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Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO
Centro de Ciências Humanas e Sociais –CCH
Programa de Pós-Graduação em História – PPGH
MÔNICA HARTZ OLIVEIRA MOITREL
A LOGÍSTICA NAVAL NA MARINHA IMPERIAL DURANTE A GUERRA DA TRÍPLICE
ALIANÇA CONTRA O GOVERNO DO PARAGUAI
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em História da Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro como requisito do título de Mestre
em História.
Orientador: Prof. Dr. Paulo André de Leira Parente
Rio de Janeiro
2010
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MÔNICA HARTZ OLIVEIRA MOITREL
A LOGÍSTICA NAVAL NA MARINHA IMPERIAL DURANTE A GUERRA DA
TRÍPLICE ALIANÇA CONTRA O GOVERNO DO PARAGUAI
BANCA EXAMINADORA:
Prof. Dr. Paulo André Leira Parente (Orientador)
(Professor convidado)
Prof. Dr. Marcos Guimarães Sanches (UNIRIO)
Prof
a
. Dr
a.
Icléia Thiesen (UNIRIO) Suplente
A todos os historiadores navais brasileiros que me
antecederam. Seus estudos possibilitaram meu
aprendizado, pesquisa e desenvolvimento na viagem do
entendimento da História Naval Brasileira.
Primeiras Palavras/ Agradecimentos
Ao iniciar o projeto do mestrado, tinha situação confortável representada por 10 anos na
chefia do Departamento de História da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha, departamento composto por pesquisadores especialistas competentes e capazes de suprir
as ausências necessárias a todos que se aventuram em um curso de extensão. Contingências de
careira foram mudando essa situação e não tive a capacidade de avaliar que tinha abraçado
compromissos maiores do que poderia sustentar. O corpo não aguentou ou melhor o coração
reclamou minha total atenção e me tirou de cena por mais de um ano. Lembro-me sempre das
palavras da Prof
a.
. Keila Grinberg no nosso primeiro encontro, ainda em uma sala improvisada,
alertando que possivelmente nem todos terminariam ou por motivos de casamento, ou
movimentações, e outras situações que geralmente podem alterar o andamento dos projetos, e por
que na ocasião tivesse a certeza que não ocorreria comigo, fui surpreendida, pois as circunstancias
provaram o contrário. Mas não desanimei e prossegui em meus objetivos, e hoje dou por concluído
ao estudo que me propus ao me candidatar para a primeira turma de mestrado das instituições da
UNIRIO.
É devido ao explanado no parágrafo acima que dirijo o meu primeiro agradecimento ao
corpo docente do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro UNIRIO, que soube entender a situação me apoiando, torcendo e vibrando tanto
para minha completa recuperação (ainda em curso) como com os progressos que fui fazendo ao
longo de 2009 e 2010. Tenho certeza que sem a sua compreensão não teria sido capaz de dar
continuidade a pesquisa, obedecendo a velocidade ditada pelo meu corpo.
A Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha na pessoa de seu Diretor, o
Almirante Bittencourt agradeço a confiança e amizade, da mesma forma que a todos os membros
dessa Diretoria que acompanharam de perto ou longe, torcendo para o sucesso do meu
restabelecimento, sempre prontos para auxiliar a sanar as dúvidas de pesquisa que naturalmente iam
surgindo.
Ao meu guru Almirante Leoncio, eterno orientador e incentivador, não tenho palavras de
agradecimento e reconhecimento por todo apoio que vem me dando ao longo desses anos, pois é
com ele que tiro minhas dúvidas e busco o rumo certo a ser seguido.
Agradeço em especial ao Prof. Paulo André, que além de orientador se tornou um amigo, sei
que sua confiança em meu trabalho foi o que possibilitou a continuação desse projeto. Entendeu o
momento delicado que passava, principalmente após a perda de meu pai ainda no ano de 2009,
deixando que eu achasse meu tempo, sem pressão, mas sempre ali, pronto para os passos seguintes.
Agradeço ainda, aos meus pais, Myriam e José. Sem eles com certeza não teria chegado até
aqui. Eles me conceberam e me forjaram, e estiveram e estão sempre ao meu lado apoiando todas as
minhas decisões. Minha mãe partiu algum tempo, numa época marcante em minha vida, pois
acabara de ingressar na Marinha, e meu pai recentemente, por coincidência, no momento em que
completei 30 anos de serviço. É, a vida é mesmo feita de coincidências..., meu último encontro com
ele ocorreu em fevereiro de 2009, tinha acabado de passar pela qualificação e discutíamos como
deveria abordar o evento da revolução industrial na instituição que nós dois pertencíamos. Meu pai,
estrategista e historiador nato, sempre foi partícipe atuante nos meus projetos, e consultor constante
nas minhas pesquisas. Quem conviveu comigo no dia a dia sabia dos nossos telefonemas
matutinos, quando, como quase que em uma “ordem de parada”, analisávamos os progressos de
cada um nos objetivos delineados; talvez tenha sido esse o motivo que o item relativo a Revolução
Industrial tenha ficado tão longo, quis deixar seus últimos pensamentos e orientações registrados de
algum modo nesse estudo.
Por fim agradeço meu marido Luis, sempre pronto a me apoiar, discreto e silenciosamente, e
de forma efetiva, e aos meus filhos Henrique e Ricardo que mesmo não compreendendo bem
porque gosto tanto desse trabalho de pesquisa, aceitam e compreendem a minha escolha.
SUMÁRIO:
Introdução..........................................................................................................p.1
Capítulo I – Transmigração da Instituição........................................................p.14
1.1– A estruturação da instituição Marinha no Rio de Janeiro..............p.20
1.2– Os Portugueses na Marinha do Brasil............................................p.22
1.3– Vida a bordo no século XIX..........................................................p.27
1.4- A estrutura naval no decurso do Primeiro Reinado e a atuação da Instituição
em conflitos (1808-1850)......................................................................p.35
- A estrutura administrativa............................................p.35
- A estrutura de pessoal...................................................p.38
- A atuação em conflitos.................................................p.39
- A Revolução Industrial: os novos desafios à Marinha Imperial
brasileira................................................................................................p.41
- Fumaça no horizonte: tentativas de preparo para um possível
conflito platino......................................................................................p.50
1.6.1- Armamento..........................................................................p.52
1.6.2- Construção naval.................................................................p.54
Capítulo II - O ponto de inflexão institucional da Marinha: o conflito em terras
distantes................................................................................................p.59
2.1- A agressão paraguaia.....................................................................p.62
2.2- A mobilização e a estratégia da Força Naval (1
a
fase da guerra)..p.66
2.3- A invasão do território paraguaio(2
a
fase da guerra).....................p.76
2.4- Construção Naval e Armamento....................................................p.94
2.4.1- O Arsenal de Cerrito.............................................................p.98
2.5- Saúde..............................................................................................p.101
2.6- Pessoal............................................................................................p.110
2.7- O Serviço de Intendência da Marinha............................................p.112
Conclusão..........................................................................................................p.116
Índice das ilustrações........................................................................................p.119
Anexos..............................................................................................................p.121
Bibliografia.......................................................................................................p.141
RESUMO
O foco deste estudo é a Instituição Marinha do Brasil e a forma pela qual a logística foi
desenvolvida dentro de sua estrutura ao longo do Império, numa tentativa de contribuir para o
preenchimento de lacuna existente no conhecimento da estrutura institucional
O que se pretende é
O que se pretende é
observar a origem do grupamento de manutenção e aprovisionamento português, denominado
observar a origem do grupamento de manutenção e aprovisionamento português, denominado
atualmente como Logística, e como ele foi transferido para o Brasil no período colonial, e suas
atualmente como Logística, e como ele foi transferido para o Brasil no período colonial, e suas
futuras modificações estruturais para fazer frente as novas realidades, focando em especial a sua
futuras modificações estruturais para fazer frente as novas realidades, focando em especial a sua
atuação no Segundo Reinado. A problemática da estruturação logística nos primeiros anos da
atuação no Segundo Reinado. A problemática da estruturação logística nos primeiros anos da
Guerra da Tríplice Aliança está intimamente ligada ao processo da Revolução Industrial, que
Guerra da Tríplice Aliança está intimamente ligada ao processo da Revolução Industrial, que
promoveu, entre outras mudanças, a passagem da propulsão à vela para o vapor, provocando a
promoveu, entre outras mudanças, a passagem da propulsão à vela para o vapor, provocando a
valorização do carvão na organização logística, e a passagem dos navios de casco de madeira para
valorização do carvão na organização logística, e a passagem dos navios de casco de madeira para
os de ferro.
os de ferro.
Palavras-Chave: Instituição, Marinha, Logística.
ABSTRACT
The focus of this study is the Brazilian Navy as na institution and the means in which logistics have
developed within its structure during the imperial era, in a attempt to contribute for the filling in of
the existing gap of knowledge of the institutional structure. The intention is to investigaste the
original activities of the Portuguese maintenance and supply group, nowadays known as
Logistics,and how it was transfered to Brazil in the colonial period, and its future structural
modifications in order to confront new realities, specially focusing its performance during the
historical period known as the Second Kingdom. The problems with the logistical structure in the
first years of the War of Triple Alliance (Guerra da Tríplice Aliança) is intimatly related to the
Industrial Revolution, which promoted, among other changes, the evolution from sail to steam
propulsion, stablishing a greater valorization of the coal within logistics, and the evolution on naval
construction from wooden to steel hulls.
Key Words: Institution; Navy; Logistics
INTRODUÇÃO
“Supondo que uma força naval tenha a plena
capacidade de enfrentar o inimigo nos oceanos...as comunicações não
implicam em rotas de tráfego marítimo ... e sim no abastecimento contínuo,
uma vez que os navios dispõe de uma capacidade limitada de estocagem.”
Mahan - 1911
O estudo da História de uma Instituição engloba não só o seu desenvolvimento mas também
a forma pelo qual foram suplantados os desafios enfrentados no seu desenvolvimento e porque não
dizer em sua “existência”
1
. A historiografia referente a História da Marinha Imperial Brasileira está
muito voltada para o estudo ou das batalhas navais e ou de seus personagens, com uma forte
tendência à análise das estratégia e tática empregadas nos conflitos ocorridos no período Imperial,
tendo, portanto, a preocupação maior para o fim, em detrimento ao estudo do meio. O foco desta
monografia é a Instituição Marinha do Brasil e a forma que foi desenvolvida dentro de sua estrutura
principal, a atuação logística ao longo do Império, numa tentativa de contribuir para o
preenchimento de lacuna existente no conhecimento da estrutura institucional, no caso da
administração militar, ainda pouco estudada a exemplo da afirmativa de Antonio Manuel Hespanha:
“... a problemática da concentração da força militar nas mãos do estado e o seu significado
estrutural-tipológico (i.e., relativo aos modelos de organização e distribuição sociais do poder) e
sócio-político não foi ainda explicitamente abordada”.
2
O Poder Naval de uma nação (constituído de navios de guerra, arsenais de Marinha, bases
navais, fábricas de armamento e de munição de guerra e do pessoal) é consubstanciado na sua
Marinha de Guerra, Força Armada destinada a atuar no mar. Em tempo de guerra, os elementos que
se destinam a atuar em força são subordinados a comandos operativos, apoiados por
estabelecimentos logísticos (arsenais, hospitais, centros de formação e de treinamento de pessoal,
etc.), alguns dos quais subordinados aos referidos comandantes operativos. Em tempo de paz a
Marinha é preparada, adestrada e administrada por uma estrutura organizacional atualmente
denominado Comando da Marinha
3
. Desde priscas eras as funções essenciais que à mencionada
estrutura organizacional cabe desempenhar, são: recrutar gente e formá-la profissional e
militarmente; obter as unidades operativas e mantê-las em condições de bom funcionamento; e
1
Neste estudo compreendido como o período em que a Instituição existe enquanto atua numa sociedade.
2
HESPANHA, Antonio Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. in. Poder e instituições na
Europa do Antigo Regime. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984.
3
No período estudado era denominado Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha, sendo seu titular titulado como
Ministro e Secretário.
repará-las quando avariadas ou desgastadas pelo uso e abastece-las do que for mister ao seu
funcionamento
4
.
O presente estudo se propõe a analisar a instituição Marinha do Brasil , onde o foco será
um dos elementos que, por sua característica, consiste na ação meio de toda a atuação da Instituição
no transcorrer do período Imperial. A alteração sofrida neste elemento organizacional, no período
abrangido, é fruto tanto de ação externa quanto dos conflitos internos, constituindo-se no que
Dimaggio e Powell
5
teorizam como o novo institucionalismo.
A Logística será aqui entendida como o conjunto de atividades relativas à previsão e à
provisão dos recursos de toda a natureza, necessários à realização das ações impostas por uma
Estratégia
6
. É também definida como a parcela da Arte da Guerra no que concerne ao planejamento
e execução das atividades de sustentação das forças em campanha, pela obtenção e provisão de
meios de toda ordem e pela obtenção e prestação de serviços de natureza administrativa ecnica.
No campo mais específico, a Logística militar é definida como o conjunto de atividades necessárias
para apoiar a criação, movimentação, engajamento, desengajamento e desativação de um comando
ou força operativa, com base nas estimativas de necessidades por ela formulada
7
. De uma forma
mais generalista, logística envolve tudo que não tem tiro.
A delimitação do espaço-temporal será os anos de 1864 e 1870. Entendemos que, o grande
esforço de mobilização e de estruturação logística da Força Naval responsável pelas operações que
foram realizadas nos Rios Paraná e Paraguai, por ocasião do conflito denominado Guerra da
Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai, ocorreram no transcurso dos três primeiros anos,
sendo os seguintes o resultado do esforço empreendido na mobilização e preparo logístico.
As raízes de nosso estudo têm origem em Portugal. O Alvará de 28 de julho de 1736,
promulgado pelo Rei D. João V, criou as Secretarias de Estado dos Negócios Interiores do Reino, da
Marinha e Domínios Ultramarinos e dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, e atribuiu funções
específicas às mesmas. Caberia à Secretaria de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos (ou
Secretaria de Estado da Marinha e Conquistas), no que concerne à administração da Marinha, o
encaminhamento de despachos referentes à expedição das Armadas e frotas e a administração da
4
CAMINHA, Herick Marques. Evolução da Estrutura Administrativa do Ministério da Marinha no Império. in.
História Naval Brasileira .Terceiro Volume , Tomo I. p. 29.
5
POWELL, Walter W., DIMAGGIO, Paul J. El Nuevo Institucionalismo en el análises Organizacional: estúdio
introductorio de Jorgio Javier Romero
6
O conceito de estratégia, no culo XVIII, abrangia a administração militar, o conhecimento e a utilização adequada
dos exércitos, a ciência das fortificações, a arte de comandar, o hábil recurso à propaganda da guerra e um saber político
pragmático. O aprofundamento do estado da arte no campo da previsão, obtenção e distribuição dos recursos
necessários para a garantia do sucesso da ação deram origem a um ramo específico do saber militar, a Logística.
Desde a antiguidade os conflitos são vencidos pelas armas comandadas por aqueles que melhor previu e
proveu os meios, pessoal, facilidades e serviços indispensáveis, pelo exercício instintivo ou consciente de funções hoje
denominadas logísticas.
7
Glossário das Forças Armadas – 4
a
Ed.. MD35 – G-01.2006 p 149.
fazenda dos Armazéns; os provimentos dos postos militares da Marinha; o expediente dos
passaportes dos navios que saíssem do porto de Lisboa e as ordens sobre os que entrassem; e todo o
expediente de todas as dependências da Marinha. Igualmente estaria sob a responsabilidade da
citada Secretaria de Estado a administração das possessões portuguesas de ultramar, como: a
nomeação dos vice-reis, governadores e capitães-generais dos estados da Índia, Brasil, Maranhão,
Reino de Angola, Ilha da Madeira, Açores, Cabo Verde e Presídios Africanos; o provimento de
todos os postos militares, ofícios de justiça e fazenda das colônias portuguesas de além mar e todos
os assuntos vinculados à administração da justiça, Fazenda Real, ordens religiosas, comércio e
governo dos referidos domínios ultramarinos.
As atribuições da Secretaria de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos não mudariam
nas décadas posteriores, mesmo com a vinda da Família Real portuguesa para sua colônia
americana em 1808. Com a transferência da Coroa e de toda a estrutura governativa do Reino de
Portugal para o Rio de Janeiro, a Secretaria de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, como
parte integrante desta estrutura, foi transferida para o Brasil.
Em abril de 1821, o Rei D. João VI transferiu-se com todas as Secretarias de Estado a ele
subordinadas para Portugal, inclusive a Secretaria de Estado e Negócio da Marinha e Domínios
Ultramarinos. Temendo perder suas prerrogativas de soberano absoluto com a promulgação de uma
Constituição e, mesmo, vendo ameaçada sua permanência no trono, D. João VI nomeou D. Pedro de
Alcântara, seu primogênito, o Príncipe Regente do Reino do Brasil, pelo Decreto de 22 de abril de
1821. Nas instruções anexas a esse Decreto, duplicou a estrutura governativa a ele subordinada
estabelecendo um gabinete de ministros que coadjuvaria seu filho na governo do Reino do Brasil.
Assim, enquanto os Secretários de Estado que compunham a administração do Reino Unido eram
transferidos para Portugal, D. João VI determinava a manutenção do arcabouço destas Secretarias,
nomeando novos titulares, para servirem no Reino do Brasil. Apesar desta duplicação de estruturas
e divisão de áreas de responsabilidades, tanto a Secretaria de Estado e Negócios da Marinha
estabelecida em Portugal, como a que se manteve na Brasil, continuaram sendo regidas pelo Alvará
de 28 de julho de 1736.
Com a Independência, a estrutura administrativa continuou a ser a mesma que foi transferida
para as terras brasileiras em 1808, salvo a exclusão das atribuições relativas a gestão dos Domínios
Ultramarinos portugueses que foram concentrados no Secretário de Estado e Negócios da Marinha e
Domínios Ultramarinos que acompanhou D. João VI a Portugal (em 1821, pelo Decreto de 8 de
novembro, as Cortes Gerais retiraram o controle dos Domínios Ultramarinos da Secretaria de
Estado dos Negócios da Marinha, repartindo as atribuições relativas às colônias e possessões lusas,
conforme sua naturezas, às demais Secretarias de Estado).
Fig.: 1
Legenda: 1 Cabanagem; 2- Balaiada; 3- Revolta Praieira; 4-Sabinada; 5- Guerra dos
Farrapos; 6- Cisplatina e Guerra contra Oribe e Rosas; 7 - Guerra da Tríplice Aliança contra o
governo do Paraguai.
A Constituição outorgada em 1824 não legislou sobre a Secretaria de Estado e Negócios da
Marinha, continuando os titulares desta pasta a regular suas atribuições pelo Alvará de 1736.
Durante todo o período Imperial (1822-1889), mesmo sofrendo modificações pontuais em sua
estrutura ao longo dos anos, a Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha não teve suas
atribuições modificadas, quais sejam, a de gerir as Armadas e Frotas, e administração da Fazenda
dos Armazéns, e os provimentos de todos os postos militares da mesma Marinha, mantendo-se no
corpo do governo diretamente vinculado ao detentor máximo do poder executivo de então, o
Imperador.
8
No tocante a logística da Marinha no Primeiro Reinado e na Regência, a sua estrutura foi
suficiente para suprir as necessidades dos órgãos da Instituição distribuídos pelo litoral do Império
brasileiro, mesmo em momentos de conflitos como os havidos no período regencial, principalmente
devido à comunicação marítima e ao apoio territorial existente nas províncias, como de arsenais e
depósitos(fig.:1). A deficiência da estrutura logística naval foi sentida no momento em que se fez
necessário seu apoio em terras distantes do governo central e de difícil navegabilidade, como o
ocorrido na Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai (fig.:2).
Fig.:2
O estudo da Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai, tem, nos últimos
anos, se revestido de importância por permitir uma diversidade de objetos de pesquisa e de
enfoques metodológicos, em virtude de ter sido o maior conflitolico ocorrido na América do
Sul. Francisco Doratioto afirma que a Guerra do Paraguai foi o conflito externo de maior
8
Conforme estudo realizado em Parecer do Serviço de Documentação da Marinha, 2007.
repercussão para os países envolvidos, quer quanto à mobilização e perda de homens, quer quanto
aos aspectos políticos e financeiros.
9
Nosso enfoque se baseará na atuação de representantes da Marinha que, longe de suas
bases, receberam a atribuição do poder de decidir num determinado momento histórico, observando
que, conforme Niklas Luhmann:
“...poder é uma comunicação orientada por um código. A atribuição
do poder ao poderoso é regulada, neste código, com consequências de
grande alcance, o que acarreta reforço dos motivos de observância,
responsabilidade, “institucionalidade”, direcionamento dos desejos de
alteração;...”
10
.
Ou seja, naquele determinado momento, devido às contingências que desenrolavam, coube
a Joaquim Marques Lisboa
11
, o Almirante Tamandaré, então Chefe da Força Naval estacionada na
embocadura do Prata, organizar, encomendar gêneros e definir os passos a serem dados em
represália as agressões paraguaias. Naquele instante ele representava o Império nas tratativas com o
governo argentino e uruguaio, e como poder é uma ação que só a um é dado o direito de exercê-lo,
o Almirante Tamandaré o exerceu, ao iniciar a por em prática toda a estruturação logística que se
fazia necessária para o apoio das forças aliadas. Posteriormente foi substituído por Ignácio Joaquim
José, o Visconde de Inhaúma, que manteve a estruturação criada aprimorando-a onde se fez
necessário.
Considero que, o esforço empreendido inicialmente se constituiu em uma tarefa hercúlea e
incerta, uma vez que o decisor logístico, o Chefe das Operações Navais, se encontrava afastado da
base principal de abastecimento, ou seja do Rio de Janeiro; dependendo do apoio dos países aliados,
sem o quantitativo dos meios navais e de pessoal necessários. Há que se considerar, também, que os
meios navais disponíveis no teatro de operações estavam desgastados pela campanha uruguaia,
necessitando dessa maneira de maiores cuidados logísticos.
12
.
Dentre as várias medidas a serem empreendidas era necessário montar uma base de
9
DORATIOTO, Francisco Fernando Monteoliva Maldita Guerra: a nova história da guerra do Paraguai. São Paulo:
Companhia das Letras, 2002 p.17
10
LUHMANN, Niklas Poder. Brasília: Editora UnB, 1985.p14.
11
Joaquim Marques Lisboa (1807-1897), Patrono da Marinha, iniciou sua carreira em 1823 como voluntário por ocasião
da Independência, tomou parte dos combates das guerras da independência; foi elemento atuante em todos os
momentos da Marinha Imperial.
12
Todd A. Diacom em seu livro Perfis brasileiros Rondon, analisa assim o tema: “O desastroso desempenho do Brasil
na Guerra do Paraguai (1865-1870) intensificou a percepção da necessidade de mudança. No início da guerra, os
paraguaios bloquearam o acesso do Brasil ao rio Paraguai, deixando patente o isolamento do oeste brasileiro. Viajar por
terra até o teatro da guerra às vezes era difícil, quando não impossível. Havia dificuldade para mobilizar a tropa, e
pesadelos logísticos assombravam o esforço de guerra brasileiro”.
operações em local ainda a ser determinado
13
, com a possibilidade de se construir barcas que
operariam em apoio ao transporte das tropas
14
, de unidades de saúde (hospitais) e acampamento
para os militares quando não embarcados. Fazia-se necessário da mesma forma, suprir os navios de
carvão, além de prever a alimentação, fardamento, reparo para os navios e um item crítico, a
munição para os canhões e armas portáteis. Era imprescindível também capacitar a força naval com
meios capazes de enfrentar com eficácia as poderosas fortificações paraguaias ao longo do Rio
Paraná. Todas as providências teriam que ser tomadas enfrentando os ataques da força adversária,
que desde o início de 1865, adotavam uma postura ofensiva.
Numa análise geral, identificamos que a Marinha Imperial viveu três momentos decisivos na
Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai: Riachuelo, que garantiu a navegabilidade;
Passo da Pátria, que representou a reação aliada com o início da invasão do território paraguaio; e a
Passagem de Humaitá, a derrota do último baluarte paraguaio. Em termos logísticos podemos
identificá-los da seguinte forma: Riachuelo representou o início da estruturação logística, que
mesmo em desvantagem obteve sucesso, Passo da Pátria a “experiência de máquinas” e Humaitá a
consagração. São momentos decisivos porque todos, ao seu modo, determinaram o rumo da guerra.
Sendo que Passo da Pátria representou, ao meu ver, a concretização de procedimentos
organizacionais e estruturais da logística da instituição.
O que se pretende, portanto, é estudar a origem do grupamento de manutenção e
aprovisionamento português, atualmente denominado de logística, e como ele foi transferido para o
Brasil no período colonial, focando em especial a sua estruturação e evolução ao longo do Império,
analisando seu comportamento frente aos efeitos da Revolução Industrial; e demonstrar como se
estruturou a logística da Força Naval brasileira nos momentos iniciais da Guerra da Tríplice Aliança
contra o governo do Paraguai, nas instâncias de decisões nos procedimentos adotados dentro da
hierarquia institucional.
Este estudo insere-se na área de concentração da História das Instituições por tratar de
análise de período histórico no qual a Instituição Marinha do Brasil teve atuação preponderante nos
acontecimentos, e sua ação, em muitas ocasiões, constituiu em um importante instrumento para a
condução das operações de guerra, além de promover alterações importantes na estruturação
organizacional de sua esquadra, frente as novas realidades impostas a sua execução.
Dentro desse escopo, o estudo se inclui na linha de pesquisa Instituições, Poder e Sociedade,
onde se investigará a atuação do Poder Naval, no que tange a estruturação logística, em uma
conjuntura adversa como foram as operações desenvolvidas ao longo dos Rios Paraná e Paraguai.
13
A província argentina de Corrientes serviu como base para o início das operações.
14
Foi criado em Cerrito, próximo a Corrientes, um arsenal com esse propósito.
Como anteriormente citado o tema está coadunado com a afirmação de Hespanha quanto à
necessidade de se explicar melhor o significado estrutural da força militar dentro da história
institucional, faltando perspectivas atualizada, capazes de valorizar de forma nova os dados
existentes. Da mesma forma que será observada, no tocante as ações dos personagens centrais do
estudo, a definição de Niklas Luhmann referente a organização de uma instituição como um sistema
elaborador de informações e comunicações, ao invés de uma estrutura puramente hierárquica, onde
a ação, ou seja, o poder fica a cargo de um elemento da estrutura organizacional que muitas vezes
não corresponde ao superior da cadeia hierárquica de uma determinada instituição, como o ocorrido
no período em foco.
René Remond
15
afirma que a história como realidade, tomada no sentido da sequência dos
acontecimentos, teve seu papel nessa volta às boas graças do político, sendo que a experiência das
guerras, cujo desencadeamento não pode ser explicado apenas pela referência aos dados da
economia, tem influenciado em vários aspectos a política e a sociedade. Jean-Pierre Azéma
16
indica que a guerra funciona segundo impulsos cada vez mais específicos, exemplificando com a
influência crescente da logística, “o destino das batalhas dependeu da possibilidade de se ter ou
não abastecimento de combustível no tempo desejável”.
A problemática da estruturação logística nos primeiros anos da Guerra da Tríplice Aliança
está intimamente ligada ao processo da Revolução Industrial, que promoveu, entre outras
mudanças, a passagem de propulsão a vela para o vapor, provocando a valorização do carvão na
organização logística, e a passagem dos navios de casco de madeira para os de ferro. Essa inovação,
a da propulsão a vapor, trouxe uma nova problemática para a logística da Instituição, o
abastecimento da matéria prima das caldeiras, ou seja, o abastecimento de carvão dos navios.
A primeira vez que a Marinha Imperial utilizou navio a vapor de grande porte em um
conflito fora de seu domínio territorial, foi em 1850/1 na Guerra contra Oribe e Rosas. O Império
brasileiro que se opunha frontalmente à anexação do território uruguaio ao território argentino de
Buenos Aires, apoiava o governo constituído do Uruguai, exercido pelo Partido Colorado. Por se
tratar de região conhecida, e com o apoio do governo local, o problema logístico, em geral, não
apresentou sério obstáculo para a execução das operações. O mesmo não se pode dizer do ocorrido
na Guerra da Tríplice Aliança, onde o território não era de todo conhecido, e tinha-se que prover
locais para abastecimento de, por exemplo, carvão e víveres. A distância existente do centro político
obrigou a força naval a organizar estrutura de apoio na medida em que as forças aliadas iam
15
REMOND, René (Org.) Por uma História política. Tradução Dora Rocha. 2 ed. Rio de Janeiro: editora FGV, 2003. .
p. 23.
16
AZÉMA, Jean-Pierre A guerra. IN REMOND, René (org.) Por uma História política. Tradução Dora Rocha. 2 ed. Rio
de Janeiro: editora FGV, 2003. p.424.
avançando na sua marcha.
A bibliografia referente a Guerra da Tríplice Aliança é muito extensa, abrangendo a análise
crítica quanto a política e a ação Imperial adotada, a influência econômica consequente dos anos de
guerra, e, aos que se dedicam aos assuntos militares, a ação das tropas terrestres. Na sua grande
maioria, a atuação da Força Naval é retratada apenas na Batalha Naval do Riachuelo e na Passagem
de Humaitá, sendo seu foco voltado para as operações realizadas e a modernização dos meios
navais. Vagas são as menções referente a estrutura logística de nossas Forças na ocasião,
configurando-se portanto, este estudo, em uma análise inédita onde se buscará renovar os objetos
de investigação referentes à instituição Marinha.
A metodologia adotada neste estudo foi composta de leitura da bibliografia de apoio
existente, referente ao assunto da Guerra da Tríplice Aliança, de modo a subsidiar o capítulo inicial
contextual. Investigou-se qualitativamente essa bibliografia, no qual destaco os livros de Francisco
Fernando Monteoliva Doratioto Maldita Guerra: a nova história da guerra do Paraguai, em que
se discute principalmente os aspectos políticos do conflito; e o clássico História da guerra entre a
Tríplice aliança e o Paraguai de Augusto Tasso Fragoso no qual se apresenta um panorama militar
muito detalhado, principalmente as questões referentes às movimentações terrestres no teatro de
operações, tendo a logística naval como elemento auxiliar às ações terrestres.
Dividi o estudo em dois capítulos, no primeiro analisei como se procedeu a transmigração da
Instituição Marinha, seu estabelecimento no Rio de Janeiro; sua permanência por ocasião da
Independência do Brasil; e sua adequação à nova ordem política e social diante na nova realidade.
Enfocando os aspectos da Instituição como seu pessoal, material e saúde, além dos conflitos que
enfrentou ao longo do Primeiro Reinado, mesclado com o novo desafio de se adequar a nova ordem
mundial que surgiu com o advento da Revolução Industrial. A elaboração desse capítulo foi baseada
em renomados estudiosos e historiadores navais, os quais cito a seguir.
A primeira obra editada tratando da chegada da Família Real ligada à formação da Marinha
da qual tive registro em nossa pesquisa, data de 1881, é de autoria de Theotonio Meirelles da Silva,
Apontamentos para a História da Marinha de Guerra Brazileira. Essa obra, dividida em três
volumes, foi organizada por ordem do então Ministro e Secretário dos Negócios da Marinha,
Conselheiro Dr. José Rodrigues de Lima Duarte. Em suas páginas, o leitor tem a oportunidade de
estudar os Decretos e Alvarás que criaram os diversos elementos da estrutura organizacional da
Marinha Portuguesa, tanto nos anos anteriores a 1808 quanto nos primeiros anos que se seguiram à
chegada no Rio de Janeiro da Família Real. A importância dos Apontamentos de Theotonio
Meirelles pode ser conferida nas demais obras publicadas onde é sempre citada como referência.
Porém, em todos esses estudos seus autores (Lucas Alexandre Boiteux, Prado Maia, e Dídio Iratim
Costa) se dedicaram em analisar basicamente como se procedeu a organização da viagem marítima
da comitiva real e a formação da primeira esquadra brasileira por ocasião da Independência do
Brasil, não se atendo especificamente na análise da herança deixada por meio da transmigração da
instituição Marinha, como por exemplo: por ocasião do centenário da vinda da Família Real a
Revista Marítima Brasileira (RMB), publicou ao longo do ano de 1908, artigos de autoria de Lucas
Alexandre Boiteux, sob o título Marinho de Guerra do Brasil, abrangendo a criação da Marinha
portuguesa, sua transferência para o Brasil, e sua atuação até a Independência. Mais recentemente,
em 2001, Helio Leoncio Martins publicou artigo com o título Influência portuguesa na formação
da Marinha Imperial. Por razão do bicentenário da vinda da família Real, a RMB publicou
diversos artigos sobre o tema, dos quais destaco o de autoria de Armando de Senna Bittencourt Da
Marinha de Portugal forma-se uma Marinha para o Brasil, 1807 a 1823.
Ainda em 1940, em comemoração aos centenários de Portugal (1130-1640), sob organização
de Dídio Iratim Costa, foi publicado Os portugueses na Marinha de Guerra do Brasil, relato,
enfocando de forma narrativa e direta os primeiros momentos da corte no Rio de Janeiro, e as
consequentes melhorias promovidas no âmbito naval. Traz em sua parte final, resumo biográfico
dos oficiais portugueses que aderiram a causa do Império brasileiro, demonstrando a influência lusa
na estruturação da Instituição. Outro periódico que se dedicou a publicar em seus meros,
trabalhos relativos ao tema, foi a Revista Navigator: subsídios para a História marítima do Brasil.
Nas edições da década de setenta e oitenta, é possível consultar artigos de historiadores navais
consagrados, como Max Justo Guedes, Brian Vale e João Carlos Gonçalves Caminha.
Culminando o estudo da formação da Marinha temos a coleção História Naval Brasileira.
Em dois de seus Tomos esta relatada a transmigração da Família Real no qual figuram como
colaboradores: Antonio Marques Esparteiro, Pedro Calmon e Antonio Luiz Porto e Albuquerque; e
a formação da Marinha de autoria do Prof. Brian Vale. Referente a estrutura da Instituição
apoiaremos em Herick Marques Caminha, História Administrativa da Marinha no Império, onde
apresenta o panorama administrativo da Marinha Imperial. Todas essas obras se coadunam com a
ideia de que Portugal teve forte influência na Instituição Marinha no seu aspecto organizacional.
O segundo capítulo trata da forma pela qual a Instituição Marinha reagiu e se comportou ao
ter que enfrentar um conflito armado longe de suas bases, em território inóspito e desconhecido,
onde, devido o advento do vapor, necessitou de constante abastecimento para seus navios a fim de
garantir a mobilidade dos mesmos, enfocando também a dificuldade da alimentação e da saúde e do
fornecimento de gêneros. Esse capítulo foi elaborado a partir do testemunho de partícipes desse
conflito, registrados nas memórias referentes as suas vivências : Marinha de Outrora
17
de autoria do
17
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, Visconde de A Marinha d’Outrora - subsídios para a história. 3
a
Visconde de Ouro Preto, então Ministro da Marinha do Gabinete de 3 de agosto de 1866, onde
relata como se procedeu a mobilização e estruturação da Força Naval na guerra da Tríplice Aliança;
Memórias do Almirante Barão de Teffé na Batalha Naval do Riachuelo
18
de Antonio Luiz von
Hoonholtz, Barão de Teffé, traz detalhado relato da Batalha Naval do Riachuelo contada à família
em carta íntima poucos dias depois do 11 de junho, precioso trabalho visto ter sido ele participante e
testemunha ocular como comandante da Canhoneira Araguari; O Barão do amazonas e o combate
naval do Riachuelo
19
de Francisco Manuel Barroso da Silva além de conter detalhes da Batalha
Naval do Riachuelo, traça considerações do estado das forças navais sob seu comando no período
inicial da guerra; André Rebouças
20
, no seu Diário: a guerra do Paraguai também registra
interessante aspectos do apoio logístico existente na altura de Corrientes; as Memórias das
Campanhas contra o Estado Oriental do Uruguai e a República do Paraguai durante o Comando
do Almirante Visconde de Tamandaré
21
de autoria de Euzébio Jo Antunes é um testemunho vivo
de como se processou a composição do apoio logístico; somados a essas memórias temos ainda
Reminiscência da Guerra do Paraguai
22
de autoria Artur Silveira da Mota, Barão de Jaceguai, que
apesar de conter muitas críticas a atuação do Almirante Tamandaré ressalta a característica ímpar de
bom administrador, que prioriza a boa utilização do erário público, aliando assim a eficácia com a
eficiência das operações; e Diário da campanha naval do Paraguai: 1866
23
de Manoel Carneiro da
Rocha, que o registro da movimentação de navios e notícias do arsenal construído na Ilha de
Cerrito. Na área da saúde nos apoiamos na História médico-cirúrgica da esquadra brasileira nas
campanhas do Uruguai, e Paraguai de 1864 a 1869
24
, de autoria do Dr. Carlos Frederico dos Santos
Xavier Azevedo
25
, onde relata o preparo e apoio da área médica, suas dificuldades e desafios, em
ed. Revisada e atualizada. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha, 1981. 326p. Importante registro
histórico da atuação da Marinha no conflito,cuja primeira edição ocorreu em 1894.
18
TEFFÉ, Antonio Luiz von Hoonholtz. Memórias do Almirante Barão de Teffé na Batalha Naval do Riachuelo. Rio de
Janeiro: Garnier Irmãos,1865. 168p.
19
AMAZONAS, Francisco Manuel Barroso da Silva. O Barão do Amazonas e o combate naval do Riachuelo. Rio de
Janeiro: Tipografia Imp. e Const. de J. Villeneuve, 1878. 41p
20
REBOUÇAS, André. Diário: a guerra do Paraguai (1866). São Paulo: Instituto de estudos Brasileiros USP, 1973.
173p.
21
ANTUNES, Euzébio José. Memórias das Campanhas contra o Estado Oriental do Uruguai e a República do
Paraguai durante o Comando do Almirante Visconde de Tamandaré. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da
Marinha, 2007. 162p.
22
JACEGUAI, Artur Silveira da Mota, Barão de, Reminiscência da Guerra do Paraguai. 2 ed. Revisada e atualizada
Rio de Janeiro: Serviço de Documentação Geral da marinha, 1982. 196p.
23
ROCHA, Manoel Carneiro da. Diário da campanha naval do Paraguai: 1866. Rio de Janeiro: Serviço de
Documentação da Marinha, 1990. 351p
24
AZEVEDO, Carlos Frederico dos Santos Xavier História médico-cirúrgica da esquadra brasileira nas campanhas
do Uruguai, e Paraguai de 1864 a 1869. Typografia Nacional: Rio de Janeiro. 1870.
25
A história da Medicina Operativa na Marinha do Brasil tem início na época do Império, e está registrada pelo livro do
Dr. Carlos Frederico dos Santos Xavier, Cirurgião-Mór da Armada Nacional e Imperial, Dignatário da Imperial Ordem
da Rosa, Oficial do Cruzeiro, Cavaleiro da Ordem de s. Bento de Aviz, condecorado com as medalhas de Campanhas do
Uruguai em 1851, 1852 e 1864, e com a da rendição de Uruguaiana em 1865, Chefe de Saúde da Esquadra na Guerra
da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai.
período de grandes mudanças e inovaçõesconsequência da Revolução Industrial, apresenta ainda,
com uma visão atual da nova história, quando afirma da possibilidade de caminho distintos para o
desenvolvimento de análise de um fato histórico onde o pesquisador possa explora-lo levando em
consideração outros aspectos, que não o da operação de guerra em si
26
. Para analisar como foi
aplicado a logística no transcorrer da guerra baseamos no relatado no Diário pessoal do Almirante
Visconde de Inhaúma durante a guerra da tríplice aliança:(dezembro de 1866 a janeiro de 1869)
27
de autoria de Ignácio Joaquim José, Visconde de Inhaúma.; e os diários do exército em operações
do Marquez de Caxias. Em contrapartida, o posicionamento paraguaio sobre o conflito é extraído do
depoimento de George Thompson A guerra do Paraguai
28
,engenheiro civil, comissionado em
tenente-coronel e encarregado do serviço de engenharia de Lopez, a cujo Estado-Maior pertenceu, o
seu depoimento contido na obra tem sua importância por ter o autor vivido a guerra, assim como os
demais, mas com a visão do lado oponente. Somados a essas fontes primárias utilizei a
documentação oficial e pessoal existente no acervo do Arquivo Tamandaré
29
; e os Relatórios dos
Ministros da Marinha em especial de 1864 a 1866, que constituem registro de época e que balizam
este estudo como se pode verificar no trecho transcrito do Relatório de 1865:
“Tudo está calculado e previsto. O bravo vice-almirante,
commandante em chefe da esquadra, justifica-se plenamente das
sôfregas e irrefletidas censuras, que se fazia à sua pretendida demora
longe do teatro da guerra, provando pelos factos, que, na deficiência
dos elementos que organizou inteligentemente, sem o poderoso auxilio
dos encouraçados, serião menos efficazes, na execução e resultados,
os planos concebidos e deliberados contra o inimigo...”
30
26
“A guerra em todos os tempos preocupou o espírito do escritor sob o ponto de vista administrativo, político, militar e
médico. Ao encetar-se a campanha do Uruguai, e Paraguai, tivemos sempre em vista apresentar ao Governo do nosso
país um trabalho mais extenso, e minucioso, do que o exigido pelos regulamentos aos Chefes de Saúde das esquadras
em operação de guerra. Estudos importantes reclamavam a confecção desse trabalho, que consistia na apreciação
médica e cirúrgica dos fatos mais importantes da campanha, onde a corporação médica tanto se distinguiu. Clima,
elementos de guerra, moléstias próprias do país, estudos reclamados pela cirurgia, ofereciam vasto campo às nossas
observações. Tudo era novo, a cirurgia reclamava atenções especiais, a criação de Hospitais de sangue despertava o
cuidado daquele, sobre quem pesava a árdua missão da direção do serviço médico em campanha” Op. Cit nota 18.
27
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, Visconde de Diário pessoal do Almirante Visconde de Inhaúma durante a guerra
da tríplice aliança:(dezembro de 1866 a janeiro de 1869). Rio de Janeiro: G. De Andrea Frota, 2008. 394p;
28
THOMPSON, George Guerra do Paraguai. Coleção de temas brasileiros. Vol. 8. Rio de Janeiro: Conquista. 1968.
29
O Arquivo Tamandaré, composto de dezessete volumes de dimensões diversas, que totalizam cerca de 1.500
documentos primários referente a vida operativa de Joaquim Marques Lisboa.
30
Relatório do Ministro da Marinha, 1865. p 13.
Se concordarem com Toynbee
31
de que “história não é uma situação, história é uma viagem”,
convido então que participem dessa viagem ao momento histórico do preparo logístico da Marinha
Imperial na Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai.
31
TOYNBEE, Arnold . A Study of history. Londres: Oxford University Press, 1972.
Capítulo I
Transmigração da Instituição Marinha
“O Brasil é um prolongamento sendo também a
coroação - da admirável aventura marítima dos portugueses. Foi o que as
armadas permitiram que fosse: essa imensa linha da costa, que
corresponde à hipotenusa na triangulação continental; base e condição da
conquista subsequente da terra. Condição de unidade: base de
ocupação”.Pedro Calmon
32
.
