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Desigualdade Ambiental e “Zonas de Sacrifício”
Rodrigo Nuñez Viégas
A expressão “zonas de sacrifício” é utilizada pelos movimentos de justiça ambiental
para designar localidades em que observa-se uma superposição de empreendimentos e
instalações responsáveis por danos e riscos ambientais. Ela tende a ser aplicada a áreas de
moradia de populações de baixa renda, onde o valor da terra relativamente mais baixo e o
menor acesso dos moradores aos processo decisórios favorece escolhas de localização que
concentram, nestas áreas, instalações perigosas. A designação “zona de sacrifício” surgiu
nos Estados Unidos, quando o movimento de Justiça Ambiental associou a concentração
espacial dos males ambientais do desenvolvimento ao processo mais geral que produz
desigualdades sociais e raciais naquele país. Tal movimento ganhou força em 1987, quando
um estudo patrocinado pela Comissão de Justiça Racial da United Church of Christ
mostrou que todos os depósitos de lixo tóxico do território americano estavam localizados
em áreas habitadas pela comunidade negra. Seu resultado apontou para a existência do que
passou a ser chamado de “racismo ambiental”, articulando as lutas ambientais às lutas
tradicionais pelos direitos civis.
Examinaremos a seguir um certo número de casos onde há indícios da constituição
de áreas no Estado do Rio de Janeiro como objeto de escolhas locacionais de múltiplos
empreendimentos ambientalmente danosos. São destacados para fins desta análise o
município de Itaguaí (especialmente as áreas da Ilha da Madeira e do entorno do Porto de
Sepetiba), o bairro de Santa Cruz (e parte do bairro de Campo Grande) e o Distrito de Vila
de Cava (em Nova Iguaçu), áreas de relativa concentração de práticas ambientalmente
agressivas.
Mestrando em Sociologia e Antropologia pelo PPGSA/IFCS/UFRJ.
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ITAGUAÍ
O município de Itaguaí situa-se na região sul-fluminense, a 70 km do centro da
capital do Estado do Rio de Janeiro. O mesmo compreende uma área de unidade territorial
de 272 Km², com uma população estimada de 91.551 habitantes
1
, possuindo os seguintes
limites geográficos: ao norte, o município de Seropédica; ao sul, a Baía de Sepetiba; ao
leste, a Baixada Fluminense; a oeste, Mangaratiba; e a nordeste, Rio Claro e Piraí.
Município sede do Porto de Sepetiba e vizinho da maior área industrial da capital
(Santa Cruz), Itaguaí é considerado o município de maior potencial industrial da Região
Metropolitana, localizando-se em um entorno geoeconômico dos mais importantes do país,
que abrange as cidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Vitória. Tal
município foi escolhido para sediar a ZPE (Zona de Processamento de Exportação) do
Estado. Ou seja, um Distrito Industrial cercado, aberto às indústrias que se destinam ao
mercado internacional, funcionando como uma área de livre comércio com o exterior. A
região reúne empresas como a CSN II (Cia. Siderúrgica Nacional) e a NUCLEP (Central
Nuclear de Equipamentos Pesados). Tais empresas, e outras mais sediadas no município,
contam com o auxílio de uma lei municipal de Itaguaí, datada de 1993, que isenta, por dez
anos, qualquer empresa que gerar mais de 30 empregos de pagar taxa de obras, Habite-se e
IPTU.
Apesar de todos esses empreendimentos, que para muitos viriam a representar o
verdadeiro motor do desenvolvimento econômico-social do município e do Estado do Rio
de Janeiro em geral, proporcionando, entre outras vantagens, uma significativa expansão da
oferta de empregos na região e aumento de qualidade de vida para população, vemos que,
nas últimas décadas, o município vem passando por um processo intenso de poluição
hídrica, ocasionada pela ausência de saneamento, o abandono de resíduos tóxicos pela
empresa Ingá Mercantil, o Porto de Sepetiba e o lixão de Itaguaí.
Segundo Mendes
2
, em Itaguaí, na segunda metade dos anos 1990, houve um
crescimento de 60% da população que vive em favelas. A urbanização tem sido feita, em
1
Informações colhidas no IBGE.Cidades@ relativos ao ano de 2004 (http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php)
2
Cf. Mendes, J. Portos, cidades e territórios na virada do século. O caso do Porto de Sepetiba. Rio de Janeiro (seminário),
CPCH/ UFRJ, 1999.
2
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grande parte, via ocupação de lotes de forma não legalizada. Outros dados relativos à
população demonstram que 20% dos habitantes são analfabetos e 40% não chegam a ter o
primeiro grau completo. Esse crescimento rápido e desordenado não é acompanhado por
obras de infra-estrutura, como redes de água e esgoto, eletricidade e transporte.
As agressões ambientais agravam-se em função da presença de um lixão, onde o
chorume (líquido produzido pelos detritos) e resíduos químicos se infiltram no solo e vão
parar no Rio da Prata, que desemboca na Baía de Sepetiba. Não há separação entre lixo
doméstico e hospitalar, sendo o local repleto de seringas e tubos espalhados em meio aos
dejetos. Nesse cenário, entre porcos e urubus, e sem qualquer tipo de proteção, encontram-
se crianças e adultos coletando o lixo
3
.
Outro caso crítico do município diz respeito ao passivo ambiental da Companhia
Ingá Mercantil, que possui área de aproximadamente 120 mil m², situada na Ilha da
Madeira, vizinha ao Porto de Sepetiba.
Nos primeiros anos de atuação, a Companhia Ingá despejava seus rejeitos líquidos
tóxicos e ácidos sem qualquer tratamento diretamente na Baía de Sepetiba, além de
acumular resíduos em seu pátio. Em 1984, por determinação da FEEMA, foi construído um
dique de contenção para que os constantes vazamentos de efluentes fossem evitados,
reduzindo assim a mortandade de peixes nas águas próximas à Ilha da Madeira. Contudo, a
construção foi mal feita: ficou muito próxima ao mar e num terreno baixo.
