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Comunidade Lua Nova
Uma experiência de acolhimento a jovens
mães em situação de risco social
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Comunidade Lua Nova
Uma experiência de acolhimento a jovens
mães em situação de risco social
Prêmio Criança 2002
DIRETORIA EXECUTIVA
Diretor-presidente:Rubens Naves
Diretor-tesoureiro:Synésio Batista da Costa
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
Presidente:Ismar Lissner
Secretário:Sérgio E.Mindlin
Membros efetivos:Aloísio Wolff,Carlos Antonio Tilkian,Carlos Rocha Ribeiro da Silva,
Daniel Trevisan,Emerson Kapaz,Éricka Quesada Passos,Guilherme Peirão Leal,
Gustavo Marin,Hans Becker,Isa Maria Guará,José Berenguer,José Eduardo P.Pañella,
Lourival Kiçula,Márcio Ponzini,Oded Grajew e Therezinha Fram
Membros suplentes:Edison Ferreira,José Luis Juan Molina e José Roberto Nicolau
CONSELHO FISCAL
Membros efetivos:Audir Queixa Giovani,José Francisco Gresenberg Neto e
Mauro Antônio Ré
Membros suplentes:Alfredo Sette,Rubem Paulo Kipper e Vítor Aruk Garcia
CONSELHO CONSULTIVO
Presidente:Therezinha Fram
Vice-presidente:Isa Maria Guará
Membros efetivos:Aldaíza Sposati,Aloísio Mercadante Oliva,Âmbar de Barros,
Antônio Carlos Gomes da Costa,Araceli Martins Elman,Benedito Rodrigues dos
Santos,Dalmo de Abreu Dallari,Edda Bomtempo,Helena M.Oliveira Yazbeck,Hélio
Pereira Bicudo,Ilo Krugli,João Benedicto de Azevedo Marques,Joelmir Betting,Jorge
Broide,Lélio Bentes Corrêa,Lídia Izecson de Carvalho,Magnólia Gripp Bastos,Mara
Cardeal,Marcelo Pedroso Goulart,Maria Cecília C.Aranha Lima,Maria Cecília Ziliotto,
Maria Cristina de Barros Carvalho,Maria Cristina S.M.Capobianco,Maria Ignês
Bierrenbach,Maria Machado Malta Campos,Marlova Jovchelovitch Noleto,Marta
Silva Campos,Melanie Farkas,Munir Cury,Newton A.Paciulli Bryan,Norma Jorge
Kyriakos,Oris de Oliveira,Pedro Dallari,Rachel Gevertz,Ronald Kapaz,Rosa Lúcia
Moysés,Ruth Rocha,Sandra Juliana Sinicco,Sílvia Gomara Daffre,Tatiana Belinky,
Valdemar de Oliveira Neto e Vital Didonet
SECRETARIA EXECUTIVA
Gerente Executiva Operacional:Ely Harasawa
Gerente Executivo de Relacionamento:Luis Vieira Rocha
Área Administrativo-Financeira:Victor Alcântara da Graça
Área de Comunicação:Renata Cook
Área de Informação:Walter Meyer Karl
Área de Mobilização e Políticas Públicas:Itamar Baptista Gonçalves
Área de Mobilização de Recursos:Luis Vieira Rocha
Área de Planejamento e Avaliação:Ely Harasawa
PROGRAMA PRÊMIO CRIANÇA
Coordenadora:Leila Midlej
Equipe:Maria do Carmo Krehan e Nelma dos Santos Silva
PARCERIA E APOIO
O processo seletivo e o evento de premiação do Prêmio Criança 2002 contaram com a parceria de:
Grupo Santander-Banespa
Abecitrus
Faber Castell
Apoio de:
Gol Linhas Aéreas Inteligentes SESC São Paulo Instituto Telemig
“Comunidade Lua Nova:uma experiência de acolhimento a jovens mães em
situação de risco social”
São Paulo,abril de 2004
ISBN:85-88060-13-2
Esta publicação é resultado do processo de sistematização da experiência
desenvolvida na Associação Lua Nova,vencedora do Prêmio Criança 2002 da
Fundação Abrinq na categoria Convivência Familiar e Comunitária.
Texto: Maria Cristina Meirelles
Preparação de texto:Immaculada Lopez
Revisão:Renato Potenza e Vivian Miwa Matsusita
Fotografias:Luis Dantas
Edição:Ricardo Prado (Área de Comunicação da Fundação Abrinq)
Projeto gráfico e capa:Silvia Ribeiro
Editoração eletrônica:Estúdio Silvia Ribeiro
Assistente de design:Nicole Boehringer
Produção gráfica:Finalle
Impressão e fotolito:Laser Press
Associação Lua Nova
DIRETORIA
Presidente:Raquel da Silva Barros
Tesoure ira:Patrícia Reis Aguiar
Secretária:Maria José Siqueira
Coordenadora geral:Raquel da Silva Barros
EQUIPE TÉCNICA:
Ana Paula da Fonseca Braga,André Reinaldo Soares,Carlo Signorini,Celina Barros
Mercúrio,Claudia Aparecida Rosa,Cristiane Regina da Silva,Doralice Ferreira dos
Santos,Janáina Iris Matias,Jéssica Oishi,Juliana Camargo,Luciane Cristina Tomaz
Maria Antonia Torres de Miranda,Marina Nazareth Pompeia,Marta Volpi,Maysa
Mazzon Camargom,Neusa Aparecida Corrêa,Sandra da Silva Lopes,Silvia Cristina
de Oliveira,Silvina Cecília Mojana,Silvio Arcanjo de Oliveira,Solange Aparecida
Rosa Tavares,Tiago Cavalcante,Viviane Reinecke
PARTICIPANTES DAS OFICINAS DE SISTEMATIZAÇÃO
Funcionários:Doralice Ferreira dos Santos,Claudia Aparecida Rosa,Benito Rosa
Filho,Solange Aparecida Rosa Tavares,Maria Antonia Torres de Miranda,Marina
Nazareth Pompeia,Antonio Petrone,André Reinaldo Soares,Gilson Pedro de Aguiar
Poletti,Rosangela Cristina Fernandes Caetano,Flavia de Souza Otuka,Aline
Anthero Rosa,Silvina Cecília Mojana,Josete Maria Conceição de Lima Freitas,Nanci
de Lima Freitas,Viviane Reinecke,Maysa Mazzon Camargo
Jovens:Cirlene Antonia Rosa Santos,Elaine Aparecida Rodrigues,Jeniffer de
Santana Ribeiro,Debora Fernanda Soares do Nascimento,Patricia da Silva Calmo,
Patricia Costa,Janaina Iris Matias,Sandra Aparecida da Silva Lopes,Ana Paula da
Fonseca Braga,Luciana Prudenciano
ivemos um drama silencioso,pouco visto e quase nada assistido:a
gravidez na adolescência.Uma em cada cinco mães brasileiras,segundo
o Censo 2000 do IBGE,tem entre quinze e dezenove anos de idade.
Estivéssemos no século 19 e não haveria escândalo ou incômodo algum nisso.
Nossas bisavós se casavam cedo,a mulher era praticamente excluída do
mercado de trabalho e,muitas vezes,da escolarização.Mas entre o século 19 e
o atual houve o século 20,de profundas mudanças,no qual as mulheres
conquistaram o direito de votar e ser votadas,ter uma profissão e escolher o
melhor momento para engravidar – as que assim o desejassem.Métodos
contraceptivos existem vários,vivemos a era da informação e,ainda assim,a
cada dia seis adolescentes brasileiras entram em processo de aborto,segundo
dados do Ministério da Saúde.
Quando a gravidez,mesmo sendo precoce,se dá em um contexto
acolhedor,a menina pode reestruturar sua vida e,aos poucos,retomar os
estudos e,dessa forma,conquistar autonomia.Mas quando acontece com
meninas vivendo em situação de risco,moradoras de rua muitas vezes
envolvidas com prostituição e drogadição,mãe e filho correm sério risco.E o
apoio,seja do poder público,seja de organizações da sociedade civil,
financeiro,psicológico ou médico,é quase ausente para essa parcela
extremamente desfavorecida da nossa população jovem.
É nessa condição de fragilidade social e emocional que ganha importância
a experiência da Associação Lua Nova,de Araçoiaba da Serra,interior de São
Paulo,vencedora do Prêmio Criança 2002 da Fundação Abrinq,na categoria
Convivência Familiar e Comunitária.O grande diferencial desse trabalho,
sistematizado com o apoio da empresa Blockbuster e publicado com o apoio
da Fundação W.K.Kellogg é aproveitar essa situação de risco para criar um
vínculo essencial entre a mãe e seu filho.Do vínculo,surge um novo projeto de
vida,capaz de absorver as necessidades da criança e da jovem mãe.
Separar a mãe adolescente que vive em situação de risco do seu filho só
reforça a exclusão social.Juntar os dois,ao mesmo tempo em que se trabalha
com a mãe a responsabilização pelo cuidado de seu filho,é apostar na
autonomia e na capacidade que o ser humano tem de tomar conta de seu
destino.E os dados confirmam a excelência deste trabalho até hoje pouco
conhecido:das jovens mães que passaram pela organização,apenas 8%
retornaram para a situação de rua original.
A lição de cidadania que a Comunidade Lua Nova oferece,e que pode
servir de inspiração,debate e exemplo para outras organizações da sociedade
civil e prefeituras igualmente preocupadas com essa questão,mostra um
caminho justamente no momento no qual tudo parece dizer o contrário.Nada
mais justo que premiar (e conhecer melhor) aqueles que dizem “sim”quando
tudo em volta diz “não”.
Boa leitura.
Rubens Naves
Diretor-presidente da Fundação Abrinq
pelos Direitos da Criança e do Adolescente
V
Rubens Naves
Diretor-presidente da Fundação Abrinq
pelos Direitos da Criança e do Adolescente
NASCE UMA NOVA LUA
....................................................................................................................
VIVER EM RISCO NO BRASIL
....................................................................................................
PERFIL DAS MENINAS ATENDIDAS .........................................................................................
CONCEPÇÕES E PRÁTICAS
.....................................................................................................
IMPLANTAÇÃO DO PROJETO .................................................................................................
PROPOSTA DA RESIDÊNCIA ..................................................................................................
1. Acolhimento .................................................................................................................................................
2. Acompanhamento em saúde e educação .............................................................
3. Atendimento psicopedágico ....................................................................................................
4. Atendimento psicoterápico .....................................................................................................
5. Trabalho com a criança ............................................................................................................
CONQUISTA DA AUTONOMIA
...................................................................................................
1. Profissionalização ...............................................................................................................................
2. Inserção social ..........................................................................................................................................
RESULTADOS E NOVOS DESAFIOS ...................................................................................
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................
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71
SUMÁRIO
8
.
Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta,anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim,ora não,creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.Cumpro a sina.
Inauguro linhagens,fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável.Eu sou.
Adélia Prado
9
10
Cada vez que nasce uma criança filha de uma jovem usuária de droga,
moradora de rua ou em situação de prostituição,a história de exclusão social se
repete.Ao lado de suas mães,esses meninos e meninas têm seus direitos
fundamentais negados.Muitas vezes,a resposta do Poder Público e da sociedade
tem sido separá-los,sem que isso sequer signifique a garantia de um futuro
diferente para um ou outro.
A certeza de que essa realidade pode mudar impulsionou a criação da
Associação Lua Nova.Valente,além de afirmar o direito dessas jovens e crianças
conquistarem uma vida digna,a iniciativa mostra que a oportunidade de mudança
ganha força no próprio vínculo materno.Acolhidos e apoiados,mãe e filho,juntos,
têm mais chances de ser felizes.
Em reconhecimento à originalidade e impacto social da proposta,a Lua Nova
recebeu o Prêmio Criança 2002,na categoria Convivência Familiar e Comunitária,
concedido pela Fundação Abrinq.Nesse ano,pela primeira vez,a premiação foi
dedicada às crianças pequenas,em busca de boas iniciativas para a defesa e
promoção de seus direitos.De diversos estados do país,foram apresentadas 294
experiências de organizações da sociedade civil,empresas e pessoas físicas.Ao
final,foram quatro premiadas,que tiveram suas propostas sistematizadas para
disseminação em outras cidades e estados.Esta publicação é,justamente,fruto do
processo de sistematização da experiência da Lua Nova,realizado entre novembro
de 2002 e abril de 2003.
Em todo o país,crianças,adolescentes e jovens em situação de risco pessoal e
social exigem políticas públicas capazes de garantir a proteção integral preconizada
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.Em condições de vulnerabilidade,o
cuidado,respeito e afeto só se efetivam a partir da existência de redes sociais que
apóiem as famílias.O investimento no fortalecimento do vínculo familiar e
comunitário – especialmente o dirigido às jovens mães – mostra-se um passo
importante para a conquista do direito das crianças pequenas a um ambiente
familiar e comunitário saudável e seguro.
A Associação Lua Nova é uma organização não-governamental sem fins
lucrativos que nasce com a missão de fortalecer a auto-estima,o espaço social,a
cidadania e o direito à maternidade com responsabilidade de jovens mães em
situação de risco social,possibilitando a vivência prazerosa do papel materno e a
formação de crianças psiquicamente saudáveis.São consideradas situações de
risco:o uso de drogas,a prostituição,a falta de moradia e a mendicância.
A iniciativa tem como objetivo a construção de referências para programas de
inserção social de mães adolescentes e seus filhos expostos a situações de risco.E
assim evitar a sua marginalização e discriminação,bem como a dolorosa e
freqüente separação das famílias.
11
NASCE UMA NOVA LUA
A Lua Nova foi criada em janeiro de 2000,na cidade de Araçoiaba da Serra,no
interior paulista,por iniciativa da psicóloga brasileira Raquel Barros.Mas sua história
começou bem antes,do outro lado do mar.Em 1984,surgiu em Veneza,na Itália,a
Comunidade Villa Renata,que trabalha com cura e recuperação de jovens
dependentes de drogas de ambos os sexos. Funciona como um Centro de
Pronto-Acolhimento,administrado por uma Associação de Familiares com o apoio
da Prefeitura de Veneza.Uma das suas principais estratégias é atuar em parceria
com os serviços públicos e associações voluntárias,de maneira a estabelecer
relações de colaboração e de complementaridade no programa terapêutico.
O atendimento enfatiza a quebra do isolamento e propõe o enfrentamento da
realidade e do entorno social.Nessa proposta,a comunidade tem importância
fundamental,uma vez que avalia continuamente o processo de mudança dos
jovens.O objetivo é mobilizar os jovens para que enfrentem a vida cotidiana de
modo responsável,assumam as dificuldades e convivam com as contradições,sem
fugir ou submeter-se passivamente.
Os educadores e terapeutas estabelecem vínculos indispensáveis para que os
jovens repensem a própria vida.Aceitar os novos modelos propostos por meio do
caminho comunitário,desmontar o estilo anterior de vida,e,portanto,mudar e
crescer em direção a uma autonomia progressiva exige vontade e convicção.
A experiência dos primeiros anos da Villa Renata mostrou que mulheres com
filhos apresentavam características significativamente diferentes de outras
populações em situação de risco.Em 1996,foi então fundada,com a participação
de Raquel Barros,a Casa Aurora – uma comunidade onde as mulheres
permanecem com seus filhos durante o tratamento.Também sediada em Veneza,a
comunidade já atendeu quarenta mães usuárias de drogas e seus filhos,com 70%
de sucesso no atendimento.Essa conquista levou a instituição a expandir seu
trabalho,por meio do apoio a outras associações.A Associação Lua Nova foi então
implementada no Brasil,inspirada pelos resultados e metodologias da Casa Aurora
e com o apoio da Cooperativa Villa Renata.