A transmigração da Família Real portuguesa para sua colônia brasileira, possibilitou a união
das diversas províncias em um sentimento comum, fortificando a identidade de costumes, da língua
e da religião, promovendo assim, nos alicerces das instituições portuguesas, a estruturação nacional
brasileira. Esse movimento foi o ponto de partida para o processo de independência no qual se
apoiou e manteve as estruturas vindas juntamente com a família Real portuguesa, no caso desse
estudo foi a instituição Marinha.
Conforme indica Maria Fernanda:
“...tanto a transferência da Corte portuguesa quanto o processo de
independência de 1822, este acompanhado pela opção ao
constitucionalismo, que refletia as aspirações liberais expressas na
Carta de 1824, representaram marcos irrefutáveis no que se refere à
história política brasileira, no sentido de que, naquele momento,
iniciava-se a construção formal das instituições que integraram a
monarquia brasileira, a qual, entre avanços e recuos, seguiria o
padrão europeu do Estado-nação...
“Nesse sentido, observa-se que as raízes do modelo brasileiro
não podem ser buscadas apenas no processo que conduziu à
Independência em 1822, nos turbulentos anos das regências, ou no
movimento regressista que levou a declaração da maioridade do
imperador Pedro II em 1840. Suas origens devem ser investigadas no
longo processo de constituição e desenvolvimento das elites
brasileiras ainda no período colonial e nas práticas políticas e
administrativas do Antigo regime e sua influência na Colônia, em
suas relações com o modelo da monarquia absolutista europeia e,
mais tarde, nos embates com o ideário iluminista/liberal de fins do
32
CALMON, Pedro História Naval Brasileira – Introdução - Primeiro volume Tomo I – 1975.
século XVIII”.
33
Pretendo, portanto, nesse primeiro momento apresentar os aspectos importantes que
representou para a formação da Marinha do Brasil, a transmigração da Família Real. Citando as
palavras de João Carlos Gonçalves Caminha:
“Mais do que uma evacuação de forças e elementos do
território europeu para o Continente Americano, a vinda da família
real representou uma transferência de instituição. O transplante do
poder lusitano para o Rio de Janeiro teve consequências cuja
importância nunca deixou de ser salientada e compreendida.
Destaque-se entre elas, a fixação em solo brasileiro do embrião de
onde se originaria, cada e meia após, a Marinha Imperial
brasileira”.
34
Mas onde tudo começou?
35
Poderíamos dizer que com a preocupação moderna de prever
para prover, D. Dinís
36
, fundou, na Leiria, uma povoação de nome Paredes, destinada à construção
de barcos à pesca, obrigada a manter no mar pelo menos seis caravelas aprestadas, às suas custas,
sendo que os pinheirais garantiriam matéria-prima para a construção naval. em 1336 e 1337,
verifica-se a atuação da esquadra portuguesa nas hostilidades existentes entre Portugal e Espanha.
Com a crescente especialização da marinha e o abandono progressivo dos navios a remos no
Atlântico, à Coroa tornou-se necessário orientar e estimular uma força capaz de lhe assegurar
mobilidade diante de adversário poderoso. É por esse motivo que, em 1377, a 6 de junho, o rei D.
Fernando de Portugal
37
concedeu extensa carta de privilégios, rara na época, àqueles que, sendo
33
MARTINS, Maria Fernanda Vieira. A velha arte de governar: um estudo sobre política e elites a partir do Conselho
de Estado (1842-1889). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2007. P-44.
34
CAMINHA, João Carlos Gonçalves Formação da Marinha Imperial. in. Navigator: Subsídios para a História
Marítima do Brasil, n
o
10, Dezembro, 1974. p 7.
35
SCARVADA, Levy A História do Corpo de Suboficiais da Armada. in. Subsídios para a História Marítima do Brasil:
desde a fundação da nacionalidade lusitana, no século XII, assinala-se a existência de movimentos navais em Portugal,
sendo naquele século que se ensaiara a organização da sua Marinha, com a contratação de um armador genovês,
Emanuel Pessangña, contratado com o título de almirante, tinha por obrigação formar uma esquadra de galés, para a
qual deveria ter sempre prontos vinte alcaides (capitães combatentes) e arraies (patrões de galés, os pilotos, os que
atendiam ao governo e manobra desse tipo de navio, cuja propulsão à época era a remo).
36
No reinado de D. Dinís (1279-1325) podemos destacar os seguintes esforços para o fomento da navegação: a criação
de um centro de cultura, os “Estudos Gerais”, encarregado de ensinar matemática, geografia, cosmografia, astronomia,
que contribuiu para formação de navegadores e viajantes; a instituição dos seguros marítimos; a criação e nomeação do
primeiro almirante português, Nuno Fernandes Cogominho. Alguns historiadores acreditam que foi no governo de D.
Diniz que se firmou o primeiro tratado comercial entre Inglaterra e Portugal. Através de cartas endereçadas à Inglaterra,
o rei português conseguiu estabelecer alianças de mútuo apoio entre os dois governos. Ver MORAIS, Tancredo Octávio
Faria de. História da Marinha Portuguesa. Lisboa: Clube Militar Naval, 1940, p. 75 e 80-81.
37
O rei D. Fernando I (1367-1383) foi responsável por nacionalizar a navegação marítima ao conceder benefícios e
isenção de impostos aos que se habilitassem a construir ou comprar navios; criou uma bolsa marítima visando a
seus súditos, construíssem e mantivessem naus, possibilitando seu emprego em campanhas
militares.
Desta forma a Marinha passou a ser elemento-chave na defesa do reino. Contudo, ter uma
esquadra não era suficiente: era preciso comandá-la, aprovisiona-la e, enfim, torná-la permanente e
com uma maior organização. Em 1384-5, diante da crise nacional acarretada pelos choques com a
Espanha e o fim da dinastia de Borgonha
38
, assistiu-se ao desenvolvimento da Marinha portuguesa
como expressão de um estado nacional em expansão, apoiada e prestigiada.
D. João I
39
, ciente de que a expansão terrestre estava vedada a Portugal, buscou o oceano e o
comércio marítimo. Dentre os reis portugueses, os que mais prestigiaram a sua Marinha, no tocante
a evolução técnica, foram D. Diniz, que assegurou pessoal qualificado e matéria-prima e D.
Fernando, encorajando ao máximo a navegação pela ação incentivadora e orientadora do Estado.
O aparecimento de várias instituições navais foi fruto natural da emergência do estado
nacional Português, que identificou a Marinha como um instrumento de preservação e expansão dos
interesses nacionais. no governo de D. Maria I
40
elevou o valor das forças navais a um nível
nunca atingido, desde os finais do século XVI, devido à zelosa diligência do Secretário de Estado
dos Negócios da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro; mantendo-se à frente dos
destinos da Armada durante mais de 25 anos (1770-1795)
41
, procedeu a uma completa renovação da
esquadra e à modernização da organização e das infra-estruturas de apoio. As razões que motivaram
o desenvolvimento da Armada seriam a ameaça de guerra com a França; a proteção do comércio,
principalmente com o Brasil; a proteção das costas metropolitanas contra a crescente ousadia dos
corsários berberes e franceses; e a proteção dos territórios portugueses no Oriente.
Dentre as transformações institucionais implementadas citamos a substituição do cargo de
Provedor dos Armazéns da Guiné e Índia pelo de Intendente dos Armazéns, terminando desta feita,
arrecadação de capital entre todos os armadores de Lisboa e do Porto a fim de indenizar os navegantes que sofressem
algum acidente no mar ou tivessem prejuízos durante suas viagens; atribuiu-se também a D. Fernando a criação do
cargo de “capitão-mor do mar”. Ver MORAIS, Tancredo Octávio Faria de. História da Marinha Portuguesa. Lisboa:
Clube Militar Naval, 1940, p. 77 e 83 e SARAIVA, José Hermano. História concisa de Portugal. Lisboa: Publicações
Europa-América, 1980, p. 115.
38
Foi a primeira dinastia a reinar Portugal iniciada com D. Afonso I (1139-1185), cujo último rei foi D. Fernando (1367-
1383).
39
D. João I foi o primeiro rei da dinastia de Avis no trono português. Durante seu reinado (1385-1433) deu inicio o
processo de expansão marítima de Portugal. Ver AMEAL, João. Breve Resumo da História de Portugal. Lisboa: 196?,
p. 36.
40
Rainha de Portugal da dinastia de Bragança (1777-1816).
41
Martinho de Melo e Castro (1716-1795) Durante o período que esteve à frente da Secretaria de Estado e Negócios
da Marinha e Ultramar, organizou o quadro de oficiais, melhorou os estudos do respectivo curso, criou a Companhia de
Guardas-Marinha, reorganizou o Arsenal, desenvolveu a Cordoaria Nacional, enfim fez tudo o necessário para que a
Marinha de Guerra portuguesa readquirisse o lugar honroso que suas tradições e a extensão dos seus domínios
ultramarinos exigiam. Só do arsenal de Lisboa, de 1788 a 1795, foram lançados à água dezoito navios, e seis das antigas
naus foram reparadas e algumas quase reconstruídas de 1792 a 1799. Faleceu aos 79 anos a 24 de Março de 1795, sendo
substituído (Decreto de 7 de Setembro de 1796) por D. Rodrigo de Sousa Coutinho.
a transmissão hereditária daquele cargo; para dirigir a administração e contabilidade, foi criada a
Contadoria dos Armazéns da Guiné e Índia que mais tarde (Alvará de 3 de Junho de 1793) passou a
designar-se por Arsenal de Marinha
42
; a instituição do Conselho do Almirantado com a função de
presidir a direção superior dos assuntos da Marinha e da administração naval (Decreto de 25 de
Abril de 1795), sendo constituído por um presidente e quatro vogais, escolhidos entre os mais
graduados oficiais da Armada; o quadro de oficiais foi definido e constituído por 4 chefes de
esquadra (hoje vice-almirantes), 8 chefes de divisão (hoje contra-almirantes), 30 capitães-de-mar-e-
guerra, 30 capitães-de-fragata, 70 capitães-tenentes, 140 primeiros tenentes e 140 segundos
tenentes, e fixaram-se os respectivos vencimentos; foi criada a Real Junta da Fazenda da Marinha
como o organismo de gestão do que concernia à construção e recepção dos navios; e à Real Fábrica
de Cordoaria, competia garantir o abastecimento de amarras, cabos, massame, poleame e velame e
toda a palamenta necessária às marinhas de guerra e mercante. Fundou-se o Arsenal da Bahia, no
Brasil e foi reorganizado o Arsenal da Índia, em Goa, considerados importantes bases de apoio à
operacionalidade e equipamento dos navios. Em 1782, foi criada a Companhia Real dos Guardas-
Marinhas e a respectiva Academia Real dos Guardas-Marinhas, para a formação acadêmica e
prática dos futuros oficiais, tendo em vista melhorar a preparação daqueles oficiais para guarnecer
os novos navios.
Ordenou ainda Melo e Castro que se realizassem trabalhos hidrográficos para a obtenção de
cartas da costa de Portugal e planos das barras e portos. Para cooperar nesta missão foi criada
(1798) a Sociedade Real Marítima Militar e Geográfica para o Desenho, Gravura e Impressão das
Cartas Hidrográficas, Geográficas e Militares, com a incumbência do levantamento e publicação
das cartas hidrográficas e militares
43
. Na sequência das iniciativas de melhorias das infra-estruturas
de apoio à Armada Real, foi criado (Alvará de 27 de Setembro de 1797) o Real Hospital de
Marinha, destinado exclusivamente ao pessoal de Marinha.
Devido ao impulso empreendido, a Armada Portuguesa contava, no virar do século XIX,
com 65 navios de alto bordo além de outros de menor porte (14 naus, 23 fragatas, 3 corvetas, 17
brigues e 8 charruas). Isto significava, um efetivo em pessoal embarcado de cerca de 800 oficiais e
20.000 homens numa população de 3.100.000 habitantes
44
.
No início do século XIX, o pessoal pertencente à Marinha de Guerra de Portugal subdividia-
42
A construção do dique do Arsenal, que foi uma das primeiras docas secas da Europa, para reparar e carenar os navios
de guerra foi outra importante medida deste período e onde foram praticamente reconstruídos alguns navios de linha.
43
Sendo as cartas hidrográficas os documentos de maior importância para a navegação, sua produção tornou-se o
principal objetivo da Sociedade.
44
O Exército da época, com um efetivo oficial de 40.000 homens, não conseguia mobilizar mais de 25.000.
se nas seguintes categorias: oficiais de Marinha e oficiais de tropa de Marinha
45
; oficiais de
proa
46
;marinhagem
47
; pessoal da tropa
48
; pessoal dos arsenais; e os cirurgiões e capelães.
Desde cedo os dirigentes lusitanos
49
procuraram incentivar o desenvolvimento da indústria
naval nos portos de sua colônia, com a criação de arsenais em Salvador (1550), em Belém (1771), e
no Rio de Janeiro (1763), onde foram construídos navios de boa qualidade.
No Arsenal do Rio de Janeiro, situado na praia de São Bento, foi construído, por ordem do
Vice-Rei Conde da Cunha
50
, a nau São Sebastião (fig.:3), lançada ao mar em fevereiro de 1767.
Mas foi a partir de 1808, com a chegada da Corte portuguesa, que se observa positivas mudanças
nesse Arsenal, principalmente no que tange a capacidade de apoio a Esquadra. Registros informam
que se tornara tão ativo o Arsenal de Marinha (fig.:4) que ali se trabalhava aos Domingos e dias
santos.
45
Eles tinham carta-patente assinada pelo monarca, eram de maior status na corporação, e possuíam mais estudos
realizados em cursos regulares, eram oriundos da Companhia dos Guardas-Marinhas que, além dos estudos especiais,
eram de origem nobre ou filhos de Capitão-de-Mar-e-Guerra ou Coronel do Exército, se consideravam a ciência junta à
nobreza.
46
Intermediários entre os oficiais de patente, a marinhagem e a tropa de Marinha. Grupo de oficiais procedentes da
classe dos Voluntários da Academia Real de Marinha, os quais só obtinham esta qualificação sendo premiados após dois
anos na Academia, representavam a ciência da arma.
47
Conjunto dos marinheiros que executavam a bordo as fainas e tarefas marinheiras, divididos em duas especialidades, a
classe dos Sargentos-de-Mar-e-Guerra, e a classe de Pilotos, aprendiam a profissão no próprio serviço, sem nenhuma
formação escolar.
48
Destinados a executarem as tarefas de artilheiro, fuzileiro e artífice.
49
Isso devido a posição estratégica do Brasil em relação à rota da Índia e a abundância de madeira de boa qualidade fez
com que, a Coroa incentivasse a instalação de estaleiros, para atividade de reparo e de construção. As primeiras
embarcações de modelo europeu construídas no Brasil foram dois bergantins feitos no Rio de Janeiro em 1531, onde
também se construiu por volta de 1670 a Nau Padre Eterno, tida como o maior navio do seu tempo em todo mundo.
50
D. Antônio Alvarez da Cunha, o Conde da Cunha, tinha a missão de fortalecer militarmente a Colônia e,
principalmente, o Rio de Janeiro. Entre outras medidas, decidiu fundar um estaleiro. O local escolhido foi a praia, ao
sopé do Mosteiro de São Bento, cujos terrenos haviam sido doados ao governo em escritura. A data da fundação, 29 de
dezembro de 1763.
Fig.3
Nau São Sebastião.
Fig.:4
Arsenal de Marinha da Corte tomada do adro do Mosteiro de São Bento.
Mas o que motivou a transmigração da instituição?
Emergindo das dificuldades do período revolucionário (1789-1799), a França erguia-se
perante a Europa aristocrática com o “Grande Exército” chefiado por Napoleão Bonaparte. As
notáveis vitórias militares francesas subjugaram a maior parte do Velho Mundo e esse
expansionismo teve repercussões intensas na própria América, abrindo caminho para a emancipação
política das colônias Ibéricas.
As guerras napoleônicas (1804-1815) foram caracterizadas por dois aspectos: o primeiro na
luta de uma nação burguesa contra uma Europa aristocrática; e o segundo na luta entre França e
Inglaterra. Com a derrota da Marinha francesa na Batalha de Trafalgar (1805) para a inglesa, decide
Napoleão investir contra seus inimigos continentais (Áustria e Prússia) e, ao tomar Berlim, iniciou
guerra econômica à Inglaterra, estabelecendo em 1806 um “bloqueio continental”.
51
Os demais
Estados europeus foram concitados a aderir ao bloqueio, dentre eles Portugal.
Portugal sempre manteve laços comerciais com a Inglaterra e a sua não-adesão ao bloqueio
52
foi determinante para a decisão de sua invasão por Exército francês. Ao saber da aproximação do
exército invasor de Napoleão, o Conselho de Estado com o Príncipe Regente D. João acordam na
retirada para o Brasil, em novembro de 1807.
1-1 A estruturação da instituição Marinha no Rio de Janeiro -
Instalada a Corte, em março de 1808, necessário era que de pronto se organizasse a
administração pública e se instalassem também as diversas repartições. No tocante a Marinha, o
primeiro decreto expedido data de 11 de março de 1808, onde é confirmado no cargo de Ministro e
Secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos D. João Rodrigues de Sá e
Menezes, então Visconde de Anadia, sendo instalada a respectiva Secretaria de Estado, nos moldes
ao estipulado pelo Alvará de 1736, que tinha organizado em Portugal uma Secretaria de Estado e
Negócios de Marinha.
Na sequência foi criado o Quartel General da Armada, no qual seu titular tinha por missão
dividir as responsabilidades administrativas com o Ministro da Marinha, tratava-se de similar criado
em Lisboa em 1807, pela necessidade de haver uma autoridade em que o Ministro da Marinha
delegasse parte de seus poderes, como Presidente que lhe competia ser do Conselho do
Almirantado, criado em 25 de abril de 1795. O lugar de Major General da Armada deveria ser
51
O Decreto de Berlim, assinado em 1806, estabelecia o bloqueio continental. Tratava-se de medidas protecionistas,
pelas quais países europeus associados à França deviam abster-se de importar mercadorias inglesas.
52
Pela Convenção Secreta de Londres, de 1807, entre a Inglaterra e Portugal, decidiu-se, dentre outras providências, a
mudança da sede da monarquia portuguesa para o Brasil e a assinatura de novo tratado de comércio quando da sua
chegada.
sempre ocupado por um oficial de patente não inferior a Chefe de Esquadra, e a secretaria da
repartição do dito Major General denominar-se-ia Quartel General da Marinha. Segundo a leitura da
legislação vigente, verifica-se que a atribuição do titular do Quartel General da Armada abrangia a
organização, regulamento e funcionamento da saúde, do Arsenal, dos navios, da Intendência, do
pessoal
53
e até da Academia de Marinha.
A ele se seguiu a instalação do Conselho Supremo Militar, da Contadoria de Marinha e da
Intendência da Marinha. Criou-se ainda um hospital, núcleo base do que veio a ser o Hospital
Central da Marinha, e fundou-se o Arquivo Militar.
Com a corte, embarcada na Nau Conde D. Henrique, veio a Academia Real dos Guardas-
Marinha, com todo o seu pessoal, professores e alunos, acessórios de ensino e uma considerável
biblioteca. Aqui chegando, foi instalada em dependência do Mosteiro de São Bento, reiniciando os
trabalhos acadêmicos em fevereiro de 1809.
54
Outro componente básico que acompanhou a Família Real ao Brasil, foi a Brigada Real da
Marinha, uma organização militar que começou a demonstrar sua razão de ser no passar dos séculos
XVII e XVIII nas marinhas europeias, visando o aumento da potencialidade do navio de guerra. O
seu desembarque no Rio de Janeiro é considerado o marco zero da história dos Fuzileiros Navais,
sendo a Brigada Real sua célula-mater. Da metrópole veio também, um crescido número de
operários de machado, ferreiros de forja e lima, latoeiros, fundidores e cordeiros.
O desenvolvimento que a Marinha portuguesa teve durante a permanência da Família Real
no Rio de Janeiro, não foi relevante, sobretudo neste centro naval em que sob as imediatas vistas
da coroa funcionou a administração naval, como também contribuiu para vincular por estreitos
laços grande parte do pessoal naval à terra que os recebera com gentil hospitalidade.
Assim, quando da Proclamação da Independência permaneceram intactas as instalações
navais estabelecidas no Rio de Janeiro desde 1808, ou seja, o próprio Ministério da Marinha, a
Intendência, Contadoria e Auditoria, o Conselho Supremo Militar, o Hospital da Marinha, a
Academia de Marinha, o Arsenal e seus estaleiros
55
.
A frota portuguesa que deixou Portugal em 29 de novembro de 1807 era composta de 23
navios de guerra e 31 navios mercantes. Esses navios de guerra eram 8 naus navios de linha,
53
Na Coleção de Legislação encontramos registro de ordens referente as tarefas dos Ajudantes do Intendente da Marinha
em relação aos trabalhos desenvolvidos nos Arsenais, no tocante ao ancoradouro, conservação dos cascos e mastreação,
limpeza dos navios, guarda em paiol apropriado do material como poleame e cabos, inspeções regulares do material,
revista de pessoal, dos navios no tocante a arrumação e limpeza, Escala de Serviço: seis em seis horas, grupo de
vigilância ao redor das embarcações feita pelo pessoal de serviço; além da regulamentação das ações do Intendente da
Marinha, e da autorização de matrícula na Academia de Marinha .
54
A Escola Naval do Brasil tem sua origem direta na Academia Real dos Guardas-Marinha.
55
VALE, Brian. Estratégia, Poder Marítimo e a criação da Marinha do Brasil-1822-23. in. Navigator: Subsídios para a
História Marítima do Brasil. N
o
4. Dezembro, 1971. p.8 .
fortemente armados, com 64 a 79 peças de artilharia; 4 fragatas – com 40 a 48 peças; 5 brigues – de
dois mastros, armados com 18 a 24 peças; e navios menores: 3 escunas e 3 charruas. Ao proclamar-
se o Império, os navios de guerra portugueses, ainda surtos no porto do Rio de Janeiro, compuseram
a primeira esquadra brasileira. Foram eles os seguintes: naus Martim de Freitas, Vasco da Gama e
Príncipe Real; fragatas Sucesso, União e Real Carolina; corvetas Maria da Glória e Liberal; brigue
Reino Unido e mais alguns pequenos navios sem valor como navios de guerra. Posteriormente, à
medida que a independência ia sendo firmada nas províncias, o brigue Infante D. Miguel, no
Maranhão, a fragata Imperatriz, no Pará, e a fragata Thetis na Cisplatina, arvoraram também a
bandeira brasileira.
Os nomes de alguns destes navios foram mudados: a nau Martim de Freitas recebeu a
denominação de Pedro I, tornou-se a capitânia da esquadra e, foi a seu bordo içada pela primeira
vez em um navio da jovem nação, a Bandeira Imperial, a 10 de outubro de 1822; a fragata Sucesso
passou a ser denominada de Niterói; a Real Carolina de Carolina, a União foi nomeada de
Ipiranga, e o brigue Reino Unido passou a ser chamado de Guarani. Portanto, o primeiro navio que
se denominou navio de guerra brasileiro nada mais era do que um navio de guerra português, com a
Bandeira Imperial auriverde içada no penol da carangueja: a sua oficialidade, a sua guarnição, os
usos e costumes de bordo, tudo tinha vindo de Portugal, tudo era português. O mesmo ocorreu com
todos os estabelecimentos, repartições, leis, regulamentos e ordens que vigoraram na repartição da
Marinha nos primeiros anos do Império: tudo veio da autoridade portuguesa e depois foi sendo
alterado para atender as novas necessidades.
- 1.2 - Os Portugueses na Marinha do Brasil
56
:
Quando soou o grito de liberdade nesta parte da América, poucos foram os oficiais da
Marinha portuguesa que de estação no Brasil preferiram regressar a Portugal; para muitos deles
de longo tempo era o Brasil uma pátria. Calorosamente aderiram à nova nacionalidade grande
número de oficiais, de guardas-marinha e de aspirantes; o pessoal artístico do Arsenal do Rio de
Janeiro e bem assim os das repartições navais continuaram nos seus encargos; as tropas de Marinha
– batalhão de artilharia – bem como as guarnições dos navios surtos nos portos passaram ao serviço
do novo Império. Somente a esquadra que estacionava na Bahia permaneceu fiel à sua bandeira, e
bem assim a guarnição de uma escuna que fazia parte da esquadrilha estacionada em Montevidéu.
O número dos oficiais de mar que espontaneamente passaram ao serviço do Império montou
56
Os oficiais estrangeiros, contratados por ocasião da Independência, não se preocuparam em preparar a organização
técnica e administrativa da Marinha, sendo sua missão comandar e tripular navios e com eles atacar os portugueses que
se opunham ao ideal de emancipação, expulsando-os da terra e dos mares que pertenciam ao novo Império, por isso que
seu estudo não será contemplado na presente análise.
98, dos quais dois Vice-Almirantes, dois Chefes de Esquadra, um Chefe de Divisão, 10 Capitães-de-
Mar-e-Guerra, 21 Capitães-de-Fragata, 18 Capitães-Tenentes, 15 Primeiros-Tenentes, e 29
Segundos-Tenentes. O número que se retiraram para Portugal foi de apenas 23 não entrando nesta
contagem os da esquadra da Bahia. Nos Apontamentos para História da Marinha de Guerra
Brasileira por Teotônio Meireles, vêm-se reproduzidas algumas cartas de adesão, das quais extrai,
como exemplo, pequeno trecho referente a adesão do Capitão-Tenente Fernando José de Mello, por
considerar que bem retratou o ambiente da época:
“Vim para o Brasil em 1800: no Brasil fui promovido a
Segundo-Tenente, a Primeiro-Tenente e a Capitão-Tenente; no Brasil
casei-me com uma senhora brasileira, de cujo matrimônio tenho
filhos. Consentindo o serviço, não fosse eu nomeado para a esquadra
que conduziu a Sua Majestade Fidelíssima a Portugal, nem para
outro navio que se destinasse aquele Reino: assim aconteceu; não
são com tudo estes os motivos mais fortes, que me decidiram sem
hesitar a aderir a tão justa causa do Brasil”.
“É a razão, que despida de prejuízos se convenceu desde
tempo imemorial que a causa do Brasil era a mais justa...”
Como exemplo dos portugueses
57
que aderiram a causa podemos citar alguns nomes dentro
os quais cinco que ocuparam a pasta da Marinha, como Manuel Antonio Farinha (Conde de Souzel),
Secretário de Estado dos Negócios da Marinha em 1821-2; Diogo Jorge de Brito, por ocasião da
independência comandou a fragata Real Carolina, promovido a Chefe de Divisão, em 1823,
assumiu, entre outros o comando da Companhia dos Guardas-Marinhas, e da Nau Pedro I, exerceu
o cargo de Ministro de Estado e Negócios da Marinha, de 20/11/1827 a 15/06/1828; Miguel de
Sousa Melo e Alvim Ministro de Estado dos Negócios da Marinha de 1828 a 1829, presidente da
Província de Santa Catarina entre 1829 e 1831, e da Província de São Paulo em 1841; Jacinto
Roque de Sena Pereira era Capitão-Tenente por ocasião da Independência, foi Ministro de
Secretário de Estado dos Negócios da Marinha em 1839 a 1840; e Joaquim José Ignácio, o
Visconde de Inhaúma, partícipe de diversos eventos relacionados à história naval brasileira, exerceu
importantes comandos e comissões do qual destaco a de Ministro e Secretário de Estado dos
Negócios da Marinha, em 1861-2, e comandante da Esquadra em Operações de Guerra contra o
governo do Paraguai.
Outros exemplos de oficiais também de origem lusitana que ocuparam cargos de relevância
57
O juramento da Constituição outorgada pelo Imperador foi prestado por parte dos oficiais na Capela do Arsenal,
segundo Juvenal Greenhalgh, em 5 de abril de 1824, e o do pessoal do Arsenal no dia 7.
dentro da estrutura naval são: Eliziário Antônio dos Santos (Barão de Angra), ao longo de sua
carreira, serviu em diversos navios da esquadra, tendo desempenhado importantes comissões como
a do comando da Fragata Amazonas, (primeiro navio de grande porte a vapor utilizado pela
Marinha). Por ocasião da Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai, comandou a
Segunda Divisão da Esquadra em operações de guerra no rio Paraguai, tendo participado dos
combates contra as fortalezas de Curuzú e Curupaiti, assumiu em1869 o comando em Chefe da
Esquadra em Operações de Guerra no Paraguai, foi ainda Encarregado do Quartel General da
Marinha; Francisco Manoel Barroso da Silva (Barão do Amazonas), bravo comandante da divisão
naval que derrotou a esquadra paraguaia no Rio Paraná, próxima a embocadura do Riachuelo, em
11 de junho de 1865, se distinguiu nas várias comissões que exerceu; Frederico Mariath, como
Capitão-de-Fragata comandou as forças navais estacionadas no porto da Colônia do Sacramento
(1827-8), por ocasião da revolta da Cabanagem, comandou no período de 1836-7 a Divisão Naval
estacionada no Pará; João Maria Wandenkolk (Barão de Araguarí), a família Wandenkolk teve mais
dois membros na Marinha, José Eduardo Wandenkolk, e já na República, Eduardo Wandenkolk, que
foi Ministro da Marinha; José dos Santos Primeiro, era Primeiro-Tenente, construtor naval, em
1822, aderiu à causa do Brasil e assim respondeu a consulta que lhe foi dirigida pelo Quartel
General da Marinha, em 31 de dezembro de 1822:
“Todos sabem que fui empregado por Decreto do Nosso Bom
Rei o senhor D. João VI, pouco antes de sua retirada para Lisboa, e,
portanto é ainda muito de perto que existe a lembrança com que
carinhosamente amava seus fiéis Vassalos, causa bem capaz de
enfatuar qualquer homem de bem e religioso, que sempre se funda na
obediência e gratidão; princípios que sempre governaram a melhor,
ainda que menor parte do Mundo; por isso afirmo com bastante
razão que quem ama o Régio Pai ama o Régio Filho”:
“Eis a carreira que me levará às barreiras da morte,
confessando fidelidade ao Muito Poderoso D. Pedro I, Imperador do
Brasil, continente que prometo fazer prosperar pela minha arte, uma
vez que me seja propício o auxílio”.
Não poderia deixar de citar Luis da Cunha Moreira, apesar de brasileiro nato, era filho de
oficial português que acompanhou a transmigração da Família Real para o Brasil. Cunha Moreira
ingressou na Marinha portuguesa, lutou nas guerras napoleônicas e, em 1809, participou da
ocupação de Caiena, evento que caracterizou a represália portuguesa a invasão francesa em
Portugal. Em 1822, devido a sua nacionalidade e competência profissional foi nomeado Ministro
Secretário de Estado dos Negócios da Marinha, e a ele coube a manutenção e aprimoramento da
estrutura naval no primeiro momento do novo Império.
No tocante ao pessoal subalterno, não foi encontrado registro escrito de adesão,
provavelmente devido a forma como se processava a sua incorporação no serviço ativo e a sua
origem. Até a criação das Companhias Fixas de Marinheiros, em 1836, as guarnições dos navios
eram constituídas por marinheiros engajados voluntariamente ou contratados (em geral estrangeiros
contratados por ocasião da Independência); marinheiros recrutados à força, entre tripulantes das
embarcações mercantes
58
ou entre vagabundos, criminosos, etc. Também operários para os arsenais
de Marinha eram recrutados por esse processo; entre o grande número de presos recrutados pelas
patrulhas policiais, o chefe de polícia selecionava aqueles cujas profissões eram as requeridas e os
enviava ao Inspetor do Arsenal.
Outras vezes, a minguá de pessoal na ativa, recorria o governo a marujos estrangeiros
assalariados, o recrutamento forçado como é natural, foi sempre encarado com particular
antipatia e forte repulsão por toda parte; pois além dos inconvenientes dos processos violentos,
brutais, acarretava o prejuízo para a marinha mercante que não tinha onde buscar pessoal apto a seu
serviço.
Segundo Boiteux
59
, na estrutura da Marinha real portuguesa, antes de Pombal, a maruja Del-
Rei, pouco se diferenciava dos marinheiros mercantes quanto até ao armamento, pois lhes era
comuns nas viagens de longo curso, compartilhar dos riscos das crespas arrancadas contra corsários
e piratas, os celebres irmãos da casta e falsificadores. A figura, pois dos marujos dessa época algo
remota “a uma silhueta vaga impressiva, uma sorte de gravura grosseira cujos contornos são apenas
perceptíveis, distinguindo-se tão somente dos traços gerais da espécie”.
Mais tarde, continua Boiteux, então, já será possível “distinguir com maior precisão senão a
figura exata do marujo, pelo menos seus traços principais; o meio pode ser reconstituído e se os
traços peculiares a tal individuo nos escapam, os documentos oficiais permitem fixar os caracteres
da carreira, indicar os hábitos, as ocupações, o armamento, o equipamento, a soldada e a
alimentação do marinheiro e de encontrar, com surpresa, a bordo daqueles navios detalhes de
serviço, particularidades que de ano para ano vieram perpetuando-se ate os nossos dias”.
A organização militar portuguesa, no alvorecer do século XIX, baseava-se no “Regimento
Provisional da Armada”, 1736, e nos “Artigos de guerra”, com força de lei posto em execução a 18
de setembro de 1799 e que vieram substituir o “Regimento mandado observar pelos capitães de mar
58
O soldo (ordenado) pago nos navios mercantes era superior ao pago pela Marinha.
59
BOITEUX, Lucas Alexandre. O Marinheiro da Independência. in. Jornal do Commercio – Domingo, 31 de março de
1935.p 8.
e guerra em 24 de março de 1736”. Além desses, tinham aplicação a bordo o regulamento militar de
infantaria unicamente naquelas partes que ele possa ser aplicável, o regimento para o exercício da
disciplina dos regimentos de infantaria dos exércitos de sua majestade e o regulamento dos
cirurgiões. O que sabemos ainda não havia sido introduzido em Portugal e suas colônias a inscrição
ou arrolamento marítimos, compreendidos neles o pessoal Ribeirinho, os que abraçavam a vida do
mar ou se dedicavam a carreira ou misteres a ela correlatos.
Na tentativa de suprir os navios, em 1823, mandou-se recrutar mercantes, e admitir como
Marinheiro e Grumetes os escravos oferecidos pelos seus senhores, abonando-se a estes as
competentes gratificações; e, pelo decreto de 2 de julho de 1825, mandou-se comprar escravos para
servir a bordo dos navios da esquadra. Esgotada esta fonte, recorreu-se, então, às prisões. Assim, o
decreto de 21 de março de 1823, substituiu as penas dos presos da nau presiganga a fim de serem
eles empregados como soldados e marinheiros. Havia, ainda em último caso, o recurso da anistia e
do perdão; o decreto de 29 de fevereiro de 1810 perdoou todos os desertores da Armada; e o de 6 de
dezembro de 1822, concedeu perdão dos soldados da Artilharia da Armada, que se achavam
desertados.
No tocante à composição das tripulações, temos dados referentes a Corveta Maria da
Glória
60
, onde encontramos esparsos registros de grumetes de origem portuguesa que seguiram
carreira na Marinha Imperial, a saber: José Maria, permaneceu no serviço naval até o ano de 1848,
tendo servido como mestre e contra-mestre em diversos navios da Esquadra; Manoel Francisco, em
1852 era mestre do Brigue-Escuna Guararapes; José Rodrigues, em 1858 era 3
o
Maquinista da
Barca a vapor de reboques Empreendedor; José Gonçalves teve longa carreira, em 1849 era Mestre
da Corveta Dois de Julho; e Antônio Pimenta ocupou o cargo de Patrão Mór do Porto do Rio de
Janeiro em 1858 e em 1859 lecionava a disciplina Aparelho da Escola de Marinha. Sobre essa
mesma tripulação, relata Boiteux que era de qualidade questionável, compondo-se da pior classe de
portugueses, com quem a porção brasileira da gente mostrava repugnância em misturar-se.
61
Entendendo que a composição da instituição Marinha na Independência era uma natural
continuidade da portuguesa, e conforme os registros e documentos existentes demonstram, sua
rotina e realidade se assemelhavam por quase a totalidade com a lusa, tomaremos então como base
a evolução da incorporação dos praças da Marinha portuguesa.
Pensando em melhorar as condições das equipagens da esquadra, o Conde dos Arcos,
quando Ministro da Marinha, fundou, como incentivo talvez, um núcleo de marujos voluntários
selecionados; e, nessas condições por decreto de 4 de maio de 1819, mandou criar a bordo da nau
60
Arquivo Nacional. Livro de Socorros –Documento XVII M3444, série Marinha.
61
THOMPSON, George , op. cit. nota 28.
Rainha de Portugal um “Corpo de Marinheiros Voluntários” composto de 400 praças com melhores
vencimento; infelizmente, o voluntariado não alcançou nunca completar aquele máximo. Muito
pouca gente, embora cativa do mar, se deixou embelezar pela vida do marinheiro.
1.3 – Vida a bordo no século XIX
A tripulação de um navio de guerra era constituída de Marinheiros e da Tropa, isto é da
gente de mar e da gente de guerra. A marinheiragem destinava-se, parte à manobra e parte ao
combate (artilharia). A tropa, constituída de soldados de infantaria e de artilharia de Marinha, era
empregada em auxiliar a artilharia, e no serviço de guardas e de mosquetaria, em desembarques,
etc..., procedia da Brigada Real da Marinha e o efetivo do destacamento de cada navio devia ser,
proximamente, de um terço da marinheiragem. Esta, que constituía segunda classe, ou parte passiva
da tripulação, abrangia quatro diversos grupos ou também classes, que são: primeiros Marinheiros,
segundos ditos, Grumetes e Pagens (mais tarde denominados boys de cabo). A primeira destas
classes compreendendo ainda três divisões, que vem a ser: Cabos de marinheiros e Escoteiros, e
Patrões; a dos Grumetes, divide-se em Moços de governo e de agulha; e, finalmente, a classe dos
Pagens (ou mancebos) compreende os rapazes, noviços que, entre outras atividades, varrem o navio,
raspam, fazem caixetas e pinos, ajudam a alar cabo, fazem o ofício de rondas para as ordens e em
combate servem de porta cartuchos. Desta classe, muitos tinham designações peculiares: Moços das
luzes, das tintas, do lixo, etc.
De conformidade com as especialidades e incumbências que lhe eram afetas distribuíam-se
ainda os marujos em: Artilheiros, Homens do terço, Timoneiros ou Homem de leme ou de governo,
Sinaleiros, Paioleiros, Capitão dos pagens (Faxineiros), Fieis de artilharia, da aguada, do porão, etc.
O conhecimento do ofício era aprendido na prática, ou seja, em alto mar. Deles saíam os rijos Cabos
de Marinheiros, de Guardiões desempenados, os Contra-Mestres patescas e os experimentados e
sisudos Mestres...
Figurava também na hierarquia naval o sargento do mar e guerra, posto extinto pelo decreto
de 2 de maio de 1808, sendo incumbidos de suas obrigação os Sargentos ou Oficiais inferiores da
Brigada de Marinha, os Guardiães e os Cabos-marinheiros.
A tripulação de uma nau, “a obrigação do navio” , como se dizia naqueles afastados tempos,
constava de 800 a 900 homens, dos quais cerca de 100 eram artilheiros, 500 marujos ou
manobristas, e uns 200 soldados. Com a soldadesca a bordo estabelecia e alimentava-se muito
discretamente certa rivalidade entre as duas classes a fim de contrabalançar o peso da maruja.
Pelo decreto de 17 de dezembro de 1791 foi criado em Portugal o Regimento de Artilharia
da Marinha com seu regulamento. Devido a isso houve nesse ano uma grande promoção. Em 1796
pelo decreto de primeiro de agosto, todos os regimentos de marinha foram aumentados de 1200
praças e os regimentos da real armada passaram a ser constituídos no mesmo pé que os da artilharia.
Pelo decreto de 8 de maio de 1822, mandou-se que todos os que assentarem praça voluntariamente
na Artilharia da Marinha entre o dia primeiro do dito mês e fins de outubro, só servissem três anos.
Como dissemos, servia esse corpo para completar a tripulação dos navios militares. Vemos
que eram os soldados os representantes das tropas embarcadas outrora nos barcos de pesca ou de
comércio, em ocasião de guerra, no tempo em que a Marinha Militar estava em formação, quando
se exigia dos navios serem principalmente transportes de combatentes em vez deles próprios serem
órgãos de combate.
Nos navios de linha, o destacamento da tropa era distribuído, quando no porto, em dois
quartos, cada um constituindo de uma metade da artilharia outro de infantaria; no mar, era
distribuído em três divisões, para formarem três guarnições, nas fragatas eram em duas guarnições.
Os soldados a bordo, ficavam sob a direção do Comandante do destacamento (Major ou Capitão,
conforme a classe do navio) e seus subalternos (Capitão, Tenente e Alferes), Inferiores (Sargentos) e
graduados (Furriel
62
e Cabo de esquadra). As armas de fogo portáteis eram manejadas por eles:
mosquetes ou fuzis de pederneiras e baionetas ou triangular. Nas abordagens armavam-se, como a
maruja, de armas brancas: machadinhas, espadas, piques e meios-piques.
A disciplina geral a bordo era sobremodo severa, para não dizer desumana, e igual para
todos, tanto para os marujos, quanto para os soldados; estes se guiavam também pelo Regimento de
Infantaria e eram subordinados ao Comandante do Destacamento, como dissemos. Apesar do rigor
da disciplina, o art. CXXIV do Regulamento Provisional determinava que o comandante deveria
cuidar para que a tripulação servisse com gosto, fazendo com que todos fossem tratados com
respeito pelos seus oficiais, enquanto seu proceder não merecesse castigo. As punições em voga a
bordo tinham uma rudeza inerente aos costumes da época. Os castigos corporais em uso eram: a
chibata, o chicote do cabo (com na ponta) ou não, a vara de marmeleiro, a palmada, as algemas,
a solitária simples ou rigorosa a pão e água, o impedimento, e as cabras de cabrestantes
63
.
O aparelhamento da justiça marítima se apoiava em práticas condenáveis nos tempos atuais,
a delação era consignada oficialmente com prêmios concedidos aos denunciantes às custas dos
culpados. Cada comandante, debaixo da autoridade de Comandante em Chefe da Esquadra,
regulava a disciplina e polícia do seu navio. o Chefe da Esquadra podia, em viagem, dar baixa a
qualquer marinheiro por incapacidade; como o comandante do navio tinha o direito de castigar
62
Antiga graduação militar entre sargento e cabo.
63
Durante a Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai, consta que a polícia e disciplina de bordo dos
navios da esquadra foram sempre inexcedíveis nos cinco anos de campanha, sem que os comandantes tivessem
necessidade de apoiar-se nos imperiais marinheiros para chegar à ordem o Batalhão Naval, ou neste conter os imperiais.
os seus subordinados com 25 chibatadas ou pranchadas por dia. Os abusos, no entanto, eram sem
conta; qualquer Oficial podia meter a ferros uma praça, mas o comandante tinha poderes de
mandar aliviar o paciente do referido castigo. O Intendente geral de Polícia, o Auditor geral da
Marinha e o comandante geral da Junta do Comércio eram as únicas autoridades não militares que,
sem permissão especial, podiam entrar a bordo dos navios de guerra, pedir todas as informações e
fazer as diligencias que necessitassem
64
.