Sem ter cumprido uma série de compromissos assumidos com a FEEMA, a
Companhia não resolveu o problema da destinação adequada aos seus rejeitos tóxicos,
deixando armazenados a céu aberto algo em torno de 4 milhões de toneladas de resíduos,
em área de 100 metros de largura, 16 metros de altura acima da superfície e 05 metros por
dentro do solo, além de 50 milhões de litros de água ácida contaminada por metais pesados.
Em 2002, fortes chuvas fizeram com que o dique da Companhia Mercantil
Industrial Ingá, abandonado já há cinco anos, transbordasse lixo químico em direção à Baía
de Sepetiba. Uma vistoria realizada por técnicos do Ibama, representantes do Ministério
Público Estadual e dirigentes da Assembléia Permanente de Entidades de Defesa do Meio
Ambiente (Apedema) revelou que o lençol freático e poços artesianos da região já estão
contaminados.
3
cf. Roberta Novis, “Baía de Sepetiba vira lixão”, disponível em www.essencis.com.br/shownews
3
Em 2003, o dique rompeu-se novamente em dezenas de pontos e a água e lama
tóxicas escorreram diretamente para os manguezais da Baía de Sepetiba, repetindo o
primeiro desastre ecológico de 1996, quando 50 milhões de litros de água e lama com
metais pesados vazaram para a baía. Pelo menos 6.000 metros quadrados do mangue foram
atingidos. O vazamento devastou cerca de 300 metros quadrados do manguezal. No trecho
mais afetado pelos vazamentos, a lama soterrou a vegetação.
No histórico da Companhia Ingá Mercantil destacam-se cinco acidentes principais,
uma denúncia de morte de funcionário, duas ações civis públicas (uma movida pelo
Ministério Público Estadual e outra pelo Ministério Público Federal) e dezenas de multas
aplicadas pelos órgãos responsáveis pela fiscalização ambiental (CECA, FEEMA)
4
.
No segundo semestre de 2003, devido ao colapso das condições de segurança do
dique da Ingá, o Ministério Público Federal determinou que o Estado do Rio deveria
assumir a responsabilidade sobre a execução de obras que impediriam o rompimento da
estrutura e a conseqüente contaminação da Baía de Sepetiba. O representante da Secretaria
Estadual de Meio Ambiente autorizou recursos para o início dos trabalhos em novembro de
2003, coordenados por um professor da COPPE/UFRJ. Em janeiro 2005, os ex-diretores da
Companhia Mercantil e Industrial Ingá S.A foram condenados por crime ambiental, pela
poluição da Baía de Sepetiba.
No contexto das agressões ambientais sofridas por Itaguaí, o Porto de Sepetiba,
localizado a 80 km do Rio de Janeiro, vem causando sérios transtornos ao seu entorno
geográfico, em especial à Baía de Sepetiba. Inaugurado em 1982, operando, na época, com
a descarga de alumina para a VALESUL e carvão para a CSN, o empreendimento foi
concebido para transformar-se em um Complexo Portuário e Industrial de Itaguaí.
4
cf. J.P.Leroy, Relatores Nacionais em Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais: Missão Itaguaí,
Projeto DHESC, Ri de Janeiro, 2004
4
Fonte mapa: Ministério dos Transportes. Site: http://www.transportes.gov.br
O ano de 1998 foi marcado pela quebra do monopólio estatal de operação dos
portos públicos. Com o apoio financeiro recebido do BNDES e recursos do Orçamento
Geral da União para investimentos na estrutura do empreendimento, no mesmo ano
iniciaram-se obras de ampliação do porto, o que veio a gerar conflitos ambientais na área.
Tais obras consistiam na construção de um terminal de carga geral (grãos, contêineres,
produtos siderúrgicos, etc.), o que exigiu o aterramento de uma área junto ao litoral. Para o
aterramento, utilizou-se material retirado do fundo do mar, do trabalho de aprofundamento
de cais de atracação. Nessa dragagem do cais e do canal de acesso foram retirados mais de
20 milhões de metros cúbicos de material. Um dos problemas associados à realização do
aterro deveu-se ao fato de a areia removida do fundo da baía apresentar alto grau de
poluição dos sedimentos tanto orgânica quanto inorgânica (metais pesados provenientes
das atividades industriais do entorno da baía).
5
O Porto de Sepetiba também é acusado de poluição da baía em processo da
FEEMA, em que a mesma denunciou o porto em razão de os funcionários da CSN, ao
realizarem limpeza de píer, lançarem resíduos de zinco diretamente no mar, provocando
uma mancha na Baía de Sepetiba. Os analistas da FEEMA, na ocasião, identificaram mais
irregularidades, como poluição do ar.
5
cf. Relatório do Projeto Interinstitucional: ‘o Porto de Sepetiba: cenários, impactos e perspectivas’, mimeo,
Rio de Janeiro, UFRJ, UFRRJ E FIOCRUZ, 1998.
5
As constantes agressões contra a Baía de Sepetiba por atividades como as citadas
acima, vêm provocando a deteriorização e a queda da qualidade das águas da mesma. A
baía, com suas áreas de mangue e zonas estuarinas, nas quais a água doce se mistura com a
do mar, constitui-se num criadouro privilegiado para várias espécies de grande valor
pesqueiro. Além da atividade econômica tradicional de pesca artesanal, a baía permite
também a prática da maricultura (coleta de crustáceos e moluscos, que ficam alocados à
beira de suas costas). Com sua degradação, grandes problemas surgem para aqueles que
exercem a atividade pesqueira na área.
Entidades importantes de defesa contra as agressões sofridas no município, como,
entre outras, a Associação de Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira - APLIM e a
Associação de Pescadores Artesanais da Ilha da Madeira – APAIM vêm lutando
intensamente contra a poluição da Baía de Sepetiba, pois a produção de pescado da baía
sustenta uma comunidade pesqueira de cerca de 3500 pescadores, distribuídos em três
colônias.
