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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Daniela Emmerich de Souza Mossini
Ensino Jurídico: história, currículo e
interdisciplinaridade
Doutoramento em Educação: Currículo
PUC-SP
São Paulo – 2010
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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Daniela Emmerich de Souza Mossini
Ensino Jurídico: história, currículo e
interdisciplinaridade
Tese apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do
título de Doutor em Educação: Currículo
pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, sob a orientação do Dr. Alípio
Márcio Dias Casali.
São Paulo – 2010
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3
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total
ou parcial desta Tese por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura:_______________________________
Local:________________ Data:____/____/______
4
MOSSINI, Daniela Emmerich de Souza
Ensino Jurídico: história, currículo e interdisciplinaridade/ Daniela Emmerich de
Souza Mossini – São Paulo: (s.n.), 2010.
256f.; 30 cm
Tese (Doutorado em Educação: Currículo) – Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo – PUC-SP
Orientador: Professor Doutor Alípio Márcio Dias Casali
Tese (doutoramento) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
1. Ensino Jurídico em Portugal. 2. Ensino Jurídico no Brasil. 3. História
4. Currículo 5. Interdisciplinaridade.
5
Banca Examinadora
___________________________________
___________________________________
___________________________________
___________________________________
____________________________________
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Dedicatória
Ao meu marido, Mauro Cezar Miskulin, por seu incondicional apoio, nesta
longa e desafiadora jornada. Sem ele, não cruzaria nenhum oceano.
Aos meus pais e mestres, Euzébio Mossini e Marília Emmerich de Souza
Mossini, que ao se encontrarem na escola, se apaixonaram entre si e por ela,
deixando um enorme legado de amor ao conhecimento e à vida.
Aos meus filhos, Rafael Mossini Miskulin e Gabriel Mossini Miskulin, que foram
gerados junto com esta tese e por isso a nortearam, assim como os anjos São
Rafael e São Gabriel nortearam os irmãos Paulo e Vasco da Gama no caminho dos
Descobrimentos.
A todas as minha amigas, em especial Amanda, Bianca, Regina e Lúcia, com
quem tive o privilégio de conviver na melhor escola do mundo.
À doutora Katya Laís Patella Couto pela leitura criteriosa e amorosa.
Ao meu irmão e mestre, Fábio Emmerich de Souza Mossini, e sua aluna e
esposa, Cristiane Mossini que são prova de que o amor acontece na escola.
Ao grande amigo Dr. José Walter dos Santos (in memorian) que foi um dos
primeiro militantes do Direito Educacional em Brasília. Essa tese é para você.
A minha avó Helyette, que deixou a escola para cuidar de sete alunos-filhos.
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Agradecimentos
Agradeço a Deus pelo dom da vida e pelo privilégio de poder estudar na PUC
e chegar até essa grande Universidade.
Agradeço a meus pais, Euzébio Mossini e Marília Emmerich de Souza
Mossini, pelo amor incondicional em todos os momentos de minha vida e também
pela sólida educação recebida e que continuo a receber.
Agradeço a todos os meus familiares, em especial a meu irmão Fábio e minha
cunhada Cristiane, por todo o apoio recebido e compreensão nos momentos de
ausência para a elaboração desta tese.
Agradeço ao meu orientador, Professor Doutor Alípio Márcio Dias Casali,
antes de tudo pela amizade e atenção paternal dispensadas ao longo de muito
tempo, bem como pela acolhida generosa das ideias apresentadas neste trabalho.
Agradeço ao Professor Doutor Marcos Tarciso Masetto, pela participação no
exame de qualificação e pela leitura atenta do texto apresentado, cujas sugestões
ali formuladas serviram como grande estímulo para a finalização deste trabalho.
Agradeço ao Professor Doutor Alfredo Sérgio Ribas dos Santos, pela
participação no exame de qualificação e também pelas imprescindíveis sugestões
ali formuladas, especialmente de ordem filosófica e metodológica.
Agradeço as professoras e amigas Katya e Dayse, pela leitura criteriosa e
apoio incondicional.
Agradeço a professora Ivani Fazenda pela sensibilidade, intuição e visão de
futuro.
Agradeço de forma especial aos Professores do Programa de Educação:
Currículo, cujas aulas nas disciplinas cursadas contribuíram para o desenvolvimento
e processo no programa de doutoramento.
8
Agradeço aos queridos amigos da PUC, em especial à Regina e à Lúcia,
companheiras da mesma estrada, egressos de muitas partes do Brasil e de outras
partes do mundo, pela enriquecedora oportunidade de convivência e amizade
construída ao longo destes anos na PUC.
Agradeço ao Professor Doutor Almerindo Janela Afonso, da Uminho, em
Portugal.
Agradeço, ainda, aos amigos e vizinhos Luciano, Amanda e João Pedro
Dantas por oferecerem ajuda e apoio no cuidado com os pequenos durante esta
jornada.
Agradeço à Raquel e ao Claudio, meus companheiros de todas as horas
difíceis em Portugal.
Agradeço aos meus colegas de graduação em Direito e Letras, que me
ajudaram a chegar até aqui trabalhando e estudando.
Agradeço ao senhor gerente geral do Banco Real, Sebastião Moura Fortuna, e
sua esposa, Elizabeth Forli Fortuna, pela dispensa para poder estudar na PUC.
Agradeço à Capes, pelo apoio e oportunidade de estar na PUC.
Por fim, um agradecimento especial ao apoio em todos os momentos, meu
marido Mauro Cezar Miskulin.
9
“O mundo do trabalho passa por transformações gerais e radicais. O
ritmo acelerado do reordenamento econômico em escala mundial e a
modernização tecnológica e gerencial alteram completamente o perfil
da oferta de empregos. O desemprego aparece como uma realidade
estrutural, em vez de uma suposta disfunção do sistema econômico.
Simultaneamente, novas exigências se impõem à qualificação
profissional: o que se exige agora do trabalhador é que apresente e
desenvolva certas qualidades que vão muito além daquelas
habilidades gerais ou técnicas que os processos educativos
convencionais podem oferecer. Requer-se uma nova educação, que
seja mais geral, versátil, criativa e permanente“ (CASALI, 1997B: 15).
São momentos graves sem dúvida, e, exatamente por isso, são
também momentos grávidos de possibilidades nos quais é preciso
saber compatibilizar a tensão entre flexibilidade, persistência e
rigidez. Como toda crise, manifesta um perigo; entretanto, enquanto
crise, anuncia alternativas, sem que a esperança precise ficar em
apuros” (CORTELLA, 1997: 22).
10
Uma das maiores capacidades que educação pode e deve dar é o
poder de vislumbrar o geral no particular; o poder de sentir que,
apesar de isto estar a acontecer-me a mim, é muito parecido com o
que acontece aos outros, com que aconteceu durante séculos e com
o que pode continuar acontecer. É fácil sentir que a desgraça de cada
um, as injustiças que sofremos ou as malevolências de que somos
alvo são especiais e peculiares. Isto aplica-se não só ao próprio,
como à sua família, classe, nação, ou mesmo continente. Porém, em
resultado da educação, é possível ver esses acontecimentos com
justiça imparcial. De outro modo, é improvável alcançar jamais essa
imparcialidade (RUSSELL, 1961)
11
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo examinar as novas demandas que o ensino jurídico
brasileiro busca atender auxiliado pelos conhecimentos históricos das políticas
públicas responsáveis pela construção do currículo do Ensino Jurídico Nacional com
ênfase sobre a influência de Portugal. Com base na perspectiva filosófica e histórica
desde a criação dos cursos de Direito no Brasil (1827) até a atualidade, busca uma
combinação dos Estudos na Área de Currículo com o Direito, para discutir a histórica
intervenção articulada do público e do privado na construção de seus paradigmas e
inovar por meio da interdisciplinaridade.
Para a elaboração deste estudo, percorremos um itinerário que tem início com um
panorama dos desafios e conquistas do ensino jurídico na atualidade, um histórico
acerca do Ensino Jurídico no Brasil e Portugal, além de um histórico sobre as teorias
de Currículo, o Ensino Jurídico, as influências internacionais e, por fim, a busca pela
inovação no ensino da justiça.
O exame mais específico recai sobre o entendimento de que os problemas da
atualidade decorrem da falta de conhecimento histórico sobre o legado português ao
Ensino Jurídico e também da falta de clareza sobre os fundamentos teóricos para
uma boa estruturação curricular dos cursos de formação na perspectiva de uma
vinculação orgânica entre Ensino Jurídico e desenvolvimento social e político do
país.
A opção metodológica utilizada foi a pesquisa qualitativa, do tipo bibliográfica. O
objetivo dessa pesquisa é abordar a trajetória histórica dos cursos de Direito no
Brasil focando a interferência, a influência e a herança recebida dos cursos de
Direito de Portugal, com o objetivo de propiciar a reflexão contextualizada sobre a
necessidade de mudanças na intervenção pública e privada na formação dos
candidatos a bacharéis.
Nesse sentido, faz-se necessário um olhar e um pensamento críticos para que
possamos avaliar e planejar as diretrizes de formação que cumpram e entreguem a
todos o que prometem, ou seja, formar profissionais que, além da capacidade de
lidar com o conhecimento jurídico e pesquisá-lo com autonomia, tenham uma
compreensão ética da sua atividade profissional articulada ao saber humanístico
interdisciplinar, buscando uma participação social efetiva.
Conclui-se que a grande mudança se encontra na construção de uma nova
concepção curricular sobre o ensino do Direito que atenda às demandas sociais e
produza a inovação, ao formar profissionais com uma percepção das novas formas
de atuação na área jurídica.
Palavras-chave: Ensino Jurídico em Portugal – Ensino Jurídico no Brasil – História –
Currículo – Interdisciplinaridade.
12
ABSTRACT
This present study has the aim to examine the new demands that the Brazilian
juridical teaching tries to fulfill helped by the historical knowledge of public policies
responsible for the construction of the national Juridical Teaching curriculum,
emphasizing Portugal influence on it. Based on the philosophical and historical
perspectives since the creation of Law Courses (1827) until the present days,
searching for a combination of Studies in the Curriculum Area with Law, discussing
the historical intervention articulated of the public and private in the construction of its
paradigms and reach the interdisciplinarity.
To the elaboration of this study, we are going through an itinerary that begins with a
brief overview of today’s juridical teaching, a history about the Juridical Teaching,
besides a history about the theories of Curriculum, Juridical Teaching, the
international influences and the search for innovation.
The most specific exam is about the understanding that the current problems are
due to the lack of historical knowledge about the Portuguese legacy concerning the
Juridical Teaching, and also the lack of distinction about the theoretical fundaments
to a good curricular organization of the undergraduate courses in the perspective of
an organic link between the Juridical Teaching and the social and political
development of the country.
The methodological option used was the qualitative research, from the bibliographical
type. The objective of this research is to approach the historical trajectory of the Law
courses in Brazil focusing the interference, the influence, and the heritage received
from the Law courses form Portugal with the goal to promote a contextualized
reflection about the needs for a change in the public and private intervention in the
formation of the candidates to become bachelor of Laws.
In this sense, it is necessary a critical look and thought, so that we can evaluate and
plan the formation guidelines that enforce and charge to all that are committed, that
is, to educate professionals that, beyond the ability to deal and research the juridical
knowledge with autonomy, have the ethics comprehension of his/her professional
activity articulated to the interdisciplinary humanistic knowledge searching for an
effective social participation.
It is concluded that the great change is found in the construction of a new conception
about the juridical teaching that serves the social demands and get the innovation to
graduate professionals with a perception of new ways to work in the juridical area.
Key words: Juridical Teaching in Portugal – Juridical Teaching in Brazil – History –
Curriculum – Interdisciplinarity.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABE
Associação Brasileira de Educação
ABEDi
Associação Brasileira de Ensino do Direito
ABMS
Associação Brasileira de Mantenedores do Ensino Superior
CES
Câmara de Educação Superior
CF
Constituição da República Federativa do Brasil
CFE
Conselho Federal de Educação
CONPEDI
Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito
CNE
Conselho Nacional de Educação
CRUB
Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras
DCNs
Diretrizes Curriculares Nacionais
DOU
Diário Oficial da União
EAD
Educação À Distância
ENADE
Exame Nacional de Desempenho de Estudantes
IES
Instituição de Educação Superior
INEP
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira
LDB
Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MEC
Ministério da Educação
MS
Mandado de Segurança
OAB
Ordem dos Advogados do Brasil
PDI
Plano de Desenvolvimento Institucional
PNE
Plano Nacional de Educação
PPC
Projeto Pedagógico de Curso
PPI
Projeto Pedagógico Institucional
SESu
Secretaria de Educação Superior
SINAES
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
STF
Supremo Tribunal Federal
STJ
Superior Tribunal de Justiça
UMinho
Universidade do Minho em Braga Portugal
14
Sumário
Introdução_______________________________________________________________ 17
Preliminares: A história de uma pesquisa____________________________________ 19
Definição e delimitação do problema________________________________________ 19
Metodologia de pesquisa: abordagem bibliográfica____________________________ 26
Procedimentos metodológicos______________________________________________ 33
Capítulo 1: Panorama atual: Os desafios e conquistas do ensino jurídico no Brasil 35
1.1 O Ensino Jurídico na atualidade___________________________________________35
1.2 A busca por uma transformação no Ensino Jurídico _________________________42
1.3 O futuro do Ensino Jurídico e a mudança social_____________________________48
Capítulo 2: Contexto histórico: A herança portuguesa no ensino jurídico no Brasil_ 60
2.1 As influências das primeiras universidades no mundo________________________ 60
2.2 A origem do ensino jurídico Português_____________________________________63
2.3 O processo de criação do Ensino Jurídico em Portugal (1290)________________64
2.3.1 Reforma Pombalina (1750 – 1777) ________________________________________67
2.3.1.1 O Alvará Régio (1759)_________________________________________________70
2.3.1.2 Real Mesa Censória (1767) ____________________________________________72
2.4 O processo de criação do Ensino Jurídico no Brasil (1827)___________________74
2.4.1 A Assembleia Constituinte (1823) _________________________________________76
2.4.2 Lei de 11 de agosto de 1827______________________________________________79
2.5 Primeira fase: O ensino jurídico no Brasil Império (1827- 1889) _______________84
2.6 Segunda Fase: O ensino jurídico no Brasil República (1889- 2010)____________90
2.6.1 Reforma Francisco de Campos (1930)_____________________________________91
2.6.2 O Estado Novo (1937 – 1945)
____________________________________________93
2.7 Transformação Histórica do Currículo Jurídico______________________________98
2.7.1 O "currículo único" do ensino jurídico (1827-1961)___________________________98
2.7.2 O "currículo mínimo" do ensino jurídico (1962-1995)________________________101
2.7.3 O "currículo mínimo nacional" do ensino jurídico (1972-1990)________________104
2.7.4 O currículo de "conteúdo mínimo do curso jurídico" (1994-2010) _____________106
2.7.5 Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Direito (1994)____109
2.7.6 Síntese histórica do Currículo Jurídico no Brasil____________________________111
2.7.7 As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Direito_________________112
2.7.7.1 Resolução CNE/CES n° 9/2004________________________________________112
15
2.7.7.2 Elementos estruturais na Resolução CNE/CES n° 9/2004_________________116
Capítulo 3: Currículo: histórias, teorias e a importância para o ensino jurídico ___ 118
3.1 A importância do termo currículo_________________________________________118
3.2 A história das concepções de currículo____________________________________119
3.2.1 As Teorias do Currículo e a Pós-Modernidade _____________________________125
3.2.2 História, Currículo e Ensino______________________________________________127
3.3 A história do Ensino do Direito___________________________________________129
3.3.1 O Currículo no Direito___________________________________________________133
3.4 As responsabilidades das Instituições de Ensino Jurídico ___________________141
3.4.1 Tipos de Instituições de Educação Superior _______________________________142
3.4.2 Uma combinação de olhares ____________________________________________152
3.5 As influências e confluências internacionais no ensino superior______________158
3.5.1 Processo de Mudança: Declaração de Bolonha (1999)______________________163
Capítulo 4: A interdisciplinaridade no ensino da justiça _______________________ 166
4.1 A Inovação por meio da interdisciplinaridade no Ensino Superior_____________166
4.2 A Universidade e o Currículo ____________________________________________168
4.3 Projeto pedagógico do curso ____________________________________________173
4.4 Gestão pedagógica_____________________________________________________177
4.4 Interdisciplinaridade ____________________________________________________186
4.5 Formação institucional docente __________________________________________197
4.6 O Direito Educacional___________________________________________________209
4.6.1 A OAB________________________________________________________________209
4.6.2 A ABEDi ______________________________________________________________210
4.6.3 O CONPEDI___________________________________________________________211
4.6.4 O Direito Educacional: um caminho em construção_________________________211
Considerações Finais____________________________________________________ 216
Referências Bibliográficas ________________________________________________ 225
16
Lista de Quadros
Quadro 1 - Número de IES Públicas e Privadas no Brasil ....................................................... 39
Quadro 2 - Número de matrículas no curso de Direito em IES ................................................ 39
Quadro 3 - Currículo único do curso jurídico no Império ........................................................ 99
Quadro 4 - Currículo jurídico na República ........................................................................... 100
Quadro 5 - Currículo mínimo do ensino de Direito (1962) .................................................... 101
Quadro 6 - Currículo mínimo nacional do ensino jurídico (1972-1994) ................................ 103
Quadro 7 - Currículo mínimo nacional do ensino jurídico- MEC (1980) .............................. 105
Quadro 8 - Currículo do ensino jurídico - Portaria MEC n° 1.886/94 ................................... 108
Quadro 9 - Síntese da configuração estrutural dos currículos jurídicos ao longo da história 112
Quadro 10 - Diretrizes Curriculares na Resolução CNE/CES nº 9/2004 ............................... 115
17
Introdução
Não vou pretender que há uma resposta simples ou fácil para a sua
desilusão, mas penso que uma educação adequada poderia fazer
com que esses jovens se sentissem mais capazes de perceber os
problemas e de, criticamente, julgar esta ou aquela solução sugerida
(RUSSELL, 1961 {Educação para um mundo difícil}).
Esta tese teve origem a partir de muitas indagações e questionamentos
surgidos ainda na época da minha graduação em Direito, os quais, com o início do
exercício profissional na área financeira em uma multinacional e na profissão de
professora universitária, aprofundaram-se devido à constatação das muitas
carências existentes na minha formação ao longo dos anos do curso universitário.
Além da constatação das deficiências no período formativo, questionamentos
sobre a responsabilidade que o ensino de Direito tem na sociedade atual tiveram
grande importância para a construção deste trabalho, especialmente a partir do
contato com os alunos do ensino superior, muitos dos quais recém-chegados à
Universidade e primeiros representantes de suas famílias a chegar aos bancos
universitários.
O exercício da atividade docente e o trabalho em uma multinacional do setor
financeiro continuavam a me motivar a pensar o ensino do Direito na atualidade. Ao
refletir sobre a maneira pela qual a universidade pode atender à complexidade da
sociedade mundial atual (demandas sociais) para que o ensino jurídico se aprimore,
notei que é preciso entender o processo originário lusitano dos cursos jurídicos, do
qual somos herdeiros. É necessário, também, entender de que maneira a revisão
das responsabilidades do Estado frente à sociedade por meio das políticas públicas
para orientação do funcionamento das faculdades de Direito pode garantir esse
aprimoramento.
Este trabalho é o resultado de uma pesquisa realizada no Brasil e em
Portugal sobre a origem histórica dos cursos jurídicos, a origem das diretrizes
curriculares de formação do Ensino Superior Jurídico e sua influência portuguesa e a
busca pela inovação por meio da interdisciplinaridade. Para a pesquisa, não
podemos desconsiderar os problemas no cenário mundial da crescente
mercantilização do ensino superior; da repolitização do ensino jurídico; do seu perfil
quase que exclusivamente tecnicista; da cultura jurídica essencialmente formalista
18
que as escolas de Direito reproduzem cada vez com mais intensidade; e da atuação
crescentemente burocrática dos profissionais do Direito em geral no Brasil e em
Portugal.
Por essa razão, este trabalho é uma busca por respostas para contribuir para
o aperfeiçoamento do ensino do Direito, mediante seu alinhamento com a realidade
econômica, social, cultural, política... e, consequentemente, para a melhoria da
formação e atuação profissional dos bacharéis em Direito na dinâmica da sociedade
chamada pós-moderna.
Para tanto, pareceu-me indispensável um prévio estudo acerca do histórico
das intervenções públicas e privadas na formação dos estudantes, visando a um
duplo objetivo: saber se as instituições de ensino superior de Direito podem ser
mesmo instrumento de mudança social e se os estudantes têm a formação cultural
necessária para o exercício de suas funções no rumo dessa mudança.
O entendimento acerca da maneira pela qual se processa e se transmite o
conhecimento para a formação dos bacharéis em Direito no Brasil, que possui um
inegável legado de Portugal, bem como a compreensão sobre o tipo de cultura que
resulta dessa produção e reprodução do saber jurídico supõem, necessariamente,
uma análise do modelo curricular de ensino unificado pela legislação brasileira,
Resolução 9/2004 (BRASIL, 2004), e a forma como realmente é praticado nas
faculdades de Direito, desde suas propostas pedagógicas, definidas por diretrizes
curriculares do Ministério da Educação, até as influências internacionais, como a
Declaração de Bolonha (1999).
A chance de refletir sobre o Direito na atualidade, em que a complexidade da
sociedade mundial apresenta novos e instigantes desafios, tais como a globalização,
a sociedade da informação, a biotecnologia, a revisão da atuação das
responsabilidades do Estado, entre tantos outros, representa uma oportunidade
única de reflexão sobre a responsabilidade dos cursos jurídicos diante desse novo
contexto.
Além disso, é válido também estudar a forma pela qual esse ensino vem se
realizando efetivamente no âmbito do sistema de ensino superior, com as suas
universidades, centros universitários e faculdades isoladas, tanto públicas quanto
19
privadas, dada a diversidade de resultados obtidos por elas em exames de
qualificação profissional, como a OAB, e de mensuração acadêmica, como o Enade.
Preliminares: A história de uma pesquisa
Ao fazer uma retrospectiva da própria trajetória, encontro realizações e
projetos pessoais e profissionais, dentre eles: o início da graduação em Letras e em
Direito em 1998 na Universidade Católica de Santos; as pós-graduações lato sensu
na mesma instituição; aprovação no exame da OAB em 2002; a entrada no
Mestrado em Língua Portuguesa na PUC-SP em 2002 e no Doutorado em
Educação-Currículo na mesma instituição em 2006. Simultaneamente, o trabalho
como gerente no Banco Real desde 2001, depois na supervisão da C&A em 2005 e
concomitantemente o trabalho docente no SENAC em 2003 e na UNIP de 2006 a
2010. E por fim, mas não menos importante, o casamento em 2008, a chegada do
Rafael em 2008 e do Gabriel em 2009.
Em 2008, surgiu a oportunidade de ir a Portugal para pesquisar o ensino
jurídico. Por meio da bolsa de doutorado sanduíche oferecida pela CAPES, pude
conhecer um pouco da realidade portuguesa e trazer algumas reflexões para este
trabalho. Durante minha permanência na Universidade do Minho, na cidade de
Braga, sob a orientação local do Professor Almerindo Janela Afonso, pude coletar
dados que me permitiram conhecer a origem do Ensino Jurídico e também a
realidade portuguesa.
Definição e delimitação do problema
O Conselho Nacional de Educação, o Ministério da Educação, o Instituto
Nacional de Pesquisa Superior, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação
Brasileira de Ensino do Direito têm demonstrado preocupação com o aumento do
número de cursos de Direito e com a queda de qualidade do seu ensino-
aprendizagem.
20
Acredito que, em boa parte, os desafios e conquistas apontados decorrem de
falta de conhecimento histórico sobre o legado português e os problemas que nós
aqui apresentamos no ensino do Direito (sem prejuízo dos muitos ganhos que
temos) e da falta de clareza sobre os fundamentos teóricos para uma boa
estruturação curricular, ou seja, uma vinculação orgânica entre ensino jurídico e
desenvolvimento social e democrático do País.
As legislações específicas que orientam as diretrizes curriculares em vigor
vêm sofrendo inúmeras alterações, mas essas mudanças não garantem os
resultados nas diversas avaliações (Enade e OAB). Nesse sentido, devemos debater
as diretrizes curriculares de formação articulando-as à realidade e às demandas
sociais.
Em Portugal, a Declaração de Bolonha (1999) foi assinada na perspectiva de
unificar os cursos superiores das diversas áreas, criando um modelo de formação
integrado com a realidade acadêmica de diversos países da Comunidade Europeia.
Tais medidas buscam integrar os estudantes de diversos cursos e diversos países
em uma formação internacional.
Por meio de uma análise bibliográfica pretende-se entender o processo
histórico das diretrizes curriculares de formação dos futuros bacharéis e sobretudo, o
papel e a função social que desempenharam, que vêm desempenhando ou
deveriam desempenhar na sociedade a partir das diretrizes curriculares orientadas
por medidas públicas e privadas.
Acreditamos que o perfil educacional com o qual os bacharéis vem sendo
formados fomenta a falta de conhecimento profundo e amplo em outras áreas do
conhecimento, que pode ampliar os horizontes de atuação dos estudantes. Por isso,
defendemos que o currículo deve compor interdisciplinarmente diversas áreas que
servem de apoio ao funcionamento do Direito, alcance da justiça por meio da
interdisciplinaridade.
Escolhemos, assim, como objeto de pesquisa refletir a respeito da
importância das políticas que puderam e podem se articular para conduzir as
diretrizes curriculares do ensino jurídico superior no Brasil “numa época que viu as
fronteiras entre os mundos acadêmico, empresarial e público tornarem-se cada vez
21
permeáveis – e com a necessidade irrefutável de se avaliarem os custos associados
com essa transição” (PIRES, 2007).
Objetivos gerais
Realizar uma investigação acerca:
a) da origem das políticas que estruturam as diretrizes curriculares no âmbito do
ensino superior jurídico sob o legado português após as recentes normatizações do
MEC e as possíveis influências internacionais da Declaração de Bolonha, no Brasil;
b) dos impactos das políticas públicas no compromisso e da função social que as
instituições de ensino superior jurídico têm para com a formação desses futuros
bacharéis.
No que se refere ao ensino jurídico oficial, há entre os estudiosos um
consenso no sentido de que o atual modelo se encontra em crise, atribuída à falta de
identidade do bacharel em Direito; à perda do seu papel político; à perda de
legitimidade dos operadores jurídicos, bem como à descaracterização dos
paradigmas científicos e políticos da ciência do Direito e de muitas outras distorções
políticas, culturais e epistemológicas que envolvem a produção e a reprodução do
saber jurídico.
Defendemos, nesta tese, que a crise do ensino jurídico é um processo cíclico
e histórico, que exibe várias faces, desde sua origem em Portugal (1288/90) até sua
introdução no Brasil (1827). Além da crise estrutural, pode-se falar de uma crise
operacional educacional, englobando as questões curriculares, didático-pedagógicas
e administrativas das faculdades de Direito; e de uma crise funcional econômica e
social, que se manifesta na saturação do mercado de trabalho e na perda de
identidade do bacharel em Direito, atirado em massa a esse mercado para compor
uma espécie de exército de bacharéis de segunda classe.
O ensino jurídico vive a crise de criatividade e de identidade. Não sabe para
que serve, de onde veio e para onde vai na sua visão maniqueísta do homem e da
sociedade. Rodrigues (1988: 211), em sua obra, cita Lyra Filho, o autor da crítica
mais contundente do ensino jurídico brasileiro e, segundo ele, talvez o autor que
22
melhor vislumbrou o conjunto de seus problemas. Assim se manifestava o estudioso
sobre a possibilidade de uma revolução no ensino do Direito:
É evidente que uma reforma global do ensino jurídico (...) exigiria
condições de viabilidade que estamos longe de entrever. Porém,
ainda que atuando em campo mais limitado, é preciso ter sempre em
vista o delineamento inteiro. Pois com ele é que discernimos o Direito
apresentado no sistema tradicional como verdadeira mutilação, que
apresenta as sobras torcidas do que realmente o Direito é. (...) E esta
já é uma contribuição ao processo geral, histórico, de superação, que
evidentemente transcende a reforma do ensino jurídico em si, ou
mesmo a concepção global do Direito. Elas são, apenas, dois
aspectos de outra totalidade ainda maior: o que se realiza no
itinerário histórico para um futuro de liberdade, paz, justiça e união
fraternal, em vez de dominação do semelhante. O Direito é
substancialmente, na sua ontoteleologia, um instrumento que "deve" (
para preencher o seu fim ) propiciar a concretização de justiça social,
em sistemas de normas com particular intensidade coercitiva. No
universo jurídico, entretanto, uma dialética se forma, entre as
invocações de justiça e as manifestações de iniquidade, para a
síntese superadora das contradições. Mas a consumação do projeto,
como o de um ensino certo do Direito certo, só pode ocorrer, como
Direito justo e homogeinizado, numa sociedade justa e sem oposição
de dominantes e dominados. Preconizá-lo é também um passo,
embora minúsculo, para o seu advento. O único, porém, ao alcance
das minhas deficiências e temperamento; o que realizo, como posso,
devolvendo o Direito, como um todo, aos espíritos jovens e inquietos
que o reclamam. E isto é viável, dentro das próprias condições do
ensino atual, desde que os professores de índole progressista o
focalizem nos seus programas e aulas. (...) De qualquer maneira, "o
mundo dos juristas tão calmos, tão bem-educados e tão-pensantes
não é mais o mesmo. (...). É preciso ver os sinais do mundo diferente
que está em gestação" (LYRA FILHO, 1980: 18-9).
Os profissionais do Direito vêm perdendo a capacidade de entender e decifrar
o contexto sociopolítico em que estão inseridos e a aptidão para intervir nesse
contexto com poderes decisórios. Por essa razão, tem sido cada vez mais evidente a
importância de questionar a formação acadêmica dos futuros bacharéis e o ethos
cultural do jurista.
Desse ponto será possível compreender melhor qual o papel do bacharel
moderno e qual a função social do seu saber/fazer numa sociedade conflituosa,
desigual e em profundas transformações, como é o caso da sociedade brasileira, e
que avanços e recuos estão relacionados à influencia do legado português. Por tais
razões é que o nosso trabalho se concentrará, com mais ênfase, no estudo histórico
das contribuições (medidas) positivas e negativas da herança portuguesa para a
análise do modelo de formação jurídico brasileiro e sua respectiva função social na
atualidade.
23
A própria ordem jurídica brasileira, desde os últimos anos do século XIX, veio
ganhando também um novo e avançado perfil, devido a sucessivas e profundas
mudanças legislativas, com a promulgação de uma Constituição (1988)
reconhecidamente progressista e de inúmeras leis com forte conteúdo social e
político, o que resultou em reflexos no modo de agir dos profissionais do Direito.
Um trabalho significativo sobre a importância do ensino jurídico e da figura do
bacharel é a obra de Sérgio Adorno (1988). Tal obra demonstrou que o pensamento
educacional brasileiro, no século XIX, a respeito da educação jurídica e superior,
estava voltado para o ensino de Direito e não para o ensino do Direito.
Por meio do ensino de Direito é que se formou a elite política que comandou e
ditou os rumos do Estado imperial. A preocupação do ensino jurídico não residia
tanto na formação de juristas, mas, sim, na formação de bacharéis que pudessem
assumir os diversos cargos que a burocracia estatal ofertava, nos poderes
administrativo, legislativo e judiciário.
Não obstante a deficiência do ensino do Direito, formaram, como regra, um
bacharel hábil, prudente e moderado nas relações políticas, um homem preparado
para assumir os postos de dominação do aparelho estatal. Embora o pensamento
pedagógico não estivesse centrado no ensino do Direito, o ensino jurídico produziu
os profissionais que comandaram o Estado imperial e que levaram o país a
significativas transformações nas ordens sociais, política e econômica.
Como bem esclareceu o autor em suas conclusões, "não se pretendeu,
entretanto, concluir que a formação dos bacharéis não fosse necessariamente
jurídica" (ADORNO, 1988: 241). O que ocorreu foi a prevalência de uma formação
política sobre a formação jurídica propriamente dita (ADORNO, 1988: 241). E, nesse
sentido, o ensino de Direito conseguiu atender ao principal objetivo que se
apresentava à formação superior na época: formar a elite intelectual e cultural que
conduziu o Estado brasileiro.
Muito embora se possam apresentar diversas observações críticas sobre o
ensino do Direito na época imperial, é certo que o ensino jurídico e o pensamento
pedagógico que o orientaram cumpriram um papel importante, enquanto formadores
da elite intelectual e dirigente que levou o país ao abolicionismo, à república e a
outras importantes transformações sociais e políticas.
24
Almeida Júnior (1951), ao analisar o ensino superior no período imperial antes
da reforma do ensino livre, apontou os males que atingiam esse nível de ensino na
época, dentre os quais se destacaram as péssimas instalações das instituições de
ensino; a ênfase da proteção política na escolha dos professores; a pouca
assiduidade dos docentes; a deficiência do ensino propriamente dito; a falta de
preparo e de interesse dos alunos; os conflitos na relação professor-aluno; as
fraudes nos exames; a tolerância dos professores nos exames; o descaso do Poder
Público a toda essa situação.
Esse autor destacou, também, os pontos positivos do ensino superior na
época. Muito embora tenha reconhecido a fragilidade do ensino superior no período,
esse ensino produziu os profissionais necessários àquele momento, porque das
Academias de Direito e Médicas “proveio o elemento humano com que o país
organizou os primeiros quadros dêsses dois exércitos indispensáveis a qualquer
nação civilizada: - o que defende a saúde e o que assegura a distribuição da justiça”
(ALMEIDA JÚNIOR, 1951: 37-38). Observou, também, que as diversas atividades
desenvolvidas pelos alunos “fora das aulas” valeram “muito mais, em conjunto, do
que as lições de seus mestres” (ALMEIDA JÚNIOR, 1951: 39).
A opinião final de Antônio Ferreira de Almeida Júnior é, entretanto, bastante
positiva. Embora tenha reconhecido que “muito pouco ficou do trabalho sistemático,
regulamentar, produzido pelos lentes nas salas de aula” (ALMEIDA JÚNIOR, 1951:
41), a atuação social das Academias,
como influência democratizadora, reveladora e orientadora de
vocações, preparadora das vanguardas políticas e doutrinárias do
país, e vitalizadora da unidade nacional [...] é, ao que nos parece,
mais do que suficiente para podermos afirmar que as velhas
Academias do Império prestaram grandes serviços ao país.
(ALMEIDA JÚNIOR, 1951: 41)
Outro estudioso que deve ser incluído no rol dos que demonstraram a
importância do ensino jurídico é Antônio Luís Machado Neto (1969). Em sua obra, o
autor demonstrou a riqueza e a originalidade do pensamento jurídico brasileiro, que
foi desenvolvido, em boa parte, por professores e bacharéis formados nas
Academias de São Paulo e Recife no século XIX. Conforme observou Miguel Reale
no prefácio da pesquisa de Antônio Luís Machado Neto (1969):
25
procurou penetrar na infraestrutura teórica da experiência jurídica
nacional, campo no qual o Brasil se orgulha de ter realizado algo de
válido em si e por si mesmo, o que nunca será demais proclamar
numa época em que tôlamente se pretende diminuir o valor de nossa
vocação para o Direito (MACHADO NETO, 1969: 234)
Antônio Luís Machado Neto (1969) estudou a atuação de alguns dos
principais estudiosos do Direito brasileiro, como os defensores do jusnaturalismo, os
adeptos da renovação das ideias ocorrida no século XIX, os formadores da
sociologia jurídica da chamada Escola do Recife, chegando até os pensadores do
século XX. Antônio Luís Machado Neto foi, com acerto, categórico ao afirmar que a
história da intelectualidade jurídica brasileira representa “um passado de que, sem
favor, nos podemos orgulhar” (1969: 235).
Verificamos que o problema se origina de uma tensão que nasce do contraste
de uma cultura jurídica lusitana antiga essencialmente formalista, tecnológica e
despolitizada dos profissionais do Direito, proporcionada pelo ensino jurídico
eminentemente dogmático, em face da nova configuração de um ordenamento
jurídico fortemente carregado de fatores políticos e sociais, que exige novas
responsabilidades do bacharel.
Tal tensão tende a impulsionar os integrantes daquelas carreiras, enquanto
operadores do Direito, para o questionamento dos modelos antigos de aplicação da
lei, impulsionando também a modernização dos padrões de distribuição de justiça no
âmbito do Poder Judiciário, ao se considerar que este último sempre foi tido como
um poder com funções clássicas de manutenção do status quo político, jurídico,
social, econômico e cultural.
A compreensão da mencionada tensão que envolve os profissionais do
Direito, com formação acadêmica tecnicista, mas incumbidos de operar uma
legalidade com forte conteúdo social e político, e que por isso mesmo os torna
portadores dos desafios de mudança e de rompimento com os paradigmas
meramente legalistas de interpretação e aplicação do Direito, é, por assim dizer,
exatamente o ponto nuclear das reflexões que se seguem.
26
Metodologia de pesquisa: abordagem bibliográfica
Procuramos fazer em nossas reflexões, com base bibliográfica, uma análise
histórico-estrutural das medidas que orientam as diretrizes curriculares de formação
que atingem o ensino jurídico no Brasil, devido à influência de Portugal no passado e
na atualidade. Assim, verificamos como essa formação acadêmica influi no modo de
atuação do jurista, sobretudo a partir da Declaração de Bolonha (1999), que, como
se sabe, impôs um novo modelo de formação e provocou também uma revisão no
perfil e nos papéis do jurista contemporâneo.
A opção por uma investigação crítica acerca do ensino jurídico acadêmico
luso-brasileiro, bem como sobre a formação acadêmica dos futuros operadores do
Direito, se impôs como necessária a partir da perspectiva de crise político-ideológica
que caracteriza o atual estágio do Direito numa sociedade conflituosa e desigual
como a nossa. A abordagem crítica é a única capaz de permitir a variedade de
indagações sobre o Direito, sobre o seu ensino e sobre a atuação dos profissionais
dessa área, que é uma instância ideológica com profundos reflexos políticos.
No ensino jurídico, o Direito não deve ser tomado como instrumento mecânico
da opressão de uma classe pela outra, como numa versão estreita do marxismo.
Muito pelo contrário, seu reconhecimento como instância ideológica que pode,
eventualmente, projetar os interesses de uma classe superior em detrimento das
inferiores, numa sociedade de classes, ordenada pelo modo de produção capitalista,
é constatação corriqueira tanto no âmbito da sociologia quanto no da ciência política.
A ciência jurídica com a ideia de neutralidade é que ainda resiste à
confirmação de que o Direito pode funcionar como um dos mecanismos de
dominação na sociedade capitalista, e a ideologia jurídica normativista, tal como
ocorreu com o positivismo em outros campos, acabou sendo apropriada pela classe
dirigente para impor os padrões de legalidade e de atuação dos operadores do
Direito.
Ferraz Júnior (1994) salienta que a Ciência do Direito evolui de modo diverso
das demais ciências, não havendo separação entre a história da ciência jurídica e a
história do próprio Direito. Nas demais ciências, o objeto é um dado, enquanto na
ciência jurídica o objeto é um resultado, que só se realiza numa prática.
27
Em outras ciências, as definições possuem caráter informativo, enquanto na
ciência jurídica possuiriam um sentido informativo (descrever o estado das coisas)
combinado com um diretivo (dirigir o comportamento). As definições teóricas, no
caso de um físico, por exemplo, estariam superadas: na medida em que o estado
das coisas muda, a definição torna-se falsa. No caso do jurista, as definições se
superam à medida que deixam de ser guia para a ação. Assim, a ciência jurídica não
apenas informa, mas conforma o fenômeno de estudo, faz parte dele.
Em uma sociedade capitalista, a pauta ideológica das classes que figuram no
topo da hierarquia social necessita ao menos da aparência de legalidade para
buscar o consenso legitimador. E essa aura de legalidade é perseguida por
intermédio do discurso dogmático que apresenta, retoricamente, a lei como instância
desideologizada, indiferente aos interesses políticos desta ou daquela classe.
Nas sociedades capitalistas atuais, o sistema normativo tende a “legalizar” o
projeto social hegemônico das classes economicamente superiores, e o consenso
em torno dessa hegemonia também é conseguido por meio de um discurso retórico
e legitimador que sustenta a igualdade dogmática de todos perante a lei, ocultando
as diferenças sociais. Não são raras as vezes em que esse sistema normativo acaba
albergando algumas reivindicações das classes subalternas, como resultado da
pressão social exercida por partidos, sindicatos, movimentos sociais e outros
organismos populares.
A melhor perspectiva para observar a dimensão ideológica do Direito é o
momento de sua produção, quer pelo fato evidente de que a ideologia liberal
burguesa é aquela que predomina hegemonicamente nos parlamentos de formação
capitalista, quer pelo fato, também evidente, de que as relações sociais e
econômicas de produção condicionam toda a produção normativa do Estado liberal
burguês. Além disso, essa ideologia acaba prevalecendo como paradigma da
ciência jurídica e critério axiológico dos mecanismos de interpretação e aplicação da
lei.
Uma vez materializada no processo produtivo, a ideologia da classe
hegemônica projeta-se no ordenamento jurídico, que cuida imediatamente de
formalizar aquela hegemonia política dominante, fazendo-o por meio de leis que
28
garantem a coesão e o consenso sociais em torno dos projetos socioeconômicos de
classe.
O ordenamento jurídico positivo confere ao projeto da classe dominante um
caráter legal que o torna, só por isso, um projeto de pretensão universal, já que
opera a completa abstração dos antagonismos sociais, absorvidos ou
“institucionalizados” pela ordem jurídica que se apresenta como expressão do
interesse geral.
A abordagem dos problemas relacionados ao ensino do Direito, à sua ciência
e à formação acadêmica dos seus intérpretes e operadores implica a necessidade
de proceder a algumas indagações acerca da própria concepção de Direito, ou seja,
daquilo que se considera como o conteúdo ou a essência mesma do fenômeno
jurídico: se um fenômeno estático e reduzido à sua expressão meramente normativa,
que parece ser o pensamento dominante, ou, pelo contrário, um fenômeno dinâmico
e multifacetado, com dimensões normativas, mas também políticas, econômicas,
sociais, culturais, etc., que é um pensamento marginal, ou seja, ainda não
hegemônico.
A determinação do “ser” do Direito é o tema fundamental da filosofia do
Direito, uma vez que o problema ontológico de saber qual é a sua essência
determina também, conforme se tenha esta ou aquela concepção do fenômeno
jurídico, conforme seja este ou aquele o método utilizado para a captação desse
fenômeno, o modo de transmissão do saber e a atuação prática do jurista, em razão
do caráter aplicado da ciência jurídica. É exatamente isso o que já afirmou Chaim
Perelman (1998) em Lógica jurídica, onde ensina que a argumentação dos juristas
depende da ideia que têm acerca do Direito e do funcionamento deste último na
sociedade.
São inúmeras as correntes do pensamento jurídico que definiram pelo menos
dois pontos fundamentais para a ciência jurídica: seu objeto e método. Tais
correntes entendem o Direito e a sua metodologia das mais diferentes maneiras.
Desde o jusnaturalismo, sem dúvida a mais antiga delas, até as correntes
contemporâneas, o Direito e seu método de compreensão têm sido encarados por
tantos e tão diferentes modos que hoje já não há mais qualquer condição de
estabelecer uma verdade científica sobre tais questões.
29
Essas questões que afetam gravemente a ideia de Direito, seu papel na
sociedade e a ciência que o estuda estão a merecer uma revisão radical que implica,
obviamente, a revisão tanto do objeto da ciência jurídica quanto da sua metodologia.
A recuperação da dimensão axiológica do Direito e de sua ciência, bem como
do conteúdo social da função do jurista, numa sociedade industrial de
transformações rápidas e desenvolvimento não planejado, é tarefa que passa pela
revisão de alguns paradigmas e, necessariamente, pela maneira como se concebe o
Direito e como se transmite o saber jurídico.
Segundo Coelho (2006), a Teoria Crítica aparece no Direito no final dos anos
60, graças à contribuição de pensadores europeus que estudavam o Direito de
modo crítico, isto é, de modo não tradicional. Basicamente, nesse período, tivemos
como legado o economicismo jurídico soviético (Stucka e Pashukanis), a releitura
gramsciana da teoria marxista feita pelo grupo de Althusser, a teoria crítica
frankfurtiana e as teses arqueológicas de Foucault sobre o poder.
Em 1970, o movimento se concentrou na França, com professores
universitários de esquerda, e num segundo momento, na Itália, tendo à frente
magistrados antipositivistas e politizados, precursores do "uso alternativo do Direito".
Em 1980, o movimento de crítica jurídica repercutiu na América Latina,
principalmente na Argentina, no México, no Chile, na Colômbia e no Brasil. As
discussões acerca da crítica jurídica e da importância pedagógica da teoria crítica no
Direito ganharam força a partir da metade dessa década, graças não só à
repercussão dos movimentos críticos francês e italiano, mas também ao pioneirismo
e ao incentivo de alguns professores de filosofia e sociologia jurídicas em diversas
faculdades de Direito do País, como Roberto Lyra Filho, Tércio Sampaio Ferraz Jr., e
Luiz Alberto Warat.
Resta evidente que uma teoria jurídica crítica busca um novo paradigma para
a resolução de conflitos que emergem da vida sócio-comunitária; e, se assim
procede, é justamente para contestar o modelo caduco e superado de legalidade
estatal convencional, um modelo insuficiente para resolver os conflitos que brotam
das necessidades populares.
A Teoria Crítica do Direito, que no início se limitava a se opor aos
fundamentos do positivismo jurídico, ampliou seu objeto de crítica, voltando-se
30
também contra o jusnaturalismo e o realismo sociológico, este de viés positivista. O
movimento pretendia revelar como, através do ensino dessas doutrinas idealistas e
formalistas, eram encobertas e reforçadas as funções do Direito e do Estado na
reprodução das sociedades capitalistas.
Convém apontar que, se para Wolkmer (2001B), o movimento teve sua
origem no final de 1960, para Warat e Pêpe, o movimento começou nas
universidades francesas, na década de 70.
Um grupo considerável de professores que atuavam dentro de referenciais
teóricos marxistas, sentindo-se ameaçados em seus cargos acadêmicos, decidiram
criar uma associação crítica do Direito e publicar uma revista chamada Procès. No
primeiro número, datado de 1978, aparece o Manifesto para uma teoria crítica do
Direito. Esse trabalho coletivo pretendia questionar as ideias aceitas sobre o Direito
em nossa sociedade, assim como a forma como ele é ensinado na Universidade. Os
mais conhecidos representantes dessa associação são Michel Miaille e Antoine
Jeammaud. A associação logo se estendeu para Bélgica, Alemanha, Portugal,
Espanha e Inglaterra, tendo, na América Latina, seus principais ecos no México,
Brasil, Venezuela e Argentina.
De acordo com Wolkmer (2001A), a teoria jurídica crítica representa:
A formulação teórico-prática que se revela sob a forma do exercício
reflexivo capaz de questionar e de romper com o que está
disciplinarmente ordenado e oficialmente consagrado (no
conhecimento, no discurso e no comportamento) em dada formação
social e a possibilidade de conceber e operacionalizar outras formas
diferenciadas, não repressivas e emancipadoras, de prática jurídica.
Nesta linha de pensamento, podemos então conceber e
operacionalizar práticas de pluralidade alternativa, a exemplo da
resolução dos conflitos por via não-institucionalizada, forma
diferenciada e emancipatória de prática jurídica (WOLKMER: 2001A:
4).
Na medida em que o órgão de jurisdição do modelo de legalidade estatal
convencional se torna funcionalmente incapaz de acolher as demandas e de
resolver os conflitos inerentes às necessidades engendradas por novos atores
sociais, nada mais natural do que o poder societário instituir instâncias extrajudiciais
assentadas na informalidade, autenticidade, flexibilidade e descentralização. A
constituição de outro paradigma da política e do jurídico está diretamente vinculada
ao surgimento comunitário-participativo de novas agências de jurisdição não-estatais
31
espontâneas, estruturadas por meio de processos de negociação, mediação,
conciliação, arbitragem, conselhos e tribunais populares.
De acordo com o pensamento habermasiano, a legitimação pelo
procedimento é diversa da legitimação pelo consenso. Isso significa que não basta
que uma lei ou ato administrativo sejam produzidos conforme a circulação oficial do
poder político Estatal, mas que esse poder deve manter íntima conexão com o poder
comunicativo gerado fora da circulação oficial para ser legítimo. Em outras palavras,
depende da participação dos atores sociais no espaço público, do entendimento
recíproco e consciente face ao processo de construção das normas, bem como do
consenso em torno do conceito universal do justo, o que se dá por meio da
linguagem e da razão comunicativa.
Resta evidente que uma teoria jurídica crítica busca um novo paradigma para
a resolução de conflitos que emergem da vida sócio-comunitária; e, se assim
procede, é justamente para contestar o modelo caduco e superado de legalidade
estatal convencional, um modelo insuficiente para resolver os conflitos que brotam
das necessidades populares.
Tomando emprestada essa definição, convém declinarmos as principais
propostas de uma Teoria Crítica no Direito. Warat (2004), por exemplo, aponta
algumas propostas:
a) mostrar os mecanismos discursivos a partir dos quais a cultura
jurídica se converte em um conjunto fetichizado de discursos;
b) denunciar como as funções políticas e ideológicas das concepções
normativistas do Direito e do Estado se encontram apoiadas na
falaciosa separação do Direito e da Política e na utópica idéia da
primazia da lei como garantia dos indivíduos;
c) rever as bases epistemológicas que comandam a produção
tradicional da ciência do Direito, demonstrando como as crenças
teóricas dos juristas em torno da problemática da verdade e da
objetividade cumprem uma função de legitimação epistêmica, através
da qual se pretende desvirtuar os conflitos sociais, apresentando-os
como relações individuais harmonizáveis pelo Direito;
d) superar os bizantinos debates que nos mostram o Direito a partir
de uma perspectiva abstrata, forçando-nos a vê-lo como um saber
eminentemente técnico, destinado à conciliação de interesses gerais
(...) Desta forma, a teoria crítica tenta recolocar o Direito no conjunto
das práticas sociais que o determinam (...) (WARAT, 2004: 23)
A Teoria Crítica é importante, na medida em que confere ao Direito um
sentido sociopolítico, combate o positivismo jurídico, bem como contesta o tipo de
32
justiça apresentado por determinado ordenamento jurídico constituindo base da
inovadora Justiça Restauradora.
A teoria jurídica crítica tem procurado romper com o mito da neutralidade do
Direito e também de seu ensino, demonstrando que a interpretação e aplicação
dogmática da lei, de forma supostamente “neutra” em relação aos conflitos sociais,
nada mais é do que uma reprodução dos interesses da classe econômica dirigente.
A estratégia adotada por esses diferentes “usos do Direito”, inclusive do ponto
de vista epistemológico, é a busca de um pluralismo jurídico mais democrático, por-
quanto procura explorar as fissuras, contradições e ambiguidades do ordenamento
jurídico positivo, bem como as chamadas “regras programáticas”, internalizando na
estrutura jurídica estatal os interesses das classes populares, historicamente
excluídas do processo decisório, e procurando conferir uma efetiva função social ao
Direito.
O pensamento crítico do Direito supõe um saber antidogmático em concreto
diálogo com as determinantes sociais desse fenômeno. Portanto, esse pensamento
parte da constatação de que o idealismo jurídico do universo teórico tradicional,
limitado pelo conhecimento lógico-formal e meramente descritivo de normas e
instituições, tal como positivadas pelo legislador racional, jamais responderá às
necessidades concretas dos sujeitos. Estas somente poderiam ser absorvidas e
solucionadas por meio de um Direito articulado com a base material da sociedade e
concebido como instrumento de sua transformação.
As teorias críticas têm um embasamento teórico-marxista, na medida em que
concebem o Direito a partir de um modelo de conflito que enfatiza as contradições
sociais e o antagonismo de interesses existente nas formações capitalistas e, por
conseguinte, na superestrutura jurídica dessas formações.
Quanto a essa função transformadora do Direito, visualizada pela teoria
crítica, duas advertências parecem-nos imprescindíveis. Em primeiro lugar, seria
falso supor que se possa realizar a revolução socioeconômica por meio da lei e da
jurisprudência, mecanismos tradicionais de controle e conservação do status quo; de
resto, não consta que os juristas críticos houvessem sustentado tal possibilidade,
visto que consideram o Direito e o Estado apenas espaços privilegiados de luta. Em
segundo lugar, não se pode dizer também que tais “usos do Direito” pudessem
33
propor um aplicador irresponsável, completamente liberto da norma, pronto para
exercer uma “ditadura judicial”, segundo sua própria subjetividade.
Procedimentos metodológicos
A pesquisa bibliográfica é um procedimento metodológico que se oferece ao
pesquisador como uma possibilidade na busca de soluções para seu problema de
pesquisa. Para tanto, parte da necessidade de exposição do método científico
escolhido pelo pesquisador; expõe as formas de construção do desenho
metodológico e a escolha dos procedimentos; e demonstra como se configura a
apresentação e análise dos dados obtidos.
Expõe, também, um desenho metodológico de aproximações sucessivas,
considerando que a flexibilidade na apreensão dos dados garante o movimento
dialético no qual o objeto de estudo pode ser constantemente revisto.Trabalhar com
a pesquisa bibliográfica significa realizar um movimento incansável de apreensão
dos objetivos, de observância das etapas, de leitura, de questionamentos e de
interlocução crítica com o material bibliográfico, e isso exige vigilância
epistemológica.
Ao tratar da pesquisa bibliográfica, é importante destacar que ela é sempre
realizada para fundamentar teoricamente o objeto de estudo, contribuindo com
elementos que subsidiam a análise futura dos dados obtidos. Portanto, difere da
revisão bibliográfica, uma vez que vai além da simples observação de dados
contidos nas fontes pesquisadas, pois imprime sobre eles a teoria, a compreensão
crítica do significado neles existente.
A tese será estruturada com os seguintes capítulos:
Capítulo 1 – Panorama atual: os desafios e conquistas do ensino jurídico no
Brasil; apresenta a situação atual, a busca por uma transformação e a mudança
social.
Capítulo 2 – Contexto histórico: a herança portuguesa no ensino jurídico no
Brasil; discorre sobre a origem, influência e o legado português no ensino jurídico
brasileiro.
34
Capítulo 3 – Currículo: histórias, teorias e a importância para o ensino
jurídico, trata da história do currículo, da história do ensino jurídico brasileiro, das
responsabilidades das instituições de ensino jurídico, dos tipos de instituições e das
influências e confluências internacionais.
Capítulo 4 – A interdisciplinaridade no ensino da justiça, discutindo a
importância da inovação na gestão e do projeto pedagógicos do curso,
interdisciplinaridade e formação institucional docente sob a orientação do Direito
educacional.
Considerações Finais – Acredito que o mundo do trabalho passa por um
momento grave e chega a hora de todos aqueles que pensam o ensino jurídico,
devem deixar de lado as rivalidades com outras áreas do conhecimento e da
sociedade, os velhos comportamentos passivos, descompromissados com a
realidade e inovarem. Estudemos a história para saber de onde viemos, cumpramos
as orientações legais para saber onde estamos e principalmente contribuamos para
a melhoria das relações sociais, para que no futuro possamos nos orgulhar mais da
nossa história e das nossas leis.
35
Capítulo 1: Panorama atual: Os desafios e conquistas do ensino jurídico no
Brasil
(...) o fato de que as escassas noções científicas envolvidas na
massa indigesta desse ensino, soa subministradas sempre sob a sua
expressão mais abstrata, didaticamente, por métodos que não se
dirigem senão a gravar passageiramente na memória proposições
formuladas no compendio, repetidas pelo mestre e destinadas
apenas a habilitar os alunos a suspirada matricula numa Faculdade,
que recebe assim espíritos absolutamente despreparados para os
altos estudos acadêmicos, e incapazes de assimilá-los (BARBOSA,
1942: 35-36).
O capítulo foi estruturado com o objetivo de situar o leitor a respeito do
panorama atual do ensino jurídico no Brasil. Para tanto, elegemos alguns aspectos
relacionados aos desafios e as conquistas experimentados pelos envolvidos com o
ensino jurídico.
1.1 O Ensino Jurídico na atualidade
Tereis educado as classes populares, as camadas operárias e as
partes menos afortunadas e mais duramente laboriosas da nação, se
lhes não incutires, pela evidencia das leis naturais, a convicção do
caráter providencial das desigualdades, em que a riqueza divide os
homens ainda no seio dos Estados mais felizes? (...) Se quereis, pois
cimentar a ordem necessária das sociedades em bases estáveis, é na
escola que as deveis lançar (BARBOSA, 1947, t II: 361).
O presente trabalho busca indicar alguns aspectos do panorama atual do
ensino jurídico no Brasil, recortando os momentos mais importantes dessa história e
concentrando-se na análise dos principais estudos utilizados como ponto de partida
para nossa pesquisa.
A situação atual do ensino superior jurídico demonstra desajustes de diversas
ordens, desde problemas de democratização do acesso aos alunos provenientes de
um ensino fundamental e médio em transformação, passando por um processo de
ensino e aprendizagem no ensino superior que não consegue agregar
conhecimento, até um prometido sucesso profissional que não garante ao aluno
sequer uma competição justa por uma vaga no mercado de trabalho. Ao analisar a
quantidade e a qualidade do ensino jurídico, Paulo Roberto de Gouvêa Medina
(2006) declara:
36
A formação jurídica está em xeque, sem dúvida, em consequência da
proliferação indiscriminada de cursos e da inevitável queda de
qualidade que se verifica na medida em que o interesse comercial
para ser a mola propulsora da expansão dos cursos e a falta de
critério para a sua instalação fazem com que se criem novos cursos
sem atender ao requisito da necessidade social
(MEDINA, 2006: 30).
A democratização do acesso precisava ser promovida, mas deveria ter sido
feita sem abrir mão da qualidade, pois o ensino superior, desde sua origem, era
privilégio de poucos. No entanto, não se podia promover a quantidade em
detrimento da qualidade.
Ao perseguir a excelência acadêmica, o ensino jurídico deve buscar formar
profissionais autônomos, intelectual, moral e eticamente, para atuar na realidade,
conscientes do papel que devem desempenhar no fortalecimento da democracia, na
busca da atenuação das desigualdades sociais. É preciso “desenvolver o espírito
científico e o pensamento reflexivo”, conforme o art. 43 da LDB (BRASIL, 1996).
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 (BRASIL,1988), houve
campo democrático para transformações substanciais no ensino jurídico. Vários
Direitos e garantias foram introduzidos no ordenamento jurídico brasileiro pela lei
maior (BRASIL, 1988), e a onda cidadã permitiu inovações nos cursos de Direito.
Em virtude das repercussões sociais da crise dos cursos de Direito, a OAB,
por meio de sua Comissão de Ensino Jurídico, desde 1992 iniciou um estudo
nacional, buscando uma “reavaliação da função social do advogado e de seu papel
como cidadão”. Começou-se pela realização de estudos e avaliações sobre as
condições dos cursos de Direito no Brasil, tendo como parâmetro regulador a
Resolução CFE 03/72 (BRASIL, 1972), até aquele momento ainda responsável
pelas diretrizes do ensino jurídico.
Sem uma atuação maior do Estado, a Portaria 1.886/94 (BRASIL, 1994) (já
revogada) poderia ter seguido os mesmos caminhos da regulamentação anterior.
Todavia, a presença de outras regras, entre as quais a nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Lei 9.394/96 (BRASIL, 1996), permitiu a criação de um sistema
de avaliação do ensino superior sob o encargo do Estado, cujos maiores
instrumentos seriam o Exame Nacional de Cursos Lei 9.131/95 (BRASIL, 1995),
voltado à avaliação do desempenho discente, e as Avaliações Institucionais
37
Externas, voltadas à análise das condições de ensino das Instituições de Ensino
Superior (IES).
