
da. Apesar desta precariedade observa-se, porém, um
grande esforço para a preservação dos bens e para a
manutenção de um ambiente limpo e agradável. A
absoluta falta de recursos para fazer as melhorias ne-
cessárias impede que esses agricultores morem em con-
dições mais dignas.
Figura 5 – Moradia de uma propriedade descapitalizada
62
3. Preparando a sucessão
U
ma vez que o universo selecionado para esta
pesquisa compõe-se de famílias onde vivem ao
menos um rapaz e uma moça, não é de se es-
tranhar a quase inexistência de unidades sem suces-
sores: a pesquisa toma o problema sucessório pelo
lado da demanda de terra e não examinou a situação
das famílias onde não há sucessores.
9
A etapa anteri-
or do trabalho (Abramovay et alii, 1998) mostrou que,
até o final dos anos 1960, existia um processo
sucessório centrado no minorato
10
que possibilitava a
9
O tema merece ser melhor investigado: se, por um lado, o universo de
propriedades sem sucessores pode ser bem superior aos 12% identificados
na pesquisa Epagri/Icepa, por outro não se conhece o tamanho e as condi-
ções destes estabelecimentos. É bem possível que parte deles não sejam
adequados para receber jovens agricultores iniciando suas atividades pro-
fissionais autônoma. Neste caso, seria necessário um trabalho de
reordenamento fundiário.
10
Instituição pela qual a propriedade paterna é transmitida ao filho mais
novo que, em contrapartida, fica com a responsabilidade de cuidar dos pais
durante a velhice. Este padrão, também conhecido como ultimogenitura,
não foi inteiramente eliminado, como será visto adiante.
63
64
reprodução social e econômica de novas unidades de
produção. A partir dos anos 70 esse padrão sucessório
se esgota. A “questão sucessória” na agricultura surge
quando a formação de uma nova geração de agricul-
tores perde a naturalidade com que era vivida até en-
tão pelas famílias envolvidas neste processo. A con-
seqüência é – convém insistir – o desencontro entre a
oferta de terras das gerações que envelhecem e a de-
manda dos jovens que não podem satisfazer suas vo-
cações profissionais nas propriedades paternas.
Este capítulo procura descrever os principais ele-
mentos de que se compõe o processo sucessório pro-
priamente dito: Quem fica no estabelecimento pater-
no? Em que circunstâncias e como são compensados
os herdeiros não sucessores? Qual o momento da su-
cessão? Qual a relação de rapazes e moças, respecti-
vamente, com os processos sucessórios?
3.1. Quem fica?
A maioria das famílias entrevistadas ainda não de-
finiu quem será o sucessor. Entretanto, afirma que al-
guém ficará na propriedade como pode ser visto na
tabela 17. É importante salientar que não houve dife-
rença nas respostas quando considerados os três es-
tratos de renda.
11
A resposta dos pais coincide com a
dos rapazes e moças, quanto a este item.
11
Julgou-se desnecessário mostrar esta igualdade nas respostas entre os
três segmentos de renda, por meio de tabelas.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
65
Fonte: Pesquisa de Campo
A indefinição quanto à escolha do sucessor tam-
bém pode ser observada quando se analisa os dados
da tabela 18. Para 75% das moças e 78% dos rapazes
“ainda não foi definido quem ficará com a proprieda-
de”. Esta percepção dos filhos sobre a questão
sucessória diverge um pouco da opinião dos pais: 61%
deles disseram que “ainda não foi escolhido quem fi-
cará com a propriedade”. Na verdade, a pesquisa de
campo
12
mostrou que as questões sucessórias são
pouco discutidas no interior das famílias. Apesar dis-
so, em alguns casos, utilizando as atribuições de “che-
fe da família”, os pais já escolheram o sucessor. Só
que, na maioria das vezes, esta decisão ainda não foi
explicitada para o conjunto da família. Nas famílias
que já escolheram o sucessor, como pode ser obser-
12
Ao aplicar os questionários, a equipe, evidentemente, conversava com
as famílias, o que permitiu colher informações não expressas diretamente
nas tabelas.
66
vado na tabela 18, o que predomina é a preferência
pelo filho mais velho, sendo que em todos os casos a
escolha recaiu sobre um filho homem. Esta informação
– que mostra o viés fortemente masculino na sucessão
– vem das conversas informais em campo: é curioso que
quando respondem aos questionários, todos reconhe-
cem a igualdade formal de direitos entre rapazes e mo-
ças. Mas a verdade é que todas as escolhas de sucesso-
res já identificadas recaem sobre os rapazes.
Fonte: Pesquisa de Campo
Nas propriedades onde já foi escolhido o sucessor,
em mais da metade delas, houve a participação de
toda a família no processo de escolha, como pode ser
observado na tabela 19. Esta informação sugere que o
padrão de rigidez hierárquico típico das famílias rurais
está sendo substituído por um considerável grau de
democratização das decisões, como será visto adian-
te com mais detalhe.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
67
O processo sucessório, na maioria dos casos, pode
conduzir a conflitos que vão desde as formas de re-
muneração dos irmãos não contemplados com a pro-
priedade paterna até a questão do viés de gênero que
tende a acompanhar esses processos. O afastamento
destas questões acaba atrasando a definição dos ar-
ranjos familiares necessários, que envolvem tanto o
herdeiro e a continuidade da unidade de produção
paterna, quanto o destino dos demais irmãos não-su-
cessores. Está em discussão a necessidade de realizar
os investimentos necessários na propriedade e de
definir o valor e as formas de pagamento aos irmãos
que não serão contemplados com a propriedade pa-
terna. Embora as famílias hoje já tenham um razoável
nível de diálogo sobre o destino dos filhos e mesmo
sobre a organização da propriedade, os temas de na-
tureza sucessória acabam sendo raramente abordados.
Mas é interessante observar que os arranjos
sucessórios não passam necessariamente pela remu-
neração monetária de todos os herdeiros. Confirman-
Fonte: Pesquisa de Campo
68
do que a unidade produtiva é, ao mesmo tempo,
patrimônio e forma de reprodução familiar, muitas ve-
zes seu destino não responde a um critério de nature-
za estritamente econômica, como será visto a seguir.
3.2. A compensação dos outros herdeiros
Apenas 6% das moças e 9% dos rapazes, disseram
que o herdeiro não necessita compensar os demais
irmãos “porque fica com a responsabilidade de cuidar
dos pais” (tabelas 20 e 21). A resposta dos pais com
relação a essa responsabilidade, difere um pouco da
dos filhos: 15% dos pais disseram que o herdeiro não
necessita compensar os demais irmãos “porque fica
com a responsabilidade de cuidar dos pais”
13
.
