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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (UNIRIO)
CENTRO DE LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA
MESTRADO EM MÚSICA
ASPECTOS ACÚSTICOS E FISIOLÓGICOS DO SISTEMA
RESSONANTAL VOCAL COMO FERRAMENTA PARA O ENSINO-
APRENDIZAGEM DO CANTO LÍRICO
JULIANA MARTINS DOS SANTOS
RIO DE JANEIRO, 2010
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ASPECTOS ACÚSTICOS E FISIOLÓGICOS DO SISTEMA RESSONANTAL VOCAL
COMO FERRAMENTA PARA O ENSINO–APRENDIZAGEM DO CANTO LÍRICO
por
JULIANA MARTINS DOS SANTOS
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Música do Centro de Letras e
Artes da UNIRIO, como requisito parcial para a
obtenção do grau de mestre, sob a orientação da
Professora Dra. Mirna Rubim.
Rio de Janeiro, 2010
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Santos, Juliana Martins dos.
S237 Aspectos acústicos e fisiológicos do sistema ressonantal vocal como
ferramenta para ensino-aprendizagem do canto lírico / Juliana Martins
dos Santos. 2010.
xiv, 190f.
Orientador: Mirna Rubim.
Dissertação (Mestrado em Música) Universidade Federal do Es-
tado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.
1. Canto. 2. Voz Instrução e estudo. 3. Voz Aspectos fisiológicos.
4. Ressonância vocal. 5. Acústica vocal. I. Rubim, Mirna. II. Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (2003-). Centro de Letras e Artes. Curso
de Mestrado em Música. III. Título.
CDD 783
iii
iv
AGRADECIMENTOS
A Deus, por tudo.
Ao Dilton, pelo amor, carinho, paciência e suporte.
À minha orientadora, Mirna Rubim, inspiração deste trabalho.
Ao José Nunes Fernandes, pela coordenação e batalha pelo Minter e por todos nós.
À Ruth e ao Sebastião, pais queridos, pelo apoio incondicional.
À minha família, pelo sustento e consolo.
À Daniela, minha irmã, amiga e direção.
Aos professores de canto que generosamente participaram desta pesquisa.
Ao Leonardo Fuks, pela gentil contribuição.
Aos amigos Wladimir Pinheiro, João Miguel Aiub, Joubert de Paiva Guimarães e Edna Ricci.
À Salete, Regina e Solange, três da Casa das Quatro Mulheres de Copacabana.
Aos funcionários do DASC - Hospital de Clínicas da UEL, às enfermeiras Márcia Pizzo de
Castro, Rita Domansky e Mariângela Chenso, ao Dr Ricardo Rezende, à Ana Paula, à Dra
Olegna, e ao Ricardo Martins, pela significativa colaboração.
Às professoras Carol Mc Davit e Valquíria Ferraz, e à Dra Luciana Oliveira pelo carinho e
ajuda.
Aos professores Marcus Bittencourt e Flávio Apro, pela colaboração, cuidado e incentivo.
Aos cientistas e pesquisadores, fontes e esperança do nosso ofício.
Aos professores, profissionais, amadores, cantores, mestres, aprendizes e amantes da voz
cantada.
"O amor é filho da compreensão;
o amor é tanto mais veemente
quanto mais a compreensão é exata."
(Leonardo da Vinci)
vi
SANTOS, Juliana Martins dos. Aspectos Acústicos e Fisiológicos do Sistema Ressonantal
Vocal como Ferramenta para o Ensino-Aprendizagem do Canto Lírico. 2010. Dissertação
(Mestrado em Música) Programa de Pós-Graduação em Música, Centro de Letras e Artes,
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.
RESUMO
O objetivo deste trabalho é investigar a importância da ressonância vocal como ferramenta
para o ensino-aprendizagem do canto lírico. A metodologia adotada contou com dois
procedimentos: (1) uma revisão da fisiologia e acústica vocais com enfoque no sistema
ressonantal do trato vocal do cantor lírico com base em estudos de anátomo-fisiologia do trato
vocal, fonoaudiologia, física e técnicas de canto; e (2) a aplicação de um questionário semi-
estruturado a onze cantores/professores de canto para investigar como eles lidam com a
ressonância vocal, considerando seu processo de aprendizagem, sua performance, e como eles
ensinam esse aspecto técnico a seus alunos. Dentre os referenciais teóricos principais estão:
(1) os trabalhos de Miller (1986), Appleman (1986), Brown (1996), Ware (1998), Sundberg
(1987), Titze (1994) e Vieira (2004), na acústica e pedagogia da voz; (2) Iazzetta (2006), na
acústica; (3) Zemlin (2000), Behlau (2004) e Pinho & Pontes (2008), na fisiologia e
fonoaudiologia; e (4) as dissertações sobre o comportamento vocal de Björkner (2006) e
Sacramento (2009), entre outras teses e artigos. O resultado dessa pesquisa é apresentado no
Capítulo 3, através de um relatório no qual as respostas dos onze participantes são
confrontadas com a literatura. Os principais achados foram suas informações claras e
objetivas sobre o processo de ensino da ressonância vocal, o seu conceito sobre som de
qualidade, e as expressões que usam em suas aulas.
Palavras-chave: Canto – Ressonância Vocal – Pedagogia Vocal – Acústica Vocal – Fisiologia
da Voz
vii
SANTOS, Juliana Martins dos. Acoustics and Physiologics Aspects of Vocal System
Resonance as a Teaching-Learning Tool for Classical Singing. 2010. Master’s Degree
Dissertation (Mestrado em Música) Programa de Pós-Graduação em Música, Centro de
Letras e Artes, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.
ABSTRACT
The objective of this work is to investigate the importance of vocal resonance as a tool for the
teaching-learning process on classic singing. The methodology adopted here included two
procedures: (1) a bibliographic review on vocal physiology and acoustics focused on the
singers’s resonantal vocal system based on anatomical, physiological, phonoaudiological,
physical, and technical studies; and (2) a semi-structured questionnaire applied to eleven
teachers/singers in order to investigate how they deal with vocal resonance considering their
learning process, their performances and how they teach this technical aspect to their students.
Among the main theoretical references were: (1) the works of Miller (1986), Appleman
(1986), Brown (1996), Ware (1998), Sundberg (1987), Titze (1994) and Vieira (2004), on
vocal acoustics and vocal pedagogy; (2) Iazzetta (2006), on acoustics; (3) Zemlin (2000),
Behlau (2004) and Pinho&Pontes (2008), on physiology and phonoaudiology; and (4) theses
on the vocal behavior in singing by Björkner (2006) and Sacramento (2009). The results of
this research are presented in Chapter 3 through a report in which all answers of the
participants are crossed with bibliographic information. Main findings are their clear and
objective information about the teaching-learning process on vocal resonance, their concept
about good tone of quality, and the expressions they use in their lessons.
Keywords: Singing –Vocal Resonance –Vocal Pedagogy –Vocal Acoustics –Vocal
Physiology
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1.1: Onda senoidal (EVEREST, 2001, p.10). 9
Figura 1.2 : Ondas sonoras, que são ondas longitudinais produzidas pela compressão e expansão do meio no qual
são propagadas. A figura mostra as partes de compressão (alta pressão) e rarefação (baixa pressão). (AP
Physics-B). 10
Figura 1.3: (1) Movimentos de um cone de alto-falante, para frente e para trás, produzindo sucessivos pulsos de
compressão e rarefação de ar, que se propagam em forma de onda. (2) Abaixo: Representação gráfica de
onda: a parte acima do eixo horizontal representa a compressão, e a parte abaixo do eixo representa a
rarefação (IAZZETTA, s/d). Acima: o ciclo completo incluindo fases de compressão e rarefação (TRUAX,
1999). 11
Figura 1.4: Onda sinusóide ou senóide. Representação gráfica de uma onda bidimensional, onde o eixo
horizontal representa a passagem do tempo e o vertical indica a variação de pressão (EVEREST, 2001,
p.8). 12
Figura 1.5: Onda sinusóide (variação de pressão [de rarefação a compressão] versus espaço); o comprimento de
onda (λ) está evidenciado. Segundo Iazzetta, esse tipo de gráfico pode fornecer várias informações sobre o
som. Esse som, o som senoidal, é chamado som puro porque é desprovido de harmônicos; tal nome deve-
se ao fato de poder ser representado pelo gráfico de uma função seno. 13
Figura 1.6 : Amplitude versus tempo relacionada a alta e baixa frequências (AUDIOSOUP, 2004). 14
Figura 1.7: Ondas regulares e irregulares (Escola Superior de Tecnologia de Tomar, Portugal) 15
Figura 1.8: Série Harmônica em pentagrama (SCHMIDT-JONES, 2009). 16
Figura 1.9: Onda complexa com seu espectro (amplitude versus frequência). A forma de onda resultante (onda
quadrada) é a somatória da fundamental e os harmônicos. Também apresentada na forma tridimensional
ou em perspectiva, para comparação (DIGTRX, 2001). 17
Figura 1.10: Ataque, sustentação (ou liberação, segundo Miller (1996)[release]) e finalização (decaimento
[decay]). (HyperPhysics). 18
Figura 1.11: (1)O espectro irradiado em forma de som vocal, produto acústico final do processo de fonação. O
som é produzido na glote e filtrado pelo trato vocal antes de sua emissão. Modelo fonte-filtro adaptado de
Vieira (2004) e Aquino (AQUINO, 2009). (2) Esquema da fonação
(http://www.kfs.oeaw.ac.at/content/blogsection/26/396/lang,8859-1/) 20
Figura 1.12 : Trato vocal humano de perfil (GRAY’S ANATOMY e NETTER, 2001) 22
Figura 1.13: (1) O efeito do damping, amortecimento, abafamento ou ainda decaimento por razão da dissipação
de energia da onda ao longo da sua propagação. (2) Gráfico mostrando a diminuição da amplitude do som
em amortecimento ou abafamento pesado ou forte. A amplitude do som será maior em um sistema com
pouco amortecimento. (www.antonine-education.co.uk) 23
Figura 1.14: Esquema acústico - as funções do sistema vocal do fornecedor de energia, oscilador e ressonador. O
fluxo aéreo é interrompido periodicamente pela vibração das pregas vocais. O som resultante (a fonte
vocal) é representado em um espectro contendo um grande número de harmônicos parciais cuja amplitude
diminui com a frequência (SUNDBERG, 1977). 23
Figura 1.15: Modelo Fonte-Filtro no trato vocal. Estrutura anatômica do trato vocal. A elevação do pórtico
velofaríngeo (P) desacopla as cavidades nasais. Note a proximidade da entrada do esôfago (E) com a
região das pregas vocais, situadas acima da traquéia (T). Os pulsos gerados na fonação o filtrados pelas
cavidades acústicas do trato vocal, e propagam-se pelo ar. Na irradiação, como sugere o desenho, parte do
som (baixas frequências) espalha-se, enquanto que outra parte (altas frequências) propaga-se para frente.
Abaixo (adaptado de Fant, 1970): modularização introduzida pelo modelo Fonte-Filtro (em alguns
espectros divisões em intervalos de 6 dB, no eixo vertical, e em oitavas, no horizontal). A fonte é
representada por uma série harmônica, o filtro por formantes (F1, F2, etc.), e a irradiação pela sua
característica passa-altas. Comparando-se o oscilograma do fluxo com o da pressão sonora veem-se, de
forma desordenada, as ondulações introduzidas pelos formantes, mas, no espectro da pressão irradiada,
distingue-se cada um dos formantes (VIEIRA, 2004, p. 71). 27
Figura 1.16: A imagem mostra os pulsos do ar provindo dos pulmões atravessando as pregas vocais e sendo
expelidos de maneira periódica. Os pulsos são então transformados pelas ações da ressonância do formato
do trato vocal. Os formantes vocais são modificados pela ação dos articuladores (HyperPhysics). 28
Figura 1.17: Ciclo de vibração glótica: esquema da diferença da fase vertical durante um ciclo de vibração das
pregas vocais. Pode-se observar, em sequência: as bordas mediais evertidas durante a fase de abertura (1),
as faces interior e superior da prega vocal (2) e (3), as pregas vocais no final da fase de fechamento (4) e
(5) (ZEMLIN, 2005, p.171). 29
Figura 1.18 : As fases do ciclo glótico e expansão da abertura glótica (de trás para frente e de baixo para cima) e
do fechamento da glote (da frente para trás e de baixo para cima) e a diferença vertical de fase (BEHLAU,
2001, p. 26). 29
ix
Figura 1.19: O trato vocal como um tubo uniforme: área transversal de 17,5cm e fechada em uma extremidade.
Sua primeira frequência ressonante tem comprimento de onda quatro vezes superior ao comprimento do
tubo, e as próximas frequências são múltiplos ímpares da primeira (ZEMLIN, 2005, p. 315; KNOBEL, sd)
31
Figura 1.20: (1) Diferenças entre harmônicos da série harmônica segundo comprimento de onda e frequência. O
segundo harmônico tem metade do comprimento de onda e duas vezes a frequência do primeiro. O terceiro
harmônico tem um terço do comprimento de onda e três vezes a frequência do primeiro. O quarto
harmônico tem um quarto do comprimento de onda e quatro vezes a frequência do primeiro, e assim segue
a proporção. O quarto harmônico é duas vezes a frequência do segundo e o sexto harmônico é duas vezes a
frequência do terceiro harmônico, e esta relação também segue nessa proporção (SCHMIDT-JONES,
2009, p.5). (2) As informações anteriores aplicadas a um tubo fechado simulando acusticamente o trato
vocal. Modelo ressonador do tubo fechado (SUNDBERG, 1977, HyperPhysics). 32
Figura 1.21: O espectro laríngeo alterado pelas cavidades de ressonância criando formantes (APPELMAN, 1967,
p. 126). 32
Figura 1.22: Diferença do som vocal com e sem formante extra (SUNDBERG, The acoustic of singing voice
apud HyperPhysics). 33
Figura 1.23: Formante do cantor: espectros médios de longo prazo. Sem o recurso do formante do cantor (região
escura), os sons da fala são mascarados pela orquestra. Com o abaixamento da laringe e o alargamento da
região supraglótica, o formante do cantor é criado próximo a 3.000 Hz. Adaptado de Sundberg (1979) por
Vieira (VIEIRA, 2004, p. 75). 34
Figura 2.1: a) A caixa torácica mostrando a localização do diafragma, sculo principal da respiração. O osso
esterno e as costelas estão discriminados. (DELANEY, 2009, adaptações nossas) b) O movimento costo-
diafragmático na inspiração (esquerda) e na expiração (direita) respectivamente. 46
Figura 2.2: O movimento do diafragma (a) na inspiração: a pressão nos pulmões diminui, o ar começa a entrar e
o diafragma contrai e desce; e (b) na expiração: a pressão nos pulmões aumenta, o ar é empurrado para
fora e o diafragma relaxa (sobe). 47
Figura 2.3: As fases da prega vocal: (a.) Fechada; (b.) Abertura-aberta; (c.) Em fechamento; À direita observa-se
a coordenação das forças mioelásticas juntamente com o efeito Bernoulli (PHILLIPI, s/d, p.12). Abaixo, as
forças agindo nas pregas vocais (TITZE, 2010). 49
Figura 2.5a: (1): Pregas vocais. Acima (de Södersten & Lindestad, 1992): endoscopia oral (direita) e nasal
(esquerda). Abaixo, à esquerda: visão endoscópica das pregas vocais. As linhas tracejadas indicam a
posição das pregas sob a epiglote. Abaixo, à direita: corte transversal de uma prega vocal, destacando as
duas camadas mais relevantes para a fonação: o corpo e a cobertura (VIEIRA, 2004, p. 72); (2) Corte
esquemático das partes da prega vocal: cobertura, transição e corpo. Trabalho de Stevens e Hirano (Vocal
Fold Physiology, 1981) (MILLER, 1993, p. 5); (3) As linhas desenhadas indicam o movimento deslizante
que ocorre entre o corpo e a cobertura. A possibilidade de uma força vertical na cobertura está indicada na
seta central (MILLER, 1993, p. 6). 54
Figura 2.5b: (1) Glote vista de cima, mostrando a localização da frente (pescoço). As setas indicam o movimento
das cartilagens aritenóides na fonação e respiração. (2) Músculos intrínsecos da laringe. O músculo vocalis
é a prega vocal propriamente dita. 54
Figura 2.5c: (1) A laringe vista de trás (vista posterior), em corte coronal (IRISH, 2010), e (2) vista de cima,
mostrando a glote, em posição apresentada pelo espelho e as pregas vocais em fonação e respiração
(NETTER, 2001). 55
Figura 2.6: Acima: Fotografia de laringoscopia mostrando a glote nas duas situações citadas (ZEMLIN, 2006).
Abaixo: (1) Glote em repouso, o ar passando e (2) glote em fonação, com as pregas aduzidas
(MAGALHÃES). 57
Figura 2.7: Registros, qualidade vocal e ajustes laríngeos nos formatos das pregas vocais. Na voz modal no
falsete um grande aumento de tensão longitudinal e, em F0, uma fenda glótica. No fry ou creak
(crepitação ou voz rangida), há redução da tensão longitudinal na pressão subglótica e aumento da
compressão medial, resultando um som mais grave, aperiódico e com sub-harmônicos. No cochicho, a
falta de aproximação da glote causa uma fenda, resultando em um som de fricção e não vibração das
pregas vocais. Os gráficos mostram ajustes laríngeos e mudanças na frequência fundamental e serie
harmônica (VIEIRA, 2004, p. 73). 62
Figura 2.8: Estrutura externa da laringe. 63
Figura 2.9: Músculo vocalis ou tireoaritenóideo em vista lateral (1) e de cima (2). 63
Figura 2.10: Músculos do pescoço, tórax e abdômen (MILLER, 1993, p.18). 66
Figura 2.11: Triângulo das vogais. Duas formas de representação: as vogais fechadas nos extremos e as abertas
no meio (BROWN, 1996, p. 103), e a disposição do eixo frente-fundo nas vogais /i/ e /u/. As vogais /a/, /i/
e /u/ representam os três extremos de F1-F2 em termos de localização no gráfico e na colocação da língua.
As outras vogais estão entre estes extremos. As pontas extremas são: em /a/, a língua é baixa e posterior;
em /i/, a língua é alta e frontal; e em /u/, a língua é alta e posterior. 74
Figura 2.12: Quadrilátero vocálico onde estão as posições da língua para as vogais (ZEMLIN, 2005, p. 319). 75
Figura 2.13: Cada vogal tem seu espectro próprio e as cavidades oral e nasal, determinadas pela articulação,
influenciam diretamente esse espectro. 77
Figura 2.14: Espectro Harmônico. Cada som de cada vogal tem seu espectro harmônico (HyperPhysics, 2006).
F1 x F2, formantes determinados pelas vogais: gráfico adaptado de G.E. Peterson e H.L. Barney (1952),
mostrando as regiões de frequência para F1 e F2 que resultam nas 10 vogais do idioma inglês (TITZE,
2010). 77
Figura 2.15: Comparação entre espectros harmônicos da mesma vogal AH (/a/)(como em “alegria” ou “father”).
O gráfico mostra a vogal /a/ em diferentes frequências (alturas ou pitch) (HyperPhysics, 2010). 82
Figura 2.16: Detalhamento dos fonemas de acordo com o quadrilátero das vogais. (ATKIELSKI, 2006). 88
Figura 2.17: A) Vogais:Detalhamento dos fonemas de acordo com o quadrilátero das vogais.
(http://web.uvic.ca/ling/resources/ipa/charts/IPAChart96.pdf) 88
Figura 2.17: B) Consoantes
Figura 2.18: As consoantes de acordo com seu ponto de articulação.
(http://pages.slc.edu/~ebj/IM_97/Lecture9/consonants.gif) 92
Figura 2.19: Traçado mostrando a amplitude de um /i/ sustentado por uma voz feminina. A mudança periódica
de amplitude deveria ser descrita como trêmulo. Se houver variação de altura, o vibrato estará presente e é
o caso mais comum (HyperPhysics). 97
Figura 2.20 : Comparação entre dois tipos de espectro de regularidade do vibrato. O gráfico (1) mostra voz com
vibrato regular, taxa de aproximadamente 5,5 Hz e amplitude de 0,70 semitons. O gráfico (2) mostra
vibrato irregular e de baixa amplitude, apresentando dois picos maiores em 4,2 e 8,4 Hz (VIEIRA, 2004,
p.78). A regularidade é um parâmetro muito importante para o vibrato do cantor. 98
Figura 2.21: Diâmetro do trato vocal nas posições de fala e canto, ambas em emissão da vogal /a/. A expansão do
canto é naturalmente maior na cavidade oral e faríngea. 102
Figura 2.22: Discriminação do trato vocal: cavidades nasal e orofaríngea. 104
Figura 2.23: O esquema (2) mostra a relação muscular dos elevadores e abaixadores do osso hióide, responsável
pela flexibilidade de abaixamento e elevação da laringe (ZEMLIN, 2010). 105
Figura 2.24: a) Cavidade oral exibindo o véu palatino. 1. Palato duro. 2. Aponeurose palatina 3. Inserção do
elevador do véu palatino. 4. Úvula. 5. Músculo Palatofaríngeo. 6. Músculo Palatoglosso (FIGÚN, 1994,
P.84). 104
Figura 2.24: b) Esquema dos níveis de projeção vocal relacionando face, nariz boca e pescoço (PINHO,
2008.p.30). 105
Figura 2.24: c) Tabela baseada nos níveis de projeção vocais desenvolvidas por Pinho (2008, p.29). 105
Figura 2.25: a) Articulação da mandíbula evidenciando a articulação temporo-mandibular e nas posições
fechada, aberta e bem aberta(NETTER, 2001). b) Mandíbula vista lateralmente, de cima e da frente
(ZEMLIN, 2010). 111
Figura 2.26: Posição da boca em relação ao primeiro formante. Com a abertura dos lábios, o primeiro formante
(F1) ganha amplitude, frequência e forca acústica (SUNDBERG, 1977, p. 23). 113
Figura 2.27: Formante do cantor (SUNGBERG, 1977). 116
Figura 2.28: Seios piriformes em esquema e mostrando o acesso com pinça. 116
Figura 2.29: Pêndulo ilustrando o equilíbrio vocal entre as polaridades de hiperfunção (voz tensa) e hiperfunção
(debilidade vocal, soprosidade). Para o professor de canto, o diagnóstico de onde se encontra o aluno é
fundamental para elaborar sua regulação (WARE, 1998, p. 20). 120
Figura 2.30: Lista de variáveis que influenciam a produção da voz (TITZE, 1994, p. 5). 120
Tabela 3.1: Formação dos professores. Dados dos questionários. 124
Tabela 3.2: Fontes de conhecimento segundo ordem de relevância para os participantes. 125
Tabela 3.3: Respostas a questões sobre conhecimentos de fisiologia da voz e acústica. 127
Figura 3.4: Seios paranasais, “máscara” no canto (MEDSCAPE, 2006). 137
Tabela 3.5: Resultados: Ajustes ensinados aos professores de canto. 147
Figura 3.6:Conciliação dos Opostos: esfera representando os opostos para equilíbrio dos elementos que
compõem a pedagogia vocal. (WARE, 1998). 150
Tabela 3.7: Resultados: Estratégias de ensino recebidas sobre ressonância do trato vocal. 150
Tabela 3.8: Qualidades vocais em relação aos ajustes necessários, segundo Sacramento (2008). 157
xi
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS..............................................................................................................viii
INTRODUÇÃO......................................................................................................................... .1
Formulação do problema ..................................................................................................................... 1
Objetivos, delimitação e relevância..................................................................................................... 2
Referencial Teórico .............................................................................................................................4
Metodologia......................................................................................................................................... 6
Organização da dissertação.................................................................................................................. 7
CAPÍTULO 1 BREVES NOÇÕES DE ACÚSTICA................................................................. 8
1.1 Acústica como Fenômeno.............................................................................................................. 8
1.1.1 Ondas Sonoras........................................................................................................................ 9
1.1.2 A propagação das ondas sonoras pelo ar.............................................................................. 10
1.1.3 O som e suas propriedades................................................................................................... 11
1.1.4 Frequência ............................................................................................................................ 12
1.1.5 Amplitude............................................................................................................................. 13
1.1.6 Timbre .................................................................................................................................. 15
1.1.7 Duração ................................................................................................................................ 18
1.1.8 Sons estranhos ou ruídos ...................................................................................................... 19
1.2. Processo acústico da fonação...................................................................................................... 19
1.2.1 O trato vocal......................................................................................................................... 20
1.2.2 Produção da fonação ............................................................................................................ 22
1.2.3 Ressonância como fenômeno............................................................................................... 24
1.2.4 Frequências de ressonância naturais..................................................................................... 24
1.3. Teoria fonte-filtro da fonação..................................................................................................... 26
1.3.1 Característica da fonte sonora .............................................................................................. 27
1.3.2 Função de transferência do trato vocal................................................................................. 30
1.3.3 .O trato vocal como um tubo uniforme ................................................................................ 30
1.3.4 Frequências formantes.......................................................................................................... 32
1.3.5 Efeito das configurações do trato vocal ............................................................................... 35
1.3.6 Resistência à propagação...................................................................................................... 36
CAPÍTULO 2 ACÚSTICA APLICADA À FISIOLOGIA DA VOZ...................................... 38
2.1 Postura e alinhamento.................................................................................................................. 40
2.1.1 Tônus muscular .................................................................................................................... 41
2.1.2 Atitude corporal.................................................................................................................... 41
2.2. Processo Respiratório ................................................................................................................. 44
2.2.1 Músculos da respiração ........................................................................................................ 45
2.2.2 Mecanismo gerador da voz................................................................................................... 48
2.2.3 Mecanismo vibratório .......................................................................................................... 49
2.3 Laringe......................................................................................................................................... 50
2.3.1 Funções da laringe................................................................................................................ 51
2.3.2 Pregas Vocais ....................................................................................................................... 53
2.3.3 Pressão subglótica ................................................................................................................ 56
2.3.4 Foco e função fonatória: Registros....................................................................................... 57
2.3.5 Musculatura intrínseca da laringe......................................................................................... 62
2.3.6 Ação do músculo cricotireóideo no registro......................................................................... 64
2.3.7 Musculatura extrínseca e outros músculos indiretos............................................................ 65
2.4 Classificando transições/passagens de registros (passaggio)...................................................... 66
2.5. Equalização dos registros .......................................................................................................... 68
2.6 Articulação................................................................................................................................... 70
2.6 Vogais.......................................................................................................................................... 73
2.6.1 O triângulo das vogais.......................................................................................................... 73
2.6.2 Características das vogais..................................................................................................... 75
xii
2.6.3 A língua nas vogais .............................................................................................................. 76
2.6.4 A laringe nas vogais ............................................................................................................. 76
2.6.5 Características específicas vogais ........................................................................................ 77
2.6.6 Vogais Umlaut...................................................................................................................... 79
2.6.7 Vogais neutras...................................................................................................................... 79
2.7 Semivogais (glissando ou deslizando)......................................................................................... 79
2.8 Ditongos e Tritongos ................................................................................................................... 79
2.9. Modificação vogal (aggiustamento) e eficiência sonora ............................................................ 80
2.9.1 O trajeto dos formantes ........................................................................................................ 82
2.9.2 Modificações nas transições de registros ............................................................................. 83
2.9.3 Vogais e legato no canto ...................................................................................................... 85
2.9.4 A posição acústica de descanso............................................................................................ 86
2.10 As vogais cardinais.................................................................................................................... 86
2.10.1 O quadrilátero vocálico ...................................................................................................... 87
2.10.2 Arredondamento dos lábios................................................................................................ 89
2.10.3 Os Formantes das Vogais................................................................................................... 89
2.11 Consoantes................................................................................................................................. 91
2.12 Timbre Vocal............................................................................................................................. 93
2.12.1 Chiaroscuro ........................................................................................................................ 94
2.12.2 Vibrato Vocal ..................................................................................................................... 95
2.13 Ressonância vocal...................................................................................................................... 99
2.13.1 Ressonadores vocais......................................................................................................... 100
2.13.2 Peito e vias aéreas subglóticas.......................................................................................... 100
2.13.3 Laringe ............................................................................................................................. 100
2.13.4 Faringe e Cavidade oral.................................................................................................... 101
2.13.5 Cavidade nasal e sinus...................................................................................................... 102
2.14 Amplificação vocal no canto lírico - maximizando a ressonância vocal................................. 104
2.14.1 Posicionando a laringe ..................................................................................................... 104
2.14.2 Posicionando a língua....................................................................................................... 107
2.14.3 Posicionando a faringe ..................................................................................................... 107
2.14.4 Posicionando o palato mole.............................................................................................. 107
2.14.5 Posicionando a mandíbula................................................................................................ 110
2.14.6 Posicionando boca e lábios .............................................................................................. 111
2.15 Eficiência vocal .......................................................................................................................113
2.15.1 Ataque vocal (l’attacco del suono)................................................................................... 113
2.15.2 O formante do cantor........................................................................................................ 114
2.15.3 Colocação e foco .............................................................................................................. 116
2.15.4 Considerações sobre equilíbrio vocal............................................................................... 119
CAPÍTULO 3 METODOLOGIA E RESULTADOS ............................................................122
3.1 Procedimentos............................................................................................................................ 122
3.1.1 População e Amostra.......................................................................................................... 123
3.1.2 Tratamento e Análise dos dados......................................................................................... 124
3.2 Resultados.................................................................................................................................. 124
3.2.1 Formação dos professores de canto.................................................................................... 124
3.2.2 Fontes de conhecimento e informações.............................................................................. 125
3.2.3 Literatura sobre canto lírico ............................................................................................... 126
3.2.4. Conhecimentos sobre fisiologia da voz e acústica ............................................................ 127
3.2.5 Conceito de ressonância do trato vocal no canto lírico...................................................... 128
3.2.6 Lacunas no conhecimento sobre ressonância do trato vocal.............................................. 129
3.2.7 Conceito de qualidade do som vocal.................................................................................. 132
3.2.9 Trabalho técnico individual para ressonância /amplificação /desenvolvimento do som vocal
..................................................................................................................................................... 134
3.2.10 Parâmetros/Critérios físicos corporais.............................................................................. 135
3.2.11 Ajustes físicos .................................................................................................................. 137
xiii
3.2.12 Dificuldades Técnicas ...................................................................................................... 138
3.2.13 Técnicas para melhorar a ressonância.............................................................................. 139
3.2.14 Ajustes utilizados na transição de registros vocais .......................................................... 140
3.2.15 Modificações do timbre.................................................................................................... 142
3.2.16 Ajustes do trato vocal....................................................................................................... 143
3.2.17 Dificuldades técnicas no início dos estudos de canto....................................................... 147
3.2.18 Estratégias de ensino da ressonância do trato vocal......................................................... 148
3.2.19 Erros/dificuldades/lacunas pedagógicas........................................................................... 151
3.2.20 Dificuldades técnicas dos alunos...................................................................................... 153
3.2.21 Termos (palavras, expressões) no ensino do som vocal................................................... 154
3.2.22 Explicações sobre o fenômeno da ressonância vocal aos alunos ..................................... 155
3.2.23 Ajustes no trato vocal (garganta, boca e nariz) solicitados ao aluno durante o canto...... 156
3.2.24 Ensino do som vocal de qualidade ................................................................................... 161
3.2.25 Ensino dos Ajustes no trato vocal na transição de registros............................................. 162
3.2.26 Ensino do Timbre vocal ................................................................................................... 163
3.2.27 Ensino do Vibrato............................................................................................................. 164
3.2.28 Problemas no ensino do canto lírico ................................................................................ 166
3.2.29 Ensino da Ressonância Otimização do som.................................................................. 167
3.2.30 Ensino do foco.................................................................................................................. 167
3.2.31. Espaço livre para comentários sobre o instrumento de coleta......................................... 169
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................. 170
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 175
ANEXOS................................................................................................................................ 180
Anexo 1 Questionário adotado ....................................................................................................... 180
Anexo 2 Passagens das vozes femininas ........................................................................................ 182
Anexo 3 Passagens nas vozes masculinas ...................................................................................... 184
Anexo 4 Normas para o Português Brasileiro Cantado (2008) ...................................................... 185
Anexo 5 International Phonetic Alphabet (IPA) ............................................................................ 190
INTRODUÇÃO
Formulação do problema
Na área do canto lírico é comum que os alunos recebam de seus professores
orientações de naturezas e pedagogias diversas, algumas delas contraditórias e, em geral,
transmitidas de geração a geração com base em empirismos e tradições. A maioria desses
alunos frequenta aulas de canto individuais, procura workshops em festivais de música,
Masterclasses com cantores renomados e provavelmente tem tido acesso a informações
provenientes de diferentes profissionais da área do canto. Outros grupos envolvidos com o
canto são os dos regentes e dos preparadores vocais, que lidam com a técnica vocal de forma
bastante controversa pela falta de consenso no seu ensino-aprendizagem e de materiais
didáticos embasados na ciência e escritos em português. Sobre isso, a professora de educação
musical Helena Coelho comenta:
Foi assim, numa vivência musical eclética, que descobri quão mágico era o ensino de canto.
Baseava-se na imitação de modelos, no talento inato, e no empirismo. Certos termos como
“apoio”, “voz empostada”, “coluna de ar”, “timbre natural” e dezenas de outros, honestavam a
superioridade e a propriedade de pareceres avaliativos (quase sempre desabonadores...) de uns
cantores e professores de canto sobre outros. Entre eles, em geral, encontrava muita pompa,
hermetismo e agressividade disfarçada de competência; mas pouca, bem pouca clareza de
conceitos básicos no processo de ensino-aprendizagem de sua arte (COELHO, 2005, p. 9).
Quando conheci o trabalho da Dra. Mirna Rubim, como cantora e professora de
canto, constatei que seria possível a associação de busca da performance eficiente à
curiosidade investigativa, aliadas a uma generosidade e clareza no ensino do canto. Através
dela conheci o trabalho publicado do também pedagogo vocal Richard Miller e,
posteriormente, os demais teóricos consultados para a execução deste trabalho (ver
Referencial Teórico).
Dentre outras, uma lacuna no ensino-aprendizagem do canto lírico que foi pouco
esclarecida na nossa formação foi relativa aos conceitos sobre a “colocação” ou a
"impostação" da voz, ou seja, de que maneira clara e objetiva o cantor pode otimizar sua
produção vocal a partir das causas, não dos efeitos. Essas dúvidas, que assombram o
aprendizado e a prática do canto, têm sido transmitidas por décadas a professores e alunos de
canto. O empirismo começou a mudar com as primeiras experiências de Manuel Garcia
(1805-1906), inventor do laringoscópio, datado de 1854, e só chegaram a um número razoável
de professores de canto apenas em meados do século XX. Outra questão a ser colocada é que
a maioria dos grandes cantores líricos optou pelo foco em suas carreiras e não se preocupam
em compartilhar seus processos de ensino e aprendizagem. Por último, raros são os livros que
2
descrevem a prática do canto de forma eficiente; ao contrário, focam nos fenômenos, na
descrição física e pouco abordam sobre os exercícios práticos de forma efetiva. O único que
encontramos nessa direção foi o livro The Structure of Singing, do pedagogo Richard Miller
(1986). Tendo em vista o ensino-aprendizagem do canto, neste trabalho procuramos investigar
como alguns professores de canto no Brasil têm lidado com essa prática.
O ato de cantar é caracterizado por processos complexos, que envolvem funções
cognitivas, físicas, emocionais e acústicas, internas e externas. Por essa razão, o estudo do
canto demanda uma compilação extensa, interdisciplinar e multifacetada, que nos levou a
enfocar os fenômenos ressonantais da voz. Muito recentemente, de 1980 para cá, com o
advento das pesquisas na área de acústica vocal, vários conceitos que eram "achismos"
puderam ser comprovados cientificamente, e então as discussões vagas e não embasadas
foram esclarecidas, como conclui Vieira:
A arte do canto tem estado à frente da ciência, mas aos poucos, a acústica vem explicando
fenômenos que professores de canto conhecem séculos. Com o avanço da tecnologia, o uso
não de registros acústicos, mas de sinais aerodinâmicos (fluxo aéreo e pressão sonora) e
eletroglotográficos, tende a tornar-se um forte aliado à compreensão e evolução das técnicas de
canto, como tem ocorrido na fonoaudiologia e na otorrinolaringologia (VIEIRA, 2004, p.78).
Consideramos que a compreensão dos principais conceitos fisiológicos e acústicos
que fundamentam e instrumentalizam o cantor, tanto em sua prática performática quanto na
prática pedagógica, é essencial e objeto de estudo deste trabalho.
Com base nos problemas expostos, várias questões de pesquisa foram formuladas:
(1) Que conjunto de informações sobre fisiologia e acústica vocal é fundamental para um
cantor lírico, aluno ou professor? (2) De que maneira os cantores e professores de canto lírico
brasileiros têm lidado com este tema? (3) De que forma este trabalho poderia contribuir para a
transmissão seguramente fundamentada e facilitada desse conhecimento?
Com essas perguntas em mente, partiu-se para a construção de um estudo
sistematizado e deduzimos que não seria possível cobrir todos os aspectos da técnica vocal.
Por consequência, decidimos enfocar o aspecto da ressonância vocal, por considerarmos ser
um assunto abordado com deficiência pelos profissionais do canto.
Objetivos, delimitação e relevância
O objetivo desse trabalho é, através de um estudo sobre os principais aspectos da
técnica vocal (treinamento clássico), discutir a ressonância vocal com base na literatura e na
experiência de um grupo de onze cantores e professores de canto brasileiros.
3
Neste trabalho, quando usamos o termo canto, estamos nos referindo ao canto lírico,
também conhecido como canto erudito ou canto artístico. Este se caracteriza pela projeção da
voz em espaços físicos de tamanhos variados, desde salas de câmara a grandes teatros, em
contraste com o canto amplificado (uso de microfones), usado pela música popular. Para
tanto, o cantor deve valer-se de técnicas que ajudem a otimização
1
do som vocal, tornando-o
mais forte (potente e com brilho), a fim de percorrer os espaços e competir com o som dos
instrumentos que o acompanham.
O professor Richard Miller (1986) comenta que a técnica vocal serve justamente para
equipar o cantor com condições de independência e capacidades/habilidades maximizadas a
ponto de disponibilizá-las a serviço da expressão que se deseja, almeja e sonha. Ele diz que a
técnica deve ter como objetivo principal a estabilização de coordenação apropriada durante o
canto. O cantor, ao conhecer como seu instrumento vocal funciona e buscando seu
funcionamento de maneira consistente, será dono de seu instrumento e poderá colocar esta
técnica a serviço da arte da interpretação. É por isso que uma abordagem sistemática da
técnica vocal é a melhor rota de sucesso para o canto artístico (MILLER, 1986). Optamos
pelo foco na otimização do som vocal por entendermos que esse domínio é indispensável
àqueles que pretendem a carreira do canto lírico.
Miller (1986) complementa que a arte não pode ser realizada sem o significado
técnico para sua apresentação. A técnica vocal sistemática e a expressão artística são
inseparáveis; elas constituem a estrutura do canto. Uma compreensão da função física será a
grande diferença entre a construção de uma técnica sólida e uma vida inteira de lutas com a
mecânica vocal, geralmente não estudada de forma adequada e embasada. Os cantores de
modo geral estão mais preocupados com o impacto da performance final (o produto estético)
e pensam pouco nos fatores físicos e acústicos da produção do som; uma informação mal
formulada na pedagogia vocal pode causar danos à voz ou à relação do indivíduo com a
música e com a prática do canto. Sabemos que existem práticas pedagógicas inconscientes e
defasadas permeando nossa realidade em todos os níveis. Pela escassez de material em
português que esclareça a prática consciente do canto, a educadora musical Helena Coelho se
mostra indignada com a falta de profissionais que têm coragem e disciplina de expor suas
idéias de forma sistemática e fundamentada, evitando, assim, a proliferação de práticas
mecânicas irresponsáveis e irrefletidas (COELHO, 2005, p. 9).
1
Otimização aqui é usada como melhoria, habilitação (termo preferido por Titze), aproveitamento máximo dos
recursos, trabalho para tornar a voz excelente ou, nos termos de Richard Miller, uma voz de elite.
4
Miller (1986), ao se referir à grande variedade de ensinamentos em técnica vocal,
compara a pedagogia vocal com uma mesa de petiscos em um buffet, onde há grande
diversidade de comidas, ricas e simples, e onde também é possível provar todas elas ou até
mesmo fartar-se à vontade; mas adverte que nem tudo o que irá ser ingerido será nutritivo ou
benéfico.
A crescente literatura estrangeira em fisiologia vocal, acústica, fonoaudiologia, teses
de pesquisadores e pesquisas de cientistas da voz (atualmente a ciência da voz tem sido
chamada de vocologia) muito tem acrescentado aos estudantes ou professores que pesquisam
esse material, mas ainda se encontra difuso e muito pouco disponível aos educadores
brasileiros. Material adequado em português ainda não existe e os que são publicados têm
enfoque na voz falada.
A pedagogia vocal atual tem procurado estabelecer meios de otimização da voz
cantada e de como transmitir ao aluno a idéia de que uma voz “boa para o canto” é a voz livre,
saudável, disposta a servir de instrumento à música que representa, qualquer que seja o estilo
escolhido e também disponível para mostrar sua beleza própria. Através da expressão de sua
beleza única e caracteristicamente individual, a voz poderá se destacar a ponto de ser
compartilhada e usufruída artisticamente pelo próprio cantor e pelos seus ouvintes. Apesar de
um crescente interesse nas pesquisas de técnicas vocais, tais estudos ainda apresentam
divergências e dificuldades na sua comunicação pela vasta terminologia mal definida e mal
explicada. Este trabalho é parte de um processo de reflexão com foco na ressonância como
ponto de integração dos diversos aspectos técnicos vocais que assombram cantores, alunos e
professores de canto, além dos demais profissionais da voz cantada.
Referencial Teórico
Considerando a natureza multidisciplinar do assunto, que abrange várias áreas de
conhecimento, selecionamos literaturas provenientes da física, anatomia, fisiologia,
fonoaudiologia, técnica e pedagogia vocais, com o intuito de estabelecer conexão entre elas e
esclarecer termos definidos de forma inconsistente na literatura do canto. Entretanto,
considerando o tempo curto de um curso de mestrado, optou-se pelo foco nos pedagogos
vocais. O primeiro teórico que apresentamos é Richard Miller, falecido em 2009, autor de oito
livros sobre canto, a saber: The Structure of Singing (1986), Training Tenor Voices (1993);
On the Art of Singing (1996); National Schools of Singing (1997); Singing Schumann: An
Interpretive Guide for Performers (1999); Training Soprano Voices (2000); Solutions for
Singers: Tools for Performers and Teachers (2004) e Securing Baritone, Bass-Baritone, and
5
Bass Voices (2008). Pioneiro da pedagogia vocal nos Estados Unidos, Miller fundou o Centro
de Artes Vocais Otto B. Schoepfle, do Conservatório Obelin, em Ohio, o primeiro laboratório
acústico dentro de uma escola de música. Miller foi um grande pesquisador e dedicado
pedagogo da voz cantada. Seus livros contêm vasta bibliografia com nomes importantes da
fisiologia vocal, tais como os médicos Janwillem van den Berg e Minoru Hirano, que muito
contribuíram para o estudo da voz.
Outros pedagogos vocais consultados para este trabalho foram Clifton Ware,
professor da Universidade de Minnesota, no Schuessler Vocal Arts Center, com seu livro The
Basics of Vocal Pedagogy, um livro de linguagem acessível muito utilizado em diversos
cursos de Pedagogia Vocal nos Estados Unidos; e Ralph Appleman, com seu livro denso e
científico The Science of Vocal Pedagogy, que deve ser livro de consulta obrigatório para todo
professor de canto lírico. Também foram incluídos os pedagogos vocais Oren Brown e seu
livro Discover your Voice: developing healthy habits, onde apresenta as bases da técnica
vocal numa linguagem acessível e objetiva; e Cornelius Reid, de visão mais tradicional,
porém fundamental ao canto lírico, com seu trabalho Bel Canto: Principles and Practices.
De grande importância para a fisiologia vocal foram os autores Willard Zemlin,
Professor Emeritus da Universidade de Illinois, e as brasileiras Mara Behlau e Silvia Pinho,
autoridades em fonoaudiologia que muito têm contribuído para a saúde, estudo e ensino da
voz.
Johann Sundberg é mundialmente conhecido como um dos maiores especialistas e
pesquisadores da acústica vocal. PhD em Musicologia, é consultor de várias universidades e
publicou inúmeros artigos sobre voz cantada. Também importantes foram os trabalhos do Dr.
Ingo Titze, grande pesquisador e professor de voz e fala, e diretor executivo do National
Center of Voice and Speech, da Universidade do Iowa.
Na área de acústica, de grande auxílio foram os trabalhos de Fernando Iazzetta,
Professor na área de Música e Tecnologia do Departamento de Música da Escola de Artes da
USP, e pesquisador do Laboratório de Acústica Musical e Informática (LAMI). Os sites da
Web na área de Física, principalmente os muito bem elaborados e destinados a fins
educativos, também foram de grande ajuda. São eles: AP Physics –B e HyperPhysics.
Duas teses, dentre as consultadas, foram fundamentais: a de Eva Björkner, cuja tese
de doutorado (realizada em 2006, Suécia) abordou aspectos de características vocais em
cantores de ópera e teatro musicado, e a de Cristina Sacramento (Aveiro, Portugal), que
6
pesquisou o crossover
2
entre as técnicas de canto lírico e de teatro musicado e nos ofereceu
informações úteis e relevantes sobre a realidade lírica portuguesa. O vasto referencial abrange
cientistas pesquisadores da acústica da voz e fonoaudiólogos e serve de base para pesquisas
complementares a esta.
Metodologia
A estratégia metodológica consistiu na soma das partes: (1) revisão da literatura com
base nas referências apresentadas, na qual buscamos conceitos básicos de acústica, anatomia e
fisiologia da voz. A ênfase desejada na correlação entre os assuntos determinou que estes
fossem amalgamados desde o início deste relatório de pesquisa. E (2) para alcançar o
pensamento, práticas e dificuldades de ensino-aprendizagem dos professores de canto em
relação à ressonância do trato vocal, foram realizadas questões semi-estruturadas com 11
cantores e professores de canto brasileiros ativos (questionário no Anexo 1; o Capítulo 3
apresenta as respostas integrais e comentadas). Considerando a natureza da avaliação semi-
estruturada, foram formuladas questões que consideramos essenciais para se compreender
como os professores lidam com o assunto da ressonância vocal. Como caracterização geral da
entrevista semi-estruturada Triviños fornece o seu parecer:
Segundo o nosso ponto de vista, para alguns tipos de pesquisa qualitativa, a entrevista semi-
estruturada é um dos principais meios que tem o investigador para realizar a Coleta de Dados.
(...) Queremos privilegiar a entrevista semi-estruturada porque esta, ao mesmo tempo em que
valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o
informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação
(TRIVIÑOS, 1987, pp. 145-146).
Segundo Alves-Mazzotti (2001), a entrevista semi-estuturada inclui aspectos
objetivos e subjetivos, o que consideramos ideais para nossa pesquisa:
Nas entrevistas não estruturadas, o pesquisador introduz o tema da pesquisa, pedindo que o
sujeito fale um pouco sobre ele, eventualmente inserindo alguns tópicos de interesse no fluxo
da conversa. Este tipo de entrevista geralmente é usado no inicio da coleta de dados, quando o
entrevistador tem pouca clareza sobre aspectos mais específicos a serem focalizados, e é
frequentemente complementado, no decorrer da pesquisa, por entrevistas semi-estruturadas.
Nestas, também chamadas focalizadas, o entrevistador faz perguntas especificas, mas também
deixa que o entrevistado responda com seus próprios termos (ALVES-MAZZOTTI, 2001, p.
168).
A opção pela alternativa metodológica mais adequada à análise da questão da
pedagogia vocal do tema escolhido se deve à complexidade da linguagem ou dos termos
utilizados. Uma vez que a terminologia em canto lírico não possui uma padronização fixa, a
2
Cruzamento ou transição termo usado para descrever os cantores que tanto cantam como cantores líricos
como cantores de teatro musical. Também se aplica o termo a cantores líticos que cantam música popular, como
é o caso de Pavarotti, Domingo e Kiri te Kanawa (SACRAMENTO, 2009).
7
própria explicação dos termos, acreditamos, caracterizaria uma intervenção significativa do
pesquisador. Frente a essa questão e diante da possibilidade de se combinarem partes
estruturadas com menos estruturadas, optamos pelas questões semi-estruturadas e pela
construção do um instrumento de coleta de dados, o questionário que melhor atendesse às
questões da pesquisa.
Da confrontação dos dados obtidos, elaborou-se uma discussão sobre os principais
aspectos da ressonância vocal, sua relação com a amplificação vocal natural (sem microfones)
e de que modo seria possível facilitar o ensino do canto lírico com enfoque nesse aspecto.
Organização da dissertação
Esta dissertação está organizada em três capítulos. No primeiro capítulo, é
apresentada uma revisão sobre acústica geral e vocal. No segundo capítulo, são introduzidos
os principais aspectos da técnica vocal com base na fisiologia da voz e enfoque na ressonância
vocal. No terceiro capítulo, são mostrados os resultados dos questionários, incluindo todas as
respostas dos professores e, no final de cada tópico, é realizada uma discussão confrontando-
se os achados da literatura que corroboram as indicações dos participantes. Fecham este
trabalho as Considerações finais, as Referências e os Anexos.
8
CAPÍTULO 1 BREVES NOÇÕES DE ACÚSTICA
Este estudo visa o desenvolver fundamentos que auxiliem o ensino do canto a
professores das mais variadas categorias que trabalham com voz cantada e também contribuir
com a prática da performance em canto. Dessa forma, começaremos por esclarecer pontos
importantes do processo acústico, anatômico, fisiológico e técnico da produção sonora vocal
como instrumento de fundamentação para a pedagogia e prática vocal. Nesta parte do
trabalho, buscamos explicações para termos como ondas simples, ondas complexas,
intensidade e loudness, espectro vocal, trato vocal, formante do cantor e outros tão
controversos e pouco esclarecidos na literatura sobre técnica vocal em português.
1.1 Acústica como Fenômeno
Os físicos Halliday, Resnick e Walker (1996) citam as palavras de Leonardo da
Vinci como um conhecedor de ondas, e fornecem os seguintes conceitos:
É frequente que uma onda de água fuja de seu local de origem, enquanto a água não; como as
ondas criadas pelo vento num campo de trigo, onde vemos as ondas correndo através do
campo, enquanto os pés de trigo permanecem no mesmo lugar (Leonardo da Vinci apud
HALLIDAY, 1996, p. 111).
Partículas e ondas têm conceitos opostos. Enquanto partículas são pequenas
concentrações de matéria capazes de transportar energia, onda é uma larga distribuição de
energia que preenche o espaço por onde passa. Não é possível compreender o fenômeno da
ressonância vocal sem a compreensão dos fenômenos acústicos que estão relacionados a ela.
vários tipos de ondas que podem ser classificadas de vários modos. Podem ser
classificadas em: (1) mecânicas, quando precisam de um meio para se propagar (água, ar,
uma corda esticada), ou (2) eletromagnéticas, quando não precisam de meio, podem se
propagar no vácuo (luz, Raios X, microondas). As ondas sonoras vocais se enquadram nas
ondas mecânicas do tipo “onda complexa”, como veremos mais adiante.
As ondas também podem ser classificadas como (a) transversais e (b)
longitudinais. A mais simples das ondas mecânicas pode ser explicada através das ondas
vibratórias de uma corda esticada. Um impulso (um puxão para cima e para baixo) é gerado
em uma extremidade, esse pulso passa de partícula a partícula da corda e desta forma uma
onda segue através da corda com certa velocidade. Se o movimento (impulso) para cima e
9
para baixo de maneira constante, isso se constitui em um movimento harmônico simples, que
provoca a propagação de uma onda chamada senoidal (Fig. 1.1). Observa-se a forma da onda
e também a direção. No caso da corda, ela oscila de cima para baixo, portanto
perpendicularmente à direção da propagação da onda. Este é um exemplo clássico de uma
onda transversal.
Figura 1.1: Onda senoidal (EVEREST, 2001, p.10).
No caso de um pistão, a onda oscila dentro de um tubo e neste tipo de onda mecânica
a propagação se faz através de pequenas concentrações de ar, com massa própria, que se
deslocam para trás e para frente, paralelamente à propagação da onda. Neste caso, o
movimento ondulatório será chamado de longitudinal.
1.1.1 Ondas Sonoras
São ondas mecânicas que podem se propagar através de gases, líquidos ou sólidos.
Pode haver dois tipos de ondas num sólido. Como explicado acima, as transversais são
aquelas onde os pequenos elementos do sólido são perpendiculares à direção de propagação
da onda. As longitudinais são aquelas onde as oscilações são paralelas à direção de
propagação. Num gás ou num líquido só transmissão de ondas longitudinais. Para
transmitir ondas transversais, o meio deve se comportar de maneira elástica quando sofrer
tensões de cisalhamento,
3
originando assim uma força restauradora. Os fluidos escoam ou
fluem, quando submetidos a tais tensões, assim não podem originar forças restauradoras e,
portanto, transmitir ondas transversais.
No caso da voz, o som é transmitido transversalmente do trato vocal, originado da
fonte glótica (pregas vocais), por ondas transversais, via osso, ao ouvido. É interessante
destacar que o cantor escuta sua própria voz de duas maneiras associadas: pelo osso (ondas
transversais) audição interna; e pelo ambiente, via ouvido externo (ondas longitudinais)
audição externa. É um dos motivos por que o cantor não reconhece a própria voz gravada,
estranhando o som, pois está habituado a ouvir a somatória auditiva das duas vias. É também
3
Cisalhamento: cisalhar = cortar. Deformação que sofre um corpo quando sujeito à ação de forças cortantes
(FERREIRA,1999, p.479).