No aspecto estrutural, a antiga Portaria de 1994 (BRASIL, 1994) criou a
exigência de que cada curso de Direito mantivesse um acervo jurídico de, no
mínimo, “dez mil volumes de obras jurídicas e referência às matérias do curso, além
de periódicos de jurisprudência, doutrina e legislação”. No que concerne ao estágio,
passou a exigir a criação de um “Núcleo de Prática Jurídica” dotado de “instalações
adequadas para treinamento das atividades profissionais”.
Como crítica, os aportes dessa Portaria, mesmo ao inovarem e tentarem
superar o aspecto das reformas limitadamente curriculares, deixaram exposto o
maior dos espaços de aprendizagem, a sala de aula, porquanto é nela que a
herança liberal continua a reproduzir seu modelo pedagógico tradicional. Segundo
Jean-François Lyotard (1989):
A crise do saber científico, cujos sinais se multiplicaram desde o fim
do século XIX, não provém de uma proliferação fortuita das ciências,
que, por sua vez, seria o efeito do progresso das técnicas e da
expansão do capitalismo. Ela advém da erosão interna do princípio
de legitimidade do saber. Esta erosão acha-se em ato no jogo
especulativo e é ela que ao desmanchar a trama enciclopédica na
qual cada ciência deveria encontrar o seu lugar, as deixa emancipar
(LYOTARD, 1989: 82).
Acompanhando as grandes repercussões desse processo de avaliação do
ensino jurídico, da Comissão de Ensino Jurídico da OAB surgiu a Comissão de
Especialistas em Ensino Jurídico da SESU/MEC. A conclusão desse processo de
análise autoavaliativa da práxis dos cursos de Direito resultou na elaboração do
texto final da Resolução 9 de 2004 (BRASIL, 2004) que revogou a Portaria 1.886/94
do MEC (BRASIL, 1994), que por sua vez revogou a Resolução CFE 03/72 (BRASIL,
1972). Assim, temos que a regulação do ensino jurídico no Brasil é feita pela
Resolução 9/2004 (BRASIL, 2004).
Nesse ciclo de reprodução histórica de um padrão nos cursos de Direito, seu
“ponto de produção” ainda não pôde ser atingido de dentro para fora. Em outras
palavras, na evolução do ensino jurídico no Brasil, ainda não ocorreu uma reforma
voltada para a construção de inovações pedagógicas dentro das salas de aula,
como se propunha com a Escola Nova.
Apesar da desqualificação que o ensino jurídico superior vem
38
experimentando, pela sua redução ao nível de conhecimento meramente técnico, é
curioso notar que, mesmo perdendo parte daquela aura de autoridade que esse
ensino sempre manteve tradicionalmente, trata-se ainda de um campo do
conhecimento vinculado ao poder, quer pelo modo autoritário com que é transmitido,
quer porque a sua transmissão tecnicista é, no fundo, uma transmissão da ideologia
dominante no campo político, social, econômico e cultural.
Vale ressaltar que uma das principais características do ensino superior é
justamente a capacidade de identificar as relações de poder estabelecidas com as
diversas formas do saber, constituindo-se também num instrumento de crítica e de
democratização dessas relações, especialmente no plano da universidade, pelas
óbvias vinculações que esta última mantém com os projetos políticos de
desenvolvimento e de democratização da sociedade.
Visivelmente ruim para a vida cultural das nações em estudo, e para o
exercício da cidadania em geral, é o notável despreparo dos bacharéis em Direito,
tanto no que se refere à formação científica ou teórica quanto no que diz respeito à
capacitação técnica e profissional, cada vez mais insuficiente, quer para o exercício
das atividades jurídicas tradicionais, quer para o cumprimento de novas funções
emergentes na sociedade moderna.
A indiferença social configura uma espécie de anomalia na atuação do jurista
que chega até mesmo a explicar, por exemplo, os protestos populares e a descrença
da população diante de certas atitudes ou omissões dos órgãos incumbidos da
aplicação do Direito, cujos integrantes frequentemente estão mais envolvidos com
questões corporativistas, na luta por conquista de privilégios funcionais e vantagens
remuneratórias, do que propriamente com as funções sociais das suas respectivas
carreiras.
No Brasil, as Constituições sempre garantiram a convivência da educação
privada com a pública. Contudo, existem semelhanças e diferenças entre esses dois
sistemas de ensino, especialmente no que se refere à quantidade de cada uma
delas, conforme Quadro 1.
39
Quadro 1 - Número de IES Públicas e Privadas no Brasil
Ano
Instituições Cursos Matrículas
Total Pública Privada Total Pública Privada Total Pública Privada
1996
922 211 711 6.644 2.978 3.666 1.868.529 735.427 1.133.102
2008
2.252 236 2.016 24.719 6.772 17.947 5.080.056 1.273.965 3.806.091
% 144,3% 11,8% 183,5% 272,0% 127,4% 389,6% 171,9% 73,2% 235,9%
Fonte: INEP, 1996 – 2008.
Cabe ao Estado avaliar as condições da proposta para a criação de um
estabelecimento privado de ensino, a partir da análise dos critérios estabelecidos
pelas normas administrativas que tratam o credenciamento dos cursos para poder
autorizar o início de suas atividades.
Das 2.281 instituições de ensino jurídico registradas pelo Censo de 2007,
2032 pertencem ao setor privado, ou seja, 89%. Embora o sistema seja submetido
ao controle do Estado para autorização, reconhecimento e renovação de curso e
autorização para expansão de vaga, há na verdade uma grande diferença entre o
desempenho desses mais de duas mil instituições. Observamos o Quadro 2:
Quadro 2 - Número de matrículas no curso de Direito em IES
Ano Total Públicas Privadas
1995
215.177 44.643 170.534
2003
508.424 60.000 448.424
2008
638.741 67.290 571.451
Fontes: Relatório do grupo MEC/OAB. Brasília, mar./2005 e INEP, 2008.
Um problema é o grande aumento de ofertas de cursos e vagas jurídicos, que
interfere no equilíbrio das relações sociais visto que a sociedade não tem como
absorver tão vasto exército de bacharéis de cursos jurídicos, mesmo que de
qualidade. Não se pode esquecer, todavia, que o Plano Nacional de Educação
(PNE), Lei nº 10.172 de 9/1/2001 (BRASIL, 2001), no que se refere à educação
superior, impôs como meta nº 1 prover, até o final dessa década, a oferta de
educação superior para pelo menos 30% da faixa etária de 18 a 24 anos.
O primeiro passo para a transformação dos currículos jurídicos é, justamente,
revelar que o Direito passa por uma transformação radical quanto aos seus
conteúdos. Nesse sentido, é preciso conscientizar-se de que o Direito não pode mais
pretender somente regular situações interpessoais, relações individuais entre "A
versus B", mas produzir normas que reflitam também interesses coletivos e difusos,
de natureza transindividual.
40
No que concerne à importância das disciplinas fundamentais e sua articulação
com a interdisciplinaridade, são precípuos os ensinamentos de Paulo Luiz Neto Lôbo
(1996):
A interdisciplinaridade, na dimensão externa ao saber dogmático
jurídico, enlaça-se com matérias que contribuem para a formação do
profissional de Direito, notadamente estimuladoras da reflexão crítica
e da atuação político-institucional, que a sociedade cada vez mais
dele reclama. Assim, a interessante abertura para as Ciências
Sociais, Humanas, Políticas, para a Filosofia, incluindo as
perspectivas lógica e ética, para a Psicologia, para a Informática, para
a Ciência da Linguagem. [...]
[...] O conteúdo mínimo é assim divido em três partes: a) a parte
fundamental e reflexivo-crítica; b) a parte profissionalizante ou
técnica-jurídica; c) a parte prática.
O curso jurídico, para bem desempenhar suas finalidades, deve
atingir, de modo interindependente, a tríplice função de: a) formação
fundamental e sócio-política, que forneça ao aluno uma sólida base
humanística e de capacitação crítica; b) formação técnico-jurídica,
que o capacite ao exercício competente de sua profissão
reconhecendo que as disciplinas dogmáticas admitem espaço à
reflexão crítica; c) formação prática, oferecendo-lhes os meios para
aplicar os conhecimentos obtidos (LÔBO, 1996: 10-11).
Acreditamos que é preciso conectar teoria à prática, a partir da leitura crítica
da lei, da doutrina e da jurisprudência; sobretudo do exercício responsável e
consciente do professor para o desenvolvimento intelectual, afetivo e profissional do
futuro bacharel.
A docência do ensino jurídico está tão centrada no professor, na
memorização acrítica de textos legais orientando o ensino, que a prática da
docência jurídica não considera a perspectiva humanista e solidária. Paulo Freire
(1996) ensina que:
O êxito de educadores está centrado nesta certeza que jamais os
deixa: de que é possível mudar, de que é preciso mudar, de que
preservar situações concretas de miséria é uma imoralidade. Pois não
somos apenas objeto da história, mas seu sujeito igualmente. No
mundo da História, da cultura, da política, constato não para me
adaptar, mas para mudar (FREIRE, 1996: 79).
Atualmente, a política de massificação do ensino jurídico consumou essa
tendência de privilegiar matérias e disciplinas tecnológicas nas grades curriculares
das faculdades de Direito, em detrimento daquelas que apresentam um conteúdo
mais reflexivo.
As diretrizes curriculares do curso de graduação em Direito estão definidas
pelo Conselho Nacional de Educação através da Resolução 9 (BRASIL, 2004). Logo
41
no seu art. 2.°, § 1.°, ela já define a estrutura do projeto pedagógico, que deverá
conter os seguintes elementos:
a) concepção e objetivos gerais do curso, contextualizado em relação
às suas inserções institucional, política, geográfica e social; b)
condições objetivas de oferta e a vocação do curso; c) cargas
horárias das atividades didáticas e da integralização do curso; d)
formas de realização da interdisciplinaridade; e) modos de integração
entre teoria e prática; f) formas de avaliação do ensino e da
aprendizagem; g) modos de integração entre graduação e pós-
graduação; h) incentivo à pesquisa e à extensão, como necessário
prolongamento da atividade de ensino e como instrumento para a
iniciação científica; i) concepção e composição das atividades de
estágio curricular supervisionado, suas diferentes formas de
realização, bem como a forma de implantação e a estrutura do Núcleo
de Prática Jurídica; j) concepção e composição das atividades
complementares; k) inclusão obrigatória do trabalho de curso
(BRASIL, 2004).
Esta Resolução propõe a busca de um perfil de bacharel com “sólida
formação geral, humanística e axiológica”, de tal maneira que o graduando em
Direito possa desenvolver uma capacidade valorativa dos fenômenos jurídicos e
também sociais, bem como a visão crítica e reflexiva, indispensável ao “exercício da
Ciência do Direito, da prestação da justiça e do desenvolvimento da cidadania” (art.
3.°).
O novo modelo de ensino jurídico, que combina a formação geral,
humanística, crítica e reflexiva com a formação profissionalizante e prática, é
expressamente previsto no art. 3.º, que assim dispõe:
O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do
graduando, sólida formação geral, humanística e axiológica,
capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia
jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos
fenômenos jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de
visão crítica que fomente a capacidade e a aptidão para a
aprendizagem autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício da
Ciência do Direito, da prestação da justiça e do desenvolvimento da
cidadania (BRASIL, 2004).
Todavia, a mera reforma curricular das faculdades de Direito no nosso País,
com propostas de grades que contemplem ao mesmo tempo as disciplinas
profissionalizantes e as fundamentais, por si só não basta para garantir padrões
minimamente aceitáveis de ensino jurídico em nível realmente superior, com
formação crítica, humanística e politizada do bacharel, a ponto de habilitá-lo a
reconhecer os novos problemas jurídicos, sociais e políticos que as sociedades
contemporâneas vêm enfrentando neste início do terceiro milênio.
42
Além da previsão de disciplinas que possam garantir um curso de qualidade
tanto do ponto de vista profissional quanto humanístico, deve-se definir o conteúdo
programático dessas disciplinas, a respectiva bibliografia e o perfil do corpo docente
que deverá lecioná-la, de modo que os objetivos pedagógicos do curso possam ser
efetivamente alcançados, como definidos nas orientações jurídicas atuais e que são,
em linhas gerais, a formação interdisciplinar, crítica, humanística, axiológica e
também profissionalizante do bacharel em Direito. Sem uma adequada fiscalização
institucional e estadual sobre os conteúdos das disciplinas, sobre a abordagem e a
didática desenvolvida pelo corpo docente, será muito difícil garantir a consecução
dos objetivos pedagógicos determinados pelas medidas públicas e privadas, pelo
plano de ensino e pelo currículo.
1.2 A busca por uma transformação no Ensino Jurídico
A grande transformação no ensino jurídico seria uma revolução, antes de
tudo, epistemológica, com a substituição dos paradigmas axiológicos do
normativismo positivista e a superação da metodologia de ensino centrada na
investigação lógico-formal do Direito positivo. Mas essa revolução não se faz
simplesmente por intermédio da mudança na grade curricular, muito menos no
espaço do ensino privado. Segundo Daniel Pereira Militão da Silva (2009):
A mentalidade predominante ao longo da maior parte do tempo, no
âmbito do ensino jurídico, bem como os conteúdos oferecidos para a
formação do jurista brasileiro, acabou por refletir um ideário calcado
no individualismo e na resolução de conflitos com contornos apenas
individuais, dispensando-se pouca atenção ao caráter coletivo das
demandas (SILVA, 2009: 109).
As possibilidades de mudança repousam no espaço da universidade com
consequências político-sociais, assumindo seu papel estratégico no
desenvolvimento nacional, com a implementação de um ensino jurídico de qualidade
e comprometido com a construção de uma sociedade efetivamente justa, solidária e
democrática. Segundo o professor Marco Antonio Rodrigues Dias Sobrinho (2003):
43
Em realidade o que debateram foi a decisão que havia sido tomada
pelos governos de diversos países oito anos antes, em abril de 1994,
poucos meses antes da criação da OMC (janeiro de 1995), aprovando
o Acordo Geral sobre Comércio e Serviços (AGCS) que tem por
objetivo a liberalização do comércio de todo tipo de serviço. O acordo
prevê uma única exceção: estarão fora da área dos serviços
comerciais regulamentados pela OMC aqueles que forem fornecidos
no exercício da autoridade governamental. Tal dispositivo levou vários
analistas a imediatamente concluírem que as universidades públicas
não seriam atingidas por estas regras por se situarem entre os
serviços dependentes da autoridade governamental. Esses analistas
não perceberam, ou não leram, ou fingiram que não compreenderam
que este dispositivo tinha um complemento segundo o qual os
serviços governamentais estão fora da OMC desde que não sejam
fornecidos numa base comercial, nem permitam a competição com
um ou mais provedores de serviços.
É este dispositivo que levou funcionários da OMC, em setembro de
1998, por meio de um documento então considerado restrito (WTO
1998 Council for Trade Services Background Note by the Secretariat -
SCW49, 23/9/98), a defender a tese em realidade um grande sofisma
segundo a qual, desde que permita a existência de provedores
privados na educação, os governos aceitam o princípio de que a
educação, e em particular a educação superior, pode ser tratada
como serviço comercial e, em conseqüência, deve ser regulamentada
no quadro da OMC. Trata-se de uma interpretação abusiva de um
dispositivo talvez propositadamente redigido de forma ambígua.
Ainda que se trate de um bem público, em termos jurídicos, os
governos soberanamente têm o Direito de delegar as funções que lhe
correspondem, a instituições da sociedade civil, tudo dentro de
normas e leis, base de um sistema de concessão, delegação ou
autorização, normalmente submetido a controles rígidos pela
legislação da maioria dos países (DIAS SOBRINHO, 2003: 817).
A Organização Mundial do Comércio (OMC) patrocinou um Acordo Geral para
o Comércio de Serviços em que a educação deixa de ser Direito básico para se
transformar em simples serviço, tratado como mercadoria lucrativa.
A educação passa da esfera política dos Direitos para a esfera do mercado.
Conclui-se daí que há mesmo uma verdadeira “campanha na OMC pela privatização
do ensino em nível mundial”. É evidente que essa tendência privatizante do ensino
em geral, e do ensino superior na universidade, obedece aos interesses da ideologia
neoliberal, o que implica o enfraquecimento (senão o completo desaparecimento) da
universidade pública.
No caso do Brasil, a expansão do ensino privado, em detrimento da rede
pública, teve início mesmo antes da proclamação da República, com a reforma de
1879, que instituiu o chamado “ensino livre”.
Como ressalta Chauí (1999):
44
A reforma do Estado tem um pressuposto ideológico básico: o
mercado é portanto de racionalidade sócio-política e agente principal
do bem estar da república. Esse pressuposto leva a colocar Direitos
sociais (como a saúde, a educação e a cultura) no setor de serviços
definidos pelo mercado. Dessa maneira, a Reforma encolhe o espaço
público democrático de Direitos e amplia o espaço privado não só ali
onde seria previsível – nas atividades ligadas à produção econômica-,
mas também onde não é admissível – no campo dos Direitos sociais
conquistados (CHAUÍ, 1999: 3).
Como resultado dessa política, o ensino superior privado teve facilitado o seu
crescimento a um ritmo acelerado, ao mesmo tempo em que se reduziram
drasticamente os recursos para a expansão e manutenção das instituições de
ensino superior públicas (AMARAL, 2003).
A intensa privatização do sistema universitário e a sua inevitável
mercantilização situam-se dentro dos marcos do neoliberalismo, tão bem definidos
pelo chamado Consenso de Washington, que propõe um programa de ajustes para
os países em desenvolvimento, especialmente os da América Latina, com a
implementação de uma forte disciplina fiscal, reforma tributária, liberalização do setor
financeiro e comercial, câmbio competitivo, desregulamentação da economia e, por
fim, privatização do setor público.
Esse projeto neoliberal propõe uma espécie de “ênfase economicista na
educação”, uma vez que esta deve servir apenas ao desempenho do mercado e
potencializar o crescimento econômico, baseando-se numa lógica de destruição dos
Direitos, no caso o Direito à educação, e imposição de uma lógica essencialmente
mercantilista.
Essa universidade, com todos esses compromissos sociais, científicos e
políticos, com ensino de qualidade e gratuito, acessível a todos os brasileiros,
voltada para os projetos nacionais e para as necessidades legítimas da população, é
o que se pode chamar de universidade verdadeiramente republicana.
Nas universidades, nesse contexto, não tem conseguido contribuir para essa
articulação. Isso talvez seja a expressão mais enfática de sua crise, obrigando-a a
refletir sobre a sua própria efetividade social e a buscar respostas para as questões
básicas relacionadas à sua identidade e ao papel social que deseja desempenhar.
Há um evidente descompasso entre a universidade e a realidade social
brasileira. De um lado, porque a universidade não tem assumido seu papel de
45
agente estratégico do desenvolvimento nacional; de outro, porque também não tem
contribuído para a crítica acerca dos modelos de desenvolvimento até hoje
implementados de forma autoritária no País.
Se a expansão do ensino superior se verifica apenas no setor privado e se a
capacidade de financiamento dos próprios estudos é cada vez mais escassa por
parte da população brasileira, haja vista os percentuais de vagas ociosas na
universidade privada, será lícito concluir que esse nível de exclusão da população
em idade universitária continuará se aprofundando, consolidando assim o sistema
antidemocrático de acesso ao ensino superior no País.
Qual, então, a influência que esse modelo de universidade, voltada apenas
para os apelos do mercado e para a formação, sem conteúdo crítico-humanístico,
poderia ter na formação jurídico-cultural dos bacharéis em Direito e, por
consequência, também na sua atuação, considerando-se ainda a influência de uma
ideologia jurídica liberal individualista?
A ação da indústria cultural se faz sentir também no campo do Direito com
implicações tanto na produção do saber quanto na formação cultural do bacharel em
Direito. Há ainda outro aspecto dessa indústria cultural que se infiltrou no campo do
ensino jurídico: os inúmeros eventos culturais e supostamente científicos realizados
na área do Direito, muitas vezes até mesmo por intermédio de empresas
especializadas na promoção de eventos de qualquer natureza, inclusive recreativa e
empresarial. O sucesso desses eventos jurídicos, que se proliferaram de forma
sintomática, é geralmente avaliado pelo aspecto quantitativo de público e,
consequentemente, pelo potencial de lucro ou de retorno financeiro que possam
representar.
Acrescente-se que a seleção para as carreiras jurídicas (advocacia,
promotoria, magistratura, procuradorias, polícia, dentre outras), realizada com base
estritamente no conhecimento dogmático da legislação em vigor e da prática
forense, propiciou o surgimento e a proliferação de “cursos preparatórios”,
destinados ao treinamento dos candidatos àquelas carreiras em que a “preparação”,
mais uma vez orientada pelo lucro e pelas exigências do mercado, realiza-se apenas
por meio de uma intensa bateria de informações acríticas sobre a legislação vigente,
como se o candidato fosse um receptáculo de leis e de decisões jurisprudenciais,
46
acirrando de modo perverso os seus desvios formalistas.
O Direito tem enfrentado, tanto no plano histórico quanto no epistemológico, o
fenômeno da emergência dos chamados “novos Direitos” ou “Direitos de nova
geração”, exigindo por parte dos operadores da ciência jurídica ampla reflexão
acerca da natureza de tais Direitos, de suas perspectivas claramente publicísticas e
interdisciplinares, bem como de todo o antigo arsenal de conceitos e institutos por
meio dos quais o jurista vinha compreendendo até aqui o fenômeno jurídico.
Isso significa que o futuro do Direito parece projetar-se na direção de uma
dimensão pública e transindividual. A emergência em profusão dos Direitos difusos,
coletivos e sociais, no final do século XX e início do século XXI, é a prova mais
evidente de que o Direito, que no seu nascedouro e nas suas raízes romanísticas
surgiu com caráter exclusivamente privado, caminha hoje a passos largos para a sua
decidida publicização.
Até mesmo o Direito privado vem estabelecendo cada vez mais intensa
interdisciplinaridade com os diversos ramos do Direito público. Haja vista, por
exemplo, que já não se concebe mais o Direito de propriedade e as relações
decorrentes do contrato, tradicionalmente privados, sem a inafastável função social
de ambos. Daí falar-se numa espécie de “constitucionalização” do Direito civil.
Portanto, a formação do jurista, para estabelecer uma adequada sintonia com
os novos rumos do Direito, vai exigir um ethos cultural claramente interdisciplinar, a
partir de certa ênfase no ensino e na prática dos Direitos de nova geração, com o
estudo também de todas as dimensões sociais, políticas, econômicas e culturais que
esses Direitos encerram naturalmente.
(...) os mecanismos de sistemas racionais de poder, estruturante
imposto pela modernidade, e têm como fundamento a iniqüidade e a
adaptação cultural de indivíduos à ordem econômica verdadeira
indústria do saber e à tendência não menos ambígua da (des)
escolarização (CASALI, 1997A: 21).
No século XXI, quando os chamados conflitos de massa, em torno, por
exemplo, de questões agrárias, ambientais, urbanísticas, de cidadania e do
consumidor, estão a exigir soluções adequadas e consequentes, impõe-se à cultura
jurídica a necessidade de proporcionar uma formação interdisciplinar e humanística
aos bacharéis em Direito, por intermédio de uma ciência verdadeiramente capaz de
47
compreender os novos rumos da realidade, compreendendo também a necessidade
de construir uma sociedade assentada em valores humanos autênticos.
Assim, a formação do profissional do Direito, atualmente, deve levar em conta
a necessidade de compreender adequadamente a emergência dos chamados novos
Direitos, bem como a necessidade de compreender o contexto histórico em que
esses Direitos vão surgindo. A compreensão dessa realidade é necessariamente um
trabalho interdisciplinar, que supõe a análise de fenômenos tais como o problema da
globalização, da cidadania, dos Direitos humanos, do acesso à justiça, do meio
ambiente, da questão agrária, do princípio da legalidade, das relações de trabalho,
da dignidade humana, da bioética, do urbanismo, da democracia, dentre outros.
O eixo temático da nova cultura jurídica deve mesmo direcionar-se para o
ensino do Direito nas suas dimensões transindividuais, sempre com o propósito de
investigar o fenômeno jurídico não apenas como técnica supostamente neutra de
decisão, mas, sobretudo, como instrumento que estabelece íntima interlocução com
a ética, na perspectiva emancipatória de um Direito comprometido com as questões
fundamentais da política.
Essas abordagens requerem uma metodologia transdisciplinar de estilo
dialético, capaz de proporcionar a apreensão do fenômeno jurídico na sua dinâmica
histórica, como autêntico “vir-a-ser” dentro do processo histórico. Portanto, urge uma
metodologia capaz de compreender o Direito dentro de uma totalidade histórica, com
suas contradições, visando à superação delas e à construção de realidades jurídicas
eticamente sustentáveis.
Uma vez fracassada a promessa emancipatória do Direito na modernidade,
com a predominância do seu aspecto meramente regulador, impõe-se cada vez mais
a necessidade de repensar a metodologia jurídica e o próprio Direito, entendido
agora como instrumento da promoção e da emancipação humanas, e não
propriamente como instrumento de controle, repressão e manutenção do status quo
vigente.
48
1.3 O futuro do Ensino Jurídico e a mudança social
O futuro do Direito parece residir no seu caráter crescentemente público,
transindividual, bem como numa pedagogia de ensino jurídico que seja
interdisciplinar e dialética. O futuro do jurista está na capacidade que tiver para
exercer tecnicamente a profissão e, ao mesmo tempo, exercitar a cidadania pelo
compromisso de interpretar e aplicar o Direito sem desvinculá-lo de suas finalidades
ético-políticas. Segundo Casali (1997): “É preciso desconstruir todo esse moderno
jeito do sistema educativo e corrigir sua tendência patológica de colocar-se a serviço
de interesses puramente econômicos; socialmente excludentes (CASALI, 1997A:
21).
É necessário que o Direito, a sua ciência e os seus operadores estejam
preparados para o enfrentamento de uma realidade que põe não apenas os desafios
próprios das profissões jurídicas no plano técnico profissional, mas também os
desafios de efetivação dos valores da democracia e da justiça social, indispensáveis
à construção de um autêntico Estado Democrático de Direito e de uma sociedade
sustentada em bases minimamente éticas.
Os Direitos difusos e sociais, como expressão de reivindicações populares,
alavancados por organismos da sociedade civil, tais como sindicatos, associações
de bairros, associações culturais e estudantis, ONGs e até partidos políticos,
atuando articuladamente com os profissionais do Direito, conferiram a estes certo
papel político, muitas vezes com funções de defesa e de representação da
sociedade democrática.
Ao abordar a problemática dos movimentos sociais e o seu poder, temos que
um novo espectro ameaça o mundo do capitalismo avançado, já em crise. E todos
esses movimentos têm reconhecido no Direito e no jurista verdadeiros aliados na
luta pela democracia. É justamente a partir dessa aliança que já se prevê certo
comprometimento ético do jurista com a construção de uma realidade política, social
e econômica moralmente sustentável, capaz de permitir também a plena realização
de todas as dimensões éticas do Direito.
Os juristas, instigados por uma legislação de novo perfil e por novas
demandas da sociedade, poderão protagonizar algumas mudanças sociais, por meio
49
do Direito, fazendo deste não apenas um instrumento repressivo, mas, sobretudo,
transformador de relações sociais superadas e incompatíveis com a realidade atual.
Para Gaudêcio Frigotto (1997: 147), se o objetivo for a melhoria da qualidade
do ensino brasileiro, precisa-se acabar com a subserviência das diretrizes e da
política educacional aos interesses do Banco Mundial, que reduz o problema da
aprendizagem exclusivamente à condensação de modernos conhecimentos
tecnológicos, como tele-educação, parabólicas, multimídia e outros. Sem dúvida, tais
meios são importantíssimos enquanto mecanismos de auxílio aos sistemas clássicos
de escolas, com professores qualificados, bem remunerados e com condições
adequadas para estabelecer a ponte entre os sujeitos e o conhecimento científico,
no intuito de socializá-lo e ampliá-lo.
Na efetivação dessa realidade, será necessário romper com esse sistema
econômico, político, ideológico e social de desigualdades e injustiça que vem
perpetuando-se, romper com uma cultura profundamente excludente, escravocrata e
elitista, para efetivar-se um sistema político, ético, efetivamente democrático onde
sejam assegurados não só os Direitos civis, mas principalmente os Direitos sociais.
Não se pode construir uma escola democrática e um ambiente de aprendizagem de
qualidade, se a sociedade na qual estão inseridos não possuir as mesmas
condições objetivas.
A mudança social é um dos fenômenos que a sociologia tem abordado pelos
mais diferentes aspectos. A sociologia moderna, com todos os seus atributos de
cientificidade, admite que a ideia de mudança é mesmo inerente aos sistemas
sociais e que as suas causas podem ser endógenas, exógenas e até mesmo mistas.
Além disso, os sociólogos vêm catalogando os mais diferentes tipos de mudança,
como a mudança evolutiva, a cíclica, a linear, a contínua ou descontínua, entre
outras.
Há um consenso no sentido de que a mudança social é um fenômeno
complexo. A ideia de mudança social encerra em si as possibilidades de
transformação das relações entre os homens, nos seus aspectos políticos,
econômicos, culturais, morais e até mesmo afetivos, em busca de novas formas de
socialização que representem verdadeira ruptura com as formas vigentes, mudando-
lhes a natureza.
50
A noção de mudança social sempre colocará também a ideia de revolução
social, que supõe não só uma transformação no modo de produção econômica e,
consequentemente, no sistema político, mas também o conceito de reforma, em que
as relações sociais assumem padrões diferentes dos tradicionais, porém sem a
radical transformação dos sistemas políticos e econômicos.
Vale dizer, trata-se de uma hermenêutica comprometida com a inclusão
social, em que o intérprete/aplicador, diante da vagueza, ambiguidade e
contradições do sistema jurídico (as chamadas “brechas” da lei), opta sempre pelo
sentido da lei que mais atende aos fins sociais, ao bem comum (art. 5° da Lei de
Introdução ao Código Civil) e aos legítimos interesses da maioria. Trata-se, na
verdade, de explorar o caráter polissêmico dos vocábulos que compõem o texto
legal, com a finalidade de se obter a decisão mais adequada a uma aplicação
democrática do Direito. É exatamente sob esse aspecto que Boaventura de Souza
Santos fala, sugestivamente, num “uso não burguês do Direito burguês” (SANTOS,
2002).
Nesse caso, para além de simples instrumento de controle, repressão e
manutenção do status quo, o Direito poderia funcionar como mecanismo de direção
e promoção social, impulsionando as mudanças que poderiam significar, no limite,
um conjunto de medidas contrárias à lógica da ordem vigente, de verdadeiro
confronto com os valores, ou com os padrões de relações sociais típicas de uma
sociedade capitalista, como é o caso, por exemplo, do uso do Direito para a inclusão
social, para garantir a autonomia dos trabalhadores, para a distribuição de renda e
de Direitos básicos.
Não é inteiramente estranha aos juristas a ideia de que o Direito possa vir a
ter uma função transformadora, de mudança social, sobretudo naquelas sociedades
cujos padrões de socialização já revelam sinais de esgotamento, quer pelo grau
elevadíssimo de exclusão, miséria e pobreza, quer pelos desníveis estabelecidos
entre os estratos sociais incluídos no processo de participação política e econômica,
numa evidente demonstração de que tais padrões já atingiram patamares extremos
de injustiça, incompatíveis com a própria ideia de Direito. É o que efetivamente
acontece nas sociedades em desenvolvimento, como as sociedades dos países
51
periféricos, em que o grau de injustiça social desvela todos os aspectos de crise do
Direito.
Uma democracia efetiva, que signifique a realização concreta do ideal de
igualdade, não pode permanecer isonômica apenas no plano formal de suas
instituições jurídico-políticas. É necessário que o princípio democrático, expresso
formalmente pelo aparato institucional, tenha plena correspondência na base
material da sociedade. Ou seja, as estruturas jurídicas precisam ter operatividade
suficiente para conduzir a sociedade a níveis reais de igualdade social, econômica e
cultural. Caso contrário, as estruturas formais podem perder legitimidade e acabam
até mesmo se descaracterizando como ideal democrático.
Nos países emergentes, como é o caso do Brasil e de toda a América Latina,
o desafio é conciliar os níveis de liberdade política e jurídica já conquistados no
plano formal, após as ditaduras militares, com níveis correspondentes de igualdade
socioeconômica no plano substancial. Por isso, o Direito, as instituições jurídicas e
os aplicadores de ambos, incumbidos da defesa do regime democrático concreto e
efetivo, não apenas formal e abstrato, somente poderão cumprir sua missão
constitucional se puderem aprofundar, simultaneamente, a defesa da legalidade, a
participação popular e a igualdade socioeconômica no âmbito da sociedade civil.
Com efeito, a Constituição brasileira de 1988, ao refundar a República do
Brasil, fê-lo a partir dos ideais do Estado Democrático de Direito, baseado na
soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana e no valor social do
trabalho com livre iniciativa, estabelecendo, ainda, uma forma de democracia
participante, em que o poder é exercido pelo povo por meio de seus representantes
ou diretamente por meio de canais próprios (art. 1.°, § único, BRASIL,1988). Além
disso, a Carta Constitucional instituiu entre os objetivos da República a construção
de uma sociedade livre, justa e solidária; o desenvolvimento nacional; a erradicação
da pobreza e da marginalização, bem como a erradicação das desigualdades sociais
e regionais; a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 30, BRASIL, 1988).
Assim, ao instituir tais objetivos, a Carta Magna brasileira traçou também os
paradigmas de atuação das instituições jurídicas, para defender o regime
democrático. Com isso, definiu para o Direito e seus aplicadores os mesmos
52
princípios de defesa da legalidade, da justiça social e da participação política,
indispensáveis à construção de uma sociedade efetivamente democrática e de um
autêntico Estado Democrático de Direito.
As expectativas de mudança, tanto no Direito quanto no perfil do jurista e
também nas relações sociais, suscitadas pela nova ordem constitucional e por uma
legalidade de acentuada dimensão política, são semelhantes às expectativas que
outras determinações históricas também geraram em relação ao Direito e aos
bacharéis, como, por exemplo, a independência do Brasil, a proclamação da
República, a revolução capitalista de 30, o desenvolvimentismo de 50, o regime
burocrático-militar de 64, que, na verdade, acabaram por efetivar importantes
mudanças sociais no País, acompanhadas de notória reconfiguração do Direito e
das profissões jurídicas.
A prática pedagógica encontra-se centrada exclusivamente no método lógico-
formal, que proporciona ao bacharel em Direito um conhecimento meramente
descritivo, e não especulativo ou crítico-reflexivo, da ordem jurídica. Ora, a
apreensão do fenômeno jurídico segundo um método lógico-formal e a prática legal
transmitida por essa didática gravitam apenas em torno do problema da
decidibilidade e concebem o Direito, ou a dogmática jurídica, como mero instrumento
de controle e organização, bloqueando, por conseguinte, qualquer concepção do
Direito e da dogmática jurídica como instrumentos de promoção ou de mudança
social.
De modo que, uma vez reduzido o saber jurídico à técnica de interpretar
normas (hermenêutica) e de eliminar conflitos (decisões), para garantir a
funcionalidade da dogmática jurídica, qualquer tendência de enxergar no Direito um
instrumento de mudança, ou mesmo um parâmetro de justiça social, será tida como
verdadeira disfunção da dogmática, que, dessa forma, ficaria ameaçada nos seus
objetivos de controle e manutenção do equilíbrio nas relações sociais.
Essas questões, somadas à massificação do ensino jurídico e ao modelo
didático-pedagógico autoritário e unidirecional adotado pelo ensino brasileiro, e em
praticamente todo o mundo do Direito ocidental, conduzem a uma formação do
jurista semelhante àquela que Herbert Marcuse (1964) teria chamado de formação
unidimensional, quando analisou o pensamento e a cultura do homem moderno,
53
incapaz de negar o positivo e de criticar as estruturas da sociedade. Somente uma
abordagem crítica da realidade poderia proporcionar o reconhecimento dos
contornos dessa crise. E é justamente essa abordagem crítica que permitiu
visualizar o fato de todo evidente – ocultado pelo pensamento jurídico liberal – de
que o Direito é uma instância ideológica, na medida em que o sistema normativo,
bem como sua interpretação e aplicação, surgem condicionados pelos interesses
classísticos predominantes dentro do sistema socioeconômico e político vigente.
A neutralidade política sempre foi sustentada com especial ênfase porque a
função tradicional dos operadores do Direito, via de regra, consistia na de fiscais da
lei, ou custos legis, necessariamente imparciais, fortemente apegados aos
parâmetros de legalidade objetivados na norma jurídica. A esse operador do Direito,
fiscal da lei por definição, não seria permitido nenhum tipo de questionamento sobre
a legitimidade do poder normativo, representado pelo Estado liberal, ainda que nas
estruturas desse Estado, sem falar no seu uso patrimonialista, predominassem os
interesses socioeconômicos das classes hegemônicas que detêm a direção material
e cultural da sociedade.
Estudar o ensino, seja do Direito, seja de qualquer área do saber, exige,
primeiramente, a compreensão de que ensinar deve ser uma via de mão dupla; uma
necessária interação entre docentes e discentes, visando à construção do
conhecimento, do olhar crítico e investigativo da sociedade e, prioritariamente, das
bases de uma cidadania ativa. Ou, ainda que não se atinjam todos esses objetivos,
o ensino deve ser, no mínimo, uma experiência mútua de aprendizado, valorização
do outro e de comunicação.
Escolhida essa concepção de ensino como meta – como ele deve ser –, cabe,
em seguida, evidenciar o ensino do Direito como ele hoje está, em termos de um
diagnóstico do tempo presente, para identificar o que, nesse estado atual, está
impedindo-o de se orientar em relação à sua meta e o que se pode fazer para liberar
essa orientação.
Se fosse possível resumir os 183 anos de ensino jurídico no Brasil em uma só
palavra, esta seria unilateralidade. Algumas imagens podem ressaltar a marca dessa
orientação: a transferência unilateral de informações e de concepções de mundo (a
qual Paulo Freire sintetizou no chamado ensino bancário), a desigualdade da
54
relação instituição-aluno, a composição escolástica de sala de aula, o centramento
na figura do professor, a aceitação passiva do argumento de autoridade, a
memorização de textos normativos e a mimetização de comentários de antigos
jurisconsultos (BITTAR, 2006: 377).
Tem-se, em suma, o discurso da palavra oca, ao qual se referia o educador
Paulo Freire (2000), graduado em Direito, quando ensinava:
Cada vez mais nos convencemos, aliás, de se encontrarem na nossa
inexperiência democrática as raízes deste nosso gosto da palavra
oca. Do torneio do verbo. Da ênfase nos discursos. É que toda esta
manifestação oratória, quase sempre também sem profundidade,
revela, antes de tudo, uma atitude mental. Revela ausência de
permeabilidade característica da consciência crítica. E é
precisamente a criticidade a nota fundamental da mentalidade
democrática (FREIRE, 2000: 103).
O quadro é potencializado pela postura docente de representante do poder,
por uma formação distante da compreensão de certa perversidade por trás de uma
“posição doutrinária” e por um perfil curricular que se estabelece em conteúdos
estanques. Abre caminho para as peripécias do caráter linguístico do Direito, cujo
desvelar ainda não se anunciou na maior parte das escolas jurídicas brasileiras e
cujo debate nos faz passar para o próximo ponto. Na mesma direção, completa
Ferraz Junior (1973):
(A doutrina jurídica) costuma ver a norma como um imperativo
acabado e dado antes do caso concreto ao qual ela se aplica. Daí a
tendência em confundir o texto da norma com a própria norma ou,
pelo menos, a tendência em admitir que a palavra da norma exprime
basicamente, de modo suficiente e adequado, a sua validez (FERRAZ
JUNIOR, 1973: 105).
Ao personificar esse discurso, num contexto de acriticidade discente e
desestímulo às investigações no campo da teoria geral do Direito, incluindo a
necessária atenção ao caráter interdisciplinar da referida ciência, o docente, na sala
de aula, contribui para a sedimentação desse conjunto de valores que expressam
opções ideológicas no âmbito dos estudantes. Alimenta, com isso, toda uma cultura,
que se eterniza e, do primeiro ao décimo semestre, vai moldando a personalidade do
bacharel.
Na prática, porém, a objetificação de pessoas em coisas e a compreensão
isolada dos fenômenos sociais ainda são correntes no ensino jurídico. Esse é um
primeiro passo necessário. Ao afirmar a importância de um ensino do Direito
55
dialógico, é impossível se esquecer do papel e da função social do bacharel em
Direito, que deve ser sistematicamente reiterado e cunhado nas salas de aula.
Um ponto de partida passa pela revisão do perfil de docente que se tem, e
que é diretamente responsável pelo perfil do estudante de Direito. Trata-se de uma
decisão institucional e política, que influencia no perfil do próprio curso e do
ingressante que se quer. Ainda que se argumente que pesquisa, produção e
titulação sejam perfumarias numa área em que predomina a exigência do
conhecimento técnico dirigido ao mercado, o caminho está aberto, e não o seguir é
permanecer na contramão da evolução do pensamento crítico do Direito.
Juliana Ferrari Oliveira (2010) traz à tona a trajetória de formação dos
professores do Ensino Superior. A legislação atual, por força do art. 66, da Lei
Federal nº. 9.394/96, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), prevê
que os professores do magistério superior no Brasil terão sua formação na pós-
graduação, “prioritariamente em programas de mestrado e doutorado” (BRASIL,
1996). Entretanto, apesar de a legislação prever que o professor que busca a pós-
graduação está apto a lecionar no ensino superior, a norma não orienta como será
feita a formação docente. “No que tange à legislação, esta não é precisa quanto à
formação pedagógica de mestres e doutores; as universidades fazem o que julgarem
melhor” (VAZ DE MELLO, 2002: 13).
Deve haver a consolidação e, sobretudo, o cumprimento de projetos
pedagógicos que foquem na formação interdisciplinar, plural e crítica e equilibrem a
exigência de um aprofundamento acadêmico, por meio da pesquisa científica, com o
conhecimento técnico necessário a quem se decidir pelo caminho de ser um
operário do Direito, cuja importância não se pode afastar. Porém, mesmo esse
operário não pode ter à sua disposição somente um saber acrítico, dogmático,
positivista, centrado no conhecimento gramatical da norma e na hermenêutica que
remete ao paradigma da filosofia da consciência; deve ser capaz de compreender a
norma criticamente
1
e manejá-la a partir de fundamentos éticos árdua e
filosoficamente trabalhados.
1
A exigência de uma cultura dialógica do ensino do Direito passa pela crítica de que “em Faculdades de Direito,
acadêmicos são treinados para o uso estratégico da linguagem (...) como mecanismo de sedução, indução a erro,
manipulação, constrangimento pela força do argumento ou pela capacidade de influenciação”( BITTAR, 2001:
35).
56
A primeira implicação que se verifica é a manutenção do estado de
consciência que impede o crescimento do número de programas de pós-graduação
stricto sensu em Direito. Dentre o universo dos mais de dois mil cursos de Direito
aprovados no País, somente sessenta e sete deles mantêm programas de pós-
graduação stricto sensu, ou seja, menos de 3% do total de cursos existentes, o que
denota não apenas a falta de estrutura para oferecê-los como também a falta de
interesse nessa estruturação.
Contudo, a responsabilidade não pode ser atribuída simplesmente à opção
profissional individual, que, qual seja, também se enriquece com os estudos dirigidos
e sistemáticos da pós-graduação, mas também, e principalmente, à faculdade, que
não consegue mostrar aos alunos a relevância da pesquisa acadêmica de boa
qualidade e como ela pode ser útil até mesmo no exercício da profissão. É muito
comum que um aluno que passou cinco anos frequentando diariamente a faculdade
e, portanto, o ambiente acadêmico, se forme sem ter noção do que seja pesquisa.
Ou então que saia da faculdade achando que pesquisa se resume a procurar
jurisprudência para fundamentar pareceres e petições.
No que tange à questão do acesso à pós-graduação, nas faculdades que
mantêm programas de mestrado e doutorado, muitas vezes, este é o caminho
natural do aluno que termina a graduação. No entanto, não têm a mesma sorte
aqueles que estudaram em faculdades que não possuem um programa de pós-
graduação na modalidade stricto sensu. Visto que se a faculdade não possui, já na
graduação, tradição em pesquisa, é impossível cogitar a pesquisa em âmbito de
pós-graduação. E, nesse último caso, inclusive o acesso à informação necessária
para que o estudante saiba o que significa a “pós-graduação” e até mesmo para que
possa participar dos processos seletivos existentes é muito difícil.
Além disso, a não realização de pesquisa na modalidade de iniciação cien-
tífica durante a graduação pode ser um fator que impeça ou dificulte o acesso à pós-
graduação, especialmente se existir a pretensão de financiamento da pesquisa por
agências de fomento, que preferem sempre os alunos já acostumados a manusear o
ferramental metodológico que a pesquisa séria exige.
Para transformar esse cenário, é fundamental uma ruptura que resulte na
transformação de consciência por parte não apenas do corpo administrativo das
57
faculdades, mas da integralidade do corpo docente. O exclusivismo da sala de aula,
visão que impera em muitas faculdades e se coaduna com o positivismo jurídico que
ainda prevalece no exercício da atividade jurídica e, consequentemente, no modo
como se ensina esse Direito, faz com que qualquer atividade realizada além dos
limites da sala de aula seja vista com descrédito.
Essa mentalidade equivocada, ou então aquela que “forma profissionais para
o mercado de trabalho” – e implica, por exemplo, a criação de “mestrados
profissionais” e a predominância das especializações em vez de programas de pós-
graduação stricto sensu – impede que a pesquisa em Direito se consolide no Brasil.
Para mudar esse quadro, é preciso que se ofereça, desde a graduação,
oportunidade de pesquisa a todos os interessados, permitindo-se a descoberta e o
desenvolvimento de talentos como pesquisadores e professores.
É fundamental que todos aqueles que se formem em Direito estejam cientes
de seu papel social, e a habilidade em pesquisa traz contribuições inestimáveis
nesse sentido. Assim, não se pretende que todos os graduados em Direito saiam da
faculdade pesquisadores, pessoas comprometidas com o universo acadêmico, mas,
ao menos, comprometidas com a função social da atividade profissional que
escolheram e conscientes do quanto a pesquisa pode auxiliá-los.
A prática tem papel fundamental na formação do estudante de Direito.
Adquire-se um aprendizado complementar, possibilitando ao aluno muito mais do
que praticar o que lhe foi passado na faculdade. Para se alcançar uma sociedade
mais justa, teoria e prática devem estar articuladas, ainda mais no campo jurídico,
diretamente relacionado com o aspecto social e, portanto, com a efetivação das suas
formulações. João Mendes de Almeida Júnior (1972) escreve:
Teoria é o conjunto de princípios, de regras, de leis científicas, de
conceitos, que descrevem e explicam um certo conjunto de fatos, que
fundamentam uma atividade, uma arte, e que lhe determinam a
prática. (...) prática diz respeito à ação, à aplicação de regras ou
princípios de uma ciência ou de uma arte. Praticar é realizar, aplicar
regras teóricas, exercitar. Os significados das palavras teoria e prática
demonstram que uma não sobrevive sem a outra (ALMEIDA JÚNIOR,
1972: 174).
Acreditamos que as diretrizes da Resolução 9 de 2004 (BRASIL, 2004)
buscam conferir o acesso à justiça a todos os cidadãos, por meio de uma prática que
possibilita a construção do ensino jurídico voltado as demandas sociais e por isso,
58
numa perspectiva não apenas técnica, mas humanista e solidária. O aspecto mais
relevante da atividade de estágio é o contato do estudante de Direito com a
sociedade e seus anseios, com os profissionais e com questões como ética
profissional e construção de cidadania.
Para João Mendes de Almeida Júnior (1972):
(...) a grande maioria [dos alunos que ingressam num curso de
graduação] é absolutamente despreparada, desmotivada e
desprovida de conhecimento, mesmo aqueles mais básicos.
Trabalhar a teoria com alunos desse nível é extremamente difícil.
Articulá-la com a prática não é tarefa penosa, é muito mais que isso.
Trata-se, na verdade, de missão desanimadora (ALMEIDA JÚNIOR,
1972: 175).
Em algumas faculdades, o estudante nem precisa buscar a experiência
profissional no mercado de trabalho. Não precisa aprender como procurar emprego,
como falar com as pessoas, como fazer pesquisa, peças de Direito, atendimento ao
público. O que algumas faculdades exigem é o cumprimento do crédito da disciplina
“estágio supervisionado” mediante confecção de peças jurídicas a serem entregues
para um professor que, na maioria das vezes, já indicou a posição que quer que
seus alunos adotem diante do problema proposto e corrigirá o conteúdo jurídico do
trabalho, limitando-se a isso.
Devemos regulamentar também a formação fora dos muros da universidade,
onde profissionais que atuam no mercado de trabalho recebem estudantes como
estagiários. Parece que o estágio não tem cumprido seu papel, tendo em vista que
estudantes têm sido cada vez mais contratados para desempenhar serviços
burocráticos que nem exigem conhecimentos técnicos da área jurídica. Afinal, a
aprendizagem também ocorre em outros espaços que não a universidade.
O estudante deixa de ter um contato com a prática, para que lhe seja
conferida a oportunidade de errar. O Direito trabalha com seres humanos, e qualquer
erro do profissional pode ter grandes implicações na vida de alguém. Assim, é
preciso que o futuro advogado, juiz, desembargador, promotor entre outros adquira,
ainda na graduação, valores éticos/morais e noções básicas de prática profissional,
que lhe permitam exercer corretamente a profissão que escolheu. A consciência
desse papel deve estar na rotina do profissional do Direito e não é só na sala de
aula que se aprende isso.
59
(...) as ciências jurídicas, em seu grande número, são ciências
aplicadas, que visam menos à especulação e mais à decisão social, à
produção de determinado efeito imediato nas cadeias de relações
sociais. Dessa forma, fazer da prática engajada do Direito um item do
preparo do profissional do Direito é algo de grande importância, em
face dos desafios que a prática antepõe ao operador do Direito.
(...) A simulação de atividades e visita a órgãos judiciários, prática de
atos jurídicos e rotinas processuais, a orientação de profissionais da
área, o aprendizado da deontologia jurídica, o acesso a documentos
e processos são alguns itens importantes de desempenho desse
setor, que, no entanto, não pode reduzir-se a mero setor protocolar
das burocracias jurídicas, mas integrar-se ao projeto pedagógico do
curso e de ensino crítico do Direito (BITTAR, 2006: 147)
As metodologias para instaurar esse novo modelo terão de ser objeto de outra
reflexão, mas alguns de seus frutos já podem ser previstos: profissionais
esclarecidos e dotados de instrumental crítico que os capacite a escolher
conscientemente – e com certeza de forma mais livre do que antes – entre serem
humanos ou autômatos.
A mudança da cultura do ensino do Direito, portanto, passa pela
compreensão de que o sentido dado pelo sistema não é o mais benéfico para o perfil
do ensino que se quer. As instituições de ensino superior devem se pautar por uma
lógica de inclusão, e isso envolve um esforço social, resultando numa nova interação
professor-aluno, num ensino que não sobreviva sem pesquisa, um estágio
profissional que não faça sentido sem que de alguma forma repercuta em
possibilidades de transformação social e de um profissional que seja resultado direto
disso.
60
Capítulo 2: Contexto histórico: A herança portuguesa no ensino jurídico no
Brasil
Todavia, a adesão à Europa, a política de mercado, a livre circulação
de pessoas, capitais e mercadoria, exige que as competências sejam
bem definidas não já para as necessidades e condicionamentos
daquela década (1974), mas para um território e uma população que
vai do Atlântico ao Urais (PIRES, 2007 Apud MORREIRA, Adriano).
O capítulo expõe elementos que orientam a respeito do legado português no
ensino jurídico, estudando desde a origem bolonhesa até os dias atuais.
2.1 As influências das primeiras universidades no mundo
O ensino formal do Direito no Brasil atualmente é feito predominantemente no
âmbito das faculdades, instituições autorizadas a ministrar o ensino superior e a
habilitar os indivíduos para o exercício de profissões jurídicas, para as quais se exige
o diploma de curso superior oficial ou reconhecido. Por essa razão será
indispensável um exame prévio acerca da origem, da natureza, das condições e dos
objetivos desses espaços universitários, onde o ensino jurídico foi elaborado e
transmitido aos bacharéis em Direito, do passado aos dias de hoje.
Segundo Terezinha Oliveira (2002), a universidade como instituição surgiu na
Europa da baixa Idade Média, mais precisamente entre os séculos XII e XIII, de
forma mais ou menos concomitante, na Itália, França e Inglaterra, com as
universidades de Bolonha, Paris e Oxford, respectivamente.
Conforme Terezinha Oliveira (2002), a partir da Idade Moderna, e no
Ocidente, a universidade foi se definindo em torno de certos objetivos que, por sua
vez, definiram também seus vários modelos. Podemos abordar o modelo francês,
alemão, inglês, norte-americano, latino-americano, em que a universidade foi
assumindo perfis e papéis diferentes, de acordo com a realidade e as exigências
sociais e políticas de cada país em determinado momento.
Segundo Maria Laura Bettencourt Pires (2007) o modelo francês caracterizou-
se por encarar a universidade como produto da revolução industrial, vinculando-a
aos objetivos de progresso, procurando produzir o conhecimento e a formação dos
61
profissionais indispensáveis ao desenvolvimento científico e tecnológico exigido pela
nova sociedade burguesa e capitalista. Trata-se de um modelo que se distanciou
inteiramente do perfil aristocrático e medieval que preponderou na universidade até
o advento da revolução burguesa. O modelo francês é conhecido também como o
modelo de federação, porque a universidade na França foi inicialmente idealizada a
partir de faculdades isoladas, com funções profissionalizantes.
O modelo inglês, ao contrário, ainda mantém certos traços aristocráticos da
universidade tradicional, com uma estrutura universitária fortemente hierarquizada,
em que Oxford e Cambridge ocupam o topo da pirâmide, seguidas logo abaixo por
inúmeras subuniversidades e pelos colleges na base dessa hierarquia.
Na Alemanha, a revolução burguesa ocorreu bem depois do que na França e
em outros países europeus. Esse desenvolvimento tardio exigiu da universidade
moderna alemã uma parte do esforço de promover a industrialização do país.
Porém, ao desempenhar o papel de promover o desenvolvimento industrial em
conjunto com o Estado, a universidade na Alemanha tornou-se excessivamente
burocrática, revelando extrema subserviência aos objetivos da burocracia estatal.
A universidade norte-americana formou-se a partir da expansão dos colleges,
que se caracterizaram pelo esforço e pelos objetivos conjuntos na consolidação do
desenvolvimento do país. Esses colleges foram reunidos em dois modelos de
universidade: um mais voltado para a investigação científica, como Harvard, por
exemplo; outro, de nível intermediário, mais preocupado com a sistematização
prática do conhecimento, os chamados junior colleges, dos quais alguns evoluíram
para um ensino muito superior, como é o caso de Massachusetts (MIT).
A universidade latino-americana mantém traços da universidade tradicional e
reflete todos os problemas típicos do subdesenvolvimento, ora atuando como agente
da manutenção do status quo, ora como simples reflexo de uma modernização
proveniente de outros centros. O fato é que as universidades modernas chegam aos
dias atuais trazendo ainda a aura e alguns traços da velha universidade tradicional,
como a ideia básica de comunidade autônoma voltada para o ensino em nível
superior.
Com o advento da modernidade, as comunidades universitárias firmaram-se
como o locus da produção científica e conservaram até hoje essa ideia original de
62
comunidade de mestres e alunos, investigando e ensinando as disciplinas do
conhecimento de forma autônoma, sempre numa perspectiva de altos estudos, ou
de estudos realmente superiores. Portanto, parece certo afirmar que pelo menos três
traços fundamentais da ideia de universidade permanecem presentes nas
instituições universitárias contemporâneas, ou seja, a noção de comunidade, de
autonomia e de ensino superior.
A prática do ensino superior significa a possibilidade de transmitir o
conhecimento numa perspectiva elevada e profunda, de modo que se possa
conhecer e ensinar os mais diversos aspectos da realidade, em suas manifestações,
causas, efeitos e contingências, proporcionando ao acadêmico um saber sistemático
e global, capaz de produzir generalizações sobre os mais diferentes fenômenos; de
articular esses fenômenos entre si; de fundamentar o conhecimento metodológica e
cientificamente; de criar novas hipóteses sobre o real e, sobretudo, de ter uma
compreensão geral, do ponto de vista histórico, social, político e ético, acerca do
próprio saber produzido na universidade.
Criar um ambiente como esse pode trazer um enorme avanço, mas a demora
em sua criação proporciona um enorme e proposital atraso. Diversos fatos históricos
embasam os argumentos que confirmam a distância temporal entre o surgimento de
universidades na América espanhola e no Brasil. Cunha (1996: 12) apresenta alguns
argumentos em sua obra: o bloqueio de Portugal ao desenvolvimento da colônia,
com o consequente incentivo para que os brasileiros fossem estudar na Corte
portuguesa, e o fato de, no século XVI, já existirem, na Espanha, oito universidades
em funcionamento, enquanto em Portugal havia apenas uma, a de Coimbra (que foi
nossa matriz universitária por um longo período).
Segundo Terezinha Oliveira (2002), a universidade brasileira é uma instituição
nova, se comparada às universidades seculares da Europa, que datam do século
XII, e mesmo a algumas da América Latina, como, por exemplo, a Universidade de
Lima (1551), do México (1553) e de Córdoba (1613). Pode-se dizer que, depois de
algumas tentativas fracassadas, a universidade no Brasil surgiu tardiamente, já na
terceira década do século XX, mais precisamente em 1934, com a criação da
Universidade de São Paulo, muito embora em 1920, com o Decreto 14.343, tenha
63
sido instituída a Universidade do Rio de Janeiro, reunindo a Escola Politécnica, a
Faculdade de Medicina e a Faculdade de Direito.
Segundo Maria Laura Bettencourt Pires (2007) é o que se convencionou
chamar de universidade napoleônica, por ter sido o modelo proposto por Napoleão
na França do século XIX, em que a universidade deveria funcionar, mesmo no
regime de faculdades isoladas, com o propósito de formar os cientistas e tecnólogos
indispensáveis ao desenvolvimento da sociedade industrial.
A adoção desse modelo napoleônico, pela universidade portuguesa, parece
ter afetado não apenas a universidade brasileira, mas todo o sistema universitário da
América Latina. As universidades latino-americanas são conglomerados de
faculdades e escolas que, idealmente, deveriam abarcar todas as possíveis linhas
da formação profissional, através de correspondente número de unidades escolares
independentes e autossuficientes.
2.2 A origem do ensino jurídico Português
Na universidade de Bolonha, desde o século XIII, o ensino do Direito já era
praticado com todas as honras de um ensino superior. Aliás, o Direito e a Medicina,
a partir daquele século, já se impunham como ensino superior na maioria das
universidades da Europa.
No caso do Direito, ensinava-se o conjunto do Corpus juris civilis, que
acabava de ser redescoberto e cuja compilação, feita pelo imperador Justiniano no
século VI, abrangia todo o Direito Civil praticado pelos romanos. Esse Código, con-
siderado o grande monumento jurídico da Antiguidade clássica, transformou-se no
único objeto de estudo nas escolas de Direito no final da Idade Média, ao lado do
Direito eclesiástico, compilado no Corpus juris canonici.
A autoridade do Direito romano e do Direito canônico sempre acompanhou o
ensino jurídico, por séculos a fio, conferindo-lhe uma aura quase mítica, de ensino
sagrado, vinculado à manutenção da ordem e do poder, com uma dimensão ética
muito enfática e capaz de habilitar o exercício de importantes e belas carreiras.
Tanto assim que jamais se cogitou reduzir o ensino oficial do Direito a uma
64
dimensão secundária, como curso técnico de segundo grau. O ensino jurídico
sempre desfrutou do status de conhecimento realmente superior e científico, cuja
produção e transmissão deveriam ser feitas em nível universitário.
2.3 O processo de criação do Ensino Jurídico em Portugal (1290)
Os estudos jurídicos remontam, em Portugal, à fundação da Universidade,
durante o reinado de D. Dinis. Não se pode precisar a data exata da sua criação,
mas, com certeza, foi entre 1288 e 1290. É tradicional, embora não isento de
controvérsia, o ponto de vista que reconhece a instituição do Studium Generale na
carta dionisiana de 1.º de março de 1290.
