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Shirlene Bemfica de Oliveira
COMPREENDENDO O PROCESSO INTERACIONAL NA SALA DE AULA DE
LÍNGUA INGLESA: VISÕES DE PROFESSORES E ALUNOS
Belo Horizonte
Faculdade de Letras/UFMG
2004
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2
Shirlene Bemfica de Oliveira
COMPREENDENDO O PROCESSO INTERACIONAL NA SALA DE AULA DE
LÍNGUA INGLESA: VISÕES DE PROFESSORES E ALUNOS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Estudos Lingüísticos da Faculdade de Letras da
Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em Lingüística
Aplicada.
Área de concentração: Lingüística Aplicada
Linha de pesquisa: Ensino/Aprendizagem de Língua
Estrangeira
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Deise Prina Dutra
Belo Horizonte
Faculdade de Letras da UFMG
2004
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3
Oliveira, Shirlene Bemfica de
O48c Compreendendo o processo interacional na sala de aula de língua
inglesa [manuscrito] : visões de professores e alunos / Shirlene
Bemfica de Oliveira. – 2004.
163 f., enc. : il., tab., graf. + 1 CD-ROM
Inclui CD-ROM contendo: Anexos B a G.
Orientadora : Deise Prina Dutra.
Área de concentração: Lingüística Aplicada.
Linha de Pesquisa: Ensino/Aprendizagem de Língua Estrangeira.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas
Gerais, Faculdade de Letras.
Bibliografia : f. 147-156.
Anexo : f. 157-163.
1. Análise de interação em educação – Teses. 2. Interação
professor-alunos – Teses. 3. Língua inglesa – Formação de
professores – Teses. 4. Ambiente de sala de aula – Teses.
5. Competência comunicativa – Teses. 6. Língua inglesa – Estudo
e ensino – Teses. 7. Língua inglesa – Métodos de ensino – Teses.
I. Dutra, Deise Prina. II. Universidade Federal de Minas Gerais.
IV. Título.
CDD : 418.007
4
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................15
Objetivos.................................................................................................................17
Perguntas da Pesquisa............................................................................................18
Organização da dissertação...................................................................................19
1. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ....................................................................................22
1.1. As abordagens de ensino e a formação de professores de língua inglesa............22
1.1.1. Visão mecanicista ou estrutural ...................................................................25
1.1.2. Visão mentalista............................................................................................28
1.1.3. Abordagem comunicativa.............................................................................30
1.2. Foco no professor e na prática reflexiva..............................................................33
1.3. O papel da interação na sala de aula de língua inglesa........................................39
1.3.1. Modificação do discurso...............................................................................40
1.3.2. Negociação de sentido..................................................................................41
1.3.3. Foco na fala dos professores........................................................................42
1.3.4. Perspectiva sócio-cultural da aprendizagem ...............................................44
1.3.5. Foco na conversação....................................................................................46
1.4. As crenças de professores e alunos no processo de ensino e de aprendizagem de
língua estrangeira........................................................................................................48
1.5. Tensões instrucionais, dilemas ou conflitos vivenciados pelos professores na
prática docente............................................................................................................51
2. METODOLOGIA .........................................................................................................56
2.1. Natureza da pesquisa qualitativa..........................................................................56
2.2. Estudo de Caso.....................................................................................................57
2.3. Contexto da Pesquisa...........................................................................................58
2.4. Os participantes....................................................................................................59
2.5. Instrumentos de coleta.........................................................................................62
2.5.1. Questionários................................................................................................63
2.5.2. Entrevista semi-estruturada..........................................................................63
2.5.3. Diários..........................................................................................................63
5
2.5.4. Observação das aulas...................................................................................64
2.5.5. Filmagem das aulas......................................................................................65
2.5.6. Sessões de visionamento...............................................................................66
2.5.7. Transcrição e análise....................................................................................68
3. RESULTADOS .............................................................................................................73
3.1. Resultados da análise do conceito de processo interacional................................75
3.1.1. Maria ............................................................................................................75
3.1.2. Renato...........................................................................................................77
3.2. Resultados da análise da aula típica dos professores participantes .....................78
3.2.1. As atividades desenvolvidas..........................................................................79
3.2.2. Análise da interação.....................................................................................82
3.3. Resultados da análise das percepções e reações dos alunos..............................102
3.3.1. Estratégias de aprendizagem......................................................................104
3.3.2. Expectativas dos alunos..............................................................................105
3.3.3. Reação dos alunos à abordagem do professor...........................................106
3.3.4. Experiências anteriores..............................................................................107
3.3.5. Participação dos alunos nas aulas.............................................................108
3.4. Resultados da análise dos conflitos sobre interação na sala de aula de língua
inglesa.......................................................................................................................113
3.4.1. Tensões instrucionais..................................................................................114
3.4.2. Dilemas ou conflitos ...................................................................................120
4. CONCLUSÕES ...........................................................................................................142
4.1. Síntese dos resultados........................................................................................142
4.2. Contribuições e encaminhamentos ....................................................................148
5. BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................146
6. ANEXOS.......................................................................................................................155
6
LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS
Quadro 01: Paralelo lingüístico psicológico (Brown, 1994, p. 12) _______________30
Quadro 02: Contexto da pesquisa_________________________________________59
Quadro 03: Perfil dos professores_________________________________________60
Quadro 04: Perfil dos alunos ____________________________________________61
Quadro 05: Perguntas de pesquisa e padrões de análise _______________________74
Quadro 06: Relevância da interação para o ensino de LE______________________77
Quadro 07: Atividades propostas pelos professores para promover interação ______79
Quadro 08: Número de turnos em uma aula de aproximadamente trinta minutos____82
Quadro 09: Movimentos pedagógicos nas aulas dos participantes nos dois contextos 84
Quadro 10: Tipos de perguntas feitas nas aulas dos professores participantes nos dois
contextos ____________________________________________________________86
Quadro 11: Funções das perguntas nas aulas dos participantes nos dois contextos __89
Quadro 12: Quantificação do tempo em cada estrutura de participação___________91
Quadro 13: Relevância de se aprender inglês_______________________________103
Quadro 14: Estratégias utilizadas pelos alunos para aprender inglês____________104
Quadro 15: Expectativas dos alunos______________________________________105
Quadro 16: Reação dos alunos à abordagem de ensinar do professor ___________107
Quadro 17: Experiência dos alunos com outro professor______________________108
Quadro 18: Movimentos pedagógicos dos alunos nas aulas dos dois contextos ____109
Quadro 19: Movimentos de ajuda (HEP) dos alunos participantes ______________111
Quadro 19: Conflitos sobre o papel do professor____________________________130
Quadro 20: Conflitos sobre o contexto escolar______________________________139
Gráfico 01: Grau de escolaridade e faixa etária dos alunos participantes _________61
Gráfico 02: Quantificação do tempo em cada estrutura de participação__________101
Gráfico 03: Distribuição relativa dos movimentos por agente__________________112
7
CONVENÇÕES PARA AS TRANSCRIÇÕES
(Baseado em Marcuschi, 1986)
FALANTES
Primeira letra ou pseudônimo
Voz de um aluno individualmente : indicada pelo nome fictício
Voz dos alunos em coro: Alunos
SUPERPOSIÇÃO DE DUAS OU MAIS VOZES [
TRANSCRIÇÕES INCERTAS / /
PERGUNTAS ?
PAUSA (+)
PAUSA LONGA (+++)
INAUDÍVEIS /?/
ALONGAMENTO DE VOGAIS :
ÊNFASE LETRA MAIÚSCULA
COMENTÁRIOS DA PESQUISADORA ( )
PALAVRAS FALADAS PAUSADAMENTE pa-la-vra
8
RESUMO
Propiciar um ensino de língua estrangeira, no caso deste estudo língua
inglesa, centrado no aluno, tendo o foco na comunicação mediada pela interação, é uma
preocupação atual dos lingüistas aplicados que se voltam para questões de ensino e
aprendizagem. Mudanças significativas têm ocorrido na formação de professores para
atender a esta demanda. Nesta perspectiva, os professores de línguas, segundo Moita
Lopes (1996), não são mais os transmissores de conhecimento, e sim os profissionais
que devem refletir e construir sua prática. Os alunos, por sua vez, deixam de ser
passivos no processo e constroem sua interlíngua por meio da interação na língua alvo.
No entanto, os professores enfrentam dificuldades e vivenciam conflitos em construir
uma prática que atenda à perspectiva citada acima, que espelhe suas crenças e que
atenda às expectativas dos alunos.
Esta investigação, de natureza qualitativa, discute as percepções dos
professores sobre interação, alguns aspectos de sua prática, a percepção dos alunos
sobre a prática pedagógica dos professores e se há conflitos em relação ao processo
interacional proposto nos contextos em que os participantes atuam. A discussão dos
dados coletados é uma interpretação da pesquisadora que não pretende ser exaustiva e
sim mostrar uma maneira de compreender os contextos pesquisados, contribuindo para
o entendimento do que ocorre em salas de aula de língua inglesa. Os resultados apontam
para uma conscientização por parte dos professores da importância da interação para a
aquisição de uma língua estrangeira. Não obstante, eles enfrentam dificuldades e
vivenciam conflitos ao desempenhar a prática que eles acreditam ser benéfica para o
desenvolvimento dos alunos.
9
ABSTRACT
Recent research has shown the importance of student centeredness in
English Language Teaching, focusing on communication mediated by interaction.
Meaningful changes have occurred in teacher education to meet these needs. In this
perspective, language teachers, according to Moita Lopes (1996), are not the ones who
transmit knowledge. They are the professionals who must reflect and construct their
own practice. The students, on the other hand, are not passive in the learning process
and develop their interlanguage through interaction in the target language. However,
teachers face difficulties and conflicts in building their practice in a way that it fits in
the perspective mentioned above, which reflects their beliefs and that meet students’
expectations.
This investigation, developed on a qualitative basis, discusses teachers’
perspectives about interaction, some aspects of their practice, students’ perception about
teachers’ pedagogic practice and if there are conflicts concerned in the interaction
process proposed by the teachers in the different scholar contexts they work. The
discussion is a researcher’s interpretation and it does not intend to be exhaustive, but
demonstrate a way to comprehend better the researched context, contributing to our
understanding of what happens in the language classroom. The results point up that the
teachers are conscious about the importance of interaction. Nevertheless, they face
difficulties and conflicts to put into practice what they believe is beneficial to learners’
development.
10
INTRODUÇÃO
11
O trabalho apresentado a seguir discute questões que julgamos essenciais
para o ensino de uma língua estrangeira
1
: as abordagens de ensino, o papel da interação
no processo de aquisição e os possíveis conflitos vivenciados pelo professor na prática
docente. Para discutirmos estes aspectos, não podemos deixar de mencionar a transição
do foco das pesquisas da área de Lingüística Aplicada que interferiram na formação e
nos papéis assumidos pelos professores de língua inglesa
2
.
A transição do foco das pesquisas em Lingüística Aplicada se deu, segundo
Allwright e Bailey (1994, p.06), quando profissionais da área perceberam que algumas
questões relacionadas ao ensino não eram resolvidas pelo treinamento ou por pesquisas
baseadas em aplicações de métodos e técnicas. Desta forma, sentiram a necessidade de
investigar o que constituía um bom ensino e de que forma ele poderia ser colocado em
prática. Com isso, o foco das pesquisas começa a mudar de “prescritivo” para
“descritivo”, como será discutido nos próximos parágrafos.
Até a década de sessenta, as pesquisas na área de formação de professores
dedicavam-se à delimitação e descrição de qualidades pessoais dos professores como
elemento determinante da qualidade do ensino. O objetivo era encontrar características
estáveis neles, a fim de criar um modelo único de bom professor para que todos os
outros pudessem seguir. Segundo Teberosky e Cardoso (1990, p.49), por volta dos anos
setenta, é que “a pesquisa na sala de aula começou a ser estruturada de maneira mais
sistematizada, apoiada no paradigma processo-produto.” Com base neste paradigma, os
pesquisadores começaram a relacionar as qualidades pessoais dos professores com os
resultados acadêmicos dos alunos e com isso surgiu o conceito de competência docente.
Sob esta ótica, o objetivo da formação de professores passou a ser a criação de técnicas
eficientes capazes de alcançar um resultado eficaz com os alunos.
1
De agora em diante o termo língua estrangeira será denominada LE.
2
De agora em diante o termo língua inglesa será denominada LI.
12
“A formação do professorado consistia em desenvolver nos professores a
aquisição de habilidades e levá-los a pôr em prática determinados
conhecimentos, de maneira que o rendimento dos alunos fosse otimizado. O
professor, de acordo com esse paradigma, era considerado o executor de
prescrições curriculares, elaboradas por profissionais competentes, que
acreditavam que as variáveis da sala de aula poderiam ser controladas”
(Contreras
3
, 1985 citado por Teberosky e Cardoso, 1990, p.50).
Com o impacto da psicologia cognitiva, o objeto de estudo das pesquisas
deixou de ser a conduta do professor e passou a residir na compreensão dos processos
psicológicos internos que sustentam e condicionam a atuação dele. Segundo Teberosky
e Cardoso (1990, p.50), o professor passou a ser um agente ativo no processo. Seus
conhecimentos, crenças e atitudes, adquiridos ao longo da vida, passaram a ser levados
em consideração. A pesquisa sobre o pensamento do professor começou a evoluir com
identidade própria procurando entender os processos e estruturas implícitas no
pensamento dele.
Desde o início da década de noventa o foco, segundo Moita Lopes (1996) e
Wallace (1991), é na formação de um professor de línguas que não é mais treinado para
aplicar métodos de ensino e transmitir conhecimentos prontos e acabados. Jorge (2001,
p.04) afirma que “a concepção de formação desses profissionais tem mudado de
treinamento para uma concepção de formação”. Formação, seja ela inicial ou
continuada, que traz a oportunidade para o professor refletir sobre suas crenças,
experiências e conhecimentos, a fim de construir e reconstruir, em um processo
contínuo, sua própria abordagem de ensinar. Segundo Dutra e Mello (2001, p.47), o
professor deve ter a oportunidade de refletir sobre “como” e “por quê” toma certas
atitudes em sala de aula. Como conseqüência, os métodos já não fariam tanta diferença
como antes.
3 CONTRERAS, D. J. El pensamiento o el conocimiento del profesor? Una crítica a los postulados de las
investigaciones sobre el pensamiento del profesor y sus implicaciones para la formación del profesorado. Revista de
Educación. v.277, mai/ago. 1985.
13
“Reflective approaches to teacher development start from the assumption that
teachers, rather than methods, make a difference
4
” (Richards, 1998, p.03).
Os professores fazem a diferença, pois eles não são mais aqueles que
simplesmente aplicam técnicas compatíveis com um certo método, mas aqueles que
refletem e constroem sua prática. Segundo Mattos (2000, p.149), este profissional
reflexivo, em um processo de desenvolvimento profissional, cria estratégias, assume
posturas e adota procedimentos dentro da sala de aula no intuito de contribuir para o
processo de aprendizagem dos alunos, explorando e tentando entender sua própria
metodologia. Para Teberosky e Cardoso (1990, p.51), o objetivo desta reflexão é, além
de uma prática de auto-avaliação, uma forma de os professores investigarem suas
próprias teorias e formularem princípios explicativos para seu ensino.
Nesse sentido, a formação do professor passa a ser produto da construção ou
reconstrução do conhecimento que ele desenvolve através de determinadas leituras,
cursos de capacitação, da experiência prática, dos aspectos contextuais e através dos
recursos socialmente disponíveis que interagem com seu sistema de crenças. Portanto,
considera-se que não é suficiente que o professor saiba o que tem de ser feito, mas ele
deve desejar realizar sua prática de determinada maneira. Nesse sentido, a cultura de
ensinar e aprender do professor pode ser determinante na tomada de decisões em sala de
aula (Almeida Filho, 1999, Barcelos, 2001).
Além da preocupação social do desenvolvimento do professor, atualmente
há várias pesquisas que se concentram no professor e nos aspectos comunicativos do
ensino de línguas. Em tal perspectiva, a promoção de oportunidades de comunicação e
de negociação de sentido é uma preocupação central do professor de línguas
4
Tradução feita pela autora. As abordagens reflexivas de desenvolvimento dos professores começam pela suposição
de que os professores, mais que os métodos, é que fazem a diferença na sala de aula.
14
estrangeiras. Há um interesse em se fazer um trabalho diversificado de forma a
aumentar essas oportunidades para os alunos interagirem na língua alvo e, assim,
desenvolverem as suas habilidades lingüísticas na referida língua. Os trabalhos em pares
e em grupos são de grande importância na abordagem atual, o que não acontecia nas
abordagens anteriores. A interação passou a ser um fator primordial para o
desenvolvimento da aprendizagem de uma LE e, cada vez mais o professor deve se
preocupar em criar um ambiente em sala de aula que seja propício a ela.
Nunan (1991, p.279) caracteriza as aulas interativas como aquelas que
seguem os pressupostos da abordagem comunicativa. Em tais aulas, há uma ênfase na
aprendizagem, através da veiculação da língua alvo, na introdução de textos e materiais
autênticos em situações de aprendizagem e na oportunidade de os alunos focalizarem
não só a língua, mas também o próprio processo de aprendizagem. Brown (1994, p.81)
considera que as aulas dentro desta abordagem promovem uma aquisição mais eficaz,
pois os alunos recebem insumos autênticos em contextos reais, com um número
significativo de atividades em pares e em grupos, o que faz com que eles utilizem a
língua para uma comunicação significativa e verdadeira. Nesta abordagem, segundo o
referido autor, a bagagem cultural dos alunos é um fator importante para a
aprendizagem e a interação deste fator com as atividades desenvolvidas em sala de aula
podem promover uma aquisição com melhores resultados.
15
Justificativa
O interesse em desenvolver esta pesquisa esteve diretamente ligado com as
nossas inquietações e conflitos vivenciados enquanto professores e pesquisadores da
sala de LE. Reconhecemos a importância da interação e sabemos das dificuldades em
promovê-la de forma efetiva em alguns contextos. Acreditamos que se o professor
compreende melhor os eventos de sua sala de aula, ele pode minimizar as dificuldades e
desenvolveria ações mais conscientes.
Sendo assim, esta pesquisa pretende criar situações propícias para a reflexão
com a finalidade de investigar como diferentes professores, em dois contextos distintos
de ensino, oferecem momentos de interação em sala de aula e como esses professores e
seus alunos avaliam isso. Esta pesquisa se justifica, pois o professor em processo de
reflexão e educação contínua poderá tornar-se capaz de compreender e avaliar situações
positivas e negativas na sala de aula e investigar os fatores que afetam o processo de
ensino/aprendizagem. Ele poderá tomar mais consciência do seu papel enquanto
professor e do papel do aluno no processo de ensino aprendizagem de LE. Para Vieira-
Abrahão, (1999, p.46) “a capacidade de reflexão e de crítica poderá levar este professor
a um processo de auto-avaliação constante, e torná-lo aberto para a análise de novas
abordagens e propostas que, com certeza, surgirão em sua vida profissional.”
No entanto, a consciência da prática poderá fazer com que professores
entrem em conflito com sua abordagem de ensinar e a forma de promover a interação na
sala de aula. O reconhecimento de que estes conflitos existem pode servir como
instrumento para a compreensão do contexto e até, se o professor o desejar, promover
mudanças benéficas em sua prática pedagógica. Uma maneira de se atingir essas
mudanças é envolver o professor em um processo reflexivo, tornando-o mais seguro
16
para tomar decisões na sala de aula. Ele terá a oportunidade de repensar, por exemplo, a
“dinâmica interacional” que ele desenvolve durante as aulas (Richards & Lockhart,
1996, p.153). Os alunos, por sua vez, podem tanto se tornar mais conscientes e críticos
da abordagem de ensinar do professor, quanto fazer uso desta consciência para
desenvolver o que Oxford (1990, p.14) categoriza como estratégias de aprendizagem em
um contexto mais interativo. Estas estratégias, segundo a autora, são ações realizadas
por aprendizes de língua estrangeira para controlar ou melhorar sua própria
aprendizagem, por exemplo, perguntar ao professor ou ao colega o significado de
alguma palavra na língua alvo, parafrasear, trabalhar em grupos para obter “feedback”,
fazer inferências, etc. A seguir, descrevemos separadamente, os objetivos da pesquisa e
as questões a serem respondidas.
17
Objetivos
Como foi dito anteriormente, a capacidade de reflexão crítica pode ser
desenvolvida pelo professor para que ele possa compreender o contexto em que atua, e
se o desejar, beneficiar-se e até promover mudanças em sua prática docente caso ele
acredite ser necessário. O objetivo geral deste trabalho é proporcionar momentos para a
reflexão de professores e alunos para que eles possam discutir aspectos relacionados à
interação em sala de aula de LE.
Desta forma, propõe-se uma pesquisa com o objetivo de compreender a
interação verificando:
1. como os professores definem o processo interacional;
2. como a interação é construída na prática na escola regular e no curso livre;
3. quais as percepções e reações dos alunos ao ensino de inglês nos dois contextos e ao
tipo de interação que é construída;
4. a existência de conflitos sobre a forma como o processo interacional é desenvolvido
em sala de aula em diferentes contextos;
5. a natureza destes conflitos, caso eles existam;
6. a influência dos conflitos nos contextos de ensino e na abordagem de ensinar dos
professores.
Esperamos que o fruto desta investigação possa contribuir para o
desenvolvimento profissional dos participantes, para uma melhor compreensão do que
ocorre na sala de aula de língua estrangeira e para a os estudos desenvolvidos na
Lingüística Aplicada.
18
Perguntas da Pesquisa
De acordo com os objetivos apresentados, explicitamos abaixo as perguntas
de pesquisa para orientar e facilitar a discussão do estudo.
1. Como os professores participantes definem o processo interacional?
2. Como é a prática dos professores nos dois contextos de ensino (escola regular e
curso livre) em termos de interação?
3. Quais as percepções e reações dos alunos ao processo interacional que é construído
nos dois contextos e ao tipo de interação que é construída?
4. Os professores de inglês enfrentam conflitos quando atuam em contextos escolares
diferentes?
5. Se os conflitos existem, são de que natureza?
6. Quando presentes, de que forma esses conflitos interferem nos contextos de ensino e
na abordagem de ensinar dos professores?
19
Organização da dissertação
Nosso estudo está organizado em cinco partes que enumeraremos e
apresentaremos a seguir.
A Introdução descreve o tema por meio do debate acerca da transição do
foco das pesquisas em Lingüística Aplicada, e do papel da interação no processo de
aquisição da LE. Nesta seção, também são apresentados os objetivos e as perguntas de
pesquisa que norteiam este estudo.
O Capítulo I refere-se ao arcabouço teórico que serviu de base para a
pesquisa. São discutidas as abordagens de ensino e de formação de professores de LI
dentro das visões estruturalista, mentalista e comunicativa. Ao final desse capítulo são
apresentados alguns dos desdobramentos das pesquisas desenvolvidas atualmente, tais
como: abordagem reflexiva de formação de professores de LE, interação no ensino de
LE, crenças de professores e alunos de LE, a influência do contexto para o ensino de LE
e pesquisas acerca dos possíveis dilemas e conflitos da prática do professor.
O Capítulo II destina-se à metodologia utilizada para o desenvolvimento do
estudo. Inclui, portanto, a discussão e a justificativa da natureza da pesquisa e do
paradigma escolhido, bem como os procedimentos de coleta e análise de dados
utilizados.
O Capítulo III apresenta a análise dos dados orientada pelas seis perguntas
de pesquisa anteriormente mencionada. Esta seção se subdivide em seis subitens que
respondem, respectivamente, a cada pergunta.
O Capítulo IV discute a interpretação da pesquisadora, retoma as perguntas
de pesquisa e apresenta as conclusões. O presente estudo se encerra discorrendo sobre
20
as contribuições desta pesquisa para a área de Lingüística Aplicada e encaminhamentos
para estudos futuros.
21
CAPÍTULO I
REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA
22
“A língua não é um instrumento autônomo de codificação, produção e
transmissão de sentidos objetivos unívocos e claramente inscritos no texto.
Embora apresente certa estabilidade formal, a língua é uma atividade
contextualmente situada, cognitivamente determinada, social e
historicamente constituída”(Marcuschi, 1998, p.16)
Considerações iniciais
Este capítulo está dividido em quatro seções: a primeira discute os métodos
e as abordagens de ensino de LE e o papel dos professores e alunos em cada uma delas;
a segunda concentra-se em quando e como a interação ganha importância nos estudos
de aquisição e ensino de uma língua estrangeira, mais especificamente no ensino de
inglês; a terceira seção discute a relevância do estudo das crenças de forma
contextualizada nas pesquisas com foco no professor e nos alunos. Enfim, a última
seção apresenta as pesquisas sobre os dilemas e conflitos vivenciados pelos professores
na prática docente. Tal discussão é relevante, pois entende-se que a forma de ensinar do
professor é composta, além de outros aspectos, de sua compreensão do que é língua e do
que é ensinar e aprender língua em contextos variados.
1.1. As abordagens de ensino e a formação de professores de língua inglesa
Nesta seção discutem-se as abordagens
5
de ensino de línguas estrangeiras e
os diversos papéis assumidos por professores e alunos em cada uma delas, partindo-se
da distinção entre língua, ensino e aprendizagem.
5
Abordagens são as posições teóricas e crenças sobre a natureza da linguagem e ensino-aprendizagem e sua relação
com os contextos de ensino. Metodologias são as práticas pedagógicas e método é o conjunto de especificações para a
sala de aula para que se atinjam os objetivos de aprendizagem (Brown, 1994 b, p.51).
23
Língua, segundo Brown (1994, p.05), é um conjunto de símbolos arbitrários
que podem ser vocálicos ou visuais. Esses símbolos são convenções dos significados a
que eles se referem. A língua, segundo o autor acima citado, é sistemática, gerativa e
usada pelos humanos para a comunicação. Ela opera no discurso e na cultura de uma
comunidade e é adquirida por todos da mesma forma.
“A consolidation of the definitions of language yields the following
composite definition:
Language is systematic and generative.
Language is a set of arbitrary symbols.
Those symbols are primarily vocal, but they may also be visual.
The symbols have conventionalised meaning to which they refer.
Language is used for communication.
Language operates in a speech community or culture.
Language is essentially human, although possibly not limited to humans.
All people acquire language in much the same way - Language and language
learning both have universal characteristics
6
.” (Brown, 1994, p.05).
Na nossa opinião, esta definição é satisfatória para os nossos objetivos, pois
ela leva em consideração os fatores sintáticos, semânticos, fonológicos, pragmáticos e
discursivos. Contudo, seria necessário mencionar que a língua sofre influências
culturais, não podendo ser definida apenas como símbolos arbitrários. Além disso, não
podemos afirmar que os processos de aquisição se dão da mesma forma. O processo de
aquisição da língua materna é diferente do processo de aquisição de uma língua
estrangeira e, conseqüentemente, o ensino também pode se dar de maneiras desiguais.
Ensinar, segundo Brown (1994, p.07), é mostrar ou ajudar alguém a
aprender a fazer algo; guiar, dar instruções, levar ao conhecimento. Esta definição
6
Tradução da autora: Uma consolidação de definições de língua produz a seguinte definição:
- A língua é sistemática e gerativa.
- A língua é um conjunto de símbolos arbitrários.
- Esses símbolos são primeiramente vocálicos, mas podem ser visuais.
- Esses símbolos têm significados convencionados ao que se referem.
- A língua é usada para a comunicação.
- A língua opera no discurso e na cultura de uma comunidade.
- A língua é essencialmente humana, embora possivelmente não limitada aos humanos.
- Todas as pessoas adquirem a língua da mesma forma
- A língua e aprendizagem de uma língua têm ambas características universais.
24
corrobora com Gage (1964, p.269
7
citado por Brown 1994, p.07), que notou que para
satisfazer a demanda prática da educação, as teorias de aprendizagem deveriam estar
associadas às teorias de ensino. Este, por sua vez, guia e facilita a aprendizagem,
capacitando o aluno a aprender estabelecendo condições para o seu aprendizado. A
compreensão de como o aluno aprende vai determinar não só a filosofia de educação, o
estilo, a abordagem de ensinar, os métodos e técnicas, como também o papel dos
participantes no processo de ensino/aprendizagem. Constata-se que, quando a visão de
língua muda, conseqüentemente, a abordagem de aprender e ensinar sofre alterações e o
papel que os participantes assumem envolve diferentes tipos de trabalho, níveis de
responsabilidade, relações de poder, padrões de interação e comunicação (Richards &
Lockhart, 1996, p.98).
Partindo do pressuposto de que as teorias de aquisição sempre variaram de
acordo com os conceitos de língua que o homem formulou, Brown (1994, p.12) afirma
que este padrão revolucionário é normal e todas as ciências passam por ele. Num
primeiro momento, estabelece-se um paradigma; num segundo momento segue-se um
período de dúvidas, questionamentos, crises e insegurança entre os profissionais; por
fim, num terceiro momento surge um novo paradigma ou uma nova teoria. Essas
mudanças de visão ou de perspectivas refletem na reformulação das abordagens e
métodos de ensino.
Mackey (1974, p.138) afirma que sempre houve a preocupação em vencer o
efeito de pêndulo existente na criação de métodos de ensino. O movimento pendular
existe na medida em que as concepções foram mudando, novos métodos foram surgindo
e as abordagens foram de um extremo a outro, por exemplo, podemos citar a análise da
língua e a metodologia de gramática e tradução, o uso da língua e a abordagem
7
GAGE, N. Handbook of research on teaching. Chicago: Rand McNally & Company. 1964. Apud: BROWN, D. H.
Principles of language learning and teaching. Engleawood Cliffs NJ: Prentice Hall Regents, 1994.
25
comunicativa, etc. Mackey (1974, p.05) descreveu esta oscilação teórica categorizando
as visões de aquisição como mecanicista ou estrutural e mentalista ou cognitiva. Nas
próximas subseções serão discutidas essas visões mais detalhadamente.
1.1.1. Visão mecanicista ou estrutural
Na abordagem estrutural, a língua é um sistema de elementos que são
definidos em termos de unidades gramaticais e relacionados estruturalmente para
codificar o significado (Richards, 1985, p.18). Como todas as atividades humanas, a
língua, é uma corrente de causa material e conseqüências. A aprendizagem dela, nesta
perspectiva, ocorre quando os alunos adquirem essas unidades por meio de
condicionamento respondente e operante. Respondente quando o aluno é visto como o
ser que aprende quando recebe um estímulo e, conseqüentemente, dá uma resposta. E
operante quando há uma seqüência ordenada de estudos onde o professor recompensa
cada resposta dada pelo aluno com estímulos reforçadores. O estímulo-reforço aparece
depois da resposta e aumenta a probabilidade de ocorrência futura (Rogers, 1978, p.
331).
Os métodos sob a ótica mecanicista
8
surgiram de um movimento contrário
aos métodos de ensino de línguas estrangeiras através de tradução. De acordo com
Mackey (1974, p.144), esses métodos foram desenvolvidos baseados no princípio da
psicologia da ciência. Dois métodos iniciaram este movimento, o Método Natural
9
.
8
Richards (1998, p.34) nomeia as pesquisas dentro da visão mecanicista de pesquisas científicas, que são informadas
e validadas com base no experimento e investigação empírica.