12
13
O desafio de reeditar essa experiência em outra realidade social e cultural,na
qual as condições de vida das jovens e o acesso a serviços são muito diversos da
experiência italiana,tem exigido a busca criativa por novas soluções e estratégias.
Entre as principais diferenças enfrentadas para a execução da metodologia no Brasil
estão:os tipos de drogas utilizadas,a escassez de recursos comunitários (creche,
escola,saúde,transporte etc.),a fragilidade das estruturas familiares de apoio e a
menor disponibilidade de recursos de financiamento institucional.
Apesar das dificuldades,a Lua Nova já colhe resultados animadores.O
acompanhamento das duplas – mães e filhos – tem mostrado que jovens expostas
a inúmeras situações de risco são capazes de assumir suas responsabilidades
maternas,sem colocar em risco a própria vida ou de terceiros.Muitas delas,que
buscavam respostas nas drogas ou na prostituição,passam a trabalhar,cuidar dos
filhos e planejar o futuro.As crianças,por sua vez,encontram oportunidade de
desenvolvimento integral.E,juntos,mães e filhos mudam suas histórias.
Diante da precariedade ou mesmo ausência dessas políticas,a experiência da
Lua Nova torna-se ainda mais valiosa.A metodologia experimentada revela-se
possível de ser reeditada por outras organizações.Nas páginas a seguir,são
apresentados o histórico e o contexto do trabalho da organização,bem como as
estratégias e ações do seu dia-a-dia.O relato foi produzido a partir das percepções
e aprendizagens de seus profissionais.Aprendizagens que resultam das tensões
entre a teoria e a prática,em constante renovação.
Não há um modelo pronto,mas sim um caminho traçado com muitas
dificuldades,dúvidas e desacertos.Mas certamente também marcado por
conquistas e esperanças.
14
ASSOCIAÇÃO LUA NOVA
Principais objetivos
Fortalecimento do vínculo materno
Apoio ao projeto de vida das jovens por meio de um trabalho
sociopedagógico e psicoterápico
Inserção social das jovens,com geração de renda e trabalho
Principais estratégias
Acolhimento das mães e de seus filhos em regime residencial,em quartos
conjuntos,num espaço acolhedor e saudável
Profissionalização e geração de renda
Criação de um espaço transitório entre a residência e a vida autônoma
Integração com a comunidade local
Formação de redes de atendimento
Principais projetos
Comunidade Lua Nova: espaço de residência onde são acolhidos as
mães e seus filhos,com atendimento sociopedagógico e psicoterápico
(Pág.11)
República Lua Crescente: espaço de residência transitório entre a
Comunidade Lua Nova e o desligamento completo da organização
(Pág.63)
Criando Arte e Buffet Escola:projetos de profissionalização e geração
de renda,desenvolvidos com participação das residentes e moradores
da comunidade (Pág.57 – 61)
Projeto Maternidade: espaço coletivo de reflexão sobre a relação mãe
e filho,incluindo acompanhamento individual das gestantes (Pág.52)
Projeto Crianças do Bairro: projeto pedagógico dirigido às crianças
residentes na casa e seus arredores,com destaque para a Casa das
Crianças (Pág.55)
Rede local:articulação de rede de atendimento,envolvendo os
equipamentos locais - creche,escola,posto de saúde,hospital,empresas
etc.(Pág.35 – 6)
Projeto Soma: articulação e fortalecimento de iniciativas de geração de
renda da região,visando ao desenvolvimento local sustentável (Pág.37)
Projeto de Redução de Danos: projeto de promoção de saúde na
comunidade,em parceria com o Programa de Redução de Danos de
Sorocaba (Pág.37)
15
Tudo era muito novo e eu não sabia bem aonde ia chegar. Sabia, porém, que uma das
melhores soluções para o sofrimento é o acolhimento, nos seus variados modos. Apostei
no afeto. O primeiro ano foi difícil e parecia que entrava água no barco por todos os
lados, mas a vontade era tanta de que ele não afundasse que surgiam idéias
mirabolantes para superar as dificuldades.
Depois de um ano e meio, participei do aniversário da filha mais velha de uma das
residentes – fruto de um estupro que a mãe sofreu aos onze anos. E vi aquela mãe que
quando chegou “odiava” a sua filha, guardar dinheiro, comprar uma bicicleta, fazer
salgadinhos, cantar parabéns e chorar, chorar muito. Todos nós choramos. Ali percebi que
o caminho era aquele. Logicamente ainda havia muito por ajustar e acrescentar, mas com
certeza o caminho era aquele.
Raquel Barros,presidente e coordenadora da Lua Nova
Tenho vinte anos e já sou mãe de dois filhos,um menino de cinco anos e
uma menina de três.E espero o terceiro.Estou morando na Lua Nova e vou
lhe contar brevemente a minha história.
Eu nasci numa família muito humilde e desde o começo foi uma luta
muito grande pela sobrevivência.Eu e meus quatro irmãos pedíamos esmola
na rua para ajudar a nossa mãe.Quando eu tinha dez anos,minhas irmãs
foram morar num orfanato.Eu fiquei em casa vendendo papelão para ajudar
a minha mãe.Nossa vida era uma miséria.Em casa,não tinha água nem luz.
Certo dia,eu estava pedindo esmola na rua quando um senhor pediu que eu
fosse na casa dele e em troca ele me daria algum dinheiro.Foi assim que me
envolvi na prostituição.Eu não gostava de fazer isso,mas aquele dinheiro era
muito importante para nós.
Quando tinha treze anos,conheci o pai do meu primeiro filho,mas
mesmo assim continuei a me prostituir.Foi com essa idade também que me
envolvi com o álcool.Aos dezessete anos,conheci uma menina que vendia
drogas e me convidou para vender com ela.Disse que dava muito dinheiro e
acabou me convencendo.Realmente o dinheiro era bom,eu pagava as
contas em casa e dava para sustentar meu filho.Só parei de traficar quando
ela foi presa,pois fiquei com medo que isso pudesse acontecer comigo
também.
Nessa época,minha mãe arrumou um cara e saiu de casa para morar
com ele.Fiquei muito triste.Fui morar então com meus tios,mas eles bebiam
muito e me batiam.Como não estava dando para ficar lá,fui embora.Meu
filho ficou com o pai,e a menina com uma família.Eu fiquei na rua.Foi então
que conheci o pai da criança que estou esperando.Fiquei um tempo na casa
dele,mas o relacionamento não deu certo.Fui embora sem saber que estava
grávida.Procurei a Secretaria da Criança e do Adolescente e pedi ajuda.Eles
me mandaram para uma pensão e fiquei lá até conseguir meus filhos de
volta.Foi aí que o Conselho me trouxe para a Lua Nova.
Aqui aprendi a cuidar melhor dos meus filhos,a viver em comunidade,
sempre respeitando o próximo.Aprendi a batalhar pela vida e a viver um dia
de cada vez.Chegando aqui tive que fazer alguns exames e descobri que
tenho Aids.Ainda não me acostumei com isso,minha família não sabe,não
tive coragem de contar.
Estar na Lua Nova é uma satisfação imensa,aqui sinto vontade de viver e
correr atrás dos meus sonhos.Não perco as esperanças de que eles um dia
se realizem.Sonho em ter minha casa para que eu possa morar junto com
meus três filhos,ser cantora e até mesmo conhecer a Bahia.
Ex-residente da Lua Nova
16
17
LINHA DO TEMPO
1984 Criação da Villa Renata,em Veneza (Itália)
1996 Criação da Casa Aurora,em Veneza (Itália)
2000 Criação da Associação Lua Nova e inauguração da
Comunidade Lua Nova,na área rural de Araçoiaba da Serra (SP)
Criação da Oficina Criando Arte
2001 Criação da República Lua Crescente,no centro de Sorocaba (SP)
Finalista do Prêmio Empreendedor Social,concedido pela Ashoka
Empreendedores Sociais
2002 Vencedora do Prêmio Criança 2002,categoria Convivência Familiar e
Comunitária,concedido pela Fundação Abrinq
2003 Criação do Buffet Escola Lua Nova
Finalista da Brazil Foundation com o Projeto de Formação de
Agentes Mutiplicadores
18
Para compreender melhor o trabalho realizado pela Lua Nova,é necessário
estender o olhar para a realidade da infância e juventude no Brasil.Segundo o IBGE,
aproximadamente 34 milhões de pessoas residentes no país são adolescentes e
jovens de quinze a 24 anos de idade,o que representa 20% da população.Desses,
cerca de 80% vivem em zona urbana,e 2,6 milhões (7,6%) são chefes de família.
Pelo menos a metade se compõe de mulheres,com 4,3% delas não alfabetizadas
1
.
São jovens inseridas em um contexto no qual 28,4% das famílias brasileiras
encontravam-se,em 1999,abaixo da linha de pobreza (renda
per capita
familiar até
meio salário mínimo/mês).Situação bastante concentrada na infância,adolescência
e juventude,mais intensamente entre negros e mulheres nesta faixa de idade
2
.
Educação
Embora a rede de ensino público tenha se expandido muito no Brasil nas
últimas décadas,33,5% da população entre quinze e dezenove anos ainda não vão
à escola
3
.Observa-se que a taxa de freqüência dos rapazes é ligeiramente maior do
que a das moças.Entretanto essa diferença não significa desigualdade de acesso,
mas sim que as adolescentes concluem sua escolaridade antes do que os rapazes.
De qualquer forma,a exclusão escolar ainda é marcada pela discriminação racial,
atingindo de forma mais intensa a população de origem negra.
Trabalho
A juventude entre quinze e 24 anos representa aproximadamente 25% da
população economicamente ativa do Brasil e tem sido intensamente atingida pelo
desemprego,informalidade e precariedade das condições de trabalho.Segundo
dados do Unicef de 2002,quase 63% dos adolescentes (entre doze e dezoito anos)
trabalham sem regularização oficial
4
.
Novamente,esses dados são marcados pela desigualdade entre homens e
mulheres,brancos e negros.Mais da metade dos adolescentes sem registro é
constituída por rapazes e moças de origem negra,que também sofrem mais com o
desemprego e os baixos salários.Por outro lado,destaca-se o grau de informalidade
presente no trabalho doméstico,ao qual se dedicam 30% das adolescentes
trabalhadoras do sexo feminino,entre quinze e dezenove anos,que moram nas
cidades
5
.
19
VIVER EM RISCO NO BRASIL
IBGE Censo Demográfico 2000.
Adolescência,escolaridade,profissionalização e renda – versão para discussão no Seminário Nacional pela Cidadania dos Adolescentes,
set.2002 – Fonte:IBGE/PNAD.
Adolescência - Escolaridade,profissionalização e renda – Propostas de políticas públicas para adolescentes de baixa escolaridade e baixa
renda,dez 2002,p.10 e 11 – Fonte:IBGE/Tabulação Avançada do Censo 2000.
Adolescência – Escolaridade,profissionalização e renda – Propostas de políticas públicas para adolescentes de baixa escolaridade e baixa
renda,dez 2002,p.22 e 23 – Fonte:Pochmann,2000.
Idem.
1
2
3
4
5
Gravidez na adolescência
Embora a taxa de fecundidade em geral tenha decrescido,o número de filhos em
cada grupo de mil mulheres brasileiras de quinze a dezenove anos subiu de oitenta
para noventa em uma década.Dados do IBGE mostram que,em 2000,mais de 330
mil crianças eram filhas de gestantes adolescentes entre doze e dezessete anos
6
.
O principal motivo de internações de adolescentes no país é a maternidade.Em
2001,25% dos partos realizados na rede pública aconteceram durante a
adolescência.Chama ainda a atenção o fato de que cerca de 40% das
adolescentes que tiveram uma gestação voltam a engravidar,sugerindo mais uma
vez a ausência de políticas efetivas para essa faixa etária.
7
De 1982 a 2002,a taxa de gravidez entre dez e dezenove anos de idade
aumentou 391% no Brasil
7
.Segundo a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde,em
1996,14% das mulheres entre quinze e dezenove anos tinham pelo menos um filho,
sendo maior o número de filhos entre as jovens de pior situação socioeconômica
8
.A
pesquisa mostrou ainda o impacto do acesso à educação:54% das jovens sem
escolaridade já haviam engravidado,enquanto só 6,4% das que tinham mais de nove
anos de estudo eram mães ou estavam grávidas pela primeira vez.
Diante da gravidez e das dificuldades enfrentadas,muitas adolescentes e jovens
optam pelo aborto.Dados do Ministério da Saúde,divulgados com base nos
atendimentos feitos pelo Sistema Único de Saúde,chamam a atenção para o fato
de que,todos os dias,cerca de 140 meninas têm a gestação interrompida.Seis
adolescentes entram em processo de aborto a cada hora no país! As complicações
durante gravidez,parto e pós-parto são a sexta causa de morte mais freqüente entre
mulheres de quinze a dezenove anos.
Embora os dados evidenciem a necessidade de priorizar essa questão na
agenda nacional,não significam que a gravidez na adolescência seja,
necessariamente,indesejada.Algumas pesquisas feitas entre grupos de
adolescentes e jovens indicam que o nascimento de um bebê nem sempre é visto
como algo negativo.Passado o impacto inicial,os ganhos relacionados ao vínculo
com a criança podem ser maiores que as perdas.
Entretanto,não existem no Brasil políticas e programas que enfrentem essa
situação e promovam intervenções de apoio às mães adolescentes.Também faltam
iniciativas de estímulo à interação entre os casais e seus bebês,visando à
construção de uma relação adequada,de complementaridade entre mãe e filho.
Crianças pequenas
Do lado das jovens estão seus bebês,em uma situação social marcada pela
exclusão.Das 23 milhões de crianças de zero a seis anos de idade residentes no
Brasil,apenas 32% freqüentam a educação infantil e apenas 9,5% de zero a três
anos têm acesso a creches
9
.Além do direito à educação infantil ainda não ser
universal,há problemas quanto à qualidade e recursos do atendimento já existente.
20
IBGE Censo Demográfico 2000.
Adolescência – Escolaridade,profissionalização e renda – Propostas de políticas públicas para adolescentes de baixa escolaridade e baixa
renda,dez 2002,p.26 – Fonte:Sociedade Brasileira de Pediatria.
Idem.
Unicef 2003 – Fonte:IBGE,Censo Demográfico 2000.
6
7
8
9
Quanto à saúde,houve um grande avanço no combate à mortalidade infantil,
apesar dos dados ainda serem preocupantes.Em 1990,a taxa brasileira era de
quase 48 mortes para cada mil crianças nascidas vivas.Em 2000,29,7 bebês entre
mil não sobreviviam ao primeiro ano de vida.Vale ressaltar a grande disparidade
regional,com o índice até três vezes maior em alguns estados do Nordeste em
comparação ao Sul ou Sudeste
10
.
Outra conquista tem sido a redução do baixo peso ao nascer.No entanto,todos
os anos,270 mil bebês ainda nascem no Brasil com baixo peso.Também merece
atenção o alto índice de retardo de crescimento que persiste nas áreas rurais do
país,onde 20% das crianças menores de cinco anos apresentam disparidade entre
altura e idade
11
.
Vioncia urbana
Durante a adolescência,a exposição à violência é maior.Do total do número de
óbitos de pessoas entre doze e dezessete anos,provocados por causas externas,
40,5% são por homicídio
12
.Por outro lado,segundo dados do Ministério da Justiça,
cerca de 50 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes são
registrados por ano,embora pesquisadores estimem que esse número represente
apenas 10% do total dos casos
13
.As violações muitas vezes ocorrem dentro de casa.
