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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA ELÉTRICA
APROVEITAMENTO DA BIOMASSA FLUTUANTE DO RIO
MADEIRA PARA GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA.
ATLAS AUGUSTO BACELLAR
TD 55/2010
UFPA/ITEC/PPGEE
Belém – Pará - Brasil
2010
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA ELÉTRICA
APROVEITAMENTO DA BIOMASSA FLUTUANTE DO RIO
MADEIRA PARA GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA.
ATLAS AUGUSTO BACELLAR
Orientadora:
Prof
a
Dr
a
Brígida Ramati Pereira da Rocha
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Elétrica do Centro Tecnológico
da Universidade Federal do Pará, como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do Grau de Doutor em
Engenharia Elétrica, área de Sistemas de Energia Elétrica.
UFPA/ITEC/PPGEE
Belém – Pará - Brasil
2010
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________________________________________________________________
B117b Bacellar, Atlas Augusto
Biomassa lenhosa do Rio Madeira : uma opção sustentável
para geração de energia elétrica em comunidades isoladas na
Amazônia / Atlas Augusto Bacellar; orientadora Brígida
Ramati Pereira da Rocha.-Belém, 2010.
Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Pará,
Instituto de Tecnologia, Programa de Pós-graduação em
Engenharia Elétrica, Belém, 2010.
1.Energia fontes alternativas - Rio Madeira (AM).
2.Biocombustíveis 3. Energia elétrica produção. I.
orientador. II. título.
CDD 22. ed. 33379098113
___________________________________________________________________
Ao que de mais importante
tenho na vida: Minha
Família
AGRADECIMENTOS
À Universidade Federal do Pará, por meio do Programa de Pós-Graduação de
Engenharia Elétrica, pela oportunidade e credibilidade.
À professora Brígida Ramati Pereira da Rocha, pela parceria harmoniosa,
confiança depositada e maneira paciente de tratativa, durante todo o tempo de
orientação, além das valiosas contribuições.
À Universidade Federal do Amazonas, representada pelos colegas do
Departamento de Geotecnia e Transportes da Faculdade de Tecnologia,
professores Heloísa Cardoso, Marly Honda, Edson Ferreira, Nilton Campelo,
Sérgio Cardoso, Elpídio Gomes e Consuelo Frota pelo apoio à política de
incentivo à formação de doutores, em especial aos professores Elpídio, Campelo
e Edson pela disposição de dados técnicos e científicos, orientações e suporte
acadêmico durante minhas ausências em sala de aula.
Ao professor e amigo Rubem Cesar Rodrigues Souza pelos incentivos, por
acreditar em minha pessoa, pelas incontáveis horas de orientações, pelas
críticas construtivas e ensinamentos.
Aos amigos professores e pesquisadores Sandro Bitar, Sheila Mota, Patrícia Sá,
Omar Seye e João Caldas pelas importantes ajudas no desenvolvimento do
trabalho, sobretudo durante a fase de publicação de artigo científico.
Ao colega engenheiro Sílvio Romano pela disponibilidade de valiosas
informações relativas às atividades de desobstrução do rio Madeira junto à
Administração das Hidrovias da Amazônia Ocidental – AHIMOC.
Ao colega engenheiro Jonas Almeida pelo apoio na busca de informações
relativas à tese.
Aos colegas do Centro de Desenvolvimento Energético Amazônico CDEAM,
da Universidade Federal do Amazonas, Fernando Souza e Márcia Sardinha,
pela ajuda nas atividades junto à UFAM, permitindo mais tempo de dedicação a
este trabalho.
À pesquisadora do CDEAM Cristiane Daliasse e ao bolsista Manoel Jeffreys pela
ajuda nos ensaios relativos às amostras de biomassa coletadas no rio Madeira.
Ao professor Francisco Tarcísio do Laboratório de Propriedades Físicas da
Madeira da UFAM pelos ensaios de identificação das amostras de biomassa
lenhosa coletadas no rio Madeira.
Aos amigos Francisco Cruz, Luis Carlos Ferreira e Raul Menezes pelo apoio
logístico durante trabalhos de campo no rio Madeira.
Ao amigo Willamy Frota pelo exemplo de perseverança e incentivo pessoal.
À minha esposa Marina pela tolerância, dedicação, paciência e companheirismo.
Aos meus filhos Andréa, Felipi e Atlas Neto, e ao meu neto Lucas, pela
tolerância e compreensão com as minhas ausências.
Às minhas irmãs Ghislaine, Aldiva e Adília pelos incentivos e credibilidade.
À minha mãe, Waldiva, pela formação que me foi dada, pelas palavras sempre
otimistas e de esperança, por acreditar no sucesso do trabalho e por entender
as muitas horas ausentes do convívio com a família.
Ao meu pai Atlas (in memoriam), que sempre esteve presente em minha vida,
mesmo distante, orientando o melhor caminho.
Por fim, à Deus, por ter-me dado a oportunidade de chegar ao estágio de vida
em que estou e poder contribuir de algum modo com a sociedade em que
vivemos.
RESUMO
A universalização do fornecimento de energia elétrica é uma meta
ainda distante de ser alcançada na Amazônia brasileira, em face dos obstáculos
geográficos, da dispersão de seus habitantes, da indefinição de tecnologias
adequadas, além dos aspectos econômicos, em que pese ações
governamentais, traduzidas no Programa Luz para Todos - PLpT, criado em
2003, cuja meta é atender a totalidade dos consumidores rurais até 2010, e a
determinação da Agência Nacional de Energia Elétrica –ANEEL, responsável no
Brasil pela regulação do setor elétrico, da obrigatoriedade da universalização até
2015. Este trabalho descreve pesquisa realizada no rio Madeira, na Amazônia
brasileira, em que a geração de energia elétrica para atendimento de
comunidades e pequenas cidades ao longo do rio, contribuindo para a
universalização, pode ser viabilizada usando como fonte renovável inédita a
biomassa lenhosa depositada no fundo do rio, decorrente de processos naturais,
cuja retirada faz parte da rotina do Ministério dos Transportes, por obrigação
legal, para viabilizar segurança na navegação. Como etapa inicial foram
realizadas revisões bibliográficas para dar suporte à fundamentação teórica
acerca de sistema elétrico brasileiro, universalização de acesso à energia
elétrica, fontes renováveis na Amazônia, tecnologias para geração de
eletricidade usando biomassa como fonte, subsídios no setor elétrico do Brasil, o
rio Madeira, suas características e importância, além de ferramentas de análise
de investimento. Em seguida, foram coletadas informações junto à AHIMOC,
órgão responsável pela hidrovia do Madeira, quanto aos dados quantitativos e
qualitativos da retirada de biomassa lenhosa do leito desse rio, bem como
trabalhos de coleta in locu de amostras dessa biomassa para posterior análise
de suas características físico-químicas em laboratório da UFAM. De posse
dessas informações procedeu-se a avaliação de potencial de geração de
energia elétrica da biomassa, assim como de rotas tecnológicas para tal. Os
resultados obtidos das biomassas coletadas serviram como balizadores para
confirmação de valores constantes na literatura e foram usados posteriormente
na avaliação de potencial de geração de energia elétrica com identificação de
rotas tecnológicas para tal. Etapa posterior contemplou a obtenção junto à
concessionária de identificação e caracterização de potenciais mercados
consumidores localizados na calha do Rio Madeira. Uma vez caracterizada a
biomassa disponível, as possíveis rotas tecnológicas e os potenciais mercados
consumidores, foram avaliados os aspectos tecnológicos, econômicos,
ambientais, sociais e legais envolvidos. O estudo conclui pela competitividade do
sistema de gaseificação, podendo contribuir para a universalização do acesso a
eletricidade, cuja viabilização depende de adoção de política pública neste
sentido, a partir de ações entre os Ministérios dos Transportes, de Minas e
Energia e do Meio Ambiente. Conclui, também, pelo potencial de atração de
capital privado, o que contribuiria para a redução de gastos públicos. Trabalhos
futuros quanto à replicabilidade do estudo em áreas com fenômeno semelhante,
bem como de oportunidades de uso de outras biomassas apresentam-se
viáveis.
Palavras-chave: Biomassa; energia renovável; Amazônia;
ABSTRACT
The universal provision of electricity remains far from achieved in the
Brazilian Amazon, given the geographical obstacles, the dispersion of its
inhabitants, the indistinctness of appropriate technologies, and the economic
obstacles. Governmental action was taken in 2003 with the creation of the Light
for All Program (PLpT), with the goal of bringing electricity to all rural consumers
by 2010. In addition, the National Electric Power Agency, ANEEL (Agência
Nacional de Energia Elétrica), which is responsible in Brazil for the electrical
sector regulation, has issued a determination of compulsory access to electricity
by 2015. This study describes research conducted on the Madeira River, in the
Brazilian Amazon, where the electric needs of the communities and small towns
along the river can be satisfied through the gasification system, using as a
renewable feedstock the wood-fuel biomass deposited on the riverbed, derived
from natural processes, which the Ministry of Transport is already legally
obligated to remove in order to provide safe navigation along the river. The first
part of the study was dedicated to review Brazilian power system, Universal
access to electricity in Brazil, renewable sources of energy in the Amazon region,
technologies to produce electricity using biomass as source, Brazilian power
sector subsidies, the Madeira River, its characteristics and economic importance
and investment analysis tools. Next, quality and quantity information of the
biomass collected from the river along the years was taken from AHIMOC, the
Federal Organization responsible for the Madeira River navigability. Then a
physical-chemical analysis was made at the UFAM’s laboratories, using biomass
collected in a field trip. The biomass power potential and the technological power
production routes using biomass were evaluated with these data after comparing
the results with available literature. Subsequently information about householders
and communities located at the Madeira River was obtained with the State Utility.
Once the available biomass, the technology routes and the possible consumers
were characterized, the study evaluated technology, economy, environment,
social and legal aspects. The study results show the competitiveness of
gasification comparing to diesel thermoelectric plants, along with its advantages
in helping Brazilian universal electrification program, which implementation
depends on public policies with the obligatory participation of the Ministry of
Mines and Energy, Ministry of Transports and The Ministry of Environment, and
also the attractiveness potential private capital participation which could
contribute to reduce public investment. The results should help future studies in
others areas with similar phenomena and the opportunity to use another types of
local biomass in Gasifier systems.
Keywords: biomass, renewable energy, Amazon Region.
i
SUMÁRIO
Lista de Figura Iv
Lista de Tabelas Vi
Lista de Nomenclaturas Vii
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO
1.1 Contextualização 1
1.2 Justificativa 3
1.3 Objetivos 7
1.3.1 Objetivo geral 7
1.3.2 Objetivos específicos 7
1.4 Procedimento Metodológico 8
1.5 Delimitação do Estudo 10
1.6 Estrutura do trabalho 10
CAPÍTULO 2 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Introdução 13
2.2 Sustentabilidade; 13
2.3 Sistemas Isolados; 18
2.4 Universalização dos Serviços Públicos de Energia Elétrica no Brasil; 20
2.5 Subsídios no Sistema Elétrico Brasileiro; 31
2.6 Fontes Renováveis na Amazônia; 33
2.7 Conversão de biomassa em energia 36
2.8 Ferramentas de Análise de Investimento. 43
CAPÍTULO 3 - TECNOLOGIAS DISPONÍVEIS PARA USO DE BIOMASSA NA
PRODUÇÃO DE ELETRICIDADE
3.1 Introdução 46
3.2 Ciclo a vapor 46
3.3 Gaseificação 49
ii
3.3.1 Breve Histórico 49
3.3.2 Tipos de gaseificadores 50
3.3.2.1 Gaseificador com leito em movimento contracorrente 51
3.3.2.2 Gaseificador com leito em movimento concorrente 52
3.3.2.3 Gaseificador com leito em movimento de fluxo cruzado 53
3.3.2.4 Gaseificador com leito em movimento fluidizado 54
3.4 Sistemas para produção de energia a partir da biomassa 56
3.4.1 Motores de combustão interna 57
3.4.1.1 Motor ciclo Otto 58
3.4.1.2 Motor ciclo Diesel 60
3.4.1.3 Outros ciclos 62
3.4.2 Motor de combustão externa 63
3.4.3 Turbinas a gás 64
3.4.4 Micro-turbinas a gás 67
3.4.5 Células a combustível (FC) 69
CAPÍTULO 4 - APROVEITAMENTO ENERGÉTICO DA BIOMASSA
LENHOSA DO RIO MADEIRA
4.1 O rio Madeira 72
4.1.1 Introdução 72
4.1.2 Informações gerais 73
4.1.3 Regime hídrico 76
4.1.4 Clima 78
4.1.5 Geologia 78
4.1.6 Descarga sólida 79
4.1.7 Dificuldades na navegação 80
4.1.8 Importância econômica 85
4.2 A biomassa lenhosa disponível no rio Madeira 86
4.3 Potenciais consumidores de energia elétrica 90
4.4 Potencial de geração usando biomassa lenhosa do rio Madeira 92
iii
CAPÍTULO 5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS 96
5.1 Introdução 96
5.2 Conclusões 101
5.3 Sugestões para trabalhos futuros 102
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 103
LISTA DE ENDEREÇOS CONSULTADOS NA INTERNET 107
iv
LISTA DE FIGURAS
Figura 1.1
Operação de retirada de troncos flutuantes no rio Madeira
6
Figura 2.1
Sistema elétrico brasileiro
18
Figura 2.2
Percentual de pessoas em domicílio com energia elétrica por
município em 2000.
24
Figura 2.3
Metas do Luz no Campo por estado
28
Figura 2.4
Potencial eólico da região norte
35
Figura 2.5
Esquema de uso da biomassa para fins energéticos
36
Figura 2.6
Reação de transesterificação de um triacilglicerídeo
39
Figura 3.1
Esquema de um gaseificador de leito em movimento
contracorrente
51
Figura 3.2
Esquema de um gaseificador de leito em movimento concorrente
53
Figura 3.3
Esquema de um gaseificador de leito em movimento de fluxo
cruzado
54
Figura 3.4
Esquema de um gaseificador de leito fluidizado
55
Figura 3.5
Veículo movido à gás pobre usado durante a Segunda Guerra.
57
Figura 3.6
Partes componentes de um motor ciclo Otto com 1 cilindro
59
Figura 3.7
Fases do motor ciclo Diesel
61
Figura 3.8
Esquema simplificado de uma turbina a gás
65
Figura 3.9
Esquema de uma micro-turbina a gás
68
Figura 3.10
Esquema de uma célula a combustível
70
Figura 4.1
Localização do rio Madeira
72
Figura 4.2
Confluência dos rios Beni e Mamoré, formando o rio Madeira
73
Figura 4.3
Hidrograma do rio Madeira em Porto Velho e próximo à foz em
Vista Alegre
77
Figura 4.4
Afloramento de ilhas de areia durante a vazante do rio Madeira
81
Figura 4.5
Pedral no rio Madeira
82
Figura 4.6
Vista do rio Madeira com sua notável quantidade de troncos
flutuantes
82
Figura 4.7
“Paliteiros”no rio Madeira
83
Figura 4.8
Um dos Locais de descarte da operação de retirada de paliteiros
89
v
LISTA DE TABELAS
Tabela 2.1
Prazo máximo para a universalização no município
23
Tabela 2.2
Índice de atendimento dos estados do norte do Brasil
25
Tabela 2.3
Prazo máximo para a universalização para as concessionárias
25
Tabela 2.4
Situação dos equipamentos do Prodeem amostrados pelo TCU em
2001.
27
Tabela 2.5
Ligações efetivadas pelo Luz no Campo por região
29
Tabela 2.6
Cronologia das ligações previstas pelo PLpT
30
Tabela 2.7
Características do biodiesel para as rotas metílica e etílica
40
Tabela 3.1
Empreendimentos com ciclos a vapor, usando biomassa
47/48
Tabela 4.1
Locais identificados, posicionamentos e dificuldades à navegação no
rio Madeira
83/84
Tabela 4.2
Volumes de biomassa lenhosa retirada dos paliteiros do rio Madeira
87
Tabela 4.3
Número de acidentes no rio Madeira provocados por colisão com
objeto submerso
89
Tabela 4.4
Comunidades próximas aos locais de retirada de paliteiros ocorridas
90/91
Tabela 4.5
Potencial de geração de energia elétrica e do número de unidades
consumidoras a serem atendidas utilizando a biomassa retirada de
paliteiros do rio Madeira.
94/95
Tabela 5.1
Custos de geração com sistema de gaseificação e termelétrica a diesel
99
Tabela 5.2
Pay back, VLP e TIR, considerando o fluxo de caixa incremental,
considerando-se as opções de geração a diesel e gaseificação.
100
vi
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ANA – Agência Nacional de Águas
ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica
BEN – Balanço Energético Nacional
BIG – Banco de Informações de Geração (da Aneel)
CCC – Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis
CDE – Conta de Desenvolvimento Energético
Ceam – Companhia Energética do Amazonas
CGH – central geradora hidrelétrica
Cresesb – Centro de Referência em Energia Solar e Eólica Sérgio de Salvo Brito
DNAEE – Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica
Eletrobrás – Centrais Elétricas Brasileiras S.A.
GEE – gases de efeito estufa
Hz - Hertz
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IEA – International Energy Agency (da OECD)
km - quilômetro
kVA – Quilovolt ampere
kW – quilowatt
kWe – quilowatt de energia elétrica
MJ/Nm
3
– Megajoules por normal metro cúbico
MME – Ministério de Minas e Energia
MT – Ministério dos Transportes
MPa – mega pascal
MW – mega watt
MWe – mega watt elétrico
m
3
/s – metros cúbicos por segundo
m/s – metros por segundo
PCH – pequena central hidrelétrica
Prodeem – Programa de Desenvolvimento Energético de Estados e Municípios
Proinfa – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica
RGR – Reserva Global de Reversão
RPM – rotações por minuto
SIN – Sistema [elétrico] Interligado Nacional
TCU – Tribunal de Contas da União
UFAM – Universidade Federal do Amazonas
UFPa – Universidade Federal do Pará
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UHE – usina hidrelétrica
Unicamp – Universidade Estadual de Campinas
USP – Universidade de São Paulo
UTE – usina termelétrica
VR – Valor de Referência
Wp – watt pico
o
C – graus Celsius
1
Capítulo 1
INTRODUÇÃO
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO
O modelo de desenvolvimento econômico que tem experimentado a
humanidade ao longo dos séculos trouxe como desafio o abastecimento energético
em bases sustentáveis. A superação ou não desse desafio implicará em profundas
mudanças no progresso da humanidade.
O desafio se reveste de uma enorme complexidade por conta da
necessidade premente de viabilizar a geração de energia de maneira sustentável,
reduzindo os impactos ambientais que os combustíveis fósseis - principal fonte
energética usada ao longo das últimas décadas - têm causado. Dentre esses
impactos ambientais, o aumento do efeito estufa provocado pelas emissões de
diversos gases, com conseqüentes alterações climáticas, destaca-se como principal
preocupação do homem neste início de século XXI.
Neste sentido, segundo a UNEP (2007), mantendo-se os níveis atuais de
emissão de CO
2
, o Planeta sofrerá, ainda neste culo, acréscimos da ordem de
0,2
o
C por década na temperatura média, o que poderá provocar catástrofes
inimagináveis. Neste cenário, existe a possibilidade de ocorrer na Amazônia um
fenômeno denominado “savanização”.
Em outras palavras, a floresta tropical deverá desaparecer, dando lugar a
uma savana. Se isto de fato vir a ocorrer, certamente trará como conseqüências a
extinção de um sem número de espécies animais e o comprometimento do clima da
Terra e da sobrevivência da espécie humana.
Assim sendo, é de vital importância a busca por fontes energéticas que
substituam as atuais visando a redução da emissão de gases responsáveis pelo
efeito estufa, sobretudo o CO
2
, haja vista ser este o gás emitido em maior
quantidade.
No cenário mundial, o Brasil destaca-se no que concerne a busca por
fontes renováveis de energia graças ao sucesso alcançado pelo Programa Brasileiro
do Álcool, iniciado em 1975 em resposta à primeira crise mundial de petróleo, que
2
contempla a produção de álcool etílico como combustível líquido a partir da cana de
açúcar.
Em que pese o destaque internacional em fontes renováveis, o Brasil
apresenta um número considerável de habitantes excluídos do acesso à energia
elétrica, destacando-se os sistemas elétricos isolados
1
do norte do Brasil, onde o
suprimento é assegurado em grande parte por unidades geradoras que fazem uso
de combustíveis fósseis derivados do petróleo. Nessa região, os consumidores não
atendidos procuram assegurar o suprimento de energia elétrica por meio de
pequenos grupos geradores a diesel.
Goldemberg apud Coelho (2005), afirma que em torno de 1000 pequenas
usinas termelétricas, principalmente a diesel, abastecem pequenas cidades e
comunidades isoladas na Amazônia. Aproximadamente 700 dessas unidades têm
capacidade instalada inferior a 500 kW, geralmente velhas e ineficientes, com altos
índices de emissões de poluentes e custos elevados.
Para Coelho (2005), o uso de energia renovável, principalmente
biocombustíveis, em área rural está intrinsecamente ligado à redução da pobreza.
Ademais, o acesso a energia elétrica possibilita disponibilidade de água potável,
redução de tempo de mulheres e crianças em atividades de sobrevivência (colhendo
lenha, carregando água e cozinhando), maior tempo dedicado à educação, redução
de poluição doméstica e derrubada de árvores.
Ainda segunda a autora, mais de dois bilhões de pessoas no mundo não
tem acesso à eletrificação, afetando de forma intensa as chances de
desenvolvimento econômico e qualidade de vida.
Segundo Silva et al (2001), apesar do custo de geração com fontes
renováveis serem mais elevados do que os sistemas tradicionais, os custos evitados
de transportes de combustíveis tornam muitos desses sistemas competitivos. Ainda
segundo Silva et al (2001), a maior parte desses consumidores estão localizados na
chamada Amazônia Legal.
Neste contexto, a região amazônica possui como alternativa para geração
de energia elétrica de forma renovável a utilização da biomassa existente em
abundância, destacando-se os processos de aproveitamento usando ciclos a vapor
e gaseificadores.
3
1.2 Justificativa
Propiciar desenvolvimento sustentável é uma das mais desafiadoras
metas da humanidade, em face das perspectivas que se apresentam, sobretudo,
como destacado anteriormente, no que diz respeito às alterações climáticas do
Planeta, onde existe uma quase unânime conclusão de que os níveis atuais de
emissão de gases de efeito estufa não podem ser mantidos, sob pena de
comprometimento da sobrevivência da espécie humana.
Isso significa uma alteração considerável no processo de
desenvolvimento experimentado pelo homem nas últimas décadas, baseado em alto
consumo de bens que demandam o uso de combustíveis líquidos, energia elétrica
ou energia calorífica, provenientes principalmente de fontes fósseis, intensamente
poluentes, prejudicando a qualidade de vida das espécies.
Na prática urge a necessidade de mudança de paradigma energético e
tecnológico, incorporando a coexistência de variadas fontes alternativas de energia
(FERNANDES, SANCHES, ANGULO, 2002).
Essa mudança ganha mais evidência quando se verifica os impactos
econômicos provocados pelos preços praticados na comercialização do principal
produto ssil, o petróleo, que alcançou recentemente valores superiores a $100 o
barril, bem acima dos níveis previstos em cenários feitos pela International Energy
Agency - IEA, em 2007, onde supunha a estabilidade dessa oferta para algo em
torno de $35,00/barril.
Diante desse cenário, as energias alternativas ganharam maior
importância e interesse, potencializando a possibilidade de implementação do
chamado desenvolvimento sustentável, compromisso assumido pela maioria dos
Países, nos mais diversos fóruns realizados nos últimos anos, dentre eles a Eco-92,
no Rio de Janeiro, Rio + 5, Rio + 10 e o protocolo de Quioto.
Estima-se que em todo o planeta exista um contingente de 2 bilhões de
pessoas que não tem acesso a energia elétrica (DE GOUVELLO, MAIGNE, 2003). A
maioria dessas pessoas habita países sub-desenvolvidos ou em desenvolvimento.
No Brasil as estimativas oficiais do governo, externadas na Portaria n
o
38,
de 09 de março de 2004, do Ministério de Minas e Energia, giravam em torno de 2,5
4
milhões de residências sem energia elétrica, onde cerca de 2 milhões encontram-se
no meio rural.
Segundo o Censo 2000, 503.319 domicílios não estavam conectados à
rede elétrica na região norte. Ressalta-se que 90% de todas as famílias brasileiras
sem acesso a rede elétrica possuía renda mensal inferior a dois salários mínimos.
Neste contexto, o Governo Federal criou vários programas ao longo dos
últimos anos visando à minimização da problemática do déficit energético. Podem-se
citar como exemplos: Programa Luz no Campo, cujo objetivo era levar energia
elétrica, a partir de extensão de redes, para 930 mil domicílios, beneficiando cerca
de 4,4 milhões de pessoas; Programa de Desenvolvimento Energético de Estados e
Municípios - PRODEEM, criado em 1994 com objetivo de suprir basicamente com
sistemas fotovoltaicos comunidades rurais de baixa renda, localizadas distantes da
rede elétrica convencional; Programa de Incentivo a Fontes Renováveis - PROINFA,
que se aplica ao Sistema Interligado; Programa Luz para Todos - PLpT, em
substituição ao Programa Luz no Campo, cujo objetivo era universalizar o serviço de
fornecimento de energia elétrica no meio rural brasileiro até 2008, prorrogado para o
final de 2010. Em princípio o Programa Luz para Todos buscou o atendimento de
consumidores que pudessem ser atendidos com extensão de rede.