9
Método natural- o aluno aprende a segunda língua da mesma forma que aprende a língua materna, partindo-se do
princípio de que ele aprende com a maturidade (Mackey, 1974, p.145). Parte-se de perguntas com respostas sobre
objetos e figuras. A aula é dada em L2, não há tradução e não se discute aspectos relativos à língua. Novas palavras
são ensinadas por inferência e a gramática é utilizada para corrigir erros. A ordem de desenvolvimento das
habilidades é: percepção e produção oral, leitura, escrita e gramática (Mackey, 1974, p.152).
26
desenvolvido por Haness em 1866 e o Método Direto
10
, criado por Gouin em 1880 com
base na obra “L’art d’enseigner et d’etudier les langues
11
.”
Em 1902, o Método Direto é considerado o método oficial de ensino de
línguas estrangeiras na França, Alemanha e Inglaterra (Mackey, 1974, p.144). Com tal
oficialização, vários países tentaram adaptá-lo à sua realidade. Vários autores
criticaram-no ou criaram métodos similares complementando-o, tais como: o Método
Eclético também chamado de Ativo, o Método Berlitz, o Método Psicológico e o Método
de Controle da Língua, todos dentro de uma visão estrutural. Nos referidos métodos,
como o afirma Richards e Lockhart (1996, p.102), o papel do professor era gerenciar e
monitorar o progresso dos alunos engajando-os em tarefas de aprendizagem. Cabia a ele
ainda comunicar claramente e dar um retorno crítico, informando os aspectos positivos
e negativos da produção dos alunos.
Como houve, na época, uma demanda pela língua falada, que não era muito
desenvolvida através do Método Direto, apesar de o ensino partir da habilidade oral,
alguns professores canadenses e americanos desenvolveram estudos e técnicas
diferentes na tentativa de reformular as propostas metodológicas. Este movimento ficou
conhecido como “The Reform Methods”. Um vasto projeto foi planejado e desenvolvido
entre os anos de 1920 e 1935 para solucionar o problema dos métodos por meio de
experimentos, período que, segundo Mackey (1974, p.144), foi considerado o império
ativo da experimentação na América.
A II Guerra Mundial fortaleceu este movimento de reforma em favor do
ensino de línguas através da oralidade. O exército, conveniado com as universidades,
10
Gouin aplicou o “princípio da associação de idéias, visualização, aprendizagem através dos sentidos, centros de
interesse e atividades do dia-a-dia” (Mackey, 1974, p.144). Parte-se da habilidade de produção oral, utiliza-se frases
(unidades básicas do discurso) e ensina-as através de gestos e figuras. A leitura é introduzida mais tarde como foco na
cultura do país estrangeiro. Os conhecimentos de gramática são adquiridos indutivamente pelos estudos de texto.
11
Esta obra relata a pesquisa desenvolvida pelo autor ao observar o desenvolvimento lingüístico de seu sobrinho. Ele
conclui que a aprendizagem de uma língua é, primeiramente, uma questão de transformar percepções em conceitos.
As crianças usam a língua para representar os conceitos, como meio de pensar e de representar o mundo.
27
criou o Programa de Treinamento Especializado do Exército que era baseado na
lingüística estrutural. Segundo Mackey (1974, p.144), as aulas eram em horário integral,
com exercícios de imitação da conversa natural, geralmente utilizando um nativo como
modelo.
Entre os anos 40 e 50, a escola da lingüística estrutural ou descritiva
aplicava o princípio da observação científica das línguas humanas. Brown (1994, p.09)
afirma que a “tarefa do lingüista estrutural era descrever as línguas humanas e
identificar características estruturais destas línguas
12
”. A língua poderia ser fragmentada
em pequenas unidades e estas poderiam ser descritas cientificamente e contrastadas
novamente para formar o todo. Partindo deste conceito, focalizava-se as respostas que
eram percebidas objetivamente, gravadas e medidas. Alguns métodos de ensino de
língua estrangeira foram formulados seguindo estes pressupostos.
Um exemplo desses métodos é o Método Audiolingual
13
, que surgiu no final
dos anos 40 e 50 utilizando-se dos pontos positivos do método direto, e rompendo com
o Método de Gramática e Tradução. Segundo Mackey (1974, p.154) este método foi
conhecido no início como Método de Memorização e Mímica ou Método Informante e
foi desenvolvido com o princípio da demonstração e repetição. A gramática era
apresentada indutivamente ou através de frases modelo. Nos níveis elementares havia
palestras, dramatizações e discussões e o professor era o modelo da língua ensinada. Ele
controlava, direcionava e estabelecia o ritmo da aprendizagem. Cabia a ele selecionar as
atividades de repetição para a prática das estruturas, corrigir os erros dos alunos e
manter o grupo atento à perfeição da produção (Richards e Lockhart, 1996, p.102).
12
Tradução da autora: the linguist’s task, according to the structuralism, was to describe human languages and to
identify the structural characteristics of those languages.
13
A teoria behaviorista ou comportamental é a base dos conceitos de ensino e aprendizagem utilizados nesse método.
28
1.1.2. Visão mentalista
A abordagem mentalista, vê a língua como veículo da expressão do
significado. Em tal visão, há uma ênfase maior no uso do que na estrutura lingüística,
como conseqüência, conduzem-se as atividades com mais ênfase na função do que na
forma. Este ponto de vista, segundo Mackey (1974, p.06), mantém uma distinção entre
o físico e o mental. Os atos de linguagem são principalmente atos mentais e, embora
eles possam ser relacionados com os atos físicos do discurso, são atos de um tipo
diferente. Nesta perspectiva, a compreensão do que é língua e como a apreendemos é
um fenômeno cognitivo e humano, não simplesmente um ato físico.
Essa linha de pensamento foi utilizada pela escola gerativa transformacional
nos anos sessenta, sob a influência das idéias de Chomsky. O referido autor adota uma
postura inatista e segundo ele, a língua não poderia ser fragmentada em pequenas
unidades e estas analisadas cientificamente em termos de estímulos observáveis e
respostas, sendo depois contrastadas para formar o todo.
“Language cannot be described as a system of organization of behaviour ...
To learn a language is to construct for oneself this abstract system, of course
unconsciously
14
” (Chomsky, 1973).
“…normal linguistic behaviour cannot possibly be accounted for in terms of
stimulus control, conditioning, generalization and analogy, patterns and habit
structures or dispositions to respond in any reasonably clear sense of these
much abused terms
15
” (Chomsky, 1966, p.73).
14 Tradução da autora: A língua não pode ser descrita como um sistema de organização de comportamentos...
Aprender uma língua é construir para si este sistema abstrato inconscientemente. CHOMSKY, N. For reasons of
state. Bangay, Suffolk. Fontana, 1973. In: LLOBERA, M. (Trad.) Competencia comunicativa. Documentos básicos
en la enseñanza de lenguas extranjeras. Madrid: Edelsa Grupo Didascalia, 1995.
15
Tradução da autora: Uma conduta lingüística normal não pode ser descrita em termos de controle de estímulos,
condicionamento, generalização e analogia, estruturas, estruturas de hábitos ou disposições a responder, de maneira
que seja claro o significado destes termos dos quais tanto se tem abusado. CHOMSKY, N. Cartesian Linguistics.
New York. Harper and Row. 1966. In: LLOBERA, M. (Trad.) Competencia comunicativa. Documentos básicos en la
enseñanza de lenguas extranjeras. Madrid: Edelsa Grupo Didascalia, 1995.
29
O lingüista gerativo está interessado, segundo Brown (1994, p.10), não só
em descrever a língua, mas em chegar a um nível de explicação adequado ao estudo da
língua. A lingüística gerativa tem foco no pensamento. Sob esta ótica, os pesquisadores
tentavam descobrir os princípios psicológicos de organização e função da linguagem. A
língua, segundo Llobera (1995, p. 09), é vista mais como uma competência do que uma
estrutura e a sua aprendizagem envolve uma capacidade cognitiva.
O método audiolingual é questionado na época em que a obra de Chomsky é
divulgada. Alguns métodos foram desenvolvidos para demonstrar que o Método
Audiolingual não era apropriado ao ensino de L2, tais como: o Método de Teoria e
Prática, o Método Fonético, o Método de Unidades, Método Cognato e o Método
Duplo (bilíngüe).
As filosofias comportamentais e cognitivistas influenciaram diretamente na
criação das teorias de aprendizagem e, conseqüentemente, nos métodos de ensino, nos
conteúdos e nos tipos de atividades trabalhados em sala de aula. Para Brown (1994,
p.10) houve uma revolução similar na psicologia e na lingüística. Tal revolução surgiu
com a investigação da adequação da teoria comportamental. Por um lado, os lingüistas e
psicólogos estruturais estavam interessados em compreender objetivamente o
comportamento em situações controladas. Por outro lado, os gerativistas e os
cognitivistas estavam interessados em responder aos porquês da aprendizagem que os
estruturalistas não tiveram instrumentos, naquele momento, para responder através do
estudo da razão e do pensamento. O quadro abaixo resume os dois paradigmas dentro da
lingüística e da psicologia:
30
ESCOLA DE
PSICOLOGIA
ESCOLA DE
LINGÜÍSTICA
CARACTERÍSTICAS
Behaviorista
Estrutural
Descritiva
Repetição e reforço
Condicionamento da aprendizagem
Estímulo e resposta
Respostas observáveis
Empirismo
Método científico
Performance
Estrutura superficial
Descrição – “o que”
Cognitiva
Gerativa
Transformacional
Análise e insight
Aquisição inata
Consciência
Racionalismo
Processo
Mentalismo, intuição
Competência
Estrutura profunda
Explicação – “Por que”
Quadro 01: Paralelo lingüístico psicológico (Brown, 1994, p. 12)
16
Uma terceira linha de pensamento se desenvolveu a partir dos anos 70 e
também influenciou a abordagem de ensinar LE. Alguns trabalhos ligados à Lingüística
Aplicada passam a definir língua como veículo para a realização das relações
interpessoais e para a atuação das transações sociais entre os indivíduos e dão a base
para a abordagem comunicativa. Esta abordagem será discutida na próxima seção.
1.1.3. Abordagem comunicativa
Esta perspectiva foi adotada a partir da década de setenta pois, segundo
Brown (1994, p.14), os lingüistas estavam interessados em pesquisar a natureza da
comunicação e da competência comunicativa e buscavam explicações para o processo
interativo da linguagem. Houve, também, o reconhecimento de que fatores afetivos e
cognitivos eram primordiais na aquisição de uma L2. O foco das abordagens de ensino
16
Quadro 1: Traduzido de: BROWN, H. D. Principles of language learning and teaching. Engleawood Cliffs NJ:
Prentice Hall Regents, 1994.
31
passa a ser ensinar os alunos a se comunicarem espontaneamente e de forma
significativa, desenvolvendo a competência comunicativa. Em outros termos, usar a
língua de forma adequada, para uma determinada função e em um contexto apropriado
(Savignon, 1997, p.25). Nessa abordagem, “forma e função são duas faces
indissociáveis de um par, uma vez que o sentido é a base para que estruturações
simbólicas possam ser organizadas” (Dutra e Mello, no prelo, p.02).
Baseando-se nas idéias de Halliday (1970)
17
e Hymes (1972)
18
, Canale &
Swain (1980) e, mais tarde, Canale (1983) propuseram o conceito de competência
comunicativa e seus sub-componentes. Competência comunicativa é o conhecimento
consciente e inconsciente da língua alvo e de outros aspectos referentes ao uso dessa
língua, bem como a habilidade de utilizar esses conhecimentos em comunicação real
(Canale, 1983, p.66). Ela é composta de sub-competências, a saber: gramatical, sócio-
lingüística, discursiva e estratégica. A competência gramatical ou lingüística, refere-se
ao conhecimento de vocabulário, regras de formação de palavras e sentenças, semântica,
pronúncia e grafia. A competência sócio-lingüística é o conhecimento das regras sociais
do uso da língua, ou seja, a habilidade de se distinguir o que dizer, onde e como. A
competência discursiva ou textual, é a capacidade de se conectar uma série de frases ou
atos de fala para formar um texto que possa significar, baseando-se no conhecimento de
mundo ou na familiaridade com o contexto, o leitor ou o ouvinte. Por fim, a
competência estratégica refere-se às estratégias que usamos para compensar as
17
Halliday afirma que a língua deve ser ensinada de forma social e situacional. Ela serve para expressar o conteúdo
(função ideacional), estabelecer e manter relações sociais (função interpessoal) e para que o falante possa distinguir o
discurso oral e escrito (função textual) (Halliday, 1970 apud Savignon, 1997).
18
“Temos que considerar o fato de que uma criança normal, adquire conhecimento das orações não só como
gramaticais mas também como adequadas (dentro de um contexto). E ela adquire a competência de distinguir quando
falar ou não, o que dizer a quem, quando, onde e de que maneira. Em resumo, uma criança começa a formar um
repertório de atos de fala, a formar parte de acontecimentos de fala e a avaliar sua aquisição por outros.”
HYMES, D. On communicative competence. Pride and Holmes, 1972. In: LLOBERA, M. (Trad.) Competencia
comunicativa. Documentos básicos en la enseñanza de lenguas extranjeras. Madrid: Edelsa Grupo Didascalia, 1995,
p.130.
32
imperfeições no uso da língua para manter a comunicação, por exemplo, paráfrase,
repetição, hesitação etc (Canale, 1983, p.66-70).
Na mesma época em que Canale & Swain (1980) e Canale (1983) definem
os componentes da competência comunicativa, desenvolvem-se paralelamente estudos
sobre o desenvolvimento dessa competência (Widdowson 1978, Breen & Candlin 1980,
Brown 1994 & Savignon 1997). Tais estudos demonstram que as técnicas de ensino de
língua devem objetivar o engajamento dos alunos nos usos pragmáticos, autênticos e
funcionais da língua. O uso da língua deve ser praticado de forma produtiva e repetido
em contextos não ensaiados. Ainda, segundo estes autores, para que os alunos aprendam
a se comunicar, a forma não pode ser o foco central. Deve-se dar ênfase a todos os
componentes da competência comunicativa e não restritamente à competência
gramatical ou lingüística. A gramática deve ser apresentada em categorias funcionais e a
fluência e precisão são vistos como aspectos complementares. O papel do professor,
segundo Richards e Lockhart (1996, p.103), nesse sentido, é o de facilitar o processo de
comunicação entre os alunos durante o desempenho das atividades. Ele atua como
participante independente, organiza recursos e guia os procedimentos. Ele é visto como
um “aprendiz e pesquisador”.
As pesquisas que comparavam os métodos realizadas entre os anos 40 e 70,
não chegaram a conclusões sobre qual método seria o mais eficaz. Com isso, elas
tomaram novos rumos. Pesquisadores começaram a focalizar na abordagem pessoal do
professor, no papel dos alunos, e nas estratégias de aprendizagem utilizadas por eles,
suas crenças e a interferências dos fatores contextuais na aprendizagem dos mesmos.
Ainda, a partir dessa época, a interação passa a ser vista como um componente essencial
para o desenvolvimento lingüístico.
33
Nas próximas seções serão discutidas algumas destas pesquisas
separadamente.
1.2. Foco no professor e na prática reflexiva
As pesquisas com foco no professor ganharam força nos anos 90. O
movimento denominado “formação reflexiva de professores” foi um avanço para a
pedagogia, pois, além de levar em consideração a aprendizagem do professor, “também
coloca a prática da sala de aula como um pré-requisito central para se chegar à
competência profissional” (Mattos, 2002, p.127).
Os estudos desenvolvidos acerca da prática reflexiva tiveram uma grande
influência dos pensamentos do filósofo John Dewey (1916)
19
que, ao determinar o
desenvolvimento do pensamento humano na experiência, afirmou que ela envolve uma
conexão do “fazer” ou “do experimentar” com algo que é vivido em “conseqüência”
dessa experiência. Segundo ele, a separação da fase de ação e da experiência vivida não
é possível, elas estão entrelaçadas. O pensamento, segundo ele, é a “instituição exata de
conexões entre o que é feito e suas conseqüências
20
.”
Dewey (1916) propôs um modelo educacional democrático em que o
objetivo maior era o estímulo do pensamento crítico dos alunos e dos professores. Ele
afirma que o estímulo do pensamento reflexivo é positivo quando se deseja determinar
sentido tanto às ações já executadas quanto às ações que serão executadas, ou seja, “as
reflexões sobre as ações e reflexões nas ações”. Então, através do pensamento reflexivo
19
Não foi possível enumerar as páginas pois os textos foram lidos na internet.
www.columbia.edu/publications/johndewey
20
“In determining the place of thinking in experience we first noted that experience involves a connection of doing or
trying with something which is undergone in consequence. A separation of the active doing phase from the passive
undergoing phase destroys the vital meaning of an experience. Thinking is the accurate and deliberate instituting of
connections between what is done and its consequences.” (John Dewey, 1916)
34
antecipam-se as conseqüências das ações. Esta reflexão crítica e a problematização
antecipada, segundo Dewey (1916), implica em uma busca de solução para as ações que
não foram executadas de forma satisfatória. Para aperfeiçoar esta hipótese, condições
existentes têm de ser examinadas cuidadosamente e as implicações devem ser
desenvolvidas, o que Dewey (1916) nomeia “raciocínio”. Quando o professor ativa sua
reflexão crítica na busca de soluções e ações modificadas, ele formula teorias
raciocinadas que têm de ser testadas em novas ações modificadas. Assim, o pensamento
humano, segundo Dewey (1916), inclui: o sentido de um problema, a observação das
condições, a formação e elaboração racional de uma conclusão sugerida, e um teste
ativo experimental. Quando o professor reflete de forma crítica sobre a experiência ao
invés de vivê-la simplesmente, inevitavelmente distingue entre sua própria atitude os
fatores que sustentam esta atitude. A reflexão sobre a experiência aumenta a distinção
do “quê” o professor vivencia como experiência e “como” ele vivencia a experiência.
Quando o professor estabelece esta distinção, ele pode alcançar um nível de raciocínio
mais apurado sobre o conteúdo que leciona e o método que utiliza, o que pode levá-lo a
executar ações modificadas e aperfeiçoadas
21
.
Há uma distinção entre ações de rotina e as ações reflexivas. Nesta
distinção, nomeiam-se as ações de rotina como aquelas que o professor faz
automaticamente sem nenhuma crítica. As reflexivas, por outro lado, significam um
21
Paráfrase de (…) “The stimulus to thinking is found when we wish to determine the significance of some act,
performed or to be performed. Then we anticipate consequences. This implies that the situation as it stands is, either
in fact or to us, incomplete and hence indeterminate. The projection of consequences means a proposed or tentative
solution. (...) To perfect this hypothesis, existing conditions have to be carefully scrutinized and the implications of
the hypothesis developed - an operation called reasoning. Then the suggested solution - the idea or theory - has to be
tested by acting upon it. (…) Thinking includes all of these steps, - the sense of a problem, the observation of
conditions, the
formation and rational elaboration of a suggested conclusion, and the active experimental testing. (…)
While all thinking results in knowledge, ultimately the value of knowledge is subordinate to its use in thinking. (…)
When we reflect upon an experience instead of just having it, we inevitably distinguish between our own attitude and
the objects toward which we sustain the attitude. (…) Getting an idea of how the experience proceeds indicates to us
what factors must be secured or modified in order that it may go on more successfully” Such reflection upon
experience gives rise to a distinction of what we experience (the experienced) and the experiencing - the how. When
we give names to this distinction we have subject matter and method as our terms. (Dewey, 1916)
35
processo que envolve as ações, crenças, práticas, o estabelecimento e a solução de
problemas levando em conta a intuição e as emoções do professor (Dewey,1933
22
).
Schön (1983) também precursor do movimento reflexivo, baseando na
distinção proposta por Dewey (1933), utilizou-se da análise das pessoas sobre suas
próprias ações de modo a incentivá-las a compreender e construir o conhecimento a
partir das auto-análises. Schön (1983) corrobora as idéias de Dewey (1916) e afirma que
o estímulo de ações reflexivas sistemáticas, podem ser feitas seguindo dois modelos: a
“reflexão-sobre-a-ação” e a “reflexão-na-ação
23
” que são essenciais para o
desenvolvimento da prática docente. Segundo ele, este processo espiral de reflexão e
ação modificada pode criar um ciclo de reinterpretação e reconstrução da prática.
Insatisfeito com os modelos de formação de professores anteriores, Wallace
(1991) propôs um modelo de formação reflexiva que relaciona a história de vida do
professor à sua prática, baseando-se nas idéias de Schön (1983). Este modelo propõe,
segundo o autor acima citado, que para se compreender melhor o desenvolvimento
profissional do professor, deve-se levar em consideração não somente os conhecimentos
formais recebidos por ele, mas também as experiências vividas. O modelo de formação
proposto é dividido em estágios; pré-treinamento, desenvolvimento da formação
profissional e da competência profissional (Modelo no anexo A).
O estágio do pré-treinamento é o momento em que todas as experiências
anteriores de aprendizagem que os professores trazem consigo, quando atuam em sala
de aula, determinam a maior parte de suas ações (Wallace, 1991, p.50). Considera-se
que os professores trazem suas crenças e valores que foram e ainda são construídos
22 DEWEY,J. How we think. Lexington: D. C. Heath. 1933. In: SCHÖN, D. The reflective Practitioner. New York:
Basic Books, 1983.
23
A reflexão sobre a ação ocorre quando o professor reflete antes e depois da ação, no momento do planejamento e
após a aula ao verificar o sucesso dos alunos no processo. A reflexão na ação ocorre durante a ação, quando os
professores ajustam sua instrução levando em consideração as reações dos alunos ou problemas que podem ocorrer
durante a aula (Schön, 1983 apud Zeichner & Liston, 1996, p.22).
36
socialmente e culturalmente durante a vida. No estágio de formação inicial e
continuada, considera-se que essa formação envolva os conhecimentos formais que este
professor recebe na escola quanto à sua experiência prática. Estes conhecimentos em
conjunto com as crenças é que vão determinar a prática do professor. O conhecimento
formal e o conhecimento experiencial são interligados por uma seta bidirecional,
demonstrando uma relação de reciprocidade. Wallace (1991, p.52) ressalta que o
conhecimento ou insumos adquiridos devem ser ensinados e apreendidos com maior
ênfase na prática. O professor em formação deve ter meios de aplicar este conhecimento
à prática. Desta relação de reciprocidade, parte-se para o ciclo da reflexão e prática que
deve ser contínuo, formalizado e relacionado ao conhecimento adquirido e experiencial
do professor. Com isto, o professor pode desenvolver uma competência profissional
diferente e mais crítica.
Com este modelo, Wallace retratou a importância de relacionar o que os
professores em formação trazem para o curso, o que eles ganham com a formação e
também, a importância de se quebrar as barreiras entre o conhecimento formal e o
conhecimento advindo da experiência. O papel do professor, nessa perspectiva, passa a
ser de pesquisador e construtor de sua própria abordagem de ensinar aliando a pesquisa
à prática, levando em conta suas crenças e experiências, diferentemente do papel que
era assumido pelos professores nas abordagens anteriores. A prática reflexiva pode ser
apreendida ou desenvolvida seguindo certos procedimentos, tais como: a escrita de
diários, observação e gravação de aulas e pesquisa-ação (Gebhard & Oprandy, 1999,
p.81).
O professor pode desenvolver teorias pessoais através da prática consciente
(Zeichner & Liston, 1996, p.31). Estas teorias são baseadas no conhecimento
37
transmitido nas experiências instrucionais, nas crenças e valores dos professores
24
.
Segundo os autores acima citados, as teorias pessoais são constituídas no contexto
social em que o professor está inserido, no tipo de reflexão que ele faz sobre a ação
pedagógica e nas metáforas e imagens que ele constrói ao longo da carreira acadêmica.
A abordagem pessoal de cada professor se manifesta a partir de três de seus
componentes constitutivos, a saber: a concepção de língua/linguagem/língua
estrangeira, a concepção de ensinar e a concepção de aprender (Almeida Filho, 1999,
p.11). Elas se apresentam, na realidade, em níveis ou combinações variáveis. A
interpretação e a interação contínua e compreensiva são a chave para uma prática
reflexiva e uma tomada de consciência de sua prática pedagógica. Esta perspectiva de
ensinar se opõe à concepção tradicional anglo-saxônica de treinamento do profissional.
Segundo o mesmo autor, o desejo da compreensão da prática deve partir,
primeiramente, do professor que se propõe a adotar uma atitude consciente, mas a
mudança não pode ser isolada, deve alcançar os cursos de formação de professores, os
alunos, materiais, comunidade escolar e legisladores.
Almeida Filho acrescenta que o professor deve constituir a raiz de seu
ensinar não só promovendo um diálogo consigo mesmo e com possíveis observadores
como também examinando a possibilidade de interpretar a formação subjacente a sua
abordagem de ensinar. O exame da prática pode ser feito de forma etnográfica,
qualitativa e interpretativista, com triangulação da teoria pertinente, as percepções do
professor e do observador sobre as aulas gravadas. É possível que o confronto entre a
interpretação do professor sobre sua prática com a imagem real da prática cause um
24
As experiências pessoais incluem as experiências enquanto aluno, com professores e regras instrucionais
diferentes. O conhecimento transmitido tem relação com o conhecimento que os professores compartilham com os
outros, com a vida acadêmica, mídia, cultura e outros aspectos. Handal and Lauvas (1987) apud Zeichner & Liston
(1996, p. 31) definem os valores como o que os professores consideram benéfico ou não para a educação no geral.
Segundo eles, estes valores podem influenciar em como os professores interpretam suas experiências e o
conhecimento transmitido que eles recebem do mundo. Estes aspectos a que os professores são expostos são aceitos
ou rejeitados para construção de suas teorias.
38
estranhamento capaz de provocar vontade de mudanças e de estimular a compreensão
da parte implícita ao professor (crenças, valores e conhecimento) e suas inter-relações
com as condições explícitas às quais ele está inserido.
Se o professor atua dentro da perspectiva reflexiva, ele pode, segundo
Almeida Filho (2001, p.20), desenvolver cinco competências, a saber: lingüístico-
comunicativa, implícita, teórica, aplicada e a profissional. A competência lingüístico-
comunicativa é orientada pela capacidade de produção lingüística, e a habilidade de
distinguir como, onde e quando se utiliza certos padrões lingüísticos. A competência
implícita é a que nós desenvolvemos a partir das experiências de aprender línguas que
vivemos. A teórica é relativa ao corpo de conhecimentos que podemos enunciar. A
aplicada se refere ao ensino que podemos realizar orientado e explicado pela
competência teórica que temos. Já a competência profissional é o nosso reconhecimento
do valor de ser professor de língua estrangeira, nossa responsabilidade pelo avanço
profissional próprio e dos outros e as ações correspondentes (Almeida Filho, 2001,
p.20). Estas competências quando estão em desenvolvimento tem um movimento de ir e
vir que é comum à cultura de ensinar. Neste movimento de desenvolvimento de
competências, o professor pode tanto compreender gradualmente a sua abordagem
quanto a qualidade e composição e é possível também inteirar-se do nível de
competências/desempenho em um dado momento investigado.
Ressalta-se a importância de valorizar a auto-investigação da prática para a
construção da competência profissional que leva em consideração as crenças, as teorias
de ensino e aprendizagem e o estilo de interação que o professor acredita ser apropriado
para sustentar suas teorias (Brown 1994, Richards e Lockhart 1996, Zeichner & Liston
1996, Vieira Abrahão, 1999, Dutra 2001). Os autores acima mencionados afirmam que
a prática reflexiva é uma abordagem em que há um diálogo colaborativo entre
39
professores e a avaliação de suas práticas. Esta abordagem pode levar o professor a
desenvolver a consciência crítica da prática, criar teorias próprias, desenvolver
autonomia e segurança na tomada de decisões, visto que pode fazer com que o professor
compreenda o processo de ensino e aprendizagem, definindo a abordagem de ensinar a
partir da sua compreensão. A ligação entre sua abordagem de ensinar e sua prática
docente é a chave da dinâmica do ensino.
1.3. O papel da interação na sala de aula de língua inglesa
De acordo com o que discutimos anteriormente, desde o advento da
abordagem comunicativa, há uma tendência do ensino de línguas focado na interação
em sala de aula. Para promover a comunicação e a negociação de sentido, há uma
preocupação do professor em fazer um trabalho diversificado de forma a aumentar as
oportunidades de os alunos interagirem. Há, por exemplo, uma certa ênfase em
trabalhos em pares e em grupos, o que não acontecia nas abordagens anteriores.
Existe uma grande discussão acerca do conceito de interação. Pensa-se que
ele seria complexo e não teria sido ainda definido de maneira clara. Pesquisadores da
área de lingüística aplicada, entre eles, os sócio-interacionistas, debatem sobre a melhor
forma de definir o termo. A relevância da interação para a aquisição de uma língua
estrangeira é comprovada, porém, de que forma ela favorece a aprendizagem é um fato
que ainda gera controvérsias. Algumas linhas de pesquisa podem ser tomadas como
base para se discutir o que é interação: processamento de insumos, modificação do
discurso, negociação de sentido, interação social e análise da conversação (Lamy &
Goodfellow, 1999, p.44). Os estudos destas linhas foram baseados na idéia de insumo
compreensível postulada por Krashen (1982). Segundo ele, a aquisição acontece quando
40
o aprendiz compreende o insumo (i) que contém algumas formas além de seu atual nível
de proficiência (i + 1). Ao compreender o insumo, a interlíngua do aluno
necessariamente avança. Neste modelo, quanto mais insumos compreensíveis o aluno
receber, maior será a aquisição da língua. Krashen é muito criticado, pois rejeita a
importância da produção na aquisição de uma L2 ou LE. Parece-nos que tornar o
insumo compreensível é central no processo de aquisição da L2 ou LE. A seguir
apresentamos algumas pesquisas na área.
1.3.1. Modificação do discurso
Um primeiro grupo de pesquisadores focalizam na fala do estrangeiro (FT) e
demonstram, segundo Hall e Verptaetse (2000, p.02), que o nativo modifica seu
discurso utilizando estratégias e táticas
25
quando fala com um falante “não nativo”. Esta
modificação serve de insumo para que o falante não nativo aprenda. Long (1983, p.126)
constatou que a modificação na estrutura interacional da conversa é mais positiva para a
aquisição da LE do que somente a compreensão do insumo. Mackey (1998, p.339)
também discute a interação conversacional postulada por Hatch (1978), Long (1983,
1985, 1996) e Pica (1986) como um fator que pode ser facilitador da aquisição de uma
L2 e Ellis (1991) apud Gallaway e Richards (1994, p.230) acrescenta que a qualidade da
modificação interacional é que facilita a aquisição trazendo informações lingüísticas
específicas para o aprendiz.
25
As estratégias são utilizadas para evitar problemas na conversa. A tática ou reparo é utilizado para solucionar um
problema ocorrido durante a conversa. No discurso do não nativo com o nativo, há o uso de estratégias e táticas e elas
são favoráveis ao desenvolvimento da interlíngua do não nativo (Long, 1983, p.126).
41
1.3.2. Negociação de sentido
Um segundo grupo de pesquisadores dá ênfase à importância do papel do
falante não nativo na interação através da negociação de sentido (Hall e Verptaetse,
2000, p.02). Trabalhos como Gass e Varonis (1991),Pica (1997), Boulima (1998),
Foster (1998) ressaltam que o insumo deve ser compreensível para os alunos, mas que é
a negociação que aumenta as chances de o insumo tornar-se compreensível.
Esta negociação é possível através da produção colaborativa dos alunos.
Swain (1985, p.235) propôs a hipótese da produção, afirmando que somente o insumo
compreensível não é suficiente para a aquisição de uma L2, a não ser que o aprendiz
tenha a oportunidade de produzir. A atenção é voltada para a relação da compreensão do
insumo e a produção dentro do nível de proficiência e competência lingüística do aluno.