Apesar da falta de estatísticas oficiais,a violência doméstica (sexual,física ou
psicológica),ao lado da omissão e negligência dos adultos,é uma ameaça inegável.
A violência é a causa de 70% das mortes entre quinze e 24 anos de idade,
vítimas de acidentes e homicídio
14
.Dados do Ministério da Saúde revelam ainda
que,em 1996,a taxa de mortalidade entre quinze e dezenove anos era de 32 óbitos
em cada 100 mil habitantes,enquanto que na população em geral era de menos
de 25 óbitos
15
.
Expostos a uma intensa cultura de violência e sem um sistema de garantia de
direitos e políticas de proteção eficazes,os jovens muitas vezes acabam eles
próprios associados à violência e passam a ser vistos como uma ameaça frente à
qual é preciso reagir.
Em São Paulo,a Fundação Seade criou o Índice de Vulnerabilidade Social para
avaliar os riscos sociais da população entre quinze e dezenove anos moradora na
capital paulista.Detectou que a maioria dela vive em regiões de elevado risco de
contágio pela violência urbana:são mais de 335 mil adolescentes expostos a
situações cotidianas que os aproximam do tráfico de drogas e outras atividades
ilegais
16
.
DST/Aids
Entre 1980 e 1998,segundo o Ministério da Saúde,13% dos casos de HIV
diagnosticados no país ocorreram entre adolescentes.A tendência de contaminação
dos jovens,especialmente de baixo poder econômico,tem aumentado.Entre 1992 e
1999,o número de jovens com menos de dezenove anos com HIV cresceu quase
300%
17
.
21
Situação da Infância Brasileira 2001,Unicef,p.24.
Idem.
Situação da Adolescência Brasileira – Unicef.Fonte :Fundação Nacional de Saúde,do Ministério da Saúde,2000.
Conanda – Diretrizes Nacionais para a Política de Atenção Integral à Infância e Adolescência – 2001 -2005.
Adolescência – Escolaridade,profissionalização e renda – Propostas de políticas públicas para adolescentes de baixa escolaridade e baixa
renda,dez 2002,p.27 – Fonte:Jovens Acontecendo nas Trilhas das Políticas Públicas,Brasília:CNPD.1998,v.1.
Idem.
Idem.
Idem,p.26 e 27 – Fonte:Ministério da Saúde.
10
11
12
13
14
15
16
17
22
23
PERFIL DAS MENINAS ATENDIDAS
1. As jovens e as crianças que chegam à Lua Nova pertencem a esse universo de
exclusão e risco social.Entre agosto de 2000 e janeiro de 2003,foram recebidas 79
adolescentes e jovens (entre quinze e 25 anos) e 78 crianças (entre zero e nove
anos) com o perfil descrito a seguir.
resença dos filhos (no momento de chegada)
28 jovens acompanhadas de seus filhos
10 jovens com filhos abrigados em outras instituições
19 jovens durante a gestação
22 jovens sem filhos,sendo 11 encaminhadas por determinaçã judicial
Jovens segundo faixa etária (no momento de chegada)
Jovens segundo escolaridade (no momento de chegada)
50%
40%
30%
20%
10%
menos de 16 16 a 18 19 a 21 22 a 25 mais de 25
100%
80%
60%
40%
20%
nenhuma ensino fund.
incompleto
ensino fund.
completo
ensino médio
incompleto
ensino médio
completo
24
Crianças segundo faixa etária (no momento de chegada)
Filhos segundo faixa etária da mãe (no momento de chegada)
50%
40%
30%
20%
10%
0 a 1 2 a 3 4 a 6 7 e mais
menos de 16
16 a 18
19 a 21
22 a 25
4%
31%
28%
37%
As meninas carregam suas barrigas e usam drogas para passar a fome até o
nascimento de seus bebês. Dão à luz em hospitais públicos sem nenhuma anestesia e
saem depois de dois dias com uma criança da qual não sabem cuidar. É inacreditável que
bebês tão pequenos consigam sobreviver. Sobrevivem, mesmo que antes de nascer já
estejam inseridos em um ambiente sem os elementos afetivos, sociais e econômicos
necessários para um desenvolvimento saudável. É comum a continuidade das situações
adversas vividas pela mãe. A violação dos direitos básicos dessas jovens se repete na
vida dos filhos.
Raquel Barros,coordenadora da Lua Nova
Uso de drogas
Do total das jovens atendidas,73% foram ou são usuárias de drogas (álcool,
crack,maconha,cola,cocaína).O quadro abaixo mostra a incidência por faixa etária:
25
Direitos e deveres se tornam palavras destituídas de sentido. De fato, as histórias de
vida de meninas moradoras de rua são fortemente marcadas por experiências de
abandono familiar precoce, violência e abuso sexual, prostituição e impossibilidade de
inserção social. Morar na rua é uma opção em alguns casos, pois é melhor do que onde
vivem. É uma escolha em razão das poucas alternativas de vida que podem vislumbrar.
Stella Almeida,psicóloga da Lua Nova
50%
40%
30%
20%
10%
menos de 16 16 a 18 19 a 21
22 a 25
mais de 25
26
Prostituição
Do total de jovens atendidas,51% viveram ou vivem episódios de prostituição.
O quadro abaixo mostra a incidência por faixa etária:
Outras situações de risco
Do total das jovens atendidas,observam-se as seguintes situações de risco:
48% sofreram violência sexual doméstica
46% viviam nas ruas
33% cumprem medidas socioeducativas
18% são portadoras do vírus da Aids
38% têm apenas contato com a família de origem
25% têm contato com o pai da criança
menos de 16
16 a 18
19 a 21
22 a 25
mais de 25
5%
40%
27%
20%
8%
27
Seu pai foi morto com uma facada no pescoço por um vizinho na
frente dos filhos. Sua mãe – viúva, com quatro filhos, morando em
uma favela – foi trabalhar como faxineira em uma empresa. Diante de
uma situação economicamente insustentável, a mãe a vendeu, com
catorze anos, a seu patrão, um homem casado de 54 anos, que a
obrigava a manter relações sexuais. Desse relacionamento nasceram
três filhos – o primeiro quando ela tinha somente catorze anos. Ela
diz que tinha vergonha e nojo dele, mas que continuava com ele pelo
dinheiro e porque a mãe e o irmão, atualmente preso, a obrigavam.
Começou então a usar crack.
Quando ficou sabendo do uso de drogas, o “patrão” a abandonou na
rua, pagando a avó materna pela guarda das crianças. Sem dinheiro e
longe dos filhos, ela começou a se prostituir para comprar crack.
Passava a noite fumando e fazendo programa por cinco a quinze
reais. Começou então a morar na casa de uma mulher traficante de
drogas. Só parou de fumar quando chegou à Lua Nova há um mês e
meio. Está grávida de seis meses e não sabe quem é o pai.
Os outros três filhos continuam com sua mãe, que tem um
companheiro alcoólatra que agride a todos e diz que na casa não há
espaço para mais ninguém.
Sua esperança é conseguir o quanto antes a guarda dos filhos
para poder reconstruir sua família finalmente como mulher
independente e capaz de decidir pela própria vida.
Relatório interno da Lua Nova
28
29
Para acolher essas jovens e crianças e conquistar novas perspectivas de
vida,a Lua Nova lançou-se à construção de uma proposta educativa e
terapêutica que fosse viável e eficaz.Apesar de estar em constante renovação,a
proposta apresenta alguns valores,conceitos e estratégias que alicerçam sua
metodologia.
Concepção de criança e adolescente
Na Lua Nova,as jovens e as crianças são percebidas como sujeitos de
direitos.A equipe reconhece os valores,saberes e experiências adquiridos pelas
jovens antes de chegar à associação.Valoriza a capacidade de cada uma de
pensar sobre sua vida e desenvolver sua autonomia,efetivando um projeto de
futuro próprio,responsável e viável.Esse projeto parte da história,sonhos e
visão de mundo de cada jovem.
Também é entendido que,mesmo em situação de exclusão e risco social,
elas vivem as características típicas de toda adolescência,tendo vontade de
namorar,passear,sair...
Construção de vínculos
Na Lua Nova,a garantia da proteção integral à criança tem como ponto de
partida o fortalecimento do vínculo mãe e filho.Considera-se que o apoio às
jovens no resgate de sua identidade,espaço social,cidadania e direito a uma
maternidade com responsabilidade favorece a vivência prazerosa do papel
materno e a construção de relações em um ambiente psiquicamente saudável,
com a necessária proteção à criança.À medida que as crianças têm seus
direitos básicos garantidos,em um espaço seguro,perto de suas mães,rompe-
se um círculo vicioso de sofrimento e exclusão.
Outro desafio permanente e cotidiano é a construção de vínculos entre as
jovens,as crianças e a equipe,especialmente,os educadores.Em primeiro
lugar,eles precisam conhecer e compreender a história de vida da jovem e sua
criança.Em seguida,com cuidado e sem pressa,buscam estabelecer uma
relação de confiança.Trata-se de observar a forma pela qual as jovens e as
crianças se colocam no mundo e,a partir daí,desenhar o conjunto de ações
para apoiá-las,valorizando seu pensamento e aprendendo com elas.
No dia-a-dia,são criados momentos lúdicos e prazerosos,como também
realizadas atividades coletivas,principalmente da rotina da casa.A organização
de espaços comuns e a reserva de tempo para conversas diárias constituem
elementos importantes para a construção de vínculos saudáveis.De qualquer
forma,deve-se considerar que os resultados não acontecem de forma linear e
sem contradições.
São essas situações reais que ajudam o educador a perceber que a
aprendizagem de cada jovem depende sempre da forma pela qual ela se
coloca no mundo,que não é igual para todas.Quando o educador cria
estratégias de ação a partir dessa observação,deixa de controlar ou transmitir
experiências e passa a criar soluções novas para cada situação concreta.
CONCEPÇÕES E PRÁTICAS
30
A vivência de experiências que possibilitem a descoberta da criança pela mãe –
e vice-versa – colabora com a superação dos conflitos e rejeições ligados à gravidez
e promove a construção do vínculo materno. É o estabelecimento do vínculo,
sobretudo entre mães e filhos,que indica o momento em que a jovem está
preparada para se desligar do projeto.Só assim ela terá condições de preservar as
relações conquistadas,sem colocá-las em risco por causa das drogas ou
prostituição.
Agora tenho minha filha.Não sou mais sozinha na vida.Ela é gordinha,
branquinha,cabeluda...Um cabelo preto lindo.E tem olhos verdes.É linda! A
Lua Nova me ensinou como mudar de vida.Eu era muito revoltada.Eu não
deixava ninguém chegar perto de mim por causa do sofrimento que passei
na rua.Na rua,eles me roubavam,me machucavam e eu aprendi a me
defender.Ninguém se aproximava de mim na rua.Quando cheguei aqui,eles
queriam conversar,chegar perto e eu me trancava no quarto e ficava só
chorando,querendo ir embora.
Elisângela Ribeiro,residente da Lua Nova
Vida comunitária e familiar
Na metodologia da Lua Nova,o enfrentamento da realidade social e da vida
cotidiana revela-se um ingrediente decisivo para as jovens elaborarem estratégias
de superação de seus obstáculos e dificuldades.Originárias de uma situação de
exclusão social,muitas vezes as jovens constróem um mundo à margem da
comunidade e da família,com regras e códigos próprios.Assim,a busca constante
de formas para enfrentar a realidade é capaz de propiciar novas vivências e
alternativas para suas vidas.
A equipe da Lua Nova aprendeu que a capacidade de fazer escolhas não se
consolida de forma isolada.Ao contrário:é a abertura para a vida comunitária que
estrutura,de maneira viva e constante,as mudanças necessárias.Somente
pertencendo é que se transforma.
Ao mesmo tempo,o trabalho de sensibilização e mobilização da comunidade e
da família também abre possibilidades para as jovens experimentarem,em
ambiente protegido,uma nova forma de estar no mundo.Tecer redes de relações
diferentes apresenta-se assim um desafio permanente.
Ao chegar à Lua Nova, as jovens costumam estar com a auto-estima muito baixa e
estabelecem um vínculo afetivo muito forte com a equipe, como que pedindo proteção
materna, de uma mãe que muitas delas nunca tiveram. Outras chegam agressivas e
rejeitam de imediato um contato mais próximo. Nas duas situações há dificuldades, pois
em um momento ou outro elas rejeitam as regras, sugestões ou alternativas que
oferecemos.
Muitas vezes quebrei a cabeça tentando achar uma saída para os conflitos. Em
alguns momentos, cheguei a ficar muito confusa e perdida, com um medo enorme de
errar. Aprender a lidar com minhas dificuldades também foi um grande aprendizado.
Cláudia Aparecida Rosa,educadora da Lua Nova
31
A mobilização da comunidade local e a conquista de espaços concretos para
as jovens nas escolas ou empresas podem configurar um processo longo e
trabalhoso,que passa pela mudança de visão e mentalidade.
Apesar das dificuldades iniciais junto aos moradores,a equipe insistiu na
aproximação,diálogo e entendimento com os vizinhos,que resultou numa
verdadeira parceria.Antes de ter um carro próprio,por exemplo,a Lua Nova contava
com a carona dos vizinhos,que se revezavam para levar as jovens à maternidade
na hora do parto.
Além do envolvimento com a comunidade local,a Lua Nova realiza um trabalho
de aproximação e relacionamento com as famílias das residentes.Na maioria das
vezes,o abandono da filha,entre outras dificuldades,deriva da precária situação em
que se encontram os familiares.Fica claro que eles necessitam de auxílio tanto
quanto as meninas e crianças atendidas.O desafio é estruturar uma intervenção a
fim de que as adolescentes possam voltar ao convívio familiar,sem que sejam
expostas a novos riscos.Algumas vezes,a família acaba se recompondo por ação
da residente,estimulada a descobrir qual era – e qual será – o seu espaço.
Projeto de vida
Pensar sobre o futuro,traçar um projeto e criar condições para concretizá-lo são
ações que compõem o caminho essencial para a transformação de vida de cada
jovem que chega à Lua Nova.Desde o primeiro momento,a equipe mobiliza-se para
construir e realizar em parceria com ela seu projeto de vida e,a partir de então,
identificar espaços e procedimentos que o concretizem.
Torna-se estratégico organizar o cotidiano das jovens a partir da estruturação
do seu projeto de vida.Assim,se o desejo é ficar com o filho é preciso aprender os
cuidados necessários com o bebê e como administrar uma casa.Se para tanto é
necessário trabalhar,torna-se obrigatório voltar para a escola e pensar em
profissionalização.Um caminho interessante tem sido estabelecer metas específicas
para cada mês,tendo como norte a conquista de um objetivo mais amplo.
Alguns fatos me comoveram bastante na minha convivência com a Lua Nova.
Passamos uma virada de ano todos juntos na casa, e foi muito alegre. Outro fato
marcante, este bastante triste e de muita comoção, foi o falecimento de uma criança na
comunidade. Mesmo sabendo que fizemos tudo o que era possível, essa perda doeu
muito em toda a equipe. Outro acontecimento que não esqueço ocorreu com uma jovem
com quem eu tinha um vínculo afetivo muito bom. Eu entrei de férias e, nesse período,
ela e mais duas residentes fugiram. Quando soube, fiquei muito decepcionado.
