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RAQUEL FACTORI CANOVA
CRENÇA, CONCEPÇÃO E COMPETÊNCIA DOS PROFESSORES
DO 1º E 2º CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL COM RELAÇÃO
À FRAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PUC/SP
SÃO PAULO
2006
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2
RAQUEL FACTORI CANOVA
CRENÇA, CONCEPÇÃO E COMPETÊNCIA DOS PROFESSORES
DO 1º E 2º CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL COM RELAÇÃO
À FRAÇÃO
Dissertação apresentada à banca
examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
MESTRE em Educação Matemática,
sob orientação da Profa. Dra. Sandra
Maria Pinto Magina.
PUC/SP
SÃO PAULO
2006
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3
BANCA EXAMINADORA
__________________________________
__________________________________
__________________________________
4
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação por processos de foto copiadoras ou eletrônicos.
ASSINATURA: ________________________ LOCAL E DATA: _____________
5
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Iedo e Virginia
à meu irmão Renato
e ao meu esposo Diego.
6
AGRADECIMENTOS
É com grande satisfação e entusiasmo que chego ao final desta pesquisa.
Além de todo conhecimento e experiência, este trabalho me proporcionou
conviver com pessoas maravilhosas que me ajudaram e me apoiaram em toda a
trajetória.
À Profa. Dra. Sandra Maria Pinto Magina, pela orientação constante, apoio,
incentivo e, sobretudo o privilégio de uma convivência acolhedora. Sua dedicação
foi fundamental para realização deste estudo, meu muito obrigada.
À Profa. Dra. Tânia Maria Mendonça Campos, pelo incentivo e valiosas
sugestões, seja individualmente, seja nas discussões do grupo de fração.
À Profa. Dra. Rosana Giaretta Sguerra Miskulin, por ter aceito fazer parte
da banca e por suas sugestões e valiosas contribuições.
À Profa. Dra. Maria Célia Leme Pires, pelas sugestões e auxílio que muito
contribuíram para a evolução desta pesquisa.
Gostaria muito de agradecer também, as instituições Alice Rodrigues Dias,
representada pela Profa. Dra. Silvia Alcântara Machado, a CAPES e a CNPq, pela
bolsa de estudo, pois sem esta, com certeza este trabalho não seria possível.
Aos meus amigos: Aparecido (o Cido), Wilson, Vera, Angélica, Alécio,
Conceição, Leonel e Ubiratan (o Bira), pela oportunidade das discussões e
contribuições em diferentes momentos deste estudo, e ao grupo de fração em
particular, o meu agradecimento pelo auxílio na análise.
À direção e professores das escolas municipais pela colaboração para a
realização deste trabalho
7
Aos meus queridos Pais pela educação e por apostarem em mim dando
boas escolas e sempre incentivando a nunca parar. Durante todo esse percurso,
colaboraram para eu pudesse fazer um bom trabalho e me apoiaram em todos os
momentos com muito carinho, atenção e compreensão. Meu muito obrigada pai e
mãe.
A meu esposo Diego, pelo constante incentivo, colaboração e pela
compreensão de minha ausência em muitas horas dedicadas a este estudo. O
seu companheirismo foi muito importante durante todo o desenvolvimento deste
trabalho. Muito obrigada Diego.
E finalmente, agradeço a Deus por ter me dado saúde e iluminado este
percurso.
8
RESUMO
O presente trabalho teve por objetivo identificar e analisar as crenças,
concepções e competências dos professores que atuavam no 1º e 2º ciclos no
Ensino Fundamental no que diz respeito ao conceito de fração. Para isso o estudo
se propôs a responder a seguinte questão de pesquisa: “Qual é o entendimento
que os professores dos 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental apresentam em
relação ao conceito de fração?” Para responder tal questão, primeiro, construímos
uma sustentação teórica baseada nas idéias de Vergnaud, Nunes e Ponte. Em
seguida, elaboramos um instrumento investigativo composto por 29 questões
sudvididas em quatro partes: (1) perfil; (2) crenças; (3) concepções e (4)
competências. Esse instrumento foi aplicado a 51 professores do 1º e 2º ciclos do
Ensino Fundamental, distribuídos em três escolas da Rede Municipal da cidade
de Osasco. No segundo momento, realizamos entrevistas clínicas em 10% da
amostra. A análise dos dados também foi dividida nas mesmas quatro partes que
compôs o instrumento. Utilizamos a classificação teórica proposta por Nunes et al.
(2003) e consideramos as variáveis de quantidade (contínua e discreta) e
representação (íconica ou não) além dos invariantes do conceito (ordem e
equivalência). Os resultados mostraram que as crenças dos professores não são
influênciadas pela sua prática docente, o que não é verdade para as concepções.
Estas eram mais restritas entre os professores do 1º ciclo (significado parte-todo
em quantidade contínua não íconica) do que para os professores do 2º ciclo
(exploraram mais variáveis, sendo estas bem próximas das encontradas nos
livros didáticos). Quanto à competência, constatamos que não houve um
desempenho eqüitativo entre os cinco significados da fração e os invariantes.
Estas evidências levaram-nos a concluir que há a necessidade de se ampliar o
campo conceitual desses professores com relação ao objeto fração.
Palavras-chaves: significados da fração, campo conceitual, formação de
professor, Ensino Fundamental, estudo diagnóstico
9
ABSTRACT
This work had the goal to identify and analyse the teachers` beliefs, conceptions
and competences who work in First and Second cycles of Ensino Fundamental
with the concept of decimal and vulgar fraction. It was proposed in this study to
answer the following question of research: “What is the understanding that the
teachers of First and Second cycles of Ensino Fundamental present with the
relation to decimal and vulgar fraction?” To answer this question, first we built a
theoretical support based in Vergnaud`s, Nunes`, and Pontes` ideas. Then we
elaborated an investigable instrument with twenty nine questions subdivided in
four parts: (1) outline; (2) beliefs; (3) conceptions and (4) competences. This
instrument was applied to fifty one teachers of First and Second cycles of Ensino
Fundamental, distributed to three schools of Municipal Net of Osasco City. At the
second moment, we accomplished clinical interviews with 10% of the sample. The
analyses of the data was also divided in the same four parts that made the
instrument. We utilized the theoretical classification proposed by Nunes and
others (2003) and we considered the variants of quantity (continuous and
discreet) and representation (iconic or not) besides the invariants of concept
(order and equivalence). The results showed the teachers` beliefs are not
influenced by their teaching practice, what it is not true to the concepts. These
were more restricted among the teachers of the First cycle (meant part-whole in
continuous quantity not iconic) than teachers of the Second cycle (they explored
more variants, being these nearer of those found in didactic books). As to
competence, we verified that there was not an equitable performance among the
five fraction meanings and the variants. These evidences led us to conclude there
is the need to enlarge these teachers`conceptual background about fraction.
Key Words: meanings of fraction, conceptual background, teacher’s background,
diagnostic study
10
SUMÁRIO
CAPÍTULO I – APRESENTAÇÃO
1.1. Introdução ..............................................................................................12
1.2. Justificativa .............................................................................................16
1.3. Problemática ............................................................................................21
1.4.
Objetivo e questão de pesquisa............................................................. 23
1.5.
Descrição dos capítulos subseqüentes .................................................25
CAPÍTULO II – CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA: A FORMAÇÃO DO
CONCEITO
2.1. Introdução ............................................................................................. 27
2.2. Formação do Conceito .......................................................................... 27
2.2.1. Situações que dão significado ao conceito....................................... 34
2.2.2. Porcentagem, probabilidade e razão ............................................... 49
CAPÍTULO III – CONTRIBUIÇÕES EDUCACIONAIS: FORMAÇÃO DO
PROFESSOR
3.1. Introdução ............................................................................................. 52
3.2. Formação de professores ...................................................................... 52
3.3. Crença, concepção e competência ........................................................ 59
11
CAPÍTULO IV – FRAÇÃO NA PERSPECTIVA DA MATEMÁTICA, DA ESCOLA
E DA PESQUISA
4.1. Introdução ............................................................................................... 63
4.2. Fração na perspectiva da Matemática .................................................... 63
4.2.1. Uma pré-contextualização do surgimento ......................................... 64
4.2.2. Compreensão atual da fração ............................................................67
4.3. Fração na perspectiva da escola .............................................................71
4.3.1. Categorias de análise .........................................................................71
4.3.2. Livros didáticos .................................................................................. 72
4.3.3. Visão geral ........................................................................................ 78
4.4. Fração na perspectiva da pesquisa......................................................... 83
4.4.1.Pesquisas realizadas no grupo de pesquisa de frações coordenadas
pelas Profas. Dras. Tânia Campos e Sandra Magina ........................ 83
4.4.2. Pesquisas correlatas ..........................................................................90
CAPÍTULO V – METODOLOGIA
5.1. Introdução...............................................................................................104
5.2. Discussão Teórico-Metodológica............................................................105
5.3. Estudo Preliminar ...................................................................................106
5.4. Estudo Principal......................................................................................108
5.4.1. Universo de pesquisa .......................................................................109
5.4.2. Análise do instrumento de pesquisa ................................................110
5.4.2.1. Caderno 1: perfil, crença e concepção .......................................112
5.4.2.2. Caderno 2: competência .............................................................119
5.5.. Procedimentos da aplicação..................................................................140
12
CAPÍTULO VI – ANÁLISE DOS RESULTADOS
6.1. Introdução ..............................................................................................143
6.2. Análise do perfil dos professores ...........................................................144
6.3. Análise das crenças dos professores ....................................................148
6.4. Análise das concepções dos professores...............................................155
6.4.1. Classificação das situações quanto aos cinco significados da
fração ..............................................................................................159
6.4.2. Classificação das situações quanto as variáveis ............................164
6.4.3. Classificação das situações quanto aos invariantes .......................168
6.4.4. Material didático ............................................................................. 169
6.5. Análise das competências dos professores ...........................................170
6.5.1. Desempenho dos professores quanto aos cinco significados da
fração ............................................................................................172
6.5.2. Desempenho dos professores quanto as variáveis ........................176
6.5.3. Desempenho dos professores quanto aos invariantes ...................178
6.5.4. Categorias criadas a partir das estratégias ....................................180
CAPÍTULO VII – CONCLUSÃO
7.1. Introdução...............................................................................................192
7.2. Síntese dos resultados obtidos ..............................................................193
7.3. Respondendo à questão de pesquisa ...................................................202
7.4. Sugestões para futuras pesquisas .........................................................206
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
............................................................... 208
ANEXOS
CAPÍTULO I
APRESENTAÇÃO
1.1 INTRODUÇÃO
No dia-a-dia é muito comum ouvir, ler ou falar sobre situações que envolvam
frações. Podemos pensar em fração como uma forma de representar os números
racionais. No desenvolvimento deste trabalho, referir-nos-emos a representação
fracionária de números racionais simplesmente como fração.
A seguir apresentaremos dentro do nosso cotidiano, alguns exemplos
ilustrativos nos quais as frações aparecem representadas por:
Símbolo matemático: nesse caso a fração é indicada como
b
a
(significando a b), sendo a e b números inteiros e b diferente de 0. ÷
Uma situação muito comum desse tipo de representação são as receitas de
culinária, como ilustra a figura 1.1 abaixo:
FIGURA 1.1: Receitas retiradas do livreto do consumidor que acompanha o
Microondas Panasonic Junior
.
13
Nas duas receitas acima, encontramos a fração sendo utilizada para
expressar quantidades (½ kg de file mignon, ¼ de xícara (chá) de molho de soja)
e também o tempo (tempo aproximado:1 minuto, (1 ½ )).
Outra situação em que também é muito comum encontrarmos esse tipo de
representação são as listas de material hidráulico, como mostra a figura 1.2 a
seguir:
FIGURA 1.2: Exemplo fictício de uma lista de material
hidráulico de um encanador
Na situação descrita acima, temos uma lista de compras de materiais
hidráulicos tal qual ela costuma ser frequentemente escrita por encanadores.
Notamos na lista que os diâmetros dos materiais estão todos apresentados em
fração. Essas frações referem-se a unidade polegada. Assim, o item 01 da lista
refere-se a uma peça que liga um cano de ½ polegada a outro de ¾ de polegada,
com a função de redutor da passagem de água na tubulação. Ao usar essa
terminologia (fração de polegadas) não significa que o encanador tenha
conhecimento do que esse objeto significa do ponto de vista da Matemática. Na
verdade quando um encanador nos pede para comprar um cano “Tigre” de
2
1
(um
cano da marca Tigre com o diâmetro de meia polegada) esse valor
2
1
é referido
14
como um rótulo referente ao cano sem que, contudo, haja um entendimento
matemático a seu respeito.
Língua natural: nesse caso a fração é utilizada em frases, que ouvimos
com muita freqüência. As frações mais utilizadas nesse caso são: um
quarto
4
1
, meio
2
1
, um terço
3
1
, três quartos
4
3
Quem já não ouviu, ou falou alguma das frases abaixo?
“P
ARA FAZER UMA LARANJADA USEI MEIA DÚZIA DE LARANJAS
TRÊS QUARTOS DA ESTRADA ESTAVA EM PÉSSIMO ESTADO
“G
ASTEI UM QUARTO DE GASOLINA
“QUE HORAS SÃO? TRÊS E MEIA
As frases descritas são pronunciadas com muita freqüência no dia-a-dia. No
entanto podemos usá-las sem nos darmos conta das frações que nelas estão
contidas. Temos a compreensão, por exemplo, na última frase, que três e meia
significa 3 horas mais metade de uma hora, isto, porém está implícito.
O termo fração também é utilizado para expressar parte de alguma coisa,
como mostra o exemplo, que se refere a venda de um bilhete de loteria:
FIGURA 1.3: Padovan, Guerra, Milan Matemática.
3ª série, p. 128,2005.
15
Por fim, a fração ainda pode ser utilizada para se referir a um curto espaço
de tempo. Neste caso, ela pode aparecer em situações do dia-a-dia ou, ainda,
como figura metafórica, como ilustram os exemplos da figura 1.4:
“Eterno é tudo aquilo que vive uma
fração de segundo
mas com tamanha intensidade que
se petrifica e nenhuma força o
resgata”
(Esse poema foi escrito por Nandinha,
sendo retirado do site
http://mundodeandinha.zip.net/
em 03/05/2005)
FIGURA 1.4: Exemplos de referência a um período de tempo expresso por fração
No poema acima, a palavra fração é usada para expressar um período de
tempo muito curto, tão curto que nos remete a algo menor que a menor unidade
de tempo marcada por um relógio comum, isto é, em uma parte do segundo, e
que, portanto um número inteiro não expressaria tal situação.
No ensino, muitas vezes, o conceito de fração aparece solto, deslocado,
sem um contexto que dê significado para ele, como nos exemplos mencionados
acima. Isso pode fazer com que as crianças não associem esse conceito ao seu
conhecimento do cotidiano, dificultando a sua aprendizagem.
Uma vez feita a apresentação do nosso estudo, passaremos a justificativa
do porquê escolhermos a fração como objeto de estudo desta dissertação
.
16
1.2 JUSTIFICATIVA
Acreditamos, assim como Behr et al (1983), que o conceito de fração é uma
das idéias matemáticas mais complexas e importantes na formação do aluno e
que o seu ensino e aprendizagem envolvem três aspectos:
1) O primeiro aspecto é o prático, isto é, as frações, em suas diferentes
representações, surgem com freqüência em diversas situações relacionadas à
expressão de medida e de quantidade. Este fato evidencia a necessidade da
extensão do conjunto dos números naturais;
2) O segundo aspecto refere-se a uma perspectiva psicológica, ou seja, o
trabalho com as frações surge como uma oportunidade privilegiada para
alavancar e expandir estruturas mentais necessárias ao desenvolvimento
intelectual;
3) O terceiro aspecto diz respeito à perspectiva da Matemática, pois serão
justamente os primeiros estudos com as frações que fundamentarão idéias
matemáticas mais complexas como, por exemplo, as operações algébricas
elementares a serem desenvolvidas ao longo do ensino de Matemática.
Além desses importantes aspectos, evidenciamos, por meio de pesquisas
recentes (Bezerra, 2002; Merlini, 2005; Moutinho, 2005), que tanto os alunos das
séries iniciais (1º e 2º ciclos), quanto aqueles das séries finais (3º e 4º ciclos)
apresentam dificuldades em resolverem situações-problema envolvendo fração.
O baixo rendimento dos alunos em relação a esse conceito também pode
ser observado nos resultados das avaliações oficiais, tanto do Sistema de
Avaliação e Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP, 1998),
quanto no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB, 2001).
Nos relatórios oficiais em que se discutem os resultados dessas avaliações, há
17
recomendações claras para que o conceito de fração seja mais explorado na
escola e que se utilizem situações práticas do cotidiano.
No último relatório divulgado do SARESP (1998, p.35), o desempenho dos
alunos de 5ª série do Ensino Fundamental nas questões que envolveram o
conteúdo de fração ficou abaixo do esperado. Vale salientarmos que os técnicos
responsáveis por essa avaliação consideram, conforme consta no próprio
relatório, que ao se avaliar alunos da 5
a
série, estarão avaliando na verdade, os
conteúdos referentes à 4
a
série do Ensino fundamental. Uma das questões que
envolveu o conceito foi a questão de número 10, que traz o seguinte situação:
Das figuras abaixo, quais representam frações equivalentes a
4
1
?
FIGURA 1.5: Questão 10 do SARESP 1998
Apesar de encontrarmos facilmente questões similares a esta nos livros
didáticos, o índice de acerto dos alunos da 5
a
série foi apenas de 26%. Esse
percentual é muito baixo se pensarmos que o significado parte-todo é o mais
utilizado no ensino de fração e, possivelmente, é o significado que os alunos mais
dominam. Esse baixo índice de acerto demonstra a grande dificuldade que os
alunos têm para trabalharem com a representação fracionária.
A análise encontrada no relatório do SARESP (1998) para a referida
questão, aponta que, pedagogicamente, era esperada uma atuação bem melhor
18
dos alunos. A hipótese levantada para esse baixo rendimento foi a de que os
alunos não apresentavam domínio do conceito de frações equivalentes, embora
tal domínio fosse fundamental para um trabalho significativo de números
fracionários.
Com relação a avaliação do SAEB (2001), aplicada em alunos de 4ª série do
Ensino Fundamental, foi apresentada a seguinte questão:
Para fazer uma horta, Marcelo dividiu um terreno em 7 partes iguais. Em cada
uma das partes, ele plantará um tipo de semente. Que fração representará cada
uma das partes dessa horta?
FIGURA 1.6: Questão apresentada no descritor 24, nível 5, do SAEB 2001
Trata-se, novamente, de uma questão que envolve o significado parte-todo e
que possivelmente é trabalhada nas escolas. Assim como na questão do
SARESP, o índice de acertos dos alunos foi muito baixo; aqui tivemos o
percentual de 35% de acertos. Esse baixo rendimento denota que embora se trate
de uma questão costumeiramente trabalhada em sala de aula, os alunos não
tinham o conhecimento necessário para resolução dessa situação.
O baixo desempenho dos alunos, conforme os resultados do SARESP
(1998) e SAEB (2001) podem estar ligados ao próprio entendimento e
competência que os professores das séries iniciais têm sobre o conceito de
fração.
Segundo Magina et al. (2001, p. 11) não se pode descrever e analisar
avanços e conquistas dos alunos no seu processo de aprendizagem sem
considerar as suas competências e concepções:
19
A competência é traçada pela ação do aluno diante das situações
(no caso, resolução de problemas), e as concepções dos alunos
podem ser traçadas por suas experiências verbais ou outras
representações simbólicas (tais como a escrita ou o gesto).
Dentro desse processo de formação e desenvolvimento de
competências e concepções, o ensino é essencial e o professor
tem um papel fundamental, pois é dele a responsabilidade de
fazer escolhas adequadas para criar um ambiente favorável para
o aluno avançar nesse processo.
Assim sendo, é de grande interesse investigar-se sobre o conhecimento, o
qual Ponte (1994) considera como sendo as crenças e concepções. É importante
destacar que o objetivo desta pesquisa vai além, buscando também investigar as
competências que os professores, que atuam nas séries iniciais do Ensino
Fundamental (polivalentes), apresentam sobre o conteúdo de fração. Esses
profissionais participam diretamente da formação e desenvolvimento do
conhecimento e competência dos seus alunos.
Os três termos investigados nesta pesquisa – crença, concepção e
competência – serão incluídos na palavra “entendimento”.
Cabe ressaltar que este estudo faz parte de um projeto de pesquisa mais
amplo, desenvolvido dentro do programa de cooperação entre a Oxford University
– sob a coordenação de Terezinha Nunes – e o Programa de Educação
Matemática da PUC-SP, coordenado pelas Professoras Tânia Campos e Sandra
Magina. Tal projeto, intitulado “A formação, desenvolvimento e ensino do conceito
de fração”, tem por objetivo investigar a formação e desenvolvimento do conceito
de fração nos Ensinos Fundamental, Médio e Superior, quer seja do ponto de
vista do seu ensino (professor), quer seja do ponto de vista da sua aprendizagem
(aluno).
Neste projeto estão sendo desenvolvidas seis dissertações de mestrado e
duas teses de doutoramento. Os trabalhos de mestrado, nos quais nos incluímos,
20
são estudos diagnósticos com o objetivo de mapear algumas dificuldades e
estratégias apresentadas tanto pelos alunos quanto pelos professores.
Tanto os estudos de mestrado, quanto os de doutorado, serão descritos
resumidamente no Capítulo IV deste trabalho.
No momento, é importante destacarmos o trabalho de mestrado de Santos
(2005), cujo estudo foi realizado em duas etapas. Na primeira etapa, ele pediu
que os professores do 1º, 2º e 3º ciclos do Ensino Fundamental elaborassem seis
problemas que abordassem o conceito de fração. Na segunda etapa realizada um
mês após a primeira, ele pediu para que estes professores resolvessem os seis
problemas que eles próprios elaboraram. A partir da análise dos protocolos de
elaboração dos problemas, Santos estabeleceu algumas classificações, sendo
que uma delas diz respeito à fração e seus cinco significados.
Esta pesquisa serviu de base para o desenho de nosso estudo, que buscou
estender o diagnóstico feito por Santos (2005), no sentido de que além de
pesquisar as concepções dos professores nas elaborações de questões que
envolviam o conceito de fração, fomos mais além, elaborando questões
investigativas a respeito de suas crenças e competências com relação à fração.
Os termos “crenças”, “concepções” e “competências” serão abordados em
detalhes no Capítulo III. Porém, para efeito de compreensão neste capítulo,
salientamos que os mesmos são empregados em nosso estudo com os seguintes
sentidos:
As crenças, segundo Ponte (1992), são verdades pessoais que não se
apóiam em experiências válidas, são criações livres da imaginação. As
crenças não têm suporte empírico que as valide.
21
As concepções, segundo o mesmo autor, têm uma natureza
essencialmente cognitiva. São mantidas pelas convicções, são
consensuais e têm procedimentos para valorizar sua validade. Para
Vergnaud (1987), as concepções, na maioria das vezes, são traçadas nas
expressões simbólicas – explícitas – por meio de problemas práticos e
teóricos.
As competências podem ser traçadas por meio da ação do sujeito frente a
uma situação, Vergnaud (ibid). São conhecimentos e conceitos implícitos,
analisados como combinação de esquemas
1
.
Exposta a justificativa do nosso estudo, apresentaremos a problemática a
qual se insere.
1.3 PROBLEMÁTICA
O conceito de número fracionário tem o seu ensino iniciado a partir do
segundo ciclo do Ensino Fundamental. Embora esse conteúdo seja desenvolvido
nos ciclos iniciais, constata-se (Merlini, 2005) que os alunos chegam ao terceiro
ciclo sem a compreensão do significado desse número.
Pesquisas recentes (Silva, 1997; Bezerra, 2002; Moutinho, 2005; Merlini,
2005; Santos, 2005) têm demonstrado que a introdução desse conceito está
longe de ser trivial, tanto do ponto de vista do ensino como da aprendizagem. No
ensino, percebemos um grande exagero em procedimentos algoritmos (Silva
1997; Santos, 2005) e uma forte tendência em traduzir o conceito de número
1
O termo “esquema” foi introduzido por Piaget para dar conta das formas de organização tanto das
habilidades sensório-motoras como das habilidades intelectuais.
22
racional, na representação fracionária, utilizando apenas um significado, seja
parte-todo, seja operador multiplicativo.
Além do mais, os resultados de estudo de Nunes (1997) aponta que as
crianças inglesas apresentam maior facilidade no entendimento de problemas que
trazem o significado quociente, embora haja uma tendência da escola em
trabalhar muito pouco este significado.
Uma explicação para as dificuldades encontradas na aprendizagem dos
números racionais supõe rupturas com as idéias construídas para os números
naturais (Merlini, 2005). A noção de ruptura parece, por exemplo, no seguinte
exemplo: Pergunta-se a um aluno após este ter aprendido que a multiplicação é
uma adição repetida “Seis vezes quanto dá o número três?”.
Este aluno provavelmente vai dizer que é impossível e ficará muito surpreso
ao perceber que, ao comprar 6 pacotes de pipoca doce ao preço de R$0,50 (
2
1
),
ele terá que pagar R$3,00. Magina et al.mag (2001, p.6) comenta algumas
rupturas e diz “que a idéia que “multiplicação sempre aumenta”, só é verdade
quando está restrita ao domínio de validade dos números naturais.”
A falta de compreensão que a representação
b
a
com 0
b é um número e
não dois números naturais e um traço separando-os faz com que surjam outras
dificuldades na aquisição desse novo conceito. Os alunos transferem o seu
conhecimento de números naturais para os números racionais e isso faz com que
eles, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), enfrentem várias
dificuldades.
23
De fato, tanto os resultados encontrados por Santos (2005) no ensino, como
de Merlini (2005) e Moutinho (2005) na aprendizagem, evidenciaram que muitas
vezes a fração é tratada como dois números naturais sobrepostos. Já nos
resultados de Silva (1997) e de Bezerra (2001), ambos constataram que tanto os
professores quanto os alunos desprezam a conservação de área nas figuras,
levando assim, ao erro. Esses estudos serão aprofundados no Capítulo IV.
Acreditamos que as dificuldades do aluno, na aprendizagem (Merlini (ibid);
Moutinho (ibid); Bezerra (ibid)), estejam relacionadas à falta de compreensão do
professor sobre fração (Silva (ibid), Santos (ibid)), acreditamos que tais
dificuldades podem estar relacionadas a compreensão que os professores têm da
fração. Pra tanto, elaboramos um instrumento diagnóstico com o objetivo de
investigar e analisar algumas crenças, concepções e competências dos
professores, com relação a este conteúdo.
A seguir apresentaremos o objetivo do nosso estudo seguido da nossa
questão de pesquisa.
1.4 OBJETIVO E QUESTÃO DE PESQUISA
Este trabalho tem como objetivo identificar e analisar as crenças,
concepções e competências dos professores que atuam no 1º e 2º ciclos no
Ensino Fundamental no que diz respeito ao conceito de fração. Para tanto, nos
apoiaremos na classificação teórica proposta por Nunes et al. (2003) a qual
apresenta a fração com cinco significados (parte-todo, quociente, medida, número
24
e operador multiplicativo). Também levaremos em conta, duas variáveis: de
quantidade (contínua e discreta) e representação (icônica e não icônica), além
dos invariantes do conceito (ordem e equivalência).
Tendo este objetivo, o presente estudo foi elaborado para responder a
seguinte questão de pesquisa:
Qual é o entendimento que os professores dos 1º
e 2º ciclos do Ensino Fundamental apresentam em
relação ao conceito de fração?
Para responder tal pergunta será necessário investigar outras duas
questões: 1- Quais as crenças e concepções que esses professores têm a
respeito da fração? – entendimento no ensino.
2- Quais as competências desses professores nas resoluções das questões
envolvendo o conceito de fração? – entendimento na competência.
Para responder tais perguntas, analisaremos a resolução do instrumento
diagnóstico e os relatos dos professores durante a entrevista. Pretendemos ainda,
averiguar a freqüência em que os cinco diferentes significados da fração surgem
na elaboração e resolução de questões.
Com tais resultados em mãos, será possível traçar um mapa dos
professores presentes em nossa pesquisa, em relação ao conceito de fração.
Temos a preocupação de não apenas diagnosticar como está formado esse
conceito hoje, mas também de relacionar esse resultado com as características
(perfil) profissionais desses sujeitos.
25
Assim sendo, o instrumento foi elaborado de modo a permitir quatro olhares
distintos desses professores: (a) o
perfil, com questões que abordaram o tipo e
tempo de formação desses professores, bem como as séries que já lecionaram e
lecionavam no momento da coleta de dados, entre outras; (b) suas crenças em
relação ao conceito de fração, em que foram feitas questões abertas que
investigaram como esses professores vêem a fração no ensino e em particular;
(c) as concepções, em que solicitamos aos professores que criassem livremente
situações-problema para o ensino de fração: e (d) a
competência, que será
medida a partir da resolução desses professores a problemas envolvendo cinco
significados distintos da fração.
A partir da análise desse diagnóstico, esperamos obter informações
suficientes para a elaboração de um mapa, o qual aponte o conjunto de crenças,
concepções e competências desses professores no que tange à fração. Se assim
for, nosso estudo terá contribuído para oferecer uma boa base para futuras
pesquisas cujo interesse seja a de intervenção na formação, inicial e continuada,
de professores polivalentes no que tange ao conceito da fração.
Descrita aqui nossa questão de pesquisa, apresentaremos na próxima seção
a descrição dos capítulos que configuraram nosso estudo.
1.5 DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS SUBSEQÜENTES
No presente Capítulo, apresentamos a problemática que nos incentivou a
investigar o tema fração junto aos professores das séries iniciais. Para a
26
justificativa, o objetivo e a questão de pesquisa, buscamos responder, analisando
o desenvolvimento do estudo.
No Capítulo II, faremos a apresentação da teoria que subsidiou o nosso
estudo para a compreensão da formação do conceito, a Teoria dos Campos
Conceituais de Vergnaud (1990, 2001) e também uma discussão das idéias
teóricas que contemplaram os significados da fração, Nunes et al. (2003).
No Capítulo III, consideramos importante fazer uma discussão da formação
do professor (Nóvoa, 2001; Ponte, 1995), abordando um pouco da legislação, a
profissão docente e sobre os termos crença, concepção e competência.
No Capítulo IV, apresentaremos a “fração” sob três aspectos da Matemática:
na Matemática - o seu surgimento e a compreensão atual (definições e
propriedades) – na Escola – análise de três coleções de livros– na Pesquisa –
estudos correlatos ao nosso trabalho, tanto do ponto de vista da aprendizagem
quanto do ensino.
No Capítulo V, trataremos da metodologia utilizada em nossa pesquisa, o estudo
preliminar que nos proporcionou refinar o instrumento, o estudo principal com os
sujeitos envolvidos, a análise preliminar das questões que formaram o
questionário e por fim o procedimento de aplicação.
No Capítulo VI, apresentaremos os resultados obtidos e faremos a análise,
com base nas respostas dos sujeitos de pesquisa.
Por fim, o Capítulo VII, as conclusões. Apresentaremos comentários sobre
os resultados encontrados e depois retomaremos a questão de pesquisa e
finalizaremos com sugestões para futuros estudos.
CAPÍTULO II
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA: A
FORMAÇÃO DO CONCEITO
2.1 INTRODUÇÂO
Para realizarmos uma pesquisa, é preciso buscar uma fundamentação
teórica que sustente o objetivo do estudo. Procuramos compreender a formação
do conceito e a questão da representação apoiando-nos principalmente na Teoria
dos Campos Conceituais de Vergnaud (1990).
Para a classificação dos significados da fração, temos como suporte os
estudos de Kieren (1988), que foi o precursor em classificar os números racionais
em diferentes significados, e principalmente a classificação proposta por Nunes et
al. (2003), a qual se assume para este estudo.
2.2 FORMAÇÃO DO CONCEITO
Um conceito não é facilmente construído por um sujeito. O tempo
necessário varia de pessoa para pessoa e pode se estender por um longo tempo.
Para entendermos um pouco a construção de um conceito, devemos iniciar
abordando algumas idéias de Vygotsky no que tange à noção de conceitos
espontâneos e científicos. Segundo Vergnaud (1989), essas idéias o
influenciaram na construção de sua teoria.
28
Vygotsky (1987) divide os conceitos em dois tipos: cotidianos (ou
espontâneos) e científicos. Na formação do conceito cotidiano, a motivação é
interna e se desenvolve a partir de situações particulares vivenciadas pelo sujeito.
O desenvolvimento do conceito espontâneo da criança é, portanto, ascendente.
Segundo Vygotsky (ibid), ao operar com conceitos cotidianos, a criança não está
consciente deles, pois a sua atenção está sempre centrada no objeto ao qual o
conceito se refere e nunca no próprio ato do pensamento. O desenvolvimento do
conceito cotidiano deve atingir certo nível de generalização para que a criança
esteja apta a absorver um conceito científico.
Podemos mesmo dizer que os conceitos cotidianos têm um percurso de
desenvolvimento partindo de uma situação particular para muitas (ascendente),
enquanto que o conceito científico tem um desenvolvimento descendente, do
geral para o específico. Isto porque o conceito científico depende da interferência
de outras pessoas, sendo que o ensino escolar desempenha um importante papel
nessa formação. Na formação do conceito científico, o contato com o objeto é
mediado por outro conceito. Esses conceitos constituem o meio no qual a
consciência e o domínio se desenvolvem, sendo mais tarde transferidos a outros
conceitos e a outras áreas do pensamento.
O ensino do conceito de fração, que geralmente é formalizado na escola,
possibilita estabelecer forte ligação com o cotidiano das crianças, o que facilita a
compreensão desse conhecimento. Por exemplo, o conceito de metade
2
1
é
formado no cotidiano da criança, ao dividir um doce, repartir brinquedos, etc.
Podemos ir mais além, e dizer que, as frações de denominador 1 são usualmente
encontradas no dia-a-dia das crianças.
29
Existe uma grande influência da teoria de Vygotsky no trabalho de
Vergnaud. Uma delas é idéia de que o conceito é construído a partir das
situações a que o sujeito se submete dentro ou fora da escola e que esses
conceitos evoluem e se sofisticam ao longo do tempo. Em sua teoria, Vergnaud
procura focar a construção do conceito no próprio conteúdo do conhecimento a
ser construído pelo indivíduo.
Vergnaud (1993) considera a construção de um conceito matemático como
algo que não se dá de maneira imediata. Para ele são por meio de resoluções de
situações-problema que um conceito adquire sentido para o sujeito. Para
formarmos um conceito matemático, é preciso lidarmos com ele dentro de um
conjunto de situações, e para cada situação, por sua vez, traz consigo uma
variedade de conceitos.
Devemos ressaltar que o termo “situação”, tal como é empregado por
Vergnaud, não tem o sentido de situação didática, mas sim de tarefa. “A idéia é
que qualquer situação complexa pode ser analisada como uma combinação de
tarefas, cuja natureza e dificuldade própria é importante conhecer” (Vergnaud,
2001, p.167).
A Teoria dos Campos Conceituais tem como objetivo possibilitar uma
estrutura às pesquisas sobre atividades cognitivas complexas, principalmente
com referências às aprendizagens cientificas e técnicas. Permite situar e estudar
as filiações e rupturas entre conhecimentos, do ponto de vista conteúdo
conceitual.
Essa teoria ainda possibilita analisarmos a relação entre os conceitos
enquanto conhecimentos explícitos e os invariantes operatórios implícitos nos
30
comportamentos dos sujeitos frente a uma determinada situação, bem como
analisarmos as relações existentes entre significados e significantes.
É importante enfatizarmos que a Teoria dos Campos Conceituais retoma e
aprofunda pontos dos estudos de Piaget, como é o caso do conceito de esquema.
Vergnaud aprofunda o termo, afirmando que a construção de um conceito se dá a
partir de um tripé (referente, significado e significante), que veremos mais adiante,
em que as situações que dão sentido ao conceito são formadas pelos esquemas
que o sujeito possui.
Para Piaget (1970), esquema é o conceito introduzido para dar conta das
formas de organização tanto das habilidades sensório-motoras como das
habilidades intelectuais. Vergnaud (1996) considera que os esquemas,
necessariamente, se referem às situações, a tal ponto que se deve falar em
interação esquema-situação ao invés de interação sujeito-objeto da qual falava
Piaget. Decorre daí que o desenvolvimento cognitivo consiste, sobretudo, no
desenvolvimento de um vasto repertório de esquemas.
Os esquemas são de grande importância para o conjunto de situações,
mas funcionam de maneiras diferentes para cada classe de situação. Segundo
Vergnaud (2001), podemos distinguir duas classes de situações:
Classes de situações para as quais o sujeito dispõe, no seu repertório,
num dado momento do seu desenvolvimento, e em determinadas
circunstâncias, das competências necessárias ao tratamento relativamente
imediato da situação;
31
Classes de situações para as quais o sujeito não dispõe de todas as
competências necessárias, o que o obriga a um tempo de reflexão e de
exploração, as hesitações, as tentativas abordadas conduzindo-o ao êxito ou
ao fracasso.
Dessa forma, sempre que o sujeito se encontra diante de uma situação e
não dispõe de esquemas para enfrentá-la, tenderá uma sucessiva utilização
destes esquemas, que para atingirem a solução desejada, devem ser
acomodados, descombinados e recombinados. Esse processo é necessariamente
acompanhado por descobertas (Vergnaud,1993).