Fonte: Pesquisa de Campo
13
Não se julgou necessário colocar a tabela correspondente a esta informa-
ção no texto.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
69
Fonte: Pesquisa de Campo
E os outros? Quando os rapazes foram colocados
diante desta pergunta, as duas respostas com maior
incidência (tabela 20) enfatizam que “depende da si-
tuação de cada filho no momento da transmissão”
(31%) e que a compensação se faz em “estudo e di-
nheiro” (23%). Infelizmente, o questionário não sepa-
rou “estudo e dinheiro”; mas, esta resposta é um forte
indicativo de que o estudo credencia o jovem ao exer-
cício de uma ocupação urbana que torna dispensável
o acesso à renda da propriedade para sua sobrevivên-
cia. Esta idéia é corroborada pela repartição social da
resposta: “depende da situação de cada filho no mo-
mento da transmissão”. Quando o patrimônio
fundiário e o valor do negócio é relativamente impor-
tante, sua transmissão dá lugar, quase sempre, à com-
pensação dos herdeiros não-sucessores. Por isso ape-
nas 21% dos capitalizados respondem nesta direção.
70
Já entre os descapitalizados, 44% vão neste sentido,
admitindo que a herança depende da situação em que
vai encontrar-se cada filho no momento da ausência
dos pais. No caso dos descapitalizados, a unidade pro-
dutiva é uma fonte de sobrevivência precária e é pos-
sível que ela não seja sequer suficiente para a repro-
dução de uma família, quanto mais para compensar
as dos filhos não-sucessores.
3.3. O momento da transferência: o fim do
padre padrone
Pais e filhos não têm um ponto de vista comum a
respeito do momento da transferência do controle da
propriedade. Pouco mais de um quarto dos pais (mas
metade dos filhos) não pensaram ainda no assunto,
como pode ser visto nas tabelas 22e 23.
Fonte: Pesquisa de Campo
Mas é interessante observar na tabela 23 que três
quartos dos filhos vivendo em unidades capitaliza-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
71
das já têm uma opinião a respeito, confirmando o
interesse dos jovens deste segmento pela continui-
dade na profissão paterna. Nas unidades produti-
vas dos agricultores capitalizados parece existir
maior espaço de diálogo dos jovens com os pais. É
bem verdade que nestas propriedades existe uma
participação no trabalho mais constante dos jovens,
determinada pela natureza das atividades, consti-
tuídas principalmente pela produção de suínos, aves
e leite. Para o funcionamento deste conjunto de ati-
vidades é preciso, em geral, a contribuição perma-
nente do trabalho de todos os membros da família.
Por isso, é que qualquer investimento mais impor-
tante, como um aviário, por exemplo, tem que pas-
sar por um acordo com os filhos que serão decisi-
vos no trabalho e na gestão da propriedade.
Fonte: Pesquisa de Campo
Entre os que já pensaram no momento da suces-
são, a ênfase dos pais (e sobretudo daqueles que vi-
72
vem em propriedades de maior renda) está em sua
própria capacidade de trabalho: 38% do total e 45%
dos pais de unidades capitalizadas dizem que passa-
rão o domínio da propriedade para o sucessor quan-
do não puderem mais trabalhar (tabela 22). Entre os
rapazes, as opiniões se dividem entre o acento no tra-
balho paterno e a ênfase em sua própria capacidade
profissional (tabela 23).
Demonstrando que não existe uma discussão prévia
e organizada das questões que envolvem o processo
sucessório, nas tabelas 23 e 24 pode-se verificar que
para 47% dos rapazes entrevistados e 53% das moças,
ainda não foi discutido qual o melhor momento para
fazer a transferência do controle da propriedade para o
sucessor. Na pesquisa de campo ficou nítido, contudo,
que a transferência do controle da propriedade, não
ocorre exatamente a partir da retirada dos pais por oca-
sião da aposentadoria ou da preparação do sucessor. A
passagem das responsabilidades sobre a gestão da pro-
priedade, se dá em um processo de transição em que
os pais gradativamente vão passando as tarefas de ges-
tão da propriedade, como a abertura de conta bancária
própria ou conjunta, bloco de produtor, responsabili-
dades de gerir os negócios até a passagem completa
do gerenciamento da propriedade.
O caráter rigidamente hierárquico da organização fa-
miliar tradicional centrado no poder quase absoluto do
pai está definitivamente desaparecendo, dando lugar a
um ambiente de maior participação de todos os mem-
bros da família, sobretudo dos rapazes, criando portanto
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
73
um maior espaço de discussão em torno das questões
relacionadas à gestão da propriedade e também da-
quelas que envolvem os processos sucessórios.
Fonte: Pesquisa de Campo
Alguns dados da pesquisa apontam para a constru-
ção deste ambiente familiar mais democratizado. Pelas
informações dos filhos (tabela 25), 49% (chegando a 62%
entre os capitalizados) responderam que o pai “aceita
quase sempre” as idéias que são sugeridas, enquanto
que 34% disseram que o pai “discute em família e aceita
algumas propostas”. Apenas 7% dos rapazes entrevis-
tados, nenhum deles dentre os capitalizados, “não cos-
tumam fazer propostas novas para os pais”.
74
O comportamento das moças, que mostra na ver-
dade sua não -participação, é diferente do observado
entre os rapazes: 28% delas (porém 42% das vivendo
em famílias mais pobres) responderam que “não cos-
tumam fazer propostas para os pais” que impliquem
algum tipo de mudança na propriedade (tabela 26). Os
dados mostram claramente o afastamento das moças
das decisões da propriedade, sobretudo aquelas dos
segmentos mais pobres. A sua não - participação nas
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
75
discussões sobre o futuro da propriedade demonstra
a pouca atração, que, em geral, as moças têm pelo tra-
balho na agricultura. Este comportamento é resultan-
te de, pelo menos, duas razões (sem levar em conta
seu maior preparo educacional para enfrentar o mer-
cado de trabalho urbano): ausência de espaço de par-
ticipação na propriedade e o desinteresse das moças
pela agropecuária em função da penosidade do traba-
lho associada a esta atividade. Talvez esta última ra-
zão explique a preferência de algumas moças entre-
vistadas casar com rapazes de fora do meio rural.
A democratização das decisões sobre o destino da
propriedade aparece também nas respostas à ques-
tão sobre quem toma as decisões importantes na uni-
dade produtiva. Sobre esta questão, embora os dados
não estejam expressos em tabelas, as respostas dos
pais, filhos e filhas são coincidentes: 50% dos pais,
(67% capitalizados e, apenas, 37% entre os
descapitalizados) e 51% dos rapazes e das moças res-
ponderam que as decisões importantes sobre os ru-
mos da propriedade são tomadas “pelo conjunto da fa-
mília”. Disseram que é “o pai quem toma a decisão depois de
conversar com toda a família” 35% dos pais, 22% dos rapa-
zes e 18% das moças. Outro fato que indica a maior
participação dos jovens está em sua concordância a
respeito das mudanças e dos investimentos realiza-
dos nas propriedades nos últimos anos. Embora em
24% das unidades produtivas descapitalizadas não te-
nha sido feito nenhum tipo de investimento, naque-
las que o fizeram, havia o acordo de 68% dos rapazes
76
Fonte: Pesquisa de Campo
e 67% das moças. O fato de concordar com os investi-
mentos realizados significa que houve pelo menos um
certo grau de participação nas discussões que orienta-
ram as mudanças (tabela 27 e 28).