A meta estabelecida pelo PLpT, quando de sua instituição por meio do
Decreto 4873/03 de 11 de novembro de 2003, era eletrificar 2 milhões de unidades
consumidoras, prioritariamente no meio rural, tomando como referência o número de
residências sem acesso à energia elétrica no Brasil, com base no censo 2000 do
IBGE. Esta meta deverá ser cumprida em termos numéricos. Entretanto, a
universalização não será alcançada, haja vista dois fatores principais: o primeiro diz
respeito à meta em si, em valores numéricos, em face do procedimento
metodológico do censo que não alcança o meio rural por completo, portanto
deixando de levar em conta um sem número de habitantes dessa área desprovidos
de eletricidade; o segundo por conta de diferença naturais esperadas entre as
estatísticas apresentadas no ano de 2000 e as atuais, em 2010, uma década depois,
visto que um crescimento populacional normal da sociedade como um todo,
mormente o meio rural que apresenta índices maiores que a área urbana.
Naturalmente outros fatores que se apresentam como barreiras para o
cumprimento da universalização, sobretudo nas comunidades da Amazônia, que
5
certamente estão longe do atingimento dessa meta. Vale ressaltar que o PLpT
praticamente usou até o momento extensões de rede para atender as unidades
consumidoras. Isto significa que os maiores desafios não foram enfrentados, ou seja,
as situações em que esta opção não é viável, por aspectos econômicos ou técnicos,
como acontece na Amazônia. Para a grande maioria das pequenas comunidades da
região o Programa Luz para Todos está longe, muito longe, e certamente não os
alcançará até o prazo de sua existência estabelecido em Lei.
Isso posto, existe a convicção de que a manutenção da meta de
universalização do acesso à energia elétrica na Amazônia irá além de 2010.
Ademais, a solução para tal não será uma única via tecnológica, e sim um mix de
soluções, buscando-se aproveitar ao máximo as oportunidades de uso de fontes
locais, sem esquecer os aspectos sociais e ambientais. Desta forma, a biomassa se
apresenta como uma opção com grande potencial de uso.
A busca de soluções futuras para a problemática da universalização na
Amazônia nos remete a refletir sobre experiências passadas de outros programas
governamentais, como foi a experiência de insucesso da fase I do PRODEEM,
citado anteriormente, onde 50% dos sistemas instalados em alguns estados não
estavam mais operando 3 a 4 anos depois, seja por problemas de ordem técnica ou
econômica, no qual gerou um considerável passivo ambiental de painéis
fotovoltaicos e baterias, induz à refletir sobre esses modelos e concluir que não se
pode pensar na geração de energia de forma isolada e sim associada a programas
sociais de geração de renda, buscando a sustentabilidade de uma forma genérica
(ROCHA, 2005).
Além da problemática da oferta de energia elétrica o Poder Público se
depara com a necessidade de criar condições de logística de transportes na região
no intuito de suprir o abastecimento e permitir a exportação. Dentre os modais
disponíveis a opção hidroviária se apresenta como a mais promissora, por se tratar
do meio de transporte que se confunde com a cultura popular. Os rios da Amazônia
fazem parte da vida quotidiana das comunidades ali estabelecidas há décadas.
Neste contexto, a Hidrovia do Madeira exerce papel fundamental. Dados
do Grupo Maggi apontam um tráfego de mais de 1.900.000 toneladas de grãos pelo
porto da cidade de Itacoatiara, no estado do Amazonas.
6
Para viabilizar a navegação no rio Madeira ao longo do ano, é necessária
a adoção de algumas intervenções por parte do órgão governamental responsável
por essas atividades, a Administração das Hidrovias da Amazônia Ocidental
AHIMOC, ligada ao Ministério dos Transportes.
Uma dessas intervenções diz respeito à desobstrução do canal de
navegação, retirando as árvores ali se depositam, oriundas de arrasto das suas
margens e de seus tributários pelo movimento de subida e descida dos níveis de
água que acontece todos os anos, natural dos rios da Amazônia. A presença dessas
árvores é responsável por uma indesejável estatística de acidentes com
embarcações no Rio Madeira, sobretudo em razão do acúmulo nos trechos em curva
do rio. Praticamente todos os anos centenas árvores são retiradas do canal principal
desse importante rio pela AHIMOC, cujo procedimento de retirada é mostrado na
figura 1.1.
Figura 1.1 – Operação de retirada de troncos flutuantes no rio Madeira Fonte:
AHIMOC, 2006.
Em que pese essas operações de retirada, a AHIMOC se depara com
problemas para destinação final desse material e tem, ao longo dos últimos anos,
depositado na própria margem do rio.
Diante dessa realidade, este trabalho contém resultados da pesquisa de
uso dessa biomassa lenhosa com a finalidade de geração descentralizada de
energia elétrica em comunidades isoladas ao longo da calha do rio Madeira,
demonstrando ter essa opção viabilidade técnica, econômica e ambiental, de forma
sustentável.
7
1.3 Objetivos geral e específicos
1.3.1 Objetivo geral
Proposição de aproveitamento energético da biomassa lenhosa do rio
Madeira, consequência dos movimentos naturais desse manancial de água, para
suprimento elétrico de Comunidades Isoladas, por meio de sistemas
descentralizados.
1.3.2 Objetivos específicos
Abordar as especificidades do sistema interligado nacional e
sistemas isolados do sistema elétrico brasileiro;
Descrever os programas nacionais que visavam à
universalização do acesso aos serviços de energia elétrica;
Descrever tecnologias de transformação de biomassa em
energia elétrica;
Avaliar o potencial energético da biomassa lenhosa, oriunda de
operações de retirada do canal principal, disponível na calha do
Rio Madeira;
Identificar os potenciais mercados consumidores de energia
elétrica na calha do Rio Madeira;
Propor estratégias para aproveitamento energético da biomassa
disponível na hidrovia do Rio Madeira;
Identificar barreiras e oportunidades sob a ótica sócio-ambiental,
econômica, política e tecnológica referente às estratégias
propostas;
Fazer estudo comparativo das diferentes estratégias sob a ótica
técnica-econômica e sócio-ambiental.
8
1.4 Procedimentos metodológicos
A tese foi desenvolvida tendo como etapa inicial a pesquisa bibliográfica
buscando dar suporte à construção de uma fundamentação teórica abordando os
seguintes temas: sistema elétrico brasileiro, com ênfase nas características
inerentes às comunidades isoladas na Amazônia; programas governamentais
desenvolvidos ao longo dos anos, visando a universalização dos serviços de acesso
à energia elétrica, suas características e resultados alcançados; subsídios existentes
no sistema elétrico brasileiro, descrevendo suas peculiaridades e evoluções ao longo
do tempo; fontes renováveis na Amazônia, com abordagem sucinta do potencial da
região para geração de energia elétrica a partir dessas fontes; tecnologias
disponíveis para geração de energia elétrica usando biomassa como fonte,
observando as mais adequadas para atendimento ao nível de geração previsto; o rio
Madeira, suas características hidromorfológicas e geomorfológicas, sua importância
para o transporte regional e organização responsável por sua gestão enquanto
hidrovia; ferramentas de análise de investimentos, para dar suporte a um processo
decisório na escolha do tipo de geração a ser adotado.
Esta etapa de revisão bibliográfica foi efetivada usando-se todos os meios
possíveis e disponíveis, tais como livros, revistas, anais de congressos e periódicos,
tanto em nível nacional como internacional, além da rede mundial de computadores,
restritos aos sítios com credibilidade, sobretudo os de órgão oficias de Governo e
Instituições oficiais, além de organizações de credibilidade reconhecida nacional e
internacionalmente. A revisão se deu de forma intensa e de caráter permanente ao
longo do trabalho para garantir o ineditismo ao final do mesmo.
Após a revisão bibliográfica foram obtidas informações, para dar
continuidade à pesquisa, junto ao órgão governamental responsável pela hidrovia do
rio Madeira, no caso em questão a Administração das Hidrovias da Amazônia
Ocidental AHIMOC, para conhecimento das dificuldades encontradas quanto à
navegabilidade da hidrovia, e das ações obrigatórias, de cunho legal, que visassem
à viabilidade de uso ininterrupto da hidrovia ao longo do ano, além das empresas
parceiras contratadas para esse fim.
Durante esta fase foram focadas informações específicas quanto às
operações de retirada de árvores do canal principal do rio Madeira, denominada de
9
“retirada de paliteiros”, no que concerne à época em que foram realizadas, seus
volumes e locais de realização, assim como a destinação final desse material.
Também nesta etapa foram identificadas as comunidades próximas aos locais de
retirada.
Etapa posterior constou de viagem a campo para identificação de algumas
localidades onde a retirada de biomassa havia sido realizada, especificamente as
mais representativas, com a coleta de amostras de biomassa lenhosa para sua
caracterização em laboratório. A viagem foi iniciada na cidade de Manaus até a
cidade de Porto Velho, de onde se seguiu rio abaixo, passando pelas localidades de
Mutum, Capitari e Curicaca, onde a expedição foi encerrada, retornando-se à cidade
de Porto Velho e posteriormente a Manaus.
Amostras de biomassa lenhosa disponíveis nessas localidades foram
coletadas, a partir de árvores que se encontravam no canal principal, quase que
totalmente submersas, formando o denominado “paliteiro”.
De posse das amostras, as mesmas foram enviadas para laboratórios da
Universidade Federal do Amazonas, onde foram identificadas, com a obtenção de
dados necessários para suas análises, visando aproveitamento na geração de
energia elétrica.
Os resultados obtidos das biomassas coletadas serviram como
balizadores para confirmação de valores constantes na literatura, usados
posteriormente na avaliação de potencial de geração de energia elétrica da
biomassa lenhosa do rio Madeira com identificação de rotas tecnológicas para tal.
Etapa posterior contemplou a identificação e caracterização de potenciais
mercados consumidores localizados na calha do Rio Madeira. Informações foram
obtidas junto às concessionárias de energia elétrica.
Uma vez caracterizada a biomassa disponível, as possíveis rotas
tecnológicas, os potenciais mercados consumidores, foram avaliados os aspectos
ambientais envolvidos, quando, então, desenvolveu-se proposta de estratégias para
aproveitamento energético, ocasião em que foram identificadas barreiras e
oportunidades, no que tange aos aspectos cnicos, econômico, político, social e
ambiental.
10
1.5 Delimitação do trabalho
O trabalho foi desenvolvido a partir de dados obtidos entre os anos de
2000 a 2005 em região específica da Amazônia, mais precisamente o rio Madeira,
usando a biomassa lenhosa disponível nessa hidrovia. Como anteriormente exposto,
a disponibilidade dessa fonte energética é resultado da ação do Estado, que tem a
obrigação de manter a navegabilidade dessa importante via fluvial, cujo papel na
economia regional é crucial. Determinando, desta forma, o limite geográfico da
pesquisa.
1.6 Estrutura do trabalho
Para melhor entendimento do trabalho foi adotada sua organização em 5
capítulos que, muito embora guardem relação entre si, podem ser lidas e
compreendidas de forma independente, sem prejuízo do entendimento global.
A primeira parte, que corresponde a esta em que se encontra o leitor,
chamada de capítulo 1, dedicada a aspectos que visam o conhecimento do contexto
da tese, bem como dos objetivos, procedimentos metodológicos usados e a sua
estruturação.
As três partes seguintes foram denominadas de capítulos 2, 3, 4 e 5. O
capítulo 2 trata da fundamentação teórica, onde é abordada revisão bibliográfica dos
seguintes tópicos:
Sustentabilidade - com um breve histórico do uso do termo
desenvolvimento sustentável, os conceitos mais aceitos sobre o
tema, a complexidade de seu atendimento a importância de sua
busca no contexto atual da humanidade;
Sistema Elétrico Brasileiro sua divisão, compreendendo o
sistema interligado nacional e o sistema isolado, com ênfase na
Amazônia;
Universalização dos Serviços Públicos de Energia Elétrica no
Brasil – onde é relatado o processo histórico de tomada de
decisão para a implementação desse tema como política pública
no Brasil, os principais programas adotados em nível federal,
11
seus resultados, Programa Luz para Todos e as perspectivas
desse processo em comunidades isoladas na Amazônia;
Subsídios no Sistema Elétrico Brasileiro mostrando o
arcabouço legal que deu origem a Conta de Consumo de
Combustível CCC, suas alterações ao longo do tempo e
situação atual;
Fontes renováveis na Amazônia englobando as fontes
possíveis de serem usadas na região, mais especificamente
hídrica, eólica, solar e biomassa, analisando de forma
condensada seus potenciais regionais;
Conversão de biomassa em energia ocasião em que os
processos físico-químicos, biológicos e termo-químicos são
descritos;
Ferramentas de análise de investimento são descritos os
métodos denominados payback, valor líquido presente e a taxa
interna de retorno, ditos todos determinísticos da engenharia
econômica para avaliar riscos e incertezas de determinado
investimento.
O capítulo 3 é dedicado a discussão de tecnologias disponíveis para uso
de biomassa visando à geração de energia, dentre as quais o ciclo a vapor e a
gaseificação, com ênfase nos tipos de gaseificadores, além de sistemas para
produção de energia elétrica a partir da biomassa.
O aproveitamento energético da biomassa lenhosa do rio Madeira é
discutido no capítulo 4, descrevendo-se basicamente quatro aspectos:
O rio Madeira - abordando informações gerais a respeito de sua
formação, regime hídrico, clima, geologia, descarga sólida,
dificuldades na navegação e importância econômica;
A biomassa lenhosa disponível sua origem, disponibilidade,
volumes retirados nos últimos anos e localização;
Os potenciais consumidores no rio Madeira as comunidades e
sedes municipais ao longo do rio, nas proximidades dos locais
de retirada da biomassa;
12
O potencial de geração de energia elétrica onde é avaliado o
potencial usando a biomassa lenhosa disponível, a partir dos
resultados das análises das amostras, obtidos em laboratório, e
os dados disponíveis em literatura sobre madeiras da Amazônia.
A etapa final é denominada de capítulo 5 constando de considerações
finais, momento em que são definidas as estratégias mais adequadas para
aproveitamento da biomassa lenhosa do rio Madeira para geração de energia
elétrica, a partir dos resultados obtidos no capítulo 4, além de potenciais para futuros
trabalhos.
13
Capítulo 2
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 INTRODUÇÃO
Este capítulo 2 trata de temas da fundamentação teórica, por meio de
revisão bibliográfica de sustentabilidade, sistema elétrico brasileiro, universalização
dos serviços públicos de energia elétrica no Brasil, subsídios no sistema elétrico
brasileiro, fontes renováveis na Amazônia, conversão de biomassa em energia e
ferramentas de análise de investimento.
2.2 SUSTENTABILIDADE
O século XX foi marcado pelas dúvidas suscitadas pela raça humana
quanto à sua relação com o meio ambiente. Durante os anos finais desse século um
impressionante aumento da preocupação com a consequência à natureza das
atividades antrópicas aconteceu na Europa e nos Estados Unidos. Sucessivos
acidentes que vitimaram um considerável número de seres humanos contribuíram
para essa conscientização, dentre eles: o desastre de derramamento de mercúrio na
Baía de Minamata, no Japão, entre 1932 e 1968, pela companhia química Chisso,
responsável pelo nascimento de mais de 3000 pessoas com deformações; o
vazamento de gases tóxicos em Bhopal, na Índia, proveniente das indústrias de
pesticidas da Union Caribe, em dezembro de 1984, matando mais de 27 mil
pessoas; vazamento radioativo da Usina Nuclear de Chernobyl, na Ucrânia, em abril
de 1986, totalizou mais de 5 milhões de vítimas, segundo OMS, 2006;
derramamento de cerca de 41 milhões de litros de petróleo, em março de 1989, em
uma área de vida selvagem no Alaska, provocando o aparecimento do que
denominou de mar negro naquela região, com consequências danosas à natureza,
propagando-se até os dias de hoje.
A denominação do termo desenvolvimento sustentável inicia quando o
modelo de desenvolvimento adotado pelas nações do mundo, baseado
predominantemente em crescimento, começa a ser questionado em debates
14
internacionais. Segundo Bellen, 2007, o primeiro impacto relacionado a essa
questão foi suscitado pelo chamado Clube de Roma, formado por pessoas ilustres
do mundo inteiro, em seu relatório de 1972, denominado Meadows, que preconizava
crescimento zero. Esse relatório utilizou modelos, desenvolvidos pelo
Massachussets Institut of Technology MIT, e chegou a conclusão que o Planeta
Terra não suportaria mais o crescimento populacional devido à pressão sobre os
recursos naturais e energéticos e o aumento da poluição, mesmo considerando o
avanço das tecnologias.
No mesmo ano da publicação do relatório do Clube de Roma, em 1972,
aconteceu a conferência de Estocolmo sobre o meio ambiente humano, promovida
pelas Organizações das Nações Unidas - ONU. Naquela ocasião foi ressaltado que
a maioria dos problemas ambientais tinha dimensões globais, não respeitando
limites geográficos, além de aceleração exponencial. Além disso, a principal
preocupação estava ligada ao crescimento populacional e ao processo tecnológico
na industrialização.
Em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, foi realizada uma nova conferência
da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento. Surge então, por parte da maioria
dos países do mundo, em seus discursos oficiais, a admissibilidade de
relacionamento entre processo de desenvolvimento e as transformações do meio
ambiente. Nessa conferência foi produzido um documento onde se conceituou
desenvolvimento sustentável intitulado Agenda 21, um plano composto por 40
capítulos.
O conceito de desenvolvimento sustentável é resultado de um longo
processo histórico de reavaliação entre a sociedade civil e seu meio natural
(BELLEN, 2007). Existe uma série considerável de diversas abordagens sobre esse
conceito. Apesar disso o se tem uma definição exata. O mais conhecido conceito
é o que estabelece como sendo o desenvolvimento que atende às necessidades das
gerações presentes sem comprometer as gerações futuras, oriunda do Relatório
Brundtland (WECD, 1987). Nele dois conceitos principais estão contidos: a
necessidade, sobretudo à dos países subdesenvolvidos, e a limitação,
intrinsecamente ligada ao estado da tecnologia e à organização social.
Os cinco pilares do desenvolvimento sustentável segundo Sachs (2004),
apud Rosa (2007), são:
15
Social: essencial por razões intrínsecas e instrumentais, diante
da possibilidade de disrupção social que ameaça muitos locais
problemáticos do planeta;
Ambiental: com duas dimensões os sistemas de sustentação
da vida como provedores de recursos e como recipientes, para a
disposição de resíduos;
Territorial: no que diz respeito à distribuição espacial dos
recursos, das populações e das atividades;
Econômico: com a viabilidade econômica como condição sine
qua non para que as coisas se realizem; e
Político: com a governança democrática como valor fundador e
instrumento necessário para fazer com que as coisas se
realizem, sendo a liberdade democrática parte das demandas
centrais do desenvolvimento sustentável.
Segundo esse relatório, a indústria deveria produzir mais com menos
recursos, adotando tecnologias limpas e difundindo o conhecimento destas
tecnologias.
De acordo com Maimon (1996), citado por Casagrande (2003), as
variáveis do desenvolvimento sustentável são econômica, ambiental e social.
A variável econômica busca estratégias que visem a sustentabilidade do
sistema econômico e produtivo, mantendo sua produtividade mesmo exposta a
perturbações e choques.
A variável Ambiental é composta de recursos naturais de um ecossistema
que depende de um equilíbrio entre ritmos de extração, que assegurem um mínimo
de renovabilidade.
A variável social cria condições socioeconômicas para o atendimento das
necessidades básicas, melhoria do nível de instrução e minimização da exclusão
social e do sistema produtivo.
Casagrande (2003), cita que o desenvolvimento sustentável pode ser
subdividido em quatro dimensões: econômica; social; ambiental; e cultural. Suas
fronteiras não possuem delimitações perfeitas. São interrelacionadas intimamente,
16
formando áreas comuns. É o caso da dimensão cultural, que apresenta traços da
dimensão social, econômica e ambiental juntas.
A dimensão econômica é a que incorpora a maior parte dos interesses das
organizações empresariais e produtivas. Os avanços nessa dimensão visando
resultados econômicos positivos, gerando mais lucro e maximizando a riqueza, são
consideráveis, tanto no meio empresarial quanto acadêmico.
A análise da sustentabilidade econômica identifica em primeiro plano a
liquidez, ou seja, a capacidade da organização de gerar seus recursos financeiros
para saldar seus compromissos de forma continuada, além da rentabilidade, que é a
capacidade de remunerar de forma satisfatória seus acionistas.
Alcançar essa sustentabilidade depende de vários atores, dentre eles os
clientes que estão cada vez mais exigentes quanto à qualidade e ao preço, exigindo
responsabilidades sociais e ambientais. Ressalta-se que essas responsabilidades
nem sempre fazem parte do leque de obrigações da empresa e sim do governo.
A dimensão social está focada nas desigualdades das condições de
sobrevivência humana, que coloca em risco a sustentabilidade do sistema social,
consequência de concentração de riqueza, colocando em risco, também, a
sustentabilidade da empresa. Essa dimensão está evidenciada em índices de
criminalidade, na insegurança e na pobreza.
As organizações, via de regra, consideram cumpridas suas obrigações
sociais quando melhoram diretamente as condições de seus trabalhadores e
indiretamente de seus dependentes, além do pagamento de tributos, imputando a
responsabilidade dessa dimensão social aos órgãos governamentais.
Entretanto essa visão tem sofrido alterações para um compartilhamento de
responsabilidades entre todos, empresa, governo e sociedade em geral. Isso se
torna latente ao observar a preocupação coletiva das nações em reduzir a pobreza,
o analfabetismo, as doenças e os sem-teto.
A dimensão ambiental desenvolveu-se ao longo das últimas três décadas,
em decorrência da consciência ecológica. As organizações passaram de uma
situação reativa, ou seja, de poluir para depois despoluir, para uma preocupação por
uma ação mais proativa com a qualidade do meio ambiente físico, ainda que
focadas nos objetivos econômicos. Deste modo, a sustentabilidade econômica
passa a ter uma relação mais direta com a sustentabilidade ambiental.
17
Entretanto surge um questionamento fundamental quanto à consolidação
da sustentabilidade econômica com a ambiental, uma vez que culturalmente custos
adicionais podem ser agregados para o atingimento de novos padrões de qualidade
na produção e comercialização. Esses novos padrões referem-se, dentre outros, a
maior eficiência no uso de insumos, incluindo eletricidade, introdução de tecnologias
mais limpas e responsabilidade com o pós-uso. Demais custos estão relacionados à
preservação do ecossistema onde a organização está inserida.
A dimensão cultural está relacionada com princípios e valores que possam
criar um clima organizacional saudável, satisfazendo os anseios dos atores internos
e externos da organização. A criação e divulgação da cultura organizacional, de
princípios e valores de prevenção de riscos ambientais, saúde ocupacional, controle
da saúde e prevenção de acidentes são exemplos de ações visando à
sustentabilidade cultural.
No entanto a práxis dessas ações encontra barreiras vinculadas à
dificuldade de incorporação por parte dos indivíduos que compõem as organizações,
haja vista as resistências às mudanças inerentes ao ser humano, além da diferença
entre a cultura da organização e aquela vivenciada pela comunidade onde a mesma
se insere.
Segundo Casagrande (2003), é importante salientar que a sociedade
contemporânea tem sua organização fortemente embasada em racionalidades
econômicas, consequência do modelo capitalista implantado, onde a lógica do
crescimento econômico e a acumulação de riquezas é o que vale, tendo como
resultado uma maior valoração aos aspectos econômicos do que aos ambientais e
sociais. As organizações buscam freneticamente maior produtividade, mais
eficiência e melhor qualidade, visando ao atendimento às leis de mercado que,
muitas vezes, não focam os ideais do desenvolvimento sustentável.
O entendimento de que é possível proteger e conservar o meio ambiente,
distribuir riquezas e gerar melhores condições de vida sem efetiva geração de
recursos econômicos não é perceptível pelas pessoas em geral. As organizações
crêem na impossibilidade de gastar ou distribuir sem antes gerar riquezas.
A mudança desses paradigmas requer a existência de políticas públicas,
visando a conciliação entre as forças de mercado, a sociedade em geral e a filosofia
do desenvolvimento sustentável.
18
Apesar das barreiras encontradas para a implementação de modelos de
desenvolvimento sustentável, pelas razões anteriormente expostas, além das
dificuldades de harmonia entre as dimensões da sustentabilidade, a busca por esses
modelos deve ser perseguida, haja vista seus benefícios à natureza, tanto por seu
valor econômico quanto como base de sustentação da vida no planeta Terra, assim
como aos valores da sociedade, tais como qualidade de vida, educação, saúde,
cultura, visão de mercado, desenvolvimento comunitário e direitos humanos.
2.3 SISTEMAS ISOLADOS
O sistema elétrico brasileiro está basicamente dividido em dois grandes
blocos, chamados Sistema Interligado Nacional SIN e Sistema Isolado, que podem
ser visualizados na figura 2.1.
Figura 2.1 – Sistema elétrico brasileiro Fonte:Adaptado de ANEEL (2008).
O sistema interligado, observado na figura 2.1 como a própria
denominação induz, corresponde a um sistema composto por diversas unidades
geradoras, onde predomina a geração hídrica, conectadas por extensas linhas de
transmissão responsáveis por levar eletricidade aos centros consumidores. Desse
19
sistema fazem parte as regiões sul, sudeste, nordeste, centro-oeste e parte da
região norte.
O denominado sistema isolado está restrito praticamente à região norte, e,
segundo a ANEEL (2008), corresponde a 45% do território brasileiro, 3% da
população, 3% do consumo nacional e 4% do parque gerador.