Solange Aparecida Rosa,educadora da Lua Nova
32
Construção de um projeto de vida
A primeira entrevista sobre seu projeto de vida aconteceu na sua
primeira semana de residência na Lua Nova, quando a equipe e a
jovem decidiram que o mês de avaliação tinha sido positivo e que
ela permaneceria no programa proposto. Usuária de maconha, cocaína
e especialmente de crack, ela chegou à Lua Nova com a filha de onze
meses. Elas não tinham onde morar e foram encaminhadas pelo
Conselho Tutelar.
Mapeamento dos sonhos
• Sonha em ser veterinária
• Ter uma casa para morar com os filhos
• Estudar
• Casar
Projetos
Inicialmente, não conseguiu perceber o que significava ter
projetos e disse não ter nenhum. Aos poucos, vivenciando os espaços
da Lua Nova, passou a pensar na importância de ter trabalho, estudo
e de melhorar a relação com a filha.
Competências
• Cozinha bem
• Tem habilidades manuais
• Gosta de animais
• É proativa
Recursos individuais/sociais
• Afetiva
• Muito colaborativa
• Rápida nas decisões
• Interage com os demais de maneira cortês
Situação educacional
• Primeiro grau incompleto
• Proposta: deve freqüentar o grupo de alfabetização da entidade
parceira da Lua Nova
Capacitação
• Curso de culinária
• Curso de garçonete
• Curso de dança e teatro
• Aula de canto
Relações afetivas e sociais
• Mantém amizade com todas as residentes
O pai da sua filha estava preso e ela insistiu em revê-lo. Ao
sair da prisão, voltaram a se encontrar e ela percebeu que ele
era muito violento e agressivo. Decidiu então não procurá-lo mais
• Tem dificuldade em encontrar novos namorados
• Não queria se aproximar dos familiares, mas após insistência
da equipe foi visitar a avó e reatou o relacionamento
• A relação com a filha é muito impessoal e aos poucos está
melhorando
33
Comecei, junto com meu marido, cuidando do espaço em que hoje existe a Lua Nova,
pois havia na época muitos assaltos. Começaram então a chegar as primeiras doações e
depois vieram as primeiras residentes. Sempre tinha ouvido sobre o assunto das drogas
na televisão. Mas nada que fosse próximo, eu não tinha nenhum contato. Confesso que na
visita das primeiras meninas fiquei com bastante medo e disse ao meu esposo que eu
não queria ficar mais lá, pois os olhares delas me transmitiam muita insegurança.
Doralice Ferreira dos Santos,educadora da Lua Nova
O maior aprendizado do nosso trabalho tem sido descobrir soluções para cada caso.
Não existe uma receita. As situações são sempre novas e diferenciadas, necessitando de
um acompanhamento integral para cada projeto de vida.
Rosângela Cristina Fernandes,assistente social da Lua Nova
Situação psicológica
Dificuldade em expressar-se assertivamente
Usa padrão de comportamento agressivo direcionado a terceiros
ou a si mesma, independentemente dos estímulos envolvidos
Medo da rejeição
Análise das reais possibilidades
Teria dificuldade em fazer o curso de Veterinária, mas pode
trabalhar em um canil
Não consegue ser constante nas suas propostas e deve ter o
educador muito próximo
Tem dificuldade na gestão da maternidade, estudo e trabalho.
Deve definir prioridades e concluí-las
Perspectiva profissional
Sem experiência profissional prévia
Iniciou período de experiência na Oficina Criando Arte,
desenvolvendo atividades de acabamento
Tem interesse em trabalhar com vendas, em lugares com
movimento
Propostas: estágio em loja de roupas parceira da Lua Nova e
um dia de voluntariado no canil vizinho da comunidade
Parceiros do Projeto de Vida
Amigas antigas
Avó
A tia
O educador de referência
Antigas residentes
A professora de balé
O conselheiro tutelar que a encaminhou
A responsável pela Oficina Criando Arte
Relatório interno da Lua Nova
34
35
A base metodológica para este projeto ganhou vida a partir da implantação
da Associação Lua Nova no início do ano 2000.Meses depois,em setembro,foi
inaugurada a Comunidade Lua Nova,com o acolhimento das primeiras mães e
de seus filhos.Hoje,refletindo sobre sua trajetória,a equipe distingue cinco
etapas iniciais para implementar o serviço.Certamente,elas não ocorreram de
forma linear,mas podem servir como guia para novas intervenções.
Passo 1: Diagnóstico local
Para que a proposta realmente possa interagir de forma orgânica com a
comunidade onde se insere,torna-se fundamental o mapeamento da região.
Em primeiro lugar,deve-se identificar as demandas existentes.Quais as
temáticas mais freqüentes? Gravidez na adolescência? Uso de drogas?
Situação de rua? Prostituição? Em outras palavras,qual é o problema para o
qual a solução deve ser criada? O segundo aspecto é mapear os serviços de
acolhimento,tratamento e/ou prevenção dessas questões já atuantes na região
ou proximidades.Descobrir quais alternativas existentes que podem ser
potencializadas.
Dessa maneira,é possível caracterizar as questões sociais a ser
enfrentadas a partir da representação da própria região.Além de ajudar a
romper o isolamento da instituição e sua equipe,o diagnóstico local é o
primeiro passo para construir bases concretas para a avaliação de impacto do
trabalho.
A Lua Nova buscou decifrar essa realidade ouvindo a comunidade atendida
por organizações parceiras,como o Conselho Tutelar,a Prefeitura Municipal de
Araçoiaba,a Associação de Amigos do Bairro de Araçoiabinha.O objetivo era
diagnosticar suas principais necessidades.Em seguida,foi feita uma análise de
demanda junto à Secretaria da Assistência e Desenvolvimento Social do Estado
de São Paulo,que demonstrou a inexistência da oferta de residência para mães
com filhos maiores de quatro meses.Os serviços existentes não aceitavam a
presença dos filhos durante o processo de atendimento da mãe e não
investiam no vínculo materno.Centravam sua atenção no uso de drogas e
raramente se preocupavam com a construção do projeto de vida das pessoas
em tratamento.
Passo 2 : Formação da rede
O segundo passo é identificar possíveis parceiros na região.Baseada na
convivência comunitária e no enfrentamento da vida real,a proposta de
intervenção junto às meninas precisa construir uma rede local de serviços
capaz de dar suporte às necessidades concretas das jovens e das crianças.A
equipe deve preparar-se para um investimento permanente na transformação
IMPLANTAÇÃO DO TRABALHO
36
da parceria em uma rede de proteção integral,que aos poucos se tece em torno de
objetivos e compreensões comuns.
Para a Lua Nova,por exemplo,uma criança estar abrigada não significa que foi
abandonada pela mãe.A equipe defende que a mãe é capaz de reassumir o filho e
investe nisso o tempo todo.Como também a mãe abrigada não perde a capacidade
de assumir os cuidados com seu filho.Legalmente,o Estatuto da Criança e do
Adolescente prevê que,nesse caso,a guarda da criança é do dirigente do abrigo,
porém,pedagogicamente,a Lua Nova sustenta a idéia de que a mãe pode exercer
seu papel e dá a retaguarda necessária para que,em breve,ela venha a assumi-lo
sozinha.Mas para que isso seja possível,torna-se essencial que a Vara da Infância
e Adolescência compartilhe dessa compreensão.
Rede de atendimento
No sentido de formar uma rede,portanto,o primeiro foco de atenção da Lua
Nova foram os serviços de saúde para garantir o direito ao atendimento pré-natal e
ao parto das adolescentes,bem como a assistência aos bebês.Também foram
contatadas instituições,como a Prefeitura Municipal,o Juizado da Criança e do
Adolescente,o Conselho Tutelar,escolas,creches,empresas,que pudessem apoiar a
construção e a manutenção da residência.
Hoje,a Lua Nova conta com uma rede que envolve o Conselho Tutelar,a creche
e escolas do bairro,o posto de saúde e hospitais,além de profissionais liberais
voluntários e organizações que contribuem com o desenvolvimento profissional das
jovens.O Projeto Quixote,ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
oferece respaldo técnico à equipe,além de serviços de psiquiatria e pediatria para
as famílias residentes.
Passo 3: Sustentabilidade
Desde o princípio,também se apresentou o desafio de conquistar diferentes
fontes de renda para sustentar o projeto.Em 2003,o custo médio mensal do
atendimento oferecido pela Lua Nova era de R$ 500,00 para cada jovem e R$ 430,00
para cada criança,incluídos os gastos com recursos humanos,alimentação,água,
luz,telefone,gás,aluguel,farmácia,transporte,material de consumo,matéria-prima
das oficinas e material didático.
Atualmente,a organização conta com parceiros vitais,como a Cooperativa Villa
Renata,que doou o local onde foi instalada a primeira casa em Araçoiaba da Serra;
encaminha anualmente um profissional para participar da equipe; sedia as atividades
de cooperação internacional; compila a documentação necessária para as atividades
de captação de recursos; e representa todas as atividades da Lua Nova na Itália.
Também se destacam:OffPrintset Veneta,formado por um grupo de empresários
italianos que produz todo o material gráfico da Lua Nova em italiano;a Embaixada da
Itália no Brasil,que apóia as reformas e construções de novos espaços; a Secretaria
de Assistência e Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo,que mantém
convênio para o atendimento de 25 pessoas,contando mães e filhos.
Por outro lado,a Lua Nova investe na organização de festas e eventos para
arrecadar fundos e vender os produtos de suas oficinas.A comercialização dos
produtos,inclusive,tornou-se ponto de partida para a articulação de uma nova rede
comunitária,com a criação do
Projeto Soma
.O objetivo é fomentar o
desenvolvimento local sustentável,por meio da articulação e fortalecimento de
iniciativas de geração de renda,como grupos de artesãos,associações ou fundos
sociais.Juntos com a Lua Nova,esses grupos buscam o aperfeiçoamento dos
produtos e novos caminhos de divulgação e venda.
Passo 4: Mobilização da comunidade
A possibilidade de transformação das jovens só é possível quando elas entram
em contato com o seu contexto social de origem (família) e também com o atual
(comunidade local) e conseguem perceber-se
pertencendo
,desenvolvendo papéis e
funções sociais e estabelecendo vínculos.Daí a ênfase na mobilização da
comunidade como uma etapa fundamental na implantação do trabalho.
Antes da implantação da residência para as mães e seus filhos,a Lua Nova
iniciou um trabalho de conscientização e mobilização dos moradores do bairro.
Durante seis meses,foram organizadas reuniões para ouvir as questões da
comunidade e buscar mecanismos para superar suas dificuldades – foi o
Projeto
Comunidade Espaço Aberto
.
Logo as mulheres da comunidade apontaram a necessidade de ter um local
onde pudessem deixar os filhos para ir trabalhar.O direito da criança à educação
infantil ainda não era compreendido por elas com clareza,prevalecendo a
necessidade de a mãe poder trabalhar e colaborar com o orçamento doméstico.O
grupo então se organizou e foi reivindicar a construção de uma creche comunitária
junto à Prefeitura Municipal. Seis meses depois,ela foi inaugurada.
Durante as reuniões com os moradores,também foi discutida a possibilidade de
construir a Comunidade Lua Nova em parceria com a população do bairro,abrindo
novas oportunidades de trabalho.Daí surgiu a opção de trabalhar com educadores
e voluntários originários da própria comunidade.
A importância da interação com a comunidade,entretanto,não se limita ao
momento inicial do projeto.Deve ser contínua,pois novas temáticas vão surgindo.
Um exemplo representativo é o
Projeto de Redução de Danos
,desenvolvido em
parceria com o Programa de Redução de Danos (PRD),de Sorocaba.
O programa realiza um conjunto de ações em campo,através de agentes
comunitários de saúde,formados como “redutores de danos”.Faz parte da proposta:
troca e distribuição de seringas;orientação sobre uso seguro de droga;prevenção
de doenças sexualmente transmissíveis através da distribuição de preservativos e
orientação sobre sexo seguro;atividades de informação,educação e comunicação;
aconselhamento e encaminhamento; entre outras.
37
38
O PRD oferece suporte técnico para a Lua Nova; organiza palestras sobre uso
de drogas e sexo seguro para a equipe e as residentes;ajuda a identificar os casos
que podem ser atendidos por eles;supervisiona e orienta o atendimento a
residentes com HIV ou DST.A Lua Nova,por sua vez,supervisiona a equipe do PRD
no que diz respeito às especificidades de atuação com o público feminino,a
importância de valorizar as questões da maternidade,e desenvolve instrumentos
para a operacionalização de mapeamentos.Além do mais,a parceria ajuda na
animação da rede local envolvendo outras instituições da região.
Os novos dados epidemiológicos e a crescente chegada de mulheres HIV
positivo na comunidade levaram a equipe da Lua Nova a estruturar um programa de
redução de danos especialmente dirigido ao público feminino:o
Projeto Mulheres
Multiplicadoras
.Um detalhe importante é que as multiplicadoras são as próprias
residentes da Lua Nova,que conquistaram a oportunidade de vivenciar um novo
papel social.No total,25 jovens participaram da capacitação sobre autoproteção e
prevenção das DST/Aids,sendo que dez se formaram como educadoras
comunitárias para atuar como agentes de prevenção na comunidade,
especialmente entre as adolescentes.
Passo 5: Estruturação do espaço
A escolha e a organização do espaço do projeto devem ser coerentes com seu
fundamento principal,que é a possibilidade de integração com o entorno social.
Algumas diretrizes orientam essa fase do trabalho:
Conceber o local como um espaço aberto,que facilite tanto a inserção
social das jovens e crianças,como o acesso da comunidade local;
Criar um ambiente acolhedor,não padronizado ou burocratizado;
Prever áreas comuns e de lazer que rompam a idéia de
confinamento ou punição.São espaços facilitadores da integração e
da co-responsabilidade das residentes pelo bem-estar das crianças;
Garantir a privacidade das duplas (mãe e filho) em quartos conjuntos,
com o objetivo de facilitar a adaptação e reforçar o vínculo familiar;
Reservar espaços para os atendimentos das residentes e para o
trabalho da equipe.
O primeiro espaço conquistado pela Lua Nova foi a Comunidade Lua Nova,
espaço de residência para mães e filhos,situada no bairro rural de Araçoiabinha.A
casa já existia quando o terreno foi comprado,e muitas adequações se fizeram
necessárias – algumas já realizadas e outras a depender de recurso financeiro para
serem feitas.Atualmente,ela conta com onze apartamentos (um para cada duas
duplas); galpão para oficinas; cozinha; refeitório; sala para educadores;oficina para
as crianças; biblioteca;farmácia;salão de jogos; sala de TV; piscina; e horta.
Escolheu-se a zona rural porque seria mais caro e difícil encontrar uma casa ampla
na cidade.Era necessário garantir espaço e liberdade para as crianças brincarem.Além
do mais,em um bairro mais tranqüilo,as residentes teriam maiores chances de interagir
com personagens da vida local,como o padeiro ou o dono da farmácia.
A República Lua Crescente,por sua vez,foi instalada no centro de Sorocaba.
Como a proposta é que as jovens exercitem o desligamento da organização de
forma madura e planejada,foi escolhido um local de fácil acesso a creches,escolas
e hospitais.Alugada,a casa tem capacidade para alojar no máximo três jovens e
suas crianças ao mesmo tempo.
39
Passo 6: Formação da equipe
Após a identificação das necessidades e potenciais existentes na região,torna-se
possível definir melhor a equipe de profissionais.Ela própria será responsável pela
concepção,planejamento e implementação do projeto.A formação da equipe antes
do detalhamento da proposta oferece maiores possibilidades de que esta venha a
ser construída a partir de representações comuns.Cria-se a condição necessária
para uma maior responsabilidade,compromisso e cooperação entre todos.