Como a maioria da marinheiragem fosse de “voluntariado a laço”, havia grande vigilância
sobre ela para evitar continuadas deserções. Era proibido pernoitar em terra, todo marinheiro e
soldado que em terra dormisse sem a devida licença do seu comandante era severamente castigado.
Devia, para isso, levar consigo o “bilhete de licença”.
A vida corrente, costumeira, do marujo no porto, era, em tempos normais, monótona,
trabalhosa, em rotina apertada e quase invariável. A Fortaleza do registro ou o navio almirante (o
capitânia) abria o porto com o tiro d’alva. Mal se começavam a distribuir os objetos, os pífaros e
tambores, seguidos dos estridentes apitos da mestrança, rompiam em três toques da alvorada.
E a maruja em voz baixa, acompanhava as notas pingentes do instrumento:
Ai! Jesus!...
Quanto sofrer...
Tanto trabalho,
Tão pouco comer!
À boca da escotilha encontrava-se um barril d’água destemperada com vinagre para a
lavagem obrigatória da boca; e junto dele, uma calha ou tina para receber os sobejos dos bochechos
feitos com a tal. Lavava-se, penteava-se e agitava-se ali a guarnição Em estação e em hora própria
costumava-se tomar banho de mar (natação), havendo o cuidado de ter arriada uma embarcação
para socorro. Daí passava a guarnição a tomar um caneco de chá da Índia (do reino, como diziam)
ou até café com bolacha, após o qual, começava logo a faina da limpeza e baldeação, raspagem e
esfregão dos conveses, da tolda, castelo e baterias com escovas inglesas, casca de coco, e lona e
areia. A propósito dessa faina tinham os marujos mercantes portugueses esta quadrinha:
Antes da baldeação.
Varre o Moço e apanha o lixo.
Ai! Lé, lé, lé.
Feito a barra, finca o pé.
Também os nossos marujos de guerra para o toque da baldeação, tinham a letra seguinte:
64
Ainda em 1865, o Ministro Francisco de Paula da Silveira Lobo, destaca, em seu Relatório a Assembleia Geral
Legislativa, a necessidade de se reformar o código penal com o fim de rarear o máximo possível, os casos de aplicação
de castigo de pancadas, quando não aboli-lo totalmente.
Oh! Marinheiro,
Da quarta seção! (Bis)
Da lona e areia
Na baldeação...
Os Moços do lixo e do porão varriam todo o navio e o lixo colhido era lançado em lugar
próprio, à proa, junto das perchas, com o maior cuidado e limpeza, sendo rigorosamente proibido
largar-se coisa alguma ao convés ou no costado. Competia aos guardiães zelar por isso. Varrido o
navio, iniciava-se, ao nascer do sol, a baldeação interna e externa do navio com as “bombas de
fogo”. De oito em oito dias lançava-se água no porão para lavá-lo. Os Moços, dois a dois, muitas
vezes de braço dados, começavam uma interessante quadrilha, esfregando com o pé, envolto em
pedaço de lona, a areia no convés; e em seguida, perfumava-se o navio com vinagre, alcatrão ou
pólvora, tudo sob as vistas do Mestre.
As sete e meia tocava-se faxina, mudava-se o fato, recolhiam-se às redes e trincheiras as
roupas e macas, por ordem e em seus devidos lugares. Os marinheiros arrumavam suas macas nas
redes do castelo e bailéus, os grumetes e pagens no tombadilho, e a tropa na tolda. Diariamente,
quatro marujos (boys), perfeitamente uniformizados, eram escolhidos para atenderem aos cabos do
portaló
65
(fig.: 5).
Fig.:5
Demonstração da faina de marinheiro no portaló.
Após a baldeação, passavam-se à limpeza das embarcações miúdas e da artilharia, depois do
que as baterias deviam ficar inteiramente safas, prontas, desembaraçadas e providas de tudo, como
se fosse entrar em combate. Terminado esse serviço, o Oficial de quarto fazia uma rápida inspeção.
65
Abertura feita na borda, ou costado de um navio de grande porte, por onde o pessoal entra e sai do navio, ou por onde
passa carga leve. Antigamente quando os navios ficavam fundeados o embarque e desembarque era realizado por uma
guindola, espécie de tábua suspensa pelas extremidades, que era puxada ao som do apito do mestre, pelos marinheiros
escalados.
Às oito horas içava-se o pavilhão nacional, cruzavam-se as vergas de joanetes, e nos domingos e
dias santificados, rezava-se a primeira missa.
As oito e meia havia assembleia (formatura ou parada) para a revista; as nove rendia-se a
guarda; às 10 rezava-se a missa solene (aos domingo e dias santos de guarda). O jantar era
distribuído às 11horas; e ao meio dia fazia-se ligeira oração ao bater o sino as quatro ampulhetas
dobradas. De uma hora as quatro faziam-se exercícios gerais, usualmente dirigidos pelo comandante
e, no impedimento, pelo imediato; e aos domingos, era esse intervalo destinado à explicação do
catolicismo e da doutrina cristã.
Depois disso eram permitidos alguns jogos lícitos; estes, porém deviam ter a maior
moderação. Os jogos de parar (cartas, dados) eram severamente proibidos, sendo, às vezes,
permitidos alguns exercícios de capoeiragem e o jogo do pau a portuguesa.
Conforme fosse inverno ou verão, às quatro e meia ou cinco horas, distribuía-se a ceia,
apagando-se depois dela os fogões de campanha na presença de um Oficial. Meia hora antes do por
do sol ou da Ave Maria fazia-se a ladainha rezada e mais orações, em que se pedia a Deus todo o
bom sucesso pelas armas de Sua Majestade e saúde da família Real. Ao sol pôr, ao sinal do apito,
arriava-se a bandeira nacional juntamente com as vergas do joanete.
Passava-se o santo e a senha às sentinelas e distribuíam-se, então, as luzes de polícia, que
eram lanternas fechadas a cadeado, cujas chaves deviam ficar com o Sargento de serviço ou o da
guarda, e eram levados por cabos de esquadra, para a revista do Oficial de quarto, antes de serem
distribuídas. O temor do fogo era o primeiro cuidado nos navios de madeira, em que o alcatrão tinha
tantas aplicações. As recomendações as mais severas eram feitas: proibição de embarcar materiais
combustíveis fechados ou abertos sem expressa ordem do comandante; proibição de fumar do pôr
ao nascer do sol. O fogo ou lume eram transportados por ordem do comando. Todos os fogos e
luzes (a não ser o de polícia) eram extintos ao anoitecer, permanecendo apenas um farol na proa
outro na popa, no corpo da guarda, na câmara do comandante, e na praça d’armas. O cachimbo,
inseparável da indumentária do marujo da legenda e da gravura, era permitido com as restrições de
tempo e lugar imposto pelo temor de incêndio. era consentido fumar tabaco do nascer ao por do
sol, e isso mesmo sob tina com água, colocada próximo ao mastro do traquete. Daí o hábito de
mascar, inveterado, entre os marujos de então.
Os paióis das amarras, da pólvora (a Santa Bárbara dos antigos), e dos mantimentos eram
severamente defesos a qualquer luz. Pelo convés, durante a noite, deviam ser dispostos baldes, tinas
com água e bombas de fogo; e de acordo com a tabela de postos de incêndio, toda a guarnição devia
reunir no primeiro sinal. Às 8 ou 9 horas da noite, conforme a estação, eram dados os toques de
recolher . No estrangeiro, a essa hora, dava-se um tiro de peça e bem assim ao romper d’alva.
Procedia-se então a distribuição das macas. Às nove horas e meia fazia-se silêncio. E assim
terminava o dia do Marujo da Independência, quando o navio surto
66
.
O encarregado do rancho dos praças era o Sargento Mar e Guerra, cargo extinto em 1808 e
depois substituído pelo Mestre d’Armas. Cada rancho constava somente de 5 a 6 homens com uma
cabeça (hoje rancheiro) que, ao toque do sino e ao apito do Mestre, ia com uma calha de madeira
lavada, buscar as rações à caldeira de acordo com o caderno do referido sargento. Era proibido aos
praças de caldeiras comerem na coberta
67
; faziam-no na tolda
68
, castelo
69
e convés
70
, ao rigor do
tempo(fig.:6 e fig.:7). Até então havia celas para os marinhagem comer, às quais condecoravam
com o nome de bandejas, porém eram realmente calhas onde cabia a ração para sete praças e onde
todas elas metiam a mão ou a grosseira colher de pau, em torno dos quais se agrupavam sentados no
soalho do navio ao rigor do tempo.
Fig.: 6
66
Diz-se de navio ou embarcação ancorada ou amarrada à boia ou ao cais.
67
Espaço compreendido entre o primeiro e o segundo pavimentos acima do porão. As naus de guerra tinham duas
cobertas: a mais baixa destinada ao alojamento da guarnição, e a mais de cima, guarnecida pela artilharia.
68
No século XIX correspondia ao pavimento acima da primeira coberta em que se achava a bateria de canhões.
69
Superestrutura no extremo de vante do navio (castelo de proa).
70
Pavimento da primeira coberta em que havia bateria de canhões, e acima da qual era a tolda.
Fig.:7
Os líquidos eram tomados em canecos, vasilha de madeira ou de chifre, de forma de cone
truncado; ou então em cocos da Bahia, com um pequeno cabo. Ao rancho devia sempre assistir um
Oficial de patente, para manter o silêncio e o comedimento da tropa.
Terminada a refeição, fazia-se a limpeza das bandejas e do local; para isso os Guardiães e
Furriéis (para os soldados). Sob vela, a marinhagem tomava a refeição primeiro que a tropa; no
porto, entretanto, sem haver precedência, esta a fazia antes.
O comandante não podia reduzir a ração das praças sem licença do Chefe da Esquadra;
ambos eram estritamente responsáveis pelos gastos. Em caso de arribada por falta de víveres,
deviam justificar-se por isso, os longos e incertos cruzeiros constrangiam-os a uma severa
economia. Devia haver o máximo de cuidado no recebimento dos gêneros, que consistiam em:
carne de balso, ou bálsamo (carne em salmoura), bacalhau, toucinho, bolacha, legumes secos,
feijão, grão de bico, sal, vinagre, azeite doce, açúcar, chá da Índia, etc.
No tocante ao provisionamento de rancho
71
, a restrição de espaço existentes nos navios, as
dificuldades de conservação de alimentos frescos e as limitações impostas ao preparo dos alimentos
para ingestão, sempre constituíram problemas de monta de todos os tempos, em especial nos tempos
da navegação à vela. Havia os ranchos frescos ou gordos e os secos ou de paiol, chamados magros.
O balsamo era distribuído a razão 250 gramas por praça; o toucinho duas onças; a bolacha ou
71
Denominação dada à alimentação do pessoal de Marinha.
biscoitos, 250 gramas; o vinho, 70 centímetros, sete decilitros de água potável era a ração diária
para cada praça. Às sextas-feiras e dias de jejum entrava em cena a bacalhoada, com a competente
ração de vinagre, azeite e cebolas. Empregava-se também o pão de munição, e nos grandes dias
havia uma melhoria no rancho. A comida se não era muito abundante, também não primava pela
qualidade. Era permitido, no entanto, com a moderação devida, reclamar-se contra a má qualidade
da ração, mas no geral, as autoridades faziam a isso ouvidos de mercador. Os restos e sobejos eram
recolhidos em calhas e lançados ao mar, sob as vistas do sargento de mar e guerra. A distribuição
dos víveres era fiscalizada pelo Escrivão, acompanhado de seu fiel, que a cercavam de precauções
particular, principalmente quanto à [garapa] o vinho
72
. O peso das carnes, correspondente a cada
rancho, era lançado na caldeira acompanhado de um lembrete de madeira com o número de rancho.
A água potável de bordo era acondicionada em grandes tonéis, guardados no porão. Entre as
refeições a maruja bebia água servida com um pouco de vinagre (sangria), usado para tratar a água
dos tonéis de bordo.
Quanto à higiene do navio e a saúde do pessoal, além do que foi dito, acrescentamos que
de 8 em 8 dias (as sextas-feiras para a Tropa e aos sábados para a Marinhagem) era distribuída água
doce e uma ração de sabão, para a lavagem da roupa de linho, que devia secar em adriças
73
passadas
do castelo para o mastro do traquete
74
. No primeiro dia de cada mês lavavam-se as macas com água
salgada. Essas lavagens eram fiscalizadas pelos Mestres e Furriéis e pelo Comandante do
destacamento da Tropa. Somente Guardiões e Furriéis para cima podiam, com licença do
Comandante, lavar roupa em terra.
Aos domingos e dias santificados, quando não houvesse trabalho, mudava a equipagem
fardamento limpo e asseado. Em tempo chuvoso, antes de dormir, o pessoal trocava a roupa
molhada; e antes de render o quarto, a guarnição descansava cerca de dez minutos debaixo do
castelo (a casaca de pau, como o chamavam) ou da tolda, para esfriar o corpo e esperar o toque do
sino, “a fim de evitar o dano, que pode lhe causar, passando de um lugar ordinariamente quente para
o ar frio, e muitas vezes úmido e chuvoso”.
75
No mar, à vela, o pessoal devia dormir vestido e estar pronto a primeira voz. Nos dias
chuvosos entrava em cena a ração de aguardente, como dissemos já. Nunca tivemos, na época que
72
Conta Juvenal Greenhalgh , que constava da ração diária nas forças armadas o fornecimento da cachaça aos soldados
e marinheiros, a saber: “havendo no Exército e na Marinha oficiais que faziam garbo em serem dela grande bebedores,
o que consideravam panache essencial aos que desejavam gozar de fama de bons e desembaraçados profissionais. Era a
cachaça responsável pela sua maior parte dos atos de indisciplina que se produziam a miúdo a bordo dos navios e
estabelecimentos militares e que chegavam, por vezes, a assumir a gravidade de desordem e motim”. in.
GREENHALGH, Juvenal O arsenal de Marinha do Rio de Janeiro na História- 1822-1889. Rio de Janeiro: IBGE.
1965.p 13.
73
Cabo usado para içar uma vela, bandeira ou sinal.
74
Mastro de vante do navio com dois ou três mastros.
75
THOMPSON, George , op. cit. nota 28.
estudamos, um navio-hospital acompanhando a esquadra em operações. Em princípio eram as
praças da armada curadas na Santa Casa de Caridade de Misericórdia, depois passaram a ser
internados no Hospital Militar no Morro do Castelo, perdendo os enfermos, enquanto baixados, seus
vencimentos. As praças inválidas e estropiadas recebiam meio soldo, e as que ainda se encontravam
em condições de trabalhar eram empregadas nos Arsenais. De acordo com o “Regimento
Provisional”, as praças, a bordo, deviam ser tratados com carinho e com assistência de remédios, de
trato e de Enfermeiro e socorro de toda natureza. Um oficial, voluntário ou designado, era
encarregado da inspeção e cuidados dos doentes. Estes deviam ficar separados da gente sã, em lugar
limpo e asseados em um catre. Quando qualquer pessoa da equipagem adoecia em terra, o Cirurgião
do navio era obrigado a visitá-lo, e seus cuidados médicos, não deviam merecer qualquer
retribuição por parte do doente. A bordo, tinha o Cirurgião ao seu cargo um Livro de Registro e o
cofre de cirurgia.
Cada navio tinha um Capelão, padre secular ou frade de qualquer ordem, que era obrigado a
dizer duas missas aos domingos
76
e dias santificados de guarda (às 8 e 10 horas), salvo quando
houvesse mau tempo, rezar a ladainha ao cair da tarde, ensinar o catecismo e a doutrina cristã uma
vez por semana, geralmente aos domingos, a um certo número de praças designados pelo
Comandante
77
.
Cabiam-lhe, ainda, outros atos de religião e caridade, como desobrigar a guarnição pela
quaresma, atender aos enfermos e auxiliar os moribundos. Tinham um criado com praça de
grumete, que lhe servia de sacristão e lhe cuidava da “caixa de ornamentos”. O capelão na
hierarquia militar-naval era mais moderno que o Capitão-Tenente e alojava em rancho inferior a
este; e em combate auxiliava o Cirurgião.
1.4- A estrutura naval no decurso do Primeiro Reinado e a atuação da Instituição em conflitos
(1808- 1850).
1.4.1 – A estrutura administrativa (Anexo 1.)
Antes de retornar a Portugal, D. João VI nomeou o Príncipe D. Pedro para Regente do Reino
76
O ritual da celebração Eucarística, e a própria rotina do dia a dia anteriormente descrito, pode ser verificado nos
navios do Império brasileiro, como quando da manhã de 11 de junho de 1865, data do confronto entre os navios
brasileiros e paraguaios, na célebre Batalha Naval do Riachuelo, do qual existe registro de integrantes da força naval
estacionada no Rio Paraguai.
77
Havia a bordo um magistrado que superintendia os delitos cometidos pelas praças e as castigava, principalmente na
repressão de faltas ao serviço religioso. Quem faltasse a missa, ao terço ou ladainha, era punido com certo número de
chibatadas. Os blasfemadores, pela primeira vez, eram postos a ferros e ficavam privados do soldo por determinado
tempo; em caso de reincidência eram julgados em Conselho de guerra e condenados a maior pena. Na Marinha francesa
tinham a língua furada.
do Brasil, designou o Chefe-de-Esquadra Manuel Antônio Farinha para Ministro e Secretário de
Estado e Negócios da Marinha; ao Auditor-Geral da Marinha coube a incumbência de supervisionar,
no âmbito naval, as atividades da justiça militar, exercidas pelos conselhos de inquirição e de
guerra. Constituía então a Armada do Reino do Brasil a parcela da Armada Real e Nacional luso-
brasileira que não acompanhou D. João VI no seu regresso a Portugal, somada aos elementos do
Corpo de Artilharia que constituíam o Batalhão da Brigada da Marinha.
Ao Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro
78
, como (apesar de sua então precariedade) o
principal Arsenal construtor do Brasil, coube a coordenação dos demais arsenais de marinha das
províncias (da Bahia, de Recife, de Belém e do Rio Grande). Tinha a função do provimento dos
materiais de toda ordem necessários à construção dos navios da Armada, a sua movimentação e
reparação, a alimentação dos seus tripulantes, o municiamento dos seus canhões, a realização dos
pagamentos devidos e a contabilidade das despesas. Portanto integrado ao dito Arsenal foi criado a
Contadoria da Marinha sob a direção do Intendente da Marinha (que dirigia também o Arsenal com
o título de Inspetor). Essa estrutura perdurou até 1830, quando ocorreu a desvinculação cabendo ao
Inspetor do Arsenal a responsabilidade dos trabalhos realizados no Arsenal como combate a
incêndios nas dependências navais e na cidade do Rio de Janeiro, administração dos navios
desarmados, operação dos navios de transporte, execução de obras de melhoramento do porto,
balizamento, carta marítima, compensação de agulhas, matrículas de embarcações mercantes,
policiamento do porto, praticagem das barras e socorro marítimo; e ao Intendente da Marinha as
funções de um diretor de finanças da Marinha.
Em maio de 1828, foi reorganizado o Quartel-General da Marinha sendo criado o cargo de
Ajudante-de-Ordens (do Ministro) Encarregado do Expediente, que passou a atuar como
intermediário entre o ministro e os comandantes da força e de navios e os chefes de
estabelecimentos relacionados com o pessoal embarcado; passando este a ser o centro da Armada, e
o vínculo por onde o ministro expedia as ordens imperiais e recebia as participações de tudo quanto
dizia respeito ao serviço naval. Tinha ao seu cargo a correspondência com todos os órgãos de
Marinha, sobre objetos de serviço e disciplina; a expedição e fiscalização das ordens; a inspeção dos
navios armados, fortalezas da Ilha das Cobras e de Villegagnon e dos corpos nelas aquartelados,
assim como do respectivo hospital; as informações sobre tudo o que é relativo ao pessoal da
Marinha e classes anexas; os livros-mestres dos oficiais da Armada; culto, saúde e náutica; além do
78
O Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro teve três regulamentos no período imperial: o de 1834, definia apenas as
atribuições dos que se empregavam no Arsenal; o de 1860, estabelecia diretamente uma estrutura orgânica, com a
criação e definição de atribuições e deveres dos cargos, além de fixar o número de oficinas e de criar as escolas de
instrução primária e profissional com as matérias a serem nelas ensinadas; e o de 1874 consequência direta do
desenvolvimento da industria da construção naval e as modificações introduzidas por novos regulamentos na
Intendência e na Contadoria, que afetaram o funcionamento do Arsenal.
conhecimento de toda a força naval, o provimento dos navios quanto ao equipamento, armamento,
desarmamento, e pessoal. As responsabilidades atribuídas ao titular desse cargo correspondiam em
essência com as do cargo que fora criado em 1808 e extinto em 1812.
79
No ano de 1840 foi criado
dentro da estrutura de Marinha a Contadoria-Geral de Marinha com a missão de verificação e
inspeção das contas de todas as repartições de Marinha, e posteriormente a distribuição das verbas
anuais; assim o Intendente da Marinha passou a exercer as atribuições de um diretor de material, e o
contador-geral as de um diretor de finanças como um todo. O trato dos assuntos relacionados com
os estabelecimentos navais sediados nas províncias realizava-se por meio dos respectivos
presidentes de províncias
80
.
Com relação à saúde, até 1834, os enfermos da Marinha eram baixados no Hospital Militar
da Corte, localizado no Morro do Castelo, quando foi instalado na Ilha das Cobras, nas
dependências da fortaleza de São José o Hospital da Marinha da Corte. Nas províncias, a Marinha
recolhia os enfermos aos hospitais de caridade, pagando as despesas correspondentes; depois de
1840, foram criadas enfermarias próprias nos arsenais de Pernambuco, Bahia e Pará. A lei
orçamentária para o exercício financeiro de 1848-9 autorizou o governo a instituir um Conselho
Naval, como órgão supervisor dos assuntos sanitários.
No ano de 1847 foi criado o Conselho de Administração, incumbido de promover o
fornecimento de víveres e fardamentos para os navios e corpos da Armada, compunham esse
Conselho o encarregado do Quartel-General da Marinha, o Intendente da Marinha, o Contador-
Geral, os comandantes dos Corpos de Imperiais Marinheiros e Fuzileiros e os dois comandantes
mais graduados dos navios de guerra estacionados no porto do Rio de Janeiro
81
.
79
“Decreto de 3 de novembro .
“Havendo cessado, com o triste acontecimento da morte do meu muito amado e prezado sobrinho o Infante D.
Pedro Carlos, o exercício das funções e autoridades do posto de Almirante General da Marinha, que, por Decreto
de 13 de maio de 1808, fui servido criar, para lhe ser especialmente conferido, anexando-lhe todas as atribuições
que competiam aos Capitães Generais dos galões da Armada Real de alto bordo do mar oceano, e aos Inspetores
da Marinha; e sendo por tanto necessário por agora os negócios e administração deste importante cargo do meu
serviço Real naquela marcha que convém, para que não sofra o seu expediente, mas antes prossiga com a devida
regularidade e boa ordem: hei por bem determinar que tudo volte ao estado em que os negócios desta Repartição se
achavam até o momento em que pelo citado decreto fui servido dar-lhes aquela diferente forma; ordenando que o
competente Ministro e Secretário de Estado e Negócios da Marinha e domínios ultramarinos haja daqui em diante
exercer todas as funções e autoridades próprias dos Inspetores da Marinha, as quais em certo modo foram
praticadas pelo seu antecessor, enquanto não se criou o posto de Almirante General, que ora se acha extinto pela
expressa declaração com que foi criado. O Conde das Galvêas, do meu Conselho de Estado, Ministro e Secretário
de estado dos Negócios da marinha e domínios ultramarinos, o tenha assim entendido e faça executar com as
participações necessárias. Palácio do Rio de Janeiro, em 3 de novembro de 1812. Com rubrica do Príncipe
Regente Nosso Senhor.” in. Legislação Brazileira tomo II (segundo) p. 48-9
80
Como as ordens eram sempre emitidas em nome do Imperador, e como os presidentes de províncias eram nomeados
(sendo, portanto, seus subordinados diretos), não era necessário que houvesse subordinação formal dos presidentes de
províncias ao Ministro da Marinha.
81
Conselhos semelhantes seriam estabelecidos nas províncias onde houvesse Arsenal de Marinha, bem como nas
divisões ou navios soltos em portos estrangeiros ou do Império que não possuíssem estabelecimento naval, quando
houvesse necessidade de realizar os mencionados fornecimentos.
Ainda em 1828
82
, os navios da Armada estavam distribuídos da seguinte maneira: esquadra
do Rio da Prata; Divisão Naval na Bahia (serviço de guarda-costa e como proteção estratégica);
Divisão Naval na costa da África (destinada a fiscalizar os navios brasileiros quanto à observância
das disposições da Tratado de 1815 com a Inglaterra, sob o tráfego negreiro); forças navais nas
províncias de Pernambuco, Ceará, Maranhão e Pará de embarcações para prestar socorro marítimo,
que estavam subordinadas aos respectivos presidentes de província
83
; e os meios navais que
permaneciam na Corte. Cabia aos inspetores dos arsenais de Marinha, nas províncias onde
houvesse, dirigir os serviços de matrícula dos marítimos e suas embarcações, de polícia naval, de
praticagem das barras e de socorro marítimo, porém com a criação em 1845 das Capitanias dos
Portos essas funções passaram a ser exercidas pelos respectivos capitães dos portos
84
.
1.4.2 – A estrutura de pessoal:
Reconhecida a Independência o problema com a incorporação de pessoal persistia. Os meios
de guarnecer os navios eram os mesmos adotados por Portugal, constituindo grupamento
heterogêneo de remanescentes lusitanos adesistas, estrangeiros contratados, pequeno número de
voluntários, de negros arrancados da escravidão, e de caboclos desocupados. Ainda em 1826,
durante a Guerra Cisplatina, estabeleceu-se a bordo da Nau Vasco da Gama um depósito de recrutas
para suprir as guarnições dos navios da esquadra.
85
Com a preocupação do baixo nível cultural do
pessoal recrutado, em 1833 foi estabelecido que a bordo dos navios armados fosse ministrado, de
preferência pelo padre-capelão, as primeiras letras e a doutrina cristã. Em 1836, estabeleceu-se na
capital do Império, a bordo da Fragata Imperial, uma escola de marinhagem, para ensino da arte do
marinheiro. Nesse mesmo ano foi autorizada a criação de Companhias de Marinheiros, às quais
seriam incorporados elementos melhores escolhidos e preparados para a carreira naval nos escalões
subalternos, formados por jovens de 14 a 17 anos, órfãos e desvalidos, aos quais a Marinha
ministraria instrução primária e aprendizagem nas artes do marinheiro, do artilheiro, e do fuzileiro.
82
Segundo Relatório Ministerial de 1828 assinado pelo Conselheiro Diogo Jorge de Brito, a Força Naval da Armada
brasileira em efetivo serviço era composta por: uma nau; nove fragatas; quatro corvetas, 13 brigues, sete brigue-
escunas; um lúgar; 25 escunas e barcas, além de 16 transportes.
83
A subordinação era no tocante à defesa da província, de acordo com consulta realizada ao Conselho Supremo Militar,
em 1º de dezembro de 1837. (BRASIL. Coleção das decisões do Governo do Império do Brasil: 1861. Rio de Janeiro:
Typografia Nacional, 1937.).
84
Em princípio, nos locais onde houvesse Arsenal de Marinha, seriam exercidas cumulativamente com as de inspetor
do arsenal, mas a partir de 1851 os cargos foram separados.
85
Esforço que com o fim daquele conflito foi aumentado com a iniciativa dos demais comandantes de navios que
receberam em seus navios os menores que podiam encontrar para dar-lhes educação científica e militar, esse seria um
ensaio para a futura criação da Escola de Aprendizes Marinheiros.
Herança do tempo de colônia, ao Corpo de Artilharia da Marinha, competia, guarnecer a nau
presiganga, fornecer escolta para presos sentenciados e guarda para o Arsenal de Marinha da Corte,
guarnecer a fortaleza da Ilha das Cobras, e fornecer destacamentos de soldados veteranos e
adestrados nas diferentes armas, no caso de ser necessário sua utilização em navios da esquadra. No
ano de 1847 o Corpo é extinto e em seu lugar foi criado o Corpo de Fuzileiros Navais, constituído
de praças de pré de infantaria, denominados fuzileiros navais.
Quanto à oficialidade, continuou a ser oriunda da Academia Imperial dos Guardas-
Marinha
86
; do Corpo de Engenheiros Navais que provinham de duas fontes: da Academia, e do
Arsenal
87
; do Corpo de Oficiais Maquinista, introduzido a partir de 1825, que não tinham a mesma
respeitabilidade dos oriundos da Academia
88
; e do Corpo de Oficiais de Fazenda, composto pelos
comissários e escrivães contratados, eram responsáveis pelos gêneros e dinheiro da Fazenda
Nacional a bordo. No tocante ao pessoal de saúde, os cirurgiões de que a Marinha dispunha eram,
também, civis contratados (não antes de serem submetidos a exame de capacidade), com graduação
militar honorária
89
.
1.4.3 – A atuação em conflitos:
Quanto a atuação da Instituição em conflitos, retornemos a 1808. Diante da invasão do
território continental português pelas tropas de Junot, D. João assinou, a 1
o
de maio, manifesto
declarando guerra à França; com os tratados
90
assinados anteriormente tornados nulos, os limites
entre o Brasil e a Guiana Francesa voltaram a ser questionados. Não se podendo fazer a guerra em
território europeu, e sendo importante a ocupação de território inimigo em qualquer guerra, o
objetivo ideal se tornou a colônia francesa. Uma expedição militar
91
partiu de Belém, a 3 de
dezembro, em direção à baía do Oiapoque, onde desembarcaram as tropas que ocuparam, sem
oposição, a margem esquerda do rio. Logo após, seguiu a expedição para o norte, em direção a
86
Sua denominação foi sendo alterada ao longo dos anos até 1866, quando passou a ser denominada em definitivo de
Escola Naval.
87
Em 1838, sendo o casco de ferro e a propulsão a vapor uma realidade, decidiu a administração naval enviar oficiais
das diversas especialidades para a Europa com a incumbência de aprenderem as novas técnicas de construção devido a
necessidade de atualizar conhecimentos sobre a construção e condução dos navios que surgiam.
88
Na maioria dos casos os maquinistas provinham das classes mais humildes da sociedade, e não raro dos inferiores de
Marinha. Galgavam o oficialato pela experiência e conhecimento prático das máquinas.
89
Em 1853 regulou-se as atribuições dos Enfermeiros, que apesar de também serem civis contratados, não tinham
garantia nem honraria militar.
90
Dentre os tratados anulados destacamos os de Badajós e de Madri, ambos de 1801, e o de neutralidade, de 1804.
91
A Força Naval que compunha a expedição era formada pela Escuna General Magalhães (capitânea); Cúter Vingança e
Leão; três barcas canhoneiras; Sumaca Ninfa; Iate Santo Antonio; e a Lancha São Narciso. A ela se juntou por três
navios vindos da Corte: Corveta Confidence; e Brigues Voador e Infante D. Pedro, junto traziam reforço de 300
homens.
Caiena, que, a 12 de janeiro de 1809, capitulou. Apesar do reforço vindo da Corte, em análise
realizada nas ordens de movimentação e aprontamento de navios para a ocupação, não foi
encontrado registro de qualquer movimentação no Arsenal da Corte, sendo possível verificar a
concessão de pensão às viúvas dos militares de Marinha falecidos em combate, isso em meados
de 1809, o que demonstra que o maior esforço de guerra recaiu a Província do Pará. Outro
movimento importante ainda na época de D. João VI foi à ocupação da Banda Oriental, onde a
Marinha atuou tanto no transporte das tropas como no bloqueio de portos.
Com a Independência, fazia-se necessário assegurar a unidade territorial das antigas
províncias portuguesas, foi a Marinha a responsável por levar a notícia e assegurar a união
territorial do Império, diante da inexistia de estradas a comunicação era possível pelo mar. Sua
atuação na Bahia, no Maranhão, Pará e na Cisplatina constituiu verdadeiro marco para a integridade
territorial.
Durante o período regencial o Brasil foi fértil em dissensões políticas; revoltas e sedições
sucederam-se nas diversas províncias ameaçando a estrutura do Império. As revoltas deflagradas em
diversas províncias foram abafadas pelo governo regencial com a utilização da Marinha e do
Exército. A Marinha teve presença expressiva no Pará (Cabanagem), no Maranhão e Piauí
(Balaiada); no Rio Grande do Sul (Farrapos); e na Bahia (Sabinada); já no Segundo Reinado atuaria
em Pernambuco na revolta Praieira.
A Marinha atuou ainda em conflitos externos: na Guerra da Cisplatina (1825-1828) e na Guerra
contra Oribe e Rosas (1851-2), ambos os conflitos tiveram como teatro de operação o estuário do
Prata. A primeira após longos combates com corsários argentinos e sob a intermediação inglesa foi
acordada a desvinculação da Província Cisplatina do Brasil e em consequência a estruturação do
novel país a República do Uruguai; quanto ao segundo, ressaltamos que durante as manobras navais
foi empregado pela primeira vez na Marinha Imperial o navio a vapor na histórica Passagem de
Toneleiro.
Percebe-se que a atuação da Marinha em ações combinadas ou não com o Exército, se localizou
sempre, ao longo da costa brasileira, se estendendo ao máximo ao estuário do Prata, tendo portanto
o apoio logístico necessário para a execução da ação no território em conflito.
1.5– A Revolução Industrial: os novos desafios à Marinha Imperial brasileira.
Fig.: 8
Cromolitografia publicada em 1864, intitulada “Madeira e Ferro”, apresenta um tradicional navio de guerra de
madeira à esquerda, ao lado do HMS Warrior.
A Revolução Industrial foi de grande impacto no cotidiano da civilização ocidental, no mar,
porém, as inovações não encontraram eco fácil. O homem do mar, de um modo geral, recebeu com
desconfiança a máquina a vapor, isto devido às várias circunstâncias, como por exemplo: a
manutenção do navio à vela que, então, se restringia à conservação de suas madeiras, de seu velame
e dos cabos que formavam seus aparelhos; e a navegação que dependia unicamente do vento e do
estoque de comida, tornando seu raio de ação quase ilimitado. Já com a propulsão a vapor, o raio de
ação se tornou restrito, devido à necessidade de abastecimento mais contínuo; além do mais, no que
concernia aos navios de guerra, as rodas de pás, que passaram a compor os convés dos navios a
vapor, eram vulneráveis e ocupavam espaço destinado aos canhões, e as caldeiras ocupavam os
espaços da guarnição e dos mantimentos.(figs.: 9 e 10).
Fig.: 9
Perfil de fragata inglesa, onde nota-se a redução de canhões no convés principal devido a roda de pás,
afetando, desta feita, o poderio de ataque.
Fig.: 10
Plano de convés demonstrando o espaço tomado pela a roda de pás.
Interessante verificar que o setor que sempre demonstrou ser a ponta da evolução moderna,
mudando o rumo da civilização nos séculos XV e XVI com seu desbravamento do mar oceano,
criando novas tecnologias e, por que não dizer novos conceitos científicos, tenha desenvolvido uma
reação contrária a incorporação do vapor aos meios navais. Acredito que as razões para essa
desconfiança podem ser encontradas no seio da então grande potência naval.
Ao final das Guerras Napoleônicas, a arte da navegação à vela havia atingido um nível de
aprimoramento que, para as circunstâncias da época, poderia ser considerado como excepcional. O
profissionalismo implantado na Marinha Britânica como consequência da necessidade de manter
uma ação de presença com credibilidade no Oceano Mundial e o modelo de organização de seu
Poder Naval conforme estruturado por Samuel Pepys
92
, possibilitaram o estabelecimento de um
predomínio indiscutível sobre seus rivais calcado na adiantada combinação do binômio ser humano-
navio.
Tal presença implicava na obrigatoriedade da existência de um sistema de apoio logístico de
âmbito mundial que permitisse não apenas o recompletamento dos itens necessários à sobrevivência
das tripulações (especialmente, água potável e alimentos), como também, dos sobressalentes
exigidos principalmente para a manutenção da capacidade de movimentação dos navios.
É possível constatar que no passar dos tempos a Grã-Bretanha conseguiu criar um sistema
logístico de abastecimento e reparo na ambiência do Oceano Mundial seja pela conquista de
posições estrategicamente localizadas, seja por acordos e tratados com os detentores daquelas
facilidades. Gibraltar, Alexandria e o Cabo da Boa Esperança são exemplos daquela primeira
condição; Lisboa e Rio de Janeiro, da segunda condição
93
.
Seria lógico que dentre os milhares de homens do mar que guarneciam os meios navais
britânicos surgissem uns poucos que, por seus dotes pessoais, se sobressaíssem dentre os demais e
passassem a representar para os governantes e para a opinião pública britânica o modelo ideal para a
garantia da superioridade alcançada. Mais ainda, no contexto de uma cultura naval sedimentada,
não era percebida a necessidade de adaptar aquele modelo às novas realidades decorrentes do
progresso tecnológico.
Nelson foi o representante maior daquele modelo ideal. Suas consecutivas vitórias navais; as
92
Samuel Pepys (1633-1703), funcionário público inglês nascido em Londres, que ficou citado na história dos costumes
britânicos pela criação do famoso Diário de Samuel Pepys. Iniciou sua carreira como escrivão da Marinha (1660), ano
em que iniciou seu diário. Tendo conquistado a confiança do rei Carlos II, foi nomeado secretário do almirantado,
principal posto administrativo da Marinha (1673). Durante o reinado de Jaime II, foi encarregado de controlar as
despesas do estado. Como membro do Parlamento, pôs em prática programas que restauraram o poderio da Marinha
inglesa. Ver também, OLLARD, Richard. A biography of Pepys. Nova Iorque: Holt, Rinehart and Winston, 1974.
93
Na primeira década do século XIX o porto do Rio de Janeiro era imprescindível para a presença e ocupação britânica
da Austrália.
modificações que introduziu na tática de emprego de uma esquadra; sua visão prospectiva sobre a
sequência que deveria ocorrer em um engajamento naval, aproveitando-se das condições do vento e
do mar; tudo isso, o transformou em uma legenda que deveria ser imitada no futuro para a
consecução das batalhas navais
94
.
Surgiu, o Band of Brothers
95
, oficiais de Marinha contemporâneos de Nelson que, ao
assumirem por questões de carreira, posições importantes no Almirantado Britânico reagiram
obstinadamente à qualquer alteração do “modelo nelsoniano”. Daí, porque, a Marinha Real
Britânica recusou-se seguidamente a aplicar os benefícios do progresso tecnológico nos seus meios
navais. Armando Amorim Ferreira Vidigal
96
informa que, “a oposição britânica ao vapor
fundamentava-se ainda na consequência de que a adoção generalizada desse tipo de propulsão,
especialmente para os grandes navios de linha, tornaria obsoleta, de um golpe, toda a sua
esquadra”, o que no pensar do Almirantado britânico, tinha sido planejada para dar um golpe fatal
na supremacia naval do Império. Entretanto, o desafio naval francês, encabeçado por Henri
Paixhans
97
, levaria o Almirantado a rever suas posições.
Nesse ínterim, no Brasil, Caldeira Brant
98
já no início dos anos vinte do século XIX tentava,
na Inglaterra, a obtenção de um barco a vapor que, na sua opinião permitiria realizar uma viagem ao
Norte do país em duas semanas (quatro semanas, era o tempo previsto para um navio veleiro).
Ainda que houvesse aquela reação contrária a uma mudança no “modelo naval” praticado pela
Marinha “nelsoniana” existiriam “homens do mar” dotados de uma visão prospectiva e que
tentaram, na medida de suas possibilidades, modificar o pensar britânico.
No entanto, fortes razões impuseram a máquina a vapor bem cedo à Marinha Mercante, em
especial no tocante ao transporte de passageiros; a grande virtude era a regularidade das viagens e a
não dependência do vento. As experiências para dotar os navios com a propulsão a vapor vinham
sendo feitas desde os últimos anos do século XVIII, mas as primeiras embarcações a utilizarem esse
94
A última grande batalha naval envolvendo apenas navios a vela ocorreu em 1827, na Baía de Navarrino (no mar
Jônico, costa ocidental do Peloponeso), quando uma força naval combinada da Inglaterra, França e Rússia, destruiu a
esquadra turco-egipcia, assegurando a independência da Grécia.
95
Tem como significado “irmãos de armas”.
96
VIDIGAL, Armando Amorim Ferreira A evolução tecnológica no setor naval na segunda metade do século XIX e as
consequências para a Marinha do Brasil. in. Revista Marítima Brasileira. Serviço de Documentação da Marinha: Rio
de Janeiro. 4
o
Trimestre/2000. p. 136 (131-197).
97
Henri-Joseph Paixhans - oficial de artilharia do exército, lutou nas guerras Napoleônicas, galgando o posto de General
de Divisão. Inventor das granadas explosivas, que levaram seu nome, foi a primeira vez que uma arma naval combinou
a granada explosiva em trajetória tensa, marcando o inicio da obsolescência dos navios com casco de madeira com a
revolução da construção de navios com casco de aço.
98
Felisberto Caldeira Brant Pontes de Oliveira Horta (1772-1842), primeiro Visconde de Barbacena, militar, diplomata
e político brasileiro. Foi, no Brasil, pioneiro da navegação a vapor, tendo, em 1818, recebido de D. João VI o privilégio
de explorar o negócio com exclusividade por catorze anos. Foi Encarregado de negócios do Brasil em Londres, Ministro
da Fazenda, do Império, Deputado Geral e Senador.
meio de propulsão começaram a surgir no início do século XIX.
99
Em 1801, o engenheiro escocês
William Symington construiu um pequeno rebocador a roda; em 1803, Roberto Fulton, o percussor
da nova propulsão, construiu um pequeno barco a vapor que navegou no Rio Sena e, em 1807
100
,
nos Estados Unidos, construiu uma embarcação a vapor, o navio Clermont, que fez a viagem de
Nova Iorque para Albany. No ano de 1812, Fulton iniciou o projeto do primeiro navio de guerra a
vapor, a Fragata USS Demelogos
101
, lançada ao mar em 1815 após sua morte.
na Europa, o navio a vapor francês Élise, fez a primeira travessia do canal da Mancha em
1816, e, em 1819 o Savannah, realizou a primeira viagem de um navio a vapor cruzando o
Atlântico, partiu dos Estados Unidos e em vinte e seis dias chegou a Liverpool na Inglaterra. Em
1838, o Sírios inaugurou a travessia oceânica de passageiros, e em seguida o Great Western.
Portanto, a Marinha Mercante tratou logo em adaptar os seus meios para a nova realidade,
aumentando as dimensões de seus navios, para melhor acomodar a quina e os passageiros e/ou
carga. Logo apareceram as primeiras companhias de navegação a vapor, como em 1840 a Cunard
Line com o navio Britannia, e em 1843 o lançamento ao mar de navio com casco de ferro Great
Britain, dotado de hélice
102
.
Ainda em 1836, temos a invenção do hélice por F. Smith e J. Ericson, e para dar maior
proteção à máquina passou ela a ser montada sob a linha-d’água. Em 1850 ocorre o lançamento do
Napoléon (francês) (fig.:11) e em 1852, o lançamento do Agamemnon (inglês).
99
CAMINHA, Herick Marques, op. cit. nota 4.
100
Em 1806 Robert Fulton patenteou nos Estados Unidos o barco movido a vapor.