Esse sistema não pode ser visto como passivo de um mesmo tratamento,
no que tange ao atendimento de eletrificação, como se comportasse como um único
mercado. A região amazônica, em se tratando de sistema isolado, apresenta
características específicas quanto ao seu mercado de energia elétrica. Segundo
Souza (2003), o sistema isolado correspondente à região amazônica pode ser
dividido em três mercados distintos. O primeiro deles, denominado pelo autor como
mercado das capitais, corresponde ao atendimento das capitais dos estados, com
características de suprimento a partir de geração hidráulica e térmica. O segundo
mercado compõe-se por pequenas localidades e pela área urbana dos municípios
do interior dos estados da região, que recebeu a denominação de mercado
concentrado, normalmente atendido por geração térmica a diesel, de pequeno e
médio porte. O terceiro mercado, chamado de disperso, corresponde àqueles que
não têm acesso à energia elétrica ou dispõem apenas de pequenos grupos
geradores a diesel que, em sua grande maioria, funciona de forma precária, durante
poucas horas por dia.
Ainda segundo Souza (2003), apesar dos dois primeiros mercados
possuírem, em quase toda a sua totalidade, agentes responsáveis pelos serviços, o
fornecimento de energia elétrica acontece com baixa qualidade e grandes
desperdícios, além de possuírem em quase sua totalidade geração termelétrica
usando combustíveis de origem fóssil.
O mercado das capitais está hoje restrito às cidades de Manaus, Maca
e Boa Vista. Até bem recentemente, mais precisamente até 23 de outubro de 2009,
as cidades de Porto Velho, capital do estado de Rondônia, e Rio Branco, capital do
estado do Acre, passaram a fazer parte do SIN, com a operacionalização da linha de
transmissão em 230 kV ligando Jauru, no Mato Grosso a Vilhena, em Rondônia,
deixando assim de fazer parte do sistema isolado. Está prevista para o ano de 2012
a interligação de Manaus e Macapá ao SIN via linha de transmissão ligando essas
cidades a Hidrelétrica de Tucuruí. Há, ainda, projeto de ligação de Boa Vista a
20
Manaus por intermédio de uma linha de 530 kV, o que deixará todas as capitais
brasileiras integradas ao SIN.
Dentre os mercados abordados por Souza (2003), o disperso é
considerado como o mais desafiador, em face de inúmeros aspectos que o
diferencia dos demais, dentre os quais a enorme carência de educação, saúde,
transporte e capacitação para a produção.
Salienta-se que esse mercado é composto por grupos com características
totalmente distintas, como comunidades indígenas, áreas de reforma agrária,
populações tradicionais (seringueiros, ribeirinhos, extrativistas, etc), populações
tradicionais em reservas extrativistas, ecológicas e de desenvolvimento sustentável,
e demais populações que não se enquadram nesses grupos, cujas tratativas devem
ser específicas.
O maior desafio para suprir as comunidades isoladas na Amazônia de
suas necessidades de energia elétrica é a definição de um modelo que considere as
questões sócio-econômicas e ambientais, a logística, o uso produtivo da energia, a
organização da produção local, a gestão e o consumo.
2.4 A UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ENERGIA ELÉTRICA
NO BRASIL
Universalizar, no que concerne ao setor elétrico, significa generalizar o
serviço de energia elétrica independentemente da classe do consumidor ou mesmo
sua localização. Este direito surgiu no Brasil a partir da Constituição de 1988 em seu
art. 175, inciso IV, porém necessitava de Lei complementar para sua
operacionalização, o que ocorreu em 7 de julho de 1995 por meio da Lei n
o
9.074
que em seu art. 3
o
, inciso IV, estabeleceu a obrigatoriedade de atendimento
abrangente ao mercado, sem a exclusão das populações de baixa renda e das
áreas de baixa densidade demográfica, inclusive as rurais.
Até o início da década de 90, quando da re-estruturação do setor elétrico,
onde o Estado passa do papel de empreendedor para regulador, o termo
universalização não era discutido de forma abrangente. Somente no ano de 2000,
embora restrita ao acesso físico, passou a ser citada nos regulamentos do setor
elétrico, mais especificamente em propositura de regulamentação feita pela Agência
Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), onde houve entendimento de que a tarifa
21
compreenderia toda a prestação de serviço, inclusive a necessidade de obras para
conexão ao consumidor (FUGIMOTO, 2005).
Segundo Fugimoto (2005), a regulamentação dos serviços de eletricidade
no Brasil tem seu início em 26 de fevereiro de 1957, por meio do Decreto n
o
41.019,
que estabelecia a obrigatoriedade e responsabilidade da concessionária no que
concerne ao suprimento de energia elétrica a uma região, cuja abrangência era
configurada em plantas organizadas em comum acordo com as Prefeituras
Municipais e aprovadas pelo órgão federal responsável à época, o Conselho
Nacional de Águas e Energia - CNAE. O crescimento das concentrações
populacionais impunha revisões a essas regiões, porém as extensões em baixa
tensão possuíam limites de custeio pela concessionária de até três vezes a receita
anual estimada do novo consumo, deixando ainda ao consumidor a possibilidade de
contribuir com seus próprios recursos, além de permitir a execução das extensões
por entes privados com posterior cessão às empresas concessionárias.
As distribuidoras eram responsáveis pela implementação das linhas de
transmissão, subtransmisssão, distribuição em tensão primária, ou seja, igual ou
superior a 2,3 kV, incluindo as subestações, para atendimento da região delimitada
pelo Poder Concedente. As áreas de expansão, isto é, fora da região previamente
definida, assim como os consumidores de média e alta tensão, possuíam seus
limites de custeio em três vezes e meia a receita anual estimada dessa expansão.
As áreas rurais não eram de responsabilidade da distribuidora.
Somente em 12 de março de 1979, após mais de vinte anos, a legislação
sofreu alteração, com o Decreto 83.269, onde os limites de investimentos
passaram para à responsabilidade do Departamento Nacional de Águas e Energia
Elétrica - DNAEE, sucessor do CNAE, em ato do Ministério de Minas e Energia
MME. Essa norma previa que investimentos não poderiam acarretar aumento nas
tarifas dos consumidores, além de considerar de responsabilidade da distribuidora o
acréscimo de fases em redes existentes, reforço ou acréscimo de novo circuito em
tensão inferior a 34,5 kV (com exceção da eletrificação rural), reforma em redes
existentes e atendimento aos níveis de continuidade e qualidade. No entanto,
responsabilizava o consumidor quanto à extensões de linhas exclusivas, melhoria
em qualidade e continuidade superior ao estabelecido em regulamentação e
melhoria de aspectos estéticos.
22
Em 26 de outubro de 1989 o Decreto 98.335 alterou novamente o
Decreto 41.019/57, diminuindo a responsabilidade total da concessionária quanto
ao atendimento de novas cargas, ficando como responsabilidade financeira do
consumidor a extensão de linha exclusiva ou de reserva, melhorias de aspectos
estéticos ou de qualidade e continuidade além do que estabeleciam as Normas
vigentes. O DNAEE passou a ser o responsável pela definição dos limites de
investimentos, de modo que não acarretasse acréscimos ao custo total do serviço
superior ao acréscimo de receita. O consumidor teria seu atendimento condicionado
ao pagamento da contribuição financeira, podendo aportar a totalidade dos recursos,
com direito a restituição da parcela de responsabilidade da concessionária.
É interessante observar que apesar do dispositivo constitucional de 1988
estabelecer suporte ao direito de acesso aos serviços de energia elétrica a todos os
brasileiros, o Decreto nº 98.335 de 1989 não criava obrigações neste sentido para as
concessionárias ou permissionárias de distribuição de energia elétrica, tampouco
desonerava os consumidores não atendidos, caso pleiteassem esse serviço. Àquela
altura havia uma lacuna de uma Lei que regulamentasse o dispositivo constitucional,
que só ocorreu em 1995, por intermédio da Lei n
o
9.074, como anteriormente citado.
Em 26 de dezembro de 1996 foi criada a Agência Nacional de Energia
Elétrica ANEEL, nascida com a finalidade de regular a produção, transmissão e
comercialização de energia elétrica diante de um novo modelo de mercado do setor
que se abria para a participação do capital privado. O modelo vigente até então
apresentava inadimplência e ineficiência operacional das concessionárias públicas,
utilização das tarifas como controle inflacionário e incapacidade do Estado de
investir na expansão do setor.
Em 2000, com base em estudo jurídico que estabeleceu mecanismos que
pudessem implementar efetivamente o processo de universalização, a ANEEL
elaborou uma minuta de resolução contemplando metas para tal atingimento para as
distribuidoras. Em síntese, a proposta eliminava a participação financeira do
consumidor em obras de extensão e reforço de rede. Nas áreas urbanas as ligações
seriam realizadas sem nenhum ônus a partir da emissão da Norma. Já para as áreas
rurais, as distribuidoras seriam obrigadas a apresentar um “Plano de Universalização
do Atendimento Rural”, prevendo o atendimento de todo o mercado rural em cinco
anos, à razão de 20 % por ano.
23
Em 26 de abril de 2002, o Governo Federal criou a Conta de
Desenvolvimento Energético - CDE, por meio da Lei N
o
10.438, em seu art. 13, que
tinha como um de seus objetivos promover a universalização do serviço de energia
elétrica em todo o território nacional. Os recursos o provenientes dos pagamentos
anuais realizados a título de uso de bem público, das multas aplicadas pela ANEEL
a concessionários, permissionários e autorizados, e das quotas anuais pagas por
todos os agentes que comercializam energia com o consumidor final. Os recursos
provenientes do pagamento pelo uso de bem público e das multas impostas aos
agentes do setor serão aplicados, prioritariamente, no desenvolvimento da
universalização do serviço público de energia elétrica. A duração prevista para a
CDE foi de 25 anos. As metas de universalização do uso de energia elétrica para
cada concessionária e permissionária, bem como a fiscalização do cumprimento,
ficou sob responsabilidade da ANEEL.
Em 2003, em face do que dispunha a Lei N
o
10.438, a ANEEL estabeleceu
metas para universalização do setor elétrico, por meio da Resolução 223, de 29 de
abril de 2003. Nessa resolução a ANEEL estabeleceu prazos para atendimento da
universalização em cada município, função do Índice de Atendimento (I
a
), definido
como sendo a razão entre o número de domicílios com iluminação elétrica e o total
de domicílios, ambos obtidos a partir do Censo 2000 da Fundação Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística - IBGE. A tabela 2.1 mostra esses prazos.
Tabela 2.1 – Prazo máximo para a universalização no município Fonte: ANEEL (2003).
Índice de Atendimento do Município
(I
a
)
Prazo Máximo para Universalização
no Município
I
a
> 96% 2004
90% < I
a
< 96% 2006
83% < I
a
< 90% 2008
75% < I
a
< 83% 2010
65% < I
a
< 75% 2012
53% < I
a
< 65% 2014
I
a
53% 2015
24
Observando-se a tabela 2.1 e confrontando-se com a figura 2.2, que
corresponde ao mapa da exclusão de energia elétrica de 2000, onde é mostrado o
percentual de pessoas em domicílio com energia elétrica por município, segundo
MME (2005) apud Rodrigues (2006), verifica-se que o prazo máximo para
universalização, estabelecido pela ANEEL, da maioria dos municípios da Amazônia
estaria entre 2012 e 2014.
Figura 2.2 - Percentual de pessoas em domicílio com energia elétrica por município em 2000
Fonte: MME (2005) apud Rodrigues (2006).
Silva (2005), indica que o índice de atendimento da região norte em 2002,
apresentado na tabela 2.2, alcançava uma média de 70%, calculado a partir dos
índices de cada estado da região, também apresentados, corroborando para as
expectativas de universalização para após o ano de 2012. Entretanto, como se trata
de um índice médio, onde estão incluídos os mercados das capitais e das sedes dos
municípios, cujos índices de atendimento são certamente maiores, significa que a
maior parte dos municípios desses estados possuía valores abaixo dessa média,
implicando nos prazos máximos citados anteriormente.
25
Tabela 2.2 - Índice de atendimento dos estados do norte do Brasil Fonte: Silva (2005).
A Resolução 223 da ANEEL ainda dispõe sobre as metas a serem
alcançadas pelas concessionárias em função do Índice de Atendimento, mostradas
na tabela 2.3.
Tabela 2.3 – Prazo máximo para a universalização para as concessionárias
Fonte: ANEEL (2003).
Índice de Atendimento (I
a
) Prazo Máximo para Universalização
I
a
> 99,5% 2006
98% < I
a
< 99,5% 2008
96% < I
a
< 98% 2010
80% < I
a
< 96% 2013
I
a
80% 2015
Para Rodrigues (2006), o desafio da universalização dos serviços de
energia elétrica no Brasil tem as mesmas proporções de dificuldades do
enfrentamento das desigualdades sociais e regionais.
Segundo MME (2004), o Brasil possuía 80% dos excluídos ao acesso da
energia elétrica vivendo na área rural, cuja população correspondia a 20% do total
do país. No entanto, essa população tende a ser em maior porcentagem, haja vista
que as estatísticas oficiais seguem critério legal datado de 1938, assimilando
Índice de atendimento em
2002 (%)
BRASIL 91
REGIÃO NORTE
70
Rondônia 64
Acre 69
Amazonas 72
Roraima 70
Pará 70
Amapá 88
Tocantins 72
26
somente sede administrativa e cidade. Além disso, a eletrificação rural se caracteriza
por baixa atratividade para as concessionárias (RODRIGUES, 2006).
Por conta da concentração na área rural de consumidores não atendidos
em eletrificação é que surgiram as cooperativas de eletrificação rural que, em
conjunto com a participação financeira de estados e municípios, buscavam atender a
essa população, reduzindo as desigualdades, destacando-se os implementados em
São Paulo e Minas Gerais no final da década de 50, início da década de 60.
Os primeiros programas em escala nacional surgiram no início da década
de 70 com o auxílio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA)
e do Ministério da Agricultura. O Grupo Executivo de Eletrificação Rural (GEER) e o
Fundo de Eletrificação Rural (FUER) implantaram o I e o II Programas de
Eletrificação Rural (PNER), com empréstimos do Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) e recursos da União. Entretanto, a distribuição por região das
propriedades eletrificadas pelo GEER foi muito desigual. A Região Sul ficou com
56,3%, a Região Nordeste com 25,5%, a Região Sudeste com 10,5% e a Centro-
Oeste com 7,7% das propriedades eletrificadas (FUGIMOTO, 2005).
Nos anos seguintes surgiram o Programa de Desenvolvimento Energético
de Estados e Municípios Prodeem (1994), o Programa Nacional de Eletrificação
Rural Luz no Campo (1999-2002) e o Programa Luz para Todos (2002-2010),
abordados a seguir.
Instituído por Decreto Presidencial em 27 de dezembro de 1994, o
Programa de Desenvolvimento Energético de Estados e Municípios Prodeem
direcionava-se ao atendimento das populações rurais dispersas não supridas por
energia elétrica pela rede convencional. Três eram os objetivos principais desse
programa: viabilizar a instalação de pequenos sistemas elétricos, baseados em
fontes energéticas descentralizadas; utilizar as fontes renováveis em
complementação ao uso de fontes energéticas convencionais; e capacitar recursos
humanos no intuito de promover o desenvolvimento das tecnologias e da indústria
nacional.
O Prodeem fazia parte de um programa plurianual do Governo Federal
chamado Programa Avança Brasil. Em 2001 foi selecionado como alternativa
estratégica, constituindo-se um dos 15 programas do Projeto Alvorada, com
acompanhamento especial do Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão
MPOG, com isenção de contingenciamento de orçamento.
27
Segundo Silva (2005), o Prodeem, na prática não cumpriu com seus
objetivos, pois fez uso apenas de sistemas fotovoltaicos, com a maior parte dos
componentes importados, criando problemas para a formação de estoques e de
peças de reposição, resultando na descontinuidade do atendimento de inúmeras
comunidades, criando um passivo ambiental considerável, em nada contribuindo
para o desenvolvimento tecnológico e da indústria nacional.
Ainda segundo Silva (2005), as instalações de sistemas fotovoltaicos
foram executadas apenas em escolas, postos de saúde e poços artesianos, sem o
controle adequado, negligenciando as demandas residenciais, irregularidades estas
constatadas pelo Tribunal de Contas da União em auditoria realizada em 2002.
Fugimoto (2005), também relata as irregularidades do Prodeem
constatadas pelo TCU, onde dos sistemas energéticos inspecionados somente
23,4% estavam instalados. A tabela 2.4 apresenta a situação dos equipamentos
amostrados pelo TCU em 2001.
Tabela 2.4 – Situação dos equipamentos do Prodeem amostrados pelo TCU em 2001.
Fonte: Fugimoto (2005).
Situação dos
equipamentos
Quantidade Percentual
Instalados e funcionando 241 23,4%
Instalados e não
funcionando
135 13,1%
Estocados 138 13,4%
Inexistentes 470 45,7%
Em outras condições 45 4,4%
Rodrigues (2006) descreve que o Prodeem foi reestruturado e
incorporado, pelo Programa Luz para Todos, com a denominação de Plano de
Revitalização e Capacitação do PRODEEM - PRC-PRODEEM, cuja proposição é a
eletrificação de diversas escolas com o intuito de beneficiar 200 mil alunos da rede
pública, treinar cerca de 400 técnicos, capacitar 14 mil agentes comunitários, além
de recuperar 1.000 poços de água no Nordeste e 7 mil sistemas fotovoltaicos que
apresentaram defeitos durante a primeira fase do programa. Ainda segundo a
28
autora, o conceito do programa mudou de ação de infraestrutura para se tornar de
inclusão social e desenvolvimento.
O Programa Nacional de Eletrificação Rural Luz no Campo foi criado pelo
Decreto Presidencial, de 2 de dezembro de 1999, com o objetivo de eletrificar um
milhão de propriedades rurais até 2002. Sua meta era atingir 100% da eletrificação
rural em oito estados brasileiros: São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Santa
Catarina, Paraná, Goiás, Rio Grande do Norte e Pernambuco. A figura 2.3 ilustra as
metas por estado.
Figura 2.3 - Metas do Luz no Campo por estado
Fonte: Pertusier (2000) apud Fugimoto (2005).
Depreende-se da figura 2.3 que a região Norte ficou praticamente de fora
do Programa Luz no Campo, onde apenas o Mato Grosso possuía uma meta
considerável. Observa-se que os estados do Amazonas, Amapá e Maranhão não
faziam parte dessas metas.
29
Os recursos para a execução do programa advinham da Reserva Global
de Reversão RGR
1
, cujos financiamentos eram realizados diretamente com as
concessionárias.
O número de ligações realizadas pelo Luz no Campo até ser sucedido
pelo Luz para Todos foi de 584.000, com investimentos em torno de R$ 1,6 bilhão. A
tabela 2.5 apresenta as ligações por região.
Tabela 2.5 – Ligações efetivadas pelo Luz no Campo por região Fonte: Rodrigues (2006).
Região Número de ligações
Norte 53.967
Nordeste 267.487
Centro-oeste 63.800
Sul 41.535
Sudeste 156.946
Total 583.735
Verifica-se na tabela 2.5 que a região nordeste foi a mais contemplada
com cerca de 45,82 % das ligações, seguida pela região sudeste com 26,89%.
O Programa Luz para Todos PLpT foi instituído por meio do Decreto
4873/03 de 11 de novembro de 2003, visando atender à população rural, dado o
contexto em que 80% da exclusão elétrica se encontrava nesse meio. Àquela altura
os menores índices de eletrificação rural encontravam-se nos estados da região
norte, acrescidos de Piauí e Maranhão, e o estado da Bahia possuía o maior número
absoluto de excluídos.
Mais do que apenas um programa de eletrificação, foi idealizado como um
programa de inclusão social, onde o esforço da eletrificação contemplava também
1
A Reserva Global de Reversão (RGR) é um encargo equivalente a 2,5% dos investimentos efetuados
pelas concessionárias de geração, transmissão e distribuição do setor elétrico brasileiro, limitados a 3% da receita
anual, pago mensalmente, cuja finalidade é prover recursos para reversão e/ou encampação dos serviços públicos
de energia elétrica. Outra destinação legal desse encargo é o financiamento de expansão e melhoria dos serviços
do setor elétrico, bem de fontes alternativas, além de financiar estudos de inventário e viabilidade de
aproveitamentos de novos potenciais hidráulicos, bem como para desenvolver e implantar programas e projetos
destinados ao combate ao desperdício e uso eficiente da energia elétrica.
30
melhorar a prestação de serviços à população beneficiada, integrando-o aos
diversos programas sociais e de desenvolvimento rural da União, Estados e
Municípios, visando a incrementação da produção agrícola, da demanda por energia
elétrica e da renda.
A meta prevista era de eletrificar, até 2008, 2 milhões de domicílios rurais,
cerca de 10 milhões de brasileiros, cuja renda de 90% dessas famílias correspondia
a menos de 3 salários mínimos, equivalente a US$ 793,50, segundo IBGE (2000)
apud MME (2003), distribuídas na cronologia apresentada na tabela 2.6.
Tabela 2.6 – Cronologia das ligações previstas pelo PLpT Fonte: MME (2004)
.
Ano Número de ligações
2004 150.000
2005 620.000
2006 630.000
2007 300.000
2008 300.000
Vale salientar que o prazo estabelecido pelo PLpT antecipava a
universalização pretendida pela ANEEL, por meio da Resolução 223, de 29 de abril
de 2003, que é o ano de 2015, para o atendimento de pedido de ligação a novas
unidades consumidoras com carga instalada até 50 kW, sem ônus para os mesmos.
A meta do programa foi posteriormente prorrogada para 2010, por meio do Decreto
6.442, de 25 de abril de 2008.
Os recursos financeiros necessários para implantação do PLpT são
aportados pelos estados da federação em 10% do total, pelas distribuidoras e
cooperativas em 15% e o restante pelo Governo Federal por meio de uma
composição de recursos a fundo perdido, proveniente da Conta de Desenvolvimento
Energético CDE
2
, e financiamento, originário da Reserva Global de Reversão -
RGR.
2
Os recursos da CDE são provenientes dos pagamentos anuais realizados a título de uso de bem
público, das multas aplicadas pela ANEEL aos concessionários, permissionários e autorizados e das quotas
anuais pagas por todos os agentes que comercializem energia com o consumidor final.
31
Desde seu início, o PLpT concentrou seus esforços no atendimento à
consumidores por meio de extensão de rede, onde existia geração, basicamente
em locais próximos às sedes municipais, postergando o atendimento das
comunidades mais distantes e dispersas na Amazônia.
Segundo Relatório de fevereiro de 2009 do Comitê Gestor do Estado do
Amazonas, a concessionária Manaus Energia (atualmente Eletrobrás Amazonas
Energia) atingiu apenas 29,09% da meta prevista. Informações desse Comitê dão
conta de que até o final de 2010 a meta total prevista no início do Programa será
alcançada, com o agravante de que o número de unidades consumidoras tinha
como referência o Censo 2000 que, por razões metodológicas utilizadas pelo IBGE,
órgão responsável por esse trabalho, não alcançam a área rural do estado, sem
conseguir refletir a realidade deste setor. Levantamentos preliminares feitos pela
concessionária Eletrobrás Amazonas Energia apontam para a duplicação desse
quantitativo até o presente momento.
Uma vez esgotados os atendimentos possíveis com extensão de rede, o
PLpT deverá buscar outras alternativas para cumprir sua meta de universalização,
dentre elas o uso de fontes alternativas, preferencialmente renováveis, em face de
que a experiência de uso de grupos geradores a diesel se mostrou inadequada ao
longo dos últimos anos na região amazônica, onde um considerável número desses
sistemas encontra-se inoperante, seja por falta de manutenção, seja pelos altos
custos de operação. Há situações em que o transporte de cada litro de diesel
consome 3 litros desse combustível.
Além disso, em locais já atendidos, como as sedes municipais, existe uma
demanda reprimida, limitada pela geração, obstaculizando a implantação e/ou
ampliação de atividades produtivas. Um dos gargalos para a interiorização das
atividades industriais e execução de políticas blicas é a oferta limitada de energia
elétrica.
2.5 SUBSÍDIO NO SISTEMA ELÉTRICO BRASILEIRO
Específico do setor elétrico brasileiro, a Conta de Consumo de
Combustível surgiu por meio do Decreto nº. 73.102/1973, considerando a Lei
5.899/1973, onde estabelecia o rateio de ônus ou vantagens decorrentes do uso de
combustíveis fósseis nas termelétricas entre as concessionárias do chamado
32
Sistema Interligado Nacional SIN. Àquela altura sua aplicação era exclusiva para
esse sistema, tendo sido extendida para o Sistema Isolado ISOL por intermédio
das Portarias 179 e 328/1991 do Ministério da Infraestrutura.
Em 2002 a Lei 10.438 estabeleceu a duração deste subsídio aabril de
2022 e disponibilizou essa conta para uso exclusivo dos sistemas isolados,
denominada, a partir de então, de CCC-ISOL, embora o rateio incluísse, ainda, o
SIN. Para se ter uma idéia do montante deste subsídio, em 2009 a ANEEL aprovou
o valor de R$ 2,471 bilhões, equivalente à época da publicação (abril de 2009) a
US$1,123 bilhões.
Esta mesma Lei possibilitou a sub-rogação dos benefícios ou rateio da
CCC, limitados a 75% do valor do empreendimento, na condição de aprovação pela
Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, em favor de titular de concessão ou
autorização que venha a implantar empreendimentos para a geração, transmissão
ou distribuição de energia elétrica em sistemas isolados que permitam a substituição
total ou parcial de geração termelétrica que se utilize de combustíveis fósseis ou o
atendimento a novas cargas, reduzindo o dispêndio atual ou futuro da CCC. O
instrumento legal que regulamenta as condições desta sub-rogação é a Resolução
nº 245, de 1999, da ANEEL.