Em abril de 1990, os pescadores artesanais denunciaram ao Ministério Público
Federal a atividade de pesca predatória em função da mesma gerar diminuição de tamanho
e quantidade de espécies marinhas. Esta atividade era realizada por grandes barcos
oriundos do próprio estado, assim como barcos vindos de Santos, Santa Catarina e até do
exterior. Após uma série de protestos junto a entidades públicas, os pescadores
conseguiram que fosse elaborado um documento denominado “Carta de Jaguanum”, onde
ficou acertado, dentre outras coisas, que o IBAMA baixaria uma portaria proibindo a pesca
de arrastão na baía. Entretanto, as pescas predatórias continuaram ocorrendo, de modo que
em novembro de 1994, a ONG Defensores da Terra solicitou abertura de Inquérito Civil e
Ação Civil Pública contra a omissão dos órgãos públicos federais em relação à pesca
predatória. Após isso, o Ministério Público Federal impetrou Ação Civil Pública contra a
União Federal e contra o IBAMA, pelo fato de não estarem reprimindo as atividades
predatórias e ilegais. Tanto o Ibama quanto a Capitania dos Portos, na época, alegaram
falta de recursos humanos, materiais e financeiros para realização das fiscalizações e
tomadas de decisão pertinentes à situação.
6
Posteriormente, o juiz que avaliou a Ação Civil Pública propôs que se firmasse um
Termo de Ajustamento de Conduta considerando todas as partes envolvidas. No mesmo
período, o IBAMA solicitou investimentos em infra-estrutura.
No segundo semestre de 2000, a comunidade pesqueira ainda reclamava do descaso
do poder público. Em setembro de 2003, o processo ainda tramitava no Ministério Público
Federal.
Outro caso de resistência por parte da população foi o caso da Usina Termelétrica
(UTE) de Sepetiba. Tal projeto consistiria na implantação de uma usina com uma planta de
grande porte, com custo de 830 milhões de dólares e potência líquida final de 1250 Mw.
Sua justificativa econômica era logística: o Porto de Sepetiba receberia o carvão mineral
(importado) destinado à usina em um pátio da Cia. Siderúrgica Nacional, que hoje opera a
50% de sua capacidade. As empresas Inepar Energia S/A (com sede em Curitiba/PR),
Enelpower do Brazil Ltda.(multinacional italiana) e Eletrobrás eram responsáveis pelo
empreendimento, de acordo com a licitação realizada pela ANEEL.
Com a implementação da Usina, além da população urbana, as comunidades de
pescadores da Ilha da Madeira e de pequenos agricultores dos bairros Mazomba e
Mazombinha seriam as mais diretamente afetadas. Por isso, em abril de 2002, depois de
várias denúncias por parte da Associação dos Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira,
Comissão de Ética e Cidadania de Itaguaí, Assembléia Permanente das Entidades em
Defesa do Meio Ambiente – APEDEMA-RJ e outros, o MPE reuniu-se ao MPF e
determinou que a supressão do artigo 305 da Lei Orgânica do Município era
inconstitucional. Este fator desencadeou a liminar expedida a 15 de abril de 2002 pela 24a.
Vara da Justiça Federal no Rio de Janeiro, que suspendeu o processo de licenciamento
ambiental pela FEEMA para a instalação da UTE Sepetiba, até a realização do plebiscito no
município de Itaguaí. Mediante pareceres técnicos da COPPE/UFRJ e da FEEMA, ao lado
do parecer jurídico da SEMADS, o empreendimento teve a Licença de Operação revista e
anulada pela CECA em 23 de julho de 2002 (conforme publicado no DOE em
25.07.2002)
6
.
6
Para um maior aprofundamento sobre o caso, Ver: Ferraz. Iara, “O fim do projeto da usina termelétrica a carvão mineral
em Itaguaí”. In Conflito social e meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro. (org) Henri Acselrad. Rio de Janeiro:
Relume Dumará: FASE, 2004.
7
O município de Itaguaí é também alvo de agressões ambientais relacionadas mais
diretamente ao uso do solo, como o caso da Pedreira Sepetiba e dos inúmeros areais em
locais como a Reta de Piranema.
Instalada na Ilha da Madeira, a pedreira Sepetiba Engenharia e Comércio Ltda, que
atua na exploração de recursos minerais com destino à construção civil, funciona em área
adjacente ao manguezal e armazena, em condições precárias, 8.500 kg de dinamite e 10 mil
kg de nitrato de amônio. Seu trabalho de extração de matéria-prima já dizimou parte da
reserva de mata atlântica que ainda restava na Ilha (abrindo espaço para o potencial
destruidor das chuvas), secou duas cachoeiras, rachou inúmeras casas das ruas do entorno
(algumas casas encontram-se condenadas).
7
No que concerne à atividade de extração de areia, desenvolve-se em Itaguaí um pólo
areeiro em ambiente de cava submersa (extração no leito dos rios feita por meio de cavas),
com mais de vinte anos de atividade, onde atualmente cinqüenta e quatro empresas extraem
areia, produzindo aproximadamente dois milhões de m3 por ano. Esta área é o principal
abastecedor deste bem mineral para a construção civil da Região Metropolitana do Rio de
Janeiro.
A extração de areia descaracteriza a paisagem e contamina os lençóis freáticos.
Dada a magnitude dos problemas ambientais causados por esta atividade, algumas ações do
poder público tem sido elaboradas no sentido de buscar sua legalização e controle
ambiental, sendo que, entre elas, destaca-se a tentativa da criação de uma Zona de Produção
Mineral - ZPM, e a exigência de estudos de impactos ambientais.
8
7
Ver J.P. Leroy, Relatores Nacionais em Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais: Missão
Itaguaí, Projeto DHESC, Rio de Janeiro, 2004.