Para compor a equipe de educadores e voluntários,a Lua Nova optou por
trabalhar com pessoas da comunidade,comprometendo-se com a sua formação
inicial e permanente.A grande maioria (90%) é moradora do bairro de
Araçoiabinha,onde está a residência.Além de facilitar maior envolvimento das
residentes com os moradores,essa escolha cria alternativas de crescimento
profissional e pessoal para a comunidade local.
CONTEÚDOS E COMPETÊNCIAS
NECESSÁRIAS AOS EDUCADORES
Ter concepção abrangente de criança e jovem
Ter concepção abrangente de processo educativo e terapêutico
Ter conhecimentos gerais sobre saúde,higiene,drogas e doenças
sexualmente transmissíveis
Conhecer a legislação da área:
1.Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
2.Lei de Diretrizes e Bases (LDB)
3.Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)
Saber trabalhar em grupo
Estar preparado para enfrentar desafios
Ter capacidade de decisão,iniciativa e flexibilidade
Para atendimento terapêutico e familiar,o projeto conta com dois psicólogos e
uma assistente social.Há também uma coordenação geral e administrativa para
oferecer apoio organizacional e financeiro para o desenvolvimento dos projetos.
Cada profissional tem atribuições e responsabilidades bem definidas:
Assistente Social:
responsável pelo acompanhamento familiar,faz a
ponte entre as jovens e seus pais ou responsáveis,possibilitando a
participação deles no processo terapêutico das adolescentes.Organiza
visitas mensais da residente à família e coordena a parceria com as
organizações que encaminham jovens para a Lua Nova.Desenvolve
trabalho em conjunto com as psicólogas para planejar,organizar,
realizar reuniões e oficinas diversas,como também adquirir um olhar
compartilhado da dinâmica interna e externa de cada uma das
residentes,facilitando sua inserção social.
Psicólogos:
responsáveis pela triagem,avaliação e acompanhamento
psicoterápico individual e coletivo,desenvolvem projetos em conjunto
com os educadores e acompanham o projeto de vida das jovens.
Educadores:
acompanham os psicólogos e a assistente social na
coordenação das oficinas junto às residentes.Acompanham o almoço,
providenciam a documentação das residentes,administram a
medicação e a bolsa-auxílio de quem participa das oficinas.Negociam
e renegociam as regras de convivência.São responsáveis pelo
planejamento e realização das atividades lúdicas,pedagógicas e
esportivas das residentes,incluindo a organização de eventos e
passeios quinzenais e o acompanhamento das atividades escolares e
do projeto de vida das jovens.Também faz parte do seu trabalho a
elaboração de registros diários e do caderno geral de passagem entre
os turnos,que compõem o histórico de cada dupla e o
acompanhamento do seu cotidiano.
Formação permanente
Traduzir conceitos em prática e refletir permanentemente sobre ela é uma
premissa do projeto proposto,que exige a criação de condições organizacionais
para o acompanhamento e formação dos profissionais.Estabelecer mecanismos e
espaços para que a equipe discuta e reflita sobre a ação concreta desenvolvida é
percebido como um elemento capaz de garantir e impulsionar a qualidade do
trabalho.Ajuda a releitura dos pressupostos conceituais e legais que lastreiam a
compreensão de infância,adolescência,processo educativo e terapêutico.
A experiência da Lua Nova aponta que a ênfase no processo formativo deve ser
dada para o aprimoramento da comunicação entre as diferentes áreas,bem como
para o desenvolvimento da capacidade de cada profissional no trato com o
cotidiano das jovens e crianças.No dia-a-dia,estão previstas reuniões semanais
entre os educadores,para avaliação e planejamento; supervisões mensais;
encontros bimestrais entre todos os setores para estabelecer metas e a metodologia
que será utilizada; e cursos periódicos para atender demandas diversas.
40
41
ORGANOGRAMA DA LUA NOVA
Coordenação geral:supervisão geral do atendimento responsável pela
cooperação internacional,parcerias,assessoria de comunicação e jurídica
Secretaria e administração:responsável pelas atividades financeiras e
contábeis,convênios,departamento pessoal,registros e relatórios
técnicos
Administrativo e estrutural:responsável pela estrutura física e
manutenção do espaço (higiene,limpeza,alimentação),desenvolvendo
projetos com as residentes para auxiliá-las e informá-las sobre esses
trabalhos
Captação de recursos:organização de eventos,venda de produtos,
convênios,parcerias com empresas,fundações e pessoas em geral
Projetos:responsável pelas diferentes áreas (educação,
profissionalização,atendimento psicoterápico etc.) que trabalham
diretamente com as jovens,as crianças e a comunidade
Estar em contato com as meninas da Lua Nova abriu um caminho de autodescoberta
e apropriação de meus direitos. Embora eu venha de um contexto social oposto ao delas,
as minhas dores, baixa auto-estima e desamor não diferiam. Passei por poucas e boas.
Minha ingenuidade teve que se deparar e se posicionar perante a astúcia e percepção
aguçada de garotas que davam um drible à vida. Arregacei as mangas e realizei feitos
para os quais nunca imaginei que tivesse capacidade.
Maria Ísis de Luca,psicóloga da Lua Nova.
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43
Após a estruturação do projeto,o passo seguinte da Lua Nova foi acolher as
jovens e seus filhos.Baseado na proposta de residência,o atendimento começou
com a inauguração da Comunidade Lua Nova,em setembro de 2000,
oferecendo moradia,educação,acompanhamento médico e psicológico.Até
janeiro de 2003,haviam sido recebidas 79 adolescentes e jovens (entre quinze
e 25 anos) e 78 crianças (entre zero e nove anos).Nesse mês,residiam na casa
22 mães e seus filhos,sendo que 41% das jovens tinham entre dezenove e 21
anos;32% entre 22 e 25; e 27% entre dezesseis e dezoito.
1. Acolhimento
Mensalmente,são recebidas cerca de vinte novas solicitações para
inserção de jovens mães e seus filhos em situação de risco na Comunidade Lua
Nova.Essas solicitações são originárias de diversos municípios do estado de
São Paulo,bem como de outros estados,do Acre ao Rio Grande do Sul.
No total,43% das jovens chegam à Lua Nova encaminhadas por outras
instituições e projetos sociais (especialmente na faixa etária entre dezenove e
21 anos) e 29% por Conselhos Tutelares (especialmente entre dezesseis e
dezoito anos).Para completar,11% são encaminhadas por igrejas e instituições
religiosas,10% chegam por iniciativa própria (especialmente na faixa etária de
22 a 25 anos) e 8% pela Vara da Infância e Adolescência.
Origem dos encaminhamentos segundo idade da adolescente
PROPOSTA DA RESIDÊNCIA
50%
40%
30%
20%
10%
projetos sociais conselho tutelar igreja espontâneo vara da infância
22 a 2516 a 18
19 a 21
menos de 16
Em um primeiro momento,as jovens passam por uma avaliação feita pela equipe
técnica com o objetivo de verificar a adequação da Comunidade Lua Nova à dupla
mãe-criança e vice-versa.O processo avaliativo consiste em uma primeira entrevista
euma visita prévia à Lua Nova.Normalmente a jovem vem acompanhada por uma
assistente social e algumas vezes por algum familiar,que se configure como um ponto de
apoio para o futuro processo de inserção social.A entrevista acontece com a participação
de educador,psicólogo e assistente social da Lua Nova.São feitos o cadastro e o
prontuário da jovem,bem como a avaliação dos recursos familiares e sociais.
Pontos de avaliação para entrada
Histórico pessoal (infância,adolescência e escolarização)
Histórico familiar (relacionamento com os pais,tios e avós)
Histórico de maternidade (relacionamento entre mãe e filho)
Histórico sexual (parceiros e perfil de relacionamento)
Histórico social (moradia,amigos,lazer)
Histórico profissional (cursos e ocupações)
Histórico médico-terapêutico (doenças,medicações,tratamentos
ambulatoriais,internações e antecedentes familiares)
Histórico de uso de drogas
Histórico forense (delitos,prisão,medidas socioeducativas)
Perfil para atendimento
Jovens com dezesseis anos ou mais,pois a proposta pressupõe o
investimento na formação profissional e no trabalho
Jovens residentes em municípios próximos,pois existe uma previsão
de visitas domiciliares e finais de semana na casa de parentes ou
conhecidos
Jovens sem problemas psiquiátricos graves,pois o projeto não conta
com educadores para as crianças,e as mães têm que ter condições
mínimas para cuidar dos filhos
Em média,por mês,a Lua Nova recebe sete encaminhamentos que não
atendem ao perfil proposto.Outros quatro também não são atendidos,apesar de ter
o perfil,por falta de vaga. Quando é possível acolhê-los,a jovem e seu filho são
recebidos por um mês de experiência.
Definida a data de sua chegada na casa,entra em ação a
Comissão de
Acolhimento
.Composta por educadores e residentes,a comissão acompanha a dupla
durante o período de experiência,sobretudo quanto ao entendimento da proposta do
trabalho.Todos os dias,a comissão realiza o registro do processo de adaptação,que
irá subsidiar a decisão da permanência da jovem na Comunidade Lua Nova.Um fator
decisivo é a opção da própria jovem em permanecer na Lua Nova especialmente em
caso de medida judicial,pois não há muros ou vigias para obrigá-la a ficar.
Critérios para permanência
Compreensão dos objetivos do projeto
Consonância desses objetivos com as expectativas da jovem
Adaptação da jovem às regras do projeto
Dificuldades e possibilidades de superação
Participação nas atividades
Relacionamento com equipe e residentes
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2. Acompanhamento em saúde e educação
Confirmada a permanência da jovem e seu filho na casa,o educador
providencia a regularização de seus documentos:CPF,RG,carteira de trabalho,
histórico escolar,carteira de vacinação,certidão de nascimento.
O período de residência é previsto para oito meses,considerado suficiente para
um processo de amadurecimento sem gerar vínculos de dependência com a Lua
Nova,que busca a inserção social das jovens.Ainda assim,não é um período
definido de forma rígida e,dependendo do histórico e circunstâncias de vida
específicas,algumas jovens permanecem por mais tempo.
Saúde
Já no primeiro mês de residência,o educador levanta as necessidades médicas
e odontológicas da residente e de seu filho.Em conjunto com a assistente social,
viabiliza então os encaminhamentos e atendimentos necessários.
A residente menor de idade vai acompanhada pelo educador às consultas
médicas e retirada de exames.Com a receita em mãos,o educador verifica se há o
medicamento prescrito em estoque e toma as providências necessárias,como a
inclusão da ficha da medicação nos turnos,o agendamento de exames e retornos
médicos.
Sempre que são necessários serviços médicos especializados,as parcerias são
acionadas.O Projeto Quixote,da Unifesp,garante atendimento psiquiátrico.A Santa
Casa de Sorocaba,por sua vez,oferece atendimento preferencial às jovens
gestantes,além de contar com médicos especialistas e dentistas voluntários.Ainda
assim,continua difícil garantir o pleno atendimento a todas as necessidades de
saúde,especialmente das crianças,que chegam fisicamente muito frágeis e
requerem serviços que nem sempre estão disponíveis.
Educação
Em paralelo à atenção à saúde,o educador acompanha a escolarização da
residente e de seus filhos,verificando as dificuldades e ajudando-as a encontrar
caminhos para superá-las.Ele verifica o rendimento escolar e a freqüência às aulas,
provas e demais atividades escolares.Organiza também os históricos escolares e as
matrículas,bem como as atividades de reforço escolar,quando necessário.
O acesso ao estudo é garantido junto às escolas do bairro.Entretanto,a qualidade
do ensino e o ambiente escolar ainda são um desafio.Muitas vezes,a escola torna-se
um espaço para uso de drogas.Por outro lado,as residentes apresentam grande
defasagem idade/série,são encaminhadas para os cursos supletivos noturnos e às
vezes desistem de estudar por causa do filho.Além disso,dependendo do momento
em que chegam à Lua Nova,já encontram o semestre letivo em curso,com
dificuldade de se inserir.
A Lua Nova tem aprendido a buscar alternativas,estabelecendo parcerias com
projetos universitários,com os quais as jovens se identificam mais,sobretudo
aquelas que ainda não estão alfabetizadas.
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3. Atendimento psicopedagógico
A Lua Nova considera que a vida cotidiana e as relações interpessoais
compõem um espaço essencial para compreensão e modificação dos
comportamentos e desenvolvimento de um projeto pessoal de vida.Sob
responsabilidade dos educadores,portanto,o atendimento psicopedagógico
acontece no desenrolar das atividades diárias.
O cotidiano das jovens está estruturado em torno da construção do projeto de
vida,que se inicia no momento em que ela ingressa na Lua Nova.Desde o
acolhimento,a equipe observa os objetivos,motivações e potencialidades de cada
menina.E,com ela,busca planejar e viabilizar seus sonhos e projetos.
O acompanhamento desse projeto pensado na perspectiva do dia-a-dia,o
trabalho com regras de convivência,a vivência da rotina e o apoio no cuidado dos
filhos e na interação com a comunidade local revelam-se os pilares para a
educação das jovens.
Trabalhando regras
As normas e regras da casa são consideradas o diferencial entre a vida que as
jovens estão construindo e o mundo que deixaram.Todas,por exemplo,devem
participar das atividades propostas (aconselhamento com educador,reuniões,
psicoterapia etc.),atender os horários,respeitar as funções e atividades de cada
um,além de participar da rotina de limpeza e preparo da comida.
Cada uma das questões propostas para o desenvolvimento das jovens traz em
si regras próprias:como estabelecer vínculos,como viver em grupo,como participar
da comunidade,como lidar com o filho.Entretanto,não basta o conhecimento da
regra para que sejam criadas soluções concretas para os problemas enfrentados.É
necessário estabelecer procedimentos que ajudem a interiorizar as regras e tragam
resultados.Resultados que,ao serem revistos e refletidos pelas próprias jovens,
sustentem as mudanças desejadas e promovam uma atitude autônoma diante da
vida.
A proposta busca estabelecer regras claras,pontuadas e viáveis.De qualquer
forma,motivam constante negociação.Na Lua Nova,elas são periodicamente
discutidas com as residentes,que apresentam muita dificuldade de adaptação,
sinalizando a importância desses limites no processo pedagógico.Estabelecê-las
exige critério e capacidade de equilibrá-las com as possibilidades concretas das
jovens se adaptarem.
Negociar as regras significa garantir que elas sejam adotadas pelo grupo.Cada
um se torna o avalista da sua execução,sem que o educador deixe de assumir sua
responsabilidade em cobrá-las.Mas,para que possa fazê-lo com clareza,ele deve
participar do processo de elaboração das regras e compreender sua motivação.
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Partimos da certeza de que as regras serão infringidas. Acreditamos que é nesse
processo de discutir as regras, desrespeitá-las e novamente discuti-las, que elas são
incorporadas gradativamente à nova proposta de vida. Negociá-las é uma forma de
impulsionar a adesão das jovens.
Raquel Barros,coordenadora da Lua Nova
47
UM DIA NA LUA NOVA
O educador que dormiu na casa acorda todo mundo.Elas acordam e dão
leite para os filhos.Uma das meninas é responsável pelo café-da-manhã.
Algumas já querem fumar,mas o cigarro é regulado (horário fixo para fumar e
uma caixinha sustentada por elas para comprar os cigarros.O horário do
cigarro – e também dos remédios – é controlado pelo educador).Depois,elas
levam os filhos com mais de sete meses para a creche e escolas da cidade.O
horário limite é oito horas,então,não podem se atrasar.No percurso,elas
costumam aproveitar para paquerar um pouco.