A bula do papa Nicolau IV, que confirmou a criação dos cursos jurídicos, em 9
de agosto de 1290, representa, sem dúvida, o momento decisivo da legitimação da
origem do conhecimento aos olhos da Europa culta daquela época. Ora, logo então,
a bula De statu regni Portugaliae encerrava uma referência expressa ao magistério
do Direito canônico e do Direito romano. Aqueles que se graduassem teriam ubique,
sine alia examinatione, regendi liberam potestatem. Tais diplomados podiam, assim,
ensinar em qualquer parte do mundo cristão.
A origem da Universidade de Coimbra não é diferente das demais
universidades de seu tempo: está ligada à Igreja Católica. Inicialmente, os estudos
jurídicos seriam dedicados ao Direito romano e ao Direito canônico. É interessante
questionar: admitindo uma estrutura clássica de ensino em que temos professores e
alunos, de onde provinham os professores de Coimbra? A história marca a
Universidade Italiana de Bolonha, fundada na segunda metade do século XI, como a
primeira instituição de ensino jurídico. Ela foi responsável por fornecer os primeiros
professores das universidades dessa época, inclusive os de Coimbra (OLIVIO, 2000:
49).
A Espanha também influenciou os primórdios de Coimbra através da
Universidade de Salamanca (fundada em 1215) e do documento conhecido como
Siete Partidas, obra destinada ao ensino do Direito.
65
Em 1308, a universidade de Direito de Lisboa passa para a cidade de
Coimbra, foi outorgada à Universidade de Coimbra uma carta de privilégios, com
data de 15 de fevereiro de 1309, onde se determinava que houvesse um doutor in
Decretis e um mestre in Decretalibus, bem como um professor de Leis. A
Universidade encontrava-se, a princípio, composta de simples “cadeiras” e não de
autênticas “faculdades” no sentido moderno. A metodologia adotada nas aulas de
Direito seguiria de perto o modelo bolonhês, assente num discurso glosador que
radicava em processos explicativos de exegese textual. Havia três tipos de exercício:
as lectiones, as repetitiones e as disputationes.
A Universidade portuguesa continuou a viajar entre Lisboa e Coimbra até o
século XVI. Os cursos de cânones e leis (que deram origem aos curso jurídicos)
eram os que reuniam maior número de alunos, e as remunerações atribuídas aos
respectivos professores eram mais elevadas do que as dos demais.
Por séculos, foi a Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada em 1540 por
Inácio de Loyola, que determinou os caminhos de Coimbra. A Igreja mantinha uma
posição conservadora, defendendo o status quo e negando outras vertentes de
pensamento. Coimbra não fugia dessas características.
As mudanças sociais produziram poucos efeitos em sua vida, tanto que
Coimbra não foi influenciada pela Reforma, já que a “[...] ruptura do culto oficial da
Igreja Católica com a Reforma Protestante foi um desses abalos que produziu sérios
efeitos sobre o sistema educacional ocidental, em face da marcante doutrina de
Martinho Lutero” (BITTAR, 2001: 57). Portugal era o reduto da resistência às
mudanças, principalmente quando estas correspondiam a um enfraquecimento da
Igreja.
Uma das realizações dos jesuítas foi o desenvolvimento de centros
educacionais. Embora nenhum tenha alcançado o status de universidade, alguns
dizem que o Colégio da Bahia (Salvador foi capital da colônia até 1763, quando o
Rio de Janeiro assumiu esta posição) possuía plenas condições de assim ser
considerado (OLIVIO, 2000: 55-56). Os jesuítas supriam a demanda por ensino,
pois:
66
(...) desempenharam um papel ideológico e burocrático de maior
relevância na colônia e os seus colégios cumpriam uma tríplice
função, assim definida por CUNHA: a) de um lado, formar padres
para a atividade missionária; b) de outro, formar quadros para o
aparelho repressivo, como oficiais de justiça, da fazenda e da
administração; c) por fim, ilustrar a classe dominante local, fossem os
filhos dos proprietários de terra e de minas, fossem os filhos dos
mercadores metropolitanos aqui residentes. Em Coimbra, a formação
em Direito era um processo de socialização destinado a criar um
senso de lealdade e obediência ao rei. É bastante significativo que,
durante os trezentos anos em que o Brasil foi colônia de Portugal,
Coimbra fosse a única Faculdade de Direito dentro do império
português. Todos os magistrados do império, tivesse ele nascido nas
colônias ou no continente, passavam pelo currículo daquela escola e
bebiam seu conhecimento em Direito e na arte de governar naquela
fonte (OLIVIO,2000: 55-56).
Não há como negar a limitação que esse modelo proporcionava aos
bacharéis. Eles estudavam anos em Portugal, assimilavam toda a ideologia de lá e
depois vinham ao Brasil, em uma realidade que desconheciam aplicar o que haviam
aprendido em Lisboa.
A ruptura com a Igreja permitiu que Coimbra se abrisse ao pensamento
europeu, porém trouxe poucos resultados para a aproximação dos estudantes de
Direito à realidade social brasileira. Eles continuaram sendo formados por
portugueses que viam no Brasil uma mera colônia de exploração. Os problemas
sociais brasileiros só importavam na medida em que repercutissem economicamente
na Metrópole.
D. João II e D. Manuel I tentaram valorizar os nossos estudos superiores.
Esse último concedeu estatutos à Universidade, que traduzem, essencialmente, uma
simples reposição sistematizada de preceitos em vigor nos fins do século XV. Em
1431, aparecem já documentados os graus universitários de bacharel, de licenciado
e de doutor. A inspiração italiana continuava a vingar nos métodos de ensino,
servindo de pauta às poderosas exposições magistrais de teor romanístico e
canonístico que encheram de erudição o período medievo.
A Coroa Portuguesa queria, com sua política colonial, a conquista do capital
necessário para sua passagem da etapa colonial para a mercantil e por fim a
industrial. No entanto, Portugal não conseguiu alcançar este objetivo integralmente
até hoje, mantendo uma mentalidade colonialista. A nação que exercia a liderança
hegemônica no século XVIII era a Inglaterra, beneficiada pelos lucros coloniais dos
portugueses.
67
(…) o Tratado de Methwen (1703), firmado com a Inglaterra, país
já inserido no capitalismo industrial, o processo de
industrialização em Portugal é sufocado. Seu mercado interno foi
inundado pelas manufaturas inglesas, enquanto a Inglaterra se
comprometia a comprar os vinhos fabricados em Portugal.
Canaliza-se, assim, para a Inglaterra, o capital português, diante
da desvantagem dos preços dos produtos agrícolas em relação
aos manufaturados. Desta maneira, enquanto uma metrópole
entrava em decadência (Portugal) outra estava em ascensão
(Inglaterra) (RIBEIRO, 2000: 29).
A situação econômica e política dos países colonizadores é diversificada.
Enquanto Portugal buscava sem êxito desenvolver-se industrialmente, a Inglaterra, a
partir do século XVI e, principalmente, do século XVII, já era uma nação burguesa e
industrial hegemônica que enriquecia por conta do boicote a Portugal. Como prova
disso temos:
Como nação, continuava Portugal um país pobre, sem capitais,
quase despovoado, com uma lavoura decadente pela falta de
braços que a trabalhassem, pelas relações de caráter feudal
ainda existentes, dirigido por um Rei absoluto, uma nobreza
arruinada, quase sem terras e sem fontes de renda, onde se
salientava uma burguesia mercantil rica mas politicamente débil,
preocupada apenas em importar e vender para o estrangeiro
especiarias e escravos e viver no luxo e na ostentação
(BAUSBAUM, 1957: 48-9).
Portugal no século XVII ainda era uma sociedade feudal agrícola sem
capacidade econômica de gerir as suas colônias e os portugueses contentavam-se
em importar e vender, se submetendo às condições impostas pela Inglaterra.
2.3.1 Reforma Pombalina (1750 – 1777)
Segundo o historiador Kenneth Maxwell (1986), neste período, o rei de
Portugal, D. José I, nomeia para seu ministro Sebastião José de Carvalho e Melo,
que caminha no sentido de recuperar a economia por meio de uma concentração do
poder real e de modernizar a cultura portuguesa. Reforçando o Pacto Colonial,
inicia-se uma tentativa de transformação no século XVII, com as Reformas
Pombalinas.
As reformas buscavam transformar Portugal numa metrópole capitalista,
seguindo o exemplo da Inglaterra, além de adaptar sua maior colônia – o Brasil –, a
fim de acomodá-la à nova ordem pretendida em Portugal.
68
Ao longo de quase três décadas, perdurou o lastro ideológico, reformador e
autoritário, voluntarista e despótico e de tirano esclarecido de Pombal.
2
Análise das
transformações da até hoje retrógrada sociedade portuguesa em meados do século
XVIII, introduzidas nas Reformas Pombalinas, que abarcaram os âmbitos
econômico, administrativo e educacional, tanto em Portugal como nas suas colônias,
principalmente no Brasil, requer o conhecimento da situação da metrópole neste
período.
Pombal procurou industrializar o país, decretando altos impostos sobre os
produtos importados. Fundou a Companhia dos Vinhos do Douro, que monopolizou
a comercialização dos vinhos em Portugal, prejudicando a nobreza que produzia
vinhos em suas quintas. Incentivou a produção agrícola e a construção naval.
Reformou a instrução pública e fundou várias academias. Confiou a reorganização
do Exército português ao conde de Schaumburg-Lippe, militar alemão. Acabou com
a distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos. Entretanto, o exemplo mais
conhecido de suas ações reformadoras é a expulsão dos jesuítas de Portugal e de
seus domínios.
Décadas antes do fim da dominação portuguesa sobre o Brasil, Coimbra
sofreu uma drástica revitalização orientada pelo Marquês de Pombal, na época
primeiro-ministro de D. José I. Pombal foi o primeiro a combater a influência
conservadora da Igreja Católica no Estado português, sendo considerado um
déspota esclarecido pelos historiadores. No Brasil, Pombal organizou a exploração
das riquezas, aumentando os ganhos de Portugal. Criou duas companhias de
comércio, a do Grão-Pará e Maranhão e a de Pernambuco e Paraíba, para
financiarem a produção de açúcar, café e algodão e depois comercializarem os
produtos. O algodão era exportado para a Inglaterra e para as indústrias por ele
criadas em Portugal. Criou um tribunal da relação na nova capital e juntas de justiça
em todas as capitanias. As capitanias hereditárias que ainda pertenciam a
particulares foram compradas pela Coroa durante seu governo e transformadas em
capitanias reais.
2
Kenneth Maxwell estuda o estadista que governou Portugal por 27 anos, no que se refere às reformas no Brasil
colônia. Pombal inaugurou um regime inspirado em um absolutismo lógico que usava seu autoritarismo para o
processo de restabelecimento do controle nacional sobre a economia
e a revitalização do Estado por meio da
promoção da propaganda, cujo exemplo mais conhecido é a perseguição sistemática aos jesuítas.
69
Em 1753, Pombal extinguiu a escravidão dos índios no Maranhão, onde ela
era mais comum que no resto da colônia. Em 1755, proclamou a libertação dos
indígenas em todo o Brasil, indo ao mesmo tempo contra os proprietários de
escravos índios e os jesuítas, que dirigiam a vida das comunidades indígenas nas
missões (aldeamentos indígenas organizados pelos jesuítas). Após ter expulsado os
jesuítas de Portugal, obrigou-os também a sair do Brasil em 1760. Pombal proibiu a
discriminação aos índios e elaborou uma lei favorecendo o casamento entre eles e
portugueses. Finalmente, criou o Diretório dos Índios para substituir os jesuítas na
administração das missões.
Pombal, segundo Kenneth Maxwell (1986),
3
não agia por intenção, mas pelas
opções determinadas pela posição de Portugal no sistema de Estado mercantilista
do século XVIII. No caso da expulsão dos jesuítas, o que pretendia era a supressão
do domínio dos religiosos sobre a fronteira, acordada no tratado de Madri,
4
onde
estavam situadas as sete missões jesuíticas. Seu objetivo era que os índios fossem
libertados da tutela religiosa e se miscigenassem para assegurar um crescimento
populacional que permitiria o controle do interior nas fronteiras. O marquês não
acreditava em uma emigração europeia. Era mais fácil europeizar a população local.
Para ele, o afastamento dos jesuítas dessa região significava tão somente assegurar
o futuro da América portuguesa através do povoamento estratégico.
E não pela reforma educacional, por meio da qual abriu as portas a um
florescimento da ciência e da filosofia portuguesas em fins do século XVIII, mas
pelas relações entre o Iluminismo e o exercício do poder do Estado. Não foi por
espírito libertador e igualitário que Pombal empreendeu a reforma educacional por
meio de mestres e professores seculares, mas pela necessidade de preencher o
extenso vazio deixado pela expulsão dos jesuítas, de preparar homens
suficientemente capazes para assumir postos de comando no Estado absolutista.
O interesse de Estado acabou entrando em choque com a política
protecionista dos jesuítas para com os índios e melindrando as relações com
3
Kenneth Maxwell é um historiador inglês, autor, entre outros, de A devassa da devassa e Marquês de Pombal -
paradoxo do Iluminismo, ambos editados no Brasil pela Paz e Terra.
4
Nesse tratado os portugueses cederam à Espanha a Colônia de Sacramento e as terras ao norte do rio da Prata
em troca das fronteiras fluviais ocidentais do Brasil. Estas incluíam o rio Uruguai, o que punha as sete missões
jesuíticas da região, havia tempos sob o domínio espanhol, sob a soberania de Portugal.
70
Pombal, tendo este fato entrado para a história como uma grande rivalidade entre as
ideias iluministas de Pombal e a educação de base religiosa jesuítica.
2.3.1.1 O Alvará Régio (1759)
Por meio do Alvará Régio de 28 de junho de 1759, o Marquês de Pombal
suprimia as escolas jesuíticas de Portugal e de todas as colônias mediante a
expulsão dos jesuítas e, ao mesmo tempo, criava as aulas régias ou avulsas de
Latim, Grego, Filosofia e Retórica, que deveriam suprir as disciplinas antes
oferecidas nos extintos colégios jesuítas. Essas providências, entretanto, não foram
suficientes para assegurar a continuidade e a expansão das escolas brasileiras,
constantemente criticadas pela população que até então se beneficiava dos colégios
jesuítas. Portugal logo percebeu que a educação no Brasil estava estagnada e era
preciso oferecer uma solução.
Nas Instruções do Alvará Régio de 1759 (BELLOTTO: 2004, 96) transparece
claramente o objetivo que norteou a reforma na instrução. A preocupação básica era
formar o perfeito nobre, simplificando os estudos, abreviando o tempo do
aprendizado de latim, facilitando os estudos para o ingresso nos cursos superiores,
além de propiciar o aprimoramento da língua portuguesa, diversificar o conteúdo e
incluir a natureza científica. O Alvará de 1759 pode ser visto como o primeiro esforço
no sentido da secularização das escolas portuguesas e de suas colônias,
entendendo que somente um ensino dirigido e mantido pelo poder secular poderia
corresponder aos fins da ordem civil.
Tal Alvará teve como significado central a tentativa de manter a continuidade
de um trabalho pedagógico interrompido pela expulsão dos jesuítas. A educação
jesuítica não mais convinha aos interesses comerciais emanados por Pombal, com
seus conhecidos motivos e atos na tentativa de modernização de Portugal, que
chegariam também às suas colônias. Sendo assim, as escolas da Companhia de
Jesus, que tinham por objetivo servir aos interesses da fé não atendiam aos anseios
de Pombal, quais seja organizar a escola para servir aos interesses do Estado.
O Estado português assume o controle da educação colonial. A criação da
figura do “Diretor-Geral dos Estudos” deixa clara, no mesmo Alvará, a intenção da
71
Coroa de uniformizar a educação na Colônia e fiscalizar a ação dos professores –
desde já por ela nomeados –, do material didático por eles utilizado – também
devidamente “recomendado” no mesmo documento –, de modo a que não houvesse
choque de interesses, isto é, que não houvesse nenhum outro poder, como era o
dos jesuítas, a afrontar as determinações da Coroa. Cabe à Coroa a instalação de
um novo sistema de ensino, e é exatamente essa a linha pela qual segue o Alvará
Régio.
Mesmo exigindo novos métodos e novos livros, o latim servia apenas como
instrumento de auxílio à língua portuguesa, o grego era indispensável a teólogos,
advogados, artistas e médicos e a retórica não deveria ter seu uso restrito à cátedra.
A filosofia ficou para bem mais tarde, mas efetivamente nada de novo aconteceu,
devido, principalmente, às dificuldades oriundas da falta de recursos e de pessoal
preparado.
O Marquês de Pombal, que estudara Direito em Coimbra, tinha como objetivo
modernizá-la, inclusive o seu ensino, abandonando as tradições medievais e
aproximando-a das escolas jurídicas europeias ligadas ao Iluminismo.
Curricularmente, “[...] introduziu as cadeiras de Direito Natural Público Universal e
das Gentes, voltada para o ensino das inovações doutrinárias e legislativas da
Europa da época; a cadeira de História Civil dos Povos; a cadeira de Direito Romano
e Português e, por fim, a cadeira de Direito Pátrio, servida por um compêndio, as
Institutiones iuris civilis lusitani, de Pascoal José de Melo Freire”
(OLIVIO, 2000: 54).
Séculos depois, a política educacional de Pombal era lógica, prática e
centrada nas relações econômicas anglo-portuguesas. A reforma educacional
pombalina culminou com a expulsão dos jesuítas precisamente das colônias
portuguesas, tirando o comando da educação das mãos destes e passando para as
mãos do Estado. Extintos os colégios jesuítas, o governo não poderia deixar de
suprir a enorme lacuna que se abria na vida educacional tanto portuguesa como de
suas colônias. Para o Brasil, a expulsão dos jesuítas causou a destruição do único
sistema de ensino no País.
A organicidade da educação jesuítica foi consagrada quando
Pombal os expulsou levando o ensino brasileiro ao caos, através
de suas famosas “aulas régias”, a despeito da existência de
escolas fundadas por outras ordens religiosas, como os
Beneditinos, os Franciscanos e os Carmelitas (NISKIER, 2001:
34).
72
A reforma pombalina no Brasil não foi implementada no mesmo momento e
da mesma forma que em Portugal. Quase trinta anos foram necessários para que o
Estado português assumisse o controle pedagógico da educação a ser oferecida em
terras brasileiras e efetivasse a completa expulsão dos jesuítas, desmantelando,
com isso, seu sistemático aparelho educacional, dos métodos aos materiais
didáticos, e nomeando um Diretor-Geral dos Estudos, que deveria, em nome do rei,
nomear professores e fiscalizar sua ação na colônia.
2.3.1.2 Real Mesa Censória (1767)
Somente quando a Real Mesa Censória, criada em 1767 (inicialmente com
atribuição para examinar livros e papéis já introduzidos e por introduzir em Portugal),
passa a assumir, alguns anos depois, a incumbência da administração e direção dos
estudos das escolas menores de Portugal e suas colônias é que as reformas na
instrução ganham meios de implementação.
Essa Mesa apontou para as necessidades, tanto na Metrópole quanto na
colônia, referentes ao campo educacional. A educação básica ganhou amplitude e
penetração com a instituição, em 1772, do chamado “subsídio literário”
5
para
manutenção do ensino primário e secundário. Como Carvalho bem explicitou:
Com os recursos deste imposto, chamado subsídio literário, além
do pagamento dos ordenados aos professores, para o qual ele foi
instituído, poder-se-iam ainda obter as seguintes aplicações: 1)
compra de livros para a constituição da biblioteca pública,
subordinada à Real Mesa Censória; 2) organização de um museu
de variedades; 3) construção de um gabinete de física
experimental; 4) ampliação dos estabelecimentos e incentivos
aos professores, dentre outras aplicações (CARVALHO, 1978:
128).
O novo sistema educacional, que deveria substituir o sistema jesuítico, aberto
que estava à modernidade europeia, incorporou partes dos discursos sobre a ação
do Estado na educação e passou a empregá-lo para ocupar o vácuo que foi deixado
5
O “subsídio literário” consistiu num imposto que incidia sobre a carne, o vinho e a cachaça, passando assim o
ensino público a ser financiado pelo Estado e para o Estado.
73
com a saída dos jesuítas, pelo menos no que diz respeito ao controle e à gestão
administrativa do sistema escolar.
As aulas régias eram autônomas e isoladas, com professor único, e uma não
se articulava às outras. O novo sistema não impediu a continuação do oferecimento
de estudos nos seminários e colégios das ordens religiosas que não a dos jesuítas.
Com a implantação do subsídio literário, imposto colonial para custear o
ensino, houve um aumento no número de aulas régias, porém ainda muito precário
devido à escassez de recursos, de docentes preparados e à falta de um currículo
regular. Em continuidade à sua ação pedagógica, mantiveram sua metodologia e
seu programa de estudos, que deixava de fora, além das ciências naturais, as
línguas e literaturas modernas, em oposição ao que acontecia na Metrópole, onde
as principais inovações de Pombal no campo da educação, como o ensino das
línguas modernas, o estudo das ciências e a formação profissional, já se faziam
presentes.
O Brasil não é contemplado com as novas propostas que
objetivavam a modernização do ensino pela introdução da
filosofia moderna e das ciências da natureza, com a finalidade de
acompanhar os progressos do século. Restam no Brasil, na
educação, as aulas régias para a formação mínima dos que iriam
ser educados na Europa (ZOTTI, 2004: 32).
Quem tinha condições de cursar o ensino superior enfrentava os perigos das
viagens para frequentar a Universidade de Coimbra ou outros centros europeus.
Como as “Reformas Pombalinas” visavam a transformar Portugal numa metrópole
como a Inglaterra, a elite masculina deveria buscar respaldo fora, para poder servir
melhor na sua função de articuladora dos interesses da camada dominante.
Essa era a época do Iluminismo em Portugal, com a luta do Estado português
para voltar a ser a grande nação da época dos descobrimentos – por meio do
fortalecimento do Reino e seu soberano –, adaptando-se às técnicas que acreditava
terem sido utilizadas pelos seus rivais para ultrapassá-lo, ainda que para tanto
devesse se apoiar nas novas ideias da Ilustração, que não poupavam críticas à sua
ordem política e social, já considerada velha. Pombal tinha essa visão iluminista.
Embora a Metrópole portuguesa só abrisse perspectivas para a penetração
de um Iluminismo contido, científico na aparência, já que permaneceria submetido à
tradição cultural da imitação, memorização e erudição literária, houve um avanço no
74
ensino público português, que passou a formar uma burocracia administrativa mais
moderna e eficiente. Além disso, os professores régios que aqui exerciam a
profissão de ensinar foram propulsionadores dos sentimentos liberais e
incentivadores das ideias filosóficas que tão significativamente se fizeram atuantes
nos últimos trinta anos que antecederam a independência do País.
Percebemos por quais vias o Iluminismo chegou ao Brasil. É pela política
imperial de racionalização e padronização da administração de Pombal que a
educação passou para as mãos do Estado, mas essa educação que passou a ser
pública não se fazia para os interesses dos cidadãos. Ela serviu aos interesses
imediatos do Estado, que, para garantir seu status absolutista, precisava manter-se
forte e centralizado, sob comando de uns poucos preparados para tais tarefas.
Concordamos com a análise de Maxwell (1986) de que os lucros das
reformas pombalinas foram individuais, privados. Mas os interesses foram públicos –
no sentido de estatal –, na medida em que, naquele contexto, iluminismo,
racionalidade e progresso têm um significado muito diferente, ao qual se deve estar
atento: iluminismo no contexto da colônia brasileira tratou-se, na verdade, do
engrandecimento do poder do Estado e não das liberdades individuais.
Entender o projeto do iluminismo pombalino ajuda a perceber a tradição
reformista nas tentativas de construção de um sistema nacional de educação pública
voltado aos interesses públicos, que até hoje não se consolidou no Brasil. A
evolução histórica do ensino jurídico brasileiro pode ser analisada em duas fases
teoricamente compartimentadas: os modelos de Estado Império e Estado República.
2.4 O processo de criação do Ensino Jurídico no Brasil (1827)
Após a Independência, dentro do processo de emancipação política e cultural
do Brasil, criou-se um novo cenário, como parte das exigências culturais e
ideológicas de um Estado Nacional em formação. Não existia mais Metrópole e
Colônia, mas sim campo e cidade. Assim é que os novos bacharéis, oriundos das
classes dominantes (latifúndios e comércio), não mais precisariam transpor o oceano
para ir às universidades da Europa. Procurava-se estabelecer, assim, a formação de
uma elite intelectual brasileira capaz de guiar a nação jurídica e politicamente.
75
Influenciados pela Reforma Pombalina no ensino jurídico, ditada nos
Estatutos de 1772, os estudantes brasileiros puderam acompanhar as
transformações liberais da Faculdade de Direito de Coimbra, ocorridas em décadas
seguintes, trazendo consigo essa bagagem cultural ao Brasil.
O espaço intelectual do iluminismo liberal floresceu ao alcance do
conhecimento dos estudantes brasileiros da Coimbra clássica. Essa tendência liberal
é confirmada pela estrutura curricular “una”, apresentada na Carta de Lei de 11 de
agosto de 1827, destacando-se que os dois últimos anos do curso de Direito seriam
destinados ao estudo do Direito civil e comercial (quarto ano) e ao estudo da
economia política e prática processual (quinto ano). Não era somente o poder sobre
o Estado que estava em modificação (fim do absolutismo); um novo modelo
científico também entraria em conflito com a ala eclesiástica da academia.
Desde o início do século XIX, o Brasil já contava com algumas faculdades
isoladas de ensino superior, como as duas faculdades de Direito criadas em 1827, e
as faculdades de Medicina e de Engenharia do Rio de Janeiro.
O projeto de criação de estatuto utilizado para regulamentar o funcionamento
dos cursos de Direito no Brasil ficou a cargo do Visconde de Cachoeira. O
regulamento expressa que:
Tendo-se decretado que houvesse, nesta Corte, um Curso Jurídico
para nele se ensinarem as doutrinas de jurisprudência em geral, a fim
de se cultivar este ramo da instrução pública, e se formarem homens
hábeis para serem um dia sábios Magistrados, e peritos Advogados,
de que tanto se carece; e outros que possam vir a ser dignos
Deputados, e Senadores, e aptos para ocuparem os lugares
diplomáticos, e mais empregados do Estado (...) (CUNHA, 1996:
112).
A elite em prelúdio de decadência, que vivia da exploração de monoculturas
latifundiárias com mão de obra africana escrava, exigia do Estado meios para a
manutenção de seu poder social. Os cursos de formação de bacharéis em Direito
deveriam garantir que os filhos dos grandes latifundiários pudessem continuar a
escrever a história de nosso País não mais com sangue do chicote no tronco da
fazenda, mas com a pena no papel do governo, impondo suas regras e seu poder
político e econômico.
Os cursos de Direito no Brasil têm uma origem no Estado totalitário português
atrelado aos interesses das oligarquias agropecuárias. A educação Superior pós-
76
independência foi instituída mais para garantir a integração e consolidação do
Estado, do seu território, do seu povo e do governo, do que propriamente com o
intuito de formar cidadãos de todas as classes sociais capazes de pensar
criticamente os problemas e desafios da imensa nação que começava a se desligar
da pequena metrópole. O ensino jurídico no Brasil é chamado assim porque seguiu
o modelo português de exclusão.
2.4.1 A Assembleia Constituinte (1823)
Na Assembleia Constituinte de 1823, o consenso a respeito da necessidade
de criação de um curso jurídico no Brasil estava implantado, mas havia séria
divergência a respeito da escolha das cidades que recepcionariam tais cursos. A
escolha não se mostrou pacífica e muitas vozes se levantaram para ponderar ser
cruel a criação de um curso jurídico em uma cidade que não teria infraestrutura
capaz de receber, hospedar e alimentar os jovens mais brilhantes da Corte.
A cidade de São Paulo era uma pequena e pobre vila, longe do porto, úmida,
e na qual se falava um português com sotaque criticável para a época. Na ata que
registrou os debates daquela Constituinte há trechos que citam a razão dessa
rejeição, como este: “(...) é reconhecido que o dialeto de São Paulo é o mais notável.
A mocidade do Brasil, fazendo aí os seus estudos contrairia pronuncia mui
desagradável” (ALMEIDA, CCJB, 1977: 22).
Verificamos a importância dos militares em nossa sociedade, visto que o
primeiro Diretor dos Cursos Jurídicos de São Paulo foi o Tenente-General José
Arouche Rendon, que escolheu um convento, o de São Francisco, e não um quartel,
para sediar o Curso Jurídico, cuja aula inaugural foi proferida no dia 10 de março de
1828 pelo único lente até então contratado, o Professor José Maria Avelar Brotero.
Estava inaugurado, do ponto de vista acadêmico, o primeiro Curso Jurídico do Brasil,
a Faculdade de Direito de São Paulo, a Faculdade de Direito do Largo de São
Francisco, a Velha Academia.
6
6
Repetem os estudantes do Largo, entre as suas “trovas acadêmicas”, aquela que é a mais conhecida delas, que
pode ser a primeira ou a última de todo o elenco de trovas a serem cantadas: “Onde é que mora a amizade, onde
é que mora a alegria? No Largo de São Francisco, na velha Academia!”.
77
Depois de vencidas as barreiras de interesses regionais, o curso constituiu-se
de uma grade curricular distribuída em oito anos, quatro dos quais dedicados ao
chamado Curso Anexo, em que se procurava incutir nos jovens estudantes valores
humanistas e conhecimentos que consistiam em pressupostos para o bom
acompanhamento do Curso Jurídico, cujas disciplinas se distribuíam, naquela época,
do quinto ao oitavo ano do curso. As disciplinas jurídicas eram as seguintes: Direito
Natural, Direito Público, Direito das Gentes e Análise da Constituição do Império e
Diplomacia, Direito Público Eclesiástico, Direito Pátrio Civil, Direito Pátrio Criminal
(com a teoria do Processo Criminal), Direito Mercantil e Marítimo, Economia Política,
Teoria e Prática do Processo adotado pelo Império.
Vale ressaltar que nosso ponto de partida advém de um fato histórico.
Existem documentos e relatos de que as disciplinas e os estatutos da Faculdade
criada no Brasil em 1827 eram tomados de empréstimo da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, local que presidira a formação dos primeiros docentes e
dos quatro primeiros diretores da Faculdade. Por essa razão fica documentada
nossa origem lusitana tão fortemente marcada até os dias de hoje. Tal informação
recai sobre a importância do desafio e da conquista de construir uma identidade
curricular cultural formativa Nacional.
Apresentaremos o pensamento sobre os cursos jurídicos na época do
Império, resgatando, em especial, a opinião dos senadores e deputados dessa
época, já que eles produziram intenso debate sobre o tema, mostrando a sua
relevância, e a obra intitulada “Criação dos Cursos Jurídicos no Brasil”, editada pelo
Centro de Documentação e Informação do Congresso Nacional e pela Fundação
Casa de Rui Barbosa no ano de 1977. Nesta estão disponíveis discursos proferidos
pelos parlamentares a respeito do tema, entre 14 de junho de 1823 e 9 de agosto de
1827.
7
As discussões versavam sobre se a pátria necessitava alfabetizar suas
crianças ou proporcionar ensino superior para os jovens brasileiros. A criação dos
cursos jurídicos era um projeto de classe e isso suscitava protestos. Deputados
reclamavam que aos menos afortunados não estava garantido o Direito à educação.
7
Nocorrerdestatese,aobraseráidentificadatãosomenteporsuasiniciais:CCJB.
78
(...) esta primeira instrução de que tanto precisamos, está muito atra-
sada; há muita gente, que não sabe ler, nem escrever; o método de
ensinar é péssimo. Logo, este é que deve ser um dos grandes
objetos, de que devemos tratar: a primeira instrução. Podemos
igualmente ocupar-nos das aulas maiores, mas sempre como de
objeto secundário. Nós seremos mais felizes com a instrução do
povo, do que com o grande número de doutores. (Apoiado!) Portanto
declaro que deveremos dar a principal atenção à instrução
elementar, sem nos esquecermos dos estudos maiores (COUTINHO,
CCJB, 1977: 175).
Decidiu-se por implantar os cursos superiores, garantindo a organização da
Nação e proporcionando aos filhos da elite a possibilidade de estudo sem ida para o
exterior. A implementação dos cursos jurídicos no Brasil decorre de uma
circunstância histórica: o medo da necessidade de um enfrentamento militar com
Portugal, a fim de garantir a independência. Isso faz com que se diga que:
Legislar-se que as universidades serão pagas pelo Tesouro Público é
uma quimera na presente ocasião, em que eu vejo dizer-se que é
preciso abrir-se um empréstimo, que eu vejo a Nação com despesas
extraordinárias, criando uma Marinha, e defendendo-se de uma
guerra (RENDON, CCJB, 1977: 145).
Começava a formar-se uma concepção de cultura brasileira. A historiadora
Neder (1986: 147) percebe uma preocupação intelectual no sentido de formar uma
ideia de nação brasileira. Na época, o acesso à Universidade estava restrito pela
distância e custos de se manter um estudante em território europeu. Esses fatos se
incorporaram à discussão sobre a criação de faculdades de Direito, que surgem para
sanar as dificuldades de criar o corpo burocrático do País. Durante a Assembleia
Constituinte de 1823, clamava-se que:
Quando, nas Cortes de Lisboa, o deputado pernambucano Muniz
Tavares propôs a criação de uma universidade no Brasil, foi-lhe dito
pelos deputados portugueses que não precisávamos de outras
escolas que não fossem as primárias (NILO PEREIRA, CCJB, 1977:
XXVI).
8
E Pereira da Cunha (CCJB, 1977: 51) acrescentava sua posição sobre a
dificuldade em se estudar em Portugal como única opção de formação superior:
8
A declaração do Conselho Ultramarino, citado por Venancio Filho (1979: 7): “(...) que poderá ser questão
política se convinham estas aulas de artes e ciências em colônias (...) que podia relaxar a dependência que as
colônias deveriam ter do Reino; que um dos mais fortes vínculos que sustentavam a dependência das nossas
colônias era a necessidade de vir estudar a Portugal; que este vínculo não se devia relaxar; que (o precedente)
poderia talvez, com alguma conjuntura para o futuro, facilitar o estabelecimento de alguma aula de
jurisprudência até chegar ao ponto de cortar este vínculo de dependência”.
79
Emendemos esse erro grosseiro do antigo sistema, com o qual
pretendia a política portuguesa conservar-nos na escravidão e na
dependência de irmos buscar, a duas mil léguas de distância, a
habilitação e luzes de que precisávamos para sermos empregados,
custando-nos excessivas despesas, e (o pior) sacrifícios pessoais
pelos males eminentes que corríamos na primeira idade, longe da
Pátria, e dos parentes, e entregues a um correspondente que ou não
sabia, ou não tinha suficiente força para inspirar sentimentos de
religião, moral, e boa educação de que tanto se necessita nos verdes
anos. Este negócio é da maior importância para todos em geral, e
com especialidade para os pais das famílias, é necessário dar-lhe o
impulso que exige o bem de nosso País e por isso proponho Emenda
(...) (CUNHA, CCJB, 1977: 51).
Em 1825, estava pronto o Projeto de Regulamento ou Estatuto do Visconde
de Cachoeira, destinado a organizar um curso de Direito na Corte. Mais dois anos e
concretizou-se a ideia da formação jurídica no Brasil. Contudo, haveria de saber-se
que aí estava apenas o início de uma longa trajetória para os acadêmicos e para a
Nação. Custódio Dias (CCJB, 1977: 208) explicita que:
(...) não é este curso de Direito que vai fazer a felicidade do Brasil; é
preciso que todos saibam por experiência que só aquele que tiver
préstimos e virtudes há de ser chamado aos empregos, e que aquele
que não tiver verdadeiro merecimento nunca será admitido. Eis aí
quando eu hei de dizer à boca cheia que temos leis, que temos
Constituição, que temos Governo, e que temos felicidade. Antes disto
não. Todavia, eu não me oponho, como tenho dito, à criação desta
escola, porém não quisera que ela fizesse monopólio das luzes,
assim como faz a Universidade de Coimbra, a que ela vai imitar. Eu
quisera que aqueles que se habilitassem ainda fora desta escola
fossem julgados hábeis para os empregos do foro, e para isso eu me
lembrava de propor uma subscrição para se estabelecerem mestres
em todas as províncias para essa e outras ciências (DIAS, CCJB,
1977: 208).
2.4.2 Lei de 11 de agosto de 1827
A implantação dos cursos jurídicos do Brasil ocorreu em um contexto
marcado principalmente pela recente proclamação da Independência (1822). Os
centro de estudos jurídicos foram criados com o objetivo de formar bacharéis para
auxiliar na administração pública do país consolidando dessa forma o projeto político
nacional.
Então, em lei de 11 de agosto de 1827 foram criados os cursos jurídicos de
São Paulo e Olinda, mas discussões aconteciam desde a Constituinte de 1823, e um
Projeto de Regulamento ou Estatutos para um Curso Jurídico, organizado pelo
Conselheiro de Estado Visconde de Cachoeira, após a declaração de
80
Independência, em 7 de setembro de 1822, quando o Brasil constituiu-se em um
novo Império (coroando o filho do antigo imperador), houve espaço para que a
formação do bacharel em Direito brasileiro ocorresse no Brasil.
9
Dom Pedro Primeiro, por graça de Deos e unanime aclamação do
povo, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil,
fazemos saber a todos os nossos súditos que a Assembléia Geral
decretou e nós queremos a Lei seguinte:
“Art. 1° Crear-se-hão dous Cursos de Sciencias Jurídicas e Sociaes,
hum na Cidade de São Paulo, e outro na de Olinda, e nelles no
espaço de cinco annos e em nove Cadeiras, se ensinarão as materias
seguintes:
(...)
Dada no Palácio do Rio de Janeiro aos onze dias do mez de Agosto
de mil oitocentos e vinte-sete, sexto da Independência e do Império.
O Imperador
Visconde de S. Leopoldo
Os movimentos para a criação do ensino jurídico no Brasil começaram pela
Faculdade de Direito de Coimbra. Pelos portões das escadarias de Minerva
passaram, até o início do século XIX, os estudantes brasileiros do curso de Direito.
Isso perdurou até a sanção da Carta de Lei de 11 de agosto de 1827, que instituiu
os cursos em São Paulo e Olinda, instalados em 1828: um no Convento de São
Francisco, em São Paulo, outro no Mosteiro de São Bento, em Olinda. Em 1825,
porém, já havia sido criado um curso jurídico, a título provisório, para funcionar no
Rio de Janeiro, mas nunca chegou a ser instalado.
O texto legal (Lei de 11 de agosto de 1827) que criou os cursos de Direito
sintetiza duas características importantes dos docentes: 1) a vinculação deles ao
Estado, pois deveriam ater-se às “doutrinas que estejam de accôrdo com o systema
jurado pela nação”, e principalmente 2) a condição de proprietários do saber, “o
Governo nomeará nove Lentes proprietário (...) Os Lentes farão escolha dos
compêndios da sua profissão, ou os arranjarão, não existindo já feitos (...)”. Sobre
este personagem do ensino jurídico:
9
VenancioFilho(1979:8)destacaseremtrezeosbrasileirosqueseformaramemCoimbranoséculoXVI;
noséculoXVII,354;noséculoXVIII,1752;eentre1781e1822,339.
81
Não se pode deixar de chamar a atenção para o divórcio entre os
reclamos mais imediatos das camadas populares do campo e das
cidades e o proselitismo acrítico dos profissionais da lei que, valendo-
se de um intelectualismo alienígeno, inspirados em princípios
advindos da cultura inglesa, francesa ou alemã, ocultavam, sob o
manto da neutralidade e da moderação política, a institucionalidade
de um espaço marcado por privilégios econômicos e profundas
desigualdades sociais (WOLKMER, 2001: 99-100).
As pressões da sociedade civil sobre o Estado induziram a reforma
educacional do ensino jurídico. Os dois cursos de Direito existentes deixaram de ser
monopólio, e passou a ser permitida a criação de novas faculdades de Direito. A
primeira dessas faculdades criadas foi a da Bahia, em 1891. Iniciava-se o período da
reforma do “ensino livre” ou, como considera Barros (apud Bastos (2000: 75-76), o
período da “Ilustração Brasileira”, com o objetivo de que a educação fosse a força
inovadora da sociedade:
Afastem-se os entraves à criação de escolas, de cursos, de
faculdades e estas florescerão vigorosas. O princípio de seleção
natural encarregar-se-á de “fiscalizar” a escola, só sobrevivendo os
mais aptos, os melhores. O próprio ensino oficial só terá a lucrar com
isto, a concorrência das escolas particulares obrigando-o a manter um
ensino elevado (BARROS, apud BASTOS: 2000,75-6).
É perceptível que essas conjunções sociais da primeira fase do ensino
jurídico brasileiro mantiveram-no atrelado às bases ideológicas do momento,
estritamente voltadas para o plano dos conteúdos curriculares da livre economia. O
chamamento científico do momento histórico vivido era de afirmação do Estado
Liberal, e a academia necessitava reproduzir a regulação socialmente requerida.
Como em Coimbra, a academia jurídica brasileira tendeu para o afastamento
das influências eclesiásticas nas grades curriculares. Mantida na primeira grade
curricular criada pela Carta de Lei de 1827, a disciplina de Direito Eclesiástico
tornou-se optativa em 1879 e foi banida dos currículos na reforma de 1895. A
ideologia do momento exigia a consolidação do poder da classe burguesa sobre a
produção do conhecimento.
A função social do ensino jurídico neste período demonstrou ratificar o modelo
liberal, interpretá-lo, dar vida e continuidade aos currículos ideologicamente
preparados. Na área metodológica, como foi insubsistente qualquer tentativa de
avanço pedagógico, o resultado natural foi sua inclinação para a pedagogia
tradicional.
82
Enquanto processo de mera transmissão do conhecimento, o uso da
pedagogia ou “tendência liberal tradicional” resulta, segundo Cipriano Carlos Luckesi
(1994), numa definição sintética, no processo comunicativo básico de transferência
de informações. Assim, ao limitar-se a função do professor ao ato de exposição oral
de conteúdos, o resultado maior possível será a reprodução do conhecimento
existente. Nesse aspecto, a pedagogia tradicional contribuiu com o modelo liberal ao
permitir a manutenção da estrutura social em concomitância com a estrutura
operacional do Direito, na formação direcionada dos bacharéis.
A ausência de exigências qualitativas para a profissão de professor de Direito
favoreceu a lei do mercado do “ensino livre”, permitindo a fácil expansão quantitativa
do ensino jurídico no aspecto da oferta de mão de obra docente. A escolha dos
lentes, tendo por critério seu sucesso profissional como operador jurídico, resultou
no modelo de “nivelamento pedagógico”, baseado em levar para as salas de aula os
melhores práticos.
Além da falta de instituições de ensino e de uma organização judiciária que
contemplava vários cargos para leigos, ingressar em uma carreira pública, a
magistratura, por exemplo, só era possível se o candidato tivesse a devida instrução
jurídica, sempre realizada na Universidade de Coimbra. Durante o período colonial,
(1577 e 1822), Coimbra formou 2.464 estudantes oriundos do Brasil. Não há como
negar a influência desta instituição portuguesa na gênese do Direito brasileiro. O
tempo diferenciou as escolas:
O intento do Grupo do Recife foi tratar o fenômeno jurídico a partir de
uma pluralidade temática, reforçada por leituras naturalistas,
biologistas, cientificistas, históricas e sociológicas, apoiando-se
fortemente num somatório de tendências que resultavam
basicamente no evolucionismo e no monismo, sem desconsiderar a
crítica sistemática a certas formulações jusnaturalistas e
espiritualistas [...] Já a Academia de São Paulo, cenário privilegiado
do bacharelismo liberal e da oligarquia agrária paulista, trilhou na
direção da reflexão e da militância política, no jornalismo e na
“ilustração” artística e literária (WOLKMER, 2003: 82-83).
Com o fortalecimento do Sudeste e o declínio do Nordeste, houve uma
mudança no centro de decisões do País. Posteriormente, é interessante analisar
como o pensamento jurídico nacional, que possuía duas vertentes, acabou sendo
direcionado quase que exclusivamente para São Paulo.
83
Para entender a estruturação dos cursos de Direito, tanto em Recife quanto
em São Paulo, é preciso descobrir quem seriam os doutores responsáveis por
transmitir o conhecimento. Os chamados “lentes” adotaram uma posição
metodológica similar à de Coimbra, colocando em primeiro lugar no raciocínio
jurídico o princípio da autoridade (GALDINO, 1997: 159). A validade de um
conhecimento dependia da importância de seu defensor, o professor, e não das
razões que o justificariam (Discurso de Autoridade).
Em uma relação de ensino não se tem apenas professores, então é preciso
analisar os alunos da época: “[...] ao fim do império mais da metade dos jovens
alunos oriundos das grandes famílias proprietárias de terras e escravos” ocupavam
os cursos de Direito (OLIVIO, 2000: 58). O ensino era gratuito, o que leva a pensar
que:
Estava, pois, iniciado um processo que tem desde então
caracterizado o Estado nacional: o da socialização das despesas da
camada social eventualmente dirigente. Sob o manto diáfano dos
ideais liberais, o embrião de um processo de concentração de renda
pela intermediação do aparelho estatal (GALDINO,1997: 159).
Enquanto na França os iluministas vão se apoiar no Direito Natural para
derrubar o poder absolutista através da Revolução Francesa (1789), no Brasil ele
será utilizado para sedimentar as diferenças e as instituições lusitanas que
interessavam à monarquia recém-estabelecida. Portanto, pode-se dizer que, no
Brasil, os fatores reais de poder fizeram com que o jusnaturalismo se inclinasse ao
conservadorismo. Os pensadores também destacam o ecletismo como característica
da filosofia jurídica entre 1840-1880 (WOLKMER, 2005: 126-127). Ele busca unir em
um sistema o que era verdadeiro em todos os sistemas, refletindo o mito brasileiro
da imparcialidade. Com todas essas características, o ensino jurídico do período não
permitiu que o estudante analisasse as questões sociais brasileiras. Estudavam-se
apenas teorias estrangeiras e divagações sobre a realidade estrangeira.
Para facilitar o estudo do ensino jurídico, faremos a divisão do mesmo em
duas fases. A primeira fase destaca parte do desenvolvimento do paradigma do
Brasil Império, com poucas legislações sobre o ensino; a segunda, aponta a
contextualização histórica do Brasil República.
84
2.5 Primeira fase: O ensino jurídico no Brasil Império (1827- 1889)
Nos trabalhos legislativos do primeiro reinado, determinou-se a criação de
uma universidade em território nacional. A razão principal parece ter sido dotar a
juventude brasileira de um espaço para a discussão de idéias, desvinculando-se de
vez o País das raízes metropolitanas, representadas pela enorme afluência da
mocidade de então à Universidade de Coimbra.
Já verificamos anteriormente que as possibilidades da época levaram à
criação de dois cursos jurídicos, um em Olinda, Pernambuco, e outro na capital da
província paulista, nas terras pobres de Piratininga. Uma das razões para a criação
dos cursos jurídicos na cidade de São Paulo foi a pobreza e as dificuldades que se
encontravam para o seu desenvolvimento econômico.
10
Por obra do Visconde de
São Leopoldo, paulista de nascimento, uma das cidades escolhidas para sediar os
cursos jurídicos foi justamente a pobre São Paulo.
Ainda que vinculado à perspectiva típica da época, o ensino jurídico
proporciona uma visão complexa do processo de ensino-aprendizagem, iniciando
uma perspectiva metodológica que em documentos posteriores, inclusive
contemporâneos, foi abandonada. Escreve Aurélio Wonder Bastos (2000) sobre o
tema:
(...) independentemente das críticas que desenvolvemos sobre o es-
tatuto do Visconde de Cachoeira, não há como negar a sua visão
integrada do ensino – para cada conteúdo disciplinar uma forma de
ensinar – e, principalmente, deve-se admitir que se trata de um dos
únicos documentos acadêmicos oficiais no Brasil que insistem na
importância dos métodos e modos que deveriam os lentes
(professores) utilizar na transmissão do conhecimento, chegando,
inclusive, a detalhar linhas de atuação pedagógica e um panorama
bibliográfico, para a época, de grande extensão e percepção
(BASTOS, 2000: 41).
A liberdade era limitada, visto que o Estatuto da Faculdade vinha emprestado
de Coimbra e impunha os compêndios a serem ensinados. Vale ressaltar que os
10
Com a independência do Brasil, São Paulo firmou-se como capital da província e sede de uma Academia de
Direito, convertendo-se em centro de atividades intelectuais e políticas. Ajudaram na criação da Escola Normal,
a impressão de jornais e livros e as atividades culturais.
85
cursos jurídicos estavam sob supervisão imperial. Nesse mesmo sentido,
Vasconcelos explica (CCJB, 1977):
Eu ainda quisera mais, pois creio que o mesmo art. 15.° deve ser
substituído por outro. Este projeto, meus senhores, foi feito para um
curso de Direito, que tivesse o seu assento nesta Corte, e por isso se
determinou que ficasse debaixo da imediata inspeção do Ministro do
Império; mas como se decidiu já que aqui não fosse estabelecido,
mas sim em São Paulo e Pernambuco, creio que a inspeção imediata
já não pode competir ao Ministro do Império, mas aos Presidentes
daquelas províncias (VASCONCELOS, CCJB, 1977: 344).
Esse temor de controle por parte do Imperador ou de seus ministros pode ser
percebido igualmente quando da análise dos compêndios que deverão ser adotados.
Lino Coutinho reconhece a importância dos professores na seleção dos livros,
sempre destacando a necessidade de que seja afastado o Poder Executivo dessa
escolha.
Porém, como esta minha opinião não agradou, eu cedo de boa
vontade, e forme-se o curso de cinco ou seis anos; não seja essa a
dúvida; porém, o que não aprovo, é que se deixa ao Governo a
escolha dos compêndios.
A aprovação dos compêndios deve nascer da Assembléia. (apoiado
geralmente) Embora sejam propostos pela Congregação dos Lentes,
mas a aprovação deve ser do Corpo Legislativo. Eu vou propor um
curso de seis anos, e distribuirei as matérias pela forma seguinte
(COUTINHO, CCJB, 1977: 244).
E Vergueiro (CCJB, 1977: 338) traz à tona uma verdade que aqueles que
acreditam deter o poder não parecem querer aceitar: a de que os poderes
encontram-se muito mais “capilarizados”
11
do que se pretende (FOUCAULT, 1989:
214):
11
Explica que: “Ora, as mudanças econômicas do século XVIII tornaram necessário fazer circular os efeitos do
poder, por canais cada vez mais sutis, chegando até os próprios indivíduos, seus corpos, seus gestos, cada um de
seus desempenhos cotidianos. Que o poder, mesmo tendo uma multiplicidade de homens a gerir, seja tão eficaz
quanto se ele se exercesse sobre um só…”.
86
Demais, senhores, se o lente professa uma doutrina diferente da que
se vê obrigado a ensinar, ele terá muitos meios de iludir os estatutos,
os compêndios e as ordens as mais positivas, e por isso o único meio
de prevenir a prevaricação é a exclusão desses homens inimigos do
nosso sistema.
Lembro-me que um dos meus lentes em Coimbra era obrigado a
explicar por um compêndio, com cuja doutrina ele nem sempre se
conformava, principalmente quando este compêndio, definindo os
poderes espiritual e temporal, dizia que o espiritual era o poder da
Igreja e o temporal o poder dos reis. Ele reproduzia esta mesma idéia
e depois acrescentava: – Vamos, com os nossos Estatutos, que nos
obrigam a seguir esta opinião. E por fim dava uma risada.
Ele certamente era obrigado a ensinar um princípio tão errôneo, para
satisfazer os Estatutos, porém, não podia dissimular que semelhante
proposição era absurda e revoltante, e por que seria? Porque
respeitava a opinião pública, que há muito tempo reconhece que o
poder temporal não é dos reis, mas dos povos; e não queria que se
rissem dele.
Portanto, meus senhores, não tenhamos tanto medo de que os lentes
venham a escolher compêndios opostos às idéias recebidas
(VERGUEIRO, CCJB, 1977: 338).
A lei de 11 de agosto, art. 7.°, decidiu, afinal, que:
Os Lentes farão a escolha dos compêndios da sua profissão, ou os
arranjarão, não existindo já feitos, contanto que as doutrinas estejam
de acordo com o sistema jurado pela Nação. Estes compêndios,
depois de aprovados pela Congregação, servirão interinamente;
submetendo-se porém à aprovação da Assembléia Geral, e o
Governo os fará imprimir e fornecer às escolas, competindo aos seus
autores o privilégio exclusivo da obra, por dez anos (BRASIL, 1827).
Essa necessidade de valorizar os professores era unânime. Sabemos,
deveriam pensar os que gostariam de professores submissos ao imperador, que eles
possuíam liberdade de cátedra. A oposição reivindicava melhores condições de
trabalho e remuneração, pensando que garantia maior autonomia para livres
pensadores. Em agosto de 1826, Cruz Ferreira clamava:
Senhores, um homem não se pode fazer hábil para ensinar sem
exercício de muitos anos de estudo, e sem grande merecimento, e, se
havemos de dar aos lentes alguma consideração, então, atendendo
aos seus trabalhos, quero que os lentes do curso jurídico tenham a
graduação e ordenado de Desembargadores (CRUZ FERREIRA,
CCJB, 1977: 309).
Ele tinha o objetivo de justificar sua emenda, que garantia aos professores os
honorários de Desembargadores das Relações das Províncias e graduação de
Desembargadores. Dessa opinião compartilhava Custódio Dias, que, na mesma
sessão, dizia:
87
A Câmara se tem pronunciado pela grande importância que
merecem os mestres, como cidadãos que ensinam ao público; deve-
se porém ter em vista que um mestre é um homem, e o homem não
crê, não obedece, não trabalha, senão por cálculo de interesse. E
que cálculo desta natureza poderá fazer um homem erudito, que o
induza a empregar-se em o nobre ofício de ensinar, vendo que
qualquer artista tem muito mais lucros, quer no negócio, quer na sua
arte, sendo o seu trabalho muito superior, pois que custa ser mental?
(CUSTÓDIO DIAS, CCJB. 1977: 313).
Afinal, a lei entendeu que o cargo que ocupariam deveria ser de muito
respeito e passou a rezar o Estatuto em seu art. 3.°: “Os Lentes proprietários
vencerão o ordenamento que tiverem os Desembargadores das Relações, e gozarão
das mesmas honras. Poderão jubilar-se com o ordenado por inteiro, findos vinte
anos de serviço”.
Criou-se, com tais prerrogativas, o corpo docente, professores que se
organizavam como grupo fechado. Entretanto, sete anos após a promulgação da lei
(VENANCIO FILHO, 1979: 169), seus salários já eram baixos – sendo a lei,
claramente, descumprida (VENANCIO FILHO, 1979: 119). Atualmente, Rodrigues
ressalta que:
Um poço de narcisismo, egocentrismo e auto-suficiência. Esta parece
ser, em muitos casos, a postura do professor de Direito. Postura que
gera uma relação autoritária e vertical – um verdadeiro monólogo. E
não apenas em relação aos seus colegas de magistério. Postura esta
que logo é assimilada também pelo corpo discente. Nos cursos
jurídicos é onde mais se encontra propagado o individualismo. Na
realidade, parece ser esta uma postura tradicional dos diversos
operadores jurídicos, não restrita apenas a instância educacional
(RODRIGUES, 1996: 108).
Os professores, sem formação pedagógica, reprodutores da aula coimbrã,
expositiva, eram juristas que não buscavam, por exemplo, inspiração em Emílio
(ROUSSEAU, 2004), apesar de conhecerem o autor de Contrato Social. Cabe
ressaltar que os docentes recebiam indicações claras de como deveriam ser suas
aulas. A respeito, o art. 6.° do Estatuto esclarece:
Será mui breve e claro nas suas exposições. Não ostentará erudição
por vaidade, mas aproveitando o tempo com lições úteis, trará só de
doutrina o que for necessário para perfeita inteligência das matérias
que ensinar, e trabalhará quanto lhe for possível por terminar o
compêndio a tempo de poderem os estudantes ainda no mesmo ano
ouvir todas as lições de Direito Público (BRASIL, 1827).
Na parte didático-pedagógica do curso de Direito proposta pelo Estatuto, o
capítulo X, Dos exercícios práticos das aulas, prevê desde o ano letivo (de março a
88
outubro) até o número de faltas admitidas. O principal, entretanto, fica por conta do
legislado no art. 2°: “Em cada uma delas [refere-as às aulas] durarão as lições por
espaço de hora e meia. O Professor gastará a primeira meia hora em ouvir as lições,
e o mais tempo em explicar o compêndio”.
Destacam-se duas atividades: a primeira, regida pelo art. 30, consiste em
arguições semanais realizadas aos sábados. Nesses encontros, seis alunos
questionam outros três alunos sobre uma das matérias explicadas pelo professor na
semana e designada na véspera. A segunda, regida pelo art. 40, mensal, consiste
na redação de uma dissertação escrita em língua portuguesa.
A avaliação, segundo o Estatuto (capítulos XI e XII), ocorria na forma de
exame oral ao término do ano. Um ponto era escolhido com, no mínimo, vinte e
quatro horas de antecedência, e o acadêmico era arguido durante uma hora por dois
professores. Ao final desse ato, com voto secreto, os arguidores optavam pela
aprovação ou reprovação.
Após o exame realizado ao término do quarto ano, o aluno jurava defender e
guardar a constituição do Império e recebia o grau de bacharel. No exame do quinto
ano, o acadêmico recebia o ponto quarenta e oito horas antes e eram três os
examinadores – acrescente-se a esse uma dissertação sobre ponto também
sorteado.
Essa atitude indica interesse em incentivar o estudo e a dedicação. No art. 2.°
observa-se: “Nesta Congregação se tratará de conferir prêmios a dous dos
estudantes de cada ano, que pela sua freqüência, lições, dissertações, atos, e até
por sua conduta, mostraram ter mais merecimento. Os prêmios serão de 50$000
cada um”.
Mas um curso universitário se faz de conhecimentos, e estes refletem
paradigmas da ciência que o percebe como seu objeto de estudo. Nas ciências
jurídicas, em época em que ainda se batiam os paradigmas do Direito natural e do
Direito positivo, grande polêmica envolvia a discussão sobre a necessidade de
ensino do Direito romano. Segundo Batista Pereira (1977):
89
O estudo do Direito Romano já foi indispensável ao jurisconsulto,
porque a legislação romana era universal, tendo sido adotada por
todas as nações; as quais antes quiseram segui-la do que fazer
códigos por que se regessem; porém, depois que se foram
conhecendo os erros daquela legislação, que já não podia ser
aplicável aos usos modernos tratou-se de formar leis próprias e
acomodadas ao nosso tempo; e pouco a pouco foi acabando o
império e o prestígio da legislação romana e a autoridade dos
glosadores (BATISTA PEREIRA, CCJB, 1977: 236).
(..)
E como se podem entender leis modernas pelo sentido de uma
legislação tão antiga e tão complicada? Sou, portanto, de parecer
contrário: em lugar de continuarmos a admitir o Código Romano, que
só servirá para embaraçar a nossa Jurisprudência, tratemos de
formar quanto antes um código propriamente nosso. (Apoiado,
apoiado) Nenhuma aplicação pode ter na América, no século XIX,
uma legislação feita para Roma e compilada por Justiniano de todas
as leis antiquíssimas, tudo quanto escreveram os jurisconsultos
daquele Império em diversas épocas.
Passando agora às doutrinas, que devem constituir este curso,
limitar-me-ei somente a um ponto. Eu não posso conformar-me com a
inteira exclusão do Direito Romano. Uma coisa é fazer deste Direito o
principal estudo, como acontecia na Universidade de Coimbra, e outra
é o degradá-lo absolutamente.
A nossa legislação ainda adota o Direito Romano em muitas e
importantíssimas matérias, omissas inteiramente nas leis pátrias; e
isto é sabido de todos os que professam a jurisprudência (MIRANDA
RIBEIRO, CCJB, 1977: 268).
