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A REPRESENTAÇÃO DA PRÁTICA DOCENTE EM QUÍMICA NA
PERSPECTIVA METODOLÓGICA PROGRESSISTA DO
EDUCADOR LIBERTADOR: POR UMA QUÍMICA SOCIAL
PIRES NETO, João Pessoa – UEPB
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RESUMO
O presente trabalho busca apreender e analisar as práticas do ensino de Química bem
como sua relevância social. Entende-se aqui a contribuição do educador de química não
como a “transferência bancária”, mas a contextualização dos conhecimentos químicos
com aspectos sociais, relacionando conceitos da Química com o cotidiano dos alunos e
uma reconstrução de idéias com a finalidade de permitir desvendar as realidades
existentes. Por outro lado, como formar cidadãos em um país “presos” por grandes
desigualdades sociais, onde não há uma política eficaz nas áreas: social, habitacional,
saúde, educação e segurança? Onde jovens consomem drogas para amenizar a fome e o
frio? O que responder a um aluno em uma aula de química ao defender o uso das drogas
justificando a sensação de poder, liberdade e prazer? A partir dessas indagações é que a
Química Social irá subsidiar o(a) educador(a) nas práticas “pedagógicas libertadoras” de
ensino, transformando o ambiente escolar em um espaço de aprendizagem democrática.
Desse modo, o ensino da química proposto será focado na formação conscientizadora,
partindo do pressuposto de que, a química que constrói é a mesma que destrói. Para
tanto, o ensino com reflexão crítica sobre a prática, subsidia o educador/educando numa
formação da química com comprometimento social.
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Graduando em Licenciatura Plena em Química da Universidade Estadual da Paraíba – UEPB;
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Introdução
Entender que o pensamento químico, isto é, a utilização deliberada de obter
certos produtos utilizando procedimentos definidos, esteve presente mesmo nas
civilizações primitivas, extraindo os metais contidos nos minérios e no aproveitamento
das plantas com finalidades medicinais (CARRARA JR; MEIRELLES, 1996), como o
caso de síntese de drogas para o tratamento de problemas perenes a saúde, como
hipertensão, diabetes, artrite e problemas mentais, (MASTERTON; SLOWINSKI;
STANITSKI, 1990), é compreender a relevância social da química para uma sociedade
cada vez mais dependente de inovações tecnológicas e de avanços científicos. Assim
sendo, o professor de Química pode utilizar desse estudo de desenvolvimento da ciência
Química como um fator de contribuição na formação do cidadão mais consciente do seu
papel de educando/educador frente às questões sociais.
Entende-se aqui a contribuição do educador de química não como a
“transferência de conhecimentos”, apresentada por Freire (1996) como um “ensino
bancário”, mas a contextualização dos conhecimentos químicos com aspectos sociais,
relacionando conceitos químicos com o cotidiano dos alunos e uma reconstrução de
idéias com a finalidade de permitir ao aluno desvendar as realidades existentes. Por
outro lado, o educador experiência realidades dos seus alunos, aprendendo com eles, ou
seja, “[...] o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é
educado [...]” (FREIRE, 1970, p 68).
Maldaner (2003, p 97) alerta que,
[...] Não podemos esquecer, no entanto, que temos uma função especial no
complexo da produção do conhecimento químico. Somos professores de
Química, ou melhor, educadores químicos e, nesse sentido, o nosso
conhecimento é de natureza especial. Mais que fazer ‘avança’ o conhecimento
químico especifico, temos o compromisso de recriá-lo em ambiente escolar e na
mente das gerações jovens da humanidade [...].
Portanto, o ensino da química precisa ser contextualizado, onde o foco do
conhecimento é a formação consciente do cidadão. De acordo com Santos e Schnetzler
(2003) formar o cidadão não consiste apenas ensinar a química dos polímeros, das
poliamidas, policarbonatos, dos hidrocarbonetos, das sulfamidas, como pretendem
alguns livros maquiados com o cotidiano. A química que precisamos implica também o
desenvolvimento de valores éticos. Para tanto, faz-se necessário o entendimento e
reflexão crítica sobre a prática de ensino na relação transmissor/receptor, tornando
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necessário a “[...] relação Teoria/Prática sem a qual a teoria pode ir virando blábláblá e a
prática, ativismo”. (FREIRE, 1996, p. 24)
Importante é avaliar o que Shor e Freire (1986) afirmam sobre a necessidade de
uma reformulação do ensino/aprendizagem da química como prática de uma “[...]
educação emancipadora, ao invés da pedagogia de transferência de conhecimento” (Ibid
1987, p. 67), através de uma prática libertadora.