10
10
por esse motivo que grande confusão a respeito de seu próprio som emitido. Em geral, o
que lhe agrada é um som “feio” para o ouvinte, enquanto os melhores sons para o meio
exterior soam-lhe “feios” no seu interior. Este é um dos aspectos que mais causa equívocos na
comunicação professor-aluno. O que o aluno ouve não é realmente o que está sendo
produzido. A melhor maneira de reduzir os equívocos dessa ordem é o sistema de gravação
das aulas, com equipamento de boa qualidade, para que o aluno possa ouvir de fora o som
mais próximo à realidade e assim discutir com o professor sua percepção externa a seu
próprio som.
1.1.2 A propagação das ondas sonoras pelo ar
Uma onda sonora simples, ao passar pelo ar, faz com que este oscile criando zonas
de concentração e rarefação de energia, resultando em um movimento harmônico simples em
torno de sua posição de equilíbrio. O ar oscila longitudinalmente, ou seja, paralelo à
propagação da onda sonora.
A amplitude de deslocamento é o deslocamento máximo do ar, deslocado por uma
onda, para qualquer um dos lados de sua posição de equilíbrio. A onda, ao se propagar, faz
com que a pressão do ar aumente (compressão) e diminua (expansão) com o tempo (Fig. 1.2).
Figura 1.2: Ondas sonoras, que são ondas longitudinais produzidas pela compressão e expansão do meio no qual
são propagadas. A figura mostra as partes de compressão (alta pressão) e rarefação (baixa pressão). (AP Physics-
B).
O ar é composto de pedaços microscópicos de substâncias conhecidas por moléculas,
que, quando perturbadas, explodem em todas as direções a partir da fonte sonora,
semelhantemente a um balão se expandindo. Esse movimento leve faz com que as moléculas
aglomerem-se, criando uma área de alta pressão chamada de compressão. Quando voltam à
posição original, as moléculas ficam menos densas, criando uma área de pressão mais baixa,
denominada rarefação.
11
11
Figura 1.3: (1) Movimentos de um cone de alto-falante, para frente e para trás, produzindo sucessivos pulsos de
compressão e rarefação de ar, que se propagam em forma de onda. (2) Abaixo: Representação gráfica de onda, a
parte acima do eixo horizontal representa a compressão e a parte abaixo do eixo representa a rarefação.
(IAZZETTA, s/d). Acima: O ciclo completo incluindo fases de compressão e rarefação (TRUAX, 1999).
O ciclo contínuo de fases de compressão e rarefação constitui a onda sonora que se
expande enquanto a sua fonte continuar emitindo som. As ondas sonoras se propagam para
fora da fonte em todas as direções. Essa onda sonora continua se expandindo a
aproximadamente 345 metros por segundo, fenômeno conhecido como velocidade do som.
1.1.3 O som e suas propriedades
O som, este distúrbio das partículas do ar ou variação na pressão do ar, perturba o
sistema auditivo. O movimento harmônico simples é a mais simples forma de vibração, que
pode também ser exemplificado pelo balançar de um pêndulo, movimento análogo das
moléculas do ar sob ação da fonte sonora. O pêndulo move em uma direção, lenta, para baixo,
acelera e balança para a posição grafada no tempo no eixo horizontal, se deslocando do ponto
médio do eixo vertical, isto é o exemplo de forma de onda. A forma de onda para movimento
harmônico simples é chamada onda seno ou sinusóide e o movimento é o sinusoidal.
12
12
Figura 1.4: Onda sinusóide ou senóide. Representação gráfica de uma onda bidimensional, onde o eixo
horizontal representa a passagem do tempo e o vertical indica a variação de pressão (EVEREST, 2001, p.8).
Ondas sonoras regulares e repetitivas criam um som musical, enquanto padrões
irregulares produzem ruído. No canto, as ondas regulares e repetitivas são parcialmente
determinadas pelas vogais, enquanto que padrões irregulares, na fala e no canto,
correspondem ao uso de consoantes (WARE, 1998.p.129).
As quatro propriedades mais significantes de um som musical são: (1) Frequência
(altura, pitch); (2) Amplitude (intensidade, loudness, volume); (3) Timbre (cor, qualidade),
produto combinado de frequência e intensidade; (4) Duração; e (5) Som estranho ou ruído,
que é também uma propriedade integral do som musical. Estas serão detalhadas a seguir.
1.1.4 Frequência
Um período é a quantidade de tempo que leva para completar um ciclo inteiro de
compressão e rarefação, ou seja, um ciclo completo de vibração. Frequência, que é o inverso
de um período, é o número de ciclos por segundo medido em Hertz (Hz).
Comprimento-de-onda é a distância que a compressão e a rarefação levam para viajar
pelo tempo ate o início do outro ciclo. Pode ser longo ou curto, dependendo do número de
frequências. Altas frequências produzem comprimentos-de-onda curtos, enquanto que baixas
frequências produzem comprimentos-de-onda longos (Ver Fig. 1.6).
A frequência de vibração é percebida como tom (pitch, altura); quanto mais rápida a
frequência de vibração, mais agudo o tom. Por exemplo, para a International Standards
Association, o chamado “tom de concerto” em A4 irá resultar em 440 vibrações ou ondas
sonoras por segundo.
13
13
Figura 1.5: Onda sinusóide (variação de pressão [de rarefação a compressão] versus espaço); o comprimento de
onda (λ) está evidenciado. Segundo Iazzetta, esse tipo de gráfico pode fornecer várias informações sobre o som.
Esse som, o som senoidal, é chamado som puro porque é desprovido de harmônicos; tal nome deve-se ao fato de
poder ser representado pelo gráfico de uma função seno.
O registro audível ao ouvido humano é aproximadamente de 20 a 16.000 Hz. Na fala
ou canto, o tom é determinado pela frequência da vibração das pregas vocais, que é variável
segundo a tensão ou mudança da massa do vibrador (ou oscilador, no caso, as pregas vocais).
Isto será discutido no Capítulo 2.
1.1.5 Amplitude
A quantidade de ar deslocado do ponto de repouso é a amplitude da vibração, e a
amplitude de deslocamento do corpo vibrador receptor, corresponde diretamente ao
deslocamento das partículas do ar. Em uma onda sonora percebida, a quantidade de
deslocamento das partículas de ar corresponde à quantidade de pressão colocada sobre a
membrana timpânica (tímpano).
Quando uma força (coluna de ar) é aplicada a um vibrador (pregas vocais), é
produzida uma onda sonora com determinada amplitude e período. O período pode
permanecer o mesmo apesar de mudanças de amplitude, ou o período pode mudar e a
amplitude permanecer constante.
A amplitude é um real atributo da vibração, porém é mais tipicamente medida como
intensidade, que é a quantidade de pressão exercida pela onda sonora sobre a membrana
timpânica. A intensidade pode ser medida de várias formas, sendo a mais comum o Nível de
Pressão do Som (SPL, Sound Pressure Level). Medida em decibéis (dB), a intensidade é um
atributo mensurável do estímulo. O número de decibéis corresponde aproximadamente à
percepção do ouvinte como loudness, que é considerado o equivalente perceptual de
intensidade. Medidas em decibéis têm sido padronizadas e o limiar de audibilidade tem sido
14
14
estabelecido em 0 dB. Qualquer SPL acima de 140 dB causa dor e, como referência para o
leitor, a conversação comum se situa em 40 a 60 dB.
Figura 1.6: Amplitude versus tempo relacionada a alta e baixa frequências (AUDIOSOUP, 2004).
No caso da vibração das pregas vocais, loudness também é determinado por forçar
além da amplitude de vibração. Por isso, nos referimos à intensidade vocal, que é a
intensidade da onda sonora produzida na glote. A menos que a intensidade seja medida, é
melhor se referir ao termo loudness quando se fala em sensação de escuta do ouvinte.
Intensidade é atributo de um estímulo e loudness é a sensação percebida; o ouvinte percebe
loudness, não intensidade. Observe que esse conceito é muito importante para se estudarem e
compreenderem os fenômenos da voz cantada. Quando um cantor se refere ao “volume” de
sua voz, está ser referindo ao loudness de sua voz. O loudness produzido por seu sistema de
fonação devidamente treinado para produzir tal amplificação depende de diversos fatores, não
apenas da intensidade. Depende de alterações no trato vocal que alteram os harmônicos
agudos e gera mais estridência (ring, squillo ou giro, e ping, ou ponta/projeção), que serão
abordados mais adiante nesse trabalho.
As ondas sonoras na natureza são compostas de múltiplas ondas senoidais com várias
frequências e amplitudes ocorrendo simultaneamente. Duas ondas senoidais, quando ocorrem
simultaneamente em sua fase de compressão, irão reforçar ou melhorar uma à outra, enquanto
a onda de rarefação vai afetar ou enfraquecer a onda de compressão, quando elas ocorrerem
simultaneamente. A onda complexa típica tem muitas frequências ocorrendo
simultaneamente, com amplitudes determinadas pelo reforço e interferência das ondas sonoras
que ocorrem numa base momento-a-momento. Apesar da sua complexidade, as ondas sonoras
podem ainda repetir a si mesmas em intervalos, da mesma maneira que as ondas senoidais.
15
15
Figura 1.7: Ondas regulares e irregulares (Escola Superior de Tecnologia de Tomar, Portugal
4
).
A repetição regular de ondas sonoras periódicas é percebida, pelo ouvinte, como tom,
enquanto ondas sonoras aleatórias e aperiódicas são percebidas como ruído (Ver Fig. 1.7).
1.1.6 Timbre
São as características de um som descritas em termos de “cor” e “qualidade”. Para
melhor entender como cantores são capazes de manipular as qualidades do som, precisamos
entender as frequências complexas geradas na produção do som, inclusive da voz.
um número de meios simultâneos dentro de uma simples vibração, dependendo
das características do corpo vibrante, a força de impulso, e outros fatores além das
possibilidades deste estudo. Um dado corpo vibrará na sua frequência fundamental
5
e nos
múltiplos integrais da fundamental; isto é, vibra em metade, terças, quartas, quintas e
seguintes múltiplos. Se uma corda vibra em 100 Hz, está vibrando simultaneamente a 200,
300, 400, 500 Hz, e assim por diante. A vibração de 100 Hz é chamada de som fundamental; a
vibração de 200 Hz é conhecida como primeiro harmônico; a de 300 Hz é o segundo
harmônico, e assim por diante.
Outros termos usados por músicos ao discutir harmônicos são overtones (super ou
sobretons) ou parciais. O termo geralmente se refere a como as séries harmônicas ou parciais
podem ser demonstradas com um som produzido por um instrumento (Ver Fig. 1.8). Por
exemplo, quando um piano soa a C2 (65 Hz), o primeiro harmônico será uma oitava acima C3
4
http://portal.estt.ipt.pt/
5
A frequência fundamental na voz é determinada pelo número de vezes que as pregas vocais abrem e fecham
por segundo e origina a altura (nota ou pitch percebida).
16
16
(131 Hz). O segundo harmônico vai ser uma quinta acima G3 (190 Hz), que é
aproximadamente três vezes a frequência da fundamental de 65 Hz.
A série harmônica é também um efeito no caso da fonação, quando as pregas vocais
vibram de várias maneiras simultâneas. Elas têm não somente uma frequência fundamental de
vibração que é percebida como o tom cantado, mas muitos harmônicos estão presentes. A
ação vibratória das pregas vocais é muito complexa e é neste aspecto que surgem os principais
fenômenos ressonantais de extrema importância para o cantor.
Figura 1.8: Série Harmônica em pentagrama (SCHMIDT-JONES, 2009), e relação com os harmônicos de um dó
central como nota fundamental.
O que varia de indivíduo para indivíduo e de uma configuração laríngea para a outra
é a forma de onda complexa que resulta do reforço e interferência de muitas vibrações
simultâneas, que determinam a amplitude de cada harmônico. Por essa razão, dois cantores
não soam idênticos mesmo cantando a mesma frequência fundamental. Os harmônicos ou
parciais que definem a identidade vocal de um cantor estão determinados na fenda glótica
(SUNDBERG, 1987, p. 49). Chama-se espectro ao gráfico que mostra a distribuição da
energia sonora como uma função da amplitude (eixo Y) e frequência (eixo X) (KENT, 1992).
O espectro mostra as variações nas formas de onda, mostrando amplitude de vibração
(intensidade) e frequência (Hz), ou seja, é a receita ou design (desenho, gráfico) de vibração
de cada som. As muitas variações no movimento vibratório presentes em um dado som
produzem complexas formas de onda, as quais podem ser concebidas e grafadas como um
espectro, que será uma figuração instantânea do som em um específico momento no tempo
(Ver Fig. 1.9 e 1.14).
17
17
Um tipo de gráfico desse espectro pode mostrar, por exemplo, a amplitude da
vibração no eixo vertical, ou pode mostrar intensidade. O eixo horizontal mostra a frequência,
contrário ao eixo horizontal da forma de onda, que mostra tempo.
Figura 1.9: Onda complexa com seu espectro (amplitude versus frequência). A forma de onda resultante (onda
quadrada) é a somatória da fundamental e os harmônicos. Também apresentada na forma tridimensional ou em
perspectiva, para comparação (DIGTRX, 2001).
Em um espectro sonoro, todo harmônico pode ser mostrado cada um com sua
amplitude particular, que é determinada pelos muitos caminhos complexos nos quais as ondas
poderão reforçar umas às outras, ou interferir umas com as outras.
Os diferentes espectros resultarão em diferentes qualidades de som percebidas, ou
cores tonais, geralmente referidas como timbre. Quando percebemos diferenças no timbre, na
realidade estamos percebendo diferenças no espectro de diferentes fontes sonoras. Para cada
espectro uma forma de onda correspondente, uma única maneira de representar o mesmo
fenômeno. Quando considerando o número de sons reconhecíveis ao ouvi-los por um breve
segundo ou dois, é incrível notar que todos os sons são variações na compressão e rarefação
que se repetem mais de mil vezes por segundo. Ou seja, como o ouvido humano percebe
frequências (pelo complexo sistema de células ciliadas e outras células auditivas
especializadas), é o espectro acústico que permite o reconhecimento de todos os fenômenos
acústicos, de frequência, timbre e amplitude vocais.
Às vezes, o formato geral do espectro é igualmente tão interessante quanto vendo a
relativa energia de cada harmônico. Se uma linha é desenhada através de todos os topos de
todas as linhas representando harmônicos no espectro, a figura que resulta é referida como
18
18
envelope espectral. Resultam em picos e depressões. Os picos são regiões de frequência nos
quais relativamente grande energia acústica e eles são conhecidos como formantes,
6
detalhados mais adiante neste trabalho (Ver Fig. 1.21).
1.1.7 Duração
Um outro tipo de envelope bem conhecido pelos músicos é chamado de envelope de
forma de onda e é relativo a aspectos de duração do som. Lembrando que o eixo horizontal
(Eixo X) da forma de onda é tempo e o vertical do espectro (Eixo Y) é frequência, a forma de
onda mostra a amplitude no domínio tempo, e o espectro mostra amplitude no domínio
frequência. O formato total de uma forma de onda, o envelope da forma de onda, mostra três
características de duração: (1) ataque o tempo que o som leva para alcançar seu estado
estável, que é o aspecto mais característico de seu espectro; (2) estado estável ou sustentado
o período no qual o espectro permanece relativamente estável; (3) declínio o tempo que o
som leva para se dissipar. O envelope da forma de onda contribui para a distintiva qualidade
de um som (Fig. 1.10).
Por exemplo, um som de xilofone tem um ataque preciso, um estado estável e
imediatamente declina. Inversamente, quando um gongo é batido, o som ergue-se ao máximo
ponto, e então gradualmente cai. O som vocal também tem ataque e declínio conhecido como
onset (começo ou início) e decaimento (término ou finalização), e uma porção sustentada, que
pode ou não ser um estado estável. Este conceito é importante, pois, transportando-o para a
técnica da voz cantada, o cantor compreende o controle do envelope do som vocal
(começo/onset sustentação finalização/ declínio/decaimento). Esse assunto será abordado
em eficiência vocal.
Figura 1.10: Ataque, sustentação (ou liberação, Segundo Miller (1996) [release]) e finalização (decaimento
[decay]). (HyperPhysics).
6
Formantes são picos de energia acústica; em vez do uso do termo “ressonâncias”, em análise acústica utiliza-se
“formantes”, sendo um formante um modo natural de vibração (ressonância) do trato vocal e/ou nasal (Kent &
Read, 1992, p. 18).
19
19
1.1.8 Sons estranhos ou ruídos
O espectro pode mostrar sons aperiódicos, visualizados como clusters (aglomerados)
de frequências que ficam entre os harmônicos, mais comuns na parte mais alta do espectro.
Sons inarmônicos, regularmente repetindo frequências que não são múltiplas da
fundamental, ocorrem nos sons vocais por causa de algumas irregularidades no padrão de
vibração. Todas as irregularidades se tornam uma parte do sinal e são percebidas pelo ouvinte
como ruído. Todos os instrumentos produzem ruído em conjunção com produção de tom,
como, por exemplo, um arco de violino raspando nas cordas ou um martelo batendo nas
cordas de um piano. No caso da voz, os ruídos podem ter as seguintes origens: (1) Inalação
ruidosa ou exalação, especialmente quando as vias aéreas estão entupidas ou a produção é
soprosa; (2) Órgãos articulatórios (língua, maxila, bochechas, lábios, palato mole) usados na
produção normal de consoantes, inclusive glotais; (3) Distúrbios das pregas vocais atribuídos
a inflamação, inchaço, ressecamento ou assimetria (patologias). Determinados ruídos são
inerentes à produção vocal normal; outros, entretanto, podem ser patológicos, ou melhor,
podem caracterizar alterações funcionais que devem ser investigadas por um fonoaudiólogo,
pois podem indicar disfonias associadas a tensão muscular, espessamento ou nódulos de
pregas vocais. Alguns parâmetros vocais acústicos são: medidas de ruído, perfil de extensão
vocal, espectrografia acústica e frequência fundamental e seus índices de perturbação - jitter e
shimmer. De acordo com Behlau (2001), o jitter indica a variabilidade da frequência
fundamental em curto prazo. O jitter se relaciona às frequências graves e às intensidades mais
fracas, sendo medidas expressas em porcentagem com valor limite de normalidade de 0,5%.
O shimmer indica a variabilidade da amplitude da onda sonora em curto prazo, também
expressa em porcentagem com valor limite de normalidade de 3%.
1.2. Processo acústico da fonação
Na expiração, o ar expelido dos pulmões passa pelas pregas vocais, provocando sua
vibração. As pregas passam a ser denominadas de fonte sonora, que direciona pulsos de ar
periodicamente na cavidade oral. Os pulsos gerados na fonte são filtrados pelas cavidades
acústicas do trato vocal, e propagam-se pelo ar. Na irradiação, uma parte do som (baixas
frequências) espalha-se, enquanto outra parte (altas frequências) propaga-se para frente. A
seguir, o leitor encontrará uma explicação mais detalhada sobre o processo da fonação, mas
antes é preciso compreender algumas estruturas do aparelho fonador.
20
20
Figura 1.11: (1) O espectro irradiado em forma de som vocal, produto acústico final do processo de fonação. O
som é produzido na glote e filtrado pelo trato vocal antes de sua emissão. Modelo fonte-filtro adaptado de Vieira
(2004) e Aquino (AQUINO, 2009). (2) Esquema da fonação:
(http://www.kfs.oeaw.ac.at/content/blogsection/26/396/lang,8859-1/)
1.2.1 O trato vocal
Podemos dividir as partes/áreas ou sistemas que participam da produção vocal como:
(1) Sistema Subglótico (inclui traquéia e pulmões), (2) Sistema glótico (laringe, que contém a
glote onde estão as pregas vocais) e (3) Sistema Supraglótico (trato vocal: cavidade oral, nasal
e faríngea). O trato vocal é um dos elementos mais relevantes para a compreensão dos
fenômenos acústicos vocais. Ele é formado pela boca, faringe e laringe (e cavidade nasal
quando os sons são nasais), e é nele que ocorrem os principais mecanismos de amplificação
do som que os cantores precisam conhecer. Toda a anatomia (formato) do trato é determinada
geneticamente e essa conformação herdada possui, segundo Zemlin (2005), quatro ou cinco
ressonâncias proeminentes denominadas tessituras, cujas frequências são determinadas pela
forma e comprimento do trato vocal. De acordo com Miller (2004),
... trato vocal é o sistema ressonador supraglótico que se estende dos lábios internos da laringe
(pregas vocais) até os lábios externos da boca. É um sistema solto e flexível que responde à
demanda articulatória do canto e da fala. Nessa resposta à laringe vibrante, ele (o trato vocal)
influencia o timbre da voz cantada
7
(Miller, 2004).
A energia em forma estável de corrente de ar vem dos pulmões, passa pela traquéia e
prossegue à laringe, estrutura principal da produção de corrente de ar vibrante pelos seus
elementos vibrantes que são as pregas vocais. As pregas abrem e fecham com rapidez,
interrompendo a corrente de ar, o que produz o som glótico ou som vocal no interior do trato
7
The vocal tract is the supraglottal resonator system, extending from the internal laryngeal lips (vocal folds) to
the external lip bastion. It is a flexible, non-fixated system that responds to the articulatory demands of speaking
and singing. In its response to the vibrating larynx, it influences the timbres of the singing voice.
21
21
vocal. As modificações da configuração do trato vocal alteram as propriedades acústicas do
som.
A laringe tem a forma de um tubo, estando ligada à faringe (cavidade larga que vai
da boca até o esôfago). Sua anátomofisiologia será detalhada no segundo capítulo. A faringe
tem como teto o palato mole ou véu palatino, ou ainda velum, parte posterior do céu da boca,
que pode fechar a estreita passagem para a cavidade nasal (faringe oral), ficando delimitado o
trato vocal.
O trato vocal funciona como uma câmara ressonante, tendo uma função semelhante à
de um tubo de clarinete ou de uma caixa de ressonância de um violino. A epiglote funciona
como uma espécie de válvula protetora e fecha a passagem para a laringe durante a
deglutição, ficando então o trato vocal isolado das vias aéreas inferiores. Quando o palato
mole se encontra na sua posição mais baixa, a passagem da faringe oral fica aberta,
estabelecendo a ligação à cavidade nasal. Esta situação só ocorre durante a emissão de
fonemas nasais.
A forma e o comprimento do trato vocal, e ainda seu volume, podem variar. A forma
é determinada pela posição dos articuladores: lábios, maxila, língua (corpo e ponta) e laringe,
enquanto que seu comprimento pode ser aumentado baixando a laringe ou esticando os lábios.
A complexa musculatura existente nessa zona permite modificar rapidamente a forma e as
dimensões do trato vocal, obtendo-se configurações bem determinadas ao pronunciar o
complexo sistema de fonemas que se cantam, incluindo os diversos idiomas que são usados
no canto lírico, nas diversas regiões da voz.
22
22
Figura 1.12: Trato vocal humano de perfil (GRAY’S ANATOMY e NETTER, 2001).
1.2.2 Produção da fonação
Para o canto, os pulmões devem fornecer um fluxo de ar, na expiração, contínuo (em
ritmo estável), com uma pressão (pressão subglótica) que, ao passar pela laringe, encontra
uma resistência na glote (espaço da laringe entre as duas pregas vocais), que é o estímulo para
a produção de um sinal sonoro (som glótico). A resistência ao fluxo de ar pode ocorrer em
diversos pontos ao longo do trato vocal, o que colabora diretamente para um aumento da
intensidade da projeção sonora. A pressão subglótica aumenta e faz com que as pregas vocais
se separem; há uma eclosão de ar de curta duração, que é liberada no trato vocal.
Com as pregas vocais vibrando em uma velocidade de 150 vezes por segundo, a
eclosão do ar é liberada no trato vocal a cada 1/150 segundos. O efeito de cada uma dessas
eclosões transitórias de energia é excitar a coluna de ar supraglótica, relativamente inativa,
que então vibra por um pequeno período.
A amplitude das vibrações diminui depressa, mas a sucessão rápida de eclosões de
energia serve para manter a coluna de ar em vibração. As vibrações diminuem rapidamente
porque a energia de vibração está sendo dissipada. Essas vibrações são conhecidas como
damping (amortecidas ou abafadas).
23
23
(1) (2)
Figura 1.13: (1) O efeito do damping, de amortecimento, abafamento, ou ainda decaimento, por razão da
dissipação de energia da onda ao longo da sua propagação. (2) Gráfico mostrando a diminuição da amplitude do
som em amortecimento ou abafamento pesado ou forte. A amplitude do som será maior em um sistema com
pouco amortecimento. (www.antonine-education.co.uk)
O resultado da vibração das pregas vocais é a geração de uma rápida série de
vibrações abafadas no trato vocal supraglótico, ou seja, a vibração injeta pulsos de ar
periodicamente na cavidade oral. Nas vogais orais, o trato nasal está acusticamente
desacoplado devido à elevação do véu palatino e a conformação do trato vocal é determinada
pela língua, lábios, mandíbula e posição vertical da laringe. As cavidades orais interagem
sobre o som da vibração das pregas vocais, modificando-o de uma maneira específica para
cada vogal. Por fim, o som resultante, filtrado pelo trato vocal, propaga-se dos lábios para o
ambiente externo (VIEIRA, 2004).
Figura 1.14: Esquema acústico - as funções do sistema vocal do fornecedor de energia, oscilador e ressonador. O
fluxo aéreo é interrompido periodicamente pela vibração das pregas vocais. O som resultante (a fonte vocal) é
representado em um espectro contendo um grande número de harmônicos parciais, cuja amplitude diminui com a
frequência (SUNDBERG, 1977).
24
24
Quando o valor da pressão subglótica e a velocidade de volume (fluxo aéreo) através
da glote são desconhecidos, a energia subglótica pode ser medida e comparada com a energia
acústica da voz a certa distância dos lábios. A eficiência da conversão da energia subglótica
em energia acústica costuma ser extremamente baixa e, se essa conversão fosse eficiente, no
entanto, ficaríamos surdos com o som da nossa própria voz. De modo geral, essas
modificações podem ser responsabilizadas pelo princípio de ressonância e sua antítese: o
abafamento (ZEMLIN, 2005).
1.2.3 Ressonância como fenômeno
Ambos os distúrbios de pressão do ar periódico ou aperiódico produzem
características de frequência, intensidade e duração que resultam em um espectro sonoro, o
efeito cumulativo que é percebido como timbre ou qualidade do som. Simplificando, quanto
mais harmônicos gerados por um instrumento ou uma voz, mais rico e brilhante o som,
também quanto mais força é investida nos harmônicos, mais cheio será o som.
Assim, um som vocal com beleza é o resultado combinado da vibração das pregas
vocais e o modo que o som glótico é formado quando viaja através do trato vocal. Grande
parte do segredo da amplificação vocal se encontra nesses fenômenos, mas ainda é necessário
compreender como executar as alterações do trato vocal e sua relação com o corpo como um
todo.
1.2.4 Frequências de ressonância naturais
Segundo Henrique (2002), todo sistema tem sua frequência própria, também
chamada de frequência de ressonância. Quase toda matéria, em condições apropriadas e
quando energizada por uma força externa, vibra em sua frequência natural própria. Um objeto
balançando tende a manter o movimento pendular sucessivo. Sua extensão pode variar com o
esforço, mas não sua velocidade. Um ressonador pode ser considerado qualquer objeto através
do qual uma onde sonora pode ser filtrada e, portanto, melhorada, modificando o produto
sonoro final. A forma do ressonador é fundamental para determinar sua frequência, e no caso
das pregas vocais, esta é uma função direta da tensão e uma função inversa da massa das
pregas.
Ressoadores ou ressonadores são objetos ocos ou cavidades cheias de ar que têm sua
própria frequência de vibração. Por exemplo, um jarro com uma frequência natural de 600 Hz
irá vibrar a 600 Hz quando um diapasão afinado em 440 Hz tocá-lo, mas o mesmo jarro
25
25
tocado por um diapasão afinado em 600 Hz irá vibrar com muito mais amplitude. Esse
fenômeno ilustra o princípio de ressonância: um objeto irá vibrar por um tempo mais longo e
com maior amplitude quando ele está operando com uma vibração na sua própria frequência
natural. Resumindo, quando a frequência de excitação é próxima à frequência da frequência
natural do sistema, observa-se um fenômeno de ressonância” (HENRIQUE, 2002, p. 85).
O tamanho da cavidade de ar é importante na determinação da frequência natural da
vibração. Quanto maior a cavidade de ar, mais baixa a frequência e mais baixa a altura
resultante quando o ressonador vibra. Quanto menor a cavidade de ar, maior a frequência e a
altura. Entende-se o fenômeno da ressonância com o exemplo das garrafas cheias de água
para produzir diferentes alturas de notas. Deste modo, quando o trato vocal adquire uma
forma ampla, o som se torna grave. Quando o mesmo trato vocal toma a forma de uma
estrutura estreita e curta, o som se torna agudo. Estes dados são extremamente relevantes para
o cantor lírico. Geralmente, por falta de conhecimento, o cantor lírico não percebe que seu
sistema está mais amplo do que deve e gera, assim, um som muito escurecido, distorcendo seu
timbre natural, que deve seguir o padrão chiaroscuro da técnica italiana do bel canto.
Como qualquer cavidade ressonante, o trato vocal possui sua própria frequência
natural de vibração, também conhecida como sua própria frequência de ressonância. Se as
pregas vocais vibram na frequência de ressonância do trato vocal, o som será
melhorado/realçado, certamente um objetivo desejável. Naturalmente, o canto expressivo
envolve mais que somente encontrar a melhor frequência de alguém e cantar repetidamente
nela. Além do mais, o som produzido na glote não é uma frequência, mas são muitas os
harmônicos originais daquele determinado cantor. Assim, uma discussão sobre ressonância
em canto é mais complexa que simplesmente achar a frequência de ressonância do trato vocal,
e conduzi-la com a mesma frequência das pregas vocais. Diversos outros elementos estão
envolvidos na produção vocal do cantor lírico, como, por exemplo, a amplificação em torno
de 100 Db, a emissão de fonemas de diversos idiomas e a manutenção de um timbre estável
por toda a sua extensão vocal.
26
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1.3. Teoria fonte-filtro da fonação
A atual explicação do som vocal tem como modelo a Teoria da Fonte-Filtro descrita
inicialmente por Gunnar Fant,
8
em 1960, segundo a qual a fonte sonora é o som produzido
pela vibração das pregas vocais. A equação seguinte traduz essa teoria, expressão simbólica
das funções da fonação (ZEMLIN, 2005, p. 313):
[P(f)=|U(f)| . |H(f)| . |R(f)|]
O espectro da pressão sonora P(f) a certa distância dos lábios é o produto do espectro
de velocidade de volume gerado pela fonte, ou a amplitude versus a frequência característica
da fonte U(f), a função frequência-ganho seletivo da transmissão vocal H(f), e as
características de propagação dos lábios R(f), onde a velocidade de volume através dos lábios
é convertida em pressão sonora. As barras verticais indicam preocupação apenas com a
magnitude dessas funções e a notação (f) significa função de frequência. A base da teoria
fonte-filtro, descrita por Fant (1970), é, portanto, a onda de fonação como resposta do trato
vocal a uma ou mais fontes sonoras. Com base nessa teoria, podemos inferir a importância do
tônus labial na determinação de uma maior pressão sonora, que vem a ser, na prática, um dos
elementos determinadores da amplificação vocal. Isto é, tecnicamente, um diferencial nos
ajustes do trato vocal para uma voz ressonante, que serão abordados posteriormente.
8
Carl Gunnar Michael Fant foi professor emérito do Royal Institute of Technology (KTH), de Estocolmo.
Cientista mundialmente reconhecido, muito contribuiu para o estudo da voz e pesquisas de síntese da fala.
27
27
Figura 1.15: Modelo Fonte-Filtro no trato vocal. Estrutura anatômica do trato vocal. A elevação do pórtico
velofaríngeo (P) desacopla as cavidades nasais. Note a proximidade da entrada do esôfago (E) com a região das
pregas vocais, situadas acima da traquéia (T). Os pulsos gerados na fonação são filtrados pelas cavidades
acústicas do trato vocal, e propagam-se pelo ar. Na irradiação, como sugere o desenho, parte do som (baixas
frequências) espalha-se enquanto outra parte (altas frequências) propaga-se para frente. Abaixo (adaptado de
Fant, 1970): modularização introduzida pelo modelo Fonte-Filtro (em alguns espectros há divisões em intervalos
de 6 dB, no eixo vertical, e em oitavas, no horizontal). A fonte é representada por uma série harmônica, o filtro
por formantes (F1, F2, etc.), e a irradiação pela sua característica passa-altas.
9
Comparando-se o oscilograma do
fluxo com o da pressão sonora, são vistas, de forma desordenada, as ondulações introduzidas pelos formantes,
mas, no espectro da pressão irradiada, distinguem-se cada um dos formantes (VIEIRA, 2004, p. 71).
1.3.1 Característica da fonte sonora
É chamado de fonte da voz o fluxo de ar pulsante que fica na glote (transglótico).
Um som semelhante a um zumbido de buzina, na fonte, é gerado pela série de pulsos de fluxo,
produzidos assim que as pregas vocais vibrantes entrecortam a coluna de ar proveniente dos
pulmões.
9
Passa-altas: filtro que permite que as frequências altas passem com facilidade e que filtra as frequências baixas.
28
28
Figura 1.16: A imagem mostra os pulsos do ar provindos dos pulmões, atravessando as pregas vocais e sendo
expelidos de maneira periódica. Os pulsos são então transformados pelas ações da ressonância do formato do
trato vocal. Os formantes vocais são modificados pela ação dos articuladores (HyperPhysics).
A vibração das pregas vocais se inicia quando equilíbrio apropriado entre a pressão
subglótica e a tensão muscular nas pregas vocais. A pressão sonora cresce quando a
aproximação das pregas vocais (adução) é intensificada e a pressão aérea subglótica é
aumentada; consequentemente, o aumento da pressão sonora está diretamente ligado ao
aumento da projeção vocal (BJÖRKNER, 2006, pp. 9-10).
A teoria mioelástica aerodinâmica, segundo Van den Berg, formulada em 1958,
explica a fonação como o resultado de três maiores fatores: (1) as forças aerodinâmicas que
atuam na laringe; (2) a ativação por estimulação nervosa da musculatura da laringe; (3) o
acoplamento acústico entre a laringe e as cavidades sub e supraglóticas, assim como o
acoplamento mecânico entre as pregas. São esses parâmetros os principais elementos a serem
treinados e fortalecidos para a obtenção de uma voz “forte”, rica em harmônicos, com alta
pressão sonora, esperada para o canto lírico.
O ciclo vibratório é formado por quatro etapas (BEHLAU, 2001), a saber: (1)
fechada, (2) de abertura, (3) aberta e (4) de fechamento. O ciclo é iniciado quando, por ação
muscular, as pregas vocais aduzidas (aproximadas) são forçadas a se separarem pela pressão
subglótica. Durante a fase de fechamento, no entanto, as bordas inferiores conduzem as
superiores (ZEMLIN, 2005, p. 169), resultando em cinco fases, pois o intervalo entre as duas
últimas fases é denominado de diferença de fase vertical, sendo que a parte inferior da prega
abre antes da parte superior, como demonstrado na Figura 1.17. Isto inicia um movimento
semelhante a ondas no tecido viajando da porção inferior do revestimento da prega vocal para
a superior, ao longo da borda da prega vocal. O movimento parecido com ondas é referido
como onda mucosa.
29
29
Figura 1.17: Ciclo de vibração glótica: esquema da diferença da fase vertical durante um ciclo de vibração das
pregas vocais. Pode-se observar, em sequência: as bordas mediais evertidas durante a fase de abertura (1), as
faces interior e superior da prega vocal (2) e (3), e as pregas vocais no final da fase de fechamento (4) e (5)
(ZEMLIN, 2005, p.171).
Figura 1.18: As fases do ciclo glótico e expansão da abertura glótica (de trás para frente e de baixo para cima),
do fechamento da glote (de frente para trás e de baixo para cima), e a diferença vertical de fase (BEHLAU, 2001,
p. 26).
O modo de fonação tem sido correlacionado com a duração relativa da fase de
fechamento glótico (ver Fig. 1.18). A duração da fase fechada diminui progressivamente em
registros mais leves. No registro “vocal fry”, uma fase fechada prolongada, e, no falsete, a
fase fechada é pequena ou mesmo ausente (PHILIPPI, s/d, p.19). Os registros serão discutidos
posteriormente.
Quando as pregas abrem, o fluxo de ar acelera através da constrição glótica,
causando uma queda local na pressão do ar dentro da glote, e as pregas vocais são sugadas
imediatamente através do efeito de Bernoulli descrito por Behlau: “O aumento da velocidade
das partículas de ar, quando passam pela laringe, reduz a pressão entre as pregas vocais,
30
30
desencadeando o efeito de sucção, que aproxima as pregas vocais entre si, seguidas por um
retrocesso elástico” (Behlau, 2008, Vol.1, p.35).
A combinação do Efeito de Bernoulli e da elasticidade nas pregas vocais fecha a
glote, onde após um novo ciclo glótico inicia. Flanagan, em 1958, computou propriedades do
som glótico usando gráficos de área glótica como função do tempo da vibração das pregas
vocais, que podem ser extraídos dos filmes de alta velocidade da região interna da laringe
durante a fonação. Esse cientista calculou, utilizando dados normativos para a pressão
subglótica e funções da área glótica, a resistência glótica, dado essencial para obtenção da
indicação do fluxo de ar através da glote: a velocidade de volume ou [U(f)] da equação. Por
causa dos aparelhos que começaram a ser desenvolvidos na década de 1960 e o
aperfeiçoamento posterior dos exames videolaringoscópicos e glotográficos, as pesquisas se
tornaram mais precisas e fidedignas.
1.3.2 Função de transferência do trato vocal
Segundo Sundberg (1987), função de transferência é a habilidade do trato vocal de
transportar o som da glote para a abertura labial e é dependente da frequência do som emitido.
Essa habilidade, segundo o autor, culmina nas frequências formantes. Dos três fatores na
equação fonte-filtro, as propriedades acústicas do trato vocal são as mais diretamente
relacionadas com as diferenças verificadas entre os sons da voz. Isso é a função frequência-
ganho seletiva da transmissão do trato vocal, ou [H(f)] da equação, também conhecida como
função de transferência do trato vocal. A frequência-ganho seletiva é exemplificada através da
análise da Figura 1.21, onde cada harmônico é representado por linhas verticais (cada um em
sua frequência), de comprimentos diferentes (amplitudes variadas). Do conjunto quase que
infinitamente variável destes parciais resulta o som único de cada indivíduo, sua impressão
digital vocal (ZEMLIN, 2005, p. 314).
1.3.3 .O trato vocal como um tubo uniforme
A configuração do trato vocal (região da glote até os lábios) é semelhante a um tubo
quase uniforme. A área transversal é bastante uniforme em todo o comprimento do trato
vocal, mede em média 17,5 cm em homens, 14,7 cm em mulheres, e 8,75 cm em crianças.
Segundo Zemlin (2000), o fato de esse tubo apresentar uma curva de 90 graus não
acarreta nenhuma consequência do ponto de vista acústico, significando que é representado o
trato vocal como um tubo uniforme e fechado em uma extremidade. Essa extremidade
31
31
fechada é a resistência da glote comparada à pouca resistência na abertura da boca (lábios). O
aumento do fechamento glótico associado à da resistência dos lábios aumenta a pressão
sonora e amplifica a voz, tanto falada quanto cantada.
O tubo fechado em uma extremidade ressoa ou absorve energia melhor em uma
frequência com comprimento de onda (λ) quatro vezes o comprimento do tubo. Para um tubo
com 17,5 cm de comprimento, fechado em uma extremidade, o comprimento de onda da
primeira frequência ressonante é de 70 cm. Tomando-se a velocidade do som como 340
metros por segundo (em temperatura ambiente), a primeira frequência ressonante (F1) do trato
vocal será de 485,7 Hz (arredondados para 500 Hz, para facilitar). Os tubos fechados em uma
extremidade e abertos na outra ressoam em frequências múltiplas de números ímpares da
frequência ressonante mais baixa (no caso da voz, o som fundamental da fonte glótica). A
segunda ressonância (F2) terá frequência de 500 x 3, ou 1500 Hz, e a terceira ressonância (F3)
terá frequência de 500 x 5, ou 2500Hz. Só as três primeiras frequências de ressonância
precisam ser especificadas para cada vogal, ainda que o trato tenha, na verdade, quatro de
cinco dessas ressonâncias. Essas frequências de ressonância são os formantes, que
correspondem a ondas constantes de oscilações da pressão aérea no trato vocal, como
veremos a seguir.
Figura 1.19: O trato vocal como um tubo uniforme: área transversal de 17,5cm e fechada em uma extremidade.
Sua primeira frequência ressonante tem comprimento de onda quatro vezes superior ao comprimento do tubo, e
as próximas frequências são múltiplos ímpares da primeira (ZEMLIN, 2005, p. 315; KNOBEL, sd).
32
32
(1) (2)
Figura 1.20: (1) Diferenças entre harmônicos da série harmônica de acordo com o comprimento de onda e com a
frequência. O segundo harmônico tem metade do comprimento de onda e duas vezes a frequência do primeiro. O
terceiro harmônico tem um terço do comprimento de onda e três vezes a frequência do primeiro. O quarto
harmônico tem um quarto do comprimento de onda e quatro vezes a frequência do primeiro, e assim segue a
proporção. O quarto harmônico é duas vezes a frequência do segundo e o sexto harmônico é duas vezes a
frequência do terceiro harmônico, e esta relação também segue nessa proporção (SCHMIDT-JONES, 2009, p.5).
(2) As informações anteriores aplicadas a um tubo fechado simulando acusticamente o trato vocal. Modelo
ressonador do tubo fechado (SUNDBERG, 1977, HyperPhysics).
1.3.4 Frequências formantes
É chamada de formantes ou região formântica uma região saliente de frequência
(altura) onde o envelope espectral tem um pico de amplitude invariável, independendo da
fundamental do espectro. É uma ampla região de ressonância que realça os harmônicos que se
encontram numa faixa fixa de frequências (MENEZES, 2003, p. 210).
Figura 1.21: O espectro laríngeo alterado pelas cavidades de ressonância criando formantes (APPELMAN, 1967,
p. 126).
A produção dos formantes, observados em espectros de muitos instrumentos e da voz
humana, é resultado de todo o sistema vibratório, todo o corpo, no qual uma fonte de
excitação ressoa por simpatia através de uma caixa de ressonância ou, segundo Helmholtz, um
ressonador. Todo ressonador (tubo, caixa, cavidade), de acordo com suas propriedades físicas
33
33
(tamanho, formato, material), privilegia a ressonância de determinadas regiões de frequências,
produzindo picos de espectros resultantes.
O brilho da voz se refere à presença de um ou mais desses picos, ou seja, de um ou
mais formantes ou regiões formânticas vocais. O principal formante determinante da
estridência vocal é o terceiro (F3). Os primeiros formantes são importantes para a
determinação da vogal (F1 e F2).
Figura 1.22: Diferença do som vocal com e sem formante extra (SUNDBERG, The acoustic of singing voice
apud HyperPhysics).
Se um som tônico (som composto, de altura definida) com envelope relativamente
fixo torna-se em geral mais brilhante ao se aproximar de frequências mais agudas na medida
em que seus harmônicos mais proeminentes também estarão mais agudos, um instrumento
que dependa essencialmente de seu formante permanecerá brilhante independentemente de
sua fundamental variar ou não no registro das alturas, desde que esta permaneça abaixo do
formante, ou seja, numa região mais grave do que a da região formântica (MENEZES, 2003,
p. 211).
Mas, se no contexto instrumental pode-se discutir em que medida os formantes
desempenham um papel assim tão crucial na caracterização dos timbres, em uma área da
atuação musical e sonora a importância do formante é absolutamente indiscutível: na
inteligibilidade das vogais cantadas ou faladas. A clareza e inteligibilidade das vogais
dependem essencialmente da estrutura formântica de seus espectros.
A noção dos formantes, segundo Menezes, partiu de uma análise acústica das vogais,
primeiramente enunciada por Wheatstone em 1837, posteriormente abordada por Hemholtz,
que definiu as vogais como sons produzidos pelas pregas vocais com uma câmara de
34
34
ressonância, a boca; esta seria o órgão fonador e ressonador que alteraria as vogais em
duração, extensão, altura e realçaria os diferentes parciais (MENEZES, 2003, p. 211).
Historicamente, segue Menezes, Helmholtz descreveu o potencial de ressonância da cavidade
oral e citou Donders como o primeiro a descrever a conformidade oral gerando ressonâncias
das vogais. Através do cochicho, Donders o desvelou como uma filtragem das ressonâncias da
fundamental e sua série harmônica, onde somente os formantes permanecem audíveis. Ainda
segundo Menezes, Hermann criou o termo formantes; esta palavra era originalmente
masculina e feminina, mas agora é usada como masculina. É preciso reforçar que os
formantes são responsáveis (principalmente as duas primeiras regiões ou dois primeiros
formantes) pelas propriedades acústicas das vogais, permitindo sua distinção ou
diferenciação. Isso é de suma importância para o canto lírico que necessita de alta projeção
(estridência proveniente F3, também conhecido como o Formante do Cantor) e clareza e
inteligibilidade do texto cantado (F1 e F2).
Figura 1.23: Formante do cantor: espectros médios de longo prazo. Sem o recurso do formante do cantor (região
escura), os sons da fala são mascarados pela orquestra. Com o abaixamento da laringe e o alargamento da região
supraglótica, o formante do cantor é criado próximo a 3.000 Hz. Adaptado de Sundberg (1979) por Vieira
(VIEIRA, 2004, p. 75).
Quanto mais próxima for a frequência de determinada parcial no espectro da fonte da
frequência formante, maior será sua amplitude nos lábios. Se a frequência de uma parcial na
fonte for a mesma que a da frequência formante, a amplitude propagada nos lábios será
máxima. Isso é determinante para a amplificação da voz cantada no canto lírico.
Por exemplo, se um som glótico tiver frequência fundamental de 100 Hz, os
harmônicos no espectro glótico serão múltiplos de 100: o quinto harmônico terá frequência de
500 Hz, e assim por diante. Os harmônicos nesse som glótico coincidirão exatamente com as
frequências formantes do modelo de trato vocal.
35
35
Na frequência fundamental de 120 Hz, o quinto harmônico terá uma frequência de
600 Hz, o décimo terceiro terá uma frequência de 1560 Hz, e o vigésimo primeiro harmônico
terá uma frequência de 2520 Hz. Essas frequências estão próximas o suficiente das
frequências formantes do trato vocal, de modo que também serão reforçadas, mas não tanto
quanto as frequências que coincidem exatamente.
1.3.5 Efeito das configurações do trato vocal
Como vimos anteriormente, as ressonâncias ou frequências formantes são
determinadas pela forma e comprimento do trato vocal. Quando o trato vocal é aumentado em
comprimento, todas as frequências formantes diminuem, e quando é encurtado, elas
aumentam. Os mais altos formantes se encontram nas crianças e mais baixos em adultos
masculinos, sendo das mulheres os intermediários.
O trato vocal, apesar de constituir um tubo razoavelmente uniforme, por outro lado, é
um tubo complexo, formado primariamente pelas cavidades faríngea e oral, e, às vezes, pelas
nasais. Tal complexidade se refere à administração voluntária dessas regiões por parte do
cantor. O trato vocal tanto é capaz de reforçar ou ressoar certos parciais no espectro glótico
quanto, por alterações na área transversal do trato vocal, também pode desviar as frequências
formantes individuais.
A abertura da mandíbula, por exemplo, resulta em constrição do trato vocal próximo
à glote e em expansão do trato na abertura da boca. Isso influencia a localização do primeiro e
mais baixo formante (F1) e tende a elevar quando a mandíbula é aberta. O segundo formante
(F2) é especialmente influenciado pela forma do corpo da língua, ao passo que o terceiro
formante (F3) é influenciado pela posição do ápice da língua. Na prática, uma abertura de
mandíbula, ao contrário do que se pensa, não ajuda a abrir a cavidade faríngea. A ação que
colabora para a expansão faríngea é a expansão posterior na musculatura da faringe. A
constrição e a expansão desse espaço interferem diretamente no F1. O desenho que a língua
toma vai influenciar diretamente F2, na cavidade oral, e F3, na altura do dorso da língua, que
fica mais alto dentro da cavidade oral central e que se relaciona diretamente com o palato
(APPELMAN, 1987, p. 126-140).
As modificações do trato necessárias para produzir os sons da fala em nosso
repertório são razoavelmente bem documentadas. tempos os foneticistas aprenderam que
as posições bastante específicas da língua estão associadas à produção de certos sons
36
36
vocálicos. Appelman (1987) fez um estudo detalhado incluindo fotos radiográficas do trato
vocal para cada fonema vocálico e consonantal. Behlau e Russo
10
(1993) realizaram um
estudo semelhante para o português brasileiro (sem fotos) com toda a documentação numérica
dos fonemas vocálicos e consonantais do nosso idioma. Esse tipo de trabalho é fundamental
para o estudo e discussão sobre que fonema é mais adequado para cada região, como as
passagens se comportam e tendem a esclarecer os tais “achismos” a que nos referimos na
introdução desse trabalho. Sem comprovações científicas mensuráveis não haverá um
consenso entre cantores e professores de canto.
Como a língua é altamente variável e faz contato com numerosas estruturas da boca,
é muito difícil elaborar descrições adequadas de suas posições. Na prática, a configuração da
língua é descrita, especificando-se sua posição em linhas gerais durante a produção das
vogais, juntamente com o grau de arredondamento dos lábios. Os trabalhos científicos, como
o de Ralph Appelman, apontam para zonas prováveis desses fonemas de acordo com a
variação da língua. A posição da língua também é usada para representar o triângulo das
vogais para o estudo de sua posição. Todos os estudos sobre fonética abordam o triângulo das
vogais.
1.3.6 Resistência à propagação
Para se completar a equação da teoria da fonte-filtro é preciso considerar as
características de propagação nos lábios [R(f)], onde a velocidade de volume através dos
lábios é convertida em um padrão de pressão sonora. O deslocamento de moléculas de ar é
maior para os sons de intensidade superior do que para os de baixa intensidade, o que
significa que o deslocamento de moléculas de ar é maior para os sons de baixa frequência no
espectro glótico do que para os de alta frequência. Quando o som proveniente da pressão
aérea se propaga até os lábios, o movimento de baixa frequência (deslocamento lento de
moléculas de ar) encontra maior resistência do ar que a onda de pressão de alta frequência
(deslocamento rápido de moléculas de ar). A resistência à propagação favorece as altas
frequências em detrimento das baixas frequências em velocidade de aproximadamente 6
decibéis (ou decibels, segundo o dicionário Aurélio) por oitava. Esse fenômeno de resistência
à propagação é um dos fatores mais determinantes da amplificação vocal. O tônus de todo o
trato vocal (teto, assoalho, bochecha e parede faringe), cuja abertura se encontra nos lábios,
10
Russo, ICP & Behlau, M. Percepção de fala: análise acústica do português brasileiro. São Paulo: Lovise,
1993.
37
37
associado à energia de resistência da coaptação das pregas vocais (fonte glótica), vai
efetivamente aumentar a intensidade da voz cantada. Soma-se a isso a pressão abdominal do
apoio respiratório.
Richard Miller escreveu um capítulo que intitulou: “A voz ressonante, considerações
supraglóticas no canto” (MILLER, 1996, pp. 48-68), no qual afirma que os sistemas
articulatório e ressonantal do trato vocal estão interligados, sendo que a articulação controla a
ressonância. Observe o leitor como a busca de uma ressonância rica, plena e equilibrada leva
o cantor a um cuidado integrado de todos os elementos da técnica vocal, do alinhamento
postural à articulação dos fonemas dos vários idiomas que são usados para o canto artístico.
Os articuladores, que ficam na parte próxima à saída, oferecem resistência à coluna de ar, o
que vem a corroborar com o que foi dito anteriormente sobre a resistência à propagação como
fator determinante na amplificação da voz cantada.
O formato e o tamanho do trato vocal determinam a natureza e as propriedades desse
filtro, que é excitado pela fonte. Os articuladores movimentam-se alterando a configuração do
trato vocal (tamanho e forma do tubo vocal e das cavidades). O trato vocal, sendo um tubo
ressonador, consiste em um complexo faringe-boca-nariz. A faringe inclui a laringo-faringe,
oro-faringe e naso-faringe. A cavidade oral estende-se do lábio ao véu-palatino (atualmente
tem-se evitado o termo palato mole, pois é uma estrutura mais complexa, que inclui os pilares
da garganta). A cavidade nasal funciona como ressonador nos fonemas nasais. A voz no
canto lírico é o resultado bem adaptado da combinação de formas das cavidades de
ressonância, que permite o controle do timbre vocal para a criação das diversas nuances
necessárias ao colorido expressivo do canto artístico.
No Capítulo 2, o leitor encontrará as bases fisiológicas com enfoque na ressonância,
que servem de ferramentas fundamentais para a compreensão da técnica vocal de maneira
integrada, embasada e científica. Entretanto, é fundamental levar em consideração o que
Richard Miller diz sobre a técnica:
A técnica pode ser “computadorizada” no cérebro e no corpo do cantor. Nenhum cantor deveria
estar em dúvida com o que irá acontecer, tecnicamente, na performance pública, a não ser que
alguma doença interfira. Conhecer como o instrumento da voz funciona e saber como fazê-lo
trabalhar de maneira consistente é a essência do conhecimento técnico. É por isso que uma
abordagem sistemática da técnica vocal é a melhor rota de sucesso para o canto artístico. Sistema e
arte se reúnem para produzir os sons profissionais da voz cantada (MILLER, 1996, p.xvi).