Prevaleceram as primeiras opiniões e, em consequência, desapareceu o Di-
reito romano de nossas escolas, para ressurgir em 1851. A polêmica quanto ao
ensino do Direito romano vem, pois, há muito dividindo os responsáveis pela
formação do bacharel, tendo se tornado emblemática do antagonismo entre
progressistas e conservadores. Os primeiros opunham-se à medida, os segundos
defendiam tal posição. Percebia-se questionamento a respeito, sendo levantada a
importância do Direito positivo:
O mesmo ilustre Deputado autor da emenda, Sr. Presidente,
confessou que o Direito Natural era o princípio fundamental de todo o
Direito: ora, se assim é, se no Direito Natural se funda todo e
qualquer Direito, como se há de estudar Direito Positivo sem que
primeiro se conheçam os princípios do Direito Natural, em que ele se
funda? Demais, o estudo do Direito Natural é muito simples, enquanto
o do Direito Positivo tem alguma dificuldade, pois que é muito mais
complicado; o Direito Natural é código que todos entendem, é o
código da razão ensinado pela natureza a todos os homens, é
constante, é sempre o mesmo em todas as partes do universo; o
Direito Positivo pode variar, e com efeito varia conforme a inteligência
de quem o aplica, e as circunstâncias, em que é aplicado. Eu não sei,
Sr. Presidente, como se tenha podido chamar este Direito mais
simples do que o Natural! É uma contradição manifesta, uma vez se
reconheça, como reconhece o ilustre Deputado, que ele
necessariamente supõe como fundamento o Direito Natural. Portanto,
argumente como quiser o honrado membro, semelhante opinião
nunca pode ser admissível (COUTINHO, CCJB, 1977: 425).
90
Criou-se o ensino jurídico no Brasil, pensaram-se os objetivos da educação
do Direito em seu início e as faculdades de São Paulo e Recife formaram a
burocracia no País, participando do desenvolvimento ideológico de um projeto de
Estado nacional.
2.6 Segunda Fase: O ensino jurídico no Brasil República (1889- 2010)
A República tem início em 15 de novembro de 1889 e, após ter passado por
momentos democráticos e de intensa ditadura, perdura até hoje. Os historiadores
não são unânimes em apontar os fatores relevantes para o fim da monarquia. “Duas
forças, de características muito diversas, devem ser ressaltadas em primeiro lugar: o
Exército e um setor expressivo da burguesia cafeeira de São Paulo, organizada
politicamente no PRP” (FAUSTO, 2002: 132). Embora o novo regime comece com
militares no poder, Marechal Deodoro da Fonseca, na conhecida República da
Espada (1889 - 1894), é a oligarquia cafeeira que dominará o Estado, sofrendo um
abalo apenas no final da chamada República Velha (1894 - 1930).
Apesar de adotar o federalismo, na República continuou prevalecendo a
política centralizadora quanto ao ensino jurídico (BITTAR, 2001: 68). Em 1.º de
fevereiro de 1896, durante a presidência de Prudente de Moraes, passa a vigorar o
Decreto 2.226, que aprova o Estatuto das Faculdades de Direito da República,
trazendo disposições sobre o modelo a ser adotado por todas as Faculdades,
independentemente de qual região integrassem. O começo do século XX marca o
declínio da Escola de Recife (WOLKMER, 2003: 132). O Código Civil de 1916, de
Clóvis Beviláqua, da Faculdade de Recife, demonstra a importância que sua Escola
possuía na época:
Nos começos do século, entretanto, o abandono da filosofia pela
sociologia, de parte de Sílvio Romero e Artur Orlando, ou pelo Direito,
no caso de Clóvis Beviláqua, marcariam o declínio e o
desaparecimento da Escola do Recife como corrente filosófica
(WOLKMER, 2003: 129).
O fator econômico também contribuiu para o declínio de Recife. Fausto afirma
que já em 1870, estava consolidada a tendência ao desenvolvimento do Centro-Sul,
quanto a São Paulo: “[...] a cidade, que se convertia no centro de negócios cafeeiros
91
e atraía cada vez mais imigrantes, começara uma arrancada de longo alcance,
crescendo a uma taxa geométrica anual de 3% entre 1872 e 1886 e de 8% entre
1886 e 1890” (FAUSTO, 2002: 135).
Em relação às outras repercussões da República no ensino jurídico, não
houve alteração no corpo discente, mantendo-se o perfil existente no período
imperial. O mesmo serve para os professores, que não perderam as características
já traçadas: “A República Velha mantém o status da formação jurídica retórica e
literária (não técnica), descompromissado com a realidade social e a transformação
do país” (GALDINO, 1997: 160). Algumas alterações ocorreram em virtude do
Decreto 2.226, destacando-se mudanças na grade curricular.
2.6.1 Reforma Francisco de Campos (1930)
Em 1930, a predominância do poder econômico das oligarquias agrícolas
perderia espaço com a crise econômica mundial. Surgia uma nova classe dominante
urbana, centrada no comércio e na industrialização do Brasil. No âmbito
internacional, a geopolítica havia sofrido modificações após a Primeira Guerra
Mundial, e a América Latina passou a sofrer uma influência direta dos Estados
Unidos da América, que, em superação da crise econômica de 1929, adotou uma
nova forma de atuação do Estado sobre a sociedade civil. Nascia o Welfare State,
ou Estado Social.
O ensino superior sofre mudanças significativas na década de 30 com a
promulgação do Estatuto das Universidades (Decreto 19.851, de 14 de abril de
1931), no entanto “não opera efeitos relevantes no ensino jurídico quase
hermeticamente fechado às mudanças substantivas” (GALDINO, 1997: 160). A
República é a propagação do que já existia no Império. Essa dificuldade de
renovação no ensino jurídico:
92
No quadro filosófico, até aqui descrito, deve-se mencionar que o
interior da formação social foi afetado profundamente na virada do
século XIX para o início do século XX, por transformações
decorrentes da modificação sócio-político (monarquia-república), do
deslocamento no domínio da correlação de forças (senhores de
engenho-oligarquia cafeeira agroexportadoras) e das novas
estruturas jurídico-políticas, edificadas a partir da implantação do
espírito positivista-republicano e da construção de uma ordem liberal
burguesa (WOLKMER, 2003: 128)
.
Enfim, o positivismo significava renovação, fim dos dogmas ultrapassados
que atravancavam o desenvolvimento nacional. Essa postura filosófica sofre um
abalo após a Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945). Além disso, o próprio ensino
jurídico é criticado nesta mesma época pelo professor San Tiago Dantas: “(...) sua
nova didática, coloca em segundo plano o estudo sistemático e descritivo dos
institutos, e propõe a substituição das aulas expositivas pelo case system, estudos
de casos orientados para a formação do raciocínio jurídico, voltando os olhos dos
que trabalham o Direito para as relações sociais” (GALDINO, 1997: 161).
Desse modo, isolada pelo paradigma científico-positivista, a academia jurídica
teve seu único espaço de desenvolvimento na norma legislada, por sua vez
cerceada de codificações. Esse isolamento do conhecimento jurídico, aliado à
metodologia meramente de transmissão do conhecimento, revelou uma constância
“industrial” também por ordem científica. Como na “fábrica” de montagem dos
antigos “Ford T”, essa seria a “estandardização” da formação dos “bacharéis”, em
sua atuação prática como futuros lentes, aplicadores e legisladores do Direito
Da intervenção mínima do Estado Liberal na sociedade civil passou-se ao
dirigismo social. Nesse momento, era dever do Estado atuar em prol do bem-estar
da sociedade e regular, de forma intensiva, a economia. A sociedade civil brasileira
sofreria várias transformações e sucessivas modificações políticas entre 1930 e
1945, ao mesmo tempo em que os dados indicam que o ensino jurídico brasileiro se
estagnou no período.
A mais importante das reformas educacionais providas pelos governos da
época chamou-se “Reforma Francisco Campos”, em 1931. Nela institucionalizou-se
definitivamente a figura da “universidade” no Brasil, em nítida ação dirigida à
inovação dos ideais educacionais da República Velha.
O momento era de “otimismo”, com a crença no papel transformador da
escola. O que viria a ser expresso no ano seguinte (1932) n Manifesto dos Pioneiros
93
da Escola Nova. Enquanto genericamente se instala período animador para a
sistematização universitária do ensino superior, a atualização curricular proposta por
Francisco Campos, para organização da Universidade do Rio de Janeiro
(especialmente para o ensino jurídico), revelava o seu direcionamento às demandas
do mercado. Em termos de reprodução do modelo liberal, ao incentivar o estudo do
Direito positivo, privilegiando as regras gerais do Direito pátrio, mantinha-se o cerne
liberal da fase anterior.
2.6.2 O Estado Novo (1937 – 1945)
O Estado Novo tem uma grande produção legislativa de codificações. Busca-
se uma reestruturação nacional como forma de superação dos vícios do Império e
das oligarquias da República Velha. São criados novos estatutos jurídicos: Código
de Processo Civil, Código Penal, Código de Processo Penal e uma nova Lei de
Introdução ao Código Civil.
No campo das metodologias, nem mesmo o início da hegemonia americana
sobre a América Latina e a chegada de novas pedagogias liberais, como da “Escola
Nova”, geraram reflexos suficientes para intervir na dinâmica pedagógica do ensino
jurídico, pois a “pureza” científica e o fechamento do mundo acadêmico, no seu ciclo
de “estandardização” reprodutora do conhecimento, geravam por si só uma esfera
de proteção e isolamento.
O choque entre os tradicionais da já sedimentada ideologia liberal e o
movimento da “Escola Nova”, cuja crença estava nas possibilidades de inovação do
ensino, seria inevitável. O rompimento da “pureza” e da autoridade docente em prol
de uma abertura cognitiva ditada por uma variedade alienígena de conhecimentos
metodológicos, os quais questionavam o predomínio da pedagogia tradicional,
ganhou repercussão social.
Defendemos que o Estado Social brasileiro deveria ter regulamentado
qualitativamente os cursos de Direito, pois os manteve com base na pedagogia
tradicional. A única resposta efetiva do Estado brasileiro foi permitir o aumento do
estudo dos novos estatutos legislativos, a partir da criação de mais cursos de Direito.
94
A pioneira posição sobre o ensino jurídico foi de Dantas. Em seu texto sobre a
“Renovação do Direito”, em 1941, refletiu sobre os rumos da educação no Direito:
Só se consideraria, pois, em crise, no mundo de hoje, uma Faculdade
em que o saber jurídico houvesse assumido a forma de um
precipitado insolúvel, resistente a todas as reações. Seria ela um
museu de princípios e praxes, mas não seria um centro de estudos.
Para uma escola de Direito viva, o mundo de hoje oferece um
panorama de cujo esplendor raras gerações de juristas se beneficiam
(DANTAS, 1978-79: 44).
A crítica era sobre “um museu de princípios e praxes”, distante da realidade
social da época. A crise sobre a falta de flexibilidade da academia jurídica ao
momento histórico repercutia pela primeira vez, enunciada dentro do próprio meio
acadêmico.
O ensino jurídico recebe a crítica de quem se propõe a algo mais do que a
mera reprodução do Direito posto, do que um Estado que fosse monopólio das
oligarquias, do que uma nação submetida ao domínio de uma elite econômica.
Oswald de Andrade (1985: 53) escreve no Homem do Povo:
12
“Precioso e ridiculo,
como literatura politica, nullo de visão social, fechado no mais estreito e pifio
provincianismo, vertendo apenas o puz que brotados dois cancros de São Paulo – a
Faculdade de Direito e o café o manifesto do Partido Democratico (...)”.
13
Essas
linhas provocaram manifestações dos acadêmicos paulistas e agressões ao escritor.
Em razão disso, Oswald da Andrade (1985) retoma o assunto em texto
intitulado “Isto aqui é Coimbra?”. E declara que:
12
Nome do jornal que ele e Pagu fizeram em 1931. Oswald de Andrade quando ataca a Faculdade de Direito
classificando-a como “cancro de São Paulo” – no editorialAs angústias de Piratininga”, assinado por O Homem
do Povo e publicado no número 7, o jornal enfrenta um protesto. Reunidos diante da redação, que funcionava na
praça da Sé, os estudantes queriam linchar Oswald e Pagu, mas não o conseguiram. O escritor revida no editorial
“Isto aqui é Coimbra?”, publicado no número seguinte, com sua assinatura. Aí denuncia a covardia dos
estudantes por quererem “agredir em batalhão uma mulher e um homem do povo”; rememora sua passagem
pelas Arcadas, critica o conservadorismo que as sustenta e aponta a ingenuidade dos alunos.
13
Mantemos o texto original. Destacamos que os erros devem-se a posteriores reformas ou a lapsos.
95
A grande manifestação de pensamento que produziu até hoje a
Faculdade de Direito foi o trote.
(...)
Meninos, eu vos conheço! Tambem passei pelas arcadas! E fui até
numa enorme turma, o primeiro orador do Centro Academico Onze de
Agosto!! Ser-me ia facil prosseguir nessa brilhante ascenção e hoje
em vez de estar sendo agredido pelos vossos pelotões, talvez
pudesse como o meu collega de gymnasio Gabriel de Rezende Filho,
vos estar mentindo e blefando do alto de uma carunchosa cathedra
de professor, e recolhendo a troco disso ás vossas innocentes
aclamações. Mentindo e blefando, porque eu vos estaria incutindo
noções inteiramente falsas e vencidas, num mundo renovado pelo
mais poderoso sopro revolucionario do planeta. E eu não tenho
nenhuma má vontade para com vocês.
(...)
O vosso mal é um mal coimbrão, um mal portuguez agravado pela
nossa situação de colonia-mental. A nossa velha Faculdade, é como
a de Recife, apenas um pedaço de projecto escolar, que não foi
avante no Primeiro Imperio e assim reprezou o pensamento brasileiro
na bacharelice – lamentavel – herança inteIlectual das Universidade
religiosas da Peninsula Ibérica, particularmente Coimbra e
Salamanca, os dois arcaicos reductos do pensamento jezuitico e
medieval. O feudalismo juridico, se refugiou ahi, depois de varrido
pelo Humanismo e pela Reforma de todos os grandes centros
intellectuais da Europa. Nós ficamos com a herança de Coimbra! E
vocês querem prolongar Coimbra!
Talvez um único lente dos que fazem fila na vossa galeria de retratos,
foi contrario ao pensamento coimbrão – o doutor Pedro Lessa,
campeão attazado, equivocado talvez, das modernas reivindicações
do pensamento humano, mas em todo caso, apostolo da liberdade de
pensamento, inimigo declarado da Igreja e das forças reaccionarias
que hoje de novo vos dirigem.
Lamentavel esse retrocesso, que vos faz ignorar a grandesa e a
justiça das reivindicações proletarias, que empolgam o mundo
mecanizado de hoje e vos quer manter na admiração pelos porres
romanticos da bohemia ida e pela unidade psiquica das cidades
provincianas com os seus estudantes (ANDRADE, 1985: 59).
No dia 13 de abril de 1931, Oswald de Andrade faz uma publicação criticando
duramente o ensino jurídico de sua época. Os acadêmicos de Direito de São Paulo
agem com mais violência: tentam linchar os responsáveis pela publicação do jornal.
Esses fatos servem de motivo para a autoridade policial proibir a continuidade da
circulação do periódico. Em 1943, a escola de Recife também recebe críticas de
Gilberto Freyre:
96
(...) decadência, hoje alarmante, que faz de grande parte de sua
congregação uma caricatura de mestres antigos; e de muitos de seus
estudantes, moços fantasiados de estudantes de Direito, mas na
realidade funcionários públicos, alguns até investigadores de polícia;
da pobre faculdade de Direito; tão pobre de grandes professores, tão
vazia de estudantes verdadeiramente estudantes, tão estéril de
produção intelectual, tão decadente em tudo que o palácio atual, todo
cheio de doutorados, se assemelha aos olhos dos pessimistas a um
caixão de morto glorioso. Caixão que guardasse as tradições e o
passado ilustre da casa, os retratos dos velhos mestres, os livros
bons, mas já arcaicos, em que os antigos alunos estudaram Direito e
Filosofia, Sociologia e Economia. (VENANCIO FILHO, 1979: 337)
No início da década de 1960, o cenário já era bem diferente do tempo da
implantação do Império (1822) e da República (1889) no nosso país, quando
existiam apenas dois centros de estudos nos Estados de São Paulo e Pernambuco.
Nessa época já havia grande número de faculdades de Direito mantidas pelo Poder
Público e em maior quantidade pelo Poder Privado.
A tentativa de solucionar o descompasso social do ensino jurídico (leis x
realidade) foi proposta em uma alteração curricular. Isso ocorreu em 1961, já sob o
controle do Conselho Federal de Educação. Surgia o “currículo mínimo” para cursos
de Direito, com a intenção que estes tivessem um mínimo requerido para a formação
jurídica geral dos seus estudantes. Sem controle, o mercado novamente ditou as
regras, e “o currículo mínimo tornou-se, a rigor, um currículo máximo” (VENANCIO
FILHO, 1982: 318).
O autoritarismo estatal vigente no Golpe Militar de 1964 veio direcionar as
possibilidades de alteração na estrutura dos cursos de Direito. Não havia mais
espaço para a “Escola Nova” na esfera política de influência. O momento era da
valorização do tecnicismo. Essa tendência foi confirmada com o estabelecimento
dos Acordos MEC/USAID, embasando a reforma educacional de 1968. Para ajudar
no “milagre brasileiro”, o número de vagas estava à frente de metas educacionais
qualitativas. Das 61 faculdades existentes no ano de 1964, houve um salto para 122
em uma década (VENANCIO FILHO, 1982).
A manutenção da ideia de reforma, pela simples modificação da grade
curricular, novamente voltou a ser indicada como a solução para a crise em 1972,
quando os cursos de Direito receberam nova modificação curricular por
determinação da Resolução 3 do Conselho Federal de Educação. Um dos
fundamentos da reformulação curricular de 1972 consistia em que o obstáculo à
97
implantação de “soluções inovadoras” na metodologia do ensino jurídico decorria da
“dilatada extensão” do currículo mínimo dos cursos de Direito.
Em 1977, Venancio Filho (1982: 335) declara em sua obra de análise histórica
dos cursos de Direito brasileiros que este “ainda se encontra à procura de seus
caminhos”. Nas duas décadas seguintes, uma “época perdida” para o ensino jurídico
brasileiro, continua-se a reprodução do discurso e de metodologias liberais da fase
imperial. Isso representa uma grande perda das oportunidades de transformação
emancipatória, geradas no período de “otimismo pedagógico” da “Escola Nova” e do
Estado Social.
Durante o lapso temporal entre a edição da Resolução 3 (BRASIL, 1972) e a
Portaria 1.886 (BRASIL, 1994) do Ministério da Educação transcorreram cerca de
vinte anos, nos quais há que destacar o papel que começou a ser exercido pela
Ordem dos Advogados do Brasil na tentativa de melhoria dos cursos jurídicos no
Brasil, especialmente a partir do inicio dos anos 1980, com a institucionalização de
comissões especialmente voltadas para esse tema, sendo realizados diversos
trabalhos e até mesmo publicações com propostas de melhoria na oferta desses
cursos.
A Constituição de 1988 inaugura uma nova ordem jurídica no Brasil, devendo
ser destacado o amplo processo de democratização iniciado em nosso País. Como
resultado de todo esse processo participativo, a Constituição Federal de 1988
apresenta com um dos seus marcos o caráter analítico, na medida em que se dispõe
a enfrentar e disciplinar os mais variados temas, muito além dos elementos
anteriormente tratados em um documento constitucional brasileiro.
A Portaria 1.886 de 1994 (BRASIL, 1994) construída a partir do cenário criado
pela Constituição de 1988 provocou desde a perspectiva das propostas oficiais, a
mais significativa alteração dos currículos dos cursos jurídicos ao longo de toda a
sua história.
A Lei de Diretrizes e Bases Lei 9.394 de 1996 (BRASIL, 1996) representou
um grande marco no Direito Educacional Brasileiro e passou a ser a grande
referência em matéria de organização na educação brasileira. Ao longo de mais de
noventa artigos, essa Lei base da educação brasileira disciplina diversos assuntos,
entre os quais podemos destacar os princípios e finalidades da Educação nacional,
98
os deveres do Estado na esfera educacional, as formas de organização do sistema
educacional, com a repartição de competências entre os entes da federação e a
colaboração entre todos.
A Resolução 9 de 2004 (BRASIL, 2004) surge dez anos após a Portaria
1.886, o novo instrumento normativo aborda o ensino jurídico no Brasil, dentro do
cenário constitucional de 1988 e da Lei de diretrizes e Bases de 1996. Essa
Resolução, em seus treze artigos, parte de uma grande novidade que representará
um marco importante nos curso jurídicos, com a obrigatoriedade de um projeto
pedagógico em que devem constar o perfil do formando, as competências,
habilidades, conteúdos, estágios, atividades complementares e outros elementos da
instituição que se proponha a oferecer os cursos jurídicos.
Agora analisaremos os impactos das orientações normativas sobre os
currículos do curso jurídicos no Brasil.
2.7 Transformação Histórica do Currículo Jurídico
Com base nos estudos de Sanches (2003), Linhares (2009) e Silva (2009)
analisamos:
2.7.1 O "currículo único" do ensino jurídico (1827-1961)
Nessa época o currículo jurídico era estruturado em nove matérias, a ser
cursado em cinco anos, e refletia os aspectos políticos e ideológicos do Império, com
influência do Direito Natural e do Direito Público Eclesiástico. No decorrer do
Império, ocorreu a inclusão de duas cadeiras, Direito Romano e Direito
Administrativo. O curso de Direito apresentava-se sob uma estrutura de "currículo
único", e obedecia rigidamente à seguinte estrutura
14
:
14
Segundo Carta de Lei n° 1.827, de 11 de agosto de 1827 - "Lei de criação dos cursos jurídicos no Brasil",
promulgada pelo Imperador Pedro I e assinada José Feliciano Fernandes Pinheiro, Visconde de São Leopoldo.
99
Quadro 3 - Currículo único do curso jurídico no Império
1º Ano
1ª Cadeira: Direito Natural, Público, Análise da Constituição do Império, Direito das Gentes,
Diplomacia.
2º Ano
1ª Cadeira: Continuação das matérias do ano antecedente.
2ª Cadeira: Direito Público Eclesiástico.
3º Ano
1ª Cadeira: Direito Pátrio Civil.
2ª Cadeira: Direito Pátrio Criminal com Teoria do Processo Criminal.
4º Ano
1ª Cadeira: Continuação do Direito Pátrio Civil.
2ª Cadeira: Direito Mercantil e Marítimo.
5º Ano
1ª Cadeira: Economia Política.
2ª Cadeira: Teoria e Prática do Processo adotado pelas leis do Império
Para Rodrigues (1995) o currículo jurídico no Brasil Império caracterizou-se
por:
- ter sido totalmente controlado pelo governo central (recursos,
currículos, metodologia, nomeação de professores, definição de
programas);
- ter sido o jusnaturalismo a doutrina dominante, até o período em
que foram introduzidos no Brasil o evolucionismo e o positivismo
(década de 1870);
- adotar exclusivamente a metodologia das “aulas-conferência",
semelhante às de Coimbra;
- ter sido o local de formação dos filhos das elites econômicas, que
ocupariam altos cargos políticos;
- não acompanhar as mudanças sociais (RODRIGUES, 1995: 10).
Durante a denominada República Velha (1889 a 1930) teve início a
democratização do acesso ao ensino superior: novas classes sociais chegam ao
ensino jurídico. Rodrigues (2005) menciona que continuou havendo uma
desvinculação entre o ensino e a realidade social. Entretanto, apresenta alterações
curriculares, tais como:
- alteração no currículo dos cursos, buscando uma profissionalização
maior;
- influência decisiva do positivismo na concepção de Direito e no seu
ensino;
- surgimento de novas faculdades de Direito;
- início de discussões sobre a metodologia de ensino (RODRIGUES,
2005: 61).
100
Em 1890, foi retirada a cadeira de Direito Eclesiástico, devido à desvinculação
entre Estado e Igreja, não havia mais religião de Estado desde o Decreto n° 119-A,
de janeiro de 1890, e o art. 72, parágrafo 7°, da Constituição de 1891, proibia
relações especiais do Estado com qualquer culto ou Igreja. Com a reforma
educacional Francisco Campos em 1931, o curso de Direito ganhou caráter mais
profissionalizante.
Em 1895, foram inseridas as cadeiras de Filosofia e História do Direito e de
Legislação Comparada sobre o Direito Privado com a Lei n° 314, de 30/10/1895, que
determinou um novo currículo para os cursos de Direito:
Quadro 4 - Currículo jurídico na República
1º Ano
1ª Cadeira: Filosofia do Direito.
2ª Cadeira: Direito Romano.
3ª Cadeira: Direito Público Constitucional.
2º Ano
1ª Cadeira: Direito Civil.
2ª Cadeira: Direito criminal.
3ª Cadeira: Direito Internacional Público e Diplomacia.
4ª Cadeira: Economia Política.
3º Ano
1ª Cadeira: Direito Civil.
2ª Cadeira: Direito criminal, especialmente, Direito Militar e Regime Penitenciário.
3ª Cadeira: Ciências das Finanças e Contabilidade do Estado.
4ª Cadeira: Direito Comercial..
4º Ano
1ª Cadeira: Direito Civil.
2ª Cadeira: Direito Comercial (especialmente Direito Marítimo, Falência e Liquidação Judiciária).
3ª Cadeira: Teoria do Processo Civil, Comercial e Criminal.
4ª Cadeira: Medicina Pública..
5º Ano
1ª Cadeira: Prática Forense.
2ª Cadeira: Ciência da Administração e Direito Administrativo.
3ª Cadeira: História do Direito e, especialmente, do Direito Nacional.
4ª Cadeira: Legislação Comparada sobre Direito Privado.
Os currículos do ensino jurídico estiveram, durante o Brasil Império e
República, sob forte e incondicional controle político e ideológico, com poucas
101
alterações e sem nenhum espaço para mudanças, ocorrida em 1962, com a
implantação do primeiro “currículo mínimo nacional”, para o curso de Direito.
2.7.2 O "currículo mínimo" do ensino jurídico (1962-1995)
O currículo jurídico não sofre alteração até 1962. O Conselho Federal de
Educação
15
alterou a concepção vigente de "currículo único" de matriz rígida, pré-
estabelecido, inalterado e uniforme, para todos os cursos, para a concepção de
"currículo mínimo" para os cursos de graduação no Brasil, incluindo-se, portanto, o
bacharelado em Direito, na forma e sob as competências da 1ª Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional - Lei n° 4.024/61.
Por maio da LDB 4.024/61 (BRASIL, 1961), o Conselho Federal de Educação,
criado pela citada lei, em substituição ao até então existente Conselho Nacional de
Educação, emitiu o Parecer n° 215, aprovado por aquele Conselho em 15/9/62,
propondo um "currículo mínimo" de Direito, bacharelado, com duração de cinco
anos, a ser implantado a partir do ano letivo de 1963 pelo seguinte curriculo:
Quadro 5 - Currículo mínimo do ensino de Direito (1962)
Introdução à Ciência do Direito
Direito Civil
Direito Comercial
Direito Judiciário (com prática forense)
Direito Internacional Privado
Direito Constitucional (incluindo noções de Teoria do Estado)
Direito internacional Público
Direito Administrativo
Direito do Trabalho
Direito Penal
Direito Judiciário Penal (com prática forense)
Direito Financeiro e Finanças
Economia Política
15
OConselhoFederaldeEducação(CFE)foiextintopelogovernoem1994.
102
Como vimos, história e currículo revelam a concepção dos cursos em cada
época, como também ocorrera antes de 1961, quando, ainda em funcionamento o
então Conselho Nacional de Educação, é transformado pela Lei n° 4.024/61
(BRASIL, 1961), em Conselho Federal de Educação.
Segundo Linhares (2009), o estudo comparado dos marcos legais à época
vigente, incluindo o advento da 1ª LDB - lei n° 4.024/61, revela que embora
"currículo mínimo nacional” e a "duração do curso" ainda significassem dificuldades
para as alterações curriculares, as normas decorrentes da nova LDB, ao tempo em
que instituíram "currículo mínimo", ensejavam, por seu turno, que as instituições de
ensino elaborassem seus respectivos "currículos plenos", como forma de se
adaptarem aos novos reclamos regionais, sociais, econômicos e culturais da
sociedade, o que, de fato, faz revelar uma certa flexibilidade curricular, ainda que
mantida fixa a duração de 5 anos para o curso de Direito.
Em 1962, pela primeira vez, o então Conselho Federal de Educação (CFE)
estabelece o currículo mínimo, substituindo o currículo pleno até então vigente.
Assim é o Parecer n° 215/1962, que contém o primeiro "currículo mínimo" do curso
jurídico, no Brasil, em substituição ao "currículo único", e referencial para a
elaboração de "currículo pleno" em cada instituição, que foi homologado pelo então
Ministro de Educação e Cultura, Prof. Darcy Ribeiro, nos termos da Portaria
Ministerial de 4/12/1962.
Em 1964, após o golpe militar, a tendência de profissionalização dos cursos
de Direito se intensifica. As faculdades, sem liberdade para debates, por conta da
censura, ensinam aos alunos informações genéricas e presas à legislação imposta,
transmitindo um conhecimento alheio à realidade social. Em 1968, o art. 26 da lei n°
5.540/68 determina que:
O Conselho Federal de Educação fixará o "currículo mínimo" e a
duração mínima dos cursos superiores correspondentes a profissões
reguladas em lei e de outros necessários ao desenvolvimento
nacional (BRASIL, 1968).
Na década 1970, o maior desenvolvimento da economia brasileira e o
crescimento econômico e populacional fizeram aumentar as oportunidades de
trabalho. Houve, então, espaço no mercado de trabalho para o bacharel. Em virtude
103
disso, cresceu o número de faculdades de Direito, ampliando ainda mais o acesso a
elas pela classe média.
Em 1972, é introduzido o novo currículo mínimo - que vigorou até 1994 - e o
estágio supervisionado torna-se obrigatório. No mesmo ano, o Conselho Federal de
Educação institui a Resolução n° 3/72, que fixa o currículo mínimo nacional do curso
de graduação em Direito, constituído pelo seguinte currículo:
Quadro 6 - Currículo mínimo nacional do ensino jurídico (1972-1994)
A. Básicas:
Introdução ao Estudo do Direito;
Economia;
Sociologia.
B. Profissionais:
Direito Constitucional (Teoria do Estado – Sistema Constitucional Brasileiro)
Direito Civil (Parte Geral – Obrigações – Parte Geral e Parte Especial – Coisas – Família –
Sucessão)
Direito Penal (Parte Geral – Parte Especial)
Direito Comercial (Comerciantes – Sociedades – Títulos de Crédito – Processo Trabalhista)
Direito Administrativo (Poderes Administrativos – Atos e Contratos Administrativos – Controle
de Administração Pública – Função Pública)
Direito Processual Civil (Teoria Geral – Organização Judiciária – Ações – Recursos –
Execuções)
Direito Processual Penal (Tipo de Procedimento – Recursos – Execução)
Prática Forense, sob a forma de estágio supervisionado
Estudo de problemas Brasileiros e a prática de Educação Física, com predominância
desportiva, de acordo com a legislação específica
C. Duas opcionais dentre as seguintes:
a) Direito Internacional Público
b) Direito Internacional Privado
c) Ciências das Finanças e Direito Financeiro (Tributário e Fiscal)
d) Direito da Navegação (Marinha e Aeronáutica)
e) Direito Romano
f) Direito Agrário
g) Direito Previdenciário
h) Medicina Legal
104
Em 1994, é publicada a Portaria n° 1.886/94, tornando as atividades
complementares obrigatórias e introduzindo o Trabalho de Conclusão de Curso
(TCC).
Segundo Linhares (2009), para o entendimento das estruturas curriculares do
curso de Direito, apontadas, é preciso, analisar a lei n° 314/1895, a lei n° 4.024/61 e
a lei n° 5.540/68, bem como o instituído pela atual LDB n° 9.394/96. O currículo
então vigente para o curso de Direito compreendia matérias consideradas básicas e
profissionais, incluindo-se nestas a matéria de Prática Forense, sob a forma de
estágio supervisionado.
2.7.3 O "currículo mínimo nacional" do ensino jurídico (1972-1990)
Após o "currículo mínimo nacional”' fixado pela Resolução CFE n° 3/72
(BRASIL, 1972), foi constituída pelo MEC, sob critério da representação regional,
uma Comissão de Especialistas de Ensino Jurídico, em 1980, com a finalidade de
refletir com profundidade sobre a organização e o funcionamento dos cursos de
Direito no país.
Já em um processo de busca de melhoria, a referida Comissão apresenta
uma proposta de alteração do currículo implantado pela Resolução do extinto
Conselho Federal de Educação - CFE n° 3/72 (BRASIL, 1972), que segundo Paulo
Luiz Neto Lôbo (1996: 9), encontrava-se desatualizada e insuficiente.
Essa proposta, contudo, não contemplava as necessárias mudanças
estruturais que resolvessem os problemas em torno do ensino jurídico no Brasil, pois
fundamentava-se, ainda, em concepções filosóficas baseadas unicamente num
legalismo positivista e tecnicismo, exclusivamente, formal, pouco comprometidas
com a formação educacional, de uma consciência e raciocínio jurídico.
O modelo curricular proposta por essa Comissão de Especialistas de Ensino
Jurídico, constituída em 1980, pelo MEC, e configurada por quatro grupos de
matérias, a seguir se verifica:
105
Quadro 7 - Currículo mínimo nacional do ensino jurídico- MEC (1980)
1. Matérias Básicas
Introdução à Ciência do Direito
Sociologia Geral
Economia
Introdução à Ciência Política
Teoria da Administração
2. Matérias de Formação Geral
Teoria Geral do Direito
Sociologia Jurídica
Filosofia do Direito
Hermenêutica Jurídica
Teoria Geral do Estado
3. Matérias de Formação Profissional
Direito Constitucional
Direito Civil
Direito Penal
Direito Comercial
Direito Administrativo
Direito Internacional
Direito Financeiro e Tributário
Direito do Trabalho e Previdenciário
Direito Processual Civil
Direito Processual Penal
4. Matérias Direcionadas a Habilitações Específicas
Essa proposta curricular não foi objeto de análise nem pelo Conselho Federal
de Educação, nem pelo MEC, sobretudo porque a Resolução n° 3/72 (BRASIL,
1972), apesar de enfeixar um currículo mínimo nacional, permitia às instituições de
ensino certo grau de autonomia para definirem seus currículos plenos, desde que
fossem respeitados o mínimo contido na Resolução.
Essa situação permaneceu até 1998, com a implantação das "Diretrizes
curriculares e o conteúdo mínimo do curso jurídico", de âmbito nacional, fixados pela
Portaria n° 1.886/94 (BRASIL, 1994).
O disposto no art. 15 daquele ato concedia o prazo de dois anos, contados
daquela data, para o seu cumprimento, revogando, em seu art. 17, as disposições
106
em contrário, especialmente as Resoluções n° 3/72 e 15/73, do extinto Conselho
Federal de Educação, embora a Resolução n° 15/73, que tratava da Prática Forense
e Organização Judiciária, já se encontrasse revogada com o advento da Lei nº
8.906/94 - Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (BRASIL, 1994).
Assim, a partir da lei n° 8.906/94
16
, que trata do Estatuto da OAB, passa-se a
vislumbrar, contudo, uma maior presença dessa entidade na fiscalização do ensino
jurídico e das políticas curriculares do curso de Direito.
Com efeito, a lei n° 8.906, de 4 de julho de 1994, estabelece poderes ao
Conselho Federal em relação aos cursos jurídicos.
Diz o art. 54, inciso XV do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil:
Colaborar como o aperfeiçoamento dos cursos jurídicos e opinar,
previamente, nos pedidos apresentados aos órgãos competentes
para a criação, reconhecimento ou credenciamento desses cursos
(BRASIL, 1994).
Além desse fundamento legal, a OAB tem claro que lhe são atribuídas
competências que ultrapassam os limites da fiscalização da atividade profissional,
entendendo, com base na referida lei, em conformidade com o art. 44, inciso I, que
lhe incumbe o papel de "aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas".
No entanto, há quem defenda a tese de que não é cabível a presença da OAB
de forma interveniente dentro das IES, e, por via de consequência, da fiscalização
da política curricular do ensino jurídico, posto que o curso de graduação jurídico não
forma advogados, mas sim bacharéis em Direito.
2.7.4 O currículo de "conteúdo mínimo do curso jurídico" (1994-2010)
Em 1994, foi instituída a Portaria MEC n° 1.886, de 30 de dezembro de 1994
(BRASIL, 1994), do governo Itamar Franco, que trouxe algumas inovações e
avanços ao currículo do curso de Direito, especialmente pelo seu direcionamento à
realidade social e integração dos conteúdos com as atividades, conferindo relativa
dimensão teórico-prática ao currículo jurídico.
107
O processo de formulação da Portaria MEC n° 1.886 (BRASIL, 1994) teria
como fundamentação legal a extinção do Conselho Federal de Educação pela MP n°
661/94, em seu art. 4° que daria ao MEC, após a extinção dos mandatos dos
membros do CFE, o exercício até 30 de abril de 1995, das atribuições do CNE,
criado naquele ato.
A versão final foi redigida pela Comissão de Especialistas do Ensino do
Direito da Secretaria de Educação Superior (SESu-MEC), deliberando-se o que ficou
definido em seminários regionais nas cidades de Porto Alegre, Recife e São Paulo,
após a participação de profissionais ligados ao ensino jurídico e a realização do
Seminário Nacional dos Cursos Jurídicos, realizado nos dias 6 e 7 de dezembro de
1993, em Brasília.
Esse seminário teve como ponto de partida as conclusões e propostas tiradas
nos três encontros regionais, anteriormente realizados, e para ele foram convidados
todos os cursos de Direito e respectivos Centros Acadêmicos do país, além de
outras instituições representativas da área educacional e da área jurídica em geral.
As propostas e as conclusões desses seminários foram arranjadas em três
grandes grupos: a) elevação de qualidade; b) avaliação interna e externa; c) reforma
dos currículos.
Embora a Portaria MEC n° 1.886/94, de 30 de dezembro de 1994, fixe no
corpo do seu texto normativo, pela primeira vez, a expressão "diretrizes
curriculares", os membros da Comissão de Ensino Jurídico da OAB, acabaram por
corroborar a tese de que o referido ato normativo fixava, na verdade, um "currículo
mínimo" para o curso jurídico, mesmo que tratasse em sua ementa de duas
concepções distintas de currículos, expressas no próprio ato normativo. Ocorre que
a MP n° 661/94, que extinguiu o CFE, dando nova redação ao art. 9, não incluiu,
dentre as competências do novo CNE, aquela que fixasse o currículo mínimo dos
cursos superiores.
A Portaria MEC. n° 1.886/94 fixou, assim, um "currículo mínimo nacional do
curso jurídico", com duração de, no mínimo, 3.300 (três mil e trezentas) horas de
16
BRASIL. Lei n° 8.906, de 4 de julho de 1994. Dispõe sobre o EstatutodaAdvocaciaeaOrdemas
AdvogadosdoBrasil‐OAB.(EOAB).DiárioOficial[da]República FederativadoBrasil, Brasília,DF,5
jul.1994.
108
atividades, integralizáveis em, pelo menos cinco anos, ampliando-se, dessa forma, a
carga horária mínima de 2.700 (duas mil e setecentas) horas, em relação à
Resolução CFE n° 3/72 (BRASIL, 1972).
À semelhança dos atos normativos anteriores, a Portaria Ministerial n°
1.886/94 também estabeleceu, em seu art. 6°, "o conteúdo mínimo do curso jurídico,
além do estágio", compreendendo as seguintes matérias, detalhadas e nominadas,
"que podem estar contidas em uma ou mais disciplinas do currículo pleno de cada
curso", que foram distribuídas em dois grupos:
Quadro 8 - Currículo do ensino jurídico - Portaria MEC n° 1.886/94
I. Matérias Fundamentais
Introdução ao Direito
Filosofia (Geral e Jurídica)
Ética (Geral e Profissional)
Sociologia (geral e Jurídica)
Economia
Ciência Política (com Teoria do Estado)
II. Matérias Profissionalizantes
Direito Constitucional
Direito Civil
Direito Administrativo
Direito Tributário
Direito Penal
Direito Processual Civil
Direito Processual Penal
Direito do trabalho
Direito Comercial
Direito Internacional
A Portaria criou duas espécies de matérias no currículo jurídico:
matérias fundamentais: Introdução ao Direito, Filosofia, Sociologia, Economia e
Ciência Política; e
matérias profissionalizantes ou jurídicas: Direito Constitucional, Civil,
Administrativo, Tributário, Penal, Processual Civil, Processual Penal, Trabalho,
Comercial e Internacional.
A Portaria MEC n° 1.886/94 (BRASIL, 1994) estabelecia, ainda, em relação
ao estágio externo, que a Prática Jurídica poderia ser complementada mediante
convênios que possibilitassem a participação dos estudantes na prestação de
109
serviços e assistência jurídicos, incluída aí a assistência judiciária. Essa Portaria
fazia também referência expressa ao estágio profissional de advocacia, previsto no
inciso II dos parágrafos 1° a 4° do art. 9° da lei n° 8.906/94. A Portaria inova ao
estabelecer que as demais matérias e novos Direitos serão incluídos nas disciplinas
em que se desdobrarão o currículo pleno de cada curso, de acordo com a
observância da interdisciplinaridade.
2.7.5 Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Direito
(1994)
O art. 8° da Portaria n° 1.886/94 (BRASIL, 1994) continha uma respeitável
proposta pedagógica, além do caráter metodológico, na medida em que enseja o
atendimento às vocações e demandas sociais e de mercado de trabalho,
equivalendo dizer que as instituições têm a liberdade e até a responsabilidade de
flexibilizar o seu currículo pleno para ensejar a formação de profissionais do Direito
aptos a ajustar-se às mudanças iminentes, inclusive de caráter regional, de forma
que o operador do Direito possa, além do conhecimento geral da ciência do Direito,
aprofundar-se em uma determinada área ou ramo específico a que pretenda
dedicar-se preferencialmente, sob a forma de estudos de "especialização"
integrados aos estudos da graduação. Estes podem culminar com a pós-graduação
lato sensu, de acordo com os componentes do Núcleo de Especialização Temática,
complementando a carga horária indispensável à pós-graduação.
Ocorre, porém, que essa flexibilização conforme apontou o conselheiro do
CNE, Dr. Edson de Oliveira Nunes
17
, esbarrou em uma rigidez do currículo mínimo
nacional para a graduação do bacharel em Direito, uma vez que tal procedimento
somente seria possível se fosse, primeiramente, como um pré-requisito, "observado
o currículo mínimo previsto no art. 6°”, o que descaracteriza a definição de "diretrizes
curriculares", expressão essa adotada na ementa da Portaria e que não corresponde
ao que as leis n° 9.131/95 e n° 9.394/96, com os consequentes Pareceres do
Conselho Nacional de Educação, entendiam como sendo "Diretrizes Curriculares
110
Nacionais para a Graduação" e "Diretrizes Curriculares para cada Curso de
Graduação," como ora se relata para o curso de graduação em Direito, bacharelado.
O Conselho Nacional de Educação, por meio da Câmara de Educação
Superior, aprovou o Parecer CES/CNE 507/99, contendo a indicação para que o
Ministro de Estado da Educação revogasse as Portarias n° 1.886/94 e 3/96, "para
assegurar a coerência nas Diretrizes Curriculares" sob a nova concepção
preconizada nas leis supra-referidas, para todos os cursos de graduação, incluindo,
também, os cursos de graduação em Direito. As propostas já estavam em tramitação
no âmbito do Ministério e do próprio Conselho, em decorrência do Parecer CES/CNE
n° 776/97 e do Edital SESu/MEC 4/97.
No Parecer CES/CNE n° 507/99, alertara-se quanto à necessidade de que se
observasse toda a metodologia traçada pelo Edital remetido, de tal forma que a
Câmara de Educação Superior pudesse, no momento oportuno, deliberar sobre as
Diretrizes Curriculares para o Curso de Graduação em Direito, de acordo com a
nova ordem jurídica, de forma a permitir que as instituições definam "currículos
adequados, capazes de se ajustarem às incessantes mudanças, não raro muito
rápidas, a exigir respostas efetivas e imediatas das instituições educacionais".
Esse também é o posicionamento definido no Parecer CES/CNE n° 776/97, já
que se acrescenta a seguinte orientação geral extraída do Edital n° 4/97 para a sua
organização, enfocada no Parecer CES/CNE nº 507/99:
As Diretrizes Curriculares têm por objetivo servir de referência para as
IES na organização de seus programas de formação, permitindo uma
flexibilidade na construção dos currículos plenos e privilegiando a
indicação de áreas do conhecimento a serem consideradas, ao invés
de estabelecer disciplinas e cargas horárias definidas. As Diretrizes
Curriculares devem contemplar ainda a denominação de diferentes
formações e habilitações para cada área do conhecimento,
explicitando os objetivos e as demandas existentes na sociedade.
O Parecer CES/CNE n° 507/99, da Câmara de Educação Superior enfatizou
também que:
17
Segundo posicionamento exarado pelo conselheiro do Conselho Nacional de Educação, Prof. Edson de
Oliveira Nunes, nos autos dos Processos nºs: 23001.000074/2002-10, 23001.000303/2001-15 e
23001.000150/2003-60, referente ao PARECER n° CES/CNE 211/2004 aprovado em 08/7/2004.
111
A Flexibilização enfocada induz maior nível de responsabilidade das
instituições de educação quando da "elaboração de sua proposta
pedagógica coerente com essa nova ordem e com as exigências da
sociedade contemporânea". Nesse novo contexto, no entanto, não
convivem bem a Portaria Ministerial n° 1.886/94, com a alteração que
lhe introduziu a Portaria n° 3/96, como se constata pela análise de
cada dispositivo do referido ato normativo, que esposou uma visão do
currículo do curso jurídico bem diversa daquela que, cinco anos
depois, resulta da nova política educacional brasileira contida na Lei
de Diretrizes e Bases n° 9.394/96, construída sobre os pilares da
nova Ordem Constitucional de 1988.
O currículo mínimo fixado para todos os cursos de Direito no país, tanto pela
Resolução n° 3/72 (BRASIL, 1972), como pela Portaria Ministerial n° 1.886/94
(BRASIL, 1994), significasse evidente limite à autonomia, responsabilidade e
liberdade das instituições de ensino superior, as "habilitações específicas", a
flexibilização da duração dos cursos, no primeiro ato, e a possibilidade dos "núcleos
temáticos de especialização, segundo as vocações e demandas sociais e de
mercado de trabalho", a partir do quarto ano, na forma prevista no art. 8° do segundo
ato, certamente revelam o esforço para inovar na elaboração e na operacionalização
do "currículo pleno", a cargo de cada instituição.
Nesse novo contexto legal, para substituir os currículos mínimos obrigatórios
nacionais, surgiram as Diretrizes Curriculares Nacionais, lastreadas pelos Pareceres
CES/CNE n° 776/97, n° 583/2001 e n° 67/2003, além das propostas recebidas da
SESu/MEC, dos órgãos de representação profissional e de outros segmentos da
sociedade brasileira, de cujas contribuições resultaram as atuais Diretrizes
Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito.
2.7.6 Síntese histórica do Currículo Jurídico no Brasil
Com base nos estudos de Sanches (2003), Linhares (2009) e Silva (2009), a
tabela sintetiza o percurso histórico do currículo no ensino jurídico.
112
Quadro 9 - Síntese da configuração estrutural dos currículos jurídicos ao longo da história
I. Primeiro momento histórico:
Currículo importado da Universidade de Coimbra até a estruturação do “currículo único”
currículo único” para todos os cursos de Direito, no Brasil, de 1827 (Império) a 1889 (início
da República) e até 1962
II. Segundo momento histórico:
Mudança de currículo único”, vigente no período anterior, para “currículo mínimo” nacional e
currículo pleno”, por instituição de ensino, com a flexibilização regional, embora
permanecesse rígido “currículo mínimo”.
III. Terceiro momento histórico:
De Currículo mínimo” em 1962, perpassando por 1972 com as Resoluções nº 3/72 e nº
15/73, mantendo-se as concepções simultâneas de “currículo mínimo” nacional e “currículos
plenos” institucionais.
IV. Quarto momento histórico:
currículo mínimo” nacional e “currículo pleno” das instituições com flexibilização para
habilitações e especializações temáticas, em 1994, com a Portaria Ministerial nº 1.886/94,
para implantação a partir de 1996, posteriormente diferido para 1998, ainda que a ementa da
referida Portaria estivesse assim redigida, com um equívoco ou contradição em seus termos.
Fixa as diretrizes curriculares e o conteúdo mínimo do curso jurídico”, posto que, se
diretrizes fossem, amplas e abertas, não haveria a exigência expressa de determinado
conteúdo mínimo do curso jurídico, nacional, ainda que sem embargo dos currículos plenos
das instituições.
V. Quinto momento histórico:
De currículo mínimo” / “conteúdo mínimo do curso jurídico” para “diretrizes curriculares
nacionais da graduação em Direito”, em decorrência da lei nº 9.131/95, lei nº 9.394/96 e lei nº
10.172/2001, desse conjunto normativo resultando o parecer CES/CNE nº 776/97, Edital nº
4/97, Parecer CES/CNE nº 507/99, culminando com o Parecer nº 0055/2004.
VI. Sexto e atual momento histórico:
“Diretrizes Curriculares” – Resolução CNE/CES nº 9/2004.
* Quadro sintético elaborado a partir de dados apresentados no Parecer CNE/CES n° 0055/2004.
2.7.7 As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Direito
2.7.7.1 Resolução CNE/CES n° 9/2004
Em 29 de setembro de 2004, após trabalhos e discussões do Ministério da
Educação e Cultura (MEC), foi elaborada pelo Conselho Nacional de Educação, por
sua Câmara de Educação Superior - CNE, por via de Resolução específica para
tratar das diretrizes para a configuração do currículo jurídico. Trata-se da Resolução
113
CNE/CES n° 9/2004 (BRASIL, 2004), que instituiu por força de 13 (treze) artigos, as
novas Diretrizes Curriculares a serem cumpridas, em âmbito nacional, pelas IES
públicas e privadas para os cursos de bacharelado em Direito.
Convém registrar, no entanto, que é preciso valer-se de outros documentos
normativos, além da Resolução n° 9/2004 (BRASIL, 2004), atualmente, em vigor no
ordenamento jurídico educacional, para tentar-se compreender, de maneira
sistêmica, a orientação da configuração das atuais diretrizes curriculares nacionais
para os cursos de Direito.
Citam-se aqui, especialmente, os Pareceres emanados também da Câmara
de Educação Superior, do Conselho Nacional de Educação, especificamente os
Pareceres CES/CNE n° 776/97, n° 583/2001, n° 67/2003, n° 55/2004.
Pela interpretação, por exemplo, do Parecer CNE/CES 55/2004, verifica-se
que já havia uma proposta curricular anterior que consistia, diferentemente da atual
configuração, na seguinte matriz curricular para o curso de Direito, quanto ao
conteúdo fundamental: Economia, Sociologia, Filosofia, Ciência Política, Psicologia,
Ética, Antropologia.
Com relação ao conteúdo profissionalizante, há: Introdução ao Direito, Direito
Constitucional, Direito Administrativo, Direito Tributário, Direito Penal, Direito Civil,
Direito Empresarial, Direito do Trabalho, Direito Internacional, Direito Processual,
sendo que o Trabalho de Curso - TC final era opcional.
Depreende-se dos instrumentos normativos de Direito Administrativo e de
Direito Educacional, em vigor, especificamente à Resolução n° 9/2004 (BRASIL,
2004) que, quanto à metodologia adotada, o curso de Direito deve enfocar pela
ordem:
1. organização de curso;
2. projeto pedagógico;
3. perfil desejado do formando;
4. competências e habilidades;
5. conteúdos curriculares;
6. estágio curricular supervisionado;
7. atividades complementares;
8. sistema de avaliação;
9. trabalho e curso;
10. regime acadêmico;
11. duração do curso.
114
Conforme Resolução CNE/CES n° 9/2004 (BRASIL, 2004), instituída para o
curso de bacharelado em Direito, as atuais DCNS constituem-se como:
Diretrizes cuja finalidade é orientar, em âmbito nacional, as Instituições de
Educação Superior - IES, na organização de todos os seus cursos de graduação, e
na flexibilização da organização curricular.
As Diretrizes Curriculares para o curso de Direito definem-se, assim, como
orientações cuja finalidade é nortear, em âmbito nacional, as Instituições de
Educação Superior - IES, na organização de todos os seus cursos de graduação e
na flexibilização da organização curricular.
Conforme dispõe o art. 5° da Resolução (BRASIL, 2004), os cursos de Direito
devem trabalhar conteúdos e atividades que atendam a três eixos de formação
interligados, que são os seguintes:
I. Eixo de Formação Fundamental: objetiva integrar ao aluno no
campo, estabelecendo as relações do Direito com outras áreas do
saber;
II. Eixo de Formação Profissional: abrangendo o enfoque
dogmático, o conhecimento e a aplicação dos diversos ramos,
estudados sistematicamente e contextualizados segundo a evolução
da ciência do Direito e sua aplicação às mudanças sociais,
econômicas, políticas e culturais do Brasil;
III. Eixo de Formação Prática: objetiva a integração entre a prática e
os conteúdos teóricos desenvolvidos nos demais Eixos.
As novas "diretrizes" constituem-se, em verdade, "conteúdos e atividades
obrigatórios", equiparando-se, portanto, novamente à antiga configuração de um
"currículo mínimo" cujo paradigma curricular tanto se criticou, no passado.
As atuais diretrizes curriculares instituídas devem orientar à criação de
diferentes formações e habilitações para cada área do conhecimento. Possibilitam,
assim, a definição de diversos perfis profissionais, visando e garantindo maior
diversidade de carreiras; promovendo a integração do ensino de graduação com a
pós-graduação; privilegiando, no perfil de seus alunos, as competências intelectuais
que reflitam a heterogeneidade das demandas sociais e regionais onde as IES se
encontram geograficamente localizadas.
Deve-se considerar que as DCNs atualmente instituídas por força da
Resolução do CNE/CES n° 9/2004 (BRASIL, 2004), para o curso de graduação em
Direito, devem refletir uma dinâmica que atenda aos diferentes perfis de
115
desempenho a cada momento exigido pela sociedade, pela heterogeneidade das
mudanças sociais, econômicas e culturais.
Dinâmica curricular para o ensino do Direito que deve ser acompanhada, no
entanto, na realidade de novas e mais sofisticadas tecnologias, novas e mais
complexas situações jurídicas, a exigir até contínuas revisões do projeto pedagógico,
do curso jurídico, que, assim, se constituirá em caixa de ressonância dessas efetivas
demandas, para formar profissionais do Direito, adaptáveis e com a suficiente
autonomia intelectual e de conhecimento para que se ajuste sempre às
necessidades emergentes, revelando adequado raciocínio jurídico, postura ética,
senso de justiça e sólida formação humanística.
Enquanto tecnologia de controle, seu ensino será unidisciplinar, meramente
informativo, despolitizado, massificador e dogmático, estruturado em torno de um
sistema jurídico autárquico, auto-suficiente, completo, lógico e formalmente
coerente. Enquanto atividade científica, crítica e especulativa, seu ensino será
formativo, não-dogmático e multidisciplinar, organizado a partir de uma interrogação
sobre a dimensão política, sobre as implicações socioeconômicas e sobre a
natureza ideológica de toda e qualquer ordem jurídica. Os conteúdos dos
componentes curriculares exigíveis, de maneira obrigatória, atualmente em qualquer
currículo pleno do curso de Direito, são constituídos, por três eixos de formação:
Quadro 10 - Diretrizes Curriculares na Resolução CNE/CES nº 9/2004
Resolução CNE/CES nº 9/2004:
Conteúdos e Atividades
expressamente obrigatórios
1 – Eixo de Formação
Fundamental
Antropologia,
Ciência política,
Economia,
Ética,
Filosofia,
História,
Sociologia,
Psicologia.
2 – Eixo de Formação Profissional
Direito Cosntitucional,
Direito Administrativo,
Direito Tributário,
Direito Penal, Direito Civil,
Direito Empresarial,
Direito do Trabalho,
Direito Internacional,
Direito Processual.
3 – Eixo de Formação Prática
Estágio Supervisionado,
Trabalho de Cursos,
Atividades Complementares
116
Resolução CNE/CES nº 9/2004:
Conteúdos e Atividades
expressamente obrigatóriossx
Decorrentes do perfil definido para o
egresso e da necessidade de trabalhar
competências e habilidades
Técnicas de redação jurídica,
Hermenêutica jurídica,
Teoria da argumentação,
Tecnologias,
Metodologia à pesquisa do
Direito,
Teoria do Processo,
Estudos de caso
Outros conteúdos e atividades obrigatórios
Constituição Federal Brasileira de
1988 (art. 5º)
Os conteúdos e atividades
necessários ao pleno
desenvolvimento da pessoa
humana e seu preparo para a
cidadania
Conteúdos propostos nessa tese
a serem incluídos na
configuração das Diretrizes
Curriculares
Constituição Federal
(art. 225, § 1º, inc. 6º) da lei nº
9.795/1999
e Decreto nº 4.281/2002
(Educação Ambiental)
Educação Ambiental
Temas e Práticas Integradas:
Interdisciplinares e
Transdisciplinares
Educação à Distância
Educação para 3ª Idade
Novos Direitos: Difusos e
Coletivos: Estatuto da Criança e
do Adolescente, Direito do
Consumidor
Lei nº 9.394/1996
(LDB, art. 43, inc. III)
Lei nº 10.172/2001 (PNE) e
Resolução CNE/CES nº 9/2004
(art. 2º)
Pesquisa e Extensão
Lei nº 10.861/2004
(SINAES) art. 5º, §5º
ENADE
2.7.7.2 Elementos estruturais na Resolução CNE/CES n° 9/2004
Os elementos estruturais do projeto pedagógico do curso de Direito, além do
seu currículo pleno e sua operacionalização, deverá dispor, conforme exigência do
art. 2, § 1° da Resolução n° 9/2004 (BRASIL, 2004), os tópicos a seguir:
117
I. concepção e objetivos gerais do curso, contextualizados em
relação às suas inserções institucional, política, geográfica e social;
II. condições objetivas de oferta e a vocação do curso;
III. cargas horárias das atividades didáticas e da integralização do
curso;
IV. formas de realização da interdisciplinaridade;
V. modos de integração entre teoria e prática;
VI. formas de avaliação do ensino e da aprendizagem;
VII. modos da integração entre graduação e pós-graduação, quando
houver;
VIII. incentivo à pesquisa e à extensão, como necessário
prolongamento da atividade de ensino e como instrumento para a
iniciação científica;
IX. concepção e composição das atividades de estágio curricular
supervisionado, suas diferentes formas e condições de realização,
bem como a forma de implantação e a estrutura do Núcleo de Prática
Jurídica;
X. concepção e composição das atividades complementares; e,
XI. inclusão obrigatória do Trabalho de Curso.
Conforme menciona Linhares (2009) e Silva (2009), as atuais Diretrizes
Curriculares Nacionais devem se constituir num instrumento legal de forma a
contemplar o respeito a fundamentação teórica e normativa curricular de
flexibilidade, descentralização e respeito à autonomia das IES, de maneira
adequada na configuração do ensino do Direito e das IES, essencial para as novas
habilidades e competências exigidas para a profissão do futuro em Direito, visando a
promover a formação humanística, técnico-jurídica e prática, indispensável à
compreensão interdisciplinar e transdisciplinar do fenômeno jurídico e das
transformações sociais no mundo contemporâneo.
118
Capítulo 3: Currículo: histórias, teorias e a importância para o ensino jurídico
...realizei a analise de um saber cujo corpo visível não é o discurso
teórico ou científico nem a literatura, mas uma prática quotidiana e
regulamentada (FOUCAULT, Michael).
O capítulo busca estudar aspectos relevantes do currículo e sua função
dentro do ensino jurídico.