Quando um aluno tem a oportunidade de produzir a língua, o insumo negativo ou o
retorno que ele recebe indicando que a produção dele não foi bem sucedida, faz com
que ele perceba a lacuna de conhecimento lingüístico que há entre o que ele quer
produzir e a sua habilidade em fazê-lo. Quanto ele tenta utilizar-se de sua interlíngua,
ele testa hipóteses e reflete sobre a organização do sistema lingüístico. Esta reflexão,
aliada às negociações de sentido, leva à aquisição da LE (Swain, 1985, p.235). Nesta
perspectiva, a LE ou L2 é adquirida através da interação dos alunos que têm a
oportunidade de produzir e negociar sentido, ou seja, para se fazerem compreendidos,
tanto o falante quanto o ouvinte, produzem um discurso modificado para compreender o
significado da mensagem, prestando atenção não só à forma da L2, mas também na
função comunicativa (Chapelle, 1997, p.22
26
).
26 CHAPELLE, C. A. CALL in the year 2000: still in search of research paradigms? Language learning e
technology. I(1). Retrieved from. http://www polyglot.sal.msu,edulllt.vol1num1lchapelledefault, January, 24
th
1999.
In: LAMY, M. N. GOODFELLOW, R. "Reflective Conversation". The Virtual Language Classroom. Language
Learning & Technology. v.2, n. 2, p.43-61, January, 1999.
42
Em síntese, a produção promove a oportunidade para o uso significativo dos
recursos lingüísticos forçando o aprendiz a usar a língua de forma contextualizada. Com
isto, ele testa hipóteses sobre a língua alvo e pode, assim, ir de uma análise semântica
para uma análise sintática da língua (Swain, 1985, p.248). As tarefas de negociação de
sentido são benéficas para a aquisição, pois diminuem a ansiedade dos alunos,
aumentam as chances de participação e podem ser aplicadas a alunos de diferentes
níveis de proficiência (Pica & Doughty, 1985, Foster, 1998, Porter, 1983).
1.3.3. Foco na fala dos professores
Outros pesquisadores direcionam seus estudos para a fala dos professores a
fim de compreenderem como eles modificam o discurso para torná-lo compreensível. A
fala do professor ajuda a explicitar a atenção dos alunos às formas sintáticas e facilita o
desenvolvimento do conhecimento e uso destas formas na L2 ou LE (Schimidt, 1994,
Hall e Verptaetse, 2000). Pesquisas com enfoque na correção de erros, uso de perguntas,
velocidade e quantidade da fala do professor, são exemplos de trabalhos desta natureza..
Esta linha de estudos também enfatiza que a compreensão do insumo é um processo
consciente e ele se dá através do princípio da percepção da lacuna do conhecimento. O
insumo negativo é considerado benéfico à aquisição da LE reforçando a importância da
instrução formal (Schimidt e Frota, 1986, p.312).
Durante uma aula de LE ou L2, existem vários padrões de interação
conversacional entre o professor e os alunos. Estes padrões se diversificam entre
monólogos, diálogos e conversas dependendo do nível da relação simétrica entre
professores e alunos. Lamy & Goodfellow (1999, p.44), baseados em Van Lier (1996),
43
discutem estes padrões conversacionais que ocorrem entre o professor e os aprendizes.
A descrição destes padrões é motivada pela análise convencional das relações de poder
existentes na sala de aula. Os referidos autores consideram “monólogos” os trechos das
aulas em que o modo de transmissão é centralizado no professor, este, por sua vez,
mantém o domínio total dos turnos durante explicações excessivas ou até mesmo segue
o formato de uma palestra. “Diálogos” são os momentos em que os turnos se alternam
entre o professor e alunos e vice-versa. Neste padrão os turnos são sempre iniciados e
controlados pelo professor. Como padrão de “conversação”, os autores consideram os
momentos em que há uma simetria comunicativa em termos de distribuição dos turnos e
papéis, ou seja, os turnos são distribuídos de forma mais uniforme entre professores e
alunos. Provavelmente, há maior qualidade na aprendizagem em situação de conversa,
pois os turnos são distribuídos mais igualmente pelos participantes da conversa,
propiciando aos alunos oportunidades para o seu desenvolvimento lingüístico.
Para que estes padrões sejam benéficos à aprendizagem, deve haver uma
mesclagem entre a estrutura monológica, dialógica e conversacional de forma a
proporcionar a produção de insumo compreensível, o gerenciamento da interação e a
negociação de sentido (Lamy & Goodfellow, 1999, p.44). Esta mesclagem é
conceituada por estes autores como interação contingente e ela pode ser benéfica à
aprendizagem e ao desenvolvimento da autonomia dos alunos. Ela acontece quando há
uma boa distribuição de turnos e papéis, quando há um bom nível de compreensão por
parte dos alunos e a imprevisibilidade dos resultados.
Parece-nos que todos os padrões são importantes para a aquisição de uma
língua estrangeira. O aluno necessita de momentos em que o professor possa prover
insumos para a sua aprendizagem. É relevante também que ele tenha a oportunidade de
produzir a língua alvo para o desenvolvimento da sua interlíngua. Acreditamos que
44
muitas das vezes, estes momentos de produção têm que ser um pouco controlados, ou
pelo professor ou pelo tipo de tarefa. É necessário também que o aluno tenha
oportunidades de se expressar livremente na língua alvo. Uma boa aula deve contemplar
todos estes padrões de interação de forma uniforme.
1.3.4. Perspectiva sócio-cultural da aprendizagem
Os estudos desenvolvidos sob a ótica sócio-cultural ou interacionista
verificam como a ordem social é constituída na interação (Van Lier, 1996, p.184). Esta
linha de pensamento foi inspirada nos princípios do materialismo dialético de Marx e
Engels e foi desenvolvida por Vygotsky (Rego, 1998, p.28). Ele procurou construir uma
nova psicologia integrando o homem enquanto corpo e mente, ser biológico e social,
membro da espécie humana e participante de um processo histórico e cultural. Seu
objetivo era “caracterizar os aspectos tipicamente humanos do comportamento e
elaborar hipóteses de como essas características se formaram ao longo da história
humana e de como se desenvolvem durante a vida do indivíduo”. (Vygotsky, 1984
27
,
p.21 apud Rego, 1998).
Nesta perspectiva, o desenvolvimento do indivíduo está localizado no
discurso e nas atividades socioculturais que ele desempenha (Hall e Verptaetse, 2000,
p.07). De acordo com Rego (1998, p.72), Vygotsky identificou dois níveis de
desenvolvimento humano: um que se refere às conquistas já efetivadas pelo indivíduo
(desenvolvimento real) e o outro que se relaciona às capacidades a serem construídas
por ele (desenvolvimento proximal). Para Vygotsky, a aprendizagem depende da
27 VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo, Martins Fontes, 1984. In: REGO, T. C. Vygotsky:
Uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis. Editora Vozes, 1998.
45
participação repetida dos indivíduos em atividades colaborativas. Nestas atividades, os
indivíduos têm a oportunidade de desenvolver a ZDP (zona de desenvolvimento
proximal) que é a distância entre o desenvolvimento real e potencial, ou seja, é a
diferença entre o que uma pessoa pode alcançar sozinha e o que ela pode fazer quando
recebe a ajuda de alguém mais experiente ou de um outro recurso cultural (Lantolf,
2000, p.17). A pessoa mais experiente ou o recurso serve como andaime para que o
outro se desenvolva. Quando o “andaime” ocorre há a evidência de que se está
trabalhando ou desenvolvendo a ZDP. “A mediação é a chave para a construção do
conhecimento” (Lantolf, 2000, p.17).
Pode-se afirmar que a visão sócio-interacionista se baseia em três premissas:
a) A mente individual é criada na busca de ações nos mundos sociais e materiais.
Constituir estes mundos é uma mistura variada de atividades cujos objetivos são
intelectualmente direcionados à prática (Hall e Verptaetse, 2000, p.08);
b) A aprendizagem se dá através de ferramentas físicas e simbólicas que os seres
humanos utilizam para mediar e regular as relações com os outros e com eles mesmos,
com o objetivo de mudar a natureza destas relações (Lantolf, 2000, p.01). Estas
ferramentas são os recursos com os quais o aluno internaliza e cria valores culturais,
incluindo os comunicativos e outros recursos construtores de significado. A forma como
ele utiliza estas ferramentas, transforma e constrói o conhecimento e a competência
comunicativa (Hall e Verptaetse, 2000, p.09);
c) A mente e o mundo externo estão unidos (Hall e Verptaetse, 2000, p.09).
Sendo assim, o desenvolvimento cognitivo é moldado através destas
atividades colaborativas que vão se constituindo em um conhecimento moldado pela
experiência. O diálogo colaborativo passa a ser um meio para construir o conhecimento,
desenvolvendo a compreensão e a fluência na língua. O professor, nesta perspectiva,
46
assume o papel de mediador no processo, podendo promover momentos em que os
alunos trabalhem de forma mais interativa, construindo seu próprio conhecimento de
forma colaborativa, testando hipóteses e solucionando problemas. Os alunos, por sua
vez, assumem o papel de membros culturais aprendendo a usar a língua estrangeira para
alcançar objetivos sociais e cognitivos no novo contexto cultural que se constrói.
1.3.5. Foco na conversação
A análise da conversação é uma outra perspectiva para se analisar a
interação. Ela se desenvolveu com base na sociologia nos anos 60 como uma variante
da etnometodologia (Heap, 1997, p.217). Nestes estudos, faz-se a análise das relações
entre língua e o contexto em que ela é usada (McCarthy, 1991, p.05), tentando
compreender como falantes e ouvintes constroem a interação social através do uso de
regras e de procedimentos.
A conversação analisada nestes estudos é, segundo Goffman (1963, p. 24
28
)
apud Goodwin (1981, p.02), a interação focalizada, ou seja, o tipo de interação que
ocorre quando duas ou mais pessoas se juntam e cooperam abertamente através da fala.
Este tipo de pesquisa pode incluir a análise de comportamentos lingüísticos e não
lingüísticos. Segundo Goodwin (1981, p.02), há análises dos turnos
29
e da organização
da tomada de turnos que revelam regras que se diferenciam nos contextos. De acordo
28
GOOFMAN, E. Behavior in public places. Free Press, 1963. Apud: GOODWIN, C. Conversation interaction
between speakers and hearers. New York: Academic Press, 1981.
29
O turno é constituído de uma fala seguida da outra e sua definição não pode ser de uma unidade estática, mas sim
de um processo de tempo ilimitado. A tomada é o momento de transição de um turno para o outro. Há problemas com
a delimitação das tomadas de turno, tais como, as falas simultâneas e o silêncio entre os turnos. Estados particulares
de orientação mútua entre falante e ouvinte são relevantes para a estrutura do turno. (Goodwin, 1981, p.02 )
47
com Sacks, Schegloff & Jefferson (1978, p. 7) estas tomadas de turno
30
são utilizadas
para ordenar, alocar, regular a conversação em diferentes contextos e situações.
A sala de aula, como qualquer ambiente lingüístico, também tem uma
organização conversacional. Esta organização tem sido um assunto muito pertinente nas
pesquisas da lingüística aplicada. Através deste tipo de análise torna-se possível
compreender melhor como se dão os processos interacionais, o tipo de abordagem do
professor e aspectos referentes à participação dos alunos.
Embora as pesquisas sobre interação tenham sido desenvolvidas sob
diferentes perspectivas, elas compartilham algumas suposições comuns sobre a natureza
da aprendizagem de línguas. As pesquisas sócio-culturais e com foco na análise da
conversação se preocupam em como a ordem social é construída através das interações
lingüísticas (Vygotsky, 1984, McCarthy, 1991, Heap, 1997). Todas partem do
pressuposto que o insumo deve ser compreensível para que a aprendizagem da LE
aconteça. As pesquisas sobre a modificação do discurso e com foco na fala dos
professores se interessam em compreender as regras da negociação para o
desenvolvimento da interlíngua (Lamy & Goodfellow, 1999, Hall & Verptaetse, 2000).
Estas perspectivas são de grande relevância, pois nos ajudam a compreender melhor o
corpus dos contextos estudados.
30
A tomada de turno se dá de forma organizada, e esta organização é um instrumento que modela e dá corpo a
conversa. A tomada de turno é um sistema de gerenciamento local e interacional Este sistema é considerado local,
pois é direcionado e gerenciado ao próximo turno. Ele opera de forma a permitir a variação da ordem e do tamanho
do turno através da interação dos falantes. O tamanho do turno pode ser caracterizado por dois aspectos diferentes da
organização sentencial: a multiplicação da unidade sentencial em um turno e o aumento da complexidade da
construção sintática com unidades sentenciais simples (Sacks, Schegloff & Jefferson, 1978, p. 41).
48
1.4. As crenças de professores e alunos no processo de ensino e de aprendizagem de
língua estrangeira
As pesquisas sobre a influência das crenças no ensino e na aprendizagem de
línguas surgiram nos meados dos anos 80 e como o assunto é relativamente recente,
ainda gera controvérsias.
O conceito de crenças, por ser julgado muito abrangente, ainda não foi
definido de maneira clara. As crenças foram definidas como componentes do
desenvolvimento da prática que influenciam na conceituação e nas decisões dos
professores (Nespor, 1987, p.317). Nespor fez uma tentativa de enumerar e descrever as
crenças correlacionando-as com padrões de comportamento específicos. Para tal, ele
desenvolveu um sistema de análise das crenças comparando-as ao conhecimento formal
baseando-se na psicologia e ciência cognitiva. Neste estudo ele concluiu que não há
regras que determinem o sistema de crenças. Segundo ele, o sistema de crenças
demonstra a forma como os professores compreendem o ensino.
As crenças dos professores foram também definidas como uma estrutura em
rede as quais não podem ser analisadas de forma isolada (Pajares, 1992, p.307). O
referido autor afirma que o sucesso ou o fracasso educacional depende das crenças que
os educadores têm sobre os processos de ensino e aprendizagem.
A exploração das crenças pode ajudar os professores a compreenderem
melhor sua prática docente. Nisbett and Ross (1980)
31
afirmam que as crenças podem
influenciar as percepções e as ações humanas. Elas têm efeito de filtro dos pensamentos
e dos processos de decisão dos professores. Nespor (1987, p.320) acrescenta que a
31 NISBETT, R. ROSS, L. Human inferences: Strategies and shortcomings of social judgments. Englewood Cliffs,
NJ: Prentice-Hall, 1980. In: JOHNSON, K. E. The emerging beliefs and instructional practices of Preservice English
as a second language Teachers. Teaching & Teacher Education, Great Britain, Elsevier Science. v. 10, n.4, p.439-
452, 1994.
49
compreensão do sistema de crenças é relevante, pois, são elas que determinam a
definição das tarefas, a seleção das estratégias de cognição e facilitação da recuperação
e reconstrução dos processos de memória.
Johnson (1994) desenvolveu uma pesquisa qualitativa com professores
iniciantes, levando em consideração os aspectos culturais e contextuais. A autora afirma
existirem três suposições básicas das pesquisas de crenças: as crenças dos professores
influenciam ambos a percepção e o julgamento deles; elas têm um papel crucial na
forma como os professores aprendem a ensinar; o fato de que compreender as crenças é
essencial para melhorar a prática dos professores e melhorar a preparação de programas
de ensino. A referida autora conclui, nesse estudo, que o processo de reflexão a que os
professores foram submetidos, tornou-os mais conscientes sobre suas crenças e sobre as
inconsistências de suas práticas. Todavia, esses professores entraram em conflito ao
tentarem mudar suas crenças, pois não tinham “imagens alternativas de ensino
32
” para
servir de modelo para sua prática instrucional. Os trabalhos na linha de pesquisa que
priorizam os conflitos dos professores serão apresentados na seção 1.5.
As crenças podem ser investigadas e analisadas seguindo uma das três
abordagens: “abordagem normativa, metacognitiva e contextual” (Barcelos, 2001b,
p.76). Estas diferentes abordagens indicam a concepção implícita de crenças seguida
pelos pesquisadores. Na abordagem normativa, as crenças são investigadas de maneira
descontextualizada, devido ao uso de questionários muito restritos (Barcelos, 2001b,
p.76). Na abordagem metacognitiva, as crenças são investigadas através de entrevistas
considerando-se as crenças como uma característica mental. As crenças têm um
componente cognitivo, mas também deve ser levado em consideração o fato de que elas
surgem dentro de um contexto (Barcelos, 2001b, p.79). Pensa-se que as duas primeiras
32
Johnson (1994, p.443) afirma que as crenças dos professores advém das imagens que eles têm da experiência de
aprendizagem formal e informal, das imagens deles mesmos como professores e de seus formadores.
50
abordagens não são abrangentes por não levarem em consideração este fato. Esta
investigação contextualizada deve envolver as experiências e ações dos alunos
33
, a
interpretação de suas ações, o contexto social e como este contexto molda suas
experiências.
Barcelos (2001) ao desenvolver uma pesquisa sobre as crenças dos alunos
de inglês como LE, conclui que elas têm uma relação recíproca com as estratégias de
aprendizagem, e esta relação pode guiar comportamentos ou ações e promover
mudanças nas crenças. Segundo a autora, esta correlação depende do ”background” do
aluno, da forma de ensinar a que ele é submetido, do nível de proficiência e motivação.
Seguindo a abordagem contextual, Richards e Lockhart (1996, p.52)
desenvolveram um estudo em relação às crenças dos alunos. Segundo eles, as crenças
de seus participantes foram influenciadas pelo contexto social de aprendizagem e, de
certa forma, podem influenciar as atitudes, a motivação, as expectativas, percepções e
dificuldades em se aprender uma LE. Estas crenças representam a forma como os alunos
conceituam o contexto escolar, e elas podem influenciar a aprendizagem de forma
positiva ou negativa. Foram identificadas crenças em relação à natureza da língua, a
respeito dos falantes nativos da L2, a respeito das habilidades lingüísticas, do ensino, da
aprendizagem de línguas, sobre o comportamento apropriado em sala de aula, a respeito
do aluno e seus objetivos. Os alunos apresentam comportamentos psicológicos e
cognitivos que servem como indicadores de como eles percebem, interagem e
respondem ao ambiente de aprendizagem (Richards e Lockhart, 1996, p.59).
33
Barcelos (2001) discute as três abordagens de pesquisa sobre crenças de alunos, mas elas podem ser aplicadas aos
estudos sobre crenças de professores.
51
1.5. Tensões instrucionais, dilemas ou conflitos vivenciados pelos professores na
prática docente
Com a transição de foco das pesquisas em lingüística aplicada
34
, percebeu-
se que a interação entre pensamento e a ação não obedecia a uma estrutura lógica e
linear, mas integrava componentes afetivos, experiências e de conhecimentos,
influenciados pelos diversos contextos, tais como: psicológicos, sociais e circunstanciais
que tornam dialética a conexão entre pensamento e ação (Resende, 2000, p.27). Esta
conexão aliada aos diversos fatores contextuais traz o desenvolvimento da consciência.
Sendo assim, é natural que todas as pessoas passem por estágios de desenvolvimento da
consciência. Freire (1970) apud Pimenta (1996, p.115)
35
considera que as pessoas
passam por dois estágios de consciência. O primeiro, segundo ele, é chamado semi-
intransitivo. As pessoas que se encontram nesse estágio de consciência, apresentam
limitações na esfera de apreensão das questões. Elas estão restritas a áreas de interesses
e preocupações escapando à apreensão de problemas que se situam além da esfera vital.
Freire (1970) alerta que a impermeabilidade a desafios fora dessa esfera
pode representar um descompromisso do indivíduo com a sua existência. Por outro
lado, quando se amplia o poder de captação dos desafios, abre-se o diálogo do indivíduo
com o mundo. Esse diálogo do homem com os desafios e problemas o faz um ser
histórico. A pessoa que é perceptiva, que é capaz de interpretar as causas dos eventos e
dos comportamentos, que responde às sugestões e questões emergentes no seu contexto,
que é capaz de entrar em diálogo com as outras pessoas, para Freire (1970), encontra-se
34
Transição já discutida na introdução.
35
FREIRE, P. Pedagogy of the oppressed. New York: Seabury Press, 1970. Apud: PIMENTA, S. G. Formação de
professores – saberes da docência e identidades do professor. Revista da Faculdade de educação, v.22, n.2, p.72-89,
jul/dez, 1996.
52
em um estado transitivo de consciência. A conscientização é o desenvolvimento da
tomada de consciência em direção a uma transitividade crítica. O que detona o processo
de conscientização é a percepção, pelo indivíduo, de um desequilíbrio originado por
algum incômodo externo. Nesse sentido, acredita-se que os desafios da própria
profissão são fontes de dicotomias ou dilemas e conflitos.
A prática docente é permeada por estas dicotomias que podem ir a favor ou
contra a abordagem do professor dependendo do seu grau de consciência. Estas
dicotomias podem criar tensões e até mudanças no seu comportamento. Tais tensões
podem ser internas e configurarem-se em forma de dilemas ou conflitos. Os dilemas são
vistos de duas formas: primeiro como um problema enfrentado pelo professor forçando
uma escolha entre alternativas igualmente indesejáveis (Lampert, 1985, p.182). Neste
caso, uma ou outra alternativa escolhida pelo professor poderia trazer conseqüências
problemáticas. A segunda forma de conceituar dilema é vê-lo como resultado de
argumentos entre tendências opostas no qual nenhum lado sai vencedor. Nesta
perspectiva, ter um dilema envolve manter a tensão entre objetivos igualmente
importantes, mas conflitantes sem que se possa operar uma escolha entre eles. Para
Lampert (1985, p.183), os dilemas do professor podem não ser somente um dilema de
vontade, é possível que sejam conflitos de identidade, uma vez que eles surgem quando
são colocadas em xeque suas crenças. Na filosofia, Audi (1994, p.203) define este tipo
de conflito como um argumento em que uma das premissas é uma disjunção. A
sociologia corrobora da mesma definição de conflitos e acrescenta que eles são
conscientes e considerados uma das formas centrais de interação. Segundo Simmel
(1987, p.240), o conflito “pode visar à solução de dualismos divergentes; é um meio de
alcançar uma espécie de unidade, mesmo que seja através de aniquilação de algumas
partes conflitantes”.
53
Os conflitos podem ser favoráveis, visto que o fato de os professores
mobilizarem diversos saberes em busca de respostas e alternativas para o sucesso da
aprendizagem dos alunos, os desafia. Este conflito pode impulsionar o professor no
desejo de mudanças e isto é positivo. Pimenta, (1996, p.115) ressalta que a mesma
situação conflitante pode ser percebida de diferentes maneiras de acordo com o estágio
de consciência do professor naquele momento. Segundo a autora referida acima, alguns
eventos ou situações podem tocar os indivíduos de tal maneira que eles passam a rever
suas certezas e crenças, e até suas próprias ações. Deste modo, o estado de consciência
não é algo estático, linear e bem definido, ao contrário, é repleto de conflitos internos,
avanços e recuos de pensamento, contradições e irracionalidades.
Considerações finais
As seções discutidas anteriormente são de considerável relevância para o
desenvolvimento desse estudo. Os aspectos teóricos mencionados possibilitam a
discussão dos fatores que subjazem as práticas dos participantes, ou seja, a compreensão
deles sobre o que é língua e do que é ensinar e aprender língua em contextos variados.
O relato sobre as abordagens de ensino de línguas estrangeiras pode dar
indícios sobre como é a prática dos professores participantes. A discussão acerca da
definição de interação e sua importância para o ensino de inglês dão base para a análise
e compreensão dos eventos interacionais da sala de aula, bem como dos fatores que
interferem nas práticas dos professores.
Como discutido previamente, as crenças dos professores influenciam na
compreensão e na atuação do professor na aula. O fato de eles discutirem suas
percepções sobre interação, os dilemas ou conflitos vivenciados por eles, pode ser um
54
importante instrumento para o seu desenvolvimento reflexivo, crítico e profissional.
Pimenta (1996, p.125) propõe que se criem estratégias que estimulem a capacidade de
os professores reconhecerem e enfrentarem seus próprios dilemas ou conflitos,
desenvolvendo-lhes esse pensamento profissional dilemático. Esta é uma das propostas
desse estudo, promover momentos para o desenvolvimento crítico do professor.
O capítulo seguinte descreve a metodologia utilizada para a realização desse
estudo.
55
CAPÍTULO II
METODOLOGIA
56
2. Considerações iniciais
O presente capítulo apresenta a metodologia utilizada para o
desenvolvimento desta pesquisa. Ele está dividido em duas partes: a primeira, tendo em
vista os objetivos propostos, explica e justifica a natureza desta investigação sob o
ponto de vista de Erickson (1986), Bogdan & Biklen (1994), Nunan (1992) e Davis
(1995); a segunda parte do capítulo descreve o formato de pesquisa utilizado, o contexto
e os participantes, bem como os procedimentos de coleta e análise de dados. O estudo
de caso é o formato utilizado. Ele é definido e justificado segundo os pressupostos
teóricos de Nunan (1992), Stenhouse (1983) e Goetz & Lecompte (1984).
Procede-se nesta pesquisa a um estudo de caso neo-etnográfico
36
envolvendo professores e alunos de inglês de escolas regulares e cursos livres. Os
objetivos são verificar como professores definem o processo interacional, como o
colocam em prática e como os alunos reagem a ele. Através de vários instrumentos de
coleta de dados, a pesquisadora investiga a existência ou não de conflitos sobre o
processo interacional que é desenvolvido em sala de aula e sobre as percepções dos
alunos.
2.1. Natureza da pesquisa qualitativa
A pesquisa de cunho qualitativo surgiu da necessidade de se compreender as
percepções e as relações pessoais. a pesquisa qualitativa apresenta cinco características
a saber: ela é descritiva, tem foco no processo e no significado; os dados são coletados
em ambiente natural; os investigadores levam em consideração o contexto em que os
participantes estão inseridos e suas características pessoais e a análise é feita de forma
36
O termo será definido na página 54
57
indutiva (Bogdan e Biklen, 1994, p. 47-50). Neste tipo de pesquisa pode haver uma
investigação e uma análise dos fenômenos da sala de aula em toda a sua complexidade
em contexto natural.
A escolha pela análise qualitativa e interpretativa neste estudo foi motivada
pelo fato de este tipo de pesquisa buscar variações nas relações entre as formas de
comportamento, o significado e a intenção que acompanham esse comportamento em
sala de aula. Bogdan e Biklen (1994, p. 23) afirmam que, no estudo qualitativo,
privilegia-se a compreensão dos comportamentos a partir da perspectiva dos
participantes. E, o trabalho do pesquisador, neste tipo de pesquisa, é o de combinar uma
análise bem detalhada e bem próxima do comportamento e do significado da interação
social do dia-a-dia com uma análise do contexto social mais amplo (Erickson, 1986, p.
130).
2.2. Estudo de Caso
A pesquisa em questão foi desenvolvida em formato de estudo de caso. Esta
escolha foi motivada por adequar-se aos objetivos mencionados. O estudo de caso é
uma forma de legitimar uma pesquisa dentro de um contexto. Através do estudo de
caso, pode-se representar uma multiplicidade de pontos de vista, oferecer interpretações
alternativas e também pode-se fornecer dados para pesquisas futuras. Ele é um exemplo,
inserido em um contexto mais geral (Nunan, 1992, p. 75). Há uma descrição e análise
de um caso dentro do contexto em que ele ocorre, no seu ambiente natural, com ou sem
intervenções do pesquisador. O foco deve ser holístico com o propósito de compreender
a complexidade e a natureza dinâmica do caso em questão. Nunan (1992, p. 83) afirma
58
que nos estudos de caso faz-se a análise de fenômenos em contexto com caráter natural;
sua metodologia é flexível e é formulada para adequar-se ao objetivo do estudo.
Os estudos de caso podem variar em dimensões; são freqüentemente
qualitativos, embora possam envolver quantificação de informação. Stenhouse (1983)
apud Nunan (1992., p. 77) classifica os estudos de caso em quatro tipos, “avaliativo”,
múltiplos contextos”, “pesquisa-ação” e “neo-etnográfico
37
.
A investigação aqui relatada se enquadra na categoria de um estudo de caso
“neo-etnográfico” que, segundo Nunan (1992, p.77), é uma investigação profunda de
um simples caso em que há observadores não participantes que analisam os fenômenos
para a compreensão sem interferir diretamente no contexto. O trabalho é caracterizado
como neo-etnográfico mesmo que a proposta de reflexão possa interferir na prática do
professor. A presente pesquisadora, enquanto observadora não participante, observou as
aulas dos professores e discutiu com eles, nas sessões de visionamento, aspectos
relativos à prática docente, especificamente, sobre os tipos de interação que eles
promovem em sala de aula. O fato de eles discutirem suas crenças e ações com a
observadora pode torná-los mais conscientes e promover mudanças no contexto.
2.3. Contexto da Pesquisa
A pesquisa foi desenvolvida em duas escolas regulares e um curso livre de
Belo Horizonte. As escolas regulares
38
em que atuam os professores Renato e Maria são
37
Segundo esta taxonomia, o “avaliativo” pode ser o estudo de um caso isolado ou de grupos de estudos de casos e
tem como objetivo avaliar uma política ou uma prática (pesquisa de campo condensada); o estudo de caso em
“múltiplos contextos” consiste em uma pesquisa de campo condensada feita por um time de profissionais em um
número de locais variados e possivelmente oferecendo uma abordagem alternativa de pesquisa baseada em amostras e
inferências estatísticas. “Pesquisa-ação,” que também é denominada por Nunan (1992, p.77) estudo de caso escolar, é
feita por professores que usam o status de participantes como base para desenvolver habilidades de observação e
análise da prática docente. É uma investigação feita pelo profissional da educação em seu próprio contexto com
interferência do mesmo na compreensão e implementação da prática.
38
De agora em diante o termo escola regular será denominado E.R
59
públicas estaduais e atendem ao ensino fundamental e médio. O curso livre em que
atuam os professores referidos acima funciona em regime de Centro de Extensão
39
.
Neste tipo de escola atuam professores em formação e graduados.
PROFESSOR ESCOLA TURMA OBSERVADA PERÍODO
Escola Pública
Estadual
36 alunos do 2º ano do ensino médio 25/04/2003
a 04/07/03
Renato
Centro de extensão 6 alunos do intermediário 3 26/04/2003
a 14/06/03
Escola Pública
Estadual
41 alunos da 5º série do ensino fundamental 15/05/2003
a 30/06/03
Maria
Centro de extensão 8 alunos do intermediário 3 12/05/2003
a 02/07/03
Quadro 02: Contexto da pesquisa
2.4. Os participantes
Dois professores participaram da pesquisa: Renato e Maria. A escolha das
turmas observadas foi feita por eles. Observamos 8 (oito) aulas destes professores
durante aproximadamente dois meses. Utilizamos pseudônimos para todos os
participantes para resguardar a identidade dos mesmos.
O primeiro professor, Renato, graduou-se em Letras com licenciatura em
inglês em 2000 e concluiu no primeiro semestre de 2003 a continuidade de estudos com
habilitação e licenciatura em francês, ambos em uma universidade federal. Ele atua em
duas escolas públicas estaduais. Em uma, ele trabalha com o ensino fundamental como
professor contratado, e na outra, ele é professor efetivo do ensino médio, leciona em
ambas há um ano e meio. Os cargos são completos com 18h/a semanais distribuídas em
9 (nove) turmas em cada escola. Ele também atua em um C.E. de uma Faculdade de
Letras como professor há 5 (cinco) anos. Nesse estabelecimento ele é prestador de
39
De agora em diante o termo Centro de Extensão será denominado C.E.
