LITURGIAS SATÂNICAS
“Dentro do cárcere a cela permanece escura,
mas sabemos que lá fora brilha o sol.”
Ho Chi Minh
Ó mistério dos mistérios, és a poesia e a palavra, insolente
profanação, esconjuro de quebranto, eleição de porcarias,
enterro das esperanças. Iluminados loucos saem da insanidade,
da delirante ilusão, dizer: Não, não vimos o que vimos.
A insanidade encarnada no torturado – receptáculo
de toda rebeldia e pecado. Poesia de crueldade,
poesia de sangue, vítima de superstição,
ruptura da religião, rancor do contrato social.
Carentes de piedade são os especialistas em
revolução, na violação da lei. Moinhos capazes
de triturar desesperadamente os empecilhos,
que só afetam o aspecto exterior e nada muda.
A grande lei do coração, ó inconsciente, está
ao alcance das mãos: é a grande lei da esperança.
Febre de sonho, extensão invisível: arte de governar
as forças do mal, quando grassa a epidemia de magos.
Bruxas, feiticeiros, mestres, aprendizes de novas heresias,
os pajés das almas adolescentes reinam e agradecem.
O punhal, a agulha, o anel, a luz, o cetro, o fogo, a espada,
a labareda... Perfumes, papel virgem, caneta, tinta, sangue.
– Tudo serve para recriar o Pequeno Dragão Vermelho.
Blasfêmia – consagração do Inferno. Incesto – encantamento
fatal da carne. Órgãos inumanos, fragmento do próprio corpo:
carne, cabelo, unha, gota de sangue. Tudo serve...
Onirismo, sensualidade, prostituição do pequeno diabo,
apascentam rebanhos de galáxias em terras ermas, desérticas,
sem esperança. Oferendas, filtros de amor, guerra e de ódio.
Morrer quando move perseguição demoníaca capaz de provocar
fobia em anjos celestes.
Põe a bola de cristal no jardim, desditosa vítima do suplício alucinógeno.
Executa missa blasfema e, genuflexo, de um só grogue, entorna todo
o cálice de beladona e serás todas as proibições deliberadas.
(Temos de estar realmente loucos para viver a exaltação dos sentidos).