Nos esquemas estão os conhecimentos em ação do sujeito, isto é, os
elementos cognitivos que fazem com que a ação do sujeito seja operatória. Os
conhecimentos contidos nos esquemas são designados pelas expressões
“conceito-em-ação” e “teorema-em-ação”, e também podem ser designados pela
expressão “invariantes operatórios”.
Teorema-em-ação é uma proposição tida como verdadeira pelo sujeito.
São crenças que se baseiam no real, mas não são necessariamente verdadeiras.
Conceito-em-ação é um objeto, um predicado, ou uma categoria de pensamento
tida como pertinente e podem ser relevantes ou não (Vergnaud, 1988). Há uma
relação dialética entre esses dois conceitos, ou seja, os conceitos constituem um
teorema e os teoremas são propriedades que dão aos conceitos seus conteúdos.
Os teoremas em ação é um caminho para analisarmos as estratégias intuitivas
dos estudantes e ajudá-los a transformar o conhecimento intuitivo para o
conhecimento explícito. Segundo Vergnaud (ibid), os teoremas em ação nos
apontam caminhos para se fazer um diagnóstico melhor do que os estudantes
32
sabem ou não, a fim de poder oferecer situações que lhes permitam consolidar
seus conhecimentos, aumentá-los, perceber seus limites, e, certamente superá-
los. Esse crescimento é longo, precisa de muitos anos e cabe ao professor a
consciência de que tais resultados serão obtidos com o passar dos anos, pois
todo processo de ensino-aprendizagem requer um prazo para sua construção.
Os conceitos-em-ação e os teoremas-em-ação podem se modificar ao
longo do tempo. O papel do educador é fundamental para que ele faça com que o
sujeito construa conceitos e teoremas explícitos e que sejam aceitos na
comunidade cientifica.
Caminhando para a definição da Teoria dos Campos Conceituais,
Vergnaud (1993) considera que a construção de um conceito é constituído por um
conjunto de situações, um conjunto de invariantes (explícitos ou implícitos) e um
conjunto de representações e esses três conjuntos não podem ser considerados
isoladamente na compreensão de um conceito.
Nessa perspectiva, Vergnaud (1990, 2001) considera que a principal
entrada do campo conceitual são as situações e que os vários conceitos
constituem essas situações, que também são representadas de alguma forma.
Para definir conceito, Vergnaud utiliza-se de uma terna de conjuntos,
representadas como C= (S, I, R), onde:
S – é um conjunto de situações que dão sentido ao conceito;
I – é um conjunto de invariantes, nos quais repousa a operacionalidade do
conceito (objetos, propriedades, relações);
33
R – é um conjunto de representações simbólicas que podem ser usadas
para representarem simbolicamente o conceito, suas propriedades e as
situações.
O mesmo autor faz um paralelo com os elementos da semiótica e destaca
que o primeiro conjunto –as situações- é o referente do conceito, o segundo –os
invariantes operatórios – é o significado do conceito e o terceiro conjunto – as
representações simbólicas – é o significante. Devemos ressaltar que relacionar o
estudo da Semiótica com a Psicologia já foi feito anteriormente por Piaget nos
estudos que ele chamou de “Função Psico-Semiótica”. Porém o enfoque dado por
Vergnaud é diferente daquele dado por Piaget, no sentido que este último discute
a influência dos fatores semióticos no desenvolvimento infantil, enquanto
Vergnaud estabelece paralelos entre ações psicológicas e semióticas.
Apresentamos abaixo um exemplo que bem ilustra a idéia de Vergnaud:
Que parte da melancia representa a figura ao lado?
R:
2
1
ou 0,5
Neste caso temos um valor referente ao pedaço da melancia representado
de duas maneiras diferentes: representação fracionária –
2
1
– (R-significante), e
representação decimal – 0,5 - (R-significante). Ambos referem-se ao mesmo valor
numérico e, portanto, têm o mesmo sentido de meio/metade (I- significado) de
uma melancia (S- refente).
Dentre muitas estruturas estudadas por Vergnaud, destacam-se duas: as aditivas
e as multiplicativas. O presente estudo encontra-se inserido dentro do campo
34
conceitual das estruturas multiplicativas. Cabe explicitar que esse campo envolve
um conjunto de situações, cujo tratamento implica em uma ou várias
multiplicações e divisões e o conjunto dos conceitos e teoremas, que permite
analisar essas situações como tarefa matemática. Entre outros conceitos
identificamos a proporção simples e múltipla, função linear e não linear, razão
escalar direta e inversa, quociente e produto de dimensões, combinação linear e
aplicação linear, fração, número racional, múltiplo e divisor, como conceitos
pertencentes às estruturas multiplicativas.
As competências e concepções do sujeito desenvolvem-se ao longo do
tempo. Neste contexto a estrutura dos Campos Conceituais objetivam habilitar os
professores (pesquisadores) para melhor entender que ensinar estudantes de
uma determinada série, requer que se tenha a justa idéia dos passos que eles
podem ou não ter anteriormente dado e os próximos e decisivos passos de que
se gostaria que alcançassem (Vergnaud, 1988).
O professor tem o desafio de organizar situações didáticas e realizar
experimentações com elas, para permitir que os estudantes desenvolvam
competências e concepções a longo e curto prazo. Para isso o professor deve,
primeiramente, identificar os níveis dos objetos e caminhar para desenhar
situações e materiais, de modo que esses auxiliem no desenvolvimento e
formação do conceito.
2.2.1 Situações que dão significado ao conceito
Nessa subseção pretendemos enfatizar ainda mais a importância das
situações em diferentes contextos e com diferentes significados, direcionando
para o conceito de fração.
35
Nesse sentido é fundamental que as situações sejam contextualizadas,
para que assim possam oferecer significados ao conceito. Nesse contexto,
entendemos que a aquisição do conceito de número racional na sua
representação fracionária poderá ser construído com sucesso se explorado seus
diferentes significados.
Dentre os pesquisadores que investigam o conceito de número racional
na forma fracionária, há uma consonância no sentido em que a construção
desse importante conceito se dá por meio de diversas situações que dão
significados a esse objeto matemático.
Nesse sentido, Kieren (1976) foi o primeiro pesquisador a chamar a
atenção da comunidade científica para o fato de que os números racionais são
constituídos de diversos constructos
2
e que a compreensão destes fará com que o
individuo entenda a natureza do número racional.
Um fator que demonstra que os números racionais não podem ser
considerados como uma simples extensão dos números naturais é o fato de que
nos racionais a adição e a multiplicação são operações independentes. Nos
números naturais a multiplicação conduz sempre a um número maior, enquanto
que nos números racionais a multiplicação conduz ironicamente a uma sucessão
de divisões, por exemplo, multiplicar
2
1
por
3
1
significa dividir o
2
1
em 3 partes e
não pode ser reduzido a uma adição, como se fazia com os números inteiros.
2
Kieren refere-se aos constructos e subconstructos. Podemos entender “constructos” como sendo o conceito
e “subconstructos” como os pequenos conceitos que juntos formam o conceito maior.
36
Kieren (1994) enfatiza a idéia de que o número racional deve ser visto
primeiro como um conhecimento humano e só posteriormente como uma
construção lógica formal.
Dentre as considerações de Kieren, para o estudo dos números racionais,
merece destaque a que afirma que o conhecimento dos números racionais deve
ser entendido em termos de esquemas mentais que permitem a execução de
determinadas ações. A partir dessa idéia, Kieren identificou quatro subconstructos
desse número: quociente, medida, operador e razão.
Uma conseqüência imediata dessa consideração nos currículos seria uma
melhor interligação dos vários campos da matemática. Se considerados apenas
como uma extensão dos números inteiros ou um simples algoritmo numa relação
parte-todo estática, os números racionais permaneceriam apenas no domínio
matemático dos números. Se considerados, porém, segundo a visão dos
subconstructos, os números racionais se tornam uma janela significativa para que
a criança tenha contato com outros domínios da matemática desde as séries
iniciais.
Dessa maneira, Kieren (1988) propõe a abordagem dos números racionais
como um conhecimento humano, a partir de suas bases intuitivas e de seus
significados como ponto de partida para sua posterior construção formal.
Nesta mesma perspectiva, temos o trabalho de Behr et al (1983) que
reconhecem os números racionais como sendo uma das mais importantes idéias
matemáticas desenvolvidas no contexto escolar. Esses autores entendem que a
importância de se estudar o número racional na escola elementar deve ser
37
justificada segundo três pontos de vista, como já foi citado anteriormente na
Introdução:
ponto de vista prático: aperfeiçoando a habilidade de dividir, o que permite
entender e manipular melhor os problemas do mundo real.
ponto de vista da psicológica: desenvolver e expandir as estruturas
mentais.
ponto de vista matemático: fornece a base sobre a qual serão construídas
mais tarde as operações algébricas elementares.
Os autores criticam a ênfase curricular nos procedimentos e algoritmos, e
argumentam que, geralmente, o fraco desempenho dos alunos com relação ao
conceito de número racional é conseqüência desse fator.
Sendo assim, Behr et al. (1983) apresentam seis interpretações
(subconstructos): parte-todo, decimal, razão, quociente, operador e medida. Behr
concorda com Kieren (1976) ao frisar que a compreensão completa do número
racional requer não somente um entendimento de cada um dos subconstrutos,
mas também como eles se inter-relacionam.
Para esta pesquisa, adotamos a classificação teórica proposta por Nunes
em relação à representação fracionária dos números racionais. Nunes, baseado
nas idéias de Vergnaud em relação à Teoria dos Campos Conceituais, apresenta
uma classificação teórica dos significados de fração. O conjunto de Situações
refere-se à classificação teórica de problemas contemplando os cinco significados
da fração, o conjunto de Invariantes, isto é, suas propriedades – equivalência e
ordenação –, objetos e relações que podem ser reconhecidos e usados pelo
sujeito para analisar e dominar as situações; e o conjunto de Representações, o
38
qual permite que o sujeito represente as situações por meio de signos e símbolos
matemáticos.
Nunes e Bryant (1997) afirmam que, com as frações, as aparências podem
enganar e alguns alunos podem passar pela escola sem dominar diversos
aspectos cruciais do conceito de fração, mesmo usando termos fracionais
corretos, falando coerentemente sobre frações e resolvendo alguns problemas.
Segundo a autora (1997 p.212):
... quando as crianças resolvem tarefas experimentais
sobre divisão e números racionais, elas se engajam em raciocinar
sobre as situações. Em contraste, quando elas resolvem tarefas
matemáticas em avaliações educacionais, elas vêem a situação
como um momento no qual elas precisam pensar em que
operações fazer com os números, como usar o que lhes foi
ensinado na escola; concentrando-se nas manipulações de
símbolos, os alunos poderiam desempenhar em um nível mais
baixo do que teriam desempenhado se tivessem se preocupado
mais com a situação-problema. Portanto, é possível que os
mesmos alunos que se engajam em tarefas de raciocínio
semelhantes às descritas anteriormente, nos quais eles podem
focalizar bem a situação-problema, desempenhem bastante
diferentemente de quando eles estão resolvendo problemas em
avaliações educacionais escritas: seu desempenho mostra uma
lacuna entre o que eles entendem e o que eles podem fazer com
símbolos depois destes terem sido aprendidos de uma forma
particular.
Campos et al (1995), em trabalho citado por Nunes e Bryant (1997),
apresentaram em suas pesquisas que a impressão de crianças raciocinando
sobre frações poderia ser falsa, sobretudo quando são submetidas a um método
de ensino que se limita e estimula os alunos a resolver os problemas, utilizando-
se de procedimentos de dupla contagem, sem entender o significado deste novo
tipo de número.
39
Para demonstrar sua hipótese, Campos et al (ibid) aplicaram em crianças
de idade aproximada de 12 anos ou mais, que haviam aprendido o procedimento
de dupla contagem e pediram para elas nomearem as frações apresentadas em
cada uma das figuras a seguir:
No item 1 e 2, o percentual de acertos foi perto do teto, com algumas
exceções pois trocaram o numerador pelo denominador, ou seja, utilizando-se da
dupla contagem, algumas crianças consideraram o total de partes como sendo o
numerador e o total de partes pintadas como denominador. No item 3, o total de
acertos foi muito baixo, e neste item o erro mais freqüente foi indicar a fração que
corresponderia ao procedimento de dupla contagem. Neste item, o todo não
estava explicitamente dividido, o que levou ao erro.
Nesta pesquisa, este tipo de questão também foi abordada e será
analisada até que ponto o processo de dupla contagem aparece ou não na
concepção dos professores das séries iniciais.
A hipótese de dissociação entre o desempenho dos alunos em situações
contextuais e o desempenho frente às situações de avaliação escolar foi bastante
explorada por Nancy Mack (1993), também citada por Nunes. A técnica
empregada pela pesquisadora foi a de apresentar para crianças alternadamente
os mesmos problemas, em situações que elas poderiam encontrar na vida
Item tipo 1
Item tipo 3
Item tipo 2
40
cotidiana ou como problemas simbólicos e vice-versa. Um exemplo de uma
dessas situações utilizadas por Mack é citado por Nunes e Bryant (1997 p. 212):
Suponha que você tem duas pizzas do mesmo tamanho e você
corta uma delas em 6 pedaços de tamanho igual e você corta a
outra em 8 pedaços de tamanho igual. Se você recebe um pedaço
de cada pizza, de qual você ganha mais? - foi seguida pela
pergunta - diga qual fração é maior, 1/6 ou 1/8?.
A análise dos resultados da pesquisa de Mack apontara para a idéia de
que, embora os problemas da vida cotidiana não pareçam causar dificuldades,
muitos dos problemas apresentados simbolicamente não foram resolvidos pelos
estudantes, que apresentaram algoritmos falhos e comparações inadequadas.
Na busca de solucionar muitas das dificuldades apresentadas na
aprendizagem do número racional na forma fracionária, Nunes propõe uma
classificação teórica. Antes de apresentarmos essa classificação, exporemos
algumas considerações de Nunes com relação ao conceito de fração. Nunes et al.
(2003) destacam dois invariantes que são considerados centrais no conceito de
fração: a noção de ordenação e a noção de equivalência. No que se refere à
noção de ordenação de fração existem duas idéias básicas e centrais que devem
ser levadas em consideração no seu ensino. A primeira idéia é a de que para um
mesmo denominador, quanto maior for o numerador, maior é a fração; a segunda
idéia diz respeito a uma situação em que, para um mesmo numerador, quanto
maior o denominador menor será a fração. A primeira idéia é relativamente
simples, pois a estratégia utilizada para resolver tal situação é semelhante à
comparação de dois números naturais, embora a afirmação que o denominador
deve ser constante para uma comparação direta a ser feita entre os numeradores,
41
pode oferecer alguma dificuldade. A segunda idéia, porém, pode oferecer mais
dificuldade, pois as crianças têm que pensar numa relação inversa entre o
denominador e a quantidade representada pela fração.
No que concerne à noção de equivalência de fração, devem ser levados
em consideração dois aspectos essenciais: equivalências em quantidades
extensivas e em quantidades intensivas. As quantidades extensivas (Nunes, et
al., 2005) se baseiam na comparação de duas quantidades de mesma natureza e
na lógica parte-todo, portanto raciocínio aditivo. Quando juntamos duas
quantidades extensivas o todo será igual a soma das partes, e no caso de
subtraírmos uma parte do todo, a parte que resta é igual ao todo menos a parte
retirada. No caso das quantidades intensivas, estas referem-se às medidas
baseadas na relação entre duas quantidades diferentes, portanto no raciocínio
multiplicativo.
Uma situação que ilustra bem essas duas quantidades é o exemplo
apresentado na figura abaixo:
FIGURA 2.1: Figura retirada do livro : Números e operações
numéricas, 2005.
42
O exemplo 1 desta figura representa uma situação envolvendo quantidade
extensiva, enquanto no exemplo 2 a situação é explicita a quantidade intensiva.
Nunes et al. (2005) chamam atenção, que ao tratarem de equivalência de fração
em contexto de quantidades extensivas em situação de parte-todo, a classe de
equivalência depende do tamanho do todo (ou da unidade), por exemplo, as
frações
4
1
e
8
2
somente pertencerão a uma classe de equivalência de frações se
os dois todos forem equivalentes. Se nós estivéssemos nos referindo a
4
1
de um
todo e
8
2
de um todo não equivalente,
4
1
e
8
2
não poderiam pertencer a mesma
classe de equivalência de frações.
Tendo apresentado algumas considerações, feitas por Nunes, com relação
ao conceito de fração, seguimos nosso estudo apresentando uma situação a qual
vai nos direcionar para a classificação teórica dos cinco significados da fração.
A classificação apresentada por Nunes, para situações no conjunto S
(Referente) mantém uma estreita relação com as estratégias escolhidas pelo
sujeito para resolver tal situação (Invariantes operatórios), e com os símbolos
matemáticos que o sujeito dispõe em seu repertório para representar tal situação
– (Representações). Um exemplo seria: Dividir quatro figurinhas para duas
crianças. Essa situação é classificada como significado Quociente, com base na
classificação de Nunes, pois a divisão (4 : 2 =
2
4
) seria uma estratégia bem
adaptada para resolver tal situação. Entretanto, o sujeito poderá recorrer à
estratégia de dividir o todo (quatro figurinhas) em partes iguais (duas crianças) e
apoiando-se na correspondência um-para-um e na dupla contagem, responder a
43
situação de maneira correta, porém utilizando-se de outro significado, o de Parte-
todo. Outra maneira, que também é correta, seria resolver o problema dizendo
que cada criança receberá
2
1
da quantidade de figurinhas. Para essa última
situação o sujeito utilizou o significado Operador Multiplicativo, tendo como
estratégia de resolução
2
1
de 4 figurinhas, ou seja, não importa a quantidade de
figurinhas, o que importa é que cada criança irá receber
2
1
(metade) do total.
Tendo em vista esse exemplo que abordou brevemente três significados
propostos por Nunes, cabe apresentarmos aqui, a classificação teórica dos cinco
significados da fração. Mas antes, apresentaremos as outras duas variáveis
consideradas nessa pesquisa – quantidade contínua e discreta, presença e
ausência de ícones.
Podemos dizer que a quantidade é considerada contínua, quando o objeto
dividido sucessivamente não perde a sua característica de quando objeto inteiro.
Por exemplo: o bolo por mais que se divida, não deixará de ser bolo. É diferente
dizer-se sobre as quantidades discretas, que quando divididas perdem a
característica, como no caso de uma flor, que deixará de ser uma flor.
Piaget (apud Nunes et al., 2005) salienta que apesar da lógica subjacente a
quantidades contínuas e discretas serem muito semelhantes, as crianças
apresentam mais dificuldade nas quantidades contínuas, pois nesse caso as
diferentes unidades que compõem a quantidade não são percebidas
separadamente.
44
A presença do ícone é caracterizada por uma figura que represente a
questão. A ausência seria apenas o enunciado, linguagem materna, sem a
presença de figuras que represente a situação.
Vejamos exemplos dessas variáveis descritas acima junto a classificação
teórica de Nunes et al. (2003).
Significado Parte-todo
A idéia presente nesse significado é a da partição de um todo (contínuo ou
discreto) em n partes iguais, em que cada parte pode ser representada como
n
1
.
Assim, assumiremos como o significado parte-todo, um dado todo dividido em
partes iguais em situações estáticas, na qual a utilização de um procedimento de
dupla contagem é suficiente para se chegar a uma representação correta.
Exemplo 1 (quantidade contínua e icônica): Uma barra de chocolate foi
dividida em 3 partes iguais. João meu 2 dessas partes. Que fração representa o
que João comeu?
Exemplo 2 (quantidade discreta e não icônica): Numa loja de brinquedos
havia 3 bonecas iguais. Maria comprou 2 dessas bonecas para presentear suas
sobrinhas. Que fração representa as bonecas que Maria comprou em relação ao
total de bonecas da loja?
Para resolver essas situações, o sujeito deverá identificar que o todo foi
dividido em 3 partes iguais, portanto, trata-se de uma comparação parte-todo
(significado); bem como deve identificar que o número total de partes do exemplo
45
1, assim como o total de bonecas do exemplo 2 referem-se ao denominador e que
as partes de chocolate que João comeu, assim como a quantidade de bonecas
que Maria comprou, correspondem ao numerador.
Situação Quociente
Este significado está presente em situações em que está envolvida a idéia
de divisão – por exemplo, uma pizza a ser repartida igualmente entre 5 crianças.
Nas situações de quociente temos duas variáveis (por exemplo, número de pizzas
e número de crianças), sendo que uma corresponde ao numerador e a outra ao
denominador – no caso,
5
1
. A fração, nesse caso, corresponde à divisão (1
dividido por 5) e também ao resultado da divisão (cada criança recebe
5
1
).
Exemplo 1 (quantidade contínua e icônica): Duas pizzas idênticas foram
divididas igualmente para 3 pessoas. Quanto recebeu cada uma?
Nessa situação problema, o sujeito deverá perceber que a divisão é uma
boa estratégia para resolvê-la, isto é, o quociente (significado) representa a
quantidade de pizzas que cada pessoa irá receber.
Exemplo 2 (quantidade discreta e não icônica): Foram divididas
igualmente 8 bolas de futebol de mesmo tamanho para 4 crianças. Quantas
bolas de futebol cada criança ganhará? Que fração representa essa divisão?
46
Para que possamos exemplificar a quantidade discreta no significado
Quociente, temos que nos reportar as frações chamadas aparentes, ou seja,
frações que representam números inteiros, por exemplo:
2
2
,
3
6
,
2
8
,.... No
caso da última situação apresentada a fração é
4
8
, pois não tem sentido
dividirmos igualmente 2 bolas de futebol para 3 crianças
Significado Medida
Algumas medidas envolvem fração por se referirem a quantidade
extensiva, nas quais a quantidade refere-se a relação entre duas variáveis de
valor discreto. Por exemplo, a probabilidade de um evento é medida pelo
quociente número de casos favoráveis dividido pelo número de casos possíveis.
Portanto, a probabilidade de um evento varia de 0 a 1, e a maioria dos valores
com os quais trabalhamos são fracionários.
Exemplo 1 (quantidade discreta e não icônica): Em uma loja foi feito um
sorteio. Foram enviados 150 cupons, sendo que 20 foram enviados pela minha
irmã. Qual a chance dela ser sorteada?
Nessa situação, a possibilidade da irmã ganhar o jogo é expressa por uma
medida (significado) obtida pelo quociente entre, o número de cupons enviados
pela minha irmã e o número total de cupons enviados para a loja, ou seja, pela
fração
150
20
.
Outras situações envolvem frações referindo-se a quantidades intensivas.
47
Exemplo 2 (quantidade contínua e não icônica): Para fazer uma certa
quantidade de laranjada são necessários 1 medida de concentrado de laranja e 2
medidas de água. Que fração representa a medida de água em relação ao total
de suco?
Essa receita é medida pela razão 1 para 2 que pode ser representada
como sendo
2
1
(relação parte-parte). Com essa medida podemos fazer,
indefinidamente, diversas quantidades de laranjada mantendo o mesmo sabor, e,
além disso, essa quantidade poderá nos remeter a idéia de fração, considerando-
se que o todo (a mistura) é constituído de 3 partes,
3
1
é a fração que corresponde
a medida de concentrado de laranja na mistura e,
3
2
é a fração que corresponde
a medida de água na mistura.
Significado Número
Assim como o número inteiro, a fração nesse significado é representada
por pontos na reta numérica. Os números não precisam necessariamente referir-
se a quantidades específicas (discretas).
Existem duas formas de representação fracionária, ordinária e decimal.
Exemplo (quantidade contínua e não icônica): Represente na reta numérica
a fração
3
2
.
O sujeito frente a essa situação deverá reconhecer a fração como um
número (significado) e não uma superposição de dois números naturais. Devemos
perceber ainda, que todo número tem um ponto correspondente na reta numérica
48
e que sua localização depende do princípio de ordenação (invariante), isto é,
3
2
é
um número compreendido entre 0 e 1. Mesmo considerando esse intervalo, há a
necessidade de que o sujeito compreenda que à direita e à esquerda de
3
2
ainda infinitos números. Terá ainda que se admitir a existência de duas formas de
representação fracionária, a ordinária e a decimal.
Situação Operador Multiplicativo
Associamos a esse significado o papel de transformação, isto é, a
representação de uma ação que se deve imprimir sobre um número ou uma
quantidade, transformando seu valor nesse processo. Conceber a fração como
um operador multiplicativo é admitir que a fração
b
a
funciona em quantidades
contínuas como uma máquina que reduz ou amplia essa quantidade no processo,
enquanto que em quantidades discretas sua aplicação atua como um
multiplicador divisor. Nesse sentido, a fração pode ser vista como valor escalar
aplicado a uma quantidade, que no caso do número inteiro, por exemplo,
podemos afirmar que 2 balas, no caso da fração, corresponderia a
4
3
de um
conjunto de balas.
Exemplo 1 (quantidade discreta e não icônica): Um estojo contém 40 lápis
coloridos. Marina deu
4
3
dos lápis para sua amiga. Quantas lápis Marina deu?
Nesta situação, o sujeito deverá perceber que a fração desempenha o
papel de transformação, ou seja, deve-se multiplicar 40 por 3 e dividir o total por 4
49
ou dividir 40 por 4 e multiplicar o total por 3. Ao mesmo tempo que a fração
desempenha um papel de transformação, também conduz a idéia de que os
números racionais formam um corpo munido de duas operações ; a adição e
multiplicação.
A explicação dada acima (quantidade discreta), se estende para
exemplificar as situações com quantidades discretas desse mesmo significado
(operador multiplicativo).
Exemplo 2 (quantidade contínua e não icônica): Felipe ganhou uma barra de
cereal e comeu
4
3
. Pinte a quantidade de chocolate que Felipe comeu?
O sujeito tem que perceber que a fração que Felipe comeu se refere a uma
quantidade, ou seja,
4
3
de 1.
A seguir, justificaremos o porquê de não considerarmos a porcentagem, a
probabilidade e a razão como significados de fração.
2.2.2 Porcentagem, Probabilidade e Razão
Neste estudo, assumimos a fração com cinco significados: parte-todo,
quociente, medida, operador multiplicativo e número. Para tanto, consideramos
importante justificar o porquê de não se admitirmos a porcentagem, probabilidade
e razão como sendo outros três significados da fração.
Embora alguns autores considerem essas possibilidades, este estudo está
apoiado na classificação teórica proposta por Nunes em que se considera essas
possibilidades como sendo interpretações de alguns dos significados
apresentados por Nunes.
50
Nas situações que se referem à porcentagem, como por exemplo, Ricardo
teve aumento de seu salário de 15%, isto é,
100
15
, está implícito em tal situação o
significado operador multiplicativo. Só têm sentido em dizer que 15% ou
100
15
referindo-se a uma quantidade, discreta ou contínua. Logo a porcentagem faz
parte do significado operador multiplicativo.
No contexto que se refere à probabilidade, como por exemplo, numa caixa
há 3 bolas verdes e 8 bolas vermelhas, qual a probabilidade de sortear ao acaso
uma bola verde? A resposta dessa situação é
11
3
, ou seja, de cada 11 bolas
contidas na caixa, 3 são verdes. De fato, está implícito nessa situação o
significado medida. A fração
11
3
representa a probabilidade da ocorrência desse
evento, que é medida pelo número de casos favoráveis dividido pelo número de
casos possíveis.
No caso das razões é necessário termos um pouco de cuidado, pois estas
nem sempre estão presentes em contextos que se pode dar o “status” de fração.
Como mencionado na seção 2.2.1, a quantidade intensiva é medida pela relação
de duas unidades diferentes. Essas unidades são representadas por uma razão e
podem ser atribuídas de dois tipos:
Situações nas quais é possível representar a razão como uma fração, ou
seja, unidades diferentes, mas quando misturadas formam um todo.
Exemplo: Para fazer um determinado suco é necessário 1 copo de
concentrado para 5 copos de água. Tal situação pode ser descrita por uma
51
razão: 1 para 5, ou
5
1
; ou ainda,
6
1
de concentrado para
6
5
de água. Na
primeira representação, o suco é concebido por uma razão de concentrado e
água, enquanto na segunda não está mais representando o concentrado em
relação à quantidade de água, mas sim à quantidade de concentrado em
relação a quantidade total da mistura. Ressaltamos que, nesta situação,
reunir num mesmo todo duas unidades distintas, está implícita dessa forma,
o significado medida.
Situações nas quais não é possível representar uma razão como uma
fração, ou seja, unidades diferentes que mesmo misturadas não formam um
todo.
Exemplo: Um real para cada 2 quilos de tomate. Essa situação pode ser
representada pela razão 1 para 2, mas não pode ser representada como
uma fração.
Nunes et al (2005, p. 152) afirmam que:
... a fração como uma expressão de quantidade - por exemplo,
dois terços, um quinto etc – somente é aplicável a quantidades
intensivas quando as duas unidades diferentes podem ser
reunidas em um todo, como no caso de dois terços de
concentrado e um terço de água.
Fizemos esta discussão com alguns exemplos, na busca de esclarecer o
porquê de não considerarmos razão, probabilidade e porcentagem como sendo
outros significados de fração, e sim como interpretações que surgem a partir dos
significados parte-todo, medida e operador multiplicativo.
52
No próximo capítulo, realizaremos uma discussão sobre a formação de
professor. Também temos o intuito de esclarecermos o que estamos admitindo
como crença, concepção e competência nesse estudo.
CAPÍTULO III
CONTRIBUIÇÕES EDUCACIONAIS:
FORMAÇÃO DO PROFESSOR
3.1 INTRODUÇÂO
Este capítulo tem a finalidade de se fazer uma reflexão teórica sobre a
formação do professor. Do ponto de vista do nosso estudo, tal reflexão é crucial,
pois entendemos que há uma relação entre o aprendizado dos alunos e o trabalho
desenvolvido pelo professor em sala de aula.
A nossa reflexão terá como suporte principalmente as idéias teóricas de
Nóvoa (2001) e Ponte (1992, 1995), se bem que sempre que se fizer necessário
no sentido de trazer contribuições para o debate, as idéias de autores como Rico
e Vergnaud far-se-ão presentes.
Também consideramos importante diferenciar e definir os termos crenças,
concepções e competências, que estão sendo abordados neste estudo, segundo
as idéias de Ponte (1992) e Vergnaud (1987).
3.2 FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Nos últimos anos, o desenvolvimento profissional dos professores tem
merecido uma forte atenção por parte dos educadores matemáticos. Saraiva e
Ponte (2003) afirmam que numa sociedade em mudança e consequentemente
numa escola em mudança o professor terá de se ver, permanentemente, como
53
um aprendiz, porém a mudança ocorre somente se o professor estiver disposto a
mudar e a enfrentar a insegurança das novas abordagens. Essa insegurança é
comum, pois se o professor trabalha com uma orientação curricular há algum
tempo, ele a domina e tem receio de abandonar a sua base de segurança.
Segundo Serrazina (1998), citada por Saraiva e Ponte (2003), um outro obstáculo
é relacionado com o conhecimento do professor sobre os conteúdos matemáticos
a ensinar, o como ensinar e o que ensinar.
Tudo isso desenha um cenário educacional com exigências para cujo
atendimento os professores não foram e talvez nem estejam sendo preparados.
Dentre as exigências que se apresentam para o papel docente estabelecidas na
proposta de diretrizes para a formação inicial de professores da educação básica,
(Brasil, 2000), destacam-se:
orientar e mediar o ensino para aprendizagem dos alunos;
assumir e saber lidar com a diversidade existente entre os alunos;
incentivar atividades de enriquecimento curricular;
elaborar e executar projetos para desenvolver conteúdos curriculares;
utilizar novas tecnologias, estratégias e materiais de apoio;
desenvolver hábitos de colaboração e trabalho em equipe.
Podemos acrescentar a estas exigências do MEC a necessidade do
professor ter a clareza que os conteúdos de ensino não têm sustentação em si
mesmo, mas, constituem-se como meios, para que os alunos possam
desenvolver capacidades e constituir competências.
No cenário da formação do professor, a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDBEN, 1996, p.24), apresenta os seguintes artigos:
54
Art. 62: A formação de docentes para atuar na educação básica
far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação
plena, em unidades e institutos superiores de educação, admitida,
como formação mínima para o exercício do magistério na
educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino
fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal.
Art. 63: Os institutos superiores de educação manterão:
I. Cursos formadores de profissionais para a educação
básica, inclusive o curso normal superior, destinado à formação
de docentes para a educação infantil e para as primeiras séries
do ensino fundamental;
II. Programas de formação pedagógica para
portadores de diplomas de educação superior que queiram se
dedicar à educação básica;
III. Programas de educação continuada para
profissionais de educação dos diversos níveis.
Talvez esta seja a mais importante inovação contida na LDBEN, no que diz
respeito à formação dos profissionais em educação (professores), visto que esta
medida pode representar um “ponto final” na desarticulação entre formação dos
professores de Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental e
formação dos professores para os anos finais do Ensino Fundamental e o Ensino
Médio.
Antes de ser aprovada a lei de 1996, artigos 62 e 63, para lecionar nas
séries iniciais, era obrigatório a formação no Magistério do Ensino Médio. Desde
então, podemos reafirmar que essa nova exigência apresentada pela LDBEN, que
exige a formação dos professores das séries iniciais a nível superior, foi de
extrema importância tanto para o profissional professor, quanto para os alunos,
sociedade e Estado. Apesar de muito dos professores estarem sempre buscando
novos conhecimentos, desafios, essa lei fez com que os professores, no geral,
fossem obrigados a terem uma formação superior.
55
Sendo assim, essa lei proporcionou aos profissionais da educação básica
que se aperfeiçoassem e pudessem olhar para novos e diferentes horizontes
existentes no mundo acadêmico e com isso não apenas o professor, mas todos
os que estão à sua volta, tivessem a oportunidade de se beneficiar.
O professor, independentemente do nível de ensino que atuar, terá que
possuir uma boa compreensão da matéria a ser ensinada de tal forma que torne
possível o ensino e aprendizagem dos alunos. Embora seja fundamental a
compreensão da matéria a ser ensinada, o professor também terá que ter um
bom conhecimento das possibilidades representacionais da matéria,
considerando aspectos específicos dos contextos em que leciona e da população
que freqüenta.
Nesta perspectiva Beatriz D’Ambrosio inicia seu artigo “Conteúdo e
metodologia na formação de professores” tecendo esta reflexão:
Talvez a maior dificuldade inerente à formação de
professores seja a determinação do conteúdo necessário para que
se obtenha o melhor desempenho possível. Na avaliação da
eficácia de professores em serviço, percebemos que uma das
grandes dificuldades é a sua falta de compreensão do conteúdo
matemático. Por outro lado, está claro que mais cursos tradicionais
de matemática têm pouco efeito em seu nível de compreensão.
Não queremos entrar num discurso conteudista, muito pelo
contrário. De acordo com Ma (1999), o professor deve ter um
conhecimento “profundo” de matemática (“profound understanding
of mathematics”) para que possa tomar decisões apropriadas em
sua prática no ensino. (Cultura, formação e desenvolvimento
profissional de professores que ensinam Matemática, pág 20)
Perrenoud (2000) enfatiza que o professor deve criar situações que
conduzam à aprendizagem, aderindo a um procedimento construtivista que se
oponha às tradicionais formas de transmitir o saber, como propor soluções para
56
problemas sem que os alunos tenham oportunidade de compartilhar seus
pensamentos. É importante a criação de situações-problema desafiadoras que
estimulem os alunos a novos conhecimentos, apoiados nos já construídos
anteriormente, isto é, a situação proposta deve oferecer aos alunos desafios que
estejam a seu alcance, bem como deve representar a possibilidade deles
progredirem.
Nóvoa (2001) concebe a formação do professor como um aprender
contínuo, centrado em dois pilares: na própria pessoa do professor, como agente,
e na escola, como lugar de crescimento profissional permanente. Estende-se
definindo a formação do professor como sendo um ciclo que abrange a
experiência do docente como aluno (educação base), como aluno-mestre
(graduação), como estagiário (praticas de supervisão), como iniciante (nos
primeiros anos da profissão) e como titular (formação continuada). O autor
reforça a sua definição quando afirma que o professor é um dos únicos
profissionais que, mesmo em processo de formação inicial, tem alguma
experiência profissional construída: a que viveu como aluno.
Nóvoa (2001) enfatiza que o ensinar não se aprende somente na
universidade quando esta oferece um conjunto de conhecimentos e de saberes,
mas sim, quando o professor consegue transformá-los em conhecimento
profissional. Reforça essa idéia afirmando que o professor não forma ninguém,
ele apenas oferece a sua contribuição para que o aluno se forme.
Três idéias, consideradas por Nóvoa (ibid), são fundamentais no processo
de formação continuada de professores:
a formação de professores é sempre um exercício de escuta e de palavra.
De escuta dos outros, novos conhecimentos, novas experiências e,
57
sobretudo de escuta dos colegas, sejam eles mais novos ou mais
experientes. De palavra, porque deve permitir que o professor verbalize
suas percepções a respeito das coisas da educação e de sua própria
experiência;
a formação de professor deve ser ainda um processo de desenvolvimento
pessoal, mas também um momento de consolidação do docente coletivo,
que é infinitamente maior do que a soma das experiências individuais de
cada um.
a formação de professor é sempre um espaço de mobilização da
experiência, pois um professor nunca é uma página em branco, que nada
sabe. A formação só atingirá seus objetivos, se for capaz de fazer o
professor transformar sua própria experiência em novos conhecimentos
profissionais. Entende que a experiência por si só não é formadora, pois
pode ser a rotina, a repetição de erros e processos de ensino inadequados.