Fonte: Pesquisa de Campo
Ainda com relação à democratização dos espaços
de decisão, a pesquisa se preocupou em levantar a evo-
lução histórica da participação dos jovens nas deci-
sões sobre o destino das propriedades. Embora aqui
também esteja presente o viés masculino dos proces-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
77
sos sucessórios, está havendo maior incorporação dos
jovens nos espaços de decisão da família, sobretudo
dos rapazes, e nas discussões sobre as questões liga-
das ao gerenciamento da propriedade. Embora em ape-
nas 6% delas, (10% entre as propriedades capitaliza-
das) o filho já seja responsável pela propriedade, 68%
dos rapazes (85% entre os capitalizados) e 46% das mo-
ças (61% entre os capitalizados) responderam que está
aumentando sua participação nas decisões da propri-
edade nos últimos anos. Estes dados ajudam a confir-
mar a hipótese de que nas propriedades dos agricul-
tores capitalizados, os jovens vêm conquistando mai-
or espaço de participação (tabelas 29 e 30). Ao mesmo
tempo mostram que os jovens adquirem uma experi-
ência de gestão (e não só trabalho comandado) preci-
osa para a organização de seu futuro profissional.
Fonte: Pesquisa de Campo
78
Fonte: Pesquisa de Campo
A maior perspectiva de permanência destes jovens
na propriedade paterna, a intensificação dos sistema
de produção (maior número de atividades econômicas
formadoras de renda) e uma certa divisão do trabalho
pode estar fazendo com que os pais sejam obrigados a
criar este espaço de participação para os filhos sob pena
de colocarem em risco, em função da saída do jovem, a
própria continuidade da unidade de produção. Por ou-
tro lado, com relação à não-participação nas decisões
da propriedade, apenas 6% dos rapazes (nenhum entre
os capitalizados), e 16% das moças, das quais 20% en-
tre os descapitalizados disseram que não participam de
nenhum tipo de decisão que é tomada no interior da
unidade de produção. Esta não-participação das mo-
ças vem reafirmar mais uma vez o seu afastamento das
atividades agrícolas e do meio rural.
Apesar disso deve ser ressaltado que ainda em 42%
das propriedades “o pai controla todas as atividades e todos
trabalham em todas as atividades”, e em outras 18% das pro-
priedades (33% entre os capitalizados) o pai controla to-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
79
das as atividades e o trabalho é dividido” (tabela 31). Prevale-
ce, portanto, ainda sob o controle do pai os aspectos
ligados à gestão do estabelecimento. Estes dados indi-
cam também que nas propriedades capitalizadas em
razão das atividades desenvolvidas com maior presen-
ça de criações (suínos e aves), começa a surgir uma cer-
ta divisão do trabalho entre os membros da família.
Fonte: Pesquisa de Campo
A obtenção independente de dinheiro para suprir
as necessidades próprias por parte dos jovens é mui-
to rara. As tabelas 32 e 33 mostram que 82% das mo-
ças e 66% dos rapazes não desenvolvem qualquer ati-
vidade na propriedade de cunho individual com o ob-
jetivo de obter seu próprio dinheiro. Este comporta-
mento deriva menos da concentração dos recursos nas
mãos paternas que de um contexto de ausência de
oportunidades de trabalho tanto agrícola como não-
agrícola fora da propriedade. Contudo, entre os agri-
cultores descapitalizados adquire certa importância a
venda de mão-de-obra: 29% dos rapazes e 10% das
80
moças desenvolvem atividades agrícolas fora da pro-
priedade, em situação de assalariamento permanente
ou de venda temporária de mão-de-obra. Comparan-
do-se os dados das tabelas 32 e 33, verifica-se que o
assalariamento das moças acontece em atividades não-
agrícolas, ao contrário dos rapazes. Esta situação pode
ser explicada por, pelo menos, duas razões: o seu maior
nível educacional e o próprio afastamento das ativida-
des agrícolas, conforme já assinalado acima.
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
81
A ausência de perspectivas na unidade familiar de
produção, pode significar também o início do afasta-
mento da atividade agrícola. Essa hipótese da maior
proximidade da condição de assalariado dos jovens
descapitalizados fica comprovada na resposta à ques-
tão: “como você obtém dinheiro para o seu lazer” ? 13% dos
rapazes (27% dos quais vivendo em unidades mais po-
bres) responderam “trabalhando fora da propriedade”.
O desenvolvimento de atividades próprias no interior
da propriedade, para obtenção de renda individual,
só é realizado por 9% dos rapazes e apenas uma moça.
O dinheiro para utilização própria destina-se na sua
maior parte, para atividades de lazer e aquisição de
bens de uso pessoal (71% dos rapazes e 64% das mo-
ças, segundo as tabelas 34 e 35). Apenas quatro rapa-
zes, todos do segmento dos capitalizados, responde-
ram que estão obtendo recursos para capitalização da
unidade de produção do pai ou para obtenção de sua
propriedade no futuro. Com relação a investimento em
Fonte: Pesquisa de Campo
82
A verdade é que a organização econômica da unida-
de de produção familiar está centrada em torno de uma
conta bancária única, normalmente administrada pelo
pai. Nesta forma de funcionamento, onde não há divi-
são da renda entre os membros da família. Para obter
dinheiro próprio, os jovens precisam pedir para os pais
ou então os pais tomam a iniciativa de dar dinheiro a seu
critério. Em, aproximadamente, um terço das proprieda-
des entrevistadas acontecem as duas formas simultanea-
mente: o pai toma a iniciativa de oferecer dinheiro aos
filhos, mas muitas vezes os filhos também precisam pedir.
As percepções levantadas na pesquisa de campo
indicam que esta questão está mais ligada à disponi-
Fonte: Pesquisa de Campo
sua formação profissional – principalmente educação
formal – existe uma diferença significativa e importan-
te no comportamento dos jovens. Enquanto apenas
5% dos rapazes (12% entre os capitalizados) disseram
que “buscam recursos próprios para aplicar no estudo”, 20%
das moças deram esta resposta.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
83
bilidade de recursos na propriedade - que é baixa, mes-
mo entre os capitalizados - do que propriamente a um
controle mais rigoroso dos recursos por parte dos pais.
Este é mais um indicativo da democratização das de-
cisões no interior das unidades de produção por nós
investigadas. Mesmo assim, 28% dos rapazes e 35%
das moças precisam pedir dinheiro aos pais.