8
Ver Rossete, Amintas Nazareth. “Planejamento Ambiental e Mineração. Estudo de Caso: A Mineração de Areia no
Município De Itaguaí – RJ”, dissertação de Mestrado em Geociências, Unicamp, 1996.
8
Fonte mapa: Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Site:
http://www.governo.rj.gov.br/municipios.asp
SANTA CRUZ (e parte do bairro de Campo Grande
9
)
Situado na zona oeste do Estado do Rio de Janeiro, Santa Cruz é um bairro com
população estimada de 191.836 habitantes, distribuídas numa área de 12.504,43
habitantes
10
, vizinho ao município de Itaguaí e aos bairros de Campo Grande, Paciência,
Sepetiba e Guaratiba. O bairro ocupa a 119ª posição entre os 126 bairros e distritos do Rio
no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado, possui uma população
9
A razão pela qual incorporou-se na análise de Santa Cruz parte do bairro de Campo Grande deve-se ao fato de os
mesmos fazerem parte de um dos eixos industriais que se estende ao longo da Avenida Brasil, nas regiões administrativas
de Campo Grande e Santa Cruz e também por sua proximidade geográfica.
10
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE - Censo Demográfico 2000.
9
de baixa renda
11
e sofre de deficiências infra-estruturais e falta de investimento em políticas
públicas.
12
Cortado pela estrada de ferro Central do Brasil, Santa Cruz possui uma paisagem
bastante diversificada, com áreas rurais, comerciais e residenciais. Porém, o bairro destaca-
se pela grande concentração de indústrias, o que faz do mesmo uma Zona Industrial. Nessa
região estão localizados dois importantes distritos industriais, o de Paciência e o de
Palmares, onde se encontram, em pleno funcionamento, a Casa da Moeda do Brasil, a FCC
S/A - Fábrica Carioca de Catalisadores, a COSIGUA (Companhia Siderúrgica da
Guanabara), a VALESUL Alumínio S.A, a White Martins, a Glasurit, a Continac, a Latasa,
etc.Vale ressaltar que o Porto de Sepetiba, localizado em Itaguaí, foi concebido para escoar
a carga da produção do Distrito Industrial de Santa Cruz.
No Distrito Industrial de Santa Cruz existe ainda um projeto de implantação do
PTSC (Parque Tecnológico de Santa Cruz), em terreno de propriedade da FCC S/A -
Fábrica Carioca de Catalisadores, cujo gerenciamento será realizado pelo Centro para
Inovação e Competitividade – CIC, com projeto de financiamento junto ao FINEP-
Financiadora de Estudos e Projetos, órgão do Ministério de Ciência e Tecnologia que traria
mais indústrias para a região
13
.
As transformações ocorridas em Santa Cruz ao longo das sucessivas décadas
contribuíram para acelerar o processo de descaracterização paisagística do bairro. Segundo
a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro - PCRJ e Secretaria Municipal de Meio Ambiente
-SMAC, “a implantação de rodovias, grandes aterros e a construção do ramal ferroviário de
Santa Cruz alteraram a estrutura da drenagem natural, além de formar uma barragem ao
escoamento natural das águas, o que aumenta o assoreamento de seus rios tributários. O
desmatamento, acelerado pelo plantio de bananeiras, pela proliferação do capim colonião e
11
A renda per capita da população do bairro de Santa Cruz é R$ 206,23, em contraste com renda do bairro da Gávea,
primeira no ranking, de R$ 2139,56. A renda domiciliar per capita média do 1º quinto mais pobre de Santa Cruz é de R$
27,62. Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE - Censo Demográfico 2000.
12
Ver Gomes da Gama, Sonia Vidal. “Mapeamento digital de (in)compatibilidades do uso dos solos na XIX RA Santa
Cruz – Município do Rio de Janeiro”. Nessa dissertação de mestrado em Geografia, UFRJ, 1998, a autora mostra os
problemas ambientais de Santa Cruz relacionados à incompatibilidade de uso do solo. Para ela, a negligência de
organismos competentes em ignorar o meio físico e suas restrições, atendendo prioritariamente às "necessidades"
econômicas e políticas geram problemas ambientais mais graves que comprometem as áreas urbanas e agrícolas, onde
solos adequados ao cultivo (gley e orgânico) são ocupados com assentamentos de grande porte (Distrito Industrial de
Santa Cruz) e população de baixa renda (conjuntos habitacionais; loteamentos irregulares; favelas e invasões). Nos solos
adequados à ocupação urbana (podzólicos e planossolos) a degradação é principalmente devido à falta de infra-estrutura
sanitária e serviços oferecidos.
13
Fonte: Centro para Inovação e Competitividade – CIC. Disponível em www.cic.org.br
10
pelas atividades mineradoras, contribui para a erosão dos solos, o assoreamento dos rios e,
conseqüentemente, para ocorrência de enchentes”.
14
No distrito industrial há uma sobreposição de agressões ambientais como a
ausência de saneamento, o lançamento de poluentes no ar e na água, a presença de sítios
contaminados remanescentes de fábricas desativadas, além dos sucessivos descartes de
resíduos tóxicos em localidades nomeadas de “Bota Fora”.
A população de Santa Cruz, e de um modo geral, a região da Zona Oeste, que
envolve Campo Grande, Paciência e alguns outros bairros, sofre pela precariedade do
sistema de fornecimento do saneamento básico. Problemas ambientais como a carência de
sistemas de captação de esgoto, levando a um conseqüente lançamento dos mesmos in
natura em rios figuram nessa região. Nesse sentido, o caso que envolve o rio Cação
Vermelho, que percorre vários bairros da zona oeste, incluindo Santa Cruz, e que deságua
na Baía de Sepetiba, é um exemplo paradigmático.
Os moradores de Paciência denunciaram a CEDAE ao MPE por cobrar
indevidamente serviço de tratamento de esgoto, pois o mesmo não existe. Os detritos vão
para as águas pluviais e deságuam no rio Cação Vermelho. O GATE (Grupo de Apoio
Técnico do MPE) realizou vistoria no local, enviando parecer onde consta que “a CEDAE é
a principal responsável pelos danos causados ao rio Cação e à cobrança indevida”.