Formadora é a reflexão sistemática, a indagação rigorosa e o inquérito
efetivo a respeito de novas práticas e novas experiências e, sobretudo,
formadora é a capacidade de refletir em voz alta e ser capaz de aprender
com os outros;
Nesse sentido Ponte (1994) afirma que o professor é o elemento-chave do
processo de ensino-aprendizagem. Sem a sua participação empenhada é
impossível imaginar qualquer transformação significativa no sistema educativo.
Nacarato (2004) em seu artigo “Os graduandos de pedagogia e suas
filosofias pessoais frente à Matemática e seu ensino” reflete e discute as filosofias
pessoais que os graduandos em Pedagogia trazem de sua formação matemática
58
na Educação Básica e busca compreender como elas interferem nas relações que
estabelecem com essa ciência e seu ensino. De inicio a autora salienta:
A vivência em contextos de ensino da matemática,
desprovidos de significados, acaba por gerar, muitas vezes, uma
prática pedagógica permeada por um discurso sem consistência
teórica, relegando a um plano secundário aspectos tanto da
educação como da educação matemática ( p10)
O professor está longe de ser um profissional acabado e amadurecido no
momento em que recebe a sua habilitação profissional. Os conhecimentos e
competências adquiridos antes e durante a sua formação inicial são
manifestamente insuficientes para o exercício das suas funções ao longo de toda
a carreira. O seu desenvolvimento profissional, que é de responsabilidade
individual, é influenciado pela sua formação inicial e continuada.
Ponte (2001) ao investigar o conhecimento matemático do professor relata
que este aspecto tem merecido maior atenção dos investigadores.
Na verdade, a proposição ‘sem um bom conhecimento de Matemática
não é possível ensinar bem a Matemática’ é incontornável. A preparação
dos professores, neste campo, parece ser problemática em todos os
níveis de ensino, mas particularmente insatisfatória nas séries iniciais.
(p.2)
Mas a importância de se dominar bem o conteúdo que se ensina já é
reconhecida, assim como a importância da formação pedagógica. O autor
Shulman (1986), citado por Ponte (2001), chama a atenção para a importância de
um domínio: o conhecimento didático do conteúdo. Este domínio exige a
capacidade de compreensão profunda das matérias de ensino, permitindo
encontrar as mais adequadas e diversas maneiras de se apresentar aos alunos o
conteúdo de forma a facilitar a sua aprendizagem.
59
Já Ponte (2001) destaca que a forma como o professor conduz o processo
de ensino-aprendizagem é apoiado em quatro domínios fundamentais: (a) a
Matemática, (b) o currículo, (c) o aluno e seus processos de aprendizagem e (d) a
condição da atividade institucional. O autor completa afirmando que esses quatro
domínios estão estruturados em termos das concepções dos professores, que
embora decisivo para a prática profissional, são em grande parte conhecimentos
implícitos que reelaboram-se constantemente em função das experiências vividas.
Dentre todas as exigências atribuídas ao professor, consideramos
importante destacar o papel que este desempenha no ambiente escolar, que cada
vez mais se encontra agressivo.
Ponte (1994) considera que o trabalho do professor está sendo facilmente
posto em causa pelos alunos, pelos pais, pelos colegas, pelo Ministério e pela
opinião pública em geral. Este profissional muitas vezes tem que tomar
importantíssimas decisões no seu dia-a-dia. “Debate-se com uma infinidade de
tarefas e papéis – educador, matemático, produtor de situações de aprendizagem
animador pedagógico, dinamizador de projetos, investigador, etc.” (p.02)
Por fim, devemos visualizar a formação do professor como um contínuo,
sem limites de conhecimento, investigações e experiências. Ele deve se auto
avaliar e procurar sempre se aprimorar no seu desenvolvimento profissional.
Abaixo apresentaremos algumas noções sobre o que é crença, concepção
e competência.
3.3 CRENÇA, CONCEPÇÃO E COMPETÊNCIA
Perante o senso comum, existe um paralelismo acentuado entre os
significados dos termos “crença” e “concepção”, em alguns casos ganhando o
60
estatuto de sinônimo. Diferentemente, os termos “conhecimento” e “competência”
já se configuram de forma distinta um do outro.
Considerando que as crenças, as teorias pessoais, as concepções, as
competências e o domínio do conteúdo matemático sejam elementos importantes
na configuração das práticas em sala de aula e nas decisões curriculares, temos
o intuito de definir operacionalmente a maneira como estamos utilizando cada um
desses termos. Para tanto realizaremos uma breve revisão de alguns estudos que
contemplaram essa discussão.
Ponte (1992) discute a necessidade que o professor tem das concepções e
das crenças, as quais dão sentido ao conhecimento. Concordando com
Thompson (1992), Ponte assume que ambas têm um caráter cognitivo, mas
diferentemente de Thompson. Ponte detém-se no fato de que as crenças não têm
sustentação na realidade empírica, apesar de se derivarem do conhecimento.
Para ele as crenças configuram-se de forma pouco elaboradas, fantasiosas, ao
contrário das concepções que atuam como uma espécie de filtro, ora bloqueando
novas realidades, ora dando sentido às coisas.
As crenças podem ser entendidas como uma verdade pessoal, derivadas
da experiência e convicções de cada individuo.
Rico et al (2002) em sintonia com Ponte, considera as concepções como
mini-teorias do conceito os elementos organizadores implícitos deste. Esta
organização e escolha para abordarem determinadas tarefas, podem estar longe
de serem as mais adequadas. As concepções estão estreitamente ligadas com a
prática, uma vez que por um lado elas apontam caminhos e fundamentam as
decisões, por outro, a prática faz com que brotem concepções para enquadrar as
61
atitudes tomadas. Nota-se, portanto, uma rua de mão dupla entre as concepções
e a prática, uma interferindo na outra.
Já para Vergnaud (1987), as concepções e competências são entendidas
como sendo as duas faces de uma mesma moeda. As competências se
desenvolvem a partir das ações do sujeito inserido numa dada situação, enquanto
que as concepções estão presentes nas expressões simbólicas do sujeito.
Vergnaud relata que para analisar competências é essencial o conceito de
esquema
3
, ou seja, a competência é analisada como a combinação de esquemas
usados frente a uma situação. As competências estão ligadas aos conhecimentos
implícitos (teorema-em-ação) que se encontram nas relações que se formam
entre os esquemas.
Vergnaud (ibid) apóia-se nas idéias de que as concepções podem ser
traçadas pelas expressões verbais ou simbólicas do aluno, enquanto as
competências são percebidas nas ações do sujeito frente a uma situação.
Trazendo essa discussão para os professores, Ponte (1998) entende a
competência profissional como a capacidade de se equacionar e resolver (em
tempo hábil) problemas da prática profissional. Ambos autores definem
competência como um caráter explícito, que permitem ser observados perante
situações problemas.
Para Thompson (1992), o ensino da Matemática está impregnado pelas
crenças e concepções dos professores. Nesse sentido, Ponte (1998) afirma que o
conhecimento profissional é formado pelas crenças, concepções, mitos que se
acumulam durante a experiência profissional do docente, passando por diversas
elaborações e reelaborações, tendo sempre um caráter implícito.
3
Os “esquemas” são organizações invariantes da ação num certo grupo de situações
62
Tardif (2002) estuda o fato das crenças terem raízes na formação básica,
no ambiente social e cultural, destacando que se estas crenças não forem
modificadas nesta formação básica, o exercício do magistério pode receber
influências na sua atuação profissional.
Feitas estas reflexões, podemos inferir que nosso estudo traduz os termos
crença, concepção e competência sob as noções apresentadas por Ponte (1992)
e Vergnaud (1987). Também foi possível concluir que esses termos não se tratam
de palavras sinônimas, mas sim de um tripé. Nota-se que apesar do
conhecimento diferenciar-se por ter um caráter científico, este carrega em seu
bojo crenças e concepções do indivíduo.
No próximo capítulo apresentaremos a fração na perspectiva da
Matemática, da Escola e da Ciência.
CAPÍTULO IV
FRAÇÃO NA PERSPECTIVA DA
MATEMÁTICA, DA ESCOLA E DA PESQUISA
4.1 INTRODUÇÃO
Este capítulo será dividido em três partes. A primeira trata-se da fração na
ciência, onde iremos fazer uma breve revisão da trajetória da fração e
apontaremos como ela está sendo vista hoje.
A segunda parte refere-se à fração na escola. Nesta serão analisadas três
coleções de livros didáticos, que tinham sido adotados, um por escola, no
momento em que foi realizado a coleta de dados.
Na terceira e última parte, apresentaremos a fração na perspectiva da
pesquisa. No primeiro momento faremos uma breve descrição dos estudos que
constituem o grupo “A formação, desenvolvimento e ensino do conceito de fração
o qual descrevemos no Capítulo I. No segundo momento, apresentaremos alguns
estudos que consideramos relevantes para o desenvolvimento desta pesquisa,
que são aqueles que tratam de investigações com o enfoque na aquisição do
conceito de número racional.
4.2 FRAÇÃO NA PERSPECTIVA DA MATEMÁTICA
Nesta seção temos o interesse de localizar o leitor no contexto da fração,
descrevendo de maneira breve o seu surgimento, e chegando à sua definição
formal e propriedades nos dias de hoje.
64
Para tanto nos apoiaremos nas idéias Boyer (1974), Caraça (1998) e Ávila
(1999).
4.2.1 Uma pré-contextualização do surgimento
Há um consenso entre diversos pesquisadores da história da
Matemática, (Boyer, 1974; Caraça, 1998; entre outros) que o surgimento da
Matemática deve-se ao fato de problemas oriundos da vida diária, ou seja,
salvo a sua evolução e o seu formalismo, a Matemática emerge de uma
apreensão sensível do real, isto é, de uma tentativa de construir modelos
matemáticos para se resolver problemas reais.
No caso das frações e de sua representação, cada povo, à medida que
sentia necessidade, utilizavam-nas a partir de seus próprios recursos.
Os egípcios, os babilônios e os gregos deixaram registros da utilização
dos números fracionários, mas apenas os babilônios, cuja base sexagesimal
favorecia tal reconhecimento, aceitavam as representações fracionárias como
números.
No Oriente Antigo, com a descoberta do Papiro de Rhind (descoberto em
1858; escrito por volta de 1650 a. C. por Ahmes) e do Papiro de Moscovo pôde
ser constatado, por meio dos problemas neles contidos, que esse povo egípcio já
tinha se familiarizado com as frações. Estas aparecem em uma tabela que dá as
equivalências das frações do tipo
n
2
como a soma de frações unitárias o que
significa afirmar frações de numerador 1. As frações eram escritas de forma
65
diferente da que utilizamos atualmente, por exemplo:
5
2
era representado por 3
15
4
que equivale hoje a
3
1
+
15
1
.
No Papiro de Rhind, podemos observar que para a resolução de um
problema para se achar dois terços de
5
1
procede-se ao método, como
descreveremos a seguir, o que indica alguma percepção de regras gerais
utilizados pelos egípcios.
Para a decomposição de
5
2
o processo de dividir ao meio é
inadequado; mas começando com um terço de
5
1
encontra-se a
decomposição dada por Ahmes,
5
2
=
3
1
+
15
1
. No caso de
7
2
aplica-se duas vezes a divisão por dois a
7
1
para obter o
resultado
7
2
=
4
1
+
28
1
. A obsessão egípcia com dividir por dois e
tomar a terça parte se percebe no último caso da tabela
n
2
para n
= 101. Talvez um dos objetivos da decomposição de
n2
1
fosse
chegar a frações unitárias menores que
n
1
(BOYER, 1974, p. 11).
Nos dias de hoje, temos as idéias apresentadas por Caraça (1998), acerca
da construção dos números racionais, que nem sempre é possível comparar dois
segmentos de tamanhos diferentes e exprimir com um número inteiro a
quantidade de vezes que um dado segmento cabe no outro.
Decorre desse fato, a construção de um novo campo numérico que,
segundo Caraça (Ibid) é construído levando-se em consideração três aspectos:
4
Usava-se uma barra sobre o número do denominador para transcrever as frações unitárias.
66
(a) o princípio da extensão leva-nos a criar novos números por meio dos quais
possa-se exprimir a medida de dois segmentos;
(b) a análise da questão mostra que a dificuldade reside na impossibilidade da
divisão (exata em números inteiros, quando o dividendo não é múltiplo do
divisor);
(c) o princípio da economia: (a) que com os novos números sejam abrangidas
todas as hipóteses de medição; (b) que os novos números sempre sejam
reduzidos aos números inteiros quando o dividendo for múltiplo do divisor.
Nesse contexto, Caraça (1998) define números racionais da seguinte
maneira: dado dois segmentos de reta
AB e CD , em que cada um contém o
número inteiro de vezes o segmento u
AB contém m vezes e CD contém n
vezes o segmento u. Diz-se, por definição que a medida do segmento
AB
tomando
CD como unidade, o número
n
m
, escreve-se:
1) AB =
n
m
. CD quaisquer que sejam os números inteiros m
e n (n não nulo); se m for divisível por n, o número
n
m
coincide
com o número inteiro que é quociente da divisão; se m não for
divisível por n, o número
n
m
diz-se fracionário. O número
n
m
diz-
se, em qualquer hipótese, racional – ao número m chama-se
numerador e ao número n denominador. Em particular, da
igualdade
AB =
n
m
. CD resulta que,
2)
1
n
= n visto que, se AB = n . CD, é também AB =
1
n
.
CD em que,
3)
n
n
= 1 porque as igualdades AB = AB e AB =
n
n
. AB
são equivalentes. (Caraça 1998, p.36)
67
Feitas aqui algumas considerações a respeito da história da fração, segue
abaixo a compreensão atual desse objeto matemático.
4.2.2 Compreensão atual da fração
Como se viu na seção anterior, no decorrer dos anos, a compreensão dos
números foram se modificando à medida que os indivíduos sentiam a
necessidade de resolver problemas práticos.
Hoje se estuda os diferentes conjuntos numéricos, sendo que a fração é
uma representação dos números racionais, identificados como sendo o conjunto
Q, onde Q=
b
a
; a, b Z, b 0 .
}
Dado dois números pertencentes ao conjunto Q, é possível identificar qual
é o maior e qual o menor. Para tanto devemos comparar as frações:
a) no caso dos dois números terem o mesmo denominador, será maior (menor) o
que tiver maior (menor) numerador;
b) se dois números têm o mesmo numerador, será maior (menor) o que tiver
menor (maior) denominador;
c) se dois números não têm o mesmo numerador nem o mesmo denominador,
primeiro deve-se encontrar frações equivalentes que tenham o mesmo
denominador e só depois far-se-á a comparação.
Para se interpretar melhor este último item, imagine dois números racionais
distintos r e s, representados respectivamente pelas frações
n
m
e
q
p
, tal que m, n,
p e q
Z, com n e q 0. A fim de se ter as duas frações representadas com o
mesmo denominador, apóia-se no seguinte enunciado: não altera o número
68
racional quando se multiplica ou se divide seu numerador e seu denominador pelo
mesmo número natural. Sendo assim tem-se:
r =
qn
qm
.
.
e s =
qn
pn
.
.
Estando os dois números com o mesmo denominador, basta seguir o item
“a” acima descrito para descobrir qual número é maior, o r ou o s.
No conjunto dos números racionais, define-se a propriedade de adição
como sendo a operação que a cada par (x, y)
Q
×
Q associa-se sua soma x+y
Q, exemplo:
n
m
+
q
p
=
nq
npmq
+
No caso da multiplicação, a cada par (x, y)
Q
×
Q associa-se seu produto
x.y
Q, exemplo:
n
m
.
q
p
=
nq
mp
.
No entanto, para ficar completo o conhecimento do campo dos números
racionais torna-se necessária uma fundamentação teórica do ponto de vista da
Matemática como ciência. Dessa forma, argumenta-se que o conjunto dos
números racionais possui uma estrutura de corpo comutativo ordenado que
segundo Ávila:
Um corpo (comutativo) é um conjunto não vazio C,
munido de duas operações, chamadas adição e multiplicação,
cada uma delas fazendo corresponder um elemento de C a cada
par de elementos de C, as duas operações estando sujeitas aos
axiomas de corpo. A soma de x e y de C é indicada por x + y e a
multiplicação de x e y é indicada por xy (Ávila, 1999, p.15)
Nesse sentido a terna (Q, +, .) satisfaz as propriedades de um corpo, isto é,
valem as seguintes propriedades:
69
Associativa
Dados quaisquer x, y, z
Q, é possível associar as parcelas de tal modo
que em relação à adição tem-se:
(x + y) + z = x + (y + z)
em relação a multiplicação, pode-se associar os fatores da seguinte maneira:
(x . y) . z = x . (y . z)
Comutativa
Quaisquer que sejam x, y
Q, pode-se comutar a ordem das parcelas em
relação à adição, de tal modo que se tem:
x + y = y + x
em relação à multiplicação, pode-se comutar a ordem dos fatores resultando em:
x . y = y . x
Elemento neutro
Na adição, existe um elemento em Q, chamado “Zero” indicado pelo
símbolo 0, tal que x + 0 = 0 + x = x para todo x
Q.
Na multiplicação, existe um elemento em Q, chamado “elemento unidade”
indicado pelo símbolo 1, tal que x . 1 = 1 . x = x para todo x Q.
Oposto
Para todo elemento x
Q, x 0 existe um elemento correspondente
y
Q, y 0 tal que x + y = y + x = 0, que se demonstra ser único para cada x.
Elemento inverso
A todo elemento x
Q, x 0 corresponde um elemento x Q tal que
x . x’ = x’ . x = 1, que se demonstra ser único para cada x, e é indicado com x
-1
ou
x
1
.
Distributividade da multiplicação em relação à adição
70
Quaisquer que sejam x, y, z Q, tem-se:
x (y + z) = xy + xz,
O conjunto dos números racionais, satisfazendo as propriedades descritas
acima, permite-nos afirmar que é um corpo.
Com estas propriedades podemos provar todas as operações algébricas.
Por exemplo:
Proposição 1 O elementos neutros da adição e multiplicação são únicos.
Proposição 1.1O elemento oposto e o elemento inverso são únicos.
Proposição 1.2 (Lei do Cancelamento) Em Q, vale
Prova,
Outras propriedades:
Sejam x, y, z e w Q. Então,
assoc.
elem. neutro.
o
p
os..
(tricotomia) ou ou
(anulamento do produto) ou
Na próxima seção, será apresentada a fração na perspectiva da escola,
analisando-se algumas coleções de livros didáticos.
71
4.3 FRAÇÃO NA PERSPECTIVA DA ESCOLA
Para esta seção houve o interesse em investigarmos as três coleções de
livros didáticos que estavam sendo trabalhadas nas escolas em que coletamos os
dados. Um outro motivo, não menos importante, para termos escolhido tais
coleções diz respeito ao papel essencial que livro didático desempenha para o
professor polivalente - profissional que leciona nas séries iniciais do Ensino
Fundamental. De fato, ele costuma ser o principal apoio desse profissional, que
normalmente recorre a ele antes mesmo de trabalhar os conteúdos com seus
alunos.
Nossas investigações foram feitas com vistas a identificar quando e como o
conceito de fração é introduzido. Também houve o cuidado em observarmos se existia
uma preocupação desses livros em trabalhar a fração a partir de diferentes situações e
contextos.
Na seção seguinte serão listadas algumas categorias que consideramos
importantes na nossa análise investigativa das coleções.
4.3.1 Categorias de análises
A escolha das categorias de análise se deu a partir das variáveis que
consideramos significativas para a formação do conceito de fração. Neste sentido,
decidimos investigar as seguintes categorias:
1. Forma de introdução do conceito;
2. Quando e como é introduzido o conceito formal;
72
3. Os cinco significados da fração (parte-todo, quociente, operador multiplicativo, medida
e número)
5
4. As variáveis características da quantidade – contínua ou discreta;
5. A forma de apresentação dos problemas –
com e sem representação icônica;
6. Há predominância de determinados números fracionários, isto é, de
2
1
,
3
1
,
3
2
, etc.;
7. Os invariantes do conceito de fração: ordem e equivalência;
8. A freqüência com que o conceito de fração é explorado em cada livro didático.
Essas categorias serão analisadas série por série, ou seja, no primeiro momento
analisaremos os três livros referentes à 1ª série do Ensino Fundamental, em seguida os
livros de 2ª série e assim por diante.
As categorias 3, 4 e 5, além de serem analisadas série a série, serão apresentadas
em forma de quadros resumos na seção 4.3.3. Acreditamos que tal apresentação
possibilitará ao leitor ter uma visão geral da freqüência e distribuição das três
categorias em cada coleção.
Antes de iniciarmos a análise, é importante salientarmos que não há a menor
pretensão, definitivamente, de se avaliar a qualidade das coleções, seja do ponto de vista
dos conteúdos, seja da didática adotada por elas. O interesse restringe-se apenas em
identificar como tais coleções trabalham com o conceito de fração.
4.3.2 Livros Didáticos
As três coleções analisadas foram escolhidas segundo o critério de serem
as mais utilizadas nas escolas no momento em que ocorreu a coleta de dados do
5
As categorias (1), (2) e (3) já foram discutidas na seção 2.2.1 do Capítulo II
73
presente estudo.
A justificativa para analisar todos os volumes das coleções e não apenas
aqueles direcionados para as 3
as
e 4
as
séries foi que, embora se saiba que a
introdução formal do conceito de fração se dá a partir do segundo ciclo do Ensino
Fundamental, interessa ao estudo saber se no primeiro ciclo a criança já se
depara, mesmo que informalmente, com esse conceito.
Portanto as coleções serão vistas a partir das categorias elencadas por
esse estudo, série por série. As coleções são:
1) Novo Caminho, cujos autores são Imenes, Jakubo e Lellis, que
dominaremos como
Coleção A.
2) 1 2 3 4 Matemática, cujos autores são Padovan, Guerra e Milan, que
dominaremos como
Coleção B.
3) Fazendo e Compreendendo cujos autores são Sanchez, Liberman e Wey,
que dominaremos como
Coleção C.
1ª série
A Coleção A apresentou, muito superficialmente, a noção de fração. Apesar
de não haver referência explícita ao termo fração, encontramos uma atividade em
que era solicitado aos alunos que dividissem uma folha de papel em duas partes
iguais. Essa situação certamente remete à noção de fração e em particular ao
significado parte-todo.
Na Coleção B, encontra-se um capítulo cujo título é “Metade, dobro e
triplo”, o qual explora a noção do conceito de fração. Este capítulo inicia com
algumas receitas de vitaminas e entre elas encontramos uma que apresenta
fração meio. Ao lado desta receita, no livro do professor, existe um comentário
74
solicitando que o mesmo explore a noção de frações ordinárias e números mistos
com seus alunos. Essa situação nos remete ao significado operador multiplicativo,
que faz referência de uma parte do todo (
2
1
limão).
Já a Coleção C, não apresenta nenhum capítulo ou atividade que possa
dar a noção da representação fracionária.
2ª série
Nos livros de 2
as
séries, tanto da Coleção A quanto da Coleção C, não
apresentam atividades ou mesmo a noção de fração durante toda a sua extensão.
A Coleção B, assim como no livro da 1ª série, apresenta um capítulo com o
nome “Metade, dobro e triplo”. Este inicia com atividades que nos remete ao
significado parte-todo, utilizando figuras geométricas. Além desta atividade,
encontra-se mais um exercício com três itens que remete ao significado
quociente.
3ª série
Nesta série, de acordo com os PCN, é introduzido formalmente o conceito
de fração.
A Coleção A apresenta o capítulo intitulado “Frações do círculo” para iniciar a
noção do conceito de fração. Neste capítulo, o conteúdo inicia-se com a noção de divisão
em partes iguais e a sua representação fracionária, representadas primeiramente, em figuras
de círculos e consequentemente para demais formas geométricas. Está introdução é feita,
nas quatro primeiras páginas, apenas com situações estáticas em que o aluno observa a
figura já dividida em partes iguais com uma ou mais partes pintadas – significado parte-
75
todo. Logo nesta introdução, têm-se também, dois exercícios explorando um dos
invariantes do conceito da fração: a ordem.
Mais adiante, encontram-se situações que exploraram os significados:
operador multiplicativo e número, mas o significado parte-todo é o mais abordado
neste livro. Dentre as situações, a variável quantidade contínua com a presença
de ícone foi a que apareceu com maior freqüência, sendo as frações mais
utilizadas a de numerador 1 e 2.
O conceito de fração é explorado em 10 das 200 páginas existentes nesse
volume, ou seja, em apenas 5% do livro. Cabe destacar que não se encontra uma
definição formal do conceito de fração no livro
Na Coleção B No livro da 3ª série, o capítulo de frações, inicia-se com o
seguinte título: “Conhecendo as frações”. Neste é apresentado várias situações
do dia-a-dia em que falamos a palavra “fração”, expressando um instante de
segundo, uma medida, entre outras. Também é apresentada a definição de fração
em um dicionário, ressaltando que esta representa partes de um todo; um número
que representa uma ou mais partes de uma unidade dividida em partes iguais. No
decorrer do livro encontramos várias atividades envolvendo os significados parte-
todo, quociente e operador multiplicativo. Tanto os significados quanto a
representação icônica e não icônica aparecem se alternando entre as atividades.
Apenas a variável quantidade continua é a que se destaca dentre as atividades.
Após algumas atividades é apresentado um trecho do livro Aritmética da
Emilia, obra de Monteiro Lobato. Neste é explorado a noção de unidade e divisão
de partes iguais, “nome” das frações –um quarto, oito onze avos – e também a
nomeação do denominador e numerador. Um dos objetivos é que os alunos
percebam que o denominador indica o número de partes em que o inteiro ou a
76
unidade foi dividida e que o numerador indica o número de partes que foram
consideradas.
Das 208 páginas que compõe o livro 23 trabalham com o conceito
de fração, ou seja, 11,1% do livro.
Na Coleção C, a fração surge apenas na 3ª série, tendo como título do
capítulo “A fração e o cotidiano”. Assim como na Coleção B, a fração é introduzida
abordando as diferentes maneiras que utilizamos a palavra “fração” no nosso dia-
a-dia. Encontra-se a presença dos cinco significados da fração, sendo o
significado parte-todo e a quantidade contínua os mais explorados. A presença do
ícone, assim como nas demais coleções é muito utilizada.
As frações com o numerador 1 são abordadas com extrema freqüência.
Este livro também apresenta atividades que abordam os invariantes ordem e
equivalência.
Tanto na Coleção A como na Coleção C, os alunos têm o primeiro contato
com a representação fracionária apenas nos livros de 3
as
séries.
Neste último livro, o conceito de fração é trabalhado em 24 páginas do total
de 186, ou seja, dos três livros da 3ª série, este foi o que dedicou mais espaço
para tratar o tema fração.
4ª série
O livro de 4ª série da Coleção A, apresenta com maior freqüência,
situações envolvendo o significado operador multiplicativo em quantidade
contínua com a presença de ícone. Também há questões abordando os
invariantes do conceito: ordem e equivalência.
77
Apesar das frações de numerador 1 serem mais exploradas, temos a
presença de outras frações com denominadores diferente de 1.
Neste livro o conteúdo de fração foi abordado em 9% do total das páginas e
mesmo sendo o último volume, este não apresenta a notação formal da fração
(nomear o que é o numerador e o denominador).
A Coleção B apresenta os cinco significados da fração, dando uma ênfase
maior no significado operador multiplicativo. Das variáveis, a quantidade contínua
não icônica foi a que mais se destacou. As frações foram bem diversificadas, não
houve predomínio de um tipo de fração.
Também encontramos muitas atividades que exploram os invariantes
ordem e equivalência. Neste livro o conteúdo de fração foi abordado em 11,5% do
total de páginas.
A Coleção C, assim como a Coleção B, apresentou um maior número de
questões envolvendo o significado operador multiplicativo. As questões que
envolvem a quantidade discreta são superiores às questões de quantidade
contínua e também encontramos um número razoável de questões que
envolveram os invariantes ordem e equivalência. É possível perceber a
predominância das frações com numerador 1.
As atividades com frações ocupam 15% do total de páginas deste livro.
Feita aqui a análise série por série, apresentaremos na seção seguinte os
quadros resumos referentes às categorias 3, 4 e 5, conforme descrito na seção
4.3.1. Conseguinte serão apresentadas algumas considerações.
78
4.3.3 Visão geral
Pretendemos nessa seção além de oferecer uma visão geral das 3
coleções de livros didáticos analisadas, apresentar também algumas
considerações baseadas nos resultados quantitativo da análise.
As categorias selecionadas para a apresentação dos quadros, serão as
mesmas variáveis consideradas na investigação desta pesquisa, com exceção
aos invariantes que não apresentaremos nos quadros. São elas:
1. Os cinco significados da fração (parte-todo, quociente, operador multiplicativo,
medida e número);
2. As variáveis características da quantidade – contínua ou discreta;
3. A forma de apresentação dos problemas –
com e sem representação icônica;
Na Coleção A, a distribuição das questões em relação às três categorias
foram:
Contínuo
icônico
Contínuo
não icônico
Discreto
icônico
Discreto não
icônico
Total
Parte-todo
18 1 - - 19
Quociente 1 - - - 1
Medida - - - - -
Operador
multiplicativo
6 2 4 6 18
Número 2 - - - 2
Total 27 3 4 6 40
Variáveis
Significados
TABELA 4.1: Distribuição das questões quanto ao seu significado, quantidade contínua e discreta,
representações icônicas ou não icônicas – Coleção A
Os dados da tabela 4.1 apontam que o significado parte-todo, com 19
questões, e o significado operador multiplicativo, com 18 questões, são os que
79
aparecem com maior incidência nesta coleção. O operador multiplicativo foi o
único significado que abordou todas as variáveis de quantidade e representação,
enquanto que o significado medida não foi encontrado nesta coleção.
Das 40 questões classificadas, as que envolveram o significado parte-todo
em quantidade contínua com a presença do ícone, foram as que mais se
destacaram.
Os invariantes do conceito foram encontrados em nove questões, sendo
quatro delas de ordem e cinco de equivalência. A abordagem formal do conceito
(numerador e denominador) não foi encontrada nesta coleção.
A primeira representação do número fracionário surgiu apenas no livro da
3ª série. Não esperávamos que esse conteúdo fosse introduzido na 1ª série, mas
existiam hipóteses da noção informal ser apresentado nas primeiras séries
iniciais, já que as crianças têm contato com a representação fracionária antes
mesmo do inicio da escolaridade.
Na Coleção B, diferentemente da Coleção A, a representação fracionária é
presente nos quatro livros (1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries).
A distribuição das questões encontradas na Coleção B, que abordam os
significados da fração e as variáveis de pesquisa foi:
Contínuo
icônico
Contínuo
não icônico
Discreto
icônico
Discreto não
icônico
Total
Parte-todo
17 6 - - 23
Quociente 4 9 - - 13
Medida - 1 2 - 3
Operador
multiplicativo
5 9 2 7 23
Número 3 9 - - 12
Total 29 34 4 7 74
Variáveis
Significados
TABELA 4.2: Distribuição das questões quanto ao seu significado, quantidade contínua e
discreta, representações icônicas ou não icônicas – Coleção B
80
Como mostra a tabela 4.2, encontramos a presença de todos os
significados da fração com uma incidência maior nas quantidades contínuas.
Das 74 questões classificadas, 11 exploraram noção de equivalência e 7 a
noção de ordem. Os significados parte-todo e operador multiplicativo, junto com a
quantidade continua não icônica, foram os que apresentaram maior número de
questões.
Nesta coleção, apresentou-se uma preocupação com a parte formal, ou
seja, os nomes atribuídos aos elementos da fração – numerador e denominador.
Além de apresentar questões que solicitavam a identificação do numerador e
denominador, também encontramos uma explicação do que chamamos de
frações impróprias, próprias e aparentes.
Na Coleção C, os livros de 1ª e 2ª séries não apresentam a noção de
fração. Nesta coleção não encontramos a notação denominador e numerador,
mas o conteúdo de fração foi abordado em boa parte da coleção, principalmente
no livro da 4ª série, conforme apresentamos na seção 4.3.2.
Passaremos a apresentar a distribuição das questões encontradas na
Coleção C:
Contínuo
icônico
Contínuo
não icônico
Discreto
icônico
Discreto não
icônico
Total
Parte-todo
21 2 1 1 25
Quociente 2 - 1 1 4
Medida 4 2 - - 6
Operador
multiplicativo
6 9 4 2 21
Número 4 1 - - 5
Total 37 14 6 4 61
Significado
Variáveis
TABELA 4.3: Distribuição das questões quanto ao seu significado, quantidade contínua e
discreta, representações icônicas ou não icônicas – Coleção C
81
A Coleção C, assim como a Coleção B, apesar de não abordarem os
significados da fração em todas as variáveis, apresentaram um número razoável
de questões envolvendo as diferentes variáveis.
O significado parte-todo apresentou um número maior de questões, ou
seja, 37 do total de 61.
Esta coleção, assim como as outras duas analisadas anteriormente, teve a
preocupação de trabalhar com os invariantes do conceito, apesar destes serem
muito pouco explorados. Encontramos nove questões abordando a equivalência e
oito questões abordando a ordem.
Feita a investigação dessas três coleções de livros didáticos, é possível se
apontar alguns pontos relevantes, como:
O conceito de fração que geralmente tem o seu ensino iniciado a partir do
2º ciclo, apresenta de um modo geral, as primeiras noções no significado
parte-todo com quantidade continua icônico;
Nos livros de 4
as
séries há uma incidência maior em trabalhar com
procedimentos algoritmos, envolvendo assim o significado operador
multiplicativo;
No geral, identificamos a presença dos cinco significados da fração, sendo
que os significados medida e número ficaram aquém dos demais.
A quantidade contínua foi a que mais se destacou, dentre os cinco os
significados da fração e as questões icônicas tiveram maior incidência do
que as não icônicas;
Os invariantes do conceito – ordem e equivalência – apesar de estarem
presentes nas 3 coleções, foram pouco explorados.
82
Esta análise nos permitiu ter uma visão de como alguns livros didáticos
apresentam o conteúdo de fração. Observamos como e quando o conceito é
introduzido, bem como ele é explorado até o final do 2º ciclo.
Não houve a preocupação, segundo Vergnaud (2001), em se trabalhar com
diferentes significados e contextos de um mesmo conceito. A presença dos
significados, que quando apresentados não tiveram a mesma intensidade,
surgiram “em uma ordem”, ou seja, em geral apareceram primeiro as situações
com o significado parte-todo – um grande número de questões -, depois alguns de
quociente e assim por diante, enfatizando, na grande maioria, a quantidade
continua icônica. Consideramos que esta falta de entrelaçamento entre os
significados e as demais variáveis da fração podem não proporcionar aos alunos
a construção desse conhecimento.
Com relação aos profissionais envolvidos nesta pesquisa, estes estavam
trabalhando junto a seus alunos com esses livros analisados. Uma das questões
a ser investigada é se a concepção e competência destes professores se
aproximam do conteúdo apresentado com maior ênfase nos livros didáticos?
Terminamos aqui a subseção da Fração na perspectiva da Escola, em que
nos restringimos a analisar três coleções de livros didáticos. Abaixo
apresentaremos alguns trabalhos correlatos a esta pesquisa os quais nos
subsidiarão a ter uma visão mais ampla de como se encontra a investigação do
conceito de fração no âmbito da Educação Matemática.
83
4.4
FRAÇÃO NA PERSPECTIVA DA PESQUISA
Observa-se que existem muitos pesquisadores interessados em investigar
a aprendizagem e o ensino do número racional. Para tanto, buscamos explorar
alguns desses trabalhos, organizando-se esta seção em duas partes.
Na primeira parte, apresentaremos um breve resumo, dos estudos
realizados pelo nosso grupo de pesquisa que foi desenvolvido dentro do
programa de cooperação entre a Oxford Brookes University – sob a coordenação
de Terezinha Nunes – e o Centro das Ciências Exatas Tecnologia PUC-SP,
coordenado pelas Professoras Tânia Campos e Sandra Magina, conforme dito no
Capitulo I.
A segunda parte consiste em apresentar algumas pesquisas, que
contribuíram com o nosso estudo, as quais investigaram o ensino ou
aprendizagem do conceito de fração.
4.4.1 Pesquisas realizadas no grupo de pesquisa de frações coordenadas
pelas Profas Dras Tânia Campos e Sandra Magina.
Como descrito no Capitulo I deste trabalho, nosso estudo faz parte de um
projeto de pesquisa mais amplo, intitulado “A formação, desenvolvimento e ensino
do conceito de fração”, cujo objetivo é investigar a formação e desenvolvimento
do conceito de fração nos Ensinos Fundamental, Médio e Superior, quer seja do
ponto de vista do seu ensino (professor), quer seja do ponto de vista da sua
aprendizagem (aluno).
84
Por fazer parte de um grupo, sente-se a necessidade de descrever
resumidamente a investigação de cada um dos integrantes. Começar-se-á com os
trabalhos de mestrado que foram estudos diagnósticos, onde se inclui este, com o
objetivo de mapear o conceito de fração, tanto no ensino como na aprendizagem.
Consideramos importante apresentar as pesquisas também realizadas com
alunos, visto que uma das hipóteses que se tem, assim como foi apresentado no
Capítulo I, é que o desempenho dos alunos pode ter alguma relação com o
conhecimento do professor.
No que tange ao ponto de vista da aprendizagem, temos o trabalho de
Merlini (2005), intitulado “O conceito de fração em seus diferentes significados:
um estudo diagnóstico com alunos de 5ª e 6ª séries do Ensino Fundamental”.
Este teve por objetivo investigar as estratégias que os alunos, de 5ª e 6ª séries do
Ensino Fundamental, utilizam frente a problemas que abordam o conceito de
fração, segundo a classificação teórica proposta por Nunes et al. (2003).
