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Acabada a experiência de “estudar fora”, decepcionado e
angustiado me recolhi a uma nova rota dentro do internato. Mesmo tendo
sido instalado dentro de nosso ambiente um ginásio, levado por um
professor de matemática incompetente e por uma pedagogia cega às
nossas diferenças, aboli a escola da minha vida aos 14 anos. Acabei,
então, indo morar, transferido, por cerca de oito meses, num internato
rural no interior do Paraná, numa localidade chamada Tibagi. Lá
aprimorei meu gosto pelas coisas da roça e meu espírito de liderança,
sendo aos quinze anos levado a tomar conta, a ser capataz, do sítio do
Diretor da Escola.
Depois desse período, de volta ao internato de onde saíra,
consegui que me deixassem trabalhar na cozinha, uma maneira de ter
certeza de não passar fome, além de obter algum tempo livre para viver
aventuras pelas matas e riachos, ali existentes em abundância. Nesse
período, desenvolvi a arte de escrever cartas e cobrar por elas; costumava
emocionar os pais dos internos, aqueles que os tinham, ao detalhar o dia-
a-dia vivido ali naquele ambiente. O pagamento era feito através de muitas
“moedas”: balas, pés-de-moleque, cocada, paçoca, cigarro, estilingue,
“gibis”, alguns brinquedos e outras bugigangas .
Nesse período narrado aconteceram muitas outras coisas,
boas e ruins, as quais detalharei numa outra oportunidade, talvez num
futuro livro autobiográfico. O significativo, contudo, foi o fato de nunca ter
abandonado o hábito da leitura. Diziam, no internato, que eu era louco por
livros e revistas, e que quem quisesse fazer amizade comigo tinha que
começar me dando um gibi ou algum livro, mesmo que velho. A leitura era
importante para mim, porque dava uma dimensão maior ao meu mundo,
quer dizer, o meu universo ia além da vida no internato ou das ruas,
quando eu me refugiava nelas. De certa forma, era o meu escape: fuga da
miséria, da marginalidade, do rumo à delinqüência.
Saindo do internato e da vida de rua, depois de algumas
peripécias, acabei servindo o exército (13o. Regimento de Infantaria - Ponta
Grossa - Paraná), experiência memorável, de fel e mel. Naquela época,
início de 1969, senti-me um perfeito subversivo naquela disciplina, para
mim desconhecida, castradora e inibidora da minha auto-estima. E eu que
ingenuamente pensava em seguir carreira no exército brasileiro, um jeito
de fugir à miséria, fui marcado pelo estigma do “mau comportamento”,
devido a minha rebeldia inata e compreensível. Mas, nem por isso
lamentei; afinal, foi graças ao dinheiro ganho de meretrizes e com o
comércio de comida de primeira para os filhos de papais ricos, que não
suportavam o rango (boião, comida) servido para os soldados (trabalhei na
cozinha dos Oficiais e Sargentos), pude fumar cigarro de filtro (um luxo
entre os miseráveis soldados), ouvir muitos discos, ir aos bailes, namorar e