O ensino de química como prática libertadora
Quando são abordados assuntos referentes à prática no ensino de química e se
propõe que seus conteúdos sejam trabalhados na visão de uma “pedagogia libertadora”
depara-se com o medo da rejeição do novo, quer seja pelos estudantes, pelos(as)
professores(as) ou mesmo pela própria coordenação do curso que dita a metodologia a
ser empregada. Tal receio já foi apontado por Shor e Freire (1986), em que os
professores que “[...] adotam métodos libertadores freqüentemente se queixam de que os
estudantes rejeitem o convite. Os estudantes têm expectativas tradicionais.” (Ibid, 1986,
p. 85).
Porém, na Química, como também em outras ciências existem certas crenças por
parte de grande parte dos trabalham na área de que,
“[...] ciência é algo que acerta sempre ou que é a verdade e que em nome dela
se diz e se faz. [...] também no meio intelectualizado há essa convicção de
que se ‘é científico, é verdadeiro’. Muitas vezes acaba-se uma discussão,
esgotados os argumentos, com a seguinte frase: ‘Isto foi cientificamente
comprovado!” (MALDAMER, 2003, p. 98).
Da mesma forma, do ponto de vista de autores tradicionais, falar em ensino de
química com foco social causa repúdio, como exemplifica o seguinte comentário
capturado no cotidiano, em encontros de professores: “você tem certeza que está no
curso certo? Química é exatas!!!”. Visões como estas são suportáveis quando ouvidas
no cotidiano por pessoas leigas, porém, quando tais argüições são corroboradas por
especialistas da área, nos preocupamos com a qualidade de educação trabalhada nas
escolas em prol da promoção da liberdade de um povo. Tal preocupação se faz presente
quando nos deparamos com a obra de Farias (2005), apesar do título sugestivo, alerta
os(as) professores(as) em suas primeiras páginas: “[...] licenciado não é pedagogo. [...]
para ensinar química é preciso saber química. Falar em Paulo Freire, Piaget e Vygotsky
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não vai ajudar na hora de resolver o problema sobre reagente limitante. Se você é
professor de química, estude química!” (Ibid, 2005, p.19).
Compreende-se que afirmações como estas comprometem a formação do
profissional instigando-o a fragmentar o saber. É necessário, portanto, que o ser humano
esteja preparado para contribuir com a formação do homem integral, como prática
libertária. Para isto, nos reportamos a Freire (1979) lembrando que o compromisso do
profissional com a sociedade parte do pressuposto de que antes dele ser profissional é
homem, por isso não deve estar fora de um contexto histórico social, e complementa
com a obviedade de que “humanismo e tecnologia não se exclui” (p. 22).
Reflexos de educadores que optam pela “pedagogia da transferência de
conhecimentos” (SHOR e FREIRE, 1986) fazem com que pesquisas demonstrem que o
ensino de química atual não contribui para formar o cidadão consciente do seu papel
frente a problemas sociais:
“Os resultados obtidos junto aos educadores químicos brasileiros também
demonstram que o ensino atual de química, não serve para o cidadão nem
para quem vai fazer vestibular, ou melhor, não tem a menor utilidade. Por
isso evidenciaram ser fundamental que seja adotado no Brasil um ensino de
química que esteja voltado para a cidadania. [...]” (SANTOS E
SCHNETZLER, 2003, p. 127).
Por outro lado, como formar cidadãos em um país “presos” por grandes
desigualdades sociais, onde não há uma política eficaz nas áreas: social, habitacional
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,
saúde, educação
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e segurança
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? Onde jovens consomem drogas para amenizar a fome e
o frio? O que responder a um aluno em uma aula de química ao defender o uso das
drogas justificando a sensação de poder, liberdade e prazer? A partir dessas indagações
é que a química social irá subsidiar o(a) educador(a) nas práticas “pedagógicas
libertadoras” de ensino, apresentando formas de poder, liberdade e prazer no ensino da
química frente à prevenção do uso das drogas. Afinal, saber ouvir, valorizar e respeitar
as diferenças poderá resolver essa tríade.
A falta da base epistemológica no ensino de química e a necessidade de um
ensino libertador confundem alguns educadores(as) que na tentativa de prender a
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De acordo com o Ministério das Cidades o déficit habitacional no Brasil é de 18,08% na Zona Urbana e 32,12% na Zona Rural.