11
11
Technique can be “computerized” in the brain and the body of the singer. No singer ever should be in doubt as
to what is going to happen, technically, in public performance, unless illness interferes. Knowing how the
38
38
CAPÍTULO 2 ACÚSTICA APLICADA À FISIOLOGIA DA VOZ
Cornelius Reid, pedagogo vocal, escreveu um livro sobre técnica do Bel Canto
12
(Reid, 1972), no qual relata que, em sua época e até hoje, vários anos após o surgimento da
ópera e do canto virtuoso, a necessidade de se voltarem aos princípios da técnica vocal
responsáveis pela grandeza da chamada “era de ouro das grandes vozes”. Nos séculos XIX,
XVIII e XVII, a arte vocal do Bel Canto teve um significado real relativo ao estilo e ao
resultado sonoro e técnico que nele se originaram.
Reid também afirma que a grande diversidade de métodos de canto considerados
modernos marcou também uma grande tendência de se dar uma prioridade ao papel do
método em si, em detrimento do resultado do método, prática que inevitavelmente levou ao
canto de má qualidade. E prescreve:
É importante que professores de canto se voltem mais uma vez para as fontes oficiais em busca
de orientação e esclarecimento. Com o fracasso dos modernos métodos de treinamento vocal
que se tem visto nas salas de concerto, ano após ano, o tempo agora urge no resgate daqueles
princípios do Bel Canto, praticados com sucesso absoluto tantos anos atrás (REID, 1972, pp. 1-
2)
13
.
Reid argumenta que é possível ao estudante de canto obter algum progresso com
uma técnica durável e eficiente se ele dominar os princípios básicos de canto. E afirma que a
busca de orientação segura é complicada, face à diversidade de métodos, contraditórios ao
extremo, provocando pensamentos equivocados que se transformam em conclusões ilusórias.
Outro perigo contra o qual o autor adverte é o da deterioração vocal, ou seja, uma
aprendizagem errada levaria a uma prática nociva à saúde vocal, exemplificada por abusos
vocais e danos por vezes irreversíveis ao aparato do cantor. Hoje em dia, profissionais da área
da otorrinolaringologia e da fonoaudiologia têm pesquisado e tratado essas distorções.
singing instrument works, and knowing how to get it to work consistently, is the sum of technical knowledge.
That is why a systematic approach to vocal technique is the most successful route to artistic singing. System
and art conjoin to produce the professional sounds of the singing voice. In the end, traditional vocalism is
based on efficient vocal production. Artistry cannot be realized without the technical means for its
presentation. Systematic vocal technique and artistic expression are inseparable: they comprise the structure of
singing. .
12
Bel Canto: (beautiful singing, belo canto) estilo que une o som bonito e habilidades técnicas, frequentemente
usado para descrever a literatura para canto solo; estilo cultivado de práticas de canto na primeira metade do
século XIX, assim como o repertório de Bellini, Donizetti e Rossini (MILLER, 2008, p. 186).
13
It is important that teachers of singing once again turn to authoritative sources for guidance and enlightment.
With the failure of modern methods of voice training being demonstrated in the city auditoriums year after year,
the time is now ripe for the restoration of those principles of Bel Canto practiced with such unqualified success
so long ago.
39
39
Os fonoaudiólogos prescrevem cuidados de higiene vocal a fim de manter o sistema
fonatório permanentemente saudável, atuando com prioridade na prevenção e evitando as
indicações de cirurgias otorrinolaringológicas desnecessárias. Mas os cantores e professores
de canto não podem jamais negligenciar seus cuidados vocais. Quanto à saúde vocal e à
prática do canto responsável, Reid diz ser essa deterioração devida ao uso falho da técnica de
canto:
A razão para a deterioração vocal dos dias atuais é causada pelo ensino precário. Em muitos
exemplos, princípios básicos da produção do som têm sido descartados e substituídos por
conceitos mal definidos quase totalmente sem bases factuais, tais como “colocação vocal”,
ressonância nasal, controle respiratório, e cantar na respiração (REID, 1972, p. 2).
14
Reid (1972) recomenda que esses problemas técnicos sejam aliviados através da
aplicação dos princípios seguros, que chama de primeiros princípios da produção do som, a
saber: pureza da qualidade vogal dentro de um apropriado equilíbrio de registro, o que vem a
ser a essência do Bel Canto. Richard Miller explica, ao ser questionado sobre devermos ou
não colocar uma normatização do ensino do canto nas mãos dos professores do Bel Canto:
Não podemos, porque não um sistema específico codificado do bel canto esperando pelo
neófito vocal pegá-lo e assimilá-lo. E, apesar de haver professores com ligações com a escola
antiga italiana de canto, nenhum professor moderno pode honestamente professar ensinar
algum método claramente delineado universalmente reconhecido como sendo ‘o método bel
canto’. (...) Uma leitura cuidadosa da literatura pedagógica do período histórico do bel canto
deve chegar à mesma conclusão (MILLER, 1996, p. xxi).
Além de não possuirmos uma escola brasileira de canto, pois as que existem são
baseadas no bel canto, observamos que a dificuldade em fundamentação teórica existe em
todo o globo:
Apesar do treinamento diário que aquela extensiva literatura possa auxiliar a reunião gradual
de uma boa técnica vocal, não é oferecida ao professor nenhuma informação sobre como
aqueles vocalizes se referem aos problemas comuns da voz cantada que frequentemente têm
base em causas físicas (MILLER, 1996, p. xx).
Segundo Miller (1986), as diversas investigações sobre canto atuais englobam o
estudo dos sistemas respiratório, fonatório e ressonantal da voz cantada e apontam quatro
funções mecânicas que integram a respiração à fonação: (1) um sistema que fornece energia
respiratória o sistema inspiratório-expiratório, que se encontra na cabeça e no tórax; (2) um
sistema vibratório – o mecanismo laríngeo; (3) um sistema de ressonância, formado por
cavidades que mudam seus formatos conforme o som produzido na laringe; e (4) um sistema
14
The reason for present-day vocal deterioration will be shown to be faulty teaching. In most instances basic
principles of tone production have been discarded, and supplanted by ill-defined concepts almost wholly without
factual basis, such as “voice placement”, “nasal resonance”, “breath control”, and “singing on the breath”.
40
40
articulatório, ativado pela língua, dentes, mandíbula e palato, que coordena e modifica as
atividades oriundas do complexo respiratório-fonatório. São sistemas que, apesar de
independentes, apresentam um funcionamento integrado e único para a produção da voz
cantada. Por essa razão a terminologia atual tem abolido o conceito de aparelho fonador e
adotado a expressão sistema fonatório.
Quadro 2.1 Relação dos órgãos do sistema fonatório e suas funções
Órgão
pulmões
pregas vocais
trato vocal
Função
fonte de energia
oscilador/vibrador
ressonador
ajustável
2.1 Postura e alinhamento
Um item importante e esquecido por parte dos cantores é o alinhamento postural.
Apesar de não interferir diretamente sobre a produção vocal, o não alinhamento postural
oferece um fator de diminuição da qualidade vocal. O controle respiratório feito pelos
músculos abdominais e torácicos depende diretamente da musculatura postural. O
alinhamento postural, segundo Oren Brown (1996), é a base de toda a estrutura corporal do
indivíduo, e deve consistir de: (1) uma base plantar ampla; (2) a não tensão das regiões de
calcanhar e joelhos; (3) basculamento da bacia a partir da ação da musculatura pélvica; (4)
“firmeza flexível” de toda a cinta abdominal; (5) percepção e expansão da cintura escapular; e
(6) a percepção de alongamento da região cervical. Várias técnicas acessórias podem ser
utilizadas para o estabelecimento do alinhamento postural, dentre elas as técnicas de
Alexander, a Yoga, de Feldenkrais, RPG, Pilates, Gyrotonic
15
e de Klauss Vianna.
16
Bunch
(1997) prescreve um equilíbrio entre as partes física, espiritual e mental para o
desenvolvimento pessoal do cantor, que atinge diretamente a sua performance, aprendizagem
e ensino do canto. Qualquer atividade que possa auxiliar o desenvolvimento e
autoconhecimento enriquece o cantor de formas visíveis e invisíveis. A autora indica as várias
opções de ferramentas neste sentido, tais como: Técnica de Alexander, exercícios de
condicionamento físico, esportes, neurolinguística, meditação, Tai Chi, Yoga e muitos outros.
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É um método de treinamento desenvolvido por Julio Horvath, através de equipamentos específicos que
exercitam a musculatura profunda através de movimentos circulares, rítmicos e fluidos promovendo aumento da
coordenação, flexibilidade e força.
16
Klauss Ribeiro Vianna (Belo Horizonte, MG 1928 - São Paulo,SP 1992). Preparador corporal. Introdutor de
um método próprio voltado para a corporalidade expressiva de atores e bailarinos.
41
41
Muitas técnicas ajudam a pessoa a centrar-se e buscar fortalecimento com boa qualidade de
vida.
Richard Miller (1986; 2008) emprega a denominação “postura nobre”, referindo-se à
importância de o esterno no centro do peito se manter erguido tanto na inalação como na
exalação do ar, ou seja, durante todo o processo respiratório. Esse procedimento é
fundamental na estabilidade da coluna de ar, objetivo essencial para uma emissão vocal
segura e correta. Os encaixes do pescoço também são fundamentais para a estabilidade da
laringe durante a emissão vocal.
2.1.1 Tônus muscular
Richard Miller chama a atenção para o fato de que, apesar dos cantores sofrerem por
causa da tensão excessiva, muitos padecem de falta de energia e de atividade muscular
insuficiente à atividade do canto. Onde fonação, tem que existir ação muscular. A
eficiência da musculatura intrínseca da laringe depende do equilíbrio dinâmico da
musculatura de sustentação do pescoço e tronco. Por essa razão, o trabalho de alinhamento
postural é tão importante para o cantor e para a amplificação vocal. O tônus muscular global
do cantor é determinante para a amplificação da voz.
A oclusão adequada das pregas vocais e a liberdade do sistema laríngeo requerem
uma atenção constante para o equilíbrio muscular, e esse processo deve ser muito consciente.
As várias configurações dos músculos laríngeos necessários às mudanças de vogais, altura e
colorido vocal podem ocorrer com liberdade somente quando a ação muscular está bem
equilibrada (evitando hiperfunção em alguns músculos e hipofunção em outros). Neste caso,
os músculos laríngeos devem responder à pressão subglótica e à taxa de fluxo de ar de forma
adequada e balanceada. Esses sistemas devem ter relação integrada entre si e isto não ocorre
necessariamente em estado de relaxamento, mas através de um equilíbrio muscular dinâmico,
que confere flexibilidade e é dependente do estado de prontidão do corpo.
2.1.2 Atitude corporal
Miller deu tanta ênfase ao quesito tonicidade que dedicou dois capítulos inteiros a
este assunto (MILLER, 1998): “Relaxar e cantar?” e “Facilmente, não preguiçosamente
(tonicidade no instrumento do canto).” Segundo ele, a aparência quase mórbida do cantor
“relaxado” raramente causa prazer em quem o está assistindo ou ouvindo. Uma presença
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dinâmica e vívida são atributos de uma personalidade artística (MILLER, 1986, p. 254).
17
De todas as atividades físicas que exigem um grau incomum de energia, além do
estado passivo do repouso, o canto é um exemplo típico, pois exige uma mobilização de
recursos mentais e físicos, um senso de alerta corporal e uma preparação psicológica para a
ação. Tal preparação é evidente nos animais e Miller fornece como exemplo a atitude corporal
livre e pronta de um gato, prestes a dar um bote para pegar um passarinho.
Na tentativa de se buscar o equilíbrio dinâmico muscular ideal entre um extremo e
outro, o canto sem energia pode causar mais danos ao instrumento vocal do que o aumento da
resistência glótica (enorme resposta de esfíncter laríngeo) por esforço. Deve-se evitar tanto a
ação de empurrar a voz quanto uma vocalização flácida por falta de energia e vitalidade. Por
causa disso, as vozes jovens devem ser manejadas com cuidado e os exercícios propostos não
devem exceder sua capacidade do momento. Muitos cantores não desenvolvem suas vozes
completamente porque são orientados a se sentirem relaxados durante o canto.
Miller (1986) afirma que uma das principais fontes de tensão do cantor vem de
conceitos equivocados sobre o controle respiratório. Um exemplo de orientação não
construtiva sobre isso são as tensões induzidas tanto na região hipogástrica (entre umbigo e
púbis) e umbilical/epigástrica (entre umbigo e ponta do esterno), sob alegação de que elas
“apóiam” a voz. Na verdade, pode ser que o cantor, durante seu processo de aprendizagem,
experimente tensão indesejada nessas regiões, até que encontre o equilíbrio das forças
musculares que governam o apoio respiratório; mas isso não pode ser sua prática habitual.
O trabalho muscular que ocorre nos trechos de agilidade, flexibilidade e destreza é
comparável a qualquer atividade atlética coordenada e, no canto, essa atividade não deve
ocorrer de forma tensa. Uma boa técnica de apoio respiratório deve permitir que o cantor se
mova livremente durante a performance para abaixar, ajoelhar, deitar, engatinhar ou ficar
absolutamente imóvel durante a vocalização, sem que isso lhe perturbe. Nenhuma parte do
corpo deve estar sob tensão perceptível durante o ato do canto, mas deve-se buscar sempre
uma tonicidade adequada. A atitude corporal do cantor deve ser semelhante àquela do
corredor prestes a ouvir o tiro de largada, ou de um adversário do tenista, esperando o saque,
ou seja, de alerta ou pronto para a ação nunca “relaxado” (abandonado). Falsas suposições
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The deadpan inward-retreat of the “relaxed” singer is seldom enjoyable either to watch or to hear. Vitality and
dynamic presence are attributes of the artistic personality.
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sobre relaxamento durante o canto têm causado efeitos desastrosos nas performances. Quando
se tem algo importante a ser compartilhado com alguém, supõe-se que um desejo, até
mesmo certo grau de ansiedade para fazê-lo, e não indiferença ou inércia.
Miller (1986) é categórico em prescrever a correção dos casos de hiperfunção ou
excesso de contração/tensão muscular, tão comum no cotidiano do ensino do canto. O autor
completa que nenhum cantor que cante tenso o fará bem. Deve-se, portanto, evitar o fantasma
do marasmo, pois, segundo suas palavras: “Canto com alegria é canto com vitalidade!” Por
outro lado, técnicas de aumento da amplificação vocal que acabam por gerar muita tensão
no cantor. É o caso da técnica alemã radical e dos extremos das óperas veristas, que
destruíram muitas vozes no final do século XIX e início do século XX.
A utilização de métodos não ortodoxos de amplificação vocal envolve riscos, pois
cada corpo como um todo e cada voz em particular possuem características individuais
únicas. Algumas pessoas apresentam resistência física maior que outras. As fibras musculares
variam com relação à raça, sexo, idade e comportamento relativo às atividades físicas
sistemáticas. Pinho (2008), ao descrever o comportamento das fibras musculares, nos ajuda a
esclarecer de que modo o esforço físico global e da laringe pode causar impacto na voz. Nos
seres humanos são encontrados 3 tipos de fibras musculares: Tipo I (vermelhas alta
resistência), Tipo IIA (brancas intermediárias fadiga média) e Tipo IIX (brancas fadiga
rápida). O conhecimento dos tipos de fibras que existem nos ajudam a compreender o
fenômeno da potência e resistência vocais. O Quadro 1.3 mostra que as fibras vermelhas
apresentam alta resistência e resposta lenta. As fibras brancas são rápidas, porém entram em
fadiga mais rapidamente (PINHO, 2008, pp. 62-65). Os músculos extrínsecos da laringe têm
maior proporção de fibras vermelhas. A prega vocal formada pelo músculo vocalis e outras
estruturas é composta de duas camadas musculares principais: (1) a mais interna é mais rica
em fibras brancas, cuja função é o fechamento glótico rápido para impedir a asfixia nos
indivíduos; (2) a mais externa é mais rica em fibras vermelhas, que permitem a adução da
prega e que uma pessoa fale normalmente. As fibras musculares, entretanto, entram em
fadiga, seja a de resposta rápida ou a de resposta lenta. Algumas pessoas possuem a mistura
mais resistente e toleram mais tempo de prática, outras entram em fadiga mais rapidamente.
Na prática, observa-se que as vozes mais graves (pregas vocais mais espessas e laringes mais
robustas) demoram mais a entrar em fadiga. Quanto mais aguda a voz, mais frágil é o sistema
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laríngeo e maior é a tendência à fadiga devido às proporções menores de fibras de alta
resistência (PINHO, 2000, p. 64).
Quadro 2.1 Tipos de fibras de acordo com os tipos de nomenclaturas
Nomenclatura variada dos tipos de fibras
Característica
Tipo I
Vermelhas
Tônicas
Lentas
Slow twitch fibers (ST)
Resistência
Tipo II
Brancas
Fásicas
Rápidas
Tipo IIA – rápida oxidativa
Tipo IIB ou IIX– rápida glicolítica
Fast twitch fibers (FT)
Força e velocidade
Os tipos de fibra muscular interferem tanto na musculatura laríngea quanto no tônus
corporal global. Coelho (2005) recomenda, no item postura em técnica vocal, a se ter
disciplina e paciência (consigo mesmo ou com alunos), pois seus resultados demoram a ser
evidenciados. Segundo a autora, deve-se buscar equilíbrio, autocontrole, flexibilidade, leveza
e disponibilidade para cantar. Ela define apoio, assim como Miller, como prontidão e força de
sustentação muscular de origem abdominal e intercostal da coluna de ar.
Brown (1996) entende a postura e a respiração como funções extremamente
amalgamadas na técnica do canto e afirma serem as musculaturas laterais e dorsais do tórax as
protagonistas no canto. Todos os teóricos consultados para a realização deste trabalho, cada
um à sua maneira, afirmam que um corpo sem tônus postural não pode respirar ou cantar bem.
Tônus, atitude, prontidão são palavras-chave para o canto artístico e mais ainda para aqueles
que desejam produzir uma voz mais rica em ressonância, fator fundamental para a
amplificação vocal.
2.2. Processo Respiratório
Não entraremos em detalhes sobre respiração, uma vez que este não é o foco do
presente estudo. Entretanto, alguns pontos serão mencionados por serem fundamentais à
obtenção de um som de qualidade, e por se relacionarem, também, com os aspectos
ressonantais do trato vocal. Coelho comenta que “o grande problema da angústia respiratória
dos cantores não está na falta de ar, mas em sua utilização errada” (COELHO, 2005, p. 35).
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Na comunicação cotidiana, a maioria das frases tem duração breve, geralmente cinco
a seis segundos. Entretanto, no canto pode-se sustentar uma frase pela duração de até mais de
dez segundos. Extensas passagens melismáticas podem alcançar até quinze segundos. O
processo respiratório no canto e na fala é o mesmo; no entanto, as diferenças são maiores no
que se refere ao controle e gerenciamento da saída do ar.
O ciclo respiratório da fonação consiste na inalação-fonação-exalação. A caixa
torácica, ou arcabouço torácico, tem a função de proteger os pulmões e contém 12 costelas, 12
vértebras e o osso esterno, cuja posição ocupa um lugar de suma importância no sistema de
controle respiratório no estudo do cantor. É importante frisar que, quando o esterno é elevado,
toda a região torácica será influenciada por essa ação. Segundo Miller (1986), em algumas
técnicas, a elevação do esterno ideal é relativamente alta, enquanto em outras técnicas de
canto, o abaixamento do esterno (produzindo radicalmente relações musculares tensas dentro
do tórax e ao redor da laringe) é desaconselhável. O abaixamento do esterno altera
consideravelmente a conformação global do sistema fonatório. O tórax e as vias aéreas
superiores trabalham integrados de forma que tudo que ocorre em um, repercute no outro.
2.2.1 Músculos da respiração
De forma prática, os principais músculos envolvidos na respiração são os grupos
inspiratórios e os expiratórios. Destes, vamos enfocar nossa atenção nos que Miller (1989)
considera serem mais relevantes. Dos músculos inspiratórios, os mais importantes são os
músculos intercostais, divididos em internos e externos. Os internos (mais profundos) elevam
as costelas e trabalham em sinergismo com os externos (mais superficiais), que deprimem as
costelas. O conjunto harmônico desses músculos é responsável pela expansão costal e sua
retração. Apesar dos músculos intercostais externos terem função expiratória, eles trabalham
juntamente com os internos.
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Figura 2.1: a) A caixa torácica mostrando a localização do diafragma, músculo principal da respiração. O osso
esterno e as costelas estão discriminados (DELANEY, 2009, adaptações nossas); b) O movimento costo-
diafragmático na inspiração (esquerda) e na expiração (direita), respectivamente.
O diafragma tem sido o grande mito da técnica vocal. muita confusão na
compreensão da função desse músculo. O diafragma não possui resposta proprioceptora, ou
seja, não pode ser sentido diretamente. Também não apresenta resposta eletromiográfica na
expiração e, no entanto, ainda assim, tem sido considerado o “músculo do canto”. Os estudos
atuais (Miller, 1986, pp. 264-265) demonstram claramente que o diafragma está ativo (há
contração) durante a inspiração, e que o controle do apoio respiratório, que é uma espécie de
atraso da retração elástica do tórax à sua posição de repouso, é realizado por diversos
músculos abdominais, sendo o oblíquo externo o mais importante (Miller, 1986, p. 277). As
posições do diafragma são determinadas pelos músculos abdominais que o circundam.
Empurrar ou encolher o abdome não irá manipular diretamente o diafragma. Durante o canto
(expiração), o diafragma permanece eletricamente silencioso e sua localização é mais alta que
a maioria dos cantores imagina.
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Figura 2.2: O movimento do diafragma (a) na inspiração: a pressão nos pulmões diminui, o ar começa a entrar e
o diafragma contrai e desce; e (b) na expiração: a pressão nos pulmões aumenta, o ar é empurrado para fora e o
diafragma relaxa (sobe).
O ar entra no corpo através das vias aéreas superiores (narinas, boca e faringe), e
viaja através da laringe e traquéia para os pulmões. Durante a inspiração, uma contração ativa
(voluntária) dos músculos intercostais eleva as costelas e as puxa para cima e para fora e o
diafragma retifica o assoalho do tórax. Essas ações aumentam o volume dos pulmões e criam
uma queda de pressão (pressão negativa) nos pulmões, permitindo que o ar corra
passivamente para dentro das vias aéreas abertas.
No canto, o controle da musculatura respiratória (inalatória e exalatória) é de
primordial importância. Deve-se utilizar a respiração silenciosa e a capacidade pulmonar é
crucial para a duração máxima das frases do canto. Estas competências devem ser adquiridas
através de treinamento sistemático durante todo aprendizado do canto. A música country, por
exemplo, exige que os cantores usem somente um volume respiratório pouco acima dos
outros falantes. Por outro lado, cantores de ópera profissionais usam altas porções de sua
capacidade vital. Essas diferenças existem na produção vocal e variam de um gênero musical
para outro.
Eva Björkner, em sua tese de doutorado em Estocolmo, estudou as diferenças em
tipos de canto diversos, abordando aspectos característicos vocais em ópera e teatro musicado
(musicais). A autora relata que, em cantores de ópera, o gasto da capacidade vital pulmonar
em uma frase nas cantoras foi de 40 a 50%, e nos cantores, de 20 a 30% (THOMASSON &
SUNDBERG, 1997 apud BJÖRKNER, 2006).
Considerando-se os quatro fatores principais para a produção vocal, a saber, energia
respiratória, vibração, ressonância e articulação, concluímos que o primeiro fator de
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amplificação vocal é a capacidade vital pulmonar associada à energia oferecida pela
musculatura expiratória, que tanto fornecem uma alta pressão aérea quanto sustentação de
longas frases musicais.
2.2.2 Mecanismo gerador da voz
O mecanismo responsável pela produção da voz começa nos pulmões, constituindo o
ar pressurizado, matéria prima para a produção vocal na laringe. Os pulmões, juntamente com
os músculos respiratórios abdominais e intercostais, fornecem ar a uma pressão controlada,
superior à do ambiente, atingindo as pregas vocais que fecham a glote com mais ou menos
tensão durante a fonação. Inicia-se então a vibração das pregas vocais, onde destacamos as
seguintes fases: (1) o ar vindo dos pulmões à pressão atmosférica “obriga” a glote a deixá-lo
passar; (2) após a passagem do ar uma baixa na pressão e as pregas vocais por efeito de
sucção (forças ou efeito de Bernoulli) tendem a fechar quase que imediatamente; (3) a
diferença de pressão acima e abaixo da glote aumenta, de novo voltando a forçar as pregas
vocais a se separarem um pouco para o ar passar; (4) reagindo por sucção, as pregas vocais
voltam a fechar, completando-se assim um ciclo de vibração e recomeçando a primeira fase.
No Capítulo 1, foi apresentado o modelo de Behlau (Ver Fig. 1.18).
A teoria de Bernoulli, de uma maneira mais didática, pode ser assim descrita: como
vimos acima, a velocidade do fluxo é alta em uma região de estreitamento (pregas vocais
aduzidas), criando queda de pressão perpendicular à parede dessa região, que “aspira” as
pregas vocais. Um exemplo comum é uma fina cortina de banho sendo tracionada em direção
ao jato de água. Quanto mais leve ou mais móvel a cortina, maior o movimento.
Similarmente, quando o ar é expelido para fora da estreita glote, ali se desenvolve uma
pressão negativa que aspira as pregas vocais. O quanto isso contribui para o fechamento da
glote depende da mobilidade da mucosa da prega vocal. Quanto mais móvel a mucosa, maior
o papel do efeito Bernoulli no fechamento da glote durante o ciclo vibratório (PHILLIPI, s/d,
p.12).
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Figura 2.3: As fases da prega vocal: a. Fechada; b. Abertura-aberta; c. Em fechamento; a. Fechada. À direita
observa-se a coordenação das forças mioelásticas juntamente com o efeito Bernoulli (PHILLIPI, s/d, p.12).
Abaixo, as forças agindo nas pregas vocais (TITZE, 2010).
2.2.3 Mecanismo Vibratório
A energia em forma estável de corrente de ar vem dos pulmões, passa pela traquéia e
prossegue para a laringe. As pregas abrem e fecham com rapidez, de acordo com o
mecanismo descrito acima, interrompendo a corrente de ar. Isso produz o som glótico, som
vocal, também chamado de som fundamental. O som glótico é chamado de fonte, o trato
50
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vocal é chamado de filtro, e as modificações da configuração do trato vocal alteram as
propriedades acústicas do som. Esse mecanismo foi discutido dentro de uma visão acústica no
Capítulo 1, e agora será abordado dentro de uma visão fisiológica e prática para aplicação ao
canto.
2.3 Laringe
Para compreender a terminologia usada na fisiologia do corpo humano é necessário
conceituar as expressões que descrevem a posição das estruturas anatômicas. Usa-se o termo
anterior para descrever uma estrutura que está à frente em relação ao centro do corpo, e
posterior para uma estrutura que está atrás em relação ao centro do corpo. Superior e inferior
para as estruturas que estão acima e abaixo de algo. O termo linha média ou mediana define o
centro longitudinal, ou seja: imagine uma linha que começa no centro da testa e desce até o
umbigo; esta seria uma linha mediana. Origem e inserção são termos usados para definir onde
uma fibra muscular começa e termina.
a.
b.
51
51
c.
Figura 2.4: a) Visão frontal da localização da laringe; b) A estrutura da laringe: observe a localização do osso
hióide em cor bege; c) Um corte sagital (fatiando o corpo pela linha mediana), com visão interna da laringe e o
restante do trato vocal. (Material didático fornecido por Rubim)
A laringe se situa na extremidade superior da traquéia, na linha média, na região
anterior do pescoço. Com os dedos no pescoço, na linha mediana, abaixo do queixo, detecta-
se uma chanfradura (um pequeno sulco) bem definida, a incisura tireóidea que indica a
inserção anterior das pregas vocais (ver Fig. 2.4b. o Pomo de Adão). Pressionando-se a dobra
entre o queixo e o pescoço, pode-se sentir o osso hióideo, a estrutura que suspende a laringe
(Ver Fig. 2.4b).
2.3.1 Funções da laringe
Biológica e evolutivamente falando, a respiração e a laringe apresentavam
inicialmente apenas funções de sobrevivência, e posteriormente o ser humano desenvolveu
as funções estéticas e comunicativas desse sistema. Fisiologicamente, a laringe pertence ao
sistema respiratório e suas ações primárias seriam duas: (1) impedimento do escape de ar dos
pulmões (mecanismo ativo de fechamento); e (2) proteção contra entrada de corpos estranhos,
com expulsão vigorosa das que ameaçam entrar (mecanismo da tosse). Segundo Zemlin
(2005), a produção de uma corrente de ar com finalidade de fala (fonação para fala ou canto),
passou a ser considerada como uma função não respiratória do mecanismo da respiração,
sendo que “a produção de som pela laringe pode ser considerada como uma função não-
biológica” (ZEMLIN, 2005, p. 119), e tratar-se de uma competência desenvolvida
posteriormente pelo ser humano.
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Através do mecanismo ativo de fechamento da válvula laríngea, a laringe impede
escape de ar nas situações de grande elevação de pressão abdominal (evacuação e
levantamento de peso). Uma das principais características da laringe, em termos de fonação, é
sua extraordinária capacidade de ajustes de forma rápida e cheia de variações sutis,
fornecendo diversas possibilidades sonoras à voz cantada. A mecânica básica é a resistência
que a laringe oferece ao fluxo aéreo vindo dos pulmões.
O arcabouço laríngeo é uma estrutura única, músculo-cartilaginosa, chamada
também de caixa de voz (Voice Box; ver Fig. 2.4), e consiste de: (1) uma cartilagem cricóide:
é o elemento mais inferior da laringe, possui formato de anel com a ampla porção posterior
(atrás) e constitui o topo anelado da traquéia; (2) duas cartilagens aritenóides se apóiam na
superfície superior (de cima) posterior (atrás) da cartilagem cricóide, anexadas a esta por seus
ligamentos e músculos; (3) uma cartilagem tiróide, que é aberta posteriormente, tem dois
chifres (ou cornos) inferiores e dois superiores. Os chifres (ou cornos) inferiores são anexados
às superfícies externas da cartilagem cricóide em cada lado por ligamentos e músculos. Os
chifres superiores se estendem para cima para se juntar ao osso hióide por meio dos
ligamentos tiroídeos laterais. O ângulo anterior (frontal) dessa cartilagem é identificável como
o Pomo de Adão (Ver Fig. 2.4b). Também um aro de músculos tiroídeos; (4) um osso
hióide, no topo da laringe, em forma de uma ferradura, com a abertura posterior. Livre de
anexos diretos a qualquer outra parte do esqueleto do corpo, esse osso pode se mover em
qualquer direção. É o único osso do corpo que não se articula em outro osso, apenas em
ligamentos e músculos; por isso sua inserção é tão livre e flexível; (5) uma epiglote:
cartilagem flexível em forma de folha, localizada atrás do osso hióide e na raiz da língua. É
um tipo de alçapão que se fecha quando os alimentos passam para o esôfago. Nas frequências
elevadas emitidas na voz cantada, a epiglote abre a passagem, e nas baixas ela quase cobre a
entrada da laringe; e, por último, (6) as cartilagens corniculadas e cuneiformes (cartilagens de
Santorini e Wrisberg). Segundo Brown (1998), “elas não parecem ter conexão direta com os
ajustes laríngeos,” porém, segundo Zemlin (2005), “proporcionam sustentação para as pregas
ariepiglóticas e as fortalecem para ajudar a manter a abertura para a laringe” (ZEMLIN, 2005,
p.128).
As cartilagens da laringe se relacionam com o osso hióide de modo a permitir
movimento elástico em cada ponto da articulação. Os ligamentos laríngeos têm sido
comparados a molas espirais de apoio, ao serem comprimidas ou esticadas, permitindo
53
53
inúmeras ações antagonistas. Esta característica móvel e flexível da laringe é fundamental
para a obtenção de um som livre e requer treinamento para que os ajustes do canto não
perturbem essa liberdade funcional do sistema laríngeo.
2.3.2 Pregas Vocais
São faixas longas, lisas, redondas, com um corpo muscular e uma cobertura de tecido
conjuntivo (revestidas por epitélio estratificado), e podem ser alongadas ou encurtadas,
tensionadas ou relaxadas, aduzidas (aproximadas) ou abduzidas (distanciadas, separadas). A
porção vibrante muscular das pregas humanas é mais longa e adequada para a produção
sonora que as dos animais. De acordo com Jackson e Jackson (apud BROWN, 1973), as
pregas vocais têm basicamente nove funções diferentes: (1) respiratória, regulando o
intercâmbio de dióxido de carbono no sangue; (2) valvular, afetando as pressões nos pulmões
positiva e negativa, que por sua vez têm um efeito na circulação pulmonar; (3) de fixação,
estabilizando o tórax para movimento de braço eficiente; (4) de proteção, evitando que
qualquer elemento além do ar entre nos pulmões; (5) de deglutição, fechando a passagem do
ar para permitir engolir os alimentos; (6) na tosse, pois esta repele corpos estranhos das vias
aéreas; (7) na expectoração, ou ação que limpa as passagens das secreções mucosas
excessivas que ocorrem em processos inflamatórios, alérgicos e infecciosos das vias aéreas
superiores; (8) emocional, criando sons variados, tais como riso, choro, suspiro, lamento e
outros; e (9) fonatória, para comunicação falada e cantada. As pregas vocais atuam de modo
semelhante a palhetas labiais dos executantes dos metais e constituem o elemento vibratório
que origina uma sequência de impulsos para o trato vocal.
54
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Figura 2.5a: (1): Pregas vocais. Acima (de Södersten & Lindestad, 1992): endoscopia oral (direita) e nasal
(esquerda). Abaixo, à esquerda: visão endoscópica das pregas vocais. As linhas tracejadas indicam a posição das
pregas sob a epiglote. Abaixo, à direita: corte transversal de uma prega vocal, destacando as duas camadas mais
relevantes para a fonação: o corpo e a cobertura (VIEIRA, 2004, p. 72); (2) Corte esquemático das partes da
prega vocal: cobertura, transição e corpo. Trabalho de Stevens e Hirano (Vocal Fold Physiology, 1981)
(MILLER, 1993, p. 5); (3) As linhas desenhadas indicam o movimento deslizante que ocorre entre o corpo e a
cobertura. A possibilidade de uma força vertical na cobertura está indicada na seta central (MILLER, 1993, p. 6).
Figura 2.5b: (1) Glote vista de cima, mostrando a localização da frente (pescoço). As setas indicam o movimento
das cartilagens aritenóides na fonação e respiração. (2) Músculos intrínsecos da laringe. O músculo vocalis é a
prega vocal propriamente dita.
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Figura 2.5c: (1) A laringe vista de trás (vista posterior), em corte coronal (IRISH, 2010) e (2) vista de cima,
mostrando a glote, em posição apresentada pelo espelho e as pregas vocais na fonação e respiração (NETTER,
2001).
Três aspectos afetam diretamente a produção vocal: (1) a pressão aérea controlada
pela musculatura da cinta abdominal; (2) a forma das pregas vocais (fonte); e o desenho do
trato vocal (filtro).
A espessura e a tensão das pregas vocais, assim como a pressão com que o ar vem
dos pulmões, estão relacionadas com a frequência do som emitido. Assim sendo, quanto
maior a pressão do ar, maior a tensão das pregas vocais, menor será a sua espessura e mais
agudo será esse som. Ou seja, sons graves são produzidos por pregas vocais espessas,
encurtadas e com tensão de aproximação (coaptação
18
glótica). Sons agudos são produzidos
por pregas vocais mais delgadas, alongadas e com menor tensão de aproximação e maior
tensão de alongamento. Segundo Bunch
19
(1982, pp. 52-53), os tons médios e graves
apresentam maior esforço muscular de tensão glótica, enquanto que os sons agudos
apresentam maior trabalho na coluna de ar e menor esforço de coaptação glótica. Esse dado é
fundamental para a execução de tons agudos estáveis com alta projeção por ressonância e não
por esforço mecânico, esforço este que é a causa mais comum da produção de um som agudo
apitado e de má qualidade tímbrica.
A tensão e a espessura das pregas vocais são reguladas pela complexa musculatura
da laringe, que atua mudando a posição das suas cartilagens. Esses músculos são
frequentemente chamados de músculos reguladores da altura (termo que se refere à frequência
do som emitido). O sistema vibratório que acabamos de descrever produz um som
18
Adaptação ou ajustagem de partes que estavam separadas.
19
BUNCH, Meribeth D. Dynamics of the Singing Voice. Viena: Springer-Verlag, 1982.
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fundamental laríngeo que, antes de ser irradiado para o ar ambiente, é amplificado no trato
vocal.
O trato vocal, que é considerado um filtro de frequências, pode ser comparado aos
tubos de um órgão. Sons graves são produzidos por tubos largos e longos. Sons agudos são
produzidos por tubos de calibres estreitos e curtos. Um trato vocal alargado e longo (palato
alto, garganta aberta e laringe baixa) gera sons graves ricos em harmônicos graves. Um trato
vocal constrito e encurtado (garganta comprimida e laringe alta) gera sons mais agudos por
reforçar harmônicos de frequências mais altas. Desse desenho tão mutável do trato vocal, o
cantor deve saber distinguir qual seria um desenho mais favorável à sua própria natureza
vocal, considerando sua anatomia e a estética que procura. O canto lírico exige uma qualidade
vocal com padrões que precisam ser seguidos para que se faça uma carreira. Entretanto,
depende da escola de canto. Por exemplo, os italianos, alemães, americanos e franceses não
compactuam necessariamente das mesmas escolhas estéticas. diferenças que estão
relacionadas ao próprio idioma e às preferências nacionais. Logo, não uma maneira única
de se cantar; aquela que é mais adequada a cada cultura, expectativa e tradição (MILLER,
1977, p. 196).
2.3.3 Pressão subglótica
A pressão subglótica, produzida pelo sistema respiratório, é a pressão que se
concentra abaixo da glote fechada ou semifechada. É um dos principais fatores da vibração
das pregas vocais e o fator que mais influencia a intensidade (BJÖRKNER, 2006). O aumento
da pressão subglótica em termos de aumento da intensidade vocal tende a elevar a frequência
fundamental (F0) na fala, e, por conseguinte, no canto. Adverte Björkner que a determinação
direta da pressão subglótica é um procedimento complicado e invasivo e, por isso, difícil de
ser comprovado cientificamente. Entretanto, medidas de intensidade através de espectrógrafos
são encontradas na literatura. Miller (1986) afirma que a pressão subglótica é visível através
da medição de determinados formantes. Por meio da vídeoestroboscopia laríngea, é possível
observar que uma coaptação glótica mais intensa aumenta a resistência contrária à pressão
subglótica, e esta certamente aumentará em consequência desse fechamento glótico.
57
57
Figura 2.6: Acima: Fotografia de laringoscopia mostrando a glote nas duas situações citadas (ZEMLIN, 2006).
Abaixo: (1) Glote em repouso, o ar passando e (2) glote em fonação, com as pregas aduzidas.
2.3.4 Foco e função fonatória: Registros
O fenômeno e a terminologia dos registros vocais ainda hoje são elementos
complexos e muita confusão relativa a esse tema. O estudo dos registros com relação à
ressonância vocal está relacionado à compreensão do mecanismo de ajustes do sistema
fonador e ressonador.
A origem do termo registro vem de órgãos de tubo (possuidores de pedais ou foles) e
era baseada em qualidades históricas instrumentais e acústicas. Manuel Garcia II, em 1854,
um famoso professor de canto e inventor do laringoscópio, ou espelho laríngeo (o primeiro
aparelho para visualizar a laringe e pregas vocais), foi um dos primeiros especialistas a
desenvolver uma definição científica de registro. De acordo com Garcia (GARCIA, 1953
apud WARE, 1998), o termo registro é uma série de sons homogêneos produzido por um
mesmo mecanismo, diferindo essencialmente de outra série de sons, também homogêneos,
produzidos por outro mecanismo. Hollien, em 1974, definiu um registro vocal como uma
qualidade vocal próxima dentro de um determinado alcance de altura e com pouca ou
nenhuma coincidência em F0 entre registros adjacentes (BJÖRKNER, 2006, p. 11).
Henrich (2005) sugeriu que se substituísse o termo registro por mecanismo laríngeo,
e que fosse referido em termos de números (traduzindo a produção das frequências
58
58
consecutivas). Isto facilitaria a compreensão desse fenômeno, pois o registro é um evento
totalmente laríngeo (PINHO, 2008, p.49) e consiste em uma série (ou faixa) de frequências
produzidas com a mesma qualidade sonora. O mecanismo seria o mesmo comum usado na
fala. O registro é resultado do modo de vibração das pregas vocais. Quando o cantor ascende
a escala (vai do grave para o agudo), acontecem as seguintes alterações nas pregas vocais:
alongamento, diminuição da massa vocal e aumento da elasticidade. O cantor percebe esses
eventos como mudança de sensação de ressonância. As notas graves parecem localizar-se no
peito, as agudas na cabeça, e as notas emitidas nas regiões médias parecem estar entre essas
duas partes citadas. O registro de peito é usado na parte inferior da extensão vocal, e é
associado com qualidades de voz descritas como densa e pesada. O registro de peito, por sua
natureza de força, é responsável por grande parte do enriquecimento ressonantal. Uma voz
plena é rica em harmônicos graves. Quanto mais harmônicos graves, mais parciais aquele som
vai ter e mais rico vai ser. Isso é fato físico comum a todos os instrumentos e também à voz,
como foi discutido no Capítulo 1.
O registro de cabeça é usado acima do registro agudo e é associado à voz com
qualidades descritas como mais agudas. Esses termos descrevem a qualidade e também um
ponto de vista muscular. Os registros (peito e cabeça) têm relação com diferentes qualidades
de contração do músculo vocalis (Tireo-Aritenóideo ou TA), causando espessamento ou
afilamento das pregas vocais (HIRANO e col., 1970 apud BJÖRKNER, 2006). Como
explicado anteriormente, a prega vocal, através da ação do TA, é capaz de tomar diversas
formas. No grave, o músculo se contrai, se encurta e se aproxima com mais intensidade; no
agudo, o músculo é alongado e se aproxima com menos energia. As várias combinações
desses dois extremos resultam nas variadas sonoridades de cada registro vocal.
O registro de falsetto, ou falsete, é definido como sendo um registro acima, ou
substituto do registro de cabeça, particularmente para vozes masculinas (HEIRICH, 2005).
Miller utiliza esse termo exclusivamente para indicar a voz masculina imitando a feminina. O
termo falsetto tem sido usado de forma confusa. Atualmente, esse conceito tem sido mais
aceito entre professores de canto e fonoaudiólogos como um fenômeno físico e mecânico que
pode ocorrer tanto em homens quanto em mulheres. Originalmente, o termo só era aplicado às
vozes masculinas, mas alguns autores consideram que vozes femininas, em menor escala,
podem emitir um som de falsete. Vennard (1967) utiliza falsetto como sinônimo de
59
59
mecanismo leve, e o registro de peito como mecanismo pesado; abaixo segue o mecanismo
físiológico do falsete de WilliamVennard:
Com o músculo vocalis relaxado, os músculos cricotireóideos podem imprimir uma grande
tensão longitudinal sobre os ligamentos vocais. Esta tensão pode ser aumentada para se elevar
a frequência, mesmo que as pregas tenham atingido sua extensão máxima. Isto faz com que as
pregas fiquem tão delgadas que praticamente não haverá fase vertical. O músculo vocalis se
retrai para os lados da laringe e a vibração ocorre quase que inteiramente nos ligamentos
20
(VENNARD, 1967).
Eva Björkner (2006) afirma que atualmente a comunidade científica hesita na
definição de registro vocal: enquanto alguns autores consideram um fenômeno puramente
laríngeo, outros o definem em termos de similaridade de qualidade vocal. A confusão
emergente serviu para dar significado a um novo conhecimento dentro dos termos existentes.
Uma atualização do vocabulário vocal, comum a todas as comunidades que lidam com voz,
seria, sem dúvida, de grande importância.
Uma definição bastante satisfatória de registro vocal é a de Clifton Ware, que afirma
que um registro vocal é um produto de duas partes: (1) um componente da fonação,
consistindo de vibração das pregas vocais, formato glótico e fluxo de ar, que produz a
frequência fundamental de vibrações, a qual é percebida como altura; e (2) um componente de
ressonância, consistindo de acoplamentos acústicos dos sistemas subglótico e supraglótico da
laringe, que produz o espectro harmônico, o qual não só determina a vogal emitida, mas
também o timbre da voz. Os ajustes entre fonação e ressonância são recíprocos: as pregas
vocais e os ressonadores afetam uns aos outros continuamente e de forma complexa, alterando
o produto sonoro final (WARE, 1998).
A definição de Ware facilita a compreensão do mecanismo em si e de sua
importância para o enriquecimento das ressonâncias e, por consequência, da amplificação
vocal. Um estudo aprofundado sobre registros é ferramenta indispensável ao canto artístico.
Behlau (2001) acrescenta que, vocalmente, o registro é relativo aos modos de
emissão da tessitura, ou seja, regiões de frequência (altura) possuem a mesma qualidade vocal
ou uniformidade de emissão e de som. Eis a classificação de registros que Behlau sugere e
que, aliás, tem sido usado atualmente pelos profissionais da voz no Brasil:
20
With the vocalis muscles relaxed it is possible for the cricothyroids to place great longitudinal tension upon the
vocal ligaments. The tension can be increased in order to raise the pitch even after the maximum length of the
cords has been reached. This makes the vocal folds thin so that there is negligible vertical phase difference.
The vocalis muscles fall to the sides of the larynx and the vibration take place almost entirely in the ligaments.
60
60
(1) basal ou pulsátil: apresenta as frequências mais graves da extensão total do
indivíduo e varia de 10 a 70 Hz. Solicita forte contração da musculatura tireoaritenóidea
(músculo vocalis), sendo seu uso frequente contraindicado pelos fonoaudiologistas;
(2) modal: de frequências entre 80 e 560 Hz, é o registro de fala e o maior de todos,
podendo ser dividido (embora segundo esta classificação os autores afirmarem que não
bases estabelecidas fisiológicas, acústicas ou perceptíveis para sua diferenciação) em:
(a) peito ou grave: a laringe se encontra baixa, as pregas vocais espessas e
com a grande massa vibrante, superfície de contato de mucosa extensa e grande amplitude de
excursão lateral, facilitando emissão de tons graves. É o registro principal da voz falada
masculina. Ação muscular predominante do tireoaritenóideo (vocalis).
(b) misto ou médio: fase intermediária entre peito e cabeça, é a contração do
cricotireóideo onde ajustes de passagens, podendo haver quebras entre as notas,
mascaradas com técnica vocal. As zonas de passagem (zona di passaggio) têm bases
fisiológicas.
(c) cabeça ou agudo: laringe mais alta, pregas estiradas, reduzida superfície
de contato e vibrações em menos extensão com excursão lateral restrita. Maior ação muscular
do cricoaritenóideo e pouca do tireoaritenóideo. Os tons emitidos são agudos.
(3) elevado ou leve: raro no registro de fala, as frequências são as mais agudas (entre
160 a 800 Hz). Ação prioritária do músculo cricotireóideo. Tem duas subcategorias:
(a) falsete: é a maior parte deste registro, de emissões débeis, leves. As
pregas estão muito delgadas, mínima superfície de contato, com presença de fenda anterior
(não coaptação completa das pregas vocais), podendo ter emissão soprosa (com escape
sonoro de ar).
(b) flauta: de ocorrência rara, com grande transformação da laringe, que
funciona semelhantemente a um apito (silvos de pássaros ou som passivo do vento em frestas
de janelas). Essa descrição, sugerida por Behlau, tem se mostrado a mais clara e adequada
para a compreensão dos registros vocais.
Pinho (2008) denomina o registro basal de fry e subdivide o falsete em flauta e
assobio.
61
61
Clifton Ware (1998) distingue os termos registro e registração. Segundo este
pedagogo vocal, registro é a qualidade homogênea produzida pelo mesmo sistema mecânico
como descrito anteriormente; e registração refere-se ao processo de uso e combinação de
registros para produzir o canto artístico. Seria a administração consciente dos diversos
registros transformando a voz em um tapete macio, sem asperezas nas transições de registro.
Quando o cantor não possui habilidade para gerenciar a sua registração, é fácil a percepção de
quebras e desigualdades entre os seus registros. Isto pode ocorrer também em outras
situações, tais como laringites ou ao se cantar com muita força um som agudo. Como para o
canto artístico é de suma importância um controle consciente da registração, o cantor precisa
saber corrigir possíveis maus usos de seu sistema. Para isso, Titze (1994) aponta duas
hipóteses mais aceitáveis de testes em busca de explicações fisiológicas sobre transições
involuntárias de registro: (1) ressonâncias subglóticas (traqueais) podem tanto inibir quanto
facilitar a vibração das pregas vocais em frequências específicas; (2) a tensão do músculo
vocalis alcança um limite fisiológico, forçando um desengate do vocalis para facilitar alturas
agudas. Desta forma, o desequilíbrio da pressão subglótica e da tensão do músculo vocalis são
os vilões da quebra de registro:
Quando o sujeito canta numa escala ascendente ou descendente sem nenhuma transição bem
feita com qualidade do som, ele precisa mudar gradualmente de um tipo de ajuste para outro.
Isso significa que as tensões ativas antagonistas do músculo vocalis e as tensões passivas dos
ligamentos, juntamente com a adução da glote e a pressão do fluxo de ar, precisam ser
equilibradas suave e gradualmente
21
(van den BERG, 1968 apud MILLER, 1986, p. 290).
Para corrigir esse problema, o cantor deve buscar exercícios de fortalecimento da
coaptação glótica (fechamento das pregas vocais) e de controle respiratório de sustentação
longa. Richard Miller (1986) fornece sugestões de exercícios destinados a esse fim. Miller
também, em seus trabalhos, descreve o fenômeno do damping (abafamento ou
amortecimento). Acusticamente, descrevemos esse fenômeno no primeiro capítulo. Aplicado
à voz, é um fenômeno laríngeo (acústico e fisiológico), inconscientemente controlado e
resulta da resistência do corpo principal das pregas vocais quando aumento da pressão do
ar. uma interrupção da vibração da porção posterior das pregas vocais quando emissão
muito aguda. Ocorrem então alongamento e redução da massa das pregas vocais. Esse ajuste
promove o damping (abafamento, ou queda da amplitude dos harmônicos), que faz com que
somente a porção anterior das pregas vocais vibre. Isso pode ocorrer no superagudo feminino
21
When the subject sings in a ascending or a descending scale with no appreciable transition in sound quality,
he needs to change gradually from one type of adjustment to the other. That means that the antagonistic active
tensions in the vocalis muscles and the passive tensions in the vocal ligaments, together with the adduction of the
glottis and the value of the flow of air, need to balance smoothly and gradually.
62
62
(flageolet
22
) e um pouco no masculino (MILLER, 2004). No homem, se muito damping a
voz é emitida em fonação apertada/pressionada (pressed fonation).
Figura 2.7: Registros, qualidade vocal e ajustes laríngeos nos formatos das pregas vocais. Na voz modal no
falsete há um grande aumento de tensão longitudinal e, em F0, uma fenda glótica. No fry ou creak (crepitação ou
voz rangida), há redução da tensão longitudinal na pressão subglótica e aumento da compressão medial,
resultando um som mais grave, aperiódico e com sub-harmônicos. No cochicho, a falta de aproximação da glote
causa uma fenda, resultando em um som de fricção, e não há vibração das pregas vocais. Os gráficos mostram
ajustes laríngeos e mudanças na frequência fundamental e serie harmônica (VIEIRA, 2004, p. 73).
2.3.5 Musculatura intrínseca da laringe
Os músculos responsáveis pelo funcionamento e adaptação da fenda glótica (espaço
triangular entre as pregas vocais) são os músculos intrínsecos da laringe. As Figuras 2.9 e
2.10 mostram os principais músculos envolvidos nesse processo.
22
Flageolet: Registro vocal feminino que se estende à região aguda, acompanhada de damping extremo
(MILLER, 2004, p. 251).
63
63
Figura 2.8: Estrutura externa da laringe.
Como o objetivo deste trabalho não é o estudo detalhado da anatomia da laringe, mas
sua importância nos mecanismos de ressonância, abordaremos apenas os principais músculos
envolvidos no canto. O dois músculos mais importantes na produção vocal são o vocalis
(TireoAritenóideo ou TA) e o CricoAritenóideo Lateral (CAL) Figura 2.9. Obviamente
esses dois grupos musculares trabalham em sinergia com os demais, mas a função específica
dos dois é fundamental para a compreensão da amplificação da voz cantada.
Figura 2.9: Músculo vocalis ou tireoaritenóideo em vista lateral (1) e de cima (2).
64
64
Durante a fonação de alta intensidade, o músculo TA, ou vocalis, colabora
diretamente para uma aproximação mais intensa das pregas vocais. Além disso, a laringe é
mais sustentada pelos músculos extrínsecos e toda a região laríngea fica mais tonificada para
suportar o impacto que isto causa sobre o sistema. Essa seria parte do mecanismo de peso
importante para o aumento de intensidade e também usado parcialmente nas técnicas usadas
no Belting,
23
axé,
24
sertanejo e também na ópera.