60
serviços e leciona geralmente em 2 turmas por semestre. Ele foi professor de inglês em
outros cursos livres.
A segunda professora, Maria, graduou-se em Letras com licenciatura em
inglês no primeiro semestre de 2000 por uma universidade federal. Atualmente, está
cursando a pós-graduação (mestrado) em literatura na mesma universidade. Ela leciona
inglês em uma escola pública estadual como professora efetiva do ensino fundamental
há 2 (dois) anos. Seu cargo é completo com 18h/a semanais distribuídas em 9 (nove)
turmas. No ano da coleta de dados, 2003, ela lecionou somente para as turmas de 5
a
série. Maria também atua em um C.E. de uma Faculdade de Letras como professora de
inglês há 3 (três) anos. Nesse estabelecimento ela é prestadora de serviços e
normalmente tem 2 (duas) turmas por semestre. Ela já trabalhou em outras escolas
regulares.
PROFESSOR LICENCIATURA CONDIÇÃO
ESCOLA
REGULAR
CONDIÇÃO CURSO DE
LÍNGUAS
.
EM CURSO
1º- Renato 2000/ UFMG Efetivo Prestador 2º habilitação Graduação/Letras
2º- Maria 2000 / UFMG Efetivo Prestador Pós-graduação em literatura
Quadro 03: Perfil dos professores
Foram convidados dois alunos de faixas etárias e graus de escolaridades
diferentes para participarem da pesquisa em cada contexto. Não foi estabelecido
nenhum critério para a escolha dos alunos. Estes alunos responderam voluntariamente a
uma entrevista semi-estruturada sobre as estratégias utilizadas por eles para a
aprendizagem de língua estrangeira e sobre como a interação ocorre em sala de aula.
Esta entrevista foi gravada em áudio e transcrita gerando os dados para esta pesquisa.
Foram entrevistados alunos de faixa etária e grau de escolaridade diferentes.
Dos dezesseis alunos participantes, 8 têm idade entre 10 e 20 anos, 6 têm idade entre 20
61
e 30 anos e dois têm mais de 30 anos. Destes alunos, 4 estão no ensino fundamental, 6
estão no ensino médio, 3 estão na graduação e 3 já concluíram o ensino superior. Os
gráficos abaixo mostram o resumo da faixa etária e o grau de escolaridade dos
participantes:
Grau de escolaridade dos participantes Faixa etária dos alunos participantes
0
1
2
3
4
5
6
Ensino fundamental
Esino médio
Ensino superior
incompleto
Ensino superior
completo
10-20 anos
21-30 anos
mais de 30
Gráfico 01: Grau de escolaridade e faixa etária dos alunos participantes
O quadro abaixo apresenta o resumo dos alunos participantes:
PROFESSOR NOME DO
ALUNO
SEXO IDADE ESCOLA NÍVEL DO CURSO
DE INGLÊS
Ana F 19 Regular Médio
Angélica F 20 Regular Médio
Rita F 18 Regular Médio
Pedro M 17 Regular Médio
Mário M 20 C.extensão Intermediário
Priscila F 21 C.extensão Intermediário
Patrícia F 21 C.extensão Intermediário
Renato
Jane F 19 C.extensão Intermediário
Jennifer F 11 Regular Fundamental
Wellington M 11 Regular Fundamental
David M 13 Regular Fundamental
Rodrigo M 10 Regular Fundamental
Cristofer M 27 C.extensão Intermediário
Anderson M 34 C.extensão Intermediário
Emerson M 20 C.extensão Intermediário
Maria
Luciana F 40 C.extensão Intermediário
Quadro 04: Perfil dos alunos
62
2.5. Instrumentos de coleta
Nesta sessão serão discutidos e justificados os instrumentos de coleta de
dados utilizados nesta investigação.
Como já foi mencionado acima, o resultado dessa pesquisa visou a
proporcionar momentos para a reflexão pedagógica, procedendo-se a um estudo de caso
neo-etnográfico, com coleta de dados qualitativa e análise interpretativa. Os dados
foram coletados através dos seguintes instrumentos: questionários, diários, observação
de aulas, filmagens, entrevistas semi-estruturadas, sessões de visionamento e
transcrições de partes das aulas pertinentes ao assunto em questão.
A triangulação dos procedimentos de coleta de dados foi feita para tornar
este estudo válido e confiável. Nunan (1992, p.86) afirma que com procedimentos
diferentes de coleta de dados em ambiente natural, as informações eliciadas podem
prover perspectivas diferentes do mesmo assunto. Segundo Goetz e Lecompte (1984
40
apud Nunan 1992, p.90), “a triangulação previne o pesquisador de contar com as
primeiras impressões, ajuda a diminuir a influência pessoal do observador e aumenta a
validade e confiabilidade do estudo
41
”.
40
GOETZ, J. P. LECOMPTE, M. D. Ethnography and qualitative design in educational research. FL: Academic
Press, 1984. apud NUNAN, D. Research Methods in Language Teaching. Cambridge: Cambridge University Press,
1992.
41
As Goetz and LeCompte (1984) point out, triangulation prevents the researcher from relying on initial impressions,
it helps correct for observer biases, and it enhances the development of valid constructs during the study (Nunan,
1992, p. 90).
63
2.5.1. Questionários
Os professores participantes responderam a um questionário (Anexo B) no
qual tiveram a oportunidade de apresentar o seu conceito de interação. Os participantes
também escreveram sobre a importância da interação para o ensino-aprendizagem de
LE e o tipo de atividade que desenvolvem para promovê-la nos dois contextos (E.R e
C.E.).
2.5.2. Entrevista semi-estruturada
A entrevista semi-estruturada foi respondida pelos alunos após a observação
das aulas (Anexo C). Nesta entrevista, os alunos discutiram suas expectativas em
relação às aulas de língua inglesa. Eles tiveram a oportunidade de se posicionarem sobre
o seu papel na sala de aula e, também, sobre a abordagem do professor. Os alunos
também tiveram a oportunidade de se posicionarem em relação aos trabalhos em pares e
grupos e discutirem suas crenças a respeito de como deve ser o ensino de LE.
2.5.3. Diários
Os diários das aulas observadas e filmadas foram confeccionados por nós e
pelos professores envolvidos na pesquisa. Tomamos notas das 8 (oito) aulas observadas
e os professores participantes confeccionaram três diários de suas aulas em cada um dos
contextos (Anexo D). Os diários são relatórios em primeira pessoa da experiência de
64
ensino ou aprendizagem documentados regularmente e analisados através de padrões
recorrentes ou eventos salientes, que podem ser conduzidos pelo próprio autor ou pelo
pesquisador (Nunan, 1989
42
apud Cartagena, 1994, p. 06). Os diários foram analisados
de forma interpretativa
Com os diários, pretendia-se promover mais um momento introspectivo
para reflexão sobre as aulas. A introspecção é o processo de pensar e refletir sobre os
pensamentos, sentimentos, motivos, razões, processos e estados mentais para determinar
caminhos nos quais os processos e estados determinam nosso comportamento (Nunan,
1992, p.115). Para manter a validade externa dos diários como coleta de dados, os
professores escreveram os diários um dia após a aula dada ou logo após assistirem a
fita.
2.5.4. Observação das aulas
8 (oito) aulas de 1hora e 40 minutos foram observadas neste período e três
aulas de cada contexto foram filmadas. Observamos as aulas e utilizamos-nos de alguns
critérios para fazer as notas de campo. Consideramos a organização espacial, o uso da
língua alvo, os padrões de interação, a expansão e contração do grupo durante as
atividades, ou seja, trabalhos individuais, em pares e em grupos, o interesse e a
participação dos alunos, bem como seu desempenho durante as atividades.
A observação de aulas se justifica como um instrumento de coleta de dados
importante para o estudo de caso, pois, segundo Gebhard e Oprandy (1999, p.21),
professores e pesquisadores podem fazer uso da observação de aula como instrumento
42
NUNAN, D. Understanding language classrooms: a guide for teacher-initiated action, Hertfordshire: Prentice-
Hall, 1989. Apud: CARTAGENA, J. Language Learning Diaries in EFL Classrooms. Research news. The Newsletter
of the IATEFL Research SIG, n.5, p.6-10, Nov. 1994.
65
para a compreensão e reconstrução da prática pedagógica. Allwright e Bailey (1994, p.
03) afirmam ser a observação um meio para descrever processos de qualquer natureza
que são desenvolvidos em sala de aula. A partir da descrição e interpretação das aulas
observadas, professores podem refletir sobre a própria prática, desenvolver uma
consciência crítica e formular teorias a partir da mesma. Podemos fazer uso da
observação de aula como instrumento que nos levará a uma maior compreensão das
relações existentes no contexto.
2.5.5. Filmagem das aulas
Foram filmadas três aulas consecutivas de cada professor nos dois contextos
(duração de 50 minutos cada aula). As aulas consecutivas podem compor uma amostra
da prática do professor. As filmagens aconteceram na segunda quinzena do primeiro
mês da observação para que alunos e professores se sentissem mais confortáveis com a
presença da pesquisadora em sala de aula. As filmagens, apesar de serem intrusivas,
registram a prática do professor que pode interpretá-la e assim, refletir sobre ela. Após o
término das filmagens, o professor recebeu a fita para assistir e selecionar as partes que
ele gostaria de discutir nas sessões de visionamento. Foi dada a instrução para o
professor assistir à fita e fazer anotações sobre aspectos relevantes da sua prática
docente para posterior discussão. Para as análises, foi escolhida a segunda aula filmada
de cada professor.
66
2.5.6. Sessões de visionamento
A sessão de visionamento é um dos métodos de introspecção que envolve a
gravação e transcrição de relatos do professor participante sobre suas aulas. Gass &
Mackey (2000, p. 03) afirmam que a introspecção pressupõe que “a pessoa possa
observar o que tem lugar na consciência da mesma forma que alguém pode observar
eventos do mundo externo.” Gass e Mackey (2000, p.03) relatam que os autores
Wittgenstein (1958)
43
, Habermas (1970)
44
, Wundt (1874)
45
, Dennett’s (1987)
46
e
Shulman
47
(1986), partindo do paradigma de que a língua é um fenômeno social,
descreveram a utilidade das reflexões promovidas pelos métodos introspectivos nos
processos mentais. Segundo eles, a introspecção é uma forma de auto–observação em
que o participante reporta os fatos dos quais ele está consciente. Este relato se torna
benéfico para a compreensão dos processos cognitivos e para a compreensão dos
eventos que ocorrem no contexto em que o participante está inserido. Gass & Mackey
(2000, p.110) definem a introspecção como “a verbalização consciente de o que
pensamos e sabemos.”
A sessão de visionamento, segundo Gass & Mackey (2000, p.17), é um dos
métodos introspectivos que pode ser utilizado para estimular os participantes a
reativarem a memória e os pensamentos que tiveram enquanto estavam executando uma
tarefa ou participando de um evento, no caso específico, os eventos da sala de aula.
43 WITTGENSTEIN, L. Philosophical Investigations. Oxford. Basil Blackwell. 1958. Apud: GASS, S. M.
MACKEY, A. Stimulated Recall Methodology in Second Language Research. London: Lawrence Erlbaum
Associates Publishers, 2000.
44 HABERMAS, J. Towards a theory of communicative competence. Inquiry. v.13. 1970.
45 WUNDT, J. Grundzüge der physiologisthen psychologie. Leipzig Withelm Engelmann. 1874. Apud: GASS, S. M.
MACKEY, A. Stimulated Recall Methodology in Second Language Research. London: Lawrence Erlbaum
Associates Publishers, 2000.
46 DENNET’S D. The intentional Stance. Cambridge. Massachusetts. MIT, 1987. Apud: GASS, S. M. MACKEY, A.
Stimulated Recall Methodology in Second Language Research. London: Lawrence Erlbaum Associates Publishers,
2000.
47 SHULMANN, L. S. Those who understand: Knowledge growth in teaching. Educational researcher, 15 (2), 4-14,
1986. Apud: GASS, S. M. MACKEY, A. Stimulated Recall Methodology in Second Language Research. London:
Lawrence Erlbaum Associates Publishers, 2000.
67
Através deste instrumento de coleta, o participante pode rever uma situação vivida por
ele com grande clareza e precisão. Esta técnica, segundo Nunan (1992, p.95), produz
uma compreensão dos processos de ensino e aprendizagem que seria difícil de ser
alcançada por outros meios.
As sessões de visionamento foram feitas após as três aulas filmadas e
assistidas pelos professores participantes. Houve uma proposta de se fazer uma sessão
de visionamento com os alunos. Esta proposta não foi concluída devido a empecilhos
que surgiram na escola durante a coleta. Foi feita uma categorização das sessões de
visionamento seguindo a adaptação do esquema de classificação proposta por Gass &
Mackey (2000, p.49). As sessões desenvolvidas têm relação com as ações específicas
dos professores em sala de aula, com foco na interação. Ela foi realizada algum tempo
depois da gravação das aulas e não houve nenhum treinamento anterior com os
participantes para a sessão. Os participantes foram instruídos a assistirem as aulas
gravadas e anotarem os aspectos relevantes, os pensamentos e sentimentos relacionados
à prática docente para posterior discussão. O procedimento utilizado durante a sessão de
visionamento foi pouco estruturado valendo-se de uma discussão aberta com a liberdade
de verbalização tanto por parte do participante como da pesquisadora.
Durante a discussão, os professores tiveram a liberdade de debater todos os
aspectos que eles tomaram nota, também, tiveram a oportunidade de expor suas
expectativas, dificuldades e anseios em relação ao ensino de língua estrangeira em geral.
Após discutirem os aspectos escolhidos por eles, a pesquisadora direcionou a discussão
com um enfoque na interação, caso este assunto não tivesse sido abordado (perguntas:
Anexo D). Nestas sessões de visionamento, os professores puderam expor o que pensam
a respeito da interação promovida na sala de aula nos dois contextos nos quais atuam.
68
2.5.7. Transcrição e análise
Todas as sessões de visionamento, entrevistas e uma aula de cada
participante foram transcritas gerando dados para a pesquisa. Para a transcrição das
entrevistas e sessões de visionamento e aulas foram utilizados os padrões de análise da
conversação de Marcuschi (1986) (Anexo E). Foi transcrita uma aula de cada professor
nos dois contextos. A duração das aulas foi delimitada em trinta minutos, pois as
escolas regulares estavam com indicativo de greve tendo o horário reduzido limitando
assim a análise (Anexo F).
Durante os dois meses, em que os professores e alunos participantes
estiveram envolvidos em atividades reflexivas, foi investigada a organização
interacional nos dois contextos, como eles colocam esta organização em prática e como
os alunos reagem a ela. Procurou-se observar se os professores e/ou alunos traziam
idéias ou ações quanto às interações em sala de aula que os colocassem em conflito. As
reações dos alunos frente aos tipos de interação também foram analisadas no que diz
respeito às técnicas de ensino usadas pelo professor. Nesse aspecto, as análises ficaram
limitadas, pois não foi possível fazer uma sessão de visionamento com os alunos para
discutir com eles as reações durante as aulas. Todos os dados foram analisados e
confrontados com as teorias que tratam sobre o papel da interação no processo de ensino
e aprendizagem e sobre o papel da reflexão na formação de professores.
Para responder às perguntas de pesquisa, foram utilizados diferentes
procedimentos para a análise dos dados. A análise apresentada no próximo capítulo é
uma interpretação da pesquisadora, portanto, não podemos fazer generalizações.
Primeiramente, partiu-se da análise dos questionários para conceituar e discutir a
69
importância da interação. Estes dados foram discutidos à luz das teorias de interação
como requisito para aquisição de uma LE.
Posteriormente, foi feita a análise da aula típica dos professores
participantes. Foi utilizado o procedimento de triangulação, utilizando-se de diferentes
perspectivas de coleta e análise com o objetivo de compreender a relação das
percepções discutidas na conceitualização de interação e das ações dos participantes em
sala de aula, visando, assim, uma maior confiabilidade na análise. Dos questionários,
foram selecionados os aspectos relativos às atividades propostas pelos professores para
promover interação. Estas percepções foram trianguladas com dados das sessões de
visionamento para a discussão das justificativas de escolhas das atividades. A análise da
interação foi desenvolvida a partir da transcrição da aula. Foi elaborado um quadro
sinótico
48
com categorias dos movimentos pedagógicos e das estruturas de participação,
e estas foram analisadas e discutidas sob a perspectiva das pesquisas citadas. Este
quadro foi elaborado segundo a proposta de Silva (2003), sendo ele relevante para obter
uma interpretação mais clara da seqüência e das mudanças dos eventos comunicativos e
também para mapear o comportamento verbal do professor e dos alunos em uma linha
de tempo (Anexo F).
Foram utilizados padrões para a “análise dos movimentos lingüísticos” que
regem a aula de inglês e para a “análise das estruturas de participação”. Os movimentos
pedagógicos são os acontecimentos lingüísticos da aula. Eles foram postulados
primeiramente por Bellack (1966, p.194) e são compostos de quatro sub-movimentos
principais: dois movimentos iniciadores (estruturação e solicitação) e dois movimentos
reflexivos (resposta e reação). Estes movimentos referem-se às ações verbais básicas e
estão classificados em termos de funções pedagógicas que atuam na linguagem da aula
48
Relato do maior número possível das ações que ocorreram durante a interação, cronologicamente (Silva, 2003,
p.97).
70
(Pedro, 1992, p.54). Foi utilizado também para a primeira análise um quinto movimento
que foi definido por Lundgren (1972, 1977) como movimento de ajuda ou colaboração.
“Movimentos de estruturação (STR): movimentos que organizam o contexto
para a atuação subsequente, por começarem ou continuarem uma interação
entre os alunos.
Movimentos de solicitação (SOL): destinam-se a provocar uma resposta
verbal ou física ou encorajar aqueles a quem se destinam a prestar atenção
em alguma coisa.
Movimentos de resposta (RES): implicam um relacionamento recíproco com
movimentos de solicitação e ocorrem em relação a eles.
Movimentos de reação (REA): servem para modificar e/ou avaliar o que já
foi dito.
Movimento de ajuda individual (HEP) que ocorre sempre que o professor
fala em particular com o aluno” (Pedro, 1992, p.54)
49
.
Os padrões para análise das estruturas de participação foram adaptados a
partir daqueles utilizados por Silva (2003, p.98). Através dos padrões descritos abaixo,
foi possível observar e compreender melhor a abordagem de ensinar dos professores
participantes.
“- Configuração 1- O professor assume o papel centralizado, permitindo
organizar, gerenciar e controlar a interação quanto à tomada de turno dos
alunos, sua duração e distribuição”;
- Configuração 1A – O professor interage de forma centralizada como falante
principal e ratifica todos os alunos como ouvintes primários fazendo
perguntas. Os alunos que tomam os turnos foram considerados ouvintes
falantes primários (SOL ).
- Configuração 1B- foi construída com a finalidade de realizar atividades de
compreensão auditiva. Foi utilizado como recurso um aparelho de reprodução
de fita cassete manipulado pelos professores.O material de áudio fazia parte
do livro didático. O professor organizava a interação e permanecia
centralizada.
- Configuração 1C- arranjo interacional construído para que os alunos
pudessem repetir listas de vocabulário tendo a pronúncia como foco. O
professor se posiciona de forma centralizada como falante principal e os
alunos ouvintes falantes tem que repetir.
- Configuração 1D – o professor como falante principal ratifica um aluno
para falar, pedindo para ler ou para resolver os exercícios.
- Configuração 2A – momentos em que o professor ratifica os alunos como
ouvintes primários para dar explicações e para contar estórias (STR).
- Configuração 2B - momentos em que os alunos interagem entre si sem a
solicitação da professora.
49 PEDRO, E. R. O discurso na aula: Uma análise sociolingüística da prática escolar em Portugal. Lisboa: Editorial
Caminho, 1992.
71
- Configuração 3A – os alunos interagem em pares ratificando-se como
ouvintes falantes primários e a professora descentralizada circula
monitorando a atividade interacional e coloca-se disponível podendo ser
ratificada como ouvinte falante primária por um aluno ou um par de alunos
para clarificação, bem como pode ratificar um aluno ou um par de alunos
como seus ouvintes falantes primários para correção de erros.
- Configuração 4 A – arranjo interacional que se constrói quando o aluno
toma o turno de fala do professor que está centralizado como falante principal
interagindo com a sala como um todo e o ratifica como seu ouvinte – falante
primário para questionamentos de clarificação sobre vocabulário, estruturas
gramaticais ou resoluções de exercícios.
- Configuração 4 B – quando o grupo de alunos ratifica o professor como
ouvinte-falante primário para a resolução de dúvidas de interesse pessoal que
não fazem parte da lição, enquanto os outros alunos não participam da
interação.”
Finalmente, foi feita a investigação dos possíveis conflitos sobre interação.
Para tal, foram utilizados os dados das sessões de visionamento e dos diários. A análise
e discussão dos dados foi desenvolvida dentro dos pressupostos teóricos ora discorridos.
É importante relembrar que, durante as análises, surgiu a necessidade de se ouvir a voz
dos alunos em sala de aula para compreender a interação. Tal fato não foi possível
devido à forma como foram gravadas as aulas. Este incidente impediu a compreensão de
alguns aspectos desse estudo.
72
CAPÍTULO III
RESULTADOS
73
3. Considerações iniciais
Este capítulo apresenta nossa interpretação sobre os dados. Os resultados
foram obtidos através de questionários, entrevistas semi-estruturadas, observações e
filmagens de aulas, diários dos participantes e da pesquisadora, sessões de visionamento
e transcrições das aulas, como mencionado no capítulo anterior.
A primeira seção a ser apresentada visa a responder à primeira pergunta da
pesquisa, acerca de como os professores participantes definem o processo interacional.
Esta discussão é baseada nos dados de um questionário respondido por eles (Anexo B),
nas anotações das observações de aulas feitas pela pesquisadora e a interpretação é feita
à luz das teorias que conceituam interação.
A segunda seção visa a responder à pergunta de número dois sobre a
construção da interação em sala de aula. Nesta seção são apresentados recortes da aula
nos dois contextos, anotações de campo da pesquisadora, trechos das sessões de
visionamento e diários. A interpretação é feita através da análise da alocação e
comportamentos de turno e das estruturas de participação dos professores durante as
aulas (Silva, 2003).
A seguir, são apresentadas as percepções dos alunos sobre a prática dos
professores participantes com base nos dados de uma entrevista semi-estruturada
(Anexo C) e anotações de campo da pesquisadora, respondendo assim a terceira
pergunta de pesquisa. A discussão é feita levando-se em consideração as crenças e
expectativas dos alunos em relação ao ensino de LE, as estratégias de aprendizagem
utilizadas por eles e o papel que desempenham no processo.
74
E finalmente, a última seção apresenta os resultados da investigação da
existência de conflitos sobre como o processo interacional é desenvolvido respondendo
a quarta, quinta e sexta perguntas da pesquisa. Partindo das definições de conflito,
dilema e tensão instrucional, faz-se uma discussão e categorização dos conflitos
evidenciados. Também é discutida a natureza desses conflitos e de que forma eles
interferem na abordagem de ensinar dos professores. Para estas análises, são
triangulados dados das anotações da pesquisadora, diários dos professores participantes,
sessões de visionamento e entrevistas semi-estruturadas com os alunos. O quadro 05
abaixo resume as análises:
Perguntas de pesquisa Análise
1. Como os professores participantes definem o
processo interacional?
Discurso do professor
Teorias de interação
2. Como é a prática dos professores nos dois
contextos de ensino (escola regular e curso livre) em
termos de interação?
Atividades propostas
Movimentos pedagógicos
Alocação e comportamento de
turnos
3. Quais as percepções e reações dos alunos ao
processo interacional que é construído nos dois
contextos e ao tipo de interação que é construída?
Relevância do aprendizado da
LE
Estratégias de aprendizagem
Expectativas dos alunos
Reações à abordagem do
professor
Experiências anteriores
Movimentos pedagógicos
4. Os professores de inglês enfrentam conflitos
quando atuam em contextos escolares diferentes?
5. Se os conflitos existem, são de que natureza?
6. Quando presentes, de que forma esses conflitos
interferem nos contextos de ensino e na abordagem de
ensinar dos professores?
Tensões instrucionais
Dilemas ou conflitos
Quadro 05: Perguntas de pesquisa e padrões de análise
75
3.1. Resultados da análise do conceito de processo interacional
A análise das percepções que os professores têm sobre o conceito de
interação pode revelar as teorias subjacentes às suas práticas, uma vez que eles tentam
justificar porque a interação é ou não é relevante para a aquisição da LE pelos alunos.
Partiu-se das perspectivas conceituais de aprendizagem através do insumo
compreensível (Krashen, 1983), da modificação do discurso (Hatch, 1978, Long 1983,
1985, 1996, Pica, 1986, Ellis, 1991), da negociação de sentido (Porter, 1983, Swain,
1985, Gallaway 1994, Lamy e Goodfellow 1999, Gass e Varonis, Young, Doughty,
Foster apud Hall e Verptaetse, 2000), da interação social (Van Lier, 1996, Lantolf,
2000) e da análise da conversação (Goffman, 1963, Sacks, Schegloff e Jefferson, 1978,
Goodwin, 1981, Heap, 1997, McCarthy, 1991) para se fazer a análise dos dados. Os
exemplos a seguir ilustram os conceitos formulados pelos professores e estes últimos
foram contrastados com as anotações de campo feitas pela pesquisadora.
3.1.1. Maria
A professora Maria não demonstra, no discurso, que a aquisição de uma L2
seja somente uma questão de compreensão do insumo, como afirma Krashen (1983).
Ela afirma que a interação é um meio para a aquisição de uma segunda língua. A
referida colaboradora acredita na interação dentro de uma perspectiva sócio cultural
com foco na negociação de sentido. O exemplo 1 apresenta o trecho em que Maria
define interação e fala de sua importância para a aquisição de uma LE:
76
(Exemplo 1)
Maria– Para mim interação é uma troca de experiências
50
entre
indivíduos sobre um tema em comum
51
. Ela é um fator de
relevância porque na língua estrangeira é de fundamental
importância a troca de experiências entre os alunos para uma
facilitação da aprendizagem, afinal de contas o conhecimento
deles nunca é o mesmo. Em vocabulário, por exemplo, é muito
variado o grau de conhecimento de cada um. Se eles têm
oportunidade de interagir uns com os outros, podem aprender
assim, com uma naturalidade maior do que se o professor
tivesse que intervir formalmente.
Esta definição foi evidenciada nos trechos do questionário em que a
professora participante considera interação como um fator abrangente de integração
social. Para ela, a interação é a troca de experiências, é o meio para se alcançar o
objetivo maior que é a comunicação. Esta professora vê a interação também como
construção do conhecimento e é através dela que os alunos podem aprender a se
comunicar, mesmo que não tenham ainda uma boa competência lingüística. É por meio
da interação que a construção desta competência vai se desenvolvendo.
Acreditamos que a professora Maria define interação como negociação de
sentido dentro de uma perspectiva sócio cultural, pois pelas aulas observadas no centro
de extensão, ela tem uma preocupação em promover trabalhos colaborativos em que um
aluno serve de andaime para que o outro aprenda. Nestas atividades, os alunos trocam
informações ou negociam sentido de forma que preenchem as lacunas de conhecimento
que eles ainda têm.
50
A troca de experiências foi interpretada pela pesquisadora como trocas de informações ou turnos que os alunos
fazem quando estão desempenhando as atividades em pares ou grupos.
51
Os trechos em negrito são significativos para a definição de interação do professor.
77
3.1.2. Renato
O professor Renato discute interação de uma forma mais geral que a
professora Maria. Para ele, a interação também não está relacionada somente ao insumo
compreensivo que será compreendido pelo aluno, modificando posteriormente sua
interlíngua. O exemplo 2 ilustra a forma como ele conceitua interação:
(Exemplo 2)
Renato – interação é a ação integrada, com objetivos
compartilhados. Ela é importante porque estimula o trabalho
em grupo e a língua estrangeira, sendo essencialmente
comunicação depende muito disso.
Semelhante ao conceito dado pela professora Maria, a interação para ele é
uma ação desenvolvida em coletivo para alcançar objetivos comuns, ou seja, dentro de
uma visão de negociação de sentido. O grupo constrói o conhecimento de forma
integrada.
Os professores concordam que a interação é de grande relevância para a
aprendizagem de uma LE. Várias são as funções dessa interação apresentadas por eles
nos questionários e que seriam benéficas à aprendizagem de uma LE (ver quadro 05).
Relevância Renato Maria
Estímulo à fala
Comunicação
Troca de experiência (turnos)
Facilita aprendizagem
Andaime
Quadro 06: Relevância da interação para o ensino de LE
78
Observa-se que, no discurso do professor, a importância atribuída à
interação está relacionada aos princípios da abordagem comunicativa, da comunicação
real e da significância das tarefas (Motta, 1999, p. 29). Ambos professores definem a
interação como o momento em que o aluno tem para a produção oral. Esta produção tem
uma função que é a comunicação, como mencionado pelo professor Renato. No entanto,
para compreender melhor tais definições, foi necessário investigar melhor como esta
interação foi construída na prática e com que tipo de atividades.
3.2. Resultados da análise da aula dos professores participantes
Esta seção destina-se à análise e à discussão dos dados que foram orientados
pela segunda pergunta de pesquisa já apresentada no capítulo introdutório. Trata-se de
observar como a prática dos professores participantes é desenvolvida em termos
interacionais. Será apresentada a análise do tipo de atividade escolhida pelos
participantes, como eles as desenvolvem nos dois contextos e a análise da interação em
sala de aula. A discussão dos tipos de atividade desenvolvidas pelos participantes pode
revelar as crenças subjacentes à prática deles e a forma como elas são aplicadas podem
revelar crenças semelhantes às outras ou diferentes, e também outros aspectos da
abordagem de ensinar.
A análise de uma aula típica do professor é relevante para este trabalho,
pois, através dela, pode se compreender melhor como o processo interacional é
construído pelos grupos analisados.
79
3.2.1. As atividades desenvolvidas
Os professores relataram nos questionários que desenvolvem atividades para
promover interação. Estas atividades são bastante diversificadas. O quadro 06 apresenta
os tipos de atividades que os professores disseram que utilizam para promover interação
nos dois contextos: centro de extensão (C.E.) e escola regular (E.R.).
Renato Maria
Atividades
C.E. E. R. C.E. E. R.
Information gap
Elicitação
Role play
Discussão debate
Correção em pares
Conversação livre
Músicas
Repetição
Discussão de tópicos gramaticais
Resolução de problemas
Apresentação de opiniões
Atividades desenvolvidas
Quadro 07: Atividades propostas pelos professores para promover interação
Percebe-se que a variedade de atividades é muito diferente nos dois
contextos. As atividades que os professores participantes desenvolvem no C.E.
condizem com o tipo de atividade propícia à aprendizagem de forma mais interativa,
como por exemplo, information gap, resolução de problemas e conversação livre. Como
mencionado por eles nos questionários e na sessão de visionamento, os alunos sentam-
se em círculo, o número de alunos é reduzido, as aulas são dadas na língua alvo, o que
facilita o desenvolvimento das habilidades de percepção e produção oral e escrita. Nesse
contexto, os alunos se mostram interessados e participam ativamente do processo.
