116
Vitória
195
. Destaca também essa autora referências a outros dois batuques
realizados na região compreendida entre Caetité e Rio de Contas
196
.
Uma das testemunhas, Pia Ferreira Prates, tenta desqualificar a acusação de
ter havido um samba, pois, segundo ela, teria havido apenas uma “modinha”, mais
aceitável do que o samba. A modinha era uma variante da “moda”, feita em Portugal,
sem estrutura formal fixa, quase sempre de cunho amoroso
197
.
Aqui se inicia uma tentativa de afirmar que na verdade houvera uma festa
civilizada nos “moldes” europeus e não um samba “africano”. Mas isso sequer entra
em discussão, pois as evidências eram fortes demais. O processo termina com a
condenação do dono da casa a pagar mil réis e os demais acusados a darem três
mil réis e ainda as custas do processo, tal qual estabelecia o Código de Posturas
citado anteriormente.
Outra festa com participação negra aconteceu em 1871, mas não está claro no
documento, um “sumário de culpa”, se teria sido batuque, samba ou reisado. O que
sabemos é que brancos e negros dela participaram
198
. Diz uma das testemunhas:
Estando Romão Mathias em uma sociedade com diversas pessoas, entre as
quais estava Martinha Ribeira, passara uma noite em um divertimento no
qual derão muitos tiros de salva e amanhecendo o dia vindo Martinha Ribeira
acompanhada com Candido de Tal que vinha rufando uma caixa, ao passar
pela porta da casa do réu Romão Mathias este lançara mão de uma arma de
fogo e dera um tiro de salve para o chão
199
.
195
Ver PIRES, Maria de Fátima Novaes. O crime na Cor: escravos e forros no alto sertão da Bahia
(1830-1888). São Paulo. Annablume/FAPESP, 2003, p. 75/76. Segundo Cascudo (2000), a umbigada
viera para o Brasil com os escravos oriundos da região de Angola e Congo, ou seja, seria uma
tradição banta. Concordando com Cascudo, Karash (2003) nos diz que, em Angola, um nome para a
umbigada é “semba”, palavra encontrada em quibundo, ganguela e outras línguas angolanas, que
significa “movimento pélvico
195
”. Para Gerhard Kubik (1979), no Brasil o “semba” alterou-se
foneticamente até se transformar na palavra “samba” dos dias atuais
195
. Analisando o Rio de Janeiro,
Karash (2003) diz que no século XIX o termo samba não aparece nas fontes cariocas, aparece mais o
termo batuque. Segundo Kubik (1979), é provável que, durante os batuques, os dançarinos gritassem
“samba”, “samba”, fazendo alusão à palavra da língua ganguela do interior de Angola, ”kusamba”,
que significa saltar, dar piruetas, expressar alegria e felicidade
195
.
196
Idem, pág. 52
197
Ver CASCUDO, Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro, 10ª edição, São Paulo, Ediouro, 2000,
paginas 583 a 586
198
No processo Romão Mathias é descrito como pardo, Martinha como parda escura e Candido como
Branco.
199
Processo crime 1871. AFJM-Vitória da Conquista/BA. No Rio de Janeiro, a palavra orgia era
usada para se referir ao carnaval, anota Cecília Meireles (2003). O que eles (pessoas civilizadas)
chamam de orgia, palavra tão freqüente nas canções de carnaval dos últimos tempos, é a longa
passeata com cantorias e luzes, estandartes e feras de papelão, do subúrbio ao centro da cidade,
horas e horas, com descanso nas rodas de samba, copos de cerveja ou refrescos e um
extenuamento completo, pela madrugada, estendidos nas calçadas entre brilhos de sedas e colares,
à espera da condução que os transporte a casa. (MEIRELES, 2003, p.64).
.