Consta ainda no parecer que a 10 km do rio Cação, a partir da Serra da Paciência, seus
afluentes se tornaram valas negras.
Há procedimento também quanto à atuação da CEDAE em outro empreendimento
de habitação na região: a Associação dos Arrendatários do Conjunto Residencial Recanto
Feliz, localizado na Av. Brasil, no bairro de Santa Cruz, que está cobrando da CEF e da
CEDAE resoluções quanto aos seus problemas de saneamento.
Em resposta a acusação, a CEDAE emitiu uma declaração de esgotamento em que
afirmou que houve aprovação de projeto, porém o esgoto sanitário é ligado à rede pública
de esgoto e lançado em um tanque localizado em uma Estação de Tratamento de Esgoto
(ETE) que se encontra inoperante desde a entrega dos imóveis, em final do ano 2000. O
14
Ver Ministério do Meio Ambiente através de Relatório intitulado “Estado do Meio Ambiente”, no sub-tópico
“Caracterização do Meio Ambiente Natural da Cidade” disponível em
http://www.mma.gov.br/port/sqa/urbana/doc/relatorio/riocap4estado.pdf
11
esgoto é assim lançado in natura no rio Cação. A ETE está abandonada, sendo possível
detectar lixo no rio e o esgoto retorna para dentro das residências.
Consta em ofício da presidência da Rio-Águas que: “essa área é desprovida de rede
separadora absoluta, ou seja, rede exclusiva de esgoto sanitário. Nesse caso, a CEDAE
recebe a tarifa referente à coleta do esgoto e lança esse esgoto na rede de águas pluviais
do município, o que provoca a sua deterioração, sem qualquer repasse à Prefeitura.”
Outro caso relativo a problemas de saneamento refere-se à deficiência no sistema
de tratamento de esgoto do Conjunto Habitacional Santa Veridiana, localizado em Santa
Cruz, em função de irregularidades praticadas pela RioUrbe e a construtora Nova Solar
Eng. ltda.. O conjunto, onde moram aproximadamente 920 famílias, está com a Estação de
Tratamento (ETE) abandonada. Afirma o morador, em sua carta-denúncia, que “Hoje a
rede de esgoto não suporta o volume de esgoto, estourando em todos os lados, levando
toda a comunidade ao desespero”. Os moradores declararam que, desde a entrega do
conjunto de unidades habitacionais geminadas, tipo embrião, as ETEs não puderam
funcionar, pois a CEDAE alegava não poder se responsabilizar pela operação e manutenção
das mesmas
O problema do lançamento de poluentes no bairro de Santa Cruz assume outros
panoramas quando levado em conta os despejos de resíduos industriais por meio de
vazadouros clandestinos, como o caso da empresa Brahma, que lançou seus resíduos
industriais na Estrada do Morro do Ar e da Casa da Moeda, que contaminou os rios
adjacentes às suas instalações. Vale a pena ressaltar que consta no processo desta última
informação sobre a existência de uma grande parte de trabalhadores da empresa sofrendo
de leucopenia.
A Associação de Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira (APLIM) enviou
inúmeras denúncia ao MPE alegando agressões ambientais contra a reserva de proteção
ambiental, causadas por indústrias no Distrito Industrial de Santa Cruz. Segundo os
pescadores artesanais da Ilha da Madeira o descarte de resíduos das indústrias do Distrito
nos rios que o margeiam está gerando intensa poluição na Baía de Sepetiba e destruição do
mangue, que é considerado área de preservação ambiental permanente. Santa Cruz é um
bairro vizinho ao município de Itaguaí, e os rios que beiram o Distrito Industrial
12
desembocam direto na Baía de Sepetiba, afetando mais a população de lá do que da área
urbana de Santa Cruz, da qual fica distante.
Em outubro de 2002, o Ministério Público Estadual instaurou Inquérito Civil para
apurar a existência de poluição e os possíveis responsáveis pela poluição da Baía de
Sepetiba, cuja suspeita recaía sobre a Cervejaria Brahma, a White Martins (poluição pela
emissão de efluentes líquidos e gasosos na Baía Sepetiba) e a Herga Industrias Químicas.
A presença de sítios contaminados remanescentes de fábricas desativadas agravam
ainda mais o quadro de agressões ambientais sofridas pelos bairros. Um exemplo que temos
de tal ocorrência é o caso da empresa Grupo Químico Indústrial (situada em Santa Cruz),
que paralisou suas operações em 1996 e desde então vinha armazenando, inadequadamente,
tambores com resíduos tóxicos e perigosos. O problema ocorreu quando membros do
Movimento Sem Teto dos assentamentos de Araguaia e Nova Canudos (localizado no
Distrito Industrial de Campo Grande) retiraram desta firma bombonas e as utilizaram como
reservatórios de água. O resultado foi que cerca de 50 pessoas se intoxicaram e precisaram
de internação. O analista da FEEMA envolvido no caso tentou identificar quais produtos
químicos eram armazenados nas bombonas para subsidiar a medicação dos doentes, mas
muitas delas não possuíam mais rótulos e somente foi possível evidenciar os produtos
metanol, soda cáustica e barrilha. As bombonas foram levadas para o quartel da Defesa
Civil Estadual, na Praça da Bandeira. A empresa foi denunciada a FEEMA pela Associação
de Indústrias do Pólo Industrial de Santa Cruz.