3.1 A importância do termo currículo
A palavra latina curriculum significa caminho, trajeto e percurso. Segundo o
pequisador Goodson (1995: 7), o termo curriculum é derivado da palavra latina
currere, que significa correr, curso ou carro de corrida. Pode também estar se
referindo à “ordem como sequência” e à “ordem como estrutura”. Remete ao
conjunto de práticas educativas difundidas no século XVI, em universidades,
colégios e escolas, a partir do Modus et Ordo Parisienses. Modus designava a
combinação e a subdivisão das escolas em classes, com a retenção da instrução
individualizada, isto é, aluno por aluno, e Ordo (ordem) tinha dois significados:
sequência (ordem de eventos) e coerência (sociedade ‘ordenada’) (HALMILTON,
1992).
No século XVI aparece pela primeira vez a palavra curriculum aplicada aos
meios educacionais. Os registros mostram que currículo esteve ligado à ideia de
“ordem como estrutura” em função de determinada eficiência social. Na
Universidade de Leiden (1582) os registros constam que “tendo completado o
curriculum de seus estudos” o certificado era concedido ao aluno (HAMILTON,
1992).
O conceito de currículo vai sofrendo uma transformação que o tem
transportado, desde sua concepção etimológica restrita como visto anteriormente - e,
entendido como plano de instrução, até uma concepção mais aberta de projeto de
formação, no contexto de uma dada organização educacional, enquanto projeto e
finalidade de escolarização.
Defendemos que o paradigma de currículo, na atualidade deve ser elaborado
para a promoção da dignidade da pessoa humana e de suas demandas de formação
119
integral, humanística, cultural e histórica do educando; em detrimento, inclusive, de
contextos de complexidade, de interdisciplinaridade e de transdisciplinaridade que
são indispensáveis para que as incertezas e transformações do nosso século sejam
enfrentadas.
3.2 A história das concepções de currículo
Historicamente foram construídas diferentes concepções de currículo, cada
qual a partir do cenário econômico, político, científico e ideológico em que estava
inserida. Os estudos nesta área advêm do caráter de divergência ideológica das
diversas concepções de currículo. Orientam o desenvolvimento deste capítulo
questionamentos sobre as matrizes teóricas dos estudos de currículo e seus
pressupostos desde suas origens até as últimas décadas do século XX e início do
século XXI.
O currículo é um objeto dinâmico, dado seu caráter de constante construção
coletiva. Como práxis é a expressão da função social e cultural da educação. Por
isso, as funções que o currículo assume como expressão do projeto cultural e da
socialização são realizadas por meio de seus conteúdos, de seu formato e das
práticas que gera em torno de si. Analisar os currículos concretos significa estudá-
los no contexto em que se configuram, no nosso caso os cursos de Direito no Brasil
e a herança portuguesa.
A história das concepções de currículo é marcada por decisões tomadas com
o intuito de racionalizar, administrativamente, a gestão do currículo para adequá-lo
às exigências econômicas, sociais e culturais da época; elaborar uma análise da
escola capitalista, compreender como o currículo atua e propor uma escola diferente
são caminhos que buscamos.
Uma instituição universitária só poderia atribuir um título a alguém após o
cumprimento de todas as exigências de um percurso ou trajetória acadêmica.
Supõe-se que o diploma, grau ou título somente era concedido após o alcance dos
propósitos da instituição, de acordo com os parâmetros de avaliação sobre a
eficiência da escolarização e sua eficácia social.
120
Entre os séculos XV e XVIII deu-se, em diferentes partes do mundo, a
transição do regime feudal para a sociedade capitalista. Nesta época, em que
predominou um conjunto de práticas econômicas denominado Mercantilismo,
aconteceram, como na nossa era, transformações em todas as dimensões da
realidade social: jurídica, política, econômica, social e ideológica. No sistema
capitalista houve a reestruturação do sistema educativo e da instituição escolar para
a formação do homem capacitado para uma nova sociedade. É neste contexto que
ocorre a transformação do ensino individualizado, no qual preceptor e aluno se
defrontavam, para as escolas organizadas em classes.
Os estudos sobre currículo iniciaram-se no século XX. Nos Estados Unidos é
reconhecido o papel que desempenhou Franklin Bobbit ao elaborar o primeiro
tratado de currículo – The curriculum (1918) – e depois o How make the curriculum
(1924). Além de Bobbit, podem ser citados como relevantes membros da área de
currículos naquele país W. W. Charters, Edward L. Thorndike, Ross L. Finney,
Charles C. Peters e David Snedden.
Eles estudaram a relação entre a estrutura do currículo e o controle social em
um período histórico de transição da América do Norte rural do século XIX para a
industrialização. Para Apple (1982):
(...) pessoas diferentes eram vistas como uma ameaça a uma cultura
norte-americana homogênea, uma cultura centrada na cidade
pequena e sedimentada em crenças e atitudes da classe média. A
comunidade que os antepassados ingleses e protestantes dessa
classe “lavraram de um deserto” parecia desmoronar-se diante de
uma sociedade urbana e industrial (...) (APPLE, 1982: 108).
O início do século XX acelera a competitividade e tem como base a produção
padronizada e em série para o consumo de massa. Neste cenário é preciso baixar
os custos e priorizar a racionalização da produção. Os estudos empíricos, desde
meados do século XIX, sobre a organização do trabalho vão ser sistematizados e o
taylorismo e o fordismo emergem como duas vertentes interligadas da organização
científica do trabalho.
Segundo Bobbit, mencionado por Apple (1982: 107), “o interesse dos
primeiros teóricos a estruturarem o currículo estava na preservação do consenso
cultural e, ao mesmo tempo, em destinar os indivíduos ao seu ‘lugar” adequado
numa sociedade industrial interdependente”.
121
No século XX os estudiosos estadunidenses Tyler e Dewey, com perspectivas
diferentes, criticavam o currículo acadêmico ou humanista por seu distanciamento da
realidade. Enquanto Tyler propunha um currículo com enfoque tecnicista,
enfatizando o estabelecimento de objetivos comportamentais, para atender às
exigências do desenvolvimento econômico de base industrial, Dewey estuda os
interesses e as atividades da criança e propunha um currículo com enfoque ativo.
Segundo ele, “trata-se de obter uma reconstrução contínua, que parta da
experiência infantil, para a experiência representada pelos corpos organizados de
verdades, a que chamamos ‘matérias de estudo” (DEWEY, 1965: 48). O autor
continua:
A escola tradicional está organizada para permitir que se pratiquem
certas habilidades mecânicas e certas idéias, sem cogitar da prática
de outros traços morais e emocionais desejáveis em uma
personalidade. Como aprender, com efeito, honestidade, bondade,
tolerância, no regime de “lições” marcadas para o dia seguinte? Só
uma situação real de vida, em que se tenha de exercer determinado
traço de caráter, pode levar à sua prática e, portanto, à sua
aprendizagem. Daí ser necessário que a escola ofereça um meio
social vivo, cujas situações sejam tão reais quanto as fora da escola
(DEWEY, 1965: 34).
Ao estudar a transposição dos princípios advindos do processo de produção
industrial para o âmbito do sistema educacional, Santomé (1998) salienta a
produção, no âmbito do sistema educacional, de distorções semelhantes às do
mundo produtivo, tais como hierarquização, divisão de funções, atomização de
tarefas, ênfase no conhecimento científico como verdade absoluta e currículo
composto por disciplinas estanques.
Em 1960 o currículo é visto como um sistema tecnológico de produção. Este
enfoque propõe que os resultados da aprendizagem sejam traduzidos em
comportamentos específicos definidos operacionalmente, com verbos adequados,
tendo em vista os objetivos que se pretendem alcançar com a prática pedagógica.
Em meio à contestação do status quo, as críticas eram dirigidas ao sistema de
ensino e aos currículos tecnicistas.
Os estudos de Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet destacam-se na
França. A escola, por meio do currículo, passa a ser parte do Aparelho Ideológico do
Estado (Althusser), reprodutora da estrutura social (Bourdieu e Passeron), estadual
122
e orientada pelos interesses da classe capitalista (Baudelot e Establet). Tais teorias
provocaram a abertura de novas perspectivas de estudos de currículo.
A crítica advinda dos movimentos sociais expressava a insatisfação com a
escola excludente, despreocupada com o processo de aprendizagem dos alunos e
sem conteúdos considerados essenciais. Tais movimentos articularam experiências
alternativas de currículo e representaram historicamente a possibilidade de pensar e
fazer uma escola diferente.
Neste movimento, a área do currículo foi objeto de reflexão na perspectiva
marxista ortodoxa e heterodoxa. Duas grandes linhas de pesquisa e estudos de
currículo se delinearam no período: o currículo com ênfase nos conteúdos, que ficou
conhecido como pedagogia crítica dos conteúdos, e o currículo com ênfase nas
experiências de lutas da classe trabalhadora, que alguns denominam
genericamente, sem uma análise de seus pressupostos, de “educação popular”.
A primeira linha parte do pressuposto de que a emancipação da classe
trabalhadora decorre, entre outras formas, do domínio da herança cultural. Gramsci
(1891-1937), defensor da escola socialista, por ele denominada escola única ou
unitária, constituiu o suporte teórico das denúncias ao currículo e de propostas
alternativas de muitos educadores que se posicionavam a favor de um currículo
voltado à formação da classe trabalhadora.
Os teóricos dessa linha acreditam, como Gramsci (1968), que:
a escola unitária significa o início de novas relações entre trabalho
intelectual e trabalho industrial não apenas na escola, mas em toda
vida social. O princípio unitário se refletirá em todos os organismos de
cultura, transformando-se e emprestando-lhe um novo conteúdo
(GRAMSCI, 1968: 118).
Segundo os autores dessa linha, a classe trabalhadora deve dominar o saber
da classe dominante, como estratégia de luta. Defendem que o currículo deva
enfatizar tanto os conhecimentos clássicos como os conhecimentos profissionais.
A consciência de classe passa a ser o núcleo pedagógico da organização do
currículo, porém incorporando os avanços e conquistas técnicas e científicas da
escola burguesa. A apropriação do conhecimento universal, da herança cultural não
se deve fazer de forma individualizada como na escola capitalista, mas orientada
pela solidariedade de classe sem o caráter competitivo.
123
Na segunda linha os teóricos que refletem sobre o currículo assumem como
pressuposto o pensamento marxista de que “não é a consciência que determina a
vida, mas a vida que determina a consciência”. A inspiração desta vertente para os
estudos curriculares encontra-se na nova historiografia inglesa, cujos expoentes
principais são Erick Hobsbawn e E. Thompson, que se originou das experiências da
classe trabalhadora e de sua constituição como sujeito da história. Assim, as
propostas curriculares seriam voltadas para a apreensão da história da classe
trabalhadora, de suas experiências emancipatórias.
A organização de experiências pedagógicas volta-se para a formação de
indivíduos cooperativos, solidários e portadores de uma utopia em contraposição ao
espírito competitivo, individualista, alienado e consumista típico do modelo capitalista
de produção.
O fim do socialismo real, o esgotamento do modelo taylorista-fordista de
produção, as transformações no mundo do trabalho, o toyotismo, a introdução de
novas tecnologias na produção, o desemprego estrutural e o neoliberalismo levaram
à negação destas abordagens do currículo e ao surgimento de novos estudos
curriculares.
O pós-estruturalismo parte das formulações filosóficas de Nietzsche, das
contribuições de Martin Heidegger sobre Nietzsche e das leituras estruturalistas de
Freud e de Marx, que são decisivas para a sua emergência. Ao ponderar que Marx
havia privilegiado a questão do poder e Freud havia dado prioridade à ideia de
desejo, Nietzsche não privilegiou nenhum desses conceitos. Sua filosofia oferecia
uma saída que combinava poder e desejo. Nesta direção, salienta-se a elaboração
teórica feita por Deleuze, Derrida, Foucault, Klossowski e Koffman, a partir de
Nietzsche, dos anos 60 aos anos 80.
O pós-estruturalismo é inseparável da tradição estruturalista da linguística
baseada no trabalho de Ferdinand de Saussure e de Roman Jakobson, bem como
das interpretações estruturalistas de Claude Lévi-Strauss, Roland Barthes, Louis
Althusser e Michel Foucault (da primeira fase). O pós-estruturalismo, considerado
em termos da história cultural contemporânea, pode ser compreendido no amplo
movimento do formalismo europeu, com vínculos históricos explícitos tanto com a
124
linguística e com a poética formalista e futurista quanto com a avant-garde artística
europeia.
Os pensadores pós-estruturalistas desenvolveram formas peculiares de
análise dirigidas à crítica de instituições específicas (família, Estado, prisão, clínica,
escola, fábrica, forças armadas, universidade e filosofia) e para a teorização de uma
ampla gama de diferentes meios (leitura, escrita, ensino, televisão, artes visuais,
artes plásticas, cinema, comunicação eletrônica). É neste contexto que se insere a
crítica do pós-estruturalismo ao currículo.
Ao rejeitar as “grandes narrativas”, ao questionar um conhecimento universal
e a distinção entre “alta cultura” e cultura cotidiana abrem espaço a currículos
vinculados às diferenças culturais. Os estudos de currículo têm como objetivo o
processo de construção e desenvolvimento de identidades mediante práticas sociais
por meio da análise de discurso.
Constata-se um crescente interesse atual no mundo pelos estudos culturais,
tendência também observada em relação aos estudos culturais do currículo. Sua
origem remonta aos meados dos anos 60, quando um grupo de estudiosos cria o
Centro de Estudos Culturais Contemporâneos na Universidade de Birmingham
(Inglaterra), que buscavam seus fundamentos na Teoria Crítica, enquanto nos dias
atuais seu suporte teórico decorre dos estudos pós-modernistas e pós-
estruturalistas.
Os intercâmbios culturais possibilitaram a sua divulgação em vários países
(Estados Unidos, Austrália, alguns países da África e da América Latina [Brasil e
México]). As produções de currículo na vertente dos estudos culturais não propõem
alternativas curriculares, mas compreender as diferentes formações curriculares.
Adotam as abordagens metodológicas etnográficas e as análises discursivas e
textuais, tendo em vista a necessidade de ressignificar as noções de alta cultura e
baixa cultura. A cultura passa a ser tomada como noção política, ensejando na área
educacional o surgimento da noção de pedagogia cultural.
No final dos anos 70 surgem os trabalhos de Henry Giroux, calcados nos
princípios filosóficos da Escola de Frankfurt e de Gramsci, superando as posturas
reprodutivistas e introduzindo as noções de conflito, resistência e luta contra a
hegemonia, e os de Michael Apple – Ideologia e currículo (1982) estabelecendo a
125
relação entre currículo, ideologia e hegemonia na análise do currículo das escolas
americanas. Posteriormente, Apple, em Educação e poder (1989), focaliza as
noções de resistência e oposição, destacando o papel da escola na produção do
conhecimento.
A inquietação com a globalização dos estudos de currículo não é por acaso.
Constitui hipótese fértil de trabalho investigar as razões de uma vertente de estudos
se tornar hegemônica, quando ela muda o eixo da dialética para a filosofia da
diferença, da crítica à escola capitalista para a legitimidade dos estudos das
diferenças culturais.
3.2.1 As Teorias do Currículo e a Pós-Modernidade
A área do currículo ganhou complexidade nos últimos anos. Fazem-se
necessários estudos que explicitem seus pressupostos. Estabelecer o divisor do
ponto de vista teórico entre as diferentes vertentes do campo do currículo possibilita
ampliar o conhecimento de seus desdobramentos para a prática pedagógica e torna
viável os diálogos possíveis entre as diferentes tendências. Isto coloca em discussão
as posições pós-modernas num esforço de compreender as suas pretensões de
pensar o mundo sem recorrer a metanarrativas e suas implicações para a área
educacional. Buscar a origem do pós-modernismo possibilita a compreensão da
negação das metanarrativas.
A concepção de “pós-modernismo” surgiu pela primeira vez no mundo
hispânico, na década de 1930, uma geração antes de seu aparecimento na
Inglaterra ou nos EUA. Perry Anderson, conhecido pelos seus estudos dos
fenômenos culturais e políticos contemporâneos, em As origens da pós-
modernidade (1999), conta que foi um amigo de Unamuno e Ortega, Frederico de
Onís, que imprimiu o termo pela primeira vez, embora descrevendo um refluxo
conservador dentro do próprio modernismo. Mas coube ao filósofo francês Jean-
François Lyotard, com a publicação A condição pós-moderna (1979), a expansão do
uso do conceito.
Em sua origem, pós-modernismo significava a perda da historicidade e o fim
da “grande narrativa”, o que, no campo estético, significou o fim de uma tradição de
126
mudança e ruptura, o desaparecimento da fronteira entre alta cultura e da cultura de
massa e a prática da apropriação e da citação de obras do passado. A perspectiva
pós-moderna questiona o pressuposto de uma consciência unitária, autocentrada e
construída sobre utopias, universalismos, narrativas mestras, que se
consubstanciaram a partir do Iluminismo. Nesta mesma linha, questiona tanto as
posições teórico-metodológicas positivistas como as marxistas. O currículo na
perspectiva humanista, na tecnicista e toda tentativa de currículo emancipatório das
pedagogias críticas são questionados.
Para a crítica pós-moderna as explicações totalizantes estão desacreditadas
pelas experiências socialistas stalinistas, queda do muro de Berlim, fim da guerra
fria, crise do modelo taylorista-fordista e o movimento contestatório, registrado no
mundo inteiro entre 1960 e 1970. Para legitimar este descrédito inauguram novas
perspectivas interpretativas da realidade, entre elas os estudos pós-estruturalistas e
culturais.
Os estudos pós-modernistas, ao rejeitar as análises do todo, priorizam o local
em contraposição ao global e guardam relação direta com as teses neoliberais,
tendo como causa comum a defesa da postura conservadora que paralisa os
movimentos sociais. Ao enfatizar a heterogeneidade dos jogos de linguagem,
relegam todo esforço de busca do consenso e do coletivo, considerando-o
ultrapassado.
A diferença torna-se revolucionária e os acontecimentos, devidos ao seu
caráter incerto, implicam a negação da utopia e a criação de um futuro melhor para a
humanidade. Os estudos pós-modernos limitam-se a compreender o que o currículo
faz no presente e não propõem um currículo alternativo para a formação de homens
necessários para modificar o status quo. Tais estudos negam a perspectiva de
determinado projeto pedagógico que pode ser construído pelo coletivo de docentes,
criando na escola clima de desânimo e de impotência diante dos problemas do
presente.
127
3.2.2 História, Currículo e Ensino
A importância do currículo em uma instituição educacional vai além do
percurso histórico; é preciso conhecer as diversas linhas teóricas sobre currículo.
Em uma Faculdade de Direito o currículo é considerado um dos maiores diferenciais,
visto que questões físicas e estruturais não são tão relevantes em um curso de
Direito, que não precisa de laboratórios sofisticados nem de grandes investimentos
tecnológicos.
Segundo Silva (2003) dentre as teorias sobre o currículo temos as
tradicionais, as críticas e as pós-críticas. As teorias relacionadas ao currículo
inicialmente se detinham a questionar inicialmente sobre qual conhecimento deve
ser ensinado, como o conhecimento deve ser transmitido, se é considerado mais
importante em detrimento de outros menos relevantes e para quem deve ser
ensinado.
A teoria tradicional busca ser neutra e imparcial, tendo seu foco em formar o
trabalhador especializado ou proporcionar uma educação geral. Seu maior
representante foi Bobbit, que desenvolveu suas teorias em um cenário que
procurava desenvolver uma educação de massas para que a escola funcionasse
como uma empresa. Segundo Silva (2003):
(...) de acordo com Bobbit, o sistema educacional deveria começar
por estabelecer de forma precisa quais são seus objetivos. Esses
objetivos, por sua vez, deveriam se basear num exame daquelas
habilidades necessárias para exercer com eficiência as ocupações
profissionais da vida adulta (SILVA: 2003: 23).
Em Silva (2003) Bobbit propunha a teoria de administração econômica de
Taylor e se pudesse ser resumido em uma palavra esta seria eficiência. O currículo
era uma questão de organização sistemática. Os especialistas em currículo
buscavam fazer um levantamento das habilidades, criar currículos em que tais
habilidades pudessem ser lapidadas e em seguida planejar e elaborar instrumentos
de mensuração do aperfeiçoamento dessas habilidades. Este posicionamento
teórico influenciou o posicionamento ideológico educacional não só nos EUA, mas
também em muitos outros países importantes para nosso trabalho, como o Brasil e
Portugal, até a década de 80. Silva (2003) menciona em sua obra:
128
Tyler consolidou a teoria de Bobbit quando propõe que o
desenvolvimento do currículo deve responder a quatro principais
questões: que objetivos educacionais deve a escola procurar atingir;
que experiências educacionais podem ser oferecidas que tenham
probabilidade de alcançar esses propósitos (...) (SILVA, 2003: 25).
Tyler estudou também como identificar e encontrar as resposta às perguntas
elaboradas por ele para a formulação do currículo. Para ele deveriam ser feitas
pesquisas sobre os próprios aprendizes buscando ter informações sobre a vida
contemporânea fora da educação e ter participações dos diversos especialistas de
suas disciplinas.
Já Dewey atinha-se mais à democracia e ao funcionamento da economia. Ele
dava maior importância às experiências das crianças e jovens, além da vivência
ainda na escola da prática dos princípios democráticos.
Podemos considerar que as questões fundamentais das teorias tradicionais
são: conteúdos, objetivos, ensino de forma eficaz em busca de resultados eficientes.
As teorias críticas atentavam para o desenvolvimento de conceitos que permitissem
compreender, a partir de uma análise marxista, o que o currículo faz. No
desenvolvimento desses conceitos surgiu uma relação entre currículo e ideologia.
Somado a isso, vários estudiosos formularam teorias que foram identificadas como
críticas contendo cada uma suas peculiaridades.
A escola contribui para esse processo não propriamente através do
conteúdo explícito do seu currículo, mas ao espalhar, no seu
funcionamento, as relações sociais do local de trabalho. As escolas
dirigidas aos trabalhadores subordinados tendem a privilegiar
relações sociais nas quais, ao praticar papéis subordinados, os
estudantes aprendem a subordinação. Em contraste, as escolas
dirigidas aos trabalhadores dos escalões superiores da escala
ocupacional tendem a favorecer relações sociais nas quais os
estudantes têm a oportunidade de praticar atitudes de comando e
autonomia (SILVA, 2003: 33).
Segundo Silva (2003), Althusser sustentou que a escola é uma forma pela
qual o capitalismo se vale para manter sua ideologia, pois atinge toda população por
um grande período de tempo do dia e da vida das pessoas. Conforme o autor
francês, a ideologia dominante transmite seus princípios nas disciplinas e nos
conteúdos que reproduzem seus interesses criando mecanismos de seleção que
fazem crianças de famílias desfavorecidas não alcançar a aprendizagem de
habilidades das classes dominantes.
129
3.3 A história do Ensino do Direito
Defendemos que é importante estudarmos a história do ensino jurídico para
entendermos o papel que tal ensino deve ter em seu tempo.Visto que a perda do
conhecimento histórico faz com que seja perdido a noção de percurso tão importante
no currículo para que não seja repetidos os erros do passado.
Como vimos no Capítulo 2 os primeiros cursos jurídicos no Brasil, fundados
em 1827, exibiam grade curricular com perfil nitidamente interdisciplinar, capaz de
propiciar uma formação geral e política. Essa grade, com nove cadeiras em cinco
anos, previa o estudo de Filosofia (Direito natural), de História (Direito das gentes),
de Ciência Política (análise da Constituição do Império, diplomacia, Direito público,
etc.) de Economia (Economia política), de Teoria do Direito (Teoria do processo
criminal, Teoria das leis do Império, etc.), de Direito Eclesiástico e das demais
disciplinas dogmáticas como Direito civil, criminal, processual, mercantil e marítimo.
A estrutura curricular dos cursos jurídicos manteve, ao longo do século XIX e
nas primeiras décadas do século XX, sempre um perfil equilibrado entre as
disciplinas técnicas, ou dogmáticas, e aquelas de conteúdo mais político ou
filosófico. Porém, a partir dos anos 1930 foi possível perceber uma modificação
dessa estrutura curricular com o crescente privilégio das disciplinas dogmáticas e a
consequente atrofia das matérias políticas ou filosófico-especulativas.
Sabemos que a associação entre o Direito e a História é antiga. O próprio
estudo da Ciência do Direito seria inviável sem o aporte epistemológico da História.
Se pensarmos na compreensão do Direito para além do Direito Positivo,
entenderemos que o Direito é um fenômeno sociopolítico historicamente localizado,
consequência de uma estrutura social, não somente calcada no modo de produção,
mas igualmente nas ideologias existentes, nos discursos hegemônicos, nas
manifestações de poder e nos conflitos entre os diversos atores sociais de dada
comunidade. Ou seja, somente podemos compreender o Direito, seus valores e
princípios se atentarmos para a sociedade e a época que o criaram. Mesmo as mais
técnicas das normas seria mais bem compreendida se atentarmos para a variável
histórica.
130
O estudo da História do Direito (e com todas as suas variações, como a
História do Pensamento Jurídico) sempre foi relevado dentro da academia jurídica
nacional, relegado que foi a uma posição secundária e sem maiores destaques. Uma
das razões para esse menosprezo é talvez a dupla armadilha do pensamento
tecnicista do Direito, que durante muito tempo dominou a cátedra jurídica em nosso
País. Assim, por um lado, desprezava-se tudo aquilo que não pudesse ser reduzido
ao Direito Positivo e, por outro, valorizava-se tão somente um historicismo jurídico
formal, de caráter enciclopédico, oculto no mito da neutralidade do saber:
(...) apegada a textos legais, à interpretação firmada na autoridade de
notáveis juristas, a construções dogmáticas e abstrações
desvinculadas da realidade social, acabando por consagrar uma
história elitista, erudita, idealista, acadêmica e conservadora
(WOLKMER, 2001: 7).
A portaria não mencionava a História do Direito, ainda que possamos
compreender o indicativo dessa disciplina pela ênfase pretendida nos cursos, com a
formação humanista e interdisciplinar. Para Azevedo (2005), ainda que a portaria
não cite expressamente a História do Direito,
a esta acaba se reportando, de modo genérico, quando dispõe no
parágrafo único do art. 60 que as demais matérias e novos Direitos
(...) serão incluídos nas disciplinas em que se desdobrar o currículo
pleno de cada curso, de acordo com as suas peculiaridades e com
observância da interdisciplinaridade (AZEVEDO, 2005: 35).
Em 2004, e dez anos após a revolucionária Portaria 1.886/94, a necessária
revisão, dada à nova ordem educacional no País, com a multiplicação das
Instituições de Ensino Superior e dos Cursos de Direito, impõe-se como agenda à
academia, à OAB e ao próprio MEC. Negociada durante dois anos, em especial pela
OAB e pela ABEDI (Associação Brasileira de Ensino do Direito), a Resolução 9/2004
(BRASIL, 2004), da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de
Educação, surge como o símbolo do consenso possível entre tantos interesses
divergentes. Ainda assim, é entendida pela maior parte das autoridades em ensino
jurídico no País como um avanço em relação às diretrizes anteriores e às propostas
inicialmente apresentadas pelo Estado.
A primeira grande mudança, refletindo o espírito da nova LDB (Lei 9.394/96)
(BRASIL, 1996), é que não se fala mais em currículo mínimo obrigatório, mas em
Diretrizes Curriculares. Segundo, não se expressa a exigência da oferta de
disciplinas específicas, mas sim de conteúdos que podem ser organizados numa
131
disciplina, em várias ou combinados com outros conteúdos numa disciplina. Ou seja,
estabelece-se uma flexibilização curricular que pode ajudar em muito a renovação
do ensino jurídico no País.
Para Maria Helena Diniz (2005), a História do Direito estuda,
cronologicamente, o Direito como fato social, resultante da ação humana, buscando
evidenciar as características mais específicas e as causas e motivos das
transformações,
envolvendo a experiência jurídica do passado, procurando
individualizar os fatos e integrá-las num sentido geral, ao se ater à
evolução das fontes do Direito, ao desenvolvimento jurídico de certo
povo, à evolução de ramo específico do Direito (...) ou de uma
instituição jurídica (...), mostrando a sua projeção temporal em
conexão com as teorias em que se baseiam (DINIZ, 2005: 230).
Segundo Maria Helena Diniz é ofício do historiador reviver ou reconstruir o
fenômeno jurídico em sua singularidade, buscando dessa forma compreender seu
significado no tempo. Ele faria uma análise atual do Direito do passado e verificaria
os fins que perseguiram e seus efeitos sobre a sociedade, assinalando “as
vantagens ou inconvenientes das normas ou instituições que imperaram no
passado, comparando as soluções que se deram ou surgiram depois, para chegar
ao conhecimento de todo processo histórico do Direito” (DINIZ, 2005: 230).
A História do Direito não pode se limitar a relatar fatos em ordem cronológica,
com uma mera visão positivista. A História é investigativa e se constituirá em
epistemologia adequada à Ciência Jurídica. A relação entre passado e presente
possui aspectos que não mudam e se apresentam como liames geralmente claros e
inconfundíveis. Há estruturas sociais que resistem ao tempo e às mudanças. Por
essa razão, o Direito nunca pode ser visto desvinculado de suas origens. O
conhecimento de um ordenamento jurídico depende do bom conhecimento de sua
história. Segundo Luiz Carlos de Azevedo (2005), a área de atuação da História do
Direito:
não se restringe a limites rígidos ou previamente direcionados; já que
não se conforma com a mera descrição dos fenômenos jurídicos,
deve compreendê-los e explicá-los desde o momento em que se
sucederam, como na sequência temporal na qual persistiram
sobrevivendo ou deixando de existir (AZEVEDO, 2005; 35).
132
Por sua vez Miguel Reale (2005) explica:
A História do Direito pode se desenrolar em três planos que se
correlacionam: o dos fatos sociais que explicam o aparecimento das
soluções normativas, bem como as mutações operadas no
ordenamento jurídico, dando relevo ao problema das fontes do
Direito; o das formas técnicas de que se revestem tais soluções
normativas, pela constituição de modelos institucionais; e o das idéias
jurídicas que atuam, como fins, nas alterações verificadas nas fontes
e seus modelos normativos. Conforme o maior pendor pelos aspectos
sociológicos, técnico ou filosófico de seu autor, os livros de História
do Direito revelam mais inclinação no sentido de um desses três
aspectos (REALE, 2005: 328).
Temos o estudo das fontes jurídicas, que se confunde com a própria História
do Direito, o estudo das formas jurídicas, que é exatamente a História das
Instituições jurídicas, e finalmente o estudo das ideias, consubstanciado na História
do Pensamento jurídico.
Ao se focar no estudo do pensamento jurídico, podemos centrar o estudo na
análise do Direito como expressão de um poder consolidado na sociedade,
fornecendo ao aluno uma visão panorâmica do fenômeno jurídico, desmistificando o
estudo dogmático do Direito, tornando-o um fenômeno social, político e ideológico
inserido dentro de uma realidade específica.
Quando se trata da produção sobre a História do Direito, apenas nesta área
estamos atrás de Portugal e ligados a eles. Segundo Miguel Reale (2005):
(…) com essa lacuna, arriscamo-nos a conceber o Direito de maneira
reflexa, desenvolvendo-se entre os juristas um diálogo subordinado
mais a influências externas do que às forças íntimas que governam
nossas experiências, sem sequer nos darmos conta de nossos
anacronismos e originalidades (REALE, 2005: 328).
No início do século XX já há clareza entre os portugueses da necessidade de
um estudo jurídico que não se exaura em seu aspecto simplesmente técnico, mas
que seja abrangente para permitir ao bacharel acesso às dúvidas e discussões
sobre o papel do homem em sociedade, do envolvimento do problema das
instituições e da historicidade das decisões sociais, o que demanda uma necessária
atitude do ensino no sentido de perfeccionar seu currículo para englobar um grupo
133
de disciplinas formativas (história do Direito, sociologia do Direito, filosofia do
Direito)
18
(COSTA, 2003: 455).
Acreditamos que a cultura jurídica tem resistência em aceitar a teoria crítica,
ao desenvolvimento do raciocínio aberto e atento as demandas sociais. Tal cultura
tem dificuldades de se libertar da cultura burocrática, tamanha a dose de
preponderância entre os saberes técnico-normativos (ora chamados dogmáticos) e
os saberes humano-formativos. Os próprios propósitos da Faculdade de Direito no
Brasil, desde a sua criação colaboram para esta arquetípica tradição da cultura, em
que o Direito se resume apenas a ser a compilação de normas estrangeiras
reunidas, não adaptadas a realidade social e estudadas sistematicamente.
3.3.1 O Currículo no Direito
Os estudos curriculares específicos na área do Direito têm encontrado grande
importância nas universidades, especialmente nos cursos de pós-graduação. O
campo de estudo curricular é complexo e interdisciplinar, tendo em vista que a teoria
do currículo envolve um amplo espectro de pesquisa acadêmica.
Segundo Juliana Ferrari de Oliveira (2010) há apenas poucas universidades
que possuem uma disciplina específica na graduação e na pós-graduação de
departamentos específicos que tratem da questão curricular e das problemáticas
epistemológicas críticas, exclusivamente, ao conhecimento do Direito, como já existe
na Ciência da Educação. Assim como as relações entre o currículo, o indivíduo, o
poder, sua formação, a sociedade, temas que são frequentemente ausentes na
configuração do currículo jurídico nas instituições privadas de ensino. O currículo é
também o cruzamento de práticas diferentes e se converte naquilo que se denomina
como prática pedagógica nas aulas e nas escolas. Considera-se, portanto, que esse
18
A reforma ocorrida no início do século XX em Coimbra mostra esta preocupação: “Entendia-se que a ciência
do Direito não poderia limitar-se à simples análise e interpretação dos textos legais, mas que encontrava o seu
complemento adequado nos estudos respeitantes à vida do homem em sociedade. Esta perspectiva teve natural-
mente grandes reflexos. Como exemplo: o ensino da sociologia geral ao lado da filosofia do Direito; o estudo
sociológico do crime ao lado do Direito penal propriamente dito; a importância básica atribuída à história do
Direito, enquanto se via nela um vasto campo de observação e comparação dos factos, onde principalmente se
fundava a possibilidade do emprego, na esfera jurídica, do método indutivo, próprio das ciências naturais. Além
disso, criaram-se a cadeira de Direito internacional, que abrangia tanto o Direito internacional público como o
Direito internacional privado, e as cadeiras de administração colonial e de prática extrajudicial”.
134
campo epistemológico envolve necessariamente conhecimentos interdisciplinares e
transdisciplinares.
Para estudarmos as diretrizes curriculares instituídas, pela Resolução do
CNE/CES n° 9/2004 (BRASIL, 2004), para os cursos jurídicos é preciso se valer de
uma teoria do currículo. É preciso, no entanto, salientar-se o desconhecimento de
qualquer tentativa de sistematização do fenômeno do currículo jurídico com a
finalidade de compreendê-lo na sua dimensão de alcance\sentido e complexidade
no campo da ciência do Direito.
Há diferentes classificações de teorias curriculares, que não são mais do que
tentativas de abordagens das concepções de currículo por meio das quais se
diferenciam formas distintas de relacionar a teoria com a prática e a escola com a
sociedade. Aquilo que na visão tradicional é visto como o processo de continuidade
cultural da sociedade como um todo, é visto na teoria crítica como processo de
reprodução cultural e social dessa sociedade.
O currículo é um espaço de produção e de política cultural, no qual os
conteúdos existentes funcionam como peças de um quebra-cabeças para formação,
informação e, sobretudo, de não conformação com a situação social imposta.
As faculdades de Direito reproduzem os aspectos necessários para a
sociedade capitalista: trabalhadores formados para atender às necessidades de
mercado. Segundo esta concepção teórica, a reprodução cultural atua como
educação excludente, eliminando do processo educacional as pessoas de famílias
menos favorecidas, que não têm como participar dos processos culturais da classe
dominante.
O foco das teorias críticas estava no significado subjetivo dado às
experiências pedagógicas e curriculares de cada indivíduo. Isso significa atentar às
experiências cotidianas sob uma perspectiva pessoal e subjetiva, considerando as
formas pelas quais estudantes e docentes desenvolviam, através de processos de
negociação, seus próprios significados para o conhecimento.
Para Apple, conforme Tomaz Tadeu da Silva (2003), a seleção que constitui o
currículo é o resultado de um processo que reflete os interesses particulares das
classes e dos grupos dominantes. A questão não é qual conhecimento é verdadeiro,
mas qual é considerado verdadeiro e quem o considera desta forma. Ele considera
135
relevante estudar tanto os valores, normas e disposições quanto os pressupostos
ideológicos das disciplinas que constituem o currículo oficial. Conforme Apple, a
escola deve produzir e transmitir conhecimentos, e o papel do professor é
fundamental para não transmitir apenas conhecimentos de valores capitalistas.
Na obra de Silva (2003: 54) constatamos que Henry Giroux sustenta que as
teorias tradicionais, ao se concentrarem em critérios de eficiência e racionalidade
burocrática, não consideravam o caráter histórico, ético e político das ações
humanas e sociais e do conhecimento, contribuindo para a reprodução das
desigualdades sociais. Giroux compreende o currículo por meio de conceitos de
emancipação e libertação de: (...) “um processo pedagógico que permita as pessoas
se tornarem conscientes do papel do controle e poder exercido pelas instituições e
pelas estruturas sociais que elas podem se tornar emancipadas ou libertadas de seu
poder e controle”.
No processo educacional iniciado na infância as crianças deverão participar,
discutir e colocar em debate as práticas sociais, políticas e econômicas, analisando
seu contexto e suas implicações. Os educadores têm um papel fundamental para
fomentar a reflexão por meio da mediação dos discursos estudantis.
Numa pedagogia oposta à pedagogia do colonizador (que na falta de
melhor expressão chamamos de pedagogia do conflito), o educador
reassume a sua educação e seu papel eminentemente crítico: à
contradição (opressor-oprimido, por exemplo), ele acrescenta a
consciência da contradição, forma gente insubmissa, desobediente,
capaz de assumir a sua autonomia e participar na construção de uma
sociedade livre (GADOTTI,1989: 53).
Silva (2003) analisa a teoria de Giroux, que defende Gadotti (1989) quando
faz referência à pedagogia do colonizador contra uma pedagogia do conflito,
destacando o papel fundamental do professor na busca pela formação da
consciência de seus alunos para não apenas receberem informações, mas refletirem
sobre elas.
Giroux vê a pedagogia e o currículo através da noção de “política
cultural”. O currículo não está simplesmente envolvido com a
transmissão de “fatos” e conhecimentos “objetivos”. O currículo é um
local onde ativamente se produzem e se criam significados sociais
(SILVA, 2003).
Tais significados mencionados por Silva (2003) estão ligados às relações
sociais de poder e desigualdade e devem ser questionados. Freire (2003), apesar de
136
não ter elaborado uma teoria sobre currículo, acaba discutindo esta questão em
seus estudos.
Ao estudar sobre currículo e relacioná-lo com o ensino jurídico não podemos
deixar de mencionar Antonio Chizzotti, que trata da Elite dos Bacharéis. Segundo
ele, desde 1823 já se pensava que a fundação do Partido Liberal almejaria a
homogeneidade que o governo pretendia. Se o modelo coimbrão era uma marca do
Império, Chizzotti afirma que os constituintes “desincumbiam-se de sua tarefa
constitucional professando uma confiança exaltada e eficiência nas leis que
propuseram”. Completa Chizzotti (1996):
Os bacharéis-legisladores construíram, assim, uma elite convicta do
vigor radical da lei. Confiavam construir um sistema jurídico novo para
o país como meio eficaz para a edificação de uma nova nação, igual
aos países dos quais extraíram inspiração para seus projetos de lei
(CHIZZOTTI, 1996: 34).
Romero (2002: 69) reforça que: (…) os casos de adaptação exterior de
formas políticas e povos que nunca compreenderam de todo, nem delas se serviriam
com destreza e vantagem. E completa sua ideia ao traduzir nosso constitucionalismo
como uma comédia, “cujos papéis eram distribuídos a limitado número de atores”.
Separado o Brasil de Portugal, houve um fator significativo, que foi a também
separação da Faculdade de Direito de Coimbra, onde os nossos bacharéis eram
formados. Desde o Império identifica-se uma elite no legislativo, formada por
bacharéis e nobres, legislando em busca da manutenção da segurança jurídica
pretendida pela burguesia.
Vimos que o Estado Brasileiro desde 1822 cuidou essencialmente dos cursos
superiores, esquecendo-se da educação de base. Cuidou da formação da uma elite,
que estava sendo formada para ocupar cargos administrativos no Judiciário e no
governo. A ideia conduz para a importância da criação dos cursos jurídicos no Brasil.
Provocaram uma cisão com a Faculdade de Direito de Coimbra, mas sem se
desvencilhar dos ideais do século XVIII e da Reforma Pombalina. Vivenciava-se uma
nova era, um novo século, mas com ideias jurídicas formadas no passado, em que o
império da Lei é a vontade do Estado. E o Estado legalista, como detentor de todo o
poder, para justificar sua manutenção nele.
Vivenciar um novo Direito, adotando a História como meta para correção de
erros e os olhos no futuro com preocupação em construir a verdadeira cidadania, é
137
trabalho para toda uma sociedade e não apenas para classes. No campo do Direito,
as diretrizes curriculares são entendidas como normas de conduta regulatória, de
natureza jurídico-educacional, emanadas de norma jurídica do Direito Educacional,
por órgão juridicamente competente. Por tanto, o currículo deve representar, uma
preocupação do Estado brasileiro e das autoridades que se responsabilizam pelas
definições e decisões no campo jurídico-educacional sobre o desenvolvimento da
educação superior no Brasil.
Por isso, examinar as diretrizes curriculares, no curso de graduação em
Direito, é de grande relevância para a sociedade, para o Estado, para a comunidade
acadêmica e profissional e para os agentes educacionais envolvidos.
A ideia de currículo é de longa tradição na história da humanidade, e
relaciona-se diretamente com a questão da educação, pois diz respeito diretamente
à sua prescrição e seu programa - liga-se, assim, à ideia de como as coisas
deveriam ser em educação e quais os seus conteúdos.
José Gimeno Sacristán e A. I. Pérez-Goméz (1998: 119) apontam que o
currículo, sob a ótica pedagógica prescritiva, implica a idéia de regular, e controlar a
distribuição do conhecimento, além de estabelecer a ordem de sua distribuição.
Ressaltam os referidos autores que o currículo possui papel regulador da prática e,
portanto, regulador da ação educativa.
Com base nessas constatações, o conceito de currículo oficial, constitui-se a
prescrição legal da organização das matérias/disciplinas a serem trabalhadas na
instituição de ensino e demais orientações tais como conteúdos, didáticas,
avaliações.
A construção do currículo jurídico, de seu conteúdo e de suas diretrizes diz
respeito ao compromisso maior do Direito com a própria construção da cultura, da
cidadania e da justiça social, do olhar crítico e investigativo sobre a nossa
sociedade, visando superar desigualdades sociais. Junto com suas diretrizes, diz
respeito igualmente à possibilidade de acreditar na mudança pela educação e com a
educação para construir uma sociedade mais justa, fraterna e humana.
Entende-se que a justiça está intimamente ligada à base normativa da
educação, e ao posicionamento ético no modo como se pensa e atua nos currículos
das instituições de ensino que oferecem os cursos de Direito. Pensar o currículo
138
significa refletir sobre os arranjos organizacionais mais apropriados para as escolas
de Direito. Essa reflexão não é apenas um debate organizacional, ele é também
ético, porque o que está em causa é a prática futura da educação, é a prática de
justiça social expressa em normas e em padrões de ensino, que podem muitas
vezes, seguir lógicas diversas e sentidos de moralidade também distintos do
adequado.
O currículo interfere na emancipação ou não dos próprios alunos envolvidos
no processo de formação e ensino-aprendizagem, atingidos pelas políticas de
implantação das diretrizes curriculares impedidos de participar de sua construção,
geralmente elaboradas de maneira imposta.
O currículo jurídico junto com suas diretrizes e políticas públicas constitui-se
um conjunto articulado e normatizado de saberes, regidos por uma ordem privada e
pública, entretanto, ele é instituído num espaço no qual se encontram visões
diferenciadas de mundo. O currículo jurídico deve capacitar profissionais aptos a
participar do desenvolvimento da sociedade brasileira, colaborando em sua
construção; estimulando um aperfeiçoamento profissional continuado; possibilitar os
modernos recursos oferecidos pelo avanço tecnológico como instrumento de
melhoria e dinamização da relação ensino/aprendizado; visar a excelência
acadêmica no âmbito nacional e internacional.
Com relação ao contexto da formação curricular da docência universitária
para o ensino superior deve-se salientar que essa formação pedagógica do
professor, não se encontra regulamentada, como nos outros níveis da educação. A
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB n° 9.394/96 (BRASIL, 1996),
admite que esse docente seja preparado nos cursos de pós-graduação, tanto stricto
como lato sensu, não sendo este um dos requisitos obrigatórios.
Embora a exigência legal para que as instituições de ensino superior tenham
no mínimo um terço de seus docentes titulados na pós-graduação (mestrado ou
doutorado), na realidade a docência universitária tem sido exercida por profissionais
das mais diversas áreas do conhecimento, sem a devida formação curricular integral
adequada.
É preciso considerar que verdadeira dimensão formadora e fundadora da
Educação, consubstancia-se, no desafio de uma realização, de uma liberdade, do
139
sentido da própria empresa educativa, objeto de reflexão filosófica, já que a Filosofia
tenta interrogar o sentido de tal empresa, assegurar a consciência disso. Como
afirma Severino (2008):
A grande maioria dos pensadores que construíram a cultura ocidental
sempre registrou essa produção teórica em textos relacionados à
temática educacional, discutindo aspectos epistemológicos,
axiológicos ou antropológicos da educação (SEVERINO: 2008: 9)
É o caso, por exemplo, da interpretação jurídica estritamente atrelada ao
positivismo jurídico, que reduz o Direito à vontade do soberano, à vontade do
poderoso, ou à vontade exclusiva da lei, sem levar em consideração o sentimento de
Justiça ou, na ideia de pluralidade das fontes normativas, como forma de explicação
última do Direito.
Aspecto esse, que podem ser consideradas superadas pelas incontestes
transformações sociais, econômicas, jurídicas, culturais por que passam as
modernas sociedades políticas, caminho que nos conduz incontestavelmente a um
outro modo de produção do Direito, e o da forma de tratamento dos litígios, e por via
de conseqüência, a uma reflexão mais crítica sobre as diretrizes curriculares do
ensino jurídico.
Com relação ao ensino e ao currículo jurídico desconsideram-se, na prática
que sustenta o discurso jurídico e da docência no ensino superior do Direito, a
complexidade, a interdisciplinaridade, a transdisciplinaridade e as atividades
desenvolvidas nos Núcleos de Prática Jurídica.
Permitindo-se uma abertura epistemológica para a elaboração e integração
do conhecimento dos conteúdos das disciplinas curriculares, pois dessa maneira
combate-se a fragmentação positivista e dogmática dos saberes por sua própria
natureza. Conforme afirma Henry A. Giroux (1986):
A transposição e edificação de outro paradigma no âmbito do Direito
representam também a substituição e a construção de novo conceito
de racionalidade. O modelo tradicional de racionalidade tecnoformal é
suplantado pelo modelo critico interdisciplinar da racionalidade
emancipatória. Na prática libertadora, redefine-se a noção superior de
racionalidade, que, como pressuposto do pensamento e da ação,
apresenta um projeto transcendental que não mais oprime, mas
busca libertar o sujeito histórico e a sociedade como um todo
(GIROUX, 1986: 33-39).
140
É justamente, no contexto do nosso sistema de ensino brasileiro, não
esquecendo as heranças lusitanas, que devem ter início essas mudanças
paradigmáticas na forma de ver e perceber o mundo e transformar a nossa
realidade.
O ensino e o currículo jurídico como vêm sendo ministrados, não vêm
estruturados em práticas pedagógicas direcionadas para a emancipação do
educando, mas sim a partir de algumas tradições culturais imbricadas às próprias
práticas do poder, ao qual eram destinados e para o que se treinaram os bacharéis
durante o período Imperial no Brasil.
Quanto à formação profissional deveria apresentar uma sólida formação
geral, humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de conceitos e da
terminologia jurídica, a que se somem argumentação adequada, interpretação e
valorização dos fenômenos jurídicos e sociais. Bem como, uma postura reflexiva e
visão crítica que fomentem a capacidade e a aptidão para a aprendizagem
autônoma e dinâmica, indispensáveis ao exercício da ciência do Direito, da
prestação da justiça e do desenvolvimento da cidadania.
Formação do bacharel essa que, do ponto de vista do sistema jurídico-
educacional, deixe de ser um simples fechamento curricular e disciplinar, apenas um
meio de adestrar o pensamento que condiciona e idiotiza o aluno de Direito.
O papel da universidade, em tempo de mudanças, com relação à formação do
bacharel em Direito precisa fomentar a mudança social por meio da promoção da
dignidade humana. É dessa forma que se auxilia a integração do Direito com
diversas áreas do conhecimento. Tem-se a possibilidade de encarar a solução para
esse problema a partir de uma revolução, no âmbito do ensino-aprendizagem,
dispensando-se, os seus currículos inflexíveis, cujos modelos de saberes jurídicos,
sociais e culturais, são formalmente constituídos em projetos pedagógicos
tradicionais.
Edgar Morin (2002) adverte, nesse sentido, quanto à necessidade do
pensamento e da ciência humana para não reduzir, simplificar ou mesmo eliminar a
complexidade do mundo. Segundo o autor:
141
É necessário educarmos nosso pensamento justamente para os
desafios da complexidade. Pois o pensamento e a inteligência que só
sabe separar, rompem o caráter complexo do mundo em fragmentos
desunidos, fraciona os problemas e unidimensiona o
multidimensional. Essa inteligência é cada vez mais míope, daltônica,
e vesga; termina a maior parte das vezes cega, porque destrói todas
as possibilidades de compreensão e reflexão, eliminando na raiz as
possibilidades de compreensão e reflexão, eliminando na raiz as
possibilidades de um juízo crítico e também as oportunidades de um
juízo corretor ou de uma visão a longo prazo (MORIN, 2002: 17).
O currículo jurídico e suas diretrizes constituem-se um conjunto articulado e
normatizado de saberes, regido por determinada ordem, instituído numa arena na
qual se embatem visões diferenciadas de mundo, onde se produzem, elegem e
transmitem representações, discursos, narrativas e significados sobre as coisas e
seres do mundo.
Entendido assim, como um núcleo que corporifica o conjunto de todas as
experiências cognitivas e afetivas proporcionadas aos estudantes no decorrer do
processo de sua formação, conjunto envolvido, entretanto, com a produção de
identidades individuais, coletivas e sociais, jurídicas, filosóficas e culturais
particulares.
O currículo é lugar de escolhas, representações, transgressões, local de
poder, de inclusões e exclusões, produto de uma lógica normativa que nem sempre
é a expressão do sujeito, mas muitas vezes, imposição heterônoma do próprio ato
discursivo.
3.4 As responsabilidades das Instituições de Ensino Jurídico
A educação em geral e o ensino jurídico em um campo mais restrito devem
estar compromissados com a liberdade, com a justiça social, com a solidariedade,
com a erradicação da pobreza e da marginalização e com a redução das
desigualdades sociais. Este é o sentido de um ensino jurídico que, muito mais do
que compromissos dogmáticos, deve tomar consciência profunda de sua tarefa de
transformação social, de ser ele mesmo condição de possibilidade de um acontecer
humanista.
142
É preciso um bom sistema educacional, que possibilite a inclusão democrática
de todos os cidadãos no ambiente escolar e permita a construção da autonomia
individual, constituindo-se em fator determinante do enfrentamento de injustiças
sociais, do fim das mais inúmeras violências das quais cotidianamente são vítimas
os seres humanos.
A globalização implica uma radical mudança no perfil do Estado
contemporâneo, particularmente em seu caráter soberano (Comunidade Europeia e
Mercosul), o que inexoravelmente se reflete sobre a sua capacidade de auto-
organização.
3.4.1 Tipos de Instituições de Educação Superior
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei n° 9.394 de
20/12/1996 (LDB) trata no artigo 19 sobre a classificação das instituições de ensino
no Brasil:
- públicas entendidas as criadas ou incorporadas, mantidas e
administradas pelo Poder Público;
- privadas entendidas as mantidas e administradas por pessoas
físicas ou jurídicas de Direito privado.
São consideradas públicas as criadas ou incorporadas, mantidas e
administradas pelo Poder Público, e privadas as mantidas e administradas por
pessoas físicas ou jurídicas de Direito privado (art. 19 da LDB).
No referido artigo da LDB é regulamentado pelo Decreto n° 3.860, de
9/7/2001, dispõe:
Art. 1° As instituições de ensino superior classificam-se em:
I - públicas, quando criadas ou incorporadas, mantidas e
administradas pelo Poder Público; e II - privadas, quando mantidas e
administradas por pessoas físicas ou jurídicas de Direito privado.
Art. 2° Para os fins deste Decreto entende-se por cursos superiores
os referidos nos incisos I e 11 do art. 44 da Lei n° 9.394, de 20 de
dezembro de 1996.
Com relação às das entidades mantenedoras o decreto dispõe:
143
Art. 3° As pessoas jurídicas de Direito privado, mantenedoras de
instituições de ensino superior, poderão assumir qualquer das formas
admitidas em Direito de natureza civil ou comercial, e, quando
constituídas como fundação, serão regidas pelo disposto no art. 24 do
Código Civil Brasileiro.
Parágrafo Único. O estatuto ou contrato social da entidade
mantenedora, bem assim suas alterações, serão devidamente
registrados pelos órgãos competentes e remetidos ao Ministério da
Educação.
As IES privadas são administradas por pessoas físicas ou jurídicas e podem
ser dividias conforme o artigo 20 da LDB/1996, em:
- Particulares: instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas
ou jurídicas de Direito privado; sem as demais características abaixo;
- Comunitárias: instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma
ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas de professores e
alunos que incluam na sua entidade mantenedora, representante da
comunidade;
- Confessionais: instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma
ou mais pessoas jurídicas, que atendam à orientação confessional e
ideologia específica e ao disposto no item anterior;
- Filantrópicas, na forma da lei, são as instituições de educação ou de
assistência social que prestam os serviços para os quais foram
instituídas, colocando-os à disposição da população em geral, em
caráter complementar às atividades do Estado, sem qualquer
remuneração.
As mantenedoras possuem regime jurídico diferenciados, o que as separa
em: instituições com fins lucrativos (as particulares), subordinadas à legislação que
rege as sociedades mercantis e instituições sem fins lucrativos (comunitárias,
confessionais e filantrópicas), que obedecem a critérios específicos para a
comprovação de seus fins (Decreto n° 3.860/2001, anteriormente citado).
Defendemos que é necessária uma intervenção regulamentar do Estado
(público) sobre as Instituições (privado) para que a coletividade, por meio de seus
representantes, possa dar um norte para a educação superior e que esta não fique
apenas à mercê dos caprichos do mercado. Acreditamos que as regulamentações
do Estado e suas respectivas fiscalizações têm um caráter benéfico no que tange à
organização pedagógica das Instituições de Ensino Superior.
Nos anos 90 iniciaram-se as discussões dos projetos político-pedagógicos
para orientar as propostas de construção dos cursos de Direito no Brasil. Até este
período as estruturações curriculares dos cursos jurídicos em nosso País
representavam em sua maioria transformações institucionais sem qualquer
participação da comunidade acadêmica envolvida.
144
Nos cursos jurídicos as reestruturações curriculares foram feitas de forma
empírica, oriunda de uma tradição lusitana, positivista, normativista e não
participativa. A discussão institucional não superava as áreas de conhecimento de
cada disciplina e não atingia uma construção harmônica e democrática que não
fragmentasse o conhecimento e os conteúdos.
Com a Portaria 1.886/94 (já revogada) do Ministério da Educação,
instrumento normativo que serviu como referência regulatória para os Cursos
Superiores de Direito, foram uniformizados os currículos, estabelecendo, dentre
outras exigências, a necessidade de elaboração de projetos pedagógicos que
explicassem os caminhos possíveis a serem percorridos pelos alunos e professores
na orientação pedagógica dos Cursos Superiores de Direito.
Essa obrigatoriedade normativa ficou mais reforçada em função dos
processos de avaliação instituídos pela SeSU/MEC e pelo INEP, órgãos
responsáveis pelos procedimentos de autorização de abertura e reconhecimento de
cursos, os quais, por meio de suas políticas e orientações de avaliação repassadas
ao avaliadores, exigiam a formulação de projetos político-pedagógicos que
orientassem os trabalhos acadêmicos nos Cursos Superiores de Direito.
Nos fóruns de discussão acerca do ensino jurídico no País, promovidos pela
OAB, ABEDi, MEC e instituições sérias de ensino superior, e com o debate de um
enorme número de questões começou-se a dar um relevo aos projetos político-
pedagógicos e a descobrir-se/construir-se a sua importância na condução dos
Cursos Superiores de Direito.
Voltando para trajetória histórica dos cursos de Direito no Brasil destacamos a
análise da influência portuguesa nos cursos de Direito no passado e no presente. A
investigação histórica em Portugal permitiu verificar que as poucas alterações
sofridas no curso de Direito no decorrer de quase sete séculos, desde sua criação
em Portugal e posteriormente no Brasil, limitaram-se quase que exclusivamente aos
currículos. As propostas curriculares de Direito não consagraram no decorrer da
história a preocupação com a área da didática, seja com o aperfeiçoamento da
prática docente, seja com a formação dos docentes de Direito.
A pesquisa tem por objetivo relacionar as origens portuguesas dos cursos de
Direito com a situação atual desses cursos no Brasil e buscar melhorias para os
145
cursos de Direito por meio dos conhecimentos pedagógicos e orientações das
legislações educacionais. Por esses motivos expostos a pesquisa busca mostrar a
trajetória histórica dos cursos de Direito e relacionar com o impacto das legislações
educacionais no decorrer da história, buscando, ao analisar seu percurso cíclico,
encontrar soluções para os cursos na atualidade.
O índice de reprovação nos exames em muitos Estados brasileiros revela que
os cursos de Direito enfrentam grandes problemas de gestão. Tais questões, de
grande complexidade, demandam uma análise interdisciplinar para seu
entendimento. Deve ser um trabalho coordenado entre educadores e juristas para
buscar soluções ideais e reais para superar os problemas atuais, entendendo o
presente, planejando o futuro e traçando um percurso histórico desde a criação dos
cursos jurídicos em Portugal, analisando sua influência no Brasil, até chegar a um
panorama da atualidade.
Os cursos de Direito devem atingir os atuais objetivos da educação superior
não se limitando às metas fixadas na legislação nacional ou por órgãos do Poder
Público local e devendo também conhecer os objetivos do ensino superior
estabelecidos nos tratados, instrumentos e relatórios internacionais. O jurista
Trindade (1998) defende que:
Já não pode haver dúvida de que as grandes transformações internas
dos Estados repercutem no plano internacional, e a nova realidade
provoca mudanças na evolução interna e no ordenamento
constitucional dos Estados afetados (TRINDADE, 1998: 403).
Para formular os atuais objetivos do ensino de Direito no Brasil devemos
considerar o Relatório Delors, os saberes necessários à educação do futuro segundo
Morin, a Declaração Mundial sobre Educação Superior no Século XXI, a Constituição
Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e, por fim, a
Resolução CES/CNE n. 9, de 29/9/2004 (BRASIL, 2004), e o Processo de Bolonha
(1999), sem a pretensão de esgotar o assunto.
Estudar a educação superior no Brasil implica a verificação do que se defende
a este respeito em nível mundial. É impossível refletir sobre o destino particular de
cada Estado-Nação ignorando o mesmo fenômeno objeto do estudo em escala
global.
Preparar as pessoas para viver em uma diversidade de situações, para poder
146
reorientar suas atividades, aprender a conhecer, ensinar a compreensão, enfrentar
as incertezas e aprender a viver juntas são alguns objetivos do ensino superior que
exigem das instituições e dos professores, dentre outros procedimentos, conhecer o
corpo discente e suas características.
A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), embora trate do ensino
superior, não dispõe expressamente sobre a função específica que ele deva
desempenhar. Faremos referência aos objetivos do País e da educação como um
todo, estabelecidos pela Carta Magna nos arts. 3.° e 205, respectivamente.