3.4. O viés de gênero nos processos sucessórios
As moças têm as mesmas chances sucessórias que
os rapazes; esta é a resposta de 62% dos pais entrevis-
tados (85% entre os capitalizados) conforme pode ser
observado na tabela 36. Aqui aparece um contraste sig-
nificativo entre a opinião dos pais e a das próprias mo-
ças a este respeito: apenas 46% delas dizem ter as mes-
mas chances que os rapazes e 38% (mas apenas 17%
entre os capitalizados) responderam que “não serão
sucessoras”. Deve-se considerar contudo, que o
percentual de moças que dizem ter a mesma chance
que os rapazes na sucessão da propriedade, pode estar
refletindo muito mais seu sentimento de que deveria
haver igualdade na partilha dos bens, uma vez que a
herança está associada ao pagamento dos serviços pres-
tados na terra, do que uma possibilidade concreta de
realização. Nesse sentido, Paulilo (2000) observou que
o alijamento das mulheres por ocasião da partilha da
propriedade é uma questão muito delicada. Tudo que
se consegue, diz a autora, é que as mulheres digam,
com timidez, que elas deveriam ter os mesmos direitos.
É nítida a preferência familiar masculina na escolha do
84
sucessor. Isto é o que pode ser observado pelas respos-
tas das moças na tabela 37. Conforme já assinalado,
na pesquisa de campo não foi encontrado nenhum caso
onde a moça tenha sido escolhida sucessora ou então
dirigisse, de fato, a propriedade paterna.
Existe uma completa distância não apenas das ta-
refas que envolvem a responsabilidade nas tomadas
de decisão quanto ao destino da propriedade, mas
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
85
Fonte: Pesquisa de Campo
Um dos indicadores que mostra a diferença de par-
ticipação dos jovens na propriedade está relacionado
à obtenção de crédito agrícola. Com relação a esta
questão, 85% das moças nunca sugeriram fazer um
empréstimo para a propriedade. Fizeram financiamen-
to em seu nome apenas 5% das moças entrevistadas,
a maioria de propriedades capitalizadas. Com relação
aos rapazes, 39% deles já sugeriram fazer um financia-
mento, sendo que 20% deles (32% entre os capitaliza-
dos) já fizeram um financiamento em seu nome.
Outro indicativo do desinteresse das moças pela
gestão da propriedade, e que pode estar relacionado
ao seu alijamento da sucessão, é a resposta relaciona-
da à pergunta “onde aplicaria primeiro os recursos dis-
poníveis”. Enquanto 49% dos rapazes disseram que
aplicariam primeiro na agricultura, 51% das moças dis-
também um afastamento das atividades de trabalho
ligadas à atividade agrícola. Lembramos aqui, que 60%
das moças responderam que concentram suas ativi-
dades “nos trabalhos domésticos e só esporadicamente na la-
voura e criações” (tabela 38)
86
seram que aplicariam no “estudo e na poupança”, ca-
racterizando que o investimento no ensino formal é
visto como uma alternativa para sair da agricultura (ta-
belas 39 e 40).
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
87
Para os jovens agricultores do oeste de Santa
Catarina, a possibilidade mais concreta de ascender à
profissão de agricultor é herdando a propriedade pa-
terna: 27% dos rapazes e 24% das moças responde-
ram nesta direção (tabelas 41 e 42). Preocupa contudo
o fato de que, desconsiderando essa possibilidade - e
na ausência de um programa adequado para a instala-
ção de jovens agricultores, onde esteja incluída a com-
pra da terra - 41% dos rapazes e 44% das moças (60%
entre as descapitalizadas) responderam que “não há
condição de se viabilizar na agricultura”. A coincidên-
cia das respostas entre rapazes e moças, num contex-
to de ausência de atividades não-agrícolas, reflete cla-
ramente a falta de oportunidades para os jovens que
desejam permanecer no meio rural desenvolvendo a
profissão de agricultor.
Fonte: Pesquisa de Campo
88
Fonte: Pesquisa de Campo
3.5. O interesse pela terra
O acesso à propriedade da terra é visto pelos agri-
cultores do oeste catarinense como o único caminho
para construir uma trajetória ascendente na profissão
agropecuária. O horizonte para chegar à condição de
proprietário via arrendamento não é considerado, en-
tre as possibilidades existentes, como uma alternativa
concreta e também não faz parte da história da agri-
cultura familiar na região. Pode ser que este compor-
tamento explique o alto interesse dos pais e também
dos jovens em adquirir terra por meio de financiamen-
tos junto ao Programa Banco da Terra. Muitas são as
dificuldades de inserção no mercado de um agricultor
não-proprietário; entre eles está o acesso ao crédito e
às demais políticas de apoio existentes. Além disso,
existe também um certo constrangimento de origem
cultural que coloca a família de agricultores não- pro-
prietários em posição social inferior dentro da comu-
nidade. Assim é que, ao serem perguntados se teriam
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
89
interesse em fazer um financiamento para adquirir uma
propriedade e instalar um filho como agricultor, 77%
dos pais responderam positivamente. Quando colo-
cadas diante das condições proposta pelo Banco da
Terra, esta proporção caiu, mas, ainda assim, 58% dos
entrevistados dizem que tomariam o empréstimo (ta-
belas 43 e 44).
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
O desejo de acesso à terra, embora não de uma ma-
neira tão forte como no caso dos pais aparece tam-
bém entre os filhos: 32% dos jovens disseram que têm
interesse em fazer um financiamento para adquirir uma
90
propriedade e instalar-se como agricultor. Entre os ra-
pazes, 45% disseram que tomariam um empréstimo nas
condições do Banco da Terra. Quase um terço recusa
esta possibi lidade e um quarto afirma não saber ava-
liar (tabela 45). É interessante que não há grande
disparidade entre as categorias sociais nesta respos-
ta. Uma vez que se explicou ao entrevistado quais são
as condições do Banco da Terra, pode-se dizer que qua-
se metade dos rapazes da região se disporia a adquirir
uma propriedade nestas condições.
Fonte: Pesquisa de Campo
No caso das moças apenas 21% delas (13% perten-
centes a propriedades descapitalizadas) responderam
que têm interesse em fazer um financiamento para
adquirir uma propriedade e instalarem-se como
agricultoras. Demonstrando mais uma vez o desinte-
resse pela atividade agrícola, 41% delas responderam
que não têm interesse neste tipo de investimento (ta-
bela 46). Diante da pergunta se tomariam ou não fi-
nanciamento pelo Banco da Terra, apenas 23% respon-
deram que tomariam (28% entre as das famílias capi-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
91
talizados); 34% não tomariam o empréstimo e 43% dis-
seram que não têm condições de avaliar (tabela 47).
Fonte: Pesquisa de Campo
Fonte: Pesquisa de Campo
Embora a maioria dos agricultores entrevistados
ainda não tenha decidido quem vai ficar com a propri-
edade e o que farão os demais irmãos não-sucesso-
res, a necessidade de terra, como fator importante na
complementação do processo sucessório, apareceu
também em outros momentos da pesquisa de campo.