Outro problema recorrente diz respeito aos descartes de resíduos tóxicos em “Bota
Foras”, dos quais temos como exemplos: 1) o caso da Casa da Moeda, que, durante 17
anos, armazenou tambores com cerca de 50 mil toneladas de resíduos oleosos e borra de
tinta diretamente sobre o solo e a céu aberto. Devido às péssimas condições do
armazenamento aconteceram vazamentos de produtos químicos no solo, que já estava
bastante impactado. A primeira avaliação geoambiental constatou a contaminação do solo e
das águas subterrâneas por metais pesados, como o chumbo. Além desse “bota fora”, a
estatal vinha utilizando outra área como depósito de lodo galvânico, borra de tinta e
resíduos gerais (cartuchos, estopa com resíduos, etc.). A empresa foi notificada pela
FEEMA a apresentar um Plano de Investigação Geoambiental para toda a área da CMB,
objetivando a detecção de possíveis contaminações do solo e da água subterrânea; 2) o caso
13
da empresa TASA (ligada à INFRAERO), que despejava resíduos oleosos numa área de 12
hectares em Santa Cruz seguido de aterramento. A equipe da FEEMA constatou que
estavam compactados cerca de 100 m² do terreno, com 25 cm de profundidade de borra de
óleo. A denúncia foi realizada pelos moradores da circunvizinhança, pois os odores
provindos do terreno, além de serem muito fortes, provocavam secura na garganta, ardência
nos olhos e náuseas.; 3) o caso de Palmares, um galpão da empresa Light utilizado para
armazenar uma grande quantidade de resíduos contaminados por ascarel e outros resíduos
de suas operações em Santa Cruz. A empresa assinou um Termo de Ajustamento de
Conduta com a FEEMA visando adequar o armazenamento às normas da Legislação
Ambiental; 4) o caso do descarte clandestino de produto químico não identificado em um
terreno baldio às margens da Av. Brasil, na altura de Campo Grande. Segundo consta no
processo, o Serviço de Controle da Poluição Acidental da FEEMA teria chegado no local
uma hora após receberem a denúncia por um agente da Polícia Rodoviária Federal e relatou
que cerca de 50 tambores de 200 litros estavam em chamas. O Corpo Bombeiro de Campo
Grande foi acionado para combater o fogo.
Fonte mapa: Governo do Estado do Rio de Janeiro. Site: http://www.governo.rj.gov.br/municipios.asp
14
DISTRITO DE VILA DE CAVA (especialmente os bairros de Adrianópolis e Vila de
Cava)
O distrito de Vila de Cava (que compreende os bairros de Adrianópolis, Vila de
Cava e Santa Rita) situa-se na região leste do município de Nova Iguaçu, próximo ao
limite com a divisa de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, Região Metropolitana do
Rio de Janeiro. Localizado no entorno direto da Reserva Biológica do Tinguá, o distrito
quase sediou o primeiro aterro de resíduos tóxicos do estado – a Central de Tratamento de
Resíduos – CENTRES. Os referidos bairros apresentam sérios problemas de falta de
investimentos em políticas públicas, como educação e saneamento.
O bairro de Adrianópolis, caso paradigmático dos problemas enfrentados na região,
fica a mais de cinco quilômetros do centro de Nova Iguaçu, lugar distante e isolado, onde
os serviços públicos custam a chegar. Os moradores sofrem de uma série de deficiências
infra-estruturais, tais como: falta de iluminação pública; de asfaltamento nas ruas (que gera
dispersão de poeira no ambiente); de atendimento médico; de escolas públicas, de um posto
policial, de saneamento básico; e de áreas para lazer. A distância até o centro de Nova
Iguaçu e as condições de acesso também dificultam o sistema de transporte urbano do
bairro; problemas estes relativos à demora na espera por condução.
15
Tal região tem sido cenário de agressões ambientais, tais como: lixão da
Marambaia; aterro sanitário de Adrianópolis; despejo de produtos químicos pela Fábrica de
Papel Paineira Ltda; abandono de resíduos tóxicos pela Cerâmica Açores; depósito de
materiais contaminados por ascarel pela empresa Furnas.
O lixão da Marambaia, situado no bairro de Vila de Cava, lançou resíduos sólidos
urbanos gerados pelo município de
Nova Iguaçu desde o final da década de 80, com
autorização da Prefeitura. Tal local recebia resíduos domésticos, hospitalares e industriais
gerados no município em uma área de aproximadamente 12 hectares nas proximidades da
Reserva Biológica do Tinguá.
Em maio de 2000, a Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente solicitou o
fechamento do Lixão da Marambaia à Comissão Estadual de Controle Ambiental – CECA
15
Fonte: notícia intitulada “Abandono em Adrianópolis” veiculada no RJTV na Baixada em 11 de Junho de
2005, através do site:
http://rjtv.globo.com/RJTV/0,19125,VRV0-3119-97723-20050611-633,00.html
15
alegando que o chorume produzido pelo lixão contaminava os lençóis freáticos e um canal
contribuinte ao rio Iguaçu. Já no ano de 1996, a Subsecretaria Estadual de
Desenvolvimento da Baixada havia sugerido à FEEMA a interdição do vazadouro e a
responsabilização da prefeitura por crime ambiental, em função da emissão de gases que
exalavam da montanha de lixo depositado a céu aberto e que provocavam incêndios
constantes. Além disso, encontravam-se no local centenas de catadores e animais (vacas,
porcos, etc).
Em 2000, a Prefeitura de Nova Iguaçu promoveu uma Licitação por Concorrência
Pública, visando contratar uma empresa para executar os serviços de tratamento e
disposição final de resíduos sólidos da cidade, assim como a recuperação da área do Lixão
da Marambaia. A empresa S/A Paulista ganhou a licitação e teria iniciado a recuperação do
lixão em 15 de janeiro de 2001.
Em 15 de março do mesmo ano, peritos do Departamento de Recursos Minerais -
DRM/RJ, a pedido do Ministério Público Federal (MPF) do Município de São João de
Meriti, vistoriaram o local e constataram que o lixão ainda estava em operação.
A continuação dos despejos foi autorizada por uma liminar do Juiz de Direito da 6ª
Vara Cível da Comarca de Nova Iguaçu, pois o mesmo julgou que o lançamento de lixo na
Marambaia, mesmo que em absoluto estado de colapso ambiental, teria que ser mantido até
que a Justiça Federal autorizasse a abertura do aterro da S/A Paulista, previsto para ser
instalado em Adrianópolis.