Ao voltarem para a Lua Nova,participam das oficinas de
profissionalização.As habilidades e desejos de cada uma são respeitados.
também quem gosta do trabalho,mas não consegue permanecer na oficina,
então leva para fazer em outro lugar.Quem não está na oficina limpa a casa,
cozinha...As meninas que estão com bebês ficam com os filhos,as que estão
grávidas no último mês ficam de licença.Quem tem consulta marcada vai para
o posto de saúde ou hospital.
Chega então a hora do almoço,e elas cozinham em rodízio.Há sempre as
que sabem cozinhar melhor,mas é um papel que confere poder e precisa ser
alternado.Já experimentamos várias formas de organizar essa tarefa.É um
momento difícil para o cumprimento das regras,pois em geral elas chegam
com fome e nem sempre respeitam a necessidade das outras ou das crianças.A
voracidade é manifesta na relação com a comida.
Voltam para a oficina ou para o trabalho,sempre com metas e avaliação
de desempenho.Hora,então,de buscar os filhos na creche ou na escola.Às
vezes, organizam algum passeio.Depois,o banho das crianças,jantar,lavar
roupa etc.Antes de dormir,ficam com as crianças,saem para fumar,assistem à
televisão,conversam...Assim é um dia típico na Lua Nova.
Raquel de Barros,coordenadora da Lua Nova
Na experiência da Lua Nova,o trabalho com as regras claras também ajuda a
diluir as principais fantasias e medos trazidos pelas jovens quando chegam à
associação.Ter clareza sobre o funcionamento da casa,por exemplo,permite
desmontar o recorrente medo de perder o filho,trabalhar de graça,passar fome,
entre outros.
Ao mesmo tempo,a discussão dos limites desencadeia conteúdos
fundamentais,como a vivência anterior em outras instituições,a proposta de
relação com o filho,a auto-responsabilização,a compreensão do papel de cada um,
o caminho para a conquista da independência e autonomia.
Trabalhando com a rotina
Outro ingrediente marcante do trabalho pedagógico,segundo a experiência da
Lua Nova,é a gestão dos tempos e espaços de convivência e a busca do equilíbrio
entre as atividades previamente estruturadas e as necessidades individuais.Afinal,a
programação do dia-a-dia deve combinar a estruturação das duplas no espaço
coletivo e o desenvolvimento da capacidade individual de sustentar projetos de vida
próprios.
Encontros semanais com educador
Cada residente tem um educador como referência na casa e,pelo menos uma
vez por semana,os dois sentam para conversar.Nesse momento individualizado,a
residente é olhada em suas particularidades,desejos,sonhos,ansiedades,dúvidas.
As conversas fornecem subsídios também para a orientação psicoterápica.Os
educadores compartilham com os psicólogos o teor dessas conversas e são
orientados em como proceder.
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Jovem, de dezessete anos, chegou com sua filha de três meses
desnutrida e desidratada, com alergia. Foi inicialmente encaminhada
pelo Conselho Tutelar de Carapicuíba para um abrigo que não poderia
acolher mãe e filha juntas. Aqui estranhou as regras, achando
desnecessárias, pois não usava droga há um mês. O pai, alcoólatra,
matou a mãe dela quando era pequena. O tio recebeu a sua guarda.
Ele vendia alface na rua e, quando não vendia, roubava para trazer
o dinheiro.
Ela começou a cheirar cola e usar maconha nas ruas. Teve uma
gravidez aos quinze anos, que resultou em aborto. Começou a se
prostituir para conseguir dinheiro. Não sabe quem é o pai da sua
filha. Revoltada, rebelde, não sabe cuidar da filha. Voltou a usar
drogas depois de três meses na Lua Nova. Seu relacionamento com a
filha teve uma pequena mudança, mas ela gosta de deixá-la com as
outras residentes e não dá muita atenção.
Relatório de um dos
educadores da Lua Nova
Uma ferramenta importante para acompanhar os avanços,curvas e recuos do
trabalho psicopedagógico é o livro de registro – uma tarefa diária dos educadores.
Nele,as decisões,necessidades e ocorrências do dia são compartilhadas.Anotam-se
todos os encaminhamentos,telefonemas e acontecimentos,como brigas,momentos
de alegria,solidariedade,visitas etc.A leitura desse registro faz parte da rotina de
todos os profissionais que atuam na Lua Nova e na Lua Crescente.
Cada uma das jovens também faz um registro diário de suas dificuldades,
conquistas,problemas de relacionamento com os educadores,outras residentes e
seu filho.É considerado um elemento fundamental para a adequação do
planejamento do processo de educação de cada uma das jovens.
Palestras e grupos de discussão
São realizados mensalmente palestras e grupos de discussão coordenados por
profissionais voluntários das áreas da saúde e educação,de acordo com as
necessidades detectadas.Administração de medicamentos,higiene e saúde,
doenças sexualmente transmissíveis,são alguns dos temas mais freqüentes.
4. Atendimento psicoterápico
Na experiência da Lua Nova,a psicoterapia é considerada indispensável para o
processo de educação e inserção social das jovens mães.Elas apresentam histórias
fortemente marcadas por abandonos,agressões e perdas.Nesse contexto,a
exisncia de espaços para reflexão e elaboração de alternativas de vida torna-se
crucial.O principal propósito é criar instrumentos para que as residentes lidem com
seus problemas,identificando aspectos de suas personalidades que necessitam de
maior auto-regulação.
Entretanto,tem sido necessária muita criatividade e flexibilidade no
desenvolvimento do trabalho terapêutico,pois os problemas são numerosos e
diversos,e os recursos,limitados.Há,por exemplo,a questão do espaço físico.Por
falta de salas específicas,a equipe usa espaços alternativos,como quartos,jardim
ou escritório.
Por meio de entrevistas,a equipe busca definir a melhor combinação
terapêutica para cada residente:
Psicoterapia individual e de grupo
Psicoterapia focal para dependência química
Projeto Maternidade
Acompanhamento do projeto de vida
Palestras e grupos de discussão
Psicoterapia individual e de grupo
As jovens são atendidas individualmente para acompanhamento da construção
do seu projeto de vida,elaborado em conjunto com o educador.A equipe considera
que esse é um dos principais desafios de todo o trabalho,exigindo uma grande
integração de toda a equipe.
A psicoterapia individual visa auxiliar ao autoconhecimento e identificar as
fragilidades e forças que precisam ser equilibradas a favor de seu projeto de vida.São
comuns as experiências de maus-tratos,dependência química,dificuldades de
relacionamento,agressividade e grande dificuldade de expressão.
49
50
O atendimento individual é realizado quinzenalmente pelas psicólogas da Lua
Nova.Embora não seja considerado o mais adequado,ele ocorre nas próprias
instalações da casa.Essa situação facilita o acesso das residentes,sem depender
do único carro da entidade ou da companhia de um educador para se deslocar.
O atendimento em grupo,por sua vez,busca contribuir com a socialização e a
percepção das questões internas a partir dos problemas comuns.Além do mais,
permite maior agilidade no processo terapêutico.Quando precisam de tratamento
psiquiátrico,as jovens são acompanhadas ao serviço oferecido por parceiros.
Psicoterapia focal para dependência química
Na Lua Nova,a psicoterapia para dependência química baseia-se no tratamento
focal breve e trata conteúdos específicos dessa problemática.O objetivo é informar,
conscientizar e fornecer modelos de enfrentamento da questão.Prioriza-se um
trabalho informativo sobre comportamentos e conseqüências do uso da droga,com
menor ênfase ao levantamento de emoções.Dessa forma,busca-se focalizar a
questão da droga no seu contexto.
O tratamento tem sido desenvolvido com o
Projeto Vídeo Transformação
,que
visa criar um espaço de auto-reflexão e construção da identidade por meio da
linguagem do vídeo.São realizados encontros semanais com as jovens,incluindo a
produção de entrevistas,debates e telenovelas.
Na entrevista psicológica, a residente, de 16 anos, relatou sua
história de vida. Viveu institucionalizada dos dois anos aos 14
anos de idade devido ao abandono dos pais. Fez duas tentativas de
convívio com a mãe, ambas mal sucedidas. Relata maus-tratos da mãe
e do padrasto. Fugiu, dirigindo-se e instalando-se em São Paulo,
onde trabalhou como pajem, porém, relata maus-tratos da
empregadora. Fugiu e procurou auxílio da polícia.
Há aproximadamente sete meses, surgiu a possibilidade de adoção
por uma família substitutiva, o que não foi efetivado por
desistência da família, que a expulsou de casa, sendo abrigada por
uma vizinha. Veio então a conhecer outra família para a qual
começou a trabalhar como pajem até o momento em que houve sua busca
e apreensão. Foi então encaminhada para a Lua Nova.
Durante a convivência na Comunidade Lua Nova, o pai solicitou a
sua guarda, mas a resposta judicial foi negativa. Ela demonstra
pouco interesse pela psicoterapia, geralmente falta às sessões, e
quando se dispõe a participar, efetivamente não participa.
Trabalhamos a sua indecisão e a escolha que deveria fazer entre uma
vida autônoma e outra gerida por terceiros. Optamos pela
continuidade do processo psicoterapêutico.
Relatório de uma das
psicólogas da Lua Nova
Desenvolvido por voluntários das áreas do cinema,teatro e dança,o projeto
com vídeo procura abordar assuntos ligados às vivências e necessidades das
jovens.A equipe participa das reuniões semanais da Lua Nova e tem
acompanhamento de um psicólogo.
1
o
encontro
Apresentação da proposta e dos seus objetivos:o grupo é um espaço
para discussão,informação e troca de experiências relacionadas ao
uso de drogas e outras dependências.
Discussão sobre as expectativas das jovens: o que elas acham da idéia
e como imaginam sua participação no grupo.
Início do trabalho de apoio na organização do pensamento em relação
a esta questão:cada jovem deverá pensar durante a semana sobre o
significado e sentido do uso de drogas,para que no próximo encontro
sejam entrevistadas (terão em média trinta segundos para responder,
como num programa de televisão).
2
o
encontro
Gravação em vídeo:são registradas as respostas de cada uma das
jovens em forma de entrevista de opinião.
Troca de experiências e de percepções:comentários de cada uma de
todas as entrevistas,procurando as semelhanças e diferenças.
3
o
encontro
Conversa sobre as drogas:fala-se sobre as drogas conhecidas pelo
grupo e sobre seus efeitos,com escolha de um ou dois tipos de droga
para aprofundamento.
Dramatização de um personagem:uma voluntária interpreta um
personagem que consome a droga escolhida,desde a preparação da
droga para consumo até o uso e seus efeitos.
Comentários sobre a proximidade da atuação com a realidade.
4
o
e 5
o
encontros
Mais conversa:fala-se sobre as outras drogas de maneira a garantir a
informação sobre todas as drogas conhecidas e utilizadas por elas.
Criação de um espaço lúdico coletivo:experimentação conjunta na
perspectiva da organização de um grupo de teatro que trabalhe o
tema.
6
o
encontro
Início da discussão sobre o contexto do uso da droga:lugar onde é
usada,lugar onde estão acessíveis,grupos que se formam em torno do
uso etc.
Criação de uma cidade imaginária:desenha-se o mapa da cidade com
supermercado,escola,farmácia,praça etc.
7
o
encontro
Discussão sobre o mapa:discutem-se os contextos envolvidos no uso
da droga.
Encenação dos personagens:são criados personagens comuns da
cidade (dono do supermercado, o policial,a senhora que passa na rua,
as crianças etc.) e é encenada sua relação com o usuário e
fornecedor de drogas.
51
Projeto Maternidade
A maternidade merece atenção especial do atendimento psicoterápico.As
residentes assumem no dia-a-dia as tarefas ligadas à maternidade,como preparar
as refeições da criança,levá-la e buscá-la na creche,brincar com ela,arrumar suas
roupas,lavar,passar.Todas as implicações da maternidade são discutidas
intensamente visando promover o exercício autônomo da função materna após a
saída da casa.
Em reuniões quinzenais,sob a coordenação de uma psicóloga,as mães e
gestantes discutem e refletem sobre a relação mãe e filho,os vínculos afetivos e os
cuidados necessários com a criança.A cada quatro encontros produzem um livro,
jogo ou produto artesanal temático,com o objetivo de concretizar discussões e
questionamentos sobre crenças sedimentadas,favorecendo o surgimento de outras.
Temas abordados
A gestante e o parto:as transformações do corpo e do humor da mulher
durante a gestação; as modalidades de parto; os cuidados na
alimentação da gestante; a necessidade do acompanhamento pré-natal.
O pós-parto:os cuidados necessários com a higiene da mulher; as
modificações ocorridas.
O recém-nascido:as necessidades físicas e psicológicas do
recém-nascido; os cuidados com a higiene.
Amamentação:a importância da amamentação para a saúde do bebê
e para o vínculo afetivo entre mãe e filho; os mitos sobre a
amamentação; a alimentação adequada para a lactante e o lactente.
As doenças infantis:os cuidados para evitar cólica; procedimentos
adequados para tratá-la.
Gravidez em situação de risco:a gestação de adolescente de risco; os
cuidados necessários; a importância de buscar ajuda.
O banho do bebê:o aspecto da higiene e do desenvolvimento de
vínculo afetivo entre mãe e filho.
Vivência do mundo infantil:resgate da infância das próprias mães a
fim de sensibilizá-las para as necessidades físicas,psicológicas e
afetivas das crianças.
Limites na educação:a necessidade de colocar limites para o
desenvolvimento saudável das crianças.
Violência contra criança:a violência física e sexual,a negligência dos
cuidados para com a criança; as maneiras de impor limites através de
métodos não violentos.
Identidade da criança:a importância de cada criança construir sua
própria história,através do conhecimento da história de seus pais e
seu nascimento.
Como nascem os bebês:a concepção humana a ser explicada às
crianças.
Por que as crianças choram:a identificação das necessidades afetivas,
físicas e psicológicas das crianças,através da observação e da
convivência.
52
53
As gestantes têm o acompanhamento individual de um educador durante todo
o pré-natal,parto e pós-parto.As principais questões trazidas por elas dizem respeito
ao momento do parto,à ansiedade quanto à saúde da criança devido ao uso de
drogas durante a gravidez,medo de não conseguir assumir a criança,corresponder
às suas expectativas,ou ainda,perdê-la após o nascimento.
Segundo a equipe da Lua Nova,os grupos têm contribuído com a superação
das dificuldades de expressão das jovens e com a reflexão sobre a educação
recebida por suas famílias e a relação existente com suas mães.Mas a principal
conquista,garantem os profissionais,tem sido a construção coletiva de padrões
alternativos de comportamento no trato com as crianças.Ainda que inicialmente
afirmem não precisar de nenhum tipo de conhecimento para cuidar dos filhos,cada
vez mais mostram-se sensibilizadas quanto aos temas relacionados à criança.
Esses dias minha filha ficou chorando e eu não sabia o que fazer.Daí,
lembrei do dia em que representei um nenê no grupo,do quanto a garganta
dói...Lembrei o que tinha que fazer quando a criança chora.Como não era
fome,nem estava suja,achei que era dor.E era,porque pedi remédio para a
educadora e ela conseguiu dormir.
Débora Fernanda Soares do Nascimento,residente da Lua Nova
54
5. Trabalho com a criança
O desenho do atendimento da criança parte do mesmo pressuposto utilizado
no trabalho com as mães:a vida na comunidade local.Nesse sentido,o
atendimento baseia-se na parceria com os recursos do bairro,incluindo creche,
escola e posto de saúde.