2.3.6 Ação do músculo cricotireóideo no registro
O formato da fenda glótica é resultado da ação principalmente do TA, enquanto que
os músculos cricotireóideos (CT) agem como musculatura de ajuste das frequências. Os
músculos cricotireóideos puxam a tireóide para frente e para baixo de sua posição de repouso
na cartilagem cricóide. Quando a cartilagem tireóide se move em báscula sobre a cartilagem
cricóide, o TA, que se encontra internamente paralelo ao chão, sofre um alongamento na
direção da região do Pomo de Adão. O CT contrai e as pregas vocais são esticadas e ajustadas
à posição paramediana. O movimento das pregas vocais é semelhante a um estilingue
invertido. A parte onde se coloca a pedra fica na região do Pomo de Adão (chamado
vulgarmente de gogó), e a estrutura de madeira onde se prende o elástico corresponde às
cartilagens aritenóides, que ficam na parte posterior das pregas vocais. Quando o CT entra em
ação, ocorre o estiramento do TA (elástico do estilingue) para frente e para baixo. Por isso, ao
emitir os agudos, é importante permitir que haja uma sensação para frente e para baixo. Desse
modo o corpo contribui com a natureza da produção física dos agudos.
Nos sons graves, o TA encurta e espessa. Nos sons agudos, o TA alonga por efeito
do CT. Entre um extremo e outro ocorre uma combinação de tensão e alongamento da prega
vocal, que contribuirá para a execução equilibrada de todos os registros. Por essa razão, são
utilizados exercícios de vibração labial em glissandos, assim como o uso de fonemas
consonantais vozeados como [v] e [z] para treinar a competência muscular do TA em
coordenação com CT. Ao se fazer um glissando com [v], por exemplo, os dois músculos
transferem o trabalho um para o outro. Enquanto no grave o TA está mais presente e o CT
menos tenso, conforme se vai para o agudo, o TA cede sua tensão de aproximação para que o
CT o alongue para a produção dos agudos. No extremo da extensão, o TA fica tão delgado
23
Técnica associada à música popular, gospel e teatro musical dos EUA; é usado para fazer ouvir o registro
médio-grave das cantoras acima dos outros instrumentos e considerado brilhante, tenso e forte.
24
Gênero musical baiano que surgiu na década de 1980e no carnaval de Salvador, que mistura Frevo
pernambucano, forró, Maracatu, Reggae e Calipso, que é derivado do Reggae. (Wikipédia)
65
65
que praticamente acontece apenas a vibração do ligamento vocal (como visto acima) e ocorre
então o conhecido falsete (PINHO, 2008, pp. 49-54).
Os ligamentos vocais (bordas das pregas vocais) são constituídos de fibras de uma
característica elástica e de fibras colágenas que são aderidas ao músculo vocalis. Quando os
ligamentos vocais são esticados pela ação dos músculos cricotireóideos, eles alongam até o
ponto onde as fibras colágenas não podem ceder mais porque foram totalmente estiradas.
Nesse ponto, a tensão longitudinal pode ser aumentada, porém não em comprimento. Para
chegar aos registros agudos, o músculo vocalis precisa relaxar, enquanto que os
cricoaritenóideos deveriam contrair.
Se as pregas permanecem muito espessas, um aumento da pressão respiratória é
requisitado para a fonação. Se essa espessura é mantida durante uma progressão para a região
médio-aguda, chegará ao ponto em que o grau da tensão muscular e da pressão respiratória
não poderá ser mantido sem uma alteração súbita dos ajustes. Se não ocorrer a redução
gradual do antagonismo muscular, a voz irá quebrar ou soar espremida. Uma chegada suave
às regiões média e aguda requer um equilíbrio flexível dos músculos laríngeos, da massa das
pregas vocais, da pressão subglótica e da taxa de fluxo de ar (MILLER, 1986, p. 290).
2.3.7 Musculatura extrínseca e outros músculos indiretos
Os músculos de sustentação do tórax e pescoço, apesar de não contribuírem
diretamente para a fonação e timbre vocal, colaboram para a manutenção da postura e
funcionam como coadjuvantes da produção vocal, principalmente na amplificação. Segundo
Miller (1986), em termos de musculatura de suporte respiratório que se relacionariam
indiretamente com a energia para fonação, seriam usados apenas os músculos escalenos e
esternocleidomastóides (p. 275). O que Miller diz é que estes músculos não colaboram
diretamente com a amplificação; porém, participam como coadjuvantes da respiração.
66
66
Figura 2.10: Músculos do pescoço, tórax e abdômen (MILLER, 1993, p.18).
2.4 Classificando transições/passagens de registros (passaggio)
As transições existem em todos os cantores e são suaves ou imperceptíveis,
dependendo da técnica empregada. Muitos lutam contra essa transição sem saber o que fazer.
Entre os principais fatores que influenciam os eventos de registração estão o tipo de voz e o
gênero. Na prática tradicional, homens cantam principalmente na voz de peito, combinando
gradualmente para mista e cabeça para as notas agudas. Por outro lado, mulheres, com
exceção das cantoras populares, cantam primeiramente em voz de cabeça, mudando
gradualmente para voz de peito quando descem para as regiões média e grave. Essa variação
da técnica é causada pela disparidade entre as laringes masculina e feminina. Os homens têm
comprimento de laringe e pregas vocais maiores, (17-24 milímetros) que as mulheres (13-17
milímetros).
25
25
Pacheco, Claudia & Baê, Tutti. Canto: equilíbrio entre corpo e som: princípios da fisiologia vocal. São Paulo:
Irmãos Vitale, 2006, p. 34.
67
67
Vozes masculinas têm a zona di passaggio dividida em primeira passagem (primo
passaggio), no grave, e segunda passagem (secondo passaggio), no agudo, em uma região
mais limitada que a das femininas. Titze (1994) diz ser a primeira passagem para mulheres e a
segunda passagem para os homens na região de 300 a 350 Hz, refletindo o mesmo fenômeno
de registração, ou seja, entrando e saindo da voz de peito, ocorrendo entre D3 (ré 3) e F3 (fá3)
para ambos os gêneros. Para sopranos, essa passagem se na região grave, entre vozes de
peito e cabeça; tenores apresentam a mesma passagem na transição média-alta, saindo de
cabeça a peito. Essa oitava de diferença explica por que homens cantam na maioria do tempo
em registro de peito e mulheres de cabeça.
A zona de passagem depende do tamanho e peso individual da voz determinados
pelas variações físicas, a saber, dimensões da laringe e cavidades de ressonância. As vozes
pesadas, como sopranos ou tenores dramáticos, tendem a apresentar passagens em pontos
mais graves do que as vozes mais leves, como tenores ou sopranos líricos.
As vozes femininas são mais difíceis de classificar, principalmente devido à extensão
extra de registros de peito e de assobio e T6 em duas transições pivôs (primo e secondo
passaggio), sendo divididas em regiões menores de registro. As classificações vocais variam
de escola para escola e as divisões mais completas são as adotadas pelo sistema alemão
Fach:
26
1 Soprano
1.1 soprano lírico-coloratura
soubrette coloratura
1.2 soprano dramático coloratura
1.3 soubrette alemão
soprano de caráter
1.4 soprano lírico
1.5 soprano dramático jovem
soprano spinto
1.6 soprano dramático
1.7 soprano wagneriano
2 Mezzo-soprano e contralto
2.1 mezzosoprano coloratura
2.2 mezzosoprano lírico
2.3 mezzosoprano dramático
2.4 contralto dramático
2.5 contralto profundo
3 Tenor
3.1 tenor buffo
3.2 tenor de caráter
26
FACH: Um termo padrão usado para designar categorias vocais de acordo com o tipo de voz, considerando
também características do corpo e da personalidade do cantor (WARE, 1998, p. 278).
68
68
3.3 tenor lírico
3.4 heldentenor jovem
3.5 heldentenor
4 Barítono
4.1 barítono lírico
4.2 barítono cavaliere (galã)
4.3 barítono de caráter
4.4 heldenbarítono
4.5 baixo-barítono lírico
4.6 baixo-barítono dramático
5 Baixo
5.1 baixo cantante
baixo-barítono lírico
5.2 baixo agudo
baixo-barítono dramático
baixo dramático agudo
5.3 baixo jovem
5.4 baixo buffo
5.5 buffo dramático
5.6 baixo lírico sério
5.7 baixo dramático sério
A enorme gama de classificações adotadas pela escola alemã se deve à necessidade
pela alta demanda de profissionais no mercado europeu, de se ter clareza do repertório que
cada cantor pode e deve cantar. Apesar de parecer muito detalhada, os cantores que procuram
respeitar o seu Fach terão menos chances de desenvolver problemas vocais por inadequação
de repertório.
O verismo
27
e o wagnerismo foram responsáveis por muitas falências vocais. Os
cantores, na busca desenfreada por uma amplificação vocal para executar esse repertório,
presente na virada do século XIX para XX, ultrapassaram seus limites físicos de produção
vocal (Ware, 1998, p. 45).
2.5. Equalização dos registros
O registro de um cantor não deve ser classificado prematuramente. É necessário um
tempo de observação por parte do professor de canto para compreender as ressonâncias
próprias de cada aluno, e então estabelecer uma classificação. Costuma-se adotar o
repertório central de mezzos para as mulheres e de barítonos para os homens, até que o
processo técnico do aluno tenha se estabelecido.
27
O Verismo é uma corrente literária italiana surgida na década de 1830, que durou até aos finais do século XIX,
na qual escritores e poetas utilizavam princípios realistas. Com manifestação na ópera italiana, apresenta fortes
marcas de realismo e descritivas sócio-culturais.
69
69
Os registros são coordenados quando: (1) o corpo e o trato vocal estão
apropriadamente alinhados; (2) todas as tensões estranhas são eliminadas da língua,
mandíbula, palato mole e laringe; (3) as vibrações das pregas vocais estão equilibradas; e (4) a
pressão respiratória adequada é aplicada. O controle técnico da transição dos registros é
obtido através da prática sistemática de exercícios adequados e consistentes. As escalas de
longa extensão com agilidade colaboram diretamente para esse controle. Para um estudo
profundo sobre unificação dos registros, indicamos Miller, 1986, p. 132-149.
Quando a técnica vocal está em formação, um tenor lírico experimenta dificuldade de
E a F#3, e um soprano lírico sente o mesmo de F para F#4. Um mezzo lírico, de E para F4, e
um barítono lírico, de E para Eb3 (Miller, 1986). As vozes femininas têm que aprender a lidar
com a voz de peito abaixo da zona pivotal por volta de E para Eb3 (soprano) e F3 (mezzos).
Aprender como administrar a mescla do uso da voz de peito e cabeça na voz grave é um dos
maiores objetivos no canto artístico para todas as vozes. Quando os registros não estão
unificados, a amplificação vocal fica muito prejudicada, pois o cantor apresentará vários
registros de cores muito diferentes, caracterizando sua técnica insuficiente.
Quando um som de peito exagerado é empurrado além dos limites naturais, o som irá
ficar tenso, desafinado e com curto potencial de extensão para o agudo. O estresse muscular
acumulado por empurrar além do ponto pivotal (transição médio-agudo) irá ocasionalmente
quebrar abruptamente antes de atingir a voz de cabeça, produzindo uma qualidade bem
diferente.
A ação muscular estressada/sobrecarregada é associada com um controle exacerbado,
hiperfuncional, ajustamento estático do mecanismo da laringe; por exemplo: som liso, sem
vibrato é um produto de ajuste estático. Em contraste, um ajuste dinâmico permite a ação
coordenada dos músculos, estimulando as transições suaves acompanhadas pelo som com
vibração. A administração dessas transições naturais de registro normalmente requer um
aumento extra de energia respiratória na zona pivotal, com diminuição da coaptação das
pregas vocais.
Ware (1998, p. 124) explica a percepção da afinação essencial para um equilíbrio
dinâmico entre os mecanismos agudo e grave, da seguinte forma: (1) a altura (afinação, nota
exata ou pitch) é determinada pelo mecanismo de peso na região inferior da voz, e pelo
mecanismo de leveza na região aguda; (2) a intensidade, volume ou loudness pode ser obtida
70
70
numa produção leve (sem som soproso) no canto suave e uma produção pesada (sem
pressionar demais) no canto mais forte; e (3) o timbre ou a qualidade do som produzido pelo
mecanismo pesado é um timbre rico, ressonante, enquanto que o mecanismo leve produz um
som mais doce. Portanto, a consciência técnica dos registros, a administração das zonas de
passaggio e o controle respiratório precisam estar engajados para a produção de uma voz
amplificada equilibrada e saudável.
Pinho (2008) explica que as quebras nas passagens podem ser dribladas com a
elevação do palato mole e o abaixamento da laringe (sem compressão da língua) nas escalas
ascendentes (cobertura) e, nas descendentes, deve-se usar o processo inverso (descobertura),
comprimindo a faringe, baixando o palato mole e elevando a laringe (PINHO, 2008, p.51). A
autora sugere a transformação das vogais abertas em fechadas para realização da cobertura
(exemplo: /ô/ em /u/), sendo o biquinho francês de grande auxílio. Usa-se a ressonância
faríngea, transformando-se /n/ ou /m/ para /m/ ou discreta nasalidade para descer a escala.
Nos hiperagudos, a autora prescreve o uso de /ã/ para elevação do palato. Exercícios de
vibração dos lábios e da língua auxiliam na eliminação da tensão relativa a constrições.
2.6 Articulação
Segundo Miller, os sistemas de ressonância e articulatório são integrados, pois a
articulação controla a ressonância (MILLER, 1986, p. 48). A laringe produz um som chamado
por Brown (1996) de som primordial, que é basicamente um zumbido ininteligível, de
frequência variável conforme a velocidade de vibração das pregas vocais. Este som ainda não
pode ser chamado de fala.
É dado o nome de articulação às manobras de ajuste no formato/configuração do
trato vocal durante a fonação (Sundberg, 1987; Björkner, 2006). As modificações da forma e,
portanto, das propriedades acústicas do trato vocal (o processo articulatório) são realizadas
pelos articuladores. Estes (lábios, língua, mandíbula, velum (palato) e laringe) (ver figura
abaixo) definem a área funcionante (o formato específico), que determina a capacidade de
transferência do som do trato vocal. Nessa área funcionante são geradas as frequências
formantes (parciais do espectro da fonte glótica), as concentrações de energia acústica que
serão emitidas pelo cantor.
71
71
Figura 11a: Articuladores (ROACH, 1991, p.8).
Brown (1996) afirma que falar é natural (as crianças e até papagaios o fazem por
imitação), mas, no canto, deve-se falar consciente e profissionalmente. Segundo Brown,
linguagem é formato (fôrma, configuração). O espaço na boca e faringe modificam-se e os
diversos harmônicos do som primordial são reforçados ou enfraquecidos, produzindo
qualidades denominadas vogais. O modo que os articuladores interrompem, opondo
resistência ao fluxo de ar, cria ruídos rotulados de consoantes. Callas comparou o legato no
canto a um fio de telefone com pássaros pousados neste. Os pássaros representam as
consoantes e o fio, um constante fluxo de som
28
(BROWN, 1996, p. 99). Oren Brown
representa a idéia de vogais e consoantes de uma forma bastante objetiva e clara:
Eu gosto de comparar a criação da fala à imagem de um foco de luz, que poderia representar a
fonte sonora. A glote e a origem do seu som primário schwa /"/. Diferentes cores de gelatinas
colocadas alternadamente na frente desses focos de luz simbolizariam as vogais. Se às luzes
coloridas então produzidas fossem subsequentemente dadas formas por passarem através de
uma variedade de aberturas de fôrmas, essas seriam as consoantes. A forma final colorida
representaria a palavra (BROWN, 1996, p. 99).
29
Segundo Björkner (2006), os fonemas, que se dividem principalmente em vogais e
consoantes (pelo menos nos idiomas mais usados para o canto artístico), apresentam
características ressonantais próprias, com medições de F1 e F2 específicas, que definem que
aquela vogal seja um [i] ou um [a]. Os fonemas são representados por símbolos que foram
28
Callas compared legato singing to a telephone wire with birds perched on it. The birds represent the
consonants and the wire a steady flow of tone.
29
I like to compare the generation of speech to the image of a spotlight which would represent the source of
sound. The glottis and the origin of your primal schwa /"/. Different colored gelatins placed alternately in front
of the spotlight would the symbolize the vowels. If the colored light thus produced was subsequently given form
by being passed through a variety of shaped openings these would equate with the consonants. The final shaped
colored light would represent the word.
72
72
padronizados em códigos compilados em um documento único conhecido como IPA
(International Phonetic Alphabet). Esse sistema internacionalmente padronizado traduz sons
da fala em símbolos fonéticos, sendo que um mesmo símbolo é utilizado em diversos idiomas.
Apesar de não prever dialetos ou sotaques regionais, o cantor encontra nesse sistema uma boa
referência para a literatura lírica. O Quadro 2.3 apresenta esses fonemas.
Quadro 2.3. Vogais nos idiomas inglês, italiano, alemão e francês (WARE, 1998, p. 157)
Fonemas
básicos
Símbolos
IPA
Inglês
Italiano
Alemão
Francês
Ee
[i]
seat
si
Sie
Hiver
Ih
[I]
sit
immer
Ay
[e]
day
vero
Leben
Été
Eh
[ε]
get
belle
Denn
Clair
[æ]
back
Ah
[a]
Parle
[α]
father
casa
Mann
Rãs
Aw
[ɔ]
crawl
gloria
kommt
Folie
Uh
[λ]
shut
Oh
[o]
tone
dove
So
Hotel
[U]
look
Und
Oo
[u]
soothe
sua
Zu
Boule
No Brasil, um grupo de trabalho formado nos Congressos da ANPPOM (Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música) - de 2003 a 2006, em 2007 organizou as
Normas para a Pronúncia do Português Brasileiro no Canto Erudito. O registro foi feito em
tabelas, conforme alguns modelos de documentos das áreas de linguística, fonoaudiologia e
também nos estudos fonético-articulatórios aplicados ao canto. A seguir, estão informações
desse registro e a apresentação das tabelas se encontram no Anexo 4.
Em 2007, no GT “O Português Brasileiro Cantado” (XVII Congresso da ANPPOM, São Paulo,
2007), foram feitas as alterações e aperfeiçoamentos nos conteúdos dos trabalhos anteriores.
Considerando-se as suas eventuais divergências em relação aos padrões propostos pela
Academia Brasileira de Letras (ABL), valorizaram-se soluções que atendessem às necessidades
dos cantores, professores de canto, professores de dicção, co-repetidores, maestros, enfim,
todos os profissionais do canto. Com a publicação de Normas para a Pronúncia do Português
Brasileiro no Canto Erudito, encerra-se a tarefa inicial de estabelecer um padrão de pronúncia
reconhecivelmente brasileira para o canto erudito, sem estrangeirismos ou regionalismos,
73
73
reservando-se a consideração das influências internacionais e das importantes variedades
regionais e históricas da nossa língua para estudos futuros. Os símbolos fonéticos propostos
foram selecionados a partir do padrão estabelecido pela International Phonetic Association,
que desde o final do século XIX se dedica à proposição, ampliação e constante atualização do
IPA - International Phonetic Alphabet (IPA), resultado da identificação, classificação e registro
de traços fonético-fonológicos das mais diversas línguas naturais e artificiais do mundo. Mais
informações sobre a proposição original e a evolução dos símbolos fonéticos referenciais do
PB Cantado podem ser encontradas no Handbook of the International Phonetic Association: A
guide to the use of the international phonetic alphabet. Cambridge: Cambridge University
Press, 2001 (KAYAMA, 2007).
2.6 Vogais
As vogais são definidas como o som glótico filtrado pelo trato vocal, que assumem
diferentes qualidades (sons espectrais, cores ou timbres), produzidos sem nenhuma constrição
(resistência ou impedância) na sua emissão. Cada vogal tem suas propriedades acústicas
próprias, sua distribuição de energia única ou espectro, criada através de uma configuração
específica do trato vocal.
Segundo Ware (1998), para cada vogal existe uma extensão de frequências de F1 e
F2, e os principais fatores que determinam diferenças sutis entre o som das vogais são: (1)
características de cada vogal; (2) diferenças nos órgãos articulatórios de cada cantor; (3)
diferenças entre os gêneros; (4) extensão vocalizada; (5) dialetos ou sotaques; (6) efeitos
emocionais intencionais; e (7) níveis de dinâmica. O cantor, dentre esses fatores, procura a
eficiência vogal a ser aplicada em um repertório específico.
Zemlin (2005) explica quatro aspectos de uma postura articulatória para modificação
do trato vocal na construção das vogais: (1) ponto de maior constrição; (2) grau de constrição;
(3) grau de arredondamento dos lábios; e (4) grau de tensão muscular.
São esses fatores de modificação do trato vocal que o cantor treinado aprende a
entender, a utilizar a seu favor e a buscar a produção mais eficiente de cada vogal em cada
região da voz para cada gênero ou estilo de música. As inúmeras possibilidades de emissão
das vogais são uma das causas das múltiplas cores vocais dos intérpretes.
2.6.1 O triângulo das vogais
Importante ressaltar a utilização de barras duplas / / e colchetes [ ] na exposição
sobre os fonemas: usa-se barra dupla para definir a letra, por exemplo, /i/, não importando o
som que essa vogal possa ter como fonema; usa-se [ ] para representar os fonemas, ou seja, os
sons possíveis daquela determinada vogal. Por exemplo, a vogal /e/ pode ser representada
74
74
como [e] (/e/ fechado) ou [ε] (/e/ aberto). uma discrepância na literatura, que é a
representação da vogal /a/. O [a] é um /a/ claro, aberto, enquanto que o símbolo [ɑ] é o
chamado /a/ escuro (dark /a/). Ware (1998) usa o símbolo [ɑ] para todas as ocorrências de
/a/, porém nem todas são abertas. Provavelmente ele supõe que no canto lírico deva-se utilizar
um /a/ mais arredondado e por isso assumiu esta opção.
Trata-se de um plano visual de onde as vogais são formadas na cavidade oral e
objetiva conhecer o cantor com seu espectro vocal completo, determinado principalmente pela
posição da língua (WARE, 1998). Neste plano estão representadas as partes do trato vocal
(Figura 2.12).
Figura 2.11b: Triângulo das vogais. Duas formas de representação: as vogais fechadas nos extremos e abertas no
meio (BROWN, 1996, p. 103), e a disposição do eixo frente-fundo nas vogais /i/ e /u/. As vogais /a/, /i/ e /u/
representam os três extremos de F1-F2 em termos de localização no gráfico e na colocação da língua. As outras
vogais estão entre estes extremos. As pontas extremas são: em /a/ a língua é baixa e posterior, em /i/ a língua é
alta e frontal, e em /u/ a língua é alta e posterior (BECKMAN, 2007).
Para o canto artístico, as vogais são classificadas de acordo com a posição da língua
dentro da cavidade oral (ver Fig. 2.12), e são classificadas em: (1) Vogais anteriores ou de
língua [i], [e], [ε] (/e/ aberto); (2) Vogais baixas ou centrais [a]; (3) Vogais posteriores ou
de lábio [u], [o], [ɔ] (/o/ aberto). Richard Miller (2008) classifica as vogais em séries e
segundo o modo fonético: (1) vogais frontais ou laterais (front ou lateral vowels): /i– Ie– ε
ӕ/; e (2) vogais posteriores, de fundo ou arredondadas (back ou rounded vowels): /ɔo– ʊ
u/.
75
75
Figura 2.12: Quadrilátero vocálico onde estão as posições da língua para as vogais (ZEMLIN, 2005, p. 319).
2.6.2 Características das vogais
Segundo Ware (1998), ao cantar uma série vocal do [i] para o [u] em uma
nota única, percebe-se que as mais altas frequências do segundo formante de /i/ possuem um
timbre mais brilhante e aparentam mais baixas nas vogais [e], [a], [o] e [u]; esta última soa a
mais baixa porque os formantes baixos predominam. São claras as diferenças entre os timbres
de [u] como mais escuro, baixa afinação, e [i] como mais brilhante e afinado para cima.
Quadro 2.5 - Resumo das características das vogais (WARE, 1998, p. 161)
Características
das vogais
/i/
/e/
/a/
/o/
/u/
Percepção de
altura pitch
afinação
mais alta (para
frente)
------------
------------
-----------
mais baixa
para trás
Timbre
brilhante
------------
Médio
-----------
escuro
Posição da
língua e laringe
levantada
------------
levemente
levantada
-----------
abaixada
Menezes (2003) classifica as vogais de acordo com a ressonância gerada pelas
posições formânticas:
1. COMPACTAS: os dois formantes principais estão próximos um do outro: vogal /a/.
2. DIFUSAS: as duas primeiras regiões formânticas ou formantes estão afastadas uma
da outra, como nos fonemas [i] e [u].
76
76
3. CLARAS ou ABERTAS: seu segundo formante é bem agudo (acima de 200 Hz): [i].
4. ESCURAS ou FECHADAS: segundo formante em região mais grave (entre 800 e
1100 Hz): [u].
2.6.3 A língua nas vogais
A língua é o órgão articulador principal para a variação do tamanho do trato vocal na
formação das vogais e realiza ajustes importantes (alto-baixo e frente-trás/fundo).
(1) (2)
Figura: (1) Posição das vogais e altura da língua; e (2) Partes da língua vistas de cima
e de perfil (ROACH, 1991).
Ware (1998) cita o trabalho de Titze (1984), que afirma que a língua elevada cria um
primeiro formante mais baixo e um segundo formante mais alto. Na vogal /i/ a língua fica
arqueada e vai gradualmente, de uma seqüência de [i e a o u], abaixando até /u/ (para baixo e
para trás).
2.6.4 A laringe nas vogais
A laringe, segundo Ware (1998), fica em sua posição frontal mais alta no /i/ e move-
se gradualmente para sua posição mais abaixada no /u/. Nas condições ideais de canto, esses
movimentos de transição devem ser suaves com conforto na laringe. O posicionamento
laríngeo na produção vogal é afetado pela ação dos articuladores.
Johan Sundberg informa as posições laríngeas em estudos acústicos da voz cantada:
...estudos de cantores mostrando que a laringe é abaixada com a fonação se elevando, a qual
coincide com o aumento da abertura da mandíbula na elevação da altura. Ele também afirma
que o arredondamento dos lábios tende a abaixar a laringe, enquanto que o lábio solto tende a
77
77
elevá-la. Além do mais, deprimindo ou relaxando a língua (e mandíbula), especialmente
cantando as vogais mais escuras /ɑ
30
/, /o/ e /u/, irá efetivamente abaixar a laringe; e elevando a
língua, especialmente cantando as vogais mais brilhantes /i/ e /e/, irá levantá-la (SUNDBERG
apud WARE,1998, p.162-163) .
Fonema:
[a]
[i]
[u]
Figura 2.13: Cada vogal tem seu espectro próprio e as cavidades oral e nasal, determinadas pela articulação,
influenciam diretamente esse espectro.
Figura 2.14: Espectro Harmônico. Cada som de cada vogal tem seu espectro harmônico (HyperPhysics, 2006).
F1 x F2, formantes determinados pelas vogais: gráfico adaptado de G.E. Peterson e H.L. Barney (1952),
mostrando as regiões de frequência para F1 e F2, que resultam nas 10 vogais do idioma inglês (TITZE, 2010).
2.6.5 Características específicas vogais
A vogal /a/ mostra a maior variedade de timbre e seu espectro é próximo ao espectro
da glote. A resistência glótica é similar em [a] e [u], mas é mais alta em [i], o que significa
que as diferenças das produções laríngeas nas vogais podem ser relacionadas às diferenças na
quantidade de esforço para a produção. O som vocal com maior energia acústica é [ɔ], e o
mais fraco é [i]. Entretanto, cantores treinados são capazes de intensificar o [i] de tal maneira
que podem igualar às outras vogais em timbre e consistência (WARE, 1998).
30
Observe nessa citação de Ware (1998) o uso doɑ” para representar a vogal /a/.
78
78
Cantando [i] um puxão na comissura anterior que tende a facilitar o fechamento
da glote. A base da língua também se eleva levemente e a epiglote se afasta para as pregas
vocais serem visualizadas. Um extremo oposto espectral vogal é o [u] e tem efeito de alívio e
terapêutico (WARE, 1998).
Para um estudo aprofundado sobre as vogais, indica-se o trabalho de Ralph
Appelman (1986), que realizou uma pesquisa incluindo fotos de radiografias em perfil de
todas as vogais do inglês americano. Em seu livro, no capítulo 10, cujo título é “Análise
cinesiológica
31
dos sons da fala no canto”, ele desenvolve todo um processo de análise dos
fonemas e suas características peculiares. Esse livro oferece uma gama de possibilidades para
estudos posteriores sobre fonemas.
Segundo Appelman (1986), as vogais cardinais, ou cardeais, são aquelas que
apresentam posições de língua específicas e que asseguram uma reprodução acústica mais
precisa. Apesar de a literatura apontar para diferentes definições, a mais aceita é o conjunto
das vogais [i, e, ɛ, a, ɔ, o, u]. Dentre esses fonemas, [i, e, a, o, u] apresentam língua mais
firme, enquanto que os fonemas [ɪ], [ɛ], [ɑ], [ɔ] e [ʊ] são relaxados ou abertos pela
necessidade de menor elevação de língua. Os fonemas escuros [ɪ, ɑ, ʊ] são usados em idiomas
como o inglês e o alemão, e fazem com que essas línguas soem bem arredondadas. Em
compensação, no italiano e no português observa-se a presença de vogais mais claras como [a,
ɛ, ɔ].
A compreensão do posicionamento das vogais é imprescindível no estudo de canto e
grande parte dos problemas técnicos está relacionada ao mau uso dos articuladores para a
formação adequada dos fonemas. Miller (1986) também discute isso no Capítulo 5 de seu
livro The Structure of Singing, cujo título é “A vogal bem equilibrada: diferenciação vocal no
canto.” Ele apresenta um estudo individualizado sobre cada vogal quanto à posição, forma e
demais características. Segundo Miller, também o uso equilibrado dos articuladores para
produção adequada dos fonemas está intimamente relacionado à projeção do canto lírico.
31
Cinesiologia é um termo que vem etimologicamente de kinein (movimento) e logos (estudo), o estudo do
movimento. Análise cinesiológica dos fonemas é um estudo que observa os movimentos do trato vocal para cada
respectivo fonema.
79
79
As quatro vogais francesas [ɛ
32
], [ɑ], [ɔ] e [œ], todas representadas com til /~/
(anasaladas), são vocalizadas, permitindo que o palato mole (velum) relaxe e a porta nasal
permaneça levemente aberta, facilitando a ressonância nasal.
2.6.6 Vogais Umlaut
Umlaut é a mistura de duas vogais, ou seja, formato da boca para uma vogal e
emissão de outra. Este tipo de vogal mista ocorre no francês e no alemão, principalmente.
Quadro 2.6 - Tabela de vogais Umlaut (WARE, 1998, p.165)
Símbolos IPA
Tipo
Alemão
Francês
/y/ = [i] + [u]
Umlaut/misto (F)
Über (longo)
Sur
/Y/ = [ɪ] + [ʊ]
Umlaut
Hütte (curto)
----
/ø/ = [e] +[o]
Umlaut/misto
Schön (longo)
Deux
/œ/ = [ɛ] + [ɔ]
Umlaut/misto
Götter (curto)
Fleur
2.6.7 Vogais neutras
As vogais neutras são representadas pelo fonema ["], chamado schwa, derivadas do
hebraico e do alemão. Este som é encontrado no inglês (obvious), no alemão (liebe) e no
francês (je), principalmente. Em geral é usada em sílabas átonas. a vogal surda /ʌ/, se
encontra no inglês (dull) e é usada em sílabas tônicas.
2.7 Semivogais (glissando ou deslizando)
É a cominação de duas ou mais vogais que formam um só som.
Quadro 2. 7 - Tabela de semivogais, baseada em WARE, 1998, p. 165 e KAYAMA, 2007.
IPA
Inglês
Alemão
Francês
Italiano
Português
/hw/
Which
Sério
/w/
Suave
quando
quadra
/j/
you
jahr
hier
ieri
férias
/ɥ/
puis
/ɝ/ r
silencioso
word
/ɚ/ r
silencioso
per
2.8 Ditongos e Tritongos
Ditongos: duplas vogais soadas juntas como únicas, com ênfase na primeira vogal
quando cantadas (WARE, 1998). Segundo Ware, o principal problema é que os cantores
32
Tem sido difícil usar os símbolos fonéticos nos diversos sistemas operacionais. Tendo em vista a possibilidade
de gerar erro de representação gráfica desses fonemas nasais, optou-se por descrever o fonema. No exemplo
acima, as vogais seriam representadas [õ] com o til. Mas os fonemas em questão não aceitaram o til.
80
80
enfatizam a segunda vogal do ditongo; deve-se alongar a primeira vogal do ditongo e
minimizar a segunda. Essa discussão merece um trabalho mais aprofundado, não contemplado
nesta dissertação. Sugerimos o tema ditongos nos diversos idiomas para pesquisas posteriores.
A literatura de dicção lírica aponta diversas incongruências na execução de ditongos,
pois cada idioma tem suas peculiaridades e não devem ser representados do mesmo modo. As
semivogais podem variar quanto à duração. Por exemplo, no inglês encontramos diferenças
entre sit (sentar) representada por [sɪt], um som entre /i/ e /e/ de curta duração; e seat (assento)
representada por [si:t]. Neste último caso, o diacrítico “:” indica uma prolongação da vogal /i/.
O português brasileiro não apresenta este tipo de sutileza na prática, por isso muitos alunos de
canto não entendem a diferença de duração das vogais na hora de cantar. É importante o
estudo desses aspectos fonêmicos para uma dicção mais precisa, pois esta corrobora
diretamente com a boa projeção vocal.
2.9. Modificação vogal (aggiustamento) e eficiência sonora
Esse tipo de modificação vocálica é uma técnica desejável que os cantores gastam tempo e esforço
consideráveis para desenvolver, embora estejam frequentemente inconscientes do que estão
realmente aprendendo (WARE, 1998, p. 168).
33
Segundo Appelman (1967), modificação vogal é sinônimo de migração fonética, ou
ainda migração da vogal. É uma técnica originada do Bel Canto que prescreve a modificação
da vogal cantada a fim de preservar a sua inteligibilidade e de não sofrer alterações sonoras
com mudanças no registro. Para tanto, são realizados ajustes no trato vocal. Tais ajustes
devem ser graduais e imperceptíveis na maioria das vezes, principalmente na sequência grave
para agudo. De acordo com Miller (1986), aproximando-se uma vogal de sua vizinha, em
direção a neutralização ou não, o espectro harmônico (equilíbrio da fundamental e seus
harmônicos) pode ser mantido em proporção dentro da escala (p. 157).
O aggiustamento (termo preferido por Miller), ou modificação vogal, explica o que
ocorre na voz equilibrada dinamicamente através da extensão vocal, resultando na produção
de um som caracterizado por ambas as qualidades: brilhante e escura. Esse recurso é usado
para neutralizar timbres vocais estridentes, escancarados ou penetrantes demais. Implica,
portanto, em equalização do timbre em toda a extensão cantada. Miller (2008) chama a
33
This kind of vowel modification is a desirable technique that singers spend considerable time and effort
mastering, although they are often unaware of what they are actually learning.
81
81
atenção para dois ajustes importantes: (1) aumento gradativo na energia respiratória (com
suporte ou appoggio e não significando alta taxa de expulsão do ar); e (2) um ajustamento do
trato vocal através da modificação vogal. Apesar de, na escola de Canto Italiana tradicional,
não se utilizar a vogal neutra ["], pois esta não existe no idioma italiano, Miller alega que ir
em direção à neutralidade nos sons agudos ajuda a manter a sonoridade mais flexível.
Entretanto, é importante manter a integridade das vogais (Miller, 1986, pp. 157-158) para não
haver distorções.
Segundo Titze (2010), a modificação vogal consiste em ajustes nos eixos frente-
faringe e fundo-faringe, abaixamento da mandíbula que altera F1 (que sobe ao abaixar a
mandíbula). A metade anterior ou frontal (boca) ou a metade final, posterior ou de fundo
(faringe), é alterada (estreitada ou em constrição). O autor organizou algumas regras básicas
para a modificação vogal:
(1) Todas as frequências formantes diminuem uniformemente com o aumento do
comprimento do trato vocal. Segundo Titze, não podemos mudar o comprimento anatômico
do trato, porém, por volta de 10% pode ser alterado com o abaixar ou elevar da laringe (altura
laríngea), ou fazendo a ou retração dos lábios, o que altera os formantes, resultando em
alteração da cor das vogais.
(2) Todas as frequências formantes diminuem uniformemente com o arredondamento
(acusticamente equivale a “cobrir” a boca) dos lábios e elevam quando são esticados
(esparramados). Boca: sua constrição abaixa o primeiro formante F1 e eleva F2, criando um
espectro vogal difuso, com a energia acústica se irradiando em ambas as frequências (alta e
baixa), como nas vogais /i/ e /e/. Faringe: sua contrição eleva F1 e abaixa F2, o espectro vocal
fica compactado, como em /o/.
82
82
Figura 2.15: A) Comparação entre espectros harmônicos da mesma vogal AH (/a/) (como em “alegria” ou
“father”). O gráfico mostra a vogal /a/ em diferentes frequências (alturas ou pitch) (HyperPhysics, 2010).
2.9.1 O trajeto dos formantes
As frequências dos formantes que conferem a identidade fonética às vogais são especialmente
as primeiras (F1 e F2). Tais frequências estão relacionadas respectivamente à conformação da
cavidade posterior (faringe), atrás do ponto de máxima constrição lingual (F1) e à cavidade
anterior (cavidade oral) à constrição lingual (F2). Considera-se também que F1 sofra
influências da altura de língua e da abertura de boca, e F2, variações no eixo ântero-posterior.
O terceiro formante (F3) está relacionado à passagem da constrição, ou seja, à cavidade atrás
da constrição de língua e na frente dela (LIMA, 2007).
A técnica vocal objetiva a produção eficiente de vogais, bem como um bom espectro
radiado que tenha grande projeção. Isto é conquistado através do alinhamento dos formantes
do trato vocal do cantor, com a frequência fundamental (F0) oriunda da vibração das pregas
vocais. Em outras palavras, o cantor manipula seu próprio trato vocal de modo que coincida
com os harmônicos. Este processo é conhecido por caminho/trilha do formante ou
sintonia/afinação do formante (formant tracking ou formant tuning) (WARE, 1998; MILLER,
2008). Exemplos: (1) um barítono abaixa suavemente a mandíbula para alinhar o seu terceiro
harmônico com o primeiro formante do seu trato vocal; (2) um soprano cantando /i/ em F4 (fá
4, 700Hz), seu F0 de 700Hz é acima de F1 da vogal. Seu quarto ou quinto harmônico (2800
Hz ou 3500 Hz) coincide com F2 (segundo formante), mas toda a energia harmônica abaixo é
atenuada pelas propriedades do trato vocal nessa configuração. Entretanto, se o soprano
modifica sua vogal para [ɛ] ou [ӕ], as ressonâncias do trato vocal ou formantes irão reforçar
sua F0 de 700 Hz, aumentando a energia sonora final. O cantor precisa abaixar a língua ou
deixar cair a mandíbula para elevar a frequência de F1, o que previne perda de energia
acústica. Acima de A5 (880 Hz) ou Bb5(988 Hz), o soprano pode cantar [ӕ], [a] ou [ɛ]
para não sacrificar a energia acústica (WARE, 1998, p. 168).
83
83
Nos casos em que F0 está abaixo de F1 e F2 de uma vogal, o alcance das frequências
dos dois formantes possibilita a modificação da vogal para que coincidam com um ou mais
harmônicos de F0.
Para algumas vogais, um amplo alcance de posições da língua e mandíbula é usado
para obter o melhor som em conjugação com a vogal correta. Esse tipo de modificação é o
alvo da técnica.
2.9.2 Modificações nas transições de registros
A modificação vocal é crucial na negociação da transição das zonas entre
registros (de peito e cabeça), e alcança um crucial pico no ponto pivotal de transição de
registro, ostensivamente por causa das mudanças súbitas no espectro da fonte glótica nesses
pontos.
De acordo com Titze (1994), a modificação da vogal poderia retificar as transições
de ângulo espectrais, por exemplo: tenor lírico muda o registro em F#3, onde a vogal deve ser
ajustada acusticamente. Segundo Ware (1998), a modificação vocal ocorre naturalmente se o
cantor mantiver: (1) alinhamento corpo-trato vocal apropriado; (2) sensações de colocação
frontal na máscara (cabeça); (3) envolvimento articulatório natural; e (4) controle respiratório
suficiente.
Quando o cantor se aproxima das zonas de transição mais agudas, é aconselhável
mudança das vogais na direção de ajustes de maior abertura, relaxamento articulatório e
mandíbula mais caída, ou seja, em direção a vogais neutras como schwa. Os cantores
deveriam evitar o uso de táticas manipulativas para cobrir superficialmente ou escurecer o
som. De acordo com Miller (1992), o conceito de cobertura é um dos mais confusos tópicos
no canto. O autor define cobertura (copertura) como um ajuste acústico (aggiustamento) que
o cantor realiza através da alteração do formato do trato vocal ressonador, resultando em
modificação gradual na vogal em uma escala e promovendo o timbre fechado (chiuso) em
oposição ao timbre aberto (voce aperta).
O modelo italiano de cobertura é baseado no bom equilíbrio da ressonância vocal que
produz o timbre desejável de voce chiusa, ou voz fechada, oposto da voce aperta, ou voz
aberta, mais estridente, qualidade mais gritada de som. Em contraste com o conceito de
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84
cobertura (copertura) da escola italiana, a concepção da escola alemã (deckung
34
) é de um
ajuste abrupto que ocorre na nota pivô no secondo passaggio, denominados sons mais
escuros, na garganta ou empurrados. Segundo Ware (1998), outra forma de obtenção da voz
fechada é pensar em cantar vogais nas suas configurações eficientes, ou seja, próximas às
posições “tensa/fechada” mais que “aberta/relaxada”. Alguns cantores tendem a pronunciar
vogais com uma posição mais difusa, aberta, escancarada, contrária à desejável posição mais
vertical. Se uma escala é feita concentrando-se em ser mais escura todo o tempo e mantendo-
se uma sensação de ressonância frontal na altura da máscara (olhos e raiz do nariz), palato
duro e ponte alveolar, pode-se experimentar as vogais fechadas mais eficientemente.
Um bom exemplo de clareza de vogais é a vogal /e/ geralmente pronunciada como
um ditongo, que deve ser pronunciado como uma posição mais alta da boca. Isto deve ser
feito em todas as vogais, o que não significa evitar posições abertas, mas dar atenção à
colocação vogal. Cantar vogais em toda a extensão com qualidade sonora consistente requer
um compromisso mental para se produzir a vogal pretendida na maneira mais natural, porém
sofisticada. Exemplo: um [ɑ] irá lembrar as qualidades equilibradas claro/escuro
(chiaroscuro) das preferências da escola italiana e não irá soar como a mais escura [ɔ].
Geralmente, um maior espaço interior (boca e garganta) e maior fluxo aéreo são
necessários nas notas agudas e cada vogal precisa de mais espaço ressonador quando sobe em
altura, o que é feito deixando-se cair suavemente a mandíbula ou abrindo-a, dependendo da
vogal cantada. A língua deve estar relaxada, a mandíbula confortavelmente solta, a parede
faríngea deve ser esticada vertical e lateralmente e a laringe permanecer em uma posição livre
e flutuante, mas relativamente baixa. Não deverá haver tensão na produção de maior espaço
para notas agudas, ou o resultado será um som escuro e pesado. A solução para problemas da
mandíbula é manter um foco consistente, posicionado no alto na cabeça.
Esses ajustes de espaço interno apresentam grande dificuldade para os alunos.
Compreender as diferenças dos espaços nos registros grave, misto e agudo é um desafio
constante durante o estudo de canto. Tais ajustes se relacionam às proporções acústicas entre
pressão aérea, região da voz, resistência glótica e desenho do trato vocal para produção do
fonema desejado, um conjunto complexo de fatores que geralmente não são compreendidos
claramente nem por parte do professor nem do aluno. A verdade amplamente difundida na
34
Deckung em alemão significa coberto (Webster’s New World German Dictionary. NY: MACMILLAN, 1987,
p. 102).
85
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literatura é que a energia do apoio deve sustentar o trato vocal, principalmente através da
tensão véu palatino. Qualquer tensão na região faríngea é nociva (Miller 1986, p. 158) e a voz
deve sempre flutuar (cantar sul fiato) e levar o som através da coluna de ar, sem esforço, mas
com tônus e atitude artística.
2.9.3 Vogais e legato no canto
As vogais são usadas para o desenvolvimento do estilo vocal legato. Esse estilo, ou
técnica articulatória, implica em seguir com o som, ligar, cantar homogeneamente, de maneira
conectada, como descreve e prescreve Clifton Ware:
Legato significa literalmenteligado (seguido) e, no canto, isso significa cantar de um modo
suave e conectado. A técnica do canto legato é baseada na prática de sustentação do som de
vogal pura, evitando-se a prolongação das consoantes (mantendo-as secas e energizadas) e
adiando a vogal final de um ditongo, dando-se atenção primordial à primeira vogal. Embora se
possa levar tempo para desenvolver essas habilidades, uma maneira de se obter essa “linha
vocal” é treinar cantar todo o repertório com os sons vocálicos do texto, retirando-se as
consoantes
35
(WARE, 1998, p. 170).
Articulação é um termo usado para todas as manobras que mudam o formato do trato
vocal. É realizada pelos articuladores (faringe, língua, mandíbula, palato mole ou velum e
lábios). As frequências dos dois primeiros formantes F1 e F2 determinam a qualidade das
vogais, enquanto que os formantes mais agudos F3, F4 e F5 influenciam mais a qualidade do
timbre e interferem na intensidade vocal.
Nas transições de registro, o cuidado com a articulação deve ser redobrado. O
movimento contínuo do mecanismo articulador impede as posições fixas do trato vocal;
contudo, boa articulação e dicção clara exigem movimentos do trato vocal e podem ser
gravados por símbolos fonéticos exatos. Os ajustes da língua, dos lábios, da mandíbula, do
velum e dos ressonadores podem definir uma posição fonética reconhecível mais precisamente
durante o canto que na fala, por causa da duração da emissão sonora.
Apesar das posições não serem estáticas, fixas ou rígidas, a definição da vogal
garante um alto grau de exatidão acústica, que objetiva a produção de uma vogal pura,
traduzida em som de qualidade.
35
Legato literally meansbound, and in singing it means singing in a smooth, connected manner. Legato
singing technique is based on the practice of sustaining pure vowel sound by avoiding the prolongation of
consonants (keeping them crisply energized) and postponing the final vowel of a diphthong by giving
primary attention to the first vowel. Although it may take time to develop these skills, one way to achieve
this “vocal line” is to practice singing all vocal literature on the textual vowel sounds minus the consonants. .
86
86
2.9.4 A posição acústica de descanso
As características fonéticas das vogais estão relacionadas a um constante ponto de
referência. Se não há fonação, uma posição de descanso ou estado de repouso acontece, sem a
exagerada atividade respiratória, e a língua fica relaxada na boca, com sua lâmina (ambos:
ponta e parte da frente) em contato suave com os dentes inferiores. A figura abaixo ilustra a
posição correta da língua neste caso:
Figura 2.15: B) Posição da língua na posição acústica de descanso (LEHMANN, 1902, p.100).
As filas de dentes superiores e inferiores estão levemente separadas,
independentemente se os lábios também estão. O maxilar superior e o inferior estão
separados, mesmo com a boca fechada, porque a mandíbula obedece à lei da gravidade. A
mandíbula deve estar conscientemente relaxada. A posição central da língua e a mandíbula
são os locais básicos para o mecanismo da fala. Também esta postura descrita é considerada a
posição da vogal neutra ["] (vogal schwa derivada do hebraico e germânico [no alemão
(liebe), francês (je) e inglês /ʌ/ (the)]. De acordo com Heirich (2005), existem muitas técnicas
para o relaxamento da mandíbula, que evitam rigidez. Estudiosa da técnica de Alexander, ela
defende que o ideal é não tensionar a mandíbula ou, se o cantor tiver esse problema de tensão,
deverá deixar esse hábito, promovendo um redirecionamento para um estado relaxado de
mandíbula. Segundo Pinho e Pontes (2008), exercícios de vibração labial (principalmente os
de lábio inferior e língua) são exercícios que colaboram com o relaxamento faríngeo,
promovem a drenagem das pregas vocais, e também o relaxamento da mandíbula (pp. 52-53).
2.10 As vogais cardinais
A posição da língua é definida como o ponto mais alto do corpo da língua. É difícil
descrever as posições da língua como alta, baixa, frontal, posterior, sem algum tipo de
referência. Denes e Pilson (1963) afirmam que as posições da língua em geral são descritas
por comparação com as posições usadas para emitir as vogais cardinais, que são um conjunto
de vogais cuja qualidade de percepção é substancialmente a mesma, independente do idioma
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87
utilizado. Constituem um conjunto de sons de referência-padrão, cuja qualidade é definida
independentemente de qualquer idioma específico.
Os estudos radiográficos de locutores demonstraram que as posições bastante
previsíveis da língua podem ser associadas às qualidades das vogais cardinais e, assim, é
comum comparar as posições da língua em todas as vogais com as das vogais cardinais. A
vogal produzida com a língua levantada e na frente é reconhecida como /i/. Se a língua se
mover para o extremo oposto da cavidade oral, para baixo e para trás, a vogal será
reconhecida como /a/.
Appelman (1967, p. 248) aponta a existência de oito vogais cardinais e suas posições
fisiológicas relativas são, com frequência, apresentadas na forma de um diagrama de vogais
cardinais. As vogais cardinais são úteis porque descrevem os limites fisiológicos da posição
da língua para a produção de sons vocálicos. Todas as vogais que produzimos estão dentro
dos limites descritos pelo diagrama de vogais cardinais.
2.10.1 O quadrilátero vocálico
O tradicional triângulo vocálico, ou quadrilátero vocálico (a literatura apresenta
como um trapézio invertido – ver Fig. 2.17), indica as zonas de articulação das vogais
comumente reconhecidas com relação às vogais cardinais. As vogais também são
classificadas de acordo com suas zonas de articulação com relação ao palato. Na produção
normal, quando a língua está alta e perto do palato, a vogal produzida é chamada vogal
fechada, e quando a língua está baixa, puxada para o fundo da cavidade oral, a vogal é aberta.
Os sons produzidos com a língua próxima do centro do quadrilátero vocálico são chamados
de vogais centrais ou neutras.
88
88
Figura 2.16 Detalhamento dos fonemas de acordo com o quadrilátero das vogais (ATKIELSKI, 2006).
Figura 2.17: A) Vogais: Detalhamento dos fonemas de acordo com o quadrilátero das vogais.
(http://web.uvic.ca/ling/resources/ipa/charts/IPAChart96.pdf).
Ainda podemos descrever a zona de articulação da língua como direcionada para
frente ou para trás da cavidade oral. O /i/, por exemplo, é uma vogal anterior fechada, o /u/ é
uma vogal posterior fechada. O /ӕ/ é uma vogal anterior aberta, o /a/ e o /ɔ/ são vogais
posteriores abertas. O arredondamento dos lábios e o grau de tensão muscular também são
usados para classificar as vogais. A compreensão das posições das vogais no triângulo das
89
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vogais é fundamental para a compreensão da produção vocal. Vários problemas técnicos são
oriundos da inadequação das vogais por parte do cantor.
2.10.2 Arredondamento dos lábios
Certas vogais são produzidas com os lábios relativamente separados. As
vogais [i, e, ɛ] são alguns exemplos. Podem ser comparadas com as vogais produzidas com o
lábio arredondado, como [ɔ, o, u]. Certas vogais parecem requerer mais atividade muscular
para sua produção que outras, como por exemplo, a vogal [a] necessita mais pressão sonora
que a [e].
2.10.3 Os Formantes das Vogais
Os sons complexos, como os gerados pela laringe, são compostos por frequências
que são múltiplas integrais da frequência mais baixa. O primeiro componente é a frequência
fundamental (1º harmônico) e as outras são supertons (overtones). Um parcial (frequência
parcial ou harmônico parcial) é um componente harmônico desse tom complexo e o espectro
do som é a soma de frequências de ressonância que produzem picos chamados formantes.
Todas as vogais, por si, têm ressonância, mas cada uma tem seu padrão próprio,
distinto (característico), que é resultado do número, frequências e distribuição dos overtones
que estão presente. Isso explica as diferenças nos padrões totais de ressonância resultantes e
que são percebidos como uma vogal ou outra. São padrões bem específicos que geram a
diferenciação vogal. É a alteração do formato e tamanho do tubo do trato vocal que irá
possibilitar a produção da vogal específica.
A configuração do trato faz a distribuição da energia acústica, um fenômeno que
permite a identificação de duas frequências máximas denominadas formantes, para o som
exato de cada vogal. Quando as cavidades de ressonância compõem uma vogal, uma altura é
determinada mesmo sem a aproximação completa das pregas, e podem ser ilustradas pelo
sussurro alto das vogais cardinais [i, e, a, o, u] em seqüência. Isso resultará em um padrão de
altura ascendente. Independentemente se são altos ou baixos, os harmônicos parciais que
dependem das diversas configurações do trato vocal identificam a vogal. Ouvimos a mesma
vogal determinada pelo seu espectro acústico específico, mesmo nas diversas alturas e regiões
da voz por toda a escala.