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Taxa de analfabetismo na Zona Urbana é de 12,29% e Zona Rural é de 30,7% (IBGE - Censo Demográfico, 2000)
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No período de 1998 a 2002, houve 152.624 homicídios nas regiões metropolitanas do Brasil (Secretaria Nacional de Segurança
Pública – 2004)
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atenção dos alunos “plantam bananeira” em sala de aula em busca do sucesso,
desconstruindo toda uma prática de ensino proposta por cientistas da educação.
Para Freire (1992) não existe “diálogo no espontaneísmo como no todo-
poderosismo do professor”. [...] “O diálogo na verdade, não pode ser responsabilizado
pelo uso distorcido que dele se faça. Por sua pura imitação ou por sua caricatura” [...].
(FREIRE, p 118).
O ensino das ciências ditas “exatas” precisa de uma (re)formulação de seus
conteúdos, apoiados por questões de relevância social, bem como um ensino que
instigue e busque o exercício crítico do “educador-educando ou educando-educador”
com comprometimento ético e social. Baseado nessa idéia, Chassot (1995) afirma que
“[...] Só um ensino de química questionador é que pode se transformar num ensino
libertador. [...]” e acrescenta “[...] Nosso ensino é literalmente inútil [...]” (p. 40-58).
A Química Social e seus desafios
Quando se propõe uma abordagem cognitiva no ensino da química, nos
deparamos com algumas inquietações, a seguir: qual o interesse do educando nesse
processo, onde objetivos são bem direcionados pela indústria da educação na
“transferência de conhecimento” focada no vestibular? Como e de que forma podemos
romper com práticas de educadores que enchem o quadro-negro de equações como
forma de poder?
Chassot (1995) centra essas inquietações em três investigações: Por quê? O que?
e como ensinar? Considerando que “ensina-se química, então, para permitir que o
cidadão possa interagir melhor com o mundo” (p. 39). O que para o autor quem
determina os programas de Química são os livros-textos que não diferenciam o
conteúdo da zona urbana para rural, do sul para o nordeste, Brasil e Estados Unidos,
justificando pelos os que ditam essa forma de abordagem com argumento de que ‘a
Ciência é universal’ (CHASSOT, 1995, p 42), mas, será que os interesses são
universais? Qual a prioridade de um educando-agricultor ou vice-versa, em estudar a
configuração eletrônica dos lantanídeos ou as reações e conseqüências causadas ao solo
devido às queimadas? Nesse sentido, Andreola (1999) entende que a
interdisciplinaridade é “[...] um compromisso com a vida e uma exigência ontológica,
antes ainda de se impor com o imperativo epistemológico e metodológico” (p. 68).
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Para Freire (1970) o “nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão do
mundo, ou tentar impô-la e ele, mas dialogar com ele sobre a sua e a nossa [...]” (p. 87).
Santos e Schnetzler (2003) sugerem que o ensino da química para a cidadania
deve ser de forma contextualizado, em que o conhecimento químico não será o foco,
mas o preparo para o aprendizado de um cidadão consciente do seu papel no meio
ambiente, isso se contrapõe com alguns educadores de ciências que através da
transferência de conhecimentos buscam de forma simplista resolver questões teóricas e
técnicas de derivadas, integrais e até mesmo questões de espectroscopia de ressonância
magnéticas nucleares, sem levar em consideração sua finalidade, complexidade,
variabilidade, subjetividade como também sua relevância social.
Considerações finais
No ensino da Química, o que buscamos é o entendimento de práticas
“libertadoras” frente às práticas “dominadoras”, esta última por se tratar de interesses
em determinadas abordagens “opressoras” e inúteis, formando profissionais sem
comprometimento ético, político e social, enquanto as abordagens da Química focada
nas práticas “libertadoras” buscam o entendimento e o comprometimento com a
cidadania centrado em interesses coletivos. Afinal, química, meio ambiente e cidadania
se interagem por si só, haja vista que o ensino da química proposto será focado na
formação conscientizadora, partindo do pressuposto de que, a química que constrói é a
mesma que destrói. Para tanto, o ensino com reflexão crítica sobre a prática, subsidia o
educador/educando numa formação da química com comprometimento social.
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REFERÊNCIAS
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pedagogia da simbiogêneses e da solidariedade. In: STRECK, Danilo R. (org.). Paulo
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________ Pedagogia do Oprimido. 24. ed. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.
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MALDANER, Otávio Aloisio. A formação inicial e continuada de professores de
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MASTERTON, William L., SLOWINSK, Emil J., STANITSKI, Conrad L. Princípio
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