80
Ambos os professores trabalham no contexto do C.E. de forma a atender a
proposta da abordagem comunicativa de desenvolvimento da competência comunicativa
dos alunos. Para isto, os alunos desenvolvem atividades com as quais eles podem
verbalizar idéias na língua alvo em contextos reais com pares ou grupos. Eles dão
suporte à compreensão dos alunos através de elicitação na língua alvo, exemplos no
quadro e associação de conceitos. Os alunos constroem o significado coletivamente,
mas, na maioria das vezes, com os turnos iniciados pelos professores. Os professores
justificam sua abordagem afirmando que, desta forma, os alunos ficam mais à vontade,
interessados e mais produtivos.
Já na E.R., os professores relatam o uso de poucos tipos de atividades em
pares e grupos, para que os alunos trabalhem de forma a negociarem sentido ou
construírem o conhecimento na LI. Neste contexto, ambos os professores utilizam a
língua materna a maior parte do tempo. Apenas a professora Maria utiliza a LI, em
alguns momentos, para o gerenciamento da aula, ou seja, para cumprimentar e despedir-
se dos alunos, fazer a chamada, etc. Os alunos sempre se sentam em fila indiana e as
atividades enfatizavam a estrutura da LI e apresentação de vocabulário de forma
tradicional e centrada no professor, havendo pouca elicitação do conhecimento prévio
dos alunos.
Os professores afirmam que os alunos da E.R. se mostram resistentes às
atividades interativas, que é difícil controlar um grupo tão grande de alunos, e que
encontram obstáculos com os setores administrativos da escola. Talvez esta resistência
dos alunos seja um reflexo da abordagem de ensinar a que eles sempre estiveram
expostos.
81
O exemplo 03 transcrito abaixo apresenta a justificativa do professor Renato
para não desenvolver atividades de produção oral. Ele afirma que os alunos têm pouco
interesse e não querem desenvolver as atividades propostas:
(Exemplo 03)
Pesquisadora: E eles não têm aulas iguais as que nós temos no
curso livre (+) diálogos mais simples dentro do nível deles
what’s your name? My name is fulano what’s your address (+)
eles têm este tipo de aula?
Renato: isto eu já pensei desde a quinta série (+) e tentei
colocar mas é: não deu (+) até hoje eu não consegui né (+) um
ano e pouco e eu não consegui porque eles (+) eu fiquei meio
desencorajado né tentei e ninguém quis né depois eu desisti mas
eu penso sim em fazer isto (sessão de visionamento)
O exemplo 04 traz a justificativa da professora Maria a não desenvolver
atividades em pares na escola regular a fim de promover interação. Ela afirma ter receio
de perder o controle da disciplina da turma.
(Exemplo 04)
Maria: Tenho um certo receio de solicitar a eles que trabalhem
em pares porque acho que eles podem aproveitar para
atrapalhar a aula, uma vez que certos alunos não demonstram
interesse em trocar experiências num trabalho em grupo, mas
apenas conversar e perturbar. É claro que se eu não colocá-los
para fazer esse tipo de atividade (em pares e grupos) eles nunca
vão aprender a se desenvolver e a amadurecer.(diário 01- E.R)
Sabemos que os dois contextos têm um formato diferente, mas observa-se
que os professores quando atuam no C.E. seguem uma abordagem mais comunicativa e
na escola regular, uma abordagem tradicional com foco na gramática e tradução. Os
professores afirmam enfrentar dificuldades em colocar em prática, na escola regular, o
que eles acreditam ser essencial para a aquisição, no caso, as oportunidades de interação
para negociação de sentido.
82
A seção a seguir analisa e discute mais detalhadamente o modelo
interacional construído pelos participantes nos dois contextos.
3.2.2. Análise da interação
A análise da interação construída em sala de aula é relevante para o nosso
estudo, pois, através dela, julgamos ser possível não só compreender melhor a
abordagem do professor e a participação dos alunos como também compreender as
funções das formas utilizadas no discurso. Este tipo de análise é importante, visto que
são considerados, dentre outros aspectos, a fala do professor e dos alunos, a alocação e
os comportamentos de tomada de turnos dentro do contexto em que estão inseridos
(Tsui, 1995, p.13). Como foi mencionado no Capítulo II referente à Metodologia, três
aulas de cada professor foram filmadas em dois contextos diferentes. Escolhemos uma
aula de cada professor com duração de aproximadamente trinta minutos, o que foi feito
nos dois contextos, e em seguida as transcrevemos. Em cada aula foram contados os
turnos ali existentes, como mostra o quadro a seguir:
Maria
Centro de
extensão
Maria
Escola
regular
Renato
Centro de
extensão
Renato
Escola
regular
Total de
turnos
Nº de turnos em
aproximadamente
30 minutos
130
71
144
76
421
Quadro 08: Número de turnos em uma aula de aproximadamente trinta minutos
Na próxima seção serão discutidos os aspectos relativos à fala dos
professores. A análise das tabelas a serem apresentadas representa o número de
ocorrências presentes nos turnos de fala registrados na tabela número 07.
83
3.2.2.1. A fala do professor
Com o propósito de compreender a fala do professor foram instaurados os
seguintes procedimentos: a) partiu-se da análise dos movimentos pedagógicos que
constituíam a comunicação veiculada em sala de aula; b) procedeu-se a uma
investigação dos tipos de perguntas feitas por ambos; e c) estabeleceu-se uma análise
das funções que elas exercem. Pensamos ser importante mencionar que infelizmente, há
a possibilidade deste estudo vir a apresentar dados e metodologia passíveis de
questionamento. De fato, algumas dúvidas podem surgir em relação aos seguintes fatos:
duração das aulas e ausência de alguns dos registros de fala dos alunos - o que deixa um
pouco a desejar na compreensão detalhada dos aspectos interacionais. Os resultados que
serão aqui apresentados dão indicações de como a linguagem é modelada nas aulas que
compõem nosso corpus.
Para a análise lingüística que rege a aula de inglês dos participantes, partiu-
se da categorização de quatro movimentos pedagógicos que foram utilizados por Pedro
(1992.
52
). Acredita-se que estes movimentos são comuns em qualquer contexto
pedagógico. Eles são padronizados e utilizados por professores e alunos na construção
de um discurso que é típico de sala de aula. Segundo Pedro (1992, p.55), é possível
classificar, a partir desta análise, a importância pedagógica dos enunciados e o conteúdo
da comunicação.
Os movimentos pedagógicos foram contados dentro dos turnos, o número de
ocorrências foi analisado, classificado e interpretado pela pesquisadora. O quadro a
52
Quatro movimentos pedagógicos foram categorizados primeiramente por Bellack (1966): Movimentos de
estruturação (STR), Movimentos de solicitação (SOL), Movimentos de resposta (RES), Movimentos de reação
(REA). O quinto movimento pedagógico foi definido por Lundgren (1972, 1977) como Movimento de ajuda
individual (HEP) (Pedro, 1992, p.54). A definição detalhada dos movimentos pedagógicos se encontra no Capítulo II
referente à Metodologia.
84
seguir apresenta os movimentos pedagógicos dos professores nos contextos em que
atuam:
Participante STR SOL RES REA Total
Maria (C.E.)
13 44 06 19 85
Maria (E.R.)
05 20 08 05 38
Renato (C.E.)
10 44 04 33 93
Renato (E.R.)
01 03 09 05 18
Total
29 111 27 62 234
Freqüência
6,9 % 26,4% 6,4% 14,7%
Quadro 09: Movimentos pedagógicos nas aulas dos participantes nos dois contextos
As aulas selecionadas são bastante diferenciadas do ponto de vista
contextual. Apesar disso, encontramos um padrão de interação bastante estável,
dominado pelo professor e caracterizado pelo padrão “pergunta-resposta e
confirmação”. Excetuando a atuação do professor Renato na E.R., todos os movimentos
de estruturação (STR) pertenceram ao professor. Ambos os professores utilizam este
movimento com a função de dar instruções para as atividades e para explicar aspectos
gramaticais.
Observa-se que apesar de os professores promoverem aulas mais interativas
no C.E., ainda assim, eles centralizam a aula com muitas explicações. Nos diários e na
sessão de visionamento, a professora Maria demonstra uma preocupação muito grande
com a questão da distribuição dos turnos e de sua presença forte durante as atividades.
Ela afirma que tem uma tendência a centralizar a aula em sua pessoa, dominando a
maior parte dos turnos não conseguindo promover a autonomia dos alunos para falar. O
exemplo 06 ilustra esta preocupação da professora:
85
(Exemplo 06)
Maria: assim tem umas coisas que a gente faz poucas (+)
uma interação e eu sou o centro a minha presença é muito forte
né (+) então eu acho que eu precisava começar a entregar isto
mais para eles começarem a ter uma forma de interação (sessão
de visionamento: linhas 914 a 917)
Observa-se, pelo quadro 8 citado acima, que grande parte dos movimentos lingüísticos
dos professores são utilizados para solicitar informações dos alunos (SOL) ou avaliar as
respostas dadas por eles (REA), ou seja, o professor pergunta, o aluno responde e ele
avalia a resposta dada. Esta seqüência discursiva foi nomeada por Cazden (1988) citado
por Silva (2003, p.98) como “iniciação-resposta e avaliação
53
” e serve para controlar e
monitorar a comunicação na sala de aula tanto no âmbito do comportamento quanto da
fala. Este modelo caracteriza um discurso assimétrico e tradicional em que os alunos
têm poucas oportunidades de iniciativa, já que cabe a eles somente responder ao
professor (Silva, 2003, p. 98). No entanto, percebe-se que nem todos os movimentos de
elicitação são seguidos da seqüência discursiva acima.
3.2.2.2. Solicitação
Nas aulas transcritas, observamos que os movimentos de elicitação foram
muito relevantes, daí a necessidade de compreendê-los melhor.
Nesse estudo, a elicitação
54
chamada por Pedro (1992, p.54) de solicitação,
efetiva-se por meio de perguntas ou afirmações feitas para encorajar os alunos a
falarem, para checar a compreensão deles sobre o assunto estudado ou para exercer
controle. Silva (2003, p. 98) afirma que a elicitação feita para o grupo todo sem nomear
53
- Initiation - Response - Evaluation
54
Elicitação- ato cuja função é requerer uma resposta lingüística, embora a resposta possa ser não verbal (Tsui, 1994,
p. 84).
86
os alunos é positiva, pois “dá ao aluno a liberdade de se expressar e essa condição é
favorável à comunicação”. Esta estratégia é nomeada por Denscombe (1985, p.143)
como co-opção. O professor elicita, os alunos respondem e a reação do professor às
respostas dos alunos é determinada pela forma como ele avalia as respostas dadas pelos
alunos.
Percebemos que a elicitação é predominante nos dois contextos, com
exceção da aula do professor Renato na E.R. e, por isso, faz-se necessária uma
compreensão melhor desse movimento. Para tal, procedemos-se a uma análise dos tipos
de perguntas feitas pelos professores em aula e das funções que elas exercem no
processo interacional. As perguntas foram baseadas na categorização feita por Tsui
(1995, p. 27) apresentadas a seguir como, “referenciais” e “de demonstração”
55
. O
quadro 09 apresenta a análise do tipo de pergunta utilizada pelos professores nos
momentos de elicitação:
Participante Perguntas de
demonstração
Perguntas Referenciais Total de perguntas
Maria (C.E.)
07 22 29
Maria (E.R.)
25 01 26
Renato (C.E)
16 05 21
Renato (E.R)
--- 03 04
Total
48 31 80
Quadro 10: Tipos de perguntas feitas nas aulas dos professores participantes nos dois contextos
De maneira geral, o total de perguntas feitas pelos professores (80) é
significativo, levando-se em consideração o número de solicitações, 111 ou 26,4%, e o
número de turnos das aulas analisadas 421 ou 100%. A primeira vista, a análise do total
de perguntas, sugere que os professores fazem mais perguntas de demonstração do que
referenciais. No entanto, ao investigar detalhadamente os dados verifica-se que há uma
55
Display – (de demonstração, de exposição) perguntas feitas pelo professor para elicitar respostas dos alunos que ele
já conhece a resposta. Estas perguntas geram interações típicas do discurso didático.
Referenciais- perguntas feitas pelo professor sem que ele espere uma resposta pré-estabelecida. Este tipo de pergunta
gera interações típicas da comunicação social e estimulam a negociação de sentido (Tsui, 1995, p.27).
87
variação entre os tipos de perguntas feitas pelos professores nos dois contextos. No
C.E., por exemplo, a professora Maria faz mais perguntas referenciais do que as de
demonstração, o que julgamos ser positivo. Contudo, na E.R., ela faz mais perguntas de
demonstração. O professor Renato faz mais perguntas de demonstração do que
perguntas referenciais no C.E. e, na E.R., ele faz poucas perguntas das duas naturezas.
Os exemplos a seguir ilustram o tipo de perguntas feitas pelo professor
Renato nos dois contextos:
(Exemplo 07)
Renato – C.E
Renato: So, what tense is this? Brazil won in two thousand two
(+)
what tense is this? (pergunta de demonstração)
Priscila: past
Renato: what past?
Priscila:Simple
Renato: How long did you study by yourself? (pergunta
referencial)
Patrícia: two years before entering in college.
(Exemplo 08)
Renato- E.R.
Renato: Quem é o monitor desta turma? (pergunta referencial)
Pedro: monitor?(+) ah não sei não
Renato: Em qual texto você está? (pergunta referencial)
Sandro: este
O professor Renato, no C.E., faz mais perguntas de demonstração do que
referenciais, gerando poucas situações de comunicação real iniciadas pelo professor. As
perguntas de demonstração são, geralmente, utilizadas pelo colaborador para verificar o
conhecimento da estrutura gramatical, ou metalinguagem dos alunos. As perguntas
referenciais são utilizadas para ouvir as opiniões dos alunos e discutir os tópicos
estudados. No contexto da E.R., ele quase não faz perguntas referenciais ou de
demonstração para elicitar o conhecimento prévio dos alunos. O número de perguntas
que o referido professor faz é muito reduzido e, também, a fala dele na sala de aula não
88
é muito predominante. As quatro perguntas referenciais que ocorreram na E.R. foram
utilizadas para exercer controle de disciplina como demonstra o exemplo 08.
Os exemplos 09 e 10 a seguir ilustram os tipos de perguntas utilizadas pela
professora Maria:
(Exemplo 09)
Maria – C.E.
Maria: What do you think of the law (+) when you separate (+)
the mother is in charge of the child (+) do you think that it could
be like the father or they may talk about it (+) what do you
think? (pergunta referencial)
Leandro: In most part of the situation (+) the woman has to
grow the children (+) but sometimes is different (…) it could
change but looking more for the child
Maria: You’ve called (+) what’s the verb tense? (pergunta de
demonstração)
Luciana: perfect
Maria: present perfect (+) right? So you have to make the tag
with this /?/ you’ve called the /?/
Luciana: haven’t you?
(Exemplo 10)
Maria – E. R.
Maria:Você acabou tudo? (pergunta referencial)
Aluno: acabei tudo
Maria: September (+) e depois de May qual é o mês?/(pergunta
de demonstração)
Alunos: June
Maria : vem antes do winter?o que é winter?
Alunos: inverno
Maria, no C.E., tem uma atitude mais comunicativa. Ela elicita o
conhecimento prévio dos alunos através de perguntas referenciais. As perguntas de
demonstração são em menor número sendo utilizadas para checar os conhecimentos da
estrutura gramatical ou para corrigir exercícios. Ela utiliza mais perguntas de
demonstração na E.R. e utiliza as referenciais para exercer controle de disciplina usando
a língua materna. A manutenção do controle é importante para a professora no contexto
89
da E.R., limitando, assim, as chances de comunicação real entre os alunos. Na E.R., a
professora Maria utiliza a língua alvo e a língua materna, na maior parte do tempo, para
avaliar o conhecimento dos alunos, embora o número de ocorrências seja menor do que
no C.E.. Ela faz mais perguntas de demonstração, as quais os alunos respondem e ela
confirma tais respostas, prevalecendo o modelo “iniciação-resposta e avaliação”.
Percebe-se, pelos exemplos discutidos, que as perguntas feitas em sala de aula exercem
funções diferenciadas. Constata-se que quando os professores fazem perguntas de
demonstração, prevalece o modelo de “iniciação-resposta e avaliação”. Observa-se que
as perguntas referenciais são utilizadas para estimular a comunicação ou para manter o
controle disciplinar da turma. Sinclair e Coulthard (1975, p.28) apud Tsui, (1994, p.82)
afirmam que as perguntas referenciais são feitas pelo falante com a intenção de
desencadear uma conversa. O falante pode utilizá-las para diversas funções, tais como:
fazer o ouvinte confirmar, informar, engajar, esclarecer ou concordar
56
com o que ele
diz. O quadro 08 apresenta a análise da função das perguntas feitas pelos professores em
sala de aula:
Participante Informar Confirmar Concordar Engajar Esclarecer
Maria (C.E.)
19 05 04 01 ---
Maria (E.R.)
22 04 --- --- ---
Renato (C.E)
16 04 --- --- 01
Renato (E.R)
03 01 --- --- ---
Total
60 14 04 01 01
Quadro 11: Funções das perguntas nas aulas dos participantes nos dois contextos
Esta análise demonstra e confirma novamente o modelo de iniciação por
parte do professor, processo esse seguido de uma resposta do aluno que, por sua vez, é
56
Informar – convida o ouvinte a fornecer informações. Para este estudo são consideradas as perguntas feitas sobre os
conhecimentos de língua e as perguntas feitas para controlar a disciplina.
Confirmar- convida o ouvinte a confirmar a suposição do falante (tag interrogative)
Concordar- convida o ouvinte a concordar com o argumento.
Engajar- elicita o engajamento do falante.
Repetir e esclarecer- convida o ouvinte a reportar de outra maneira o que foi dito para ficar mais claro (Tsui, 1994,
p.81-89).
90
avaliado de forma positiva e/ou negativa. A maior parte das perguntas feitas pelos
professores tem a função de solicitar informações dos alunos
57
. É também
representativo o número de perguntas para confirmar a argumentação. As questões
utilizadas com a função de engajar, concordar e esclarecer quase não aparecem. Ao
nosso ver a presença delas seria de grande valia já que estas são consideradas por alguns
autores como as mais típicas de uma conversa real.
Verificamos que, apesar de haver uma variação entre os tipos de perguntas
feitas pelos professores nos dois contextos estudados, tais colaboradores utilizavam
estratégias ora tradicionais, ora comunicativas. Esta oscilação entre tradicional e
comunicativo poderia ter relação com as crenças que o professor tem a respeito do
contexto em que atua e em relação aos alunos e à forma como eles compreendem o
processo de ensino e aprendizagem da língua. Por exemplo, a professora Maria quando
em contexto do C.E., em que ela compreende que o objetivo da aula é a comunicação
entre ela e os alunos na língua alvo, há o uso de mais perguntas referenciais,
estimulando a comunicação. Na E.R., em que ela compreende que o objetivo é mais
restrito ao ensino de gramática com foco nas formas e no ensino de vocabulário, há um
uso mais considerável das perguntas de demonstração, limitando o desenvolvimento das
habilidades de percepção e produção oral na LE.
3.2.2.3. Alocação e comportamentos de turnos
Para investigar a alocação e distribuição dos turnos nas aulas dos
participantes, foram levantadas dos dados as estruturas de participação mais
representativas, baseando-nos na mesma configuração utilizada por Silva (2003)
58
. Esta
57
A solicitação de informações é feita na maioria das vezes com perguntas de demonstração.
58
As estruturas de participação já foram discutidas no Capítulo II referente à Metodologia.
91
discussão pode revelar resultados significativos, pois permite verificar se é o professor
quem domina os turnos em sala de aula. Assim, torna-se possível investigar se ele
desenvolve padrões de interação diversificados, tais como: monólogos, diálogos e
conversas. Tais padrões de interação podem atingir o que Lamy & Goodfellow, (1999,
p. 44) denominam “nível de interação contingente”. Em outros termos, seria verificar se
todos participam desta interação de forma variada, ou seja, se há interação aluno x
aluno, professor x todo o grupo ou somente professor x aluno específico.
A discussão a seguir tem por base a análise das estruturas de participação
que foram mensuradas em minutos como demonstra o quadro sinótico (anexo F).
A tabela abaixo quantifica em minutos cada uma das estruturas de
participação
59
:
Participante IA IB IC ID IIA IIB IIIA IIIB IVA IVB
Maria (C.E.)
6’ 35’’ 3’ 56’’ 0’ 3’ 2’’ 7’ 5’’ 0’ 11’ 32’’ 5’ 2’ 0’
Maria (E.R.)
12’ 45’’ 0’ 0’ 9’ 0’ 45’’ 0’ 0’ 0’ 6’ 0’
Renato (C.E.)
2’ 0’ 0’ 13’ 7’’ 6’ 0’ 11’ 4’’ 8’ 0’ 0’
Renato (E.R.)
0’ 0’ 0’ 0’ 0’ 45’’ 15’ 4’ 0’ 0’ 6’
Total
20’ 8’’ 3’ 56’’ 0’ 25’ 9’’ 14’ 4’’ 15’ 26’ 72’’ 13’ 8’ 6’
Quadro 12: Quantificação do tempo em cada estrutura de participação
As interações do tipo I (Silva, 2003, p. 98) ocorreram nas aulas dos dois
participantes. Os momentos em que o professor assumiu o papel centralizado,
gerenciando e controlando a interação ocorreram nas aulas transcritas nas configurações
IA e IB. A configuração IC não ocorreu nas aulas analisadas, mas será discutida tendo
por suporte as anotações de campo da pesquisadora.
A configuração IA, ocorreu no momento em que o professor interagia de
forma centralizada, como falante principal, ratificando todos os alunos como ouvintes
59
Capítulo II referente à Metodologia p. 64.
92
primários fazendo perguntas. Este arranjo interacional foi evidenciado de forma mais
significativa na aula da professora Maria na E.R. (12min e 45 seg.) e no C.E. (6min. e
35 seg.). O exemplo 11 transcrito abaixo demonstra esta configuração:
(Exemplo 11)
Maria: Vamos lá então qual o mês que vem antes de February?
Alunos: January
Maria: /dz/ /dzanuery/
Maria: então primeiro é January ?
Alunos: January
Maria: vocês ainda estão falando /ja/ e é /dza/ repeat
Alunos: /dzanuery/
Maria: número dois vem antes de November?
Alunos: October
Maria: vem depois do verão qual que é?
Alunos: /?/
Maria: como que fala verão em inglês?
Alunos: Summer
Durante esta interação (exemplo 11), a professora corrigia uma atividade no
quadro elicitando as respostas dos alunos. Esta configuração foi muito utilizada pela
professora Maria nos dois contextos para correção de exercícios e foi utilizada pelo
professor Renato somente no C.E.. De um lado, esta estrutura de participação é criticada
por alguns autores, visto que limita a participação dos alunos e diminui a motivação de
aprender por ser uma prática “mecanizada” (Cazden, 1988, Hall, 2001, Silva, 2003). Por
outro lado, apesar de ser uma prática controlada, parece-nos que ela pode ser
considerada positiva em alguns momentos da aula. Poderia ser caracterizada como uma
oportunidade que o professor tem para incentivar a participação dos alunos.
Constatamos em nosso corpus que a maioria deles participava intensamente em coro ou
individualmente, corrigindo os cadernos e, neste momento, não havia conversa paralela.
Eles não pareciam demonstrar resistência a este modelo. Outro aspecto relevante,
também verificado por Silva (2003, p.102) é o fato da professora não nomear os alunos
93
para responder. Eles participam livremente tomando o turno da professora para
responder.
A configuração IB foi construída com a finalidade de realizar atividades de
compreensão oral e ocorreu somente no contexto do C.E.. Apesar de não haver
nenhuma ocorrência na aula transcrita do professor Renato no C.E., esta configuração
foi relevante nas outras aulas observadas neste contexto. Os dois professores utilizavam
o material de áudio, que fazia parte do livro didático, e também materiais extras, como
músicas, por exemplo. O professor preparava os alunos com um “warm up” com o
objetivo de organizar a interação e permanecia em uma posição centralizadora no
momento da sondagem. O exemplo 12 mostra uma das formas de apresentação da
atividade de compreensão oral após o “warm up” relacionado à fala dos bebês:
(Exemplo12)
Maria: ok let’s go to that right? (+) you have to listen to the
interview and tick and check if you /?/
(fita)
Maria: so?
Luciana: it’s not English
Dalva: it’s mama English
Maria: /?/ now you know that she said mama
Luciana: yes but it’s not English
Maria: that’s kind of universal (+) I mean even a Japanese baby
is going to spell the same sound (+) so that’s interesting right
(+) because it doesn’t matter the nationality they perform the
same sound (+) all the babies (+) so that’s interesting (+++) so
why do they say (+) why according to the interview they say first
mama?
Luciana: I think the sound (+) the first more people (+) make it
with the month
Maria: mouth (+) but is it according to the interview that she
said /?/ about the babies (+) what do you think (+) what’s the
information that the woman gave (+) don’t you remember (+)
ok (+) let’s listen again and count how many tag questions do
you listen if you want to take notes (+) just isn’t she ok and try
to guess why is mama the first word?
94
Observa-se que, após tocar a fita, a professora elicita o que os alunos
compreenderam através de uma pista de contextualização “so?” e eles têm a liberdade
de tomar o turno para verbalizar o que compreenderam. Como eles não conseguiram
todas as informações, ela toca de novo e checa, desta vez, acrescentando um item
gramatical a ser observado (tag question). Silva (2003) sugere que para se ter uma
distribuição de turnos mais democrática e mais eficaz neste tipo de correção, é
necessário que o professor peça aos alunos para discutirem em pares o que conseguiram
tomar notas e somente depois o professor elicitaria as respostas. De acordo com as
anotações de campo feitas por esta pesquisadora, tal modelo foi utilizado pelo professor
Renato em algumas das atividades de percepção oral. Ele tocou a fita, pediu aos alunos
que discutissem em pares as respostas e depois corrigia, elicitando as respostas de cada
par.
A configuração IC, que é o arranjo interacional construído para que os
alunos pudessem repetir listas de vocabulário, não foi evidenciada em nenhuma das
aulas transcritas. No entanto, segundo as notas de campo da pesquisadora, ela ocorreu,
de forma representativa, em outras aulas da professora Maria na E.R.. Este tipo de
interação é típico das aulas tradicionais em que o professor controla o momento em que
os alunos podem tomar o turno da fala, a duração dos turnos e o que devem falar (Silva,
2003, p. 106). Segundo a autora supra citada, os alunos entendem a mudança de código
lingüístico devido a uma cultura de aprender língua estrangeira, que valoriza a
pronúncia correta e que atribui ao professor o papel de exercer comandos,
reorganizando as interações conforme os objetivos das atividades pedagógicas que
propõe. Este modelo é positivo, segundo Silva (2003, p.106), pois os alunos têm a
oportunidade de pronunciar novo vocabulário tendo o apoio do modelo do professor,
contudo não deve ser o único modelo interacional proposto.
95
A configuração ID ocorreu de forma mais predominante na aula do
professor Renato no C.E. (13 min) e na aula da professora Maria na E.R. (9 min.). Nesta
configuração, o professor como falante principal ratifica um aluno para falar, pedindo
para ler ou para resolver os exercícios. O exemplo 13 abaixo demonstra como esta
configuração era construída na aula do professor Renato:
(Exemplo 13)
Renato: you can use /sold/ you can use /sold/ yeah there are
other words but you can use this (+) can you give the solution
Patrícia?
Patrícia: the number of tourists decreased because there had
been numerous bomb attacks
Renato: yes (+) it’s all right or there had been numerous bomb
attacks so the number of tourists decreased dramatically (+)
what else? Because there had been (+) there had been
numerous bomb attacks (+) ok (+) now number four I want
Priscila to do it and number five you two do two minutes to
correct the sentences
Nas interações do tipo II, Silva (2003, p.98) afirma que “o professor
permanece centralizado como falante principal e os alunos como ouvintes primários não
se esperando que tomassem os turnos de fala durante estes momentos”. No presente
estudo ocorreram as configurações de participação IIA e IIB.
A configuração IIA ocorreu com mais predominância no C.E. nas aulas dos
dois professores (Maria 7 min e 30 seg.) e (Renato 6 min.). Nestes momentos, o
professor ratificava os alunos como ouvintes primários para dar instruções, explicações
do conteúdo ou para relatar fatos. Esta configuração se assemelha ao movimento
pedagógico de estruturação (STR) já discutido anteriormente
60
. Na E.R. esta
configuração só foi utilizada para dar instruções no início das atividades propostas. O
exemplo 14 ilustra esta configuração:
60
Capítulo II referente à Metodologia p. 64.
96
(Exemplo 14)
Maria: an example ah (+) this room is really small (+) isn’t it ?
that’s the tag question (+) this room is really small is positive
(+) the tag question is negative isn’t it (+) isn’t it is the tag
question (+) but suppose that I have a NEGATIVE sentence it
isn’t so big (+) is it? So my tag has to be positive (+) it isn’t so
big (+) is it? (+++) if you have a positive in one side the other
is negative (+) if you have a negative here the other is positive
(+) the idea is you just put the verbs like verb to be (+) modals
(+) like can’t she (+) can’t he (+) and auxiliary do (+) does (+)
did (+) the same verb tense you don’t change the verb tense (+)
so let’s try (+) you dictate the sentence (+) right Dalva (+) and
Dalva make the tag question here and then you dictate to
Emerson and he gives the tag question
Em suas pesquisas Silva (2003, p. 110) observou que neste tipo de
configuração é rara a participação e a tomada de turno por parte dos alunos. No presente
estudo, todavia, mesmo quando esta configuração é predominante, verifica-se que os
alunos tomam o turno dos professores nos dois contextos, seja em língua alvo ou
materna, para tirar dúvidas sobre as atividades propostas ou sobre o conteúdo
61
. Apesar
desta tomada de turno ocorrer com mais freqüência no C.E., acreditamos que tal
procedimento seja positivo, pois os alunos se sentem à vontade para interagir.
Atribuímos o fato da referida configuração estar mais presente no C.E. do que na E.R.
às atividades que são desenvolvidas pelos professores em sala de aula, porque a nosso
ver elas envolvem os alunos e os preparam mais para a comunicação.
A configuração IIB que se refere aos momentos em que os alunos interagem
entre si sem a solicitação da professora, foi comum em todas as aulas. Infelizmente,
devido a problemas técnicos não previstos, não foi possível registrar as falas dos alunos
em sua totalidade. Esta configuração foi compreendida pela pesquisadora, de forma
testemunhal, nos momentos de conversa paralela, que se constituíam de assuntos
61
Neste estudo, no momento em que o aluno toma o turno do professor para solicitar alguma informação, a
configuração muda, neste caso da IIA para IVA.
97
vinculados à aula ou não. Esta configuração foi mais predominante na aula do professor
Renato na E.R.. Um grupo de alunos senta ao fundo da sala e conversa durante a maior
parte do tempo sobre os acontecimentos da comunidade e isto incomoda o professor
que, durante a aula, chama a atenção destes alunos.
Nas interações do tipo III, o professor assume o papel descentralizado, já
que os alunos desenvolvem interações em pares ou interagem livremente para o
desenvolvimento das atividades (Silva, 2003, p.98). Foram evidenciadas as
configurações IIIA e IIIB nas aulas analisadas.
Na configuração IIIA, os alunos têm a oportunidade de se expressar na
língua estrangeira.
