Numa formulação precisa e dramática da percepção generalizada de
medo e insegurança, frente à escalada da criminalidade violenta, o
poeta Affonso Romano de Sant’Ana não hesitou em evocar imagens de
uma guerra civil, onde exércitos de marginais avançam contra uma
sociedade e uma política excludentes: há uma guerra nas ruas e o
Governo não interfere... Os pobres já são assaltados pelos miseráveis.
Quando eles se tornarem todos uma classe, ou quando tiverem
consciência de classe, virão contra o outro lado... Há um exército de 30
milhões escalando os muros de Roma.
Nesta esteira coaduna a maioria das estatísticas sobre a origem da
violência, ou seja, dentre os fatores que a norteiam, as causas sociais – de
ordem estrutural - têm maior peso, mesmo que não se possam excluir os fatores
endógenos tratados pela criminologia. Em acepção sobre esta idéia, relevante é o
comentário do colunista político do Jornal do Brasil Mauro Santayna na
reportagem de 13 de fevereiro de 2007 da revista Carta Maior quando este aduz
à construção de um bandido:
Como se faz um criminoso? Os criminosos, salvo os casos de psicopatia
congênita, são construídos, não nascem feitos. A nova deputada federal
Marina Magessi, veterana policial carioca, não pode ser apontada como
esquerdista, fanática defensora dos “direitos dos bandidos”. Ao
contrário: sempre foi vista como “durona” na ação policial. Em recente
depoimento à TV Câmara, em companhia do rapper MV Bill, Marina
Magessi lembrou que o dia mais difícil da sua vida foi o do assalto ao
ônibus da linha 174, em 2000, no Rio, porque teve que prender uma
menina de 12 anos, envolvida no incidente. Ela resume o problema, ao
dizer que nesses episódios não há algozes: só há vítimas. A menina era
tão vítima como Sandro do Nascimento o assaltante, um sobrevivente
do massacre da Candelária, que seria assassinado logo em seguida pela
polícia, e a jovem Geisa Gonçalves, morta durante a intervenção
policial.
“Não é a pobreza que leva ao crime, mas, sim, a falta de inclusão” –
disse a mesma senhora, em outra oportunidade. “No Rio, essas crianças
não pertencem a nada. Não têm família, não têm igreja, não têm
Estado”. Se quisermos ir mais fundo no problema, devemos deixar os
limites das favelas, do Rio de Janeiro e do Brasil. Escolhemos nessa
pobre cultura universal contemporânea, induzidos pelos meios de
comunicação de massa, sobretudo do cinema e da televisão, modelo de
vida que pode ser definido como o de pacto com a morte. Passamos
parte de nossa vida vendo as balas penetrarem na testa de bandidos ou
não, acostumamo-nos com o jorro de sangue e, em certos casos,
experimentamos voluptuosa emoção diante dos corpos que tombam.
Mesmo os homens mais velhos se recordam da influência do cinema nos
jogos infantis - e a violência daquele tempo era quase inocente, diante
da que nos chega, pela televisão, todos os dias. Brincava-se, então, de
artista e bandido. Os heróis eram artistas, e os vilões, os bandidos. Era
o mito da “violência positiva”, que os norte-americanos haviam criado,
com suas “short-stories”, destinadas a distrair os trabalhadores