Ressalta-se que não existe qualquer medida que procure cobrir os custos
operacionais e de manutenção dos sistemas, além do fato de que a Resolução 784,
de 2002, da ANEEL, incluiu o gás natural como uma das fontes possíveis de
contemplação da sub-rogação da CCC, o que complica sobremaneira o fomento de
energias renováveis.
A CCC sofreu alterações profundas com a edição da Lei n
o
12.111 de 9 de
dezembro de 2009. Em seu artigo 3
0
, estabelece que esse subsídio passará a
reembolsar as concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços públicos e
instalações de distribuição de energia elétrica nos sistemas isolados a diferença
entre o custo de geração e o custo médio equivalente de potência e energia elétrica
no Sistema Interligado Nacional, comercializadas no ambiente de contratação
regulada.
Nos custos deverão estar incluídos a energia e a potência associada
contratada, a geração própria, as despesas com combustíveis, encargos, impostos,
investimentos realizados, além de outros custos associados à distribuição em
regiões remotas.
33
O direito ao reembolso se mantém até o final dos contratos de compra de
potência e energia elétrica, mesmo que haja a interligação ao SIN.
A princípio a edição desta medida provisória significa redução de interesse
e esforços por parte das concessionárias, permissionárias ou autorizadas no sentido
de substituição de geração com uso de combustíveis fósseis por outra fonte, em face
do reembolso que a legislação citada lhes garante. Entretanto, na mencionada
Medida consta que sua regulamentação deve prever mecanismos que induzam à
utilização de recursos energéticos locais e à valorização do meio ambiente visando à
sustentabilidade.
Desta forma, a utilização da biomassa disponibilizada no rio Madeira,
objeto deste trabalho, para geração de energia elétrica possibilita usufruir da sub-
rogação, no caso de implantação onde existe atendimento com termelétrica que
faça uso de combustível fóssil, ou mesmo para contemplar demandas reprimidas em
locais atendidos, cujo montante pode chegar até 75% do investimento, além de
reembolso do custo de geração, neste caso em qualquer circunstância no Sistema
Isolado.
2.6 AS FONTES RENOVÁVEIS NA AMAZÔNIA
Em face de suas características conseqüentes de localização geográfica,
da geologia, do relevo e da vegetação, a Amazônia apresenta peculiares potenciais
de aproveitamento de energias renováveis para geração de eletricidade no que
concerne às fontes hídrica, eólica, solar e biomassa.
A região é tida como a maior região hidrográfica do planeta, composta
pelas bacias hidrográficas Amazônica e do Tocantins/Araguaia. A bacia amazônica
ocupa 3.870.000,00 km
2
em território brasileiro, contribuindo com 133.000 m
3
/s,
enquanto que a do Tocantins/Araguaia ocupa 967.059 km
2
e contribui com 11.000
m
3
/s (ANA, 2008).
O potencial hídrico dessa região corresponde a 112 GW, equivalente a
43% do total do Brasil (KELMANN, 2008). As principais usinas planejadas e em
construção para atendimento do setor elétrico brasileiro estão localizadas na
Amazônia: Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, com 3.150 e 3.300 MW
respectivamente; Belo Monte, no rio Xingu, com 5.500 MW; e Estreito, no rio
Tocantins, com 1.087 MW.
34
O Brasil possui 2203 empreendimentos de geração de energia elétrica em
operação, produzindo 107.240.722 kW e está prevista uma adição de 37.395.190
kW, provenientes de 154 empreendimentos em construção e 444 outorgados
(ANEEL, 2010). Da energia total gerada 75.471.427 kW são provenientes de usinas
hidrelétricas de energia - UHE, 3.017.339 kW de pequenas centrais hidrelétricas
PCH
3
e 182.551 kW de Central Geradora Hidrelétrica - CGH
4
. Somadas essas
gerações hídricas representam, na atualidade, 72,48% do total de energia elétrica
gerada no Brasil. Desse total de energia hídrica a Amazônia Legal responde pela
geração de 11.249 MW em UHE, 568 MW em PCH e 2,96 MW em CGH (ANEEL,
2010).
A exploração do potencial hídrico anteriormente citado esbarra em
restrições socioambientais com cerca de 16% de seu território constituído por
Unidades de conservação federal, além de 25% de terras indígenas (KELMANN,
2008). Existe ainda um considerável mero de Unidades de conservação
estaduais. Uma outra barreira diz respeito as características topográficas, haja vista
ser a região uma planície.
Segundo Souza (2003), as turbinas hidráulicas disponíveis não são
adequadas às características locais, onde predomina baixa queda e pequena vazão
e geradores hidrocinéticos disponíveis no mercado exigem velocidades a partir de
4,5 m/s, necessitando de identificação das potencialidades da região que não possui
esse tipo de inventário.
A Amazônia brasileira, como todo o restante do País, é privilegiada em
termos de radiação solar. O Plano Nacional de Energia 2030 reproduz dados do
Atlas Solarimétrico do Brasil e registra que essa radiação varia de 8 a 22 MJ/m
2
durante o dia, sendo que as menores variações ocorrem nos meses de maio a julho,
variando de 8 a 18 MJ/m
2
.
Uma das restrições técnicas à difusão de projetos de aproveitamento de
energia solar é a baixa eficiência dos sistemas de conversão de energia, o que torna
necessário o uso de grandes áreas para a captação de energia em quantidade
suficiente para que o empreendimento se torne economicamente viável (ANEEL,
2005). Ademais, sistemas fotovoltaicos apresentam altos custos para uso em
processo produtivo (SOUZA, 2003).
3
Pequena Central Hidrelétrica é a designação para usinas com capacidade de geração entre 1 e 30 MW.
4
Central Geradora Hidrelétrica é a designação para usinas com capacidade de geração menor do que 1 MW.
35
Segundo Fugimoto (2005), o Tribunal de Contas da União TCU,
apresentou dados de um levantamento realizado em 2001, pela Secretaria Federal
de Controle Interno, onde consta que apenas 23,4% dos sistemas fotovoltaicos
instalados pelo PRODEEM estavam funcionando adequadamente e 45,7% foram
classificados como inexistente. Esses números revelam a necessidade de maior
maturação quanto à gestão dessa tecnologia na região.
No que concerne à energia eólica, a Amazônia apresenta potencial da
ordem de 12,8 mil MW, segundo o Atlas eólico brasileiro de 2001, concentrado
basicamente no nordeste do estado de Roraima e litorais dos estados do Amapá e
do Pará, como observado na figura 2.4. Este potencial pode ter sofrido incrementos
em face do nível de desmatamento que a região tem experimentado nos últimos
anos. A maior probabilidade de aproveitamento está restrita à costa do estado do
Pará, em face da proximidade dos centros de carga. Roraima apresenta ainda
restrições adicionais concernentes a questões ambientais pela considerável
proporção de área indígena naquele estado, cerca de 60%.
Figura 2.4 – Potencial eólico da região norte Fonte: CRESESB (2001).
36
Em que pese as opções acima descritas quanto ao aproveitamento de
energia renovável para geração de eletricidade na Amazônia, este trabalho está
focado na utilização de biomassa, mais especificamente na biomassa lenhosa
submersa no rio Madeira, disponibilizada por fenômeno natural, cuja retirada é
obrigação do estado.
2.7 CONVERSÃO DE BIOMASSA EM ENERGIA
Pode-se resumir a conversão da biomassa em energia em três processos:
físico-químico, biológico e termo-químico (CORTEZ, LORA e GOMEZ, 2008). A
figura 2.5 apresenta um esquema que mostra os processos de uso da biomassa
para fins energéticos.
Figura 2.5 – Esquema de uso da biomassa para fins energéticos
Fonte:Adaptado de Cortez, Lora e Gomez (2008)
O processo físico-químico consiste em densificar a biomassa,
transformando-a em briquetes ou pellets, reduzir sua granulometria, ou executar sua
prensagem mecânica, para extração de óleos vegetais, que podem, a posteriori,
sofrer esterificação.
A investigação na busca de combustíveis de origem vegetal remonta
épocas bem anteriores ao que se chamou de primeira crise do petróleo, ocorrida no
final da década de 1970. Em 1900, na cidade de Paris, durante a Feira Mundial, um
motor ciclo Diesel de fabricação da companhia francesa Otto, funcionou usando óleo
de amendoim, sem qualquer adaptação da máquina (KNOTHE et al, 2006). Segundo
esses autores, a idéia de usar esse óleo vegetal foi do Governo francês sem a
37
participação de Rudolph Diesel, o criador do motor, embora ele tenha conduzido
testes análogos nos anos subsequentes e se tornado defensor deste conceito.
Durante a Segunda Guerra Mundial, óleos vegetais foram usados como
combustíveis de emergência, dentre outras aplicações, levando, inclusive, o Brasil a
proibir exportações de óleo de algodão (KNOTHE et al, 2006).
O uso de óleos vegetais apresenta algumas barreiras para sua difusão,
dentre elas a questão do custo, bem acima dos derivados de petróleo, tanto na
obtenção quanto no uso e, recentemente, a competição de seu uso como alimento.
Essa competição efervesceu nos últimos anos graças a alta inflacionária dos preços
dos alimentos, consequência do aumento do consumo, sobretudo nos países em
desenvolvimento, notadamente China e Índia, resultante do incremento positivo do
poder aquisitivo da população mundial.
Embora a literatura apresente um comportamento satisfatório dos óleos
vegetais como combustível, sua viscosidade cinemática é superior à de
combustíveis de origem fóssil, provocando problemas operacionais com a ocorrência
de depósitos nas partes internas dos motores de combustão interna, como os de
ciclo Diesel e Otto. Para reduzir tais depósitos foi desenvolvida a técnica de pré-
aquecimento dos óleos, além de partida e parada com o uso de combustível fóssil.
Demais estratégias usadas para obtenção de combustíveis foram a
pirólise, o craqueamento e outros métodos de decomposição dos óleos vegetais.
O processo biológico pode ocorrer por meio de fermentação e digestão
anaeróbia.
Na fermentação os açúcares de plantas são transformados em alcoóis
(etanol e metanol), por ação de microorganismos. As plantas usadas em maior
escala são, normalmente, batatas, no Japão, milho nos Estados Unidos da América,
trigo e beterraba, na Europa e cana-de-açúcar, no Brasil e Ilhas Maurício.
A digestão anaeróbia é um processo simples e natural que ocorre com
quase todos os compostos orgânicos, por meio da ação de bactérias anaeróbias,
sem a presença do ar, provocando a decomposição do material, liberando gases
conhecidos como biogás. A composição desse biogás é basicamente metano e
dióxido de carbono (50% a 75%). É um processo muito difundido nas regiões rurais
de alguns países como a China e a Índia. Além do gás, a digestão anaeróbia tem
como efluente material que pode ser usado como fertilizante.
38
O processo termoquímico pode ser dividido em pirólise, combustão direta,
transesterificação, liquefação e gaseificação.
A pirólise é o mais antigo processo utilizado pelo homem para transformar
biomassa em um combustível de melhor qualidade, mais denso, menos poluente e
de melhor poder calorífico, essencialmente carvão, embora o processo tenha como
resultado gases, alcatrão e ácido piro - lenhoso. Esse processo consiste em elevar
lentamente a temperatura da biomassa, geralmente até valores entre 300
0
C e
600
0
C, com rarefação de ar, até que todo o material volátil seja retirado.
O elevado teor de umidade da biomassa é o principal problema da pirólise.
Via de regra, a quantidade de carvão gerado é de 10% a 30% do total de lenha
utilizada.
Há, ainda, o processo de pirólise rápida, consistindo em elevar a
temperatura a valores entre 800
o
C a 900
o
C em altas velocidades de aquecimento
em curtos tempos de residência. Como resultado deste processo apenas 10% do
material é transformado em carvão e em torno de 60% em gás rico em hidrogênio e
monóxido de carbono, competindo com a gaseificação, muito embora os problemas
com tratamento de resíduos se tornem maiores do que na pirólise convencional.
A liquefação consiste na obtenção de combustíveis quidos a partir de
misturas de biomassa triturada com óleos ou materiais solúveis com monóxido de
carbono, em presença de um catalisador alcalino, em condições específicas de
pressão e temperatura. Esse líquido pode ser usado como combustível em fornos.
O processo de combustão direta é usado quando o produto final desejado
é a energia calorífica. Geralmente seu uso ocorre em cocções de alimentos por meio
de fogões à lenha, fornos de metalúrgicas ou caldeiras. Embora seja de singular
praticidade, sua eficiência é muito baixa. Problemas relacionados à alta umidade e a
dificuldades de transporte e armazenamento são barreiras características desse
processo.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, metade da população do
mundo se utiliza de lenha para cocção de alimentos, provocando 1 milhão e meio de
óbitos anuais, por conta de doenças causadas pela inalação da fumaça advinda
dessa atividade, a chamada poluição doméstica, sobretudo às mulheres e crianças.
ainda a possibilidade de utilização da energia calorífica para geração
de energia elétrica. Nesta rota tecnológica a biomassa é queimada para geração de
calor usado para a obtenção de vapor, que é aproveitado em turbinas a vapor que,
39
por sua vez, acionam geradores de eletricidade. Nesta situação a pressão deve ser
a menor possível para viabilidade econômica. casos em que existe interesse em
aproveitar o calor de forma industrial, ocasião em que a pressão pode necessitar de
incremento.
A transesterificação consiste na reação de um lipídio com um álcool,
formando éster e glicerol. Como a reação se processa lentamente, é usado um
catalisador para acelerá-la. O éster purificado é o que se denomina de biodiesel,
cujas propriedades são similares ao óleo diesel. Na prática o lipídio pode ser um
óleo ou gordura de origem animal ou vegetal e o álcool etanol ou metanol.
Uma definição simples para o biodiesel é a de um combustível capaz de
substituir o diesel em motores do ciclo diesel, obtidos a partir de matéria-prima
renovável proveniente de biomassa (CORTEZ et AL, 2008).
No Brasil a definição desse combustível está prescrita em lei, a de número
11.097, de 13 de janeiro de 2005, que em seu artigo 4
o
, inciso XXV, define
“Biodiesel: biocombustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a
combustão interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento, para
geração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmente
combustíveis de origem fóssil.
Entretanto o termo biodiesel é usado para os ésteres metílicos e etílicos,
obtidos pelo processo de transesterificação das gorduras vegetais ou animais. Nesta
reação a gordura animal ou vegetal, chamadas de triacilglicerol (três ácidos graxos
ligados a uma molécula de glicerol), reage com álcool metanol ou etanol, de tal sorte
que o glicerol é separado dos ácidos graxos que, por sua vez, são ligados ao álcool,
formando um monoglicerido (éster metílico), no caso do metanol, ou um diglicerido
(éster etílico), para o caso do etanol. A figura 2.6 mostra a reação de
transesterificação de um triacilglicerol.
Figura 2.6 – Reação de transesterificação de um triacilglicerídeo
Fonte: Knothe et al (2006).
40
A reação, porém, precisa de catalisadores que geralmente são
incorporados ao produto, necessitando a adoção de purificadores, o que encarece o
custo final do biodiesel. Os catalisadores mais comuns são carbonatos de sódio ou
de potássio, hidróxidos ou alcóxidos de metais alcalinos ou, ainda, alcoolatos
básicos. A busca por catalisadores que possam ser reutilizados e que não
contaminem o produto final está em fase de desenvolvimento em organizações de
pesquisa, inclusive fazendo uso de nanotecnologia.
Segundo Knothe et al (2006), muitas das especificações hoje existentes
para o biodiesel foram definidas de tal modo que apenas ésteres metílicos podem
ser classificados como tal, muito embora outros alcoóis possam ser usados. Ainda
segundo esses autores, o álcool mais usado para a produção de biodiesel é o
metanol porque é o de menor custo.
A tabela 2.7, elaborada por RIBEIRO,2006, apud CORTEZ, 2008,
apresenta algumas características do biodiesel para as rotas metílica e etílica.
Tabela 2.7 – Características do biodiesel para as rotas metílica e etílica
Fonte: Cortez et al (2008)
Éster Metílico Éster Etílico
Conversão (óleo-biodiesel) 97,5% 94,3%
Glicerina total no biodiesel 0,87% 1,40%
Viscosidade 3,9 a 5,6 cSt@40
o
C 7,2% sup. ao éster metílico
Potência em relação ao diesel
2,5% menor 4% menor
Consumo em relação ao
diesel (%)
10% maior 12% maior
Quantidade de álcool/1000 l
de biodiesel
90 kg 130 kg
Preço médio do álcool US$190/kg US$360/kg
Excesso de álcool
recomendado
100% 650%
Proporção molar álcool:óleo
recomendado
6:1 20:1
Temperatura recomendada 65
0
C 80
0
C
Tempo de reação 45 minutos 80 minutos
41
O Brasil apresenta grande potencial para exploração desse combustível,
em virtude de suas características geográficas, assim como dos benefícios sociais e
ambientais que pode trazer.
A liquefação de biomassas pode ser definida genericamente como a
obtenção de líquidos (óleos) a partir de materiais lignocelulósicos (CORTEZ e LORA,
1997). O processo de produção consiste em reação da biomassa triturada em um
meio líquido com CO, usando-se catalisadores alcalinos.
A gaseificação da biomassa consiste em submetê-la a elevadas
temperaturas, da ordem de 600
o
C a 1500
o
C, de tal maneira que ocorre a oxidação,
obtendo como resultado gases, chamados de producer gas ou gases pobres, que
podem ser usados para geração de energia calorífica ou elétrica.
A gaseificação ocorre por meio de processo de combustão, reação de
óxido-redução onde o oxidante é o oxigênio e, neste caso, o redutor é a biomassa. A
fonte de oxigênio normalmente é o ar atmosférico, procedimento de menor custo,
porém, dependendo da qualidade do gás que se deseja, pode ser usado o oxigênio
puro ou, até mesmo, vapor d’água.
No processo de gaseificação, busca-se a combustão praticamente
completa, caso em que a quantidade de oxigênio é maior do que a
estequiometricamente necessária.
Quando o ar atmosférico é usado como fonte de oxigênio, o gás obtido
possui poder calorífico muito baixo, da ordem de 5MJ/Nm
3
, contendo uma grande
quantidade de nitrogênio em seu volume, em torno de 50%. No caso de se usar o
oxigênio puro ou vapor d’água, o gás obtido possui poder calorífico bem superior,
alcançando valores entre 10 a 15 MJ/Nm
3
.
Além da fonte de oxigênio, o processo de gaseificação de biomassa tem
relações de dependência com a pressão, a temperatura e o tempo de residência em
que ocorre a combustão.
Pode-se dividir o processo de gaseificação da biomassa em várias etapas
com complexas reações químicas, ainda hoje não bem totalmente conhecidas. De
forma simples, essa divisão pode ser feita em cinco etapas:
Pirólise onde ocorre a decomposição térmica, cujas
temperaturas giram em torno de 600
o
C. Ocorre a formação de
coque, gases, alcatrão e condensáveis;
42
Oxidação de parte do carbono fixo do combustível fonte de
calor para a volatização e gaseificação, com a formação de CO
e CO
2
;
Gaseificação ocorrem reações entre os gases e o coque
residual e entre os produtos formados, resultando em 2CO,
CO, H
2,
CH
4,
CO
2
e 3H
2
;
Craqueamento do alcatrão destruição das moléculas que
formam os compostos do alcatrão, obtendo-se CO, CO
2
e CH
4
;
Oxidação parcial dos produtos da pirólise, formando-se CO
2
e
H
2
.
Quando se deseja fazer uso da rota tecnológica de geração de
eletricidade a partir da gaseificação, é preciso que o gás esteja limpo, o que é feito
por meio de sistemas de filtragem. Usualmente o principal problema é a presença do
alcatrão e de particulados. O alcatrão é uma substância betuminosa, negra e viscosa
composta por centenas de substâncias químicas, condensável quando os gases
atingem temperaturas inferiores a 500
o
C, causando sérios problemas em motores de
combustão interna e turbinas a gás, formando crostas que entopem as tubulações.
Os particulados são partículas muito finas de sólidos presentes no gás, formado pela
parte não volátil da biomassa, também danosos aos equipamentos mencionados.
O uso mais eficiente da gaseificação acontece quando o
aproveitamento para geração combinada de eletricidade e calor (co-geração), caso
em que é desejável um gás de qualidade média para alta, o que implica em uso de
sistemas adequados de filtros.
A gaseificação de biomassa se apresenta como alternativa interessante
para reduzir a dependência de combustíveis fósseis de regiões ou países, sobretudo
em período de consideráveis flutuações nos preços, como o que atualmente se
vivencia. Destaque deve ser dado para pequenas gerações, de algumas dezenas e
até centenas de kW, situações em que este processo se mostra competitivo frente à
queima direta da biomassa ou de combustíveis fósseis, quando utilizados em
motores de combustão interna ou turbinas a gás. Destaca-se, ainda, o potencial de
uso em comunidades isoladas na Amazônia, onde a biomassa apresenta grande
potencial pela eventual disponibilidade a custos competitivos.
O equipamento usado para obtenção de gás pobre é chamado de
gaseificador, abordado no capítulo 3.
43
2.7 FERRAMENTAS DE ANÁLISE DE INVESTIMENTO
Como em qualquer outro investimento no mercado, o setor elétrico
também necessita de análises econômicas das opções disponíveis para a tomada
de decisão por parte do investidor que, via de regra, analisa primordialmente a
questão da viabilidade econômica em detrimento das demais dimensões envolvidas
no empreendimento. O atendimento à questão de viabilidade econômica é,
geralmente, condição sine qua non na ótica do mercado capitalista.
A decisão de alternativas de investimento necessita de ferramentas a
serem disponibilizadas ao tomador de decisão para que o mesmo possa adotar
aquela que mais se adeque às perspectivas dos acionistas ou investidores.
A lógica do investidor numa visão mais moderna é o atingimento de
máximos lucros em um determinado período de tempo, ao invés do imediatismo do
lucro que norteava as organizações no passado. Desta forma, segundo Camargo
(1998), os métodos de análise de investimentos que se ajustam ao conceito
moderno supracitado o os seguintes: o Payback; o Valor Líquido Presente; e a
Taxa Interna de Retorno.
O Payback consiste em avaliar o tempo que um determinado investimento
levaria para o retorno do valor investido, ou seja, é o momento no qual o lucro
líquido acumulado se iguala ao valor do investimento. Neste método, nem juros nem
rendimentos são levados em consideração após a recuperação do capital investido.
É o mais simples dos métodos de análise de investimentos e o mais pobre, que
não considera o valor temporal dos recursos financeiros envolvidos, tampouco o
valor recebido após a recuperação do capital. Geralmente é exigido o uso de outros
métodos para complementação de ferramenta em processo decisório.
Investimento significa a saída de recursos financeiros, que se espera
retornar em determinado espaço de tempo (meses ou anos) por meio dos lucros
líquidos. O Payback é exatamente esse tempo demandado e algebricamente pode
ser determinado usando a equação 2.1.
=
LL
I
PB
0
[1]
Sendo:
PB= Payback (unidade de tempo);
44
I
0
t= Investimento Inicial (unidade monetária);
LL = Lucro Líquido em determinada unidade de tempo (unidade
monetária).
Existe a possibilidade de se fazer uso do chamado Payback descontado,
onde se considera o valor presente das receitas incluindo a taxa de juros.
O método apresenta como inconveniente não considerar os lucros líquidos
após o ano de recuperação do investimento, desaconselhável ao se avaliar projetos
de longa duração. Suas vantagens dizem respeito à facilidade de cálculo e de
compreensão, além de fornecer uma idéia do grau de liquidez e do risco do
empreendimento, adequado à processos de avaliação quando o contexto é de risco
elevado e de vida limitada.
O método do Valor Líquido Presente (VLP) ou Valor Atual Líquido
determina o valor presente dos desembolsos e receitas futuras de um determinado
investimento, descontando o investimento inicial, considerando taxa de juros e um
tempo determinado. Em outras palavras é o calculo de quanto o custo inicial de um
empreendimento acrescido de futuros pagamentos estaria valendo atualmente. É a
ferramenta mais usada pelas grandes empresas (COPELAND, 2001).
Este método é utilizado para processo decisório de investimentos em
empreendimentos de longo prazo. Quando seu resultado for maior que zero indica
potencial de investimento no empreendimento em questão. Se o VLP for igual a
zero, o investimento é indiferente, pois o valor presente das entradas é igual ao valor
presente das saídas de caixa. Para o caso em que o VLP for menor do que zero,
significa que o investimento não é economicamente atrativo, que o valor presente
das receitas é menor do que o valor presente dos investimentos. A equação 2.2 a
seguir permite calcular o Valor Líquido Presente.
VLP =
( )
+
n
n
n
i
FC
1
1
- I
0
[2]
Sendo,
FC – Fluxo de caixa, ou seja, a diferença entre os valores de receita
e despesa no caixa do empreendimento (unidade monetária);
I
0
– Investimento inicial (unidade monetária);
45
i – Taxa de juro (% na unidade de tempo do período em análise);
n – período de análise (unidade de tempo do período considerado).
A Taxa Interna de Retorno (TIR) é a taxa de juros que torna nulo o valor
líquido presente. Diferentemente da VLP a TIR tem seu resultado expresso em
porcentagem e não em valor monetário. Usando a equação 2.2 anteriormente dada,
a taxa interna de retorno corresponde ao valor de i para uma VLP igual a zero.
Investimentos são considerados rentáveis quando a TIR for maior do que
a chamada taxa mínima de atratividade, que é o valor dos juros máximos que um
investidor se propõe a pagar por um capital emprestado, ou o mínimo que se propõe
a ganhar quando faz um investimento. Normalmente essa taxa é tomada a partir de
algumas taxas balizadoras como a caderneta de poupança e os fundos de
investimento, além de considerar os riscos do negócio e a liquidez, ou seja, a
capacidade e a velocidade com que o empreendedor pode sair do mesmo.