“Eles interagiam em pares ratificando-se como ouvintes falantes primários e
a professora, descentralizada, circulava monitorando a atividade interacional,
colocando-se disponível, podendo ser ratificada como ouvinte falante
primária por um aluno ou um par de alunos para clarificação, bem como
podendo ratificar um aluno ou um par de alunos como seus ouvintes falantes
primários para correção de erros” (Silva, 2003, p.98).
A referida configuração ocorreu de forma mais acentuada no C.E.. Ela será
discutida com mais detalhes nos movimentos de ajuda na seção das percepções dos
alunos.
Ainda na concepção da autora acima citada, a configuração IIIB, a turma
toda interagia entre si livremente. O arranjo interacional acontecia durante o
aquecimento para as atividades, para discussão de assuntos relativos ao uso da língua e
para solucionar alguma dúvida da turma. Nestes momentos, o professor lançava o
assunto e discutia com os alunos sem haver controle na distribuição dos turnos. Todos
participavam da interação. Este tipo de interação ocorreu somente no C.E. nas aulas dos
dois professores. Na aula da professora Maria durante 5 minutos e na aula do professor
Renato 8 minutos.
98
O exemplo 15 mostra como se deu esse arranjo interacional:
(Exemplo 15)
Patrícia: so every time we have two actions (+) the last action is
in the simple past and the action before is in the past perfect?
Renato: yes yes that’s it Priscila /?/
Priscila: like eh I forgot the sentence antes de morar
Renato: eh (+) before I got these shoes had bought another pair
of the same model very simple to produce but sometimes it’s
very confusing in some sentences (+) /.?/ the sentences that I did
(+) I had been waiting for three hours when they finally arrived
(+) I had been waiting (+) ah so it’s past perfect (+) what kind
of sentence is this (+) I had been waiting for three hours when
they finally arrived (+)
Aluna: it can be continuous (+) an action that happened before/
Renato: yeah
Patrícia: so like/
Renato: I had been waiting/
Patrícia: something in progress
Renato: yes (+) in progress good (+) it’s a continuing action in
the present perfect when they arrived simple past like this ah (+)
and also suggests that something /is/ been done for a long time
(+) I had been waiting (+) also another one (+) I had been
showering when the phone rang (+) what does it suggest? I had
been showering when the phone rang (+) this (+)
Susana: while
Renato: while
Susana: while you are/
Renato: yes having shower
Susana: while you were having shower the telephone rang (+)
the other action happened
Já nas interações do tipo IV, Silva (2003, p.98) afirma que “o professor é
ratificado como ouvinte-falante primário por um aluno ou por um grupo de alunos”. Há
ocorrências das configurações IVA e IVB nas aulas transcritas.
A configuração IVA é o arranjo interacional que se construiu quando o
aluno tomava o turno de fala do professor que estava centralizado como falante
principal interagindo com a sala como um todo e o ratifica como seu ouvinte–falante
primário para questionamentos de clarificação sobre vocabulário, estruturas gramaticais
ou resoluções de exercícios (Silva, 2003, p.122). Esta configuração foi evidenciada nas
99
aulas da professora Maria nos dois contextos. No exemplo 16 de nosso corpus, a
professora dava as instruções para uma atividade que seria desenvolvida em pares com
foco no uso dos “tag questions”. O aluno toma o turno da professora para esclarecer a
dúvida sobre como desenvolver a atividade usando a língua alvo e a professora usa
exemplos para esclarecer melhor as instruções dadas. O aluno participa da negociação
atuando como parceiro da professora.
(Exemplo 16)
Maria: the activity is (+) I have to dictate the sentence and you
have to give the tag question (+) ok? (+++) so (+) they don’t
like soap opera (+) you have to tell the tag for the sentence I
dictated for you (+)
Douglas: I have to make the tag?
Maria: you have a negative sentence so you have to make the tag
positive
Douglas: don’t they like?
Maria: do they?
Douglas: do they?
Maria: no (+) remember (+) the tag /?/ is negative so you put
the tag positive (+) they don’t like soap opera (+) DO THEY?
Do they like no (+) do they (+) now I have to dictate for you
right (+) she has been an actress all her life (+) all her life/
Douglas: hasn’t she?
Maria: hasn’t she because it’s positive and the tag is negative
(+) she has been an actress all her life hasn’t she? (+) you
didn’t want to be single (+)
Douglas: did I?
Esta interação foi muito produtiva para o aluno Douglas e para seus colegas,
do ponto de vista da instrução dada, pois os alunos puderam compreender melhor o que
fora proposto, apesar de não terem participado diretamente da interação. O fato de os
alunos terem a liberdade de interromper o professor durante as explicações é muito
importante e demonstra a liberdade que eles têm em colocar questões e o interesse da
professora em atender às dificuldades dos alunos. Silva (2003, p.125) relaciona o fato
de os alunos não interromperem o professor durante as explicações aos valores
atribuídos aos papéis sociais de cada um em sala de aula. Segundo a autora, ainda que o
100
aluno tenha o poder de interromper o professor, tomar o turno de fala como falante
principal e ratificá-lo como seu ouvinte-falante, ainda assim, o professor continua sendo
o principal gerenciador e organizador das interações. No entanto, do ponto de vista
comunicativo, a atividade não foi muito relevante, pois o foco foi dado apenas nas
formas e os alunos não utilizaram a língua com uma função comunicativa.
A configuração IVB ocorre, de acordo com Silva (2003, p.125), quando o
grupo de alunos ratificava o professor como ouvinte–falante primário para a resolução
de dúvidas de interesse pessoal que não faziam parte da lição, enquanto os outros alunos
não participam da interação. Este arranjo somente ocorreu nas aulas do professor
Renato na E.R. (6min.). Nas aulas da professora Maria, os alunos discutiam muitos
assuntos, mas sempre relacionados à disciplina ou às atividades propostas. O exemplo
17 transcrito abaixo mostra como se deu esta configuração:
(Exemplo 17)
Sandro: o professor fala inglês aí pra gente ver
Renato: o quê?
Sandro: qualquer coisa
Renato: anything
Sandro: o quê?
Renato: qualquer coisa
(trecho inaudível)
Aluno: ela é professora também (+) a aula lá é em inglês?
(a pesquisadora balança a cabeça que sim)
Aluno: isto humilha a gente (risos)
Rita: na Letras é só português e inglês?
Angélica: na Letras você faz inglês (+) português (+) espanhol
e /?/ só que demora
Este arranjo interacional ocorreu somente na aula do professor Renato no
contexto da E.R. (6 min.). A interação foi feita em língua materna e demonstra o
interesse dos alunos em receberem insumos na língua alvo por parte do professor. Com
base no excerto acima, percebe-se que os alunos compreendem o papel do professor
101
como o responsável pelo gerenciamento e organização das atividades pedagógicas e
cobram isso dele.
O gráfico abaixo ilustra as estruturas de participação dos professores nos
dois contextos:
0
5
10
15
20
25
30
IA IB IC ID IIA IIB IIIA IIIB IVA IVB
Maria (C.E.)
Maria (E.R.)
Renato (C.E.)
Renato (E.R.)
Gráfico 02: Quantificação do tempo em cada estrutura de participação
Os resultados obtidos neste estudo confirmam pesquisas feitas
anteriormente. A fala predominante em sala de aula é a do professor. O papel deste
último é o de organizar a interação. Ele pode fazê-la de forma mais ou menos
centralizada. Os professores participantes desse estudo, apesar das tentativas
comunicativas, ainda centralizam a interação e distribuem pouco os turnos para os
alunos. Isto acontece de forma mais acentuada na E.R..
Há a predominância de um modelo interacional bastante tradicional, ou seja,
há uma elicitação do professor, uma resposta dos alunos e uma avaliação ou comentário
por parte do professor. Isso ocorre com maior freqüência na E.R.. Este modelo
interacional foi também observado por Pedro (1992), McHouls’s (1978), Cazden
102
(1988), Silva (2003) entre outros. É importante observar que não há somente um
movimento pedagógico predominante nas aulas dos participantes. Há tentativas dos
professores, principalmente no C.E., em dar voz aos alunos, em promover atividades
que os alunos possam utilizar a LE para se comunicarem.
3.3. Resultados da análise das percepções e reações dos alunos
Esta seção visa a responder a terceira pergunta de pesquisa em relação às
percepções e crenças dos alunos sobre o ensino e aprendizagem de inglês, a participação
deles nas aulas e as reações deles sobre a abordagem de ensinar dos professores
participantes. Para a discussão das crenças, e percepções e reações dos alunos, será
apresentada uma análise quantitativa e uma análise qualitativa dos dados coletados em
uma entrevista semi-estruturada respondida pelos alunos (Anexo B). Para a análise da
participação dos alunos nas aulas será apresentada uma análise da interação.
Foram entrevistados quatro alunos de cada professor em cada contexto de
atuação (C.E e E.R) somando um total de dezesseis (16) alunos. A análise quantitativa
visa a demonstrar o interesse dos alunos pela disciplina em questão, as estratégias mais
utilizadas por eles e se reconhecem a importância de aprendê-la. A análise qualitativa
tem o objetivo de discutir as crenças dos alunos sobre o ensino e a aprendizagem de
inglês e as reações deles às abordagens dos professores participantes.
Dentre os participantes, dez (10) afirmam ter interesse e gostar de estudar
inglês e seis (6) afirmam não gostar. Os alunos que afirmaram não gostar, justificam
dizendo que acham difícil aprender a língua e que não acham as aulas interessantes. O
fato de os alunos estarem motivados ou não pode interferir no sucesso, ou não, da
aprendizagem (Brown, 1994, p. 152).
103
Os alunos foram questionados quanto à relevância de se aprender inglês.
Treze (13) destes alunos disseram ser importante aprender e, três (3) disseram que não.
Percebe-se, pelos dados, que a maioria dos alunos que têm interesse em aprender inglês
apresentam justificativas relacionadas às motivações integrativas e instrumentais
62
. É
grande o número de alunos que acredita que o conhecimento da mesma é uma
necessidade prática. Esses alunos são mais motivados a aprender inglês por motivos
instrumentais, ou seja, eles podem ampliar a visão de mundo, aumentar as chances de
arrumar um bom emprego e utilizar o aprendizado como ferramenta para auxiliar na
leitura de textos. Muitos entrevistados também têm uma motivação integrativa para
aprender a língua inglesa, ou seja, para conversar, para ouvir músicas, viajar, ou até
mesmo mudar para o exterior.
O quadro abaixo apresenta o número de ocorrência das justificativas dos
alunos para se aprender inglês e o que motiva:
Relevância de aprender inglês Número de alunos Motivação
Acha que não é relevante 3 ---
Arrumar um bom emprego 10 Instrumental
Viajar 4 Integrativa
Ampliar conhecimentos 1 Instrumental
Ler textos em inglês 2 Instrumental
Ouvir músicas 3 Integrativa
Mudar para o exterior 3 Integrativa
Conversar 3 Integrativa
Quadro 13: Relevância de se aprender inglês
62
Motivação instrumental: motivação em aprender a língua estrangeira para atingir objetivos instrumentais, tais
como, trabalho, leitura de textos, traduções, etc. Motivação integrativa: Motivação em que os aprendizes desejam se
integrar na cultura do país falante da língua em questão (Brown, 1994, p.153).
104
3.3.1. Estratégias de aprendizagem
Durante a entrevista (Anexo E), os alunos foram questionados acerca das
estratégias que eles utilizam para aprender melhor a língua inglesa. Os alunos da E.R.
mencionaram que assistem a filmes e lêem as legendas comparando as palavras e
estudam em casa fazendo a revisão da matéria. Os alunos do C.E. afirmaram que
aprendem quando lêem, escrevem, conversam em pares ou em debates.
O quadro abaixo apresenta o total de estratégias utilizadas pelos alunos nos
dois contextos:
Estratégias de aprendizagem Maria Renato Total
Assistir a filmes 2 2 4
Ler 4 3 7
Falar em inglês 2 2 4
Estudar em casa fazendo a tarefa de casa 7 3 10
Estudar gramática 2 2 4
Ouvir fitas 2 -- 2
Escrever artigos 1 -- 1
Ser corrigido pelo professor 1 -- 1
Não traduzir 1 1 1
Ouvir música 2 2 2
Aprender vocabulário pelo contexto 1 1 1
Quadro 14: Estratégias utilizadas pelos alunos para aprender inglês
É interessante observar que o número de alunos que aprendem melhor com as atividades
desenvolvidas em casa é maior em comparação com as outras estratégias (10). O
número de alunos que afirmaram aprender melhor através da leitura também é
considerável (7). Este fato pode estar relacionado às experiências de aprendizagem de
língua que esses alunos tiveram anteriormente. O tipo de estratégias utilizadas pelos
alunos pode interferir nas expectativas deles em relação à abordagem de ensinar do
professor. A próxima seção discutirá o que os alunos participantes deste estudo esperam
das aulas de inglês.
105
3.3.2. Expectativas dos alunos
Os alunos foram questionados sobre as expectativas deles em relação às
aulas de inglês. Observa-se pelos dados que as expectativas dos alunos de ambos os
professores estão direcionadas ao desenvolvimento de estratégias e habilidades, em sala
de aula, que eles ainda não são capazes de desenvolver individualmente, como por
exemplo, desenvolver as habilidades de percepção e a produção oral (listening e
speaking). A maioria deles relatou que também aprende melhor através da leitura ou das
tarefas de casa.
Os alunos entrevistados e oriundos da E.R. afirmam que as atividades em
pares quase não acontecem nas aulas de inglês para o desenvolvimento da habilidade
oral e concordam que elas seriam benéficas à aprendizagem. Segundo eles, seria mais
fácil falar com o colega do que com a turma toda. No contexto do C.E., os alunos
relataram que gostam das atividades em pares e reconhecem a importância delas para o
desenvolvimento de habilidades, da prática oral e do reforço da matéria dada. O quadro
abaixo apresenta algumas das atividades que os alunos de ambos os contextos esperam
que o professor desenvolva em sala de aula:
Expectativas dos alunos Maria Renato
Mais livros para leitura
Mais trabalhos em pares
Músicas
Mais oportunidades para debates
Mais aulas na semana
Exercícios de gramática
Dar atividades mais difíceis
Aula mais animada
Atividades para comunicação
Clareza nas instruções
Quadro 15: Expectativas dos alunos
106
3.3.3. Reação dos alunos à abordagem do professor
Para compreender melhor essa perspectiva, foi perguntado aos alunos se
eles gostam ou não das aulas de inglês e o porquê. Todos os alunos da professora Maria
afirmaram gostar de sua abordagem de ensinar na E.R.. Neste contexto, os alunos
prestam atenção nas aulas, repetem as palavras e copiam a matéria do quadro. Eles
afirmaram que gostam dos exercícios da apostila, pois através deles, eles aprendem
palavras novas.
No C.E., três alunos afirmaram que a abordagem de ensinar da professora
atende as suas necessidades e uma disse que não. A aluna que disse que a abordagem
não a favorece, afirma que aprende melhor em casa, estudando gramática e fazendo
exercícios escritos.
Dentre os alunos do professor Renato, quatro afirmaram que a abordagem
de ensinar dele favorece à aprendizagem e quatro disseram que não. Os quatro alunos
do C.E. disseram que a aula favorece à aprendizagem, pois eles têm a oportunidade de
desenvolver, de forma variada, as habilidades de percepção, de produção oral e escrita,
tanto individualmente quanto em grupos.
Na E.R. um aluno disse não gostar da aula por não ter interesse pela
disciplina. Outro acredita que somente viajando para o exterior é possível aprender a LE
e que na escola só se aprende o básico. Os outros dois afirmaram que o professor deve
dar atividades mais difíceis e uma aula mais animada com menos explicações
gramaticais.
107
O quadro abaixo ilustra a reação dos alunos à abordagem do professor:
Abordagem favorece a aprendizagem Professor
Sim Por quê? Não Por quê?
Conversação,trabalhos com livros (easy
readers)
Debates, exercícios para dar opinião
Conversação, livros, textos escritos
Não sabe explicar o porquê
Aprender palavras novas
Ela é muito clara com as coisas
Maria
7
Fala em inglês na sala
1
Aprende melhor com exercícios
de gramática
Fala inglês o tempo todo Aula monótona
Muitos exercícios de listening Exercícios muito fáceis
Há trabalhos em grupos Não tem interesse pela disciplina
Renato
4
Exercícios variados
4
Só se aprende se viajar pra fora
Quadro 16: Reação dos alunos à abordagem de ensinar do professor
Observa-se que o objetivo da maioria dos alunos é a percepção e produção
oral, visto que as justificativas dadas por eles no que diz respeito a gostar da abordagem
de ensinar dos professores envolvem estas habilidades. Para os alunos, a sala de aula
pode ser um lugar propício à aprendizagem. Sendo assim, na crença deles, a interação
deve refletir o caráter comunicativo da sala de aula.
3.3.4. Experiências anteriores
Para compreender melhor as crenças subjacentes às reações dos alunos ao
ensino de inglês, foi feita uma análise das experiências anteriores dos alunos
participantes
63
. alunos da E.R. afirmaram que ainda não tiveram a oportunidade de
estudar inglês em cursos livres. Todos os alunos do C.E. tiveram aulas de inglês em
E.R. e também em outros cursos livres. Percebe-se, pelos dados contidos no quadro 16
63
Não podemos afirmar que estes resultados são uma regra geral. No grupo entrevistado, estes foram os resultados
alcançados.
108
abaixo, que a maioria dos alunos teve uma experiência com aulas tradicionais, ou seja,
aulas com foco na estrutura, na tradução ou no desenvolvimento da leitura. No quadro
13
64
anteriormente citado, a maior parte dos alunos afirmou que aprendem mais a
disciplina em questão através da leitura de textos e de exercícios dados como tarefa de
casa. Isto demonstra que eles já estão acostumados com este tipo de tarefa e que elas
não se apresentam como desafio para eles. O quadro 16 abaixo transcrito mostra um
resumo do tipo de atividade a que eles foram expostos em experiências anteriores de
aprendizagem de inglês. Este dado reforça o resultado do quadro 15
65
, em que algumas
das características das aulas que os alunos mais gostam são aquelas às quais eles não
foram expostos anteriormente, ou seja, aulas que desenvolvam a percepção e a produção
oral. Estas habilidades apresentam-se como desafios para os alunos e eles esperam que
as mesmas sejam desenvolvidas em sala de aula pelos professores.
Aulas
Atividades
Expositiva Lista de
verbos
Tradução Habilidades
integradas
Gramática Leitura
Maria
2 1 4 1
--- ---
Renato --- ---
2
---
4 2
Quadro 17: Experiência dos alunos com outro professor
3.3.5. Participação dos alunos nas aulas
Para analisar a fala do aluno em sala de aula procedeu-se à investigação dos
mesmos movimentos pedagógicos da análise feita do discurso dos professores, como
apresentado no quadro 08
66
e os movimentos de ajuda (HEP) foram cronometrados e
64
Cf. p.99 da presente pesquisa.
65
Cf. p. 101 da presente pesquisa.
66
Cf. p. 79 da presente pesquisa.
109
serão discutidos separadamente no quadro 18
67
, pois não foi possível transcrever a fala
dos alunos durante as atividades em pares ou quando eles interagiam entre si.
Alunos
Participantes
STR SOL RES REA Total por contexto
Maria (C.E.)
--- 06 45 12 63
Maria (E.R.)
--- 09 17 02 28
Renato (C.E)
05 12 41 09 67
Renato (E.R)
--- 24 04 17 45
Total
05 51 107 40 183
Freqüência
3% 28% 58% 22%
Quadro 18: Movimentos pedagógicos dos alunos nas aulas dos dois contextos
Observa-se que grande parte do discurso dos alunos preenche a função de
demonstrar a aquisição de conhecimentos. A maioria das respostas dadas por eles foi
para responder uma pergunta de demonstração feita pelo professor, que foi
posteriormente avaliada como certa ou errada. Isto é confirmado pelo número elevado
de movimentos de resposta 107 ou 58% do corpus em detrimento às reações
espontâneas 40 ou 22%. Ressalta-se, também, que grande parte das reações espontâneas
dos alunos não foi feita para comentar aspectos relativos à aprendizagem ou ao
desenvolvimento das atividades durante a aula, como demonstra o exemplo 18:
(Exemplo 18)
Rita: espera aí que eu vou tomar a minha agüinha básica/
(REA)
Paulo: é pra entregar o que? (SOL)
Pedro: tudo pra nota (+) (SOL)
André: aos irmãos na televisão meu/ (REA)
R: só eu e ela que vamos ver (+) não precisa preocupar/ (REA)
[
André: este final de semana
(REA)
67
Cf. p. 105 da presente pesquisa.
110
Este fato implica um artificialismo no ato de comunicação que decorre na
aula, onde há a existência de “feedback” do aluno e, raramente, ela é materializada em
reações espontâneas (Pedro, 1992, p. 60).
Os movimentos de solicitação foram utilizados por eles para solucionar
dúvidas sobre o conteúdo, sobre o cronograma e sobre o andamento das atividades.
Percebe-se que os alunos têm a liberdade de fazer perguntas, embora algumas sejam
feitas na língua materna. Estes momentos são muito utilizados pelos alunos do professor
Renato, em que eles solicitam o auxílio dele para tirar dúvidas. Os alunos da professora
Maria quase não utilizam a linguagem com esta função. Pode-se relacionar isto ao fato
de a professora dizer que embora tente mudar, sua aula é muito centrada nela mesma.
No que diz respeito aos movimentos de reação, os resultados dão algumas
indicações sobre a organização social da escola. O número de reações espontâneas dos
alunos na E.R. é menor que no C.E., que também não é muito alto. Os movimentos de
reação diferem dos movimentos de resposta, visto que não são diretamente provocados
por movimentos de solicitação e servem para modificar e ou avaliar uma afirmação
anterior (Pedro, 1992, p. 060). O fato de eles ocorrerem em menor número demonstra
que os alunos trazem consigo uma crença de que o papel do aluno é apenas responder
quando solicitado pelo professor. E ainda que o espaço do C.E. seja um local em que o
professor estimula mais as reações espontâneas dos alunos fazendo mais perguntas
referenciais prevalece o modelo de pergunta, resposta e avaliação. É possível que este
resultado sofresse algumas alterações se não tivesse havido interferências de ordem
técnica impedindo a transcrição das interações em pares e grupos que constituem os
movimentos de ajuda.
111
Estes movimentos foram cronometrados como apresenta o quadro 18
abaixo:
Alunos Participantes Movimentos de ajuda (HEP)
Maria (C.E.)
11’ 32’’
Maria (E.R.)
---
Renato (C.E)
12’ 40’’
Renato (E.R)
2’
Quadro 19: Movimentos de ajuda (HEP) dos alunos participantes
De acordo com a tabela acima e as anotações de campo da pesquisadora, os
movimentos de ajuda ocorreram em maior número no centro de extensão, quando
alunos discutiam e colaboravam entre si no desempenho de atividades comunicativas.
Esta negociação acontecia na maior parte do tempo na língua alvo, mas quando os
alunos tinham dificuldades com o vocabulário se expressavam na língua materna. Os
dois professores desenvolveram estas atividades em pares e grupos no C.E.. Na E.R.
estas atividades não foram desenvolvidas por nenhum dos professores dentro do período
das observações e filmagens. O único movimento de ajuda que ocorreu neste contexto
foi de uma aluna do professor Renato que, na língua materna, auxiliou um outro aluno
que estava tendo dificuldade em uma atividade de gramática (2min.).
O gráfico abaixo apresenta um resumo da distribuição relativa dos
movimentos pedagógicos por agente, fazendo uma comparação do professor e dos
alunos sem distinguir o contexto:
112
0
10
20
30
40
50
60
70
STR SOL RES REA HEP
Maria
Maria (alunos)
Renato
Renato (alunos)
Gráfico 03: Distribuição relativa dos movimentos por agente
Confirmamos pelo gráfico 03 e pelo quadro 08
68
que o professor é quem
prepara e organiza o contexto para a comunicação, como já foi discutido anteriormente.
Os movimentos de estruturação feitos pelos alunos ocorreram em situações que o
professor orientava os alunos para ler ou dar as instruções para as atividades.
Percebemos que, dependendo da forma como o professor estrutura e organiza a
interação para desenvolver as atividades, os alunos participam compartilhando do
modelo comunicativo que é proposto pelo professor, o que ocorre sem muita resistência.
A elicitação (SOL) é também feita na maior parte do tempo pelo professor.
Os alunos, em ambos os contextos, utilizavam mais a linguagem em sala de aula para
responder às perguntas feitas pelo professor (RES). Esta participação é maior no C.E.
devido ao tipo de elicitação feita pelos professores neste contexto. Apesar de os alunos
terem oportunidade para usar a língua alvo nos trabalhos em pares e grupos (mais de um
terço da aula), ainda assim, pode-se constatar em alguns momentos o modelo
tradicional, ou seja, as perguntas feitas pelo professor, são seguidas das respostas dos
alunos e há a avaliação posterior do professor.
68
Cf. p. 79 da presente pesquisa.
113
Pode-se concluir também que no C.E., embora os alunos tenham mais
oportunidades para desenvolver as habilidades de percepção de produção oral, o tipo de
elicitação ou o tipo de atividade feita pelos professores ainda pode limitar as chances de
comunicação. Os alunos, por sua vez, respondem bem a esta cultura interacional que é
construída em sala de aula.
3.4. Resultados da análise dos conflitos sobre interação na sala de aula de língua
inglesa
Com base nos conceitos formulados pelos professores, percebemos que eles
sabem da importância de uma aula interativa. Entretanto, eles enfrentam dificuldades
em construir uma prática que, efetivamente, espelhe suas crenças e que atendam às
expectativas dos alunos. Nesta seção são apresentados os resultados acerca das tensões e
dos conflitos vivenciados pelos participantes nos dois contextos escolares, trazendo
respostas às perguntas quatro, cinco e seis da pesquisa. Para isto, será feita uma
distinção entre estes tipos de dificuldades que os participantes enfrentam e a discussão
será estabelecida tendo como foco a interação.Os dados categorizados serão ilustrados e
discutidos nas seções seguintes. Vale dizer que a categorização foi feita para uma
melhor compreensão e discussão dos dados e não para enquadrar a abordagem do
professor de forma fragmentada e estática.
114
3.4.1. Tensões instrucionais
Como discutido anteriormente, o professor enfrenta mais dificuldades em
desenvolver uma aula interativa e sua prática real no contexto da escola regular. Este
fato gera uma tensão no professor e pode haver um conflito da abordagem de ensinar,
que ele acredita e que tem intenção de seguir, e a sua prática real. A prática do professor
é permeada por estas dicotomias que podem ir contra a abordagem de ensinar dele e
estas podem criar tensões e até mudanças no seu comportamento. Elas representam
“divergências entre forças diferentes, limitações ou elementos na compreensão do
professor sobre o contexto escolar, a matéria ou os alunos” (Golombek, 1998, p. 452).
A seguir ilustramos essas tensões.
O contexto escolar
Para a discussão das tensões desta categoria e dos conflitos a serem
discutidos posteriormente, partiremos da definição de contexto proposta por Kramsch
(1993, p.46), como o alinhamento da realidade que é moldado pelas pessoas através da
comunicação. Neste estudo, o contexto será analisado dentro das dimensões situacionais
e interacionais
69
. Dentro da dimensão situacional, contexto é o espaço físico ocupado
pelos alunos e professor e os movimentos feitos por eles no espaço da sala de aula
(setting). Na mesma dimensão, o contexto pode ser relacionado ao tempo destinado para
cada atividade, ou ao instrumento, referindo-se ao tipo de canal escolhido para a
transmissão da mensagem, ou seja, oral ou escrito, na língua alvo ou materna. Quanto
69 O contexto pode ser analisado nas dimensões: lingüísticas, situacionais, culturais, interacionais ou intertextuais
(Kramsch, 1993, p. 46).
115
ao gênero (genre) refere-se ao tipo de atividade proposta pelo professor e desenvolvida
por eles na interação.
No que diz respeito à dimensão interacional, esta se relaciona ao fato de o
contexto ser criado na interação. Ele é construído, por um lado, na base das escolhas e
crenças individuais de cada falante. Por outro lado, o contexto, é constituído levando em
consideração os aspectos sociais e culturais, ou seja, por esses falantes sendo capazes de
fazer inferências sobre cada um na base do conhecimento compartilhado socialmente e
das suposições a respeito do mundo e a respeito de como alcançam os objetivos na
interação. Faz-se necessário à compreensão do contexto escolar nestas dimensões para
se compreender como um grupo social se organiza e o que leva os participantes de um
certo contexto a agirem de determinadas maneiras (Grigoletto, 1997, p. 86).
Os interlocutores do contexto escolar comportam-se conforme as suas
crenças e experiências pessoais como se estivessem de acordo com as normas
preestabelecidas pelo seu meio sociocultural (Dalacorte, 1999, p. 145). Estas regras
podem favorecer ou não a aprendizagem. Entretanto, esses interlocutores podem
compreender o contexto escolar e seus objetivos de maneiras diferentes. Essa assimetria
da compreensão do contexto por parte dos participantes pode gerar tensões e dificultar a
relação para a construção do conhecimento. Por exemplo, se o professor não conseguir
compreender os fatores que motivam a aprendizagem da língua estrangeira de um
determinado grupo, pode gerar uma tensão entre a ação proposta pelo professor e a
aceitação e compreensão por parte dos alunos.
Nos dados analisados, ficou evidenciado que o contexto da escola regular é
o que mais gera tensões nos professores participantes, devido a fatores tais como:
turmas grandes, alunos desinteressados e choque entre o desejo do professor e a
expectativa do aluno. Esses fatores influenciam a tomada de decisão dos professores. O
116
exemplo 19 transcrito abaixo ilustra a tensão de um dos participantes que planeja ações
e não consegue colocá-las em prática nesse contexto:
(Exemplo 19)
Renato: agora tem um problema também que às vezes eu chego
na sala de aula da escola pública cheio de boas intenções mas
aí eles com a bagunça e tudo eu acabo ficando desnorteado às
vezes né (+) e às vezes eu acabo esquecendo o que eu queria
dar de diferente alí (+) então na escola pública você chega
super preparado assim com tudo planejado e às vezes mesmo
assim não dá (+) às vezes você é obrigado a voltar atrás com
uma coisa por muitas reclamações por um aluno que perdeu
aula e acaba ficando um pouco confuso (sessão de
visionamento, linhas:216-221)
O contexto escolar deste professor é consideravelmente complexo. Por
exemplo, as turmas têm entre trinta e quarenta alunos, há um grande problema de
indisciplina e os alunos faltam muito. Estes fatores criam uma tensão entre as intenções
e ações do professor. Ele acaba não conseguindo efetuar as ações a que se propõe. Há
um choque entre o desejo do professor e o que ele interpreta como barreiras impostas
pelo contexto. Neste caso, cabe ao professor compreender mais este ambiente para
diminuir o efeito destas tensões que ele sofre. A reflexão sistematizada pode contribuir
para a compreensão da prática do professor. Este último já busca gerenciar este conflito
e compreender melhor o contexto em que atua, como demonstra o exemplo 20:
(Exemplo 20)
Renato: (...) foi um momento de tentar entender porque elas são
tão diferentes (+) é o número de alunos (+) é a idade dos
alunos e várias outras coisas que você vai conseguindo é (+)
compreender mais estas pessoas com quem você está lidando e
a partir daí conseguir fazer mais coisas né produzir mais
(sessão de visionamento, linhas 599-603)
117
A matéria
O status de uma disciplina em determinado contexto pode gerar tensões no
professor à medida que ela não é valorizada como importante pelos alunos e outros
membros da comunidade escolar. Nas últimas décadas, o inglês vem sendo colocado à
margem em relação às outras disciplinas, que reflete, por exemplo, na baixa da carga
horária da matéria. Esta marginalização influencia o comportamento dos profissionais e
alunos de diversas E.R.. Muitas reuniões são marcadas nos horários da aula de inglês,
essas aulas são colocadas nos últimos horários das sextas-feiras, muitos alunos são
desinteressados e infreqüentes e a própria escola que não entende qual é a função da LE.