Em apenas 14% das famílias entrevistadas (5%
descapitalizadas, 23% em transição e 18% capitaliza-
dos), mais de um sucessor ficará com a terra que será
92
A necessidade de terra aparece também nas respos-
tas dos jovens. Sobre este tema os jovens responderam
à questão relacionada à quantidade e à qualidade da ter-
ra. “A quantidade de terra a ser herdada é suficiente e
dividida e é suficiente. Esta resposta indica que pelo
tipo de atividades que desenvolvem, principalmente
entre os capitalizados, ainda existe uma pequena pos-
sibilidade de subdivisão da propriedade. Entre as pro-
priedades descapitalizadas esta possibilidade não exis-
te mais. “Mais de um sucessor ficará com a terra que
será dividida mas não é suficiente” foi a resposta dada
por 35% dos pais entrevistados (39% descapitalizadas,
32% em transição e 27% capitalizados). A necessidade
de terra aparece ainda em 14% das propriedades (ne-
nhum entre os capitalizados, 12% em transição e 20%
descapitalizadas), que responderam “que só ficará um
sucessor e os outros precisarão de terra”. Além disso,
deve-se ressaltar que em 8% das propriedades só existe
um sucessor, mas a terra não é suficiente (tabela 48).
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
93
boa”, foi a resposta dada por 21% dos rapazes. Apenas
7% dos descapitalizados; 23% das moças, apenas 10%
descapitalizadas, também deram esta resposta. “A quan-
tidade de terra é insuficiente e predominantemente de
má qualidade foi a resposta dada por 24% dos rapazes
(39% descapitalizados e apenas 5% entre os capitaliza-
dos). É interessante observar que as respostas das mo-
ças vão na mesma direção das dos rapazes: 25% delas
deram a mesma resposta (38% descapitalizadas, 19% em
transição e apenas 6% capitalizadas). Mesmo conside-
rando a terra de boa qualidade, porém insuficiente, foi a
resposta dada por 32% dos rapazes (52% entre os capita-
lizados) e 24% das moças (tabelas 49 e 50).
Fonte: Pesquisa de Campo
94
3.6. Sucessão e renda não-agrícola
O trabalho de campo mostra a precariedade das fon-
tes não-agrícolas de geração de renda no interior dos
estabelecimentos familiares do oeste de Santa Catarina.
Os jovens não mencionam atividades não-agrícolas com
base no estabelecimento, nem sequer a possibilidade
de que a unidade familiar se torne um local de residên-
cia para um eventual futuro emprego urbano.
Existem basicamente três fontes de renda vindas de
fora do estabelecimento, em ordem de importância: apo-
sentadoria, o envio de dinheiro por parte de filhos que
deixaram a propriedade familiar e o trabalho assalariado
na própria agricultura (que se faz fora do estabelecimen-
to, mas não fora da agricultura, bem entendido). Rendas
provenientes de fontes exteriores ao estabelecimento
agropecuário são tanto mais importantes quanto maior
a pobreza das famílias. E estas rendas – ao menos to-
mando-se por base o universo do oeste de Santa Catarina
– distanciam-se nitidamente do que se poderia conside-
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
95
rar como “novo rural”. Tanto é assim, que nos estabeleci-
mentos mais prósperos a renda não-agrícola tem partici-
pação bem reduzida. As rendas não-agrícolas e as possi-
bilidades de trabalho fora do estabelecimento estão as-
sociadas muito mais à precariedade de condições de vida,
que a novas alternativas de geração de riquezas para as
famílias. Discutindo as ocupações rurais não-agrícolas,
Dirven (2000), as denomina de “ocupações refúgio” e “ocu-
pações dinâmicas”. Aquelas são ocupações com baixas
barreiras à entrada (capital humano e físico), baixa pro-
dutividade e baixa renda, enquanto estas respondem a
uma demanda dinâmica e geram rendas maiores que o
rendimento médio das atividades agrícolas, porém pos-
suem altas barreiras à entrada (capital humano e físico).
Ao fazer esta divisão, a autora também aponta que as
“ocupações refúgio” estão mais relacionadas com os agri-
cultores pobres, enquanto as “ocupações dinâmicas” es-
tão mais ao alcance dos agricultores ricos. As rendas não-
agrícolas e as oportunidades de trabalho fora do estabe-
lecimento no oeste de Santa Catarina, parecem estar
associadas ao que Dirven (2000) denomina de “ocupa-
ções refúgio”. Sob a perspectiva da distribuição mais equ-
ânime das oportunidades de renda e da criação de pos-
sibilidades concretas para que os jovens (homens e mu-
lheres) possam construir seu futuro profissional no meio
rural o desafio que se coloca é superar o que Reardon et
alii (1998) chamaram de “paradoxo” das ocupações rurais
não-agrícolas. No nível micro, os autores consideram que
são os estabelecimentos mais pobres os que mais ne-
cessitam de fontes de renda adicionais àquelas que são
96
geradas pela agricultura; porém, são justamente estes que
enfrentam as maiores limitações de capital humano e
capital produtivo e dificuldades para oferecer como ga-
rantia na obtenção de crédito. Geralmente são também
estes estabelecimentos que se encontram mais distan-
tes dos centros consumidores. Por outro lado, como co-
locam os autores, são os estabelecimentos mais ricos os
que têm menos necessidades, porém maiores possibili-
dades de ganhos com as rendas não-agrícolas.
Observando a origem da renda agrícola das propri-
edades, 21% dos agricultores responderam que ela
advém somente da agricultura, 10% responderam que
resulta exclusivamente da pecuária e 64% dos agricul-
tores declararam ter renda da agricultura e da pecuá-
ria. Somente 5% dos agricultores declararam ter parte
da renda formada pela venda de produtos frescos ou
transformação da produção. Estes dados, bem como
a origem da renda agrícola nos diferentes segmentos
sociais, podem ser observados na tabela 51.
Fonte: Pesquisa de Campo
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
97
Com relação à composição da renda total das uni-
dades de produção pesquisadas, identificou-se que
50% delas não possuem nenhum tipo de renda origi-
nada fora da atividade agropecuária. Em relação à
renda não-agrícola, embora os dados não estejam ex-
pressos em tabelas, as que têm maior relevância são
a aposentadoria presente em 35 propriedades (30%
do universo pesquisado). O trabalho assalariado tem-
porário na agricultura ocorre em 20 propriedades (17%
do universo pesquisado), porém em 33% das propri-
edades descapitalizadas. O assalariamento ou traba-
lho autônomo de uma pessoa da família apareceu em
16 propriedades (14% do universo pesquisado). A ren-
da proporcionada pelo dinheiro enviado pelos filhos
que saíram da propriedade, ocorre em 11 estabeleci-
mentos (10% do universo pesquisado). Destaca-se,
ainda, que muitas propriedades possuem mais de uma
fonte de renda não-agrícola. É importante salientar
que 22% das propriedades – todas pertencentes ao
segmento em transição e descapitalizados – têm ren-
da proveniente da aposentadoria e também recebem
recursos dos filhos que estão fora. Por ocasião da
pesquisa de campo, em conversa com os membros
destas famílias, constatamos que a renda da aposen-
tadoria e os recursos financeiros enviados pelos fi-
lhos são fundamentais à manutenção familiar, bem
como para realizar pequenos investimentos na pro-
priedade, como por exemplo, a compra de uma vaca,
a construção ou ampliação de pequenas instalações
e até a aquisição de equipamentos.