O art. 3.° prescreve que “constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o
desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos
de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Montoro afirma que a justiça não é uma técnica da igualdade, da utilidade ou
da ordem social. A justiça é a virtude da convivência humana. É base da justiça o
respeito à dignidade fundamental da pessoa humana. Montoro explica que é “na
realidade histórica, concreta e variável, em que as relações sociais se desenvolvem,
que a justiça e suas exigências devem ser atendidas” (MONTORO, 2000: 138).
Para Reale, justiça é a “tentativa renovada e incessante de harmonia entre as
experiências axiológicas necessariamente plurais, distintas e complementares,
sendo, ao mesmo tempo, a harmonia assim atingida”, podendo ser “compreendida
plenamente como concreta experiência histórica” e impondo reconhecer que “funda-
se no valor da pessoa humana, valor-fonte de todos os valores” (REALE, 2003: 375-
7).
Montoro leciona que na justiça social “o ‘devido’ é a realização do bem
comum, ou, mais precisamente, a contribuição de cada um para sua realização”. A
pluralidade de pessoas, conta Montoro, “se realiza através de uma relação em que o
‘particular’ é a pessoa obrigada e a ‘sociedade’, a pessoa moral ou entidade
beneficiária”.
Por “particular” não deve ser entendido apenas os homens considerados
individualmente, como pessoas físicas ou naturais, mas também as entidades ou
grupos sociais intermediários que, como pessoas jurídicas, são também partes de
147
uma sociedade maior e têm igualmente obrigações para com o bem comum.
Para Montoro, “como os integrantes de uma grande orquestra, todos os
membros da comunidade – indivíduos, grupos, associações, classes, empresas,
dirigentes e o próprio conjunto – têm tarefas a cumprir e são partes no espetáculo”.
Acrescenta “que essas tarefas recaem sobre governantes e governados. Com
responsabilidades diferentes, adequadas a suas funções na comunidade, as
autoridades e os cidadãos têm obrigações estritas e exigíveis em relação ao bem
comum”. Por fim, evidencia Montoro que “bem comum” não deve ser interpretado no
sentido de que tudo deva pertencer confusamente a todos, mas sim “que todos os
membros da comunidade, sem qualquer exclusão de classe ou setor, participem
eqüitativamente desse bem. Pode-se dizer que é da própria natureza do bem
comum a sua comunicabilidade ou exigência de redistribuição” (MONTORO, 2000:
213-222).
Na Carta Magna o termo justiça social se faz presente no caput do art. 170 e
no art. 193 (BRASIL, 1988).
O art. 170, dos princípios fundamentais da ordem econômica, estabelece que
“a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social”, observados os princípios que elenca. Segundo a Carta Magna, não
tem por finalidade precípua o desenvolvimento econômico, mas sim “assegurar a
todos existência digna”, com a qual o bem comum se concretizará. Assim,
considerando que o fim da justiça social é a realização do bem comum, a
Constituição Federal brasileira impõe o direcionamento de esforços, inclusive no
campo da iniciativa privada, para gerar os meios necessários para garantir a
existência digna para todos.
Já o art. 193 da Carta Magna (BRASIL, 1988) estatui que “a ordem social tem
como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”.
As diferenças entre a justiça social na ordem econômica e na ordem social são
explicadas por Ferraz Jr., para quem a ordem econômica deve visar a assegurar a
todos a existência digna conforme os ditames da justiça social. O objetivo da ordem
social é o próprio bem-estar social e a justiça social. A primeira deve garantir que o
processo econômico, enquanto produtor, não impeça, mas se oriente para o bem-
148
estar e a justiça sociais. A segunda não os assegura, instrumentalmente, mas os
visa diretamente. Os valores econômicos são valores-meio. Os sociais, valores-fim
(FERRAZ. JR., 1989: 53).
Estes objetivos do Estado constituem-se também em metas a serem
alcançadas pelas instituições de ensino superior. Uma instituição de ensino superior
no Brasil, ao possibilitar que pessoas se formem, está contribuindo para o
desenvolvimento do País, para a erradicação da pobreza e da marginalização, está
diminuindo as desigualdades sociais e, ainda, promovendo o bem-estar de todos.
O art. 205 da Carta Magna (BRASIL, 1988) atesta que “a educação, Direito de
todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Constata-
se, assim, que são objetivos da educação nacional e do ensino superior contribuir
para o pleno desenvolvimento da pessoa, prepará-la para o exercício da cidadania e
qualificá-la para o trabalho.
A Constituição Federal elegeu o valor da dignidade humana como valor
essencial que lhe dá unidade de sentido, ou seja, o valor da dignidade humana
informa a ordem constitucional de 1988.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96, BRASIL,
1996) de certo modo também evidencia que a educação superior não serve apenas
para fornecer mão de obra.
O art. 2.° da referida lei reproduz o conteúdo do art. 205 da Constituição
Federal (BRASIL, 1988), antes já comentado. Ao tratar especificamente da
educação superior, o art. 43 estatui que ela tem por finalidade:
149
I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito
científico e do pensamento reflexivo; II - formar diplomados nas
diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores
profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade
brasileira, e colaborar na sua formação contínua; III - incentivar o
trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da
cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do
meio em que vive; IV - promover a divulgação de conhecimentos
culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da
humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações
ou de outras formas de comunicação; V - suscitar o desejo
permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a
correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão
sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do
conhecimento de cada geração; VI - estimular o conhecimento dos
problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais,
prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta
uma relação de reciprocidade; e VII - promover a extensão, aberta à
participação da população, visando à difusão das conquistas e
benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e
tecnológica geradas na instituição (BRASIL, 1996).
Quanto à LDB e suas relações com o ensino do Direito, Melo Filho afirma que
a exigência de “desenvolvimento do ‘pensamento reflexivo’ constitui-se na maior
preocupação metodológica do ensino jurídico de graduação, que deve ser capaz de
estimular o raciocínio e a criatividade, de exercitar uma visão crítica e de formar
cidadãos conscientes de seu papel na sociedade, ou seja, aptos para entender o
contexto onde vão operar e o sentido de sua ação no mundo”. Sustenta, ainda, que
“no âmbito do ensino jurídico não há nem deve haver assertivas indiscutivelmente
verdadeiras, verdades eternas e as afirmações devem ser suscetíveis de discussão
e de adequação às realidades”. Continua afirmando que “a nova formatação do
curso jurídico (...) abre ao futuro bacharel em Direito um leque significativo de
opções profissionais, dos quais a advocacia é apenas uma via (...)” (MELLO FILHO,
1997: 104-6).
O art. 30 da Resolução 9, de 29 de setembro de 2004 (BRASIL, 2004),
editada pela Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de
Educação/MEC, que instituiu as diretrizes curriculares nacionais dos cursos de
graduação em Direito, estabelece o perfil desejado do formando, dispondo que um
curso de Direito deve oportunizar ao estudante uma sólida formação geral,
humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de conceitos e da
terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos
fenômenos jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica que
150
fomente a capacidade e a aptidão para a aprendizagem autônoma e dinâmica,
indispensável ao exercício da Ciência do Direito, da prestação da justiça e do
desenvolvimento da cidadania.
Um deles é proporcionar uma formação geral e humanística, ou seja, um
curso de Direito não deve se preocupar exclusivamente com uma formação técnica
jurídica, impondo-lhe oportunizar ao aluno uma formação completa, que lhe prepare
para a vida e não somente para uma profissão. Tem por objetivo integrar o
estudante no campo, estabelecendo as relações do Direito com outras áreas do
saber, abrangendo, dentre outros, estudos que envolvam conteúdos essenciais
sobre Antropologia, Ciência Política, Economia, Ética, Filosofia, História, Psicologia e
Sociologia. Uma formação humanística faz o curso de Direito evitar o puro
tecnicismo jurídico e construir um ensino pluralista, democrático e interdisciplinar.
Segundo Morin (2001A):
(...) as disciplinas se fecham e não se comunicam umas com as
outras. Os fenômenos são cada vez mais fragmentados, e não se
consegue conceber a sua unidade. É por isso que se diz cada vez
mais: “Façamos interdisciplinaridade”. Mas a interdisciplinaridade
controla tanto as disciplinas como a ONU controla as nações. Cada
disciplina pretende fazer reconhecer sua soberania territorial, e, à
custa de algumas magras trocas, as fronteiras confirmam-se em vez
de se desmoronar (MORIN, 2001A: 135).
Para Martinez, “um rompimento transdisciplinar passível de ser inicialmente
vislumbrado contra a disciplinaridade fragmentária” consiste em “não mais se pensar
em disciplinas tecnonormativas”. O autor sustenta que o:
(…) oposto inovador (“despositivador”) estará em pensar disciplinas
temático-conceptuais, tais como, uma disciplina da Família e Direito,
uma disciplina de Estudo jurídico da Propriedade, nas quais o objeto
de estudo não terá um cerne normativo, mas um cerne voltado a uma
visão sócio-jurídica, imersa na complexidade das relações sociais
(MARTINEZ, 2003: 61,2).
Para Tagliavini (2008) o projeto pedagógico de um curso de Direito deve ter
por objetivo substituir uma prática pedagógica conteudista, centrada na transmissão
de fatos, conceitos e procedimentos, pela formação para o pensamento, para a
capacidade de identificar e resolver problemas e para a aquisição de habilidades e
competências.
O autor explica que em primeiro lugar estão as habilidades necessárias a
todos os cidadãos profissionais, que são as associadas ao “saber fazer”, como a
151
ação física ou mental, que indica a capacidade adquirida, citando como exemplos:
identificar variáveis, compreender fenômenos, relacionar informações, analisar
situações-problema, sintetizar, julgar, comparar, classificar, discutir, descrever,
opinar, fazer generalizações, analogias, diagnósticos, correlacionar e manipular.
Já as competências, continua o professor, são um conjunto de habilidades,
desenvolvidas em harmonia, e ter competência significa estar habilitado com
conhecimentos e esquemas para desenvolver respostas inéditas, adequadas,
criativas e eficazes para problemas novos que se apresentam. Competências,
portanto, envolvem esquemas de percepção, pensamento, avaliação, decisão e
ação.
Fomentar a capacidade de analisar significa conseguir contestar ou
questionar aquilo que é apresentado, evitando aceitar passivamente tudo que lhe é
posto. Dominar conceitos e ter uma argumentação apropriada implica a exigência de
se estimular uma postura mais reflexiva e criativa por parte do aluno, além, é claro,
de gerar nele a possibilidade de expor suas ideias e de argumentar com fundamento
e lógica.
Tagliavini lembra que o Curso de Direito, com vocação para formação gene-
ralista e ligado com a realidade atual, tem como objetivo formar o profissional
competente e ético, devendo estar ao lado das habilidades e competências
(TRAGLIAVINI, 2008: 34)
19
Müller (1998) explica que:
(…) o que se afigura como risco a partir da exclusão herdada do
passado, configura ocasião para a luta legal e não-violenta, para a
luta legitimadora contra a exclusão: a ocasião de levar essa
constituição a sério na prática. (...) Os juristas de um país da
modernidade periférica, que se vêem expostos a tal situação, têm
objetivamente o papel de vanguarda não apenas em termos de
técnica jurídica, de competências, mas justamente também em
termos sociais. Assumem o papel de vanguarda do desenvolvimento
global da sociedade no sentido de criar e fortalecer uma consciência
pública mais ampla com relação à constituição, à legalidade e à
vigência (levada a sério) dos textos oficiais de normas
(MÜLLER,1998: 105).
19
Um ensino desvinculado da realidade social também é objeto de crítica de José Eduardo Faria, segundo o
qual, "em termos práticos, tal ensino quando muito se limita a fornecer um conhecimento progressivamente
empobrecido, insensível ao que é qualitativamente novo; um conhecimento que não vê como, na materialidade
do cotidiano (...), vão sendo forjados novas relações e novos Direitos, mediante conceitos construídos através da
história e funções inéditas para as antigas categorias normativas; um conhecimento que se deixou banalizar pelas
concessões retóricas e pelo palavreado grotescamente barroco e 'coimbrão' dos pseudojuristas (...)"(FERRAZ
JÚNIOR, 1992: 186).
152
É crítico o aluno que pensa e reflete sobre os fatos concretos e extrai da sua
análise argumentos e ideias para melhorar seu desempenho, traçar melhor seus
objetivos, definir suas atitudes e repensar suas crenças.
3.4.2 Uma combinação de olhares
Um homem é aquilo que aprende a tornar-se – esta é a condição
humana (OAKESHOTT, Michael)
Defendia Freire que basta ser homem para ser capaz de captar os dados da
realidade, para ser capaz de saber, ainda que seja este saber meramente opinativo,
razão pela qual inexiste ignorância absoluta e sabedoria absoluta. Advertia, por
outro lado, que:
(…) o homem, contudo, não capta o dado da realidade, o fenômeno,
a situação problemática pura. Na captação, juntamente com o
problema, com o fenômeno, capta também seus nexos causais.
Apreende a causalidade. A compreensão resultante da captação será
tão mais crítica quanto seja feita a apreensão da causalidade
autêntica. E será tão mais mágica, na medida em que se faça com
um mínimo de apreensão dessa causalidade. Enquanto para a
consciência crítica a própria causalidade autêntica está sempre
submetida à sua análise – o que é autêntico hoje pode não ser
amanhã – para a consciência ingênua, o que lhe parece causalidade
autêntica já não é, uma vez que lhe atribui caráter estático, de algo já
feito e estabelecido. (...) (Afirmava, em conseqüência), (...) que é
próprio da consciência crítica a sua integração com a realidade,
enquanto que da ingênua o próprio é sua superposição à realidade.
(...) A toda compreensão de algo corresponde, cedo ou tarde, uma
ação. Captado um desafio, compreendido, admitidas as hipóteses de
resposta, o homem age. A natureza da ação corresponde à natureza
da compreensão. Se a compreensão é crítica ou preponderantemente
crítica, a ação também o será. Se é mágica a compreensão, mágica
será a ação (FREIRE, 1975: 105-106).
Cada vez é mais inútil tentar conhecer tudo e o processo de aprendizagem
jamais se acaba, sendo estes os motivos pelos quais o aluno precisa aprender a
conhecer. Na visão de Tagliavini, o projeto pedagógico que tiver sua proposta na
direção da formação de habilidades e competências será aquele que possibilitará ao
futuro bacharel a conquista da sua autonomia intelectual e crescer diante dos muitos
e complexos desafios da realidade sempre mutante (TRAGLIAVINI, 2008: 34).
O ensino do Direito tem diversos outros objetivos além da formação de
profissionais, uma vez que sempre proporciona ao estudante um mínimo de
desenvolvimento sociocultural e humanístico, além de habilitá-lo para inúmeras
153
outras atividades direcionadas ao aumento de conhecimentos, sem o forçoso
objetivo profissionalizante.
Os cursos de Direito não formam advogados, mas sim bacharéis em Direito.
Nem todos os que se submetem ao mencionado exame cursaram Direito pensando
em se tornar advogado, mas mesmo assim se inscrevem no exame. O conteúdo das
questões que compõem a prova está em pleno desacordo com os reais e atuais
objetivos do ensino do Direito. Cobra-se memorização, tecnicismo, legalismo e
atitude passiva, enquanto o curso de Direito estimula uma visão crítica, pluralista,
antidogmática, antipositivista e reflexiva. Scaff (2006) lembra que:
(…) todo aquele que já foi professor sabe que pode formular uma
prova de forma que nenhum dos alunos obtenha nota máxima, ou
sequer mediana. Ainda mais quando se trata de uma prova sobre
temas jurídicos, em que a consulta aos textos legais é proibida. Logo,
basta formular uma prova cheia de “pegadinhas” que privilegie a
memorização do conhecimento, em face do verdadeiro saber. (...)
Nenhum cliente entra em um escritório de advocacia perguntando ao
advogado qual o prazo de agravo, ou qual a alíquota de ICMS para a
importação de batatas. O cliente sempre apresenta um problema,
usualmente complexo e relatado de forma leiga, em que o advogado
é levado a buscar uma solução para aquela situação. Para tanto,
conta com um arsenal de textos legais, doutrinários e jurisprudenciais
para orientar seu cliente. Logo, o privilegiamento de uma
memorização é algo que frustra o saber verdadeiro, que deve ser
ensinado nas faculdades de Direito, que seguramente não são
faculdades de lei (o que é bastante diferente). Portanto, não se pode
inferir que as faculdades são boas ou ruins porque seus alunos foram
reprovados no Exame de Ordem (SCAFF, 2006: 22).
(…) uma vez tendo ingressado na corporação dos advogados o
profissional jamais será novamente submetido a outro exame, de tal
modo que poderá passar anos e anos a advogar sem jamais estudar
de forma sistemática o Direito, apenas o caso-a-caso que lhe chega
às mãos. Há uma abissal diferença entre o estudo sistemático e o
casuístico. Neste, o profissional analisa a situação de um cliente (ou
um grupo deles) e busca soluções para aquele caso concreto. No
estudo sistemático, busca-se compreender o Direito para sua
aplicação perante toda a sociedade. É claro que os dois tipos de
estudos podem convergir, mas sem um método coerente e
determinado isso jamais será obtido, correndo o advogado o risco de
se tornar um praxista, e não um profissional do Direito (SCAFF, 2006:
23).
A existência de um Exame de Ordem que regule apenas o ingresso na
corporação também não afasta a existência de profissionais desatualizados no seio
da classe. E tanto isso é verdade que, em pesquisa realizada junto aos advogados
de todo o Brasil pela própria OAB, ficou realçada por eles “a necessidade de
formação complementar. Dos entrevistados, iniciantes ou não, quase três quartas
154
partes (74,4%) sentem necessidade não somente de complementação da formação
acadêmica quanto de atualização de conhecimentos” (OMMATI, 2000: 11). Lopes
dos Santos (2002) assevera que:
(…) os processos de seleção dos magistrados – e dos operadores
jurídicos, em geral (demais concursos públicos e exame de Ordem) –
vêm relutando reiteradamente em abrir espaço a enfoques menos
enclausurados no campo da técnica, estimulando, assim, a
manutenção de uma formação pouco voltada a propiciar aos alunos
uma visão mais ampla do fenômeno jurídico, em suas diversas
facetas, que extrapolam o simples tecnicismo, adentrando as
dimensões psicológica, social, econômica e política, que nele se
conjugam (LOPES DOS SANTOS, 2002: 38).
No tocante ao Exame de Ordem, Lopes dos Santos (2002) tem “por
absolutamente válidas as críticas contra ele lançadas por parte significativa dos
juristas nacionais”. E complementa:
(…) quanto à sua possível contribuição, em qualquer nível, para a
melhoria dos cursos jurídicos nacionais, não a temos por factível,
sobretudo em razão da disparidade de perspectivas que hão de guiar,
de um lado, qualquer sistema de avaliação de qualidade de ensino, e,
de outro, um sistema de avaliação de aptidão técnica ou profissional.
(...) o efeito produzido pelo Exame de Ordem, como até hoje
empreendido, sobre a racionalidade do ensino desenvolvido em
nossas faculdades de Direito, não poderia ser mais nocivo; afinal,
trata-se de um Exame efetivamente calcado em uma lógica
completamente avessa àquela que se tem defendido como desejável
à formação dos novos profissionais do Direito, na medida em que
prestigia, indisfarçadamente, não a capacidade de raciocínio (menos
ainda crítico) de seus candidatos, mas sua capacidade mnemônica –
a velha “decoreba” (...) (LOPES DOS SANTOS, 2002: 87-96).
Embora a OAB sustente que o Exame de Ordem tem seu fundamento na
necessidade de “'verificação de conhecimentos mínimos indispensáveis ao exercício
da profissão”,
20
é fato inegável que na prática isso não ocorre. Com efeito, o Exame
de Ordem, do modo como é hoje realizado, parece mais se constituir numa
ferramenta para “reserva de mercado” e tem como consequência, dentre outras, a
proliferação de cursinhos preparatórios que constantemente se intitulam os maiores,
senão únicos, responsáveis pelos aprovados no certame da OAB.
21
Se realmente o
20
Vide a respeito a Política de Educação Continuada da Escola Nacional de Advocacia da OAB, disponível em
http://www.oab.org.br/Ena/politicaeducacao.asp. Acesso em 19/7/2006.
21
Visitamos alguns cursos preparatórios: a) Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes: “A Rede de Ensino Luiz
Flávio Gomes oferece a você Cursos Preparatórios para Carreiras Jurídicas e Pós-Graduações com o maior
índice de aprovação do mercado. Comprove você mesmo"; b) Ipojur: "Professores qualificados, estrutura
moderna, material didático atualizado e turmas reduzidas - alguns dos detalhes que fazem do Ipojur o lugar certo
para quem deseja ser aprovado na OAB e concursos públicos da magistratura e promotoria"; c) FMB Curso
Jurídico: "O Curso FMB, coordenado pelo professor Flávio Monteiro de Barros, desenvolveu um método
revolucionário de estudo, simplificando o caminho da aprovação"; d) Siga Concursos: "Curso preparatório para
155
Exame de Ordem avalia o ensino ministrado nos cursos de Direito do País, então
autorizada está a afirmação de que os “cursinhos preparatórios” estão educando
melhor do que as escolas de Direito.
A OAB já reconheceu a necessidade de modificações no Exame de Ordem. É
o que se verifica, na lição de Lôbo, publicada em livro editado pela entidade,
segundo o qual, “para que possa melhor atingir suas finalidades e, sobretudo, ser
qualificado instrumento de contribuição para o aperfeiçoamento dos cursos
jurídicos”, importante se faz a adoção de providências no Exame de Ordem para
“desenvolver questões que exijam raciocínio, reflexão crítica, e incluam temas
voltados às mudanças do Direito e às matérias de formação geral e humanística,
excluindo-se as questões que envolvam apenas memorização” (LÔBO, 2000: 156).
Um curso jurídico que trate o Direito como “atividade verdadeiramente
científica” e não como “tecnologia de controle” está respeitando e realmente
buscando os “atuais” objetivos de uma educação superior em Direito. Somente este
tipo de curso é que pode alterar a realidade e contribuir para eliminar ou diminuir as
desigualdades sociais. Para Rodrigues (1995):
(…) hoje os cursos jurídicos auxiliam, enquanto instância de
reprodução simbólica das crenças, valores e pré-conceitos jurídico-
políticos de um certo liberalismo, mesclado de nuances de
conservadorismo, a manutenção do status quo político-econômico-
social. A expectativa é que se possa transformá-lo em um instrumento
a serviço da construção de uma sociedade mais justa e democrática.
Deve ele formar agentes sociais críticos, competentes e
comprometidos com as mudanças emergentes, com o novo;
operadores jurídicos que possuam uma qualificação técnica de alto
nível, acompanhada da consciência de seu papel social, da
importância estratégica que possuem todas as atividades jurídicas no
mundo contemporâneo e, portanto, da responsabilidade que lhes
compete nessa caminhada. Em resumo: que os cursos jurídicos
sejam instrumentos de resgate da cidadania (RODRIGUES, 1995:
21).
Rodrigues (1995) ainda defende que existem várias funções que são
desempenhadas pelos egressos dos cursos jurídicos. Sustenta que não se pode
esquecer de uma constatação empírica extremamente importante, qual seja, “a
grande parte dos egressos dos cursos jurídicos não trabalha no mercado de trabalho
os principais concursos. Inclui apostilas divididas aula a aula, professores experientes, simulados comentados,
plantão de dúvidas e a experiência do Curso Anglo"; e) Central de Concursos: "Uma história de 17 anos baseada
na seriedade e competência. Com professores altamente qualificados e pedagogia eficaz, faz jus ao título: O
Maior Índice de Aprovação do Brasil"; (disponível em http://licconcursos.uol.com.br/montate1a4-
jc.php?p=guia_brasi1&secao= 1. Acesso em 19/7/2006).
156
jurídico (...)”. Warat (1996) reconhece o ensino jurídico:
(…) como prática preventiva dos processos de pós-alienação, (...)
como uma prática política dos Direitos humanos, explicando que o
ensino do Direito tem que reconhecer-se comprometido com as
transformações da linguagem, aceitar-se como prática genuinamente
transgressora da discursividade instituída, como exercício de
resistência a todas as formas de violência simbólica, isto é, como uma
prática política dos Direitos dos homem à sua própria existência
(WARAT, 1996: 22).
O curso de Direito deve formar pessoas conscientes de seus Direitos e
deveres, mais aptas a viver em sociedade, melhores chefes de família, melhores
filhos, capazes de solucionar conflitos sem se socorrer de advogados e até mesmo
do Poder Judiciário, capazes de pensar e criticar a realidade social e com vontade
de melhorar o mundo.
22
A Pedagogia elaborada por Paulo Freire apresenta-se como uma Pedagogia
humanista, problematizadora; uma pedagogia de questionamento, pergunta,
indignação, tolerância, autonomia.
Compreende homens e mulheres como seres inconclusos, inacabados e
incompletos, que por perceberem que "não sabem tudo", buscam o saber, o
conhecimento e o seu aprimoramento. O ser humano por essa perspectiva é visto
como ser de relação, reflexivo, transcendente e temporal, cuja relação com o mundo
possibilita a sua característica de sujeito de conhecimento (sujeito epistemológico),
da história e da cultura. É sujeito concreto, que existe no mundo e com o mundo,
cuja consciência é intencionada para fora de si, para um mundo que não é mero
objeto de contemplação, mas de ação.
Segundo Freire (1993) não há educação neutra, pois o processo educativo é
um ato político, uma relação de domínio ou de liberdade entre as pessoas. O diálogo
entre docentes e discentes é o caminho para a libertação das pessoas oprimidas.
Paulo Freire não comungava da concepção de educação na qual o professor é mero
transmissor de informação, que deposita seus conhecimentos nos alunos,
22
Destacamos o estudo de Boaventura de Sousa Santos, realizado na década de 70, em favelas do Rio de
Janeiro. Segundo o professor, “foi possível detectar e analisar a existência no interior destes bairros urbanos de
um Direito informal não oficial, não profissionalizado, centrado na Associação de Moradores que funcionava
como instância de resolução de litígios entre vizinhos, sobretudo nos domínios da habitação e da propriedade de
terra. Estes e muitos outros estudos que se seguiram com objetivos analíticos semelhantes permitiram concluir o
seguinte: (...) de um ponto de vista sociológico, o Estado contemporâneo não tem o monopólio da produção e
distribuição do Direito. Este conjunto de articulações e inter-relações entre vários modos de produção do Direito
constitui o que designo por formação jurídica” (FARIA, 1989: 54) (SANTOS, 1988).
157
denominada por ele de "educação bancária".
Na educação bancária o único papel do educador é o de expor e impor
conhecimentos, não havendo espaço para discussão e reflexão. Nesse sentido, a
ideia que se tem é de aquele que possui conhecimento irá depositar, transferir, pura
e simplesmente, a que conhece para aquele que nada sabe, o depositário do saber
de outrem. Segundo Paulo Freire (1993):
Eis aí a concepção bancária da educação, em que a única margem
de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os
depósitos, guardá-los e arquivá-los. Na visão "bancaria" da educação,
o "saber" é uma doação dos que julgam sábios aos que julgam nada
saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais
da ideologia da opressão e absolutização da ignorância, que constitui
o que chamamos de alienação e ignorância, segundo a qual esta se
encontra sempre no outro (FREIRE,1993: 58).
Ainda, segundo o autor: “Educa-se para arquivar o que se deposita. Mas o
curioso é que o arquivado é o próprio homem, que perde assim seu poder de criar,
se faz menos homem. O destino do homem deve ser criar e transformar o mundo,
sendo sujeito de sua ação” (FREIRE, 1983: 38).
Por essa perspectiva, a educação que considera o aluno como simples
receptáculo de informações foi duramente combatida por Paulo Freire a partir dos
anos 60 e 70. Para Paulo Freire, a educação que liberta é aquela que faz com que o
aluno desenvolva consciência crítica e participe ativamente no processo de
aprendizagem, pois só assim o homem torna-se, efetivamente livre (FREIRE, 1993:
67). A educação pode, portanto, significar libertação. Contudo, para isso, ela deve
estimular, segundo Paulo Freire (1996):
A pergunta, a reflexão crítica sobre a própria pergunta, o que
pretende com esta ou aquela pergunta em lugar da passividade em
face das explicações discursivas do professor, espécies de respostas
a perguntas não feitas. Isto não significa realmente que devamos
reduzir a atividade docente em nome da defesa da curiosidade
necessária, a puro vai e vem de perguntas e respostas, que
burocraticamente se esterilizam. A dialogicidade não nega a validade
de momentos explicativos, narrativos, em que o professor expõe ou
fala do objeto. O fundamental é que o professor e alunos saibam que
a postura deles, do professor e do aluno, é dialógica, aberta, curiosa,
indagadora e não apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve. O
que importa é que o professor e os alunos se assumam
epistemologicamente curiosos (FREIRE, 1996: 95-6).
Paulo Freire (1996) entende que a educação deve envolver o educando, o
educador, e o meio educativo. Deve, ainda, capacitar o indivíduo, tanto para viver
158
civilizadamente e produtivamente, como para formar seu comportamento para agir
corretamente com seus princípios e valores, porém, com abertura para revisá-los e
modificá-los, quando mudanças se fizerem necessárias. A educação deve englobar,
pois, de forma indissociável, tanto os processos de aprendizagem, quanto os de
ensino.
Na concepção Freireana (1993) a educação é considerada fator de
mudanças, de conscientização e transformações; é, nesse sentido, essencialmente,
libertadora. Constituindo-se, portanto, não somente um meio de intervenção
individual, mas também, da própria realidade social. Defende, ainda, que o educador
deve ser um problematizador, um agente provocador de situações. O processo
educativo deve enfatizar elementos subjetivos, especialmente a relação professor e
aluno, que se apresenta como dialógica. Segundo Paulo Freire (1994):
O currículo, no seu sentido mais amplo, implica não apenas o
conteúdo programático do sistema escolar, mas também, entre outros
aspectos, os horários, a disciplina e as tarefas diárias que se exigem
dos alunos. Há, pois, nesse currículo, uma qualidade oculta e que
gradativamente fomenta a rebeldia por parte das crianças e dos
adolescentes. Sua rebeldia é uma reação aos elementos agressivos
do currículo que atuam contra os alunos e seus interesses (FREIRE,
1994: 70).
Todo o verdadeiro currículo deve assentar e visar à autonomia dos
educandos. Aqui, convém lembrar que Paulo Freire defende que todos são
educandos e educadores. Porém, para ele falar em autonomia implica também falar
em liberdade, liberdade com responsabilidade.
O currículo sob essa perspectiva é compreendido numa ótica filosófica e
cultural, alargando-se inclusive para fora da escola, numa perspectiva integradora e
sistêmica de realização pessoal dos educandos, numa perspectiva de educação
mais ampla, não de mero ensino e instrução.
3.5 As influências e confluências internacionais no ensino superior
Quando lhe perguntaram de onde vinha, respondeu “Sou um cidadão
do mundo” (LAERTIUS, Diogenes, Vida de Diógenes, O Cínico)
A Conferência Geral da Unesco, em novembro de 1991, convidou o diretor-
geral “a convocar uma comissão internacional encarregada de refletir sobre educar e
aprender para o século XXI”. Federico Mayor pediu a Jacques Delors que presidisse
159
tal comissão, que reuniu quatorze outras personalidades de todas as regiões do
mundo, vindas de horizontes culturais e profissionais diversos.
A Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI foi criada,
oficialmente, no início de 1993. Financiada pela UNESCO, e servida por um
secretariado posto à sua disposição por esta mesma organização, a Comissão pôde
tirar partido dos preciosos recursos ao dispor da UNESCO e da sua experiência
internacional, assim como de um impressionante acervo de informações, sem deixar
de conduzir os seus trabalhos e elaborar as suas recomendações com
independência (DELORS, 1998: 268).
Os trabalhos da referida Comissão encerraram-se em 1996, consignando um
relatório no qual a educação surge como um trunfo indispensável à humanidade na
sua construção dos ideais da paz, da liberdade e da justiça social. A Comissão
considerou as políticas educativas um processo de enriquecimento dos
conhecimentos, do saber-fazer, mas também, e talvez em primeiro lugar, como uma
via privilegiada de construção da própria pessoa, das relações entre indivíduos,
grupos e nações.
É a ideia de educação permanente que deve ser repensada e ampliada. Além
das necessárias adaptações relacionadas com as alterações da vida profissional, ela
deve ser encarada como uma construção contínua da pessoa humana, dos seus
saberes e aptidões, da sua capacidade de discernir e agir. Deve levar cada um a
tomar consciência de si próprio e do meio ambiente que o rodeia e a desempenhar o
papel social que lhe cabe enquanto trabalhador e cidadão. É desejável que a escola
transmita ainda mais o gosto e prazer de aprender, a capacidade de ainda mais
aprender a aprender, a curiosidade intelectual.
23
Delors e seu grupo relataram que a educação, para poder dar resposta ao
conjunto das suas missões, deve organizar-se em torno de quatro aprendizagens
fundamentais que, ao longo de toda a vida, serão de algum modo para cada
indivíduo os pilares do conhecimento.
O primeiro pilar da educação é o aprender a conhecer, que significa adquirir
os instrumentos da compreensão. Como o conhecimento é múltiplo e evolui
infinitamente, torna-se cada vez mais inútil tentar conhecer tudo. O processo de
160
aprendizagem do conhecimento nunca está acabado e pode enriquecer-se com
qualquer experiência. Outra coluna da educação refere-se ao aprender a fazer, para
poder agir sobre o meio envolvente, objetivando adquirir não somente uma
qualificação profissional, mas, de uma maneira mais ampla, competências que
tornem a pessoa apta a enfrentar numerosas situações e a trabalhar em equipe, com
reflexos também no âmbito das diversas experiências sociais ou de trabalho que se
oferecem aos jovens e adolescentes. A terceira pilastra consiste no aprender a viver
juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades
humanas, desenvolvendo a compreensão do outro e a percepção das
interdependências, realizando projetos comuns e preparando-se para gerir conflitos,
observando-se o respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da
paz. Por fim, o aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes, para
melhor desenvolver a personalidade e estar à altura de agir com cada vez maior
capacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade pessoal.
(DELORS, 1998: 89-102).
Aos cursos superiores não cabe apenas a missão de formar pessoas aptas
para o trabalho qualificado, incumbindo-lhes também a tarefa de servir de fonte de
desenvolvimento individual, permitindo e facilitando o acesso ao saber
desinteressado, nas mais diversas áreas do conhecimento e da cultura humana.
Compete às instituições de ensino superior lutar contra a desigualdade social e
contribuir para a erradicação da pobreza e da exclusão, sendo de rigor proporcionar
a inclusão dos grupos social e economicamente marginalizados.
A UNESCO, em 1999, encomendou ao filósofo francês Edgar Morin a
exposição das suas ideias sobre a educação do futuro, com o objetivo de aprofundar
a visão transdisciplinar da educação, trabalho que teve como resultado a obra
denominada Os sete saberes necessários à educação do futuro.
Morin mostra em seu texto sua intenção de expor problemas centrais ou
fundamentais que permanecem totalmente ignorados ou esquecidos e que são
necessários para se ensinar no próximo século, não mais divididos em disciplinas.
Morin aponta um caminho a todos os educadores interessados em estudar os
objetivos das instituições de ensino de todos os níveis e modalidades de educação.
23
Idem:18.
161
Suas reflexões contrapõem-se aos que defendem que o ensino superior se destina
apenas à formação para o mercado de trabalho. Segundo o filósofo, há sete saberes
fundamentais que a educação do futuro deveria tratar em toda sociedade e em toda
cultura, sem exclusividade nem rejeição, segundo modelos e regras próprias a cada
sociedade e a cada cultura (MORIN, 2000):
1º) As cegueiras do conhecimento (o erro e a ilusão)
2º) Os princípios do conhecimento pertinente
3º) Ensinar a condição humana
4º) Ensinar a identidade terrena
5º) Enfrentar as incertezas
6º) Ensinar a compreensão
7º) A ética do gênero humano
Um debate sobre a função do ensino superior não pode deixar de lembrar a
Conferência Mundial sobre Educação Superior, convocada pela UNESCO e
realizada em sua sede em Paris, de 5 a 9 de outubro de 1998. Desta reunião
resultou o documento que reflete a posição oficial da UNESCO e de seus Estados-
Membros, dentre eles o Brasil, denominado Declaração Mundial sobre Educação
Superior no Século XXI: Visão e Ação (UNESCO, 1998).
(…) a educação serve à sociedade de diversas maneiras e sua meta
é formar pessoas mais sábias, possuidoras de mais conhecimentos,
bem informadas, éticas, responsáveis, críticas e capazes de continuar
aprendendo. Se todos os seres humanos tivessem essas aptidões e
qualidades, os problemas do mundo não se resolveriam
automaticamente, porém os meios e a vontade de fazê-lo estariam ao
alcance das mãos. A educação também serve à sociedade,
oferecendo uma visão crítica do mundo, especialmente de suas
deficiências e injustiças e promovendo maior grau de consciência e
sensibilidade, explorando novas visões e conceitos e inventando
novas técnicas e instrumentos. A educação é, também, o meio de
divulgar o conhecimento e desenvolver talentos para introduzir as
mudanças desejadas nas condutas, valores e estilos de vida e para
suscitar o apoio público às mudanças contínuas e fundamentais que
serão imprescindíveis para que a humanidade possa modificar sua
trajetória, abandonando a via mais comum que leva a dificuldades
cada vez maiores e a uma possível catástrofe, para iniciar seu
caminho a um futuro sustentável. A educação é, em síntese, a melhor
esperança e o meio mais eficaz que a humanidade tem para alcançar
o desenvolvimento sustentável (UNESCO, 1998: 35).
A educação superior sob o aspecto de sua função social e pública, isto é, da
perspectiva daquilo que política e filosoficamente lhe justifica a existência, existe
para expandir os processos civilizatórios, desenvolver e aprofundar os interesses
sociais e públicos que se hegemonizam em uma dada situação das disputas sociais
e das relações de poder.
162
A razão de ser da educação, o que lhe fornece os fundamentos e os
objetivos essenciais, é a formação global dos cidadãos, sendo dever
da instituição de educação superior construir-se cada vez mais
intensa e extensamente como um espaço público, que é o espaço da
democracia, que não pode ser confundido com o mercado, pois os
objetivos de uma e de outro não são os mesmos. A grande tarefa da
universidade é, pois, a construção de um espaço público cujos
valores falem mais alto e sejam mais duradouros que os interesses
utilitaristas e de curto prazo do mercado (DIAS SOBRINHO, 2003:
109-120).
A referida Declaração propõe que a educação superior tem um objetivo muito
maior do que formar profissionais para o mercado de trabalho. Em seu art. 1.°
declara que as missões e valores fundamentais da educação superior, em particular
a missão de contribuir para o desenvolvimento sustentável e o melhoramento da
sociedade como um todo, devem ser preservados, reforçados e expandidos ainda
mais, a fim de:
a) educar e formar pessoas altamente qualificadas, cidadãs e
cidadãos responsáveis, capazes de atender às necessidades de
todos os aspectos da atividade humana, oferecendo-lhes
qualificações relevantes, incluindo capacitações profissionais nas
quais sejam combinados conhecimentos teóricos e práticos de alto
nível mediante cursos e programas que se adaptem constantemente
às necessidades presentes e futuras da sociedade;
b) prover um espaço aberto de oportunidades para o ensino superior
e para a aprendizagem permanente, oferecendo uma ampla gama de
opções e a possibilidade de alguns pontos flexíveis de ingresso e
conclusão dentro do sistema, assim como oportunidades de
realização individual e mobilidade social, de modo a educar para a
cidadania e a participação plena na sociedade com abertura para o
mundo, visando construir capacidades endógenas e consolidar os
Direitos humanos, o desenvolvimento sustentável, a democracia e a
paz em um contexto de justiça;
c) promover, gerar e difundir conhecimentos por meio da pesquisa e,
como parte de sua atividade de extensão à comunidade, oferecer as-
sessorias relevantes para ajudar as sociedades em seu
desenvolvimento cultural, social e econômico, promovendo e
desenvolvendo a pesquisa científica e tecnológica, assim como os
estudos acadêmicos nas ciências sociais e humanas, e a atividade
criativa nas artes;
d) contribuir para a compreensão, interpretação, preservação, reforço,
fomento e difusão das culturas nacionais e regionais, internacionais e
históricas, em um contexto de pluralismo e diversidade cultural;
e) contribuir na proteção e consolidação dos valores da sociedade,
formando a juventude de acordo com os valores nos quais se baseia
a cidadania democrática, e proporcionando perspectivas críticas e
independentes a fim de colaborar no debate sobre as opções
estratégicas e no fortalecimento de perspectivas humanistas;
f) contribuir para o desenvolvimento e melhoria da educação em
todos os níveis, em particular por meio da capacitação de pessoal
docente.
A Declaração estabelece que o ensino superior deve facilitar o acesso a uma
163
educação geral ampla, especializada e interdisciplinar para determinadas áreas,
focalizando-se as habilidades e aptidões que preparem os indivíduos tanto para
viver em uma diversidade de situações como para poder reorientar suas atividades.
Dispõe que a educação superior deve reforçar seu papel de serviço extensivo
à sociedade, especialmente as atividades voltadas para a eliminação da pobreza,
intolerância, violência, analfabetismo, fome, deterioração do meio ambiente e
enfermidades, principalmente por meio de uma perspectiva interdisciplinar e
transdisciplinar para a análise dos problemas e questões levantadas (art. 6.°).
Preparar as pessoas para viver em uma diversidade de situações, para poder
reorientar suas atividades, aprender a conhecer, ensinar a compreensão, enfrentar
as incertezas e aprender a viver juntos são alguns objetivos do ensino superior que
exigem das instituições e dos professores, dentre outros procedimentos, conhecer o
corpo discente e suas características. Impõe-se, por exemplo, saber ou ao menos
analisar as peculiaridades da geração que está alcançando o nível superior de
ensino.
3.5.1 Processo de Mudança: Declaração de Bolonha (1999)
A Declaração de Bolonha (Bolonha, 1999) – que culminou o denominado
Processo de Bolonha – é um documento conjunto assinado pelos Ministros da
Educação de 29 países europeus, reunidos na cidade italiana de Bolonha.
Essa declaração marca uma mudança em relação às políticas ligadas ao
ensino superior dos países envolvidos e procura estabelecer uma Área Europeia de
Ensino Superior a partir do comprometimento dos países signatários em promover
reformas de seus sistemas de ensino. A declaração reconhece a importância da
educação para o desenvolvimento sustentável de sociedades tolerantes e
democráticas.
Embora a Declaração de Bolonha não seja um tratado, os governos dos
países signatários comprometem-se a reorganizar os sistemas de ensino superior
dos seus países de acordo com os princípios dela constantes. A mencionada
declaração visa à tomada de ações conjuntas para com o ensino superior dos
164
países pertencentes à União Europeia, com o objetivo principal de elevar a
competitividade internacional do sistema europeu do ensino superior. Para
assegurar que o sistema europeu do ensino superior consiga adquirir um grau de
atração mundial semelhante ao das suas extraordinárias tradições cultural e
científica, delinearam-se os seguintes objetivos a serem atingidos na primeira
década do terceiro milênio:
Promover entre os cidadãos europeus a empregabilidade e a
competitividade internacional do sistema europeu do Ensino
Superior.
Adotar um sistema baseado em três ciclos de estudos:
1.º ciclo, com a duração mínima de três anos; em Portugal
conduzindo à atribuição do grau de licenciado.
2.º ciclo, com a duração de um ano e meio a dois
(excepcionalmente um ano); em Portugal conduzindo à atribuição
do grau de mestre.
3.º ciclo. Em Portugal conduzindo à atribuição do grau de mestre.
Implementar o suplemento ao diploma;
Estabeler um sistema de créditos transferíveis e acumuláveis
(ECTS), comum aos países europeus, para promover a
mobilidade mais alargada dos estudantes. (Os créditos podem
também ser adquiridos em contextos de ensino não superior,
incluindo a aprendizagem ao longo da vida, desde que sejam
reconhecidos pelos estabelecimentos de ensino superior de
acolhimento;
Promover a mobilidade dos estudantes (no acesso às
oportunidades de estudo e formação, bem como a serviços
correlatos), professores, investigadores e pessoal administrativo
(no reconhecimento e na valorização dos períodos passados num
contexto europeu de investigação, de ensino e de formação, sem
prejuízo dos seus Direitos estatutários);
Promover a cooperação europeia na avaliação da qualidade, com
vista a desenvolver critérios e metodologias comparáveis;
Promover as dimensões europeias do ensino superior, em
particular: Desenvolvimento curricular; Cooperação
interinstitucional; Mobilidade de estudantes, docentes e
investigadores; Programas integrados de estudo, de formação e
de investigação.
Para além dos 29 signatários iniciais, aderiram à Declaração de Bolonha, até
a reunião de ministros de Lovaina (2009), mais 17 países: Albânia, Alemanha,
Andorra, Armênia, Azerbaijão, Áustria, Bélgica (comunidades flamenga e
francófona), Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca,
Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Geórgia, Grécia,
Hungria, Islândia, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Liechtenstein, Luxemburgo,
Macedônia, Malta, Moldávia, Montenegro, Noruega, Países Baixos, Polônia,
Portugal, Romênia, Rússia, Santa Sé, Sérvia, Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido,
República Checa e Ucrânia.
165
Após Bolonha houve diversas reuniões, tais como: Praga (2001), Berlim
(2003), Bergen (2005), Londres (2007), Lovaina (2009). As reuniões de ministros
foram realizadas em Budapeste e Viena (março de 2010) e em Bucareste será (abril
de 2012).
Segundo Pires (2007: 86) “conclui-se que o Processo de Bolonha
corresponde a um movimento de mobilização para uma reforma na Universidade
que toma em linha de conta que, no seculo XXI, todos devemos estar em
permanente processo de aprendizagem, adaptarmo-nos a diferentes realidades
espaciais para estudar e trabalhar procurando obter formações multidisciplinares”.
Acreditamos que a Declaração de Bolonha (1999) foi um primeiro passo na
busca de uma inovoção global e local nas relaçoes de ensino e aprendizagem no
ensino superior. Incentiva aprendizagem permanente, multidisciplinar e multicultural.
166
Capítulo 4: A interdisciplinaridade no ensino da justiça
O conceito de ciência sobre o qual vivemos não é nem absoluto nem
eterno; a ciência evolui... uma revolução está prestes a reagrupar as
disciplinas... (MORIN, Edgar, 2004)
Esse capítulo busca aplicar as orientações determinadas pela legislação de
Direito Educacional ao quotidiano do desenvolvimento curricular do ensino jurídico
com o objetivo de propor ações coordenadas para solucionar problemas complexos
do ensino superior jurídico.
4.1 A Inovação por meio da interdisciplinaridade no Ensino Superior
Frequentemente a própria mutação técno-político-científica obriga-nos
a desconstruir; é ela que na verdade desconstrói por si mesma as
pretensas evidências naturais ou os axiomas intocáveis (DERRIDA,
Jacques, De L’Hospitalité).
Acreditamos que o ponto de partida para a inovação por meio da
interdisciplinaridade do Ensino Superior seja a Declaração Mundial sobre Educação
Superior no Século XXI: Visão e Ação (UNESCO, 1998) – por ser um marco
referencial de visão e de ações para mudança e desenvolvimento do referido ensino.
Ratificada pelo Brasil e por mais 180 países, representa um consenso internacional
sobre a questão da educação superior. Em seu artigo 1°, que trata da "missão e
funções de educação superior”, recomenda às instituições de ensino, dos países
signatários, ao seu pessoal e aos estudantes universitários, a fim de desfrutarem de
liberdade acadêmica e autonomia plena, as seguintes iniciativas:
a) preservar e desenvolver o ensino, submetendo todas as atividades
às exigências da ética e do rigor científico e intelectual;
b) ampliar suas funções críticas e prospectivas diante de uma análise
permanente das novas tendências sociais, econômicas, culturais e
políticas;
c) utilizar sua capacidade intelectual e prestígio moral para defender e
difundir ativamente os valores aceitos universalmente,
particularmente a paz, a justiça, a liberdade, a igualdade e a
solidariedade, tal como consagrados na Constituição da UNESCO;
d) educar para a cidadania e participação plena na sociedade;
e) contribuir na proteção e na consolidação de valores e da
sociedade, formando a juventude de acordo com os valores nos quais
se baseia a cidadania democrática, e proporcionando perspectivas
criticas e independentes a fim de colaborar no debate sobre as
opções estratégicas e no fortalecimento de perspectivas humanistas
(UNESCO, 1998).
A Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI havia elaborado
167
um relatório para a UNESCO, que ficou conhecido como Relatório Jacques Delors.
As ideias contidas no relatório foram centrais para a organização da Conferência
Mundial sobre o Ensino Superior - Tendências da Educação Superior pra o Século
XXI, realizada em Paris de 5 a 9 de outubro de 1998.
Segundo os estudos de Linhares (2009), por meio desse documento
internacional passaram a existir os eixos orientadores da política educacional
superior brasileira. São recomendadas para as universidades quatro funções
essenciais para o desenvolvimento da educação contemporânea, tais quais:
- preparar para a pesquisa e para o ensino;
- dar formação altamente especializada e adaptada às necessidades
da vida econômica e social;
- estar aberta a todos para responder aos múltiplos aspectos da
chamada educação permanente;
- estar pronta a cooperar no plano internacional, compartilhando
conhecimentos científicos e priorizando o acesso à informação nas
regiões mais pobres do mundo (LINHARES, 2009: 123).
Retomando o já citado Relatório Delors (1998), este estabelece ainda os
quatro pilares da educação contemporânea: aprender a ser; aprender a fazer;
aprender a viver juntos; aprender a conhecer. O Relatório aponta, ainda, para a
necessidade do desenvolvimento da educação ao longo da vida, o que implica,
segundo esse importante documento, novas formas de perspectivas curriculares, ou
seja, uma nova organização curricular, por parte das IES, voltada para as
necessidades da sociedade civil.
Atenta, também, para a importância da aprendizagem interdisciplinar e
transdisciplinar da educação em razão da demanda de aprendizagem constante e
diversa. No entanto, a questão da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade
assenta-se na ideia de que as disciplinas tendem a compartimentar o saber
proveniente de diversos campos.
A finalidade da universidade, como local do ensino, deve ser a construção do
conhecimento e da formação da competência inovadora, não caracterizada pela
mera transmissão de conhecimentos, que reduz tudo e todos a meros objetos de
aprendizagem. É preciso relembrar as palavras de Freire: "ensinar não é transferir
conhecimento, mas criar possibilidade para a própria produção ou a sua construção”
(FREIRE,1996: 47).
A universidade deve ter autonomia no processo de construção científica e de
168
intervenção social. Inseridas no contexto de permanentes mudanças e
transformações, as Instituições de Ensino Superior IES - precisam ser
reorganizadas, com o objetivo de participarem da realidade social, econômica,
política, jurídica, cultural e educacional.
O estabelecimento de diretrizes curriculares que assegurem a flexibilidade e
diversidade nas construção dos currículos dos programas oferecidos pelas
diferentes instituições de ensino superior, deve atender às necessidades diferenciais
de seus educandos e às peculiaridades das regiões em que as IES estão
localizadas e inseridas.
4.2 A Universidade e o Currículo
Como vimos, a caracterização da universidade encontra-se determinada na
norma constitucional, ex vi da 2ª parte do artigo 207 da Constituição Federal
(BRASIL, 1988) e, atende ao que dispõe o artigo 52 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (BRASIL, 1996). As universidades são caracterizadas pela oferta
regular de atividades de: ensino (transmissão de conhecimento); pesquisa (produção
de novos conhecimentos); extensão (prestação de serviços à comunidade). A
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, 1988) expõe:
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica,
administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao
princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
§ 1º - É facultado às universidades admitir professores, técnicos e
cientistas estrangeiros, na forma da lei. [sem grifos no original].
§ 1º acrescentado pela Emenda Constitucional n. 11, de 30-4-1996.
A Lei n° 9.394, LDB (BRASIL, 1996), expõe:
Art. 52 - As universidades são instituições pluridisciplinares de
formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de
extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se
caracterizam por:
I - produção intelectual institucionalizada mediante o estudo
sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto
de vista científico e cultural, quanto regional e nacional;
II - um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica
de mestrado ou doutorado;
III - um terço do corpo docente em regime de tempo integral.
Parágrafo Único. É facultada a criação de universidades
especializadas por campo do saber.
169
As universidades (ensino, pesquisa, extensão) devem obedecer às normas
gerais de ensino e à legislação educacional pertinente, ex vi dos artigos 207 da
Constituição Federal de 1988, c/c art. 52 e 53 da LDB e do artigo 7° do Decreto n°
3.860/2001. Para o exercício de sua autonomia, são asseguradas às universidades
as atribuições previstas nos incisos I a X do art. 53 da LDB, que dispõem:
Art. 53 - No exercício de sua autonomia, são asseguradas às
universidades, sem prejuizo de outras, as seguintes atribuições:
I. criar, organizar, extinguir em sua sede cursos e programas de
educação superior previstas nesta lei, obedecendo às normas gerais
da União, e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino;
II. fixar os currículos dos seus cursos e programas, observadas as
diretrizes gerais pertinentes;
III. estabelecer planos, programas e projetos de pesquisa científica,
produção artística e atividade de extensão;
IV. fixar o número de vagas de acordo com a capacidade institucional
e as exigências do seu meio;
V. elaborar e reformar os seus estatutos e regimentos em
consonância com as normas gerais atinentes;
VI. conferir graus, diplomas e outros títulos;
VII. firmar contratos, acordos e convênios;
VIII. aprovar e executar planos, programas e projetos de
investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em geral,
bem como administrar rendimentos conforme dispositivos
institucionais;
IX. administrar os rendimentos e deles dispor na forma prevista no ato
de constituição, nas leis e nos respectivos estatutos;
X. receber subvenções, doações, heranças, legados e cooperação
financeira resultante de convênios com entidades públicas e privadas.
Parágrafo Único - Para garantir a autonomia didático-científica das
universidades, caberá aos seus colegiados de ensino e pesquisa
decidir, dentro dos recursos orçamentários disponíveis, sobre:
I. criação, expansão, modificação e extinção de cursos;
II. ampliação e diminuição de vagas;
III. elaboração da programação dos cursos;
IV. programação das pesquisas e das atividades de extensão;
V. contratação e dispensa de professores;
VI. planos de carreira docente.
A opção por uma determinada estrutura curricular do Direito deve levar em
consideração as características das diferentes instituições de ensino superior.
Portanto, não se pode desconsiderar na reflexão sobre o currículo o conceito de
universidade como instituição normativa autônoma.
Segundo Linhares (2009: 86), tal conceito foi apresentado no Simpósio
Comemorativo ao Nono Centenário da Universidade de Bologna, em que os reitores
de todos os continentes estabeleceram uma Carta Magna com a seguinte definição:
"a Universidade diversamente organizada por condições geográficas e históricas - é
a instituição autônoma que, de modo crítico, produz e transmite cultura através do
170
ensino e da pesquisa”.
Como instituição educacional, o Parecer n° 1366/2001, exarado pelo
Conselho Nacional de Educação - CNE, define universidade da seguinte forma:
Universidades são caracterizadas como instituições de excelência,
que articulam ensino, pesquisa e extensão de maneira indissociável.
Como condições para cumprir esses objetivos, devem apresentar
elevada porcentagem de docentes com titulação acadêmica e efetiva
produção intelectual institucionalizada, nos termos do que dispõe a
LDB, além da prática investigativa que se associa ao ensino de
graduação de – alta qualidade, observados também os dispositivos
legais referentes ao percentual mínimo de professores em regime de
tempo integral, entendido como a obrigação de prestar quarenta
horas semanais, na mesma instituição, nele reservado o tempo de
vinte horas semanais destinado a estudos, pesquisa, trabalhos de
extensão, planejamento e avaliação. As universidades devem, ainda,
desenvolver atividades de extensão relevantes para o contexto social
no qual se inserem.
A universidade não deve ser responsável apenas pela transmissão de um
currículo baseado na informação descontextualizada, visto que essa visão estimula
uma concepção da educação incompatível com a Dignidade da Pessoa Humana,
que constitui fundamento do Estado Democrático de Direito. Conforme o que dispõe
o artigo 1° inciso III da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), bem como o
desenvolvimento da pessoa, apontados pela Constituição Federal, no art. 205
(BRASIL, 1988) que determina:
Art. 205 - A educação, Direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho (BRASIL, 1988).
Por meio da configuração curricular de seus cursos, a universidade deve
promover e incentivar sua própria integração na comunidade na qual se insere e
pleno desenvolvimento da pessoa e o seu preparo para o trabalho, para a vida em
sociedade e para a cidadania, na busca de solução, quer de problemas de âmbito
local e global. Como afirma Boaventura (1997):
A Universidade foi criticada pela não invocação de responsabilidade
social para si, perante os problemas do mundo contemporâneo, quer
por raramente ter cuidado de mobilizar os conhecimentos acumulados
a favor de soluções dos problemas sociais, quer por não ter sabido ou
querido pôr a sua autonomia institucional e sua tradição de espírito
crítico e de discussão livre e desinteressada ao serviço dos grupos
sociais dominados e seus interesses (BOAVENTURA, 1997: 205).
171
O ensino superior atual, dada a complexidade da vida em sociedade,
pretende não mais uma Pedagogia de matriz curricular elaborada por meio de canais
bilaterais entre aluno e professor e de locais definidos. Edgar Morin (2002), ao
analisar os desafios da universidade no século XXI, afirma:
A Universidade deve adaptar-se à modernidade e integrá-la,
responder às necessidades fundamentais de formação, proporcionar
ensino para as nossas profissões técnicas, mas oferecer também um
ensino metaprofissional e metatécnico (MORIN, 2002: 11-25).
Para contribuir para uma formação integral do cidadão é fundamental ao
sistema de ensino no país seja bem estruturado. Deve ser a educação superior para
o estudante atual, que deverá buscar mediante a construção de seus currículos não
somente a instrução, mas também e, sobretudo, a formação integral do ser humano,
como vínculo político garantidor de uma cidadania, sempre no contexto da
educabilidade do homem total, ou seja, social, racional, político e ético. Ao resgatar
elementos do passado, antigos paradigmas educacionais e fatos históricos a
universidade renova-se, gerando novos saberes e novos valores, tal como aponta
Edgar Morin (2002):
A Universidade tem sua missão e uma função transecular que vão do
passado ao futuro por intermédio do presente; tem uma missão
transnacional que conserva, porque dispõe de uma autonomia que
lhe permite efetuar esta missão, apesar do fechamento nacionalista
das nações modernas (MORIN, 2002: 13).
A Magna Charta delle Università Erupée
24
mostra um dos Princípios
Fundamentais de toda universidade:
Toda Universidade, enquanto Universidade é uma comunidade
acadêmica que, dum modo rigoroso e crítico, contribui para a defesa
e o desenvolvimento da dignidade humana e para a herança cultural
mediante a investigação, o ensino e os diversos serviços prestados
às comunidades locais, nacionais e internacionais.
Acreditamos que a discussão para o ensino jurídico, sob o apecto do currículo
é a real a possibilidade de mudanças para o ensino jurídico, cuja modificação passa
pelo currículo, mas não só por ele, não sendo suficiente alterar apenas uma
estrutura normativa por outra para solucionar o impasse em o ensino jurídico se
encontra.
24
LA MAGNA Charta delle Università Erupée. (Princípios Fundamentais). Simpósio Nono Centenário da
Universidade de Bolonha. Itália, 18 sel. 1988. In: MORHY, Lauro. Universidade em questão. Brasília: UNB,
2003. v. 1: 259-273.
172
Dispõe o art. 44 da Lei 9.394 (BRASIL, 1996), a educação superior - que, no
Brasil, é ministrada em IES, de ensino superior, pública ou privada, compreendendo
os cursos de graduação, pós-graduação e extensão - tem as seguintes finalidades:
-estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico
e do pensamento reflexivo;
-formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimentos, aptos
para a inserção em setores profissionais e para a participação no
desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua;
-incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando
ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão
da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e
do meio em que vive;
-promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e
técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber por meio do ensino, de publicações ou de outras formas de
comunicação;
-suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e
profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando
os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura
intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração;
-estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em
particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à
comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade;
-promover a extensão, aberta à participação da população, visando à
difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e
da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.