101
Era um catamarã com a roda entre os seus dois cascos; deste modo a roda ficava mais protegida, mas o navio tinha
pouca manobrabilidade.
102
Até meados da década de 1830, a construção anual de barcos a vapor não tinha tanta representatividade, só a partir de
1880 que se construiu na Grã-Bretanha mais navios a vapor que a vela.
Fig.:11
Desenvolvido pelos franceses, foi o primeiro navio de linha com hélice, ainda com propulsão mista.
A Guerra da Criméia (1853-1856) demonstrou a superioridade dos navios a vapor aos de
vela, e o aparecimento de navios dotados de couraça. A importância da couraça como mecanismo de
defesa foi visto no ataque ao forte de Kimburn, já o bombardeio de Sebastapol, do qual fazia parte o
Agamemnon e outro navio da mesma classe, mostrou o valor da propulsão a vapor que possibilitou
aos navios mistos se posicionarem convenientemente aos pontos a serem atacados, dando mais
eficácia ao bombardeio, indiferentes à direção do vento. Em 1859 ocorre o lançamento ao mar a
Fragata francesa Gloire composta de madeira e couraça. Em 1860 o do couraçado inglês Warrior
casco todo de ferro, com revestimento de madeira.(fig.: 12)
Fig.:12
Couraçado Warrior
Na Guerra de Secessão (1861-1865), Hampton Roads firmou a importância do navio
encouraçado, onde ocorreu o combate entre a Fragata Virginia (ex-Merrimac, borda alta, toda
fechada) (fig.:13) e o Monitor
103
(torre giratória) (fig.:14). Foi o primeiro combate entre navios
encouraçados, cujo resultado tático foi indeciso.
103
Veio a ser nome de classe de navio muito utilizado nas marinhas, inclusive na do Brasil por ocasião da Guerra da
Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai.
Fig.:13
Fragata Virgínia (ex-Merrimac)
Fig.:14
USS Monitor
Para acompanhar o avanço das modernidades navais surgiram novas armas e novas táticas,
como por exemplo, o projétil explosivo indefensável aos navios de madeira. Como exemplos
citamos novamente a Guerra da Criméia, por ocasião da Batalha de Sinope (1853), cuja repercussão
de seu uso ocasionou o aumento da espessura das couraças tornando os navios impenetráveis aos
projeteis; e o esporão (antiga arma de guerra), utilizado na tática naval do abarroamento, que foi
empregado com sucesso na Batalha Naval de Lissa (1866), na Batalha Naval do Riachuelo (1865), e
na Guerra de Secessão. No final do século XIX, o canhão retoma seu lugar na tática naval, quando
da Batalha de Tsushima no afundamento de um encouraçado por tiros de canhão (Guerra Russo-
Japonesa – 1904-5).
No Brasil, o primórdio da navegação a vapor pode ser referenciado com a montagem em
Salvador, no ano de1819, da máquina a vapor adquirida pelo futuro Marquês de Barbacena em um
casco ali construído e pela barca a vapor Swift, adquirida nos Estados Unidos da América, que aqui
tomou o nome de Bragança. Em 1825 foi adquirida na Inglaterra a barca a vapor Hibernia
104
, que
no Brasil tomou o nome de Correio Imperial e que foi assim o primeiro navio a vapor da Marinha.
Em fins de 1826, chegou ao Rio de Janeiro, procedente da Inglaterra, a barca a vapor Britania,
adquirida para servir a Esquadra Imperial e que passou a se chamar Correio Brasileiro.
105
Foram
essas as duas únicas embarcações a vapor que teve a Marinha no Primeiro reinado, e foi com elas
que se ensaiou o novo sistema de propulsão.
As transformações a seguir, resultantes do desenvolvimento tecnológico no setor naval
ocorreram em todas as áreas: na construção naval, na propulsão dos navios, nos seus equipamentos
e, no sistema de armas. A grande maioria dos navios de guerra da primeira metade do século XIX
era de construção de madeira, de propulsão apenas a vela, e armados com canhões de ferro,
montados sobre carretas, que dispostos ao longo dos bordos dos navios atiravam objetos sólidos,
das variantes existentes
106
, paulatinamente essa realidade foi sendo alterada.
104
Embarcação de casco de madeira e movida a rodas, a caldeira queimava carvão, mas recebia também lenha para
alimentar o fogo. Teve baixa em 1832.
105
Embarcação de casco de madeira e a propulsão a rodas. Dois mastros cruzando vergas proporcionavam-lhe a
possibilidade de navegar a vela. Foi o primeiro navio brasileiro a vapor que dispôs de armamento: uma colubrina (peça
de artilharia muito comprida) de calibre 12 e duas caronadas (peça de artilharia curta ) de 24. Deu baixa em 1851.
106
Até meados do século XIX existiam quatro tipos de projetis: o tiro sólido consistia de uma esfera de ferro fundido
compatível com o calibre do canhão; apresentava duas variantes o tiro com corrente (duas esferas eram ligadas por uma
corrente) e o tiro-barra (duas semi esferas eram unidas com uma barra de ferro); o tiro de estilhaços – várias camadas de
pequenas esferas sólidas de ferro colocadas em um saco de lona grossa, até atingir a forma de um cilindro com o
diâmetro compatível com o calibre do canhão, ou então colocava-se grande número de tiros de mosquete dentro de uma
caixa cilíndrica metálica; o tiro incendiário aquecia-se a esfera de ferro antes de coloca-la no canhão, ou então
preenchia –se uma estrutura do ferro com material combustível ; e o tiro explosivo preenchimento do espaço vazio da
esfera de ferro fundido com pólvora, um pavio, uma vez aceso fazia a lvora explodir, o projetil moderno é uma
evolução dessa granada explosiva.
1.6- Fumaça no horizonte: tentativas de preparo para um possível conflito platino.
O estuário do Prata, por seu posicionamento e com a desembocadura de três grandes rios
que formavam então, o caminho natural para a penetração continental, constituía um grande
potencial mercantil; a região portanto, representou o anseio das nações fronteiriças na busca do seu
domínio e exploração. A Cisplatina e a Guerra contra Rosas, ao meu ver, representaram a intenção
do Império brasileiro de manter um equilíbrio favorável aos seus interesses na região.
A livre navegação nos rios e os limites entre o Brasil e o Paraguai foram motivos de
discordância entre os dois países. Para o Império brasileiro era importante acessar, sem empecilhos,
a Província de Mato Grosso, navegando pelo Rio Paraguai, sabedores dessa necessidade, o Paraguai
com ambição em conseguir sucesso aos seus interesses nas discussões das questões de limites
territoriais, associava a livre navegação aos seus objetivos. A ruptura das relações diplomáticas com
o Paraguai (1853) alertou para a necessidade de se prover uma esquadra com capacidade de operar
naquelas águas e de defender os interesses do Império
107
. Em Relatório apresentado a Assembleia
Geral Legislativa relativo ao ano de 1857, informa o então Ministro e Secretário de Estado dos
Negócios da Marinha José Antonio Saraiva
108
que:
“A necessidade, que tínhamos de Navios apropriados
à navegação do Rio da Prata, do Amazonas, e de seus afluentes,
resolveu o Governo a mandar construir na Europa 10
Canhoneiras a vapor, que se achão promptas, e devem estar em
viagem para o Império.
Ao digno Vice-Almirante, Joaquim Marques
de Lisboa, encarregou o Governo d’essa tarefa, que foi
desempenhada satisfatoriamente.
109
Mesmo com a preocupação demonstrada por meio dos Relatórios dos Ministros da Marinha,
parece que não surtiu efeito nas camadas decisórias do governo, existia, porém, entre membros da
107
A preocupação com a navegação dos rios pode ser verificada no Relatório de 1856 do Ministro Paranhos, em que
informa ter determinado a três navios da esquadra (Maracanã, Jupurú e Paraguaçu), que estabelecessem a
comunicação regular entre o porto de Albuquerque e os de Assunção e Paraná. Tinham as instruções de identificarem: o
regime dos rios Paraguai e Paraná e de seus afluentes; os pontos de escala; e os pontos para estabelecimento de
depósitos de carvão de pedra ou de lenha.
108
José Antônio Saraiva, o Conselheiro Saraiva (1823-1895), foi advogado e político brasileiro. Foi Deputado
provincial, Presidente de província, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Ministro da Guerra, Ministro da Marinha
(Maio/1857 a Dez/1858, e em períodos dos anos de 1865 e de 1866), Ministro do Império, Ministro da Fazenda,
Senador do Brasil Império (de 1869 a1889) e da República (de 1890 a 1893).
109
RELATÓRIO apresentado a Assembleia Geral Legislativa na Segunda sessão da Décima Legislatura pelo Ministro e
Secretário d’Estado dos Negócios da Marinha. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1857. p.3.
imprensa da época, a preocupação em relação à situação política da região platina e as providências
adotadas pelo Império para fazer frente a um possível conflito. Em “Resenha Marítima” do Diário
de Pernambuco, datada de janeiro de 1860, Euzébio José Antunes
110
, publica as seguintes
palavras
111
:
“O Paraguai, preparando-se para resistir-nos,
quando tivermos de tratar com ele do ajuste de limites que ficou
adiado pela convenção de 6 de abril de 1856, para daí a seis anos,
aproxima-se do General Urquiza, e procura firmar suas alianças”
Em agosto do ano seguinte, analisando o parecer da 3
a
Comissão do Orçamento relativa ao
Ministério da Marinha, expõe a seguinte consideração:
“O que significa a expressão, na ausência de
guerra, a próxima ou remota, de que usa a comissão? Pode
nenhum homem de Estado prever se seu país, que hoje vive na
mais profunda paz com todas as Nações, estará amanhã em uma
guerra com alguma, ou com algumas delas, e que seja
injustamente provocado? E quando este país limita com povos
turbulentos e inquietos, como sucede ao Brasil, é possível que
alimentemos a esperança de superar sempre todas as dificuldades
que eles nos suscitam, de eximirmo-nos a uma luta em que
podemos de um momento para o outro acharmo-nos envolvidos?
Acabai com a Marinha Brasileira, imprudentes e imprevidentes
políticos, e acabareis com a nossa tranquilidade, com a felicidade
pública, e quiçá com a integridade do Império. Nós não podemos
ir ao Prata: o Paraguai, a Confederação, e o pequeno Estado
Oriental poderão chegar até nós. Então nos armaremos À pressa,
não atenderemos a sacrifícios.”
112
Apesar dos esforços envidados por alguns, foi visível a situação de despreparo em que se
encontravam as Instituições militares no alvorecer do conflito da Guerra da Tríplice Aliança, e a
corrida armamentista que teve que ser desenvolvida para fazer frente ao confronto.
110
Euzébio José Antunes, oficial de Marinha, foi correspondente do Jornal do Commercio, e do Correio Mercantil, no
transcorrer do conflito ora em estudo.
111
ANTUNES, Euzébio José, op. cit. nota 21, p.11.
112
Ibidem, p.12.
1.6.1 – Armamento
A criação da granada explosiva de Paixhans nos anos iniciais do século XIX provocou uma
revolução no armamento naval, os navios passaram a ter dois tipos de poderio de fogo, os projetis
sólidos convencionais e os canhões que atiravam as granadas explosivas. Em 1843, as mudanças
tecnológicas chegaram também às minas marítimas
113
, foi desenvolvido por Samuel Colt um
sistema de minas controladas, em que sua explosão ocorria por ação de um observador que acionava
um dispositivo.
A observação do desenrolar da Guerra da Criméia, após os resultados da batalha naval de
Sinope
114
, determinou a necessidade de se construir embarcações dotadas de couraça. Foi então
desenvolvido nos estaleiros franceses, cinco baterias flutuantes dotadas de couraças
metálicas(fig.15). Eram embarcações retangulares com casco de madeira, protegidas por placas de
ferro com propulsão a vapor. Atuaram de forma efetiva contra as defesas russas em águas interiores,
mas não poderiam ser consideradas embarcações para mares abertos. Independentemente de
qualquer coisa, foram considerados os primeiros encouraçados (ironclads) navais. A partir daí não
mais se podia duvidar da eficácia da couraça para os navios de guerra e ficou claro que a tecnologia
se voltaria para o aprimoramento dos canhões e dos projetis utilizados; pois a granada explosiva
seria eficaz contra a couraça se pudesse perfurá-la e explodir na parte vulnerável dos navios. Para
tanto o projetil tinha que ser cilíndrico e ter ponta (ogiva), como os canhões eram de alma lisa
115
, o
projetil ao deixar o tubo alma do canhão tinha uma trajetória instável, não se podendo garantir o
acerto no alvo; a alma raiada
116
nos canhões introduzida por Joseph Whitworth
117
, em 1846, seria a
solução para esse problema.
113
Também chamadas de torpedos, foram inicialmente desenvolvidas no século XVIII por David Bushnell, ancestral das
minas modernas só explodiam quando em contato com o alvo.
114
O confronto entre navios e fortalezas na época desta análise, era muito frequente, sendo francamente favorável às
fortalezas, não devido a fragilidade dos navios de madeira sem couraça mesmo em face dos projetos sólidos, mas,
também, à pouca eficácia dos canhões navais contra as poderosas defesas das fortalezas.
115
Alma refere-se ao interior do tubo de um canhão, compreendido entre a parte posterior do raiamento e a boca do tubo.
As antigas armas de fogo eram destituídas de raiamento, daí a denominação de alma lisa, elas atiravam projetil de
forma esférica.
116
Superfície interna do tubo alma, no qual se abre o raiamento. Raia representa cada um dos sulcos paralelos, em
espiral, feitos no interior do tubo-alma das modernas armas de fogo, para imprimir ao projetil movimento de rotação
que lhe dá maior estabilidade na sua trajetória e, portanto maior precisão. Criado pelo inglês Joseph Whitworth.
117
Joseph Whitworth (1803-1887), engenheiro mecânico inglês pioneiro na fabricação de equipamentos bélicos na
Inglaterra Engenheiro mecânico inglês pioneiro na fabricação de equipamentos bélicos na Inglaterra.
Fig.:15
Couraça retirada do Monitor Alagoas
Em 1854 os ingleses desenvolveram o canhão Armstrong
118
, que além de raiado, era
recarregável pela culatra. Embora tenha sido adotado pelo Exército britânico, não o foi pela
Marinha (devido ao seu perigoso sistema de carregamento) que preferiu manter em suas belonaves
canhões de alma lisa, carregados pela boca.
119
A Armada Brasileira optou pelo Armamento
Whitworth, cujas peças de maior calibre também eram carregadas por esta forma. Assim os
primeiros canhões raiados do sistema Whitworth chegaram ao Brasil no ano de 1864, sendo,
portanto com os canhões Paixhans e Whitworth que a Marinha atuou na Guerra da Tríplice Aliança
contra o governo do Paraguai.
118
Tinha carregamento pela culatra (parte posterior do canhão, dotada de dispositivos que permitem acesso à câmara),
alma raiada e cinta de chumbo para que pudessem engrazar (introduzir o projetil na câmara de uma boca de fogo, de
modo que seus anéis de forçamento se prendam às raias do tubo-alma) nas ranhuras do tubo alma.
119
Em relatório de 1856, a Assembleia Geral Legislativa, o então Ministro da Marinha, José Maria da Silva Paranhos,
informa que “O armamento de nossos navios de guerra não tem ainda um sistema fixo....Convém estabelecer regra e
uniformidade em matéria tão essencial à força naval. Julgo conveniente encarregar a um de nossos mais distintos
Oficiais de ir a Europa estudar o estado atual dos armamentos navais, que nesses anos tiveram sucessivas mudanças, e
devem receber novos melhoramentos da grande experiência da guerra do oriente.”
1.6.2 – Construção naval
A atualização dos meios navais da Marinha brasileira após a Cisplatina foi bastante lenta até
cerca de 1850, embora, desde 1830, figurassem na esquadra as barcas a vapor
120
. Por exemplo, a
construção da Corveta Campista
121
, iniciada em 1824 e pronta para navegar em 1827, é um marco
da retomada da construção naval; da mesma forma a Corveta D. Januária, cuja quilha foi batida em
julho de 1826; e a D. Amélia
122
, lançada ao mar em 1830. Tais embarcações, embora de pequeno
porte e reduzido armamento, prestaram excelentes serviços na campanha da Cisplatina. Durante a
Regência a produtividade do Arsenal foi pequena, nesse período foram lançados apenas três
pequenos navios: Lúgar
123
Esmenia (1836), Brigue-Escuna
124
Calíope (1839), e Patacho
125
Argos
(1840).
Fig.: 16
Perfil de alguns tipos de embarcação utilizadas no texto.
120
Pequenas embarcações empregadas nos serviços auxiliares.
121
Projeto do então 1
o
construtor, Primeiro-Tenente José dos Santos Primeiro. Teve seu nome mudado para D.
Francisca, em homenagem a irmã de D. Pedro I. Seu primeiro nome, Campista, foi restabelecido em 1831, após a
abdicação. Teve baixa em 1846.
122
Homenagem a Imperatriz Amélia, ficou pronta para navegar em fevereiro de 1831; após a abdicação passou a se
chamar Sete de Abril, em homenagem a esse acontecimento. Teve baixa em 1847.
123
Ou lugre, navio de formas finas, de três mastros.
124
Navio de vela menor que o brigue (navio a vela com dois mastros)
125
Navio a vela com dois mastros.
Após a maioridade a primeira construção foi a Corveta Euterpe
126
Em 1843 foi construída no
Arsenal da Corte, a primeira embarcação a vapor feita no país, a barca Tétis, tendo sido importados
da Inglaterra os motores e caldeiras. Na busca em acompanhar os avanços tecnológicos o Brasil
127
adquiriu navios no exterior e incentivou a construção naval. Como resultado da primeira temos a
aquisição da Fragata Amazonas
128
(fig.17) em 1852, e dois anos depois quatro canhoneiras a hélice;
quanto a segunda, em 1854 iniciou a construção da Canhoneira Ipiranga
129
(fig.18), o primeiro navio
a hélice construído no país; e a construção da Corveta Niterói
130
(fig.19), até então o maior navio
construído no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, lançada ao mar em abril de 1862.
Fig.: 17
Fragata Amazonas
126
Ainda no Segundo Reinado foram construídos os seguintes navios: Escuna Villegagnon, Corvetas Bahiana, Imperial
Marinheiro, Brigue Maranhão, e Brigue-Escuna Toneleiro.
127
O agravamento das relações do Brasil com o Paraguai, consequência das divergências quanto as questões de
fronteiras e livre navegação nos rios da região, estimulou maiores investimentos no Poder Naval, principalmente em
termos de preparação de mão-de-obra qualificada.
128
Fragata de propulsão mista, a roda. Primeiro navio a vapor de grande porte a ser incorporado à esquadra.
129
O projeto é de autoria do engenheiro Napoleão Level, executado no Arsenal da Corte, as máquinas e as caldeiras, sob
supervisão do Engenheiro Carlos Braconnot, foram construídas também no Arsenal.
130
Projeto de Napoleão Level, a máquina, construída no Arsenal era de propulsão a hélice.
Fig.:18
Canhoneira Ipiranga
Fig.:19
Corveta Niterói
A ruptura das relações diplomáticas com o Paraguai (1853) reforçou o fomento para a
renovação do Poder Naval, em 1857 iniciou a construção da Corveta Niterói
131
. Diante da
possibilidade de um conflito em águas do Rio Paraguai, que exigia dos meios navais características
distintas das necessárias à navegação em mar aberto, como pequeno calado
132
e, como os conflitos
anteriores demonstraram necessário, estrutura reforçada com couraça em face da existência de
muitos fortes nas margens do rio, recebeu Joaquim Marques Lisboa o encargo de adquirir na Europa
131
Por dificuldades técnicas, o navio só foi prontificado em 1863, foi dotado com canhões de alma raiada.
132
Espaço ocupado pelo navio dentro da água.
canhoneiras que pudessem navegar no Prata. Em carta (anexo 2) remetida ao Almirante Tamandaré
pelo Ministro da Marinha, Conselheiro José Antonio Saraiva , datada de 13 de outubro de 1857,
o relato da missão a ele atribuída referente a compra, na Europa, de 10 canhoneiras, especificando
as qualidades essenciais esperada desses navios para o cumprimento da missão que a elas será
destinada, da mesma forma forma fala da necessidade de engajamento de marinhagem
133
; relata
ainda sobre a conturbada relação Brasil-Paraguai, informando da missão de Paranhos no tocante a
livre navegabilidade dos rios, que seu resultado reforça a necessidade de se ter meios navais com
capacidade para enfrentar a fortaleza de Humaitá, em um possível conflito armado.
Como resultado são recebidas, no ano de 1858, duas canhoneiras construídas na França e
sete na Inglaterra, todas com propulsão mista a hélice. Essas unidades constituíam então o núcleo da
Esquadra brasileira, com os navios de maior porte e calado e menor possibilidade de manobra
reservados para a proteção do tráfego marítimo ao longo das costas do Brasil, inadequados que
eram para operações fluviais.
A partir de 1865, o desafio criado pela guerra iria ser a causa de um novo surto de
desenvolvimento da construção naval no País, especialmente no Arsenal da Corte
134
. Nesse ano foi
lançada ao mar uma canhoneira a vapor e dois navios encouraçados; em 1866, um navio
encouraçado e duas bombardeiras; no ano seguinte, uma corveta e três monitores encouraçados; em
1868, três monitores encouraçados, além do início da construção da Corveta Encouraçada Sete de
Setembro. O arsenal de Mato Grosso, situado na área próxima ao conflito, em Cerrito, também
contribuiu para o esforço de guerra: em 1863, construiu uma canhoneira a vapor, de rodas; e em
1864, um vapor fluvial de rodas. Contribuiu, também, o estaleiro civil da Ponta da Areia, situado
em Niterói, com duas canhoneiras.
133
Acredito que com o novo sistema de máquinas dos monitores, o engajamento de marinhagem estrangeira esta ligada
ao fato de se ter mão de obra especializada na sua operação, com o tempo o conhecimento será passado para a
marinheiragem nacional. No final do documento Saraiva recomenda ainda que seja engajado vinte marinheiros
experientes na praticagem das barras difíceis e arriscadas da Holanda, para utiliza-los na praticagem da barra do Rio
Grande e outros locais do Império.
134
O Arsenal de Marinha cumpria um papel de “indústria motriz”, criando um fluxo intersetorial propiciando o
surgimento de outros estaleiros de construção naval e de atividades correlatas e complementares. Ao longo do século
XIX, este impulso gerado, associado à expansão urbana da capital, dinamizou ainda mais a indústria da construção
naval. Estabelecido próximo à Saúde e Prainha, onde haviam vários trapiches, foi criando um aglomerado de estaleiros
navais que atendiam as suas demandas e a dos navios que ancoravam no porto e nos trapiches, além de construírem
embarcações. No estaleiro da Ponta da Areia, de propriedade do Barão de Mauá, em Niterói, a Marinha encomendou
entre 1849 e 1883 doze navios do tipo vapor, cruzador, corveta, canhoneira, galeota e patacho. No estaleiro Miers &
Irmãos Co., em 1857, foram encomendados dois cascos de navios. Esta mesma empresa também realizou a importação
de estrutura de ferro para o Arsenal, constituindo-se num dos seus maiores prestadores de serviços.
Os projetos dos encouraçados e dos monitores
135
encouraçados eram de Napoleão Level
136
, e
as máquinas instaladas foram de projeto e construção nacionais, a cargo de Carlos Braconnot
137
.
Dificuldade maior do que o reparo e a aquisição do material flutuante era o suprimento da
Esquadra de tripulações suficientes às necessidades da guerra. Navios e seus pertences adquire-se
ou se constroem de pronto, bons marinheiros não se adquire e menos ainda se formam em pouco
tempo. Nem quanto à oficialidade, nem tocante a praça-de-pré
138
das diversas classes ofereciam os
corpos de Marinha pessoal correspondente ao maior número de navios que era preciso armar. Como
solução nomeou o Governo alguns oficiais de náutica, ou pilotos, segundos-tenentes de comissão;
os guardas-marinha
139
foram convocados para suprir os vazios da oficialidade.
As praças-de-pré da Armada distribuíam-se pela marinhagem, Batalhão Naval e Corpo de
Imperiais Marinheiros. Um dos obstáculos a vencer era o preenchimento dos numerosos claros
existentes nesses corpos. No Corpo de Imperiais Marinheiros, que formava o grosso das guarnições,
era constituído por pessoal educado profissionalmente, militavam, em 1865, apenas 1929 praças de
um total necessário de 2496. As Companhias de Aprendizes Marinheiros encontrava-se também
desfalcada com 734 menores de um total necessário de 1017. Na carência notada de voluntários,
e a falta de componentes de uma Marinha Mercante que cobrisse as necessidades, decidiu o governo
conceder prêmios aos que se alistasse.
135
Os monitores encouraçados eram de construção mista de madeira e ferro e levavam couraça de ferro; sua única
propulsão era a vapor; dispunham de um canhão montado em torre giratória, na linha do centro do navio; e tinham
pequeno calado e ótima manobrabilidade. O projeto obedecia as linhas de seu precursor da Guerra da secessão, o
Monitor.
136
Napoleão João Baptista Level nasceu na Bahia, em 20 de novembro de 1828, iniciou sua vida profissional no
Arsenal de Marinha da Bahia como aprendiz de 1ª classe da oficina de carpinteiros de machado. O talento do jovem
Napoleão Level na arte da construção naval impôs sua transferência para o Arsenal de Marinha da Corte. Com a
capacidade demonstrada nas aulas de Geometria, Desenho e Sala de Risco desse Arsenal, foi enviado para estudar
Engenharia na Europa. Enquanto estudava foi incumbido pelo Governo brasileiro da fiscalização da construção das
Fragatas D. Afonso e Amazonas, na Inglaterra. Regressou em 1852, sendo elevado ao posto de construtor no Arsenal
da Corte, foi o primeiro brasileiro graduado em Engenharia Naval. Seis anos depois, foi lançado ao mar o Patacho
Iguassú, construído no estaleiro da Ponta da Areia de acordo com seus planos. Em 1860, assumiu o posto de Diretor de
Construções Navais do Arsenal de Marinha da Corte. Em fins de 1862, retornou à Europa para estudar construção de
navios com o casco protegido por couraças de metal, os navios encouraçados. Napoleão Level notabilizou-se pela
competência demonstrada no imenso esforço deflagrado pelo Arsenal de Marinha durante a Guerra da Tríplice Aliança
contra o Paraguai.
137
Carlos Braconnot nasceu no Rio de Janeiro, em 9 de dezembro de 1831. Com 15 anos de idade, matriculou-se na
Academia de Marinha. Guarda-Marinha lutou na guerra contra Oribe e Rosas, tomando parte na Passagem de Toneleiro.
Em 1852, foi mandado a Inglaterra para instruir-se na construção de máquinas a vapor. Após quatro anos de intenso
aprendizado, empregou seus conhecimentos nas Oficinas de Máquinas do Arsenal de Marinha da Corte, como
engenheiro. Foi nomeado Diretor dessas Oficinas em 1863, com a eclosão da guerra da Tríplice Aliança contra o
governo do Paraguai dedicou-se intensamente ao preparo da Esquadra para o combate. Projetou e construiu as máquinas
para os navios que a Marinha necessitava, como os Encouraçados Tamandaré, Barroso e Rio de Janeiro; os Monitores
Pará, Rio Grande, Alagoas, Piauí, Ceará e Santa Catarina; e as Canhoneiras Forte Coimbra e Pedro Afonso. Também
participou ativamente no reparo dos navios que seguiam para o teatro de operações.
138
Designação dos militares que não tinham patente de oficial, atualmente é denominado de praça ao militar pertencente
a qualquer corpo ou quadro do pessoal subalterno da Marinha do Brasil.
139
Denominação dada aos alunos da Academia de Marinha (atual Escola Naval) em seu último ano de curso.
Capítulo II
O ponto de inflexão institucional da Marinha: o conflito em terras distantes
“A Campanha do Paraguai só pode ser descrita por quem a
observou, os quadros traçados pela fantasia não podem
desprender-se da pena do escritor, por isso que essa campanha é
especial sob qualquer ponto de vista, que o historiógrafo a
procure estudar”.
Carlos Frederico dos Santos Xavier
140
Por ocasião do início da Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai, uma
parcela da esquadra imperial brasileira (anexo 3) encontrava-se no Rio da Prata empreendendo o
bloqueio à República Oriental do Uruguai, em consequência à instabilidade política derivada do
conflito entre os partidos Blanco (de Atanásio de La Cruz Aguirre) e Colorado (de Venâncio Flores)
que se digladiavam pelo poder. O partido Colorado tinha o apoio do Império brasileiro, o Blanco
buscava sustentação no Paraguai. Residiam, então, na República Oriental cerca de 40.000 súditos
do Império; as disputas internas causavam prejuízo aos negócios dos brasileiros instalados, da
mesma forma que os constrangimentos impostos pelo governo Blanco de Aguirre tornava difícil a
sua permanência e sobrevivência. Como consequência das reclamações chegadas à Corte, o governo
enviou uma missão diplomática a Montevidéu, chefiada por José Antônio Saraiva
141
. A Missão
Saraiva
142
objetivou, portanto, solicitar ao governo uruguaio o cumprimento dos deveres daquele
Estado não só em favor dos brasileiros, mas também em atender ao clamor geral do país, colocando
o Império brasileiro na condição de um responsável moral em face da opinião pública. Os termos da
reclamação foram os seguintes:
1- O castigo, se não a todos, ao menos dos criminosos conhecidos, que gozavam de
liberdade e segurança, alguns exercendo mesmo empregos civis e ocupando, outros, postos no
Exército da Republica;
2- Imediata destituição e responsabilidade dos agentes de polícia, que haviam abusado da
140
Cirurgião-Mór da Armada Nacional e Imperial, Dignatário da Imperial Ordem da Rosa, Oficial do Cruzeiro,
Cavalheiro da ordem de S. Bento e Aviz, condecorado com as medalhas do Uruguai em 1851, 1852 e 1864, e Chefe de
Saúde da Esquadra nas duas campanhas.
141
Foi intenção desse recurso diplomático se respaldar em um apelo amigável feito ao Estado uruguaio, para atender
devidamente às reclamações contra as graves ofensas aos súditos brasileiros ali residentes, e cuja propriedade, honra e
vida não encontravam proteção.
142
Euzébio José Antunes informa na edição do Jornal do Commercio de 21 de maio de 1864, que havia uma persuasão
geral de que o resultado da Missão Saraiva seria fecundo e restituiria a paz, que os estrangeiros em geral e os nacionais
a fitavam com os olhos de esperança; porém a notícia de que uma esquadra viria junto com a missão, produziu um
desagradável efeito.
autoridade de que se achavam revestidos;
3- Indenização das propriedades extorquidas a brasileiros;
4- Liberdade de todos os súditos do Império, constrangidos ao serviço das armas;
5- Efetividade, em prol dos brasileiros, das garantias prometidas pelas leis da República a
todos os habitantes do respectivo território;
6- Fiel desempenho dos compromissos existentes entre o Brasil e a República no sentido de
serem atendidos os certificados de nacionalidade, subscritos pelos funcionários competentes; e
7- Respeito às atribuições e regalias dos agentes consulares.
Mediante o não atendimento das reclamações e diante da situação da guerra civil instalada,
decidiu Saraiva, com a autorização do governo brasileiro ajudar a restabelecer a paz no Uruguai.
Saraiva tratou de unir seus esforços aos negociadores britânico e argentino
143
, mas a tentativa de
obtenção da paz não surtiu o efeito desejado. Contudo com o respaldo do governo argentino,
Saraiva apresentou ultimato ao governo uruguaio, dando um prazo de seis dias para atender as
exigências e ameaçando represálias.
Os termos do ultimato foram os seguintes: que as forças do Exército Nacional, estacionadas
na fronteira, receberiam ordem para proceder a represálias sempre que fossem violentados os
súditos de Sua Majestade, ou ameaçadas suas vidas e segurança, incumbindo os respectivos
comandantes de providenciar pela forma que fosse mais conveniente e eficaz a bem da proteção de
que eles carecem; e que também o Vice-Almirante brasileiro receberia ordem e instruções para
proteger, com a força de sua Esquadra às suas ordens, os agentes consulares e os cidadãos
brasileiros ofendidos por quaisquer autoridades ou indivíduos incitados a cometer desordens, pela
violência da imprensa, ou instigações das mesmas autoridades.. Com a recusa, pelo governo Blanco
em aceitar o ultimato, decidiu o Ministro Saraiva dar por finda sua missão e retornar para a Corte
144
,
não antes de enviar ao Almirante Tamandaré comunicação do seu intento com as seguintes
orientações: ser conveniente manter estacionados navios de guerra em Paissandu, Salto e Colônia, e
que estes, além da proteção devida aos cidadãos brasileiros, não deviam tolerar que os dois vapores
do Governo Oriental, e quaisquer outros, levem tropas para os pontos indicados, sendo de interesse
seu apresamento quando fizer necessário. A historiografia atesta que a não aceitação das condições
por parte do governo Blanco, se deveu a crença de que teriam o auxílio de forças paraguaias a
143
O presidente argentino Bartolomeu Mitre, e o representante britânico em Montevidéu Edward Thompson, também
tinham interesse no término do conflito.
144
Segundo Maria Luísa Nabinger de Almeida, houve quem atribuísse o fracasso da Missão Saraiva à qualidade do
enviado especial, pois tratava-se de um representante da “diplomacia de partido”, não tendo sido aceito a opção do
gabinete liberal de enviar para Montevidéu um homem da política. Porém, os argumentos brasileiros para justificar o
fracasso dessas negociações imputaram ao presidente Aguirre a culpa por ter-se recusado a por termo à guerra civil.
Desde o fracasso da Missão Saraiva observa-se a troca de acusações entre os dois países sobre a responsabilidade dos
Estados, onde ambos se eximiam da culpa.
mando de Francisco Solano Lopez .
Com a retirada do Saraiva, e devido a sua alta patente, foi o Almirante Tamandaré
confirmado na chefia das Forças brasileiras em operações no Rio da Prata, recebendo de Saraiva
todos os amplos e plenos poderes de que o investira o Governo Imperial para dirigir a parte política
da campanha. Logo após a recusa do ultimato, ocorreu a imobilização do Vapor uruguaio General
Artigas; a caça ao navio Villa del Salto, incendiado pela própria guarnição; a invasão do território
da República; e o desalojamento da guarnição da Vila de Melo e sua ocupação por tropas
brasileiras. Em outubro de 1864 foi efetivado o bloqueio aos portos de Salto e Paissandu. No geral,
as ordens passadas aos comandantes dos navios brasileiros se resumiam no seguinte:
posicionamento adequado das canhoneiras; notificação aos demais navios de bandeira estrangeira
do bloqueio; e apreensão de navios que após tomar conhecimento do bloqueio tentem violá-lo.
O General Venâncio Flores fez chegar a Tamandaré sua intenção de terminar prontamente
com a luta e estabelecer a paz no Estado Oriental, após conferências acordaram a cooperação mútua
para alcançar esse objetivo, tendo Flores reconhecido a justiça das queixas dos brasileiros e que
estava intimamente disposto a atender aos reclamos do Governo Imperial. A intenção do Pacto de
Santa Lúcia, assinado entre o General Venâncio Flores e o Vice-Almirante Tamandaré em 20 de
outubro de 1864, não revelou a condição de beligerante do Império, mas também transformou a
atuação da diplomacia brasileira, ainda que involuntariamente, em promotora de um golpe de
Estado contra a República Oriental do Uruguai, particularmente contra o governo dos blancos. Em
dezembro de 1864 chega a Buenos Aires José Maria Paranhos, o Visconde do Rio Branco, com a
missão de definir a situação brasileira junto ao governo da República Argentina (os dois países
contraíram laços de perpétua aliança pela Convenção da Paz de 1828, além de ser dever dos dois
signatários contratantes auxiliar e proteger a província de Montevidéu); segundo o governo Imperial
não estava ele em guerra como governo de Montevidéu, exercia-se ali represálias para chegar a um
acordo que evitasse a guerra. Não havendo assim beligerantes. Desde logo, e oficialmente, o
governo argentino chefiado por Bartolomeu Mitre anunciou que se manteria neutro com relação ao
conflito entre o Brasil, o governo constituído do Estado uruguaio e as tropas rebeldes conduzidas
por Venâncio Flores.
De acordo com a analise de José Francisco de Lima
145
, a situação naquele momento era de
que o Governo Imperial havia afirmado a nação e, por meio de seus representantes no estrangeiro,
aos países interessados na solução do conflito, que sua intervenção no Estado Oriental nada tinha a
ver com a luta partidária de muito existente, mas sim com as reclamações feitas em desagravo a
145
LIMA, José Francisco de. Marquês de Tamandaré: patrono da Marinha: seu perfil histórico. Rio de Janeiro: Serviço
de Documentação da Marinha, 1999. p.211.
forma de tratamento dispensado aos nacionais residentes naquele país, e achando-se Tamandaré
diante de grande dificuldade para tornar efetivo o contido no ultimato apresentado pelo Conselheiro
Saraiva, devido poder contar apenas com a força embarcada nos navios da esquadra, até a chegada
dos regimentos terrestres que ocorreu em final de dezembro, o oferecimento de Flores em reunir
suas forças às imperiais, foi a solução ideal para aquele momento
146
.
Na sequência dos eventos, a 26 de outubro foi iniciado o bloqueio dos portos de Salto e
Paissandu, e decidido pela tomada da cidade de Salto, devido oferecer posição estratégica favorável
para servir de base de apoio para o ataque a Paissandu. Sua tomada ocorrida em 28 de novembro
não exigiu grandes sacrifícios, quer dos atacantes quer dos defensores, uma vez que, mal as
primeiras granadas de artilharia começaram a cair sobre as casa, as bandeiras brancas tremularam
no espaço, anunciando a rendição.
a cidade de Paissandu, por possuir vários pontos de defesa, era tão bem guarnecida e
defendida que os brasileiros chegaram a denomina-la de Forte Sebastapol, em alusão a Guerra da
Crimeia, representava a chave do Rio Uruguai e porta de entrada para qualquer ação naval brasileira
pelo sul, em combinação com a invasão terrestre pelo norte. Foram duas investidas à Paissandu, a
primeira durou três dias, com os navios brasileiros bombardeando incessantemente a sua praça
fortificada para auxiliar no avanço das forças de terra; durante o combate, um grupamento
conduzido pelo Primeiro-Tenente Antônio Carlos de Mariz e Barros conquistou Bela Vista
(elevação ao norte de Paissandu), na qual montaram canhões retirados dos navios. No terceiro dia
Tamandaré suspendeu o ataque, aguardando o reforço de contingente do Exército Imperial. Na
manhã de 31 de dezembro, a Força Naval e o contingente do Exército Imperial, sob o comando do
Marechal Mena Barreto juntamente com as tropas de Flores, reiniciaram o ataque à Paissandu, que
culminou na sua ocupação. As operações para tomada de Paissandu iniciaram em 3 de dezembro, só
tendo ocorrido sua conquista em 2 de janeiro de 1865. Mas então havia ocorrido a agressão
paraguaia.
2.1- A agressão paraguaia
Desde que assumiu a presidência da República do Paraguai, Francisco Solano Lopez
147
se
dedicou a organizar com cuidado as forças militares, alcançando proporções superiores às dos
146
A respeito da demora do Exército brasileiro, Antunes desabafa em edição do Jornal do Commercio datada de 6 de
dezembro: “Por que não marcha o Exército Imperial? Por que ainda hoje não se tem notícia dele, três meses depois da
rejeição do ultimatum? Por que não se sente a ação do Brasil senão frouxamente, quando ela devia ser decisiva?”.
147
Francisco Solano Lopez (1827-1870) filho de Carlos Antônio Lopez ditador paraguaio, estudou na Europa onde
absorveu o sistema militar prussiano. Durante suas viagens, comprou armas e munições para as forças armadas
paraguaias, e ao ser nomeado ministro da Guerra e da Marinha, Lopez adotou o sistema militar aprendido na Europa.
Após a morte de seu pai, em1862, Solano Lopez assumiu a presidência da República do Paraguai, lá permanecendo até
sua morte.
demais países da América do Sul. Estrategicamente, o Paraguai permaneceu afastado das disputas
regionais durante as décadas que se seguiram ao período de independência. Na década dos
cinquenta, todavia, esta nação, geopoliticamente dominada pelas vias aquaviárias, passou a ser
envolvida em confrontações com seus vizinhos e com as potências navais estrangeiras. Em 10 de
fevereiro de 1855, o Forte Itaipu atirou contra o navio norte americano USS Water Witch, enquanto
ele estava encalhado, participava de uma expedição exploratória. Quatro anos mais tarde, os
Estados Unidos enviou um esquadrão ao Rio da Prata para exigir indenização, era composto de
quinze navios de guerra. O vapor Fulton seguiu até Humaitá levando a intimação de indenização de
dez mil dólares, os demais permaneceram em Montevidéu. Como resultado das negociações foi
concedido indenização aos familiares dos tripulantes do USS Water Witch, e um vantajoso contrato
comercial.
As primeiras disputas com o Brasil surgiram a respeito das fronteiras do norte, em 1850; o
Brasil considerava o Rio Apa como seu limite, enquanto os paraguaios tinham como divisa o Rio
Branco. O Brasil ocupou o Pan de Azúcar, uma elevação no território disputado, sendo ali
desalojados pelos paraguaios. Ainda em 1855, em reação as interferências paraguaias feitas a
navegação aos navios brasileiros no Rio Paraguai e ao ataque ao porto brasileiro de Salinas em
frente ao Forte Olímpio, foi enviado uma força naval composta de vinte navios de guerra sob o
comando do Almirante Pedro Ferreira de Oliveira como ato de intimidação. Como resultado,
ocorreu o tratado assinado em Abril de 1855, que permitiu resolver alguns dos problemas entre os
dois países.
Em 1859 ocorreu um incidente com a Grã-Bretanha, a diretiva inglesa era de proibir a
navegação paraguaia fora do rio Paraná até que o Paraguai se submetesse a determinadas exigências
inglesas (tratava-se de prisão pelas autoridades paraguaias de um cidadão com dupla nacionalidade
inglês/uruguaia). Somente em 1862, após muitos entendimentos diplomáticos a Inglaterra retirou
a maioria de suas exigências.
Esses movimentos não passaram desapercebido ao olhar do Império, ao menos, por alguns
segmentos da sociedade, conforme consta nas manifestações de preocupação publicadas na
imprensa como a de autoria de Euzébio José Antunes datadas de 1860 e 1861:
O Paraguai, preparando para resistir-nos, quando
tivermos de tratar com ele do ajuste de limites que ficou adiado pela
convenção de 6 de abril de 1856...aproxima-se do General Urquiza ,
e procura firmar alianças.”
148
O que significa a expressão, na ausência de guerra, a
148
ANTUNES, Euzébio José, op. cit. nota 21, p.11
próxima ou remota, de que usa a Comissão?
149
Pode nenhum homem
de Estado prever se seu país, que hoje vive na mais profunda paz com
todas as nações, estará amanhã em uma guerra com alguma, ou
algumas delas, e que seja injustamente provocado? E quando este
país limita com povos turbulentos e inquietos, como sucede ao Brasil,
é possível que alimentemos a esperança de superar sempre todas as
dificuldades que eles nos suscitam, de eximirmo-nos a uma luta em
que podemos de um momento para o outro acharmo-nos envolvidos?