98
De um total de 35 agricultores que responderam
receber aposentadoria (tabela 52) 18 deles declararam
que esta receita representa menos que 25% da renda
da propriedade (todos do segmento capitalizado), 10
agricultores disseram que representa entre 25% a 50%
e 5 responderam que representa mais de 50% da ren-
da da propriedade.
Fonte: Pesquisa de Campo
A unidade produtiva tampouco tem sido um local
de residência para quem exerce atividades urbanas.
Em 78% das famílias entrevistadas (tabela 53) não ha-
via pessoas trabalhando fora e morando na proprie-
dade. Embora não fosse o foco da investigação pro-
posta neste trabalho, verifica-se que na maioria dos
municípios da pesquisa são raras as oportunidades de
trabalho não-agrícola no meio rural e, quando exis-
tem, são de natureza precária. Em apenas um dos
municípios identificou-se, no meio rural, a presença
de uma usina de reciclagem de lixo que gerava 35 pos-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
99
tos de trabalho aos agricultores da vizinhança. Mes-
mo sendo um trabalho pouco qualificado, a renda que
ele proporciona – apesar de baixa – viabiliza a perma-
nência daquelas famílias no meio rural. Em outro mu-
nicípio, um frigorifico de aves contrata jovens agricul-
tores que vivem em suas comunidades para trabalhar
na linha de abate. Diariamente um ônibus percorre as
estradas do interior transportando os “colonos operá-
rios” que vão dedicar parte do seu tempo ao trabalho
assalariado proporcionado por esta agroindústria. Mas
são casos suficientemente raros e que quase não apa-
receram nas respostas dos entrevistados.
Fonte: Pesquisa de Campo
100
Isso não significa, evidentemente, que as atividades
não-agrícolas sejam supérfluas ou pouco importantes.
Elas, certamente, são decisivas para o desenvolvimen-
to rural. O fato é que, até aqui, elas não parecem fazer
parte da experiência regional do oeste de Santa
Catarina, ao menos no que se refere às populações que
vivem no interior dos estabelecimentos agropecuários.
Em suma, o processo sucessório na agricultura fa-
miliar, não é objeto de planejamento sistemático por
parte da família, nem recebe qualquer tipo de atenção
ou subsídio vindo de instituições públicas ou repre-
sentativas. Este quadro é coerente com a falta de pre-
paro educacional dos filhos que vão assumir a propri-
edade. A remuneração dos filhos não- herdeiros não
parece ser um obstáculo importante no processo
sucessório; no caso de famílias descapitalizadas e em
transição, a compensação dos filhos não herdeiros
diretos é decidida em função da capacidade de paga-
mento da unidade produtiva. Já nos casos das famíli-
as mais abastadas, pode existir até remuneração em
dinheiro. A maneira como foram estratificados os agri-
cultores entrevistados mostrou-se coerente: os capi-
talizados não só têm maior propensão a permanecer
na atividade paterna, como já se preparam de manei-
ra mais intensiva para tanto. Apesar da existência de
diálogo em vários aspectos que concernem o destino
da propriedade, é muito precária a autonomia dos jo-
vens no interior da família: poucos têm recursos, inici-
ativas próprias e até uma conta bancária. No caso das
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
101
moças, a esta falta de autonomia acrescenta-se a com-
pleta ausência de horizonte de assumir responsabili-
dades na gestão do estabelecimento. As respostas com
relação ao Banco da Terra mostram bem o potencial
que pode ter uma política fundiária ativa numa região
que não se caracteriza pela presença massiva do lati-
fúndio. As atividades não-agrícolas no meio rural, até
aqui, não parecem despertar de maneira significativa
os interesses dos jovens agricultores.
A dinamização do meio rural passa pela incorpora-
ção do grande número de jovens que demonstraram o
desejo de construir sua vida profissional no campo.
Trata-se de um conjunto de capacidades que não pode
ser desprezado quando se busca atuar na perspectiva
do desenvolvimento local. Por isso, é necessário que
organizações voltadas ao desenvolvimento rural per-
cebam que este não é necessariamente sinônimo de
agrícola e orientem suas ações, seu pessoal técnico,
seus instrumentos de desenvolvimento, investimento
em infra-estrutura e capacitação, para este mundo ru-
ral e heterogêneo que necessita de uma visão
multidisciplinar em sintonia com a realidade e as
potencialidades locais. Também é necessário fazer es-
forços no sentido de eliminar as imperfeições de mer-
cado – especialmente preponderantes no meio rural –
e buscar uma situação de igualdade de condições en-
tre as zonas rurais e urbanas, numa realidade que
Dirven (2000) denomina de “a level play field”, ou seja,
um equilíbrio entre ambas as áreas.
103
Conclusões
O
s atuais padrões sucessórios não vão conseguir
atender à demanda por terra dos jovens que
vivem nas unidades familiares do oeste
catarinense e que desejam permanecer no meio
rural. Portanto, é necessário o estabelecimento de
políticas fundiárias que conciliem a demanda dos
jovens por terra com a oferta das propriedades que
não terão sucessores.
Começa a existir no interior das famílias maior de-
mocratização das decisões, ampliando o espaço de
participação dos jovens. Entretanto, esta maior parti-
cipação nas decisões da propriedade não vem acom-
panhada de novas possibilidades de realização pro-
fissional oferecidas no âmbito das políticas de apoio.
Existe um enorme e crescente isolamento social dos
jovens que vivem nas comunidades rurais. Verificou-se
preocupante ausência das organizações representati-
104
vas e de apoio, sobretudo no segmento dos agriculto-
res em transição e descapitalizados.
As oportunidades de renda para os jovens agricul-
tores do oeste catarinense são compostas, fundamen-
talmente, pela produção de commodities, como suínos,
aves, leite, milho e feijão, que nas condições estrutu-
rais da maioria das propriedades, não proporcionam
rentabilidade atraente. Constatou-se a baixa presen-
ça de ocupações e de rendas não-agrícolas no meio
rural. As alternativas existentes representam muito
mais uma situação de precariedade econômica do que
de ascensão social.
Existe um forte desejo de continuidade na agricultu-
ra familiar por parte dos rapazes, mesmo no caso da-
queles que vivem em unidades com rendimento econô-
mico precário; porém, há uma visão bastante negativa
das moças a respeito desta alternativa profissional.
Os jovens que permanecem no meio rural, e que pro-
vavelmente serão os sucessores, possuem um baixo ní-
vel de escolaridade que dificulta o desempenho da ati-
vidade agrícola e principalmente a organização e o de-
senvolvimento das novas atividades que se colocam para
o meio rural. O nível de escolaridade atual compromete
o próprio exercício de cidadania, na medida que eles
não conseguem sequer ter acesso aos direitos legalmen-
te constituídos, como por exemplo, a obtenção da con-
dição de agricultor por meio do “bloco do produtor”.