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90
Na acústica da fala e formação de vogais, identifica-se o fator físico que produz as
vogais frontais, as centrais e as posteriores. Esta classificação é de Minifie (1973), explicitada
por Miller (1986): se um maior estreitamento da via aérea durante a produção da vogal
como resultado da elevação da ponta e corpo da língua no ponto de estreitamento do trato
vocal, que ocorre perto da parte alveolar, esta é denominada uma vogal frontal [i, e, ɛ].
Quando e um maior estreitamento das vias aéreas entre o dorso da língua e o velum, ou
entre o dorso da língua e a parede posterior da faringe, a vogal é denominada de posterior: [ɔ,
o, u]. As outras vogais são produzidas com pontos de estreitamento do trato vocal, ou com o
maior ponto de constrição ocorrendo na região do palato duro, e são as vogais centrais: [a, ɑ].
Miller denomina as configurações específicas do trato vocal “diferenciação vogal”,
representada pelas configurações que podem ser realizadas isoladas ou juntas: (1) a posição da
língua no trato vocal, (2) a extensão de estreitamento entre a língua e o velum (palato mole),
(3) o comprimento da língua em relação ao estreitamento em certos pontos do trato vocal, (4)
a separação dos lábios, (5) o arredondamento dos lábios, (6) a separação da mandíbula, (7) a
posição da velofaringe e constrições da língua que ocorre em algumas posturas fonéticas
assim como na retroflexa (MILLER, 1986, p. 51).
Uma grande parte do trabalho da técnica no canto é feito a partir do equilíbrio dos
extremos das configurações acústicas do trato vocal. Os parciais mais altos essenciais às
vogais frontais precisam de uma posição de língua mais alta na frente que as vogais
posteriores: [i, e, ӕ, a].
36
As vogais frontais necessitam de um canal mais estreito na área da
frente da boca, criando mais espaço na faringe que as vogais de fundo. O palato elevado
contribui para a dimensão da faringe e comprimento total do trato vocal, e é também mais alto
nas vogais frontais que nas de fundo (posteriores). Em oposição, as vogais posteriores
apresentam um espaço frontal maior e menor espaço posterior (faríngeo).
A distorção acústica da vogal vai acontecer se a língua for mantida baixa e
plana na cavidade oral quando a forma acústica da vogal é determinada por uma posição bem
diferente da língua. Distorção acústica é audível se a língua é mantida alta quando devia ficar
baixa, e vice-versa. Essas distorções acústicas não são consideradas aggiustamento. São
distorções indesejáveis e demonstram uma técnica inconsistente.
36
A literatura aponta a vogal [a] ora como anterior, ora como central baixa. Neste caso, o autor classificou-a
como anterior.
91
91
2.11 Consoantes
Como é difícil para o aluno aceitar que a emissão adequada das consoantes no canto
não corresponde ao seu uso na fala habitual, o comentário de Ware (1998) aponta claramente
o motivo dessa sensação:
Emitindo-se as consoantes de uma maneira muito exagerada e sussurrada para palco, seguidas
de fortes níveis de dinâmica de fala e canto, pode-se experimentar o poder expressivo da
articulação das consoantes. Alunos iniciantes são muito encorajados a energizar fortemente e a
exagerar a articulação das consoantes, a ponto de os ouvintes relatarem ouvir distintamente
cada consoante e cada palavra. Esse exercício é, com frequência, muito estranho aos cantores
novatos, que são compreensivelmente tímidos e desacostumados a exagerar a fala. Os
resultados, no entanto, são quase sempre uma melhora tanto no som vocal total quanto na
expressão do texto, e muito válido o risco de se parecer tolo aos colegas.
37
Segundo Ware (1998), as consoantes carregam mais informações que as vogais, pois
esclarecem e revelam o significado e poder expressivo dos idiomas, colaborando com a
projeção vocal ao somar ruídos positivos ao espectro acústico final. As consoantes são sons
obtidos através da obstrução (parcial ou total) ou subdivisão nas cavidades supraglóticas.
Assim como as vogais, as consoantes são fonemas produzidos através do processo
articulatório exercido sobre o ar proveniente dos pulmões. Elas podem ser classificadas como:
1. FECHADAS: /p/, /b/, /t/, /d/, /k/, /j/
2. DIVERGENTES: /m/, /n/
3. CONSTRICTIVAS: /f/, /v/, /s/, /z/, /ch/
Várias são as maneiras de classificação das consoantes. De acordo com Ware (1998),
elas podem ser classificadas:
segundo o local (ou pontos, conforme Zemlin, 2005) de articulação: Podem
ser bilabiais, labiodentais, línguodentais, línguo-alveolares. línguo-velar,
línguo-palato-alveolar, línguo-palatal (ver Fig. 2.18).
segundo os modos de articulação, que descrevem o grau de constrição :
PLOSIVAS : de fechamento completo, que são /p/,/b/,/t/,/d/,/k/,/g/.
CONTÍNUAS: consoantes com som prolongado, podendo subdividir-se
em duas categorias:
1. vozeadas: produzidas com vibração das pregas: /v/, /z/, /j/, /l/,
/r/,/m/, /n/.
2. não vozeadas: não há vibração das pregas: /f/, /s/, /ch/, /h/.
37
By voicing consonants in a greatly exaggerated stage whisper, followed by louder dynamics levels of
speaking and singing, one can experience the expressive power of consonant articulation. Beginning students
are very much encouraged to strongly energize and exaggerate consonant articulation, to the extent that
listeners report distinctly hearing every consonant and word. This exercise is often very strange to novice
singers, who are understandably shy and unaccustomed to exaggerated speech. The results, however, are
almost always an improvement in both overall vocal tone and expression of text and well worth the risk of
looking foolish to one’s peers (WARE, 1998, p. 172).
92
92
Figura 2.17: B) Consoantes e as posições do trato vocal.
Um estudo detalhado sobre as consoantes é obrigatório para se compreender a
amplificação vocal no canto. As consoantes funcionam como gatilhos das vogais.
Figura 2.18: As consoantes de acordo com seu ponto de articulação.
(http://pages.slc.edu/~ebj/IM_97/Lecture9/consonants.gif)
Quando a emissão das consoantes e vogais está ajustada e coordenada com a
respiração, grande parte dos problemas técnicos está solucionada e a voz poderá ser
amplificada de maneira adequada, sem hiperfunção ou sobrecarga laríngea.
93
93
2.12 Timbre Vocal
Menezes (2003) aborda o tema do timbre, nomeando um capítulo de seu livro de: A
resultante enigmática: o timbre, definindo-o como:
...o timbre não constitui um parâmetro do som, mas consiste antes na resultante dos demais
atributos sonoros (a altura, a intensidade e a duração) interrelacionados entre si. [...] a
microorganização interna de um determinado espectro sonoro, o qual, em sua estruturação
microscópica, resulta da interrelação entre as alturas, as amplitudes, as durações e os
comportamentos dinâmicos (evolução das amplitudes no tempo) de seus parciais constituintes.
[...] Helmholtz, em 1883, define o timbre como sendo aquela propriedade que permite a
distinção de um som de outro contendo a mesma altura e intensidade (MENEZES, 2003,
p.199-200).
O timbre, atributo muito importante da acústica musical, é um elemento da
percepção de um evento sonoro referente à cor, ou nuance sonora. Acusticamente, um som
complexo é decomposto em sons senoidais, cada um com sua frequência, amplitude e fase
próprias. A complexidade de um som depende da relação entre as frequências dos sons
senoidais (os componentes, ou harmônicos). Quanto mais complexa a relação entre as
componentes (frequências dos sons senoidais), mais complexo será o som. Em ordem
crescente de complexidade sonora, existe desde uma simples onda senóide, com um só
componente, até o ruído branco (som que possui várias frequências), com infinitas
componentes. Entre um extremo e outro podem existir diversas nuances tímbricas, onde estão
incluídos a voz humana, os instrumentos e demais sons de ondas complexas.
O âmbito das frequências é uma representação da onda no tempo (aspecto temporal),
no qual se pode estudar o espectro sonoro ou o espectro de frequências de uma onda em certo
instante de tempo. A frequência fundamental é preceptivamente equivalente à altura do som.
O timbre sonoro depende de suas componentes senoidais, que têm diferentes frequências
relacionadas entre si de forma simples (representada por números inteiros), que são os
harmônicos, ou de forma mais complexa. O espectro do som determina seu timbre e é a
representação das frequências dessas ondas e suas amplitudes.
Na voz falada, o timbre vocal fornece dados anátomo-fisiológicos e de saúde das
pregas vocais. Perceptualmente, no canto, ele varia conforme o estilo escolhido, e, no canto
lírico, obedece às variações do chiaroscuro, assunto que será explicado a seguir. Sacramento
(2009) pesquisou o uso de timbres por cantores líricos e de musicais e constatou que a maioria
dos cantores entrevistados utiliza a modificação do timbre vocal, e o faz de maneira intuitiva e
dependente de fatores estilísticos.
94
94
2.12.1 Chiaroscuro
Segundo Miller (2004), esse é um termo usado na escola internacional de canto e
presente em tratados históricos, significando, assim como em artes visuais, o equilíbrio entre
os aspectos claros e escuros da cor e seus graus de sombreamento. No canto, trata-se
especificamente da força acústica manifestada por uma distribuição ideal de harmônicos
superiores e inferiores (overtones ou sobretons) agrupados em formantes. Miller frisa que essa
diferença é perceptível em cantores treinados (p.63-64).
Miller afirma que, apesar da maioria dos cantores aprenderem a cantar desenvolvendo
um conceito de som e estabelecendo uma rotina diária para tanto, o uso da análise espectral
através da espectrografia é muito útil. O espectrograma pode revelar detalhes complementares
aos parâmetros auditivos a respeito da ressonância. O pedagogo vocal também afirma que, a
despeito das controvérsias entre as diversas pedagogias vocais, a maioria dos professores
concorda que uma voz de qualidade (erudita, treinada) possui características subjetivamente
denominadas: “quente”, “com profundidade”, “rica, cheia, plena”, “redonda”, “aveludada”,
“com vitalidade”, “ressonante”, “que corre ou é bem projetada”, “com foco”, “bem colocada”,
“com ponta”, “balanceada ou equilibrada”, e assim por diante.
Richard Miller (2008) afirma que qualquer cantor profissional que é consciente do
que denomina voz plena ou completa (voce completa ou complete singing tone) se esforça em
obter essas características da voz ressonante, ou seja, uma voz que é treinada e se transporta
facilmente acima de uma orquestra, revelando o equilíbrio chiaroscuro, a riqueza e a
capacidade de projeção. Acrescenta que todo cantor profissional motivado espera obtê-la.
Para tanto, Miller recomenda que o cantor compreenda o que é o som chiaroscuro e todas as
ações fisiológicas e acústicas necessárias para alcançá-lo.
As informações relativas aos componentes fisiológicos e acústicos do som ressonante
fornecem uma base essencial ao cantor que estará se capacitando, ao que Miller (2008)
descreve como ações sinestésicas seguras para a aplicação na sua prática de canto. Miller
também adverte contra conceitos equivocados (místicos e misteriosos), crenças em câmaras
de ressonância inexistentes no corpo do cantor, e tentativas de direcionamento do som para os
espaços a partir do peito ou cabeça. O pedagogo também acrescenta que as distrações nesse
sentido (de crer em mitos), poderão conduzir a benefícios temporários. Somente a informação
segura e precisa irá beneficiar o cantor. O uso de imagens não deve ser feito
indiscriminadamente, sem a compreensão dos fenômenos físicos.
95
95
Uma premissa cardinal deveria ser mantida em mente: ‘a voz é um instrumento físico e
obedece às leis da fisiologia; e a voz é um instrumento acústico e obedece às leis da acústica.’
O papel vital das imagens deveria ser reservado à imaginação interpretativa (MILLER, 2008, p.
100).
38
Miller (2008) prescreve que o cantor deve assegurar a presença do
chiaroscuro no timbre do cantor lírico e afirma que os maiores problemas no som vocal são
devidos aos ajustes errados ou disfunções, prejudicando as partes do trato vocal: lábios,
língua, mandíbula e faringe. Cada parte do trato vocal será tratada separadamente mais
adiante.
2.12.2 Vibrato Vocal
Mais que qualquer outro aspecto audível do timbre vocal, a taxa de vibrato é um indicador
tanto de uma produção vocal livre quanto ineficiente. Um vibrato adequado é sinal de uma voz
cantada saudável e bem produzida (MILER, 1986, p. 187).
39
Miller define vibrato como “uma variação natural da altura, o resultado de impulsos
neurológicos durante a coordenação apropriada do fluxo aéreo e aproximação das pregas
vocais; um princípio de relaxamento da laringe característico das vozes desenvolvidas”
(MILLER, 2008, p. 191).
40
O vibrato é muito importante no legato vocal. Miller (1986) afirma que uma das
principais características do cantor erudito é a habilidade em mesclar a qualidade vocal de
nota para nota, o que não é possível se não existir um padrão comum de vibração em todas as
notas e sílabas da frase vocal, ou seja, um vibrato uniforme. As causas físicas são relatadas
por Miller (1986) a partir dos estudos de Smith publicados em 1972. Segundo Smith, o
vibrato resulta de contrações rapidamente alternadas nos músculos laríngeos (cricotireóideo e
milo-hióideo), estimulados por impulsos nervosos. Esses impulsos fornecem a energia
neuronal que regula a frequência do vibrato. Na área supra laríngea ocorre a ação conjunta
dos músculos e também tremores no sistema suspenso que se transmitem até à base da língua.
38
A cardinal premise should be kept in mind: “The voice is a physical instrument and obeys the laws of
physiology, and the voice is an acoustic instrument and obeys the laws of acoustics.” The vital role of imagery
should be reserved for the interpretive imagination.
39
More than any other audible aspects of vocal timbre, vibrato rate is an indicator of either free or inefficient
vocal production. A proper vibrato is a sign of a healthy, well-produced singing voice.
40
A desirable natural pitch variation, the result of neurological impulses during proper coordination of airflow
and vocal-fold approximation; a laryngeal relaxant principle characteristic of cultivated singing.
96
96
Isto influencia a frequência das pregas vocais, que passam a sofrer flutuações. As pregas
vocais são energizadas continuamente como resultado de sua própria mobilidade, pelo menos
parcialmente, em resposta ao feedback auditivo.
Titze (1994) afirmou que a origem do vibrato, embora não totalmente conhecida, é
um tremor fisiológico e estabilizado nos músculos laríngeos (cricotiróideos e
tiroaritenóideos). Também o vibrato indica os ajustes da frequência fundamental (F0). Relata
que autores como Tiffin e Schoe, em 1992, estudaram a fisiologia do vibrato, e afirmaram que
a probabilidade é de que existam diversos tipos diferentes de controle de vibrato, envolvendo
grupos musculares distintos, não somente os da laringe. A musculatura do tórax (sua
oscilação) também influencia a taxa do vibrato. Pinho (2008) também afirma a importância
dos músculos cricotireóideos na produção do vibrato, onde as musculaturas laríngeas e
respiratórias agem na oscilação necessária para um vibrato estável. A regularidade das
ondulações, importante no canto lírico, depende do estilo cantado. Em teatro musical, usa-se
também o vibrato respiratório associado ao laríngeo. Este efeito pode ser obtido e usado
também no canto lírico.
Desta forma atividade elevada do músculo cricotiróideo, dos músculos
expiratórios (nos aumentos de intensidade e elevação da frequência), do músculo milohóideo
(nas diminuições das mesmas) e da pressão subglótica (Zemlin, 2005; Vieira, 2004). Zemlin
(2005) denomina de vibrato as pequenas alterações de frequência e intensidade que ocorrem
no canto. Titze (1994) estabelece a uma taxa de vibrato ideal entre 4 a 6 oscilações por
segundo; Miller (1986) a fixa entre 5 e 6. Sundberg (1987) afirma que as frequências
inferiores a 5,5 promovem um vibrato muito lento, o que Miller descreve como oscilação, ou
ondulação (oscillazione, balanço ou wobble), que é quando, segundo os italianos, “la voce
oscilla”, ou “la voce balla”. Esse efeito é ruim para a voz cantada, pois, segundo Miller, é o
resultado direto de distorções dentro do trato vocal. Uma taxa de vibrato baixa (oscilação)
pode resultar de uma fraqueza das pregas vocais por uma resistência insuficiente ao fluxo
aéreo, ou seja, problema de sustentação ou appoggio. No caso de idade avançada ou
debilidade física, o tônus muscular cede e a taxa de vibrato pode cair. O baixo tônus muscular
pode aparecer em qualquer idade, quando a sustentação estrutural natural da laringe não está
presente, o que demonstra a importância de uma laringe bem estável. Miller trata o “vibrato
abdominal” como algo desfavorável; no entanto, o papel do appoggio muscular é justamente
dar equilíbrio à laringe: “Experiências empíricas em cantores experientes indicam que os tipos
97
97
de coordenação física sentidas na técnica do appoggio podem oferecer suporte para a laringe
que permitirão a existência de um vibrato desejável” (MILLER, 1986, p. 187).
O vibrato aplicado externamente à laringe pela musculatura do tórax (o vibrato “abdominal”) é
responsável pela oscilação que atormenta muitos cantores e é o resultado direto da aplicação
falha da técnica do appoggio ao canto. Os músculos da região epigástrico-umbilical produzem
um movimento oscilatório que produz este “falso” vibrato, o qual é geralmente perceptível
como um balanço. Alguns movimentos simpáticos podem ocorrer na região epigástrico-
umbilical, mas não devem funcionar como uma força oscilatória aplicada externamente
(MILLER, 1986, p. 184).
41
O vibrato de frequência acima de 7,5 Hz é muito rápido (Sundberg, 1987) e é
percebido pela maioria dos ouvintes como sendo trêmulo (tremolo) (Miller 1986; Zemlin,
2005). Tanto a oscillazione (balanço) quanto o tremolo podem estar presentes em certas
vogais e não em outras, ou podem estar restritas a algumas regiões limitadas da voz. É
trabalho técnico do cantor a uniformização do vibrato em todas as situações.
Figura 2.19: Traçado mostrando a amplitude de um /i/ sustentado por uma voz feminina. A mudança periódica
de amplitude deveria ser descrita como trêmulo. Se houver variação de altura. o vibrato estará presente e é o caso
mais comum (HyperPhysics).
Segundo Vieira (2004), a qualidade percebida do vibrato depende de três parâmetros:
(1) taxa do vibrato (número de ciclos por segundo); (2) profundidade (amplidão ou extensão é
o desvio da frequência em torno de seu valor médio, que vai de 6 a 12 %); (3) regularidade
(de aspecto senoidal, varia de 5,5 a 7,5 Hz).
41
The vibrato applied externally to the larynx by the musculature of the thorax (the abdominal”vibrato) is
responsible for the shake that plagues many singers, and is a direct result of failure to apply appoggio technique
to singing. The muscles of the epigastric-umbilical regions produce an oscillatory motion that produces this
“false”vibrato, which is generally perceived as wobble. Some sympathetic movement may occur in the
epigastric-umbilical region, but must not function as an externally-applied oscillatory force.
98
98
Figura 2.20: Comparação entre dois tipos de espectro de regularidade do vibrato. O gráfico (1) mostra voz com
vibrato regular, taxa de aproximadamente 5,5 Hz e amplitude de 0,70 semitons. O gráfico (2) mostra vibrato
irregular e de baixa amplitude, apresentando dois picos maiores em 4,2 e 8,4 Hz (VIEIRA, 2004, p.78). A
regularidade é um parâmetro muito importante para o vibrato do cantor.
Richard Miller (2008) também discrimina três parâmetros do fenômeno do vibrato:
(1) o grau de flutuação da altura, (2) a taxa temporal de alteração da altura, e (3) a intensidade
e a qualidade do timbre resultante. Como atributo de timbre, Zemlin (2005) coloca que o
vibrato adiciona uma “cor rica peculiar” à voz cantada, cujo controle exige treinamento.
Quanto a este particular, Miller complementa:
Ninguém pode determinar os impulsos neurológicos através de controles conscientemente
exercitados; ninguém, através de esforço consciente direto, pode controlar o sinergismo
muscular laríngeo de modo a produzir respostas específicas que determinem a taxa de vibrato.
No entanto, estes controles podem, até certo ponto, ser realizados e trabalhados rotineiramente
em resposta a conceitos tímbricos (MILLER, 1986, p. 185).
42
Miller (1986; 2008) defende que a dosagem de vibrato varia dependendo do cantor,
sua coordenação e principalmente de sua concepção de ideal sonoro. Segundo esse pedagogo,
o vibrato pode ser uma característica determinante do bom e do mau timbre vocal. O
fenômeno do vibrato traz grande contribuição para a percepção da frequência, intensidade e
timbre do som vocal, portanto, atributo essencial para a voz ressonante. Um dos alvos da
pedagogia vocal, segundo o autor, é o desenvolvimento da consciência do vibrato como uma
característica constante e desejável do timbre vocal.
42
No one can dictate nerve impulses through consciously exercised controls; no one, through direct conscious
effort, can control laryngeal muscle synergism so as to produce responses that determine vibrato rate. Yet these
controls can to some extent be realized and routined in response to timbre concepts.
99
99
2.13 Ressonância vocal
Um dos aspectos essenciais da ressonância é o modo de obter a qualidade vocal,
através da eficiência funcional da laringe e do espaço entre laringe e boca. A diferença
fundamental na compreensão desse fenômeno é explicada por Richard Miller (1986), que
afirma que confusão entre a vibração simpática (ou por afinidade, na qual todo o
organismo ou espaço externo a ele vibram por simpatia) e a ressonância utilizada para se
otimizar ou melhorar a voz emitida. O autor define acusticamente o fenômeno como a seguir.
A ressonância, o resultado de uma aliança acústica entre corpos vibrantes em um som
fundamental idêntico, pode ser simpática ou forçada. O som do canto é o resultado de uma
ressonância por simpatia. As estruturas ósseas da cabeça podem ser colocadas em vibração
simpática, mas não em ressonância real; elas não contribuem para o som complexo que o
público ouve (MILLER, 2004, p. 69).
43
Desta maneira, objetivamente falando, não se utilizam, na prática do canto, as
vibrações simpáticas para obtenção de qualquer melhoria na construção ou difusão do som
vocal. Entretanto, o cantor pode valer-se das sensações percebidas por essas vibrações
simpáticas, com o treinamento acostumará a guiar-se por elas, tornando-as uma ferramenta a
mais na busca da correta emissão. Exemplificando a vibração simpática em oposição à
ressonância verdadeira, Richard Miller ilustra com o exemplo de alguém segurando a estante
do piano enquanto toca uma nota grave. Podem-se sentir as vibrações simpáticas nas mãos e,
mesmo retirando-se a estante do piano, não se perceberá alteração da qualidade do som
emitido do piano. O autor completa argumentando que muitas práticas pedagógicas
estabelecem orientações aos alunos para que sintam as sensações na cabeça.
Infelizmente, muitas tentativas de impostação do som são irrealizáveis porque o som não pode
ser posicionado. Seios, queixos, testas, ossos occipitais e outras estruturas não contribuem para
a real ressonância da voz, nem o filtro ressonador do som laríngeo inclui áreas do crânio. Isso
está restrito ao trato vocal juntamente com as cavidades nasais, no caso dos fonemas nasais. O
osso, como a madeira, é um notável condutor da vibração simpática. [...] Maribeth Bunch, em
Dynamic of the singing voice, (1982, Springer-Verlag), cita fontes pedagógicas e de pesquisa
incluindo Negus, Russel, Vennard, Blanton e Bigg. Todos provam que os seios do crânio
‘exercem pequena ou nenhuma participação na ressonância vocal que é realmente percebida
por uma platéia (p. 97)’ (MILLER, 2004, p. 69).
44
43
... the result of an acoustic alliance between vibrating bodies at an identical fundamental pitch, can be either
sympathetic or forced. The sounds of singing are the result of sympathetic resonance. Bony structures of the
head can be set into sympathetic vibration, but not into actual resonance; they do not contribute to the complex
tone the listener hears.
44
Unfortunately, most placemente attempts are unrealizeble, because tone cannote be placed. Sinuses, cheeks,
foreheads, occipital bones, and other strucutures do not contribute to the actual resonance of the voice, nor does
resonator filtering of laryngeal tone include areas of the skull. Is is restricted to the vocal tract, conjoined with
the nasal cavities only for nasal phonemes. Bone, like wood, is a remarkable conveyor of sympathetic vibration.
[...] Maribeth Bunch in Dynamic of the singing voice, (1982, Springer-Verlag), quotes research and pedagogic
sources, including Negus, Russell, Vennard, Blanton, and Bigg. All prove that the sinuses of the skull ‘play little
or no part in the vocal resonance that is actually perceived by an audience’ (p. 97).
100
100
2.13.1 Ressonadores vocais
O trato vocal como um sistema de ressonância é uma cavidade de ar complexa e
altamente variável. A principal característica que distingue a voz humana de outros
instrumentos é a capacidade que o cantor tem de ajustar as características do sistema
ressonantal para modificar os resultados sonoros. Cada componente do sistema ressonantal
vocal será discutido, dos mais baixos ressonadores aos superiores.
2.13.2 Peito e vias aéreas subglóticas
Uma vez que os pulmões são cheios de material absorvente, esponjoso, eles não
podem ser considerados como cavidades de ressonância viáveis. Entretanto, os cantores
experimentam sensações vibratórias no peito quando cantam nos registros graves ou em voz
plena/cheia. Estas são as vibrações forçadas dos pulmões e caixa torácica, vibrando
simpaticamente às suas frequências naturais.
A traquéia é um tubo oco com uma superfície razoavelmente dura e isso a qualifica
como ressonador. Titze (1994a) afirma que a ressonância natural da traquéia pode ser
responsável pelas mudanças involuntárias de registro, ou pelas frequências do primo e
secondo passaggi. Entretanto, a traquéia não pode ser voluntariamente manipulada pelo canto,
pelo menos não de maneira significativa.
Portanto, enquanto o peito e as vias aéreas subglóticas são considerados parte do
sistema ressonantal vocal, eles são de limitado interesse para o cantor, pois não podem ser
modificados a fim de melhorar o som. Entretanto, o cantor pode escolher o uso de
ressonâncias mais graves através da adaptação do apoio respiratório e da atitude postural
(MILLER, 1986).
2.13.3 Laringe
Apesar de a cavidade laríngea ser classificada como um ressonador pequeno (por
causa de seu tamanho), a maioria dos cientistas da voz acredita ser esta a mais importante. A
ressonância nessa cavidade está associada à criação do ring (giro da voz ressonante) e ao
formante do cantor. Sundbeg (1977) descreve a grande possibilidade de a ressonância ser
gerada no tubo laríngeo (colar laríngeo), o espaço imediatamente acima das pregas vocais e
abaixo da borda da epiglote. Esse autor alega que tal área epilaringeal forma um tubo de
ressonância separado, amplamente independente do resto do trato, gerando uma frequência de
ressonância entre 2500 a 3000 Hz, que coincide com o nível de frequência do formante do
101
101
cantor. Bolsas dentro do colar laríngeo conhecidas como sinus (seios ou espaços) piriformes
têm sido também investigadas por Sundberg e, mais recentemente, por Dang, Seikacho e
Honda (1995), que alegam que o espectro na região de 3000 Hz é melhorado se os seios
piriformes se encontrarem fechados. As últimas pesquisas em andamento têm revelado como
cantores podem envolver o colar laríngeo na criação do essencial formante do cantor.
Acredita-se que essas cavidades têm um papel importante na produção do timbre chiaroscuro
e contribuem indiretamente para o som completo do formante do cantor na voz cantada
profissional. Esses achados são de extrema valia para a amplificação da voz. Talvez sejam a
causa principal da capacidade que um cantor lírico tem de projetar sua voz junto a uma
orquestra em uma sala de concerto de tamanho grande.
Os ajustes laríngeos intrínsecos estão fora do controle do cantor (MILLER, 2008) e
este deve evitar tentar controlá-los. Segundo Miller, o cantor não deve se preocupar com o
que acontece na laringe, pois a laringe fica sob a resposta sinérgica à síndrome da ressonância
do trato vocal. De maneira equivocada, certos professores orientam seus alunos com
manobras de controle laríngeo. Miller considera que é um dos maiores erros pedagógicos a
tentativa de controlar a musculatura intrínseca da laringe. Para este trabalho, adota-se a
orientação com base em Miller, de que os ajustes laríngeos são respostas à intenção da
obtenção de um som que se idealiza, por conta da tradição do canto lírico. A partir da
idealização de tal som, o corpo responde, através do apoio e do desenho dos fonemas do texto
cantado e o próprio corpo irá ajustar os mecanismos laríngeos para a produção desse som.
Obviamente, isso ocorrerá por causa do treinamento prévio que se desenvolveu para produzir
tal som.
2.13.4 Faringe e Cavidade oral
A faringe é dividida em nasofaringe (região nasal), orofaringe (região da cavidade
oral) e laringofaringe (parte da faringe que se relaciona com a laringe). A laringofaringe se
estende da base da cartilagem cricóide ao topo da epiglote e inclui o colar laríngeo, ou área
epilaringeal. A orofaringe se estende do topo da epiglote ao palato mole. Juntas, a
laringofaringe e orofaringe formam a mais ampla cavidade ressonantal e têm o maior efeito na
qualidade do som.
A posição de garganta aberta defendida por muitos professores refere-se a essa
espaçosa cavidade de ressonância. Em justaposição próxima à faringe, a cavidade oral é o
mais variável ressonador, devido à constante flutuação da língua e posição da maxila.
102
102
Miller (2004) alega que fixar a garganta em uma posição considerada ideal
corresponde a fixar a perna para caminhar. Não é possível.
Tanto na fala quanto no canto, deve existir uma flexibilidade constante durante a articulação. A
ressonância equilibrada pode ocorrer apenas quando o vibrador (laringe) e o ressonador (boca e
faringe) puderem responder livremente um ao outro. Tensão nunca pode resultar em liberdade.
Uma parede faríngea expandida é uma parede faríngea tensa (MILLER, 2004, p. 109).
45
Figura 2.21: Diâmetro do trato vocal nas posições de fala e canto, ambas em emissão da vogal /a/. A expansão do
canto é naturalmente maior na cavidade oral e faríngea.
2.13.5 Cavidade nasal e sinus
A cavidade imediatamente abaixo do velum (véu palatino), que se estende para cima
até a base do crânio, é a nasofaringe. A abertura e o fechamento da passagem que conecta a
cavidade nasal com a faringe são controlados primariamente por ações do velum e, em menor
grau, pela parede posterior da faringe. Ambos os mecanismos são controlados pela extensiva
musculatura dentro da faringe. Como essa musculatura é composta de fibras estriadas, trata-se
de uma região de controle voluntário e muito relevante para alterações de ressonância. O
cantor precisa saber que atitudes mentais e corporais podem ajudá-lo a respeitar o
funcionamento da abertura da garganta. Muitos erros pedagógicos se estabelecem por usarem
excesso ou falta de abertura adequada da garganta.
O velum se eleva durante a deglutição, fechando a porta velofaríngea para evitar que
a comida e bebida entrem na cavidade nasal. O velum também se eleva para promover o
fechamento velofaríngeo durante quase todas as vogais e consoantes. As vogais orais são
produzidas com a porta velofaríngea fechada, enquanto que, nas vogais nasais, a porta
encontra-se aberta. Abaixando o velum, abre-se a porta velofaríngea e se permite que a onda
sonora passe através da cavidade nasal. Quando o velum é abaixado, a passagem nasal é unida
45
Both in speech and in song, there must be constant flexibility during articulation. Only as the vibrator (larynx)
and the resonator (mouth and pharynx) are allowed to respond freely to each other can balanced resonance
happen. Tension can never result in freedom. Pharyngeal-wall spreading is pharyngeal-wall tensing.
103
103
ao trato vocal, e nesse caso a passagem nasal também se torna um ressonador para a onda
sonora glótica (MILLER, 1986).
A ressonância nasal, que é importante para a produção de consoantes nasais e vogais
nasalizadas, pode ser um componente desejável ou indesejável ao som, dependendo da
intenção do cantor. Se o velum está abaixado inadequadamente, o som resultante será uma
nasalidade indesejável e menos eficiente, pois a ressonância nasal tende a aumentar o
damping (abafamento do som), atenuando alguma energia acústica do espectro.
Em contraste, se o velum está erguido inadequadamente, o som final será a
“denasalidade”, termo difícil de traduzir. Trata-se de um som sem brilho, opaco, surdo que
também acontece quando o trato nasal está congestionado devido a gripe ou alergias. A
propósito, alguns cantores relatam frequentemente que gostam de cantar com nariz entupido
porque ficam com mais sensações apuradas de uma colocação frontal ou com a sensação de
estar cantando na máscara, quando o som apresenta esta denasalidade.
Apesar da extensão de elevação e fechamento do velum ser amplamente debatido
entre profissionais da voz, muitos parecem defender uma posição alta, levantada, com uma
leve abertura, durante as vogais sustentadas. Aparentemente, um leve grau de nasalidade
realmente melhora o som. Consideramos que deveriam ser realizadas mais pesquisas
científicas sobre o efeito do damping e a mudança espectral associados à leve nasalidade no
canto.
As cavidades nasais são menos relevantes e praticamente inacessíveis ao trato vocal
devido a suas pequenas aberturas são consideradas inconvenientes como ressonadores.
Segundo Sundberg (1987), elas não têm significância relativa à produção da fala, exceto as
mínimas contribuições às características ressonantes dos ossos do crânio, e pouco apoio
para essa argumentação.
104
104
Figura 2.22: Discriminação do trato vocal: cavidades nasal e orofaríngea.
2.14 Amplificação vocal no canto lírico - maximizando a ressonância vocal
Uma vez que as dimensões do trato vocal de um cantor irão influenciar o produto
sonoro final, sua herança genética (anatômica e fisiológica) exercerá um papel crucial no seu
som. Entretanto, como o trato vocal produz grupos de frequência reforçados (formantes) e
outros harmônicos que são abafados, não podemos afirmar que um trato vocal maior é
necessariamente um sistema melhor. É uma das funções da pedagogia vocal propagar a idéia
que qualquer voz, desde que tenha saúde, pode ser treinada para cantar.
É muito importante a habilidade do cantor em modificar o seu próprio trato vocal
com o objetivo de otimizar a ressonância para todas as notas e todas as vogais que estão sendo
cantadas. Essa habilidade é alcançada primariamente pelos ajustes musculares no trato vocal
que controlam o posicionamento dos órgãos vocais específicos, tais como a laringe, velum,
língua, mandíbula e lábios. Miller (1986), nos Capítulos 6 e 7 de seu livro The Structure of
Singing, comenta como ajustes dos músculos intrínsecos da laringe podem melhorar a
produção sonora das pregas vocais. É importante ressaltar a importância dos músculos
extrínsecos da laringe na melhoria das propriedades ressonantais do trato vocal por sua
contribuição estrutural de sustentação da laringe.
2.14.1 Posicionando a laringe
A faringe é alargada quando a laringe é abaixada, primariamente pela ação de alguns
músculos infrahióideos. O músculo esternohióideo, por exemplo, que se origina do esterno e
se insere dentro da cartilagem tireóide, é o único depressor laríngeo direto. Ambos, os
músculos esternohióideo e omohióideo, podem abaixar indiretamente a laringe através do
105
105
abaixamento do osso hióide. O músculo tirohióideo puxa o osso hióide para baixo na direção
da laringe.
Figura 2.23: O esquema (2) mostra a relação muscular dos elevadores e abaixadores do osso hióide, responsável
pela flexibilidade de abaixamento e elevação da laringe (ZEMLIN, 2010).
O posicionamento laríngeo é também afetado pela ação dos músculos suprahióideos,
que agem indiretamente como elevadores da laringe, elevando o hióide ou puxando outras
estruturas para baixo na direção do hióide.
Os três grandes pares de músculos que formam a parede faríngea são chamados
constritores inferior, médio e superior. Fincados como vasos de flores, eles se estendem da
cartilagem tireóide, osso hióide e estrutura óssea da orofaringe, ao esôfago e a sua função é
uma sequência delicada de cima a baixo, como uma onda reflexa muscular (peristalse) que
impulsiona a comida para baixo no trato digestivo. Os constritores são músculos de ação
rápida que estreitam o caminho da faringe, criando uma condição desfavorável ao canto e à
fala. Entretanto, podem ser treinados a se manterem expandidos para utilização na técnica
vocal. Essa abertura pode ser maior ou menor, dependendo da técnica. O canto lírico usa um
espaço faríngeo um pouco maior que algumas modalidades de canto popular.
A câmara de ressonância faríngea pode ser alargada naturalmente de um dos três
modos: (1) mastigando, comer uma refeição agradável com facilidade de ação mastigatória,
que ajuda a relaxar os músculos da deglutição; (2) engolindo, e então sentir o relaxamento dos
músculos da deglutição depois de engolir; e (3) inalando, através da boca como em um
106
106
suspiro de surpresa. A sensação de um começo de espirro também pode ajudar a obter um
ajuste natural dos ressonadores.
Nem todo especialista é favorável ao abaixamento da laringe. Titze admite manter a
laringe em uma posição neutra no canto. Ele sustenta que a laringe se amontoa contra a
mucosa traqueal quando muito deprimida, causando engrossamento das pregas vocais.
Inversamente, quando a laringe está elevada, as pregas vocais estão delgadas e então
grande potencial para produção de sons intensos, primariamente porque a superfície medial
faz melhor contato e um fechamento glótico mais firme. A laringe abaixada alonga o trato
vocal, abaixa as frequências formantes e produz uma qualidade de som mais escura, enquanto
que a laringe elevada encurta o trato vocal, eleva as frequências formantes e produz uma
qualidade de som mais brilhante (RUBIM, 2000).
Titze o posicionamento da laringe como relativo mais ao gosto pessoal do que à
sobrevivência da voz, com nenhuma vantagem excepcional, mesmo pensando que possa ser
necessário experimentar uma ou outra técnica (laringe alta ou baixa) em termos individuais
com base no pescoço e arquitetura laríngea do indivíduo (TITZE, 1993, p.37).
Pinho (2008), em seu excelente e referencial livro Músculos Intrínsecos da Laringe e
Dinâmica Vocal, explica que a maioria das disfunções e doenças se relaciona à hiperfunção
(tensão) da laringe (musculaturas intrínseca e extrínseca), o que ocasiona a adução glótica e a
hipersecreção de muco (pigarro). A fonoterapia é essencial em todos esses casos. A autora
fornece um exercício de abaixamento (e relaxamento) laríngeo por sucção, ampliando a
faringe e a região supraglótica. Denominou este exercício de Exercício do Espaguete
(PINHO, 2008, p.15), feito através do arredondamento do lábio (em /u/), da elevação do
palato mole, da elevação do dorso da língua, da ampliação da faringe e do abaixamento da
laringe (contração do músculo esternotireóideo). O cantor deve manter baixa a laringe
(verificando manualmente) e emitir “Hô, Hô” do Papai Noel ou “Hu, Hu” e, a seguir, falar
suavemente: janeiro, fevereiro, e assim por diante, com a sensação de bocejo e
mantendo essa configuração estabilizada (de Lorde Inglês). Pinho recomenda que não se
confunda com fonação soprosa e sim que se associe à fonação que denomina de fonação
fluida (fácil, saudável e sem forçar ou deixar escape de ar). Esse exercício, segundo a autora,
é essencial para o preparo do trato vocal para as demandas ressonantais para o canto e,
naturalmente, deverá ser aplicado conforme a necessidade do cantor.
107
107
2.14.2 Posicionando a língua
A língua é um músculo muito grande que, pela natureza de sua posição estratégica e
função, tem uma influência bastante significante no formato e tamanho do trato vocal.
Irradiando do queixo estão os músculos genioglossos, um par de músculos em forma de leque
com fibras que se inserem no osso hióide, prendem-se ao lado da faringe e inserem-se dentro
da língua. As fibras mediais dos genioglossos controlam a protrusão da língua. O músculo
hioglosso da língua puxa para baixo os lados da língua e se junta ao músculo genioglosso na
depressão da língua. Ambos servem como elevadores suplementares da laringe, querendo
dizer que qualquer rigidez, elevação ou agressão dos músculos da língua fazem a laringe se
elevar ou se mover para frente.
A exata posição da língua no canto é determinada principalmente pelas
necessidades momentâneas de configurar as vogais e articular as consoantes. É importante
que a língua permaneça relaxada, nunca rígida, e a sua ponta arredondada, e não pontiaguda.
Por exemplo, na vogal /a/, a língua deveria descansar frouxa e ser arredondada na ponta. A
colocação normal da ponta da língua é levemente tocando os dentes inferiores, e a saliência
dos dentes, nunca curvando dentro da boca, ou puxada para trás. Querendo ou não, a língua é
entalhada dependendo da fisiologia individual. Uma vez que a língua de muitos não irá
entalhar naturalmente, a língua deve permanecer plana e tranquila.
2.14.3 Posicionando a faringe
Miller (1996) relata que a parede e o teto da faringe consistem de tecido muscular,
incluindo os músculos constritores, os pilares (fauces) anteriores e posteriores e o velum.
Quando a laringe está baixa e o palato mole está alto, esses músculos têm considerável
flexibilidade, criando estiramento interno referido como a garganta aberta. Em adição ao colar
laríngeo, esta subida firme da parede faríngea é a maior fonte de metal, o brilho escutado em
toda voz bem desenvolvida. Uma sensação moderada desse estiramento interno poderá ser
obtida com a sensação de sorriso interno.
2.14.4 Posicionando o palato mole
O céu da boca é formado pelos palatos mole e duro que separam as passagens oral e
nasal durante a deglutição. Enquanto o palato duro é fixo e não pode ser modificado pelo
cantor, o palato mole, ou velum, é um determinante essencial na ressonância vocal. As
características acústicas da voz do cantor são parcialmente determinadas pelo tamanho e
108
108
dimensões da área palatal e as suas relações com a configuração total do trato vocal. Todas as
superfícies do trato vocal podem refletir ou absorver ondas sonoras, incluindo os palatos
moles e duros. O palato duro mede três quartos do total de comprimento do céu da boca e um
quarto posterior do osso do palato duro é constituído do osso palatino. O quarto restante do
comprimento do palato é o velum (palato mole), que funciona como uma válvula muscular. A
estrutura pendurada na linha media do velum é a úvula. Os dois pares de músculos que
controlam o abaixamento do velum são: o palatoglosso, formando os pilares anteriores, que
vão do palato mole at os lados da língua; o palatofaringeo’, formando os pilares posteriores
que vão do palato mole até o interior da parede da faringe. Os três músculos responsáveis por
elevar e tencionar o velum são: o elevador do véu palatino, que forma a porção do palato mole
e puxa para cima e para trás contra a parede posterior da faringe; o tensor do véu palatino, que
contrai lateralmente para estirar o palato horizontalmente; e o músculo uvular, que ajuda a
elevar o velum. Os movimentos de elevação e abaixamento do véu palatino são extremamente
importantes para a adaptação do trato vocal às diversas cores que o canto lírico exige. O
cantor bem treinado sabe usar conscientemente os possíveis desenhos que os músculos que
controlam o véu palatino podem fazer.
Figura 2.24. a) Cavidade oral exibindo o véu palatino. 1. Palato duro ou ósseo. 2. Aponeurose palatina. 3.
Inserção do elevador do véu palatino (hâmulo pterogóideo). 4. Músculo da Úvula. 5. Músculo Palato-faríngeo. 6.
Músculo Palatoglosso (FIGÚN, 1994, P.84).
Relacionando a articulação e a posição do palato mole, Pinho (2008) faz uma
explanação bastante didática e clara do que denominou de “Níveis de Projeção Vocal”, e
construiu um esquema representado a seguir:
109
109
Figura 2.24. b) Esquema dos níveis de projeção vocal relacionando face, nariz boca e pescoço (PINHO,
2008.p.30).
O esquema ilustra a ação do palato mole na abertura velofaríngea e espaço glótico, o
que controla a função da glote (hipo ou hiperfunção vocal).
Figura 2.24. c) Tabela baseada nos níveis de projeção vocais desenvolvidas por Pinho (2008, p.29).
Níveis de
Projeção
Direção da
onda sonora
Articulação/Posição
Possível
Aplicação
Elevação
do Palato
Construção
Anterior
inferior
Gutural
Voz de
garganta
Nenhuma
Garganta
vibra
Anterior
médio
Lábios
/m/
Belting e
TeatroMusical
Canto lírico
(notas graves)
Pequena
/m/ de
mala
Coceira
labial
Anterior
superior
Raiz nasal
/n/
Canto lírico
(regiões
médias)
(mais brilho)
Média
/n/ de nada
Coceira
ponta da
língua
Vertical
posterior
Acima do
Palato mole
/ŋ/
Canto lírico
(menos brilho)
Grande
Fonação
fluida,
laringe
baixa
como em
/HôHô/
Vertical
anterior
Face
/M/
Canto erudito
(mais brilho e
som
encorpado)
Grande
/m/ com
dentes
abertos e
lábios
cerrados
110
110
2.14.5 Posicionando a mandíbula
Por causa da interconexão da língua com a musculatura do trato vocal, sua utilização
é crucial. Costuma-se ter muita tensão na mandíbula, como dentes serrados, e sérios
problemas podem ser criados na articulação temporomandibular e bruxismo.
46
A maneira
correta de se abrir a boca completamente enquanto se cantam notas agudas é através do
relaxamento da musculatura que eleva a mandíbula, permitindo assim que a maxila balance na
direção do côndilo mandibular (o ponto de intersecção entre o crânio e a frente das orelhas
ver Fig. 2.22). Isso pode ser experimentado, colocando-se os dedos nessa área e deixando cair
a maxila até que uma leve saliência seja sentida. A laringe então desce livremente e a garganta
é sentida relaxada e aberta. Um suave bocejo irá ajudar essa ação apesar da quantidade de
decida da maxila depender de fatores tais como anatomia individual, nível das notas, vogais e
consoantes articuladas; o exercício deve ser feito com moderação, especialmente na região
média. De modo geral, quando a boca é forçada a abrir por volta de aproximadamente dois
dedos de largura, cria-se uma excessiva tensão nos músculos abaixo da mandíbula. Um
exercício que ajuda numa abertura mais confortável é imaginar tiras de borracha conectando a
maxila ao crânio. Quando a mandíbula cair, deve-se experimentar as sensações de um suave
estiramento. Outro problema técnico comum é a excessiva manipulação ou o exagero nas
palavras na tentativa de se articular mais claramente. A ação agressiva na maxila precisa ser
evitada nas vocalizações, especialmente nas regiões baixas e médias, incluindo o registro de
fala. Somente nos extremos altos e baixos do registro vocal a maxila precisa ser baixada para
se criar uma abertura ampla e confortável. Resumindo, a articulação deve ser flexível, solta,
nunca tensa, e combinando com a fala natural.
46
Bruxismo: atividade de tensão bucomaxilar na qual o indivíduo cerra fortemente as duas arcadas dentárias,
podendo provocar desgaste dos dentes e dor articular (FONTE, ANO, p.??).
111
111
Figura 2.25: a) Articulação da mandíbula, evidenciando a articulação temporo-mandibular, e nas posições
fechada, aberta e bem aberta (NETTER, 2001); b) Mandíbula vista lateralmente, de cima e de frente (ZEMLIN,
2010).
2.14.6 Posicionando boca e lábios
Em geral, os lábios costumam ser pouco usados na fala de algumas pessoas, até que
elas percebem a importância dos mesmos ao articular as consoantes e da configuração das
vogais. Isso acontece muito nos Estados Unidos, a saber, a tendência de se falar com
lateralidade. Miller (1986) compara a maneira de falar dos atores Richard Burton (inglês) e
Marlon Brando (americano): Burton fala mais claramente enquanto Brando às vezes fica
incompreensível. Cantores precisam usar os lábios mais ativamente e, como as pessoas não
usam muito seus músculos, fatalmente podem achar que parecem artificiais ao usá-los. Com
112
112
tempo e prática regular, gradualmente a flexibilidade dos lábios irá aumentar. Eles são
movidos pelo músculo orbicular e os músculos que circundam os lábios. A razão primária do
arredondamento dos lábios é a formação das vogais arredondadas tais como: /u/ e /o/, mas o
arredondamento é importante para a manutenção da estética do canto lírico.
Acusticamente, aumentar a cavidade oral é semelhante a adicionar uma cavidade de
ressonância no pescoço, resultando no abaixamento da frequência dos formantes do trato
vocal que mudam o espectro de uma determinada maneira pela integração da frequência
fundamental, dos formantes naturais do trato vocal, da fonte espectral glótica, e assim por
diante. Quando os harmônicos mais baixos são produzidos mais adequadamente, o ouvinte
poderá perceber um som mais rico e escuro. Muitos cantores se beneficiam empregando um
alongamento vertical da mandíbula e um leve arredondamento dos lábios para as várias
vogais, particularmente as vogais mais brilhantes /i/ e /e/.
Pode-se alcançar um amplo sorriso através dos músculos risório e bucinador, mas
nem sempre esse desenho fornece a melhor configuração para ao ressonador do trato vocal.
Deve-se aprender a sorrir com os olhos em vez de mostrar alguns dentes. Esse sorriso, que
inclui o sorriso interno e uma artitude alegre no olhar, entretanto, é amplamente usado em
musicais e outros gêneros de música popular.
Um exercício para quem canta muito lateralmente, ou seja, com a qualidade sonora
sem colorido, ou frágil, é colocar as duas mãos verticalmente na bochecha e no queixo de tal
maneira que a mandíbula fique suavemente baixa e os lábios relaxados em forma oval; a
posição é a mesma daquela quando se exclama de maneira surpresa. Enquanto vocalizar em
escala e arpejos usando todas as vogais, deve-se pensar em alongar mais quando se cantar
numa região mais aguda. Isso se traduz em um aumento do caimento da mandíbula, incluindo
uma maior abertura labial vertical e posição da boca verticalizada. O importante é produzir
um foco de som naturalmente colocado para frente equilibrado, com uma posição relaxada e
vertical. Enquanto se faz esse exercício, deve-se se manter um sorriso interno para se conter a
tendência de queixo caído ou cara de morto. Miller (1986) defende que a mandíbula relaxada
e baixa apresenta duas vantagens: (1) relaxamento do trato vocal inteiro previne efetivamente
a tensão dos músculos extrínsecos e intrínsecos, que podem produzir som estridente ou gerar
flexibilidade para o uso da escala vocal total; (2) abaixamento da mandíbula promove
mudança das características do trato vocal, dependendo dos ajustes na língua e na área
faríngea. Séculos de tentativa e erro pelos cantores têm demonstrado que uma mandíbula mais
113
113
baixa geralmente cria uma ressonância mais favorável no trato vocal, principalmente quando
se cantam notas acima do Si3 (ou Si4 no sistema americano).
Figura 2.26: Posição da boca em relação ao primeiro formante. Com a abertura dos lábios, o primeiro formante
(F1) ganha amplitude, frequência e forca acústica (SUNDBERG, 1977, p. 23).
2.15 Eficiência vocal
Apesar da falsa noção de projetar o som ainda persistir, a única maneira dos cantores
se assegurarem de que estão sendo ouvidos claramente em muitos ambientes acústicos é
cantar eficientemente (WARE, 1998, p.149). Com efeito, a audibilidade não depende
simplesmente da amplitude, mas também da correlação de muitos fatores, como a pressão da
coluna de ar, a adução da pregas vocais e a ressonância. Alguns dos termos associados com a
eficiência no canto são os formantes, a impostazione e o foco, que serão descritos a seguir.
2.15.1 Ataque vocal (l’attacco del suono)
Behlau (2001) cita duas características da emissão vocal: o ataque e a estabilidade.
Segundo Behlau, considerando a fonação: “O ataque vocal é como se inicia o som e está
relacionado à configuração glótica no momento da emissão” (BEHLAU, 2001, p. 106). A
autora classifica o ataque vocal em: (1) isocrônico (suave, equilibrado ou normal), no qual a
fase expiratória coincide com o início da vibração da mucosa das pregas vocais; (2) brusco
(com tônus muscular elevado na adução); e (3) soproso (com coaptação insuficiente das
pregas, com grande perda de ar).
Miller (1986; 2008) considera o ataque vocal decisivo não na frase musical, mas
em todo o trabalho do cantor, que deve priorizá-los em seus exercícios diários de treinamento.
114
114
O ataque preconizado pelo autor é o equilibrado, que demonstra o equilíbrio dinâmico da
musculatura da laringe e elasticidade. Miller fornece uma classificação um pouco diferente da
de Behlau: (1) suave; (2) duro; (3) equilibrado , (soft, hard e balanced). O autor sugere que se
desvincule a idéia de ataque com agressividade e se pense em onset ou início; preservaremos
o termo ataque com essa ressalva. No ataque duro (golpe de glote, click glótico, plosivo), as
pregas se encontram fechadas antes da fonação, gerando grande pressão abaixo das pregas,
ocorrendo o estalo na liberação brusca dessa pressão (exemplos: grito e grunhido). O ataque
suave corresponde ao aspirado e de baixo tônus referido por Behlau, no qual o ar sai antes do
som vocal (exemplo: sussurro). Miller denominou o ataque equilibrado de “regulação pré-
fonatória” (prephonatory tuning) da musculatura da laringe, uma sintonia que acontece não
somente no ataque, mas em todo o canto e a fala. Esse autor cita o trabalho de Wyke, que
aponta para os ajustes dessa sintonia, incluindo: a musculatura intrínseca da laringe, os
músculos intercostais, abdominais, orofaríngeos e também o ouvido médio. O processo é
descrito como uma fenda discreta na glote imediatamente antes da fonação, o que evita a
pressão elevada e o clique. O ar assim não é expelido bruscamente nem antes do tempo,
havendo bom aproveitamento do fluxo e precisão no ataque.