Acabai com a Marinha Brasileira, imprudentes e imprevidentes
políticos, e acabareis com a nossa tranquilidade, com a felicidade
pública, e quiçá com a integridade do Império. Nós não poderemos ir
ao Prata: o Paraguai, a Confederação, e o pequeno Estado Oriental
poderão chegar até nós. Então nos armaremos à pressa, não
atenderemos a sacrifícios”
150
Conta-nos Visconde de Ouro Preto:
“A despeito do patriótico movimento da opinião, que
concitara o Governo a cuidar mais seriamente, do que até então
fizera, dos aprestos militares
151
que não despreza nenhum povo
prudente; sem embargo da nobilíssima reação do espírito público,
determinado por violências recentes de alguns navios ingleses, que,
obedecendo a ordens tresloucadas do Ministro Christie, violaram a
soberania nacional em nossas águas territoriais, executando injustas
represálias por supostos agravos, cuja inexistência depois reconheceu
o próprio governo Britânico, dando condignas satisfações; apesar
desses precedentes, que nos deviam por de sobreaviso, recaímos na
antiga inércia e voltáramos ao habitual desleixo no tocante ao
Exército e à Armada.
“Passado o momento agudo do célebre conflito inglês
ninguém mais cogitou de preparar o país para a contingência de uma
149
Antunes se refere ao parecer da 3
a
Comissão de Orçamento na parte relativa ao Ministério dos Negócios da Marinha,
datada de 1861.
150
ANTUNES, Euzébio José, op. cit. Nota 21, p. 11-2.
151
A ideia de um conflito com o Paraguai passava ao largo das mentes das autoridades brasileiras, baseado nos
importantes serviços que o Império havia prestado para o reconhecimento de sua independência e, depois, para sua
organização militar quando cedeu instrutores tirados de seus quadros de oficiais, como engenheiros e artilheiros.
guerra, chegando o fatal desprendimento a ponto de que um oficial do
exército, o Coronel Carneiro de Campos, presidente nomeado para
Mato Grosso e por notável coincidência a primeira vítima de tamanho
erro, opôs-se na Câmara dos Deputados a pequeno aumento nos
quadros da primeira linha comungando talvez nas mesmas ideias de
outro representante da nação, que naquele recinto não duvidou
declarar, que daria graças à Providência se visse arder o último navio
da Esquadra Brasileira”
152
.
Ainda em 1863 em artigo do Jornal do Commercio Antunes informa:
“Procedente do Havre, vieram oito canhões raiados de 24,
com todas as sua pertenças, consignados ao Cônsul do Paraguai, em
Buenos Aires. É a segunda remessa de artilharia deste sistema que
vem para aquela República... Consta também que o Presidente Lopez
encomendou algumas canhoneiras para decidir pacificamente a
questão de limite conosco”.
153
Nesse mesmo periódico foi noticiado o desembarque de dois mil barris de pólvora em
Assunção, e a movimentação paraguaia para o recrutamento e reorganização de seu exército, era
abril de 1864.
George Thompson
154
relata que o Paraguai começou a se preparar ativamente para a guerra
no começo de 1864, e em março desse ano Lopez estabeleceu em Cerro Léon um acampamento
onde 30.000 homens de dezesseis a cinquenta anos, recebiam instrução militar. Ao mesmo tempo
17.000 recrutas eram exercitados em Encarnación, 10.000 em Humaitá, 4.000 em Assunção e 3.000
em Conceição
155
. Informa ainda que a imprensa de Buenos Aires mostrou-se grandemente alarmada
com o recrutamento e instrução em Cerro Léon, e que a preparação militar do Paraguai era realizada
em grande escala para um país de seu tamanho e recursos.
Com todos esses indícios e fatos é de se estranhar que o Império brasileiro não demonstrasse
alguma preocupação com o que ocorria.
Em 30 de agosto o Governo Paraguaio protestou contra o ultimato apresentado pelo governo
brasileiro ao uruguaio, e declarou que a entrada de forças brasileiras no Estado Oriental seria por ele
152
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op. cit. nota 17, p.27-8.
153
Jornal do Commercio, n
o
316 de 16 de novembro de 1863.
154
THOMPSON, George, op. cit. nota 28, p.32
155
Ao todo cerca de 64.000 homens receberam instrução militar em seis meses, de março a agosto de 1864.
considerada como ameaça à independência do referido Estado, a que procederia, caso ocorresse,
como lhe parecesse útil ao equilíbrio do sul da América.
Em represália ao que ocorria na República Oriental, a 14 de novembro de 1864 uma força
naval paraguaia interceptou o Vapor brasileiro Marquês de Olinda, quando este subia o Rio
Paraguai transportando o novo presidente da província de Mato Grosso, Coronel Frederico Carneiro
de Campos, fazendo-o presa de guerra. Logo a seguir, a Província de Mato Grosso foi invadida por
tropas paraguaias, sendo ocupado o Forte Coimbra. Diante desses fatos, o Império brasileiro aceita
o Estado de Guerra contra o Paraguai.
Prisioneiro da geopolítica, Lopez acreditava poder romper a clausura do Paraguai e chegar
ao estuário do Rio da Prata por meio da abertura de um corredor terrestre, entre Assunção e
Montevidéu, anexando aos seus domínios a cidade argentina de Corrientes, parte do território
brasileiro do Mato Grosso (para ter o controle total do Rio Apa) e a então Província do Rio Grande
do Sul. Continuando em seu objetivo maior que era o domínio fluvial da região, Solano Lopez
arquitetou o ataque ao Rio Grande do Sul. Para tanto, solicitou permissão do governo argentino para
atravessar Corrientes com seu exército. Não obtendo tal permissão, ordenou a ocupação da
Província de Corrientes, localizada na margem esquerda do Rio Paraná
156
. A notícia de que um
exército paraguaio invadira a província de Corrientes, depois de ter a sua Esquadra se apoderado
traiçoeiramente na véspera de dois navios de guerra argentinos que estavam fundeados naquela
província, provocou indignação geral no Rio da Prata.
Como consequência da ocupação paraguaia à Corrientes, em 1
o
de maio de 1865, o Brasil, a
Argentina e o Uruguai assinaram o Tratado da Tríplice Aliança contra o Governo do Paraguai
157
.
Em linhas gerais, estava, pois, iniciada a Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do
Paraguai(anexo 4).
2.2- A mobilização e a estratégia da Força Naval (1
a
fase da guerra)
Apesar de se encontrar em pleno estado de guerra com a República Oriental, o Brasil estava
desarmado quando da agressão do governo paraguaio, se fora suficiente o poder combatente
existente para fazer frente ao conflito na República Oriental, o mesmo não ocorria diante de uma
nação fortemente mobilizada. Ademais, as informações relativas ao estado geral das forças
paraguaias deixava a desejar, um exemplo é o contido no informe dirigido ao Almirante Tamandaré
156
Segundo Thompson, ficou estabelecido que Buenos Aires declarara virtualmente guerra ao Paraguai ao não conceder
permissão às suas tropas para atravessarem Corrientes, enquanto permitira aos brasileiros subir o rio e ameaçar o
Paraguai. THOMPSON, George, op. cit. nota 28, p.51.
157
O Tratado estipulava que as operações envolvendo forças navais e terrestres seriam operações conjuntas, ou seja, sem
unidade de comando. Ao Almirante Tamandaré coube o comando da Força Naval aliada.
referente a estrutura militar paraguaia do Ministro Residente em Assunção, César Sauvam Vianna
de Lima, datado de 13 de outubro de 1864, que deixou a falsa noção de que o Paraguai não
representava perigo ao Império brasileiro. Esse documento informava que a força total do exército
era de 30 mil homens, que dez mil homens das tropas regulares brasileiras seria o suficiente para
calar os seus canhões; que a instrução militar paraguaia era quase nula; que grande parte do
armamento era composta por espingardas antigas, muitas com pederneiras; quanto as fortificações,
só mencionava a de Humaitá e umas baterias postadas nas eminências da entrada do ancoradouro da
capital (Assunção); e que a esquadra paraguaia compunha-se de 11 vapores, não podendo-se dar
nome de navios de guerra, sendo o Tacuari o único que estava armado, mas em péssimo estado por
ser muito velho
158
. Em verdade, Lopez contava no início do conflito com cerca de 80 mil soldados
mobilizados. A esquadra paraguaia era composta pelos vapores Tacuarí, Paraguari, Igurei,
Marquês de Olinda, Iporá, Paraná, Olimpo, Pira-Guirá, Argentina, Flying-Fish, e Pulasky; navios
à vela: Escunas Independência e Aquidabã; Patachos: Rosário, General, Lopez e Paraguari;
Lanchões: Humaitá, Cerro Leon e Coimbra. Além de várias chatas (no mínimo 12) e navios
capturados de primeiro momento do conflito, a saber: Vapores Anhambaí e Ipanema (brasileiros); e
25 de Mayo, Gualeguay e Salto Oriental (argentinos). Totalizando 23 vapores, cinco navios de vela
e três lanchões. Thompson outra conta no que se refere aos meios navais paraguaios:
“compunha-se de dezessete pequenos vapores, todos de passageiros, com exceção do Añambay e do
Tacuarí, ambos construídos como canhoneiras. Eram todos armados com canhões não raiados, de
calibre 4 e 32 libras. O Jejuí tinha uma peça calibre 12, raiada, de carregar pela culatra. Os
marinheiros estavam armados de fuzis Witton com sabres-baionetas.”
159
No início da guerra a Marinha dispunha de 45 navios armados, distribuídos pelos distritos
navais, ou empregados em comissões. Destes, 33 eram de propulsão mista e 12 dependiam
exclusivamente do vento. Para a navegação nos rios era essencial a propulsão a vapor, e muitos não
tinham o calado apropriado para a navegação dos rios Paraguai e Paraná. A partir de 1865, ocorreu
mobilização para capacitar nossas forças navais não com meios de propulsão a vapor, mas
também com calado adequado para a navegação dos rios.
A guerra demandou da Marinha brasileira muitos e variados serviços em rios extensos e de
difícil navegação, sendo necessário para o sucesso das operações tirar o maior proveito dos
elementos que dispunha, e criar todos os demais que fossem necessários lançar mão.
O primeiro cuidado que o Almirante Tamandaré tomou foi propor ao Governo Imperial, por
ofício de 5 de fevereiro de 1865, a construção de uma flotilha de transportes fluviais, que iriam
158
ANTUNES, José Euzébio, op. cit. nota 21, p. 47-51.
159
THOMPSON, George, op. cit. nota 28, p. 59.
assegurar a mobilidade do Exército e a sua condução até as imediações de Três Bocas com uma
despesa insignificante comparada ao fretamento de vapores. A constante preocupação com o erário,
traço de sua personalidade, é assim retratada por Artur Silveira da Mota, ao comentar em suas
memórias o comportamento de Tamandaré quanto o gasto do erário:
Ele exigia que os movimentos dos navios no Rio da Parta se
fizesse todos à vela, mesmo quando tivessem velas auxiliares,
sendo o motor principal o vapor “Carvão é ouro, dizia ele; temos de
trocá-lo por libras esterlinas” . Mesmo nos Rios Uruguai e Paraná
era de rigor abafar os fogos sempre que havia vento à feição, por
menos veleiro fosse o navio. De sobressalentes se fornecia o
estritamente necessário. Até das munições de guerra era avaro...e
possuía mesmo um talento assombroso para manejar os detalhes da
economia de uma esquadra.”
160
O Governo Imperial
161
nada decidiu a este respeito, provavelmente porque, apanhado de
surpresa, ainda não tivesse resolvido qual o ponto por onde invadiria o território inimigo, que era
tão desconhecido como seus recursos
162
. Não podendo esperar por uma definição mais objetiva do
como agir, decidiu Tamandaré adotar a estratégia naval do bloqueio. Sendo os rios Paraná e
Paraguai as artérias de comunicação com o Paraguai, dividiu a Força Naval em três Divisões - uma
permaneceu em Buenos Aires e as outras duas subiram o Rio Paraná. Assim informou o seu plano
de manobra ao Ministro da Marinha, em 3 de março de 1865:
“... Desde já preparo uma forte divisão, composta do
Amazonas, Jequitinhonha, Beberibe, Parnaíba e Belmonte, que até o
dia 15 deve partir a tomar posição conveniente para fazer efetivo o
bloqueio daquela república. É, porém, minha opinião que o bloqueio
deveria ser estabelecido simultaneamente com o desembarque de uma
força de dez mil homens, 15 milhas de Humaitá. O acampamento
deste Exército seria flanqueado por nossas canhoneiras tanto no Rio
Paraguai como no Paraná, e assim em comunicação com a Marinha,
160
JACEGUAI, Arthur Silveira da Mota, op. cit. nota 22, p.62. Essa característica de Tamandaré certamente contribuiu
para o controle do provimento de suprimentos na guerra.
161
O conteúdo do Oficio reservado datado de 4 de maio de 1865, assinado por Francisco Xavier Pinto Lima, não passa,
ao meu ver, nenhuma orientação, excetuando a que diz respeito ao alistamento de alguns cidadãos do Paraguai que
ofereceram seus serviços militares, em que Tamandaré fica autorizado a contrata-los para as guarnições dos navios,
incorporando-os com as mesmas condições e vantagens com que eram admitidos os demais estrangeiros.
162
ANTUNES, José Euzébio, op. cit. nota 21, p.59-60.
ficaria logo em circunstância de resistir ao triplo ou quádruplo da
força inimiga que o quisesse atacar, protegendo-se também com
fortificações passageiras.
“O bloqueio deste modo estritamente estabelecido não
concorreria para proibir toda a comunicação com o Paraguai, que
ficaria completamente isolado...
“Penso, portanto, que deveríamos transportar para o dito
lugar o Exército que se acha em Montevidéu, empregando neste
transporte todos os nossos paquetes, e os vapores de nossa Esquadra,
rebocando os navios de vela e chatas que fosse mister fretar aqui
para este fim. Até a cavalaria poderia ser assim conduzida,
desmontada, mas levando, cada cavalo, seus arreios e pertenças,
para vestir a cavalhada que recebesse de Corrientes... Em 30 dias
colocaríamos 15 ou 20 mil homens na margem direita desse rio, em
território paraguaio, poupando-nos uma longa e incômoda viagem
por terra a este Exército...”
163
Nesse mesmo documento, Tamandaré informou que seria necessário que os navios
brasileiros estivessem providos de talhadeiras para cortarem as correntes de ferro que
provavelmente existiriam para bloquear a passagem dos navios junto às fortificações paraguaias;
citou ainda que da exemplo a Batalha de Sebastapol, o governo paraguaio poderia meter a pique
alguns navios para fechar o canal. Quanto ao armamento naval, solicitou mil revólveres, seis mil
granadas de mão, dois mil foguetes a Congrave e de sinais, duas mil metralhas de 68 e duas mil de
32; quatro mil bombas; e para os canhões raiados de 70, 32 e 6, do sistema Withworth, solicitou dois
mil projetos sortidos.
Numerosos vasos de vela ou a vapor, pertencentes uns ao Estado e outros fretados
começaram a partir constantemente do Rio de Janeiro para o ancoradouro da esquadra no teatro de
guera, e vice-versa, mantendo frequentes a comunicação com o governo central; cumpria-se torná-la
periódicas, em dias certos e determinados para maior regularidade e facilidade dos fornecimentos.
Assim, estabeleceu-se uma linha de transporte quinzenal, zarpando simultaneamente os vapores da
esquadra para a capital e desta para o lugar onde se achasse o navio almirante, nos dias 15 e 30 de
cada mês. Os vapores que fizeram esse serviço foram: Isabel, Vassimon, Apa e Marcílio Dias.
Tinham escala em Corrientes para entrega e recebimento de correspondência, e em Montevidéu
163
Ibidem, p. 61-6.
para receberem carvão. Ficavam de reserva o Leopoldina, para substituir qualquer falta e empregar-
se no reboque dos navios a vela, que transportavam gêneros, e o Werneck para trazer a Corte
despachos urgentes, quando fosse preciso. O Visconde de Ouro Preto informa que:
Este serviço, que até o fim da guerra desempenhou-se com a
maior pontualidade, sem que desse jamais o menor transtorno, foi de
incalculáveis vantagens. Reduziu-se grandemente a despesa dos
fretamentos; a esquadra achou-se sempre perfeitamente abastecida;
as notícias eram frequentes, as comunicações seguras.”
164
Apesar dessa afirmativa de Ouro Preto verifica-se no Diário de Inhaúma que em certos
momentos ocorreram quebra de continuidade no recebimento das correspondências tanto oficiais
quanto particulares, algumas tendo chegado com atraso de mais um mês, situação até compreensível
considerando a situação de guerra e a distancia entre os dois pontos de contato
165
.
Coerente com seu plano mandou aprontar oito canhoneiras para subirem o Rio Paraná,
formando duas Divisões, uma sob o comando do Chefe Barroso
166
e outra do Chefe Segundino
167
. O
provimento dos navios demorou o tempo necessário para que eles não sofressem falta alguma no
interior do rio. O primeiro cuidado foi assegurar a mobilidade dessa Força Naval, assim, comprou-
se um depósito de 500 toneladas de carvão que existia em Corrientes, celebrou-se contratos de
fornecimento de víveres, sobressalentes e medicamentos; e como as guarnições dos navios estavam
reduzidas, foi embarcada, sob o comando do Coronel Bruce
168
uma Brigada do Exército.
A 29 de março todos os navios tinham seguido para efetivar o bloqueio dos rios, e em 13 de
abril ocorreu a invasão paraguaia de Corrientes. Esse novo cenário colocou a questão do
abastecimento dos navios em situação precária, perdendo a Força Naval a facilidade do depósito de
carvão de Corrientes, ficou reduzida ao do Paraná, e ao que algumas escunas expedidas de Buenos
Aires poderiam fornecer. Os navios haviam levado mantimentos suficientes para 3 meses, e ainda
em 14 de maio a escuna Bela Margarida, largou de Montevidéu para se juntar aos navios levando
200 mil rações de todas as classes. Mesmo assim a falta do carvão para o pronto uso na queima das
máquinas dos navios poderia prejudicar a mobilidade dos navios, sendo necessário tomar medidas
adequadas para não prejudicar as operações então em andamento.
164
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op. cit. nota 17, p. 64.
165
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p.60 e 64.
166
Manoel Barroso da Silva, acumulava a função de Chefe do Estado-Maior de Tamandaré.
167
José Segundino de Gomensoro.
168
Brigadeiro João Guilherme Bruce, teve destacada atuação na guerra. A Brigada permaneceu embarcada nos navios
da Marinha mesmo após a chegada de Caxias no teatro de operações.
A primeira ação aliada na guerra foi a retomada de Corrientes. As duas divisões da força
naval brasileira, sob o comando do Chefe-de-Divisão Francisco Manoel Barroso da Silva,
transportaram as tropas aliadas que efetuaram a retomada. Combinou-se o ataque para o dia 25 de
maio. Naquela manhã, os navios suspenderam e subiram o rio (estavam em Bela Vista) em direção a
Corrientes, chegando, efetuou-se o desembarque das tropas
169
que infligiu grandes perdas ao
inimigo. O combate durou 17 horas, que ao final culminou com a retomada da cidade. Vejamos
como o Almirante Barroso narrou em seu diário o ocorrido:
25 de maio
“Ao romper do dia, como se tinha disposto na véspera, os
navios tomaram os seus reboques, e ao nascer do sol
embandeirávamos nos topes com a bandeira argentina no mastro
grande, por ser dia de gala de nossos aliados. Os vapores Pampeiro e
Pávon fizeram o mesmo; mas com a Bandeira Brasileira no mesmo
mastro, o que foi demasiada delicadeza....Às 10h chegamos em frente
à coluna, deixando todos os reboques fundeados do lado do Chaco, e
seguimos a colocarmo-nos em duas linhas em frente a cidade, dando
fundo às 11h.... Enquanto isto se fazia [desembarque das tropas] os
paraguaios por dentro das casas se dirigiam ao lugar do
desembarque; mas a coluna de atiradores, e os navios fizeram fogo
sobre eles..., e eles entrincheirados em uma casa que lhes servia de
quartel, muito hostilizavam a nossa gente...Deste lugar para acidade
há uma ponte, a qual os paraguaios defendiam de outro lado, mas ao
final também foram desalojados,...”
170
Interessante notar que apesar do estado de guerra, a cortesia entre os aliados era fortemente
aplicada, e registrada em quase todos os documentos, mesmo quando contrariados por algum
motivo; o mesmo pode-se dizer em relação ao inimigo quando foram respeitados os dias de festa de
cada nação.
Apesar de derrotados, os paraguaios não desistiram de Corrientes, e a notícia da chegada de
reforços ao inimigo motivou a evacuação do exército argentino daquela cidade
171
. Mais uma vez a
Força Naval ficou sem o apoio de abastecimento previamente agendado. Após a operação, os navios
169
Foi desembarcada parte da Brigada do Coronel Bruce com duas bocas de fogo.
170
AMAZONAS, Francisco Manuel Barroso da Silva, op. cit. nota 19, p. 41.
171
Logo após a ocupação de Corrientes, ocorreu a evacuação das forças aliadas, que segundo documento relatando a
marcha do Exército, fora motivada devido ao pequeno número de força em comparação ao do inimigo que se reunia
rapidamente; o embargo da passagem do gado; e a falta da cavalaria.
desceram o rio algumas milhas e atracaram em sua margem direita. Neste ponto recorreremos
novamente ao Diário de Barroso, no intuito de demonstrar que, apesar dos entraves logísticos
causados pela perda de Corrientes, o abastecimento dos navios da Força Naval continuou a ser
realizado, mesmo que de modo precário:
27 de maio
“Tanta lida, trabalho, sangue, e mortes para no outro dia
deixarmos o lugar que com tanta bravura se havia tomado!
“28 de maio
“Bom tempo, vento do lado norte, toda a Esquadra fez lenha
em terra para alimentar as caldeiras...Perguntei aos navios a
quantidade de praças a municiar, e eu verifiquei que havia 2.081.
“30 de maio
“... os quais fundearam próximos a nós à 1h da tarde,
trazendo aquele [vapor Igurei] carvão para 36 horas. Da Escuna
Anna Maria com 56 toneladas, e do Patacho Giovanni Costa com
122, mandei dar combustível à Araguari e depois à Mearim e à
Iguatemi.
“31 de maio
“Trata-se de descarregar o Patacho Giovanni Costa que trouxe
carvão; passou-se recibo de 56 toneladas ao mestre da Escuna Anna
Maria.
“1
o
de junho
“Como ao partir contávamos obter pão e carne em Corrientes,
e este recurso nos falhou por ter sido esta cidade ocupada pelos
paraguaios, principiamos a consumir logo a bolacha e carnes
salgadas que trouxemos. Dispus para que amanhã siga o Ipiranga até
o Ricón do Soto para buscar carne.
“4 de junho
“Fui a bordo de todos os navios depois da missa, e neles
encontrei para mais de 200 doentes de diarreia, bexiga e tifo.
“5 de junho
“A 1h da tarde chegou uma pequena escuna argentina, saída
de Buenos Aires em abril. Comprei a ela, para dar dietas aos
doentes, bolachinhas, arroz, aletria e açúcar fino; porque se
concluíram todas que trouxemos com tão extraordinário número de
enfermos que temos tido.”
172
Verifica-se nessas anotações de Barroso que, para alimentar as caldeiras, na falta de carvão
adotou-se a lenha vegetal, e o elevado número de doentes com as moléstias que tantas vidas
ceifaram, e ainda era maio de 1865.
O domínio dos rios também foi um dos objetivos de Solano Lopez, e a supressão da
esquadra brasileira era uma necessidade para o desenvolvimento de sua meta. Com esse objetivo em
mente elaborou a operação de ataque a força naval estacionada no rio Paraná, próximo a Corrientes,
sendo os preparativos para esse ataque feitos em Humaitá, sob a direção do próprio Lopez. Os
navios paraguaios desceram
173
, sob o comando do Comandante Meza, pelo Rio Paraguai e Paraná,
tinham a missão de dar combate aos navios de Barroso, tomá-los e incorporá-los a sua força.
Era o início da Batalha Naval do Riachuelo. A importância desse evento, ocorrido a 11 de
junho de 1865, deve-se ao fato que garantiu às forças aliadas o efetivo domínio dos rios, que
representavam então, as estradas para Assunção. Lopez quando de suas viagens para a Europa,
encomendou a construção de navios couraçados do tipo “casamata” (proteção encouraçada instalada
na tolda dos navios de combate fluviais, cobrindo canhões de grosso calibre capazes de atirar para
um e outro bordo) e do tipo de “torres” (estrutura couraçada de forma cilíndrica, que possibilita
atirar em várias direções). Quando voltou para o Paraguai, não esperou a chegada dos navios
encomendados; julgando-se bastante forte em terra, rompeu as hostilidades. Este erro custou-lhe
muito caro, pois com o resultado de Riachuelo ficou completamente bloqueado não podendo
cumprir os compromissos assumidos com as firmas construtoras. Aproveitando-se dessa situação o
Governo brasileiro conseguiu que os navios fossem prontificados para sua esquadra. Assim foram
adquiridos os Monitores-Encouraçados Bahia, Silvado e Lima Barros; e os Casamatas-
Encouraçados Mariz e Barros e Herval.
Em carta datada de 1
o
de janeiro de 1865, Jo Maria da
Silva Paranhos, informa ao Almirante Tamandaré a vinda de navios encouraçados encomendados
pelo governo paraguaio, que deveriam ser aprisionados ou então negada provisões nos portos
brasileiros em que tocar primeiro.(anexo 5).
Após a batalha naval, e dos relatórios a que ela se seguiram o Almirante Barroso alertou
tanto nos documentos oficiais como em seu diário, da necessidade de reforço de marinheiros e
172
Logo após a ocupação ocorreu a evacuação das forças aliadas, que segundo documento relatando a marcha do
Exército, informava que fora motivada devido ao pequeno número de força em comparação ao do inimigo que se reunia
rapidamente, e o embargo da passagem do gado, e a falta da cavalaria.
173
Compunham a força naval paraguaia os seguintes meios navais; Tacuarí (capitânia), Paraguarí, Igurei, Iporá,
Marquês de Olinda, Jejuí, Salto Oriental, Pirabebé e Iberá (devido a uma avaria não pode descer com os demais
navios).
oficiais para o serviço na Força Naval em Operações de Guerra. Foi no meio de preparativos para
formar uma esquadrilha, a fim de subir com ela para o Alto Uruguai, que Tamandaré recebeu em
Buenos Aires a notícia do combate de Riachuelo; tratou logo de organizar vasto hospital, como
veremos mais adiante, e enviar todos os recursos que eram necessários para reparar as faltas que
havia, que chegaram em 18 de junho após a Passagem de Mercedes. Um dos pontos positivos de
Riachuelo foi o fortalecimento da Aliança com a Argentina, que apesar dos acordos estabelecidos,
permanecia certa reserva quanto os reais interesses, desvanecido com o ocorrido.
O resultado adverso
174
em Riachuelo não abateu os ideais de Solano Lopez. Determinou ao
General Robles
175
que fosse montada na Barranca de Mercedes, cerca de duas léguas abaixo de
Riachuelo, uma poderosa fortificação, com o objetivo de separar a esquadra brasileira, com essa
manobra pretendia cortar as comunicações e a remessa de suprimentos. Descoberto esse ardil,
Barroso forçou a barragem e, após vivíssimo fogo de artilharia e fuzilaria, transpôs o obstáculo,
fundeando no Chimboral, quinze léguas abaixo de Corrientes. Vejamos agora o que relatou a parte
oficial de Barroso para Tamandaré, datada de 18 de junho de 1865
176
:
A escassez de carvão, bem como a falta de âncoras, me fez
resolver mandar descer ontem a Canhoneira Araguari, Comandante
Hoonholtz, até onde se achava encalhado do lado do Chaco o Vapor
Marques de Olinda, destruído no dia 11, para lhe tomar algum
combustível que ele tivesse bem como algum armamento.
... Felizmente na ida da canhoneira fez descobrir que os
paraguaios se estavam fortificando mais abaixo sobre a barranca de
Mercedes... colocando nelas peças de artilharia e grande número de
tropas de infantaria....A colocação dessa bateria de na menos de 20
bocas de fogo, coadjuvada por mil e tanto soldados de infantaria,
tem a meu ver dobrado fim: O primeiro não deixar subir embarcação
alguma, pois hoje as que sobem são para auxiliar a nossa
Esquadra e qualquer que venha com carvão e mantimentos, ao
primeiro tiro se retirará, certa de que não perderá o seu frete, pois
não poderia resistir a força maior; e no seguiríamos faltos de carvão,
174
THOMPSON, George, op. cit nota 28, p. 76. Thompson em analise após a Batalha cita que duas “das principais
desvantagens que os paraguaios tiveram de enfrentar consistiam em serem os navios brasileiros muitíssimo mais altos
que os seus, de modo que mal podiam abordá-los, acrescendo que todos os barcos brasileiros traziam erguidas suas
redes contra abordagem [ essa mesma característica iria auxiliar nos ataques das chatas paraguaias]; a outra
desvantagem era que os vapores brasileiros, quase todos movidos a hélice, desvencilhavam-se com muita facilidade dos
paraguaios, que não tinham ganchos de fixação para abordagem.
175
General Venceslau Robles comandou o Exército paraguaio.
176
ANTUNES, José Euzébio, op. cit nota 21, p.131-4.
como presentemente nos achamos. O segundo é que, quanto mais
descer o rio, os nossos navios maiores não poderiam passar na
travessia de Peguahó, e então viriam com o resto de seus navios,
como no dia 11, colocar-se por baixo da barranca protegidos pela
artilharia e fuzilaria nela assentadas...Todas essas considerações me
induziram a tomar a resolução de descer para não ficarmos
bloqueados...
...Ao avistar o ponto fortificado, demos viva a S.M. o
Imperador; ao Império do Brasil, ao Exército Nacional e à Armada.
A 1 e 20h começou o fogo...Nós apenas respondemos antes de chegar
a posição de transpô-la... às 2 e 35h estava tudo passado, e o fogo
havia passado. Seguimos a vir fundear no Ricón de Caballos e
esperar carvão...Navegaram bem os navios...Se estas fortificações
volantes nas barrancas continuarem, precisaremos em breve de
grandes reparos que não poderemos efetuar por estarmos longe de
recursos..”
177
.
Em todo conflito a sorte e a oportunidade andam do lado do sucesso, e foi isso que ocorreu
a falta do carvão e a manobra por sua busca surpreendeu o inimigo em sua intenção de bloqueio,
possibilitando a Força Naval brasileira tomar ação para desarticulá-la.
Ainda por Barroso
178
, temos a notícia de que no dia 19 de junho chegou o Brigue Pepiriassu,
rebocado pela Ivaí, com carregamento de carvão, 200 quintais
179
de carne seca, e outros
mantimentos, assim a força naval estava suprida por mais um mês e meio. Nesse mesmo dia os
Patachos Maria Tereza e Cavour chegaram com 108 e 123 toneladas de carvão respectivamente
180
.
No dia 20 chegou o Paquete Espigador, com mantimentos que completavam dois meses; e aos 22 o
Vapor argentino Guardia Nacional entregou dez mil quintais de carne seca; e a escuna Conceição
47 toneladas de carvão. No dia 23 a força naval recebeu 74 toneladas de carvão da Escuna Nova
Rosita e 72 toneladas da Escuna Lombardia.
181
177
Possivelmente esse comentário foi o que motivou o estabelecimento do Arsenal de Cerrito.
178
AMAZONAS, Francisco Manuel Barroso da Silva, op. cit. nota 19.
179
Medida antiga de peso correspondia a 4 arrobas, ou seja, cerca de 60 Kg.
180
A correspondência de uma tonelada é 1.000 kg, existe registro de que um navio consumia 291kg/h de carvão por
caldeira, e que um navio de cruzeiro gasta 60 toneladas por dia em cruzeiro de 10 nós, daí o registro da grande
quantidade de fornecimento de carvão, e sua constante falta.
181
No mês de julho também houve grande movimento de navios trazendo carvão para a Força Naval, totalizando 279
toneladas. Como Barroso contratou o fornecimento de carne seca no Rincón do Soto, solicitou que esse gênero não mais
viesse de Buenos Aires. No dia 12 de julho chegaram mantimentos com reses vivas, roupa, medicamento e víveres. Em
19 de julho chegaram sobressalentes, medicamentos, dietas e muitos outros objetos necessários; sendo que no dia 26 o
Não desanimaram os paraguaios diante do insucesso de Mercedes. Com o mesmo propósito
deslocaram-se para posição mais abaixo, em Cuevas, perto de Bela Vista, onde o canal do rio é
estreito e tortuoso e a barranca bastante elevada. Nesse local foram dispostos, em bateria, mais de
trinta canhões e 3.000 atiradores. Cumprindo a ordem vinda de Tamandaré, Barroso suspendeu de
Chimboral e em duas Divisões
182
a 12 de agosto, apesar do combate feroz e sangrento com
consideráveis avarias aos navios, obteve mais uma vitória.. Assim descreveu as operações o
Almirante Tamandaré ao Ministro da Marinha:
... a descida de nossa Esquadra tornou-se necessária para
não ficar ela com a retaguarda cortada, por baterias, e assim
incomunicável. É conveniente que ela marche sempre paralelamente
aos movimentos do Exército inimigo, enquanto este não for cortado
pelo nosso Exército... Os nossos navios sofreram algumas avarias, e
quando chegarem os operários que se esperam dessa Corte, os
mandarei para o Paraná, a fim de recupera-los.”
183
Nesse momento chegamos ao final do que foi instituído como a primeira fase da guerra, que
se constituiu notadamente do ataque paraguaio ao território e ás forças aliadas. Até então, a
incipiente e falha estrutura logística pode ser sentida, não na sua origem, mas no objeto de seu
suporte- as unidades da Força Naval -, pois não havia apoio efetivo no tocante ao suprimento de
víveres, carvão e tudo o mais necessário para o enfrentamento com o inimigo, em território inóspito
e desconhecido, distante dos centros de abastecimento Rio de Janeiro, Buenos Aires e
Montevidéu, devido especialmente pela dificuldade de se fazer chegar os suprimentos aos meios
navais. A estruturação de uma base de apoio tornou-se medida primordial para a manutenção do
fluxo logístico e para as futuras operações. É o que veremos a seguir.
2.3 - A invasão do território paraguaio (2
a
fase da guerra)
A vitória alcançada em Riachuelo já havia assegurado às Forças Aliadas a liberdade do uso
do Rio Paraná e o bloqueio da via fluvial para o uso do inimigo como eixo de abastecimento,
neutralizando o poder naval de Solano Lopez, encerrando desta feita, a fase ofensiva da guerra
Transporte Apa aportou transportando o 14
o
Batalhão de Voluntários, e para reforçar a Força Naval, marinheiros e
alguns oficiais, rebocava a Barca Quarahim, que trazia da Côrte munições navais e de guerra.
182
Incorporaram às Divisões, a canhoneira argentina Guardia Nacional, sob o comando do Coronel-de-Marina
Muratore.
183
ANTUNES, José Euzébio, op cit. nota 21, p. 155.
desencadeada pelo inimigo. Seus exércitos foram compelidos ao retraimento, à procura de posições
defensivas. Jataí, Uruguaiana e Corrientes passaram a constituir territórios sob domínio aliado,
propiciando a invasão do terreno paraguaio.
Finalmente, em dezembro de 1865, os exércitos aliados encontravam-se reunidos a leste de
Corrientes e ao sul de Três Bocas. Nessa ocasião, o Conselho de Guerra
184
tomou a decisão de
investir sobre o território inimigo, ficando acordado que a invasão se processaria com a travessia do
Rio Paraná pelas tropas aliadas, transportadas por navios da Marinha, até à sua margem direita.
Restou apenas a fixação de local apropriado para o desembarque, a ser definido após o
reconhecimento daquele rio por navios da Esquadra. Era necessário elaborar plano que atendesse
tanto às necessidades da Marinha como às do Exército, e com essa premissa, os Estados-Maiores
das Forças entraram em atividade analisando o problema, os fatores condicionantes, as
possibilidades e opções, e finalmente, as diversas linhas de ação e suas variáveis. Nas palavras de
Tasso Fragoso:
“Cabia-lhes agora prepararem-se para a invasão e depois
efetuá-la. Era inevitável que perdessem algum tempo na primeira
parte deste trabalho, pois que, como sempre, havia mister improvisar
in loco, e não era problema insignificante transpor, de uma margem
para outra de rios caudalosos como o Paraná e o Paraguai, uma massa
de 40.000 homens, e movê-la depois em terreno de que não havia
cartas topográficas e, pode-se afinal dizer, completamente
desconhecido.”
185
A base de operações foi montada em Corrientes, com local para construção de barcas que
operariam em apoio ao transporte das tropas (Arsenal de Cerrito), de unidade de saúde (hospital) e
acampamento para os militares. Paralelo as atividades desenvolvidas para a prontificação da base de
operações e aprestamento do pessoal, os navios da Força Naval faziam constante patrulhamento da
área, visto os consecutivos ataques das chatas paraguaias e do fogo do Forte Itapiru às bases e aos
meios navais aliados.
Barroso que vinha, desde outubro de 1865, empreendendo o reconhecimento do Rio
Paraná na altura de Três Bocas, pouco pode adiantar, em face do reduzido número de meios
186
que
184
O Conselho de Guerra era formado por Mitre, Gelly y Obes, Urquiza, Flores, Tamandaré e Osório.
185
FRAGOSO, Tasso História da guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai. Rio de Janeiro: Imprensa do Estado-
Maior do Exército, 1934.
186
Os navios que compunham a Divisão de Barroso eram: Fragata Amazonas, que devido ao seu calado não podia
passar de Corrientes; os vapores Belmonte, que tinha o fundo arruinado e as caldeiras em mal estado; Beberibe; Magé;
Ipiranga; Mearim; Ivaí, velha e estragada sem condição de sustentar um combate; Araguari; Itajaí; e Igurei, pequeno
dispunha. Era-lhe impossível dominar as 60 léguas de um rio repleto de ilhas e bancos, sem o
recurso de carta hidrográfica ou, de auxílio de práticos, não podendo também, arriscar sem proveito
os meios que seriam necessários para o desembarque dos exércitos aliados. Por estes motivos não
avançou no reconhecimento do Rio Paraná, nem fez frente aos vários raids dos paraguaios nas
margens dos aliados. Não obstante, a presença dos navios de nossa Esquadra manobrando na área
de Três Bocas exerceu o efeito de presença das forças aliadas na confluência dos Rios Paraná e
Paraguai, dissuadindo qualquer tentativa, a mais, do inimigo em descer as águas do rio.
Em janeiro de 1866 iniciou-se a movimentação do restante das tropas e de navios para a
base de operações. A 8 de fevereiro, o Almirante Tamandaré, partiu de Buenos Aires com a
Canhoneira Parnaíba e o Vapor Onze de Junho, chegando em Corrientes no dia 21. A 25 de
fevereiro, reuniram-se, no quartel-general de Bartolomeu Mitre, os chefes militares Venâncio
Flores, Marechal-de-Campo Manuel Luís Osório e Almirante Tamandaré, sendo decidido que
Tamandaré assumiria o comando das operações a serem realizadas.
Nesta ocasião era preciso estabelecer uma definição fundamental, encontrar um local de
desembarque, que seria a solução de compromisso para um problema até então inédito, pois, que
além de assegurar o sucesso da operação como um todo, deveria atender aos requisitos operacionais
de ambas as Forças.
A 20 de março, já contando com o reforço de mais meios navais
187
, a força aliada bloqueou a
confluência do Paraná e Paraguai, interceptando todas as comunicações do inimigo entre os dois
rios, e fazendo cessar as incursões que, até então, vinham sendo realizadas pelos vapores
remanescentes da Esquadra de Lopez. A esquadra contava então com quatro encouraçados, uma
fragata, 15 canhoneiras, três avisos, 12 transportes e um patacho. Acrescentem-se mais sete vapores
fretados, utilizados para o abastecimento das forças aliadas e que Tamandaré, prudentemente, reteve
para auxiliarem no transporte do Exército.
vapor utilizado para transportar víveres.
187
Os encouraçados e os monitores construídos no arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, como veremos posteriormente.
Fig.: 20
Fig.: 21
Encouraçado Bahia
Fig.: 22
Encouraçado Barroso
Fig.: 23
Encouraçado Tamandaré
Encouraçado Brasil
Para o reconhecimento do Rio Paraná, foi constituído, um grupo-tarefa composto pelo
Encouraçado Tamandaré e pelas Canhoneiras Araguari e Henrique Martins, que iniciaram
exploração dos Passos do Alto do Paraná até Itati. Nesse grupo estava embarcada a comissão de
hidrógrafos (Primeiros-Tenentes Arthur Silveira da Mota, Antônio Luís Von Hoonholtz e Cunha
Couto) incumbida de proceder ao levantamento, sondagem e delimitação de canais de acesso ao rio.
Outras comissões de sondagem se seguiram.
A necessidade de se realizar tantas operações de reconhecimento, deve-se ao fato de que um
dos aspectos mais importantes no planejamento de uma operação de desembarque com oposição,
como era a situação que se desenhava, é a escolha do local do desembarque, sendo no planejamento
de uma operação desta natureza, que se evidencia, em toda a sua complexidade e plenitude, a
necessidade da perfeita coordenação entre as forças envolvidas, ou seja o local deveria atender as
necessidades operativas de todos os envolvidos. Nas palavras do comandante Diogo Borges Fortes:
“...uma praia ótima para a Esquadra pode ser de nenhum valor
para a penetração das forças terrestres; reciprocamente, a praia de
características ideais para a progressão do Exército, pode ser
inabordável pela Marinha.”
188
Devido a ação do inimigo, que hostilizava continuamente as forças aliadas com fogos
oriundos do Forte Itapiru, que dominava a posição, como também com chatas artilhadas, as
operações de reconhecimento demandaram a necessidade de cobertura por navios da Armada.
Sensíveis danos foram causados aos nossos navios, e vidas preciosas ceifadas, como a de Mariz e
Barros
189
, então comandante do Encouraçado Tamandaré, que a 27 de março, sob vivo fogo do
forte, foi alvejado por bala paraguaia que, batendo na cortina de correntes que protegia a portinhola
da casamata, estilhaçou atingindo 34 homens, entre oficiais e praças. Esse período ficou assinalado
na história naval brasileira com o nome de Guerra das Chatas
190
.
Em consequência dos numerosos reconhecimentos realizados, alguns dirigidos pessoalmente
por Mitre e Tamandaré, ficou demonstrada a inconveniência de proceder ao desembarque pela
188
FORTES, Diogo Borges. Passo da pátria, uma operação anfíbia. in: Revista Marítima Brasileira Serviço de
Documentação da Marinha: Rio de Janeiro. 4 Trimestre. 1949. p. 477-96
189
Antonio Carlos Mariz de Barros, filho do Almirante Joaquim José Ignácio, o Visconde de Inhaúma ,foi ferido no
joelho direito, teve a perna amputada mas faleceu no dia seguinte.