Um desses problemas é relatado pela professora Maria que tem dificuldades em utilizar
a língua alvo durante as aulas sem ter interlocutores na escola que a apóiem. O exemplo
abaixo mostra que os colegas de Maria vêem o uso de inglês em sala como uma ameaça,
sem compreender seu caráter educativo, podendo, até mesmo, a LE ser utilizada como
instrumento de controle. A professora tem outra justificativa para não usar a língua alvo
gerando um dilema interno:
(Exemplo 21)
Maria: (...) a coordenadora falou olha não fale inglês o tempo
todo (+) não fale inglês com eles porque eles vão ficar em
pânico mas quer dizer tem que ser trabalhado aos poucos
(sessão de visionamento, linhas 565 a566)
(Exemplo 22)
Maria: (...) eu nunca tentei porque eu tenho medo desta
resistência porque uns vão entrar em pânico eles já até me
falaram assim (+) tem dias que eu falo assim nossa eu não
consigo controlar a conversa daquela turma e coisa e tal (+) aí
um professor falou comigo porque você não fala inglês com eles
chama a atenção em inglês eles vão ficar doidinhos e não vão
entender nada mas pra mim é um pânico eu tenho tanto medo
deles ficarem em pânico eu fico assim parece que eu respeito
isto neles (+) se eu falasse inglês com eles seria uma agressão
118
eu sinto como se fosse uma agressão porque eu tenho o
conhecimento e eles não tem (+) então assim eu faço de tudo
para não deixar eles assim de a vontade (sessão de
visionamento, linhas 568 a575)
O aluno
Nos casos dos professores Renato e Maria, o perfil do aluno que eles têm na
E.R. gera uma tensão quando eles tentam desenvolver uma abordagem sem obterem
sucesso. Como afirmam, no contexto do C.E., o aluno está ali porque quer, porque sabe
da importância da aprendizagem de uma LE. Devido a essa consciência, o
gerenciamento da aula é mais fácil e significativo em termos de aprendizagem de LI.
O maior problema em relação ao aluno da E.R., como afirmam os
participantes, é a falta de interesse. A desmotivação de alguns alunos gera uma
indisciplina que atrapalha o desenvolvimento do grupo. Richards e Lockhart (1996, p.
52) afirmam que esta desmotivação pode estar relacionada às crenças que estes alunos
têm em relação a este contexto escolar ou até mesmo em relação ao ensino de inglês, o
que pode ser visto na citação abaixo:.
“As crenças dos alunos são influenciadas pelo contexto social da
aprendizagem e podem influenciar ambas as atitudes em relação à língua em
si, como também a aprendizagem da língua no geral. O sistema de crenças
dos aprendizes cobre um vasto campo de assuntos e elas influenciam a
motivação para aprender, as expectativas em relação à matéria, as percepções
sobre a facilidade ou dificuldade em aprender a língua bem como o tipo de
estratégias utilizadas pelos alunos
70
.
70
Inglês. “Learners’ beliefs are influenced by the social context of learning and can influence both their attitude
toward the language itself as well as toward language learning in general. Learners’ belief systems cover a wide range
of issues and can influence learners’ motivation to learn, their expectations about language learning, their perceptions
about what is easy or difficult about a language, as well as the kind of learning strategies they favor” (Richards e
Lockhart, 1996.p.52).
119
Assim como os alunos têm suas crenças em relação a determinados
contextos, na relação social com o professor e com o grupo, outras crenças podem ser
construídas. Algumas delas benéficas à aprendizagem, outras não. Quando esta crença
incomoda um componente do grupo, cria uma tensão e faz, muitas vezes, com que este
componente do grupo mude de comportamento. Percebemos que há um desencontro
entre o que o professor propõe e o que os alunos esperam das aulas na escola regular. A
crença de como se deve ensinar a LE na E.R. é bem evidenciada pelo tipo de atividades
propostas para promover interação (ver quadro 06
71
).
Percebemos que as aulas dão ênfase na estrutura lingüística do inglês e na
repetição do vocabulário. Os alunos, por sua vez, querem aulas em que sejam
desenvolvidas as habilidades de percepção e produção oral (ver quadro 15
72
). No
entanto, como os alunos da E.R. não estão acostumados com as atividades que
desenvolvem estas habilidades, eles não sabem como se comportar. No exemplo 23
citado abaixo, ilustra esse desencontro:
(Exemplo 23)
Renato: acho que eu estou pensando que talvez a escola pública
tenha digamos culpa nisto porque na escola pública se você ri
para um aluno talvez você acabe com uma aula inteira (sessão
de visionamento: linhas 53 a 61)
O professor tem uma crença sobre qual deve ser o papel do aluno durante as
atividades comunicativas. O comportamento dos alunos, por sua vez, reflete que eles
têm outras crenças sobre como devem se comportar durante as atividades ou que não
compreendem qual deve ser o seu papel. Este desencontro de crenças e
71
Cf. p. 74 da presente pesquisa.
72
Cf. p. 101 da presente pesquisa.
120
comportamentos, muda ou acentua traços da personalidade do professor para que ele
possa conviver com o grupo e manter uma certa harmonia.
Neste caso, quando o professor assume que deve ter este tipo de
comportamento, sua crença passa a influenciar de forma negativa as suas escolhas nesse
contexto. Ele passa a não desenvolver atividades comunicativas para não perder o
controle da disciplina. O aluno percebe que o que foi imposto para ele como
comportamento adequado é o silêncio e se insere no modelo. As crenças são construídas
socialmente através do capital simbólico que é a linguagem, pela natureza da interação e
das relações de poder que são exercidas em sala de aula (Grigoletto, 1997, p. 87). O
contexto, visto como um fator extrínseco, juntamente com fatores intrínsecos
73
e as
crenças, como já foi dito, influenciam os modelos interacionais propostos pelos
professores em sala de aula (Dalacorte, 1999, Richards e Lockhart, 1996).
3.4.2. Dilemas ou conflitos
Assim como as tensões acima descritas podem ir contra a abordagem do
professor e criar mudanças em seu comportamento, outros dilemas ou conflitos são
vivenciados por eles na sala de aula. Para a interpretação dos dados analisados partiu-se
das definições de dilemas e conflitos já discutidos na revisão teórica.
O exemplo 24 abaixo transcrito ilustra o tipo de dilema definido por
Lampert (1985, p. 182), em que o professor enfrenta um problema forçando-o a escolher
entre soluções igualmente indesejáveis. Para solucionar o problema do “para casa” que
não era feito, que precisava ser corrigido e o programa cumprido, a professora decidiu
73
Fatores intrínsecos dizem respeito aos traços da personalidade dos participantes do contexto, tais como auto-
conceito, objetivos e atitudes em relação a língua alvo e interesse e não serão tratados nesta dissertação.
121
que os alunos iriam fazê-lo em sala, quando todo o grupo chegasse à aula. Ela não deu
tempo para que eles fizessem individualmente os exercícios e nem o discutissem em
pares. Fez a correção com o grupo todo interagindo e indicando os alunos para
responderem. Isto incomodou a professora porque sua decisão centrou os turnos em si
mesma. Os alunos não interagiram entre si, mas ela não atrasava o conteúdo.
(Exemplo 24)
Maria: O fato de eu não ter dado tempo para fazer o exercício
antes de checar não os deixou em pânico. Em geral eles têm um
bom nível mas é claro que eles cometeram erros ou tiveram
dúvidas. Eu tentei ajudá-los desta forma (+) eles não teriam
uma interação aluno-aluno. Eu era um tipo de mediador como
se fosse interação aluno-professor-aluno mas foi a solução que
eu encontrei para solucionar o problema de não ficar atrasada
com o programa. (diários)
O exemplo 25 ilustra um outro tipo de dilema que ocorre entre duas
tendências e nenhuma sai vencedora (Lampert, 1985, p.183). A professora Maria
vivencia um conflito interno em como trabalhar com turmas grandes ou pequenas e
distribuir bem os turnos. Ela se preocupa em dar mais oportunidades aos alunos de
interagirem entre si através de debates polêmicos. Nas turmas pequenas, onde os alunos
têm mais oportunidades de tomar os turnos, não o fazem com tanta freqüência. Nas
turmas grandes, é difícil controlar a distribuição de turnos. O conflito interno que surge
é em relação ao tamanho do grupo. Se por um lado é problemático trabalhar de forma
interativa em turmas grandes, o que acontece quando a turma é pequena e os alunos têm
a oportunidade e ainda assim não interagem? O que é trabalhar de forma interativa em
turmas grandes e pequenas?
122
(Exemplo 25)
Maria: eu estava até pensando nisto ontem e eu coloquei aqui
nas anotações que turma pequena é a gente sempre fala que (...)
é melhor mas no fundo no fundo eu prefiro trabalhar com turma
maior um pouco né (+) porque às vezes esta interação fica um
pouco sem graça (...) não sei fica lá aqueles pares assim como é
pouquinho (...) na hora que eu abro né para ter aquela resposta
e dou um feedback geral (+) quando é uma turma grande fica
bem melhor rende mais então eu acho complicado assim acaba
que né dá mais oportunidades para eles falarem as turmas
pequenas mas por outro lado a interação eu acho que não fica
igual (sessão de visionamento – linhas 777-788)
Maria: (...) a polêmica num num se estabelecia (+) então eu
acho que quando a turma é grande eu já tentei fazer um debate
com uma turma de básico quatro grande aos sábados e não
consegui também porque a turma era muito grande e aí todo
mundo queria falar e aí que o negócio complicou porque se eu
tivesse colocado tempo que aí seria igual estes debates da
Marilia Gabriela lá com tempo porque aí dava certo porque aí
todo mundo queria falar e não tinha tempo mas o negócio a
polêmica esquentou deu certo na questão do da interação né
(sessão de visionamento – linhas 797-807)
Percebemos, pelos dados acima transcritos, que Maria tem crenças e
tendências opostas dentro de si mesmo e nenhuma sai vencedora. Ela tenta manter estas
crenças em equilíbrio sem escolher entre elas, não definindo se uma turma grande é
realmente melhor do que uma turma pequena para promover a interação entre os alunos
.
Com base nas definições de conflitos discutidas na revisão teórica e na
ilustração proposta acima, a seção a seguir apresenta exemplos específicos de conflitos
e dilemas vivenciados pelos dois participantes que podem ser interpretados no âmbito
do papel deles como educadores e do contexto em que atuam. Ressalta-se que a
distinção entre estas duas categorias não implica que uma não tenha relação com a
outra.
123
3.4.2.1. Conflitos em relação ao papel do professor
Parece-nos que ensinar é uma atividade que não pode ser analisada
isoladamente da cultura e história dos indivíduos envolvidos. Os comportamentos e as
atitudes dos participantes de um contexto são ditadas pela cultura que nele é construída
e regulada através das interações sociais. Sendo assim, o papel que o professor e os
alunos desempenham em sala de aula são, geralmente, coerentes com as características e
limitações do contexto (Richards e Lockhart, 1996, p. 108).
“O ensino é uma atividade que está imersa em um grupo de suposições
culturais a respeito de qual deve ser o papel do professor, dos alunos e
métodos. Muitas destas suposições, geralmente, determinam e refletem as
atitudes derivadas de uma cultura. Estas atitudes influenciam as expectativas.
Onde estas expectativas estão em conflito, pode haver um potencial de não
compreensão, que pode ser minimizada pelo desenvolvimento da
consciência
74
” (Richards e Lockhart, 1996, p.108).
Acreditamos que os conflitos evidenciados em relação ao papel
desempenhado pelo professor acontecem porque eles desenvolvem abordagens ora
tradicionais ora comunicativas. Eles têm a preocupação em desenvolver o processo
interacional centralizando as aulas nos alunos, mas quando percebem através da
reflexão, estão centralizando as aulas em si mesmo. Eles ficam confusos sem saber se
utilizam um discurso mais ou menos autoritário. Grande parte destes conflitos sofre a
influência das abordagens a que estes professores foram submetidos quando alunos, por
exemplo, métodos de gramática e tradução ou audiolingual.
74
Paráfrase nossa de: Many of the assumptions that language teachers and learners hold about language learning
reflect attitudes derived from their particular cultural background. These attitudes influence the expectations that both
parties have about the other. Where these expectations are in conflict, there is a potential for misunderstanding. While
these misunderstandings may at times be unavoidable, they can be minimized through a greater awareness of their
sources (Richards e Lockhart, 1996, p.08).
124
Tradicional/comunicativo
Como discutido anteriormente, o papel do professor em sala de aula é
influenciado por muitas variáveis. Nesta seção, discute-se a abordagem de ensinar do
professor no que diz respeito a ser tradicional ou a ser comunicativo. O professor
tradicional, é visto, por um lado, como instigador e diretor de todos os que participam
do processo de aprendizagem (Denscombe, 1985, p. 41). Ele detém o conhecimento até
que ele o transmita aos alunos em pequenas doses. Nesta perspectiva, cabe a ele
controlar a ordem e o ritmo da aprendizagem. Por outro lado, o professor comunicativo,
de acordo com Motta (1999, p. 24), incentiva e cria situações em que os alunos possam
utilizar a língua para a comunicação, respeitando seu estilo, conhecimento prévio e os
erros são tratados como meio para a construção do conhecimento. Quando a aula é
comunicativa, o professor evidencia mais os ‘significados’ do que ‘a forma’ nos
exemplos citados em sala de aula, estes são contextualizados, e os diálogos têm função
comunicativa sem memorização.
Levando-se em consideração a descrição acima mencionada e as anotações
de campo da pesquisadora, ser tradicional e/ ou comunicativo é conflituoso para os
professores participantes. Vieira Abrahão (1996, p. 16) atribui este conflito à tensão do
professor em querer a renovação da prática, à força da abordagem que marcou sua
formação e a sua prática em sala de aula. Ela afirma ainda que este conflito é agravado
pelos fatores contextuais. Por exemplo, a professora Maria apresenta características de
um professor que está em conflito ou em transição entre o ser tradicional e ser
comunicativo. Estas características são mais acentuadas em um contexto do que no
outro. No C.E. as aulas são interativas, apesar de a professora sentir que deve se
distanciar mais do processo e centralizar mais nos turnos dos alunos. A gramática é
125
contextualizada com foco nas formas e na função. Não há trabalhos de tradução. Na
E.R., de acordo com as anotações de campo da pesquisadora, a professora tenta usar a
língua alvo em sala de aula de quinta série, por exemplo, cumprimentando os alunos,
fazendo a chamada e eles respondendo em inglês ou ensinando-os a fazer pedidos.
Entretanto, alguns fatores fazem com que a professora não consiga dar uma
aula interativa na E.R.. Os exemplos 26 e 27 mostram o conflito vivenciado pela
professora Maria que tenta utilizar uma abordagem mais comunicativa com sua turma
de segundo grau
75
, sem tradução, focalizando nas estratégias de leitura. Porém, os
alunos esperam dela uma abordagem mais tradicional. Ela cede e acaba utilizando a
tradução na E.R.. O choque de expectativas é o dilema enfrentado por ela, traduzir ou
não traduzir:
(Exemplo 26)
Maria: eu já trabalhei com segundo grau em escola pública (...)
eles cobram da gente tradução (...) eles acham que eles estão
aprendendo através de tradução quando eles conseguem
entender. (sessão de visionamento: linhas 210 a 213) (...) eles
cobram tradução porque eles vêm de uma prática de tradução
daí eles se desenvolvem assim parece que para eles é mais fácil
se tiver se eles estiverem entendendo o que eles estão fazendo
(idem: linhas 222 a 230)
(Exemplo 27)
Maria: eu não gosto de tradução não eu acho assim tradução é
uma coisa difícil de se fazer tem que ter uma prática à parte (...)
eu não acho que a escola de jeito nenhum deva traduzir por
exemplo formalmente pegar um texto e traduzir ou mesmo a
instrução do exercício colocar embaixo o quê que é (+) não é
legal
O professor Renato também enfrenta este dilema de ser tradicional ou
comunicativo. Como a professora Maria, ele trabalha de forma interativa em um
75
Para este estudo, as aulas foram observadas em uma turma de quinta série, o relato mencionado é de outra turma em
que a professora atua em outra escola.
126
contexto e de forma tradicional no outro. Há também um choque de expectativas, neste
caso o dilema é em relação a ensinar gramática ou não, e ensiná-la de forma explícita ou
implícita. Segundo ele, os alunos esperam somente o estudo da gramática e não
conhecem a importância das outras habilidades, conforme demonstrado no exemplo 28:
(Exemplo 28)
Renato: os alunos eles cobram gramática muito assim e eles
querem que vá mais fundo assim na gramática (+) porque eu
acho que o principal tema da aula não tem que ser gramática
do jeito que eles estavam falando né (+) eu falei gente é tudo
junto né ‘’e um conjunto até a gramática é uma coisa implícita
que está aí no meio só que eles querem mais. (sessão de
visionamento: linhas 884 a 888)
Aulas centradas no professor e centradas no aluno
Alguns estudos foram desenvolvidos com o propósito de discutir a
quantidade de fala do professor e as conseqüências da centralização dos turnos na
pessoa do professor. A fala do professor é de grande importância para a organização da
sala de aula e para o processo de aquisição da língua estrangeira (Nunan, 1995, p. 189).
Ela é importante porque, é através dela que o professor estabelece a relação com os
alunos. A forma como o professor utiliza a linguagem influencia no sucesso ou não das
atividades e no caso da língua estrangeira é o maior insumo que os alunos recebem em
sala de aula. Consolo (1997, p.24) revela que o professor, geralmente, utiliza um ritual
para gerenciar as interações em sala de aula determinando o percurso do discurso e a
participação dos alunos. Segundo ele, entretanto, este discurso é marcado pela
assimetria dos turnos do professor e dos alunos. Nunan (1995, p. 190), acrescenta que
para determinar se a quantidade de fala do professor está ou não apropriada ao
desenvolvimento da aprendizagem, deve-se levar em consideração fatores tais como: o
127
momento da aula, se a fala é planejada ou espontânea e a relevância dela para o
aprendizado dos alunos.
No presente estudo de caso, os dados sugerem que um dos participantes, a
professora Maria, vive o conflito de distribuir os turnos em sala de aula nos dois
contextos
76
. Na E.R., ela percebe que tem que dar voz aos alunos, mas justifica não
fazê-lo por medo de perder o controle. E mesmo no C.E. ela percebe que a interação é
centrada na pessoa dela. Na maioria das vezes ela inicia o turno ou aloca-o para que os
alunos participem, não havendo ‘tomada de turno’ por parte dos alunos
77
. Os exemplos
29 e 30 ilustram o conflito da professora em tentar distanciar-se do processo
interacional e dar a oportunidade aos alunos de participarem mais:
(Exemplo 29)
Maria: eu acho por exemplo que na escola regular eu interajo
demais com aquela figura do professor assim como o centro (+)
eu acho que eu sou demais o centro tanto que eu não vejo
interação entre eles né porque ao menor sinal de conversa eu já
quebro e no momento da atividade eu não proponho nenhuma
atividade que eles possam interagir né (+) na escola regular
(+) então praticamente eu corto a interação entre eles e eu sou
o centro eles interagem comigo eles interagem comigo né mas
só comigo
(Exemplo 30)
Maria: por exemplo (+) quando eu notei que nas aulas do centro
de extensão eu tento manter este ambiente agradável e às vezes
um assunto interessante e quando esta interação acontece (...)
eles ficam mais propícios a aprender eles ficam mais animados
e tal (+) agora eu acho ainda no centro de extensão que a
minha aula é muito teacher centered ainda (sessão de
visionamento: linhas 933 a937)
76
Os exemplos desta assimetria foram discutidos na análise da aula típica.
77
As tomadas de turno são utilizadas para ordenar, alocar, regular a conversação em diferentes contextos e situações.
Segundo os autores, a tomada de turno se dá de forma organizada, e esta organização é um instrumento que modela e
dá corpo a conversa (Sacks, Schegloff & Jefferson, 1978, p. 07).
128
Controle, disciplina através do discurso autoritário ou democrático
O manejo e o controle da sala de aula sempre foram uma preocupação
central dos professores. Este fenômeno é socialmente construído, vinculado à cultura
local e à competência
78
do professor (Denscombe, 1985, p. 199). As estratégias que o
professor utiliza para controlar a sala de aula têm relação com a abordagem pessoal dele
e podem se configurar em três tipos: dominação, co-opção e gerenciamento de
trabalho
79
. A tomada de decisão do professor ao escolher as estratégias mais apropriadas
para seu grupo é permeada por suas crenças. O conflito dos dois professores com a
disciplina dos alunos pode ter relação com a escolha destas estratégias e com o conjunto
de crenças dos alunos
80
sobre o que é ser um professor competente. Segundo
Denscombe (1985, p. 97) afirma os alunos esperam de um bom professor firmeza,
justiça, respeito, amizade e aulas bem dadas. Os alunos ainda preservam um modelo de
relação professor-aluno baseada no controle através de punição. Pensamos ser difícil
para o professor mudar esta relação. Mesmo que ele tenha um ideal progressista e deseje
utilizar estratégias de controle menos vinculadas a sua pessoa, o conjunto de
comportamentos que foi construído neste contexto pode dificultar uma mudança. Os
exemplo 31 e 32 ilustram o conflito dos professores participantes em relação à
disciplina dos alunos:
78 Existe uma crença que vincula a competência do professor ao controle que ele exerce sobre a turma. Se o
professor controla e mantém a turma disciplinada ele é competente na profissão. (Denscombe 1985, p. 199)
79 Dominação: imposição do professor através de um discurso autoritário. Esta estratégia é utilizada em abordagens
mais tradicionais
. Co-opção (co-optation) estratégia em que o professor controla o grupo com o envolvimento dos
alunos através da elicitação. Gerenciamento de trabalho: estratégia em que o professor controla o grupo através da
organização de grupos de trabalhos. Esta estratégia diminui o controle do professor. Ambas as estratégias de co-
opção e gerenciamento de trabalho são típicas de abordagens mais progressistas. (Denscombe, 1985, p. 143)
80
Os alunos já vem com um conjunto de crenças e expectativas que foram nomeadas por Jackson (1968) e Snyder
(1971) de currículo implícito ou escondido. (Denscombe, 1985, p. 51)
129
(exemplo 31)
Renato: ( se referindo ao C.E.) parece que, quando o professor
brinca ou se senta com os alunos, eles se sentem muito mais a
vontade; já na escola pública é difícil controlar a disciplina
(diários)
Renato: na escola pública você tem que pensar em muitos
detalhes em muita reação do aluno porque ele reage muito
imediatamente e muito exageradamente e no centro de extensão
e (...) ele espera você dar uma indicação para ele (+) ele é
muito mais educado acho que é isto mesmo né você não pode
deixar acho que até inconscientemente uma atrapalhar a outra
você tem que aproveitar a experiência de uma para ver o
potencial da outra
Pesquisadora: como você lida com este conflito?
Renato: apesar de nestes relatórios que eu fiz nestas
observações agora do vídeo é que eu estou vendo o quê que foi
errado numa e noutra e estou fazendo planos para o próximo
semestre por exemplo no centro de extensão se eu vejo se eu
tiver uma turma mais quietinha eu tenho que dar uma
agitadazinha né eu tenho que não ficar igual eu tava ficando de
pé é uma reação quando eu me sentava com os alunos eles
ficavam mais relaxados porque eu tava me colocando assim não
era aquele professor autoritário aquela coisa e com esta turma
tímida foi muito claro pra mim no vídeo quando eu sentava eles
relaxavam mais sabe e na escola pública é diferente você tem
que ser de certa forma amigo mas você tem que manter uma
distância que pra muitos alunos é eles não entendem bem o que
a gente tá fazendo alí (+) acho que o que eles estão fazendo ali
e o que eu estou fazendo é muito confuso para eles (sessão de
visionamento: linhas 79 a 97)
(exemplo 32)
Maria: eu acho assim que eu estou percebendo que às vezes eu
sou muito grossa com os alunos sou (+) então assim isto eu
acho que eu tenho que procurar mudar e eu acho que há uma
série de fatores que vão te levando a isto (+) mas se você não
puxar o freio antes quer dizer daqui a vinte anos de magistério
com estes alunos eu vou estar daquelas que gritam mesmo (...)
eu acho que eu tenho medo de descontrair demais e depois
perder o controle (+++) porque como eu comecei de cara numa
escola e chegou lá uns alunos difíceis e eu tive que arrumar um
jeito deles me ouvirem e tal (+) então assim tive que chamar a
atenção (+) fechar a cara (sessão de visionamento: linha 79 a
97)
130
Os professores sabem da existência de estratégias mais progressistas para
manter o grupo atento e participativo, mas sentem-se presos às estratégias mais
tradicionais. O conflito existe porque os professores ainda preservam traços de uma
abordagem tradicional e ficam em conflito entre manter a turma controlada ou dar voz
aos alunos. Parece que os professores precisam de uma maior reflexão para
compreender os motivos da indisciplina e, com isso, não perderem o controle da
situação.
O quadro abaixo resume a interpretação dos conflitos relacionados ao papel
do professor:
Categoria: papel do professor Renato Maria
Tradicional/ Comunicativo Ensinar gramática
ou não
Traduzir ou não traduzir
Foco no aluno/ no professor __ Deixar de ser o centro
Autoritário/Democrático Autoritário ou democrático Autoritário ou democrático
Quadro 19: Conflitos sobre o papel do professor
3.4.2.2. Conflitos relacionados aos fatores contextuais
O contexto, já definido anteriormente, pode ser analisado em diferentes
dimensões. Neste estudo serão apresentados conflitos relacionados às dimensões
situacionais e interacionais.
Os conflitos apresentados nesta categoria têm relação com a dimensão
situacional, mais especificamente com os aspectos relativos ao desenvolvimento das
atividades em sala de aula. Os dados demonstram que os professores participantes têm a
preocupação em desenvolver um trabalho comunicativo e fatores como a organização
física, as dinâmicas de par e grupo e o uso da língua alvo ou língua materna podem
131
interferir no sucesso ou não das atividades propostas por eles. No momento da reflexão,
os professores se mostram conscientes da importância destes fatores, mas vencer as
limitações que eles encontram durante o processo pode ser conflitante. As subcategorias
que serão discutidas posteriormente exemplificam os conflitos e dilemas enfrentados
pelos professores no que diz respeito ao uso da língua alvo ou língua materna, a
organização física e as dinâmicas de par e grupo. As subcategorias a serem apresentadas
têm relação direta com o gerenciamento da sala de aula e a interação aluno-professor.
De acordo com Nunan (1995, p. 189), o sucesso ou não de uma atividade
em sala pode depender das oportunidades que o professor dá ao aluno de interagir e o
tempo que ele dá para que o aluno desenvolva as atividades. Entretanto, o professor
pode ficar ansioso e confuso porque tem que, ao mesmo tempo, cumprir o programa,
dar tempo para que os alunos aprendam e ainda ter tempo para atendê-los
individualmente. O conflito surge quando o professor tem que decidir o que é
prioridade. A sensação de frustração por não conseguir atender a todas as demandas da
sala de aula incomoda um dos professores participantes. O exemplo 33 ilustra o conflito
vivenciado pela professora Maria em relação ao tempo:
(Exemplo 33)
Maria: a questão do tempo por exemplo na minha cabeça eu
tinha que passar aquele negócio eu estava doida para passar
aquele negócio para já ir para outra coisa e para falar do
negócio do lápis de cor para eles e tal e assim é realmente as
minhas atividades lá são todas preocupadas como o tempo
como se eu tivesse que dar rápido demais eu não pergunto nada
até um falou assim ah eu sei né e falou todas lá que ele sabia
Maria: A minha preocupação era justamente não atrasar o
conteúdo (+) era preciso ir devagar (...) sinto me realmente
incomodada quando não posso dedicar o meu tempo aos alunos,
indo de carteira em carteira ou pelo menos andando pelos
corredores da sala. (diários)
132
Maria: Essa foi a aula que me deu a sensação de que eu não
soube aproveitar o tempo direito. Na primeira parte da aula
eles tiveram um tempo muito grande para realizar os exercícios
de fixação sobre dias da semana, meses do ano, etc. na segunda
parte da aula eu não soube administrar direito os últimos
quinze minutos da aula; não querendo introduzir conteúdo novo
eu acabei recorrendo a uma atividade que não fora bem
planejada. (diários)
Influência de um contexto no outro
O conflito a ser discutido, de dimensão interacional, tem relação com as
mudanças de comportamento do professor participante nos dois contextos. O exemplo
34 demonstra a dúvida do professor:
(Exemplo 34)
Renato: será que dar aula para a escola pública está me
fazendo perder a confiança na competência dos meus alunos do
Centro de extensão? Será que estou com uma tendência a ser
mais lento e cobrar menos? (diários)
Já durante a sessão de visionamento o professor Renato reflete sobre seu
conflito de deixar um contexto influenciar suas atitudes em outro contexto educacional.
(Exemplo 35)
Renato eu percebi mais nestas observações foi isto é não deixar
uma escola influenciar negativamente na outra e ao mesmo
tempo foi um momento de tentar entender porque elas são tão
diferentes (+) é o número de alunos (+) é a idade dos alunos e
várias outras coisas que você vai conseguindo é compreender
mais estas pessoas né com quem você está lidando e a partir daí
né conseguir fazer mais coisas né produzir mais. (sessão de
visionamento: linha 599 a 603)
O professor Renato afirma que seu comportamento no C.E. tem sido
influenciado pelas tensões e, conflitos que vivencia na escola regular. O formato das
133
aulas é diferente, mas, segundo ele, há uma tendência da repetição do modelo de um
contexto no outro. De acordo com as notas de campo da pesquisadora, o professor
tende, no C.E., a explicitar demais, influenciado, segundo ele, pelo outro contexto.
Expectativas do aluno diferentes da abordagem que o professor oferece
Discute-se que as variáveis do contexto escolar podem afetar as
expectativas
81
dos professores em relação aos alunos e vice-versa. O nível de
flexibilidade das expectativas pode atuar de forma benéfica ou maléfica no processo de
ensino aprendizagem. O nível de flexibilidade de uma expectativa pode levar o
professor a agir de tal forma a levar o aluno a se comportar da forma adequada à
situação. Quando uma expectativa é rígida e inflexível, afirma Rüpke (1981, p. 07),
tendo como resultados a perda de vantagens pessoais e sociais, ela pode funcionar como
antecedente ou como profecia de auto-realização. Em um grupo de pessoas, as
expectativas nunca são homogêneas, esta heterogeneidade pode também interferir de
forma negativa nas relações. Pudemos perceber que o professor Renato enfrenta este
problema. Ele espera dos alunos um tipo de comportamento em relação ao ensino de
língua de LE e, os alunos, por sua vez, têm expectativas diferentes da abordagem
proposta pelo professor. O conflito de expectativas atrapalha o planejamento e
desenvolvimento da prática do professor que não consegue atender todas as expectativas
dos alunos. Além disso, estas expectativas não comungam com as idéias do professor
81
Expectativa na psicologia é uma variável cognitiva definida como a estimativa da probabilidade de que um
comportamento levará a alcançar um objetivo. Ela se refere a dimensão pessoal, o conjunto de crenças ou
antecipações sobre os resultados ou conseqüências do comportamento (Rüpke, 1981, p. 04). Na sociologia, a
expectativa é vista dentro de uma dimensão social, como profecia de auto-realização em que as expectativas de um
indivíduo em relação ao comportamento do outro podem se tornar, inconscientemente, uma predição mais certa
daquele comportamento, simplesmente por esta ter sido feita (Merton, 1957 apud Rüpke, 1981, p. 04).