2.15.2 O formante do cantor
Richard Miller (2008) explica que a fonação do cantor treinado mostra um fenômeno
conhecido como formante do cantor (o terceiro formante), que corresponde aos termos
subjetivos como giro da voz ressonante (ring), ponta ou projeção (ping) ou colocação frontal.
Segundo Miller, na região superior do espectro é observável o terceiro formante, que ocorre
na região em torno de 2800Hz. William Vennard (1967) chama esse formante ou força
acústica de “fator 2800” (VENNARD, 1967). Miller afirma que a fonte provável do formante
do cantor é o segmento mais baixo do trato vocal ou tubo epilaríngeo. A distribuição de
energia acústica nas partes superior, média e inferior do espectro determina o equilíbrio
acústico de uma vogal. O formante do cantor também está presente na fala com apoio das
vozes masculinas.
O termo é derivado da observação de que os cantores produzem um brilho vocal
eficiente e desejado. Há um pico no envelope espectral por volta de 2.500 a 3.000Hz.
Sundberg (1987) mostrou que o pico espectral de cantores treinados corresponde a uma queda
no espectro do som orquestral. Esse autor afirma que, através dos séculos, os cantores
115
115
descobriram que, se empregassem certa ressonância vocal (ring ou squillo) a suas vozes, elas
poderiam ser ouvidas acima das orquestras.
A presença do formante do cantor na voz depende de todos os fatores que afetam o
espectro irradiado. Isto exige ampla energia nos harmônicos superiores da fonte glótica que
necessita de: (1) considerável amplitude de vibração das pregas vocais; (2) fechamento
completo das pregas vocais durante cada ciclo glótico (boa coaptação das pregas vocais); e (3)
uma fase fechada do ciclo glótico que é bastante longa. Também o trato vocal deve melhorar
os harmônicos na região de 2.500 a 3.200Hz, onde o ajuste laríngeo (contração dos músculos
da laringe) é essencial para esse fenômeno. O objetivo do cantor é obter brilho ou voz
ressonante (ring, squillo ou giro), e que tenha projeção (ping ou ponta), através da prática da
tentativa e erro sob direção de um professor competente. O canto lírico definitivamente exige
o treinamento da produção do formante do cantor e, do professor bem instrumentalizado, é
esperada essa capacidade de reconhecer tais competências na sua própria voz e na voz do
aluno.
A suposição de que essa força acústica vocal, a da voz ressonante, é obtida através do
aumento da intensidade (loudness) não é somente equivocada, segundo Richard Miller (1987,
2008), mas perigosa, pois isso poderá estimular um aumento da tensão global, chamada por
ele de hiperfunção laríngea. O cantor poderá desenvolver danos anátomo-fisiológicos, os mais
variados possíveis: desde ficar condicionado a uma técnica incorreta, até a correção
terapêutica. O único modo efetivo e seguro de desenvolvimento do formante do cantor é
solicitar o apoio da ressonância do trato vocal. Por exemplo, um barítono cantando a vogal [a]
em D2 (F0=147Hz) com formantes no trato vocal em 500, 1500 e 2500Hz não irá produzir
formantes próximos às frequências dos formantes do trato vocal dele. Entretanto, se ele baixar
sua laringe e arredondar os lábios, com o objetivo de alongar seu trato vocal, ele baixa os seus
formantes para reforçar vários harmônicos nos seus formantes, e a força desses harmônicos
será aumentada, adicionando considerável poder acústico ao seu espectro total. Ou seja, ele
rastreou os formantes. A técnica de rastrear os formantes deve ser usada em conjunção com
outras técnicas para melhorar a qualidade do som. Ajustes do trato vocal para ressintonizar
formantes em cada som pode envolver energia considerável, sacrificar a clareza vocal e
resultar em mudanças bruscas da qualidade sonora através de uma frase cantada (MILLER,
1986).
116
116
Em geral, os cantores alcançam sintonia nos formantes de um modo mais global,
gradualmente ajustando os formatos das vogais de acordo com as notas, ascendendo ou
descendendo, particularmente quando negociando transições de registro.
Figura 2.27: Formante do cantor (SUNGBERG, 1977).
As bases fisiológicas da produção do formante do cantor, o reforço de F2 e F4, são
explicadas por Sundberg (1987), que afirma que o quarto formante é sensível à ampliação da
configuração da laringe. O tubo laríngeo é parte do trato que varia com a mudança de vogal,
descrita por Miller no aggiustamento (MILLER, 1986; 2008). O abaixamento da laringe
amplia os ventrículos laríngeos aumentando o espaço da faringe. Uma ampliação significativa
ocorre em duas cavidades laríngeas, situadas na parte central e que circulam a laringe: os
seios piriformes. Esses seios (cavidades) em forma de pêra (piriformes) são também
denominados recessos piriformes, sinus ou fossas piriformes.
Figura 2.28: Seios piriformes em esquema e mostrando o acesso com pinça.
2.15.3 Colocação e foco
Os professores costumam ficar divididos entre os conceitos dos termos colocação e
foco. Enquanto alguns abarcam o uso de tais metáforas ou conceitos imagéticos, outros
117
117
aderem a procedimentos científicos com terminologia mais precisa. Equilibrando-se as
posições extremas, a maioria dos professores de canto usa uma pedagogia eclética baseada no
seu próprio desenvolvimento e dependente da memória sensorial que é compatível com
princípios acústicos e fisiológicos (WARE, 1998, p.150).
Miller (2008) explana esse termo (colocação vocal ou impostação) como a maneira
de expressar o canto ressonante. Várias expressões internacionais subjetivas têm buscado
descrever a distribuição ideal de energia acústica. Os italianos chamam de “l’imposto” ou
“l’impostazione della voce”, os franceses de “placement,” os alemães de Sitz,e na língua
inglesa a correspondência é, segundo Miller (2008), “the placement of the voice.” Richard
Miller defende que o som não pode ser “colocado” em nenhum lugar, pois está muito distante
de seu emissor bem antes do cantor se conscientizar dele. Reações proprioceptivas aos ajustes
ressonadores dão a sensação de “colocação da voz”. No capítulo 1 referiu-se a essa sensação
de vibração óssea, chamada palestesia, como a irradiação do som após seu tratamento acústico
no trato vocal.
As sensações de “colocação“ são causadas por vibrações por simpatia, ou seja,
sensações vibratórias percebidas pelo cantor como resultado da condução do som através das
estruturas ósseas do peito ou da cabeça. Na pedagogia vocal histórica, o formante do cantor
permanece constante, independentemente de transições de registro, níveis de dinâmica ou
velocidade (MILLER 1986, 2008).
Outra consideração que Miller faz é a respeito do perigo do cantor pensar somente
em um som direcionado somente à cabeça ou às cavidades nasais, desconsiderando o papel da
faringe, que é justamente onde se originam os maiores reforços harmônicos, dos formantes
que Sundberg cita (origem nos ventrículos de Morgagni). Sobre esse assunto, Miller (2008)
adverte:
Pedagogias que alegam que a voz ressoante é mais bem adquirida em se dar predominância ao
nariz e às cavidades da cabeça são exemplos do quanto as suposições erradas podem induzir
desproporções entre os componentes da ressonância. Na tentativa de colocar o som “para
frente”, o papel da faringe é diminuído e o timbre se torna delgado e incompleto. A essência ou
centro do som - o chiaroscuro - é reduzida
47
(MILLER, 2008, p. 52).
47
Pedagogies that allege voice resonance is best achieved by giving predominance to the nose and to the cavities
of the head are examples of how faulty assumptions can induce disproportion among resonance components. In
attempting to place the tone “forward,” the role of the pharynx is diminished and the timbre becomes thin and
incomplete. The core or center of the soundthe chiaroscurois depleted.
118
118
De acordo com Ware (1998), os termos colocação e foco são frequentemente usados
de maneira intercambiável porque são os dois lados da mesma moeda, figurativamente
falando. Apesar de ambos os termos descreverem sensações vibratórias experimentadas na
produção vocal eficiente, eles diferem pelo menos em um aspecto importante: colocação
concerne mais ao local onde a sensação é percebida, enquanto que foco é referente a como o
som é produzido. Em outras palavras, colocação descreve a localização das sensações dentro
de um trato vocal apropriadamente alinhado, enquanto que foco descreve um som vocal
produzido eficientemente que maximiza as sensações vibratórias.
A exploração da ressonância de cabeça pode resultar em uma melhoria vocal e
muitos especialistas em voz reconhecem dois conceitos de foco, ambos sendo necessários
para a compreensão completa deste fenômeno: (1) foco de fonação, o resultado do
fechamento eficiente das pregas vocais, ou começo (ataque inicial), que continua com a saída
do som vocal; e (2) foco de ressonância, que é baseado nas vibrações do trato vocal e
sensações.
Segundo Ware (1998), suficiente evidência científica substanciando os conceitos
subjetivos de colocação e foco. Titze, a esse respeito, comenta: “Conhecemos da acústica
básica que o som pode ser focado por refletores e fontes de sons podem ser colocadas, mas o
foco vocal não é sinônimo de foco de som e colocação vocal tem pouco a ver com colocação
de fonte” (TITZE, 1994, p.167). Por outro lado, os processos fisiológicos e acústicos da
geração e reflexão do som produzem sensações físicas que podem ser mais claramente
explicadas usando-se terminologia subjetiva, inclusive porque as percepções dos cantores
variam de corpo para corpo, de mente para mente. É necessário desenvolver uma terminologia
adequada a cada indivíduo e que deixe clara a sensação que cada um tem.
Sabe-se que os sons das fontes reflexivas múltiplas que ocorrem na saída do trato
vocal, particularmente os originados na glote, são percebidos pelos cantores como vibrações
sensoriais, tipicamente onde as vogais estão localizadas ou focadas. Tais sensações são
relacionadas à localização da pressão acústica maximizada das ondas que ficam no trato
vocal. Por exemplo, Titze (1994) diz que as sensações da pressão maximizada são
experimentadas da vogal /i/: alto na região do palato, para /u/: alto na região do velum, e para
/a/: alto na faringe. Os cantores podem contar com tais sensações de pressão na modificação
vogal para se manter uma mesma escala saída do alcance vocal. Os conceitos de cantar na
máscara ou direcionar o som contra o palato duro na base dos incisivos superiores são com
119
119
frequência praticados para facilitar a pressão máxima acústica nos específicos lugares dentro
do trato vocal.
O modo que os cantores ouvem a si mesmos é também importante na consideração
da colocação ou foco. Apesar dos cantores contarem com o retorno (feedback) do auditório,
eles são incapazes de ouvir o que os outros ouvem. A explicação é simples: as ondas sonoras
de um cantor irradiam através do crânio (um processo chamado de condução óssea) e passam
através de espaços abertos, tais como os tubos de Eustáquio, que são cavidades cobertas por
mucosa que conectam a faringe ao ouvido médio. Uma vez que o som viaja através do osso
em menos da metade da velocidade que o som atravessa o ar, aproximadamente 500 pés
versus 1300 pés por segundo, um taxa mais lenta significa que frequências menores são
realçadas e frequências maiores são atenuadas.
O espectro sonoro percebido pelo ouvido através da condução óssea tem mais
energia de baixa frequência que o escutado através da condução aérea, sendo por isso que os
cantores soam ruins para si mesmos. A qualidade sonora interna escutada pelo cantor é uma
versão modificada do som externo.
2.15.4 Considerações sobre equilíbrio vocal
De acordo com Ware (1998), um dos maiores desafios em aprender a cantar é
encontrar um equilíbrio adequado entre os inúmeros fatores, características e tendências
envolvidas nas diversas estéticas, gêneros e até mesmo gosto pessoal dos ouvintes. Ware
afirma que muitos pedagogos tendem a levar seus alunos a cantar com grande volume todo o
tempo, de maneira até competitiva, em detrimento da voz eficientemente produzida, com
riqueza de timbre e “finesse”. Para exemplificar o equilíbrio vocal da voz cantada, Ware criou
uma figura de um pêndulo, onde a posição de repouso, ou central, representa a voz
equilibrada, balanceada em relação aos dois extremos. O pedagogo afirma que os esforços no
ensino-aprendizagem do canto devem confluir na busca de uma voz equilibrada, obtida
através de instrução competente, prática diligente e autoconceito positivo, ainda que realista.
120
120
Figura 2.29: Pêndulo ilustrando o equilíbrio vocal entre as polaridades de hiperfunção (voz tensa) e hipofunção
(debilidade vocal, soprosidade). Para o professor de canto, o diagnóstico de onde se encontra o aluno é
fundamental para elaborar sua regulação (WARE, 1998, p. 20).
Na Figura 2.30, observa-se um esquema sugerido por Ingo Titze, que elaborou uma
lista de alguns elementos que considerou como de oscilação biológica (variáveis naturais),
aqueles envolvidos na produção da voz e fatores que os influenciam. A voz humana é um
complexo cheio de detalhes e sensível às diversas influências. No canto, podem-se acrescentar
as peculiaridades que um instrumento musical e seu instrumentista têm que desenvolver e
treinar durante seu aprendizado, carreira e ensino.
Figura 2.30: Lista de variáveis que influenciam a produção da voz (TITZE, 1994, p. 5 - tradução nossa).
121
121
Por causa dessa complexidade apresentada no esquema de Titze, o preparo de um
cantor lírico leva pelo menos uma década de sua vida e mais uma vida inteira em busca de
aperfeiçoamento e treinamento técnico. As descobertas científicas e o aperfeiçoamento dos
equipamentos de medição videolaringoscópica e acústica ocorridos das décadas de 1980 para
cá contribuíram para o desenvolvimento de uma prática mais consciente e embasada.
Desta forma, esperamos que o treinamento do cantor alcance, nas próximas décadas,
um controle superior a toda a história do canto lírico no mundo. O cantor poderá então ter
uma carreira menos exaustiva e um treinamento mais eficiente, com critérios de saúde vocal
fundamentados cientificamente, a fim de obter maior consciência de sua própria voz e de
todas as possibilidades que esta pode oferecer.
122
122
CAPÍTULO 3 METODOLOGIA E RESULTADOS
O foco desta pesquisa foi a ressonância do trato vocal no canto lírico e as ferramentas
de ensino-aprendizagem desse aspecto da técnica vocal. Por conta desse objeto central de
investigação, adotamos dois métodos principais: (1) a revisão bibliográfica com base na
acústica vocal e na fisiologia da voz, como fundamentação teórica; e (2) a coleta de dados, na
qual averiguamos como os professores de canto lidam com a ressonância vocal em sua
própria prática e no ensino da técnica vocal.
3.1 Procedimentos
A abordagem metodológica, de caráter qualitativo e exploratório, usou como
procedimento de coleta um questionário estruturado, com perguntas abertas, que foi enviado
por e-mail para 9 professores de canto de diversos estados do país (Anexo 1). Além desses 9,
outros 2 professores receberam o questionário pessoalmente. Os questionários apontaram
como os professores lidam pedagogicamente com ressonância vocal e, de acordo com as
respostas obtidas, o restante deste capítulo foi organizado segundo categorias que emergiram
desses relatos.
O questionário adotado consta de 5 seções: (1) Perfil dos sujeitos (10 itens com
dados pessoais não divulgados nesta pesquisa); (2) Formação dos sujeitos (8 itens); (3)
Questões gerais sobre técnica vocal com enfoque na ressonância e qualidade vocal (7
perguntas); (4) Questões sobre seu próprio aprendizado e estudo (4 perguntas); e (5) Questões
sobre sua experiência docente no ensino da ressonância vocal (12 perguntas).
Investigamos como os professores abordam a ressonância vocal, quais são suas
expectativas quanto a uma voz ressonante, e que técnicas utilizam para obter uma ressonância
vocal adequada às suas expectativas. Buscamos também compreender as dificuldades de
aprendizagem desses professores no início de seus estudos e as dificuldades de seus alunos
relativas ao tema. Com os questionários respondidos, procedemos a um cruzamento dos dados
obtidos com a literatura, considerando principalmente o pensamento de Richard Miller.
Dentre os autores que complementaram o diálogo entre relatos e literatura, foi incluído o
trabalho de Sacramento (2009), que forneceu subsídios sobre o comportamento de professores
europeus de canto com relação à técnica vocal. No final de cada relado foi apresentada uma
discussão complementar.
123
123
3.1.1 População e Amostra
Foram selecionados 20 professores de canto, dos quais apenas onze concordaram em
participar desta pesquisa. Os critérios de seleção foram professores de canto/cantores que
trabalham prioritariamente com canto lírico; prioritariamente, porque grande parte dos
professores de canto tem alunos de canto popular também; entretanto, os que participaram
têm experiência no ensino da técnica lírica. Todos os participantes são professores de canto
com formação universitária em música, mais de 30 anos de idade e com pelo menos 5 de
experiência como professores. Alguns participantes alegaram que as perguntas foram
redundantes em alguns aspectos; contudo, preferiu-se a redundância à falta de informações.
Quanto à identificação ou perfil dos professores, foi-lhes previamente assegurado que seus
dados particulares de identificação não seriam divulgados.
Um primeiro questionário experimental foi produzido e submetido a um grupo de
teste no qual 2 professoras de canto e cantoras líricas e uma fonoaudióloga especializada em
cantores deram o primeiro feedback sobre o conteúdo e a organização das perguntas. A
seguir, foi formulado o questionário final organizado por categorias, como explicado no item
anterior. Não houve intervenção de nossa parte na explicação de termos com o objetivo de
considerar a definição individual dos termos abordados. Procuramos evitar os termos
polêmicos, ou que gerassem muita dúvida. As perguntas de identificação tiveram o objetivo
de conhecer alguns dados do perfil do participante. Os dados de tempo de estudo, práticas
performáticas e número de alunos serviram como critérios de validação, no sentido de
verificarmos a situação de atividade do professor de canto.
As dúvidas ou outras competências que foram incluídas aqui ficam como sugestão
para estudos posteriores. Uma dessas dúvidas se refere ao mercado de trabalho de canto lírico
no Brasil e também ao mercado de ensino e seu conteúdo. Sugerimos que seja feito um
levantamento atualizado desse mercado, seu conteúdo e currículos, número de professores de
canto dentro e fora das universidades, professores de canto popular e erudito, e alertamos para
a importância da existência de uma instituição controladora que estabeleça critérios de
atualização sistemática desses dados.
O questionário foi entregue via e-mail a 20 professores de canto, dos quais onze
responderam. Com exceção de 2 questionários, que foram aplicados pessoalmente e gravados
em mp4, um deles por dificuldade do professor em responder pelo computador, os demais
foram entregues efetivamente por e-mail. Dos questionários respondidos (50% do número
124
124
enviado), foram selecionados os que se mostraram completos e cujos participantes
obedeceram aos critérios de seleção, a saber: professores de canto, ativos.
Os participantes que responderam seguiram o conceito de motivação somado à
disponibilidade, conceitos unidos por Sacramento (2009):
Disponibilidade e motivação: embora seja um critério que à partida pudesse não parecer
importante, foi considerado relevante, pois a acuidade da informação transmitida pelos
participantes depende muito da motivação e interesse que nutrem pelo estudo a realizar; por
isso, dos elementos inicialmente contactados foram eliminados todos os que se manifestaram
pouco interessados no estudo, pois considerou-se que não teriam a motivação e a paciência de
responder a um questionário longo e intelectualmente cansativo e poderiam dar respostas
erradas, ou pelo menos descuidadas e pouco exactas (SACRAMENTO, 2009).
3.1.2 Tratamento e Análise dos dados
Os questionários foram reunidos e as respostas foram organizadas em categorias
seguindo a própria ordem das perguntas respondidas. Conforme foram descritas as opiniões
dos participantes, procurou-se integrar os dados à literatura para justificar teoricamente as
respostas dadas. A seguir, cada aspecto questionado é apresentado através dos relatos,
respaldado pela literatura e amalgamado por comentários complementares.
3.2 Resultados
3.2.1 Formação dos professores de canto
Pergunta: A parte mais importante (para sua carreira de cantor) da sua formação foi em:
( ) escola/conservatório/faculdade
( ) aulas particulares
( ) outra _________________________________
Respostas:
Os resultados foram dispostos na tabela a seguir. O sujeito 1 deu igual prioridade às
formações indicadas.
Tabela 3.1 - Formação dos professores. Dados dos questionários.
SUJEITOS
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
Escolas
X
X
X
X
X
X
X
Aulas
particulares
X
X
X
X
Outros…
Ópera
studio
Festivais
Comentários:
125
125
No canto lírico, as aulas particulares são muito procuradas, independentemente se o
cantor está vinculado a instituições de ensino, e o professor particular ainda exerce muita
influência na formação do cantor. Richard Miller, em seu livro The Structure of Singing,
básico, completo e essencial a qualquer cantor ou professor, construiu um tópico “Teaching
Yourself” (Ensinando a si mesmo, MILLER, 1996, p. 214). Nesse tópico, o mestre comenta
sobre a importância da independência do cantor, que deve procurá-la após conseguir uma voz
livre e bem estruturada. Também adverte, por outro lado, contra o perigo da crença da auto-
suficiência. Esse pedagogo, que tem como tônica de seus princípios o equilíbrio entre os
extremos, comenta sobre o perigo da imitação excessiva do discípulo, a dependência limitante
do aluno da aprovação do mestre antes de cada performance, e do profissional que se sente
seguro demais para estudar com afinco ou solicitar um “ouvido externo”.
Nas grandes instituições temos grandes professores de canto? São acessíveis aos
alunos? E nas pequenas instituições? E as perguntas não param de surgir.
3.2.2 Fontes de conhecimento e informações
Pergunta: Você obteve seu conhecimento sobre canto lírico através de (Por favor, numere em
ordem de preferência):
( ) aulas
( ) workshops, masterclasses
( ) um professor
( ) mais de quatro professores
( ) livros, materiais escritos
( ) outros _______________________________
Tabela 3.2 - Fontes de conhecimento segundo ordem de relevância para os participantes
SUJEITOS
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
Aulas
5
1
1
4
3
1
1
Workshops/
Masterclasses
2
4
2
1
2
4
2
2
Um professor
1
2
2
1
3
1
Mais de 4
professores
4
3
1
2
4
1
Livros
6
5
1
3
1
1
2
3
3
4
1
5
Outros…
Cantando
Observando canto
DVD/audio
Gravações CD e
DVD
Dando aulas de
canto
Comentários:
126
126
A segunda questão se refere à ordem de importância dada às fontes de conhecimento.
Acreditamos ser essencial que o cantor-aluno-professor seja portador de conhecimentos
básicos de anatomia, fisiologia e acústica da voz cantada para fundamentar sua prática. Esses
conhecimentos básicos formam um conjunto de saberes essenciais à formação do cantor e de
sua instrumentalização pedagógica. Quanto a esse conjunto, Rubim (2000) descreve em sua
pesquisa: “que o ensino do canto no país conta com professores de canto egressos dos
Bacharelados de Canto, cuja formação profissional visa a performance e que seus currículos
não apresentam relação entre as matérias pedagógicas e o ensino-aprendizagem do canto”
(RUBIM, 2000, p.2.) A autora oferece sugestões, em sua pesquisa, que direcionam algumas
soluções para a instrumentalização necessária citada, que incluem, entre outros conteúdos, a
criação de um banco de teses de canto e de um curso de pedagogia vocal.
Quanto ao número de professores, a tendência do cantor lírico em ter diversos
professores foi identificada também em nossa pesquisa. Sacramento (2009) verificou em sua
pesquisa de doutorado que a maioria dos cantores estuda com mais de um professor ao longo
de sua formação, a maioria (30%), com quatro professores. E a autora justifica que os alunos:
...mudam rias vezes de professor em busca daquele que mais lhes convém. Procuram em
cada professor o que ele tem de melhor para lhes dar e procuram no professor seguinte as
soluções para as lacunas que ainda sentem, ou apenas uma nova abordagem. Existe ainda o
factor moda: muitas vezes assiste-se a uma migração massiva de alunos para o professor que
está na moda e esta prática pode ser perigosa, especialmente em jovens cantores cuja técnica
ainda não estabilizou, pois pode originar dificuldades e atrasos provocados pelas mudanças de
práticas e de terminologia (SACRAMENTO, 2009, sn).
3.2.3 Literatura sobre canto lírico
Os professores forneceram os seguintes autores como sendo relevantes à sua
formação profissional: Richard Miller, Ralph Appelman, Cliffton Ware, Oren Brown, Johan
Sundberg, Robert Sataloff, William Vennard, Mara Behlau, Pedro Block, Mirna Rubim,
Barbara Doscher, Hilde Sinnek, Helena Coelho, Silvia Sobreira, Eládio Perez Gonzalez,
Edílson Costa, Alberto Pacheco, Charlotte Kahle, Madeleine Mansion, Rita de Cássia Fucci
Amato, Silvia Pinho, Thérèse Bertherat, F. Mathias Alexander.
Comentários:
Os autores mais consagrados e que nenhum professor de canto pode deixar de ler são
Richard Miller, Ralph Appelman, Cliffton Ware, Oren Brown, Johan Sundberg, Robert
Sataloff, William Vennard. As autoridades em voz cantada no Brasil são Mara Behlau, cujo
conteúdo científico é indiscutível, e Silvia Pinho, cuja didática, materiais e profissionalismo
são indispensáveis aos alunos de canto e fonoaudiólogos especializados em voz cantada.
127
127
Richard Miller, em sua obra básica The Structure of singing (1996), escrita em 1986,
inclui o que o próprio autor denomina de seleta bibliografia, que pode ser considerada uma
lista de excelência para o pesquisador sobre voz cantada. Atualmente, de grande contribuição
são os artigos de pesquisas recentes publicados em jornais de acústica, fonoaudiologia e no
Journal of Voice da NATS (National Association of Teachers of Singing dos EUA). Os
centros de pesquisa geralmente são vinculados a importantes laboratórios, independentes ou
universitários, detentores de tecnologia suficiente e em desenvolvimento específico para
pesquisas da voz. Dentre muitos citamos o KTH Royal Institute of Technology, em
Estocolmo, o Laboratoire d'Acoustique Musicale em Paris, e B. Otto Schoepfle Vocal Arts
Center (OBSVAC), fundado por Richard Miller e parte do Oberlin Conservatory of Music,
em Ohio, EUA. Algumas universidades têm o privilégio de oferecer acesso aos alunos de
canto a esses laboratórios e equipamentos, o que sem dúvida acrescenta muito ao ensino-
aprendizagem do canto.
3.2.4. Conhecimentos sobre fisiologia da voz e acústica
Perguntas:
4. De 0 a 10, como você classifica seu conhecimento sobre fisiologia da voz?
5. De 0 a 10, como você classifica seu conhecimento sobre acústica vocal?
Respostas:
Tabela 3.3 - Respostas às questões sobre conhecimentos de fisiologia da voz e acústica.
SUJEITOS
1
2
3
4
5
6*
7
8
9
10
11
FISIOLOGIA VOCAL
8
6
8
4
9,5
-
8
8
9
7
8
ACÚSTICA
8
6
8
4
9
-
6
5
8
7
8
*Sujeito 6: Houve, durante esses anos, um ganho de qualidade vocal pela respiração e pela articulação; pela
consciência e conhecimento adquirido de fisiologia vocal.
Comentários:
As notas foram relativamente altas (exceto o sujeito 4) e menores em acústica, um
assunto mais complexo e menos acessível.
A auto-avaliação docente é prática frequente na educação e focaliza, entre outros
aspectos, o processo da auto-observação, tendo o potencial de indução a reflexões e mudanças
de estratégias de ensino-aprendizagem. Os participantes responderam questões relacionadas a
um pré-requisito essencial da prática pedagógica de qualquer área, que é a posse da
fundamentação de sua prática. Quanto ao conhecimento relativo à pedagogia vocal, Ralph
Appelman (1967) afirma:
128
128
A pedagogia vocal não pode sobreviver como uma entidade educacional, independentemente
se os fatos fisiológicos e físicos que constituem sua essência permanecem objeto de sciolismo
48
(conhecimento superficial). Os pesquisadores devem constantemente interpretar esses fatos
científicos de maneira que eles possam se tornar ferramentas realistas para serem empregadas
pelos futuros professores de voz (APPELMAN, 1967, p.5).
49
3.2.5 Conceito de ressonância do trato vocal no canto lírico
Pergunta: Defina sucintamente como você entende a ressonância do trato vocal no cantor
lírico.
Respostas:
Sujeito 1: Existe um som fundamental produzido pelas pregas vocais, e esse som é moldado
pelos filtros dos lábios, língua, mandíbula, palato, faringe e laringe. No canto lírico, a grande
dificuldade é utilizar esses parâmetros em favor de uma determinada estética e período. De
forma geral, é necessário fazer muito uso do formante do cantor (brilho) para competir com a
sonoridade da orquestra, e acrescentar a este som a beleza e o redondo de cada língua. No
italiano, por exemplo, sempre ouvimos falar deste jogo entre chiaro/oscuro. Na língua alemã,
por outro lado, ressonâncias mais agudas são priorizadas. E vai do ouvido, cultura geral do
cantor e habilidade técnica, para fazer uso de suas ressonâncias a favor do Canto Lírico.
Sujeito 2: A ressonância no trato vocal é extremamente importante em todo mecanismo de
projeção e obtenção de um som de qualidade. É a partir da ressonância que o som emitido é
caracterizado.
Sujeito 3: Entendo como sendo o aproveitamento máximo das cavidades oral, nasal e faríngea.
Sujeito 4: Ressonância é quando o som está colocado e ganha projeção. Ressonância é
projeção, não importa se a voz é grande ou pequena.
Sujeito 5: Ressonância no trato vocal é o conjunto de harmônicos que, a partir do som
fundamental (F0) produzido nas pregas vocais são abafados ou amplificados no trato vocal. O
resultado desse fenômeno gera o espectro vocal do cantor (em qualquer gênero). No caso do
canto lírico os formantes F1, F2 e F3, devem ter padrões mais estáveis. Principalmente o F3,
conhecido como formante do cantor, deve estar estável e presente em toda extensão vocal do
cantor lírico. Isso é um dos fatores principais que produz a amplificação desejada neste gênero.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Ressonância é a amplificação do som gerado pela ação coordenada dos músculos
respiratórios e articulatórios do trato. Sem ressonância, o canto lírico seria amplificado
eletronicamente, como o popular e demais estilos.
Sujeito 8: Ressonância é um todo da sonoridade vocal, é a projeção dessa sonoridade. É todo
um trabalho de estrutura do indivíduo, mexe com o sujeito inteiro.
Sujeito 9: Aspectos de amplificação do som vocal através de modificações posturais oro-
faríngeas e utilização dos ressonadores da cavidade nasal e oral.
Sujeito 10: A vibração promovida pelo percurso dos sons primordiais produzidos na laringe.
48
Sciolus vem do latim e significa diminutivo de conhecimento scius (Merriam-Webster Dictionary Online
consultado em 25 de junho de 2010).
49
Vocal pedagogy cannot survive as an independent educational entity if the physiological and physical facts
which comprise its core remain subjects of sciolism (superficial knowledge). Researchers must constantly
interpret these scientific facts so that they may become realistic pedagogical tools which may be employed by
future teachers of voice.
129
129
Sujeito 11: A projeção vocal depende da ressonância perfeita do trato vocal. E a ressonância é
um padrão articulatório. Não tem nada a ver com força muscular na região costo-abdominal. O
importante é poder cantar com mais volume com o menor esforço possível, que é uma questão
de se encontrar a posição dos articuladores que permita que mais frequências no espectro vocal
sejam enriquecidas.
Comentários:
O conceito de ressonância vocal passa por variáveis citadas pelos professores e por
este estudo. Também passa pelo resultado sonoro final produzido pelo cantor, fruto de tudo o
que ele é e faz para emitir um som que entende como de qualidade ou de acordo com suas
intenções. Entretanto, de acordo com os pedagogos Miller e Appelman, ressonância vocal é
definida como:
O tubo ressonador que é o trato vocal consiste de faringe, boca, e às vezes o nariz. Pela
combinação treinada das cavidades de ressonância, o timbre vocal pode ser controlado. O tubo
responde às demandas da articulação presentes nas vogais e consoantes (MILLER, 1996, pp.
49-50).
50
A qualidade ou timbre de um som vocalizado é determinado pelo número, intensidade e
distribuição dos parciais que o compõem. Tal relação depende do seguinte: (1) a natureza da
vibração laríngea; e (2) as alterações feitas naquele som quando passa através do sistema
ressonador. A combinação desses dois fatores leva alguns parciais a serem reforçados e outros
a serem abafados. A consciência das diferenças no instrumento e a habilidade de identificar a
voz de um indivíduo depende da constante flutuação das estruturas dos parciais superiores
(overtones) dentro de cada som (APPELMAN, 1967, pp. 120-121).
51
Ver também o item Ressonância como Fenômeno na p. 28 e a discussão sobre
Ressonância Vocal na p. 94 deste trabalho.
3.2.6 Lacunas no conhecimento sobre ressonância do trato vocal
Pergunta: Que informações extras referentes à ressonância do trato vocal você gostaria de
obter?
Respostas:
Sujeito 1: A relação entre a liberdade e flexibilidade e o aumento do volume do som. Por que
isso ocorre?
Sujeito 2: Gostaria de saber quanto às anatomias diferente das etnias, o que mais influencia
sonoramente uma ou outra.
Sujeito 3: (não respondeu)
50
The vocal tract resonator tube consists of the pharynx, the mouth, anda t time the nose. By skillfully
combining the resonating cavities, vocal timbre can be controlled. The tube responds to the demand of
articulation present by vowels and consonants.
51
The quality.or timbre of a vocalized sound is determined by the number, intensity, and distribution of the
parcials which compose it. Such a relationship depends upon the following: (1) The nature of the laryngeal
vibration, (2) The changes made in that sound as it passes through the resonating system. The combination of
these two factors causes some partials to be reinforced, others to be weakened. Awareness of instrumental
dofferences and ability to identify the voice of an individual depends upon the constant fluctuation of the
overtone structure within either sound.
130
130
Sujeito 4: Como cantar no registro agudo após a passagem? Como adquirir agudos de
qualidade?
Sujeito 5: Gostaria de ter todo esse assunto mais sistematizado e digerido para poder
compartilhar com os alunos. Outra coisa são pesquisas referentes à emissão em português.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Conhecer um pouco mais sobre como executar a passagem da ressonância alta para
baixa e vice-versa, sem quebrar a linha melódica e harmônica do som.
Sujeito 8: (não respondeu)
Sujeito 9: Conhecer o olhar da física relacionado à impedância do tecido do trato vocal na
formação do som vocal resultante em um cantor no estudo e otimização da ressonância do trato
vocal.
Sujeito 10: Gostaria de mais informações sobre musculatura do trato vocal. Maior
detalhamento sobre os tipos de músculos que o formam.
Sujeito 11: (não respondeu)
Comentários:
Richard Miller, em todos os seus livros, menciona muitas vezes a palavra liberdade.
Esse pedagogo acredita ser fundamental que o cantar seja um ato livre e essa liberdade está
relacionada ao relaxamento e à estabilidade, desde as pregas vocais, passando por liberdade
de pescoço, musculatura, todo o trato vocal e principalmente da laringe.
Somente com liberdade pode-se chegar à estabilidade e flexibilidade para realização
da agilidade no canto. Até o vibrato requer liberdade, de acordo com Miller. Acredito que
liberdade e equilíbrio são as prescrições mais frequentes e veementes de Miller para a técnica
da voz cantada. O pedagogo insiste também nas ações de coordenação, ou seja, coordenar a
tensão necessária para a agilidade com o relaxamento para liberdade de ação. Uma falha
comum, principalmente nas vozes masculinas de ópera (MILLER, 2008) é fornecer muita
resistência das pregas vocais ao fluxo de ar, causando a fonação forçada ou pressionada,
gerando uma qualidade de berro.
52
A fonação é classificada segundo o grau de oclusão glótica como: (1) soprosa; (2)
normal; e (3) forçada (pressed, apertada, pressionada) (MILLER, 2008). Se, por um lado,
alto grau de soprosidade presente no sussurro ou em extremo na rouquidão, onde edema
(inchaço) e as pregas não ocluem firmemente, por outro lado, o extremo oposto é a fonação
pressionada, onde as pregas estão rigidamente apertadas. Para uma fonação normal o fluxo de
ar deve encontrar uma resistência suficientemente equilibrada. Miller (2008) acrescenta que a
fonação pressionada é mais comum na zona di passaggio (intervalo entre as passagens,
também chamada região média).
52
Berro ou grito, na língua inglesa yelling.
131
131
Em relação aos agudos, os ajustes laríngeos de baixar a laringe (que passa a ser
cobertura, ou copertura, nas vozes masculinas, conforme explicitado) vão além dessa
localização de aggiustamento (ver p. 78 deste trabalho). O relaxamento da faringe deve ser
suficiente para permitir sua ampliação e dilatar os ventrículos de Morgagni, e o ar deve fluir
livre pela oro e nasofaringe, o que facilita o ataque e equilíbrio ao fluxo de ar e à emissão.
Quanto à dilatação dos ventrículos laríngeos, Sundberg explicita:
Foi mencionado que, quando um aumento do pitch, aumenta também a abertura do tubo
laríngeo. Esse aumento tem que ser compensado por um alargamento do ventrículo de
Morgagni se o tubo de ressonância tiver que permanecer em 2.8 kHz. Uma contribuição ao
alargamento necessário é fornecida pelo estiramento das pregas vocais, constituindo o centro
do ventrículo de Morgagni. Mas provavelmente uma compensação adicional será necessária
também. Se isso ocorrer, o cantor terá que baixar sua laringe mais e mais, quanto mais agudo
for o som que cantar. Isso está de acordo com a necessária e comum “cobertura” das notas
agudas, uma vez que a cobertura tem sido um fenômeno associado aos efeitos observados no
abaixamento da laringe
53
(SUNDBERG apud Miller, 1986, p.52).
Se o cantor discordar em realizar a cobertura nos agudos de maneira explícita, ele
poderá trabalhar o reforço dos harmônicos com a sua articulação e ajustes apropriados
(também mencionados) para deixar a voz mais frontal e mais brilhante, concomitantemente
com a regulação do chiaroscuro (ver esse tópico no Capítulo 2).
Sobre a impedância, citamos o estudo de Sampaio, Oliveira e Behlau (2008). O estudo
da impedância, segundo as autoras, é importante para se entender os benefícios dos exercícios
de semi-oclusão do trato vocal. Nesse processo, o aumento da impedância acústica, efeito
semelhante à vocalização do /v/, promovendo redução da pressão subglótica e modificação do
padrão de vibração das pregas vocais. O trabalho de Sampaio, Oliveira e Behlau (2008)
mostra o estudo dos ajustes promovidos por dois exercícios de trato vocal semi-ocluído, o
finger kazoo (vocalização com dedo nos lábios; ver em Espaço da Voz no link
http://www.youtube.com/watch?v=W5ydTJz6rqo) e a vocalização com canudo, exercícios de
constrição labial e alongamento do trato vocal. Esses dois exercícios têm a intenção de
promover o que as autoras chamam de produção vocal econômica e, segundo os resultados
obtidos, promoveram mais conforto na vocalização, sendo recomendados para aquecimento
vocal.
53
It was mentioned that when we increase pitch we also increase the larynx tube opening. This increase has to
be compensated for by a widening of the sinus Morgagni if the larynx tube resonance should remain at 2.8 kHz.
A contribution to the widening required is provided by the stretching of the vocal folds constituting the bottom
of the sinus Morgagni. But probably additional compensation is required as well. If so, the singer will have to
lower his larynx more and more the higher the tones he sings. This agrees with the commonly stated need for
"covering" high notes, since covering has been shown to be associated phenomena similar to the effects observed
in larynx lowering.
132
132
A oclusão parcial do lábio produz a sensação de leve resistência à passagem do som,
facilitando o controle e a execução do exercício sem a sobrecarga da glote. A constrição do
trato vocal altera a pressão interna em relação à atmosférica, modificando a configuração
glótica e o trato vocal, e produzindo diferentes padrões acústicos. O aumento da pressão intra-
oral resulta em forças de adução ou abdução sobre as pregas vocais, reduzindo a tensão e os
impactos de colisão das pregas vocais. (...) Os resultados observados sugerem maior conforto à
fonação, provavelmente devido à mudança no padrão vibratório das pregas vocais, à redução
do primeiro formante e da pressão subglótica necessária à fonação. Os efeitos sensoriais
resultantes seriam de redução da pressão fonatória, do fluxo glótico e, ao mesmo tempo, de
uma voz rica em harmônicos (SAMPAIO, M.; OLIVEIRA, G.; BEHLAU, M, 2008, p.266).
3.2.7 Conceito de qualidade do som vocal
Pergunta: Em sua opinião, quais são as características mais relevantes de um som vocal de
qualidade? Especifique e justifique.
Respostas:
Sujeito 1: Um som livre de contrições, brilhante, flexível, capaz de emitir sons graves e agudos
sem dificuldade, e que possa ser condicionado sem dificuldades às exigências do repertório
(Como agilidade, superagudos, notas sustentadas, grandes frases, etc.).
Sujeito 2: Clareza (que não seja um som embutido), som brilhante (que apareça os espectros,
harmônicos), volume (sem que apresente esforços).
Sujeito 3: É um som brilhante (uso dos harmônicos superiores), leve e claro, mas de acordo
com a verdade vocal do sujeito (timbre verdadeiro).
Sujeito 4: É aquele que tem bom controle expiratório/apoio, respira bem e na emissão de som
atinge os pontos ideais de ressonância/projeção. O som ideal é encorpado, brilhante, com
ressonância.
Sujeito 5: Deve ser límpido (sem ruídos que caracterizem disfonias ou alterações do sistema),
estável (denotando uma coordenação fono-respiratória bem estabelecida), consistente (com
tônus e equalização de registros), vibrante (como resultado do equilíbrio do sistema, a voz gira
com todos os harmônicos) e amplificado (o perfeito ajuste entre tônus laríngeo, apoio estável e
giro bem estabelecido pelo treinamento).
Sujeito 6: O somatório de respiração de qualidade e articulação adequada. A consciência da
estrutura respiratória do tipo costodiafragmático estabelece pontos de apoio que geram energia
no momento adequado; o estudo do canto tem que fornecer essas informações e é por isso que
o cantor deve sistematizar seu estudo. A articulação depende, a meu ver, inicialmente de um
estudo pessoal de consciência dos movimentos possíveis com a boca; o cantor pode se tocar,
pode olhar num espelho enquanto formata as vogais. O movimento vertical é um aliado muito
importante no canto, pois ele lida com abertura total da boca e busca as cavidades do crânio
como amplificadores naturais. O trabalho inicial é importantíssimo ao cantor.
Sujeito 7: Emissão precisa, pois uma emissão duvidosa e “frouxa” compromete todo o
resultado. Apoio respiratório, pois é indispensável para sustentação do som, e capacidade de
manter o som sustentado sem esforço, com flexibilidade e distribuído em todas as cavidades
ressonantais.
Sujeito 8: Um som com brilho, ressonância, com liberdade de emissão, que reflete um bom
apoio e boa postura. Tem toda uma estruturação individual e técnica que resulta em beleza, seja
mais leve ou não.
Sujeito 9: Controle da coluna de ar, articulação e ressonância. Todos esses fatores são
essenciais para um canto de alta qualidade e para a compreensão auditiva do público das
qualidades vocais do cantor, das qualidades artísticas da performance e do entendimento da
mensagem textual.
133
133
Sujeito 10: Em minha opinião um som vocal de qualidade possui igualdade e equilíbrio de
timbre, consistência e maleabilidade.
Sujeito 11: (não respondeu)
Comentários:
O som de qualidade ou ideal de som vocal depende dos diversos critérios estéticos e
das opções a serem feitas pelo cantor (se possuir condições técnicas), ou buscadas por ele
dentro de seu universo cultural. Entre eles dois são importantes: (1) a saúde do aparato vocal,
que implica na integridade anátomo-funcional principalmente das pregas vocais (cujos
critérios são utilizados por otorrinolaringologistas e fonoaudiólogos); e (2) a escolha estética,
que deve estar de acordo com estilo, contexto dramático, e outros contextos. Dentro da
literatura consultada, verificou-se que os aspectos acústicos propostos por Figueiredo e
Iazzetta (2006) seriam adequados para a discussão sobre conceito de som de qualidade ou
ideal.
O núcleo de trabalho AcMus (IAZZETTA, 2001), fundado em 2002, na Universidade
de São Paulo, desenvolve ferramentas computacionais para projeto, medição e simulação do
comportamento acústico de salas destinadas à música. Os autores realizaram uma
investigação dos principais aspectos que influenciam a produção e recepção de material
musical a partir de medições e cálculos específicos. Elaboraram uma caracterização dos
parâmetros acústicos subjetivos que descrevem as qualidades acústicas de salas de música e
que podem ser utilizados como critérios para a avaliação acústica. Esses parâmetros criados
por Iazzeta e Figueiredo mostram-se adequados para descrições qualitativas acústicas
aplicadas à voz, embora tenham sido construídos para ambientes acústicos (FIGUEIREDO,
IAZZETTA, 2006). São eles: (1) Vivacidade (Liveness): Vivacidade, referindo-se ao
preenchimento do som no ambiente. A vivacidade estaria relacionada ao volume da
reverberação do som no espaço e o tempo de reverberação das frequências médias e altas
(acima de 500 Hz); (2) Calor (Warmth): Calor em acústica é definido como a presença dos
graves (fullness of bass tones). Ocorre quando o tempo de reverberação para frequências
baixas (menores que 250 HZ) é suficientemente grande para garantir que tais frequências
sejam bem percebidas; (3) Brilho (Brilliance): O som brilhante de uma sala deriva da
proeminência dos harmônicos superiores e do relativo baixo decaimento para essas
frequências. É afetado pelo intervalo entre a chegada do som direto e das primeiras reflexões,
e pela razão entre os tempos de reverberação de médias e altas frequências. Em uma sala que
apresenta clareza e vivacidade nas altas frequências, tende também a apresentar um som
134
134
brilhante. Os parâmetros subjetivos vivacidade, brilho e calor são determinados pelos tempos
de reverberação das frequências médias, agudas e graves, respectivamente; (4) Nível de som
direto e reverberante (Loudness of direct / reverberant sound): A impressão que se tem do
volume de um som em determinado ambiente é formada pelas contribuições do som direto e
do som reverberante. A energia do som reverberante é função de duas variáveis: a intensidade
do som que viaja indiretamente até o ouvinte e o tempo de reverberação do ambiente; (5)
Intimismo (Intimacy): Determinado pelo intervalo de tempo entre o som que chega
diretamente e sua primeira reflexão proveniente das superfícies refletoras; (6) Clareza, ou
Definição (Clarity, ou Definition): Articulações sonoras límpidas e precisas
independentemente do andamento; é função do padrão de reflexão de suas superfícies, da
distância entre o ouvinte e músico e das dimensões do ambiente. Mais do que qualquer outro,
o tempo de reverberação é o atributo decisivo para o parâmetro clareza; (7) Impressão
Espacial (Spatial Impression): É o efeito psicoacústico causado pelas reflexões sonoras que
atingem o ouvinte a partir de várias direções; o sistema auditivo cria uma sensação acústica
espacial do ambiente (IAZZETTA, 2006, p 1-2).
Esses mesmos autores descrevem o trabalho de Angelo Farina, que sintetizou, em
1994, uma base para um questionário a ser empregado na avaliação acústica qualitativa
subjetiva. Farina elaborou os termos seguintes: (1) agradável (pleasant); desagradável
(unpleasant); (2) definido (clear); confuso (unclear); (3) macio (soft); rígido (hard); (4)
difuso (diffuse, involving); concentrado (concentrated); (5) seco (dry); reverberante
(reverberant); (6) agudos acentuados (treble emphasized); agudos não acentuados (treble not
emph.); (7) graves acentuados (bass emphasized); graves não acentuados (bass not emph.); (8)
nível sonoro fraco (weak); bom nível sonoro (loud) (IAZZETTA, 2006, p 6).
Os achados desse item do relatório desta pesquisa são relevantes para pesquisas
posteriores que abordem a medição acústica da voz e podem estar associados aos protocolos
de investigação da área de fonoaudiologia para pesquisas sobre qualidade vocal.
3.2.9 Trabalho técnico individual para ressonância /amplificação /desenvolvimento do som
vocal
Pergunta: Como você trabalha, tecnicamente, a ressonância /amplificação /desenvolvimento
do seu som vocal? Especifique.
Respostas:
135
135
Sujeito 1: Principalmente pelo brilho, aumento do legato e, em alguns casos, principalmente na
região grave, um aumento do uso das consoantes.
Sujeito 2: Principalmente trabalho a posição da garganta, fôrma vocal, palato, língua e
músculos faciais para que funcionem de acordo com o som desejado.
Sujeito 3: Através de exercícios diversos, de acordo com as necessidades do aluno. Mas o uso
da vogal “i”, de algumas consoantes e o “bocca chiusa” sempre funcionam bem.
Sujeito 4: Trabalho os agudos abertos, após a passagem a qualidade dos agudos ficam melhor,
e tentando igualar os registros.
Sujeito 5: Em função das pesquisas que tenho feito nos principais teóricos, principalmente
Richard Miller, tenho procurado estabelecer alguns critérios principais para explorar minha
ressonância: (a) o trato vocal precisa estar bem “desenhado” os fonemas possuem desenhos
próprios e devem ser adequados às diversas regiões (Ralph Appelman); (b) a percepção da voz
na máscara é fundamental para a amplificação no canto lírico (Richard Miller); (c) a
consciência da diferença entre audição interna e externa, palestesia (vibração óssea) e
cinestesia (percepção de espaços internos no trato vocal e percepção do apoio respiratório)
(Guyton) funcionam como feedback físico de uma ressonância bem ajustada.
Sujeito 6: (não respondeu).
Sujeito 7: Vocalizes ascendentes com bocca chiusa em /nh/ e /hum/, logo em seguida,
repetindo o exercício, dessa vez com a boca aberta, mas sem mudar esse som, mantendo a
ressonância nasal.
Sujeito 8: Trabalho vocalizes e uso a respiração costo diafragmática. Não sei trabalhar se não
explorar o corpo. Sempre me interessei pelo exercício físico: fiz ioga, conheci o trabalho da
Thérèse Bertherat e uso muito a técnica de Alexander.
Sujeito 9: Utilizo procedimentos de ressonância em “bocca chiusa”em intervalos de segundas e
terças descendentes e ascendentes; utilizo a consoante “m” em sílabas “mi” e “movisando a
conscientização proprioceptiva da ressonância da voz; exercícios vocais em escala diatônica
descendente e ascendente em que o aluno é solicitado a manter a ressonância em um mesmo
ponto de incidência vocal.
Sujeito 10: Trabalho aliando um apoio abdominal ativado no instante da inspiração oral à
abertura e levantamento do palato como num bocejo. O instante da inspiração, no meu canto,
sempre acontece juntamente com essas duas coisas. Não consigo separar respiração e
ressonância.
Sujeito 11: Sinto muito, mas o primeiro trabalho para a ressonância vem da respiração. Os 5
passos para uma boa ressonância: 1. apoio (e todos os exercícios e trabalhos necessário para
conseguir um apoio constante, firme, elástico e flexível); 2. Apoio; 3. Apoio; 4. Trabalho
com as vogais para descobrir a melhor ressonância de cada uma. Quanto mais frequências no
espectro vocal são valorizadas pela articulação da vogal, maior será o volume da voz. 5.
Tenho visto que é necessário somente dizer para os alunos que o som sai na direção para frente.
Na direção da platéia para conseguir melhor coordenação da respiração, fonação, espaço bucal,
etc. O cantor gosta de criar complicações que dificultam a ressonância projeção. Perguntei
aos alunos e eles me disseram que uma das coisas mais importantes para eles foi uma idéia que
vem da fono SP. Ressonância baseada ou em “n” (ressonância alta), “m”(ressonância baixa)
ou “ng” (ressonância mista) que podemos escolher dependendo do repertório.
3.2.10 Parâmetros/Critérios físicos corporais
Pergunta: Quanto ao fenômeno da ressonância/amplificação /desenvolvimento vocal, quais os
parâmetros/critérios físicos corporais que indicam que você está emitindo um som vocal de
qualidade? O que você usa?
Respostas:
136
136
Sujeito 1: Depende da região. Na região média, percebo uma sensação de ouvido surdo, tapado
por dentro. No agudo, percebo mais brilho que esforço.
Sujeito 2: Os parâmetros indicadores são aqueles que funcionam de forma mais natural
possível, como respondi anteriormente, um som de qualidade não pode apresentar esforços
demasiados, pois deve fluir naturalmente. Utilizo todo o mecanismo da resposta anterior.
Sujeito 3: Abertura adequada da boca com a consciência da ressonância alta e com o giro.
Sujeito 4: Primeiro a audição, ouvir o som fora de você (se está preenchendo o ambiente) e
outra coisa é onde está vibrando; e segundo se está vibrando na máscara e na cabeça. Ouvir
fora de você, vibrar na máscara, o brilho da voz preenche o ambiente. E em um teatro grande,
você ouve o eco.
Sujeito 5: O conjunto de sensação estável na máscara (stezza posizione) associada à voz na
sala” me garantem que a voz está ressonante e amplificada.
Sujeito 6: Eu procuro observar o esforço físico e a articulação dos fonemas; são dois
parâmetros fundamentais na emissão. O estudo sistemático provocou mudanças na emissão;
hoje em dia consigo sentir as vibrações no corpo todo; consigo sentir que a emissão é tão cheia
de energia que ela é sentida mesmo quando eu apenas falo. Houve, durante esses anos, um
ganho de qualidade vocal pela respiração e pela articulação; pela consciência e conhecimento
adquirido de fisiologia vocal.