Para tanto, foi realizado um estudo diagnóstico com 120 alunos, sendo 60
alunos da 5ª série e 60 alunos da 6ª série do Ensino Fundamental, distribuídos
em duas escolas da rede pública estadual da cidade de São Paulo. A pesquisa de
campo constou de dois momentos: no primeiro, o questionário foi aplicado
coletivamente aos alunos, que responderam individualmente, envolvendo o
conceito de fração, e no segundo momento, foram feitas entrevistas clínicas em
12% da amostra. Nos resultados obtidos foi constatado que não houve, em
nenhuma das duas séries pesquisadas, um desempenho eqüitativo entre os cinco
significados da fração.
Quanto às estratégias de resolução dos problemas não houve uma
regularidade. Em outras palavras, para um mesmo significado foram encontradas
85
diferentes estratégias de resolução. Estes resultados levaram Merlini a concluir
que a abordagem que se faz do conceito de fração, não garante que o aluno
construa o conhecimento deste conceito.
Em paralelo ao trabalho de Merline se deu o estudo de Moutinho (2005).
Ambos realizaram as pesquisas com alunos e utilizaram o mesmo instrumento
diagnóstico.
O trabalho de Moutinho, cujo título é “Fração e seus diferentes significados:
um estudo com alunos das 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental", teve por
objetivo identificar qual(is) dos diferentes significados da fração que alunos de 4ª
e 8ª séries do Ensino Fundamental mais utilizavam frente a problemas que
abordavam o conceito de fração.
O instrumento de pesquisa, conforme descrito anteriormente, foi o mesmo
utilizado por Merlini (2005) sendo este, aplicado a 65 alunos da 4ª e 58 alunos da
8ª séries do Ensino Fundamental, distribuídos em duas escolas da rede pública
estadual da cidade de São Paulo. Os resultados foram analisados, observando-se
o desempenho e as estratégias utilizadas pelos alunos, quando resolveram de
forma errônea as questões propostas. Os alunos da 4ª série demonstraram
possuir maior domínio do significado Parte-todo, como central para resolução dos
problemas; já os das 8ª, além desta, buscaram resolver os problemas com um
uso mais intenso de operações sem, contudo, atingir um índice de acerto
favorável, o que resultou em um desempenho geral menor na 8ª do que a 4ª
série.
Com isso, Moutinho conclui pela necessidade de se abordar um trabalho
mais amplo do Campo Conceitual da Fração, com base no uso de diferentes
situações, abordando os distintos significados da fração propostos por Nunes et
86
al. (2003), na busca de um melhor aprendizado desse conceito ao longo das
séries do Ensino Fundamental.
Nos dois estudos citados, Merline (2005) e Moutinho (2005) investigaram o
desempenho e as estratégias de resolução utilizadas por alunos, frente a
problemas de fração. Em nosso trabalho, além de investigarmos o desempenho e
as estratégias de resolução, mas com professores, iremos também investigar as
crenças e concepções que os mesmos apresentam em relação à fração. Com
esses dados averiguaremos, possível, influência da concepção dos professores
na competência de seus alunos.
Rodrigues (2005) também teve sua pesquisa voltada para a aprendizagem.
O seu trabalho intitulado “Números Racionais: um estudo das concepções de
alunos após o estudo formal”, teve como objetivo identificar que aspectos do
conceito de fração, relativos aos significados parte-todo e quociente, permanecem
não apropriados por alunos após o estudo formal.
O seu instrumento diagnóstico foi composto de 48 questões envolvendo o
conceito de fração nos significados parte-todo e quociente, com questões icônicas
e não icônicas acerca de grandezas contínuas ou discretas. As questões foram
graduadas em três níveis de dificuldades, abrangendo aspectos específicos do
conceito, considerando a escolaridade do universo de pesquisa.
Esse instrumento foi aplicado em escolas e universidades particulares,
sendo 13 alunos de oitava série de uma escola de Campinas, 31 alunos do
terceiro ano do Ensino Médio de uma outra escola de Campinas e 29 alunos de
nível superior, na área de exatas de duas universidades, sendo uma em
Campinas e outra em São Paulo.
87
Em sua análise, Rodrigues (2005) constatou que, mesmo nesses níveis de
escolaridade, os alunos apresentam dificuldades sob três pontos de vista: (1) da
compreensão do papel da unidade; (2) da peculiaridade das situações envolvendo
grandezas discretas; (3) e de aspectos mais abstratos de construção dos
números racionais, como a inclusão dos inteiros e a explicitação de soluções em
termos de operações com frações.
O estudo de Rodrigues (2005) se restringiu na investigação de apenas dois
significados da fração: parte-todo e quociente. O autor não teve interesse em
avaliar a competência desses alunos, mas sim, de investigar as concepções em
relação a esses dois significados que permaneceram não apropriadas após terem
passado pela escola formal
6
.
Termina aqui, a descrição dos estudos de mestrado voltados para a
aprendizagem do conceito de fração. Abaixo será apresentado o estudo de
Santos (2005), ainda do mestrado, mas com o enfoque no ensino de fração. O
seu estudo tem como título “O conceito de fração em seus diferentes
significados: um estudo diagnóstico junto a professores que atuam no Ensino
Fundamental" e teve por objetivo compreender o estado - concepções - em que
se encontrava o conceito de fração para 67 professores que atuavam nos 1º, 2º,
3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental, distribuídos em sete diferentes escolas da
rede pública. Seu estudo serviu de inspiração para esta pesquisa, a qual além de
buscar e investigar as concepções buscou também identificar as crenças e a
competência dos professores das séries iniciais frente ao conceito de fração.
Para sua investigação, Santos realizou um estudo diagnóstico que constou
de dois momentos: no primeiro foi solicitado aos professores a elaboração de seis
88
problemas, envolvendo o conceito de fração, e no segundo momento, foi pedido
para que resolvessem os próprios problemas elaborados.
Os resultados obtidos na pesquisa de Santos (2005) apontaram uma
tendência, tanto entre os professores polivalentes, como especialistas, em
valorizar a fração com o significado operador multiplicativo na elaboração dos
problemas. Quanto à resolução, houve uma valorização nos aspectos
procedimentais - aplicação de um conjunto de técnicas e regras (algoritmo). Estas
evidências levaram Santos a concluir que não existe diferença significativa entre a
concepção dos professores polivalentes e especialistas, seja na elaboração, ou
na resolução de problemas de fração em seus diferentes significados. O autor
também destaca que as concepções desses professores, provavelmente,
carregam fortes influências daquelas construídas na Educação Básica.
Quanto ao estudo de Santos (2005) apresentado logo acima, os pontos em
comum à nossa pesquisa, é que ela trata de uma investigação sobre a concepção
de professores polivalentes, frente à elaboração de situações-problema que
envolvessem frações. O que diferencia, é que nossa pesquisa, além de investigar
as concepções, buscou também investigar as crenças e competências dos
professores em relação à fração.
As pesquisas de doutoramento encontram-se em andamento. São
investigações que buscam, entre outros objetivos, aprofundar os estudos
diagnósticos realizados pelos mestrandos do grupo.
Numa das pesquisas, há o trabalho de Damico (em andamento) cujo estudo
investiga a formação inicial de professores de Matemática de duas Universidades
6
Rodrigues (2005) entende como escola formal a escolaridade de 1º a 4ª ciclos do E.F.
89
do ABC Paulista, no que concerne à preparação dos licenciandos para o ensino
de números racionais no Ensino Fundamental. Foram pesquisados 346 alunos e
40 professores destas duas Instituições.
O trabalho, consubstanciado nos resultados de inúmeras investigações
realizadas nos últimos 30 anos, ressalta como relevante a utilização, no Ensino
Fundamental, de abordagens metodológicas que contemplem, de forma inter-
relacionada, o estudo de pelo menos seis subconstrutos dos números racionais:
parte-todo, quociente ou divisão indicada, número, operador, medida e razão;
como também o conhecimento dos invariantes, ordem e equivalência e as
operações básicas com frações. Estes conceitos constituem a base teórica
mínima defendida pelos pesquisadores sobre ensino de números racionais
(frações).
Assim, a pesquisa de Damico (em andamento) procura avaliar a formação
inicial de professores de Matemática no sentido da aproximação ou
distanciamento desta base teórica. A investigação terá como base a análise de
dados coletados a partir de três instrumentos de avaliação: sobre conhecimentos
básicos de números racionais dos licenciandos entrevistas interativas com alunos
concluintes; entrevistas interativas com professores dos cursos pesquisados,
além de documentos diversos como, ementas, planejamentos, grades
curriculares, etc.
Com este estudo, Damico pretende contribuir para uma melhor
compreensão da formação inicial de professores de Matemática, em especial, no
que diz respeito ao ensino dos números racionais, e tentar embasar discussões
relativas a reformulações curriculares dos cursos de licenciatura em Matemática,
sobre o ensino de conjuntos numéricos.
90
Como trabalho de doutorado tem-se também o estudo de Fontoura (em
andamento). Este será uma intervenção junto a professores das séries iniciais ( 1ª
a 4ª séries do Ensino Fundamental) a ser realizado com base nos resultados
obtidos nos estudos diagnóstico dos mestrandos. Sua pesquisa vai envolver os
cinco significados da fração, parte-todo, quociente, medida, operador
multiplicativo e número.
Feita a apresentação dos trabalhos que fazem parte do grupo “A formação,
desenvolvimento e ensino do conceito de fração”, serão apresentados alguns
trabalhos correlatos a este estudo.
4.4.2 Pesquisas Correlatas
Dentre as pesquisas que investigaram o conceito de número racional na
forma fracionária, escolhemos algumas que se considerou importante no sentido
de contribuição para este estudo, a iniciar com a pesquisa de Kerslake (1986).
No projeto de pesquisa que durou um período de seis anos, Kerslake (1986)
procurou investigar em 10.000 crianças da Inglaterra, com idades entre 11 a 15
anos, as estratégias de resolução e os erros que essas crianças apresentavam ao
resolver problemas que envolviam entre outros conceitos o de fração. Para esse
estudo deve-se atentar apenas para a análise dos problemas que envolveram
fração.
Na busca de se encontrar informações acerca dos caminhos, de como os
alunos pensam sobre as frações, o estudo possibilitou observar três aspectos que
emergiram dos dados obtidos.
91
1. observar se os alunos seriam capazes de pensar frações como números
ou se pensavam que a palavra “número” implicaria somente a números
inteiros;
2. descobrir os modelos de frações que as crianças dispunham;
3. investigar como as crianças visualizavam a idéia de equivalência.
Um outro aspecto notado é a importância de existir um contexto que
envolva a fração. Foi dado um mesmo problema de dois diferentes modos: com
contexto e sem contexto. No problema sem contexto foi pedido aos alunos que
resolvessem 3:5 ou 3/5 e o problema com contexto foi: “Três barras de chocolate
foram divididas igualmente para cinco crianças. Quanto cada um recebeu?”. O
total de acertos para esses dois problemas foi significativamente diferente, sendo
que para a questão que apresentava o contexto o total de acertos foi de
aproximadamente 65%, enquanto para a questão sem contexto foi de 31%.
Nas observações das frações e números inteiros, notou-se que quando se
perguntava aos alunos “quantas frações se escondem entre
4
1
e
2
1
?” Eles
respondiam: “uma”, referindo-se a
3
1
. Dessa forma, podemos concluir que os
alunos observam apenas os denominadores das frações e não se dão conta das
frações existentes entre elas, ou seja, entre
2
1
e
4
1
.
Durante as entrevistas, Kerslake (1986) pôde observar que o uso de figuras,
denominado pela autora como diagramas, facilita a interpretação das crianças. No
entanto, o uso de diagramas no modelo parte-todo nem sempre possibilita a
visualização imediata de determinadas situações como, por exemplo,
3
2
+
4
3
.
Nesta situação, fazem-se necessárias outras divisões da mesma figura para sua
92
compreensão. Neste caso, a autora, cita as idéias de Kieren e argumenta que o
conceito de número racional é diferente de número natural, visto que eles não
fazem parte do meio natural dos alunos e as diversas interpretações do número
racional resultam em uma variedade de experiências necessárias.
Desta forma, a autora conclui que o entendimento dos números racionais
como elemento do campo quociente requer a oportunidade de experiências dos
aspectos partitivos da divisão. Ressalta a necessidade de se estender o modelo
parte-todo, incluindo os aspectos quociente da fração e finalmente as frações
representadas como pontos sobre a reta numerada.
Uma outra questão proposta dizia: “Aqui estão três doces. Há quatro
crianças que desejam a sua parte. Como você pode fazer?” As crianças dividiam
os três doces para quatro pessoas, mas não se preocupavam se as partes eram
iguais. Para as respostas dadas a essa questão, notamos que não existiu
preocupação com a conservação de área que foi um dos pontos de investigação
da próxima pesquisa que abordaremos - pesquisa de Campos (1995).
Observando-se o processo de divisão realizado pelo aluno, Kerslake (1986)
avaliou que eles não faziam a conexão entre 3:4 e
4
3
.
Uma outra questão abordada nesse projeto de pesquisa foi o caso das
frações equivalentes. Os alunos não apresentaram dificuldade significativa para
esse conceito.
Em suas conclusões, Kerslake descreve que uma das grandes dificuldades
apresentadas pelas crianças é o fato de pensarem na fração como parte de uma
figura, dificultando assim a compreensão da adição e subtração de frações e
também a sua representação na reta numérica.
93
Em seus estudos realizados no Brasil, Campos et al. (1995) encontram
alguns resultados próximos dos apresentados por Kerslake (1986). A sua
pesquisa consistiu-se de um teste diagnóstico, aplicado em 76 alunos de 4ª e 5ª
séries do Ensino Fundamental de três escolas particulares da cidade de São
Paulo. Analisados os resultados deste teste, os pesquisadores perceberam que
havia respostas que mereciam serem investigadas mais profundamente,
decidindo assim realizar entrevistas.
Após analisar os protocolos e as entrevistas, Campos et al. (1995)
concluíram que a maior dificuldade encontrada foi que as crianças, apesar da
idade (10 e 11 anos), não possuíam a noção de conservação de área. Essa
dificuldade foi constatada, por exemplo, nas figuras abaixo, cuja frações
atribuídas, respectivamente, foram
3
1
e
6
2
:
Com isto fica claro que as mesmas não podem compreender o conceito de
fração, pois exige-se delas um desenvolvimento ainda não alcançado.
A autora ressalta que esta dificuldade se dá, uma vez que na escola não é
exigido esse conhecimento das crianças. É sempre dada uma figura já dividida
em partes iguais, fazendo com que as crianças não percebam essa noção
fundamental da fração. A presença da dupla contagem é muito forte,
desconsiderando assim, a conservação de área.
94
Outra dificuldade encontrada é a desconsideração das áreas equivalentes.
Nas figuras representadas abaixo, foram associadas, respectivamente, as
seguintes frações:
4
4
e
1
1
.
Nas entrevistas, a pesquisadora perguntou se não poderia se atribuir uma
mesma fração para representar as duas figuras. A criança respondeu que não,
pois são figuras diferentes, “Uma tem traço e a outra não”.
Um elemento facilitador percebido pelos pesquisadores, foi a presença de
frações com o numerador 1, como
2
1
ou
3
1
. As questões que envolviam esse tipo
de fração tiveram respostas imediatas. Essa provável facilidade não deve ser uma
simples coincidência, visto que, historicamente os egípcios e até mesmo hoje em
dia, os povos tidos como primitivos (índios, tribos africanas, etc) usam
basicamente as frações unitárias.
Na conclusão de sua pesquisa, Campos et al. (1995) afirmam que o ensino
de modo geral – não só do ponto de vista metodológico, como também curricular-
é deficiente, apresentando falhas que apesar de evidentes, são difíceis de serem
rompidas.
À busca de novos recursos, Lima (1996) elaborou um estudo a fim de
investigar a eficácia dos mapas conceituais no ensino de fração. O objetivo dos
mapas é de propiciar o estabelecimento de relações entre o conhecimento que o
aprendiz dispõe e o novo conhecimento que se quer ensinar.
95
O estudo foi realizado junto a 19 alunas do quarto ano de magistério e sete
professoras que lecionavam no 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental. O material
utilizado para a coleta de dados foi um questionário, respondido individualmente e
sem comunicação entre os sujeitos, em forma de teste matemático a respeito de
frações e alguns mapas conceituais. Esses mapas foram constituídos
primeiramente por um questionário que buscava obter informações pessoais dos
sujeitos – tipo de formação, metodologia e materiais pedagógicos usados nas
aulas, experiências obtidas em estágios e conhecimento de livros e materiais
pedagógicos.
No segundo momento, foi aplicado um questionário contendo questões
sobre frações, com o objetivo de investigar o conhecimento dos sujeitos a respeito
desse conteúdo e os procedimentos utilizados na resolução.
Ao se analisar os resultados, Lima (1996) constatou que a maioria das
professoras em exercício tinham feito cursos de reciclagem e que seis delas
perceberam mudanças na compreensão do conteúdo de fração depois de
participarem desses cursos. Com relação ao conhecimento de material didático,
os resultados apontaram que era reduzido, sendo apresentadas poucas
possibilidades de uso dos diferentes materiais para o ensino de Matemática. Já as
professoras em formação conheciam muito mais materiais e sabiam nomeá-los de
forma mais adequada.
As professoras em formação não apresentaram familiaridade com os livros
de matemática das séries inicias. Nesse momento, Lima (1996) chama atenção
para os cursos de formação que não propiciam o conhecimento de análise dos
textos, os quais o professor poderá trabalhar um dia em sua sala de aula,
96
dificultando assim, o estabelecimento de critérios de escolha para o material de
ensino.
Para ensinar aos alunos o conceito de fração, cinco das sete professoras
que estavam em exercício, ensinavam a partir do concreto, para depois levar o
aluno a formalizar o conceito. Pode ser percebido nas respostas dadas, que as
professoras não conseguiam relacionar o conceito de fração com ocorrências do
dia-a-dia, uma vez que não foi fornecido nenhum exemplo de aplicação desse
conceito em situações cotidianas. Muitas delas deixaram questões em branco e a
hipótese levantada por Lima foi a de que o curso de Magistério propicia pouco ou
nenhum conhecimento desse conteúdo.
Nos resultados das questões que envolviam frações, o desempenho das
professoras em exercício foi inferior ao desempenho das alunas do magistério.
No mapa conceitual, quando comparados os resultados, foi possível notar
que as estudantes do magistério haviam obtido resultados significativamente
melhores que as professoras em exercício.
Lima (1996) finaliza sua análise, ressaltando que apesar das alunas do
Magistério terem obtido resultados melhores nos questionários e mapas, tanto
elas quanto as professoras em exercício não se apresentam aptas em
elaborar/trabalhar com situações de ensino, nas quais seus alunos possam
aprender significativamente o conceito de fração.
O trabalho de Silva (1997) também foi realizado com um grupo de alunos do
último ano do curso de Magistério. Procurou-se investigar se eles percebiam as
97
diferentes concepções de fração como parte-todo, medida e quociente,
explorando também as quantidades discretas e contínuas.
O objetivo do estudo era possibilitar que os futuros professores das séries
iniciais refletissem sobre a introdução do número fracionário no ensino por meio
de diferentes concepções do conceito. Para tanto, foi elaborada uma seqüência
didática de dezoito horas, baseada na metodologia da Engenharia Didática.
Silva (1997) percebeu que para alguns professores a seqüência trabalhada
não foi suficiente, uma vez que nos resultados obtidos pelo pós-teste esses
professores não apresentaram um domínio razoável do conteúdo trabalhado. A
autora classificou tais dificuldades como sendo obstáculos didáticos e
epistemológicos, confirmando os resultados de Kieren (1988) e Campos (1989).
Dentre tais dificuldades encontradas foi constatada a forte tendência do uso de
algoritmos e a concepção de associar uma fração a uma figura, esta deveria estar
necessariamente, dividida em partes iguais, considerando a área e a forma
dessas partes. Esta necessidade se estabelece pelo uso da dupla contagem das
partes na identificação da fração. Por outro lado, esta concepção, conduz ao que
chamamos de discretização do contínuo, pois a referência do inteiro inicial é
substituída pelo número de partes conseguidas após a divisão.
Com relação aos obstáculos de origem epistemológica, a autora citada
constatou que o conhecimento dos números naturais leva a crença de que a
adição e subtração das frações segue uma lógica análoga a dos números
naturais, basta somar ou subtrair os numeradores e denominadores das frações.
Um ponto positivo e que reforça a opção pelo trabalho com as várias
concepções, apresentando novos pontos de vista sobre os números fracionários
na formação do professor, reside no fato de que a maioria dos professores
98
aceitou a proposta e não apresentou resistência nas discussões, o que levou a
uma mudança de comportamento para quase todas as dificuldades detectadas. A
autora também ressalta que a introdução do conceito de fração deveria ser
iniciada pelas concepções: quociente, parte-todo e medida. Esta ordem
apresentada deve-se ao fato da necessidade de se romper com as concepções
errôneas de parte-todo encontradas nos futuros professores.
Para finalizar, Silva (1997) observa que alguns conhecimentos adquiridos
anteriormente, apresentam raízes profundas e, em alguns casos, nem mesmo um
conjunto de atividades criteriosamente elaborado é capaz de mudá-los. Sendo
assim, é necessário um trabalho a longo prazo para que essas raízes sejam
cortadas, possibilitando nascer outras mais fortes e com novas direções.
O trabalho apresentado por Bezerra (2001) teve o objetivo de investigar
como ocorre a aquisição do conceito de número fracionário bem como de suas
representações. Para tanto, foi elaborado uma seqüência de ensino abordando
frações nos significados parte-todo e quociente, contemplando tanto quantidade
contínua como quantidade discreta.
A pesquisa foi aplicada a crianças cursando a 3ª série do Ensino
Fundamental, considerando que o contato desses sujeitos com o campo numérico
dos números racionais fosse inédito. Dentro dessa perspectiva, Bezerra (2001, p.
02) destaca o seu problema de pesquisa: “Como abordar os conteúdos
relacionados ao número fracionário de forma que o aluno compreenda seu
conceito e estabeleça a relação entre o número e sua representação?”.
Logo no início do trabalho, o autor fala do conjunto dos números naturais
como sendo um obstáculo à aprendizagem do conjunto dos números racionais, no
sentido atribuído ao termo por Brousseau (1986).
99
Nas diferentes formas de abordar a introdução do conceito dos números
fracionários, o autor optou por uma forma não convencional, ou seja, partir do
conceito de divisão já abordado nos números naturais e de frações impróprias. A
construção da seqüência foi baseada na formulação de situações-problema que
procuraram motivar os alunos a encontrar respostas que os levassem à aplicação
dos conceitos adquiridos em outras situações semelhantes, sempre partindo de
uma situação-problema em que os alunos, fazendo uso de determinados
materiais significativos, caminhassem na direção da construção do conceito do
número fracionário. Desse modo, Bezerra (2001, p.03) formaliza o conceito do
número fracionário e sua representação na forma a/b (a€N, b€N, com bO),
ocorrendo à institucionalização dos conteúdos trabalhados.
A seqüência de ensino proposta por Bezerra (ibid) se inicia com situações
que exploram o modelo quociente e no desencadear dos encontros são também
apresentadas situações com o modelo parte-todo. O autor destaca que o modelo
parte-todo é importante, mas não deve ser o único e nem deve ser o ponto de
partida para o aprendizado das crianças, pois ele parece oferecer uma barreira
maior entre os números naturais e os fracionários.
Nesse mesmo sentido, Escolano e Gairín (2005) apresentam no artigo
“Modelos de Medida para o Ensino do Número Racional na Educação Primária”,
os resultados de uma pesquisa realizada com alunos de educação primária na
Espanha entre os anos de 1999 e 2004, em que os autores analisam alguns dos
obstáculos didáticos que, segundo eles, são decorrentes do uso do modelo parte-
todo na introdução do conceito de número racional.
Primeiramente, os autores citados, fazem algumas considerações do
significado parte-todo comparando-o com outros significados: quociente, medida e
100
razão. Ressaltam que o uso quase exclusivo do significado parte-todo no ensino
não tem uma ligação com a gênese dos números racionais, uma vez que na
história, esse novo conjunto surge da necessidade de dividir, medir e comparar.
Apesar desses autores não citarem Caraça (1998), apresentam idéias
semelhantes, em que a construção desse novo campo numérico se dá pelos
significados quociente, medida e razão. Afirmam também que as dificuldades, que
costumam ser apresentadas pelos alunos em relação ao domínio dos números
racionais, podem ser causadas tanto pelo conjunto de procedimentos, relações e
operações próprias dos números racionais quanto pelas decisões tomadas em
relação ao processo educativo desses números.
Escolano e Gairín (2005) descrevem que o significado parte-todo é
apresentado, usualmente, numa situação estática, com a figura dividida em partes
iguais, com algumas dessas partes pintadas. Essa situação exigirá do aluno
realizar uma transferência entre representações gráficas e simbólicas e as etapas
dessa transferência são a interpretação da figura, a realização da dupla
contagem, e a representação do resultado dessas operações de forma simbólica.
Essas tarefas conduzem ao estabelecimento de uma relação simbólica entre dois
números naturais, e só depois, ao longo do processo educativo será instituída a
definição de número racional.
A construção do conceito de fração tendo como ponto de partida o modelo
parte-todo aqui descrito tem como características a constatação de que boa parte
do conhecimento é adquirida de forma visual, e também o fato de que a atividade
não está associada à tarefa de medir grandezas. Segundo Escolano e Gairín
(2005), esses fatos produzem na aprendizagem alguns efeitos indesejados, como:
101
(1) ênfase está na dupla contagem; (2) não se define uma unidade; (3) não se
atribui relevância à necessidade de igualdade dos tamanhos das partes
(conservação das áreas), pois o processo está centrado na cardinalidade do
número de partes. Está dificuldade foi aprofundada por Campos et al. (1995),
conforme descrito anteriormente.
Também criam-se alguns obstáculos como, por exemplo, na formação de
concepções adequadas, uma vez que: (1) não existem frações impróprias; (2) o
todo ou a unidade não é um número.
Outros obstáculos dizem respeito à separação conceitual entre número
racional e número natural, pois: (1) a fração é formada por dois números naturais
e descreve apenas uma situação estática em que estão envolvidos dois números
naturais, portanto, nem a fração nem a expressão decimal são entendidos como
um ente numérico diferente dos números naturais; (2) as relações e operações
com os números racionais têm os mesmos significados que os nos números
naturais. Os alunos tendem a estender aos números racionais as mesmas
técnicas operatórias usadas nos números naturais, não percebendo as
peculiaridades das operações com racionais, principalmente no que diz respeito à
adição e à multiplicação.
A partir dos obstáculos e das dificuldades descritas acima, os autores
elaboraram uma seqüência de ensino, no sentido de uma proposta alternativa de
abordagem do ensino de frações, preocupados em reduzir os efeitos apontados
como desvantagens do modelo parte-todo. Na elaboração da seqüência, levaram
em conta a gênese histórica do número racional e priorizando modelos que
forneçam suportes físicos estáveis para que os alunos construam o
102
conhecimento. As atividades tiveram a participação de 160 alunos e 5
professores.
Como conclusão, os autores argumentam que o modelo apresentado,
baseado nos significados medida, quociente e razão proporciona o
desaparecimento dos obstáculos citados inicialmente, permite que as frações
impróprias tenham o mesmo status como expressão da medida de uma grandeza,
que as frações são entes numéricos associados à idéia de medida e que a
unidade tem um papel essencial para interpretar as frações. Argumentam também
que ficam bem caracterizadas as diferenças entre os números racionais e os
naturais e as frações equivalentes, através de atividades manipulativas.
Campos e Magina (2004) realizaram um estudo diagnóstico junto a 70
professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, com o objetivo de
investigar os conceitos que esses professores tinham sobre fração. Para tanto,
solicitaram a eles que apresentassem estratégias de ensino ao analisarem
respostas errôneas de alunos em questões que envolviam o conceito de fração.
Com os resultados obtidos, as autoras puderam concluir que,
provavelmente, a maior parte dos professores das séries iniciais, apresenta
dificuldades conceituais entre representar numericamente situações de fração e
de razão. Outro dado importante foi a pouca utilização dos invariantes da fração
acionados nas estratégias, o que pode significar a pouca relevância que esses
invariantes têm no seu ensino.
Além disso, constatou-se que a principal estratégia de ensino desses professores
é o uso de desenho ou de material concreto com vistas a facilitar
comparações perceptuais dos alunos em detrimento do trabalho com os
103
invariantes lógicos da fração. Pareceu não haver uma clareza desses professores
sobre os diferentes significados da fração, o que os levaram a propor situações de
ensino limitadas, restringindo-se à percepção e ao significado parte-todo.
Apresentamos nesta seção alguns trabalhos que contribuíram para a
elaboração deste estudo e, certamente, contribuirão para a sua análise. Essas
pesquisas também nos auxiliaram no reconhecimento e entendimento de algumas
das dificuldades encontradas no ensino e na aprendizagem do conceito de fração.
A seguir será apresentado o capítulo de metodologia, no qual será descritos os
sujeitos envolvidos em nossa pesquisa, a análise preliminar das questões do
nosso instrumento diagnóstico e os procedimentos utilizados para a coleta de
dados.
CAPÍTULO V
METODOLOGIA
5.1 INTRODUÇÂO
Neste capítulo será descrita a metodologia utilizada neste estudo.
Iniciaremos com uma discussão teórica-metodológica justificando o tipo de
pesquisa. Em seguida apresentaremos o estudo que antecedeu á aplicação
principal e procuraremos justificar os procedimentos e decisões tomadas.
No estudo principal, descreveremos o universo de pesquisa, os sujeitos
envolvidos e as questões do instrumento diagnóstico acompanhadas da análise
preliminar.
Para compreendermos melhor os resultados obtidos, realizamos uma
entrevista clínica com 10% da amostra total de sujeitos. O tipo de entrevista foi
semi-estruturada, a qual Delval (2002) explica como sendo perguntas básicas
comuns para todos os sujeitos, que vão sendo ampliadas e complementadas de
acordo com as respostas, mas retornam ao tema essencial estabelecido
inicialmente.
Por fim, apresentaremos o procedimento adotado para a realização da
coleta de dados.
105
5.2 DISCUSSÃO TEÓRICO-METODOLÓGICO
A proposta desta pesquisa em identificar e analisar crenças, concepções e
competências dos professores em relação ao conceito de número racional na sua
forma fracionária envolve uma coleta de dados qualitativo e quantitativo.
Segundo a interpretação de Rudio (1978), esse experimento trata de uma
pesquisa descritiva, na qual “o pesquisador procura conhecer e interpretar a
realidade, sem nela interferir para modificá-la” (p.55). Rudio afirma ainda, que tal
tipo de pesquisa deve conter enfoques, os quais subsidiarão a interpretação dos
dados. Nesse estudo consideramos tais enfoques como: as quantidades
(contínuas e discretas), as representações (icônica ou não), os invariantes do
conceito (ordem e equivalência) e os cinco significados da fração (parte-todo,
quociente, medida, operador multiplicativo e número). Estes foram
detalhadamente apresentados na seção 2.2.1.
Tal estudo, atendendo o paradigma da pesquisa descritiva, busca conhecer
a natureza e os processos que constituem o fenômeno pesquisado, que no caso é
o conceito de fração. Assim, quando se cria questões abertas que possibilitem o
sujeito a escrever, tem-se a chance de buscar nessas respostas um pouco da
natureza desse sujeito, uma vez que ele busca selecionar o seu conhecimento
para explicitá-lo, possibilitando assim conhecer algumas de suas concepções.
Por fim, acreditamos que a utilização dessa metodologia irá possibilitar a
análise do instrumento diagnóstico que será apresentaremos ainda nesse
capítulo.
106
5.3 ESTUDO PRELIMINAR
Este estudo teve como finalidade depurar a parte de competência do
instrumento de pesquisa. Para isso foi necessário realizarmos duas coletas
diferentes.
No primeiro momento, o instrumento foi aplicado individualmente em quatro
professoras da rede municipal da cidade de Osasco, que lecionavam no 1º e 2º
ciclos do Ensino Fundamental em diferentes escolas. Escolhemos essas
professoras por serem pessoas com as quais a pesquisadora mantinha um
contato próximo, permitindo assim, que elas ficassem à vontade e também por
terem se disponibilizado em contribuir para a depuração do instrumento. Suas
contribuições foram dadas da seguinte maneira: enquanto resolviam as questões,
comentavam sobre elas. Esses comentários passavam por detalhes de
compreensão do texto, nível de clareza dos enunciados, estratégias de resolução
utilizadas e dificuldades encontradas.
Desta primeira aplicação, constatamos que a ordem das questões não
estava boa. Essas foram distribuídas no questionário aleatoriamente, por sorteio.
Notamos que essa escolha não foi adequada, uma vez que observando a
resolução das professoras, percebemos que nas páginas em que não havia
ícones, apareceram comentários como: “Ah, sem desenho!”. Ficou evidente que a
coincidência de se apresentar sequencialmente vários problemas sem figura,
tornava o instrumento mais cansativo. Sendo assim, no segundo momento da
coleta de dados, já tivemos o cuidado de distribuirmos as questões alternando as
variáveis, ou seja, presença e ausência de ícones, quantidades contínuas e
discretas e os cinco significados da fração.
107
Com relação à compreensão do enunciado das questões, foi preciso
ajustar três delas com vista a possibilitar um melhor entendimento da questão.
Quanto ao grau de dificuldade, este se apresentou adequado para o
estudo. Os professores não apresentaram dificuldades nessa variável.
Feitos os ajustes, partimos para a próxima coleta de dados.
Nesse segundo momento, o instrumento foi aplicado coletivamente, com
resolução individual, em um grupo de 15 alunas do último ano do curso de
Pedagogia de uma faculdade particular na cidade de São Paulo. O motivo dessa
escolha foi o de acessibilidade. Todavia, a escolha do 4º ano de Pedagogia foi
proposital, pois a maioria dessas alunas já estava exercendo a profissão.
Consideramos importante aplicar o instrumento nesse grupo por três razões:
1) Este grupo tinha o perfil próximo dos sujeitos que participariam do estudo
principal;
2) Pretendíamos ter uma experiência anterior ao procedimento de aplicação,
isto é, aplicaríamos o instrumento coletivamente, pedindo que a resolução
fosse individual. Tal aplicação permitiria ainda, que pudéssemos avaliar o
tempo médio necessário para a resolução do questionário;
3) Após a primeira depuração, esperávamos que o instrumento já se
encontrasse próximo de sua versão definitiva e, portanto a aplicação em um
grupo maior permitiria o refinamento final do instrumento.
Estes itens foram atendidos no momento em que percebemos que o
questionário foi resolvido no tempo médio de 40 minutos, o que consideramos
razoável, pensando-se na aplicação principal, que seria no Horário de Trabalho
Pedagógico Coletivo (HTPC). Os ajustes feitos, no primeiro momento, foram
108
significativos para uma melhor compreensão das questões. Desta forma,
consideramos o instrumento pronto para ser aplicado no estudo principal.
Cabe ressaltarmos que o instrumento foi elaborado buscando identificar e
analisar crenças, concepções e competências de professores não especialistas
em Matemática com relação à fração. Mas, como esse universo piloto era
formado na grande maioria por estudantes que estavam lecionando há pouco
tempo, achamos que não teria sentido se questionar suas crenças, e concepções
uma vez que essas questões se referiam, na maioria, ao ensino. Nesse sentido,
esse teste ficou centrado apenas na parte de competência, que constava de 18
situações-problema envolvendo os cinco significados da fração, as variáveis
discreto e contínuo, icônico ou não icônico.
Nesse sentido, o objetivo do estudo preliminar foi ter um instrumento
diagnóstico adequado para a realização do estudo definitivo, o qual será
apresentado em detalhes nas próximas seções.
5.4 ESTUDO PRINCIPAL
Conforme consta no Capitulo I, o objetivo deste estudo é identificar e
analisar crenças, concepções e competências dos professores que lecionam nas
séries iniciais do Ensino Fundamental com relação ao conceito de fração e o
entendimento do seu ensino.
Para alcançarmos tal objetivo, elaboramos um instrumento diagnóstico que
foi dividido em quatro partes: (1) perfil, (2) crenças, (3) concepções e (4)
competências. Esse instrumento foi aplicado em dois momentos, seguido da
109
análise clínica do tipo semi-estruturada realizado com 10% da amostra dos
professores.
Na seção seguinte, encontra-se descrito o universo de pesquisa, o
instrumento com a análise prévia e por fim, como este foi aplicado.
5.4.1 Universo de pesquisa
Este estudo foi realizado junto aos professores que atuam nas séries
iniciais do Ensino Fundamental (1º e 2º ciclos). O universo foi composto por 51
professores polivalentes, de três diferentes escolas da rede municipal da cidade
de Osasco, escolas estas, bem localizadas, de fácil acesso e que se encontram
em bairros de poder aquisitivo médio. Essas instituições educacionais oferecem
aos alunos uma boa infra-estrutura que pode ser traduzida pela existência de sala
de vídeo, sala de computador, com uma máquina para cada criança, biblioteca,
refeitório, aulas de inglês e de religião, entre outras. Essas escolas também
costumam oferecer aos seus alunos, passeios culturais e de lazer. O critério
utilizado para a escolha dessas escolas foi o fato de elas se situarem
geometricamente próximas uma das outras e também pelo fato de serem de fácil
acesso do ponto de vista de suas localizações (central).
Cabe salientarmos, que como professor polivalente, entende-se que é
aquele que trabalha com todos os conteúdos curriculares em suas respectivas
séries e que tem sua formação nos extintos cursos de Magistério do 2º grau ou
superior em licenciatura plena.