134
sobre como se deve ser a abordagem de ensino de uma LE. O exemplo 36 ilustra este
conflito.
(Exemplo 36)
Renato: tá eu conversei com alguns alunos da escola pública
eles querem algumas coisas que são assim meio difíceis assim
por exemplo eles querem uma aula tem uns que querem uma
aula só com texto né outros uma aula com música todo dia mas
tem muitos outros alunos que não concordam com isto que
querem uma aula mais tradicional (sessão de visionamento:
linha 164 a 167)
Língua alvo e língua materna
Dois conflitos relacionados com a dimensão situacional do contexto
(instrumento) serão interpretados a seguir, ambos sobre o uso da língua alvo (L2) e da
língua materna (L1) na sala de aula. O aspecto do uso da L1 ou L2 tem relação direta
com o gerenciamento da sala de aula e os padrões de interação. De acordo com Nunan
(1995, p.189), o sucesso ou não de uma atividade em língua estrangeira depende das
oportunidades que o professor dá ao aluno de interagir na língua alvo com ele e com os
colegas de classe. A língua materna, segundo o mesmo autor, deve ser utilizada na
construção do conhecimento, isto é, como suporte para a compreensão da língua alvo.
Alguns estudos foram desenvolvidos a este respeito. Zilm (1989) apud Nunan (1995,
p.190) desenvolveu uma pesquisa acerca dos fatores que afetam a mudança de código
(alvo ou materna). Segundo ele, a natureza da atividade, as percepções de professores e
alunos sobre que papéis desempenham no processo de aquisição, da função da língua
materna no aprendizado da língua alvo e de como se dá a aquisição pode favorecer ou
não o uso da língua alvo ou materna em sala de aula.
Os dados da pesquisa aqui apresentada demonstram que os professores
participantes têm a preocupação em desenvolver um trabalho comunicativo e de usar a
135
língua alvo para a comunicação, mas vivenciam conflitos que são subjacentes às crenças
e mitos existentes sobre a LI. Estes conflitos surgem no contexto da E.R. quando os
professores seguem a abordagem que acreditam ser benéfica aos alunos. O primeiro
conflito acontece pelo fato da LI ser tratada com preconceito, como uma disciplina à
parte, com menor importância que as outras no currículo. Segundo os participantes, o
professor de inglês enfrenta dificuldades em desempenhar seu papel quando seu
conjunto de crenças vai de encontro às crenças dos alunos, àquelas dos outros
profissionais da educação e àquelas da comunidade (exemplos discutidos na seção das
tensões instrucionais
82
).
Os dois participantes afirmam que não têm conseguido implementar o uso
da língua alvo na E.R. (exemplos 36 e 37). Como afirmam os professores, os alunos da
escola regular não sabem da importância do uso da língua alvo durante as aulas e não
levam a sério à proposta de usar a língua alvo para o desenvolvimento da aprendizagem
da língua. Surge um conflito interno, o professor tem a intenção de usar a língua alvo,
sabe da importância e não consegue conscientizar os alunos e colocar esse desejo em
prática de forma eficaz:
(Exemplo 37)
Maria: você começa a falar inglês e eles começam a rir (+) é:
eu lembro que na primeira escola que eu entrei eu falava assim
o quê que eu falava que a menina ria? (...) você vai falar inglês
para eles é uma malhação e lá no segundo grau eu tentei
trabalhar com o material do Centro de extensão (+) eu falei
assim gente eu estou com uma proposta nova (+) eu vou fazer
assim nós vamos ter umas aulas (+) vai ter listening vai ter (+)
eu vou dar oportunidades para vocês falarem aí eu perguntava
nomes ensinava pra eles como se fala quantos anos você tem se
são solteiros ou não (a professora comenta que não deu certo e
voltou a trabalhar de forma tradicional) (sessão de
visionamento: linha328 a 350)
82
Cf. p. 111 da presente pesquisa.
136
(Exemplo 38)
Renato: escola regular eu já falei com eles assim olha agora eu
vou falar dez minutos em inglês (+) mas para eles é uma é tipo
uma brincadeira mas às vezes eu faço uma parte da aula uns
minutos é em inglês. (sessão de visionamento: linhas 206 a 229)
Outro conflito relacionado ao uso da língua alvo em sala de aula foi
articulado pela professora Maria. Ela diz não usar a língua alvo nos dois contextos de
forma contínua. Nos exemplos 38 e 39 ela reporta uma experiência que teve como aluna
que marca e interfere de forma negativa a sua abordagem de ensinar:
(Exemplo 39)
Maria: (...) porque eu me sentia um pouco coagida (+) quando
eu entrei no curso de Letras eu não falava quase nada e quase
todas as professoras desde quando você entrava falava inglês o
tempo todo (+) então assim eu sentia até sufocada pelo inglês
(+) constrangida (+) coagida
(Exemplo 40)
Maria: fica aquele negócio porque eu fico sempre achando se
eu estou constrangindo ou não porque quando eu era aluna eu
tinha isto (+) eu fico com medo de toda hora estar perguntando
para eles e dar muito na cara que eu estou querendo que eles
falem em inglês e eles são assim constrangidos (+) porque eu já
notei muito isto porque eu já fui aluna e as vezes eu notava que
a professora perguntava para estes calados porque eles não
falavam e aí dava na cara que ela estava perguntando porque
eles estavam calados (+) e eu queria que fosse alguma coisa
natural (+) mas nisto eu acabei que eu não perguntei nunca
então eles não falam (sessão de visionamento: linha 484 a 502)
Este conflito é atribuído à busca do equilíbrio do professor (Golombeck,
1998, p.453). Assim como no estudo de Golombeck, Maria se sentia coagida e
bloqueada ao cobrar dos alunos que utilizassem somente a língua alvo. A prática dela
foi moldada pela sua experiência enquanto aluna. Ela não criou estratégias para
compensar o medo de pedir aos alunos para falarem. Como conseqüência, eles perderam
137
a oportunidade de se desenvolverem. Golombeck (1998, p.459) menciona que a
experiência como aluna pode influenciar a natureza do conhecimento prático da
professora (medo de ser escolhida para falar), sua natureza moral (como ela gostaria de
ser tratada) e a sua natureza consequencial (como seu comportamento silencia os
alunos). Golombeck (1998, p.459) ainda ressalta que o conhecimento prático pessoal do
professor informa o conjunto de suas experiências. Segundo ela, este processo é
dinâmico, com configuração não linear e influencia não só as experiências, mas também
os valores que afetam a tomada de decisões. Burns (1996) apud Golombeck (1998,
p.460) sugere que as teorias personalizadas para a prática motivam as redes conceituais
que moldam os pensamentos e as ações dos professores. Da mesma forma, percebe-se
que a prática da professora Maria é informada e influenciada pelos modelos de ensino e
aprendizagem que ela teorizou quando era aluna.
Trabalho em par e grupo
Nesta categoria, são apresentados conflitos que tem relação com a dimensão
situacional do contexto (gênero), ou seja, ao tipo de atividade proposta pelo professor e
desenvolvida pelos alunos na interação. O exemplo 41, demonstra novamente o conflito
da professora Maria que quer romper com o modelo de interação centralizado no
professor, em que ela sempre inicia os turnos e os gerencia.
(Exemplo 41)
Pesquisadora: qual que é seu objetivo quando você dá o
trabalho em par?
Maria: eu acho que é realmente a interação entre eles porque
tem esta turma minha que você assistiu aula no centro de
extensão ela tem uma dificuldade de interagir com eles mesmos
(+) várias vezes eu já dei atividades que eles tinham que
desenvolver por eles como se eu nem estivesse na sala e eles
não sempre tinha que eu tinha que estar intermediando às vezes
138
debate (+) que a gente fazia debates com temas polêmicos drugs
legalization então (sessão de visionamento)
O exemplo 42 também reforça a questão do controle que é um dos conflitos
vivenciados pela professora. Ela evita os trabalhos em pares, apesar de acreditar na
importância deles, com medo de perder o controle sobre a turma.
(Exemplo 42)
Maria: tenho um certo receio de solicitar a eles ( se referindo
aos alunos da escola regular) que trabalhem em grupo ou pares
porque acho que eles podem aproveitar para atrapalhar a aula,
uma vez que certos alunos não demonstram interesse em trocar
experiências num trabalho em grupo, mas apenas conversar e
perturbar. Eu sei que se eu não colocá-los para fazer esse tipo
de atividade, eles nunca vão aprender e amadurecer. (diários)
O exemplo 43 é um conflito interno da professora que menciona ter
dificuldades em promover uma interação contingente com turmas. Segundo ela, os dois
casos apresentam aspectos positivos e negativos no que diz respeito ao tamanho da
turma, dificultando a escolha em trabalhar com pares, grupos, e de propor atividades
como debates, role-plays, etc.
(Exemplo 43)
Maria: é aí é aquela questão dos números impares em sala (+)
porque aí por exemplo se eu colocar três eu acho que tem certas
atividades que são realmente pair work e eu acho que vai
complicar um pouquinho então aí eu fico lá desdobra daqui e
dali mas os dois lados acabam ficando prejudicados/
P: e isto é complicado pra você ?
M: até que numa turma pequena como aquela inclusive que é
uma turma boa de rendimento não (+) mas em turmas grandes
eu já notei que às vezes eu estou lá explicando para este aluno
fazendo a atividade com ele que inclusive às vezes é o aluno
mais fraco e o outro me chama (+) aí fica um pouquinho
complicado mesmo (+) uma outra alternativa seria sentar em
três ou pedir pra formar pequenos grupos ao invés de pares (+)
mas às vezes eu acho que dá pra controlar isto dá pra fazer
mesmo assim né só se tiver uma turma grande eu acho que eu
tenho que prestar mais atenção nisto às vezes tentar incluir o
aluno em outro grupo por exemplo ele fica esperando um
139
pouquinho e quando um acabar faz com ele. (sessão de
visionamento: linha 1011 a 1023)
Maria: em pares e em grupos (+) quase não tem inclusive eles
poderiam ter né que eu acho que uma coisa que acontece na
escola municipal (+) pelo menos a da minha irmã é assim (+)
as carteiras são conjugadas já né (+) e os alunos da nossa
escola como não são não gostam muito de trabalhar juntos
inclusive quando eles trabalham juntos eles fazem os exercícios
juntos eles falam assim o fulano está olhando de mim o
professora ele está olhando de mim aqui então eles têm este
negócio assim acha quer dizer que eles têm que fazer sozinho
(+) os melhores eles tampam o exercício (sessão de
visionamento: linha 738 a 744)
O quadro abaixo resume os conflitos vivenciados pelos professores em
relação ao contexto:
Dimensão
Contextual
Categoria: contexto Renato Maria
Situacional
(tempo)
Tempo __ Tempo vs.
ansiedade
Interacional Influência de um
contexto no outro
Um contexto prejudica
o outro?
Conflito de
comportamento
__ Expectativa do aluno diferente da
Abordagem do professor
Aula tradicional ou
comunicativa
__
Situacional
(instrumento)
Língua alvo ou
língua materna
Pode-se falar inglês na
E.R.?
Falar inglês ou não
o tempo todo?
Situacional
(gênero)
Dinâmica de par ou grupo __ Turma grande ou
pequena
Quadro 20: Conflitos sobre o contexto escolar
Como foi discutido anteriormente, grande parte das decisões tomadas pelos
professores em sala de aula tem relação direta com a sua pedagogia implícita ou prática
pessoal.
83
Esta pesquisa demonstra que a experiência do professor enquanto aluno
influencia diretamente na sua abordagem de ensinar. Esta influência pode ser positiva,
83
Pedagogia implícita ou escondida é um conjunto de suposições e crenças sobre os objetivos do ensino e
metodologias para alcança-los. Ela origina-se das experiências anteriores do professor enquanto aluno e da instrução
formal recebida por ele. Ela é uma resposta pragmática a variedade das pressões e esforços por uma prática dinâmica
(Denscombe, 1985, p. 03).
140
mas conflituosa. Estes conflitos interferem na escolha dos papeis assumidos pelos
professores e na forma como eles atuam nos diferentes contextos.
Os professores participantes vivem conflitos entre dois tipos de abordagem:
a que foram submetidos quando alunos a mais progressista à qual foram expostos na
graduação e nos cursos de capacitação. Eles sabem da importância de uma aula mais
comunicativa, mas ainda preservam traços de outras abordagens com foco na estrutura.
No próximo capítulo, apresentamos uma síntese dos dados aqui discutidos e
as conclusões desse estudo.
141
CAPÍTULO IV
CONCLUSÕES
142
Esta pesquisa teve como objetivos investigar de que forma os professores
conceituam o processo interacional, de que maneira a interação é construída na prática,
as percepções e reações dos alunos ao tipo de interação que é construída, a existência de
conflitos sobre como o processo interacional é desenvolvido em sala de aula, a natureza
destes conflitos e a influência deles na abordagem do professor nos dois contextos. A
partir destes objetivos, surgiram temas de considerável importância para a área de
lingüística aplicada, principalmente aqueles que levam à compreensão dos eventos da
sala de aula e à abordagem pessoal do professor.
Neste capítulo, é apresentada uma síntese dos resultados através da
recapitulação das perguntas de pesquisa, das contribuições e limitações da pesquisa,
bem como das sugestões para pesquisas futuras.
4.1. Síntese dos resultados
Como os professores participantes conceituam o processo interacional?
A definição de interação proposta pelos professores parece refletir a
compreensão deles sobre o conceito de língua, de como ela é apreendida e como deve
ser ensinada (Brown, 1994, p.05). Ambos os professores estão conscientes da
importância da interação para a aquisição de uma LE. Eles conceituam interação dentro
de uma perspectiva de negociação de sentido para o desenvolvimento da interlíngua dos
alunos. As justificativas dadas pelos professores refletem o desejo de um processo
interacional mais democrático e funcional. Sendo assim, o discurso dos professores
reflete a formação que vêm recebendo dentro da abordagem comunicativa.
143
Como é a prática dos professores nos dois contextos em termos de interação?
Apesar de os professores compreenderem a importância da interação, eles
ainda enfrentam dificuldades em colocá-la em prática de forma a atender às
necessidades dos alunos. Geralmente, estas dificuldades são atribuídas pelo senso
comum ao nível de proficiência do professor e dos alunos, à motivação, ao contexto,
etc. No entanto, percebe-se neste estudo que as dificuldades vão além desses fatores.
Os professores têm proficiência na língua alvo e é importante ressaltar que
há tentativas por parte deles em desenvolver um trabalho comunicativo, e nosso estudo
mostra que ele se dá de forma mais eficaz no Centro de Extensão. As atividades dadas
pelos professores são muito diferentes nos dois contextos. No Centro de Extensão, os
alunos desenvolvem atividades em pares e grupos tendo a oportunidade de construir e
negociar significados entre si, com tal procedimento testam hipóteses sobre o que
aprenderam. Em outros momentos, os professores propõem atividades que não têm uma
função comunicativa, ou seja, o foco é dado às formas. Momentos para interação aluno-
aluno não foram muito relevantes nas aulas da Escola Regular. As atividades refletem
metodologias mais próximas do método de gramática-tradução e audiolingual, ou seja, a
língua é ensinada em pequenas partes fragmentadas sem uma função comunicativa.
Parece-nos que as tarefas propostas não pressupõem a produção do aluno e não
proporcionam mudanças na estrutura interacional de forma a desenvolver a aquisição
(Long, 1983, Swain, 1985).
A análise lingüística demonstra que os professores estão em busca de
aprimoramento e desenvolvimento de competências (Almeida Filho, 2001, p.20). Há
144
uma tentativa de ambos os professores em utilizar diferentes movimentos pedagógicos
em uma mesma aula nos dois contextos. O fato é que eles agem conforme a
compreensão deles sobre o contexto. Como discutido anteriormente, eles compreendem
que o Centro de Extensão é o lugar para o desenvolvimento das habilidades orais
integradas às outras habilidades e, por isso, eles conseguem atingir um nível de
interação contingente (Lamy & Goodfellow, 1999, p. 44). Ambos os professores dão as
aulas na língua alvo e desenvolvem as habilidades
84
de forma integrada, conforme
demonstrado com os movimentos IB, IIIA e IIIB. Eles dão mais oportunidades para os
alunos interagirem entre si, como comprovam os movimentos de ajuda (HEP). Eles
elicitam mais as informações dos alunos com perguntas referenciais. E, ainda assim, no
Centro de Extensão, percebe-se, em alguns momentos, um modelo bem tradicional, o
que reflete um artificialismo no discurso.
Na Escola Regular, eles se comportam de forma diferente. A análise
interacional não reflete que a sala de aula seja um lugar para desenvolvimento da
interlíngua do aluno através da comunicação. Pensamos que, os movimentos mais
relevantes foram os movimentos centrados no professor. As oportunidades de interação
são menores, as atividades não são interativas e a abordagem que os professores
utilizam não refletem as funções comunicativas.
Atualmente, os professores coexistem com dois paradigmas, dominante e
emergente e vivem um tipo de transição que, para eles, é conflituosa (Pimentel, 1993,
p.35). Os professores ficam entre um paradigma e outro, e isto os impede de mudar de
perspectiva, para se lançarem, com segurança, na insegurança assumida. A abordagem
de ensinar dos professores, nesse estudo, é permeada de propostas comunicativas e
outras, talvez, apoiadas em modelos do passado. Acreditamos que os professores
84
Habilidades de percepção e produção oral e escrita.
145
participantes deste estudo se encontram em um estágio transitivo de consciência (Freire,
1970), pois eles já se sentem incomodados com algumas de suas práticas. Isto é muito
positivo pois este é o estado permanente de um professor crítico-reflexivo.
Qual é a reação dos alunos ao processo interacional que é construído?
Os alunos demonstram ter interesse em aprender inglês e eles esperam que,
em sala de aula, os professores desenvolvam com eles as habilidades que se apresentam
como desafiadoras, como por exemplo, a percepção e produção oral. Pelos dados,
percebe-se que os alunos compreendem a importância de se aprender uma LE e da
importância de o ensino ser desenvolvido de forma interativa.
A maioria dos alunos percebe qual é o modelo interacional proposto pelo
professor e a maioria deles se comporta conforme este modelo estabelecido. Dalacorte,
(1999, p.145) afirma que os alunos dentro do contexto e de suas experiências pessoais,
usam modos para atuar em sala de aula que estejam de acordo com as normas pré-
estabelecidas pelo seu contexto sócio-cultural e que reflitam suas próprias crenças. Os
alunos, no Centro de Extensão compreendem que os modelos interacionais foram
estabelecidos para que eles possam interagir, interferir e até mesmo interromper o
professor se for preciso. Eles sabem que em alguns momentos eles só devem responder,
em outros eles têm a liberdade de se expressarem na língua alvo ou até mesmo na língua
materna. Na escola regular, os alunos também compreendem que a eles cabe responder
as perguntas do professor ou fazê-las para tirar dúvidas. Porém, em alguns momentos há
um choque de expectativas, e surgem algumas dificuldades na implementação da prática
que o professor acredita. O aluno percebe que aquele modelo interacional proposto não
é adequado às expectativas dele em relação à disciplina. Marcuschi, (1998, p.19) atribui
146
isto ao fato de que nem todas as crenças e convicções são negociáveis e este choque
pode tornar a relação e a comunicação difícil e conflituosa. Parece-nos que este conflito
é positivo quando o professor consegue compreender que algo está errado na abordagem
de ensinar adotada por ele. Esta percepção pode ajuda-lo a criar estratégias para a
solução do problema.
Os professores de inglês enfrentam conflitos quando atuam em contextos escolares
diferentes? Qual é a natureza destes conflitos? De que forma esses conflitos interferem
na abordagem de ensinar dos professores?
Os professores vivenciam conflitos, dilemas e tensões instrucionais quando
atuam em contextos escolares diferentes e estas dificuldades têm relação direta e
recíproca com todos os fatores relacionados à prática docente. Nesse estudo foram
discutidas algumas das tensões instrucionais e conflitos ou dilemas relacionados de
alguma forma com a interação. A maior parte deles permeia o âmbito do papel do
professor, do contexto escolar, da matéria e do aluno. Acredito que os conflitos
relacionados ao papel do professor originam-se dos modelos de aprendizagem de
línguas que estes professores experimentaram enquanto alunos e as abordagens de
ensino que eles aprenderam para serem professores. E também ao fato de eles estarem
em busca da renovação da prática (Vieira Abrahão, 1996, p.16). Os conflitos de ordem
contextual subjazem às dimensões situacionais e interacionais. Estes conflitos ocorrem
porque a interação está diretamente relacionada ao contexto, ao tipo de atividade
realizada em sala, e também, aos conhecimentos prévios do professor e dos alunos
(Coracini, 1992).
As tensões e os conflitos vivenciados pelos participantes interferiram na
prática deles de forma positiva e negativa. Esta interferência foi positiva pois, eles
147
refletiram sobre estas dificuldades e tiveram a oportunidade de mobilizarem saberes em
busca de alternativas para amenizar ou solucionar estas dificuldades. Porém, as tensões,
dilemas ou conflitos interferiram de forma negativa quando impedia os professores de
desenvolver a prática coerente com suas crenças.
O confronto com a prática pode levar à reflexão e adoção de estratégias de
mudanças. As preocupações, dificuldades e conflitos dos professores vêm da vontade de
ter prática coerente com suas crenças e com a teoria. Segundo Freire (1970) apud
Pimenta (1996, p. 115) o pensamento dilemático deve ser desenvolvido no professor
para que ele se desenvolva profissionalmente de forma crítica. Sendo assim, o modelo
da prática reflexiva se mostra adequado para assegurar e conscientizar as tomadas de
decisão destes professores. Golombeck (1998, p. 460) sugere que a articulação da
prática é um processo, através do qual, os professores tomam consciência das tensões
que previamente não tinham uma relação recíproca.
Uma vez que se constata que a forma como os professores utilizam-se do
discurso é influenciada pelo conhecimento prático pessoal, especialmente moral e
emocional, resultando em um discurso personalizado, faz-se necessário repensar a
formação deste profissional para atender a esta demanda. Pesquisadores da área de
formação de professores acreditam que esta formação deve ser construída ao longo de
um processo, com base em uma visão sócio-interacional crítica da linguagem e da
aprendizagem. Nesta visão, é necessário que o profissional esteja envolvido em um
processo aberto de desenvolvimento contínuo, inserido na prática, e não derivado de um
método ou de um modelo teórico.
Schön (1987) apud Celani (2001, p.25) manifesta seu posicionamento em
relação à esta formação competente que, segundo ele, se dá em torno do “conhecimento
na ação” e seu desenvolvimento depende da “reflexão no uso”. Com isso, o profissional
148
deve ser capacitado para ser um educador que terá o compromisso com os alunos, com a
sociedade e consigo mesmo.
Moita Lopes (2001) também aponta para a necessidade de se mudar esta
visão dogmática de formação de professores. Ele propõe uma formação teórico-crítica
do professor que envolva dois tipos de conhecimento: um sobre a natureza da
linguagem e o outro sobre como atuar na produção do conhecimento
85
. Nesta
perspectiva, o conhecimento passa a ser visto como um processo que é buscado e
construído por alunos e professores em sala de aula. Isto requer a familiarização do
professor com as tradições de investigação em LA, das quais Moita Lopes (2001)
destaca a pesquisa-ação. Este processo possibilita ao professor construir uma
compreensão de sua prática e construção teórica do que seja o porque e como se ensina
para obter certos resultados em sala de aula.
4.2. Contribuições e encaminhamentos
Os resultados desta pesquisa mostraram que mesmo que o professor tenha
consciência da importância da interação para o aprendizado de uma língua estrangeira,
ele enfrenta dificuldades e vivencia conflitos na prática. Percebe-se ainda que estas
dificuldades se agravam em determinados contextos por vários fatores. Lampert (1995,
p.178) afirma que, independente da disciplina que leciona, o professor é um gerenciador
de dilemas. Ele, diariamente, quebra interesses contraditórios a fim de construir uma
identidade profissional que é construtivamente ambígua e pessoal. Esta desconstrução e
construção constante são favoráveis para o desenvolvimento da consciência crítica.
85
O conhecimento sobre a natureza da linguagem, relaciona-se à compreensão teórica sobre os tipos de conhecimento
que se possui e a forma de utilizá-lo. Ensinar a usar a língua, é então uma construção social do significado. Isto
requer uma consciência crítica e mudança nos papeis sociais. Esta reflexão crítica pode possibilitar a formação de um
professor de línguas consciente das relações de poder implícitas no uso da linguagem. Com isto, muda-se o foco da
atenção para a natureza social da linguagem, com o objetivo de desenvolver a competência comunicativa. (Moita
Lopes, 2001, p. 181) Quanto ao conhecimento sobre como atuar na produção de conhecimento, sugere-se que o
professor, mesmo em formação, desenvolva uma reflexão crítica sobre seu próprio trabalho envolvendo se em uma
auto educação continuada (Moita Lopes, 2001, p.183).
149
Nosso estudo poderá ter desdobramentos. Propõe-se que sejam
desenvolvidas pesquisas colaborativas para que o professor dialogue com o pesquisador
acerca de suas dificuldades e desta forma possa pensar em estratégias para minimizar a
interferência negativa de seus dilemas na sua prática. Acredita-se que é o momento de
se desenvolver pesquisas para auxiliar o professor em sala de aula e a prática reflexiva e
colaborativa pode ser um dos meios. Reddy (1993), Vieira Abrahão (1996), Denscombe
(1985) corroboram que os conflitos são diminuídos ou são mais bem gerenciados
através da articulação da prática.
Seria louvável testar outros modelos interacionais na Escola Regular e
checar a eficácia deles, uma vez que este contexto é o que mais trouxe dificuldades para
o professor. A educação continuada pode ser um caminho para que o pesquisador,
juntamente com o professor, possa utilizar-se de instrumentos de interferência na sala de
aula para checar de que maneira modelos comunicativos funcionam neste contexto. Um
exemplo seria sondar as expectativas dos alunos antes de planejar o curso, utilizar mais
estratégias de co-opção e gerenciamento de grupos, etc.
Além disso, é relevante repensar a formação dos professores para que não só
aspectos relativos à metodologia sejam discutidos em sala. Em nossa opinião, seria
necessária a preparação dos professores para enfrentar dificuldades. O estudo das
crenças e abordagens pessoais e das variáveis contextuais devem ser contemplados nos
cursos de formação dos professores. O que o professor é em sala de aula tem relação
com suas crenças, com a forma como ele define os problemas e com as ações que ele
vai tomar para a solução ou gerenciamento dos mesmos.
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160
ANEXOS
161
Anexo A
Modelo de reflexão proposto por Wallace (1991, p.49)
162
Anexo B
QUESTIONÁRIO SOBRE INTERAÇÃO
1- O que é interação para você?
2- Por que a interação é um fator de relevância para o ensino de língua inglesa?
3- Que tipos de atividades você utiliza para promover mais interação em sua sala de
aula?
4- Como você interage com seus alunos em classe?
5- Seus alunos se interagem uns com os outros sem a sua interferência? Como isto
acontece?
6- Você trabalha em curso livre ou escola regular? Se trabalhar em contextos
diferenciados, os padrões de interação são diferentes? Qual é a diferença se ela existe?
7- Se trabalha em contextos diferentes (escola regular e curso livre), em qual destes
ambientes você fica mais à vontade para ensinar a língua? Por quê?
Observação: Os questionários respondidos pelos professores participantes se encontram
gravados no CD anexo.
163
Anexo C
ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA DOS ALUNOS
1- Aprender inglês para você é importante? Por quê?
2- Você gosta de aprender inglês?
3- Como você aprende melhor?
4- Como você acha que inglês deve ser ensinado?
5- Esta aula favorece a sua forma de aprender? Por quê?
6- Você acha que pode aprender tudo em sala de aula?
7- Você já estudou inglês em outra escola? Como eram as aulas?
Observação: As transcrições das entrevistas se encontram no CD anexo.
164
Anexo D
DIÁRIOS DOS PROFESSORES E DA PESQUISADORA
1- Os diários dos professores participantes foram feitos sem nenhuma orientação prévia.
2. Os diários da pesquisadora foram escritos a partir das anotações de campo das aulas
observadas. Os critérios para a observação foram baseados em Richards 1996
Organização da aula
Organização espacial
Gerenciamento do tempo
Interesse e participação dos alunos
As atividades
Desempenho dos alunos nas tarefas
Tempo nas tarefas
Direcionamento das perguntas e respostas
Suporte para a compreensão
Uso de metalinguagem
Desempenho dos alunos nos trabalhos em pares e grupos
Padrões de interação (aluno/professor, professor/aluno, aluno/aluno)
Uso da língua alvo vs. língua materna
Observação: Os diários dos professores participantes e da pesquisadora se encontram no
CD anexo.
165
Anexo E
PERGUNTAS PROPOSTAS NA SESSÃO DE VISIONAMENTO
Relacionadas à prática (antes de assistir a fita)
1- O que é ser professor de línguas?
2- Como você acha que os alunos se desenvolvem mais na língua?
3- Você trabalha desta forma? Por quê?
4- A sua prática nos dois contextos é equivalente, digo segue a mesma organização? Por
que sim ou não?
5- Como você se sente em relação à sua prática nos dois contextos?
6- A organização física, digo, das carteiras é diferente?
7- Quais as dificuldades enfrentadas nos dois contextos?
Relacionadas à interação
1- Quando os alunos estão conversando entre eles, eles usam a língua materna ou língua
alvo?
2- Como você constata este fato?
3- Você conversa com eles durante a aula na língua alvo ou materna?
(se utiliza à língua alvo) O que você faz para ser compreendido?
4- Você acha que o fato de usar uma língua ou outra pode interferir no processo? Por
quê?
5- (Se o professor acredita que dar a aula na língua alvo é importante) Como você se
sente em ter que fazer com que os alunos falem em inglês durante a aula?
6- Você acha que dá tempo suficiente para que os alunos executem as tarefas?
7- O fato de esperar que os alunos terminem as tarefas te incomoda? Se incomoda como
é isto?
8- Você escolhe as atividades que vai trabalhar? Estes materiais são eficazes?
9- Os alunos têm a oportunidades de aplicar seus conhecimentos e habilidades como ?
10- Eles têm a oportunidades de usar a língua para fins significativos ou para trabalhar
em pares e grupos?
11- Você acredita que a forma como você interage com eles pode afetar ou contribuir
nas oportunidades de aprendizagem?
12- Você acha que o ambiente (centro de extensão ou escola regular) é propício à
aprendizagem? Por quê?
166
Relacionadas à reflexão promovida pela gravação
1- Você percebeu algo mais a respeito de sua prática através da gravação que não havia
notado antes?
2- Como você se sentiu se vendo na filmagem e atuando em sala de aula? Algo te
incomodou?
3- Você acha que tem que mudar algum aspecto em sua prática?
Anexo F
Observação: A transcrição da sessão de visionamento dos participantes se encontra no
CD anexo.
Anexo G
Observação: A transcrição das aulas gravadas dos participantes se encontra no CD
anexo.
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