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A Causa da Derrota
Rosa Luxemburgo
1902
Fonte:
The Marxists Internet Archive
Tradução de Nildo Viana.
O desmoronamento repentino da grande ação da classe operária belga, para a qual estavam
dirigidas os olhares de todo o proletariado internacional, é um duro golpe para o
movimento de todos os países. Seria inútil nos consolar com as frases gerais habituais
dizendo que a luta só está adiada, que cedo ou tarde também ganharemos na Bélgica. Para
julgar tal ou qual episódio da luta de classes, não basta considerar a marcha geral da
História, que no fim das contas nos beneficia. Esta não é mais do que a CONDIÇÃO
objetiva de nossas lutas e vitórias. O que é preciso considerar são os elementos subjetivos, a
atitude consciente da classe operária combativa e seus chefes, atitude que aposta para
assegurarmos a vitória pelo caminho mais rápido. Deste ponto de vista, imediatamente
depois da derrota, nossa primeira tarefa é darmos conta o mais claramente possível de suas
causas.
I - QUANDO TRIUNFA O OPORTUNISMO
O que surge antes de tudo com absoluta clareza quando se passa em revista a interrompida
campanha das últimas semanas, é a falta de uma tática clara e conseqüente de nossos líderes
belgas.
Como primeira medida vemo-los limitar a luta ao marco da câmara. Ainda que desde o
começo não houvera, por assim dizer, nenhuma esperança de que a maioria clerical
capitularia, a fração socialista parecia não querer proclamar a greve geral. Esta eclodiu pela
decisão soberana da massa proletária impaciente. Em 14 de abril podia-se ler no LE
PEUPLE de Bruxelas: Se disse que o governo está decidido a manter-se até o fim, e
também a classe se prepara para tudo. E por isso a greve geral acaba de ser proclamada em
todo o país, não pelos órgãos políticos do partido, sendo por seus órgãos econômicos, não
pelos seus deputados, sendo por seus delegados sindicais. É o próprio proletariado
organizado que, não vendo outros meios para vencer, acaba de decidir solenemente
interromper o trabalho em todas as partes".
O deputado Demblom, em 18 de abril, fez a mesma comprovação na câmara: "Quem se
atreveria a dizer ainda hoje que nada está em estado de agitação, sendo os próprios
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agitadores, frente a fulminante explosão da greve geral, que nós mesmos não
esperávamos?" (veja-se informe parlamentar de LE PEUPLE de 19 de abril).
Ao haver eclodido espontaneamente a greve geral, os chefes socialistas se declararam
imediatamente solidários das massas e da greve geral, como o supremo meio de luta. A
GREVE GERAL ATÉ A VITÓRIA, tal foi a palavra lançada pela fração socialista e pela
direção do partido. Em 15 de abril LE PEUPLE escreve "Desde o fundo de sua alma, os
socialistas haviam desejado não verem-se levados à greve geral, e o congresso de páscoa do
partido, remetendo-se às circunstâncias para determinar o instrumento conveniente de luta,
não havia decidido nada a respeito... porém somente a greve geral é capaz de nos assegurar
definitivamente e apesar de tudo a vitória".
LE PEUPLE de 17 de abril diz: "Não há cansaço nem desânimo na classe operária, o
juramos seu nome, lutaremos até a vitória".
LE PEUPLE de 18 de abril afirma: "A greve geral durará tanto tempo quanto necessário
para conquistar o sufrágio universal".
No mesmo dia, o conselho geral do partido operário decidiu CONTINUAR A GREVE
GERAL, depois que a câmara rechaçara a revisão.
Na manhã de 20 de abril, o órgão central do partido de Bruxelas assegura: "Continuar a
greve geral é salvar o sufrágio universal".
E no mesmo dia, a fração socialista e a direção do partido, com uma súbita meia volta,
decidiram terminar a greve geral.
As mesmas vacilações se manifestaram com respeito a outra palavra de ordem da
campanha: A dissolução do parlamento. Quando em 15 de abril, os liberais reclamaram a
câmara, os socialistas se abstiveram de intervir e portanto não votaram tampouco a favor do
adiamento do momento decisivo, adiamento desejado pela burguesia.
Postos frente à decisão de terminar a greve geral, nossos camaradas retomam essa palavra
de ordem e LE PEUPLE de 20 de abril recomenda aos operários: "Reivindicar por todas as
partes e a voz em coro a dissolução do parlamento. Inclusive até estes últimos dias se nota
um giro sobre o mesmo tema na atitude dos chefes. LE PEUPLE de 20 de abril apresenta A
BREVE GERAL como o único meio de impor a dissolução da câmara. Porém, nesse
mesmo dia , a direção do partido decide terminar a greve geral, e desde então a única via
que permite conseguir a dissolução do parlamento parece ser a intervenção do rei.