As três escolas escolhidas funcionavam em dois períodos – manhã e tarde.
A primeira escola, denominada Escola A, agrega cerca 60 professores, sendo que
110
40 são professores polivalentes. A segunda escola, denominada Escola B, é
também composta por 60 professores, sendo desses 40 polivalentes. A terceira
escola, a Escola C, agrega 50 professores, sendo que 30 são professores
polivalentes.
Cada escola oferecia três espaços semanais reservados para o HTPC. Para
efeito da pesquisa, utilizamos um horário semanal e houve dois encontros em
cada escola, sendo um por semana. No primeiro encontro, coletamos os dados
pessoais e algumas crenças e concepções desses professores. No segundo
encontro, estes professores resolveram problemas que envolviam frações com
seus diferentes significados. Era fundamental para o rigor científico, que os
professores participassem dos dois encontros. Por vários motivos houve
professores que não participaram de nenhum dos encontros ou, ainda, que
participaram de apenas um encontro. Com isso a amostra foi reduzida de 110
possíveis professores para 51 sujeitos efetivamente participantes da pesquisa,
sendo 11 da Escola A, 23 da Escola B e 17 da Escola C.
A seguir, apresentaremos o instrumento diagnóstico com a análise prévia
de cada questão.
5.4.2 Análise do Instrumento de pesquisa
Para alcançarmos o objetivo proposto nesta pesquisa, elaboramos um
instrumento que foi dividido em dois cadernos, sendo que o Caderno 1 foi
subdividido em três partes e o Caderno 2 em apenas uma parte.
O Caderno 1 envolveu:
Parte A: Perfil dos professores
111
Parte B: Crenças dos professores com relação ao conceito de fração e
seu ensino
Parte C: Concepção dos professores com relação ao conceito de fração
O Caderno 2 tratou da competência dos professores na resolução de
problemas envolvendo os cinco significados de fração. Foram elaboradas quatro
questões para cada significado – exemplo: significado parte-todo, uma questão
envolvendo quantidade contínua icônica, outra contínua não icônica, discreto
icônico e discreto não icônico - com exceção ao significado número que não
necessariamente se refere a uma quantidade.
Assim sendo, o instrumento como um todo, foi composto por 29 questões
subdivididas em 26 itens. Decidimos excluir o item “b” da questão 3, pois este
envolvia outros conceitos, que consideramos fator de complexidade na questão,
deixando de ser a fração o foco principal. Sendo assim o instrumento ficou com
29 questões e 25 itens. Essas questões foram divididas em dois cadernos da
seguinte forma:
Caderno 1 – Total de 11 questões subdivididas em 3 itens, sendo seis
formadas pela Parte A, quatro pela Parte B e uma pela Parte C.
Perfil Crença Concepção
Questões 1, 2, 3, 4, 5, 6 Questões 7, 8, 9 e 10
Questão 11
Caderno 2 – Total de 18 questões subdivididas em 22 itens, todas
voltadas para resolução de problemas.
O quadro 5.1 a seguir refere-se à distribuição das questões que diz
respeito aos cinco diferentes significados: parte-todo, quociente, medida,
112
operador multiplicativo e número. Além disso, segundo as variáveis quantidades
contínuas e discretas, como também a representação icônica e não icônica.
Contínuo
icônico
Contínuo
não icônico
Discreto
icônico
Discreto
não icônico
Parte-todo
Questão 1 Questão 6 Questão 11
Questão 16
Quociente
Questão 17 Questão 2 Questão 15
Questão 12
Medida
Questão 13 Questão 18 Questão 3
Questão 8
Operador
multiplicativo
Questão 9 Questão 14 Questão 7
Questão 4
Número
Questão 5 Questão 10
Variáveis
QUADRO 5.1: Distribuição das questões quanto ao seu significado, quantidade contínua
Já o quadro 5.2 apresenta a distribuição das questões que envolveram,
explicitamente, os invariantes da fração:
QUADRO 5.2: Distribuição das questões quanto aos invariantes
ordem e equivalência.
A seguir será feita uma análise prévia das questões, destacando-se e
justificando-se o objetivo de cada questão. As questões serão apresentadas na
mesma ordem em que foram colocada para os professores em questão.
O instrumento na integra, tal qual foi apresentada para os professores
encontra-se em anexo.
Ordem Equivalência
Questões 4a e 5 Questões 1.2, 2, 7 e 13
Significado
5.4.2.1 Caderno 1: perfil, crença e concepção
Nessa seção, será apresentada a análise preliminar das partes que
envolveram o Caderno 1, quais sejam, (a) o perfil, (b) as crenças e (c) as
concepções dos professores como explicado anteriormente.
113
A primeira parte, denominada Parte A, traz questões direcionadas para
traçar o perfil dos professores que fizeram parte deste estudo. A Parte B foi
elaborada a fim de diagnosticar as crenças que os professores polivalentes
apresentam com relação à fração. A última parte desse Caderno, denominada
como Parte C, diz respeito à competência dos professores na resolução de
questões. Nesta parte foram explorados os cinco significados da fração, as
variáveis de quantidades e representação e também os invariantes do conceito.
Abaixo, segue a análise preliminar das questões que antecederam a
aplicação do instrumento, buscando-se justificar o porquê consideramos
importante a inserção de cada uma delas. Primeiro será apresentado a análise
preliminar do Caderno 1, Parte A, em seguida a análise da Parte B e por fim a
análise da Parte C.
PARTE A : perfil dos professores
O objetivo dessa primeira parte foi elaborar questões a fim de traçarmos o
perfil dos professores no que diz respeito à sua formação e vida profissional. Para
tanto foram elaboradas seis questões em que se perguntou sobre o ano e tipo de
formação, rede(s) de ensino(s) em que atua(m), tempo e série(s) que leciona(m) e
as séries que já lecionaram.
As questões são apresentadas no quadro 5.3:
114
1) VOCÊ CURSOU: ( ) MAGISTÉRIO ( ) PEDAGOGIA
( ) OUTRO CURSO UNIVERSITÁRIO QUAL? ___________
2) EM QUAL(IS) REDE DE ENSINO VOCÊ LECIONA?
( ) PARTICULAR ( ) MUNICIPAL ( ) ESTADUAL
3) QUE ANO VOCÊ SE FORMOU? _________________________________
4) HÁ QUANTO TEMPO VOCÊ LECIONA?____________________________
5) EM QUE SÉRIE(S) VOCÊ ESTÁ TRABALHANDO? _____________________
6) QUAL(IS) SÉRIE(S) QUE VOCÊ JÁ TRABALHOU? _____________________
QUADRO 5.3: Perguntas relativas ao perfil dos professores (Caderno 1,
Parte A do questionário)
Até meados de 1996, para ser professor das séries iniciais (1º e 2º ciclos),
era obrigatório ter o curso de Magistério. Neste mesmo ano, encontramos nos
Artigos 62 e 63 da LDBEN, a exigência de formação superior com curso de
licenciatura plena, para esses mesmos professores. O prazo para se cumprir essa
exigência foi de dez anos, se esgotando nos dias de hoje. Tendo esse fato como
referência, o interesse na primeira questão, é saber se essa exigência foi atendida
no sentido dos professores melhorarem sua formação, buscando novos
conhecimentos que lhes possibilitassem uma visão mais ampla e profunda dos
saberes de sua profissão.
A segunda questão foi elaborada para atender o interesse em saber se o
raio de atuação desses professores restringe-se à rede pública, uma vez que a
coleta de dados foi realizada em escolas da rede municipal, ou se estende para a
rede particular.
Com a terceira questão investigamos o tempo que o professor está
formado. Na quarta, se esse tempo está relacionado ao tempo em que ele
leciona. A nosso ver, as questões 3 e 4, quando analisadas conjuntamente,
115
oferecem uma visão mais ampla sobre a vida profissional desse professor. Assim
será possível sabermos se esse profissional estudou e se formou com o objetivo
de lecionar, ou se a sua formação foi independente ao seu interesse em atuar em
sala de aula. O professor pode ter se formado há bastante tempo e só agora estar
lecionando.
O objetivo desta pesquisa com essas duas questões é identificarmos se
existe uma relação com a sua formação e o tempo que leciona.
Considerando a posição de Nóvoa (1992), que discute que o tempo de
experiência deve levar a uma maior competência ao professor, é possível
questionar se os professores que estão há mais tempo em sala de aula têm um
desempenho melhor na resolução das questões comparados com os professores
formados mais recentemente.
A quinta e sexta questões estão focadas para sabermos se esses
professores já trabalharam ou trabalham com o ensino de fração, uma vez que o
conceito é introduzido formalmente a partir da 3ª série do Ensino Fundamental.
Tal informação permitirá, nas análises das concepções e competências, investigar
se os professores que estão trabalhando neste ano, com o conceito de fração,
têm um domínio maior desse conteúdo.
Mesmo os professores que não estão lecionando nas 3ª e 4ª séries do
Ensino Fundamental, há uma grande chance da maioria deles já ter lecionado em
todas as séries que compõem os 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental. Esse será
um outro ponto a ser investigado.
Concluído a análise preliminar da Parte A, segue-se com o mesmo
propósito para a Parte B.
116
PARTE B: crenças dos professores com relação ao conceito de fração
Essa parte consistiu-se de quatro questões com o objetivo de explorarmos
as crenças dos professores em relação ao conceito de fração.
O quadro 5.4 apresenta as questões que foram pedidas para que os
professores respondessem:
7) A PARTIR DE QUAL SÉRIE VOCÊ ACHA IDEAL INTRODUZIR O CONCEITO DE FRAÇÃO? ______
POR QUÊ? ____________________________________________________________
8) C
OM BASE EM SUA EXPERIÊNCIA NA SALA DE AULA, OS ALUNOS APRESENTAM
DIFICULDADES AO TRABALHAR COM FRAÇÃO
? ( ) SIM ( ) NÃO
EM CASO AFIRMATIVO, CITE ALGUMAS DIFICULDADES E DÊ SUGESTÕES DE COMO PODEMOS
SOLUCIONÁ
-LAS. ____________________________________________
9) P
ARA ESSA QUESTÃO ENUMERE DE 0 A 5 OS ITENS ABAIXO, USANDO O SEGUINTE
CRITÉRIO
:
0 –
NUNCA ENSINEI 3 NEM DIFÍCIL, NEM FÁCIL
1 –
MUITO DIFÍCIL DE ENSINAR 4 – FÁCIL DE ENSINAR
2 –
DIFÍCIL DE ENSINAR 5 – MUITO FÁCIL DE ENSINAR
( ) ADIÇÃO ( ) SUBTRAÇÃO SEM RESERVA ( ) MULTIPLICAÇÃO
( )
DIVISÃO SEM RESTO ( ) SUBTRAÇÃO COM RESERVA ( ) FRAÇÃO
( )
DIVISÃO COM RESTO ( ) EXPRESSÃO ( ) NÚMEROS
DECIMAIS
APENAS
SE VOCÊ ASSINALOU OS CRITÉRIOS 0, 1 OU 2 EM ALGUM DOS ITENS ACIMA:
Q
UAIS SÃO AS SUAS JUSTIFICATIVAS? _____________________________________
10) V
OCÊ RELACIONA O CONCEITO DE FRAÇÃO COM ALGUMA OPERAÇÃO? ( )SI M ( ) NÃO
S
E SIM, QUAL (OU QUAIS)? ________________________________________
S
E NÃO, POR QUÊ? _______________________________________________
QUADRO 5.4: Perguntas relativas as crenças dos professores ( Caderno 1, Parte B do
questionário).
Como foi visto no Capitulo I, os alunos apresentam muita dificuldade em
lidar com o conceito de fração. Para tanto, o interesse com a questão 7 é
investigarmos se os professores acreditam que inserindo esse conceito mais
cedo, no 1º ciclo, o desempenho dos alunos, com relação a esse conceito,
melhoraria, uma vez que eles teriam, desde o início da sua formação, contato
com esse conteúdo.
117
Na questão 8, o objetivo é sabermos se os professores reconhecem as
dificuldades apresentadas pelos seus alunos e, em caso afirmativo, que sugestão
eles oferecem para solucioná-las. Podemos relacionar esta questão com a de
número 4, já apresentada anteriormente. Desta forma, obteremos informação
para respondermos a seguinte pergunta: Será que os professores que lecionam
há mais tempo descrevem mais facilmente as dificuldades apresentadas pelos
alunos e as possíveis soluções?
Já na nona questão, o objetivo foi investigarmos se os professores
descrevem suas possíveis dificuldades ao trabalharem com conceitos
pertencentes ao bloco de conteúdo “Números e operações”, em especial com as
frações. Acreditamos que por serem professores não especialistas em
Matemática, muitos não devem sentir-se preparados para trabalharem esse
conceito, uma vez que este, não mais se encontra no conjunto dos números
naturais.
Com relação a última questão, a fração geralmente não é associada a um
número. Costuma ser vista como dois números sobrepostos, conforme descrito na
seção “Fração na pesquisa”. Sendo assim, queremos investigar se os professores
associam a fração como uma divisão de números naturais.
Dentre as possíveis respostas dos professores, esperamos encontrar
algumas em que eles relacionem a fração com a subtração. Essa resposta surgiu
quando se aplicou o teste piloto para quatro professoras que lecionavam nas
séries iniciais. Para essa resposta, uma das professoras associou a fração como
ela é geralmente trabalhada em sala de aula, isto é, um todo dividido em partes
iguais e algumas dessas partes pintadas. Prosseguiu sua explicação afirmando
que essa situação se remete a idéia de diminuição do objeto.
118
Sendo assim, temos o interesse em saber se se encontrará mais respostas
relacionadas a essa e quais são as outras possíveis.
Tendo sido discutida a Parte B que diz respeito às crenças dos
professores, será apresentada a última parte do Caderno 1, que trata da
concepção desses professores.
PARTE C: Concepção dos professores com relação ao conceito de fração
Esta parte visa diagnosticar concepções dos professores e foi inspirada na
pesquisa de Santos (2005), como foi relatado no Capitulo I. A questão proposta
foi a seguinte:
11) ELABORE ABAIXO 3 SITUAÇÕES QUE VOCÊ CONSIDERA BOAS PARA TRABALHAR O
CONCEITO DE FRAÇÃO.
SITUAÇÂO A
SITUAÇÂO B
SITUAÇÂO C
QUADRO 5.5: Perguntas relativas as concepções dos professores ( Caderno 1, Parte
C do questionário).
Pedimos aos professores que elaborassem três situações que envolvessem
o conceito de fração, para se investigar sua concepção em relação a esse
conceito e sob a luz dos cinco significados propostos por Nunes. Até esse
momento, não se apresentou nenhuma questão que envolvesse o conceito de
fração, pois o objetivo é vermos que questões nasceriam espontaneamente, isto
é, que tipo de questão o professor está habituado a elaborar, de tal forma que ele
considere importante para trabalhar com o conceito de fração. Investigaremos se
119
existe a preocupação em trabalhar com diferentes contextos e diferentes
significados desse conceito.
A seção 5.4.2.2 que segue abaixo, se refere ao Caderno 2. Nessa seção
será apresentada a análise preliminar das questões que investigaram a
competência dos professores.
5.4.2.2 Caderno 2: competência
A última parte do instrumento consistiu em elaborar questões nas quais
procuramos explorar os cinco significados de frações propostos por Nunes. Além
dos diferentes significados e os invariantes do conceito, também levamos em
consideração duas variáveis:
a) a característica da quantidade (contínua ou discreta);
b) a forma de apresentação dos problemas (com representação icônica e
sem a representação icônica).
Nessa última parte do instrumento, foram propostas 18 questões
subdivididas em 25 itens. As respostas destes itens serão analisadas sob três
enfoques: (1) quanto aos significados da fração –parte-todo, quociente, medida,
operador multiplicativo e número; (2) quanto a variável quantidade - contínua e
discreta – e a representação icônica e não icônica; (3) quanto aos invariantes do
conceito – de ordem e de equivalência.
Na análise dos dados, quanto aos 2 primeiros enfoques, não serão
considerados os itens 1.2 e 4a pois esses tratam, exclusivamente e
respectivamente, dos invariantes equivalência e ordem. Já os itens 14a; 15a; 17a
e b, não serão analisados e nem considerados e nenhum enfoque, pois são
apenas para se certificar se o professor entendeu ou não a questão.
120
Em seguida, serão apresentadas as questões do Caderno 2, na mesma
ordem em que foi colocada para os sujeitos, acrescida de análise preliminar.
Nesta análise procuramos justificar o significado da fração envolvida em cada
questão (parte-todo, quociente, medida, operador multiplicativo e número), a
quantidade (discreta ou contínua) e também a presença ou não de ícone.
A seguir, segue a análise preliminar de cada questão:
Essa questão aborda o significado parte-todo de quantidade contínua
representada por ícone.
1) O
BSERVE AS FIGURAS ABAIXO.
1.1 R
ESPONDA QUAL A FRAÇÃO QUE REPRESENTA AS PARTES PINTADAS DE CADA DA FIGURA.
A) ( ) NÃO É POSSÍVEL SABER QUAL É A FRAÇÃO.
( ) É POSSÍVEL SABER, E A FRAÇÃO CORRESPONDENTE É ____
B) ( ) NÃO É POSSÍVEL SABER QUAL É A FRAÇÃO.
( ) É POSSÍVEL SABER, E A FRAÇÃO CORRESPONDENTE É ____
C) ( ) NÃO É POSSÍVEL SABER QUAL É A FRAÇÃO.
( ) É POSSÍVEL SABER, E A FRAÇÃO CORRESPONDENTE É ____
D) ( ) NÃO É POSSÍVEL SABER QUAL É A FRAÇÃO.
( ) É POSSÍVEL SABER, E A FRAÇÃO CORRESPONDENTE É ____
E) ( ) NÃO É POSSÍVEL SABER QUAL É A FRAÇÃO.
( ) É POSSÍVEL SABER, E A FRAÇÃO CORRESPONDENTE É ____
1.2 COM RELAÇÃO ÀS FIGURAS ACIMA, INDIQUE QUAIS REPRESENTAM DOIS TERÇOS.
1.1 Os itens “a”, “b” e “d” são encontrados com grande freqüência nos livros
didáticos e apresentam respostas possíveis. A estratégia de dupla contagem dá
conta de resolver esses 3 itens.
Dentre algumas respostas esperamos encontrar para os itens “a”, “b” e “d”
sucessivamente:
6
4
,
3
2
,
3
1
cada figura foi dividida em partes iguais (quantidade total de partes
representadas no denominador), sendo que algumas foram pintadas (quantidade
121
de partes pintadas no numerador), demonstrando assim que o professor pode ter
se utilizado da dupla contagem, o que caracteriza o significado Parte-todo.
Conseqüentemente ele pode simplificar a fração do item a) resultando na fração
3
2
;
4
6
,
2
3
,
1
3
para essas representações, o professor demonstra que pensou da
maneira correta, mas inverte o numerador pelo denominador;
4
2
,
1
2
,
2
1
para essas respostas, o professor está usando a relação parte-
parte, isto é, total de partes pintadas para o total de partes não pintadas.
Como, geralmente, esse significado é utilizado para introduzir o conceito de
fração e como é facilmente encontrado em livros didáticos, há fortes razões para
acreditarmos que os professores não apresentarão dificuldade na resolução
desses itens.
No item “c” a figura está dividida de forma incorreta, isto é, para representar
as partes pintadas de uma figura em forma de fração, o todo deve ser dividido em
partes iguais, o que não acontece nesta figura. Este é um caso que, geralmente, é
pouco trabalhado com os alunos. Para que o professor acerte esse item, ele terá
que perceber que se trata de grandezas distintas não podendo ser representada
com uma fração. A figura que compõe esse item, não pode ser representada por
uma fração.
Para esse item “c” acreditamos, entre outras, as seguintes respostas:
não é possível saber qual é a fração nesse caso o professor percebe a
diferença entre a divisão de áreas, ou seja, entre as grandezas, e conclui que não
é possível escrever uma fração que represente aquela figura;
122
3
2
a diferença de áreas é ignorada e utiliza-se a dupla contagem para
representar a fração;
2
3
nesse caso, comete o mesmo erro descrito para a resposta anterior e
ainda troca o numerador pelo denominador.
Percebemos que é um item difícil já que é pouco apresentado e muito
menos discutido, em livros didáticos.
Para o item “e” também é necessário uma atenção maior para as áreas
representadas. Nessa figura algumas partes pintadas correspondem a duas
partes, portanto a dupla contagem não dá conta de responder corretamente. Para
que o professor possa responder de maneira correta esse item, ele terá que
comparar duas grandezas de mesma espécie, ou seja, identificar que a maior
área pintada corresponde ao dobro das outras áreas. É possível que essa
comparação seja o fator de complexidade.
Algumas respostas esperadas são:
9
6
para essa resposta podemos deduzir que houve a preocupação na
conservação da área, ou seja, uma das partes pintadas equivale a duas partes da
figura. O professor pode ainda ter simplificado a fração resultando na fração
3
2
;
7
4
para essa resposta podemos entender não houve a conservação da área,
ou seja, o professor simplesmente utilizou a dupla contagem como se todas as
áreas pintadas tivessem a mesma dimensão;
123
3
3
nesse caso também não houve preocupação com a conservação de área.
As partes pintadas são vistas como três partes, mesmo a área sendo o dobro das
partes da figura, e as não pintadas como sendo mais três partes;
3
6
ou
3
4
para essa resposta, os professores podem ter pensado na relação
parte-parte, levando em conta que a maior parte pintada corresponde a duas
partes da figura; ou ainda também pensando na relação parte-parte, mas não se
preocupando com diferença de tamanho entre as áreas pintadas.
Acreditamos que seja uma questão com um grau de dificuldade, devido
exatamente à necessidade da conservação da área.
O objetivo do item 1.2 é observar se os professores fazem relação de
frações equivalentes, considerando que esse é um dos invariantes do conceito da
fração.
O enfoque dessa questão é o significado quociente com quantidade
contínua sem a presença de ícone. Também está presente a fração equivalente,
ou seja, triplicou o número de crianças e também o número de bolos, logo a
quantidade de bolo que cada criança recebeu será a mesma.
No caso da resposta ser Sim, ou seja, as crianças receberam a mesma
quantidade de bolo, imaginamos que os professores devem ter percebido a
equivalência das frações. Quando se pede para explicar, quer se averiguar se
2) EM UMA FESTA FORAM DISTRIBUÍDOS IGUALMENTE 3 BOLOS PARA 7 CRIANÇAS, ENQUANTO
EM OUTRA FESTA FORAM DISTRIBUÍDOS IGUALMENTE
9 BOLOS, DO MESMO TAMANHO, PARA 21
CRIANÇAS.
T
ODAS CRIANÇAS RECEBERAM A MESMA QUANTIDADE DE BOLO?
SIM NÃO
Descreva como você chegou nessa conclusão ___________________________
124
eles explicam pela equivalência de frações ou se eles explicam por meio de
figuras sem se referirem à equivalência.
Para a resposta “Não” acredita-se que dentre outras hipóteses, os
professores não percebam a equivalência e acabam optando pelos 9 bolos
divididos pelas 21 crianças, talvez pelos fato de os números serem maiores. A
probabilidade de aparecer esta resposta deve ser menor que a resposta “Sim”.
Essa questão tem o intuito de enfocar o significado Medida de quantidade
discreta e icônica. O significado medida desta questão envolve fração por se
referir à quantidade extensiva, cuja quantidade é medida pela relação entre duas
variáveis. A probabilidade de um evento é medida pelo quociente do número de
casos favoráveis dividido pelo número de casos possíveis. Portanto, a
probabilidade de um evento varia de 0 a 1, e a maioria dos valores com os quais
trabalha-se são fracionários.
Como dito na seção 5.4.2, decidimos excluir o item “b” desta questão uma
vez que o mesmo envolve outros conceitos considerados como fator de
complexidade.
Algumas respostas esperadas para o item “a” são:
3)
A) JOGANDO APENAS UMA VEZ UM DADO DE 6 FACES, QUAL A FRAÇÃO QUE REPRESENTA A
CHANCE DE TIRAR O NÚMERO
3 ?______
B) JOGANDO APENAS UMA VEZ DOIS DADOS JUNTOS, CADA UM COM 6 FACES, QUAL A FRAÇÃO
QUE REPRESENTA A CHANCE DE TIRAR O NÚMERO
3 NOS DOIS DADOS? ______
6
1
para essa resposta, o professor demonstra ter usado o significado
Medida para representar a chance de tirar o número 3 ao jogar uma vez o dado;
125
6
3
nesse caso, o professor deve ter se utilizado dos dados do enunciado, ou
seja, a chance de se tirar o número 3, jogando apenas uma vez o dado, que por
sua vez contem seis faces.
4
) EM UMA GINCANA, OS TRÊS PRIMEIROS ALUNOS QUE TERMINARAM AS TAREFAS GANHARAM
UM NÚMERO DE BOLAS
, DO TOTAL DE 35, CONFORME A CLASSIFICAÇÃO. PAULO GANHOU
14
4
DAS BOLAS
, DANIEL
7
1
E THIAGO
7
4
.
A) QUEM CHEGOU EM 1º, 2º E LUGAR RESPECTIVAMENTE?
_________________________
B) QUAL A QUANTIDADE DE BOLAS QUE PAULO, DANIEL E THIAGO GANHARAM
RESPECTIVAMENTE
? ____________________________
Essa questão focaliza o significado Operador multiplicativo com quantidade
discreta não icônica. A questão é formada por dois itens. O item “a” pergunta qual
é a classificação dos garotos que ganharam a gincana, e os professores para
responderem este item podem simplificar a fração relacionada a Paulo, ficando
com os denominadores iguais. Assim torna-se mais fácil a comparação entre os
garotos. Para responder o item “b” o professor terá que associar a questão ao
significado Operador multiplicativo, alcançando a resposta correta.
Consideramos essa questão difícil principalmente pelo item “b”.
Algumas respostas para o item “a” são:
Thiago, Paulo, Daniel para essa resposta, o professor analisou as frações e
pode até mesmo ter simplificado a fração
14
4
, para chegar no resultado de quem
ganhou o número maior de bolas. Assim obtendo a resposta correta, ou seja,
7
4
é
maior que
7
2
que por sua vez é maior que
7
1
;
126
Thiago, Daniel, Paulo nesse caso o professor considera que
7
4
é maior que
7
1
que por sua vez é maior que
14
4
. Inferimos que o professor não tenha
percebido a equivalência das frações, e como o denominador da fração
14
4
é
maior do que o denominador das outras frações, ele acaba concluindo que essa
fração representaria um número menor.
Para o item “b” dessa questão, esperamos, entre outras, a seguinte
resposta:
20, 10, 5 para essa resposta, o professor pode ter se utilizado do significado
Operador multiplicativo, ou seja, multiplicar as frações pelo número total de bolas.
Ele ainda pode ter pensado no significado Parte-todo, ou seja, dividiu o número
total de bolas em grupos de 7, e foi juntando os grupos conforme a fração.
Esta questão focaliza o significado Número com quantidade contínua
icônico. Decorre dessa interpretação, perceber que a notação
b
a
representa em
alguns casos, um número na reta numérica. Consideramos quantidade contínua
por ser um número que pode ser representado na reta numérica. O ícone está
representando uma reta numérica e as respostas, ou seja, as frações serão
indicadas nesse ícone. Muitas pessoas não percebem que existem situações em
que a fração representa um número e isso pode ser conseqüência, geralmente,
de se iniciar o conceito de fração com o significado Parte-todo, sendo a fração a
5) IDENTIFIQUE AS FRAÇÕES
2
1
, 1
4
3
,
12
3
,
2
5
NA RETA NUMÉRICA ABAIXO:
127
representação de uma parte da figura. Encontramos também a fração
representada por um número misto que, dificilmente é trabalhado no ensino de
frações. Este pode ser um fator de complicação.
Consideramos esta questão difícil, uma vez que as pessoas não fazem
conexão que fração representa um número. Esperamos encontrar muitas
respostas diferentes. Entre elas devem aparecer:
2
1
indicado como 0,5; 1
4
3
indicado como 1,75;
12
3
indicado como 0,25;
2
5
indicado como 2,5 essa resposta expressa de maneira correta a localização
dos pontos na reta numérica;
2
1
indicado como 1,2; 1
4
3
indicado como 4,4;
12
3
indicado como 3,9;
2
5
indicado como 5,2 para essa resposta, o professor não consegue ver a
fração como um número. Uma hipótese, é da fração estar sendo representada
como dois números sobrepostos separados por uma vírgula;
2
1
indicado como 3 para essa resposta podemos inferir que o aluno
considerou a reta numérica como um todo, um inteiro e, a metade desse
segmento, o
2
1
estaria localizado no ponto 3.
6) UM ELETRICISTA CORTOU UMA EXTENSÃO DE FIO EM 5 PEDAÇOS IGUAIS. USOU 2 PEDAÇOS
NA OBRA
A E 3 PEDAÇO NA OBRA B.
A) QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE FIO USADO NA OBRA A EM RELAÇÃO AO TOTAL
DE PEDAÇOS
? __________________________________
B) QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE FIO USADO NA OBRA B EM RELAÇÃO AO TOTAL
DE PEDAÇOS
? __________________________________
C) QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE FIO USADO NAS DUAS OBRAS EM RELAÇÃO AO
TOTAL DE PEDAÇOS
? _____________________________
128
Esta questão enfoca o significado Parte-todo de quantidade contínua e não
apresenta o ícone que retrate a situação. A questão apresenta 3 itens que faz
relação dos pedaços de fio usado nas obras em relação ao total de pedaços.
Mesmo sem a presença do ícone podemos considerar essa questão como sendo
de fácil compreensão. Pode-se chegar à resposta correta utilizando-se o
procedimento da dupla contagem, a quantidade total de pedaços de fio sendo o
denominador e, o total de pedaços utilizado em cada obra representada pelo
numerador. A quantidade contínua no significado Parte-todo é bem explorada nos
livros didáticos, o que então nos leva a acreditar que esse pode ser o fator
facilitador dessa questão.
Nessa questão esperamos, entre outras, as seguintes respostas para os
itens “a”, “b” e “c” sucessivamente:
5
2
,
5
3
,
5
5
pedaços de fio utilizados em cada obra para o total de pedaços de
fios, demonstrando assim que o professor pode ter se utilizado da dupla
contagem, o que caracteriza o significado Parte-todo;
2
5
,
3
5
,
5
5
o professor pensou de maneira correta, mas trocou o numerador
pelo denominador.
ainda podemos pensar na resposta 1 para o item “c” este representa a
simplificação da fração
5
5
.
129
Esta questão aborda o significado Operador multiplicativo em quantidade
discreta com a presença do ícone. Pensando nesse significado, o professor irá
multiplicar a fração que se refere à quantidade de ferramentas que Rodrigo
precisa pelo número total de ferramentas representadas, obtendo como resultado
4 ferramentas. Outra maneira seria o professor perceber que a fração
6
3
pode ser
simplificada obtendo
2
1
. Nesse caso ele pode contínuar pensando no significado
Operador multiplicativo, assim como também pode se direcionar para o
significado Parte-todo, ou seja, do total de 8 ferramentas Rodrigo irá precisar da
metade chegando no total de 4 ferramentas.
Consideramos essa questão de média dificuldade, pois o professor
percebendo a equivalência da fração
6
3
obtém a fração
2
1
que é muito utilizada
em sala de aula, sendo esse um fator facilitador.
Entre outras respostas esperamos encontrar:
7) RODRIGO GOSTARIA DE ABRIR UMA MECÂNICA. PARA ISSO ELE PRECISA DE
6
3
DAS
FERRAMENTAS REPRESENTADAS AO LADO
. QUANTAS FERRAMENTAS
ELE PRECISA
? ___________________
4 para essa resposta o professor pode ter pensado no significado Operador
multiplicativo, ou seja, multiplicou a fração referente à quantidade de ferramentas
que Rodrigo precisa pelo total de ferramentas. No caso do professor perceber que
é possível simplificar a fração
6
3
obtendo
2
1
, ele pode estar pensando no
significado Parte-todo, ou seja, do total de 8 ferramentas Rodrigo irá precisar da
metade;
130
3 para essa resposta o professor desconsiderou a quantidade total de
ferramentas e pensou apenas na fração do enunciado, ou seja, 3 de 6 se
remetendo ao significado parte-todo..
Esta questão aborda o significado Medida em quantidade discreta sem a
presença de ícone. O significado medida se refere às quantidades extensivas, em
que a probabilidade de um evento é medida pelo quociente do número de casos
favoráveis dividido pelo número de casos possíveis. Portanto, a probabilidade de
um evento varia de 0 a 1. Nessa questão a possibilidade de Tereza ser sorteada é
expressa por uma medida obtida pelo quociente entre, o número de cartas
enviadas por ela e o número total de cartas, ou seja, pela fração
400
20
. Dentre as
respostas, podemos encontrar:
8) PARA PARTICIPAR DO SORTEIO DE UMA CASA REALIZADO POR UM CANAL DE TELEVISÃO,
FORAM ENVIADAS 400 CARTAS, SENDO QUE 20 DELAS FORAM ENVIADAS POR TEREZA. QUAL A
FRAÇÃO QUE REPRESENTA A CHANCE DE
TEREZA SER SORTEADA, OU SEJA, GANHAR A CASA?
400
20
ou
20
1
para essa resposta pode-se concluir que o professor pensou na
fração com o significado Medida, ou seja, ele pensou no quociente do número de
casos favoráveis dividido pelo número de casos possíveis. Ele pode também ter
simplificado a fração
400
20
resultando em
20
1
;
380
20
para essa resposta pode-se inferir que o professor utilizou a relação
parte-parte, isto é, 20 são as cartas enviadas por Tereza e 380 são cartas
enviadas por outras pessoas;
131
20
400
ou 20 nesse caso o professor pensou de maneira correta mas troca o
numerador pelo denominador.
Essa questão enfoca o significado Operador multiplicativo com quantidade
contínua e apresenta o ícone. Queremos destacar a quantidade de brigadeiros
que Marina comeu, ou seja, por meio de uma ação transformar a quantidade de
doces. Se o professor se reportar ao significado Parte-todo, ou seja, encontrar
dois grupos de 11 brigadeiros, pode correr o risco de pegar apenas 9 brigadeiros
e não 18 como deveria, resultando assim no erro. Acreditamos ser uma questão
difícil e esperamos, entre outras, as seguintes respostas:
9) E
M UMA FESTA, MARINA QUE ADORAVA DOCES, COMEU
11
9
DOS
BRIGADEIROS REPRESENTADOS ABAIXO
. QUANTOS BRIGADEIROS
MARINA COMEU?
18 para essa resposta o professor demonstra ter usado o significado
Operador multiplicativo, ou seja,
11
9
do total de 22 brigadeiros. Pode também ter
dividido os brigadeiros em 2 conjuntos de 11 e ter tirado 9 brigadeiros de cada
conjunto, assim pensando no significado Parte-todo;
9 para essa resposta o professor não associou a quantidade total de
brigadeiros à fração dada no enunciado e acaba respondendo que a quantidade
de brigadeiros que Marina comeu foram 9.
Apesar de o ícone ser um fator facilitador, consideramos essa questão
difícil, principalmente pela fração dada no enunciado.
132
Esta questão enfoca o significado Número com quantidade contínua sem a
presença de ícone. Consideramos quantidade contínua por ser um número que
pode ser representado na reta numérica. Para responder essa questão o
professor tem que associar a fração ao significado Número, ou seja, reconhecer
que a fração
b
a
sendo a e b números inteiros, é considerada como sendo a
representação dos números racionais.
Os números racionais podem também ser representados na forma de um
número decimal, ou seja,
5
4
= 0,8.
As frações são pouco trabalhadas como representação de um número, e
esse pode ser um dos fatos de se obter um número baixo de respostas corretas.
Algumas possibilidades de respostas esperadas para os itens “a”, “b” e “c”
são respectivamente:
10) REPRESENTE NA FORMA DE NÚMERO DECIMAL AS SEGUINTES FRAÇÕES:
A)
5
1
_____________ B)
5
8
______________ C)
4
6
_
___________
0,2; 1,6; 1,5 para essas respostas, o professor considerou a fração como
sendo uma divisão de dois números, resultando, nesses casos, em um número
decimal. Pode-se inferir que o professor pensou no significado Número;
1,5; 8,5; 6,4 para essas respostas o professor não vê a fração como um
número, ou seja, ele se utiliza de forma errônea os números representados na
fração: “denominador”, “numerador”.
11) PARA ENFEITAR UMA PEQUENA ÁRVORE DE NATAL, PATRÍCIA USOU 10 BOLINHAS.
Q
UE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADES DE BOLINHAS AMARELAS EM
RELAÇÃO AO TOTAL
? _________________
133
Está presente nesta questão o significado Parte-todo de quantidades
discretas e com a presença de ícone. Apesar de este significado ser encontrado
com maior freqüência nos livros didáticos, à quantidade discreta é pouco
explorada. Não se acredita que esse seja um fator de complicação para obtermos
o sucesso.
Algumas respostas, dentre outras, que podem aparecer são:
10
3
3 bolinhas amarelas para o total de 10 bolinhas, demonstrando assim
que o professor pode ter se utilizado da dupla contagem, o que caracteriza o
significado Parte-todo;
3
10
ter pensado da maneira correta, mas acaba trocando o numerador pelo
denominador;
7
3
,
10
7
para essa resposta o aluno está pensando na relação parte-parte, ou
seja, total de bolinhas amarelas para o total de bolinhas vermelhas, ou vice-versa.