190
Thompson assim descreve esse momento: “Para divertimento pessoal de Lopez que, com excelentes telescópios
colocados em cima de uma mesa, ficava sentado em sua varanda em Paso de la Patria, de onde podia ver tudo – o vapor
Gualeguay saía todas as tardes até a ponta da ilha diante de Itapirú e desafiava a frota aliada, disparando seus canhões
de 12, que eram respondidos pela esquadra inteira, com toda espécie de projéteis de 68 até 150, que caíam em redor do
Gualeguay como uma saraivada, levando imensos repuxos d'água. O vapor paraguaio costumava retirar-se pouco antes
do por do sol. Fez isso todos os dias, durante três semanas, sendo atingido ´somente por uma bala, que lhe atravessou a
chaminé.” THOMPSON, George, op cit. nota 28, p. 111.
margem direita do Paraná, sendo acordado que o ponto ideal para executá-lo seria o proposto pelo
comandante da Canhoneira Ipiranga, Primeiro-Tenente Francisco José de Freitas, qual seja, na
margem esquerda do Rio Paraguai, em uma barranca abaixo de Atajo, próximo de sua embocadura.
Local escolhido para o desembarque, o papel da Esquadra naquele cenário compreendeu três
tarefas distintas: transporte dos exércitos aliados para o território inimigo; proteção do desembarque
e da progressão das tropas no terreno; e efetuar com seus canhões a varredura das áreas próximas.
A contínua movimentação dos navios nos trabalhos de reconhecimento ora na direção de
Itati, ora nas vizinhanças de Itapiru e Ilha de Santana, da mesma forma que a ocupação da ilha da
Redenção, por forças do nosso Exército, convenceram a Lopez que o assalto aliado ocorreria na
margem direita do Rio Paraná, posicionou assim suas forças naquela direção, deixando
praticamente desguarnecida as margens do Rio Paraguai, o que possibilitou o elemento surpresa da
operação.
Em frente ao Forte Itapirú havia um recém-formado banco de areia, de forma circular,
coberto por cumprido capim, ficava ao alcance fácil de tiro de fuzil de Itapirú. Na noite de cinco de
abril os aliados ocuparam o Banco cavando trincheiras e posições de tiro de artilharia. Foi montado
oito canhões e a guarnição era composta de 2.000 homens, deu-se o nome a ilha de Redenção.
Ocorreu em 10 de abril um ataque sem sucesso de forças paraguaias . Essa ilha teve sua
denominação mudada em homenagem ao Coronel Cabrita (Tenente Coronel João Carlos de
Vilagran Cabrita), comandante do Batalhão que guarnecia a Ilha, que faleceu em decorrência de
uma bala vinda do Forte Itapiru, quando ao fim do dia escrevia sua parte de vitória referente ao
ataque inimigo
191
.
Assim comunicou Tamandaré ao Ministro da Marinha:
“O plano combinado para o desembarque do exército no
território inimigo produziu o melhor resultado que se podia esperar.
“O ponto escolhido para a operação na embocadura do Rio
Paraguai e as posições tomadas pela Esquadra não permitiram ao
inimigo tirar partido das vantagens que lhe pertenciam pelo
conhecimento do terreno, e pela presença do grosso do seu exército,
impossibilitado de mover-se do seu acampamento permanente do
Passo da Pátria.”
191
No diário de André Rebouças tem a indicação que era originariamente denominada de Ilha Itapirú
(REBOUÇAS,André, op. cit. nota 20, p.49); e em Inhaúma existe o registro de “do Carvalho” (INHAÚMA, Ignácio
Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 74)
Ao romper do dia 16 de abril, as 1
a
e 2
a
Divisões ocuparam suas posições e iniciaram o
bombardeio, coadjuvadas pelas baterias da Ilha do Cabrita. A ordem de movimento da Esquadra
192
é
assim relatada pelo Almirante Tamandaré:
“A 2
a
Divisão, com o encouraçado Barroso, a Belmonte, a
Itajaí e o Henrique Martins, que devia ter ocupado uma posição
conveniente para bombardear o acampamento inimigo, conservou-se
no dia 16 pouco acima da ilha da Bateria [Cabrita], em
consequência de haver encalhado o primeiro destes navios
[Encouraçado Barroso].
“A 3
a
Divisão, com os vapores Magé, Beberibe, Ivaí, e
Iguatemi, ficou formada em linha no Rio Paraguai no lugar do
desembarque.
“A 1
a
Divisão com o Brasil, Bahia, Parnaíba, Mearim,
Ipiranga, Greenhalgh e Araguari formou uma linha desde o forte de
Itapiru até as Três Bocas.
“... Às 8h30min, do dia 16 de abril, os transportes suspenderam
ferro, protegidos pelo grupo de apoio de fogo. Enquanto as 1
a
e 2
a
Divisões da Esquadra bombardeavam a margem direita do Paraná,
muito especialmente as vizinhanças do Forte de Itapiru, de modo a
atrair a atenção do inimigo para aquele setor, os transportes
avançaram como se intentassem lançar em suas margens a tropa de
desembarque; ao chegarem, porém, a meio canal, guinaram águas
abaixo e, uma vez ganha a embocadura do Paraguai, por ele
subiram, protegidos pela 3
a
Divisão, indo a meia légua acima de sua
embocadura, onde começaram a desembarcar as tropas. Por volta
das 9 horas, balsas atracaram à terra e pontes de canoas ligaram-nas
192
Constituição dos grupos de ataque dos meios navais:
- 1
a
Divisão: Grupo de Cobertura – com a missão de “pairar na altura das Três Bocas para apoiar, quer a 2
a
quer
a 3
a
Divisão Naval”: Encouraçados Brasil e Bahia; Canhoneiras Parnaíba, Mearim, Ipiranga (capitânia), Greenhalgh e
Araguari.
- 2
a
Divisão: Grupo de Demonstração com a missão de “investir entre a Ilha Sant’Ana e campo
entrincheirado do Passo da Pátria, para bombardear as fortificações deste ponto”: Encouraçado Barroso; Corveta
Belmonte; Canhoneiras Itajaí e Henrique Martins.
- 3
a
Divisão: Grupo de Apoio de Fogo com a missão de “escoltar o comboio e bombardear a costa do
Paraguai logo ao norte de Três Bocas”: Corvetas Magé e Beberibe; Canhoneiras Ivaí e Iguatemi.
- Grupo de Transporte da 1
a
Expedição: Vapores Izabel, Presidente, Marcílio Dias, Duque de Saxe, Riachuelo,
Galgo, Whiteinch, Wiper, Susan Berne, Berenice, Voluntário da Pátria e Ozorio, muitas chatas, pontões e canoas à
reboque.
O documento do anexo 6 traz minuta da disposição das forças navais que deveriam auxiliar o desembarque do Exército.
aos navios. O desembarque da força anfíbia era iniciado sob o
comando do Capitão-de-Mar-e-Guerra Torres e Alvim.
“Em consequência de forte temporal, que sobreveio à 1 hora
da tarde, desembarcou no dia 16 a 1
a
expedição brasileira,
composta de duas divisões de infantaria, cujos primeiros passos no
território inimigo foram dirigidos por seu general em chefe, o Exm
o
.
Sr. Marechal de Campo Manuel Luiz Osório.
“Duas vezes forças inimigas tentaram atacar esta expedição,
nos dia 16 e 17, mas foram repelidas, deixando mais de 400 mortos no
campo, duas peças de artilharia, uma bandeira, muito armamento de
mão e 14 prisioneiros em nosso poder.(fig.:24 )
Fig.:24
“No dia 17, logo que começou o bombardeamento pela Esquadra, foi
abandonado o forte de Itapiru.
“Os vapores Henrique Martins e Greenhalgh, que tiveram
ordem para sondar o canal entre a ponta de Itapiru e a ilha de
Santana, tiveram de sustentar durante duas horas vivo fogo de fuzilaria
e artilharia com uma força paraguaia oculta em ranchos e fossos na
enseada do forte, conseguindo fazerem cessar o fogo do inimigo. ...
“Durante o dia 17 continuaram a passar as infantarias
brasileiras e argentinas, e a 2
a
Divisão da Esquadra começou a
bombardear o acampamento inimigo [Passo da Pátria].(fig.:25)
Fig.:25
“No dia 18 avançou o exército até o arroio que flanqueava a
direita do acampamento inimigo.
“A esquadra também avançou até a mesma altura.
“No dia 23 o inimigo, convencido de que não podia sustentar-
se no Passo da Pátria sem sofrer as consequências do
bombardeamento da Esquadra, abandonou seu acampamento,
entregando-o às chamas.
“No dia 25 foi o campo abandonado pelo inimigo ocupado
pelo nosso exército....”
193
(fig.:26)
Fig.: 26
Um dos ensinamentos adquiridos nessa guerra foi a da necessidade de treinamento de
operações com as unidades navais, onde são simuladas diversas situações de guerra, concretizada
com a Esquadra de Evolução, efetivada em outubro de 1884.
Ficou acordado que enquanto o Exército avançasse pelo território inimigo, a Marinha faria o
reconhecimento e exploração das vias fluviais, subindo no rumo de Humaitá e Assunção, mantendo
permanente contato com as forças de terra.
Em maio, o Almirante Tamandaré subiu com a esquadra o Rio Paraguai e, a 5 milhas das
baterias de Curuzu, estabeleceu estação de bloqueio na Volta do Palmar, onde a ilha do mesmo
193
Passo da Pátria constituiu-se na primeira operação anfíbia realizada por uma Força Naval brasileira.
nome oferecia proteção contra o fogo inimigo. Neste local permaneceu a Esquadra até setembro
aguardando a chegada do Exército, para em paralelo tomar Curuzu
194
. Consistia do plano aliado
ataques sucessivos a Curuzu, Curupaiti e Humaitá, em operações combinadas com o Exército e a
Esquadra em operações.
Em 1
o
de setembro a vanguarda couraçada se postou pelo través da fortificação inimiga e ali
fundeando bateu-se todo o resto do dia. O Encouraçado Rio de Janeiro teve que manobrar rio
abaixo para reparar uma avaria, regressando na manhã seguinte quando tinham iniciado os
combates. Os navios da esquadra tinham passando por Curuzu e iam em direção a Curupaiti. Era
intenso o bombardeio, quando, às14 horas do dia 2, o Rio de Janeiro, que subia o rio procurando
ocupar sua antiga posição toca numa mina flutuante que explode debaixo da popa, submergindo em
poucos minutos
195
.
Curupaiti tornou-se um dos formidáveis obstáculos interpostos no caminho de Assunção,
tendo sido a maior derrota enfrentada pelas forças aliadas no transcurso da guerra. Durante os
combates em Curuzu, Curupaiti teve suas defesas reforçadas, inclusive com entrincheiramento de
cerca de dois quilômetros e a construção de um grande fosso. Em 22 de setembro de 1866, o
General Manuel Marques de Souza, Barão de Porto Alegre, avançou sobre Curupaiti, contando com
reforços do acampamento geral. No entanto, por falta de munição, escassez de alimentos, doenças e
epidemias, o avanço das tropas aliadas foi prejudicado, e as defesas instaladas na fortaleza
suportaram com sucesso o ataque das tropas de Porto Alegre; contribuiu para o resultado negativo
da operação, o bombardeio efetuado pela Esquadra que, sem o efetivo apoio das forças de terra,
mostrou-se incapaz de neutralizar a artilharia da fortaleza. A derrota de Curupaiti imobilizou a
campanha
196
, o General Flores voltou para Montevidéu e Mitre para Buenos Aires, o Governo
Imperial nomeou para o Comando Geral das Forças brasileiras o General Luís Alves de Lima e
Silva
197
; e substituiu, por motivo de doença o Almirante Tamandaré nomeando o Almirante o
Joaquim José Ignácio, o Visconde de Inhaúma, comandante da Força Naval em Operações de
Guerra
198
A derrota exigiu um bom tempo para recuperação e houve então uma espécie de trégua, que
durou dez meses
199
, durante o qual aconteceu a epidemia de cólera morbo que ceifou não só aliados
e paraguaios das forças de terra, como brasileiros da Marinha.
194
Neste ínterim Tamandaré construiu oficinas para reparar as máquinas de sua esquadra, e hospitais e armazéns de
provisões em Cerrito, na embocadura do Paraguai.
195
Restos do navio ainda se encontram no leito do Rio Paraguai.
196
As baixas aliadas ascenderam a mais de 4 mil, contra menos de 60 paraguaias.
197
Caxias foi designado em 10 de outubro de 1866, chegando no teatro de operações em 15 de novembro.
198
O Visconde de Inhaúma chegou em Corrientes a 22 de dezembro de 1866.
199
Nesse período o Paraguai se fortificou com novos entrincheiramentos e mais canhões fabricados em assunção.
A nova tentativa de passagem de Curupaiti ocorreu em 15 de agosto de 1867 e foi realizada
com sucesso pelos navios da Esquadra couraçada em formação de coluna, assim relatou em seu
diário quanto os preparativos o Visconde Inhaúma:
“Dia 13 para 14 [agosto de 1867]
Pouco antes do meio dia reuniram-se a bordo os Chefes da 1
a
Grande Divisão, e os práticos dos encouraçados, e proposta a
seguinte questão- se convém passar Curupaity pelo lado do Chaco, ou
junto à barranca, decidiu-se pela segunda. Assentou-se também pelo
ancoradouro a tomar em Humaitá...”
200
E foi nesses termos que o Visconde de Inhaúma relatou à Caxias o feito da esquadra:
Hoje pelas 6 ½ horas da manhã segui o rio acima com os dez
encouraçados da esquadra do meu comando. Ás 8 horas e 45
minutos tinha transposto o perigosíssimo Passo de Curupaity, e
achava-me fundeado à vista da ponta de Humaitá. Daqui a duas
horas ou três subirei um pouco mais e recomeçarei o
bombardeamento sobre as fortificações existentes neste ponto. Todas
as embarcações sofreram avarias de maior e menor importância;
sendo mais grave as do Tamandaré, e Colombo, onde houve dez
mortos e dois feridos.
“Temos ainda que lamentar o grave ferimento do bravo e
digno capitão de fragata Elisiário José Barbosa que vai sofrer a
amputação de um braço. O comandante do Bahia está levemente
contuso. O inimigo fez-no fogo terrível. Foi preciso durante o
combate mandar rebocar o Tamandaré que ficou com a máquina
inutilizada. Não posso ser mais extenso na presente ocasião. O feito
praticado pela esquadra sob o meu comando é um dos mais
brilhantes de toda a presente campanha: assim traga ele, como
desejo, profícuos resultados para a conclusão da guerra....”
201
200
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 110
201
Campanha do Paraguay: diários do exército em operações Marquez de Caxias. Julho de 1867a Fevereiro de 1869.
Rio de Janeiro: Imprensa Militar, Estado-Maior do Exército, 1925 p.63.
Porém, despeito do sucesso obtido, devido aos canhões de Humaitá, a Esquadra é forçada a
parar na sua evolução
202
, ficando separada da base de operações da esquadra e dos navios de
madeira e transportes, ancorados abaixo da mesma fortaleza. Enquanto não fosse ocupada pelas
forças de terra, era mister que os fornecimentos para os encouraçados fossem conduzidos pelo
quase intransponível terreno do Chaco, na margem direita com a esquerda dominada pelas forças
paraguaias
203
.
Assegurar tais suprimentos era da maior importância, porque os encouraçados, esgotadas as
provisões de guerra e de boca que levavam, seriam forçados a retirar-se do ponto avançado a que
haviam chegado. Decidiu-se construir uma estrada de ferro na região do Chaco
204
, numa extensão
de aproximadamente cinco milhas, a fim de desdobrar a posição fortificada inimiga, além de
facilitar o transporte de material de guerra e víveres
205
. Conforme registrou o Visconde de Ouro
Preto:
Resolvida pelos motivos que depois ver-se-ão a construção
de uma estrada de ferro no Chaco, ordenei que dentro de três dias se
preparassem no Arsenal de Marinha os milhares de dormentes
precisos, que embarcariam no imediato, para o que autorizei aumento
de salário, de horas de serviço e engajamento de operários civis, que
se revezassem, dia e noite, com os arregimentados.
206
A 6 de dezembro de 1867 foram descarregados em Curuzu dos vapores Santa Cruz e
Marquês de Caxias, os trilhos para a ferrovia
207
, ainda em 6 de janeiro de 1868 Inhaúma notifica
nova remessa de trilhos acompanhadas de material para o telégrafo elétrico.
208
“O assentamento dos trilhos foi realizado por fuzileiros navais
e prisioneiros paraguaios, montando 400 pés de via férrea por dia no
clima abrasador do Chaco. Assim, dez navios, com um total de 1.500
homens e 50 bocas de fogo, foram abastecidos pela base de
202
As dificuldades naturais, os torpedos e às cadeias de ferro que atravessavam o rio de uma margem a outra também
impossibilitaram o avanço da Esquadra.
203
Inicialmente foram utilizadas para o transporte dos mantimentos mulas mansas.
204
A região da construção devido a superfície plana do Chaco prestava-se a receber uma linha férrea, cuja maior
dificuldade consistia na consolidação do terreno, por meio de estivamentos. A estrada de ferro denominada de “Affonso
Celso” partia do porto de Palmar, ancoradouro dos navios de madeira, seguia o curso do Rio Quiá até o porto Elisiário
onde foi estabelecido importante base naval avançada, na margem direita do Rio Paraguai em frente a Humaitá..
205
A Marinha construiu, ainda, outra pequena estrada de ferro entre São Nicolau e Betel, na Lagoa Verá, e os paraguaios
usaram, largamente a ferrovia entre Assunção e o Rio Paraguai.
206
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op. cit. nota 17, p. 36.
207
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 146
208
Ibidem p. 154.
operações localizada em Curuzú cinco navios bombardeando
constantemente as posições paraguaias de Humaitá, quatro no Porto
Elisário dominando Curupaiti, e um servindo como repetidor de
sinais entre as duas divisões na embocadura do riacho de Ouro.
“... sem via férrea do Chaco, a
esquadra encouraçada teria, no fim de três meses, quando se
acabassem os sobressalentes que levavam os navios quando
forçaram as baterias de Curupaiti, de abandonar a posição
importante que hoje ocupa, e que de decidir a sorte da guerra
com o governo do Paraguai.”
209
Ademais a estrada de ferro construída no Chaco, facilitou as comunicações entre as
Esquadras, de madeira, fundeada abaixo de Curupaiti, e a de ferro, fundeada abaixo do Humaitá
210
.
Constituindo em obra de esforço de guerra, digna de ser apreciada como representativa da valentia e
astúcia das forças aliadas, prestou ótimo serviço até ser submersa devido as enchentes comuns da
região, mesmo assim, as estradas no Chaco, quer de rodagem, quer de ferro, tinham esse destino:
atender a determinado propósito e depois desaparecer, dando vez as chalanas que passaram a fazer o
serviço de transporte. Graças a ela, a esquadra de couraçada, não se transformou de bloqueadora em
bloqueada e, abastecida, constantemente, pode continuar bombardeando incessantemente a fortaleza
de Humaitá, reduzindo a sua capacidade de defesa
211
. Tiros certeiros dos Couraçados Cabral, Bahia,
Barroso e Silvado meteram a pique as chatas que apoiavam grossas correntes, atravessadas de
margem a margem. Com a chegada dos monitores
212
e a rápida subida das águas, em princípios de
fevereiro de 1868, a passagem poderia ser realizada com probabilidade de êxito. Humaitá foi
209
Relatório datado de 30 de dezembro de 1867 de autoria do Tenente Jayme Gomes de Argollo Ferrão ao Ministro da
Marinha, Dr. Afonso Celso de Assis Figueiredo.
210
Thompson assim relata a passagem de Curupaiti e a construção da estarda de ferro: “ A passagem de Curupaity teve
como resultado levar os paraguaios a compreenderem que contra couraçados nada podiam fazer com sua artilharia de
pequeno calibre. Lopez anunciou ao exército que permitira à esquadra passar Curupaity para fazer as tripulações morrer
à míngua, pois a esquadra não poderia receber suprimentos onde se encontravaentre Curupaity e Humaitá, - e que ela
teria em breve de tornar a descer o rio passando por Curupaity, quando então os paraguaios a afundariam.
Os aliados construíram uma estrada pelo Chaco, partindo do riacho Quiá até a esquadra, entre Curupaity e
Humaitá, e instalaram uma linha de carris de madeira para as comunicações e abastecimento de seus navios.”
THOMPSON, George, op. cit nota 28, p. 174-5.
211
Segundo o Capitão-de-Fragata Henrique Batista, diretor de artilharia do Arsenal de Marinha da Corte, o
reabastecimento diários pela estrada Quiá-Porto Elisário era : projetis 51.312 libras; pólvora - 5.784 libras; víveres-
4.800 libras; e combustível – 53.760 libras. No começo a tração se operava por meio de animais, sendo substituído mais
tarde pelo vapor, apressadamente construindo-se para esse fim, no arsenal de Cerrito, uma locomotiva, com algumas
peças do maquinismo do transporte Isabel.
212
Assim encontra-se relatado no Diário de Caxias: “Sexta-feira, 31 Tendo chegado o último dos monitores
recentemente construídos nos arsenais do Rio de Janeiro e os reforços esperados de tropa, projetou S. Exa. O sr.
General em Chefe ir conferenciar com o Vice-Almirante Barão de Inhaúma sobre o plano de próximas operações, que
têm de ser executadas de combinação entre o exército e a esquadra...” op. cit. nota 201, p. 264.
transposto em 19 de fevereiro, e a Esquadra brasileira dominou o rio Paraguai até Assunção
“Seis longos meses durou o improbo
assédio de Humaitá pela grande Divisão encouraçada, cortada de
resto da Esquadra pelas fortificações indestrutíveis de Curupaiti,
reduzida para suprir-se de víveres, de combustíveis e de munições a
um caminho precário aberto no Chaco, no terreno alagadiço fronteiro
aquela posição inimiga. A dificuldade do transporte de carvão
necessário para o suprimento de dez navios, que, na posição especial
em que se achavam, tinham de conservar-se constantemente com os
fogos abafados, obrigava a empregar a marinhagem no árduo serviço
de cortar lenha no Chaco, com que se pudesse poupar o precioso
combustível mineral. Por todo movimento revezavam-se os navios de
mês em mês no posto de vanguarda, onde se conservavam à distância
de poderem entreter um bombardeio lento mas contínuo sobre a
grande praça inimiga. Com peças raiadas de pequeno calibre, ocultas
na mata que orlava a margem do rio, logo abaixo da volta de
Humaitá, eram os navios da vanguarda continuamente incomodados
pelos paraguaios que não perdiam ocasião de alvejar aos grupos de
oficiais ou marinheiros que se formavam nas toldas abertas dos
encouraçados ou aos escaleres que se dirigiam de uns para os outros
navios. O estado sanitário era péssimo, as febres palustres, a
dessentiria, o bebriberi, não escolhiam vítimas entre os oficiais e
praças de pré. O cólera-morbo, que não havia muito tempo, reinava
epidêmicamente na Esquadra e no Exército, ainda se manifestava em
casos esporádicos, frequentes a bordo dos nossos navios....”
213
.
Interessante é verificar o desabafo do Visconde de Inhaúma em carta remetida ao Barão de
Cotegipe
214
, datada de 8 de março de 1868, no tocante as críticas que recebia sobre a morosidade da
esquadra, crítica aliais também dirigida a Tamandaré por ocasião em que comandava as operação
navais na guerra:
Cumpri minha palavra; uma Divisão de nossa
213
Testemunho do Barão de Jaceguai, Artur Silveira da Mota, comandante do Encouraçado Barroso. apud.
FAIRBAIRN, Arnoldo Hasselmann, A dezembrada e a Marinha. in. Navigator : subsídios para a história marítima do
Brasil Rio de Janeiro: Serviço de Documentação Geral da Marinha, Dezembro, 1970 n
o
2. p.95-6.
214
D. João Maurício Wanderley, Senador do Império, e Ministro da Marinha em dois mandatos, 14/06/1855 a 8/10/1856
e 15/07/1868 a 28/09/1870.
esquadra forçou o colossal passo do Humaitá a 19 do mês passado
sobre a madrugada. É um feito tão glorioso como os mais gloriosos
que têm praticado as primeiras marinhas do mundo....Passei pois
Humaitá quando entendi que devia passar, isto é, quando previ que
com a grande enchente desaparecera a dificuldade das cadeias, que
sem terem mais onde se apoiassem pois se lhes havia metido no fundo
quantas chatas e chalanas colocaram, cederiam ao seu peso e à
corrente, e fariam um seio sobre o qual haveria suficiente
profundidade para os meus encouraçados de pouca água. Não
envergarei; tudo se fez otimamente na melhor ordem, e com a maior
das felicidades.”
215
Transpostas as fortificações de Humaitá, selou-se, mais uma vez, como se havia feito em
Riachuelo, em 11 de junho de 1865, o destino da guerra contra o Paraguai. Eis o que dizia Caxias ao
Ministro da Guerra ante o panorama que se lhe desenhava:
“Tenciono estabelecer nova base de operações em Humaitá,
trazendo para ali os depósitos, hospitais, repartições e tribunais, que
até agora temos mantido em Corrientes...”.
Como foi comentado, uma das maiores dificuldades encontradas pelos aliados foi o
desconhecimento do terreno. Várias surpresas verificaram-se com a passagem de Humaitá, o forte
do Estabelecimento
216
não ficava na barranca esquerda do rio Paraguai e, sim, na Lagoa Cierva; os
navios que tomaram Humainão tinham notícia da fortaleza do Timbó e foram surpreendidos por
esta posição fortificada que abriu fogo sobre eles; os navios de guerra paraguaios Taquari e Igurei,
que se esperavam encontrar em Humaitá não apareceram; e conforme previsto tanto por Tamandaré
como Inhaúma a presença de navios de guerra em frente a Assunção e o bombardeio desta capital
pelos mesmos, não importou em rendição.
Não tendo caído com o forçamento do Passo, a posição de Humaitá, somado ao fato da
surpresa de Timbó e tendo sido mantida, embora que enfraquecida, pelos paraguaios a praça de
Curupaiti, o apoio logístico e, especialmente, seu componente funcional o abastecimento prestado
215
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit nota 27, p.35.
216
Bateria denominada com esse nome que ficava logo acima de Humaitá, no dia 22 de março foi passada com sucesso
pelos navios da Esquadra.
aos navios acima de Curupaiti, tornou-se muito mais difícil. Os navios entre Curupaiti e Humaitá,
eram apoiados pela Base Avançada de Porto Elisário. Curupaiti caiu cerca de um mês depois do
forçamento de Humaitá o que melhorou bastante a situação, com os navios sendo apoiados pela
Base Avançada de Tagi, na margem esquerda do Rio Paraguai, ligada ao Passo da Pátria, no Rio
Paraná; os transportes terrestres eram realizados em carretas. Um contingente brasileiro
comandado pelo Coronel João do Rego Barros Falcão foi desembarcado em 30 de março de 1868
na margem direita do Rio Paraguai, acima de Humaitá, na região do Andaí, visando fazer a junção
com as forças aliadas que se encontravam no sul, com o objetivo de cortar as comunicações
paraguaias e facilitar o abastecimento da Divisão Avançada da Esquadra pela Lagoa Verá.
Posteriormente uma nova estrada de ferro, então S. Nicolau e o Betel (com cerca de 3Km) foi
construída pela Marinha, para facilitar o transporte do abastecimento da margem direita do rio
Paraguai a Lagoa Verá.
Passo da Pátria, Tuiuti, Tuiú-Cué, S. Solano, Para-Cué e Tagi, asseguravam a rota
indispensável de apoio aos navios, estes, por sua vez, davam a necessária cobertura às forças de
terra, principalmente de transporte pelo rio, acima do Humaitá, e eficientíssimo apoio de fogo
quando necessário, além de esclarecimentos preciosos do terreno ainda inexplorado. Como exemplo
dessas missões citamos: a da Divisão avançada sob o comando de Capitão-de-Mar-e-Guerra Delfim
Carlos de Carvalho, Barão da Passagem, composta pelo Bahia, Barroso, Pará e Rio Grande, que a
8 de março, saiu para guardar o Timbó, reduto fortificado e bloquear o Rio Tebicuari, bloqueando
assim as comunicações paraguaias com Humaitá. Ao forçar a passagem pelo Estabelecimento
avistou e perseguiu os vapores paraguaios Taquari e Igurei que foram destruídos.
Caxias supunha que Lopez estivesse em Villeta, na margem esquerda do Paraguai, acima de
Angustura. No intuito de evitar que levantasse fortificação naquele local onde o rio se estreitava,
solicitou a Inhaúma que mandasse uma divisão de couraçados para fazer o reconhecimento da área.
Os monitores passaram a atuar como verdadeiros carros blindados flutuantes, desempenhando
importante papel nas operações anfíbias. É preciso notar que Humaitá foi abandonada em 25 de
julho de 1868, cinco meses e dez dias depois da passagem de 19 de fevereiro
217
. Timbó caiu em
vinte e dois de agosto e Angostura em trinta de dezembro de 1868.
218
Assim se referiu Afonso Celso de Assis Figueiredo,o Visconde de Ouro Preto, Ministro da
Marinha na ocasião:
“Era preciso tudo levar em carretas,
217
Ocorreram duas passagens apor Humaitá a de 19 de fevereiro, nomeada de a primeira passagem , e uma segunda
passagem em 21 de julho de 1868.
218
FAIRBAIRN, Arnoldo Hasselmann. A dezembrada e a Marinha.. in. Navigator: subsídios para a história marítima do
Brasil Rio de Janeiro: Serviço de Documentação geral da Marinha, número 2 .Dezembro, 1970. p .101-2.
desde Passo da Pátria até o Tagi, quase quinze léguas [90 Km].
“Empregar continuamente uma grande
força para escoltar os comboios, correr o risco das explosões, das
avarias, etc., etc. E lutava-se com um outro embaraço: a falta de
caretas. A divisão (seis navios) consome diariamente cerca de
dezesseis toneladas de combustível. Uma carreta puxada por quatro
animais pode conduzir o peso de 2350 libras ou pouco mais de uma
tonelada. Eram, portanto, necessárias dezesseis carretas e sessenta e
quatro unidades para o transporte do combustível indispensável
para um dia. Nem se diga que a lenha poderia substituir o carvão.
Está reconhecido que uma guarnição de um vapor, empregada no
espaço de oito hora s sucessivas no corte de lenha obtém o suficiente
para o que se gasta em duas horas. Essa lenha verde ( que não
levanta vapor sem misturar-lhe algum carvão), para ser
acomodada, substituiria o carvão, a atravancando a artilharia. Seria
preciso cortá-la nas margens ocupadas pelo inimigo, com grande
risco, e combatendo-se muitas vezes. Nem era plausível distrair
diariamente as guarnições para tal serviço nem lelas tinham forças
físicas para resistirem a trabalhos tão penosos e aturados.”
219
No dia 6 de dezembro de 1868 iniciou-se o movimento das tropas brasileiras para o Sul,
conhecido como a Dezembrada que constituiu-se de uma série de vitórias obtidas pelo Exército
aliado que destruíram a capacidade de combate do inimigo.
220
No dia 1
o
de janeiro de 1869,
assunção é ocupada pelas forças aliadas.
Artur Silveira da Mota relata da seguinte forma a participação da Marinha na Dezembrada :
“Nas manobras e combates ao norte de Piquissiri no correr
do mês de dezembro a parte que coube à Esquadra foi a de impedir
qualquer movimento do inimigo nas proximidades da margem do rio
e de impor com os Exércitos Aliados vencedores a capitulação do
Forte de Angustura, no dia 30. Ela fora, porém, o instrumento sem o
qual teria sido inexequível o grande movimento envolvente das
posições do inimigo, e subdiàriamente ela preencheu, com o seu
219
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op. cit nota 17, p. 102.
220
As batalhas de Itororó (6/12); Avaí (11/12) e Piquissiri (30/12) são os marcos dessa caminhada vitoriosa dos aliados.
imenso material flutuante, tão eficazmente como teriam
preenchido largas e sólidas pontes sobre o rio Paraguai, abaixo e
acima da Angostura, o serviço inestimável de transportar com rapidez
e segurança as tropas, as cavalhadas, a artilharia, o trem, os
abastecimentos de víveres e munições, e, finalmente os milhares de
feridos em sucessivos combates para os hospitais flutuantes e os
estabelecimentos da nossa base de operações em Humaitá...”
221
Não obstante muito enfraquecido com a Dezembrada, Lopez continuou a oferecer guerra
aos aliados até a sua morte ocorrida em cerro-Corá, no Arroio Aquidaban, em 1
o
de março de 1870.
O desafio logístico na segunda fase da guerra não foi de pequena monta, porém foi sendo
resolvido a medida que surgiam as necessidades. A base estabelecida em Corrientes, no primeiro
semestre de 1866, foi de grande importância para as forças aliadas. Era ali que atracavam os navios
que traziam mantimentos, pessoal, carvão, fardamentos e remédios, para então serem distribuídos
pelos navios e forças de terras, com a tomada de Humaitá paulatinamente essa base de apoio se
locomoveu em direção a Assunção, acompanhando o avançar dos aliados.
O arsenal de estabelecido na Ilha de Cerrito, na altura de Três Bocas, próximo a Corrientes,
proporcionou agilidade nos reparos dos navios e juntamente com o laboratório pirotécnico, garantiu
o a bastecimento bélico da Força Naval. Somado a ele a construção de uma estrada de ferro e o
estabelecimento de hospital, em muito contribuiu para a logística da guerra. É o que analisaremos
com mais detalhes a seguir.
2.4 Construção Naval e Armamento
Nenhum dos objetivos propostos pelos aliados poderiam ser realizados com os navios de
madeira que compunham as Forças Navais no início do conflito, por serem inadequados para
enfrentar, não apenas as fortalezas e baterias paraguaias dispostas nas margens, mas também suas
chatas, verdadeiros monitores de madeira, armadas com canhões de 68, dos maiores que existiam
na época. Dos navios ideais para o tipo de operação que descortinava os aliados contavam apenas
com o Encouraçado Brasil
222
. Procurou-se adquirir, por construção na Europa, outros navios desse
gênero, mas o processo era demorado, e as operações empenhadas na concentração dos exércitos
221
JACEGUAI, Barão Artur Silveira da Mota , Barão de De aspirante a almirante , 1858-1902: minha fé de ofício
documentada. Serviço de Documentação da Geral da Marinha: Rio de Janeiro, 1985. p. 540
222
De construção francesa, pago com o recolhido em subscrição pública, após o evento da questão Christie, numa
tentativa de reforçar o poder da Marinha Imperial. Foi incorporado a esquadra em julho de 1865.
para a invasão não poderiam esperar. Tornou-se imperioso construir no Brasil,com celeridade,
navios capazes de enfrentar os desafios imposto pela guerra, e foi isso o que fez o Arsenal de
Marinha do Rio de Janeiro.
Aproveitando os técnicos, Level e Braconnot, construiu-se no Arsenal de Marinha os
primeiros encouraçados na América Latina e em tempo recorde
223
. Batida a quilha
224
do primeiro, o
Tamandaré
225
, em 31 de janeiro de 1865, e do Barroso
226
em 21 de fevereiro, em março de 1866,
estavam operando em Passo da Pátria, reduzindo com sua poderosa artilharia e ao abrigo de sua
couraça, o Forte Itaipu, as chatas artilhadas e os canhões dispostos na margem do rio, contribuindo
para o sucesso do avanço do exército aliado. Se seguiu aos dois primeiros o Encouraçado Rio de
Janeiro
227
.( Anexo 7)
A Corveta Vital de Oliveira, projeto de Napoleão Level, máquina de Antônio Gomes
Matos
228
e Braconnot, teve a quilha batida em março de 1863, tendo seu lançamento ao mar
ocorrido em 1867, foi o primeiro navio da Marinha brasileira a possuir destilador; o Aviso
Taquari, projeto de Level e máquina de Gomes Matos e Braconnot, lançado ao mar em janeiro de
1865, tinha propulsão a rodas. Outros navios como as Bombardeiras Pedro Afonso e Forte
Coimbra
229
; Monitores Pará, Rio Grande, Alagoas, Piauí, Santa Catarina, Ceará
230
,também
levaram a assinatura de Level e Braconnot.
“Para aqueles que tinham a dura experiência
de quatro anos de guerra de rios, os monitores desenhados pelo
arquiteto naval brasileiro Sr. Napoleão Level e construídos sob sua
direção na Capital do Império, com a colaboração do engenheiro de
máquinas, Carlos Braconnot, e do diretor de artilharia, Capitão-
Tenente H. A. Batista, reuniram realmente todas as condições táticas
223
Os navios são, em linhas gerais, construídos da quilha (peça estrutural básica do casco, constitui como que a espinhal
dorsal da embarcação) para cima e de meia nau para os extremos. A cerimônia denominada de Batimento de Quilha
ocorre quando da colocação na carreira naval, da primeira peça estrutural que integrará um navio. Fechado o casco,
colocam-se acessórios como leme, eixos, embarcam-se as máquinas, e o navio é preparado para ser lançado ao mar. A
data de construção de um navio é usualmente a data do lançamento. Depois de lançado o navio é amarrado em doca e de
acabamento, onde os trabalhos de montagem são terminados.
224
As etapas da construção naval são: elaboração do projeto; feitura do casco, batimento da quilha, lançamento ao mar e
prova de máquinas....
225
Primeiro navio encouraçado construído no Brasil, teve sua quilha batida em janeiro de 1865 e foi lançado ao mar em
junho, possuía um hélice.
226
Lançado ao mar em novembro de 1865, possuía um hélice.
227
Também projeto de Level e máquina de Braconnot, lançado ao mar em fevereiro de 1866, possuía um hélice.
228
Antônio Gomes de Matos, Segundo-Tenente oriundo da Academia de Marinha, estudou na Europa a construção de
máquinas a vapor, projetou e construiu em parceria com Braconnot, as máquinas de alguns navios lançados ao mar do
Arsenal. Antes da Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai pediu demissão do serviço ativo para se
dedicar à industria privada.
229
Lançadas ao mar em março de 1866, possuíam um hélice.
230
Lançadas entre maio de 1867 a maio de 1868.
para neutralizarem as dificuldades naturais e artificiais do passo de
Humaitá: reduzido alvo do casco que emergia apenas um da linha
d'água; integridade do couraçamento das obras vivas, pequeno
calado, engenhosa disposição do canhão de grosso calibre, que
montava a torre central de forma elíptica, reduzida ao mínimo a área
do orifício por onde a peça entrava em bateria, finalmente excelentes
qualidades evolutivas asseguradas pelo emprego do motor de dupla
hélice...”
231
Aliado a essa força combativa de Level e Braconnot temos, em Henrique Antônio Batista
232
a terceira perna do tripé que constituiu a prodigiosa força técnica e produtiva que deu ao Arsenal de
Marinha do Rio de Janeiro parte tão substancial na vitória aliada
233
. Foi ele o introdutor e defensor
do canhão Withworth raiado na Marinha Brasileira. Na guerra foi designado em fevereiro de 1867
para o teatro de operações com a missão de montar na ilha de Cerrito um laboratório pirotécnico o
qual veio a prestar os melhores serviços à esquadra em operações. No período em permaneceu,
aproveitou para instruir as guarnições a bem usarem a artilharia raiada.
Ouro Preto assim registra esse esforço de guerra dispendido:
“Não fora o esforço extremo com que, desde os chefes do
serviço até o menos graduado operário, porfiavam todos no
desagravo da honra nacional [destacaram do Arsenal da Bahia para o
do Rio de Janeiro 200 operários que prestaram bons serviços]
seguramente não se poderia contar de 31 de janeiro de 1865 até 8 de
maio de 1868, não levar a efeito importantes reparações nos
cascos, máquinas, e acessórios dos navios existentes e a construção e
a conclusão de construções encetadas, senão também começar e
terminar as de 3 encouraçados, 5 monitores e 2 bombardeiras, lançar
as quilhas e adiantar a execução de mais 1 corveta encouraçada e de
231
Barão de Jaceguai, Artur Silveira da Mota, comandante do Encouraçado Barroso assim relatou a chegada dos
monitores ao teatro de guerra. in. Navigator : subsídios para a história marítima do Brasil Rio de Janeiro: Serviço de
Documentação Geral da Marinha, Dezembro, 1970 n
o
2. p.96.
232
Henrique Antônio Batista, filho de pai brasileiro e de mãe uruguaia, nasceu em Montevidéu no ano de 1824, assentou
praça de aspirante na Escola Naval, sendo declarado Guarda-Marinha em 1842. Criou o modelo de carreta de artilharia,
que foi adotado pela Marinha sob o nome de sistema de carreta Batista. Em 1862 seguiu para Europa a fim de estudar os
novos sistemas de artilharia naval. No seu retorno foi o fundador do Laboratório Pirotécnico da Ponta da Armação,
sendo responsável pelo fornecimento à Marinha e em parte ao Exército de quase todos os artefatos de guerra de que
necessitava artilharia. Foi ainda o inventor de uma espoleta de percussão para projetis ocos; de uma câmara excêntrica; e
modificações nos aparelhos de culatra para os canhões Withworth.
233
Inhaúma registra em seu diário a chegada do Vapor Guará que transportou da Corte, 150 bombas de 13 polegadas em
18 de maio de 1867; em 3 de setembro de 1867 a do brigue mercante nacional Imperial Marinheiro com munição de
guerra. INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 88 e p. 125
1 rebocador. Um dos encouraçados caiu no mar em menos de 5
meses, as bombardeiras flutuaram em pouco mais de 3 e um dos
monitores ao cabo de 5 meses e alguns dias.”
234
Para dar vazão a tantas obras procurou-se o concurso de oficinas particulares, distinguindo-
se as da Ponta da Areia e de Jonh Maylor & Cia, e importou-se maquinismo e ferramentas para
fabricação de chapas de couraça, martinetes a vapor, prensas hidráulicas, serras e demais
ferramentas necessárias para o fabrico dos navios; foram ainda criados na Ilha das Cobras oficinas e
depósitos, e transferido para a Ilha da Armação o laboratório pirotécnico aumentando, desta feita,
sua capacidade produtiva de modo a não precisar de importação de munição
235
. Assim noticiou
uma, entre tantas, reportagem sobre a incorporação dos meios flutuantes da Marinha:
“- Marinha de Guerra.- Conforme noticiamos, foram lançados ao
mar, hontem às 3 horas da tarde, dos estaleiros da ilha das Cobras, o
novo monitor “Ceará”. Um batelão, uma barcaça e um caixão para
um sino mergulhador
236
.
“Assistirão ao acto S. M. O Imperador acompanhado dos seus
semanários, e os Srs. ministros da marinha e da justiça e officiaes
generaes da armada.
“As dimensões, machinas e artilharia do “Ceará” são em tudo
semelhantes ás dos monitores anteriormente construídos naquelles
estaleiros, e que se achão reunidos à nossa esquadra em
operações.
“Hontem mesmo foi experimentada a machina do novo monitor, a
qual funcionou satisfactoriamente.”
237
A produção bélica, munições e artefatos de guerra, levada a efeito pelo Laboratório
Pirotécnico e Diretoria de Máquinas do Arsenal do Rio de Janeiro foi muito intensificada após a
criação, em 1860, da Diretoria de Artilharia e principalmente desde que eclodiu a guerra. Pode-se
dizer que quase toda munição e artefatos de Guerra usados pela Marinha e parte usada pelo Exército
234
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op. cit. nota 17, p. 36.
235
A Marinha produziu balas ocas e rasas, espoletas diversas, bombas, pirâmides, tacos etc.