Em outra vistoria do DRM, constatou-se a poluição do lençol freático por chorume.
Segundo os peritos do órgão, o rio Iguaçu, o canal das Flechas, alguns brejos e pelo menos
uma nascente localizada próximo ao vazadouro requeriam cuidados especiais após o
encerramento das atividades do último. Desde então, o Lixão da Marambaia vem sendo
coberto por argila e virou um grande passivo ambiental.
O aterro de Adrianópolis, situado no bairro de Adrianópolis, entrou em operação em
fevereiro de 2003, sob a justificativa da necessidade de se encerrar com as atividades do
Lixão da Marambaia, que apresentava graves impactos ambientais. Porém, o
empreendimento sofreu forte contestação da sociedade civil, especialmente dos moradores
da circunvizinhaça, pois o terreno onde o aterro foi instalado abriga cinco nascentes (a água
16
mina do subsolo) e ainda vegetação de mata atlântica, que seria derrubada em área de
Reserva Biológica do Tinguá (Rebio Tinguá).
Após receber denúncias encaminhadas por carta e colher o depoimento de um
representante da Associação de Moradores de Adrianópolis, o Ministério Público Estadual
instaurou um Inquérito Civil para apurar o caso.
Uns dos maiores problemas referentes à instalação do aterro sanitário refere-se ao
fato dos moradores da região dependerem da riqueza dos mananciais hídricos do distrito de
Vila de Cava e, por não disporem de saneamento básico, temem a contaminação das águas,
pois utilizam poços artesianos para o consumo.
Em fevereiro de 2001, sem que houvesse audiência pública com a comunidade, a
empresa S.A. Paulista iniciou as obras para a construção do aterro de Adrianópolis, após
estabelecer contrato com a Empresa Municipal de Limpeza Urbana de Nova Iguaçu.
Foram verificadas algumas irregularidades no processo licitatório do aterro: 1)
apenas a empresa S.A. Paulista participara da licitação, propondo valores exorbitantes em
comparação com os custos de operação de outros aterros sanitários; 2) a empresa S.A.
Paulista iniciou as obras para a construção do aterro de Adrianópolis, após estabelecer
contrato com a Empresa Municipal de Limpeza Urbana de Nova Iguaçu. O contrato
assinado gerou uma denúncia da Câmara de Vereadores ao MPE, na qual alegava-se que a
EMLURB não poderia, perante lei constitucional, conceder qualquer serviço do município,
mas apenas o poder executivo; 3) o licenciamento do empreendimento pela FEEMA se deu
a partir da análise de um Estudo de Impacto Ambiental - EIA-RIMA de 1994 considerado
obsoleto e precário por não desenvolver a análise sócio-econômica da população.
Aproveitou-se uma Licença Prévia de outro empreendimento embargado, para se passar
diretamente à emissão de uma Licença de Instalação. A estratégia permitiu a não realização
de uma Audiência Pública, conforme determina a lei.
Após longo processo de disputa de liminares entre Associações de Moradores e
ONGs, Prefeitura de Nova Iguaçu e S.A Paulista, a justiça autorizou a implantação do
aterro.
Outro problema envolvendo poluição de corpo hídrico da região é o caso da
Fábrica de Papel Paineira Ltda, localizada no bairro de Adrianópolis. A referida fábrica é
acusada por moradores vizinhos de funcionar de forma irregular, causando grande
17
incômodo. Segundo os mesmos, vinham ocorrendo vazamentos de produtos químicos
derivados do processo de lavagem de papel nos rios Adrianino e Iguaçu, sem qualquer
tratamento. A denúncia foi encaminhada em 1996 ao Ministério Público Estadual.
A Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente - SEMUAM, após oficiada
pelo MPF, enviou laudo de vistoria técnica, realizado em 1999, informando ter sido
encontrado um nome parecido para a citada instalação, porém diferente e com outro
endereço (Rio Novo Indústria de Papel Ltda. – Av. Olinda, s/n - Adrianópolis). Constatou-
se na vistoria do local que as atividades da fábrica estavam paradas e a energia elétrica
cortada. Desde iniciado o inquérito em 1996, foram ao todo seis ofícios e reiterações à
FEEMA, todos nunca respondidos. A Prefeitura, apesar de inúmeras vezes oficiada, nunca
emitiu resposta às solicitações do Ministério Público. A mesma atitude repetiu-se com
relação à empresa. Tendo em vista os fatos, o promotor responsável pelo caso enviou à
Assessoria Criminal da Procuradoria Geral de Justiça do Ministério Público Estadual - RJ
os ofícios sem resposta da Prefeitura, a fim de punir esta prática que se tornou reincidente
pela prefeitura em inúmeros inquéritos que tramitam no Centro Regional de Nova Iguaçu.
Problemas relacionados à disposição ou depósito inadequado de rejeitos tóxicos
somam o quadro de agressões ambientais ao distrito de Vila de Cava. Este é o caso da
empresa Furnas, localizada no bairro de Adrianópolis, que usava no local um depósito de
materiais contaminados por ascarel, considerado um dos maiores do estado. Tal depósito
recebeu resíduos provenientes de outras sedes da empresa de vários estados brasileiros ao
longo de mais de 10 anos.
No que tange à disposição não licenciada de resíduos industriais, a Cerâmica
Açores mantinha abandonados em um galpão, no bairro de Vila da Cava, cerca de 80
toneladas de resíduos - fato averiguado pelo Serviço de Controle da Poluição Acidental da
FEEMA. A equipe do SCPA, em conversa com os moradores vizinhos ao depósito, apurou
que a Cerâmica Açores estava desativada há cinco anos. Segundo os técnicos, alguns
tambores com resíduos estariam estocados por um longo tempo e outros sugeriam uma
disposição bem recente. Pegadas de animais no perímetro da cerâmica indicavam que a área
servia como pasto. Os técnicos da FEEMA descobriram também a existência de duas
residências no terreno da Açores, junto aos resíduos. Um dos moradores, que se apresentou
como vigia do empreendimento, informou que os resíduos estavam nas dependências da
18
Cerâmica há sete anos. A equipe do órgão ambiental orientou as pessoas a não se
aproximarem do local e evitarem contato com os produtos.