O elevado desejo de acesso à terra, por parte dos ra-
pazes, contrasta com a magnitude do êxodo rural, sobre-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
105
tudo da população jovem, e conduz a vazios
demográficos que destróem o capital social existente,
comprometendo a continuidade da agricultura familiar e
a construção de projetos de desenvolvimento regional.
A população vivendo hoje no meio rural do oeste
de Santa Catarina (aí incluindo também suas peque-
nas aglomerações urbanas) é suficientemente impor-
tante para que um conjunto ativo de políticas possa
despertar o interesse dos jovens em sua valorização.
O mais importante é a reunião de um conjunto varia-
do de esforços no sentido não só de facilitar o acesso
à terra, ao crédito e aos mercados, mas a mudança do
ambiente educacional existente no campo e que não
é capaz de valorizar o conhecimento e por aí desper-
tar o real interesse dos jovens. Existe, no oeste de Santa
Catarina, um conjunto variado de organizações esta-
tais e não-estatais preocupadas com o desenvolvimen-
to regional. É das ações que decidirem desde já com
relação aos jovens que depende o futuro desta que
até hoje tem sido uma das mais importantes áreas de
afirmação da agricultura familiar no país.
107
Proposição de Políticas
A
s políticas orientadas a melhorar a inserção pro-
dutiva e a articulação com o mercado dos agri-
cultores famili ares do oeste de Santa Catarina
devem cuidar para que as ações em matéria de
tecnologia, crédito e comercialização sejam dirigidas
prioritariamente aos segmentos jovens (homens e
mulheres) das famílias dos agricultores mais pobres.
Considerando que o atual padrão sucessório vigente
na agricultura familiar do oeste catarinense é uma
ameaça a sua continuidade, é preciso desenvolver
mecanismos de ajuda para fazer a transferência da
propriedade (incluindo a transferência formal da terra
e o controle da propriedade) para os filhos que dese-
jam construir seu futuro profissional no meio rural. Es-
tudar as experiências de outros países, sobretudo aque-
les pertencentes à União Européia, e que já desenvol-
vem ações neste sentido pode ser o ponto de partida
108
para a construção de uma proposta adequada a nossa
realidade. As proposições que seguem não poderiam
ter caráter exaustivo. Na verdade, os movimentos so-
ciais brasileiros têm incluído de maneira pouco siste-
mática a reflexão sobre juventude em suas pautas.
Portanto, as reivindicações, as políticas e os instrumen-
tos para sua conquista serão desenhados e postos em
execução aos poucos. Trata-se aqui apenas de modes-
ta contribuição neste sentido.
a) Reordenamento fundiário
O acesso à terra é condição necessária para que os
jovens possam seguir na profissão agropecuária, uma
vez que o arrendamento não é considerado por eles
como opção. Ao mesmo tempo em que se constata
uma forte demanda por terra – traduzida pelo alto
interesse pelo Banco da Terra (ver acima, item 3.5) e
pelo número elevado de jovens que desejam ser
agricultores e não serão sucessores ou que possuem
terra em quantidade insuficiente – há um grande
número de propriedades que não terão sucessor ou
que serão vendidas. O grande desafio está em construir
políticas de acesso à terra que permitam transferir
estas propriedades para aqueles jovens que desejam
continuar na profissão de agricultor. As políticas
agrárias atualmente existentes mostram claramente
seus limites. Tanto o programa de assentamentos
quanto o Banco da Terra, em sua concepção atual, não
são suficientes para fazer com que as propriedades
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
109
sem sucessores, passem para as mãos daqueles jovens
que não possuem terra e que desejam prosseguir
exercendo a profissão de agricultor.
É necessário conceber políticas específicas de
reordenamento fundiário, que permitam a transferên-
cia de propriedades sem sucessores para jovens agri-
cultores, garantindo que estes estabelecimentos per-
maneçam nas mãos da agricultura familiar.
b) Educação e formação profissional
O baixo nível de instrução, tanto formal quanto in-
formal, demonstra a necessidade da urgente
implementação de programas de capacitação dos jo-
vens agricultores. Estes programas não devem se res-
tringir apenas à capacitação para o trabalho, mas tam-
bém para o exercício da cidadania. Propostas de ins-
trução dos jovens agricultores devem se preocupar tan-
to com o ensino formal quanto com programas de
profissionalização. Deve ser dada especial ênfase, nes-
te tipo de formação, a que os jovens tenham acesso
aos meios eletrônicos que possam permitir a amplia-
ção de seu círculo social e de seus conhecimentos. Mais
importante que a abertura de novas escolas é que se
altere o ambiente institucional que preside a relação
entre os habitantes rurais e o mundo do conhecimen-
to. O desafio de aproveitar os trunfos que o meio rural
representa para a sociedade contemporânea supõe
que o acesso à informação e a valorização do conhe-
cimento tornem-se prioridades de primeira grandeza.
110
A base inicial de um projeto de educação articula-
do entre governo federal (por meio do Ministério do
Desenvolvimento Agrário e do Ministério da Educação),
governos estaduais e municipais é que todos os jo-
vens residentes no meio rural possam completar o
segundo grau sem, para isso, ter que abandonar a re-
sidência dos pais. Mas o desafio maior está em que o
façam em condições de qualidade que lhes permitam
tanto capacidade de gestão para o trabalho em uma
propriedade familiar, como a possibilidade de enfren-
tar os desafios da inserção fora da profissão agrícola.
Transformar este objetivo num grande desafio regio-
nal (e, por que não, nacional) é a premissa mais im-
portante para a mudança na visão da sociedade a res-
peito do destino do meio rural.
A pesquisa constatou um impressionante atraso edu-
cacional, entre os jovens que pararam de estudar e que
são os mais prováveis sucessores. A geração de agricul-
tores que está tomando conta dos negócios hoje tem
um nível educacional muito aquém dos desafios que vai
encontrar pela frente. A própria introdução da informática
na agricultura fica seriamente comprometida, nem tanto
pela precariedade dos meios materiais de que dispõe a
maior parte dos agricultores, mas sobretudo pela escas-
sez de recursos culturais para lidar com novas tecnologias.
Assim, ao mesmo tempo em que se faz necessária a ga-
rantia do acesso ao ensino formal por parte daqueles
jovens em idade escolar, é necessária a construção de
programas para aqueles jovens que pararam de estudar
antes de concluir o segundo grau.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
111
Muitos jovens são levados a abandonar os estudos;
outros (sobretudo as moças) deixam o meio rural para
continuar estudando. Portanto, é necessário que seja
garantido o transporte escolar a todos os estudantes,
pelo menos até o segundo grau; responsabilidade esta,
que deve ser partilhada entre prefeituras municipais e
Estado. Além disso, é fundamental que as escolas fa-
miliares rurais possam receber incentivos significati-
vos, já que representam um caminho que associa a
formação dos mais jovens à mudança da atitude dos
próprios pais diante do trabalho e uma abertura po-
tencial em direção à inovação.