236
Caixa de ferro em forma de tronco de cone ou de pirâmide, sem fundo, suspensa por uma cabrilha (pequenas vigas), e
que recebe, por meio de um tubo flexível, ar comprimido de um compressor de ar.
237
Jornal do Commercio, de 27/03/1868. apud ALBUQUERQUE, A. L. Porto Impressões sobre a construção naval no
Brasil durante a monarquia (1822-1889). in. Navigator: subsídios para a história marítima do Brasil. Rio de Janeiro:
Serviço de Documentação Geral da Marinha, junho/1971. Número 3. p. 9
na guerra foram produzidos, com a colaboração de fundições particulares como do estaleiro da
Ponta da Areia que fundiu projetis de artilharia.
2.4.1– O Arsenal de Cerrito
238
:
Fig.: 27
Os navios brasileiros que combatiam as fortalezas e baterias paraguaias em rios tortuosos e
estreitos, necessariamente sofreram consideráveis estragos dos canhões inimigos. Para repará-los
não se podia recorrer aos portos do Rio da Prata , por falta de oficinas adequadas, e sendo por
demais demorado o envio para o Rio de Janeiro a fim de realizar os reparos, decidiu-se por
238
A Ilha de Cerrito esta localizado nas proximidades da confluência do Paraná com o Paraguai, no Diário da Campanha
Naval do Paraguai, de Manuel Carneiro da Rocha , existe o seguinte registro de sua localização : “Latitude de Cerrito -
= 27
o
- 30”; Longitude do Cerrito - = 3h 54min 19seg 934”. p. 8. A Ilha foi ponto estratégico e base das operações
aliadas.
estabelecer um arsenal de construções navais na Ilha de Cerrito
239
, sendo também instalado o
laboratório pirotécnico
240
, sob a direção do Capitão-de-Fragata Henrique Antônio Batista.
“Dia 27 para 28
...Chegou a tarde o vapor Brasil conduzindo chapa para conserto do
Tamandaré; passaram para a Angelita. Em seguida veio o S. Paulo
conduzindo o Capitão de Fragata Henrique Antônio Baptista, que
trouxe em sua companhia um mestre para a oficina pirotécnica que
vai estabelecer-se no Cerrito, noventa e quatro praças do Batalhão
naval, cento e dezenove Imperiais Marinheiros, e cinquenta e oito da
Armada, os quais passarão para o Vapor Princesa de Joinville....'
241
Foi portanto, estabelecido em Cerrito, uma oficina de máquinas com 20 operários e outra de
construção com 50, entre carpinteiros e calafates, dirigidas, respectivamente, pelo engenheiro
Conceição
242
e pelo construtor Bastos
243
.
A oficina de construção era abastecida de boas madeiras para reparos dos navios, tiradas da
margem paraguaia, no lugar onde havia antigamente uma bateria, em frente ao Atajo. Assim
registrou Manuel Carneiro da Rocha:
“Hoje cortou-se [8 de outubro de 1866] na Ilha de Cerrito, um
pouco para dentro, madeira rija e grossa, - jurundaia – para conserto
do leme da Itajaí. Por aqui se pode concluir da fertilidade do
Paraguai em madeiras. O Lopez sempre fez monopólio delas, não
consentindo que os navios do lado do Chaco fizessem derrubadas.”
244
Foi, ainda, construída na Ilha, uma igreja pelo fornecedor do Exército o Sr. Francisco Gomes
239
Consta tanto no Diário de Inhaúma como no de Rocha Carneiro a indicação, quase que diária,da entrada e saída dos
navios no Arsenal de Cerrito a fim de realizar alguma tipo de reparo, como a menção a seguir: Achavam-se em 10 de
agosto de 1866 na Ilha de Cerrito os vapores Henrique Martins e 11 de Junho, para conserto, e os pontões, chatas,
canoas etc. Neste lugar está montado o nosso Arsenal de Marinha, e atualmente o hospital do 2 Corpo do exército” ; e
vapor Lindoia em fabrico no Cerrito”, em 30/12/1866. ROCHA, Manuel Carneiro da, op cit. nota 23, p. 200 e 343.
240
No Diário de Inhaúma verificamos que em 8 de maio de 1867 pode-se ter uma primeira remessa da produção do
laboratório pirotécnico: Chegaram a esquadra vindas do novo laboratório pirotécnico do Cerrito as espoletas
preparadas pelo Capitão de Fragata Baptista segunda as medidas aconselhadas pelo que observou no
bombardeamento de 5 do corrente.”. INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 72.
241
Ibidem, p. 69.
242
José Maria da Conceição Junior, engenheiro de máquinas, oriundo de Pernambuco, em 1867 foi graduado capitão-
tenente pelos serviços prestados nas oficinas da Esquadra no Arsenal de Cerrito.
243
Antônio Luiz Bastos dos Reis, iniciou na profissão como aprendiz de carpinteiro no Arsenal de Marinha Pernambuco
em 1838. Estudou construção naval na Bahia e se especializou na Europa e Estados Unidos. Em 1852 foi transferido
para o Arsenal de Marinha da Corte sendo em 1857, nomeado ajudante do Diretor de Construções Navais. Por ocasião
da Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai foi designado para organizar o arsenal a ser instalado na
Ilha de Cerrito. Pelos serviços prestados nesse arsenal foi promovido a Primeiro-Tenente e condecorado com a Ordem
da Rosa no grau de Cavalheiro, recebendo também a medalha de bronze da campanha.
244
ROCHA, Manoel Carneiro da, op. cit. nota 23, p.260
Pereira, com auxilio do construtor Bastos e de alguns oficiais de Marinha. A imagem de Nossa
Senhora da Conceição, que estava na Itajaí, foi colocada no altar, sendo a igreja benzida em 7 de
dezembro de 1866 pelo Frade Beneditino Carneiro, ajudado pelo Padre Castilho
245
.
Assim relatou Celso Assis de Figueiredo em Relatório a Assembleia datado de 23/05/1867,
quando tratava das operações de guerra:
“O serviço naval se acha organizado nas melhores condições
para o prosseguimento da guerra.
“A esquadra em operações, além de receber suprimentos
regulares enviados da corte, dispõe dos recursos que lhe oferecem as
oficina montadas em situações escolhidas na foz do Paraguai.
“Muitos navios tem reparado avarias nos cascos e nas
máquinas, e à Corte tem vindo somente aqueles que precisavam de
maior fabrico.”
246
Sem dúvida, a arsenal de Cerrito constituiu em apoio impar às operações navais. Seu
estabelecimento e produção demonstraram a importância de se estabelecer dentro da estrutura
institucional bases de apoio autônomas distantes do poder central, no caso foi dado maior fomento
ao estabelecimento do arsenal de Mato Grosso.
Da mesma forma, as atividades desenvolvidas no Arsenal da Corte, que colocaram a
instituição Marinha autossuficiente na área da construção naval e na fabricação de armamento,
constituindo um marco nesse final do século XIX, colaborou para a reestruturação da instituição,
visto que muitas de suas responsabilidades foram relocadas para outros setores que foram criados
ou readaptados para melhor poder focar na sua missão, qual seja, a construção de meios navais.
245
Ibidem, p.320.
246
Relatório apresentado a Assembleia Geral Legislativa pelo Ministro e Secretário dos Negócios da Marinha , Afonso
Celso de Assis Figueiredo, 1866. p. 17-8.
2.5– Saúde
Componente da estruturação logística ora estudado, a atividade médica, neste estudo
denominado de saúde, foi de enorme importância, visto que o resultado obtido colaborou
diretamente no resultado positivo da atuação aliada no conflito. As dificuldades a serem enfrentadas
foram vivenciadas na campanha do Uruguai, pois foi pela primeira vez, que se desdobrou às
vistas do médico da armada contemplar as dificuldades que se ofereciam no exercício de sua
profissão a bordo de um navio de guerra, longe de suas bases de apoio e em conflito.
Dentre outros pontos, o que mais chamou a atenção do Corpo de Saúde foi a higiene de
bordo, ou melhor a sua precariedade. Carlos Frederico dos Santos Xavier
247
informa que, enquanto
nações como a França e a Inglaterra, cuidaram da higiene de suas guarnições, principalmente em
campanhas
248
quando ocorriam a acumulação de praças na coberta dos navios proporcionando
grandes males, o Brasil, não prestou toda a importância que era de desejar à salubridade
249
, sendo
atribuída a essa realidade a razão das diversa enfermidades acometidas nas guarnições, onde o seu
germe tinha, muitas vezes, origem no transcurso da construção
250
do próprio navio
251
.
A esquadra, por ocasião da intervenção no Uruguai, composta de 13 navios a vapor e um à
vela, oferecia, por esta simples circunstância, elementos constitutivos de desenvolvimento de
enfermidade. Estudos desenvolvidos na Europa demonstraram que a predisposição de
enfermidades, que manifestavam nas guarnições dos navios de guerra, era mais facilmente
desenvolvida no de propulsão a vapor, devido à acumulação de grande quantidade de óleo, calor
intenso, umidade aumentada, emprego de grande quantidade de materiais graxas, e trabalhos
especiais exigidos pela natureza do motor. Na apreciação das causas, que predominavam nos navios
movidos a vapor para a insalubridade, ficou comprovado a influência do estado do carvão; o calor
que partia da máquina e se espalhava por todo o navio; o desenvolvimento de gazes, que se
desprendiam da decomposição da graxa; o transporte de tropas, devido a aglomeração de
indivíduos; esses fatos aliado ao clima, a temperatura do país, e as transições bruscas desta,
somado a privação de fresca alimentação, e a qualidade das águas potáveis, contribuíram para a
agravar o quadro. A disposição das cozinhas nas cobertas dos navios, e o fumo por todo esse
espaço, também colaboraram para o aumento de enfermidades.
252
247
AZEVEDO, Carlos Frederico dos Santos Xavier, op cit. nota 24.
248
Na guerra da Crimeia ocorreu a bordo dos navios o cólera-morbo, a história dos 300 zuavos, que em um noite tinham
sido afetados pela enfermidade, desenvolvida pela aglomeração de indivíduos.
249
A salubridade dos navios foi considerada o ponto de inflexão para a superação das enfermidades.
250
AZEVEDO, Carlos Frederico dos Santos Xavier, op. cit nota 24, p.3.
251
Forget, médico da armada francesa, que especialmente ocupou-se da higiene naval, afirma que a higiene de um
navio começa do estaleiro.
252
A Marinha francesa reconhecendo os inconvenientes, que resultavam da instalação das cozinhas nas cobertas,
colocou-as no convés.
A alimentação reunia-se às causas que concorriam ao desenvolvimento das moléstias. A
ração do marinheiro brasileiro, comparada com a dos marinheiros de outras nações, era boa, mas
não variável. Era composta de : Almoço - Café uma libra para 18 praças; Açúcar – uma libra para
12 praças; Pão, bolacha meia libra por praça. Jantar- Gêneros variáveis.; e Ceia. Os gêneros
variáveis, se dividiam em quatro espécies: 1
a
espécie – feijão (um alqueire
253
para 184 praças); arroz
(quatro onças por praças); e carne fresca(libra e quarta por praça); 2
a
espécie – feijão; carne salgada;
toucinho; e azeite doce; 3
a
espécie feijão ou arroz; carne seca; e toucinho; e 4
a
espécie feijão;
bacalhau ou peixe; e azeite. Como exemplificação, no anexo 8 deste estudo, consta a relação de
gêneros fornecidos aos navios da Força Naval no período de 1866 a 1867
254
.
Thompson nos dá a informação de que:
“a ração diária do soldado paraguaio consistia num boi para
oitenta homens, ou, se a carne estivesse escassa, em um boi para
duzentos homens. Isto, entretanto, era raro. Recebia também, cada
homem, uma libra de erva-mate por mês, e um pouco de fumo, sal,
milho (quando houvesse) para comer assado ou fazer sopa. Durante a
guerra o sal se tronou muito escasso, e a falta dele se fez sentir mais
duramente que qualquer outra coisa, custando milhares de vidas ao
Paraguai. Também por falta de alimentos vegetais morreram milhares
de outros que se tinham alimentado somente de verduras e frutos até
serem mandados para o exército, onde nada mais comiam que carne
má, cansada e negra”
255
.
A carne fresca não podia ser continuamente distribuída pelas guarnições em consequência
das circunstâncias anormais; não obstante sempre que possível, eram obtidas do Bucêo
256
. Porém,
algumas vezes, foi necessário obedecer às circunstâncias especiais da guerra, e as guarnições
sustentavam-se com carne salgada, resultando em enfermidades graves. A alimentação vegetal, tão
necessária simultaneamente com a animal para ser reparadora, poucas vezes podia-se obter.
A aguardente era a bebida favorita ao jantar, sendo substituída por vinho em portos
estrangeiros. Na falta de café, havia o chá, podendo a farinha, nos portos estrangeiros, ser
253
Cesta bastante robusta, na qual se transportava principalmente milho e feijão.
254
A equivalência das medidas correspondia a: alqueire=13,1 litros; 1 libra=16 onças ou a 0,453Kg.
255
THOMPSON, George, op. cit nota 28, p. 61. Não temos relato de como se processava na armada paraguaia.
256
Porto de Montevidéu. Essa informação corresponde a intervenção no Uruguai.
substituída pela batata.
257
A água utilizada para o consumo , no transcurso da intervenção no Uruguai, foi a do Rio da
Prata, que apresentava características de água potável, com sabor fresco, apesar de ser um pouco
turva e pesada. Na proximidade do porto de Montevidéu seu sabor era desagradável, devido a
junção que naquela localidade fazem com o mar.
258
Quanto a estrutura dos navios para o apoio à saúde faltavam enfermarias. Soluções
alternativas, porém não ideais, foram adotadas, como na Corveta Niterói
259
, que tinha por
enfermaria a coberta
260.
No tocante as boticas
261
, eram amplamente surtidas de todos os
medicamentos, e em escala tal, que algumas vezes forneceram ambulâncias para o Exército, que
achava-se acampado em Santa Luzia, e em outros pontos do Uruguai. Foi criado Hospitais de
Sangue
262
, onde os marinheiros recebiam o primeiro atendimento, e onde eram realizadas as
cirurgias mais urgentes. O primeiro hospital criado em terra, foi em Paissandu, em uma casa de
palha, que servia de Quartel à guarda da Capitania do Porto, onde foram recebidos os feridos, e
colocados sobre tarimbas
263
.
O número de feridos crescia, tornando insuficiente esse primeiro hospital, sendo outros
inaugurados nas casas próximas a esse, onde encontraram todos os auxílios, que chegavam de
Buenos Aires, constantes de lençóis, cobertores, e roupa, totalizando sete hospitais.
Por ordem do Almirante Tamandaré foi inaugurado um hospital em Buenos Aires, onde
eram encaminhados os doentes que necessitavam de tratamentos não possíveis de serem aplicados
no campo de batalha
264
. Feita a paz em Montevidéu, os doentes foram recolhidos ao hospital da rua
Esmeralda, único, que então funcionava, e cujos leitos eram ainda em grande parte ocupados por
feridos de ataque de Paissandu.
Reinava então a estação calmosa, e moléstias de caráter diverso foram-se manifestando,
tendo-se recolhido ao hospital até o mês de junho de 1865, 435 doentes afetados das enfermidades.
Com a eclosão da Guerra da Tríplice Aliança, e o então sistema de recrutamento forçado,
que segundo Carlos Frederico
265
, era indubitavelmente uma das mais notáveis causa de moléstia, e
257
AZEVEDO, Carlos Frederico dos Santos Xavier, op. cit. 24, p.11
258
Não obstante, a elas foram consideradas as causas de moléstias, principalmente para os recém chegados.
259
O espaço destinado a enfermaria apresentava pouca ventilação e estava superlotada com elementos da guarnição.
260
Compartimento destinado a alojar a guarnição do navio, situado abaixo do convés.
261
Farmácia
262
O primeiro acampamento analisado, procurando criar um hospital militar, foi junto ao hospital do Exército em Cerro,
lugar elevado, muito ventilado, porém o terreno era argiloso, entre dois saladeiros, que , com a brisa, espalhavam um
cheiro nauseabundo, agravando assim o estado sanitário.
263
Estrado de madeira onde dormem os soldados, nos quartéis e postos de guarda.
264
Tratava-se de uma casa de dois andares, com oito pequenas enfermarias, na Rua Esmeralda, com lotação para 80
pacientes, mas devido a necessidade de mais espaço foi no dia 8 de janeiro, inaugurado outro hospital, na rua Siupacha,
casa de dois andares com três enfermarias.
265
AZEVEDO, Carlos Frederico dos Santos Xavier, op cit. nota 24.
sobre a qual a higiene deveria exercer toda sua influência, em especial nos transportes de guerra que
do Brasil partiam com tropas, e/ou marinheiros para servirem na esquadra, conduzindo elementos
de todas as idades e origens, que indistintamente eram distribuídos nos navios jovens de 17 e 18
anos com velhos de 50 e mais anos, aglomerados nas cobertas por mais de quinze dias. A carta
constante do anexo 9, bem demonstra essa situação, onde seu remetente Menna Barreto, relata seu
receio quanto a uma epidemia, dada a aglomeração da tropa e falta de cômodos.
O municionamento da esquadra em operações de guerra longe de todos os auxílios
alimentícios, foi dificuldade imensa a vencer. Utilizou-se, na falta de carne e legumes frescos,
carne fresca em conserva, de caldos de carne, e de galinha para os doentes, oriundas da Província
do Rio Grande, e cidades de Buenos Aires e Rosário, em substituição ao fornecimento diário de
carne fresca e vegetal.
266
.
Encontramos registro de como era o abastecimento desses gêneros para a esquadra em
operações de guerra pelo Diário de Inhaúma, onde existe o registro quase que diário da entrega de
gêneros para esquadra efetuado na maioria das vezes pelo transporte Lindoya. Destacamos alguns
desses referentes a entrega de gêneros e soluções encontradas para o fornecimento contínuo de
carne fresca:
“Dia 25 para 26 [maio de 1867]
“… O Recife trouxe a reboque um brigue montevideano que vem
carregado de gêneros para a esquadra, e regressou para Corrientes a
fim de conduzir dali outro que traz farinha para a padaria...”
267
“Dia 6 para 7 [junho de 1867]
“...Foram seis escaleres armados e comandados pelo 1
o
Tenente Paes
Leme buscar a madeira que se pudesse aproveitar dos destroços do
acampamento para com ela fazer-se um curral na ilha do Palmar
onde se recolhesse o gado para fornecimento da esquadra: vieram
três chalanas carregadas, trazendo, entre outros três carros de mão.”
268
As águas utilizadas para o consumo, principalmente as do rio Paraguai, eram de aspecto
vermelho, de sabor desagradável, tornando-se este mais pronunciado nos meses de verão, com a
enchente, ou a baixante do rio Vermelho, produzindo terrível influência no organismo da guarnição
(disenterias e diarreias). Nos navios da Esquadra procurou-se minorar a sua influência com a
266
O gado era trazido até Corrientes, por fornecedores, que pelos seus contratos eram obrigados diariamente a suprir as
forças.
267
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p.91.
268
Ibidem, p. 101
utilização de sacos de lona, onde eram depositadas, ou conservadas em tanques, para depois
fazerem dela uso, desembaraçando-se deste modo de alguns corpos estranhos, que pudessem conter,
tornando-se então menos turva.
O hospital na cidade de Buenos Aires, localizado na rua Bollivar, foi o primeiro que se
estabeleceu, destinados não para as praças da Armada, mas também para todos os soldados que
eram transportados do Brasil. Era um edifício importante pela sua beleza e construção, ventilado,
com largas escadarias de mármore, tendo 13 salões, que formavam as enfermarias, tinha capacidade
de 300 leitos sendo aberta a recepção dos doentes a 26 de junho de 1865, e encerradas a 29 de
setembro de 1866, por ordem do governo brasileiro, para servir exclusivamente de Hospital Militar
para o Exército
A Enfermaria na Vila de Uruguaiana, instalada em uma pequena casa que anteriormente
servira para guarda da Alfândega da vila (20/09/1865) foi o segundo asilo hospitaleiro. Em 1866,
achando-se a Esquadra ancorada em frente a Corrientes, sendo ali a base das operações de guerra,
decidiu-se pela construção de um hospital
269
. A construção levou três meses (início em março de
1866), possuía seis enfermarias, todas as salas eram ventiladas pela parte superior e inferior,
segundo o sistema que foram construídas as enfermarias quartéis dos americanos da Guerra da
Secessão; foi considerado hospital modelo.(fig.:28).
269
Conta-nos Manoel Carneiro da Rocha que, em 23 de fevereiro de 1866, Tamandaré e Barroso escolheram o local
apropriado para a sua construção, que ficou a cargo do construtor Bastos e seus operários. ROCHA, Manoel Carneiro
da, op. cit. nota 23, p.32.
Fig.: 28
Assim descreve André Rebouças o hospital de Marinha em Corrientes:
“12 de maio (Sábado)
Desembarquei com os doentes da Marinha e não podendo ir
mais longe aquelas horas pela extrema debilidade, em que me achava
pernoitei na Enfermaria dos Oficiais do Hospital da Armada. Obtive
este favor por intermédio do Dr. Villaboim, com quem travara
conhecimento em Uruguaiana, e que me fez preparar na Pharmacia
do Hospital a poção de tártaro de Larrey, que me havia sido receitada
pelo meu bom amigo o Dr. Damásio.
“O Hospital da Armada, construído sob a direção do Construtor
Naval Bastos consiste de dois grandes galpões feitos inteiramente de
madeira um deles ainda se acha por terminar. Acha-se bem provido
de todo o material necessário e esta em boa ordem e bem aceiado.
“Já havia para mais de 300 doentes....”
270
Além da enfermaria existia uma excelente capela, casa mortuária, aposentos para os
médicos, e empregados, grande botica, que sortia todos os navios da esquadra, pequena sala de
operações, casa de arrecadação, depósito para gêneros alimentícios, sala de jantar, e a cozinha
colocada no pátio, que fica no centro do edifício.
O abastecimento de água era feito por meio de uma bomba, que tirava a água do rio.
Contratos para fornecimentos de dietas, lavagem de roupa, serviço mortuário foram estabelecidos.
Em 1868 devido o avançar das forças para o Humaitá e com o estabelecimento de uma base de
270
REBOUÇAS, André, op. cit nota 20, p. 136-7.
operações, foi por ordem do Visconde de Inhaúma o hospital demolido a 31 de agosto, e transferido
os doentes para o novo hospital criado nessa praça de guerra.
Foi também necessário a criação de um Hospital de Sangue estabelecido em qualquer navio,
para que acompanhasse a Esquadra em todas as suas evoluções, recebendo feridos, durante e depois
dos combates
271
. O Vapor Onze de Junho por apresentar condições para esse fim, foi utilizado como
hospital. A câmara do navio era representada pela sala de operações, e a praça d’armas ocupada por
leitos de ferro, quando o numero de feridos era grande, havia uma botica sortida de todos os
medicamentos. Referente a medicamento, no anexo 10 consta carta de Luiz José Ribeiro, que
informa que remeteu pelo Vapor Iapoque suprimentos de saúde como: fios de ataduras, e garrafões
com tintura de arnica,.
272
A Enfermaria de Cerrito, criada na administração do Visconde de Inhaúma
273
, tinha o fim de
receber os afetados com a cólera. Inaugurada em 14 de abril de 1867, era composta de galpões
instalados na parte mais elevada da Ilha
274
.
O Hospital de Humaitá foi criado logo após o encerramento do de Corrientes, e ocupou
onze galpões que tinham servido aos paraguaios para o mesmo fim.
A Marinha teve ainda uma Enfermaria no Chaco, de pouco tempo de uso, e um Hospital em
Assunção, estabelecido em prédios da rua Oliva e da Etrella.
Assim relatou Ouro Preto sobre a atuação do Corpo de Saúde da Marinha:
“A solicitude da administração, o zelo e devotamento do
Corpo de Saúde obtiveram os mais felizes resultados. Os hospitais de
sangue ou sedentários eram modelos de ordem, asseio e economia,
nada deixando a desejar a estatística de clínica médica e cirúrgica,
que honrou os práticos brasileiros. Efetivamente os mapas oficiais
apresentam algarismos fora de toda a proporção com os mais
consoladores de outras campanhas, em qualquer parte do mundo. Nos
anos de 1865 e 1868 e no mês de janeiro de 1869, as enfermarias de
bordo receberam, doentes e feridos, 20.620 praças, das quais saíram
271
Carneiro da Rocha informa que o transporte Eponina, encontrava-se em Corrientes, a 3 de julho de 1866, sendo
utilizado como hospital de sangue. ROCHA, Manoel Carneiro da, op cit. nota 23, p. 162.
272
Consta também a remessa de aguardente de Paraty e garrafa com aguardente de flor de laranja, para Tamandaré
utilizar com os amigos.
273
Inhaúma assim registra em seu diário a Enfermaria estabelecida em Cerrito: “Acha-se estabelecida no Cerrito uma
enfermaria para cinquenta leitos a cargo do Dr. Rocha Bastos, que a mantém na melhor ordem”. INHAÚMA, Ignácio
Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 80.
274
Em 28 de maio de 1866 Tamandaré inspecionou Cerrito juntamente com uma comissão médica e decidiram que não
se prestava para ter o hospital. Porém, o mesmo autor informa que em agosto o exército mantinha uma enfermaria e
que em 7 de outubro contava com 800 homens em tratamento. ROCHA, Manoel Carneiro da, op. cit. nota 23, p. 126 e
p. 259.
curadas 16.041 e faleceram apenas 736. Dos 2.943 que completam o
número das entradas a maior parte regressou ao Brasil, continuando
os demais em tratamento.
“Para os hospitais ou enfermarias de terra, montados pelo
Ministério da Marinha, entraram no mesmo período acima de 15.259,
obtiveram alta 10.929, morreram 1.158 e 3.172 tiveram o destino
indicado – volta à Pátria. De fevereiro a dezembro de 1869, tanto nos
navios como nos hospitais, trataram-se 4.112 enfermos ou feridos:
restabeleceram-se 3.466, finando-se apenas 65. Cumpre advertir que
estes algarismos compreendem não o pessoal da Marinha, senão
também praças do Exército e prisioneiros paraguaios, indistintamente
recolhidos a bordo ou nos estabelecimentos de terra, conforme as
necessidades da ocasião.”
275
A preocupação com a higienização dos navios e estado de saúde das tripulações, muito
devido a cólera e demais doenças que abateram os combatentes dos dois lados, ocupou sempre as
atenções tanto do corpo médico quanto dos comandantes dos navios e porque não dizer do
comandante das operações navais; destacamos os seguintes registros do Diário de Inhaúma quanto a
esse tema:
“Dia 9 para 10 [abril de 1867]
Chegou de noite o “Voluntário” trazendo o Cirurgião Chefe
de Saúde...Deu-se na esquadra um caso de cólera mórbus, mas sem
consequência. Mandei que se dese uma ração adicional de café, que
se mudasse à hora da baldeação para depois das oito, e que se
observasse a risca os preceitos higiênicos estabelecidos por ordens
antigas e conhecidas na esquadra, isto tudo a pedido e de
inteligências com o Chefe de Saúde”
276
“Dia 13 para 14 [abril de 1867]
A esquadra tem a registrara, ao todo até hoje, incluídos dois
casos a bordo da “Araguay” no Cerrito, e um neste vapor “Princesa
de Joinville, dez casos de cólera, dos quais quatro não foram fatais
275
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op. cit. nota 17, p.47-8.
276
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op. cit. nota 27, p. 78.
graças ao Altíssimo...”
277
“Dia 19 para 20 [junho de 1867]
Chegou o “Jaguaribe” com tropa; trouxe também uma porção de
verduras encomendadas para o uso da esquadra em virtude do
escorbuto que começou a desenvolver-se.”
278
Desde a instalação da Corte no Rio de Janeiro, já se tem notícia da constante busca de se ter
um hospital específico que tratasse do homem do mar, isso devido as suas especifidades sanitárias
próprias da vida de bordo. A Guerra da Tríplice Aliança contra o Governo do Paraguai veio a
demonstrar não só a necessidade da existência desses estabelecimentos de saúde, mas também da
necessidade de se ter profissionais de saúde com a experiência em tratá-la, e que deveria ser
alocado dentro da estrutura física do navio local adequado para que se exercesse a atividade de
saúde. A isso se soma o entendimento da necessidade de um controle efetivo das moléstias que mais
comumente afetava os marinheiros e a aplicação de forma implacável das medidas higiênicas em
todos os setores da Instituição, assim se reduziria aos menores índices as enfermidades,
propiciando assim à administração naval tirar o melhor proveito de seu pessoal.
2.6 -Pessoal
Com o acréscimo dos novos meios navais, a carência tanto da oficialidade como das praças
de pré para armar as unidades era sentida ainda muito mais do que em tempo de paz. Para suprir os
vãos da oficialidade, nomeou o Governo alguns oficiais de náutica, ou pilotos, segundos-tenentes de
comissão. Os guardas-marinha foram dispensados da viagem de instrução rotineira e foram
promovidos segundos-tenentes, sendo enviados para o teatro de operações, no documento do anexo
11, verificamos que até aspirantes foram utilizados na campanha. Aumentou-se o número de
profissionais do quadro de Cirurgiões e Farmacêuticos da Marinha
279
; e engajou-se extranumerários
para executarem as funções de maquinistas.
Na classe de oficiais de fazenda, composta de comissários e escrivães de três categorias e
fieis de duas, poucas vagas se abriram. Foram facilmente preenchidas por engajados, em comissão,
contratados à proporção que se armavam os navios. De 209, que eram os oficiais de fazenda no
277
O registro é referente a uma comparação onde no segundo Corpo do Exército ocorreram até aquele momento
duzentos e tantos casos por dia. Ibidem, p. 79.
278
Ibidem, p.97.
279
Foram contratados 33 profissionais civis, para guarnecerem as enfermarias de bordo e os hospitais de campanha.
princípio da guerra, ascenderam a 270 em 1869.
O Corpo de Marinheiros Nacionais
280
, representou um dos maiores obstáculos a vencer,
devido aos numerosos claros existentes. Grande esforço foi realizado para supri-los, cujo resultado
pode ser observado no que registrou Ouro Preto:
“Os resultados destes esforços condensam-se nos seguintes
algarismos: ao terminar a Guerra do Uruguai, por efeito do
Convênio de 20 de fevereiro de 1865, existiam na esquadra em
operações no Rio da Prata e que deviam passar ao Paraguai:
Oficiais de todas as classes de embarque 298, praças de pré
2.031, total 2.391.
A contar daquela data até 10 de abril de 1867, seguiram quer
nas guarnições dos navios, que reforçaram a mesma esquadra, quer
em diversos contingentes, oficiais 551, praças de pré 2.367, total
3.188
281
.
De abril de 1867 a abril de 1868, oficiais 20, praças de pré
2.358, total 1.180.
De abril de 1868 a abril de 1869, oficiais 117, praças de pré
1.063, total 1.180.
Total das forças de Marinha enviadas antes e depois do Convênio
9.137.
Até 31 de março de 1870 perdemos, por mortes em combate,
ferimentos, explosões de torpedos, 52 oficiais e 208 praças de pré; e
de moléstia em campanha 121 oficiais e 1.450 praças, ao todo
1.831 homens.”
282
Ao longo do transcurso do conflito verificamos uma certa constância no envio de pessoal
para suprir tanto as baixas por morte como por doenças, como exemplo destacamos alguns dos
registros relativos a esse tópico registrado no Diário do Visconde de Inhaúma;
' Dia 26 para 27 [março de 1867]
...Veio também um contingente de cento e quarenta praças, pouco
mais ou menos, de Imperiais Marinheiros, e navais para o serviço da
280
Estes distribuídos entre Batalhão Naval e Corpo de Imperiais Marinheiros.
281
Carneiro da Rocha registra a chegada de contingentes para reforço do pessoal em duas ocasiões em 1866: em 14 de
outubro, 150 praças; e em 25 de dezembro, 200 praças e mais seis peças de calibre30 raiada. ROCHA, Manoel Carneiro
da, op. cit. nota 23, p. 266 e 338.
282
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op cit. nota 17, p. 58.
esquadra.”
283
“Dia 7 para 8 [novembro de 1867]
...Chegaram a Curuzu os transportes “Vassimon” e “Leopoldina”.
Este trouxe duzentas praças para a esquadra; e o outro gêneros que
foi descarregar no Cerrito...”
284
Dia 28 para 29 [abril de 1868]
Vieram igualmente trezentos e tantos Imperiais e soldados, muitos
medicamentos”
285
2.7 - O Serviço de Intendência
286
da Marinha:
Á Intendência de Marinha coube a aquisição e o abastecimento de todos os tipos de
sobressalentes e meios para consecução das operações de guerra, ou seja a materialização do apoio
logístico. No Rio da Prata foi criada a Repartição Fiscal e Pagadoria da Marinha
287
, que centralizou
todo o serviço de fiscalização da despesa, aquisição e fornecimento de material e pagamentos à
Esquadra em Operações, encargos antes entregue ao comandante em chefe, então o Almirante
Tamandaré. Aliviado assim dessa responsabilidade, pode ele dedicar-se inteiramente à sua precípua
função, que era a direção naval da guerra. Foi nesses termos que comunicou da criação o Ministro
da Marinha Afonso Celso de Assis Figueiredo, em carta datada 6 de outubro de 1866, ao Almirante
Tamandaré, após registrar elogio quanto aos feitos da Esquadra em Curupaiti:
“...e devida a ação militar o Governo criou uma comissão de
fazenda, tendo para chefe um empregado superior do tesouro, e esta
comissão segue para Buenos Aires, onde tomará conta de tudo o que
está a cargo do Escrivão e Comissário Geral da Esquadra.
“Oficialmente dou conhecimento disto a V. Exa., e lhe remeto
cópia das instruções que leva a comissão. É esta uma medida
283
INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, op cit. nota 27, p.75.
284
Ibidem. p.137.
285
Ibidem p. 188.
286
Repartição destinada a adquirir e distribuir o material necessário ao abastecimento, aparelhamento, movimentação e
manutenção da força naval e dos estabelecimentos da marinha. Inicialmente integrada na estrutura dos arsenais de
marinha .
287
Decreto 3 710 de outubro de 1866: “...considerando a conveniência de reunir em um centro comum todo o serviço de
fiscalização, compras e pagamentos da esquadra em operações contra a Paraguai porque daí resultará não
economia dos dinheiros públicos, mas também maior regularidade e método do mesmo serviço...[além de] evitar que a
atenção do vice-almirante comandante-em -chefe da mesma esquadra seja distraída dos importantíssimos trabalhos da
guerra, por cuidados de administração, principalmente quando a mór parte dos negócios se tem de resolver a grande
distancia do lugar em que ele se acha...” . CAMINHA, Herick Marques, op. cit. nota 4, p.321-2.
reclamada pelas atuais circunstancias da guerra. Com a sua
incontestável probidade V. Exa. zelará quanto possível a praxe que lhe
compete na nova ordem dada ao serviço econômico da Esquadra, e
não se verá [------] a economia e mais vantagens que daí
melhorarão.”
288
Essa Repartição, que teve, a princípio, sede em Buenos Aires, passando-se depois para
Montevidéu, era quem se ocupava dos recursos logísticos a serem obtidos no Rio da Prata, que
constavam principalmente de carvão e gêneros alimentícios inclusive carne, aliás obtida em
quantidades substanciais dos rebanhos inimigos criados em pastos a margem dos rios navegados
pelos navios brasileiros (anexo 12). A Repartição estava diretamente subordinada ao Ministro da
Marinha, e tinha a incumbência de: satisfazer às requisições que lhe fossem feitas pelo
Comandante-em-Chefe da Esquadra, comandantes de divisões e navios de guerra, e chefes de
estabelecimentos; remeter regularmente à pagadoria da Esquadra o numerário preciso à satisfação
das respectivas despesas, de modo que não faltasse os meios a pagar, em dia, principalmente os
soldos e mais vencimentos do pessoal da mesma Esquadra; ajustar as contas dos oficiais e praças da
armada que se retiravam para a Côrte; remeter à secretaria de estado dos Negócios da Marinha, nos
primeiros dias de cada mês, o balanço das operações da Pagadoria no mês antecedente; e regularizar
a escrituração dos diferentes depósitos, inventariando o material neles existentes entre outras
atribuições.
Assim registrou Euzébio Antunes momentos antes da criação da Repartição;
“A Repartição da Guerra não tinha ainda estabelecido no Rio da
Prata nenhuma administração militar, e o serviço dessa repartição
recaía no Estado-Maior da esquadra, que em tão múltiplos e variados
deveres encontrava-se a cada momento dificuldades imprevistas. Daí
resultou o atraso da escrituração da marinha, que justificou da
conveniência da criação de uma Repartição Fiscal, necessidade
perfeitamente entendida pelo Sr. Conselheiro Afonso Celso.”
289
Em Relatório à Assembleia Legislativa de 1867, o Visconde de Ouro Preto justifica a
criação da Repartição e Pagadoria da Marinha no Rio da Prata
290
nos seguintes termos:
288
Arquivo Tamandaré, Livro 1 – Doc. 55, p.25
289
ANTUNES, Euzébio José, op cit . Nota 21, p.140.
290
Criada pelo Decreto 3 710 de 6/10/1866 foi extinta em 15/02/1871 pelo Decreto 4 694.
O serviço econômico da esquadra em operações apresentava
inconvenientes e defeitos, que cada dia se iam tornando mais
palpáveis.
“A experiência os apontava: era urgente o corretivo.
O comandante em chefe incumbido, pela legislação vigente,
assim da direção militar, como da administração de fazenda entre os
importantíssimos cuidados da guerra, e a solução de questões
administrativas, tanto mais complicadas, quanto mais se afastava a
esquadra dos centros em que tais negócios tinham de ser realizados.
“Daí a indeclinável necessidade de delegar em subordinados
seus e agentes, sem competência nem responsabilidade legal, o
desempenho de deveres que lhe era materialmente impossível de
cumprir.
“Na urgência do momento, quer para obter os fundos
necessários à satisfação das despesas do pessoal e do material, quer
para conseguir os aprovisionamentos indispensáveis aos navios da
força naval sob seu comando, recorria indistintamente, no oficial
seu delegado em Buenos Aires, as autoridades consulares e
residentes diplomáticos do império naquela capital e na de
Montevidéu.
“Em tais circunstancias era impossível que avultadas somas
se dispendessem, sem que ao seu emprego presidissem a economia e
fiscalização que fora para desejar, não porque faltassem zelo e
probidade aos funcionários por cujas mãos corriam, mas porque a
multiplicidade dos agentes destruía a unidade da ação, e fracionava a
responsabilidade, únicas bases de um bom sistema fiscal.
“Para dar andamento a esse ramo de serviço estacionava, é
verdade, na primeira daquelas capitais, um dos secretários do
almirante, oficial inteligente, e mui dedicado no cumprimento de suas
obrigações, mas desacompanhado de auxiliares necessários, sem
atribuições claras e definidas em lei, tendo unicamente sob suas
ordens dois oficiais de fazenda para todo o trabalho da escrituração
de tão e variadas e importantes operações, quais as que lhe estavam
cometidas.”
291
Prossegue o Relatório dando conta que devido a essas deficiência o governo ficou em
completa ignorância da situação econômica das forças em operações, das suas necessidades, dos
recursos criados para abastece-la do combustível, de munições de guerra, e sobressalentes. O
remédio para sanar a difícil situação foi reunir em um centro único todo o serviço de fiscalização da
despesa, aquisição e fornecimento do material, e pagamentos à esquadra em operações contra o
Paraguai, aliviando o comandante em chefe dos cuidados relativos a tais assuntos, e
conseguintemente melhorar as garantias de economia do dinheiro público.
A criação dessa Repartição, além de seu incontestável apoio às forças navais no conflito e o
cumprimento efetivo de sua missão que somou ao sucesso das operações desenvolvidas,
demonstrou a aptidão da instituição em se adaptar e promover mudanças para melhor se adequar as
novas realidades, tanto que cessado o motivo de sua criação, a mesma foi extinta, mas permaneceu
o germe da experiência em que descentralizar o processo decisório corrobora para uma melhor
tomada de decisão.
291
Relatório apresentado à Assembleia Geral Legislativa pelo Ministro e Secretário de Estado dos Negócios da Marinha
Afonso Celso de Assis Figueiredo , 1868. p.23-4.
CONCLUSÃO
A questão não é discernir se as instituições são eficientes,
mas sim chegar a uma explicação conclusiva de como as
instituições incorporam as experiências históricas em suas
estruturas organizacionais.
Walter W. Powell e Paul J. Dimaggio
À estruturação logística e à sua efetiva implementação, objeto desse estudo, poucas
referências têm merecido dos historiadores que se dedicam ou dedicaram ao estudo da Guerra da
Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai. O esforço empreendido para levar a bom termo a
missão confiada a Marinha, representada pela sua força naval, no interior do continente sul
americano, não foi de pequena monta. A não ser pela pequena falha, logo corrigida, no
fornecimento de carvão no início da campanha, nada afetou a força naval durante todo o decurso da
guerra. Nem munições de boca e de guerra, nem tudo mais que era necessário para manter e fazer
avançar essa força nos seus propósitos: uniformes e vestuários em geral, medicamentos, dietas,
instrumentos cirúrgicos e para curativos e uma variedade imensa de materiais ou equipamentos de
consumo, para sobressalentes, ou, enfim, para os reparos que se faziam a bordo ou no pequeno
Arsenal instalado em Cerrito, subsidiário do Arsenal do Rio. Não só para as forças navais se
transportaram esses materiais, grandes partidas foram também levadas para as forças de terra,
inclusive as argentinas.
Além desse serviço de abastecimento de materiais, que contar o transporte de todo o
pessoal para o teatro de operações, não apenas o dos contingentes navais destinados a preencher
baixas por doença ou em combate, mas também, o de toda as tropas do Exército que partiam do
Rio de Janeiro e das demais províncias que usavam as vias marítimas para aqueles longínquos
rincões, ou que de eram trazidas, onde se inclui a evacuação de feridos, doentes dispensados ou
licenciados que se destinavam ao Rio de Janeiro
292
Observamos que mesmo em terreno tão inóspito e com tantos obstáculos, a busca pela
solução dos óbices que a cada dia apareciam, era feita de forma eficaz, como o caso da construção
não de uma mas de duas ferrovias que possibilitaram, cada uma a seu tempo, a manutenção
regularidade do abastecimento das forças e a continuidade das comunicações.
Na área da saúde observou-se o esforço extraordinário do corpo médico, para se adaptar as
novas condições e ao desconhecido, com excelentes resultados como o hospital de Corrientes e os
292
O encargo de transportar tropas foi dado ao Arsenal de Marinha da Corte, por Aviso de 18 de maio de 1865, e o Aviso
de 15 de julho do mesmo ano diz que os navios empregados na condução de tropas ficam inteiramente subordinados à
inspetoria de Marinha
124
hospitais de sangue.
Indiscutível foi o acerto da montagem do arsenal na ilha de Cerrito juntamente com o
laboratório pirotécnico. Juntos capacitaram a força naval de uma autonomia, que garantiu a
presença dos meios navais no conflito com a regularidade desejada; da mesma forma que
possibilitou o abastecimento da munição sem solução de continuidade, não dependendo unicamente
do abastecimento que vinha da Corte ou do exterior. No entanto, estranhamos a pouca referência
encontrada nos Relatórios e documentação pertinente ao fato de sua existência.