Ao chegar à Lua Nova,as crianças – especialmente as mais velhas – costumam
demonstrar agressividade,timidez e insegurança acentuadas,com dificuldade em
separar-se da mãe.Aos poucos,elas vão se soltando.Freqüentam a escola,os
postos de saúde e hospitais,estabelecendo relações e vínculos saudáveis.São
aprendizagens adquiridas.A agressividade e a enorme fragilidade dão lugar à
serenidade e ao fortalecimento físico.
Rotina na casa
Na Comunidade Lua Nova,o tempo e o espaço das crianças são organizados
em função de duas necessidades:garantir a intimidade da relação mãe-filho e
estimular a convivência coletiva.
Os cuidados rotineiros,como alimentação,banho,ida ao médico ou
brincadeiras são de responsabilidade das mães,sempre acompanhadas por um
educador. Por outro lado,são organizadas atividades coletivas,como jogos,
narração de histórias,músicas,atividades culinárias e artesanais,buscando
interação entre todos.Essa rotina coletiva está dividida em três períodos principais:
Manhã atividades com as crianças que vão à tarde para escola;
Tarde atividades com as crianças que estudam de manhã;
Início da noite atividades com mães e filhos.
Vínculo mãe-filho
A prática cotidiana da Lua Nova tem mostrado que a formação ou recuperação
do vínculo com a criança deve acontecer em harmonia com a disponibilidade
interna de cada mãe.Muitas delas têm uma vivência negativa de vínculo,vítimas de
maus-tratos ou violência doméstica.
Compreender as dificuldades não como falta de desejo de vínculo,mas sim
como impossibilidade interna,é a principal tarefa de quem se propõe a ajudar na
construção cotidiana dessa relação.Para encontrar o melhor caminho para cada
família,a equipe precisa observar e respeitar o tempo da jovem e estar sempre
disposta a rever as propostas feitas.Algumas vezes,é necessário até mesmo
considerar o desligamento do projeto para que a mãe amadureça seus objetivos.
Por que brincar? Porque brincar é dar à criança a oportunidade de
desenvolvimento. Brincando a criança experimenta, descobre, inventa, exercita e
confere suas habilidades. Aprende a relacionar-se com o outro, possibilitando um vínculo
maior com a mãe. A participação da mãe no jogo, na brincadeira, permite que a mãe e a
criança se aproximem, se conheçam, interajam.
Aline Anthero Rosa,coordenadora da Gerência Criança da Lua Nova
55
Projeto Crianças do Bairro
Além das atividades na casa,a Lua Nova busca trabalhar com a rede local já
constituída.As crianças residentes freqüentam a creche comunitária municipal,que
foi inaugurada em 2002 pela mobilização dos moradores locais e da própria
Associação.
Para contribuir com a melhoria da qualidade de vida das crianças da casa e seus
arredores,além de oferecer frentes de trabalho para as mulheres do bairro,a Lua Nova
mantém o
Projeto Crianças do Bairro
.Sua principal conquista é a Casa das Crianças.
Criada em 2000,ela funcionou primeiramente como creche (enquanto não havia a
creche municipal),mas hoje promove oficinas culturais para mais de 150 crianças e
setenta mães da Lua Nova e do bairro.São aulas de capoeira,natação,dança,entre
outras,coordenadas por lideranças comunitárias,além de atividades e festas.
,
Ela tem vinte anos. Sua mãe morreu de cirrose quando ela tinha
sete. O pai, que também bebia muito, vendeu a casa e foi morar com
a filha na rua. Ele começou a se relacionar com homens e, por
vezes, espancou a filha achando que ela estava competindo com ele
por parceiros. Ele usava crack, maconha, cocaína e álcool, e
ofereceu drogas à filha. Ela começou a usar drogas, não ia à
escola, era analfabeta. Aos quinze anos ficou grávida.
Depois do filho nascer, começou a ter uma relação estável com
outra mulher, que a ajudava a cuidar de seu filho. Moravam embaixo
de viadutos. De noite, ao arrumar sua cama de papelão, amarrava o
pequeno filho ao seu braço para que não caísse durante a noite.
Decidiu separar-se de seu filho entregando-o a um orfanato a fim de
protegê-lo da perigosa e sofrida vida da rua. Infelizmente o lugar
que pensava seguro se revelou ainda mais perigoso para seu filho.
Ela o visitava sempre, mas não tinha como tirá-lo de lá: o juiz só
devolveria a guarda à mãe se ela comprovasse ter onde morar e
emprego que garantisse o sustento do filho. Mas ela não se rendeu e
continuou a batalhar para seu filho. Nas entrevistas de triagem,
ela encontrou na proposta da Lua Nova a possibilidade de estar ao
lado do filho e de ser mãe novamente.
Hoje os dois são residentes da Lua Nova. Ela está sendo
alfabetizada, participa da oficina de confecção e começou a
aprender a costurar em máquinas industriais. Seu sonho imediato é
comprar uma bicicleta para o filho com o dinheiro de seu trabalho.
Seu sonho para o futuro é aprender a ler e escrever, arrumar um
trabalho, ter uma casa para viverem juntos.
Relatório interno da Lua Nova
O trabalho da Lua Nova é um trabalho de vida real, e a vida real sem droga, sem
prostituição, sem mendicância não é simples, nem fácil. O vínculo com uma nova vida vai
depender do enfraquecimento dos outros vínculos anteriores.
Raquel Barros,coordenadora da Lua Nova
56
57
Para garantir a efetiva inserção social das jovens e suas crianças,a Lua
Nova assumiu diferentes frentes de atuação.Após a inauguração da
Comunidade Lua Nova,base da proposta de residência,foram criadas a Oficina
Criando Arte,a República Lua Crescente,o Buffet Escola,além de espaços de
comercialização dos produtos e novas redes de articulação local.Apresentadas
a seguir,as diferentes iniciativas traçam um mapa de estratégias
experimentadas pela equipe.
1. Profissionalização
A finalidade da área de profissionalização na Lua Nova é investir no
potencial das jovens para gerar renda e trabalho e preparar a sua saída da
associação.O ideal seria que as jovens freqüentassem espaços de educação
para o trabalho no bairro ou na região,da mesma maneira que freqüentam
escolas e postos de saúde.Segundo a equipe,essa opção facilitaria a inserção
das jovens no mundo do trabalho na comunidade local,além de abrir
possibilidades de estágio nas organizações existentes na cidade.Sem encontrar
essa alternativa,a Lua Nova decidiu lançar,em 2000,a
Oficina Criando Arte
.
Quase três anos depois,surgiu o Buffet Escola Lua Nova.Nas instalações da
Comunidade Lua Nova,ambas as iniciativas têm caráter educativo e
profissionalizante.
Oficina Criando Arte
Criada em 2000,a Oficina Criando Arte visa à profissionalização,geração
de renda e inserção social das mães adolescentes através do desenvolvimento,
produção e venda de produtos artesanais.Está em funcionamento uma oficina
de confecção,e outras duas (cerâmica e serigrafia) estão sendo estruturadas.
Além da área de criação e produção,a oficina conta com estoque,
escritório,miniloja e cozinha.Em 2001,a oficina recebeu apoio do Prêmio
Empreendedor Social Ashoka-Mckinsey para a estruturação do seu plano de
negócios,procurando ampliar a capacidade produtiva e aumentar a
possibilidade de profissionalização e geração de renda das jovens mães,sem
ignorar seu valor terapêutico.Segundo a equipe responsável,a produção
artesanal assume papel fundamental na recuperação da dignidade,confiança e
auto-estima das jovens artesãs.
CONQUISTA DA AUTONOMIA
58
“Nascimento de um lado profissional” – esta frase é para mim.No meu
futuro eu só vejo coisa boa:conhecer pessoas,ganhar meu dinheiro.Muita
gente da minha família falou que eu não sou capaz de cuidar dos meus
filhos.Eu posso sim! E,quando eu sair daqui,vou procurar cursos de costura
para me especializar,me atualizar ainda mais.
Sandra Aparecida da Silva Soares,residente da Lua Nova
Aprendizes
Em 2002,a oficina de confecção recebeu 32 residentes da associação,
transformadas em aprendizes.Passado o primeiro mês de experiência das novas
residentes,elas são convidadas para uma entrevista na oficina que procura levantar
suas expectativas e opções quanto à participação na confecção.Recebem também
informações sobre a estrutura do trabalho,as regras e as modalidades de
funcionamento.
Se a opção for pelo ingresso na oficina,a jovem passa por um período de
experiência e por um processo de avaliação quanto à assiduidade,cumprimento de
metas,atenção,grau de responsabilidade e compromisso.A partir daí,passa a
receber uma bolsa-auxílio mensal.Essa renda está permitindo a abertura de
cadernetas de poupança para as jovens mães,o que as auxilia no projeto de suas
vidas futuras.
O que fazemos com o dinheiro? Damos para o educador guardar e,
quando precisamos comprar alguma coisa,ele autoriza dependendo do que
queremos comprar.Gastamos em roupas,sapatos...No meu caso vai tudo
para as minhas filhas,minhas quatro meninas.
Cirlene dos Santos Rosa,residente da Lua Nova
Na oficina,as residentes participam da criação de cada produto e aprendem os
passos necessários para sua confecção completa,com a supervisão das
costureiras,que são moradoras do bairro.Quinzenalmente,participam de uma
reunião com a equipe para refletir sobre seus potenciais e planos de trabalho,assim
como as funções exercidas na oficina.Também são realizadas atividades com
professores convidados,que falam de temas afins,como cerâmica,serigrafia ou
cultura afro.
Criação e definição dos produtos
As sugestões de novas técnicas e produtos para o Criando Arte são registradas
num livro,formando um “banco de idéias”.Semanalmente,a equipe de aprendizes e
os funcionários,em conjunto com a artista plástica,avaliam os produtos já
executados e discutem sobre a viabilidade das idéias levantadas.
Antes da definição dos novos produtos,o setor de custos pesquisa o preço da
matéria-prima,verifica fornecedores e detalha custos.A equipe da oficina considera
fundamental que também seja feita uma análise dos concorrentes e produtos
similares já existentes no mercado.O preço de venda é depois calculado
acrescentando-se os custos para distribuição,transportes,impostos e embalagens.
A oficina já trabalha com as seguintes linhas de produtos:
Linha Afro
Produtos:marionetes,bijuterias,runas,porta-incenso.
Objetivos:desenvolver o conhecimento da cultura negra e estudar
origens e etnias.
Matérias-primas:cerâmica,linha,tecido,madeira,tinta,papel,
miçangas,correntes,plumas.
Linha Infantil
Produtos:bonecas,bolsas,jogos.
Objetivo:trabalhar o tema da maternidade e diversidade através das
bonecas.
Matérias-primas:popelina,serigrafia,pano,enchimento,tinta,
cerâmica,linha.
Linha Folclore
Produtos:iemanjá,saci,sereia.
Objetivos:criar produtos característicos brasileiros para atividades
educativas e exportação.
Matérias-primas:pincéis,linha,pano,enchimento,lã,tinta,miçangas,
cola quente,plástico transparente fino,cordão, passante,serigrafia.
Ritmo de produção
Após a aprovação de cada novo produto,são definidas as metas de produção,
as etapas de trabalho e a equipe envolvida.
Trabalho na confecção desde que entrei na Lua Nova.Acho legal.A rotina
é assim:chegamos,uma corta,outra costura,outra pinta,vai enchendo,vai
marcando...Cada uma tem uma função específica,mas quando há pedido
grande,todas colaboram para atender a encomenda.Quando veio a
encomenda da Itália de quatrocentas bolsas,fizemos 75 por dia!
Rosemeire do Nascimento,residente da Lua Nova
Divulgação e distribuição
Além da venda direta para lojas de brinquedos educativos,a Lua Nova tem
conquistado espaços para venda própria dos produtos.Dessa forma,gera novas
possibilidades de trabalho para as residentes,que são responsáveis pela
administração dos pontos de venda.Entre eles,destacam-se um quiosque numa
chácara-restaurante em Araçoiaba da Serra e outro no Shopping Sorocaba,além de
estandes em bazares beneficentes,feiras promocionais e eventos culturais.Por outro
lado,os produtos são exportados para algumas cidades italianas.E também já está
em estruturação a venda pela internet.
Controle da qualidade de produtos
O controle da qualidade é uma preocupação constante da oficina.Entre o ano
de 2002 e 2003,foi realizada uma pesquisa no quiosque do Shopping Sorocaba
com cerca de oitenta pessoas que compraram ou consultaram os produtos.
59
Tecid o
Acabamento
Detalhes
Embalagem
Marca
Preço
Regular
8%
14%
16%
18%
10%
36%
Bom
92%
86%
68%
60%
76%
64%
Ruim
16%
22%
14%
60
Buffet Escola Lua Nova
Constituído como um espaço de formação profissional e qualificação para o
mercado de trabalho,o Buffet Escola Lua Nova desenvolve oficinas nas áreas de
hotelaria,buffet,cozinha e decoração,além de articular parcerias para oferta de
serviços.Suas ações são dirigidas para as residentes e também para jovens da
região com mais de dezoito anos e dificuldades de inserção no mercado de trabalho.
Todas as participantes são envolvidas na elaboração,manutenção e
planejamento do projeto.Dessa forma,garantem-se flexibilidade na metodologia e
atendimento às diferenças individuais.
De acordo com a postura básica da Lua Nova,o projeto utiliza os recursos
pessoais e institucionais já existentes na comunidade,viabilizando assim maior
troca de vivências e experiências.Para tanto,mantém parcerias com a Faculdade de
Hotelaria de Sorocaba,hotéis e restaurantes.
As oficinas são coordenadas por profissionais especializados em cada área e
compostas por aulas teóricas,práticas e estágio supervisionado,com 160 horas de
duração.Após essa etapa,as jovens podem optar por compor uma das equipes de
serviços:
Recepção e animação de festas e eventos:o serviço de garçons é
composto por uma equipe fixa e uma volante
Alimentação:pratos doces,salgados,salgadinhos e coquetéis são
preparados na cozinha do local ou na cozinha itinerante do Buffet Escola
Decoração de festas infantis e adolescentes:kits compostos de
painéis,toalhas,guardanapos,velas,pratos etc.A Oficina Criando Arte
é responsável pela criação e produção
Resultados
A Oficina Criando Arte tem trazido resultados complementares,de diferentes naturezas:
Psicopedagógicos:ligados à criação e ao desenvolvimento de produtos
pensados para ajudar a reflexão sobre a maternidade (bonecas
grávidas,jogos lúdicos etc.)
Sociopedagógicos:ligados à capacidade de estruturação,elaboração e
produção das jovens,dando-lhes um ofício e capacitando para o
mundo do trabalho
Financeiros:novos recursos para as artesãs e para a Associação
Os jantares que a Lua Nova promoveu foram organizados na ousadia e força de
vontade de toda a equipe. Tropeços? É óbvio que houve, mas a gratificação em ver as
meninas confiantes, servindo as mesas com orgulho de si próprias fez todos os
presentes sentirem que a Lua Nova é uma realidade possível.
Flávia de Souza Otuka,psicóloga da Lua Nova
O Buffet Escola,por sua vez,tem gerado resultados:
Psicossociais:a atuação junto a clientes desenvolve a capacidade de
relacionamento interpessoal,contribuindo para a melhoria da auto-
estima e consideração pelo outro
Sociopedagógicos:qualificação profissional,geração de renda e
melhoria da qualidade de vida
Depois que vim para cá,eu mudei.A confecção me ajudou a crescer.
