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O trabalho Princípio da Insignificância ou Bagatela de TRINDADE MOREIRA, André Luiz foi licenciado com uma Licença
Creative Commons - Atribuição - Obras Derivadas Proibidas 3.0 Não Adaptada.
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PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA OU BAGATELA
Em um Estado Democrático de Direito como o nosso, a norma
penal incriminadora não é somente aquela que formalmente descreve um fato como
infração penal, sem sequer se importar se esse fato ofende ou não o sentimento social
de justiça.
Nesse contexto, e em consonância com Constituição e seus
princípios basilares, em especial o da dignidade da pessoa humana, o tipo
incriminador deverá, obrigatoriamente, selecionar, em meio aos inúmeros
comportamentos humanos, aqueles que, de fato, possuem real lesividade perante o
meio social.
Nesse passo, situações em que o tipo, de maneira abstrata,
pode não conflitar com a Constituição e seus princípios, mas, em casos especiais e
concretos, o emolduramento de uma conduta em sua definição meramente formal
pode mostrar-se como um ato de afronta à Constituição e seus princípios.
Exatamente nesse plano, bem como em consonância com nosso
Estado Democrático de Direito, imperativamente deve o Estado-juiz “investigar”,
ontologicamente, o tipo incriminador, haja vista que crime não é apenas aquilo que o
legislador diz ser formal , pois nenhuma conduta pode, de forma material, ser
taxada como criminosa quando, de modo nenhum, essa conduta colocar em perigo
valores fundamentais da sociedade.
Assim sendo, tipos penais que se limitam narrar formalmente
infrações penais, não obstante seu efetivo potencial lesivo, tendem a contrariar o
princípio da dignidade da pessoa humana, sendo que, em casos que tais, deve o
magistrado afastar tais condutas do alcance penal do Estado, em função de sua
mínima relevância jurídico-social, sob pena de violação do princípio da dignidade da
pessoa humana. Nesse sentido, vale colacionar o que nos leciona Celso Antônio
Bandeira de Mello:
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O trabalho Princípio da Insignificância ou Bagatela de TRINDADE MOREIRA, André Luiz foi licenciado com uma Licença
Creative Commons - Atribuição - Obras Derivadas Proibidas 3.0 Não Adaptada.
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“violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma
norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um
específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de
comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou
inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido,
porque apresenta ingerência contra todo o sistema, subversão de seus
valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e
corrosão de uma estrutura mestra.”
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Nesse diapasão, os princípios constitucionais, bem como as
garantias individuais, devem servir como objeto balizador para a exata interpretação e
legítima aplicação das normas penais, de maneira que não se deve cogitar uma
aplicação meramente robotizada dos tipos penais, a qual segue um padrão de
verificação rudimentar da adequação típica formal.
Então, diante de um dado caso concreto, quando a conduta
praticada pelo agente não trouxer repercussão relevante ao meio social, e estiver
aliada ao fato de não ter havido afronta material ao tipo penal como no furto de
um pacote de arroz em um supermercado , tais fatos não podem justificar a
movimentação do Mecanismo Penal, consubstanciada na pretensão punitiva Estatal,
sendo que em casos que tais, plenamente aplicado o princípio da insignificância ou
bagatela.
Doutro norte, também de se considerar que o amparo penal
prestado pelo Estado, em casos semelhantes ao do exemplo citado no parágrafo
anterior, será excessivamente tirânico, tendo em vista que a conduta praticada está
pautada em excessiva irrelevância material. Dessarte, a referida conduta não merece
essa desarrazoada e excedente resposta Estatal, em consenso com atual conceito de
tipicidade, pautado na tipicidade formal e material.
Por oportuno, vale destacar entendimento jurisprudencial que
há muito vem sendo aplicado em casos análogos.
PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO SIMPLES. PRETENSÃO DE
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA.
AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. TEORIA
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BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio; Curso de Direito Administrativo, Ed. São Paulo, Malheiros, 1994, p.
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CONSTITUCIONALISTA DO DELITO. INEXPRESSIVA LESÃO AO BEM
JURÍDICO TUTELADO. ORDEM CONCEDIDA.
1. O princípio da insignificância surge como instrumento de
interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática
moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de
subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo
material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao
bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da
fragmentariedade e da intervenção mínima.
2. Indiscutível a sua relevância, na medida em que exclui da incidência
da norma penal aquelas condutas cujo desvalor da ação e/ou do
resultado (dependendo do tipo de injusto a ser considerado)
impliquem uma ínfima afetação ao bem jurídico.
3. O furto de uma bolsa, embora se amolde à definição jurídica do
crime de furto tentado, não ultrapassa o exame da tipicidade material,
mostrando-se desproporcional a imposição de pena privativa de
liberdade, uma vez que a ofensividade da conduta se mostrou mínima;
não houve nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade
do comportamento foi de grau reduzidíssimo e a lesão ao bem jurídico
se revelou inexpressiva.