293
A criação da Repartição de Fazenda, com sede primeiramente em Buenos Aires e depois em
Montevidéu, possibilitou ao meio operativo dedicar-se com maior empenho aos assuntos
operativos, deixando para os contadores nomeados a burocracia da escrituração e controle das
aquisições de material necessário para manter as forças navais.
Mas superior a todos esses fatos, o desenvolvimento deste estudo possibilitou demonstrar a
capacidade de adaptação inerente a Instituição Marinha, nas diversas fases de sua existência desde
sua transmigração em 1808, a sua capacitação na Independência e finalmente sua adaptação aos
novos meios surgidos da Revolução Industrial. Nesse mister a Marinha Imperial se tornou
autônoma, utilizou-se dos conhecimentos adquiridos pelos oficiais que foram enviados à Europa
absorver as novas técnicas surgidas da automação e as utilizou na produção de seus meios navais e
munições. Permaneceu sempre preocupada com a capacitação de seu pessoal, buscando as medidas
necessárias para capacitá-los de conhecimento necessário para operarem os seus meios navais.
Ao término do conflito, a Marinha contava com 94 navios
294
, dos quais 16 encouraçados, 48
fragatas, corvetas, canhoneiras e transportes de madeira; 12 lanchões de ferro, todos a vapor; 6
navios de vela; 7 pontões depósitos; e 5 chatas armadas. Nas palavras de Ouro Preto, em três anos,
contando a partir de 1865, foi preparada a maior e melhor parte de tão poderosos elementos de
guerra. A contar de 1868 não se alistou mais um marinheiro sequer, não se construiu, nem se
comprou, um navio, limitando-se o trabalho, ainda assim importante, dos arsenais à reparação
dos estragos da luta.
295
. O esforço de guerra foi sem dúvida enorme, e contou com o auxílio de todos
os elementos pertencentes a Instituição Marinha. Porém a lição dos fatos em todo o decurso da
guerra veio tornar patente erros de administração, que convinha ser remediados.
Houvesse o Corpo de Imperiais Marinheiros de Mato Grosso merecido maior atenção, não
teria sido fácil presa ao inimigo, e possivelmente se o Vapor armada Anhambaí não estivesse tão
mal armado poderia fazer frente ao ataque inimigo, essa realidade calou fundo na administração
293
Em apenas um dos relatórios encontramos referência da existência do arsenal de Cerrito e do laboratório pirotécnico.
294
As perdas ao longo do conflito foram da Jequitinhonha, encalhada em Riachuelo; o Rio de Janeiro, que submergiu
em consequência da explosão de torpedos na tomada de Curuzu; e os transportes Oiapoque, que naufragou nas praias
de Santa Rosa, à entrada do Rio da Prata, e o S. Francisco, devorado pelas chamas no porto de Buenos Aires.
295
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, op cit. nota 17, p. 36.
125
naval que com o passar dos anos tratou de aumentar os seus efetivos tanto de pessoal como de
estrutura organizacional naquela região.
A guerra também assinalou a necessidade de aumento dos seus quadros de pessoal, em
especial a do Corpo de Imperiais Marinheiros, para ser atenuadas as dificuldades da aquisição de
tripulações, mantendo sempre um número razoável de reservas para utilização em alguma
necessidade. Outra falta sentida foi uma escola prática de artilharia para a instrução dos oficiais,
cuja criação ocorreu em 1867, porém só implementada em 1882. A questão do pessoal sua lotação e
principalmente seu competente preparo para o manejo de suas obrigações sempre foi uma constante
no pensamento institucional.
Foi regulado, ainda durante o conflito, a composição do estado-maior dos comandantes-em-
chefe e comandantes das esquadras e divisões navais, e instituída a delimitação das atribuições e
deveres dos chefes do estado-maior.
Finalmente foi reorganizada a Secretaria de Estado e Negócios da Marinha (1868); a
Contadoria; e o Conselho Naval. Regulou-se o concurso para alunos pensionistas do Hospital de
Marinha do Rio de Janeiro, assim como o serviço médico e cirúrgico do mesmo estabelecimento.
Ao fim desse estudo acreditamos que contribuímos para mais um passo da análise da
História da Instituição Marinha em dos momentos mais significativos de sua evolução como
Instituição.
Muito obrigada
126
ÍNDICE DAS ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Carta Geral da América Meridional datado de 1843, acervo Diretoria do Patrimônio
Histórico e Documentação da Marinha..........................................................................p.4
Figura 2- Detalhe na carta da região onde ocorreu conflito, acervo Diretoria do Patrimônio
Histórico e Documentação da Marinha …..............................................................p.5
Figura 3 – Nau São Sebastião, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha …..............................................................................................................p.19
Figura 4 – Arsenal de Marinha da Corte, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação
da Marinha ….........................................................................................................p.19
Figura 5 – Faina de marinheiros, fonte Tradições dos homens do mar. Rio de Janeiro:Editora
Gráfica Brasileira Ltda. 1981.................................................................................p. 30
Figura 6 – Corte do plano do navio HMS Beagle, demonstrando os compartimentos e o convés,
datado de 1832, fonte http://www.uh.edu/engines/beagle.jpg . ….........................p.32
Figura 7 – Esquema geral dos pavimentos de um navio, fonte FONSECA, Maurílio M. Arte Naval.
1960, p.18...............................................................................................................p.33
Figura 8 -Cromolitografia publicada em 1864, intitulada “Madeira e Ferro”, apresenta um
tradicional navio de guerra de madeira à esquerda, ao lado do HMS Warrior, fonte CHANT,
Christopher The history of the world's warships. p.65...........................................p. 41.
Figura 9 - Perfil de fragata inglesa, fonte ARCHIBALD, E. H. H. The figthing ship of the Royal
Navy. p. 74 ….........................................................................................................p. 42
Figura 10 – plano de convés de navio, fonte ARCHIBALD, E. H. H. The figthing ship of the Royal
Navy. p.74 …..........................................................................................................p.42
Figura 11 – Navio de linha a vapor Napoleón, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e
Documentação da Marinha.....................................................................................p.46
Figura 12 – Couraçado Warrior, fonte CHANT, Christopher The history of the world's warships.
p.57 …....................................................................................................................p.47
Figura 13 – Fragata Virgínia (ex- Merrimac), acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e
Documentação da Marinha.....................................................................................p.48
Figura 14 – USS Monitor, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha..................................................................................................................p.48
Figura 15 – Couraça do Monitor Alagoas, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e
127
Documentação da Marinha....................................................................................p.53
Figura 16 – Perfil de alguns tipos de embarcações, fonte Manual do tripulante. Diretoria de Portos
e Costas. Rio de Janeiro: Gráfica Ribeiro, 1975. p.161-2......................................p.54
Figura 17 - Fragata Amazonas, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha...................................................................................................................p.55
Figura 18 – Canhoneira Ipiranga, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha...................................................................................................................p.56
Figura 19 – Corveta Niterói, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha...................................................................................................................p.56
Figura 20- Encouraçado Brasil, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha ..................................................................................................................p.79
Figura 21- Encouraçado Bahia, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha ..................................................................................................................p.79
Figura 22- Encouraçado Barroso, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha ..................................................................................................................p.79
Figura 23- Encouraçado Tamandaré, acervo Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da
Marinha....................................................................................................................p.79
Figura 24- Mapa esquemático da operação naval...........................................................p.83
Figura 25- Mapa esquemático da invasão de território...................................................p.84
Figura 26- Mapa esquemático da ocupação de território................................................p.85
Figura 27- Planta da Ilha de Cerrito levantada pelo Capitão-de-Fragata Cunha Couto datada de
1872..........................................................................................................................p.98
Figura 28- Imagem do Hospital de Marinha em Corrientes, fonte AZEVEDO, Carlos Frederico dos
Santos Xavier. História médico-cirúrgica da esquadra brasileira nas campanhas do Uruguai e
Paraguai de 1864 a 1869.........................................................................................p.106
128
ÍNDICE DOS ANEXOS
Anexo 1- Organograma da estrutura administrativa da Marinha brasileira (1821-2)......p.122
Anexo 2- Carta de José Antonio Saraiva ao Vice-Almirante Joaquim Marques Lisboa, datada
13/10/1857, referente a compra de canhoneiras na Europa e a situação diplomática com o Paraguai
quanto a livre navegação do Rio
Paraguai............................................................................................................................p.123
Anexo 3- Tabela com a relação de meios navais da Marinha nos anos de 1864/5...........p.126
Anexo 4- Cronologia da Guerra da Tríplice Aliança contra o governo do Paraguai........p.130
Anexo 5- Ofício do Conselheiro José Maria da Silva Paranhos ao Barão de Tamandaré, Vice-
Almirante Joaquim Marques Lisboa, datada de 1/01/1865,referente aos encouraçados construídos
por encomenda do governo paraguaio...............................................................................p.133
Anexo 6- Plano de ataque com disposição das forças navais no dia 16/04.......................p.134
Anexo 7- Relação dos navios construídos no Arsenal de Marinha da Corte, período de 1863 a
1868....................................................................................................................................p.135
Anexo 8 Relação dos víveres, dietas e outros gêneros fornecidos à esquadra em operações nas
águas do Paraguai...............................................................................................................p.136
Anexo 9 Ofício de João Propício Menna Barreto ao Barão de tamandaré, datada de 21/01/1865,
relatando o receio de epidemia no navio dada a aglomeração da tropa..............................p.137
Anexo 10- Carta de Luiz José Ribeiro ao Visconde de Tamandaré, datada de 3/08/1866, informando
o envio de material de farmácia e remédios........................................................................p.138
Anexo 11 Ofício de Francisco de Paula da Silveira Lobo ao Visconde de tamandaré, datada de
4/12/1865, comunicando a concessão feita a alguns aspirantes para servirem na Esquadra no
período das férias escolares.................................................................................................p.139
Anexo 12- Relação das peças de fardamento fornecidos no período de 1865 a 1867, ao pessoal
subalterno da Força Naval ( praças da armada, corpo de imperiais marinheiros e batalhão
naval)....................................................................................................................................p.140
129
ANEXO 1
Fonte:
História Naval Brasileira . Quinto Volume – Tomo II
130
ANEXO 2
Rio de Janeiro, 13 de Outubro de 1857
Ilmo. e Exmo. Sr. Vice-Almte. Joaquim Marques Lisboa
Confidencial
Tive a fortuna de receber os ofícios e carta, em que V. Exa. acusa as minhas de
diversas datas, e sobre assuntos diferentes, porém, relativos as necessidades da Armada Imperial.
Pelo Paquete que sai depois de amanhã segue o Capitão Tenente Segundino, com
quem conversei largamente sobre sua comissão, assim como o fiz com o Sr. Amazonas, e o havia
feito com o Primeiro Tenente Portugal.
Todos eles vão segundar a V. Exa. no desempenho de sua importante tarefa, e serão
auxiliares de que V. Exa. disporá com vantagem, não só para o engajamento de marinhagem, como
e principalmente para a aquisição dos vapores, de que o Governo Imperial precisa muito, para o
desenlace honroso de suas questões com o Paraguai.
Ocupando-me porém desse mister, devo dizer a V. Exa. que os meus primeiros ofícios
foram feitos sob a pressão da necessidade de tomar-se para com o Paraguai uma atitude
imediatamente hostil, e é por isso que Sua Majestade o Imperador me ordenou que procurasse
obter por compra e no mais breve tempo possível as dez canhoneiras de cuja aquisição foi V. Exa.
encarregado.
Os acontecimentos posteriores, porém, determinaram o Governo de Sua Majestade a
lançar mão ainda de uma missão especial para ver se o Presidente daquela República reconhecia
os direito, que o Império tinha obtido de navegar o Paraguai com liberdade e não opunha ao
exercício desses direitos os estorvos e embaraços que ultimamente experimentávamos.
Foi encarregado dessa missão o Sr. Paranhos, em cuja ilustração e tino confiou o
Governo Imperial a solução pacífica das questões pendentes.
Esse passo alterou os termos de nossa situação e, conseguintemente, alternou a
necessidade de obtermos com demasiada brevidade as dez canhoneiras a vapor, e deu ao mesmo
Governo a liberdade de as haver melhores, mais fortificadas, e sem os defeitos que a pressa deveria
impor.
As minhas primeiras instruções, porém, não podiam deixar de ser modificadas
somente no sentido de se procurar navios bons e os melhores, ainda que eles cheguem ao Brasil em
Abril ou Maio, em vez de chegarem em Janeiro e Fevereiro, como havia prescrito.
Nesse sentido tive a honra de escrever a V. Exa. pelo Capitão de Fragata
131
Amazonas, a quem fiz ver a necessidade e conveniência de terem os referidos navios as qualidades
indispensáveis para uma viagem de longo curso, e mesmo perigosa, qual a que tem de ser feita por
eles dos portos de Inglaterra, ou França para o Império.
Ocupando-me do que V. Exa. me observou na carta a que respondo, direi que
aplaudo a lembrança que tem V. Exa. de obter algumas das baterias flutuantes de que serviram a
Inglaterra e França no Báltico.
Seria de desejar que disposessemos (sic.) de duas dessas canhoneiras, porque elas
auxiliarão fortemente um ataque ao Humaitá pelo lado do rio, e de mais alguma, se V. Exa. pudesse
obtê-las tais, e tão bem construídas que as suas qualidades náuticas não ficassem prejudicadas
pela sua especialidade de máquinas de guerra, porque um número maior, sem essa condição,
poderia também desatender a outra necessidade.
Não pense V. Exa. que me esqueço da conveniência e vantagem de mais número de
tais navios. O meu pensamento se tornará claro e preciso, dizendo a V. Exa. que o Governo
Imperial, quando encomendou dez canhoneiras, teve em vista a necessidade de dez navios, que
disposessem (sic.) de boas qualidades náuticas e pudessem ser vantajosamente empregados em
qualquer mister, quando uma solução pacífica e honrosa fosse o resultado de seus esforços junto ao
Governo Paraguaio.
Entendeu então que poderia obter isso, e ainda mais, que esses navios fossem bem
armados, e bem fortes, para o caso de ser necessária a destruição pelo rio das Baterias do
Humaitá.
Realizando-se, porém, a circunstancia da aquisição de navios somente precisos
como máquinas de guerra, dar-se-ia a necessidade de se obter um maior mero, de sorte se ter o
Governo Imperial pelo menos oito canhoneiras perfeitamente apropriadas a navegação e
igualmente fortes para montarem uma artilharia possante e apropriada ao ataque de baterias fixas
e regulares.
Assim, se V. Exa. obtiver duas canhoneiras baterias flutuante- com boas
qualidades náuticas, a autorização para dez [subsiste], devendo ser as oito restantes tais, que se
prestem ao duplo fim, para que foram encomendadas. Se, porém, V. Exa. achar que temos
necessidade de quatro canhoneiras daquelas, e que não se podem elas bem prestar, senão como
máquinas de guerra, então deverá aumentar o número das canhoneiras, que obtiver com mais duas,
de forma a ter o Governo Imperial sempre oito canhoneiras, que se prestem perfeitamente ao
serviço da Armada em tempo de paz, e sejam navios de valor para nossos rios e pequenos portos.
Devo dizer a V. Exa. que não deve obter menos de dez canhoneiras: se não poderem
elas ser obtidas até Maio o deverão ser ainda com mais demora, visto como nós precisamos de
132
navios a vapor, que calem dez palmos mais e menos, para fortalecer a nossa Esquadrilha de Mato
Grosso, que tem necessidade de ser colocada em bom […] em razão do aumento muito sensível da
Esquadrilha do Paraguai.
Nas minhas instruções recomendei a V. Exa. que os vapores não tivessem mais de
sete pés. Hoje direi a V. Exa. que seus esforços devem também estender-se a obtê-los com o menor
calado possível; sendo que, se tivessem eles de quatro a seis pés, servirão perfeitamente às vistas
do Governo Imperial, podendo ser algum ainda de menor calado.
Com o que digo está V. Exa. habilitado, para acompanhar as modificações do
pensamento do Governo Imperial, ditadas pelos acontecimentos e mais acurada consideração do
que nos convém fazer relativamente aos vapores encomendados.
Sobre engajamento de marinhagem deixo a V. Exa. avaliar a exequibilidade das
instruções que dei, e ver até que ponto devam ser modificadas.
Nesses negócios o bom êxito legitima todos os desvios de que se tiver ordenado, e o
Governo Imperial não teria mesmo de censurar tais desvios, se consultasse a confiança que V. Exa.
lhe merece, como dedicado servidor de seu País.
Recomendo a V. Exa. muito particularmente o engajamento, ainda que com mais
dispêndio, de vinte marinheiros dados a praticagem das barras difíceis e arriscadas da Holanda,
para tê-los na a praticagem da barra do Rio Grande e outras do Império, que precisam de homens
amestrados nessa vida.
Recomendo-lhe ainda e muito especialmente o meu navio pequeno, que tem de ser
armado no Paraná em cima das cachoeiras das setes quedas, e que tem de vir em peças dos mais
pequenos pesos possíveis, porque tem de ser conduzidas por terra.
Ele deve estar aqui no mais breve tempo possível e ser acompanhado de alguns
operários, que o vão armar no lugar, em que deve ser lançado no Rio. Creio que não referi a V.
Exa. o destino que devia de ter, e apenas falei em Mato Grosso. Esse destino é o Paraná, e o
pretendo fazer seguir pelo Tietê logo que chegue.
Deixo ainda a V. Exa. toda a liberdade em sua ação.
As observações porém de V. Exa. inclinaram-me muito ao Sr. Norman Constructor
no Havre, e desejaria que nos seus Estaleiros se fabricasse pelo menos alguma das canhoneiras.
Tenho a honra de ser com toda a consideração,
De V. Exa.
O mais atenciosamente
José Antonio Saraiva.
Fonte: Arquivo Tamandaré, Livro IX, Doc. 866, p.63.
133
ANEXO – 3
NAVIO CLASSE Incorporação./Baixa OBERVAÇÕES
Constituição Fragata 1826/1867
Rio de Janeiro - Escola prática de tiro e
depósito de marinhagem. Arvorava a
insígnia do Comte. da Primeira Divisão.
Ex-Isabel Maria, atuou na Campanha da
Cisplatina , construção norte americana.
134
Bahiana Corveta 1849/1893
Rio de Janeiro. Construída no Arsenal de
Marinha da Corte.
Imperial
Marinheiro
Corveta 1851/1865
Rio de Janeiro. Construída no Arsenal de
Marinha da Corte. Naufragou na Restinga
da Marambaia em 1865.
Dona Januária Corveta 1842/1869
Rio de Janeiro. Construída na Bahia.
São Francisco Vapor à hélice/
Barca
1865/1866
Em comissão no norte do Império.
Construído nos Estados Unidos da
América, foi destruída por incêndio, em
1866, no porto de Buenos Aires.
Tieté Vapor à hélice/
Transporte
1858/1864
Rio de Janeiro. Construída na Inglaterra
Magé Corveta à vapor 1853/1883
Rio de Janeiro. Construída na Inglaterra.
Berenice Corveta/
Brigue-Barca
1846/ 1866
Rio de Janeiro. Adquirida em 1846.
Maranhão Brigue 1852/1875
Bahia arvorava a insígnia do Comte. da
Divisão do Segundo Distrito. Construída no
Arsenal de Marinha da Corte.
Tonelero Brigue-Escuna 1854/1884
Pernambuco. Construída no Arsenal de
Marinha da Corte.
Itamaracá Brigue-Barca 1853/1884
Rio de Janeiro. Construída no Arsenal de
Marinha de Pernambuco.
Rio de Contas Iate 1862/1875
Maranhão. Construída no Arsenal de
Marinha da Bahia.
Cairú Iate 1862/1869
Pará. Construída no Arsenal de Marinha da
Bahia.
Pirajá Vapor de rodas 1859/1865
Manaus - à disposição do presidente da
Província do Alto Amazonas. Construído
na Inglaterra.
Ibicuí Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1867
Pará arvorava a insígnia do Comte. da
Divisão do Terceiro Distrito. Construída na
Inglaterra.
Cachoeira Vapor de rodas [1861]/1875
Flotilha do Rio Grande do Sul -Jaguarão
Amélia
Vapor de rodas/
Barca
1840/1867
Flotilha do Rio Grande do Sul
Fluminense Vapor de rodas/
Barca
1840/1852
Flotilha do Rio Grande do Sul. Construída
no Pará.
Apa Vapor de rodas 1858/1879
Flotilha do Rio Grande do Sul -Jaguarão.
Adquirida na Europa.
Jauru
Vapor de rodas/
Canhoneira
1858
Flotilha do Mato Grosso
Corumbá
Vapor de rodas/
Canhoneira
1860/1880
Flotilha do Mato Grosso. Construída nos
Estaleiro da Ponta da Areia, Niterói.
Alpha
Vapor de rodas/
Canhoneira
1861
Flotilha do Mato Grosso
Cearense
Vapor de rodas/
Brigue
1850
Flotilha do Mato Grosso
Paraná Vapor de rodas 1859
Flotilha do Mato Grosso.
Amazonas
Vapor de rodas/
Fragata
1851/1893
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra.
Paraense Vapor de rodas 1851
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída no Estaleiro da Ponta da Areia,
Niterói.
Recife
Vapor de rodas/
Barca
1849/1880
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída no Estaleiro da Ponta da Areia,
Niterói.
135
Taquarí
Vapor de rodas/
Canhoneira
1865/1876
Rio da Prata – Esquadra em Operações
Niterói
Vapor à hélice/
Corveta
1862/ 1891
Rio da Prata Esquadra em Operações
arvora a insígnia do Comte. em Chefe o
Vice-Almirante Visconde de Tamandaré.
Maior navio de propulsão mista construída
no Brasil; sendo o primeiro dotado de
canhões de alma raiada na Esquadra
brasileira.
Jequitinhonha Vapor à hélice/
Corveta
1854/1865
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra, tinha propulsão
de hélice. Em 1865, encalhou debaixo das
baterias dos fortes paraguaios, sendo
incendiada.
Belmonte Vapor à hélice/
Corveta
1858/1878
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na França.
Parnaíba Vapor à hélice/
Corveta
1858/1868
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na França.
Maracanã Vapor à hélice 1855/1870
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Adquirido na Inglaterra.
Mearim Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1879
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra.
Itajaí Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1873
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra
Beberibe Vapor à hélice/
Corveta
1853/[1881]
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construído na Inglaterra, primeiro navio a
hélice da esquadra Imperial.
Iguatemi Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1873
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra.
Araguari Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1882
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra.
Ivaí Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1878
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra.
Araguaia Vapor à hélice/
Canhoneira
1858/1875
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída na Inglaterra.
Ipiranga Vapor à hélice/
Canhoneira
1854
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construída no Arsenal de Marinha da
Corte.
Peperiguaçu Transporte 1865
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Comprado por Tamandaré.
Iguaçu Transporte/
Patacho
1858/1882
Rio da Prata Esquadra em Operações.
Construído no Estaleiro da Ponta da Areia,
Niterói.
Jaguarão Vapor de rodas 1859/1884
Rio Grande do Sul empregado no serviço
da barra da província. Navio solto.
Construído no Estaleiro da Ponta da Areia,
Niterói.
Tamanduateí Vapor de rodas 1858
Tietê empregado no serviço do
estabelecimento naval de Itapira. Navio
solto. Adquirido na Europa.
Fonte:
1-Relatório do apresentado a Assembleia Geral Legislativa pelo Ministro e Secretário de Estado dos
Negócios da Marinha, 1865; e
2- CAMINHA Herick Marques. Organização e administração do Ministério da Marinha no
136
Império.
Obs.: Quando da divergência de denominação da classe do navio foi citada as duas formas,
observando a antiguidade da fonte.
ANEXO 4
Cronologia da Guerra
1864
137
12/11 – Apreensão do navio mercante Marquês de Olinda.
28/12 – Forças paraguaias invadem a Província do Mato Grosso, tomando o forte Coimbra.
1865
27/01 – o Império do Brasil declara oficialmente que responderá às hostilidades do Paraguai.
05/04 – Parte de Buenos Aires uma Força Naval brasileira para bloquear o Rio Paraná.
13/04 – O governo paraguaio declara guerra à Argentina e forças paraguaias invadem Corrientes.
01/05 – Assinado em Buenos Aires o Tratado da Tríplice Aliança, entre os governos do Brasil,
Argentina e Uruguai.
20/05 O Chefe-de-Divisão Francisco Manoel Barroso assume o comando das duas Divisões
navais brasileiras incumbidas do bloqueio.
25/05 – Retomada de Corrientes pelas forças aliadas.
10/06 – Forças paraguaias invadem a Província do Rio Grande do Sul.
11/06 – Batalha Naval do Riachuelo.
18/06 – Passagem de Mercedes.
12/08 – Passagem de Cuevas.
1866
16/04 – Inicia-se a travessia de Passo da Pátria.
02/04 As forças aliadas são atacadas pelas paraguaias no Estero Bellaco, com severas perdas de
ambos os lados.
24/05 Trava-se a Batalha de Tuiuti, na qual as forças de Lopez sofrem tremendo revés. Os
paraguaios retiram-se do campo de batalha sem serem perseguidos pelas tropas de Mitre, o que
trouxe o descontentamento de Osório, que, logo no mês seguinte, deixa o teatro de operações.
27/07 – Inicia-se o reconhecimento da Fortaleza de Curuzú.
31/08 Desembarque de tropas brasileiras, sob o comando do General Manoel Marques de Souza,
Barão de Porto Alegre, no Fortaleza de Curuzú
02/09 Perda do Encouraçado Rio de Janeiro, posto a pique pela explosão de duas minas
flutuantes.
03/09 -Tomada da Fortaleza de Curuzú.
22/09 Tentativa fracassada de tomada do Forte de Curupaiti, considerada a maior derrota da
Tríplice Aliança. Os aliados avançaram sobre Curupaiti, submetido a inconsequente bombardeio
efetuado pela esquadra. Desconhecendo as defesas a enfrentar, o ataque resultou em completo
fracasso.
138
22/12 – O Chefe-de-Esquadra Joaquim José Ignácio recebe do Almirante Tamandaré o Comando da
Esquadra brasileira em Operações no Paraguai. Estabeleceu-se o comando único para as forças
terrestres e navais em operações.
1867
13/01 - A esquadra brasileira inicia novo bombardeio ao Forte de Curupaiti.
31/07 –Ocupação por forças aliadas de Tuiú-Cué.
15/08 – Primeira passagem do Forte de Curupaiti. Iniciou-se as primeiras ações contra Humaitá, que
ficou completamente cercada em novembro de 1867.
1868
13/02 – Segunda passagem do Forte de Curupaiti.
19/02 Inicio da passagem de Humaitá (primeira passagem). Três encouraçados brasileiros e três
monitores forçam a passagem de Humaitá. Simultaneamente, a fortaleza é tomada pelo exército.
Com a passagem de Humaitá, as forças paraguaias ali posicionadas ficaram em situação precária
quanto ao seu reabastecimento.
21/03 - Conquista do Forte de Curupaiti.
21/07 Os Encouraçados Cabral, Silvado, e Piauí forçam a passagem de Humaitá (segunda
passagem).
25/07 – Forças aliadas conquistam a Fortaleza de Humaitá.
01/08 – Combate em Lagoa Verá entre chalanas paraguaias e escaleres dos navios brasileiros.
5/08 – Humaitá é finalmente ocupada pelas forças aliadas.
16/08 – Início da Dezembrada.
01/10 – Navios brasileiros forçam as baterias de Angostura.
Outubro – Construção da estrada do Chaco.
04/12 – Início da passagem do exército do Chaco para a Barranca de Santo Antônio.
06/12 – Em Itororó tem início a célebre “Dezembrada”.
11/12 – Batalha do Avaí.
21/12 - Batalha de Lomas-Valentinas.
24/12 – Apresentado um ultimato a Lopez para que se rendesse. O marechal recusa-se a faze-lo.
1869
01/01 – Tropas brasileiras ocupam Assunção.
06/02 – O Chefe-de-Esquadra Elisário Antônio dos Santos assume o comando da Força Naval.
139
15/04 – O Conde D'Eu chega como novo comandante-em-chefe das forças aliadas.
11/06 – Estabelecido o governo provisório em Assunção.
Setembro de 1869 à Março de 1870 – perseguição à Lopez .
1
o
de março de 1870 – término do conflito.
Fonte:
GUEDES, Max Justo. A guerra: uma análise. IN. MARQUES, Maria Eduarda Castro Magalhães.
(org.) A guerra do Paraguai: 130 anos depois. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995.
ANEXO 5
Missão Especial do Brasileira
Buenos Aires em 1
o
de Janeiro de 1865
140
Ilmo. e Exmo. Sr.
Hontem chegaram a este porto os Vapores “Oyapok” e “Cruzeiro do Sul”, que transportam
as tropas de infantaria e artilharia esperadas do Rio de Janeiro, donde saíram a 26 de mês último
à tarde, deixando o Império em plena paz.
A tropa segue o destino que V. Exa. deu, segundo as ordens que V.Exa. expediu ao Sr. Chefe
de Divisão Barroso.
Os vapores devem regressar logo que desembarque a tropa, ou quando os seus serviços não
forem aqui precisos. S. Exas. os Srs Ministros da Guerra e do Negócio Estrangeiros, escrevendo-
me a respeito dessa expedição, nada dizem sobre o regresso dos ditos vapores. Os comandantes,
porém, declararam-me que se retirarão logo que o despachássemos, e que cada dia de demora,
além das primeiras 24 horas, custará ao Estado 500$000, fundeados e 1:000$000, em viagem
A bordo da “Bahiana” ficou o contingente do Batalhão de Engenheiros, em consequência
de uma requisição do Sr. Ministro Leal, da qual o Sr. Coronel Jacinto Machado de Bittencourt dará
conhecimento a V. Exa. e ao Sr. Marechal Menna Barreto.
A correspondência que veio para V. Exa. eu a entreguei ao Sr. Chefe de Divisão Barroso.
Rogo a V. Exa. queira enviar por terra, porque não se oferece outro meio mais prompto, o
maço junto, que é dirigido por S. Exa. Ministro da Guerra ao Presidente da Província de S. Pedro
do Rio Grande do Sul.
O Sr. Conselheiro Dias Vieira previne-nos de que se falava no Rio de Janeiro na vinda de
navios encouraçados para o Paraguai, e manifesta a esperança de que, se realizar-se a notícia, a
que não dava muito crédito, sejam eles aqui aprisionado; o Governo Imperial tinha expedido
ordem para os diversos portos do Império, onde os ditos vapores poderão tocar, a fim de que,
quando as não possam capturar, lhes neguem provisão para a continuação da viagem.
Renovo a V. Exa. A segurança de minha perfeita estima e distinta consideração.
José Maria da Silva Paranhos.
Fonte: Arquivo Tamandaré, Livro III, Doc. 1860, p 97
ANEXO 6
Disposição das forças navais que devem auxiliar o desembarque do nosso exército na boca do Rio
Paraguai e costa do Forte Itapiru na manhã do dia 16 de Abril.
141
Magé
Iguatemy
Ivahy
No Rio Paraguai ½ légua acima da embocadura
para evitar que o inimigo tente por algum meio
obstar o desembarque da nossa força do
exército.
Araguary
Ypiranga
Acompanhar o nosso exército que desembarcar
na boca do Rio Paraguai e acompanhá-lo pela
costa um pouco mais adiante fazendo fogo de
bombas para terra em direção que não ofenda
nossas forças.
Brasil
Bahia
Parnahiba
Bater a metralha e bombas o Forte de Itapirú
com fogo sucessivo para calar seus fogos.
Tamandaré
[Cachimbo]
Procurar aproximar-se o mais possível da Ponta
da Ilha de Sta. Ana de modo a ofender o Forte
Itapiru evitando quanto possível receber chamas
de seus fogos.
Barroso
Belmonte
Henrique Martins
Itajahy
Atacar o acampamento do inimigo, tentando
descer pelo canal que o separa da Ilha de Sta.
Ana, mas só fazer fogo sobre o Itapirú para não
ofender à nossa força de mar e terra.
Greenhalgh
Chuhy
Lindoia
Reserva para tentar montar pelo canal do
Itapirú e atacar o acampamento.
Fonte: Arquivo Tamandaré, Livro IV, Doc. 270, p. 86.
ANEXO 7
Construção naval brasileira no período de 1863 a 1868
142
NOME DO NAVIO CLASSE ENTRADA NO
ESTALEIRO
LANÇAMENTO AO
MAR
Taquari Vapor 03/11/63 30/01/65
Tamandaré Encouraçado 31/01/65 23/06/65
Barroso Encouraçado 21/02/65 04/11/65
Rio de Janeiro Encouraçado 26/06/65 17/02/66
Pedro Afonso Bombardeira 20/11/65 17/03/66
Forte Coimbra Bombardeira 20/11/65 17/03/66
Vital de Oliveira Corveta 14/03/63 21/03/67
Pará Monitor 08/12/66 21/05/67
Rio Grande Monitor 08/12/66 17/08/67
Alagoas Monitor 08/12/66 30/10/67
Piauí Monitor 08/12/66 08/01/68
Ceará Monitor 08/12/66 26/03/68
Santa Catarina Monitor 22/03/67 06/03/68
Sete de Setembro Corveta Encouraçada 08/01/68 -----------
Lamego Rebocador 08/01/68 -----------
Fonte:
OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, Visconde de. A Marinha d'outrora:(subsídios
para a história) p.37
ANEXO 8
N.24
Relação dos víveres, dietas e outros gêneros pertencentes à 1
a
secção do almoxarifado da marinha
da côrte, que foram remetidos à esquadra em operações nas águas do Paraguai, por intermédio da
143
repartição fiscal e pagadoria da marinha em Montevidéu, desde Abril de 1867 a Março de 1868,
em virtude de ordem superior.
Lista dos gêneros: Aletria, [Araraia], Açúcar (refinado e branco grosso); Alfazema; Azeite
doce; Algodão em fio; Aguardente; Arroz; Bacalhau; banha; Bolachinhas; Biscoitos;
Batatas; Barricas de de seco; Bandejas; Barris; Baldes; Balanças romanas; Barris para
escaleres; Barris de galé; Cevadinha; e Chá [hysson].
N. 24A.
Lista dos gêneros: Chá preto; Chá da Índia; Cera em velas; Café (em grão e moído);
Chocolate; Canecos de pau; Colheres de ferro; Caixões (de condução e de madeira); Cutelos
para cortar carne; Depósitos (de madeira e de ferro); Escumadeiras; Feijão; arinha; Flor de
enxofre; Facas para cozinha; Funis de folha; Garrafas vazias (grandes e pequenas);
Garrafões; Goiabada em lata; Geleia; Graxa do Rio Grande; Garfos para cozinha;
Querosene; Latas vazias para condução; Moinhos para o café; e Medida de folha (jogos).
N.24B.
Lista de gêneros: Manteiga; Marmelada; Mostarda inglesa; Pratos travessas; [Pucaros] de
folha; Piaçaba; Pipas (de arco de pão e FF); Quartolas; Ratoeiras; Espírito de vinho; Sabão;
Serrotes para cortar carne; Sal; Sopa juliana; Sacos; Tapioca; Toucinho; Torrador para café;
torneiras de metal; Vinho (Porto e Lisboa; Verduras em conserva; e Vinagre.
Obs.: Trata-se de extrato do documento anexo ao relatório composto de quatro tabelas.
Fonte:
Relatório apresentado a Assembleia Geral Legislativa pelo Ministro e Secretário de Estado e
Negócios da Marinha, ano 1867. Anexo.
ANEXO 9
Ilmo. e Exmo. Sr. Barão de Tamandaré
144
Depois d'uma viagem demorada chegamos hontem a este lugar aonde deveríamos
encontrar a V. Exa.
A força que se achava em Fray Bento recebeu três dias de fornecimento e outros
tantos trouxe aquela que veio do Exército; assim é que temos necessidade de víveres, e nas atuais
circunstancias só V. Exa. Poderá providenciar a respeito.
Tão aglomerada como vai a tropa e com tanta falta de cômodos, receio que se
desenvolva alguma epidemia que torne mais embaraçosa ainda a nossa posição.
Ancioso aguardo à V. Exa. A quem reitero os protestos d'estima e consideração com
que sou
De V. Exa.
Amigo e camarada
Bodo do Vapor Cruzeiro
do Sul nas Ilhas de [Heornos]
21 de Janeiro de 1865.
João Propicio Menna Barreto
Fonte: Arquivo Tamandaré, Livro IX, Doc. 829, p.41.
ANEXO 10
Ilmo. e Exmo. Sr. Tamandaré
Rio de Janeiro, 3 de Agosto de 1856.
145
Grande pesar tenho em ir interromper por momentos dos grandes trabalhos que estou
informado que V. Exa. se perseguido, mas a reconhecida benevolência de V. Exa. me anima a
dirigir as minhas insignificantes letras, não para me informar da saúde de V. Exa., como para
apresentar as seguintes ofertas para uso dos feridos em defesa da nossa Santa causa; V. Exa. terá a
bondade de dar-lhes o destino conveniente.
Por especial obséquio do Exmo. Sr. Chefe do Quartel General da Marinha remeto 1 caixa n
o
1 com fios de ataduras; 2 garrafões de n
os
2 e 3 com tintura de arnica, 20 barris pintados de verde
de n
os
4 a 23 com aguardente de Paraty; e 1 garrafão de n
o
24 com aguardente de flor de laranja
para V. Exa. usar com os amigos, pois julgo ser útil e agradável na estação presente; como a maior
destas ofertas foram feitas por diferentes pessoas remeto em separado uma relação delas.
Meu Sr., os meus insignificantes serviços estão sempre ao dispor de V. Exa. como quem se
preza de ser de
V. Exa.
Amigo respeitoso
Luiz José Ribeiro
NB
Estas ofertas vão pelo Vapor Iapoc.
Fonte: Arquivo Tamandaré, Livro IX, Doc. 796.
ANEXO 11
1
a
Seção Ministério dos Negócios da Marinha
Rio de Janeiro 4 de Dezembro de 1865.
146
Ilmo. Sr.
Tendo concedido aos aspirantes Antonio Carlos Freire de Carvalho, Marcos Augusto
Pimentel, Urbano Sabino Corrêa e Augusto de Andrade [Valditano] servirem na esquadra do
comando de V. Exa., enquanto durarem as férias da Escola; assim o comunico a V. Exa. Para seu
conhecimento e para que de suas ordens, a fim de estarem eles de volta ao tempo de abrirem-se as
aulas no princípio do mês de Março vindouro.
Deus Guarde a V. Exa.
Francisco de Paula de Silveira Lobo
Fonte: Arquivo Tamandaré, Livro II, Doc. 285. p 71.
ANEXO 12
N.17.
147
Relação das peças de fardamento compradas desde janeiro de 1865 até fim de março de 1867, por
diferentes contratos com designação dos respectivos preços.
Relação de peças: Camisas(de brim, de algodão azul, de baeta); Calças ( de brim, de algodão azul, e
de pano); Bonets (para marinheiros e para o batalhão naval); Fardetas( de pano para o corpo de
Imperiais marinheiros, e de brim para o batalhão naval); Sapatos; Coturnos; Charlateiras; Lenços de
seda; Gravatas; Bandas de lã; Japonas de pano; Sobrecasacas(para o batalhão naval); Chapéus de
oleado (para marinheiros); Capotes (para o batalhão naval).
Obs.: Extrato do anexo ao Relatório de 1867. As peças de fardamento foram adquiridas ou pelo
conselho de compras ou pela intendência da Marinha.
Fonte: Relatório apresentado a Assembleia Geral Legislativa pelo Ministro e Secretário de Estado e
Negócios da Marinha, ano 1867. Anexo.
BIBLIOGRAFIA
148
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pretextos:1863-1865. São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie. 2009.
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Janeiro: serviço de Documentação Geral da Marinha, junho/1971. Número 3.
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_________________________ O marinheiro da Independência. in. Jornal do Commercio. Rio de
Janeiro, 31 de março de 1935
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a
Edição,
4
a
tiragem. 497p.
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13-CALMON, Pedro História Naval Brasileira – Introdução - Primeiro volume Tomo I – 1975.
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(História administrativa do Brasil, 15.)
15-_________________________. Evolução Administrativa do Ministério da Marinha no Império.
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16-CAMINHA, João Carlos Gonçalves. Formação da Marinha Imperial. in. Navigator: subsídios
para a história marítima do Brasil. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação Geral da Marinha, n
o
10, dezembro 1974.
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do Riachuelo. Rio de Janeiro: Tipografia Imp. e Const. de J. Villeneuve, 1878. 41p
2- REBOUÇAS André, Diário: a guerra do Paraguai (1866). São Paulo: Instituto de Estudos
Brasileiros – USP, 1973. 173p.
3- ANTUNES, Euzébio José. Memórias das Campanhas contra o Estado Oriental do Uruguai e a
República do Paraguai durante o Comando do Almirante Visconde de Tamandaré. Rio de
Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha, 2007. 162p.
4- AZEVEDO, Carlos Frederico dos Santos Xavier de. História Médico-Cirúrgica da esquadra
brasileira nas Campanhas do Uruguai e Paraguai de 1864 a 1869. Rio de Janeiro. 1870.
5- BIBLIOTECA NACIONAL Anais da Câmara.
6- BRASIL. Coleção das decisões do Governo do Império do Brasil, anos 1864 – 1866.
7- Campanha do Paraguay : diários do exército em operações Marquez de Caxias. Julho de
1867 a Fevereiro de 1869. Rio de Janeiro: Imprensa Militar, Estado-Maior do Exército, 1925.
694p.
8- INHAÚMA, Ignácio Joaquim José, Visconde de Diário pessoal do Almirante Visconde de
Inhaúma durante a guerra da tríplice aliança:(dezembro de 1866 a janeiro de 1869). Rio de
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janeiro: G. De Andrea Frota, 2008. 394p.
9- JACEGUAI, Artur Silveira da Mota, Barão de Reminiscência da Guerra do Paraguai. 2. ed.
Revisada e atualizada - Rio de Janeiro: Serviço de Documentação Geral da Marinha, 1982.
196p.
10- OURO PRETO, Afonso Celso de Assis Figueiredo, Visconde de A Marinha d’Outrora -
subsídios para a história. 3
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ed. Revisada e atualizada. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação
da Marinha, 1981. 326p.
11- RELATÓRIO da Repartição dos Negócios da Marinha à Assembléia Geral Legislativa nos
anos de 1864 à 1866. Rio de Janeiro: Typografia Nacional.
12- ROCHA, Manoel Carneiro da. Diário da campanha naval do Paraguai: 1866. Rio de Janeiro:
Serviço de Documentação da Marinha, 1990. 351p
13- TEFFÉ, Antonio Luiz von Hoonholtz. Memórias do Almirante Barão de Teffé a Batalha Naval
do Riachuelo. Rio de Janeiro: Garnier Irmãos,1865. 168p.
14- THOMPSON, George. Guerra do Paraguai. Coleção de temas brasileiros. Vol. 8. Rio de
Janeiro: Conquista. 1968. 278 p.
DOCUMENTAÇÃO PRIMÁRIA NÃO EDITADA
1- Arquivo Tamandaré
2- Arquivo Barroso
3- Coletânea de documentos microfilmados pertencentes ao Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro.
4- Arquivo Nacional, documentos da série Marinha. – Livro de Socorros. Documento XVII M3444,
série Marinha.
154
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