Está questão focaliza o significado Quociente com quantidade discreta não
icônica. As respostas do item “a”, onde é feita a pergunta se as salas de Fernanda
e Ana terão a mesma quantidade de vasos. Provavelmente teremos um número
alto de respostas corretas, pois se trata de uma questão de divisão comum no
12) F
ERNANDA TEM 27 VASOS DE VIOLETA PARA DISTRIBUIR IGUALMENTE ENTRE 9 SALAS. ANA
TAMBÉM IRÁ DECORAR OUTRAS
6 SALAS E POSSUI 24 VASOS DE VIOLETA PARA SEREM
DISTRIBUÍDOS IGUALMENTE ENTRE ELAS
.
A) AS SALAS DE FERNANDA E DE ANA TERÃO A MESMA QUANTIDADE DE VASOS?
SIM. DESCREVA COMO VOCÊ CHEGOU NESSA CONCLUSÃO. ________________________
NÃO. POIS AS SALAS DE FERNANDA TERÃO __ VASOS E AS SALAS DE ANA TERÃO __ VASOS.
B) QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE VASOS DISTRIBUÍDOS EM CADA SALA DE
FERNANDA?_________________
C) QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE VASOS DISTRIBUÍDOS EM CADA SALA DE ANA?___
134
dia-a dia das pessoas. Para os itens “b” e “c” em que ser pede para representar
por uma fração a quantidade de vasos distribuídos em cada sala, tanto de Ana
quanto de Fernanda, esperamos, entre outras, as seguintes respostas para os
itens sucessivamente:
9
27
,
6
24
para essa resposta pode-se concluir que o professor pensou na
fração com o significado Quociente. Ele associou a divisão feita no item “a” com a
fração solicitada nos itens “b” e “c”;
27
9
,
24
6
neste caso o professor pensou de maneira correta, mas trocou o
denominador pelo numerador;
Essa questão foi inspirada em uma pesquisa feita por Nunes et al. (2003).
A mesma também fez parte dos trabalhos de Merline (2005) e Moutinho (2005). A
situação aborda o significado Medida em quantidade contínua representado por
ícone. É composta pela pergunta do enunciado e mais três itens, que se referem
à quantidade de tinta azul em relação à mistura, ou seja, estamos considerando a
mistura (quantidade de tinta azul e branca) como o todo. Isso faz com que a
questão remeta a idéia de fração, uma vez que a mistura é constituída por 10
partes, sendo que 5 são tintas azuis. Tomemos o item “a” como exemplo. Neste
13) A
MISTURA DE TINTA VAI TER A MESMA COR NA SEGUNDA E NA TERÇA-FEIRA?
A) QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE TINTA AZUL EM RELAÇÃO À MISTURA DAS
TINTAS AZUL E BRANCA
?__________________________
B) NA SEGUNDA-FEIRA?___________________________
C) E NA TERÇA-FEIRA?____________________________
135
caso, representamos a resposta como sendo
10
5
. O significado medida dessa
questão envolve fração por se referir as quantidades intensivas.
Acreditamos que poucos professores irão relacionar o todo a mistura. As
respostas devem se referir à parte-parte, ou seja, a mistura é feita pela razão 2
para 2 que se pode representar como
5
5
(relação parte-parte).
Esta questão enfoca o significado Operador multiplicativo de quantidade
contínua e não icônico. A questão apresenta dois itens. No item “a” perguntamos
se Plínio ficou com mais da metade das barras de chocolate, e para responder
esse item, o professor deverá olhar a fração que representa a quantidade de
barras que ele pegou em relação ao total, para depois decidir se assinala o Sim
ou o Não. Esse item não será quantificado em nossa análise.
Consideramos essa questão de média dificuldade e dentre algumas
respostas possíveis para o item “b”, podemos obter:
14) FÁTIMA E PLÍNIO COMPRARAM UMA CAIXA DE CHOCOLATE QUE CONTINHA 40 BARRAS
IGUAIS
. PLÍNIO PEGOU PARA ELE
10
7
DAS BARRAS.
A) PLÍNIO FICOU COM MAIS DA METADE DO TOTAL DE BARRAS DE CHOCOLATE?
SIM NÃO
B) QUANTAS BARRAS PLÍNIO PEGOU PARA ELE?
28 para essa resposta consideramos que o professor pensou na fração com
o significado Operador multiplicativo, ou seja,
10
7
de 40 barras de chocolate. Pode
também ter dividido os chocolates em 4 conjuntos de 10 e ter tirado 7 barras de
cada conjunto, utilizando-se assim o significado Parte-todo;
136
7 para essa resposta, o professor desprezou a quantidade total de barras de
chocolate e se deteve apenas a fração apresentada no enunciado que tinha como
numerado o número 7.
Esta questão tem como intuito enfocar o significado Quociente de
quantidade discreta com ícone. O item “a”, quando se pergunta quantos coelhos
terão em cada viveiro, é para se certificar que o professor entendeu o problema
como uma situação de divisão, sendo este desconsiderado na quantificação dos
dados.
Como se pode notar nos alunos e professores, o conceito de divisão não
está ligado diretamente ao conceito de fração. Muitas vezes, este está
relacionado com o significado Parte-todo que é geralmente o mais trabalhado nas
escolas, além de ser o significado mais utilizado para introduzir o conceito de
fração. Acreditamos que poucas respostas irão ser dadas no significado
quociente. A fração, tanto para os professores quanto para os alunos.
Algumas respostas esperadas para esse item “b” são:
15) T
ENHO 10 COELHOS PARA SEREM DISTRIBUÍDOS IGUALMENTE EM 2 VIVEIROS.
A) QUANTOS COELHOS TERÃO CADA VIVEIRO? _______________
B) QUE FRAÇÃO REPRESENTA ESSA DIVISÃO? _______________
2
10
10 coelhos distribuídos igualmente entre dois viveiros. Essa resposta
caracteriza o significado Quociente;
137
10
5
para essa resposta pode-se pensar que o professor utilizou a resposta
do item “a’. Neste caso a resposta nos remete ao significado Parte-todo, ou seja,
cada viveiro terá 5 coelhos do total de 10;
2
1
nesse caso, pode-se inferir que o professor poderia estar pensando no
significado Operador multiplicativo, ou seja, não importa a quantidade de coelhos
a serem distribuídos, pois cada viveiro irá receber
2
1
do total de coelhos;
10
2
para essa resposta o professor pensou de maneira correta, mas inverte
o denominador pelo numerador, acreditando que o denominador tem que ser
sempre maior que o numerador.
Esta questão tem como intuito enfocar o significado Parte-todo de
quantidade discreta sem a presença do ícone. Utilizando-se do procedimento da
dupla contagem é possível obter a resposta correta, ou seja, total de vogais para
o total de letras.
Esperamos encontrar, entre outras, as seguintes respostas:
16) E
SCREVA A REPRESENTAÇÃO FRACIONÁRIA QUE INDICA O NÚMERO TOTAL DE VOGAIS EM
RELAÇÃO AO TOTAL DE LETRAS
, DA SEGUINTE PALAVRA: “PROFESSOR”
_______________
9
3
,
3
1
pode-se dizer que para essa resposta o professor deve ter se utilizado
da dupla contagem, o que caracteriza o significado Parte-todo e
conseqüentemente a simplificação da fração
9
3
;
138
3
9
ter pensado da maneira correta, mas acaba trocando o numerador pelo
denominador;
6
3
,
3
6
para essa resposta o aluno está pensando na relação parte-parte, ou
seja, total de vogais para o total de letras ou total de letras para o total de vogais.
Esta questão retirada de uma pesquisa realizada por Nunes et al. (2003),
também se encontra na dissertação de Merlini (2005) e Moutinho (2005), e tem
como intuito enfocar o significado quociente de quantidade contínua, utilizando-se
o ícone para representar a situação.
A questão apresenta três itens. Nos itens “a” e “b” acreditamos que os
professores não irão apresentar dificuldade para responder, uma vez que o ícone
é um facilitador nesta questão. Vale ressaltar que não iremos considerar esses
itens na quantificação dos dados para a análise. Já no item “c” onde pede-se a
representação da divisão de chocolate por criança na forma de fração,
acreditamos que a resposta não seja tão imediata como nos itens anteriores. A
idéia de divisão geralmente não está ligada diretamente à idéia de fração. Para a
divisão as pessoas procuram chegar a resultado de números inteiros, na maioria
5) FORAM DIVIDIDAS IGUALMENTE PARA 4 CRIANÇAS, 3 BARRAS DE CHOCOLATE.
A) CADA CRIANÇA RECEBERÁ 1 CHOCOLATE INTEIRO?
SIM NÃO
B) CADA CRIANÇA RECEBERÁ PELO MENOS METADE DE UM CHOCOLATE?
SIM NÃO
C) QUE FRAÇÃO DE CHOCOLATE CADA CRIANÇA RECEBERÁ? _______________
139
das vezes, e nunca representar como ma fração. Devem aparecer como alguma
das respostas para o item “c”:
4
3
3 chocolates para 4 crianças, o que caracteriza o significado Quociente;
12
3
para essa resposta acreditamos que os professores consideraram os
três chocolates como o todo, e foram dividindo até chegarem em uma quantidade
de partes iguais para serem distribuídas igualmente para as quatro crianças;
3
4
para essa resposta podemos deduzir que o aluno pensou de maneira
correta, mas inverteu a numerador com o denominador.
Esta questão enfoca o significado Medida em quantidade contínua não
icônica. O significado medida dessa questão envolve fração por se referir as
quantidades intensivas – areia e cimento, ou seja, para conseguir uma quantidade
de argamassa é necessário misturar 2 partes de cimento e 5 partes de areia.
Falando de outra maneira, temos a razão 2 para 5 que pode ser representada
como sendo
5
2
(relação parte-parte). Com essa medida podemos fazer qualquer
quantidade de argamassa, resultando na mesma consistência, e além disso, essa
quantidade poderá nos remeter a idéia de fração, se considerar que o todo (a
mistura) é constituído de 7 partes,
7
2
é a fração que corresponde a medida de
cimento e
7
5
é a fração que corresponde a medida de areia.
10) P
ARA FAZER CERTA QUANTIDADE DE ARGAMASSA SÃO NECESSÁRIAS 2 MEDIDAS
DE CIMENTO PARA
5 MEDIDAS DE AREIA. QUE FRAÇÃO REPRESENTA A QUANTIDADE DE
CIMENTO EM RELAÇÃO A TODA A ARGAMASSA
? _________________
140
Para essa questão esperamos, entre outras, as seguintes respostas:
7
2
para essa resposta o professor pode ter pensado como sendo 2 de
cimento para 7 partes da mistura (total), caracterizando assim o significado
Medida;
5
2
nesse caso inferimos que o professor pensou na relação parte-parte, ou
seja, duas partes de cimento para 5 partes de areia.
2
7
para essa resposta acreditamos que o professor pensou de maneira
correta, mas acabou invertendo o numerador pelo denominador.
Feita a análise preliminar das questões que constituíram o instrumento
diagnóstico, na próxima seção apresentaremos os procedimentos que
subsidiaram a aplicação.
5.5 PROCEDIMENTOS DA APLICAÇÃO
Como já foi mencionado, o universo de pesquisa foi composto por 51
professores polivalentes de três escolas da rede municipal da cidade de Osasco.
Antes de se fazer a coleta de dados, a pesquisadora se deslocou até as
escolas onde se apresentou para as diretoras e coordenadoras pedagógicas,
expondo o seu objetivo geral. Também conheceu os professores que fariam parte
de seu estudo e agendou os dias para realizar a sua pesquisa.
A coleta de dados foi feita em duas sessões com duração média de 50
minutos, no HTPC e com a participação da coordenadora pedagógica de cada
escola, que auxiliara na distribuição e recolhimento dos cadernos. Na Escola A,
141
participavam 11 professores polivalentes, na Escola B 23 professores e na Escola
C 17 professores. Para efeito da pesquisa foi necessário seis encontros, dois em
cada escola, para assim se concluir a coleta de dados.
No primeiro encontro foi entregue o Caderno 1, que consistiu em
questões referentes ao perfil dos professores, suas crenças e concepções no que
tange o número racional na sua representação fracionária. Os professores foram
informados que a atividade deveria ser individual e sem apoio de qualquer tipo de
instrumento, tais como: livros didáticos, apostilas, entre outros. O tempo médio
gasto neste primeiro encontro variou de 30 a 40 minutos.
O segundo encontro consistiu na entrega do Caderno 2, que foi composto
por 18 questões envolvendo a fração com os diferentes significados e as
variáveis: características da quantidade e a forma de apresentação dos
problemas. Lembramos aos professores de que as atividades deveriam ser feitas
individualmente, sem apoio de material e também solicitamos que eles deixassem
registrados os passos da resolução, para que com isso, conseguíssemos
identificar quais os significados da fração que foram mobilizados para a resolução
de cada item do questionário. O tempo gasto para a resolução deste Caderno, foi
aproximadamente 50 minutos.
Feita a tabulação dos dados, e uma primeira e breve análise, retornamos
as escolas para entrevistar 10% da amostra dos professores. Durante as
entrevistas procuramos entender algumas respostas descritas no instrumento e
investigar se esses professores perceberam alguma diferença entre as questões
que envolvia os diferentes significamos da fração. Levamos uma folha contendo 5
questões que contemplavam os cinco diferentes significados da fração (questões
142
estas já apresentadas na Parte de competência do instrumento, anexo II) e
indagamos sobre as possíveis dificuldades que as mesmas poderiam provocar,
tanto do ponto de vista do aluno quanto do professor e se alguma dessas
questões eram mais freqüentes nos livros didáticos.
Descrito aqui a metodologia adotada em nossa pesquisa, no próximo
capítulo apresentaremos os resultado dos dados obtidos, bem como a sua
análise.
CAPÍTULO VI
ANÁLISE DOS RESULTADOS
6.1 INTRODUÇÃO
No presente capítulo faremos a análise dos resultados obtidos na aplicação
do instrumento diagnóstico de acordo com a própria constituição deste, ou seja,
em quatro partes: (6.2) Perfil dos professores, (6.3) Crenças dos professores,
(6.4) Concepção dos professores e (6.5) Competência dos professores.
Nas duas primeiras partes agruparemos os tipos de respostas dadas pelos
professores e analisaremos os resultados com ricas contribuições adquiridas
durante as entrevistas.
Nas partes (6.4) e (6.5) a análise irá abordar três enfoques: os cinco
significados da fração, as variáveis quantidade contínua e discreta e o tipo de
representação (icônica ou não) e os invariantes do conceito. Frente a essas
análises e com os resultados quantitativos fornecidos pela parte de competência,
criaremos categorias de análise baseadas nas estratégias errôneas utilizadas
pelos professores nas resoluções das questões.
Conforme descrito no capítulo de metodologia, a amostra dos sujeitos foi
formada por 51 professores polivalentes da rede municipal da cidade de Osasco.
Para a análise dessa pesquisa, dividiremos essa amostra em dois grupos:
Grupo denominado G
1
– formado por professores que lecionavam nas 1
as
e 2
as
séries do Ensino Fundamental, os quais não estavam trabalhando, no
momento da coleta de dados, com o ensino de fração.
144
Grupo denominado G
2
– formado por professores que lecionavam nas 3
as
e 4
as
séries do Ensino Fundamental, os quais, no momento da coleta de
dados, estavam trabalhando com o ensino de fração.
Decidimos formar esses grupos porque pretendemos investigar se existe
diferença entre as crenças, concepções e competências dos professores que
estavam, no momento da pesquisa, trabalhando com o ensino de fração e os que
não estavam.
Feito aqui um breve resumo deste capítulo, apresentaremos na próxima
seção os resultados obtidos no instrumento diagnóstico, juntamente com sua
análise, respeitando aos três enfoques de análise descritos anteriormente.
6.2 ANÁLISE DO PERFIL DOS PROFESSORES
Consideramos importante traçar o perfil dos professores envolvidos nesta
pesquisa porque acreditamos que alguns fatores, tais como a formação, tempo de
experiência, série em que leciona ou lecionou, podem influenciar nas crenças,
concepções e competências que esses professores têm sobre o número racional
na sua representação fracionária. A primeira informação que obtivemos do perfil
desses professores é que todos lecionam em escolas públicas municipais.
Com relação as suas formações, a tabela 6.1 nos mostra que 41 dos 51
professores, além de terem habilitação no Magistério (curso de nível Médio que
até meados de 1996 era obrigatório para lecionar nas séries iniciais) também
possuem curso Superior, dos quais se destaca o curso de Pedagogia.
145
TABELA 6.1: Distribuição dos professores de acordo com a sua formação
Podemos interpretar tal resultado como uma atitude positiva da parte desses
professores, os quais, de um modo geral, seja por exigência profissional ou
pessoal, buscaram aprimorar os seus conhecimentos, freqüentando cursos de
nível superior (96,1% têm formação de nível superior). É interessante ressaltar
que entre os cursos superiores não encontramos habilitação na área de exatas.
Além dos 45 professores formados em Pedagogia (37+1+7), os cursos que se
destacaram foram: Letras e Psicologia, sendo dois professores formados em cada
um desses cursos.
Os dados advindos do perfil nos informaram ainda que 42 dos 51
professores têm mais de cinco anos de magistério e 37 deles já lecionaram tanto
no 1º como no 2º ciclo do Ensino Fundamental, conforme apresenta o gráfico 6.1
abaixo:
Há quanto tempo e em quais séries os professores lecionaram?
0
5
10
15
20
25
30
35
40
0-5 6-10 11-15 16-20 acima de 21 1ª e 2ª 3ª e 4ª todas
Há quanto tempo leciona (anos) Séries em que já lecionaram
de professores
GRAFICO 6.1 – Tempo de magistério (em anos) e séries em que já lecionaram
Curso
Apenas
Magistério
Magistério e
Pedagogia
Magistério e
outros cursos
superiores
Pedagogia e
outros cursos
superiores
Apenas
Pedagogia
Quantidade
de
Professores
2 de 51
3,9%
37 de 51
72,6%
4 de 51
7,8%
1 de 51
2,0%
7 de 51
13,7%
146
A partir desse perfil, consideramos que esta amostra é formada por
profissionais experientes no que tange à prática docente.
No momento da coleta de dados, 43 professores estavam trabalhando em
apenas uma série e os oito restantes trabalhavam simultaneamente em duas
séries. Desses oito professores, cinco trabalhavam em outro período em escolas
particulares e os três restantes em escolas municipais. O gráfico a seguir
apresenta a distribuição dos professores de acordo com as séries em que
lecionavam no momento da pesquisa:
Quantidade de professores por série em que
lecionava
12
10
13
8
8
série
série
série
série
duas séries
GRAFICO 6.2 - Relação entre o número de professor por série que leciona
Dos oito professores que trabalhavam em mais de uma série, quatro
lecionavam em 3ª e 4ª séries. Portanto, considerando a divisão dos grupos (G
1
formado por professores que atuam nas 1ª e 2ª séries e G
2
por professores de 3ª
e 4ª séries) – estes envolvem, respectivamente, 26 e 25 professores.
Dos 25 professores do G
2
,
quinze tinham mais de 11 anos de magistério
enquanto no G
1
apenas treze professores. Esse dado indica que os professores
do G
2
tinham mais experiência de ensino comparado aos professores do G
1.
Dentre os 26 professores que lecionavam no 1º ciclo, apenas seis deles
nunca trabalharam na 3ª ou 4ª séries do Ensino Fundamental, ou seja, 45 dos 51
147
professores (88,2%) já ensinaram ou ensinam fração a seus alunos. Esse dado é
de grande importância para esta pesquisa, uma vez que nosso foco são os
professores que já trabalharam com o ensino de frações.
Comparando o tempo de experiência e as séries em que os professores
estavam lecionando, temos:
Tempo de
magistério
(anos)
0 a 5 6 a 10 11 a 15 16 a 20 21 a 36 Total
G
1
5
8
3
6 4 26
G
2
3 7 2 6 7 25
TABELA 6.2: Distribuição dos professores de acordo com a sua formação
Os dados da tabela 6.2 nos mostram que, apesar da diferença entre os
anos de magistério e os grupos de professores serem pequena, os professores do
G
2
(60%)
lecionam a mais tempo do que os professores do G
1
(50%)
.
O nosso interesse, com a delimitação do perfil dos sujeitos de pesquisa, é
termos subsídios para, quando da análise das demais partes (crenças,
concepções e competências) podermos investigar se as variáveis profissionais,
tais como a formação, ou o tempo de serviço (experiência profissional) ou ainda o
maior ou menor contato com o ensino de fração, influência nas crenças,
concepções e competências desses professores em relação ao conceito de
fração.
Vale ressaltar que não pretendemos generalizar nosso resultado para além
do universo pesquisado, uma vez que temos consciência de que se trata de um
Grupos de
professores
148
número restrito de sujeitos e que estes contemplam apenas três escolas
municipais escolhidas de forma pragmática.
6.3 ANÁLISE DAS CRENÇAS DOS PROFESSORES
Nesta seção, que analisa os dados da Parte B do instrumento,
pretendemos identificar as crenças dos professores com relação a fração e seu
ensino.
Segundo Ponte (1994) o sentido que damos ao conhecimento é
necessariamente formado pelas crenças e concepções de cada indivíduo, sendo
a crença uma verdade pessoal, na qual cada pessoa tem seu ponto de vista.
Considerando a afirmação acima, questionamos se os professores
envolvidos nesta pesquisa acreditam que seus alunos apresentam dificuldades
frente a problemas que envolvem frações e se os mesmos sugerem possíveis
estratégias para solucioná-las.
Os resultados obtidos encontram-se na tabela 6.3 abaixo:
Grupos
G1 G2 Total
Os alunos apresentam
dificuldades
14 de 26
53,8%
14 de 25
56,0%
28 de 51
55,0%
Os alunos não apresentam
dificuldades
9 de 26
34,6%
8 de 25
32,0%
17 de 51
33,3%
Branco
3 de 26
11,5%
3 de 25
12,0%
6 de 51
11,8%
TABELA 6.3 – Comparação entre as crenças d o G1 e G2 em relação a dificuldades dos
alunos frente a problemas envolvendo frações
Analisando a tabela 6.3, percebemos que, praticamente, não existem
diferenças percentuais entre a opinião dos professores do G
1
e do G
2
, ou seja, a
série em que o professor encontra-se ministrando aula, não interfere em suas
crenças com relação as possíveis dificuldades apresentadas pelos alunos. Um
149
segundo dado que nos chamou a atenção é o fato de muitos professores, nos
dois grupos, não acharem fração um tema difícil para os alunos (34% dos
professores do G
1
e 32% do G
2
, ou seja, 1/3 da amostra). É necessário ressaltar
que essa crença de
3
1
dos professores dos dois grupos, não se apóia na
realidade dos alunos brasileiros, pelo menos segundo as últimas avaliações
nacionais.
Dos 28 professores que acreditavam que os alunos apresentam dificuldades
em lidar com o conceito de fração, 82% apontam possíveis dificuldades, sendo
estas nomeadas conforme apresenta o gráfico 6.3:
Dificuldades dos alunos
5
1
2
6
9
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
representar a
frão no
concreto
comparar
frões
fracionar o
inteiro
relacionar a
frão com
divio
equivalência e
comparão
tipos de
dificuldades
de professores
GRÁFICO 6.3 - Dificuldades dos alunos apontadas pelos professores
Estas dificuldades apontadas vieram acompanhadas, nos dois grupos de
professores, por um número limitado de estratégias de ensino para solucionar tais
problemas. As estratégias se resumiam ao uso de material concreto. Tais
respostas (estratégias de ensino) limitavam-se a ações para estimular a
percepção dos alunos (“trabalhar com o concreto”). Este resultado condiz com o
que foi encontrado por Campos & Magina (2004).
150
Entendemos que tal estratégia, que tem a preocupação de apenas facilitar
comparações perceptuais, pode ser uma solução enganosa, visto que os alunos
irão desenvolver seus raciocínios sobre fração baseada, principalmente, em suas
percepções em detrimento do uso das relações lógico-matemáticas nela
envolvida.
Os professores que acreditavam que seus alunos apresentam dificuldades
em trabalhar com o conceito de fração, em grande parte, são os mesmos que
indicaram a fração como sendo um conceito não tão fácil de ensinar. Isso ocorreu
com mais freqüência na população de professores com menos de 11 anos de
magistério. Já os professores que acreditavam que seus alunos não apresentam
dificuldades, foram em grande parte, os mesmos que indicaram o ensino de
fração como não sendo tão difícil de ensinar. Estes eram os que possuíam mais
tempo de magistério.
A tabela 6.4 apresenta os critérios atribuídos pelos professores ao ensinar o
conceito de fração em diferentes níveis de experiência no magistério:
0 a 5 6 a 10 11 a 15 16 a 20 21 a 36 Total
nunca ensinei 2 -
-
1 - 3
muito difícil de ensinar
1
3 1 4 1 10
difícil de ensinar 1 3 - 1 - 5
nem difícil, nem fácil
4 6 1 5 1 17
fácil de ensinar
1
1
2
5 3 12
muito fácil de ensinar
- 1 1 - 2 4
TABELA 6.4: Critérios atribuídos ao ensinar o conceito de fração indicados em diferentes etapas
de tempo de magistério
Critérios
atribuídos
Tempo de
magistério
(anos)
151
Dos professores com menos de 11 anos de magistério, oito indicaram a
fração como um conceito difícil de ensinar e três como um conceito fácil de
ensinar. Já os professores que lecionavam há mais tempo, estes apresentaram
dados opostos, ou seja, sete consideraram difícil ensinar fração a seus alunos e
doze consideraram fácil.
Ao entrevistarmos a professora 16 (P 16) sobre as possíveis dificuldades
de um aluno ou de um professor em responder uma questão envolvendo fração,
obtivemos a seguinte resposta:
A dificuldade é a mesma. O que vai ser difícil para o professor vai ser difícil
para o aluno. Se você não tem firmeza em um conteúdo você passa de
maneira duvidosa para seus alunos.
A palavra “firmeza” dita pela professora pode ser traduzida como o domínio
de um conteúdo e Ponte (2001; p.2) afirma: “sem um bom conhecimento de
Matemática não é possível ensinar bem a Matemática”.
Quando pedimos aos professores que consideraram o conceito de fração
muito difícil de ensinar e difícil de ensinar (15 dos 51 professores), que
justificassem suas escolhas, obtivemos o seguinte resultado, conforme mostra a
tabela 6.5 abaixo:
G1 G2 Total
Justificativas
Grupos
Não justificou 2 2 4
Conceito pouco trabalhado
- 2 2
Conceitos difíceis de entender 2 - 2
Abstrato para as crianças
5 1 6
Requer entendimento de conceitos
anteriores
1 - 1
Total
10 5 15
TABELA 6.5: Justificativas dos professores que marcaram as opções muito difícil
ou difícil de ensinar, quando se referiam ao ensino de frações
152
Interpretando essas justificativas, podemos inferir que algumas podem ser
conseqüências de outras, ou seja, ao dizer que o conceito é pouco trabalhado em
sala de aula, provavelmente os alunos apresentarão maior dificuldade em
entendê-lo. Na tabela 6.5, ainda nos chamou atenção, a quantidade de
professores que justificaram o ensino de fração como sendo abstrato para as
crianças. A fração
4
3
é tão abstrata como o número 2, quando esses não
representam algo. Agora
4
3
de uma “pizza” é tão concreto como 2 “carrinhos”. O
que podemos considerar abstrato é o cálculo pelo cálculo, mas isso não é só para
as frações, mas também para os números naturais.
A professora (P 16) justificou o que considera abstrato:
O ABSTRAIR ESTÁ RELACIONADO COM A MATURIDADE. ANTES DEVEMOS
TRABALHAR O LÚDICO E QUANDO A CRIANÇA JÁ CONSEGUE ABSTRAIR AÍ
INTRODUZIMOS A FRAÇÃO COM SEUS NOMES
NUMERADOR, DENOMINADOR. ELA
TEM QUE ESTAR TOTALMENTE MADURA PARA CONSEGUIR FAZER ESTA
ABSTRAÇÃO
.
Essa resposta retoma a explicação dos professores em basear suas
estratégias de ensino na percepção (trabalhar com o material concreto) em
detrimento da lógica matemática. Com isso queremos deixar posto que somos a
favor da utilização do lúdico para trabalhar os diversos conceitos matemáticos,
mas é importante não perdermos de vista o trabalho a partir da lógica e dos
invariantes matemáticos, sem os quais o ensino pode voltar-se unicamente para
as técnicas e algoritmos desprovidos de qualquer significado. Tal ensino, preso à
percepção e restrito à situações particulares corre o risco das crianças
construírem concepções errôneas sobre o conceito.
153
Em seguida perguntamos ao professor se ele relacionava a fração com
alguma operação e tivemos o seguinte resultado:
V
ocê relaciona o conceito de fração com al
g
uma operação? Qual?
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
20
d
i
visão
4
operações b
ási
cas
d
ivi
são
e
m
ult
i
pl
i
cação
di
v
isão e subtração
d
i
visão
e ad
i
ção
adição
e mul
t
iplicação
b
ran
co
outr
os
n
º
d
e
r
e
s
p
o
s
t
a
s
GRÁFICO 6.4 – Com qual operação o professor relaciona o conceito de fração
Mesmo reconhecendo que o maior número de respostas dadas foi a
operação de divisão, consideramos este um valor muito baixo em relação ao total
de professores, ou seja, apenas 35% responderam divisão.
Solicitamos, em entrevista, a uma das professoras (P 31), que havia
respondido que o conceito de fração relacionava-se com as “4 operações
básicas”, para explicar melhor sua resposta. Sua argumentação, além de ser
confusa, apresentou erros conceituais:
QUANDO SE FALA EM FRAÇÃO, VOCÊ ESTÁ DIVIDINDO QUE É O MESMO QUE
SUBTRAINDO
, VEJA SE VOCÊ CONSEGUE ENTENDER. O ALUNO QUANDO SUBTRAI,
MENTALMENTE TEM QUE OPERAR A ADIÇÃO E A MULTIPLICAÇÃO.
Tentamos obter mais precisão em sua resposta, mas a professora fez um
gesto para que desligássemos o gravador e pediu desculpas, afirmando que não
sabia explicar melhor.
154
A resposta dada pela professora nos fez refletir sobre sua própria
dificuldade em lidar com frações, não sabendo ao certo o seu verdadeiro
significado.
O resultado obtido no gráfico 6.4 apontou ainda, que o conceito de fração
está longe de ser claro para a maioria dos professores de nossa pesquisa.
Ao perguntarmos aos professores em que série eles achavam ideal
introduzirem o conceito de fração, a tabela 6.6 apontou que a maioria, 31 dos 51
professores, propõe que o conceito deve ser introduzido no 1º ciclo do Ensino
Fundamental.
Escolha das séries
1ª série 2ª série 3ª série
4ª série
Branco
Quantidade de
Professores
17 de 51
33,3%
14 de 51
27,5%
16 de 51
31,4%
2 de 51
3,9%
2 de 51
3,9%
TABELA 6.6: Distribuição dos professores de acordo com suas crenças em relação a introdução
do ensino de fração.
Apesar do 1º ciclo ser expressivamente mais indicado do que o 2º,
percebemos que professores estiveram um pouco divididos entre as 1ª, 2ª e 3ª
séries, embora tenha ficado claro que introduzir fração na 4
a
série, definitivamente
não é a melhor escolha.
Se por um lado há professores que acham que o conceito de fração é
muito abstrato para as crianças, por outro, há um número ainda maior que
acredita que o conceito deve ser introduzido nas primeiras séries do Ensino
Fundamental.
Essa crença vai ao encontro das idéias de Vergnaud (1993), quando este
afirma que a construção de um conceito matemático não se dá de maneira
imediata, mas sim que se forma ao longo do tempo.
155
6.4 ANÁLISE DAS CONCEPÇÕES DOS PROFESSORES
Nesta seção, que analisa a Parte C do instrumento, pretendemos identificar
as concepções dos professores com relação à fração.
As concepções, segundo Vergnaud (1987), podem ser traçadas pelas
expressões verbais ou simbólicas do aluno e segundo Rico et al. (2002) são estas
estreitamente ligadas com a prática.
Para se investigar essas concepções com relação à fração, solicitamos que
cada professor elaborasse três situações-problema que envolvessem esse
conceito, as quais eles considerassem adequadas para trabalharem com seus
alunos. Sendo assim, poderíamos ter 153 problemas elaborados, uma vez que
nossa amostra era formada por 51 professores.
No entanto, o número de situações-problema elaboradas foi muito baixo
(27) e dessas, cinco foram descartados por serem incompreensíveis, ou seja, não
forneciam dados suficientes para resolução. Para efeito da análise, decidimos
então classificar, além das situações elaboradas compreensíveis (22) também as
situações indicadas (29) em três diferentes enfoques: (6.4.1) os cinco diferentes
significados da fração, (6.4.2) as variáveis de quantidade e representação e
(6.4.3) os invariantes do conceito.
O diagrama abaixo mostra as categorias que desenvolvemos para se
classificar as situações-problema criadas pelos professores:
156
No primeiro momento, classificamos as situações como elaboradas (27) e
não elaboradas (29). Em seguida as questões elaboradas foram divididas em
situações compreensíveis (22), aquelas que mesmo apresentando falhas
7
na
elaboração foi possível compreendê-las e as situações incompreensíveis (5),
aquelas que não forneciam dados suficientes para resolução. Um exemplo de
situação incompreensível pode ser vista no problema abaixo (figura 6.1), o qual foi
criado por uma professora do G
2
, com 14 anos de experiência na docência nas
séries iniciais do Ensino Fundamental e com formação nos cursos de Magistério e
Pedagogia.
153
p
ossíveis situa
ç
ões-
p
roblema
126
situações não elaboradas
27
situações elaboradas
51
Classificação nos
três enfo
q
ues
29
indicam uma situa
ç
ão
97
não indicam situa
ç
ão
38
em branco
27
indicam
algum material
pedagógico
32
indicam
trabalhar com
o “concreto”
5
incompreensíveis
22
compreensíveis
FIGURA 6.1: Exemplo de uma situação incompreensível
As cinco situações consideradas incompreensíveis foram descartadas e
procedemos a análise com as situações compreensíveis.
As situações consideradas como não elaboradas (126) também foram
subdivididas em mais dois grupos:
7
Quando dizemos “falhas” nos referimos a falta de rigor ou clareza no enunciado.
157
- as que indicavam uma situação a ser trabalhada (29 situações)
FIGURA 6.2: Exemplo de uma situação indicada
Este tipo de material foi indicado por uma professora do G
1
, com 9 anos de
experiência na docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental e com
formação nos cursos de Magistério, Pedagogia e Letras.
- as que não indicavam situação (97 indicações)
Essa última foi dividida em mais três grupos:
- as que indicavam algum material pedagógico para trabalhar com o conceito de
fração (27 indicações)
FIGURA 6.3: Exemplo de uma situação que indica um tipo de material didático
Este tipo de material foi indicado por uma professora do G
1
, com 34 anos de
experiência na docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental e com
formação nos cursos de Magistério, Pedagogia e Estudos Sociais.
-as que indicavam em trabalhar com o concreto, sem nada especificar (32
indicações)
158
FIGURA 6.4: Exemplo de uma situação que indicou trabalhar com o concreto sem nada
especificar
Este tipo de material foi indicado por uma professora do G
2
, com 6 anos de
experiência na docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental e com
formação no curso de Pedagogia.
- as questões em branco (38)
Como dito no início dessa seção, tanto as situações elaboradas
compreensíveis como aquelas que apenas indicaram uma situação foram
classificadas em três enfoques: (6.4.1) os cinco significados da fração - parte-
todo, quociente, operador multiplicativo, medida e número-, (6.4.2) as variáveis
quantidades contínuas e discretas e representação icônica ou não e (6.4.3) os
invariantes do conceito ordem e equivalência.
Para a análise desses três enfoques, consideramos importante manter os
grupos G
1
e G
2
a fim de fazermos comparações com os dados obtidos pelos
professores que no momento da pesquisa estavam ensinando fração e os que
não estavam.
Os materiais pedagógicos indicados serão categorizados e apresentados
somente a título de ilustração. A seguir iniciaremos a análise da concepção dos
professores abordando os três diferentes enfoques.
159
6.4.1 Classificação das situações quanto aos cinco significados da fração
O primeiro enfoque trata da classificação das situações elaboradas e
indicadas em relação aos diferentes significados da fração. Para iniciarmos tal
análise cabe retomarmos esses significados, que são cinco: parte-todo (PT),
quociente (QO), operador multiplicativo (OM), medida (ME) e número (Nº).
Com o intuito de validar a classificação das situações-problema criadas
8
pelos professores dentro dos cinco significados da fração, convidamos quatro
mestres em Educação Matemática e um em doutoramento, também na mesma
área, os quais realizaram pesquisas envolvendo o conceito de fração. A situação
seria classificada com um determinado significado, se tivesse a concordância de
pelo menos três dos cinco pesquisadores.
Os gráficos abaixo apresentam essa classificação quanto às situações
elaboradas compreensíveis (gráfico 6.5) e as situações indicadas (gráfico 6.6)
distribuídas de acordo com os dois grupos de professores:
GRÁFICO 6.5 - situações cridas por grupo e significado GRÁFICO 6.6situações criadas por grupo e significado
8
Situações criadas serão entendidas como a junção das situações elaboradas compreensíveis e as situações
indicadas
160
Decidimos apresentar esses gráficos separadamente pois os problemas
elaborados, que expressavam claramente o sentido dado pelo professor, foram
classificados facilmente pelo grupo de pesquisadores de fração. Já os problemas
indicados não apresentavam com transparência o significado utilizado, sendo
classificados apenas por indícios apresentados em seus enunciados.