Os métodos descritos são denominados de métodos determinísticos,
podendo se valer da análise de sensibilidade para avaliar os riscos e incertezas do
investimento. Quando disponibilidade de dados históricos é possível lançar mão
dos métodos probabilísticos os quais decorrem dos todos determinísticos, sendo
que as variáveis são representadas por distribuições de probabilidade. Tais métodos
possibilitam uma análise mais precisa do risco do empreendimento.
De outra sorte, quando os dados são pouco confiáveis, pode-se lançar
mão dos todos possibilísticos. Em tais métodos, que adotam procedimentos
semelhantes aos todos determinísticos, as variáveis são representadas como
números fuzzys.
Em todos os métodos é possível incorporar a influência da inflação e da
depreciação dos bens envolvidos.
46
Capítulo 3
TECNOLOGIAS DISPONÍVEIS PARA USO DE BIOMASSA NA PRODUÇÃO DE
ELETRICIDADE
3.1 INTRODUÇÃO
A forma de energia mais usada tendo biomassa como fonte é a calorífica,
seja em uso doméstico para cocção de alimentos ou aquecimento de ambientes,
seja em indústrias para uso desta energia no processo produtivo. Entretanto, sua
utilização na geração de energia elétrica tem se mostrado promissora, sobretudo no
aproveitamento de resíduos de processos agrícolas, madeireiros e da indústria de
celulose, bem como em gerações distribuídas, mormente para atendimento de
sistemas isolados em países em desenvolvimento, em que pese seu maior
desenvolvimento tecnológico com as maiores eficiências ocorra em usinas com
grandes potências (acima de 200 MW), instaladas em países desenvolvidos.
O aproveitamento do bagaço da cana de açúcar exemplifica esse
potencial, no caso do Brasil, onde praticamente toda a indústria suco-alcooleira é
autossuficiente em energia elétrica, ocorrendo, ainda, a venda de excedentes em
inúmeros casos.
A rota tecnológica de mais intenso uso nesses processos de geração de
energia elétrica é a de geração de vapor. No entanto, há outras possibilidades, como
é o caso da gaseificação, sobretudo para pequenas potências, onde existe a
possibilidade de incremento da eficiência com o uso da co-geração.
Neste Capitulo são descritas essas rotas tecnológicas com ênfase em
ciclos a vapor e gaseificação, haja vista serem as tecnologias passivas de serem
utilizadas no aproveitamento da biomassa flutuante do rio Madeira.
3.2 CICLO A VAPOR
Esta rota tecnológica usa biomassa para produção de calor, aproveitado
para gerar vapor em pressão e temperatura bem definidos, usado para movimentar
uma turbina a vapor ou até mesmo um motor a pistão.
47
Um dos problemas desse tipo de aproveitamento de biomassa é o baixo
rendimento, em torno de 20% a 25%, em face da alta umidade da biomassa, da
densidade e do baixo poder calorífico. Para aumentar a eficiência do sistema faz-se
uso da co-geração, ou seja o aproveitamento do calor para o processo produtivo.
Outro fator que obstaculiza esse tipo de sistema é a quantidade de
biomassa a ser processada, o que implica em custos mais elevados com a
disponibilidade, haja vista a logística para tal. Normalmente as faixas de potência
das termelétricas a biomassa são da ordem de 25 MW a 50 MW, podendo chegar,
em alguns casos, a 80 MW. De maneira geral são usadas biomassas sólidas para
atender a esse tipo de termelétrica, exceto quando do aproveitamento da lixívia para
geração de energia nas indústrias de celulose. Salienta-se a existência de
termelétricas a lenha de potências elevadas, a partir de 200 MW, em alguns países
desenvolvidos, onde a lógica de fornecimento de biomassa está embasada em
florestas energéticas, solucionando a problemática de disponibilidade e custos do
combustível, porém aproveitando a energia calorífica em co-geração, para aumentar
a eficiência.
A tabela 3.1 mostra os empreendimentos existentes na Amazônia que
fazem uso de biomassa com ciclo a vapor, com base em informações do Banco de
Informação de Geração BIG da Agência Nacional de Energia Elétrica ANEEL.
Nessa mesma fonte são apresentadas 321 usinas que usam biomassa como fonte,
instaladas no Brasil, respondendo pela geração de 4.786.954,70 kW de energia
elétrica. Desse total 13 operam com lixívia, 6 com casca de arroz, 28 com resíduos
de madeira, 3 com carvão vegetal, 8 com biogás e as demais 263 com bagaço de
cana.
Tabela 3.1 – Empreendimentos na Amazônia com ciclos a vapor, usando biomassa
Fonte: ANEEL (2010).
Usina
Potência
(MW)
Destino da
Energia
Proprietário Município Combustível
Itacoatiara 9
Produtor
independente
BK Energia
Itacoatiara Ltda.
Itacoatiara/AM
Resíduos de
madeira
Tramontina
1,5 Registrado
Tramontina
Belém S/A
Belém/PA
Resíduos de
madeira
48
Cont. da tabela 3.1 – Empreendimentos na Amazônia com ciclos a vapor, usando biomassa
Fonte: ANEEL (2010).
Usina
Potência
(MW)
Destino da
Energia
Proprietário Município Combustível
Pampa 0,4
Pampa Export.
Ltda
Belém/PA
Resíduos de
madeira
Bio Fuel 4,8 Registrado
Brasil Bio Fuels
Ltda
São João da
Baliza/RR
Resíduos de
madeira
Jarí
Celulose
55
Produtor
independente
Jarí Celulose
S/A
Almeirim/PA
Licor Negro
Simasa 8
Produtor
independente
50% Companhia
Siderúrgica Vale
do Pindaré e
50% Siderúrgica
do Maranhão
S/A
Açailândia/Ma
Carvão
vegetal
Viena 7,2
Auto
produção
Viena
Siderúrgica do
Maranhão S/A
Açailândia/Ma
Carvão
vegetal
Gusa
Nordeste
10
Produtor
independente
Gusa Nordeste
S/A
Açailândia/Ma
Carvão
vegetal
No intuito de reduzir emissões de CO
2
e de SO
x
em termelétricas que
utilizam carvão mineral, um significativo uso do chamado co-firing em países
como os Estados Unidos, Dinamarca e Holanda, o qual consiste na adição de
biomassa ao carvão mineral em termelétricas que fazem uso desta fonte. A
porcentagem de mistura pode variar de 2% a 25%. Acima desse valor os custos se
elevam, haja vista a necessidade de gaseificação da biomassa previamente (BAIN et
al (2003), apud CORTEZ, LORA e GOMES,2008).
49
3.3 GASEIFICAÇÃO
3.3.1 BREVE HISTÓRICO
Assim como o fogo é a pedra fundamental do início da civilização, o uso
de combustíveis líquidos e gasosos é o marco histórico da era moderna da
tecnologia. Muitos processos hoje usados seriam impossíveis sem esses
combustíveis, além do que outros estariam com menos eficiência e mais poluentes.
Apesar de sua importância na vida moderna, o uso de combustíveis
gasosos teve início no final do culo XVIII, tendo começado seu uso comercial e
doméstico em 1830. por volta de 1850 a cidade de Londres possuía grande parte
de sua iluminação a gás.
O uso de motores movidos a gás tem seu início em torno de 1881. Em
1920 caminhões e tratores usando gás foram introduzidos na Europa. Operavam
tanto com carvão quanto com madeira. No entanto produziam alcatrão altamente
prejudicial às partes mecânicas do motor, o que levou ao desuso.
Durante a II grande guerra houve escassez de combustível líquido,
propiciando a intensificação pela busca de alternativas locais resultando na
concepção e instalação de geradores movidos à gás. Com o término deste conflito
mundial veio a incrementação de uso de combustíveis fósseis e o quase total
abandono do uso de gaseificadores, à exceção de alguns países subdesenvolvidos.
A crise do Petróleo no final dos anos 70 trouxe à baila a retomada de
pesquisas em gaseificadores.
As previsões de cientistas quanto às conseqüências climáticas causadas
pelas emissões de gases de efeito estufa, sobretudo o CO
2
, provocaram pressões
da Sociedade aos Governos, de tal sorte que políticas públicas estão sendo
adotadas no mundo inteiro buscando redução de uso de combustíveis de origem
fóssil, maior responsável por essas emissões. Naturalmente, as pesquisas em
gaseificadores estão sendo incentivadas, haja vista que se apresentam neste
contexto como opções factíveis.
50
3.3.2 TIPOS DE GASEIFICADORES
Para Nogueira e Lora (2003), os gaseificadores para biomassa podem ser
classificados em inúmeros tipos, dependendo de parâmetros a serem considerados.
A seguir são apresentados alguns desses parâmetros e tipos:
1. Segundo o critério do poder calorífico dos gases produzidos, tem-se:
Gaseificadores de baixo poder calorífico – até 5 MJ/Nm
3
;
Gaseificadores de médio poder calorífico – de 5 a 10 MJ/Nm
3
;
Gaseificadores de alto poder calorífico – de 10 a 40 MJ/Nm
3
.
2. Segundo o critério de tipos de agente de gaseificação, estes se
classificam em:
Gaseificadores a ar;
Gaseificadores a vapor, e;
Gaseificadores a oxigênio.
3. Segundo a pressão de trabalho, estes podem ser denominados de:
Gaseificadores de baixa pressão - pressão atmosférica;
Gaseificadores pressurizados – até 3 MPa.
4. Segundo a direção do movimento da biomassa relativo à do agente de
gaseificação, tem-se:
Gaseificadores com leito em movimento contracorrente
alimentação da biomassa em sentido contrário à saída do gás;
Gaseificadores com leito em movimento concorrente
alimentação da biomassa em sentido contrário à saída dos
gases;
Gaseificadores com leito em movimento de fluxo cruzado
alimentação da biomassa perpendicular à saída dos gases, e;
Gaseificadores com leito fluidizado.
Na prática os gaseificadores recebem denominação com o uso de todos
os critérios acima descritos simultaneamente, ou seja, são identificados pelo poder
calorífico do gás produzido, do tipo de agente gaseificador, da pressão de trabalho e
do movimento da biomassa relativo ao s. Existe, também, uma relação direta
entre esses parâmetros. Por exemplo, a produção de gás de médio ou alto poder
calorífico só é possível ao usar vapor ou oxigênio como agentes gaseificadores.
51
Entre os critérios descritos, o mais usual é o do movimento da biomassa
relativo ao gás. A seguir discorre-se acerca dos tipos de gaseificadores segundo
esse critério.
3.3.2.1 GASEIFICADORES COM LEITO EM MOVIMENTO CONTRACORRENTE
O mais antigo e mais simples dos gaseificadores, possui a entrada de ar
pela parte inferior e a alimentação da biomassa pela parte superior, juntamente com
a saída do gás. A figura 3.1 mostra um esquema desse tipo de gaseificador.
Figura 3.1 - Esquema de um gaseificador de leito em movimento contracorrente
Fonte: adaptado de Reed (2002).
Observa-se que a grelha é fixa na parte inferior, contígua à região onde
ocorre a combustão. Imediatamente acima se encontra a zona de redução seguida
pela pirólise e secagem. As cinzas são removidas no fundo do equipamento. O ar é
introduzido pela parte inferior e na parte superior combustão e pirólise da biomassa
ocorrem como resultado da transferência de calor forçada por convecção e radiação
das partes inferiores.
52
Esses gaseificadores são os de mais baixos custos e apresentam elevada
eficiência térmica, além de possibilitarem o uso dos mais variados tipos de
biomassa, porém seus gases são muito sujos, de baixo poder calorífico e possuem
altos teores de alcatrão, sobretudo quando a biomassa usada possui elevada
umidade, restringindo seu uso para aquecimento direto (CORTEZ e LORA, 1997).
A grelha desses tipos de gaseificadores é de suma importância. Como
estão diretamente conectadas com a zona de combustão, onde a temperatura atinge
valores acima de 1300
0
C, os materiais que a constituem devem ser capaz de
suportar tais valores, além de deixar passar as cinzas sem perder combustível.
Alguns modelos fazem uso de grelhas rotativas para facilitar esse trabalho.
3.3.2.2 GASEIFICADORES COM LEITO EM MOVIMENTO CONCORRENTE
A busca pela retirada do alcatrão do gás gerado pelos gaseificadores com
leito em movimento contracorrente levou ao desenvolvimento do gaseificador com
leito em movimento concorrente. Neste caso o equipamento é alimentado com
biomassa pela parte superior, a saída de gás ocorre pela parte inferior e a entrada
de ar acontece antes ou na zona de oxidação. Isso faz com que ocorra o
craqueamento do alcatrão presente no gás ou na zona de oxidação. O movimento
de alimentação e de saída dos gases, portanto, ocorrem no mesmo sentido. A figura
3.2 apresenta um desenho esquemático desse tipo de gaseificador.
O baixo nível de condensados orgânicos é item favorável ao uso desse
tipo de gaseificador no que concerne a aspectos ambientais.
Fator desfavorável deste equipamento reside no fato de não operar
qualquer tipo de biomassa, necessitando peletizar
1
ou briquetar
2
aquelas com
pequena densidade, por conta da dificuldade de deslocamento para baixo. Mesmo
aquelas com suficiente densidade é preciso homogeneizar sua dimensão e limitá-la
a cerca de 10 cm para permitir a passagem dos gases e do ar.
53
Figura 3.2 – Esquema de um gaseificador de leito em movimento concorrente
Fonte: Adaptado de Reed (2002).
No intuito de permitir a utilização de alguns tipos de resíduos agrícolas e
industriais foi desenvolvido o gaseificador de leito em movimento concorrente de
topo aberto.
3.3.2.3 GASEIFICADORES COM LEITO EM MOVIMENTO DE FLUXO CRUZADO
Caracteriza-se pela saída do gás lateralmente da câmara de gaseificação,
perpendicular à alimentação do combustível, na mesma altura da entrada de ar, que
é localizada, normalmente, na área central da zona de combustão. Seus gases
resultantes possuem poder calorífico entre os dois tipos de gaseificadores
anteriormente citados.
Adaptado para consumir carvão vegetal o gaseificador de leito em
movimento de fluxo cruzado possui altas temperaturas (1500
0
C ou mais) na zona de
oxidação, conseqüência de maior taxa de fornecimento de ar, que pode gerar
problemas com materiais.
Uma de suas mais importantes vantagens é seu uso em equipamentos de
geração em pequena escala, sendo em algumas ocasiões economicamente factível
54
até para geração abaixo de 10kW. Responde com rapidez às variações de carga e
possui peso reduzido. A figura 3.3 apresenta um esquema com este tipo de
gaseificador.
Figura 3.3 - Esquema de um gaseificador de leito em movimento de fluxo cruzado
Fonte: Adaptado de Reed (2002).
3.3.2.4 GASEIFICADORES DE LEITO FLUIDIZADO
O desenvolvimento deste tipo de gaseificador deu-se a partir da
necessidade de prover temperaturas uniformes e melhor eficiência no contato entre
sólidos e gases em processos industriais (REED, 2002).
Neste equipamento a biomassa é alimentada diretamente a um leito que
contém materiais inertes, geralmente quartzo e dolomita, pré-aquecidos, em
suspensão, simulando um fluido, em razão do fluxo de ar. O combustível, ao entrar
em contato com os materiais aquecidos, mistura-se rapidamente e ocorre uma
quase que instantânea transferência de calor entre as partes, ocorrendo a pirólise
rápida da biomassa, resultando em uma grande quantidade de materiais gasosos. O
gás resultante tende a ser mais limpo, em face do maior contato entre os voláteis e
55
as partículas do leito (CORTEZ e LORA,1997). A figura 3.4 mostra um esquema com
esse tipo de gaseificador.
Figura 3.4 - Esquema de um gaseificador de leito fluidizado
Fonte: Adaptado de Reed (2002).
O gaseificador de leito fluidizado permite um controle mais fácil da
temperatura de operação por meio de alimentação da biomassa e de ar. Desta forma
pode trabalhar com temperaturas mais baixas do que os outros tipos de
gaseificadores, porém em valores menores ocasionam a presença maior de alcatrão
nos gases produzidos. Dependendo do uso, o alcatrão torna-se interessante por
aumentar o poder calorífico do gás resultante e melhorar a transferência de calor, no
entanto provoca incrustações nas tubulações (CORTEZ e LORA, 1997).
Desvantagem apresentada pelos gaseificadores de leito fluidizado diz
respeito ao fato de não responderem, com a necessária velocidade, às mudanças de
consumo do gás. Neste caso é preciso um aumento tanto no fluxo de ar quanto no
de combustível, trazendo como conseqüência uma maior atenção na atividade de
alimentação.
A utilização de gaseificadores de leito fluidizado é ainda bastante recente
e se encontra em pleno processo de desenvolvimento, apresentando-se com grande
56
potencial. Sua vantagem está no fato de permitir o uso de combustíveis de difícil
gaseificação pelos demais métodos, tais como bagaço de cana e casca de arroz.
Essas biomassas apresentam umidade elevada e baixa densidade, dentre outros,
como barreiras para uso como combustíveis.
3.4 SISTEMAS PARA PRODUÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DA
BIOMASSA
A partir da biomassa pode-se gerar energia elétrica usando combustíveis
sólidos, líquidos ou gasosos. Quando do uso de combustíveis sólidos, a biomassa
pode ser usada in natura, após redução e homogeinização de sua granulometria ou
como carvão em geradores de vapor conectados a turbinas a vapor ou motores de
pistão. Quando ocorre a disponibilidade de combustíveis líquidos ou gasosos as
rotas disponíveis são motores de combustão interna ou externa, turbinas e micro-
turbinas a gás e células a combustível.
Quando na hipótese de uso de combustível gasoso, a decisão pela rota
tecnológica a ser adotada para geração de energia elétrica está diretamente
dependente do comportamento da demanda requerida, havendo situações em que
acontece superposição tecnológica, implicando na necessidade de estudo mais
apurado para a tomada de decisão.
A gaseificação de biomassa produz um gás que contém contaminantes,
normalmente alcatrão, particulados sólidos, amônia, metais alcalinos e sulfeto de
hidrogênio. A presença desses contaminantes torna-se, às vezes, indesejadas, pois
causam danos aos equipamentos energéticos (NOGUEIRA E LORA, 2003).
Os diferentes tipos de gaseificadores produzem gases com características
peculiares quanto aos contaminantes. Os gaseificadores de leito fixo tipo
concorrente produzem gases com menores teores de alcatrão do que os demais. Os
gaseificadores de leito fixo contracorrente produzem as maiores taxas de alcatrão e
menores taxas de particulados. Os gases resultantes de gaseificadores de leito
fluidizado o os de maiores taxas de particulados. Embora as taxas de alcatrão em
gases advindos de gaseificadores de leitos fluidizados sejam altas, são geralmente
menores do que os de leito fixo contracorrente.
A escolha da rota tecnológica depende, dentre outros fatores, da faixa de
potência. Essa faixa pode ser dividida em pequena, média e grande escala. Para
57
efeito deste trabalho, considera-se de pequena escala os sistemas que atendem até
100 kWe, de média escala até 200 MWe, e os de grande escala acima desse valor.
A seguir são abordados os sistemas para produção de energia elétrica a
partir da gaseificação.
3.4.1 MOTORES DE COMBUSTÃO INTERNA
A utilização de motores de combustão interna usando gases de baixo
poder calorífico data de meados do século passado, sobretudo usando o carvão
vegetal como matéria prima, cujo baixo teor de alcatrão permite redução
considerável de problemas. Durante a Segunda Grande Guerra, mais de um milhão
de veículos adaptados para usar esse tipo de motor e matéria prima foram
fabricados (REED, 2002). Um desses tipos de veículos é mostrado na figura 3.5.
Isso aconteceu em face das dificuldades de dispor de combustível fóssil.
Essa tecnologia foi praticamente abandonada nos anos seguintes, com o fim da
guerra e com o baixo preço do Diesel. A retomada do interesse por esses
equipamentos aconteceu com as crises do petróleo na década de 1970. Novamente
a queda dos preços do diesel inviabilizou a continuidade do uso de gaseificadores e
motores de combustão interna na produção de energia elétrica até nova fase de
interesse a partir dos anos 90, desta feita por razões ambientais. Busca-se o uso de
fontes renováveis, em face da redução na emissão de gases causadores do efeito
estufa, principalmente CO
2
, visando a sustentabilidade.
Figura 3.5- Veículo movido à gás pobre usado durante a Segunda Guerra.
Fonte: Reed (2002).
58
Segundo Nogueira e Lora (2003), em sistemas em que a faixa de potência
não ultrapassa 2MWe os gaseificadores concorrentes e contracorrentes associados
a motores de combustão interna apresentam-se mais viáveis para produção de
energia elétrica, enquanto que os gaseificadores de leito fluidizado são mais
vantajosos para potências superiores a 5 MWe.
Motores de combustão interna têm como princípio de operação o
aproveitamento da energia liberada em forma de gases expandidos, conseqüência
da aplicação de ignição em um volume considerável de fluido em um pequeno
espaço limitado, fechado. Essas explosões podem acontecer centenas de vezes por
minuto. Recebem esta denominação em razão da combustão ser realizada no
próprio fluido operante. Pode acontecer a partir de duas formas de ignição: centelha
ou compressão. O primeiro, de ignição por centelha, é conhecido como motor de
ciclo Otto, enquanto que o segundo, de ignição por compressão, é chamado de ciclo
Diesel.
3.4.1.1 MOTOR CICLO OTTO
Este tipo de motor foi apresentado pela primeira vez na feira mundial em
Paris, em 1878, por Nikolaus August Otto, a gás, funcionando em quatro tempos
(Silva e Rugero, 2003, apud Muraro,2005).
Para melhor compreensão apresenta-se a explicação com apenas um
cilindro, o que não é normal, pois apenas alguns equipamentos fazem uso desse
tipo de motor, como é o caso de motonetas e motores de popa. O entendimento de
motores com mais cilindros fica assim facilitado por se tratarem de repetições do que
ocorre em um deles.
O motor com apenas um cilindro é constituído essencialmente pelas
partes mostradas na figura 3.6.
59
Figura 3.6 - Partes componentes de um motor ciclo Otto com 1 cilindro
Fonte: Muraro (2005).
Dentro do cilindro existe o pistão, que pode se movimentar para cima e
para baixo, ligado à biela, que acompanha seu movimento. Esta, por sua vez, é
conectada à árvore de manivelas, comumente chamada de virabrequim. O
movimento da biela provoca o giro da árvore de manivelas, girando o volante. Este
resultado de movimentos mecânicos pode ser aproveitado para inúmeras utilizações,
dentre elas a geração de energia elétrica.
Na parte superior do cilindro são localizadas as válvulas de admissão e de
escape, responsáveis pela alimentação de combustível e saída dos gases,
respectivamente, além de velas que respondem pela ignição.
O movimento do pistão no cilindro acontece basicamente em quatro
etapas. Na primeira o pistão inicia seu movimento para baixo, ao mesmo tempo em
que a válvula de admissão abre, permitindo a entrada do combustível. Nesse
movimento para baixo o pistão aspira a mistura ar e combustível. Na etapa seguinte,
a válvula de admissão é fechada e o pistão inicia seu processo de subida,
comprimindo a mistura ar/combustível. Na terceira etapa ocorre a combustão do
combustível, conseqüência da faísca provocada pela vela. Gases em alta pressão
são formados e empurram o pistão para baixo. Na etapa final o pistão volta a subir e
a válvula de escape se abre, permitindo a saída dos gases, reiniciando assim um
novo ciclo.
Quando o motor possui vários cilindros, este processo aumenta o giro na
árvore de manivelas, permitindo maior rotação.
60
Segundo a FAO (1993), os motores de ignição por centelha (ciclo Otto)
podem funcionar com gás pobre unicamente, embora apresente problemas
relacionados à limpeza de gases advindos de gaseificadores. A presença de
alcatrão e particulados são extremamente prejudiciais a esses equipamentos e,
portanto, é crucial garantir baixos níveis desses componentes nos gases.
Outro aspecto importante a se considerar diz respeito ao comportamento
do sistema mediante as variações de carga elétrica. Quando a carga varia, o
conjunto motor-gerador tende a modificar sua rotação, o que leva a mudança no
nível da tensão e da freqüência geradas. Tal comportamento pode ocasionar danos
às cargas elétricas supridas pelo sistema. Geralmente a superação desse problema
é levada a efeito pela utilização de combustível de poder calorífico mais elevado,
normalmente de origem fóssil.
3.4.1.2 MOTOR CICLO DIESEL
Após vários projetos em busca de um motor que utilizasse totalmente a
energia do combustível, Rudolf Diesel, engenheiro alemão, conseguiu patentear sua
idéia em 22 de fevereiro de 1893. Apenas em 1898 foi apresentada sua primeira
versão, de 10 cv de potência, apelidada de “minha amante pretinha”.
Semelhante ao ciclo Otto, o ciclo diesel possui quatro fases ou tempos:
aspiração, compressão, expansão e descarga. A diferença reside no fato de que não
acontece centelha ou faísca para provocar a explosão do combustível com
conseqüente expansão dos gases. Isso se graças à grande compressão do ar
puro dentro do cilindro, elevando significativamente a temperatura que, combinada
com o combustível, pulverizado em pequenos jatos a alta pressão, iniciam o
processo de combustão, evitando o efeito de detonação que ocorre nos motores de
ciclo Otto, aumentando o rendimento volumétrico. As quatro fases de funcionamento
do motor ciclo Diesel são mostradas na figura 3.7.