Em maio de 1998, a FEEMA solicitou a Bayer análise do material abandonado, pois
naquele momento esta fundação não dispunha de condições para proceder com o trabalho.
De acordo com os resultados fornecidos pela Bayer, a composição dos resíduos era de: 49%
de óleo mineral, 15% de carbonato de cálcio, 05% de álcool e 02% de hidróxido de cálcio.
A Bayer, a partir da composição dos resíduos, afirmou ser capaz de identificar o produtor
do mesmo: a Lubrizol do Brasil.
Em junho de 1998, a advogada da Cerâmica Açores e um representante da Lubrizol
coletaram amostras do material para análise. Seis dias depois a Lubrizol reconheceu que era
a geradora dos resíduos, retirou os tambores do galpão e os encaminhou para a cerâmica
Basilar, no distrito de Itambi, em Itaboraí.
Fonte mapa: Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Site:
http://www.governo.rj.gov.br/municipios.asp
19
Considerações finais
A pesquisa realizada pelo sociólogo Robert Bullard nos EUA
16
teve grande peso na
constatação da existência de uma distribuição locacional desigual de riscos ambientais, pois
revelou que a proporção de residentes pertencentes a minorias étnicas em áreas onde há lixo
tóxico era igual ao dobro da mesma população em áreas livres de poluentes. Segundo o
autor, nos Estados Unidos “três dos cinco grandes depósitos comerciais de rejeitos
perigosos localizam-se em áreas onde hispânicos e negros compõem a maioria da
população. Essas disparidades locacionais expõem as minorias a riscos muito maiores do
que a população em geral”
17
. Os resultados provocaram uma reação governamental que
culminou na criação de um Departamento de Justiça Ambiental na Agência de Proteção
Ambiental nos EUA (Environmental Protection Agency - EPA).
Na perspectiva dos estudiosos da desigualdade ambiental, o termo “zona de
sacrifício” passou a designar locais onde há ocorrência de múltiplas práticas
ambientalmente agressivas atingindo populações de baixa renda ou minorias étnicas. Tais
populações são vítimas de impactos indesejáveis de grandes investimentos que se
apropriam dos recursos existentes nos territórios, concentram renda e poder, ao mesmo
tempo em que atingem a saúde de trabalhadores e a integridade de ecossistemas de que
dependem. Como agravante, esses mesmos grupos, submetidos aos mais variados riscos
ambientais
18
, são aqueles que dispõem de menos condições de se fazerem ouvir no espaço
público, não tendo oportunidade de colocar em questão os efeitos da desigual distribuição
da poluição e da proteção ambiental.
Nessas áreas, os moradores convivem com a poluição industrial do ar e da água,
depósitos de resíduos tóxicos, solos contaminados, ausência de abastecimento de água,
riscos associados a enchentes, lixões, pedreiras, etc. Fatores como a desregulação ambiental
e isenções tributárias, voltadas para atrair para tais locais investimentos de todo tipo, não
importando o ônus social e ambiental que os mesmos acarretarão (implantação de novos
16
Ver Bullard, Robert D. Dumping in Dixie: race, class and environmental quality. Boulder, Westview Press, 1990.
17
Cf. Bullard, Robert D. Dumping in Dixie: race, class and environmental quality. Boulder, Westview Press, 1990, p.35.
18
Entende-se aqui por “risco ambiental” a possibilidade de ocorrência de um dano, enfermidade ou morte resultante da
exposição de seres humanos, animais ou vegetais a agentes ou condições ambientais potencialmente perigosas (Glossário
de Defesa Civil: estudos de riscos e medicina de desastres, 1998).
20
empreendimentos de alto potencial poluidor), fariam parte da dinâmica desse processo de
zoneamento do risco ambiental pelo mercado.
No caso brasileiro, e do estado do Rio de Janeiro, em particular, cabe às pesquisas
futuras investigar se as áreas que vêm se beneficiando com investimentos importantes para
a retomada do dinamismo da economia fluminense, como é o caso de Itaguaí desde o início
dos anos 2000, não estariam, ao mesmo tempo, concentrando sobre seus ecossistemas e,
consequentemente, sobre muitos dos habitantes desta localidade, os efeitos ambientais
indesejáveis do desenvolvimento.
Referências bibliográficas:
BULLARD, Robert D. (1990)
Dumping in Dixie: race, class and environmental quality. Boulder,
Westview Press
FERRAZ. Iara (2004), “O fim do projeto da usina termelétrica a carvão mineral em Itaguaí”. In
Conflito social e meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro. (org) Henri Acselrad. Rio de Janeiro:
Relume Dumará: FASE.
GOMES DA GAMA, Sonia Vidal (1998) . “Mapeamento digital de (in)compatibilidades do uso dos
solos na XIX RA Santa Cruz – Município do Rio de Janeiro”. Dissertação de mestrado em
Geografia, UFRJ, Rio de Janeiro
IPPUR-UFRJ/FASE (2006), Mapa dos Conflitos Ambientais no Estado do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, CD ROM.
LEROY, J.P. (2004) “Relatores Nacionais em Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e
Ambientais: Missão Itaguaí”, Rio de Janeiro.
MENDES, J. (1999) Portos, cidades e territórios na virada do século. O caso do Porto de Sepetiba.
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ROSSETE, Amintas Nazareth (1996). “Planejamento Ambiental e Mineração. Estudo de Caso: A
Mineração de Areia no Município De Itaguaí – RJ”, dissertação de Mestrado, UNICAMP.
INSTITUTO DE GEOCIENCIAS.
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