Comparando os gráficos 6.5 e 6.6 é possível perceber que não houve
diferença significativa entre a quantidade de problemas apresentados pelo G
1
e
pelo G
2
, ou seja, os dois grupos elaboraram 11 questões cada um (gráfico 6.5) e
nas situações indicadas (gráfico 6.6) tivemos 13 indicações do G
1
e 16 do G
2.
Analisando o gráfico 6.5, que trata das 21 situações elaboradas
9
pelos
professores, percebemos uma forte tendência do G
1
em traduzir o conceito
utilizando o significado parte-todo. Como este grupo não estava trabalhando com
o conceito de fração no momento da coleta de dados, podemos inferir, assim
como Silva (1997), que a concepção do significado parte-todo é a referência que
eles têm de seu aprendizado com fração. Nesse mesmo sentido, Santos (2005,
p.140) afirma que “é provável que a concepção do professor, sobre o conceito de
fração, está bem próxima daquela construída, como aluno da Educação Básica”.
Essas inferências estão diretamente relacionadas com as idéias defendidas por
Nóvoa (2001) que a formação é um ciclo que abrange várias fases da vida
(quando aluno da escola básica e graduação, primeiros anos da profissão e
titular).
Já os professores do G2, ainda no gráfico 6.5, elaboraram as situações
com uma predominância do significado operador multiplicativo, sendo estes, na
9
As situações elaboradas compreensíveis serão denominadas, a partir deste trecho, somente como situações
elaboradas.
161
maioria das vezes, tido no contexto algoritmo. Esse resultado nos surpreendeu,
pois as recomendações do PCN para os ciclos iniciais sugerem que o ensino de
frações aborde os significados parte-todo, quociente e razão, sendo o significado
operador multiplicativo sugerido apenas para os ciclos posteriores.
Apesar dos resultados obtidos não estarem em consonância com as
recomendações do PCN, esses se assemelharam com os encontrados por
Santos (2005) e aos resultados obtidos na análise dos livros didáticos.
Com relação aos problemas indicados, gráfico 6.6, vale ressaltar que foram
29 situações indicadas, mais do que os problemas elaborados, o que nos levou a
pensar se estes professores tiveram receio de se expor ou simplesmente optaram
pela indicação. Não podemos afirmar nada com relação a atitude desses
professores frente a situações indicadas.
Diferentemente do gráfico 6.5, é possível notar a predominância do
significado quociente (51,7%), enquanto o significado operador multiplicativo tem
uma diminuição expressiva resultando em um baixo número de questões
indicadas (6,9%).
É possível notar ainda que nas situações indicadas (gráfico 6.6) o G
1
mantém a criação predominante de problemas envolvendo o significado usual
parte-todo, enquanto o G
2
migra para o quociente. De fato, o quociente ganha
uma quantidade bem maior de questões.
Esse resultado nos faz refletir sobre as idéias de Kerslake (1986), Nunes e
Bryant (1997), Bezerra (2001), Escolano e Gairín (2005), os quais defendem a
idéia de que a introdução do ensino de frações a partir do significado quociente
pode proporcionar um melhor entendimento desse conteúdo. Kieren (1988), em
seus estudos com números racionais, sugere que as frações são produzidas por
162
divisões. Assim podem ter sido as concepções dos professores do G
2
ao
indicarem
um número alto de questões com esse significado.
Lima (1996) relata que as professoras que participaram de sua pesquisa
não relacionavam o conceito de fração com o dia-a-dia, pois não elaboraram
nenhum problema nesse sentido. Em nossa pesquisa, nas questões elaboradas,
tivemos um resultado próximo do encontrado por Lima (ibid), mas nas situações
indicadas, o resultado foi de encontro ao apresentado pela autora, ou seja, as
situações indicavam procedimentos adotados no dia-a-dia.
Pudemos destacar os seguintes pontos das situações criadas:
- quando a situação é elaborada, ela está muito próxima dos problemas
encontrados nos livros didáticos e não necessariamente retratam o cotidiano das
pessoas. A situação criada por uma professora do G
2
, com 34 anos de
experiência na docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental e com
formação nos cursos de Magistério, Pedagogia e Estudos Sociais, ilustra as
situações elaboradas:
FIGURA 6.5: Exemplo de uma situação elaborada compreensível
-
quando as situações que foram apenas indicadas, inferimos que o
professor se expressou “mais livremente” usando, na maioria das vezes,
situações práticas do dia-a-dia. O exemplo da figura 6.6, criado por uma
professora do G
1
, com 17 anos de experiência na docência nas séries iniciais do
163
Ensino Fundamental e com formação nos cursos de Magistério e Psicopedagogia,
ilustra duas indicações de situações:
FIGURA 6.6: Exemplo de duas situações indicadas
O significado medida não foi empregado em nenhuma situação criada
pelos professores. O significado número só não passou despercebido porque uma
professora (P 31) indicou uma situação com números decimais - 0,1; 0,01 e
0,001. Durante a entrevista perguntamos a esta professora como ela propunha
trabalhar com os decimais.
EU TRABALHO MUITO COM O MATERIAL DOURADO PARA ENSINAR A FRAÇÃO
DECIMAL
... PEGO UM QUADRADO FORMADO POR VÁRIOS OUTROS MENORES E
DIGO
: ESTE REPRESENTA 1 QUADRADINHO DESSES 10 E POSSO INDICAR COMO
0,1. ESSE OUTRO REPRESENTA 1 DE 100 E POSSO INDICAR COMO 0,01.
Nesse caso é provável que a professora tenha estabelecido as frações
10
1
e
100
1
para exemplificar tal trabalho com os decimais. Este procedimento
pedagógico é interessante desde que não seja restrito, pois até mesmo no relato
desta professora não ficou claro se a mesma tem o entendimento da fração como
um número que pode ser representado na forma decimal ou se apenas utiliza um
método de transformação.
Para finalizar esta seção, consideramos os resultados gerais apresentados
nos gráficos 6.5 e 6.6 e as entrevistas das professoras, chegando a algumas
conjecturas:
164
- ao solicitar que os professores elaborassem situações, percebemos que
eles procuraram ser fiéis às questões apresentadas nos manuais didáticos,
explorando o significado parte-todo (G
1
) e o operador multiplicativo (G
2
);
- quando o professor apenas indica uma situação, ele se desprende, em
grande parte, do material de apoio e acaba sendo “mais espontâneo” na sua
citação. O significado quociente se destaca para o G
2
e é apontado em grande
parte nas situações do dia-a-dia.
Feita a análise das concepções dos professores quanto ao conceito de
fração e seus diferentes significados passaremos a apresentar os resultados
quanto as variáveis de quantidade e representação.
6.4.2 Classificação das situações quanto as variáveis.
Esse segundo enfoque trata da análise das situações criadas pelos
professores sob a utilização das quantidades contínuas e discretas e a presença
ou ausência de ícones.
Essas variáveis podem ser reconhecidas quando empregadas junto aos
diferentes significados da fração, com exceção do significado número que admite
apenas a quantidade contínua conforme descrito no Capítulo V da metodologia.
As tabelas 6.7 e 6.8 apresentam a distribuição das variáveis em relação aos
grupos de professores.
165
TABELA 6.7:
situações elaboradas TABELA 6.8: situações indicadas
Os dois grupos de professores tiveram o mesmo comportamento nas
situações elaboradas (tabela 6.7) e nas indicadas (tabela 6.8). O G
1
se restringe
às situações no contínuo sem o auxilio de ícones, enquanto o G
2
varia em relação
às quantidades contínuas e discretas, mas não se utiliza, na maioria, de ícones
para representar tais questões.
O problema ilustrado na figura 6.7 é um exemplo típico dos problemas
elaborados pelos professores do G
1
, os quais predominaram a quantidade
contínua, geralmente se referindo a “pizza” ou “chocolate” e sem a presença de
ícone.
Variáveis
Grupos
CÑI CI DÑI DI Tota
l
G1 13
0 0 0 13
G2 8
1
6
0 15
Total
21 1 6 0 28
Variáveis
Grupos
CÑI CI DÑI DI Tota
l
G1 11
0 0 0 11
G2 5
2
5
0 12
Total
16 2 5 0 23
CI – contínua icônica CÑI - contínua não icônica
DI – discreta icônica DÑI - discreta não icônica
FIGURA 6.7: Exemplo típico das situações elaboradas pelos professores do G
1
Essa situação foi elaborada por uma professora do G
1
, com 17 anos de
experiência na docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental e com
formação nos cursos de Magistério e Pedagogia.
Vale ressaltar a falta de rigor e clareza que encontramos em muitas das
situações consideradas elaboradas, tanto no G
1
quanto no G
2
. Nessa ilustração,
166
por exemplo, a professora (P 20) não teve a preocupação de explicitar que
gostaria de saber quanto do chocolate sobrou, explicitado em forma de fração.
Essas “falhas” foram comuns nas situações elaboradas.
Ainda no que diz respeito às situações criadas pelo G
1
, se juntarmos as
informações obtidas nos gráficos 6.5 e 6.6 referentes aos problemas elaborados e
os indicados, temos 16 situações envolvendo o significado parte-todo, ou seja,
3
2
das situações criadas por esses professores. Nesse caso, podemos caracterizar
que a concepção dos professores do G
1
é restrita, voltadas para as situações de
parte-todo, com quantidade contínuas não icônicas.
Já os professores do G
2
, talvez por estarem trabalhando com o conteúdo de
fração naquele momento, mobilizaram diferentes variáveis e contextos em seus
problemas. Estes não se limitaram à “pizza” ou ao “chocolate” como o G
1
. Eles
foram um pouco mais adiante, elaborando em contextos, por exemplo, de
pessoas, frutas, dinheiro como mostra a ilustração 6.8:
FIGURA 6.8: Exemplo que caracteriza as situações elaboradas pelos professores do G
2
A situação acima foi elaborada por uma professora do G
2
, com 25 anos de
experiência na docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental e com
formação nos cursos de Magistério, Psicopedagogia e Letras.
Os problemas elaborados pelos professores do G
2
tenderam à
representação sem o auxílio de ícones e a quantidade contínua se destacou um
pouco mais em relação à quantidade discreta.
167
Retomando os dados obtidos nos gráficos 6.5 e 6.6 e nas tabelas 6.7 e 6.8,
pudemos caracterizar a concepção do professor do G
2
voltada para os
significados quociente e operador multiplicativo, sem representação icônica e com
preferência para a quantidade contínua.
Parece-nos que o fato dos professores estarem ensinando fração, pode
fazer com que estes tenham uma visão mais ampla de como ensinar esse
conteúdo. Esse fato nos faz pensar sobre o conhecimento profissional
(Ponte,1998), o qual carrega em seu bojo crenças, concepções e mitos do
professor e que podem, esses, serem percebidos em sua atuação profissional.
Diferentemente, Ponte (ibid) apresenta a competência profissional, a qual se
caracteriza pelo saber resolver e nesse momento uma questão nos surge: O
grupo dos professores do G
2,
que nos pareceu ter o conhecimento profissional
(saber ensinar) mais significativo do que o G
1
, terá
a
mesma vantagem na
competência profissional (saber resolver)? Após apresentarmos os resultados
obtidos na parte de competência retomaremos essa questão a fim de respondê-la.
Para finalizar a análise das variáveis de quantidade, temos Escolano e Garin
(2005) que destacam a importância em trabalhar com diferentes modelos de
situações envolvendo fração e dá uma atenção especial a quantidade discreta,
afirmando que esta fornece novas perspectivas ao significado da fração, por ser
um conhecimento útil e por sua ampla presença no mundo real.
168
6.4.
3 Classificação das situações quanto aos invariantes
Este terceiro enfoque aborda a utilização dos invariantes do conceito de
fração nas diferentes situações criadas pelos professores. Esses invariantes,
segundo Nunes et al. (2003), são: equivalência
,...
9
3
,
6
2
,
3
1
e ordem
>> ,...
5
1
4
1
3
1
.
Considerados como noções centrais do entendimento do conceito de
fração, esses invariantes foram pouco abordados pelos professores em seus
problemas criados, assim como mostra a tabela 6.9:
Invariantes
Grupos
Ordem Equivalência Total
G1
2 2 4
G2
2 3 5
Total
4 5 9
TABELA 6.9: Distribuição dos invariantes nos grupos de professores
Como é possível visualizar na tabela 6.9 acima, os problemas criados com
os invariantes ordem e equivalência representam 17,6% do total de situações.
Não há, praticamente, diferença entre a quantidade de problemas criados pelos
grupos de professores e nem entre os invariantes da fração.
Nesse caso, a análise quanto aos invariantes, diferentemente dos
resultados obtidos na análise dos significados e das variáveis, os grupos G
1
e G
2
apresentam resultados bem próximos.
Parece-nos que do ponto de vista pedagógico, os professores do G
2
avançam (diferentes situações e representações) mas do ponto de vista
matemático (invariante do conceito) não.
169
Retomando as idéias de Vergnaud (2001), que para a aquisição de um
conceito é necessário reconhecer a terna S, I, R, e a qual Nunes (2003) se utiliza
para exemplificar a construção do conceito fração, tanto para o G1 quanto para o
G2 esta terna não se encontrou estável. O G
1
se mostrou restrito nos três
enfoques (na terna) enquanto o G
2
foi um pouco mais presente no conjunto de
situações e representações, mas mesmo assim não obteve um equilíbrio no tripé.
As cinco questões que envolveram o invariante equivalência foram utilizadas
as frações equivalentes a
2
1
, sendo elas representadas na maioria das vezes
como
4
2
.
Esse percentual da utilização dos invariantes do conceito nas situações
criadas pelos professores se assemelhou com o que observamos nas coleções
dos livros didáticos. Consideramos baixo, a presença desses invariantes, uma vez
que são as noções centrais do conteúdo de fração.
6.4.4 Material didático
Conforme indicado no final da seção 6.4 descreveremos resumidamente os
materiais indicados pelos professores, uma vez que não é o foco desta pesquisa.
Ao solicitarmos aos professores que elaborassem três situações-problema
que considerassem “boas” para trabalharem com seus alunos o conceito de
fração, obtivemos 27 indicações de materiais didáticos, conforme mostra a tabela
6.10:
170
Materiais
Dominó de
frações
Dobradura
Material
dourado
Figuras
geométricas
Receitas
Quantidade de
Professores
2 de 27
7,4%
3 de 27
11,1%
2 de 27
7,4%
11 de 27
40,7%
9 de 27
33,3%
TABELA 6.10 – Categorias dos materiais indicados
O material mais indicado é o uso de figuras geométricas. Supomos que
esta indicação está implicitamente ligada a situações que envolvem o significado
parte-todo em quantidade contínua, representada por um ícone, que
provavelmente são trabalhadas sem um contexto.
Durante a entrevista, perguntamos a P 45 o que ela quis dizer com a
indicação “figuras geométricas” e a explicação foi a seguinte:
ESSAS FIGURAS GEOMÉTRICAS PODEM SER REPRESENTADAS, POR EXEMPLO, PELOS
DISCOS FRACIONÁRIOS
. É UM MATERIAL DE MADEIRA QUE PARECE UMA PIZZA E É DIVIDIDO
EM VÁRIAS PARTES
. VOCÊ PODE TRABALHAR EM FRACIONAR O INTEIRO, POR EXEMPLO,
SOLICITANDO AO ALUNO QUE PEGUE PARTE POR PARTE E AO SOMAR ELE IRÁ PERCEBER
QUE RESULTA NO TODO
“1””.
Em fim, as situações que indicaram um tipo de material pedagógico (27
indicações) e as que indicaram trabalhar com material concreto, sem nada
explicitar (32 indicações), tem vistas em facilitar as comparações perceptuais dos
alunos. São indicações importantes, mas apenas “visuais” que quando
trabalhadas isoladas ou sem uma extensão são desprezíveis, insuficientes tanto
para o ensino tanto quanto para a aprendizagem.
6.5 ANÁLISE DA COMPETÊNCIA DOS PROFESSORES
Para analisar a competência dos professores, elaboramos um instrumento
formado por 18 questões. Este envolveu (1) os diferentes significados da fração
(parte-todo, quociente, medida, operador multiplicativo e número), (2) as variáveis
171
quantidade (contínua e discreta) e forma de representação (icônica e não icônica)
e (3) os invariantes do conceito de fração (ordem e equivalência). Esses três
critérios utilizados para a elaboração do instrumento foram os mesmos utilizados
na análise das concepções dos professores e os mesmos a serem considerados
na análise das competências.
Antes de iniciarmos a análise por enfoque, cabe apresentarmos aqui uma
visão geral da competência dos professores frente aos problemas propostos:
Grupos Total de acertos % de acertos
G1
188 de 468 40,2%
G2
213 de 450 47,3%
TABELA 6.11: Total e percentual de acertos do s grupos G
1
e G
2
Analisando o índice total de acertos dos professores do G
1
e G
2
na tabela
6.11, temos que a média de acertos foi de 43,7%, o que indica um baixo
desempenho desses profissionais. Consideramos baixo o índice, visto que 88,2%
dos professores já ensinaram fração em algum momento de sua vida docente.
Cabe salientar que os problemas contidos no questionário eram problemas
simples adequados para esse universo de pesquisa.
Comparando o índice de acertos entre os grupos G
1
e G
2
, a tabela 6.11 nos
mostra uma diferença de 7,1 pontos percentuais a favor do G
2
. Consideramos
esses resultados próximos e proporcionais, visto que o melhor desempenho
47,3%, se reporta ao G
2
, grupo de professores que estavam trabalhando com a
fração.
Tendo exposto uma visão geral do desempenho dos professores frente às
situações propostas, passaremos nas próximas seções a expor a análise dos
resultados de acordo com os três enfoques descritos anteriormente, ou seja, cinco
172
significados da fração (PT, QO, ME, OM, Nº), quantidade (contínua e discreta) e a
representação (icônica ou não) e os invariantes do conceito (ordem e
equivalência)
Durante essas análises e considerando alto o número de erros obtidos
nessa parte do instrumento, procuraremos identificar algumas estratégias
utilizadas pelos professores as quais levaram ao erro. Identificadas algumas
dessas estratégias de resolução, serão criadas o que denominamos de categorias
de análise.
6.5.1 Desempenho dos professores quanto aos cinco significados da
fração.
Assim como na seção 6.4.1, o enfoque desta seção diz respeito aos cinco
diferentes significados da fração propostos por Nunes et al. (2003). Na seção
citada, analisamos a concepção dos professores frente às situações criadas e
neste momento analisaremos a competência desses mesmos professores frente à
resolução de problemas.
A distribuição dos significados se deu conforme apresenta o quadro 6.1:
S
I
G
NIFI
C
AD
OS
QU
E
S
T
Õ
E
S
Parte
-
todo 1; 6; 11 e 16
Q
uociente 2
;
12
;
15 e 17
Medida 3
;
8
;
13 e 18
O
p
erador multi
p
licativo 4
;
7
;
9 e 14
Número 5 e 10
QUADRO 6.1: Distribuição das questões por significados
173
Assim como na análise da concepção, iremos manter a distribuição dos
grupos – G
1
e G
2
- a fim de diagnosticar possíveis relações entre os mesmos e os
resultados encontrados.
Sendo assim, o quadro 6.2 apresenta os resultados da distribuição dos
índices de acertos dos significados em relação aos grupos:
GRAFICO 6.7: Comparação do desempenho dos grupos frente aos diferentes
significados da fração
Analisando o gráfico 6.7 é possível perceber uma pequena e constante
diferença entre o desempenho dos grupos e os cinco significados da fração. O G
2
permanece, em média, 6,4 pontos percentuais na frente do G
1
.
Notamos que o percentual de acertos referente ao significado parte-todo se
destaca dos demais significados em ambos os grupos. Esse percentual é
resultado de quatro questões (1; 6; 11 e 16), subdivididas em nove itens.
O G
1,
que apresentou a concepção fortemente ligada ao parte-todo, teve o
melhor índice de acerto nesse mesmo significado, o que nos mostrou coerência.
PT QO OM ME
%
acertos do G
1
68,3 27,9 39,4 36,5 17,3
%
acertos do G
2
76,0 32,0 49,0 45,0 22,0
Total 72,0 29,9 44,1 40,7 19,6
Competência dos grupos G1 e G2
0
20
40
60
80
100
Parte-todo Quociente Medida Operador
multiplicativo
mero
significados
% de acertos
G1
G2
174
Podemos deduzir, assim, como foi descrito na análise da concepção que este
significado está intrínseco no conhecimento desse grupo de professores.
Segundo Tardif (2002) o professor interioriza ao longo de sua vida conhecimento,
competências que são reutilizados de maneira não reflexiva, mas com grande
convicção.
Com relação ao G
2,
parece existir uma dissonância entre a concepção e
competências desses professores. Quanto à competência, o significado parte-
todo que teve maior índice de acertos, pode estar intrínseco no conhecimento
dos mesmos, assim como descrito para o G
1.
Quanto à concepção no significado
operador multiplicativo, observado nas questões elaboradas, este pode estar
ligado à grande quantidade de problemas envolvendo esse significado nos livros
didáticos. Já o índice alto de situações indicadas como quociente pode ter
ocorrido, uma vez que ao classificarmos as indicações, não era necessariamente
aquele significado que o professor estava dando para a questão. A situação
indicada por uma professora do G
2
que tinha 21 anos de experiência
nas séries
do
Ensino Fundamental, ilustra a conjectura:
FIGURA 6.9: Exemplo de uma situação indicada por uma professora do G
2
Nesse caso temos duas variáveis (pizza e criança) e a operação de divisão
explícita. Sendo assim classificamos como quociente, conforme definido no
Capítulo II. Embora a situação remeta ao significado quociente, a professora ao
indicar pode ter dado outro significado, o qual permitiria ser interpretado, por
175
exemplo, no significado parte-todo: “uma pizza dividida em dezesseis partes
iguais para serem distribuídos entre oito crianças. Quantos pedaços cada criança
receberá?”.
Enfim, o significado é pessoal e ao interpretarmos uma questão não
significa que esta tenha sido construída com esse mesmo significado. Sendo
assim, temos apenas indícios na interpretação das questões indicadas, o que as
diferencia das questões elaboradas.
O significado quociente que foi o segundo mais indicado nas situações
criadas teve um desempenho muito baixo. Mais uma vez a conjectura apontada
acima pode ser verdadeira. Ainda neste significado, os pontos mais críticos se
concentraram nas questões icônicas, em especial, a que envolveu quantidade
discreta exigindo como resposta uma fração imprópria (questões 15). Essa
mesma dificuldade foi apontada por Rodrigues (2005), em sua pesquisa com
alunos de Ensino Fundamental, Médio e Superior.
Quanto ao desempenho nos significados operador multiplicativo e medida,
esses foram bem próximos. Esse é um outro resultado interessante, visto que nas
situações criadas pelos professores não tivemos uma indicação se quer do
significado medida.
O significado número foi o que apresentou menor índice de acertos. Nas
questões criadas esse significado apareceu em apenas uma indicação. Sendo
assim, inferimos que esses professores não entendem a fração como número.
Por fim, podemos afirmar que a competência dos professores, tanto do G
1
quanto do G
2
, está intimamente ligada ao significado parte-todo e que esses estão
longe de alcançarem uma homogeneidade entre os significados da fração.
176
6.5.2 Desempenho dos professores quanto as variáveis
As variáveis, quantidade contínua e discreta e a representação icônica ou
não icônica, foram um dos critérios escolhidos para a elaboração dos 18
problemas que contemplaram o instrumento diagnóstico. Cada um dos cinco
significados da fração, com exceção o significado número, que não apresenta
situação no contexto discreto, foram criados abordando as duas variáveis de
quantidade e as duas de representação, conforme apresenta o quadro 6.2 abaixo:
VARIÁVEI
S
QU
E
S
T
Õ
E
S
Contínua icônica 1; 5; 9; 13 e 17
Contínua não icônica 2
;
6
;
10
;
14 e 18
Discreta icônica 3
;
7
;
11 e 15
Discreta não icônica 4
;
8
;
12 e 16
QUADRO 6.2: Distribuição das questões em relação as variáveis
Na seção anterior, onde analisamos o desempenho dos professores frente
aos cinco significados da fração observamos uma diferença significativa nos
percentuais de acertos entre os significados.
Para este enfoque, questionamos se as variáveis também poderiam
influenciar no desempenho dos professores. Para facilitar a compreensão dessa
análise, decidimos apresentar separadamente o percentual de acertos nas
diferentes variáveis consideradas, conforme apresenta a tabela 6.12:
177
Tabela 6.12: Percentual de acertos entre as variáveis
Os dados da tabela 6.12 apresentam uma diferença de 8,7 pontos
percentuais favoráveis à quantidade discreta em comparação à quantidade
contínua. Este resultado nos surpreendeu uma vez que na elaboração de
situações problemas o número de questões criadas, utilizando quantidade
discreta (12 situações), foi bem inferior às criadas com a quantidade contínua (39
situações).
Piaget citado por Nunes et al. (2005) salienta que as crianças apresentam
mais dificuldade nas quantidades contínuas do que nas discretas e o mesmo
acontece com o desempenho dos professores que participaram dessa pesquisa.
Um questionamento que se pode fazer é até que ponto coincide as
concepções e competências de aluno e professores? Não pretendemos
responder tal pergunta, mas inferimos que tal questionamento é relevante e
interessante para futuras pesquisas.
Quanto à presença de ícones, estes não mostraram um fator facilitador nas
questões, visto que o melhor desempenho se deu nas questões não icônicas.
Nesse caso conjeturamos que não é o uso de figuras nas questões ou até mesmo
o uso de material concreto que influenciará no bom desempenho ou
entendimento, mas sim, o significado da situação e as reflexões que elas
ocasionaram.
Variáveis
Grupos
C D I ÑI
G1
35,4% 46,2% 39,3% 41,0%
G2
44,4% 51,0% 46,7% 48,8%
Total
39,9% 48,6% 43,0% 44,9%
C – contínua I - icônica
D – discreta ÑI - não icônica
178
A tabela 6.13 apresenta a visão geral do desempenho dos professores em
relação as variáveis e os significados:
PT QO ME OM
I NI I NI I NI I NI I NI
D 23
22 2 9 18 8 8 6 - -
G
1
C
9
17
6 12 11 4 12 12 3 6
D 23
21 2 13 20 9 8 6 - -
G
2
C
12
20
5 12 17 3 15 16 3 8
TABELA 6.13: Comparação entre o desempenhos dos professores do G1 e G2 com relação aos
significados e variáveis
Cabe relembrar que cada uma das células referente ao G
1
poderia atingir
26 respostas corretas e nas células referente ao G
2
, 25.
Observando a tabela 6.13 é possível perceber que os dois grupos de
professores têm o mesmo comportamento em relação aos significados da fração,
às quantidades e representações.
O significado parte-todo foi o que apresentou maior número de acertos em
relação às variáveis de quantidade e representação.
6.5.3 Desempenho quanto aos invariantes
Nesta seção iremos analisar os invariantes do conceito de fração. Segundo
Vergnaud (1993) um conceito deve ser visto como a composição de uma terna
(S,I,R) em que o segundo componente “I” indica os invariantes. Nunes et al.
(2003) lança mão desta mesma terna para discutir o conceito de fração, cujos
invariantes desse conceito são: ordem e equivalência.
O quadro 6.3 mostra as questões que fizeram parte do instrumento e que
abordaram tais invariantes:
179
INVARIANTE
S
QU
E
S
T
Õ
E
S
Ordem 4 e 5
E
q
uivalência 1.2
,
2
,
7 e 13
QUADRO 6.3: Distribuição das questões em relação aos invariantes
Tivemos o cuidado de distribuir esses invariantes de tal modo que
aparecessem nas questões que abordaram os cinco diferentes significados e as
variáveis de quantidade e representação. Essa escolha se deu, pois não
queríamos que possíveis dificuldades apresentadas na resolução com os
invariantes; influenciassem nos resultados dos demais enfoques.
Assim sendo, a questão 1.2 abordava o significado parte-todo com
quantidade contínua icônica; a questão 2 o significado quociente com quantidade
discreta icônica; as questões 4 e 7 o significado operador multiplicativo com
quantidades discretas icônica e não icônica; a 5 o significado número com
quantidade contínua icônico e por último a questão 13 no significado medida com
quantidade contínua icônica. Decidimos deixar essas questões com mais
representações icônicas, pois pensamos que esses invariantes poderiam ser
fatores de “complexidade” e nesse caso a presença do ícone seria um
“facilitador”.
A porcentagem de resultados obtidos nas 6 questões foram:
Invariantes
Grupos
Ordem Equivalência Total
G1
9 de 52
17,3%
33 de 104
31,7%
42 de 156
26,9%
G2
9 de 50
18,0%
46 de 100
46,0%
55 de 150
36,7%
TABELA 6.14 – Percentual de acertos envolvendo os invariantes do conceito
180
Com base nos dados da tabela 6.14, podemos afirmar que o percentual de
acerto, no geral, foi muito baixo. Tanto o G
1
quanto o G
2
não atingiram 50% de
respostas corretas em nenhum dos dois invariantes.
Comparando o desempenho geral dos grupos, o G
2
apresentou melhor
desempenho nos dois invariantes. No que diz respeito ao percentual de acertos
entre os invariantes, na ordem não houve diferença entre o número de acertos do
G
1
e do G
2
, mas nas questões de equivalência o G
1
apresentou 14,3 pontos
percentuais abaixo do G
2
.
Podemos caracterizar que os professores do G
2
além
de apresentarem
melhor desempenho quanto aos invariantes, nas questões que envolveram
equivalência esse percentual de acertos se destacou.
Nas situações criadas (tabela 6.9), a concepção dos professores do G
1
e
G
2
se mostrou muito próximas em relação aos invariantes. Em relação à
competência, o G
2
se destacou apenas pelo alto índice de acerto no invariante
equivalência, pois o perfil dos grupos foi o mesmo.
6.5.4 Categorias criadas a partir das estratégias
Frente ao baixo desempenho dos professores nas resoluções das
questões, pudemos perceber que muitos erros se repetiam em diferentes
questões. Sendo assim, decidimos agrupar algumas dessas estratégias que os
levaram ao insucesso nas questões e criamos seis categorias de análise como
apresenta o quadro 6.4:
181
C
ATE
GO
RIA
S
N
O
ME DA
S
C
ATE
GO
RIA
S
C1
Desprezo da conservação da área
C2 Rela
ç
ão Parte-
p
arte
C3
Q
uociente remete
p
ara o O
p
erador multi
p
licativo
C4 Fra
ç
ão vista como dois números sobre
p
ostos
C5 Inversão do nume
r
ador com o denominado
r
C6 O
p
erador multi
p
licativo remete
p
ara o Parte-todo
QUADRO 6.4: Relação das categorias de análise
Ainda nessa seção, definiremos cada uma dessas categorias apresentando
as questões em que elas foram diagnosticadas, o total de erros os quais se
remetem às categorias bem como uma ilustração que as caracterize. Salientamos
que na análise das categorias não mais há separação dos grupos de professores.
Vale relembrar que para cada questão tínhamos no máximo 51 acertos, o
número de sujeitos envolvidos em nossa pesquisa.
Antes de exemplificarmos cada categoria, a tabela 6.15 abaixo nos mostra
uma visão geral do número de erros por categorias:
Categorias C1 C2 C3 C4 C5 C6
Nº de erros
46 37 49 17 56 43
TABELA 6.15 – Total de erros por categorias
Para melhor compreensão dos dados da tabela 6.15, vale ressaltar que
nem todos os erros foram categorizados. Categorizamos apenas os erros que
apareceram em mais de um item e os quais possibilitaram uma inferência do
porquê de tal resposta.
182
C1 – Desprezo da conservação da área
A categoria C1 está diretamente ligada ao significado Parte-todo. Neste
caso o professor deixa de lado um requisito fundamental da fração (“o todo
dividido em partes iguais”) e se utiliza do procedimento de dupla contagem. A
categoria C1 foi encontrada nos itens “c” e “e “ da questão
1:
Questões
1c 1e
Nº de erros
22 24
TABELA 6.16 - Distribuição da C1 nas questões
No caso da questão 1c, as partes não apresentavam a mesma área e
nesse caso era impossível representar uma fração que caracterizasse a figura. Já
o item “e” exigia que o professor percebesse que as partes pintadas
correspondiam ao dobro das demais partes não pintadas, ou seja, o todo não
estava explicitamente dividido.
Essa categoria pode ser ilustrada com resolução da professora P 38 do
grupo G
2
com 20 anos de experiência nas séries iniciais do Ensino Fundamental:
FIGURA 6.10: Erro classificado na categoria 1
Em ambos os itens a professora se utilizou do procedimento de dupla
contagem, ou seja, total de partes pintadas para o numerador e o total de partes
183
para o denominador, resultando nas frações
3
2
e
7
4
. Já os itens em que o todo estava
dividido em partes iguais o desempenho foi próximo do “teto”.
Esse erro também foi apontado como significativo nos trabalhos realizados
com alunos segundo os autores: Campo et al. (1995); Nunes et al. (2003); Merlini
(2005) e Moutinho (2005). Esse é mais um ponto comprovatório da conjectura que
levantamos da possível relação entre a concepção errônea do professor e do
aluno, apontada na seção 6.5.2.
C2 – Relação Parte-parte
Para essa categoria o professor despreza o todo e se remete apenas às
partes. Também cabe pensarmos sobre a utilização de razão a fim de representar
tais questões. Essa categoriaC2 foi encontrada nas seguintes questões:
Questões
3a 8 16 18
Nº de erros
2 2 3 30
TABELA 6.17 - Distribuição da C2 nas questões
As questões 3 e 8 envolviam o significado medida em quantidade discreta
sendo uma delas representada por ícone e outra não. Ainda no significado
medida, mas em quantidade contínua sem a representação de ícone, temos a
questão 18. E por fim a questão 16 que envolvia o significado parte-todo em
quantidade discreta não icônica.
A figura 6.11 ilustra a categoria C2. Essa questão foi respondida por uma
professora do grupo G
1
com 14 anos de experiência nas séries iniciais do Ensino
Fundamental:
184
FIGURA 6.11: Erro classificado na categoria 2
Das 32 respostas errôneas dadas pelos professores, 30 utilizaram à
estratégia “parte-parte” ou “razão” fornecendo a resposta
5
2
e não respondendo
exatamente à questão que solicitava uma fração em relação ao todo. A razão,
assim como explicitado no Capítulo II seção 2.2.2, se refere somente às partes
que compõem o todo, não sendo o “todo” a referência. Já a fração retrata parte de
um todo, sendo a resposta correta para a questão 18 a fração
7
2
.
Esse equívoco apareceu em outras respostas, sendo apenas uma das
questões no significado parte-todo e as demais no significado medida, assim
como apresentamos na tabela 6.17.
C3 – Quociente remete para o Operador multiplicativo
A categoria denominada C3 é exclusiva das questões cujo significado
enfocado foi o quociente em quantidade discreta. Sendo assim as questões que
apresentaram essa categoria foram:
12b
Questões
12c 15
Nº de erros
18 14 17
TABELA 6.18 - Distribuição da C3 nas questões
185
Essa categoria explicita uma situação de significado quociente em que o
referencial solicitado passa a ser o número de elementos do conjunto a ser
repartido e se solicita que o sujeito utilize, implicitamente, a idéia de quociente
para representar uma quantidade por uma fração, que sempre poderá ser
reduzida a um número natural. Essa operação, se executada como uma simples
divisão, remete ao significado quociente. Se executada como o produto de uma
fração por um número natural remete ao significado operador multiplicativo.
Um exemplo comum desse tipo de erro (C3) será ilustrado abaixo por uma
professora do G
1
com 9 anos de experiência nas séries iniciais do Ensino
Fundamental:
FIGURA 6.12: Erro classificado na categoria 3
A resposta
2
1
, dada por 43,6% dos professores que responderam
incorretamente, explica o que descrevemos acima, ou seja, esses professores
pensaram em
2
1
de 10 que resulta no número inteiro 5. Nesse caso podemos
afirmar que esses professores não têm a compreensão do que Caraça (1952)
denominou como sendo o “princípio da extensão”. Esse princípio conduz ao
entendimento de que as mesmas operações que conduzem a números racionais
podem conduzir, em casos particulares, a números naturais, caracterizando o fato
de que o conjunto dos números racionais contém o dos naturais.
186
C4 – Fração vista como dois números sobrepostos
Entendemos a categoria denominada como (C4) os casos em que o
professor vê a fração como dois números sobrepostos separados por uma vírgula.
Esse erro pode ser interpretado nas questões que envolveram o significado
número, conforme mostra a tabela 6.19:
Questões
5 10
Nº de erros
9 8
TABELA 6.19: Distribuição da C4 nas questões
O significado número, assim como descrito no capítulo V, não precisa,
necessariamente, referir-se a quantidades específicas (discretas). Sendo assim,
apenas duas questões (5 e 10) envolveram esse significado.
Uma hipótese para tal erro é que questões como essas apresentadas para o
significado número são pouco exploradas e quando trabalhadas se apresentam
em um quadro restrito de exemplos/atividades. A figura 6.13 apresenta essa
categoria estampada na questão 10, no questionário respondido por uma
professora do G
2
com 11 anos de experiência nas séries iniciais do Ensino
Fundamental:
:
FIGURA 6.13: Erro classificado na categoria 4
Esse tipo de erro nos mostra claramente que estes professores não têm o
conhecimento do número racional, na representação fracionária, como um
número que representa uma divisão. Ele trabalha com esse número sem saber o
187
seu significado, ou simplesmente considerando a fração como dois números
naturais, um sobre o outro separado por um “traço” que ele interpreta como uma
“vírgula”.