61
Figura 3.7 - Fases do motor ciclo Diesel Fonte: http://www.demec.ufmg.br
No primeiro tempo ou fase, dita de aspiração, o pistão desloca-se no
cilindro desde sua parte superior até a parte inferior, aspirando ar por meio da
válvula de aspiração posicionada na parte superior.
Em seguida, no segundo tempo, chamado de compressão, fecha-se a
válvula de aspiração e o pistão desloca-se da parte inferior para a superior do
cilindro, comprimindo o ar. Com a compressão, o ar sofre aumento de temperatura,
que será tanto maior quanto for a taxa de compressão.
Antes de atingir o limite superior do pistão, a válvula de injeção de
combustível se abre, pulverizando-o para o interior da câmara. Ao encontrar o ar em
elevada pressão e temperatura o combustível incendeia-se espontaneamente,
empurrando o pistão para baixo. Esta fase é denominada de expansão.
No momento em que o pistão se aproxima da parte inferior do cilindro,
ocorre a abertura da válvula de descarga. O pistão, então, reinicia seu processo de
subida, empurrando os gases, nesta que é chamada de fase de descarga. Em
seguida o processo recomeça.
De maneira análoga aos motores ciclo Otto, os de ciclo Diesel também
podem funcionar com gás pobre, apresentando, também problemas com a limpeza
dos gases quando advindos de gaseificadores. Ainda assim, precisam de
adaptações, diminuindo o índice de compressão e instalando uma ignição por
centelha, ou de transformação em um sistema dois combustíveis, gás e diesel.
Neste caso, a necessidade de usar cerca de 20% do consumo de combustível
sendo óleo diesel. Apresenta a vantagem de flexibilidade de usar somente diesel
62
para o caso de falha no funcionamento do equipamento de gaseificação ou da falta
de biomassa (FAO,2003).
Nem todos os tipos de motores diesel podem ser adaptados ao sistema de
funcionamento exposto acima. Seus índices de compressão são elevados, podendo
ocorrer explosões ocasionadas por pressões demasiadamente altas e por
retardamento da ignição. São mais adequados os motores com injeção direta.
Também apresenta dificuldades quanto às variações de carga elétrica,
que podem sofrer danos, tal qual o que acontece no motor ciclo Otto, cuja superação
do problema acontece ao se usar o sistema gás/diesel.
3.4.1.3 OUTROS CICLOS
Ciclo Wankel
Desenvolvido pelo engenheiro alemão Felix Wankel, em 1936, usa o
mesmo ciclo termodinâmico do motor Otto, porém sua construção é totalmente
diferente. Há um rotor de três vértices que pode girar dentro de uma cavidade
especial, em vez de cilindro e pistão com movimento alternativo.
O rotor ao girar no sentido horário aspira o combustível, juntamente com
ar, e os comprime aa região onde o volume é mínimo. Neste momento ocorre a
detonação, por meio da vela, impelindo o rotor e expelindo os gases.
Este tipo de motor apresenta algumas vantagens, tais como menos peças
móveis, movimento suave, com menos vibrações, trabalha em menor rotação para a
mesma potência. No entanto possui desvantagens como maior dificuldade de
refrigeração, desgastes de vedação dos vértices do rotor, maior consumo de
combustível, maior concentração de poluentes nos escapes e maior custo de
produção. Existe apenas um fabricante no mundo, apesar das perspectivas de
amplo uso em automóveis durante as cadas de 1960 a 1980, quando a indústria
Mazda vendeu mais de 300 mil veículos com esse motor. Novas pesquisas podem
viabilizar um maior uso no futuro.
Ciclo Atkinson
Patenteado em 1882 por James Atkinson, motor, que foi batizado com o
sobrenome de seu criador, possui seu ciclo semelhante ao ciclo Otto, porém com a
interligação da biela com a árvore de manivelas numa engenhosa geometria.
63
Pode-se observar a lvula de combustível posicionada na parte inferior
do cilindro, enquanto que a de escape está na parte superior. Entre as duas válvulas
encontra-se a vela.
Em apenas uma única rotação do virabrequim ocorrem os quatro tempos:
admissão, compressão, expansão e descarga. Isso proporciona maior expansão do
que compressão, causando maior aproveitamento da energia dos gases, tornando
maior sua eficiência quando comparado ao ciclo Otto nas mesmas dimensões,
contudo com menor potência.
Após mais de cem anos de sua criação, a utilização desse tipo de motor
ganha força na indústria automobilística, que passa a fazer uso de veículos elétricos
híbridos (VEH). Nesse tipo de veículo o movimento das rodas é acionado por
bateria, cuja alimentação é feita por motor de combustão interna. Quando a
necessidade de energia do motor elétrico é inferior à capacidade do gerador o
excedente é estocado em baterias. Ao contrário, quando a demanda por potência
supera a capacidade do gerador (nas arrancadas), as baterias suprem a energia
necessária. A Toyota e a Ford fabricam modelos de VEH com motores ciclo
Atkinson, cuja razão para tal é atribuída à eficiência desses equipamentos.
3.4.2 MOTORES DE COMBUSTÃO EXTERNA
Sistema diferenciado de combustão acontece no motor Stirling ou de
combustão externa, criado em 1816 pelo pastor escocês Robert Stirling. Nesse
sistema não ocorre combustão no cilindro, a fonte de calor é externa, podendo ser
de qualquer origem. Os gases usados na parte interna do motor não são perdidos,
mantém-se no sistema, sem explosões, o que redunda em baixíssimo nível de ruído.
Por conta disso, submarinos e iates o utilizam com freqüência.
Basicamente o motor Stirling foi desenvolvido a partir de dois princípios
dos gases: O primeiro diz respeito ao aumento da pressão com o aumento de
temperatura para certo volume de gás em espaço limitado; O segundo é o aumento
de temperatura quando ocorre uma redução de volume de uma determinada
quantidade de gás confinado (aumento de pressão).
Há vários arranjos para o motor Stirling. Um sistema simplificado desse
tipo de motor usa uma câmara contendo ar que recebe aquecimento na parte inferior
e resfriamento na parte superior. Outros arranjos utilizam hidrogênio, nitrogênio ou
64
hélio como gás contido na câmara, em face do alto calor específico desses gases.
Dentro da câmara existem dois pistões, chamados auxiliar e acionador, fixados a
uma manivela com defasagem de 90
0
. Quando ocorre certo nível de aquecimento do
ar na parte inferior, acontece maior quantidade de ar quente no conjunto com maior
pressão interna, provocando deslocamento dos pistões para cima. O ar frio na parte
superior reduz a pressão forçando o pistão acionador para baixo que empurra,
também, o pistão auxiliar no mesmo sentido. Em seguida, o ciclo volta a se repetir.
Por não haver escapamento de gases, liberados sob pressão, a operação
é silenciosa, tornando-se esta uma vantagem para o uso deste sistema. A eficiência
apresentadas está em torno de 30%. No entanto, as respostas às variações de
velocidade são muito lentas, pois é grande a inércia da variação do aquecimento.
O amplo uso do motor Stirling é restringido pelos altos custos de
produção, resultantes, principalmente pela complexidade do eixo de manivelas e dos
elementos de troca de calor. Ademais, a necessária construção de um sistema de
gás compacto acrescenta problemas construtivos.
É bem verdade que esses custos tenderiam a redução, caso houvesse
economia de escala, fato não acontecido em virtude de ser uma tecnologia em
desenvolvimento, além dos avanços tecnológicos dos motores de combustão
interna, cuja escala de produção foi incrementada ao longo dos anos, graças aos
baixos preços praticados pelos combustíveis de origem fósseis usados nos mesmos.
Vale ressaltar a vantagem de se ter uma fonte de calor externa, permitindo
maior flexibilidade, podendo-se fazer uso das mais variadas opções, inclusive
energia solar.
A aplicação de motores de combustão externa depara-se com dificuldades
quanto à disponibilidade desses equipamentos para aquisição no mercado, em face
da existência de poucos fabricantes no mundo. No Brasil essa dificuldade aumenta,
já que todas essas indústrias estão estabelecidas no exterior.
3.4.3 TURBINAS A GÁS
Idealizada em 1870 por George Brayton, a turbina a gás possui ciclo
termodinâmico que recebe o seu nome. Teoricamente seu funcionamento é muito
simples. São compreendidas em três partes: compressor, onde ocorre a compressão
65
do ar por alta pressão; combustão, lugar em que acontece a queima do combustível,
produzindo gás com alta velocidade e pressão; e turbina, que extrai energia do gás
vindo da combustão. A figura 3.8 apresenta esquema simplificado desse
equipamento.
Na área de compressão o ar é admitido pela ação de um compressor, que
pode ser do tipo mostrado em que possui a forma de um cone com pequenas pás
dispostas em fileiras. Nesse estágio, o ar é forçado a passar pelas fileiras de pás
provocando um considerável aumento de pressão, podendo atingir um incremento
de trinta vezes.
Da área de compressão o ar com alta pressão é conduzido à área de
combustão, onde o combustível é injetado por anéis, e mantido em combustão de
forma constante. Em face das elevadas velocidades do ar, ocorrem dificuldades de
se manter acesa a chama, condição necessária para garantir a combustão
ininterrupta. Para tanto é preciso usar uma peça metálica oca perfurada, conhecida
como “caneca”.
Figura 3.8 – Esquema simplificado de uma turbina a gás
Fonte: Adaptado de http://science.howstuffworks.com
O calor gerado pela queima do combustível expande o ar, e o
deslocamento em alta velocidade desse ar quente aciona a turbina, que está
diretamente ligada ao compressor por um eixo. No entanto, o estágio final da turbina,
ou seja, a última fileira de pás, está ligado ao eixo de saída, girando livremente, de
forma independente do restante do equipamento.
66
O uso de turbinas a gás para instalações de geração de energia elétrica
usando biomassa tem sua faixa típica de aplicação acima de 5.000 kW, cuja
tecnologia ainda está em desenvolvimento com custo de geração em torno de
US$1.500/kW (NOGUEIRA e LORA, 2003).
Uma característica desses sistemas é a redução do custo de geração à
medida que se aumenta a capacidade de geração. Em outras palavras, apresentam
redução do fator de escala sobre os custos unitários de capital (CORTEZ e LORA,
1997).
No sistema de turbinas a gás ocorre exaustão de gases em altas
temperaturas, cuja recuperação o torna mais eficiente, do ponto de vista
termodinâmico. Quando isso acontece, este ciclo é denominado de combinado.
Basicamente o uso de biomassa como combustível em sistemas de
turbinas a gás pode ser efetivado das seguintes formas:
Sistema BIG/GT (Biomass Integrated Gasification/Gás Turbine)-
O gás advindo de um sistema de gaseificação de biomassa é
injetado como combustível na zona de combustão, após
limpeza;
Sistema BIG/STIG (Biomass Integrated Gasification/Steam
Injected Gás Turbine) – Neste sistema os gases de exaustão em
altas temperaturas são aproveitados para gerar vapor que é
injetado na turbina;
Sistema BIG/IIGT (Biomass Integrated Gasification/Intercooled
Injected Gás Turbine) – ocorre resfriamento intermediário do
combustível e injeção de vapor;
Ciclos de ar quente a turbina opera com aquecimento do ar
por meio de um trocador de calor que usa o calor advindo da
combustão do gás pobre do gaseificador;
Ciclos de queima direta da biomassa Um combustor com leito
fluidizado pressurizado é usado como câmara de combustão.
67
Os principais problemas enfrentados com os sistemas que fazem uso de
turbinas a gás funcionando com gás pobre dizem respeito às dificuldades de limpeza
desse gás, haja vista as altas temperaturas de operação, além da necessidade de
grandes volumes de combustível, consequência do baixo poder calorífico do gás, o
que implica em quantidades significativas de biomassa para alimentar os
gaseificadores. No primeiro caso dificuldades de se obter filtros cujos materiais
componentes consigam operar com temperaturas acima de 700
0
C. Alguns materiais
cerâmicos têm sido usados visando à superação desta barreira. No segundo, é
preciso que se disponha da biomassa com custo de transporte compatível para não
inviabilizar o sistema. É o caso das florestas energéticas e da utilização do bagaço
da cana-de-açúcar.
No caso de se utilizar gaseificadores pressurizados, pode acontecer que a
alimentação da biomassa se transforme numa dificuldade, em face da freqüência de
abastecimento, além da sua pulverização e redução de umidade para no máximo
25%.
3.4.4 MICRO-TURBINAS A GÁS
Micro-turbinas seguem o mesmo princípio das turbinas a gás e são
sistemas normalmente compostos por compressor, câmara de combustão, turbina e
gerador de eletricidade. Desenvolvidas a partir de aplicações da indústria automotiva
e aeroespacial, comercialmente são disponibilizadas com potências que variam de
25 kW a 250 kW, não há uma definição rigorosa para as micro-turbinas (NOGUEIRA
e LORA, 2003). Apresentam uma série de vantagens, dentre elas: podem operar
com vários tipos de combustível, entre os quais gás natural, biogás, diesel, propano
e gás pobre; eficiência elétrica em torno de 30%, podendo ser elevada a mais de
80% quando utilizada em co-geração; baixo nível de ruído; pequenas dimensões, o
equipamento para gerar 30 kW é do tamanho de uma geladeira; baixas emissões de
gases à atmosfera; facilidade de instalação; utilizam rolamentos a ar, evitando a
contaminação dos combustíveis. Entretanto, seus custos de manutenção são
desconhecidos, pouca experiência de utilização, bem como sua vida útil e
68
confiabilidade quando submetidos a cargas parciais o questionáveis (CORTEZ,
LORA E GÓMEZ, 2008).
A figura 3.9 ilustra o funcionamento de uma micro-turbina a gás, onde a
turbina e o compressor estão conectados em um mesmo eixo, possibilitando o uso
da energia gerada para movê-lo. O ar admitido no compressor é submetido a uma
elevação de pressão, empurrando-o para a câmara de combustão onde é
adicionado combustível. Ar quente e combustível são expandidos na turbina,
transformando energia térmica em mecânica, girando o eixo onde está acoplado o
gerador, gerando energia elétrica. Para aumentar o rendimento usa-se um
recuperador de calor (regenerador) que aproveita o calor dos gases de escape para
aquecer o ar antes de admiti-lo no compressor.
Figura 3.9- Esquema de uma micro-turbina a gás Fonte: http://www.Turbec.com
Normalmente o eixo trabalha com rotações em torno de 70.000 a 90.000
rpm, o que implica na produção de eletricidade em corrente alternada com
freqüência elevada (em torno de 1800 Hertz). Para sua utilização em corrente
alternada com freqüência de 50 Hz ou 60 Hz, primeiro a corrente é retificada para
continua depois invertida novamente para alternada.
O uso de gás de gaseificação em micro-turbinas requer eficaz
resfriamento e limpeza desse combustível, para que não haja materiais particulados,
amônia ou alcatrão, prejudiciais a câmara de combustão.
A operação de micro-turbinas com gás de gaseificação de biomassa não
se encontra em escala comercial, havendo poucos projetos demonstrativos no
mundo, dentre eles o Flex-Microturbines, da Reflective Energies, que funciona com
69
cascas de nozes, em Tucson, Arizona, nos Estados Unidos, e o Green Gasifier
Generator, da Commonwealth Scientific and Industrial Research Organization em
parceria com a Capstone e a Smale&CO.
3.4.5 CÉLULAS A COMBUSTÍVEL (FC)
A primeira célula a combustível foi criada em 1839 por William Grove.
Sabia-se que hidrogênio e oxigênio poderiam ser obtidos a partir da água, por meio
de corrente elétrica, processo chamado eletrólise. Grove imaginou que ao inverter o
processo seria capaz de obter eletricidade e água. Criou, então, o que chamou de
bateria a gás voltaico. Cinco anos mais tarde, os cientistas Ludwig Monde e Charles
Langer adotaram o termo célula a combustível, durante a construção de um modelo
prático para produzir energia elétrica.
Consiste, basicamente, de dois eletrodos (ânodo e cátodo) separados por
um eletrólito de diferentes composições químicas, onde o hidrogênio passa pelo
ânodo e o oxigênio pelo cátodo, gerando energia elétrica e água.
O hidrogênio pode ser obtido a partir de gases combustíveis que
alimentam continuamente o eletrodo negativo (ânodo) e o oxigênio, geralmente
advindo do ar, alimenta o eletrodo positivo (cátodo). A reação eletroquímica ocorre
nos eletrodos, produzindo corrente elétrica.
Diferentemente de uma bateria, teoricamente uma célula a combustível
pode produzir energia elétrica sempre, desde que ocorra a continuidade de
suprimento de combustível e do oxidante. Na prática isso de fato não ocorre, por
conta de corrosão primária e degradação dos componentes. A figura 3.10 ilustra o
funcionamento de uma célula a combustível.
70
Figura 3.10 - Esquema de uma célula a combustível
Fonte: http://www.electrocell.com.br
Existem vários tipos de células a combustível, todas gerando corrente
contínua, cuja classificação depende da temperatura de operação e do tipo de
eletrólito usado. Os principais são:
Proton Exchange Membrane Fuel Cell (PEMFC) ou Membrana
de Intercâmbio Protônico – utiliza uma membrana polimérica
hidratada como eletrólito, deve trabalhar a temperaturas em
torno de 80
0
C, para evitar a evaporação excessiva da água,
único líquido neste tipo de FC, mantendo assim a membrana
hidratada, para que se obtenha eficiência adequada. Essa
limitação da temperatura baixa implica em usar combustível com
um mínimo de CO, altamente venenoso nessas condições de
temperatura;
Alkaline Fuel Cell (AFC) ou Célula a Combustível Alcalina
neste tipo de FC o eletrólito é o hidróxido de potássio (KOH)
com dois tipos de concentração possíveis, 85 wt% ou 35 wt% a
50 wt%, adequados para altas temperaturas, em torno de
250
0
C, ou temperaturas menores, em torno de 120
0
C,
respectivamente. Combustíveis isentos de CO e CO
2
são
imperativos, para não alterar o eletrólito, conseqüência de
possíveis reações químicas na presença desses elementos;
71
Phosphoric Fuel Cell (PFC) ou Célula a Combustível de Ácido
Fosfórico o eletrólito utilizado é o ácido fosfórico a 100%, em
temperaturas que variam de 150
0
C a 220
0
C. Seu gerenciamento
é facilitado pela baixa vaporização de água apresentada nesta
FC;
Molten Carbonate Fuel Cell (MCFC) ou Célula a Combustível
Carbonato Fundido combinações de carbonatos alcalinos ou
de sódio e potássio são usadas como eletrólitos, retidos em uma
matriz composta de cerâmica de LiAIO
2
. Operam em
temperaturas elevadas, em torno de 800
0
C;
Solid Oxide Fuel Cell (SOFC) ou Célula a Combustível de Óxido
Sólido óxido de zircônio cerâmico é usado como eletrólito,
operando a temperaturas em torno de 1000
0
C. Obtém o
hidrogênio a partir do metano do combustível.
As células a combustível operam, sem exceção, usando hidrogênio como
combustível, o que implica em usar o combustível gasoso para o caso da biomassa
como fonte. Desta forma, gases obtidos em resíduos lidos urbanos, resultantes de
processo de tratamento de efluentes, gases pobres obtidos em gaseificadores e
reforma de alcoóis são passíveis dessa utilização. As MCFC e SOFC são as mais
recomendadas para esse uso, por conta de suas elevadas temperaturas de
operação.
Salienta-se que não existem sistemas comerciais de células a combustível
operando com biomassa, somente em nível de pesquisa em laboratórios. Seus
custos são elevados, necessitando de maturidade tecnológica. Pode-se citar o
Centro Holandês de Pesquisas em Energia- ECN, a Universidade de L’Alquila, na
Itália, o National Renewable Energy Laboratory, nos Estados Unidos e a
Universidade de Delft, também na Holanda, como exemplos de organizações que
desenvolvem esse tipo de pesquisas.
72
Capítulo 4
APROVEITAMENTO ENERGÉTICO DA BIOMASSA LENHOSA DO RIO MADEIRA
4.1 O RIO MADEIRA
4.1.1 INTRODUÇÃO
Os rios fazem parte da vida quotidiana dos amazônidas, seja como fonte
principal de sua alimentação, seja como importante meio de transporte,
conseqüência da vasta rede hidrográfica existente na região. Eles se confundem
com o dia-a-dia do povo que habita essa área, sobretudo os aglomerados humanos
localizados em áreas distantes das sedes municipais.
Neste contexto encontra-se o rio Madeira, um dos mais importantes rios
da Amazônia Brasileira, exercendo papel crucial nas economias dos estados de
Rondônia e Amazonas. É considerado o mais importante afluente do Rio Amazonas,
em face do volume de águas que esse manancial d’água despeja no maior rio do
planeta. Ocupa o quinto lugar entre os maiores rios do mundo em termos de volume
de água. A figura 4.1 mostra a sua localização.
Figura 4.1 – Localização do rio Madeira Fonte: Adaptado de MT (2004).
73
Entretanto, a navegação nesta hidrovia apresenta alguns percalços
oriundos de fenômenos naturais, tais como bancos de areia, pedrais e troncos
flutuantes, responsáveis por uma indesejável estatística de acidentes aos usuários
deste curso d’água.
A seguir são descritas informações gerais, regime hídrico, clima, geologia,
descarga sólida, dificuldades na navegação e importância econômica do rio Madeira.
4.1.2 INFORMAÇÕES GERAIS
O rio Madeira é formado pela confluência dos rios Beni e Mamoré, na
fronteira com a Bolívia, a jusante da cidade de Guajará-Mirim, como pode ser visto
na figura 4.2 Possui um percurso de aproximadamente 1.450 km, percorrendo toda a
parte leste da Bolívia, norte e oeste do estado de Rondônia, desaguando no rio
Amazonas, na sua margem direita, distante 27 km da cidade de Itacoatiara, no
estado do Amazonas.
Figura 4.2 – Confluência dos rios Beni e Mamoré, formando o rio Madeira
Fonte: http//www.googleearth.com
Segundo a CPRM (1999), a bacia hidrográfica deste importante curso de
água possui área aproximada de 1.420.000 km2, correspondendo a 23% da Bacia
Amazônica, captando 18% da precipitação pluviométrica, contribuindo com 15% do
volume total do rio Amazonas.
74
Pode-se dividir o rio Madeira em três trechos distintos, chamados de alto,
médio e baixo Madeira. O primeiro desses trechos refere-se à região constituída
pelos seus formadores. O médio Madeira é caracterizado pelo trecho repleto de
cachoeiras, iniciando na cachoeira Mamoré até a de Santo Antônio, localizada nas
proximidades da cidade de Porto Velho, estado de Rondônia. O baixo Madeira é a
parte navegável, iniciando-se em Porto Velho até a sua foz, com aproximadamente
1.050 km.
O nome madeira é consequência da notável quantidade de árvores que
flutuam neste rio, trazidas pelos seus afluentes e pelo processo de erosão que ele
próprio causa em suas margens, graças aos movimentos de enchente/vazante.
Esse movimento causa o desprendimento de parte das margens do rio em
fenômeno denominado popularmente de terras caídas. O fenômeno provoca o
arraste para as águas de porção do solo componente das margens, incluindo a
vegetação existente.
Carvalho (2006), define terras caídas como um termo regional usado para
a designação da erosão fluvial, desde as mais simples a altamente complexas,
englobando indiferenciadamente escorregamento, deslizamento, desmoronamento e
desabamento que acontece às vezes em escala quase que imperceptível, pontual,
recorrente e não raro catastrófico, afetando em muitos casos distâncias
quilométricas. É um fenômeno predominantemente complexo, inter-relacionado
causado por fatores hidrodinâmicos, hidrostáticos, litológicos, climáticos,
neotectônicos e, ainda que em pequena escala, antropogênicos.
Para Guerra (1993), citado em Carvalho (2006), as terras caídas são
escavações produzidos pelas águas dos rios, solapando suas margens, assumindo
por vezes aspecto assustador.
La Condamine (1992), apud Carvalho (2006), cita que entre os anos de
1735 e 1745, quando descia o rio Amazonas, um dos maiores perigos da navegação
dizia respeito à colisão com árvores submersas, relatando acidentes com muitos
botes, além do seu próprio barco que foi a pique após colidir com um tronco
submerso.
Esse mesmo autor relata o seguinte trecho de manifestação de viagem de
inspeção do Ouvidor Sampaio ao rio Solimões em setembro de 1774:
75
Foi pouco agradável o dia de hoje; porque
além das contínuas correntezas, toda a margem,
que era necessário seguir em pouca distancia da
terra, estava embaratada de grossísimos troncos, e
ramos de árvores, ou arrojadas no rio, ou cahidas da
terra da mesma margem. Esta estava
continuamente desabando em largas porções.
Passávamos por baixo de árvores altíssimas, que
ameaçavão momentânea cahida; porque o terreno
pouco sólido, as raízes a superfície, e a água
sucessivamente minando, assim o indicavão e a
cada passo se vião terras precipitadas de fresco.
Este he hum dos grandes perigos desta viagem, e
que tem sido a cauza de muitos naufrágios com
perda de inumeráveis vidas ( SAMPAIO, Ouvidor
1825, p. 14).
Verifica-se que o fenômeno acontece séculos na região e que não se
imagina que irá reduzir em um horizonte próximo, mesmo porque se trata de um
evento geológico, onde a unidade temporal normalmente se em valores
consideráveis.
A maior contribuição de volume de água do rio Madeira provém do rio
Beni, um de seus formadores, chamado outrora de rio dos Troncos, devido à enorme
quantidade de troncos de árvores trazidas pelas suas enchentes.