As finalidades da educação superior anteriormente mencionadas são bastante
amplas, sendo preciso uma orientação mais precisa no que tange as diretrizes
curriculares no ensino jurídico, mais particularizado por meio do projeto pedagógico
do curso, para acompanhar a realidade do mundo e os problemas globais e locais.
A invocação da universidade, como instituição social, faz-se aqui em razão
dos comandos constitucionais e legais que apontam no sentido de uma configuração
curricular que dê ênfase à democracia participativa fundamental, assentada nos
objetivos fundamentais da República Federativa do país, conforme dispõe o artigo
3°, incisos I, II, III e IV da Constituição Federal de 1988, bem como pelo fato de que
a própria Constituição, ao definir o dever do Estado para com a Educação, dispõe
que também esta deve ser promovida e incentivada com base na participação e na
colaboração da sociedade, artigo 205. Não se admite mais antiga visão do ensino
centrado num currículo jurídico, segundo a qual o conhecimento deva ser transmitido
pelo professor, cuja atuação, sobretudo na área da ciência jurídica, restringe-se ao
uso formal do discurso repetitivo.
173
4.3 Projeto pedagógico do curso
Eça de Queirós, em sua obra O conde de Abranhos, citado por Paulo Roberto
de Gouvêa Medina no ensaio “O ensino jurídico na literatura: testemunhos e críticas”
(2006), referindo-se às faculdades de seu tempo e às mentalidades que a
sustentavam, expõe, pelo personagem do conde:
(...)Tem alguns espíritos, ávidos de inovação, ainda que no fundo
sinceramente afeiçoados aos princípios conservadores, sustentando
que o sistema da sebenta (como, na sua jovial linguagem, lhe chama
a mocidade estudiosa) é antiquado. Eu considero, porém, a sebenta
como a mais admirável disciplina para os espíritos moços. O
estudante habituando-se, durante cinco anos, a decorar todas as
noites, palavra por palavra, parágrafos que há quarenta anos
permanecem imutáveis, sem os criticar, sem os comentar – ganha o
hábito salutar de aceitar, sem discussão, e com obediência, as idéias
preconcebidas, os princípios adotados, os dogmas provados, as
instituições reconhecidas (MEDINA, 2006: 165-66).
Eça de Queiroz formado em Direito pela Universidade de Coimbra em 1866,
demonstra em uma de suas obras, escrita em novembro de 1878, na qual faz um
retrato impiedoso de uma figura do Constitucionalismo, as expectativas dos jovens
estudantes de sua época.
Com base nos estudos do professor Masetto (1998, 2003) quando se pauta
em diverso autores internacionais, podemos elencar três elementos constitutivos da
Inovação no Ensino Superior. Ao examinar o primeiro elemento constitutivo do
conceito pode-se considerar:
- o projeto pedagógico da IES, da criação até as constantes
alterações no projeto por força de demandas sociais ou de novas
políticas públicas;
- a exposição e divulgação dos objetivos educacionais elegidos pela
IES;
- a flexibilização curricular construída participativamente;
- a reconceptualização das disciplinas curriculares em função dos
objetivos formativos pretendidos de acordo com o perfil de egresso
que a IES pretende formar;
- a integração das disciplinas e atividades curriculares;
- a substituição da metodologia tradicional, baseada apenas em aulas
expositivas, por metodologias interativas (aluno-professor-sociedade);
- o fomento das conexões tecnológicas para superar barreiras de
tempo e espaço entre alunos-professor-sociedade;
- a avaliação formativa e cooperativa que colabore para o seu
desenvolvimento integral e o acompanhe em seu processo de
aprendizagem;
- o mediador ou tutor pedagógico trabalhando em equipe;
- a formação contínua dos professores para a inovação que possibilite
a reflexão sobre suas atividades, o intercâmbio com colegas e o
diálogo entre as áreas;
- a criação de ambientes inovadores que fomentem a interação e a
integração (aluno-professor-sociedade)
174
O segundo elemento constitutivo de conceito de inovação apresentado –
demandas sociais – como vimos no Capítulo 3 mostra que, há muito tempo, o
sistema universitário brasileiro vem se organizando conforme o modelo francês-
napoleônico, voltado principalmente para a formação de profissionais, a partir de
currículos inicialmente transpostos de universidades europeias, em especial
Portugal.
O conhecimento é a matéria prima de trabalho das IES. É preciso avançar na
reflexão sobre as consequências das alterações na sociedade, trazidas pela
tecnologia. O trabalho acadêmico na universidade exige mudanças profundas na
cultura organizacional da instituição. Para que essas mudanças aconteçam, sabe-se
que é preciso, no mínimo: abertura, diálogo, intercomunicação e parceria com as
mais diversas fontes de produção de conhecimento; revisão e reformulação de
bancos de dados e informações; implantação de novos processos informativos e de
comunicação.
Como vimos no item anterior 4.1 deste capítulo, a Declaração Mundial sobre
Educação Superior no Século XXI: Visão e Ação da UNESCO defende a missão do
Ensino Superior voltada para a formação de pessoas altamente qualificadas e
cidadãos responsáveis, aprendizagem permanente, promoção, geração e difusão da
pesquisa e proteção e consolidação de valores atuais.
Além do ensino com pesquisa na graduação e do uso de novas tecnologias
na sala de aula, acreditamos em propostas, como a de tornar o estudante
universitário sujeito do processo de aprendizagem, alterando radicalmente a
disposição anterior de se entregar a ele todas as informações já prontas e
sistematizadas para memorização e reprodução.
A valorização tanto da parceria e co-participação (professores-alunos-
sociedade) na dinamização do processo de aprendizagem como da comunicação se
justificam pela necessidade de gerarem novas formas de trabalho pedagógico e
aproveitamento das atividades escolares. Defendemos o papel do professor como
educador/mediador capz de estimular não só a aprendizagem do aluno como
processo grupal,bem como orientar o trabalho discente, incentivando o estudante a
avançar no processo do conhecimento.
175
As faculdades de Direito devem ter um projeto pedagógico criado a partir da
matriz curricular orientada pelo MEC. Este deve ser ponto de partida e não ponto de
chegada. É preciso organizar, estruturar, fiscalizar, mas não unificar os projetos
pedagógicos que refletem a identidade e a regionalidade das instituições de ensino
superior.
Segundo Goodson (1995: 17), o processo de fabricação do currículo não é
lógico, mas social. Nele convivem, lado a lado, fatores lógicos, epistemológicos,
intelectuais, determinantes sociais menos nobres e menos formais; interesses,
rituais, conflitos simbólicos por fatores ligados à classe, à raça e ao gênero. O
currículo está, portanto, articulado ao poder e à ideologia. Como componente da
cultura, recria e reproduz significados e poderes, ligando-se às relações de
transformação.
A Lei de Diretrizes e Bases (1996), em seu art. 54, expõe a questão da
autonomia universitária. No entanto, essa autonomia tem limites reais ligados ao
custo financeiro das iniciativas acadêmicas. As faculdades podem fazer uso dessa
autonomia didático-pedagógica e construir um curso embasado em uma concepção
ideológica adequada à sua realidade no que tange a ensino-aprendizagem,
organização curricular e de avaliação, estabelecendo parâmetros sustentáveis
adequados às necessidades apresentadas pela própria comunidade acadêmica
envolvida com a instituição.
No Capítulo 2, vimos que o ensino do Direito no Brasil data de 1827, ano em
que Pedro I, com a pretensão de criar uma elite burocrática para o novo Império,
criou duas escolas de Direito, uma em Olinda, outra em São Paulo. Isso, porém, não
significou mudança alguma no aprendizado, pois foi dado acesso ao ensino superior,
sem, contudo, lhe conferiranão a autonomia. O modelo coimbrão, quando
transplantado para o Brasil, não sofreu alterações. As aulas permedada de lições
doutrinarias e jurisprudenciais continuam enfatizando leitura da lei.
No passado, acreditava-se que a lei era a expressão da vontade geral. Ela
passou a refletir o convívio possível entre interesses conflitantes de soluções para as
mais variadas questões. Ela deixou de corresponder ao ideal pressuposto de
exteriorização do interesse geral. Rodrigues (2005) assinala que:
176
(…) a forma mais eficaz de construir-se um saber democrático sobre
o Direito é fazê-lo através de uma ciência que esteja comprometida
com a vida e com a justiça social concreta e na qual não haja
restrições à produção do conhecimento. Para isso, é necessária a
constituição de um saber estruturado a partir de métodos e de
paradigmas epistemológicos abertos. Os saberes fechados,
estanques, unívocos, são perigosos e autoritários, transformando-se
o ensino a eles vinculado em um conjunto de atos de violência
simbólica. Apenas o ato pedagógico ligado a uma visão plural do
mundo e comprometido com a construção de uma sociedade mais
justa pode recuperar um espaço livre, democrático e não autoritário
para o ensino do Direito (RODRIGUES, 2005: 41).
A sociedade brasileira precisa de mais justiça e menos de Direito. Não é
paradoxo afirmar que a técnica levada às suas últimas consequências, a erudição e
o trato asséptico das normas jurídicas são responsáveis por infindáveis injustiças.
Pois “no sistema mercadológico de poder atuante, o sistema judiciário resguarda
toda potencialidade do injusto, e sua aplicação – em um círculo vicioso – reafirma
esse injusto, caso a caso”
(TELLES JÚNIOR, 1986: 115).
O apego ao procedimentalismo persegue a busca de uma solução lógica. O
importante, para a base do ensino jurídico, é institucionalizar o conflito, dar-lhe forma
prevista no ordenamento, observar seus trâmites também preordenados no sistema
e fazê-lo culminar em resposta insuscetível de mácula técnica. O justo formal
abandona o justo real.
O ensino jurídico perpetua a situação de profunda desigualdade entre as
pessoas ao considerar o Direito uma técnica de apropriação reservada a poucos
iniciados. Os litígios passam a obedecer a regras e ritos complexos, cuja
inobservância põe em risco o cerne da controvérsia. Mais vale a forma do que o
conteúdo. Em lugar de merecer solução, os conflitos se institucionalizam.
O fato é que discussões com esse objeto são escassas no âmbito
universitário. Não se discute currículo, planejamento, estrutura e método. Continua-
se a ensinar Direito, quando o mundo parece necessitar de mais justiça. Decorar
artigos de lei e saber a orientação jurisprudencial é insuficiente para formar
profissionais. Em lugar da memorização, a escola precisaria investir na capacidade
de reflexão, de maneira a fazer o estudante “aprender e desaprender para aprender
de modo diferente” (ALARCÃO, 2001: 53).
Atualmente, aulas continuam expositivas, seja pelo professor, seja pelo aluno
em seminários. Não há participação ativa, planejada e articulada entre professores e
177
estudantes. Os professores não têm autonomia para trabalhar e são abandonados
para agindo sem planejamento pedagógico com os alunos. Nesse certo tipo de
universidades o único setor rigoroso é o departamento financeiro. A falta de
investimento no aprimoramento pedagógico das instituições de ensino jurídico não
pode ser justificada pela conveniência econômica. As instituições que só têm
compromisso com o lucro devem ser obrigada cumprir orientações de políticas
educacionais do Direito Educacional que garantam o investimento e
aperfeiçoamento dos docentes e discentes.
4.4 Gestão pedagógica
Não se administra sem um projeto de objetivos e o claro estabelecimento de
prioridades, sempre levando em conta a distinção entre atividades-fim e atividades-
meio. Vale ressaltar que todo projeto deve sofrer correção de rumos por via de
avaliações desenvolvidas pelos segmentos da instituição, além daquelas
desenvolvidas por entidades externas, a pedido das direções, e por órgãos públicos
competentes.
Administrar democraticamente compreende a real participação dos
professores, estudantes e servidores na tomada de decisão coletiva sobre os rumos
das escolas. Para tanto, os conselhos não podem ser farsas, que se reúnem com
decisões anteriormente tomadas. Conselhos superiores, educacionais ou
administrativos assim compostos nada mais são do que órgãos de ratificação de
ditaduras escolares. Os colegiados devem regimentalmente prever a participação
ativa de todas as categorias envolvidas nas escolas, assim como uma clara
definição de suas competências e de suas áreas de decisão, a fim de evitar a
constituição de órgãos consultivos.
A administração, racionalmente desenhada e planejada com o objetivo de ter
flexibilidade para atender ao crescimento, deve apresentar competência para
enfrentar crises e tomar decisões com rapidez e eficácia. O controle autocrático só
aumenta a possibilidade de erros. No mesmo sentido, a administração financeira
deve ter um planejamento dinâmico, no qual as prioridades sejam claras e voltadas
para as finalidades educacionais dos cursos. Os órgãos diretores devem
178
desenvolver mecanismos de controle e avaliação permanentes das atividades
pedagógicas.
A gestão educacional deveria não se ater a recursos, caixa, financiamentos e
investimentos, mas a desenvolver um conjunto de procedimentos para medir, corrigir
e induzir a qualidade dos cursos. Isso implica analise e monitoramento de
conteúdos, processos pedagógicos, instalações, motivação de alunos e professores,
formação complementar, avaliação da qualidade e inserção dos egressos, biblioteca,
publicações, grupos de pesquisa, núcleos de prática jurídica dentre outros.
As mantenedoras resistem à inovação porque ela gera custo. O novo, o risco
e a criatividade estão longe dessas instituições: elas pertencem ao capitalismo sem
risco praticado por nossas elites, entre o Estado e as entidades privadas, no qual o
primeiro está sempre pronto para relevar, ajudar e apoiar quem não presta os
serviços que deveria, quem é inadimplente financeira e socialmente.
Se o critério de grande parte dos cursos jurídicos está assentado nas
finanças, tudo aquilo que as ameaça deve ser evitado ou combatido. Assim,
professores muito exigentes, mestres que tragam reflexões novas, docentes que
avaliem com rigor e educadores que acirrem a crítica e a capacidade de
reivindicação dos estudantes são ameaças, devendo ser afastados. Surge um
paradoxo nessas instituições: o comando último e definitivo encontra-se nas mãos
das lideranças estudantis, muitas vezes descomprometidas com o processo de
aprendizagem que as beneficiaria, que desfazem qualquer planejamento
educacional.
Engessada por dentro (burocracia), isolada por fora, a escola de Direito tende
a formar alunos fechados e desatualizados. Um processo pedagógico que não leve
em conta o contexto, ou a instrumentalização das noções recebidas, torna-se mera
formalidade, simples conteúdo sem sentido, instrumento útil para a manipulação e
para o preenchimento de sentidos pelos interesses dos donos dos poderes.
O mundo unidimensional e o saber monodisciplinar cerceiam os currículos e
programas de muitos cursos jurídicos, levando as instituições a um trabalho dividido,
centrado em disciplinas isoladas, que pouco dialogam entre si, configurando um
caminho pedagógico que se assemelha a um armário cheio de gavetas e
escaninhos incomunicáveis.
179
A legalidade educacional vigente estimula as atividades complementares,
prevendo até mesmo percentuais de horários para seu desenvolvimento. Essas
atividades podem exercer nos cursos de Direito uma função de reprodução dos
formalismos, constituindo-se em mais uma obrigação a ser cumprida. Essas
atividades têm um potencial multidisciplinar, um papel possível de atualização e
enriquecimento dos currículos e da formação dos estudantes.
A prática não pode ser dissociada da teoria. Se partíssemos dessa
deformação do entendimento da produção dos saberes, teríamos, no âmbito do
Direito, disciplinas teóricas, como filosofia do Direito, teoria geral do Direito, e
disciplinas práticas, como estágio supervisionado. A primeira e a segunda deveriam
ser tratadas com rigor metodológico, com docentes qualificados e titulados nessas
áreas. As outras, como o próprio nome está indicando, seriam práticas, trabalhariam
com os problemas que o mundo apresenta para o Direito e inseririam os estudantes
no campo profissional e social.
Essa escola ainda colorida com os tons coimbrões condiciona nos estudantes
uma adaptabilidade conservadora, que os demarca como diferentes até em termos
folclóricos dentro das universidades. Tal escola passa a assumir uma linguagem
rebuscada, uma indumentária mais senhoril, uma seriedade formal. Os problemas
vividos pelas instituições educacionais públicas e privadas são diferentes. As
públicas, dependentes de verbas da União e dos Estados, sofrem os efeitos de uma
política governamental que não prioriza a formação de quadros profissionais
atualizados e nem investe na produção de conhecimento. As privadas não sofrem as
devidas fiscalizações que garantam a qualidade.
Quando os cursos de Direito fogem de sua obrigação de estimular e financiar
mestrados e doutorados, quando não executam um plano de cargos e salários,
condenam suas aulas à mediocridade e viverão trocando de professores, sem
formar um corpo docente estável, que desenhe um perfil da instituição. Os
professores são condenados a serem repassadores de leis e nunca cientistas e
pedagogos do Direito. São homens e mulheres das letras, do livro, embora não
adestrados a sua leitura rigorosa. Isso significa uma repetição tediosa ou aulas que
só poderão ter algum encanto em função da vivacidade ou erudição personalíssimas
de cada docente.
180
Os cursos de Direito sofrem na esfera pública pela ausência de investimentos,
pela falta de concursos públicos para completar seu quadro docente, pelo
contingenciamento de suas verbas. Já o privado sofre pela ausência de investimento
em seus docentes, pela retirada financeira de seu movimento, para financiar outros
cursos mais caros da mesma instituição, ou atividades menos honradas.
Para empresas públicas e privadas responsáveis, seria absurdo produzir
alguma coisa sem saber o que ela será e para que serve, assim como treinar
trabalhadores para algo que não sabemos bem o que é, seja em sua natureza,
amplitude ou recorte. Surpreendentemente, aceitamos pacificamente essas fábricas
de ventos e ilusões e, pior, pagamos por isso.
As escolas de Direito devem buscar sempre que possível sair de dentro de
seus muros para atingir a sociedade, para ser um instrumento de diálogo com as
tensões e os problemas da sociedade, para criticar e participar, para reivindicar para
dentro delas mesmas e para fora, em suma, para serem cidadãs.
Carlini (2004), no Congresso da Associação Brasileira do Ensino do Direito
(ABEDI), do ano de 2004, destacou a ausência de preocupação com o aspecto
crítico ou com o aspecto didático por parte dos professores de Direito e escreveu:
Apesar das críticas que têm sido feitas, é inevitável constatar que as
aulas nos cursos de Direito ainda são preparadas em sua grande
maioria a partir de informações contidas nos manuais, apostilas e
livros de doutrina que, fundamentalmente, analisam a legislação
existente sobre cada tema, sem preocupação com o aspecto crítico
ou com o aspecto didático. As aulas nas faculdades de Direito quase
sempre são ministradas de forma expositiva, e os alunos são
incentivados a participar delas como ouvintes, de preferência, atentos
e silenciosos. (...) Nos últimos anos, em boa parte das escolas
privadas, os professores de Direito foram incentivados a ministrar
aulas para preparar os alunos para o Exame do Provão (Exame
Nacional de Cursos) e da Ordem dos Advogados do Brasil, em
especial para o primeiro que avalia ao mesmo tempo o aluno e a
própria instituição (CARLINI, 2004: 14).
Ela segue, levando à discussão o fato de que o professor de Direito
fundamenta sua aula no texto da lei, sem espaço para questionamentos seus e dos
alunos. De fato, na carreira de docente, pude constatar professores que dispensam
toda ou quase toda a atenção ao exame da OAB, acreditando que o bom
desempenho de sua disciplina está no fato de os alunos resolverem as questões da
prova, aplicando, desde o primeiro ano do Curso de Direito, os testes de exames já
realizados. Essa cultura privilegia, com excesso, a memorização, daí a necessidade
181
de refletir sobre a adequação do método utilizado para a boa formação do aluno.
Parafraseando Eça de Queirós, atualmente a nação inteira se doutorou; do
norte ao sul não se encontra outra coisa a não ser doutores. É certo que o autor
escreveu algo semelhante há mais de um século e fazendo referência a Portugal da
sua época, mas tais palavras podem ser aplicadas hodiernamente ao Brasil,
notadamente em razão da proliferação dos cursos de Direito. Com efeito,
levantamento realizado nos meses de abril e maio/2006 junto ao Cadastro das
Instituições de Educação Superior, mantido pelo MEC através do INEP, demonstra
claramente tal expansão (ALMEIDA JR, 2006: 79-117).
Eça de Queiroz (1845-1900) não poupou ironias, através do personagem
Fradique Mendes, aos brasileiros que faziam o impossível para obter o grau de
doutor. Nada mudou. Há quem faça mágica para pagar curso superior de escola
privada pelo comodismo de não querer estudar e ingressar numa instituição pública,
pela dificuldade de acesso.
A visão dos bacharéis sempre se lastreou na influência positivista que marcou
a história brasileira. Nada foi capaz de modificar as práticas cotidianas do bacharel
brasileiro, até mesmo porque a ele não foi dada conhecer a sociedade em sua
concretude histórica. Os trabalhos jurídicos tenderam a ser genéricos no fundamento
e detalhistas no âmbito normativo, de forma que as questões de fundo dos conflitos
nunca eram tratadas, sob pena de gerar perplexidade para advogados e
magistrados, embora seja cediço que, às vezes, apenas o tratamento de fundo tem o
dom de resolver uma situação pendente.
Para os bacharéis sempre bastou a leitura da lei, da jurisprudência e da
doutrina para encaixar o fato contado na óptica do interesse do cliente, ou seja,
sempre se teve aversão à pesquisa empírica, o que tornou o bacharel um adversário
do avanço da ciência jurídica (AGUIAR, 1994: 32-41). Esse pensamento formalista,
para Alberto Machado (1999),
182
é uma ideologia jurídica hegemônica, que não concebe o jurídico na
sua totalidade sociopolítica e não admite também, via de
conseqüência, que as escolas de Direito possam funcionar como loci
para a discussão dos problemas sociais enquanto fatos jurídicos
ontologizados substancialmente na base material da sociedade. O
ensino segue assim de forma idealista, através de uma epistemologia
que não responde satisfatoriamente aos requerimentos sociais e não
permite sequer a emancipação mesma do jurista, porquanto não
proporciona a este, fora do formalismo normativista, qualquer
condição para discutir conscientemente os valores que permeiam os
contextos político-sociais onde realiza-se o seu saber e a sua vivência
profissional. (...) O resultado de tudo isso é o completo divórcio entre
a atuação do profissional do Direito e o meio social onde atua. Aquele
segue isolado num universo cognitivo conceitual e a-histórico,
enquanto grupos sociais marginalizados, por outro lado, seguem
desconfirmando seu papel através, por exemplo, de ocupações de
terras em que os ocupantes (sem-terra) não acatam liminares
judiciais reintegratórias; greves que prosseguem a despeito da
ilegalidade declarada por tribunais do trabalho; decisões anti-
populares contestadas publicamente, etc (MACHADO, 1999: 58-59).
Um ensino legalista facilita a aceitação da norma da forma como foi positivada
e implica a adoção de costumes intelectuais tidos como certos e incontestáveis.
Segundo Warat (1994),
os juristas contam com um arsenal de pequenas condensações de
saber: fragmentos de teorias vagamente identificáveis, coágulos de
sentido surgidos do discurso dos outros, elos rápidos que formam
uma minoria do Direito a serviço do poder. Produz-se uma linguagem
eletrificada e invisível – o “senso comum teórico dos juristas” – no
interior da linguagem do Direito positivo, que vaga indefinidamente
servindo ao poder. Resumindo: os juristas contam com um
emaranhado de costumes intelectuais que são aceitos como
verdades de princípios para ocultar o componente político da
investigação de verdades. Por conseguinte se canonizam certas
imagens e crenças para preservar o segredo que escondem as
verdades. O senso comum teórico dos juristas é o lugar do secreto.
As representações que o integram pulverizam nossa compreensão do
fato de que a história das verdades jurídicas é inseparável (até o
momento) da história do poder (WARAT, 1994: 15).
Prando (2001) também lembra algumas consequências de um ensino jurídico
baseado apenas nos códigos, afirmando que
apresenta-se em nossa sociedade uma disfunção entre o que é
ensinado nas escolas de Direito e a realidade da sociedade. O ensino
do Direito tem ainda seus fundamentos, ou vícios, muitos advindos da
fundação das escolas jurídicas. (...) Os cursos jurídicos no Brasil
desenvolveram e ainda desenvolvem um papel de propiciar a
internalização dos padrões culturais e políticos da elite burguesa
econômica. (...) Os cursos jurídicos, de modo geral, não procuram
preparar as pessoas que o freqüentam para capacitá-las a atuarem
em situações reais da vida. (...) O ensino, que inicia e termina nos
códigos, não é capaz de apreender novas situações ocorridas na
sociedade (PRANDO, 2001: 35-37).
183
Quando se pretende erradicar as consequências nefastas de um ensino
jurídico estritamente legalista, característica marcante do ensino do Direito no Brasil
desde a instalação dos cursos jurídicos, imperioso se torna discorrer sobre os
objetivos que devem ser buscados através do ensino superior nessa área.
Estudar a educação superior no Brasil implica a verificação do que se defende
a este respeito em nível mundial. É impossível refletir sobre o destino particular de
cada Estado-Nação ignorando o mesmo fenômeno objeto do estudo em escala
global. Em outras palavras:
(…) a educação serve à sociedade de diversas maneiras e sua meta
é formar pessoas mais sábias, possuidoras de mais conhecimentos,
bem informadas, éticas, responsáveis, críticas e capazes de continuar
aprendendo. Se todos os seres humanos tivessem essas aptidões e
qualidades, os problemas do mundo não se resolveriam
automaticamente, porém os meios e a vontade de fazê-lo estariam ao
alcance das mãos. A educação também serve à sociedade,
oferecendo uma visão crítica do mundo, especialmente de suas
deficiências e injustiças e promovendo maior grau de consciência e
sensibilidade, explorando novas visões e conceitos e inventando
novas técnicas e instrumentos. A educação é, também, o meio de
divulgar o conhecimento e desenvolver talentos para introduzir as
mudanças desejadas nas condutas, valores e estilos de vida e para
suscitar o apoio público às mudanças contínuas e fundamentais que
serão imprescindíveis para que a humanidade possa modificar sua
trajetória, abandonando a via mais comum que leva a dificuldades
cada vez maiores e a uma possível catástrofe, para iniciar seu
caminho a um futuro sustentável. A educação é, em síntese, a melhor
esperança e o meio mais eficaz que a humanidade tem para alcançar
o desenvolvimento sustentável (UNESCO, 1999: 35).
Defendendo a reforma do ensino jurídico, Santos (2001) insiste na
necessidade de se lidar com incertezas, abandonando o ensino dogmático. Eis sua
lição:
Parece-nos que os obstáculos maiores para uma reforma do ensino
jurídico estejam na dificuldade encontrada, tanto por alunos quanto
por professores, em modificar suas posturas tradicionais ante o
processo de construção do chamado “saber jurídico”. A postura
crítica, quer no educador que se imagine capaz de “transmitir” um
saber “pronto”, quer no aluno que pretenda apenas “receber” esses
conhecimentos, crendo, com base neles, poder se julgar apto ao
exercício das profissões jurídicas, nos parece o primeiro dos entraves
a serem removidos. Maior maleabilidade do educador, maior
responsabilidade do educando, maior comprometimento de ambos
em relação a objetivos mais definidos. Mudando as posturas, contudo
– e é preciso ter muito clara essa noção – essa prática abre espaço,
inevitavelmente, para o inesperado, para o imprevisível. Lida-se, mais
próxima e continuamente, com incertezas. (SANTOS, 2001: 51-52).
184
A educação superior, materializada nas práticas de suas instituições, do ponto
de vista de sua função social e pública, isto é, da perspectiva daquilo que política e
filosoficamente lhe justifica a existência, existe para expandir os processos
civilizatórios, desenvolver e aprofundar os interesses sociais e públicos que se
hegemonizam em uma dada situação das disputas sociais e das relações de poder.
Do ponto de vista ideal, mas sem desconsiderar as reais contradições e
limites de qualquer fenômeno humano e social, uma instituição de educação
superior existe para cumprir o mandato social de produzir os conhecimentos
emancipatórios, formar os cidadãos e assim desenvolver a sociedade humana,
segundo e mediante os valores e princípios mais caros ao processo civilizatório e à
vida democrática, tais como a solidariedade, a cooperação, a justiça, a igualdade, o
Direito à dignidade, o respeito à alteridade e à pluralidade.
Enfim, uma formação geral e humanística cobra de um curso de Direito evitar
o puro tecnicismo jurídico e atribuir preferência a um ensino antidogmático,
antipositivista, pluralista, democrático e desfragmentado. Segundo Morin (2001a), é
sabido:
(…) cada vez mais as disciplinas se fecham e não se comunicam
umas com as outras. Os fenômenos são cada vez mais
fragmentados, e não se consegue conceber a sua unidade. É por isso
que se diz cada vez mais: “Façamos interdisciplinaridade”. Mas a
interdisciplinaridade controla tanto as disciplinas como a ONU
controla as nações. Cada disciplina pretende fazer reconhecer sua
soberania territorial, e, à custa de algumas magras trocas, as
fronteiras confirmam-se em vez de se desmoronar (MORIN, 2001a:
135).
Em razão disso, defende Morin que é preciso ir além e impõe o aparecimento
do termo transdisciplinaridade (2001a: 135), tornando-se necessário complexificar o
modo de conhecimento (2001b: 31).
Uma visão crítica é outra qualidade que deve ser desejada no formando de
um curso de Direito. É crítico o aluno que pensa e reflete sobre os fatos concretos e
extrai da sua análise argumentos e ideias para melhorar seu desempenho, traçar
melhor seus objetivos, definir suas atitudes e repensar suas crenças. O crítico tem
repulsa pelo dogmatismo e busca compreender a realidade para melhorá-la.
Um curso jurídico que trate o Direito como atividade verdadeiramente
científica e não como tecnologia de controle está respeitando e realmente buscando
185
os reais objetivos de uma educação superior em Direito e somente este tipo de curso
é que pode alterar a realidade e contribuir para eliminar ou diminuir as
desigualdades sociais. Para Rodrigues (1995),
hoje os cursos jurídicos auxiliam, enquanto instância de reprodução
simbólica das crenças, valores e pré-conceitos jurídico-políticos de
um certo liberalismo, mesclado de nuances de conservadorismo, a
manutenção do status quo político-econômico-social. A expectativa é
que se possa transformá-lo em um instrumento a serviço da
construção de uma sociedade mais justa e democrática. Deve ele
formar agentes sociais críticos, competentes e comprometidos com
as mudanças emergentes, com o novo; operadores jurídicos que
possuam uma qualificação técnica de alto nível, acompanhada da
consciência de seu papel social, da importância estratégica que
possuem todas as atividades jurídicas no mundo contemporâneo e,
portanto, da responsabilidade que lhes compete nessa caminhada.
Em resumo: que os cursos jurídicos sejam instrumentos de resgate
da cidadania (RODRIGUES, 1995: 21).
O mesmo autor defende que, na prática, não se tem uma profissão de jurista,
mas sim várias funções que são desempenhadas pelos egressos dos cursos
jurídicos. Sustenta, ainda, se pode esquecer de uma constatação empírica
extremamente importante, qual seja, a grande parte dos egressos dos cursos
jurídicos não trabalha no mercado de trabalho jurídico e sim no parajurídico. Em
razão disso, afirma que profissionalizar os alunos dos cursos jurídicos não pode e
não deve representar a formação de técnicos em Direito positivo, meros exegetas
dos textos legais emanados do Estado. Fazer isso é desprepará-los para um
mercado de trabalho plural onde as normas estatais não são mais as únicas efetivas
de pacificação e/ou controle social, se é que ainda o são em alguma medida
(RODRIGUES, 2000: 19).
Rodrigues (2000: 20), completa enfatizando que profissionalizar os egressos
dos cursos jurídicos, neste momento histórico, deve ser prepará-los para enfrentar
essa realidade; é colocá-los a serviço da sociedade, em busca da justiça social
efetiva, é transformar o Direito em instrumento de libertação. Warat (1997)
reconhece o ensino jurídico como prática preventiva dos processos de pós-
alienação,
186
(...) como uma prática política dos Direitos humanos, explicando que
o ensino do Direito tem que reconhecer-se comprometido com as
transformações da linguagem, aceitar-se como prática genuinamente
transgressora da discursividade instituída, como exercício de
resistência a todas as formas de violência simbólica, isto é, como uma
prática política dos Direitos do homem à sua própria existência. Após
alertar que a humanidade corre o risco de tornar-se estranha a si
mesma, consagrando um espaço comunicacional despolitizado e
desprovido das máscaras e cerimônias do pensamento, defende que
o ensino do Direito pode proteger-nos contra estas formas patológicas
de humanidade que ameaçam instalar-se como um fascinante projeto
de existência, possibilidade que entrevê mirando o ensino jurídico
como uma prática de inscrição nas dimensões simbólicas dos Direitos
humanos e da democracia. Para ele, uma das coisas que se pode
esperar do ensino jurídico, despojado das estratégias alucinantes dos
saberes da lei, é a de poder contribuir para a formação de
personalidades visceralmente comprometidas com duas dimensões
éticas fundamentais: a dignidade e a solidariedade, valores sem os
quais nunca poderemos gerar uma sociedade melhor (WARAT, 1997:
41-60).
A expansão dos cursos de Direito no Brasil impõe-se e deve ser aceita pelo
Estado e pelas organizações profissionais, uma vez preenchidos os requisitos legais
mínimos. Os novos cursos jurídicos vieram ao encontro dos anseios da grande
massa da população, oportunizando aos excluídos uma chance de melhorar de vida,
de ter mais condições de brigar por seus Direitos, de exigir posturas diferentes do
governo, de aumentar as possibilidades de um rendimento melhor e de diminuir as
chances de permanecerem ou se tornarem desempregados.
4.4 Interdisciplinaridade
Pensar a interdisciplinaridade como processo de integração entre várias
disciplinas e campos de conhecimento "capaz de romper as estruturas de cada uma
delas para alcançar uma visão unitária e comum do saber trabalhando em parceria",
conforme afirma Palmade (1979), é, sem dúvida, uma tarefa que demanda, dos
educadores, grande esforço na ruptura de uma série de obstáculos ligados a uma
racionalidade extremamente positivista da sociedade industrializada. Conceituar a
palavra interdisciplinaridade não é tarefa fácil. Essa dificuldade pode ser observada
se percebermos a polissemia que envolve a palavra e o conceito, especialmente
quando aplicado à educação. Para alguns,
187
a interdisciplinaridade tem sua razão de ser na busca de uma grande
teoria, uma nova etapa do desenvolvimento da ciência caracterizado
por uma reunificação do saber em um modelo que possa ser aplicado
a todos os âmbitos atuais do conhecimento. Para outros, o caminho
rumo a maiores parcelas de interdisciplinaridade é provocado pela
dificuldade, que se torna mais evidente a cada dia, de delimitar as
questões que são objetos deste ou daquele campo de especialização
do saber (SANTOME, 1998: 45).
Outros, ainda, a concebem como “método a tirar as ciências da caminhada
em direção ao abismo e da sua situação de trevas ou, em outras palavras, da
incapacidade destas de resolver seu suposto mal maior: a especialização (germe de
sua própria morte)”, conforme detectam Jantsch e Bianchetti (1997: 12), em análise
de concepções de autores que privilegiam a perspectiva voluntarista na consecução
da interdisciplinaridade. A isso tudo podemos acrescentar as frequentes confusões e
atribuição de equivalência entre os conceitos de multidisciplinaridade,
pluridisciplinaridade, transdisciplinaridade e interdisciplinaridade, como se pode
observar no artigo de Siebeneichler (1989). Há ainda, de outra parte, autores que a
apreendem como o meio através do qual é possível superar a “patologia” ou a
“cancerização” que tomaram conta dos campos do saber e das organizações,
representadas pela especialização (Japiassu, 1976), sendo a “parceria” (Fazenda,
1991 e 1999) uma das estratégias privilegiadas de alcance desses objetivos.
Cientes de toda essa controvérsia e também dos riscos concernentes a uma
tentativa de aproximação do objeto interdisciplinaridade, arriscaremos algumas
proposições de elementos que, acreditamos, devam compor o cenário teórico da
conceitualização da interdisciplinaridade. Como sublinha Frigotto (1997),
a questão da interdisciplinaridade, ao contrário do que se tem
enfatizado, especialmente no campo educacional, não é sobretudo
uma questão de método de investigação e nem de técnica didática,
ainda que se manifeste enfaticamente neste plano (...). A questão da
interdisciplinaridade se impõe como necessidade e como problema
fundamentalmente no plano material histórico-cultural e no plano
epistemológico (FRIGOTTO, 1997: 26).
A necessidade de interdisciplinaridade para a produção de conhecimentos é ditada
pela própria dinâmica social, por seu cunho dialético. Justifica-se, também, por sua
ação mediadora. Ela é “necessária para mediar a comunicação entre os cientistas e
entre eles e o mundo do senso comum” (Etges, 1997:.73).
Apesar de não se poder negar a importância da adequação de métodos e
técnicas didático-pedagógicas como elementos importantes na adoção de posturas
188
interdisciplinares, a sua simples transposição mecânica no tratamento de conteúdos
curriculares/disciplinares está longe de se configurar em ações interdisciplinares.
Além disso, tendo claro que a produção científica está intimamente
relacionada com os dispositivos tecnológicos presentes em cada momento histórico
e que as relações sociais objetivam-se, em grande parte, com a utilização dos mais
diversos meios técnicos, consideramos pouco produtivo discutir o objeto
interdisciplinaridade sem ter em conta as possíveis contribuições das novas
tecnologias de informação e comunicação para esse processo.
Isso não significa dizer que o foco de análise deva centrar-se na questão
tecnológica. Mas também não se pode negar o poder instituinte da tecnologia no
movimento das relações sociais, especialmente no que diz respeito à comunicação.
Por isso, percebemos a necessidade de integrar o objeto interdisciplinaridade ao rol
de preocupações do campo de pesquisa da educação e comunicação. Pensar a
interdisciplinaridade do ponto de vista dos referenciais teóricos da educação e
comunicação deverá acrescentar elementos novos ao debate em torno desse objeto
tão controvertido.
Há quase meio século, antes mesmo de G. Gusdorf, H. Japiassu e I. Fazenda
(Jantsch e Bianchetti, 1997), McLuhan já chamava a atenção para o problema dos
currículos compartimentalizados. Porém, ao invés de considerar isto uma patologia,
uma cancerização, e de reduzir a interdisciplinaridade à filosofia do sujeito
25
, ele
insere a explicação na história. Critica a universidade centralizada e o fato desta ter-
se organizado a partir dos paradigmas que instituíram a indústria do século XIX. Em
suas palavras: “Nossas aulas e nossos currículos são ainda modelados no velho
ambiente industrial” (McLuhan, 1970: 104).
25
“A filosofia do sujeito é a base e a expressão maior da concepção a-histórica relativa à
interdisciplinaridade (...). Não negamos as possíveis contribuições da filosofia do sujeito na produção
historicamente acumulada do conhecimento. Contudo, seja na circunstância idealista (autonomia das
idéias ou primado explicativo das idéias ou, ainda, atribuição de suficiência absoluta ao sujeito
pensante) ou em outra qualquer (ecletismo etc.) que incorra em a-historicidade, não vemos substrato
suficiente para configurar a construção histórica do objeto ‘interdisciplinaridade’. Chamamos a
atenção para o fato de que a construção histórica de um objeto implica a constituição do objeto e a
compreensão do mesmo, aceitando-se, com isso, a tensão entre o sujeito pensante e as condições
objetivas (materialidade) para o pensamento” (Jantsch e Bianchetti, 1997: 11).
189
Entretanto, “nós estamos entrando na nova era da educação, que passa a ser
programada no sentido da descoberta, mais do que no sentido da instrução”
(McLuhan, 1995: 13). Uma nova forma de abordagem da educação terá,
necessariamente, na pesquisa sua âncora. Desafiar cada aluno a se constituir num
pesquisador deve ser tarefa da escola e dos educadores. A criança, nos primeiros
anos de vida, é extremamente curiosa, uma pesquisadora em potencial. Ao tomar
contato com os conteúdos escolares compartimentados, classificados, lineares,
acabados, vai perdendo essa curiosidade. Muitas condições objetivas já estão dadas
para que nossas escolas se convertam em verdadeiros centros de pesquisa. O
volume de informações hoje disponível em mecanismos físicos os mais diversos, de
fácil acesso e baixo custo, permite a materialização de uma educação muito mais
voltada à descoberta do que à instrução. Além disso, a presença de uma razoável
quantidade de meios eletrônicos de comunicação nas escolas permite que sejam
exploradas outras formas de linguagens além da oralidade e da escrita,
características das aulas expositivas.
A necessidade da integração dos conhecimentos, numa perspectiva
interdisciplinar, ainda não é consenso entre os educadores e estudiosos. Como bem
percebe Santomé (1998), a construção e difusão do conhecimento nas últimas
décadas do século XX oscilam entre dois pólos: de um lado tendências a maiores
parcelas de especialização e de outro propensões a uma maior unificação do saber.
O grupo daqueles que propõe uma maior unificação do saber vem implementando
equipes de pesquisa interdisciplinares
26
, “cujo objetivo é tratar de compreender e
solucionar problemas significativos, assuntos que para poderem ser enfrentados
exigem o esforço conjunto de vários campos de conhecimento e pesquisa”
(SANTOME, 1998: 44).
Essa comunicação interativa entre os diversos campos do saber já é
potencialmente possível com a utilização das tecnologias digitais. Talvez por isso, a
cada dia mais encontramos autores demonstrando a necessidade de abordagens
interdisciplinares. Na medida em que o potencial tecnológico supõe resolvido o
26
Emborasejasabidoqueasimplesimplementaçãodeequipesdepesquisanãolegitimea
interdisciplinaridade,suaformaçãoéindispensávelàconsolidaçãoderedesdepesquisa,asquaisseaproximam
bastantedasnovaspropostasinterdisciplinares.
190
problema da comunicação, é de se esperar que entre as disciplinas curriculares e as
instituições de ensino fluam projetos interativos.
Em muitos aspectos, então, as condições materiais para a implementação de
uma nova proposta pedagógica, que respeite o pluralismo epistemológico, a
interdisciplinaridade e a globalidade estão dadas. Talvez, no passado, experiências
progressistas em educação tenham fracassado porque os educadores “careciam das
ferramentas que lhes permitiriam criar novos métodos de uma forma confiável e
sistemática” (PARPERT, 1994: 20). Essas ferramentas estariam hoje disponíveis nas
novas tecnologias, principalmente nos computadores.
Além de poder contar com o auxílio das tecnologias digitais para a objetivação
de uma nova proposta pedagógica, começa a despontar um novo aliado dos
educadores no campo institucional, ou seja, o reconhecimento da flexibilidade
curricular e da autonomia das instituições escolares por parte de muitos órgãos da
administração governamental de diversos países, pelo menos nos discursos. Com
isso “abrem-se possibilidades reais de intervir em um espaço prático que podem ser
aproveitadas pelo corpo docente, estudantes e grupos sociais comprometidos com a
educação” (SANTOME, 1998: 22). Podem derivar daí dinâmicas de participação que
culminem com uma real democratização do espaço escolar e suas estruturas.
Essa democratização do espaço escolar, numa perspectiva crítica e
interdisciplinar, deverá ser informada por uma postura que supere tanto o
voluntarismo, derivado da filosofia do sujeito (JANTSCH e BIACHETTI, 1997),
quanto as abordagens holísticas, de cunho generalizador e universalizante (ETGES,
1997), atualmente hegemônicas nas produções teóricas sobre interdisciplinaridade.
Pensar a inovação do ensino superior juridico só é possível se tivermos todos
os campos do conhecimento ajudando a condicionar as formações sociais ao
mesmo tempo em que são por elas condicionadas. Entretanto, as especificidades de
cada uma das ciências e campos do saber devem ser mantidas, não obstante se
alarguem os canais de comunicação entre eles.
Apostar na interdisciplinaridade supõe a defesa de um novo tipo de pessoa,
“mais aberta, flexível, solidária, democrática e crítica” (SANTOME, 1998: 45), pois as
sociedades atuais precisam de pessoas com formação sempre mais polivalente,
abertas para a mudança, capazes de lidar com o inesperado.
191
Uma visão global, que evite a fragmentação dos conhecimentos, deve ter
presente que “quando algo se divide em partes, torna-se mais difícil compreender
cada uma delas isoladamente” (REGGINI, 1994: 4). Além disso, muitos educadores
já acreditam que “aprender mais é melhor e mais fácil do que aprender menos”
(REGGNI, 1994: 4).
Apesar de reconhecer a existência de muitos entraves à efetivação de uma
nova proposta pedagógica centrada na não-linearidade, na pluralidade
epistemológica, na negação de uma razão tecnicista, Battro e Denham (1997: 26)
acreditam que “a nova sociedade do conhecimento superará todas estas barreiras,
será uma sociedade digital, mundial e livre”.
Perceber o processo de ensino-aprendizagem como uma atividade
comunicacional implica entender a “mediatização” (BELLONI, 2001) como uma
categoria explicativa extremamente importante dos processos educacionais. Uma
mediatização competente será de grande valia no exercício da interdisciplinaridade.
Isso se torna particularmente importante na medida em que a qualidade e a
quantidade de mídias disponíveis avança em progressão geométrica. Uma variada
gama de mídias possibilita a tradução do currículo nas mais diversas linguagens,
além de facilitar um intercurso entre os diversos componentes curriculares.
Além disso, uma vez que cada meio de comunicação traduz o mundo à sua
maneira, os efeitos psicológicos de cada um deles são qualitativamente diferentes.
Assim, se acreditarmos que a interdisciplinaridade “enquanto princípio mediador
entre as diferentes disciplinas, não poderá jamais ser elemento de redução a um
denominador comum, mas elemento teórico-metodológico da diferença” (ETGES,
1993: 18).
A tarefa de aplicar esse conhecimentos nas matrizes curriculares dos cursos
de Direito que são elaboradas, em geral, de forma compartimentada, impedindo a
integração das diversas áreas e dificultando a formação integral do futuro bacharel
não é fácil.
As novas Diretrizes Curriculares traduzidas pela Resolução n° 9/2004
(BRASIL, 2004), em seu art. 2°, parágrafo 1°, inciso IV, exige que o curso de Direito,
por meio da concretização da elaboração de seus currículos, realize a
interdisciplinaridade. Entretanto, projeto pedagógico de cada curso, deverá
especificar as formas de sua realização.
192
No art. 2, parágrafo 1°, inciso IV, da Resolução (BRASIL, 2004):
Art. 2° A organização do Curso de Graduação em Direito, observadas
as Diretrizes Curriculares Nacionais se expressa através do seu
projeto pedagógico, abrangendo o perfil do formando, as
competências e habilidades, os conteúdos curriculares, o estágio
curricular supervisionado, as atividades complementares, o sistema
de "avaliação, o trabalho de curso como componente curricular
obrigatório do curso, o regime acadêmico de oferta, a duração do
curso, sem prejuízo de outros aspectos que tornem consistente o
referido projeto pedagógico.
§ 1º O Projeto Pedagógico do curso, além da clara concepção do
curso de Direito, com suas peculiaridades, seu currículo pleno e sua
operacionalização, abrangerá, sem prejuízo de outros, os seguintes
elementos estruturais:
[...]
IV - formas de realização da interdisciplinaridade:
(grifo nosso).
Segundo Linhares (2009), não basta a inclusão no currículo de várias
disciplinas de áreas afins e que propiciem, cada uma delas, uma visão estanque do
fenômeno jurídico.Isso acarreta um conjunto de visões diferenciadas e isoladas do
mesmo objeto, sem, no entanto, propiciar ao aluno uma perspectiva concreta de sua
integralidade.
A interdisciplinaridade, como aspiração emergente de superação da
racionalidade científica positivista, aparece como entendimento de uma nova forma
de institucionalizar a produção do conhecimento nos espaços da pesquisa, na
articulação de novos paradigmas curriculares e na comunicação do processo de
perceber as várias disciplinas; nas determinações do domínio das investigações, na
constituição das linguagens partilhadas, nas pluralidades dos saberes, nas
possibilidades de trocas de experiências e nos modos de realização da parceria.
Essa realização integrativa-interativa permite-nos visualizar um conjunto de
ações interligadas, de caráter totalizante e isenta de qualquer visão parcelada,
superando-se as atuais fronteiras disciplinares e conceituais.
Torna-se necessário repensar a produção e a sistematização do
conhecimento fora das posturas científicas dogmáticas, no sentido de inseri-las num
contexto de totalidade. Dessa forma, a complexidade do mundo em que vivemos
passa a ser sentida e vivida de forma globalizada e interdependente, o que coloca a
necessidade de se recuperar o sentido da unidade que tem sido sufocada pelos
valores constantes do especialismo.
193
A compreensão crítica do mundo, da sociedade-cultura e do homem
contemporâneos, depende da inter-relação entre as disciplinas (ou ciências), pois o
isolamento e a fragmentação jamais darão conta da complexidade do real.
Trabalhar a interdisciplinaridade não significa negar as especialidades e
objetividade de cada ciência. O seu sentido reside na oposição da concepção de
que o conhecimento se processa em campos fechados em si, como se as teorias
pudessem ser construídas em mundos particulares, sem uma posição unificadora
que sirva de base para todas as ciências, isoladas dos processos e contextos
histórico-culturais. A interdisciplinaridade tem que respeitar o território de cada
campo do conhecimento, bem como distinguir os pontos que os unem e que os
diferenciam. Essa é a condição necessária para detectar as áreas onde se possam
estabelecer as conexões possíveis. Como observa Gusdorf (1976: 26), "a exigência
interdisciplinar impõe a cada especialista que transcenda sua própria especialidade,
tomando consciência de seus próprios limites para colher as contribuições das
outras disciplinas".
Por mais que interdisciplinaridade seja uma exigência do saber, existe uma
nítida fronteira entre a reflexão e o agir político, de um lado, e a reflexão e o agir
jurídico, de outro. Porém essa afirmação não deve ser entendida como defesa do
paradigma positivista, o qual ensejou análises acríticas do Direito e sua forma de
atuação na sociedade, apoiado no mito da neutralidade do sujeito de conhecimento.
Hoje, com a intensa transformação da ciência, com a emergência de novos
paradigmas, com o reconhecimento do saber como uma tessitura interdependente,
só é possível formar juristas e operadores jurídicos quando sua formação for
multidisciplinar. Talvez possamos ir mais longe e afirmar que, perante a velocidade
do mundo, as diferenças humanas, o nível exasperante das assimetrias sociais, a
exclusão e os impactos das tecnologias em todos os aspectos da vida, faz-se
necessário assumirmos, com os cuidados metodológicos necessários, uma posição
transdisciplinar.
Os conceitos de multi, inter e transdisciplinaridade são distintos e, por vezes,
antagônicos em suas propostas e objetivos metodológicos, porém ainda muito
confundidos. A multidisciplinaridade via de regra pressupõe que várias disciplinas
podem ser reunidas; porém, essa reunião não implica nem que elas tenham o
194
mesmo objeto de estudo e nem que partilhem qualquer tipo de relação sobre esse
objeto.
No caso do ensino interdisciplinar, dois ou mais campos do saber estão
reunidos e voltados para a análise e verificação do mesmo objeto de estudo. Os
professores fazem um planejamento conjunto com objetivo de propor discussões
que levem os alunos a estabelecer relações entre o que estão pesquisando nas
diversas disciplinas em relação a um tema em questão. No trabalho chamado
interdisciplinar, costuma-se conceber que uma área enriquece o conhecimento da
outra e o resultado é a construção de um saber mais complexo e menos
fragmentado, que buscará trazer mais nexos para o estudante, visto que pesquisado
e discutido sob diferentes pontos de vista.
Já a transdisciplinaridade é um conceito mais amplo. O prefixo trans quer
dizer aquilo que está entre, através e além. Nesse sentido, um ensino
transdisciplinar não se restringe nem à simples reunião das disciplinas nem à
possibilidade de haver diálogo entre duas ou mais disciplinas porque ultrapassa sua
dimensão. Faz com que o tema pesquisado passe pelas disciplinas, porém sem ter
como objetivo final o conhecimento específico dessa mesma disciplina ou a
preocupação de delimitar o que é o seu objeto ou o que é de outra área inter-
relacionada. A transdisciplinaridade se preocupa com a interação contínua e
ininterrupta de todas as disciplinas num momento e lugar.
A inter e a transdisciplinaridade tentam romper com a ideia positivista e
trabalhar no campo do pensamento complexo estudado pelo filósofo francês Edgar
Morin (1921), que reúne, dialoga com, duvida, pesquisa, questiona e constrói
conhecimentos que novamente podem ser postos em dúvida porque estão
permanentemente em mutação. Num modelo de ensino inter e transdisciplinar, as
disciplinas são postas ao redor de um mesmo objeto e suas situações são cíclicas.
Ou seja, as disciplinas não possuem posição de importância uma em relação à
outra, porém, em processo de compreensão do objeto, estudam, de um ponto de
vista dialógico, aquilo que é objeto do estudo.
Em Fazenda (1994), coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas da
Interdisciplinaridade (Gepi) da PUC-SP, relata um pouco da trajetória dos estudos da
interdisciplinaridade no Brasil e no mundo. Segundo ela, o movimento da
195
interdisciplinaridade surgiu na Europa, principalmente na França e na Itália, em
meados da década de 60, evidenciando o compromisso de alguns professores
universitários que buscavam "o rompimento com uma educação por migalhas", com
a organização curricular excessivamente especializada e toda e qualquer proposta
de conhecimento que incita o olhar do aluno numa única direção. Um dos principais
precursores da interdisciplinaridade foi o filósofo e epistemólogo Georges Gusdorf
(1912-2000). Segundo ele, o destino da ciência multipartida seria a falência do
conhecimento, pois, na medida em que nos distanciamos de um conhecimento em
sua totalidade, estaríamos decretando a falência do humano, "a agonia da nossa
civilização".
As discussões sobre interdisciplinaridade chegaram ao Brasil no final da
década de 60. De acordo com Ivani Fazenda, interdisciplinaridade tornou-se, então,
palavra de ordem a ser empreendida na educação, uma forma de modismo. A
primeira produção significativa sobre o tema no Brasil é de Hilton Japiassu, que
publica Interdisciplinaridade e patologia do saber em 1976.
De acordo com Fazenda, tanto Japiassu quanto Gusdorf dão indicações
detalhadas e ainda atuais sobre os cuidados a serem tomados na constituição de
uma equipe interdisciplinar: necessidade do estabelecimento de conceitos-chave
para facilitar a comunicação entre os membros da equipe, exigências para
delimitação do objeto ou tema a ser pesquisado, repartição de tarefas e partilha de
resultados.
As características de um professor interdisciplinar também são descritas por
Ivani Fazenda: "O professor interdisciplinar traz em si um gosto especial por
conhecer e pesquisar, possui um grau de comprometimento diferenciado para com
seus alunos, ousa novas técnicas e procedimentos de ensino. Antes, porém, analisa-
os e dosa-os convenientemente".
Os métodos pedagógicos que levam em conta os conhecimentos prévios dos
alunos e pressupõem que os alunos constroem seus conhecimentos a partir do que
conhecem e da troca com o outro, como o construtivismo, costumam trabalhar bem
com a interdisciplinaridade.
De acordo com o conceito de multidisciplinaridade, recorre-se a informações
de várias matérias para estudar um determinado elemento, sem a preocupação de
196
interligar as disciplinas entre si. Assim, cada matéria contribuiu com informações
próprias do seu campo de conhecimento, sem considerar que existe uma integração
entre elas. Essa forma de relacionamento entre as disciplinas é considerada pouco
eficaz para a transferência de conhecimentos, já que impede uma relação entre os
vários conhecimentos.
A origem da multidisciplinaridade encontra-se na ideia de que o conhecimento
pode ser dividido em partes (disciplinas), resultado da visão cartesiana e depois
cientificista na qual a disciplina é um tipo de saber específico e possui um objeto
determinado e reconhecido, bem como conhecimentos e saberes relativos a esse
objeto e métodos próprios. Constitui-se, então, a partir de uma determinada
subdivisão de um domínio específico do conhecimento. A tentativa de estabelecer
relações entre as disciplinas é que daria origem à chamada interdisciplinaridade.
A multidisciplinaridade difere-se da pluridisciplinaridade porque esta, apesar
de também considerar um sistema de disciplinas de um só nível, possui disciplinas
justapostas situadas geralmente ao mesmo nível hierárquico e agrupadas de modo a
fazer aparecer as relações existentes entre elas.
O certo é que a abordagem interdisciplinar do fenômeno jurídico em conjunto
com as outras ciências sociais, para alguns autores, chega a ser considerada até
mesmo a única forma pela qual o Direito assume a condição de verdadeira ciência,
uma vez que o objeto comum das ciências sociais é a relação social.
Em tema de transdisciplinaridade, é extremamente sugestiva a lição de
Boaventura de Souza Santos, quando afirma que “os objectos têm fronteiras cada
vez menos definidas; são constituídos por anéis que se entrecruzam em teias
complexas com os dos restantes objectos, a tal ponto que os objectos em si são
menos reais que as relações entre eles”. Significa dizer que o “objeto de
conhecimento” precisa ser abordado com uma multiplicidade transdisciplinar.
Um ensino jurídico realmente superior engloba uma ideia de Direito
historicamente contextualizada e uma metodologia multidisciplinar, capaz de
proporcionar um conhecimento global sobre o fenômeno jurídico.
Somente um pensamento verdadeiramente interdisciplinar pode constituir a
base para a transformação da realidade. Do mesmo modo, é somente esse
conhecimento interdisciplinar que, fugindo de uma análise tecnicista do ordenamento
197
jurídico vigente, permite compreender o fenômeno jurídico em suas múltiplas
particularidades e permite dar conta de que o Direito é fruto de um modo
determinado de apreensão e compreensão do real.
Dentro dessa compreensão, o significado atual da teoria do Direito deve ser
compreendido como plural, abrindo o conhecimento jurídico para a diferenciação e
contingência deste início de século. Só uma formação flexível, multidisciplinar,
metodologicamente aberta, poderá propiciar o aparecimento de cientistas e
operadores criativos, curiosos, envolvidos e abertos para o novo. Se a atual
estrutura for mantida, as escolas de Direito, seus responsáveis, seus professores e,
principalmente, seus estudantes continuarão alheios às novas demandas, não terão
capacidade de identificar mudanças, nem criatividade para administrar as novas
situações advindas de novos problemas.
Já a pluri e a multidisciplinaridade se constituem pela reunião de diversas
disciplinas em torno de um problema, sem que haja um ponto de vista integrador ou
federativo. A transdisciplinaridade é, por sua vez, a transferência de um modelo,
conceito ou método de uma disciplina a outra, o que consiste num exercício bem
mais complexo.
Ao mapear o que se pode ter em conta para tratar o tema, o sujeito identifica
as disciplinas a mobilizar. Isso significa que a abordagem interdisciplinar não
dispensa o conhecimento das disciplinas. Bem ao contrário, presume-o. Do mesmo
modo que o aluno, o professor precisa deter, com segurança, os conhecimentos
correspondentes à formação básica prevista pelo currículo, que consiste no acervo
mínimo para o exercício profissional. A especialidade do professor não o dispensa
de uma visão jurídica global, a mesma que está sendo transmitida ao aluno durante
os anos em que frequenta o ensino superior, que, aliás, é bastante modesta em
relação ao que o conhecimento humano já foi capaz de gerar.
4.5 Formação institucional docente
Para atuar no magistério superior de instituições tão distintas, espera-se um
professor comprometido com as funções sociais da universidade em que leciona.
Para isso, além da formação acadêmica trazida por meio de sua titulação, ele deve
198
ser orientado constantemente com relação às diretrizes da instituição em que está
inserido. Assim, quer se um professor que:
indica caminho, que desafia, sugere, questiona, desequilibra e faz
o aluno pensar, incentivando-o a buscar a origem e a história dos
conhecimentos, desafiando-o a analisar as várias facetas dos
mesmos (RIBEIRO JUNIOR, 2003: 61).