Nesse mesmo contexto podemos destacar a fala de uma professora quando
esta terminou de resolver o caderno 2 que investigava a competência dos
professores. O dialogo desta professora com a pesquisadora é ilustrado a seguir:
Professora: Como posso responder esta questão?
(nesse momento ela apontava a
questão 10 que pedia para representar as frações na forma decimal)
Investigadora: Vou te responder com outra pergunta. O que é uma fração? O
que significa uma fração?
Professora: Não sei dizer.
(e nesse momento ela se dirigiu à lousa). Se a fração
fosse
10
1
eu iria responder 0,1; se fosse
100
1
seria 0,01. Pois são essas frações
que ensinamos aos alunos.
Investigadora: Isso mesmo, está correto. Como você chegou a tais resultados?
Professora: Ensinamos assim: Depende de quantos zeros tem aqui no
denominador, você terá de casas depois da vírgula. Exemplo: a fração
10
1
tem
apenas um zero. Então escrevo zero, a vírgula e o número 1. A fração
100
1
tem
dois zeros. Coloco um zero, a vírgula, outro zero e depois o um. Dois zeros, duas
casas decimais.
Nesse momento percebemos a aplicação mecânica de um procedimento
que não representa se quer o conceito de fração. É um procedimento
descontextualizado que quando aplicado em frações decimais resulta em acerto.
188
C5 – Inversão do numerador com o denominador
Nessa categoria inferimos que o professor “entende” a situação, mas não
sabe transcrevê-la como uma fração, ou seja, não tem o entendimento do que
significa o numerador e o denominador de uma fração.
As questões que permitiram visualizar esse erro foram:
Questões
1a 6a 6b 8 12b 12c 15 16 17c
Nº de erros
1 6 6 2 13 15 6 1 6
TABELA 6.20 - Distribuição da C5 nas questões
Como mostra a tabela 6.20, essa categoria se fez presente em várias
questões, as quais contemplaram os significados parte-todo, quociente e medida.
Esse tipo de erro é muito comum entre as crianças, conforme apresentou os
resultados de Bezerra (2001), Merlini (2005) e Moutinho (2005). Mais uma vez, a
conjectura de que alunos e professores podem apresentar as mesmas
dificuldades se confirmam com esse resultado.
Dentre as várias questões que apresentou a C5, a figura 6.14 ilustra essa
categoria com a resposta de uma professora do G
2
com 11 anos de experiência
nas séries iniciais do Ensino Fundamental:
FIGURA 6.14: Erro classificado na categoria 5
189
Essa categoria muitas vezes é tida como “todo-parte” o que significa que o
sujeito representa a fração não como uma parte do todo e sim o inverso.
O alto número de respostas erradas na questão 12, faze-nos inferir na
possibilidade de além da inversão do numerador pelo denominador, os
professores terem a forte crença que o denominador tem que ser sempre maior
do que o numerador. Essa hipótese leva a concepção parte-todo, o qual o
denominador representa o total de partes e o numerador as partes “tomadas”. As
respostas corretas para essa questão seriam
9
27
e
6
24
.
Não podemos deixar de expressar certa preocupação frente a esses
resultados, visto que se trata de pessoas responsáveis pela organização das
experiências (crenças) de seus alunos e que possuem um lugar chave para
influenciar em suas concepções, Ponte (1992).
C6 – Operador multiplicativo remete para o Parte-todo
Essa categoria foi criada com a finalidade de chamar a atenção para a
influência que o significado parte-todo tem nas concepções desses professores. A
categoria C6 caracteriza-se nas questões de operador multiplicativo, uma vez que
essas apresentavam em seu enunciado frações para serem utilizadas como
ferramentas na resolução das questões. A tabela 6.21 nos mostra essas
questões:
Questões
4b 7 9 14
Nº de erros
11 12 5 6
TABELA 6.21 - Distribuição da C6 nas questões
190
As quatro questões contemplam o significado operador multiplicativo o qual
apresentou o segundo melhor desempenho. A dificuldade encontrada pelos
professores em tais questões foi o fato de não fornecermos diretamente uma
fração que pudesse ser calculada com a quantidade fornecida, ou seja, na
questão 7 quando pedimos, dentro de um contexto, para se calcular
6
3
de 8,
apenas 16 professores responderam corretamente tal questão. Essa categoria
pode ser observada na figura 6.15. Essa ilustração é parte do instrumento
respondido por um professor do grupo G
1
com 30 anos de experiência nas séries
iniciais do Ensino Fundamental:
FIGURA 6.15: Erro classificado na categoria 6
A C6 retrata, nesse caso, a resposta 3, onde acreditamos que o professor
desprezou tanto a quantidade total de ferramentas fornecidas quanto o
denominador da fração, detendo-se apenas ao numerador, que no significado
parte-todo, geralmente representa a “parte pintada de uma figura”.
Essa categoria se concretizou após o relato da professora P 13 na
entrevista. Apresentamos a essa professora uma folha com cinco questões, as
quais abordavam os cinco significados da fração e perguntamos se todas
apresentavam o mesmo grau de dificuldade ou se alguma delas poderia ser mais
difícil ou fácil de resolver. A resposta foi a seguinte:
191
A QUESTÃO 3 (VER ANEXO II),
6
3
DE 8 É IMPOSSÍVEL PARA A CRIANÇA. SE
FOSSE
8
3
DE 8, AÍ SIM DARIA, POIS NEM EU SEI RESPONDER ESTA QUESTÃO.
Foi nesse momento que criamos tal categoria, pois as mesmas também
poderiam ser categorizadas em um novo tipo de erro, ou seja, dificuldade em
visualizar frações equivalentes.
Acreditamos agora ter dado suficientes para responder nossa questão de
pesquisa, a qual será tratada no próximo capítulo, o seja, conclusão de nosso
estudo.
CAPITULO VII
CONCLUSÃO
7.1 INTRODUÇÃO
Este estudo teve por objetivo identificar e analisar as crenças, concepções e
competências dos professores que atuavam no 1º e 2º ciclos no Ensino
Fundamental, no que diz respeito ao conceito de fração.
Para alcançarmos tal objetivo, iniciamos por justificar o interesse de tal
investigação e, em seguida, apresentamos a problemática e a questão de
pesquisa (Capítulo I).
Dois pressupostos teóricos foram fundamentais para nos auxiliar no
desenvolvimento desse estudo: a Teoria dos Campos Conceituais (Vergnaud,
1990, 2001), que nos ajudou a compreendermos como se dá a formação do
conceito e a Classificação teórica de fração proposta por Nunes et al. (2003), a
qual apresenta cinco diferentes significados para esse conceito (Capítulo II).
Ainda como aporte teórico, tivemos as contribuições de Ponte (1992, 1995) e
Nóvoa (2001), os quais nos auxiliaram quando de nossa interpretação dos dados
advindos do perfil dos professores e sua relação com as crenças, concepções e
competências deles (Capítulo III).
Na seqüência, procuramos entender a fração a partir de três diferentes
perspectivas: da Ciência – sua evolução histórica e construção formal -, da Escola
– análise de três coleções de livros didáticos dos 1
o
e 2
o
ciclos do Ensino
Fundamental – e da perspectiva da Pesquisa – revisitando estudos relevantes e
correlatos ao nosso estudo (Capítulo IV).
193
Apoiando-nos nas idéias teóricas, bem como nas leituras de pesquisas
relacionadas ao nosso estudo, definimos e construímos a metodologia de nosso
estudo, a qual consistiu na elaboração e aplicação de um instrumento diagnóstico.
Tal instrumento foi formado por quatros partes e aplicado coletivamente em dois
encontros. Tivemos um público alvo de 51 professores, sendo que 26 lecionavam
no 1º ciclo e 25 no 2º ciclo do Ensino Fundamental, distribuídos em três escolas
da rede municipal da cidade de Osasco (Capítulo V).
O passo seguinte à realização do estudo foi a análise dos dados (Capítulo
VI). Esta análise nos forneceu informações suficientes para respondermos à
nossa questão de pesquisa, o que acontecerá no presente capítulo. Para tanto
apresentaremos, na próxima seção (7.2), uma síntese desses resultados, para em
seguida retomarmos a questão de pesquisa com o intuito e respondê-la (seção
7.3). Por fim, concluiremos esta dissertação apresentando algumas sugestões
para futuros trabalhos, as quais nos surgiram após a reflexão sobre nosso estudo
(seção 7.4).
7.2 SÍNTESE DOS RESULTADOS OBTIDOS
Nessa seção apresentaremos uma síntese dos resultados obtidos e
discutidos no capítulo de análise. Para tanto, dividiremos esta seção em três
partes: crença, concepção e competência, sendo que os dados referentes ao
perfil dos professores serão, sempre que forem pertinentes, acoplados a essas
partes.
194
Crença
Os professores dos dois grupos (G
1
e G
2
) apresentaram crenças muito
próximas com relação à fração e seu ensino, o que indica que o fato do professor
estar ou não trabalhando com o ensino desse conteúdo, não influência em suas
crenças. Nesse caso, podemos inferir que a crença é “mais forte” do que a prática
docente, ou seja, ela se sobrepõe à experiência docente.
Mais da metade dos professores (tabela 6.3, p.148) acredita que os alunos
apresentam dificuldade em lidar com o conceito de fração e sugerem como
estratégia de ensino apenas lançar mão da percepção -trabalhar com o concreto.
Essa estratégia aparece isolada, ou seja, sem a explicação de como poder
trabalhar com o concreto. Concluímos que a preocupação desses professores
não estava relacionada ao trabalho com as relações lógico-matemáticas, mas sim
com o ensino da fração por meio da percepção, como apontado por Campo e
Magina (2004) na conclusão de seu estudo.
Os dados do gráfico 6.4 (p.153) e da tabela 6.4 (p.150) nos permitiram
concluir que, pelo menos,
3
1
dos professores não reconhecem a divisão como a
operação por excelência da fração e consequentemente têm dificuldade de
ensiná-la, uma vez que não entendem a estrutura dessa representação. A
entrevista com uma das professoras (p.151) mostrou que a mesma acredita que a
dificuldade do professor influência na concepção dos alunos, e esta foi uma das
conjecturas que levantamos Capítulo III.
Mesmo considerado a fração como um conceito “abstrato” (6 professores),
há um número grande (33 professores), que acreditam que o conceito de fração
deve ser introduzido no 1º ciclo do Ensino Fundamental. Do ponto de vista da
195
Teoria dos Campos Conceituais essa crença é justificável, já que Vergnaud
(1993) afirma que a construção de um conceito se dá ao longo tempo.
Concepção
A análise das concepções foi realizada a partir da interpretação dos
problemas criados pelos professores. Das 153 situações que poderiam ser
criadas, tivemos apenas 51. Destas, 22 foram elaboradas e as demais, 29, foram
apenas indicação de uma possível situação. Interpretamos tal comportamento
como uma indicação de que esses professores apresentam dificuldades em
elaborar situações-problema que favoreçam o ensino de fração.
Outro dado interessante foi que a quantidade de situações criadas pelos
professores dos dois grupos, foram muito próximas (G
1
=24 e G
2
=27). Mais uma
vez notamos que o comportamento desses professores sofre pouca influência
pelo fato de eles estarem ou não trabalhando com o conceito de fração.
Nas situações criadas foi possível identificar o aspecto prático apontado
por Behr et al. (1983), no que tange ao ensino e aprendizagem do conceito de
fração. Esse aspecto esteve presente, principalmente, nas situações indicadas,
nas quais os professores explicitavam uma divisão entre duas variáveis distintas
relacionadas ao cotidiano das crianças.
Com relação aos cinco significados da fração, os dados apontaram que
não houve uma distribuição na criação eqüitativa dos significados.
Os professores do G
1
apresentaram suas concepções fortemente ligadas
ao significado parte-todo (gráficos 6.5 e 6.6, p 159) enquanto os professores do
G
2
no significado operador multiplicativo (gráfico 6.5) e quociente (gráfico 6.6).
196
A concepção dos professores do G
1
pode ser interpretada
como o espelho
de seu aprendizado da época em que eram alunos do Ensino Fundamental.
Salientamos que eles não estavam trabalhando com o conceito de fração no
momento da coleta de dados. Já os professores do G
2
podem ter tido suas
concepções influenciadas pelos livros didáticos, os quais costumam apresentar
um número alto de questões, envolvendo o significado operador multiplicativo
(seção 4.3.3, p. 79). No que diz respeito ao significado quociente, alguns
pesquisadores como: Kerslake, (1986); Nunes e Bryant, (1997); Bezerra, (2001);
Escolano e Gairín, (2005) e Kieren, (1988) sugerem que a introdução do conceito
de fração por este significado pode proporcionar um melhor entendimento desse
conteúdo. Essa pode ter sido a justificativa para a indicação de situações com o
significado quociente.
Os demais significados, número e medida, não tiveram incidência nos
problemas criados, talvez porque os livros didáticos não explorassem esses
significados (seção 4.3.3, p. 78).
Quanto as variáveis de quantidade (discreta e contínua) e de
representação (icônica e não icônica), predominaram nos problemas criados pelo
G
1
a quantidade contínua, sem a presença de ícone e esses, geralmente se
referindo a “pizza” ou a “chocolate” (tabelas 6.7 e 6.8, p. 165). Já os professores
do G
2,
mobilizaram diferentes variáveis e também exploraram diferentes
contextos, além do chocolate e da pizza, contexto com pessoas, frutas e dinheiro.
O G
2
só não explorou na criação das situações-problema a variável quantidade
discreta icônica.
Acreditamos que tal diferença, entre as concepções dos professores do G
1
e G
2
, esteja relacionada às séries em que esses professores estavam trabalhando
197
e não ao tempo de experiência de ensino, visto que os problemas elaborados são
bem próximos dos que se encontram nos livros didáticos. Nesse sentido, temos
as idéias de Nóvoa (2001) que defende a idéia de que a experiência, por si só,
não é formadora, pois pode ser uma mera repetição, de uma mera rotina.
Neste momento, podemos inferir que a concepção dos professores parece
sofrer influências de sua prática docente, o que possibilitaria que fosse feito um
trabalho minucioso com os professores a fim de se solucionar possíveis
concepções errôneas. O mesmo não acontece com a crença, conforme
descrevemos no inicio dessa seção. A prática docente não influência nas crenças
já formadas.
Quanto aos dois invariantes da fração (ordem e equivalência), os grupos
apresentaram o mesmo perfil, sendo que a ocorrência nos problemas criados foi
baixo (17,6%). Considerando que tais invariantes são pouco explorados nos livros
didáticos, talvez seja a explicação para a baixa ocorrência nos problemas criados
no G
2
.
Comparando os dados obtidos nos grupos G
1
com o G
2
, podemos
interpretar que os professores do G
2
possuem um melhor conhecimento
profissional (Ponte, 1998) do que os professores do G
1,
uma vez que esse último
apresentou concepção restrita às situações de parte-todo, com quantidade
contínua não icônica. Observamos que o G
2
explorou um pouco mais as variáveis
da fração (significados, quantidade e representação), mas o resultado geral ficou
aquém do esperado, uma vez que as questões elaboradas, além de terem sido
em pouca quantidade, apresentaram falhas conceituais no seu enunciado. Outro
dado importante e relevante foi a concepção restrita dos significados da fração,
visto que estamos defendendo e apoiado-nos nas idéias de Vergnaud e Nunes,
198
cujo conhecimento conceitual deve emergir dentro de uma variedade de
situações.
Nesta perspectiva, temos também o aspecto psicológico apontado por Behr
et al. (1983), que propõem um rico campo para que as crianças possam expandir
suas estruturas mentais. Este aspecto psicológico, por sua vez, não se fez
presente na concepção dos professores do G
1
e G
2,
os quais apresentaram
concepções restritas a respeito do conceito de fração.
Competência
De início, observamos que os percentuais de acertos, tanto para o G
1
(40,2%) quanto para o G
2
(47,3)
foram baixo
e próximo um do outro, o que
demonstra certa homogeneidade no que se refere à competência desses
professores para lidarem com resolução de problemas de frações.
O G
2
apresentou, em média, 6,4 pontos percentuais acima do G
1
nos cinco
significados da fração. Essa diferença, provavelmente, se deveu à experiência
profissional do G
2
, que estava trabalhando com o ensino de fração no momento
da coleta de dados. Não acreditamos que haja influência do tempo de
“experiência” em sala de aula, pois as concepções se mostraram bem próximas
daquelas que encontramos nos livros didáticos e os erros cometidos na
competência foram, praticamente, os mesmos dos professores do G
1
. Esses erros
se mostram como concepções errôneas já enraizadas, as quais influenciam na
competência desses professores.
A semelhança entre os percentuais de acertos nos grupos de professores
se confirmou ao analisarmos os diferentes significados da fração (gráfico 6.7, p.
199
173), e onde foi possível identificar imediatamente o significado parte-todo
(72,0%) como o melhor desempenho dentre os significados para os dois grupos.
Nesse sentido, o G
1
mostrou total coerência entre a concepção (maior
números de problemas criados foi no significado parte-todo) e a competência
(maior índice de acerto foi nos problemas de parte-todo), o que não aconteceu
com o G
2.
Os professores deste último grupo elaboraram maior número de
situações no significado operador multiplicativo e o maior número de indicação no
significado quociente, enquanto que na competência, o melhor desempenho foi no
significado parte-todo. Para esse último grupo de professores
,
podemos inferir
que, mesmo ainda restrito nas concepções relacionadas à fração, eles
apresentam mais estratégias de ensino do que a própria competência na
resolução de problemas.
Podemos destacar que o significado parte-todo foi o único que apresentou,
na média, mais de 50% de acertos. O melhor desempenho se deu nos problemas
que envolveram quantidade discretas e, em especial, com a presença de ícones.
É possível observar, ainda, que nas questões que envolviam a quantidade
contínua, o ícone não foi um agente facilitador. Por exemplo, a questão 1e, que
abordava o significado parte-todo (o significado com mais sucesso) em
quantidade contínua com presença de ícone, o índice de acerto foi 43,1% sendo a
dificuldade identificada no desprezo da conservação de área (erro do tipo C1, p
182).
Foi no significado quociente que os professores apresentaram o segundo
pior desempenho (29,9% de acertos). Dentro desse significado, as questões
icônicas foram as que mais apresentaram erros (tabela 6.13, p. 178), sendo que
os erros mais comuns foram aqueles classificados na categoria “inversão do
200
numerador pelo denominador” (erro do tipo C5, p. 188). Uma explicação para isso
pode estar na crença errônea de que o numerador da fração deve ser sempre
menor que o denominador. Crença esta que também apareceu com freqüência
nos estudos de Moutinho (2005) e Merline (2005). O maior sucesso nesse
significado se deu nas questões não icônicas, tendo uma homogeneidade no
percentual de acertos que envolviam as quantidades discreta e contínua.
Analisando o significado medida, embora o percentual de acertos nos dois
grupos tenha sido baixo, este foi o terceiro melhor desempenho entre os
significados (G
1
= 36,5% e G
2
= 45,0%), alcançando maior sucesso nas questões
icônicas. Nestas questões percebemos facilmente que o ícone foi um fator
facilitador. Nestes dados, chama-nos a atenção a discrepância entre concepção e
competência. Na concepção não tivemos se quer uma situação indicada nesse
significado. Sendo assim, inferimos que os professores não consideram como
uma possibilidade de ensino, situações que envolvam esse significado.
O significado operador multiplicativo, o qual apresentou o segundo melhor
desempenho dentre os grupos de professores (G
1
= 39,4% e G
2
= 49,0%), teve
como variável facilitadora a quantidade contínua. Neste significado não houve
diferença alguma no desempenho dos professores com relação às questões
terem ou não representação icônica.
Por último temos o significado número, o qual os professores do G
1
e G
2
apresentaram pior desempenho (G
1
= 17,3% e G
2
= 22,0%). Nesse significado, que
só envolveu quantidade contínua, o ícone não se apresentou como facilitador,
uma vez que o melhor desempenho foi na questão não icônica. Aqui,
diferentemente dos significados medida e quociente, os baixos resultados
referentes à concepção e à competência dos professores estão em consonância.
201
Esse resultado nos permite concluir que a fração compreendida enquanto objeto
do conjunto numérico dos racionais está longe de ter sido apropriada por esses
dois grupos de professores.
O terceiro aspecto apontado por Behr et al. (1983), perspectiva
matemática, que deve estar presente no ensino e aprendizagem do conceito de
fração, diz respeito às primeiras compreensões desse conceito. Com os
resultados obtidos na parte de competência podemos afirmar que este aspecto
está aquém do satisfatório.
Com relação aos invariantes da fração – ordem e equivalência – o
percentual de acertos foi bem baixo (tabela 6.14, p. 179). Foi possível perceber
que, apesar do desempenho do G
2
ter sido um pouco melhor, os resultados
apontam para uma mesma tendência de sucesso entre os grupos G
1
e G
2
. Os
melhores índices de acerto foram obtidos nas questões de equivalência (G
1
=
31,7% e G
2
= 46,0%), sendo que o invariante ordem teve um sucesso bem baixo
(G
1
= 17,3% e G
2
= 18,0%). Mais uma vez, confirma-se a não ampliação do campo
conceitual desses professores, pois o invariante ordem esta diretamente
relacionado ao significado número, o qual está compreendido como objeto do
conjunto numérico dos racionais.
Constatamos que não houve, em nenhum dos grupos pesquisados, um
desempenho eqüitativo entre os cinco significados da fração propostos por Nunes
et al. (2003), ou entre as variáveis de quantidade ou de representação e nem
mesmo nos invariantes do conceito.
Este dado é preocupante e relevante, visto que, segundo Vergnaud (1990),
os conceitos matemáticos adquirem significado a partir de uma variedade de
202
situações e que cada situação normalmente não pode ser analisada com a ajuda
de um único conceito, mas, ao contrário, ela requer vários deles.
Nesse mesmo sentido, mas direcionando para o nosso objeto de pesquisa,
temos as idéias de Nunes et al. (2003) e Kieren (1976), as quais afirmam que
para a compreensão do conceito de fração é necessário, não apenas, o
entendimento dos diferentes significados (constructos), mas sim a relação entre
estes.
7.3 RESPONDENDO A QUESTÃO DE PESQUISA
Nosso estudo teve por objetivo identificar e analisar as crenças,
concepções e competências dos professores que atuam no 1º e 2º ciclos no
Ensino Fundamental no que diz respeito ao conceito de fração e os seus cinco
significados.
O interesse para tal pesquisa se deu ao depararmos com o baixo
desempenho dos alunos frente às questões de fração. Apesar de não ser o
objetivo deste trabalho, no seu bojo, levantamos vários questionamentos sobre a
possível relação entre o conhecimento e competência de professores e alunos.
Após a análise dos dados, consideramos ter informações suficientes para afirmar
que essa relação existe.
As evidências diagnosticadas até aqui, apontam a grande importância do
papel do professor nas crenças, concepções e competências dos seus alunos.
Apoiados, nessa hipótese, elaboramos a seguinte questão de pesquisa:
203
Qual é o entendimento que os professores dos 1º e 2º
ciclos do Ensino Fundamental apresentam em relação
ao conceito de fração?
Para responder tal pergunta, consideramos necessários mais duas
perguntas especificas, propostas no início deste trabalho, com o objetivo de
fornecer os elementos necessários para responder à questão de pesquisa
principal:
1- Quais as crenças e concepções que esses professores têm a respeito da
fração? – entendimento no ensino.
2- Quais as competências desses professores nas resoluções das questões
envolvendo o conceito de fração? – entendimento na competência.
Essas duas questões podem ser resumidas no que Ponte (1998) nomeia
como conhecimento profissional (pergunta 1) e competência profissional
(pergunta 2).
Como conhecimento profissional (pergunta 1), podemos apontar que os
professores reconhecem as dificuldades, tanto de seus alunos quanto deles
próprios, em lidar com frações e consideram que a antecipação desse ensino
para o 1º ciclo pode proporcionar melhor entendimento a seus alunos. Sua crença
de ensino é restrita à percepção, ou seja, acreditam que trabalhar apenas com a
percepção proporcionará a seus alunos o entendimento de fração.
Quanto às concepções, os dois grupos apresentaram comportamentos
distintos. O G
1
apresentou concepção restrita no significado parte-todo com
quantidade contínua não icônico. Já no G
2
,
a concepção abrangeu os significados
no operador multiplicativo em quantidade discreta não icônica e no significado
204
quociente nas quantidades contínuas não icônicas. O primeiro significado
apontado para o grupo G
2
foi explicitamente diagnosticado nos problemas
elaborados pelos professores enquanto o segundo significado foi interpretado
(implicitamente) nas questões indicadas. Estes professores nos pareceram ter
uma visão mais ampla, mas não atingiram o significado número, medida e nem a
quantidade discreta não icônica.
Quanto aos invariantes do conceito de fração, constatamos, nos dois
grupos, uma baixa, mas presente, utilização dos mesmos.
Na competência profissional (pergunta 2), identificamos que tanto os
professores do G
1
quanto os do G
2
apresentaram melhor competência em
problemas envolvendo o significado parte-todo.
Quanto à variável quantidade contínua e discreta houve uma tendência de
acertos nas quantidades discretas. No que diz respeito à variável representação,
esta apresentou, salvo pequena diferença, resultados muito próximos entre o
percentual de acerto nas questões icônicas e não icônicas.
Nos invariantes do conceito de fração, ordem e equivalência, tivemos uma
diferença expressiva na quantidade de acertos entre esses invariantes. Os
professores se mostraram ser mais competentes quanto ao invariante
equivalência em comparação à ordem. Mais uma vez a restrição na aquisição do
conjunto numérico dos racionais.
Com as respostas das duas questões que subsidiaram a principal, é
possível responder à questão, geral, de pesquisa a qual retomaremos a seguir:
Qual é o entendimento que os professores dos 1º e 2º ciclos do Ensino
Fundamental apresentam em relação ao conceito de fração?
205
Podemos afirmar que, para essa amostra de sujeitos, os professores
reconhecem a fração como sendo um conceito complexo, mas acreditam que se
trabalhado desde as primeiras séries do 1º ciclo pode-se proporcionar uma melhor
compreensão para os alunos. Por outro lado, esses professores precisam adquirir
conhecimento mais amplo sobre o conceito de fração. Essa afirmação pode ser
justificada, ao analisarmos o baixo percentual de acertos (significados, variáveis e
invariante do conceito) e também ao diagnosticarmos que os erros cometidos
pelos professores, nessa pesquisa, são bem próximos dos cometidos pelos
alunos (Merlini, 2005 e Moutinho, 2005).
O significado parte-todo permanece fortemente implícito no conhecimento
desses professores, mas também percebemos que os livros didáticos influenciam
muito em suas concepções.
Identificamos muitas concepções errôneas que já estão enraizadas no
conhecimento desses professores. Esse fato pôde ser observado nos resultados
obtidos pelos professores do 2º ciclo, os quais estavam trabalhando com fração.
Suas concepções são influenciadas pelos livros didáticos, mas quando ficam
frente a questões a serem resolvidas, as concepções formadas quando aluno,
que em muitos casos apresentam falhas, florescem e influência na sua
competência.
Partindo dessa hipótese, é o momento de refletirmos se os cursos de
formações inicial e continuada estão atentos para esse fato, e se sim, como estão
sendo realizados os trabalhos junto a esses professores. Temos a convicção de
que um bom trabalho nessa área pode amenizar tais falhas como, por exemplo,
fazer com que os professores reconheçam a fração em outros significados, além
do parte-todo, a ampliação do conjunto numérico e a apropriação explicita dos
206
invariantes do conceito. O resultado alcançado nesse trabalho, poderia
proporcionar aos professores um maior equilíbrio na terna S,I,R , citada por
Vergnaud (2001) como fundamental para a construção do conceito.
Podemos afirmar também que os professores do G
2
perceberam, ainda
que seja muito pouco, a necessidade de trabalhar com várias situações e
contextos para a construção do conceito, mas estes não apresentaram
competência o suficiente para ensinar seus alunos. Nesse mesmo sentido
podemos afirmar que esses professores oferecem maior variedade em técnicas
de ensino, mas não têm a apropriação do entendimento dessas.
Nesse sentido, temos a convicção de que, o processo para um melhor
conhecimento e competência profissional desses professores, no que refere à
fração, já se encontra nos primeiros degraus e sua chegada ao topo exige que
continuemos realizando pesquisas e formação continuada com os professores.
7.4 SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS
Nesse estudo, o nosso objetivo foi investigar o entendimento (crença,
concepção e competência) que os professores do 1º e 2º ciclos do Ensino
Fundamental têm a respeito do conceito de fração. Para alcançarmos tal objetivo,
muitas outras questões ficaram latentes no decorrer do trabalho, as quais
propomos para futuras pesquisas:
Como os cursos iniciais que propiciam esses profissionais o direito de
lecionar nas séries inicias, os quais vão influenciar diretamente nas
crenças e concepções dos alunos, trabalham com o conceito de fração?
Esses mesmos cursos têm a possibilidade de diagnosticar concepções
207
errôneas criados pelos seus “alunos” quando criança e trabalhar para
modificá-la?
Com essa questão poderíamos diagnosticar se os cursos de formação iniciais
propiciam aos futuros professores que ingressem no mercado com suas
concepções errôneas solucionadas, pois estas, assim como vimos em nosso
estudo, refletem diretamente em sua competência e conseqüentemente nas
concepções de seus alunos.
Outra questão seria:
Os cursos de formação continuada têm a preocupação de estar
trabalhando com resultados (preocupantes) encontrados em pesquisas
diagnósticas? Como está a relação desses cursos com os resultados
obtidos no campo da pesquisa?
Essa outra questão nos permitiria visualizar a influência que a formação
continuada possa ter no entendimento dos professores. Esta questão poderia vir
acompanhada de um trabalho comparativo entre professores que não participam
de cursos de formação continuada com os que participam.
Além das questões que nos permeou durante a realização desse estudo,
propomos também, a futuros trabalhos, que de posse dos dados adquiridos nessa
pesquisa diagnóstica realize um trabalho de intervenção com professores, a fim
de minimizar ou até mesmo superar alguns entendimentos errôneos
diagnosticados aqui.
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ANEXOS
ANEXO I – O instrumento de pesquisa
Nome:_______________________________________________(pode ser fictício)
1) Você cursou: ( ) Magistério ( ) Pedagogia
( ) outro curso universitário Qual? ________________
2) Em qual(is) rede de ensino você leciona?
( ) Particular ( ) Municipal ( ) Estadual
3) Que ano você se formou? _________________________________
4) Há quanto tempo você leciona?_____________________________
5) Em que série(s) você está trabalhando? _____________________________
6) Qual(is) série(s) que você já trabalhou? _____________________________
7) A partir de qual série você acha ideal introduzir o conceito de fração? ______
Por quê? ________________________________________________________
_____________________________________________________________
8) Com base em sua experiência na sala de aula, os alunos apresentam dificuldades ao
trabalhar com fração? ( ) SIM ( ) NÃO
Em caso afirmativo, cite algumas dificuldades e dê sugestões de como
podemos solucioná-la ____________________________________________
________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
9) Para essa questão enumere de
0 a 5 os itens abaixo, usando o seguinte critério:
0 – nunca ensinei
1 – muito difícil de ensinar
2 – difícil de ensinar
( ) adição ( ) subtração sem reserva ( ) multiplicação
( ) divisão sem resto ( ) subtração com reserva ( ) fração
( ) divisão com resto ( ) expressão ( ) números decimais
3 – nem difícil, nem fácil
4 – fácil de ensinar
5 – muito fácil de ensinar
209
APENAS se você assinalou os critérios 0, 1 ou 2 em algum dos itens acima:
Quais são as suas justificativas? _______________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
10) Você relaciona o conceito de fração com alguma operação? ( ) SIM ( ) NÃO
Se SIM, Qual (ou quais)? _________________________________________
Se NÃO, por quê? _______________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
11) Elabore abaixo 3 situações que você considera boas para trabalhar o conceito de
fração
SITUAÇÃO A:
SITUAÇÃO B:
SITUAÇÃO C:
210
Nome:________________________________________________________(pode ser
fictício)
1.1 - Responda qual a fração que representa as partes pintadas de cada da figura.
a) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
b) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
c) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
d) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
e) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
1.2 Com relação às figuras acima, indique quais representam dois terços__________
2) Em uma festa foram distribuídos igualmente 3 bolos para 7 crianças, e em outra festa
foram distribuídos igualmente 9 bolos, do mesmo tamanho, para 21 crianças.
Todas crianças receberam a mesma quantidade de bolo? Sim Não
Descreva como você chegou nessa conclusão __________________________
__________________________________________________________________________
______________________________________________________________
3) Jogando apenas uma vez um dado de 6 faces, qual a fração que representa a
chance de tirar o número 3? _________
b) Jogando apenas uma vez dois dados juntos, cada um com 6 faces, qual a fração
que representa a chance de tirar o número 3 nos dois dados?
________
211
4) Em uma gincana, os três primeiros alunos que terminaram as tarefas ganharam um
número de bolas, do total de 35, conforme a classificação. Paulo ganhou
14
4
das bolas,
Daniel
7
1
e Thiago
7
4
.
a) Quem chegou em 1º, 2º e 3º lugar respectivamente? _____________________
b) Qual a quantidade de bolas que Paulo, Daniel e Thiago ganharam
respectivamente?___________________________________________________
5) Identifique as frações
2
1
, 1
4
3
,
12
3
,
2
5
na reta numérica abaixo:
6) Um eletricista cortou uma extensão de fio em 5 pedaços iguais. Usou 2 pedaços na obra
A e 3 pedaço na obra B.
a) Que fração representa a quantidade de fio usado na obra A em relação ao total de
pedaços? ___________________
b) Que fração representa a quantidade de fio usado na obra B em relação ao total de
pedaços? ___________________
c) Que fração representa a quantidade de fio usado nas duas obras em relação ao total de
pedaços?_____________
7) Rodrigo gostaria de abrir uma mecânica. Para isso ele precisa de
6
3
das ferramentas
representadas ao lado. Quantas ferramentas ele
precisa? ______________________________
8) Para o sorteio de uma casa realizado por um canal de televisão, foram enviadas 400
cartas, sendo que 20 delas foram enviadas por Tereza. Qual a fração que representa a
chance de Tereza ser sorteada, ou seja, ganhar a casa? __________
212
9) Em uma festa, Marina que adorava doces, comeu
11
9
dos brigadeiros
representados abaixo. Quantos brigadeiros Marina
comeu?_________________________
10) Represente na forma de número decimal as seguintes frações:
a)
5
1
________________ b)
5
8
________________ c)
4
6
_______________
11) Para enfeitar uma pequena árvore de Natal, Patrícia usou 10 bolinhas. Que fração
representa a quantidades de bolinhas amarelas em relação ao
total?______________________________
12) Fernanda tem 27 vasos de violeta para distribuir igualmente entre 9 salas. Ana também
irá decorar outras 6 salas e possui 24 vasos de violeta para serem distribuídos igualmente
entre elas.
a) As salas de Fernanda e de Ana terão a mesma quantidade de vasos?
Sim. Descreva como você chegou nessa conclusão. __________________
_______________________________________________________ Não.
Pois as salas de Fernanda terão _____ vasos e as salas de Ana terão
_____ vasos.
b) Que fração representa a quantidade de vasos distribuídos em cada sala de Fernanda?
_______________
c) Que fração representa a quantidade de vasos distribuídos em cada sala de
Ana?__________________
13) A mistura de tinta vai ter a mesma cor na segunda e na terça-feira?
Sim Não
a) Que fração representa a quantidade de tinta azul em relação à mistura das tintas azul e
branca?__________________________________
b) na segunda-feira?___________________________
c) E na terça-feira?____________________________
213
14) Fátima e Plínio compraram uma caixa de chocolate que continha 40 barras iguais. Plínio
pegou para ele
10
7
das barras.
a) Plínio ficou com mais da metade do total de barras de chocolate?
Sim Não
b) Quantas barras Plínio pegou para ele? _________________________________
15) Tenho 10 coelhos para serem distribuídos igualmente em 2 viveiros.
a) Quantos coelhos terão cada viveiro? ___________________
b) Que fração representa essa divisão?_____________________
16) Escreva a representação fracionária que indica o número total de vogais em relação ao
total de letras, da seguinte palavra: “PROFESSOR” ______________
17) Foram divididas igualmente para 4 crianças, 3 barras de chocolate.
a) Cada criança receberá 1 chocolate inteiro? Sim Não
b) Cada criança receberá pelo menos metade de um chocolate?
Sim Não
c) Que fração de chocolate cada criança receberá? __________________________
18) Para fazer uma certa quantidade de argamassa são necessárias 2 medidas de cimento
para 5 medidas de areia. Que fração representa a quantidade de cimento em relação a toda
a argamassa? ___________________
214
ANEXO II– O instrumento da entrevista
1- Responda qual a fração que representa as partes pintadas de cada da figura.
a) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
b) ( ) não é possível saber qual é a fração.
( ) é possível saber, e a fração corresponde é ____________
2) A mistura de tinta vai ter a mesma cor na segunda e na terça-feira?
Sim Não
a) Que fração representa a quantidade de tinta azul em relação à mistura das tintas
azul e branca? __________________________
3) Rodrigo gostaria de abrir uma mecânica. Para isso ele precisa de
6
3
das ferramentas
representadas ao lado. Quantas ferramentas ele
precisa?
__________________________________
4) Foram divididas igualmente para 4 crianças, 3 barras de chocolate.
Que fração de chocolate cada criança receberá? ___________________________
5) Identifique as frações
2
1
, 1
4
3
,
12
3
,
2
5
na reta numérica abaixo:
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