Assim se emaranharam, se cruzaram e se chocaram mutuamente as diferentes palavra de
ordem no transcurso da recente campanha belga: Obstrução ao Parlamento, Greve Geral,
Dissolução da Câmara, Intervenção do Rei. Nenhuma dessas bandeiras foi prosseguida até
o final e por último toda a campanha foi sufocada de um só golpe, sem nenhuma razão
aparente, e os operários foram mandados de volta à suas casas, consternados, com as mãos
vazias.
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Se não se podia esperar que a maioria parlamentar consentisse em revisar a constituição,
não se compreende porque se recorreu à greve geral, com tanta vacilação e repugnância.
Não se explica porque, de pronto, precisamente quando tomava um bom impulso, foi
suspenda quando se havia reconhecido que era o único meio de luta.
Se a dissolução do parlamento e novas eleições realmente deixavam prever a derrota dos
clericais, é impossível então a passividade de nossos deputados quando os liberais
propuseram dissolver o parlamento, e mais impossível todavia é compreender toda a
campanha atual para a revisão da constituição, que de todos os modos podia ser conseguida
efetivamente nas próximas eleições. Porém se é vã a esperança posta em novas eleições no
desprezível sistema eleitoral atual, é por sua vez incompreensível o entusiasmo atual dos
socialistas por esta bandeira.
Todas estas contradições parecem insolúveis no entanto se analisa a tática socialista em si
na campanha belga, porém elas se explicam muito simplesmente enquanto se considera o
campo socialista em sua união com o campo LIBERAL.
Antes de tudo foram os liberais quem determinaram o programa dos socialistas na recente
luta. Fundamentalmente por desígnio o partido operário teve que renunciar ao sufrágio
feminino para adotar a representação proporcional como cláusula da constituição.
Os liberais ditaram aos socialistas os MEIOS da luta, erguendo-se CONTRA a greve geral
inclusive antes que houvera eclodido, impondo-lhes os limites legais quando se
desencadeou, lançando primeiro a bandeira da dissolução da câmara, apelando ao rei como
árbitro supremo e decidindo por fim em sua sessão do dia 19, CONTRARIAMENTE a
decisão da direção do partido de 18 de abril, a culminação de greve geral. A tarefa dos
chefes socialistas vinha sendo transmitir à classe operária as bandeiras lançadas por seus
aliados e fazer a música da agitação que correspondia ao texto liberal. Finalmente em 20 de
abril, os socialistas puseram em execução a última decisão dos liberais mandando a retirada
de suas tropas.
Assim, em toda a campanha, os LIBERAIS aliados com os socialistas aparecem como os
verdadeiros CHEFES, os socialistas como seus submetidos executantes e a classe operária
como uma massa passiva, arrastada pelos socialistas a reboque da burguesia.
A atitude contraditória e tímida dos chefes de nosso partido belga se explica pela sua
posição intermediária entre a massa operária, que se lança na luta, e a burguesia liberal que
a retém por todos os meios.
II - PARLAMENTARISMO OU AÇÃO DE MASSA
Não somente o caráter vacilante desta campanha, mas também sua derrota final, explicam-
se pela posição dirigente dos liberais.
Na luta pelo sufrágio universal desde 1886 até o momento atual, a classe operária belga fez
uso da greve de massas como o meio político mais eficaz. Foi a greve de massas a que se
deveu, em 1891, a primeira capitulação do governo e o parlamento: o começo da revisão da
constituição. A ela se deveu, em 1893, a segunda capitulação do partido dirigente: o
sufrágio universal com voto plural.
É evidente que, inclusive desta vez, somente a pressão das massas operárias sobre o
parlamento e sobre o governo permitiu arrancar um resultado palpável. Se a defesa dos
clericais foi desesperada já no último decênio do século passado, quando não se tratava
mais do que o começo das concessões, a toda vista devia converter-se em uma luta de
morte agora que se trata de entregar o resto: a dominação parlamentar. Era evidente que os
ruidosos discursos na câmara não podiam conseguir nada. Fazia falta a pressão máxima das
massas para vencer a resistência máxima do governo.
Frente a isto, as vacilações dos socialistas em proclamar a greve geral, a esperança secreta
porém - evidente, ou pelo menos o desejo de triunfar no possível, SEM recorrer à greve
geral, aparecem desde o começo como o primeiro sintoma do reflexo da política liberal
sobre nossos camaradas, desta política que em todas as épocas, sabe-se, crê poder quebrar
as muralhas da reação com o som das trombetas da grandiloqüência parlamentar.
Não, obstante, a aplicação da greve geral na Bélgica é um problema claramente
determinado pela sua repercussão ECONÔMICA direta, a greve atua antes de tudo em
desfavor da burguesia industrial e comercial, e em uma medida muito reduzida somente em
detrimento de seu inimigo verdadeiro, o partido clerical. Na luta atual, a repercussão
POLÍTICA da greve de massas sobre os clericais no poder não pode ser, portanto, mais que
um efeito INDIRETO exercido pela pressão que a burguesia liberal, molestava pela greve
geral transmite ao governo clerical e a maioria parlamentar. Além disso a greve geral
também exerce uma pressão política DIRETA sobre os clericais, aparecendo-lhes como o
precursor, como a primeira etapa de uma verdadeira revolução andarilha em gestação, para
a Bélgica, a importância política das massas operárias em greve residiu sempre, e ainda
hoje, no fato de que em caso de rechaço obstinado da maioria parlamentar, estão dispostas e
são capazes de vencer o partido no poder por meio de distúrbios, por meio de sublevações
andarilhas.