A interdisciplinaridade oferece uma nova postura docente diante do
conhecimento, uma mudança de atitude em busca do contexto do conhecimento, em
busca do ser como pessoa integral. Ela visa a garantir a construção de um
conhecimento globalizante, rompendo com os limites das disciplinas. Para isso, será
preciso, como propõe Ivani Fazenda, “uma postura interdisciplinar”, que nada mais é
do que uma atitude de busca, de inclusão, de acordo e de sintonia diante do
conhecimento.
A docência universitária ainda continua a ter como exigência
privilegiada (e quase exclusiva) a competência científica, descurando
a competência pedagógico-didática. Essa situação tem como
fundamento a visão de que quem sabe, automaticamente, sabe
ensinar e é referendada pela institucionalização de uma formação
específica para o ingresso e a progressão na carreira (LEITE;
RAMOS, 2007: 31).
Alunos e professores participam mais do processo de ensino aprendizagem
com a interdisciplinaridade. Os alunos, porque aprendem a trabalhar em grupo,
habituam-se a essa experiência de aprendizagem grupal e melhoram a interação
com os colegas. Os professores, porque se veem compelidos pelos próprios alunos,
a ampliar os conhecimentos de outras áreas e melhoram a interação com os colegas
de trabalho. A metodologia do trabalho interdisciplinar supõe atitude e método,
envolvendo integração de conteúdos; passando de uma percepção fragmentária
para uma concepção unitária do conhecimento; superando a dicotomia entre ensino
e pesquisa, ponderando sobre o estudo e a pesquisa, a partir do apoio das diversas
ciências.
Considerando as concepções e práticas, trazidas pelos jesuítas, que
impregnaram fortemente o ensino em todos os níveis de escolaridade
até os dias de hoje, constatamos que sua influência persiste com
mais intensidade no ensino superior. Centrado quase exclusivamente
na ação do professor, o ensinar reduz-se a expor os conteúdos nas
aulas (ou explicá-los nos laboratórios). Ao aluno, resta ouvir com
atenção. O professor competente é aquele capaz de expor e explicar
um conteúdo com clareza e propriedade e manter o aluno atento.
Assim, um bom professor é o que consegue fazer uma boa palestra,
cabendo ao aluno ouvir, anotar com atenção e memorizar o conteúdo
exposto (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002: 227).
199
É necessário destacar, aqui, que essa prática pedagógica persiste até hoje
devido, principalmente, ao fato de as universidades brasileiras terem sido fortemente
influenciadas pelo modelo napoleônico de universidade. Tal modelo, conforme já foi
dito, fragmenta o currículo, separa teoria e prática, isola o trabalho do professor,
deixando-o responsável apenas por sua disciplina, e valoriza a exposição do
conteúdo pelo professor e sua memorização pelos alunos (ANASTASIOU, 2006).
Na aprendizagem, o professor é o norte que ajuda o aluno a descobrir, a
reconstruir e a posicionar-se frente ao conhecimento. No processo de aprendizagem,
o aluno não constrói sozinho o conhecimento, essa construção é feita continuamente
com outros e na interação com os outros. As práticas pedagógicas em sala aula
devem exceder uma visão fragmentada e descontextualizada do ensino, tornando as
aprendizagens significativas. Os cinco princípios que subsidiam a prática docente
interdisciplinar, de acordo com Ivani Fazenda são: humildade, espera, respeito,
coerência e desapego.
Conforme Bittar (2006),
o professor da área jurídica possui, em seu perfil mais genérico, uma
série de deficiências com relação aos profissionais da educação de
outras áreas: (1) falta de didática de ensino; (2) escasso preparo
metodológico; (3) desconhecimento da legislação que rege o setor;
(4) pouco compromisso educacional; (5) distante compreensão da
lógica dos procedimentos educacionais, tornando o espaço
acadêmico um espaço regido pelas mesmas regras do exercício das
profissões jurídicas; (6) deficiente preparo psicológico no trato com os
alunos; (7) insatisfatória visão de sistema do Direito, que é tratado
mais no caso a caso e na dimensão dos fatos e ocorrências
quotidianas; (8) indisciplina no cumprimento das regras regimentais
da instituição de ensino à qual se vincula; (9) escasso compromisso
com os planos de ensino e com o programa de conteúdos
programáticos; (10) inabilidade para a formulação de projetos
pedagógicos (BITTAR, 2006: 157-158).
A efetivação do processo de envolvimento do educador em um trabalho
interdisciplinar, mesmo que sua formação tenha sido fragmentada, é realizada por
meio da interação professor/aluno, professor/professor, pois a educação só tem
sentido no encontro. “Se há interdisciplinaridade, há encontro, e a educação só tem
sentido no encontro. A educação só tem sentido na “mutualidade”, numa relação
educador-educando em que haja reciprocidade, amizade e respeito mútuo”
(FAZENDA, 2003: 23).
200
A proposta concreta de uma renovação docente não significa propiciar
qualificação pedagógica aos professores de Direito. Isso talvez seja conveniente e
se mostre benéfico, mas não é suficiente, pois depende do que se entende por bom
professor. Se a qualificação docente restringir-se a uma qualificação dogmática –
unidisciplinar e legalista –, ela apenas servirá para reforçar o que está posto. “No
que tange à legislação, esta não é precisa quanto à formação pedagógica de
mestres e doutores; as universidades fazem o que julgarem melhor” (VAZ DE
MELLO, 2002: 13).
Acreditamos que: “... a problemática da educação brasileira, em especial do
ensino superior, não se esgote com a questão da formação de professores, esta,
inevitavelmente, far-se-á presente em qualquer ângulo em que se tome a
investigação educativa” (VAZ DE MELLO, 2002: 5).
Para Masetto (1998: 13), “a docência no ensino superior exige não apenas
domínio de conhecimentos a serem transmitidos por um professor como também um
profissionalismo semelhante àquele exigido para o exercício de qualquer profissão”.
Ele continua explicando que a docência no Ensino Superior
exigia competências próprias que, desenvolvidas, trariam àquela
atividade uma conotação de profissionalismo e superaria a situação
até então muito encontradiça de ensinar 'por boa vontade', buscando
apenas certa consideração pelo título de 'professor de universidade',
ou apenas para 'complementação salarial', ou, ainda, apenas para
'fazer alguma coisa' no tempo que restasse do exercício de outra
profissão (MASETTO, 1998: 18).
Mais do que formação docente, precisamos de ética na docência. Ética
otimista, capaz de transmitir alento e vontade a uma juventude sem líderes, sem
projetos, sem perspectivas, mergulhada no hedonismo e na consecução de
resultados lucrativos e rápidos, mas distanciados de qualquer conotação moral.
O compromisso, na formação deste profissional, está centrado nas
possibilidades de intervenção no próprio mercado, numa adesão
acrítica, ou possibilitando o surgimento de profissionais que vão
compreender o processo e nele intervir, inclusive na direção de
transformá-lo (ANASTASIOU, 2007: 45-46).
O conhecimento descomprometido não ajuda a suprir essa deficiência. Muito
mais importante do que o domínio da técnica é a capacidade de direcionar vontade e
deliberação para as coisas consideradas intrinsecamente boas e nobres.
201
O narcisismo docente esconde a tênue qualidade da identidade de
alguns professores. Eles conseguem fortalecer a auto-imagem do seu
“eu” com as ilusões de grandezas que obtêm do culto imperial de seu
discurso erudito. Empregam o saber como tentativa de preencher o
vazio de suas vidas. Ensinam como uma forma de estabelecer um
processo existencial de auto-atenção. Ensinam como uma forma de
preencher o tempo e iludir-se de seu vazio na desvalorização dos
outros, mas dependendo destes outros desvalorizados. Precisam do
aplauso como um inócuo preenchimento do vazio (WARAT, 1996:
200).
O Direito neutraliza as diferenças, premia as ações de acordo com seu mérito,
restaura situações afetadas por desequilíbrio, restitui a paz, o patrimônio e a
liberdade. As situações de injustiça vivenciadas pelo alunado precisam ser trazidas
ao ambiente universitário para merecerem análise e a alternativa de
encaminhamento para a solução possível.
O exercício docente no ensino superior exige competências
específicas, que não se restringem a ter um diploma de bacharel, ou
mesmo de mestre ou doutor, ou, ainda, apenas o exercício de uma
profissão. Exige isso tudo, além de outras competências próprias
(MASETTO, 1998: 11).
De maneira geral, o professor que inicia, hoje, a carreira docente universitária
não encontra plano de carreira para os professores, que permanece sem incentivos
e estímulos para se aperfeiçoar e sendo até mesmo punido, quando sai da rotina,
marcada pela abstração do trabalho, pois o que conta é o número de aulas. Não há
muito interesse em identificar conteúdos, salvo na hipótese de alguém muito ousado
que tenha se perdido na instituição e venha com novas experimentações ou
conteúdos, que se chocam com o conservadorismo da direção e com a dificuldades
dos discentes.
Darling-Hammond (1997 apud REALI; MIZUKAMI, 2002) indica o percurso
que os professores precisam conhecer e que os capacita a observar para a
realização da docência. De acordo com este percurso, cabe aos professores:
a) compreender o conteúdo específico tendo em vista a área
estudada: o professor deve conhecer profundamente a área para
ser capaz de ir além das ideias principais de que trata e de
selecionar exemplos e problemas significativos para serem
discutidos em aula;
b) conhecer a audiência para a qual o conteúdo será trabalhado: o
professor deve conhecer seus alunos, suas experiências e o
contexto no qual estão inseridos, já que ambos influenciam
diretamente na aprendizagem;
c) conhecer os diversos modos de conhecimento, os processos de
informação e de comunicação: esses são aspectos importantes
pois direcionam as possibilidades de o ensino ocorrer;
202
d) avaliar adequadamente o conhecimento dos alunos e manejar
diferentes estratégias de ensino: o professor deve saber lidar com
as dificuldades que porventura surjam;
e) conhecer recursos e tecnologias educacionais: desta forma o
professor expande as fontes de informação dos seus alunos para
além dos livros didáticos;
f) promover experiências produtivas: com o intuito de motivar os
alunos; e
g) analisar e refletir sobre a própria prática: para que ele possa
avaliar seu trabalho e, consequentemente, melhorá-lo.
É função inerente dos educadores formar os educandos. Formar para a vida
cidadã e para a vida profissional. Mas formar integralmente para a curta aventura da
existência humana e não apenas informar, adicionar conhecimentos e descuidar-se
do uso que deles farão os egressos do sistema educacional.
o professor assuma a diversidade mais como um recurso do que
propriamente um problema, o que implica: a capacidade para
aprender sobre as particularidades de seus alunos e respectivas
comunidades tendo em vista os seus contextos de origem, a
apresentação de expectativas elevadas, a capacidade para
estabelecer pontes entre o saber escolar e o saber do aluno, de modo
a facilitar a entrada na sala de aula dos elementos culturais
relevantes, o domínio dos conteúdos específicos e conhecimentos
sócio-culturais [sic] e o estabelecimento de estratégias de ensino que
favoreçam a participação ativa dos alunos (ZEICHNER, 1992 apud
MIZUKAMI; REALI, 2002, p. 122).
O professor fala a partir de um lugar peculiar, que lhe permite manter sob
controle a tônica e os rumos da discussão. Seu saber dogmático apresenta-se
autossuficiente, encontrando suas soluções apenas nas estruturas normativas onde
estão selecionadas e previstas as variáveis do jurídico. Essa pedagogia atende aos
valores de segurança e certeza do saber científico, tão ao gosto dos positivistas,
mas é óbvio que não atinge um pleno conhecimento do Direito em todas as suas
manifestações concretas no espaço-tempo social.
É como se a compreensão comportasse um vício terrível, que conduzisse à
fraqueza e à abdicação. Mas “compreender não é justificar. A compreensão não
desculpa nem acusa. A compreensão favorece o julgamento intelectual, mas não
impede a condenação moral”; assim, compreender “conduz, não à impossibilidade
de julgar, mas à necessidade de tornar complexo nosso julgamento” (MORIN, 2004:
135, 6).
Em primeiro lugar, diante da crescente complexidade técnica do Direito e da
própria vida, a realidade não é assimilável sem prévia formação. A sabedoria popular
pode ser relevante no plano dos valores, mas o exercício profissional baseado no
203
empirismo e na experiência, na melhor das hipóteses, é incapaz de superar a
realidade, quando, na verdade, grande parte do trabalho do lidador do Direito
consiste em encontrar maneiras de reinventar situações reais.
Em segundo lugar, mesmo que o aluno inapto se tenha ardilosamente
adaptado à realidade, o caso é ainda mais grave: há não somente o risco coletivo de
que, por inépcia, cause dano à sociedade, mas o risco individual de que conclua, ao
final da vida, que serviu a um querer que não era o dele.
No entanto, o objeto da reflexão jurídica é precisamente demonstrar uma ideia
essencial que permita compreender um fenômeno complexo. Raramente é possível
ou desejável dizer tudo. É preciso aprender a triar o que é importante e o que é
acessório. Trata-se de encontrar o elemento fundamental, decisivo, a chave. Do
poder de síntese depende em grande parte a qualidade do trabalho do operador do
Direito.
O professor precisa preparar-se para incentivar e intensificar esse
processo promovendo atividades que provoquem necessidade de
mudança no 'status quo' dos participantes; atribuam significado ao ato
de aprender; promovam a aceitação de uma relação entre adultos, de
parceria e co-responsabilidade. Além disso, o professor precisa
pensar em meios presenciais e virtuais de se aproximar dos objetivos
propostos e das necessidades dos alunos; em estratégias para
aproximar o conteúdo selecionado das atividades profissionais; em
métodos para facilitar e intensificar a aprendizagem dos alunos; em
técnicas variadas, que dinamizem a ação pedagógica e permitam o
desenvolvimento de múltiplas facetas dos alunos, além dos recursos
tradicionais ou de novas tecnologias para viabilizar os métodos
escolhidos. E, ainda, a que mecanismos pode recorrer para analisar
se a aprendizagem ocorreu ou não adequadamente (MASETTO,
2008: 398).
Exercer o senso crítico e provocá-lo no aluno permite, assim, avaliar a
coerência dos argumentos, a compatibilidade entre marcos regulatórios, e entre
estes e dadas condutas. Permite igualmente levar em conta as repercussões da
problemática e das eventuais soluções a ela atribuídas (ou a ausência de soluções)
sobre a vida social. É o caso dos efeitos perversos de determinadas normas ou a
inaptidão à efetividade de certas medidas judiciais.
Juliana Ferrari de Oliveira (2010) traz importante trecho de Berbel (2008: 548-
549), a respeito disso e, por serem consideradas pertinentes, são transcritas a
seguir:
204
Como pretender cobrar dos futuros professores – daqueles que estão
hoje em processo de formação inicial no ensino superior – e de atuais
professores – que se encontram em cursos de formação continuada,
que apresentem uma postura analítica e crítica, se não são
colocados, em momentos de formação, na situação de experimentar,
de vivenciar habilidades intelectuais que lhes possibilitem valorizá-las
e incorporá-las em seu desempenho?
Como pretender que futuros e atuais professores em formação sejam
criativos e inovadores, se nas situações de aprendizagem não lhes
são dadas oportunidades de exercitar a iniciativa e a criatividade,
além de não vivenciarem situações criativas e inovadoras propostas
por seus próprios formadores?
Como esperar que futuros e atuais professores em formação se
mostrem coerentes em seu modo de pensar e agir na sua prática
pedagógica, se em nossos discursos em sala de aula valorizamos
teorias progressistas, construtivas e humanizadoras, mas
continuamos praticando uma pedagogia tradicional?
Como pretender que futuros e atuais professores em formação
desafiem a acomodação, a subserviência e a manutenção do
paradigma dominante, da burocracia e da simples sobrevivência na
prática docente, se não lhes forem abertas inúmeras e constantes
oportunidades de conhecer seu potencial, de refletir sobre suas
escolhas, de tomar consciência da sua condição profissional, de
exercitar a reflexão e a auto-avaliação constante, entre tantas outras
ações próprias da profissionalização docente?
Como pretender que futuros e atuais professores em formação atuem
com autonomia, se não lhes forem proporcionadas oportunidades de
desenvolver sua capacidade crítico-reflexiva e criativa diante das
questões da profissão, durante o tempo de formação?
Como esperar que futuros e atuais professores em formação
desenvolvam o espírito científico, se não lhes forem oferecidas
condições de aprender a pesquisar e a elaborar conhecimentos no
tempo de sua formação?
Como pretender que futuros e atuais professores em formação
possam respeitar e valorizar todo o processo interativo com seus
alunos e até mesmo reconhecer seus alunos e a sala de aula como
fontes valiosas de sua própria formação continuada, e por que não
dizer sua humanização, se os tratarmos como consumidores de
informações que nós professores detemos, se os submetermos ao
nosso poder de decisão sobre todos os aspectos do processo
pedagógico do qual participam?
Como pretender que futuros e atuais professores em formação
estejam aptos para resolver os problemas da prática pedagógica e
desenvolvam em seus próprios alunos essa capacidade, se no tempo
de sua formação não lhes forem proporcionadas as condições para
problematizar os conteúdos e situações reais de sua área de atuação
e buscarem respostas fundamentadas para as mesmas? Se os
próprios professores formadores confundirem problematização com
resolução de problemas oferecidos por outros? (BERBEL, 2008).
O espírito crítico requer, ainda, curiosidade e coragem. A curiosidade
depende da abertura de espírito e do tino para encontrar novos temas e novos
enfoques, mas a coragem é essencial: é muito mais perigoso pôr em causa as ideias
batidas do que seguir os caminhos já calcados pelas pegadas dos outros. O
205
professor precisa ter a coragem necessária: de enfrentar um tema pertinente de
forma inovadora e de esclarecer antecipadamente os parâmetros utilizados para
tanto.
O trabalho docente competente é um trabalho que faz bem. É aquele
em que o docente mobiliza todas as dimensões de sua ação com o
objetivo de proporcionar algo bom para si mesmo, para os alunos e
para a sociedade. Ele utiliza todos os recursos de que dispõe
recursos que estão presentes ou que se constroem nele mesmo e no
entorno – e o faz de maneira crítica, consciente e comprometida com
as necessidades concretas do contexto social em que vive e
desenvolve seu ofício (RIOS, 2006: 107).
A função docente, bem feita, deve ser considerada em relação aos diferentes
modos de conceber a prática educativa. Para analisar a formação de professores
trata-se de saber em que consiste aprender a ser e a tornar-se um professor que
saiba responder às necessidades dos alunos, às próprias enquanto pessoa em
evolução pessoal e profissional, às da instituição e às da realidade.
Várias disciplinas podem contribuir para enriquecer a construção de um
conhecimento sobre a formação de professores, mas é possível efetuar um trabalho
interdependente. O modo como os professores aprendem a ensinar começou a ser
objeto de estudo e investigação sistemática nas últimas décadas. Há, porém, um
conjunto de pesquisas sobre o que leva alguém a ser professor.
Segundo Doyle (1985) essas pesquisas abrangem quatro fases: a primeira é
a fase da pré-formação, com as decisões de opção pela docência; a segunda é a
formação inicial, os estudos formais; a terceira é a da indução: alguns autores
sugerem que muitos professores aprendem seu ofício com a prática. A última fase é
a do exercício efetivo da profissão.
Ao tratar a inovação, o professor precisa refletir sobre alguns pressupostos:
querer aprender se quiser inovar, pois lidará com incertezas, riscos e até erros;
conhecer-se e ter abertura reflexiva e participativa; envolver-se no seu próprio
aprendizado como pretende ser o de seu aluno; compartilhar conceitos sobre o que
é um bom ensino que leve a uma aprendizagem efetiva e a aquisição de habilidades
profissionais.
A iniciativa de inovação tem dois aspectos. Um é motivacional e envolve o
início das ações. O outro é cognitivo e envolve a capacidade de descobrir novos
modos de agir.
206
As Faculdades do Direito não têm se destacado pelos avanços pedagógicos
ou didáticos. As críticas que o professor Melo Filho (1984) faz ao docente do Ensino
Jurídico indica a exigência de buscar alternativas mais eficientes e a valorização da
figura do professor como condição de mudança. Estratégias de aprendizado e
ensino, relacionadas aos conhecimentos técnicos e à metodologia própria ao ensino
do Direito, passam a constituir prioridades para o surgimento do docente capaz de
desempenhar suas tarefas.
A formação de docentes para o ensino superior no Brasil não está
regulamentada sob a forma de um curso específico como nos outros
níveis. De modo geral, a LDB admite que esse docente seja
preparado nos cursos de pós-graduação tanto 'stricto' como 'lato
sensu', não se configurando estes como obrigatórios. No entanto, a
exigência legal de que todas as instituições de ensino superior
tenham um mínimo de 30% de seus docentes titulados na pós-
graduação 'stricto sensu' aporta para o fortalecimento desta como o
lugar para formação do docente (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002:
23).
As brechas da regulamentação para formação, atuação e carreira docente no
ensino superior deixa amplo espaço para improvisações por parte de docentes que,
para atender às exigências das instituições em que trabalham se desdobram em
diferentes cursos e disciplinas.
O docente do ensino jurídico deve ser um profissional ético, com formação
jurídica integral e interdisciplinar. A visão humanística é imprescindível para
considerar o aluno como centro do processo de ensino e aprendizagem. A
profissionalização dos professores de Direito é uma imposição do momento. Não
são poucas horas retiradas da atividade principal que satisfarão as exigências da
atuação do docente do Direito.
Propomos que cada instituição de ensino superior deva ser estimulada pela
legislação a criar programas de formação docente. É preciso ensinar por meio de
uma disciplina sistematizada como articular as estratégias de ensino.
Também é importante que se considere que, para além do conteúdo
proposto nessa disciplina, as formas de ensino e de sua construção
são determinantes e fundamentais para uma apreensão bem-
sucedida por parte do professor-aprendiz. Uma preparação
pedagógica que conduza a uma reconstrução de sua experiência
pode ser altamente mobilizadora para a revisão e construção de
novas formas de ensinar (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002: 250).
A partilha dos saberes com os outros e a discussão crítica reflexiva do saber
fazer levam à formação mútua. É o reconhecimento de que a aprendizagem dura
207
toda a vida e pode ser compartilhada. Oliveira (2010) menciona, baseada em
Behrens (1998: 57), que existem quatro grupos de profissionais do ensino superior:
a) os profissionais de várias áreas do conhecimento que se dedicam
à docência em tempo integral; b) os profissionais que atuam no
mercado de trabalho específico e se dedicam ao magistério algumas
horas por semana; c) os profissionais docentes da área pedagógica e
das licenciaturas que atuam na universidade e, paralelamente, no
ensino básico (educação infantil, ensino fundamental e/ou ensino
médio); d) os profissionais da área de educação e das licenciaturas
que atuam em tempo integral na universidade.
No entanto, a diversidade de experiências docentes e profissionais só pode
enriquecer o ensino superior. O problema que entendo acontecer é a falta de
comprometimento docente com a formação discente. E isso pode ocorrer em
qualquer dos casos mencionados. Vale destacar que, preocupar-se em desenvolver
pedagogicamente seus professores, faz parte, de acordo com Pimenta e Anastasiou
(2002), do próprio papel das instituições.
As universidades, centros universitários, faculdades integradas e
institutos ou escolas superiores, conforme suas definições na LDB/96,
são instituições de ensino superior que se diferenciam entre si pela
abrangência de ações e pelas condições de trabalho de seus
docentes. No entanto, todas têm em comum a graduação de
profissionais de diferentes áreas, o que, por si, já seria indicador
suficiente da necessidade de uma profissionalização da categoria
docente que considere a análise dos elementos caracterizantes de
uma profissão: o ideal, o objetivo social, a regulamentação
profissional, o conceito, a formação acadêmica inicial e continuada,
os conteúdos específicos da área e, principalmente, o que mais falta:
os conteúdos da área pedagógica (ANASTASIOU,2002: 174).
O professor de Direito deverá reconhecer o aluno como o centro do processo
ensino-aprendizagem e aceitar seu papel de mediador, considerando a instabilidade
do contexto da sala de aula e o sentido de totalidade do ensino. Esse último aspecto
dá sentido de globalidade (decorrente da interação do professor, pessoa e
profissional, com a pessoa do aluno, considerado um ser em formação e já com um
conhecimento provisório). Tal assertiva decorre, em especial, da idéia de respeito
aos saberes do aluno.
O aluno, como se sabe, detém uma carga de conhecimento, tem ideias pré-
concebidas a respeito da matéria, e a aprendizagem somente se verifica quando tais
idéias são por ele próprio questionadas. Constata-se, então, a superação, a ruptura,
e em consequência, o crescimento. Indispensável, para tanto, o exemplo. É verdade
que admitir a dialética, em toda a sua amplitude, não é tarefa fácil, porque ela
208
comporta contestação. Mas o professor de Direito, ao que se verifica, tem
consciência de que a educação é uma forma de intervenção no mundo, e a partir
dessa ideia, opera transformações em seu meio.
Visto que independente de seu cargo na carreira jurídica “o professor
profissional ou o profissional liberal professor das mais variadas áreas do
conhecimento, ao optar pela docência no ensino universitário, precisam ter
consciência de que, ao adentrar a sala de aula, seu papel essencial é ser professor”
(BEHRENS, 1998: 61).
O melhor juiz do desempenho docente é o próprio professor que, quando
aberto à crítica de outros e a sua autoavaliação, pode reorientar suas ações. Pode
parecer uma simples prescrição, mas é severa porque exige o encontro consigo
mesmo, um posicionamento entre antinomias e a reconsideração dos limites de sua
atuação dentro da sistemática existente. A aceitação de novas tecnologias não será
imediata, exige um certo tempo de preparo.
O reconhecimento de ser o aluno o centro do processo ensino-aprendizagem
requer a aceitação de que a participação ativa e crítica do mesmo deve ser
estimulada a luz de um compromisso com a realização humana do discente.
Finalmente, uma metodologia pedagógica dinâmica aplicada ao Direito
revigorada na teoria e na prática, contextualizada, estimulada pela constatação de
que o conhecimento é provisório e sua construção pode ser prazerosa, impulsiona
novos estudos sobre a metodologia do ensino jurídico.
Enfim, o ensino superior jurídico requer tecnologias e metodologias
inovadoras e participativas que deverão estar acompanhadas da compreensão
significativa do desenvolvimento humano, o qual requer reflexão sobre a conduta
docente, crítica sobre a situação vigente e conhecimento do contexto e da realidade
mais ampla, e do compromisso de fazer o necessário para possibilitar esse
desenvolvimento.
209
4.6 O Direito Educacional
Neste tópico final, pretendemos apresentar as relações existentes entre
educação e Direito, analisando as contribuições de educadores, juristas e cientistas
dos diferentes ramos das ciências humanas e sociais. Para tanto, com o objetivo de
superar a fase legislativa do ensino, temos o propósito inicial de contribuir para
construção de uma teoria e prática do Direito Educacional e promover um debate
com os educadores e profissionais do Direito sobre a relação do Direito com a
Educação.
4.6.1 A OAB
A Ordem Brasileira de Advogados (OAB) desempenha importante papel em
relação ao ensino jurídico, apontando problemas seja nos cursos, seja na formação
do profissional do Direito. Desde 1994, dois anos após a criação da Comissão de
Ensino Jurídico da OAB, que se tornou uma instituição autorizada legalmente avaliar
o ensino jurídico.
A comissão é formada de Conselheiros Federais de advogados e
professores, conceituados. A Comissão foi responsável pela criação da portaria
1886/94 (BRASIL, 1994) cujo objetivo reside em promover a melhoria dos cursos
jurídicos no país.
O artigo 54, inciso XV, da Lei Federal nº. 8.906/94 (BRASIL, 1994) determinou
que “compete ao Conselho Federal da OAB colaborar com o aperfeiçoamento dos
cursos jurídicos, e opinar, previamente, nos pedidos apresentados aos órgãos
competentes para criação, reconhecimento ou credenciamento desses cursos”
(SANTOS, 2002: 84). Desde então, a OAB tem se dedicado, veementemente, à
avaliação dos cursos jurídicos, principalmente através do exame de ordem.
Atualmente, o referido artigo encontra-se regulamentado pelo Decreto Federal
nº. 3.680/01, que dispõe caber ao Conselho Federal da OAB a manifestação sobre o
reconhecimento ou a renovação do reconhecimento dos cursos a serem criados,
daqueles já existentes e dos que estão em funcionamento.
210
Em 2001, o Conselho Federal da OAB autorizou a comissão desse órgão a
lançar o projeto OAB/Recomenda, com o intuito de “coletar dados dos vários
instrumentos de avaliação existentes, para computá-los e reuni-los num documento
único onde se vai mostrar à sociedade (e na medida do possível), a verdadeira
situação de cada curso” (CASTRO, 2000: 23). Apesar de o envolvimento institucional
da OAB sobre o ensino jurídico ser tema gerador de polêmicas, principalmente em
relação ao exame de ordem, segundo Santos (2002), é inegável, pelo menos desde
a criação da Comissão de Ensino Jurídico, sua contribuição para enriquecer o
debate sobre o ensino jurídico brasileiro.
4.6.2 A ABEDi
A Associação Brasileira de Ensino do Direito (ABEDi) é uma entidade recente,
que tem o objetivo de unir pessoas físicas e jurídicas ligadas ao ensino ou à
administração dos cursos de Direito, buscando a melhoria do ensino jurídico
nacional. Ela realiza eventos, na forma de congressos e colóquios, por exemplo,
para disponibilizar um espaço de troca de ideias e proposições.
O I Congresso da ABEDi foi realizado em agosto de 2002, em Natal. Desde
então, esses encontros acontecem, anualmente, seguidos da publicação do Anuário
ABEDi, contemplando o que foi apresentado nos congressos. Esta com objetivos em
comum, que são:
Congregar especialistas e entidades vinculadas à pesquisa e à
educação em Direito, promover e divulgar estudos e debates sobre
ensino, pesquisa e extensão em graduação e pós-graduação em
Direito;
Elaborar propostas de elevação da qualidade do ensino,
isoladamente ou em conjunto com autoridades públicas, entidades
interessadas e instituições de ensino; colaborar com os processos de
avaliação dos cursos de graduação em Direito e dos programas de
pós-graduação em Direito;
Promover eventos sobre a matéria, preferencialmente em conjunto
com outras instituições interessadas (ABEDI, [s.d.]).
Podemos dizer que a ABEDi vem conseguindo realizar eventos para contribuir
com o debate acerca do ensino jurídico.
211
4.6.3 O CONPEDI
Criado em 1992, o Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Direito (CONPEDI) busca promover a discussão e o desenvolvimento da pós-
graduação em Direito no país. O CONPEDI tem por objetivo:
Incentivar os estudos jurídicos de pós-graduação nas diferentes
instituições brasileiras de ensino universitário; colaborar na definição
de políticas jurídicas para a formação de pessoal docente da área
jurídica, opinando, junto às autoridades educacionais, sobre os
assuntos de interesse da pesquisa e da pós-graduação em Direito;
defender e promover a qualificação do ensino jurídico, bem como sua
função institucional e seu papel social (CONPEDI, 2009).
Concordamos com Linhares (2009) as que mudanças no ensino jurídico são
cruciais, mas que o primeiro passo para alcançá-las é o reconhecimento dessa
necessidade. O papel exercido pela OAB e a própria existência da ABEDi e do
CONPEDI são indicativos de uma perspectiva mais promissora para o magistério
jurídico no país.
Precisamos congregar forças entre juristas e educadores para não segregar
alunos por meio de provas de entrada em faculdades ou carreiras jurídicas.
Identificar instituições de ensino superior jurídico com melhor desempenho é um
primeiro passo que já foi dado. O segundo é unir alunos e professores dessas
instituições de excelência na melhoria do ensino jurídico e do equilíbrio social.
4.6.4 O Direito Educacional: um caminho em construção
A discussão dos juristas e educadores em relação ao Direito educacional
iniciou-se, em termos efetivos, em outubro de 1977, no 1º Seminário de Direito
Educacional, realizado em Campinas. Além disso, o primeiro importante trabalho
para sistematização do Direito educacional foi publicado em 1981, pelo educador e
jurista Alberto Teodoro Di Dio "Contribuição à sistematização do Direito
educacional".
Segundo o autor Di Dio, precursor do Direito Educacional brasileiro, o mais
apropriado seria a expressão Direito da educação, Direito educacional ou Direito
educativo. Consciente das possíveis objeções, que, segundo ele, podem ser feitas
212
ao termo tem-.se a expressão Direito Educacional, à espera de que o uso e os
especialistas consagrem a melhor denominação (DI DIO, 1981).
Direito Educacional é o conjunto de normas, princípios, leis e
regulamentos que versam sobre as relações de alunos, professores,
administradores, especialistas e técnicos, enquanto envolvidos,
mediata ou imediatamente, no processo ensino-aprendizagem (DI
DIO, 1981: 24).
Para Edivaldo Machado Boaventura (1997),
O Direito Educacional, como disciplina nova que é, não pode ser visto
e estudado tão somente dentro dos limites da legislação. Muito ao
contrário, deve ser tratado à luz das diretrizes que lastreiam a
educação e os princípios, que informam todo o ordenamento jurídico.
Tanto no caso das relações de trabalho como nos relacionamentos
da educação, legislação seria apenas um corpo sem alma; continua
Susseking; uma coleção de leis esparsas e não um sistema jurídico
dotado de unidade doutrinária e precisos objetivos, o que contraria
uma inquestionável realidade (BOAVENTURA, 1997: 30).
O Direito Educacional tem duplo objetivo: de um lado, atua, preventivamente,
no âmbito administrativo; por outro lado, atua na solução judicial, no âmbito judicial.
Nesse caso, o Direito Educacional disponibiliza instrumentos ou mecanismo
preventivo administrativos e mecanismo ou instrumentos judiciais.
O Direito Educacional tem como fonte várias legislações no sentido amplo:
decretos, portarias, regulamento, regimento escolar, resoluções e pareceres
normativos dos conselhos de educação, tratados e convenções internacionais
(BOAVENTURA, 1997: 30). Contudo, a fonte primeira e fundamental do Direito
Educacional brasileiro está na Constituição Federal (BRASIL, 1988). Trata-se do
Título VIII, da Ordem Social, Capítulo III, intitulado Da Educação, da Cultura e do
Desporto, com uma soma de dez artigos dedicados à educação (art. 205 a 214),
com os princípios do Direito Educacional.
Quando à Educação À Distância (EAD), temos o art. 80 da LDB, cujos
regulamentos estão disciplinados nos Dec. 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, Dec.
256, de 27 de abril de 1998, Portaria Ministerial 301, de 7 de abril de 1998 e Portaria
2.253, de 18 de outubro de 2001. Aqui, a EAD pode oferecer relevante contribuição
como instrumento de inclusão digital e educacional daqueles que historicamente
foram discriminados pelo poder público e pela sociedade. Para tanto, se faz
necessária à democratização do acesso às tecnologias da comunicação e da
213
informação, bem como a implementação de uma cultura digital no contexto
educacional.
No caso do Direito Educacional, por se tratar de um ramo novo do Direito com
carência de pesquisa, entendemos que a doutrina, como fonte jurídica, é
fundamental para a construção da teoria, sistematização e autonomia do Direito
Educacional. Trata-se, aqui, da possibilidade efetiva de reunir doutrinas, em corpos
mais ou menos homogêneos no contexto da ciência jurídica educacional.
Podemos citar alguns doutrinadores e estudiosos do Direito Educacional:
Renato Alberto Teodoro Di Dio, João Roberto Moreira Alves, Edivaldo Boaventura,
Pedro Sancho da Silva, Paulo Nathanael Pereira Souza, Horácio Wanderlei
Rodrigues, João Roberto Covac, Helder Martinez Dal Col, Elias Motta de Oliveira,
Carlos Alberto Bittar, Dâmares Ferreira, Aurélio Wander Bastos, Maria Regina
Muniz, Messias Costa, Célio Muller, Jorge Saboya, Rita de Cássia Borges de M.
Amaral, Murilo José Digiácomo, Carlos Alberto Lima de Almeida, Selma Aragão.
Essa nova tendência se introduziu no Direito Educacional com o advento da
Constituição de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Aliás, nesse
sentido, os princípios assumiram funções normativas específicas, reforçando-se os
princípios doutrinários educacionais (art. 206 CF e arts 2ª e 3ª LDB).
Todas as grandes conquistas da história do Direito, como a abolição
da escravatura e da escravidão, a livre aquisição da propriedade
territorial, a liberdade de profissão e de consciência, só puderam ser
alcançada através de séculos de lutas intensas e ininterruptas. O
caminho percorrido pelo Direito em busca de tais conquistas, (...)
sempre pelos Direitos subjetivos pisoteados, (...) violado o Direito
subjetivo, o titular defronta-se com uma indagação: deve defender
seu Direito, resistir ao agressor, em outras palavras, deve lutar, ou
deve abandonar o Direito para escapar à luta? A decisão a este
respeito só a ele pertence (Rudolf Von Ihering, 1891: 8-13-15).
O Direito à educação, como Direito subjetivo público, é um Direito social
fundamental (art. 6º c/c art. 205 CF), com três objetivos definidos na Constituição
Federal, diretamente relacionados com os fundamentos do Estado brasileiro (art. 1º
c/c art; 3º da CF): a) pleno desenvolvimento da pessoa; b) preparo da pessoa para o
exercício da cidadania; c) qualificação da pessoa para o trabalho.
Além disso, por um lado, o acesso ao ensino fundamental, obrigatório e
gratuito é um Direito subjetivo; por outro lado, é um dever jurídico do Estado oferecer
o referido ensino. Caso isso não ocorra, ou seja, o não-oferecimento ou sua oferta
214
irregular importa responsabilidade da autoridade competente (art. 208 § 2º da CF;
art. 5º § 4º da LDB; art. 54 § 1º e § 2º do ECA). Contudo, o Direito à educação, como
Direito subjetivo privado, apresenta características dos Direitos da personalidade
(art. 11 do Código Civil).
As instituições de ensino privadas ou/e públicas deparam-se com grandes
mudanças de concepções na área da educação, quer sejam legislativas ou da
própria sociedade, que estão provocando o aumento de conflitos nas relações
educacionais. Nesse contexto, surgem os instrumentos preventivos institucionais ou
extrajudiciais e instrumentos judiciais, que veremos a seguir. Para Joaquim Barbosa
Gomes (2001),
ações afirmativas podem ser definidas como um conjunto de políticas
públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário,
concebidas com vistas ao combate à discriminação racial de gênero e
de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da
discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a
concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens
fundamentais como a educação e o emprego (GOMES, 2001: 123).
O Direito Educacional pode ser considerado como conjunto formado de
normas dispositivas, prescritivas e imperativas, que dispõem sobre princípios e
conceitos; que prescrevem, assim, como orientar a conduta dos poderes públicos e
das pessoas físicas e jurídicas, dando-lhes diretivas coerentes para as relações
ensino-aprendizagem e que impõem deveres, obrigações e limites à liberdade.
Bastos (2000) define Direito Educacional como:
O conjunto das disposições constitucionais, a legislação
complementar, os decretos regulamentares e um amplo documentário
constituído de portarias, resoluções e pareceres de importância
especial após a criação do Ministério da Educação e dos Conselhos
de Educação (BASTOS, 2000: ix, x).
O Direito Educacional estuda, além disso, as origens e os fundamentos legais
do processo educativo, sua estrutura legislativa, seus propósitos pedagógicos,
programas e métodos de ensino e avaliação, bem como seus valores e princípios.
Estuda, ainda, os fundamentos sociais, políticos, éticos, culturais e filosóficos dos
currículos.
O estudo combinado dessas variantes jurídicas, educacionais, sociológicas,
políticas, filosóficas e culturais permite identificar, historicamente, as políticas de
proteção legal para a superação de problemas educacionais e as alternativas
215
paradigmáticas para se alcançarem mudanças nos padrões tradicionais no ensino,
especialmente no que se refere ao ensino jurídico.
O Direito Educacional que se traduz num conjunto de normas específicas da
área educacional, princípios, valores e doutrinas que regulam e disciplinam as
formas de instituição, organização, manutenção e desenvolvimento do processo
ensino/aprendizagem, bem como o desenvolvimento do ensino e dos currículos e as
condutas humanas relacionadas diretamente com os processos educativos, no seio
de proteção das famílias, das relações entre alunos, professores, escolas,
organizações governamentais, instituições públicas, e aquelas mantidas pela
iniciativa privada, disciplinando o comportamento relacionado à educação.
Na Constituição Federal, lei fundamental do Direito Educacional, encontra-se
a origem do Direito à educação e do dever para com a educação, onde estão
contemplados também os princípios norteadores da tarefa educacional.
As Constituições Estaduais alinham as regras basilares e orientadoras da
atividade educacional de cada Estado da Federação, seguindo sempre as
orientações da Lei Maior. As leis complementares traçam as diretrizes e bases da
educação nacional, propugnando a unidade na condução da atividade educacional.
As leis ordinárias dispõem sobre normas gerais e abstratas, disciplinando as
relações no âmbito educacional.
Os decretos, as portarias, os regulamentos explicitam a aplicação das
disposições gerais, aclarando o mandamento das leis e determinando sua fiel
execução. Ainda, há os pareceres, as resoluções, as deliberações e as indicações
do Conselho Nacional de Educação, da Secretaria de Ensino Superior do Ministério
da Educação, e dos Conselhos Estaduais de Educação onde se encontram
enunciadas as normas disciplinadoras e regulamentadoras da atividade educacional.
216
Considerações Finais
O objetivo do presente trabalho consistiu em buscar descrever as
características do ensino jurídico no tempo presente no Brasil, apresentando um
itinerário histórico do seu legado português, bem como de um percurso também
histórico sobre a teoria de currículo e finalizando com a indicação de algumas
possibilidades para alcançar a inovação por meio da interdisciplinaridade no ensino
da justiça e a mudança social.
Para tanto, o itinerário percorrido assentou-se especialmente na pesquisa
bibliográfica, com auxilio de documentos oficiais que contiveram as propostas
curriculares do Estado Brasileiro e Português para os cursos jurídicos nos diversos
momentos da história. Lembramos que o ensino jurídico brasileiro nasce do currículo
da Universidade de Coimbra que nos é emprestado até que a partir dele é
confeccionado o nosso tempos depois.
Busca-se então, combinar o saber jurídico com as demandas sociais atuais,
cujos conflitos necessitam novas formas de percepção e resolução. Cada vez mais
os conflitos transcendem os meros interesses individuais e ganham aspectos
coletivos, com o risco de fragmentação da sustentabilidade das relações sociais.
Defendo que a nova percepção do jurídico na sociedade do século XXI
somente será possível por meio da educação, tal como se orienta na Constituição
Federal de 1988, que a entende e define em sentido amplo, apontando no sentido
do caráter integral e totalizante da educação, diferente da mera instrução ou
formação para o trabalho.
Para construir um Direito Restaurador, um Direito Alternativo e considerando
o conceito de educação presente no Texto Constitucional, uma observação pode ser
feita no sentido de constatar que ao longo de sua história a proposta oficial para os
cursos jurídicos preocupou-se muito mais com o ensino e a instrução, com a
formação para o exercício da profissão, esquecendo-se do objetivo mais amplo da
educação.
Acredito que a Carta Constitucional vigente, bem como os demais
instrumentos normativos estudados, fornecem importantes parâmetros para que os
217
cursos jurídicos sejam pensados no sentido de promover uma educação jurídica a
serviço do equilíbrio das relações sociais.
Por isso, apóio a concepção contemporânea de universidade ligada à noção
de uma agência impulsionadora do desenvolvimento científico e tecnológico que se
projeta também nos objetivos de construção da democracia e de sociedades com
relações sustentáveis. Esse novo modelo de formação e atuação jurídico-política-
educacional reclama a adoção de uma práxis consciente dos seus
condicionamentos políticos dos futuros bacharéis, em constante tensão com a
formação tecnicista e despolitizada dos juristas.
É preciso considerar também que a nova atuação sociojurídica do jurista
contemporâneo, para institucionalizar-se organicamente, necessita de uma mudança
da mentalidade jurídica em relação aos usos do Direito. É muito grande a resistência
que ainda existe com relação aos novos modos de atuação do operador jurídico,
quer em função da visão conservadora de alguns, quer pelo natural receio de outros
– beneficiários das estruturas de poder vigentes.
A Constituição de 1988 reúne condições de provocar no profissional do Direito
uma atuação consciente de suas funções jurídicas, políticas e sociais, pelo
relacionamento interdisciplinar que estará forçado a fazer entre a estrutura normativa
do Direito que aplica e as estruturas sociopolíticas que estão na gênese dos conflitos
coletivos.
O novo perfil do profissional do Direito a ser construído pelo modelo de
formação esperado pela sociedade atual aliado às novas normas de orientação
jurídico-político-educacionais postas à sua disposição para reformulação do ensino
do Direito brasileiro para construção da mudança social.
Em confronto com a formação antiga, individualista e unidisciplinar dos
profissionais do Direito que geram um conjunto de contradições no modo de atuação
do jurista contemporâneo, tornando difíceis o cumprimento de suas graves funções
sociais, mas, ao mesmo tempo, fazendo desse jurista verdadeiro agente da
superação dos modelos normativo-positivistas de ensino e aplicação do Direito
liberal.
Esse quadro tensional que circunda a atividade político-jurídica do novo jurista
brasileiro é o próprio substrato político capaz de impulsionar a transformação do
218
profissional do Direito, qualificando-o como um operador jurídico e portador do
desafio de, por meio de uma práxis jurídica, romper com os paradigmas
normativistas e com o positivismo liberal, politicamente alienado, que ainda orientam,
hegemonicamente, a teoria e a prática da ciência jurídica no Brasil.
O desafio de ruptura com o modelo tradicional da ciência e da práxis do
Direito, reproduzido pelo ensino jurídico brasileiro, essencialmente normativista e
ainda com evidentes traços do modelo coimbrão, assume clara importância histórica
que vai além da mera ampliação dos limites e possibilidades de atuação dos
operadores jurídicos tradicionais.
Há uma missão de defesa legítima da ordem jurídica democrática pelos
bacharéis do Direito: a alternativa que resta aos integrantes das carreiras jurídicas
de atuar mais no sentido do aprofundamento da democracia no âmbito das classes
populares, lutando pela distribuição igualitária dos Direitos fundamentais da pessoa
humana (educação principalmente), do que atuar apenas na aplicação e fiscalização
formalista de uma legalidade que bloqueia a liberdade e a inclusão das massas
populares, limitando a justiça social em nome da lei.
Acredito que a chave dos currículos inovadores é a admissão da
interdisciplinaridade. Os currículos cujas disciplinas não forem integradas,
combinadas e repensadas estão metodologicamente inviabilizados para formar os
estudantes em termos de consciência do mundo, construção ética e competência
técnica.
Para o desenvolvimento das habilidades jurídicas é preciso que os estudantes
discutam os desafios éticos que esse mundo em veloz transformação possui. Só a
precedência dessa formação mais sólida poderá evitar que os formandos terminem
seus cursos com conhecimentos já ultrapassados e inadequados para o mundo do
trabalho e para a vida social, cultural e política.
Esse não é um problema novo e só do Direito. Precisa ser debatido com
diversas áreas do conhecimento apresentado por vários cursos universitários, como
as engenharias e os cursos de medicina, em que a tendência é desenvolver
processos pedagógicos que habilitem os estudantes a compreender e interferir
nessa vertiginosa mudança social e tecnolígica.
219
No tocante aos cursos jurídicos, a ideia é buscar reorientar a formação
jurídica em relação às necessidades e às habilidades essenciais atualmente, para as
mais variadas carreiras jurídicas. Sustento que será essencial o debate de um maior
número possível de interlocutores e representantes de todos os segmentos sociais
para qual o Direito se destina. E que esse debate não se restrinja à busca de
culpados dos fracassos escolares evidenciados nas avaliações.
Um aspecto muito importante para a definição de um curso jurídico é atentar
para as necessidades regionais de onde está instalado. Em verdade, todos os
cursos devem ser universais e locais, pertencendo ao planeta e ao local. O que se
vê é uma uniformidade mais determinada pelos currículos mínimos do Conselho
Nacional de Educação do que pelas demandas locais, tornando o curso alheio à vida
social local, o que não enseja a fixação de recursos humanos nem agrega em
termos de formação de capital social.
Não menos importante é a definição sobre as prioridades formativas. O que
se quer do curso? A formação de operadores públicos? O aprofundamento da
advocacia empresarial? A formação de pesquisadores de novos fenômenos
jurídicos? A ênfase no terceiro setor? Assim, várias outras perguntas poderão ser
feitas para estabelecer a identidade dos cursos jurídicos, que não pode ser uma
reunião desconexa sem objetivos de disciplinas.
Indico ser importante a adoção de matérias e disciplinas que estimulam a
autonomia do educando nos cursos jurídicos, fazendo-o sair da passividade para a
participatividade acadêmica e social. Outro ponto que merece destaque é a
formação humanística que se vê ameaçada com a redução das disciplinas básicas
dos currículos por influência da Declaração de Bolonha (1999) e das provas (OAB e
Enade) que não as exigem.
Outra característica dos cursos jurídicos tem sido a de manter uma acirrada
concorrência com outros cursos. Essa disputa mercantil dificulta qualquer
colaboração ou sinergia, aspecto que os torna mais fracos, principalmente “nestes
tempos” de capitalismo monopolista. Em direção oposta, as massas críticas de
diversos cursos podem ser partilhadas, possibilitando o surgimento de
especializações, mestrados e doutorados interinstitucionais, que serão frutos desse
aproveitamento complementar dos quadros qualificados dos diversos cursos e
220
poderão vir a ter o papel de aperfeiçoar os corpos docentes das instituições
envolvidas.
A pesquisa facilita a superação da visão individualista e contratualista
presente nas disciplinas ministradas, introduzindo o social, o contextual e o
metajurídico como componentes necessários ao trabalho dos operadores do Direito.
Por ser a pesquisa um processo de descoberta, que exige técnicas e elementos
metodológicos para dar consistência e plausibilidade ao que é descoberto, ela é um
elemento liberador da visão fechada e dogmática da técnica, que se lastreia mais na
internalidade da norma e na repetição de padrões, em evidente negação da riqueza
que a técnica pode trazer para o Direito.
Essa atividade pode ajudar os estudantes a se deparar com o mundo do dado
de modo direto, introduzindo outro olhar para além da pura contemplação dos textos
e comentários normativos. É preciso que os cursos jurídicos absorvam noções de há
muito trabalhadas em outras ciências, como o necessário tratamento interdisciplinar
dos temas jurídicos, podendo mesmo, em alguns casos, resvalar para o
transdisciplinar; a natureza complexa da juridicidade, que implica outras formas
metodológicas de seu tratamento.
Os cursos de extensão universitária integra a formação dos alunos com a
inserção das escolas nas localidades às quais pertencem, além de possibilitar o
diálogo com outras áreas. Como os cursos jurídicos são limitados no tempo e no
espaço, não podem acolher sem seus currículos todas as áreas de conhecimentos
ligados direta ou indiretamente ao Direito, surgindo a extensão como um instrumento
para orientar essa limitação. Assim, o novo tanto do ponto de vista do conteúdo
quanto da metodologia de ensino, o não desenvolvido pelo currículo regular, os
problemas e demandas sociais, as artes, a história das comunidades, as
experiências sociais exitosas, os questionamentos do conhecimento de ponta
deverão estar contemplados pela extensão.
As práticas de resolução de problemas, o teatro, os concertos, a música
popular, os debates sobre temas polêmicos, entre tantas outras atividades possíveis,
poderão ser veículos de sensibilização e abertura social e participativa dos
estudantes e mesmo dos professores, podendo despertar outras habilidades e
facetas da vida subjetiva de cada um dos envolvidos nessas práticas.
221
As atividades de extensão devem ser planejadas interdisciplinarmente, devem
seguir um plano pedagógico que leve em conta as funções de estimular as
habilidades de ser, de pensar e de relacionamento dos estudantes. Nesse
planejamento, devem ser procurados conteúdos e práticas que aumentem a
inserção dos estudantes e egressos na localidade, enriquecendo, desse modo, o
capital social local, de estímulo às condutas cidadãs tanto dos discentes quanto da
população, o que implica dizer que a extensão também é uma prática para todos os
cidadãos, que podem receber os influxos das escolas de Direito, tornando-se, por
essas atividades, um dos vetores de estimulação do desenvolvimento sustentável
local.
Por isso, o setor encarregado da Extensão nos cursos de Direito tem a
responsabilidade não somente de planejá-la, organizá-la e executá-la, mas também
de avaliá-la como evento e resultados discentes e sociais, por via de tutorias, que
dariam a continuidade do processo educativo para aqueles que se interessarem em
aprofundar os temas, ou criar incubadoras experimentais de projetos sociais e
jurídicos derivados dos estímulos criados pela extensão.
Seus professores e estudantes não podem viver intelectual e cientificamente
isolados, devendo ser estimulados a se relacionar com disciplinas semelhantes,
complementares ou necessárias para seu conhecimento, pertencentes a currículos
de outros cursos. Dentro da mesma chave, é necessária a celebração de convênios
com instituições nacionais e estrangeiras para oportunizar encontros, seminários,
intercâmbio de trabalhos científicos, livros e revistas, além das possibilidades de
bolsa de estudo.
Nesse cenário, as bibliotecas são fundamentais, devendo ser superado o
entendimento de que elas sejam uma pilha de conhecimento postos para dar a
impressão de que todas as áreas jurídicas estão atendidas. Ela deve ser inter, trans,
pluri e multidisciplinar, com obras consistentes. Atualmente, as bibliotecas clamam
por conexões informáticas, a fim de que, on-line, possibilitem o acesso de
estudantes e professores às mais recentes produções nas diversas áreas do
conhecimento. O que se propõe aqui é uma biblioteca real e virtual, uma biblioteca
participativa e interativa, que, aos poucos, vai se tornando um poderoso instrumento
pedagógico e de produção de conhecimento.
222
Uma escola de Direito contemporânea, além de fortalecer e participar do
local, deve estar referenciada aos fatos e conhecimentos do mundo. Isso significa
dizer que estudantes e professores não conseguem chegar às informações
necessárias às intervenções científicas e profissionais contemporâneas.
Defendemos que as escolas de Direito deveriam ter atelier de produção textual de
línguas, inclusive o português que tem que ser aprimorado sempre.
As novas diretrizes curriculares expressas na Resolução 9/2004 (BRASIL,
2004) são um passo de uma longa caminhada, pois trouxeram a possibilidade de
enriquecimento dos cursos jurídicos, assim como maior coerência e rigor. A
monografia de final de curso dá ao estudante a possibilidade de aferir sua
capacidade, seu critério de escolha temática e sua expressão escrita. O
desenvolvimento dessa atividade também será importante para os cursos, que
poderão publicar os melhores trabalhos e constituir um dos acervos para a criação
de uma revista, que sempre procurará resumir o que de melhor foi produzido nas
escolas.
Os cursos jurídicos necessitam levar para sua comunidade interna e para o
público em geral o resultado de suas pesquisas, trabalhos docentes e discentes,
além das notícias sobre suas atividades. Por isso devem lutar para criar caminhos
de comunicação interna e externa para chegar à sociedade. Sabemos que nossas
produções de alunos e professores têm que ser bem feitas só não sabemos o que
fazer para eles saírem das prateleiras da biblioteca e serem lidas.
Todos esses aspectos se iniciam no dia a dia das salas de aula, em que os
processos pedagógicos precisam ser constantemente revistos, com reuniões
periódicas e remuneradas, tendo como pano de fundo o acompanhamento
minuncioso do movimento institucional e social. As aulas são feitas de um jeito,
constituindo-se em comentários “regorgitados” das leis, repetindo o que já se
encontra nos manuais.
O caminho para a pós-graduação começa com cursos de Extensão e
Aperfeiçoamento, ministrados para alunos e comunidade e direcionados para temas
importantes para o local ou úteis para a formação complementar dos alunos. Após o
aprimoramento dos cursos de Especialização e do investimento na qualificação do
corpo docente, pode-se pensar em construir um Mestrado e Doutorado, que não
223
pode se confundir com a especialização, pois tem uma função de formar
pesquisadores e docentes. E é nesse momento que devemos pensar na formação
institucional docente. A instituição tem que auxiliar a construção do perfil docente
que ele almeja formar e manter.
Acredito que a gestão dos cursos jurídicos tem que ser profissional e
adequada às demandas sociais e às transformações do conhecimento. A solução
para esses problemas passa pela democratização da gestão, da qual os diversos
segmentos das escolas possam institucionalmente participar, pela integração
racional e pela articulação entre o administrativo e o educacional, a fim de que a
ânsia voraz pelos lucros não inviabilize a dimensão educacional, ou que sonhos
etéreos das vaidades comprometam a sanidade financeira das instituições.
Sabemos claramente quais são as instituições de excelência (USP, PUC,
Mackienzie e GV Direito são algumas delas) no ensino jurídico no Brasil, podemos
estudar cada uma para conhecer seu processo de seleção de alunos e professores,
a formação de alunos e professores e o segredo do sucesso. No entanto fica a
pergunta... Qual a responsabilidade dessas instituições com relação às piores
instituições de ensino?
Se os primeiros estudantes de Direito da história que se formaram em
Bolonha foram professores em Coimbra que por sua vez os estudantes de Coimbra
foram professores da Faculdade de Olinda e São Paulo no Brasil e construíram
nossa herança lusitana. Esse encadeamento também continua atualmente. Onde
atuam os primeiros estudantes em desempenho oriundos das melhores instituições
de ensino? Será que ter estudantes de Direito de segunda classe (sem autonomia e
sem bom domínio linguístico) não atinge a sustentabilidade das relações sociais?
Não queremos aqui propor uma pesquisa de egressos, desejo mostrar que há
um encadeamento entre alunos e professores que atuam em uma mesma
sociedade. Acredito que segregar alunos de mais de dois mil instituições de ensino
jurídico, seja pelo vestibular, pela OAB ou pelos concursos, não colabora em nada
para a melhoria do ensino jurídico, apenas identifica quem alcançou êxito nessas
provas.
O oferecimento de uma visão mais abrangente do Direito também poderia ser
construído a partir de outros elementos auxiliares, por exemplo, a música, o teatro, a
224
literatura, o cinema, a oficina de docência, as artes em geral que podem ser bem
trabalhados, conferindo ao estudante capacidade de observação, reflexão e senso
crítico, além de sensibilizar que o fenômeno jurídico não está presente apenas nos
códigos e livros de doutrina, mas principalmente naqueles fatos da vida cotidiana.
Constato muitos bacharéis gostam de lecionar seja para estudar, seja para
ganhar a vida enquanto não arranjam outro emprego, ou até por amor à docência.
Precisamos ligar de alguma maneira os estudantes das melhores instituições com os
estudantes das piores. Acredito que assim como temos os escritórios de
atendimento jurídico poderíamos ter cursos para a comunidade sobre temas
jurídicos, ministrados pelos alunos. Acredito que seria a melhor maneira de fazer da
aprendizagem significativa um processo de atuação social.
Se buscarmos uma cultura de conciliação, de mediação, de arbitragem e de
restauração nos mais diversos segmentos da sociedade, precisamos primeiramente
inserir essa cultura nos bancos acadêmicos.
Já no fim desse trabalho outra observação que merece ser feita é que
precisamos construir uma nova mentalidade, por meio da educação para que o
ensino jurídico possa servir a todas as áreas eficientemente, buscando a inovação e
a mudança sustentável das relações sociais.
A situação descrita no começo do trabalho por Casali e Cortella, em epígrafe,
explica bem tudo que foi objeto de minha ocupação e compromisso neste trabalho.
Acredito que o mundo do trabalho passa por um momento grave e chega a hora de
todos aqueles que pensam o ensino jurídico, deixarem de lado as rivalidades com
outras áreas do conhecimento e da sociedade, os velhos comportamentos passivos,
descompromissados com a realidade e inovem. Estudemos a história para saber de
onde viemos, cumpramos as orientações legais para saber onde estamos e
principalmente contribuamos para a melhoria das relações sociais, para que no
futuro possamos nos orgulhar mais da nossa história e das nossas leis.
225
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