Nunca tinha trabalhado e,com o passar do tempo,soube abraçar o que vinha
surgindo.Sou residente,sou secretária,vendo no apiário,vou para São Paulo,
aprendi a abraçar as oportunidades...
Cristiane Regina Pereira da Silva, residente da Lua Nova
Entre as principais aprendizagens destacadas pela equipe confirma-se a
importância de construir canais de capacitação das jovens,na perspectiva ampliada
da valorização e concretização de seus potenciais.A descoberta da capacidade de
gerar alguma renda,através da bolsa-auxílio,por exemplo,aparece como uma
enorme conquista. Também se destaca o exercício da responsabilidade e do
cumprimento de horários.
Ao mesmo tempo,o trabalho concreto e a vivência em equipes estruturadas
impulsionam – às vezes pela primeira vez – a vivência coletiva com valores de
respeito ao outro.A construção de novos valores por meio da produção conjunta
ajuda a descobrir a necessidade da comunicação e a superar o discurso inicial das
meninas – “não posso”,“não consigo”,“não sei”,“não tenho”.
Embora a oficina faça parte da instituição,percebe-se que as jovens mães
aproximam-se dela como se chegassem a um“mundo encantado”,que ao mesmo
tempo atrai e assusta.
61
Este espaço não aparece apenas como um espaço rígido de profissionalização. A
oficina tem uma característica de acolhimento, que propicia a estas mães a
experimentação. Elas podem criar, brincar com uma boneca em seu colo... Existem as
regras, mas também a possibilidade de mostrar seu potencial e ser reconhecida por ele.
Muitas vezes as mães não se julgam capazes de iniciar um trabalho na confecção.
Mas, com o tempo, com a possibilidade de aprender aos poucos, experimentar e escolher,
acabam se encontrando dentro deste espaço. Por isso, temos que respeitar a criação
destas pessoas, pois colocam a história delas nas suas criações. Mostramos sim, o que
pode e deve ser aperfeiçoado, mas jamais ignoramos ou deixamos de observar um
produto confeccionado. Este é um trabalho bastante complexo, delicado, pois
trabalhamos com a descoberta de potenciais de cada ser humano.
Elisa Maria Neiva de Lima Vieira,psicóloga da Lua Nova
62
2. Inserção social
Todo trabalho desenvolvido pela Lua Nova não se guia somente pelo
acolhimento e desenvolvimento das jovens e crianças em seus diferentes projetos.
Busca-se,desde o primeiro momento,garantir a construção de um projeto de vida
inserido na sociedade.
De acordo com a experiência da Lua Nova,as maiores dificuldades para o
sucesso de programas de atenção a adolescentes e jovens em situação de risco
dizem respeito justamente às condições sociais existentes para uma efetiva
inserção social.O trabalho com as jovens mães e seus filhos é uma prática
complexa,na qual as organizações responsáveis desempenham um papel
fundamental,mas não exclusivo.A sociedade e a comunidade local também
precisam se responsabilizar.Como conseqüência,em muitos casos,o desligamento
dos jovens de programas é o momento no qual eles enfrentam a falta de
perspectivas perante a vida.
Atenta a essa encruzilhada,a Lua Nova conta com profissionais dedicados
especialmente para acompanhar este momento a partir de critérios específicos.É o
Projeto de Inserção Social.Tem como objetivo otimizar as condições sociais reais
que as jovens têm para concretizar seu projeto de vida.
Antes de entrar na Lua Nova,eu era muito sofrida,não tinha onde dormir,
onde comer.Eu era alcoólatra e,depois de uma crise,fui internada numa
clínica de recuperação pelo Conselho Tutelar e lá descobriram que eu estava
grávida de quatro meses.Eu nem sabia.Para mim,foi uma alegria e uma
tristeza.Fiquei triste porque pensei no meu filho sofrendo tudo o que eu sofri.
E fiquei feliz porque eu era sozinha na rua e agora tenho uma criança para
me fazer companhia,para eu cuidar,para ser minha família.
Débora Fernanda Soares do Nascimento,dezesseis anos,residente
Ações desenvolvidas
Início do projeto de vida:entrevista com cada nova residente assim
que chega à Comunidade Lua Nova e início do processo de
elaboração de seu projeto de vida,a partir dos dados já levantados
sobre escolaridade,capacitação,experiência profissional.
Apoio no desenvolvimento do projeto de vida:mapeamento dos sonhos,
competências e recursos individuais/sociais e levantamento dos
interesses e aptidões para planejar o percurso da capacitação necessária.
Acompanhamento da situação familiar:estabelecimento de contato
com a família e visita domiciliar para que uma possível parceria seja
estabelecida.
Articulação de rede:contato com a instituição que fez o
encaminhamento da jovem para Lua Nova para apoio e colaboração
durante sua estadia e depois da sua saída.
Banco de parceiros para o projeto de vida:levantamento das pessoas
e/ou instituições da sociedade civil que possam investir na sua
capacitação educacional e profissional.
Vínculo com parceiro:contato pessoal da equipe com o parceiro
potencial e estabelecimento do compromisso de ambas as partes,
através de um contrato formal.
63
Reuniões da equipe:o educador de referência e a equipe terapêutica
trocam informações a fim de garantir coerência entre as diferentes
práticas educativas.
Avaliação do projeto de vida:encontros mensais entre os educadores e
as residentes para avaliação do desenvolvimento do projeto de vida e
do percurso terapêutico.
Saída da Comunidade Lua Nova:acompanhamento da passagem da
residência para a República Lua Crescente,orientando sobre o
significado da transição e as novas regras.
Transição:estabelecimento,em conjunto com a jovem,das novas
metas e objetivos para o projeto de vida,bem como as perspectivas
para o desligamento da Associação.
Acompanhamento:realização de grupos semanais,na República,para
reflexão acerca do trabalho,local e custos para moradia, gestão do
dinheiro,relação mãe e filho,visitas e saídas nos finais de semana.
Completado o ciclo na Comunidade Lua Nova,a jovem e seu filho passam um
período transitório na República Lua Crescente,que funciona em uma casa alugada
no centro de Sorocaba.Com apoio e acompanhamento da equipe,passam a viver
uma nova rotina com maior autonomia e mais responsabilidades.
Após a fase de transição na República Lua Crescente,é feita uma avaliação para
o desligamento da mãe e da criança da Associação Lua Nova.Nesse momento,a
equipe completa seu papel de ponte até a completa autonomia das jovens e seus
filhos.Essa avaliação segue diversos indicadores observados pela equipe.
Indicadores de avaliação para desligamento
Motivação para elaboração e concretização do projeto de vida
Envolvimento e dedicação no cumprimento de metas
Compreensão dos objetivos,significados e importância do projeto
pessoal
Regularidade do cumprimento das regras e normas
Participação e autonomia nas atividades propostas
Capacidade de organização das tarefas internas e externas
Qualidade das relações interpessoais com o filho, equipe,outras
residentes e pessoas externas
Higiene e cuidados pessoais e do filho
Responsabilidade na identificação,prevenção e tratamento de doenças
próprias e de seu filho
Organização e higiene do espaço,individual e coletivo
Mudança de hábitos quanto ao consumo de drogas
Uso dos recursos da comunidade:atendimento médico,assistência
social etc.
Freqüência à escola
64
65
Impacto social
Até novembro de 2003,a Lua Nova acolheu 136 jovens mães,acompanhadas
de seus filhos.Do total,26 deixaram o atendimento antes dos três primeiros meses.
Por diferentes motivos,elas não se adaptaram à proposta da Lua Nova ou – pelo
contrário – não encontraram na instituição a resposta que necessitavam.Das 108
que aderiram ao atendimento,31 continuavam no projeto em novembro de 2003.
As outras 77 já haviam deixado a casa e iniciado um novo projeto de vida.
A fim de avaliar o impacto de seu trabalho,a Lua Nova levantou e analisou a
realidade de vida dessas 77 jovens.A situação foi avaliada a partir do histórico
registrado pela instituição bem como dos relatos realizados pela equipe nos
contatos mantidos com as jovens.
Metodologia
A pesquisa considerou onze indicadores estabelecidos pela equipe como
elementos essenciais no processo de inserção social.Para cada indicador,foram
previstos três graus de risco,com pontuação crescente.A partir daí,foi analisado
item a item.
O passo seguinte foi somar os pontos recebidos por cada jovem nos diferentes
indicadores.O resultado foi então classificado de acordo com três faixas de
pontuação geral.Entre onze e 33 pontos,as faixas foram estabelecidas
considerando a necessidade de nota máxima em indicadores decisivos no processo
de inserção social,como a permanência com o filho,a conquista de moradia ou a
suspensão do uso de drogas.
Graus de risco:
Risco grave:01 ponto
Risco médio:02 pontos
Fora de risco:03 pontos
Soma dos pontos:
Risco grave:11 a 15 pontos
Risco médio:16 a 23 pontos
Fora de risco:24 a 33 pontos
Permanência com o filho
Mãe e filho vivendo juntos
RESULTADOS E NOVOS DESAFIOS
vive sem o filho
visita o filho
vive com o filho
100%
66
Vínculo com o filho
Intensidade e qualidade do relacionamento entre mãe e filho
Drogas
Prostituição
Situação da jovem em relação à prostituição
tem difícil
relacionamento
com o filho
tem relacionamento
oscilante de apego e
desapego
tem ótimo
relacionamento
com o filho
21%
35%
44%
usa drogas menos
freqüentemente do que
ao iniciar o atendimento
apresenta episódios
esporádicos de uso de
maconha ou embriaguez
não usa drogas há mais
de seis meses
19%
26%
55%
sai com mais de um
parceiro em troca de
remuneração
sai com mais de um
parceiro em troca de
outros benefícios
não se prostitui
25%
30%
45%
67
Moradia
Situação de moradia da jovem e seu filho
Creche/Escola
Inserção da criança na educação infantil
Trabalho
Inserção da jovem no mercado de trabalho formal ou informal
sem moradia fixa
tem moradia provisória
ou vive com amigos
aluga ou tem
casa própria
29%
38%
33%
criança à espera de vaga
na educação infantil
criança com baixa
freqüência na educação
infantil
criança com freqüência
regular na educação
infantil
19%
46%
35%
não trabalha
faz “bicos”
tem trabalho fixo
34%
44%
22%
Lazer
Acesso da jovem e da criança a opções de lazer e cultura
Família
Contato da jovem com seus pais,avós ou parentes próximos
Comunidade
Inserção da jovem na vida comunitária
68
sem atividades de lazer
com atividades de lazer
esporádicas
com atividades de lazer
freqüentes
34%
41%
25%
tem contatos mínimos
com familiares
encontra
esporadicamente
familiares
encontra
freqüentemente com
familiares
35%
46%
19%
tem bom
relacionamento
com a comunidade
busca relacionar-se
apesar das dificuldades
tem difícil
relacionamento
com a comunidade
34%
39%
27%
Lua Nova
Vínculo da jovem com a equipe da Lua Nova
Situação geral
Resultados
No período observado,de todas as jovens que finalizaram o atendimento na Lua
Nova,92% saíram do risco social grave.Apenas 8% voltaram a viver em situação de
risco extremo sem moradia,trabalho,em prostituição ou fazendo uso freqüente de
drogas.Do primeiro grupo,43% ainda apresentavam algumas situações de risco
mediano e 49% estavam fora de risco em relação a todos os indicadores.Uma
vitória que faz brilhar o potencial de disseminação da iniciativa,bem como de
inspiração na criação de políticas públicas para essa população.
No geral,a Lua Nova tem obtido grande êxito nos quesitos que são alvo do seu
foco direto de intervenção.O mais evidente é a construção do vínculo materno:
100% das jovens atendidas permaneciam vivendo com seus filhos.Outro exemplo é
o enfrentamento do uso de drogas:apenas 15% continuavam fazendo uso
freqüente de drogas e,mesmo assim,de forma menos intensa de que antes do
atendimento.
69
telefona
esporadicamente
para a equipe
visita a equipe uma vez
ao ano e telefona
regularmente
visita e telefona
freqüentemente
para a equipe
38%
41%
21%
vive em risco grave
vive em pequeno risco
vive fora de risco
8%
49%
43%
No entanto,os resultados também iluminam os desafios que a Lua Nova ainda
tem por enfrentar.Fica claro que a efetiva e completa inserção social das jovens
mães e seus filhos só será conquistada com a intensificação da rede social de
atendimento,incluindo políticas governamentais específicas.Afinal,43% das jovens
atendidas conseguiram sair da situação de risco extrema,mas não encontraram
políticas ou serviços que assegurassem oportunidades de moradia,trabalho ou
educação – consideradas essenciais para um projeto de vida diferente.Apenas 38%
conseguiram,por exemplo,um lugar para morar com autonomia e apenas 17%,um
trabalho fixo.Apesar de não serem foco de atuação específica da Lua Nova,esses
quesitos – ao lado da educação para os filhos e a superação da prostituição –
revelam-se decisivos para o êxito do trabalho.
Desafios
Um dos maiores entraves no processo de inserção social é a falta de estrutura
das famílias que,também desassistidas pelas políticas públicas,não podem dar às
jovens o suporte necessário para sua nova vida.Soma-se a isso a dificuldade para
encontrar canais de inserção das jovens no mundo do trabalho e de geração de
renda e muitas vezes,essa situação resulta numa dependência mais longa,
sobretudo financeira,da Associação Lua Nova,que várias vezes acaba por contratar
a jovem nesse período.
A experiência vem sugerindo,portanto,a necessidade de enfatizar o
planejamento da saída da residente e seu filho desde o momento em que chegam
à Associação.Além de uma integração maior entre todas as áreas,propõe-se o
estabelecimento de condições para que a jovem comece a utilizar redes de serviços
durante o seu período de permanência.
Hoje eu sei que a gente precisa de carinho na vida.A minha filha,eu
encho ela de beijos e abraços.Às vezes,dá até vontade de morder,mas
tenho medo de machucar.Eu quero dar para ela tudo o que eu não tive:
carinho,uma mãe,comida,uma casa...
Faz sete meses que estou morando na Lua Nova.Assim que ela fizer
cinco meses,vou procurar um emprego de garçonete.Eu fiz o curso,e eles
estão me ajudando a encontrar um emprego.Também vou continuar
trabalhando na confecção da Lua Nova,fazendo bonecas.Eu já tenho um
pouco de dinheiro por este trabalho na confecção,mas a Lua Nova guarda
para a gente não gastar com bobeira.Este dinheiro que estou juntando será
para eu alugar uma casa.Já estou vendo umas casas aqui por perto.
Eu preciso que alguém cuide de mim.Só tenho dezesseis anos.Eu quero
ter mais filhos.Eu vou esperar ela crescer,a gente montar nosso canto,eu
arrumar um emprego e então ter mais filhos.Eu nunca quis ter filho.Quando
me perguntavam eu dizia:"Eu,ter filho? Estou fora!".Agora olho para ela e
acho ela tão linda.Eu vou ser avó dos filhos de minha filha sim.Eu quero
muitos netos.
Para minha filha,quero um mundo de alegria,felicidade,sem aflição,sem
fome,com cores.Eu não achava que podia construir algo.E hoje estou
construindo minha família.Também aprendi a ter força de vontade,a lutar e
ter vontade de viver...viver muito.
Elaine Aparecida Rodrigues,residente da Lua Nova
70
ABERASTURY,Arminda.
Adolescência
.Porto Alegre:Artes Médicas,1983.
ARIÈS,Philippe.
História social da criança e da família
.2.ed.Rio de Janeiro:Guanabara,1986.
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Traçando caminhos em uma sociedade violenta:a vida de jovens infratores
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