4. Ordem concedida para determinar a extinção da ação penal
instaurada contra a paciente, expedindo-se o competente alvará de
soltura, se por outro motivo não estiver presa.
(HC 133.522/MG, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA
TURMA, julgado em 23/06/2009, DJe 03/08/2009). [Grifo meu].
Quanto aos crimes de bagatela, é relevante considerar, também,
que o próprio Estado não interesse em se movimentar em casos semelhantes, tudo
em função do ínfimo valor em litígio.
Assim, há situações outras que o prejuízo material sofrido é
vultuosamente maior do que o do eventual caso em questão, e, mesmo assim, o
Estado nem mesmo se preocupa em manifestar-se quanto ao prejuízo. Muito pelo
contrário, em casos que tais, o Estado prefere se manifestar de maneira a suportar os
prejuízos, em vez de mover a máquina judicial. É o que ocorre nos casos de inscrição
em dívida ativa da Fazenda Nacional onde não é permitida a inscrição se o valor for
igual ou inferior a R$ 1.000,00 , bem como nos casos de ajuizamento de execuções
fiscais onde não é permitido ajuizamento para valores iguais ou inferiores a R$
10.000,00 , conforme consta da Portaria do Ministério da Fazenda 049, de de
abril de 2009. Nesse sentido é o posicionamento do STJ. Vejamos.
HABEAS CORPUS PREVENTIVO. DESCAMINHO. ATIPICIDADE
MATERIAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSTO ILUDIDO (R$ 4.410,00) INFERIOR AO
VALOR ESTABELECIDO PELA LEI 11.033/04 PARA EXECUÇÃO FISCAL
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(R$ 10.000,00). CONDUTA IRRELEVANTE AO DIREITO
ADMINISTRATIVO, QUE NÃO PODE SER ALCANÇADA PELO
DIREITO PENAL. PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE. NOVO
ENTENDIMENTO DO STF. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA
ORDEM. ORDEM CONCEDIDA, PORÉM, PARA DETERMINAR O
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR FALTA DE JUSTA CAUSA.
1. De acordo com o entendimento recentemente firmado pelo STF,
aplica-se o princípio da insignificância à conduta prevista no art.
334, caput, do CPB (descaminho), caso o ilusão de impostos seja igual
ou inferior ao valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), estabelecido pelo
art. 20, caput, da Lei 10.522/2002, alterado pela Lei 11.033/2004, para
a baixa na distribuição e arquivamento de execução fiscal pela Fazenda
Pública. HC 92.438/PR, Rel. Min.
JOAQUIM BARBOSA, DJU 29.08.08, HC 95.749/PR, Rel. Min. EROS
GRAU, DJU 07-11-2008 e RE 536.486/RS, Rel. Min. ELLEN GRACIE,
DJU 19-09-2008.
2. Segundo o posicionamento externado pela Corte Suprema,
cuidando-se de crime que tutela o interesse moral e patrimonial da
Administração Pública, a conduta por ela considerada irrelevante não
deve ser abarcada pelo Direito Penal, que se rege pelos princípios da
subsidiariedade, intervenção mínima e fragmentariedade.
3. Parecer do MPF pela denegação da ordem.
4. Ordem concedida, para determinar o trancamento da Ação Penal.
(HC 116.293/TO, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
QUINTA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 09/03/2009). [Grifo
meu].
RECURSO ESPECIAL. PENAL. DESCAMINHO. APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
1. Aplica-se o princípio da insignificância à evasão de imposto em
valores que o próprio Estado, sujeito passivo do delito de descaminho,
expressou o seu desinteresse pela cobrança.
2. Recurso não conhecido.
(REsp 220.692/PR, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA
TURMA, julgado em 02/05/2000, DJ 23/10/2000 p. 204)
Ainda assim, e, de outra perspectiva, de se considerar que a
condenação por crimes de valor ínfimo caracteriza-se, em sentido amplo, como um
verdadeiro mal irremediável para a sociedade, haja vista que tais condenações abrem
reais possibilidades para que um cidadão se desvirtue para outras práticas criminosas,
fomentando, assim, caminhos criminosos na vida de um cidadão que, agora, devido à
rotulação de criminoso, a sociedade o trata de maneira distinta, retirando-lhe reais
oportunidades, o que por si só, enseja a continuação delitiva.
Alfim, não é todo e qualquer interesse que deve ser selecionado
para ser pleiteado na alçada do direito penal, haja vista que para a provocação do
direito penal, devem ser selecionados apenas aqueles interesses que,
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reconhecidamente, sejam valorados pelo Direito, em função de seus princípios
dirigentes. Exatamente por isso que o direito penal é a
ultima ratio
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Essa pois, pequena explanação da essência do princípio da
insignificância ou bagatela.
Texto elaborado em 13.02.2010.
Por: TRINDADE MOREIRA, André Luiz Advogado militante, graduado pela
Universidade Paulista (Campus Brasília).
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