Sujeito 7: Apoio e respiração costo-diafragmática.
Sujeito 8: É o corpo, corpo e corpo. E se você não tem liberdade de tórax, apoio e boa postura,
não consegue a boa ressonância.
Sujeito 9: Percepção cinestésica da ressonância de cabeça e a maleabilidade do som emitido.
Sujeito 10: Além das vibrações da caixa craniana, percebo também pela audição. Sei que quem
canta não ouve o que a platéia ouve, mas, em meus estudos, treinei o ouvido para reconhecer os
diferentes ajustes de ressonância e sensações proporcionadas pelos mesmos em meu corpo.
Sujeito 11: Somente, de fato, o som. Corpo posição relaxada de pescoço, mandíbula, boa
postura. Boa coordenação da respiração, boca confortavelmente aberta, língua relaxada. Deve
haver um vibrato vocal saudável no som de qualidade.
Comentários:
Miller é bem objetivo em dizer que as sensações corporais não são indicativas de que
o som esteja sendo projetado e otimizado; no entanto, o uso das sensações corporais é útil
desde que associado a um resultado sonoro comprovadamente eficaz pelo cantor. Uma vez
que ele obtenha o som desejado, é útil que este esteja associado às suas sensações corporais
para fixá-las e obtê-las com mais facilidade.
Em relação às sensações nas cavidades e no nariz, Titze concluiu em suas pesquisas
que as sensações na face são uma indicação da conversão efetiva da energia aerodinâmica em
energia acústica, ou seja, da eficácia desse parâmetro ao invés da ressonância sonora nos sinus
ou cavidades nasais. Mais detalhes poderão ser obtidos em seu artigo publicado no Journal of
Voice Workshop on Acoustic Analysis (TITZE, 2009).
137
137
Figura 3.4: Seios paranasais, conjunto que constiste a denominada “máscara” no canto (MEDSCAPE, 2006).
3.2.11 Ajustes físicos
Pergunta: Que ajustes corporais (garganta, boca, nariz) você realiza para obter um som de
qualidade?
Respostas:
Sujeito 1: Normalmente, percebo a garganta aberta, a laringe e a língua relativamente baixas,
com uma ressonância aguda e leve pairando por cima de uma laringe baixa.
Sujeito 2: O posicionamento da garganta, boca, nariz, palato, língua são modificados conforme
as articulações que a execução pedir.
Sujeito 3: Abertura de todo espaço da garganta e relaxamento da mandíbula e da língua.
Sujeito 4: Difícil responder. Nos agudos vai até a passagem, a laringe desce, a língua desce o
espaço aumenta; no agudo a tendência é descer a laringe para os homens. Se evitar a passagem,
a laringe sobe. Faço um pouco de protrusão de lábios no grave.
Sujeito 5: Tônus adequado de lábio superior e comissuras, tensão no véu palatino como um
todo (teto e pilares da garganta), atividade lingual articulatória adequada e atitude mental
positiva associada à autoridade.
Sujeito 6: Eu sempre peço que o cantor imagine uma platéia diante dele e se coloque de forma
a não abaixar pescoço e não se curvar de forma alguma. A idéia de estrutura plena preparar o
corpo para passa por um bom posicionamento corporal.
Sujeito 7: Parto do princípio da escola italiana de canto. Distribuo o peso do corpo sobre as
duas pernas, ligeiramente separadas, utilizo respiração completa, abertura interna (como num
bocejo), posição da boca vertical, distribuindo o som por toda a face. Dispenso o uso de
pantomimas, posição de sorriso, abertura extremada de maxilar, essas coisas, que, em minha
opinião, geram tensões desnecessárias. Meu canto é baseado em apoio e deixo que o som
conduza os movimentos do corpo, boca, face.
Sujeito 8: (não respondeu)
Sujeito 9: Ajustes na postura oro-faríngea para conduzir o som aos ressonadores superiores.
Sujeito 10: O que procuro fazer na maioria das vezes é aumentar ou reduzir espaço faríngeo. A
boca, em geral se mantém com um leve formato de corneta. Utilizo o nariz, em geral, quando
desejo produzir sons mais brilhantes.
Sujeito 11: (não respondeu)
Comentários:
Esse tópico já foi discutido anteriormente.
138
138
3.2.12 Dificuldades Técnicas
Pergunta: Quais as maiores dificuldades técnicas que você encontrou ao iniciar seus estudos
de canto (lírico), no que se refere ao som vocal que lhe fosse satisfatório?
Respostas:
Sujeito 1: O exagero do volume na região de voz de peito.
Sujeito 2: Sim, devo treinar para manter as posições desejadas de forma mais natural e não
mecânica. Também tenho dificuldades para obter mais volume.
Sujeito 3: Não, mas preciso estar inteira para uma boa qualidade.
Sujeito 4: Tenho dificuldades no registro agudo, após a passagem.
Sujeito 5: Como tenho um uso vocal muito intenso, a emissão de sons suaves é dificultada.
Gostaria de desenvolver tecnicamente essa competência.
Sujeito 6: Eu sempre inicio as aulas com exercícios de respiração; a busca pela articulação
adequada se dá quando pesquiso fonemas que se ajustam à voz que está sendo trabalhada.
Sujeito 7: No momento, não.
Sujeito 8: (não respondeu)
Sujeito 9: Não.
Sujeito 10: Não.
Sujeito 11: (não respondeu)
Comentários:
A idéia de procurar entender os problemas para que estes gerem o conteúdo a ser
ensinado é amplamente explorado nos sistemas de ensino dos estudos baseados em
problemas. A Universidade Estadual de Londrina, no Bacharelado em Medicina, implantou
esse sistema curricular, que vigora até o presente dia.
Na pedagogia vocal, Oren Brown escreveu seu livro Discover your voice: How to
develop healthy voice habits e discorre sobre esse aspecto:
Às vezes eu desejo ser jovem novamente para estudar canto com o que eu sei hoje. Mas,
colocando o sentimentalismo de lado, sei que foi porque lutei para entender a minha própria
voz que posso trabalhar com eficácia com meus alunos. Se você ensina canto, recomendo que
você continue a aprender tudo o que puder sobre sua própria voz. Nós todos temos a
capacidade de empatia,
54
mas, como todas as virtudes, ela deve ser exercitada e ampliada.
55
(BROWN, 1996, p. 243-244).
54
Empatia: Estado mental em que a pessoa se identifica com outra ou se sente na mesma condição psicológica. É
um tipo de projeção (DORIN, 1978, p.92). (…) Justamente tal projeção, em um outro ser, de um estado emotivo
(…) seria o modo de comunicação entre as pessoas (ABBAGNANO, 1982, p.307).
55
Sometimes I wish I could be young again and study voice with what I know about it today. But, putting
sentimental thoughts aside, I know it is because I have struggled to understand my own voice that I can work
effectively with my students. If you teach singing, I recommend that you continue to learn all you can about your
own voice. We all have a capacity for empathy, but like all virtues, it must be exercised and enlarged.
139
139
O feedback que foi pedido aos professores corrobora com a colocação de Brown: o
professor de canto deve estar em estado permanente de pesquisa, buscando conhecer melhor
sua própria voz e se manter atualizado dentro da literatura da sua área. Com o tempo, o
professor de canto fica desatualizado e pode vir a disseminar conceitos equivocados ou vagos.
3.2.13 Técnicas para melhorar a ressonância
Pergunta: Tecnicamente, como o cantor pode aumentar/melhorar sua ressonância/som vocal?
Especifique.
Respostas:
Sujeito 1: Em primeiro lugar, o cantor deve fazer uma pesquisa corporal para conhecer as
possibilidades de ressonância do próprio corpo, para fazer uso delas, eu diria consciência
corporal em primeiro lugar. No entanto, recentemente, tenho observado a compreensão do que
seria o famoso giro italiano. Que seria justamente a possibilidade de ter sempre ressonâncias
agudas, em qualquer trecho da voz, porém, com uma laringe baixa. Acho que a principal
confusão geral do cantor é essa relação de obter ressonâncias altas pela posição do palato,
faringe e boca, mas não da laringe.
Sujeito 2: Através de muito treino, após descobrir que mecanismos funcionam mais para sua
execução, é necessário fazer um exercício mental para manter o posicionamento ideal a cada
articulação.
Sujeito 3: Usando o espaço adequado e a soltura necessária.
Sujeito 4: Fazendo aula particular com um bom professor.
Sujeito 5: Principalmente pelo conhecimento da fisiologia da amplificação: pressão aérea
adequada, tônus do trato vocal respeitando a natureza dos fonemas e consciência da voz estável
na máscara. Para aumentar a amplificação, o cantor precisa (a) aumentar a pressão aérea de
acordo com cada região vocal, (b) ter consciência do posicionamento dos articuladores para
todos os fonemas nos diversos idiomas, incluindo o conhecimento da importância da
plosividade dos fonemas [p,b,t,d,k,g] e a necessidade de prolongar as fricativas [f,v,s,z,r,m,n]
para dar mais energia à emissão, (c) manter a tensão do véu palatino, elevadores e abaixadores
do hióide para estabilizar a laringe em posição ideal para a emissão amplificada.
Sujeito 6: Sim, se depois dos estudos iniciais ele compreender o trato vocal e tentar investir em
ressonâncias da parte mediana e posterior da boca; esse estudo é possível depois que o
cantor tiver experiências iniciais conscientes e fundamentadas.
Sujeito 7: Trabalhando os exercícios que descrevi acima.
Sujeito 8: O trabalho sistemático e constante. Eu dou aulas duas vezes por semana, de meia
hora, por causa disso; acho a constância fundamental para o trabalho. Outra coisa é investir na
correção dos hábitos ruins e substituir pelos bons, começando pela postura e relaxamento. Eu
uso vocalizes progressivos, primeiro trabalho bem a região média para depois aumentar a
tessitura.
Sujeito 9: Estudar e praticar exercícios que desenvolvam a propriocepção do som vocal e sua
ressonância, através de modificações posturais do trato orofaríngeo e utilização dos
ressonadores superiores.
Sujeito 10: Creio que vocalizes são um ótimo caminho. Especialmente o trabalho com
consoantes sonadas, como V, F, ou J. Creio também que pesquisar diferentes sonoridades e
diferentes recursos pode ser um caminho interessante, como numa brincadeira de fazer
diferentes sons e, com isso, ir mapeando os diferentes coloridos, efeitos, etc.
Sujeito 11: Veja acima.
140
140
Comentários:
Sacramento (2009) verificou em sua pesquisa que 72% dos cantores entrevistados
realizam a modificação vogal no canto “associada à necessidade de afinação dos formantes e
de compensação do excesso de harmónicos agudos, principalmente nas vogais anteriores, à
medida que a voz se desloca para os agudos, e é fundamental para a técnica lírica”
(SACRAMENTO, 2009, sn); e 63% dos participantes praticam a colocação frontal da voz.
Richard Miller precreve alguns bons exercícios no capítulo “A voz ressonante” em seu
livro Structure of Singing (1996). Alguns dos procedimentos que ele aponta são: com os
lábios fechados, respirar através do nariz suavemente, como se estivesse inalando um aroma
agradável; usar uma expressão suave facial sem realmente sorrir.
Manter a sensação de abertura, exalar em “hm” e cuidar do equilíbrio nas sensações.
Manter a postura “nobre”, cuidados com tensões, vocalizar com os dedos apertando
suavemente as narinas e cantando a vogal /a/, exercício antigo prescrito por Miller para retirar
a nasalidade e verificar o equilíbrio entre boca e faringe. Justapor “hm” com o exercício
anterior, para que as sensações se movam para fora da garganta. Apesar de a faringe ser o
maior ressonador no canto, Miller explica que esses procedimentos facilitam para que o
cantor tenha as sensações de maneira uniforme em todo o trato vocal.
3.2.14 Ajustes utilizados na transição de registros vocais
Pergunta: Que eventos ou procedimentos/modificações na boca, garganta e nariz você utiliza
para a transição de registros vocais?
Respostas:
Sujeito 1: Eu diria que atualmente, e bem recentemente, tenho tido a consciência de um palato
constante e firme, porém não rígido, e uma flexibilidade no momento da troca de registros.
Sujeito 2: Cada registro requer um posicionamento diferente da boca, garganta e nariz,
aberturas diferentes, relaxamentos e tensões diferentes. Treino para deixar os registros
homogêneos e as passagens imperceptíveis.
Sujeito 3: Só serão necessários ajustes mais significativos se o espaço estiver insuficiente.
Sujeito 4: Não faço, ela acontece naturalmente. Me lembro sempre de uma orientação de um
professor, que disse:”Quando a voz quiser mudar de lugar, deixa a voz ir para onde ela quiser.”
Isso faz com que eu desencane da voz.
Sujeito 5: Eu uso a manobra da transição através do véu palatino, seguindo o conceito de
“stessa posizione”. Eu fixo um arco no palato e todas as notas devem vibrar nesse mesmo arco.
Durante a transição de registro, eu atenuo a pressão do apoio e misturo um registro ao outro, de
modo que o ouvinte não perceba a troca de registro. Entretanto, eu percebo internamente a
mudança de registro. Por causa da prática, eu me acostumei com a sensação e hoje tenho a
impressão subjetiva de um registro só.
141
141
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Procuro me guiar pelo espaçamento interno da boca, bocejo (citado anteriormente),
pois acredito que seja suficiente para a consequência de um som de qualidade.
Sujeito 8: Eu exploro bem a ressonância de corpo, e é que vem o perigo, porque dentro do
que faço eu não concordo que a voz seja só de cabeça nos agudos acho que tem que ter também
o apoio de tórax, acho isso muito importante. Com ressonância de tórax, o som aumenta,
melhora. Ressonância de tórax, apoio torácico. Voz de peito era considerada um pecado;
cantora de serenata usava voz de peito. E eu perguntava e ninguém me explicava nada e então
fui me observando.
Sujeito 9: Manutenção da postura alta do véu palatino, ponto de incidência vocal e controle da
postura laríngea.
Sujeito 10: Apenas abertura e fechamento de espaços.
Sujeito 11: Em geral, não focalizo atenção em mudanças no nariz. Mais uma vez, depende do
problema do aluno para conseguir posição relaxada de pescoço, mandíbula, boa posição da
cabeça, língua relaxada, etc. Falo aos alunos dos 3 principais degraus da voz e que podemos
cantar em cada um deles, dependendo do repertório, altura, textura, tessitura, etc. A voz mais
‘fina’, mais aguda, leva menos esforço de apoio que a voz mais pesada e serviria para música
leve ou da época barroca. A voz mais pesada serve para cantar Verdi, Wagner, etc., e exige
MUITO mais apoio para não forçar o pescoço. A maior parte de nosso repertório é cantada na
voz do meio a voz mista.
Comentários:
No canto lírico, de acordo com Miller (1996), o registro de peito deve ser limitado à
região grave (até Eb4 para sopranos, e E4/F4 para mezzo-sopranos), porém serve às intenções
interpretativas. Nas transições, Miller prescreve a mistura entre registros de cabeça e de peito.
As passagens de registro das vozes masculinas e femininas são resumidas no Anexo 2, de
acordo com Miller. A partir desses dados os cantores e professores de canto podem se situar
melhor até mesmo para classificar mais adequadamente a voz dos seus alunos. As regiões de
passagens são um indicativo auxiliar na classificação, sendo que o mais importante é o timbre
e a adequação da voz ao repertório vocal.
várias teorias sobre registro, incluindo o conceito de registro único, os três
registros (peito, misto, cabeça) e suas variações, e a teoria de que cada nota é um registro em
si. A maioria dos autores, inclusive Miller (1996), Brown (1996) e Ware (1998), assumem
três registros principais, peito-misto-cabeça, mas o principal entendimento deste fenômeno se
refere às alterações físicas estabelecidas na laringe. A musculatura intrínseca, principalmente
a ação proporcional do músculo vocal e dos crico-aritenóides, vai permitir as diversas
adaptações aos registros em associação às pressões aéreas e aos desenhos do trato vocal. O
conjunto desses fenômenos vai fazer com que o cantor perceba diferenças internas nos
diferentes registros. Entretanto, o ouvinte deverá perceber um único timbre, que soa “como
se” fosse um único registro:
142
142
Por considerarmos o registro único, os termos utilizados para ensinar registros passam por uma
concepção chamada centralização ou horizontalidade do som. A partir das vogais faladas,
mantendo o “foco” centralizado, percorre-se toda a extensão vocal de modo a mapear as
relações de espaços e pressões de cada região. Desta forma, a equalização se dá de forma
helicoidal, onde a escala deixa de ser percebida por registros, mas por expansões (RUBIM,
2000, p. 126).
Rubim utiliza termos tais como “arrumar a voz falada antes de cantar”, “partir da fala
para construção do registro de peito”, “o som interno não corresponde ao que o público está
ouvindo”, “com o tempo o aluno tem a percepção de um único registro.” O mais importante
nessa discussão é que sejam levadas em conta as diferentes percepções dos alunos. Cada um
sente sua voz e seu corpo de modo particular e individual; por isso deve-se explicar o
fenômeno físico que ocorre e tentar estabelecer-se uma explicação de que modo o aluno
perceba aquele fenômeno de acordo com sua linguagem corporal e pessoal.
3.2.15 Modificações do timbre
Pergunta: Você faz modificação vocal do timbre? Se afirmativo, especifique as modificações
no trato vocal que você realiza.
Respostas:
Sujeito 1: A principal mudança de timbre que eu faço é para cantar repertório alemão, que seria
usar um som com mais brilho, com uma postura do trato geral mais vertical do que horizontal;
e no repertório italiano, uma maior horizontalidade.
Sujeito 2: Sim, cada estilo de música requer timbres diferentes, timbres mais aveludados, mais
brilhantes, mais volumosos, mais pesados e vibrantes, mais claros e puros, entre outros.
Sujeito 3: Acho um pouco arriscado, só faço se realmente for muito necessário.
Sujeito 4: Não altero o timbre nas músicas.
Sujeito 5: Faço modificações de timbres para executar diversos gêneros e estilos. Quando
ensino canto popular, tenho que alterar vários parâmetros do meu timbre. O principal deles é a
posição da laringe mais alta no canto popular. Além disso, produzo um estreitamente antero-
posterior do trato vocal para produzir um som mais estridente. Quando canto ópera e canção
brasileira faço adaptações para cada um desses gêneros. Na ópera a tensão é máxima, a
projeção é grande e a articulação é bem exagerada, levando em conta os espaços que
geralmente são amplos. No canto de câmara, como o espaço costuma ser menor, não preciso de
tanta pressão aérea e tensão articulatória. Em algumas canções o timbre é mais escuro
(alemão), em outras, o timbre é mais claro (italiano, inglês).
Sujeito 6: Utilizo as colocações orais e nasais a partir de fonemas que proporcionam estas
modificações.
Sujeito 7: Não. Procuro cantar com clareza e brilho, mas não mudo meu timbre, nem o faço aos
meus alunos. Acredito que isto é agressivo. Timbre deve ser respeitado, não alterado. Se tiver
de ser alterado, que seja trabalhado para ganho de harmônicos, mas não, modificado.
Sujeito 8: O Timbre , quando a voz se coloca, se define, mulheres geralmente falam diferente
que cantam; depois que colocam a voz o timbre se define.
Sujeito 9: Sim. Pequenas alterações na postura do véu palatino, língua e articulação.
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Sujeito 10: Sim. De acordo com a sonoridade desejada, uso mais o nariz e os dentes superiores
para obter um som mais brilhante, uso mais a faringe na busca de mais veludo e escuro, uso
ressonância peitoral para graves mais explosivos, etc.
Sujeito 11: Timbre é questão de ressonância é articulatório. Temos que utilizar
constantemente mudanças de timbre, dependendo do repertório que estamos fazendo. O cantor
lírico tem que aprender a pintar com a voz. Mas modificações de timbre frequentemente
afetam o volume a ressonância.
Comentários:
Segundo Ware (1998), o timbre (características sonoras) é muitas vezes associado à
classificação vocal, cuidando para que a voz classificada esteja sendo produzida de maneira
correta. No entanto, o cantor é capaz de produzir variados timbres (ver capítulo 2), alterando
acusticamente os harmônicos produzidos pelas alterações do formato do trato vocal, dosando
nuances de colorido e empregando seus esforços técnicos e expressivos na produção de uma
voz ressonante (MILLER, 2008). O chiaroscuro e a presença do formante do cantor
(previamente discutidos) são exemplos dessa regulação do timbre vocal. Em relação ao uso de
timbres diferentes, Sacramento identificou o seguinte, em sua pesquisa em Aveiro, Portugal:
O uso de diferentes timbres vocais é utilizado em 80% dos casos, por motivos estilísticos, e de
forma intuitiva em 46% dos casos. O uso de diferentes timbres vocais para colorir a
interpretação é uma característica do canto lírico, no entanto, um resultado tão elevado poderá
apontar para que esta prática seja transversal a todos os estilos, que os cantores de musicais
também mencionaram a sua prática (SACRAMENTO, 2009, sn).
Alteração de timbre pode ser analisada por diversos prismas: o timbre original do
cantor é um aspecto exclusivo e é até chamado de “impressão digital” do indivíduo. Outros
aspectos do timbre podem não apenas ser alterados, mas comprovados através de aparelhos
que medem esses parâmetros. Por fim, alteração de timbre é o que permite diversos coloridos
nos diversos estilos e gêneros musicais. Sem alteração de timbre não haveria ópera, rock,
canto siberiano e música flamenca. Outro exemplo desse fenômeno são os dubladores, que
alteram seu timbre para criar diversos personagens.
3.2.16 Ajustes do trato vocal
Pergunta: O que lhe foi ensinado tecnicamente de mais relevante no que se refere à
ressonância do trato vocal? Especifique mudanças em:
o Boca
o Palato
o Mandíbula
o Língua
o Lábios
o Garganta
o Agudos
144
144
o Médios
o Graves
o Outros
Respostas:
Sujeito 1:
o Boca vertical, uma simulação e /o/ comum em todas as vogais, ou arredondamento.
o Palato alto.
o Mandíbula relaxada.
o Língua maleável, com a ponta acordada e a base relaxada.
o Lábios presentes, terminando a forma de todo o trato.
o Garganta aberta, com a faringe larga no agudo.
o Agudos brilhantes e principalmente flexíveis, a boca e garganta mais abertas.
o Médios existindo sempre esse arredondamento sem, muito esforço, ressonâncias altas,
palato alto.
o Graves não aumentar muito o volume da voz de peito.
o Outros o giro italiano, que já citei anteriormente, palato alto priorizando ressonâncias
altas, com a laringe baixa.
Sujeito 2:
o Boca rmas mais abertas ou fechadas, verticais ou horizontais, mais tensas ou relaxadas,
dependendo da articulação.
o Palato altos e baixos conforme o som desejado.
o Mandíbula sempre relaxada, pode-se levantá-la ou abaixá-la conforme o som desejado.
o Língua sempre relaxada e quanto mais abaulada e abaixada aumenta a cavidade sonora.
o Lábios mais tensos ou relaxados, conforme o som desejado.
o Garganta mais aberta ou fechada conforme o registro vocal.
o Agudos o som é projetado mais acima, a fôrma da boca mais vertical, garganta relaxada.
o Médios os lábios trabalham mais, narinas mais abertas.
o Graves mandíbula bem relaxada.
Sujeito 3:
o Boca é um grande órgão ressoador
o Palato precisa estar elevado
o Mandíbula tem que se manter relaxada
o Língua deve ficar abaixada e relaxada
o Lábios também projetam o som
o Garganta tem que ter espaço suficiente
o Agudos se cantam pensando para baixo
o Médios precisam de um bom trabalho, em consequência ajuda no desenvolvimento dos
agudos e dos graves
o Graves se cantam pensando para cima e geralmente mais próximo da fala.
Sujeito 4:
o Boca é bem importante a forma da boca, verticalizar tudo.
o Lábios às vezes foco projeção dos lábios um pouco nos graves.
o Palato sentir sempre o som no palato duro.
o Mandíbula relaxada e bem aberta nos agudos.
o Língua solta.
o Garganta abrir a garganta.
o Agudos procurar cantar bem claros os agudos para não entubar.
o Médios (não respondeu)
o Graves (não respondeu)
o Outros cantar claro, todos devem cantar bem claro (desde o baixo profundo a o soprano
ligeiro), não som fabricado, sua própria voz projetada, sua própria voz, não imitar outros
timbres (escurecer muito ou entubar), o palato irá funcionar sem forçar a barra. Não é voz
fabricada, imitando os cantores acaba-se entubando a voz.
Sujeito 5:
145
145
o Boca e Lábios tônus de lábio superior e comissuras.
o Palato véu palatino (palato mole e pilares da garganta) sempre tônico.
o Mandíbula relaxada, mas presente ativamente na formação de todos os fonemas.
o Língua ponta tocando os alvéolos inferiores e dorso livre para obedecer aos movimentos
livres da laringe.
o Garganta aberta, mas sem abaixamento provocado. Uso o conceito de laringe
“pendurada” em vez de laringe abaixada. A garganta deve estar livre como uma passagem
aberta e oca.
o Agudos flutuantes, livres, explorar apenas a ressonância. Sem esforço, apenas com o
trabalho da coluna de ar.
o Médios os médios correspondem ao registro misto que deve ter um trabalho equilibrado
de tensão muscular vocal e suporte aéreo. A região média é a região mais difícil de
compreender e estabilizar. Exige tônus médio, não se pode produzir um som tão grande
quando nas outras regiões. É o mau uso dos sons médios que causa os maiores problemas
vocais nos cantores líricos.
o Graves teno do músculo vocal, presea de voz falada e sempre com mistura de voz de
cabeça até o som mais grave, para equalizar todos os registros.
o Outros o registro de assobio é feito com voz de cabeça quase pura. São harmônicos
agudos que flutuam e a prega vocal vibra apenas uma pequena abertura na região anterior.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7:
o Boca aberta mais internamente. A abertura exterior é controlada pela interna, livre de
tensões.
o Palato não há o que se fazer com ele; está fixo num lugar. Não há como levantar ou
abaixar.
o Mandíbula também deve obedecer ao movimento interno. Nunca deve controlar uma voz,
deve apenas contribuir com articulação, mas nunca ser responsável pela qualidade do som;
é pra isso que existem os ressonadores.
o Língua sempre no assoalho da boca, nunca arqueada, pois tranca o som.
o Lábios nem demasiadamente relaxados, nem demasiadamente tonificados, mas
suficientemente modulando as vogais, para garantir a inteligibilidade das palavras.
o Garganta noção de espaço interno (bocejo).
o Agudos muito bem apoiados pelo diafragma e músculos intercostais este é o princípio
básico.
o Médios igualmente.
o Graves iguais às respostas anteriores, e nunca forçados. Se a voz tem bem definidos os
agudos e bem apoiados, o mesmo acontecerá com os graves, dentro da classificação vocal
de cada indivíduo. Não se pode exigir que todas as vozes tenham os mesmo agudos e
graves. É preciso entender qual a sonoridade de graves nas vozes lírica, ligeiras, dramáticas,
coloraturas, e sucessivamente.
Sujeito 8: (não respondeu)
Sujeito 9:
o Boca: relaxada, acompanha as necessidades de prolação das palavras.
o Palato: alto.
o Mandíbula: relaxamento e abertura livre.
o Língua: relaxamento.
o Lábios: acompanham a necessidade de clareza e prolação das vogais.
o Garganta: expandida, sem tensão.
o Agudos: ressonância de cabeça.
o Médios: manter a ressonância de cabeça.
o Graves: manter a ressonância de cabeça e o foco.
Sujeito 10:
o Boca: (não respondeu)
146
146
o Palato: sobe num movimento aliado ao da inspiração oral e ao apoio abdominal. Antes, eu
tinha respiração, apoio e ressonância como coisas diferentes que deveriam ser acionadas em
momentos diferentes. Agora sinto que se trata de um único movimento que engloba tudo.
o Mandíbula: noto, nas buscas pelo movimento palatal, que a mandíbula se movimenta para
baixo, além de recuar delicadamente para trás.
o Língua: quase sempre relaxada e tocando o espaço entre os dentes inferiores e a gengiva.
Noto uma leve pressão no dorso da língua, para baixo, quando alcanço as notas mais altas.
o Lábios: uma certa tensão labial, provocando um formato similar ao de uma corneta.
Mais perceptível no lábio inferior.
o Garganta: procuro aliviar ao máximo as possibilidades de tensão na garganta durante o
canto.
o Agudos: como tenho uma voz médio-grave, busco, nos meus agudos, manter a ressonância
sempre alta. Como se as notas fossem produzidas acima do palato duro. a sensação de
bolhas de ar acima da estrutura sólida.
o Médios: mantenho a ressonância alta, porém cedo ao corpo natural da pasta sonora da voz.
Uso, na região média, um apoio abdominal menos intenso.
o Graves: para uma sonoridade mais brilhante e audível, uso, nos graves, menos ressonância
faríngea. Alio algo de ressonância peitoral à sensação das bolhas de ar que tenho nos
agudos. Noto que há, sobretudo nas notas mais graves, um suave encolhimento do abdome,
que serve, em minha opinião, como um reforço na emissão de ar para uma maior vibração
das pregas.
Sujeito 11: (não respondeu)
Comentários:
Sacramento (2009) observou, em cantores portugueses, uma posição preferencial da
laringe em 69% dos pesquisados, e o fazem na variação da tessitura, nos agudos,
principalmente em 46%. Observou também que 85% fazem retração das pregas ventriculares,
traduzidas em abertura da faringe, sendo que esses cantores justificaram ser esta uma posição
habitual na formação do canto lírico.
A postura do palato elevado predominou em 80% dos cantores, com a mesma
justificativa citada acima. Interessante que 22% apenas levantam mais o palato nas notas
agudas, segundo a pesquisadora. Outro dado importante foi o controle da abertura
velofaríngea, que a autora verificou presente em 26% dos casos, em cantores que dizem ser
um controle consciente, em 44% o fazem de maneira intuitiva.
O controle fino da porta velofaríngea, de acordo com Sacramento (2009), fornece
inúmeras possibilidades ao cantor relativas a expressões em dinâmica e timbre.
Quanto à posição da língua, a autora identificou 37% como preferência à posição
baixa ou pousada. Para a potencialização da ressonância do trato vocal, 57% tentam ampliar o
trato vocal.
Em nossa pesquisa, obtivemos o resultado exposto resumidamente na tabela abaixo:
147
147
Tabela 3.5: Ajustes ensinados aos professores de canto.
3.2.17 Dificuldades técnicas no início dos estudos de canto
Pergunta: Quais as maiores dificuldades técnicas que você encontrou ao iniciar seus estudos
de canto (lírico), no que se refere ao som vocal que lhe fosse satisfatório?
Respostas:
Sujeito 1: Má classificação, muita dificuldade no registro grave (peito).
Sujeito 2: Encontrar um mecanismo ideal para obter mais volume e naturalidade; também
dificuldade em retirar o som anasalado.
Sujeito 3: Conseguir a abertura necessária da garganta e a consciência de soltura da mandíbula.
Sujeito 4: Tive dificuldades sérias no início, precisei fazer oito meses de fonoterapia, pois tinha
a laringe e pescoço muito tensos e lábios rígidos. Também entubava a minha voz por
orientações erradas. Também me davam repertório errado, músicas para as quais eu não estava
tecnicamente preparado.
Sujeito 5: Primeiro, entender a dinâmica do apoio, que não é sempre para dentro nem sempre
para fora, mas um misto das duas para cada região, para cada repertório e principalmente para
148
148
cada tipo de voz. Segundo, entender claramente qual era minha verdadeira voz, como descobrir
meu verdadeiro timbre pleno com todos os harmônicos produzidos na prega vocal. E, por
fim, como amplificar de forma ideal, sem empurrar, sem gritar e mantendo os padrões
internacionais do canto lírico.
Sujeito 6: Não tive dificuldades a não ser de adaptações de pronúncia de cada língua.
Sujeito 7: Saber projetar a voz e cantar sem esforço. Adquirir esse domínio técnico.
Sujeito 8: Sou de uma época do “faça como eu faço.” O professor fazia e a gente saia cantando
isso durante muito tempo. Depois comecei a ver o mecanismo das pregas vocais e as figuras
nos métodos eram estranhas. Então, peguei o atlas do Netter e comecei a ver como era; fui à
Universidade para olhar e vi em vídeo; eu sabia o mecanismo, mas e o resultado?
Sujeito 9: Dificuldades imensas na escolha de um primeiro repertório que se adaptasse à minha
voz devido ao equívoco de classificação, o que também gerou dificuldades quanto à qualidade
do som, amplificação, foco, audibilidade, etc.
Sujeito 10: Tinha muita facilidade nos agudos, por isso negligenciava um pouco a região
média. Acabava imprimindo muita força ao centro da voz, “usando a garganta”. O resultado
era um som desequilibrado, pouco flexível e com um vibrato forçado e sem controle.
Sujeito 11: (não respondeu)
3.2.18 Estratégias de ensino da ressonância do trato vocal
Pergunta: Como lhe foi ensinado o processo para obter um som vocal amplificado e de
qualidade? Seja específico nas técnicas e procedimentos.
Respostas:
Sujeito 1: A primeira informação relevante sobre técnica vocal foi a de garganta aberta (faringe
larga e laringe baixa). A segunda foi a percepção das inúmeras ressonâncias que somos capazes
de gerar e vários e inúmeros exercícios podem ajudar a compreender essas possibilidades. São
muito bons exercícios longos que obriguem o aluno a perceber as mudanças necessárias nos
diferentes registros para obter uma voz equalizada.
Sujeito 2: Através da ressonância, ou seja, todo esse processo que foi comentado
anteriormente, e também da respiração adequada.
Sujeito 3: Palato mole elevado e laringe baixa.
Sujeito 4: Quando iniciei eu escurecia muito o som com o palato. O som ficava muito para trás,
no fundo. Agora procuro fazer o som mais claro, mais nítido.
Sujeito 5: Foi muito difícil. Cada professor tem uma forma de explicar e de idealizar o som
ideal. Poucos se preocupam em encontrar a “voz original” de cada aluno. Não sou eu quem
decido a voz do outro. É o corpo do outro que dita seus próprios sons. Existem exercícios para
isso como, por exemplo, pulsação do [a] para os homens, e pulsação do [u] para as mulheres.
Uma vez compreendida a produção vocal de cada aluno, o professor tenta equalizar o timbre
com base nas informações que vieram do próprio aluno.
Sujeito 6: O modo com que faço as aulas com os alunos teve como princípio as dificuldades
que encontrei buscando a melhor emissão vocal.
Sujeito 7: Técnicas de respiração, ressonância, repertório adequado, e sempre cantar com
LEVEZA, característica tão essencial e desprezada por tantos alunos e mestres. Através da
leveza se consegue grandes resultados.
Sujeito 8: Não ensinaram nada, era tudo autodescoberta. Perguntava e não me respondiam: ou
me escondiam e não queriam ensinar, ou não sabiam mesmo. Eu estudei o livro do Pedro
Block, médico, foniatra, escritor, fez um dos livros de referência sobre voz. Eu pesquisava,
procurava sentir em mim. Me senti perdida, pois fui dar aula sem entender; você tinha que
cantar sem saber nada.
149
149
Tive uma aluna com muitos problemas vocais e na época não havia fonoaudiologia tão
desenvolvida. Eu tinha achado o livro do Pedro Block. A aluna queria muito cantar. Eu não
sabia o que fazer. Eu não sei, mas vamos tentar. Começamos com esse exercício do Pedro
Block e vemos o que conseguimos com eles. Aplicando os exercícios e buscando a colocação
do som. O aluno se recuperou. Comecei a pesquisar mais.
Cada festival de música que tinha vinha um professor diferente falando coisas diferentes,
terminava o festival e eu tinha a impressão de que não sabia nada. Então encontrei uma
professora com as mesmas idéias que eu e foi quando a coisa começou a andar.
Sujeito 9: Inicialmente, desfeito o equívoco da classificação, foram os exercícios de
condução nasal do som através de exercícios com consoantes nasais, passando a amplificação
deste som, com a ajuda do repertório que foi escolhido, ampliando o alcance vocal ascendente
de forma gradual e progressiva.
Sujeito 10: O principal foi o processo de obedecer à natureza da minha voz. Ouvi-la e respeitá-
la. Não forçar graves e médios. Buscar leveza e brilho, inclusive nas regiões mais altas, o que é
difícil para um barítono com muito som.
Sujeito 11: (não respondeu)
Comentários:
Ware (1998) apresentou um tópico bem interessante que denominou “Conciliação de
Opostos”. Mencionamos isto também com o intuito de ressaltar que, em pedagogia, algumas
experiências que o aluno vivencia podem ser tanto traumatizantes (acarretando bloqueios e
inseguranças emocionais e técnicas) quanto estimulantes, a ponto de o motivarem a não
cometer os mesmos erros. Ao apresentar esse diagrama, obtido da adaptação de Hoffman de
Vennard (1967), Ware (1998, p.194) demonstra a importância dos opostos no sentido da
promoção do equilíbrio técnico, com objetivo de um apoio/suporte na direção de uma voz
trabalhando com correto funcionamento. Esta esfera holística é tradução nossa do trabalho de
M. Hoffman, de 1972: Segments of a Sphere- Vocal Pedagogy Class (paper), da Universidade
de Minnesota, Minneapolis. A sequência numérica liga os opostos:
1. PEDAGOGIA: Mecanicista ou Holística? Ensinando ambas: a habilidade e a pessoa
como um todo.
2. FONAÇÃO: Focada ou Solta? Firmeza não é rigidez e liberdade não é abandono.
3. REGISTRAÇÃO: Leve ou Pesada? O ideal é que o cantor saiba transitar livremente
nessas duas e ter flexibilidade para isso.
4. RESSONÂNCIA: Brilhante ou Quente? Essas duas formas também devem ser
exploradas com segurança.
5. ARTICULAÇÃO: Vogais ou Consoantes? Saber explorar a sonoridade de ambas e
buscar clareza na emissão.
6. TÉCNICA: Liberdade ou Rigor? Ambas são necessárias para o canto eficiente.
150
150
Figura 3.6: “Conciliação dos Opostos”: esfera representando os opostos para equilíbrio dos elementos que
compõem a pedagogia vocal (WARE, 1998).
Os professores comentaram algumas vantagens e desvantagens de suas aprendizagens
relativamente à ressonância vocal. O sujeito 8, em um outro momento, comentou sobre a
importância do aproveitamento do que de melhor de todas as escolas de canto. Em relação
à construção dos fundamentos que cada professor faz para escolher e organizar o que irá
ensinar, é nosso pensamento que o acesso às pesquisas e reflexões, bem como a oportunidade
de compartilhar conhecimentos, só tem a somar em qualidade profissional.
Na tabela a seguir procuramos dividir os comentários em aspectos positivos e
negativos que o professores receberam durante sua jornada de aprendizado. Enfatizamos que
esse critério é relativo ao modo de interpretação do aluno, se entendeu a experiência de
maneira positiva ou não. A intenção aqui é chamar a atenção para aspectos estratégicos
técnicos e de ensino.
Tabela 3.7 Resultados: Estratégias de ensino recebidas sobre a ressonância do trato vocal
151
151
3.2.19 Erros/dificuldades/lacunas pedagógicas
Pergunta: Em sua opinião, quais os maiores erros/dificuldades/lacunas cometidos pelos
professores de canto que lhe orientaram?
Respostas:
Sujeito 1: O erro na classificação vocal, no repertório. A tentativa de impor um som e uma
técnica, ao invés de proporcionar a minha descoberta vocal, e a aplicação desta voz à minha
arte.
152
152
Sujeito 2: Estabelecer receitas prontas sem considerar minha anatomia e personalidade; em
minha opinião, é necessário verificar diversos aspectos de natureza técnica para cada pessoa e
assim adaptar procedimentos e avaliar resultados para, passo a passo, caminhar em busca do
satisfatório.
Sujeito 3: Falarem do relaxamento dos diversos músculos e articulações, mas não ensinarem
práticas que levem a essa soltura.
Sujeito 4: Aplicarem o repertório errado (método, ária antiga e depois ária de ópera), passagem
do agudo, passagem (não o agudo), mudança de registro, conseguir um agudo de qualidade.
Falta aos professores ter consciência de que se estrutura gradativamente a voz; entender que o
repertório deve ser gradativo, pois os agudos demoram para chegar.
Sujeito 5: Primeiro, quando me disseram que eu era muito curiosa e que eu devia cantar que a
voz iria responder espontaneamente. Segundo, quando me fizeram pensar demais e fiquei
muito tensa. E por último, não me explicavam como fazer as coisas com base na ciência, na
fisiologia vocal e na acústica vocal.
Sujeito 6: (a) Desrespeitar a estética dos gêneros musicais; o canto lírico não tem uma única
colocação e ele se presta a qualquer tipo de música; (b) A tessitura vocal não é uma tábua
musical imutável; diversas experiências, principalmente em música contemporânea, onde o
timbre do cantor não determina a região que deva cantar; (c) O trabalho de afinação depende de
outros fatores que devem ser investigados com a ajuda de outras informações acerca do cantor
(o trabalho conjunto com fonoaudiólogos e psicólogos é muito importante).
Sujeito 7: Tive sorte de ter encontrado professores que conheceram bem e respeitaram e
souberam trabalhar minha voz. Não sinto lacunas.
Sujeito 8: Nos festivais têm-se oportunidades de conhecer cantores de outros estados
brasileiros, e diferenças chocantes, diferem grandes em técnicas. Até cantores de nome
internacional falam barbaridades, coisas absurdas, por falta de conhecimento. Quanto às
escolas, o que interessa é o bom de todas as escolas de canto. (...) Muitas vezes eu perguntava,
perguntava e o professor não me explicava; parecia que queria esconder o que sabia, não sei,
ou não tinha coragem de admitir que não sabia.
Sujeito 9: Houve muitos erros em relação à administração da respiração, e o excesso de pressão
aérea para a obtenção de um som de maior amplitude. Creio que essa relação entre força na
coluna de ar e volume sonoro é sem dúvida o maior erro.
Sujeito 10: O maior problema (no meu caso) era a informação de que respiração, apoio e
ressonância eram coisas diferentes. Quando a percepção de que tudo pode ser feito num
raciocínio e movimento, tudo fica mais fácil e mais funcional. Houve também lacunas e
enganos em relação ao repertório e à interpretação. Sinto que meus antigos professores tinham
talento, porém não tinham didática. Talvez porque fossem mais intérpretes que professores.
Tinham apenas suas experiências como referência.
Sujeito 11: O maior problema que tive foi uma má orientação com todos sobre a respiração até
que conheci a professora Leila Farah, que me ‘salvou’. Com uma boa respiração, é possível ter
uma boa ressonância.
Comentários:
Os professores de canto, assim como os de outras áreas, necessitam de, além de uma
formação específica na área que abraçaram, recursos e estratégias de acesso a informações,
condições de debates e reflexões, com o objetivo de somar esforços para o desenvolvimento
de uma prática segura e eficaz. Os professores citaram problemas de cunho técnico,
metodológico e humano. A esse respeito, Fernandes (2007) considera:
...cabe lembrar que os professores agem de determinada maneira, embasados por uma teoria
pedagógica, mas podem modificar suas abordagens a partir de estudo e reflexão pessoal. O
153
153
difícil é superar os entraves colocados pelo próprio homem às inovações e mudanças, como o
hábito, a primazia, a dependência, a insegurança, entre outros (FERNANDES, 2007, p.9).
3.2.20 Dificuldades técnicas dos alunos
Pergunta: Quais as maiores dificuldades técnicas dos seus alunos?
Respostas:
Sujeito 1: São diferentes entre si. A dificuldade que mais me assusta é a musical, falta de
afinação e ritmo.
Sujeito 2: Buscar mecanismos ideais. Eles precisam ser mais persistentes e deixar o
imediatismo de lado.
Sujeito 3: Entender que não é necessário fazer esforço ou empurrar o som para que ele tenha
um bom alcance.
Sujeito 4: A maior dificuldade dos alunos é em percepção, em musicalidade. Principalmente
afinação. Conheço ótimas vozes que cantam bem sozinhas, mas não conseguem cantar um
dueto. O aluno, aqui no Brasil, geralmente começa os estudos muito tarde, ao contrário de
outros países, em que a criança cresce cantando na escola; é outra realidade.
Sujeito 5: Aceitar a própria voz; entender que o que ouvem internamente não corresponde
necessariamente ao som que é ouvido pelo público; aceitar que a articulação no canto lírico é
muito mais intensa que a da fala normal e ter uma dicção adequada nos diversos idiomas que se
devem estudar; entender o que é cantar no timbre (não empurrar); saber estudar e ter uma
inteligência vocal que administre todos os parâmetros técnicos vocais.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: As dificuldades normais que todo aluno de canto experimenta, mas muito mais com
o controle de apoio no canto.
Sujeito 8: No Brasil, os alunos não têm educação musical desde cedo, começam a estudar
muito tarde em relação a outros países, onde iniciam a cantar em coro ou aulas na escola. O
aluno então chega com problemas de afinação, de musicalização básica, de solfejo. Mas nunca
me importei com desafinação, porque acredito que tudo é questão de treino. Muitos professores
só pegam alunos já adiantados; eu não, eu gosto de desafios.
Sujeito 9: Administrar a respiração.
Sujeito 10: Os maiores equívocos são quase sempre em relação a respiração e ressonância.
Sujeito 11: Todos têm problemas com apoio. Todos têm tensões desnecessárias na região do
pescoço, mandíbula, língua. Isso sem falar das dificuldades psicológicas de se impor com a voz
(medo de volume).
Comentários:
Toda correção ou tratamento de um problema passa por um bom diagnóstico. Ao
instrumentalizar o professor de canto com conhecimento, ele deve saber quais os desafios
serão enfrentados. Conforme percebemos nas respostas acima, as dificuldades variam muito
individual e socioculturalmente. Sobre problemas de afinação, aconselha-se a leitura do livro
Desafinação Vocal, da professora Silvia Sobreira, que discute o assunto com propriedade.
154
154
Sobre a questão da não aceitação da voz, talvez esse seja o aspecto mais grave, o
sintoma mais profundo, ou mesmo a principal causa para os demais problemas técnicos. O ser
humano tende a cobiçar o que é do outro. O aluno de canto tende a querer a voz de outra
pessoa e poucos aceitam sua própria voz. Na busca por essa suposta voz, surgem equívocos,
exageros, distorções e danos vocais. Este seria um estudo bem instigante para outros
pesquisadores.
3.2.21 Termos (palavras, expressões) no ensino do som vocal
Pergunta: Quais os termos (palavras, expressões) que você usa para que o aluno obtenha um
bom som vocal?
Respostas:
Sujeito 1: Flexível, macio, redondo, brilhante, gargantão. Depende da região e da situação.
Sujeito 2: Guarde isto! (se foi obtido um bom resultado); Lembra? (exercitar mentalmente a
manutenção de certos procedimentos); Isto! (incentivo); Muito bem! (incentivo); Novamente,
outra vez (expressão de “vamos recomeçar, desta vez da maneira certa”).
Sujeito 3: Depende muito do aluno e do que ele está precisando. O som é levado para cima
(palato) para que haja a mistura dos harmônicos pelo giro (ex. centrífuga); aumente a distância
entre os seus últimos dentes; temos que trazer os harmônicos de cima para baixo; sinta a sua
mordida; seu corpo é todo inflável, inclusive a cabeça; nos agudos temos que sentir que o
corpo flutua; sente-se numa poltrona bem confortável e sinta-a ceder; você tem uma coroa na
cabeça, deixe-a brilhar (piscar); cante entrando na piscina, nunca saindo...
Sujeito 4: Pense o som na máscara, sinta a vibração no palato duro.
Sujeito 5: “Tenha atitude”; “esteja presente”; “energia pélvica”; “base, estrutura, sustentação
postural”; “som na máscara”; “energia articulatória”; “pressão sonora”; “focaliza o som”;
“costas”; “mantenha sua identidade vocal”.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Apoio, leveza vocal, som percorrendo toda a face, voz na frente, som vertical, etc.
Sujeito 8: A comunicação com o aluno é muito importante, falar a língua dele, e, sobretudo,
procurar não brigar, não atrapalhar o aluno.
Sujeito 9: Foco, condução, ampliação, relaxamento.
Sujeito 10: Redondo, estável, claro, brilhante, etc.
Sujeito 11: Existem montes e são diferentes para cada aluno.
Comentários:
Alguns comentários dos professores incluem observações técnicas e de incentivo,
demonstrando que muito do que o professor fala exerce influência direta na psique do aluno.
Esse assunto vem de acordo com o que Clifton Ware coloca como características essenciais a
um professor de canto, que o pedagogo vocal divide em três categorias: (1) pessoais, onde
155
155
aborda aspectos emocionais (otimismo e humor); (2) músico-dramáticas (aspectos musicais e
concernentes aos atores-cantores); e (3) pedagógicas: abaixo discriminadas:
Características do ensino: Achados de pesquisa de Blades-Zeller (1994) revelam que o
professor modelo demonstra uma preocupação sincera pelo progresso do aluno, usa um estilo
de ensino pessoal, aborda o aluno individualmente e com respeito, direciona tarefas de
aprendizagem provindas da observação, diagnosticando e oferecendo soluções que funcionem,
e dão o feedback apropriado e honesto. O professor modelo é também comprometido com o
desenvolvimento profissional, através do aprendizado contínuo, pesquisa, e performance
56
(WARE, 1998, p. 256).
Ware (1998) escreveu um capítulo que intitulou “Ensinando Canto” (Teaching
Singing), onde descreve o papel do professor, modelos e categorias de professores de canto.
Fernandes (2007) também estabeleceu tipologias de professores de música, que discutem
aspectos psicológicos e didáticos relativos à relação professor-aluno. Fernandes (2000) faz um
estudo detalhado sobre a didática musical na escola regular brasileira e as tendências didáticas
dos professores, estudo esse que inclui a formação dos professores, o planejamento (recurso
ideal para a prática curricular) e a avaliação (revisão da efetividade do planejamento). O autor
inclusive cita, nesse trabalho, as categorias de planejamento de Pratt e Stephens,
57
que
preveem a atividade do canto como habilidade necessária em todas as fases do ensino
(FERNANDES, 2000, p. 68). Fernandes (2007) considera aspectos de importância e
influências do professor, enquanto centro do processo educacional:
Levando em consideração que a personalidade do professor e a metodologia usada em sala de
aula deixam transparecer uma filosofia de vida do educador, uma cosmovisão, com a qual o
aluno convive e é influenciado. O professor, então, está diretamente comprometido com a
formação integral do ser, o que vai além da transmissão de saberes (FERNANDES, 2007, p. 1).
3.2.22 Explicações sobre o fenômeno da ressonância vocal aos alunos
Pergunta: Você explica o fenômeno da ressonância vocal aos seus alunos? Como?
Respostas:
Sujeito 1: Não. Apenas digo que somos capazes de ajustar os sons pela posição que assumimos
na boca e garganta. E faço exercícios para que eles compreendam.
Sujeito 2: Sim, teoricamente e na prática, através de exemplos meus e de audições de diversos
cantores.
56
Teaching characteristics: Research findings by Blades-Zeller (1994) reveals that the model teacher
demonstrates a sincere concern for student progress, uses a personal teaching style, approaches students
individually and with respect, addresses specific learning tasks by observing, diagnosting, and offering workable
solutions, and gives honest, appropriate feed-back. The model teacher also committed to professional
development, through continual learning, research, and performance.
57
Teaching Music in the National Curriculum. Edição de George Pratt e John Stephens. London:
Heinemann, 1995.
156
156
Sujeito 3: Mostrando as partes do corpo através de figuras, estimulando sentir e principalmente
procurando conscientizá-los do processo natural da diferença do som que ouvimos através do
nosso corpo, do som que é ouvido pelas pessoas.
Sujeito 4: Sim, explico a vibração na testa, na máscara, no palato duro e na ponta da cabeça.
Falo também para manter o som sempre no mesmo lugar, respiração e apoio.
Sujeito 5: Sim, explico o sistema “pressão aérea-tônus dos fonemas-voz na máscara-stessa
posizione.”
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Sim, por meio de livros e figuras ilustrativas do trato, por meio de exercícios e
exemplos em outros cantores de classificação vocal similar a quem eu estiver dando aula, e
exemplos dados por mim mesma.
Sujeito 8: Me criticam pelo fato de eu cantar com o aluno, mas eu toco, canto, mostro.
Aprendia-se por imitação, escutando os cantores, imitando os professores de canto. Agora
mostro as figuras, atlas, anatomia e fisiologia.
Sujeito 9: Através de exercícios de propriocepção e bibliografia.
Sujeito 10: Procuro aproximar as sensações do fenômeno da ressonância com sensações
naturais de nossa anatomia. Bocejo, choro, espirro, gargalhada. Uso bastantes exercícios com
consoantes como V, J e V. Estimulo a pesquisa pessoal de “novas” sonoridades e espaços.
Sujeito 11: O que disse acima é basicamente o que digo para eles.
Comentários:
A comunicação com o aluno, citada nas respostas, é fator decisivo no ensino-
aprendizagem do canto. Independentemente da expressão ou termo que o professor escolha
para identificar o princípio específico a que se refere, enfatizamos a interação entre o que está
sendo falado e o que o aluno está sentindo, uma vez que esta associação é o que fará o aluno
apreender o assunto de maneira cognitiva e proprioceptiva. A esse respeito, citamos Rubim,
além de sugerir que o leitor tenha acesso ao seu relato de pesquisa, de grande importância
para a pedagogia vocal brasileira:
...constatamos que o processo de ensino-aprendizagem do canto com enfoque emancipatório
demanda uma competência do professor de canto em utilizar uma linguagem de comunicação
que estabeleça uma participação dinâmica e ativa tanto do professor quanto do aluno-
correspondente à tendência dinâmico-dialógica. Para que esta linguagem seja estabelecida, é
necessário conhecer o tipo de linguagem adequada para cada aluno, considerando as bases
cognitivas da aprendizagem, e a tendência de cada aluno para uma percepção mais auditiva,
visual ou tátil-cinestésica das informações a serem processadas por ele (RUBIM, 2000, p. 137).