Os principais afluentes do Madeira são: rio Jamary com aproximadamente
370 km de extensão, com calado que pode atingir até 9m, é navegável até o local
onde se localiza a usina hidrelétrica Samuel, deságua nas proximidades da
localidade denominada São Carlos a 80 km da cidade de Porto Velho; rio Ji-Paraná,
também conhecido como rio Machado, com mais de 700 km de extensão possui
navegabilidade durante o inverno, atingindo 10m de calado e sua foz se encontra
próximo à comunidade Calama, 200 km a jusante da cidade de Porto Velho; rio
Marmelos, possui cerca de 270 km navegáveis dos seus mais de 700km de
extensão, com calados variando de 1m, durante o verão, até 4m, durante o inverno,
desaguando na localidade que recebe o mesmo nome (Marmelos), cerca de 100 km
76
a montante da cidade de Manicoré, no estado do Amazonas; rio Manicoré,
navegável durante o inverno por mais de 120 km, com 3m de calado, desaguando a
montante da cidade de Manicoré, bem próximo à sua sede; rio Aripuanã, possui
1100 km de extensão, em seu leito está prevista a construção da Hidrelétrica de
Dardanelos, sua foz está localizada na sede da cidade de Novo Aripuanã.
Segundo Medeiros (2006), o declive do rio Madeira na sua parte
navegável é de apenas 53,6 m, entre a cidade de Porto Velho e sua foz no rio
Amazonas, ao longo de 1160 km, ou seja, 4,6 cm/km, o que leva à conclusão de que
o deslocamento da massa aquosa se como conseqüência de pressão da água
nova que entra no rio e não pela declividade.
Ressalta-se uma particularidade da bacia do Madeira no fato de que sua
margem esquerda possui uma pequena extensão, com largura média de 100 km,
limitando-se com a bacia do rio Purus, ficando praticamente a margem direita como
única responsável pela área de contribuição dessa bacia.
4.1.3 REGIME HÍDRICO
O regime hídrico desse importante rio da Amazônia apresenta situação
atípica em relação aos demais cursos d’água da região. Segundo Medeiros (2006),
apenas 25% de seu volume provêm de rios de pequenas descargas líquidas
existentes à jusante da cidade de Porto Velho, estado de Rondônia, dependentes do
clima da região sul amazônica, local onde duas estações climáticas são bem
definidas, verão e inverno, quando ocorrem maiores e menores precipitações
pluviométricas, respectivamente. Os demais 75% estão relacionados com o clima da
região andina do leste da Bolívia.
A vazão do rio Madeira apresenta uma enorme variação entre os períodos
de enchente e de vazante, muito embora esses valores máximos e mínimos não
apresentem grandes diferenças entre si na comparação ao longo dos anos. As
descargas máximas atingem patamares entre 30.000 a 35.000 m
3
/s, enquanto que
na vazante entre 5.000 e 10.000 m
3
/s, conforme AHIMOC (1999).
Dado interessante referente ao ciclo de enchente é o que regionalmente
se chama “enchente de cima” e “enchente de baixo”. A primeira enchente atinge
77
toda a extensão do rio Madeira e ocorre por conta do ciclo hidrológico, ocasião em
que o rio Amazonas apresenta suas águas baixas. A segunda enchente acontece a
partir de abril, quando o rio Madeira inicia seu ciclo de vazante o coincidente com
o ciclo do rio Amazonas que se encontra ainda na época de enchente. Chega um
momento em que a cota do rio Amazonas torna-se mais elevada que a do rio
Madeira, represando-o até a cidade de Manicoré, no estado do Amazonas. Este
fenômeno provoca o aparecimento de muitas ilhas móveis de sedimentos, em razão
da redução da dinâmica do rio, desaparecendo quando acontece a cheia de cima. O
limite superior da “enchente de baixo” é chamado de “barra da enchente de baixo”.
A figura 4.3 mostra as variações de vazão ao longo dos meses, medidas
em estações localizadas na cidade de Porto Velho e na comunidade de Vista Alegre,
localizada próxima à foz, a aproximadamente 50 km.
Hidrograma do rio Madeira
0
10000
20000
30000
40000
50000
60000
Jan
ei
r
o
M
ar
ço
M
a
i
o
Ju
l
ho
Setembro
Novembro
Meses
Vazão (m
3
/s)
Vista Alegre
Porto Velho
Figura 4.3 – Hidrograma do rio Madeira em Porto Velho e próximo à foz em Vista Alegre
Fonte: AHIMOC (1999).
Pode-se observar na figura 20 que o período de maior vazão na cidade de
Porto Velho ocorre entre os meses de fevereiro a abril, enquanto o de maior vazante
de agosto a novembro.
Ainda na figura 4.3, verifica-se que o período de maior vazão em Vista
Alegre tem ocorrência entre os meses de março a maio, e os de menor vazão entre
os meses de setembro a novembro.
78
Analisando o hidrograma, pode-se constatar que é muito pequeno o
deslocamento do pico de cheia entre Porto Velho e Vista Alegre e que ocorre pouco
incremento de vazão, o que leva à conclusão de maior influência da região à
montante de Porto Velho.
4.1.4 CLIMA
O clima da região do Madeira é do tipo “AM”, segundo a classificação de
Köppen, quente e úmido, com estação seca pouco pronunciada. A umidade
relativa do ar fica em torno de 85% ao longo do ano, com temperaturas médias
que variam entre 25
0
C e 27
0
C. As precipitações médias anuais estão acima de
2200 mm, concentrando o período chuvoso de dezembro a abril (CPRM, 2000).
4.1.5 GEOLOGIA
A partir da cidade de Porto Velho até sua nascente, o rio Madeira possui
seu curso sobre rochas Pré-Cambrianas, onde se apresenta estruturalmente
encaixado, com desníveis em relação às margens e elevado número de cachoeiras
e corredeiras.
Em direção à sua foz atravessa áreas sedimentares da formação Alter do
Chão (65 a 60 milhões de anos) e formação Solimões (2,6 a 2,4 milhões de anos),
região em que desaparecem as cachoeiras e corredeiras, porém mantém o mesmo
aspecto de encaixamento.
A Formação Alter do Chão corresponde a área denominada de Planaltos
Rebaixados da Amazônia, mais conhecidos regionalmente como terras firmes.
Normalmente apresenta água subterrânea em abundância e de boa qualidade,
embora pobre em sais minerais em sua composição química. Seu ambiente
compõe-se de sedimentos transportados do final do Terciário, com porções
lenticulares de arenito de coloração avermelhada (arenito Manaus), estratos de
argila e areia intercalados, com morfologia de ondulações leves, com ocorrências de
latossolos vermelho-amarelo distrófico gigantes, com mais de 100 m de perfil.
A Formação Solimões tem como característica um ambiente continental
fluvial, representada por sedimentos de transbordamento de canal. Apresenta
79
porções lenticulares, predominando argilas cinza, verde, marrom-arroxeada ou
esbranquiçada, com lentes e veios de calcita e gipso, acamadas ou laminadas,
estratificações cruzadas de pequeno e médio portes, pouco endurecidas.
O rio Madeira, de modo geral apresenta menor faixa de planície em sua
margem esquerda, que está em contato com os relevos do Planalto Rebaixado da
Amazônia. Este fenômeno parece ser um dos agentes responsáveis pela não
ocorrência de meandros em seu talvegue.
4.1.6 DESCARGA SÓLIDA
De acordo com AHIMOC (2003), a cordilheira dos Andes exporta
aproximadamente 5x10
8
toneladas de sedimentos anualmente, dos quais 40% são
transportados pelos rios e 60% ficam em seu sopé. O Madeira é um dos principais
rios transportador desses sedimentos.
Ainda segundo AHIMOC (2003), o rio Madeira possui um fluxo global de
sedimentos da ordem de 2,7x10
8
toneladas por ano. Desse total 15% é material
dissolvido e 85% material particulado (sedimento de fundo ou em suspensão).
Apenas 2% do material particulado são transportados por arraste e/ou saltitação e se
encontra no leito, enquanto que 98% são transportados em suspensão.
A análise do tamanho dos grãos desse material particulado aponta uma
granulometria média (diâmetro correspondente a mais de 50% das partículas - d50)
em torno de 0,11mm, compondo-se de lama (70%), argila e silte 20% e areia (10%).
O material de fundo é composto de 50% de quartzo, 20% de feldspato e 30% de
argilas (MEDEIROS, 2006).
Ainda segundo Medeiros (2006), nas proximidades da foz, na cidade de
Urucurituba, a granulometria média desse material particulado sofre um acréscimo e
assume o valor de 0,17 mm, e na maior parte é constituída de areia fina.
Os sedimentos transportados pelo Madeira provocam o aparecimento de
bancos formados por argila e areia, causando dificuldades para a navegação a partir
do assoreamento do canal navegável. Em algumas cidades esse fenômeno tem
aumentado de forma substancial, de forma particular na cidade de Manicoré.
Uma explicação plausível desse fenômeno está intrinsecamente ligada à
redução da velocidade de escoamento das águas quando ocorre o que
regionalmente se denomina “barra da enchente de baixo”, anteriormente explicada.
80
Em outras palavras o nível do rio Amazonas na foz impede o deságüe do rio
Madeira, provocando uma elevação do nível desse rio, formando uma espécie de
cortina de sedimentação e consequente assoreamento. Como essa “enchente” tem
seu ponto máximo em Manicoré, é nessa cidade que ocorre com mais ênfase esse
processo, porém os demais municípios à jusante também sofrem com esse
problema.
Vale salientar que em face de monitoramento ambiental da Hidrovia,
obrigatório desde 1999, por conta das Licenças de Instalação e de Operação, está
sendo construído um banco de dados que poderá permitir maior conhecimento sobre
esse fenômeno, de tal sorte que possa manter a qualidade do ecosistema.
4.1.7 DIFICULDADES NA NAVEGAÇÃO
Como os demais rios da região amazônica, o rio Madeira apresenta dois
períodos distintos, bem definidos, que possuem características diferenciadas quanto
às dificuldades para sua navegabilidade. O primeiro ocorre durante a época
chamada de enchente, quando o nível de suas águas sobe, conseqüência de
contribuição de seus formadores e tributários, por conta do degelo dos Andes e das
chuvas em sua bacia hidrográfica. Geralmente acontece entre os meses de
setembro a maio, sendo entre março e maio a época de cotas mais elevadas. O
segundo período, conhecido como vazante, ocorre entre os meses de maio a
setembro, quando o rio atinge seu nível mais baixo. Existe, ainda, um terceiro
período chamado de repiquete, que acontece durante o mês de outubro, ocasião em
que o ciclo das águas inverte seu fluxo e ao invés de aumentar o nível das águas,
esse sofre uma descida de até 3m, quando volta a subir.
A diferença de nível entre a vazante e a enchente do rio Madeira chega a
atingir 14 m. Seu traçado é permanente, embora seu canal principal sofra alterações
durante a estação de enchente, época em que suas águas apresentam-se de cor
barrenta, alterando para claras durante a fase de vazante.
Em face do movimento de enchente/vazante o calado do canal principal
sofre variações que vão de 2m na época de águas baixas até mais de 6m durante as
águas altas. Esses valores de calado inferem a condição de navegabilidade durante
todo o ano ao rio. Apesar disso, exige atenção constante de quem o navega por
conta da forte correnteza, do aparecimento de bancos de areia, dos pedrais, dos
81
obstáculos flutuantes descendo o rio e do acúmulo de árvores e troncos em
determinados pontos, chamados de “paliteiros”.
A velocidade das águas do Madeira provoca uma série de redemoinhos
que chegam a tirar embarcações de seu rumo. Na cidade de Borba atinge valor que
chega a 7 nós ou aproximadamente 3,6 m/s, capaz de perda de ferros de algumas
embarcações.
Os aparecimentos de ilhas de bancos de areia são freqüentes durante o
período de vazante, cujas localizações variam muito ano após ano. Esses bancos de
areia são responsáveis por inúmeros acidentes e seu processo de retirada é feito por
meio de dragagem que por conta de razões ambientais fazem a deposição do
material retirado no próprio leito do rio. Salienta-se que em determinados locais os
bancos de areia aparecem todos os anos, possibilitando suas identificações em
cartas náuticas, além de sinalizações. A figura 4.4 apresenta um desses
afloramentos.
Figura 4.4 – Afloramento de ilhas de areia durante a vazante do rio Madeira
Fonte: Medeiros (2006).
Os pedrais existentes na hidrovia são constituídos de diques de granito
que cortam a calha do rio de forma transversal e, assim como inúmeros bancos de
areia, já foram inventariados e constam de cartas náuticas. A definição de um melhor
processo de retirada, denominado derrocamento, carece de prévio levantamento
geológico. A figura 4.5 mostra um desses pedrais.
82
Figura 4.5 – Pedral no rio Madeira Fonte: AHIMOC(2000).
Os obstáculos flutuantes são formados por pedaços de terra com
vegetação, árvores e troncos de madeira que acontecem ao longo de todo o trajeto
do rio desde a sua formação, na fronteira com a Bolívia, até a sua foz. Esses
obstáculos são originários de processo erosivo natural de queda das margens, em
face da instabilidade, que o curso d’água provoca, em fenômeno conhecido como
“terras caídas”, conseqüência do movimento de enchente/vazante. Normalmente a
queda das árvores e de barrancos acontece quando da vazante e são arrastados
durante o período de cheia. Há, também, a contribuição do homem que desmata a
área de várzea, geralmente para uso da pecuária, deixando que o resultado dessa
atividade de desmatamento seja arrastado pelas águas do rio. Pode-se verificar na
figura 4.6 uma imagem característica do Madeira durante a cheia.
Figura 4.6 – Vista do rio Madeira com sua notável quantidade de troncos flutuantes
Fonte: AHIMOC (2000)
83
Os troncos e árvores arrastados pelas águas do Madeira, dependendo de
suas densidades, podem não flutuar e arrastados pela correnteza acumularem-se
em determinados locais causando o que é denominado “paliteiro”. Esses troncos e
árvores acumulados atuam como verdadeiras lanças colocadas no leito do rio e têm
causado prejuízos às embarcações, inclusive provocando naufrágios. A figura 4.7
mostra um desses “paliteiros”.
Figura 4.7 – “Paliteiros” no rio Madeira Fonte: AHIMOC, 2000.
Baseado em informações contidas em AHIMOC (1999, 2000, 2003) e
Medeiros (2006), a tabela 4.1 apresenta um resumo das passagens identificadas
com seus respectivos obstáculos, sobretudo na época de águas baixas, e suas
localizações referenciadas a partir da foz em direção à cidade de Porto Velho,
estado de Rondônia.
Tabela 4.1 – Locais identificados, posicionamentos e dificuldades à navegação no rio
Madeira
Local Posic. Dificuldades à navegação
Foz do Madeirinha PK 197 "Paliteiros"
Ilha dos Ganchos PK 235 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Porto do Cruzeiro PK 339 "Paliteiros"
Bom Malcher PK 345 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Uruazinho PK 355
Afloramentos rochosos, "paliteiros" e
bancos de areia
84
Continuação da Tabela 4.1 Locais identificados, posicionamentos e dificuldades à
navegação no rio Madeira
Local Posic. Dificuldades à navegação
Uruá Grande PK 365 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Cachoeirinha PK 380 "Paliteiros"
Paraná do
Jenipapo
PK 399,5
"Paliteiros"
Costa do Atininga PK 408 "Paliteiros"
Manicoré PK 465 Bancos de areia
Santa Helena PK 538 Bancos de areia
Marmelos PK 550 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Ilha Santa Cruz PK 565 Bancos de areia
Baianos PK 617 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Pedra São
Raimundo PK 625 Afloramento rochoso
Trapicho PK 640 Bancos de areia
Ilha Rasa das 3
Casas PK 730 Bancos de areia
Pupunhas PK 780 Bancos de areia
Boca do Rio PK 795 Bancos de areia
Ilha Salomão PK 845 "Paliteiros"
Ilha do Tambaqui PK 855 Bancos de areia
Papagaio PK 905 Bancos de areia e "paliteiros"
Abelhas PK 923 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Pombal PK 930 Afloramentos rochosos e bancos de areia
Barreira do
Guierera
PK 955 Bancos de areia
Periquitos/Curicaca
PK 975 "Paliteiros"
Porto Chuelo PK 1015 Bancos de areia
Belmonte PK 1035 Afloramento rochoso
Mutuns PK 1036 Bancos de areia e "paliteiros"
85
Das localidades relacionadas na tabela 4.1, dois pontos destacam-se , em
face de se constituírem os mais críticos para navegação de comboios durante a
vazante, são as passagens Marmelos, no PK-550, e Abelhas, no PK–923.
Em Marmelos os comboios são obrigados a efetuar o desmembramento
de suas unidades para ultrapassá-lo, por conta de pedrais que impõem ao canal
principal sinuosidade com raios de curvatura limitados, além de intensa velocidade
das águas.
na passagem Abelhas o canal principal apresenta-se com grande
largura, profundidade adequada, porém com pedras no meio que limitam o calado.
4.1.8 IMPORTÂNCIA ECONÔMICA
A importância econômica do rio Madeira para a região ganhou uma nova
pujança em virtude do avanço da fronteira agrícola no norte do Mato Grosso e sul de
Rondônia, mais especificamente do cultivo de grãos, em especial a soja. É
interessante observar que esse avanço foi propiciado por incentivos implementados
por políticas públicas de consecutivos governos federais entre os anos 60 e 70 que
foram responsáveis pela implantação de rodovias, como a Belém-Brasília, a
Transamazônica, a Cuiabá-Porto Velho e a Manaus-Porto Velho, e de programas de
colonização como o Polamazônia, Pin e Proterra, fatores determinantes para esse
avanço.
Os escoamentos das produções dessas regiões ocupadas pelos
Programas de Colonização eram realizados praticamente por modal rodoviário em
quase toda a sua totalidade, o que propiciou um elevado custo para esses produtos
agrícolas. Para se ter uma idéia, a tonelada transportada de soja da Chapada dos
Parecis, no Mato Grosso, até os portos de Santos e Paranaguá tinha os custos com
variação entre US $ 95,00 a US $ 110,00, com consequente perda de
competitividade no mercado externo.
A alternativa encontrada foi a utilização do multi-modal rodo-fluvial-
marítimo, por meio da integração do rio Madeira aos modais rodoviário e marítimo,
em um sistema de transportes denominado Corredor Noroeste Multi-Modal de
Exportação. Este sistema permitiu economia de mais de US $ 30,00 por tonelada,
possibilitando fortalecer a integração econômica dos estados do Amazonas, Mato
Grosso, Rondônia, Acre, Roraima e Pará.
86
O Corredor Noroeste Multi-Modal de Exportação consiste de transporte
rodoviário pela BR-364 da produção de grãos do Mato Grosso até a cidade de Porto
Velho, daí segue em comboios de balsas/empurrador pelo rio Madeira até a cidade
de Itacoatiara, no estado do Amazonas e então de navios para o Porto de Roterdam,
na Holanda.
Para que se possa avaliar o que significa o uso desse corredor, segundo
AHIMOC (2008), pela Hidrovia do Madeira no ano de 2007 foram transportados
1.714.243 ton de grãos de soja de Porto Velho para Itacoatiara e 883.097 ton para o
porto de Santarém, no estado do Pará, além de 474.872 ton de demais cargas para
Manaus. Ainda segundo esta mesma fonte, pelo rio Madeira foram transportados
929.121 ton de carga de Manaus para Porto Velho. Ao todo, considerando todos os
destinos, a Hidrovia do Madeira foi responsável pelo transporte de mais de 4 milhões
de toneladas de carga em 2007.
4.2 A BIOMASSA LENHOSA DISPONÍVEL NO RIO MADEIRA
Em razão de ser uma hidrovia, as ões necessárias para a manutenção
da navegabilidade de forma perene e segura do rio Madeira é de responsabilidade
do Governo Federal. A Administração das Hidrovias da Amazônia Ocidental
AHIMOC, órgão vinculado à Companhia Docas do Maranhão e ao Departamento
Nacional de Infraestrutura Terrestre – DNIT, do Ministério dos Transportes, é a
responsável pelas atividades necessárias para garantir essa navegabilidade. Para
atingir esse objetivo são necessárias, dentre outras intervenções, a realização de
balizamento (operação de sinalização), a remoção de bancos de areia do canal
principal, a retirada de pedras, em operação denominada derrocamento, assim como
a retirada de obstáculos flutuantes, dentre eles os paliteiros.
Segundo AHIMOC (2000), a remoção de paliteiros iniciou-se de forma
emergencial no rio Madeira no ano de 2000 em função de interrupção da navegação
entre as cidades de Porto Velho e Humaitá, mais precisamente nas passagens
conhecidas como Papagaios e Cavalcante, em agosto daquele ano, por intermédio
da empresa Hidrocart Cartografia Ltda. Essa empresa foi contratada para realizar a
tarefa, além de levantamentos batimétricos após o destocamento, ou seja, realizar
levantamentos capazes de possibilitar a identificação da situação do canal após a
87
limpeza. O aparelho utilizado para tal foi um eco-batímetro, que faz uso da emissão
de ondas sonoras para identificação de profundidades.
Ainda de acordo com AHIMOC (2000), nessa operação foram retirados
3200 m
3
de material, porém não há registro das localidades onde foram retirados
esses materiais.
A partir de 2001 até o ano de 2005 as retiradas de paliteiro foram
realizadas regularmente e seus volumes constam na tabela 4.2.
Tabela 4.2 – Volumes de biomassa lenhosa retirada dos paliteiros do rio Madeira
Fonte: Hidrocart (2000, 2001), J.R. Almeida (2002, 2003, 2004,2005).
Volume retirado por ano (m
3
)
Local
2001 2002 2003 2004 2005 Média
Foz do Paraná do
Madeirinha
209.36 209.36
Porto do Cruzeiro 350.2 350.2
Santa Rosa 418.71 418.71
Enseada
Cachoeirinha
310.59 310.59
Paraná do Jenipapo 650 238.92 444.46
Costa Bela Vista do
Atininga
468.89 468.89
Ilha do Salomão 545 590 590 725 649.43 619.89
Papagaios 545 560 560 690 406.75 552.35
I. Periquitos/
Curicaca
420 440 440 540 424.74 452.95
Capitari 520 540 540 665 0 566.25
Mutum 670 770 755 930 143.32 653.66
Totais 2700 3550 2885 3550 3620.91
3261.18
Ao se observar os dados constantes na tabela 4.2, verifica-se que as
atividades de retirada de paliteiros foram repetidas nas localidades Paraná do
Jenipapo, Ilha do Salomão, Papagaios, Ilha dos Periquitos/Curicaca, e Mutum nos
anos de 2001 a 2005. A operação na localidade de Capitari aconteceu de 2001 a
88
2004, não tendo sido realizada em 2005 devido ao nível elevado das águas
quando da chegada dos equipamentos ao local, segundo informações obtidas junto
à empresa J.R Engenharia Ltda, executora do contrato de desobstrução. As
operações na localidade Mutum também foram prejudicadas nesse ano pelas
mesmas razões, ocasião em que menos de 1/3 dos volumes anteriormente retirados
puderam ser destocados.
Ainda na tabela 4.2, pode-se observar que em 2005 os paliteiros
apareceram em lugares não retirados em anos anteriores. Atribui-se ao fato de que
naquele ano foi registrada uma das maiores vazantes do rio Madeira, corroborado
pela época em que foram iniciados os trabalhos, que permitiu visualizar tais
obstáculos.
É importante destacar que os procedimentos de retirada das árvores
submersas que formam os paliteiros têm sido realizados sem uso de equipamentos
específicos para suas visualizações. As árvores são identificadas a olho nu a partir
da parte que fica acima do nível d’água, por conseguinte as árvores totalmente
submersas não são retiradas.
Salienta-se que os volumes retirados dos paliteiros ao longo dos anos não
refletem os valores mais adequados para a garantia da navegação. Na verdade
esses volumes são normalmente limitados por dotações orçamentárias da AHIMOC.
Outro fator limitador está intrinsecamente ligado ao sincronismo entre
procedimentos burocráticos inerentes à contratação de empresa para realizar a
atividade e a velocidade do movimento natural de enchente/vazante do rio. Todo
trabalho burocrático deve ser concluído de tal sorte que a retirada de paliteiros deva
coincidir com o período de vazante máxima. Vale salientar que existe uma
defasagem de aproximadamente um mês entre a época em que ocorre a vazante
em Porto Velho e em Vista Alegre, nas proximidades da foz. Em Porto Velho as
mínimas vazantes ocorrem entre os meses de setembro e outubro, e em Vista
Alegre entre os meses de outubro e novembro.
Como anteriormente citado, um dos motivos para a retirada dos paliteiros
é a segurança na navegação. A ocorrência constante de obstáculos flutuantes no rio
Madeira apresenta-se como uma das principais causas de acidentes envolvendo
colisão. Dados obtidos em histórico de acidentes ocorridos entre os anos de 1997e
2005, baseados em inquéritos instaurados pela Capitania dos Portos, citados em
89
Medeiros (2006), foram usados para elaboração de resumo desses acidentes,
expressos na tabela 4.3.
Tabela 4.3 – Número de acidentes no rio Madeira provocados por colisão com objeto
submerso
Fonte: Adaptado de Medeiros (2006)
.
Ano 1997 1998 1999 2000 2001
2002
2003 2004 2005
Número de
acidentes
7 13 9 4 1 0 4 2 1
Verifica-se na tabela 4.3 uma sensível redução do número de acidentes a
partir de 2000, ano em que a AHIMOC deu início às atividades de retirada de
paliteiros. É interessante observar, também, que os anos de 1997, 1998 e 1999
registraram cheias e vazantes historicamente expressivas, segundo a ANA (2008), e
que mesmo em 2005, quando ocorreu a maior vazante registrada no rio Madeira até
então, o número de acidentes foi de apenas 1.