A criação de um programa de bolsas de estudo,
evitando que os pais interrompam a formação dos
filhos devido às necessidades de mão-de-obra na pro-
priedade, pode desempenhar um papel importante
para a agricultura familiar. Além de garantir o acesso
à educação aos filhos de agricultores, este programa
pode tornar-se uma importante forma de transferên-
cia de renda para o meio rural. É fundamental que as
experiências de bolsa-escola (tão bem sucedidas no
meio urbano), possam beneficiar as áreas rurais mais
precárias do país.
É fundamental que se criem mecanismos que per-
mitam aos filhos de agricultores – sobretudo aqueles
com desempenho econômico mais precário – o aces-
so aos cursos técnicos de nível médio voltados para a
agricultura e ao meio rural. Além disso, deve-se esti-
mular e fortalecer aquelas iniciativas de formação de
jovens agricultores existentes na região, como a expe-
112
riência das Casas Familiares Rurais e o Programa Terra
Solidária que, gerido diretamente por organizações não
governamentais e coordenado pela Central Única dos
Trabalhadores vem permitindo associar a formação
técnica e profissional à difusão de uma consciência
voltada explicitamente à valorização do meio rural.
c) Capacitação profissional
Existe hoje um conjunto considerável de organiza-
ções e programas voltados à formação profissional dos
agricultores. O desafio não está em localizar um ou
outro programa ainda não existente, mas em criar a
sinergia que transmita à população rural (sobretudo
aos jovens) os sinais necessários para que possam de
maneira verossímil construir seus projetos de vida no
meio rural. O essencial para isso é que se forme uma
verdadeira rede composta pelos mais diferentes tipos
de atores, das organizações locais, à Epagri, passan-
do pelos sindicatos, pelas escolas e pelas ONG e pe-
los Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural e
que associem a capacitação profissional à valorização
do território, da cultura e dos conhecimentos da po-
pulação. Os técnicos da Epagri, os estudantes univer-
sitários, os colégios agrícolas podem associar-se num
movimento de descoberta de potenciais produtivos
ainda não explorados na região. O importante é que a
formação estritamente técnica esteja sempre associa-
da a uma prática de valorização das capacidades pro-
dutivas e associativas da agricultura familiar.
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
113
É importante ressaltar, que juntamente com este
tipo de programa de capacitação profissional, devem
ser criadas linhas de crédito específicas para a instala-
ção de jovens agricultores que contemplem a
viabilização do projeto econômico da nova unidade.
Em resumo, que isto resulte em uma política perma-
nente para a criação e a formação de uma nova gera-
ção de agricultores.
Convém insistir, porém, na urgência de que o apren-
dizado e o uso da informática possam fazer parte do
universo de formação destes jovens. Se hoje o acesso
até à Internet pode parecer distante, o avanço das
tecnológicas de comunicação vai fazer com que em pou-
cos anos, o meio rural possa dispor destas tecnologias
de maneira bastante massiva. O acesso às novas
tecnologias da informação é tão fundamental para a ci-
dadania dos jovens agricultores quanto o acesso à edu-
cação, ao crédito e aos mercados. Sem a informatização
das regiões de agricultura familiar, é totalmente ilusório
imaginar uma política de desenvolvimento rural capaz
de despertar o entusiasmo dos jovens.
d) Programa de moradia no meio rural
Embora a pesquisa não tenha formulado ques-
tões para analisar as condições de moradia dos agri-
cultores, por ocasião da aplicação dos questionári-
os constatou-se que este problema é um dos com-
ponentes importantes que pesa nas decisões de
permanência dos jovens no meio rural em função
114
da precariedade em que vivem as famílias dos agri-
cultores, sobretudo os descapitalizados.
Em função da necessidade urgente de melhorar as
condições de moradia, propõe-se a criação de um pro-
grama nacional de habitação para o meio rural, que
poderia fazer parte do mesmo escopo do Pronaf (“Pronaf
moradia”) e deve ficar sob responsabilidade executiva
da Caixa Econômica Federal. A seleção dos beneficiários
deste programa deve passar, obrigatoriamente, pelo
conselho municipal de desenvolvimento rural.
O custo necessário para construir ou reformar es-
sas casas é baixo frente ao impacto na melhoria da
qualidade de vida que ele proporcionará. Durante a
pesquisa de campo observou-se que alguns agriculto-
res conseguiram construir suas casas com bom nível
de conforto com custos entre R$ 3.000,00 a 10.000,00.
A organização deste programa deve ser concebida pre-
vendo a utilização da mão-de-obra e de materiais exis-
tentes nas comunidades rurais, podendo servir tam-
bém como oportunidade de capacitação de agriculto-
res em atividades não agrícolas, como pedreiros, car-
pinteiros, eletricistas e pintores. O programa dever ser
flexível prevendo várias formas de pagamento, tais
como: programa de renda mínima articulado a um pro-
jeto de reflorestamento (para pagamento futuro em
madeira) ou pagamento em dinheiro.
e) Criação de novas oportunidades de rendas
A produção de commodities ainda é a principal alter-
Os impasses sociais da sucessão hereditária na agricultura familiar
115
nativa de renda e ocupa um papel fundamental na eco-
nomia regional. Contudo, apenas a produção primá-
ria não cria os postos de trabalho necessários para
atender o desejo de permanência dos jovens no meio
rural. Além disso, somente a atividade agrícola não gera
renda atrativa para satisfazer as expectativas dos jo-
vens, principalmente das moças que buscam ativida-
des menos penosas que o trabalho na agricultura. As
políticas públicas devem ter a preocupação de viabilizar
as atividades agrícolas no interior da agricultura fami-
liar e ao mesmo tempo criar um ambiente propício para
o surgimento de atividades não-agrícolas e de
verticalização da produção no meio rural.
A criação de agroindústrias de pequeno porte apre-
senta-se como uma importante alternativa de geração
de postos de trabalho e renda. Embora estas experi-
ências estejam ainda distante do horizonte da maio-
ria dos agricultores da região, iniciativas inovadoras
estão sendo desenvolvidas. Estas iniciativas vão na
direção da criação de pequenas agroindústrias famili-
ares grupais comandadas pelos próprios agricultores.
Uma das experiências de maior importância desen-
volvidas na região foi a construção do Projeto de
Agroindústrias Associativas dos Agricultores Familiares do Oeste
Catarinense- “Pronaf Agroindústria” elaborado em parce-
ria entre Epagri, prefeituras municipais e ONGs e con-
cebido de acordo com os princípios estabelecidos pela
então Secretaria do Desenvolvimento Rural do Minis-
tério da Agricultura e do Abastecimento – SDR/MA.
Este projeto partiu do que já havia acumulado na re-
gião em termos de competências técnicas, estruturas
organizacionais e institucionais.
Esta experiência pode constituir-se de base para a
construção de um projeto mais abrangente, capaz de
contemplar, principalmente, os grupos de agriculto-
res em transição e descapitalizados. Para tanto, se
faz necessária a superação dos problemas que estão
bloqueando a consolidação desta proposta, como as
dificuldades de acesso ao crédito, legislação restritiva
à construção de pequenas indústrias e apoio
institucional adequado.
116
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