A aliança e o compromisso de nossos camaradas belgas com os liberais privaram a greve
geral de seu efeito político em dois pontos.
Impondo de ANTEMÃO limites e formas legais à luta, submisso à pressão dos liberais,
proibindo toda manifestação, todo espírito da massa, dissipavam a força política latente da
greve geral. Os clericais não tinham porque temer uma greve geral que DE TODAS AS
MANEIRAS não queria ser outra coisa que uma greve pacífica. Uma greve geral,
acorrentada de ANTEMÃO aos grilhões da legalidade, se assemelha a uma demonstração
de guerra com canhões cuja carga haveria sido previamente arremessada à água, a vista do
inimigo. Nem sequer um menino se assusta de uma ameaça "com os punhos no bolso",
assim como o aconselha seriamente LE PEUPLE aos grevistas, e uma classe no poder,
lutando até a morte por sua dominação política, se assusta menos ainda. Precisamente por
isso em 1891 e 1893 lhe bastou ao proletariado belga com abandonar tranqüilamente o
trabalho para romper a resistência dos clericais que podiam temer que a paz se
transformaria em distúrbio e a greve em revolução. Por isso, inclusive desta vez, a classe
operária talvez não houvera necessitado recorrer à violência se os dirigentes não houvessem
descarregado sua arma de ANTEMÃO, se não houvessem feito da expedição de guerra uma
parada dominical e do tumulto da greve um simples alarme falso.
Porém, em segundo lugar, a aliança com os liberais aniquilou o outro efeito, o efeito direto
da greve geral. A pressão da greve sobre a burguesia só tem importância política se a
burguesia estiver obrigada a transmitir esta pressão a seus superiores políticos, os clericais
que governam. Mas esta só se produz se a burguesia se sente subitamente assaltada pelo
proletariado e se vê incapaz de escapar a este impulso.
Este efeito se perde quando a burguesia se encontra em uma situação cômoda que lhe
permite deslocar sobre as massas proletárias que leva a reboque, a pressão que padece,
antes que transmita-a aos governos clericais desembaraçando-se deste modo de um peso
difícil como um simples movimento de ombro. A burguesia belga se encontrava
precisamente nesta situação no transcurso da última campanha: graças à aliança ela podia
determinar os movimentos das colunas operárias e fazer cessar a greve geral em caso de
necessidade. Isto é o que ocorreu e enquanto a greve começou a incomodar seriamente à
burguesia, esta lançou a ordem de voltar ao trabalho. E aqui terminou a "pressão" da greve
geral.
Assim, a derrota final aparece como consequência inevitável da tática de nossos camaradas
belgas. Sua ação parlamentar não deu resultados porque a pressão da greve geral que
apoiava esta ação não se apresentou e a greve geral tampouco por ter, atrás dela, não estava
o espectro ameaçador do livre desenvolvimento do movimento popular, o espectro da
revolução.
Em uma palavra, a ação extra parlamentar foi sacrificada à ação parlamentar, porém,
precisamente por causa disto, ambas foram condenadas à esterilidade, e toda a luta ao
fracasso.
III - O BUROCRATISMO CONTRA A ESPONTANEIDADE
O episódio da luta pelo sufrágio universal que acaba de terminar representa uma reviravolta
no movimento operário belga. Pela primeira vez na Bélgica o partido socialista entrou na
luta ligado ao partido liberal por um compromisso formal, e, do mesmo modo que a fração
ministerialista do socialismo francês aliado ao radicalismo se encontrou na situação de
Prometeu Acorrentado. Saberão ou não libertar-se nossos camaradas do abraço asfixiante
do liberalismo? Da resposta a esta pergunta depende, não vacilarmos em dizer, o futuro do
sufrágio universal na Bélgica e do movimento operário em geral. Porém a experiência
recente dos socialistas belgas é preciosa para o proletariado internacional. Não será
novamente sendo um efeito desse sopro fraco e enervante do oportunismo que sopra a
alguns anos, e que se manifestou na aliança funesta de nossos amigos belgas com a
burguesia liberal.
A decepção que acabamos de sofrer na Bélgica deve nos por em guarda contra uma política
que, estendem-se a todos os países conduziria a graves derrotas e finalmente ao
relaxamento da disciplina e da confiança ilimitada que as massas operárias tem em nós, os
socialistas; destas massas sem as quais não somos nada e que algum dia poderíamos perder
com ilusões parlamentares e experiências oportunistas.
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