3.2.23 Ajustes no trato vocal (garganta, boca e nariz) solicitados ao aluno durante o canto
Pergunta: Quais são as modificações no trato vocal (garganta, boca e nariz) que você solicita
ao aluno durante o canto? Especifique.
Respostas:
157
157
Sujeito 1: Tenho feito muito o uso dessa nomenclatura italiana do giro, que eu acho incrível. E
acho que fala justamente dessa relação entre laringe baixa e ressonância alta (palato alto e
faringe larga).
Sujeito 2: As modificações necessárias para cada especificidade que requer o aluno, o estilo, a
situação.
Sujeito 3: Elevar o palato, alargar todo o perímetro da garganta, manter a língua posicionada
baixa, na frente com a ponta para baixo e pensando para cima.
Sujeito 4: A posição vertical da boca, palato elevado, cantar na máscara.
Sujeito 5:Ensino as mesmas que eu descrevi no item 7 de técnica.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: A mesma já citada anteriormente, que eu utilizo para mim.
Sujeito 8: (não respondeu)
Sujeito 9: Postura alta do véu palatino, relaxamento de língua, controle da postura laríngea.
Sujeito 10: Mais ou menos espaço faríngeo, maior ou menor movimentação do maxilar, maior
ou menor tensão muscular na boca, etc.
Sujeito 11: Depende do aluno.
Comentários: O sujeito 1 utiliza a nomenclatura italiana do giro como relação entre
laringe baixa e ressonância alta (palato alto e faringe larga) e afirma ter excelentes resultados.
Na técnica vocal clássica, encontramos para este termo a palavra italiana squillo, que
corresponde ao inglês ring, característica ressonante da voz trabalhada acusticamente,
também conhecida como formante do cantor, que se projeta com brilho e riqueza de
harmônicos. Sacramento (2009) aborda este termo como característico do metal (ou caráter
metálico) presente no canto operístico, que é dosado segundo o repertório do cantor.
A seguir, apresentamos uma tabela que fizemos com base nos estudos de Sacramento
(2009), que exemplifica ajustes conforme as seis qualidades abordadas: (1) fala (speech):
registro de peito, zona grave da tessitura, música ligeira ou nos recitativos (onde a dicção é
mais intensa), (2) falseto, (3) lamento, (4) twang, (5) ópera e (6) belting.
O conhecimento dessas qualidades e seus ajustes necessários é importante porque
permite ao cantor lírico entender a possibilidade de recursos disponíveis para os diferentes
estilos, personagens, contextos e interpretações.
Tabela 3.8: As qualidades vocais discriminadas em relação aos ajustes necessários, segundo Sacramento (2008).
FALA
SPEECH
FALSETO
LAMENTO
TWANG
ÓPERA
BELTING
PREGAS VOCAIS:
INÍCIO E
CONCLUSÃO
glótico
aspirado
simultâneo
simultâneo
simultâneo
simultâneo
158
158
PREGAS
VENTRICULARES
médias
médias
retraídas
retraídas
retraídas
retraídas
MASSA DAS
PREGAS VOCAIS:
(CORPO E
COBERTURA)
espessa
tensa
fina
fina
fina
espessa
CARTILAGEM
TIREÓIDEA
vertical
vertical
inclinada
inclinada
inclinada
vertical
CARTILAGEM
CRICÓIDEA
vertical
vertical
vertical
vertical
vertical
inclinada
ESFÍNCTER
ARIEPIGLÓTICO
largo
largo
largo
estreito
estreito
estreito
LARINGE
média
média
baixa
alta
baixa
alta
LÍNGUA
média
média
alta
alta
comprimida
alta
PALATO
alto
alto
alto
médio
alto
alto
MAXILAR
médio
médio
médio
médio
médio
médio
LÁBIOS
médios
médios
médios
médios
médios
médios
ANCORAGEM
CABEÇA E
PESCOÇO
relaxada
relaxada
ativada
relaxada
ativada
ativada
ANCORAGEM
TRONCO
relaxada
relaxada
ativada
relaxada
ativada
ativada
Os ajustes são assim expostos: na cabeça e no pescoço, são controlados o palato, os
lábios, a língua e o queixo. Na laringe, são controlados o esfíncter ariepiglótico, as pregas
ventriculares, as pregas vocais, a cartilagem tiroídea, a cartilagem cricoídea e a altura da
laringe. A função valvular da laringe ocorre em três níveis de fechamento: pregas vocais
(nível inferior), pregas ventriculares (nível médio, logo acima das pregas vocais) e esfíncter
ariepiglótico (nível superior). Por fim, a ancoragem do tronco, da cabeça e do pescoço. Os
ajustes, portanto, são:
Pregas Vocais: Início e conclusão (ataque e finalização): Tipos de finalizações: (1)
Suave ou Expirada: é quando a glote abre antes que a pressão subglótica termine, tornando o
som soprado e comprometendo todo o final da frase. Quando a glote começa a abrir,
desaparece o vibrato e a vibração, restando apenas a turbulência do ar. (2) Dura: o fechamento
glótico provoca um som como um grunhido resultante da tentativa de soltar as pregas vocais
demasiado tensas. Se não houver um reajuste muito rápido, o início seguinte será também
duro. Pode ser usado como recurso dramático. (3) Equilibrada: onde a saída do ar interrompe
com suavidade e eficiência, não havendo escape de ar ou ruído.
Os problemas da finalização do som são opostos aos do início do som. É
fundamental não abandonar a postura muscular do canto até ter concluído totalmente o som
para evitar o colapso da ressonância, o relaxamento dos articuladores antes de finalizar a
159
159
frase, abandono do apoio ocasionando quebra na pressão do fluxo do ar. A boa finalização do
som influenciará o som seguinte (SACRAMENTO, 2009; MILLER, 1986).
Pregas Ventriculares (situadas no nível médio, logo acima das pregas vocais): de
acordo com Sacramento (2009), podem se encontrar nas seguintes condições: (1) Médias:
posição na fala confortável, a meio caminho entre o fechamento apertado e a grande abertura.
(2) Constritas (constriction): se encontram para dentro da posição média, em fechamento
(esforço muito intenso, som tenso ou apertado/pressionado). (3) Retraídas (retraction): se
encontram para fora da posição média, numa posição de grande abertura (como no riso ou no
choro).
Massa das Pregas Vocais (Corpo e Cobertura): O controle das bordas das pregas
vocais (variação da massa das pregas vocais) é essencial a fim de evitar as mudanças bruscas
(transição e quebras) de registros, e equalizá-los em toda a tessitura. O cantor pode também
usar essas mudanças como recurso interpretativo, dependendo do estilo, teor dramático ou
gênero. Os modos vibratórios são decorrentes da maneira como as várias camadas das pregas
vocais, de acordo com o modelo corpo-cobertura do controle da frequência fundamental de
Hirano (já descrito no capítulo 2). A massa das pregas pode ser: (1) massa frouxa (slack): (voz
arranhada ou atrito glótico) padrão vibratório irregular, com pulsações irregulares de energia
sonora; bom uso na zona grave da tessitura, com muito pouca pressão do ar e durante pouco
tempo. (2) Massa espessa (thick): (registro modal ou da fala) pregas vocais curtas; boa para as
zonas média e grave. (3) Massa fina (thin): nas frequências agudas (pregas alongadas) ou
emissão suave; boa para a zona aguda e som intimista e sem sopro. (4) Massa tensa (stiff): nas
zonas agudas (pregas alongadas, esticadas e tensas), ou falseto, onde a borda das pregas
vocais vibra; boa para a zona aguda, porém o som fica fraco ao descer na tessitura.
Cartilagem tireóidea: Posições: (1) vertical: é a situação/posição neutra da fala ou
respiração silenciosa; e (2) inclinada ou em rotação: trabalho do CT (músculo
cricotiróideo). Sua posição influencia a massa das pregas vocais, logo, a altura (pitch). O
espaço cricotiróideo (aberto ou fechado) age na posição (vertical ou inclinada) da cartilagem
tiróidea, alterando o comprimento das pregas vocais, alongando (mais finas produzem sons
agudos ou fracos) ou encurtando (mais espessas produzem sons graves ou intensos).
Cartilagem cricóidea: Posição inclinada: aumenta o volume do som com menos
pressão de ar. No som intenso, a cartilagem cricóidea inclinada espessa ainda mais as pregas
160
160
vocais, aumentando a fase fechada. Pode-se aumentar a intensidade do som sem aumentar a
pressão do ar. A inclinação é obtida com a preparação para o grito ou berro e mantendo as
pregas ventriculares retraídas; evitando-se a sensação de arranhar ou de comichão nas pregas
vocais (trauma vocal).
Esfíncter Ariepiglótico: Posições: (1) largo (estado neutro); e (2) estreito:
estreitamento da epilaringe (tubo que contém o esfíncter ariepiglótico), onde se verifica o
twang e produção de formantes de alta energia acústica (entre os 2 e os 4 kHz),
empregando à voz brilho, projeção e um timbre metálico.
Laringe: Posições: (1) baixa: (trato vocal longo) cor mais escura (ópera, lamento,
choro), usada nas notas graves; (2) média: (neutra) como na respiração ou repouso; e (3)
elevada: notas agudas, mais brilho e projeção (twang, belting, grito ou guincho).
Língua: Posições: (1) baixa: plana (boa para som escuro); (2) média: da fala ou com
grande articulação; (3) alta (dorso e a raiz levantados); e (4) comprimida: a ponta dobrada e
para trás e a parte de trás empurrada para a frente, arredondando e comprimindo a língua.
Palato: O palato mole (porta velofaríngea) é uma porta que abre ou fecha as entradas
posteriores da cavidade oral e do nariz. As passagens nasais agem como abafadores, filtrando
as frequências agudas através do amortecimento da energia acústica. As consoantes nasais
/m/, /n/ e /ng/ apenas ressoam nas passagens nasais. Quando uma vogal ressoa nas duas
cavidades, oral e nasal, é anasalada ou nasal. Posições: (1) baixo: contato com a parte
posterior da língua (porta velofaríngea completamente aberta) e o som é nasal, como nos sons
/m/, /n/ e /ng/; (2) médio: pouca elevação e afastamento da língua (fechamento da porta
velofaríngea incompleto), como na produção dos sons /ã/, /õ/ ou /ĩ/, de som anasalado; (3)
elevado: (porta velofaríngea completamente fechada), com o palato em contacto com as
paredes da nasofaringe e o som é oral, como nas vogais abertas /a/, /e/ e /o/.
Maxilar: Posições: (1) avançado: projetado para frente, com os dentes inferiores e o
maxilar à frente dos dentes superiores; (2) médio (posição neutra); (3) recuado: com os dentes
inferiores puxados para trás, por trás dos dentes superiores; e (4) baixo (máxima abertura).
Lábios: Posições: (1) protuberantes: aumento das ressonâncias graves (som escuro);
(2) médios (fala); e (3) esticados (esparramados ou em sorriso): aumento das ressonâncias
agudas e do brilho.
161
161
Ancoragem de cabeça e pescoço: É a estratégia de promover a estabilização através
da contração dos músculos circundantes. A ancoragem da cabeça e do pescoço promove o
suporte da laringe, e a do tronco (grandes peitorais, os grandes dorsais, quadrado lombar e
caixa torácica com elevação do esterno) suporte à respiração durante o canto, ajudando no
processo da ressonância. Quando as estruturas do esqueleto da cabeça e do pescoço estão
ancoradas, os pequenos músculos que controlam as pregas vocais podem executar mais
finamente os seus ajustes, com uma moldura externa estável. A ancoragem pode estar: (1)
ativada: na qual os músculos acima do palato mole, nos lados do pescoço e na região occipital
estão contraídos; ou (2) relaxada: músculos em descanso, ou estado neutro.
3.2.24 Ensino do som vocal de qualidade
Pergunta: O que, tecnicamente (excetuando a respiração e uma boa postura), você acha que o
aluno deve compreender para obter uma boa sonoridade vocal?
Respostas:
Sujeito 1: Conceitos como flexibilidade, constância (igualdade) e ressonância alta. E também
adequação ao repertório.
Sujeito 2: Principalmente através de tudo o que foi especificado neste questionário, porém
buscando suprir suas particularidades para alcançar seus próprios objetivos, o que muda muito
conforme cada aluno.
Sujeito 3: (não respondeu).
Sujeito 4: Cantar com a voz na máscara.
Sujeito 5: Principalmente manter a voz estável na máscara.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Que suas pregas vocais devem ser bem cuidadas e protegidas de exageros, e que
cada voz é particular. Conhecer bem fisiologia do próprio instrumento também é indispensável
e não cantar com esforço nunca.
Sujeito 8: (não respondeu)
Sujeito 9: Manutenção da postura orofaríngea e manutenção do ponto de incidência vocal nos
ressonadores superiores.
Sujeito 10: Articulação, foco de emissão, ressonância, etc.
Sujeito 11: Além de entender a importância do ‘appoggio’ e do trabalho para equilibrá-lo, o
desconhecimento da articulação apropriada para as vogais (não importa a língua em que canta)
é fundamental ao problema. Aliás, através da dicção correta, pronúncia correta das palavras, se
uma melhora clara na ressonância projeção. Repito o que falei acima no 6: Quanto mais
frequências o espectro vocal, etc...... É uma questão de física! Física para servir à arte. Isso
não quer dizer que é fácil conseguir equilibrar a voz de cada um e cada um é diferente do
colega na busca de ressonância.
Comentários:
162
162
A pedagogia vocal implica no desenvolvimento, por parte dos professores, de uma
clareza no explicar e também no entender o que o aluno está dizendo ou tentando dizer. O
problema da comunicação aluno-professor é discutido em Rubim (2000) e é assunto
fundamental no ensino do canto.
O ensino do que é uma boa sonoridade vocal passa também pela terminologia clara
que o professor deve escolher como estratégia de comunicação dos parâmetros técnicos
essenciais. Sundberg (1987) menciona o problema pedagógico de o aluno não compreender a
terminologia do professor. Tais problemas de comunicação podem gerar erros de julgamento
e a falsa idéia de “falta de talento” para o canto. Isso é um desafio constante no ensino do
canto, como afirma Sundberg.
De qualquer maneira, o objetivo final na instrução dos cantores deve ser fornecer a eles um
instrumento obediente através do qual eles possam desenvolver idéias musicais, sem qualquer
limitação técnica audível. A terminologia do professor nunca deve impedir o aluno de alcançar
este objetivo
58
(SUNDBERG, 1987, p. 132, tradução nossa).
3.2.25 Ensino dos Ajustes no trato vocal na transição de registros
Pergunta: Você ensina alguma modificação no trato vocal (boca, nariz, garganta) na transição
de registros? Quais?
Respostas:
Sujeito 1: Existe uma flexibilidade na hora da troca, e uma percepção de nasalidade gerada pela
posição alta do palato, principalmente nas mudanças para o peito na voz feminina, e na mistura
com a ressonância alta na voz masculina.
Sujeito 2: Sim, tudo o que foi visto anteriormente neste questionário.
Sujeito 3: Procuro conscientizar de que é preciso haver um grande espaço para que o ajuste seja
o menor possível, assim não se torna audível e não se denuncia a mudança.
Sujeito 4: Sim. Peço para o aluno cantar tudo no mesmo lugar e nos agudos usar mais espaço.
Sujeito 5: Sim, as mesmas que eu descrevi no item 7 de técnica.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Não. A mesma forma da boca na vertical. A dinâmica do som, se é forte ou piano,
vai definir se aboca abre ou fecha externamente, mas sempre o som na vertical.
Sujeito 8: A base para fala, canto e tipos de canto é a mesma; dentro da minha experiência eu
não sei trabalhar se não explorar o corpo, a ressonância de corpo, e é que vem o perigo,
porque dentro do que faço eu não concordo que a voz seja de cabeça nos agudos acho que
tem que o apoio de tórax mais leve ou não, acho isso muito importante. Com ressonância de
tórax aumenta, melhora.
58
In any event, the ultimate goal in educating singers must be to give them a obedient instrument through which
they can realize musical ideas, without any audible technical limitations. The teacher’s terminology should never
prevent the student from reaching this goal.
163
163
A outra tem tórax também e sempre ouvi que se pode usar em médios e graves. Dou aulas
mais de trinta anos e cheguei a essa conclusão; eu mostrando você a diferença.
Ressonância de tórax, apoio torácico, voz de peito era pecado, só cantora de serenata usava voz
de peito. Eu perguntava e ninguém me explicava; fui me observando. É o corpo, corpo e corpo
e se você não tem liberdade de tórax, apoio e boa postura, não consegue a boa ressonância.
Sujeito 9: Entendo que nos pontos pivotantes de registro, com a mudança muscular envolvida
em cada um, há a tendência do aluno a relaxar ou tensionar em excesso a musculatura
extrínseca da laringe. Minha orientação vai no sentido de manter a postura orofaríngea e a
incidência vocal, que nesses pontos necessitam de uma atenção particular para evitar mudanças
bruscas com a consequente modificação de timbre e qualidade vocal.
Sujeito 10: Sim. Sugiro, sempre de acordo com o aluno, coisas como manter as notas graves
com o mesmo espaço de ressonância das notas mais altas, para ter um som mais equilibrado,
usar mais de ressonância nasal para maior brilho, etc.
Sujeito 11: Como disse, depende do problema do aluno.
Comentários: A maioria das respostas foi compatível com o desejo de se manter a
transição entre registros da maneira mais imperceptível e homogênea possível. Observamos,
de maneira geral, que os principais ajustes foram: (1) Percepção de nasalidade gerada pela
posição alta do palato nas mudanças para o peito; (2) Aumento do espaço; (3) Utilização do
foco ou cantar tudo no mesmo lugar; (4) Manutenção da forma da boca na vertical; (5)
Emição dos graves com o mesmo espaço de ressonância das notas mais altas; e (6)
Manutenção da postura orofaríngea e da incidência vocal
Na pesquisa de Sacramento, a autora estabeleceu os ajustes a serem questionados: (1)
Mistura os registros, de acordo com o percurso da frase; (2) Mantém a uniformidade do som
ao longo da tessitura; (3) Antecipa a passagem com uma elevação do palato; (4) Suaviza as
notas de passagem; (5) Adiciona a impostação; (6) A subir, ganha leveza para não baixar a
afinação; (7) Focaliza o som à frente; (8) Concentra-se na abertura dos graves; (9) Descontrai
a laringe; (10) Descontrai o palato; (11) Usa vários registros para evidenciar as suas
diferenças e a mudança de forma intuitiva (onde o cantor não pensa nisso).
3.2.26 Ensino do Timbre vocal
Pergunta: Você ensina alteração/manipulação de timbre vocal? Como?
Respostas:
Sujeito 1: Não, do timbre como todo é raro, mas dessas percepções de ressonância alta
associada a toda a voz. Se o aluno apresenta um problema específico de timbre, tipo voz nasal,
espremida ou entubada, faço exercícios que o façam escutar e compreender algo contrário
àquilo a que está habituado; se a voz é nasal, fazemos sons denasais, por exemplo.
Sujeito 2: Sim, tudo o que foi visto anteriormente neste questionário.
Sujeito 3: Acho a manipulação de timbre um tanto perigosa, penso que é preciso ter uma ótima
consciência para que se faça sem esforço.
164
164
Sujeito 4: Não.
Sujeito 5: Sim, como eu descrevi no item 6 de técnica.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Não. Apenas tento enriquecer o timbre com brilho, leveza e ganho de harmônicos, na
medida do possível, respeitando os limites, características de idade, e identidade vocal dos
cantores.
Sujeito 8: Não.
Sujeito 9: Não.
Sujeito 10: Ensino diferentes recursos de ressonância e de manipulação de timbre. Diferentes
coloridos vocais. Isso acontece através de pesquisa em exercícios. Estimulo também que o
aluno pesquise em casa e escreva as sensações obtidas. Acho importante conhecer os recursos
do instrumento para escolher o que utilizar.
Sujeito 11: Acredito que cada um tem que achar seu jeito de manipular o timbre vocal. Porém,
conversamos sobre o fato de que mudanças de timbrem a ver com mudanças no trato vocal.
Um som mais escuro é resultado de um trato vocal mais comprido, efeito de projetar lábios,
etc. Para mim, professora de dicção, timbre é modificado pela formação vocálica.
Comentários:
A diversidade de recursos tímbricos permite ao cantor a possibilidade de usos
dramáticos e interpretativos. Não o cantor poderá transitar entre diversos estilos, escolas
técnicas e gêneros, como também terá à disposição uma gama enorme de “cores” ou
“nuances” para criar à vontade. E essencial ao cantor é que quanto maior o domínio técnico,
maior é a habilidade de utilizar a voz da maneira que se quer, preservando a saúde das pregas
vocais.
O sujeito 1 utilizou, a exemplo de outros cantores em outras respostas, o termo “voz
entubada”, que Miller (2008) denomina de voce ingolata, ou timbre faríngeo. O pedagogo,
em toda a sua literatura (ver tópico de timbre vocal), se refere à voz erudita ou do canto lírico
como equilibrada e que utiliza com maestria o chiaroscuro, dosando a clareza, abertura com o
veludo escurecido produzido pela faringe. A voz entubada é o escuro exagerado (ver tópico
chiaroscuro), a voz ingolata ou engolida. O oposto em excesso seria a voz estridente, clara
demais e sem profundidade. Essas dosagens ou “temperos” da voz, tal qual na culinária,
exigem moderação e sutileza. Sacramento (2009) observou que a utilização de timbres vocais
diferentes é feita por 79% dos cantores pesquisados, com o objetivo de “criar nuances
tímbricas (cores)”, e somente 11% usam o mesmo timbre vocal durante todo o canto.
3.2.27 Ensino do Vibrato
Pergunta: Se você acha que o vibrato vocal é algo treinável, como você o ensina?
165
165
Respostas:
Sujeito 1: Normalmente associo o vibrato com uma flexibilidade do trato, e quando o aluno
tem dificuldades, fazemos notas sustentadas e leves, e o vibrato aparece naturalmente.
Sujeito 2: Sim, o apoio é muito importante para isto. Explico este funcionamento.
Sujeito 3: Entendo que o vibrato é uma consequência. Ele depende de relaxamento dos
músculos. Não acho que se possa ensinar diretamente.
Sujeito 4: Digo para o aluno: você tem que procurar o seu vibrato, ouvir o vibrato dos cantores,
chacoalhar, imitar cabrito, ver onde mexe. Muitos professores dizem que o vibrato vem
naturalmente, mas eu não acredito nisso. Vi alunos fazerem 20 anos de canto e ainda não terem
vibrato. Ensino o aluno a fazer transição entre duas notas, dois semitons e ir aumentando a
velocidade, para ele entender a oscilação.
Sujeito 5: Com base na literatura, o vibrato é resultado do equilíbrio de todo o sistema: laringe
livre e apoio respiratório estável. Para induzir esse fenômeno, uso dois exercícios principais:
pulsação de nota em bocca chiusa e repetição da mesma nota 5 a 6 vezes. Segundo Miller, a
frequência de vibrato ideal está em torno de 6,5 vezes por segundo.
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Não peço que o aluno fabrique vibrato; é perigoso e envelhece a voz.
Sujeito 8: Não. O vibrato é uma coisa que aparece naturalmente e com o tempo.
Sujeito 9: Não ensino.
Sujeito 10: Vibrato é treinável sim. Uso dois exercícios concomitantes, com os quais venho
obtendo bons resultados. A parte consiste em exercícios de agilidade em graus conjuntos
com sustentação de vogais. Frases com muitas notas e agilidade. Começo com 2 notas, depois
aumento até o aluno conseguir frases longas e ágeis, sempre pedindo leveza e naturalidade.
Quando percebo que o aluno já tem capacidade de realizar mudanças rápidas de notas de forma
leve, ágil, começo a trabalhar repetições da mesma nota. com pausas curtas entre elas,
depois substituo a pausa por uma oscilação de volume, aumentando gradativamente a
velocidade. Tudo isso muito bem focado, apoiado e ressoado. A união da sensação de leveza e
agilidade do exercício com a oscilação rápida e consciente de volume numa espécie de
subdivisão das notas longas resulta num vibrato estável e consistente.
Sujeito 11: Vibrato é resultado de uma produção relaxada do som com uma boa coordenação
respiratória e sem tensões no instrumento em si, deve haver um vibrato saudável.
Comentários:
As abordagens prática e didática do vibrato são, entre cantores, assuntos controversos.
A presença desse assunto nesta investigação é muito importante por se tratar de um
componente essencial do som vocal, como discutido nos capítulos anteriores. Segundo
Rubim (2000), as escolas de canto divergem quanto à dosagem e o emprego do vibrato, e
prossegue:
Nós defendemos que, de acordo com a natureza vocal do cantor, ele apresenta maior ou menor
facilidade para adquirir o vibrato. Alguns cantores conseguem realizar o vibrato após
treinamento e outros têm muita dificuldade e, por esta razão, é fundamental adotar o tratamento
individualizado ao aluno de canto (RUBIM, 2000, p. 10).
166
166
Muitos pedagogos entendem o vibrato como um componente fundamental no canto
lírico e seu ensino. (Ver tópico Vibrato)
3.2.28 Problemas no ensino do canto lírico
Pergunta: Para você qual é a maior falha/lacuna/deficiência no ensino do canto lírico?
Respostas:
Sujeito 1: (não respondeu)
Sujeito 2: A formação de professores deixa muito a desejar. É necessário que cada professor
esteja bem resolvido tecnicamente, sem colocar vícios, sabendo discernir vícios adquiridos
pelos alunos e saber como retirá-los.
Sujeito 3: Dizer que se canta com o corpo todo e não dizer como se canta com o corpo todo.
Não encaminhar o aluno para perceber o seu corpo de maneira sensível.
Sujeito 4: Primeiro, não ter onde colocar em prática o repertório que se aprende; segundo, o
contato com grandes cantores é difícil; e terceiro, falta de bons professores na maioria dos
lugares. A formação dos professores também não é boa.
Sujeito 5: O “achismo” e o “ensino como me ensinaram.” Grande parte dos professores de
canto repete o que lhes foi ensinado sem levar em conta que cada cantor é um indivíduo
diferente com diferentes vozes e diferentes percepções de si mesmo. O aluno deve receber
ferramentas para se descobrir e desenvolver sua voz de forma autônoma e artística. Em resumo
livre!!!
Sujeito 6: (não respondeu)
Sujeito 7: Ensinar todas as vozes igualmente, sem respeitar que existem vozes e vozes.
Atualmente, no Brasil a cultura de potência vocal é enfatizada e, assim, canta-se Lied, barroco,
classicismo, romantismo, como se fosse tudo um mesmo estilo, o que significa extrema
ignorância musical.
Sujeito 8: Caretas, esforços , tensões, o grande problema é separar energia no canto de esforço.
O relaxamento faltando é uma coisa muito perigosa.
Sujeito 9: A enorme falta de conhecimento teórico dos professores de canto em geral, quer em
termos técnicos ou anatômicos do canto.
Sujeito 10: Por mais incrível que pareça, para mim, o problema maior é adequação de
repertório. Tenho visto professores de excelente técnica sugerindo repertório inadequado. Não
há técnica que aguente.
Sujeito 11: Respiração inadequada, com falhas no apoio como resultado.
Comentários:
Os problemas citados pelos participantes: inadequação da abordagem de assuntos
essenciais ao canto com os alunos, aplicação equivocada de repertório nas diferentes fases de
aprendizagem, e outros, convergem para a formação inadequada dos professores. Rubim
(2000) detectou lacunas na pedagogia vocal brasileira e oferece algumas sugestões para
melhorá-la. Também cita Felix (1998), em sua dissertação de mestrado, sobre o ensino do
canto no Brasil:
167
167
Não existem cursos especializados que possam ajudar na formação do profissional cantor que
queira se aperfeiçoar no magistério (...) alertamos sobre essa lacuna no ensino de canto no
Brasil, no sentido de que, se esse profissional cantor quiser fazer carreira no magistério, possa
optar por um curso que o fundamente para isso, conferindo-lhe ferramentas pedagógicas que,
aliadas às técnicas, viabilizem um ensino mais fundamentado e coerente com as concepções
mais recentes de ensino-aprendizagem (FELIX, 1998, p. 63-64 apud RUBIM, 2000, p. 22).
Rubim sugere a criação de um curso de Pedagogia Vocal que atenda às demandas do
ensino brasileiro atual. Outro problema citado pelos professores é o do mercado de trabalho
do canto lírico no Brasil, cuja particularidade exige um estudo específico e transformações
significativas no panorama no país.
3.2.29 Ensino da Ressonância – Otimização do som
Pergunta: O que você explica ao aluno para que ele amplifique ou melhore o som emitido?
Respostas:
Sujeito 1: Aumento da pressão e das ressonâncias altas.
Sujeito 2: Explico a importância de todo o processo para que a projeção de seu som seja cada
vez mais satisfatória.
Sujeito 3: Que ele precisa se conhecer bem, sentir o seu corpo e exercitar para ter um corpo
flexível.
Sujeito 4: Peço que o aluno pense que o som brota dentro dele, do abdome, e se projeta para
fora; ele então não se fixa na garganta. Digo para o aluno jogar o som para o fundo do teatro,
para o último da fila, que pagou ingresso, poder ouvir também.
Sujeito 5: Que ele tem que usar todo o corpo para manter a laringe estável, a voz na máscara e
a dicção impecável. Deve estar focado mentalmente e gradualmente se habituar com toda
aquela energia.
Sujeito 6: A idéia de estrutura plena preparar o corpo para passa por um bom
posicionamento corporal.
Sujeito 7: Paciência, treino disciplinado, apoio correto, emissão correta, postura adequada e
trabalho de vocalizes específicas para cada tipo de voz.
Sujeito 8: Uso a respiração costodiafragmática e vocalizes.
Sujeito 9: Os mesmos procedimentos já citados.
Sujeito 10: Concentro isso em ressonância e apoio. Uma boa pesquisa de efeitos
proporcionados por diferentes ressonâncias, um apoio inteligente, sempre aliado a uma
inspiração de boa qualidade.
Sujeito 11: Depende totalmente no aluno cada um tem defeitos diferentes.
Comentários:
Este assunto já foi discutido nos itens 3.2.24/25/26/27 e no Capítulo 2.
3.2.30 Ensino do foco
Pergunta: Você solicita que o aluno cante com foco ou concentração em algum lugar fora ou
dentro do corpo dele? Qual (is)?
168
168
Respostas:
Sujeito 1: Sempre peço que ele perceba as ressonâncias fora do corpo, ressonâncias que eu
chamo de flutuantes.
Sujeito 2: Sim, concentração na sua postura.
Sujeito 3: Depende do aluno, mas acho que a maioria precisa estar concentrada no seu corpo
para perceber a “coreografia interna” que acontece enquanto canta e buscar o prazer da
produção do som, da articulação.
Sujeito 4: Ensino o foco do som entre as sobrancelhas e olhos. Também ensino o aluno a
pensar na trajetória do som, em projetar para o fim do teatro, ou um ponto no fundo do salão.
Sujeito 5: Sim, como já expliquei, ele deve focar o tempo todo na atitude global do corpo. Uma
atitude de prontidão muito focada. A partir deste corpo todo disponível, sua laringe em posição
ideal vai responder às demandas vocais associadas ao conteúdo artístico do texto cantado.
Durante a preparação das obras artísticas, o aluno deve preparar o seu instrumento,
programando as energias necessárias à produção vocal. Após minucioso estudo sobre o
conteúdo da poesia ou do libretto, ele vai construir um trabalho artístico sólido sem problemas
técnicos que poderiam impedir de realizar o som artístico idealizado para responder às
demandas dramáticas dos textos.
Sujeito 6: Eu sempre peço para que o cantor imagine uma platéia diante dele e se coloque de
forma a não abaixar pescoço e não se curvar de forma alguma.
Sujeito 7: Não. O foco é o som na frente, rico em ponta e harmônicos.
Sujeito 8: Ensino a boa postura.
Sujeito 9: Sim. Solicito que o aluno procure enviar a sua voz ao fundo da sala em que está, no
ponto mais distante possível.
Sujeito 10: Às vezes sim. Varia de aluno pra aluno. Trabalho muito o foco do olhar para atingir
maior projeção. Uso todos os recursos possíveis, inclusive coisas mais subjetivas, como pedir
para imaginar uma sala maior ou menor, imaginar “a célebre velhinha no fim da sala”, ou a
pessoa amada na 1ª fila, etc. O corpo compreende melhor quando o cérebro se diverte.
Sujeito 11: Peço para o aluno focalizar como tivesse um funil e o som sai pela boquinha do
funil. Para os graves, é um bico de tucano. Mas NUNCA falo de foco sem pedir para o aluno
prestar atenção ao fato que um som mais focalizado tem um impulso melhor e uma
concentração melhor da energia do apoio.
Comentários:
O foco ressonantal se relaciona aos ajustes que o cantor realiza em seu trato vocal
(configurações, principalmente a distância epiglote-palato mole), promovendo a amplificação
do som vocal. A representação esquemática apresentada dos níveis de projeção vocal
elaborada por Pinho (2008) elucida esta questão. (Ver tópico Posicionando o palato mole.) O
cantor é ensinado a combinar a sensação de vibração em seu corpo por vibração simpática
com o resultado sonoro (feedback do professor), e então memoriza a propriocepção de acordo
com o efeito que quer produzir. Na pedagogia vocal, essa etapa é de grande importância para
o aluno. No trabalho fonoaudiológico, que deve cursar simultaneamente com as aulas de
169
169
canto, o aluno pode entender e exercitar especificamente cada problema individual, como
explica Silvia Pinho:
Quando ensinamos o cantor, ator ou outro profissional da voz a vivenciar as ressonâncias,
dizemos que, no nível gutural de projeção, a voz “vem por baixo”, pela garganta, ocorrendo
grande sobrecarga vocal nessa situação de emissão em decorrência à acentuada adução glótica
(PINHO, 2008, p.30).
Cada aluno tem um desafio diferente do outro e também facilidades. O professor faz
uma triagem das necessidades do aluno e é ideal que trabalhe com um fonoaudiólogo e um
otorrinolaringologista. A partir do diagnóstico anatômico e funcional do cantor, será indicada
a terapia e o trabalho técnico.
3.2.31. Espaço livre para comentários sobre o instrumento de coleta
Pergunta: Você gostaria de fazer algum comentário sobre algum assunto que não foi coberto
por esta pesquisa?
Respostas:
Sujeito 1: O por quê de ressonâncias leves e flutuantes (sobre o ar) projetarem tanto.
Sujeito 2: Sim, sobre a formação de professores e a responsabilidade de se lidar com a cnica
vocal.
Sujeito 3: (não respondeu)
Sujeito 4: Não.
Sujeito 5: Apesar da técnica ser uma ferramenta fundamental para a produção de um som vocal
ideal, um artista não se comunica com a técnica, mas com a sua arte e com seu envolvimento
no que está dizendo e expressando verdadeiramente. Este estudo focou na ressonância por ser
um assunto tão pouco explorado. Mas o estudo mais importante que se deve fazer é “como
transformar um som vocal ótimo em arte genuína que toca o coração e a alma.”
Sujeito 6: O estudo sistemático provocou mudanças na emissão; hoje em dia consigo sentir as
vibrações no corpo todo; consigo sentir que a emissão é tão cheia de energia que ela é sentida
mesmo quando eu apenas falo. Houve, durante esses anos, um ganho de qualidade vocal pela
respiração e pela articulação; pela consciência e conhecimento adquirido de fisiologia vocal.
Sujeito 7: Sim. Achei a pesquisa bastante relevante e gostaria de ver o trabalho final. achei
o questionário extenso, mas relevante.
Sujeito 8: Não.
Sujeito 9: Não.
Sujeito 10: (não respondeu)
Sujeito 11:( não respondeu)
170
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho buscou-se investigar o nível de conhecimento de um grupo de
professores de canto ativos e cruzou-se o resultado dos dados das questões propostas com a
literatura. Com base nos conceitos apresentados pelo grande pedagogo vocal Richard Miller,
respeitado por professores de canto de todo o mundo e autor dos conceitos que embasam o
ensino do canto lírico atual, conseguimos obter resultados positivos e úteis para os
profissionais da área.
Constatamos, então, que, no canto, a busca de informações e subsídios para
fundamentação da prática performática e pedagógica é tarefa exaustiva, no sentido de os
professores brasileiros de canto, de modo geral, terem pouco acesso a uma formação
específica em pedagogia vocal. Não existe nenhum curso específico de pedagogia vocal e o
único que tem algum caráter dessa ordem é o Mestrado em Canto da UFRJ. Os demais cursos
apresentam enfoque musicológico ou em práticas interpretativas. Atualmente, como houve
um aumento de doutores em canto no Brasil (um grande número de doutores permanece no
país no qual receberam o título), está havendo um aumento de pesquisas e trabalhos com
abordagem técnica vocal, como apontam os trabalhos de Rezende (2010), no Brasil, Björkner
(2006) da Suécia, e Sacramento (2009) de Portugal. O aspecto da formação se reflete
diretamente na prática, que, em termos de canto lírico (mercado de trabalho, solidificação de
uma escola de canto nacional, padronização da terminologia usada e difusão da tradição até
agora conquistada), no Brasil ainda está incipiente.
Mas, o que tem a ver ressonância do trato vocal com o mercado de trabalho? As
respostas dos professores explicam isso. Por exemplo: um professor de canto de uma cidade
do interior do Brasil estuda muito, todos os livros que consegue, prepara um aluno que fez
progressos notáveis nos últimos anos, e esse aluno não terá chances de trabalho a menos que
vá para o Rio de Janeiro ou São Paulo. E nessas cidades, terá chance de trabalho? Talvez sim.
Mas, se não tiver sucesso, ele irá se dedicar ao ensino do canto. E o ciclo continua. Professor
sem preparo orientando futuros professores sem preparo. A realidade atual do mercado de
trabalho com o advento dos espetáculos musicais no país urge uma preparação mais apurada
dos professores de canto, dentro e fora das universidades. O canto lírico tem sido, como
informou a professora LoVetri, em entrevista por e-mail dada à professora Mirna Rubim, a
base técnica que solidez ao estudo do canto nos EUA. O treinamento com base na técnica
vocal sólida do canto lírico fornece mais tonicidade, extensão, qualidade de ressonância e
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amplificação adequada e controlada, tanto para microfone como na ausência dele. A falta de
preparo, ou o preparo incompleto nessa área, pode levar a cantores sem técnicas que permitam
uma temporada de 5 a 7 espetáculos por semana. Apenas um sistema fonador treinado,
consciente, resistente poderá superar essa demanda de trabalho.
O mote escolhido para este estudo foi justamente a necessidade que encontramos na
fundamentação e na instrumentalização do professor de canto lírico. Para entender a
ressonância vocal, defendemos que os aspectos mais importantes da física e da fisiologia
deveriam ser compreendidos. Para tal, desenvolvemos, nos capítulos 1 e 2, breves noções
nessas áreas para servir de base de estudo para professores de canto que não têm acesso às
referências escritas em outros idiomas e também que são difíceis de ser obtidos (apenas
importando-os).
Mitos, falsas suposições e, pior, medos infundados são transmitidos de geração a
geração. Muito do que se fazia e se ensinava era atribuído ao empirismo. Aos poucos, esses
mitos vão sendo derrubados, novas informações de pesquisas nos chegam e a experiência dos
profissionais vão sendo compartilhadas. Muitos cantores não se importam como fazem porque
o que fazem resulta satisfatoriamente. Mas, quando se trata do ensino, tudo deve ser muito
mais cuidadoso e com excelência.
Como os professores lidam com o problema? No Capítulo 3, apresentamos os
resultados das questões aplicadas a 11 professores de canto ativos na carreira e confrontamos
suas respostas com a literatura. Vários alegaram que não se preocupavam com a ressonância
diretamente, alguns receberam orientação superficial sobre o assunto e os resultados estão
todos registrados sob a forma de relatórios comentados. No questionário, foram incluídas
perguntas sobre a formação vocal dos sujeitos, assim como suas dificuldades técnicas iniciais,
as lacunas que observam no ensino do canto e optamos por ter um espaço livre para
comentários adicionais. Os resultados apresentados no Capítulo 3 foram gratificantes e nos
ajudaram a construir um embasamento mais sólido nos Capítulos 1 e 2, embasamento este que
se tornou uma espécie de guia de estudo sistematizado.
A ressonância vocal, em nosso entender, é a essência do canto. Não se obtém
ressonância vocal se a postura, o relaxamento ou o appoggio não estiverem estabelecidos. A
coordenação entre a respiração, a fonação e a articulação é o que condições a uma boa
ressonância. No entanto, os eventos laríngeos, os problemas articulares, as transições de
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registro são dificuldades técnicas complexas e problemáticas quanto à abordagem
metodológica de ensino no canto lírico.
Nesta pesquisa, de caráter qualitativo, foi buscada a forma mais adequada para se
entender o fenômeno da ressonância que tem interfaces com outras áreas. As respostas dos
professores per se são a verdadeira contribuição deste estudo. Poder compilar a opinião de 11
professores de diversos estados do país, de diferentes origens e formações nos permitiu ter
uma noção inicial do que pensam a respeito desse assunto tão pouco discutido e ensinado com
pouca clareza. Apesar da amostragem pequena, obtivemos respostas significativas no sentido
de fazer com que os professores de canto que porventura lerem este trabalho possam refletir
sobre cada aspecto abordado. De certa forma, as redundâncias serviram para testemunhar e as
contradições para acrescentar, para completar.
Optamos por um questionário mais genérico porque acreditamos que o olhar do
pesquisador deve ser ampliado, sempre. Abrimos diversas lacunas para pesquisas posteriores
como, por exemplo, desenvolver um processo de estudo sistematizado dos fenômenos
acústicos e fisiológicos da ressonância, criar laboratórios de medição acústica da voz cantada,
desenvolver processos de ensino aprendizagem da amplificação vocal, estudos mais
aprofundados sobre a produção vocal cantada do português brasileiro, para citar alguns.
Um dos aspectos que concluímos foi que o instrumento de coleta de dados
denominado “Questionário sobre Ressonância do Trato Vocal” deveria ter sofrido maiores
modificações, segundo as sugestões e críticas recebidas. A principal crítica foi que o
questionário continha muitas perguntas. Não querendo justificar e já explicitamos que
preferimos a redundância à falta de informações, nossa prática médica (talvez contenha o
chamado vício profissional) é a de fazer diversas perguntas, muitas delas repetidamente, de
modo a obter do paciente a maior clareza de dados possível. E curiosamente, em grande parte
das respostas, os indivíduos se contradizem ou revelam informações inéditas à medida que as
perguntas vão sendo feitas. No caso desta pesquisa, notamos que a repetição não gerou
redundância, mas reforço de cada conceito apresentado numa pergunta anterior.
Elaboramos um questionário piloto a fim de esclarecermos questões incompletas ou
não pertinentes ao estudo. Ao obtermos as respostas, procuramos modificar e adequar à
proposta qualitativa. Uma das dificuldades principais consistiu na falta de tempo dos
participantes para poderem se dedicar a tal empreitada. Talvez um novo esquema de
abordagem fosse mais interessante, entrevistas ao vivo, onde a redundância fosse minimizada,
173
173
ainda que houvesse uma intervenção maior por parte da investigadora. Apesar dessas
colocações, os resultados foram relevantes e esclarecedores.
A idéia de indagar os professores também tinha a intenção de descobrir novos
aspectos que não foram contemplados na nossa revisão bibliográfica. Em outras palavras,
buscamos “alimentar” a literatura com as respostas obtidas e vice-versa, embora as duas
tenham validade e importância por si próprias. E, embora também devêssemos considerar que
este é um processo cíclico e infinito, no intuito de oferecer ao leitor a opção de não ser
direcionado no que se refere à interpretação dos dados obtidos, optamos por disponibilizar as
respostas dos participantes na íntegra e de maneira seqüencial, de acordo com as perguntas.
Concluindo, procuramos realizar uma revisão da fisiologia e acústica vocais, com
enfoque no sistema ressonantal do trato vocal do cantor lírico e com base em estudos de
anátomo-fisiologia do trato vocal, fonoaudiologia, física e técnicas de canto.
Os onze professores de canto lírico que responderam ao questionário sobre
problemas de aprendizado, prática e ensino da ressonância vocal puderam colaborar de forma
magnífica com a revisão efetuada. Cada informação por eles fornecida contribuiu para um
aspecto relevante contemplado ou digno de reflexões e investigações a serem feitas.
Compreendemos que muitos problemas técnicos levantados pelos professores fazem
parte de uma construção de ensino-aprendizagem complexa e detalhada, que exige
contemplação multi e interdisciplinar.
A investigação da construção do conhecimento necessário à docência é um
trabalho árduo. O professor geralmente exerce mais que a função de instrutor, ele estabelece
modelos de configurações os quais os alunos reproduzem por toda a vida. E estabelece
modelos de ensino também. Identificar esses aspectos em uma disciplina tão complexa e
orgânica como o canto exige muita pesquisa e reflexão. Por isso, a necessidade de estarmos
cientes da produção científica recente somada aos contextos sócio-econômicos e culturais
globais.
A habilitação da voz do cantor requer dedicação e tempo (relativos). O cantor
fisiologicamente é um atleta e um instrumento a serviço da poética escolhida por ele. Não se
pode comprar uma voz, como acontece com instrumentos musicais. E a sensibilidade e a
fragilidade, assim como a dependência de múltiplos fatores (variáveis discutidas) deste
174
174
instrumento, são assombrosas. O cantor é simultaneamente o seu instrumento, seu
instrumentista e seu construtor (luthier, quando se trata de construção do instrumento
musical).
No processo de ensino, o professor irá escolher o procedimento adequado ao aluno,
lembrando que cada indivíduo é um universo diferente, com suas particularidades que
merecem ser consideradas e trabalhadas com carinho e dedicação.
Uma das funções fundamentais do professor é justamente levar o aluno ao encontro
do conhecimento. Esse conhecimento (saber sensível) é a ferramenta que permitirá ao aluno a
autonomia do desenvolvimento de sua arte e da transmissão desta aos outros, na performance
ou no ensino. Esta é a idéia da ferramenta, a que auxilia na construção, é o recurso
disponibilizado para o uso e, neste caso, o uso poético.
Este trabalho pretende, de maneira enfática, estimular outras pesquisas e reflexões
sobre os assuntos tratados. Apesar da instabilidade geral do globo, em termos de futuro das
artes, da ciência e dos seres humanos, acreditamos que o futuro do canto lírico no Brasil
merece investimentos em todos os níveis. A pedagogia vocal merece mais atenção,
principalmente em um país como o nosso, que ficou tanto tempo sem educação musical e
onde as crianças não têm educação musical. Não é de se estranhar que os poucos praticantes
do canto lírico tenham conseguido exercê-lo mediante muita luta e determinação, empirismo e
sorte. As palavras dos professores atestam isso.
175
175
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180
180
ANEXOS
Anexo 1 Questionário adotado
Ressonância: ensino-aprendizagem:
1. Perfil (dados pessoais não serão divulgados na pesquisa)
Naturalidade (cidade):
Endereço/cidade/telefone:
Anos de estudo?
Canta há quanto tempo (canto lírico)?
Onde canta?
Apresenta-se regularmente? Vezes por semana?
Ensina há quanto tempo?
Locais onde ensinou e ensina
Quantos alunos particulares em média por semana?
Quantos alunos individuais em instituições?
2. Formação
2.1 A parte mais importante (para sua carreira de cantor) da sua formação foi em:
( ) escola/conservatório/faculdade
( ) aulas particulares
( ) outra _________________________________
2.2 Você obteve seu conhecimento sobre canto lírico através de (Por favor, numere em ordem de preferência)
( ) aulas
( ) workshops, masterclasses
( ) um professor
( ) mais de quatro professores
( ) livros, materiais escritos
( ) outros _______________________________
2.3 Você leu alguma literatura sobre canto lírico? Em caso afirmativo, cite os principais autores relevantes para
seu aperfeiçoamento.
2.4 De 0 a 10, como você classifica seu conhecimento sobre fisiologia da voz?
2.5 De 0 a 10, como você classifica seu conhecimento sobre acústica vocal?
2.6 Defina sucintamente como você entende a ressonância do trato vocal no cantor lírico?
2.7 Que informações extras referentes à ressonância do trato vocal você gostaria de obter?
2.8 Em sua opinião, quais são as características mais relevantes de um som vocal de qualidade? Especifique e
justifique.
3.Técnica
Instruções: Para as próximas questões desconsidere, por favor, respiração e postura porque esta pergunta tem
como foco principal os fenômenos ressonantais do trato vocal.
3.1 Como você trabalha, tecnicamente, a ressonância /amplificação /desenvolvimento do seu som
vocal? Especifique.
3.2 Quanto ao fenômeno da ressonância/amplificação /desenvolvimento vocal, quais os
parâmetros/critérios físicos corporais que indicam que você esta emitindo um som vocal de
qualidade? O que você usa?
3.3 Que ajustes corporais (garganta, boca, nariz) que você realiza para obter um som de qualidade?
3.4 Você teria dificuldades técnicas atualmente para obter um bom som vocal? Em caso positivo, quais
seriam?
3.5 Tecnicamente, como o cantor pode aumentar/melhorar sua ressonância/som vocal? Especifique.
3.6 Que eventos ou procedimentos/modificações na boca, garganta e nariz você utiliza para a transição
de registros vocais?
181
181
3.7 Você faz modificação vocal do timbre? Se afirmativo, especifique as modificações no trato vocal
que você realiza.
4. Aprendizagem
4.1 O que lhe foi ensinado tecnicamente de mais relevante no que se refere à ressonância do trato
vocal? Especifique mudanças em:
boca
palato
mandíbula
língua
lábios
garganta
agudos
médios
graves
outros
4.2 Quais as maiores dificuldades técnicas que você encontrou ao iniciar seus estudos de canto (lírico),
no que se refere ao som vocal que lhe fosse satisfatório?
4.3 Como lhe foi ensinado o processo para obter um som vocal amplificado e de qualidade? Seja
específico nas técnicas e procedimentos.
4.4 Em sua opinião, quais os maiores erros/dificuldades/lacunas cometidos pelos professores de canto
que o/a orientaram?
5. Ensino do canto lírico
5.1 Quais as maiores dificuldades técnicas dos seus alunos?
5.2 Quais os termos (palavras, expressões) que você usa para que o aluno obtenha um bom som vocal?
5.3 Você explica o fenômeno da ressonância vocal aos seus alunos? Como?
5.4 Quais são as modificações no trato vocal (garganta, boca e nariz) que você solicita ao aluno durante
o canto? Especifique.
5.5 O que, tecnicamente (excetuando a respiração e uma boa postura), você acha que o aluno deve
compreender para obter uma boa sonoridade vocal?
5.6 Você ensina alguma modificação no trato vocal (boca, nariz, garganta) na transição de registros?
Qual?
5.7 Você ensina alteração/manipulação de timbre vocal? Como?
5.8 Se você acha que o vibrato vocal é algo treinável, como você o ensina?
5.9 Para você qual é a maior falha/lacuna/deficiência no ensino do canto lírico?
5.10 O que você explica ao aluno para que ele amplifique ou melhore o som emitido?
5.11 Você solicita que o aluno cante com foco ou concentração em algum lugar fora ou dentro do corpo
dele? Qual(is)?
5.12 Você gostaria de fazer algum comentário sobre algum assunto que não foi coberto por esta
pesquisa?
182
182
Anexo 2 Passagens das vozes femininas
Esquema: Passagens e zonas de registro nas vozes femininas (MILLER, 2000, p. 25).
Considerar que no padrão americano C4 equivale ao C3 (dó central) no Brasil.
PASSAGENS DE SOPRANO
Observação: No Brasil utiliza-se a representação das notas com uma relação C3=C4. O dó
central C3 no Brasil corresponde a C4 no padrão americano. Logo, o leitor deve analisar os
esquemas das vozes femininas levando em conta esse fato.
183
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PASSAGENS DE MEZZO-SOPRANO E CONTRALTO (abaixo)
184
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Anexo 3 Passagens nas vozes masculinas
Passagens de registro nas vozes masculinas
(1) Eventos aproximados de registro nas vozes masculinas adaptado de MILLER, 1996,
p.117.
CATEGORIA
PRIMO PASSAGGIO
SECONDO PASSAGGIO
TENORINO
F3
Bb3
TENOR LIGEIRO
E3 (Eb3)
A3 (Ab3)
TENOR LÍRICO
D3
G3
TENOR SPINTO
D3 (C#3)
G3 (F#3)
TENOR ROBUSTO
(TENOR DRAMÁTICO)
C3 (C#3)
F3 (F#3)
BARITONO LÍRICO
B2
E3
BARITONO DRAMÁTICO
Bb2
Eb3
BAIXO-BARÍTONO
A2
D3
BAIXO PROFUNDO
Ab2 (G2)
Db3 (C3)
Observação: Nas tabelas de zonas de passagens das vozes masculinas utilizou-se o padrão
brasileiro já traduzido.
185
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Anexo 4 Normas para o Português Brasileiro Cantado (2008)
186
186
187
187
188
188
189
189
190
190
Anexo 5 International Phonetic Alphabet (IPA)
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