Fato que merece destaque é que durante os anos em que as retiradas de
paliteiros foram realizadas, os descartes dos materiais resultantes dessas atividades
foram feitos nas margens do próprio rio Madeira, em locais onde o retorno desses
materiais teria pouca probabilidade de ocorrer, segundo a AHIMOC (2006). A figura
4.8 mostra um desses lugares.
Figura 4.8 – Um dos Locais de descarte da operação de retirada de paliteiros
Fonte: AHIMOC (2003)
90
Uma análise mais apurada permite conjecturar que a disposição da
biomassa lenhosa da forma como foi executada não permite a afirmação de que seu
retorno ao rio não é possível. Essa conjectura fundamenta-se nas limitações dos
equipamentos usados para essa atividade, os guinchos acoplados à balsa não
possibilitam dispor a biomassa em locais que garantam que a mesma não seja
atingida durante a enchente, trazendo-a de volta às águas.
Todo esse material se apresenta, na verdade, como uma importante fonte
de energia que pode ser utilizada para fins de geração de energia elétrica destinada
ao suprimento de comunidades isoladas não contempladas por esse bem de
consumo, situadas nos arredores dos locais de coleta, ou mesmo para reduzir a
demanda reprimida nas sedes municipais da calha do Madeira, podendo contribuir
desta forma com o PLpT no tocante a definição de uma solução sustentável passível
de contribuir com o cumprimento de suas metas.
4.3 POTENCIAIS CONSUMIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA
Ao longo da calha do rio Madeira, em sua parte navegável, são
encontradas as sedes dos municípios de Porto Velho, em Rondônia, em seu início, e
de Humaitá, Manicoré, Novo Aripuanã, Borba e Nova Olinda do Norte em território
amazonense, além de um considerável número de comunidades. As comunidades,
por município e localidade, que se encontram nas proximidades dos pontos onde
foram realizadas as operações de retirada de paliteiro entre os anos de 2001 a 2005,
segundo informações obtidas em Ministério dos Transportes, 2004, constam na
tabela 4.4.
Tabela 4.4 – Comunidades próximas aos locais de retirada de paliteiros.
Fonte: Ministério dos Transportes (2004)
.
Local Município Comunidades
Foz do Paraná do
Madeirinha
Borba
Jacarezinho, Santa Helena,
Muiratinga, S. Sebastião,
Iracema, Felicidade, B.
Horizonte, S. Sebastião do
Jauari
91
Continuação da tabela 4.4 Comunidades próximas aos locais de retirada de paliteiros
Ministério dos Transportes (2004)
.
Local Município Comunidades
Porto do
Cruzeiro
Novo
Aripuanã
Bom Malcher, Bacabal, Santa Rosa, Novo Mundo, São
Bento, Conceição, Nova Estrela
Foz do
Paraná do
Madeirinha
Borba Jacarezinho, Santa Helena, Muiratinga, S. Sebastião,
Iracema, Felicidade, B. Horizonte, S. Sebastião do Jauari
Porto do
Cruzeiro
Novo
Aripuanã
Bom Malcher, Bacabal, Santa Rosa, Novo Mundo, São
Bento, Conceição, Nova Estrela
Santa Rosa
Novo
Aripuanã
Plinióplis, Itaituba, São Pedro, Vencedor, Conceição
Enseada
Cachoeirinha
Manicoré
Colares, Cachoeirinha, Santa Helena, Macaco Prego,
Itapenima
Paraná do
Jenipapo
Manicoré
Primavera, Jenipapo, São Raimundo, São Mateus, Porto
Seguro
Costa Bela
Vista do
Atininga
Manicoré Curralinho, Boa Vista do Atininga, Delícia, Santo Antônio
Ilha do
Salomão
Humaitá Fausto, Goiabal, Laranjal
Papagaios
Humaitá Assunção, Nova Fé, Goiana, Nova Esperança, Firmeza
I. dos
Periquitos
Porto Velho Vista Alegre, Vila de Nazaré, Boa Hora, Boa Vitória
Capitari
Porto Velho Sobral, São Carlos, Aliança e Bom Sossego
Mutum
Porto Velho Cojubim, Bom Jardim, Mutuns, Barreira Vermelha
De acordo com CEAM (2009), verificou-se que ao longo do rio Madeira
apenas as sedes municipais das cidades de Borba, Novo Aripuanã, Manicoré e
Humaitá, todas no estado do Amazonas, constantes na tabela 4.4 possuem
atendimento de energia elétrica.
Por meio de levantamento in situ verificou-se que as comunidades
localizadas na margem direita do rio Madeira, desde a sede da cidade de Porto
92
Velho, estado de Rondônia, até a foz do rio Jamary, estão conectadas à rede. São
elas as comunidades Cojubim, São José, Aliança, Bom Sossego, Belmonte e Sobral.
As demais, localizadas na margem direita, não possuem geração de energia, à
exceção de São Carlos.
4.4 POTENCIAL DE GERAÇÃO USANDO A BIOMASSA LENHOSA DO RIO
MADEIRA
Vislumbram-se duas rotas adequadas para a geração de eletricidade
usando a biomassa lenhosa oriunda do rio Madeira: a gaseificação acoplada a
motores de combustão interna e o ciclo a vapor usando turbinas. A mais adequada
está intrinsecamente ligada à escala de produção.
Para Nogueira e Lora (2003), tecnologia com gaseificadores e motores
alternativos de geração elétrica com biomassa estão disponíveis até a capacidade
de 1 MWe, enquanto o uso de tecnologia de ciclo a vapor estão disponíveis em
plantas a partir desse valor.
Segundo Cortez, Lora e Gómez (2008), efeitos da economia de escala
limitam a produção de energia elétrica por meio de motores de combustão interna
integrados a gaseificadores a instalações com capacidades até 150 kWe.
Para exemplificar, na cidade de Itacoatiara, a aproximadamente 50 km da
foz do rio Madeira, existem duas plantas instaladas, com capacidades de 9 MWe e
5MWe, pertencentes às empresas BK Energia
5
e Maggi Energia
6
, respectivamente,
que utilizam resíduos de indústrias madeireiras como insumo.
A utilização de biomassa lenhosa como combustível sólido em sistemas
de geração de energia elétrica impõe a necessidade de granulometrias bem
definidas para que sejam logradas boas condições de operação e rendimento
(NOGUEIRA e LORA, 2003). No caso da madeira flutuante do rio Madeira significa a
adoção de procedimentos de corte com uso de picadores para enquadramento nas
dimensões requeridas visando a utilização nas rotas tecnológicas vislumbradas
neste trabalho: gaseificação ou ciclo a vapor.
5
BK Energia Itacoatiara Ltda Produtor independente de energia elétrica, localizado no município de Itacoatiara, estado do Amazonas,
autorizado pela Resolução ANEEL n
o
425, de 15 de outubro de 2001.
6
Maggi Energia S/A – Produtor Independente de energia elétrica, localizado em Itacoatiara, estado do Amazonas, autorizado pela Resolução
ANEEL n
o
385, de 31 de julho de 2003.
93
O volume resultante após o corte, chamado volume a granel, certamente
diferirá daquele obtido durante a operação de retirada de paliteiros, ressaltando-se
sua variação de espécie para espécie de madeira. Este volume pode ser estimado a
partir do conhecimento da massa do material disponível in natura, obtido a partir do
volume constante na tabela 2.1 multiplicado pela densidade aparente desse material
pela expressão seguinte:
M
disp
=V
disp
×ρ [3], onde:
M
disp
– massa disponível in natura (kg);
V
disp
- volume disponível in natura (m
3
)
ρ - densidade da biomassa disponível (kg/m
3
).
Em face da inexistência de inventário relativo às espécies de madeira
retiradas dos paliteiros, que permitiriam avaliação da densidade da biomassa (ρ),
foram coletadas amostras de biomassa lenhosa nas localidades Mutum, Capitari e
Curicaca. Após análises em laboratório foram identificadas as espécies Xylopia SP.
(Envira), Couratari SP. (Tauari), Hymenolobium SP. Fabaceae (Angelim) e
Calycophillum SP. Rubiacaee (mulateiro da várzea).
Os valores encontrados de densidade aparente dessas espécies
madeireiras são todos superiores a 500 kg/m
3
. Desta forma, adotou-se esse valor
para efeito deste trabalho, em face da heterogeneidade das espécies encontradas
no bioma da várzea do rio Madeira, além de permitir um cenário conservador, ou
seja, os valores usados não implicarão em superestimações.
Uma vez definida a densidade, foram calculados os valores de volumes
disponíveis, a partir do qual se chegou aos volumes a granel disponíveis, bastando,
para tal, efetuar a multiplicação por sua densidade a granel, ou seja:
V
g
= M
disp
×γ [4], onde:
V
g
– Volume a granel disponível;
M
disp
– massa disponível;
γ – densidade a granel da biomassa.
A densidade a granel é obtida por meio de ensaio normatizado pela NBR
6922, onde se verifica o peso da biomassa para uma amostra com volume igual a
0,216 m
3
. Para este ensaio a biomassa deverá estar com sua granulometria
adequada ao requerido pelo sistema a ser adotado. Para efeito deste trabalho foi
adotado o valor de 245 kg/m
3
, obtido a partir da média das 43 espécies amazônicas
caracterizadas em Feitosa Netto et al (2006).
94
Os resultados de massa disponível e volume a granel para cada localidade
onde as operações de retirada de paliteiro foram realizadas, usando-se para tal a
média das retiradas, constam da tabela 4.
Uma vez conhecidos os volumes a granel, o potencial de geração de
energia elétrica pode ser avaliado por meio do produto da densidade energética da
biomassa pelo volume a granel, ou seja:
P
ele
= δ × V
g
[3], onde:
P
ele
– Potencial de geração de energia elétrica (MJ);
δ – densidade energética (MJ/m
3
);
V
g
– Volume a granel (m
3
).
A densidade energética adotada neste trabalho foi de 4.893 MJ/m
3
,
resultante da média obtida para 43 espécies amazônicas publicadas em DUARTE et
al, 2007.
Os valores calculados em MJ foram convertidos para kWh, e em seguida,
foram calculadas as potências disponíveis em kVA, considerando um fator de carga
de 0,4, além do número de unidades consumidoras que o sistema é capaz de
atender, tomando-se como referência o valor unitário de 2,5 kVA, obtido a partir de
relatório de fevereiro de 2009 do Programa Luz para Todos, Coordenação Estadual
do Amazonas. A tabela 4.5 mostra os resultados obtidos.
Tabela 4.5 Potencial de geração de energia elétrica e do número de unidades
consumidoras a serem atendidas utilizando a biomassa retirada de paliteiros do rio Madeira.
Local Massa Vol. a Energia Potência Número de
disponível(kg)
granel (m3) (kWh) (kVA) Unid. Cons.
Foz do
Paraná do
Madeirinha 104.680,00
427,27
116.112,43
41,42
17
Porto do
Cruzeiro
175.100,00
714,69
194.223,22
69,29
28
Santa Rosa 209.355,00
854,51
232.219,32
82,84
33
Enseada
Cachoeirinha
155.295,00
633,86
172.255,26
61,45
25
Paraná do
Jenipapo 222.230,00
907,06
246.500,44
87,94
35
95
Continuação da tabela 4.5 Potencial de geração de energia elétrica e do número de
unidades consumidoras a serem atendidas utilizando a biomassa retirada de paliteiros do rio
Madeira.
Local Massa Vol. a Energia Potência Número de
disponível(kg)
granel (m3) (kWh) (kVA) Unid. Cons.
Costa Bela
Vista do
Atininga 234.445,00
956,92
260.049,48
92,77
37
Ilha do
Salomão 309.943,00
1.265,07
343.792,85
122,64
49
Papagaios 276.175,00
1.127,24
306.336,94
109,28
44
Iha dos
Periquitos
/Curicaca 226.474,00
924,38
251.207,94
89,61
36
Capitari 283.125,00
1.155,61
314.045,97
112,03
45
Mutum 408.540,00
1.667,51
453.157,94
161,66
65
Totais
1.630.591,00
6.655,47
1.808.672,97
645,22
258
96
Capítulo 5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
5.1 INTRODUÇÃO
No intuito de se poderem obter subsídios para dar suporte a uma
conclusão adequada quanto ao aproveitamento energético da biomassa disponível a
partir de operações de retirada de “paliteiros” no rio Madeira, foram desenvolvidas
análises quanto aos aspectos de viabilidades técnica, econômica, ambiental, legal e
social, relatadas a seguir.
Aspectos de viabilidade técnica:
As retiradas de “paliteiros” do rio Madeira realizadas pelo Governo
Federal, por intermédio da AHIMOC, entre os anos de 2000 a 2005, indicam um
potencial de aproveitamento para geração de energia elétrica constante na tabela
4.5, onde se verifica que o aproveitamento de toda a biomassa redundaria em uma
potência de aproximadamente 645 KVA.
Esse aproveitamento energético poderia ter gerado eletricidade suficiente
para atender algo em torno de 258 unidades consumidoras (UCs) ao longo desses
anos, ao invés de sua disponibilização nas margens do rio Madeira, sem qualquer
utilidade, como de fato aconteceu.
Três cenários distintos podem ser conjecturados como estratégias de
aproveitamento dessa biomassa: uso em comunidades próximas a cada local de
retirada; geração em local próximo ao atingimento da capacidade volumétrica do
veículo usado para transporte da biomassa (balsa); e o aproveitamento em um único
local de todo o material lenhoso retirado.
Desses cenários, o que supõe o aproveitamento em comunidades
próximas ao local onde o limite de transporte da balsa é alcançado é o que não
causa alterações na rotina usada até o presente momento na retirada de “paliteiros”,
com consequente manutenção de custos por parte da AHIMOC.
Essa rotina, adotada pelas empresas responsáveis pela retirada de
“paliteiros”, contratadas pela AHIMOC, consistia em processo operacional em que
foram usadas balsas equipadas com guindastes que permitiam cargas a 25
97
toneladas. Para evitar riscos de tombamento das balsas e no intuito de permitir
armazenamento adequado nas mesmas, com melhor aproveitamento de suas
capacidades, os troncos de árvores retirados sofreram redução de suas dimensões
por meio de motosseras.
Desta forma foi possível armazenar um volume equivalente a 1000 m
3
de
madeira em uma única balsa, nos anos em que as retiradas foram realizadas, tendo
sido, em seguida, dispostos às margens do rio Madeira, em local onde a empresa
responsável pela operação considerava reduzidas as chances de retorno às águas,
antes de reiniciar a operação.
Na hipótese de adoção do cenário de não alteração da rotina de retirada
de “paliteiros”, considerando-se a média dos volumes obtidos entre 2001 e 2005,
verifica-se a possibilidade de uso da biomassa disponível para alimentação de
quatro usinas: três de 158 kW, para fazer uso de 1000 m
3
de biomassa cada uma,
que permitiria atender 79 UCs por usina, totalizando 237 UCs; e uma usina de 40
kW, para fazer uso de 261 m
3
, capaz de atender 21 UCs.
Focando-se a demanda, no cenário mencionado, verifica-se oportunidade
de geração na comunidade São Carlos, situada nas proximidades do local
conhecido como Curicaca, no estado de Rondônia. Nessa comunidade existe
fornecimento de energia elétrica pelo Poder Público, sob responsabilidade de um
Produtor Independente de Energia - PIE, com potência efetiva de 284 kW. A
implantação de sistema de geração com aproveitamento da biomassa permitiria o
atendimento de todos os consumidores hoje supridos por usina termelétrica a diesel.
Outra localidade que apresenta potencial para uso da biomassa é a sede
da cidade de Humaitá, bem próxima ao local de retirada de “paliteiro” conhecido
como Ilha do Salomão. Nesta cidade, segundo CEAM (2008), existe geração
termelétrica a diesel para 6765 consumidores, com 8850 kW de potência instalada,
das quais 1600 kW são gerados por PIE.
Em Humaitá, onde o mercado é bem mais robusto, a implantação desse
tipo de sistema significa um acréscimo de apenas 5,83% na oferta de energia, porém
possibilitaria o atendimento de eventual demanda reprimida.
Considerando-se este nível de potência, bem como as rotas tecnológicas
disponíveis no mercado, evidenciam-se vantagens competitivas no uso do sistema
de gaseificação em relação às demais tecnologias, haja vista seu grau de
maturidade e eficiência.
98
Fica reforçada a opção pela gaseificação se for considerada a hipótese de
aproveitamento da biomassa de forma não concentrada, sem que isso ocorra em um
único local, uma vez que os níveis de potência seriam necessariamente menores,
reduzindo mais ainda a competitividade das outras rotas tecnológicas disponíveis no
mercado.
Ressalta-se a possibilidade de aquisição de sistema de gaseificação no
mercado internacional, haja vista a inexistência de fornecedores nacionais para esse
tipo de equipamento, muito embora experiências implementadas no Brasil
demonstrem a capacidade técnica de desenvolvimento de tecnologia nacional ou
mesmo de adaptação dessa tecnologia.
Ressalta-se, ainda, que não grandes dificuldades de preparação de
mão-de-obra para lidar com gaseificadores quando se compara com a capacidade
técnica necessária para operar sistemas a diesel.
Outro aspecto a considerar diz respeito à hipótese de necessidade de
substituição ou complementação de biomassa para o sistema de gaseificação,
considerando-se a possível escassez desta fonte lenhosa do rio Madeira, ou mesmo,
da necessidade de atendimento de ampliação da demanda. Nestes casos salienta-
se ser perfeitamente viável para o sistema de gaseificação a possibilidade de uso de
outras biomassas porventura existentes nas comunidades, preferencialmente as
resultantes de processos produtivos como, por exemplo, a casca de castanha e a
casca de cupuaçu. Existe, também, a possibilidade de atendimento desta demanda
a partir de cultivo manejado de espécies energéticas, podendo para tanto
priorizarem-se áreas degradadas.
Em resumo a viabilidade técnica está caracterizada em face da
disponibilidade de fonte, no caso a biomassa lenhosa, em quantidade e qualidade
para aproveitamento na geração de eletricidade, existe demanda para a energia
elétrica nas proximidades da disponibilidade, além da existência de tecnologia, sem
grandes barreiras quanto à aquisição, à operação e à manutenção.
Aspectos de viabilidade econômica:
Foram efetuadas avaliações concernentes aos custos de geração da
energia elétrica, considerando-se o sistema de gaseificação e o de termelétrica a
diesel. A escolha de termelétrica a diesel para comparação deve-se ao fato de ser
este sistema o mais usado atualmente nas comunidades isoladas da Amazônia em
que esse serviço está disponibilizado. Os resultados obtidos estão apresentados na
99
tabela 5.1, e consideram a hipótese de instalação em local onde existe geração
usando combustível de origem fóssil.
Tabela 5.1 - Custos de geração com sistema de gaseificação e termelétrica a diesel
Gerador a Diesel
Gaseificação
Potência [kW] 158 158
Custo de instalação [R$/kW] 1.629,00 3.258,00
Custo de capital [R$] 257.382,00 128.691,00
Custo anual de O&M [R$] 992.604,32 392.280,31
Custo anual com biomassa [R$] Não aplicável 50.103,70
Custo anual com diesel [R$] 872.275,59 218.068,90
Custo anual com óleo lubrificante 10.149,74 10.149,74
Energia produzida [MWh/ano] 968,86 968,86
Taxa minima de atratividade [%] 12 12
Vida útil [ano] 15 15
Custo de geração [R$/MWh] 1.063,52 502,44
É importante ressaltar que em ambos os casos, biomassa e diesel, foram
adotadas as mesmas taxas de juro anual (12%) e o mesmo período de vida útil dos
equipamentos (15 anos). O consumo de diesel usado foi de 0,285 l/kWh e de 0,0015
de óleo lubrificante para o grupo-gerador, obtido de CEAM (2008), e 75% como
índice de substituição do diesel no sistema de gaseificação. Além disso, considerou-
se o ressarcimento de 75% do investimento, para o caso da biomassa, em face de
dispositivo legal previsto na Lei 12.111/2009, concernente à CCC. O custo da
biomassa foi estimado em R$ 0,036/kg, apesar da hipótese da sua disponibilidade
em local próximo à geração, para fazer face à despesas com transporte da biomassa
até a usina, bem como a redução de suas dimensões, visando à compatibilização
com o sistema de gaseificação.
Assim sendo, observa-se que o sistema de gaseificação apresenta custo
de geração que representa apenas 47,24% do custo na termelétrica a diesel.
A partir dos resultados obtidos dos custos de geração foram calculadas as
figuras de mérito pay back, VLP e TIR, usando-se para tanto o fluxo de caixa
incremental, ou seja, as diferenças entre os custos de capital e os benefícios das
100
opções termelétrica a diesel e gaseificação, aqui abordadas, constantes da tabela
5.2.
Tabela 5.2 - Pay back, VLP e TIR, considerando o fluxo de caixa incremental, considerando-se as
opções de geração a diesel e gaseificação.
Custo de capital incremental [R$] 128.691,00
Benefício incremental anual [R$] 281.901,28
Taxa mínima de atratividade [% a.a.] 12
Vida útil [anos] 15
FIGURAS DE MÉRITO
VLP [R$] 1.791.300,43
TIR [% a.a.] 219,05
Pay back time [anos] 0,46
Os resultados apresentados na tabela 5.2 permitem a constatação de
vantagem econômica da adoção do sistema de gaseificação.
Aspectos de viabilidade ambiental
A retirada de obstáculos flutuantes da Hidrovia do Madeira está prevista
dentre um conjunto de ações preconizadas no seu Plano de Controle Ambiental, em
face da necessidade de permitir condições mínimas de segurança para a
navegabilidade deste importante rio da Amazônia. A disposição desse material
retirado de forma concentrada em suas margens tem-se constituído em um
problema ambiental, haja vista que potencializa a proliferação de vetores de
doenças. O uso desse material para geração de energia elétrica apresenta-se como
interessante opção para a solução desse gargalo.
ainda que se ressaltar que no que concerne à tecnologia proposta,
neste caso o sistema de gaseificação, a obtenção de licenciamento ambiental é
perfeitamente factível, em face de estágio atual de desenvolvimento dessa
tecnologia.
É importante destacar que na hipótese de substituição de termelétrica a
diesel implantada pelo sistema de gaseificação, ocorrem ganhos quanto às
emissões na atmosfera de gases de efeito estufa, haja vista que o uso de biomassa
como fonte remete a um balanço zero de emissão de CO
2
, o que não ocorre no caso
de uso de combustíveis de origem fóssil.
101
Aspectos de viabilidade legal
A manutenção da navegabilidade em hidrovias no Brasil faz parte das
obrigações do estado. O rio Madeira é considerado como uma hidrovia federal e por
conta disso cabe ao Ministério dos Transportes, via Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes DNIT, a obrigação da manutenção das condições
permanentes de sua navegação. Por conta disso é que são realizadas as operações
de retirada de “paliteiros” possibilitando, assim, a disposição da biomassa lenhosa.
Outro aspecto a considerar diz respeito à Lei 12.111/2009 que incentiva o
uso de biomassa para geração de energia.
Aspectos de viabilidade social
Do ponto de vista social não se vislumbra qualquer impacto negativo em
face de instalações de usinas com o sistema proposto, tão somente aspectos
positivos decorrentes da geração de postos de trabalho e renda, como conseqüência
direta da implantação, bem como dos inúmeros ganhos ocasionados pela oferta de
energia elétrica aos domicílios, escolas, postos de saúde, etc.
5.2 CONCLUSÕES
Os resultados aqui apresentados sinalizam a oportunidade de uso inédito
para geração de energia elétrica de uma biomassa disponibilizada pela natureza de
maneira viável sob a ótica técnica, econômica, ambiental, legal e social.
A viabilização desta geração requer a adoção de política pública neste
sentido, a partir do estabelecimento de ações entre entes pertencentes ao mesmo
poder público, no caso os Ministérios dos Transportes, de Minas e Energia e do Meio
Ambiente, onde o primeiro dispõe da biomassa e o segundo possibilitaria o seu
uso como fonte energética em programa de universalização.
Verifica-se que os empreendimentos ora em curso no rio Madeira, leia-se
a construção das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, não comprometem o uso
energético contemplado no estudo, haja vista que a ocorrência de “paliteiros” está
intrinsecamente ligada ao fenômeno das terras caídas.
Por fim, conclui-se que o aproveitamento energético da biomassa lenhosa
tem potencial de atração de capital privado, o que poderá levar, inclusive, a redução
de custos públicos.
102
5.3 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS
Estudos relativos à replicação da experiência em outras calhas de rios da
Amazônia em que acontece fenômeno semelhante, como no rio Solimões, seriam
oportunizados a partir do amadurecimento tecnológico da rota de gaseificação aqui
proposta.
que se considerar, também, a oportunidade de realização de estudos
relativos à disponibilidade de outras biomassas, considerando as situações de
aumento da demanda ou de redução de oferta da biomassa proposta, originárias de
diversas atividades econômicas, destacando-se o extrativismo e a agricultura
famílias, ou de culturas energéticas manejadas.
103
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. ADMINISTRAÇÃO DAS HIDROVIAS DA AMAZÔNIA OCIDENTAL AHIMOC.
Plano de Controle Ambiental da Hidrovia do Madeira, 1999.
2. ADMINISTRAÇÃO DAS HIDROVIAS DA AMAZÔNIA OCIDENTAL AHIMOC.
Relatório Final de Desobstrução de Trecho Crítico do Canal Preferencial do Rio
Madeira, 2000.
3. ADMINISTRAÇÃO DAS HIDROVIAS DA AMAZÔNIA OCIDENTAL AHIMOC.
Monitoramento Ambiental da Hidrovia do Madeira. 2003.
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